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1 A DINÂMICA DA ACUMULAÇÃO PAULISTA (1803-1897): das origens à diversificação do capital da família Lacerda Franco RESUMO: o texto visa apreender a formação da riqueza paulista durante o século XIX, de sua formação no começo do oitocentos à diversificação no último quarto do período. Para tanto, a análise recai sobre os Lacerda Franco, importante família paulista cujos membros principiaram economicamente em atividades de cunho interno (lavoura de mantimentos, criação e comércio de animais, produção de aguardente) nas terras próximas da vila de São Paulo e, durante o século XIX, migraram para o Oeste Paulista, tornando-se senhores de engenho e, por volta de 1850, cafeicultores. A continuação desse processo de enriquecimento aponta a formação de sociedades agrícolas, casa comissária e exportadora, indústria e banco, diversificando as formas de riqueza dentro do complexo exportador cafeeiro paulista da segunda metade do século. O fio condutor que perpassa o trabalho é a apreensão da dinâmica (movimento) desse processo, materializada, através da documentação da família e de suas empresas, no deslocamento pela Província de São Paulo, nas diferentes atividades econômicas que os enriqueceram e nas difusas formas de alocação do capital. 1 Atibaia e Jundiaí (1803-1816): constituição da família e acumulação via mercado interno nas cercanias de São Paulo No início do século XIX, o Brasil teve no revivescimento do açúcar sua principal mercadoria a ser exportada, sendo que, em 1805, das terras brasileiras eram extraídos 15% da produção mundial, ficando atrás somente de Cuba. O predomínio do açúcar na pauta exportadora nacional se conservaria até 1830 (LUNA; KLEIN, 2010, p. 95). Todavia, esta demanda era atendida em menor parte pela produção paulista, uma vez que, entre 1796-1811, o maior exportador de açúcar branco no Brasil foi a capitania do Rio de Janeiro (6.608.097 arrobas), seguido de Pernambuco (6.116.182 arrobas), da Bahia (5.636.858 arrobas) e São Paulo (98.556 arrobas) (ARRUDA, 1980, p. 361). Se a posição da capitania paulista frente aos rincões escravistas produtores do açúcar brasileiro não era de destaque, todavia, as transformações que a lavoura açucareira demandou e possibilitou foram fundamentais ao desenvolvimento da economia de São Paulo na primeira metade do século XIX. Em 1797, foram produzidas pouco mais de 100.000 arrobas de açúcar nesta capitania; já, em 1847, o número foi de quase 600.000 arrobas (PETRONE, 1968, p. 152-159). Concomitantemente, a população paulista, que era de 162.345 habitantes no ano de 1798, elevou-se para 326.902 habitantes no ano de 1837 (MARCÍLIO, 2000, p. 213-214). O trabalho nas lavouras se dava prioritariamente com o uso de escravos, sendo que a população cativa

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Page 1: A DINÂMICA DA ACUMULAÇÃO PAULISTA (1803-1897): das … · açucareira demandou e possibilitou foram fundamentais ao desenvolvimento da economia de São Paulo na primeira metade

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A DINÂMICA DA ACUMULAÇÃO PAULISTA (1803-1897): das origens à

diversificação do capital da família Lacerda Franco

RESUMO: o texto visa apreender a formação da riqueza paulista durante o século XIX, de sua

formação no começo do oitocentos à diversificação no último quarto do período. Para tanto, a

análise recai sobre os Lacerda Franco, importante família paulista cujos membros principiaram

economicamente em atividades de cunho interno (lavoura de mantimentos, criação e comércio

de animais, produção de aguardente) nas terras próximas da vila de São Paulo e, durante o

século XIX, migraram para o Oeste Paulista, tornando-se senhores de engenho e, por volta de

1850, cafeicultores. A continuação desse processo de enriquecimento aponta a formação de

sociedades agrícolas, casa comissária e exportadora, indústria e banco, diversificando as formas

de riqueza dentro do complexo exportador cafeeiro paulista da segunda metade do século. O fio

condutor que perpassa o trabalho é a apreensão da dinâmica (movimento) desse processo,

materializada, através da documentação da família e de suas empresas, no deslocamento pela

Província de São Paulo, nas diferentes atividades econômicas que os enriqueceram e nas difusas

formas de alocação do capital.

1 – Atibaia e Jundiaí (1803-1816): constituição da família e acumulação via

mercado interno nas cercanias de São Paulo

No início do século XIX, o Brasil teve no revivescimento do açúcar sua principal

mercadoria a ser exportada, sendo que, em 1805, das terras brasileiras eram extraídos

15% da produção mundial, ficando atrás somente de Cuba. O predomínio do açúcar na

pauta exportadora nacional se conservaria até 1830 (LUNA; KLEIN, 2010, p. 95).

Todavia, esta demanda era atendida em menor parte pela produção paulista, uma vez

que, entre 1796-1811, o maior exportador de açúcar branco no Brasil foi a capitania do

Rio de Janeiro (6.608.097 arrobas), seguido de Pernambuco (6.116.182 arrobas), da

Bahia (5.636.858 arrobas) e São Paulo (98.556 arrobas) (ARRUDA, 1980, p. 361).

Se a posição da capitania paulista frente aos rincões escravistas produtores do

açúcar brasileiro não era de destaque, todavia, as transformações que a lavoura

açucareira demandou e possibilitou foram fundamentais ao desenvolvimento da

economia de São Paulo na primeira metade do século XIX. Em 1797, foram produzidas

pouco mais de 100.000 arrobas de açúcar nesta capitania; já, em 1847, o número foi de

quase 600.000 arrobas (PETRONE, 1968, p. 152-159). Concomitantemente, a

população paulista, que era de 162.345 habitantes no ano de 1798, elevou-se para

326.902 habitantes no ano de 1837 (MARCÍLIO, 2000, p. 213-214). O trabalho nas

lavouras se dava prioritariamente com o uso de escravos, sendo que a população cativa

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de São Paulo, que era pouco mais de 30.000 escravos em 1798, chegou a 91.184 no ano

de 1836 (MARCÍLIO, 2000, p. 215-216; MÜLLER, 1923, p. 154).

O açúcar era o principal gênero de exportação paulista na década de 1820,

condição mantida até o final da década de 1840, quando será sobrepujado pelo café

(LUNA; KLEIN, 2010, p. 102). Porém, diferente da maioria das regiões açucareiras

brasileiras e mundiais, em São Paulo o açúcar conviveu lado-a-lado com a cultura de

mantimentos. Milho, arroz, feijão eram muitas vezes plantados nas mesmas

propriedades em que se produzia o açúcar, tendo igualmente no cativo sua mão-de-obra

(LUNA; KLEIN, 2005, p. 123)1. A simbiose entre a lavoura açucareira e a cultura de

mantimentos pode ser demonstrada pelos seguintes números: o milho era a cultura mais

produzida na província de São Paulo em 1836, e do Oeste Paulista, principal região

açucareira paulista2, eram oriundos 45,8% do cereal (LUNA; KLEIN, 2005, p. 112-

113).

O transporte da produção paulista era feito pelo lombo dos muares, equinos e

bovinos. A cana-de-açúcar do Oeste Paulista, o mercado consumidor do Rio de Janeiro

– impulsionado pela vinda da Família Real em 1808 – e, posteriormente, o café, não

somente mantiveram a procura pelas bestas sulinas3, bem como ela cresceu ainda mais.

Além disso, as Minas, com sua grande massa populacional remanescente do ouro, ainda

possuíam um bom mercado consumidor que estimulava o comércio interno, bem como

os negócios entre esta região e as demais da Colônia (SUPRINYAK; RESTITUTTI,

2006, p. 3). Em 1798 foram registradas na feira de Sorocaba 11.498 bestas; em 1822

esta cifra elevou-se a pouco mais de 20.761 bestas; e, nos períodos 1850-1859 e 1860-

1869, a média de muares chegados à Sorocaba ficou bem próxima aos 50.000 animais

(STRAFORINI, 2001, p. 64 a 67). Este volume do comércio de animais era importante

fonte de receitas para a Província de São Paulo, como no ano financeiro 1836-1837, em

1 Devido ao fácil cultivo, baixos investimentos e safras anuais, o milho era plantado em toda a província

de São Paulo. As grandes fazendas açucareiras, por exemplo, o cultivavam para a subsistência de seus

trabalhadores e do gado. Ademais, sua ampla procura tornava simples a comercialização, o que pode ter

gerado os capitais que sustentaram a implantação dos cafezais em algumas vilas paulistas enquanto os

cafeeiros não começavam sua produção (LUNA; KLEIN, 2005, p. 125). 2 Em 1836, o açúcar estava no topo das exportações efetuadas pelo porto de Santos, e 96,8% vinha das

fazendas do Oeste Paulista (LUNA; KLEIN, 2005, p. 113). 3 É possível indicar uma divisão territorial do trabalho, pois, o Sul era o lugar de criação dos muares, que

no Paraná faziam sua invernada, ou seja, a mula era alimentada e engordava na região de pastos dos

Campos Gerais, para então serem comercializadas na Feira de Sorocaba.

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que 28% da receita provincial vieram da rubrica Direitos sobre os Animais no Rio

Negro4.

Os muares que interligavam as regiões açucareiras à zona exportadora de Santos

eram, ao mesmo tempo, responsáveis por levar o restante da produção agrária paulista

aos seus respectivos mercados consumidores, tanto dentro quanto fora da capitania. À

vila de São Paulo acorria diariamente o feijão, o milho, o toucinho, a aguardente, o

tecido de algodão, a farinha de mandioca e outras mercadorias trazidas das vilas

paulistas de Atibaia e Bragança, gêneros que somavam 95% do valor total

comercializado por estas localidades com outras vilas (CANABRAVA, 1972, p. 85).

Na vila de Atibaia, mais exatamente no ano de 1803, que se deu constituição da

família Lacerda Franco. Esta nova família surgiu da união de Ignacio Franco de

Camargo com Anna Maria da Conceição5. Ele era filho de Chrispim da Silva Franco,

um dos capitães de ordenanças atibaiense e grande proprietário rural escravista. Por sua

vez, ela era viúva de Francisco Corrêa de Lacerda. Dentre os 10 filhos do novo casal – 7

da parte de Ignacio e 3 de Anna Maria – nossa atenção vai recair inicialmente sobre o

enteado Antonio de Lacerda Guimarães6 (filho de Anna com seu viúvo esposo) e Maria

Franco (filha de Ignácio com sua primeira esposa Gertrudes Pires), pois em 1813, na

mesma vila, eles se casaram, matrimônio que serviu para cimentar a formação da nova

família. O outro filho que haverá de ter sua trajetória destacada será Joaquim Franco de

Camargo, figura responsável por iniciar a migração dos Lacerda Franco pelo Oeste

Paulista (filho de Ignacio com Gertrudes Pires) (MP ATIBAIA, 1803-1818).

4 Consistia na cobrança de Rs. 2$500 por cada besta, Rs. 2$000 por cada cavalo e Rs. $960 por cada égua

que se criava aquém dos limites desta Província até o Registro (MÜLLER, 1923, p. 209-211). 5 Anna Maria da Conceição nasceu na vila de São Paulo e era moradora da vila paulista de Jundiaí até

1799, quando ficou viúva do capitão Francisco Corrêa de Lacerda. Ela teria 48 anos em 1803 MP

JUNDIAÍ, 1790-1802; MP ATIBAIA, 1803). 6 Os enteados eram colocados na situação de filhos segundo as leis coloniais (CAMPOS, 2003, p. 248).

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Tabela 1: Atividades agrícolas, produtos, maior plantel de cativos e cargos

militares dos membros da família Franco de Camargo-Lacerda Guimarães nas

vilas de Atibaia e Jundiaí (1803-1842)

NOMES ATIVIDADE PRODUTOS MAIOR

PLANTEL

(ANO)

PATENTE

MILITAR E

OUTROS

CARGOS

1 - Chrispim

da Silva

Franco

lavrador com

tropa

milho, capados, feijão,

arroz, algodão

13 escravos

(1810)

capitão de

ordenanças

2 - Ignacio

Franco de

Camargo

lavrador com

engenho e

tropa

milho, capados, feijão,

aguardente, bois,

éguas,toucinho, bestas

23 escravos

(1824)

soldado da

cavalaria/capitão

de ordenanças

3 - Joaquim

Franco de

Camargo

Negociante de

animais e

lavrador

milho, feijão, tropa

solta

4 escravos

(1816)

sargento de

milícias

4 - Antonio

de Lacerda

Guimarães

Lavrador milho, feijão, capados,

arroz, algodão,

capados, gado, bestas

16 escravos

(1836)

soldado

auxiliar/juiz de

paz Fonte: Maços de População das vilas de Atibaia e Jundiaí (1803-1842).

Pela tabela 1 percebemos que a atuação econômica dos membros que formariam a

família Lacerda Franco se deu prioritariamente em atividades voltadas ao mercado

interno. A produção de mantimentos (milho, feijão, arroz, porcos, algodão) visava o

abastecimento do mercado paulistano. A criação e comércio de animais (bois, éguas e

bestas) tinham nas próprias regiões açucareiras em expansão, sobretudo no Oeste

Paulista, grande parte de sua demanda, complementada pelo Rio de Janeiro

(PETRONE, 1976, p. 88 a 90). Inclusive a produção de aguardente, que denota a posse

de engenho, tinha no mercado interno seu principal destino, como verificado em 1836-

1836, quando a exportação de aguardente representou somente 1,02% das mercadorias

saídas pelo porto de Santos (MÜLLER, 1923, p. 226-227).

Em vilas antigas como Atibaia e Jundiaí, que surgiram respectivamente em 1665 e

1769, a colonização pretérita legara no século XIX um quadro marcado pela baixa

disponibilidade de terras livres, agravado pelas técnicas agrícolas extensivas, ademais

havia falta até mesmo de lenha para os engenhos. No caso dos Lacerda Franco a

concorrência aumentava ainda mais em virtude dos dez filhos do casal Ignacio e Anna

Maria. A alternativa seria embrenhar-se na fronteira, buscando mais ao interior de São

Paulo as oportunidades que escasseavam nas proximidades da capital (BACELLAR,

1991, p. 40).

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2 – Mogi-Mirim e Limeira (1818-1847): a formação da riqueza no

“Quadrilátero do Açúcar”

Os serviços de transporte na primeira metade do século XIX, tarefa comandada

pelos tropeiros proprietários de grandes levas de muares, foram fundamentais no

processo de enriquecimento de vários indivíduos, possibilitando-lhes a inserção nos

postos da elite paulista, em que se encontravam os senhores de engenho e os

cafeicultores, além de comerciantes e profissionais liberais de êxito, todos escravistas

(LUNA; KLEIN, 2005, p. 239). Os lucros gerados pelo tropeirismo, a estrutura e custo

menor dos engenhos paulistas – quando comparados, por exemplo, às moendas

nordestinas – que demandavam menos cativos e a própria cultura de mantimentos foram

atividades que proporcionaram um autofinanciamento para a formação das propriedades

açucareiras (PETRONE, 2010, p. 142).

Como demonstra a tabela 1, o avô (Chrispim) e o pai (Ignacio) de Joaquim Franco

de Camargo eram proprietários agrícolas que também possuíam tropas de animais na

vila de Atibaia. Todavia, Joaquim era o membro da família que se dedicava de forma

mais explícita aos serviços de transporte, constando como negociante de animais na

documentação. Grande parte do trabalho das tropas vinha da demanda exercida pelo

transporte dos gêneros agrícolas produzidos no interior e que tinham que ser levados até

Santos a fim de serem exportados. Na primeira metade do século XIX, o açúcar era o

principal produto de exportação paulista e do “quadrilátero do açúcar” – área

geográfica constituída pelas vilas de Jundiaí, Mogi Mirim, Piracicaba e Sorocaba –

saíam quase 97% do açúcar paulista7, fomentando o afluxo de vários tropeiros para estas

localidades (PETRONE, 2010, p. 139).

Mogi Mirim, que se tornou vila em 1769, possuía terras férteis e propícias à

cultura canavieira, lavoura cujos primórdios na localidade remontam ao final do século

XVIII, e que atraíram diversos migrantes no desejo do enriquecimento8. Segundo os

7 (Luna; Klein, 2005, p. 113).

8 O desenvolvimento da cultura açucareira na vila de Mogi Mirim se daria sobretudo a partir de 1836,

sendo que em 1854 de Mogi sairiam mais de um quarto de todo o açúcar paulista (PETRONE, 1968, p.

50).

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Maços de População9 da vila de Mogi-Mirim no ano de 1818, dentre estes recém-

chegados habitantes constava o nome de Joaquim Franco de Camargo, que aparece

como morador novo. Dois anos depois, ele, que teria 29 anos de idade e casado com

Maria Lourença de Morais (27 anos), com quem tinha 4 filhos, constava como morador

da mesma vila e senhor de engenho, detentor de 17 escravos – em 1818 ele tinha apenas

12 cativos – que lhe permitiram produzir 500 arrobas de açúcar, além de vender 60

porcos na vila (MP MOGI MIRIM, 1818-1820).

A descrição acima aponta que o tropeiro Joaquim encontrou no quadrilátero do

açúcar a oportunidade de galgar postos na sociedade paulista, tornando-se proprietário

de terras e escravos, ou seja, afazendando-se. Na economia mercantil-escravista

açucareira10

, assim como seria visto com o café, a disponibilidade de terras era

fundamental no que tangia à produtividade, pois as técnicas agrícolas rudimentares

encurtavam a vida útil dos terrenos para o plantio, induzindo os proprietários a

acumularem cada vez mais terras, que no futuro seriam cultivadas e,

concomitantemente, levando-os a um movimento migratório pelo interior paulista em

busca de novos terrenos (LUNA; KLEIN, 2010, p. 107). Era na área da fronteira, ou

zona pioneira, em que se encontrava uma maior oferta de novas e produtivas terras que

atraíam diversos migrantes em busca do enriquecimento e enobrecimento na sociedade

paulista do século XIX, caracterizado pelo ser proprietário de terras e escravos

(MONBEIG, 1984, p. 93).

A fronteira, que representava novas oportunidades de ganhos econômicos aos seus

aventureiros, tinha no distanciamento do litoral um limitador a sua expansão. Entre

1720 e 1867, quando foi inaugurada a São Paulo Railway Co., o transporte das

mercadorias entre o interior e a zona portuária se dava prioritariamente sobre o lombo

9 Os Maços de População eram uma espécie de censo da população residente nas vilas paulistas entre a

segunda metade do século XVIII e a primeira metade do XIX. Nele constam os dados referentes a cada

residência (fogo) da localidade analisada: nome do casal dono da propriedade, nome dos filhos, nome dos

escravos, bem como as idades e a naturalidades, além do ofício do chefe de família e de sua produção

econômica no ano. 10

O processo de produção em qualquer economia mercantil escravista principia-se com a existência de

um “quantum” de capital-dinheiro, que se metamorfoseia, em seguida, em terras, meios de produção e

escravos os quais, combinados de um certo modo, se transformam em mercadorias. As mercadorias, ao

serem realizadas, assumem novamente a forma de capital-dinheiro, agora acrescido de um plus, o lucro

(MELLO, 2009, p. 45).

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de muares, contando em muito com o trabalho dos escravos (ELLIS, 1979, p. 195)11

. Os

caminhos eram vitais para o fluxo econômico das localidades, pois viabilizavam o

escoamento da produção e a chegada das mercadorias vindas de Santos. Este fluxo

crescera demasiadamente com a expansão do açúcar, implicando em uma melhoria da

infra-estrutura viária paulista, formada pelos caminhos e estradas para os muares, bem

como a abertura de novos trechos, que redundaram na formação de novas localidades

(PETRONE, 1968, p. 187)12

.

Uma dessas estradas era a do Morro Azul a Campinas, que se iniciou em 1823 e

que teve à sua margem o nascimento do povoado próximo ao bebedouro do ribeirão

Tatu, em cuja margem direita havia o “Rancho da Limeira”, bastante procurado por

tropeiros e viajantes para o pousio nas marchas pelo interior paulista13

. No ano de 1826,

foi construída a capela de Nossa Senhora das Dores de Tatuibi, considerado o marco

inicial do povoamento de Limeira; em 1830, foi constituída a freguesia de Tatuibi –

com forte pressão no governo provincial exercida pelo Senador Vergueiro – pertencente

a vila de Constituição (Piracicaba); e, em 1842, foi constituída a vila da Limeira, a partir

do desmembramento de terras pertencentes à vila de Constituição (Piracicaba)

(BUSCH, 1967, p. 69).

Os primeiros habitantes da freguesia da Limeira eram originários de Piracicaba,

Campinas, Mogi-Mirim, Bragança, Jundiaí e Atibaia (BUSCH, 1967, p. 97-102). Em

meio a eles estava Joaquim Franco de Camargo, que iniciara sua trajetória econômica

como tropeiro na vila de Atibaia, tornara-se senhor de engenho em Mogi Mirim e teria

papel de destaque na formação da futura vila de Limeira, localidade em que Joaquim

conjugaria a ascensão econômica à inserção nos cargos militares e administrativos

municipais.

Joaquim, que teria chegado à Limeira em 1828, consta como morador da freguesia

no ano de 1835, sendo sua esposa Maria Lourença de Morais e agora com 12 filhos. Ele

era classificado como senhor de engenho e proprietário de 37 escravos que produziram

11

A viagem de Ouro Preto ao Rio de Janeiro, em um percurso de mais de 300 quilômetros, era feito em

mais de 30 dias, enquanto que de São Paulo às Gerais gastavam-se dois meses (GOULART, 1961, p. 38 e

p. 97 a 101). 12

Até 1799, no Oeste Paulista se contabilizavam 5 vilas. Mas, com o forte desenvolvimento da cultura

açucareira na região na primeira metade do século XIX, surgiram outras 9 vilas (MARCÍLIO, 2000, p.

144). 13

A limeira (planta) teria brotado em virtude de algumas sementes que foram deixadas no local por um

frade que acompanhava uma caravana que se dirigia aos sertões de Araraquara (BUSCH, 1967, p. 12).

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1.400 arrobas de açúcar, 50 canadas de aguardente, 100 arrobas de café, 700 alqueires

de milho, além de arroz e feijão. Estas produções lhe proporcionaram um rendimento de

2 contos de réis naquele ano (MP LIMEIRA, 1835).

Como importante produtor de açúcar e dono de escravaria14

, Joaquim se inseriu

no grupo dos proprietários que passaram a ter o mando político-econômico de Limeira,

na transição da freguesia à vila. Ele participou da comissão que demarcou as divisas de

Limeira com as vilas vizinhas. Em 1833, o nome de Joaquim Franco de Camargo consta

na lista dos Guardas Nacionais de Limeira15

. Em 1835, Joaquim foi nomeado curador

do inventário do capitão Luiz Manoel da Cunha Bastos, em cujas terras teria sido

erigida a capela de Nossa Senhora das Dores de Tatuibi16

. Ademais, entre 1842 e 1856,

Joaquim Franco de Camargo será o subdelegado de polícia de Limeira, sendo que em

1859, aparece como um dos potentados limeirenses que subscreveram capitais para a

construção do prédio que abrigaria a cadeia, o Fórum e a Câmara Municipal de Limeira,

localidade em que foi eleito vereador no ano de 1857 (BUSCH, 1967, p. 122 a 133, p.

170 e p. 208).

Tanto na aplicação da lei quanto no recolhimento de informações

políticas, os principais agentes dos presidentes de província eram os chefes

de polícia provinciais e seus delegados, também nomeados pelo governo

central. Os subdelegados e os inspetores de quarteirão – cada quarteirão tinha

vinte e cinco casas – levavam a autoridade do governo central, pelo menos

teoricamente, a cada pequena localidade. No entanto, com exceção dos chefes

de polícia, não recebiam salários do governo; sua renda pessoal derivava de

suas atividades normais, privadas; em resumo, no campo, os postos eram

14

A média de escravos na Província de São Paulo no ano de 1829 era de 31 escravos por engenho,

enquanto que a média do Oeste Paulista, que concentrava aproximadamente 80% dos engenhos de São

Paulo, era de 32 cativos por engenho. Dessa forma, entendemos que os 37 escravos de Joaquim Franco de

Camargo no de 1835 o colocavam no rol dos grandes proprietários paulistas (LUNA; KLEIN, 2010, p.

103). 15

Em de agosto de 1831 foi criada a Guarda Nacional que objetivava dotar os representantes da

oligarquia agrária dos meios de coerção e, ao mesmo tempo, frear uma possível união do exército com as

classes menos abastadas. Para tanto, os oficiais só seriam eleitos se tivessem uma renda de 200 mil réis

nas quatro maiores cidades brasileiras e 100 mil réis nos outros municípios. Entretanto, já em 1832, estes

valores foram elevados para 400 mil réis e 200 mil réis respectivamente. Tornar estes indivíduos oficiais

da Guarda significava imbuí-los de poder policialesco: patrulhar as ruas, proteger os edifícios públicos,

transportar prisioneiros e manter a ordem em geral. Em alguns casos, os membros da Guarda eram

chamados a participar do combate de conflitos fora de seus municípios, sob o comando do exército, que a

esta altura ficara reduzido a 6.000 mil homens através das medidas de Feijó. Dessa forma, a Regência

legara o poder local às forças agrário-militares que se traduziam, como no caso de São Paulo, em

senhores de engenho e cafeicultores que se tornaram oficiais da Guarda Nacional (BETHELL, 2001, p.

708-720). 16

O capitão Luiz Manoel da Cunha Bastos faleceu com uma riqueza que totalizou Rs. 38:396$720 e era

composta de 2 propriedades açucareiras com 68 escravos – o sítio da Lagoa Nova e o do Tatu, que em

1835 produziram 2.142 arrobas de açúcar – nota-se, no item Dívidas Passivas, que o capitão Cunha

Bastos tinha como um de seus 24 credores o próprio Alferes Franco (crédito de Rs. 210$700), além de

casas comerciais de Santos e da vila de São Paulo.

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ocupados, em sua maioria, por fazendeiros que gostavam de ocupar tais

posições para exercer mais autoridade, especialmente sobre os adversários

locais [...] Ao confiar a cidadãos comuns a execução de suas ordens, o

governo mantinha abertas as linhas de comunicação e reconhecia o poder e a

importância dos poderosos locais (BETHELL, 2001, p. 803-804).

O sucesso político era expressão da ascensão econômica e, ao mesmo tempo,

ampliava as possibilidades de manutenção e crescimento da riqueza17

. Nestas novas

localidades paulistas, neófitos proprietários souberam açambarcar os espaços políticos e

econômicos a fim reforçarem suas posições dominantes na seara local. Corrobora esta

hipótese a trajetória de Joaquim Franco de Camargo que, em 1854, já conhecido como

Alferes Franco18

, possuía 4 propriedades rurais: duas na vila paulista de Limeira e uma

vizinha vila de Rio Claro. Na última localidade, ele era dono da fazenda das Araras

(1.012,5 alqueires com estabelecimento de cana de açúcar e cafezais, além de 2 casas de

morada e pastagens) e do sítio Confim (com casas de morada e pastagens) (REGISTRO

TERRAS RIO CLARO, 1855). Já, na vila de Limeira, ele era proprietário da fazenda do

Morro Azul (área total de 2.025 alqueires com plantações de café, fábricas de beneficiar

café, engenho de açúcar, casas de morada e pastagens) e da fazenda Montevidéo (3.600

alqueires com plantação de café e administrada pelos seus genros José de Lacerda

Guimarães e Albino Alves Cardoso) (REGISTRO TERRAS LIMEIRA, 1855).

Ademais, a fazenda do Morro Azul, na vila de Limeira, abrigava uma das 23 colônias

paulistas de trabalhadores assalariados, a Colônia Morro Azul, de propriedade de

Joaquim Franco de Camargo, contando com indivíduos nacionais e estrangeiros19

.

No interregno entre o início e a metade do século XIX, a acumulação primitiva

dos Lacerda Franco, que se deu em atividades de cunho interno (aguardente, criação e

comércio de animais e cultura de mantimentos), foi transfigurada em propriedades

17

A ascensão nos quadros militares do Reino estava ligada à experiência militar obtida em campanhas

bélicas ou cargos menores, mas também à abastança de bens do indivíduo e, no caso da Metrópole, à

hereditariedade (COSTA, 2007, [s.n.]). 18

Segundo Taunay (1939, tomo VI, p. 53), na metade do século XIX, quando o Barão de Von Tschudi,

que esteve no Brasil entre 1857 e 1859, e depois entre 1860 e 1868, visitava a vila de Limeira, ele

conversou com o tão conhecido Alferes Franco, de prestigiosos apelidos naquela região do Oeste

Paulista. 19

Em 1859 havia 23 colônias de trabalhadores nacionais, franceses, alemães e portugueses na Província,

totalizando 2.614 indivíduos, sendo que sete delas em Limeira: a do Morro Azul de Joaquim Franco de

Camargo (115 trabalhadores que não têm descrição de nacionalidade); a da Lagoa Nova de Joaquim

Franco do Amaral (4 trabalhadores brasileiros e 4 portugueses); a de São Jeronymo e Santa Bárbara de

Francisco Antonio de Souza Queiroz (266 trabalhadores brasileiros, 349 alemães); a de Raphael Antonio

de Sampayo (9 trabalhadores portugueses); a de Lourenço Franco da Rocha (56 trabalhadores brasileiros,

18 portugueses e 24 franceses); a do Bom Retiro do capitão Joaquim da Silva Diniz (53 trabalhadores

alemães); e a Senador Vergueiro de Nicolau Pereira de Campos Vergueiro (783 trabalhadores alemães)

(SILVEIRA, 2007, p. 159).

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escravistas açucareiras. Esta mutação se deu através do deslocamento da família na

Província de São Paulo, deixando a área próxima à vila de São Paulo (capital) e

adentrando ao Quadrilátero do Açúcar, na região que seria conhecida por Oeste Paulista,

a principal produtora de açúcar no período. O açúcar representou a passagem de São

Paulo, anteriormente uma zona de abastecimento às outras províncias, sobretudo Minas

Gerais e Corte, para uma região voltada à agricultura de exportação e com elevado

número de escravos. O produto representou também a consolidação do senhor de

engenho como no topo da elite paulista da metade do século XIX.

Com o desenvolvimento da lavoura canavieira, há em São Paulo uma

modificação completa de valores econômicos e sociais. A agricultura, que

antes do ciclo do açúcar, não raro, era considerada degradante, deixa de sê-lo.

Ser proprietário de uma fazenda de cana, torna-se um fator importante para

distinguir um indivíduo, dando-lhe projeção considerável no cenário político,

econômico e social paulista. O ser senhor de engenho, como mais tarde, o ser

fazendeiro de café, eleva uma pessoa à mais alta classe, à classe dominante,

da qual dependem todas as outras e de cuja influência escapam apenas alguns

elementos, tais como os fazendeiros de gado (PETRONE, 1968, p. 129).

Para estes grandes proprietários, a mudança que estava em curso nas lavouras

paulistas, em que pese o custo do capital empatado preteritamente, haveria de ser um

dinamizador da riqueza até então acumulada. Se o café servirá para catapultar novos

indivíduos à elite paulista, será ainda mais útil para consolidar a posição de homens e

famílias que ajudaram a formar esta elite.

3 – Oeste Paulista (1847-1870): família e capitalização na economia cafeeira

A migração dos Lacerda Franco rumo às terras do Oeste Paulista se mostrava

exitosa ao final da primeira metade do XIX. Joaquim Franco de Camargo, que

principiara no tropeirismo nas cercanias da vila de São Paulo, convertera-se em senhor

de terras e escravos na vila de Limeira. Todavia, a manutenção e aumento da riqueza até

então amealhada dependia tinha na escolha dos cônjuges a se unirem aos herdeiros do

cabedal um elemento de vital importância.

A vivência em região mais interiorana – entre Limeira e Atibaia há uma distância

de aproximadamente 140 quilômetros – podia implicar em dificuldades na obtenção de

bons cônjuges que pudessem agregar conhecimentos econômicos e capitais à família

(BACELLAR, 1991, p. 55)20

. De outra parte, a endogamia exercia papel-chave na

20

A região de Limeira concentrava aproximadamente 15% da população paulista em 1854, enquanto na

região que continha as vilas de Campinas, São Paulo, Atibaia e Jundiaí, dentre outras, vivia quase 40%

dos paulistas (MILLIET, 1982, p. 21).

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seleção dos cônjuges na sociedade colonial paulista, pois era fundamental garantir que

os herdeiros só se unissem a pessoas do mesmo nível social, pois como afirma Campos

(2003, p. 152). “A escolha do cônjuge dentro do mesmo grupo deve ser vista como uma

manifestação do sistema social, buscando coerência entre as tensões que nele se

produziam”.

A fim de preencher os requisitos para um bom matrimônio na sociedade paulista

do século XIX, uma das soluções seria recorrer aos próprios parentes, afinal, estes

tinham suas vidas e habilidades conhecidas de antemão pelos futuros sogros e contavam

com o peso do pertencimento à família para avalizar a união. Mas, para atrair cônjuges

que se dispusessem a migrar rumo à fronteira era necessário que houvesse motivações

para tanto, que neste caso respondiam pelo nome de dote21

, instrumento matrimonial

que podia alavancar a vida do jovem casal, alocando-os em posição privilegiada na

sociedade paulista, uma vez tornando-os proprietário de terras, escravos e lavouras.

A aquisição da terra estava intimamente ligada ao funcionamento da

Frente Pioneira, que com seu avanço ia conquistando novas áreas para a

grande lavoura. Havia um ponderável deslocamento espacial dos cônjuges de

elite, que se moviam em função da oferta de terras nas mais diversas vilas do

Oeste. O deslocamento geográfico, a aquisição de terras nos novos núcleos

urbanos e a seleção do cônjuge são aspectos de toda uma estratégia de um

grupo social específico, que procurou cada vez mais concentrar terra, renda e

poder em suas mãos (BACELLAR, 1991, p. 59).

Foi justamente a união de interesses de ambos os lados que redundou, no dia 11

de dezembro de 1847, em um duplo matrimônio22

: os irmãos Bento de Lacerda

Guimarães e José de Lacerda Guimarães casaram-se com suas primas Manoela de

Cássia Franco de Camargo e Clara Miquelina Franco de Camargo, respectivamente,

filhas do alferes Joaquim Franco de Camargo – que por sua vez, era tio de seus novos

genros, pois a mãe deles era Maria Franco, irmã do Alferes Franco. Nestes matrimônios,

os dotes foram constituídos por propriedades agrícolas: Bento passou a controlar

fazenda das Araras (1.012,5 alqueires com estabelecimento de cana de açúcar e

21

Em que pese não haver uma regulamentação, o dote era geralmente composto por: escravos, terras,

mobílias, moeda corrente, ou seja, os pertences de valor das famílias de elite. Os grandes senhores, sem

maiores preocupações em dividir igualmente os valores cedidos no dote aos seus filhos, destacavam-se,

em alguns casos, pela cessão de propriedades inteiras no dote. Por outro lado, além da riqueza do

proprietário permanecer em família, este genro poderia administrar a nova propriedade, pois o grande

fazendeiro permanecia na propriedade original (BACELLAR, 1997, p. 125 a 146). 22

Segundo Bacellar (1991, p. 55) era comum que os dois casamentos fossem tratados como uma só

cerimônia, ocorrendo no mesmo dia e juntas, a fim de diminuir despesas e demonstrar melhor a união das

duas famílias.

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cafezais, além de 2 casas de morada e pastagens) na vila de Rio Claro; enquanto ao seu

irmão José coube a administração da fazenda Montevidéo (3.600 alqueires com

plantação de café) (CRESSONI, 2007, p. 45; MATTHIESEN, 2010, p. 25).

O ano de 1847 marca o pico da exportação de açúcar pelo Porto de Santos, com

597.551 arrobas em boa parte vindas do Oeste Paulista. Daquele ano em diante, o

movimento da economia paulista se ajustaria ao quadro nacional: o café, que liderava as

exportações brasileiras desde a década de 1830, manterá este posto até o final do século

XIX, tendo como piso na pauta de exportações brasileiras o índice de 45,5% entre 1861-

1870, e como teto representará 64,5% dos produtos saídos do Brasil entre 1891-1900

(SINGER, 2006, p. 387). No Porto de Santos, menos de dez anos após o auge

açucareiro, serão exportadas 773.892 arrobas de café em 1854-1855, frente a apenas

184.049 arrobas de açúcar no mesmo ano, levando a uma mudança: o quadrilátero do

açúcar se transfigurou no Oeste Paulista cafeeiro. Em São Paulo, a passagem das

lavouras açucareiras ao café na metade do XIX se deu com a expertise, a infraestrutura

viária e os capitais acumulados no cultivo da cana (PETRONE, 2010, p. 148-154).

A demanda mundial pelo café brasileiro era constante e crescente, sendo que no

ano de 1823, o país exportou 13,56 milhares de toneladas métricas, número que chegou

a 586,26 milhares de toneladas métricas exportadas em 1899 (SAMPER; FERNANDO,

2003, p. 432-433). Já na década de 1830, o Brasil alcançara o posto de maior produtor

mundial de café superando Cuba e Haiti (MARQUESE; TOMICH, 2009, p. 356). Até o

final da década de 1880, o Rio de Janeiro, sobretudo a região sul fluminense (Vale do

Paraíba) – em municípios como Vassouras, Resende e Valença – será a principal área

produtora de café no Brasil, sendo superada pela província de São Paulo somente no

início da década de 1890 (FRANCO, 1982, p. 11). O lado paulista do Vale do Paraíba

era a principal zona produtora de café da província na metade do século XIX,

respondendo por 77,46% da produção. Porém, em 1886, a produção do Vale do Paraíba

recuou para menos de 20% do café produzido em São Paulo, ao passo que das fazendas

do Oeste Paulista saiu quase 75% do café da província (MILLIET, 1982, p. 22).

Atuando naquela que viria a ser principal região produtora da maior província

cafeicultora brasileira, Bento e José de Lacerda Guimarães dariam um novo rumo à

condução dos negócios da família Lacerda Franco. O alferes Joaquim Franco de

Camargo se caracterizou por atuar de forma solitária em suas empreitadas, sendo grande

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senhor de engenho. Porém, os irmãos Bento e José se valerão de uma nova estratégia

para consolidar a posição na elite paulista: o associativismo e a capitalização familiar,

ou seja, formação de sociedades entre os membros da família Lacerda Franco contando,

para tanto, exclusivamente com o capital acumulado pela família. Este capital, no

momento em que algum familiar fenecia, era redistribuído entre os herdeiros na forma

de legítimas paternas ou maternas, possibilitando uma capitalização aos membros da

família Lacerda Franco que engendrava a formação de sociedades. Para algumas

famílias paulistas mais abastadas, como os Lacerda Franco, em um contexto de

incipiente sistema bancário em São Paulo23

, formar sociedades e empresas poderia

passar muito mais por uma questão de rearranjo da riqueza e associação de capitais

familiares, do que a busca de crédito institucional (HANLEY, 2005).

Entre 1850 e 1864, os irmãos Bento e José de Lacerda Guimarães receberam 4

legítimas referentes à morte dos seus pais, do sogro e da esposa de José, valores que

evoluíram com o passar do tempo.

Tabela 2: Membros da família Lacerda Franco que morreram entre 1850-

1864, suas relações de parentesco com os irmãos Bento e José de Lacerda

Guimarães e os valores (em mil réis) legados aos herdeiros.

Familiares ANO LOCAL MONTE

MOR

LEGÍTIMA Nº de

herdeiros

Terras e

escravos

ANTONIO DE

LACERDA

GUIMARÃES

(pai)

1850 Jundiaí

(SP)

34:138$436 3:131$843 5 1 propr. em

Jundiaí e

19 escravos

MARIA

FRANCO

(mãe)

1861 Jundiaí

(SP)

65:059$000 11:501$800 5 1 propr. em

Jundiaí e

22 escravos

JOAQUIM

FRANCO DE

CAMARGO

(sogro)

1861 Limeira

(SP)

990:447$327 27:000$000 18 5 propr. em

Limeira, 2

propr. em

Rio Claro e

182 escravos

CLARA

MIQUELINA

(esposa de José

de Lacerda

Guimarães)

1864 Limeira

(SP)

202:333$298 11:240$738 9 1 propr. em

Limeira, 1

propr. em

São Carlos

(SP) e 55

escravos Fonte: Inventário de Antonio de Lacerda Guimarães (JUNDIAÍ, 1853); Inventário de Dona Maria Franco

(JUNDIAÍ, 1861); (CRESSONI, 2007, p. 45; MATTHIESEN, 2010, p. 25; ALMEIDA, 1948, p. 21-22);

Inventário de Clara Miquelina de Jesus (1864) apud MALUF (2005, p. 158-159).

23

O sistema bancário paulista ganhou vulto a partir da década de 1880, sendo que ao final do período

havia em torno de 19 agências bancárias na província de São Paulo, um aumento comparado às 9

agências bancárias que havia na província em 1873 (SAES, 1986, p. 75-78).

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Como demonstra a tabela 2, o aporte de capital recebido pelos irmãos Bento e

José de Lacerda Guimarães, além dos demais herdeiros da família Lacerda Franco, no

espaço de menos de 15 anos foi substancial. Este montante era representado

prioritariamente por unidades agrícolas cafeicultoras e escravos, demonstrando que no

Oeste Paulista o plantio do café se iniciara na década de 1840 (DEAN, 1977, p. 45).

Sem considerar o efeito da inflação, somente entre 1861 e 1864, cada herdeiro recebeu

quase 50 contos de réis, valor estimado para a conversão de uma lavoura açucareira em

cafeicultora no Oeste Paulista24

. Dessa forma, o reinvestimento dos lucros obtidos com

a economia açucareira permitia aos Lacerda Franco da metade do século XIX adentrar

no mundo do café em posição privilegiada, pois estavam munidos do capital familiar.

Assim, em 1847, após casarem-se na vila de Limeira com as irmãs Manoela e

Clara – filhas do Alferes Franco – Bento e José de Lacerda Guimarães constituíram uma

sociedade agrícola Lacerda & Irmão, que contava com as terras de seus pais na

freguesia paulista de Belém de Jundiaí (fazenda Bocaina) e as terras legadas pelo sogro

na vila de Limeira (fazenda Montevidéo). A sociedade tinha como finalidade a

produção e venda de café, para tanto o sócio Bento entrou com 8 escravos, enquanto seu

irmão e sócio José entrou com outros 6, totalizando 14 cativos (CONTRATO

LACERDA & IRMÃO, 1855 apud ALMEIDA, 1948, p. 23-24)25

.

Em 17 de dezembro de 1860, a Lacerda & Irmão comprou uma parte das terras da

Sesmaria da Babilônia, pelo valor de 18 contos de réis. A fazenda era inicialmente

denominada Babilônia e situava-se no distrito de Belém do Descalvado, pertencente à

vila paulista de Rio Claro – posteriormente as terras pertenceriam à vila de São Carlos26

24

Dean (1977, p. 47) demonstra, em seu estudo sobre a lavoura canavieira e cafeeira no município de Rio

Claro durante o século XIX, que por volta de 1850, o custo total de conversão de uma fazenda do açúcar

para o café (100.000 pés de café) era de 50 contos de réis divididos em: terra necessária ao plantio de

100.000 cafeeiros (Rs. 4:350$000); custo de plantio e tratamento dos cafeeiros até a maturidade durante 4

anos (Rs. 35:450$000); terreiros de secagem e máquina de beneficiamento (Rs. 10:000$000); juros de

15% ao ano sobre o custo da terra e das melhorias. 25

A formação de sociedades agrícolas buscava ampliar o acesso ao crédito, melhorar a produtividade das

lavouras com ganhos de escala e ter maior volume de café em mãos para obter posição de vantagem no

momento da venda do produto (TOSI; FALEIROS; FONTANARI, 2011, p. 408). 26

Em 1857, São Carlos do Pinhal foi elevado a distrito, tempo em que a povoação era composta por

algumas pequenas casas ao redor da capela e seus moradores eram, em sua maior parte, herdeiros da

família Arruda Botelho, primeiros proprietários das terras da Sesmaria do Pinhal. Em 1865, o distrito foi

elevado à vila (TRUZZI; BASSANEZI, 2009, p. 197-212).

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Estas terras foram usadas por José de Lacerda Guimarães, junto de seu filho Antonio

Franco de Lacerda, para fundar a Fazenda Paraizo27

.

Em abril de 1865, a sociedade Lacerda & Irmão foi dissolvida. Na partilha social

determinou-se que uma parte das terras do sítio das Araras28

em que havia sido erigida a

capela de Nossa Senhora do Patrocínio, acrescida de outras partes do mesmo sítio, seria

doada para formalização da capela, o que culminaria com a formação da vila de Araras

em 24 de março de 1871, como desmembramento de terras da vila de Limeira29

.

Contudo, a formação de sociedades agrícolas por parte dos Lacerda Franco não

findou em 1865. Foi mantendo a predileção pelo capital familiar que, em 20 de julho de

1869, na cidade de Limeira (SP), constituiu-se a sociedade agrícola Antonio Franco de

Lacerda & Irmão, que tinha na direção Antonio Franco de Lacerda e como seu sócio o

irmão Joaquim Franco de Lacerda – ambos sendo filhos de José de Lacerda Guimarães.

Esta firma agrícola contava com as terras que os irmãos possuíam em igualdade na vila

de São Carlos, o sítio da Babilônia, futura fazenda Paraizo30

. Para compor a firma, o

sócio Joaquim entrou com um escravo e mais Rs.1:900$000, quantia que deveria depois

ser integralizada pelo sócio Antonio (LACERDA & IRMÃOS, 1869).

Em 29 de janeiro de 1874, a Lacerda & Irmão seria dissolvida para dar lugar uma

nova firma que repetiria a opção pela união familiar, denotando a importância do

27

Escritura de compra e venda que fazem Ricardo Rodrigues de Andrade, sua mulher Maria Antonia de

Andrade e Jose Ignácio da Costa Junior e sua mulher Anna Cândida de Andrade, aos compradores

Lacerda e Irmãos. Neste documento consta que as terras se situavam no distrito de Belém do Descalvado,

pertencente ao termo de Rio Claro em 1860. Entretanto, preferimos considerar as terras como

pertencentes à vila de São Carlos, pois assim se configuraria no futuro, como é até hoje

(http://fazendaparaizocentoecinquenta.blogspot.com/2009/08/historia-da-compra-da-fazenda.html) 28

Esta propriedade localizava-se na vila de Rio Claro, mas pela lei provincial n° 17, de 20 de abril de

1864, ela passou a pertencer à vila da Limeira (SILVA, 2011, p. 147). 29

Na formação da vila de Araras foi fundamental o papel exercido por Bento e José de Lacerda

Guimarães ao doarem parte de suas terras para a formação da localidade. Porém, uma vez constituída a

vila, esta preponderância se manteve e foi estendida à posição dominante que a família Lacerda Franco

teve na condução da política local, com vários de seus membros dominando uma Câmara Municipal que

contava em seus primeiros anos com figuras do peso de Martinho Prado Junior. Tamanha peso político-

econômico no município de Araras foi ratificado em 7 de maio de 1887, quando José de Lacerda

Guimarães recebeu o título de Barão de Arary, mesma data em que seu irmão Bento de Lacerda

Guimarães recebeu o título de Barão de Araras (SILVA, 2011, p. 149-159). 30

Quando se deu a partilha dos bens de Clara Miquelina de Jesus, esposa de José de Lacerda Guimarães,

portanto mãe dos irmãos Antonio e Joaquim Franco de Lacerda, José executou um ordenamento

geográfico de sua riqueza que dividiu sua parte da família Lacerda Franco em 2 vilas paulistas: Limeira –

posteriormente Araras – e São Carlos. José de Lacerda Guimarães legou aos seus 5 filhos – Antonio,

Candido, José, Joaquim e João – as terras do sítio Babilônia na vila de São Carlos. Para as 4 filhas –

Maria da Glória, Ana Miquelina, Maria das Dores e Rita – e a si próprio ele deixou as terras na futura vila

de Araras, agrupadas na fazenda Montevidéo (Inventário de Clara Miquelina de Jesus (1864) apud

MALUF, 1995, p.158-159).

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rearranjo da riqueza nos momentos de partilha e seu vínculo com a constituição de

empresas familiares A sociedade agrícola Lacerda & Irmãos, segundo o contrato

assinado na vila de Araras, foi composta pelos filhos de José de Lacerda Guimarães: os

irmãos Antonio Franco de Lacerda, José Franco de Lacerda e Candido Franco de

Lacerda. Antonio entrou para a sociedade com a parte que lhe cabia na extinta firma.

Por conseguinte, José e Candido Franco de Lacerda adentraram à nova sociedade com a

parte a que tinham direito nos bens da extinta firma, como cessionários de seu irmão

Joaquim Franco de Lacerda. Além disso, cada um compôs o fundo social da Lacerda &

Irmãos com os bens, valores e direitos que houveram por herança de sua finada mãe

Clara Miquelina, e da avó materna Maria Lourença de Moraes. A Lacerda & Irmãos

tinha sede na vila de São Carlos do Pinhal, tendo como propriedade social a fazenda

Paraizo, no bairro da Babilônia, sendo seu fundo social no montante de 80 contos de

réis (LACERDA & IRMÃOS, 1874).

A Lacerda & Irmãos teve seu capital social aumentado para 200 contos de réis

com um novo contrato firmado pelos mesmos sócios no dia 11 de abril de 1881, na

cidade paulista de Araras. Cândido, o único sócio residente na vila de São Carlos, sede

da firma agrícola (Fazenda Babilônia), era o gerente da sociedade31

(LACERDA &

IRMÃOS, 1881). Todavia, a formação de sociedades destinadas ao plantio e venda do

café englobava apenas a parte inicial da cadeia cafeeira. A riqueza dos Lacerda Franco,

ora denominada em propriedades cafeicultoras e sociedades agrícolas haveria de se

diversificar. Afinal, os lucros maiores se alojavam nos estratos superiores do complexo

econômico cafeeiro paulista, onde à produção se aglutinava o financiamento da lavoura

e dos próprios financiadores, além da elaboração de bens manufaturados, papéis

executados, respectivamente, comissários e exportadores, bancos e a indústria nascente.

4 – O Complexo Exportador Cafeeiro Paulista (1870-1897): a diversificação do

capital dos Lacerda Franco

A consolidação do Oeste Paulista como principal zona produtora de café passou

pela conjunção de diversos fatores: a disponibilidade de terras férteis no interior de São

Paulo, com boa topografia e de elevada produtividade inicial, o que possibilitava a

31

O Fundo social da Lacerda & Irmãos era constituído pela Fazenda Paraizo (dividida e demarcada

judicialmente), localizada em São Carlos do Pinhal, bairro da Babylonia, com 400 alqueires de terras,

145.000 pés de café, com 42 escravos de serviços, máquina de beneficiar café e engenho de serra movida

a vapor, pastos e mais benfeitorias, totalizando o valor de 200 contos de réis.

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expansão da fronteira do café de forma incessante32

; a implementação das ferrovias33

entre 1867 e 1875; a adoção do trabalho assalariado, em grande parte com a vinda do

imigrante europeu, como complemento à escassez e altos preços dos escravos após o

fim do tráfico em 1850; e os aprimoramentos produtivos como a máquina de

beneficiamento de café, que foram adquiridas no intuito de racionalizar a produção e

diminuir a dependência da mão-de-obra34

(CANO, 1981, p. 31; COSTA, 2007, p. 318).

A fazenda cafeicultora do Oeste Paulista era uma unidade agrícola que aglutinava

estes fatores: alta produtividade, transição entre trabalho escravo e livre, dotada de

máquinas de beneficiamento e atendida por uma rede transportes ferroviários, fatores

acrescidos da enorme oferta de novos e férteis terrenos, que possibilitava à produção

cafeeira sua manutenção e crescimento, sempre se expandindo pelas zonas pioneiras35

.

Por tudo isso, a produção cafeeira paulista dobrou entre 1876-1883 (CANO, 1981, p.

35).

Tamanha evolução do plantio cafeeiro em São Paulo demandou a superação de

vários obstáculos que, à medida que eram sobrepujados, tornavam-se oportunidades aos

indivíduos ligados à economia cafeeira. Financiamento da lavoura, abastecimento das

fazendas e de seus trabalhadores, escoamento da produção no mercado interno e

externo, serviços públicos nos centros urbanos que cresciam junto à expansão do café –

principalmente a cidade de São Paulo – foram atividades que nasceram atreladas aos

bons resultados da lavoura cafeeira, converteram-se em opções de investimento aos

lucros gerados pela produção e venda do café e, posteriormente, haveriam de se

32

Os primeiros indícios da crise do café nas lavouras do Vale do Paraíba foram vistos na década de 1860,

pois a expansão da produção apontara a escassez de terras virgens e as dificuldades na reposição de mão-

de-obra escrava, com os preços majorados após o fim do tráfico (STEIN, 1990, p. 72-81 e FRANCO,

1982, p. 12). 33

Anteriormente, o transporte do café era feito no lombo de mulas e por escravos – o que ocupava cerca

de um terço da escravaria das fazendas – e, por exemplo, os fretes do café saído de Rio Claro a Santos

representavam aproximadamente metade de seu preço de exportação (LUNA; KLEIN, 2010, p. 109).

Mas, em 1867, foi criada a companhia inglesa São Paulo Railway Co., ferrovia que interligava Jundiaí

(localidade à que afluía o café paulista) a Santos (o destino para a exportação). Entre 1870 e 1875 veio a

criação da companhia Paulista , Ituana, Sorocabana e Mogiana, nos aproximados 20% de queda nos

custos do café transportado pelas ferrovias (CANO, 1981, p. 34; SAES, 2002, p. 182). 34

“Em São Paulo, os fazendeiros do Centro e Oeste Paulista introduziram em suas fazendas máquinas de

beneficiar café e faziam experiências com o trabalho livre, empenhavam-se em estimular a imigração.

Martinho Prado, representando a opinião dos grupos mais avançados, afirmava na Câmara que um colono

valia três escravos” (COSTA, 2007, p. 326). 35

Quanto ao uso de terras, o café tinha três zonas: pioneira, madura e velha. Na zona velha situava-se o

café mais antigo e, em virtude disso, com queda de produtividade. Na madura estava o café que se

encontrava no auge produtivo. A zona pioneira constituía-se de terreno novo em preparo para a produção

do café (MONBEIG, 1984, p. 93).

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consolidar como importantes ramos da economia paulista. A partir da década de 1870,

as ferrovias, bancos, casas comissárias e exportadoras, comércio de importação e

exportação, empresas de serviços públicos e indústrias formaram o complexo econômico

cafeeiro paulista, que tinha no centro a produção cafeeira, que era o eixo que enfeixava

as atividades supracitadas (CANO, 1981, p. 17-22).

Os nexos econômicos entre as diversas atividades permitiam redução dos custos,

aumento da produtividade, ampliação do mercado e a diversificação dos investimentos

pela camada mais dinâmica dos cafeicultores, justamente os que não se prenderam ao

plantio e venda do próprio café, pois passaram a ter múltiplas fontes de lucratividade. O

representante do grande capital cafeeiro podia, ao mesmo tempo, ser fazendeiro de

café, dono de indústria, acionista de bancos e ferrovias, grande comerciante de

importação e exportação, comissário de café e outros gêneros, além de, em muitos

casos, ter uma participação na esfera política. A possibilidade de atuar em diferentes

etapas do complexo – da produção à exportação – e em suas difusas atividades – do

financiamento à indústria, do transporte aos serviços públicos – é que colocou os

representantes do grande capital cafeeiro no topo do complexo econômico paulista,

controlando a maior parte dos lucros, atravessando de forma resoluta as conjunturas do

mercado cafeeiro, ao contrário dos membros da lavoura, cujos ganhos vinham

exclusivamente de seus cafezais e que, a cada safra sabiam das altas cotações do café é

que dependia a manutenção de suas terras (SILVA, 1995, p. 54; PERISSINOTTO,

1994, p. 49).

Sem dúvida, no século XIX, quando se lança de modo espetacular na

imensa novidade industrial, o capitalismo parece especializar-se, e a história

geral tende a apresentar a indústria como o remate que afinal teria dado ao

‘capitalismo’ a sua verdadeira face. Será assim tão certo? Parece-me antes

que, depois do primeiro surto de mecanização, o capitalismo mais alto voltou

ao ecletismo, a uma espécie de indivisibilidade, como se a vantagem

característica de estar nesses pontos dominantes fosse precisamente, tanto

hoje como no tempo de Jacques Coeur, não ter de se cingir a uma única

opção. Ser eminentemente adaptável, portanto não-especializado

(BRAUDEL, 1996, p. 335).

4.1 – A casa comissária e exportadora J. F. de Lacerda & Cia.: os Lacerda Franco

no controle do comércio de café

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A economia cafeeira engendrou um circuito de produção e comercialização do

café cujos agentes eram os seguintes: fazendeiro, comissário, ensacador e exportador36

.

O contato mais estreito que o cafeicultor tinha era com o comissário, que se situava

como o intermediário entre o produtor (interior) e os exportadores (litoral), ou seja,

entre o início e o fim da cadeia econômica cafeeira37

. Esta relação de proximidade

levava a uma simbiose: o produtor tinha no comissário seu agente de venda do café e o

fornecedor de tudo o que a unidade agrícola necessitasse; o comissário, por sua vez,

tinha na venda do café sua substância, pois dela cobraria sua comissão e de seus valores

gerados é que viria a demanda dos produtores pelos víveres à unidade agrícola.

No Oeste Paulista, a maior inserção do comissário no mundo do fazendeiro se deu

a partir de 1850, quando, necessitando de aportes de capital para constituir novos

cafezais em terras virgens, os produtores se valeram dos recursos fornecidos pelos

comissários como complemento aos capitais próprios. “Então, o comissário passa de

mero agente, de intermediário entre fazendeiro e exportador, para ser também o grande

financiador do fazendeiro” (PEREIRA, 1980, p. 85). Em virtude das necessidades de

financiamento cada vez mais vultosas por parte do mundo agrícola foi que ganharam

força as casas comissárias, firmas que pela aglutinação de capitais de vários indivíduos,

com parentesco ou não, tinham a condição de irrigar a economia cafeeira com o crédito,

na forma de adiantamentos em dinheiro atrelados ao vindouro38

.

A relação entre as casas comissárias e os produtores era regulada pelo sistema de

contas correntes: o fazendeiro abria uma conta corrente na casa comissária em que no

lado dos débitos (deve) constavam todos os compromissos financeiros saldados pela

casa em seu nome: empréstimos junto a bancos, entrega de sacos para acondicionar o

36

A estrutura de produção e venda do café no século XIX contava com os seguintes agentes: 1) produtor;

2) comissário); 3) ensacador; e 4) exportador. De modo geral, o fazendeiro enviava seu café ao

comissário que cobrava uma comissão de 3% para vender o café aos ensacadores, ou de forma direta aos

exportadores. Os ensacadores compravam o café do comissário e o pagavam em 31 dias. Os exportadores

compravam o café já ensacado e pagava os ensacadores em 21 dias (CANO, 1981, p. 71). 37

No Código Comercial Brasileiro de 1850, do artigo 165 a 190 é descrita a atividade dos intermediários

de mercadorias em geral. O artigo 140 aponta: “Dá-se mandato mercantil, quando um comerciante confia

a outrem a gestão de um ou mais negócios mercantis, obrando o mandatário e obrigando-se em nome do

comitente”. E no artigo 165: “A comissão mercantil é o contrato do mandato relativo a negócios

mercantis, quando, pelo menos, o comissário é comerciante, sem que nesta gestão seja necessário declarar

ou mencionar o nome do comitente”. Por sua vez, no artigo 186: “Todo o comissário tem direito para

exigir do comitente uma comissão pelo seu trabalho, a qual, quando não tiver sido expressamente

convencionada, será regulada pelo uso comercial do lugar onde se tiver executado o mandato (Código

Comercial Brasileiro: lei nº 556, de 25/06/1850 apud Pereira (1980, p. 81). 38

“Na ausência de um sistema de crédito robusto e estruturado por políticas governamentais,

prevaleceram arranjos alternativos com vistas à expansão da produção cafeeira” (TOSI; FALEIROS;

FONTANARI, 2011, p. 409).

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café, alimentos e materiais para a fazenda, compra de ações de empresas, remessas de

dinheiro para ele ou terceiros. Já no lado do crédito (haver) constavam os valores a

receber em predominavam: os pagamentos da casa pelo café remetido, os dividendos

das ações de empresas e a quitação de empréstimos anteriormente concedidos

(CONTAS CORRENTES JLG, Santos, 1883-1893)39

.

As casas comissárias, em virtude da negociação do café com os exportadores,

situavam-se na cidade paulista de Santos, localidade em que atuavam os indivíduos

ligados à comercialização do café: comerciantes, industriais, capitalistas, banqueiros,

corretores e armadores, nacionais ou estrangeiros (DIÁRIO OFICIAL, 1874). Visando

regulamentar o comércio cafeeiro – e ocasionalmente, de outros gêneros como o

algodão – na praça santista, estes indivíduos se organizaram e fundaram, em 22 de

dezembro de 1870, a Associação Comercial de Santos (ACS). Dos 14 presidentes que a

ACS teve entre 1870 e 1920, predominaram os grandes comissários de café – só dois

presidentes não o foram – como Nicolau Vergueiro (1870-1878) (PEREIRA, 1980, p.

60-69).

Dentre seus os fundadores da ACS, no total de 106 pessoas, consta o nome de

Joaquim Franco de Lacerda, o filho de José de Lacerda Guimarães que montara uma

sociedade agrícola (Lacerda & Irmão) na década de 1860. No decênio seguinte, em

1877, Joaquim estará comandando os negócios da casa comissária J. F. de Lacerda &

Cia, empresa situada na cidade de Santos (Rua do Santo Antonio, número 50)40

.

A J. F. de Lacerda & Cia., a exemplo do ocorrido com as sociedades agrícolas, era

um empreendimento essencialmente familiar e de grande amplitude41

. Em 14 de julho

de 1884, a J. F. de Lacerda & Cia. tinha como sócios solidários42

Joaquim Franco de

39

Para Braudel (1996, p. 339) “No balanço de qualquer comerciante, ao lado do estoque de mercadorias,

há regularmente um ativo de créditos e um passivo de dívidas. A sabedoria está em salvaguardar o

equilíbrio, mas não em renunciar a essas formas de crédito que, afinal, representam uma massa enorme,

que multiplica por 4 ou 5 o volume das trocas. Todo o sistema mercantil depende disso. Cessando esse

crédito, o motor enguiçaria”. 40

Moraes (1988, p. 65) pontua que na década de 1870, a Vergueiro & Cia. e a J. F. de Lacerda & Cia.

eram as principais casas comissárias de Santos. Tomamos o ano de 1887 como o de início das atividades

da J. F. de Lacerda & Cia. baseado no seguinte documento: ESCRIPTURA DE DISTRACTO QUE

FAZEM MANOEL ALVES FERREIRA DA SILVA & CIA E J. F. DE LACERDA & COMPANHIA.

Livro de Notas do 1º tabelião de Santos, nº 15, fl. 95 apud PEREIRA (1980, p. 230 e 231). 41

Os únicos sócios que não eram pertencentes à família Lacerda Franco, os senhores Antonio Carlos da

Silva Telles e Paulo Pimenta, deixaram de compor a casa em 1881. 42

A sociedade em comandita simples era a caracterizada pela existência de dois tipos de sócios: os sócios

comanditários e os comanditados. Os sócios comanditários tem responsabilidade limitada em relação às

obrigações contraídas pela sociedade empresária, respondendo apenas pela integralização das quotas

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Lacerda e Antonio de Lacerda Franco (residentes em Santos), que eram os gerentes da

casa; e os sócios comanditários eram Joaquim Franco de Camargo Junior e João Soares

do Amaral (residentes na cidade paulista de Araras)43

. O capital social da firma se

elevara para 600 contos de réis, sendo que 200 contos de réis deveriam vir de cada sócio

solidário, 140 contos de réis de Joaquim Franco de Camargo Junior e os 60 contos de

réis restantes do sócio João Soares do Amaral. Dos lucros apurados ao final de cada

exercício, que se dava em 30 de junho de cada ano, dez por cento seria retido para o

fundo de reserva e o restante dividido da seguinte forma: um terço para cada sócio

solidário e um terço para os dois sócios comanditários, de acordo com os respectivos

capitais. Cada sócio pode sacar seu valor referente aos lucros ou creditar em sua conta

corrente na casa comissária, com juros de 6% ao ano. Ademais, O sócio Antonio de

Lacerda Franco, como gerente da casa, recebia a quantia de 15 contos pela função

executada, sendo que apenas ele, e Joaquim Franco de Lacerda, sócios solidários,

podiam fazer uso da firma social, mas somente em negócios pertinentes à casa

(CONTRATO SOCIAL J. F. de LACERDA & Cia., Rio de Janeiro, 1884).

Segundo o contrato, a finalidade da casa era o comércio de comissões em geral,

compra e venda de café nas praças de Santos e Rio de Janeiro e exportação para o

exterior por conta própria ou de terceiros. Como demonstra o contrato, a J. F. de

Lacerda & Cia. expandira seu raio de ação, com uma filial na capital do Império44

e a

inserção na exportação do café, seara controlada em grande medida pelas casas

estrangeiras que atuavam na cidade de Santos desde a metade do século XIX

(FRANCO, 1980, p. 126).

subscritas e não contribuindo de nenhuma outra forma para o funcionamento da empresa, ficando alheio,

inclusive, da administração da mesma. Já os sócios comanditados/solidários contribuem com capital e

trabalho, além de serem responsáveis pela administração da empresa. Sua responsabilidade perante

terceiros é ilimitada, devendo saldar as obrigações contraídas pela sociedade. A firma ou razão social da

sociedade somente pode conter nomes de sócios comanditados. 43

O padre Joaquim Franco de Camargo Junior era filho de Joaquim Franco de Camargo, portanto, tio dos

sócios Antonio de Lacerda Franco e Joaquim Franco de Lacerda, constando seu nome como fazendeiro na

lista dos habitantes mais ricos do município de Araras em 1876. Por sua vez, João Soares do Amaral

também era fazendeiro e listado entre os cidadãos ararenses mais abastados. Ele entrara para a família

Lacerda Franco através do casamento com Maria da Glória Lacerda, filha de José de Lacerda Guimarães

e Clara Miquelina. 44

Na capital do Império, a J. F. de Lacerda & Cia. situava-se na rua da Alfândega, nº 15 (ANUÁRIO

LAEMMERT, 1889, p. 767). Segundo Moraes (1988, p. 45) “[...] era necessário, por motivo de técnica

financeira, ter uma representação própria na capital do país em vista da crescente influência da política

sobre o comércio. Além disso [...] era preciso fechar as cambiais para importação e exportação naquela

cidade”.

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Em 14 de junho de 1884 foi constituída a Lacerda & Cia. tendo Joaquim Franco

de Lacerda e seu primo Antonio de Lacerda Franco como sócios solidários, e José de

Lacerda Guimarães, que era pai do primeiro sócio e tio do segundo, na condição de

sócio comanditário. A sede da firma era a cidade portuária francesa de Le Havre,

localização que se justificava pelo fato da França ser o principal destino do café saído

de Santos45

, e a cidade possuir uma Bolsa do Café46

na década de 1880. A Lacerda &

Cia. constituiu-se com um capital social de um milhão de francos, cabendo a cada sócio

solidário a integralização de 300 mil francos e, para o sócio comanditário, a quantia de

400 mil francos. A gerência da casa coube novamente aos sócios Joaquim e Antonio,

que podiam fazer uso da firma social. Na divisão dos lucros, cada sócio solidário ficava

com um terço e restava um terço para o sócio comanditário, sendo que no final de cada

balanço anual, o valor referente aos lucros podia ser sacado ou creditado em conta

corrente na casa com juros de 6% ao ano.

A J. F. de Lacerda & Cia. comandava as operações compra (Oeste Paulista) e

venda (Santos) do café no Brasil e, através da Lacerda & Cia., sua filial francesa, passou

a fazer parte do circuito de exportação da rubiácea, podendo assim estar na ponta final

da cadeia de comercialização do café, onde se localizavam as maiores cotações do

produto e, por conseguinte, os maiores lucros. Aliás, agregar a função de casa

exportadora de café era tarefa das mais complicadas, pois implicava em uma maior

escala e controle dos negócios, necessários para articular as operações comerciais a

longas distâncias, e maior acesso a fontes de financiamento para adquirir maior volume

de café no Brasil a fim de ser exportado e armazenado com vistas a vendas futuras,

quando as cotações do produto fossem ascendentes47

. Em virtude disso, a formação de

sete novos bancos na Província de São Paulo, totalizando dez bancos comerciais, foi

fundamental para a expansão das atividades da casa comissária e exportadora dos

45

Do café exportado por Santos no segundo semestre de 1886, para a França seguiram 328.779 arrobas,

vindo logo atrás a Alemanha com 314.163 arrobas e em terceiro os Estados Unidos com 231.913 arrobas

(RELATÓRIO ACS, 1886, p. 56). 46

Segundo Moraes (1988, p. 66) “Agora os negociantes podiam cobrir-se contra suas compras, vendendo

em parte ou no total no mercado de termo, contra contratos de embarques de café feitos em ultramar,

evitando, assim grandes riscos com oscilações dos preços. O negócio tinha assim a grande vantagem de

poder vender a qualquer tempo, conforme sua opinião sobre o próximo futuro do mercado, os cafés que

chegavam entrementes, total ou parcialmente, na praça ou no interior, e de liquidar os contratos no termo

correspondente”. 47

Segundo Cano (1981, p. 70-71) “Eram poucos os fazendeiros que também exerciam as demais

atividades, e a maior ocorrência de casos em que ele exercia mais de uma, se limitava até o serviço de

comissariar os negócios cafeeiros, dado que o capital externo praticamente controlava a exportação de

café”.

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Lacerda Franco, pois ampliou as fontes de crédito institucional que, ao lado do capital

familiar, eram a base financeira que permitia o funcionamento da J. F. de Lacerda &

Cia48

. Sem esse aporte do capital bancário dificilmente a J. F. de Lacerda & Cia teria

alcançado o topo da exportação de café em Santos, concorrendo com a esmagadora

maioria de casas estrangeiras, que contavam com acesso ao crédito de suas matrizes e

bancos na Europa e Estados Unidos49

.

Tabela 3: Exportadores de café pelo Porto de Santos durante o ano financeiro

1885-1886 – valores do café em sacas de 60 kg

CASA EXPORTADORA SACAS CAFÉ

1 - J. F. de Lacerda & Cia. 225.468

2 - Zerrener Bülow & C. 204.395

3 - Holworthy &Ellis 119.983

4 - Hard Hand & C. 118.526

5 - John Bradshaw & C. 114.027

6 - Jonh Ford & C. 100.787

7 - Felix Sawen 91.900

8 - Arbuckle Brothers 77.473

9 - A. Trommel & C. 76.853

10 - Berla Cotrim & C. 75.268

11 - Augusto Leuba & C. 73.191

12 - Theodor Wille & C. 71.710

TOTAL 1.657.176

Fonte: Relatório ACS (1886, Anexo 13).

4.2 – Lacerda, Camargo & Cia.: o grande capital cafeeiro no nascimento da

indústria paulista

48

Os bancos domésticos criados foram: Banco Comercial (1886), Banco da Lavoura (1886), Banco

Popular (1888) e Banco de São Paulo (1889). Os bancos estrangeiros foram: London and Brazilian Bank

Ltd. fundado em Santos (1881), English Bank of Rio de Janeiro-São Paulo (1882) e Brasilianische Bank

für Deutschland fundado em São Paulo (1888). Além destes, já existia o Banco do Brasil (1856), o

English Bank of Rio de Janeiro (1870) e o Banco Mercantil de Santos (1872) (HANLEY, 2005, p. 48). 49

Um exemplo da atuação de uma casa exportadora estrangeira no Brasil é o da alemã Theodor Wille &

Cia., cujo capital vinha da matriz em Hamburgo e das fortes ligações financeiras com o Brazilianische

Bank für Deutschland, também daquela cidade. Além disso, Theodor Wille era acionista do Banco Anglo-

Alemão e do London & Hanseatic Bank. Na década de 1880, a casa exportadora Theodor Wille & Cia.

tinha representações na Áustria, Itália, cobrindo pouco tempo depois os países mediterrânicos e o Egito

(MORAES, 1988, p. 57-82).

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A conjuntura do mercado cafeeiro na década de 1880 foi extremamente favorável,

pois este seria o único decênio, entre 1856 e 1900, em que a importação mundial de café

(demanda) superaria a produção e exportação (oferta) (SAMPER; FERNANDO, 2003,

p. 417-419). Os preços do café no mercado internacional expressavam o aumento no

volume da demanda: em 1880, o preço do café importado nos Estados Unidos era de

12,5 centavos de dólar por libra-peso, cotação que subiu para 20 centavos de dólar por

libra-peso no ano de 1891, em uma tendência de alta que começou em 1886 (DELFIM

NETTO, 2009, p. 277-278).

A grande acumulação no centro do complexo econômico cafeeiro, produção e

comércio do café, permitiu ao capital empregado na atividade-eixo desdobrar-se em

capital industrial, a fim de dar vazão aos lucros do café e diversificar as fontes de

investimento a partir da década de 1880 (SUZIGAN, 2000, p. 86; MELLO, 2009, p. 83,

CANO, 1981, p. 129). O nascimento da indústria paulista neste decênio se fez com a

participação do grande capital cafeeiro, pois o mesmo indivíduo que tinha a fazenda, a

casa comissária, o banco, participava da diretoria de empresas (ferrovias, serviços de

iluminação, água e esgoto), podia ser encontrado como industrial, demonstrando que

dentro do capital cafeeiro conviviam difusas funções do mesmo capital: capital agrário,

capital industrial, capital bancário e capital comercial, funções que eram diferentes, mas

que podiam ser exercidas pela mesma pessoa, o que caracterizava os membros do

grande capital cafeeiro, com sua múltiplas atividades e fontes de renda (SILVA, 1995,

p. 54).

O móbil da atuação dos fazendeiros em atividades industriais era a possibilidade

de auferir lucros com o capital gerado na lavoura e comercialização do café50

. A

constituição a Arbenz & Cia., em 5 de fevereiro de 1884, é exemplo significativo da

atuação industrial dos fazendeiros, pertencentes ao grande capital cafeeiro. A firma era

uma fundição, mas que também executava a função de casa importadora, que foi

formada pelo suíço João Arbenz (sócio solidário), que possuía uma caldeiraria, e pelo

padre Joaquim Franco de Camargo Junior (sócio comanditário), congregando as duas

raízes do empresariado paulista: a expertise industrial do estrangeiro e o capital nacional

50

Segundo uma demonstração elaborada por Cano (1981, p. 138), um importador de determinado bem

industrial consumido no mercado brasileiro tinha uma margem de lucro, em relação aos custos totais, de

11%. Entretanto, à medida que parte do produto passa a ser elaborada internamente, sendo importadas

apenas algumas peças ou matérias-primas, a lucratividade chegaria a 31,6%.

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vindo dos negócios cafeeiros (DEAN, 1971)51

. A empresa, situada na cidade de São

Paulo, na Freguesia de Santa Ifigênia, foi formada com um capital social de 40 contos

de réis, sendo que a parte de Joaquim foi dada em dinheiro, enquanto o caldeireiro suíço

entrou com o maquinário e as mercadorias que possuía em sua fundição, além de dois

terrenos na capital. A finalidade era: o comércio de fabrico e importação de máquinas,

aparelhos, instrumentos e materiais para todas as indústrias e para qualquer outro ramo

de negócio que convier Ademais, João Arbenz recebia três contos de réis ao ano pela

gerência da firma, sendo que os lucros eram divididos de forma equânime pelos sócios

(CONTRATO ARBENZ & Cia., São Paulo, 05/02/1884).

Em 1886, o suíço João Arbenz deixou a sociedade52

. No ano seguinte, a firma

mudaria sua razão social para Lacerda, Camargo & Cia., composta agora

exclusivamente por membros da família Lacerda Franco: como sócios solidários

Joaquim Franco de Camargo Junior e seu sobrinho Candido Franco de Lacerda, e como

sócio comanditário José de Lacerda Guimarães (cunhado do primeiro e pai do segundo).

Os sócios solidários respondiam pela gerência da firma que sutilmente mudara sua

atuação, pois, como exposto no contrato de 11 de junho de 1887, a finalidade era: o

comércio de importação, exportação e fabrico de máquinas, aparelhos, instrumentos e

materiais para todas as indústrias e para qualquer outro ramo de negócio que convier.

Doravante, a fabricação própria das máquinas a serem vendidas – peças de reposição às

ferrovias, máquinas agrícolas às fazendas, equipamentos às obras públicas – era uma

função posterior à importação, e exportação, dos bens de capital. Para a importação das

máquinas a serem comercializadas no mercado brasileiro, a firma, que originalmente

tinha um capital social de 40 contos de réis, aumentou seu capital para 500 contos de

réis, cabendo 200 contos a cada sócio solidário e 100 contos ao sócio comanditário

(CONTRATO LACERDA, CAMARGO & Cia., São Paulo, 11/06/1887).

O encadeamento das atividades empreendidas pela família Lacerda Franco pode

explicar o fato da Lacerda, Camargo & Cia. não ter se atrelado à fabricação de

máquinas, unindo-a à importação. Na verdade, havia uma complementaridade entre a

51

Em recente estudo sobre a origem do empresariado paulista, Marson (2012, p. 54) afirma que “Apesar

de serem raras as empresas da indústria mecânica que tiveram ligação direta com os cafeicultores, o

capital desses últimos foi importante para a expansão da indústria de máquinas e equipamentos,

principalmente após 1891, com as transformações de algumas empresas pertencentes a imigrantes em

sociedade anônima, como a Mac Hardy e a Arens”. 52

O suíço João Arbenz recebeu uma indenização no valor de Rs. 16:179$240, mas que seria paga de

forma integral apenas se ele finalizasse as encomendas de artigos e cobre que a firma recebera

(DESISTÊNCIA JOÃO ARBENZ, São Paulo, 18/09/1886).

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fabricação e a importação, pois as matérias-primas vinham em grande parte do exterior,

bem como os bens de capital (maquinário mais complexo) que eram instalados nas

fundições paulistas (MARSON, 2012, p. 25)53

. Em virtude de Joaquim Franco de

Camargo Junior e José de Lacerda Guimarães também participarem como sócios da J.

F. de Lacerda & Cia., casa que exportava e importava mercadorias com sua filial na

Europa, as facilidades para a fundição dos Lacerda Franco se tornar uma casa

importadora de máquinas e equipamentos industriais eram maiores. No balanço

patrimonial da Lacerda, Camargo & Cia. para o ano de 1887, no lado do passivo consta

a conta garantida de Robey, C. (Londres), firma situada na capital inglesa e que se

destinava à produção de vidro para obras que se mantém até hoje (BALANÇO

LACERDA, CAMARGO & Cia., São Paulo, 31 dez. 1887)54

.

No início da década de 1890, o setor de máquinas, oficinas mecânicas e fundições

paulistas era dominado pelas grandes casas de importação, sociedades por ações criadas

por imigrantes comerciantes que se incumbiam da comercialização, distribuição e

financiamento das máquinas importadas (MARSON, 2012, p. 78). Um destes

imigrantes era o italiano Alexandre Siciliano, que em 1890 criou a Companhia

Mecânica e Importadora de São Paulo, empresa dividida em fundição, seção de

máquinas, serraria, carpintaria e olaria. Elaborava vagões às ferrovias, máquinas de

beneficiar café e diversas obras de engenharia civil. A empresa importava equipamento

mecânico e materiais de construção, inclusive locomotivas, automóveis, geradores,

trilhos para ferrovias e cimento (DEAN, 1971, p. 82-83). Entre os acionistas da firma

constavam membros da família Silva Prado, Sousa Queiroz, e figuras como Elias

53

Entre 1882-1887, das mercadorias importadas de forma direta através de Porto de Santos, a principal

rubrica foi ferro, aço em vergas e lâminas, cuja importação alcançou Rs. 7.917:581$119. Estes insumos

tinham como destino as oficinas e fundições paulistas, dentre elas: Fábrica de Ferro de São João de

Ypanema (Sorocaba); as das ferrovias São Paulo Railway (São Paulo), Cia. São Paulo e Rio de Janeiro

(São Paulo), da Cia. Paulista (Jundiaí), da Cia. Mogiana (Campinas); e as oficinas particulares da

Lacerda, Camargo & Cia. (São Paulo), Lidgerwood & Cia. (Campinas), McHardy & Cia. (Campinas),

Arens & Irmãos (Campinas), Viúva Faber & Filhos (Campinas) e Adolph Sidow (São Paulo)

(RELATÓRIO SÃO PAULO, 1887, p. 132, 261-262). 54

ROBEY & Co.: Cakebread Robey & Co Ltd, do Stoke Newington, uma empresa formada para o

fornecimento de materiais para construção, que foi fundada em 1882 por George H. Cakebread e E.

Arthur Robey. Por várias décadas, Cakebread Robey & Co foi relativamente bem conhecida por seus

produtos de vidro. Muitos de seus vidros, gravados ou em relevo, e espelhos, bem como seus vitrais,

ainda podem ser encontrados em toda Inglaterra por bares, hotéis e igrejas. ( http://www.glassmaking-in-

london.co.uk/WorkingPremadeGlass).

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Antonio Pacheco Chaves e Carlos Paes de Barros, elementos ligados às empresas

ferroviárias (SAES, 1986a, p. 108)55

.

A firma de Siciliano adquiriu a Lacerda, Camargo & Cia. em 31 de dezembro de

1892, pelo valor de 1.100 contos de réis. A oferta que induziu os membros da família

Lacerda Franco à venda de sua firma industrial foi tentadora, afinal, os ativos que da

firma negociada somavam Rs.: 491:567$240: terrenos na cidade de São Paulo que se

espalhavam entre o bairro de Santa Ifigenia (Rua do Triunfo) e o Brás, fábrica,

fundição, armazém, casas, máquinas, armação das oficinas, utensílios do armazém,

utensílios e móveis das oficinas, modelos de madeira para fundição e caixas de ferro

(LIQUIDAÇÃO Lacerda, Camargo & Cia, São Paulo, 31/01/1892).

4.3 – Banco União de São Paulo (1890): os Lacerda Franco no controle do

financiamento

Novos bancos surgiram em São Paulo no início da República em virtude da

legislação bancária de janeiro de 1890. Estas reformas ampliaram o mercado creditício e

facilitaram a formação de sociedades anônimas, ao estabelecer a responsabilidade

limitada para os acionistas das empresas e a permissão aos bancos de emissão, o que

antes era facultado somente ao Banco do Brasil (MARCONDES; HANLEY, 2010, p.

111-112)56

. Em 1892, no Estado de São Paulo havia 24 bancos, sendo 20 deles criados

entre 1890 e 1892 (HANLEY, 2005, p. 155).

Em 31 de janeiro de 1890, Antonio de Lacerda Franco (sócio na casa comissária e

exportadora J. F. de Lacerda & Cia.57

) e João Baptista de Mello Oliveira (participava da

Companhia Paulista, Companhia Carris de Ferro de São Paulo e do Banco do Comércio

55

A Cia. Mecânica e Importadora de São Paulo era a maior firma de bens de capital do Estado de São

Paulo em 1907 (MARSON, 2012, p. 59). 56

Os Decretos nº 164 e 165, de 17 de janeiro de 1890, estimularam as sociedades anônimas com a

possibilidade negociar suas ações apenas com a integralização de 10% do capital subscrito pelos

incorporadores. Esta medida foi revista em outubro do mesmo ano, já sob efeito da onda especulativa que

começava a assolar a praça financeira do Rio de Janeiro, elevando a quota mínima de capital subscrito

para 40%. Entretanto, a especulação financeira não foi detida e o ano de 1892 marcou o auge do

Encilhamento (TANNURI, 1981, p. 65). 57

Os negócios comerciais de Antonio de Lacerda Franco a frente da J. F. de Lacerda & Cia. foram de

suma importância à construção de uma rede de captação e concessão de crédito de que se valeu para

formar o capital de sua casa bancária, uma vez que conhecia quem necessitava de empréstimos e, ao

mesmo tempo, os detentores de riqueza dispostos a adentrar em um recém-criado banco que rapidamente

se tornou o maior dentre as instituições bancárias criadas em São Paulo no início da República.

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e Indústria de São Paulo)58

criaram o Banco União de São Paulo, que receberia em abril

a autorização governamental para seu funcionamento59

. O banco União de São Paulo foi

o único banco universal com permissão para emitir notas bancárias em São Paulo60

.

Sua natureza de banco universal lhe permitia realizar: atividades de crédito comercial,

como por exemplo, a provisão de empréstimos de curto prazo, descontos e câmbio; as

atividades de crédito agrícola e a hipotecária, como a concessão de financiamentos de

longo prazo, garantidos por propriedades imobiliárias rurais ou urbanas, e

adiantamentos contra colheitas futuras; crédito industrial para a construção de prédios,

ferrovias, docas, melhorias portuárias, comunicações e atividades administrativas, como

a propriedade e a operação de interesses industriais (MARCONDES; HANLEY, 2010,

p. 112-113)61

.

Com suas seções comercial, hipotecária, industrial e construtora, o banco União

de São Paulo tinha sua sede na capital do Estado à Rua 15 de Novembro, número 37.

Possuía também uma caixa filial em Curitiba; agências nas cidades paulistas de Santos,

Campinas e Rio Claro; e correspondentes no Rio de Janeiro (que era coincidentemente

era a casa comissária e exportadora J. F. de Lacerda & Cia.), no Sul (Banco Emissor do

Sul e suas filiais), no interior de São Paulo (Sorocaba, Itatiba, São João da Boa Vista,

Lorena, Espírito Santo do Pinhal e Jaboticabal). Emitia saques, cartas de crédito, etc.,

sobre as agências e correspondências (SÃO PAULO, 1891, p. 206).

O banco União era uma sociedade por ações presidida por Antonio de Lacerda

Franco (senador estadual em 1892 e que chegou ao senado federal, no período entre

58

Os pais de João Baptista de Mello Oliveira foram: o coronel José Estanislau de Oliveira, nascido em

São Paulo em 1803 e falecido em Rio Claro em 1884, com 81 anos, e Elisa de Melo Franco, nascida em

Goenttingen, Alemanha, em 1806 e falecida em Rio Claro em 1891, com 85 anos. Seus pais foram os

primeiros Barões de Araraquara e segundos Viscondes de Rio Claro

(http://www.arruda.botelho.nom.br/txtAscendenciaCondessa.htm). Os sobrinhos do coronel João Baptista

de Mello Oliveira – Elisa e Justiniano – eram casados um dos filhos do Barão de Arary e uma de suas

sobrinhas – Cândido e Cândida. 59

As informações adiante sobre o Banco União de São Paulo vêm de duas fontes: (GALLAS; GALLAS,

2008, p. 257-258) e (HANLEY, 2005, p. 130-155). 60

A atuação do banco União de São Paulo como casa bancária emissora não se prolongou. O banco foi

fundado com uma capitalização máxima de 60 mil contos de réis e com direito de emitir até 24 mil contos

de réis. Porém, quando estoura a crise do Encilhamento, entre 1890-1892, o União de São Paulo só

emitira 10 mil contos de réis em notas próprias que chegaram a circular nacionalmente. Com o

Encilhamento e a alta da inflação e da especulação financeira, houve boatos sobre a pouca receptividade

do Governo Federal em relação às notas vindas dos bancos emissores. Até que, em 1893, foi revogada a

prerrogativa dos bancos emissores (HANLEY, 2005). 61

Outros dois bancos universais foram criados em São Paulo: o Banco de Santos e o Banco de Crédito

Real, entretanto, o União de São Paulo foi maior dentre eles. Sua diferença de atuação em relação aos

bancos comerciais estava no foco que das atividades empreendidas pelas casas bancárias comerciais: o

mercado de crédito de curto prazo (MARCONDES; HANLEY, 2010, p. 105).

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1924 e 1930; membro da comissão executiva do PRP entre 1901-1906 e 1914-1927)62

e

outros membros do grande capital cafeeiro que, além robustos economicamente, tinham

grande influência política no Partido Republicano Paulista (PRP), evidenciado pelos

nomes que foram eleitos para a primeira diretoria do banco em 4 de maio de 1890: João

Baptista de Mello Oliveira (um dos fundadores do PRP e senador estadual entre 1892-

1903); Joaquim Lopes Chaves (senador estadual em 1894 e 1901 e cunhado de Américo

Brasiliense, que foi o primeiro presidente do Estado de São Paulo); Antonio Paes de

Barros (senador estadual em 1903, filho do Barão de Piracicaba e sobrinho do

brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar); Bento Quirino dos Santos (vereador por São Paulo

e presidente da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro); João Tobias de Aguiar e

Castro (senador estadual em 1892, filho da Marquesa de Santos e do brigadeiro Rafael

Tobias de Aguiar); e Vitoriano Gonçalves Camilo. O peso político-econômico dos

participantes de seus integrantes fez com que o União de São Paulo aparecesse como o

detentor do maior ativo, com 112.000 contos de réis, entre todos os bancos paulistas em

1892 (HANLEY, 2005, p. 155).

O União de São Paulo era o único banco com uma atuante carteira industrial, que

absorvia grande parte de seus investimentos e que cresceu com o passar do tempo, tendo

o banco abandonado a intermediação financeira em 1906 e se fixado em seu portfólio

industrial (HANLEY, 2005, p. 151)63

.

Em 1890, o banco União de São Paulo adquiriu a fazenda de São Francisco, cujas

terras ficavam próximas à cidade de Sorocaba e se caracterizavam pela existência de

62

“Dentro do PRP, as disputas entre as facções eram em grande parte neutralizadas pela continuidade

assegurada pela comissão executiva do partido, órgão intermediário entre o governador e os coronéis. A

autoridade da comissão derivava do poder dos chefes do partido (ou de seus representantes) que dela

faziam parte. Através dos chefes, a comissão também representava os diferentes interesses regionais

dentro do estado, provendo a intermediação necessária na distribuição de empregos e recursos destinados

a obras públicas. Além do mais, legitimava a transferência de poder das mãos de um governador para o

seguinte. Pelo menos durante os primeiros anos da República, podia também “interceder” junto à câmara

estadual em defesa de políticas específicas, além de, em comum acordo com o governador, proceder à

indicação dos nomes para o preenchimento de cargos estaduais e federais. Na década de 1890, embora de

modo informal, influiu muito no governo do estado” (LOVE, 1982, p. 163).

63

Quando de sua criação o banco adquiriu, logo em abril de 1890, a Companhia Melhoramentos de São

Paulo, empresa constituída por Antonio Paes de Barros (diretor do banco União), José Vicente de

Azevedo, o coronel João Baptista de Mello Oliveira (um dos fundadores e diretor do banco União) e

Francisco de Paula Rantz. A firma era presidida por José Vieira de Carvalho, sendo que ela negociava e

financiava terrenos e casas na cidade de São Paulo e vizinhança, através de hipotecas e empréstimos em

que cobrava comissões/corretagem sobre os negócios, nos moldes de uma imobiliária. Ao absorver a

Melhoramentos, o banco União de São Paulo, além da capacidade emissora de cédulas, passou a operar

com carteiras de empréstimos, descontos e câmbios, hipotecas e penhores agrícolas, financiamento de

máquinas, construção de edifícios, compra, parcelamento e venda de terras, colonização de grandes áreas,

levantamentos topográficos e abertura de estradas.

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uma cachoeira conhecida pelos indígenas como Boturantim, levando a futura povoação

a ser denominada como Votorantim64

. Ainda em 1890, o banco União tratou de

viabilizar o fornecimento de energia elétrica ao construir as barragens da corredeira do

Rio Sorocaba e formar a usina que, a partir de 1892, passou a alimentar a recém-criada

Fábrica de Chitas, unidade industrial têxtil em parceira com ingleses, uma vez que

grande parte da matéria-prima era importada.

A frente dos projetos industriais do banco União de São Paulo estavam renomados

arquitetos do final do século XIX, como o francês Victor Dubugras e o alemão

Maximiliano Emilio Hehl, chefiados pelo campineiro Francisco de Paula Ramos de

Azevedo. Eles coordenaram a formação de uma grande planta industrial nas terras que

originariam Votorantim, planta esta constituída de: dois núcleos de casas que poderiam

acomodar até quatro mil funcionários, uma grande olaria para a provisão de tijolos e

telhas às construções e outros empreendimentos do banco; havia também a pedreira da

na Serra de São Francisco, de onde se retirava e lapidava calcários, mármores e granitos

que foram usados até mesmo na construção do Teatro Municipal de São Paulo.

O complexo industrial têxtil criado e administrado pelo banco de Antonio de

Lacerda Franco cresceu e era a segunda maior fábrica de São Paulo em 25 de fevereiro

de 1917, data em que um incêndio consumiu um grande galpão de algodão da Fábrica

Votorantim65

. Para agravar este quadro, em 17 de julho do mesmo ano, estourou uma

greve geral, ecoando o movimento que se iniciara na capital do Estado. Ademais, a

importação de matérias-primas – os tecidos crus eram importados da Inglaterra para

serem estampados na Fábrica de Chitas – via-se em dificuldades em meio à Primeira

64

Em tupi-guarani significa grande espuma branca/cascata branca

(http://www.nossosaopaulo.com.br/Reg_12/Reg12_Votorantim.htm). 65

Uma descrição do incêndio e da fábrica Votorantim nos é dado pelo jornal sorocabano Cruzeiro do Sul

em sua edição de 26 de fevereiro de 1917 "Arde um deposito de algodão da Fabrica de Tecidos de

Votorantim. Os prejuizos aproximam-se de mil contos de reis. O incendio começou as 18h45min só foi

contido de madrugada quando o corpo de bombeiros chegou. A fabrica de tecidos Votorantim pertence

ao Banco União de São Paulo é um dos estabelecimentos industriaes de maior importância do Estado.

Possue cerca de 1200 teares e neles trabalham calculadamente 3 mil operarios. No deposito existiam

3200 fardos de algodão, muitas barricas de soda caustica e potassa, grande quantidade de farinha de

trigo; enumeras botijas de ácido para preparação de tinta etc. O fogo tomou proporções assustadoras. A

população de Votorantim, composta em quasi sua totalidade de operarios affluiu ao logar do incêndio

rapidamente tentando dominar as chamas, luctando com grande dificuldade por falta de numero

suficiente de mangueiras e aparelhos extinctores de incendio no deposito. Do inquerito aberto ficou

constatado que o incendio não foi proposital, sendo o mesmo atribuido a alguma fagulha desprendida

por uma locomotiva fagulha esta que penetrou por abertura situada na parte superior do barracão. Os

prejuizos subiram a quase 1000 contos de réis, estando o deposito de algodão da referida fábrica de

tecidos seguro em 240 contos de réis." (apud

http://www.ihggs.org.br/index.php?option=content&task=view&id=204&Itemid=76&limit=1&limitstart

=4)

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Guerra Mundial. Por tudo isso, após o fim da greve em julho de 1917, a fábrica ficou

um mês fechada, tempo que serviu para o banco União de São Paulo decretar sua

falência e se desfazer de uma massa falida formada por: fábricas, obras hidráulicas, 440

casas de operários, linha férrea, Fazenda Ituporanga, fornos de cal e outros bens que

foram arrematados em leilão Nicolau Scarpa e Antonio Pereira Inácio, sogro de José

Ermírio de Moraes, que assumiria o comando dos negócios em 1925, originando um dos

maiores grupos industriais atualmente, o Grupo Votorantim.

Considerações finais: a riqueza se dinamizou (1897)

Acompanhando a trajetória de acumulação de capital da família Lacerda Franco

durante todo o século XIX, notamos que a dinamicidade foi traço característico desse

processo de evolução econômica. No início dos oitocentos, as origens remontam às

terras próximas da cidade de São Paulo, com atividades voltadas ao mercado interno

(cultura de mantimentos, criação e comércio de animais, aguardente). Na década de

1820, Joaquim Franco de Camargo migrou para as terras do Oeste Paulista, onde se

tornou grande proprietários de escravos e lavouras, primeiro a açucareira e, por volta de

1850, transformou-as em cafezais. Seu êxito na fronteira atraiu membros da família (os

irmão Bento e José de Lacerda Guimarães) que, no afã de se tornarem igualmente

proprietários de terras, repetiram sua trajetória, só que agora respaldados pelo cabedal

acumulado anteriormente.

A economia cafeeira paulista permitiu aos Lacerda Franco aumentar ainda mais

sua riqueza e a amplitude de seus negócios, calcados na lógica do associativismo

familiar, ou seja, a constituição de sociedades que contavam prioritariamente com

parentes. Inicialmente, houve a formação de sociedades agrícolas. Depois, os Lacerda

Franco alcançaram o topo da exportação do café em Santos, com a casa J. F. de Lacerda

& Cia. Esta estratégia foi replicada na Lacerda, Camargo & Cia., firma industrial que

representou a possibilidade de diversificação dos ganhos e grande retorno em curto

espaço de tempo. Dos capitais e da expertise gerada pelos empreendimentos anteriores

resultou a formação do Banco União de São Paulo, a única sociedade acionária

analisada e que foi maior banco paulista de investimentos industriais.

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Tabela 4: Riqueza inventariada do Barão de Arary e sua distribuição

percentual, 1897 – valores em réis (Rs.) e percentuais (%)

BENS Réis (Rs.) % em relação à

riqueza bruta

Imóveis na Cidade de São Paulo 485.525.160 8,3

Fazenda Montevidéo (Araras-

SP)

332.160.800 5,7

Benfeitorias Fazenda

Montevidéo

478.148.000 8,1

Cafezais Fazenda Montevidéo 983.290.200 16,7

Animais Fazenda Montevidéo 24.935.000 0,4

Outros Imóveis em Araras-SP 46.389.000 0,8

Terras em Ibitinga-SP 285.000 0,0

Jóias 5.085.000 0,1

Ações de Bancos e Companhias 2.430.505.500 41,4

Dívidas Ativas 953.582.906 16,2

Dinheiro 136.711.346 2,3

RIQUEZA BRUTA 5.876.617.912 100

MEAÇÃO 2.899.228.532 50

LEGÍTIMA 223.017.579 3,8

Fonte: INVENTÁRIO BARÃO DE ARARY (São Paulo, 1897).

Obs: os valores referentes ao mobiliário existente nas propriedades do Barão de Arary, tanto na

cidade de São Paulo quanto no município paulista de Araras, já está incluso na soma dos valores dos

imóveis nestas localidades.

Por fim, concluímos que a dinamicidade da riqueza em São Paulo caminhou ao

par com a transição rumo ao capitalismo e suas formas de acumulação. Ao final do

século XIX, findado o regime escravista, com a intensa valorização das terras – no

interior para ocupá-las com cafezais e na capital para construir a morada dos

endinheirados – e com a difusão das sociedades por ações (bancos, ferrovias e

indústrias) na economia paulista, a riqueza de José de Lacerda Guimarães, o Barão de

Arary, concentrava-se em papéis de empresas66

, imóveis na capital paulista e cafezais

no interior. O montante de sua riqueza bruta o coloca entre os maiores proprietários

paulistas do final do século XIX, sendo que, pela sua trajetória de enriquecimento, de

José de Lacerda Guimarães a Barão de Arary, pudemos apreender a dinâmica da

acumulação paulista no século XIX.

66

As empresas que José de Lacerda Guimarães tinha participação acionária eram: Banco do Comércio e

Indústria de São Paulo, Banco União de São Paulo, Banco de Santos, Companhia Paulista de Vias Férreas

e Fluviais, Companhia Estrada de Ferro do Muzambinho, Companhia Carris de Ferro de São Paulo a

Santo Amaro, Companhia Mecânica e Importadora de São Paulo, Companhia Fabril Paulistana,

Companhia Lacerda e Companhia Paraná Industrial.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Fontes documentais

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Jundiaí, SP: 1853. In: Centro de Memória da Unicamp.

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Jundiaí, SP: 1861. In: Centro de Memória da Unicamp.

MP ATIBAIA. Maços de População da vila de Atibaia (SP), 1785-1850. Arquivo

Público do Estado de São Paulo (APESP).

MP JUNDIAÍ. Maços de População da vila de Jundiaí (SP): 1785-1842. Arquivo

Público do Estado de São Paulo (APESP).

MP LIMEIRA. Maços de População da vila de Limeira (SP): 1835. Arquivo Público do

Estado de São Paulo (APESP).

MP JUNDIAÍ. Maços de População da vila de Mogi Mirim (SP): 1818-1820. Arquivo

Público do Estado de São Paulo (APESP).

REGISTRO TERRAS LIMEIRA. Registro de Terras da vila de Limeira (SP): 1855.

Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP).

REGISTRO TERRAS RIO CLARO. Registro Paroquial de Terras da vila de Rio Claro

(SP): 1855. Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP).

Arquivo Nacional (Rio de Janeiro-RJ)

CONTRATO SOCIAL J. F. LACERDA & Cia., Rio de Janeiro, 1884. O contrato foi

assinado no município de Araras (SP). Fundo/coleção: Junta Comercial do Rio de

Janeiro / Notação: livro 160, registro 26966 / Assunto: Contrato social da firma J. F.

Lacerda & Cia. / Ano: 1884.

CONTRATO ARBENZ & Cia. São Paulo, 05 fev. 1884.

DESISTÊNCIA JOÃO ARBENZ. São Paulo, 18 set. 1886.

CONTRATO LACERDA, CAMARGO & Cia. São Paulo, 11 jun. 1887.

Associação Comercial de Santos (ACS)

DIÁRIO OFICIAL. Diário Oficial do Império do Brasil. Rio de Janeiro, 29/03/1874.

RELATÓRIO ACS. Relatório da Associação Comercial de Santos (ACS). Santos: ACS:

1886.

Cartório do Segundo Ofício de São Paulo (Arquivo do Tribunal de Justiça de São

Paulo)

INVENTÁRIO BARÃO DE ARARY. Inventário de José de Lacerda Guimarães

(Barão de Arary). Processo 226/1897, Pacote 1447/1897.

Fazenda Montevidéo (Araras-SP)

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LACERDA & Cia. Contrato social casa comissária de café Lacerda & Cia. traduzido

do original em francês. Araras e Havre (França).1884.

CONTAS CORRENTES JLG. Contas Correntes de José de Lacerda Guimarães (Barão

de Arary) na casa comissária e exportadora J. F. de Lacerda & Cia. Santos, 1883-

1893.

LIQUIDAÇÃO LACERDA, CAMARGO & CIA. Conta de liquidação da firma

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BALANÇO LACERDA, CAMARGO & CIA. São Paulo, 31 dez. 1887.

Fazenda Paraizo (São Carlos-SP)

LACERDA & IRMÃOS. Contrato social da sociedade agrícola Lacerda & Irmãos,

1869. Araras-SP.

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1874. Araras-SP.

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BIBLIOGRAFIA CITADA

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