a educaÇÃo e seus valores - avm - pós-graduação · 2.2 – a educação nova e os valores 21...

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” A EDUCAÇÃO E SEUS VALORES MARCO AURÉLIO SILVA DE FARIA ORIENTADORA Mª. DINA LÚCIA CHAVES ROCHA Rio de Janeiro 2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

A EDUCAÇÃO E SEUS VALORES

MARCO AURÉLIO SILVA DE FARIA

ORIENTADORA

Mª. DINA LÚCIA CHAVES ROCHA

Rio de Janeiro

2010

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

A EDUCAÇÃO E SEUS VALORES

Rio de Janeiro

2010

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Docência do Ensino Superior. Por Marco Aurélio Silva de Faria

3

EPÍGRAFE

Questionamentos geram conhecimentos, formam mentores

capazes de descortinar soluções para os problemas.

"O professor não ensina, mas arranja modos de a própria criança descobrir. Cria situações-problemas." (Jean Piaget)

4

AGRADECIMENTOS:

Ø A Deus que me ajudou a permanecer até o termino deste curso.

Ø Aos meus pais que me deram força para dar continuidade nesta carreira,

sendo eles também professores.

Ø Aos colegas de classe, que através da amizade e cooperação,

contribuíram para estarmos, aqui, finalizando.

Ø Aos mestres que sem a presença deles, nada disso seria possível, o

nosso viver se afogaria num mar de ignorâncias.

5

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos mestres que nos auxiliaram na subida dos

degraus do saber com a preparação para o crescimento como docentes no

ensino superior.

A todos os brasileiros que querem ver a educação tendo prioridade

para o desenvolvimento do país.

6

RESUMO

Apresentação da variedade de valores que sustentam uma educação

para combater as falhas existentes na aprendizagem.

Trata-se de uma pesquisa, através de uma retrospectiva histórica,

sobre os conceitos dos valores, questionamentos suas mudanças, tendências

e, principalmente, suas conseqüências na prática educativa.

7

METODOLOGIA

Valorização do aluno como descobridor atuante no seu meio,

como pessoa criativa, como ser autodisciplinado.

Valorização do professor como orientador, respeitando as

diferenças individuais e como alavanca impulsora determinante no

aprendizado.

Valorização da escola como instrumento de conscientização do

meio em que vive, agente importante na relação ensino-aprendizagem,

parar detectar os pontos críticos e mapear soluções no contexto

pedagógico brasileiro.

8

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO 1 12

ANTECEDENTES DA TEORIA DOS VALORES

CAPÍTULO 2 16

A EDUCAÇÃO E OS VALORES

2.1 – A Educação Tradicional e os Valores 18

2.2 – A Educação Nova e os Valores 21

2.3 – A Educação Progressista e os Valores 25

CAPÍTULO 3 28

VALORES DA EDUCAÇÃO ATUAL BRASILEIRA

CONCLUSÃO 33

BIBLIOGRAFIA 46

ANEXOS 48

9

INTRODUÇÃO

O homem é um ser cultural, aliás, já ao nascer encontra-se envolto

por valores herdados. O mundo cultural é um sistema de significados já

estabelecido por outros, conforme atendemos ou transgredimos certos

padrões, nossos comportamentos são avaliados como bons ou maus.

Fazemos juízos de valor quando descobrimos o conteúdo que mobiliza

nossa atração ou nossa repulsa, ou seja diante dos seres que constituem o

nosso mundo familiar estamos atribuindo valores de forma bipolar.

Nem sempre os valores transmitidos são claramente percebidos a

educação será mais coerente se formos capazes de explicitá-los, ou seja,

existe a necessidade de um trabalho reflexivo que esclareça as bases

axiológicas da educação.

Educação e liberdade são inseparáveis. A educação autêntica só pode

ser a educação para a liberdade. Podemos considerar inicialmente duas

posições contraditórias, a da liberdade incondicional e a do determinismo

absoluto.

A liberdade incondicional, o homem teria uma liberdade absoluta.

Enquanto que para as teorias deterministas, o homem, à semelha das coisas,

sofre constrangimento externo e interno que apenas tem a ilusão de escolher

livremente.

O impasse provocado por essas duas posições contraditórias pode ser

superado a partir de uma visão dialética da liberdade.

A partir desses conceitos, podemos ver as dificuldades que surgem

diante de uma proposta coerente de educação para a liberdade, afinal, educar

é dar condições para que o educando se encontre e faça seu caminho.

10 Acreditando, pois na importância e significação dos valores para a vida

humana, ressaltamos a necessidade de que o ser, o valer e o refletir sejam

vividos como movimentos integrados na situacionalidade do projeto educativo.

Assim sendo, a filosofia – enquanto reflexão crítica e questionadora que

parte da constatação, alimenta-se da perplexidade, passa pela negação e

recupera a significação e a doação de sentido – característiza-se para o

educador como a possibilidade de vincular a teoria à prática o saber ao fazer

pedagógico. Apresenta-se como processo que nos possibilita reconfigurar o

“ser-no-mundo-com-os-outros”, cerne no projeto educativo numa busca maior

de conhecimento das próprias relações que nessa ambientação se processam.

Isso deverá propiciar condição de tratarmos o problema dos valores tanto no

sentido de compreender, tanto no sentido – apontando por Nietzsche – busca,

descoberta e criação de novas significações que garantam ao homem o

“poder-swer-mais –humano”.

Em vista disso, na primeira parte deste nosso trabalho, procuraremos

apontar em direção a alguns veios maisrepresentante da reflexão filosófica

sobre os valores, desde o passado remoto (remoito, no sentido cronológico

mas sempre muito próximo no tocante à validade do movimento do

pensamento

Entendendo o ser humano como produtor e produto do universo de

valorações estéticas, éticas, religiosas, políticas e educacionais, este estudo

objetiva analisar os valores na educação.

Partindo de uma retrospectiva histórica, procura-se situá-los no atual

contexto social, uma vez que são os alicerces dos objetivos educacionais.

O enfoque dos valores na educação nos parece pertinente, visto que

existe uma dimensão axiológica do processo educativo que, necessariamente,

deve ser conhecida, explicada e repensada.empreendido) até posicionamentos

mais atuais.

11

A reflexão filosófica sempre trabalhou com categorias axiológicas,

não apenas visando aplicá-las espontaneamente, como se dá no pensar

cotidiano, mas realizando também um questionamento sistemático a respeito

da função dessas categorias, suas origens e limitações, relações e influências

mútuas, condições objetivas de surgimento, manutenção e transformação.

Por categorias axiológicas entende-se aqui a manifestação dos

valores, conforme o poder de captação e tratamento que se pode ter deles no

desenvolvimento das experiências existenciais ou históricas, individuais ou

coletivas. Ou ainda, categoria axiológica refere-se ao valor, enquanto algo

significativo, necessariamente, presente à vida humana, ao mesmo tempo

determinante e determinado pelo processo humano de existir. Nesse sentido,

então, usa-se aqui como sinônimo os termos categoria axiológica, categoria

valor e valor.

De um modo geral, percebe-se na bibliografia especializada que o

século XIX (mais precisamente em sua segunda metade), foi estabelecido

como o verdadeiro marco de uma Teoria de Valores ou Axiologia, enquanto

disciplina filosófica responsável por uma investigação específica sobre a tão

decisiva problemática dos valores.

Essa busca de sistematização da reflexão axiológica, teve, porém,

vários antecedentes, precursores e sugestões ao longo da história da filosofia.

Desta forma, retorna-se alguns desses momentos centrais,

principalmente aqueles mais ricos em consequências, para o contexto

educacional, que é sempre o horizonte imediato da nossa pesquisa.

Talvez, se estruture melhor, desta forma, um referencial para a

análise da maneira como as categorias axiológicas se manifestam no seio da

prática educativa, que é, afinal, a preocupação motivadora desta dissertação.

12

CAPÍTULO 1

ANTECEDENTES DA TEORIA DOS VALORES

Sobre a teoria dos valores, Hessen assegura que: “ o termo Teoria

dos Valores ou Filosofia dos Valores, é relativamente recente, embora o objeto

de que trata remonte à antiguidade clássica” .

Segundo Sócrates, apenas o homem se conduz com o conhecimento dos

fins,somente ele possui os objetivos da sua opção. Em suma, o homem age em

função dos valores.

Platão, ao fazer de sua Teoria das Ideias uma teoria dos valores, dá

prosseguimento à apreensão axiológica de Sócrates. As ideias de Platão são

essencialmente ideias de valores como provam a sua ideia de bem, valor

supremo e fonte de todos os demais valores éticos, estéticos, intelectuais, etc.

“A multiplicidade das diferentes formas é unificada no bem, forma suprema,

causa primeira que dá a existência e a essência às formas inferiores”.

Dando continuidade e reformulando o pensamento socrático-

platônico,Aristóteles substitui o cosmos das ideias pelo cosmo das formas, em

que os modelos e o próprio Bem passam a ser tomados como presentes nas

coisas, na própria realidade empírica e assumem plena imanência liberando-se

da transcendência platônica. O objetivo maior de Aristóteles era exatamente

trazer as ideias platônicas do mundo celeste e fundi-las no interior do universo

empírico, mutável, histórico, concreto e natural. Para ele, a política (inseparável

da ética e igualmente da retórica, da ciência da administração das técnicas

educacionais, etc.) é a responsável pela determinação do fim supremo ou a

felicidade, para o homem-cidadão, implica na prática da virtude que

corresponde ao seu fim último, ao valor máximo. O bem do estado, da

13comunidade real e concreta à qual pertence será, portanto, o bem do homem.

O homem virtuoso só pode ser o homem político.

As tendências filosóficas que começam a discutir os valores como

entidades dadas, previamente constituídas, surgem somente depois do

renascimento.

Como representante de uma das correntes do período renascentista ,

surge Maquiavel que busca uma reaproximação entre a moral e a política

através da concepção laica dos Estado, fazendo aflorar uma nova postura

axiológica.

No início da Idade Moderna, percebe-se que a superação da

hierarquia tradicional europeia e do teocentrismo característico do período

medieval, implicou na necessidade de um redimensionamento total dos valores

e ações valorativas. Em consequência, a filosofia burguesa se sente obrigada a

fundamentar seus valores, a teorizar sobre eles.

Paralelamente ao racionalismo e ao empirismo, pilares de toda a

filosofia moderna, surgem outros movimentos que, endossando ou refutando

essas duas tendências, vão constituindo um quadro filosófico variado e

complexo.

Assim, surge, o iluminismo, desenvolvido na França do século XVIII e

o Romantismo Naturalista de Jean Jacques Rousseau que contesta a

Filosófica das Luzes. Sendo o objetivo principal deste trabalho a questão

axiológica, cumpre tecer apenas algumas considerações a respeito dos

primórdios de uma filosofia dos valores.

O iluminismo, representante de uma sólida tradição racionalista,

passa a intervir nos acontecimentos através de uma intensa atividade

pedagógica e civilizatória que vem alicerçar a Revolução Francesa.

Inicialmente, ligado às vanguardas iluministas, Jean Jacques

Rousseau, passa a combatê-las praticamente desde a sua primeira obra. No

seu Discurso sobre as ciências e as artes, já se acham delineados os

elementos que compõe toda a sua doutrina acerca da educação, da cultura, da

reflexão científico-filosófica e político-social, dos quadros de valores e

valorações institucionalizadas.

14 Para ele, o ideal consistiria em retroceder a um regime de plena

liberdade individual e de inocência no qual o homem, irmanado à natureza sem

outros problemas que não os da alimentação e reprodução, desconhecendo

assim leis expressas ou escritas e, consequentemente, qualquer espécie de

tirania ou imposição de hierarquias valorativas.

Uma nova fase da filosofia se inicia com Kant e o idealismo alemão.

Novamente, ela se aprofunda e busca a totalidade do ser, numa sistemática

filosófica completa.

Kant conhece as conquista da ciência moderna bem como o valor da

sabedoria metafísica e ética na continuidade do pensamento ocidental. Daí,

pretender assegurar o reconhecimento do valor da moral, da verdade e da

religião, recolocando-as, todavia, em bases sólidas contra o ceticismo, o

utilitarismo, o materialismo, o naturalismo, etc.

A Crítica da Razão Pura, uma das suas principais obras, constitui-se

numa teoria do conhecimento. A palavra “crítica”, aqui, quer dizer análise critica

e razão “pura” significa aquela parte do entendimento que não depende dos

sentidos. É assim, a capacidade que temos de formar, criar ou aperfeiçoar

conhecimento em virtude da natureza e estrutura desta mesma razão. A

experiência sensível só nos dá aquilo que é, mas nada nos diz do que deva ser

necessariamente assim e não de outro modo. Isto só a razão nos pode dar.

Kant marca profundamente um momento teórico de reconhecimento

da autonomia e da importância decisiva da reflexão sobre os valores e as

valorações indispensáveis à visão sistemática do domínio da razão prática.

Neste precursor da contemporânea Teoria dos Valores surge uma

perspectiva “individuocêntrica” na medida em que exalta o homem enquanto

ser racional e a “consciência do bem” como o fundamento básico de todo valor

e atividade valorativa. Tanto o fundamento como o fim último da moral do

conhecimento ou do juízo de valor estão sediados no próprio homem enquanto

ser racional.

Para Hegel, a razão não é, como em Kant apenas um conjunto de

princípios, formas e regras mas, sim, o próprio modo de ser das coisas, sua

realidade profunda, a essênsia do próprio ser.

15 O mundo, segundo ele, não é uma coleção de unidades autônomas,

átomos, almas cada um com suas existências independentes. Nada é

completamente independente a não ser o Todo. Este, em sua complexidade,

recebe o nome de absoluto. O Absoluto é dinâmico. O seu movimento, se

desenvolve de acordo com sua fundamental lei interna: a dialética. Movimento

dialético é aquele que se faz segundo a marcha triádica de tese, antítese e

síntese que, por sua vez de acordo com as novas condições internas e

externas, gera novas antíteses dando, como síntese, novas realidades e assim

sucessivamente numa cadeia ininterruptas. Toda posição (síntese) se

caracteriza- por ser uma alternativa. Nada permanece como é, e tudo marcha

para seu oposto.A temporalidade da visão sistemática dos valores não impede

o amadurecimento do conjunto de valores que, enriquecendo-se, atingirá a sua

total explicitação dialética.

Portanto, a perspectiva historiocentríaca dos valores vai além da

posição individuocêntrica do kantismo, no campo de reflexão axiológica. O

tema é transportado do plano da consciência moral para o nível da construção

histórica. A mais profunda lei política é a liberdade, por ser um caminho para o

processo histórico.

A Teoria dos Valores, advinda dos quadros axiológicos abordados

nesse capítulo, passa a ser explorada nos itens subsequências, portanto

sentimos a necessidade de questionar até onde a Educação tomou consciência

e reformulou o legado vindo da Antiguidade, do período medieval e da

Modernidade.

16

CAPÍTULO 2

A EDUCAÇÃO E OS VALORES

Tendo situado a reflexão filosófica sobre os valores dos primórdios

da Filosofia Grego-Ocidental até o surgimento mais recentemente da Axiologia,

procuraremos neste capítulo direcionar nossa reflexão para a relação Valor-

Educação.

O objetivo é especular como se manifestam as categorias axiológicas

no decurso do processo e pedagógico. Pensamos que essa manifestação

suceda diferentemente, dependendo da proposta educativa em questão. O

fenômeno educativo se realiza com base numa determinada visão de homem,

de mundo e em função de uma realidade específica social, fundamentando em

certos valores. Acreditando-se serem os valores essenciais permanentes,

eternos e inalteráveis logo, entes absolutos, independentes do homem e de

sua realidade existencial ou entendendo-se os valores a partir do próprio

esforço humano da valoração, e logo, como aquilo que não é, em si e por si

mesmo, mas vale para o homem a partir de sua realidade circunstancial

concreta ou, ainda se tenha uma concepção axiológica outra intermediária,

mais próxima a tal ou qual posição, haverá sempre uma base valorativa,

embora não se tenha o devido esclarecimento a esse respeito.

Levando em conta essa pressuposição, analisa-se propostas

educativas às quais determinam-se, como Georges Snyders em obra

“Pedagogia Progressiva”: Educação Tradicional,Educação Nova e Educação

Progressista. Apesar de outros utilizarem nomenclaturas diferentes, esta será

adotada, uma vez que toda e qualquer classificação das propostas educativas

poderá se reduzir a essas três que, em síntese, representam os elementos

17fundamentais que deverão ser captados para se garantir a compreensão e

interpretação das diferentes leituras do processo educativo.

No artigo “Tendência Pedagógicas na prática escolar”, José Carlos

Libâneo, segue o mesmo roteiro categorizando as tendências Liberal

conservadora (identificada com a Pedagogia nova); como subdivisão da

tendência liberal renovada, o autor inclui as subintendências: renovada

progressista e renovada não diretiva. O bloco da Pedagogia Progressista,

assim chamada a partir de Snyders, compreenderá, por sua vez, a tendência

progressista liberadora (nome atribuído pelo autor à linha educativa proposta

por Paulo Freire), a tendência progressista libertária e , finalmente, a tendência

progressista dos conteúdos, professada pelo autor. A caracterização dessa

multiplicidade de tendências segue basicamente a mesma linha de explicitação

de Saviani, Charlot, Suchodolski e outros

18

2.1 A educação tradicional e os valores

Quem estuda com mais cuidado o período da Educação tradicional,

pode conferir que dela o nosso tempo herdou valores preciosos, que não

devem ser perdidos, porque fortaleceram a vida e o caráter de gerações como

a de nossos pais e a geração que hoje, está experienciando meio século de

história neste planeta.

Inevitavelmente, podemos conferir que os pontos positivos da

educação tradicional, entre outros, foram: o poder de concentração (que ajuda

os engenheiros a construir grandes obras como pontes, edifícios, usinas

hidroelétricas, com a responsabilidade de quem sabe que não está projetando

a vida somente para o tempo de agora, mas para ultrapassar, se possível,

várias gerações além e aquém da nossa e dos nossos netos). Este requisito

também fortalece o caráter humano, para que haja respeito pela vida alheia,

em todos os momentos, em qualquer tempo histórico, político e cultural. Na

época da Educação Tradicional, havia mais RESPEITO MÚTUO.

Outra característica que considero fundamental para uma boa

formação mental, é a tão criticada memorização, que (ao contrário do que

muitos pensam e falam), fez um trabalho de dinâmica do registro das

informações no cérebro dos alunos de então. Senão, vejamos a principal

justificativa da memorização, que é o uso da lousa e de outros materiais não

permanentes no tempo da educação tradicional, que exigia, antes da

compreensão do assunto, a sua memorização, para depois, aos poucos, ser

assimilado pelos que tivessem a mente desperta para os acontecimentos da

sua época e do seu mundo. O uso da lousa obrigava os alunos a fazer

anotações rápidas, que logo depois eram apagadas, mas que eram “cobradas”

no decorrer da vida escolar do aluno, e depois, ainda, na vida profissional.

Pessoas que vivenciaram aquele período, ainda hoje mostram uma fortaleza

mental, um conhecimento definitivo das noções básicas dos cálculos práticos e

dos princípios norteadores de uma vida de sucesso, no trabalho e na família,

19que hoje fazem falta na vida social dos indivíduos.

Através de uma análise axiológica da Educação Tradicional, centrada

no intelecto, na transmissão de conteúdo e na pessoa do professor, pode-se ter

os seguintes fatores decisivos:

a) valorização do aluno – naturalmente motivado, autodisciplinado e

esforçado na busca do conhecimento. Apreende, confronta e imita os

modelos para só depois criar.

b) Valorização da memorização dos conteúdos do ensino;

c) Valorização da autoridade do professor e de sua competência;

d) Valorização da preservação e transmissão de conteúdos culturais;

e) Valorização da exclusão “escola-meio exterior”, garantindo a preservação

do ambiente escolar;

f) Valorização de uma relação educação-sociedade de caráter conservador-

no sentido de transmitir valores e conhecimentos indispensáveis à

manutenção da estrutura e funcionamento de uma determinada sociedade;

g) Valorização da organização lógica do ensino- centrado no professor, com

uma programação lógica de disciplina;

h) Valorização da cultura sistematizada dentro do processo educativo

escolar.

Resalta-se a tendência axiológica que fundamenta a Educação

Tradicional de “objetivismo-Culturalista” pela enorme importância dada aos

valores culturais tomados como entidades objetivas, posto que os valores que

norteiam a Educação Tradicional são os valores resultantes da tradição

cultural já estabelecida e cristalizada. Transparecem como entes em si,

essenciais e objetivos, “independentes dos bens e dos sujeitos que os

valoram” Consideram a criança em geral e não especificamente e

diferenciadamente; não se percebe a preocupação de tradução desses

valores em conceitos particulares e operacionais, deixando-os intactos e

inalteráveis, pois, não devem interferir no processo educativo que ocorre

20intramuros escolares-fundado numa hierarquia de valores objetiva, prefixada e

indestrutível.

Estamos, pois, diante de uma posição axiológica que, ao desvincular

valores e valorações, seriam apenas o traço de “união entre o valor e o seu

suporte” os valores, em seu ser, em si mesmo, independeriam total e

amplamente dos homens e demais seres sobre os quais recaem.

A transmissão e reprodução de valores são os movimentos axiológicos

mais fortemente presentes no seio dessa proposta educativa.

21

2.2 A educação nova e os valores

A instituição escolar se tornou mais complexa a partir do Renascimento e Idade

Moderna.

Foi a partir do século XVIII que a legislação que demonstra o interesse do

Estado em assumir a educação, tornando-a leiga e gratuita.

A escola nova surge no final do século XIX para propor novos caminhos a uma

educação em descompasso com o mundo onde se acha inserida favorecendo

os já socialmente favorecidos. A herança escolar cabe aos herdeiros de

sistemas privilegiados: o acesso à escola, o sucesso escolar, a possibilidade

da escolaridade prolongada até a universidade estão reservados àqueles cujas

famílias pertencem às classes dominantes.

Para Establet e Baudelot, se vivemos em uma sociedade dividida em classes,

não é possível haver uma “escola única”. Existem na verdade duas escolas,

não apenas duas escolas diferentes, mas opostas, heterogêneas. Desse modo,

a escola reafirma a divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual.

Da mesma forma, Snyders considera que a separação escola-mundo descrita

por Baudelot e Establet parece muito defasada no tempo. Embora tenham

enfatizado a luta de classes, acabam descartando a possibilidade de que a

escola seja um dos campos dessa luta, o que redunda em pessimismo e

impotência.

22 Depois de uma análise da proposta educacional escolanovista,

ressaltaremos os seguintes elementos que nos permitirão uma apreciação de

suas bases axiológicas.

O centro do pensamento de Scheler era a sua teoria do valor. De

acordo com Scheler, o ser-valor de um objeto precede a percepção. A

realidade axiológica dos valores é anterior à sua existência. Os valores e seus

correspondentes opostos existem em uma ordem objetiva:

Obtido em "http://pt.wikipedia.org/wiki/Max_Scheler"

• Valorização do aluno –centro gravitacional da Educação nova.

• Valorização da infância como período de grande plasticidade e vitalidade,

de experimentação diversificada, de harmonização de recursos, interesses

e habilidades;

• Valorização do mundo da criança e desvalorização do mundo adulto, de

seu universo axiológico, da herança cultural e dos modelos pedagógicos;

• Valorização da capacidade de iniciativa da criança, de sua atividade livre e

espontânea;

• Valorização da organização psicológica do processo ensino-aprendizagem,

centrada no aluno;

• Valorização de uma reforma pedagógico-metodológica, em detrimento da

preocupação com os métodos do ensino;

• Valorização da escola ativa, aberta à vida baseada na necessidade do

aluno. Toda atividade é sempre suscitada por uma necessidade segundo

Claparède;

• Valorização da continuidade e transparência do conhecimento. Crença na

continuidade natural entre só conhecimentos que a criança pode obter por

si própria os conhecimentos complexos de cultura atual e local;

• Valorização de uma relação educação-sociedade inovadora; o trabalho

educativo será a base para a construção de uma sociedade harmoniosa e

23organizada, por outro lado, essa posição torna-se anbiguidemente,

conservadora, na medida em que quando implantada tal ansiedade, a

função da educação se reduzirá à sua manutenção e conservação;

• Valorização das seguintes funções atribuídas ao professor: organização do

material didático a ser manuseado pelo aluno; acompanhamento da

atividade do aluno, sem dirigi-la; preparação do meio educativo de maneira

que toda a atividade da criança transcorra sem nenhum obstáculo; garantia

do máximo respeito à realidade infantil. Enfim, o professor só se descola em

função da atividade infantil.

Nesta proposta pedagógica em que o indivíduo é o centro,

valorizando suas características, atividades e necessidades pessoais, só

poderia predominar uma abordagem subjetivista dos valores em contraposição

ao Objetivismo Axiológico da Educação Tradicional. Isto significa que aqui se

afirma, enquanto , dado fundamental a conexão do valor com o sujeito que

valora, ligando-se indissoluvelmente, valor à valoração.

Verifica-se que o desejo, o agrado e o interesse do sujeito conferem

valor ao objeto, o que pode-se dizer que os valores são criados pelo sujeito,

sem levar em conta qualquer elemento que transcenda ao próprio sujeito. 6

Sendo o sujeito, o indivíduo, fonte e referencial único do processo

valorativo, torna-se impossível estabelecer uma tábua de valores, posto que os

mesmos estão condicionados aos desejos e interesses humanos.

Não há pois, valores máximos, mas sim a maximização do homem,

enquanto sujeito do seu processo de existência, e, portanto , único

determinador dos movimentos e direções da atividade axiológica – particular e

pessoal.

Em suma, tal identificação entre o ser do valor e a vivência valorativa

proposta por esta tendência subjetivista-psicologistica, procede de uma visão

que reduz o valor à valoração, considernado-o único e exclusivamente como

uma projeção dos atos de valoração do sujeito.

24 Nesta forma de se caracterizar a relação homem-mundo e

consequentemente leitura do processo educativo, privilegia-se, portanto, o

sujeito, a existência, a atividade, o movimento, o individual, a inovação, a

espontaneidade, o natural. Donde se conclui e se justifica a rejeição dos

padrões pré-estabelecidos e já validados, Daí a prioridade concedida à ação

ao movimento valorativo sobre o valor enquanto tal, configurando-se como a

tônica axiológica predominante na tendência escalanovista. Percebe-se,

portanto, pelo menos em intenção, um ímpeto de inovação que, permeando

toda a proposta da Educação Nova, estende-se também às suas bases

valorativas. No entanto, segundo o que foi levantado, quando da caracterização

desta linha educativa, esta tendência inovadora que primordialmente se releva,

acaba cedendo lugar aos movimentos de transmissão e reprodução dos

valores que garantiram a constituição e deverão garantir a manutenção da

sociedade democrática, meio e condição básica da educação renovada. Passa-

se, então, de uma ênfase à valoração-processo pessoal, subjetivo e

intransferível à necessidade de se garantir determinados

valores socialmente indispensáveis que, por outro lado, não são nitidamente

formulados, ocasionando assim uma situação de ambiguidade axiológica.

Este nível de preocupação com o social não é, portanto, suficiente

para descaracterizar o enfoque primordialmente subjetivista das bases

axiológicas da Educação nova.

25

2.3 – A educação progressista e os valores

O papel da escola progressista libertadora era visar e levar

professores e alunos a atingir um nível de consciência da realidade em que

vivem na buscada transformação social.A relação do professor e aluno e de

igual,horizontalmente com aprendizagem problemática onde propõe uma

educação libertadora, na qual o professor e aluno se educam mediados pelo

mundo.A dialética progressista pedagógica libertadora, tem sido empregada

com êxito em vários setores dos movimentos sociais (sindicatos,associações

de bairro, alfabetização de adultos,etc).O termo progressista e tomado por

empréstimos de George Snyders e apontam processos ou movimentos

voltados à morte de uma velha estrutura e a construção de uma nova. A escola

progressista libertadora faz com que professor e aluno tenham total segurança

do seu direito de aprofundar e aperfeiçoar mais com as tendências

pedagógicas dentro da pratica escolar dentro das teorias progressista

libertadora.]

A tendência axiológica predominante na proposta de Educação

progressista é aquela que advém das reflexões instauradas a partir do

materialismo histórico dialético, trabalhando com conteúdos vinculados á

realidade social vivida, considerando a Educação como fenômeno

indissoluvelmente social e cultural, comprometido com finalidades

sociopolíticas e nesse sentido constituindo-se como instrumento de luta de

classes.

26

Para melhor analisarmos axiologicamente a Educação Progressista, alguns

fatores decisivos são citados:

• Valorização do professor como orientador do aluno e do processo

educativo, respeitando as emoções, vontade e capacidade de

desempenho do aluno;

• Valorização do aluno enquanto ligado ao processo social e evolução do

meio em que vive e aos projetos para superação dos problemas

momentâneos;

• Valorização da escola como instrumento de conscientização e

organização política dos educandos, tornando-a um centro de confiança

da comunidade na solução dos problemas através das fases sincrética,

analítica e sintética do conhecimento;

• Valorização do presente – gerador de valores a serem desenvolvidos em

seus potenciais emergentes;

• Valorização da disciplina onde o aluno autodisciplinado se dedica ao

estudo e pesquisa de resultados úteis, procurando dar a mesma ênfase

aos alunos ainda não autodisciplinados;

• Valorização do social sobre o individual- a associação a outros membros

da comunidade produz um desempenho mais satisfatório aos interesses

da comunidade;

• Valorização do trabalho humano- núcleo gerador de todos os valores da

coletividade, proporcionando ideia de igualdade e de oportunidade para

todos e provocando a emancipação das camadas populares, que define-

se pelo processo de conscientização cultural e política fora dos muros

da escola

• Valorização da educação integrada no processo sociopolítico econômico

global- firmada em valores sociais coletivos, historicamente

siginificativos e de que se repense sempre e ao mesmo tempo, a

educação, a sociedade e os valores em que estão fundamentados;

27• Valorização de conteúdos e modelos educativos atualizados e

diretamente relacionados ao mundo do aluno, socialmente

siginificativos-retomando o ponto básico da Educação Tradicional.

Esta visão dialética do homem, do real da história, da educação e da

atividade axiológica, traz o caráter e o ímpeto da transformação, sendo esta

a tônica fundamental da proposta educativa progressista. Sentimos, no

entanto, a impossibilidade de que o processo transformatório se dê de

modo ininterrupto. De modo que a transmissão e a reprodução de valores,

processos de valoração, modos de pensar, de ser, agir, existir, enfim,

também se fazem presentes neste posicionamento teórico-prático, dialético-

histórico que embasa esta leitura progressista do fenômeno educativo.

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CAPÍTULO 3

VALORES DA EDUCAÇÃO ATUAL BRASILEIRA

O tempo passou. A internet entrou em nossas casas, As cidades

cresceram na sua beleza e na sua miséria. A escola, porém, continuou

comandada por princípio de outras eras, permanecendo como dona da verdade

e distante das necessidades da comunidade.

Historicamente, através de um discurso coerente com as atribuições

que lhes foram conferidas e que o próprio tempo se encarregou de consolidar,

a escola jamais conseguiu romper com o mito em torno da sua

indispensabilidade, poder e saber.

Everett Reimer afirma: “A escola dos tempos modernos tornou-se

mais poderosa do que a Igreja da Idade Média. A carreira e,

consequentemente, a vida de um homem depende do sucesso que obtenha na

escola. Se não a frequenta, é legalmente marginalizado”.

A valorização da escola como único meio de o indivíduo adquirir os

conhecimentos necessários ao bom desempenho profissional e social, coloca

as famílias, particularmente as de camadas populares, numa posição de

submissão, sentindo-se culpadas pela exclusão e pelos fracassos escolares

dos filhos.

São inúmeros os dados sobre crianças e jovens fora da escola, nas

ruas dos centros urbanos que, marginais invadem os noticiários com

estatísticas alarmantes: a vítima torna-se culpada. Esta é uma das mais graves

inversões da política educacional brasileira.

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A abordagem deste aspecto se torna fundamental, visto tratar-se de

um valor supremo- a Escola- que vem constituir-se no alicerce das

contradições axiológicas do nosso sistema educacional, pois como diz Freire:

“a tradição pedagógica insiste, ainda hoje, em liminar o pedagógico á sala de

aula, à relação professor-aluno...”

A educação sempre se faz a partir de bases axiológicas, portanto, a

leitura, a captação, a tentativa de organização e operacionalização do

fenômeno educativo sempre se fará com base numa determinada visão do

homem, do mundo , dentro e em função de uma realidade social específica.

Tentando definir as bases axiológicas da escola atual brasileira,

dentro das tendências pedagógicas a que nos referimos nos capítulos

anteriores, percebemos uma coexistência entre elas.

No texto “ Tendências e Correntes da Educação Brasileira”, aborda

esse aspecto, procurando caracterizar as correntes e tendências presentes na

educação brasileira, enquanto expressão da filosofia da educação. Apresenta

quatro tendências provenientes da função de diferentes correntes: tendência

humanista tradicional, tendência humanista moderna, tendência analítica e

tendência dialética. Essas quatro tendências correspondem respectivamente às

concepção: Tradicional , Renovada e progressista.

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A essa miscelânea axiológica, une-se uma prática escolar

maldirecionada, indefinida e mascarada, responsáveis pelos caos há muito

instaurados em nosso sistema formal de ensino.

É notória a discrepância entre os valores formais e os valores reais

da educação brasileira; entre o que é dito e o que é feito na prática educativa.

Assim é que , quanto mais se fala em democracia dentro da escola, menos

ela é democrática; quanto mais imbuído do ideário escalanovista estão

professor, mais tradicional é a sua ação docente.

A Educação no Brasil é profundamente conservadora, apesar do

discurso progressista e modernizador” A afirmação é do sociólogo J.

Vaidergorn, professor assistente da Faculdade de Ciência e Letras, da

UNESP, na pesquisa “Educação Moral e Cívica: História, Atualidade e Crítica.

Nesse trabalho, Vaidergorn procurou as origens da disciplina Educação Moral

e Cívica e sua influência na educação e chegou a algumas conclusões

interessantes “o fundamento da Moral e Cívica é a doutrinação autoritária,que

aponta para o totalitarismo”, explica.

Na pesquisa, o sociólogo demonstra que o discurso moral e cívico

tem componentes do liberalismo, do conservadorismo romântico, do

positivismo e da doutrina de segurança nacional, instituída pelos militares

brasileiros com o golpe de 1964.

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O mais grave, para Vaidergorn, é que as intenções doutrinadoras

dessas disciplinas estão implícitas em outras matérias. Assim, desde que

entram na escola, as crianças passam a receber uma educação que valoriza

a ordem, a disciplina, a hierarquia e a autoridade.

Vaidergorn mostra ainda em seu trabalho que essa doutrinação

objetiva a destruição da vontade pessoal. Nesse sistema, segundo o

sociólogo, as entidades supremas que subjugam a criança são Deus e Pátria.

Acreditam-se ter abordado neste capitulo alguns exemplos que

permitem observar a presença, irrefutável de valores e valorações, dentro do

trabalho educativo, que deverão ser objetos de preocupação, enquanto

educadores comprometidos com a libertação das massas oprimidas.

Acreditam-se portanto:

Ø que a escola seja o ambiente cuidadosamente preparado, catalizador

de energias, indispensáveis ao autodesenvolvimento do aluno.

Ø que o professor seja aquela presença discreta capaz de oferecer

condições para que a sabedoria brote, de uma maneira espontânea,

levando o aluno a produzir algo sozinho e sentir-se realizado no seu

crescimento.

Ø que conhecimento passa a ser resultado de pesquisas e experiências

vividas e analisadas. Passa-se a perceber a capacidade de trabalhar, de

viver em comunidade, de construir alternativas e apresentar soluções

para os problemas, não só intelectuais, mas, também comportamentais.

Aprende-se a ter ordem, disciplina, conviver com as diferenças e ter

respeito pelos outros.

Há que se refletir, questionar e indagar. Ao abordarmos a questão

dos Valores e das Valorações, introduzimo-nos num complexo que diz

respeito ao domínio humano. Assim sendo, não existe a pretensão de estar

concluindo ou tecendo considerações finais.

Questionamentos

Em que medida os educadores têm consciência clara de suas

próprias tábuas de valores?

32 E da escola de valores dos educandos?

Será válido e possível considerar uma hierarquia de valores única, objetivan e

universal?

Em que medida os educadores acham-se conscientes da

perspectiva de uma transvalorização?

Estes questionamentos levam à preocupação com os valores e as

valorações na prática educativa.

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CONCLUSÃO

O que são, afinal os valores? Que valores devem ser estudados e

desenvolvidos na escola? Entre o que a escola ensina de valores há

coerência com o que sociedade requer dos homens e mulheres? Além de

responder as questões acima levantadas, trazer exemplos e sugestões bem

concretas para o trabalho do professor em sala de aula, para que não se

limite ensine valores mas praticá-los e a se tornar, assim, um educador em

valores.

A educação em valores é uma exigência da sociedade atual inserida

no mundo globalizado e marcado, no início deste século, por tantas

mudanças tecnológicas e novos paradigmas políticos, culturais e

educacionais, ora debatidos por diferentes agentes sociais. Temas como

Ecologia, Educação Sexual, Direitos e Deveres do Cidadão, Ética na Política

e na vida pública, a cada dia, são pautas de congressos, seminários,

encontros internacionais, nacionais e locais, levando-nos a crer que o

currículo escolar, sem dúvida, ficou defasado, ou melhor, não conseguiu

acompanhar a velocidade de transformações do mundo pós-industrial.

No caso do Brasil, o currículo escolar, realmente, ficou e está

defasado se compararmos o que ensinamos com o que os Parâmetros

Curriculares Nacionais, produzidos nos anos 90, requerem dos professores e

alunos No entanto, a razão de ser da escola, a de educar os alunos

formalmente, não é uma tarefa descartada pela sociedade, apesar da

influência da mídia eletrônica na formação cognitiva e de valores dos alunos.

Também não perdeu tanto espaço assim para a sociedade

informática.

Por estar inserida em determinada comunidade, a escola traz para o seu

interior os conflitos, as aflições e as mais diversas demandas comunitárias

que levam professores, alunos e gestores escolares a criarem espaços, em

seus projetos pedagógicos, para que as crianças e adolescentes discutam e

opinem sobre suas inquietações e aspirações pessoais e coletivas. É

34exatamente nesse momento, quando os agentes educacionais criam

espaços, ocasiões, fóruns para discussão sobre a violência urbana, meio

ambiente, paz, família, diversidade cultural, eqüidade de gênero e sociedade

informática, que a educação em valores começa a ser desenhada e

vivenciada como processo social que se desenvolve na escola.

Não é uma tarefa fácil abordar a questão dos valores na educação

escolar. E sabemos o porquê. A Pedagogia Tradicional levou-nos acreditar (e

sua influência ainda desapareceu totalmente do meio escolar), por muitos

séculos, que a principal tarefa da escola era a de transmitir conteúdos

escolares. É um modelo pedagógico que não se enquadra mais às exigências

do mundo moderno.

A educação escolar não se restringe mais, como no passado, a mera

transmissão de conhecimentos, onde a atividade de ensinar era centrada no

professor, detentor dos saberes e o aluno, um mero recebedor da matéria. Na

sociedade atual, com a ampliação das ambiências de formação escolar, o

aluno passa a ser o centro do processo didático-pedagógico e a educação

escolar, agora, entendida como processo de desenvolvimento físico,

intelectual e moral do educando.

A educação em valores, embora tenha sido considerada, pelo

menos, até o século XIX, implicitamente, parte do currículo oculto das

instituições de ensino, ganha terreno fértil, no ambiente escolar, a partir da

segunda metade do século XX, quando a sociedade, através da legislação

educacional (por exemplo, a chamada Lei de Diretrizes e Bases da educação

Nacional) reconhece no professor, no aluno e na família, sujeitos do processo

de formação escolar.

Retomando a proposta de uma prática de valores, na escola,

diríamos que, para que a educação em valores seja uma realidade

educacional, primeiro terá que passar por dois componentes do processo

didático: o ensino e a instrução de valores. Para a Pedagogia, palavras como

educação, ensino e instrução são elementos distintos na Didática, embora,

para maioria das pessoas, as tomam como sinônimos. Vamos, então, as

diferenças entre eles e observaremos suas implicações para uma educação

35em valores ou pedagogia de valores.

Quando nos referimos à educação em valores, estamos tomando

esta expressão como processo social, no seio de uma determinada

sociedade, que visa, sobretudo, através da escola, levar os educandos à

assimilação dos valores que, explicita ou implicitamente, estão presentes,

como já disse, no conteúdo das matérias, nos procedimentos e atitudes dos

professores, colegas de sala, pais de alunos e nas experiências humanas

acumuladas no decorrer da história, tendo em vista a formação dos

indivíduos enquanto cidadãos.

Se a escola deixa de cumprir o seu papel de educador em valores, o

sistema de referenciarão ético de seus alunos estará limitado à convivência

humana que pode ser rica em se tratando de vivências pessoas, mas pode

estar também carregada de desvios de postura, atitude comportamento ou

conduta, e mais, quando os valores não são bem formal ou sistematicamente

ensinados, podem ser encarados pelos educandos como simples conceitos

ideais ou abstratos, principalmente para aqueles que não os vivenciam,

sejam por simulações de práticas sociais ou vivenciados no cotidiano.

Por isso, a escola não pode, na atual estrutura da Educação Básica

onde as crianças e jovens ficam a maior parte do dia, deixar de ensinar

explicitamente a prática de valores. Como diz o filósofo L. Althusser, em seu

livro Aparelhos Ideológicos do Estado, a sociedade burguesa estabeleceu

como seu aparelho de Estado n° 1, e portanto dominante, o aparelho escolar,

que, na realidade, substitui o antigo aparelho ideológico de Estado

dominante, a Igreja, em suas funções.

O trabalho explícito com a prática de valores pode advir das

atividades docentes e curriculares no interior da sala da aula. Durante uma

aula de Língua Portuguesa, por exemplo, o professor comprometido com a

educação em valores não se limitará a indicar ou solicitar de seus alunos uma

lista de palavras como justiça, dignidade, solidariedade, para exemplificar os

substantivos abstratos, como assinalam as gramáticas escolares. Mais do

que abstratas, estas palavras, na sociedade, são categorias que se aplicam

às práticas sociais, isto é, às atividades socialmente produzidas, ao mesmo

36tempo, produtoras da existência social.

A noção de solidariedade, para os educadores em valores, não deve

ser ensinada como simples substantivo feminino, reduzindo-a uma conceito

gramatical ou metalingüístico, e sim, como uma prática contra injustiça ou

injúrias que outros estejam sofrendo, no âmbito político ou comunitário.

Há ensino de valores quando o professor, ao preparar suas aulas ou

atividades curriculares, planeja, organiza, redireciona e avalia os temas

transversais que não são, vale advertir, novas matérias, mas assuntos que

atravessam as diferentes áreas do currículo escolar. Não há, portanto,

necessariamente, aula, com dia e horário previamente estabelecidos, para o

ensino de valores. Ao contrário, o ensino de valores decorre de ocasiões que

surgem ao acaso – como uma flagrante de uma cola durante a realização de

uma prova em sala de aula ou de uma briga entre alunos na hora do recreio –

ou de ocasiões já previstas na proposta pedagógica para o bimestre ou

semestre e, dependendo da sensibilização do professor, um tema

considerado relevante para a educação moral dos alunos.

Para que a educação em valores se realize, há, pois, necessidade de

ser considerada no plano de ensino do professor, de logo, como objetivo

geral da disciplina, em nível de transversalidade. Para que a prática de

valores seja uma realidade, o educador terá que se organizar, didaticamente,

para a instrução de valores, dentro e fora da sala de aula. Assim, só podemos

dizer que um aluno aprendeu valores quando, após a ministração de

conteúdos em sala, os professores, na escola, em diferentes ocasiões e os

pais, nos lares, observam que seus alunos ou filhos não apenas apresentam

melhor rendimento escolar, mas diminuíram os conflitos interpessoais, estão

mais abertos à socialização, e mais, efetivamente, assimilaram e integram

valores, atitudes e normas, na prática social, de modo que os valores

assimilados tenderão a acompanhá-los por toda a vida.

Em substância, podemos dizer que educamos em valores quando os

alunos se fazem entender e entendem os demais colegas; aprendem a

respeitar e a escutar o outro; aprendem a ser solidários, a ser tolerantes, a

trabalhar em, a compartilharem ou socializarem o que sabem, a ganharem e

37a perderem, a tomarem decisões, enfim. É, assim, o resultado da educação

em valores na escola: ajudar os alunos a se desenvolverem como pessoas

humanas e faz ser possível, visível ou real, O desenvolvimento harmonioso

de todas as qualidades do ser humano.

Valores na LDB

Uma dos pontos altos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB) é o reconhecimento da importância dos valores na educação

escolar.

Para isso, assinala que o fim último da educação é a formação da

cidadania, incorpora nas finalidades da educação básica, princípios e valores

fundamentais que dão um tratamento novo e transversal ao currículo escolar.

Anterior à promulgação da LDB, sabe-se que, tradicionalmente, afora o

trabalho das escolas confessionais ou religiosas, os valores vinham sendo

ensinados, em sala de aula, de forma implícita, sem aparecer na proposta

pedagógica da escola, configurando o que denominamos de parte do

currículo oculto da escola.

A partir da nova LDB, promulgada em particular com os Parâmetros

Curriculares Nacionais, ficou explicitado para todas as instituições de ensino

o reconhecimento da importância do ensino e a aprendizagem dos valores na

educação escolar, e doutra sorte, o Conselho Nacional de Educação (CNE),

ao estabelecer as diretrizes curriculares para a educação básica, deu um

caráter normativo à inserção e integralização dos conteúdos da educação em

valores nos currículos escolares,

A idéia de que a educação em valores permeia os dispositivos da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional pode ser observada à primeira

leitura do artigo 2º, que, ao definir a educação como dever da família e do

Estado, afirma que a mesma é inspirada nos princípios de liberdade e nos

ideais de solidariedade humana, tendo por finalidade o pleno

desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e

sua qualificação para o trabalho.

Depreende-se da leitura do artigo 2º da LDB que a educação em

38valores dá sentido e é o fim da educação escolar já que, junto com aquisição

de conhecimentos, competências e habilidades, faz-se necessário a

formação de valores básicos para a vida e para a convivência, as bases para

uma educação plena, que integra os cidadãos em uma sociedade plural e

democrática.

No seu artigo 3º, a LDB elenca, entre os princípios de ensino,

vinculados diretamente a educação em valores, a liberdade de aprender,

ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber (inciso

II), pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; (inciso III); IV -

respeito à liberdade e apreço à tolerância (inciso IV) e gestão democrática do

ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino

(inciso VIII).

O artigo 27 da LDB faz referência à educação em valores ao

determina que os conteúdos curriculares da educação básica observarão,

ainda, as seguintes diretrizes “a difusão de valores fundamentais ao interesse

social, aos direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e a

ordem democrática” (inciso I).

A educação em valores deve ser trabalhada na educação infantil, ensino

fundamental e no ensino médio, etapas, conforme a nova estruturação da

Educação Básica, prevista na LDB.

No artigo 29, a LDB determina que a educação infantil, sendo a

primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento

integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico,

psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da

comunidade. É interessante assinala que a educação em valores se

fundamental no respeito mútuo do desafio do professorado, do aluno e da

família. Requer, pois, que as instituições de ensino utilizem o diálogo

interativo, o envolvimento do professores, alunos e seus pais ou

responsáveis.

No que se refere ao Ensino Fundamental, a LDB aponta a educação

em valores como principal objetivo desta etapa da educação básica, a

formação do cidadão, mediante aquisição de conhecimentos através do

39desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como estratégias básicas

o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo e de três competências

relacionadas explicitamente com a educação em valores: a compreensão do

ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos

valores em que se fundamenta a sociedade (inciso II); o desenvolvimento da

capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos

e habilidades e a formação de atitudes e valores; (inciso III) e o fortalecimento

dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerância

recíproca em que se assenta a vida social (inciso IV)

Para o Ensino Médio, a LDB, no seu artigo 35, aponta além do

desenvolvimento cognitivo, que se caracteriza pela a consolidação e o

aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental,

possibilitando o prosseguimento de estudos (inciso I) e pela preparação

básica do educando para o trabalho e a cidadania (inciso II) e explicitamente

aponta o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a

formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do

pensamento crítico; e mais ainda a compreensão dos fundamentos científico-

tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática,

no ensino de cada disciplina (inciso IV).

A educação em valores está presente em todas as disciplinas do

currículo escolar. Para educar em valores, é necessário que o professor

organize seu plano de ensino em atividades lúdicas, reflexivas e conceituais

sobre temas transversais. Apontaremos, na tabela abaixo, dez temas

transversais, por ordem alfabética, com seus conceitos básicos, que podem

ser trabalhados na educação infantil, no ensino fundamental e no ensino

médio.

Decálogo da educação em Valores

Temas transversais Acepções

1. Autonomia Refere-se ao valor que reconhece o direito de um indivíduo

tomar decisões livremente, ter sua liberdade, independência moral ou

intelectual. É a capacidade apresentada pela vontade humana de se

autodeterminar segundo uma norma moral por ela mesma estabelecida, livre

40de qualquer fator estranho ou externo.

2. Capacidade de convivência Valor que desenvolve no educando a

capacidade de viver em comunidade, na escola, na família, nas igrejas, nos

parques, enfim, em todos os lugares onde se concentram pessoas, de modo

a garantir uma coexistência interpessoal harmoniosa .

3. Diálogo Valor que reconhece na fala um momento da interação entre dois

ou mais indivíduos, em busca de um acordo.

4. Dignidade da pessoa humana Valor absoluto que tem cada ser humano. A

pessoa é fim, não meio. A pessoa tem valor, não preço.

5. Igualdade de direitos Valor inspirado no princípio segundo o qual todos os

homens são submetidos à lei e gozam dos mesmos direitos e obrigações.

6. Justiça Entre os temas transversais, é o valor mais forte. No educando,

manifesta-se quando o mesmo é capaz de perceber ou avaliar aquilo que é

direito, que é justo. É princípio moral em nome do qual o direito deve ser

respeitado.

7. Participação social Valor que se desenvolve no educando à medida que o

torna parte da vida em sociedade e leva-o a compartilhar com os demais

membros da comunidade conflitos, aflições e aspirações comuns.

8. Respeito mútuo Valor que leva alguém a tratar outrem com grande

atenção, profunda deferência, consideração e reverência. A reação de outrem

será no mesmo nível: o respeito mútuo.

9. Solidariedade Valor que se manifesta no compromisso pelo qual as

pessoas se obrigam umas às outras e cada uma delas a todas,

particularmente, diante dos pobres, dos desprotegidos, dos que sofrem, dos

injustiçados, com o intuito de confortar, consolar e oferecer ajuda

10. Tolerância Valor que manifesta na tendência a admitir, nos outros,

maneiras de pensar, de agir e de sentir diferentes ou mesmo diametralmente

opostas às nossas.

41

Pelo menos quatro maneiras ou abordagens pedagógicas podem ser

utilizadas para o desenvolvimento dos valores nos educandos: a) doutrinação

dos valores; b) clarificação dos valores; c) Julgamento dos valores e d)

Narração dos valores.

Abordagem pela doutrinação de valores é a mais antiga das

maneiras de educar os alunos em valores, através da qual a escola educa ou

tentar educar o caráter dos alunos. Tal abordagem,se dá através da

disciplina, do bom exemplo dos professores, do currículo que enfatiza mais

as condutas do que os raciocínios, destacando as virtudes do patriotismo, do

trabalho, da honestidade, do altruísmo e da coragem.A escola, através de

seus professores, imprime valores no espírito dos seus educandos, através

de recomendações do que considera correto, justo e ideal para a prática de

valores.

A doutrinação de valores é inspirada nas práticas de formação

religiosa uma vez que procura incutir ou inculcar nos educandos valores,

crenças e atitudes particulares, com o objetivo de que não aceitem quaisquer

outros, julgados errados quando seguem a doutrina. No Brasil, durante os

períodos colonial e imperiaL, as escolas tradicionais ensinavam valores a

seus educandos, fazendo-os repetir ou decorar a moral de narrativas ou

fábulas européias. Muitos docentes chegavam a utilizar a palmatória para

educar em valores, corrigindo os alunos com castigo severo, quando não

assimilavam ou memorizavam bem as lições de moral. No meio familiar,

cabia, principalmente, à figura do pai o papel de doutrinador, de modo que

era o pai também o principal educador do filho em valores, valendo-se, não

poucas vezes, da dureza da palavra ou da punição exemplar.

A abordagem pela doutrinação de valores foi bastante trabalhada nos

Estados Unidos no século XIX, mas a partir da década de 20, no século XX,

foi posta em questão, em decorrência, da transposição, para o domínio da

42moralidade da concepção de relatividade de Einstein, o que deu origem ao

relativismo moral.

Nas práticas escolares atuais, a abordagem pela doutrinação de

valores, em geral, explicita-se à medida que a escola procura regular o

comportamento moral dos alunos, exigindo, por exemplo, a obediência dos

alunos aos professores, proíbe a violência, o vandalismo e pune,

exemplarmente, os “delitos” tais como cola, o atraso às aulas, o não

cumprimento das tarefas ou dos deveres de casa, entre outros. Escolas que

apontam como paradigmas os exemplos de professores e de colegas de sala,

está colando em prática a abordagem pela doutrinação de valores, o que

acabará por desenvolver nos alunos o comportamento de respeito e

educação moral.

O segundo modo de desenvolver a educação em valores é através

da clarificação dos valores. Consiste em os professores, num clima de não-

diretividade e de neutralidade, ajudarem os alunos a clarificar, assumir e por

em prática os seus próprios valores.

Na prática escolar, o professor pode utilizar uma atividade simples

como a votação de valores, que se dá, por exemplo, através da atividade de

leitura, em voz alta, de uma a uma, de questões que começam pela

expressão “Quantos de vocês...? (a) ....pensam que há momentos em que a

cola se justifica? ....a primeira coisa que leem no jornal de domingo é a

página de novelas e fofocas? ... acham a prática do aborto um direito da

mulher?...aprovam relações sexuais antes do casamento? E os alunos

respondem levantando as mãos. Um aspecto positivo desta abordagem é que

ajuda os alunos a pensarem sobre valores e fazerem a ligação entre os

valores que defendem (A prática da cola é errada) e a ação desenvolvida ou

a desenvolver (“o que tenho feito para combater a prática da cola

clandestina?). Um aspecto negativo é que a referida abordagem pode vir a

confundir questões triviais (fofocas) com questões éticas (O aborto, ato

praticado contra o direito à vida) importantes. Para o trabalho com esta

metodologia, caberá ao professor, desde logo, estabelecer a diferença entre

o que o aluno gosta de fazer (colar durante a avaliação escolar, por exemplo)

43do dever fazer (respeitar o regimento da escola ou as condições

estabelecidas pelo professor para aplicação de uma prova).

Outro modo de desenvolver os valores na escola é através da

abordagem pela opinião ou julgamento dos valores. Consiste em a escola

acentuar os componentes cognitivos da moralidade. A abordagem pelo

julgamento de valores defende que existem princípios universais (Tolerância

recíproca, Liberdade, Solidariedade e a Justiça, o mais forte deles) que

constituem os critérios da avaliação moral ou do juízo de valor.

Os alunos, na abordagem pelo julgamento de valores são vistos pelos

professores como sujeitos da educação em valores, uma vez que constroem

tais princípios ativamente e regulam a sua ação de acordo com os princípios.

Esta abordagem propõe que a educação moral se centre na discussão de

dilemas morais em contexto de sala de aula sem levar em conta, no entanto,

as diferenças de sexo, de raça, de classes sociais e de cultural,

concentrando-se unicamente na atribuição de significados que pessoas dão

às suas experiências ou vivências morais.

Uma atividade, baseada na abordagem pelo julgamento de valores,

que pode ser desenvolvida pelo professor, inclusive, com atividades de

expressão oral e escrita, é pedir que os alunos desenvolvam um texto, oral ou

por escrito, sobre o que pensam da concepção de Justiça em frases do tipo

“A justiça é a vingança do homem em sociedade, como a vingança é a justiça

do homem em estado selvagem” (Epicuro).

O quarto modo de ensinar os valores na escola baseia-se nas

narrativas ou nas expressões orais ou escritas dos educandos. Esta

abordagem centra-se nas histórias pessoais, ou coletivas, nas quais os

alunos contam, através de textos orais ou escritos, em sala de aula, seus

conflitos e escolhas morais. A abordagem pela narração envolve as três

dimensões da educação em valores: a cognição, a emoção e a motivação.

A abordagem pela narração ou narrativa reconhece que, na

diversidade cultural, é comum a contação de histórias por parte das pessoas

com o objetivo de transmitir valores de gerações mais velhas para as mais

novas. Assim, o papel das histórias e das narrativas, ou seja, das práticas de

44leitura de textos escolares, nomeadamente os textos literários, exercem um

papel muito importante na formação dos valores nos alunos.

A narrativa desempenha um papel na vida e na dimensão moral das

pessoas, em particular. Os nossos pensamentos e ações estão estruturadas

em práticas discursivas. A abordagem pela narração pode ocorrer, num

simples ato de perguntar em sala de aula: “Vocês poderiam me contar o que

aconteceu nas últimas eleições no Brasil, no seu Estado, na sua cidade, no

seu bairro, na sua rua, na sua casa?” As pessoas atribuirão significados às

experiências de vida, representadas sob a forma de narrativa. Nesta

abordagem, as pessoas desenvolvem-se moralmente, tornando-se autores

das suas histórias morais e aprenderão, de forma consciente, as lições

morais em que contam as suas experiências.

A abordagem pela narração centra-se nas experiências reais das

pessoais, nos seus conflitos e escolhas pessoais As dimensões da educação

em valores pode ser bem evidenciada à medida que os professores, em sala

de aula, após a leitura de um artigo de opinião, por exemplo, sobre a

legalização ou não do aborto, extraído do jornal diário, levanta perguntas para

os alunos do tipo: O que vocês pensam sobre essas idéias do autor deste

artigo?(dimensão cognitiva); O que você sentiu ao ler este artigo? (dimensão

emotiva) e o que vocês pretendem fazer após a leitura deste texto?

(dimensão atitudinal). Portanto, a abordagem favorece o pensar, o sentir e o

fazer sobre temas transversais, extraídos do cotidiano dos alunos.

O desenvolvimento da educação em valores, pela narração, propõe

que os professores convidem os seus alunos a contarem as suas próprias

histórias morais ou a ouvir, ler e discutir histórias dos demais colegas.

A utilização da literatura escolar e o estudo do perfil dos seus heróis e

heroínas podem constituir uma boa metodologia de desenvolvimento dos

valores, desde que acompanhada de uma reflexão crítica, baseada em

princípios éticos universais, constituindo tais valores, por excelência,

parâmetros para avaliação moral ou juízo de valor, isto é, para o que é justo,

tolerável, digno, possível, certo, errado ou diferente.

Em vista do exposto e diante do quadro teórico-prático sincrético que

45caracteriza o processo educativo e, em especial, na realidade educacional

brasileira, fica patente a procedência de se passar em revista as propostas

educativas: tradicional, nova e progressista que, em suma, nucleiam as várias

abordagens aqui delineadas. Há muito para ser aprendido a respeito dos modos pelos quais a

escola pode influenciar os valores. A escola da atualidade tende mais a

cristalizar o caráter que o aluno traz do que mudá-lo. Os alunos que vêm para

a escola com pouca consciência tendem a permanecer do mesmo modo,

enquanto os alunos com elevado grau de maturidade moral, tendem a manter

o seu nível original.

Com este estudo, espera-se ter conseguido levantar alguns

questionamentos tão necessários à tarefa comum a todos os educadores, de

detectar os pontos críticos e mapear soluções para a crise axiológica tão

ampla e fortemente instaurada no contexto pedagógico brasileiro.

Fica, também, evidenciada a necessidade de se realizarem estudos

que tragam conhecimentos sobre os valores, nas camadas populares que

permitam uma política educacional voltada para as mudança social.

Alguns pontos essenciais foram aqui abordados: a coexistência sin-

crética de opções teóricas contraditórias; a defasagem entre a orientação

teórica professada de modo explícito, ou não e a prática pedagógica vivida

em sala de aula; a falta de criticidade; a sujeição a modismo; as mitificações,

ambiguidade e contradições que permeiam a atividade docente.

Finalizando, pois, este trabalho comungando com o pensamento de

Everett Reimer:

As tarefas educacionais modernas talvez não exijam gênios, mas podem

precisar de heróis. Ainda existe espaço, se não para gênios, pelo menos para

o verdadeiro talento.

Trazer as verdades da moderna ciência economia, política e

psicologia ao conhecimento das massas, sem restrições ou distorções

simplistas, requer uma boa dose de suor. No entanto, o desejo sincero de

realizar esta proesa continua sendo uma qualidade mais rara do que a

capacidade de fazê-lo.

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BIBLIOGRAFIA

ALAIN, Émile Chartier. Reflexões sobre a educação. São Paulo, Saraiva,

1978

Ceccon, Claudius; OLIVEIRA, Miguel Darcy; Oliveira Rosiska Darcy.

A vida na escola e a escola da vida. Petrópolis, Vozes, 1984

COLLET, Heloisa , Gouvêa. Educação Permanente – uma abordagem

metodológica, Rio de janeiro , SESC, 1976

Freire, Paulo. Educação e mudança. 6ª edição, Paz e Terra,

Rio de Janeiro, 1983

Pedagogia do oprimido. 12ª Ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1983

FRONDIZI, Rosieri. Que son los valores? 2ª Ed., México, Fondo de Cultura

Econômica, 1962.

HESSEN, Johannes. Filosófica dos valores. 5ª ede, Coembra, A. Amado.

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LIBÂNIO, J. B. Formação da consciência crítica. Petrópolis, Vozes, 1978.

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ao compromisso político. São Paulo, Cortez e Moraes, 1982

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SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum á consciência filosófica.

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SNYDERS, Georges. Pedagogia progressista. Coimbra, Livraria Almeidina,

1974.

Escola, classe e luta das classes. Lisboa, Moraes Editores, 1977.

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ANEXOS

"A ESCOLA EDUCAÇÃO CRIATIVA

"A Escola Educação Criativa acredita que a leitura abre portas para o pensamento

criativo, diversifica o vocabulário e amplia os conhecimentos. http://ludicalivros.blogspot.com/2009/05/contando-historias-na-escola-educacao

CONGRESSO JOVEM DA EDUCAÇÃO CRIATIVA

50Como num "acampamento" pedagógico, os alunos participaram de uma intensa programação com atividades diversificadas que incluiu: palestras, momento cultural, reflexões, dinâmicas, ginástica matinal e outras surpresas.

O tema central do encontro é "O Jovem e a Formação de Hábitos Saudáveis". E, foram abordados em toda a programação, valores que vêm reforçar a autoestima, o processo de construção de uma vida sustentável e eficaz. Confira a alegria estampada nas fotos dos jovens do Congresso!

http://www.eecriativa.com.br/visualizar_noticia.aspx?id=203

ABORDAGEM TRADICIONAL

Esta relação é vertical e o mestre ocupa o centro de todo o processo, cumprindo objetivos selecionados pela escola e pela sociedade. O professor comanda todas as ações da sala de aula e sua postura está intimamente ligada à transmissão de conteúdos. Ao aluno, neste contexto, era reservado o direito de aprender sem qualquer questionamento, através da repetição e automatização de forma racional. (p.14-15)

SAVIANI (1991), referindo-se à relação professor e aluno, na escola tradicional, mostra-nos que o professor: "transmite, segundo uma gradação lógica, o acervo cultural aos alunos. A estes cabe assimilar os conhecimentos que lhes são transmitidos.” (p. 18) Ainda sob esta perspectiva, o aluno para ter acesso ao conhecimento tinha de passar pelo professor, que era quem mediava à relação. Assim, o professor controlava todas as ações exigindo dos alunos obediência que, por outro lado, era também exigida na empresa ou na indústria. Desta forma, pensar, questionar era coisa do chefe ou do dono da empresa.

ABORDAGEM COMPORTAMENTALISTA

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Segundo MIZUKAMI (1986), o professor é um planejador do ensino e da aprendizagem que trabalha no sentido de dar maior produtividade, eficiência e eficácia ao processo, maximizando o desempenho do aluno. O professor, como um analista do processo, procurava criar ambientes favoráveis de forma a aumentar a chance de repetição das respostas aprendidas. (p.31-32)

Segundo SAVIANI (1991), neste contexto: " o elemento principal passa a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e aluno posição secundária, relegados que são a condições de executores de um processo cuja concepção, planejamento, coordenação e controle ficam a cargo de especialistas supostamente habilitados, neutros, objetivos e imparciais."(p. 24)

ABORDAGEM HUMANISTA.

Nesta abordagem as qualidades do professor (facilitador) podem ser sintetizadas em autenticidade, compreensão empática - compreensão da conduta do outro a partir do referencial desse outro - e o apreço (aceitação e confiança em relação ao aluno). (p.53) O professor como facilitador da aprendizagem, aberto às novas experiências, procura compreender, numa relação empática, também os sentimentos e os problemas de seus alunos e tenta levá-los à autorrealização. A responsabilidade da aprendizagem (objetivos) fica também ligada ao aluno, àquilo que é mais significativo para ele, e deve ser facilitada pelo professor. Portanto, o processo de ensino depende da capacidade individual de cada professor, de sua aceitação e compreensão e do relacionamento com seus alunos.