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1 A EDUCAÇÃO DO CAMPO E A EXPERIÊNCIA DO INSTITUTO FEDERAL DE BRASÍLIA (IFB) JUNTO AO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO NA REFORMA AGRÁRIA (PRONERA) 1 Ednizia Ribeiro Araújo Kuhn 2 Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected] Juliano Rosa Gonçalvez 3 Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected] Tarcísio Kuhn 4 Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected] Resumo O presente trabalho pretende relatar a experiência do curso de Agropecuária com ênfase em Agroecologia, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB), em parceria com o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA). O curso é desenvolvido no regime de alternância e atende estudantes de 17 assentamentos vinculados à Superintendência Regional 28 do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (SR 28/INCRA). O objetivo do relato é discutir os desafios, as possibilidades e as contradições desta experiência. Palavras-chave: Educação do campo. IFB. PRONERA. Introdução: O objetivo deste trabalho é relatar a experiência do curso de Agropecuária com ênfase em Agroecologia, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB) com recursos oriundos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), que é vinculado ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). O artigo e seus autores são vinculados às pesquisas em andamento junto ao Projeto GeografAR/DF (A Geografia da área rural do Distrito Federal e entorno), do IFB, que tem por objetivo geral a análise e entendimento do espaço rural do Distrito Federal e dos municípios goianos e mineiros do seu entorno, identificados na Figura 1:

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A EDUCAÇÃO DO CAMPO E A EXPERIÊNCIA DO INSTITUTO FEDERAL DE BRASÍLIA (IFB) JUNTO AO PROGRAMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO

NA REFORMA AGRÁRIA (PRONERA) 1

Ednizia Ribeiro Araújo Kuhn2

Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected]

Juliano Rosa Gonçalvez3

Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected]

Tarcísio Kuhn4

Instituto Federal de Brasília - IFB [email protected]

Resumo O presente trabalho pretende relatar a experiência do curso de Agropecuária com ênfase em Agroecologia, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília (IFB), em parceria com o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA). O curso é desenvolvido no regime de alternância e atende estudantes de 17 assentamentos vinculados à Superintendência Regional 28 do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (SR 28/INCRA). O objetivo do relato é discutir os desafios, as possibilidades e as contradições desta experiência. Palavras-chave: Educação do campo. IFB. PRONERA.

Introdução:

O objetivo deste trabalho é relatar a experiência do curso de Agropecuária com ênfase

em Agroecologia, ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de

Brasília (IFB) com recursos oriundos do Programa Nacional de Educação na Reforma

Agrária (PRONERA), que é vinculado ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma

Agrária (INCRA). O artigo e seus autores são vinculados às pesquisas em andamento

junto ao Projeto GeografAR/DF (A Geografia da área rural do Distrito Federal e

entorno), do IFB, que tem por objetivo geral a análise e entendimento do espaço rural

do Distrito Federal e dos municípios goianos e mineiros do seu entorno, identificados na

Figura 1:

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Figura 1: Rede Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno

Fonte: www.centrodametropole.org.br, acesso em 30 de junho de 2012.

Em relação às institucionalidades envolvidas no processo analisado (PRONERA e IFB),

pode-se afirmar que o PRONERA foi instituído formalmente em 16 de abril de 1998, no

momento em que se completavam dois anos do massacre de Eldorado dos Carajás, no

Pará, que culminou na morte de 20 trabalhadores rurais sem-terra e no ferimento de

cerca de 70. Por ter sido uma política pública resultante de uma luta social, o

PRONERA apresenta a particularidade de integrar diferentes setores da sociedade.

Segundo o Manual de Operações do PRONERA, os fundamentos deste Programa são:

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Enquanto política pública, o PRONERA fundamenta-se na gestão participativa e na descentralização das ações das instituições públicas envolvidas com a educação. Essas instituições criam por meio de projetos a oportunidade de exercitar e realizar ações com a co-participação dos movimentos sociais e sindicais de trabalhadores e trabalhadoras rurais, instituições de pesquisa, governos estaduais e municipais em prol do desenvolvimento sustentável no campo, da construção da solidariedade e da justiça social (INCRA, 2004, p. 11).

O curso em análise é oferecido para assentamentos ligados à Superintendência Regional

do INCRA (INCRA SR-28), que atende o Distrito Federal e Entorno. Portanto, o curso

abrange cinco municípios do Estado de Goiás mais Brasília, no Distrito Federal e recebe

vinte e oito estudantes de dezessete assentamentos, conforme detalhado no corpo da

Tabela 1:

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Tabela 1: Assentamentos atendidos pela parceria IFB-PRONERA

UF Município Assentamento Estudantes atendidos

GO

Agua Fria de Goiás

Sonho Realizado 1

Barra do Cigano 1

Nova Jerusalém 1

Cocalzinho Santa Felicidade 1

Formosa Vale da Esperança 2

Barra Verde 1

Padre Bernardo

Vereda I 2

Vereda II 2

Colônia I 2

Colônia II 3

Santa Helena 1

Planaltina de Goiás

União Flor da Serra 4

Itaúna I 3

Itaúna II 1

Cigano 1

Nova Jerusalém 1

DF Brasília Pequeno Willian 1

Fonte: Pesquisa de campo, 2012. Elaboração: EDNIZIA KUHN, JULIANO GONÇALVES, TARCÍSIO KUHN, 2012.

O IFB, por seu tempo, foi instituído a partir da Lei nº 11.892/2008, que criou a Rede

Federal de Educação Profissional e Tecnológica. Como Instituto desta Rede, ele tem a

missão de “qualificar profissionais para os diversos setores da economia brasileira,

realizar pesquisas e desenvolver novos processos, produtos e serviços em colaboração

com o setor produtivo” (MEC, 2012). Portanto, em termos de história e missão, o IFB e

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o PRONERA possuem perspectivas bastante diferenciadas entre si. No entanto, esta

discussão será melhor detalhada no próximo item deste trabalho.

O curso de Agropecuária com ênfase em Agroecologia é realizado no regime de

alternância, onde os tempos educativos se alternam na formação do estudante. Assim,

há a articulação de aprendizados organizados em tempo-escola (TE) e tempo-

comunidade (TC). A duração do curso é de dois anos, sendo que durante uma semana

por mês os estudantes realizam o tempo-escola e o restante do mês é destinado ao

tempo-comunidade.

Discutindo a origem da pedagogia da alternância, na França e com relações com a igreja

católica, Marlene Ribeiro coloca que Neste tempo/lugar fariam um curso de agricultura por correspondência e, junto com esse curso, receberiam uma formação geral, humana e cristã, orientada pelo padre. Assim nasce a pedagogia da alternância, onde se alternam tempos/lugares de aprendizado, sendo uma formação geral e técnica em regime de internato, em um centro de formação, e um trabalho prático na propriedade familiar e na comunidade (RIBEIRO, 2010, p.294)

Além da articulação de espaço e tempos de formação, há ainda a perspectiva de articular

as diferentes áreas do conhecimento socialmente produzido. Assim, o curso é composto

por eixos temáticos que englobam aspectos do Desenvolvimento, Estado, Políticas

Agrárias, Sustentabilidade, Planejamento das Unidades Produtivas, Agroecologia e

Reestruturação Produtiva. Esse é o pano de fundo em que se insere o curso analisado. O

mais instigante, no entanto, é analisar mais detidamente as relações contraditórias e

desafiadoras que se apresentam na construção/realização, bem como as possibilidades e

significados que ele apresenta para o grupo social em questão.

Desafios, contradições e possibilidades:

Inserido no movimento da totalidade, onde partes e todo convergem para o melhor

entendimento e explicação dos fenômenos, o curso de Agropecuária com ênfase em

Agroecologia, na parceria IFB-PRONERA, apresenta problemáticas condizentes com

aquelas apresentadas pela Educação do Campo no país. Ou seja, o contexto da sua

existência foi a demanda dos assentados, que buscaram o Instituto para propor o curso.

Uma vez proposto e aprovado junto ao PRONERA, o curso se viu inserido nas

burocracias e contradições do Estado, tanto por parte do INCRA, quando por parte do

Instituto Federal de Brasília. No entanto, apesar das dificuldades encontradas no

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decorrer do processo, o curso representa a perspectiva de uma formação profissional

para o grupo social e a possibilidade de uma permanência mais digna no campo, com

maior qualidade de vida.

Diante do exposto, entende-se que para o relato e análise das problemáticas que

subjazem o curso, é fundamental dar voz aos estudantes, que são, essencialmente, os

principais agentes desse processo. Assim, a metodologia para o desenvolvimento deste

trabalho foi o acompanhamento das Coordenações Político-Pedagógicas (CPP), como o

espaço em que os estudantes colocam questões (críticas, dificuldades e propostas)

relacionadas com a organização do tempo-escola e o tempo-comunidade, conjuntura

política, questões institucionais, entre outros. Complementarmente, foi realizada uma

pesquisa com os estudantes, solicitando que eles avaliassem criticamente a presença no

currículo de uma disciplina voltada para as discussões mais teóricas, de cunho

filosófico, político e histórico, que são as disciplinas Estudos Regionais I e II, no

contexto de um curso profissionalizante. Alguns relatos mais contundentes contribuem

para o entendimento do processo e serão transcritos no decorrer do trabalho.

As disciplinas Estudos Regionais I e II têm por objetivo central estudar as relações

sociais e políticas no Brasil, fazendo correlações entre as escalas local, regional e

global. A ideia é identificar e analisar tais relações, com vistas a um entendimento mais

profundo de cada realidade que aparece no curso. Assim, são estudados temas como

Estado, Política Pública, Questão Agrária no Brasil, Cidadania, Movimentos Sociais de

Luta pela Terra, Educação do Campo, entre outros. Em relação ao questionamento sobre

a importância destas disciplinas no contexto do curso, obtiveram-se as seguintes

respostas: No meu ponto de vista é de extrema importância, pois é através dela que conhecemos toda a história e a importância das terras no Brasil e, com isso, conseguimos aprender e entender melhor a questão da reforma agrária, que é uma política pública. E por fim, a burocracia das políticas públicas. (Estudante do curso, Assentamento Colônia II, Padre Bernardo-GO, 2012)

É de grande importância, pois com o foco maior dos Estudos Regionais que é a política, compreendemos melhor o que se passa e também alguns direitos que podemos ter. (Estudante do curso, Assentamento Nova Jerusalém, Planaltina-GO)

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Ou seja, compreende-se dentro desse processo de reflexão do papel das disciplinas

Estudos Regionais I e II, que a profissionalização não deve ser entendida somente como

formação das questões chamadas “técnicas”, mas deve ser uma formação omnilateral5,

onde a Geografia e a História são centrais no entendimento dos processos sociais atuais.

Pelo que apareceu na maior parte dos relatos, esse entendimento é também é

compartilhado pelos estudantes do curso.

Tal entendimento vem ao encontro com as formulações de Demerval Saviani,

relacionadas à pedagogia histórico-crítica. Segundo tais formulações, a tarefa da

pedagogia histórico-crítica em relação à educação escolar implica em: a) Identificação das formas mais desenvolvidas em que se expressa o saber

objetivo produzido historicamente, reconhecendo as condições de sua produção e compreendendo as suas principais manifestações, bem como as tendências atuais de transformação.

b) Conversão do saber objetivo em saber escolar, de modo que se torne assimilável pelos alunos no espaço e tempo escolares.

c) Provimento dos meios necessários para que os alunos não apenas assimilem o saber objetivo enquanto resultado, mas apreendam o processo de sua produção, bem como as tendências de sua transformação. (SAVIANI, 2008, p.9)

Os fundamentos ético-filosóficos da pedagogia histórico-crítica são os balizadores da

inserção dos Estudos Regionais no curso. Especialmente, na compreensão da

importância de se conhecer o “saber objetivo produzido historicamente”. No entanto,

para ser efetivo esse saber precisa se transformar em fator mobilizador da realidade dos

estudantes.

Nesse sentido, quando perguntados sobre as possibilidades de aplicação dos

conhecimentos aprendidos em Estudos Regionais na realidade dos assentamentos,

foram apresentadas respostas como: “Somos assentados da reforma agrária, então o que

nós aprendemos ajuda a saber como funciona as coisas no país em relação a nossa

realidade” (Estudante do curso, Assentamento Vereda I, Padre Bernardo-GO, 2012) e

“Ajudar a própria comunidade a entender sua história, entender sobre política pública e

a partir daí tentar mudar a realidade da comunidade para melhor” (Estudante do curso,

Assentamento Colônia II, Padre Bernardo-GO, 2012). Ou seja, compreende-se que os

estudos mais teóricos propostos pelas disciplinas possuem implicações e podem

transformar a realidade concreta.

Nesse sentido, foi solicitado que os estudantes se posicionassem sobre a afirmação: As

disciplinas de Estudos Regionais I e II são importantes para o curso de

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Agropecuária com ênfase em Agroecologia. Sobre os posicionamentos adotados pelos

estudantes, foram encontrados os resultados apresentados no Gráfico 1:

Fonte: Pesquisa de campo, 2012. Elaboração: EDNÍZIA KUHN, JULIANO GONÇALVES, TARCÍSIO KUHN, 2012. Os resultados mostram que os estudantes reconhecem os Estudos Regionais como

importantes para sua formação. Em relação aos estudantes que não se posicionaram

concordando totalmente com a questão, a justificativa dada por eles foi a dificuldade de

abordar os temas tratados nas disciplinas no contexto da sua comunidade devido,

principalmente, à falta de organização da mesma. Respondendo sobre esta questão, ou

seja, possibilidade de aplicar os conhecimentos da disciplina no assentamento, um dos

estudantes apontou que

Pouca oportunidade pelo fato de que não somente a comunidade é desunida, mas também o grupo que participa do curso. Devido ao desinteresse da comunidade essa possibilidade é muito difícil de se executar (Estudante do curso. Assentamento Flor da Serra, Planaltina de Goiás-GO, 2012)

Ou seja, as dificuldades de organização dos assentamentos se constituem como um

desafio para o grupo social. E esta é uma dos desafios mais marcantes para os

estudantes em relação aos objetivos do PRONERA, pois os mesmos têm o papel de

atuarem também como articuladores políticos e produtivos nos assentamentos,

buscando que haja sempre maior interação e integração entre os grupos.

No entanto, os maiores desafios apresentados no desenvolvimento do curso dizem

respeito à questões institucionais. Por questões de ordem administrativa, o recurso do

0

5

10

15

20

25

Discordo totalmente

Discordo parcialmente

Nem concordo, nem

discordo

Concordo parcialmente

Concordo totalmente

Gráfico 1: Posicionamento dos estudantes em relação à importância das disciplinas Estudos Regionais I e II.

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PRONERA para o segundo ano do curso ainda não foi repassado ao IFB. Já o recurso

disponibilizado para o primeiro ano foi repassado com atraso, após o início das

atividades, e ainda teve um baixo nível de execução por parte do IFB, resultando na

devolução de mais de 70% do volume contratado para o primeiro ano.

Mesmo o Instituto Federal tendo assumido parte dos custos necessários à matrícula e

início do curso, algumas atividades centrais não foram realizadas, como por exemplo, a

contratação de monitores para atuar principalmente no tempo-comunidade e realização

das atividades do tempo-escola na Escola Família Agrícola de Padre Bernardo, no

âmbito do assentamento Vereda II. Especialmente esses dois aspectos fizeram com que

muitos dos fundamentos políticos e pedagógicos da Educação do Campo não fossem

alcançados, pois a inserção nas comunidades e a mobilização delas foram prejudicadas

pela falta dos recursos humanos e financeiros necessários para tal fim. Esta situação

corrompeu a essência da pedagogia da alternância transformando o curso numa espécie

de modalidade semipresencial.

Ademais, o Campus Planaltina do IFB, que é a unidade onde o curso acontece, tem uma

construção histórica mais ligada à educação rural, com processos tradicionais de

formação humana. Nesse sentido, é preciso diferenciar educação rural de educação do

campo, onde (...) em uma leitura dialética, a segunda – a escola do campo – é, ao mesmo tempo e no movimento contraditório das lutas sociais, a continuidade e a ruptura com a primeira – a escola rural. (RIBEIRO, 2012, p. 42)

Assim, há uma divergência de concepções entre a estrutura da construção histórica do

Campus e a nova demanda que surgiu a partir dos movimentos sociais. A educação rural

é reprodução das relações de produção do campo brasileiro, enquanto a educação do

campo é transformação das mesmas.

Há ainda um embate muito forte no âmbito do corpo docente do Campus sobre a própria

concepção de agropecuária, polarizando matrizes de racionalidade convencionais e

agroecológicas. Esse embate traz consigo, toda a contradição das relações sociais do

campo no Brasil e repercute nos desafios postos ao curso. Isto porque tais concepções

adquirem materialidade na forma como a instituição se posiciona e apresenta recursos

para o desenvolvimento do curso.

Do ponto de vista da atuação dos docentes no curso, é possível identificar ainda alguns

desafios. Um deles diz respeito à questão da formação. Considerando a complexidade

10

que subjaz a pedagogia da alternância, onde há a perspectiva de articulação profunda

entre teoria e prática, é exigida dos docentes uma formação específica que, em geral, os

cursos de licenciaturas tradicionais não oferecem. E há que se considerar também que

nem todos os professores são licenciados. Especialmente os que atuam nas chamadas

“áreas técnicas” são bacharéis. Nesse sentido, institucionalmente, não foram oferecidas

as condições para um trabalho mais efetivo dos professores no curso do IFB-

PRONERA. Além disso, o fato dos docentes não estarem exclusivamente dedicados a

este projeto (pois os mesmos atuam nos demais cursos da Instituição) faz com que não

seja possível dedicar ao curso o tempo que a proposta diferenciada dele exige.

Por fim, concorda-se com Ribeiro (2010), quando a autora aponta que a educação do

campo se constitui como um projeto de escola construído nas lutas pela terra. De acordo

com sua linha de raciocínio, há uma relação muito estreita entre escola e terra, pois o

acesso a terra é uma grande desafio para o jovem que se forma nos processos de

educação do campo. Um projeto de escola, mesmo que seja uma proposta pedagógica saída de dentro dos movimentos sociais populares rurais/do campo, não resolve a questão da terra. Terra e escola estão indissoluvelmente imbricadas na constituição do que os movimentos sociais populares identificam, com o sentido da unidade política e da historicidade, como camponês. (RIBEIRO, 2012, p. 195).

Essa, talvez, seja a compreensão mais estrutural que se deve ter sobre o processo de

emergência e consolidação da educação do campo. Da mesma forma, ela é o grande

desafio para os estudantes que ainda lutam no processo de permanência na terra, com

todas as muitas dimensões que essa luta envolve. Como essa escola e a organização do

território vão se construir é o trabalho dos grupos sociais que lutam e movimentam o

campo no Brasil.

Conclusões

Diante do exposto, pode-se concluir que a oferta do curso de Agropecuária com ênfase

em Agroecologia na parceria IFB-PRONERA, embora atendendo à demanda dos

assentados, apresenta uma série de contradições e desafios, relacionados com questões

de ordem institucional. O fato de não haver recurso suficiente para o desenvolvimento

de atividades essenciais para a conformação filosófica da educação do campo,

descaracteriza um processo que tem história e significado político. No final das contas,

11

o curso fica em uma espécie de “limbo” entre o que se poderia qualificar como

educação rural e educação do campo, não sendo, efetivamente, nem uma nem outra.

No entanto esta experiência está sendo apropriada pelos estudantes que participam do

curso. Há o reconhecimento da importância deste curso na formação individual e há

ainda situações em que a comunidade está sendo mobilizada pelas atividades que os

estudantes/professores desenvolvem.

Entretanto, a educação do campo está em disputa. É nesse sentido que processos estão

sendo construídos histórica e socialmente. É a luta que está em curso. A questão que

emerge é se diante de todas as contradições e deficiências apontadas, o Curso de

Agropecuária com ênfase em Agroecologia, resultado da parceria PRONERA-IFB, será

capaz de atingir seus objetivos políticos e pedagógicos e formar Técnicos em

Agropecuária condizentes com as demandas da educação do campo.

Notas: ___________________________ 1Artigo apresentado no Encontro Nacional de Geografia Agrária, realizado na cidade de Uberlândia-MG, no período de 15 a 19 de outubro de 2012. O evento tem como tema geral “Territórios em disputa: os desafios da Geografia Agrária nas contradições do desenvolvimento brasileiro”. O artigo está vinculado ao eixo temático “Desafios e Perspectivas da Educação do Campo”. 2 Professora do Instituto Federal de Brasília/Campus Planaltina, onde ministra as disciplinas Estudos Regionais, Geografia e Políticas Públicas. 3 Professor do Instituto Federal de Brasília/Campus Planaltina, onde ministra as disciplinas Estudos Regionais, Geografia e Metodologia Científica. 4 Professor do Instituto Federal de Brasília/Campus Planaltina, onde ministra as disciplinas Estudos Regionais, História e Políticas Públicas. 5 Conceito marxista que indica uma oposição à formação unilateral provocada por processos de alienação. Referências

CEM/Cebrap (Centro de Estudos da Metrópole). Rede Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno. Disponível em: www.centrodametropole.org.br. Acesso em 30 de junho de 2012.

INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária: Manual de operações. Disponível em: www.pronera.gov.br. Acesso em 15 de abril de 2011.

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MEC (Ministério da Educação). Expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: histórico. Disponível em: www.redefederal.mec.gov.br. Acesso em 30 de maio de 2012.

RIBEIRO, Marlene. Movimento camponês, trabalho e educação: liberdade, autonomia, emancipação: princípios/fins da formação humana. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

SAVIANI, Demerval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 10 ed. rev. Campinas, SP: Autores Associados, 2008. (Coleção educação contemporânea)