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1 DIREITOS TERRITORIAIS E POVOS REMANESCENTES DE QUILOMBOS: MAPEAMENTO DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS NO BRASIL E EM MINAS GERAIS Letícia de Castro Guimarães Socióloga, Mestre em Geografia – UFU [email protected] Karla Raquel de Souza Graduanda em Geografia – Faculdade Católica de Uberlândia Bolsista FAPEMIG [email protected] Pablo Guimarães Andrade Graduando em Ciências Sociais – UFU [email protected] Resumo O presente estudo tem por objetivo dar visibilidade ao processo de territorialização das comunidades quilombolas no Brasil e, de modo especial, em Minas Gerais, de modo a compreender o panorama de sua distribuição geográfica, assim como a dinâmica da regularização territorial dos remanescentes de quilombos. Utilizando-se de informações sistematizadas em um banco de dados para a investigação sobre a situação das comunidades remanescentes de quilombos, foi possível identificar e localizar os territórios quilombolas em nível nacional, regional, estadual e municipal, assim como analisar a sua situação fundiária. Palavras-Chave: Remanescente de Quilombos. Direitos Territoriais. Territórios Quilombolas. Introdução No Brasil, as comunidades afrodescendentes vêm reivindicando a titulação dos territórios onde vivem como forma de garantir a produção de sua existência material e cultural. Atualmente, graças às iniciativas das comunidades quilombolas pelo seu auto- reconhecimento, aproximadamente 4.000 comunidades espalhadas por todo território nacional, foram identificadas, como primeiro esforço para o reconhecimento legal dos seus direitos patrimonial e territorial. Na trajetória de luta pelo direito ao território quilombola, tais comunidades elaboram suas identidades coletivas, constituem-se como sujeitos sociais, ampliando sua presença no espaço político, além de impor o reconhecimento de sua cidadania. Nesse processo de construção da cidadania os quilombolas questionam o lugar que lhes é imposto na sociedade, sendo portadores de reivindicações que visam resgatar seus direitos territoriais.

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DIREITOS TERRITORIAIS E POVOS REMANESCENTES DE QUILOMBOS: MAPEAMENTO DOS TERRITÓRIOS QUILOMBOLAS NO BRASIL E EM

MINAS GERAIS

Letícia de Castro Guimarães Socióloga, Mestre em Geografia – UFU

[email protected]

Karla Raquel de Souza Graduanda em Geografia – Faculdade Católica de Uberlândia

Bolsista FAPEMIG [email protected]

Pablo Guimarães Andrade

Graduando em Ciências Sociais – UFU [email protected]

Resumo O presente estudo tem por objetivo dar visibilidade ao processo de territorialização das comunidades quilombolas no Brasil e, de modo especial, em Minas Gerais, de modo a compreender o panorama de sua distribuição geográfica, assim como a dinâmica da regularização territorial dos remanescentes de quilombos. Utilizando-se de informações sistematizadas em um banco de dados para a investigação sobre a situação das comunidades remanescentes de quilombos, foi possível identificar e localizar os territórios quilombolas em nível nacional, regional, estadual e municipal, assim como analisar a sua situação fundiária. Palavras-Chave: Remanescente de Quilombos. Direitos Territoriais. Territórios Quilombolas. Introdução No Brasil, as comunidades afrodescendentes vêm reivindicando a titulação dos

territórios onde vivem como forma de garantir a produção de sua existência material e

cultural. Atualmente, graças às iniciativas das comunidades quilombolas pelo seu auto-

reconhecimento, aproximadamente 4.000 comunidades espalhadas por todo território

nacional, foram identificadas, como primeiro esforço para o reconhecimento legal dos

seus direitos patrimonial e territorial.

Na trajetória de luta pelo direito ao território quilombola, tais comunidades elaboram suas

identidades coletivas, constituem-se como sujeitos sociais, ampliando sua presença no

espaço político, além de impor o reconhecimento de sua cidadania. Nesse processo de

construção da cidadania os quilombolas questionam o lugar que lhes é imposto na

sociedade, sendo portadores de reivindicações que visam resgatar seus direitos territoriais.

2

Considerando que as experiências de luta desencadeadas pelos povos quilombolas para

o reconhecimento jurídico-formal das práticas de uso comum da terra contrariam as

interpretações teóricas que indicam o trágico declínio, ou mesmo a tendência inexorável

ao desaparecimento das comunidades tradicionais, de modo especial das populações

quilombolas, o presente trabalho objetiva dar visibilidade ao processo de

territorialização do movimento quilombola no Brasil e, de modo especial, em Minas

Gerais, de forma a compreender o panorama da distribuição geográfica assim como a

situação fundiária desses grupos étnicos. Este trabalho reúne alguns resultados da

pesquisa intitulada “Direitos territoriais e patrimoniais: cartografia dos territórios

quilombolas em Minas Gerais”, desenvolvido no âmbito do Programa Institucional de

Bolsas de Iniciação Científica – FAPEMIG, cujo tema central é a cartografia os

territórios de remanescente de quilombos, buscando contribuir para a investigação sobre

a situação das comunidades quilombolas em Minas Gerais.

Para compreender a dinâmica socioterritorial das comunidades quilombolas em nível

nacional e, de modo especial em Minas Gerais, buscou-se investigar nas bases de dados

disponibilizadas pela Fundação Cultural Palmares – FCP – e pelo Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária – INCRA –, além dos registros municipais das

comunidades afrodescendentes produzidos por Anjos (2009), identificando as

comunidades negras de origem quilombola. As informações obtidas nas respectivas

fontes foram armazenadas em um banco de dados, classificando os remanescentes

quilombolas em cinco níveis escalares: nacional, macrorregional, estadual,

mesorregional e municipal, além de indicar a situação fundiária de seus territórios.

Conceito e dispositivos legais da questão quilombola Os estudos e pesquisas referentes aos direitos patrimoniais dos povos tradicionais,

particularmente, dos quilombolas são relativamente recentes. Eles resultam dos debates

inseridos em torno da aplicação do artigo 68 do Ato de Disposições Constitucionais

Transitórias da Constituição Federal (BRASIL, 1998, p. 189), que afirma: Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os respectivos títulos

De acordo com O´Dwyer (2010), a Associação Brasileira de Antropologia iniciou, a

partir de 1994, uma reflexão sobre o conceito de comunidade remanescente de

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quilombo, com vistas à aplicação do artigo 68, acima mencionado. O termo quilombo

foi ressemantizado, não se referindo mais a resíduos arqueológicos de ocupação

temporal ou a uma população estritamente homogênea, consistindo em grupos que

desenvolveram práticas cotidianas de resistência na manutenção e reprodução dos seus

modos de vida característicos e na consolidação de um território próprio (O´DWYER,

2010, p. 43). Para esta autora a identidade social desses grupos se define por

experiências vivenciadas, assim como valores compartilhados por uma história comum.

Constituem-se, portanto, em grupos étnicos cujas identidades se diferenciam da

sociedade mais ampla.

O termo quilombo é também referenciado como terras que resultaram da aquisição por

negros libertos, da posse pacífica de ex-escravos pelas terras abandonadas pelos

proprietários em épocas de crise, ou mesmo da ocupação de terras doadas aos santos

padroeiros. Nesse sentido, os quilombos constituem o que Almeida (2008) denomina

com terras de uso comum. De acordo com esse autor, uma das modalidades de uso

comum da terra, mantidas à margem da ação oficial de regularização fundiária, se refere

às “terras de preto”, constituindo em domínios equivalentes a antigos quilombos e/ou

áreas de alforriados nas cercanias de antigos núcleos de mineração, que

permaneceram em isolamento relativo, mantendo regras de uma concepção de direito,

que orientavam uma apropriação comum dos recursos (ALMEIDA, 2008, p. 148).

A definição jurídico-normativa do conceito de remanescente de quilombo veio a ser

veiculada somente em 2003, por meio do Decreto 4.887 (BRASIL: s/d, p.40), que no

seu artigo 2º considera comunidades remanescentes de quilombos como (...) os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a existência à opressão histórica sofrida.

A iniciativa do Decreto 4.877/2003 instituiu novas normas que regulamentam

procedimentos para identificação, reconhecimento e regularização (delimitação,

demarcação e titulação) das terras ocupadas por quilombolas, delegando ao INCRA a

competência para a titulação das áreas e à FCP a missão de expedir, por meio do

Cadastro Geral de Remanescentes de Comunidades de Quilombos, a certificação dos

grupos de afrodescendentes que se auto-reconheceram como quilombolas. Ressalte-se

que o Decreto em referência se fundamenta na Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil

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é signatário, que considera a consciência identitária dos povos indígenas e tribais como

critério para a sua identificação.

A literatura sobre territórios quilombolas (ALMEIDA, 2008; BASTOS, 2007;

O´DWYER, 2010) indica a dificuldade na efetivação dos dispositivos legais para o

reconhecimento desses territórios. Uma evidência da restrição aos direitos territoriais

dos quilombolas, como relata O´Dwyer (2010) é a Ação Direta de Inconstitucionalidade

(ADIN) ajuizada pelo Partido Democratas (DEM) no Supremo Tribunal Federal,

contestando, especialmente, o direito à terra das comunidades, que uma vez tituladas, se

tornam coletivas e inalienáveis.

Para Almeida (2008, p. 26) o reconhecimento dos territórios quilombolas não está

isento de situações de conflito, uma vez que rompem com a invisibilidade social, que

historicamente caracterizou estas formas de apropriação dos recursos baseadas

principalmente no uso comum e em fatores culturais intrínsecos, e impelem a

transformações na estrutura agrária.

Por sua vez, o reconhecimento jurídico-formal dos territórios étnico-raciais não

significa, de acordo com esse autor, o acatamento absoluto das reivindicações

encaminhadas pelos movimentos sociais, não se traduzindo em resolução de conflitos

territoriais, de modo especial, no que se refere às diferentes formas de apropriação e uso

comum dos recursos naturais por diferentes grupos tradicionais.

Outro estudo relevante para a compreensão da territorialidade quilombola é aquele

realizado por Anjos (2009). De acordo com esse autor, as comunidades remanescentes

das populações de matriz africana se territorializaram, por distintos processos de

ocupação no espaço rural e nas periferias urbanas do Brasil, vivenciando, portanto,

situações de exclusão social e com dificuldades de inserção na sociedade brasileira.

Nos últimos anos, o Brasil tem se destacado no cenário econômico, tornando-se a sexta

economia do mundo. Na perspectiva de atender a demanda crescente da economia

globalizada e a avidez para alcançar mercados externos, o agronegócio tem sido

incrementado, agravando a questão da terra. Com a priorização de grandes

investimentos no setor agrícola, fundamentada na grande propriedade, a produção de

commodities como etanol, grãos, minério, carne, celulose, ganha importância estratégia

nos mercados globais, promovendo a expropriação de povos e comunidades tradicionais

do campo, numa escala sem limites. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Segurança

Alimentar (CONSEA), por meio do documento intitulado “Terra: direitos patrimoniais

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e territoriais”, elaborado em outubro de 2008 pelo Grupo de Trabalho sobre Terra e

Patrimônio Territorial, denuncia que a questão da terra, coloca-se, de forma renovada,

no centro do conflito social no Brasil. Esse mesmo documento evidencia o avanço dos

conflitos nos territórios étnico-raciais: Inúmeros conflitos existem entre as comunidades quilombolas e grandes fazendeiros devido às terras ocupadas pelos quilombolas sem a respectiva proteção federal. Em alguns casos o governo tomou partido daqueles que se opõem às reivindicações dos quilombolas. Tais conflitos intensificam-se, freqüentemente, ao ponto que latifundiários recorreram ao uso de táticas de intimidação. (CONSEA, 2008, p. 4)

Em Minas Gerais, de modo especial, o agronegócio se consolidou com a política de

modernização da agricultura, sobretudo, nas áreas do cerrado. A implementação dos

programas de ocupação do cerrado (POLOCENTRO, PADAP e PRODECER), partir da

década de 1970, buscou incentivar, como afirma Guimarães (2002), a prática de uma

agricultura “moderna e racional” no que refere ao emprego de novas técnicas e de

processos capazes de proporcionar mudanças na base de produção, em detrimento da

tradicional praticada até então. Neste contexto, o cerrado mineiro, marcado, até então,

pela criação extensiva de gado de corte e pela agricultura de subsistência deu lugar à

produção intensiva de grãos, florestas homogêneas de eucalipto e, mais recentemente,

do monocultivo da cana. Tudo isso provocou a destruição do meio ambiente, a

concentração de renda, assim como a exclusão do campesinato nessa região.

Para as comunidades quilombolas, ao contrário do agronegócio, a terra não é apenas um

patrimônio econômico. Ela está associada à identidade quilombola, uma vez que ela

singulariza o modo de viver e de produzir dessas comunidades. Como afirma Alexandro

Reis, no Prefácio ao Programa Brasil Quilombola: Ancestralidade, resistência, memória, presente e futuro sintetizam o significado da terra para essas comunidades, fortemente marcadas pela tradição e respeito aos bens naturais, como fonte garantidora de sua reprodução física, social e econômica (BRASIL, s/d, p. 6)

Desse modo, a garantia de acesso à terra se apresenta como questão fundamental para

esses grupos. De acordo com Carril (2006, p.161), Permanecer nessas terras após alguns séculos revela-se uma vitória histórica numa sociedade camuflada pelo “mito da democracia racial”. Num sistema sócio-econômico-político e territorialmente excludente, a luta pela terra nos quilombos é, de um lado, uma fração da luta pela reforma agrária e de outro, uma tentativa de reparar parcialmente a histórica exclusão social do negro brasileiro, no tocante a comunidades com identidades próprias.

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No processo de identificação e mapeamento das comunidades quilombolas, há que se

reconhecer que elas não se encontram no mesmo nível organizacional. Existem aquelas

que se auto-definem e são reconhecidas formalmente como comunidades quilombolas,

outras que apresentam formas de organização embrionárias. De modo geral elas podem

ser assim tipificadas: as comunidades que se encontram em processo de autodefinição,

ou em observação, as auto-definidas e aquelas que cumpriram tais etapas e aguardam o

processo definitivo de reconhecimento de seus territórios por parte do Estado. Nesse

contexto, o levantamento das diferentes situações organizacionais e identitárias das

comunidades quilombolas permite compreender a sua dinâmica socioterritorial.

Distribuição geográfica das comunidades de quilombos Por meio de um levantamento realizado na base de dados da FCP, foi possível elaborar

um panorama da distribuição geográfica dos grupos quilombolas no Brasil. A FCP

certificou, de janeiro de 2004 a dezembro de 2011, 1.820 comunidades remanescentes

de quilombos em todo país, com exceção dos estados de Acre e Roraima. A distribuição

geográfica dessas comunidades demonstra que a Região com maior número de

comunidades quilombolas é a Nordeste, que conta com 1.169 grupos remanescente de

quilombos, correspondendo a 64.2% do seu total, seguida das Regiões Sudeste, com

248 (13.6%), Norte, com 164, (9.1%), Sul com 131 (7.2%) e finalmente Centro-Oeste,

com apenas 108 comunidades, equivalendo a 5.9% daquelas certificadas pela Fundação.

O Gráfico 1, a seguir, indica a localização dos remanescentes quilombolas, segundo as

Grandes Regiões do Brasil.

Gráfico 1 - Localização das comunidades quilombolas certificadas, segundo as Grandes Regiões – Brasil (2011)

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Conforme demonstra a Tabela 1, os estados com maior número de comunidades

certificadas são Bahia, Maranhão e Pernambuco, apresentando a maior concentração de

quilombos localizadas na Região Nordeste A maior incidência de quilombolas na Bahia

e no Maranhão pode ser explicada pelo fato de que nestes estados elas se encontram

num estágio mais avançado de organização. A Bahia, por exemplo, já implementou, de

acordo com a Associação dos Advogados de Trabalhadores Rurais do Estado da Bahia

(2012), o Conselho Estadual de Quilombolas, com o objetivo de promover o

fortalecimento institucional das associações quilombolas. Já no Maranhão, os grupos

quilombolas encontram-se articulados na Associação das Comunidades Negras Rurais

Quilombolas do Maranhão (ACONERUQ), organização pioneira na luta pela garantia

dos direitos territoriais dos remanescentes de quilombos deste estado, cuja missão é

servir como fórum de representação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do

Maranhão (ROSAR, 2009).

Tabela 1. Estados brasileiros com maior número de comunidades quilombolas certificadas (2011)

ESTADOS COM MAIOR Nº DE COMUNIDADES QUILOMBOLAS

NUMERO DE COMUNIDADES

Bahia 435 Maranhão 406 Minas Gerais 148 Pernambuco 108 Pará 102

Fonte: FCP

Embora Minas Gerais apresente 148 comunidades auto-reconhecidas, foi possível

identificar, no levantamento realizado a partir diferentes fontes, 299 comunidades que

podem ser classificadas como quilombolas. Por meio da pesquisa foi possível elaborar

um panorama da distribuição destes grupos étnicos nas diferentes mesorregiões de

Minas. Como mostra a Tabela 2, os territórios quilombolas mineiros estão concentrados

nas mesorregiões do Jequitinhonha, Norte de Minas e Metropolitana de Belo Horizonte,

onde se encontram 64,6% do seu total. A Zona da Mata apresenta 8%, Vale do Mucuri

7% e Noroeste 6,7%. As demais regiões apresentam registros pouco significativos, que

correspondem a 13,7%.

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Tabela 2 - Localização das comunidades quilombolas mineiras, segundo as mesorregiões – Brasil (2011)

GRANDE REGIÃO NÚMERO % Campo das Vertentes 04 1,3 Central Mineira 02 0,7 Jequitinhonha 81 27,1 Metropolitana de Belo Horizonte 52 17,4 Noroeste 20 6,7 Norte de Minas 60 20,1 Oeste 04 1,3 Sul/Sudoeste de Minas 07 2,3 Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba

11 3,7

Vale do Mucuri 21 7,0 Vale do Rio Doce 13 4,3 Zona da Mata 24 8,0 Fonte: FCP, INCRA e ANJOS (2009)

Conforme relata Guerrero (2008), o processo de modernização da agricultura no Vale

do Jequitinhonha ocorreu ao longo da década de 1970, com a instalação de empresas

reflorestadoras em uma extensa área do cerrado, sobretudo no Alto e Médio

Jequitinhonha. Com o objetivo de incentivar o abastecimento de indústrias siderúrgicas

e de papel celulose, as reflorestadoras formaram um grande deserto verde, mediante o

monocultivo do eucalipto, restringindo a produção camponesa para as grotas. São

nessas áreas de difícil acesso que grande parte das comunidades quilombolas da região

resiste à modernização conservadora, enfrentando problemas de toda ordem, além de

serem mal atendidas pelo poder público, conforme indica CEDEFES (2008). A maioria

dos quilombos da região se localiza nos municípios de Chapada do Norte, Berilo,

Itamarandiba e Minas Novas (Tabela 3).

O Norte de Minas possui 89 municípios, ocupando uma área de 128.454 km². Nessa

mesorregião predomina o bioma do cerrado, seguido pela caatinga, que ocupa 2% da

região, estando restrita à porção extremo-norte, na bacia do Rio São Francisco. O estudo

do CEDEFES (2008) sobre os quilombolas de Minas Gerais indica que as populações

tradicionais do Norte de Minas, incluindo aí as comunidades quilombolas, são

conhecidas conforme os biomas (caatinga ou cerrado) e atividades que ocupam. Nas

chapadas, localizadas na margem esquerda do Rio São Francisco, vivem as populações

quilombolas conhecidas como chapadeiros. Nos municípios de Manga e Januária,

encontramos os ribeirinhos ou vazanteiros. Nos vales do Verde Grande e Gorutuba

encontram-se os quilombolas denominados geraizeiros ou caatingueiros. Os municípios

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do Norte de Minas que mais concentram remanescentes de quilombos são: Manga e

Januária (Tabela 3).

Grande parte dos remanescentes de quilombos do Norte de Minas se localiza, de acordo

com CEDEFES (2008), entre os vales dos rios Verde Grande e Gorutuba. Essa região, a

princípio não foi habitada pela população européia nos primeiros séculos de ocupação,

em razão dos focos de malárias ali existentes. Para o CEDEFES (2008, p. 46), como a

população de origem africana apresentava maior resistência a essa doença endêmica,

a malária serviu como escudo que permitiu a ocupação desse local por escravos e

outros negros. Dois grandes territórios quilombolas dessa mesorregião estão

localizados em espaços que extrapolam as fronteiras administrativas do município: a

comunidade Brejos dos Crioulos se estende pelos municípios de São João da Ponte,

Varzelândia e Verdelândia; já o grande quilombo dos Gorutubanos ocupa terras

distribuídas pelos municípios de Porteirinha, Pai Pedro, Catuti, Janaúba, Jaíba, Monte

Azul e Gameleira.

Tabela 3 - Municípios mineiros com maior número de comunidades quilombolas (2011) MUNICÍPIOS COM MAIOR Nº DE COMUNIDADES QUILOMBOLAS

NUMERO DE COMUNIDADES

Manga 17 Chapada do Norte 14 Berilo 13 Ouro Verde de Minas 11 Itamarandiba 10 Januária 9 Minas Novas 8 Vazante 8 Paracatu 7 Conceição do Mato Dentro 6

Fonte: FCP, INCRA e ANJOS (2009)

Vale ressaltar que as comunidades quilombolas do Norte de Minas resistem, ainda, ao

processo de desenvolvimento rural implantado pelo poder público, voltado para

produção de monocultivos. Os programas governamentais de modernização agrícola

implementados nessa mesorregião, transformaram o espaço agrário, marcado antes pela

criação extensiva de corte e por uma agricultura de subsistência praticada pelos povos

tradicionais. De acordo com Costa Filho (2008, p. 59), o processo de modernização da

agricultura, baseado no estímulo do reflorestamento monocultural do eucalipto e, em

menor medida, na pecuária extensiva, contribuiu para uma exclusão ainda maior da

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agricultura camponesa. Com a expansão das áreas de reflorestamento e da agricultura

de irrigação, as populações tradicionais (geraizeiros, ribeirinhos, caatingueiros e

chapadeiros), ficaram à margem deste processo de modernização, se tornando vítimas

de processos expropriatórios e de impactos ambientais do que sobrou de seus territórios.

Há que se considerar, ainda, que o Jequitinhonha e o Norte de Minas apresentam-se

como uma das regiões mais pobres do Brasil, cujos indicadores sociais estão abaixo da

média do país. Enquanto os valores do Índice de Desenvolvimento Humano – IDHi – do

Brasil e de Minas Gerais correspondem a 0,718 e 0,800, os do Jequitinhonha e Norte de

Minas equivalem a 0,650 e 0,649, respectivamente. Tais indicadores demonstram a

situação de vulnerabilidade vivenciada pelas populações quilombolas que se encontram

nessas regiões.

Panorama da regularização fundiária dos povos remanescentes de quilombos De acordo com o Decreto 4887/2003, o INCRA é a instituição responsável pela

regularização fundiária das comunidades quilombolas, em parceria com os Institutos de

Terras Estaduais e a FCP.

Conforme dispõe a Instrução Normativa 57/2009 do INCRA, os processos de

regularização só podem ser iniciados mediante a certificação das comunidades

remanescentes de quilombos emitidas pela FCP. Apesar de se estimar a existência de

cerca de 4.000 comunidades quilombolas no Brasil, foram certificadas 1.820 no período

de 2004 a 2011. O Gráfico 2 mostra o quantitativo de comunidades certificadas por ano.

Gráfico 2 - Comunidades certificadas por ano – Brasil (2004-2011)

Fonte: Fundação Cultural Palmares

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Ao analisar o Gráfico 2, foi possível verificar o elevado número de comunidades

certificadas em 2006, totalizando 416 certificações, ao passo que em 2009 foram

certificadas apenas 98.

O processo de regularização fundiária das áreas remanescentes de quilombos pressupõe

algumas etapas. Inicialmente faz-se a abertura do processo no INCRA, seguida da

elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) que inclui a

elaboração de relatório antropológico, de levantamento fundiário, de planta e

memorial descritivo, assim como o cadastramento das famílias quilombolas. (BRASIL,

2012, p.13). Na sequencia, publica-se o RTID no Diário Oficial da União abrindo-se

prazos para a interposição de recursos judiciais e possíveis contestações ao RTID. As

etapas seguintes referem-se à publicação da portaria de reconhecimento do território;

decretação do território como de interesse social; desintrusão dos ocupantes não

quilombolas por meio de indenização quando for o caso. Finalmente o INCRA expede a

titulação da área. O título é coletivo, indivisível, inalienável e emitido em nome da

Associação, como representante legal das comunidades quilombolas.

Conforme indica o documento Territórios Quilombolas – Relatório 2012, no período de

2004 a 2011 foram abertos 1149 processos no INCRA, sendo 149 RTID’s elaborados;

71 portarias de reconhecimento territorial publicadas, e efetivados 42 decretos de

interesse social. O mesmo relatório indica a existência de 121 títulos emitidos,

regularizando 988.356,6694 hectares em benefício de 109 territórios, 190 comunidades

e 11.946 famílias quilombolas. (BRASIL, 2012: 16). Considerando que entre 1995 e

2003 foram expedidos 49 títulos, a quantidade emitida entre 2004 a 2011 foi de 72

títulos. A Tabela a seguir demonstra o andamento da regularização fundiária dos

territórios quilombolas no Brasil.

Tabela 4 – Regularização fundiária das comunidades quilombolas – Brasil (2004-2011) Ano 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Processos abertos no INCRA

111 208 189 167 123 147 74 130

Titulações expedidas 2 7 19 5 16 9 11 3 Fonte: INCRA

Apesar do alto número de comunidades quilombolas certificadas e com processo aberto

no INCRA, pode-se verificar que poucas delas conseguem a titulação de seu território.

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Dos 1149 processos abertos nessa autarquia, no período de 2004 a 2011, apenas 72

(6,3%) foram finalizados, mediante a titulação de suas terras.

Coincidentemente, foi em 2006, ano de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da

Silva, a maior incidência de territórios quilombolas certificados e titulados, como

demonstra o Gráfico 2 e a Tabela 4.

Tabela 5 – Regularização fundiária de quilombos – Títulos emitidos por Estados ESTADO TÍTULOS

Pará 56 Maranhão 23 Rio Grande do Sul 08 São Paulo 07 Bahia 06 Piauí 05 Mato Grosso do Sul 04 Mato Grosso 01 Rio de Janeiro 02 Amapá 03 Pernambuco 02 Goiás 01 Sergipe 01 Minas Gerais 01 Rondônia 01

TOTAL 121 Fonte: INCRA

Ainda que o INCRA seja a instituição responsável pelo processo de regularização

fundiária no território nacional, sua atuação não impede a ação dos estados e

municípios. Nos casos dos territórios quilombolas localizados em terras públicas do

estado, esta autarquia efetiva parcerias com os Institutos de Terras. Esta é a razão da

maior emissão de títulos em estados como o Pará, Maranhão, Rio Grande do Sul, São

Paulo, Bahia e Piauí (Ver Tabela 5), cujos processos de regularização territorial são

executados pelos Institutos de Terras. Vale salientar que noveii estados que possuem

comunidades certificadas ainda não alcançaram o processo regularização fundiária,

enquanto outros estados, como Minas Gerais, por exemplo, apenas uma comunidade

obteve a titulação de sua área.

Para compreender a dinâmica da regularização fundiária dos territórios quilombolas em

Minas Gerais, buscou-se sistematizar a situação das comunidades mapeadas, seguindo a

seguinte classificação: considera-se comunidade identificada aquela que está passando

por processo de autodefinição como remanescente de quilombo e se encontra em estágio

embrionário de organização; denomina-se comunidade certificada aquela que foi

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cadastrada pela FCP, contudo não possui processo administrativo para identificação e

reconhecimento do seu território no INCRA; o processo aberto no INCRA refere-se

àquelas comunidades que já iniciaram o procedimento administrativo de regularização

fundiária na autarquia e aguardam a elaboração do RTID, para fins de identificação e

delimitação de suas áreas; o território é reconhecido, mediante aprovação definitiva do

RTID e declaração dos limites da área pelo INCRA; a emissão do título é a última etapa

da regularização fundiária, efetivada após a desintrusão do território (Ver Tabela 6).

Tabela 6 - Situação fundiária das comunidades quilombolas em Minas Gerais (2011) Status Quantidade %

Comunidade Identificada 130 43,5 Comunidade Certificada 54 18,1 Processo aberto no INCRA 108 36,1 RTID publicado 5 1,7 Território reconhecido 1 0,3 Título emitido 1 0,3 TOTAL 299 100,00

Fonte: FCP, INCRA e ANJOS (2009)

Ao verificar a Tabela acima, percebe-se que das 299 comunidades pesquisadas, 43,5%

não foram cadastradas pela FCP. Uma das hipóteses levantadas com relação ao não-

cadastramento de tais comunidades é que elas se encontram em um processo

embrionário de organização, ou seja, não se auto-reconheceram, ainda, como

quilombolas, procedimento fundamental para se requisitar a regularização de seus

territórios. Outro aspecto averiguado foi que, dentre as 108 comunidades com processo

aberto no INCRA, cinco tiveram o RTDI concluído – procedimento administrativo

fundamental para titulação –, ao passo que apenas uma conseguiu a emissão do titulo de

seu território. Somente uma comunidade quilombola teve o seu território reconhecido

pelo INCRA.

Quando se desagregam os dados relativos às comunidades identificadas em termos das

mesorregiões mineiras, é possível averiguar que grande parte das comunidades

quilombolas localizadas no Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba e no Oeste encontram-se

em processo de autodefinição, correspondendo a 81,9% e 75% respectivamente. Na

mesorregião do Triângulo Mineiro foram encontradas onze comunidades, sendo que

apenas duas estão certificadas e com processo aberto no INCRA, ao passo que na Oeste,

das quatro comunidades pesquisadas, apenas uma obteve certificação na FCP e está com

processo aberto no INCRA.

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Ainda com relação à Tabela 6, fica evidente o contraste entre o número de comunidades

identificadas com o reconhecimento do território e o título de posse emitido pelo

INCRA, o que evidencia o processo intricado de regularização fundiária dos

quilombolas em Minas Gerais. A única comunidade que obteve o reconhecimento pelo

INCRA no estado foi Brejo dos Crioulos e a que conquistou a titualação foi Porto Corís.

A comunidade quilombola Porto Corís, localizada no município de Leme do Prado, na

mesorregião do Jequitinhonha, foi a primeira de Minas Gerais a ser certificada e a única

tituladaiii. Contudo, em 2004, com a construção da Usina Hidrelétrica Irapé, localizada

no rio Jequitinhonha, esta comunidade foi obrigada a deixar seu território, devido a

inundação da área causada pela construção da barragem. Como observa a Comissão

Pró-Índio de São Paulo (2012), os quilombolas, com o apoio de instituições como a

Campo Vale, a Comissão Pastoral da Terra, o Movimento dos Atingidos de Barragem,

do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA – UFMG e o CEDEFES

lutaram para permanecer em seu território, porém, este ato foi em vão. Em 2006, a

CEMIG os retirou daquele espaço, reassentando-os irregularmente no povoado de. de

Mandassáia, no município de Leme do Prado. Como a área do território onde vivam é

muito diferente do atual, os quilombolas têm dificuldades para se adaptarem à nova

realidade. Lidar com a mudança para outro universo, inclusive de produção agrícola,

tem sido um desafio. Nesse novo local eles tentam reconstruir a sua história, criar

novas referências e estabelecer vínculos como um espaço que lhes é estranho

(Comissão Pró-Índio de São Paulo: 2012).

O que chama a atenção é que Porto Corís, foi a primeira comunidade em Minas Gerais a

conquistar o título de suas terras tradicionais, é também a primeira a perder o acesso a

seu território em decorrência de uma ação governamental para a instalação de projetos

de desenvolvimento, o que configura uma injustiça ambiental.

O quilombo Brejo dos Crioulos localiza-se entre os municípios de São João da Ponte,

Verdelândia e Varzelândia, na mesorregião Norte de Minas e é constituído por 650

famílias, totalizando 2.884 moradores (CEDEFES, 2008). Segundo o Grupo de Estudos

em Temáticas Ambientais – GESTA – UFMG (2012), Brejo dos Crioulos foi a primeira

comunidade desta mesorregião a se autodefinir como remanescente de quilombo,

reivindicando a regularização fundiária para o governo federal, em 1998. Desde então,

os quilombolas vêm mobilizando, por meio de uma rede de apoio formada por

organizações como o Sindicato de Trabalhadores Rurais (STR), a Comissão Pastoral da

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Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Centro

Alternativa do Norte de Minas (CAA) e Movimento Negro, para reivindicar seus

direitos territoriais. Desde 2004, quando obtiveram a sua certificação pela FCP, os

quilombolas reocuparam por seis vezes a terra que se encontra nas mãos dos

fazendeiros, desencadeando uma situação de tensão permanente. Como indica GESTA –

UFMG (2012): Em todas as reocupações territoriais, os quilombolas denunciaram na imprensa regional e pelos meios midiáticos disponíveis a forma ilegítima e violenta como foram conduzidas as reintegrações de posse. Em decorrência da pressão do movimento social regional, a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa de Minas Gerais realizou três Audiências Públicas cujos desdobramentos propiciaram a intermediação da Procuradoria da República em Minas Gerais para a negociação entre os quilombola e os fazendeiros.

Segundo Quilombo Brejo dos Crioulos (2012), diante da morosidade do Governo

Federal na solução dos conflitos vivenciados no território, três quilombolas se

acorrentaram, no dia 28 de setembro de 2011, em frente ao Palácio do Planalto, junto a

outros cem acampados, exigindo a assinatura do decreto de desapropriação do seu

território pela presidente Dilma Roussef. A assinatura do referido decreto deu-se em 29

de setembro de 2011, autorizando a desapropriação de 74 fazendas, totalizando uma

área de 17.302 hectares, beneficiando 500 famílias quilombolas.

Com o reconhecimento do quilombo Brejo dos Crioulos, os conflitos entre fazendeiros e

quilombolas se agravaram, culminando com ameaças por parte de pistoleiros, a mando

dos latifundiários da região, aos membros da comunidade. Segundo a Agência de

Notícias da Polícia Federal (BRASIL, 2012), para proteger os remanescentes do

quilombo, o órgão deflagrou, com o apoio da Polícia Militar de Minas Gerais, a

Operação Brejo dos Crioulos, cumprindo, em fevereiro de 2012, oito mandatos de busca

e apreensão de armas nos municípios de São João da Ponte, Varzelândia e Verdelândia.

O processo de regularização do território quilombola encontra-se, segundo indica o

Combate ao Racismo Ambiental (2012), na fase de avaliação das fazendas que serão

desapropriadas para, então, dar início aos trâmites de compra e, finalmente, efetivar a

titularidade em nome da comunidade.

Cabe destacar que a regularização fundiária dos territórios quilombolas tem como ponto

de partida a articulação política das comunidades e movimentos negros, no sentido de

desencadear as primeiras iniciativas em direção ao seu reconhecimento, conforme

afirma Rodrigues (2010). Contudo a chegada ao processo final para a conquista de seus

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direitos implica um longo percurso que atravessa uma imbricada zona burocrática,

técnica e política que se impõe à titulação.

Considerações finais Ao longo deste trabalho, procurou-se elaborar um panorama da distribuição geográfica

dos grupos remanescentes de quilombos no Brasil e em Minas Gerais, buscando

demonstrar a situação encontrada em termos de regularização fundiária dos seus

territórios. Verificou-se que a partir da Constituição de 1988, esses grupos obtiveram o

reconhecimento de seus direitos territoriais e culturais, saindo da invisibilidade social a

que foram relegados durante 500 anos. Nesse sentido, o presente ensaio é uma

contribuição para o processo de identificação e de mapeamento das comunidades

étnico-raciais, dando visibilidade à questão quilombola no âmbito acadêmico.

Outro aspecto revelado por este estudo diz respeito aos obstáculos vivenciados pela

população quilombola na conquista dos seus direitos territoriais garantidos pela

Constituição Brasileira. Apesar da estimativa de cerca de 4.000 comunidades de

quilombos em todo Brasil, a incidência de titulações é pouco significativa. Em Minas

Gerais, em especial, o processo de titulação territorial demonstra os entraves

burocráticos na demarcação das terras quilombolas, entrecruzados pelas reações dos

setores mais conservadores na justiça e na mídia, além do recrudescimento da violência

no campo. O processo de certificação estabelece o reconhecimento oficial do território

tradicionalmente ocupado, contudo a garantia da sustentabilidade das comunidades

quilombolas se efetivará com a titulação de seus territórios. Afinal, mais do que espaço

físico e geográfico, o território é entendido como patrimônio necessário para a

reprodução física, material e cultural das comunidades quilombolas.

Notas

i O IDH é a composição de três índices conhecidos: 1) expectativa de vida ao nascer, 2) grau de escolaridade e analfabetismo; 3) nível de renda ajustado ao poder de compra do dólar. Ele varia de 0 a 1, subdividido em baixo IDH (de 0 a 0,5), médio IDH (0,51 a 0, 79) e IDH alto (acima de 0,8).

ii Os estados cujas comunidades quilombolas não obtiveram titularização de suas áreas são: Amazonas, Amapá, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Tocantins.

iii Porto Corís obteve a titulação de sua área, expedido em julho de 2000, pela Fundação Cultural Palmares (Fonte: INCRA-DFQ).

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