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1 A horta como espaço de edução ambiental na escola Lady Diana Souto - CEUNES/UFES Campus São Mateus Veratriz Souto Campos EMEF “Benônio Falcão de Gouvêia” Marcos da Cunha Teixeira - CEUNES/UFES Campus São Mateus RESUMO: A educação ambiental é um processo no qual o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades e atitudes voltadas para a conservação do meio em que vivemos. A horta cultivada por alunos estimula o interesse pela preservação do meio ambiente através das atividades interdisciplinares. Neste sentido foi desenvolvida uma pesquisa com a comunidade escolar sobre os resultados da implantação do Projeto Horta, realizado em uma escola de ensino fundamental de Conceição da Barra/ES, para análise de viabilidade da horta enquanto espaço de educação ambiental. Constatou-se que a horta atua como ferramenta de promoção para a educação ambiental, através de atividades transversais e interdisciplinares. Observou- se que a prática das atividades como: preparar a terra, plantar e colher hortaliças; instigou os alunos a conscientização para um convívio com a natureza de forma mais sustentável, harmonizando um espaço de interação entre escola e comunidade, proporcionando melhor percepção ambiental. Palavras-chaves: Educação ambiental; interdisciplinaridade; alimentação saudável ABSTRACT Environmental education is a process in which the individual and the community construct social values, knowledge, skills and attitudes aimed at the conservation of environment in which we live. The vegetables garden cultivated by students stimulates the interest for the preservation of the environment through interdisciplinary activities. In this sense, a research was developed with the school community about the results of the implementation of the Horta Project, carried out in a fundamental teaching school in Conceição da Barra / ES, to analyze the viability of the vegetable garden as an environmental education space. It was verified that the vegetable garden acts as a promotion tool for environmental education, through transversal and interdisciplinary activities. It was observed that the practice of activities such as: preparing the land, planting and harvesting vegetables; stimulates students to raise awareness of nature in a more sustainable way, harmonizing a space of interaction between school and community, providing better environmental awareness. Keys-words: Environmental education; interdisciplinarity; healthy eating INTRODUÇÃO De acordo com a conjectura da Política Nacional de Educação Ambiental - PNEA (BRASIL, 1999) entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade. Ainda segundo a PNEA a educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal. Como parte do processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental incumbindo ao IX EPEA Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

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A horta como espaço de edução ambiental na escola

Lady Diana Souto - CEUNES/UFES – Campus São Mateus

Veratriz Souto Campos – EMEF “Benônio Falcão de Gouvêia”

Marcos da Cunha Teixeira - CEUNES/UFES – Campus São Mateus

RESUMO: A educação ambiental é um processo no qual o indivíduo e a coletividade

constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades e atitudes voltadas para a

conservação do meio em que vivemos. A horta cultivada por alunos estimula o interesse

pela preservação do meio ambiente através das atividades interdisciplinares. Neste

sentido foi desenvolvida uma pesquisa com a comunidade escolar sobre os resultados da

implantação do Projeto Horta, realizado em uma escola de ensino fundamental de

Conceição da Barra/ES, para análise de viabilidade da horta enquanto espaço de

educação ambiental. Constatou-se que a horta atua como ferramenta de promoção para

a educação ambiental, através de atividades transversais e interdisciplinares. Observou-

se que a prática das atividades como: preparar a terra, plantar e colher hortaliças;

instigou os alunos a conscientização para um convívio com a natureza de forma mais

sustentável, harmonizando um espaço de interação entre escola e comunidade,

proporcionando melhor percepção ambiental.

Palavras-chaves: Educação ambiental; interdisciplinaridade; alimentação saudável

ABSTRACT

Environmental education is a process in which the individual and the community

construct social values, knowledge, skills and attitudes aimed at the conservation of

environment in which we live. The vegetables garden cultivated by students stimulates

the interest for the preservation of the environment through interdisciplinary activities.

In this sense, a research was developed with the school community about the results of

the implementation of the Horta Project, carried out in a fundamental teaching school

in Conceição da Barra / ES, to analyze the viability of the vegetable garden as an

environmental education space. It was verified that the vegetable garden acts as a

promotion tool for environmental education, through transversal and interdisciplinary

activities. It was observed that the practice of activities such as: preparing the land,

planting and harvesting vegetables; stimulates students to raise awareness of nature in a

more sustainable way, harmonizing a space of interaction between school and

community, providing better environmental awareness.

Keys-words: Environmental education; interdisciplinarity; healthy eating

INTRODUÇÃO

De acordo com a conjectura da Política Nacional de Educação Ambiental -

PNEA (BRASIL, 1999) entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos

quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos,

habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente,

bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade.

Ainda segundo a PNEA a educação ambiental é um componente essencial e permanente

da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e

modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal. Como parte do

processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental incumbindo ao

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Poder Público, nos termos dos Arts. 205 e 225 da Constituição Federal, definir políticas

públicas que incorporem a dimensão ambiental, promover a educação ambiental em

todos os níveis de ensino e o engajamento da sociedade na conservação, recuperação e

melhoria do meio ambiente. Nesse contexto, cabe às instituições educativas, promover a

educação ambiental de maneira integrada aos programas educacionais que

desenvolvem.

Na escola podem ser trabalhados diversas atividades práticas que contribuem

para garantir a oferta da Educação ambiental. Nesse sentido, diversos projetos escolares

tem utilizado a horta como espaço de educação ambiental. Entre as justificativas para o

uso da na escola é que esta proporciona grandes vantagens, tais como: diminuição de

gastos com a alimentação, permite a inserção de alimentos saudáveis cultivados pelos

alunos; estimula o interesse pela preservação do meio ambiente através das atividades

pedagógicas desenvolvidas durante a implantação e manutenção da horta, além do

enriquecimento nutricional da merenda escolar. No entanto, esses motivos não são

suficientes para se estabelecer a horta como um espaço de transversalização do tema

meio ambiente e de oferta de uma educação ambiental para uma formação crítica.

A transversalidade diz respeito à possibilidade de se estabelecer,

na prática educativa, uma relação entre aprender conhecimentos

teoricamente sistematizados (aprender sobre a realidade) e as

questões da vida real e de sua transformação (aprender na

realidade e da realidade). E a uma forma de sistematizar esse

trabalho e incluí-lo explícita e estruturalmente na organização

curricular, garantindo sua continuidade e aprofundamento ao

longo da escolaridade. (BRASIL, 1998:30)

Por outro lado, a educação ambiental crítica entende que:

Não se trata de promover apenas reformas setoriais, mas uma

renovação multidimensional capaz de transformar o

conhecimento, as instituições, as relações sociais e políticas, e

os valores culturais e éticos. Trata-se de incluir no debate

ambiental a compreensão político-ideológica dos mecanismos

da reprodução social e o entendimento de que a relação entre o

ser humano e a natureza é mediada por relações socioculturais e

classes historicamente construídas. Essa tendência traz então

uma abordagem pedagógica que problematiza os contextos

societários em sua interface com a natureza. Por essa

perspectiva, definitivamente não é possível conceber os

problemas ambientais dissociados dos conflitos sociais; afinal, a

crise ambiental não expressa problemas da natureza, mas problemas

que se manifestavam na natureza (LOUREIRO e LAYRARGUES,

2013). Assim, dois aspectos básicos se fazem necessário para que os projetos escolares

apresentem-se como proposta de transversalização dp tema meio ambiente concatenado

à uma educação ambiental crítica: relacionar conteúdos teóricos das disciplinas

escolares à vida cotidiana e problematizar as relações existentes entre as questões

ecológicas e as questões sociais. Diante disso, torna-se necessário avaliar os projetos

escolares desenvolvidos sob o título de educação ambiental. Neste artigo analisou-se a

transversalização do tema meio ambiente e a educação ambiental praticada no “Projeto

Horta Escolar’ desenvolvido na Escola Municipal de Ensino Fundamental (EMEF)

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“Benônio Falcão de Gouvêa”, localizada no distrito de Itaúnas, município de Conceição

da Barra. Além do exposto acima, o trabalho ganha relevância ainda em função da

escola citada está localizada em comunidade limítrofe ao Parque Estadual de Itaúnas -

PEI. Nesse contexto, a escola recebe constantes intervenções do Parque em atividades

de educação ambiental.

MATERIAL E METODOS

O Projeto Horta propôs a abordagem da Educação Ambiental de forma

interdisciplinar por meio da execução de ações que contribuíram para a

contextualização de conteúdos teóricos ministrados em sala de aula e na mudança de

hábito alimentar dos alunos. A horta foi implantada em terreno situado na Vila de

Itaúnas, em uma área de 336 (trezentos e trinta e seis) m². As atividades do projeto horta

aconteceram no horário alternado ás atividades normais de ensino. A construção dos

canteiros se deu através dos alunos, pais, moradores, além do apoio do Parque Estadual

de Itaúnas e de uma empresa de atuação local.

Para avaliar a viabilidade da horta como espaço de educação ambiental foram

realizadas entrevistas a partir de um roteiro contemplando as seguintes categorias de

análise:

Caracterização do projeto

O uso da horta como espaço de transversalização do tema meio ambiente no

currículo escolar;

Realização da atividade prática como espaço de interação escola - comunidade;

Apreensão dos conceitos desenvolvidos durante o projeto pelos estudantes.

Participaram das pesquisas, a diretora da escola, 5 professores, 2 merendeiras, 2

coordenadoras pedagógicas, 5 alunos e 5 pais.

Durante a entrevista, as questões foram elaboradas de acordo com a papel

desempenhado pelo participante na comunidade escolar e ou na condição de pai de

estudante. Os diálogos foram gravados em áudio e posteriormente transcritos, sendo

tabulados em planilha de dados para análise de resultados. Com exceção da Diretora da

escola, todos os demais participantes tiveram suas identidades não reveladas e estão

identificados por um código formado pelas letras iniciais da posição que ocupa na

comunidade seguida no número referente à ordem que se deu a entrevista, como segue:

C = Coordenadora pedagógica; P = Professor; E = Estudante; M = Merendeira; Pa = Pai

de estudante. Ainda com objetivo de preservar as identidades dos entrevistados, as

disciplinas das professoras foram suprimidas das transcrições.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Percepções quanto à gestão do projeto: aspectos positivos e negativos

O Projeto Horta na escola foi um dos itens do Projeto Político Pedagógico da

Escola Municipal de Ensino Fundamental (E.M.E.F) Benônio “Falcão de Gouvêa”,

selecionado pela equipe Pedagógica como ferramenta pra a execução da Educação

Ambiental para o ano de 2009, sendo desenvolvido até o final do período letivo de

2011.

A complementação da merenda escolar pelas hortaliças produzidas na horta da

escola foi citada tanto pela Diretora quanto pelas duas pedagogas e por 4 professoras,

ressaltando especialmente o fato dos alunos se sentirem orgulhosos por consumir algo

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saudável e produzido por eles mesmos. A P4 também destacou esse fato, manifestado

no seguinte discurso:

- "Olha, que eu me lembre, de positivo, foi que despertou muito

o cuidado das crianças com as hortaliças, né? Que antes eles não

tinham muita pratica de gostar de comer, eles passaram a ter

uma visão diferente para a alimentação saudável, a merenda

ficou mais atraente, mais gostosa, e dentre outras que eu não me

lembro agora".

O aspecto positivo da horta como espaço pedagógico foi lembrado apenas por 3

professoras principalmente porque “[...] eram as atividades extra classe, desenvolve a

curiosidade dos alunos, aula prática e o consumo das hortaliças na merenda escolar”

(P5). A P6 enfatizou a “a participação da colheita para com os pais dos alunos e

funcionários da escola”. Nesse contexto, a Diretora e as Pedagogas também

consideraram relevantes o fato do projeto ter possibilitado o debate com a comunidade

externa sobre alimentação saudável. Uma das Pedagogas considerou importante que os

estudantes deixaram de ficar na rua para se dedicarem à horta nos horários alternados ao

das aulas.

Os discursos da Diretora, das Pedagogas e dos professores também foram

convergentes quanto aos aspectos negativos, pois enfatizaram o fato do terreno não

pertencer à escola e não terem um profissional efetivo para trabalhar a Educação

ambiental, pois isso impediu a continuidade do projeto com a horta. O discurso de P6

ilustra esse descontentamento generalizado da comunidade escolar:

- "As dificuldades em dar continuidade ao projeto se deu

principalmente por parte política, corte de gastos, envolvendo a

não contratação de profissionais para dar continuidade ao

projeto de educação ambiental e outros projetos mais da escola.

Principalmente também não ter espaço a continuidade da horta,

o espaço usada era particular que teve que ser devolvido e a

escola não possuía por perto um espaço que pudesse ser dado

continuidade ao projeto." (P6)

A horta como espaço de transversalização do tema meio ambiente: olhares

docentes

Analisando-se as entrevistas com os professores, foi possível observar que o

projeto horta na escola atuou como ferramenta de transversalização da educação

ambiental, através de práticas educativas interdisciplinares. Segundo o Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN’s), na prática pedagógica, interdisciplinaridade e

transversalidade se alimentam mutuamente, sendo impossível haver transversalidade

sob outra ótica, se não a da interdisciplinaridade. Ambas se fundamentam na crítica de

um conhecimento fragmentado e isento da realidade. Dessa forma, a

interdisciplinaridade questiona a segmentação do conhecimento, referindo-se a uma

relação entre as disciplinas, enquanto a prática transversal diz respeito à possibilidade

de a prática educativa estabelecer uma relação entre aprender na realidade e da realidade

(BRASIL, 1998). Nesse sentido, ao se avaliar as atividades do projeto horta foi possível

observar a interação entre as disciplinas do currículo, como relata a educadora P4

quando questionada de que forma sua disciplina se envolveu no Projeto Horta: "Através

de produção de textos, de desenhos e montagem de painéis ... assim (P4)."

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Também foi possível observar a pratica em campo, como foi relatado pelas

educadoras do 4° e 5º ano do ensino fundamental, respectivamente.

- "Conforme o assunto que eu estava trabalhando em ciências,

eu marcava uma visita na horta com a professora responsável

pela horta, alguns dos assuntos que lembro ter trabalhado foram

[...]" (P3),

- "Bom, durante a minha aula, quando o assunto dava pra usar a

horta como aula prática, a gente usava" (P5).

Esses discursos corroboram a análise de Dias (2004) já que esse autor retrata o

espaço da horta como uma alternativa de unir a teoria e prática, na qual se insere a

interdisciplinaridade em diversos níveis e áreas de ensino, aliando o meio ambiente com

a saúde alimentar, despertando nos alunos um encantamento frente ao ambiente criado.

A transversalidade e a interdisciplinaridade se fundamentam na crítica de um

conhecimento fragmentado e isento da realidade.

- "E que eu lembro da participação no projeto... conselho de

classe... agora diretamente a disciplina de [...] não foi envolvida,

nós não se envolvemos com o projeto visto que era uma projeto

voltado para ciência e não foi um projeto interdisciplinar, então

a gente ficou fora desse projeto". (P2)

- "A minha disciplina não teve envolvimento com o projeto

horta, pois é uma disciplina... é difícil de encontrar conteúdo

para que fossem trabalhado as hortaliças e o projeto de um modo

geral." (P6)

Aqui, ganha destaque a afirmação de que se tratava de um projeto voltado para

ciência. Este resultado corrobora as afirmações de diversos autores sobre os desafios

para a transversalização da educação ambiental no currículo escolar, fruto de um olha

reducionista sobre o conceito de meio ambiente.

Contudo Bizerril e Faria (2001) também discute a dificuldade de se trabalhar

com a interdisciplinaridade, por que, na maioria dos casos, os assuntos abordados estão

limitadamente relacionados às drogas ou a sexualidade. Já os assuntos ligados ao meio

ambiente, que normalmente trata do desperdício de água ou reciclagem do lixo, ficam

com a responsabilidade quase exclusiva do professor de Ciências ou de Geografia.

Segundo Santos e Santos (2016), o que prevalece na escola em relação à prática

da EA são ações multidisciplinares, restringindo as questões socioambientais às

disciplinas de geografia, biologia e ciências, ou seja, disciplinas que possuem afinidades

com a temática ambiental.

Apesar da não identificação de sua disciplina com o projeto desse olhar

reducionista sobre os conteúdos ambientais, também se observou uma valorização

pedagógica do projeto, conforme se pode confirmar no seguinte discurso:

- "Infelizmente eu não me envolvi [...]. Positivo eram as

atividades extra classe, desenvolve a curiosidade dos alunos,

aula prática e o consumo das hortaliças na merenda escolar"

(P5)

O discurso dessa professora demonstra que a não utilização pedagógica do

projeto com a horta é um indicativo de que nem sempre há uma percepção negativa

quanto à sua importância pedagógica. Mesmo não se envolvendo a professora considera

a importância do projeto por envolver os estudantes em atividades extraclasse. Diante

disso, fica evidente a necessidade de projetos de formação continuada para esses

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professores, sobretudo que contribuam para que consigam relacionar os conteúdos de

suas disciplinas com o ambiente das hortas. Nóvoa (2003) argumenta que estas

disposições exigem práticas de formação de professores inevitavelmente localizadas na

escola. Não se trata, claro está, de advogar uma qualquer forma de “praticismo”, mas

antes de sublinhar a importância da escola como lugar da formação e o papel dos

professores no seu próprio processo de desenvolvimento profissional.

Contribuições do projeto horta com a apreensão de conceitos pelos estudantes

Quando perguntou-se sobre o que eles aprendiam na horta, percebe-se que as

atividades práticas do dia-dia na horta, proporcionou um contato direto do aluno com a

natureza e que alguns objetivos pretendidos no projeto foram alcançados, como:

compreender a relação solo-planta-atmosfera; identificar processos de semeadura,

adubação e colheita; desenvolver a atividade motora, comunicação e socialização dos

alunos. Alguns discursos dos alunos:

- "A gente aprendeu sobre os tipos de solo, como plantar, os

cuidados que devemos ter, sobre a higiene com as hortaliças na

hora de comer." (E1)

- "Nossa, aprendi sobre os tipos de solo, quais são melhores pra

planta, as diferenças entre verduras e legumes e como plantar

cada coisa." (E2)

A horta inserida em espaço escolar é um “laboratório vivo”, pois, possibilita o

desenvolvimento de diversas atividades pedagógicas e interdisciplinares, integrando o

aluno ao meio ambiente, de forma teórica e prática, auxiliando no processo de ensino e

aprendizagem, proporcionando trabalho coletivo e cooperado entre os agentes sociais

envolvidos, ainda, uma reflexão da importância dos recursos naturais para a

sobrevivência dos seres vivos (MORGADO e SANTOS, 2008).

Convém ressaltar que o projeto horta na escola, foi um instrumento para realizar

a educação ambiental de uma forma prazerosa, estimulando-os a estarem sempre em

presente nas atividades desenvolvidas, percebemos isso quando perguntávamos o que

eles mas gostavam de fazer na horta.

- "Ah, eu gostava de plantar de colher e molhar." (E3)

- "De plantar as hortaliças." (E4)

Esses discursos corroboram as afirmações de Sato (2003, p. 13) quando afirma

que é necessário uma "renovação dos laços com a natureza, tornando-nos parte dela e

desenvolvendo a sensibilidade para o pertencimento". Dessa forma, pode-se afirmar que

o projeto propiciou ao alunos a participarem de um processo de um modo vida mais

saudável, não só no âmbito escolar, mas também no seu dia-a-dia fora da escola.

No Brasil, os Parâmetros Curriculares Nacionais indicam que a abordagem da

temática ambiental necessita atender a aspectos conceituais, pois os alunos precisam

atribuir significados aos termos como biodiversidade, sociodiversidade, preservação,

conservação, degradação e sustentabilidade. O mesmo documento destaca que esses

conceitos devem estar integrados aos conteúdos procedimentais e atitudinais, de modo a

priorizar reflexões e exercícios que desenvolvam valores e atitudes críticas (NARDY &

LABURU, 2014).

Dessa forma, quando se trata de uma aprendizagem significativa voltada à

educação ambiental, devem-se levar em consideração os conteúdos que vão além dos

conceituais, como exemplificado na fala de um educando e uma mãe:

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- "Aprendi muitas coisas como plantar, preparar a terra e a

importância de cada alimento na nossa alimentação, porque que

a gente tem que consumir certos alimentos, é o que eu lembro."

(E1)

- "Olha pra mim sim, ele passou a valorizar mais a verduras na

comida, ajudou ele a entender melhor alguns conteúdos que a

professora passava na aula." (Pa1)

Segundo Loureiro (2011) a percepção do ambiente (percepção ambiental) está

relacionada ao pensamento do homem em sociedade vivendo e intervindo no meio

ambiente, e essas relações que se estabelecem em ambientes escolares, na família, no

trabalho ou na comunidade contribuem para que o indivíduo tenha uma percepção

crítica de si e da sociedade onde está inserido, podendo, assim, perceber sua posição e

construir a base de respeitabilidade para com o próximo.

A horta como espaço de interação escola – comunidade

As escolas vem sendo um dos espaços privilegiados para a implementação de

ações integradas aos interesses das populações afetadas pelos problemas

socioambientais, promovendo a sensibilização do público em relação ao seu próprio

ambiente, para envolvê-lo na resolução dos problemas local, considerando a

importância da temática ambiental e a visão integrada do mundo, no tempo e no espaço.

A Educação Ambiental potencializa as relações entre escola e comunidade, na

medida em que gera condições de articulação de práticas educativas que superam a

dinâmica interna da ação escolar e ampliam-se para o encontro com os desejos e

necessidades da vida além da escola. Os resultados da pesquisa revelam que, onde são

desenvolvidos projetos de Educação Ambiental com apelo à participação comunitária,

consegue-se instalar uma ação consequente, que gera rebatimentos nos saberes e fazeres

que a escola realiza em seu dia-a-dia (TRAJBER e MENDONÇA, 2007, p. 103).

Foi identificado algumas ações que demonstram como ocorreu a relação escola-

comunidade, assim agrupados:

a) da comunidade para a escola: em algumas falas dos pais, relatam como participaram

do projeto horta.

- "Eu participei da limpeza do terreno, na construção da horta."

(Pa2)

- "Não participei do projeto de forma direta, mas indiretamente,

acompanhando e incentivando a minha filha." (Pa3)

b) da escola para a comunidade: A escola Benônio, através de reuniões de pais, e

atividades na semana da família na escola, conseguiu instigar o envolvimento dos pais

no projeto.

- "Eu participei da horta durante a semana da família na escola,

onde fomos lá limpar, plantar e sempre incentivei muito meu

filho a participar." (Pa4)

- "Participei de atividades na horta, em reuniões de pais foram

faladas algumas coisas sobre a importância do projeto horta para

nossos filhos." (Pa5)

Entre 2001 e 2004 o censo escolar mapeou a inclusão da Educação Ambiental

nas escola, sendo possível ter um panorama como as escolas proporcionam a EA para a

comunidade.

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Apesar de ser difícil mensurar a relação escola-comunidade com métodos

quantitativos, o Censo Escolar de 2004 traz informações sobre a participação da escola

em diversas atividades comunitárias. Apenas 8,8% das escolas que oferecem Educação

Ambiental participam na atividade de colaborar na manutenção de hortas, pomares e

jardins; em termos absolutos isto significa aproximadamente 13,4 mil escolas das 152

mil escolas que oferecem Educação Ambiental. No Brasil, a atividade com maior

participação das escolas que oferecem Educação Ambiental corresponde ao mutirão de

limpeza da escola, 17,9% ou 27,2 mil escolas aproximadamente. Finalmente, 10,5% das

escolas que oferecem Educação Ambiental – aproximadamente 15,9 mil escolas –

participam na manutenção da estrutura física da escola. Ainda existe um enorme

caminho para avançar na relação escola-comunidade (VEIGA et al, 2005).

CONCLUSÃO

Do ponto de vista da transversalização do tema meio ambiente pode-se afirmar

que o projeto horta escolar constitui-se como importante instrumento de ensino, pois

permitiu que os professores extrapolassem seus conteúdos e práticas para fora da sala de

aula indo ao encontro de questões do cotidiano dos estudantes, especialmente

vinculadas à alimentação. No entanto, ao longo dos 3 anos de projeto, alguns

professores não desenvolveram a percepção da horta como espaço pedagógico capaz de

facilitar a transversalização, pois não viram relação entre os conteúdos de suas

disciplinas com os conhecimentos que se utiliza para desenvolvimento da horta. Nesses

casos, o projeto não foi capaz de transformar a visão reducionista e fragmentada do

conhecimento portada por esses professores. Portanto, o projeto horta, isoladamente,

não pode ser considerado como instrumento único para garantia da transversalização do

tema meio ambiente. Nesse contexto, destacam-se a abordagem sobre a origem dos

alimentos e sua importância para uma boa saúde alimentar.

O Projeto Horta representou uma importante ferramenta de educação ambiental

na escola ao inserir o debate sobre os problemas socioambientais na comunidade

escolar. Além disso, ao fortalecer a relação escola-comunidade o projeto horta deu um

passo importante rumo à construção de uma educação ambiental crítica.

Uma questão que ficou evidente a partir dos resultados da pesquisa foi a

necessidade de se proporcionar a formação continuada em educação ambiental para os

professores da escola onde se deu o estudo. Nesse sentido, encarando a escola como

espaço de formação docente, sugere-se que a escola busque maior aproximação com o

PEI para se utilizar as questões sobre a relação homem-natureza no entorno do Parque

como instrumento de problematização da realidade socioambiental.

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Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

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IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental