a formação do publicitário e sua responsabilidade social: por uma prática publicitária mais...

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DANIELA REGINA DA SILVA A FORMAÇÃO DO PUBLICITÁRIO E SUA RESPONSABILIDADE SOCIAL: POR UMA PRÁTICA PUBLICITÁRIA MAIS ÉTICA. Dissertação apresentada, ao Programa de Pós- Graduação na área de Educação, como exigência para obtenção do título de Mestre em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Orientador: Prof. Dr. Jairo Araujo Lopes PUC-CAMPINAS 2007

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Daniela Regina da SilvaDissertação de MestradoPUC-Campinas, 2007A dissertação objetiva explicitar como conciliar a formação humanística e ética com a formação profissional no campo da Publicidade e Propaganda.

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  • DANIELA REGINA DA SILVA

    A FORMAO DO PUBLICITRIO E SUA RESPONSABILIDADE SOCIAL:

    POR UMA PRTICA PUBLICITRIA MAIS TICA.

    Dissertao apresentada, ao Programa de Ps-Graduao na rea de Educao, como exigncia para obteno do ttulo de Mestre em Educao da Pontifcia Universidade Catlica de Campinas.

    Orientador: Prof. Dr. Jairo Araujo Lopes

    PUC-CAMPINAS 2007

  • 2

    Ficha Catalogrfica Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e

    Informao - SBI - PUC-Campinas

    t378.12 Silva, Daniela Regina da. S586f A formao do publicitrio e sua responsabilidade social: por uma prtica publicitria mais tica / Daniela Regina da Silva. Campinas: PUC-Campinas, 2007. 147p. Orientador: Jairo Arajo Lopes. Dissertao (mestrado) Pontifcia Universidade Catlica de Campinas, Centro de Cincias Sociais Aplicadas, Ps-Graduao em Educao. Inclui anexos e bibliografia. 1. Professores universitrios - Avaliao. 2. Publicidade. 3. Comunicao de massa. 4. tica profissional. 5. Propaganda. I. Lopes, Jairo de Arajo. II. Pontifcia Universidade Catlica de Campinas. Centro de Cincias Sociais Aplicadas. Ps-Graduao em Educao. III. Ttulo. 22.ed.CDD t378.12

  • 3

    Autor: SILVA, Daniela Regina da.

    Ttulo: A formao do Publicitrio e sua Responsabilidade Social: por uma prtica publicitria mais tica.

    Orientador: Prof. Dr. Jairo de Arajo Lopes

    Dissertao de Mestrado em Educao

    Este exemplar corresponde redao final da

    Dissertao de Mestrado em Educao da PUC-

    Campinas, e aprovada pela banca examinadora.

    Data: 15/03/2007.

    BANCA EXAMINADORA

    _________________________________________ Prof. Dr. Jairo Araujo Lopes _________________________________________ Prof. Dr. Adolpho Carlos Franoso Queiroz _________________________________________ Prof Dr Flailda Brito Garboggini

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    Aos meus pais, Luzia e Jos Amrico (in memorian), por todo amor e dedicao e pelas lies de vida pautadas, sempre, pela honestidade, generosidade e justia.

    Eu tenho tanto pra lhe falar, Mas com palavras no sei dizer,

    Como grande o meu amor por voc.

    Como grande o meu amor por voc - Roberto Carlos

  • 5

    AGRADECIMENTOS

    A elaborao desta dissertao marca o fechamento de um ciclo, que se iniciou tempos atrs. Muitos amigos e mestres ajudaram nesta caminhada, direta ou indiretamente, por meio de conversas, questionamentos, conselhos, inspiraes, apoios e, at mesmo, de sorrisos. So familiares, professores, alunos e colegas de profisso de ontem e de hoje que, algumas vezes, sem saber, me motivaram, revigoraram e tornaram mais leve minha caminhada at aqui.

    Agradeo os sorrisos e as lgrimas, As palavras amveis, engraadas, provocantes,

    E os silncios glaciais, abismais, telepticos.

    Agradeo as reflexes e as inspiraes, As trocas intensas, generosas, verdadeiras,

    E os encontros acidentais, surreais, oportunos.

    Agradeo, ainda, as chances e as esperanas, De aprender, de crescer, de me tornar melhor,

    Pois s me identifico e me construo pelo teu olhar.

    Agradecimento aos amigos - Daniela Regina - 28/11/06

    Ao meu orientador, Jairo Arajo Lopes, pela doce e firme conduo do trabalho.

    Aos membros da Banca, Prof. Dr. Adolpho Carlos Franoso Queiroz e Prof Dr Flailda Brito Garboggini, pela generosidade nas contribuies para o trabalho.

    Aos alunos do 2 Ano de Comunicao Social de 2006, pela confiana, pelos insigths proporcionados, pela experincia de vida.

    Claudia Lcia Trevisan, professora e amiga, por ter reconhecido e despertado a educadora que existe em mim e me inspirado com seu trabalho.

    Aos meus amigos, Clia Maria Cassiano, Haenz Gutirrez Quintana, Solange Stroppa Lima, Amaury Aranha, pela ajuda no incio do projeto e pelas parcerias de trabalho e trocas intelectuais.

    Suely Galli Soares e famlia pela ajuda, incentivo e torcida pelo meu sucesso nesta jornada.

    s professoras Elizabeth e Maria Eugnia, e aos amigos do mestrado da PUC-Campinas: Jaqueline, Srgio e o grande grupo, Cidinha, Lucinda, Roseli, Melissa e Eduardo.

    Aos amigos e colegas de trabalho do Unisal.

    minha famlia, Luzia, Bianca, Felipe, Josiane, Caio, e a amiga-irm, Andra. Meu porto seguro, alvio para todos os males e aflies.

  • 6

    Uma rvore que no pode ser abraada nasceu de uma raiz fina como um cabelo.

    Uma torre de nove andares edificada sobre um montculo de terra.

    Uma viagem de mil lguas comea com um passo.

    Lao Tzu sbio chins

  • 7

    RESUMO

    A publicidade uma atividade que se engendrou na histria e tornou-se necessria para prestar informao sobre idias, servios e produtos, que, de outra maneira, no chegariam aos consumidores.

    O publicitrio se vale de muitos conhecimentos cientficos e recursos tcnicos e artsticos para construir suas mensagens, o que lhe acaba conferindo um certo poder de influncia sobre o consumidor. Tal poder pode ser utilizado conscientemente a favor da sociedade, mas, por conta de abusos cometidos contra ela, vista com desconfiana por muitos.

    Considerando que o publicitrio deva estar atento para sua responsabilidade social e que tenha uma prtica mais tica, conscientizao que se daria por meio da educao, este trabalho busca responder ao seguinte problema: como conciliar a formao humanstica e tica e a formao profissional no campo da Comunicao Social, mais especificamente da Publicidade e Propaganda?

    Assim, este trabalho tem por objetivo investigar se a prtica pedaggica da pesquisadora proporciona reflexes, no sentido da formao de profissionais reflexivos e ticos, diante de questes prprias da rea da publicidade.

    A abordagem de pesquisa adotada a investigao sobre a prpria prtica que consiste no processo reflexivo por meio de questionamento na conduo do plano de interveno educacional do professor sob diversos olhares: o do aluno, da instituio, do orientador e o da prpria pesquisadora.

    O estudo foi realizado em uma instituio de ensino superior do interior do estado de So Paulo, no curso de Comunicao Social em que ocorre uma experincia pedaggica que, pela sua proposta, mostra-se como uma boa oportunidade de conscientizao desses alunos e futuros profissionais.

    As anlises realizadas sobre a prtica docente indicam formas de conduta profissional no sentido almejado pelo questionamento apresentado, produzindo reflexes vlidas para contextos de mesma natureza.

    Este trabalho est inserido na linha de pesquisa Universidade, Docncia e Formao de Professores. Palavras-chave: Formao de professores, prtica reflexiva, formao profissional

    tica, comunicao social.

  • 8

    ABSTRACT

    Publicity is an activity that is rooted in history and has become necessary to provide information about ideas, services and products that otherwise would not reach consumers.

    Advertisers have a lot of scientific knowledge and technical and artistic resources that construct their messages and that in the long run give them a certain power to influence the consumer. That power can be utilized conscientiously to benefit society, but, because of the abuses committed against it, many see it as distrustful. Considering that advertisers ought to be conscious of their social responsibility and have a more ethical practice, an awareness that could be learned through education, this work tries to answer the following problem: how to conciliate humanistic and ethical education with professional education in the field of Social Communication, specifically speaking in Publicity and Advertising?

    Thus, this work has the objective of investigating whether or not the pedagogical practice of the researcher provides reflections in the sense of educating reflective and ethical professionals faced with questions proper to the area of publicity.

    The approach adopted for the study is an investigation about the practice itself consisting of the reflective process by means of questioning in the conduction of the plan of educational intervention of the teacher under various views: that of the student, the institution, the director and the researcher herself.

    The study was done in an institution of higher learning in the State of So Paulo, in the Social Communication course where there is a pedagogical experiment that according to its proposal appears to be a good opportunity for the conscious raising of these students and future professionals.

    The analyses done about teaching practice indicate types of professional conduct in the sense of being ardently desired by the questioning presented, producing valid reflections for contexts of the same nature.

    This work follows the line of research University, Teaching and Education of Teachers.

    Key words: Education of teachers, reflective practice, ethical professional education,

    social communication.

  • 9

    SUMRIO INTRODUO............................................................................................................11 CAPTULO I - METODOLOGIA: REFLEXO SOBRE A PRTICA ..........................16

    1.1. Em busca da identidade profissional do professor ...................................16 1.2. Por que a reflexo sobre a prpria prtica ...............................................18 1.3. O que se entende por investigar a prpria prtica ...................................21

    CAPTULO II - CONTEXTUALIZANDO A PUBLICIDADE E A PROPAGANDA ........27

    2. 1. Conceituao ...........................................................................................28 2.2. A Publicidade e o ensino de Publicidade e Propaganda no Brasil ...........32 2.3. Estudos do Comportamento do Consumidor ...........................................57 2.4. Publicidade e tica - a sociedade sob a tica do direito ..........................61

    2.4.1. O controle da Publicidade ...........................................................68 Sistema auto-regulamentar: o Conar e o Cdigo de Auto-Regulamentao Publicitria.................................................................70 Sistema legal: O Cdigo de defesa do consumidor ..............................73 O Procon ...............................................................................................75

    CAPTULO III O ENSINO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA: UMA NOVA

    PROPOSTA DE EDUCAO POR MEIO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL ...................................................78

    3.1. As atuais Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Comunicao Social com habilitao em Publicidade e Propaganda ............................78

    3.2. O Projeto Poltico Pedaggico da instituio-campo ...............................82 3.3. Uma nova proposta: PIC - Projeto Integrado de Comunicao................87

    CAPTULO IV A IMERSO NA PRPRIA PRTICA - O TRABALHO E A

    PARTICIPAO DA PROFESSORA/ PESQUISADORA .....................................................................................................92

    4.1. A trajetria - o dirio de campo.................................................................92 4.2. Anlise dos resultados obtidos com os trabalhos dos alunos.................100 4.3. Anlise dos questionrios e da Avaliao Institucional...........................113

    CONSIDERAES FINAIS .....................................................................................126

  • 10

    REFERNCIAS ........................................................................................................131 BIBLIOGRAFIAS CONSULTADAS ..........................................................................137 ANEXOS ..................................................................................................................140

  • 11

    INTRODUO

    Primeiramente, preciso dizer que, por trs deste texto, existe a crena no

    potencial da educao e tambm no da comunicao, em especial da publicidade, de

    influenciar o comportamento e a vida das pessoas.

    A influncia de ambas grande, constituindo campos que se interseccionam.

    Apesar disso, cada qual tem constituies e finalidades muito distintas.

    Resumidamente, enquanto a primeira tem por finalidade auxiliar e promover reflexo

    e melhoria na vida pessoal, social e profissional das pessoas por meio do

    conhecimento, a segunda busca tornar conhecido um produto, um servio ou uma

    empresa, despertar no consumidor o desejo por algo anunciado e conferir prestgio

    ao anunciante de uma forma aberta, j que h sempre por trs um anunciante

    pagando por ela. (SANTANNA, 1998, p. 76)

    Para promoo da educao e da publicidade existem profissionais, alguns

    mais e outros menos conscientes de sua influncia sobre as pessoas, alguns com

    valores ticos slidos e outros nem tanto, comprometidos com a transformao da

    sociedade ou alienados e alienadores. O contedo selecionado para as mensagens,

    a viso de mundo traduzida em crenas e pr-conceitos e a capacidade de reflexo

    que esses profissionais empregam no trabalho podem tanto gerar bem sociedade,

    como, tambm, ferir seus princpios e direitos, causando excluso de uma parcela da

    populao por apresentar premncias inatingveis ou verdades carregadas de

    intencionalidades.

    Um professor alienado que no v articulao dos conhecimentos especficos

    com os que compem a realidade, ou seja, que no dotado de uma viso integrada

    de mundo, na maioria das vezes, no consegue estimular a autonomia, a criticidade

    e a criatividade de seus alunos, qualidades fundamentais para viver bem em

    sociedade e com ela colaborar. Uma hiptese que parece vivel primeira vista: um

    publicitrio alienado pode ter sido fruto de um processo de escolarizao bsica ou

    superior que o levou a ser um aluno alienado em sua trajetria acadmica. Assim, se

  • 12

    ele ainda permanece alienado, no v problema em apelar, por exemplo, para nudez

    na elaborao de um anncio, pois no est consciente ou convencido da

    desvalorizao da mulher e da banalizao do sexo. Esse profissional no hesita em

    escalar as super modelos para ilustrar seu exemplo de perfeio em campanhas

    publicitrias, porque no est se preocupando ou se dando conta de que pessoas

    esto infelizes por no conseguirem atingir esses ideais propagados.

    Assim, como o professor em sua prtica est sendo alertado para o fato de

    que ele faz parte de um contexto mais amplo de educao, que ultrapassa as

    barreiras da transmisso do conhecimento, que tem responsabilidade na construo

    da sociedade e de que preciso superar a fragmentao de saberes, a fim de

    proporcionar ao aluno uma experincia significativa de aprendizagem e uma forte

    educao cidad, parece ser hora de mostrar ao publicitrio que ele tambm

    responsvel por essa sociedade a qual ele faz parte, e que sua prtica pode causar

    srios impactos na estrutura de uma comunidade, seja familiar, social, cultural ou

    mesmo profissional.

    Dessa forma, esta pesquisadora sente-se duplamente responsvel, pois

    educadora e publicitria e, ainda mais, educadora de publicitrios, o que a deixa

    entre o desejo de formar profissionais mais ticos e solidrios e a necessidade de

    formar um profissional qualificado para enfrentar a competitividade predominante na

    rea de publicidade.

    Conciliar desejo e necessidade no parece ser tarefa fcil. Enquanto numa

    primeira observao um professor um sujeito altrusta, preocupado no s com o

    saber acumulado por geraes, mas com a insero de minorias, com a diminuio

    das desigualdades e a promoo do indivduo em vrios sentidos, um publicitrio

    seria aquele que incentivaria o consumo de produtos, servios ou idias, auxiliando

    no acirramento das desigualdades sociais e na excluso. , pois, um agente

    fundamental no acmulo de capital.

    Um publicitrio precisa ser competente na hora de atender um cliente, e deve

    se valer de conhecimentos especficos sobre o produto, o mercado, a concorrncia, o

    pblico-alvo, de recursos artsticos e de conhecimentos cientficos para que a

  • 13

    comunicao seja eficiente. Se ele e sua equipe falharem, dificilmente tero outra

    chance diante da repercusso do fracasso e, com isso, o cliente dar sua conta ao

    concorrente ou a outro profissional. Trata-se de um mercado competitivo, em que o

    que se vende, para muitos, no totalmente necessrio e visto como um gasto e

    no um investimento. Assim, se um publicitrio deixar de realizar o que deve ser

    feito, cometer suicdio profissional. O que fazer, ento?

    No se pode imaginar que a publicidade e a propaganda deixem de utilizar os

    recursos artsticos e os conhecimentos da cincia para vender ou convencer um

    segmento da populao a mudar de atitude e de costumes. Uma proposta que

    parece vivel seria se os profissionais usassem esses e outros recursos com

    responsabilidade, evitando causar mal sociedade. H os que acreditam que esse

    tipo de pensamento pode comprometer a eficcia da publicidade e, por isso, a

    proposta seria invivel. H, tambm, os que acreditam ser possvel criar, com

    criatividade, inteligncia e escrpulos, mensagens que vendam produtos ou servios

    sem prejudicar os indivduos que com elas tenham contato, e que, em alguns casos,

    at os auxiliem - nessa concepo que a pesquisadora acredita.

    Um fator favorvel na busca desse objetivo a prpria legislao. Percebe-se

    que, pelos apelos da sociedade, a publicidade est mais cuidadosa nos dias atuais.

    No se trata de uma crise de conscincia coletiva entre os profissionais da rea, mas

    de determinaes legais do Cdigo de Defesa do Consumidor que regula, inclusive,

    a responsabilidade sobre a publicidade enganosa e abusiva. Assim, alm de uma

    necessidade, a conscientizao da condio humana e da tica uma obrigao e,

    por isso, deve ser includa em todos os cursos superiores de Publicidade e

    Propaganda.

    Diante da complexidade do tema e dos dilemas aqui descritos, este trabalho

    busca responder ao seguinte questionamento ou problema: como conciliar a

    formao humanstica e tica e a formao profissional no campo da Comunicao

    Social, mais especificamente da Publicidade e Propaganda?

    Considerando a curta, mas questionadora, trajetria profissional como

    professora e publicitria, este trabalho tem por objetivo investigar se a prtica

  • 14

    pedaggica da pesquisadora proporciona reflexes no sentido da formao de

    profissionais reflexivos e ticos diante de questes prprias da rea da publicidade. Pretende-se ver, na prtica de professora do Curso de Publicidade e Propaganda,

    pelos olhares da pesquisadora diante de obras de tericos, do orientador e dos

    prprios alunos, formas de contribuir para a formao do profissional da rea,

    segundo a concepo que ela prpria acredita.

    A abordagem de investigao sobre a prpria prtica a ser aqui utilizada, foi

    formulada pelo educador ingls Lawrence Stenhouse, em 1975, consiste no

    processo de questionamento na conduo do plano de interveno educacional do

    professor segundo alguns critrios e aproxima-se do conceito de investigao-ao,

    atribudo ao psiclogo social Kurt Lewin na dcada de 1940 (PONTE, 2002).

    O principal instrumento utilizado nessa metodologia o dirio de campo, em

    que o pesquisador anota detalhadamente fatos, percepes e anseios relacionados

    ao processo educacional. Alm do dirio, o pesquisador pode e deve se valer de

    outros instrumentos de pesquisa para complementar dados e enriquecer a anlise,

    como questionrios, avaliaes qualitativas e quantitativas e dilogos com os

    envolvidos, principalmente com o orientador que atua como uma conscincia auxiliar,

    provocando o orientando, despertando nele dvidas, lanando desafios, a fim de que

    a anlise da prpria prtica tenha rigor cientfico e seja reconhecida pelos pares em

    dada rea do conhecimento.

    O estudo a ser apresentado refere-se a uma experincia pedaggica ocorrida

    no contexto de um curso de Comunicao Social de uma Instituio de Ensino

    Superior confessional do interior do Estado de So Paulo, durante o ano de 2006,

    onde a pesquisadora docente.

    Para atingir o propsito aqui delineado, o presente trabalho estar estruturado

    como o descrito a seguir:

    O captulo I trata da opo metodolgica: a reflexo sobre a prpria prtica em

    que a pesquisadora tambm sujeito da pesquisa, deixando-se, assim, ser revelada

    e analisada profissionalmente por outros olhares, como os dos tericos, dos futuros

  • 15

    profissionais, e do prprio orientador, como questionadores de concepes e aes

    assumidas por ela durante o desenvolvimento do projeto.

    No captulo II h a contextualizao da publicidade abordando brevemente os

    conceitos, a histria, a importncia dos Estudos do Comportamento do Consumidor

    no marketing em geral e na criao de campanhas publicitrias, a tica e a legislao

    focando a relao com o consumidor e apontando seus pontos positivos e negativos.

    O captulo III aborda o ensino de Publicidade e Propaganda. Primeiramente,

    resgatam-se as diretrizes curriculares mais recentes da rea de Publicidade e

    Propaganda e tambm o projeto poltico e pedaggico da instituio-campo. Depois,

    descreve-se um trabalho realizado na faculdade em que a pesquisadora atua, o PIC -

    Projeto Interdisciplinar de Comunicao - que, pela nfase na responsabilidade

    social e no respeito ao ser humano, parece apresentar elementos originais e um

    grande potencial de transformao dos futuros profissionais.

    O captulo IV traz as anlises e reflexes vindas da imerso na prpria prtica.

    H a descrio da participao da pesquisadora no projeto e dos resultados obtidos

    nas assessorias, baseada no dirio de campo e no trabalho final dos alunos. H,

    tambm, a anlise dos resultados do questionrio aplicado e da avaliao

    institucional, ambos respondidos pelos alunos participantes do PIC.

    Na ltima parte constam as consideraes finais em que se verifica se o

    objetivo foi atingido, de que forma a prtica da educadora contribuiu para isso e quais

    os caminhos apontados pela pesquisa, tanto no campo acadmico quanto no social.

  • 16

    CAPTULO I

    METODOLOGIA: REFLEXO SOBRE A PRPRIA PRTICA

    1.1. Em busca da identidade profissional do professor

    H quem acredite que ser educador, para alm de assumir um compromisso

    profissional, ter uma misso a seguir. orientar, auxiliar, motivar, mover, inspirar,

    os alunos em direo aos objetivos educacionais traados previamente. gerenciar

    as relaes e as tenses previsveis e imprevisveis que surgem durante o processo

    educacional, que transcendem o conhecimento de teorias e tcnicas e que no se

    restringem sala de aula. , principalmente, estar consciente de seu papel de

    mediador1 entre os conhecimentos cientficos especficos com os quais se props a

    trabalhar a realidade do alunado2, seu contexto, enfim seu repertrio de vivncias, e

    suas aspiraes para que estes se integrem, se complementem e que haja

    apropriao, de fato, do conhecimento e no somente memorizao e treinamento.

    1 O russo Lev Vygotsky, um dos autores mais citados atualmente pelos educadores, aborda a questo da mediao no processo educacional. Para ele, o desenvolvimento humano se d por meio de um processo sociohistrico e a idia de mediao fundamental para entender suas concepes: como sujeito do conhecimento, o homem no tem acesso direto aos objetos, mas sim um acesso mediado, operado pelos sistemas simblicos de que dispe. Assim, os educadores tm papel fundamental no sentido de proporcionar experincias significativas aos alunos, para que, por meio da mediao, construam o conhecimento. Para maiores esclarecimentos buscar VYGOTSKY,1994. 2 O mestre brasileiro Paulo Freire, que tambm acredita no conceito de mediao para a construo do conhecimento, d exemplos de como fazer os contedos das disciplinas se integrarem com o repertrio do aluno: Por que no discutir, com os alunos, a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo contedo se ensina a realidade agressiva em que a violncia constante e a convivncia das pessoas muito maior com a morte do que com a vida? Por que no estabelecer uma intimidade entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experincia social que eles tm como indivduos? Por que no discutir as implicaes polticas e ideolgicas de um tal descaso dos dominantes pelas reas pobres da cidade? (FREIRE, 1996, 30)

  • 17

    Quando h essa integrao, o aluno desfruta de maior autonomia intelectual no

    processo educacional e este, por sua vez, passa a fazer mais sentido para ele.

    fazer com que a responsabilidade ultrapasse a esfera individual, por meio da

    percepo de que as aes isoladas se refletem no coletivo e vice-versa, e que,

    dessa forma, a atuao de cada um seja importante na construo da sociedade

    desejada.

    No ensino superior, a necessidade de um educador que tenha essas

    preocupaes parece se acentuar, j que os alunos sero inseridos numa categoria

    profissional em que tero responsabilidades profissionais e sociais que na prtica

    encontram-se, ou deveriam encontrar-se, integradas. Se se respeita a natureza do

    ser humano, o ensino dos contedos no pode dar-se alheio formao moral do

    educando. Educar substantivamente formar. O objetivo, ento, formar o

    profissional cidado que, ao realizar com eficincia e tica seu ofcio, presta

    sociedade importantes servios (FREIRE, 1996, p. 33) .

    Para que tal objetivo seja atingido, fundamental que o educador saiba

    claramente que tipo de profissional deseja formar, quais os conhecimentos cientficos

    que embasam sua prtica, quais as habilidades que ele deve ter no que diz respeito

    s tcnicas, enfim, que tenha um conhecimento geral da atividade e do seu impacto

    na sociedade. Mas isso apenas no basta: alm de ter claro para si essas noes,

    preciso ver se as prticas e condutas realizadas as deixam claras tambm para o

    aluno. preciso refletir se a sua prtica est oportunizando a tomada de conscincia

    dessas questes por parte dos alunos, e ter coragem de diagnosticar se h algo

    errado ou contraditrio entre o que se pensa, deseja e realiza, e promover mudanas

    se for preciso.

    Assim, este trabalho aborda a necessidade de proporcionar ao aluno, e futuro

    profissional de publicidade, um ensino que o leve a uma prtica mais tica e

    responsvel para com a sociedade. Um caminho para isso seria o profissional de

    publicidade tornar-se consciente de que sua prtica tem um impacto na sociedade,

    aliando a sua obrigao profissional responsabilidade social, o que se daria por

    meio da reflexo e da ao. Nesse sentido, se boa parte dos professores desejam

  • 18

    alunos e profissionais reflexivos, preciso que eles dem o exemplo tornando-se,

    primeiro, professores reflexivos.

    Em virtude disso, optou-se neste trabalho, por uma metodologia que, no

    sendo muito explorada, figura como uma opo para o pesquisador da rea de

    educao que est disposto a sair da posio confortvel de seu isolamento

    cientfico e tcnico e que deseja, cada vez mais, evoluir em seu trabalho que a

    reflexo sobre a prpria prtica.

    1.2. Por que a reflexo sobre a prpria prtica

    Antes de explicar o que se entende por investigar a prpria prtica e no que

    consiste a metodologia e seus instrumentos, faz-se necessrio falar um pouco sobre

    a pesquisa em educao. O leitor da rea, provavelmente, j deve ter tomado

    contato com o que breve e superficialmente ser apresentado. Mas isso se faz

    necessrio para justificar a escolha pela metodologia para os leitores que no esto,

    ainda, familiarizados com a rea.

    A reflexo sobre a prpria prtica a metodologia que desponta nesse cenrio

    de mudana paradigmtica3, em que o positivismo4, a fenomenologia5 e o prprio

    3 Paradigmtica vem de paradigma: ...refere-se a modelo, padres compartilhados que permitem a explicao de certos aspectos da realidade. mais do que uma teoria; implica uma estrutura que gera novas teorias. algo que estaria no incio das teorias (MORAES, 1997, p. 31). 4 Elaborado por Augusto Comte, o positivismo manteve-se forte na pesquisa at a dcada de 1970, quando a fenomenologia e o neomarxismo, representado pela escola de Frankfurt, questionam a sua capacidade de explicao do mundo. No positivismo h a fragmentao do objeto de estudo, h a extrema importncia dos dados e a excluso do que no pode ser quantificado no estudo. No sculo XIX, poca em que surge o positivismo, os esforos de Comte eram no sentido de dar um status de cientificidade s cincias sociais, e, para isso, o adotou como ideal a cientificidade das cincias naturais. Dentro desse contexto, pode-se ver que esse esforo se justifica, j que foi um momento histrico que pedia essa interveno. Em tempos atuais, essa maneira de pesquisar tornou-se, em muitos casos, uma atividade mecnica, cujos resultados so anlises sem profundidade, na medida em que os aspectos qualitativos so ignorados. Havia, ainda, a questo da neutralidade cientfica

  • 19

    marxismo6 - principais paradigmas das pesquisas em educao no pas - comeam

    a perder lugar para a teoria da complexidade que, por suas caractersticas, a

    opo da pesquisadora.

    Quando um pesquisador opta por determinado paradigma educacional, de

    forma consciente, acaba por revelar certas crenas, adotar novas posturas, e

    demonstra como enxerga o mundo e a relao do homem com o conhecimento. Os

    paradigmas educacionais esto ligados aos avanos da cincia na histria da

    humanidade, avanos esses que transformam o mundo e so transformados por

    este.

    As mudanas que ocorreram no mundo e na cincia e o nascimento da

    incerteza no seio da prpria certeza, ou seja, da matemtica e da fsica, com a

    segunda revoluo cientfica7, apontaram a limitao da cincia tradicional

    newtoniana8 para explicar certos fenmenos (CAPRA, 1982). Isso deflagrou a

    conscincia da necessidade de um novo pensamento: o pensamento complexo.

    abordada por Japiassu (1975) como um mito, j que nas cincias humanas no h como haver uma distino clara entre sujeito e objeto e o pesquisador no pode abrir mo de quem . 5 A fenomenologia nasce, de certa maneira, das crticas ao positivismo. Se o primeiro usa a estatstica para embasar e construir seu discurso cientfico, a fenomenologia utiliza a experincia, a facticidade para conhecer o homem e o mundo. Os estudiosos fenomenlogos buscavam descrever as essncias das coisas, e sua idia fundamental era a de intencionalidade, que o fato da conscincia estar dirigida aos objetos do mundo. Segundo Trivios (1987), essa corrente de pensamento causou entusiasmos desmedidos entre os pesquisadores brasileiros no final da dcada de 1970. Diante das limitaes do positivismo, pesquisadores viram na fenomenologia uma forma de superao, porm essa recusa implicou recusar os dados objetivos, que so tambm importantes para a compreenso da realidade. Ao rejeitarem os nmeros, a fenomenologia tambm no dava conta de explicar a realidade e cometia erros, assim como o positivismo. 6 O marxismo volta-se dimenso social e coloca o bem do indivduo como conseqncia do bem coletivo. Tem tradio na filosofia materialista e baseia-se na interpretao dialtica do mundo. Essas duas idias juntamente com a anlise crtica da prtica social, constituem uma concepo cientfica da realidade. Assim, a base do materialismo dialtico, que a teoria do marxismo, a matria, a dialtica e a prtica social - essa ltima por meio de uma idia original considerada como critrio de verdade. Para os materialistas dialticos as verdades cientficas so conhecimentos limitados pela histria. (TRIVIOS, 1987) 7 As descobertas da fsica, no sculo XIX, fazem a teoria newtoniana perder papel na explicao dos fenmenos, pois pulverizada com a teoria da relatividade e a teoria quntica. (CAPRA, 1982) 8 Toda a elaborao da cincia mecanicista, nos sculos XVII, XVIII e XIX, incluindo a sntese de Newton, foi baseada no pensamento cientfico de Descartes de que a natureza uma mquina perfeita, governada por leis matemticas exatas.

  • 20

    O pensamento complexo transcende a idia de soma das partes e encara a

    complexidade dos fenmenos considerando todas as esferas que o envolvem. Ele

    abrange tudo o que existe e nos mostra a incerteza como caracterstica de todos os

    fenmenos. A complexidade um pensamento que, ao contrrio do cartesiano, no

    divide, no separa e descarta algo que no pode ser conhecido, mas promove o

    encontro da ordem e da desordem, une e contextualiza, mas tambm reconhece o

    individual. Uma questo importante a ser colocada que o pensamento complexo

    no exclui a simplicidade, e sim, a v como integrante de um sistema maior (MORIN,

    2003).

    Diante da fragmentao dos saberes, da perda da dimenso emocional,

    afetiva e moral que esta implica, da superespecializao que faz o indivduo perder a

    noo do todo, alm de outros efeitos causados pela viso clssica de cincia, a

    complexidade surge como uma alternativa de mudana de concepes acerca da

    cincia. Por meio do pensamento complexo deve-se desmontar a lgica cartesiana

    que v o mundo como algo esttico em relao ao quadro de conhecimentos para

    introduzir a idia de que a realidade dinmica, que para se conhecer algo no

    basta fragmentar o objeto e que preciso ter a percepo de conjunto. Essas e

    outras idias podem proporcionar ao aluno uma maior flexibilidade de pensamento

    que vai ajud-lo a conhecer e lidar com o mundo. Esta noo de cincia,

    representada principalmente por Morin, comea a despontar na pesquisa em

    educao na dcada de 1990, e est em expanso entre os intelectuais, embora

    ainda divida as atenes com as abordagens cientficas citadas anteriormente.

    Em cada poca, a humanidade apresenta seus problemas especficos e

    necessita de uma forma prpria de ver o mundo e de encarar as dificuldades. Assim,

    se no so resolvidos os principais problemas de nosso tempo como, no caso da

    educao, a fragmentao do saber em disciplinas, a perda da noo do todo e com

    isso a perda da prpria autonomia do pensamento, porque, de acordo com Capra

    (1982), os intelectuais no esto usando metodologias mais abrangentes para

    resolv-los.

  • 21

    A cincia que explica nossa relao com a natureza, com a prpria vida, esclarece tambm a maneira como apreendemos e compreendemos o mundo, mostrando que o indivduo ensina e constri o conhecimento baseado na forma como compreende a realizao desses processos. Uma cincia do passado produz uma escola morta, dissociada da realidade, do mundo e da vida. Uma educao antiquada leva o indivduo a pensar que os pensamentos cientficos so fatos isolados e independentes. Uma escola morta, voltada para uma educao do passado, produz indivduos incapazes do autoconhecimento como fonte criadora e gestora de sua prpria vida, da autoria de sua prpria histria (MORAES, 1997, p.19).

    O que se pretende deixar claro nesta justificativa que, para cada poca,

    pesquisador e cada problema de pesquisa h um referencial terico e uma

    metodologia que se revelam mais adequados para serem adotados e que, apesar do

    reconhecimento da importncia dos outros paradigmas, a exemplo dos antes

    mencionados, a teoria da complexidade mostrou-se mais adequada para essa

    pesquisadora, na abordagem de seu (1) problema e de seu (2) objetivo de pesquisa

    que aqui se apresentam novamente: (1) como conciliar a formao humanstica e

    tica e a formao profissional no campo da Comunicao Social, mais

    especificamente da Publicidade e Propaganda; (2) investigar se a prtica pedaggica

    da pesquisadora proporciona reflexes no sentido da formao de profissionais

    reflexivos e ticos diante de questes prprias da rea da publicidade.

    No caso do objetivo, a prtica pedaggica investigada durante todo o

    processo de um trabalho interdisciplinar, que a pesquisadora acredita ter potencial

    transformador, para saber se est contribuindo para a formao de profissionais

    ticos e solidrios. Realizar a anlise do processo em curso, do qual se sujeito e

    objeto, um desafio que pede uma metodologia diferente.

    1.3. O que se entende por investigar a prpria prtica

  • 22

    Entendemos por metodologia o caminho do pensamento e a prtica exercida na abordagem da realidade. Neste sentido, a metodologia ocupa lugar central no interior das teorias e est sempre referida a elas. Dizia Lnin (1965) que o mtodo a alma da teoria (p. 148), distinguindo a forma exterior com que muitas vezes abordado tal tema (como tcnicas e instrumentos) do sentido generoso de pensar a metodologia como a articulao entre contedos, pensamentos e existncia (MINAYO, 2002, p.16).

    A metodologia, ento, no algo a que o pesquisador deva se enquadrar, e

    sim algo que deve ajud-lo na abordagem da realidade. Apesar da necessidade de

    rigor e clareza, as tcnicas no devem ser encaradas com formalismo excessivo, ou

    correm o risco de resultar em respostas estereotipadas. O avano da cincia deve-se

    criatividade humana que capaz de reinventar mtodos e tcnicas:

    Nada substitui, no entanto, a criatividade do pesquisador. Feyerabend, num trabalho denominado contra o mtodo (1989), observa que o progresso da cincia est associado mais violao das regras do que sua obedincia. Dada uma regra qualquer, por fundamental e necessria que se afigure para a cincia, sempre haver circunstncias em que se torna conveniente no apenas ignor-la como adotar a regra oposta (MINAYO, 2002, p.16-17).

    Considerando a criatividade no mtodo, a reflexo sobre a prpria prtica

    consiste em uma alternativa para a abordagem de problemas de pesquisa que muito

    diferem dos problemas levantados pelas cincias naturais e, por isso, considerou-se

    o mais apropriado neste caso.

    Investigar sobre a prpria prtica e refletir sobre a prpria prtica so

    expresses que, aparentemente, trazem o mesmo significado. A primeira, no

    entanto, traz o carter de uma metodologia de pesquisa acadmica, e a segunda,

    apresenta-se como inerente ao docente. No entanto, pode-se observar que a

    reflexo da ao docente pode traduzir-se em pesquisa acadmica e, assim, ambos

    os termos tm valor fundamental para as transformaes necessrias para mais e

    mais atingir objetivos de uma educao que se quer transformadora. O termo

    reflexo crtica, que aparece em alguns autores, parece uma redundncia, uma vez

    que a palavra reflexo significa volta da conscincia, do esprito, sobre si mesmo,

    para examinar o seu prprio contedo por meio do entendimento, da razo

    (FERREIRA, 1986, p. 1471).

  • 23

    Para Ponte (2002), a investigao sobre a prpria prtica :

    Um processo fundamental de construo do conhecimento sobre essa mesma prtica e, portanto, uma actividade de grande valor para o desenvolvimento profissional dos professores que nela se envolvem activamente. E, para alm dos professores envolvidos, tambm as instituies educativas a que eles pertencem podem beneficiar fortemente pelo facto dos seus membros se envolverem neste tipo de actividade, reformulando as suas formas de trabalho, a sua cultura institucional, o seu relacionamento com o exterior e at os seus prprios objetivos (p. 8).

    O autor cita que Beillerot (2001) afirma que essa investigao deve satisfazer

    trs condies: (I) produzir conhecimentos novos; (II) ter uma metodologia rigorosa;

    (III) ser pblica. A questo do novo refere-se a algo que o indivduo ainda no

    vivenciou e, portanto, no h resultados como referncia; o rigor metodolgico aqui

    colocado est relacionado necessidade de sistematizao dos dados e de sua

    anlise frente s posies colocadas por autores e avaliadores do processo; por fim,

    o processo deve ser comunicado para apreciao e avaliao, pois s deste modo a

    investigao poder ser eventualmente integrada no patrimnio do grupo de

    referncia e, possivelmente, da comunidade em geral (PONTE, 2002, p. 9).

    Numa entrevista para Denise Pellegrini para a revista Nova Escola (Edio n

    152 de Agosto de 2002), ao ser questionada como possvel tornar-se um professor

    reflexivo sobre sua prpria prtica, Isabel Alarco, educadora portuguesa, assim se

    expressou:

    Podemos distinguir vrios momentos. Quem est em formao precisa de algum que o ajude. Como? Levando-o a responder perguntas que, a princpio, ele no capaz de se fazer. Ao aprofundar o nvel das questes, ele aprofunda o prprio pensamento. Outra estratgia que utilizo pedir que o colega v registrando as coisas que aconteceram, o que sentiu, as dificuldades que tem. Num caderno, ele pode at pr fotografias que tirou das situaes de sala de aula. Quando esse material chega s minhas mos, fao perguntas e ele tem de raciocinar para responder.

    Assim, olhares externos sobre o fazer pedaggico so o que propiciam um

    bom grau de reflexo num primeiro momento, sendo que, aps determinado tempo

    de auxlio no procedimento, o sujeito pode distanciar de si mesmo e indagar sobre

  • 24

    suas aes. Libneo (2005, p. 67) encontrou nos estudos de Contreras, realizados

    em 1997, as quatro fases de reflexo, segundo Smith:

    1. Descrever: o que estou fazendo?

    2. Informar: que significado tem o que fao?

    3. Confrontar: como cheguei a ser ou agir dessa maneira?

    4. Reconstruir: como poderia fazer as coisas de modo diferente?

    A prtica social que move a ao docente tem sido um grande empecilho para

    o desenvolvimento de prticas investigativas. Assim, para Perrenoud (2002), uma

    prtica reflexiva positiva tambm por compensar a superficialidade da formao

    profissional, favorecer a construo de conhecimento de experincia, despertar para

    a responsabilidade poltica e tica, favorecer a inovao, auxiliar a lidar com a

    crescente complexidade das tarefas, alm de proporcionar uma maior

    profissionalizao.

    A reflexo sobre a prpria prtica visa alterar algum aspecto da prtica a partir

    da deteco de um problema e da necessidade de mudana, mas tambm pode e

    deve ser uma prtica regular em que o professor se auto-avalia e se deixa avaliar por

    outros olhares, como os dos alunos.

    Refletir sobre a prpria prtica significa tomar para si a parte da

    responsabilidade que lhe cabe. admitir falhas e erros, se desnudar. ter coragem

    de se expor, de ficar vulnervel ao assumir que no se pode ter controle de tudo e

    aceitar a existncia de problemas. Isso exige desprendimento e humildade e tambm

    comprometimento, principalmente com as aes que devero ser tomadas para

    solucionar as falhas que forem apontadas nesse processo, se for o caso.

    Apesar dos medos e desconfianas que a princpio esse processo de reflexo

    pode causar, ele proporciona ao educador autonomia. Quanto mais ele refletir

    intencionalmente sobre seu trabalho, mais autonomia ele conquistar para lidar com

    os problemas que se apresentam, e quanto maior a autonomia, maior ser a

    competncia profissional.

  • 25

    A competncia profissional pode ser concebida como a capacidade de gerenciar o desvio entre o trabalho prescrito e o trabalho real. (...) a autonomia permite que se enfrentem os limites do trabalho prescrito para tornar a tarefa suportvel e para realiz-la da melhor maneira possvel quando as prescries so falhas ou incompatveis com o tempo, com os materiais ou com as condies de trabalho (PERRENOUD, 2002, p. 11).

    Falando especificamente da metodologia, o leitor ainda pode se perguntar por

    que no adotar a pesquisa participante9, a pesquisa-ao10 ou a pesquisa

    etnogrfica11 no lugar da praticamente desconhecida reflexo sobre a prpria prtica.

    A resposta tem duas partes: a primeira, a questo da formao, pois para que

    essas abordagens tenham validade e rigor cientfico, importante, ou pelo menos

    recomendvel, que o pesquisador tenha formao em cincias sociais; a outra razo,

    a questo do tempo, j que as pesquisas normalmente so de longa durao e

    exigem imerso total do pesquisador.

    A reflexo sobre a prpria prtica no dispe de instrumentos exclusivos. Ao

    contrrio, ela utiliza instrumentos convencionais, como questionrios, entrevistas,

    documentos escritos e tambm fotografias, se for o caso.

    Nesta metodologia, a pesquisa qualitativa tem importante destaque. Como o

    ambiente fonte direta dos dados e o prprio pesquisador o principal instrumento,

    9 A pesquisa participante na Amrica Latina surge na dcada de 1960. No Brasil, o primeiro pesquisador a quem pode se vincular a pesquisa participante Paulo Freire. Preocupa-se com o papel do investigador dentro da realidade a ser investigada. Para uma melhor captao de informaes preciso haver uma relao de confiana entre pesquisador e pesquisado. estabelecida uma participao adequada dos pesquisadores dentro dos grupos observados com o objetivo de reduzir a estranheza recproca. Os pesquisadores compartilham, superficialmente, os papis e os hbitos dos grupos observados, cujas condies no devem ser alteradas com a presena de um estranho (Brando, 1984). Alm de tempo e imerso total que so fundamentais para este tipo de pesquisa, difcil imaginar que as condies de um grupo social no sero alteradas na presena de um estranho. Mesmo ele sendo um observador, o simples fato de estar ali j pode mudar a dinmica da sociedade. 10 A pesquisa-ao uma forma de pesquisa participante, mas nem todas as pesquisas participantes so pesquisa-ao. A pesquisa participante no concentra seu foco em torno da relao entre investigao e ao dentro da situao a ser estudada, enquanto que na pesquisa-ao a ao do pesquisador destacada. 11 Um estudo etnogrfico quando possvel, a partir de sua leitura, interpretar o que ocorre no grupo estudado como um membro dele (ANDR e LDKE, 19). Tambm difcil conceber que um indivduo, mesmo em total imerso, interprete um fenmeno como se fosse membro do grupo.

  • 26

    necessrio haver contextualizao. Os dados coletados so descritivos j que os

    detalhes podem ajudar a compreender o problema, alm de existir tambm uma

    grande preocupao com o processo.

    Trs caractersticas particularizam a reflexo sobre a prpria prtica: a

    primeira, o dirio de campo, em que o pesquisador anota detalhadamente o que se

    passa entre os envolvidos de pesquisa; a segunda, a interveno marcante do

    orientador, responsvel por desestabilizar certezas, buscando diminuir a parcialidade

    e a subjetividade da interpretao do pesquisador; a terceira, que a viso de outros

    envolvidos, acrescenta outros dados para anlise.

    Alm da pesquisa qualitativa, dados quantitativos tambm podem ser

    utilizados para complementar os dados e aumentar a rigorosidade do mtodo.

  • 27

    CAPTULO II

    CONTEXTUALIZANDO A PUBLICIDADE E A PROPAGANDA

    Como dito anteriormente, esta dissertao busca resposta para uma questo

    educacional que se insere no ensino superior de Comunicao Social com

    habilitao em Publicidade e Propaganda. Possivelmente ela chamar a ateno de

    jovens educadores de publicitrios que, assim como a autora, tem como formao

    inicial a publicidade, mas pode ocorrer tambm que educadores sem essa formao

    visitem estas pginas e assim, se faz necessrio inform-los sobre a

    contextualizao da atividade.

    Como j aparece no captulo I, para que um professor de ensino superior

    desempenhe um trabalho adequado aos propsitos educacionais12 fundamental

    que saiba claramente que tipo de profissional deseja formar, quais os conhecimentos

    cientficos que embasam sua prtica, quais as habilidades que ele deve ter no que

    diz respeito s tcnicas, enfim, que tenha um conhecimento geral da atividade e do

    seu impacto na sociedade, e isso que se pretende abordar neste captulo.

    Desta forma, nas pginas seguintes o leitor encontrar brevemente descritas

    as informaes13 que o professor da rea precisa saber14, para que possa conduzir o

    aluno percepo de como o contedo ensinado se relaciona com os demais num

    12 Em cada rea existem propsitos a serem atingidos, mas neste caso seria a formao do profissional qualificado e ao mesmo tempo do cidado tico e comprometido com a sociedade, como j mencionado anteriormente. 13 Existem outras informaes que so importantes para o profissional da rea, porm, como todo trabalho cientfico, esta dissertao procura dar conta de um recorte da realidade por meio da seleo dos contedos. No entanto, no h a inteno de excluir ou desvalorizar outros aspectos da profisso que no esto aqui presentes. 14 importante ressaltar que mesmo os professores de disciplinas especficas, como as relacionadas arte, criao e produo necessitam ao menos ter estas informaes para poder contextualizar e traar relaes entre o conhecimento que se ensina e a atividade em geral. Caso contrrio, o aluno poder apresentar dificuldade de reconhecer a importncia daquele contedo especfico devido fragmentao.

  • 28

    curso. Essas informaes de cunho terico, histrico e tcnico revelam, em parte,

    porque a atividade do publicitrio exerce grande influncia na sociedade, como se d

    a relao com o consumidor e o debate sobre a tica. Alm disso, encontrar

    tambm trechos que revelam como a histria da atividade no Brasil impulsiona o

    surgimento e a evoluo da educao superior nesta rea e provoca mudanas.

    O leitor da rea de publicidade provavelmente perceber que as informaes

    aqui presentes, j foram apresentadas e discutidas, certamente com muito mais

    propriedade, por outros autores como J.B. Pinho e Ricardo Ramos, de quem so

    utilizadas as obras como fundamentao terica. Alm desses, outros autores so

    utilizados para o devido embasamento e para auxiliar a pesquisadora a apresentar

    ou relembrar o leitor sobre a rea.

    2. 1. Conceituao

    De acordo com a crena de que preciso fazer a contextualizao da

    atividade, antes de conceituar os termos publicidade e propaganda preciso saber

    onde se situam e qual o papel que eles desempenham dentro do marketing. Desta

    maneira, para que haja maior clareza na exposio, o texto comea por conceitu-lo

    e explic-lo.

    No Brasil, h alguma confuso em relao aos termos marketing, propaganda

    e publicidade. Muitas vezes, so usados como sinnimos, mas principalmente no

    caso do marketing, cometer esse engano ignorar a sua complexidade e

    abrangncia.

    Marketing definido pela American Marketing Association como a planificao

    e execuo de um conjunto de atividades comerciais, tendo como objetivo final a

    troca de produtos, ou servios, entre produtores e consumidores, mas, como observa

    Gracioso (1998), trata-se de uma definio abrangente que est distante do

    marketing praticado atualmente. Para ele a definio mais dinmica seria: o

  • 29

    conjunto de esforos realizados para criar (ou conquistar) e manter clientes

    satisfeitos e lucrativos (GRACIOSO, 1998, p. 29).

    Outros autores tambm se preocuparam em definir marketing. Para

    SantAnna (1998, p.18), a execuo por uma empresa de todas as atividades

    necessrias para criar, promover e distribuir produtos que estejam de acordo com a

    demanda atual e potencial e com a sua capacidade de produo, enquanto que,

    para Samara (2002), a mais ampla e difundida conceituao :

    A do conjunto de atividades humanas destinado a atender aos desejos e necessidades dos consumidores por meio dos processos de troca, utilizando ferramentas especficas, como a propaganda, a promoo de vendas, a pesquisa de marketing, a concepo de produtos, a distribuio e a logstica entre outras ( p. 1).

    O conceito de marketing voltado ao mercado surge na dcada de 1950, e

    passa a ajudar as empresas a conhecer melhor o mercado e o consumidor. Desde

    ento, vem crescendo de importncia e o sucesso das empresas, muitas vezes,

    associado aos esforos de marketing.

    O marketing oferece empresa ampliadas possibilidades de combinao de

    estratgias para que ela obtenha xito15. A estratgia de marketing, s pode ser

    determinada aps anlises, principalmente, do produto, do mercado, de distribuio,

    de preos, entre outras variveis. Essa combinao de estratgias chamada

    composto de marketing ou mix de marketing, que aquele conjunto de instrumentos

    que a organizao utiliza para viabilizar operacionalmente a sua estratgia (PINHO,

    2001, p.34).

    O composto de marketing classicamente16 composto pelos quatro Ps que

    so: produto, distribuio, preo e promoo. Para cada um dos quatro Ps o

    profissional de marketing deve tomar decises que sejam adequadas ao mercado 15 O xito depender do alcance dos objetivos que, por sua vez, variam de empresa para empresa. Pode ser que o objetivo de uma seja aumentar vendas, enquanto que o de outra seja lanar ou reposicionar algum produto, entre outros objetivos possveis. 16 Classicamente, os quatro Ps so: produto, distribuio, preo e promoo, respectivamente product, place, price, promotion. Atualmente, novas teorias esto se referindo tambm a outros quatro Ps que deveriam ser inseridos no composto de marketing: personal service (servio pessoal), pblico, poder e packaging (embalagem). Maiores informaes sobre marketing e o mix de marketing consultar em Pinho, 2001.

  • 30

    potencial e empresa. Apesar da grande importncia do marketing, no objetivo

    deste trabalho detalhar os quatro Ps, assim, s se falar da promoo que onde se

    inserem a publicidade e a propaganda. Para Pinho (2001), promoo ou

    comunicao :

    Todo esforo de comunicao empreendido pela empresa para informar a existncia do produto e promover as vendas, por meio da venda pessoal, publicidade, propaganda, relaes pblicas, merchandising, marketing direto, embalagem e promoo de vendas (p. 35-36).

    Feita a contextualizao e a explicao sobre o marketing pode-se falar sobre

    a publicidade e a propaganda, palavras-chave deste estudo.

    Os termos publicidade e propaganda so tanto usados juntos, como por

    exemplo, em nomes de cursos superiores, como so usados separadamente, posto

    que cada um possui significado diferente, mas inter-relacionados. Para ajudar o leitor

    a compreender estes termos, primeiro foi transcrita a definio de propaganda,

    encontrada no Dicionrio de Comunicao, de Rabaa e Barbosa (1987):

    1. Comunicao persuasiva. Conjunto das tcnicas e atividades de informao e de persuaso, destinada a influenciar as opinies, os sentimentos e as atitudes do pblico em determinado sentido. Ao planejada e racional, desenvolvida por meio dos veculos de comunicao, para divulgao das vantagens, das qualidades e da superioridade de um produto, de um servio, de uma marca, de uma idia, de uma doutrina e de uma instituio etc. Processo de disseminar informaes para fins ideolgicos (polticos, filosficos, religiosos) ou para fins comerciais. No Brasil, e em alguns outros pases de lngua latina, as palavras publicidade e propaganda so geralmente usadas com o mesmo sentido, e essa tendncia parece ser definitiva, independente das tentativas de definio que possamos elaborar em dicionrios ou livros acadmicos (...) (p. 481).

    Como j foi dito, no Brasil e em alguns pases de lngua latina as palavras so

    usadas como sendo sinnimos, embora tenham, na sua raiz, uma diferenciao:

    Os termos publicidade e propaganda so utilizados indistintamente por muitos autores e profissionais da rea publicitria, bem como no dia-a-dia do mercado. Porm, embora usados como sinnimos, no significam rigorosamente a mesma coisa (CHAISE, 2001, p. 9).

  • 31

    Publicidade deriva de pblico (do latim publicus) e designa a qualidade do que pblico. Significa o ato de vulgarizar, de tornar pblico um fato, uma idia. Propaganda definida como a propagao de princpios e teorias. Foi traduzida pelo Papa Clemente VII, em 1597, quando fundou a Congregao da Propaganda, com o fito de propagar a f catlica pelo mundo. (...) Seria, ento, a propagao de doutrinas religiosas ou princpios polticos de algum partido (SANTANNA, 1998, p. 75).

    J em pases de outras lnguas, a diferena de significado dos termos mais

    acentuada:

    Na lngua inglesa, por exemplo, propaganda usado exclusivamente para a propagao de idias, especialmente polticas, tendo muitas vezes uma conotao depreciativa, sendo que para a propaganda comercial ou de servios, se usa o termo advertising. Na lngua alem, Propaganda mais de idias, usando-se Reklame, emprstimo do francs, para o comercial, e tendo-se ao lado desses dois tambm Werbung Webesprache, que no dicionrio de Bussmann (3) o verbete correspondente ao nosso ttulo linguagem da propaganda (SANDMANN, 2001, 10).

    O elemento principal que propaganda e publicidade tm em comum o fato

    de utilizarem a persuaso17, mas enquanto a propaganda est associada

    propagao de idias e doutrinas - e em alguns pases vista de forma pejorativa,

    por estar historicamente relacionada ao nazismo18 - a publicidade est relacionada a

    tornar pblicas as qualidades de um produto ou servio.

    A fim de esclarecer mais a questo, ainda consultando Pinho (2001), pode-se

    ver a diferena e a semelhana entre publicidade e propaganda:

    (publicidade) a disciplina do composto de promoo cuja fora provm da sua grande capacidade persuasiva e da sua efetiva contribuio aos esforos para mudar hbitos, recuperar uma economia, criar imagem, promover o consumo, vender os produtos e informar o consumidor. (p.171) (propaganda) tcnica ou atividade de comunicao de natureza persuasiva, como a publicidade, a propaganda tem sua diferena no propsito bsico de influenciar o comportamento das pessoas por meio da criao, mudana ou reforo de imagens e atitudes mentais, estando presente em todos os setores da vida moderna. (p.129)

    17 1. Ato ou efeito de persuadir(-se). 2. Convico, certeza. (Novo Dicionrio Aurlio). Sandmann explica que a persuaso faz parte da linguagem publicitria, especialmente, mas no exclusivamente, da funo persuasiva ou apelativa (SANDMANN, 2001, p. 27). 18 Pinho transcreve falas de ditadores, como Hitler, exaltando a importncia da propaganda, mas segundo ele, Napoleo j a utilizava. Talvez seja por isso que na Frana a palavra tenha significado ainda mais negativo do que em outros pases (2001, p. 141-144).

  • 32

    Tanto a publicidade quanto a propaganda emprestam a esttica e a linguagem

    das artes plsticas, da literatura, do teatro, da dana, da msica e do cinema. Da

    mesma forma, emprestam conceitos e teorias cientficas de reas como a sociologia,

    a psicologia, a economia e a estatstica. por meio do conhecimento desses e de

    outros recursos que o publicitrio d forma ao contedo a ser comunicado - definido

    anteriormente no planejamento19 de comunicao.

    A preocupao da pesquisadora exatamente com a manipulao desses

    recursos e desses conhecimentos cientficos na publicidade. Fazer com que o futuro

    profissional reflita e use conscientemente e com tica esses elementos o desafio

    que se quer destacar.

    2.2. A Publicidade e o ensino de Publicidade e Propaganda no Brasil

    A publicidade acompanha o homem e, ao mesmo tempo, reflexo da

    sociedade e espelho dela. Dessa maneira, interessa principalmente a sua histria no

    Brasil, j que este estudo abordar o ensino de Publicidade e Propaganda em uma

    instituio de ensino superior do pas.

    No incio e durante um bom tempo, a publicidade no Brasil foi basicamente

    oral. Poucos foram os avisos por escrito, que traziam uma linguagem simples e no

    contavam com as tcnicas de persuaso.

    O primeiro anncio de que se tem notcia, surgiu em 1808 no jornal A gazeta

    do Rio de Janeiro e tornou-se o ponto de partida para o estudo da publicidade no

    pas.

    Numa primeira fase da publicidade, o que prevaleceu foram os classificados

    em jornais. No havia o uso de argumentao, e as qualidades dos produtos ou

    19 Planejamento (rp, pp, mk) Ato de relacionar e avaliar informaes e atividades - de forma ordenada e com lgico encadeamento entre elas - a serem executadas num prazo definido, visando a consecuo de objetivos pr-determinados (RABAA e BARBOSA, 1998, p. 463).

  • 33

    servios eram apenas relacionadas. Entre os produtos e servios mais anunciados

    estavam:

    Venda de casas, captura e comrcio de escravos (Figura 1), divulgao de hotis, confeces, fotografias, chapelarias, medicamentos eram os assuntos mais comuns dos reclames, alguns j com textos e desenhos em litogravuras encomendados a escritores e artistas renomados (MARTINS, 1997, p. 24).

    Figura 1

    Segundo Martins (1997), a primeira agncia de publicidade do Brasil surge em

    1891. Era a chamada Empresa de Publicidade e Comrcio cuja finalidade era a

    corretagem de reclames. J para Ramos (1985), em 1913 ou 1914 que surge a

    primeira agncia de publicidade que deveria merecer esse nome: a Castaldi e

    Bennaton.

  • 34

    De qualquer maneira, em 1900 a publicidade comea a mudar de

    caracterstica. A razo disso foi o lanamento de revistas como a Revista da

    Semana, O Malho, A Careta, Fon-Fon, Vida Paulista, Arara e Cri-Cri.

    Foram revistas publicadas em So Paulo, durante anos, e que se mantiveram graas a anunciantes locais. Elas vm testemunhar a existncia de um negcio de propaganda, de um germe de organizao em que avulta a figura do agenciador de anncios (RAMOS, 1985, p. 19).

    Comea com isso uma fase de influncia europia, com destaque para o

    movimento francs Art Nouveau20 e a participao de escritores poetas como

    Casemiro de Abreu, conhecido como o precursor do texto publicitrio, e Olavo Bilac,

    prncipe dos poetas e nosso maior free-lancer (RAMOS, 1998, p. 26).

    A linguagem utilizada por esses artistas introduziu o verso na publicidade e

    tambm a stira poltica por meio da caricatura e viso bem-humorada dos fatos.

    Mas se a publicidade prosperava, no s aos poetas isso se devia. O empenho de

    Jos Lyra tambm foi fundamental nessa fase de busca do profissionalismo. Ele nos

    fala de profissionalismo, de uma atividade ordenada de propaganda, de homens que

    tornavam possvel o anncio regular. Os agentes, ou agenciadores (RAMOS, 1995,

    p. 26).

    Em 1913, apesar dos esforos dos agenciadores, a publicidade no contava

    com profissionais informados sobre os mtodos de vendas e sobre a prpria

    linguagem persuasiva, que hoje as pessoas se habituaram a ver. Quem fala sobre

    isso o pioneiro Jlio Cosi que ajudou a preparar as bases para a publicidade atual.

    Em uma carta escrita por seu filho v-se a importncia de Cosi ao organizar o setor

    no Brasil:

    Naquele tempo, as coisas eram realmente difceis. A maioria dos jornais no tinha tabela de preos de centimetragem. Na dcada de 20, ele teve de viajar o Brasil todinho para fazer as ligaes das agncias com os jornais de todo o pas, de modo a estabelecer um mtodo de operao agncia-veculo: nasceram as autorizaes, prevendo tamanho, data e preo do anncio (COSI JR. apud RAMOS, 1985, p. 38).

    20 O movimento Art Noveau nasce, em 1883, para exaltar a natureza e falar da vida buclica que comeava a desaparecer com a Revoluo Industrial.

  • 35

    Com a chegada da I Guerra Mundial, num primeiro momento, pouco se

    alterou. Nos jornais os anncios, em sua maioria de remdios, continuavam com a

    mesma linguagem e com poucos avanos no visual. J nas revistas os anncios se

    diversificavam e a linguagem tornava-se mais entusiasmada e, de certa forma, mais

    prxima praticada atualmente. Veja este exemplo pesquisado por Ramos: As

    Galas da Natureza mais se realam pela Formosura Feminina que lhes empresta

    Vida e Alegria. Neste dia de sol, concorra V. Excia. com o seu quinho para o

    encanto da deslumbrante cidade em que vivemos. As ltimas criaes do pas so o

    que h de mais delicado e fino, e em casa alguma esto melhor representadas do

    que no Parc Royal.

    Apesar do ainda incipiente uso de uma linguagem publicitria persuasiva,

    alguns anncios fugiam regra e traziam apelos erticos como o caso do Lana

    Perfume Alice, de 1917 (Figura 2).

    Figura 2

  • 36

    Aps a I Guerra Mundial, havia cinco agncias: A Ecltica, a Pettinati, a

    Edane, a de Valentin Haris, a de Pedro Didier e Antonio Vaudagnoti. Nos anos 20,

    elas experimentam um perodo de prosperidade, principalmente pelo avano

    tecnolgico e incrementos como o outdoor e pela vinda de empresas estrangeiras

    que se tornaram clientes regulares. Nessa poca, a publicidade evolui e campanhas

    marcantes como a do Almanaque Fontoura (figura 3), feita por Monteiro Lobato, so

    criadas.

    Jeca Tatuzinho, segundo carta do autor, em que abre mo de todo direito pela histria, foi feito por amizade. Tudo comeou com Monteiro Lobato e Cndido Fontoura trabalhando no Estado de So Paulo, o primeiro escrevendo artigos, o segundo colaborando no setor de medicina. Conheceram-se. Adoecendo, ou simplesmente fora de forma, o escritor recebeu do industrial a indicao do Biotnico. Tomou-o, deu-se bem. Como retribuio, escreveu o livrinho que, j em 1941, chegava a dez milhes de exemplares (RAMOS, 1985, p. 39).

    Figura 3

  • 37

    A dcada de 20 foi a poca tambm de grandes marcas e da influncia norte-

    americana de publicidade. Produtos femininos, por meio de anncios, buscavam

    tocar a vaidade da mulher. As mensagens se aproximavam do desejo das mulheres

    que queriam ser belas, andar na moda, enfim, que valorizavam a aparncia. No

    anncio a seguir, por meio da imagem, possvel ver o apelo sensual j utilizado em

    1924. A moa usa a meia e fica sentada despreocupadamente em uma rvore,

    enquanto um menino simples no desgruda os olhos dela. O texto fala do fascnio

    que a mulher, ao usar a meia, exercer sobre os ingnuos, simples e rudes

    camponeses. Apesar de no se comparar ao uso feito delas hoje, parece que

    finalmente a criatividade e a persuaso comeam a figurar nos anncios publicitrios

    (Figura 4).

    Figura 4

  • 38

    Se h elementos de mudana em alguns anncios, isso, no entanto, no se

    trata de regra. Um fato que pode explicar o motivo dessa linguagem mais criativa no

    ter sido utilizada largamente antes, o depoimento de Aldo Xavier, tambm pioneiro

    na profisso, de que a publicidade se antecipou demanda do mercado, pois

    somente em 1932, aps a Revoluo Constitucionalista, que a indstria teria sido

    implantada no Brasil. Ele destaca tambm o movimento modernista como chave para

    a valorizao dos smbolos nacionais, inclusive da indstria que comeava a

    prosperar, criando terreno frtil para a atividade (RAMOS,1985, p.41).

    Assim como nas primeiras dcadas tiveram destaque o jornal e a revista, na

    dcada de 30, o surgimento do rdio no Brasil inaugurou a era dos jingles e spots21

    que caram no gosto do brasileiro rapidamente. No incio, a linguagem do rdio ainda

    era amadora, mas a maneira como ela entrava na casa do consumidor e sua

    acessibilidade, at mesmo para analfabetos, tornaram o rdio o meio mais popular

    do pas. No entanto, a mdia impressa, focada nesse estudo, no desapareceu.

    Os cartazes das dcadas de 30 e 40 apareciam nos bondes, nos cafs, nos teatros, nas estaes, atraindo a ateno do pblico pela originalidade e pelo colorido de suas mensagens (MARTINS, 1998, p. 28).

    A linguagem que antes era pouco ou nada persuasiva, posto que no havia a

    necessidade de se estimular tanto a demanda em funo da pequena oferta de

    produtos e servios, comea a se modificar, e os desejos e gostos dos consumidores

    passam a figurar cada vez mais nos textos. Veja abaixo o texto de um anncio para o

    Rum Cresotado:

    Veja ilustre passageiro o belo tipo faceiro que o senhor tem ao seu lado. Mas, no entanto, acredite quase morreu de bronquite. Salvou-o o Rum Creosotado! (GIACOMINI FILHO, 1991, p.32)

    21 Spot o Texto publicitrio para transmisso radiofnica, (...) Pode ter fundo musical ou efeitos sonoros, mas a fora da mensagem est na palavra falada. Distingue-se do jingle, que o comercial cantado (RABAA e BARBOSA, 1998, p. 547).

  • 39

    Os conhecimentos especficos da rea tambm comearam a se difundir. A

    necessidade de se trabalhar com informaes que dessem base criao comeou

    a se afirmar diante do novo quadro de competio.

    de 1937 o lanamento da revista Propaganda. Nela eram abordados

    assuntos da rea com enfoque na necessidade da profissionalizao. De modo

    geral, a dcada de 1930 foi de muita importncia para a publicidade, pois nela foram

    aliceradas as bases para a publicidade brasileira atual.

    Alm de uma imprensa especializada e de entidades profissionais, os anos trinta viram nascer as nossas mais importantes agncias. Comeando com a N. W. Ayer e a J. Walter Thompson, passando pela Standard Propaganda e a McCann-Erickson (...), chegamos fundao da Inter-Americana em 1938. Foram anos decisivos, sob os prismas de maturidade e profissionalizao (RAMOS, 1985, p. 46).

    As primeiras associaes da classe publicitria, como a ABP (Associao

    Brasileira de Propaganda) e a APP (Associao Paulista de Propaganda) nas

    primeiras dcadas do sculo e, mais tarde, em 1949 a ABAP (Agncia Brasileira de

    Agncias de Propaganda), organizaram, fortaleceram e modernizaram, ainda mais, a

    profisso. As discusses das associaes impulsionaram, mais tarde, o surgimento

    do ensino de publicidade.

    A dcada de 1940 foi uma poca difcil para a publicidade. Graas II Guerra

    Mundial, o investimento feito em anncios diminuiu drasticamente ao passo que a

    profisso se expandiu. A sociedade respirava guerra e, como no poderia deixar de

    ser, a publicidade abordou o tema por meio de seus textos e imagens. Um exemplo

    disso foi o anncio de Piralgina: Piralgina destri qualquer dor. Nesse anncio, os

    comprimidos eram bombas, caindo sobre o alvo com a palavra dor, se

    desintegrando (RAMOS, 1985, p. 55).

    No final da dcada, os grandes magazines comearam a explorar o credirio e

    isso favoreceu o consumo e, conseqentemente, a publicidade. Foi a poca dos

    slogans22 e das rimas.

    22 Slogan (pp) Frase concisa, marcante, geralmente incisiva, atraente, de fcil percepo e memorizao, que apregoa as qualidades e a superioridade de um produto, servio ou idia (RABAA e BARBOSA, 1998, p. 544).

  • 40

    A dcada de 1950 foi a poca do surgimento das escolas de propaganda e de

    comunicao. A necessidade de se criar uma escola que formasse profissionais

    qualificados parte das discusses dos prprios publicitrios, em dezembro de 1950,

    por ocasio do I Salo Nacional de Propaganda, realizado em So Paulo sob o

    patrocnio do MASP, Museu de Arte de So Paulo. Rodolfo Lima Martensen foi o

    autor do anteprojeto da escola que, em 1955, passa a se chamar Escola de

    Propaganda de So Paulo, e mais tarde, em 1978, adquire o status de ensino

    superior sendo reconhecida como Escola Superior de Propaganda e Marketing

    (PINHO, 1995, p. 38).

    A atividade, como vista at aquele momento, nunca havia contado com uma

    escola e assim seus profissionais se formaram por meio da prtica. Eram esses

    profissionais que se tornariam os professores de uma nova gerao de publicitrios

    que encontraram na escola uma metodologia voltada para o mercado e no

    preocupada com a cincia (TREVISAN, 1998, p. 87).

    A histria da publicidade est ligada aos avanos tecnolgicos e aos meios de

    comunicao e a chegada da televiso no Brasil foi um passo importante para a

    transformao do cenrio publicitrio. A partir da dcada de 1950 a televiso se

    desenvolveu rapidamente, tanto nos contedos quanto na linguagem e, com isso,

    promoveu tambm um rpido desenvolvimento da linguagem publicitria.

    O panorama das comunicaes se altera rapidamente; em 1951 criada a TV Tupi do Rio de Janeiro; dois anos aps, inaugura-se a TV Paulista, que mais tarde faria parte da atual TV Globo, e a TV Record. At 1962, a histria da TV brasileira s contada por fotos e folclore, data em que aparece o videoteipe. Em 1964, as Organizaes Globo obtiveram concesso do governo para instalao de uma emissora no Rio de Janeiro; a partir de 1968, formando um conjunto de emissoras, ficaria implantada a Rede Globo de Televiso, que se tornaria a emissora de maior audincia do Pas a partir dos anos 70, ampliando sua cobertura para mais de 90% do territrio nacional no final dos anos 80 (GIACOMINI FILHO, 1991, p. 35).

    No incio da televiso no havia ainda os comerciais, e sim a presena de

    garotas-propaganda que, sorridentes, diziam o texto e enalteciam as qualidades do

    produto em cena.

  • 41

    Os textos eram longos, muitas vezes simples estratgias de produto ou proposies de venda. O lado criativo e a originalidade eram pobres, pois desfiava-se uma avalanche de razes de compra e abusava-se da oportunidade de mostrar o produto em uso ( SIQUEIRA, 1995, p. 75).

    Aps o perodo em que a televiso emprestou a linguagem do rdio, os

    anunciantes passaram a confiar e gostar da televiso, e assim os investimentos

    publicitrios aumentaram.

    Com esses fatores, estavam cada vez mais edificadas as bases sobre as

    quais a publicidade se desenvolveria. Novos profissionais especializados em

    marketing, na linguagem do rdio, da televiso e do cinema surgem diariamente e

    vo incrementando a linguagem publicitria acompanhando as exigncias do mundo

    moderno e tambm as mudanas no gosto do consumidor.

    Aos poucos, a linguagem publicitria aperfeioa-se e toma outro rumo ao apresentar mais requinte e mais e mais apuro nas construes frsicas com a utilizao de recursos semiticos que provocam mais reflexo nos leitores pelo jogo de palavras, a polissemia, a paronmia, as figuras e os neologismos (MARTINS, 1997, p.29).

    Para a publicidade havia muito trabalho e poucos profissionais competentes.

    Por isso existia, o cupincha que atualmente chamado de free-lance, que nada

    mais , do que um trabalho encomendado por agncias a uma pessoa sem vnculo

    empregatcio. Ao que parece, pela falta de pessoal especializado, muitas agncias

    recorriam ao mesmo free-lancer para criar suas campanhas. Um fato curioso,

    contado por Ramos, que trabalhos realizados para concorrncias de algumas

    contas23 traziam textos e imagens dos mesmos profissionais, como na vez em que,

    das cinco agncias participantes quatro teriam usado o mesmo redator (1985, p.68).

    dessa dcada o anncio da Kolynos, considerado o primeiro realmente

    diferente, pois os apelos racionais usados pelos concorrentes, contra a crie e mau-

    hlito, no aparecem e do lugar a uma linguagem nova que parece pr fim aos

    23 Conta (pp) Entidade ou pessoa que entrega a uma agncia a responsabilidade de sua propaganda. Cliente da agncia. Anunciante, do posto de vista da agncia ou dos veculos. Esta expresso pode designar, conforme o caso, toda a empresa anunciante ou apenas um dos seus produtos (p. ex.: a empresa x uma boa conta de propaganda; esta agncia ganhou a conta do produto y) (RABAA e BARBOSA, 1998, p. 169-170).

  • 42

    apelos repetitivos e sem criatividade. Conseguem aliar a refrescncia do creme

    dental refrescncia da piscina e, porque no dizer, da mente (Figura 5).

    Figura 5

  • 43

    Para a publicidade, a dcada de 1960 foi revolucionria. Muitas mudanas

    ocorreram e outras prticas se consolidaram. O primeiro ponto a ser destacado a

    criatividade reconhecida pelo ramo como fundamental. H a integrao entre

    redao e arte, e a valorizao de profissionais versteis que criam para diferentes

    mdias. Com relao linguagem, houve a mudana de nfase dos apelos racionais

    para os apelos emocionais (Figuras 6 e 7).

    Figura 6 Figura 7

    A influncia das agncias estrangeiras auxiliou a melhorar a criao no Brasil.

    As campanhas da Volkswagen foram um marco de uma renovao de approach e

    linguagem, a se refletir por todos esses ltimos anos. As agncias brasileiras

    passam a ter maior importncia nos anos 60 (RAMOS, 1985, p. 77).

  • 44

    Ao longo da dcada se constri o homem de comunicao, que acumula

    experincia em agncias, clientes e veculos. Novas associaes surgem e a

    publicidade se profissionaliza ainda mais. A Fundao da Associao Brasileira de

    Anunciantes realiza um novo sistema de remunerao. Primeiramente, o bnus de

    veiculao de 17,65%, e depois passa aos 20% at hoje praticado. Como o

    anunciante paga mais, passa a exigir mais tambm, e isso faz com que pesquisas,

    controles de programao, dados sobre a concorrncia, a avaliao dos resultados

    da publicidade, passem a existir e, ao longo da dcada, se aprimorem. A criao do

    IVC (Instituto Verificador de Circulao) foi outro ponto favorvel que se consolidou

    rapidamente.

    Ainda nessa dcada, somente as revistas mais profissionais persistiram, e as

    publicaes especficas da rea comeam a surgir e se ampliar. Em 1967, surge a

    revista Veculos, e, em 1969, h o lanamento do Anurio Brasileiro de

    Propaganda, a renovao da revista Propaganda que oferece muitas informaes

    especializadas (RAMOS, 1985).

    Setores como bancos, financiadoras e o prprio governo passam a investir em

    publicidade. A qualidade criativa dos comerciais de televiso chama a ateno e

    passa a contar com personalidades do show business brasileiro interpretando

    personagens.

    Foi a poca tambm da difuso das escolas de comunicao, a fim de formar

    profissionais para as reas de cinema, de rdio e televiso, de publicidade e de

    relaes pblicas. Por se tratar ainda do incio da educao na rea, o primeiro

    currculo, de 1962, era genrico, pois seus idealizadores tiveram dificuldade em

    estabelecer as disciplinas que seriam necessrias formao.

    Em 1966, a modificao curricular implementada por meio da Resoluo nmero 20 do Conselho Federal de Educao, imps uma verdadeira camisa de fora, restringindo a eleio de disciplinas complementares e indicando um conjunto de 16 disciplinas, das quais seis de natureza tcnica ou de especializao, que sinalizam uma tendncia de tecnificao do ensino de Jornalismo. A abordagem tcnico-cientfica do ensino de Comunicao se completa em 1969, com a proposta de novo currculo mnimo do agora curso de Comunicao, oferecido com cinco habilitaes: Polivalente, Jornalismo, Relaes Pblicas, Publicidade e Propaganda e Editorao, com o propsito de atender s novas exigncias criadas pelo desenvolvimento industrial e tecnolgico. Existiam nove matrias comuns a todas as habilitaes e,

  • 45

    depois, cada habilitao apresentava uma relao de disciplinas para o aprofundamento em sua rea especfica (PINHO, 1995, p.47).

    Ainda hoje se percebe que a idia de currculo mnimo comum para as

    diferentes habilitaes da Comunicao Social persiste. Apesar das discusses

    terem evoludo24 no sentido de se atualizar a grade clssica e acabar com o ncleo

    comum em favor da criao de um projeto pedaggico que atenda s especificidades

    regionais, a realidade econmica e a crise no setor, devido exploso do nmero de

    cursos superiores de comunicao, esto fazendo com que instituies25 voltem a

    adotar essa estratgia para reduzir custos, agrupando alunos de diferentes

    habilitaes na mesma sala.

    Assim como as escolas superiores, a idia da comunicao se difunde e,

    como afirma Ramos, a sociedade entra na era da sociedade de consumo.

    A dcada de 1970 foi marcada pela censura, pelos avanos tecnolgicos, pelo

    aumento do volume de investimentos na rea e um maior comprometimento dos

    profissionais com a atividade. No que diz respeito economia, Renato Castelo

    Branco diz que 1979 foi o fundo do poo, enquanto, Roberto Duailibi critica a

    intromisso do governo, mas v na crise oportunidades para enriquecer. Jos

    Fontoura da Costa da opinio que evolumos, apesar de tudo referindo-se

    censura. Ele aponta a abertura como elemento de mudana. Porque, e bom que

    ningum se esquea, durante longos anos a discusso foi abolida neste pas. E o

    exerccio de discutir, de pensar, de falar alto, de no ter medo de perder o emprego

    afeta beneficamente o trabalho criativo (RAMOS,1985, p.109).

    Na opinio de Carlos Roberto Chueiri, no que diz respeito linguagem, no

    final da dcada houve um surto de ousadia com o fim da censura (Figura 8).

    24 Este assunto foi tema de discusses em eventos do Intercom Sudeste 2006. 25 Um exemplo disto o que ocorre na instituio em que trabalha a pesquisadora. A partir de 2007, ser adotada a semestralidade, uma tendncia que visa diminuir a inadimplncia, e, aproveitando a mudana, foi aberta a habilitao Jornalismo e instituindo-se o ncleo comum. A razo que se antes a instituio conseguia abrir duas salas totalizando no mnimo uns 80 alunos, nos ltimos tempos h dificuldade em se formar at mesmo uma nica turma de alunos.

  • 46

    Figura 8

    Com relao educao, em 1977, um novo parecer promove mudanas no

    currculo dos Cursos de Comunicao Social o que d origem fase crtico-reflexiva

    do ensino de comunicao. quando comea a se pensar na importncia e no

    impacto da comunicao na sociedade. Como se v, a questo que move este

    trabalho est presente h pelo menos 30 anos.

    O currculo mnimo comum integrado pelo conjunto das matrias de fundamentao geral humanstica, de fundamentao especfica e de natureza profissional. A distribuio seqencial das disciplinas deve obedecer ao critrio da maior concentrao das Matrias de Fundamentao Geral Humanstica e das matrias de Fundamentao Especfica na primeira metade de durao do curso, e das Matrias de Natureza profissional na segunda metade, aplicadas ao respectivo campo profissional. O ltimo semestre do curso foi reservado exclusivamente para a aplicao prtica dos conhecimentos adquiridos na realizao de projetos experimentais (PINHO, 1995, p. 48).

    Esse formato de curso, com algumas alteraes, ainda praticado hoje.

    praticamente um consenso reservar o ltimo semestre do curso para a realizao

    dos projetos experimentais.

    Um fato de extrema importncia para a comunicao social ocorreu em

    dezembro de 1977: o primeiro encontro para a fundao da Sociedade Brasileira de

    Estudos Interdisciplinares da Comunicao - Intercom.

    A Intercom foi o espao encontrado por intelectuais e pesquisadores que podiam discutir, mesmo com pontos-de-vista diferentes, as questes da comunicao e da sociedade atual. Desde a sua fundao, teve o compromisso de tentar contribuir para a superao da dependncia poltica, cultural e tecnolgica que caracteriza os sistemas nacionais de comunicao (TREVISAN, 1998, p. 101-102).

  • 47

    A atuao da Intercom de inestimado valor, posto que deu mais credibilidade

    e seriedade comunicao no pas por meio da discusso, sistematizao e

    ampliao de prticas e teorias, e da elaborao de um referencial terico

    consistente que inclui o resgate histrico da atividade, o que, sem dvida, influenciou

    e impulsionou a educao na rea no Brasil26.

    Se nos anos 60 e 70 a publicidade se desenvolveu rapidamente, o que dizer,

    ento, a partir das dcadas de 80 e 90?

    Na opinio de Trevisan (1998):

    Para a publicidade brasileira, os anos oitenta foram de inovaes, aperfeioamentos, especializaes e de conquista de muitos prmios internacionais como dos festivais Sawa, Cannes e Nova York. Foram os anos de sustentao dos nomes Duailibi, Jlio Ribeiro, Alex Periscinoto e de novos como Washington Olivetto e Nizan Guanaes; profissionais que se destacaram tanto em criao como na administrao de negcios (1998, p.107).

    Uma das razes para esse sucesso, alm do desenvolvimento da linguagem

    escrita e persuasiva pesquisada por redatores e outros profissionais envolvidos,

    pode-se encontrar na linguagem visual, que experimentou grande desenvolvimento,

    principalmente quando os computadores e softwares voltados rea surgem nos

    Estados Unidos, em 1985, e chegam s grandes cidades do pas, principalmente a

    partir da dcada de 1990. Esse agrupamento constitua o primeiro sistema de DTP

    Desktop Publishing (editorao de mesa), nome inventado na ocasio (BAER,

    1999, p.57).

    A produo fotogrfica e artstica, os recursos de diagramao, a maior

    diversidade e a facilidade na manipulao desses e outros elementos fizeram com

    que a publicidade se tornasse cada vez mais sofisticada: seria a vida passada a

    limpo ou o mundo de sonhos e fantasias que alguns condenam.

    As possibilidades so multiplicadas. Com essa tecnologia de apenas dez

    anos, todos os elementos de uma pgina so integrados pelos programas de DTP,

    como o Page Maker ou o QuarkXpress, da Quark Inc (BAER, 1999, p. 57).

    26 Muitos dos fundadores e participantes da Intercom so professores da rea nas mais proeminentes instituies de ensino superior no pas. o caso do pioneiro fundador Jos Marques de Melo.

  • 48

    As ilustraes que foram usadas na dcada de 1970, algumas de carter

    ingnuo (Figura 9), deram lugar a imagens super produzidas. O anncio em preto e

    branco (Figura 10) desapareceu27, pois os custos com fotolitos foram reduzidos ou

    eliminados por conta de novos processos como a Internet e a tecnologia CTP

    (Computer to Plate) que imprime arquivos diretamente na chapa de impresso.

    Figura 9 Figura 10

    A difuso e acessibilidade tecnologia tambm diminuram o isolamento

    tcnico. Antes, a criao e a produo em publicidade eram feitas por pessoas com

    habilidades manuais e artsticas. As artes eram feitas mo e levavam um bom

    tempo para ficarem prontas, e a pessoa que no tivesse essas habilidades

    simplesmente no poderia fazer esse trabalho.

    27 Atualmente, podem at existir anncios de revista em PB (preto e branco), mas certamente a razo no o custo. Esse recurso pode ser usado at para chamar ateno em meio a pginas coloridas.

  • 49

    Num passado no muito remoto, layoutmen e assistentes de arte trabalhava