a imunidade parlamentar no estado democrÁtico de direito

12
A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Revista de Direito Constitucional e Internacional | vol. 42 | p. 190 | Jan / 2003 Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional | vol. 4 | p. 183 | Mai / 2011DTR\2003\50 Flávia Piovesan Guilherme Figueiredo Leite Gonçalves Área do Direito: Constitucional; Penal Sumário: 1.Introdução - 2.Do direito medieval ao Estado Moderno: a imunidade parlamentar como aquisição evolutiva ou ruptura? - 3.A prevalência da imunidade parlamentar no Estado Liberal - 4.O Estado Social e a flexibilização do conceito de imunidade parlamentar - 5.A imunidade parlamentar no Estado Democrático de Direito 1. Introdução Qual é o sentido da imunidade parlamentar na ordem contemporânea? O que estaria a justificar a sua previsão nos textos constitucionais atuais? Como compatibilizá-la com os princípios da igualdade e da responsabilidade dos agentes públicos? Por que parlamentares devem possuir um tratamento especial perante a lei? Seria a imunidade uma prerrogativa ou um privilégio, capaz de assegurar a impunidade dos parlamentares? O objetivo deste ensaio é investigar a razoabilidade da persistência da imunidade parlamentar, particularmente da imunidade processual, no modelo contemporâneo de Estado Democrático de Direito, com especial atenção à Constituição brasileira de 1988. Vale dizer, este artigo propõe-se a avaliar se a exigência da prévia licença do Legislativo para processar criminalmente parlamentares, nos termos previstos pelo art. 53, § 1.º, da CF/1988, é consonante com os princípios de um Estado Democrático de Direito. Note-se que há a imunidade parlamentar material e a processual. 1 A imunidade parlamentar material refere-se à inviolabilidade por opiniões, palavras e votos expressos por parlamentares. Objetiva assegurar a ampla liberdade de expressão ao parlamentar, a fim de garantir o bom exercício do mandato, excluindo-se a incidência do crime quando da manifestação de opiniões, palavras e votos por deputados e senadores. Já a imunidade formal ou processual refere-se aos institutos do processo-crime e da prisão. Conforme estabelece o texto constitucional de 1988, "os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente sem prévia licença de sua Casa". O presente estudo atém-se a esta última modalidade de imunidade - notadamente ao instituto que condiciona o processo criminal à autorização do Legislativo - e sua (in)compatibilidade com os ditames de um Estado que se pretende Democrático e de Direito. Sob a perspectiva histórica, inicialmente, serão desvendadas as origens do instituto da imunidade parlamentar, com a análise do direito medieval e sua transição para o direito do Estado Moderno. Será então enfocada a imunidade parlamentar no Estado Liberal e a sua flexibilização no Estado Social. É a partir deste amplo marco histórico que o instituto da imunidade será examinado à luz das tendências contemporâneas, que afirmam o Estado Democrático de Direito, com ênfase na ordem democrática inaugurada pela Constituição Federal de 1988. Rever um instituto jurídico à luz de um novo paradigma requer uma reconstrução histórica capaz de precisar com maior exatidão o conteúdo do objeto do estudo. A investigação das origens e do processo evolutivo da imunidade parlamentar permitirá incorporar à análise um componente, ao mesmo tempo, reflexivo e crítico. Cada etapa do desenvolvimento histórico servirá de fundamento para a edificação de um conceito de imunidade parlamentar. 2 Esta análise histórica possibilitará o posterior questionamento do instituto em face dos princípios informadores do Estado Democrático de Direito e das tendências da ordem internacional contemporânea. Sob o prisma histórico, o maior obstáculo para o enfrentamento do problema da imunidade parlamentar refere-se ao seu surgimento. Em primeiro lugar, buscar-se-á estabelecer se existe ou não algum vínculo entre os privilégios medievais do direito inglês e o conceito moderno atribuído ao instituto. O movimento constitucionalista do século XVIII teria incorporado as práticas A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO Página 1

Upload: arnaldo-b-s-neto

Post on 30-Nov-2015

47 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

Page 1: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Revista de Direito Constitucional e Internacional | vol. 42 | p. 190 | Jan / 2003Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional | vol. 4 | p. 183 | Mai / 2011DTR\2003\50

Flávia Piovesan

Guilherme Figueiredo Leite Gonçalves

Área do Direito: Constitucional; PenalSumário:

1.Introdução - 2.Do direito medieval ao Estado Moderno: a imunidade parlamentar como aquisiçãoevolutiva ou ruptura? - 3.A prevalência da imunidade parlamentar no Estado Liberal - 4.O EstadoSocial e a flexibilização do conceito de imunidade parlamentar - 5.A imunidade parlamentar noEstado Democrático de Direito

1. Introdução

Qual é o sentido da imunidade parlamentar na ordem contemporânea? O que estaria a justificar asua previsão nos textos constitucionais atuais? Como compatibilizá-la com os princípios da igualdadee da responsabilidade dos agentes públicos? Por que parlamentares devem possuir um tratamentoespecial perante a lei? Seria a imunidade uma prerrogativa ou um privilégio, capaz de assegurar aimpunidade dos parlamentares?

O objetivo deste ensaio é investigar a razoabilidade da persistência da imunidade parlamentar,particularmente da imunidade processual, no modelo contemporâneo de Estado Democrático deDireito, com especial atenção à Constituição brasileira de 1988. Vale dizer, este artigo propõe-se aavaliar se a exigência da prévia licença do Legislativo para processar criminalmente parlamentares,nos termos previstos pelo art. 53, § 1.º, da CF/1988, é consonante com os princípios de um EstadoDemocrático de Direito. Note-se que há a imunidade parlamentar material e a processual. 1Aimunidade parlamentar material refere-se à inviolabilidade por opiniões, palavras e votos expressospor parlamentares. Objetiva assegurar a ampla liberdade de expressão ao parlamentar, a fim degarantir o bom exercício do mandato, excluindo-se a incidência do crime quando da manifestação deopiniões, palavras e votos por deputados e senadores. Já a imunidade formal ou processualrefere-se aos institutos do processo-crime e da prisão. Conforme estabelece o texto constitucional de1988, "os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crimeinafiançável, nem processados criminalmente sem prévia licença de sua Casa". O presente estudoatém-se a esta última modalidade de imunidade - notadamente ao instituto que condiciona oprocesso criminal à autorização do Legislativo - e sua (in)compatibilidade com os ditames de umEstado que se pretende Democrático e de Direito.

Sob a perspectiva histórica, inicialmente, serão desvendadas as origens do instituto da imunidadeparlamentar, com a análise do direito medieval e sua transição para o direito do Estado Moderno.Será então enfocada a imunidade parlamentar no Estado Liberal e a sua flexibilização no EstadoSocial. É a partir deste amplo marco histórico que o instituto da imunidade será examinado à luz dastendências contemporâneas, que afirmam o Estado Democrático de Direito, com ênfase na ordemdemocrática inaugurada pela Constituição Federal de 1988.

Rever um instituto jurídico à luz de um novo paradigma requer uma reconstrução histórica capaz deprecisar com maior exatidão o conteúdo do objeto do estudo. A investigação das origens e doprocesso evolutivo da imunidade parlamentar permitirá incorporar à análise um componente, aomesmo tempo, reflexivo e crítico. Cada etapa do desenvolvimento histórico servirá de fundamentopara a edificação de um conceito de imunidade parlamentar. 2Esta análise histórica possibilitará oposterior questionamento do instituto em face dos princípios informadores do Estado Democrático deDireito e das tendências da ordem internacional contemporânea.

Sob o prisma histórico, o maior obstáculo para o enfrentamento do problema da imunidadeparlamentar refere-se ao seu surgimento. Em primeiro lugar, buscar-se-á estabelecer se existe ounão algum vínculo entre os privilégios medievais do direito inglês e o conceito moderno atribuído aoinstituto. O movimento constitucionalista do século XVIII teria incorporado as práticas

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 1

Page 2: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

consuetudinárias do Parlamento inglês iniciadas na alta Idade Média ou a Revolução Francesaaboliria definitivamente qualquer fórmula político-jurídica do Ancien Regime? Existe um fio condutorentre a sociedade estamental e a moderna? Definir a raiz histórica do instituto repercutirá nacaracterização que o mesmo adquirirá ao longo do século XX e no questionamento de suamanutenção no direito contemporâneo.

Desvendada a origem da imunidade parlamentar, será investigado o modo pelo qual os EstadosLiberal e Social incorporaram tal instituto. Delimitar-se-á a capacidade funcional da imunidadeparlamentar nas duas formas estatais, indagando se realmente cumpriu o papel convencionado peladoutrina jurídica clássica, aquele de proteção institucional da Casa Legislativa. Isto é, será avaliadoem que medida a imunidade parlamentar exerceu a prerrogativa de instrumento-garantia do sistemapolítico representativo e do funcionamento do Parlamento (sob a lógica da política relativa àmaioria/minoria; governo/oposição), ou, em que medida desvirtuou-se desta função atuando sob aforma de escudo pessoal para acobertar crimes comuns cometidos por parlamentares.

Os argumentos levantados proporcionarão rediscutir as tendências modernas do instituto e arazoabilidade de sua manutenção na sociedade contemporânea. Nesta análise serão abordadas astendências do direito internacional contemporâneo, bem como a propensão do constitucionalismocomparado em relativizar a imunidade parlamentar. Por fim, será avaliada a imunidade processualparlamentar à luz da Constituição Federal de 1988 e sua (in)compatibilidade com as exigências deum Estado Democrático de Direito.2. Do direito medieval ao Estado Moderno: a imunidade parlamentar como aquisição evolutivaou ruptura?

Constata-se uma absoluta imprecisão histórica relativa às origens do instituto da imunidadeparlamentar. A teoria constitucional, até hoje, não estabeleceu um consenso quanto a esta origem.De um lado, há o seu nascimento identificado com a noção de privilégio do direito medieval inglês,que teria sido posteriormente recepcionado pelo constitucionalismo do século XVIII e adaptado aoinstituto do Parlamento moderno. De outro, há a demarcação da Revolução Francesa como fonte deruptura e criação da imunidade parlamentar. 3

Na Inglaterra medieval, é possível identificar dois institutos conferidos aos membros do Parlamento:o freedom of speech e o freedom from arrest. O primeiro impedia que qualquer membro doParlamento fosse conduzido a um tribunal pelas opiniões ou votos que proferisse no exercício de suafunção. Já o segundo referia-se à impossibilidade de um mandatário ser aprisionado por dívidas. 4

Ambos institutos foram muitas vezes violados e reafirmados até o Bill of Rigths de 1689, que em seuart. 9.º consagrou o freedom of speech. 5O freedom from arrest tornou-se ineficaz neste período tãologo a prisão por dívidas foi abolida do direito inglês. 6

Importa, no entanto, saber se o instituto da imunidade processual parlamentar encontra fundamentonessas categorias jurídicas medievais. Tal como Alcindo Pinto Falcão, destacar-se-á o sistemarepresentativo como ponto de partida argumentativo. 7Isto porque a imunidade parlamentar estáintimamente associada à modalidade de regime eletivo: somente os representantes são invioláveispor seus atos. Conforme os parâmetros da democracia, afirma Celso Fernandes Campilongo, 8paraexercer a representação de forma ampla e irrestrita, há que observá-la "como uma propriedade dosistema político". Não se pode reduzi-la à "relação interindividual" entre representante erepresentado e, muito menos, a uma "relação intergrupal" na qual a Assembléia representa toda acomunidade.

Se a imunidade parlamentar está intrinsecamente relacionada ao sistema representativo, indaga-se:o Parlamento inglês medieval refletia este modelo representativo?

Ao contrário do que se postula, a história do parlamentarismo britânico não se verificou de maneiratotalmente diferenciada das demais instituições da Europa continental na Idade Média. 9Advém,igualmente, de uma instância decisória feudal sustentada unicamente pelo domínio da terra,interpretada como unidade exclusiva de produção. Desenvolve-se, entretanto, e este é seu mérito,num ambiente histórico-social propício ao renascimento comercial. Estas condições favoreceram,primeiramente, a consolidação do absolutismo 10e, depois, a limitação do poder real pelo próprioParlamento. Isto não significa, em absoluto, que, na sociedade estamental, ele já possuía qualquercaracterística democrática. O Parlamento medieval inglês deve ser definido mais sob a perspectiva

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 2

Page 3: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

de um organismo consultivo, ato de criação do rei e hierarquicamente inferior à sua vontade, quecomo uma instituição representativa da vontade popular.

As relações políticas de representação no Estado estamental assentam-se em um liame de naturezacontratual e não pública, como prevista na sociedade moderna. Segundo Ricardo L. ChuecaRodriguez, surgiam do estabelecimento de uma prévia subordinação obrigacional de caráter pessoalsuserano-vassalo. 11Nesse sentido, as "eleições" reafirmavam o que já estava prescrito no vínculo davassalagem: os proprietários menos poderosos colocavam-se a serviço dos maiores, recebendo emtroca sua proteção. 12As eleições não simbolizam a consecução de aspirações, mas o respeito aocontrato feudal. Este é o modelo político original da Câmara dos Lordes. A mesma lógica de relaçãode trocas é transposta para a Câmara dos Comuns: a carência de recursos financeiros do monarcapossibilitava a participação daqueles que pagavam impostos. A fórmula é notória no taxation withoutrepresentation. A representatividade era circunscrita à corporação de ofício e não à coletividade. 13

Esses grupos sociais articulavam-se e deliberavam acerca daquilo que fôra previamente estipuladocontratualmente. 14

A sociedade medieval caracterizava-se pela diferenciação hierárquica entre os grupos sociais. Opapel de cada indivíduo era definido de acordo com sua posição familiar e o estamento que asustentava. Inexistia qualquer possibilidade de mudança, sob pena de se violar o pacto políticofeudal. Ao invés da dialética moderna das democracias contemporâneas, as relações entre as castaseram, como condição de preservação do status quo, regidas pelo princípio da reciprocidade. 15Aodireito sobre a terra do senhor feudal conjugava-se o direito de ser protegido do servo. Destavinculação mútua de "direitos" exclui-se a correlação com deveres. Na Idade Média, ainda não existea idéia de prestação obrigacional, mas de corporação: 16a commendatio feudal pressuponha umaunião assimétrica por afeição, respeito mútuo e lealdade. 17As castas são, segundo Otto Hintze,construídas menos por diferenças socioeconômicas da população que por privilégios firmados doponto de vista jurídico e político. 18

A Igreja Católica influenciou decisivamente as estruturas políticas que começaram a se formar naAlta Idade Média. A organização do Vaticano na escolha do clero superior, com base no princípioeletivo, estendeu-se a várias instituições laicas, inclusive ao Parlamento inglês nos seus primórdios.Se a regra da maioria foi adotada pelo laboratório eclesiástico e, como pretende Otto von Gierke,prolongada ao Estado, devemos observá-la com restrições e compreendê-la sob a égide dasociedade estamental. 19

Falava-se em maioria, mas não se pode perder de vista que o cristianismo possui como premissafundamental a prevalência da vontade divina sobre a humana. Poderia, então, existir uma minoriaque negasse os desígnios de Deus? Para o direito canônico, a decisão deve ser tomada com vistasao justo, ao bom-senso e ao princípio da eqüidade. 20Os eleitores eram chamados de testemunhasda veleidade transcendental: os que votavam contra eram reprimidos e excomungados. 21Se noparadigma católico prevaleceu o princípio da unanimidade, a realidade não foi diferente no ambienteestatal. Segundo Edoardo Ruffini, no Parlamento inglês, a maioria aprovou pela primeira vez uma leisomente em 1554. "O procedimento normal era a aclamação". 22Aqui, também predominava obom-senso como clara alusão ao commendatio feudal. O princípio da unanimidade concebeu aminoria como um obstáculo, relegando-a à esfera penal. 23

Na verdade, pressupor a unanimidade significa a inexistência da minoria. Se a imunidadeparlamentar deve assegurar a expressão da oposição, faz ela sentido neste contexto? Tal instituto,de fato, exerceria alguma função diante do pacto feudal?

A concepção moderna de imunidade parlamentar é incompatível com o sistema político medieval.Torna-se claro, portanto, que o instituto do freedom of speech não pode ser confundido com aimunidade no sentido de instrumento jurídico de defesa do Parlamento e dos parlamentares diantedos ataques da Coroa. Tratava-se, isto sim, de uma categoria adicional ao "direito" de ser ouvido nasdecisões reais. Os conselhos daqueles grupos sociais, vassalos ou mestres de ofício, seriamescutados sem nenhum óbice, até como forma de viabilizar o princípio da unanimidade e a lealdadedo commendatio feudal. 24

A imunidade parlamentar pressupõe sistema representativo e democracia para se desenvolver. Nãoé possível contextualizá-la em estamentos vinculados por contratos privados, mas apenas em umespaço público heterogêneo de representação social. O freedom of speech não era outra coisasenão uma cláusula complementar de reciprocidade entre vassalos e suseranos. A consciência

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 3

Page 4: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

política da imunidade parlamentar "surge de uma dinâmica que só atingiu a população a partir domomento em que esta foi mobilizada e individualizada por meio de processos de modernizaçãoeconômica e social que a libertaram dos laços sociais corporativos". 25

A imunidade parlamentar surgiu, de fato, na Revolução Francesa, no final do século XVIII, comoprerrogativa do Parlamento moderno e do sistema representativo. Logo que a Assembléia Nacionalfoi constituída, promulgou-se o Decreto de 20.06.1789, contendo os ditames da inviolabilidade dosdeputados. Seguiu-se a este, o Decreto de 26.06.1790, ampliando o instituto da imunidade, enquanto"instrumento constitucional necessário para assegurar a independência e a liberdade dos membrosdo Parlamento". A Constituição de 1791 compilou toda a legislação esparsa, consagrando aimunidade parlamentar nos arts. 7.º e 8.º, da Seção 5.º, do Capitulo I, de seu Título III.

No Estado Moderno, a esfera política encontra-se fracionada. O Parlamento, conforme GianfrancoPoggi, "deve ser o mediador entre a 'multiplicidade' de opiniões individualmente sustentadas (cadauma delas com sua expressão garantida pelos 'direitos públicos') e a necessidade de um comandounívoco e geral para resolver e reduzir a diversidade de opiniões. Para tanto, o Parlamento não podefuncionar puramente como um reflexo condensado da distribuição da opinião pública; também devesimplificar essa distribuição, focalizar questões e gerar alinhamentos, coligações, maioria eoposição". 26A controvérsia, enquanto condição de decidibilidade, atribui à imunidade parlamentaruma função essencial na formação da democracia contemporânea: além de neutralizar o Legislativoda ingerência dos demais poderes, viabiliza a existência de minorias.

A soberania do Parlamento deve ser observada como efeito da soberania popular alcançada pelaRevolução Francesa. Todavia, esta assunção não foi automática ou mero preenchimento da lacunadeixada pela queda da Coroa, mas um processo que se inicia a partir da ruptura com o passado. 27Éuma construção histórica fundada na conquista de direitos, em que o espaço da cidadania,gradativamente, passa a se confundir com a redoma estatal. 28

É sob esta perspectiva que há de se conceber o sistema representativo moderno e seu papel nocampo da legitimação social e política, pautado no valor da soberania popular. Neste contexto, érazoável compreender o instituto da imunidade parlamentar a sua expansão na sociedade moderna,como instrumento a neutralizar a interferência dos demais Poderes e a assegurar a dinâmica do jogomaioria/minoria.3. A prevalência da imunidade parlamentar no Estado Liberal

Como propõe Otto Hintze, a representação de um povo é considerada o substrato típico do EstadoModerno. 29Influenciará na chamada virada ao direito positivo ou superação do "Governo doshomens" para o "Governo das leis". Sem a figura do soberano, a legitimidade do Estado se dava noâmbito daqueles que expressavam a vontade popular: "o povo fala por meio de seusrepresentantes". 30Assim, se a sede da soberania era o Parlamento, a produção legislativarepresentava os anseios da população em garantir a coesão e controle social. No modelo liberal, oPoder Legislativo ocupa uma posição primordial na organização da sociedade. 31

A imunidade parlamentar se caracterizara pela função de preservar o status alcançado peloParlamento, o que significa concebê-la como um mecanismo protetor da vontade e soberaniapopular, obstando a ingerência de outros Poderes na atividade política. 32

No século XIX, a imunidade parlamentar adquiriu, contrapondo-se à sombra do monarca supremo,um caráter absoluto. 33O Decreto de 20.06.1789 na França, o primeiro a dispor sobre o tema, aafirmava com o seguinte teor: "A Assembléia proclama que é inviolável a pessoa de cada deputado.Qualquer indivíduo, organização, tribunal, magistratura ou comissão que, durante ou depois dassessões parlamentares, pretender perseguir, investigar, ameaçar ou fazer ameaçar, deter ou fazerdeter, por motivo de alguma proposta, parecer ou discurso, manifestado ou pronunciado nos Estadosgerais e, igualmente aqueles que colaborarem com os atentados anteriores, seja quem for aautoridade que houvesse ordenado, serão considerados infames e traidores da nação e culpados decrime capital. A Assembléia Nacional estabelece que nos casos precedentes tomará todas asmedidas necessárias para investigar perseguir e castigar os responsáveis, e instigadores eexecutores". O temor de se retornar ao Ancien Regime conferia ao deputado a garantia de poderfalar e votar da maneira que lhe conviesse e também não ser preso ou processado sem a aprovaçãode sua Assembléia.

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 4

Page 5: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Na verdade, o instituto da imunidade nasce com a finalidade de impedir que o arbítrio obstasse aatividade parlamentar. Ao Parlamento eram asseguradas todas as garantias capazes de imunizá-lodo temor e da ingerência indevida dos demais Poderes. Pode-se fazer, assim, uma associação daimunidade parlamentar com o contexto de consolidação dos direitos civis e políticos. Pelaprerrogativa, preservava-se a integridade liberal-democrática das ameaças de qualquer poderestranho ao Parlamento e de perseguição da minoria, o que, na prática, seria o regresso ao impériodos príncipes.

Representação política e democracia eram essenciais para a consolidação do liberalismo. A formasingularizada de representação, em que cada eleitor falava por seu parlamentar, confirma ascaracterísticas do Estado Liberal, particularmente o individualismo e a liberdade. A imunidadeparlamentar traz à tona a existência de um direito reflexo: a reprodução da liberdade do indivíduo noâmbito estatal. O laissez faire dependia do não condicionamento político e da ausência de amarrasno exercício do mandato parlamentar.

No entanto, a justificativa do instituto da imunidade parlamentar deve ser realizada com cautelas, sobpena de adotar argumentos medievais para explicar o mundo contemporâneo. Na sociedadeestamental, não existiam elementos capazes de estabelecer uma diferença entre Estado eSociedade. A distinção era de outro porte: a hierarquia. A passagem para a modernidade implicadiferenciação funcional. O Estado é parte integrante da sociedade, mas suscetível de percepção,pois edificado em estrutura e organização próprias. A autonomia operativa do Estado implica aexistência de mecanismos internos capazes de auto-sustentá-lo e de mantê-lo incólume com relaçãoao ambiente que o cerca. A imunidade parlamentar apresenta-se, assim, como um mecanismo deafirmação da integridade e emancipação do Estado, evitando os riscos de retorno ao absolutismo. Aimunidade parlamentar pressupõe autonomia na decisão. Segundo Gerhard Leibholz, não hápossibilidade de representação "se o representante depende de terceiros". Para ele, "a oposiçãoexistente entre "mandato imperativo" 34e "mandato livre" de uma parte; e a oposição entre interessegeral e interesse individual de outra, fazem parte da contraposição fundamental entre sistemarepresentativo e antiga constituição por castas" . 35

Sob a perspectiva do sistema representativo, o instituto da imunidade parlamentar está associadoprincipalmente à autonomia do representante no exercício de sua legislatura. 36Se a modernidadepossibilitou a separação do Estado, também permitiu o divórcio do direito com as demais formas deorganização social. 37A diferença funcional possibilita, paradoxalmente, a comunicação das esferasseparadas: a prerrogativa passa a ser vista como uma categoria jurídica capaz de legitimar a açãopolítica. Afirma-se como uma ponte que acopla estruturalmente dois sistemas distintos, o direito e apolítica. Na verdade, faz-se o uso da legalidade para impedir a subversão da lógica maioria/minoria.Mas, e quando a regra for invertida: quando a política apropriar-se do direito para violá-lo?

Paolo Ridola lembra que o liberalismo privilegiou o sistema representativo que se caracterizava pela"interpretação, ou mera reprodução, de uma dimensão "coletivo-espiritual" de um grupo social". 38Arepresentação política, neste período, atuava com um baixo grau de representação popular. 39Votocensitário, eleições precárias, inconsistência ideológica na formação dos partidos políticostransformavam o Parlamento em um autêntico "Clube dos Lordes". Quem de fato era representadono século XIX? A imunidade parlamentar assegurava a autonomia de quais deputados? No Governoda burguesia para a burguesia, a imunidade parlamentar não perdeu sua referência moderna paraadotar a lógica do freedom of speech?

É inquestionável a relevância da imunidade parlamentar como baluarte inibidor de perseguiçõespolíticas. Sua importância se acentua no direito brasileiro que, durante todo o império, conviveu coma existência do Poder Moderador. 40Mas isto não impede constatar que o instituto pode facilmenteser transposto para a natureza estamental, de forma a atuar com base na estrutura hierárquica. Istoé, a imunidade parlamentar pode converter-se de instrumento de resistência ao Ancien Regime eminstrumento assegurador da irresponsabilidade pessoal, criando um grupo de intocáveis, excluído dodireito pelo próprio direito. A adoção de um privilégio em razão do grupo social não é outra coisasenão a subversão da modernidade pelas regras feudais, o que pode ser extremamente perverso.4. O Estado Social e a flexibilização do conceito de imunidade parlamentar

Se no apogeu do conceito de representação política, a imunidade parlamentar produziucontradições, que se dirá, então, quando ele entrou em "crise"? Como vislumbrar a imunidade

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 5

Page 6: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

parlamentar quando se introduz no Estado a dimensão dos direitos coletivos em detrimento doindividualismo? Se, no Estado Social, o direito é visto como instrumento de realização da igualdade,como preservar intacto o conteúdo da imunidade parlamentar? Em outras palavras, é possível tratarde forma diferenciada os parlamentares? Todas essas questões podem ser resumidas com aseguinte indagação: como legitimar a imunidade parlamentar no século XX?

Importa avaliar em que medida as razões que fundamentam a imunidade parlamentar parecemcompatíveis com a emergência de uma nova realidade social. Para tanto, mais uma vez, o estudo darepresentação política será primordial para a compreensão do instituto da imunidade parlamentar.

O surgimento de diversos atores sociais acarretou o acirramento das relações desenvolvidas naesfera pública. Estes entes adquiriram, em sua essência, uma natureza peculiar: são pessoasjurídicas de direito privado com capacidade para deliberar sobre assuntos eminentemente políticos.41Sindicatos, multinacionais, conglomerados e instituições financeiras são exemplos ilustrativos dacomplexidade que enfrenta o Estado no último século. Os partidos políticos passam a concorrer comoutras formas sociais dotadas de intenso poder de decisão e influência no conjunto da sociedade.

Por outro lado, as finalidades e metas do Estado também foram alteradas. Deixou-se de atuar pormeio do controle retrospectivo, visando à manutenção da ordem liberal, para intervir na realidade,mudar a estrutura estabelecida, buscando, principalmente, mitigar as desigualdades materiais.Também o direito se mobiliza. Introduz uma dimensão teleológica ao positivismo e uma categoriatemporal prospectiva: o direito social opera com base em um feed back positivo. 42

Ao incorporar o futuro, o direito passa a lidar com insegurança e instabilidade. A imunidadeparlamentar, como garantia-proteção, é compatível com esta perspectiva? A prerrogativa permite,como atenta Eloy García, uma situação inusitada em que os componentes de um mesmo órgãosejam, ao mesmo tempo, juiz e parte de seus próprios atos. 43O que outrora foi o domínio dasegurança no Estado Liberal - resistência às pretensões de retorno ao absolutismo - torna-se acerteza de impunidade no modelo social?

A assunção de novas organizações sociais concorrendo com o Parlamento e a existência de outrasfunções estatais diversas das concebidas pelo maquinário liberal redescreveram a agendapolítico-jurídica do século XX. Se, no passado, a lei foi considerada instrumento de legitimidade doEstado, no modelo social o ato administrativo e a sentença judicial passam a exercer um papelexcepcional ao conferir maior agilidade nas áreas de intervenção pública. 44O eixo de referência dasociedade se desloca do Parlamento para outras formas de poder e estruturas. Isto não significou aexclusão do Legislativo, mas o redimensionamento da esfera política com a inclusão de novoselementos sociais, estatais ou não estatais.

Além da emergência de novas instâncias representativas, há que se questionar acerca do risco deameaça de arbítrio a afetar a atividade do Parlamento - o que justificou, por exemplo, o amploalcance da imunidade parlamentar no passado. O risco do arbítrio é condição inafastável daimunidade parlamentar. A razão da prerrogativa é proteger deputados e senadores de perseguições,o que possibilita o livre funcionamento da Casa Legislativa.

A respeito, constata-se que os regimes ditatoriais foram os momentos em que mais se esquartejarama imunidade parlamentar. O totalitarismo stalinista aboliu a imunidade material, conforme aConstituição da União Soviética de 1936, da Romênia de 1948, da Hungria de 1949, da China de1954 e de Cuba. O exemplo brasileiro confirma esta premissa. Se a redação da atual Constituição de1988 é quase a mesma desde 1824, ela sofreu somente duas grandes alterações pela Carta de 1937e pela EC 1, de 1969. No Estado novo, a imunidade material foi praticamente eliminada e a formalrestringida às sessões do Congresso Nacional. Já na ditadura militar, a inviolabilidade não severificava nos casos de injúria, calúnia ou difamação, ou nos previstos na Lei de Segurança Nacional(LGL\1983\22), e a imunidade processual foi extirpada. 45

Contudo, fora do arbítrio, não há mais espaço para o alcance ilimitado da imunidade processualparlamentar. Nesse sentido, deflagra-se uma tendência de revisão do sistema representativo e daprópria imunidade parlamentar.

Os delineamentos da imunidade parlamentar passam a ser redefinidos. A Lei Fundamental de Bonn,por exemplo, prescreveu certos limites à liberdade de falar não aplicando a inviolabilidade em casos

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 6

Page 7: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

de ofensas caluniosas. Já as Constituições da Argentina, do Chile, da Bolívia, da Espanha, dePortugal, da Itália e da França condicionaram o alcance da imunidade material ao exercício dasfunções parlamentares. Esta modalidade de imunidade foi ainda mais limitada pelas Constituições dePorto Rico e da República Dominicana, que a estipularam somente no momento das sessões dasCâmaras.

A imunidade processual, concernente ao processo criminal, por sua vez, foi banida pelasConstituições da Colômbia de 1991, de Portugal de 1976, da República Dominicana de 1966, dePorto Rico de 1956, da Costa Rica de 1949. A licença para o processo dos deputados nasConstituições mexicana de 1917 e chilena foi transferida ao Poder Judiciário, retirando este poder daprópria Casa Parlamentar.

Em muitos países, a imunidade processual passou a ser exercida pela maioria como instrumento deopressão da minoria: acusações e denúncias falsas de deputados da oposição eram invariavelmenteendossadas pelo Parlamento. Da mesma forma que o arbitrarismo monolítico, a tirania da maioriaproduz o efeito de destruição do Estado Democrático. 46Nas duas últimas décadas do séculopassado, a Espanha vivenciou esta realidade, o que a obrigou a se amoldar à tendência de aboliçãodo privilégio processual. Atualmente, ele praticamente inexiste neste país: todas as decisões dasCâmaras em matéria de "prerrogativas" estão sujeitas ao controle do Tribunal Constitucional. 47

Este reduzido panorama do constitucionalismo dirigente reflete as tendências de transformação doinstituto da imunidade parlamentar na ordem contemporânea. Percebe-se que a permanência daimunidade, de alcance absoluto e ilimitado como nos moldes liberais, é capaz de converter-se emprivilégio e não em prerrogativa ou garantia funcional. Basta observar a Itália de 1948 que, durante oprimeiro ano de atividade do Parlamento republicano, recebeu 55 pedidos de autorização paraprocessar deputados e deferiu somente dois. 48No Brasil, o problema é crônico: entre 1995 e 1999, aCâmara dos Deputados recebeu 137 pedidos de autorização, indeferindo 109 deles. 49

A imunidade parlamentar no Estado Social só se justifica pela mesma razão do seu nascimento: paraassegurar a autonomia e independência do Legislativo. Caso contrário, será observada sob o vérticenefasto do privilégio. Hans Kelsen somente a admitiu quando o conflito entre Parlamento e Governoera intenso e furioso, como na monarquia e no início da modernidade. O autor assevera que naRepública Parlamentar, onde o Governo não é outra coisa senão uma comissão do Legislativo e aoposição extremamente fortalecida pela opinião pública, ela perde completamente o sentido. 50

O processo de redefinição dos contornos do instituto da imunidade parlamentar passa, então, a serfomentado pelo impacto dos valores que sustentam o ideário do Estado Democrático de Direito,como será apreciado a seguir.5. A imunidade parlamentar no Estado Democrático de Direito

Ao longo deste estudo, pode-se perceber que o instituto da imunidade parlamentar apresentou umalcance absoluto e ilimitado no Estado Liberal (justamente como garantia em face do arbítrio), para,posteriormente flexibilizar-se à luz das transformações do Estado Social, na medida em que deprerrogativa passou a ser, por vezes, privilégio.

Nesta análise é importante diferenciar a imunidade material da imunidade processual. Sustenta-seque, mesmo à luz do Estado Democrático de Direito, a imunidade material justifica-se pelanecessária inviolabilidade, que impede retaliações pelo uso da palavra, opinião e do voto. Aimunidade material exclui o crime, protegendo Governo e oposição, maioria ou minoria. Quando oJudiciário se depara com uma acusação referente à opinião expressa por um parlamentar, deve, deplano, desconsiderá-la, pois está diante de uma conduta permissiva pelo próprio direito. Umdeputado ou senador não poderá ser calado como condição do exercício da democracia, desde quesua manifestação esteja atrelada ao exercício de sua função. A imunidade material guarda, assim,identidade com a proteção das minorias e a garantia da palavra sem perseguição.

E quanto à imunidade processual: é possível justificá-la à luz das exigências contemporâneas doEstado Democrático de Direito? É ela compatível com a principiologia da Constituição brasileira de1988?

Cabe inicialmente observar que, no Estado Democrático de Direito, afasta-se o risco do arbítrio e dasameaças indevidas dos demais poderes no âmbito do Legislativo. Se este era o motivo a justificar a

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 7

Page 8: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

existência da imunidade processual, ausente tal pressuposto, carece de justificativa a manutençãodo instituto.

Contudo, além deste argumento, outros se somam no sentido de evidenciar a total incompatibilidadedo instituto à luz do Estado Democrático de Direito. 51

Há que se reiterar que o Estado de Democrático de Direito pressupõe, como elementos essenciais, aconstitucionalidade, a legalidade e a observância de direitos e garantias fundamentais. O elementoda constitucionalidade é o que afirma a Constituição como um pacto jurídico-político-social. Alegalidade, por sua vez, assenta-se na idéia da prevalência do Estado de Direito e do Governo dasLeis e não dos homens. Já a dimensão dos direitos e garantias, fundamenta-se no valor ético dadignidade humana, a orientar o constitucionalismo de direitos contemporâneo.

O Estado Democrático de Direito tem ainda como fundamento o princípio da igualdade de todosperante a lei, o que requer seja a lei aplicada de forma geral e genérica a todos os indivíduos,independentemente do cargo e da função que exerçam.

Além disso, o Estado Democrático de Direito requer sejam os agentes públicos responsabilizadospelas ações que cometerem. A accountability é dimensão crucial de todo modelo democrático. O fatode exercer determinada função pública não pode ser elemento de escudo para a atribuição deresponsabilidades. A título de exemplo, merece menção o caso Pinochet (preso na Inglaterra eprocessado criminalmente) e o caso Milosevic (preso e indiciado pelo Tribunal da ONU), bem comotoda a tendência contemporânea de abolir ou restringir o alcance das imunidades em razão doexercício de determinado cargo, tornando as pessoas públicas responsáveis pelos seus atos. Basta,para tanto, citar o art. 27 do Estatuto do Tribunal Penal Internacional Permanente de 1998, aoprescrever que o Estatuto será aplicável igualmente a todos, sem distinção alguma baseada emcargo oficial, que, em caso algum, eximirá a responsabilidade penal e nem tampouco será motivopara a redução de pena.

Não bastando estes argumentos, em um Estado Democrático de Direito, a vítima de um crime tem odireito fundamental à proteção judicial, não podendo a lei excluir da apreciação do Poder Judiciáriolesão ou ameaça a direito (como prevê a própria Constituição, no art. 5.º, XXXV, da CF/1988). Aoprincípio do livre acesso ao Poder Judiciário conjuga-se o dever do Estado de investigar, processar epunir aqueles que cometeram delitos. Vale dizer, é insustentável privar a vítima deste direito, sob amanta da imunidade processual parlamentar, que condiciona o processo criminal contra umparlamentar à prévia licença da Casa Legislativa.

Logo, os parâmetros jurídicos contemporâneos, concernentes ao Estado Democrático de Direito,consagram: a) o princípio da separação dos poderes, afastando o arbítrio e a ameaça àindependência do Legislativo; b) o princípio da igualdade perante a lei; c) o princípio daresponsabilidade dos agentes públicos ( accountability); d) o princípio do acesso ao Poder Judiciário,bem como o direito da vítima à justiça, mediante a efetiva prestação jurisdicional.

Todos estes valores são consagrados pela Constituição Federal de 1988, na qualidade de marcojurídico da transição democrática e da institucionalização dos direitos e garantias fundamentais. Otexto demarca a ruptura com o regime autoritário militar instalado em 1964, refletindo o consensodemocrático "pós-ditadura". Estabelece os delineamentos do Estado Democrático de Direito. Nocontexto democrático, não mais se vive o temor autoritário do chefe do Executivo intimidar ou impediro livre exercício da atividade parlamentar.

Neste cenário, há que se romper com o legado autoritário da imunidade processual parlamentar, porexigência dos princípios que regem o Estado Democrático de Direito.

Dentro da perspectiva de separação do direito e da política, a imunidade processual apresenta-secomo bloqueio político da comunicação jurídica. Não há como verificar a ilicitude da condutacometida, antes que a própria Casa autorize seu julgamento. Pela imunidade formal, a políticaexerce uma função própria do sistema jurídico, incompatível com o conceito de cidadania. Trata-seda subversão do direito pelo sistema político, que produz privilégios e impunidade. 52

Na ordem contemporânea, a imunidade processual parlamentar converte-se de prerrogativainstitucional em privilégio pessoal, inaceitável e inadmissível pela lógica e principiologia de umverdadeiro Estado Democrático de Direito.

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 8

Page 9: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

(1) Cf. José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 15. ed., São Paulo: Malheiros,1998, p. 532-533; Celso Ribeiro Bastos, Curso de direito constitucional, 14. ed., São Paulo, 1992, p.306; Michel Temer, Elementos de direito constitucional, 14. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p.129-130 e Fernando Whitaker da Cunha, Direito constitucional do Brasil, Rio de Janeiro: Renovar,1990. p. 246.

(2) A concepção tradicional de instituição jurídica, observada como um emaranhado de normas queadentra na realidade social, não compreende os problemas que um tema como a imunidadeparlamentar pode suscitar. Buscar-se-á, conforme Niklas Luhmann, inverter a direção desta relaçãoe conceber o instituto jurídico como "um complexo de expectativas fáticas, de condutas que seatualizam em conexão com o rol social e que podem contar geralmente com o consenso social", ouseja, partir do universo tangível para chegar ao direito positivo. Apud ARAUJO, José AntonioEstévez. La Constitución como proceso y la desobediencia civil. Madrid: Trotta, 1994. p. 94.

(3) Cf. Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, p. 21-22. Esta confusão históricareflete a heterogeneidade terminológica que o instituto apresenta nas legislações modernas. Aimunidade material e a formal conhecidas pelo direito brasileiro, português e espanhol sãodenominadas pela técnica francesa de irresponsabilidade e inviolabilidade parlamentar. NaAlemanha, estas categorias são classificadas como indenidade e imunidade parlamentar (Cf. AlcinoPinto Falcão, Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparado e particularbrasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 1955. p. 14-15).

(4) Cf. Alcino Pinto Falcão, Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparado eparticular brasileiro, p. 20-25 e Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 23.

(5) Como afirma Alcino Pinto Falcão, estas categorias se consolidaram a partir de uma construçãoconsuetudinária e prática. Surgiram de situações concretas que resistiam aos ataques do rei, masmuitas vezes eram por ele sucumbidas. Ilustrativos são os casos Strode e Sir Jonh Eliot citados peloautor. O primeiro foi preso e processado pela Stannary Court de Devon por ter elaborado um projetode lei que extrapolava a competência da Câmara dos Comuns. Em resposta, o Parlamentopromulgou, em 1512, um dispositivo legal, estatuindo o freedom of speech e impondo a liberação doparlamentar. Posteriormente, no caso Sir Jonh Eliot, o mesmo foi preso e processado sob a alegaçãode que aquela legislação não era geral, mas particular ao episódio anterior (cf. Alcino Pinto Falcão,Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparado e particular brasileiro, cit., p.21-22).

(6) Cf. Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 24.

(7) Cf. Alcino Pinto Falcão, Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparado eparticular brasileiro, cit., p. 19.

(8) Cf. Celso Fernández Campilongo, Representação política, São Paulo: Ática, 1988, p. 15.

(9) Cf. Edoardo Ruffini, Il principio maggioritario: profilo storico, Milano: Adelphi, 1976, p. 65.

(10) Durante o absolutismo, como observa Ferdinand Lassalle, verificam-se relações de exigências edemandas entre a Coroa e a burguesia nascente. Se, de uma parte, a burguesia fornece subsídiosfinanceiros para o príncipe consolidar seu poder, por meio da formação de um exército permanente,de outra, o príncipe envia seus batalhões contra a nobreza, possibilitando a expansão mercantil (cf.Ferdinand Lassalle, A essência da Constituição, 5. ed., Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2000, p. 30-31).

(11) Cf. Ricardo L. Chueca Rodriguez, La regla y el principio de la mayoria, Madrid: Centro deEstudios Constitucionales, 1993, p. 37.

(12) Cf. Dalmo de Abreu Dallari, Elementos de teoria geral do Estado, 19. ed., São Paulo: Saraiva,1995, p. 58-59.

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 9

Page 10: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

(13) Cf. Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 26-27.

(14) O pacto travado era claro: o rei, maior suserano, retirava soldados dos barões e dinheiro docomércio e os vassalos eram consultados nas decisões da coroa. Não há como se falar em vontadepopular se, no regime feudal, como apregoa Edoardo Ruffino, era o rei o maior interessado naconvocação do parlamento, aplicando, inclusive, sanção para os faltosos (cf. Edoardo Ruffini, Ilprincipio maggioritario: profilo storico, cit., p. 65).

(15) Sobre o princípio da reciprocidade ou solidariedade, ver Otto Hintze, Stato e Società, Bologna:Zanichelli, 1980. p. 130.

(16) O conceito medieval de corporação remonta ao direito romano, sendo recriado pelos glosadoresno Corpus Iuris Civilis. Sustentado pelo jusnaturalismo, a corporação, neste período, baseia-se naconcepção de solidariedade e lealdade entre todos os membros de uma associação. Ver, nessesentido, para uma relação entre a corporação e o sistema representativo Otto von Gierke, GiovanniAlthusius e lo sviluppo storico delle teorie politiche giusnaturalistiche, Torino: Giulio Einaudi, 1996, p.167-171; Ricardo L. Chueca Rodriguez, La regla y el principio de la mayoria, cit., p. 45-48 e EdoardoRuffini, La ragione dei piu', Bologna: Il Mulino, 1977, p. 60.

(17) Cf. Gianfranco Poggi, A evolução do Estado moderno, Rio de Janeiro: Zahar, 1981, p. 34-35.

(18) Cf. Otto Hintze, Stato e Società, cit., p. 117.

(19) Cf. Otto von Gierke, Giovanni Althusius e lo sviluppo storico delle teorie politichegiusnaturalistiche, cit., p. 167-168.

(20) Willis Santiago Guerra Filho, ao citar Niboyet, observa que a busca pelo bom-senso e daeqüidade aparece de forma decisiva nos pós-glosadores para a solução de casos específicos (cf.Willis Santiago Guerra Filho, Introdução à filosofia e à epistemologia jurídica, Porto Alegre: Livrariado Advogado, 1999, p. 108-109).

(21) Cf. Edoardo Ruffini, Il principio maggioritario: profilo storico, cit., p. 24.

(22) Idem, ibidem, p. 62.

(23) Cf. Edoardo Ruffini, Il principio maggioritario: profilo storico, cit., p. 43.

(24) Cf. Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 27.

(25) Cf. Jürgen Habermas, Direito e democracia: entre facticidade e validade, vol. II, Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1997, p. 281.

(26) Cf. Gianfranco Poggi, A evolução do Estado moderno, cit., p. 120.

(27) Em sentido contrário, Eloy García que concebe a mudança do Ancien Regime como atranslação da soberania do monarca pela da nação. Afirma o autor que, "quando a nação suprime oabsolutismo, se coloca no antigo posto da mesma maneira absoluta" (cf. Eloy García, Inmunidadparlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 30-32). Habermas rechaça esta hipótese antevendo acriação da soberania estatal a partir da emancipação popular (cf. Jürgen Habermas, Direito edemocracia: entre facticidade e validade, cit., p. 284).

(28) Para Habermas, há um "auto-legislar". Habermas extrai a expressão de Rousseau e Kant, quelegitimavam a autoridade estatal por meio do consenso alcançado na formação da opinião popular(cf. Jürgen Habermas, Direito e democracia: entre facticidade e validade, cit., p. 284).

(29) Cf. Otto Hintze, Stato e società, cit., p. 139.

(30) Esta assertiva é de Celso Fernandes Campilongo para quem a "soberania popular ou nacional,primado do parlamento, sufrágio universal e processo eleitoral desempenham a função - teórica,prática e retórica - de legitimação social e política" (cf. Celso Fernández Campilongo,

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 10

Page 11: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

"Representação política e ordem jurídica: os dilemas da democracia liberal", Tese de Mestradoapresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1987, p. 8-10).

(31) Cf. Celso Fernández Campilongo, "Política, direito e decisão judicial: uma redescrição a partir dateoria dos sistemas", Tese de Livre Docência apresentada à Faculdade de Direito da PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2000, p. 16-17; Gianfranco Poggi, A evolução doEstado moderno, cit., p. 145 e Niklas Luhmann, Sociologia do direito I. Rio de Janeiro: TempoBrasileiro, 1983, p. 230.

(32) Ver Zenio Veloso, "Imunidades parlamentares dos vereadores", Revista de InformaçãoLegislativa 92/150-151, ano 23, Brasília, out.-dez. 1986, e Alcino Pinto Falcão, Da imunidadeparlamentar: informe de direito constitucional comparado e particular brasileiro, cit., p. 16-17. Aexpressão "prerrogativa do Parlamento" demonstra que a imunidade parlamentar ampara ainstituição e não os homens. Segundo Raul Machado Horta, "Os privilégios satisfazem o interesseindividual de seus beneficiários. As prerrogativas se distanciam da satisfação de interessesparticularistas, visando regular o exercício de funções do Estado" (cf. Raul Machado Horta,"Imunidades parlamentares", Revista de Direito Público 03/32, São Paulo).

(33) No modelo liberal não havia restrições para a imunidade parlamentar. O Decreto de 26.06.1790completou o sistema declarando que: "A Assembléia, reservando-se no direito de estabelecer nofuturo a regulação detalhada dos instrumentos constitucionais necessários para assegurar aindependência e a liberdade dos membros do parlamento, afirma que, até o estabelecimento dostribunais penais e de uma nova parte da Corte Nacional, os membros da Assembléia Nacionalpodem, em caso de flagrante delito, serem responsabilizados conforme as ordenanças que,igualmente, podem - salvo em relação ao que foi anteriormente indicado - ser demandados einvestigados judicialmente, mas não detidos, antes que o corpo legislativo em função dasinformações dos elementos de convicção, decida que há lugar para o processo" (apud GARCÍA,Eloy. Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 28-30).

(34) Sobre o mandato imperativo, ver John Stuart Mill, Considerações sobre o Governorepresentativo, Brasília: Universidade Federal de Brasília, 1981, p. 121-129.

(35) Cf. Gerhard Leibholz, La representazione nella democrazia, Milano: Giuffrè, 1989, p. 130 e 148.

(36) Cf. Gerhard Leibholz, La representazione nella democrazia, Milano: Giuffrè, 1989, p. 131.

(37) Segundo Niklas Luhmann, quando a sociedade torna-se mais complexa e produz umanecessidade de regulamentação crescente, o direito deve adquirir maior autonomia e, ao mesmotempo, mais eficiência. Para tal necessidade, a doutrina do Estado da Idade Moderna acha,primeiramente, uma resposta, transformando a antiga doutrina do regimen commixtum na modernateoria da divisão dos poderes, ou seja no notório esquema de distinção e separação organizativaentre legislativo, executivo e judiciário" (cf. Niklas Luhmann, Stato di diritto e sistema sociale, Napoli:Guida, 1978, p. 55-56).

(38) Cf. Paolo Ridola, "Reppresentanza e associazionismo", Reppresentanza e democrazi. Org.Gianfranco Pasquino, Bari: Laterza, 1988, p. 101-102.

(39) Paradoxalmente, o século XIX foi, ao mesmo tempo, o apogeu formal do sistema representativoe o período de menor participação política na modernidade. Por esta razão, Celso FernandesCampilongo afirma que o Estado Liberal "conheceu a representação, mas não a democracia" (cf.Celso Fernandes Campilongo, Representação política e ordem jurídica: os dilemas da democracialiberal, cit., p. 10).

(40) A existência de um poder moderador (o quarto poder) apareceu pela primeira vez nopensamento de John Locke. Este autor considerava o reconhecimento de uma esfera de poderdiscricionário do rei imprescindível à realização do bem público. Segundo Dalmo Dallari, ao rever opensamento de Locke, esta quarta função realizada pelo soberano era um bom pretexto para asdecisões absolutistas, já que "bem público" é uma expressão de difícil definição (Dalmo de AbreuDallari, Elementos de teoria geral do estado, 19. ed., São Paulo: Saraiva, 1995, p. 183). AConstituição Imperial de 1824 o adotou como o maior centro de decisão do país. Atribuiu-lhe uma

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 11

Page 12: A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

superioridade hierárquica facilmente perceptível a partir da intelecção dos arts. 98 e 101, o quepermitiu o nascimento do arbítrio e a manutenção, em certa medida, de um poder absoluto. AfirmaJosé Afonso da Silva que "aqui, o rei reinava, governava e administrava, como considera Itaboraí, aocontrário do sistema inglês, onde vigia e vige o princípio de que o rei reina, mas não governa" (JoséAfonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 15. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 78).Ver, ainda, Fernando Whitaker da Cunha, Direito constitucional do Brasil, Rio de Janeiro: Renovar,1990, p. 28; Paulo Bonavides e Paes de Andrade, História constitucional do Brasil, 2. ed., Brasília:Paz e Terra Política, 1990, p. 96-97.

(41) Cf. Gianfranco Poggi, A evolução do Estado moderno, cit., p. 130.

(42) Para uma análise do direito no Estado Social, ver Niklas Luhmann, "Il Welfare State comeproblema politico e teorico", Transformazione e crisi del Welafare State, Org. Éster Fano, StefanoRodotà e Giacomo Marramao, Torino: De Donato, 1983, p. 349-361; André-Jean Arnaud e MariaJosé Fariñas Dulce, Introdução à análise sociológica dos sistemas jurídicos, Rio de Janeiro:Renovar, 2000, p. 241-246.

(43) Cf. Eloy García, Inmunidad parlamentaria y Estado de partidos, cit., p. 82.

(44) Cf. Gianfranco Poggi, A evolução do Estado moderno, cit., p. 139-141.

(45) Cf. Zenio Veloso, Imunidades parlamentares dos vereadores, cit., p. 149 e p. 155-156 e RaulMachado Horta, Imunidades parlamentares, cit., p. 33.

(46) Cf. Ricardo L. Chueca Rodriguez, La regla y el principio de la mayoria, cit., p. 181.

(47) Cf. Plácido Fernández-Viagas Bartolomé, La inviolabilidad e inmunidad de los diputados ysenadores: la crisis de los "privilégios" parlamentarios, Madrid: Civitas, 1990, p. 169-170.

(48) Cf. Alcino Pinto Falcão, Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparadoe particular brasileiro, cit., p. 11.

(49) "Imunidade parlamentar será votada em maio na Câmara", 29.04.2001, Agência Brasil.

(50) Cf. Hans Kelsen, La democrazia, Bologna: Il Mulino, 1984, p. 82-84.

(51) Na análise de algumas Constituições totalitárias do século XX, observa-se que a imunidadeparlamentar sempre foi preservada naqueles regimes, salvo na ditadura militar nacional que a aboliu.

(52) Curiosamente, a primeira vez que se aboliu na história a imunidade processual foi naproeminência da fase do terror na França revolucionária. Diante da afirmação do princípio daigualdade, a Convenção a suspendeu com a seguinte aclamação de Billaud-Varenne: "o Governoserá terrível para os conspiradores, coercitivo contra os agentes públicos, severo para osprevaricadores..." (cf. Jacques Godechot, Les institutions de la France sous la révolution et l'empire,Paris: Presses Universitaires de France, 1951, p. 293). Ver também Jacques Godechot, RevoluçãoFrancesa: cronologia comentada, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 137, e Alcino PintoFalcão, Da imunidade parlamentar: informe de direito constitucional comparado e particular brasileiro,cit., p. 63.

A IMUNIDADE PARLAMENTAR NO ESTADODEMOCRÁTICO DE DIREITO

Página 12