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Research, Society and Development, v. 9, n. 3, e12932299, 2020 (CC BY 4.0) | ISSN 2525-3409 | DOI: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v9i3.2299 1 A fotografia como recurso didático para contextualizar conceitos de Química Analítica Photography as a didactic resource to contextualize concepts of Analytical Chemistry La fotografía como recurso didáctico para contextualizar conceptos de Química Analítica Recebido: 01/12/2019 | Revisado: 05/12/2019 | Aceito: 07/12/2019 | Publicado: 18/12/2019 Fernanda Oliveira Lima ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4055-1216 Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil E-mail: [email protected] Marcia Borin da Cunha ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3953-5198 Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Brasil E-mail: [email protected] Resumo A Química Analítica é considerada um dos componentes curriculares mais difíceis na graduação em Química, principalmente por estar centrada no equilíbrio químico. Assim, este estudo aborda a inserção da Fotografia Científica Observatória na contextualização dos conceitos de Química Analítica, como facilitador do ensino e da aprendizagem, junto à 18 estudantes do Ensino Superior na Universidade Federal da Fronteira Sul, para observação do equilíbrio químico presente no cotidiano. De forma geral, os acadêmicos se restringiram em trazer exemplos mais presentes em livros didáticos. No entanto, a análise das fotografias apresentadas pelos estudantes mostrou a importância de motivar os estudantes a buscar conhecimento de forma contextualizada e intencional. Palavras-chave: Leitura de Imagens; Ensino de Química; Equilíbrio Químico. Abstract Analytical Chemistry is considered one of the most difficult curricular components in undergraduate chemistry, mainly because it is centered on chemical equilibrium. Thus, this study addresses the insertion of Observatory Scientific Photography in the context of the concepts of Analytical Chemistry, as a facilitator of teaching and learning, along with 18 students of Higher Education at the Federal University of Fronteira Sul, to observe the chemical

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(CC BY 4.0) | ISSN 2525-3409 | DOI: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v9i3.2299

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A fotografia como recurso didático para contextualizar conceitos de Química Analítica

Photography as a didactic resource to contextualize concepts of Analytical Chemistry

La fotografía como recurso didáctico para contextualizar conceptos de Química

Analítica

Recebido: 01/12/2019 | Revisado: 05/12/2019 | Aceito: 07/12/2019 | Publicado: 18/12/2019

Fernanda Oliveira Lima

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4055-1216

Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil

E-mail: [email protected]

Marcia Borin da Cunha

ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3953-5198

Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Brasil

E-mail: [email protected]

Resumo

A Química Analítica é considerada um dos componentes curriculares mais difíceis na

graduação em Química, principalmente por estar centrada no equilíbrio químico. Assim, este

estudo aborda a inserção da Fotografia Científica Observatória na contextualização dos

conceitos de Química Analítica, como facilitador do ensino e da aprendizagem, junto à 18

estudantes do Ensino Superior na Universidade Federal da Fronteira Sul, para observação do

equilíbrio químico presente no cotidiano. De forma geral, os acadêmicos se restringiram em

trazer exemplos mais presentes em livros didáticos. No entanto, a análise das fotografias

apresentadas pelos estudantes mostrou a importância de motivar os estudantes a buscar

conhecimento de forma contextualizada e intencional.

Palavras-chave: Leitura de Imagens; Ensino de Química; Equilíbrio Químico.

Abstract

Analytical Chemistry is considered one of the most difficult curricular components in

undergraduate chemistry, mainly because it is centered on chemical equilibrium. Thus, this

study addresses the insertion of Observatory Scientific Photography in the context of the

concepts of Analytical Chemistry, as a facilitator of teaching and learning, along with 18

students of Higher Education at the Federal University of Fronteira Sul, to observe the chemical

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balance present in daily life. In general, academics were restricted to bringing more examples

from textbooks. However, the analysis of the photographs presented by the students showed the

importance of motivating the students to seek knowledge in a contextualized and intentional

way.

Keywords: Image Reading; Chemistry Teaching; Chemical Balance.

Resumen

La química analítica se considera uno de los componentes curriculares más difíciles en la

química de pregrado, principalmente porque se centra en el equilibrio químico. Así, este estudio

aborda la inserción de la Fotografía Científica del Observatorio en la contextualización de los

conceptos de Química Analítica, como facilitador de la enseñanza y el aprendizaje, junto con

18 estudiantes de educación superior de la Universidad Federal de Fronteira Sul, para observar

el equilibrio químico presente en la vida diaria. En general, los académicos se limitaron a traer

más ejemplos de libros de texto. Sin embargo, el análisis de las fotografías presentadas por los

estudiantes mostró la importancia de motivar a los estudiantes a buscar conocimiento de una

manera contextualizada e intencional.

Palabras clave: Lectura de Imágenes; Enseñanza de la Química; Equilibrio Químico.

1. Introdução

Nunca olhamos apenas uma coisa,

estamos sempre olhando para as relações entre as coisas e nós mesmos.

John Berger

A Química Analítica é um dos componentes curriculares mais “temidos” no Ensino

Superior de Química. A maior dificuldade está relacionada ao ensino e a aprendizagem do

equilíbrio químico, conceito central desta disciplina.

O equilíbrio químico envolve um conjunto complexo de relações entre quantidade de

espécies químicas presentes em equilíbrio e, também, entre estas relações e outras variáveis

como temperatura, pressão e adição ou remoção de substâncias ao sistema. Nas situações em

que é necessário considerar estas relações há uma exigência conceitual dos estudantes, por isto

a dificuldade neste tema.

Nesta perspectiva, este estudo surgiu da inquietude em como melhorar o processo de

ensino e aprendizagem na Química Analítica, com intuito de renovar, reformular e aperfeiçoar

o mesmo.

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Assim, a fim de tornar o processo educativo mais significativo para os estudantes,

buscamos trabalhar o equilíbrio químico de forma contextualizada, com a intenção de

aproximar e articular os conteúdos escolares com a realidade dos acadêmicos, por meio da

utilização da fotografia como recurso didático, para observação e/ou registro dos fenômenos

químicos.

A fotografia é uma forma de comunicação não verbal, de registro de fatos e

acontecimentos, muito utilizada na sociedade e de fácil acesso. Por isso, pode ser usada como

ferramenta de ensino e divulgação científica.

Dessa forma, este trabalho objetivou inserir a fotografia na contextualização dos

conceitos de Química Analítica como recurso didático-pedagógico, facilitador do ensino e da

aprendizagem, junto à estudantes do Ensino Superior no componente curricular de Química

Analítica Qualitativa, com o intuito de mobilizar um outro olhar sobre o equilíbrio químico

presente no cotidiano, por meio da Fotografia Científica Observatória (FoCO).

2. O Ensino de Química Analítica

O curso de graduação de Química Licenciatura da Universidade Federal da Fronteira

Sul (UFFS) busca promover a formação de professores pesquisadores na área de Ciências da

Natureza e suas Tecnologias, especialmente, de Química, relacionada à compreensão histórica,

crítica e reflexiva. No componente curricular de Química Analítica Qualitativa são

aprofundados os conceitos fundamentais relacionados aos principais equilíbrios químicos,

ácido-base, precipitação, complexação e óxido-redução. Estes conceitos, os estudantes já

estudaram em disciplinas anteriores como Química Geral e Química Inorgânica, nas quais o

estudo foi realizado de forma ampla.

Assim, na disciplina de Química Analítica os equilíbrios químicos são estudados de

forma mais específica, articulado com o que é abordado na Educação Básica, na busca da

integração dos conhecimentos conceituais, contextuais e pedagógicos para o desenvolvimento

de habilidades profissionais docentes, incluídos também na Prática como Componente

Curricular.

O equilíbrio químico é um dos principais conceitos no ensino de química, tanto no

Ensino Médio quanto no Ensino Superior. No entanto, este tema é considerado complexo e sua

compreensão se faz necessária para a fundamentação de várias discussões que levam ao

entendimento de fenômenos e processos, articulando vários temas como reação química,

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reversibilidade de reações, cinética química, entre outros (TESERPALIS;

KOUSATHANA;NIAZ, 1998; MENDONÇA; JUSTI; FERREIRA, 2005).

Estudos indicam diversas dificuldades dos estudantes, de diferentes níveis de

escolaridade, na aprendizagem de equilíbrio químico (TYSON; TREAGUST; BUCAT (1999)

LIMA (2012)). As dificuldades podem estar relacionadas a aprendizagem, bem como na

natureza intrínseca do assunto (JOHNSTONE, 2000). Uma destas dificuldades é a compreensão

do assunto no nível teórico (atômico-molecular), e são decorrentes da transposição, para o

contexto químico, em que se pode destacar as seguintes concepções: equilíbrio químico

estático, não dinâmico; visão compartimentalizada do equilíbrio; igualdade de concentrações

de produtos e reagentes (JOHNSTONE, 2000; GRESCZYSCZYN et al., 2017).

Estas dificuldades, também podem ser resultado de uma abordagem de apenas um dos

níveis do conhecimento químico (macroscópico ou simbólico), ou ainda, de forma estritamente

quantitativa do tema, enfatizando expressões matemáticas, em detrimento do significado lógico

e da interpretação Química dos fenômenos (POZO; CRESPO, 2009; LIMA, 2012;

GRESCZYSCZYN et al., 2017).

Segundo Johnstone (2000), para a construção do conhecimento químico é necessária a

compreensão e a articulação de três formas complementares de pensamento, sendo que

nenhuma forma é superior à outra. Essas formas de pensamento são o macro e o tangível (o que

pode ser visto, tocado e cheirado), o submicro (átomos, moléculas, íons e estruturas), e o

representacional (símbolos, fórmulas, equações, molaridade, cálculos matemáticos e gráficos).

No entanto, no processo de ensino e aprendizagem, estes três níveis de conhecimento químico

não devem ser trabalhados simultaneamente.

Além disso, independente de qual seja

[...] a concepção metodológica a ser seguida, os saberes desenvolvidos no ensino de

Química devem ser fundamentados em estratégias que estimulem a curiosidade e a

criatividade dos estudantes, despertando sua sensibilidade para a inventividade e

compreendendo que esta ciência e seus conhecimentos permeiam a sua vida, estando

presentes nos fenômenos mais simples do seu cotidiano. (ASTOLFI, 1995 apud

LIMA 2012, p. 99)

Neste sentido, motivamos os estudantes a utilizar a fotografia, mais especificamente a

Fotografia Observatória (FoCO), para observar e/ou registrar os fenômenos que envolvem o

equilíbrio químico no seu dia a dia dos estudantes.

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3. A fotografia na construção de significados da Química

A imagem tem uma contribuição na sociedade desde a pré-história, em que o homem

buscou representar as relações sociais e a natureza. E a imagem fixa, produzida pelo processo

fotográfico é possível desde 1839. Segundo Hacking (2012) apud Belz (2017), a fotografia

pertence tanto ao campo da representação da realidade quanto da imaginação, influenciando

diretamente a vida das pessoas e transformando a realidade que vivemos (BELZ, 2017).

A imagem fotográfica, mesmo sendo banalizada atualmente, precisa ser atraente,

carregada de um contexto comunicativo mais complexo, possibilitando uma análise e

interpretação mais profunda. Assim, a fotografia pode ser usada como uma importante

ferramenta de comunicação científica e de ensino em qualquer área das Ciências. No entanto,

ainda, no ensino poucos professores utilizam a fotografia como recurso didático (BORGES;

ARANHA;SABINO (2010); BELZ (2017)).

No ensino de Ciências é importante incentivar os estudantes ao ato de observar

intencionalmente e a buscar meios para fomentar o papel mais ativo dos estudantes na educação.

É preciso que os estudantes interajam ativa e profundamente com o seu ambiente, entendendo

que este faz parte do mundo do qual ele também é corresponsável (LIMA, 2012). A fotografia

pode contribuir nesse processo, como uma ferramenta didática, cada vez mais presente no

cotidiano das pessoas e de fácil acesso hoje em dia (FARIA;CUNHA, 2016).

Segundo Costa (2013), as imagens possuem um caráter intuitivo maior do que a

linguagem verbal/escrita, pois elas são mais universais do que as linguagens verbais e sonoras.

Dessa forma, a utilização da fotografia, como ferramenta de ensino, pode facilitar a

aprendizagem dos estudantes, uma vez que cada pessoa tem um olhar singular sobre as coisas,

e permite investigar a percepção do observador (estudante) que está por trás da tela, podendo,

assim, vir a saber por que ele capturou determinada imagem, objeto ou situação (FARIA;

CUNHA, 2016).

Para Lopes (2006),

[...] A linguagem fotográfica é vista como uma prática, que pode ser estimulada na

escola, equivalente a uma experiência artística, estética e de aprendizagem. Colocando

em foco as múltiplas formas de ver e de ser visto, o ato fotográfico desponta como

mais um caminho de problematização da vida, que nos permite, através da mediação

técnica da câmera fotográfica, registrar, decifrar, ressignificar e recriar o mundo e a

nós mesmos (LOPES, 2006, p. 9).

Neste sentido, Cunha (2018) apresenta em seu estudo, duas possibilidades de utilização

da Fotografia Científica Didática no ensino de Ciências/Química, como recurso didático para

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as aulas de Química, sendo a Fotografia Científica Observatória (FoCO) e a Macrofotografia

Didática (MFD). A FoCO baseia-se no registro de fenômenos e a MFD no acompanhamento

de atividades experimentais, observação de objetos e de fenômenos com ampliação da imagem.

4. O processo de contextualização dos conceitos por parte dos acadêmicos

Este estudo buscou instigar os estudantes de graduação a utilizar a Fotografia Científica

Observatória (FoCO), conforme Cunha (2018), como recurso de observação dos equilíbrios

químicos que estão presentes no nosso dia a dia. A atividade foi desenvolvida na Universidade

Federal da Fronteira Sul – Campus Realeza/PR, no curso de Química Licenciatura no

componente curricular de Química Analítica Qualitativa teórica e experimental, com 4 créditos,

que corresponde a 72 horas aula e a 60 horas relógio, divididos em 18 aulas, na 3ª fase do curso,

e envolveu 18 estudantes. Ao todo foram entregues 33 fotografias, pois 2 estudantes não

concluíram a atividade.

A atividade fotográfica consistiu em mobilizar os estudantes a fotografar dois

fenômenos do cotidiano deles, que envolvesse cada um dos quatro equilíbrios químicos

estudados ao longo do semestre, sendo os equilíbrios de ácido-base, precipitação, complexação

e oxirredução. Junto com a fotografia os acadêmicos deveriam inserir uma legenda da imagem,

explicando o equilíbrio fotografado, incluindo também representações das reações apresentadas

por meio da imagem. Os acadêmicos entregaram esta atividade individual no final do semestre

via moodle.

Para fins de discussão neste estudo, foi escolhido o equilíbrio ácido-base, por se tratar

do equilíbrio químico mais “popular” no estudo de Química, e que se encontra presente em

materiais didáticos do ensino básico. Assim, a atividade foi analisada com base na leitura de

todas as imagens produzidas pelos acadêmicos, segundo indicações de Valle Gastaminza

(2002) apud Sardelich (2006) e Agustín-Lacruz (2015), que considera as seguintes

competências: iconográfica, narrativa, estética, enciclopédica, linguístico-comunicativa e

modal. Apresentaremos as imagens produzidas com suas respectivas legendas, considerando o

objeto fotografado. Cada imagem/fotografia foi identificada por acadêmico 1, acadêmico 2 e

assim sucessivamente.

As imagens foram lidas observando cada uma das competências. A competência

iconográfica refere-se às formas visuais que reproduzem ou não algo que existe na realidade,

e consistem na observação e identificação de formas visuais simples como animais e pessoas.

A análise da competência narrativa da imagem busca verificar se há uma sequência narrativa

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entre os elementos que aparecem na imagem e/ou os elementos de informação complementar

(título, data, local etc.). Já a análise da competência estética está relacionada à atribuição do

sentido estético à composição. Enquanto a análise da competência enciclopédica visa

identificar personagens, situações, contextos e conotações. A análise da competência

linguístico-comunicativa envolve a atribuição de um tema, um assunto que poderá contrapor-

se ou coincidir-se com as informações complementares. E, por fim, a análise da competência

modal relaciona-se à interpretação do espaço e tempo da imagem. (SILVA, 2005;

SARDELICH, 2006; AGUSTÍN-LACRUZ 2015; GATTO, 2018).

A seguir são apresentadas as leituras das imagens das fotografias apresentadas pelos

acadêmicos. Para isto, as competências estética e linguístico-comunicativa, e as competências

enciclopédica e modal, foram agrupadas a fim de tornar a discussão compreensível.

4.1. Competência iconográfica

A iconografia (do grego "eykon", imagem, e "graphia", escrita) é uma forma de

linguagem visual que usa imagens para representar algum tema, e como estas imagens são

expostas e formadas.

Neste sentido, das 33 fotografias deste estudo, 22 imagens envolveram produtos

contendo substâncias com caráter ácido-base, como bicarbonato de sódio, hidróxido de

magnésio e ácido acético (comumente chamado de vinagre); 11 imagens abordaram situações

cotidianas em que o equilíbrio químico está presente, como num copo de água, nos peixes, nas

flores e árvores, na escovação dentária e dentes, no suco de limão e em sabonetes e

desodorantes.

Das imagens que abordaram substâncias com caráter ácido-base, o bicarbonato de sódio

foi mais fotografado (10 imagens), possivelmente por ser o exemplo mais presente nos livros

didáticos, sendo a maioria (4 imagens) de sal de frutas, que é um antiácido estomacal composto

por bicarbonato e carbonato de sódio e ácido cítrico. Outras imagens (envolvendo esta

substância) foram a aplicação de desodorante, frasco de fermento químico e do oceano,

conforme Figura 1. A primeira buscou explicar a neutralização de ácidos carboxílicos que

produzem odores na transpiração, a segunda abordou a neutralização do ácido cítrico pelo

bicarbonato de sódio, e a terceira relacionou o sistema tampão dos oceanos com o equilíbrio do

dióxido de carbono, mas estas imagens não apresentam evidências do momento de equilíbrio

químico.

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Figura 1: imagens dos acadêmicos 2, 9 e 17 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

4.2. Competência narrativa

Para compreensão das imagens e dos fenômenos estudados, as legendas são de

fundamental importância. “A legenda de uma fotografia é condutora do olhar do espectador e

pode refletir o seu conteúdo de maneira genérica, específica ou abstrata” (MANINI, 2002,

p. 60). Segundo Santana (2018), as legendas criam uma ligação entre o texto principal, a

imagem e a compreensão do leitor, podendo aproximar a imagem do objeto real representado,

sendo então menor a necessidade de legendas e explicações relacionadas a essa imagem, como

mostra Perales e Jimenez (2002).

Assim, quanto a competência narrativa das fotografias analisadas, foi possível observar

que nem todas as legendas estavam de acordo com as imagens apresentadas, como podemos

observar, por exemplo, na Figura 2.

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Figura 2: imagem apresentada pelo acadêmico 7 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

A legenda apresentada na imagem (Figura 2) foi assim descrita pelo acadêmico:

"Figura 3: Ao adicionarmos leite de magnésia que possui caráter básico no ácido acético, o pH

do meio aquoso aumentará gradativamente até que o ácido seja completamente neutralizado,

onde todos os átomos de hidrogênio ionizáveis do ácido iram acabar se reagindo com todos os

ânions hidroxila da base”, enquanto a fotografia da direita apresenta um prato branco com

desenhos de flores contendo um líquido incolor, e na fotografia da esquerda com um prato

transparente contendo um líquido incolor com pequenos sólidos brancos e uma figura vermelha,

parecendo sangue. Assim, não foi possível estabelecer uma relação entre a imagem e a legenda

apresentada.

Observamos também que a maioria das imagens trazem uma ilustração com um texto

explicativo, que nem sempre é uma legenda, por exemplo, a fotografia do acadêmico 10 na

Figura 3. Neste caso, nota-se que a imagem não está associada à um conceito ou interpretação

de fenômeno, sobretudo a sua relação com o texto principal é auto evidente. Ao contrário da

fotografia do Acadêmico 9 (Figura 1), com a imagem de um frasco comercial de fermento em

pó químico, em que não há nenhuma relação entre a imagem o texto apresentado, que é “Mistura

de fermento (NaHCO3) e limão (C6H8O7): o ácido cítrico e um ácido orgânico fraco e o

bicarbonato de sódio é um sal ácido que age como neutralizador e sua reação forma um novo

sal o citrato de sódio, agua e libera de gás carbônico”.

Figura 3: imagem apresentada pelo acadêmico 10 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

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Constatamos que alguns acadêmicos cometeram erros graves nas legendas apresentadas,

no que ser refere à conceitos químicos, como podemos perceber na Figura 4, com a legenda “A

vitamina C possui características antioxidantes, porém em solução aquosa ela dissocia-se

totalmente formando um íon hidrônio, como a vitamina C é um composto de caráter ácido, a

água torna-se a base para a reação, durante a reação ocorre também a liberação de gás oxigênio”.

Figura 4: imagem apresentada pelo acadêmico 16 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

O ácido ascórbico (vitamina C) é um ácido fraco, ou seja, se dissocia parcialmente em

água e esta substância, quando pura, não libera gás carbônico neste processo. A composição do

comprimido efervescente, comumente utilizado, pode variar de acordo com a indústria

farmacêutica, mas os ingredientes básicos são, normalmente, um ácido orgânico e uma base

carbonada.

O comprimido (Bio-C) presente na fotografia (Figura 4) contém como excipiente as

substâncias bicarbonato de sódio, carbonato de sódio, macrogol, sorbitol, sucralose, ácido

cítrico, aroma de laranja e corante amarelo crepúsculo e, por isso, quando em contato com a

água ocorre a reação de neutralização entre as substâncias de caráter básico (bicarbonato de

sódio, carbonato de sódio) e as de caráter ácido (ácido cítrico) e há a liberação de gás carbônico.

Outro equívoco gravíssimo cometido por um dos estudantes foi utilizar o nome dado a

uma experiência, conforme Arroio et. al. (2006), sem explicar e nem referenciar (plágio) a

fonte, para explicar o fenômeno ocorrido na experiência. Isto pode ser observado no texto

apresentado, juntamente com a fotografia (Figura 5), em que o acadêmico descreve: “Reação

ativada pela voz, em uma solução de etanol e hidróxido de sódio quando colocamos um

indicador ácido-base como por exemplo o azul de bromotimol que apresenta as seguintes

colorações para faixas de pH: ácido (amarelo), neutro (verde) e básico (azul). E quando

espiramos liberamos o gás carbônico (CO2) que é um óxido ácido, e em meio aquoso produz

ácido carbônico, pois quando pronunciamos algumas palavras perto do erlenmeyer [...]”.

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Figura 5: imagem apresentada pelo acadêmico 3 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Nesta atividade o acadêmico 3 deveria ter explicado que o título dado por Arroio et.al.

(2006) foi o de “Reação química "ativada" pela voz”, em que

[...] o azul de bromotimol é um indicador ácido-base que apresenta as seguintes

colorações para faixas de pH: ácido (amarelo), neutro (verde) e básico (azul). Quando

o hidróxido de sódio (base) é adicionado à solução contida no erlenmeyer, está se

torna básica. Durante o processo da respiração, quando expiramos liberamos boa

quantidade de gás carbônico que é um óxido ácido. Este gás em meio aquoso produz

ácido carbônico. Quando alguma palavra é pronunciada bem perto do erlenmeyer

injetamos grande quantidade de ar contendo gás carbônico e este, em contato com a

água, produz ácido carbônico [...] A produção desse ácido vai neutralizando a solução

que, inicialmente, é básica. O efeito visual da neutralização é a solução mudar sua

coloração para verde. (ARROIO et al., 2006, p. 175).

Outra falha foi observada na Figura 6 se refere ao texto que acompanha a fotografia.

Nele podemos ler: “[...] quando ingerimos um ácido forte, [...]”. Esta informação se encontra

equivocada, já que ácidos fortes, como, por exemplo, o ácido clorídrico (HCl), é altamente

corrosivo e irritante para a pele, mucosas e olhos. A ingestão deste ácido resulta em lesões

ulcerativas no trato digestivo, além de haver evidência de carcinogenicidade ao ser humano

(SIGMA, 2017). E estas informações foram abordadas em sala de aula com estes estudantes.

Figura 6: imagem apresentada pelo acadêmico 6 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

O Acadêmico 3 deve ter feito uma relação errônea quando se referiu à produção deste

ácido (HCl) pelo organismo, já que o suco gástrico contém água, enzimas, sais inorgânicos,

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ácido clorídrico (em baixa concentração) e uma quantidade mínima de ácido láctico. O ácido

clorídrico estomacal serve para modificar quimicamente a pré-enzima inativa pepsinogênio,

para produzir a pepsina e a enzima pancreática tripsina, que proporciona a digestão gástrica dos

alimentos, principalmente das proteínas. Este equívoco também pode ser observado na Figura 7,

com o texto “[...] e na presença do ácido no estômago ocorre uma neutralização”. Este erro pode

estar associado à nossa cultura, pois popularmente as pessoas denominam o suco gástrico como

“ácido do/no estômago”, conhecido por causar “azia” (refluxo ácido), que é um problema

clínico comum, que ocorre quando o ácido gástrico se acumula no esôfago.

Figura 7: imagem do acadêmico 8 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Os estudantes também confundiram “bolhas de ar” com “bolhas de gás”, como, por

exemplo, a fotografia apresentada na Figura 8. Quando ocorre uma neutralização de um ácido

com o bicarbonato, geralmente, é liberado gás carbônico, visualizado por bolhas deste gás

(CO2) na superfície da solução. Isto nos remete a importância de uma alfabetização científica

escolar mais sólida na qual se possa superar as concepções prévias a respeito do que se atribui

em contextos cotidianos, como a diferença em “ar” e “gás”.

Figura 8: imagem do acadêmico 7 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Ainda foi possível constatar que 17 atividades fotográficas deste estudo apresentaram

erros na escrita da equação química, quanto ou balanceamento e/ou quanto a seta indicativa da

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reação. Esta constatação corrobora com Pereira (1989) e Raviolo (2001), em que a primeira

realizou uma revisão das principais publicações sobre ensino e aprendizagem de equilíbrio

químico, e o segundo avaliou o conhecimento dos estudantes, de ensino médio e superior, sobre

equilíbrio de solubilidade e diagnosticou dificuldades em relação aos conceitos prévios.

4.3. Competência estética e linguístico-comunicativa

Dando continuidade à leitura das imagens produzidas pelos s acadêmicos, a fim de “[...]

relacionar os efeitos estéticos da estrutura informativa, supomos que a fotografia transmite o

conhecimento de certa analogia figurativa, de um pensamento, a memória de uma cena, a

construção de uma figura” (PAIVA, 2006, p. 6) e possui uma temática.

Assim, quanto a competências estética, que está relacionada à comunicação e a

atribuição do sentido estético à composição temática, 16 fotografias remetem à um ambiente

comum nas residências, ou seja, a cozinha, pois aparecem elementos típicos deste espaço tais

como fogão, mesa, pia, toalha de mesa xadrez, com desenho de alimentos e plantas e utensílios

domésticos próprios deste ambiente. Isto denota que os estudantes provavelmente estavam em

suas próprias residências, pois existem elementos característicos deste ambiente familiar. E a

escolha do ambiente da cozinha pode estar relacionado à própria solicitação da atividade, na

qual era para ser um equilíbrio químico do cotidiano. Neste sentido, a estética da imagem traz

algo do cotidiano, a cozinha.

Nestas fotografias fica nítida e reconhecida as bancadas de pia de granito (preto, cinza

e bege) e de inox, como podemos observar, por exemplo, na imagem do acadêmico 2 na

Figura 9, em que ao fundo, sobre a pia de inox, está um frasco de refrigerante da marca Fanta®

laranja, uma xícara branca, uma lixeira de plástico branca, panela, cuia de chimarrão e torneira.

Já na fotografia do acadêmico 5 (Figura 9), nota-se uma pia de inox com um pires de cerâmica

branco, uma embalagem comercial de bicarbonato de sódio, muito usado na fabricação de

bolachas caseiras, e um frasco de vinagre, geralmente usado para temperar saladas.

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Figura 9: imagens dos acadêmicos 2 e 5 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Já na Figura 2, anteriormente apresentada, pode-se observar um prato de cerâmica

branco com flores desenhadas e um prato de vidro transparente incolor em um granito preto,

elementos estes que nos confirmam o local onde foi obtida a foto, na cozinha.

Enquanto, na Figura 10 a imagem mostra um copo de vidro transparente, uma

embalagem comercial de bicabornato de sódio, uma colher de metal, um limão cravo cortado

pela metade sobre uma mesa aparentemente média, com uma toalha xadrez (branca e vermelha)

com desenho de frutas, sendo que estes últimos dois elementos foram utilizados por vários

acadêmicos para compor o cenário temático das fotografias.

Figura 10: imagem do acadêmico 12 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Ainda foram apresentadas 11 fotografias com fundo branco, sem cenário/composição

de fundo, dessa forma não foi possível identificar o contexto nem local onde estas imagens

foram capturadas, impossibilitando a análise de suas competências estéticas e linguístico-

comunicativa.

Outras 4 fotografias dos acadêmicos abordam como temática a natureza e o meio

ambiente, por exemplo a Figura 1, em que o estudante mostrou um barco, aparentemente à

deriva com um fundo de montanhas, um céu azul com nuvem, transmitindo uma tranquilidade

com a imagem da imensidão do oceano. Ainda foi possível perceber que a fotografia foi tirada

em alto mar, provavelmente de outro meio de transporte marítimo, uma vez que “[...] para poder

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relacionar os efeitos estéticos da estrutura informativa, supomos que a fotografia transmite o

conhecimento de certa analogia figurativa, de um pensamento, a memória de uma cena, a

construção de uma figura.” (PAIVA, 2006, p.6).

O tema higiene pessoal também surgiu em duas fotografia, uma (acadêmico 18,

Figura 11) mostrando a boca de uma pessoa com aparelho ortodôntico com borrachinhas verdes,

no momento da escovação dentária usando uma escova de dentes de cor azul, e a outra

(acadêmico 2, Figura 1) expõe uma pessoa, que supomos ser do sexo feminino por apresentar

uma mão fina com unhas compridas, aplicando desodorante aerossol na axila direita. Devido

ao ângulo da fotografia, presumimos que a foto foi tirada usando um celular no modo selfie.

Figura 11: imagens dos acadêmicos 18 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

4.4 Competência enciclopédica e modal

Segundo Gonçalves (2009) “[...] a imagem, mesmo decorrente da prática/ação de um

sujeito, não é resultado apenas deste sujeito individual, mas de um contexto” e está associada a

um espaço e tempo.

Neste sentido, a maioria das imagens estão em um ambiente doméstico, a cozinha, ora

na mesa de refeição, ora na pia. Isto pode estar relacionado aos materiais utilizados como

bicarbonato de sódio, vinagre (ácido acético) e antiácido, que culturalmente são armazenados

neste local. Nenhuma das fotos apresentou referência temporal.

Além disso, como a proposta do trabalho foi apresentar um equilíbrio químico presente

no cotidiano dos alunos, a cozinha faz parte deste dia a dia e, por isso, um local que bem o

representa.

De forma geral, todas as fotografias abordaram um contexto real, mas a maioria

apresentou materiais que contém substâncias com caráter ácido e/ou básico, ou seja, não houve

a representação de uma reação de equilíbrio químico, conforme foi solicitado aos acadêmicos.

Isto leva a inferir que houve um desvio entre o entendimento do que é o equilíbrio químico

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ácido-base e a propriedade de uma substância química, já que “[...] nós vemos o mundo através

das lentes teóricas constituídas a partir do conhecimento anterior” (PRAIA et al., 2002, p. 136)

e nossas observações são influenciadas pelo que já compreendemos, pela cultura que

temos/vivemos, e pelo que buscamos conhecer (FARIA; CUNHA, 2016).

O que mais chamou a atenção foram as apresentações de embalagens (frascos e pacotes)

de produtos comerciais com o objetivo de representar o equilíbrio químico, como pode ser visto

nas imagens da Figura 12. Diante disso, podemos dizer que o fato de apresentar uma foto de

um frasco de antiácido (por exemplo), não remete o leitor da imagem ao equilíbrio químico que

ocorre desta substância com o ácido estomacal no momento da ingestão. Este tipo de

representação foi o que mais apareceu, isto é, a fotografia que o acadêmico apresentou não dá

indicativos da ocorrência de uma reação química, que é o princípio primeiro para o equilíbrio

químico.

Figura 12: imagens de embalagens (frascos e pacotes) de produtos comerciais, dos acadêmicos, para

representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

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Na Figura 13 temos as fotografias de situações cotidianas, nas quais dois estudantes

registraram um copo/caneca de água, com o intuito de abordar a autoionização da água. No

entanto, quando observamos um copo com água, não vemos evidências desta reação de

equilíbrio de autoprotólise e ainda podemos pensar nos sais dissolvidos na água potável.

Figura 13: imagens dos acadêmicos 6 e 15 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Na Figura 14 podemos observar imagens de mãos segurando peixes, uma com fundo de

um lago e outra com fundo de uma bandeja. Este fundo remete ao habitat dos peixes e o outro

ao local de preparo destes na alimentação humana, respectivamente. A intenção destes

acadêmicos foi de relacionar o odor do peixe com a maneira de eliminar este cheiro

característico, devido a presença das substâncias metilamina e piridina, que possuem caráter

básico. Ambos os estudantes abordaram a forma de remover o cheiro destas substâncias das

mãos, empregando um ácido, como ácido acético (presente no vinagre) e ácido cítrico (presente

no limão), para neutralização.

Figura 14: imagens dos acadêmicos 13 e 16 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Já na Figura 15 é possível ver fotografias de plantas, apresentadas para abordar os

diferentes o pH do solo. Uma das imagens demonstra a influência do solo sobre a coloração de

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alguns tipos de flores, como é o caso das hortênsias, que se tornam azuis em solo ácido e rosa

em solo básico. A outra imagem traz uma paisagem com árvores e gramas.

Figura 15: imagens dos acadêmicos 13 e 14 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

O equilíbrio químico, também foi apresentado com a imagem de uma boca por dois

acadêmicos, conforme Figuras 11 e 16. Em uma das imagens foi apresentado um sorriso, com

o intuito de abordar a desmineralização e mineralização do esmalte dos dentes. Em outra foi

apresentada uma boca com aparelho ortodôntico e escova dentária, com o objetivo de relacionar

a escovação dentária com a acidez do meio oral.

Figura 16: imagem do acadêmico 6, de uma boca sorrindo, para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Outro acadêmico apresentou a imagem de sabonetes utilizados para tomar banho e

limpar a pele, da marca Palmolive®, com o intuito de representar a saponificação. No entanto,

a saponificação é uma reação irreversível, ou seja, não é um equilíbrio químico. A fotografia

apresentada pode ser observada na Figura 17.

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Figura 17: imagem de sabonete do acadêmico 1 para representar o equilíbrio químico.

Fonte: arquivo didático.

Para representar uma reação química, por meio da fotografia, é preciso considerar que

em uma reação temos o “antes” e o “depois”, ou seja, há necessidade de apresentar uma imagem

em que possa ser visualizado algum tipo de mudança, seja por meio de coloração ou presença

de gás (bolhas). Isto nos remete a intencionalidade no momento do registro, já que:

Observar, no sentido científico, é uma habilidade que deve ser desenvolvida ao longo

do processo escolar, em diversas disciplinas, mas, em especial, nas disciplinas de

Ciências e Química. Em geral, visualizamos o conjunto, o todo das coisas, e isso

dificulta o detalhamento do objeto ou do fenômeno. Entretanto, a observação no

ensino de ciências deve ser distinta de simplesmente ver ou olhar para algo

rotineiramente (CUNHA, 2018, p. 235).

Neste sentido, de todas as fotografias, apenas uma (do acadêmico 12) empregou a FoCO

para acompanhamento do processo observado (Figura 18), apresentando o “antes” e o “depois”

da reação química, que envolveu a neutralização das substâncias básicas produzidas por fungos

e bactérias.

Figura 18: representação de uma reação química.

Fonte: arquivo didático.

Por outro lado, em algumas imagens (em menor quantidade), houve o registro do

momento da reação, como podemos observar na Figura 3, em que a fotografia foi tirada da

reação de neutralização entre as soluções aquosas de bicarbonato de sódio (NaHCO3) e de ácido

(a maioria) cítrico (C6H8O7), que produz citrato de sódio (Na3C6H5O7), água e liberação de gás

carbônico (CO2), caracterizado pelas bolhas presentes na solução.

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De modo geral, podemos dizer que as fotografias apresentadas pelos acadêmicos

representam o objeto, mas não o processo de transformação de substâncias, ou seja, a reação

química, princípio fundamental de todo o conhecimento em química.

5. Considerações finais

A análise das fotografias apresentadas pelos estudantes mostrou a importância de

motivar os estudantes a buscar conhecimento de forma contextualizada e intencional. No

entanto, a forma de ensino tradicional ainda está arraigada, e é um fato “[...] complicado seja

se deparar com a mente do próprio estudante, que já vem, há anos e anos, sendo doutrinado

para não pensar, não questionar, não dialogar” (DIAS, 2002, p. 21).

Tradicionalmente, no ensino de Química é dada ênfase à transmissão de conteúdos e à

memorização de fatos, símbolos, nomes, fórmulas, sem considerar a construção do

conhecimento científico e de maneira descontextualizada. Essa forma pode dificultar aos

estudantes o estabelecimento da relação entre aquilo que se estuda na sala de aula, a natureza e

a sua própria vida (LIMA 2012; ROCHA, 2016).

Além disso, por vários outros motivos, no geral, do Ensino Básico até o Superior, não

há uma compreensão da importância da educação para a formação do indivíduo e do cidadão

brasileiro. Isto é, a Ciência acaba não sendo ensinada desde o começo como deveria ser. Este

fato é percebido, a maioria, na formação altamente deficitária dos estudantes que chegam à

universidade. (LIMA, 2012).

Assim, é interessante ressaltar que os acadêmicos se restringiram em trazer exemplos

mais presentes em livros didáticos. Neste sentido, estes estudantes não perceberam que a

representação de um equilíbrio químico por meio de uma fotografia deveria considerar a

existência de uma reação, na qual o antes e depois são fundamentais.

Apesar dos problemas conceituais apresentados pelos estudantes, ainda é possível

considerar que a atividade teve um caráter motivador para estes estudantes, pois durante o

semestre em que foi realizado este estudo, houve uma agitação por parte dos estudantes,

principalmente por utilizar um recurso didático de ensino diferente do habitual até então

vivenciado por eles. Esta inquietude provocada neles possibilitou um início de observação e

interação com o ambiente em que vivem com “outros olhos”.

Neste sentido, outros trabalhos semelhantes podem mudar a relação dos estudantes com

a produção de imagens que representem um processo químico qualquer. Além disso, qualquer

trabalho que tenta relacionar a química com aspectos do cotidiano dos estudantes precisa ser

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discutido em sala de aula, no sentido de contrapor ideias equivocadas que se fazem presente no

dia a dia.

Agradecimentos

Ao Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e Educação Matemática da

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus Cascavel/PR/BR e a Universidade Federal

da Fronteira Sul – Campus Realeza/PR/BR.

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Porcentagem de contribuição de cada autor no manuscrito

Fernanda Oliveira Lima – 80%

Marcia Borin da Cunha – 20%