a emergÊncia dos “remanescentes (1)

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  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    Articular historicamen te o passa do n o sign ifica conh ec -lo como e le de fa-

    to foi. Sign ifica a propriar-se d e u ma reminiscncia, tal como ela relam pe ja

    no mome nto de u m p erigo (Walter Ben jamin, Sob re o Conce ito de H istria).

    Para aq ue les qu e se interessam p ela g ne se da s ca tegor ias socia is , ou

    pe la formao (no sentido thompsoniano) da s classe s, estra tos ou gru -

    pos como sujeitos polticos, a h istria d o Brasil pa ssa p or um m ome nto

    privilegiado, apesar d a a patia, ou justamen te por causa d ela, qu e se a po-de rou da p oltica conven ciona l. Novos sujeitos de interesse e ntram e m

    cena , no s por conta d o crescimen to de g rupos e p otencia l izao de

    luta s j existen tes, como no caso do Movimen to dos Sem -Terra, mas

    tambm em funo da cr iao de novas f iguras legais , os chamados

    d ireitos insu rge nte s (Silva 1994), que pe ne tram n osso direito positivo

    atravs de ssas racha du ras herme n uticas qu e so os direitos difusos.

    A pa rtir de les, gan ha m e spao as popu laes tradicionais, particular-

    men te aq uelas a q ue se refere o Art igo 68, conh ecida s, de sde e nto,

    como comun idade s rema ne scentes de qu ilomb os1. Este texto pretend e

    tomar como objeto d e re flexo tais criaes sociais , feitas simu ltane a-

    me nte d e imag ina o sociolgica, criaes jurdicas, vonta de poltica e

    desejos.

    Depois de ter sido ap rovado sem ma iores discusses como uma d as

    disposies constituciona is tran sitrias, n o tan to pe lo seu va lor intrnse-

    co, ma s como mais um item no pa cote das festivida de s pelo cen ten rio

    da ab olio da escravatu ra, o Artigo 68 ficou sem q ua lque r proposta

    de regulamentao2 at 1995, qu an do (en to associad o s festivida de s

    pe la memria de Zu mb i de Palmares) ga nh a importncia e pa ssa a ser

    alvo de de ba tes e reflexes em m bito nacional. Nessas discusses, fun -

    damen ta lmente orientadas pe la necessidade de responder s deman das

    de natu reza jurdica e legislativa, a q ue sto que de sponta como central

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES:

    N O TAS PARA O DILO G O EN TREINDGENAS E QUILOMBOLAS*

    Jos M au rc io Andion Arrut i

    MAN A 3(2):7-38, 1997

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    a da prp ria d efinio do qu e foram , historicame nte , os quilomb os, na

    exp ectativa d e, a p artir da , pod er d iscern ir os critrios de ide ntifica o

    daquelas comunidades remanescentes.Aind a q ue os resultados de ssas discusses (e as formas de acesso a

    e las) es te jam surgindo apenas muito lentamente , pr incipalmente em

    en contros cien tficos e polt icos, as n ovas contribuies so d e g ran de

    importncia, tanto no plan o conceitual, como resultado do d eb ate en tre

    his tor iad ores e a ntroplogos, qu an to normativo, um a ve z qu e e xis tem

    dois proje tos de regu lame ntao d o ar t igo e dua s por tar ias produ zida s

    pe los rgos estatais qu e tm tomad o a si a responsab ilida de d e atu ao

    na rea. Essas contribu ies, no en tanto, so de n ature za mu ito diferen -tes, j que n elas apa recem, lad o a lad o, o intere sse mais estritam en te aca-

    d mico, cujo en ga jam en to com as causas popu lares me diado por pro-

    blemticas qu e tm origem em tradies d isciplinare s e deb ates concei-

    tuais, e o interesse mais diretame nte vinculado qu elas lutas, que surge

    muito freqe nteme nte associado causa d e um a comunidade , ou de u ma

    regio. Neste ltimo caso, com m ais evid ncia qu e no p rimeiro, ressurge

    o desafio de traba lhar simu ltan ea me nte com dois un iversos de refern cia

    mu ito distintos e, por vezes, incom pa tveis: o da a n lise cien tfica e o dainterven o e inte rpreta o jurdica, tem a j basta nte controverso en tre

    os antroplogos ligad os qu esto indgen a, freqe ntem ente solicitados

    a pa r t ic ipa r como pe r itos e m processos jud icia is (Si lva , Luz e He lm

    1994).

    N o por acaso que estamos assistind o a um a conside rvel transla -

    o de espe cialistas (ONG s e an troplogos) de um tema ao outro, lan -

    and o mo do instrumen tal cr t ico e do acm ulo das tcnicas de med ia-

    o e interveno sobre a ter ra indgena , para uma a tuao sobre as

    terras d e p retos, ou como insistem n ossos leg isladores, terras de comu -

    nidad es reman escente s de q uilombos. Aqui, pe rmitindo-me man ter um

    tom ma is livre qu e rigoroso, exp lorarei os pon tos de en contro entre e ssas

    du as tem ticas , suger indo q ue e les de vem ir (suposio e imp erat ivo)

    muito alm d a migrao de e specialistas, ultrapassan do esse aspe cto

    ma is ou me nos conjuntu ral para a ssumir um carte r sistem tico e reflexi-

    vo, fun da men tal, do me u p onto de vista , na retomada da histria d essas

    populaes e na an lise de sua realidad e atua l.

    Para tanto, es te ar t igo n o se apia em uma le i tura s is temtica da

    bibliografia e xistente , mas em um rea rranjo dos fragm en tos disponveis e

    em algun s dados de campo, a l terand o a nfase sobre uma qu esto que

    n o desconhe cida , mas qu e ocupa u m espa o pe rifrico nos trabalhos

    existen tes, procuran do tirar pa rtido das relaes (ma teriais, simblicas e

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    an algicas) en tre populaes ind gena s e populaes neg ras, seja enqu an-

    to cha ves classificatrias, seja en qu an to popu laes histricas sub me ti-

    da s/rebe ladas ou en qu an to novos sujeitos polticos criad ores d e cultura.

    Raa e etnia: apontamentos sobre uma mitologia savante

    Evitemos os a ta lhos. Se tomarmos a liberdad e de da r ao pen same nto

    social brasileiro o estatuto d e u ma cosm ologia nacional, veremos qu e

    (ap esar d o qu e foi dito sobre a fb ula d as trs raas) ela se orga nizou, em

    boa me dida , mediante a repar t io de grup os humanos em universossem nticos distintos: de pois de u m p rime iro mome nto d e ind istino con-

    ceitual, a p roduo intelectual posterior dca da de 30, progressivamen -

    te inst ituc ional izada , discipl ina da e ad ap tada s p r t icas divisrias d o

    discurso acad m ico, pa ssou a de dicar aos ind ivduos de a scend n cia a fri-

    cana a d esignao de ne gros, liga nd o-os id ia de raa , assim como a

    de dicar aos de or ige m am erican a a de sign ao de nd ios , l iga nd o-os

    idia d e e tnia. Poderamos afirmar qu e a cad a u m d esses dois recortes da

    populao subme tida aos apa relhos e ideologia do Estado N acional bra-sileiro coube um a tradio acad mica, cada um a com o seu prprio pa n-

    teo d e a utores, seu repe rtrio terico, suas cate gorias de a n lise, seus

    diagn st icos sobre a rea l ida de brasi le ira . Da mesma forma, o Estado

    Na cional produ ziu expe dientes de controle cultura l e socia l diferen tes

    pa ra cada um d esses recortes , ge rand o formas dis tintas d e l ida r com a

    alterida de represen tada por ind ivdu os no-brancos, incivilizados , infe -

    riores e m termos m en tais e cu lturais qu e, no en tanto, precisavam ser assi-

    milados ou absorvidos pe la nao brasileira.

    Parece ter sido tamb m a prem ncia de responde r a esse impe rativo

    de muda na qu e fez com que aqu elas duas tradies de estudos produzis-

    sem linh as, trajetrias idea is de transformao, s qua is aq ue las popula-

    es, sob a fora de um a vontade sent ida como necess idade e pe nsa da

    como fatalidade, estariam sub metidas. Filha da modern ida de e orienta da

    pe la id ia de p rogresso, essa m itologia savante, no lug ar do temp o cclico,

    disps dois planos line are s e finitos de su cessivas mutaes scio-tnico-

    raciais que experimen tam forte homologia. Cada uma dessas tradies d e

    estudos, amba s comp rometida s em p en sar o Estado e m olda r o Nacional,

    produziu, aparen temen te de forma autnoma e e m seu prpr io camp o

    semntico, eixos de m utaes estruturalmen te seme lha ntes e ntre si. Em

    um d eles a diversida de d e socied ad es e culturas passaria pelas sucessivas

    redu es represen tad as pe los termos nd io/cab oclo/civilizad o, en qu an to

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    no outro, tal red uo seria e xpressa pe la sucesso ne gro/mu lato/b ranco.

    A correspond n cia e ntre esses termos, no entan to, de forma e p osi-

    o, mas n o de contedo. Sub stantivamen te eles desenh am u ma p erfei-ta d ua lidade , que justi fica cam inh are m sobre e ixos dis tintos . Em su as

    image ns ideais um correspond eria ao isolam en to, en qu an to o outro inte-

    rao, um pu reza en qu an to o outro contam ina o. Os a tr ibu tos da

    popu lao indgen a ser iam o exot ismo , a alter ida de radical, o un iverso

    de re fe rnc ias absolu tamen te es t ranho que deve se r t raduzido, send o

    qu e, neste ca so, os dilema s nacionais ficariam por conta da ne cessida de

    de integrar , ab sorver e e l iminar , ao me smo temp o de , sob o s igno d o

    romantismo, protege r como n cleo da na cionalida de ou, sob o sign o doun iversalismo, armazen ar, junto a ta ntos outros reg istros de a lteridade ,

    como contribuio a um a viso total do hum an o. Ma rcado e va lorizado

    como origem , na sua re lao com a socied ad e b rasileira o ndio obje -

    to de contam inao e, neste caso, a a lter idad e serve construo de u m

    juzo de valor est tico.

    Qua ndo a construo desse n acional tematiza a populao negra,

    os sinais se invertem: ela rep resentaria p ara e le o p roblema da desag ra-

    d vel imag em d e si mesmo (um d ilema cravad o no terreno d a identidadee n o da a l ter idad e), da n ecessidad e d e a bsorver, integ rar, mas sem se

    contaminar, sem d eixar que esse outro, to ntimo e to nu meroso, altere

    a imag em de uma nacionalidad e ociden talizante e branca. Neste caso, a

    universa lidad e d o problema no e star ia n o plano do hu mano, mas no

    da s popu laes suba lternas q ue p reciso edu car e controlar . Seus d ile-

    mas seriam ora os da de mocracia, ora os do capitalismo, de forma qu e o

    sinal posi t ivo recair ia no na preservao e no isolamento, mas na

    mud an a e na interveno. Marcado e de svalorizado como aparncia, n a

    sua relao com a socieda de brasileira o neg ro agente d e contam ina-

    o, fazend o com q ue a a lteridad e sirva, no seu caso, construo de u m

    ju zo de va lor poltico.

    As ana logias e op osies pode riam avan ar atravs d as posies cor-

    respond en tes da qu eles eixos homlogos. Por exem plo, o mulato nos estu-

    dos raciais tem um peso e u ma p ositividad e q ue no p odem ser compara-

    dos com a p osio do cab oclo nos estud os tnicos ou indige nistas. Este

    ap arece como simp les passagem de uma s ituao out ra , e p or tan to

    como uma categ oria sociologicamen te fraca; en qu an to aque le surge como

    u m lugar semp re tema tizado, como um vr t ice qu ase i r redut vel. Mas

    tamb m, por outro lad o, se m ulato/bra nco e cab oclo/civilizad o so

    os pares finais de u ma p roblema tizao lan ada sobre o tema da popu la-

    o, eles so tamb m o ponto de p artida pa ra outro tipo de formulao,

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    aqu ela produzida ou produtora d o campo semn tico dopopular. Tran s-

    formados e m povo , ponto de convergn cia d aq ue les eixos, a alter idad e

    dome sticada d e nsejo a outras que inicialmen te vo ocup ar os estud osfolclricos e, dep ois do exp urg o de sta pe rspectiva, os estud os sobre cu l-

    tura p opular e c lasses pop ulares . O olhar volta-se , ento, para u m

    objeto homogne o e indistinto que , se no a pag a, submete toda pa rticu-

    larida de (incluind o a tamb m a diversida de tnica dos imigran tes euro-

    peu s) que distingu ia sua s partes entre si e com relao n ao3.

    Aind a q ue esta seja, obviame nte, um a forma caricata d e n os referir-

    mos aos estud os desses camp os (a id ia de cosmologia exclui os deb ates,

    os contextos, as su btra dies), ela pod e se r til se n osso objetivo for de s-tacar o ponto de d eslocamen to e a alterao de pe rspectiva que as novas

    situaes e tnogrf icas nos esto propondo e qu e tm ge rado trabalhos

    qu e invertem aq ue les m odelos. Por um lad o, a identificao de comuni-

    dades rura is negras que ganham o es ta tu to de unidades cu l tura is e

    socia is , por pa r t ilha rem u ma or ige m e um a cosmologia comuns, uma

    ances t ra l idade , por apresenta rem grande s nd ices de endoga mia e a t

    me smo um dialeto pa rticular, escorrega nd o, assim, para o plo do isola-

    me nto, da a lteridad e, do exotismo, do un iverso de referncias autno-mo e origina l. Por outro, ganh am visibilidade poltica e acad m ica comu-

    nidad es ind ge na s recentes, isto , que p assaram p or um p rocesso de

    retomada d e suas tradies a partir de uma iden tidad e ge nrica de cabo-

    clos j a ssimilad os, sem um a lngu a d istinta, cristian izad os, mu itas vezes

    integ rados aos me rcados local e nacional como fora de trab alho mvel,

    escorrega nd o, de ssa forma, pa ra o plo da inte rao, do un iverso poltico

    e cognitivo partilha do p elo observador.

    ndios e negros heterodoxos

    De fa to, a observao de s itua es e tnog rf icas re lac ionad as a e ssas

    du as formas de inverso do pa dro d os estudos tnicos e raciais tem leva -

    do a u ma sub verso de pos turas e procedimen tos canonizad os dent ro

    da qu eles camp os de estudos, he terodoxias qu e pe rmitem jogar luz sobre

    grup os sociais antes p en sados como irrelevantes ou residu ais, mas q ue ,

    a lad os ao esta tuto de obje tos dignos e p en sados em su a p osit ividad e,

    abrem novos campos de an l ise ao mesmo tempo qu e tm sua reprodu-

    o (e, por vezes, sua produo) social ben eficiad a ou m esmo g ara ntida

    por esse seu novo es ta tu to . A segui r, apresentam os um map eam ento

    mu ito sum rio do que compree nd emos como um movimento converge n-

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 11

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    te de ssas he terodoxias nos camp os de estu dos tn icos e raciais brasilei-

    ros.

    No caso do cam po de estud os tnicos, nosso ponto de pa r t ida oNordes te d a d cada de 30, quand o a lguns pe squisadores in icia lmente

    liga dos ao folclorismo, passa m a se intere ssar pe los vestgios de cultura s

    an cestrais em gru pos de rema ne scentes ind ge na s, na e xpresso esco-

    lhida p ara d escrever tais grup os. Motivados pe la entrad a d o Servio de

    Proteo ao ndio (SPI) na reg io e a trados p or crescentes de man da s

    da qu eles g rupos locais (Arruti 1995), esses p rime iros acad m icos ao se

    ded icarem temtica indgena p rocuravam naq uelas comunidade s ape-

    nas os t raos de suas sup ostas cul turas ancestra is , reconhe cendo comodigno de nota apen as aque les eleme ntos que p ude ssem ajuda r na recons-

    truo de cade ias d e fam lias ling sticas, ou na constituio d o qu ad ro

    folclrico regiona l, com sua n fase no sincre tismo .

    Apesar de terem realizado, duran te as d cadas de 30 e 40, uma sig-

    nifica t iva re tomada de ident idad es a t ento p ensad as como ext intas ,

    mesm o mais tarde , ao long o das d cada s de 60 e 70, tais grup os continu a-

    vam sen do pe nsad os como exemp los de p rocessos de assimilao, acultu-

    rao e p roletarizao descaracterizadores, aos qu ais os grup os ind gena smais cedo ou mais tarde e stariam fada dos. Mesmo sob outras inspiraes

    acad m icas e referidos a outros qua dros tericos, at m uito recen teme nte

    os estudiosos perma ne ceram p resos ao diag nstico bsico do iminen te

    de sapa recimen to, da d ecad n cia cultural e da d esag regao social.

    Foi somente d ep ois de u m novo surto de ressurgimento de grup os

    indgen as na regio, ao long o das d cada s de 70, 80 e 90, e p ela conse-

    q en te expan so do campo ind igenista fomen tado e fomen tador dessas

    em erg ncias tnicas, qu e a l iteratura a ntropolgica mu dou sua postura

    diante d aqu eles grupos. Na d cad a de 90, fina lmente, depois de m ais de

    cinq e nta an os de sucessivas emergncias e re invenes, comeam a

    ap arecer os primeiros trabalhos que d eixam de tem atizar a de cad ncia e

    o desap arecimen to dos grup os indgen as do Nordeste p ara inverter esta

    perspect iva , abandonando a associao entre a ca tegor ia ident i tr ia

    ndios nordest inos e os modelos de integrao e acampes inamento 4

    pa ra repen s- la sob os modelos de tradies inventadas (Hobsbawm e

    Ran ge r 1984) e etnicidade (Barth 1969). Nesses ca sos, a ab ordag em his-

    trica tem assumido grand e importncia , dan do conta d as s ituaes de

    conflito fun dirio qu e e nvolvem tais grup os, da sua relao com o rg o

    tutor e da m ontage m de histrias exem plares, mitos de orige m qu e cons-

    tan teme nte so acionados pe los grupos como forma de leg itimar suas pre-

    ten ses, justificar facciona lismos, explicar e fun da me nta r ritua is5.

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES12

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    No caso do campo de estudos raciais, a partir da d cada de 70 hou-

    ve uma mud ana ta lvez a sua p rpr ia fund ao enq uan to questo

    na ab ordag em da identidade negra, assumida pelo grup o ou atribu dape lo pe squisador, en tre populaes eminente men te camp onesas. Essa

    mu da na p ode ser dividida e m dois mome ntos. No primeiro, qu e pod e-

    r am os pe nsar como aq ue le de estud os sobre com un idades rurais que

    apresentavam a part icular idade de serem negras , apareceram como

    exe mp los institucionalm en te isolados (Vogt e Fry 1981; 1982; 1983; Vogt,

    Fry e G ne rre 19836; Gusm o 1979; Bran d o 1977; Soares 1981; e Telles

    s/d), no gua rdando n enhu ma perspectiva comum aparente. Mas ao lon-

    go da dcada de 80, quand o tem incio na USP uma nova sr ie de estu-dos interliga dos e qu e p assam a operar com o conceito de etnicidad e,

    surgem trab alhos qu e , inver tend o lige iramen te a qu esto, pode r amos

    pen sar como estud os sobre com un idades ne gras que tinh am a particula-

    ridade d e serem campone sas. Com isso, at o an o de 1988, ha viam sido

    produ zida s du as d issertaes de me strado (Qu eiroz 1983; Monte iro 1985)

    e du as teses de doutorado (Baiocchi 1983; Ban de ira 1988), e nq ua nto

    alguns outros trabalhos estavam e m a nda mento7.

    Depois do ano de 1988, no entanto, acontecimentos externos aosde ba tes propriame nte acad micos iro interferir na produo a ntropolgi-

    ca voltada pa ra os chama dos e studos raciais, no sen tido de incentiv-la

    e d e a lter -la. Ne sse an o, o Artigo 68 d as d isposies tran sitrias criou

    a p ossibilidad e d e se reconhe cer s comunidades rema nescentes de qui-

    lombos o dire i to sobre a s ter ras qu e ocupam e , ape sar de a inda n o se

    ter lhe da do u ma de finio jurdica e institucional, seu s efeitos sociais se

    fizeram sentir quase qu e imed iatam en te, pela mob ilizao de ON Gs, apa-

    relhos de Estad o, profissiona is de justia e se tores da rea a cad mica,

    en tre outros , nem sem pre , todavia , em perfe i to acordo, mesmo q uan do

    imbudos de uma pe rspectiva poltica comum. Com isso, o camp o de estu-

    dos sobre neg ros passa a ter de responde r a novas dem and as originada s

    da luta poltica, que o levam a u ma alian a forada com pe rspectivas at

    en to apa rtada s, imp ond o aos estudos etnogrficos sobre comu nidad es

    rurais ne gra s a literatu ra histrica sobre qu ilombos e vice-versa.

    Abre-se ent o um n ovo camp o de investimen tos, pe squisas so reo-

    r ien tada s e um n mero crescente d e an troplogos, pr incipa lme nte em

    pe rodo de formao, passa a investir no tema 8. Mas as pe rspectivas ape -

    nas comearam a ser d elinea das e o prprio objeto e ncontra-se em fase

    de de finio, crian do u m e spao a na ltico ainda am orfo. As pou cas biblio-

    tecas que j ad otaram o termo qu ilombos como nova chave de e ntrada

    em seus fichrios, fornecem-n os uma med ida da estranh eza e da dificul-

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 13

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    da de em se repe nsar e reclassificar os an tigos estud os sobre comunida -

    des rurais neg ras em termos de comunidades reman escentes.

    Se a configurao qu e foi se de line an do pa ra os estudos sobre comu -nidad es ne gras rura is a p ar t ir de 1980 j convergia com um a p ar te dos

    estudos sobre grup os ind ge nas (o ab and ono do cul tura lismo, marcado

    pelas noes de a culturao e assimilao, e a ad oo de u ma a bor-

    dagem tnica de grupos camponeses) , as a l teraes que lhes foram

    imp ostas a pa rtir das rep ercusses do Artigo 68 s vm ap rofun da r tal

    imbricame nto. Tais mud an as, como dissemos, tiveram o efeito de imp or

    pe la p r imeira vez aos estudiosos e militantes d esta q ue ser ia a rea d e

    estud os raciais e de comun idad es rurais ne gras, que stes mu ito prximasdas qu e qu ase semp re envolveram a p roblem tica indgen a, obriga ndo-

    os a se ma nifestar sobre a qu esto fun diria, gerar respostas e instrum en -

    tos crticos para o dilogo com ag n cias e stata is e d ialogar com interlo-

    cutores cujo qua dro de refern cia n o o dos conceitos das c in cias

    sociais, ma s o da s regra s administrativas e do direito positivo.

    Estam os dian te, ento, da p ossibilidade de avan ar na crtica to

    clara rep artio en tre os cham ad os estud os tnicos e raciais, send o que ela

    pode tomar du as direes, ou me lhor, pode segu ir a me sma d ireo emdois plan os paralelos. O primeiro, est n a su speita sobre a evidncia qu e

    assume a d istino en tre ndios e neg ros no qu e d iz respeito a n ume rosas

    situa es tema tizad as pe la histria social. Nu m seg un do plan o, nos ap ro-

    vei tarem os dessa suspei ta e d a cr t ica a u ma cate gor ia de uso comum

    para apresen tarmos algu mas p istas para a investigao e tnogrfica.

    Rearranjos classificatrios

    A primeira proposio a d e q ue as unidade s de de scrio das popula-

    es subm etidas respond em , ao custo de um a brutal red uo de sua alte-

    ridade, s ne cessidade s de p roduo de u nidade s gen ricas de interve n-

    o e controle social, sen do q ue tais unidad es v ariam seg un do aqu elas

    ne cessidade s de controle e dom nio. Vrias situa es atu ais de ind istin-

    o parecem estar re lac ionad as a e ssa plast ic ida de de ca tegor ias . Um

    de ntre outros exemp los possveis de ssa plasticida de vivido pelo grup o

    Pank araru, localizado n o Brejo dos Pad res, serto pe rnam bu cano d o So

    Francisco, para os qu ais a dis tino entre nd ios e ne gros antes d e ser

    pu ramen te descritiva de u ma rea lidade e viden te de n atureza p oltica e

    simb lica, servind o de te rmo acusa trio e facciona l. Na me mria recup e-

    rada e n a d inmica vivida pe lo grup o impossvel e in til a tentativa de

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES14

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    separar aq ueles que podem ser perfe i tame nte reconhecidos como ind-

    ge na s em oposio qu eles que sejam claram en te ne gros (Arruti 1996).

    H outros exemp los em q ue a d istino en tre ndios e neg ros ultra-pa ssa q ua lquer p ossibilida de de verificao objetiva, para assumir esse

    mesmo aspecto de operador de disputas famil iares e faccionais . Os

    Ne gros do Riach o, localizad os no Rio Gra nd e d o Norte e de scritos por

    Assun o (1994), por exem plo, tm como princpio difere nciad or inte rno

    fund ame ntal a diviso entre os da raa de n egro e os da raa de cab o-

    clo , mas como nu ma imag em inver t ida da s ituao Pank araru, neste

    caso as acusaes de imp ureza recaem sobre a an cestralidad e indgena.

    Os Atikum , descritos por Grun ew ald (1993), localizad os na Serra d o Um,em Floresta (PE), local em q ue as fontes histricas ap onta m a existncia

    de quilombos histricos, so conhecidos pela populao local como

    ne gros e n o e ram totalmente refratrios a e ssa classificao a t q ue na

    dcad a d e 40 conseguissem ser reconh ecidos como rema ne scentes ind-

    ge na s pe lo extinto Servio de Proteo ao nd io9.

    A comunidad e d e Mocamb o, localizada em Por to da Folha (SE),

    be ira do So Francisco, outro exemp lo qu e n os imp e essas q ue stes.

    Mocam bo p ossui 150 fam lias n eg ras, distribu das em um vilarejo de um anica rua , cujas ter ras de t rabalho, que ocupam h vr ias geraes,

    en tram em litgio em 1992. A fam lia qu e se diz proprietria inicia, ent o,

    uma ao de d espe jo e as famlias de Mocambo pa ssam a ser subme tidas

    a sucessivas expu lses, vrias vezes operad as p or fora armad a conjun ta

    de jagun os da qu ela famlia e solda dos da d elegacia de Porto da Folha ,

    alm d e serem a ssediada s constantem ente por pistoleiros. Em conseq n-

    cia d isso, em 1994, a C omisso Pastoral da Terra (CPT), resp alda da no

    Art igo 68, en tra com um pe dido de reconh ecimento daq ue las ter ras

    como terras tradicionais de reman escentes d e qu ilombos. O interessan te,

    no en tanto, q ue a rea reivindicada p ela comun idad e acompa nha o for-

    ma to e se man tm fronteiria rea Xoc, com os qu ais mant m relaes

    de pa rente sco, trocan do dias de trab alho, terras de cultivo em p ocas de

    seca ou de che ia etc. O prp rio conflito com a famlia de pr oprietrios

    tem incio no an o segu inte, ao fim d o qu al, de pois de u m p rocesso extre-

    ma me nte conflituoso, os Xoc conseg ue m a de ma rcao de suas terras

    (Arruti 1997).

    As pr ime iras aes da qu ela famlia de fazen de iros j a ponta vam

    pa ra uma pe rcepo do problema em q ue ndios e ne gros, jun tos e indis-

    tintam en te, eram acu sados de invasores nos mesmos processos e intima-

    dos conjuntam en te pa ra de poimentos na Ju st ia . Os Xoc10 , dep ois de

    terem eme rgido na d cada de 30 como um dos desdobramen tos daq ue-

    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 15

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES16

    le crculo de em erg ncias qu e j tinh a alcanad o os Pank araru (Arruti

    1995), na d cada de 90 passam a par t icipar a t ivamen te do p rocesso de

    reconhe cime nto do Mocamb o, principa lmen te por inte rm dio de famliasde de scend ncia tanto negra quan to indgena .

    O interesse de s i tuaes como estas est em nos revelarem um

    aspe cto do arb itrrio qu e p ode constituir a dicotomia nd ios/n eg ros, n o

    s em cada u ma d essas e tnogra fias , mas tamb m qu and o passamos a

    explorar sua e xtens o histrica. A trajetria Pank araru sug estiva. Como

    os outros grupos indgen as d o Nordeste, eles ressurgiram na s primei-

    ras dca da s deste scu lo, de pois de te rem sido extintos por volta d a d ca-

    da de 1870, num momen to em qu e se p rocessava a ex t ino em m assados aldea men tos indgen as na regio (cf. Carn eiro da Cu nh a 1992; Dan-

    tas e t alii 1992). Como cha mou a ate n o Reis (1996), os verbos extinguir

    e destruirforam os ma is usa dos pe los pode res coloniais para se relacio-

    narem com ndios e ne gros, no apen as com os rebeldes a que o autor

    faz referncia.

    A ext ino daqueles a ldeamentos, em regra , foi operada pelas

    Com isses de De ma rcao da s Terras Pb licas (criad as na s provncias

    pa ra da r conta d as novas formas d e a propriao do territrio estabe leci-da s com a lei de te rras de 1850), que a ssumiram como um a de suas tare -

    fas a ide ntificao, localizao e d em arcao da s terras dos aldea me ntos.

    Essas dem arcaes eram precedidas por um relatrio no qu al o enge nhe i-

    ro responsvel se man ifestava sobre a situao d o aldeame nto e d a p opu-

    lao aldea da, diagn osticand o os seus problemas e o g rau d e m istura

    em q ue e la se en contrava , is to , qua nto aqu elas populaes j te r iam

    sido ab sorvida s no mercado de m o-de -obra local e qu an to elas mesma s

    j teriam a bsorvido, atravs de ca same ntos e laos de compa drio, a p opu -

    lao regional no-ind gen a, enfim, seu g rau d e me stiagem . Como o

    diagn stico era invariavelme nte o de total m istura d a pop ulao aldea -

    da com os na cionais , os a ldea men tos eram conside rados ext intos e

    aq ue las comisses (ou um a e qu ipe formada ap s o fim d os seu s t rab a-

    lhos) voltavam p ara p roced er su a rep ar t io em lotes que de ver iam,

    segu nd o a letra d a lei , ser distr ibu dos en tre os antigos alde ados e en tre

    na cionais. No caso Panka raru isto significou a repa rtio de suas te rras

    no que e les chamam de l inha s , a expulso de u m grand e n mero de

    fam lias ind gen as e a en trega d os melhores lotes para a clien tela do che-

    fe p oltico local e p ara um n me ro ind efinido d e fam lias de ex-escravos

    que acabavam de se emancipar.

    O importante de se reter desse qu adro, no entanto, qu e na dcada

    em qu e se concen tram essas extines de aldeam en tos, ocorrem simulta-

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 17

    neamente inic ia t ivas de l iber tao de escravos a travs do Fundo de

    Emancipao11, uma intensa movime nta o dos governos p rovinciais nor-

    de stinos no sen tido de criar difere nte s figuras d e reu nio e controle terri-torial e pop ulacional, na forma d e colnias (agrcolas, de rph os , de

    indigentes e tc.), e algum as ten tativas frustradas d e imigrao europ ia e

    nor te-americana . A coincid ncia e m u m lapso de tempo re la t ivamen te

    curto dessas iniciativas revela u m asp ecto imp ortante d as estratg ias12 de

    enfren tamen to dos problemas de correntes da libertao da mo-de-obra,

    em q ue gan ha des taque a ten ta t iva de subs t itu io do domnio senh o-

    rial13 por formas pb licas de controle da popu lao, e q ue levam a um

    rearranjo das classif icaes a que elas esto submetidas. Extintos osa ldea men tos e l ibe r tos os escravos, aque las pop ulaes deixam de ser

    classif icadas, para efeito dos mecanismos de controle, em termos de

    ndios e ne gros, pa ssand o a figu rar nos documen tos como ind ige ntes ,

    rfos, margina is, pob res, traba lhad ores na ciona is...

    H ou tros exemp los dessa forma flutuante por meio da qu al a popu -

    lao foi sen do classificad a, n o tanto ou principa lmente pe la observao

    de sua s caractersticas intrnse cas (fossem e las as mais obtusa s ou este-

    reotipa da s), mas segu nd o os interesses e os instrumen tos de dominaodisponveis. Ainda n o Pernamb uco da d cada de 1870, por exemp lo, o

    aldea men to de Riacho do Mato extinto para ser fun da da e m seu lugar

    a C olnia Agrcola d e Socorro, cr iad a p ara a brigar o gran de n me ro de

    retirantes, indigen tes emigrad os, qu e a fluam ao local que r do centro

    de sta p rovncia, qu er d as circun vizinh as , conforme o Relatrio do Presi-

    den te da Provncia d e Pernamb uco de 1878. Como no m encionad o o

    de stino dos an tigos alde ad os de Riacho do Ma to, o mais provvel que ,

    como nos outros casos de e xtino de aldeam entos, eles tenh am perma-

    ne cido n o local, ma s ag ora r eclassificad os n os docum en tos oficiais:

    atravs de u m ato adm inistrativo, de ixam d e ser ndios pa ra pa ssarem

    a ser concebidos, contados e tratados como ind ige ntes.

    Na So Pau lo colonial, por exe mp lo, fica claro como essa flutua o

    pd e che ga r muito prximo de u ma d issoluo d as diferen as entre nd ios

    e n egros, fun dad a justamente n a forma pe la q ual aqu eles grupos e indi-

    vdu os eram cap turad os pelas diferen tes instituies do sistem a d e e xplo-

    rao da mo-de-obra . Na d ocumentao da poca , segu nd o Monteiro

    (1994:155), o termo ndio referia-se ap en as a os integ rantes dos a ldeam en -

    tos, reservando-se para a vasta ma ioria d a p opulao indgen a n o aldea-

    da a d en ominao de n eg ros da terra; em fins do sculo XVII, a den o-

    minao preferencial se simplificava pa ra ap en as n eg ros, s cede nd o

    lugar a outras den ominaes no sculo seguinte, com o au men to do aflu-

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES18

    xo de e scravos african os nos plan tis pa ulistas (Mon teiro 1994:165). Me s-

    mo a , no e nta nto, e contra a legislao vige nte , a confuso classificatria

    era pe rpetua da por estratg ias de alterao fsica daq ue las popu laes,qu an do os donos de plant is de escravos incent ivavam e m uitas vezes

    foravam os casamentos mistos entre grupos tnicos distintos, entre

    ndios dos alde am en tos e cativos, entre african os e nd ios, como forma

    de transferir de m os a atr ibu io do controle sobre a qu eles ind ivdu os

    (Monte iro 1994:169-170)14 .

    Ou tras vezes a prpria dinm ica do en frentam en to qu e leva a que

    essa d istino seja tem porria ou de finitivame nte su pe rada , como no caso

    das revoltas, fug as e organizao de m ocambos. Assim qu e n o Nordes-te, as ban de iras ou outros t ipos de m ilcias particulares (qu e pod eriam

    ser comp ostas, b om lem bra r, por nd ios e ne gros) (cf. Reis 1996:20),

    amp lian do sua s atr ibu ies iniciais de captura de ne gros fug idos, avan-

    am tamb m sobre os a ldea men tos ind gena s caa de nd ios pa ra a

    escravizao, en contrando e m resposta, como no e xemp lo da invaso d e

    1763 da Vila d e S o Cristvo, na Provncia d e Se rgipe, o levante con-

    jun to daq ue las populaes. De forma sem elhan te, o ma ssacre dos segui-

    dores de Mestre Q uiou, no incio do sculo XIX em Pernam bu co, podeser lido tan to como um a situa o de represso a u m m ovimen to messi-

    nico qu e a mea ava a ordem re l igiosa local , qu anto como a rep resso a

    um qu ilombo que a mea ava a estabilidade d as proprieda de s escravagis-

    tas locais, dado o g rande n mero de neg ros fug idos qu e p ara l afluram.

    Isso vale tamb m pa ra algun s dos gran des q uilombos conh ecidos, como

    o da C arlota ou Piolho e m M ato Grosso, ond e o alferes resp onsvel por

    sua d estruio, Francisco Pedro de Melo, re la ta ter encontrado a pe nas

    seis ne gros entre as 54 p resas qu e a li fez , sen do o restante rep ar t ido

    en tre 27 nd ios e ndias e 21 ca bors, como eram conhe cidos os me sti-

    os de ne gros com ndias (Oliveira 1951).

    Na bibliografia eme rgente sobre quilombos essa q uesto recorren-

    te , a inda qu e cont inue gan han do um lugar ape nas margina l nas in te r -

    preta es. No Amazona s do fina l do sculo XVIII, por exem plo, mas tam -

    b m em vr ias outras regies da Am rica , reg is tram-se d eseres em

    ma ssa de ndios para forma r mocam bos (Gomes 1996:49). Em e xem -

    plos compleme ntare s aos j levan tados pa ra o Nordeste, arrolam -se casos

    na Ama znia b rasileira em q ue e xped ies inicialmen te orien tada s para

    o resgate de ndios de scobre m importantes qu ilombos ao long o dos

    r ios , qu e comp ar t ilham com os pr imeiros cer tas id ias de liberda de

    (Gome s 1996:47). Reu nidas essas situaes, pod eramos n os pe rgun tar ,

    enfim, se a identidad e qu e se sup e ter produzido en tre neg ros (escra-

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 19

    vos ou livres), relacionad a a o qu e os d ocume ntos oficiais viam como a

    sed uo de certas idias (Gome s 1996:51), no p ode ter alcanad o cr-

    culos ma iores , rompen do com os l imites sempre to au to-evidente s doque se reconhe ce como neg ro.

    Tais brech as a be rtas nos d iscursos institudos, pe rmitem-nos colocar

    em su spen so a evidncia de sse recorte qu e se institucionalizou na du ali-

    dade tnico/racial, obrigand o-nos a reconh ecer qu e a s diferen tes instn-

    cias de p ode r (esta tais, religiosas, em pre sariais, privad as...), assim como

    as popu laes subm etidas ou reb eladas contra elas, tende ram a ser b as-

    tan te flexveis no u so da s classificaes q ue os cien tistas sociais e/ ou a

    militn cia poltica m ais tarde cristalizariam como re alidad es n o d iscuti-da s e sobre as q ua is construir iam verda de iros castelos interp retativos e

    conceituais . Os exem plos qu e e vocamos tm o valor de nos cham ar a

    aten o para o an tigo (mas semp re atua lizad o) problema de en frentar a

    docu me nta o histrica ou os discursos no cam po etn ogr fico sob a ilu-

    so de q ue as me smas pa lavras correspond em s mesma s coisas. Assim

    qu e n os apropriarmos r igorosame nte de ssas flutua es semn ticas, qu e

    de rmos inteligibilida de s sua s sucessivas formas de variao, avan an -

    do n a de snaturalizao da s categorias sociais, nos de sobrigaremos tam-bm da e strita obed in cia a os ditame s fun da dos sobre e las.

    De retornos e encruzilhadas

    Nossa segu nda proposio a de que o fenm en o atual que assist im os,

    do surg ime nto , resga te ou descoberta de com unidades rem anescen tes

    indgenas e de com unidades rem anescentes de quilomb o, corresponde

    produ o de nov os sujeitos polticos, novas un idad es d e ao social, atra-

    v s de um a m axim izao da alteridade que , por um lado, subv erte a ind is-

    tino de qu e falvam os e, por outro, inte nsifica a com parabilidade en tre

    as du as situaes.

    No de ve ter passado desp erceb ido qu e o termo escolhido pelos

    legislad ores na formu lao do Artigo 68 o mesm o utilizad o para d es-

    crever a situao da s comunidade s indgen as d o Nordeste, principalmen-

    te pelos age ntes que estavam em a o no momento das primeiras e m e r -

    gncias, ao long o das d cada s de 30 e 40. A coincidn cia na opo qu e

    os ag en tes p olticos, ad ministrativos e judiciais fizera m p elo uso do me s-

    mo termo-chave rema nescentes p ara essas dua s situaes, aponta para

    a q ue sto dos rearran jos classificatrios de q ue falvam os, ma s tamb m

    pa ra a p osio an loga, ta lvez homloga , que essas s ituaes ocupa m

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    diante da s ag ncias estatais e d o senso comum a cad mico. Posio de ri-

    vada e m grand e pa rte da fora de e vid ncia qu e essa noo parece car-

    rega r em si, no seu n cleo sem ntico b sico e n eb uloso, sobre o qu al preciso inve stir como nica forma d e controlar seu uso e faz-la ope rar

    sob vigiln cia.

    No processo de em erg ncia dos nd ios do Norde ste o em preg o do

    termo rema nescentes respond eu, antes de ma is nada , ne cessidad e

    de torn-los nome ve is, adjetivand o-os de forma q ue se fizessem visveis

    e aceitveis. A pergu nta q ue p arece ter se imposto aos que re alizavam a

    med iao en tre aq uelas popu laes, o rgo indigenista e os direitos,

    pa rece ter s ido a d e co mo , a final , de sign ar g rupos d e caboclos que sesupu nh a terem an cestrais ind ge na s aldead os, sem incorrer na impreci-

    so, dificilmente aceita primeira vista (n o s na d cad a d e 30, mas a in-

    da hoje), de simp lesme nte d esign -los por ndios, j q ue e les no pos-

    suam ma is, como explicitou um da qu eles me diadores, os sina is exter-

    nos reconhe cidos p ela cin cia etn olgica (Arruti 1996).

    Nos primeiros docum en tos do rg o ind igen ista e n os textos dos pri-

    meiros folcloristas/etnlogos sobre os grupos do Nordeste, fica clara a

    inde ciso na e scolha da ca tegoria a tenua nte ma is adeq uad a, levand o al ternncia e combinao de caboclo , descendentes indgenas ,

    remane scentes indgen as e outras variantes, em qu e o indgen a podia

    ser substitudo por de sign aes tn icas ou toponmicas. Essa ind eciso, no

    entan to, com o temp o, cedeu luga r a um franco predomnio do termo

    remane scentes, categoria q ue se man tm presente ainda h oje n os tex-

    tos e d iscursos de autores e pe rsonage ns qu e, a travs de la , acabam por

    criar u ma categoria espe cial de ndios e reconhecer um pa dro particular

    de indianidade 15. Trata-se d e u ma a deq uao de vocabulrio que per-

    mitiu a imediata incluso d aq ue las populaes no novo cdigo d e d ireitos

    institudo atrav s do statusjurd ico de ndios (de creto n o 5.484 de 1928),

    mas se m ofen de r os sinais externos qu e ind icavam o contrrio.

    Ne sse conte xto, referir-se a eles como descende ntes indgen as pare-

    ce no ter se ade qu ado pe rfeitamen te aos objetivos da med iao, j qu e,

    em seu u so comum 16 , a d escend ncia pode e star refer ida a um luga r

    de orige m (reg io ou na o), a um a raa, religio ou etn ia, sem q ue isto

    impliqu e qu e o sujeito dessa descend ncia seja efetivamen te mem bro da

    categoria, grup o, lug ar ou religio a q ue a d escend n cia faz referncia.

    Me smo no seu uso an tropolgico, a idia de de scend n cia d ep osita for-

    a na p osio do ancestra l, mais do que na d aqu ele que dele descende ,

    n o estand o imp lcita a tran smisso imediata d e direitos. Estabe lece-se,

    assim, um compromisso en tre um a viso culturalista e ou tra lega l de cul-

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    tura, de tradio e de ide ntidad e: enqu an to, de um lad o, o culturalismo

    no ad mite reconhecer na que la au sncia d e cultura e tradies pu ras um

    valor etn olgico prprio, ma s ape na s relativo ao pa ssado, toma nd o aqu e-les grup os em te rmos de sincretismo e valorizan do-os, portanto, no como

    ndios, mas como represe ntan tes t picos de u ma h eran a cul tura l em

    de sap are cime nto; de ou tro, o cdigo civil e o d ecreto d e 1928 afirma m

    direitos aos ind ge na s pen sados em sua p resencialidade , no introduzin-

    do ne sses dire itos qu alque r sent ido pu ramen te he redi tr io . Para se ter

    direitos e tute la era p reciso se rsilvcola, e n o a pe na s descender deles.

    A frmula rem an escen tes fun ciona como a soluo classificatria

    mediante a qua l se a dmite a presencia l idad e d o estado de ndio na que -les grup os, sem d eixar de reconhecer ne les um a q u e d a com relao ao

    mod elo original: os remanescentes so uma e spcie de ndios cados do

    nosso cu d e m itos nacionais e acad m icos, sobras , restos, sobejos

    (Mirador 1980), aos qu ais se reconh ecem profun da s e talvez irrem ed i-

    veis pe rdas culturais, mas q ue n o neg am seu s direitos ao estatuto leg al.

    Uma soluo classificatria su stenta da por um a n arrativa b em de limitada

    (ainda qu e implcita), qu e fala d o destino daqu eles grup os em termos de

    um processo evolutivo: do estad o de bom selvage m , pu ro, na tural, ato de civilizad o ou, caso n o fossem sub me tidos tute la qu e d evia orien -

    tar e regu lar essa transio, ao estatuto de de grada do, que p erde sua cul-

    tura e n o consegu e ser inteiramen te a bsorvido pela civilizao, passan-

    do a ocupa r um e spao ded icado aos excludos e de sajustados.

    Ma s, de algum a forma, ao apontar pa ra os seu s laos com o passad o

    e n o com o futuro de ssa linha m utaciona l, o termo rem an escentes

    reserva ou resgata p ara a que les grup os algu ma positividad e, sem romper

    com a na rrativa b sica, fata lista e line ar. Esses pre ssupostos colocam n o

    n cleo de d efinio da qu eles grupos uma historicidade que remete sem-

    pre ao par memria-direitos, em a lterna tiva e , por vezes (no caso ind ge -

    na ), oposio, ao pa r cultura-proteo : em se tratand o de remanescentes

    o que est em jogo a man uteno d e u m territrio como reconhecimen -

    to do processo h istrico de esp oliao .

    Pode -se reconhe cer no caso das comunidad es ne gras fun o seme-

    lha nte . No Artigo 68, o termo rem an escente s tamb m surge p ara

    resolver a difcil relao de continu idade e d escontinuidad e com o passa -

    do histrico, em q ue a de scend n cia n o pa rece ser um lao suficiente.

    De forma semelhan te dos grup os ind ge nas, o emp rego do termo impli-

    ca, no limite, reconhe cer nas comun idad es p resentes formas a pen as atu a-

    lizadas d os antigos quilombos, ainda que em fun o do lugar espe lhad o

    qu e o ne gro ocupa com re lao ao ndio, isso inver ta o valor a tr ibu do

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES22

    qu elas sobras e restos de formas antepa ssada s. Se en tre os indige-

    nistas o termo serviu pa ra relativizar, na prtica (aind a q ue por caminh os

    tortuosos, qu e acab avam por rea firma r a cren a n o mode lo), o extico, oisolame nto, a continuidad e d e u ma carga cultural homogn ea e a utno-

    ma, no caso da s comun idade s neg ras rurais, ou melhor, pa ra a represe n-

    tao que se pa ssa a fazer delas, seu e mpreg o pode sign ificar justame nte

    a a firma o ou produ o de ssas id ias. Principalmen te porqu e, a pa rtir

    da d cada de 70, qu an do a renovao his tor iogrfica se vol tou pa ra os

    movime ntos populares e pa ra a h istria dos de b aixo e d a sua resis-

    tncia, a retoma da do tem a d os quilombos transformou-os em smbolos

    da recusa a bsoluta ordem escravocrata, oligrqu ica e, em alguns casos,do prp rio cap italismo.

    Ao serem iden tificadas como rema ne scentes, aque las comunida-

    des em lugar de rep resentarem os que e sto presos s relaes arcaicas

    de prod u o e rep rodu o social, aos misticismos e aos ata vismos pr-

    prios do mun do rural, ou ainda os que, na sua ignorncia, so incapa zes

    de uma militncia efetiva p ela causa n eg ra, elas pa ssam a ser re conheci-

    da s como smb olo de u ma iden t ida de , de u ma cul tura e , sobre tu do, de

    um modelo de luta e m ilitncia neg ra, dand o ao termo u ma positividad eque no caso indgen a ap ena s consentida.

    Com e feito, o uso da noo, em a mb os os casos, implica, para a popu -

    lao qu e o assume (ind gena ou ne gra) , a p ossibi lida de de ocupar um

    novo luga r na re lao com seus vizinh os, na polt ica local, dian te d os

    rgos e polticas gove rna me nta is, no imag inrio na ciona l e, finalme nte ,

    no seu prprio imagin rio. Lug ar a pa rtir do q ua l possvel produzir um

    retorno com relao q ue le eixo de m utaes d e qu e falvamos inicial-

    men te. Em a mbos os casos, trata-se d e reconhecer n aqu eles grupos, at

    en to marg inais, um va lor cultural absolutam en te novo que , por ter ori-

    gem em um outro quadro de referncias (a ta l cosmologia nacional ,

    savante), era at en to desconhecido deles mesmos. E aqu i cheg amos ao

    ponto fund ame ntal.

    O e sforo de crt ica e historiciza o de categ orias sociais, que nos

    levou a e sta incurso pelas implicaes da noo de rema nescente s ,

    no de ve ser red uzido simples observao de q ue a s palavras podem

    ser inven tada s, emp restada s e gan ha r novos sen tidos, o que tran sforma-

    ria e ste nu m morn o exerccio de etimologia. Talvez tenh a a lgum a u tilida -

    de lemb rar que o trab alho gen ea lgico, ne ste caso, ape na s o ponto de

    pa rtida de u ma crtica idia de qu e tais denomina es so simples ins-

    titucionalizaes de d ivises espon tn ea s do mun do social, ou, de outra

    forma, batismos de seres n aturais. A histria d os nomes tam b m a h is-

  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 23

    tria dos seres e instituies qu e eles nom eiam, do seu surg imento, desa-

    pa recimen to e mu tao. Afirmar qu e o termo rema ne scente n o era

    conh ecido ou usado p elos remanescentes at q ue ele lhes fosse comun i-cado ap ena s uma tautologia se n o avanarmos a t a id ia de qu e a

    criao do n ome e st liga da ao p rprio surgimen to da coisa17.

    No processo (na ma ioria, se n o na totalidad e d as veze s, conflituo-

    so) de nomeao de um g rupo como remane scente , produzem-se uma

    srie de mud anas que atinge m aq uelas comunidades, tanto na sua re la-

    o com os que as rodeiam sejam a s popu laes vizinh as, os poderes

    locais ou os apa relhos de Estado , qu an to nas relaes en tre seu s pr-

    prios atores, com a comodaes, disputa s e m uitas vezes a prpria cria-o de chef ias e forma s de orde na me nto pol t ico, com a a l tera o dos

    sign ificad os atribu dos s festas e ritua is, com a reelab orao da me m-

    r ia e com a a l terao do status dos guardad ores da me mr ia , que pa s-

    sam a de sempen har um p ape l sem precedentes na vida do grupo. Ape-

    sar das exigncias do termo, os reman escentes n o so sobras de an ti-

    gos qu i lombos p rontos para serem iden t ificad os como ta is , pre sos aos

    fatos do passado por uma continuidade eviden te e prontamente resgata-

    da n a m emria coletiva d o grupo.Ind ep en de nte d e como de fato foi no p assad o, os laos das comu-

    nida de s atuais com grup os do pa ssado precisam ser produzidos hoje, atra-

    vs da seleo e recriao de elem entos da me m ria, d e traos cultu rais

    qu e sirvam como os sinais externos reconh ecidos pelos me diad ores e o

    rgo qu e tem a au toridad e d e n omeao. As diferenas qu e p odiam a t

    en to dis tingui- los da p opulao local na forma de est igm as pa ssam a

    ga nh ar positividad e, e os prprios termos n egro ou preto, muitas ve-

    zes recusados at pouco temp o antes da ad oo da iden tidad e de rema -

    nescentes, passam a ser ad otados. As fronteiras entre qu em e q uem no

    d a comunidade, qua se sempre mu ito porosas, passam a gan har r igidez

    e n ovos critrios de d istin o, ge ne alogias e pa ren tescos horizontais pas-

    sam a ser recuperad os como formas d e comprovao da incluso ou n o

    de indivdu os na coletivida de . Ao mesm o temp o, a maior visibilidade do

    grup o lhe d um a n ova posio em face d o jogo p oltico mun icipa l e, por

    vezes, es tadu al . Enfim, a adoo da iden t ida de d e rem an escente s por

    uma determinada cole t ividad e, a inda q ue possa fazer referncia a uma

    realida de comprovvel, , com m uito mais fora, a produ o de ssa pr-

    pria realidad e.

  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES24

    Comunidades emergentes

    A relevncia do movimen to anal t ico que a proxima a s comunida de sremanescentes de qui lombos da noo de e tnicidad e est , portanto,

    na p roblema tizao do seu processo d e autoconsti tuio como grup os

    sociais e culturais difere nciad os, ou, em ou tros term os, no q ue a litera tu-

    ra an tropolgica conven cionou cha ma r de etnognese .

    Ma s aq ui p reciso fazer referncia a a lgu mas leituras confusas qu e

    pode m ser produ zida s a pa rtir desse m ovime nto an alt ico. Em um texto

    de V. Stolcke, por exem plo, a opo p ela pe rspectiva tn ica, pen sada no

    contexto de d eb ates acerca do racismo, vista ape na s como a p rodu ode um eufemismo politicamen te carreg ad o, j q ue se u p ap el seria uni-

    came nte o d e e nfatizar o carter cultural e ideolgico das discrimina es

    raciais, aba nd onan do o camp o das re ferncias biolgicas para a dotar um

    vocab ulr io acad emicame nte mais r igoroso e comprometido com uma

    interpre tao his tr ica e cul tura l dos a grup ame ntos hu man os (Stolcke

    1991). A autora se pe rgun ta se , reconhecida a id ia de que a raa tam -

    b m his tr ica e cul tura lmen te construda , res tar ia a lgum a d iferen a

    sociolgica sign ificativa entre raa , e tnia e , avanan do ma is um pou-co, classe . Afirma q ue a opo p ela etnia corresponde ria a uma postu-

    ra polt ica conservad ora, atravs da q ua l cheg aramos a uma p arad oxal

    n atu ralizao da cultura, em q ue os preconceitos seriam justificad os

    por uma preten sa relativizao das xen ofobias em ge ral, ao me smo tem-

    po qu e e vitaria o tema fun dam en tal das relaes de d ominao econmi-

    ca e social. Uma crt ica qu e p erde d e vista a g rand e variedad e d e situa-

    es em qu e e sto en volvidos os processos de criao d e fronteiras sociais

    e cu l tura is , que no se t r aduzem n em e m u ma q ues to de cor, nem em

    um a qu esto socioeconmica.

    Ban ton (1979), por exem plo, ao traba lhar com o caso do racismo con-

    tra neg ros am erican os, bu sca estabe lecer correspon d ncias com outros

    exem plos pa ra associ-lo a um leq ue maior de qu estes. Como resultado

    de sse movimen to, prope pe nsar a oposio entre raa e e tnicida de e m

    termos d e va lor social, j q ue o uso da primeira n oo refletir ia a s ten-

    d ncias ne ga tivas de dissoluo e e xcluso (os estudos sobre o racismo

    ser iam semp re sobre a na tureza e o poder das maiorias), en qu an to o

    segu nd o expressaria a s tend n cias p ositivas de ide ntificao e incluso

    (os estudos tnicos i lum ina nd o o pode r que pode ser mobilizad o pe las

    minorias). Ou seja, a d iferen a no u so das noes estaria associad a a u ma

    pe rspectiva qu e a tribu i maior ou me nor n fase s qu estes de classifica-

    o socia l em termos de mobilizao d e g rupos e da s formas e valores

  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 25

    qu e e sta pode a ssumir. Segu ndo Banton, na pa ssagem d o racial ao tni-

    co, os signos de distino teriam seus sinais invertidos, deixando de

    represen tar estigma s, para assumir um sentido de solida ried ade e iden ti-ficao. Ne sse sen tido, um gru po racial torna r-se-ia u m g rup o tnico a

    partir do momen to em q ue, aceitand o a d istino qu e lhe imposta pela

    ma ioria, passa a utilizar-se polit icame nte d ela na formao d e ag rup a-

    me ntos autnomos ou com interesses e reivind icaes comuns. Uma res-

    posta til, ma s ainda insuficien te pa ra pe nsa rmos a situa o dos rema-

    nescentes, como verem os.

    Outro tipo de confuso que pode envolver a converso de uma ab or-

    dag em e m termos de raa para um a pe rspectiva em termos de etnicidad e a presen tado p or Maria d e Lourde s Ban deira (1988), quan do a firma q ue

    nos trab alhos sobre grup os rurais negros a bu sca da e tnicida de surge

    associad a n fase do an troplogo n as formas culturais q ue marcariam

    as e specificidad es objetivas dos gru pos tn icos, tais formas e stand o

    associad as p ersistncia d e traos culturais origin rios da frica (Ban -

    de ira 1988:21). Um e feito que, ap aren teme nte, se d eve tenta tiva de pro-

    por uma leitura diferen te pa ra a histria e o de stino da qu elas popu laes,

    mas qu e n aturaliza as diferenas e sua continu ida de com o pa ssado. Comofoi dito com relao posio d e Banton, ma s sobretud o voltand o ao p on-

    to fun da me nta l de stacad o por Web er (1991), o sociologicame nte re levante

    no uso da categoria etnicidade sua rem isso ao movimen to de u m de ter-

    minado ag rega do no sen tido da constituio de uma un idad e p olt ica. A

    etnicida de no m arcaria, portan to, o reconh ecimento de seme lha nas pre-

    viame nte d ada s, inscritas na turalmente nos corpos e n os costumes e cuja

    exp licao estaria no pa ssado, mas um a a titud e positiva e p ropositiva,

    atravs da qu al seriam produzida s dema nd as e um projeto comum 18 , ou

    seja, cuja vinculao e razo de ser est n o futuro.

    O qu e aq uelas dua s posies qu e ap resentamos como problem ticas

    tm e m comum p erderem de vista a rup tura produzida por Barth (1969)

    e C ohen (1974) e p or todo um cam po de discusses j p len ame nte e sta-

    be lecido, cujas referncias mais freq en tes n o Brasil so os traba lhos de

    Ca rdoso d e Oliveira (1976 [1971]) e C arn eiro da Cu nh a (1986 [1979]). Se

    o uso mais freq en te da noo de grup o tnico na s cin cias sociais este-

    ve liga do ao u so popular da expresso, que remete ao sign ificado greg o

    grupo de pessoas de mesma raa ou na cionalidade que apresentam uma

    cultura comu m e d istinta (Keye s 1976), tal noo tornou-se incap az de

    continu ar d and o conta d as n ecessidad es a na lticas dos an troplogos con-

    temporneos (Keyes cita como primeiro exemplo disso a anlise dos

    Kachin re alizada por Leach e m 1954), qua nd o, ento, ficou claro no exis-

  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    tirem traos culturais que possam ser tomad os como p rimordiais. Da a

    tend ncia en tre antroplogos e socilogos, ina ug urada pelo trabalho de

    Barth (1969), de disting uir o conceito de grup o tnico de qu alque r sign i-ficad o cultural ine rente , pa ra v-lo como um a en tida de social qu e e mer-

    ge da diferenciao estrutural de grup os em interao, um modo de cons-

    truir oposies e classificar p essoas, em qu e o social e simbolicame nte

    relevante s so as fronteiras desses gru pos o que e m um a primeira

    formulao era a prese nta do como o problema d os limites do grup o pol-

    tico (cf. Forte s e Evan s-Pritchar d 1981[1940]) e os me can ismos de

    criar e ma nte r tais fronte iras (Barth 1969).

    Assim, falar de grup o tnico para d escrever as comunidad es ruraisne gras h istoricame nte vinculad as aos qu ilombos (ou outras formas q ue

    lhe tenham cor respondido) no d eve levar bu sca d e peq uen as f ri -

    cas, que pode ria rem eter a u ma id ia d e resistncia cuja contrapartida

    ser ia a conservao e /ou o re torno ao passad o. Me smo na a n l ise de

    Cohe n (1974) sobre o fen men o da retr ibalizao n as cidad es afr ica-

    nas, o que se en contra a o explorar a etnicida de so formas d e organ iza-

    o social em q ue as pop ulaes articulam an tigos costume s e formas d e

    re lac ionam en to socia l com a s novas regras a q ue esto subm etidas , deuma forma dinm ica , em funo de u ma a uto-organizao em termos

    polt icos. Essa reorganizao, nos exemplos trabalhados por Barth e

    Cohen , no responde r ia n em a recor tes to gen r icos, como o de cor19 ,

    ne m reme ter ia a gru pos to bem de linead os qu an to os de scritos pe la

    an tropologia estrutu ral-fun ciona lista. Aind a qu e os conte dos culturais

    possam var iar n o temp o, no espao e na prpr ia or igem dos indivdu os

    qu e ven ha m a compor o grup o tnico, a a n lise d eve recair sobre os

    mecanismos de cr iao e / ou ma nuten o de uma forma organ izacional

    qu e prescreve pad res un ificados de interao e que reg ula que m faz e

    que m n o faz parte do grup o, alm da s relaes entre aqu eles que fazem

    parte e en tre estes e aqu eles que n o fazem.

    O q u e o s t r a b a l h o s s o b r e e t n o g n e s e e n f a t i z a m ( S i d e r 1 9 7 6 ;

    G a llag he r 1974; Despres 1975) e q ue marca os novos estudos sobre os

    grupos indgen as do N ordeste, pensad os no mais como reman escentes,

    mas como emerg en tes, qu e tais fronteiras pode m ser criadas ou mu da r

    de n atureza qu and o entra em cen a a d isputa p or recursos, em e special os

    recursos fun dir ios . Nas s i tuaes de e merg ncia d e g rupos indgena s

    no Nordeste , a iden t ida de g en r ica de nd ios est sempre a ssociad a

    aos d ireitos a qu e este rtulo faz referncia e, em todas a s situaes j

    trabalhadas, a recuperao de uma iden tidad e indgena (que , simulta-

    nea mente , a produo de u ma iden t ida de Pan ka raru, Xoc, Potigu ara

  • 8/14/2019 A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES (1)

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 27

    etc .) es teve a ssociad a de scobe r ta da existncia de sses dire i tos .

    simultaneamente ao processo de de scobe rta dos direitos que a qu e la s

    fronteiras, semp re to p orosas e a travessad as p ela m istura e pelo sin-cretismo, mud am de consistncia, que o arran jo poltico inte rno s comu -

    nidad es pa ssa por transformaes no sentido de um a m aior formalizao

    e q ue a re lao com a m emria e com as tradies tamb m p assa por

    profun da s transformaes.

    O a tual processo de atribuio de direitos s comunidad es rema-

    ne scentes de q ui lombos opera u m t ipo de t ransforma o seme lha nte

    en tre as comun idade s rurais ne gras, da nd o orige m tamb m a p rocessos

    de etn og ne se. Como ap ontou Sider (1976), se o etn ocdio o extermniosistem tico de u m e stilo de vida , em oposio a e le, a constru o frater-

    na l de u ma a utoconscincia e d e um a iden tida de coletiva (de ba se racial

    e/ ou histrica) contra a a o de u m Estad o Nacional opre ssor, com vistas

    a g an hos polticos, en tre os quais pode -se encontrar algum a exp ectativa

    de au tode te rminao , deve se r chamad a d e e tnognese . Mas , r e ssa lta

    Side r, os grup os tnicos n o so pe rseverad os ou prese rvados, e sim cria-

    dos. Isso faz com que o processo de localizao e m obiliza o pa ra o reco-

    nhe cimen to de rema nescentes fuja do u niverso das q uestes de raa,pa ra figurar no plano no s da e tnic ida de , mas da e tnog ne se , j que

    n o se trata de recupe rar etnias, no sen tido convenciona l, mas produzir

    novos sujeitos polticos, qu e se orga nizam m obilizan do um a srie de ele-

    men tos de iden tidad e comum e de carter localizado que remetem a um

    mesmo p assado de escravido e submisso, a fim d e a lcanarem novos

    recursos, em pa rticular os de na tureza territorial.

    Tan to nos casos ma is conhecidos, como das comun idade s de Kalun-

    ga (GO ), Rio da Rs (BA), Oriximin (PA) e Vale d a Ribe ira (SP), qu an to

    em situaes aind a m uito pouco estuda da s, como as de M ocambo (SE) e

    Sacotiab a (BA), com as q ua is t ive conta to, o processo de assu n o da

    ident idade de rema ne scentes teve incio com a d isputa p or recursos

    (norma lmen te trad uzidos em te rmos territoriais), e s ento, concomitan-

    temen te ou ainda mais tarde, qu and o o instrumento de luta p rivilegiado

    pa ssa a ser o Artigo 68, as qu estes de cultura e orige m comum e mer-

    gem, passando a ser plename nte tematizadas pela comunidade e tornan-

    do-se objeto de reflexo para o prprio gru po. A mobilizao d esses ele-

    men tos de iden t idad e leva a u ma n ova re lao com o pa ssado e com as

    rem iniscncias de qu e falou W. Ben jamin, num esforo de reconstru-

    o de uma continu ida de n a ma ioria da s vezes perdida, levan do ao que

    Hobsbaw m e Rang er chama ram de inveno de t radio, is to , uma

    reap ropr iao de velhos modelos ou a nt igos e lemen tos de cul tura e de

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES28

    me mria p ara n ovos fins, em qu e o pa ssado serve como repe rtrio de sm-

    bolos, rituais e personage ns exemp lares que a t ent o poderiam ser de s-

    conhecidos pe la maior pa rte da comunidad e.Ma s ao falarmos de inv en o cultural como ind issocive l da no o

    de etnogn ese, preciso estarmos atentos para o carter de inveno que

    constitui qua lque r agrup am en to social e a prpria definio de socied a-

    de (Wolf 1988), para n o se a tribu ir a esse m ovime nto a na ltico um sen ti-

    do n eg ativo, associad o s id ias de falsida de , man ipulao, artificialismo

    etc. Como de stacou O liveira Filho (1993) com rela o s em erg n cias

    indgena s, seu car te r pragm tico ineg vel , mas ser ia um e qu voco

    redu zir tais processos de e tnogn ese a este n ico aspecto, j q ue as lutascomun s e os ritua is retomad os ou inven tados (ma s de qu alque r forma pa r-

    t ilhad os) cont ribue m p ara d ota r aq ue las iden t idad es de uma grande

    importn cia n ormativa, afetiva e valorativa, crian do a s condies de p os-

    s ibi l idade para que sur ja em torno daqueles suje i tos his tr icos uma

    comun idade imagina da (Ande rson 1989), isto , um sen time nto de u ni-

    da de , de p erte ncimen to e d estino comun s (Oliveira Filho 1993:vii).

    Alm disso, reap ropriand o-nos da s crticas d e Keye s (1976) a Barth

    (seria, no en tanto, mais ad eq ua do d irigi-las s reapropriaes e vulgariza-o da s proposies de Barth), n ece ssrio reconhe cer qu e, se os movi-

    men tos de re-sign ificao e me smo de a doo e e mpr stimo de atribu tos

    iden titr ios sejam e les elemen tos de cu ltura ou d e origem -histria-

    me mria comun s so situacionais, os prprios eleme ntos e a possibili-

    dad e de operar e ssas re-sign ificaes, adoes ou emp rstimos n o o so

    (cf. tamb m os p roblemas e mp ricos leva nta dos p or Galaty 1982). Como

    ap onta Keyes, na p rtica, mesmo os autores inte ressados primariamen te

    na diferen ciao estrutural de g rupo tnico, emp regam algum da do cul-

    tural pa ra de finir sua n atu reza, como alis se mp re reivind icad o pelos

    prprios observad os. A plasticidade iden titria formad ora de sses gru-

    pos p ermite, efetivamen te, que eles resgatem, recupe rem, elementos

    substantivos de iden tida de q ue p assam a integra r seu s processos de eme r-

    g ncia , mas como matr ias-pr imas q ue precisam ser man ufaturada s

    pe las foras mobilizad as n o seu interior, na forma d e d ese jos coletivos.

    Assim, as crticas recente s a um a p erspe ctiva exclusivame nte prag -

    mtica n o devem desen har u m recuo essencialista, da mesma forma q ue

    as noes de etn ogn ese e de inven o no devem d escartar a conside-

    rao dos eleme ntos ide ntitrios eles mesmos, nem neg ar sua legitimida-

    de . No lug ar d essa d icotomia , de vemos reconh ecer a re lao dia l t ica

    qu e se estabe lece entre o he rdad o e o projetad o, en tre passado e futuro

    qu e, no curso das interaes, subme te elemen tos de cultura, de estrutura

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    A EMERGNCIA DOS REMANESCENTES 29

    e d e m emria a re-sign ificaes e re-atua es. A constatao das p erma-

    n ncias, dos sincretismos e da s contrastivida de s n o serve ma is como res-

    posta, mas como ponto de pa rtida . apenas aparentemente pa radoxa l r econhecer que ident idades

    legtimas foram inventa da s um dia, ou qu e trad ies, me mrias e identi-

    dad es inventadas so legtimas, j q ue, como apontam H obsbawm e Ran-

    ge r, as ruptu ras esto at mesmo n os corpus ou topoi mais genuinamente

    contnu os com relao a uma tradio h istrica. O qu e marca essas rup -

    turas e a presena da inven tividad e social o fato de qu e toda te ntativa

    de preservar ou recuperar tradies est, dada a impossibilidad e d e m an-

    ter o passado como algo pe rmane nteme nte vivido, de stina da a se trans-formar em tradio inven tad a . Ao tematizar e da r carter reflexivo

    sua cultura e sua liga o com o passad o, o grup o est retirand o do flu-

    xo contnuo a qu ilo qu e d eseja p reservar, tran sformar em smb olo e, por

    isso, fixar, rompe nd o justame nte com seu carter de h bito que su bme te

    aque les elementos a uma permanente m utao20, para a l-los a u m n ovo

    estatuto, o de uma tradio, nesse sen tido semp re inventada .

    A reao ao emp rego da idia de inveno (fund ame ntal para enten -

    de rmos o processo a qu e essas comunida de s esto sub me tida s hoje) temsua fonte n a ad eso a u ma teor ia da his tr ia , comum l ing ua ge m cor-

    rente, que supe a pa rtir das pa lavras qu e d esignam instituies ou enti-

    da de s coletivas ab stratas, a existncia d e sujeitos histricos capazes de

    originar e rea lizar os seu s prp rios fins (Bourd ieu 1989:75). A m gica d es-

    se procedimen to seria a de transformar o fim da histria n o fim da ao

    histrica, natu ralizan do a relao en tre o qu e a histria fez dos sujeitos e

    dos grup os e o qu e e la lhes ped e pa ra fazer . Hoje a his tr ia pe de a os

    rema nescente s q ue e les representem (no sen t ido p ol tico e tea tra l) o

    qu e se sup e te r s ido o ob je t ivo he rico dos qu ilombos, t ransformad os

    em cones d a luta ne gra, inde pen den te do qu e a histria p osteriormen te

    tenh a fe ito daq ue las comun ida de s. Por isso, o reconhecimento como

    rema nescente , qu e pa ra muitas comun idad es tem se mostrado uma via

    importante (algum as vezes a nica via) de ga ran tir suas terras e sua voz

    polt ica, an tes de se r um ato na tural de iden tificao do qu e d ad o, ao

    contrrio, as obriga a compree nd er as transformaes operad as na ide o-

    logia d ominan te pa ra que possam ace ita r e se a dap ta r a e sses novos

    pa p is. Muitas vezes isso sign ifica fazer opes a p artir do qu e p ode ra-

    mos pensar enq uan to uma plasticidad e identitria q ue se ab re a outras

    possibilidade s, s en to d escartada s.

    Como lembra Bourdieu , a histria objetivada , institucionalizad a, s

    se torna atuad a e atuan te se o posto ou a designao ou a iden tidad e em

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    causa encontra quem a ache interessante e n ela veja vantag ens, mas tam-

    b m qu e ne la possa se reconhecer pa ra se responsab il izar por e la e a

    assumir, fazend o com q ue os agen tes ou grup os entrem na pele d o perso-nag em social que deles se espe ra e q ue eles esperam d e si prprios (Bour-

    dieu 1989:87). Trata-se d a a de qu ao d os corpos em q ue est inscrita um a

    de termina da histria s novas fun es e leituras qu e lhe so atr ibu da s.

    Essa h is tria d eve se r tan to apre end ida qua nto apren dida , re tomada ,

    revitalizada , retirad a da d inmica dos corpos qu e, eventu almen te, a leva -

    ria p or outros caminhos pa ra assum ir sua s novas fun es.

    Ma s se essa dialtica, no caso dos re man escentes indgena s, en con-

    trou respaldo em um esteretipo de finido a p artir de mode los etnolgicosamp lamente difun didos que en contraram no Tor a sua forma-sntese 21 ,

    no caso dos rem an escen tes de q uilombos, pela falta de ta is mode los pron-

    tamente disponveis , essa dia l t ica paradoxalmente mais c lara . A

    importncia d e pe rceb -los como emerge ntes est em reconh ecer que o

    seu lugar, porque ainda mal de finido tanto com relao s condies d e

    acesso aos seu s novos direitos, quan to s condies d e exerccio de sua

    nova identidad e, antes de fazer aqu eles que o ocupam , ainda e st por ser

    feito por aqu eles qu e conseg uirem ocup -lo. Por sua vez, a d efinio maisfavorvel daq uilo qu e d evem ser no depe nde apena s deles ou dos seus

    opositores, ma s tamb m do estad o da correlao de foras em q ue a qu e-

    las comunidade s e seu s med iadores e concorrentes a med iadores esto

    inseridos e na qu al o pa pe l interpre tativo do antroplogo e do historiad or

    pa rece ter destaq ue . Reconh ecer a sua construtivida de , liga da plasti-

    c idad e ident i tr ia q ue m arca boa pa r te de ssas comun idad es, antes de

    vir a d esleg itimar o luga r dos preten de ntes, serve como um sina l de a ler-

    ta pa ra aq ueles que operam n a corre lao de foras que def inir q ual

    este lugar e qua is as formas d e a cesso a e le.

    Recebido em 12 de junho d e 1997

    Reapresen tado em 21 de julho de 1997

    Aprovado em 6 de a gosto de 1997

    Jos Maurcio Andion Arruti formado em histria pela UFF, mestre edou torand o em an tropologia social pelo Muse u Na ciona l, UFRJ e p rofessorsubst i tu to de a ntropologia da UFF. Tem pe squisa em his tr ia ind gena donordeste b rasileiro e traba lho de cam po en tre os Panka raru (PE). Atualmen tedese nvolve pesquisa sobre comu nidade s rema nescen tes de qui lombos,com traba lho de cam po em Sergipe e Rio de Ja ne iro. E-ma il: [email protected] c.org.

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    Notas

    * Este artigo foi escrito origina lmen te como trab alho fina l de u m cu rso minis-trado no 1o seme stre de 1996 pe lo prof. Joo Pache co de O liveira Filho. Foi ap re-senta do na reun io da ABA, em Salvad or, no mesm o ano (cf. nota 17) e n o 1o

    seme stre de 1997 foi discutido p ela turma do sem inrio de doutorado ministradopelo prof. Otvio Velho, quan do, ento, pud e m e b en eficiar d e sua s crt icas e deme us coleg as Eme rson Giumb elli, Fab ola Rohd en e Ktia Ma ria Pere ira de Almei-da . Agrad eo tamb m a s muitas suge stes do prof. Ma rcio Goldm an . As falhas,obviamen te, continu am a ser de minh a inteira responsab ilidade .

    1 O texto do Artigo 68 das Disposies Constitucionais Transitrias oseguinte: Aos reman escentes da s comunidades d os quilombos que estejam ocu-pan do suas terras reconhe cida a p roprieda de definitiva, devend o ao Estado e mi-tir-lhes os ttulos respectivos.

    2 A necessidade ou no de sua regulamen tao foi tambm objeto de de ba-te, mas ap esar dos argum entos por sua au to-aplicabilidade, as poucas ten tativasconcretas de b ene ficiar comunidad es de re man escentes esbarraram na p osiode ju zes que a leg avam n o possuir ins trum entos bsicos para a or ientao de

    seus pronunciamen tos.

    3 Veja-se a importante re viso cr t ica de Eder Sad er e Ma ria C l ia Paol i(1986) sobre a n oo de classes popu lares, em qu e os au tores exploram repre -sentaes intelectuais mais contemporn ea s que ten de m a confund i-la ou redu zi-la idia de classes trabalhad oras, ape sar e sob o lamen to da sua diversidad esubjacente . H, no entanto , um enorme campo de invest imento muito poucoexplorado sobre a relao entre e sses discursos acerca do popular e formas dediscurso sobre o outro, como o orien talismo (Said 1990) ou terceiro-mun dis-

    mo (Ahma d 1988). Como n esses l timos casos, a d iscip lina e scolhida pa ra ainvest igao do p opular, o fo lc lore , tendeu a substancia l izar um a s n tese que produto de seu p rprio movime nto ana ltico, ajuda ndo a conhecer m enos o objetodo discurso que o seu formulador, protagonistas de uma relao de conhe cimen -to, ma s sobretud o de p oder.

    4 Aqu i tam b m seria ne cessrio qua lificar o uso deste s termos no Brasil, maspara a a rgumen tao desenvolvida basta lembrar q ue os termos integrao (e/ouassimilao) e acam pesiname nto reme tem a a bordage ns do contato com n fa-ses distinta s, nu m caso ma is culturalista e noutro ma is sociolgica, repre sen tad as,

    respe ctivam en te, por Darcy Ribeiro (1978) volum e q ue re ne textos produzidosde sde a d cada de 50 e p or Roberto Card oso de Oliveira (1978) volume reu-nindo textos produzidos desde a d cada de 60.

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    5 J foi produzido sobre o tema um n me ro razovel de traba lhos monogr -ficos com n fases no processo de eme rgn cia e n a qu esto da inven o culturaldos g rup os indge na s d o N ordeste , como e m Valle (1993); Batista (1992); Barre to

    Filho (1992); Souza (1992); G run ew ald (1993); e M artin s (1994); inte rpre tae sge rais, ba sicam en te, em C arvalho (1984); Danta s et alii (1992); e Oliveira Filho(1993); e an lises qu e pre tend em inte rpreta es regionais com nfases tem ticasa pa rtir de an lises m onogr ficas, como e m Peres (1992) e Arruti (1996).

    6 Estes textos (ma is um em colab orao com R. Slenes) foram re pu blicad osem forma d e livro em Vogt e Fry (1996). Ne ste volum e os au tores acresce nta ramtamb m um a esp cie de p osfcio, no qual tentam trazer tais textos pa ra o contex-to do debate a tual sobre comunidad es reman escentes de q uilombos. Uma tarefa,

    no entanto, difcil.

    7 interessante p ercebe r como a he terodoxia d esses obje tos fo i revelada jus tamente por uma espcie de desvio no interior de tradies institucionais.Assim, da mesm a forma que os es tudos com um novo olhar sobre comunidade sindgena s camponesas se concentraram n o Museu Nacional , essa n ova sr ie deestud os sobre ne gros rurais tem incio na USP.

    8 Existe um nico exemplo de trabalho j finalizado de autoria d e a ntrop-logos sobre u ma comunidade rema nescente de q uilombos, realizado no contex-

    to de reconhe cime nto dos direitos da comun idade a sua terras tradicionais (Ca r-valho 1996). mesmo possvel que boa p arte da s novida de s que ven ha m a surgirdaq ui em diante ne ssa rea seja produto de situao seme lhante, o que n os apon -ta um a caracterstica interessante: a e ncomend a e o dilogo com o camp o jur-dico no apa recem como um dilem a de adequ ao, mas como uma m arca de ori-gem desse camp o de estudos.

    9 Apesar de Grune wald n o enfatizar esse aspecto na sua d issertao, umaidia jocosa ap resenta da por e le dura nte o GT sobre indigen ismo na ABA, em

    1994, revela o a lcance de ssa plasticidade tn ica que es tamos suge r indo se r deinteresse a ntropolgico e poltico. Seg un do aq ue le pesq uisad or, os caboclos daSer ra d o Um poder iam no te r se t rans fo rmad o em At ikum, se a agn c ia d econtato na p oca de sua mobilizao p oltica n o tivesse sido o Servio de Prote-o ao ndio, mas um possvel Servio de Proteo ao N eg ro, caso ele tivesse exis-tido, j q ue na ascendncia do g rupo podem-se e ncontrar essas dua s fontes iden -titrias.

    10 A pop ulao Xoc distribu i-se p or cerca d e 200 famlias, divididas en treuma rea d e b eira (a rea C aiara, com 4.220ha) e uma rea de ilha (a rea

    Ilha d e So Ped ro, com 97ha). Com o progressivo e violen to apossame nto de suasterras , a par t i r de 1850 pelos podere s locais, par te de sua p opulao comea amigra r para junto dos Ca riri (dan do origem a os atua is Kariri-Xoc, localizadospoucos qu ilmetros ab aixo, s m arge ns do rio So Francisco, no lado a lagoano) ea pa r te do g rupo que p e rmane ce comea a faze r v iage ns cap i ta l e s tadua l edep ois ao Rio de Jan eiro, em busca de apoio, semp re sem sucesso. Na dcad a de

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    30 os Xoc tm acesso ao rg o indigen ista oficial e o gru po re conhe cido comoindgena, ma s o conflito progride at q ue, na s dcad as de 60 e 70, dep ois de a lcan-ar gra ves propores, inclusive com violn cias contra rep rese nta nte s da Igreja, a

    Funai intervm compran do as terras d a Ilha em 1984. Segu iram -se fortes repres-lias pop ulao Xoc, qu e resp onde u com a invaso da te rra C aiara, provo-cand o a in terveno d e sucess ivas ins tncias de pode r : polcia mil itar, Jus t iaesta du al, Ministrio Pb lico Fed era l e, finalme nte , a Procuradoria da Rep b lica,a t q ue e m 1988 a Funa i in t imada a de ma rcar a terra Xoc, o que s ocorrepor m e m 1991 (cf. Dan tas e Dallari 1980; Peti 1993).

    11 Na le i de 1871 es tabeleceu-se , a lm d o que ficou conhecido como a le ido ventre livre, a criao de um me canismo de finan ciame nto estatal para a liber-

    tao an tecipa da d e escravos, atravs de um fund o composto de impostos sobrecompra e ve nda de e scravos e de u ma lo ter ia , den tre outros , conhecido comoFundo de Emanc ipao . A a r recada o des te fundo d ever ia se r em pregad asegu ndo as listas organ izada s por comisses mun icipais criada s espe cificame n-te pa ra es te f im. Uma sr ie d e p roblema s, no entan to , que iam do montante q uese conseguia arrecadar a t a sua g esto , passand o pelo processo de formulaoda s listas, que ficava n as m os dos poderes locais, mu ito rapidam en te vieram ade sacreditar o Fun do, conde na ndo-o no ap en as diante d os olhos dos abolicio-nis tas , ma s tamb m dos h is tor iad ores que lhe s seguiram. O seu fracasso comoproposta g lobal e em seus e fe i tos qu ant i ta t ivos em face do p roblem a m aior da

    ab olio n o deveria, no enta nto, ser obstculo para u ma considera o ma is justasobre seu s possveis imp actos em situaes circunscritas, como a d e localida de s eprovncias j e conomicamen te ma rginais naq uela poca.

    12 A noo de estrat gia , conforme usa da p or Bourdieu (1989:82) pa ra de s-crever aes ind ividuais e que aq ui ada ptam os aos nossos in teresses , an tes deaponta r para u ma a o consciente , um recurso que permite fugir tanto de umaviso finalista qu an to desinteressada da ao social, ind ican do a possibilidade dearticulao entre investimentos que , ap esar de n o serem reg idos por um clculo

    plena me nte conscien te, que s poderia remete r a fan tasma gorias como o Esta-do ou a classe d ominante , muito menos so arbitrrios ou aleatrios, estand ovinculados a posturas e habitus comuns qu e vo ganha ndo sentido e un idade atra-vs da su a p rpria p rtica.

    13 No caso dos aldeam en tos, tamb m o domnio qu e o missionrio ou o capi-to-mor exerciam sobre os aldead os no estava m uito distante d o controle sen ho-rial sobre a sen zala (cf., p. e x., Mon teiro 1994:151).

    14 N o deve ser inoportuno lembra r que a s prprias classificaes internas

    aos grup os ind gena s respon diam a o mesmo tipo de lgica, em q ue va lia ma is otipo de relao que se que ria impor do que a d esinteressada observao do mun -do: a du alidade en tre Tup i e Tap uia respon dia ao jogo classificatrio en tre a qu e-les grupos j sub metidos ou com os qua is j se estabe lecera uma relao estvel eaq ue les mais brba ros, indom veis, traioeiros, qu e seria preciso rep rimir ou apre -sar atravs d as ba nde iras. Mais tarde, o termo ge n rico Tap uia seria substitudo

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    por outros qu e, no enta nto, guard ariam funo sem elhan te, como Ca riri, Carnij,Aimor etc, seg un do a reg io (cf. Dan tas et alii 1992; Monte iro 1994).

    15 O termo indianidade, conforme proposto por Oliveira Filho (1988),designa um a de terminada forma d e ser e de concebe r-se ndio, no sentido gen -rico do termo, construda e m intera o com o rg o tutelar. Associado a um a d ete r-minada image m do que deve ser o ndio, a indianidade um p adro de inte-rao e de comportamen to criad o, basicamen te, atravs da instituio e a tuaode apare lhos burocr t icos de or igem esta ta l , que es tabelecem procedimentosestanda rtizados para lidar com a d iversidad e indgena . A indianidad e tem lugar,

    justamen te, quan do o mode lo imposto pe lo rgo aca ba p or se impor realida dee o indivduo, ou gru po tnico, passa a a ssumi-lo como sua re alidad e ou como seu

    prprio pad ro de comportamento. Ainda qu e e sse m ovimento entre homogen ei-dade e h eterogeneidade n o seja l inear e que mesmo no interior da pad ronizaoexista o m ovime nto no se nt ido da d iferen ciao, a imp ortncia d o concei to deindianidad e e st na sua identificao de um d os efeitos fund ame ntais da relaoentre grup os indgen as e apa relhos de Estado.

    16 Ne ste caso, os vocabu lrios sociolgico e an tropolgico tamb m se a proxi-ma m do uso vulgar d a cate goria (cf. Free dm an 1986).

    17 Devo agra decer as provocaes e o deba te desen cadea do pelas enfticas

    intervenes d e Valdlio Santos Silva e Jos J orge de Ca rvalho, durante a a pre-senta o de u ma primeira verso de ste trabalho no en contro da ABA de 1996. Apartir da me vi estimulado a d esenvolver boa p arte da s reflexes qu e se seg uem .

    18 Falar dessa unidad e de ao n o implica de sconhe cer todo o processo dedisputa s intern as qu e a p rpria instituio do grup o poltico, norma lmen te, acar-reta a travs de d ifere nte s formas de facciona lismos e disputas interna s.

    19 Um recorte que em situaes de socied ad es complexas (como a dos EUA)

    sign ificaria supor como um m esmo grup o, a p artir de um contraste com a p opula-o branca, o que na verd ad e um a gran de p opulao cultural, social e organ i-zativame nte d ispe rsa. Ne sse caso, seria n ecessrio deixar claro o que exatam entese concebe p or grupo, ante s de p artir para uma discusso sobre g rupo tnico.

    20 O resultado de ssas mutaes send o apontad o, de a cordo com a inclina odo obse rvador, ora como exem plo de p rogresso, evoluo social ou de conscin ciae integrao n a vida nacional, ora como sinais da de gen erao, miscigen ao ousincretismo, que leva pe rda d a p ureza original.

    21 Na falta d os sina is diacrticos mais eviden tes, a solu o do rgo rep etiu asua n atureza burocrtica, estabelecen do u m critrio fixo, de observao d ireta eimed ia ta e de fc il apreenso. Quand o um representante da Funai v is itava um aaldeia do N ordeste e m p rocesso de reconhecimento , e le pre l iminarmente ped iaque o grupo dem onstrasse que sabia dan ar o Tor e, a pa rtir da performance ,tecia consideraes acerca da sua a utenticidad e tn ica, que e ram levadas e m con-

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    ta a o longo d o seu p rocesso de reconhe cimen to. Com isso, quem no p ossusse oTor entre os seu s rituais arriscava-se a n o ser reconhe cido, levan do a q ue , emmuitos casos, eles procurassem a prend -lo com gru pos de tronco ve lho, tornan do-

    se um a expresso obrigatria da indianidad e (Arruti 1996).

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