a escola como espa.o de inclus.o -...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIOLOGIA E HISTÓRIA DA PROFISSÃO DOCENTE E DA EDUCAÇÃO ESCOLAR A ESCOLA COMO ESPAÇO DE INCLUSÃO: SENTIDOS E SIGNIFICADOS PRODUZIDOS POR ALUNOS E PROFESSORES NO COTIDIANO DE UMA ESCOLA DO SISTEMA REGULAR DE ENSINO A PARTIR DA INCLUSÃO DE ALUNOS PORTADORES DE NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS. MARISA APARECIDA DOMINGOS BELO HORIZONTE 2005

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS

DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: SOCIOLOGIA E HISTÓRIA DA PROFISSÃO

DOCENTE E DA EDUCAÇÃO ESCOLAR

A ESCOLA COMO ESPAÇO DE INCLUSÃO:

SENTIDOS E SIGNIFICADOS PRODUZIDOS POR ALUNOS E PROFESSORES

NO COTIDIANO DE UMA ESCOLA DO SISTEMA REGULAR DE ENSINO A

PARTIR DA INCLUSÃO DE ALUNOS PORTADORES DE NECESSIDADES

EDUCACIONAIS ESPECIAIS.

MARISA APARECIDA DOMINGOS

BELO HORIZONTE

2005

MARISA APARECIDA DOMINGOS

A ESCOLA COMO ESPAÇO DE INCLUSÃO:

SENTIDOS E SIGNIFICADOS PRODUZIDOS POR ALUNOS E PROFESSORES

NO COTIDIANO DE UMA ESCOLA DO SISTEMA REGULAR DE ENSINO A

PARTIR DA INCLUSÃO DE ALUNOS PORTADORES DE NECESSIDADES

EDUCACIONAIS ESPECIAIS.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação do Instituto de Ciências Humanas do Departamento de Educação do Mestrado em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientadora: Doutora Sandra de Fátima Tosta Pereira

BELO HORIZONTE

2005

FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Domingos, Marisa Aparecida D671e A escola como espaço de inclusão: sentidos e significados produzidos

por alunos e professores no cotidiano de uma escola do sistema regular de ensino a partir da inclusão de alunos portadores de necessidades educacionais especiais / Marisa Aparecida Domingos. – Belo Horizonte, 2005.

372f. : il. Orientadora: Profª. Drª. Sandra de Fátima Pereira Tosta. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas

Gerais, Programa de Pós-Graduação em Educação. Bibliografia. 1. Educação - Brasil - Estudo de casos. 2. Educação inclusiva. 3.

Multiculturalismo. 4. Educação especial. 5. Atividades cotidianas. 6. Políticas públicas. I. Tosta, Sandra de Fátima Pereira. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós - Graduação em Educação. III. Título.

CDU: 37(81) Bibliotecária : Maria Auxiliadora de Castilho Oliveira – CRB 6/641

MARISA APARECIDA DOMINGOS

A ESCOLA COMO ESPAÇO DE INCLUSÃO: SENTIDOS E SIGNIFICADOS PRODUZIDOS POR ALUNOS E PROFESSORES NO COTIDIANO DE UMA ESCOLA DO SISTEMA REGULAR DE ENSINO A PARTIR DA INCLUSÃO DE ALUNOS PORTADORES DE NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS. Dissertação defendida e aprovada, em 26 de outubro de 2005, pela Banca Examinadora Constituída pelas professoras:

___________________________________________________________

Profª Doutora Sandra de Fátima Tosta Pereira (Orientadora) – PUC MINAS

__________________________________________________________

Profª Doutora Anna Maria Salgueiro Caldeira – PUC MINAS

__________________________________________________________

Profª Doutora Maria Auxiliadora Monteiro Oliveira – PUC MINAS

À minha família, às minhas amigas e aos meus amigos pelo incentivo e carinho.

AGRADECIMENTOS

Muitos deram sua contribuição ao conteúdo desta dissertação. Alguns fizeram

por sua boa vontade em escutar o que me inquietava e o que ocupava a minha

mente, assim encorajaram-me a projetá-los para o exterior. Outros me ajudaram

fazendo perguntas e dando sugestões. Outros ainda, com suas críticas ácidas,

causaram-me desejo de registrar meus pensamentos e questionamentos para ser

capaz de analisar e interpretar com maior propriedade essas indagações. O que

produzi são projeções do que aprendi com os outros e através da minha própria

trajetória de vida. Aprendi tanto de tantos que é impossível nomeá-los aqui e

distinguir minha gratidão para com alguns e não para com outros seria injusto. Mas

posso expressar meu reconhecimento pelo menos àqueles que me ajudaram

diretamente na execução desta pesquisa.

Sou grata às instituições que possibilitaram este estudo, notadamente a PUC

MINAS que me forneceu as condições materiais necessárias para edificá-lo e ao

Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais pelo apoio financeiro na realização

do Mestrado. Aos meus pais e irmãos pela grande luz e por estarem próximos em

todos os momentos de minha vida, enfrentando e compartilhando junto comigo as

dificuldades e alegrias. Aos amigos e amigas um agradecimento especial e

carinhoso pelo incentivo e acolhimento nos muitos momentos de desânimo e

cansaço. Aos professores e colegas de Mestrado que discutiram comigo estas e

outras idéias, gente igualmente generosa e envolvida pelo encantamento da

pesquisa a respeito da vida na Escola.

Não posso, também, deixar de mencionar o auxílio, apoio, estímulo da Profª.

Sandra que me emprestou muito de sua competência e zelo acadêmico,

assim como de sua amizade para que eu pudesse levantar de meus tropeços. Foi a

sua amável insistência e grande consideração por meus sentimentos que venceram

minhas hesitações e me deram coragem para prosseguir. Ela soube me ouvir em

situações de perplexidade e apontar saídas. O seu firme julgamento, cuidado e

profundidade com que pensa sempre a realidade educacional brasileira, a sua

extraordinária integridade e orientação fundada numa ética colaborativa, tornaram

menos dramática minha eterna e necessária condição de incompletude e

insuficiência. Minha gratidão a você professora Sandra que compôs comigo estas

reflexões formativas, em tudo e por tudo essenciais, a considero parceira nos

caminhos aqui percorridos e na mobilização de outras caminhadas.

Por fim, agradeço aos professores e alunos da Escola Estadual “Prof. Wilson

Lopes do Couto” pelos novos ângulos e vertentes que trouxeram a cada contato, dos

quais falo com emoção e saudades.

A todos vocês, meu muito obrigada.

“O outro que fala e pensa, meu objeto, portanto, não fala e pensa como eu. Se não, não seria meu objeto. Mas devo falar e pensar como ele, pois eu digo e penso alguma coisa, na verdade, daquilo que lê diz e pensa. Se não, não seria o meu objeto, nem o seu, nem o de ninguém. Sem este jogo de diferença e de identificação não teria ciência sobre aquilo que quero conhecer.”

(Marie-Jeanne Borel)

RESUMO

A presente dissertação de Mestrado em Educação teve como objetivo

conhecer, analisar e interpretar sentidos e significados produzidos por sujeitos no

cotidiano de uma escola regular que conta com alunos com necessidades

educacionais especiais. O estudo foi realizado junto ao Mestrado em Educação da

PUC Minas, com apoio financeiro do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais,

tendo o seu início em março de 2003. A metodologia de cunho qualitativo e se

configurou, em sua totalidade, como um estudo de caso realizado na Escola

“Professor Wilson Lopes do Couto”, Bom Despacho, Minas Gerais, para investigar,

descrever e analisar desafios, polaridades, discursos, ações, sentidos e significados

que permeiam a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais no

cotidiano da escola do Sistema Regular de Ensino. Teve como eixo teórico o debate

sobre as diferenças culturais na sociedade e na escola, inclusão escolar e cidadania,

presentes na LDBEN/96, nos PCN’s e na concepção de aprendizagem como

experiência relacional.

Palavras-Chave: Educação, inclusão escolar, diferença cultural e

cotidiano escolar.

ABSTRAT

The present dissertation of Mastering Education to know, anlyze and interpret

the meanings and significances produced by individuals in the everyday life of a

regular school that takes students with special educacional needs. The study was

done in conjunction with the Mastering in education of PUC Minas, with the finacial

support of Minas Gerais State Court of Law, having started in March, 2003. The

methodology of qualitative feature took place as a study of case carried out at

Professor Wilson Lopes do Couto School, Bom Despacho, Minas Gerais, to

investigate, describe and analyze challenges, polarities, speeches, actions,

meanings and significances that permeate the inclusion of students with special

educacional needs in the everyday life of a school belonging to be Regular System fo

Teaching. Its theoretical axis was the debate about the cultural differences in the

society as well as the school, school inclusion and citzenthip, mentioned in the

LDBEN/96, the PCN’s and in the conception of learning as relational experience.

Key words: Teaching, school inclusion, Cultural difference and school

everyday.

LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 Evolução da Matrícula de Alunos com Necessidades Especiais por Tipo de Deficiência ............................................................................................................95 QUADRO 2 Matrícula em 2005 e 2004, segundo etapas/modalidades da educação básica ........................................................................................................................97

QUADRO 3 Trajetórias dos Alunos da APAE de Bom Despacho/MG no Sistema

Regular de Ensino – 2004 .......................................................................................123

QUADRO 4 Matrícula dos Alunos do 1º ano do Ciclo Intermediário da APAE –

BD.............................................................................................................................139

QUADRO 5 Distribuição dos Alunos (série/turno) – 2004........................................151

QUADRO 6: Funcionários Da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” - 2004

..................................................................................................................................153

QUADRO 7: Distribuição dos Professores (Conteúdo

Curricular/Atuação/Habilitação)................................................................................154

QUADRO 8: Distribuição dos Professores por Nível de Formação –

2004..........................................................................................................................155

QUADRO 9: Matrícula efetiva do Ensino Fundamental por Série e Turno, Segundo o

Ano de Nascimento. – 2004.....................................................................................160

LISTA DE TABELAS

TABELA 1: Resultado Final do Censo Escolar 2004 ..............................................108

TABELA 2: População Ocupada Por Setores Econômicos......................................109

TABELA 3: Resultado Final do Censo Escolar 2004...............................................110

TABELA 4:Níveis de Ensino da Escola Estadual “Paulo Campos Guimarães”.......119

TABELA 5: Matrícula Efetiva do Ensino Fundamental Por Série e Turno Segundo

Ano de Nascimento .................................................................................................161

LISTA DE MAPAS

MAPA 1 Mapa Rodoviário – vias de acesso à Bom Despacho (MG) ......................101

MAPA 2 Mapa de Bom Despacho (MG) ....................................................................

MAPA 3 Mapa da Localização da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” no

Bairro de Fátima.......................................................................................................136

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: Igreja Matriz Nossa Senhora do Bom Despacho (MG) ........................100

FIGURA 2: Festa de Congado em Bom Despacho (MG).........................................102

FIGURA 3: Capelinha da Rua Cruz do Monte - Bom Despacho (MG) ....................104

FIGURA 4: Imagem de Nossa Senhora do Bom Despacho (MG) ..........................106

FIGURA 5: Imagem de Nossa Senhora do Bom Despacho (MG) ..........................106

FIGURA 6: Oficinas Ocupacionais e Pedagógicas do CEAC .................................113

FIGURA 7: Entrada Principal da APAE DE Bom Despacho....................................117

FIGURA 8: Sala de Recursos da APAE de Bom Despacho (MG) ..........................122

FIGURA 9:Fachada Principal da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................128

FIGURA 10: Entrada Principal da Siderúrgica São José ........................................134

FIGURA 11: Igreja Nossa Senhora de Fátima. .......................................................135

FIGURA 12: Vista Parcial do Campo do FAMORINE .............................................136

FIGURA 13: Localização da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” no

Bairro de Fátima.......................................................................................................137

FIGURA 14: Entrada Principal da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................138

FIGURA 15: Secretaria da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................143

FIGURA 16: Vista Parcial do Pátio central da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes

..................................................................................................................................144

FIGURA 17: Pavilhão II da Escola Estadual “Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................146

FIGURA 18: Pátio Interno Central da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................149

FIGURA 18: Quadra de Esportes da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”.......................................................................................................................150

FIGURA 19: Pátio Interno da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”........164

FIGURA 20: Momento do Recreio - fila na cantina..................................................172

FIGURA 21: Momento do Recreio – Pátio Central..................................................174

LISTA DE ABREVIATURAS

Coord. – Coordenador

Ed. - Editora

Ex. - Exemplo

Prof. – Professor

p. - página

Org. – Organizador

LISTA DE SIGLAS

AAMR - Associação Americana de Deficiência Mental

AD – Análise do Discurso

ADNPM – Atraso Neuropsicomotor

APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

ANSI - American National Standards Institute

AVC - Acidente Vascular Cerebral

CADEME – Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes Mentais

FHEMIG – Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais

CEAC – Centro Educacional “Antônio Carlos”

CENESP – Centro Nacional de Educação Especial

CESB – Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro

CORDE – Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência DEE - Delegacia de Ensino Especial

DSM – Disgnostic and Statistical of Manual

DUDH - Declaração Universal dos Direitos do Homem

FEBEM – Fundação do Bem Estar do Menor

FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério GU – Gramática Universal

IBC - Instituto Benjamim Constant

IEC – Instituto de Educação Continuada da PUC Minas

15

INDI - Instituto de Desenvolvimento Industrial de Minas Gerais

INEP/MEC - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos

LBA – Legião Brasileira de Assistência

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LEPED - Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade

MEC – Ministério de Educação

NASM/BD – Núcleo de Atenção à Saúde Mental de Bom Despacho

OMS – Organização Mundial da Saúde

ONG – Organização Não-Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PC – Paralisia Cerebral

PCNs – Parâmetros Curriculares Nacionais

PDE – Plano de Desenvolvimento

PPPE – Projeto Político Pedagógico da Escola

PPD - Pessoa Portadora de Deficiência

PROEB - Programa de Avaliação de Rede Pública de Educação Básica

PUC MINAS – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

QI – Quociente de Inteligência

SEDESE - Secretaria de Desenvolvimento Social e Esportes de Minas Gerais

SEE/MG – Secretaria de Estado de Educação - MG

SEESP - Secretaria de Educação Especial

SIMAVE - Sistema Mineiro de Avaliação da Educação Pública SUS - Sistema Único de Saúde UNIPAC - Universidade “Presidente Antonio Carlos”

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...............................................................................19

2. EDUCAÇÃO ESPECIAL NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA...........................................................................................45

3. CIDADANIA E POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA.............................................................................................63 3.1. EDUCAÇÃO INCLUSIVA COMO CIDADANIA..............................................63 3.2. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA......................................................................................... 70

4. A DEFICIÊNCIA COMO DIFERENÇA .........................................77 4.1. EDUCAÇÃO ESPECIAL E DEFICIÊNCIA.........................................................77 4.2.IGUALDADE, DIFERENÇA E DIVERDIDADE: CONTROVÉRSIAS NO UNIVERSO DA INCLUSÃO ESCOLAR....................................................................87

5. OS OLHARES DA PESQUISA: A CIDADE E O BAIRRO...........99 5.1.BOM DESPACHO: HISTÓRIAS, CONTOS E LENDAS.....................................99 5.2.1. DE SENHORA DO SOL A BOM DESPACHO..............................................101 5.3.”NUM TEMPO E NUM LUGAR”.......................................................................107 5.4. A EDUCAÇÃO ESPECIAL E O ESPECIAL DA EDUCAÇÃO EM BOM DESPACHO.............................................................................................................111

6. OS LUGARES DA PESQUISA: A ESCOLA...............................127 6.1.OLHANDO, OUVINDO E ESCREVENDO SOBRE O COTIDIANO NA ESCOLA ESTADUAL “PROF. WILSON LOPES DO COUTO”.............................................127 6.1. NA HISTÓRIA DO BAIRRO, A HISTÓRIA DA ESCOLA................................132 6.2. ADENTRANDO NO CAMPO DE PESQUISA...................................................138

7. NO COTIDIANO ESCOLAR, DEFICIÊNCIA, DIFERENÇA E INCLUSÃO ESCOLAR................................................................................................................159

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................181

17

REFERÊNCIAS........................................................................................................186

ANEXOS..................................................................................................................194

19

1. INTRODUÇÃO

“Traga dúvidas e incertezas, doses de ansiedade, construa e desconstrua hipóteses, pois aí reside a base do pensamento científico do novo século. Um século cansado de verdades, mas sedento de caminhos.”

(Cláudia Werneck)

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei nº. 9394/96)

estabeleceu, entre outros princípios, a "igualdade de condições para o acesso e

permanência na escola" e recomendou que a educação para "educando com

necessidades especiais” ocorra, preferencialmente, na rede regular de ensino. Além

da questão normativa, têm-se presenciado, em nossa sociedade, ao longo das

últimas décadas, rápidas e intensas transformações com importantes mudanças no

interior desta. Uma delas é o quanto se tem discutido a respeito de exclusão social,

configura-se por exclusão social toda situação ou condição social de carência,

dificuldade de acesso, segregação, discriminação, vulnerabilidade e precariedade

em qualquer âmbito. Segundo Mantoan (2003), a temática da inclusão escolar vem

rendendo, tanto no meio acadêmico quanto na própria sociedade, novas e

acaloradas discussões.

Nos debates a respeito da inclusão escolar, revelam-se dados que ganham

ainda mais importância neste momento de afirmação das práticas e teorias que a

fundamentam. Falar desta nova realidade para pessoas com necessidades

educacionais especiais significa entender que seu desenvolvimento e socialização

podem ser bastante satisfatórios, quando os mesmos passam a ser vistos como

indivíduos capazes de fazer parte de um mundo constituído para habilidosos e

competentes. Mesmo que a história da educação das pessoas com necessidades

20

educacionais especiais apresente desdobramentos na história de nossa sociedade

carregados de seus movimentos e contradições.

Na estruturação da educação brasileira, o discurso científico, as idéias de

modernização e racionalização estão presentes desde os primórdios da educação

especial também. A crença nas “potencialidades inatas” vai fundamentar um

pensamento meritocrático, presente em nossa história passada e também na

organização da sociedade atual. A evolução dos serviços de educação especial

caminhou de uma fase inicial, eminentemente assistencial, visando apenas o bem-

estar da pessoa com deficiência, para uma segunda, em que foram priorizados os

aspectos médicos e psicológicos, chegando às instituições de educação escolar e

provocando a integração da educação especial no sistema geral de ensino.

Atualmente, tal processo depara-se com a proposta de inclusão escolar dos alunos

com necessidades educacionais especiais nas salas de aula do ensino regular.

Tais fatos têm modificado o significado da educação especial e alterado o

sentido dessa modalidade de ensino. Como esta pesquisa vai mostrar, há muitos

educadores, pais e profissionais interessados que a confundem como uma forma de

assistência prestada por abnegados a crianças, jovens e adultos com deficiência. E

mesmo quando concebida adequadamente segundo Mantoan (2003), a educação

especial no Brasil tem sido entendida como um conjunto de métodos, técnicas e

recursos especiais de ensino e de formas de atendimento que se destinam os

alunos que não conseguem atender às expectativas e exigências da educação

regular.

A inclusão escolar se contrapõe à exclusão escolar e tem representado o

espaço comum daqueles que se dedicam à de pessoas com necessidades

educacionais especiais, aparece no centro de todas as discussões acerca da

21

significação de ser deficiente. Visto que, os termos e expressões empregados pela

educação especial para designar tais pessoas, comumente tem gerado inúmeras

ambigüidades e distorções no entendimento e na aplicação de seus significados. O

critério no emprego do referido termo não configuram preciosismo lingüístico, mas

uma necessidade que se impõe para a remoção de barreiras atitudinais, decorrentes

de juízos equivocados sobre a capacidade das pessoas com necessidades

educacionais especiais e o respeito às diferenças. Trabalhar esta questão é um

desafio para o nosso tempo.

A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais no dia-a-dia

das escolas do sistema regular de ensino e da classe comum provoca indagações

no âmbito da educação geral: Qual o impacto deste processo no cotidiano escolar?

Qual a relação entre inclusão e diferença cultural? Será que a inclusão escolar não

se constitui como um elemento a mais para manter posturas de discriminação na

escola? Como são postas em jogo as identidades e diferenças no espaço da

escola?

Dar conta dessas questões pode ser uma maneira nova da gente se ver, ver

os outros e ver a Educação, de aprender a conviver com as diferenças, com as

mudanças, com o que se está além das imagens; uma maneira de apostar no outro.

De trilhar um caminho que é sem imagem, porque “caminhante, não há caminho, o

caminho se faz com o caminhar.” (MORIN, 2000).

22

CAMINHOS, ENCONTROS E DESCOBERTAS

É difícil defender, só com palavras, a vida, ainda mais quando ela é esta que vê, Severina: mas se responder não pude a pergunta que fazia, ela, a vida, a respondeu com sua presença viva; vê-la desfiar seu fio, que também se chama vida, ver a fábrica que ela mesma, teimosamente, se fabrica.

(João Cabral de Melo Neto)

A trajetória da educação especial em minha vida não se diferencia muito

daquela experimentada pela grande maioria das pessoas com quem convivi no meio

acadêmico. Chamava-me a atenção, desde o antigo primário, as salas de aula que

eram nomeadas como as salas dos alunos que não aprendiam.1.

Desde minha infância convivi com parentes e amigos portadores de

deficiência que, diferente da lógica da escola que os condenavam ao lugar de

incapazes, insistiam em comprovar o contrário no cotidiano. Na prática, a escola se

transformou para muitos desses em uma instituição onde sentimentos de esperança

e de frustração vivem lado a lado. A partir dessa constatação, a questão da

educação dos portadores de deficiência passou a ser um empenho na minha vida.

Como se dá a educação de quem, supostamente, não aprende? Percebi na minha

vida acadêmica que, o que o perturba não são as coisas, mas suas opiniões sobre

as coisas. Acredito que existe uma diversidade na maneira de encarar a relação do

homem com a realidade, pois na verdade, cada apreciação revela um aspecto,

projeta uma face, deforma de um jeito, o que insinua crenças, delineia pontos de

vista, revela intenção.

1 Isso porque, na cidade de Bom Despacho, na década de 70, os alunos que apresentassem diagnóstico de atraso significativo no processo de aprendizagem tinham como certa a colocação nas classes especiais na escola regular. Essas classes ficavam discretamente localizadas nas salas nos fundos dos corredores das escolas. Maior aprofundamento, sobre as Classes Especiais em Bom Despacho, será dado no Capítulo 4, no tópico A EDUCAÇÃO ESPECIAL E O ESPECIAL DA EDUCAÇÃO EM BOM DESPACHO, p. 111 e seguintes.

23

Ingressei em 1987 no curso de Psicologia da PUC MINAS acreditando que

poderia encontrar respostas para esta questão. Imaginava que, entendendo o

funcionamento psíquico do ser humano e o seu processo de desenvolvimento,

poderia encontrar respostas para tais questionamentos.

A preocupação com a temática da educação dos que apresenta necessidades

educacionais especiais sempre me marcou, desde o tempo de estudante. Ao refletir

sobre a minha formação acadêmica, constato que nos meus primeiros trabalhos, de

maneira singular e crucial, a questão da inclusão escolar sempre estava presente,

tendo em vista que, inclusão escolar não é apenas acesso ao ensino regular.

Julgo que, por ter na família pessoas portadoras de deficiência, ao buscar

estágio no 3º Período de Psicologia, em 1988, a minha preferência recaiu sobre

crianças com significativo atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (ADNPM), da

Creche São Geraldo, no Alto Vera Cruz, Bairro de Belo Horizonte. No 4º período fui

convidada a trabalhar em atendimento psicopedagógico com crianças e

adolescentes que estudavam em escolas do ensino regular e apresentavam

necessidades educacionais especiais, nas antigas clínicas da Legião Brasileira de

Assistência (LBA). No ano de 1989 realizei estágio na educação infantil, em escola

de ensino regular, fazendo acompanhamento psicopedagógico de uma criança

portadora de deficiência visual. O contato com os profissionais do Instituto Hilton

Rocha possibilitou a abertura de novos caminhos para lidar com a questão:

deficiência e processo de ensino-aprendizagem.

Mazzota (1996) afirma que a educação tem como princípio fundamental a

capacidade do ser humano, que é ilimitada quanto a qualquer tentativa de previsão.

Nesse sentido, é impossível antecipar e indicar com precisão as possibilidades de

cada um. Entendo que os educadores que vivenciam a educação dos alunos

24

portadores de deficiências sabem que as necessidades educacionais especiais são

específicas para cada aluno e que cabem à escola intervenções capazes de lhes

proporcionar o acesso ao conhecimento. Importante ressaltar que nem toda pessoa

com deficiência apresenta necessidades educacionais especiais.

A preocupação com esse tema e o meu envolvimento com a questão foi se

configurando de tal modo que terminei nela me concentrando. Em 1990, em estágios

na disciplina de Psicologia Escolar - Problemas da Aprendizagem e de

Psicopatologia Geral 2 colocaram-me a frente com as formas de exclusão mais

degradantes que, até então, testemunhei. Foi nesses estágios que percebi na “pele”

minha opção pela educação das pessoas com necessidades educacionais

especiais, como atividade profissional.

Sempre com a preocupação de buscar o máximo de eficácia nos projetos

desenvolvidos nos estágios, havia alguns aspectos que me incomodavam

sobremaneira, a saber: a impossibilidade de oferecer atendimento à grande

quantidade de portadores de deficiência que nos procuravam; a dificuldade para

encaminharmos os casos não elegíveis, principalmente os “multi-deficientes”

carentes, frente à carência de instituições especializadas naquela época,

especialmente nos locais mais distantes e pobres; as dificuldades dos pais em

lidarem com seus sentimentos e enfrentarem a sociedade com seu filho “diferente”; a

segregação que impúnhamos à população atendida por não conseguir lidar de

maneira contundente com as barreiras à participação criadas pela sociedade e as

suas instituições.

2 O estágio da disciplina de Psicologia Escolar - Problemas da Aprendizagem foi realizado no Centro Educacional “Paulo Campos Guimarães”, extinta Fundação do Bem Estar do Menor (FEBEM), na região do Barreiro de Cima, em Belo Horizonte. E os estágios de Psicopatologia Geral foram feitos no Hospital Psiquiátrico Raul Soares (no Bairro Santa Efigênia, Belo Horizonte) e no Hospital Espírita André Luiz (no Bairro Salgado Filho, região oeste de Belo Horizonte),

25

A partir de todas essas vivências, compreendi que a modificação da realidade

socialmente construída pelos homens só pode se efetivar a partir de uma visão

crítica. Oliveira (2004a) considera que numa política de atendimento ao deficiente

faz-se necessário desvelar os reais papéis que a educação especial tem cumprido

em nossa sociedade: muitas vezes tem servido mais para a manutenção da

população deficiente no âmbito do assistencialismo, sendo esse entendido como a

antítese do direito ao exercício da cidadania.

No ano de 1994 comecei a trabalhar na Associação de Pais e Amigos dos

Excepcionais (APAE-BD) de Bom Despacho, que abriga a escola de ensino especial

“Paulo Campos Guimarães”. Fundada no ano de 1982, caracteriza-se por ser uma

entidade filantrópica que atende portadores de deficiência do município, incluindo a

zona rural, com a finalidade de oferecer-lhes “recursos básicos para seu

desenvolvimento global, integração educacional e social”. Desde a sua fundação,

em 1982, a APAE-BD vem demonstrando crescimento, buscando libertar-se do

caráter clínico-patológico da deficiência.

Na vivência do cotidiano da APAE-BD, no período de 1994 a 2001, foi

possível juntamente com a equipe de profissionais e a comunidade escolar,

desenvolver projetos baseados no princípio democrático da educação para todos,

que se evidencia nos sistemas educacionais que se especializam em todos os

alunos, não apenas em alguns deles, os alunos com deficiência.

Constatei que a inclusão escolar como conseqüência de uma educação de

qualidade para todos os alunos, provoca e exige da escola novos posicionamentos e

é um motivo a mais para que o ensino se modernize e para que políticas públicas

educacionais atuem em consonância com a idéia de que a inclusão escolar é uma

26

proposta que implica no esforço de atualização e reestruturação das condições

atuais da maioria de nossas escolas de nível básico.

No ano de 1995, após denúncias nos meios de comunicação sobre a situação

absurda constatada no Centro Educacional “Antônio Carlos” (CEAC) em Bom

Despacho3, de desrespeito à pessoa humana, foi proposto um projeto de trabalho

que não se detivesse na deficiência em si, mas sim nas possibilidades e

capacidades de aprendizagem que a população apresentava. Fui convidada, em

1996, compor a equipe de profissionais responsáveis pela elaboração e execução

desse novo projeto. Na realidade encontramos um lugar de indivíduos segregados

onde cada interno foi submetido a um longo e agressivo período de estadia,

inclusive em decorrência de toda a conhecida precariedade que o Estado lida com

esse tipo de entidade.

Foram elaboradas propostas que procuraram viabilizar meios de ampliação

dos contatos sociais de cada interno, proporcionando a inserção do educando na

comunidade e na sua família, quando possível, e no mercado de trabalho; ainda

intervenções de ordem educacional, respeitando as individualidades.

Envolvi-me profundamente pelo clima de conquista de direitos dos portadores

de deficiência aos projetos desenvolvidos nessas duas instituições, APAE e CEAC,

pois apontavam para a proposta desafiadora da inclusão escolar e social,

objetivando proporcionar aos seus alunos a formação necessária ao

desenvolvimento de suas potencialidades, auto-realização, preparação para o

trabalho e inclusão na sociedade em que vivem e convivem. Observava, porém que,

apesar de todos os esforços, a oferta de educação especial parecia responder mais

3 O CEAC abrigava nesse período uma população estritamente masculina, portadores de deficiências, em regime de abrigo, de faixa etária entre 22 a 54 anos e estava vinculada à Secretaria de Estado do Trabalho Ação Social da Criança e do Adolescente de Minas Gerais – SETASCAD. Maiores detalhes ver Capítulo 4, p.106 e seguintes.

27

ao processo de marginalidade do que à oferta de oportunidades educacionais. A

partir daí percebi que era necessário buscar estudos que favorecessem práticas que

produzissem maiores e melhores efeitos.

Em 1999, fiz o curso de Pós – Graduação em Psicopedagogia com ênfase na

educação especial, no Instituto de Educação Continuada da PUC Minas (IEC). Como

herança desta especialização restou uma forte preocupação com as políticas

públicas de educação inclusiva de Bom Despacho. Comecei a analisar tais políticas

e, mais uma vez, via confirmadas algumas de minhas suspeitas: o município não

vinha respondendo ao princípio fundamental de acesso aos bens e serviços sociais.

Se considerarmos o acesso ao conhecimento básico, os resultados deixavam a

desejar, porque a maioria dos portadores de deficiência não havia ultrapassado os

níveis iniciais de escolaridade e um número irrisório de deficientes estava

incorporado ao ensino regular com resultados desastrosos.

Em 2001 iniciei, também, um trabalho junto com a equipe do Núcleo de

Atenção à Saúde Mental de Bom Despacho (NASM/BD) e priorizei na minha

proposta de trabalho o atendimento de crianças e adolescentes com transtorno

mental4, principalmente os que apresentavam dificuldades de permanência nas

instituições educacionais.

No NASM/BD, a conquista por uma compreensão mais abrangente do

atendimento às pessoas com necessidades educacionais especiais levou-me a

apoiar todos os projetos desenvolvidos pela equipe na lógica da inclusão, buscando

ampliar os limites da tolerância social para com a deficiência e a doença mental que,

vistas como desvantagem, torna o outro ainda mais desigual, inferior.

4 Segundo Ey (1981), o termo transtorno mental ou “doença mental” engloba um amplo espectro de condições que afetam a mente. Transtorno mental provoca sintomas tais como: desconforto emocional, distúrbio de conduta e enfraquecimento da memória. Algumas vezes, doenças em outras partes do corpo afetam a mente; outras vezes, a mente pode desencadear outras doenças do corpo ou produzir sintomas somáticos.

28

O trabalho nesse Núcleo proporcionou-me a abertura para a seguinte

reflexão: sendo o homem um animal que tem sua existência na sociedade, os

movimentos para afastá-lo dessa sociedade provocam e aumentam seu sofrimento,

visto que ele não existe fora dela. Condenar alguém a estar fora da convivência com

os outros não pode significar tratamento. A isso se chama: violência, intolerância,

discriminação e exclusão. O que se espera diante de situações como essas, creio

eu, é que sejamos infinitamente convocados e reconvocados a negociar e afirmar a

manutenção da presença do homem na vida social e o princípio de que a diferença é

o que nos torna radicalmente iguais.

Em 2002, ao fazer as disciplinas isoladas de Políticas Públicas Educacionais

e Filosofia da Educação, no programa de Mestrado em Educação da PUC MINAS,

decidi buscar esse Programa para melhor investigar, analisar, compreender e

contribuir para ampliar o entendimento de construção das políticas públicas de

educação inclusiva de pessoas com necessidades educacionais especiais na rede

regular de ensino.

NO MESTRADO

Quando falamos de Gabriela, tenho muito a dizer. Não propriamente sobre Gabriela, mas em torno.

(JORGE AMADO)

Ingressei no Mestrado em Educação da PUC Minas em 2003 e depois de um

longo percurso por caminhos teóricos o objeto de pesquisa foi sendo construído e

decidi, na linha de pesquisa “Educação, Cotidiano e Diferença Cultural”, analisar a

produção de sentidos e significados produzidos no cotidiano de uma escola da rede

29

estadual regular de ensino na cidade de Bom Despacho, Minas Gerais, procedentes

de ações educativas inclusivas que têm como eixo o convívio com alunos com

necessidades educacionais especiais e a educação que aconteça no contato entre

seres humanos que se apóiem mutuamente como aprendizes ativos, dinâmicos e

recíprocos.

Sem deixar de lado o necessário aprofundamento na compreensão das

políticas públicas educacionais voltadas à inclusão escolar, percebi que era da

mesma forma importante ultrapassar esse entendimento e me aproximar

concretamente de como a proposta da inclusão acontecia na escola. Em uma

escola, pelo menos.

Por quê? Por intuir que os alunos com deficiência no cotidiano escolar

poderiam estar sendo tratados desigualmente no sentido da elaboração de

representações sobre o outro, com o risco de produzir sentimentos de rejeição e

discriminação entre as pessoas que significassem a deficiência como inferioridades

em relação à superioridade de um outro não deficiente.

Em síntese, algumas questões deveriam ser respondidas: processos de

inclusão escolar como os exigidos nos documentos normativos, quando vistos lá

onde as leis devem ser corretamente interpretadas e orientar ações e

representações, estavam efetivamente possibilitando processos sociais e culturais

de inclusão? Inclusão pensada como o entendimento da diferença (física e mental)

como traços biológicos que, na interação com o aprendizado cultural e vice-versa,

são partes da natureza humana. Portanto, como expressões que deveriam ensejar a

comunicação e a convivência e não o estranhamento e o isolamento. Ou,

paradoxalmente, experimentar a convivência com o deficiente, não estaria

30

traduzindo a deficiência em diferença que impede a convivência entre iguais seres

humanos?

CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA

Revendo a evolução histórica do atendimento educacional à pessoa com

deficiência constato que a área denominada de educação especial expandiu-se no

Brasil com a criação de entidades filantrópicas assistenciais e especializadas

destinadas à população das classes menos favorecidas. Hoje, ao contrário, buscar

uma sociedade e uma escola inclusivas é lutar, antes de tudo, por uma sociedade

isenta de preconceitos de qualquer ordem.

A questão da exclusão/inclusão social tem sido debatida com freqüência,

tanto no campo da educação, como em outros relativos às ciências sociais. Nesses

debates a escola é vista como uma das instituições que poderia quebrar com muitos

tabus, mas, ao contrário, ela tem sido permeada de preconceitos e juízos prévios

sobre os alunos e suas famílias. Nessa perspectiva, soma-se à minha preocupação,

neste estudo, entender como no cotidiano escolar, a individualidade e a

personalidade das pessoas são ou não respeitadas e levadas em conta.

Sabe-se que a vida cotidiana é heterogênea e hierárquica, e o homem já

nasce inserido em sua cotidianidade. Com o amadurecimento, ele adquire todas as

habilidades para a vida cotidiana da sociedade. Esse amadurecimento começa

sempre nos grupos. Mas, muitas vezes, a pessoa com necessidades educacionais

31

especiais é privada deste convívio em grupos, sendo segregada, excluída da

sociedade por causa das suas diferentes limitações.

Heller (1970, p. 20) enfatiza que a vida cotidiana está no centro do acontecer

histórico: é a verdadeira essência da substância social. E o indivíduo é sempre um

ser particular e genérico, simultaneamente, não se devendo esquecer disso no

cotidiano escolar.

A história recente da pesquisa educacional no Brasil, segundo Patto (1999),

tende a se configurar no abandono da quantificação em nome de procedimentos

não-estatísticos e qualitativos de coleta e análise de dados, apesar de não ser

garantia não-positivista da metodologia5. A adoção aos métodos da Antropologia tem

sido um dos recursos mais freqüentes dos estudos do/no cotidiano. No referencial da

sociologia da vida cotidiana, segundo Caldeira (20036, elaborada por Heller (1970), a

análise da realidade investigada vai além da mera descrição da rotina das práticas

sociais, em geral, e das relações interpessoais, em particular, mas Trata-se de uma

investigação ampla, que focaliza aspectos da vida social menosprezados pelos

filósofos ou arbitrariamente separados pelas ciências sociais (PATTO, 1999, p.181),

na qual estes aspectos são agrupados, não arbitrariamente, mas segundo uma

teoria e conceitos determinados.

Ao afirmar a intenção de analisar aspectos desta parte da vida social, a

cotidianidade da escola, de acordo com a etnografia, recusa-se a possibilidade de

separação entre descrição e interpretação, uma vez que, o trabalho etnográfico

implica em preocupar-se com uma análise holística ou dialética da cultura em foco.

5 O fato de “desquantificar” a pesquisa não basta para “despositivá-la”, uma vez que procedimentos quantitativos e qualitativos, segundo Patto (1999c) não guardam qualquer relação com a filosofia positivista e a filosofia da totalidade; da mesma forma, a simples participação dos sujeitos da pesquisa em seu planejamento e execução não garante sua coerência metodológica com essa última. 6 CALDEIRA, Anna Maria Salgueiro. Estudos do Cotidiano Escolar. Belo Horizonte: PUC Minas, 2003. Notas de aula.

32

O que implica em introduzir os atores sociais com uma participação ativa e dinâmica

e modificadora das estruturas sociais; preocupar-se em revelar as relações e

interações significativas de modo a desenvolver a reflexividade sobre a ação de

pesquisar. Fato que, no entendimento de pesquisadoras como Ezpeleta & Rockwell

(1986), significa afirmar que o estudo de uma unidade escolar não configura um

“estudo de caso”, mas “um estudo sobre o caso”. Esclarece Patto:

É isto que Rockwell (1986) quer dizer quando afirma a necessidade de realizar estudo da vida cotidiana escolar de posse de uma teoria social na qual a definição de “sociedade” seja aplicável a qualquer escala de realidade (entre elas, a sala de aula e a escola) e de reconhecer os processos educacionais como parte integrante de formações sociais historicamente determinadas. (PATTO, 1999, p. 182)

Ezpeleta & Rockwell ao desenvolverem importantes estudos em escolas

rurais do México, na década de 1980, percebem a escola como uma instituição

sociocultural, organizada e pautada por valores, concepções e expectativas, onde os

alunos, os professores, a direção, os pais e a comunidade são vistos como sujeitos

históricos. Portanto, ela deve ser compreendida sob a ótica de sua cotidianidade, em

sua singularidade. Compreende-se, que, é a partir do seu cotidiano que a escola se

constrói e é com base nele que se estabelecem as representações daqueles que

estão envolvidos com o contexto escolar: representações sobre si mesmas e sobre o

mundo. Maia (2004) aponta em seus estudos que,

Finalmente, os estudos destas autoras evidenciaram que na vida cotidiana da escola, apesar do componente de reprodução e alienação em que diferentes indivíduos se encontram imersos e presos, contém, também como indica Heller e Certeau, espaço e condições para que estes indivíduos saiam da dimensão cotidiana e alcancem a dimensão não-cotidiana, ou seja, transformem-se em sujeitos reflexivos e capazes de elaborar saberes e estratégias. (MAIA, 2004, p. 68)

33

Nessa perspectiva é que busquei desvendar as manifestações explícitas ou

sutis da exclusão/inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais nos

espaços sociais, especialmente na escola. Decidi pela opção metodológica que se

situa no âmbito da investigação qualitativa e se configura, em sua totalidade, como

um estudo de caso. Procedimento esse que me permitiu fazer uma pesquisa de

cunho qualitativo, utilizando o Estudo de Caso e aplicando-o em uma escola da rede

estadual regular, na cidade de Bom Despacho, Minas Gerais.

Segundo Lüdke e André (2000), pesquisa qualitativa é a que se desenvolve

em uma situação natural e rica em descrição, tem um plano aberto e flexível e

focaliza a realidade de uma forma complexa e contextualizada. Esse método, assim

como os demais métodos qualitativos, é útil quando o fenômeno a ser estudado é

amplo e complexo, onde o corpo de conhecimentos existente é insuficiente para

suportar a proposição de questões causais e nos casos em que o fenômeno não

pode ser estudado fora do contexto onde naturalmente ocorre, esclarece Bonoma

(1991).

Os instrumentos de pesquisa utilizados foram definidos concomitantemente à

construção do problema e à construção metodológica. Utilizei a pesquisa

bibliográfica; consulta documental; pesquisa exploratória; depoimentos e a

observação sistemática no cotidiano da Escola.

A literatura sobre observação7, técnica fundamental usada na maioria das

pesquisas qualitativas, afirma Vianna (2003a), apresenta diferentes concepções de

observação e do papel do observador. Se for levado em conta o tipo de estrutura,

classifica-se a observação, de acordo com o meio em que a mesma tem lugar como

natural ou artificial (laboratório, sala especial). De acordo com o grau de estruturação

7 O referencial teórico usado sobre a Metodologia da Observação que se segue baseia-se nos estudos de Vianna (2003b), Selltiz (1967), dentre outros.

34

imposto pelo observador, determina-se a observação como estruturada (que procura

determinar a freqüência com que um comportamento ocorre ou certas coisas são

ditas) e como não-estruturada, na qual o observador não procura um comportamento

específico, mas apenas observa e registra as diferentes ocorrências.

Do ponto de vista teórico, considera-se que cada um dos dois tipos de

observação, pode ser concretizado como observação participante (o observador é

parte da atividade objeto da pesquisa) ou não-participante (o observador não se

envolve nas atividades do grupo sob observação e não procura ser membro do

grupo). Uma observação pode ser “aberta”, quando o observador é visível aos

observadores que sabem que estão sendo sujeitos de uma pesquisa, ou “oculta”

quando os observados não sabem que estão sob observação.

As observações totalmente estruturadas ocorrem em laboratórios. As

observações de campo nos trabalhos de pesquisa em educação são, em geral,

semi-estruturadas, “têm lugar em contexto natural e, na maioria das vezes, não

procuram dados quantificáveis, que apenas eventualmente são coletados”.

(VIANNA, 2003, p. 21). O autor esclarece:

A observação não-estruturada consiste na possibilidade de o observador integrar a cultura dos sujeitos observados e ver o “mundo” por intermédio da perspectiva dos sujeitos da observação e eliminando a sua própria visão, na medida em que isso é possível, segundo ressalta Bailey (1994). A questão inicial que se coloca é: O que observar? E nem sempre é fácil dar uma resposta plenamente satisfatória nos momentos iniciais do trabalho. (VIANNA, 2003, p. 26).

A opção metodológica nessa pesquisa foi a observação semi-estruturada e

seletiva, que consiste na observação e descrição dos eventos determinados em

função do problema de pesquisa. Vianna (2003) ressalta que observar tudo ao

mesmo tempo é humanamente impossível, pois o pesquisador vai se deparar com

35

uma multiplicidade de estímulos oriundos do universo da escola. Por isso foi vital

que me concentrasse nos elementos que realmente eram imperativos para

interpretar e colocar em relevo discussão sobre os sentidos e significados

produzidos por alunos e professores a respeito da inclusão/exclusão e

diferença/deficiência no cotidiano de uma escola que atende alunos com

necessidades educacionais especiais.

Vianna (2003) destaca, de maneira resumida, baseando-se em vários autores

como Creswell (1998), Flick (1999), Bailey (1994), as diferentes fases do processo

de observação:

Seleção de um “cenário”, ou seja, estabelecer o local onde e quando as pessoas envolvidas no processo podem ser observadas;

Definição do que vai ser documentado na observação e em que casos, ou seja, identificar quem ou o que observar, quando e por quanto tempo;

Treinamento de observadores para fins de padronização dos procedimentos e determinar, inicialmente, as funções do observador;

Observações descritivas e reflexivas que ofereçam uma apresentação geral do campo observado; planejamento e a metodologia do registro das anotações de campo;

Destaque das observações que contenham aspectos relevantes para as indagações da pesquisa; registrar aspectos, como descrição dos informantes, contexto físico, eventos e atividades particulares, e as próprias reações do observador;

Observações seletivas que pretendam, intencionalmente, compreender aspectos centrais;

Durante a observação, se for observador externo, apresentar-se, apresentar-se, estabelecer relações amistosas, iniciar com objetivos restritos nas primeiras sessões de observação;

Término da observação quando a mesma atingiu um ponto de saturação teórica, ou seja, outras observações não proporcionariam mais nenhum conhecimento;

Após a observação, informar aos interessados sobre o uso dos dados e a disponibilidade do estudo. (VIANNA, 2003, p. 28-29).

Para tanto, no contexto escolar, nessa metodologia, a seleção prévia do

centro de atenção ou dos aspectos a enfocar foi importante para que a observação

não se fixasse em aspectos menos relevantes em detrimento de outros

36

fundamentais para atingir os objetivos desta pesquisa. A atenção seletiva8 fez parte

da metodologia de trabalho, porém o cuidado em não me concentrar apenas naquilo

que pudesse ser conveniente foi tomado, para não correr o risco da investigação se

converter apenas em justificativas de minhas formulações e opções teóricas.

No que se refere às notas de campo, preferi, além de utilizar um bloco de

notas grande, com margens largas dos lados para minhas anotações. Tais margens

permitiram o destaque de observações particulares sobre aquilo que foi do meu

interesse, escrever notas analíticas, ou escrever anotações sobre um evento ou

relação para investigação mais profunda, ou ainda, outras leituras sobre o

observado. Muitas anotações foram feitas no momento da observação, outras

imediatamente à saída do campo. Acredito que, o tempo despendido com o campo

foi fator importante para o empreendimento da pesquisa. Pois proporcionou maior

familiaridade com a linguagem do meio social investigado, intimidade com

cotidianidade vivida por esse, o que impôs uma constante reflexão sobre os

caminhos e os resultados obtidos durante a investigação.

Vianna (2003) salienta que existe sempre uma atividade interpretativa

associada ao ver, ao ouvir e aos demais sentidos. É preciso estabelecer que os

significados produzidos pelo homem sejam construídos nas relações sociais, por

isso passíveis de serem interpretados. O autor acentua que o “objetivo final de uma

observação participante é dessa forma gerar verdades práticas e teóricas sobre a

cultura humana com apoio nas realidades da vida diária”. (VIANNA, 2003, p. 51).

Com o objetivo de buscar o desvelar dos sentidos emanados nas falas e

gestos de alunos e professores, é que desenvolvi este trabalho. Sem a pretensão de

8 Para Caballo (2003), entende-se por atenção seletiva a capacidade de atentar seletivamente para informações relevantes à despeito de estímulos distratores, ou seja, identificar e isolar dados relevantes a partir da massa de informações sensoriais disponíveis.

37

aprofundar apresentei algumas falas e recortes da vida cotidiana da escola

buscando aplicar o referencial teórico da Análise do Discurso (AD)9. As análises

foram realizadas com a intenção de identificar as posições de sujeito e os

significados manifestados por alunos e professores sobre a inclusão escolar que

emergem e/ou se entrecruzam nesses pronunciamentos, manifestando sentidos

diversos.

A metodologia da análise do discurso, segundo Mari (2004) 10 implica buscar

bases epistemológicas e conceituais que indiquem caminhos para a apreensão dos

fenômenos estudados. Uma metodologia voltada especialmente à analise qualitativa

e baseada nos princípios da concepção múltipla da realidade, que busca as relações

e correlações, que interrogue sobre a intencionalidade das ações e leve a uma

pesquisa participante, apreende mais a realidade e aproxima-se mais do real.

Identifica-se quem discursa de onde, quais as contradições inseridas nos

discursos, falas e ações, que realidades produzem suas diferenças, as relações e

interações dos discursos, em uma dada realidade social. Orlandi (2000) lembra que,

[...] os estudos discursivos visam pensar o sentido dimensionado no tempo e no espaço das práticas do homem, descentrando a noção de sujeito, relativizando a autonomia do objeto da lingüística. Não trabalha com a língua fechada nela mesma, mas com o discurso que é um objeto sócio-histórico em que o lingüístico intervem apenas como pressuposto. (ORLANDI, 2000, p. 16).

9 Em oposição aos estudos lingüísticos conhecidos e que se ocupavam, principalmente com a ordem da língua e seus significantes, emerge, por volta dos anos 60, a Análise do Discurso (AD). Até então, a supremacia do racionalismo do Pensamento Cartesiano (Descartes), se fazia presente nos estudos científicos da época. A concepção de sujeito e de linguagem, de acordo com estes princípios, se mesclava em uma teoria da transparência, onde o sujeito - "ser universal", concluso, psicológico, calculável e descritível se constituía por uma linguagem também transparente. Durante a segunda metade do século XIX, com a contribuição da Psicanálise, entre outras ciências, as noções de sujeito e de linguagem deixam de ser as mesmas, pois o "ser universal" passa a ter um inconsciente agindo sobre o consciente, o que lhe fornece o caráter da não transparência e da incompletude do sujeito da linguagem. Partindo dos princípios da não transparência dos sujeitos e dos discursos, a Análise do Discurso vai se ocupar com o que está "por de trás" dos enunciados e vai buscar no ideológico a relação entre o "dito" e o "não dito", a partir das posições de sujeito ocupadas pelos indivíduos, na sociedade. 10 MARI, Hugo. Análise do Discurso. Belo Horizonte: PUC Minas, 2004. Notas de aula.

38

Mari (1999) enfatiza que na análise do discurso propõe-se a construir escutas

que permitam levar em conta esses efeitos e explicar a relação desse saber com a

realidade, uma análise que não se aprende não se ensina, mas que produz seus

efeitos. Na AD o imaginário, os signos, as imagens são produzidas de forma

relacionada com o modo como as relações sociais se inscrevem na história e são

regidas por meio de relações de poder. Araldi (2003) afirma que o discurso revela as

representações e ideologias, permeadas pela linguagem que são também

temporais. Segundo Orlandi,

O sentido não existe em si, mas é determinado pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-histórico em que as palavras são produzidas. As palavras mudam de sentido segundo as posições daqueles que as empregam. Elas tiram seu sentido dessas posições, isto é, em relação às formações ideológicas nas quais essas posições se inscrevem. (ORLANDI, 2000, p. 42-43)

Como afirma Brandão (1994), todo discurso coloca em jogo uma formação de

sentidos e esses são regulados socialmente, de modo que a mesma expressão ou

gesto produz sentidos diferentes, segundo quem enuncia e/ou a posição que ocupa,

uma vez que o sentido não se depreende da materialidade discursiva, mas de uma

série de relações a serem estabelecidas entre o enunciado, seu enunciador e o

amplo contexto que envolve a enunciação.

As diferentes formas de perceber o ambiente escolar provocam uma reflexão

sobre as diferentes concepções de linguagem que pairam sobre esse mesmo

ambiente. Segundo Krause-Lemke (2004), em linhas gerais, essas concepções

estão resumidas em três correntes: a saussuriana, a chomskiana e a bakhtiniana.

Na primeira, de caráter estruturalista, sustenta-se que a linguagem é um

conjunto de signos ordenados, dos quais se pode abstrair um sentido. A língua para

39

Saussure11 (2001), é sistemática, objetiva e homogênea. Tal visão de linguagem

concentra-se na sentença e exclui qualquer matiz ideológico que possa fazer parte

da linguagem, ou melhor, da sentença comunicada. Em relação à segunda, a língua

é caracterizada como um componente inato, fruto da faculdade da linguagem. Para

Chomsky (1980)12, cada sujeito já nasce com um sistema lingüístico (o que ele

chama de Gramática Universal – GU), que é ativado por um input, caracterizado pela

fala a que o sujeito está exposto. Quanto à terceira, de caráter dialógico, a

linguagem é construída num processo interacional. O indivíduo, baseando a sua

análise no enunciado13, abstrai as informações lingüísticas e os significados de

acordo com o momento da interação. Assim, o mesmo enunciado, em contextos

comunicativos distintos, expressará diferentes significados. Para Bakhtin14 (1999), a

linguagem constrói-se num processo de interação em que os sentidos são sócio-

historicamente atribuídos.

Orlandi (2000) nos ensina que uma das condições de produção, que

constituem os discursos, é a relação de sentidos. Segundo essa noção, não há

discurso que não se relacione com outros. Em outras palavras, os sentidos resultam

11 Ferdinand de Saussure (1857-1913), lingüista suíço, fundador da análise estruturalista. Criou muitos desenvolvimentos da lingüística no século XX. Entendia a lingüística como um ramo da ciência mais geral dos signos, que ele propôs fosse chamada de Semiologia (lingüística). Saussure procurou entender a estrutura da linguagem como um sistema em funcionamento em um dado ponto do tempo. Para ele, "Um signo é a unidade básica da língua. Toda língua é um sistema completo de signos. A fala é uma manifestação externa da língua." Ele também fez importante distinção entre as relações sintáticas e as relações paradigmáticas que existem em qualquer texto (MARI, 2004). 12 Noam Avram Chomsky nasceu na Philadelphia em 1928. Estudou lingüística, matemática e filosofia. A teoria de Chomsky discute que os meios para adquirir uma língua é inata em todos os seres humanos e são provocados tão logo um "infante" começa aprender os princípios básicos de uma língua (MARI, 2004).

13 Conforme Souza (1995, p. 21) “[Enunciado] são os elementos lingüísticos produzidos em contextos sociais reais e concretos como participantes de uma dinâmica comunicativa”. 14 Mikhail Mikhailovich Bakhtin (1895 - 1975) foi um lingüista russo. Seu trabalho é considerado influente na área de teoria literária, crítica literária e semiótica. Bakhtin é na verdade um filósofo da linguagem e sua lingüística é considerada uma "trans-lingüística" porque ela ultrapassa a visão de língua como sistema. Para Bakhtin, não se pode entender a língua isoladamente, mas qualquer análise lingüística deve incluir fatores extra-lingüisticos como contexto de fala, intenção do falante, a relação do falante com o ouvinte, momento histórico (MARI, 2004).

40

de relações: um discurso aponta para outros que o sustentam, assim como para

dizeres futuros. Todo discurso é visto como um estado de um processo discursivo

mais amplo, contínuo. Não há, desse modo, começo absoluto nem ponto final para o

discurso. Um dizer tem relação com outros dizeres realizados, imaginados ou

possíveis.

Além de lidar com a questão conceitual, observações, indagações e reflexões

ao longo da minha vida acadêmica e profissional, principalmente no Mestrado e no

convívio com pessoas com necessidades educacionais especiais, constituíram-se

em inspiração das principais abordagens deste estudo investigativo. O estudo foi

organizado em duas partes, distribuídas em cinco capítulos.

Na Primeira Parte abordei concepções, cunhadas pela cultura no decorrer do

Século XX e nos primeiros anos do Século XXI, acerca da educação geral e da

Educação Especial, o que permitiu discutir os conceitos de exclusão e inclusão no

cotidiano escolar, possibilitando assim, analisar as políticas públicas educacionais

que exploram as características de universalização e democratização da educação,

sua evidência ou não nas políticas públicas educacionais endereçadas aos que

apresentam necessidades educacionais especiais, pós-promulgação da nossa mais

recente Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96).

Ao longo dessa parte procurei evidenciar os avanços recentes, apresentados

em estudos sobre os desafios da inclusão escolar, como também articular uma

construção a respeito da educação para analisar e compreender os sentidos e

significados produzidos no cotidiano de uma escola regular com a presença e

permanência de alunos com necessidades educacionais especiais. Pesquisei a

presença de idéias implícitas em alguns conceitos que amparam e norteiam estudos

sobre a inclusão escolar, nos quais encontrei respaldo para pensar sobre as

41

concepções construídas historicamente de “normal e anormal”, “igualdade e

diferença”, “inclusão e exclusão”.

Na introdução, busco discutir a pertinência de debater e discutir sobre a

inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais na rede regular de

ensino. Recorro a minhas observações e reflexões ao longo de uma experiência

acadêmica e profissional com o intuito de compreender os sentidos e significados

produzidos no cotidiano dessa escola comum por alunos e professores. Apresento

os recursos metodológicos que possibilitaram a realização do trabalho empreendido.

No segundo capítulo, que denominei “Educação Especial na História”, tive

como propósito refletir a respeito da evolução histórica da educação especial

brasileira. Parti da exclusão dos alunos com deficiência em instituições

especializadas de cunho eminentemente terapêutico até chegar aos dias de hoje,

em que esta modalidade educacional propõe uma escola para todos, aberta às

diferenças e, conseqüentemente, inclusiva. O caminho percorrido é enfocado do

ponto de vista dos documentos legais, dos planos e políticas educacionais.

No terceiro capítulo, sobre “Cidadania e Políticas Públicas Para a Educação

Inclusiva”, busco trabalhar conceitos de cidadania que configuram novos e diferentes

cenários sociais, políticos e culturais presentes nas sociedades contemporâneas,

analisar e refletir acerca das principais contribuições teóricas de autores pertinentes

a abordagem. O caminho percorrido é enfocado do ponto de vista dos exames da

literatura recente sobre o tema, baseados na Filosofia Política, nas concepções de

cidadania e direitos do homem e o significado atual dessas definições em contraste

com o seu significado ideal. Uso como suporte o resgate histórico, a

problematização, também, o próprio conceito de “pessoas com necessidades

42

educacionais especiais”, tal como formulado no Brasil, e suas interfaces às próprias

políticas públicas destinadas a este grupo social.

No quarto capítulo parto das idéias implícitas em alguns conceitos que

amparam e norteiam estudos sobre deficiência, nos quais encontrei respaldo para

pensar sobre o tema “Deficiência como Diferença”, concepções cunhadas durante

séculos de história, pela mitologia, religiosidade e superstição, o que contribuiu

significativamente para que o foco fosse na deficiência, como impacto e desconforto

que gera no outro, e não na pessoa. Aqui, busquei trabalhar deficiência e diferença

em ícones, com a finalidade de repensar criticamente a educação e a escola como

sistemas culturais.

Na Segunda Parte da dissertação foi realizado um mergulho no cotidiano de

uma escola regular a fim de realizar uma abordagem interpretativa, crítica e dialética

de um tema tão complexo como inclusão escolar de alunos com necessidades

educacionais especiais no sistema regular de ensino, seus sentidos na ótica de

alunos e professores no cotidiano escolar.

No capítulo cinco, intitulado “Os Lugares da Pesquisa” preocupei-me em

resgatar a história da cidade (Bom Despacho), do bairro (Bairro de Fátima) e da

escola (Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”) para melhor compreender

como os conceitos de exclusão/inclusão foram construídos e difundidas

historicamente. Não se pode perder de vista que a história do passado dessas

comunidades é parte fundamental para se ter um perfil mais nítido do todo. Os

relatos foram baseados em fontes primárias, documentos, arquivos, livros, relatos,

projetos desenvolvidos na escola que foram úteis e necessários para se conhecer os

pormenores da vida cotidiana da escola, aquilo que os bom-despachenses fizeram e

fazem, num esforço poderoso de continuidade e sobrevivência.

43

O capítulo seis se constituiu como uma imersão no cotidiano da escola para

se compreender a rede de sentidos e significados, normas, valores, ideais e crenças

estabelecidos nos diferentes ambientes culturais de convivência produzidos, no

cotidiano escolar por alunos e professores com a presença de alunos com

necessidades educacionais especiais no ensino regular e que se configuram como

ethos específico.

O processo de análise foi realizado por aproximações, reconstrução analítica,

descoberta de novas maneiras de acercamento dos problemas, usa de recursos

metodológicos da análise de discursos dos atores. Segundo Tura (2000), certos

estudos terminam por ater-se a uma mera descrição das culturas e fogem à

interpretação e reflexão sobre elas. Contudo, necessário se faz reconhecer que

somos parte do mundo que estudamos, a idéia do caráter da reflexibilidade das

pesquisas sociais tem como implicação metodológica exatamente levar em conta as

interpenetrações entre o senso comum e a teoria social. Explica a autora:

Assim, ao invés de o pesquisador iludir-se em procurar eliminar os efeitos de sua presença no campo de investigação, o importante é buscar entendê-las. Afora isto, atentar para o fato de que, se desenvolvemos uma explicação do comportamento humano, essa deve também ser aplicada em nossas atividades como pesquisadores e na busca de estratégias de investigação. Vale nesse ponto lembrar da afirmação de Geertz de que estaremos sempre diante de uma versão dos fatos e de uma visão provisória e parcial dos acontecimentos. (TURA, 2000b, p. 19-20).

No cuidado de não identificar os sujeitos da pesquisa, fiz uso de siglas dos

nomes dos alunos, professores e funcionários. O tempo prolongado em que

permaneci no campo de investigação, os muitos momentos em que me senti

confusa, os imensos esforços para acompanhar uma dinâmica escolar, as relações

interpessoais que mantive, os interesses que fui adquirindo pelas coisas da Escola

44

Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” fizeram com que, ao final da pesquisa, eu

sentisse um grande carinho pela escola e sua gente.

Nas considerações finais procurei fazer exposições que a pesquisa me

permitiu de acordo com os objetivos propostos. Busquei retomar alguns dos sentidos

e significados que parecem circular em torno da questão da inclusão dos alunos com

necessidades educacionais especiais na escola regular e a discussão dos

significados produzidos na escola acerca dos termos deficiência e diferença. Meu

propósito foi pôr sob suspeita algumas naturalizações que foram feitas dessas

expressões de acordo somente com as imposições legalistas, para sugerir que

talvez se trate de um novo sistema ordenador da alteridade, de uma maneira de

querer reduzir o outro. E só uma maneira de assegurar-se da própria identidade, do

próprio olhar, da tediosa e estúpida mesmice. Enfim, com base nessas

considerações, comprova-se a urgência de se conceber uma educação para uma

sociedade inclusiva pautada em propostas de mudanças que busquem superar

preconceitos, barreiras e desenvolva assim, na escola e na sociedade, uma ação

mais coerente e comprometida com os novos paradigmas.

45

2. EDUCAÇÃO ESPECIAL NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

BRASILEIRA

A escola, enquanto instituição surgiu como uma tentativa de resguardar a

educação dentro dos parâmetros adequados e necessários ao fortalecimento e

ampliação da sociedade capitalista. Contida nos muros da escola, a educação seria

passível de um maior controle da classe dominante não só de seus objetivos, como

de sua organização (PARREIRAS, 1999). 15

A evidente relação entre escola e modo de produção capitalista significou, por

um lado, um grande avanço dentro das teorias educacionais que consideravam na

sua maioria, o espaço pedagógico neutro e apolítico, mas, por outro, justificou

atitudes descrentes frente à possibilidade de mudança.

A perspectiva de análise da escola, em termos de seu significado social e

político, devem-se fundamentalmente aos autores de inspiração marxista, bem como

as alternativas que acentuam basicamente esses aspectos. Gomes (1999) afirma

que as interpretações de Bourdieu e Passeron (1970), de Baudelot e Establet (1977)

são esforços para evidenciar e revelar o significado sociopolítico da escola

encoberta pela ideologia dominante. O que também pode ser visto em obras de

outros autores, como Freinet e Wallon16. Entretanto, este tipo de análise está

presente em autores que, sem fazer profissão de fé marxista, analisam as analogias

15 PARREIRAS, Arthur Gomes. Educação Especial. Belo Horizonte: PUC Minas, 1999. Notas de aula. 16 Sobre os autores ver: FREINET, Celestin; SALENGROS, R.. Modernizar a escola. Lisboa: Dinalivro, 1977 e MAHONEY, Abigail Alvarenga; ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. (Org.). Henri Wallon: psicologia e educação. São Paulo: Loyola, 2000.

46

educativas em termos de relações de poder e promovem alternativas em que a

liberação da opressão e da exploração é tão importante quanto a liberação da

ignorância e da falta de cultura17. O caso de Paulo Freire talvez seja o mais claro de

todos. 18

A análise do tipo de instrução que seria conveniente para cada classe social

em nome da nova psicopedagogia (respeito às diferenças individuais, às aptidões

inatas do aluno, às diferentes personalidades), que já encontra suas evidências

desde 1927, resultou na diversificação da apreciação das nossas realidades

educacionais. Defendia-se a expansão da instrução pública e a necessidade de se

diferenciar a escola para o atendimento de clientelas diferentes. Citando Arroyo:

Para as lideranças políticas e econômicas a linguagem é direta. Cada população deve ter um tipo de instrução, não por causa das diferenças psicopedagógicas no processo de ensino-aprendizagem, mas pelo destino que terão na diversificada estrutura sócio-econômica. (ARROYO, 1984, p.04).

Segundo Mazzotta (1996), a história da educação brasileira mostra que esta

foi centro de atenção e preocupação apenas nos momentos e na medida exata em

que dela sentiram necessidade os segmentos dominantes da sociedade. A

educação para as classes populares, portanto, foi sendo concebida à medida que

ela se tornou necessária para a subsistência do sistema dominante, pelo menos até

o momento em que se estruturaram movimentos populares que passaram a

reivindicar a educação como um direito.

17 Sobre a literatura acerca da análise sociopolítica da escola, ver PALÁCIOS, Jésus. Tendências contemporâneas para uma escola diferente. In. Cadernos de Pedagogia nº 51, março/1979. Ano V, Barcelona. 18 Segundo (Streck, 1999), Paulo Freire (1921-1997) destacou-se por seu trabalho na área da educação popular. As suas maiores contribuições foram no campo da educação popular para a alfabetização e a conscientização política de jovens e adultos operários. Sempre com o conceito básico de que não existe uma educação neutra: segundo a sua visão, toda educação é, em si, política.

47

Esse modelo de interpretação da história educacional fornece também os

elementos para o entendimento da história da educação especial. Considerando que

a abordagem histórica implica a consideração do movimento histórico da dinâmica

social. Kassar (2000) nos ensina que Vygotsky, em suas análises que tomam por

base a constituição social dos processos psíquicos do sujeito, assinala para a

relação implacável entre movimento e história. O repúdio do “olhar” estático leva-o a

dizer que “estudar alguma coisa historicamente significa estudá-la no processo de

mudança” (VYGOTSKY, 1984, p.74). É essa tendência que se pretende considerar: o

desenvolvimento de constituição de sujeitos na apropriação de práticas socialmente

instituídas e o processo da história social, a qual o sujeito está/é imerso/participante.

A história das pessoas portadoras de deficiência19 tem sido contada por

documentos institucionais, legislação ou outras formas de registros escritos.

Trabalhos como os de Pessotti (1994), Jannuzzi (1985), Bueno (1997), Mazzota

(1986) trazem grandes contribuições para o entendimento do “lugar” das pessoas

com deficiências na história da sociedade brasileira.

O desenvolvimento histórico da educação especial no Brasil inicia-se no

Século XIX, quando os serviços dedicados a esse segmento de nossa população,

inspirados por experiências concretizadas na Europa e nos Estados Unidos da

América do Norte, foram trazidos por estudiosos brasileiros que se dispunham a

organizar e a implementar ações isoladas e particulares para atender a pessoas com

deficiências físicas, mentais e sensoriais.

Essas iniciativas não estavam integradas às políticas públicas de educação e

foi preciso o passar de um século, aproximadamente, para que a educação especial

passasse a ser uma das componentes do sistema educacional (MAZZOTTA, 1996).

19 Deficiência é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica. Classificação proposta pela Organização Mundial de Saúde – OMS (1988).

48

Segundo Mantoan (2001), pode-se afirmar que a história da educação de

pessoas com deficiência no Brasil encontra-se dividida entre três grandes períodos:

de 1854 a 1956, marcado por iniciativas de cunho privado; de 1957 a 1993, definido

por ações oficiais de âmbito nacional; de 1993 até o momento, caracterizado pelos

movimentos sociais em defesa da inclusão escolar.

No primeiro período, de 1854 a 1956, enfatizou-se o atendimento clínico

especializado, seguindo o exemplo e o pioneirismo do Instituto dos Meninos Cegos,

fundado na cidade do Rio de Janeiro, em setembro de 1854. Incluindo a educação,

nesse tempo, foram fundadas as instituições mais tradicionais de assistência às

pessoas com deficiências: mental, física e sensorial.

O Imperial Instituto dos Meninos Cegos passou a denominar-se Instituto

Benjamim Constant (IBC), em janeiro de 1891, pelo Decreto nº. 1320, a escola. Em

setembro de 1857, D. Pedro II fundou, também no Rio de Janeiro, o Imperial Instituto

dos Surdos–Mudos e em 1909, em Santa Catarina, na cidade de Joenville, foi

fundado o Colégio dos Anjos, de ensino regular, particular com atendimento a

deficientes mentais, como descreve Mazzotta (1996).

Entre essas primeiras iniciativas até os dias de hoje, a história da educação

especial no Brasil foi se estruturando, seguindo quase sempre modelos pautados

pelo assistencialismo, pela visão segregacionista e por uma segmentação das

deficiências, fato que contribui, ainda mais para que a formação escolar e a vida

social das pessoas com deficiência aconteçam em um mundo à parte.

A prática de “apartheid” das políticas educacionais tem, para o primeiro

período, segundo Carvalho (1999), um caráter humanitário por ser proposto por uma

pedagogia científica e racional. Essa pedagogia científica legitima-se por estar

“fundada na natureza”.

49

É importante ressaltar que estava inserida nessas propostas uma visão

organicista da deficiência. Havia uma crença em que, por meio da educação, dos

exercícios de “ortopedia mental” incluídos nas atividades escolares (exercícios

lúdicos para o treino e a melhoria das capacidades mentais como atenção,

memória), esses alunos poderiam ser curados de seus desvios. Assim, a educação,

conforme observa Aun (1994), era vista como um meio de evitar que a anormalidade

trouxesse influências nocivas para a sociedade.

Neste primeiro período, destaca-se de forma irrefutável o pensamento de

Helena Antipoff20 que, na década de 1930, marca a educação especial, com a

organização do Instituto Pestalozzi de Minas Gerais. Dentre as múltiplas propostas

vinculadas na reforma mineira do ensino, estava a formação das professoras das

escolas públicas em psicologia da criança e nos novos métodos divulgados pelo

movimento da Escola Nova21 em suas várias concepções, que estava em voga na

Europa e nos Estados Unidos da América.

A partir de 1940, Antipoff liderou a criação da Escola Fazenda do Rosário, em

Ibirité, Minas Gerais, com a finalidade de educar e reeducar crianças excepcionais

ou abandonadas que não conseguiam se adaptar às escolas públicas ou por elas

ser aceitos. A escola oferecia diversas atividades, onde a criança podia, no contato

com o instrumental disponível e sob a orientação de professoras devidamente

20 Psicóloga e educadora. Nasceu na Rússia, formou-se em São Petersburgo, Paris e Genebra. Seu trabalho revela a influência da psicologia sócio-histórica russa, e da abordagem interacionista elaborada por Claparède e Piaget. Ver PIAGET, Jean. A epistemologia genética/sabedoria e ilusões da filosofia; Problemas de psicologia genética. São Paulo: Abril Cultural, 1993. Os Pensadores. 21 Ideal de educação proposto no início do século XX, alicerçado nas idéias propagadas pelo Instituto Jean Jacques Rousseau. Caracterizou-se por novas propostas pedagógicas que enfatizavam a democracia nas relações escolares, uma educação que respeitasse as diferenças individuais, as aptidões e os interesses das crianças. Sobre a Escola Nova ver ROMANELLI, Otaiza de Oliveira. História da Educação no Brasil (1930/1973). Petrópolis: Vozes, 2002.

50

treinadas, exercitar e desenvolver, de forma lúdica, suas habilidades e funções

mentais.

Paralelamente às aulas, eram oferecidos serviços e assistência médica,

odontológica, psicológica, cursos para preparação de professores, palestras para

orientação de familiares e voluntários que cuidavam dos excepcionais. Além disso,

havia o acompanhamento sistemático de cada aluno nos níveis somático e

psicológico, visando à avaliação do trabalho realizado e o melhor conhecimento

científico das diversas disfunções apresentadas pelas crianças e adolescentes.

Foi em meio a essa atividade de separar crianças segundo seus interesses e

aptidões individuais que Antipoff se deparou pela primeira vez, no Brasil, com a

causa das crianças excepcionais, causa essa que abraçaria pelo resto da vida e que

traria a marca da contradição. Na interpretação feita por Patto (1984) e Bueno (1993)

sobre a relação entre psicologia e ideologia e referente à história da educação

especial no Brasil, “os autores tendem a considerar propostas como estas de

Antipoff a partir de suas conseqüências práticas: a segregação e a exclusão das

crianças excepcionais dos sistemas públicos de ensino” (LOURENÇO, 2000, p.25).

Durante a maior parte da história da humanidade, desde a era pré-cristã até o

início da década de 70 no século XX, o portador de deficiência foi vítima de

segregação, pois a ênfase era na sua incapacidade, na anormalidade22. As primeiras

iniciativas referentes à educação especial, no Brasil, datam do Império, com a

criação por D. Pedro II, do Instituto Imperial dos Meninos Cegos, hoje Instituto

Benjamim Constant, e do Instituto dos Surdo-Mudos, atual Instituto Nacional de

Educação de Surdos.

22 Anormais: os que sofrem de moléstia contagiosa e repugnante, os imbecis que por defeito orgânico forem incapazes de receber educação. Diz-se de indivíduo cujo desenvolvimento físico, intelectual ou mental é defeituoso. (DICIONÁRIO AURÉLIO, 2002).

51

No segundo período, de 1957 a 1993, conforme explica Mazzotta (1996), a

educação especial, só foi explicitamente assumida pelo poder público federal em

1957 com a criação das "Campanhas" que eram destinadas especificamente para

atender a cada uma das deficiências. A primeira campanha instituída foi a

“Campanha para a Educação do Surdo Brasileiro” – CESB, seguida da instalação do

Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES, no Rio de Janeiro/RJ. Outras

campanhas similares foram criadas posteriormente, para atender a outras

deficiências: “Campanha Nacional de Educação e Reabilitação23 de Deficientes da

Visão” (1958) e “Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes

Mentais” – CADEME, (1960).

Em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº. 4.024),

garantiu o direito dos "alunos excepcionais" à educação, estabelecendo, em seu

Artigo 88 que, para integrá-los na comunidade, os alunos deveriam enquadrar-se,

dentro do possível, no sistema geral de educação. Entende-se que nesse sistema

geral estariam incluídos, tanto os serviços educacionais comuns, como os especiais,

mas pode-se também compreender que, quando a educação de deficientes não se

enquadrasse no sistema geral, deveria constituir um especial, tornando-se um

subsistema à margem do geral 24, apesar desse não ser o propósito à época.

23 Entende-se por reabilitação, segundo Mazzotta (1996), o processo de tratamento de pessoas portadoras de deficiências que, mediante o desenvolvimento de programação terapêutica específica de natureza médico-psicossocial, visa à melhoria de suas condições físicas, psíquicas e sociais. Desse modo, a reabilitação caracteriza-se pela prestação de serviços especializados e se desenvolve necessariamente através de equipe multiprofissional. Entre as atividades multidisciplinares requeridas, via de regra, encontram-se também as educacionais (MAZZOTTA, 1996). 24 "DA EDUCAÇÃO DOS EXCEPCIONAIS”. Art. 88. A educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade. (BRASIL. Congresso Nacional Lei No. 4.024/61). A partir de 1973 o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP) passa a conduzir as Políticas Públicas na área da educação especial de modo a enfatizar o aspecto da reabilitação que, fiel à herança iluminista, dá às ciências a responsabilidade de através de seus métodos e técnicas, normalizar o 'deficiente' e, dessa forma, integrá-lo ao ensino regular.

52

A minha interpretação é que essa e outras imprecisões acentuaram o caráter

dúbio da educação especial no sistema geral de educação. A questão que se

apresentava na época era: enfim, diante da lei, trata-se de um sistema comum ou

especial de educação? Desse modo, essa situação vai se perpetuar ainda até os

anos 90.

Em 1972, foi constituído pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC) o

Grupo-Tarefa de Educação Especial com participação do especialista James

Gallagher, norte-americano consultor em educação especial, que apresentou

propostas de estruturação da educação especial brasileira. Os resultados dos

trabalhos do Grupo–Tarefa contribuíram para a criação de um órgão central

responsável pelo atendimento aos excepcionais no Brasil, sediado no próprio

Ministério e denominado Centro Nacional de Educação Especial (CENESP). Esse

Centro é hoje, a Secretaria de Educação Especial (SEESP), que manteve

basicamente as mesmas competências e estrutura organizacional de seu

antecessor. 25

O que se percebe, afirma Mazzotta (1996) é que a condução das políticas de

educação especial no Brasil esteve por muito tempo nas mesmas mãos, ou seja,

foram mantidas por um grupo que se envolveu a fundo com essa tarefa. Essas

pessoas, entre outros, estavam ligadas a movimentos particulares e beneficentes de

assistência aos deficientes, que até hoje têm muito poder sobre a orientação das

grandes linhas da educação especial. Na época do regime militar, instaurado em

1964, por exemplo, eram generais e coronéis que lideravam as instituições

especializadas de maior porte. Assim, antes, durante e depois da vigência deste

25 Sobre as atividades do Grupo-Tarefa, Mazzotta relata de forma detalhada em seu livro Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas. São Paulo. Cortez, 1996.

53

regime, observa-se a continuidade da presença de certos grupos na condução da

política de educação especial no Brasil. 26

De fato, no início dos anos 60 é que essa modalidade de ensino foi instituída,

com a denominação de "educação dos excepcionais". Segundo Aun (1994), as

classes especiais27 públicas vão surgir mantidas por discursos científicos positivistas

que defendiam a separação dos alunos normais e anormais, na pretensão de

organizar salas de aula homogêneas, a partir dos preceitos da racionalidade e

modernidade. A permanência desse modelo se confirmava à medida que o critério

de seleção da sua clientela repousava no pré-requisito do desvio de normalidade

estabelecido pelo ensino regular. Assim, para Aun (1994) ao estabelecer a sua

clientela como aquela que apresenta “desvios” em características biológicas,

estatísticas, psicológicas ou sociais, a educação especial reproduz, no âmbito de

ação o processo de participação-exclusão. 28

No terceiro período, na década de 90, o movimento de inclusão, que começou

incipiente na segunda metade dos anos 80 nos países desenvolvidos, tomou um

forte impulso. Sob a inspiração de novos princípios traçados na Conferência Mundial

de Educação para Todos29 (1993) e a Declaração de Salamanca30 (1994), o Brasil

26 Em razão de seu caráter privado, os grupos de interesse dispõem de um amplo poder político; igrejas, sindicatos, grupos econômicos com poder de pressão em geral, não exercem somente uma influência direta sobre a opinião pública (por terem sob seu poder a imprensa, o rádio e setores inteiros da administração). Mas enviam, também, representantes aos conselhos de administração, comissões, órgãos consultivos e comitês de especialistas, para não mencionar as pressões sobre a distribuição de cargos em todos os níveis. O mesmo Estado transmite aos grupos de interesses certas funções. (HABERMAS, 1981, v.1, p.382) 27 Há registros de atendimento a alunos com deficiência mental em ensino regular juntamente com pessoas com deficiências físicas e visuais, em 1887, na Escola México, no Rio de Janeiro. Mais detalhes a este respeito pode ser encontrado em JANNUZZI, 1985b, p 36-42. 28 A educação sustentada pelas idéias positivistas afirmava que o progresso humano seria uma decorrência do desenvolvimento científico, no sentido de criar tecnologias voltadas para o bem-estar da espécie humana (AUN, 1994). 29 Conferência que reuniu em Jomtien, na Tailândia, os países em desenvolvimento para traçarem metas acerca dos excluídos de seus sistemas de ensino, independentemente de suas condições

54

comprometeu-se a enfrentar o desafio de construir uma escola de qualidade para

todos, fruto do movimento mundial, que reconhece e reafirma o direito que todas as

pessoas têm à educação.

Oliveira (2004) aponta a Conferência Mundial sobre Educação para Todos,

realizada em Jomtien, na Tailândia, em março de 1990, como o marco notório na

formulação de políticas governamentais para a educação na última década do

século passado. Nesse panorama, todas as dificuldades em relação à

aprendizagem, as insistentes repetências escolares, a evasão escolar, passam a ser

admitidas. Todavia, não apenas em relação a um público especial, mas sim, em

relação a todas as crianças que se encontram num patamar sócio-econômico, que

não permite as suas famílias custearem os serviços educacionais e de suporte,

oferecido a uma camada cada vez menor e privilegiado da população brasileira.

A Declaração de Salamanca (1994) propõe que "[...] as pessoas com

necessidades especiais devem ter acesso às escolas comuns que deverão integrá-

las numa pedagogia centralizada na criança, capazes de atender a essas

necessidades." (UNESCO, 1994, p. 10).

O essencial, no que diz respeito a esses documentos, são as garantias com

força de lei que produziram. Embora a realidade esteja ainda muito aquém da

legislação existente, é inegável que as leis, nascidas na história dos povos, têm

força também de construir história. As políticas públicas educacionais, até então,

contribuíam com ações de princípios padronizadores, voltadas à manutenção de

escolas especiais e/ou à integração de alunos com deficiência nas escolas físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas, de gênero, etnia ou religião. (CARVALHO, 2004). 30 Para tratar especificamente da educação dos alunos com necessidades especiais, entre eles os portadores de deficiências, os países reuniram-se em Salamanca, Espanha, assumindo a seguinte posição. Cada país deveria: “construir um sistema de qualidade para todos e adequar as escolas às características, interesses e necessidades de seus alunos, promovendo a inclusão escolar de todos no sistema educacional. (UNESCO, 1994).

55

regulares, sempre que possível. A partir da década de 90, surge um novo sentido

para a educação no Brasil. Um sentido que acompanha tendências mundiais de uma

educação de qualidade e para todos os seres humanos.

Esse conceito de inclusão, elaborado em Jontiem e Salamanca, fundamenta-

se em um sistema de valores que faz com que todos se sintam acolhidos e celebra a

diversidade que tem como base o gênero, a nacionalidade, a etnia, a linguagem de

origem, a formação social e o nível de aquisição educacional.

No século XX, a criação de escolas especiais em nosso país deveu-se a

movimentos e organizações filantrópicas, Sociedade Pestalozzi, Associação de Pais

e Amigos dos Excepcionais (APAE) e, mesmo reconhecendo o mérito do

empreendimento, eles ratificaram o movimento anterior de exclusão, de segregação.

Para minimizar tais práticas a educação especial programou determinados

mecanismos para categorizar o portador de deficiência, o que não escapou de

rotulações.

Observa-se que a nomenclatura usada atualmente para o alunado da

educação especial pode ser considerada também como desafio, pelas múltiplas

interpretações que desencadeia. Inicialmente chamados de excepcionais, após a

década internacional das pessoas portadoras de deficiência (1981-1990) têm sido

denominados como: pessoas portadoras de deficiência, pessoas com deficiência,

pessoas com necessidades especiais ou com necessidades educacionais especiais.

O problema de definição diz da dificuldade de se lidar com o diferente, daí a

diversidade de designações. No caso da universalização da educação tem sido

muito importante o debate em torno das propostas de educação para todos, sem

discriminações. Há, também, um forte desejo dos defensores das pessoas com

deficiência, de se combater práticas de discriminação e de exclusão social. Mas,

56

somente agindo dar-se-á prosseguimento ao processo histórico de atendimento a

pessoa com deficiência, que teve início em instituições assistencialistas (que, por

piedade, lhes oferecia abrigo), passando pela fase médica, quando eram tratados

como doentes, posteriormente sendo transferidos para instituições da educação

especial, que os segregou em espaços limitados e, finalmente, iniciando uma fase

de busca de igualdade de oportunidades, a integração 31, e de valores, a Inclusão 32.

Sob a ótica de Sassaki (1998), tanto integração quanto inclusão se constituem

formas de inserção. Era próprio da integração escolar, principalmente na década de

sessenta e setenta, apoiar-se no referencial médico da deficiência, segundo o qual

era preciso modificar a pessoa com deficiência para ajustá-la aos padrões de

normalidade estabelecidos no meio social (familiar, escolar, profissional, recreativo,

ambiental). Ou seja, a integração escolar é definida como uma forma de inserção

que admite alunos com deficiência desde se esses ajustem à escola regular nos

moldes tradicionais.

Já a prática da inclusão escolar, segundo Mantoan (2003), pauta-se na

capacidade de entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e

compartilhar com pessoas diferentes; é acolher todas as pessoas, sem exceção. É

construir formas de interagir com o outro, que, uma vez incluídas, poderão ser

atendidas as suas necessidades especiais; o estudante com deficiência física, os

31 Definição da NARC - National Association of Retarded Citizens, EUA: integração é uma filosofia ou princípio de oferta de serviços educativos, que se põe em prática mediante a provisão de uma variedade de alternativas de ensino e de aulas adequadas ao plano educativo de cada aluno, permitindo a máxima integração educacional, temporal e social entre alunos deficientes e não deficientes durante o período escolar normal. Ver, BAUTISTA, Rafael (Coord). Necessidades Educativas Especiais. Lisboa: Aljibe, 1993. 32 No campo da educação, a inclusão envolve um processo de reforma e de reestruturação radical das escolas como um todo, (MITTLER, 2003), com o objetivo de assegurar que todos os alunos possam ter acesso a todas as gamas de oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola. Isto inclui o currículo corrente, a avaliação, os registros e os relatórios de aquisições acadêmicas dos alunos, as decisões que estão sendo tomadas sobre o agrupamento dos alunos nas escolas ou nas salas de aula, a pedagogia e as práticas de sala de aula, bem como as oportunidades de esporte lazer e recreação.

57

que têm deficiência mental, os superdotados, todas as minorias e para o aluno (a)

que é discriminado (a) por qualquer outro motivo. Como destaca Sassaki (1998),

Educação inclusiva é o processo que ocorre em escolas de qualquer nível preparadas para propiciar um ensino de qualidade a todos os alunos independentemente de seus atributos pessoais, inteligências, estilos de aprendizagem e necessidades comuns ou especiais. A inclusão escolar é uma forma de inserção em que a escola comum tradicional é modificada para ser capaz de acolher qualquer aluno incondicionalmente e de propiciar-lhe uma educação de qualidade. Na inclusão, as pessoas com deficiência estudam na escola que freqüentariam se não fossem deficientes. (SASSAKI, 1998c, p. 8)

Sá (2005) afirma que a escola inclusiva exige novas estruturas e novas

competências. Observa-se que as escolas públicas não têm correspondido às

características individuais e socioculturais diferenciadas de seu alunado,

funcionando de forma seletiva e excludente. Experiências que aproximam da

proposta inclusiva, como da Escola Plural, da Rede Municipal de Educação de Belo

Horizonte33, sugerem mudanças significativas no sistema escolar e a construção de

novas perspectivas; constitui-se como escola que se abre ao universo das

possibilidades humanas e que se constroem no enfrentamento cotidiano dos

conflitos, impasses e limitações. Para Sá (2005), especial é a educação que legitima

esquemas, espaços e dimensões do conhecimento e dos direitos humanos sem

atributos restritivos.

Com base no princípio inclusivo, elabora-se o conceito de que o deficiente é

uma pessoa com direitos e deveres iguais a todo e qualquer ser humano. Neste

sentido, conscientes de que o processo de mudança está intimamente ligado ao

processo educacional, necessário se faz inverter a ordem do estabelecido. Isto é

33 Sobre estudos acerca da Escola Plural ver SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, Escola Plural, proposta político-pedagógica, Prefeitura de Belo Horizonte, outubro/1994. GLÓRIA, Dília Maria Andrade. “A escola dos que passam sem saber”: a prática da não-retenção escolar na narrativa de alunos e familiares. Trabalho apresentado no GT Sociologia da Educação, durante a 25ª Reunião Anual da ANPEd (Caxambu, MG, de 29 de setembro a 2 de outubro de 2002); dentre outros.

58

imprescindível para que todos possam se fazer ouvidos, sabedores dos seus

próprios desejos e defensores de seus direitos, preconizando o indivíduo, o cidadão,

o próprio sujeito da história e não a deficiência. Tornando assim, a “Educação

Especial” mais eficiente e elevando ao estatuto de “especial” a prática educacional

inclusiva.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) mais recente Lei nº.

9.394 de 20/12/96 destina o Capítulo V inteiramente à educação especial34,

definindo-a no Artigo 58 como uma a modalidade de educação escolar, oferecida

preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos que apresentam

necessidades especiais (CURY, 2002, P.101). Pergunto: Este destaque representou

de fato um avanço?

Sem dúvida, avançou-se muito em relação ao texto da Lei nº. 4.024/61, pois,

parece que não há porque rejeitar a idéia de que a "educação dos excepcionais"

pode enquadrar-se no sistema geral de educação. Mas, a verdade é que

continuamos ainda atrelados à subjetividade de interpretações, quando se depara

com o termo "preferencialmente" da definição citada, que não garante de fato o

direito. Observa-se nos decretos pós LDB 9394/96 que apontam para a questão da

educação dos portadores de necessidades educacionais especiais de forma mais

abrangente e em sintonia com o momento democrático. 35

No Artigo 59, a LDB/96 dispõe sobre as garantias didáticas diferenciadas,

como currículos, métodos, técnicas e recursos educativos; terminalidade específica

para os alunos que não possam atingir o nível exigido para a conclusão do ensino

fundamental, em virtude da deficiência; especialização de professores em nível

34 Ver em Anexo G, LDB/96, art. 58, p. 210. 35 A questão legal será discutida no Capítulo 3 sobre Cidadania e Políticas para a Educação Inclusiva, página 64 e seguintes.

59

médio e superior e educação para o trabalho, além de acesso igualitário aos

benefícios sociais36.

A LDB/96, segundo Mantoan (2003), definiu finalmente o espaço da educação

especial na educação escolar, mas não mencionou os aspectos avaliativos em

nenhum item e esta ausência gera preocupação, pois não se sabe o que fazer a

respeito, pode-se tanto proteger esses alunos com parâmetros específicos para esse

fim, como equipará-los ao que a lei propõe para todos.

Sobre a "terminalidade específica" dos níveis de ensino, o texto da lei fica

também muito em aberto, principalmente no que diz respeito aos critérios pelos

quais se identifica quem cumpriu ou não as exigências para a conclusão desses

níveis e o perigo é que a idade venha a ser o indicador adotado.

Constata-se historicamente foram muitos os políticos, educadores, pais,

personalidades brasileiras que se identificaram com a educação de pessoas com

deficiência e que protagonizaram o percurso dessa modalidade de ensino. Todos

tiveram papéis relevantes e não podem ser ignorados, pois, segundo Mantoan

(2003) atuaram em quadros político-situacionais, que de alguma forma afetaram a

educação de pessoas com deficiência, seja avançando, ousando, transformando as

propostas, seja retardando-as, impedindo a sua evolução para novas práticas

educacionais.

Dessa maneira, verifica-se a importância das iniciativas de caráter privado e

beneficente lideradas pelos pais no atendimento clínico e escolar de pessoas com

deficiência. É pertinente destacar que grupos de pais de pessoas com deficiência

mental fundaram mais de 1000 APAEs em todo o Brasil37. A tendência desse

36 Ver em Anexo G, LDB/96, art. 59, p. 210. 37 Em Minas Gerais, são 373 APAEs sendo basicamente financiadas pelos poderes públicos municipal, estadual e federal. (Federação Nacional das APAE’s, 2005).

60

movimento é ainda de se organizar em associações especializadas, gerenciadas

pelos pais que buscam parcerias com a sociedade civil e ação governamental para

atingir suas metas.

De acordo com a Federação Nacional das APAEs (2005), Associação de Pais

e Amigos dos Excepcionais é um movimento que se destaca no país pelo seu

pioneirismo. Um grupo de pais, amigos, professores e médicos de excepcionais

motivados por Beatrice Bemis, membro do corpo diplomático norte-americano e mãe

de uma portadora de síndrome de Down e participante efetiva na fundação de mais

de duzentas e cinqüenta associações de pais e amigos em seu país, fundou a

primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE do Brasil, no Rio

de Janeiro, no dia 11 de dezembro de 1954.

Nos oito seguintes surgiram outras APAEs e no final de 1962, realizou-se, em

São Paulo, a primeira reunião nacional de dirigentes apaeanos, com a presença de

doze das dezesseis existentes. Pela primeira vez no Brasil, discutia-se a questão da

pessoa portadora de deficiência com um grupo de famílias que trazia para o

Movimento Apaeano suas experiências como pais de deficientes e, em alguns

casos, também como técnicos na área.

Em 1964, com apoio do governo federal o Movimento logo se expandiu para

outras capitais e depois para o interior dos estados que se destaca por ser o maior

movimento filantrópico do Brasil e do mundo, na área38. Por meio de congressos,

encontros, cursos, palestras, as APAEs buscam sensibilizar a sociedade em geral,

bem como, viabilizar os mecanismos que garantam os direitos da cidadania da

pessoa portadora de deficiência no Brasil.

38 A Federação, a exemplo de uma APAE, se caracteriza por ser uma sociedade civil, filantrópica, de caráter cultural, assistencial e educacional com duração indeterminada, congregando como filiadas as APAE’s e outras entidades congêneres, tendo sede e fórum em Brasília – DF. (Federação Nacional das APAE’s, 2005)

61

Segundo dados da federação Nacional das APAEs, atualmente, existem 2000

APAE’s aproximadamente, presentes em municípios de todo o Brasil, mantenedoras

de escolas especiais que propiciam atendimento educacional a mais de 230.000

pessoas e uma grande rede de pessoas, constituída por pais, amigos, voluntários,

profissionais e parcerias com empresas e governos para a promoção e defesa dos

direitos de cidadania da pessoa com deficiência mental e pela sua inclusão social.

Assim, como nas oficinas abrigadas de trabalho39, apesar de suas intenções

serem na maioria das vezes, respaldadas pela discriminação e pelo forte

protecionismo, os pais de pessoas com deficiência, afirma Mantoan (2003), estão

entre os que constroem essa liderança. Na sua maioria tem sido uma grande força,

mais para a manutenção do que para mudar as concepções e condições de

atendimento clínico e escolar de seus filhos com deficiência.

Vale salientar, segundo Mazzotta (1996), que estudos realizados na

Inglaterra40, afirmam que os pais de crianças “com necessidades especiais”

freqüentemente manifestam preferência por recursos integrados à escola comum.

Para Mantoan (2003), os pais, no Brasil, contrariamente a outros países, na sua

maioria, ainda não se posicionaram em favor da inclusão escolar de seus filhos.

Apesar dessa preferência constar na nossa Constituição Federal (1988), observa-se

uma tendência dos pais de se organizarem em associações especializadas para

garantir o direito à educação de seus filhos com deficiência.

39 As Oficinas Abrigadas de Trabalho nasceram de uma necessidade do adulto com deficiência como possibilidade de desenvolvimento bio-psico-social, são realizadas nessas oficinas diferentes atividades artesanais, na maioria das vezes sem fins lucrativos, além de outras atividades pedagógico-terapêuticas, como música, educação física, etc. 40 Para maiores detalhes da pesquisa ver: HAGARTY, POCKLINGTON & LUCAS (1981), ICEA (1985), citados por DESSENT, T. Making the Ordinary School Special, London, The Falmer Press, 1987, p. 139. Citado por Mazzotta, Educação Especial no Brasil: história e políticas públicas. São Paulo. Cortez, 1996.

62

Esse posicionamento, que vai contra o compromisso legal estabelecido desde

Jomtien (1990), causa estranheza. Porém, não é de todo absurdo. A minha

experiência em educação especial permite dizer que muitos pais segregam seus

filhos, pelo medo da discriminação. Ou, ainda, os pais querem proteger seus filhos

em uma escola cercada pelos muros da indiferença e, sendo assim, confirmam sua

exclusão social e escolar. Será necessário trabalhar, primeiramente, a abertura dos

pais às concepções de inclusão escolar, bem como as instituições, que inovam e

mudam o destino de seus filhos e seus reais direitos?

Só muito recentemente, a partir da década de 80 e início dos anos 90, grupos

estruturados por portadores de deficiência têm se organizado participando de

comissões, de coordenações, fóruns e movimentos, visando a assegurar, de alguma

forma, os direitos que conquistaram de serem reconhecidos e respeitados em suas

necessidades básicas de convívio com as demais pessoas. Esses movimentos estão

se introduzindo, pouco a pouco, em todos os ambientes relacionados ao trabalho,

transporte, arquitetura, urbanismo, segurança, previdência social e acessibilidade

em geral. Mas, infelizmente, apesar de estarem presentes e terem mostrado suas

atuações em vários aspectos da vida social, os referidos movimentos apresentam

discordâncias no que diz respeito às prerrogativas educacionais que se amparam na

idéia da classe comum como único espaço de escolarização para todos, aos

processos escolares, notadamente os inclusivos.

63

3. CIDADANIA E POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A EDUCAÇÃO

INCLUSIVA

Ao longo do capítulo dois, procurei não só realizar uma revisão de literatura

sobre a história da educação especial, apresentada em estudos sobre os desafios

da educação dos alunos com necessidades educacionais especiais através das

idéias relevantes de alguns autores, como também articular uma construção ampla a

respeito da educação para projetar, portanto, repensar nossas práticas pedagógicas

e desvelar caminhos que garantam aos alunos com necessidades educacionais

especiais a possibilidade e a oportunidade de aprender de forma eficiente e

significativa. O capítulo 3 tem por objetivo ampliar a compreensão da educação das

pessoas com necessidades educacionais especiais a partir da abordagem da

questão da cidadania exoandindo-a para o contexto das políticas públicas

educacionais para a educação inclusiva. Busca-se, portanto, apontar alguns

desafios e polaridades que permeiam o discurso e a ação que envolve a

problemática da educação inclusiva no Brasil.

3.1. EDUCAÇÃO INCLUSIVA COMO CIDADANIA

Os homens nascem e permanecem livres e iguais em seus direitos. (Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada pela Assembléia Nacional Francesa, em 26 de agosto de 1789).

A história da organização da sociedade humana é sinalizada por um processo

contínuo de criação e recriação de categorização das pessoas. Esse processo, por

se tratar de atividades humanas, indica, implícita ou explicitamente, intenções.

Tendo em conta os fatores econômicos, sociais, culturais e históricos, o ser humano

64

constrói sua identidade nas relações que estabelece consigo mesmo e com outros

seres, ao mesmo tempo em que transforma a sociedade e por ela é transformado.

Os grupos sociais humanos definem padrões normais ou estigmatizados41.

Assim, uma pessoa é considerada normal quando atende padrões sociais

previamente estabelecidos. A transgressão desses padrões caracteriza a

qualificação pejorativa que, por sua vez, expressa desvantagem e descrédito diante

de oportunidades concernentes aos padrões de qualidade, de acordo com o estádio

mais avançado das criações humanas. Assim sendo, discutir o conceito e o tipo de

integração/inclusão/exclusão implica delinear os contornos do paradigma

denominado escola inclusiva.

A exclusão social, no final do século XX, assume o caráter de um conceito-

denúncia da ruptura do Estado do bem-estar social. Ao mesmo tempo, proclama-se

o direito à diferença, podendo-se apontar a presença de discriminação quando não

se respeita esse direito. Assim, o conceito de exclusão social hoje se confronta

diretamente com a concepção de universalidade dos direitos sociais e da cidadania.

A exclusão é a negação da cidadania. 42

41 O estigma se interpõe, atualmente, em todas as relações, como um constructo social que é internalizado pela maioria das pessoas como “coisa anormal”. Nesse enfoque, podemos entender a análise de Goffman (1988 p.15): “Por definição é claro, acreditamos que alguém com estigma não seja completamente humano. Com base nisso, fazemos vários tipos de discriminação, através das quais efetivamente e, muitas vezes sem pensar, reduzimos suas chances de vida. Construímos uma teoria de estigma, uma ideologia para explicar a sua inferioridade e dar conta do perigo, racionalizando algumas vezes uma animosidade, baseada em outras diferenças, tais como as de classe social”. 42 O conceito de cidadania neste trabalho está ancorado nas principais contribuições dos pressupostos básicos de Michelangelo Bovero a respeito das suas conceituações para uma gramática da democracia. O caminho percorrido é enfocado do ponto de vista dos exames da literatura recente sobre o tema, baseados na Filosofia Política, nas concepções de cidadania e direitos do homem e o significado atual dessas definições em contraste com o seu significado ideal. De acordo com Bovero (2002), a idéia de cidadania parece configurar uma questão-chave das produções científicas de diversas perspectivas disciplinares, como: ciência política, sociologia política, filosofia política. O autor enfatiza que a cidadania é principalmente um conceito jurídico, de origens muito antigas e, destaca a notória obra de T. H. Marshall (1967) na qual a noção de cidadania é refeita em clave sociológica.

65

A superação dos limites impostos aos seres humanos começa pela

conscientização de sua importância como cidadãos. Igualdade, liberdade e

cidadania configuram novos e diferentes cenários sociais, políticos e culturais

presentes nas sociedades contemporâneas. O avanço da cidadania e da civilização

no mundo ocorre, historicamente, por meio da afirmação de direitos. 43

De modo objetivo e claro, considera-se a cidadania como um conjunto

específico de direitos e obrigações de cada cidadão que abrange desde os seus

Direitos humanos, sociais, individuais, até os seus direitos políticos, concretizados

pelo sufrágio universal e ampliados pelo enraizamento desse título com outras

ciências afins que calculam e estudam os seus reflexos e a importância de sua

existência na sociedade em que atua, ressalta Bobbio (2001). Constata-se que a

idéia atual de cidadania está na ordem do dia porque ela significa exatamente o

avanço da própria democracia substancial, ou seja, aquela que caminha para a

igualdade social e econômica.

Os conceitos de cidadania e direitos do homem possuem peculiaridades que

não se esgotam no entendimento de ser o cidadão aquele que, efetivamente,

participa dos “negócios da cidade”. Essas palavras parecem desgastadas nos

discursos partilhados pela maioria dos membros da sociedade. Muito se tem escrito

no Brasil sobre a idéia de cidadania, em especial a partir da Constituição de 1988,

que a consagrou como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil,

muito se fala em cidadania e direitos do homem; "o cidadão" foi colocado no centro

de todo e qualquer discurso político. Resta, contudo, questionar o que significa

43 Segundo Bovero (2002), uma investigação na literatura recente sobre o assunto, revela problemas e contradições acerca da definição do status de cidadão. Ou seja, é daquele status que compete ao indivíduo moderno, e é por ele reivindicado, uma vez que ele não quer mais estar submetido à vontade de outrem; simples sujeito de deveres e destinatário passivo de comandos. A busca de consenso dos diversos estudiosos que debruçam sobre a definição de quais direitos designam o status do cidadão e,que relação existe entre eles.

66

cidadania para que possamos dizer se somos ou não cidadãos e qual a amplitude

dessa qualificação em relação aos direitos do homem.

A análise do conceito de democracia44 é fundamental e indispensável quando

se pretende estudar as características intrínsecas em uma sociedade, como a

cidadania. Bovero (2002) afirma que, no léxico mais recente cidadania indica um

amplo gênero de direitos com inúmeras especificações; no léxico clássico-moderno

cidadão é um termo específico, correlato principalmente, ainda que não apenas à

espécie dos direitos políticos. Observa-se que a questão da cidadania não é apenas

normativa e doutrinária, mas sociológica: apura-se também no plano dos fatos que

compõem e afetam a vida dos seres humanos.

Assim, implica também verificar a cidadania efetivamente vivenciada pela

sociedade, pois, para além das teorias e das normas, está a vida de cada ser

humano que constitui a sociedade. Esse ser humano que se crê agente, é um objeto

de cultura: ela o precede e o forma. A cidadania expande-se e afirma-se na

sociedade, à medida que os indivíduos adquirem direitos e ampliam a participação

na criação do próprio direito. Logo, esses valores centralizam as idéias de direito,

Estado e cidadania. Os direitos que constituem a cidadania são resultados de

processos históricos e por meio dos quais os indivíduos, os grupos lutam para

adquiri-los e pela sua validade.

A cidadania, como assinala os sociólogos e antropólogos, adveio dos

movimentos sociais, resultou da afirmação desses direitos. Tal prática se deu em

função da luta pelos direitos civis. A concepção de direito e cidadania (o conjunto

44 Democracia (do grego demos, "povo", e kratos, "autoridade") entendida aqui, segundo o Dicionário Aurélio (2002), como doutrina ou regime político baseado nos princípios da soberania popular e da distribuição eqüitativa do poder, ou seja, regime de governo que se caracteriza, em essência, pela liberdade do ato eleitoral, pela divisão dos poderes e pelo controle da autoridade. Ou seja, uma forma de organização política que reconhece a cada um dos membros da comunidade o direito de participar da direção e gestão dos assuntos públicos.

67

dos direitos e obrigações do cidadão) sofreu grande evolução no curso da história.

Embora tais direitos possam não constar na totalidade de um código (no Brasil,

consta na Constituição Federal/1988, por exemplo), estão inscritos na consciência

coletiva da humanidade e, por isso, têm sido invocados em toda a história, todas as

vezes que foram desrespeitados.

Ao longo dos séculos, sempre houve uma íntima correlação entre a idéia de

lei natural e a concepção dos direitos naturais do homem. Nesse mesmo

entendimento, Bobbio (2001) adota posição firme contra a idéia dos direitos naturais.

Os direitos nascem quando devem e podem nascer. São direitos históricos,

emergidos de lutas travadas através do tempo, gradualmente. Nascem em

determinadas circunstâncias, relacionadas com a defesa de novas liberdades. A

história é, geralmente, a melhor mestra. Pensar historicamente nos ajuda a

compreender a gênese e o movimento da conquista da cidadania, afirma Cury

(2005). 45

A valorização dos direitos pressupõe que a cidadania não é apenas fato e

meio, mas sim princípio. A dignidade do homem é sagrada e constitui dever de todas

as autoridades do Estado promover medidas de ação significativas, que garantam

igualdade real de oportunidades na prevenção à violação dos direitos humanos.

Cury (2005) atenta para o cuidado que se deve ter em dar a cada indivíduo o seu

devido valor, apontando para o conceito de igualdade aritmética, que considera ser a

plenitude do conceito de igualdade, esta, base do conceito de inclusão social. Esse

é um convite para se recordar Hegel que insistia, em seus escritos, com palavras

que parecem escolhidas para uma réplica pontual: O homem tem valor porque é

homem, não porque é judeu, católico, protestante, alemão, italiano (CURY, 2005).

45 CURY, Carlos Roberto Jamil, Belo Horizonte: Puc Minas e UFMG, 2005. Notas de aula.

68

Assim, a base verdadeira dessa transformação está na educação política (em

sentido amplo) do povo, envolvendo tanto a participação na vida coletiva quanto à

educação para a ética na política, afirma Cury (2005). A educação, além de ser um

direito social básico e elementar, é também o caminho ou a condição necessária

que vai permitir o exercício e a conquista do conjunto dos direitos da cidadania, que

se ampliam a cada dia em contrapartida às necessidades do homem e da dignidade

humana.

Nesse sentido, entende-se a educação como mediação para a construção da

cidadania, contribuindo para a integração dos homens no tríplice universo do

trabalho, da simbolização subjetiva e das mediações institucionais da vida social. A

educação política do povo, ou educação para a cidadania, deve, pois, possibilitar

primeiro o igual acesso ao Direito, isto é, o conhecimento do ordenamento jurídico

das liberdades públicas por parte de todas as pessoas e, então, a formação das

consciências dos sujeitos sociais para a necessidade de sua afirmação ao nível dos

fatos, ao nível da vida real. E daí a luta por sua extensão.

Desde o início da civilização, a educação foi pauta de discussões e

preocupação dos estudiosos e pesquisadores a ponto de se chegar a afirmar que

sem educação não haveria humanidade (MEC, FUNDESCOLA, p. 14, 2000). A idéia

pode soar como um exagero, mas, no tocante à educação, esse é o grande tema e a

justa conclusão apresentados nos escritos dos grandes pensadores, religiosos ou

laicos, homens da ciência ou das humanidades, em todas as culturas, ao longo dos

cinco ou seis mil anos de civilização.

A educação é vital para o homem como o próprio ato de sobreviver, no

sentido de preservar sua frágil existência e assegurar sua evolução. Apresenta-se

como elemento fundamental para a sobrevivência da espécie humana, para o

69

desenvolvimento da civilização e para a plenitude da vida individual. Com a

educação, o homem acomoda-se ao meio em que vive a ponto de ser ele tão

importante e fundamental quanto o ato de procriar ou de desenvolver-se na vida

social. Nesse sentido, a educação é a própria humanidade.

Tanto assim que a nossa Constituição Federal, no artigo 205, estabelece que

a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, deve visar ao pleno

desenvolvimento da pessoa humana, seu preparo para o exercício da cidadania e

sua qualificação para o trabalho, que é também uma das várias dimensões da idéia-

força da cidadania. Ela se amplia na medida em que se afirma como prática social,

para além dos textos legais, faz eco à afirmação de que a cidadania, sem dúvida, é

passível de ser aprendida.

Cumpre, ao cabo, concluir que o processo de construção da cidadania é

antigo e não tem fim. Não se completa nunca. Onde quer que seja, existirão sempre

homens e mulheres, grupos e indivíduos singulares, minorias e estratos particulares,

submetidos a algum tipo de humilhação, degradação, injustiça ou opressão e, por

isso, reivindicando direitos em concreto, exigindo a fruição efetiva das liberdades

públicas.

A educação que visa à inclusão de todos assume um sentido reparador:

supõe o reconhecimento e a restituição das perdas ao desenvolvimento humano

causada pela cultura elitista, dominadora, machista, pela subordinação econômica e

política a que o neoliberalismo46 nos submete como países emergentes. Educação,

esta, também denominada de educação indenizatória, que visa a restituir a condição 46 Nereide Saviani (1997) aponta que o neoliberalismo tem um ideário que se sustenta na defesa do Estado Mínimo, na ênfase ao mercado e ao indivíduo desvinculado de suas organizações (partidos, sindicatos, associações). Sua base de sustentação está na defesa da desestatização, que é o desmonte das propriedades estatais e públicas; da desregulamentação, que é a redução da interferência do Estado nas atividades econômicas e sociais dando liberdade às forças de mercado, e da desuniversalização, que é a particularização dos direitos e benefícios sociais em que cada indivíduo investe, por exemplo, na sua aposentadoria ou em um programa de saúde.

70

maior de ser humano, isto é, a extensão da categoria de humanos a todos. Não

basta a palavra de ordem: "toda criança na escola". É preciso ousar, dar um salto de

qualidade e comprometer a escola e a sala de aula com o processo mais amplo de

inclusão social. Caso contrário corre-se o risco dela vir a ser mais um elemento de

exclusão social, quando deveria contribuir para a inclusão.

3.2. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A

EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Num momento em que o direito ganha novos espaços e abre novas áreas por meio das grandes transformações pelas quais passa o mundo contemporâneo, é importante ter o conhecimento de realidades que, no passado, significaram e no presente ainda significam passos relevantes no sentido da garantia de um futuro melhor para todos. O direito à educação escolar é um desses espaços que não perderá sua atualidade (CURY, 2002, p.7).

Uma das grandes particularidades do século XX foi ser capaz de produzir

legislação internacional que atuasse sobre os Estados soberanos e que servisse de

modelo para leis internas dos Estados – nação47. O surgimento de um corpo de leis

que defende os direitos fundamentais da pessoa humana, em vários aspectos e

níveis, representou, sem dúvida, um avanço importantíssimo na construção de uma

sociedade mundial baseada no direito.

Os direitos básicos do cidadão estão garantidos em vários documentos.

Destaca-se em âmbito internacional e nacional, respectivamente, a Declaração

47 Destaque para a Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH) adotada pela assembléia Geral das Nações Unidas em 1948. É considerado como o principal documento internacional norteador e disciplinador dos direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana.

71

Universal dos Direitos do Homem (1948) e a Constituição Brasileira (1988)48, ambas

enfatizam que todos somos iguais perante a lei. A ênfase se justifica porque pessoas

são vítimas de violação dos direitos do homem, com destaque a os portadores de

deficiência que costumam ser discriminados e, nesta condição, ficam excluídos do

acesso e usufruto dos bens e serviços socialmente disponíveis. Ou seja, do princípio

de igualdade entre todos.

A “educação de qualidade para Todos” tem a ver com a inclusão total,

incondicional de todos os alunos às escolas de seu bairro, como cita a Declaração

de Salamanca (1994), e que ultrapassa o âmbito dos alunos com deficiência,

englobando-os sem dúvida. Em outras palavras, este especial qualifica as escolas

que são capazes de incluir os alunos excluídos, indistintamente, descentrando os

problemas relativos à inserção total dos alunos com necessidades educativas

especiais e focando o que realmente produz situação lamentável de nossas escolas.

Outro ponto a ser lembrado é a exeqüibilidade da inclusão escolar. Torna-se

importante destacar que as transformações exigidas pela inclusão escolar não são

utópicas e que temos meios de efetivá-las. Essas mudanças já estão sendo

implementadas em alguns sistemas públicos de ensino e em escolas particulares no

Brasil49 e no exterior50, que aceitaram o desafio de se tornar verdadeiramente

48 A Constituição Brasileira de 1988, no Capítulo III, Da Educação, da Cultura e do Desporto, Artigo 205 prescreve : "A educação é direito de todos e dever do Estado e da família". Em seu Artigo 208, prevê: "o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino". Este e outros dispositivos legais referentes à assistência social, saúde da criança, do jovem e do idoso levantam questões muito importantes para a discussão da educação especial brasileira. Ver Anexo A, p. 195. 49 Exemplos dessas implementações é o Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade (LEPED), criado em fins de 1997 na Faculdade de Educação/ Unicamp, é indiscutivelmente pioneiro nos estudos sobre a inclusão escolar. As propostas do LEPED centraram-se primordialmente em problemas relativos à transformação das escolas regulares, de modo que pudessem se abrir, indistintamente, a todas as crianças. Bem como, estudar e investigar as barreiras educacionais que excluem crianças e jovens das escolas, interrompendo trajetórias educacionais pelos mais diferentes motivos. E o Fórum Permanente Sociedade Inclusiva, na PUC Minas que surgiu como proposta no "Seminário Internacional Sociedade Inclusiva" (1999), envolve representantes das

72

inclusiva e estão fundamentadas nas teorias educacionais, elucida Candau (2002)

no multiculturalismo, no interculturalismo, e em novos paradigmas que emergem no

cenário da educação no início de século XXI.

Não são poucos os documentos de caráter internacional, assinados por

países da Organização das Nações Unidas (ONU), que reconhecem e garantem o

acesso de seus cidadãos à educação escolar. Tal é o caso do art. XXVI da

Declaração Universal dos Direitos do Homem51, de 1948. Do mesmo assunto se

ocupa a Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino, de

1960, e o art. 13 do pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,

de 1966. Além disso, como nunca ocorrera na História nesta escala e nesta

magnitude, os direitos das pessoas, em várias instâncias, foram defendidos por

instrumentos jurídicos de caráter internacional e nacional (Cury, 2002, p.7).

A partir do artigo 227 da Constituição Federal de 1988, adotou-se no Brasil a

doutrina jurídica de proteção integral à infância e à adolescência (CF/88) que

corresponde, historicamente, a um qualitativo avanço no âmbito da Teoria dos

Direitos Fundamentais, que tem sua referência, do ponto de vista legal, na DUDH.

unidades desta Universidade e representantes de órgãos públicos e organizações da sociedade civil (Instituições de ensino, empresas, sindicatos, conselhos/representações de classe, ONGs). O Fórum tem como objetivo dar continuidade e encaminhamento ao debate sobre a Sociedade Inclusiva. Desenvolve ações através de grupos de trabalho, atende a demanda da comunidade e participa em outros grupos e eventos, bem como, tem promovido encontros, seminários, congressos com objetivo de discutir e criar uma consciência cidadã. As ações do Fórum na Universidade visam promover a formação de um profissional comprometido com o ser humano, sujeito de direitos e deveres. 50 Ver Ratzka, Adolf D. HISTÓRIA DA SOCIEDADE INCLUSIVA, Seminário Internacional Sociedade Inclusiva. Anais. Belo Horizonte: Puc Minas. 1999. Movimento iniciado na Europa na década de 70, que luta por uma sociedade inclusiva, no verdadeiro sentido da palavra, uma sociedade para todos, independentemente do sexo, idade, crença, etnia, raça, orientação sexual ou deficiência. Não basta ser uma sociedade aberta e acessível a todos os grupos, mas uma sociedade que encoraja a participação e aprecia a diversidade e as experiências humanas. O objetivo principal é criar oportunidades iguais para todos, percebendo o potencial humano. 51 A DUDH salienta o propósito humanista e enobrecedor da educação: “A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao esforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e devem favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étnicos ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz”.

73

Por meio desse conjunto, a concepção de criança e de adolescente como sujeitos

de direito e, sobretudo, sujeitos de direitos fundamentais, pretende-se a substituição,

ao longo de um denso processo histórico-político de mobilização e articulação, da

ideologia da defesa social que constituía o eixo da inspiração doutrinária anterior. O

olhar em relação à criança e ao adolescente enseja uma transformação de valores:

da condição de menores, objetos de compaixão-repressão, passam a condição de

sujeitos plenos de direitos (direito à vida, à saúde, à educação, à convivência

familiar, ao lazer, entre um elenco de outros atributos que lhe são normativamente

assegurados como cidadãos).

A Lei nº. 8.069 de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA), estabelece, no capítulo IV, no artigo 53, do direito

à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer, que

[...] criança e o adolescente têm direito à educação, visando o pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho assegurando-lhes igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. (BRASIL, 1990, p. 22).

Além do ECA a população brasileira conta, no ordenamento jurídico, com um

leque de leis, dispondo sobre o direito à educação e sobre o dever de educar,

fixando a organização da educação nacional; indicando as atribuições da União, dos

estados e dos municípios; definindo os elementos integradores dos sistemas federal,

estadual e municipal de ensino; tratando da composição da educação escolar,

dividindo-a em educação básica (que abrange a educação infantil, o ensino

fundamental e o ensino médio) e educação superior; cuidando, ainda, da educação

de jovens e adultos que não tiveram acesso ou que não tenham concluído o ensino

fundamental e médio na idade própria, da educação profissional, da educação

74

especial, da educação superior, dos profissionais da educação e dos recursos

financeiros destinados à educação, esclarece Cury (2002).

Observa-se, em todo texto constitucional, referência às pessoas com

deficiências em outros artigos e incisos52 das áreas da saúde, trabalho, assistência

social. São direitos reconhecidos e proclamados. Os próprios portadores de

deficiência, politicamente mais organizados do que há décadas atrás, têm lutado

para que tais direitos sejam respeitados e cumpridos, sem cunho de

assistencialismo. Mesmo reconhecendo os avanços propiciados pela Constituição de

1988, o texto vai desvelando que a contradição básica de uma sociedade que

naturalizou até a exclusão dos ditos “normais” não poderia resolver por meio de

decreto a condição de vida do deficiente. Sem que se questione o papel da escola.

Segundo Caiado (2003), sem que se conteste a sua função social e as práticas

sociais na área da educação especial, pouco se avança na complexa questão da

inclusão escolar e social da pessoa com deficiência.

O objetivo das políticas públicas, visando a inclusão escolar de alunos com

necessidades educacionais especiais para atender aos dispositivos legais é,

segundo Mittler (2003), garantir o acesso e a participação de todos em todas as

possibilidades de oportunidades oferecidas pela escola e impedir a segregação e o

isolamento. Essa política foi planejada para beneficiar todos os alunos, incluindo

aqueles pertencentes a minorias lingüísticas e étnicas, aqueles com deficiência ou

dificuldades de aprendizagem, aqueles que se ausentam constantemente das aulas

e aqueles que estão sob o risco de exclusão social e escolar. 53

52 Ver Anexo A, art. 205, 206, 208 e 213 (CF/88), p. 195. 53 Soma-se também aquelas crianças que não estão freqüentando a escola por alguma razão: meninos de rua, crianças trabalhadoras, desistentes totais ou parciais, os rotulados como imotivados, de baixo aproveitamento e insubordinados, os que são vítimas de abuso, bem como crianças com deficiência que nunca freqüentaram a escola, ou que têm sido excluídas como inaptas. Muitas dessas

75

O novo ordenamento constitucional e legal da educação no Brasil54,

inaugurado em 1988, juntamente com várias medidas na esfera do planejamento

educacional, configuram um conjunto de leis que podem, ao serem respeitadas e

aprimoradas, possibilitar uma vida mais digna para todos, tornando-as exigências

legais do cidadão comum. Ainda que haja muitíssimo por caminhar nesse sentido, o

avanço é incontestável55.

Na legislação atual, a pessoa deficiente ganhou o status de cidadã. Hoje,

olha-se para ela como alguém com direitos e capacidades. Resta o movimento

social avançar ao patamar da implantação conquista desses direitos. Pensar, decidir

e trabalhar em favor da inclusão escolar e social é deflagrar por essa tão óbvia

concepção uma revolução no ensino. Não se trata aqui de alunos com necessidades

educacionais especiais, mas de todos os alunos que estão na escola, e nela

marginalizados, e dos que estão fora dela, porque foram excluídos ou ainda não

conseguiram nelas encenar, por preconceitos de toda ordem: sociais, culturais,

étnicos, religiosos. Somos um país transcultural dada a nossa forte miscigenação,

crianças vivem abaixo da linha de pobreza, em condições de grande sofrimento, privações e má nutrição. 54 Cujos principais instrumentos são, no plano Federal:

- A Constituição Federal de 1988 com a emenda nº 14/96. - O Estatuto da Criança e do adolescente (ECA), com 267 artigos, a Lei nº 8.069, de

13/07/1990, “dispõe sobre a proteção integral á criança e ao adolescente”. Nele, considera-se criança “a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), com 92 artigos, a Lei nº 9.394, de 20/12/1996, estabelece de maneira rica e detalhada os propósitos, os mecanismos e a estrutura educacional no Brasil.

- A LDB representa um avanço em relação às leis anteriores, especialmente no significado ampliado que atribui à educação. Com base nela, os maiores e melhores ideais educacionais contemporâneos assumem forma de obrigação legal, e o direito da criança brasileira, não só à educação, mas à boa educação fica garantido por lei.

- A Lei 9.424/96 do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF).

- Os pareceres e resoluções do Conselho Nacional de Educação. Além destes, há os instrumentos estaduais e municipais próprios de cada âmbito político-administrativo.

55 Para se inteirar dos textos legais (leis, decretos, portarias, resoluções, pareceres, avisos, documentos internacionais) pós LDB 9394/96, ver anexos da página 195 e seguintes.

76

mas nem por isso deixamos de discriminar e de isolar os grupos minoritários mais

estigmatizados e também outros, que foram e são considerados inferiores, como os

negros, índios, imigrantes e migrantes do Norte e Nordeste, entre outros.

Como afirma Cury (2002) “o contorno legal indica possibilidade e limites de

atuação, os direitos, os deveres, proibições, enfim, regras” (CURY, 2002, p. 8),

porém, a conversão para as realizações no cotidiano entra em choque com as

condições sociais. Inegavelmente, tudo isso tem impacto nas vidas das pessoas,

sabe-se que a educação tem um papel de destaque na formação do cidadão. Assim,

para pensar e refletir sobre a temática da inclusão escolar em sua extensão e

complexidade, é necessário levar em consideração o que já foi construído

historicamente seja no aspecto educacional, político ou social, é preciso acreditar

nas possibilidades de todas as pessoas, sem distinção.

77

4. A DEFICIÊNCIA COMO DIFERENÇA

O objetivo desse capítulo é refletir sobre dois conceitos que têm sido

fundamentais no empreendimento da inclusão escolar: deficiência e diferença. Nos

capítulos centrou-se a atenção na história da educação das pessoas com deficiência

e as controvérsias produzidas no espaço contraditório e complexo da educação

especial um espaço certamente histórico e político. A proposta é trabalhar a

dimensão da deficiência desprendendo-a do conceito de doença, segundo Skliar a

deficiência não é uma questão biológica e sim uma retórica social, histórica e cultural

(Skliar, 1999, p. 6). A noção de diferença tem como objetivo pôr em cena a

problematização da deficiência posta em discussão com a noção de identidade,

alteridade. Assim, ao considerar essa idéia, deficiência deixa de ter uma conotação

naturalizada, reduzida a uma alteração biológica para se tornar um processo de

respeito às diferenças.

4.1. EDUCAÇÃO ESPECIAL E NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS

Cada homem tem uma identidade diferente da que pertence aos outros, e o direito deve reconhecê-la e protegê-la (Cury, 2005).

Há várias maneiras de definir a educação especial, dependendo do

contexto histórico, cultural de cada sociedade. Segundo uma definição geral, é

preciso entender essa “modalidade de educação escolar” como a educação

especificamente projetada para pessoas em situação, não apenas de deficiência.

78

Segundo Ander-Egg (1997), compreende-se educação especial como um conjunto

de medidas e recursos (humanos e materiais) disponibilizados aos alunos com

necessidades educacionais especiais para favorecer adequado desenvolvimento

escolar.

Nota-se que a educação especial é bastante abrangente e ampla, engloba

uma diversidade de necessidades educacionais especiais, demanda uma equipe

multidisciplinar, composta por diversos profissionais especializados. Seu objetivo

principal é promover uma melhor qualidade de vida àqueles que, por algum motivo,

necessitam de um atendimento educacional adequado à sua realidade física,

mental, sensorial e social.

Desse modo, Oliveira (2004) ensina que, a educação especial destina-se aos

que apresentam necessidades educacionais especiais, ou seja, todas as pessoas

que precisam de métodos, recursos e procedimentos especiais durante o seu

processo de ensino-aprendizagem. Indivíduos portadores de: deficiência sensorial

(auditiva ou visual), deficiência motora, deficiência cognitiva, altas habilidades,

transtornos psicomotores, doenças crônicas, transtornos de personalidade, autismo,

psicoses, síndromes, deficiência múltipla, inadaptação social e dependência

química.

Desde a era Imperial no Brasil, passando pelo século XIX, até a década de 60

no século XX, a educação especial foi encarada de maneira dissociada da Educação

Geral. Os processos de democratização da escola trouxeram em seu cerne outra

clientela e, com ela, diferenças bastante acentuada. O aprimoramento da qualidade

do ensino regular e a adição de princípios educacionais válidos para todos os alunos

resultaram na expansão da matrícula dos alunos com necessidades educacionais

especiais nas escolas de ensino regular. Desta maneira, emerge uma visão de

79

escola particularmente atenta à sua função social e educativa de favorecer o

desenvolvimento integral de todos os alunos, independente de suas características

individuais e as de seu contexto; logo, uma concepção de escola que responde

diferencialmente à diversidade do grupo.

Segundo Bueno (1997), a educação especial tem sido apresentada, por boa

parte da literatura especializada e pela ampla maioria dos seus militantes56, como

um dos agentes fundamentais para a inclusão social das pessoas com necessidades

educacionais especiais. A rigor, é quase impossível imaginar alguém que se oponha

à afirmação de que todo cidadão tem o direito de participar da vida social, política e

econômica da nação. Do mesmo modo como é impossível desconhecer que todos

parecem partilhar do sentimento de que a escola tem, também, a responsabilidade

de dar ao cidadão o instrumental para que ele exerça seu direito de avançar no

socialmente.

A necessidade maior é que a educação especial deve ser pensada no

contexto geral da educação e não em si mesma, pois essa dicotomia só tem

contribuído para o distanciamento tanto dos que apresentam deficiência e da

população dita normal, como da construção de uma educação democrática. A

inclusão da diferença no ambiente atitudinal, afirma Carvalho (1988), apresenta-se

como um desafio e não deve ser omitido ou vulgarizado pelos movimentos em prol

de uma escola inclusiva, inserida numa sociedade que deve ser ao mesmo tempo

inclusiva.

56 Políticos, educadores, personalidades brasileiras, grupos de pais e amigos de pessoas com de deficiência mental, que fundaram mais de 1000 APAE’s em todo o Brasil, Família Down, Associação de Amigos dos Autistas (AMA) e grupos estruturados por portadores de deficiência que se identificaram com a educação das pessoas com necessidades especiais, atuaram e atuam em quadros político-situacionais que, de alguma forma, afetaram e afetam a educação das pessoas com necessidades educacionais especiais.

80

No que tange à concepção de inclusão, como diz Oliveira (2004), a educação

especial passa a buscar um contexto menos restritivo possível, invertendo o

processo atual em que as diferenças tem sido motivo de segregação. A adequada

resposta às necessidades educacionais especiais dos alunos exige dispor de um

projeto educativo na escola, compartilhado por toda a comunidade escolar 57, que

assuma, tanto em nível conceitual, quanto metodológico e organizacional, a

diversidade como fator inerente a todo grupo humano.

A questão da nomeação: sujeitos deficientes, com deficiência, portadores de

necessidades educativas especiais, alunos especiais, constitui, segundo Skliar

(1999) “apenas um debate sobre melhores e piores eufemismos para denominar a

alteridade” (SKLIAR, 1999, p. 21) e não pressupõe por si mesma, transformação

política, epistemológica e/ou pedagógica. Em síntese, trata-se de significações que

servem para abalizar as demarcações referidas ao estar fora, ao estar do outro lado,

ao definir oposições.

A denominação não implica na mudança da significação de ser deficiente

tampouco determina o tratamento dado ao deficiente. A deficiência diz de diferença,

não constitui, simplesmente, um conceito de diversidade, ou pluralidade, e muito

menos o de necessidades especiais; também não ocupa o mesmo espaço

discursivo. Assim explica Fischer (1999)

Skliar defende que o termo diversidade, tão utilizado quando se fala de educação especial, na realidade indica uma estratégia bastante conservadora e inclusive hipócrita: aceita-se uma espécie de pluralidade diferente, a qual na maior parte das vezes está referida a uma norma ideal. Sua proposta é que se pense que as diferenças não seriam alguma coisa óbvia na cultura, que elas são construídas, são sempre políticas, não são

57 A LDB/96 incorpora como gestão democrática a participação dos profissionais da educação e a participação da comunidade escolar local em conselhos escolares ou equivalentes (alunos, pais, vizinhança, amigos, profissionais da educação).

81

algo por si indesejável e, finalmente, o fato de existirem não depende de uma autorização dada pelo mundo da normalidade (FISHER, 1999, p. 6).

De acordo com a nosografia médica e a Organização Mundial da Saúde

(OMS), ensina Cordié (1996), as deficiências podem ser classificadas como sendo

do tipo: deficiência de audiocomunicação; deficiência física-ortopédica; deficiência

mental; deficiência visual; deficiência de ajustamento emocional e múltipla

deficiência. A revisão que farei sobre deficiências baseia-se nos autores: Henri Ey

(1981), Ide (1993), Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados à Saúde (CID 10, 1993), Cordié (1996), Organização Mundial de

Saúde (OMS, 1997) e Quinet (2001).

Para o Programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência, publicado

em 1997, a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de

Deficiência (CORDE) e a Organização Mundial de Saúde (OMS), incapacidade é

toda restrição ou falta (devido a uma deficiência) da capacidade de realizar

atividades na forma ou na medida em que se considera normal para o ser humano.

Impedimento é considerado a situação desvantajosa para um determinado indivíduo,

em conseqüência de uma deficiência ou de uma incapacidade que lhe limita ou

impede o desempenho de um papel que é esperado em seu caso (em função de

idade, sexo e fatores sociais e culturais). 58

Nessa nosografia médica, esclarece Cordié (1996), o fator lesional e a

transmissão hereditária aparecem como causas essenciais das deficiências.

Segundo a Associação Americana de Deficiência Mental (AAMR) e o Manual

58 Não são raros esses termos ingleses serem trazidos, indiscriminadamente, como deficiência, englobando-se as idéias de incapacidade e de impedimento. Ficando, assim comprometida uma importante reflexão em torno do significado político, econômico e social das incapacidades impostas pela deficiência, mas que a rigor, não devem representar impedimento ao exercício da plena cidadania. (CARVALHO, 2001)

82

Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM – V), por deficiência mental

entende-se o estado de redução notável do funcionamento intelectual

significativamente inferior à média59, associado a limitação pelo menos em dois

aspectos do funcionamento adaptativo: comunicação, cuidados pessoais,

competência domésticas, habilidades sociais, utilização dos recursos comunitários,

autonomia, saúde e segurança, aptidões escolares, lazer e trabalho.

A forma de apreender as deficiências mentais se modificou bruscamente com

o surgimento dos testes, afirma Cordié (1996), nota-se que essa abordagem não

modificou profundamente a antiga, supõem-se até, que reforçou seu caráter

segregacionista, substituindo apenas os rótulos. Segundo essa concepção, a

deficiência mental pode ser caracterizada por um quociente de inteligência (QI)

inferior a 70, média apresentada pela população, conforme padronizado em testes

psicométricos ou por uma defasagem cognitiva em relação às respostas esperadas

para a idade e realidade sócio-cultural, segundo provas, roteiros e escalas,

baseados nas teorias psicogenéticas. Os superdotados, tal como o nome já indica,

apresentam quociente de inteligência acima do normal, ou seja, acima da média.

Geralmente são notados nas escolas, que, em alguns casos, já lhes oferecem

programações curriculares específicas, e, em raras hipóteses no Brasil, curso

especial. Essas pessoas apresentam facilidade enorme de aprendizado, não sendo

raras notícias narrando façanhas precoces desse grupo de pessoas.

Ao lado da capacidade criativa e da grande agilidade mental, decorrência de

inteligência superior, alguns superdotados podem apresentar problemas de

integração social bem grande. Dessa forma, pode-se, como já foi mencionado

acima, rejeitar a idéia de que a pessoa portadora de deficiência tem «falta de alguma 59 O conceito de deficiência (debilidade) origina-se da psiquiatria do século XIX, o termo em si não existia ainda, mas havia uma categoria que correspondia a esse tipo de deficiência intelectual: era a categoria dos “fracos de espírito”.

83

coisa». No caso dos superdotados, eles têm inteligência acima da média. No

entanto, em alguns casos, enfrentam dificuldades de integração social.

Essa crença de QI, conceito poço usado atualmente, é uma medida da

inteligência combatida, pois para vários psicólogos e psiquiatras60, a medida é

científica, e a deficiência se tinge de certo caráter pejorativo, trata-se sim de uma

avaliação comparativa, serve para avaliar, em um dado momento, as aquisições e as

condutas adaptativas de uma criança (CORDIÉ, 1996, p. 110). Essas condutas

adaptativas não se restringem apenas à função intelectual, importante destacar a

diversidade e a multiplicidade dos fatores que podem dificultar a eficiência da

aprendizagem. Lamenta-se o fato de que a crença numa inteligência mensurável,

estável, inata, gera a idéia de que a deficiência mental é constitucional.

Para a OMS (1997), ao tratar das deficiências físicas, escolheu-se o plural, já

que não há uma deficiência determinada, mas graus e variações de dificuldades de

integração social produzidas por uma deficiência. Não é apenas a falta de visão ou a

falta de um membro que causa a deficiência. Assim, trata-se, sempre, de um

conjunto de moléstias que podem provocar a dificuldade de integração social.

A OMS (1997) afirma que, as deficiências físicas referem-se ao

comprometimento do aparelho locomotor que compreende o sistema ósteo-articular,

o sistema muscular e o sistema nervoso. As doenças ou lesões que afetam

quaisquer desses sistemas, isoladamente ou em conjunto, podem produzir quadros

de limitações físicas de grau e gravidade variáveis, segundo o(s) segmento(s)

corporais afetados e o tipo de lesão ocorrida.

60 Destaque para o psicólogo Howard Gardner, da Universidade de Harward, nos Estados Unidos, que propõe “uma visão pluralista da mente” ampliando o conceito de inteligência única para o de um feixe de capacidades. Para ele, inteligência é a capacidade de resolver problemas ou elaborar produtos valorizados em um ambiente cultural ou comunitário. Dentro deste conceito a formação básica realiza-se pela construção de diferentes competências por meio de estimulação de habilidades. Ver GARDENER, Howard. Inteligências Múltiplas: a teoria na prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

84

Nas deficiências de locomoção, englobam-se, conjuntamente, as pessoas que

têm dificuldade de movimentos de uma forma geral. A alteração da função

locomotora pode estar ligada aos mais diversos fatores, desde a má formação

congênita, até a hipótese de um trauma, passando pela paralisia cerebral (PC)61, ou

ainda pela ocorrência de acidentes vasculares cerebrais (AVC).

O termo deficiência visual refere-se a uma situação irreversível de diminuição

da resposta visual, em virtude de causas congênitas ou hereditárias, mesmo após

tratamento clínico e/ou cirúrgico e uso de óculos convencionais. A diminuição da

resposta visual pode ser leve, moderada, severa, profunda e ausência total da

resposta visual (cegueira). Para a OMS (1997), o indivíduo com baixa visão ou visão

subnormal é aquele que apresenta diminuição das suas respostas visuais, mesmo

após tratamento e/ou correção óptica convencional, e uma acuidade visual menor

que 6/18 à percepção de luz, ou um campo visual menor que 10 graus do seu ponto

de fixação, mas que usa ou é potencialmente capaz de usar a visão para o

planejamento e/ou execução de uma tarefa.

Deficiência auditiva é considerada genericamente como a diferença existente

entre o desempenho do indivíduo e a habilidade normal para a detecção sonora de

acordo com padrões estabelecidos pela American National Standards Institute

(ANSI) 62. Ao lado das deficiências da audição, encontram-se, às vezes como sua

conseqüência, e/ou de forma isolada, os distúrbios de fala. Esses defeitos podem ter

origem na dificuldade de audição, mas também podem decorrer de outros problemas 61 Paralisia Cerebral é um distúrbio que afeta a postura e o movimento devido a uma encefalopatia estática (não progressiva), tendo a lesão cerebral ocorrido no período pré-natal, perinatal ou na infância precoce. Sua característica básica é o atraso do desenvolvimento motor, no entanto, a maioria das crianças são adicionalmente deficientes mentais, apresentam crises convulsivas e comprometimento cognitivo, sensorial, visual e auditivo (PARREIRAS, 1999). 62 Zero audiométrico (0 dB N.A) refere-se aos valores de níveis de audição que correspondem à média de detecção de sons em várias freqüências, por exemplo: 500 Hz, 1000 Hz, 2000 Hz, etc. Considera-se, em geral, que a audição normal corresponde à habilidade para detecção de sons até 20 dB N.A (decibéis, nível de audição).

85

alheios a esse. Nesse grupo, há possibilidade de integração social mais fácil do que

certos grupos já estudados, isto porque, apresentando apenas uma dificuldade de

articular as palavras, sem problemas de audição, a pessoa portadora de deficiência

poderá ocupar espaço social e profissional que pouco lhe exija da fala. Há inúmeras

possibilidades profissionais que não necessitam de manifestação oral.

Seguindo o raciocínio de Skliar (1999), faz-se necessário escapar da

armadilha da simples biologização da deficiência, para o autor essa “deveria ser

padronizada epistemologicamente” (SKLIAR, 1999, p. 18). Nesse sentido, a inversão

daquilo que foi considerado como princípio, como verdade codificada e como

questão comum é vital para a compreensão do “discurso deficiência”. Contudo, o

objeto desse discurso não se restringe à pessoa cadeirante ou que não aprende

segundo o ritmo e a forma de uma norma estabelecida e, sim, a processos

construídos culturalmente. Para Skliar (1999) “a deficiência não é uma questão

biológica e sim uma retórica de suas famílias ou dos especialistas. A deficiência está

relacionada com a própria idéia de normalidade e com sua historicidade” (SKLIAR,

1999, p. 18) 63.

A educação especial conserva para si um olhar iluminista sobre a identidade

de seus sujeitos, isto é, se valem de oposições de normalidade/anormalidade, de

racionalidade/irracionalidade e de completude/incompletude, como elementos

centrais na produção de discursos e práticas pedagógicas. A sociedade, geralmente,

lida com a pessoa com deficiência de modo equivocado. Por exemplo, conversa com

o deficiente físico como se ele não compreendesse, tende a infantilizar o diálogo e

as atitudes, mesmo quando adulto, fala com o surdo gritando. Isso acontece porque

63 Os valores e as normas praticadas sobre as deficiências formam parte de um discurso historicamente construído, onde a deficiência não é simplesmente um objeto, um fato natural, uma fatalidade. Esse discurso, assim construído, não afeta somente as pessoas com deficiência; regula também as vidas das pessoas consideradas normais (Skliar, 1999).

86

grande parcela da sociedade se deixa levar pelas aparências e forma conceitos

equivocados a respeito da deficiência e de quem a porta. Skliar (1999), em uma

discussão sobre o problema da alteridade deficiente, afirma que:

[...] na atualidade, a epistemologia tradicional da educação especial cedeu espaço a algumas representações sociais das identidades dos sujeitos deficientes; nelas os cegos, os surdos, as crianças com problemas de aprendizagem, são percebidos como totalidades, como um conjunto de sujeitos homogêneos, centrados, estáveis, localizados no mesmo contínuo discursivo. Assim, ser deficiente auditivo, ser deficiente visual, ser deficiente mental, constituem, todavia, matriz representacional, a raiz do significado identitário, a fonte única de caracterização biológica desses outros. (SKLIAR, 1999, p.19-20)

Certa mãe de uma criança com síndrome de Down, em uma entrevista

psicológica, afirma que num mundo tão competitivo seu filho havia nascido em

desvantagem e que ela estava disposta a tudo para ajudá-lo a diminuir (minimizar)

tal desvantagem64. A maioria das famílias luta contra essa situação que é real, não a

aceita, se mostra magoada com algo que não saíra como o planejado. Percebem

que precisam seguir uma direção, e começam tomar atitudes neste momento.

Procuram instituições especializadas, enfrentam barreiras e o preconceito da

sociedade.

É preciso que ocorra mudança significativa na maneira de ver o deficiente;

expressões como coitadinho, não dá conta, não pode; que se configuram como

posições paternalistas da família e da sociedade, de superproteção pouco

contribuem para mudanças de posições. A educação inclusiva conduz a um

questionamento sério em relação aos preconceitos e estereotipo, através dos quais

aprendemos que o problema é muito mais sério que a imputação de culpa por parte

da família, escola, sociedade. Cabe a todos fazer valer as leis municipais, estaduais

64 Trecho da palestra feita pelas Psicólogas da APAE/BD na III Conferência Municipal de Saúde de Bom Despacho, Minas Gerais, em agosto de 1994.

87

e federais para e com a pessoa com deficiência, trabalhar em função do

reconhecimento desses como cidadãos capazes, integrantes, participantes e sujeitos

da nossa história.

4.2. IGUALDADE, DIFERENÇA E DIVERSIDADE: CONTROVÉRSIAS NO

UNIVERSO DA INCLUSÃO ESCOLAR

Ainda que analisadas de forma ainda sucintas as questões relativas à

inclusão escolar, na perspectiva das políticas públicas, adentra-se a seguir, no

campo da cultura e da diferença cultural como um dos referenciais relevantes para

este trabalho. Isto é, analisar os sentidos e significados produzidos por alunos e

professores no cotidiano de uma escola do Sistema Regular de Ensino na cidade de

Bom Despacho, Minas Gerais, a partir da matrícula e convivência de alunos com

necessidades educacionais especiais, no período após 1996.

O termo Cultura, do verbo latino colere, referia-se na Antigüidade ao cultivo e

ao cuidado com as plantas, os animais e tudo que se relacionava com a terra; donde

o termo agricultura. Por extensão, passa a ser usado para referir-se ao cuidado com

as crianças e sua educação, estendendo-se ainda ao cuidado com os deuses;

decorrendo daí o termo culto. Em síntese, Cultura passa a designar o cuidado com a

terra para torná-la habitável e agradável aos homens, o zelo com as divindades, os

ancestrais e seus monumentos, ligando-se à memória e, por ser usado como o

cuidado com a educação, referia-se ao “cultivo do espírito”. Segundo o Dicionário

Aurélio (2002), cultura é categoria dialética de análise do processo pelo qual o

88

homem, por meio de sua atividade concreta (espiritual e material), ao mesmo tempo

em que modifica a natureza, cria a si mesmo como sujeito social da história. 65

A pluralidade humana se manifesta por meio da diferença, da diversidade da

espécie em sua especificidade, singularidade, originalidade, identidade, igualdade e

a desigualdade que são construções sociais. A igualdade “básica”, segundo Escorel

(1999) é o reconhecimento do outro como igual em direitos, porém diferente em

personalidade; é a igualdade das diferenças frente a algo que é comum. A relação

com o outro, a relação de reciprocidade, a ação frente à diferença que é

caracterizada nas interações com o “estrangeiro”, no reconhecimento (ou não) de

semelhanças.

Skliar (1999) esclarece que Bhabha (1998) propôs uma maior distinção entre

os termos diferença e diversidade e criticou o uso desse último pelo discurso liberal

para denotar a importância de uma sociedade “plural e democrática”. Bhabha (1998,

In Skliar, 1999) alertou, ainda sobre a existência de uma "norma transparente” que

se instala, sempre, na diversidade, construída pela sociedade que hospeda os

outros e que cria e supõe um falso consenso de igualdade. Assim, a estrutura

normativa produz uma contenção, uma obstrução e uma falsificação da diferença

cultural. 66

De acordo com Skliar (1999), algumas premissas que possibilitam a

compreensão das diferenças são: elas não se constituem como uma obviedade

cultural, nem como marca de “pluralidade”; elas se constroem histórica, social e

politicamente; elas não se caracterizam como totalidades fixas, essenciais e

inalteráveis; elas são sempre diferenças e não devem ser entendidas como um

65 Para entender mais sobre o termo cultura ver Laraia (1999) e Cuche (1999), dentre outros. 66 Sobre diferença e diversidade, ver Bhabha (1998).

89

estado não desejável, impróprio, de algo que cedo ou tarde voltará a normalidade.

As diferenças, dentro de uma cultura, devem ser definidas como diferenças políticas

e, não simplesmente, como diferenças formais, textuais ou lingüísticas; as

diferenças, ainda que vistas como totalidades, ou colocadas em relação umas com

as outras, não são facilmente permeáveis nem perdem de vista suas fronteiras; a

realidade das diferenças existe independentemente da autorização, da aceitação, do

respeito da permissão ou da outorgação da normalidade.

Segundo Moreira (2002), reconhecer a diferença cultural na sociedade e na

escola traz como primeira implicação, para a prática pedagógica, o abandono de

uma perspectiva monocultural. Ou seja, todos os estudantes são idênticos, com

saberes e necessidades semelhantes, o que exime a escola de diferenciar o

currículo e a relação pedagógica que se estabelecem na sala de aula, dificultando,

assim, o aproveitamento da riqueza, implicada na diversidade de símbolos,

significados, padrões de interpretações e manifestações que se acham presentes na

sociedade e nas escolas.

A partir da compreensão da sociedade como constituída de identidades

plurais, com base na pluralidade de etnia, gênero, classe social, padrões culturais e

lingüísticos, habilidades e outros marcadores, configura-se a perspectiva

intercultural e a opção por uma postura correspondente na área da educação,

tornando-se um horizonte norteador, que conforme Canen & Oliveira (2002), é uma

necessidade imperiosa.

A compreensão das formulações de Sodré (1999), explicitada na citação

abaixo, é importante para percepção de identidade:

Dizer identidade é designar um complexo relacional que liga o sujeito a um quadro contínuo de referências, constituído pela interseção de sua história individual com a do grupo onde vive. Cada sujeito singular é parte de uma

90

continuidade histórico-social, afetado pela integração num contexto global de carências naturais, psicossociais e de relações com outros indivíduos, vivos e mortos. A identidade de alguém, de um “si mesmo”, é sempre dada pelo reconhecimento do “outro”, ou seja, a representação que o classifica socialmente. (SODRÉ, 1999, p. 34).

As diferenças são inerentes ao ser humano e, na diferença não estão

somente às minorias ou as crianças com deficiências. Todos somos diferentes. Às

vezes se entende errado o conceito de diversidade, porque falar de diversidade é

falar de coletivo e, no interior desse coletivo, também existem muitas diferenças

individuais. Ou seja, as diferenças próprias uma condição a qualquer ser humano.

O cenário escolar, como todo contexto social, é constituído por indivíduos que

apresentam semelhanças, quando olhados como coletividade, porém,

fundamentalmente, diferentes nas peculiaridades de sua individualidade. Todos têm

particularidades que fazem com que, em muitos aspectos (idéias, classe social, cor

da pele, formas de expressar a afetividade) sejam semelhantes a muitas outras

pessoas, revela-se diferentes na complexidade das características individuais e nas

diversas formas de pensar, sentir e agir que nos fazem únicos e singulares. Tais

diferenças dependem e são produtos da interação das características biológicas que

cada pessoa apresenta, do nível de desenvolvimento em que cada um se encontra e

dos significados atribuídos às situações vividas no cotidiano.

Nessa perspectiva, não existe uma sociedade isolada, nem em sua própria

representação, nem na análise sobre a representação dos seus membros. A

interculturalidade implica no reconhecimento dessas diferenças culturais, em ir além

da valorização da diversidade cultural em termos folclóricos ou exóticos, para

avançar no sentido de questionar a própria construção das diferenças e, por

conseguinte, dos estereótipos e preconceitos contra aqueles estigmatizados como

“diferentes”, no seio de sociedades desiguais e excludentes.

91

De acordo com Canen & Xavier (2001), é preciso repensar as questões e os

desafios ligados ao papel da escola, singular ou plural, única ou não, especial,

regular ou inclusiva, como espaço de encontros e desencontros culturais, bem como

de regulação e produção de significados e de identidades culturais.

A perspectiva intercultural orienta processos que têm, por base, o

reconhecimento do direito à diversidade e a luta contra todas as formas de

discriminação e desigualdade social e tenta promover relações dialógicas e

igualitárias entre pessoas e grupos que pertencem a universos culturais diferentes.

Neste sentido, trata-se de um processo permanente, sempre inacabado, marcado

por uma deliberada intenção de promover uma relação dialógica e democrática entre

culturas e os grupos involucrados e não visando a apenas, uma coexistência

pacífica, num mesmo território. Candau (2002) enfatiza que essa seria a condição

fundamental, para qualquer processo ser qualificado como intercultural.

De acordo com esta concepção de inclusão, a educação especial passa a

buscar uma direção menos restritiva possível, invertendo o processo atual, no qual a

diferença tem sido motivo de segregação. A adequada resposta aos alunos que

possuem necessidades educacionais especiais exige a existência de um projeto

educativo na escola, elaborado e compartilhado pela comunidade escolar, que

contemple tanto o âmbito conceitual quanto o metodológico e o organizacional.

É preciso conceber a escola como espaço sociocultural, construído no

cotidiano das práticas escolares, abrindo para a possibilidade de pensar o processo

educativo escolar como heterogêneo fruto da ação recíproca entre sujeito e

instituição, e capaz de reconhecer e incorporar positivamente a diversidade no

desenvolvimento dos alunos como sujeitos socioculturais, ensina Candau (2002).

92

O debate atual está centrado nas direções entre integração escolar e inclusão

escolar. O assunto cria inúmeras e infindáveis polêmicas, provoca as corporações

de professores e de profissionais que atuam no atendimento às pessoas com

deficiência e outros que tratam clinicamente de crianças e jovens com problemas

escolares e de adaptação social. E também "mexem" com as associações de pais

que adotam paradigmas tradicionais de assistência às suas clientelas, afetando,

também, e muito os professores da educação especial que se sentem temerosos de

perder o espaço que conquistaram nas escolas e redes de ensino. Os professores

do ensino regular consideram-se sem competência para atender às diferenças nas

salas de aula, especialmente aos alunos com deficiência, avaliam que seus colegas

especializados se distinguem por realizar esse atendimento e exageram essa

capacidade de fazê-lo aos olhos de todos. Há também um movimento contrário de

pais de alunos sem deficiências que resistem à inclusão escolar, por acharem que

as escolas vão baixar e/ou piorar ainda mais a qualidade de ensino se tiverem de

receber esses novos alunos.

Nesse jogo político-institucional quem perde são os alunos e a educação

brasileira, que tem suas novas gerações mais uma vez privada dos benefícios de

uma escola que ensinaria justiça, democracia e abertura às diferenças, pelo método

mais eficiente: a convivência entre pares.

Na inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais no espaço

escolar regular, afirma Mantoan (1997), não se trata apenas incluir fisicamente. O

que se pretende é criar as condições de inclusão de todos na aprendizagem,

favorecendo a integração interpessoal entre alunos deficientes e não deficientes,

para o que se impõe aprimorar a qualidade das respostas educativas da escola para

todos.

93

A inclusão escolar esclarece Mantoan (1998), remete a escola a questões de

estrutura e de funcionamento que subvertem paradigmas e que implicam em um

redimensionamento de seu papel, para um mundo que evolui a “bytes”. Considera-

se que o movimento inclusivo nas escolas, ainda que gere controvérsias pelo caráter

ameaçador de toda e qualquer mudança, é fato e deve ser uma realidade nacional,

nas escolas públicas como na rede privada de ensino, para que haja realmente um

espaço amplo e democrático, destinado a todos, sem discriminações.

Sassaki (1998) pondera que o princípio constitucional da igualdade aplica-se,

particularmente, à educação brasileira, cujas estatísticas divulgadas pelo MEC “em

1993 evidenciam que somente cerca de 3% dos nossos deficientes recebem

atendimento educacional”. Dados preliminares do Censo Escolar 2004, feito pelo

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep/MEC) em parceria

com as secretarias estaduais e municipais de educação, divulgado em 06 de outubro

de 2004 em Brasília, indicam que houve expansão no número de alunos na

educação infantil, educação de jovens e adultos e um crescimento significativo da

inclusão de estudantes com necessidades educativas especiais em classes

comuns67.

Segundo Silva (2003), os dados estatísticos de 1974 (BRASIL, 1998)

indicavam um total de “96.413 matrículas em educação especial”, “58,2% em

estabelecimentos públicos e 41,8% em privados; em 1994” não há informe

estatístico a respeito da educação especial; o quadro em 1996 (BRASIL, 1997) era de

“104.268 matrículas, 58,3% na rede pública e 41,7% no setor privado; em 2000”

67 Em 1998, os estudantes com necessidades especiais em classes comuns eram 43,9 mil; em 2003, 145,1 mil em 2004, 194,5 mil. Minas Gerais registrou crescimento na educação especial (tanto em classes comuns quanto em escolas ou salas exclusivas), saltaram de 45,5 mil em 1998, para 57,6 mil em 2004.

94

(BRASIL, 2001) os dados apresentavam “382.215 matrículas, com 55,9% na rede

pública e 44,1% no setor privado” 68.

Prieto (2003) considera que o discurso governamental e a legislação

educacional brasileira vêm reforçando o propósito de atender alunos com

necessidades educacionais especiais preferencialmente na rede regular de ensino

(Prieto, 2003, p.128). O que, então, justificaria essa ampliação das matrículas na

rede privada? Seria a demonstração do descompasso entre o discurso e a ação

governamental? Ou o setor privado se configura, na maioria das vezes, como

alternativa única quando o aluno requer atendimento com maior grau de

especificidade? Essas são apenas algumas das perguntas que continuam sem

respostas.

Para Silva (2003), há uma grande dificuldade ao se analisarem os informes

estatísticos em relação à educação especial, pois a coleta de dados a cada ano

utiliza procedimentos muito diferenciados: em 2000 ocorre a retirada, por exemplo,

dos dados acerca de “outros atendimentos69”, que correspondiam a serviços de

educação especial desenvolvido em organizações não governamentais, mas que

não eram de caráter estritamente escolar, previstas no artigo 60 da LDB/9670. Onde

as instituições diluíram estes dados?

68 Dados obtidos no site www.mec.gov.br, mais especificamente os divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), em consultas realizadas no mês de novembro de 2002. 69 Considera-se outros atendimentos, os atendimentos específicos da área clínica terapêutica (psicologia, terapia ocupacional, estimulação precoce, fisioterapia, neurologia, pediatria) oferecidos em instituições não governamentais, como por ex. as APAEs. 70 No art. 60 LDB/96 os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder público. Parágrafo único. O poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo.

95

A educação, que é uma política pública de cobertura universal e que está

vinculada ao próprio direito básico da pessoa ao desenvolvimento, será tanto mais

respeitada quanto maior for o empenho da sociedade na demanda concreta de

operacionalização do direito positivado e quanto maior for a superação dos

paradigmas tradicionais que permeiam e empobrecem a leitura da lei.

Dados do Censo Escolar71 de 2003 (MEC/INEP) registram que a participação

do atendimento inclusivo cresceu, no Brasil, passando dos 24,7% de 2002 para

28,7% em 2003, um crescimento de 30,6% em apenas um ano, em relação às

matrículas. A participação do atendimento em separado, nas classes especiais e nas

escolas especiais, diminuiu, passando de 75,3% para 71,3%. Conforme mostram os

Quadros 1:

- 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Tipo de Necessidade

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Qtd. Alunos

Total Brasil 201.142 334.507 337.326 374.129 300.520 323.399 337.897 500.375Deficiência Visual

8.081 13.875 15.473 18.629 8.019 8.570 9.622 20.521

Deficiência Auditiva

30.578 43.241 42.584 47.810 35.545 36.055 35.582 56.024

Deficiência Física

7.921 13.135 16.463 17.333 10.764 12.182 11.817 24.658

Deficiência Mental

121.021 189.370 181.377 197.996 178.005 189.499 199.502 251.506

Deficiência Múltipla

23.522 47.481 42.582 46.745 41.726 47.086 50.484 62.283

Condutas Típicas

9.529 25.681 8.994 9.223 7.739 9.190 9.744 16.858

Superdotação 490 1.724 1.187 1.228 454 692 625 1.675Outras - - 28.666 35.165 18.268 20.125 20.521 66.850

QUADRO 1 – Evolução de Alunos com Necessidades Especiais por Tipo de Deficiência – 1996-2003. FONTE: MEC/INEP/SEEC (2004)

71 Segundo o MEC/INEP o censo escolar coleta anualmente informações sobre a educação básica, abrangendo todas as suas etapas/níveis (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e modalidades (ensino regular, educação especial, educação de jovens e adultos e educação profissional de nível técnico). O amplo conjunto de informações produzidas pelo censo escolar sobre matrículas, funções docentes, estabelecimentos, turmas, rendimento e movimento dos alunos e transporte escolar constituem subsídio indispensável para formulação, implementação e avaliação das políticas educacionais das três instâncias de governo: União, Estados e Municípios” (MEC/INEP/SEEC, 2004).

96

Para além dos dados desse quadro que aponta crescimento da matrícula de

alunos com necessidades educacionais especiais, é preciso pensar na

complexidade do processo de inclusão escolar, a matrícula não necessariamente

garante a inclusão desse aluno. No cerne do processo inclusivo existe, portanto,

uma importante e contemporânea discussão sobre a superação paradigmática, com

conseqüente abertura de um contexto prático-discursivo sobre a relação deficiência

– diferença - necessidades educacionais especiais. Dentro do mesmo propósito está

a discussão sobre o desenvolvimento de uma crítica e uma ação política a respeito

da formação inicial e continuada dos profissionais da educação.

Segundo dados do MEC/INEP (2005), o censo escolar de 2005 contabilizou

56,5 milhões de matrículas, considerando-se todas as etapas e modalidades da

educação básica. Em relação ao ano anterior, houve uma pequena queda de 0,7%

no número total de matrículas, que corresponde a uma redução de 379 mil

matrículas, nas séries iniciais do ensino fundamental e no ensino médio. Observa-se

no Quadro 2, que o comportamento da matrícula da educação especial continua

registrando crescimento da matrícula, se comparado aos anos anteriores. Esses

dados provocam, em meu pensar, reflexão sobre o tema da inclusão escolar, pois à

medida que alunos com necessidades educacionais especiais aumentam sua

presença na escola, abre-se a possibilidade do desafio da inclusão ser diálogo de

construção. Ou corre-se o risco indevido de estabelecer relações geradoras de

preconceitos/estigma que confluem para ações discriminatórias.

97

ETAPAS/MODALIDADES DE EDUCAÇÃO BÁSICA

2005 2004 DIFERENÇA: 2005-2004

VARIAÇÃO % EMRELAÇÃO A 2004

Educação Infantil 7.205.013 6.903.763 301.250 4,4% Creche 1.414.343 1.348.237 66.106 4,9% Pré-escola 5.790.670 5.555.526 235.144 4,2% Ensino Fundamental 33.534.561 34.012.434 -477.873 -1,4% Ensino Médio 9.031.302 9.169.357 -138.055 -1,5% EJA 5.615.409 5.718.061 -102.652 -1,8% Educação Especial 378.074 371.382 6.692 1,8% Educação Profissional 707.263 676.093 31.170 4,6% TOTAL 56.471.622 56.851.090 -379.468 -0,7% Quadro 2 – Matrícula em 2005 e 2004, segundo etapas/modalidades da educação básica Fonte: INEP/MEC – Censo Escolar (2005)

Para Beust (2000), cabe à educação assumir a extraordinária

responsabilidade72 de formar o indivíduo para que ele possa interagir como pessoa

em desenvolvimento na sociedade. O direito fundamental à educação assegurado a

crianças e adolescentes, de forma indiscriminada e universal está esculpido na

doutrina da proteção integral a qual, de forma absolutamente inovadora e

revolucionária, veio abrir novos horizontes para o atendimento dessa população

brasileira. Mas, o que significa essa não-discriminação e universalidade, no contexto

de um país marcado pela pobreza, pelo desemprego, por problemas sociais,

econômicos e políticos agudos e que parecem não ter fim? Mesmo assim, é possível

falar em não-discriminação e universalidade da educação?

A Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais vem propondo uma

retomada da discussão da natureza e dos objetivos da escola pública regular,

sustenta Mafra (2002). As implicações pedagógicas que se pode retirar dessas

novas contribuições teóricas são inúmeras e a LDB/96 já indica algumas delas em

72 Na sua origem, responsabilidade provém do latim responsus, particípio do verbo respondere, que significa responder, corresponder. Responsabilidade, portanto, indica bem mais do que simplesmente “compromisso” ou “dar conta dos próprios atos”. Implica comunicação, resposta, envolvimento, responsabilidade é vida e crescimento (BEUST, 2000, p.64).

98

seu texto, quando se refere, por exemplo, quando sugere planos de

desenvolvimento individualizados das escolas, respeitando a identidade social e

cultural dos alunos, participação ativa dos pais nas decisões das escolas e outros

meios pelos quais podemos compatibilizar os princípios de uma educação

verdadeiramente inclusiva, com alternativas pedagógicas e organizacionais

necessárias à sua consecução. Em poucas palavras, mudam-se as escolas e não

mais os alunos.

99

5. OS LUGARES DA PESQUISA: A CIDADE E O BAIRRO

O objetivo deste capítulo é descrever, de forma breve, apenas os aspectos e

as condições que caracterizam a cidade de Bom Despacho, a fim de enfocar

questões que esclareçam o comum e o especial, a exclusão e a inclusão no âmbito

da história da educação do município. Nogueira (2005) destaca a relevância dos

acontecimentos locais interioranos, pois mesmo de modesta monta, são expressões

da atividade humana e objetos da História, para quais todos os fatos são valiosos,

desde que possam contribuir para revelar a verdadeira fisionomia dos episódios e

dos personagens que os constitui.

5.1 BOM DESPACHO: HISTÓRIAS, CONTOS E LENDAS

Uma história detalhada de uma comunidade representa a mais legítima contribuição à história regional e nacional. A história de uma nação é incompleta se deixa de tratar dos interesses dos homens comuns, e a história local cuida como nenhuma outra dos acontecimentos diários dos homens comuns, promovendo deste modo um conhecimento mais seguro e amplo da vida nacional que o historiador tenta reconstruir. (NOGUEIRA, 2005, p. 9, citando José Honório Rodrigues)

Teixeira (2005)73 esclarece que as diversas narrativas feitas sobre a História

de Bom Despacho, destaque para as lendas orais colhidas pelo vigário padre

Nicolau Ângelo Del Duca (1886/1927) e os livros dos historiadores Laércio

Rodrigues - História de Bom Despacho – origem e formação (1968) e Orlando

Ferreira de Freitas - Raízes de Bom Despacho (2005), somados com seus 73 Cronista do Jornal de Negócios de Bom Despacho e divulgador da história e das estórias de Bom Despacho. Ver Freitas (2005).

100

patrimônios imateriais e móveis (A Biquinha, a Cruz do Monte, A Tabatinga, O

Quenta-Sol, a Igreja Matriz, a Praça da Estação com a Maria-fumaça, os conjuntos

arquitetônicos da Santa Casa, da Vila Militar, dos seculares casarões rurais),

riquezas e heranças, as lendas, o reinado e as folias-de-rei, a língua da Tabatinga;

são riquezas que compõem a História de Bom Despacho, elementos essenciais para

a formação da identidade, da cidadania e da auto-estima do indivíduo; e ademais de

todo o povo deste município altaneiro dos altiplanos de Minas, abençoado pela

Senhora do Bom Despacho e banhado pelas águas do Lambari, do Picão e do São

Francisco. (TEIXEIRA, 2005, p.19).

FIGURA 1: Igreja Matriz Nossa Senhora do Bom Despacho. Bom Despacho, MG. Fonte: Foto de Registro de Pesquisa de Campo de 18 de junho de 2004.

101

5.2.1 DE SENHORA DO SOL A BOM DESPACHO

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no universo... Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer. Porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura.

(Fernando Pessoa, 2003)

O município de Bom Despacho está situado no centro-oeste do Estado de

Minas Gerais, a 147 km de Belo Horizonte, entre as cidades de Nova Serrana e Luz.

Em termo político-administrativo, insere-se na Região Administrativa do Alto São

Francisco. Partindo-se de Belo Horizonte ou do Triângulo Mineiro, chega-se a Bom

Despacho pela BR 262.

Mapa 1: Mapa Rodoviário, vias de acesso à Bom Despacho (MG). Fonte: SENHORA DO SOL, 2002a.

Conhecida, também, como a Cidade da Senhora do Sol, Bom Despacho

surgiu de uma pequena aldeia fundada nos fins do século XVIII por colonizadores

portugueses, num “lugar verdadeiramente pitoresco pela imensidade e beleza de

102

seu horizonte”, os patrícios e amigos encontram-se, por ocasião de suas caçadas,

para as longas conversas de saudades e de esperança (GUERRA, 1985, p.28).

Também definida como lugar de boa gente, antigos garimpos de cristal, muito gado

leiteiro, um rico folclore (como o congado), 74 bandas de músicas, belezas naturais,

áreas de lazer.

A História da formação de Bom Despacho iniciou-se na ponte do Lambari,

alongando-se para oeste, até atingir as nascentes do Rio Picão, daí em diante, à

74 De acordo com Gabarra (2005), o congado é uma manifestação cultural brasileira, de influência africana e católica. Essa festa, composta por uma série de ritos populares, preservam uma tradição, mas, ao mesmo tempo, se mostram dinâmicos, cheios de incorporações modernas. Por esse motivo permanecem vivos ao longo do tempo, mostrando um espetáculo de cores, música, alegria e vitalidade cultural. Entre a religiosidade e a profanação, o congado se constitui numa festa, dentre as inúmeras da cultura brasileira, com encantos etno-musicais. As festas de congado são também chamadas de Reinado ou Reisado do Rosário e tiveram início na antiga capital de Minas: Ouro Preto. Os principais pólos festeiros em Minas Gerais estão concentrados na região metropolitana de Belo Horizonte, Sete Lagoas, Montes Claros, Raposos, Oliveira, Bom Despacho e Dores do Indaiá.

FIGURA 2: Festa de Congado em Bom Despacho (MG). Fonte: Foto de SENHORA DO SOL, 2004 .

103

fazenda da Piraguara e ao Rio São Francisco. No início da segunda metade do séc.

XVII cessada a febre do ouro e com as minas quase já sem exploração, ocorreu uma

decadência da cidade de Pitangui75 assim como toda a Capitania.

Muitos dos que viviam nessa localidade partiram para a região entre os rios

Lambari e São Francisco em busca de subsistência por meios de outras atividades

econômicas. Na área ocorreu formação de quilombos76 que foram liquidados. As

áreas conquistadas foram sendo distribuídas em sesmarias, resultando na formação

das primeiras fazendas de criação de gado.

A partir de 1770, o Capitão Francisco de Sá é mencionado como o primeiro

criador de gado, na condição de proprietário da fazenda do Rio Picão. Daí em diante

intensificou-se o processo de ocupação. Reza a tradição que Domingos Luiz de

Oliveira, Manoel Ribeiro da Silva e o Padre Vilaça construíram a pequena ermitã77

coberta de capim, da qual originou-se a aldeia de Nossa Senhora do Bom

Despacho, que se tornou centro polarizador da região, hoje a cidade de Bom

Despacho. Com o decorrer dos anos foi rodeada de outras construções, como

casas, ranchos, e vendas favorecendo a formação do Arraial da Nossa Senhora do

75 Antiga sede administrativa de Bom Despacho. Como seu primeiro explorador da localidade da Vila de Pitangui, é apontado o bandeirante Bartolomeu Bueno da Siqueira (Anhangüera II), que, por volta de 1694, chegou com sua bandeira até as paragens da Vila de Pitangui. Com a descoberta das suas riquezas auríferas (1709), segundo Freitas (2005), uma multidão de portugueses, em sua maioria originários do norte de Portugal, fez de Pitangui um ponto de partida para se embrenharem pelos sertões incultos. Os motins em 1720 empurraram, para o oeste, aventureiros, foragidos, clérigos, mocambeiros que, segundo tradição pouco conhecida, esses rebeldes acamparam por algum tempo no lugar que foi berço da cidade de Bom Despacho. 76 Os quilombos ficaram conhecidos na história como núcleos de resistência à escravatura. Como “um espaço construído pelo escravo fugido, que encontrava nesses lugares ermos as condições necessárias para sobreviver e tentar reconstruir-se espaço de vivências, produzindo o seu próprio sustento ou através dali ter acesso às condições mínimas de sobrevivência”. (Maestri, 1996). ANPED. Negro e Educação: identidade negra, pesquisas sobre o negro e a educação no Brasil. Rio de Janeiro, 2004. 77 Do gr. eremítes, pelo lat. tard. eremita. Segundo padrão erudito é próprio daquele (a) vive no ermo por penitência. Ermida – igreja construída em local isolado (que se encontra sozinha).

104

FIGURA 3: Capelinha da Rua Cruz do Monte – Bom Despacho, MG. Fonte: Foto de SENHORA DO SOL, 2004 .

Bom Despacho, conforme relata Padre Nicolau Ângelo Del Duca em 1886, segundo

Rodrigues (1967)78:

“Mais tarde, no reinado d’El Rei D. José de Portugal, no ano de 1775, mais ou menos, aqui aportaram três portugueses: Domingos Luiz de Oliveira, Manoel Ribeiro da silva e Padre Vilaça. (...) É corrente que estes três portugueses foram deportados para o Brasil e que em Portugal pertenceram a ordem religiosa, sendo os dois primeiros leigos e o terceiro pelo menos iniciado em alguma ordem sagrada; (...). Parece pois evidente que estes homens, a par de muitos outros, fossem vítimas do despotismo e ódio do célebre ministro d’El Rei D. José, o Sr. Marquês de Pombal, na sua guerra encarniçada contra as ordens religiosas. (...) é precisamente no cume dessas três colinas que se acham fundados os nossos mais importantes edifícios, isto é, a Matriz de Nossa Senhora do Bom Despacho, a Capela da Cruz do Monte e o Cemitério. (Rodrigues, 1968, p. 109-110)

Segundo Freitas (2005), estudando a história oral ou escrita dos municípios

do centro-oeste mineiro depara-se com um excessivo número de fantasias criadas

pela tradição e que nem sempre correspondem com a realidade. Tarefa difícil é

separar a realidade da lenda, essa de maior poder de atração. Segundo o historiador

Freitas (idem), o autor da nossa primeira história, registrada a partir de documentos

oficiais, titulou o sesmeiro alferes Luís Ribeiro da Silva como “fundador” e “patriarca”

78 Sobre a historiografia de Bom Despacho, ver: FREITAS (2005), GUERRA (1985), site: http://www.senhoradosol.org.br/historiadebomdespacho.

105

de Bom Despacho, supondo que, após o ato de doação do patrimônio, em seguida,

dar-se-ia o processo de povoamento. Ocorre que esse processo de povoamento já

estava em andamento havia vários anos em outro local, desconsiderado pelo

pesquisador, com sua capela já erguida desde 1766. No interior da ermida foram

sepultados os restos mortais do alferes Luís Ribeiro da Silva, Domingos Luís de

Oliveira e de Francisco Martins da Silva Vilaça (FREITAS, 2005, p. 217-278).

Existem controvérsias a respeito do nome do município. Uma corrente o

atribui à devoção do fundador da capela, Luiz Ribeiro da Silva, que como outros

portugueses povoadores do Oeste Mineiro, eram procedentes da Província do

Minho, norte de Portugal, onde era fervoroso o culto a Nossa Senhora do Bom

Despacho. Outra corrente afirma que a denominação surgiu na ocasião de uma seca

prolongada, ocorrida entre 1767 e 1770, penalizando pessoas, animais e lavouras.

Então os devotos de Nossa Senhora do Bom Despacho fizeram súplicas e orações

pedindo chuva. Certos de que suas preces foram ouvidas, pois a chuva não

demorou chegar, ergueram a capela em honra à Santa. Foi em 1801 e 1831, que o

arraial começou a desenvolver seu potencial.

A principal atividade econômica era criação de gado, secundada pela

produção de rapadura e aguardente, bem como pelas culturas de arroz, milho,

mandioca e algodão. Em 1812, o arraial constituído ao redor da Capela de Bom

Despacho, através da carta régia, atingiu a condição de instituição civil.

Com a aquisição de contornos urbanos, resultante do desenvolvimento do

comércio e do setor produtivo local, a comunidade requereu inutilmente, durante

anos, a elevação do arraial à categoria de Vila. O município só foi criado em 1911,

em 30 de agosto, com o desmembramento da cidade de Santo Antônio do Monte. A

106

Vila foi efetivamente instalada em 1º de junho de 1912, contando com dois distritos:

Bom Despacho e Engenho do Ribeiro.

Observa-se nas histórias de Bom Despacho a presença, desde os seus

primórdios, de grupos tradicionalmente excluídos: degredados, escravos fugidos,

mulatos cativos, religiosos idealistas que, enraizados na pré-história de Bom

Despacho, são referências no entendimento do processo de inclusão/exclusão

vividos nos tempos atuais. Busca-se a proteção da santa, que, segundo o historiador

Augusto de Lima (1978), a Senhora do Bom Despacho é a “padroeira dos pecadores

e rebeldes e dos gentios chamados à fé cristã”.

Fonte: Foto de SENHORA DO SOL, 2004 .

FIGURA 5: Imagem de Nossa Senhora do Bom Despacho

FIGURA 4: Imagem de Nossa Senhora do Bom Despacho.

107

5.3 “NUM TEMPO E NUM LUGAR”

Bom Despacho terra produtiva

Que uma gente altiva sabe cultivar Na cidade labor ardente em Minas presente

Põe-se a brilhar. (Roberto Teixeira Campos, Hino de Bom Despacho)

A partir dos dados obtidos pelo Instituto de Desenvolvimento Industrial de

Minas Gerais (INDI), elaborou-se um documento com o perfil municipal de Bom

Despacho, contendo informações básicas geográficas, econômicas e sociais,

concentrando dados que fornecem subsídios preliminares sobre a infra-estrutura e

recursos existentes nas cidades, sinalizando as potencialidades do município79.

79 Para maiores informações acessar o site: www.senhoradosol.com.br

Mapa 2: Fotografia de Satélite da Cidade de Bom Despacho/MGFonte: SENHORA DO SOL, 2002b.

108

Bom Despacho apresentou, segundo a contagem populacional efetuada pelo

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2001, uma população total

de 40.914 habitantes, sendo os residentes da zona urbana em número de 37.198 e

da zona rural 2.721. A estimativa é de que o município já tenha ultrapassado os

50.000 habitantes, conforme apresentado na Tabela 1, a seguir:

TABELA 1 Crescimento Populacional de Bom Despacho (1970-2002)

ANOS URBANA RURAL TOTAL 1970 20.088 7.210 27.298 1980 24.357 4.996 29.353 1991 30.823 4.507 35.330 2000 37.198 2.721 39.919

2002 (1) 40.914 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (1) Dados preliminares

De acordo com documento produzido pelo INDI (2003) 80, as principais

atividades econômicas de Bom Despacho estão concentradas na fabricação de

produtos alimentícios e bebidas, fabricação de produtos têxteis, confecção de artigos

do vestuário e acessórios, preparação de couro e fabricação de artefatos de couro –

artigos para viagem e calçado, fabricação de produtos de madeira, edição e

impressão e reproduções de gravações, fabricação de artigos de borracha e plástico,

fabricação de produtos minerais não-metálicos, metalurgia básica, fabricação de

móveis. Como podemos observar no Tabela 2, destaque para a tradição da cultura

voltada para agropecuária e pecuária.81

80 Este documento encontra-se no arquivo do INDI em Belo Horizonte e está disponível nos sites: www.indi.mg.gov.br e www.senhoradosol.com.br. 81 Inclui apenas empresas com 10 ou mais empregados.

109

TABELA 2

População Ocupada Por Setores Econômicos – 2000

SETORES No. DE PESSOAS Agropecuário, extração vegetal e pesca 2.400 Industrial 4.073 Comércio de Mercadorias 3.880 Serviços 7029 TOTAL 17.382

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

As perspectivas favoráveis ao desenvolvimento econômico, social, cultural e

da cidade estão pautadas na sua localização privilegiada na região do Alto São

Francisco, por ser bem servida de recursos hídricos, formação vegetal

predominantemente de campo cerrado, a chegada da linha férrea, a presença do 7º

Batalhão de Polícia Militar de Minas Gerais, o crescimento da bacia leiteira

aceleraram a expansão em todos os setores, educacionais, sociais, religiosos e

comerciais, principalmente dos estabelecimentos de ensino.

A rede de ensino da cidade é constituída nos níveis de educação infantil,

ensino fundamental, ensino médio, ensino profissionalizante, ensino superior e

educação especial. A cidade possui dezessete estabelecimentos de ensino pré-

escolar, vinte de ensino fundamental, três de ensino médio, um de ensino superior82

e um de educação especial. Sendo que, doze são vinculados à rede municipal, doze

rede estadual e nove à rede particular, segundo dados da Secretaria Municipal de

82 A Universidade Presidente Antonio Carlos (UNIPAC) Bom Despacho é um Campus que tem sede na cidade de Barbacena, com 40 anos de história na educação mineira. Tudo começou, em 1998 com a Faculdade de Ciências Contábeis. Em fevereiro de 2001 foi criado o Curso de Pedagogia e em agosto de 2001 foi estabelecido o Curso de Sistemas de Informação. No início de 2002, com a aprovação do Campus Bom Despacho e de acordo com uma rigorosa pesquisa de mercado, foram criados os cursos de Administração, Direito, Enfermagem e Fisioterapia. A UNIPAC Campus Bom Despacho conta hoje com 15 cursos de graduação sendo eles: Administração; Biomedicina; Ciências Contábeis; Direito; Educação Física; Enfermagem; Farmácia; Fisioterapia; Pedagogia; Psicologia; Serviço Social; Sistemas de Informação e o Tecnólogo: Moda e Acessórios, e os novos Agronomia e Medicina Veterinária. Alem disso está em andamento 02 Cursos de Pós-Graduação: Direito Processual Civil e Contabilidade. Para maiores informações acessar www.unipacbomdespacho.com.br

110

Educação (2005), e as matrículas distribuídas de acordo com a Tabela 3 que se

segue:

TABELA 3

Resultado Final do Censo Escolar 2004

Matrícula inicial

Ens

ino

Fund

amen

ta

l (R

egul

ar)

Edu

caçã

o

Esp

ecia

l

Mun

icíp

io

D

epen

dênc

ia

Adm

inis

trativ

a

Cre

che

Pré

-Esc

ola

Educação Especial

(Incluídos)Total 1ª a 4ª

série 5ª a 8ª série

Anos Iniciais

Anos Finais

Ens

ino

Méd

io

(Reg

ular

)

Total Funda-mental

488 1.414 69 7.862 291 338 3.547 3.686 2.062 198 67Estadual 0 220 41 4.847 0 0 1.239 3.608 1.917 0 0Municipal 321 902 26 2.386 0 0 2.308 78 0 0 0

BOM DESPACHO

Privada 167 292 2 629 291 338 0 0 145 198 67 Fonte: www.inep.gov.br

Interessante observar que o termo alunos da educação especial “incluídos”

aparece nos dados do censo escolar da cidade de Bom Despacho, no ano de 2004.

Contemplado no plano das idéias, o uso dessa designação e a garantia legal, como

discutida anteriormente, são insuficientes para garantir mudanças imperativas no

que tange às conduções das políticas públicas educacionais. Assim, a sua

existência nos dados oficiais abre novas frentes de discussão sobre a inclusão nos

espaços cotidianos da escola comum, espaços que permitam construir e

compartilhar sentidos e significados produzidos por alunos e professores com a

inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais.

111

5.4 A EDUCAÇÃO ESPECIAL E O ESPECIAL DA EDUCAÇÃO EM BOM

DESPACHO

A trajetória da educação especial em Bom Despacho não se diferencia muito

à experimentada pela grande maioria das cidades mineiras. Para os alunos que

apresentassem diagnóstico de imaturidade, sob o ponto de vista físico, intelectual e

emocional, leve desvio em funções importantes para aprendizagem escolar, ritmo de

aprendizagem mais lento que a média, estimulação perceptiva inadequada era-lhes

reservada as classes especiais na escola regular, segundo orientações e instruções

da Delegacia de Ensino Especial (DEE) do estado. Tais classes sobreviveram,

oficialmente, em Bom Despacho até o início da década de 90. Segundo Parreiras

(1999), a extinção dessa designação se deu devido ao caráter opressor que

carregava e acarretava efeito discriminatório de alguns alunos dentro da escola.

Na prática, a escola se transformou, para muitos, em uma instituição onde

sentimentos de esperança e frustração vivem lado a lado. É a partir desta

constatação que enfocamos a questão da educação formal do aluno com

necessidades educacionais especiais que, incontestavelmente, atravessa hoje um

momento singular e crucial, onde a questão da inclusão está no centro de todos os

debates.

Atualmente, em Bom Despacho, existem duas escolas de ensino especial

distintas: Centro Educacional “Antônio Carlos” (CEAC) e a Escola Especial “Paulo

Campos Guimarães”. A primeira fundada na década de 50, pelo então governador,

Juscelino kubstichek, para abrigar “menores infratores”. Situada a 7 km da cidade,

em uma fazenda de 254 hectares, teve a sua população modificada no início de

112

1970 para “menores abandonados portadores de deficiência e que abriga hoje 94

internos, na faixa etária de 22 a 54 anos”.

A primeira observação sobre a vida na unidade diz respeito a seu enorme empobrecimento, em todos os níveis se produz amputações; o educando não possui nada que possa ser sentido como próprio, nem sequer suas roupas, é um mundo unissexual, com dormitórios com camas alinhadas que, não permitem reconstruções de grupos primários. A amputação mais dolorosa é a da dignidade pessoal, a coisificação dos sujeitos. Qualquer mensagem emitida pelo interno é tida como “coisa de louco”, que deteriora o sentimento de autonomia e de auto-respeito. (...) Isso faz com que o interno se torne respeitoso, cumprindo o regulamento e as expectativas da instituição. (...) O ambiente é um lugar frio, fechado, distante da cidade e do contato com o mundo de fora dos muros. (...) a ociosidade é muito grande, a única tarefa que sobra é a agressão e a estruturação de delírios. Há uma carência quase total de objetos pessoais, alguns internos furam buracos para guardarem roupas, revistas e até comida. Temos a sensação de estarmos numa espécie de povoado de mendigos, de gente desesperançada, isolada entre si, de gente que responda a uma pergunta, que pede fogo, pede cigarro. (Plano de Ação CEAC – BD, 1997, p. 61).

Em 1995, após denúncias nos meios de comunicação sobre a situação

absurda constatada no CEAC, de desrespeito à pessoa humana, foram elaboradas

propostas baseadas nas necessidades e realidades apontadas no relatório da

Secretaria de Saúde do Estado, em visitas feitas pela Federação Estadual das

APAEs em dados coletados “in locu”. Diante de um contexto tão complexo como o

do CEAC, onde deficiência, miséria, preconceito se misturam de forma tão

homogênea fez-se necessário um esforço imperativo para se inverter o pré-

estabelecido. Uma realidade onde se encontram indivíduos segregados, com um

longo e agressivo período de estadia, na qual cada interno foi submetido, e com toda

a conhecida precariedade que o Estado lida com este tipo de entidade.

A opção pelo modelo educacional que privilegiasse as relações tecidas no

processo educacional em que participam todos os educandos, funcionários do CEAC

(a assistência social, a psicologia, a pedagogia, estagiários do magistério, a

medicina, a odontologia, a terapia ocupacional, a fisioterapia, a agronomia), família,

113

comunidade, mecanismos institucionais e estrutura estatal objetivava assegurar e

garantir o cumprimento efetivo das políticas públicas sociais, pautadas nas

discussões da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996. Nesse

aspecto o eixo de intervenções busca articular o conjunto de relações que se fazem

presentes e constituem o dia-a-dia desse centro educacional, a busca de superação

de preconceitos e estereótipos e a tônica no potencial e nas possibilidades de cada

um, a exemplo do que ocorria nas oficinas pedagógicas, ocupacionais e

terapêuticas, como mostra a figura 6.

FIGURA 6: Oficinas Ocupacionais e Pedagógicas Fonte: Foto de Arquivo (CEAC/BD, 1998).

O CEAC veio procurando, desde então, trabalhar os espaços das políticas

públicas na realidade social; bem como, prazos e metas na racionalidade do serviço

público, visando a eficiência e eficácia. Buscando o regaste do cidadão–gente

inserido numa realidade institucionalizada, saindo do engodo e ascendendo para um

viver mais digno e procurando meios de ampliar os contatos sociais de cada um,

114

viabilizando a sua inserção na comunidade e na sua família (quando possível),

otimizando sua inserção a possibilidade de introdução no mercado de trabalho para

alguns.

Em março de 2004, iniciou-se, por determinação da Secretaria de

Desenvolvimento Social e Esportes de Minas Gerais (SEDESE), o processo de

desativação dos centros educacionais, por considerarem tal modelo inviável para o

momento atual e incoerente com as políticas públicas sociais e educacionais

vigentes. O que gerou ansiedade e expectativa tanto nos funcionários quanto nos

internos do CEAC por se tratar de uma nova modalidade de atendimento, que

utilizaria o modelo de “Casa-lar” 83.

Conforme os registros do setor social do CEAC (1999), no contrato de

parceria com a SEDESE e APAEs reza que cada casa-lar deverá ser equipada pelo

Estado, com infra-estrutura necessária; repassar uma per-cápita/mês de seiscentos

reais por morador para as despesas da casa (aluguel, funcionários, água, energia,

alimentação, medicação...); todo morador deverá ter o Benefício de Prestação

Continuada (BPC), que equivale a um salário mínimo por mês (tem como enfoque,

gastos com lazer e cultura de cada um); o número de pais sociais e auxiliares por

casa será determinado de acordo com as necessidades dos moradores da casa. É

de responsabilidade do estado e das APAEs o monitoramento, orientação das casas

e aprimoramento do pessoal, caso seja detectado qualquer irregularidade é feito

83 A casa-lar é uma modalidade de atendimento a jovens e adultos portadores de deficiência, em situação de abandono tem a finalidade de resgatar o ambiente familiar, oferecendo-lhes a oportunidade de uma convivência afetiva equilibrada e saudável, condição indispensável ao seu pleno desenvolvimento. Os residentes são acompanhados por pais sociais que assegura-lhes assistência integral (alimentação, saúde, educação, lazer, esporte e atividades culturais).

As casas lares, inicialmente chamadas de Pequenos Lares, existem desde 1992 e são espaços que visam oportunizar a essas pessoas um lar, com referencial afetivo, emocional e seguro, onde a condição de desamparo seja minimizada e seu desenvolvimento global favorecido. O principal objetivo do trabalho realizado na Casa Lar é propiciar um ambiente onde exista um convívio harmonioso, com vínculo familiar. Deve ser uma casa aberta e que estimule o contato e preparação para o "mundo", a "vida", a família, a comunidade, a cultura, o futuro independente.

115

orientação e aprimoramento dos projetos desenvolvidos na casa, se persistirem é

cancelada a parceria e transferida toda infra-estrutura para APAE de outra cidade.

A reuniões realizadas pela SEDESE com as APAEs da região visavam a

possibilidade de constituição de parcerias, o que não foi possível devido ao

desinteresse dessas pelo projeto e insegurança quanto à competência de

assumirem tal proposta, bem como o descrédito na responsabilidade do Estado.

A proposta foi apresenta para APAEs de outras regiões que aceitaram o

desafio de buscar formas mais humanas e cidadãs de atendimento aos portadores

de necessidades educativas especiais. De acordo com os registros do setor social

do CEAC (2005), no período de março de 2004 a junho de 2005,

[...] dos noventa e três internos do CEAC, todos recebem o BPC, nove deles retornaram à família, levando consigo o benefício e medicação para três meses; cinco deles faleceram, um está foragido; sessenta e oito estão incluídos em casas-lares assim distribuídos: Tupaciguara (oito), Itaúna (sete), rio Paranaíba (seis), Entre Rios de Minas (sete), Mantena (seis), Prata (oito), Itabira (seis), Belo Horizonte (onze) e Itajubá (4). No CEAC, encontram-se quinze educandos que estão aguardando a finalização do processo legal de cada um, o contrato de parceria da SEDESE com as APAEs está firmado e a data prevista para a transferência desses últimos educandos é 27 e 28 de junho de 2005, que serão enviados para as cidades de são Vicente de Minas (seis), cristais (três), Tupaciguara (um) e Itabira estará constituindo mais uma casa-lar com cinco educandos84.

Segundo o setor social e direção do CEAC (2005), os resultados estão sendo

satisfatórios, até o momento. Constata-se 100% de satisfação tanto por parte dos

educandos quanto dos parceiros, observa-se aceitação dos educandos ao novo

estilo de vida, inserção nos projetos educacionais e no mercado de trabalho como:

auxiliar de pintura (construção civil), auxiliar de cozinha, auxiliar de lavanderia,

84 A divisão dos educandos por cidade foi feita de acordo com os vínculos de amizade e afinidades pessoais de cada um, pelo cada cidade poderia oferecer em termos de inclusão social e educacional. Cada grupo tinha 80% de pessoas menos comprometidas (deficiência mental e física leve ou moderada) e 20% de pessoas mais dependentes (deficiência mental e física grave e intensa). São destinadas oito vagas no máximo para cada casa-lar, sendo seis para o CEAC – BD e duas ficam á disposição da demanda da cidade, sendo que nas casas-lares a população pode ser mista.

116

lavador de veículos, oficinas profissionalizantes de horticultura, culinária e

artesanato. Em depoimento de uma das coordenadoras da APAE sobre um dos

moradores que tem epilepsia, logo ela relata que após uma crise pela manhã ele

pede “eu sei que eu estou dando trabalho, mas não me leva de volta para Bom

Despacho não, porque aqui está muito bom (sic)” (Setor social, 2005). Segundo a

auxiliar de promoção social do CEAC, todos os educandos incluídos mantêm contato

telefônico regular e sempre falam da satisfação de terem uma casa como qualquer

funcionário do CEAC, visto que esta era uma de suas maiores reivindicações, a

maioria, no passado, pedia que os funcionários os levassem para morar em suas

casas e, hoje eles têm as suas bem equipadas. “Numa sociedade igual a nossa, são

poucas as famílias que têm renda per-cápita de novecentos reais” (sic) 85.

O CEAC conta atualmente com quadro de quarenta e quatro funcionários

sendo vinte estatutários (sendo um em cargo comissionário), cinco da Fundação

Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG), uma assistente social e quatro

auxiliares de enfermagem, dezessete da MGS (sete afastados devido licença

médica) e dois estagiários do Centro Integrado Empresa Escola (CIEE), atuam nas

oficinas pedagógicas. Aguardam o término desse processo para encerrarem mais

um capítulo da história do CEAC, que construiu capítulos e capítulos de exclusão

social das pessoas com necessidades educativas especiais e tem a pretensão de

escrever outras histórias viáveis de igualdade de direitos e respeito às diferenças.

A outra escola de ensino especial de Bom Despacho é a “Paulo Campos

Guimarães”, abrigada pela APAE, conforme registros históricos (APAE, 1982) FOI

fundada em dois de fevereiro de 1982, por iniciativa de alguns pais de portadores de

deficiências, somados à vontade da sociedade civil organizada (Rotary Club Bom

85 Dados obtidos com a secretaria do CEAC e a promotora do setor social em junho de 2005.

117

FIGURA 7: Entrada principal da APAE – BD. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – 09 de março de 2004.

Despacho) e ao poder público executivo municipal. Traz na sua trajetória de vida

semelhanças com as de outras APAEs do país que, surgem de forma paternalista e

ênfase emocional, afirmando-se como “especial” e, com o decorrer do tempo foi-se

adequando às exigências das políticas públicas sociais, assegura a diretora

pedagógica da APAE (2004) 86,.

A APAE de Bom Despacho configura-se como entidade filantrópica, sem fins

lucrativos, que atende portadores de deficiência do município (incluindo zona rural),

com a finalidade de oferecer aos seus alunos recursos básicos para seu

desenvolvimento global, integração educacional, social e profissional. Atualmente,

atende 230 alunos, na faixa etária de zero a setenta e três anos de idade, com

diversos tipos de deficiências: mental, física, sensorial, visual e auditiva, motora, de

86 Dados obtidos em entrevista com a diretora pedagógica da APAE em março de 2004.

118

linguagem, deficiências múltiplas. Atende, também, condutas típicas87, apesar de

não se enquadrarem como quadros de deficiência, todos esses quadros recebem

atendimentos específicos de acordo com a necessidade de cada um. Para prestar

seus serviços a APAE – BD oferece serviços especializados em: terapia

ocupacional, fonoaudiologia, psicologia, serviço social, fisioterapia, assistência

médica (neurologista), escolaridade (educação infantil, ensino fundamental – anos

iniciais), oficinas pré-profissionalizantes e profissionalizantes, intervenção precoce,

programa individual especializado, sala de recurso e ensino itinerante88.

De acordo com a Resolução da Secretaria de Educação do Estado de Minas

Gerais (SEE/MG) nº. 469 de dezembro de 2003, que organiza o ensino fundamental

com duração de nove anos, especialmente em relação ao Ciclo Inicial de

Alfabetização, segundo a SEE/MG, a luta pela universalização do acesso e

permanência à escola para as crianças de zero a quatorze anos ocupou lugar

central na política educacional mineira nos últimos anos. No entanto, segundo os

resultados das avaliações sistêmicas estaduais e nacionais, apontam que nossas

crianças não têm apresentado um grau satisfatório de alfabetização e letramento,

seja para prosseguir na vida escolar, seja para integrar-se à vida social89.

87 Segundo o MEC Secretaria de Educação Especial (SSE), condutas típicas são “manifestações comportamentais típicas de portadores de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que ocasionam atrasos no desenvolvimento da pessoa e prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atendimento educacional especializado”. (MEC-SEESP, 1994, p.7-8). 88 Dados coletados do censo escolar da APAE de Bom Despacho em março de 2004. 89 A urgência em intervir na realidade da escola pública mineira é que justifica as medidas que a SEE/MG adotou em relação ao ensino fundamental, especialmente em relação aos anos iniciais:

- ampliação do ensino fundamental para nove anos, com atendimento das crianças de seis anos,

- organização dos anos iniciais em ciclos, com ênfase nos processos de alfabetização e letramento.

Ver orientação SEE Nº 01/2004 – Operacionalização da Resolução SEE nº 469/2003

119

Para atender a orientação da resolução alterou-se o Regimento Interno da

Escola Especial “Paulo Campos Guimarães” que ficou assim organizado e os níveis

de ensino, conforme demonstra a Tabela 4.

TABELA 4

Níveis de Ensino da Escola Especial “Paulo Campos Guimarães” – 2004

NÍVEIS DE ENSINO CICLOS Nº. DE ALUNOS

Educação Infantil Intervenção Precoce Pré-Escola

33 29

Educação Fundamental

Ciclo Inicial de Alfabetização Fase I Fase II Ciclo Complementar de Alfabetização Fase III Fase IV

5 -

10

17 35

Educação Profissional

Iniciação para o Trabalho Qualificação para o Trabalho Colocação no Trabalho

78

02 Sala de Recurso 56

Ensino Itinerante/Professor Itinerante

68

TOTAL 213

Fonte: Dados coletados do arquivo escolar da APAE de Bom Despacho em março de 2004

Na análise da Tabela 4, a direção pedagógica da APAE ressalta a crescente

procura de atendimento na educação profissional, principalmente por pessoas que

abriram mão dos outros níveis de escolaridade e/ou nunca freqüentaram escola, por

razões diversas. Observa-se que, o número de atendimentos dos setores de sala de

recurso e ensino itinerante/professor itinerante está diretamente ligado à matrícula

dos alunos com necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino.

Nesse contexto, as atitudes e as posturas dos profissionais da educação e dos

120

responsáveis pelos alunos são fundamentais no processo de inclusão escolar, social

e profissional.

Na escolaridade da APAE de Bom Despacho, a educação infantil atende

crianças na faixa etária de cinco e seis anos de idade, compreende o pré-escolar,

primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral

da criança, nos seus aspectos fisioterápicos, psicológico, intelectual e social,

complementando a ação da família e da sociedade.

A organização do tempo escolar na APAE-BD é ciclo, o que, afirma a diretora,

assegura aos alunos a progressão continuada, considerando seu desenvolvimento

integral e aprendizagem. A escola organiza as turmas de alunos em cada ano dos

ciclos, orienta a implementação do currículo, de forma a respeitar os diferentes

ritmos dos alunos, levando em conta suas experiências e conhecimentos já

acumulados. Essa procura seguir na íntegra a intervenção da SEE/MG na realidade

da escola pública mineira presente na Resolução SEE nº. 469/03:

[...] antecipar para seis anos a entrada no ensino fundamental – uma medida de inclusão – constitui importante passo na ampliação do atendimento escolar, uma vez que o acesso à pré-escola não tem sido igualmente facultado às crianças das diferentes regiões do Estado e de todas camadas sociais. (MINAS GERAIS, 2003, 1)

O programa individual especializado é realizado com alunos a partir dos

quatro anos de idade e tem por objetivo trabalhar as áreas do desenvolvimento

infantil. As estratégias de intervenção são adequadas aos interesses e necessidades

da criança. A programação pedagógica inclui psicomotricidade (coordenação geral

estática e dinâmica), cognição (pensamento e linguagem) e expressão livre por meio

de artes e afetividade (auto-estima e confiança). Conta também, com aulas

especializadas de educação física, musicoterapia, artes e oficina de leitura.

121

FIGURA 8: Atendimento ao aluno em sala de recurso da APAE – BD. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – 09 de março de 2004.

A sala de recurso atende, na APAE-BD, sessenta e dois alunos com

necessidades educacionais especiais, matriculados na escola comum e/ou na escola

especial da APAE, é equipada com materiais e recursos pedagógicos para facilitar a

aprendizagem dos alunos que apresentam déficit de aprendizagem.

Sobre os serviços prestados, a APAE – BD, define como ensino itinerante o

programa de atendimento individual (ou em grupo) de alunos, na rede regular,

realizado por professores especializados, pedagogos e psico-pedagogos, que,

diagnosticados pela APAE - BD como “alunos com necessidades educacionais

especiais”, matriculados na escola comum. Freqüentam, atualmente, esse serviço

quarenta e dois alunos. A APAE – BD considera esse serviço como sendo parte

integrante no processo de inclusão escolar, que segundo a instituição, a escola se

organiza para incluir em seus sistemas gerais, “pessoas portadoras de deficiência” e

os quadros de condutas típicas.

122

Segundo a diretora pedagógica da APAE – BD, o ensino itinerante é um

recurso educacional organizado para o atendimento a alunos portadores de

necessidades especiais na escola regular (APAE, 2004), é realizado através de

visitas periódicas de uma equipe especializada que orienta, acompanha e avalia as

atividades relativas à integração dos mesmos (APAE, 2004). A APAE de Bom

Despacho considera esse serviço essencial no processo inclusivo, pois se configura

como apoio pedagógico e profissional nas escolas regulares para conscientizar o

pessoal técnico-administrativo da escola sobre o aluno com necessidades

educacionais especiais, auxiliar o trabalho do professor da rede regular de ensino

onde se encontra esse aluno e orientar os familiares dos alunos atendidos sobre a

programação do serviço.

A educação profissional da APAE – BD engloba oficinas ocupacionais, pré-

profissionalizantes e profissionalizantes, atende setenta e quatro alunos acima de

quatorze anos de idade. Visa A garantir a efetiva participação e a inclusão da

Pessoa Portadora de Deficiência (PPD) na vida e na sociedade, para aqueles

alunos, que devido a características peculiares, não trabalharam, ainda,

capacidades laborativas para o ingresso no mercado formal de trabalho ou na vida

acadêmica. O se configura como um outro desafio, a inclusão da pessoa com

necessidades educacionais especiais no mercado de trabalho.

Na intervenção precoce são atendidas dezesseis crianças, até três anos e

onze meses de idade, que apresentam algum comprometimento no seu processo de

crescimento e, tem como objetivo o desenvolver as potencialidades da criança nas

áreas cognitivas, físico-motora e sócio-emocional.

O setor de fisioterapia (habilitação e reabilitação) atende setenta e cinco

crianças apresentando desde alterações físicas já instaladas, com déficits funcionais

123

e seqüelas progressivas que, comprometem o seu desenvolvimento

neuropsicomotor. O setor atende, também, a comunidade em geral, atuando nas

áreas de ortopedia e traumatologia, geriatria e neurologia. Neste contexto realiza

3.075 sessões por mês via Sistema Único de Saúde (SUS).

Desde a sua fundação, a APAE - BD vem progressivamente, procurado

modificar o foco clínico-patológico da deficiência, entende-se que deficiência não é

sinônimo de doença. Diante da proposta da inclusão escolar e social, tende

proporcionar aos seus alunos a formação necessária ao desenvolvimento de suas

potencialidades, auto-realização, preparação para o trabalho e inclusão à sociedade

em que vive e convive.

Na observação das ações da APAE de Bom Despacho que, desde 1996,

busca efetivar projetos baseados na recomendação da inclusão escolar, entende-se

que a inclusão provoca e exige da escola novos posicionamentos. Para Mittler

(2003), essa implica no esforço de atualização e reestruturação das condições atuais

da maioria das escolas. Os dados da APAE – BD, em 2004, sobre as trajetórias dos

alunos matriculados no sistema regular de ensino, carecem de serem trabalhados.

Esses apontam resultados de inclusão escolar têm deixado a desejar, visto que um

número significativo dos alunos matriculados no ensino regular não tem ultrapassado

os níveis iniciais de escolaridade e revelam dificuldade de permanência na rede

regular, conforme apresenta o Quadro 3 a seguir.

ENCAMINHAMENTO Rede Pública

Rede Particular

Zona Rural

EF

EM

EJA

Promoção 30 03 02 36 01 02

Retenção 04 01 05

Abandono 04 04

QUADRO 3: Trajetórias dos Alunos da APAE no Sistema Regular de Ensino - 2004 Fonte: Secretaria Pedagógica da Escola Especial “Paulo Campos Guimarães”, APAE – BD

124

Dos quarenta e oito alunos matriculados na rede regular e acompanhados

pelo ensino itinerante, observa-se que trinta e sete foram promovidos de níveis e/ou

ciclos de alfabetização (segundo avaliação dos profissionais da APAE – BD, cinco

apresentaram dificuldades significativas no processo e foram promovidos em

obediência à Lei Estadual que regulamenta os ciclos de aprendizagem, que não

aceita retenção); cinco permaneceram no mesmo ciclo de aprendizagem, sendo que,

quatro desses abandonaram a escola e uma retornou para a escolaridade da APAE

- BD. No ano de 2005 foram incluídos vinte e um alunos no ensino fundamental,

desses um está na zona rural de Bom Despacho.

Resultados como esses provocam acaloradas discussões a respeito das

expectativas abertas pelo artigo 58 da LDB/96: a garantia do direito à educação dos

que apresenta necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino e

trajetórias da vida escolar desses alunos. O depoimento da supervisora pedagógica

da APAE – BD diz respeito desse processo:

Houve “um caso de inclusão” que provocou grande repercussão na cidade, logo após a promulgação da LDB 9394/96, o aluno foi incluído no sistema regular de ensino, o que gerou, a princípio rejeição, insegurança e sentimento de incapacidade da escola regular em lidar com o aluno e a sua diferença. Foi um processo doloroso, devido a rejeição tanto dos profissionais da escola quanto dos pais dos alunos da mesma. Foram necessários vários encontros com os profissionais das duas modalidades de ensino, assessoria intermitente dos profissionais da APAE - BD, intervenção da 12ª Delegacia Regional de Ensino, bem como sensibilização e conscientização a respeito do direito de uma educação para todos. Passados oito anos de luta pela efetivação da inclusão, nos deparamos com o pouco avanço em termos práticos, no dia-a-dia, no interior da escola e o muito que temos a fazer. (Supervisora Pedagógica, 09/11/2004) 90.

A supervisora faz referência a um caso que explicita bem os impasses do

processo de atendimento de pessoas com necessidades educacionais especiais

classe comum. Esse exemplo rendeu exaltadas discussões em várias instâncias: na 90 Optou-se pela não descrição deste caso devido da impossibilidade da manutenção do sigilo, pois seria facilmente identificado, pois seria facilmente identificado em razão da grande repercussão que este teve na época.

125

própria APAE - BD, na escola de ensino regular que o aluno foi matriculado, na

Superintendência de Ensino, na comunidade onde residia o aluno, no ambiente de

trabalho do pai do mesmo e, principalmente, chamou a atenção de todo o sistema

educacional de Bom Despacho acerca dessa prerrogativa de matrícula no sistema

regular de ensino ou retorno, já que esse aluno era oriundo do da rede regular antes

de freqüentar a educação especial.

A trajetória dos alunos com necessidades educacionais especiais na classe

comum, segundo a direção pedagógica da APAE – BD é fortemente marcada por

exaltadas discussões, esperanças e incertezas, tanto por parte da escola comum

quanto da especial, acerca da urgência da lei, dos apelos da sociedade e do

conceito e prática da inclusão escolar.

Para a direção e supervisão pedagógica da APAE – BD, na análise resultados

obtidos, observa-se que o processo de inclusão escolar do município está

intimamente ligado ao grau de comprometimento do aluno com necessidades

educacionais especiais (APAE - BD, 2004). Verificam-se efeitos positivos, em suas

vivências, nos relacionamentos interpessoais e no estabelecimento de vínculos

afetivo-sociais, porém os problemas de aprendizagem, de escolarização

apresentam-se as maiores dificuldades e constata-se maior abandono e evasão

escolar dos alunos, principalmente dos deficientes mentais. Observa-se que quanto

maior o envolvimento familiar e o acolhimento do aluno incluído na escola regular,

maior as possibilidades de sucesso dos casos. Segundo dados da APAE – BD, a

maioria da sua clientela é proveniente de cultura familiar carente de apoio e de

estímulos adequados para levar adiante um processo tão complexo como o da

inclusão escolar.

126

Percebe-se que são inegágeis as dificuldades, os problemas e os obstáculos

que se apresentam nessas situações, inegáveis, porém não insuperáveis. A

possibilidade de construção de processos coletivos, a participação ativa das pessoas

e suas diferenças, a inserção nos contextos da escola. A inclusão escolar,

confronta-se com discursos de várias ordens, os que confirmam o estigma do

preconceito, da segregação e discrimanções. Na contramão dessas acepções,

percebe-se a urgência em mudar a maneira de ver e de conviver com o aluno com

necessidades educacionais especiais; enfatizar as idéias de “estar dentro”, de

participar. Nesse sentido, é prudente riscar rótulos e atitudes paternalistas da família

e da sociedade. Operar essa mudança é questão imprescindível e, necessário se faz

é reconhecê-los como cidadãos capazes, integrantes, participantes e sujeitos da

busca e da nossa história; e que essa operação se inicie nesse hoje que se chama

agora.

Na busca de entender os sentidos e os significados construídos por alunos e

professores de uma escola regular com a matrícula de alunos com necessidades

educacionais especiais conduz para o cenário da escola. Trata-se de compreender

os produtos da experiência, da vivência e das relações que se estabelecem no

cotidiano escolar, nos seus diferentes espaços e situações. Com o intuito de

conhecer sobre a trama das inter-relações e cultivo de sentidos e significados e os

seus processos observáveis, foi-se ao encontro de uma escola e das pessoas que a

integram.

127

6. OS LUGARES DA PESQUISA: A ESCOLA

Este capítulo reveste-se de especial interesse pela escola, sua história, as

percepções e atitudes dos alunos e professores para a inclusão escolar. No sentido

de contribuir para a compreensão desse processo permaneci e observei em vários

contextos o cotidiano escolar e os envolvidos nesse processo inclusivo que nela se

desenrola.

Dessa perspectiva, esforcei-me em realizar uma observação da vida da

Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” conforme os ensinamentos de

Vianna (2003). Indubitavelmente, houve aumento do meu interesse em anotar o que

ia observando. O que significou não considerar suficiente o mero registro formal dos

acontecimentos, mas envolver-me em um relato mais detalhado do observado. As

observações que serão apresentadas em destaque e associadas a um texto para

possibilitar melhor compreensão e análises das circunstâncias e interações

produzidas no dia-a-dia da escola.

6.1 OLHANDO, OUVINDO E ESCREVENDO SOBRE O COTIDIANO DA ESCOLA

ESTADUAL “PROF. WILSON LOPES DO COUTO”

De quem é o olhar Que espreita por meus

olhos? Quando penso que vejo,

Quem continua vendo Enquanto estou pensando?

(Fernando Pessoa, 2003)

Ao me aproximar da Escola Estadual “Wilson Lopes do Couto” (EWLC) para

investigar sobre o atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais

lá realizado, busquei compreender e tomar de empréstimo os três momentos

128

estratégicos do “métier do antropólogo” destacados por Oliveira (2000); o Olhar, o

Ouvir e o Escrever, que têm, segundo o autor, características precisas quando bem

exercitadas, especialmente, na Antropologia, sendo que cada uma dessas

“faculdades” pode elevar a eficácia do trabalho investigativo devidamente

disciplinado e refletido epistemologicamente. E, consciente de que essa empreitada

só poderia ser feita no cotidiano da escola.

FIGURA 9: Fachada principal da Escola Wilson Lopes do Couto com a Praça da Constituição, ao fundo a Igreja N.S. de Fátima. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – março de 2004, 14 horas.

Roberto Cardoso de Oliveira (2000) desenvolve a discussão metodológica

para o pesquisador que, ao sentir-se preparado para a investigação empírica, a

primeira experiência de campo (ou no campo) a ser realizada é a domesticação

teórica do olhar. Para esse antropólogo, seja qual for o objeto, ele não escapa de ser

apreendido pelo esquema conceitual da disciplina formadora de nossa maneira de

ver a realidade. Esse esquema funciona como uma espécie de prisma por meio do

qual a realidade observada sofre um “processo de refração”, não exclusivo do olhar,

129

visto que está presente em todo processo de conhecimento. Mas, é no olhar que

corre-se o risco de maior comprometimento dessa refração.

Oliveira esclarece que, o Olhar e o Ouvir, no exercício da investigação,

servem de muletas para o pesquisador. Pois, não podem ser tomados como

faculdades totalmente independentes, e sim, complementares. Afirma que as

disciplinas e seus paradigmas são condicionantes tanto de nosso Olhar quanto de

nosso Ouvir. É nesse ímpeto de conhecer que o Ouvir complementa o Olhar, e

participa das mesmas precondições desse último. Em que se constitui o ato de

ouvir? Que “ruídos” devem ser eliminados em uma entrevista? Como lidar com a

pretensa neutralidade científica na relação pesquisador/entrevistado?

Para esse autor faz-se necessário estabelecer uma relação dialógica entre

pesquisador e pesquisados, transformando o informante em interlocutor favorecendo

com que os horizontes semânticos em confronto se abram um ao outro, de maneira

a converter confronto em encontro etnográfico, uma verdadeira interação. Para tal,

os antropólogos apoiam-se, sobretudo, na observação participante, a qual consiste

no dispêndio de períodos mais ou menos longos junto dos grupos de indivíduos ou

culturas que se pretendem estudar. Enquanto outros “cientistas sociais” se apóiam

mais em questionários, o antropólogo usa as relações que estabelece com as

pessoas durante o trabalho de campo para perceber o significado das situações que

observa.

É ainda Oliveira (2000) quem afirma

[...] que os atos de Olhar e de Ouvir são, a rigor, funções de um gênero de observação muito peculiar, por meio do qual o pesquisador busca compreender a sociedade e a cultura do Outro de dentro, em sua verdadeira interioridade (OLIVEIRA, 2000, p.31).

130

Para esse autor olhar e ouvir denota atos cognitivos preliminares no trabalho

de campo. No entanto, é, seguramente, no ato de Escrever a aquisição do

conhecimento se torna tanto ou mais criteriosa. Entende-se por Escrever, de acordo

com Oliveira (2000e), a ação realizada, posteriormente, por excelência no silêncio do

gabinete, que carrega características singulares, sobretudo quando o compararmos

com o que se escreve no campo, seja no diário de campo, seja nas anotações

rabiscadas em nossas cadernetas. Desse modo o Olhar, o Ouvir e o Escrever são

momentos interdependentes na pesquisa e estão em sintonia com o sistema de

idéias e valores próprios da ciência antropológica. Orientada por esses

ensinamentos é que tentei compreender, portanto, os sentidos significados

produzidos por alunos e professores sobre a inclusão escolar dos alunos com

necessidades educacionais especiais.

Dessa forma, ao buscar a escola, tendo como ferramenta conceitual a vida

cotidiana, tornou-se necessário ampliar o olhar, amplificar o ouvir e aprimorar o

escrever da abrangência dos significados do que se inscrevem no seu interior e que,

conseqüentemente, constituem a própria história da escola. Segundo Ezpeleta &

Rockwell (1989), a escola se constrói a partir de duas histórias: uma história

documentada, geralmente elaborada a partir do poder estatal, a qual destaca sua

existência homogênea (onde são reproduzidas as ideologias dominantes), e outra

história e existência não-documentada, por meio da qual a escola toma forma

material, ganha vida. Entre essas duas, a determinação e presença estatal se

entrecruzam com as determinações e presenças civis de variadas características.

Portanto, a homogeneidade documentada, decompõe-se em múltiplas realidades

cotidianas. Nessa história não-documentada, nesta dimensão cotidiana, educadores,

131

alunos e pais se apropriam dos subsídios e das prescrições estatais e constroem a

escola.

Abordar a escola a partir de seu cotidiano, conforme mostram Ezpeleta &

Rockwell (1989), em estudos desenvolvidos em escolas rurais do México a partir de

1980, possibilita, portanto, ao pesquisador desvelar as inter-relações entre essas

histórias. Esse imbricamento só é possível constatar no cotidiano escolar

observando as relações que ocorrem entre aluno - professor, professor - direção;

aluno - direção; pais - professores; pais - direção.

Nesse sentido, entendo que cotidiano escolar é o espaço privilegiado, onde

ocorre o encontro dos diversos segmentos que estão envolvidos com o dia-a-dia da

escola, o que circunscreve o campo para a emergência das contradições que estão

implícitas nas relações sociais que ali se desenvolvem. Em outras palavras, este

espaço refere-se à contingência que se deve propiciar junto à comunidade escolar, a

possibilidade da otimização das relações sociais.

A questão da exclusão/inclusão social tem sido debatida com freqüência,

tanto no campo da educação, quando em outros relativos às ciências sociais. E a

Escola seria uma das instituições privilegiadas para quebrar com muitos tabus, por

que ser espaço privilegiado que pode proporcionar cenas de afirmações e

transformações que apontam para as identificações, conflitos, consensos de

identidades culturais em movimento. Mas, ao contrário, o que se vê é que parece

estar permeada de preconceitos e juízos prévios sobre os alunos e suas famílias

como discutido anteriormente.

Reforçando esse argumento, Ezpeleta & Rockwell (1989) consideram que

conhecer compreender e discutir sobre este cotidiano escolar, constituído também

por alunos com necessidades educacionais especiais, implica na decisão de

132

identificar e interpretar os modos como ocorrem as construções de sentidos e

significados nas interações com a diferença, necessidades educacionais especiais e

deficiência. O que significam inclusão e exclusão no dia-a-dia da escola.

6.1.1 NA HISTÓRIA DO BAIRRO, A HISTÓRIA DA ESCOLA

O poeta é um repórter De pensamento ligado

Ouvindo o que o povo diz Fazendo todo apanhado

E sai contando na rua Tudo quanto foi passado.

(Caboclo, 2001)

Os dados históricos do bairro e da escola foram colhidos do Regimento

Escolar da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” e dos produtos do

Projeto: “Viva o Bairro de Fátima” (mostra de vídeo, palestras, mural, peças de

teatro, feira de cultura, painéis, depoimentos) desenvolvido na escola no ano de

2004. Tal projeto envolveu principalmente as áreas de conhecimento de História,

Geografia, Matemática e Português, objetivava resgatar a história dessa escola, bem

como propiciar ao aluno informações ampliadas do onde estuda e/ou reside e dos

problemas do mesmo. Observei intensa participação do corpo docente e discente da

escola, ex-alunos, ex-funcionários, ex-diretores, familiares, moradores do bairro, com

destaque para os mais antigos que foram foco do resgate histórico. 91

Nesse sentido, a minha intenção foi a partir desse levantamento histórico,

entender em que medida a escola traz na sua biografia marcas próprias do passado

que produzem significados no seu presente dando sentido no seu cotidiano e 91 A minha participação nesse projeto foi como expectadora na culminância, nos eventos em que aconteceram entrevistas e debates com ex-alunos, ex-professores e funcionários e com os moradores do bairro.

133

apontando para o futuro. Em outros termos, busquei compreender a possibilidade de

se estabelecer a relação entre a história constituída e os sentidos e significados

construídos e atribuídos, pelos diferentes atores, à concepção de

diferença/deficiência, inclusão/exclusão no cotidiano escolar e, acima de tudo, tentar

pelo dom da palavra escrita, ver, ouvir, sentir e compreender as palavras, os gestos,

fatos e histórias dos verdadeiros autores dos acontecimentos da história.

Vale destacar a forma surpreendente como os alunos receberam a notícia de

que a sua escola era foco de pesquisa de mestrado, alguns se mostravam

admirados pelo meu interesse, outros ficaram por entender as razões desse trabalho

de pesquisa. A repercussão foi tal nos turnos onde eu não estava presente

sistematicamente que fui convidada a explicar nesses turnos as razões e motivações

da minha presença na escola.

O Bairro onde se situa a Escola Wilson Lopes iniciou sua ocupação no final

dos anos 1950, a partir da fazenda de Gustavo Lopes, distante 3 km

aproximadamente do centro comercial da cidade que carrega desde os primórdios

da sua história a marca da exclusão, como dito antes. Bairro predominantemente

operário, onde se instalam no início do ano de 1960 a Siderúrgica São José com o

seu alto-forno92 que contribuiu significativamente para que o bairro fosse

denominado, na época, como “Vila dos Urubus” 93 e encerrou suas atividades nos

primeiros anos da década de setenta.

92 Alto-forno: forma como se denominava as siderúrgicas em Bom Despacho. 93 A denominação “Vila dos Urubus” se referia ao pó preto do carvão que impregnava a pele dos trabalhadores do Alto-forno e o conceito desqualificado que o animal carrega como sendo aquele que sobrevive das sobras e da podridão de outrem, não sendo desse modo agradável ao convívio geral.

134

FIGURA 10: Entrada Principal da siderúrgica São José Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – 18 de junho de 2004.

Segundo Teixeira (2004) 94, o bairro se estabeleceu tendo como pilares a

articulação com o seu trabalho (“Alto-forno”), a religião (Igreja N.S. de Fátima) e a

educação (Escola Estadual Prof. Wilson Lopes do Couto). Sobre esses alicerces o

bairro cresceu e se desenvolveu e, pelo menos, dois aspectos são relevantes na sua

história: a transferência da Vila Vicentina da área central da cidade nessa época,

para o Bairro de Fátima95; e a formação, em novembro de 1977, do time de futebol

“FAMORINE”, que surge como possibilidade de lazer e nasce com a cara do bairro,

94 Professor e foi o primeiro secretário da E.E. Wilson Lopes do Couto (1967), informações obtidas em entrevista no dia 20 de maio de 2004 e complementada no dia 12 de junho de 2005. 95 Com o desenvolvimento da cidade e com uma maior ampliação da área central, optou-se pela mudança da Vila Vicentina (mantida pela SSVP - Sociedade São Vicente de Paulo, que tem uma tradição secular de caridade e promoção dos pobres). Atualmente, com a redefinição do mapa da cidade, a Vila Vicentina está localizada no Bairro Ozanan.

135

que diferente dos outros times de então foi constituído pelos operários, e não pela

elite96, conforme explicou Teixeira (2004).

FIGURA 11: Igreja Nossa Senhora de Fátima. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – 18 de junho de 2004.

Atualmente, com a instalação do transporte urbano no bairro, a ampliação do

comércio, do parque industrial e a construção do Laces do SESC97 nas fronteiras do

bairro observa-se um aumento populacional significativo, confirmando, assim, a sua

tradição operária. 96 O nome FAMORINE foi construído tendo como referência os valores de Fé, AMOR, INteligência e Educação. Tem seu campo de futebol adquirido em regime de comodato com o 7º BPM (Batalhão de Polícia Militar de Minas Gerais) e a escolinha de futebol com 300 (trezentos) integrantes: crianças, jovens e adultos. (Dados obtidos com a diretoria do clube em julho de 2005). 97Liceu de Artes, Cultura, Esporte e Saúde do Serviço Social do Comércio (SESC) de Bom Despacho/MG - Regional do Alto São Francisco. Uma Grande conquista para a cidade devido a sua estrutura e funcionamento. Centro de Turismo, Convenções e Lazer – além dos serviços sociais, esportivos e culturais oferecidos recebem, também, famílias em férias, finais de semana ou temporadas de descanso em apartamentos. Também, mantém aberto, para promoção de encontros de negócios, reuniões e seminários.

136

FIGURA 12: Vista parcial do Estádio Lino da Costa, “Campo do FAMORINE”. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – 18 de junho de 2004.

O prédio da Escola Prof. Wilson Lopes do Couto R.0.3.5. B.2 localiza-se na

Avenida Manoel da Costa Gontijo, 311, no Bairro de Fátima, região Norte de Bom

Despacho, ao lado da Igreja Nossa Senhora de Fátima, à sua frente tem a Praça da

Constituição e a Rua Gabriel Tavares de tráfego intenso de caminhões, por ser a

principal via de acesso à MG – 164 que liga as cidades de Bom Despacho, Martinho

Campos, Pompéu e Br 040.

137

Mapa 3: Localização da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” no Bairro de Fátima. Fonte: SENHORA DO SOL, 2002c.

138

6.2 ADENTRANDO NO CAMPO DE PESQUISA

Com a chave na mão Quer abrir a porta,

Não existe porta; Quer morrer no mar,

Mas o mar secou; Quer ir para Minas, Minas não há mais.

José, e agora?

Se você gritasse, Se você gemesse,

Se você tocasse A valsa vienense,

Se você dormisse, Se você cansasse,

Se você morresse... Mas você não morre,

Você é duro, José!

(...) Você marcha, José! José, para onde?

(Carlos Drummond de Andrade)

FIGURA 13: Entrada principal da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”. Fonte: Foto de Registro de pesquisa de campo – março de 2004, 14 horas.

139

Na escolha da escola, que foi o locus dessa investigação, levei em

consideração três critérios: a natureza da instituição educativa como sendo do

sistema regular de ensino, da rede pública de ensino fundamental; o fato de está

aberta para os alunos, oriundos da APAE - BD, para cursarem a educação

fundamental e pelo número maior de alunos da turma do primeiro ano do ciclo

intermediário da Escola Especial “Paulo Campos Guimarães” da APAE – BD que

fizeram opção pela E.E. Prof. Wilson Lopes do Couto (EWL) no ano de 200198. O

que pode ser constatado no Quadro 4.

ENCAMINHAMEN

TO DM DA D. MÚLTIPLA PC

Abandono 01 Colégio Tiradentes 01

E.E.Ir. Maria 02 E.E. Wilson Lopes 03 01

Óbito 01 Outras Cidades 01

QUADRO 4: Matrícula dos alunos do Primeiro ano do ciclo intermediário da APAE – BD - 2001 Fonte: Secretaria Pedagógica da Escola Especial “Paulo Campos Guimarães”, APAE – BD, 2004.

Pela análise dos dados do Quatro 4, revela-se que um dos grandes interesse

em investigar a Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” que recebeu esse

grupo de alunos surgiu, foi também, pelo ao fato desse grupo apresentar histórico de

mais de quatro anos de escolaridade, na APAE – BD e na mesma turma. Essa turma

era composta por dez alunos, com idade entre 11 e 17 anos, sendo três do sexo

feminino e sete do sexo masculino, com os seguintes diagnósticos: dois com

deficiência mental leve quatro com deficiência mental moderada, dois com

98 A Escola Especial “Paulo Campos Guimarães” da APAE – BD oferece até o primeiro ano do ciclo intermediário do ensino fundamental.

140

deficiência auditiva grave, uma PC e um com deficiências múltiplas decorrentes de

Distrofia Muscular Progressiva.

Um dos dados favorável foi a receptividade com que a diretora recebeu a

solicitação de ser a sua escola locus de pesquisa e, posteriormente, ao verificar que

além dos alunos oriundos da educação especial a escola contava com outros alunos

do ensino regular e que encaixavam, segundo a supervisora, também, no rol de

alunos com necessidades educacionais especiais, por apresentarem aprendizagem

lenta, distúrbios de conduta, deficiências físicas; que eram causa de preocupação e

desafio para a escola.99

O meu contato com a escola, antes de escolhê-la como campo de

investigação, era restrito a palestras realizadas em todas as escolas do município

juntamente com a equipe multiprofissional da APAE – BD quase sempre na Semana

do Excepcional (segunda quinzena do mês de agosto). Tínhamos o intuito de

esclarecer, sensibilizar e promover a questão das pessoas com deficiências por

respeito e igualdade de direitos. Participei também, de duas palestras feitas para

pais, alunos e professores sobre “Sexualidade na Adolescência – desafios e

descobertas”, realizadas no período de 1998 a 2002 enquanto profissional da área

da saúde mental do município.

O conhecimento preliminar somado à receptividade com que a diretora e sua

adjunta receberam, no início de novembro de 2003, a carta de apresentação do

Mestrado em Educação da PUC Minas, se converteu em ingredientes básicos de

motivação para a investigação. Senti, então, a abertura do campo. A dificuldade

encontrada, era que a direção encontrava-se em fim de mandato, estavam previstas

99 Este comentário foi feito pela supervisora pedagógica no nosso primeiro encontro em 22 de março de 2004.

141

eleições para o corrente mês e a atual não poderia se comprometer em nome de

quem a sucederia, apesar de estar concorrendo à reeleição.

O processo eleitoral na rede estadual de ensino foi um tanto quanto

conturbado, pois, infelizmente, houve impugnações do resultado das eleições em

alguns estabelecimentos. Conseqüentemente, ocorreu atraso na posse de todas as

diretoras eleitas. Mesmo estando reeleita, a diretora da Escola Estadual “Prof.

Wilson Lopes do Couto” solicitou que a pesquisa de campo se iniciasse após a sua

posse; que, ao invés de acontecer em janeiro, foi dada no dia 29 de abril de 2004.100

Iniciou-se, então, em conformidade ao estabelecido, a entrada legítima no campo e

no seu cotidiano.

Percebi que estar no campo de pesquisa, naquele momento, era se

comprometer com a história desse, ter ousadia suficiente para estar no universo do

outro de forma invasiva, apesar de todo constrangimento que isto podem causar, e

ser capaz de manter o distanciamento. É, portanto, entender cotidiano escolar como

espaço privilegiado onde ocorre o encontro dos diversos segmentos que estão

envolvidos com o dia-a-dia da escola, em outras palavras, este espaço refere-se à

contingência que se deve propiciar junto à comunidade escolar, a possibilidade da

otimização das relações sociais.

Nessa primeira fase da pesquisa verifiquei a importância do diálogo e da

negociação permanente com os funcionários na cultura da escola, uma vez que a

inserção no mundo do outro exige a dedicação intensa. Determinar conforme ensina

Vianna (2003), delicadeza aliada à instrumentação teórica. Fato marcante foi a

abertura dada a mim no espaço escolar, sem restrições. Pude ter acesso às

100 Enquanto aguardava-se a liberação do campo de pesquisa, resolve-se por realizar levantamento de dados na APAE – BD e na Secretaria Municipal de Educação, coleta de dados estatísticos acerca da história de atendimento de alunos com necessidades educacionais especiais em Bom Despacho, a História do bairro onde se localiza a escola e a História da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto.

142

dependências físicas, reuniões, festas, recreios, sala de professores, secretaria,

arquivos, documentos e salas de aulas.

Ficou estabelecido com a direção da escola que o levantamento de dados

registrados nos documentos da mesma ocorreria também nessa primeira fase,

ficando a meu critério o horário mais adequado. Destaco aqui a disponibilidade e o

interesse das secretárias e das supervisoras em contribuir com o trabalho. Na

execução dessa tarefa privilegiei o horário da manhã e, esporadicamente, usava o

da noite; para a busca e análise de documentos e levantamento de dados, o que

demorou aproximadamente quatro meses. Mesmo assim, no período de observação

e contato mais direto com o cotidiano escolar, retornei várias vezes ao exame dos

documentos tanto para verificar dados, quanto para complementá-los.

Cabe ressaltar que, que nesse tempo de pesquisa, tanto na secretaria, quanto

na diretoria, havia um fluxo constante de professores, funcionários e, principalmente,

de alunos que recebiam, por parte dos funcionários, atenção, trato refinado e

encaminhamento devido de suas demandas, tanto a respeito do estabelecimento de

limites de convivência no ambiente escolar, como ao atendimento de suas

necessidades escolares mais urgentes. O que pude observar ainda é quando

constatavam a minha presença, os questionamentos, as especulações e as

conclusões por parte da comunidade escolar surgiam espontaneamente. O desabafo

de uma professora ao se surpreender com minha a presença consultando

documentos na secretaria da escola, resume tudo isso de modo eloqüente:

Ah! Você vai trabalhar aqui na escola? Após explicação do meu propósito acrescenta: interessante a sua pesquisa. É bom que você poderá nos ajudar a entender esses alunos. Bem que seria bom ter a presença de uma psicóloga, por que lidar com esse tipo de aluno especial e o nível de aprendizagem que a grande maioria dos nossos alunos está chegando na 5ª série não é tarefa só para nós professores. A gente não sabe como lidar com eles, o que fazer para a aprendizagem real deles. São tantas

143

mudanças e pouco preparo do professor. (Anotações de campo do dia 06 de abril de 2004, às 19h30mim).

FIGURA 14 - Secretaria da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”, ao fundo porta de acesso à diretoria. Fonte: Foto de Registro de Pesquisa de campo. Dezembro de 2004.

Compreendo que aqui existe uma relação entre educação e educação de

alunos com necessidades educacionais especiais, políticas educacionais,

aprimoramento profissional e intervenção educacional adequada às necessidades

gerais e específicas de todo e qualquer aluno, bem como dúvidas quanto à

educação inclusiva, suas possibilidades, impasses no interior da escola, muita

vontade de saber como fazer e a expectativa de que um profissional especializado e

distinto do que compõe o quadro da escola poderia lidar melhor com a questão das

necessidades educacionais especiais de seus alunos.

Em consideração à metodologia definida para a pesquisa, a observação, optei

em definir como espaços de observações e entrevistas o pátio central da escola,

onde os alunos se reúnem para o recreio, os corredores de acesso às salas de aula,

144

o portão de entrada e saída de pessoal e o corredor que dá acesso à secretaria e

diretoria. Espaços esses que, como outros da escola, tal como esclarece Freire

(2004), produzem consistência nas relações cotidianas que se estabelecem no

interior da mesma.

FIGURA 15: Vista parcial do pátio central da escola, ao fundo corredor de circulação. Primeira porta à direita de acesso ao Pavilhão II da escola e à quadra de esportes. Fonte: Foto de Registro de Campo, 09 de agosto de 2004, 15h e 30 mim.

Ficou acordado, então, que o turno da observação aconteceria à tarde, por

ser o horário de estudos do grupo de alunos com necessidades educacionais

especiais matriculados em classes comuns em 2001 e definido como espaço de

observação, o pátio central como o local de encontros por excelência. Local este

onde aconteciam a maioria das atividades coletivas, que intensificam a convivência

rotineira de modo menos formal, sem perder o caráter catedrático: recreio,

brincadeiras, conversas. Na observância de pessoas diferentes, com trajetórias e

interesses também diferentes que dividem um mesmo espaço, confirma Freire

145

(2004), o espaço do pátio seja para o recreio, ou violações é independentemente da

enturmação formal da escola, da postura metodológica dos professores; o ambiente

que permite o confronto de visões de mundo, estilos e culturas (Freire, 2004, p.178).

Ou seja, o pátio é o lugar para onde convergem todos e de onde todos saem para

outros locais da escola, é o ponto central de circulação dos sujeitos da escola.

Vianna (2003) considera a observação como uma das mais importantes

fontes de informações em pesquisas qualitativas em educação. Sem acurada

observação, não há ciência (Vianna, 2003, p.12). Essencial ao observador não é

simplesmente olhar, necessário se faz saber ver, identificar e descrever as inúmeras

interações e processos humanos. No trabalho de campo, para Vianna (2003), é

fundamental ao observador ser capaz de manter a concentração, tolerância,

sensibilidade e, muita capacidade física, mental e emocional para investir nesse

propósito.

Nessa perspectiva de abertura adotada pela escola foi fator determinante

para o que eu pretendia entender: a compreensão dos sentidos e significados

construídos por alunos e professores, a partir da presença e permanência de alunos

com necessidades educacionais especiais, no cotidiano da escola. No que se refere

ao objetivo proposto, o foco da observação concentrou-se nas relações ocorridas

fora das salas de aula, no pátio, principalmente. O que implica dizer que questões

pedagógicas referentes à sala de aula, especificamente não foram contempladas na

pesquisa.

146

FIGURA 16: Pavilhão II da escola, Laboratório ao fundo e duas salas de aula de 5ª séries e uma de 7ª série. Fonte: Foto de Registro de Pesquisa de Campo. Agosto de 2004.

A opção metodológica pela observação semi-estruturada demandou um

período mais longo de contato entre o observador e o “observado”, que se estendeu

de maio a dezembro de 2004. Segundo Vianna (2003), em decorrência do tempo

prolongado no campo, geralmente desenvolve-se relacionamento emocional

agradável e/ou desagradável, que pode ser fator que facilita ou dificulta a melhor

compreensão do observado. Vianna (2003) adverte:

Lembremos que o campo da observação possui múltiplas e complexas dimensões e o observador, sem uma definição prévia de sua estratégia sobre o que observar, sentir-se-á inteiramente perdido diante da numerosidade de possíveis elementos de informação, na totalidade do campo observacional. Faz-se necessário desenvolver condições para uma certa organização e orientação, a fim de proceder ao trabalho de observação com fins de pesquisa. (Vianna, 2003, p. 66)

147

O prédio da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” foi concebido pelo

Padre Antenor101, no período em que foi vigário de Bom Despacho, de 1958 a 1962,

que sonhava construir um empreendimento denominado “Patronato” para abrigar

crianças abandonadas da cidade e da região. Devido à carência de recursos

financeiros a obra ficou paralisada por alguns anos. O Professor Jacinto Guerra102

vendo a obra inacabada, solicitou junto a Secretaria de Educação do Estado de

Minas Gerais (SEE/MG) a aprovação para o funcionamento no local de um Ginásio

Industrial. A autorização se deu pela Portaria nº. 225 de 25 de abril de 1965, com a

organização de um Ginásio Orientado para o Trabalho. A sua instalação se deu a 20

de julho de 1966, conforme ata lavrada em livro próprio e arquivado na secretaria da

escola.

Nessa história é possível constatar, desde a sua concepção, a preocupação

da escola com a questão dos excluídos e menos favorecidos era adicionada a

atenção voltada para formação profissional. A missão da escola vem encontro da

demanda do bairro de proporcionar uma educação que vise o mercado de trabalho

com a preparação de mão-de-obra operária. O que se confirmou nas palavras do

primeiro diretor da escola: Cumpria-se todo o currículo normal acrescido das práticas

industriais e comerciais e economia doméstica - educação para o lar. (GUERRA,

2004, p.2-3).

E é nesta sociedade que está inserida a escola, a qual tem como objetivo primordial preparar o aluno, levando-o a atuar de forma crítica, responsável e transformadora. Atuar como cidadão. Porém, para exercer a cidadania, pressupõe a participação política de todos na definição de rumos, não

101 Padre Antenor Nunes Pimentel, se ordenou sacerdote em 1946, foi vigário nas cidades de Dores do Indaiá, Manhumirim, Carangola, Bom Despacho e morreu em Dores do Indaiá no ano de 1981. em Bom Despacho morou no período de 1958-1962 época que conseguiu angariar fundos através de doações da comunidade iniciando a construção de um patronato, obra que cresceu, se transformou, e é hoje a sede da E.E. Prof. Wilson Lopes do Couto. 102 Professor Jacinto Guerra; escritor, Secretário de Cultura de Bom Despacho (1997-2000) bolsista da Universidade de Évora, sul de Portugal, instituiu o Programa de Intercâmbio entre Bom Despacho e a cidade portuguesa de Vila Verde, na província do Minho, de onde, no século XVIII, vieram muitos colonizadores do Centro-Oeste e do Alto São Francisco, em Minas Gerais.

148

apenas na escolha de representantes políticos, mas também na participação em movimentos sociais e envolvimento com temas e questões da nação e em todos os níveis da vida cotidiana. (Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”, 2004, p.6).

Na visão dos funcionários sobre a missão da escola, o que se considera como

exemplar nesse tópico é a confirmação do otimismo e da confiança dos funcionários

revelados nos seus relatos nos momentos de debates e apresentações no projeto de

resgate histórico ali construído. Para muitos desses, na atualidade, são tantas as

informações que circulam pelo mundo ao mesmo tempo (através do rádio, da

televisão, internet, jornais, revistas) e com tanta velocidade que se faz necessário

oferecer aos seus alunos condições de operarem as mudanças necessárias para

desenvolvimento, o crescimento e a manutenção de suas vidas na em sociedade.

A sua denominação inicial Ginásio Industrial Estadual foi modificada para

Ginásio Estadual de Bom Despacho pela Resolução n° 18 de fevereiro de 1971, do

Secretário de estado da educação. De acordo com o Decreto nº. 16.244 de 08 de

maio de 1974, que dispõe sobre denominação e tipologia das Unidades de Ensino,

passou a denominar-se Escola Estadual de Bom Despacho de 1° Grau 0.5.0. Por

força da Lei n° 7.382, de 25 de outubro de 1978, sancionada pelo governador do

estado, adquiriu a denominação Escola Estadual Prof. Wilson Lopes do Couto

R.0.3.5.B.2. O Decreto n° 24.359, de 22 de março de 1985, do Exm° Sr. Governador

do Estado, Dr. Hélio Carvalho Garcia, criou o ensino de 2° Grau na Escola. A

Portaria n° 231/87 da Superintendência Educacional da Secretaria do Estado, MG,

de 28/03/85, autorizou o funcionamento do ensino do 2° Grau sem habilitação

profissional.

149

FIGURA 17: Pátio interno da escola destaque para porta de entrada da Secretaria (1) e da Diretoria (2). Fonte: Foto de registro de pesquisa de campo – 18 de junho de 2004.

A Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” ocupa uma área de 10.000

m² (dez mil metros quadrados) em 5.430 m² construídos divididos em: onze salas de

aula (duas salas em outro endereço - compartilhadas com a Escola Estadual

Coronel Robertinho); diretoria; secretaria; sala dos professores; biblioteca; cozinha;

laboratório de Ciências; auditório; depósito de alimentos; quadra de esportes;

banheiro masculino com 6 vasos e banheiro feminino com 4 vasos. Todos, de

acordo com o parecer da direção, se apresentam em bom estado, exceto a quadra

de esportes que não é reformada desde sua construção. Essa se apresenta com

buracos no piso, com aberturas na tela de proteção, sem cobertura, sem

arquibancada, sem iluminação e seus arredores ainda são de terra batida.

150

FIGURA 18: Quadra de esportes da escola. Fonte: Foto de registro de pesquisa de campo – 18 de junho de 2004.

A escola procura preservar os recursos materiais disponíveis como os

utensílios de cozinha (fogão industrial, freezer, liquidificador, geladeira, filtro, forno

elétrico e a gás e forno microondas) e os equipamentos (três videocassetes, quatro

TVs, antena parabólica, máquina fotográfica, filmadora, copiadora, sete ventiladores

de teto distribuídos em salas de aula, três aparelhos de som, dois bebedouros e um

microcomputador de uso exclusivo da secretaria). A escola mantém, ainda, as

máquinas e equipamentos que eram utilizados quando funcionava como Ginásio

Industrial. Em parceria com a comunidade, os equipamentos são utilizados por ela,

que, em troca, faz reparos nos materiais permanentes da escola, principalmente nas

mesas e cadeiras dos alunos. Da mesma forma, a comunidade colabora na

manutenção de hortas, pomares e jardins da escola.

A Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”, em termos de organização,

pertence à rede estadual que oferece ensino fundamental organizado em quatro

151

séries, o ensino médio com duração de 3 anos e a Educação de Jovens e Adultos

(EJA). A instituição atende a uma média de 563 alunos do ensino fundamental,

distribuídos em 15 turmas, funcionando em 03 (três) turnos. O ensino médio com

255 alunos distribuídos em 07 turmas, funcionando em 02 (dois) turnos e a

Educação de Jovens e 0Adultos (EJA) atende duas turmas no noturno com 35

alunos e outra com 38 alunos, funcionando num segundo endereço, em prédio

compartilhado com a Escola Estadual Coronel Robertinho, conforme Quadro 5 103:

Série

Série

Série

Série

1º ano

Ensino

Médio

2ºano

Ensino

Médio

3º ano

Ensino

Médio

EJA

Manhã - - - 04 03 01 01 -

Tarde 03 04 03 Turmas - - - -

Noite - - - 01 01 01 01 02

82 125 106 158 136 60 46 73

Total de Alunos - 786

QUADRO 5: Distribuição dos Alunos por série/turno em 2004. Fonte: Proposta Político Pedagógica da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” de 1º de março de 2004.

A maioria dos estudantes da escola reside no Bairro de Fátima e demais

bairros vizinhos e/ou próximos geograficamente: Calabouço, Ozanan, Esplanada,

Realengo, Vila Gontijo, Olegário Maciel, Vale do Amanhecer, Babilônia, Rosário,

103 As turmas são organizadas de acordo com o nível de desenvolvimento respeitando o tempo de aprendizagem e/ou a idade de cada aluno. A enturmação dos alunos na escola é flexível, ocorrendo remanejamento do aluno quando se faz necessário. Os turnos das aulas são assim definidos: manhã de 7h às 11h30min; tarde de 13h às 17h30mim e noite 18h30min às 22h30min.

152

Santa Marta. Da totalidade dos alunos, setenta e cinco moram na zona rural do

município: Engenho do Ribeiro, Ressaca e Mato Seco. 104

De acordo com a Proposta Curricular da Escola Estadual “Prof. Wilson

Lopes do Couto” (2004), seu objetivo primordial é preparar o aluno, levando-o a

atuar de forma crítica, responsável e transformadora, ou seja, exercer a cidadania.

105 Na leitura do documento, idéias de autonomia, flexibilidade e liberdade de

expressão aparecem como condição necessária ao resgate dos compromissos da

escola e dos educadores com uma aprendizagem de qualidade. Assim estão

enunciadas na Proposta Político Pedagógica da Escola:

A escola busca desenvolver um trabalho integrado à realidade, ou seja, contextualizado e significativo. No qual, o seu pilar é o educando, visando assim, uma educação que tenha como alicerce o respeito, os valores, a cultura e a valorização humana. Conta com um trabalho em equipe, onde professores e alunos trabalham juntos em prol de uma aprendizagem constante. Procurando promover um ambiente de ensino agradável e harmônico, no qual todos têm o mesmo objetivo: trilhar o caminho da informação e contribuir para um mundo justo e digno para todos. (Proposta Político Pedagógica, 2004, p. 6).

Havia um esforço da direção da escola em manter o quadro de funcionários o

mais permanente possível, para fugir às variações, principalmente, do corpo

docente, comum nas escolas durante o ano letivo. Motivadas por licenças médicas,

férias-prêmio, aposentadorias, mudanças de locação, efetivações, licenças para

concorrer a candidaturas em eleições, determinações da SEE/MG. Professores

entram e saem das escolas com muita freqüência. Pela forma de organização do

trabalho pedagógico, tais alterações causam uma série de dificuldades, porque cria

rotatividade de funcionários, descontinuidade no processo de aprendizagem e

insegurança no estabelecimento de vínculos afetivos, especialmente entre aluno- 104 Para melhor localização dos bairros, ver Mapa 3, p. 138. 105 A escola está inserida nos Programas Desenvolvidos pelo Governo Federal: Bolsa-Família, Programa de Manutenção e Desenvolvimento da Educação, Dinheiro na Escola e Programa Nacional de Transporte Escolar.

153

professor. O quadro de funcionários da escola estava organizado segundo a Quadro

6 que se segue:

Dire

tor

Vic

e-

dire

tor

Esp

ecia

lis

ta

Sec

retá

ria

Aux

iliar

Sec

reta

ria

Pro

fess

or

Bib

liote

ca

Pro

fess

or

Rel

igiã

o

Pro

fess

or

Aju

dant

e

de S

ervi

ço

Desig

-nado - 01 03 - 01 - 01 31 08

Efetiv

o 01 - - 01 03 03 - 11 02

Total 66 funcionários

Quadro 7: Funcionários da a Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” – 2004 Fonte: Proposta Político Pedagógica da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto de 1º de março de 2004.

A Escola Estadual Wilson Lopes do Couto tinha, em 1º de março de 2004,

trinta e duas professoras e cinco professores, que se distribuíam entre as dez

disciplinas do ensino fundamental (Língua Portuguesa, Matemática, História,

Geografia, Ciências, Educação Física, Educação Artística, Ensino Religioso, Língua

Estrangeira Moderna – Inglês e Redação) e entre as onze disciplinas do ensino

médio (Língua Portuguesa, Arte, Educação Física, Matemática, Química, Biologia,

Física, Geografia, História, Literatura e Língua Estrangeira Moderna – Inglês). Soma-

se à matriz curricular, tanto para o Ensino Fundamental quanto para o ensino médio,

estudos complementares segundo orientações do MEC e da SEE/MG106. A

106 Ensino Fundamental: Os temas abaixo serão desenvolvidos através de projetos, integrados aos conteúdos: cidadania, ética e civismo, desenvolvimento afetivo-sexual, educação ambiental, educação fiscal/tributátia e drogas. Os estudos sobre dependência química e as conseqüências neuropsíquicas e sociológicas do uso de droga permeiam todos os conteúdos da Base Nacional Comum. Lei 13.431/99 – Decreto N.º 41.166/ 2000 e Res. Conj. N.º 01 de 2001. Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro - Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o Currículo Escolar, em especial nas áreas de Educação Artística, Literatura e História Brasileiras. Lei 10.639/2.003.

154

classificação do pessoal docente por conteúdo curricular, atuação e habilitação (lê-

se EF – ensino fundamental e EM – ensino médio), como podemos observar no

Quadro 7 abaixo:

Disciplina EF EM EFETIVO DESIGNADO

- - - EF EM EF EM Língua portuguesa 05 02 01 01 04 01

Inglês 02 01 - - 02 01 História 03 01 01 01 02 -

Geografia 03 - 01 - 02 - Matemática 05 02 02 01 03 01

Ciências 03 - 02 - 01 - Física - 01 - 01 - 01

Química - - - - - 01 Biologia - - - - - 01

Educação Religiosa 01 - - - 01 - Educação Artística 01 - - - 01 01 Educação Física 02 01 - - 02 01

QUADRO 8: Distribuição dos Professores (conteúdo curricular/atuação/habilitação) - 2004 Fonte: Censo Escolar da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto datado de 31 de março de 2004.

A Escola prevê na sua proposta político-pedagógica a formação continuada

dos profissionais que se aperfeiçoarão

[...] por meio de reuniões, seminários, cursos, palestras e encontros para melhor entrosamento e resoluções das questões do dia-a-dia escolar. No decorrer do ano está previsto a realização de várias outras reuniões para: elaboração de projetos; participação em seminários e palestras promovidos por outras entidades; estudar, refletir e repensar a prática pedagógica e temas atuais e relevantes; reelaborar a Proposta Político Pedagógica da Escola (PPPE), PDE e Regimento quando necessário.

Ensino médio: Lei 12.767/98 – Estudo de Direitos Humanos – Permeia em todos conteúdos. Lei 9.795/99 - Educação Ambiental – Integrada a todos os conteúdos. Lei 13.411/99 – Dependência Química – uso de drogas – Permeiam todos conteúdos. Lei 10.639/03 – História e Cultura Afro-Brasileira – Permeiam Arte – Literatura e História. Lei 9.394/96 - Os componentes curriculares Filosofia e Sociologia são integrados à História e Geografia. Lei 12.909 de 24/06/98 – Educação para Consumo – Inserido no Projeto Pedagógico.

155

Os professores e professoras, segundo o nível de formação, modalidade de

atuação e conteúdo curricular estão distribuídos conforme o Quadro 9 que se segue:

Nível de Formação Licenciatura Com Magistério Sem Magistério

Mestrado 01 Pós-graduação Latu sensus 13

Outra formação completa 34 04 Séries Finais 21 01

EM/ Profissionalizante 14 04 EJA 05 -

Superior em Curso 03 QUADRO 9: Distribuição dos Professores por Nível de Formação - 2004 Fonte: Censo Escolar da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto datado de 31 de março de 2004.

Registra-se que a professora de Arte tem somente o 2º Grau, porém é

autorizada a lecionar a disciplina a título precário, segundo Resolução da

SEE/MG397/CEE e Portaria Conjunta nº. 0193. Do pessoal administrativo três têm

ensino fundamental completo e cinco têm incompleto; cinco têm ensino médio; dois

tem curso superior e a diretora tem curso superior e licenciatura.

Segundo a proposta político pedagógica, a Escola Estadual “Prof. Wilson

Lopes do Couto” busca desenvolver um trabalho integrado à realidade, ou seja,

contextualizado e significativo. Seu pilar é o educando e a escola, tem por objetivo

oferecer educação que tenha como alicerce o respeito, os valores, a cultura e a

valorização humana. Conta com um trabalho em equipe, no qual professores e

alunos trabalham juntos em prol de uma aprendizagem constante. A escola procura

promover um ambiente de ensino agradável e harmônico, onde todos têm o mesmo

objetivo: trilhar o caminho da informação e contribuir para um mundo justo e digno

para todos (Proposta Político-Pedagógica, 2004, p.6).

156

Ainda de acordo com esse documento, a escola prioriza o entrosamento com

os pais para que estes possam ajudar a alcançar as metas estabelecidas e propor

as mudanças que atendam significativamente a comunidade escolar. A instituição

acredita que a articulação Escola x Comunidade x Parcerias diversas faz-se

necessária, sempre que possível, envolvendo a comunidade em projetos, festas,

teatros, feira cultural e outros eventos para conseguir alcançar seus objetivos gerais,

assim definidos:

- Dar continuidade à formação integral do aluno recebida na família e na comunidade em consonância com os valores humanos, a solidariedade e a cooperação; - Tornar a escola uma agência de disseminação de produção de conhecimentos, de busca de ensino continuado, de novas técnicas de ensino-aprendizagem e implementação de novas tecnologias educacionais; - Permitir a concretização das intenções educativas dos profissionais da escola pela dinâmica, ação-reflexão-ação; - Estimular o pensamento coletivo, a aprendizagem em equipe e a busca de metas comuns como requisito para vivência da cidadania. (Proposta Político-Pedagógica, 2004, p.7)

Em termos de procedimentos didáticos trabalha-se com a pedagogia de

projetos envolvendo toda a escola, de forma interdisciplinar e transdisciplinar, sob o

aspecto construtivo do conhecimento, promovendo a articulação dos vários tipos de

saberes e experiências e não apenas as habilidades de um saber específico. Na

leitura do documento percebe-se a preocupação em promover a diversificação

metodológica e curricular, no intuito de converter todas as ações educativas em prol

do desenvolvimento integral do aluno.

Para trabalhar os conteúdos, toma-se como referência os Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCNs), a vivência e discussões dos alunos, tentando tornar

a aprendizagem mais significativa. São usados diferentes recursos didáticos,

adaptando-os de modo a obter uma aprendizagem eficiente como pesquisa, debate,

palestra, teatro, excursão, seminário, entrevista, mesa redonda, vídeo, leitura, aula

157

expositiva, atividades fotocopiadas ou mimeografadas, livro didático, oficinas

oferecidas por membros da comunidade, comemorações, momento cívico,

olimpíadas, trabalho em grupo, várias dinâmicas que oportunizam um ensino de

qualidade.

Pude perceber que são considerados no planejamento didático da escola os

resultados das avaliações internas e os do Programa de Avaliação de Rede Pública

de Educação Básica (PROEB) e os do Sistema Mineiro de Avaliação da Educação

Pública (SIMAVE). A avaliação constitui-se num processo para acompanhar o

desenvolvimento da aprendizagem do aluno, da sua aquisição de competências e

habilidades necessárias à sua formação. Bem como, um processo para verificar a

eficácia do trabalho docente, corrigir e rever ações na busca da adequação

necessária às características dos alunos.

Os instrumentos e as situações de avaliação da escola podem ser os mais

variados: a observação, o debate, a pesquisa, entrevista, ficha de registro, auto-

avaliação, trabalhos em grupo e individual, jogos, relatórios de atividades, avaliações

escritas, atividades referente ao conteúdo trabalhado ou do livro didático. Enfim,

todas as atividades de ensino podem e devem ser utilizadas para avaliar o processo

de aprendizagem. O que importa é que o professor saiba observar, interpretar,

investigar, buscando acompanhar o processo de construção do conhecimento do

aluno identificando o seu progresso e permitindo que os aspectos qualitativos

prevaleçam sobre os quantitativos107.

Do ponto de vista da operacionalidade a estrutura organizacional da escola

está amparada no sistema colegiado, que é destinado a prestar assessoramento

107 Para maiores informações ver anexo da página 371.

158

técnico-pedagógico e administrativo às atividades da escola. O Colegiado108 e os

Conselhos de Classe por Série109 constituem os órgãos colegiados desta escola e

funcionam como dinamizadores da Proposta Político-Pedagógica. Caracterizam-se,

principalmente, por ser espaço interdisciplinar de debate permanente, de geração de

idéias e de tomadas de decisão a partir do exercício democrático, os conselhos são

vistos pela escola como espaços privilegiados de produção de conhecimento. 110

De acordo com o modelo organizacional da escola, se sistematizadas e

concretizadas têm uma intencionalidade deliberada e um compromisso explícito em

tornar acessível o conhecimento de todos os alunos. No meu entender, as premissas

esboçadas pela escola são extremamente profícuas para o tema em pauta, pois

coloca importantes intervenções para o alcance de um entendimento mais profundo

das complexas relações estabelecidas na escolarização, na presença ou ausências

de necessidades educacionais especiais.

108 O Colegiado é o órgão representativo da comunidade escolar, com funções de caráter deliberativo e consultivo nos assuntos referentes à gestão pedagógica, administrativa e financeira da Escola, respeitadas as normas legais pertinentes. Ao Colegiado, observadas as normas legais e as diretrizes estabelecidas para o setor educacional e as especificidades da comunidade escolar, compete: participar da elaboração, implementação e avaliação da Proposta Político-Pedagógica da Escola; acompanhar o processo de composição do Quadro de Pessoal; acompanhar e aprovar a aplicação dos recursos orçamentários e financeiros da Escola; participar dos processos de avaliação da Escola, a fim de subsidiar o replanejamento da Proposta Político-Pedagógica ; em articulação com Associações de Bairros, Conselhos de Série, Sindicatos e outras formas de parcerias, alianças e ações de voluntariado. (Proposta Político-Pedagógica, 2004, p9-10) 109 Os Conselhos são órgãos colegiados que reúnem, periodicamente, os vários professores, juntamente com a equipe pedagógica, para refletirem sobre o trabalho educativo desenvolvido com os alunos. Os Conselhos objetivam discutir e analisar o processo de aprendizagem dos alunos, detectar aqueles mais necessitados de acompanhamento e, com vistas a um processo de ensino efetivo, definir, coletivamente, a Proposta Político-Pedagógica da Escola, para atendimento a essas necessidades. (Proposta Político-Pedagógica, 2004, p.12) 110 Os Conselhos de Classe aconteceram nos dias 24 de abril, 15 de julho e 03 de novembro de 2004.

159

7. NO COTIDIANO ESCOLAR, DEFICIÊNCIA, DIFERENÇA E

INCLUSÃO

As coisas não querem mais ser vistas por pessoas razoáveis; elas desejam ser olhadas de azul – Que nem uma criança que você olha de ave.Poesia é voar fora da asa.

(Manoel de Barros, 2001)

Ao iniciar a pesquisa de campo na escola pública estadual do sistema regular

de ensino, que acolhe em seu interior pessoas com necessidades educacionais

especiais, tendo em vista contribuir para a elucidação dos sentidos e significados

produzidos pela inclusão escolar, observei que a bagagem teórica considerada a

partir das contribuições das áreas do conhecimento como a Sociologia, a

Antropologia e a Educação tornam-se insuficientes. Pois o contato com a intricada

realidade escolar, muitas vezes indecifrável para mim, evidenciava que a

constituição do quadro referencial teórico não é tão simples nem se dá num

momento totalmente acabado e anterior à pesquisa propriamente dita. O que se

evidenciou no campo de pesquisa foi que no decorrer do estudo da cotidianidade da

Escola houve necessidade de um aprofundamento teórico e busca de outras leituras

que contribuíram para o propósito de significar, interpretar e entender a realidade

expressa. Patto (1999) chama a atenção para o esforço contínuo de um

adensamento teórico e afirma que:

Assim sendo, por intermédio do estudo da cotidianidade, também se realiza a ascensão do abstrato ao concreto e a referência à realidade social deixa de ser feita no singular para se fazer no plural; do ângulo da análise social centrada na vida cotidiana, (...) Rockewell (1986) refere-se à relação contínua entre os conceitos teóricos e os fenômenos observados, entre a conceituação e a observação, como o processo analítico que permite a construção do conteúdo concreto de conceitos abstratos. Como ela diz, “no processo analítico, o pesquisador trabalha com as categorias teóricas mas não as define de antemão em termos de condutas ou efeitos observáveis. Essa forma de análise permite a flexibilidade necessária para descobrir que

160

formas particulares assume o processo que se estuda, a fim de interpretar-se seu sentido específico em determinado contexto”. (PATTO, 1999, p.182-183)

No convívio ávido e muito interessado do cotidiano dessa escola,

especificamente no turno da tarde, com seus protagonistas, alunos e professores, e

outros atores da comunidade escolar, funcionários, pais e vizinhança observei, em

vários momentos de seu cotidiano, formas de expressão, inquietações e queixas.

Lutas e conquistas, choros e risos, num esforço permanente para compreender os

sentidos dos seus gestos, sinais, falas, olhares, gírias e as significações construídas

na forma de organizarem a convivência social e de distinguirem suas

particularidades.

Como apresentado anteriormente, era significativo o número de alunos da

Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto” vindos de escolas localizadas na

vizinhança do Bairro de Fátima. Aproximadamente 95% dos alunos da 5ª série são

oriundos da Escola Municipal João Dornas Filho, que fica no Bairro Ozanan. Dentre

estes havia prevalência do sexo masculino, o que pode ser comprovado pelo quadro

10 abaixo:

GÊNERO 5ª 6ª 7ª Masculino 47 74 62 Feminino 35 66 45

Total 82 140 107

FIGURA 10: Quadro de Distribuição dos Alunos Segundo o Sexo - 2004 Fonte: Censo Escolar da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto datado de 31 de março de 2004.

Segundo o censo escolar de 2004, a faixa etária dos alunos do Ensino

Fundamental e da Educação de Jovens e Adultos varia entre 10 e 34 anos de idade

distribuídos segundo a Tabela 5 que se segue:

161

TABELA 5

Matrícula Efetiva do Ensino Fundamental Por Série e Turno, segundo o Ano de Nascimento.

ANO 5ª SÉRIE 6ª SÉRIE 7ª SÉRIE 8ª SÉRIE

DIURNO 8ª SÉRIE

NOTURNO 1994 01 - - - - 1993 60 01 - - - 1992 12 61 - - - 1991 05 55 43 - -

1990 01 07 42 33 02 1989 - 02 09 54 07 1988 01 03 03 30 05 1987 - 01 03 11 08 1986 - 01 01 06 10 1985 - 03 02 03 10

1984-1980 02 03 02 01 06 1979-1975 - - 01 - 01 1974-1970 - - 01 01 -

CONTROLE 82 140 107 139 49

Fonte: Censo Escolar da Escola Estadual Wilson Lopes do Couto datado de 31 de março de 2004.

A população infanto-juvenil prevalece no universo da escola e desloca

consigo toda vitalidade, contradições, lutos, crises, alvoroços próprios da

adolescência111. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a

adolescência se insere na faixa etária compreendida entre 12 e 18 anos de idade.

Bahia, Grossi e Cirino (2000), a adolescência caracteriza-se por ser uma fase de

transição entre a infância e a juventude, uma etapa extremamente importante do

desenvolvimento, com características muito próprias, que levarão a criança a

tornar-se um ser adulto, acrescida da capacidade de reprodução. As mudanças

corporais que ocorrem nesta fase são universais, com algumas variações,

111 A investigação não se ateve às questões ligadas à adolescência, mas procurei estar atenta para as características da mesma a fim de proporcionar uma melhor clareza da população de estudantes observada.

162

enquanto as psicológicas e de relações variam de cultura para cultura, de grupo

para grupo e até entre indivíduos de um mesmo grupo112.

Teóricos como Zagurry (1999), Alberty (1999) e Levisky (1998) afirmam que

na adolescência há uma busca de identidade e necessidade de reconhecimento

pessoal a partir do grupo, para as quais o adolescente precisa de um tempo para

elaborar suas questões, pois essas acarretam, em muitos adolescentes angústias,

dificuldades de relacionamento, confusão e medo. Há um crescente interesse,

nesta fase de vida, pelas coisas que ocorrem no mundo. E, é comum o surgimento

de preocupações sociais, melhor dizendo, começam a perceber, às vezes com

agonia, as diferenças sociais, as carências de determinados segmentos da

população. Os adolescentes da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”,

também, em suas trajetórias de vida possuem marcas dos afetos e transformações

próprias da adolescência.

Na interação com as pessoas desse universo escolar em situações e

contextos particulares, privilegiei o pátio principal como ponto de observação, pelos

motivos já colocadas anteriormente. Defini acompanhar minuciosamente a entrada

dos alunos e as duas primeiras horas do tempo de aula; o recreio e as duas últimas

horas do tempo de aulas e, conseqüentemente, a saída dos alunos; nas segundas,

terças e quartas-feiras, comumente, e quintas e sextas-feiras esporadicamente.

Importante comentar que à medida que foi se desenvolvendo a investigação, essa

aos poucos se tornava, para mim, cada vez mais concreta e centrada em aspectos

essenciais para esclarecer as questões da pesquisa.

Pude registrar que os alunos entravam e saíam sempre pelo portão lateral,

enquanto os funcionários e visitantes utilizavam a entrada principal. Em meio a

112 Sobre cultura juvenil ver: DAYRELL, Juarez. Juventude, grupos de estilo e identidade. Educação em Revista, Belo Horizonte, nº30, dez, 1999.

163

grande movimentação e barulho produzidos na entrada dos alunos, entre gritos,

cumprimentos e disputas para saciarem a sede no bebedouro, logo após passarem

pela funcionária que recolhe as cadernetas escolares e a alegria demonstrada por

estarem com os “chegados”. Nessa movimentação a presença da pesquisadora de

início é pouco notada, tanto pelos alunos, quanto pelos professores que chegam.

Decorridos os primeiros cinco minutos alguns alunos demonstram espanto ao

perceberem alguém estranho ao cenário da escola, assentado no banco do pátio

fazendo anotações. As atitudes nesse momento são de aproximação e de

identificação do estranho:

Do que você é professora? O que você faz aqui. Deixa eu escrever meu nome aqui? (aponta para o bloco de anotações) escreve o nome e continua. Deixa eu apresentar os meus colegas. eu sou da 5ª 3. depois você vai na minha sala. (Fala de estudante, 5ª série, com histórico de ter sido avaliado pelos profissionais da APAE - BD em 2002 e diagnosticado como com Deficiência Mental leve, com atraso significativo no processo de aprendizagem). Esta dinâmica de contato desse aluno se repete nas duas primeiras semanas de presença no campo. (03/05/2004, 13h00min h) O que você está fazendo? Me dá uma folha para eu fazer uma coisa. Eu só tenho um caderno. (Estudante da 5ª série em contato com a pesquisadora). Um outro aluno aproxima-se e o repreende. “Deixa a Dona em paz, pára de ficar pedindo as coisas para os outros. Liga não Dona ele é assim mesmo, meio doidão. Vamos para sala. Tchau Dona”. Saem correndo abraçados e desaparecem no corredor que dá para o pátio 2 (Nota de campo, 10/05/2004, 13h00minh).

Nestas cenas importam observar as normas de conduta que prevalecem:

primeiramente uma aproximação desconfiada, buscando entender qual a intenção

da minha presença na escola (Professora? Inspetora? Fiscal? Alguém da SEE/MG?

Visitante? Funcionária nova?); o questionamento que mais se repetia era “Você é a

professora nova?”, fato que chamou muita atenção. A supervisora explica que várias

mudanças de professores ocorreram nos últimos dias, principalmente devido às

eleições municipais, pois, alguns eram candidatos e se licenciaram para

164

concorrerem às mesmas, provocando alterações no quadro de professores de

diversas escolas do município.

FIGURA 19: Pátio interno da escola, destaque para o ponto de observação. Fonte: Foto de registro de pesquisa de campo – 03 de maio de 2004.

Depois, passadas as duas primeiras semanas de convivência no interior da

escola, observei que a minha presença não mais se apresentava como algo

incomum, tornava-se cada dia mais familiar, sendo conhecida como a “Dona da

Pesquisa”. A princípio soava um tanto quanto bizarro; mas no decorrer da

investigação transformou-se em trato diário.

Noto que os alunos têm o hábito de chamar todas as professoras e funcionárias genericamente de “DONA”, raramente citam o nome, as identificam pela função que exercem – Dona da portaria, Dona da secretaria, Dona da diretoria, Dona da cantina, Dona de ciências, Dona de matemática... (Nota de campo do dia 28/05/2004).

165

Vianna (2003), atenta para o fato de que os sujeitos observados, em princípio,

quando sabem que estão sendo observados e com que finalidade, costumam portar

diferentemente, com menos naturalidade (VIANNA, 2003, p.12) A minha presença

sistemática implicou numa familiarização do campo e no retorno das relações

“naturais” estabelecidas entre os seus integrantes por excelência.

No início da aula prevalecia um ambiente relaxado, brincadeiras, pressa em

colocar “as fofocas em dia”, conversas e “sorrisos de chegada”. Era comum

encontrar, minutos antes de soar o sinal de entrada, vários grupos reunidos na

praça, que fica em frente a escola, onde o clima de encontro já se estabelecia. A

praça e as escadas de entrada eram lugares de encontros, conversas rápidas e

secretas, “azaração” (flerte), checada na agenda de atividades escolares, fofocas,

acerto de contas.

Mclaren (1992) atenta para a importância de se observar no cotidiano os

rituais, que atribui como sendo produção cultural construída como uma referência

coletiva ao simbólico e à experiência localizada da classe social de um grupo; um

evento político e parte das distribuições objetivadas do capital cultural dominante da

escola. Afirma que o estudo do ritual e de sua representação auxilia a explorar

como o campo cultural de uma escola funciona, tanto de forma tácita como

manifesta, na transmissão de mensagens ideológicas, bem como fornece uma base

para a incursão teórico-crítica ao domínio do conhecimento do ritual. 113

O vai-e-vem de alunos no pátio permanece até aproximadamente dez minutos

após o sinal de início das aulas, quando a supervisora pedagógica, a vice-diretora e

113 Peter MacLaren é professor da Faculdade de Estudos da Educação e Informação da Universidade da Califórnia, Los Angeles. Como professor, passou grande parte do tempo trabalhando em escolas públicas urbanas, com estudantes carentes. É também um ativo representante da tradição crítica em educação e utilizando-se dessa tradição e de estudos antropológicos sobre rituais.

166

a agente jovem114 se encarregam de encaminhar para as salas de aula os que

resistem ao sinal. Entre um tempo de aula e outro ocorre a troca de professores sem

o uso do sinal, nesse momento de troca alguns alunos costumam dar a sua volta

rotineira no pátio. Nas observações feitas percebi a tolerância da escola para esse

tipo de atitude. Ao encaminhar um dos alunos que perambulava pelo pátio, a

supervisora comenta:

Alguns alunos demoram um pouco mais a irem para sala, este principalmente, ele não suporta muito ambientes tumultuados. Tem dia que ele não faz quase nada, fica parecendo que está perdido, ri à toa, conversa sozinho, o pessoal já acostumou com ele. Pedimos a mãe dele para buscar algum tratamento para ele e ela disse que ele já recebeu alta da APAE, no entanto ao entrarmos em contato com a APAE descobrimos que o mesmo havia sido encaminhado para o Núcleo de Saúde Mental e constatado a necessidade de tratamento psiquiátrico para ele, mas a mãe se recusa, afirmando que seu filho não é louco. O problema é que nós da escola não sabemos muito bem como lidar com casos como o dele. (Comentário da supervisora pedagógica, 11/05/2004, 13h30min h).

Destaco, ainda, que, de uma forma ou outra, aparecem algumas indicações

de interesse da escola de reestruturar seu espaço de convivência escolar a fim de

implementar a prática de inclusão de todo e qualquer aluno, com ou sem

necessidades educacionais especiais. Percebi que esse processo traz a marca da

novidade, gera inseguranças e sentimentos de impotência, principalmente quando

não se tem o cuidado de oferecer preparo e assessoria aos profissionais que ali

atuam. Nesse sentido, corre-se o risco de reduzi-lo apenas na incorporação de

alunos especiais à escola regular. Omote (2003) afirma que a educação inclusiva é,

antes de tudo, ensino de qualidade para todos os alunos e, para a eficiência da

114 Ação de assistência social destinada a jovens entre 15 e 17 anos, visando ao desenvolvimento pessoal, social e comunitário. Proporciona capacitação teórica e prática, por meio de atividades que não configuram trabalho, mas que possibilitam a permanência do jovem no sistema de ensino, preparando-o para futuras inserções no mercado. O MDS concede, também, diretamente ao jovem, uma bolsa durante os 12 meses em que ele estiver inserido no programa e atuando em sua comunidade.

167

mesma considera, essencial que os professores do ensino comum recebam, na sua

formação, alguns conhecimentos básicos sobre alunos com necessidades especiais

e recursos especiais, bem como alguma experiência pedagógica com tais alunos

(OMOTE, 2003, p. 156)115. O autor defende a idéia de que:

Assim, pode-se apontar que, na realidade, os professores de ensino comum necessitam de uma sólida formação como um bom professor e de conhecimento e experiência sobre algumas questões relevantes sobre os alunos com necessidades educacionais especiais e os recursos que podem ser utilizados na sua aprendizagem escolar. A questão central, na formação de professores de ensino comum capacitados para atender alunos com necessidades educacionais especiais em suas classes comuns, é então decidir que conhecimento e que experiência devem ser proporcionados a esses professores. (Omote, 2003, p.157)

Opinião reforçada por Montoan (1997) que afirmam que a educação inclusiva

envolve um processo de preparação do professor; considera as diferenças e as

dificuldades dos alunos na aprendizagem escolar como fontes de conhecimento

sobre como ensinar e como aperfeiçoar as condições de trabalho nas salas de aula.

Conseqüentemente, cabe ao professor desenvolver o seu trabalho a partir das

condições efetivamente existentes de seus alunos. Resumindo, a diversidade dos

alunos deve ser respeitada e a todos esses, inclusive aos com necessidades

educacionais especiais, não deve ser negado o direito de participação ativa no

interior da comunidade escolar. Algumas das minhas notas de campo evidenciam

essas preocupações da autora:

Ela acha aqui o trem mais bom do mundo. Ela melhorou demais. Eu fico pensando: para mim era tão difícil trazê-la e hoje ela está tão

115 Idéia defendida na V Jornada Pedagógica da UNESP de Marília, em novembro de 1994. Neste aspecto importante ressaltar outros estudiosos que compartilham com essa idéia. Ver: Bueno (1999), Ferreira (1999), Mendes (1999).

168

feliz. Só o tanto de amigos que ela fez aqui vale. Ela tem se saído muito bem. Assiste às aulas, presta atenção, depois eu completo os seus cadernos. Antes eu ficava na biblioteca completando os seus cadernos, enquanto ela estava em sala de aula. Agora ela não deixa que eu fique. Acho que foi bom eu não ficar. Ela se sentiu mais livre. Melhorou muito o seu relacionamento com os outros. Hoje eu completo em casa. (Depoimento da mãe de estudante com Paralisia Cerebral (PC), ex-aluna da APAE – BD116, incluída em 2001. Nota de campo do dia 09/08/2004).

É interessante notar a ênfase dada à aceitação da proposta de inclusão

escolar, ao processo efetivado e os resultados obtidos, principalmente o rompimento

com o medo da mudança. Os ganhos significativos dessa aluna no que diz respeito

ao processo de aprendizagem, à autonomia e independência e a ampliação das

relações interpessoais.

Comentário da supervisora sobre a aluna referida acima: “Eu não consigo entender o que ela diz para mim é difícil, me dá aflição. Fico com muito medo dela se machucar, cair da cadeira. Sempre que eu preciso conversar com ela eu peço aos outros alunos, eles a compreendem muito bem. Dentro da escola eles a ajudam no que é necessário, eu acho isso incrível. (...) Admiro o seu esforço, procura fazer as atividades por ela mesma, se sai bem nas avaliações que são feitas, a maioria oral e de marcar”. (Nota de campo do dia 11/10/2004, 15h20minh)

O cotidiano escolar apresenta problemas e desafios constantes. Observa-se

no cenário educacional, a tendência de se oferecer cursos de formação contínua aos

professores. A maioria dos professores da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do

Couto”, consideravam que a pouca ou nenhuma capacitação para atuarem com

alunos que apresentam necessidades educacionais especiais apresentava-se fator

de apreensão e intranqüilidade. Vêem-se, nesse sentido, discursos sustentados pelo

o argumento da incompetência dos profissionais para a inclusão escolar. Portanto,

faz-se necessário que todos os profissionais e cidadãos sejam formados na

116 Importante ressaltar que esse familiar acompanhou e auxiliou a filha, ex-aluna da APAE, com necessidades educacionais especiais, assim que esta começou a freqüentar a escola regular.

169

perspectiva da inclusão escolar e não apenas os professores, por essa se configurar

como parte de um empreendimento maior, uma sociedade inclusiva.

[...] Temos a visita da equipe itinerante da APAE, só que eu ainda não entendi o seu objetivo. Eles vêm visitam, perguntam como o aluno está, dizem das necessidades do aluno e vão embora. Acredito que o trabalho deveria ser mais próximo da nossa realidade, Na verdade aprendemos a lidar com esses alunos é no nosso dia-a-dia. (Fala da supervisora pedagógica - Nota de campo do dia 11/10/2004, 15h20minh).

Quanto às dificuldades em se definir o papel da APAE na construção da

escola inclusiva, isso, na verdade, esbarra com a história da educação brasileira que

traz a marca do sistema dual, ensino regular e ensino especial. Esse sistema dual já

foi objeto de extensos debates e avançar na discussão de que na escola especial os

professores são especiais é importante, na medida em que quebra com o mito de

que somente determinados professores são capazes de atuarem com esse tipo de

aluno. Assim, os professores de ensino regular necessitam de uma sólida formação

como um bom professor e de conhecimento e experiência sobre algumas questões

relevantes sobre os alunos com necessidades educacionais especiais e os recursos

que podem ser utilizados na sua aprendizagem escolar.

Outro dia uma das alunas chamou o JAL de aluno da APAE. Ele queria bater nela. Gostaria que você não me identificasse, pois já trabalhei em várias escolas em Bom Despacho, mas posso garantir que aqui é uma escola que acolhe esse tipo de aluno, o tratamento é igual, não fazem distinção. (Funcionária da escola. Nota de campo do dia 19/10/2004, 16h).

Reforça-se, nesse dado, o fato de que a matrícula e a freqüência na escola

regular, por si só, não é garantia de inclusão escolar e traz consigo posições

antagônicas. Pressupõem, pois, mudanças valorativas e atitudinais, o que envolve

abertura para mudanças dos padrões curriculares da escola que convencionalmente

170

tende a retificar os estigmas associados às pessoas que não correspondem ao

instituído como normal.

Na observação atenta do cotidiano da escola, localizei intervenções feitas

pelos Conselhos de Classe elucidam atitudes de mudanças na escola frente às

questões das diferenças no desenvolvimento dos alunos. No Conselho de Classe do

mês de abril de 2004 do turno da tarde, após reflexões sobre a evolução escolar dos

alunos, foi elaborado um projeto para atender alunos que apresentavam

aprendizagem lenta e aproveitamento insuficiente. Basicamente, o que se realizou

foi atendimento das demandas específicas dos alunos nas áreas de Língua

Portuguesa (gramática, interpretação de texto e ortografia) e Matemática, no turno

da manhã, organizados em grupos de no máximo seis alunos. Essa assistência era

dada, aos alunos do turno da tarde, no período da manhã. O modo interessado e a

disponibilidade dos professores chamaram minha atenção, bem como as

dificuldades encontradas no encaminhamento deste projeto: a baixa freqüência dos

alunos nos atendimentos e o uso por parte dos alunos do trabalho da sala de apoio

escolar como substituto das aulas regulares.

No conjunto das intervenções realizadas pelos Conselhos de Classes, noto

que, nesse sentido, as necessidades educacionais especiais são tratadas a partir

das diferenças que cada aluno porta. Observo um princípio ideológico em defesa do

acesso às oportunidades, redimensionando o currículo, interferindo no cotidiano

escolar e buscando assegurar uma nova mentalidade e atitudes genuinamente

inclusivas. No entanto, observei que nos registros dos Conselhos de Classes, o

processo de avaliação é pautado nas limitações dos alunos, nas interpretações de

comportamentos, provocando uma visão confusa do grupo de professores quanto às

171

noções de diferença e de necessidades educacionais especiais. Registros dessas

falas foram apontados:

DCA – Fraca com a Matemática, irresponsável. Falando muito. Aprende bem. Voz linda. (Conselho de Classe de 16/04/2004) DCCP – Tem dificuldade em interpretar, precisa de incentivo. Preguiçoso. (Conselho de Classe de 24/04/2004) Fraco, melhorou no 1º bi, estava fraco e matando aula. Fraco com relação à turma. MAGC – Desatento, mas é bom. Melhorou, era preguiçoso. Português razoável (concentrar). Aprende bem, faz 50%. Ver com a família. Dedicar mais. Desenha bem. (Conselho de Classe de 24/04/2004) FAC – tem dificuldade, é preguiçoso, não faz atividade extra-classe. Falta muito. É educado, carinhoso e bom. (Conselho de Classe de 25/10/2004) JAL – APAE, esforçado. Muita dificuldade. (Conselho de Classe de 24/04/2004). Fraco está pior depois do celular. (Conselho de Classe de 14/07/2004). Recuperação de Matemática. Na média nas outras recuperações. Português, conversar com APAE. Não acompanha a turma. (Conselho de Classe de 25/10/2004) Fraco, não consegue copiar do quadro. Fraco demais, defasagem em matemática. Segundo a irmã tem problemas, só copia, não resolve as atividades. Escreve até o nome errado. Indisciplinado. (Pareceres do Conselho de Classe sobre os alunos da 6ª série em 24/04/2004)

Considerando que os discursos são constitutivos de formas de ver a

realidade, observo uma necessidade crescente dos professores entenderem e

pensarem a escola com a presença de alunos com necessidades educacionais

especiais e que criam um espaço no contexto escolar. Os professores tentam pensar

em um modelo de atendimento e sugerem que o ponto de partida deva ser um

planejamento diferenciado para cada aluno. Igualmente o grupo de profissionais

parece sentir-se vítima da promessa de garantia de “capacitação”, da presença de

recursos humanos e materiais, que nunca foi cumprida pelo órgão central. Parece

172

acreditar que a resposta técnica seria suficiente para garantir “qualidade” do

processo educativo dos alunos com necessidades educacionais especiais.

Ao sinal do recreio, a excitação ocupa todo o pátio, movimentação extrema,

corre-corre para a cantina (a maioria dos alunos merenda na escola que serve

geralmente pequenas refeições: macarronada, arroz enriquecido com carne e

legumes, saladas). Alguns enfrentam a fila para comprar balas e guloseimas na

pequena lanchonete improvisada, fazem filas para banheiro e bebedouro, entram e

saem nas salas de aula. Som, música e dança no pátio, é o momento em que a

galera acerta o passo e aprende novos “passinhos”. Esta é a hora apropriada para

“jogar aquele charme”, momento em que as trocas afetivas são melhor percebidas.

Algumas meninas conversam e dançam próximo à secretaria, grupos de meninos

simulam lutas marciais e jogam capoeira, em alguns momentos acontecem

agressões físicas que são alvo de intervenção de professores e funcionárias que

conversam com os que excedem na conduta.

FIGURA 20: Momento do recreio, fila na cantina para merendar. Fonte: Foto de registro de pesquisa de campo – 31 de agosto de 2004, 15h35min.

173

O tempo do recreio tem características próprias por carregar o elemento da

rotina; e na tentativa de se aproveitar o máximo em tempo restrito observei a

formação de grupos por afinidades e interesses, mesmo que momentâneos, que

operam na lógica e fluidez desse tempo determinado: o grupo da dança, o grupo da

brincadeira na porta da sala de aula, o grupo das conversas e discussões dentro da

sala de aula, o grupo do toque de bola feita com papel, o grupo das conversas ao pé

do ouvido, o grupo do footing, o grupo que fica reunido ao redor da aluna

cadeirante117, o grupo dos capoeiristas, o grupo dos que simulam lutas marciais, o

grupo das brincadeiras de pega-pega, o grupo que se dedica aos jogos de sedução.

A ênfase é que na construção desses grupos não ocorre distinção por seus

membros serem ou não alunos com necessidades educacionais especiais, as

escolhas são feitas por identificação, afinidades afetivas e opções peculiares à fase

da adolescência.

Ih você não tem coragem de mostrar o seu celular para ela. Mostra as suas mensagens?! Ela recebe um monte de mensagens no celular, algumas são românticas, outras são muito indecentes. Mostra, quero ver se você tem coragem. (Estudante da 7ª Série questiona a colega de sala que apresenta quadro de paralisia cerebral, 15/09/2004). Agora que ele está com celular que tira foto acha que é o tal. (Estudante da 7ª Série). E eu sou bobo de perder. Você está com inveja porque eu estou fazendo sucesso com as meninas. Só tiro retrato de filé. (Estudante da 6ª série). (Diálogo entre os estudantes, sendo que o da 6ª série é ex-aluno da APAE-BD. 15/09/2004). A supervisora diz da importância do trabalho regular sobre sexualidade e da precocidade de alguns adolescentes, vê a necessidade de informar, orientar e desenvolver nos alunos atitudes de respeito quanto aos seus sentimentos na medida em que formam um sistema próprio de valores. (Notas de campo do dia 06/10/2004).

117 Termo usado para pessoas que fazem uso de cadeiras de roda. Esta aluna já citada anteriormente é PC.

174

FIGURA 21: Momento do recreio, pátio interno. Fonte: Foto de registro de pesquisa de campo – 02 de setembro de 2004, 15h40min. Nesses momentos muitos alunos postavam próximos de mim e quase sempre

falavam sobre suas vidas e os conceitos construídos na convivência escolar. Fato

que, associado às observações, me ajudou a pensar sobre os significados de

deficiência/diferença manifestados por eles e os modos como lidavam com essas

construções. Constatei a necessidade de ressaltar suas marcas diferenciadoras com

relação ao processo de aquisição de conhecimento e em seus posicionamentos no

espaço social e cultural da escola a partir da classificação “burro – inteligente”,

normal – diferente, sua representação no cotidiano da escola e o modo como os

significados se desvelam.

O que você está fazendo aqui? (ouve com atenção a explicação da pesquisadora) Ih! Todos aqui são burros, eu sou o mais inteligente (risos)... Dona eu saí no jornal dos bobos. Você precisa vir aqui no dia de teatro, aí a gente dá o show. (Recorte do diálogo de estudante da 7ª série com a pesquisadora. 06/05/2004, 15h30min) A agente jovem se aproxima e relata: “Nossa hoje eu quase apanhei, o ABC, aluno da 6ª série fica implicando o estudante (ex-aluno da

175

APAE-BD, e ele tem problema. Esse estudante) ficou bravo e queria bater no outro colega, eu tive de segurá-lo. Ele é grande, mas quem mandou o outro mexer”. (Nota de campo do dia 31/08/2004 16h10min).

Assim que termina o recreio a supervisora e a secretária conversam com os

alunos envolvidos no episódio, descrito pela agente jovem, sobre normas de

convivência, respeito mútuo e tolerância. Como o estudante (ex-aluno da APAE-BD)

ficou muito descontrolado com nesse último episódio, as funcionárias consideraram

melhor encaminhá-lo para a sua casa, o que foi feito pela agente jovem. Algum

tempo depois esta retorna dizendo que no percurso foi conversando com o

estudante e ele foi se acalmando.

Percebe-se que a elaboração da noção de “ter problema”, nesse caso está

diretamente associada ao fato de considerarem que o aluno não consegue reagir de

modo extremamente tolerante com relação às nomeações desqualificantes; para ele,

ser chamado de aluno da APAE é sinônimo de ser doente, não ser “normal”. O

quanto se sentia magoado com tal denominação, mesmo que o embate trouxesse

certo gozo pelo fato de ter se saído melhor impondo a força física e ser reconhecido

pelo grupo de alunos que incentivavam o combate, como forte.

Viu, mexeu comigo, levou. Bem feito é bom para ele não fazer mais isso. Viu só ele aprendeu o que é bom. Vem mexer comigo de novo para ele ver. Precisa aprender que eu sou mais forte. (Comentário do estudante,ex-aluno da APAE-BD, sobre o episódio relatado acima. 31/08/2004 15h40min).

Entre os alunos da escola a necessidade de ressaltar as marcas

diferenciadoras dos alunos com necessidades educacionais especiais era percebida

na forma como distinguiam tais necessidades e os vínculos afetivos estabelecidos

entre si. Nem todos com essas necessidades eram considerados pelo grupo “como

quem tem problemas” ou eram condenados por terem sido alunos da APAE.

176

Estudante, ex-aluno da APAE, mantém sistemática de busca de identificação estreita com a agente jovem. Consegue estabelecer vínculo temporário com alguns colegas, que muitas vezes se aproximam interessados em suas balas, que são prontamente divididas. Algumas colegas reclamam da sua implicância. “Ih, já vem esse menino chato, só podia ser ele, vive puxando meu cabelo. Grita para ele: Por que você não volta para a APAE”? (Nota de campo: 20/09/2004) Ela é a minha melhor amiga na escola, estamos sempre juntas. A gente vive contando segredo uma para outra, não é? (Volta-se para a amiga perguntando). Ela me passa um tantão de mensagem legal no celular. (Estudante da 7ª Série expondo sobre seu vínculo com a colega que tem paralisia cerebral. 03/11/2004).

Com relação ao que se estabelecia no cotidiano da escola no que tange as

idéias sobre o humano e sua singularidade e idéias sobre a deficiência apontam

para certo aprisionamento a seus significados culturais estereotipados carregados

de crenças e afetos imaginários. Vygotsky (1998) critica a concepção tradicional do

aluno, trazida pela Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento que o

apreende como se ele permanecesse inalterável no tempo e no espaço. Chama a

atenção para a precisão se captar a chamada realidade concreta que se apresenta

para o ser humano, no plano social e individual. Pois, na verdade, os homens

reagem frente a algo que acreditam ter existência real. Assim, como o fazem os

próprios sistemas sociais, econômicos e políticos.

O que se percebe é uma leitura de mundo onde tudo se tece por meio da

linguagem e da palavra. Essas estabelecem atos, ações significativas que

determinam os rumos dos homens, esclarece Mrech (1999). Importante destacar

que esses rumos são tecidos de forma consciente, pois, há sempre preconceitos e

estereótipos que podem anteceder à própria estrutura de pensamento das pessoas.

Comentários desse teor foram registrados:

Um dia ele alegou que não poderia copiar as matérias em sala de aula porque tinha machucado a mão, e flexiona os dedos, deixando-

177

os tensos. Ele ficou o tempo todo das aulas sem copiar as matérias. Ao ajudá-lo percebia que à vezes ele esquecia e relaxava os dedos, quando a gente perguntava se estava melhor ele voltava à posição inicial dos dedos novamente. (Fala de uma mãe de estudante em 17/05/2004, 13h00min h) 118. Eu me preocupo muito com esse aluno (citado acima), ele às vezes parece aéreo, a gente não consegue nem comunicar com ele direito. Tem dias que ele ri quase que as aulas todas, tem dias que ele não quer fazer nada e tem dias que ele corresponde bem. Não entendo porque que a mãe insiste em dizer que ele não tem nada. (Comentário da supervisora, 11/08/2004, 13h30minh). Coitado, alguém deve ter batido nele, esse meninos aqui são muito bagunceiros, eu não deixo fazer covardia com ele, se eu ver eu xingo esses meninos e falo para as professoras. Comigo eles não fazem gracinha. (Estudante da 6ª série, ex-aluno da APAE, matriculado em 2001, 09/06/2004, 15h35min).

Após observações, reflexões e análises recuperam-se afirmações

sustentadas anteriormente de que a inclusão escolar, realmente, não acontece num

passe de mágica, mostra-se como uma conquista que é feita com muito trabalho,

estudo e dedicação de toda comunidade escolar. O que ficou expresso durante a

investigação é que um dos fatores que tem contribuído para o processo inclusivo é o

fato de contarem com a colaboração não apenas dos professores, mas, sobretudo,

dos colegas e familiares. Como ilustra o momento abaixo

O estudante (citado no comentário anterior) chega atrasado para as aulas. Pára próximo ao bebedouro e começa a puxar a água com um rodo e pano de chão. Um estudante pergunta para o colega: Oh doidão, para que esse pano? Ele responde: As mesas estão tudo sujas. A agente jovem fala: “Vá para sua sala. O estudante: responde: “Para sua sala” a agente jovem o conduz para a sala. Ao retornar comenta: “Ele é tão diferente, com ele não adianta falar muito”. (Nota de campo do dia: 13/09/2004)

Interessante perceber que a “inclusão” nessa situação adquire um sentido

especial de tolerância, que traz uma maior aceitação na convivência e nessa a

118 Importante ressaltar que esse familiar acompanhou e auxiliou a filha, ex-aluna da APAE, com necessidades educacionais especiais, assim que esta começou a freqüentar a escola regular.

178

possibilidade de conhecer o outro. Mesmo que, embora alguns sujeitos apresentem

resistências ao diferente, à medida que convivem com os alunos com necessidades

educacionais especiais experimentam a possibilidade de outra forma de relação e,

talvez, de desmistificar a idéia de que sejam menos capazes.

Diante da aporia entre “explicar” e “compreender” os sentidos e significados

construídos por alunos e professores a partir da inclusão escolar dos alunos com

necessidades educacionais especiais na rede regular, pode-se perceber que o

material reunido na convivência da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”

comporta várias possibilidades de sínteses, entre as elucidações que este estudo

permitiu, sem a pretensão de esgotar a análise do cotidiano dessa escola, serão

tratadas aqui algumas dessas relevantes para a reflexão da questão em pauta e que

serviram de ponto de partida para organizar os dados e, conseqüentemente, as

análises.

A inclusão escolar é engodo legal. Na visão dos professores o fato do art. 58

da LDB/96 recomendar educação escolar para os alunos “portadores” de

necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino e vários outros

documentos (pareceres, resoluções, decretos, declarações) acentuarem a

importância da escola para todos, percebe-se que nem sempre a teoria anda lado a

lado com a prática. Para muitos, as políticas educacionais inclusivas enviam seus

discursos, no entanto, não oferecem parâmetros e subsídios para a prática inclusiva

cotidiana. Por fim, consideram imprescindível curso de formação inicial e continuada

de professores que os qualifiquem para intervirem às diversas situações que

envolvem processos de ensino e de aprendizagem, bem como capacidade de

compartilhar responsabilidades. Por essas razões, para os professores, afirmar a

179

inclusão escolar pautado apenas em dados estatísticos é não levar em conta a

realidade das escolas do sistema regular é falsear a realidade.

A inclusão escolar é desafio. No entender dos professores, inclusão escolar

representa um desafio que é difícil e perigoso. Difícil por se sentirem sozinhos, em

algumas situações incompetentes, nessa busca de recursos viáveis para atender as

demandas dos alunos com necessidades educacionais especiais. Evidenciam, além

da carência de alternativas pedagógicas, psicopedagógicas e sociais que

contribuem para o processo de aprendizagem de todos os alunos, quando essas são

criadas, quase sempre esbarra na rigidez curricular, na insuficiência de recursos,

nos entraves institucionais.

Por razões diferentes, os alunos consideram inclusão escolar desafiante

porque estimula, provoca alguma coisa, incita para a luta, para a competição, para a

busca insistente de ações de transformação e adaptação da realidade apresentada.

Daí advém dos alunos, atitudes de auto-afirmação, conquista de espaços,

confrontos pessoais, socialização dos medos e angústias, construção de parcerias

para a superação dos limites, abertura para novas formas de relação, resistência ao

rótulo desqualificante. Pode-se dizer, por extensão, que na visão dos alunos, no

cotidiano escolar, as dificuldades são muitas e variadas, não impossíveis de serem

ultrapassadas.

A inclusão escolar é tolerância. As relações e os conflitos interpessoais do

cotidiano escolar, com os sentimentos, pensamentos, posicionamentos e emoções,

exigem de todos um processo de aprendizagem para o enfrentamento adequado

dos impasses da inclusão escolar. Nessa perspectiva, professores e alunos da

escola estudada consideram que é na convivência com o outro que pode-se admitir

modos de pensar, de agir e de sentir que diferem dos demais. A tolerância, os

180

sentimentos, emoções e valores podem induzir as pessoas a compreender melhor

às causas e conseqüências dos conflitos cotidianos, assim a educação trabalha as

dimensões cognitiva e afetiva, além disso, prepara os alunos para a vida cotidiana

ao mesmo tempo.

Inclusão escolar é afirmar diferenças. Postas algumas idéias sobre diferenças,

para os alunos a definição é clara e objetiva; é o jeito de ser de cada um, Alguns de

seus conceitos se sustentam em marginalização, preconceitos, estereótipos e

estigma. Outros entendem que cada aluno como um ser único, individual e

particular, é assegurar a diferença como valor, como item de admiração. Nas

proposições dos professores o diferente fica cada vez mais comum no cotidiano da

escola. Comum nas suas necessidades e diferente na sua individualidade.

Diferença que impõem, no dia-a-dia, a presença do aluno com identidade, com

história.

Carlos Skliar, em seu livro Pedagogia (improvável) da diferença e se o outro

não estivesse aí? (2003) nos convida a pensar de outro modo a educação que, em

síntese, significa pensar de outro modo a nossa relação com o outro. O autor chama

a atenção para o enfoque da diversidade, geradora de novas identidades e

evidencia o respeito às diferenças; diferença que se constitui pela auto-afirmação do

outro, que resiste contra as mesmices. Provoca entre a identidade (o eu, o mesmo) e

a alteridade (o outro, o diferente) múltiplas alternativas de interpretações e ao

mesmo tempo estabelece os posicionamentos singulares no contexto desta luta de

interpretações possíveis do ser diferente. Sustenta a tensão entre as diferenças

procurando mantê-las e não dissolvê-las.

181

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Se nos forem dados uns poucos de anos a mais de trabalho tranqüilo, certamente haveremos de deixar alguma coisa que justifique a

nossa existência. (FREUD)

Ao mergulhar no cotidiano da Escola Estadual “Prof. Wilson Lopes do Couto”

percebi que mesmo com a “bússola” nas mãos e o itinerário traçado, o sentido é

construído no dia-a-dia, bem como seus significados, porque não dizer a própria

história. Na interpretação de Mrech (1999), este fenômeno é tecido através da

linguagem e da fala, fazendo com que não haja uma realidade pré-discursiva

concreta e acarretando uma leitura de mundo onde tudo se tece através da

linguagem e da palavra. Pois, estas estabelecem atos, ações significativas que

determinam os rumos dos sujeitos. Rumos que são tecidos de forma consciente, já

que, há sempre preconceitos e estereótipos que podem anteceder à própria

estrutura de pensamento dos sujeitos.

Considero que os dados refletem uma preocupação de alunos e professores

acerca do processo de inclusão escolar e apontam para a possibilidade de

valorização da experiência cotidiana na Escola e a necessidade de dar voz a esses

atores que vivenciam diretamente mudanças que a política educacional de inclusão

propõe; possuem vivência suficiente para apontarem críticas e oferecerem

sugestões de mudanças na prática escolar no Ensino Regular.

Oi, está fazendo pesquisa de novo? Ih! Aqui é péssimo. Os professores são leiteiros119. Tem que contar isso aí. (Comentário de estudante da 7ª série demonstrando surpresa com a minha insistência no campo de pesquisa. 13/05/2004).

119 Expressão coloquial que se refere àquele que “tira leite”, “puxa-saco” bajulador, que favorece alguém para obter privilégios.

182

Aqui é ruim você vai ver. Falta espaço, é muito pequeno. Antes a gente podia ir lá fora para comprar merenda. Agora a gente não pode sair. Deveria aumentar mais, deixar a gente sair. (Fala de estudante da 5ª série. Nota de Campo do dia 23/06/2004). Você é fiscal? E aí dona tá gostando da nossa escola? Aqui é bom. Não é Dona? (Interroga a secretária que passava). Quando eu quero ser bonzinho eu sou. Quando não quero... (Estudante da 7ª série. 09/08/2004). Entra e sai de alunos das salas com cadeiras e carteiras. Um deles grita para dentro da sala: Tem cadeira sobrando aí? Ao passar pela pesquisadora exclama: “Escola mais pobre do Brasil é aqui”. (Nota de campo do dia 13/09/2004).

A luta pelo processo de inclusão escolar nessa escola, embora, vistas pelos

sujeitos, como “experiências” iniciais, percebo que está ocorrendo a construção de

novos valores, onde não há roteiro nem receita pronta. Ao contrário, é uma situação

que exige criatividade e alternativas para reconhecer singularidades e diferenças

individuais. O que só está sendo possível com a concreta convivência no mesmo

contexto escolar de alunos, cujas diferenças individuais são postas em questão.

Observei que, quando os alunos portadores de necessidades educacionais passam

a ocupar seu lugar na escola regular, podem ser estabelecidas relações e a escola

como um todo configura um espaço de valoração individual. Tais fatores foram

percebidos através da ajuda mútua e cooperação entre alunos, professores,

familiares e funcionários daquela Escola.

Compreendo que lidar com os “diferentes” na escola regular significa a

aceitação e o respeito à diferença que, não é necessariamente tarefa que diz

respeito apenas à capacitação de professores e às privilegiadas condições humanas

e materiais na Escola, a solidariedade ou a tolerância. Diz do rompimento com as

concepções anteriores sobre a deficiência, que consagra o mito de que pessoas

com deficiência apresentam diferenças entendidas como qualidades negativas. A

partir dessas elaborações e convicta do aspecto revolucionário da prática inclusiva,

183

considero importante colocar em evidência um debate sobre a diferença/deficiência,

inclusão/exclusão.

Tal enfoque nos incita a buscar compreender e enfrentar a questão da

diferença na educação em sua dimensão estrutural e não apenas em suas

manifestações conjunturais. Assim, antes de procurar individualizar autores e

culpados pelas políticas discriminatórias, antes mesmo de demarcar os preconceitos

e estereótipos que as legitimam, é preciso compreender a estrutura do campo

relacional e discursivo que torna possível as hierarquias discriminatórias e as

classificações rígidas dos estereótipos. E buscar nos entrelugares, entre os

enunciados e os processos de enunciação, nos interstícios entre os sujeitos e os

jogos de poder por eles sustentados, as potencialidades de constituição de novas

identidades e de novas políticas.

Nessa perspectiva recorro ao afro-americano James Weldon Jonhson que

denunciou com a sua poesia a exclusão de seu grupo étnico para questionar qual

seria o real significado da educação inclusiva: “Como nos aceitarias? Assim como

somos? Nosso olhar em êxtase preso a uma estrela? Ou estupefato e vazio ante o

desespero? Ascendendo ou tombando? Homens ou coisas?” (JONHSON, 1989, p.

234).

O momento atual da educação inclusiva nos conduz a um questionamento

sério em relação aos preconceitos e estereótipos, através dos quais aprendemos

que o problema é muito maior que a imputação de culpa às pessoas que acreditam

nas próprias imagens que eles têm dos alunos. Há na Educação Inclusiva e na

perspectiva da diferença cultural a introdução de um outro olhar. Falar nessas

perspectivas é isto: se abrir para escutar a diferença. Uma escuta que remete para

184

algo não estruturado. Uma escuta que remete para algo a se tecer: a própria

Educação.

Com efeito, ao cumprir o itinerário teórico metodológico de olhar, ouvir,

escrever, observar, interpretar e analisar a escola na sua cotidianidade e a produção

de sentidos e significados com a inclusão dos nomeados como alunos com

necessidades educacionais especiais, a reflexão que me ocorre aponta para uma

concepção de “deficientes e diferentes” resignados na vivência subjetiva de

convivência e aceitação da alteridade. Percebo que para transpor a abstração

teórica da inclusão escolar e concretizá-la na prática é condição entender que essa

não se define pela origem do problema: define-se pelo tipo de resposta educativa e

pelo tipo de recursos, de auxílios que devem ser proporcionados. Nesse sentido, até

agora, só os alunos com deficiências pareciam ter direitos a esses recursos e ajudas

especiais. No entanto, a nova idéia é que o conceito de necessidades especiais abra

um leque muito mais amplo e que “necessidades especiais” não seja sinônimo de

“deficiência”. Trata-se de desconstruir conceitos que estigmatizam, isolam e

desqualificam os alunos para que se concretizem em ações que acolha, inclua e

respeite a identidade de seus alunos independente de suas condições financeiras,

cultural, social, afetiva, suas características orgânicas, étnicas, religiosas ou de

gênero.

Entendo que um projeto, às vezes, se escreve várias vezes. De um jeito ... de

outro... As palavras parecem nunca dar a dimensão exata, daquilo que se pretende

dizer. Não são suficientes, faltam outras vezes não se combinam. Tem-se a

impressão de que deixa sempre a desejar e é por isso mesmo que se vai em frente.

Um projeto é sempre causado por alguma coisa, uma frase, uma palavra, um

enigma. Um projeto, segundo sua origem epistemológica, significa lançar para

185

frente, avançar, projetar. Assim, o mais importante no que tange à educação

inclusiva, é o querer, o desejar, o lutar pela constituição de um projeto, que vai

adquirindo consistência gradualmente, até que, não só a escola, mas a sociedade se

torne, realmente, inclusiva. O mais importante é o querer, o desejar, o realizar um

projeto que se inscreve não no papel e sim no dia-a-dia de cada um, na sua própria

vida.

186

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194

ANEXO A - CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será

promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

Art. 208. O dever do Estado com a Educação será efetivado mediante a

garantia de:

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,

preferencialmente na rede regular de ensino;

IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade.

Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas, podendo ser

dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei, que:

I – comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus excedentes

financeiros em educação.

195

ANEXO B - LEI Nº. 7.853, DE OUTUBRO DE 1989

Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração

social, sobre a Coordenadoria para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência

– CORDE, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas

pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras

providências.

Art. 2º. Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas

portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos

direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo

à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis,

propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.

Parágrafo Único. Para o fim estabelecido no caput deste artigo, os órgão e

entidades da administração direta e indireta devem dispensar, no âmbito de sua

competência e finalidade, aos assuntos objetos desta Lei, tratamento prioritário e

adequado, tendente a viabilizar, sem prejuízo de outras, as seguintes medidas:

I – na área da educação:

a) a inclusão, no sistema educacional, da Educação Especial como

modalidade educativa que abranja a educação precoce, a pré-escolar, as de 1º e 2º

graus, a supletiva, a habilitação e reabilitação profissionais, com currículos, etapas e

exigências de diplomação próprios;

b) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em

estabelecimentos públicos de ensino;

c) a oferta, obrigatória e gratuita, da Educação Especial em estabelecimentos

públicos de ensino;

196

d) o oferecimento obrigatório de programas de Educação Especial em nível

pré-escolar e escolar, em unidades hospitalares e congêneres nas quais estejam

internados, por prazo igual ou superior a um (um) ano, educandos portadores de

deficiência;

e) o acesso de alunos portadores de deficiência aos benefícios conferidos aos

demais educandos, inclusive material escolar, merenda escolar e bolsa de estudo;

f) a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos

e particulares de pessoas portadoras de deficiência capazes de se integrarem ao

sistema regular de ensino.

197

ANEXO C - LEI Nº. 8069/90, DE 13 DE JULHO DE 1990

Dispõe sobre o Estatuto da criança e do adolescente e dá outras

providências.

Capítulo IV

Do Direito à Educação , à Cultura, ao Esporte e ao Lazer

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando o pleno

desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e

qualificação para o trabalho assegurando-lhes:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,

preferencialmente na rede regular de ensino.

198

ANEXO D - LEI N.º 8.899, DE 29 DE JUNHO DE 1994

Concede Passe Livre às Pessoas Portadoras de Deficiência no Sistema de

Transporte Coletivo Interestadual.

Art. 1- É concedido passe livre às pessoas portadoras de deficiência,

comprovadamente carentes, no sistema de transporte coletivo interestadual.

Art. 2 - O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de noventa dias a

contar de sua publicação.

Art. 3 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 4 - Revogam-se as disposições em contrário.

199

ANEXO E - LEI N.º 8.859 DE 23 DE MARÇO DE 1994

Modifica dispositivos da Lei nº 6.494, de 7 de dezembro de 1977, estendendo

aos alunos de ensino especial o direito à participação em atividades de estágio.

Art. 1º - As pessoas jurídicas de Direito Privado, os órgãos de Administração

Pública e as Instituições de Ensino podem aceitar, como estagiários, os alunos

regularmente matriculados em cursos vinculados ao ensino público e particular.

§1º - Os alunos a que se refere o "caput" deste artigo devem,

comprovadamente, estar freqüentando cursos de nível superior, profissionalizante de

2º grau, ou escolas de educação especial.

200

ANEXO F - LEI N.º 10.098 DE 23 DE MARÇO DE 1994

Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da

acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e

dá outras providências.

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção

da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade

reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços

públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de

transporte e de comunicação.

Art. 2o Para os fins desta Lei são estabelecidas as seguintes definições:

I - acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com

segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das

edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa

portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;

II - barreiras: qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, a

liberdade de movimento e a circulação com segurança das pessoas, classificadas

em:

a) barreiras arquitetônicas urbanísticas: as existentes nas vias públicas e nos

espaços de uso público;

b) barreiras arquitetônicas na edificação: as existentes no interior dos edifícios

públicos e privados;

201

c) barreiras arquitetônicas nos transportes: as existentes nos meios de

transportes;

d) barreiras nas comunicações: qualquer entrave ou obstáculo que dificulte ou

impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens por intermédio dos

meios ou sistemas de comunicação, sejam ou não de massa;

III - pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida: a que

temporária ou permanentemente tem limitada sua capacidade de relacionar-se com

o meio e de utilizá-lo;

IV - elemento da urbanização: qualquer componente das obras de

urbanização, tais como os referentes a pavimentação, saneamento, encanamentos

para esgotos, distribuição de energia elétrica, iluminação pública, abastecimento e

distribuição de água, paisagismo e os que materializam as indicações do

planejamento urbanístico;

V - mobiliário urbano: o conjunto de objetos existentes nas vias e espaços

públicos, superpostos ou adicionados aos elementos da urbanização ou da

edificação, de forma que sua modificação ou traslado não provoque alterações

substanciais nestes elementos, tais como semáforos, postes de sinalização e

similares, cabines telefônicas, fontes públicas, lixeiras, toldos, marquises, quiosques

e quaisquer outros de natureza análoga;

VI - ajuda técnica: qualquer elemento que facilite a autonomia pessoal ou

possibilite o acesso e o uso de meio físico.

CAPÍTULO II

DOS ELEMENTOS DA URBANIZAÇÃO

202

Art. 3o O planejamento e a urbanização das vias públicas, dos parques e dos

demais espaços de uso público deverão ser concebidos e executados de forma a

torná-los acessíveis para as pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade

reduzida.

Art. 4o As vias públicas, os parques e os demais espaços de uso público

existentes, assim como as respectivas instalações de serviços e mobiliários urbanos

deverão ser adaptados, obedecendo-se ordem de prioridade que vise à maior

eficiência das modificações, no sentido de promover mais ampla acessibilidade às

pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Art. 5o O projeto e o traçado dos elementos de urbanização públicos e

privados de uso comunitário, nestes compreendidos os itinerários e as passagens

de pedestres, os percursos de entrada e de saída de veículos, as escadas e rampas,

deverão observar os parâmetros estabelecidos pelas normas técnicas de

acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.

Art. 6o Os banheiros de uso público existentes ou a construir em parques,

praças, jardins e espaços livres públicos deverão ser acessíveis e dispor, pelo

menos, de um sanitário e um lavatório que atendam às especificações das normas

técnicas da ABNT.

Art. 7o Em todas as áreas de estacionamento de veículos, localizadas em

vias ou em espaços públicos, deverão ser reservadas vagas próximas dos acessos

de circulação de pedestres, devidamente sinalizadas, para veículos que transportem

pessoas portadoras de deficiência com dificuldade de locomoção.

Parágrafo único. As vagas a que se refere o caput deste artigo deverão ser

em número equivalente a dois por cento do total, garantida, no mínimo, uma vaga,

203

devidamente sinalizada e com as especificações técnicas de desenho e traçado de

acordo com as normas técnicas vigentes.

CAPÍTULO III

DO DESENHO E DA LOCALIZAÇÃO DO MOBILIÁRIO URBANO

Art. 8o Os sinais de tráfego, semáforos, postes de iluminação ou quaisquer

outros elementos verticais de sinalização que devam ser instalados em itinerário ou

espaço de

acesso para pedestres deverão ser dispostos de forma a não dificultar ou

impedir a circulação, e de modo que possam ser utilizados com a máxima

comodidade.

Art. 9o Os semáforos para pedestres instalados nas vias públicas deverão

estar equipados com mecanismo que emita sinal sonoro suave, intermitente e sem

estridência, ou com mecanismo alternativo, que sirva de guia ou orientação para a

travessia de pessoas portadoras de deficiência visual, se a intensidade do fluxo de

veículos e a periculosidade da via assim determinarem.

Art. 10. Os elementos do mobiliário urbano deverão ser projetados e

instalados em locais que permitam sejam eles utilizados pelas pessoas portadoras

de deficiência ou com mobilidade reduzida.

CAPÍTULO IV

DA ACESSIBILIDADE NOS EDIFÍCIOS PÚBLICOS OU DE USO COLETIVO

Art. 11. A construção, ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados

destinados ao uso coletivo deverão ser executadas de modo que sejam ou se

tornem acessíveis às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade

reduzida.

204

Parágrafo único. Para os fins do disposto neste artigo, na construção,

ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo

deverão ser observados, pelo menos, os seguintes requisitos de acessibilidade:

I - nas áreas externas ou internas da edificação, destinadas a garagem e a

estacionamento de uso público, deverão ser reservadas vagas próximas dos

acessos de circulação de pedestres, devidamente sinalizadas, para veículos que

transportem pessoas portadoras de deficiência com dificuldade de locomoção

permanente;

II - pelo menos um dos acessos ao interior da edificação deverá estar livre de

barreiras arquitetônicas e de obstáculos que impeçam ou dificultem a acessibilidade

de pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;

III - pelo menos um dos itinerários que comuniquem horizontal e verticalmente

todas as dependências e serviços do edifício, entre si e com o exterior, deverá

cumprir os requisitos de acessibilidade de que trata esta Lei; e

IV - os edifícios deverão dispor, pelo menos, de um banheiro acessível,

distribuindo-se seus equipamentos e acessórios de maneira que possam ser

utilizados por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Art. 12. Os locais de espetáculos, conferências, aulas e outros de natureza

similar deverão dispor de espaços reservados para pessoas que utilizam cadeira de

rodas, e de lugares específicos para pessoas com deficiência auditiva e visual,

inclusive acompanhante, de acordo com a ABNT, de modo a facilitar-lhes as

condições de acesso, circulação e comunicação.

CAPÍTULO V

DA ACESSIBILIDADE NOS EDIFÍCIOS DE USO PRIVADO

205

Art. 13. Os edifícios de uso privado em que seja obrigatória a instalação de

elevadores deverão ser construídos atendendo aos seguintes requisitos mínimos de

acessibilidade:

I - percurso acessível que una as unidades habitacionais com o exterior e com

as dependências de uso comum;

II - percurso acessível que una a edificação à via pública, às edificações e aos

serviços anexos de uso comum e aos edifícios vizinhos;

III - cabine do elevador e respectiva porta de entrada acessíveis para pessoas

portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Art. 14. Os edifícios a serem construídos com mais de um pavimento além do

pavimento de acesso, à exceção das habitações unifamiliares, e que não estejam

obrigados à instalação de elevador, deverão dispor de especificações técnicas e de

projeto que facilitem a instalação de um elevador adaptado, devendo os demais

elementos de uso comum destes edifícios atender aos requisitos de acessibilidade.

Art. 15. Caberá ao órgão federal responsável pela coordenação da política

habitacional regulamentar a reserva de um percentual mínimo do total das

habitações, conforme a característica da população local, para o atendimento da

demanda de pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

CAPÍTULO VI

DA ACESSIBILIDADE NOS VEÍCULOS DE TRANSPORTE COLETIVO

Art. 16. Os veículos de transporte coletivo deverão cumprir os requisitos de

acessibilidade estabelecidos nas normas técnicas específicas.

206

CAPÍTULO VII

DA ACESSIBILIDADE NOS SISTEMAS DE COMUNICAÇÃO E

SINALIZAÇÃO

Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na

comunicação e estabelecerá mecanismos e alternativas técnicas que tornem

acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de

deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação, para garantir-lhes o direito

de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à

cultura, ao esporte e ao lazer.

Art. 18. O Poder Público implementará a formação de profissionais intérpretes

de escrita em braile, linguagem de sinais e de guias-intérpretes, para facilitar

qualquer tipo de comunicação direta à pessoa portadora de deficiência sensorial e

com dificuldade de comunicação.

Art. 19. Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens adotarão

plano de medidas técnicas com o objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais

ou outra subtitulação, para garantir o direito de acesso à informação às pessoas

portadoras de deficiência auditiva, na forma e no prazo previstos em regulamento.

CAPÍTULO VIII

DISPOSIÇÕES SOBRE AJUDAS TÉCNICAS

Art. 20. O Poder Público promoverá a supressão de barreiras urbanísticas,

arquitetônicas, de transporte e de comunicação, mediante ajudas técnicas.

Art. 21. O Poder Público, por meio dos organismos de apoio à pesquisa e das

agências de financiamento, fomentará programas destinados:

207

I - à promoção de pesquisas científicas voltadas ao tratamento e prevenção

de deficiências;

II - ao desenvolvimento tecnológico orientado à produção de ajudas técnicas

para as pessoas portadoras de deficiência;

III - à especialização de recursos humanos em acessibilidade.

CAPÍTULO IX

DAS MEDIDAS DE FOMENTO À ELIMINAÇÃO DE BARREIRAS

Art. 22. É instituído, no âmbito da Secretaria de Estado de Direitos Humanos

do Ministério da Justiça, o Programa Nacional de Acessibilidade, com dotação

orçamentária específica, cuja execução será disciplinada em regulamento.

CAPÍTULO X

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 23. A Administração Pública federal direta e indireta destinará,

anualmente, dotação orçamentária para as adaptações, eliminações e supressões

de barreiras arquitetônicas existentes nos edifícios de uso público de sua

propriedade e naqueles que estejam sob sua administração ou uso.

Parágrafo único. A implementação das adaptações, eliminações e supressões

de barreiras arquitetônicas referidas no caput deste artigo deverá ser iniciada a partir

do primeiro ano de vigência desta Lei.

Art. 24. O Poder Público promoverá campanhas informativas e educativas

dirigidas à população em geral, com a finalidade de conscientizá-la e sensibilizá-la

quanto à acessibilidade e à integração social da pessoa portadora de deficiência ou

com mobilidade reduzida.

208

Art. 25. As disposições desta Lei aplicam-se aos edifícios ou imóveis

declarados bens de interesse cultural ou de valor histórico-artístico, desde que as

modificações necessárias observem as normas específicas reguladoras destes

bens.

Art. 26. As organizações representativas de pessoas portadoras de

deficiência terão legitimidade para acompanhar o cumprimento dos requisitos de

acessibilidade estabelecidos nesta Lei.

Art. 27. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

209

ANEXO G - LEI Nº. 9.394 DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996

LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL

CAPITULO V

DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Art. 58 . Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a

modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de

ensino, para educandos portadores de necessidades especiais.

§1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola

regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial.

§2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços

especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não

for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.

§3º A oferta da educação especial, dever constitucional do Estado, tem início

na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil.

Art. 59 . Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com

necessidades especiais:

I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização

específicos, para atender às suas necessidades;

II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível

exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e

aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os

superdotados;

210

III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior,

para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular

capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;

IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na

vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem

capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos

oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas

áreas artística, intelectual ou psicomotora;

V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares

disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.

Art. 60 . Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios

de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com

atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro pelo

Poder Público.

Parágrafo único. O poder Público adotará, como alternativa preferencial, a

ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria

rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições

previstas neste artigo.

211

ANEXO H - LEI Nº. 9424 DE 24 DE DEZEMBRO DE 1996

Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério, na forma prevista no art. 60, § 7º, do

Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências.

Art. 1º É instituído, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, o Fundo

de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do

Magistério, o qual terá natureza contábil e será implantado, automaticamente, a

partir de 1º de janeiro de 1998.

§ 1º O Fundo referido neste artigo será composto por 15% (quinze por cento)

dos recursos:

I - da parcela do imposto sobre operações relativas à circulação de

mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e

intermunicipal e de comunicação - ICMS, devida ao Distrito Federal, aos Estados e

aos Municípios, conforme dispõe o art. 155, inciso II, combinado com o art. 158,

inciso IV, da Constituição Federal;

II - do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE e dos

Municípios - FPM, previstos no art. 159, inciso I, alíneas a e b, da Constituição

Federal, e no Sistema Tributário Nacional de que trata a Lei nº 5.172, de 25 de

outubro de 1966; e

III - da parcela do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI devida aos

Estados e ao Distrito Federal, na forma do art. 159, inciso II, da Constituição Federal

e da Lei Complementar nº 61, de 26 de dezembro de 1989.

§ 2º Inclui-se na base de cálculo do valor a que se refere o inciso I do

parágrafo anterior o montante de recursos financeiros transferidos, em moeda, pela

União aos Estados, Distrito Federal e Municípios a título de compensação financeira

212

pela perda de receitas decorrentes da desoneração das exportações, nos termos da

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, bem como de outras

compensações da mesma natureza que vierem a ser instituídas.

§ 3º Integra os recursos do Fundo a que se refere este artigo a

complementação da União, quando for o caso, na forma prevista no art. 6º.

§ 4º A implantação do Fundo poderá ser antecipada em relação à data

prevista neste artigo, mediante lei no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal.

§ 5º No exercício de 1997, a União dará prioridade, para concessão de

assistência financeira, na forma prevista no art. 211, § 1º, da Constituição Federal,

aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios nos quais a implantação do Fundo

for antecipada na forma prevista no parágrafo anterior.

Art. 2º Os recursos do Fundo serão aplicados na manutenção e

desenvolvimento do ensino fundamental público, e na valorização de seu Magistério.

§ 1º A distribuição dos recursos, no âmbito de cada Estado e do Distrito

Federal, dar-se-á, entre o Governo Estadual e os Governos Municipais, na

proporção do número de alunos matriculados anualmente nas escolas cadastradas

das respectivas redes de ensino, considerando-se para esse fim:

I - as matrículas da 1ª a 8ª séries do ensino fundamental;

II - as matrículas do ensino fundamental nos cursos de educação de jovens e

adultos, na função suplência. (Dispositivo Vetado)

§ 2º A distribuição a que se refere o parágrafo anterior, a partir de 1998,

deverá considerar, ainda, a diferenciação de custo por aluno, segundo os níveis de

ensino e tipos de estabelecimento, adotando-se a metodologia de cálculo e as

correspondentes ponderações, de acordo com os seguintes componentes:

I - 1ª a 4ª séries;

213

II - 5ª a 8ª séries;

III - estabelecimentos de ensino especial;

IV - escolas rurais.

§ 3º Para efeitos dos cálculos mencionados no § 1º, serão computadas

exclusivamente as matrículas do ensino presencial.

§ 4º O Ministério da Educação e do Desporto - MEC realizará, anualmente,

censo educacional, cujos dados serão publicados no Diário Oficial da União e

constituirão a base para fixar a proporção prevista no § 1º.

§ 5º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, no prazo de

trinta dias da publicação referida no parágrafo anterior, apresentar recurso para

retificação dos dados publicados.

§ 6º É vedada a utilização dos recursos do Fundo como garantia de

operações de crédito internas e externas, contraídas pelos Governos da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, admitida somente sua utilização como

contrapartida em operações que se destinem, exclusivamente, ao financiamento de

projetos e programas do ensino fundamental.

Art. 6º A União complementará os recursos do Fundo a que se refere o art. 1º

sempre que, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, seu valor por aluno não

alcançar o mínimo definido nacionalmente.

§ 1º O valor mínimo anual por aluno, ressalvado o disposto no § 4º, será

fixado por ato do Presidente da República e nunca será inferior à razão entre a

previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental no

ano anterior, acrescida do total estimado de novas matrículas, observado o disposto

no art. 2º, § 1º, incisos I e I.

214

§ 2º As estatísticas necessárias ao cálculo do valor anual mínimo por aluno,

inclusive as estimativas de matrículas, terão como base o censo educacional

realizado pelo Ministério da Educação e do Desporto, anualmente, e publicado no

Diário Oficial da União.

§ 3º As transferências dos recursos complementares a que se refere este

artigo serão realizadas mensal e diretamente às contas específicas a que se refere o

art. 3º.

§ 4º No primeiro ano de vigência desta Lei, o valor mínimo anual por aluno, a

que se refere este artigo, será de R$ 300,00 (trezentos reais).

§ 5º Na complementação da União, prevista neste artigo, é vedada a

utilização de recursos da Contribuição Social do Salário-Educação, de que trata o

art. 212, § 5º, da Constituição Federal. (Dispositivo Vetado)

215

ANEXO I - LEI Nº. 10.216 DE 04 DE JUNHO DE 2001

DIREITO E PROTEÇÃO ÀS PESSOAS ACOMETIDAS DE TRANSTORNO MENTAL

Art. 1º Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental,

de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto

à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade,

família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu

transtorno, ou qualquer outra.

Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e

seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos

enumerados no parágrafo único deste artigo.

Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I - ter

acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas

necessidades;

II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de

beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no

trabalho e na comunidade;

III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;

IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;

V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a

necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;

VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;

VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de

seu tratamento;

VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos

possíveis;

IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde

mental.

Art. 3º É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde

mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de

transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual

216

será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as

instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de

transtornos mentais.

Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada

quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes.

§ 1º O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do

paciente em seu meio.

§ 2º O tratamento em regime de internação será estruturado de forma a

oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo

serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer, e

outros.

§ 3º É vedada a internação de pacientes portadores de transtornos mentais

em instituições com características asilares, ou seja, aquelas desprovidas dos

recursos mencionados no § 2º e que não assegurem aos pacientes os direitos

enumerados no parágrafo único do art. 2º .

Art. 5º O paciente há longo tempo hospitalizado ou para o qual se caracterize

situação de grave dependência institucional, decorrente de seu quadro clínico ou de

ausência de suporte social, será objeto de política específica de alta planejada e

reabilitação psicossocial assistida, sob responsabilidade da autoridade sanitária

competente e supervisão de instância a ser definida pelo Poder Executivo,

assegurada a continuidade do tratamento, quando necessário.

Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo

médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. Parágrafo único. São

considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:

I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;

II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário

e a pedido de terceiro; e

III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.

Art. 7º A pessoa que solicita voluntariamente sua internação, ou que a

consente, deve assinar, no momento da admissão, uma declaração de que optou

por esse regime de tratamento. Parágrafo único. O término da internação voluntária

dar-se-á por solicitação escrita do paciente ou por determinação do médico

assistente.

217

Art. 8º A internação voluntária ou involuntária somente será autorizada por

médico devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina - CRM do Estado

onde se localize o estabelecimento.

§ 1º A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas

horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do

estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser

adotado quando da respectiva alta.

§ 2º O término da internação involuntária dar-se-á por solicitação escrita do

familiar, ou responsável legal, ou quando estabelecido pelo especialista responsável

pelo tratamento.

Art. 9º A internação compulsória é determinada, de acordo com a legislação

vigente, pelo juiz competente, que levará em conta as condições de segurança do

estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e

funcionários.

Art. 10. Evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e

falecimento serão comunicados pela direção do estabelecimento de saúde mental

aos familiares, ou ao representante legal do paciente, bem como à autoridade

sanitária responsável, no prazo máximo de vinte e quatro horas da data da

ocorrência.

Art. 11. Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não

poderão ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu

representante legal, e sem a devida comunicação aos conselhos profissionais

competentes e ao Conselho Nacional de Saúde.

218

ANEXO J - LEI N.º 10.436 DE 24 DE ABRIL DE 2002

Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências.

Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua

Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.

Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a

forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-

motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de

transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do

Brasil.

Art. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas

concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e

difusão da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e

de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil.

Art. 3º As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços

públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado

aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor.

Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas e ducacionais estaduais,

municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação

de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e

superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante

dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente.

Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a

modalidade escrita da língua portuguesa.

219

ANEXO K - PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO - EDUCAÇÃO

ESPECIAL

8. EDUCAÇÃO ESPECIAL

8.1 Diagnóstico

A Constituição Federal estabelece o direito de as pessoas com necessidades

especiais receberem educação preferencialmente na rede regular de ensino (art.

208, III). A diretriz atual é a da plena integração dessas pessoas em todas as áreas

da sociedade. Trata-se, portanto, de duas questões - o direito à educação, comum a

todas as pessoas, e o direito de receber essa educação sempre que possível junto

com as demais pessoas nas escolas "regulares".

A legislação, no entanto, é sábia em determinar preferência para essa

modalidade de atendimento educacional, ressalvando os casos de excepcionalidade

em que as necessidades do educando exigem outras formas de atendimento. As

políticas recentes do setor têm indicado três situações possíveis para a organização

do atendimento: participação nas classes comuns, de recursos, sala especial e

escola especial. Todas as possibilidades têm por objetivo a oferta de educação de

qualidade.

Diante dessa política, como está a educação especial brasileira?

O conhecimento da realidade é ainda bastante precário, porque não dispomos

de estatísticas completas nem sobre o número de pessoas com necessidades

especiais nem sobre o atendimento. Somente a partir do ano 2000 o Censo

Demográfico fornecerá dados mais precisos, que permitirão análises mais profundas

da realidade.

220

A Organização Mundial de Saúde estima que em torno de 10% da população

têm necessidades especiais. Estas podem ser de diversas ordens - visuais,

auditivas, físicas, mentais, múltiplas, distúrbios de conduta e também superdotação

ou altas habilidades. Se essa estimativa se aplicar também no Brasil, teremos cerca

de 15 milhões de pessoas com necessidades especiais. Os números de matrícula

nos estabelecimentos escolares são tão baixos que não permitem qualquer

confronto com aquele contingente. Em 1998, havia 293.403 alunos, distribuídos da

seguinte forma: 58% com problemas mentais; 13,8%, com deficiências múltiplas;

12%, com problemas de audição; 3,1% de visão; 4,5%, com problemas físicos;

2,4%, de conduta. Apenas 0,3% com altas habilidades ou eram superdotados e

5,9% recebiam "outro tipo de atendimento" (Sinopse Estatística da Educação

Básica/Censo Escolar 1998, do MEC/INEP).

Dos 5.507 Municípios brasileiros, 59,1% não ofereciam educação especial em

1998. As diferenças regionais são grandes. No Nordeste, a ausência dessa

modalidade acontece em 78,3% dos Municípios, destacando-se Rio Grande do

Norte, com apenas 9,6% dos seus Municípios apresentando dados de atendimento.

Na região Sul, 58,1% dos municípios ofereciam educação especial, sendo o Paraná

o de mais alto percentual (83,2%). No Centro-Oeste, Mato Grosso do Sul tinha

atendimento em 76,6% dos seus Municípios. Espírito Santo é o Estado com o mais

alto percentual de Municípios que oferecem educação especial (83,1%).

Entre as esferas administrativas, 48,2% dos estabelecimentos de educação

especial em 1998 eram estaduais; 26,8%, municipais; 24,8%, particulares e 0,2%,

federal. Como os estabelecimentos são de diferentes tamanhos, as matrículas

apresentam alguma variação nessa distribuição: 53,1% são da iniciativa privada;

31,3%, estaduais; 15,2%, municipais e 0,3%, federal. Nota-se que o atendimento

221

particular, nele incluído o oferecido por entidades filantrópicas, é responsável por

quase metade de toda a educação especial no País. Dadas as discrepâncias

regionais e a insignificante atuação federal, há necessidade de uma atuação mais

incisiva da União nessa área.

Segundo dados de 1998, apenas 14% desses estabelecimentos possuíam

instalação sanitária para alunos com necessidades especiais, que atendiam a 31%

das matrículas. A região Norte é a menos servida nesse particular, pois o percentual

dos estabelecimentos com aquele requisito baixa para 6%. Os dados não informam

sobre outras facilidades como rampas e corrimãos. A eliminação das barreiras

arquitetônicas nas escolas é uma condição importante para a integração dessas

pessoas no ensino regular, constituindo uma meta necessária na década da

educação. Outro elemento fundamental é o material didático-pedagógico adequado,

conforme as necessidades específicas dos alunos.

Inexistência, insuficiência, inadequação e precariedades podem ser

constatadas em muitos centros de atendimento a essa clientela.

Em relação à qualificação dos profissionais de magistério, a situação é

bastante boa: apenas 3,2% dos professores (melhor dito, das funções docentes), em

1998, possuíam o ensino fundamental, completo ou incompleto, como formação

máxima. Eram formados em nível médio 51% e, em nível superior, 45,7%. Os

sistemas de ensino costumam oferecer cursos de preparação para os professores

que atuam em escolas especiais, por isso 73% deles fizeram curso específico. Mas,

considerando a diretriz da integração, ou seja, de que, sempre que possível, as

crianças, jovens e adultos especiais sejam atendidos em escolas regulares, a

necessidade de preparação do corpo docente, e do corpo técnico e administrativo

222

das escolas aumenta enormemente. Em princípio, todos os professores deveriam ter

conhecimento da educação de alunos especiais.

Observando as modalidades de atendimento educacional, segundo os dados

de 1997, predominam as "classes especiais", nas quais estão 38% das turmas

atendidas. 13,7% delas estão em "salas de recursos" e 12,2% em "oficinas

pedagógicas". Apenas 5% das turmas estão em "classes comuns com apoio

pedagógico" e 6% são de "educação precoce" . Em "outras modalidades" são

atendidas 25% das turmas de educação especial. Comparando o atendimento

público com o particular, verifica-se que este dá preferência à educação precoce, a

oficinas pedagógicas e a outras modalidades não especificadas no Informe,

enquanto aquele dá prioridade às classes especiais e classes comuns com apoio

pedagógico. As informações de 1998 estabelecem outra classificação, chamando a

atenção que 62% do atendimento registrado está localizado em escolas

especializadas, o que reflete a necessidade de um compromisso maior da escola

comum com o atendimento do aluno especial.

O atendimento por nível de ensino, em 1998, apresenta o seguinte quadro:

87.607 crianças na educação infantil; 132.685, no ensino fundamental; 1.705, no

ensino médio; 7.258 na educação de jovens e adultos. São informados como

"outros" 64.148 atendimentos. Não há dados sobre o atendimento do aluno com

necessidades especiais na educação superior. O particular está muito à frente na

educação infantil especial (64%) e o estadual, nos níveis fundamental e médio (52 e

49%, respectivamente), mas o municipal vem crescendo sensivelmente no

atendimento em nível fundamental.

As tendências recentes dos sistemas de ensino são as seguintes:

integração/inclusão do aluno com necessidades especiais no sistema regular de

223

ensino e, se isto não for possível em função das necessidades do educando, realizar

o atendimento em classes e escolas especializadas;

. ampliação do regulamento das escolas especiais para prestarem apoio e

orientação aos programas de integração, além do atendimento específico;

. melhoria da qualificação dos professores do ensino fundamental para essa

clientela;

. expansão da oferta dos cursos de formação/especialização pelas

universidades e escolas normais.

Apesar do crescimento das matrículas, o déficit é muito grande e constitui um

desafio imenso para os sistemas de ensino, pois diversas ações devem ser

realizadas ao mesmo tempo. Entre elas, destacam-se a sensibilização dos demais

alunos e da comunidade em geral para a integração, as adaptações curriculares, a

qualificação dos professores para o atendimento nas escolas regulares e a

especialização dos professores para o atendimento nas novas escolas especiais,

produção de livros e materiais pedagógicos adequados para as diferentes

necessidades, adaptação das escolas para que os alunos especiais possam nelas

transitar, oferta de transporte escolar adaptado, etc.

Mas o grande avanço que a década da educação deveria produzir será a

construção de uma escola inclusiva, que garanta o atendimento à diversidade

humana.

8.2 Diretrizes

A educação especial se destina às pessoas com necessidades especiais no

campo da aprendizagem, originadas quer de deficiência física, sensorial, mental ou

múltipla, quer de características como altas habilidades, superdotação ou talentos.

224

A integração dessas pessoas no sistema de ensino regular é uma diretriz

constitucional (art. 208, III), fazendo parte da política governamental há pelo menos

uma década. Mas, apesar desse relativamente longo período, tal diretriz ainda não

produziu a mudança necessária na realidade escolar, de sorte que todas as

crianças, jovens e adultos com necessidades especiais sejam atendidos em escolas

regulares, sempre que for recomendado pela avaliação de suas condições pessoais.

Uma política explícita e vigorosa de acesso à educação, de responsabilidade da

União, dos Estados e Distrito Federal e dos Municípios, é uma condição para que às

pessoas especiais sejam assegurados seus direitos à educação. Tal política

abrange: o âmbito social, do reconhecimento das crianças, jovens e adultos

especiais como cidadãos e de seu direito de estarem integrados na sociedade o

mais plenamente possível; e o âmbito educacional, tanto nos aspectos

administrativos (adequação do espaço escolar, de seus equipamentos e materiais

pedagógicos), quanto na qualificação dos professores e demais profissionais

envolvidos. O ambiente escolar como um todo deve ser sensibilizado para uma

perfeita integração. Propõe-se uma escola integradora, inclusiva, aberta à

diversidade dos alunos, no que a participação da comunidade é fator essencial.

Quanto às escolas especiais, a política de inclusão as reorienta para prestarem

apoio aos programas de integração.

A educação especial, como modalidade de educação escolar, terá que ser

promovida sistematicamente nos diferentes níveis de ensino. A garantia de vagas no

ensino regular para os diversos graus e tipos de deficiência é uma medida

importante.

225

Entre outras características dessa política, são importantes a flexibilidade e a

diversidade, quer porque o espectro das necessidades especiais é variado, quer

porque as realidades são bastante diversificadas no País.

A União tem um papel essencial e insubstituível no planejamento e

direcionamento da expansão do atendimento, uma vez que as desigualdades

regionais na oferta educacional atestam uma enorme disparidade nas possibilidades

de acesso à escola por parte dessa população especial. O apoio da União é mais

urgente e será mais necessário onde se verificam os maiores déficits de

atendimento.

Quanto mais cedo se der a intervenção educacional, mais eficaz ela se

tornará no decorrer dos anos, produzindo efeitos mais profundos sobre o

desenvolvimento das crianças. Por isso, o atendimento deve começar

precocemente, inclusive como forma preventiva. Na hipótese de não ser possível o

atendimento durante a educação infantil, há que se detectarem as deficiências,

como as visuais e auditivas, que podem dificultar a aprendizagem escolar, quando a

criança ingressa no ensino fundamental. Existem testes simples, que podem ser

aplicados pelos professores, para a identificação desses problemas e seu adequado

tratamento. Em relação às crianças com altas habilidades (superdotadas ou

talentosas), a identificação levará em conta o contexto sócio-econômico e cultural e

será feita por meio de observação sistemática do comportamento e do desempenho

do aluno, com vistas a verificar a intensidade, a freqüência e a consistência dos

traços, ao longo de seu desenvolvimento.

Considerando as questões envolvidas no desenvolvimento e na

aprendizagem das crianças, jovens e adultos com necessidades especiais, a

articulação e a cooperação entre os setores de educação, saúde e assistência é

226

fundamental e potencializa a ação de cada um deles. Como é sabido, o atendimento

não se limita à área educacional, mas envolve especialistas sobretudo da área da

saúde e da psicologia e depende da colaboração de diferentes órgãos do Poder

Público, em particular os vinculados à saúde, assistência e promoção social,

inclusive em termos de recursos. É medida racional que se evite a duplicação de

recursos através da articulação daqueles setores desde a fase de diagnóstico de

déficits sensoriais até as terapias específicas. Para a população de baixa renda, há

ainda necessidade de ampliar, com a colaboração dos Ministérios da Saúde e da

Previdência, órgãos oficiais e entidades não-governamentais de assistência social,

os atuais programas para oferecimento de órteses e próteses de diferentes tipos.

O Programa de Renda Mínima associado a Ações Sócio-educativas (Lei

n.9.533/97) estendido a essa clientela, pode ser um importante meio de garantir-lhe

o acesso e à freqüência à escola.

A formação de recursos humanos com capacidade de oferecer o atendimento

aos educandos especiais nas creches, pré-escolas, centros de educação infantil,

escolas regulares de ensino fundamental, médio e superior, bem como em

instituições especializadas e outras instituições é uma prioridade para o Plano

Nacional de Educação.

Não há como ter uma escola regular eficaz quanto ao desenvolvimento e

aprendizagem dos educandos especiais sem que seus professores, demais

técnicos, pessoal administrativo e auxiliar sejam preparados para atendê-los

adequadamente. As classes especiais, situadas nas escolas "regulares", destinadas

aos alunos parcialmente integrados, precisam contar com professores

especializados e materiais pedagógico adequados.

227

As escolas especiais devem ser enfatizadas quando as necessidades dos

alunos assim o indicarem. Quando esse tipo de instituição não puder ser criado nos

Municípios menores e mais pobres, recomenda-se a celebração de convênios

intermunicipais e com organizações não-governamentais, para garantir o

atendimento da clientela.

Certas organizações da sociedade civil, de natureza filantrópica, que

envolvem os pais de crianças especiais, têm, historicamente, sido um exemplo de

compromisso e de eficiência no atendimento educacional dessa clientela,

notadamente na etapa da educação infantil.

Longe de diminuir a responsabilidade do Poder Público para com a educação

especial, o apoio do governo a tais organizações visa tanto à continuidade de sua

colaboração quanto à maior eficiência por contar com a participação dos pais nessa

tarefa. Justifica-se, portanto, o apoio do governo a essas instituições como parceiras

no processo educacional dos educandos com necessidades especiais.

Requer-se um esforço determinado das autoridades educacionais para

valorizar a permanência dos alunos nas classes regulares, eliminando a nociva

prática de encaminhamento para classes especiais daqueles que apresentam

dificuldades comuns de aprendizagem, problemas de dispersão de atenção ou de

disciplina. A esses deve ser dado maior apoio pedagógico nas suas próprias

classes, e não separá-los como se precisassem de atendimento especial.

Considerando que o aluno especial pode ser também da escola regular, os

recursos devem, também, estar previstos no ensino fundamental. Entretanto, tendo

em vista as especificidades dessa modalidade de educação e a necessidade de

promover a ampliação do atendimento, recomenda-se reservar-lhe uma parcela

228

equivalente a 5 ou 6% dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do

ensino. 8.3 Objetivos e Metas

1. Organizar, em todos os Municípios e em parceria com as áreas de saúde e

assistência, programas destinados a ampliar a oferta da estimulação precoce

(interação educativa adequada) para as crianças com necessidades educacionais

especiais, em instituições especializadas ou regulares de educação infantil,

especialmente creches. **

2. Generalizar, em cinco anos, como parte dos programas de formação em

serviço, a oferta de cursos sobre o atendimento básico a educandos especiais, para

os professores em exercício na educação infantil e no ensino fundamental, utilizando

inclusive a TV Escola e outros programas de educação a distância.

3. Garantir a generalização, em cinco anos, da aplicação de testes de

acuidade visual e auditiva em todas as instituições de educação infantil e do ensino

fundamental, em parceria com a área de saúde, de forma a detectar problemas e

oferecer apoio adequado às crianças especiais.

4. Nos primeiros cinco anos de vigência deste plano, redimensionar conforme

as necessidades da clientela, incrementando, se necessário, as classes especiais,

salas de recursos e outras alternativas pedagógicas recomendadas, de forma a

favorecer e apoiar a integração dos educandos com necessidades especiais em

classes comuns, fornecendo-lhes o apoio adicional de que precisam.

5. Generalizar, em dez anos, o atendimento dos alunos com necessidades

especiais na educação infantil e no ensino fundamental, inclusive através de

consórcios entre Municípios, quando necessário, provendo, nestes casos, o

transporte escolar.

229

6. Implantar, em até quatro anos, em cada unidade da Federação, em

parceria com as áreas de saúde, assistência social, trabalho e com as organizações

da sociedade civil, pelo menos um centro especializado, destinado ao atendimento

de pessoas com severa dificuldade de desenvolvimento **

7. Ampliar, até o final da década, o número desses centros, de sorte que as

diferentes regiões de cada Estado contem com seus serviços.

8. Tornar disponíveis, dentro de cinco anos, livros didáticos falados, em braille

e em caracteres ampliados, para todos os alunos cegos e para os de visão sub-

normal do ensino fundamental.

9. Estabelecer, em cinco anos, em parceria com as áreas de assistência

social e cultura e com organizações não-governamentais, redes municipais ou

intermunicipais para tornar disponíveis aos alunos cegos e aos de visão sub-normal

livros de literatura falados, em braille e em caracteres ampliados.

10. Estabelecer programas para equipar, em cinco anos, as escolas de

educação básica e, em dez anos, as de educação superior que atendam educandos

surdos e aos de visão sub-normal, com aparelhos de amplificação sonora e outros

equipamentos que facilitem a aprendizagem, atendendo-se, prioritariamente, as

classes especiais e salas de recursos.

11. Implantar, em cinco anos, e generalizar em dez anos, o ensino da Língua

Brasileira de Sinais para os alunos surdos e, sempre que possível, para seus

familiares e para o pessoal da unidade escolar, mediante um programa de formação

de monitores, em parceria com organizações não-governamentais.

12. Em coerência com as metas nº 2, 3 e 4, da educação infantil e metas nº

4.d, 5 e 6, do ensino fundamental:

230

a) estabelecer, no primeiro ano de vigência deste plano, os padrões mínimos

de infraestrutura das escolas para o recebimento dos alunos especiais;

b) a partir da vigência dos novos padrões, somente autorizar a construção de

prédios escolares, públicos ou privados, em conformidade aos já definidos requisitos

de infraestrutura para atendimento dos alunos especiais;

c) adaptar, em cinco anos, os prédios escolares existentes, segundo aqueles

padrões.

13. Definir, em conjunto com as entidades da área, nos dois primeiros anos

de vigência deste plano, indicadores básicos de qualidade para o funcionamento de

instituições de educação especial, públicas e privadas, e generalizar,

progressivamente, sua observância.

14. Ampliar o fornecimento e uso de equipamentos de informática como apoio

à aprendizagem do educando com necessidades especiais, inclusive através de

parceria com organizações da sociedade civil voltadas para esse tipo de

atendimento.

15. Assegurar, durante a década, transporte escolar com as adaptações

necessárias aos alunos que apresentem dificuldade de locomoção.

16. Assegurar a inclusão, no projeto pedagógico das unidades escolares, do

atendimento às necessidades educacionais especiais de seus alunos, definindo os

recursos disponíveis e oferecendo formação em serviço aos professores em

exercício.

17. Articular as ações de educação especial e estabelecer mecanismos de

cooperação com a política de educação para o trabalho, em parceria com

organizações governamentais e não-governamentais, para o desenvolvimento de

programas de qualificação profissional para alunos especiais, promovendo sua

231

colocação no mercado de trabalho. Definir condições para a terminalidade para os

educandos que não puderem atingir níveis ulteriores de ensino.

18. Estabelecer cooperação com as áreas de saúde, previdência e

assistência social para, no prazo de dez anos, tornar disponíveis órteses e próteses

para todos os educandos com deficiências, assim como atendimento especializado

de saúde, quando for o caso.

19. Incluir nos currículos de formação de professores, nos níveis médio e

superior, conteúdos e disciplinas específicas para a capacitação ao atendimento dos

alunos especiais

20. Incluir ou ampliar, especialmente nas universidades públicas, habilitação

específica, em níveis de graduação e pós-graduação, para formar pessoal

especializado em educação especial, garantindo, em cinco anos, pelo menos um

curso desse tipo em cada unidade da Federação.

21. Introduzir, dentro de três anos a contar da vigência deste plano,

conteúdos disciplinares referentes aos educandos com necessidades especiais nos

cursos que formam profissionais em áreas relevantes para o atendimento dessas

necessidades, como Medicina, Enfermagem e Arquitetura, entre outras.

22. Incentivar, durante a década, a realização de estudos e pesquisas,

especialmente pelas instituições de ensino superior, sobre as diversas áreas

relacionadas aos alunos que apresentam necessidades especiais para a

aprendizagem.

23. Aumentar os recursos destinados à educação especial, a fim de atingir,

em dez anos, o mínimo equivalente a 5% dos recursos vinculados à manutenção e

desenvolvimento do ensino, contando, para tanto, com as parcerias com as áreas de

232

saúde, assistência social, trabalho e previdência, nas ações referidas nas metas nº

6, 9, 11, 14, 17 e 18.

24. No prazo de três anos a contar da vigência deste plano, organizar e pôr

em funcionamento em todos os sistemas de ensino um setor responsável pela

educação especial, bem como pela administração dos recursos orçamentários

específicos para o atendimento dessa modalidade, que possa atuar em parceria com

os setores de saúde, assistência social, trabalho e previdência e com as

organizações da sociedade civil.

25. Estabelecer um sistema de informações completas e fidedignas sobre a

população a ser atendida pela educação especial, a serem coletadas pelo censo

educacional e pelos censos populacionais.

26. Implantar gradativamente, a partir do primeiro ano deste plano, programas

de atendimento aos alunos com altas habilidades nas áreas artística, intelectual ou

psicomotora.

27. Assegurar a continuidade do apoio técnico e financeiro às instituições

privadas sem fim lucrativo com atuação exclusiva em educação especial, que

realizem atendimento de qualidade, atestado em avaliação conduzida pelo

respectivo sistema de ensino.

28. Observar, no que diz respeito a essa modalidade de ensino, as metas

pertinentes estabelecidas nos capítulos referentes aos níveis de ensino, à formação

de professores e ao financiamento e gestão.

233

ANEXO K - DECRETO N.º 914 DE 6 DE SETEMBRO DE 1993

Capítulo III

Das Diretrizes

Art. 5º . São diretrizes da Política Nacional para a Integração da Pessoa

Portadora de Deficiência:

III - incluir a pessoa portadora de deficiência, respeitadas, as suas

peculiaridades, em todas as iniciativas governamentais relacionadas à educação,

saúde , trabalho, à edificação pública, seguridade social, transporte , habitação,

cultura, esporte e lazer;

VIII - proporcionar ao portador de deficiência qualificação profissional e

incorporação ao mercado de trabalho.

Capítulo IV

Dos Objetivos

Art. . 6º . São objetivos da Política Nacional para a Integração da Pessoa

Portadora de Deficiência :

- integração das ações dos órgãos públicos e entidades privadas nas áreas

de saúde, educação, trabalho, transporte e assistência social, visando a prevenção

das deficiências e à eliminação de suas múltiplas causas.

234

ANEXO L - DECRETO Nº. 2.208 DE 17 DE ABRIL DE 1997

Regulamenta o §2º do art. 36 e os artigos 39 a 42 da Lei 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional

Art. 1º . A educação profissional tem por objetivos:

IV – qualificar, reprofissionalizar e atualizar jovens e adultos trabalhadores,

com qualquer nível de escolaridade, visando a inserção e melhor desempenho no

exercício do trabalho.

Art. 2º . A educação profissional será desenvolvida em articulação com o

ensino regular ou em modalidades que contemplem estratégias de educação

continuada, podendo ser realizada em escolas do ensino regular, em instituições

especializadas ou nos ambientes de trabalho.

Art. 3º . A educação profissional compreende os seguintes níveis:

I – básico - destinado à qualificação e reprofissionalização de trabalhadores,

independente de escolaridade prévia;

II – técnico - destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos

matriculados e egressos do ensino médio, devendo ser ministrado na forma

estabelecida por este decreto;

III – tecnológico - correspondente a cursos de nível superior na área

tecnológica, destinados a egressos do ensino médio e técnico.

Art. 4º . A educação profissional de nível básico e modalidade de educação

não-formal e duração variável, destina-se a proporcionar ao cidadão trabalhador

conhecimentos que lhe permitam reprofissionalizar-se, qualificar-se e atualizar-se

para o exercício de funções demandadas pelo mundo do trabalho, compatíveis com

a complexidade tecnológica do trabalho, o seu grau de conhecimento técnico e o

nível de escolaridade do aluno, não estando sujeita à regulamentação curricular.

235

§1º As instituições federais e as instituições públicas e privadas sem fins

lucrativos, apoiadas financeiramente pelo Poder Público, que ministram educação

profissional deverão, obrigatoriamente, oferecer cursos profissionais de nível básico

em sua programação, abertos a alunos das redes públicas e privadas de educação

básica, assim como a trabalhadores com qualquer nível de escolaridade.

§2º Aos que concluírem os cursos de educação profissional de nível básico

será conferido certificado de qualificação profissional.

236

ANEXO M - DECRETO Nº. 3.298, DE DEZEMBRO DE 1999.

Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a

Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida

as normas de proteção, e dá outras providências.

Seção II

Do Acesso à Educação

Art. 24. Os órgãos e as entidades da Administração Pública Federal

direta e indireta responsáveis pela educação dispensarão tratamento prioritário e

adequado aos assuntos objeto deste Decreto, viabilizando, sem prejuízo de outras,

as seguintes medidas:

I - a matrícula compulsória em cursos regulares de estabelecimentos

públicos e particulares de pessoa portadora de deficiência capazes de se integrar na

rede regular de ensino;

II - a inclusão, no sistema educacional, da educação especial como

modalidade de educação escolar que permeia transversalmente todos os níveis e as

modalidades de ensino;

III - a inserção, no sistema educacional, das escolas ou instituições

especializadas públicas e privadas;

IV - a oferta, obrigatória e gratuita, da educação especial em

estabelecimentos públicos de ensino;

V - o oferecimento obrigatório dos serviços de educação especial ao

educando portador de deficiência em unidades hospitalares e congêneres nas quais

esteja internado por prazo igual ou superior a um ano; e

237

VI - o acesso de aluno portador de deficiência aos benefícios conferidos

aos demais educandos, inclusive material escolar, transporte, merenda escolar e

bolsas de estudo.

§ 1o Entende-se por educação especial, para os efeitos deste Decreto, a

modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de

ensino para educando com necessidades educacionais especiais, entre eles o

portador de deficiência.

§ 2o A educação especial caracteriza-se por constituir processo flexível,

dinâmico e individualizado, oferecido principalmente nos níveis de ensino

considerados obrigatórios.

§ 3o A educação do aluno com deficiência deverá iniciar-se na educação

infantil, a partir de zero ano.

§ 4o A educação especial contará com equipe multiprofissional, com a

adequada especialização, e adotará orientações pedagógicas individualizadas.

§ 5o Quando da construção e reforma de estabelecimentos de ensino

deverá ser observado o atendimento as normas técnicas da Associação Brasileira de

Normas Técnicas – ABNT relativas à acessibilidade.

Art. 25. Os serviços de educação especial serão ofertados nas

instituições de ensino público ou privado do sistema de educação geral, de forma

transitória ou permanente, mediante programas de apoio para o aluno que está

integrado no sistema regular de ensino, ou em escolas especializadas

exclusivamente quando a educação das escolas comuns não puder satisfazer as

necessidades educativas ou sociais do aluno ou quando necessário ao bem-estar do

educando.

238

Art. 26. As instituições hospitalares e congêneres deverão assegurar

atendimento pedagógico ao educando portador de deficiência internado nessas

unidades por prazo igual ou superior a um ano, com o propósito de sua inclusão ou

manutenção no processo educacional.

Art. 27. As instituições de ensino superior deverão oferecer adaptações

de provas e os apoios necessários, previamente solicitados pelo aluno portador de

deficiência, inclusive tempo adicional para realização das provas, conforme as

características da deficiência.

§ 1o As disposições deste artigo aplicam-se, também, ao sistema geral

do processo seletivo para ingresso em cursos universitários de instituições de ensino

superior.

§ 2o O Ministério da Educação, no âmbito da sua competência, expedirá

instruções para que os programas de educação superior incluam nos seus currículos

conteúdos, itens ou disciplinas relacionados à pessoa portadora de deficiência.

Art. 28. O aluno portador de deficiência matriculado ou egresso do

ensino fundamental ou médio, de instituições públicas ou privadas, terá acesso à

educação profissional, a fim de obter habilitação profissional que lhe proporcione

oportunidades de acesso ao mercado de trabalho.

§ 1o A educação profissional para a pessoa portadora de deficiência

será oferecida nos níveis básico, técnico e tecnológico, em escola regular, em

instituições especializadas e nos ambientes de trabalho.

§ 2o As instituições públicas e privadas que ministram educação

profissional deverão, obrigatoriamente, oferecer cursos profissionais de nível básico

à pessoa portadora de deficiência, condicionando a matrícula à sua capacidade de

aproveitamento e não a seu nível de escolaridade.

239

§ 3o Entende-se por habilitação profissional o processo destinado a

propiciar à pessoa portadora de deficiência, em nível formal e sistematizado,

aquisição de conhecimentos e habilidades especificamente associados a

determinada profissão ou ocupação.

§ 4o Os diplomas e certificados de cursos de educação profissional

expedidos por instituição credenciada pelo Ministério da Educação ou órgão

equivalente terão validade em todo o território nacional.

Art. 29. As escolas e instituições de educação profissional oferecerão,

se necessário, serviços de apoio especializado para atender às peculiaridades da

pessoa portadora de deficiência, tais como:

I - adaptação dos recursos instrucionais: material pedagógico,

equipamento e currículo;

II - capacitação dos recursos humanos: professores, instrutores e

profissionais especializados; e

III - adequação dos recursos físicos: eliminação de barreiras

arquitetônicas, ambientais e de comunicação.

240

ANEXO N - DECRETO Nº. 2264 DE 27 DE JUNHO DE 1997

Regulamenta a Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996, no âmbito federal, e

determina outras providências.

Art. 1º A partir de 1º de janeiro de 1998, o Ministério da Fazenda, quando da

transferência para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dos recursos de

que trata o art. 159 da Constituição, observará o disposto no art. 60 do Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias, com a redação dada pelo art. 5º da

Emenda Constitucional nº 14, de 1996, bem como na legislação pertinente.

Art. 2º O valor destinado ao Fundo de Manutenção e desenvolvimento do

Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério em cada Unidade da Federação

será creditado em contas individuais e específicas dos Governos Estaduais, do

Distrito Federal e dos respectivos Municípios, mediante aplicação de coeficientes de

distribuição a serem fixados anualmente.

§) 1º Para o estabelecimento dos coeficientes de distribuição serão

considerados:

a) o número de alunos matriculados nas escolas cadastradas das respectivas

redes de ensino, apurado no Censo Escolar do exercício anterior ao da distribuição,

considerando-se para este fim as matrículas da 1º à 8º séries do ensino fundamental

regular;

b) a estimativa de novas matrículas, elaborada pelo Ministério da Educação e

do Desporto;

c) a diferenciação do custo por aluno, segundo os níveis de ensino e os tipos

de estabelecimentos, conforme previsto no § 2º do art. 2º da Lei nº 9.424, de 24 de

dezembro de 1996.

241

§ 2º Para fins do disposto neste artigo, o Ministério da Educação e do

Desporto;

a) divulgará, até o dia 31 de março de cada ano, a estimativa do número de

alunos referida no parágrafo anterior por Estado, Distrito Federal e Município, bem

assim as demais informações necessárias ao cálculo dos recursos a serem

repassados no ano subseqüente, com vistas à elaboração das propostas

orçamentárias das três esferas de Governo.

b) publicará, até o dia 30 de novembro de cada ano, as informações

necessárias ao cálculo efetivo dos coeficientes de distribuição para o ano seguinte e

o Censo Escolar do ano em curso.

§ 3º Com base no Censo Escolar e nas demais informações publicadas, o

Ministério da Educação e do Desporto elaborará a tabela de coeficientes de

distribuição dos recursos do Fundo, e a publicará no Diário Oficial da União até o

último dia útil de cada exercício, para utilização no ano subseqüente, remetendo as

planilhas de cálculo ao Tribunal de Contas da União, para exame e controle.

§ 4º Somente será admitida revisão dos coeficientes de que trata o § 2º deste

artigo se houver determinação do Tribunal de Contas da União nesse sentido.

§ 5º O repasse dos recursos nos termos do caput deste artigo será efetuado

nas mesmas datas do repasse dos recursos de que trata o art.159 da Constituição,

observados os mesmos procedimentos e forma de divulgação.

Art. 3º Compete ao Ministério da Fazenda efetuar o cálculo da

complementação anual devida pela União ao Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização Magistério em cada Estado

e no Distrito Federal.

242

§ 1º O cálculo da complementação da União em cada ano terá como base o

número de alunos de que trata o § 1º do Art. 2º deste Decreto, o valor mínimo por

aluno, definido nacionalmente, na forma do art. 6º, da Lei nº 9.424, de 24 de

dezembro de 1996, e a arrecadação das receitas vinculadas ao Fundo.

§ 2º A complementação anual da União corresponderá a diferença, se

negativa, entre a receita anual do Fundo em cada Unidade da Federação e o valor

mínimo da despesa definida para Fundo no mesmo ano.

§ 3º As planilhas de cálculo da estimativa de complementação da União serão

remetidas previamente ao conhecimento do Tribunal de Contas da União.

§ 4º Até o dia 31 de dezembro de cada ano o Ministério da Fazenda publicará

o valor da estimativa da complementação da União para o ano seguinte, relativa a

cada Unidade da Federação, bem como o respectivo cronograma de pagamentos

mensais ao Fundo.

§ 5º Após encerrado cada exercício, o Ministério da Fazenda calculará o valor

da complementação devida pela União com base na efetiva arrecadação das

receitas vinculadas ao Fundo, relativa ao exercício de referência.

§ 6º O Ministério da Fazenda promoverá os ajustes que se fizerem

necessários entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, em

decorrência do cálculo da complementação efetivamente devida, até 30 dias após a

entrega, ao Ministério da Fazenda, dos dados oficiais relativos a arrecadação anual

do ICMS do exercício encerrado, de todos os Estados e do Distrito Federal.

§ 7º Nenhum ajuste relacionado com o pagamento da complementação da

União será admitido ao longo do respectivo exercício de competência.

§ 8º O cronograma de que trata o § 4º deste artigo observará a programação

financeira do Tesouro Nacional e contemplará pagamentos mensais de, no mínimo,

243

5% da estimativa de complementação anual, a serem realizados até o último dia útil

de cada mês, assegurados os repasses de, no mínimo, 45% até 31 de julho e 85%

até 31 de dezembro de cada ano.

§ 9º Parcela do valor da complementação devida pela União poderá ser

destinada, em cada ano, ao ajuste de que trata o § 6º deste artigo.

§ 10 Estimativa da Complementação de que trata este artigo será efetuada

pelo Ministério da Educação e do Desporto e a Secretaria de Orçamento Federal, do

Ministério do Planejamento e Orçamento para fins de inclusão na proposta

orçamentária do ano subseqüente.

§ 11 O Ministério da Fazenda informará mensalmente ao Ministério da

Educação e do Desporto e ao Tribunal de Contas da União os valores repassados a

cada Fundo de que trata este Decreto, discriminando a complementação federal.

Art. 4º Os recursos necessários ao pagamento da complementação da União

ao Fundo serão alocados no Orçamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da

Educação - FNDE, podendo ser destinadas a essa finalidade receitas da

contribuição do Salário Educação até o limite de 20% do total da referida

complementação.

Art. 5º O Conselho de Acompanhamento e Controle Social sobre os Fundos

de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do

Magistério, no âmbito da União terá a seguinte composição:

I - quatro representantes do Ministério da Educação e do Desporto, sendo um

do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE e um do Instituto

Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais - INEP;

Il - um representante do Ministério da Fazenda;

Ill - um representante do Ministério do Planejamento e Orçamento;

244

IV - um representante do Conselho Nacional de Educação -CNE;

V - um representante do Conselho Nacional dos Secretários Estaduais da

Educação - CONSED;

Vl - um representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em

Educação - CNTE;

VII - um representante da União Nacional dos Dirigentes Municipais de

Educação - UNDIME;

VIII - um representante dos pais de alunos e professores das escolas públicas

de ensino fundamental.

§ 1º O Conselho de que trata o caput deste artigo será presidido pelo

representante do FNDE. ou pelo Ministro de Estado da Educação e do Desporto nas

reuniões a que este comparecer.

§ 2º A participação no Conselho de que trata este artigo não será

remunerada, ressalvado o ressarcimento das despesas inerentes à participação nas

reuniões.

Art. 6º Para as Unidades da Federação que anteciparem a implantação do

Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do

Magistério para o exercício de 1997, serão observados os seguintes

procedimentos:

I - as transferências de recursos da União aos Estados e seus respectivos

Municípios e ao Distrito Federal observarão o disposto neste Decreto a partir da data

da efetiva implantação do Fundo, desde que haja comunicação tempestiva a

Secretaria do Tesouro Nacional, do Ministério da Fazenda;

II - para o cálculo dos coeficientes de distribuição serão observados somente

os critérios definidos na alínea "a" do § 1º do art. 2º;

245

III - a complementação da União será paga à razão de um duodécimo do

valor anual hipotético para cada mês de efetiva vigência do Fundo em cada Unidade

da Federação.

Art. 7º Os Ministros de Estado da Educação e do Desporto, da Fazenda, e do

Planejamento e Orçamento proporão, até o dia 30 de abril de cada ano, o valor

mínimo definido nacionalmente a ser fixado para o ano subseqüente, nos termos do

art. 6º da Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996.

Art. 8º Constitui falta grave a adoção de quaisquer procedimentos que

impliquem pagamento incorreto, pela União, dos valores devidos ao Fundo de que

trata este Decreto, aplicando-se aos responsáveis as cominações legais cabíveis.

Art. 9º Compete ao Ministério da Educação e do Desporto denunciar aos

órgãos competentes a ocorrência de irregularidades, e respectivos responsáveis,

que implicarem pagamento incorreto dos valores devidos pela União ao Fundo.

Art. 10. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

246

ANEXO O - DECRETO Nº. 3.076/99 DE 01 DE JUNHO DE 1999

Cria, no âmbito do Ministério da Justiça, o Conselho Nacional dos Direitos da

Pessoa Portadora de Deficiência - CONADE, e dá outras providências.

Art 1º Fica criado, no âmbito do Ministério da Justiça, como órgão superior de

deliberação coletiva, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de

Deficiência - CONADE.

Art 2º Compete ao CONADE:

I - zelar pela efetiva implantação e implementação da Política Nacional para

Integração da Pessoa Portadora de Deficiência;

II - acompanhar o planejamento e avaliar a execução das políticas setoriais de

educação, saúde, trabalho, assistência social, política urbana e outras relativas à

pessoa portadora de deficiência;

III - acompanhar a elaboração e a execução da proposta orçamentária do

Ministério da Justiça, sugerindo as modificações necessárias à consecução da

Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência;

IV - zelar pela efetivação do sistema descentralizado e participativo dos

direitos da pessoa portadora de deficiência;

V - acompanhar e apoiar as políticas e as ações dos Conselhos dos Direitos

da Pessoa Portadora de Deficiência no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e

dos Municípios;

VI - propor a elaboração de estudos e pesquisas que objetivem a melhoria da

qualidade de vida da pessoa portadora de deficiência;

VII - propor e incentivar a realização de campanhas visando à prevenção de

deficiências e a promoção dos direitos da pessoa portadora de deficiência;

247

VIII - aprovar o plano de ação anual do órgão da Administração Pública

Federal responsável pela coordenação da Política Nacional para Integração da

Pessoa Portadora de Deficiência;

IX - acompanhar, mediante relatórios de gestão, o desempenho dos

programas e projetos do órgão da Administração Pública Federal responsável pela

coordenação da Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de

Deficiência.

X - elaborar o seu regimento interno.

Art 3º O CONADE será constituído, paritariamente, por representantes de

instituições governamentais e da sociedade civil, sendo sua composição e o seu

funcionamento disciplinados em ato do Ministro de Estado da Justiça.

Parágrafo único. Na composição do CONADE, o Ministro de Estado da

Justiça disporá sobre os critérios de escolha dos representantes a que se refere este

artigo, observado, dentre outros, a representatividade e a efetiva atuação, em nível

nacional, relativamente aos direitos da pessoa portadora de deficiência.

Art 4º Poderão ser instituídas outras instâncias deliberativas pelos Estados,

pelo Distrito Federal e pelos Municípios, que integrarão sistema descentralizado dos

direitos da pessoa portadora de deficiência.

248

ANEXO P - DECRETO Nº. 3.691, DE 19 DE DEZEMBRO DE

2000

Regulamenta a Lei nº. 8.899, de 29 de junho de 1994, que dispõe sobre o

transporte de pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo

interestadual.

Art. 1º As empresas permissionárias e autorizatárias de transporte

interestadual de passageiros reservarão dois assentos de cada veículo, destinado a

serviço convencional, para ocupação das pessoas beneficiadas pelo Art. 1º da Lei nº

8.899, de 29 de junho de 1994, observado o que dispõem as Leis nos 7.853, de 24

de outubro de 1989, 8.742, de 7 de dezembro de 1993, 10.048, de 8 de novembro

de 2000, e os Decretos nºs 1.744, de 8 de dezembro de 1995, e 3.298, de 20 de

dezembro de 1999.

Art. 2º O Ministro de Estado dos Transportes disciplinará, no prazo de até

trinta dias, o disposto neste Decreto.

Art. 3º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

249

ANEXO Q - DECRETO Nº. 3.952 DE 04 DE OUTUBRO DE 2001

Dispõe sobre o Conselho Nacional de Combate à Discriminação - CNCD.

Art. 1o Este Decreto trata da competência, da composição e do

funcionamento do Conselho Nacional de Combate à Discriminação - CNCD, a que

se refere o inciso X do art. 16 da Lei no 9.649, de 27 de maio de 1998.

Art. 2o Ao CNCD, órgão colegiado, integrante da estrutura básica do

Ministério da Justiça, compete propor, acompanhar e avaliar as políticas públicas

afirmativas de promoção da igualdade e da proteção dos direitos de indivíduos e

grupos sociais e étnicos afetados por discriminação racial e demais formas de

intolerância.

Art. 3o O CNCD tem a seguinte composição:

I - o Secretário de Estado dos Direitos Humanos, que o presidirá;

II - um representante da Assessoria Especial do Gabinete da Presidência da

República;

III - um representante do Ministério das Relações Exteriores;

IV - um representante do Ministério da Educação;

V - um representante do Ministério da Saúde;

VI - um representante do Ministério do Trabalho e Emprego;

VII - um representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário;

VIII - um representante da Secretaria de Estado de Assistência Social;

IX - um representante do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA;

X - um representante da Fundação Cultural Palmares;

XI - um representante da Fundação Nacional do Índio; e

250

XII - onze representantes de movimentos sociais e organizações não-

governamentais, com especial ênfase na participação de entidades da comunidade

negra, que se ocupem de temas relacionados com a promoção da igualdade e com

o combate a todas as formas de discriminação.

§ 1o Poderão integrar, ainda, o CNCD:

I - um representante do Ministério Público Federal; e

II - um representante do Ministério Público do Trabalho.

§ 2o Haverá um suplente para cada membro do Conselho.

§ 3o Os membros e os suplentes do Conselho serão indicados pelos titulares

dos órgãos e entidades mencionados neste artigo e designados pelo Ministro de

Estado da Justiça.

§ 4o Os membros do Conselho terão mandato de dois anos, permitida uma

recondução, e não serão remunerados, sendo sua participação considerada serviço

público relevante.

Art. 4o Nas reuniões do CNCD será necessária a presença de, no mínimo,

doze membros, sendo seis representantes das entidades ou dos órgãos públicos e

seis de movimentos sociais ou de organizações não-governamentais referidos no

art. 3o.

§ 1o As decisões do Conselho serão tomadas por maioria de votos dos

presentes.

§ 2o Em caso de empate, o Presidente do Conselho tem o voto de qualidade.

§ 3o O Conselho poderá convidar para participar das reuniões, sem direito a

voto, representantes de órgãos públicos diversos dos arrolados no art. 3o e pessoas

com especialização ou experiência na temática da promoção e proteção dos direitos

humanos e do combate à discriminação.

251

Art. 5o O CNCD poderá constituir comissões para a análise de assuntos

específicos relacionados com as matérias de sua competência.

Art. 6o O CNCD, no exercício de sua competência, poderá solicitar

informações a órgãos e entidades governamentais e não-governamentais, examinar

as denúncias que lhe forem submetidas e encaminhá-las para as autoridades

competentes.

Art. 7o Os serviços de secretaria-executiva do CNCD serão prestados pela

Secretaria de Estado dos Direitos Humanos.

Art. 8o As dúvidas decorrentes da aplicação deste Decreto serão dirimidas

pelo Presidente do CNCD.

Art. 9o O regimento interno do CNCD será aprovado pelo Ministro de Estado

da Justiça.

Art. 10. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

252

ANEXO R - PORTARIA N.º 1.793, DE DEZEMBRO DE 1994

FORMAÇÃO DE DOCENTES

O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, no uso de

suas atribuições, tendo em vista o disposto na Medida Provisória n.º 765 de 16 de

dezembro de 1994 e considerando:

- a necessidade de complementar os currículos de formação de docentes e

outros profissionais que interagem com portadores de necessidades especiais;

- a manifestação favorável da Comissão Especial instituída pelo Decreto de

08 de dezembro de 1994, resolve:

Art.1º. Recomendar a inclusão da disciplina “ASPECTOS ÉTICO-POLITICO-

EDUCACIONAIS DA NORMALIZAÇÃO E INTEGRAÇÃO DA PESSOA

PORTADORA DE NECESSIDADES ESPECIAIS”, prioritariamente, nos cursos de

Pedagogia, Psicologia e em todas as Licenciaturas.

Art. 2º. Recomendar a inclusão de conteúdos relativos aos aspectos Ético –

Políticos – Educacionais da Normalização e Integração da Pessoa Portadora de

Necessidades Especiais nos cursos do grupo de Ciência da Saúde (Educação

Física, Enfermagem , Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição,

Odontologia, Terapia Ocupacional), no Curso de Serviço Social e nos demais cursos

superiores, de acordo com as suas especificidades.

Art. 3º. Recomendar a manutenção e expansão de estudos adicionais, cursos

de graduação e de especialização já organizados para as diversas áreas da

Educação Especial.

Art. 4º. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário.

253

ANEXO S - PORTARIA Nº 319 , DE 26 DE FEVEREIRO DE 1999

COMISSÃO BRASILEIRA DO BRAILLE

O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso de suas atribuições e

considerando o interesse do Governo Federal em adotar para todo o País, uma

política de diretrizes e normas para o uso, o ensino, a produção e a difusão do

Sistema Braille em todas as modalidades de aplicação, compreendendo

especialmente a Língua Portuguesa, a Matemática e outras Ciências, a Música e a

Informática; considerando a permanente evolução técnico-científica que passa a

exigir sistemática avaliação, alteração e modificação dos códigos e simbologia

Braille, adotados nos Países de língua portuguesa e espanhola; e, finalmente,

considerando a necessidade do estabelecimento de permanente intercâmbio com

comissões de Braille de outros Países, de acordo com a política de unificação do

Sistema Braille, a nível internacional, resolve

Art. 1º - Fica instituída no Ministério da Educação, vinculada à Secretaria de

Educação Especial/SEESP e presidida pelo titular desta, a Comissão Brasileira do

Braille, de caráter permanente.

Art 2º - A Comissão Brasileira do Braille será constituída de 08 (oito) membros

sendo:

I - 1 representante do Instituto Benjamin Constant - IBC; II - 1 representante

da União Brasileira de Cegos - UBC; III - 1 representante da Fundação Dorina Nowill

para Cegos - FNDC; IV - 5 representantes de instituições de e para cegos,

escolhidos em fórum convocado pela União Brasileira de Cegos - UBC. § 1º - Os

membros referidos nos itens I, II e III terão um mandato de 3 anos e os no item IV

terão mandato de 2 anos.

254

§ 2º - Os representantes do Instituto Benjamin Constant - IBC, da União

Brasileira de Cegos - UBC e da Fundação Dorina Nowill para Cegos - FNDC,

referidos nos incisos I; II e III deste artigo, constituirão a Consultoria Técnico

Científica da Comissão.

§ 3º - Os cinco representantes escolhidos no fórum referido no inciso IV deste

artigo, deverão preferencialmente atender as áreas de aplicação do Sistema Braille

especificados no parágrafo subseqüente.

§ 4º - Os membros da Comissão Brasileira do Braille deverão ser pessoas de

notório saber e larga experiência no uso do Sistema Braille, nas seguintes áreas:

a) Braille integral e abreviado (grau I e grau II) da língua portuguesa e

conhecimentos específicos de simbologia Braille usada em outras línguas, em

especial espanhol, francês e inglês.

b) Simbologia Braille aplicada à matemática e ciências em geral;

c) Musicografia Braille;

d) Simbologia Braille aplicada à informática, produção Braille (transcrição,

adaptação de textos, gráficos e desenhos em relevo e impressão).

§ 5º - Os trabalhos da Comissão serão considerados relevantes e as funções

exercidas por seus membros não serão remuneradas, sendo vedada a percepção de

vantagens pecuniárias de qualquer natureza, exceto despesas eventuais de

passagens e diárias.

Art. 3º - Compete à Comissão Brasileira do Braille:

I - Elaborar e propor a política nacional para o uso, ensino e difusão do

Sistema Braille em todas as suas modalidades de aplicação, compreendendo

especialmente a língua portuguesa, a matemática e outras ciências exatas, a música

e a informática;

255

II - Propor normas e regulamentações concernentes ao uso, ensino e

produção do Sistema Braille no Brasil, visando a unificação das aplicações do

Sistema Braille, especialmente nas línguas portuguesa e espanhola.

III - Acompanhar e avaliar a aplicação de normas, regulamentações, acordos

internacionais, convenções e quaisquer atos normativos referentes ao Sistema

Braille.

IV - Prestar assistência técnica às Secretarias Estaduais e Municipais de

Educação, bem como a entidades públicas e privadas, sobre questões relativas ao

uso do Sistema Braille.

V - Avaliar permanentemente a Simbologia Braille adotada no País, atentando

para a necessidade de adaptá-la ou alterá-la, face à evolução técnica e científica,

procurando compatibilizar esta simbologia, sempre que for possível com as adotadas

nos Países de língua portuguesa e espanhola.

VI - Manter intercâmbio permanente com comissões de Braille de outros

Países de acordo com as recomendações de unificação do Sistema Braille em nível

internacional.

VII - Recomendar, com base em pesquisas, estudos, tratados e convenções,

procedimentos que envolvam conteúdos, metodologia e estratégias a serem

adotados em cursos de aprendizagem no Sistema Braille com caráter de

especialização, treinamento e reciclagem de professores e de técnicos, como

também nos cursos destinados a usuários do Sistema Braille e à comunidade geral.

VIII - Propor critérios e fixar estratégias para implantação de novas

Simbologias Braille que alterem ou substituam os códigos em uso no Brasil,

prevendo a realização de avaliações sistemáticas com vistas a modificações de

procedimentos sempre que necessário.

256

IX - Elaborar catálogos, manuais, tabelas e outras publicações que facilitem o

processo ensino-aprendizagem e o uso do Sistema Braille em todo o território

nacional.

Parágrafo Único - Os itens IV, V, VI e IX, poderão constituir matéria de

apreciação e deliberação da Consultoria Técnico Científica.

Art. 4º - A SEESP assegurará o apoio técnico, administrativo e financeiro

indispensável ao funcionamento da Comissão.

Art. 5º - A instalação da Comissão Brasileira do Braille dar-se-á no prazo de

até 60 (sessenta) dias da data de publicação desta Portaria.

Art. 6º - A Comissão elaborará o Regulamento Interno no prazo de 60

(sessenta) dias a partir de sua instalação.

Art. 7º - Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

257

ANEXO T - PORTARIA Nº 554 DE 26 DE ABRIL DE 2000

REGULAMENTA COMISSÃO BRASILEIRA DO BRAILLE

O Ministro de Estado da Educação, no uso de suas atribuições, tendo em

vista o disposto no art. 6º da Portaria nº 319, de 26 de fevereiro de 1999, que

instituiu a Comissão, resolve:

Art. 1º Aprovar o Regulamento Interno da Comissão Brasileira do Braille, na

forma do Anexo a esta Portaria.

Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

(Anexo à PORTARIA Nº 554 DE 26 DE ABRIL DE 2000)

Regulamento Interno da Comissão Brasileira do Braille.

CAPÍTULO I

DA NATUREZA E DA COMPETÊNCIA

Art.1º A Comissão Brasileira do Braille, vinculada à Secretaria de Educação

Especial – SEESP, do Ministério da Educação, instituída pela Portaria nº 319, de 26

fevereiro de 1999, tem por competência:

I - elaborar e propor diretrizes para o uso, ensino e difusão do Sistema Braille

em todas as modalidades de aplicação, compreendendo especialmente a língua

portuguesa, a matemática e outras ciências exatas, a música e a informática;

II - propor normas e regulamentações concernentes ao uso, ensino e

produção do Sistema Braille no Brasil, visando a unificação das aplicações do

Sistema Braille, especialmente nas línguas portuguesa e espanhola;

III - acompanhar e avaliar a aplicação de normas, regulamentações, acordos

internacionais, convenções e quaisquer atos normativos referentes ao Sistema

Braille;

258

IV - prestar assistência técnica às Secretarias Estaduais e Municipais de

Educação, bem como às entidades públicas e privadas, sobre questões relativas ao

uso do Sistema Braille;

V – avaliar, permanentemente, a simbologia Braille adotada no País,

atentando para a necessidade de adaptá-la ou alterá-la, face à evolução técnica e

científica, procurando compatibilizar esta simbologia, sempre que for possível, com

as adotadas nos países de língua portuguesa e espanhola;

VI - manter intercâmbio permanente com comissões de Braille de outros

países, de acordo com as recomendações de unificação do Sistema Braille em nível

internacional;

VII - recomendar, com base em pesquisas, estudos, tratados e convenções,

procedimentos que envolvam conteúdos, metodologia e estratégias a serem

adotados em cursos de aprendizagem do Sistema Braille, com caráter de

especialização, treinamento e atualização de professores e técnicos, como também

nos cursos destinados aos usuários do Sistema Braille e à comunidade geral;

VIII - propor critérios e fixar estratégias para implantação de novas

Simbologias Braille, que alterem ou substituam os códigos em uso no Brasil,

prevendo a realização de avaliações sistemáticas, com vistas a modificações de

procedimentos sempre que necessário; e

IX - elaborar catálogos, manuais, tabelas e outras publicações que facilitem o

processo ensino-aprendizagem e o uso do Sistema Braille em todo o território

nacional.

CAPÍTULO II

DA COMPOSIÇÃO

259

Art. 2º A Comissão Brasileira do Braille é constituída por nove membros,

sendo:

I –um representante da Secretaria de Educação Especial – SEESP;

II - um representante do Instituto Benjamin Constant – IBC;

III - um representante da União Brasileira de Cegos – UBC;

IV - um representante da Fundação Dorina Nowill para Cegos – FDNC;

V- cinco representantes de instituições de e para cegos, escolhidos em fórum,

convocado pela União Brasileira de Cegos – UBC.

§ 1º A escolha dos representantes para a Comissão Brasileira do Braille

deverá recair sobre pessoas de notório saber e larga experiência no uso do Sistema

Braille.

§ 2º Os representantes do IBC, da UBC e da FDNC terão mandato de três

anos e poderão ser reconduzidos uma única vez, observando-se as formalidades

legais exigidas para a sua primeira indicação.

§ 3º Os representantes referidos no item V, deste artigo, terão mandato de

dois anos.

§ 4º Ocorrendo, por qualquer motivo, o afastamento definitivo do

representante na Comissão, a entidade representada terá direito a indicar outro

representante, para completar o mandato;

§ 5º Haverá perda de mandato quando o representante deixar de comparecer

a duas reuniões consecutivas, sem justificativa aceita pela Comissão.

§ 6º Os representantes do Instituto Benjamin Constant – IBC, da União

Brasileira de Cegos – UBC e da Fundação Dorina Nowill para Cegos – FDNC,

constituem a Comissão Técnico - Científica de Trabalho da Comissão Brasileira do

Braille.

260

CAPÍTULO III

DO FUNCIONAMENTO

Art.3º As reuniões da Comissão Brasileira do Braille realizar-se-ão nas

dependências da SEESP/MEC, em Brasília, ou em outras localidades, quando

houver conveniência administrativa e/ou financeira e, serão presididas pelo

representante da SEESP.

§ 1º Na ausência do presidente, este indicará um membro da Comissão para

presidir a reunião.

§ 2º Fazendo-se presente em qualquer etapa da reunião, o presidente

assumirá, automaticamente, a direção dos trabalhos.

Art. 4º A Comissão Brasileira do Braille reunir-se-á ordinariamente, na

primeira quinzena dos meses de março, junho, setembro e dezembro de cada ano, e

extraordinariamente, sempre que necessário, cabendo ao presidente convocar e

fixar as datas das reuniões.

§ 1º A convocação para as reuniões ordinárias deverá ocorrer com

antecedência mínima de vinte dias e, para as reuniões extraordinárias a

antecedência deverá ser de, no mínimo, dez dias, mediante comunicação escrita aos

membros da Comissão e aos dirigentes das entidades representadas.

§ 2º A cada reunião, os membros da Comissão elegerão um relator, para

registrar e divulgar os resultados das reuniões, com a colaboração da SEESP,

segundo o previsto no art. 4º, da Portaria nº 319, de 26 de fevereiro de 1999.

§ 3º O quorum mínimo para a instalação de cada reunião da Comissão será

de cinco membros e as decisões serão tomadas por maioria simples dos votos dos

membros presentes, sendo que em caso de empate, o presidente exercerá o voto de

qualidade.

261

Art. 5º A Comissão Técnico-Científica de Trabalho reunir-se-á com o quorum

mínimo de, pelo menos, mais dois membros da Comissão, sendo aplicáveis às suas

reuniões, no que couber, as normas previstas neste capítulo.

Art. 6º Quaisquer encaminhamentos deverão ser dirigidos à SEESP, que os

encaminhará às áreas especializadas e transmitirá as respostas aos consulentes.

CAPÍTULO IV

DAS ATRIBUIÇÔES

Art. 7º Ao presidente incumbe I - adotar todas as providências administrativas

necessárias para o bom funcionamento da Comissão;

II - convocar as reuniões ordinárias e extraordinárias da Comissão Brasileira

do Braille;

III – designar substituto para presidir, em seus impedimentos, as reuniões

previstas no inciso anterior;

IV – representar, ou em seus impedimentos designar substitutos, a Comissão

Brasileira do Braille junto ao Ministro de Estado da Educação, bem como em suas

relações externas.

Art.8º. Aos membros da Comissão incumbe:

I – cumprir e fazer cumprir este Regulamento;

II – participar das reuniões da Comissão, sempre que convocados, ou

justificar sua ausência;

III – estudar, discutir e votar matéria submetida a exame da Comissão;

IV – participar dos grupos de trabalho para os quais tenham sido designados.

CAPÍTULO V

DO APOIO ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO

262

Art. 9º. A SEESP manterá, em Brasília, o apoio administrativo necessário ao

funcionamento da Comissão Brasileira do Braille, inclusive providenciará suporte

financeiro para as despesas da Comissão, bem como passagens e diárias para seus

membros, quando oficialmente convocados para as reuniões, fora da cidade de seu

domicílio.

Art.10. Os membros da Comissão Brasileira do Braille, indicados pela

Fundação Dorina Nowill para Cegos e pelo Instituto Benjamin Constant manterão o

acervo técnico da Comissão, que compreende catálogos, manuais, tabelas e demais

publicações de interesse para o uso do Sistema Braille, no Brasil e no exterior.

Parágrafo único. As publicações de que trata este artigo deverão, sempre que

possível, ser conservadas em duplicata, nas duas entidades, a fim de facilitar o

trabalho de seus técnicos e as consultas dos membros da Comissão.

CAPÍTULO VI

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Art.11. Compete à Comissão Técnico - Científica de Trabalho, sem prejuízo

da liberdade de iniciativa da Comissão, tomar as decisões técnicas relativas aos

incisos IV, V, VI e IX do artigo 1º, deste Regulamento, cabendo à Comissão fixar as

orientações para o desenvolvimento dos trabalhos.

Art. 12. Os casos omissos serão resolvidos, em primeira instância, pelo titular

da SEESP e, em segunda instância, pelo Ministro de Estado da Educação.

263

ANEXO U - PORTARIA Nº 8, DE 23 DE JANEIRO DE 2001

ESTÁGIOS

O MINISTRO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E

GESTÃO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso II,

da Constituição, considerando o disposto na Lei n° 6.494, de 7 de dezembro de

1977, no Decreto nº 87.497, de 18 de agosto de 1992, alterado pelos Decretos nºs

89.467, de 21 de março de 1994, e 2.080, de 26 de novembro de 1996, e tendo em

vista a necessidade de rever, atualizar e consolidar os procedimentos operacionais

adotados pelas unidades de recursos humanos para a aceitação, como estagiários,

de alunos regularmente matriculados e que venham freqüentando, efetivamente,

cursos de educação superior, de ensino médio, de educação profissional de nível

médio ou de educação especial, vinculados à estrutura do ensino público e

particular, resolve:

Art. 1° Os órgãos e entidades da Administração Pública Federal direta,

autárquica e fundacional que tenham condições de proporcionar experiência prática

na linha de formação, podem aceitar, como estagiários, pelo prazo máximo de vinte

e quatro meses, alunos regularmente matriculados e que venham freqüentando,

efetivamente, cursos de educação superior, de ensino médio, de educação

profissional de nível médio ou de educação especial, vinculados à estrutura do

ensino público e particular, oficiais ou reconhecidos.

§ 1° O estágio, sob responsabilidade e coordenação da instituição de ensino e

controlado pela unidade de recursos humanos do órgão ou entidade solicitante, será

planejado, executado, acompanhado e avaliado em conformidade com os currículos

e deverá propiciar complementação de ensino e aprendizagem aos estudantes,

264

constituindo-se em instrumento de integração, de aperfeiçoamento técnico-cultural,

científico e de relacionamento humano.

§ 2° Somente poderão ser aceitos estudantes de cursos cujas áreas estejam

relacionadas diretamente com as atividades, programas, planos e projetos

desenvolvidos pelo órgão ou entidade nos quais se realizar o estágio.

Art. 2º O número de estagiários em cada órgão ou entidade não poderá ser

superior a vinte por cento do total da lotação aprovada para as categorias de nível

superior e a dez por cento para as de nível intermediário, reservando-se, desse

quantitativo, cinco por cento das vagas para estudantes portadores de deficiência,

compatível com o estágio a ser realizado.

Parágrafo único. No caso de o órgão ou entidade não possuir lotação

aprovada, o quantitativo de estagiários, de nível superior e nível intermediário,

corresponderá ao somatório de cargos comissionados, funções gratificadas ou

equivalentes, mais o total de requisitados não ocupantes de cargos comissionados,

nos mesmos percentuais previstos no caput deste artigo.

Art. 3° Para a caracterização e definição do estágio curricular é necessária a

celebração de convênio com instituições de ensino ou agentes de integração,

públicos ou privados, sem fins lucrativos, entre o sistema de ensino e os setores de

produção, serviços, comunidade e governo.

Parágrafo único. No convênio poderá ser incluída cláusula para custeio das

despesas necessárias à realização do seu objeto, mediante prestação de contas.

Art. 4º A realização do estágio curricular não acarretará vínculo empregatício

de qualquer natureza e dar-se-á mediante termo de compromisso celebrado entre o

estudante e o órgão ou entidade, com a interveniência obrigatória da instituição de

ensino ou do agente de integração, no qual deverá constar, pelo menos:

265

I - identificação do estagiário, da instituição de ensino, do agente de

integração e do curso e seu nível;

II - menção de que o estágio não acarretará qualquer vínculo empregatício;

III - valor da bolsa mensal;

IV - carga horária semanal de, no mínimo, vinte horas, distribuída nos horários

de funcionamento do órgão ou entidade e compatível com o horário escolar;

V - duração do estágio, obedecido o período mínimo de um semestre e o

máximo de quatro;

VI - obrigação de cumprir as normas disciplinares de trabalho e de preservar o

sigilo das informações a que tiver acesso;

VII obrigação de apresentar relatórios ao dirigente da unidade onde se

realizar o estágio, trimestrais e final, sobre o desenvolvimento das tarefas que lhe

forem cometidas;

VIII - assinaturas do estagiário e responsáveis pelo órgão ou entidade e pela

instituição de ensino;

IX - condições de desligamento do estagiário; e

X - menção do convênio a que se vincula.

Art. 5º O estudante de nível superior ou de segundo grau perceberá, a título

de bolsa de estágio, pela jornada semanal de vinte horas, importância mensal

equivalente a duzentos e sessenta reais e cento e quarenta e cinco reais,

respectivamente.

§ 1° Será considerada, para efeito de cálculo do pagamento da bolsa, além,

da proporcionalidade da jornada a que estiver submetido, a freqüência mensal do

estagiário, deduzindo-se os dias de falta não justificada e a parcela de remuneração

266

diária, proporcional aos atrasos, ausências justificadas e saídas antecipadas, salvo

na hipótese de compensação de horário, até o mês subseqüente ao da ocorrência.

§ 2° A despesa decorrente da concessão da bolsa só poderá ser efetuada se

houver prévia e suficiente dotação orçamentária constante do orçamento da

instituição onde se realizar o estágio.

Art. 6º Ocorrerá o desligamento do estudante do estágio curricular:

I - automaticamente, ao término do estágio;

II - a qualquer tempo no interesse da Administração;

III - após decorrida a terça parte do tempo previsto para a duração do estágio,

se comprovada a insuficiência na avaliação de desempenho no órgão ou entidade

ou na instituição de ensino;

IV - a pedido do estagiário;

V - em decorrência do descumprimento de qualquer compromisso assumido

na oportunidade da assinatura do Termo de Compromisso;

VI - pelo não comparecimento, sem motivo justificado, por mais de cinco dias,

consecutivos ou não, no período de um mês, ou por trinta dias durante todo o

período do estágio; e

VII- pela interrupção do curso na instituição de ensino a que pertença o

estagiário.

Art. 7° Uma vez atendidas todas as condições específicas de realização e

avaliação de desempenho do estágio, o órgão ou entidade encaminhará à instituição

de ensino o certificado de estágio, juntamente com os relatórios trimestrais e final

apresentados pelo estagiário e avaliados pelo supervisor do estágio.

Parágrafo único. Não será expedido o certificado na hipótese em que o

estudante não obtiver aproveitamento satisfatório.

267

Art. 8° O supervisor do estágio será o chefe da unidade em que o estagiário

estiver desenvolvendo suas atividades, desde que possua nível de escolaridade pelo

menos igual ao do estagiário, que controlará sua freqüência mensal e a

encaminhará à unidade de recursos humanos do órgão ou entidade onde se realizou

o estágio.

Parágrafo único. Na hipótese de o chefe da unidade não possuir nível de

escolaridade igual, o supervisor do estágio será a autoridade imediatamente superior

à chefia da unidade com, pelo menos, idêntico grau de escolaridade do estagiário.

Art. 9º Para a execução do disposto nesta Portaria, deverão as unidades de

recursos humanos:

I - articular-se com as instituições de ensino ou agentes de integração com a

finalidade de oferecer as oportunidades de estágio;

II - participar da elaboração dos convênios a serem celebrados com as

instituições de ensino ou agentes de integração;

III - solicitar às instituições de ensino ou aos agentes de integração a

indicação de estudantes que preencham os requisitos exigidos pelas oportunidades

de estágio;

IV - selecionar e receber os candidatos ao estágio;

V - lavrar o termo de compromisso a ser assinado pelo estagiário, pela

instituição de ensino e pelo agente de integração;

VI - conceder a bolsa de estágio e autorizar o seu pagamento;

VII receber, das unidades onde se realizar o estágio, os relatórios, avaliações

e freqüências do estagiário;

VIII - receber e analisar as comunicações de desligamento de estagiários;

IX - expedir o certificado de estágio;

268

X - apresentar às instituições de ensino ou agentes de integração os

estagiários desligados; e

XI - dar amplo conhecimento das disposições contidas nesta Portaria às

unidades do respectivo órgão ou entidade, aos supervisores de estágio e aos

próprios estagiários.

Art. 10. A instituição de ensino ou entidade, pública ou privada, concedente da

oportunidade de estágio curricular, diretamente ou por meio de atuação conjunta

com os agentes de integração, providenciará seguro de acidentes pessoais em favor

do estudante, condição essencial para a celebração do convênio.

Art. 11. Nos períodos de férias escolares a jornada de estágio será

estabelecida de comum acordo entre o estagiário e o órgão ou entidade, onde se

realizar o estágio, sempre com a interveniência da instituição de ensino ou agente

de integração.

Art. 12. O servidor público poderá participar de estágio, sem direito à bolsa,

nos termos desta Portaria, em qualquer órgão ou entidade, público ou privado,

desde que cumpra, no mínimo, vinte horas semanais de jornada de trabalho na

unidade que estiver em exercício.

Art. 13. É vedado aos órgãos e entidades, onde se realizar o estágio,

concederem vale-transporte, auxílio-alimentação e benefício da assistência saúde a

estagiários.

Art. 14. Em nenhuma hipótese poderá ser cobrada do estudante qualquer

taxa adicional referente às providências administrativas para obtenção e realização

do estágio curricular.

Art. 15. O estágio poderá ser realizado sem ônus para os órgãos e entidades,

observando-se os demais procedimentos operacionais previstos nesta Portaria.

269

Art. 16. As unidades de recursos humanos informarão periodicamente no

Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos - SIAPE o número total

de estudantes aceitos como estagiários de nível superior e intermediário.

Art. 17. Por possuir legislação específica, as disposições desta Portaria não

se aplicam aos estágios para os estudantes dos cursos de licenciatura, cursos

técnicos, industriais e agrotécnicos de segundo grau das instituições de ensino.

Art. 18. Por ato do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão,

as autarquias e fundações qualificadas como Agência Executiva poderão aceitar

estagiários em percentuais superiores aos estabelecidos no art. 2° desta Portaria,

desde que haja prévia e suficiente dotação orçamentária, comprovada na

solicitação, nos termos da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, em

especial o disposto nos artigos. 16 e 17.

Art. 19. Fica delegada a competência ao Secretário de Recursos Humanos do

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão para, em caráter excepcional,

autorizar a contratação de estagiários acima do limite previsto no art. 2º desta

Portaria.

Art. 20. Os estágios em realização na data de vigência desta Portaria serão

ajustados às normas nela contidas.

Art. 21. Revoga-se a Instrução Normativa n° 5/MARE, de 25 de abril de 1997.

Art. 22. Esta Portaria entra em vigor na data da sua publicação.

270

ANEXO V - PORTARIA Nº 3.284, DE 7 DE NOVEMBRO DE 2003

ENSINO SUPERIOR

Dispõe sobre requisitos de acessibilidade de pessoas portadoras de

deficiências, para instruir os processos de autorização e de reconhecimento de

cursos, e de credenciamento de instituições.

O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, INTERINO, no uso de suas

atribuições, tendo em vista o disposto na Lei n o 9.131, de 24 de novembro de 1995,

na Lei n o 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e no Decreto nº 2.306, de 19 de

agosto de 1997, e considerando a necessidade de assegurar aos portadores de

deficiência física e sensorial condições básicas de acesso ao ensino superior, de

mobilidade e de utilização de equipamentos e instalações das instituições de ensino,

resolve:

Art. 1º Determinar que sejam incluídos nos instrumentos destinados a avaliar

as condições de oferta de cursos superiores, para fins de autorização e

reconhecimento e de credenciamento de instituições de ensino superior, bem como

para renovação, conforme as normas em vigor, requisitos de acessibilidade de

pessoas portadoras de necessidades especiais.

Art 2º A Secretaria de Educação Superior, com apoio técnico da Secretaria de

Educação Especial, estabelecerá os requisitos de acessibilidade, tomando-se como

referência a Norma Brasil 9050, da Associação Brasileira de Normas Técnicas, que

trata da Acessibilidade de Pessoas Portadoras de Deficiências a Edificações,

Espaço, Mobiliário e Equipamentos Urbanos.

§ 1º Os requisitos de acessibilidade de que se trata no caput compreenderão

no mínimo:

271

I - com respeito a alunos portadores de deficiência física:

a) eliminação de barreiras arquitetônicas para circulação do estudante,

permitindo acesso aos espaços de uso coletivo;

b) reserva de vagas em estacionamentos nas proximidades das unidades de

serviço;

c) construção de rampas com corrimãos ou colocação de elevadores,

facilitando a circulação de cadeira de rodas;

d) adaptação de portas e banheiros com espaço suficiente para permitir o

acesso de cadeira de rodas;

e) colocação de barras de apoio nas paredes dos banheiros;

f) instalação de lavabos, bebedouros e telefones públicos em altura acessível

aos usuários de cadeira de rodas;

II - no que concerne a alunos portadores de deficiência visual, compromisso

formal da instituição, no caso de vir a ser solicitada e até que o aluno conclua o

curso:

a) de manter sala de apoio equipada como máquina de datilografia braile,

impressora braile acoplada ao computador, sistema de síntese de voz, gravador e

fotocopiadora que amplie textos, software de ampliação de tela, equipamento para

ampliação de textos para atendimento a aluno com visão subnormal, lupas, réguas

de leitura, scanner acoplado a computador;

b) de adotar um plano de aquisição gradual de acervo bibliográfico em braile e

de fitas sonoras para uso didático;

III - quanto a alunos portadores de deficiência auditiva, compromisso formal

da instituição, no caso de vir a ser solicitada e até que o aluno conclua o curso:

272

a) de propiciar, sempre que necessário, intérprete de língua de sinais/língua

portuguesa, especialmente quando da realização e revisão de provas,

complementando a avaliação expressa em texto escrito ou quando este não tenha

expressado o real conhecimento do aluno;

b) de adotar flexibilidade na correção das provas escritas, valorizando o

conteúdo semântico;

c) de estimular o aprendizado da língua portuguesa, principalmente na

modalidade escrita, para o uso de vocabulário pertinente às matérias do curso em

que o estudante estiver matriculado;

d) de proporcionar aos professores acesso a literatura e informações sobre a

especificidade lingüística do portador de deficiência auditiva.

§ 2º A aplicação do requisito da alínea “a” do inciso III do parágrafo anterior,

no âmbito das instituições federais de ensino vinculadas a este Ministério, fica

condicionada à criação dos cargos correspondentes e à realização regular de seu

provimento.

Art. 3º A Secretaria de Educação Superior, com suporte técnico da Secretaria

de Educação Especial tomará, no prazo de noventa dias contados da vigência das

normas aqui estabelecidas, as medidas necessárias à incorporação dos requisitos

definidos na forma desta Portaria aos instrumentos de avaliação das condições de

oferta de cursos superiores.

Art.4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, ficando

revogada a Portaria nº 1.679, de 2 de dezembro de 1999, publicada no D.O.U. de 3

de dezembro de 1999, Seção 1E, pág. 20.

273

ANEXO W - RESOLUÇÃO Nº 2, DE 24 DE FEVEREIRO DE 1981.

RESOLUÇÃO Nº 02/81 - PRAZO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE

GRADUAÇÃO

CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO

Autoriza a concessão de dilatação de prazo de conclusão do curso de

graduação aos alunos portadores de deficiência física, afecções congênitas ou

adquiridas.

O Presidente do Conselho Federal de Educação,no uso de suas

atribuições, e tendo em vista as conclusões do Parecer CFE nº 359/80, homologado

pelo Ministro da Educação e Cultura . RESOLVE:

Art.1º. Ficam as Universidades e os estabelecimentos isolados de ensino

superior autorizados a conceder dilatação do prazo máximo estabelecidos para

conclusão do curso de graduação que estejam cursando, aos alunos portadores de

deficiências físicas, afecções congênitas ou adquiridas que importem na limitação de

capacidade de aprendizagem .

Art. 2º. A dilatação do prazo a que se refere o artigo anterior não poderá

ultrapassar de 50% (cinqüenta por cento) do limite máximo de duração fixada pelo

curso.

Art. 3º. Nos casos em que a dilatação acima autorizada for reputada

insuficiente, deverá a entidade submeter à apreciação do Conselho Federal de

Educação a proposta sobre a espécie.

Art. 4º. A presente Resolução entrará em vigor na data de sua publicação no

Diário Oficial da União.

Art. 5º. Revogam-se as disposições em contrário.

274

ANEXO X - RESOLUÇÃO Nº 05 DE 26 DE NOVEMBRO DE 1987

ALTERA A REDAÇÃO DO ART. 1º DA RESOLUÇÃO Nº 2/81

CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO

Altera a redação do Artigo 1º da Resolução nº 2/81.

Art. 1º. O art. 1º da Resolução nº 2/81, do Conselho Federal de Educação

passa a vigorar com a seguinte redação:

Art. 1º. Ficam as Universidades e os Estabelecimentos Isolados de Ensino

Superior autorizados a conceder dilatação do prazo máximo estabelecido para

conclusão do curso de graduação, que estejam cursando, aos alunos portadores de

deficiências físicas assim como afecções, que importem em limitação da

capacidade de aprendizagem. Tal dilatação poderá ser igualmente concedida em

casos de força maior, devidamente comprovados, a juízo da instituição.

Art. 2º . Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação

Resolução CNE/CEB Nº 2/01 - Diretrizes Nacionais para a Educação Especial n

Educação Básica

275

ANEXO Y - RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 2, DE 11 DE FEVEREIRO

DE 2001.(*)

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA

Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Educação, de conformidade com o disposto no Art. 9o, § 1o, alínea “c”, da Lei

4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de

novembro de 1995, nos Capítulos I, II e III do Título V e nos Artigos 58 a 60 da Lei

9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com fundamento no Parecer CNE/CEB

17/2001, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação em 15 de agosto

de 2001, RESOLVE:

Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Nacionais para a educação

de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, na Educação

Básica, em todas as suas etapas e modalidades.

Parágrafo único. O atendimento escolar desses alunos terá início na

educação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de

educação especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a

família e a comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado..

Art. 2º Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às

escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades

educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação

de qualidade para todos.

276

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem conhecer a demanda real de

atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais, mediante a criação

de sistemas de informação e o estabelecimento de interface com os órgãos

governamentais responsáveis pelo Censo Escolar e pelo Censo Demográfico, para

atender a todas as variáveis implícitas à qualidade do processo formativo desses

alunos.

Art. 3º Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se

um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure

recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para

apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços

educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o

desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades

educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica.

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar u

setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos, materiais e

financeiros que viabilizem e dêem sustentação ao processo de construção da

educação inclusiva.

Art. 4º Como modalidade da Educação Básica, a educação especial

considerará as situações singulares, os perfis dos estudantes, as características

biopsicossociais dos alunos e suas faixas etárias e se pautará em princípios éticos,

políticos e estéticos de modo a assegurar:

I - a dignidade humana e a observância do direito de cada aluno de realizar

seus projetos de estudo, de trabalho e de inserção na vida social;

II - a busca da identidade própria de cada educando, o reconhecimento e a

valorização das suas diferenças e potencialidades, bem como de suas necessidades

277

educacionais especiais no processo de ensino e aprendizagem, como base para a

constituição e ampliação de valores, atitudes, conhecimentos, habilidades e

competências;

III - o desenvolvimento para o exercício da cidadania, da capacidade de

participação social, política e econômica e sua ampliação, mediante o cumprimento

de seus deveres e o usufruto de seus direitos.

Art. 5º Consideram-se educandos com necessidades educacionais especiais

os que, durante o processo educacional, apresentarem:.

I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de

desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares,

compreendidas em dois grupos:

a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica;

b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;

II - dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais

alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis;

III - altas habilidades/superdotação, grande facilidade de aprendizagem que

os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes.

Art. 6o Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos

alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve

realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e

aprendizagem, contando, para tal, com:

I - a experiência de seu corpo docente, seus diretores, coordenadores,

orientadores e supervisores educacionais;

II - o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema;

278

III - a colaboração da família e a cooperação dos serviços de Saúde,

Assistência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público,

quando necessário.

Art. 7º O atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais

deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou

modalidade da Educação Básica.

Art. 8o As escolas da rede regular de ensino devem prever e prover na

organização de suas classes comuns:

I - professores das classes comuns e da educação especial capacitados e

especializados, respectivamente, para o atendimento às necessidades educacionais

dos alunos;

II - distribuição dos alunos com necessidades educacionais especiais pelas

várias classes do ano escolar em que forem classificados, de modo que essas

classes comuns se beneficiem das diferenças e ampliem positivamente as

experiências de todos os alunos, dentro do princípio de educar para a diversidade;

III - flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado

prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos

didáticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento

dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância

com o projeto pedagógico da escola, respeitada a freqüência obrigatória;

IV - serviços de apoio pedagógico especializado, realizado, nas classes

comuns, mediante:

a) atuação colaborativa de professor especializado em educação especial;

b) atuação de professores-intérpretes das linguagens e códigos aplicáveis;

279

c) atuação de professores e outros profissionais itinerantes intra e

interinstitucionalmente;

d) disponibilização de outros apoios necessários à aprendizagem, à

locomoção e à comunicação.

V - serviços de apoio pedagógico especializado em salas de recursos, nas

quais o professor especializado em educação especial realize a complementação ou

suplementação curricular, utilizando procedimentos, equipamentos e materiais

específicos;

VI - condições para reflexão e elaboração teórica da educação inclusiva, com

protagonismo dos professores, articulando experiência e conhecimento com as

necessidades/possibilidades surgidas na relação pedagógica, inclusive por meio de

colaboração com instituições de ensino superior e de pesquisa;

VII - sustentabilidade do processo inclusivo, mediante aprendizagem

cooperativa em sala de aula, trabalho de equipe na escola e constituição de redes

de apoio, com a participação da família no processo educativo, bem como de outros

agentes e recursos da comunidade;

VIII - temporalidade flexível do ano letivo, para atender às necessidades

educacionais especiais de alunos com deficiência mental ou com graves deficiências

múltiplas, de forma que possam concluir em tempo maior o currículo previsto para a

série/etapa escolar, principalmente nos anos finais do ensino fundamental, conforme

estabelecido por normas dos sistemas de ensino procurando-se evitar grande

defasagem idade/série;

IX - atividades que favoreçam, ao aluno que apresente altas

habilidades/superdotação, o aprofundamento e enriquecimento de aspectos

curriculares, mediante desafios suplementares nas classes comuns, em sala de

280

recursos ou em outros espaços definidos pelos sistemas de ensino, inclusive para

conclusão, em menor tempo, da série ou etapa escolar, nos termos do Artigo 24, V,

“c”, da Lei 9.394/96.

Art. 9o As escolas podem criar, extraordinariamente, classes especiais, cuja

organização fundamente-se no Capítulo II da LDBEN, nas diretrizes curriculares

nacionais para a Educação Básica, bem como nos referenciais e parâmetros

curriculares nacionais, para atendimento, em caráter transitório, a alunos que

apresentem dificuldades acentuadas de aprendizagem ou condições de

comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos e demandem ajudas e

apoios intensos e contínuos.

§ 1o Nas classes especiais, o professor deve desenvolver o currículo,

mediante adaptações, e, quando necessário, atividades da vida autônoma e social

no turno inverso.

§ 2o A partir do desenvolvimento apresentado pelo aluno e das condições

para o atendimento inclusivo, a equipe pedagógica da escola e a família devem

decidir conjuntamente, com base em avaliação pedagógica, quanto ao seu retorno à

classe comum.

Art. 10. Os alunos que apresentem necessidades educacionais especiais e

requeiram atenção individualizada nas atividades da vida autônoma e social,

recursos, ajudas e apoios intensos e contínuos, bem como adaptações curriculares

tão significativas que a escola comum não consiga prover, podem ser atendidos, em

caráter extraordinário, em escolas especiais, públicas ou privadas, atendimento esse

complementado, sempre que necessário e de maneira articulada, por serviços das

áreas de Saúde, Trabalho e Assistência Social.

281

§ 1º As escolas especiais, públicas e privadas, devem cumprir as exigências

legais similares às de qualquer escola quanto ao seu processo de credenciamento e

autorização de funcionamento de cursos e posterior reconhecimento. § 2º Nas

escolas especiais, os currículos devem ajustar-se às condições do educando e ao

disposto no Capítulo II da LDBEN.

§ 3o A partir do desenvolvimento apresentado pelo aluno, a equipe

pedagógica da escola especial e a família devem decidir conjuntamente quanto à

transferência do aluno para escola da rede regular de ensino, com base em

avaliação pedagógica e na indicação, por parte do setor responsável pela educação

especial do sistema de ensino, de escolas regulares em condição de realizar seu

atendimento educacional.

Art. 11. Recomenda-se às escolas e aos sistemas de ensino a constituição de

parcerias com instituições de ensino superior para a realização de pesquisas e

estudos de caso relativos ao processo de ensino e aprendizagem de alunos com

necessidades educacionais especiais, visando ao aperfeiçoamento desse processo

educativo.

Art. 12. Os sistemas de ensino, nos termos da Lei 10.098/2000 e da Lei

10.172/2001, devem assegurar a acessibilidade aos alunos que apresentem

necessidades educacionais especiais, mediante a eliminação de barreiras

arquitetônicas urbanísticas, na edificação - incluindo instalações, equipamentos e

mobiliário - e nos transportes escolares, bem como de barreiras nas comunicações,

provendo as escolas dos recursos humanos e materiais necessários.

§ 1o Para atender aos padrões mínimos estabelecidos com respeito à

acessibilidade, deve ser realizada a adaptação das escolas existentes e

282

condicionada a autorização de construção e funcionamento de novas escolas ao

preenchimento dos requisitos de infra-estrutura definidos.

§ 2o Deve ser assegurada, no processo educativo de alunos que apresentam

dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais educandos, a

acessibilidade aos conteúdos curriculares, mediante a utilização de linguagens e

códigos aplicáveis, como o sistema Braille e a língua de sinais, sem prejuízo do

aprendizado da língua portuguesa, facultando-lhes e às suas famílias a opção pela

abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais

especializados em cada caso.

Art. 13. Os sistemas de ensino, mediante ação integrada com os sistemas de

saúde, devem organizar o atendimento educacional especializado a alunos

impossibilitados de freqüentar as aulas em razão de tratamento de saúde que

implique internação hospitalar, atendimento ambulatorial ou permanência

prolongada em domicílio.

§ 1o As classes hospitalares e o atendimento em ambiente domiciliar devem

dar continuidade ao processo de desenvolvimento e ao processo de aprendizagem

de alunos matriculados em escolas da Educação Básica, contribuindo para seu

retorno e reintegração ao grupo escolar, e desenvolver currículo flexibilizado com

crianças, jovens e adultos não matriculados no sistema educacional local, facilitando

seu posterior acesso à escola regular.

§ 2o Nos casos de que trata este Artigo, a certificação de freqüência deve ser

realizada com base no relatório elaborado pelo professor especializado que atende o

aluno.

Art. 14. Os sistemas públicos de ensino serão responsáveis pela identificação,

análise, avaliação da qualidade e da idoneidade, bem como pelo credenciamento de

283

escolas ou serviços, públicos ou privados, com os quais estabelecerão convênios

ou parcerias para garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais de

seus alunos, observados os princípios da educação inclusiva.

Art. 15. A organização e a operacionalização dos currículos escolares são de

competência e responsabilidade dos estabelecimentos de ensino, devendo constar

de seus projetos pedagógicos as disposições necessárias para o atendimento às

necessidades educacionais especiais de alunos, respeitadas, além das diretrizes

curriculares nacionais de todas as etapas e modalidades da Educação Básica, as

normas dos respectivos sistemas de ensino.

Art. 16. É facultado às instituições de ensino, esgotadas as possibilidades

pontuadas nos Artigos 24 e 26 da LDBEN, viabilizar ao aluno com grave deficiência

mental ou múltipla, que não apresentar resultados de escolarização previstos no

Inciso I do Artigo 32 da mesma Lei, terminalidade específica do ensino fundamental,

por meio da certificação de conclusão de escolaridade, com histórico escolar que

apresente, de forma descritiva, as competências desenvolvidas pelo educando, bem

como o encaminhamento devido para a educação de jovens e adultos e para a

educação profissional.

Art. 17. Em consonância com os princípios da educação inclusiva, as escolas

das redes regulares de educação profissional, públicas e privadas, devem atender

alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, mediante a promoção

das condições de acessibilidade, a capacitação de recursos humanos, a

flexibilização e adaptação do currículo e o encaminhamento para o trabalho,

contando, para tal, com a colaboração do setor responsável pela educação especial

do respectivo sistema de ensino.

284

§ 1o As escolas de educação profissional podem realizar parcerias com

escolas especiais, públicas ou privadas, tanto para construir competências

necessárias à inclusão de alunos em seus cursos quanto para prestar assistência

técnica e convalidar cursos profissionalizantes realizados por essas escolas

especiais.

§ 2o As escolas das redes de educação profissional podem avaliar e certificar

competências laborais de pessoas com necessidades especiais não matriculadas

em seus cursos, encaminhando-as, a partir desses procedimentos, para o mundo do

trabalho.

Art. 18. Cabe aos sistemas de ensino estabelecer normas para o

funcionamento de suas escolas, a fim de que essas tenham as suficientes condições

para elaborar seu projeto pedagógico e possam contar com professores capacitados

e especializados, conforme previsto no Artigo 59 da LDBEN e com base nas

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Docentes da Educação Infantil

e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em nível médio, na modalidade Normal,

e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da

Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura de graduação plena.

§ 1º São considerados professores capacitados para atuar em classes

comuns com alunos que apresentam necessidades educacionais especiais aqueles

que comprovem que, em sua formação, de nível médio ou superior, foram incluídos

conteúdos sobre educação especial adequados ao desenvolvimento de

competências e valores para:

I - perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos e valorizar a

educação inclusiva;

285

II - flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento de

modo adequado às necessidades especiais de aprendizagem;

III - avaliar continuamente a eficácia do processo educativo para o

atendimento de necessidades educacionais especiais;

IV - atuar em equipe, inclusive com professores especializados em educação

especial.

§ 2º São considerados professores especializados em educação especial

aqueles que desenvolveram competências para identificar as necessidades

educacionais especiais para definir, implementar, liderar e apoiar a implementação

de estratégias de flexibilização, adaptação curricular, procedimentos didáticos

pedagógicos e práticas alternativas, adequados ao atendimentos das mesmas, bem

como trabalhar em equipe, assistindo o professor de classe comum nas práticas que

são necessárias para promover a inclusão dos alunos com necessidades

educacionais especiais.

§ 3º Os professores especializados em educação especial deverão

comprovar:

I - formação em cursos de licenciatura em educação especial ou em uma de

suas áreas, preferencialmente de modo concomitante e associado à licenciatura

para educação infantil ou para os anos iniciais do ensino fundamental;

II - complementação de estudos ou pós-graduação em áreas específicas da

educação especial, posterior à licenciatura nas diferentes áreas de conhecimento,

para atuação nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio;.

§ 4º Aos professores que já estão exercendo o magistério devem ser

oferecidas oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de

286

especialização, pelas instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios.

Art. 19. As diretrizes curriculares nacionais de todas as etapas e modalidades

da Educação Básica estendem-se para a educação especial, assim como estas

Diretrizes Nacionais para a Educação Especial estendem-se para todas as etapas e

modalidades da Educação Básica.

Art. 20. No processo de implantação destas Diretrizes pelos sistemas de

ensino, caberá às instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal

e dos Municípios, em regime de colaboração, o estabelecimento de referenciais,

normas complementares e políticas educacionais.

Art. 21. A implementação das presentes Diretrizes Nacionais para a Educação

Especial na Educação Básica será obrigatória a partir de 2002, sendo facultativa no

período de transição compreendido entre a publicação desta Resolução e o dia 31

de dezembro de 2001.

Art. 22. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação e revoga as

disposições em contrário.

287

ANEXO Z - RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, DE 18 DE FEVEREIRO

DE 2002.

DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A FORMAÇÃO DE

PROFESSORES

RESOLUÇÃO CNE/CP Nº 1, de 18 de Fevereiro de 2002

Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da

Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena.

O Presidente do Conselho Nacional de Educação,no uso de suas

atribuições legais e tendo em vista o disposto no Art. 9º, § 2º, alínea “c” da Lei 4.024,

de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de

novembro de 1995,e com fundamento nos Pareceres CNE/CP 9/2001 e 27/2001,

peças indispensáveis do conjunto das presentes Diretrizes Curriculares Nacionais,

homologados pelo Senhor Ministro da Educação em 17 de janeiro de 2002, resolve :

Art. 1º As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores

da Educação Básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação

plena, constituem-se de um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos a

serem observados na organização institucional e curricular de cada estabelecimento

de ensino e aplicam-se a todas as etapas e modalidades da educação básica.

Art. 2º A organização curricular de cada instituição observará, além do

disposto nos artigos 12 e 13 da Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, outras

formas de orientação inerentes à formação para a atividade docente, entre as quais

o preparo para:

I - o ensino visando à aprendizagem do aluno;

II - o acolhimento e o trato da diversidade;

288

III - o exercício de atividades de enriquecimento cultural;

IV - o aprimoramento em práticas investigativas;

V - a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos conteúdos

curriculares;

VI - o uso de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias,

estratégias e materiais de apoio inovadores;

VII - o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe.

Art. 3º A formação de professores que atuarão nas diferentes etapas e

modalidades da educação básica observará princípios norteadores desse preparo

para o exercício profissional específico, que considerem:

I - a competência como concepção nuclear na orientação do curso;

II - a coerência entre a formação oferecida e a prática esperada do futuro

professor, tendo em vista:

a) a simetria invertida, onde o preparo do professor, por ocorrer em lugar

similar àquele em que vai atuar, demanda consistência entre o que faz na formação

e o que dele se espera;

b) a aprendizagem como processo de construção de conhecimentos,

habilidades e valores em interação com a realidade e com os demais indivíduos, no

qual são colocadas em uso capacidades pessoais;

c) os conteúdos, como meio e suporte para a constituição das competências;

d) a avaliação como parte integrante do processo de formação, que possibilita

o diagnóstico de lacunas e a aferição dos resultados alcançados, consideradas as

competências a serem constituídas e a identificação das mudanças de percurso

eventualmente necessárias.

289

III - a pesquisa, com foco no processo de ensino e de aprendizagem, uma vez

que ensinar requer, tanto dispor de conhecimentos e mobilizá- los para a ação, como

compreender o processo de construção do conhecimento.

Art. 4º Na concepção, no desenvolvimento e na abrangência dos cursos de

formação é fundamental que se busque:

I - considerar o conjunto das competências necessárias à atuação

profissional;

II - adotar essas competências como norteadoras, tanto da proposta

pedagógica, em especial do currículo e da avaliação, quanto da organização

institucional e da gestão da escola de formação.

Art. 5º O projeto pedagógico de cada curso, considerado o artigo anterior,

levará em conta que:

I - a formação deverá garantir a constituição das competências objetivadas na

educação básica;

II - o desenvolvimento das competências exige que a formação contemple

diferentes âmbitos do conhecimento profissional do professor;

III - a seleção dos conteúdos das áreas de ensino da educação básica deve

orientar-se por ir além daquilo que os professores irão ensinar nas diferentes etapas

da escolaridade;

IV - os conteúdos a serem ensinados na escolaridade básica devem ser

tratados de modo articulado com suas didáticas específicas;

V - a avaliação deve ter como finalidade a orientação do trabalho dos

formadores, a autonomia dos futuros professores em relação ao seu processo de

aprendizagem e a qualificação dos profissionais com condições de iniciar a carreira.

290

Parágrafo único. A aprendizagem deverá ser orientada pelo princípio

metodológico geral, que pode ser traduzido pela ação-reflexão-ação e que aponta a

resolução de situações-problema como uma das estratégias didáticas privilegiadas.

Art. 6º Na construção do projeto pedagógico dos cursos de formação dos

docentes, serão consideradas:

I - as competências referentes ao comprometimento com os valores

inspiradores da sociedade democrática;

II - as competências referentes à compreensão do papel social da escola;

III - as competências referentes ao domínio dos conteúdos a serem

socializados, aos seus significados em diferentes contextos e sua articulação

interdisciplinar;

IV - as competências referentes ao domínio do conhecimento pedagógico;

V - as competências referentes ao conhecimento de processos de

investigação que possibilitem o aperfeiçoamento da prática pedagógica;

VI - as competências referentes ao gerenciamento do próprio

desenvolvimento profissional.

§ 1º O conjunto das competências enumeradas neste artigo não esgota tudo

que uma escola de formação possa oferecer aos seus alunos, mas pontua

demandas importantes oriundas da análise da atuação profissional e assenta-se na

legislação vigente e nas diretrizes curriculares nacionais para a educação básica.

§ 2º As referidas competências deverão ser contextualizadas e

complementadas pelas competências específicas próprias de cada etapa e

modalidade da educação básica e de cada área do conhecimento a ser contemplada

na formação.

291

§ 3º A definição dos conhecimentos exigidos para a constituição de

competências deverá, além da formação específica relacionada às diferentes etapas

da educação básica, propiciar a inserção no debate contemporâneo mais amplo,

envolvendo questões culturais, sociais, econômicas e o conhecimento sobre o

desenvolvimento humano e a própria docência, contemplando:

I - cultura geral e profissional;

II - conhecimentos sobre crianças, adolescentes, jovens e adultos, aí incluídas

as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais e as das

comunidades indígenas;

III - conhecimento sobre dimensão cultural, social, política e econômica da

educação; IV - conteúdos das áreas de conhecimento que serão objeto de ensino;

V - conhecimento pedagógico;

VI - conhecimento advindo da experiência.

Art. 7º A organização institucional da formação dos professores, a serviço do

desenvolvimento de competências, levará em conta que:

I - a formação deverá ser realizada em processo autônomo, em curso de

licenciatura plena, numa estrutura com identidade própria;

II - será mantida, quando couber, estreita articulação com institutos,

departamentos e cursos de áreas específicas;

III - as instituições constituirão direção e colegiados próprios, que formulem

seus próprios projetos pedagógicos, articulem as unidades acadêmicas envolvidas e,

a partir do projeto, tomem as decisões sobre organização institucional e sobre as

questões administrativas no âmbito de suas competências;

IV - as instituições de formação trabalharão em interação sistemática com as

escolas de educação básica, desenvolvendo projetos de formação compartilhados;

292

V - a organização institucional preverá a formação dos formadores, incluindo

na sua jornada de trabalho tempo e espaço para as atividades coletivas dos

docentes do curso, estudos e investigações sobre as questões referentes ao

aprendizado dos professores em formação;

VI - as escolas de formação garantirão, com qualidade e quantidade, recursos

pedagógicos como biblioteca, laboratórios, videoteca, entre outros, além de recursos

de tecnologias da informação e da comunicação;

VII - serão adotadas iniciativas que garantam parcerias para a promoção de

atividades culturais destinadas aos formadores e futuros professores;

VIII - nas instituições de ensino superior não detentoras de autonomia

universitária serão criados Institutos Superiores de Educação, para congregar os

cursos de formação de professores que ofereçam licenciaturas em curso Normal

Superior para docência multidisciplinar na educação infantil e anos iniciais do ensino

fundamental ou licenciaturas para docência nas etapas subseqüentes da educação

básica. Art. 8º As competências profissionais a serem constituídas pelos professores

em formação, de acordo com as presentes Diretrizes, devem ser a referência para

todas as formas de avaliação dos cursos, sendo estas:

I - periódicas e sistemáticas, com procedimentos e processos diversificados,

incluindo conteúdos trabalhados, modelo de organização, desempenho do quadro

de formadores e qualidade da vinculação com escolas de educação infantil, ensino

fundamental e ensino médio, conforme o caso;

II - feitas por procedimentos internos e externos, que permitam a identificação

das diferentes dimensões daquilo que for avaliado;

III - incidentes sobre processos e resultados.

293

Art. 9º A autorização de funcionamento e o reconhecimento de cursos de

formação e o credenciamento da instituição decorrerão de avaliação externa

realizada no locus institucional, por corpo de especialistas direta ou indiretamente

ligados à formação ou ao exercício profissional de professores para a educação

básica, tomando como referência as competências profissionais de que trata esta

Resolução e as normas aplicáveis à matéria.

Art. 10. A seleção e o ordenamento dos conteúdos dos diferentes âmbitos de

conhecimento que comporão a matriz curricular para a formação de professores, de

que trata esta Resolução, serão de competência da instituição de ensino, sendo o

seu planejamento o primeiro passo para a transposição didática, que visa a

transformar os conteúdos selecionados em objeto de ensino dos futuros professores.

Art. 11. Os critérios de organização da matriz curricular, bem como a alocação

de tempos e espaços curriculares se expressam em eixos em torno dos quais se

articulam dimensões a serem contempladas, na forma a seguir indicada:

I - eixo articulador dos diferentes âmbitos de conhecimento profissional;

II - eixo articulador da interação e da comunicação, bem como do

desenvolvimento da autonomia intelectual e profissional;

III - eixo articulador entre disciplinaridade e interdisciplinaridade;

IV - eixo articulador da formação comum com a formação específica;

V - eixo articulador dos conhecimentos a serem ensinados e dos

conhecimentos filosóficos, educacionais e pedagógicos que fundamentam a ação

educativa;

VI - eixo articulador das dimensões teóricas e práticas.

Parágrafo único. Nas licenciaturas em educação infantil e anos iniciais do

ensino fundamental deverão preponderar os tempos dedicados à constituição de

294

conhecimento sobre os objetos de ensino e nas demais licenciaturas o tempo

dedicado às dimensões pedagógicas não será inferior à quinta parte da carga

horária total.

Art. 12. Os cursos de formação de professores em nível superior terão a sua

duração definida pelo Conselho Pleno, em parecer e resolução específica sobre sua

carga horária.

§ 1º A prática, na matriz curricular, não poderá ficar reduzida a um espaço

isolado, que a restrinja ao estágio, desarticulado do restante do curso.

§ 2º A prática deverá estar presente desde o início do curso e permear toda a

formação do professor.

§ 3º No interior das áreas ou das disciplinas que constituírem os componentes

curriculares de formação, e não apenas nas disciplinas pedagógicas, todas terão a

sua dimensão prática.

Art. 13. Em tempo e espaço curricular específico, a coordenação da dimensão

prática transcenderá o estágio e terá como finalidade promover a articulação das

diferentes práticas, numa perspectiva interdisciplinar.

§ 1º A prática será desenvolvida com ênfase nos procedimentos de

observação e reflexão, visando à atuação em situações contextualizadas, com o

registro dessas observações realizadas e a resolução de situações-problema.

§ 2º A presença da prática profissional na formação do professor, que não

prescinde da observação e ação direta, poderá ser enriquecida com tecnologias da

informação, incluídos o computador e o vídeo, narrativas orais e escritas de

professores, produções de alunos, situações simuladoras e estudo de casos.

§ 3º O estágio curricular supervisionado, definido por lei, a ser realizado em

escola de educação básica, e respeitado o regime de colaboração entre os sistemas

295

de ensino, deve ser desenvolvido a partir do início da segunda metade do curso e

ser avaliado conjuntamente pela escola formadora e a escola campo de estágio.

Art. 14. Nestas Diretrizes, é enfatizada a flexibilidade necessária, de modo

que cada instituição formadora construa projetos inovadores e próprios, integrando

os eixos articuladores nelas mencionados.

§ 1º A flexibilidade abrangerá as dimensões teóricas e práticas, de

interdisciplinaridade, dos conhecimentos a serem ensinados, dos que fundamentam

a ação pedagógica, da formação comum e específica, bem como dos diferentes

âmbitos do conhecimento e da autonomia intelectual e profissional.

§ 2º Na definição da estrutura institucional e curricular do curso, caberá a

concepção de um sistema de oferta de formação continuada, que propicie

oportunidade de retorno planejado e sistemático dos professores às agências

formadoras.

Art. 15. Os cursos de formação de professores para a educação básica que

se encontrarem em funcionamento deverão se adaptar a esta Resolução, no prazo

de dois anos.

§ 1º Nenhum novo curso será autorizado, a partir da vigência destas normas,

sem que o seu projeto seja organizado nos termos das mesmas.

§ 2º Os projetos em tramitação deverão ser restituídos aos requerentes para a

devida adequação.

Art. 16. O Ministério da Educação, em conformidade com § 1º Art. 8o da Lei

9.394, coordenará e articulará em regime de colaboração com o Conselho Nacional

de Educação, o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação, o Fórum

Nacional de Conselhos Estaduais de Educação, a União Nacional dos Dirigentes

Municipais de Educação e representantes de Conselhos Municipais de Educação e

296

das associações profissionais e científicas, a formulação de proposta de diretrizes

para a organização de um sistema federativo de certificação de competência dos

professores de educação básica.

Art. 17. As dúvidas eventualmente surgidas, quanto a estas disposições,

serão dirimidas pelo Conselho Nacional de Educação, nos termos do Art. 90 da Lei

9.394.

Art. 18. O parecer e a resolução referentes à carga horária, previstos no

Artigo 12 desta resolução, serão elaborados por comissão bicameral, a qual terá

cinqüenta dias de prazo para submeter suas propostas ao Conselho Pleno.

Art. 19. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas

as disposições em contrário.

297

ANEXO AA - RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 2, DE 11 DE

FEVEREIRO DE 2001.

INSTITUI A DURAÇÃO E A CARGA HORÁRIA DE CURSOS

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA

Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Educação, de conformidade com o disposto no Art. 9o, § 1o, alínea “c”, da Lei

4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei 9.131, de 25 de

novembro de 1995, nos Capítulos I, II e III do Título V e nos Artigos 58 a 60 da Lei

9.394, de 20 de dezembro de 1996, e com fundamento no Parecer CNE/CEB

17/2001, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação em 15 de agosto

de 2001, RESOLVE:

Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Nacionais para a educação

de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, na Educação

Básica, em todas as suas etapas e modalidades.

Parágrafo único. O atendimento escolar desses alunos terá início na

educação infantil, nas creches e pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de

educação especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a

família e a comunidade, a necessidade de atendimento educacional especializado..

Art. 2º Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às

escolas organizar-se para o atendimento aos educandos com necessidades

educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação

de qualidade para todos..

298

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem conhecer a demanda real de

atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais, mediante a criação

de sistemas de informação e o estabelecimento de interface com os órgãos

governamentais responsáveis pelo Censo Escolar e pelo Censo Demográfico, para

atender a todas as variáveis implícitas à qualidade do processo formativo desses

alunos..

Art. 3º Por educação especial, modalidade da educação escolar, entende-se

um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure

recursos e serviços educacionais especiais, organizados institucionalmente para

apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços

educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o

desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades

educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica..

Parágrafo único. Os sistemas de ensino devem constituir e fazer funcionar

um setor responsável pela educação especial, dotado de recursos humanos,

materiais e financeiros que viabilizem e dêem sustentação ao processo de

construção da educação inclusiva..

Art. 4º Como modalidade da Educação Básica, a educação especial

considerará as situações singulares, os perfis dos estudantes, as características

biopsicossociais dos alunos e suas faixas etárias e se pautará em princípios éticos,

políticos e estéticos de modo a assegurar:

I - a dignidade humana e a observância do direito de cada aluno de realizar

seus projetos de estudo, de trabalho e de inserção na vida social;

II - a busca da identidade própria de cada educando, o reconhecimento e a

valorização das suas diferenças e potencialidades, bem como de suas necessidades

299

educacionais especiais no processo de ensino e aprendizagem, como base para a

constituição e ampliação de valores, atitudes, conhecimentos, habilidades e

competências;

III - o desenvolvimento para o exercício da cidadania, da capacidade de

participação social, política e econômica e sua ampliação, mediante o cumprimento

de seus deveres e o usufruto de seus direitos.

Art. 5º Consideram-se educandos com necessidades educacionais especiais

os que, durante o processo educacional, apresentarem:

I - dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de

desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares,

compreendidas em dois grupos:

a) aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica;

b) aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;

II - dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais

alunos, demandando a utilização de linguagens e códigos aplicáveis;

III - altas habilidades/superdotação, grande facilidade de aprendizagem que

os leve a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes. .

Art. 6o Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos

alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve

realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e

aprendizagem, contando, para tal, com:

I - a experiência de seu corpo docente, seus diretores, coordenadores,

orientadores e supervisores educacionais;.

II - o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema;.

300

III - a colaboração da família e a cooperação dos serviços de Saúde,

Assistência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público,

quando necessário.

Art. 7º O atendimento aos alunos com necessidades educacionais especiais

deve ser realizado em classes comuns do ensino regular, em qualquer etapa ou

modalidade da Educação Básica.

Art. 8o As escolas da rede regular de ensino devem prever e prover na

organização de suas classes comuns:

I - professores das classes comuns e da educação especial capacitados e

especializados, respectivamente, para o atendimento às necessidades educacionais

dos alunos;

II - distribuição dos alunos com necessidades educacionais especiais pelas

várias classes do ano escolar em que forem classificados, de modo que essas

classes comuns se beneficiem das diferenças e ampliem positivamente as

experiências de todos os alunos, dentro do princípio de educar para a diversidade;.

III - flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado

prático e instrumental dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos

didáticos diferenciados e processos de avaliação adequados ao desenvolvimento

dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em consonância

com o projeto pedagógico da escola, respeitada a freqüência obrigatória;

IV - serviços de apoio pedagógico especializado, realizado, nas classes

comuns, mediante:

a) atuação colaborativa de professor especializado em educação especial;

b) atuação de professores-intérpretes das linguagens e códigos aplicáveis;

301

c) atuação de professores e outros profissionais itinerantes intra e

interinstitucionalmente;

d) disponibilização de outros apoios necessários à aprendizagem, à

locomoção e à comunicação.

V - serviços de apoio pedagógico especializado em salas de recursos, nas

quais o professor especializado em educação especial realize a complementação ou

suplementação curricular, utilizando procedimentos, equipamentos e materiais

específicos;

VI - condições para reflexão e elaboração teórica da educação inclusiva, com

protagonismo dos professores, articulando experiência e conhecimento com as

necessidades/possibilidades surgidas na relação pedagógica, inclusive por meio de

colaboração com instituições de ensino superior e de pesquisa;

VII - sustentabilidade do processo inclusivo, mediante aprendizagem

cooperativa em sala de aula, trabalho de equipe na escola e constituição de redes

de apoio, com a participação da família no processo educativo, bem como de outros

agentes e recursos da comunidade;

VIII - temporalidade flexível do ano letivo, para atender às necessidades

educacionais especiais de alunos com deficiência mental ou com graves deficiências

múltiplas, de forma que possam concluir em tempo maior o currículo previsto para a

série/etapa escolar, principalmente nos anos finais do ensino fundamental, conforme

estabelecido por normas dos sistemas de ensino, procurando-se evitar grande

defasagem idade/série;

IX - atividades que favoreçam, ao aluno que apresente altas

habilidades/superdotação, o aprofundamento e enriquecimento de aspectos

curriculares, mediante desafios suplementares nas classes comuns, em sala de

302

recursos ou em outros espaços definidos pelos sistemas de ensino, inclusive para

conclusão, em menor tempo, da série ou etapa escolar, nos termos do Artigo 24, V,

“c”, da Lei 9.394/96.

Art. 9o As escolas podem criar, extraordinariamente, classes especiais, cuja

organização fundamente-se no Capítulo II da LDBEN, nas diretrizes curriculares

nacionais para a Educação Básica, bem como nos referenciais e parâmetros

curriculares nacionais, para atendimento, em caráter transitório, a alunos que

apresentem dificuldades acentuadas de aprendizagem ou condições de

comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos e demandem ajudas e

apoios intensos e contínuos.

§ 1o Nas classes especiais, o professor deve desenvolver o currículo,

mediante adaptações, e, quando necessário, atividades da vida autônoma e social

no turno inverso.

§ 2o A partir do desenvolvimento apresentado pelo aluno e das condições

para o atendimento inclusivo, a equipe pedagógica da escola e a família devem

decidir conjuntamente, com base em avaliação pedagógica, quanto ao seu retorno à

classe comum.

Art. 10. Os alunos que apresentem necessidades educacionais especiais e

requeiram atenção individualizada nas atividades da vida autônoma e social,

recursos, ajudas e apoios intensos e contínuos, bem como adaptações curriculares

tão significativas que a escola comum não consiga prover, podem ser atendidos, em

caráter extraordinário, em escolas especiais, públicas ou privadas, atendimento esse

complementado, sempre que necessário e de maneira articulada, por serviços das

áreas de Saúde, Trabalho e Assistência Social.

303

§ 1º As escolas especiais, públicas e privadas, devem cumprir as exigências

legais similares às de qualquer escola quanto ao seu processo de credenciamento e

autorização de funcionamento de cursos e posterior reconhecimento.

§ 2º Nas escolas especiais, os currículos devem ajustar-se às condições do

educando e ao disposto no Capítulo II da LDBEN.

§ 3o A partir do desenvolvimento apresentado pelo aluno, a equipe

pedagógica da escola especial e a família devem decidir conjuntamente quanto à

transferência do aluno para escola da rede regular de ensino, com base em

avaliação pedagógica e na indicação, por parte do setor responsável pela educação

especial do sistema de ensino, de escolas regulares em condição de realizar seu

atendimento educacional.

Art. 11. Recomenda-se às escolas e aos sistemas de ensino a constituição de

parcerias com instituições de ensino superior para a realização de pesquisas e

estudos de caso relativos ao processo de ensino e aprendizagem de alunos com

necessidades educacionais especiais, visando ao aperfeiçoamento desse processo

educativo.

Art. 12. Os sistemas de ensino, nos termos da Lei 10.098/2000 e da Lei

10.172/2001, devem assegurar a acessibilidade aos alunos que apresentem

necessidades educacionais especiais, mediante a eliminação de barreiras

arquitetônicas urbanísticas, na edificação - incluindo instalações, equipamentos e

mobiliário - e nos transportes escolares, bem como de barreiras nas comunicações,

provendo as escolas dos recursos humanos e materiais necessários.

§ 1o Para atender aos padrões mínimos estabelecidos com respeito à

acessibilidade, deve ser realizada a adaptação das escolas existentes e

304

condicionada a autorização de construção e funcionamento de novas escolas ao

preenchimento dos requisitos de infra-estrutura definidos.

§ 2o Deve ser assegurada, no processo educativo de alunos que apresentam

dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais educandos, a

acessibilidade aos conteúdos curriculares, mediante a utilização de linguagens e

códigos aplicáveis, como o sistema Braille e a língua de sinais, sem prejuízo do

aprendizado da língua portuguesa, facultando-lhes e às suas famílias a opção pela

abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais

especializados em cada caso.

Art. 13. Os sistemas de ensino, mediante ação integrada com os sistemas de

saúde, devem organizar o atendimento educacional especializado a alunos

impossibilitados de freqüentar as aulas em razão de tratamento de saúde que

implique internação hospitalar, atendimento ambulatorial ou permanência

prolongada em domicílio.

§ 1o As classes hospitalares e o atendimento em ambiente domiciliar devem

dar continuidade ao processo de desenvolvimento e ao processo de aprendizagem

de alunos matriculados em escolas da Educação Básica, contribuindo para seu

retorno e reintegração ao grupo escolar, e desenvolver currículo flexibilizado com

crianças, jovens e adultos não matriculados no sistema educacional local, facilitando

seu posterior acesso à escola regular.

§ 2o Nos casos de que trata este Artigo, a certificação de freqüência deve ser

realizada com base no relatório elaborado pelo professor especializado que atende o

aluno.

Art. 14. Os sistemas públicos de ensino serão responsáveis pela identificação,

análise, avaliação da qualidade e da idoneidade, bem como pelo credenciamento de

305

escolas ou serviços, públicos ou privados, com os quais estabelecerão convênios ou

parcerias para garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais de

seus alunos, observados os princípios da educação inclusiva.

Art. 15. A organização e a operacionalização dos currículos escolares são de

competência e responsabilidade dos estabelecimentos de ensino, devendo constar

de seus projetos pedagógicos as disposições necessárias para o atendimento às

necessidades educacionais especiais de alunos, respeitadas, além das diretrizes

curriculares nacionais de todas as etapas e modalidades da Educação Básica, as

normas dos respectivos sistemas de ensino.

Art. 16. É facultado às instituições de ensino, esgotadas as possibilidades

pontuadas nos Artigos 24 e 26 da LDBEN, viabilizar ao aluno com grave deficiência

mental ou múltipla, que não apresentar resultados de escolarização previstos no

Inciso I do Artigo 32 da mesma Lei, terminalidade específica do ensino fundamental,

por meio da certificação de conclusão de escolaridade, com histórico escolar que

apresente, de forma descritiva, as competências desenvolvidas pelo educando, bem

como o encaminhamento devido para a educação de jovens e adultos e para a

educação profissional.

Art. 17. Em consonância com os princípios da educação inclusiva, as escolas

das redes regulares de educação profissional, públicas e privadas, devem atender

alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, mediante a promoção

das condições de acessibilidade, a capacitação de recursos humanos, a

flexibilização e adaptação do currículo e o encaminhamento para o trabalho

contando, para tal, com a colaboração do setor responsável pela educação especial

do respectivo sistema de ensino.

306

§ 1o As escolas de educação profissional podem realizar parcerias com

escolas especiais, públicas ou privadas, tanto para construir competências

necessárias à inclusão de alunos em seus cursos quanto para prestar assistência

técnica e convalidar cursos profissionalizantes realizados por essas escolas

especiais.

§ 2o As escolas das redes de educação profissional podem avaliar e certificar

competências laborais de pessoas com necessidades especiais não matriculadas

em seus cursos, encaminhando-as, a partir desses procedimentos, para o mundo do

trabalho.

Art. 18. Cabe aos sistemas de ensino estabelecer normas para o

funcionamento de suas escolas, a fim de que essas tenham as suficientes condições

para elaborar seu projeto pedagógico e possam contar com professores capacitados

e especializados, conforme previsto no Artigo 59 da LDBEN e com base nas

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Docentes da Educação Infantil

e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, em nível médio, na modalidade Normal,

e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da

Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura de graduação plena.

§ 1º São considerados professores capacitados para atuar em classes

comuns com alunos que apresentam necessidades educacionais especiais aqueles

que comprovem que, em sua formação, de nível médio ou superior, foram incluídos

conteúdos sobre educação especial adequados ao desenvolvimento de

competências e valores para:

I - perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos e valorizar a

educação inclusiva;

307

II - flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento de

modo adequado às necessidades especiais de aprendizagem;.

III - avaliar continuamente a eficácia do processo educativo para o

atendimento de necessidades educacionais especiais;.

IV - atuar em equipe, inclusive com professores especializados em educação

especial.

§ 2º São considerados professores especializados em educação especial

aqueles que desenvolveram competências para identificar as necessidades

educacionais especiais para definir, implementar, liderar e apoiar a implementação

de estratégias de flexibilização, adaptação curricular, procedimentos didáticos

pedagógicos e práticas alternativas, adequados ao atendimentos das mesmas, bem

como trabalhar em equipe, assistindo o professor de classe comum nas práticas que

são necessárias para promover a inclusão dos alunos com necessidades

educacionais especiais.

§ 3º Os professores especializados em educação especial deverão

comprovar:

I - formação em cursos de licenciatura em educação especial ou em uma de

suas áreas, preferencialmente de modo concomitante e associado à licenciatura

para educação infantil ou para os anos iniciais do ensino fundamental;

II - complementação de estudos ou pós-graduação em áreas específicas da

educação especial, posterior à licenciatura nas diferentes áreas de conhecimento,

para atuação nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio;

§ 4º Aos professores que já estão exercendo o magistério devem ser

oferecidas oportunidades de formação continuada, inclusive em nível de

308

especialização, pelas instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios.

Art. 19. As diretrizes curriculares nacionais de todas as etapas e modalidades

da Educação Básica estendem-se para a educação especial, assim como estas

Diretrizes Nacionais para a Educação Especial estendem-se para todas as etapas e

modalidades da Educação Básica.

Art. 20. No processo de implantação destas Diretrizes pelos sistemas de

ensino, caberá às instâncias educacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal

e dos Municípios, em regime de colaboração, o estabelecimento de referenciais,

normas complementares e políticas educacionais.

Art. 21. A implementação das presentes Diretrizes Nacionais para a Educação

Especial na Educação Básica será obrigatória a partir de 2002, sendo facultativa no

período de transição compreendido entre a publicação desta Resolução e o dia 31

de dezembro de 2001.

Art. 22. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação e revoga as

disposições em contrário.

309

ANEXO AB - RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 1, DE 21 DE JANEIRO

DE 2004.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA

Estabelece Diretrizes Nacionais para a organização e a realização de Estágio

de alunos da Educação Profissional e do Ensino Médio, inclusive nas modalidades

de Educação Especial e de Educação de Jovens e Adultos.

O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de

Educação, no uso de suas atribuições legais, e de conformidade com o disposto na

alínea “c” do § 1º do Art. 9º da Lei 4.024/61, com a redação dada pela Lei 9.131/95 e

no Art. 82 e seu Parágrafo único, bem como nos Art. 90, 8º, § 1º e 9º, § 1º da Lei

9.394/96, e com fundamento no Parecer CNE/CEB 35/2003, do 5/11/2003,

homologado pelo Senhor Ministro da Educação em 19/1/2004, resolve:

Art. 1º A presente Resolução, em atendimento ao prescrito no Art. 82 da LDB,

define diretrizes para a organização e a realização de estágio de alunos da

educação profissional e do ensino médio, inclusive nas modalidades de educação

especial e de educação de jovens e adultos.

§ 1º Para os efeitos desta Resolução entende-se que toda e qualquer

atividade de estágio será sempre curricular e supervisionada, assumida

intencionalmente pela Instituição de Ensino,configurando-se como um Ato

Educativo.

§ 2º Os estagiários deverão ser alunos regularmente matriculados em

Instituições de Ensino e devem estar freqüentando curso compatível com a

modalidade de estágio a que estejam vinculados.

310

§ 3º O estágio referente a programas de qualificação profissional com carga

horária mínima de 150 horas, pode ser incluído no respectivo plano de curso da

Instituição de Ensino, em consonância com o correspondente perfil profissional de

conclusão definido com identidade própria, devendo o plano de curso em questão

explicitar a carga-horária máxima do estágio profissional supervisionado.

Art. 2º O estágio, como procedimento didático-pedagógico e Ato Educativo, é

essencialmente uma atividade curricular de competência da Instituição de Ensino,

que deve integrar a proposta pedagógica da escola e os instrumentos de

planejamento curricular do curso, devendo ser planejado, executado e avaliado em

conformidade com os objetivos propostos.

§ 1º A concepção do estágio como atividade curricular e Ato Educativo

intencional da escola implica a necessária orientação e supervisão do mesmo por

parte do estabelecimento de ensino, por profissional especialmente designado,

respeitando-se a proporção exigida entre estagiários e orientador, em decorrência

da natureza da ocupação.

§ 2º Cabe ao respectivo sistema de ensino, à vista das condições disponíveis,

das características regionais e locais, bem como das exigências profissionais,

estabelecer os critérios e os parâmetros para o atendimento do disposto no

parágrafo anterior.

§ 3º O estágio deve ser realizado ao longo do curso, permeando o

desenvolvimento dos diversos componentes curriculares e não deve ser etapa

desvinculada do currículo.

§ 4º Observado o prazo-limite de cinco anos para a conclusão do curso de

educação profissional de nível técnico, em caráter excepcional, quando comprovada

a necessidade de realização do estágio obrigatório em etapa posterior aos demais

311

componentes curriculares do curso, o aluno deve estar matriculado e a escola deve

orientar e supervisionar o respectivo estágio, o qual deverá ser devidamente

registrado.

Art. 3º As Instituições de Ensino, nos termos dos seus projetos pedagógicos,

zelarão para que os estágios sejam realizados em locais que tenham efetivas

condições de proporcionar aos alunos estagiários experiências profissionais, ou de

desenvolvimento sócio-cultural ou científico, pela participação em situações reais de

vida e de trabalho no seu meio.

§ 1º Serão de responsabilidade das Instituições de Ensino a orientação e o

preparo de seus alunos para que os mesmos apresentem condições mínimas

de competência pessoal, social e profissional, que lhes permitam a obtenção de

resultados positivos desse ato educativo.

§2º Os estagiários com deficiência terão o direito a serviços de apoio de

profissionais da educação especial e de profissionais da área objeto do estágio.

Art. 4º As Instituições de Ensino e as organizações concedentes de estágio,

poderão contar com os serviços auxiliares de agentes de integração, públicos ou

privados, mediante condições acordadas em instrumento jurídico apropriado.

Parágrafo único. Os agentes de integração poderão responder por

incumbências tais como:

a) Identificar oportunidades de estágio e apresentá-las aos estabelecimentos

de ensino;

b) Facilitar o ajuste das condições do estágio a constar de instrumento jurídico

próprio e específico;

c) Prestar serviços administrativos, tais como cadastramento de estudantes e

de campos e oportunidades de estágio;

312

d) Tomar providências relativas à execução do pagamento da bolsa de

estágio, quando o mesmo for caracterizado como estágio remunerado;

e) Tomar providências pertinentes em relação ao seguro a favor do aluno

estagiário contra acidentes pessoais ou de responsabilidade civil por danos contra

terceiros;

f) Co-participar, com o estabelecimento de ensino, do esforço de captação de

recursos para viabilizar o estágio;

g) Cuidar da compatibilidade das competências da pessoa com necessidades

educacionais especiais às exigências da função objeto do estágio.

Art. 5º São modalidades de estágio curricular supervisionado, a serem

incluídas no projeto pedagógico da Instituição de Ensino e no planejamento

curricular do curso, como ato educativo:

I - Estágio profissional obrigatório, em função das exigências decorrentes da

própria natureza da habilitação ou qualificação profissional, planejado, executado e

avaliado à luz do perfil profissional de conclusão do curso;

II- Estágio profissional não obrigatório, mas incluído no respectivo plano de

curso, o que o torna obrigatório para os seus alunos, mantendo coerência com o

perfil profissional de conclusão do curso;

III- Estágio sócio-cultural ou de iniciação cientifica, previsto na proposta

pedagógica da escola como forma de contextualização do currículo, em termos de

educação para o trabalho e a cidadania, o que o torna obrigatório para os seus

alunos, assumindo a forma de atividade de extensão;

IV- Estágio profissional, sócio-cultural ou de iniciação científica, não incluído

no planejamento da Instituição de Ensino, não obrigatório, mas assumido

intencionalmente pela mesma, a partir de demanda de seus alunos ou de

313

organizações de sua comunidade, objetivando o desenvolvimento de competências

para a vida cidadã e para o trabalho produtivo;

V- Estágio civil, caracterizado pela participação do aluno, em decorrência de

ato educativo assumido intencionalmente pela Instituição de Ensino, em

empreendimentos ou projetos de interesse social ou cultural da comunidade; ou em

projetos de prestação de serviço civil, em sistemas estaduais ou municipais de

defesa civil; ou prestação de serviços voluntários de relevante caráter social,

desenvolvido pelas equipes escolares, nos termos do respectivo projeto pedagógico.

§ 1º Mesmo quando a atividade de estágio, assumido intencionalmente pela

escola como ato educativo, for de livre escolha do aluno, deve ser devidamente

registrada no seu prontuário.

§ 2º A modalidade de estágio civil somente poderá ser exercida junto a

atividades ou programas de natureza pública ou sem fins lucrativos.

§ 3º As modalidades específicas de estágio profissional supervisionado

somente serão admitidas quando vinculadas a um curso específico de educação

profissional, nos níveis básico, técnico e tecnológico, ou de ensino médio, com

orientação e ênfase profissionalizantes.

Art. 6º A Instituição de Ensino e, eventualmente, seu agente de integração,

deverão esclarecer a organização concedente de estágio sobre a parceria

educacional a ser celebrada e as responsabilidades a ela inerentes.

§ 1º O termo de parceria a ser celebrado entre a Instituição de Ensino e a

organização concedente de estágio, objetivando o melhor aproveitamento das

atividades sócio-profissionais que caracterizam o estágio, deverá conter as

orientações necessárias a serem assumidas pelo estagiário ao longo do período de

vivência educativa proporcionada pela empresa ou organização.

314

§ 2º Para a efetivação do estágio, far-se-á necessário termo de compromisso

firmado entre o aluno e a parte concedente de estágio, com a interveniência

obrigatória da Instituição de Ensino e facultativa do agente de integração.

§ 3º O estágio realizado na própria Instituição de Ensino ou sob a forma de

ação comunitária ou de serviço voluntário fica isento da celebração de termo de

compromisso, podendo o mesmo ser substituído por termo de adesão de voluntário,

conforme previsto no Art. 2º da Lei 9.608/98, de 18/2/98.

§ 4º O estágio, ainda que remunerado, não gera vínculo empregatício de

qualquer natureza, ressalvado o disposto sobre a matéria na legislação

previdenciária.

§ 5º A realização de estágio não remunerado representa situação de mútua

responsabilidade e contribuição no processo educativo e de profissionalização, não

devendo nenhuma das partes onerar a outra financeiramente, como condição para a

operacionalização do estágio.

§ 6º A realização do estágio, remunerado ou não, obriga a Instituição de

Ensino ou a administração das respectivas redes de ensino a providenciar, a favor

do aluno estagiário, seguro contra acidentes pessoais , bem como, conforme o caso,

seguro de responsabilidade civil por danos contra terceiros.

§ 7º O seguro contra acidentes pessoais e o seguro de responsabilidade civil

por danos contra terceiros, mencionados no parágrafo anterior, poderão ser

contratados pela organização concedente do estágio, diretamente ou através da

atuação conjunta com agentes de integração.

§ 8º O valor das apólices de seguro retro-mencionadas deverá se basear em

valores de mercado, sendo as mesmas consideradas nulas quando apresentarem

valores meramente simbólicos.

315

Art. 7º A carga horária, duração e jornada do estágio, a serem cumpridas pelo

estagiário, devem ser compatíveis com a jornada escolar do aluno, definidas de

comum acordo entre a Instituição de Ensino, a parte concedente de estágio e o

estagiário ou seu representante legal, de forma a não prejudicar suas atividades

escolares, respeitada a legislação em vigor.

§ 1º A carga horária do estágio profissional supervisionado não poderá

exceder a jornada diária de 6 horas, perfazendo 30 horas semanais.

§ 2º A carga horária do estágio supervisionado de aluno do ensino médio, de

natureza não profissional, não poderá exceder a jornada diária de 4 horas,

perfazendo o total de 20 horas semanais.

§ 3ºO estágio profissional supervisionado referente a cursos que utilizam

períodos alternados em salas de aula e nos campos de estágio não pode exceder a

jornada semanal de 40 horas, ajustadas de acordo com o termo de compromisso

celebrado entre as partes. § 4ºA carga horária destinada ao estágio será acrescida

aos mínimos exigidos para os respectivos cursos e deverá ser devidamente

registrada nos históricos e demais documentos escolares dos alunos.

§ 5º Somente poderão realizar estágio supervisionado os alunos que tiverem,

no mínimo, 16 anos completos na data de início do estágio.

Art. 8º Os estágios supervisionados que apresentem duração prevista igual ou

superior a 01 (um) ano deverão contemplar a existência de período de recesso,

proporcional ao tempo de atividade, preferencialmente, concedido juntamente com

as férias escolares. Art. 9º A presente normatização sobre estágio, em especial no

que se refere ao estágio profissional, não se aplica ao menor aprendiz, sujeito à

formação profissional metódica do ofício em que exerça seu trabalho vinculado à

316

empresa por contrato de aprendizagem, nos termos da legislação trabalhista em

vigor.

Parágrafo único. A presente normatização não se aplica, também, a

programas especiais destinados à obtenção de primeiro emprego ou similares.

Art. 10. Para quaisquer modalidades de estágio, a Instituição de Ensino será

obrigada a designar, dentre sua equipe de trabalho, um ou mais profissionais

responsáveis pela orientação e supervisão dos estágios.

Parágrafo único. Compete a esses profissionais, além da articulação com as

organizações nas quais os estágios se realizarão, assegurar sua integração com os

demais componentes curriculares de cada curso.

Art. 11. As Instituições de Ensino, nos termos de seus projetos pedagógicos,

poderão, no caso de estágio profissional obrigatório, possibilitar que o aluno

trabalhador que comprovar exercer funções correspondentes às competências

profissionais a serem desenvolvidas, à luz do perfil profissional de conclusão do

curso, possa ser dispensado, em parte, das atividades de estágio, mediante

avaliação da escola.

§ 1º A Instituição de Ensino deverá registrar, nos prontuários escolares do

aluno, o cômputo do tempo de trabalho aceito parcial ou totalmente como atividade

de estágio.

§ 2º No caso de alunos que trabalham fora da área profissional do curso, a

Instituição de Ensino deverá fazer gestão junto aos empregadores no sentido de que

estes possam ser liberados de horas de trabalho para a efetivação do estágio

profissional obrigatório.

Art. 12. A Instituição de Ensino deverá planejar, de forma integrada, as

práticas profissionais simuladas, desenvolvidas em sala ambiente, em situação de

317

laboratório, e as atividades de estágio profissional supervisionado, as quais deverão

ser consideradas em seu conjunto, no seu projeto pedagógico, sem que uma

simplesmente substitua a outra.

§ 1º A atividade de prática profissional simulada, desenvolvida na própria

Instituição de Ensino, com o apoio de diferentes recursos tecnológicos, em

laboratórios ou salas-ambientes, integra os mínimos de carga horária previstos para

o curso na respectiva área profissional compõe-se com a atividade de estágio

profissional supervisionado, realizado em situação real de trabalho, devendo uma

complementar a outra.

§ 2º A atividade de prática profissional realizada em situação real de trabalho,

sob a forma de estágio profissional supervisionado, deve ter sua carga horária

acrescida aos mínimos estabelecidos para o curso na correspondente área

profissional, nos termos definidos pelo respectivo sistema de ensino.

Art. 13. O estágio profissional supervisionado, correspondente à prática de

formação, no curso normal de nível médio, integra o currículo do referido curso e sua

carga horária será computada dentro dos mínimos exigidos, nos termos legislação

específica e das normas vigentes.

Art. 14. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação, após a

homologação do Parecer CNE/CEB 35/2003 pelo Senhor Ministro da Educação,

revogadas as disposições em contrário.

(*) CNE. Resolução CNE/CEB 1/2004 Diário Oficial da União, de 4 de

fevereiro de 2004, Seção 1, p. 21. (3*) CNE. Resolução CNE/CEB 1/2004 Diário

Oficial da União , de 4 de fevereiro de 2004, Seção 1, p. 21. (4*) CNE. Resolução

CNE/CEB 1/2004 Diário Oficial da União, de 4 de fevereiro de 2004, Seção 1, p. 21.

318

ANEXO AC - PARECER Nº 17/2001

FUNDO DE MANUTENÇÃO E DESENVOLVIMENTO DO ENSINO

FUNDAMENTAL E DE VALORIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO

Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério, na forma prevista no art. 60, § 7º, do

Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, Faço saber que o Congresso Nacional

decreta e eu sanciono a seguinte lei Art. 1º É instituído, no âmbito de cada Estado e

do Distrito Federal, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério, o qual terá natureza contábil e será

implantado, automaticamente, a partir de 1º de janeiro de 1998.

§ 1º O Fundo referido neste artigo será composto por 15% (quinze por cento)

dos recursos:

I - da parcela do imposto sobre operações relativas à circulação de

mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e

intermunicipal e de comunicação - ICMS, devida ao Distrito Federal, aos Estados e

aos Municípios, conforme dispõe o art. 155, inciso II, combinado com o art. 158,

inciso IV, da Constituição Federal;

II - do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal - FPE e dos

Municípios - FPM, previstos no art. 159, inciso I, alíneas a e b, da Constituição

Federal, e no Sistema Tributário Nacional de que trata a Lei nº 5.172, de 25 de

outubro de 1966; e

III - da parcela do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI devida aos

Estados e ao Distrito Federal, na forma do art. 159, inciso II, da Constituição Federal

e da Lei Complementar nº 61, de 26 de dezembro de 1989.

319

§ 2º Inclui-se na base de cálculo do valor a que se refere o inciso I do

parágrafo anterior o montante de recursos financeiros transferidos, em moeda, pela

União aos Estados, Distrito Federal e Municípios a título de compensação financeira

pela perda de receitas decorrentes da desoneração das exportações, nos termos da

Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, bem como de outras

compensações da mesma natureza que vierem a ser instituídas.

§ 3º Integra os recursos do Fundo a que se refere este artigo a

complementação da União, quando for o caso, na forma prevista no art. 6º.

§ 4º A implantação do Fundo poderá ser antecipada em relação à data

prevista neste artigo, mediante lei no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal.

§ 5º No exercício de 1997, a União dará prioridade, para concessão de

assistência financeira, na forma prevista no art. 211, § 1º, da Constituição Federal,

aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios nos quais a implantação do Fundo

for antecipada na forma prevista no parágrafo anterior.

Art. 2º Os recursos do Fundo serão aplicados na manutenção e

desenvolvimento do ensino fundamental público, e na valorização de seu Magistério.

§ 1º A distribuição dos recursos, no âmbito de cada Estado e do Distrito

Federal, dar-se-á, entre o Governo Estadual e os Governos Municipais, na

proporção do número de alunos matriculados anualmente nas escolas cadastradas

das respectivas redes de ensino, considerando-se para esse fim:

I - as matrículas da 1ª a 8ª séries do ensino fundamental;

II - as matrículas do ensino fundamental nos cursos de educação de jovens e

adultos, na função suplência. (Dispositivo Vetado)

§ 2º A distribuição a que se refere o parágrafo anterior, a partir de 1998,

deverá considerar, ainda, a diferenciação de custo por aluno, segundo os níveis de

320

ensino e tipos de estabelecimento, adotando-se a metodologia de cálculo e as

correspondentes ponderações, de acordo com os seguintes componentes:

I - 1ª a 4ª séries;

II - 5ª a 8ª séries;

III - estabelecimentos de ensino especial;

IV - escolas rurais.

§ 3º Para efeitos dos cálculos mencionados no § 1º, serão computadas

exclusivamente as matrículas do ensino presencial.

§ 4º O Ministério da Educação e do Desporto - MEC realizará, anualmente,

censo educacional, cujos dados serão publicados no Diário Oficial da União e

constituirão a base para fixar a proporção prevista no § 1º.

§ 5º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, no prazo de

trinta dias da publicação referida no parágrafo anterior, apresentar recurso para

retificação dos dados publicados.

§ 6º É vedada a utilização dos recursos do Fundo como garantia de

operações de crédito internas e externas, contraídas pelos Governos da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, admitida somente sua utilização como

contrapartida em operações que se destinem, exclusivamente, ao financiamento de

projetos e programas do ensino fundamental.

Art. 6º A União complementará os recursos do Fundo a que se refere o art. 1º

sempre que, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, seu valor por aluno não

alcançar o mínimo definido nacionalmente.

§ 1º O valor mínimo anual por aluno, ressalvado o disposto no § 4º, será

fixado por ato do Presidente da República e nunca será inferior à razão entre a

previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental no

321

ano anterior, acrescida do total estimado de novas matrículas, observado o disposto

no art. 2º, § 1º, incisos I e I.

§ 2º As estatísticas necessárias ao cálculo do valor anual mínimo por aluno,

inclusive as estimativas de matrículas, terão como base o censo educacional

realizado pelo Ministério da Educação e do Desporto, anualmente, e publicado no

Diário Oficial da União.

§ 3º As transferências dos recursos complementares a que se refere este

artigo serão realizadas mensal e diretamente às contas específicas a que se refere o

art. 3º.

§ 4º No primeiro ano de vigência desta Lei, o valor mínimo anual por aluno, a

que se refere este artigo, será de R$ 300,00 (trezentos reais).

§ 5º Na complementação da União, prevista neste artigo, é vedada a

utilização de recursos da Contribuição Social do Salário-Educação, de que trata o

art. 212, § 5º, da Constituição Federal. (Dispositivo Vetado)

Art. 16. Esta Lei entra em vigor em 1º de janeiro de 1997.

Art. 17. Revogam-se as disposições em contrário.

322

ANEXO AD - AVISO CIRCULAR Nº 277/MEC/GM

Brasília, 08 de maio de 1996

Magnífico Reitor

A execução adequada de uma política educacional dirigida aos portadores de

necessidades especiais possibilita que venham a alcançar níveis cada vez mais

elevados do seu desenvolvimento acadêmico.

É importante, por isto, registrar o esforço que as Instituições de Ensino

Superior – IES empreendem no sentido de adequar-se, estruturalmente, para criar

condições próprias, de forma a possibilitar o acesso desses alunos ao 3º grau.

Os levantamentos estatísticos no Brasil não têm contemplado o atendimento

educacional aos portadores de deficiência, dificultando, assim, a exposição de dados

sobre o número de alunos que concluem o 2º grau e o número daqueles que

ingressaram no ensino superior.

É, no entanto, elevado o número de solicitações – tanto dos pais, dos alunos

portadores de deficiência, quanto das próprias instituições de ensino superior – no

sentido de que seja viabilizado o acesso desses candidatos ao 3º grau, razão pela

qual o tema acesso e permanência do educando portador de deficiência na

instituição de ensino superior está sendo objeto de estudos pela maioria das IES.

A prática vem demonstrando que a operacionalização das estratégias já

utilizadas necessitam de ajustes para que possam atender a todas as necessidades

educativas apresentadas por esse alunado.

Segundo análise dos especialistas, tais ajustes se fazem necessários em três

momentos distintos do processo de seleção:

323

- na elaboração do edital, para que possa expressar, com clareza, os recursos

que poderão ser utilizados pelo vestibulando no momento da prova, bem como dos

critérios de correção a serem adotados pela comissão do vestibular;

- no momento dos exames vestibulares, quando serão providenciadas salas

especiais para cada tipo de deficiência e a forma adequada de obtenção de

respostas pelo vestibulando;

- no momento da correção das provas, quando será necessário considerar as

diferenças específicas inerentes a cada portador de deficiência, para que o domínio

do conhecimento seja aferido por meio de critérios compatíveis com as

características especiais desses alunos.

Transmito a Vossa Magnificência, para conhecimento dessa Instituição,

sugestões visando facilitar o acesso dos portadores de deficiência ao 3º grau,

encaminhadas que foram a este Ministério:

- instalação de Bancas Especiais contendo, pelo menos, um especialista na

área de deficiência do candidato;

- utilização de textos ampliados, lupas ou outros recursos ópticos especiais

para as pessoas com visão subnormal/reduzida;

- utilização de recursos e equipamentos específicos para cegos: provas orais

e/ou em Braille, sorobã, máquina de datilografia comum ou Perkins/Braille, DOS

VOX adaptado ao computador.

- colocação de intérprete no caso de Língua de Sinais no processo de

avaliação dos candidatos surdos;

- flexibilidade nos critérios de correção da redação e das provas discursivas

dos candidatos portadores de deficiência auditiva, dando relevância ao aspecto

324

semântico da mensagem sobre o aspecto formal e/ou adoção de outros mecanismos

de avaliação da sua linguagem em substituição a prova de redação.

- adaptação de espaços físicos, mobiliários e equipamentos para candidatos

portadores de deficiência física;

- utilização de provas orais ou uso de computadores e outros equipamentos

pelo portador de deficiência física com comprometimento dos membros superiores;

- ampliação do tempo determinado para a execução das provas de acordo

com o grau de comprometimento do candidato;

- criação de um mecanismo que identifique a deficiência da qual o candidato é

portador, de forma que a comissão do vestibular possa adotar critérios de avaliação

compatíveis com as características inerentes a essas pessoas.

Por oportuno, espero que essa Instituição possa, ainda, desenvolver ações

que possibilitem a flexibilização dos serviços educacionais e da infra-estrutura, bem

como a capacitação de recursos humanos, de modo a melhor atender às

necessidades especiais dos portadores de deficiência, possibilitando sua

permanência, com sucesso, em certos cursos.

Em anexo, encaminho cópia da Portaria nº 1793/94 e do documento

“Sugestões de Estratégias”, como orientação ao trabalho dessa Instituição, referente

à matéria.

Estou certo, Senhor Reitor, do empenho de Vossa Magnificência no sentido

de continuar oferecendo condições aos deficientes para que possam enfrentar o

vestibular com maior segurança. Assim, estaremos prestando mais um serviço

educacional à comunidade.

Atenciosamente,

PAULO RENATO SOUZA

325

ANEXO AE - DECLARAÇÃO MUNDIAL SOBRE EDUCAÇÃO PARA

TODOS

(CONFERÊNCIA DE JOMTIEN - 1990)

PLANO DE AÇÃO PARA SATISFAZER AS NECESSIDADES BÁSICAS DE

APRENDIZAGEM

Aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos

Jomtien, Tailândia - 5 a 9 de março de 1990.

Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem

PREÂMBULO

Há mais de quarenta anos, as nações do mundo afirmaram na Declaração

Universal dos Direitos Humanos que "toda pessoa tem direito à educação". No

entanto, apesar dos esforços realizados por países do mundo inteiro para assegurar

o direito à educação para todos, persistem as seguintes realidades:

• mais de 100 milhões de crianças, das quais pelo menos 60 milhões são

meninas, não têm acesso ao ensino primário;

• mais de 960 milhões de adultos - dois terços dos quais mulheres são

analfabetos, e o analfabetismo funcional é um problema significativo em todos os

países industrializados ou em desenvolvimento; - mais de um terço dos adultos do

mundo não têm acesso ao conhecimento impresso, às novas habilidades e

tecnologias, que poderiam melhorar a qualidade de vida e ajudá-los a perceber e a

adaptar-se às mudanças sociais e culturais; e

• mais de 100 milhões de crianças e incontáveis adultos não conseguem

concluir o ciclo básico, e outros milhões, apesar de concluí-lo, não conseguem

adquirir conhecimentos e habilidades essenciais.

326

Ao mesmo tempo, o mundo tem que enfrentar um quadro sombrio de

problemas, entre os quais: o aumento da dívida de muitos países, a ameaça de

estagnação e decadência econômicas, o rápido aumento da população, as

diferenças econômicas crescentes entre as nações e dentro delas, a guerra, a

ocupação, as lutas civis, a violência; a morte de milhões de crianças que poderia ser

evitada e a degradação generalizada do meio-ambiente. Esses problemas atropelam

os esforços envidados no sentido de satisfazer as necessidades básicas de

aprendizagem, enquanto a falta de educação básica para significativas parcelas da

população impede que a sociedade enfrente esses problemas com vigor e

determinação.

Durante a década de 80, esses problemas dificultaram os avanços da

educação básica em muitos países menos desenvolvidos. Em outros, o crescimento

econômico permitiu financiar a expansão da educação mas, mesmo assim, milhões

de seres humanos continuam na pobreza, privados de escolaridade ou analfabetos.

E em alguns países industrializados, cortes nos gastos públicos ao longo dos anos

80 contribuíram para a deterioração da educação.

Não obstante, o mundo está às vésperas de um novo século carregado de

esperanças e de possibilidades. Hoje, testemunhamos um autêntico progresso rumo

à dissensão pacífica e de uma maior cooperação entre as nações. Hoje, os direitos

essenciais e as potencialidades das mulheres são levados em conta. Hoje, vemos

emergir, a todo momento, muitas e valiosas realizações científicas e culturais. Hoje,

o volume das informações disponível no mundo - grande parte importante para a

sobrevivência e bem-estar das pessoas - é extremamente mais amplo do que há

alguns anos, e continua crescendo num ritmo acelerado. Esses conhecimentos

incluem informações sobre como melhorar a qualidade de vida ou como aprender a

327

aprender. Um efeito multiplicador ocorre quando informações importantes estão

vinculadas com outro grande avanço: nossa nova capacidade em comunicar.

Essas novas forças, combinadas com a experiência acumulada de reformas,

inovações, pesquisas, e com o notável progresso em educação registrado em muitos

países, fazem com que a meta de educação básica para todos - pela primeira vez na

história - seja uma meta viável.

Em conseqüência, nós, os participantes da Conferência Mundial sobre

Educação para Todos, reunidos em Jomtien, Tailândia, de 5 a 9 de março de 1990:

Relembrando que a educação é um direito fundamental de todos, mulheres e

homens, de todas as idades, no mundo inteiro;

Entendendo que a educação pode contribuir para conquistar um mundo mais

seguro, mais sadio, mais próspero e ambientalmente mais puro, e que, ao mesmo

tempo, favoreça o progresso social, econômico e cultural, a tolerância e a

cooperação internacional;

Sabendo que a educação, embora não seja condição suficiente, é de

importância fundamental para o progresso pessoal e social;

Reconhecendo que o conhecimento tradicional e o patrimônio cultural têm

utilidade e valor próprios, assim como a capacidade de definir e promover o

desenvolvimento;

Admitindo que, em termos gerais, a educação que hoje é ministrada

apresenta graves deficiências, que se faz necessário torná-la mais relevante e

melhorar sua qualidade, e que ela deve estar universalmente disponível;

Reconhecendo que uma educação básica adequada é fundamental para

fortalecer os níveis superiores de educação e de ensino, a formação científica e

tecnológica e, por conseguinte, para alcançar um desenvolvimento autônomo; e

328

Reconhecendo a necessidade de proporcionar às gerações presentes e

futuras uma visão abrangente de educação básica e um renovado compromisso a

favor dela, para enfrentar a amplitude e a complexidade do desafio, proclamamos a

seguinte:

DECLARAÇÃO MUNDIAL SOBRE EDUCAÇÃO PARA TODOS:

SATISFAÇÃO DAS NECESSIDADES BÁSICAS DE APRENDIZAGEM

EDUCAÇAO PARA TODOS: OBJETIVOS

ARTIGO 1

SATISFAZER AS NECESSIDADES BÁSICAS DE APRENDIZAGEM

1. Cada pessoa - criança, jovem ou adulto - deve estar em condições de

aproveitar as oportunidades educativas voltadas para satisfazer suas necessidades

básicas de aprendizagem. Essas necessidades compreendem tanto os instrumentos

essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o

cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem

(como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os

seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades,

viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar

a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. A

amplitude das necessidades básicas de aprendizagem e a maneira de satisfazê-las

variam segundo cada país e cada cultura, e, inevitavelmente, mudam com o decorrer

do tempo.

2. A satisfação dessas necessidades confere aos membros de uma sociedade

a possibilidade e, ao mesmo tempo, a responsabilidade de respeitar e desenvolver

sua herança cultural, lingüística e espiritual, de promover a educação de outros, de

329

defender a causa da justiça social, de proteger o meio-ambiente e de ser tolerante

com os sistemas sociais, políticos e religiosos que difiram dos seus, assegurando

respeito aos valores humanistas e aos direitos humanos comumente aceitos, bem

como de trabalhar pela paz e pela solidariedade internacionais em um mundo

interdependente.

3. Outro objetivo, não menos fundamental, do desenvolvimento da educação,

é o enriquecimento dos valores culturais e morais comuns. É nesses valores que os

indivíduos e a sociedade encontram sua identidade e sua dignidade.

4. A educação básica é mais do que uma finalidade em si mesma. Ela é a

base para a aprendizagem e o desenvolvimento humano permanentes, sobre a qual

os países podem construir, sistematicamente, níveis e tipos mais adiantados de

educação e capacitação.

EDUCAÇAO PARA TODOS: UMA VISÃO ABRANGENTE E UM

COMPROMISSO RENOVADO

ARTIGO 2

EXPANDIR O ENFOQUE

1. Lutar pela satisfação das necessidades básicas de aprendizagem para

todos exige mais do que a ratificação do compromisso pela educação básica. É

necessário um enfoque abrangente, capaz de ir além dos níveis atuais de recursos,

das estruturas institucionais, dos currículos e dos sistemas convencionais de ensino,

para construir sobre a base do que há de melhor nas práticas correntes. Existem

hoje novas possibilidades que resultam da convergência do crescimento da

informação e de uma capacidade de comunicação sem precedentes. Devemos

330

trabalhar estas possibilidades com criatividade e com a determinação de aumentar a

sua eficácia.

2. Este enfoque abrangente, tal como exposto nos Artigos 3 a 7 desta

Declaração, compreende o seguinte: - universalizar o acesso à educação e

promover a eqüidade;

• concentrar a atenção na aprendizagem,

• ampliar os meios e o raio de ação da educação básica; - propiciar um

ambiente adequado à aprendizagem;

• fortalecer alianças.

3. A concretização do enorme potencial para o progresso humano depende

do acesso das pessoas à educação e da articulação entre o crescente conjunto de

conhecimentos relevantes com os novos meios de difusão desses conhecimentos.

ARTIGO 3

UNIVERZALIZAR O ACESSO À EDUCAÇÃO E PROMOVER A EQÜIDADE

1. A educação básica deve ser proporcionada a todas as crianças, jovens e

adultos. Para tanto, é necessário universalizá-la e melhorar sua qualidade, bem

como tomar medidas efetivas para reduzir as desigualdades.

2. Para que a educação básica se torne eqüitativa, é mister oferecer a todas

as crianças, jovens e adultos, a oportunidade de alcançar e manter um padrão

mínimo de qualidade da aprendizagem.

3. A prioridade mais urgente é melhorar a qualidade e garantir o acesso à

educação para meninas e mulheres, e superar todos os obstáculos que impedem

sua participação ativa no processo educativo. Os preconceitos e estereótipos de

qualquer natureza devem ser eliminados da educação.

331

4. Um compromisso efetivo para superar as disparidades educacionais deve

ser assumido. Os grupos excluídos - os pobres; os meninos e meninas de rua ou

trabalhadores; as populações das periferias urbanas e zonas rurais; os nômades e

os trabalhadores migrantes; os povos indígenas; as minorias étnicas, raciais e

lingüísticas; os refugiados; os deslocados pela guerra; e os povos submetidos a um

regime de ocupação - não devem sofrer qualquer tipo de discriminação no acesso às

oportunidades educacionais.

5. As necessidades básicas de aprendizagem das pessoas portadoras de

deficiências requerem atenção especial. É preciso tomar medidas que garantam a

igualdade de acesso à educação aos portadores de todo e qualquer tipo de

deficiência, como parte integrante do sistema educativo.

ARTIGO 4

CONCENTRAR A ATENÇÃO NA APRENDIZAGEM

1. A tradução das oportunidades ampliadas de educação em desenvolvimento

efetivo - para o indivíduo ou para a sociedade - dependerá, em última instância, de,

em razão dessas mesmas oportunidades, as pessoas aprenderem de fato, ou seja,

apreenderem conhecimentos úteis, habilidades de raciocínio, aptidões e valores. Em

conseqüência, a educação básica deve estar centrada na aquisição e nos resultados

efetivos da aprendizagem, e não mais exclusivamente na matrícula, freqüência aos

programas estabelecidos e preenchimento dos requisitos para a obtenção do

diploma. Abordagens ativas e participativas são particularmente valiosas no que diz

respeito a garantir a aprendizagem e possibilitar aos educandos esgotar plenamente

suas potencialidades. Daí a necessidade de definir, nos programas educacionais, os

332

níveis desejáveis de aquisição de conhecimentos e implementar sistemas de

avaliação de desempenho.

ARTIGO 5

AMPLIAR OS MEIOS E O RAIO DE AÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

A diversidade, a complexidade e o caráter mutável das necessidades básicas

de aprendizagem das crianças, jovens e adultos, exigem que se amplie e se redefina

continuamente o alcance da educação básica, para que nela se incluam os

seguintes elementos:

- A aprendizagem começa com o nascimento. Isto implica cuidados básicos e

educação inicial na infância, proporcionados seja por meio de estratégias que

envolvam as famílias e comunidades ou programas institucionais, como for mais

apropriado.

• O principal sistema de promoção da educação básica fora da esfera

familiar escola fundamental. A educação fundamental deve ser universal, garantir a

satisfação das necessidades básicas de aprendizagem de todas as crianças, e levar

em consideração a cultura, as necessidades e as possibilidades da comunidade.

Programas complementares alternativos podem ajudar a satisfazer as necessidades

de aprendizagem das crianças cujo acesso à escolaridade formal é limitado ou

inexistente, desde que observem os mesmos padrões de aprendizagem adotado; na

escola e disponham de apoio adequado.

• As necessidades básicas de aprendizagem de jovens e adultos são

diversas, e devem ser atendidas mediante uma variedade de sistemas. Os

programas de alfabetização são indispensáveis, dado que saber ler e escrever

constitui-se uma capacidade necessária em si mesma, sendo ainda o fundamento de

333

outras habilidades vitais. A alfabetização na língua materna fortalece a identidade e

a herança cultural. Outras necessidades podem ser satisfeitas mediante a

capacitação técnica, a aprendizagem de ofícios e os programas de educação formal

e não formal em matérias como saúde, nutrição, população, técnicas agrícolas,

meio-ambiente, ciência, tecnologia, vida familiar - incluindo-se aí a questão da

natalidade - e outros problemas sociais.

• Todos os instrumentos disponíveis e os canais de informação,

comunicação e ação social podem contribuir na transmissão de conhecimentos

essenciais, bem como na informação e educação dos indivíduos quanto a questões

sociais. Além dos instrumentos tradicionais, as bibliotecas, a televisão, o rádio e

outros meios de comunicação de massa podem ser mobilizados em todo o seu

potencial. A fim de satisfazer as necessidades de educação básica para todos.

Estes componentes devem constituir um sistema integrado - complementar,

interativo e de padrões comparáveis - e deve contribuir para criar e desenvolver

possibilidades de aprendizagem por toda a vida.

ARTIGO 6

PROPICIAR UM AMBIENTE ADEQUADO À APRENDIZAGEM

A aprendizagem não ocorre em situação de isolamento. Portanto, as

sociedades devem garantir a todos os educandos assistência em nutrição, cuidados

médicos e o apoio físico e emocional essencial para que participem ativamente de

sua própria educação e dela se beneficiem. Os conhecimentos e as habilidades

necessários à ampliação das condições de aprendizagem das crianças devem estar

integrados aos programas de educação comunitária para adultos. A educação das

crianças e a de seus pais ou responsáveis respaldam-se mutuamente, e esta

334

interação deve ser usada para criar, em benefício de todos, um ambiente de

aprendizagem onde haja calor humano e vibração.

ARTIGO 7

FORTALECER AS ALIANÇAS

As autoridades responsáveis pela educação aos níveis nacional, estadual e

municipal têm a obrigação prioritária de proporcionar educação básica para todos.

Não se pode, todavia, esperar que elas supram a totalidade dos requisitos humanos,

financeiros e organizacionais necessários a esta tarefa. Novas e crescentes

articulações e alianças serão necessárias em todos os níveis: entre todos os

subsetores e formas de educação, reconhecendo o papel especial dos professores,

dos administradores e do pessoal que trabalha em educação; entre os órgãos

educacionais e demais órgãos de governo, incluindo os de planejamento, finanças,

trabalho, comunicações, e outros setores sociais; entre as organizações

governamentais e não-governamentais, com o setor privado, com as comunidades

locais, com os grupos religiosos, com as famílias. É particularmente importante

reconhecer o papel vital dos educadores e das famílias. Neste contexto, as

condições de trabalho e a situação social do pessoal docente, elementos decisivos

no sentido de se implementar a educação para todos, devem ser urgentemente

melhoradas em todos os países signatários da Recomendação Relativa à Situação

do Pessoal Docente OIT/UNESCO (1966). Alianças efetivas contribuem

significativamente para o planejamento, implementação, administração e avaliação

dos programas de educação básica. Quando nos referimos a "um enfoque

abrangente e a um compromisso renovado", incluímos as alianças como parte

fundamental.

335

EDUCAÇÃO PARA TODOS: OS REQUISITOS

ARTIGO 8

DESENVOLVER UMA POLÍTICA CONTEXTUALIZADA DE APOIO

1. Políticas de apoio nos setores social, cultural e econômico são necessárias

à concretização da plena provisão e utilização da educação básica para a promoção

individual e social. A educação básica para todos depende de um compromisso

político e de uma vontade política, respaldados por medidas fiscais adequadas e

ratificados por reformas na política educacional e pelo fortalecimento institucional.

Uma política adequada em matéria de economia, comércio, trabalho, emprego e

saúde incentiva o educando e contribui para o desenvolvimento da sociedade.

2. A sociedade deve garantir também um sólido ambiente intelectual e

científico à educação básica, o que implica a melhoria do ensino superior e o

desenvolvimento da pesquisa científica. Deve ser possível estabelecer, em cada

nível da educação, um contato estreito com o conhecimento tecnológico e científico

contemporâneo.

ARTIGO 9

MOBILIZAR OS RECURSOS

1. Para que as necessidades básicas de aprendizagem para todos sejam

satisfeitas mediante ações de alcance muito mais amplo, será essencial mobilizar

atuais e novos recursos financeiros e humanos, públicos, privados ou voluntários.

Todos os membros da sociedade têm uma contribuição a dar, lembrando sempre

que o tempo, a energia e os recursos dirigidos à educação básica constituem,

certamente, o investimento mais importante que se pode fazer no povo e no futuro

de um país.

336

2. Um apoio mais amplo por parte do setor público significa atrair recursos de

todos os órgãos governamentais responsáveis pelo desenvolvimento humano,

mediante o aumento em valores absolutos e relativos, das dotações orçamentárias

aos serviços de educação básica. Significa, também, reconhecer a existência de

demandas concorrentes que pesam sobre os recursos nacionais, e que, embora a

educação seja um setor importante, não é o único. Cuidar para que haja uma melhor

utilização dos recursos e programas disponíveis para a educação resultará em um

maior rendimento, e poderá ainda atrair novos recursos. A urgente tarefa de

satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem poderá vir a exigir uma

realocação dos recursos entre setores, como por exemplo, urna transferência de

fundos dos gastos militares para a educação. Acima de tudo, é necessário uma

proteção especial para a educação básica nos países em processo de ajustes

estruturais e que carregam o pesado fardo da dívida externa. Agora, mais do que

nunca, a educação deve ser considerada uma dimensão fundamental de todo

projeto social, cultural e econômico.

ARTIGO 10

FORTALECER SOLIDARIEDADE INTERNACIONAL

1. Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem constitui-se uma

responsabilidade comum e universal a todos os povos, e implica solidariedade

internacional e relações econômicas honestas e eqüitativas, a rim de corrigir as

atuais disparidades econômicas. Todas as nações têm valiosos conhecimentos e

experiências a compartilhar, com vistas à elaboração de políticas e programas

educacionais eficazes.

337

2. Será necessário um aumento substancial, a longo prazo, dos recursos

destinados à educação básica. A comunidade mundial, incluindo os organismos e

instituições intergovernamentais, têm a responsabilidade urgente de atenuar as

limitações que impedem algumas nações de alcançar a meta da educação para

todos. Este esforço implicará, necessariamente, a adoção de medidas que

aumentem os orçamentos nacionais dos países mais pobres, ou ajudem a aliviar o

fardo das pesadas dívidas que os afligem. Credores e devedores devem procurar

fórmulas inovadoras e eqüitativas para reduzir este fardo, uma vez que a capacidade

de muitos países em desenvolvimento de responder efetivamente à educação e a

outras necessidades básicas será extremamente ampliada ao se resolver o

problema da dívida.

3. As necessidades básicas de aprendizagem dos adultos e das crianças

devem ser atendidas onde quer que existam. Os países menos desenvolvidos e com

baixa renda apresentam necessidades especiais que exigirão atenção prioritária no

quadro da cooperação internacional à educação básica, nos anos 90.

4. Todas as nações devem agir conjuntamente para resolver conflitos e

disputas, pôr fim às ocupações militares e assentar populações deslocadas ou

facilitar seu retorno a seus países de origem, bem como garantir o atendimento de

suas necessidades básicas de aprendizagem. Só um ambiente estável e pacífico

pode criar condições para que todos os seres humanas, crianças e adultos, venham

a beneficiar-se das propostas desta declaração.

Nós, os participantes da Conferência Mundial sobre Educação para Todos,

reafirmamos o direito de todos à educação. Este é o fundamento de nossa

determinação individual e coletiva - assegurar educação para todos.

338

Comprometemo-nos em cooperar, no âmbito da nossa esfera de

responsabilidades, tomando todas as medidas necessárias à consecução dos

objetivos de educação para todos. Juntos apelamos aos governos, às organizações

interessadas e aos indivíduos, para que se somem a este urgente empreendimento.

As necessidades básicas de aprendizagem para todos podem e devem ser

satisfeitas. Não há modo mais significativo do que este para iniciar o Ano

Internacional da Alfabetização e avançar rumo às metas da Década das Nações

Unidas para os Portadores de Deficiências (l983-1992), Década Internacional para o

Desenvolvimento Cultural (1988-1997), Quarta Década das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (1991-2000), Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas

de Discriminação contra a Mulher e Estratégias para o Desenvolvimento da Mulher,

e da Convenção sobre os Direitos da Criança. Nunca antes uma época foi tão

propícia à realização do nosso compromisso em proporcionar oportunidades básicas

de aprendizagem a todos os povos do mundo.

Adotamos, portanto, esta Declaração Mundial sobre Educação para Todos:

Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem, e aprovamos o Plano de

Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de Aprendizagem, com a finalidade

de atingir os objetivos estabelecidos nesta Declaração.

INTRODUÇÃO

1. Este Plano de Ação para Satisfazer as Necessidades Básicas de

Aprendizagem deriva da Declaração Mundial sobre Educação para Todos, adotada

pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos, da qual participaram

representantes de governos, organismos internacionais e bilaterais de

desenvolvimento, e organizações não-governamentais. Fundamentado no

339

conhecimento coletivo e no compromisso dos participantes, o Plano de Ação foi

concebido como uma referência e um guia para governos, organismos

internacionais, instituições de cooperação bilateral, organizações não-

governamentais (ONGs), e todos aqueles comprometidos com a meta da educação

para todos. Este plano compreende três grandes níveis de ação conjunta:

(i) ação direta em cada país;

(ii) cooperação entre grupos de países que compartilhem certas características e

interesses; e

(iii) cooperação multilateral e bilateral na comunidade mundial.

2. Países, individualmente ou em grupos, assim como organizações

internacionais, continentais, e nacionais, poderão recorrer ao Plano de Ação para

elaborar os seus próprios planos de ação e programas, em conformidade com os

seus objetivos específicos, sua determinação e o interesse de seus representados.

Assim tem funcionado, por dez anos, o Projeto Principal da UNESCO sobre

Educação para a América Latina e o Caribe. Outros exemplos deste tipo de iniciativa

são o Plano de Ação da UNESCO para a Erradicação do Analfabetismo no Ano

2000, adotado pela Conferência Geral da UNESCO em sua vigésima-quinta reunião

(l989); o Programa Especial da ISESCO (l990-2000); a revisão em curso, pelo Banco

Mundial, de sua política para a educação fundamental; e o Programa da USAID para

o Fomento da Educação Básica e Alfabetização. Na medida em que esses planos

de ação, políticas e programas sejam coerentes com este Plano, os esforços

internacionais para satisfação das necessidades básicas de aprendizagem

convergirão, facilitando a cooperação.

3. Ainda que os países tenham muitos interesses comuns, no que tange à

satisfação das necessidades básicas de aprendizagem de suas populações, é

340

evidente que o caráter e a intensidade dessas preocupações variam de acordo com

a real situação da educação básica e do contexto cultural e socioeconôrnico de cada

país. Caso se mantenham os índices atuais de matrícula, por volta do ano 2000 mais

de 160 milhões de crianças no mundo inteiro não terão acesso ao ensino

fundamental, pura e simplesmente em função do crescimento populacional. Em

grande parte da África ao Sul do Saara e em muitos outros países de baixa renda,

proporcionar educação fundamental a um sempre crescente contingente de crianças

permanece um desafio a longo prazo. Apesar dos progressos na alfabetização de

adultos, a maioria desses países ainda apresenta elevados índices de

analfabetismo, o número de analfabetos funcionais adultos é crescente, e constitui-

se, de fato, um grave problema social na maior parte da Ásia e dos Estados Árabes,

assim como na Europa e na América do Norte. Muitas pessoas se vêem privadas da

igualdade de acesso à educação por razões de raça, sexo, língua, deficiência,

origem étnica ou convicções políticas. Além disso, elevadas percentagens de evasão

escolar e resultados de aprendizagem medíocres são problemas detectados

igualmente em todo o mundo. Estas considerações bem gerais ilustram a

necessidade de uma ação decisiva em grande escala, com objetivos e metas

claramente definidos.

OBJETIVOS E METAS

4. O objetivo último da Declaração Mundial sobre Educação para Todos é

satisfazer as necessidades básicas da aprendizagem de todas as crianças, jovens e

adultos. O esforço de longo prazo para a consecução deste objetivo pode ser

sustentado de forma mais eficaz, uma vez estabelecidos objetivos intermediários e

medidos os progressos realizados. Autoridades competentes, aos níveis nacional e

341

estadual, podem tomar a seu cargo o estabelecimento desses objetivos

intermediários, levando em consideração tanto os objetivos da Declaração quanto as

metas e prioridades gerais do desenvolvimento nacional.

5. Objetivos intermediários podem ser formulados como metas específicas

dentro dos planos nacionais e estaduais de desenvolvimento da educação. De modo

geral, essas metas:

(i) indicam, em relação aos critérios de avaliação, ganhos e resultados esperados

em um determinado lapso de tempo;

(ii) definem as categorias prioritárias (por exemplo, os pobres, os portadores de

deficiências); e

(iii) são formuladas de modo a permitir comprovação e medida dos avanços

registrados. Essas metas representam um "piso" - não um "teto" - para o

desenvolvimento contínuo dos serviços e dos programas de educação.

6. Objetivos de curto prazo suscitam um sentimento de urgência e servem

como parâmetro de referência para a comparação de índices de execução e

realização. À medida que as condições da sociedade mudam, os planos e objetivos

podem ser revistos e atualizados. Onde os esforços pela educação básica tenham

que focalizar a satisfação das necessidades específicas de determinados grupos

sociais ou camadas da população, o estabelecimento de metas direcionadas a

esses grupos prioritários de educandos pode ajudar planejadores, profissionais e

avaliadores a não se desviarem do seu objetivo. Metas observáveis e mensuráveis

contribuem para a avaliação objetiva dos progressos.

7. As metas não precisam ser fundamentadas exclusivamente em tendências

e recursos atuais. Objetivos preliminares podem refletir uma apreciação realista das

possibilidades oferecidas pela Declaração, no que concerne à mobilização das

342

capacidades humanas, organizativas e financeiras adicionais, em torno de um

compromisso de cooperação para o desenvolvimento humano. Países que

apresentem baixos índices de alfabetização e escolarização, além de recursos

nacionais muito limitados, serão confrontados com escolhas difíceis ao longo do

processo de estabelecimento de metas nacionais a prazos realistas.

8. Cada país poderá estabelecer suas próprias metas para a década de 1990,

em consonância às dimensões propostas a seguir:

1. Expansão dos cuidados básicos e atividades de desenvolvimento infantil,

incluídas aí as intervenções da famflia e da comunidade, direcionadas

especialmente às crianças pobres, desassistidas e portadoras de deficiências;

2. Acesso universal e conclusão da educação fundamental (ou qualquer nível

mais elevado de educação considerado "básico") até o ano 2000;

3. Melhoria dos resultados de aprendizagem, de modo que a percentagem

convencionada de uma amostra de idade determinada (por exemplo, 80% da faixa

etária de 14 anos), alcance ou ultrapasse o padrão desejável de aquisição de

conhecimentos previamente definido;

4. Redução da taxa de analfabetismo adulto à metade, digamos, do nível

registrado em 1990, já no ano 2000 (a faixa etária adequada deve ser determinada

em cada país). Ênfase especial deve ser conferida à alfabetização da mulher, de

modo a reduzir significativamente a desigualdade existente entre os índices de

alfabetização dos homens e mulheres;

5. Ampliação dos serviços de educação básica e capacitação em outras

habilidades essenciais necessárias aos jovens e adultos, avaliando a eficácia dos

programas em função de mudanças de comportamento e impactos na saúde,

emprego e produtividade;

343

6. Aumento da aquisição, por parte dos indivíduos e famílias, dos

conhecimentos, habilidades e valores necessários a uma vida melhor e um

desenvolvimento racional e constante, por meio de todos os canais da educação -

inclusive dos meios de comunicação de massa, outras formas de comunicação

tradicionais e modernas, e ação social -, sendo a eficácia destas intervenções

avaliadas em função das mudanças de comportamento observadas.

9. Sempre que possível, deve-se estabelecer níveis de desempenho para os

aspectos anteriormente indicados. Tais níveis devem ser coerentes com a atenção

prioritária dada pela educação básica à universalização do acesso e à aquisição da

aprendizagem, consideradas aspirações conjuntas e inseparáveis. Em todos os

casos, as metas de desempenho devem incluir a igualdade entre os sexos. No

entanto, a determinação dos níveis de desempenho e da proporção de participantes

que deverão -atingir esses níveis em programas específicos de educação básica,

deve ser deixada a cargo de cada país.

PRINCÍPlOS DE AÇÃO

10. O primeiro passo consiste em identificar, de preferência mediante um

processo de participação ativa, envolvendo grupos e a comunidade, os sistemas

tradicionais de aprendizagem que existem na sociedade e a demanda real por

serviços de educação básica, seja em termos de escolaridade formal, seja em

programas de educação não-formal. Consiste em abordar, por todos os meios, as

necessidades de aprendizagem básica: cuidados básicos e oportunidades de

desenvolvimento e educação infantis; ensino fundamental relevante, de qualidade,

ou uma educação extra-escolar equivalente para as crianças; e alfabetização,

conhecimentos básicos e capacitação de jovens e adultos em habilidades para a

344

vida cotidiana. Significa também capitalizar o uso dos meios tradicionais e modernos

de informação e de tecnologias para educar o público em questões de interesse

social e apoiar as atividades de educação básica. Esses elementos complementares

da educação básica devem ser concebidos de maneira a garantir o acesso

eqüitativo, a participação contínua e a aquisição efetiva da aprendizagem. A

satisfação das necessidades básicas de aprendizagem também envolve ações de

adequação dos ambientes familiar e comunitário à aprendizagem, e a correlação da

educação básica a um contexto socioeconômico mais amplo. É preciso ainda

reconhecer o caráter de complementaridade e os efeitos multiplicadores dos

investimentos de recursos humanos em matéria de população, saúde e nutrição.

11. Por serem as necessidades básicas de aprendizagem complexas e

diversas, sua satisfação requer ações e estratégias multissetoriais que sejam parte

integrante dos esforços de desenvolvimento global. Se, mais uma vez, a educação

básica for considerada corno responsabilidade de toda a sociedade, muitos

parceiros deverão unir-se às autoridades educacionais, aos educadores e a outros

trabalhadores da área educacional, para o seu desenvolvimento. Isso implica que

uma ampla gama de colaboradores - famílias, professores, comunidades, empresas

privadas (inclusive as da área de informação e comunicação), organizações

governamentais e não-governamentais, instituições, etc. - participe ativamente na

planificação, gestão e avaliação das inúmeras formas assumidas pela educação

básica.

12. As práticas correntes e os dispositivos institucionais de provimento de

educação básica e os mecanismos de cooperação nesta esfera devem ser

cuidadosamente avaliados, antes da criação de novos mecanismos ou instituições.

Construir sobre os esquemas de aprendizagem existentes, reabilitando as escolas

345

deterioradas, aperfeiçoando a capacidade e as condições de trabalho do pessoal

docente e dos agentes de alfabetização, parece ser mais rentável e produzir

resultados mais imediatos que os projetos iniciados a partir de zero.

13. A realização de ações conjuntas com organizações não-governarnentais,

em todos os níveis, oferece grandes possibilidades. Essas entidades autônomas, ao

mesmo tempo que defendem pontos de vista públicos, independentes e críticos,

podem desempenhar funções de acompanhamento, pesquisa, formação e produção

de material, em proveito dos processos da educação não-formal e da educação

permanente.

14. O propósito primeiro da cooperação bilateral e multilateral deve nascer do

verdadeiro espírito de parceria: não se trata de transplantar modelos rotineiros, mas

de fomentar o desenvolvimento da capacidade endógena das autoridades de cada

país e de seus colaboradores nacionais, para a satisfação eficaz das necessidades

básicas de aprendizagem. As ações e os recursos devem ser empregados para

fortalecer as características essenciais dos serviços de educação básica,

concentrando-se na capacidade de gestão e de análise, que podem estimular novos

avanços. A cooperação e o financiamento internacionais podem ser particularmente

valiosos no apoio a reformas importantes ou ajustes setoriais, e no fomento e teste

de abordagens inovadoras no ensino e na administração, quando seja necessária a

experimentação de novas opções e/ou quando envolvam investimentos maiores que

o previsto e, finalmente, quando o conhecimento de experiências relevantes

produzidas alhures for de alguma utilidade.

15. Cooperação internacional deve ser oferecida, prioritariamente, aos países

atualmente menos capazes de satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem

de suas populações. Deve intentar, também, ajudar países a corrigir suas

346

desigualdades internas quanto às oportunidades de educação. Tendo em vista que

dois terços dos adultos analfabetos e das crianças que não vão à escola são

mulheres, será necessário dar prioridade à melhoria do acesso de meninas e

mulheres à educação e a supressão de quantos obstáculos impeçam a sua

participação ativa, onde quer que existam essas injustiças.

1. AÇÃO PRIORITÁRIA EM NÍVEL NACIONAL

16. O progresso na satisfação das necessidades básicas de aprendizagem

para todos dependerá, em última instância, das ações adotadas em cada país,

individualmente. Ainda que cooperação e ajuda financeira continentais e

intercontinentais possam apoiar e facilitar essas ações, as autoridades públicas, as

comunidades e as diversas contrapartes nacionais são os agentes-chave de todo

progresso. Os governos nacionais são os principais responsáveis pela coordenação

do uso dos recursos internos e externos. Dada a diversidade de situações,

capacidades, planos e metas de desenvolvimento dos países, este Plano de Ação

pode apenas sugerir certas áreas como merecedoras de atenção prioritária. Cada

país determinará soberanamente quais ações concretas e específicas, além

daquelas já em curso, fazem-se necessárias em cada uma das seguintes áreas.

1.1 AVALIAR NECESSIDADES E PLANEJAR AÇÕES

17. Para alcançar o conjunto de suas metas, cada país será encorajado a

elaborar ou atualizar planos de ação mais amplos e a longo prazo, aos níveis local e

nacional, para a satisfação das necessidades de aprendizagem consideradas

básicas. No contexto dos planos e estratégias gerais de desenvolvimento ou

específicos para a educação, já existentes, um plano de ação de educação básica

347

para todos será necessariamente multissetorial, de forma a orientar as atividades

dos setores envolvidos (por exemplo, educação, informação, meios de comunicação,

trabalho, agricultura, saúde). Modelos de planejamento estratégico variam por

definição. No entanto, a maioria deles envolve ajustes constantes entre os objetivos,

recursos, ações e limitações. Em nível nacional, os objetivos são comumente

expressos em termos gerais, ocorrendo o mesmo com respeito aos recursos do

governo central, enquanto que as ações são executadas em nível local. Assim,

planos locais divergirão naturalmente, quando num mesmo contexto, não apenas

quanto ao seu alcance, mas também quanto ao conteúdo. Planos de ação nacional,

estadual e local devem prever variações de condições e circunstâncias. Podem,

portanto, especificar:

• Os estudos para a avaliação dos sistemas existentes (análises dos

problemas, falhas e êxitos);

• As necessidades básicas de aprendizagem a serem satisfeitas,

incluindo também capacidades cognitivas, valores e atitudes, tanto quanto

conhecimentos sobre matérias determinadas;

• As línguas a serem utilizadas na educação;

• Os meios para estimular a demanda e a participação em grande escala

na educação básica;

• As formas de mobilização da família e obtenção do apoio da

comunidade local;

• As metas e objetivos específicos;

• O capital necessário e os recursos ordinários, devidamente avaliados,

assim como as possíveis medidas para garantir seu efetivo retorno;

348

• Os indicadores e procedimentos a serem usados para medir os

progressos obtidos na consecução das metas;

• As prioridades no uso dos recursos e no desenvolvimento dos serviços

e dos programas ao longo do tempo;

• Os grupos prioritários que requerem medidas especiais;

• Os tipos de competência requeridos para programar o plano;

• Os dispositivos institucionais e administrativos necessários;

• Os meios para assegurar o intercâmbio de informação entre programas

de educação formal e outros programas de educação básica; e.

• A estratégia de implementação e o cronograma.

1.2 DESENVOLVER UM CONTEXTO POLÍTICO FAVORÁVEL

18. Um plano de ação multissetorial implica ajustes das políticas setoriais de

forma a favorecer a interação mutuamente proveitosa entre os setores, em

consonância aos objetivos de desenvolvimento global do país. As ações orientadas

para a satisfação das necessidades básicas de educação devem ser parte

integrante das estratégias de desenvolvimento nacional e regional, e estas, por sua

vez, devem refletir a prioridade conferida ao desenvolvimento humano. Podem ser

necessárias medidas legislativas ou de outro tipo para promover e facilitar a

cooperação entre os diversos parceiros envolvidos. Promover o compromisso com a

educação básica, bem como informar o público sobre o tema, são passos

importantes no sentido de criar um contexto político favorável, aos níveis nacional,

regional e local.

19. Quatro passos concretos merecem atenção:

349

(i) o início de atividades, aos níveis nacional e regional, para renovar o compromisso

amplo e público com o objetivo da educação para todos;

(ii) a redução da ineficácia do setor público e das práticas abusivas no setor privado;

(iii) a melhor capacitação dos administradores públicos e o estabelecimento de

incentivos para reter mulheres e homens qualificados no serviço público; e

(iv) a adoção de medidas para fomentar a participação mais ampla na concepção e

na execução dos programas de educação básica.

1.3. DEFINIR POLÍTICAS PARA A MELHORIA DA EDUCAÇÃO BÁSICA

20. As pré-condições para a qualidade, eqüidade e eficácia da educação são

construídas na primeira infância, sendo os cuidados básicos e as atividades de

desenvolvimento e educação infantis condições essenciais para a consecução dos

objetivos da educação básica. Esta deve corresponder às necessidades, interesses

e problemas reais dos participantes do processo de aprendizagem. A relevância dos

currículos pode ser incrementada vinculando-se alfabetização, habilidades

matemáticas e conceitos científicos aos interesses e primeiras experiências do

educando, como, por exemplo, aquelas relativas à nutrição, saúde e trabalho.

Enquanto muitas necessidades variam consideravelmente entre os países e dentro

deles e, portanto, a maior parte de um currículo deva ser sensível às condições

locais, há também muitas necessidades universais e interesses comuns que devem

ser levados em conta nos programas educacionais e no discurso pedagógico.

Questões como a proteção do meio ambiente, uma relação equilibrada

população/recursos, a redução da propagação da AIDS e a prevenção do consumo

de drogas são problemas de todos, igualmente.

350

21. As estratégias específicas, orientadas concretamente para melhorar as

condições de escolaridade, podem ter como foco: os educandos e seu processo de

aprendizagem; o pessoal (educadores, administradores e outros); o currículo e a

avaliação da aprendizagem; materiais didáticos e instalações. Estas estratégias

devem ser aplicadas de maneira integrada; sua elaboração, gestão e avaliação

devem levar em conta a aquisição de conhecimentos e capacidades para resolver

problemas, assim como as dimensões sociais, culturais e éticas do desenvolvimento

humano. A formação dos educadores deve estar em consonância aos resultados

pretendidos, permitindo que eles se beneficiem simultaneamente dos programas de

capacitação em serviço e outros incentivos relacionados à obtenção desses

resultados; currículo e avaliações devem refletir uma variedade de critérios,

enquanto que os materiais, inclusive a rede física e as instalações, devem seguir a

mesma orientação. Em alguns países, a estratégia deve incluir mecanismos para

aperfeiçoar as condições de ensino e aprendizagem, de modo a reduzir o

absenteísmo e ampliar o tempo de aprendizagem. Para satisfazer as necessidades

educacionais de grupos que não participam da escolaridade formal, fazem-se

necessárias estratégias apropriadas à educação não-formal. Estas incluem e

transcendem os aspectos já mencionados, e podem ainda conceder especial

atenção à necessidade de coordenação com outras formas de educação, o apoio de

todos os parceiros envolvidos, os recursos financeiros permanentes e a plena

participação da sociedade. Encontramos um exemplo deste enfoque aplicado à

alfabetização no "Plano de Ação para a Erradicação do Analfabetismo antes do Ano

2000", da UNESCO.

Outras estratégias podem ainda recorrer aos meios de comunicação para

satisfazer as necessidades educacionais mais amplas de toda a comunidade

351

devendo, todavia, vincular-se à educação formal, à educação não-formal, ou a uma

combinação de ambas. A utilização dos meios de comunicação traz em si um

tremendo potencial no que diz respeito a educar o público e compartilhar um volume

considerável de informações entre aqueles que necessitam do conhecimento.

22. Ampliar o acesso à educação básica de qualidade satisfatória é um meio

eficaz de fomentar a eqüidade. A permanência do envolvimento de meninas e

mulheres em atividades de educação básica até a consecução do nível padrão de

aprendizagem pode ser garantida se lhes forem oferecidos incentivos, via medidas

especialmente elaboradas para esse fim e, sempre que possível, com a participação

delas. Enfoques similares são necessários para incrementar as possibilidades de

aprendizagem de outros grupos desassistidos.

23. Promover urna educação básica eficaz não significa oferecer educação a

mais baixos custos, porém utilizar, com maior eficácia, todos os recursos (humanos,

organizativos e financeiros), para obter os níveis pretendidos de acesso e

desempenho escolar. As considerações anteriores relativas à relevância, à

qualidade e à eqüidade não se constituem alternativas à eficácia, representam,

antes, as condições específicas em que esta deve ser obtida. De fato, em alguns

programas, a eficácia irá exigir um aumento, e não uma redução dos recursos. No

entanto, se os recursos existentes podem ser utilizados por um número maior de

educandos ou se os mesmos objetivos de aprendizagem podem ser alcançados a

um menor custo por aluno, então será facilitada à educação básica a consecução

das metas de acesso e desempenho para os grupos atualmente desassistidos.

1.4 APERFEIÇOAR CAPACIDADES GERENCIAIS, ANALÍTICAS E

TECNOLÓGICAS

352

24. Serão necessárias inúmeras habilidades e especialidades para pôr em

prática essas iniciativas. Tanto o pessoal de supervisão e administração quanto os

planejadores, arquitetos de escolas, os formadores de educadores, especialistas em

currículo, pesquisadores, analistas, etc., são igualmente importantes para qualquer

estratégia de melhoria da educação básica. Não obstante, são muitos os países que

não lhes proporcionam capacitação especializada, a fim de prepará-los para o

exercício de suas funções; isto é especialmente correto quanto à alfabetização e

outras atividades de educação básica que se desenvolvem fora da escola. Uma

concepção mais ampla da educação básica será pré-requisito crucial para a efetiva

coordenação de esforços entre esses muitos participantes. E, em muitos países, o

fortalecimento e o desenvolvimento da capacidade de planejamento e gestão, aos

níveis estadual e local, com uma maior distribuição de responsabilidades, serão

necessários. Programas de formação e de capacitação em serviço para o pessoal-

chave devem ser iniciados ou reforçados onde já existirem. Tais programas podem

ser particularmente úteis à introdução de reformas administrativas e técnicas

inovadoras no campo da administração e da supervisão.

25. Os serviços técnicos e os mecanismos para coletar, processar e analisar

os dados referentes à educação básica podem ser melhorados em todos os países.

Essa é uma tarefa urgente em muitas nações, onde faltam informações e/ou

pesquisas confiáveis sobre as necessidades básicas de aprendizagem da

população, e sobre as atividades de educação básica existentes. Uma base de

informações e conhecimentos sobre um determinado país é vital para a preparação

e execução de seu plano de ação. Uma implicação capital do enfoque na aquisição

de aprendizagem é a necessidade de se elaborarem e aperfeiçoarem sistemas

eficazes para a avaliação do rendimento individual dos educandos e do sistema de

353

ensino. Os dados derivados da avaliação dos processos e dos resultados devem

servir de base a um sistema de informação administrativa para a educação básica.

26. A qualidade e a oferta da educação básica podem ser melhoradas

mediante a utilização cuidadosa das tecnologias educativas. Onde tais tecnologias

não forem amplamente utilizadas, sua introdução exigirá a seleção e/ou

desenvolvimento de tecnologias adequadas, aquisição de equipamento necessário e

sistemas operativos, a seleção e treinamento de professores e demais profissionais

de educação aptos a trabalhar com eles. A definição de tecnologia adequada varia

conforme as características de cada sociedade e poderá mudar rapidamente, na

medida em que as novas tecnologias (rádio e televisão educativos, computadores e

diversos auxiliares audiovisuais para a instrução) se tornem mais baratas e

adaptáveis aos diversos contextos. O uso da tecnologia moderna também permite

melhorar a gestão da educação básica. Cada país deverá reavaliar periodicamente

sua capacidade tecnológica presente e potencial, em relação aos seus recursos e

necessidades básicas educacionais.

1.5. MOBILIZAR CANAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

27. As novas possibilidades que surgem a todo momento exercem poderosa

influência na satisfação das necessidades básicas de aprendizagem, e é evidente

que esse potencial educativo mal começa a ser aproveitado. Essas novas

possibilidades são, em grande parte, resultado da convergência de duas forças,

ambas subprodutos recentes do processo de desenvolvimento geral. Em primeiro

lugar, a quantidade de informação disponível no mundo - uma boa parcela da qual

importante para a sobrevivência e o bem-estar básico dos povos - é imensamente

maior do que a existente há poucos anos, e o seu ritmo de crescimento continua se

354

acelerando. Por outro lado, quando uma informação importante está associada a

outro grande avanço moderno - a nova capacidade de intercomunicação no mundo

de hoje - produz-se um energético efeito multiplicador. E existe, de fato, a

possibilidade de dominar essa força e utilizá-la positiva, consciente e

intencionalmente, para a satisfação das necessidades de aprendizagem já definidas.

1.6. ESTRUTURAR ALIANÇAS E MOBILIZAR RECURSOS

28. Na definição do plano de ação e na criação de um contexto de políticas de

apoio à promoção da educação básica, seria necessário pensar em aproveitar ao

máximo as oportunidades de ampliar a colaboração existente e incorporar novos

parceiros como, por exemplo, a família e as organizações não-governamentais e

associações de voluntários, sindicatos de professores, outros grupos profissionais,

empregadores, meios de comunicação, partidos políticos, cooperativas,

universidades, instituições de pesquisa e organismos religiosos, bem como

autoridades educacionais e demais serviços e órgãos governamentais (trabalho,

agricultura, saúde, informação, comércio, indústria, defesa, etc.). Os recursos

humanos e organizativos representados por estes colaboradores nacionais deverão

ser eficazmente mobilizados para desempenhar seu papel na execução do plano de

ação. A parceria deve ser estimulada aos níveis comunitário, local, estadual, regional

e nacional, já que pode contribuir para harmonizar atividades, utilizar os recursos

com maior eficácia e mobilizar recursos financeiros e humanos adicionais, quando

necessário.

29. Os governos e seus parceiros podem analisar a alocação e uso corrente dos

recursos financeiros e outros para a educação e capacitação nos diferentes setores,

355

a fim de determinar se apoio adicional à educação básica pode ser obtido mediante:

(i) o incremento da eficácia;

(ii) a mobilização de fontes adicionais de financiamento, dentro e fora do orçamento

público; e

(iii) a redistribuição dos fundos dos orçamentos de educação e capacitação atuais,

levando em conta os critérios de eficácia e eqüidade. Nos países onde a

contribuição orçamentaria total para a educação é escassa, será necessário estudar

a possibilidade de realocar, para a educação básica, certos fundos públicos,

anteriormente destinados a outros fins.

30. Avaliar os recursos já destinados ou potencialmente disponíveis para a

educação básica, comparando-os com o orçamento previsto para a execução do

plano de ação, permite detectar possíveis inadequações que, a longo prazo, podem

afetar o calendário das atividades planejadas ou solicitar alternativas diversas de

solução. Os países que necessitam de ajuda externa para satisfazer as

necessidades básicas de aprendizagem de suas populações podem utilizar a

estimativa de recursos e o plano de ação como base para a discussão com seus

aliados internacionais, e também para coordenar financiamentos externos.

31. Os educandos constituem, em si mesmos, um recurso humano vital a ser

mobilizado. A demanda pela educação e a participação nas atividades educativas

não podem ser meramente pressupostas, antes, devem ser estimuladas ativamente.

Os educandos potenciais precisam ver que os benefícios da educação são maiores

do que os custos a serem enfrentados, seja por deixarem de receber ganhos, seja

pela redução do tempo disponível para atividades comunitárias, domésticas, ou

lazer. Meninas e mulheres, em particular, podem ser convencidas a abrir mão das

vantagens da educação básica por razões inerentes a determinadas culturas. Essas

356

barreiras à participação podem ser superadas pelo emprego de incentivos e

programas adaptados ao contexto local, fazendo com que sejam encaradas, pelos

educandos, suas famílias e comunidades, como "atividades produtivas". Além disso,

os educandos tendem a obter maior proveito da educação quando são parte

integrante do processo educativo, em vez de serem considerados como simples

"insumos" ou "beneficiários". A atenção às questões da demanda e da participação

ajudará a garantir a mobilização das capacidades pessoais dos educandos para a

educação.

32. Os recursos da família, principalmente em tempo e apoio recíprocos, são

vitais para o êxito das atividades de educação básica. Podem ser oferecidos às

famílias incentivos e assistência que lhes assegurem que os seus recursos serão

investidos de modo a permitir que todos os seus membros possam se beneficiar, o

mais plena e eqüitativamente possível, das oportunidades de educação básica.

33. O proeminente papel do professor e demais profissionais da educação no

provimento de educação básica de qualidade deverá ser reconhecido e

desenvolvido, de forma a otimizar sua contribuição. Isso irá implicar a adoção de

medidas para garantir o respeito aos seus direitos sindicais e liberdades

profissionais, e melhorar suas condições e status de trabalho, principalmente em

relação à sua contratação, formação inicial, capacitação em serviço, remuneração e

possibilidades de desenvolvimento na carreira docente, bem como para permitir ao

pessoal docente a plena satisfação de suas aspirações e o cumprimento satisfatório

de suas obrigações sociais e responsabilidades éticas.

34. Em parceria com o pessoal escolar e agentes comunitários, as bibliotecas

devem constituir-se elo essencial no processo de provisão de recursos educativos a

todos os educandos - da infância à idade adulta - tanto nos meios escolares quanto

357

não escolares. É preciso, portanto, reconhecer as bibliotecas como inestimáveis

fontes de informação.

35. Associações comunitárias, cooperativas, instituições religiosas e outras

organizações não-governamentais também desempenham papéis importantes no

apoio e provisão de educação básica. Sua experiência, competência, dinamismo e

relações diretas com os diversos setores que representam constituem-se valiosos

recursos na identificação e satisfação das necessidades básicas de aprendizagem.

Deve-se promover sua participação ativa em alianças para a educação básica,

mediante políticas e mecanismos que fortaleçam suas capacidades e reconheçam

sua autonomia.

2. AÇÃO PRIORITÁRIA AO NÍVEL REGIONAL (CONTINENTAL,

SUBCONTINENTAL E INTERCONTINENTAL)

36. As necessidades básicas de aprendizagem devem ser satisfeitas

mediante ações integradas dentro das fronteiras de cada país. Porém, existem

muitas formas de cooperação entre países com condições e interesses similares,

que poderiam contribuir e, de fato, contribuem para esse esforço. Algumas regiões já

elaboraram planos, como o Plano de Ação de Jacarta para o Desenvolvimento dos

Recursos Humanos, aprovado pela ESCAP, 1988. Mediante o intercâmbio de

informações e experiências, a colaboração entre especialistas, o uso comum de

instalações e os projetos de atividades conjuntas, vários países, trabalhando

integradamente, podem incrementar sua base de recursos e diminui; seus custos,

em benefício mútuo. Freqüentemente, esses convênios se estabelecem entre

nações vizinhas (nível subcontinental), de uma mesma grande região geocultural

(continental ou subcontinental), ou entre as que compartilham o mesmo idioma ou

358

mantêm entre si relações culturais e comerciais (inter) ou subcontinental).

Organizações continentais e internacionais desempenham, muitas vezes, um papel

importante num tal contexto, facilitando este tipo de cooperação entre países. Na

exposição a seguir, todas essas atividades estarão englobadas no termo "regional".

De modo geral, os convênios "regionais" já existentes deveriam ser fortalecidos e

providos dos recursos necessários ao seu funcionamento eficaz, ajudando os países

a satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem de sua população.

2.1 INTERCAMBIAR INFORMAÇÕES, EXPERIÊNCIAS E COMPETÊNCIAS

37. Diversos mecanismos regionais, tanto de caráter intergovernamental

quanto não-governamental, promovem a cooperação em matéria de educação e

capacitação, saúde, desenvolvimento agrícola, pesquisa e informação,

comunicação, e em outros campos relativos à satisfação das necessidades básicas

de aprendizagem. Esses mecanismos podem ser ainda mais ampliados para fazer

face às necessidades (em constante mudança) das partes. Entre outros possíveis

exemplos, cabe indicar os quatro programas regionais estabelecidos sob a égide da

UNESCO, na década de 80, para apoiar os esforços nacionais para a

universalização da educação fundamental e eliminar o analfabetismo adulto:

• Projeto Principal de Educação para América Latina e o Caribe;

• Programa Regional para a Erradicação do Analfabetismo na África; -

Programa de Educação para Todos na Ásia e no Pacífico (APPEAL);

• Programa Regional para a Universalização e Renovação da Educação

Primária e a Erradicação do Analfabetismo nos Estados Árabes no Ano 2000

(ARABUPEAL).

359

38. Além das consultas técnicas e políticas organizadas em interação com

esses programas, podem ser empregados outros mecanismos de consulta relativos

a políticas de educação básica. Seria possível recorrer, sempre que necessário, às

conferências de ministros de educação, auspiciadas pela UNESCO e por várias

organizações regionais, às assembléias ordinárias das comissões regionais das

Nações Unidas e a algumas reuniões transregionais, organizadas pela Secretaria da

Comunidade Britânica das Nações, à CONFEMEN (Conferência Permanente dê

Ministros de Educação dos Países Francófonos), à Organização de Cooperação e

Desenvolvimento Econômicos (OECD), e à Organização lslâmica para a Educação,

a Ciência e a Cultura (ISESCO). Além disso, numerosas conferências e encontros

organizados por organismos não-governamentais oferecem aos profissionais

oportunidades de troca de informações e pontos de vista sobre questões técnicas e

políticas. Os promotores dessas conferências e reuniões poderiam analisar meios de

ampliar a participação, para incluir, quando conveniente, representantes de outros

setores engajados na luta pela satisfação das necessidades básicas de

aprendizagem.

39. As oportunidades de utilização conjunta das mensagens e programas dos

meios de comunicação deveriam ser aproveitadas plenamente pelos países que

possam intercornunicá-las ou elaborá-las em parceria - especialmente onde os

vínculos lingüísticas e culturais ultrapassem fronteiras políticas.

2.2 EMPREENDER ATIVIDADES CONJUNTAS

40. Há muitas atividades que podem ser realizadas conjuntamente pelos

países, em apoio aos esforços nacionais de implementação dos planos de educação

básica. As atividades conjuntas deveriam ser concebidas com vistas ao

360

aproveitamento das economias de escala e às vantagens comparativas dos países

participantes. Seis áreas parecem-nos particularmente apropriadas a essa forma de

colaboração regional:

(i) capacitação de pessoal-chave, como planejadores, administradores, formadores

de educadores, pesquisadores, etc.;

(ii) esforços para melhorar a coleta e análise da informação;

(iii) pesquisa;

(iv) produção de material didático;

(v) utilização dos meios de comunicação para satisfazer as necessidades básicas

de aprendizagem; e

(vi) gestão e uso dos serviços de educação à distância.

Também, nesse aspecto, existem muitos mecanismos que poderiam ser

utilizados para fomentar tais atividades. Entre eles, o Instituto Internacional de

Planejamento da Educação, da UNESCO, e suas redes de capacitação e pesquisa,

bem como a rede de informação do IBE e o Instituto de Educação da UNESCO; as

cinco redes para a inovação educacional, operando sob os auspícios da UNESCO;

os grupos consultivos de pesquisa e estudo (RRGAs), associados ao Centro

Internacional de Pesquisa Para o Desenvolvimento (IDRC); o "Commonwealth of

Learning"; o Centro Cultural Asiático para a UNESCO; a rede participante

estabelecida pelo Conselho Internacional para a Educação de Adultos; e a

Associação Internacional para a Avaliação do Desempenho Escolar, que congrega

as principais instituições nacionais de pesquisa de, aproximadamente, 35 países.

Certas agências de desenvolvimento bilateral e multilateral, que acumularam

experiência valiosa em uma ou mais dessas áreas, devem interessar-se em

participar nas atividades conjuntas. As cinco comissões regionais das Nações

361

Unidas podem prestar apoio adicional a essa colaboração regional, particularmente

pela mobilização de dirigentes para a tomada das medidas adequadas.

3. AÇÃO PRIORITÁRIA EM NÍVEL MUNDIAL

41. A comunidade mundial tem uma sólida história de cooperação em

educação desenvolvimento. Entretanto, financiamentos internacionais para a

Educação registraram uma certa estagnação em princípios dos anos 80; ao mesmo

tempo, muitos países sofreram desvantagens resultantes do crescimento de sua

dívida e das relações econômicas canalizadores de recursos financeiros e humanos

para países mais ricos. Países industrializados ou em desenvolvimento

compartilham um interesse comum pela educação básica; por isso mesmo, a

cooperação internacional poderá aportar valioso apoio aos esforços e ações

nacionais e regionais, no sentido de implementar um enfoque mais amplo da

Educação para Todos. Tempo, energia e fundos destinados à educação básica

constituem-se, talvez, o mais importante investimento que se pode fazer no povo e

no futuro de um país; há uma clara necessidade e um forte argumento moral e

econômico apelando à solidariedade internacional para que se proporcione

cooperação técnica e financeira aos países que carecem dos recursos necessários

ao atendimento das necessidades básicas de aprendizagem de suas populações.

3.1 COOPERAR NO CONTEXTO INTERNACIONAL

42. Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem constitui-se

responsabilidade comum e universal a todos os povos. As perspectivas de

satisfação dessas necessidades são determinadas, em parte, pela dinâmica das

relações e do comércio internacional. Graças ao relaxamento das tensões e ao

362

decréscimo do número de conflitos armados, apresenta-se agora uma possibilidade

real de redução do tremendo desperdício representado pelos gastos militares que

poderão, então, ser canalizados para setores socialmente úteis, entre os quais a

educação básica. A urgente tarefa de satisfação das necessidades básicas de

aprendizagem pode vir a requerer uma tal realocação de recursos entre os diversos

setores. A comunidade mundial e os governos nacionais deverão proceder ao

planejamento dessa conversão de recursos a fins pacíficos, munidos de coragem, e

discernimento, agindo de forma cuidadosa e refletida. Serão igualmente necessárias

medidas internacionais para redução ou eliminação dos desequilíbrios ora

registrados nas relações comerciais, e também para reduzir o fardo da dívida, de

forma a possibilitar aos países de baixa renda reconstituir suas economias, otimizar

e manter os recursos humanos e financeiros necessários ao desenvolvimento e ao

provimento de educação básica às suas populações. Políticas de ajuste estrutural

devem assegurar os níveis adequados de recursos a serem alocados para a

educação.

3.2 FORTALECER AS CAPACIDADES NACIONAIS

43. Apoio internacional deve ser proporcionado, quando solicitado, aos países

desejosos de desenvolver as capacidades nacionais necessárias ao planejamento e

administração dos programas e serviços de educação básica ( ver seção 1.4). Cabe

a cada nação, em particular, a responsabilidade capital pela elaboração e

administração dos programas de provisão das necessidades de aprendizagem de

toda a população. A cooperação internacional pode traduzir-se também em

capacitação e desenvolvimento institucional para a coleta, análise e pesquisa de

dados, inovações tecnológicas e metodológicas educacionais. Sistemas informáticos

363

e outros métodos modernos de gerenciamento poderiam também ser introduzidos,

com ênfase nos níveis inferior e médio de administração. Essas capacidades serão

ainda mais necessárias como apoio à melhoria da qualidade da educação

fundamental e à introdução de programas extra-escolares inovadores. Além do apoio

direto a países e instituições, a cooperação internacional pode também ser

proveitosamente canalizada para atividades conjuntas - intercâmbio de programas

de pesquisa, capacitação e informação - conduzidas por entidades internacionais,

regionais e bilaterais. De fato, atividades de capacitação e informação devem ser

baseadas e apoiadas, aperfeiçoadas e fortalecidas, quando for o caso, por

instituições e programas já existentes, em detrimento da criação de novas

estruturas. Um tal tipo de apoio será particularmente valioso no âmbito da

cooperação técnica entre países em desenvolvimento, nos quais tanto as

circunstâncias quanto os recursos disponíveis para lidar com elas são, muitas vezes,

similares.

3.3 PRESTAR APOIO CONTÍNUO E DE LONGO PRAZO ÀS AÇÕES

NACIO NAIS E REGIONAIS (CONTINENTAIS, SUBCONTINENTAIS E

INTERCONTINENTAIS)

44. Satisfazer às necessidades básicas de aprendizagem de todas as

pessoas em todos os países, é, obviamente, um empreendimento a longo prazo.

Este Plano de Ação provê diretrizes para a formulação de planos de ação nacional e

estadual para o desenvolvimento da educação básica, mediante o compromisso

duradouro dos governos e seus colaboradores nacionais, com a ação conjunta para

a consecução das metas e objetivos que eles mesmos se propuseram. Instituições e

agências internacionais, entre as quais pontuam inúmeros patrocinadores, co-

364

patrocinadores e patrocinadores associados da Conferência Mundial sobre

Educação para Todos, devem empenhar-se ativamente no planejamento conjunto e

sustentação do seu apoio de longo prazo às ações nacionais e regionais tipificadas

nas seções anteriores. Os principais patrocinadores da iniciativa de Educação para

Todos (PNUD, UNESCO, UNICEF, Banco Mundial), cada um no âmbito de seu

mandato e responsabilidades especiais, e de acordo com a decisão de suas

instâncias diretoras, devem ratificar seu compromisso de apoio às áreas prioritárias

de ação internacional listadas abaixo, e a adoção de medidas adequadas para a

consecução dos objetivos da Educação para Todos. Sendo a UNESCO a agência

das Nações Unidas particularmente responsável pela educação, deverá conceder

prioridade à implementação do Plano de Ação e fomento à provisão dos serviços

necessários ao fortalecimento da cooperação e coordenação internacionais.

45. Uma maior assistência financeira se faz necessária para que os países

menos desenvolvidos possam implementar seus planos autônomos de ação, em

consonância ao enfoque mais amplo da Educação para Todos. Uma autêntica

parceria, caracterizada pela cooperação e compromissos conjuntos de longo prazo,

permitirá a obtenção de melhores resultados e o estabelecimento das bases para um

aumento substancial do financiamento global para este importante subsetor da

educação. A pedido dos governos, as agências multilaterais e bilaterais deverão

concentrar seu apoio em ações prioritárias, especialmente em nível nacional (ver

seção 1), em áreas, como as que se seguem:

a. Desenho ou atualização de planos de ação multisetoriais nacionais ou

estaduais (ver item 1.1), o que deve acontecer no início dos anos 90. Muitos países

em desenvolvimento carecem de assistência técnica e financeira para a coleta e

365

análise de dados, em particular, e também para a organização de consultarias

nacionais.

b. Esforços nacionais e cooperação entre países para atingir um nível

satisfatório de qualidade e relevância na educação fundamental (com forme os itens

1.3 e 2 acima). Experiências que envolvam a participação das famílias, comunidades

locais e organizações não-governamentais no incremento da relevância da

educação e melhoria de sua qualidade podem ser proveitosamente compartilhadas

por diferentes países.

c. Universalização da educação fundamental nos países economicamente

mais pobres. As agências internacionais de financiamento deveriam considerar

negociações caso-a-caso para a provisão de apoio a longo prazo, de modo a ajudar

cada país em seu progresso rumo à universalização da educação fundamental,

dentro do calendário estabelecido por cada país.

As agências externas devem reavaliar as práticas ordinárias de assistência, e

encontrar maneiras de prestar ajuda efetiva aos programas de educação básica que

exigem não uma contribuição intensiva de capital e tecnologia, porém, apoio

orçamentário a longo prazo. Nesse sentido, é preciso atentar para os critérios

relativos à cooperação para o desenvolvimento da educação, levando em conta

mais que considerações meramente econômicas.

d. Programas desenhados para satisfazer as necessidades básicas de

aprendizagem de grupos desassistidos, jovens fora da escola e adultos com pouco

ou nenhum acesso à educação básica. Todos os parceiros poderão compartilhar

suas experiências e competências na concepção e execução de medidas e

atividades inovadoras, bem como concentrar seus financiamentos para a educação

básica em categorias e grupos específicos (por exemplo: mulheres, camponeses

366

pobres, portadores de deficiências), e assim melhorar significativamente as

oportunidades e condições de aprendizagem que lhes são acessíveis.

e. Programas de educação para mulheres e meninas. Tais programas devem

objetivar a eliminação das barreiras sociais e culturais que têm desencorajado, e

mesmo excluído, mulheres e meninas dos benefícios dos programas regulares de

educação, bem como promover a igualdade de oportunidades para elas em todos os

aspectos de suas vidas.

f. Programas de educação para refugiados. Os programas a cargo de

organizações como o Alto Comitê das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR)

e a Agências das Nações Unidas de Obras e Socorro aos Refugiados Palestinos no

Oriente Próximo (UNRWA), exigem um apoio financeiro a longo prazo, mais

substancial e seguro, para o cumprimento dessa reconhecida responsabilidade

internacional. Nos casos em que os países que acolhem refugiados necessitem de

assistência técnica e financeira internacional para fazer face às necessidades

básicas dos refugiados - as de aprendizagem, inclusive - a comunidade internacional

poderá aliviar este fardo mediante o incremento da cooperação. Esta se estenderá

também ao esforço para assegurar às pessoas que vivem em territórios ocupados,

que foram deslocadas pela guerra ou por outras calamidades, o acesso a programas

de educação básica que preservem sua identidade cultural.

g. Programas de educação básica de todo tipo em países com altas taxas de

analfabetismo (como na África ao Sul do Saara) e com grandes contingentes

populacionais iletrados (como no sul da Ásia). Será necessário uma considerável

assistência para reduzir significativamente o elevado número de adultos analfabetos

no mundo.

367

h. Formação de capacidades para pesquisa. planejamento e a

experimentação de inovações em pequena escala. O êxito das atividades de

Educação para Todos dependerá fundamentalmente da capacidade de cada país

conceber e executar programas que reflitam as condições nacionais. Para isso, será

indispensável uma sólida base de conhecimentos, alimentada pelos resultados da

pesquisa, lições aprendidas com experiências e inovações, tanto quanto pela

disponibilidade de competentes planejadores educacionais.

46. A coordenação dos financiamentos externos para educação é uma área

de co-responsabilidade em nível nacional, que deve ser assumida igualmente pelos

diversos parceiros, e onde os governos beneficiários devem tomar a si a iniciativa,

de forma a garantir o uso eficaz dos recursos, de acordo com as suas prioridades.

As agências de, financiamento do desenvolvimento devem explorar formas

inovadoras e mais flexíveis de cooperação, em consulta com os governos e as

instituições com os quais trabalham e cooperam em iniciativas regionais, como é o

caso do Grupo de Trabalho de Doadores para a Educação na África. Além disso,

devem ser criados outros fóruns, onde as agências de financiamento e os países em

desenvolvimento possam colaborar na elaboração de projetos entre países e discutir

assuntos gerais relativos à ajuda financeira.

3.4 CONSULTAS ACERCA DE QUESTÕES DE POLÍTICA

47. Os atuais canais de comunicação e fóruns de consulta entre as muitas

partes engajadas na satisfação das necessidades básicas de aprendizagem deverão

ser plenamente utilizados durante a década de 90, com o intuito de manter e ampliar

o Consenso internacional em que se baseia este Plano de Ação. Alguns canais e

fóruns, como a Conferência Internacional de Educação, que acontece a cada dois

368

anos, atuam globalmente, enquanto outros se concentram em regiões específicas,

grupos de países ou categorias de parceiros. Na medida do possível, as

organizações devem procurar coordenar estas consultas e compartilhar os

resultados.

48. Além disso, e com a finalidade de manter e desenvolver a iniciativa da

Educação para Todos a comunidade internacional precisará tomar as medidas

apropriadas para assegurar a cooperação entre os organismos interessados,

utilizando, se possível, os mecanismos existentes, de forma a:

(i) continuar propugnando a Educação Básica para Todos, aproveitando-se o

impulso gerado pela Conferência Mundial;

(ii) facilitar o intercâmbio de informação sobre os processos realizados na

consecução das metas da educação básica estabelecidas por cada país,

individualmente, e também sobre as estruturas e os recursos organizativos

necessários para o êxito destas iniciativas;

(iii) encorajar novos parceiros a somarem-se a este esforço mundial; e

(iv) assegurar que todos os participantes estejam plenamente conscientes da

importância de se sustentar um sólido apoio à educação básica.

CALENDÁRIO INDICATIVO DE IMPLEMENTAÇÃO PARA OS ANOS 90

49. No processo de determinação de seus próprios objetivos e metas

intermediárias e preparação do plano de ação para sua consecução, cada país

deverá estabelecer um calendário que harmonize e programe as atividades

específicas. Do mesmo modo, devem ser as ações regionais e internacionais

369

programadas ordenadamente, a fim de ajudar os países a atingir suas metas dentro

do tempo proposto.

O calendário geral que se segue propõe fases indicativas para o trabalho a

ser desenvolvido ao longo dos anos noventa; evidentemente, é possível que certas

fases venham a se imbricar neste processo, tornando necessário adaptar as datas

pré-estabelecidas às condições específicas de cada país e ao seu contexto

organizacional.

1. Governos e organizações devem estabelecer metas específicas e

completar ou atualizar seus pianos de ação para satisfazer as necessidades básicas

de aprendizagem (ver seção 1. 1); adotar medidas para a criação de um contexto

político favorável (l.2), delinear políticas para o incremento da relevância, qualidade,

eqüidade e eficiência dos serviços e programas de educação básica (l.3); definir

como será feita a adaptação dos meios de comunicação e informação à satisfação

das necessidades básicas de aprendizagem (l.4); mobilizar recursos e estabelecer

alianças operacionais (l. 6). Os parceiros internacionais poderão prestar ajuda

mediante o apoio direto e a cooperação regional, completando esta etapa

preparatória (1990-1991).

2. As agências de desenvolvimento devem estabelecer políticas e planos para

a década de 90, em consonância ao seu compromisso de manter o apoio a longo

prazo às ações nacionais e regionais, e ampliar a ajuda técnica e financeira à

educação básica (3.3). Todos os parceiros devem fortalecer e utilizar os

mecanismos apropriados de consulta e cooperação já existentes, bem como

estabelecer procedimentos para o acompanhamento dos progressos aos níveis

regional e internacional (1990-1993).

370

3 . Primeira etapa de implementação dos planos de ação: os organismos

nacionais de coordenação irão acompanhar a implementação e propor ajustes aos

planos. Etapa de realização de ações regionais e internacionais de apoio (1990-

1995).

4. Os governos e as organizações procederão à avaliação do período

intermediário de implementação de seus respectivos planos e, caso necessário,

farão ajustes. Governos, organizações e agências de desenvolvimento deverão

empreender também uma ampla revisão das políticas aos níveis regional e mundial

(1995-1996).

5. Segunda etapa de implementação dos planos de ação e apoio regional e

internacional. As agências de desenvolvimento promoverão ajustes em seus planos,

onde necessário, e incrementos consoantes em sua ajuda à educação básica (1996-

2000).

6. Governos, organizações e agências de desenvolvimento deverão avaliar as

realizações e empreender uma ampla revisão das políticas aos níveis regional e

mundial (2000-2001).

50. Jamais testemunharemos um outro momento tão propício à renovação do

compromisso com o esforço em longo prazo para satisfação das necessidades

básicas de aprendizagem de todas as crianças, jovens e adultos. Tal esforço exigirá,

contudo, um muito maior e racional aporte de recursos para a educação básica e

capacitação do que tem sido feito até o momento. Todavia, os benefícios advindos

deste esforço começarão a ser colhidos de imediato, e crescerão um tanto a cada

dia, até a solução dos grandes problemas mundiais que hoje enfrentamos. E isso

graças, em grande parte, à determinação e perseverança da comunidade

internacional na persecução de sua meta: Educação para Todos.

371

ANEXO AF - - PROPOSTA POLÍTICO-PEDAGÓGICA

ESCOLA ESTADUAL PROF. WILSON LOPES DO COUTO R.0.3.5.B.2 - BOM DESPACHO/MG

Bom Despacho, 01 de março de 2004.

2 – ORGANIZAÇÃO PEDAGÓGICA

F - Avaliação

São distribuídos 100 pontos no decorrer do ano letivo sendo vinte e cinco (25)

pontos por bimestre. Desses vinte e cinco (25) pontos, dez (10) são obrigatoriamente

de prova bimestral. Ao final de cada bimestre os professores reúnem-se com equipe

pedagógica e direção em conselho de classe, para analisar e refletir sobre o

desempenho dos alunos, verificarem os aspectos cognitivos (competências,

habilidades, dificuldades pedagógicas); comportamentais e emocionais (de

interferência no processo ensino-aprendizagem) para juntos buscarem soluções

cabíveis para um melhor desempenho do aluno. A recuperação (que deve ser

paralela) destina-se ao aluno de aproveitamento insuficiente, visando colocá-lo em

condições de desenvolvimento satisfatório.

A progressão parcial é adotada nos 04 (quatro) anos finais do ensino

fundamental e no ensino médio. Beneficia-se da progressão parcial o aluno que não

apresentar o desempenho mínimo em até 02 (duas) disciplinas. Ficará retido na

série em curso o aluno que não apresentar o desempenho mínimo em 03 (três) ou

mais disciplinas, incluindo-se nesse cômputo as disciplinas da série em que se

encontra e aquelas em regime de progressão parcial.

Para efeito da definição da retenção do aluno, cada disciplina deve ser

computada apenas uma vez - independentemente das séries em que incidir, tendo

em vista que a recuperação deve ser planejada considerando as aprendizagens

372

fundamentais de cada área e as necessidades básicas de desenvolvimento do

aluno. O aluno concluirá o nível de ensino somente quando obtiver a aprovação nas

disciplinas em que se encontrar em regime de progressão parcial. (Proposta Político-

Pedagógica, 2004, p.20-22)

A Escola no ano de 2004 abriu mão dos ciclos de aprendizagem e retornou ao

sistema de organização por séries.