a implataÇÃo da via expressa e seus impactos ambientais
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A IMPLATAÇÃO DA VIA EXPRESSA E SEUS IMPACTOS AMBIENTAIS EM SÃO
LUÍS (MARANHÃO)
Erika Suzana Pereira Sodré (UFMA/LEBAC)
Prof. MSc. Luiz Jorge B. Dias (UFMA\CCH\DEGEO)
1. INTRODUÇÃO
Desde os primórdios da civilização o homem transforma o meio onde vive para
satisfazer suas necessidades sociais, culturais econômicos e, para isso, desmatou florestas,
construiu casas e abrigos, domesticou animais, cada vez mais tornando os ambientes naturais
em espaços antropogênicos. Os sucessivos danos ao meio levam a modificações locais e
regionais,alterando as dinâmicas naturais do espaço total (AB’SÁBER, 2006).
Atualmente o crescimento urbano tem sido mais intenso em todo o mundo e as
suituações brasileira, maranhense e ludovicense não diferem desse contexto, que gera,
pelocrescimento populacional,áreas de ocupação desordenadas, problemas de saneamento e
poluição ambiental, riscos de habitabilidade e, como não poderia ficar alheio a esse conjunto
de processos, os danos ocasionados pela necessidade de melhoras as dinâmicas de
trafegabilidade inter e intraurbanas.
Podemos ver o processo de urbanização mais intenso na cidade de São Luís, que
desenvolveu nos últimos anos um intenso processo de urbanização, caracterizando
principalmente pela inserção de grandes projetos de urbanização ambiental. A necessidade de
aumentar e adequar os espaços para recebimento de fluxos de transportes públicos é
considerado um desafio premente, que requer planejamento e implementação de atividades de
forma adequada aos ambientes e às demandas da sociedade.
Para fins de análise de danos ambientais do Empreendimento “Via Expressa” em
São Luís (MA), obra desenvolvida pelo Governo do Estado do Maranhão na capital, São Luís,
objetivou-se reconhecer as dinâmicas socioambientais em curso nos espaços do Sítio Santa
Eulália e em toda a área de influência direta (AID) do Empreendimento, tendo como foco
analisar os impactos advindos da implantação de desta obra proposta pelo Executivo Estadual.
O presente trabalho traz discussões acerca das relações de interesse existentes sobre o espaço
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total em questão, considerando o momento político estadual, o forte processo de urbanização
e a perda de áreas de preservação permanente (APPs), que vêm sofrendo modificações
substanciais nos últimos anos. Ademais, este estudo tem o intuito de contribuir com a gestão
dessas áreas e de propor alternativas para o monitoramento dos impactos e a conservação de
suas potencialidades.
2 METODOLOGIA
A presente pesquisa está fundamenta no método indutivo proposto por Marconi e
Lakatos (2008), com análise e observação dos dados a serem investigados, fundamentados na
observação dos elementos naturais. Para complemento da metodologia fez-se necessáriaa
utilização de alguns procedimentos metodológicos, tais como:
levantamento bibliográfico para consolidação do referencial teórico de acordo
com a temática do estudo como;
pesquisasincluindo artigos, anais de congressos, decreto do Conselho Nacional
do Meio Ambiente, Pesquisa documental;
levantamento da documentação cartográfica, nessa perspectiva;
aquisição de informações junto às secretarias estaduais de Infraestrutura e Meio
Ambiente, com o intuito de obter cópia do Estudo e Relatório de Impactos
Ambientais (EIA\RIMA) do Empreendimento Via Expressa.
3 RESULTADOS E DISCURSÕES
3.1. Localização e caracterização da área de estudos
Como área de estudo foram escolhidos os interespaços da área de influência direta
(AID) do Empreendimento “Via Expressa”, principalmente as localidades Sítio Santa Eulália,
Vinhais Velho, Vila Cristalina e Ipase, conforme representado na Figura 01.
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Figura 01: Localização da Área de Influência Direta (AID) do Empreendimento “Via Expressa”, situado ao Norte de São Luís (MA). Fonte: Registros da pesquisa.
No tocante às características geoambientais da AID do Empreendimento “Via
Expressa”, é relevante afirmar que o espaço total do Empreendimento “Via Expressa” está
situado em área de tipologia climática Aw, ou Tropical Chuvoso, segundo classificação por
Köppen (1948 apud AYOADE, 2001). Apresenta precipitações pluviométricas médias anuais
de aproximadamente 2.000mm (MARANHÃO, 2003).
A Geologia da área é composta por duas formações evidentes: a Formação
Barreiras (de idade mio-pliocênica), aflorante no Sítio Santa Eulália, no Vinhais Velho e no
Ipase, e a Formação Açuí, com presença de depósitos pleisto-holocênicos de manguezais e,
pró-parte, de várzeas e nascentes, que serão diretamente afetadas pelas frentes de obras.
Quanto à Geomorfologia do espaço em análise, são observadas quatro tipologias
de geoformas: a) tabuleiros costeiros (em ambientes geológicos de Formação Barreiras); b)
voçorocas (processos erosivos acelerados em áreas de tabuleiros costeiros, associados à
supressão de cobertura vegetal, exposição de solos laterizados e incidência de fluxos chuvosos
intensos); c)planícies de marés lamosa ou vasosa (recobertas por manguezais e apicuns
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associados à margem esquerda do estuário do Rio Anil e de idade holocênica); c) micro-vales
fluviais em cabeceiras de drenagem (Formação Açuí).
A Pedologia local da AID do Empreendimento “Via Expressa” é formada por
latossolos textura média e solos indiscriminados de manguezais, além de ambientes com
gleissolos.
3.2 Ocupação espacial ludovicense e necessidade de expansão de malhas de
infraestruturas de transportes
Quanto ao processo de ocupação, São Luís tem experimentado um crescente fluxo
migratório e como consequência o uso e ocupação desordenada do ambiente físico. Para que
melhor se compreenda a gradação de eventos relacionados à ocupação do espaço total
ludovicense, bem como para facilitar a sua análise, o Município de São Luís enquadra-se na
categoria geográfica de espaço com alto grau de controle humano. Tendo em vista o grande
incremento demográfico pelo qual passou a Capital Maranhense a partir da década de 1960,
houve grandes esforços para concretizar novos eixos de ocupação urbana em ambientes
outrora considerados insalubres para habitação (DIAS, 2012).
Nesse aspecto, o Governo Estadual, bem como a União, a partir da construção de
grandes conjuntos habitacionais entre as décadas de 1960 e 1980 (COHAB-Anil, Cohatrac,
Angelim, Maiobão, Parque dos Nobres, Parque Amazonas, Cidade Operária, São Raimundo e
Jardim América, por exemplo), acabaram por preparar espaços com desmatamentos e
terraplenagens de áreas superiores às passíveis de utilização para a articulação de movimentos
urbanos de origem e consolidação de ocupações irregulares. Sempre acompanhados de vias de
acesso, que ao longo do tempo passariam por saturação devida ao aumento da própria
população circulante, tal qual o incremento no número de veículos automotivos em
circulação. Essa dinâmica derivou, principalmente, do poder atrativo que a Capital
Maranhense exercia sobre a sua hinterlândia1, em que pese os municípios da Baixada
Maranhense, do próprio Golfão Maranhense, bem como áreas do Leste e Sudeste do Estado
(DIAS, 2004; DIAS; NOGUEIRA JÚNIOR, 2005; DIAS, 2012).
Historicamente, no ano de 1940, a população ludovicense contava com “apenas”
50.735 habitantes e teve um incremento de aproximadamente 57,4% no ano de 1950. Com
base no primeiro ano citado, em 1970 houve aumento demográfico de 243,45% e, em 2000,
1Hinterlândia significa, literalmente, área de influência de um pólo espacial urbano, este dotado de infra-estruturas e serviços capazes de suprir as demandas do entorno imediato, ao menos em tese.
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um número correspondente a 1.715,15% do valor original, totalizando 870.184 habitantes
(IBGE, 2010).
Esses dados encaminham à interpretação de que o aumento populacional levou a
uma incorporação cada vez maior de espaços para o desenvolvimento de atividades humanas,
especialmente para a habitação. Dessa forma diversas áreas consideradas insalubres foram
assimiladas pelo incremento socioespacial, tais como áreas de substrato de manguezal e
encostas com mais de 45% de inclinação (que são áreas geológicas e geomorfológicas
instáveis, sujeitas a diversos processos de descaracterização, fato indicado pela sua idade e
processos formadores quaternários, como indicado em páginas anteriores). E essa é uma
justificativa pautada na própria legislação em vigor, época a época, que permitiria a supressão
de áreas de preservação permanentes (APPs), tais quais áreas de manguezais, de fundos de
vale e de nascentes, permitindo maior impermeabilização dos solos e afugentamento ou
extinção local da biodiversidade local.
Assim, tal ritmo de ocupação requereu mais equipamentos urbanos. Ao visualizar
a Figura 02, pode-se ter uma breve noção esquemática de como esse crescimento exponencial
foi verificado na Capital Maranhense, desde a década de 1940 até o ano de 2009 (IBGE,
2010).
Figura 02: Crescimento demográfico da cidade de São Luís: 1940-2009.
Fonte: IBGE (2010).
Analogamente, essa tendência apresenta a materialização desse incremento
demográfico o crescimento horizontal como um fato inquestionável. A Figura 03 representa
esse argumento, evolutivamente.
1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2009
50.735 88.425123.517
263.486
449.887
695.199
870.184
997.098
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Figura 03: Crescimento horizontal de São Luís (MA) por hectare (eixo y) entre 1950 e 2005 (eixo x). Fonte: Adaptado de Dias e Nogueira Júnior (2005).
Dentro dessas perspectivas se torna necessário uma análise constante dos agentes
constituidores dessas perturbações ambientais dadas as ocupações sem planejamento.
Ressalta-se que um planejamento voltado para a organização do território é um ponto chave
para restruturação do espaço físico e social.
Voltando à análise da AID do Empreendimento “Via Expressa”, o Sitio sofreu
uma grande devastação para construção de um conjunto habitacional, que foi embargado na
década de 1980 e, desde então, foi parcialmente recomposta vegetacionalmente, contudo este
processo não foi acompanhado de maneira adequada por especialista, havendo certa
uniformização das espécies vegetais ali plantadas (com predomínio de cinco, apenas).
Contudo, tal processo foi suficiente para conter processos erosivos acelerados e
manutenção de APPs de fundo de vale, bem como das associadas aos manguezais de
entorno. Atualmente, com a implantação da “Via Expressa” há em curso diversas
perturbações ambientais, tais como: desmatamentos de APP’s, aceleração de fluxos erosivos
outrora estabilizados, afugentamento da fauna, aterramento de manguezais e mudanças nos
sentidos da drenagem local.
O avanço da “Via Expressa” neste local proporcionará a ampliação dos
problemas já citados e a quase ou total perda da biodiversidade e os remanescentes
arqueológicos de Santa Eulália, o que resultará em uma perda significativa para a
biodiversidade e história ludiviscense. Ressalte-se, ainda, a perda de sítios arqueológicos
ainda não estudados suficientemente, considerando não ter sido inserido em EIA-RIMA
específico as alternativas locacionais e de traçado, em função das restrições geoambientais,
biogeográficas, geoecológicas, socioeconômicas e sócio-históricas. E, como se pode
664
1506
6.601
7.878
13.878
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
16000
Até 1950 Até 1970 Até 1988 Até 1991 Até 2005
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observar na Figura 04, grande parte da área por onde passará o traçado do Empreendimento
ora estudado refere-se a Zona de Proteção Ambiental, associada aos manguezais da margem
direita do estuário do Rio Anil.
Figura 04: Traçado do Empreendimento “Via Expressa”, apresentando alto grau de controle antropogênico, induzido por ações políticas estaduais, em áreas de preservação permanentes (APPs) associadas a manguezais. Fonte: Maranhão (2011).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A urbanização encontra-se estreitamente relacionada à problemática do
desenvolvimento das sociedades citadinas. Historicamente, este processo resulta em
transformações estruturais que são conseqüência de movimentos cumulativos de recursos
técnicos, materiais e humanos disponíveis. Nessa perspectiva, a paisagem e os espaços
urbanos sofrem contínua evolução em ritmos distintos, estabelecendo contornos e redefinindo
os elementos ambientais herdados da natureza física, ecológica e histórico-social.
A bem da verdade, São Luís (MA) não foi planejada devidamente para suportar,
no longo prazo, tão grandes demandas relativas a trânsito e transportes. Nesse aspecto (e
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apenas nesse) a instalação do Empreendimento “Via Expressa” passa a ser imprescindível no
tocante à recuperação da mobilidade urbana tão requerida para a Capital Maranhense.
O Empreendimento “Via Expressa” é justificado politicamente como uma
intervenção de menos de 7,0 km na zona urbana de São Luís (considerado como uma
“rodovia estadual”, de maneira ilógica), tendo em vista a demanda por novos espaços/vias de
circulação. Contudo, não foi planejado de forma adequada, tendo em vista ligar as avenidas
Carlos Cunha e Daniel de La Touche, que, di per si, são duas vias absolutamente
congestionáveis, o que pode inviabilizar, no curto prazo de operação, o próprio
empreendimento, permitindo-se apenas escoamento de trânsito e mobilidade urbana entre três
dos principais shopping-centers da Capital Maranhense.
Diante dessa problemática é necessário um acompanhamento sobre as mudanças
ocorridas nos sistemas ambientais associados ao Empreendimento “Via Expressa”. Para tanto,
é importante um estudo detalhado das perturbações socioambientais, socioeconômicas e
socioculturais em curso, para que, assim, possa ser sugerido um planejamento adequado para
a AID do Empreendimento. Os autores não se manifestam contrários à justificativa das
intervenções que materializarão novos espaços para mobilidade intraurbanaludovicense.
Contudo, sugerem que haja monitoramento dos impactos ambientais já em evidência,
enfocando a necessidade de:
a) Realizar esforços de salvamentos arqueológicos locais na localidade Vinhais
Velho;
b) Recompor a vegetação da AID do Empreendimento “Via Expressa”, com
essências nativas e com alta variação genética (de espécies) vegetais;
c) Criar uma unidade de conservação (UC) estadual no espaço total do Sítio
Santa Eulália, para evitar especulação imobiliária e proporcionar a melhoria
das recargas de aqüíferos locais, permitir a permanência de estoques de
biodiversidade ameaçada de extinção local e regional, bem como propor a
inserção de atividades de controle e monitoramento da ocupação de entorno.
Embora sejam atividades pontuais, os impactos positivos relacionados à
implementação em médio prazo desses esforços pode gerar melhorias significativas da
qualidade ambiental local adjacente ao estuário do Rio Anil e ao corredor ecológico da ESEC
Rangedor e do Parque Natural Municipal da Saúde, este em fase de criação pela Prefeitura
Municipal de São Luís (MA). Esforços interessantes para a promoção das condições
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ambientais adequadas para espaços tão controlados pelas atividades humanas, como os são
aqueles circunscritos à Ilha do Maranhão (lato sensu) e a São Luís (stricto sensu).
REFERÊNCIAS AB’SÁBER, Aziz Nacib. Bases conceptuais e papel do conhecimento na previsão de impactos. In: MÜLLER-PLANTENBERG, Clarita; AB’SÁBER, Aziz Nacib (orgs.). Previsão de impactos: o estudo de impacto ambiental no Leste, Oeste e Sul. Experiências no Brasil, Rússia e Alemanha. 2. ed. São Paulo: EDUSP, 2006a. p. 27-49. DIAS, Luiz Jorge Bezerra. Cidade Operária e área de entorno imediato: dinâmicas espacial e socioambiental. 2004. 112 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Geografia Bacharelado). Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2004. _______. Plano de Reassentamento Involuntário – Canal do Rio das Bicas/Córrego Salinas-Sacavém. São Luís: Prefeitura Municipal de São Luís, 2012. 112 f. il. DIAS, Luiz Jorge Bezerra; NOGUEIRA JÚNIOR, João de Deus Matos. Contribuição às análises da problemática ambiental da Ilha do Maranhão. Ciências Humanas em Revista. São Luís, v. 3, n. 2, dez.2005. p. 127-144. IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2010: resultados do universo. São Luís: IBGE, 2010 (mimeografado). MARANHÃO (Estado). Estudo de Impacto Ambiental – implantação e pavimentação da Via Expressa de ligação das avenidas Carlos Cunha (Jaracaty), Jerônimo de Albuquerque e Daniel de La Touche (Ipase).São Luís: Secretaria de Estado de Infraestrutura, 230 f. il.