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Porto Alegre, 26 a 30 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural A ATIVIDADE LEITEIRA NO CONTEXTO DA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO DE CASO [email protected] Apresentação Oral-Agricultura Familiar e Ruralidade DIONÉIA DALCIN; ALESSANDRA TROIAN; SIBELE VASCONCELOS DE OLIVEIRA; PEDRO SELVINO NEUMANN. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA, BOA VISTA DAS MISSOES - RS - BRASIL. A atividade leiteira no contexto da agricultura familiar: um estudo de caso Grupo de pesquisa: AGRICULTURA FAMILIAR E RURALIDADE Resumo O leite, além de ser um produto indispensável na alimentação humana, constitui-se em uma atividade econômica de suma importância na economia do país e principalmente para um número significativo de agricultores familiares. O Rio Grande do Sul é o segundo estado brasileiro produtor de leite, produz 10,6% da produção nacional, sendo os agricultores familiares responsáveis por 85% dessa produção (CORLAC, 2004). Atualmente, o Estado conta com uma capacidade instalada de aproximadamente 2,2 milhões de litros de leite/dia, sendo a maior produção advinda da região Noroeste gaúcha. Considerando a importância da produção de leite para o estado gaúcho e a importância da agricultura familiar no desenvolvimento econômico do país, o presente trabalho objetiva identificar a relevância econômica da atividade leiteira na formação da renda agrícola nas unidades produtivas de natureza familiar, considerando para isso, elementos da rentabilidade por hectare. A pesquisa foi desenvolvida a partir de um estudo de caso na unidade de produção familiar, localizada no município de Caiçara-RS. Para coleta de dados utilizou-se questionário semi-estruturado e o convívio na unidade de produção. Quanto aos resultados, pode-se perceber a importância da atividade leiteira, por apresentar resultados econômicos acima do nível de reprodução simples, pela capacidade de agregação de valor por hectare, bem por proporcionar o desenvolvimento de atividades complementares. Evidencia-se, dessa forma, o êxito da estratégia de produção adotada pela unidade, a qual obtém significativa renda por unidade de trabalho familiar e retorno de capital, reproduzindo os bens e capital investido. Ressalta-se ainda a relevância de políticas públicas, no fomento da atividade. Palavras - Chave: Agricultura Familiar, Atividade Leiteira, Agregação de Valor, Políticas Públicas. Abstract The milk, besides being an indispensable product in the human feeding, is constituted in an economical activity of addition importance in the economy of the country and mainly for a significant number of family farmers. Rio Grande do Sul is the second Brazilian state of milk producer, it produces 10,6% of the national production, being the family farmers responsible for 85% of that production (CORLAC, 2004). Currently, the State have an installed capacity of approximately 2,2 million liters of milk/day, being the largest production arrival from the

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Porto Alegre, 26 a 30 de julho de 2009,

Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

A ATIVIDADE LEITEIRA NO CONTEXTO DA AGRICULTURA FAM ILIAR: UM ESTUDO DE CASO

[email protected]

Apresentação Oral-Agricultura Familiar e Ruralidade DIONÉIA DALCIN; ALESSANDRA TROIAN; SIBELE VASCONCELOS DE OLIVEIRA;

PEDRO SELVINO NEUMANN. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA, BOA VISTA DAS MISSOES - RS - BRASIL.

A atividade leiteira no contexto da agricultura familiar: um estudo de caso

Grupo de pesquisa: AGRICULTURA FAMILIAR E RURALIDAD E

Resumo O leite, além de ser um produto indispensável na alimentação humana, constitui-se em uma atividade econômica de suma importância na economia do país e principalmente para um número significativo de agricultores familiares. O Rio Grande do Sul é o segundo estado brasileiro produtor de leite, produz 10,6% da produção nacional, sendo os agricultores familiares responsáveis por 85% dessa produção (CORLAC, 2004). Atualmente, o Estado conta com uma capacidade instalada de aproximadamente 2,2 milhões de litros de leite/dia, sendo a maior produção advinda da região Noroeste gaúcha. Considerando a importância da produção de leite para o estado gaúcho e a importância da agricultura familiar no desenvolvimento econômico do país, o presente trabalho objetiva identificar a relevância econômica da atividade leiteira na formação da renda agrícola nas unidades produtivas de natureza familiar, considerando para isso, elementos da rentabilidade por hectare. A pesquisa foi desenvolvida a partir de um estudo de caso na unidade de produção familiar, localizada no município de Caiçara-RS. Para coleta de dados utilizou-se questionário semi-estruturado e o convívio na unidade de produção. Quanto aos resultados, pode-se perceber a importância da atividade leiteira, por apresentar resultados econômicos acima do nível de reprodução simples, pela capacidade de agregação de valor por hectare, bem por proporcionar o desenvolvimento de atividades complementares. Evidencia-se, dessa forma, o êxito da estratégia de produção adotada pela unidade, a qual obtém significativa renda por unidade de trabalho familiar e retorno de capital, reproduzindo os bens e capital investido. Ressalta-se ainda a relevância de políticas públicas, no fomento da atividade. Palavras - Chave: Agricultura Familiar, Atividade Leiteira, Agregação de Valor, Políticas Públicas. Abstract The milk, besides being an indispensable product in the human feeding, is constituted in an economical activity of addition importance in the economy of the country and mainly for a significant number of family farmers. Rio Grande do Sul is the second Brazilian state of milk producer, it produces 10,6% of the national production, being the family farmers responsible for 85% of that production (CORLAC, 2004). Currently, the State have an installed capacity of approximately 2,2 million liters of milk/day, being the largest production arrival from the

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Northwest area of the state. Considering the importance of the production of milk for the south State and the importance of the family agriculture in the economical development of the country, the present work aims to identify the economical relevance of the milk activity in the formation of the agricultural income in the productive units of family nature, recital to this, elements of the profitability per hectare. The research was developed from a case study in family production unit, located in Caiçara-RS. For data collection was used semi-structured questionnaire and living in the unit of production. As the results, one can understand the importance of dairy, produce economic results for above the level of simple reproduction, the ability of added value per hectare, and for providing the development of complementary activities. There is thus the success of the strategy adopted by the production unit, which derives significant income per family work and return, and playing the property investment. It is also the relevance of public policies in promoting the activity. Key - words: Family agriculture; Milk system; Production system, Added value; Public policies. 1. INTRODUÇÃO

O universo agrário é extremamente complexo, seja em virtude da diversidade de sua paisagem, seja em função da existência de diferentes tipos de agricultores, os quais têm interesses particulares, estratégias próprias de sobrevivência e de produção e que, assim sendo, agem de formas distintas a desafios e restrições semelhantes (PELLINI et al, 2006).

Para Guanziroli e Caram (2000), os diversos tipos de produtores são portadores de racionalidades especificas que, se adaptam ao meio ao qual estão inseridos, fato que reduz a validade de conclusões derivadas puramente de uma perspectiva econômica única, universal e atemporal que, supostamente, caracterizaria o ser humano.

Intrínsecos ao sistema capitalista, os processos de modernização tecnológica rural tornam o grupo de agricultores familiares mais vulneráveis. Frente a este paradigma, a atividade leiteira compõe uma produção atraente, pois proporciona autonomia relativa para os produtores que contam com a mão-de-obra de cunho familiar no desempenho das práticas produtivas (VILELA et al., 2002).

Atualmente, a produção de leite constitui-se em uma estratégia para o pequeno produtor, em função do baixo risco da exploração, a elevada liquidez do capital imobilizado em animais e a freqüência diária, quinzenal ou mensal do fluxo de receitas da atividade, a qual depende das relações com o mercado. Produção esta que caminha como uma alternativa para a agricultura familiar, e para o desenvolvimento de muitas regiões brasileiras, sendo uma estratégia na composição da renda dos agricultores (VILELA, et al. 2002).

O presente trabalho constitui-se de uma análise da unidade de produção da família Perlin, localizada na linha Aimoré, município de Caiçara-RS. Objetivou-se diagnosticar as atividades agrícolas da unidade e identificar a relevância econômica da atividade leiteira na formação da renda agrícola, como objetivos específicos avaliou-se a agregação de valor por hectare e a relevância das políticas públicas para a unidade. A coleta de dados ocorreu no ano de 2005, com informações válidas para realização e elaboração das análises agronômica e econômica na unidade.

2. A PECUÁRIA LEITEIRA NO CONTEXTO DA AGRICULTURA F AMILIAR

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2.1 Agricultura familiar: uma categoria em evidência

Apesar do termo agricultura familiar ser recente, este segmento social é entendido e debatido desde os primórdios. Seu papel é relevante para o desenvolvimento do país, tanto sob o ponto de vista produtivo como para as relações políticas e sociais que se estabelecem na construção da cidadania (DALCIN, TROIAN e OLIVEIRA, 2008).

A agricultura familiar é um conceito muito discutido e debatido academicamente pelo qual Wanderley (1999, p.23), define-o como sendo,

Entendida como aquela em que a família, ao mesmo tempo em que é proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no estabelecimento produtivo. É importante insistir que esse caráter familiar não é um mero detalhe superficial e descritivo, ou seja, o fato de uma estrutura produtiva associar família-produção-trabalho tem conseqüências fundamentais para a forma como ela age econômica e socialmente. No entanto, assim definida, essa categoria é necessariamente genérica, pois a combinação entre propriedade e trabalho assume, no tempo e espaço, uma grande diversidade de formas sociais.

Segundo Schneider (2006) o reconhecimento da existência da agricultura familiar,

ocorreu a partir da década de 1990. Este reconhecimento se deu principalmente por meio de movimentos sociais e através da legitimação do Estado por meio de políticas públicas como o Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), este estabelecido no ano de 1996. O autor suscita ainda a importância do reconhecimento acadêmico, por meio de estudos, o que referenda o termo. Na visão do autor, a consolidação da agricultura familiar demorou a ocorrer, em razão dos debates e discussões terem girado em torno da questão agrária, em que a modernização do campo surgiu no local da reestruturação fundiária.

A história da humanidade revela que a agricultura vem influenciando e sendo influenciada por mudanças políticas, sociais e culturais. De acordo com Assad e Almeida (1990), o Brasil, país que carrega desigualdades sociais e econômicas pelas suas dimensões continentais, tem sua história assinalada pela agricultura. Isso é comprovado, desde o século XVI, quando o Brasil colônia era exportador de pau-brasil, até os dias atuais, pois sua riqueza sustenta-se em produtos primários, como os produtos agrícolas que respondem por parte significativa do Produto Interno Bruto (PIB).

Para Schneider (2006), a manutenção da agricultura familiar se dá pelo modo como ela interage com o capitalismo, e esta interação varia em formas heterogêneas e muito particulares. Assim a agricultura familiar tem certa autonomia em relação ao capital e se reproduz nessas condições. Apesar das novas tecnologias, as decisões são tomadas pela família e pelo grupo doméstico ante as condições materiais e do ambiente social e econômico que são cruciais e definidoras das trajetórias e estratégias que viabilizam ou não sua sobrevivência social, econômica, cultural e moral. E isso depende das relações com o ambiente e o espaço em que estão inseridas, sendo o a reprodução resultado de um ato coletivo. A agricultura familiar possui significativos fatores que a limitam, quais sejam seus obstáculos naturais.

Observa-se também que a agricultura familiar possui peculiaridades que a diferencia das demais atividades econômicas, em especial por suas potencialidades referentes à interdependência dos fatores de produção, propriedade e trabalho e pela sua capacidade de gerar emprego e renda no meio rural.

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Conforme Vilela et al. (2002), pode-se caracterizar a agricultura familiar como uma exploração que utiliza mão-de-obra dos membros da família, tendo acesso a terra e capital limitado e mercado submisso. É um segmento de suma importância para o desenvolvimento da economia brasileira, além de produzir uma diversidade de produtos para a subsistência e para a exportação oferece empregos com baixo custo social.

A agricultura familiar configura-se nas unidades produtivas em que todo e qualquer trabalho é desenvolvido pelos membros da família, que detêm a posse da terra e dos instrumentos de trabalho, bem como tenha pelo menos 80% da renda familiar proveniente da atividade agropecuária (GIRARDI, 1996, p.33 e BLUM, 2001, p.62).

Ainda segundo Vilela et al. (2002), no Brasil, em 1995 existiam cerca de 5,8 milhões

de estabelecimentos familiares. Estudos do Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) mostram que os estabelecimentos que possuem menos do que 100 hectares são aproximadamente 23% do total existente, tendo significativa importância na produção agropecuária do país.

Ainda tratando de agricultura familiar, Caporal e Costabeber (2004), evidenciam a importância deste setor,

(...) Existem no Brasil 4.139.369 estabelecimentos rurais familiares que, embora, ocupando apenas 30,5% da área total e dispondo de 25,3% do financiamento, respondem por 37,9% do Valor Bruto da Produção (VBP) e por 76,85% da mão de obra ocupada na agricultura. Os agricultores familiares produzem 24% do VBP total da pecuária de corte, 52% da pecuária de leite, 58% dos suínos e 40% das aves e ovos. Além disso, respondem pela produção de 33% do algodão, 31% do arroz, 72% da cebola, 67% do feijão, 97% do fumo, 84% da mandioca, 49% do milho, 32% da soja, 46% do trigo, 58% da banana, 27% da laranja, 47% da uva, 25% do café e 10% da cana-de-açúcar, o que demonstra a grande importância estratégica deste setor (CAPORAL E COSTABEBER, 2004, p.141).

No entanto, a área agrícola das propriedades por si só não revelam sua viabilidade ou

potencialidade de exploração, esta depende de vários fatores tais como: fertilidade do solo, localização, o sistema de produção adotado, tecnologias empregadas, acesso aos mercados, políticas públicas, acesso a crédito, entre outros. Neste sentido a atividade leiteira ganha espaço e abarca uma parcela significativa de estabelecimentos. 2.2 A produção de leite na agricultura familiar

A análise histórica da economia agrícola brasileira mostra que a atividade leiteira foi a mais penalizada pelas políticas públicas. Os efeitos provocados pelo tabelamento de preços, ainda estão vivos na lembrança do produtor de leite, que durou quase meio século. A atual situação da pecuária leiteira nacional tem muito a ver com as políticas públicas que discriminaram essa atividade (GOMES, 1995).

Segundo Gomes (1995) a característica mais marcante das políticas públicas que afetaram a atividade leiteira diz respeito à busca de resultados imediatos ou de curto prazo. Pouco se fez numa perspectiva de longo prazo, objetivando solucionar os problemas estruturais da atividade. Dessa forma, é injusto atribuir somente ao produtor a culpa do atraso tecnológico, este apenas acomoda as condições que lhe são impostas.

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Ainda segundo o mesmo autor, a competitividade do leite no Brasil foi prejudicada pela combinação das seguintes políticas públicas: 1) desproteção do setor à concorrência predatória de produtos subsidiados na origem; 2) aplicação de impostos que agravam a atividade e de tarifas alfandegárias que protegem a indústria produtora de insumos para a pecuária e, 3) defasagem cambial que favorece as importações e dificulta as exportações.

Porém, a exploração da atividade leiteira no Brasil compõe significante atividade do setor agrícola e desempenha papel relevante no processo de desenvolvimento econômico e social do país. O mercado do leite vem sofrendo sérias transformações nos aspectos, econômicos, de qualidade e higiene, desde sua produção até a comercialização. As especificidades do produto final, em especial a qualidade, se encontram intimamente ligada à sua matéria-prima advinda da propriedade rural.

Segundo Peraci (2007), representante do MDA em entrevista ao MilkPoint, o leite pode ser considerado um dos produtos mais importantes para a agricultura familiar brasileira. Além de estar presente em mais de 1,8 milhões de propriedades rurais, representar 52% do valor da produção de leite brasileiro, a atividade leiteira gera rendas mensais para os agricultores facilitando a gestão do capital da propriedade. O leite também é a opção inicial de produção na maioria dos assentados de reforma agrária.

Os Estados Unidos ocupam, isoladamente, a primeira posição no ranking dos maiores produtores de leite do mundo, com 80,2 bilhões de litros/ano e 15% do volume, na segunda posição aparece a Índia com uma produção anual de 38,5 bilhões de litros (EMBRAPA, 2006).

Além de produto indispensável na alimentação humana, o leite apresenta-se como uma atividade econômica de suma importância na economia do Brasil e, em especial, para um número significativo de agricultores familiares. O país encontra-se em sétimo lugar na produção mundial. No ano de 2005, foram produzidos aproximadamente 23,3 bilhões de litros, tendo, nos últimos anos, produção e crescimento contínuo (EMBRAPA, 2006).

O Rio Grande do Sul é o segundo estado brasileiro produtor de leite, produz 10,6% da produção nacional, sendo os agricultores familiares responsáveis por 85% dessa produção (CORLAC, 2004). Atualmente, o Estado conta com uma capacidade instalada de aproximadamente 2,2 milhões de litros de leite/dia, sendo a maior produção advinda da região Noroeste gaúcha.

Segundo Wilkinson (1997), a atividade leiteira é alicerce para muitos agricultores familiares, a qual vem passando por transformações nos seus sistemas produtivos. Apresenta um nível médio de produção de apenas 20 litros/leite/dia, o que resultará no final do mês a um montante o equivalente em média a um salário mínimo.

Conforme dados do IBGE (1996), no Rio Grande do Sul, 48% dos produtores de leite possuem unidades de produção menores de 20 hectares e 79% possuem menos de 50 hectares. Também se observa que os pequenos produtores de economia familiar são responsáveis por grande parte do leite produzido no estado, característica ressaltada pelo conhecimento de que 84% dos produtores possuem até dez vacas leiteiras em ordenha (EMATER, 2001).

Assim evidencia-se que a atividade leiteira é típica de pequenas propriedades, apresentando-se como fonte de renda mensal da família, ao contrário de outras culturas e criações, proporcionando vantagem pelo baixo percentual de perdas durante períodos secos e pela rápida recuperação após a época das chuvas. Na Região onde a propriedade em estudo está inserida esta realidade não é diferente, o que pode ser confirmado na afirmação de Girardi (1996, p.55) “[...] a Região do Médio Alto Uruguai, constituída de pequenas propriedades, a pecuária de corte é inexpressiva, mas, a pecuária de leite, é uma atividade

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forte, embora com baixa produtividade”. Ressalta-se ainda, que a produção de leite do Médio Alto Uruguai no ano de 2003 foi de 85.567 em milhões de litros, tendo uma participação de 3,71% no estado (IBGE, 2003).

O leite, que muitas das vezes já estava inserido à dinâmica do sistema de produção. Passa a ter importância também como produto para comercialização.

[...] a produção do leite tornou-se estratégica na agricultura familiar, pois permite uma renda quinzenal ou mensal, que mesmo em pequenos valores, possibilitam a família fazer frente às despesas essenciais como luz; farmácia; compra de alimentos. Mas ela tornou-se essencial para as iniciativas de agroindustrialização do leite, o que a coloca em uma nova condição que suscita novos problemas e desafios. (CORONA; PEZARICO apud CORONA; POSSAMAI, 2003, p.14).

Carvalho e Oliveira (2006) ressaltam que, com o reconhecimento da importância e da

amplitude do setor, este passou a objetivar a abertura de novos mercados externos, sendo necessário repensar estratégias competitivas.

A Instrução Normativa 51 (IN 51) representou uma das mudanças mais significativas do setor, para a qualidade dos produtos e aproximação dos padrões internacionais. A IN 51 é uma resolução do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que regulamenta a produção, o armazenamento, o transporte, a industrialização e a comercialização do leite no Brasil, no que diz respeito à qualidade do produto e que interfere no sistema de produção dos agricultores (DESER, 2003).

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A fim de compreender a unidade de produção, em especifico a atividade leiteira, foi

utilizada a metodologia Análise Diagnóstico de Sistemas Agrários1 (ADSA) que, especificamente,

(...) tem por objetivo principal identificar e classificar hierarquicamente os elementos de toda natureza que mais condicionam a evolução dos sistemas de produção e compreender como eles interferem concretamente nas transformações da agricultura (DUFUMIER, 2007, p. 58).

O método ADSA de Sistema de Produção é entendido como “combinação (no tempo e no espaço) dos recursos disponíveis (terra, trabalho e capital de exploração) para a obtenção das produções vegetais e animais na Unidade de Produção Agrícola” (DUFUMIER, 2007, p. 85).

De forma geral, o ADSA visa estudar a realidade, de forma que possa ser utilizado para compreender as interações sociedade-natureza e como estas podem ser potencializadas através de políticas públicas, visando promover o desenvolvimento agrícola, ou seja, resulta um prognóstico com indicadores capazes de esclarecer as perspectivas e apontar possíveis cenários futuros (DUFUMIER, 2007). 1 Entende-se Sistema Agrário, como um instrumento teórico para estudo da realidade, sendo definido como “um modo de exploração do meio historicamente constituído e durável, um sistema (técnico) de forças produtivas, adaptado às condições bioclimáticas de um espaço dado, compatível com as situações e necessidades sociais do momento” (DUFUMUIER, 2007, p. 62).

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Desta forma, o estudo realizado contou com duas etapas: uma preliminar marcada pelo levantamento de informações secundárias e revisão bibliográfica e, com a realização de trabalho a campo para a investigação in loco e elaboração de propostas de ações para o desenvolvimento da unidade produtiva analisada.

Na visita a campo, a técnica utilizada foi entrevista semi-estruturada com os membros da família que contribuiu para identificar e caracterizar as dimensões ambientais, sociais e econômicas. Também fez parte da metodologia a convívio na unidade de produção.

Para a análise econômica foram utilizados os dados financeiros obtidos a partir da média dos anos agrícolas de 2003, 2004 e 2005, visto que a pesquisa realizou-se em setembro de 2005, assim ressalta-se que os valores e preços de mercado apresentados referem-se ao mesmo ano. Dento da UPA, o estudo foi focado na atividade leite.

Para a obtenção dos resultados econômicos utilizaram-se das seguintes medidas: • Produto Bruto (PB): Expresso pelo valor monetário da produção física gerado

exclusivamente pela unidade de produção durante um ciclo de produção. Compõem o PB somente o valor dos produtos e serviços finais, tais como: a produção vendida; produção estocada; produção consumida pela família; produção destinada ao pagamento de serviços a terceiros; a variação do rebanho animal, a remuneração de serviços prestados para terceiros (LIMA et al. 2001: 133).

• Consumo Intermediário (CI): Expresso pelo valor dos bens e serviços consumidos no decorrer do ciclo de produção, tais como: fertilizantes, pesticidas, fungicidas, herbicidas, produtos veterinários (carrapaticida, vermífugo, vacina), suplementação mineral e combustível. Os serviços considerados no CI são apenas aqueles que compreendem o consumo de bens materiais durante a execução de uma determinada tarefa, não incluindo, portanto, os salários dos funcionários.

• Depreciação (D): Corresponde à fração de valor dos meios de produção (benfeitorias, instalações, máquinas, implementos, cercas e bretes e veículos) que não são integralmente consumidos do decorrer de um ciclo produtivo, mas no decorrer de vários ciclos. Para seu calculo, usa-se a seguinte fórmula:

D: (valor novo - valor residual) /número de anos. • Valor Agregado Líquido (VAL): Quando o produtor acrescenta trabalho aos

insumos e ao capital fixo de que dispõe, ele gera novas riquezas, agregando valor a essas mercadorias (Garcia F’, 1999: 42). Esse valor é igual ao valor dos produtos finais do qual é subtraído o valor do conjunto de bens e serviços consumidos: VAL = PB - CI – D

• Renda Agrícola (RA): É a parte do Valor Agregado que fica com o produtor após o pagamento de Salários (S), Impostos (I), Subsídios (Sub), Juros (J) e Renda da Terra (RT), quando os mesmos fizerem parte do processo produtivo. Fórmula: RA= VA – J - S –T –I. 4. REGIÃO MÉDIO ALTO URUGUAI: O MUNICÍPIO DE CAIÇAR A

A configuração territorial do Estado do Rio Grande do Sul está diretamente vinculada ao seu processo de formação histórica. Na metade norte predominam os estabelecimentos com características vinculadas à agricultura familiar. Já na porção sul, apresentam características fortemente vinculadas à agricultura patronal, representada na pecuária extensiva tradicional.

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O município em estudo localiza-se na metade norte do Estado, na região do Médio Alto Uruguai a qual é integrada por trinta municípios, somando uma população de 183.927 habitantes, sendo 43,85% residentes no meio urbano e 56,15% no meio rural, enquanto que no Estado o percentual de habitantes no meio rural é de 18,35% (IBGE, 2000). Eminentemente uma região rural, conta 26.072 estabelecimentos rurais, sendo que as propriedades apresentam tamanho médio de 18,7 hectares.

O município de Caiçara (Figura 1) foi emancipado em 19 de outubro de 1.965 através do Decreto Lei n° 5,067. Distante 440 quilômetros da capital estadual Porto Alegre possui uma área de 189,24 km² com densidade demográfica de 27,7 hab/km² (FEE, 2008).

Figura 1. Mapa do RS com destaque para o município de Caiçara. Com relação à população, Caiçara, de acordo com dados do Atlas de Desenvolvimento

Humano no Brasil, possui um total de 5.580 habitantes, sendo destes 26,68% habitantes rurais e 73,32% habitantes urbanos. Do total de habitantes da zona rural, 47,15% são do sexo feminino e 52,85% são do sexo masculino.

Segundo dados da FEE (2008), o município apresentou em 2006 PIB de R$ 59.063.000,00, com PIB per capita de R$ 7.656,00. Economicamente, o município apresenta uma agricultura fundamentada na cultura da soja e na pecuária extensiva. As atividades econômicas desenvolvidas estão basicamente no setor primário com a agricultura e pecuária, os setores secundário e terciário tem pequena participação na economia. 5. CONTEXTUALIZANDO A UPA

A propriedade em estudo localiza-se na linha Aimoré, município de Caiçara - RS, sendo a família composta por seis pessoas. Em 1997, iniciam o cultivo com as atividades de produção fumo, milho, soja e leite em pequena escala. No entanto, ao perceber que a UPA não apresentava resultados econômicos satisfatórios, decidiram trabalhar com atividades que proporcionassem maior retorno, no caso o leite, está que tem renda mensal e fez com que a família começasse a se reproduzir economicamente. Posteriormente introduziram à suinocultura, com o objetivo de adquirir o adubo orgânico, reduzindo assim seus custos. Atualmente a família desagregou a atividade fumo e introduziu a piscicultura. Além disso,

Legenda: Caiçara

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possui as atividades complementares milho, sorgo e pastagem para o gado leiteiro, com a intenção de reduzir os custos da unidade.

A unidade de produção conta com 25 hectares para o desenvolvimento de suas atividades agropecuárias, dando especial destaque para a atividade leiteira. Possui 2,8 unidades de trabalho familiar (UTF), sendo que há divisão de trabalho para o desenvolvimento das atividades, porém existe ajuda mútua para que as elas se desenvolvam de maneira a trazer benefícios para a família. Quanto às decisões são também tomadas por toda a família.

O solo é caracterizado como litosolo, sendo bastante explorado. No entanto, a família vem desenvolvendo ações para a recuperação deste, através de adubação orgânica, adubo químico e cobertura verde.

Os maquinários e equipamentos para lavoura foram adquiridos quando começaram com os cultivos e criações e melhorados e renovados conforme as necessidades e a evolução tecnológica. Quanto aos equipamentos para a atividade leiteira, foram adquiridos ao longo dos anos, conseguindo completá-los em 2005, com a construção de uma sala de ordenha modelo espinha de peixe, para utilizar o modo canalizado de ordenha. Observa-se a preocupação com a qualidade genética do rebanho seguida de um bom manejo nutricional.

A família participa de associações e cooperativas como da Associação de Produtores de Leite deste município. As perspectivas futuras são de continuar com as atividades: leite, suinocultura, subsistência e piscicultura, porém maximizar a produção de cada uma dentro das estruturas que a unidade oferece.

6. ATIVIDADES PRODUTIVAS ENCONTRADOS NA UPA EM ESTU DO Na unidade de produção Perlin foram encontradas as seguintes atividades: a) Subsistência: Para esta atividade é utilizada uma área de 0,3 hectares, a adubação é

orgânica e os alimentos são produzidos para o autoconsumo da família, dentre eles destaca-se mandioca, batata-doce, feijão, hortigranjeiros, etc.

b) Grãos (Soja): Ocupa uma área de 2,5 hectares, a qual é desenvolvida no sistema de plantio direto, com semente transgênica e sem adubo. Sua rentabilidade produtiva no total é de aproximadamente 75 sacas/ano.

c) Piscicultura: Desenvolvida há três anos, em dois açudes. Em média, alojam-se 800 alevinos das espécies: Carpa Prateada e Cabeça Grande. Ao final do ciclo os peixes possuem peso médio de 2,5 Kg. A unidade conta com produção anual de 2.500 Kg de peixe, produção esta para o mercado externo.

d) Suinocultura: trata-se de uma criação em parceria s com a Cotrifred (a qual fornece a ração consumida pelos animai), caracterizando-se como uma atividade de terminação. Os suínos chegam à unidade pesando em média 22 Kg,. Os suínos são vendidos pesando em média 110 Kg, com aproximadamente 100 dias. A capacidade de produção por lote é de 450 animais. E por ano, a unidade consegue engordar em média 3,5 lotes.

e) Bovinocultura de Leite: para a produção do leite utiliza-se das seguintes atividades complementares: milho, sorgo e pastagem. O rebanho bovino é de 61 cabeças de gado da raça holandesa sendo que destas em média 42,6% estão em lactação todos os meses do ano. O manejo sanitário é processado em etapas, antes, durante e após ordenha.

Na figura 2, é possível observar o fluxograma das atividades desenvolvidas na unidade de produção e as relações existentes entre estas. Bem como, os valores econômicos referentes ao Produto Bruto e Custo Intermediário.

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Figura 1. Fluxograma das atividades com seus respectivos PB e CI.2 7. ANÁLISE ECONÔMICA DA UPA

Para avaliação do nível de reprodução econômica da unidade, foram pesquisados os seguintes indicadores: PB, CI, VAB, D, e VAL, tendo a finalidade de conhecer os dados econômicos da atividade leiteira e relacioná-la com as demais atividades a fim de observar sua relevância para a UPA. Estes dados são expressos no Quadro 1.

2 O CI (R$35.958,88) do leite, divide-se em custos diretos e indiretos (das atividades complementares), embora apareça só nos custos indiretos.

Atividades PB (R$) CI (R$) VAB (R$) D (R$) VAL (R$) Leite 92.670,00 35.958,88 56.711,12 4.111,72 52.599,40

Leite

Soja

Suinocultura Subsistência

Piscicultura

Sal mineral/Sal pré-parto/Inseminação/Medicamentos/Med Sanitários/

Óleo/Semente/Uréia/Agrotóxicos/Adubo

R$35.958,88

Alevino R$67,66

Semente/Ração/Pintos/Leite/pisc.

R$1.466,50

Venda R$16.670,0

0

Alimentação R$180,00

Venda R$2.025,

00

Óleo/Colheitadeira/Agrotóxicos

R$617,48

Sorgo/ Milho Pastagem

Venda R$1.250,00

Venda R$92.670,00

Adubação orgânica

Consumo R$13.527,42

Produto obtido pela suinocultura e distribuído para as atividades complementares

Legenda

Entrada de insumos Saída de produtos Atividades Existentes

Atividades complementares

Atividade Principal

Relação entre as atividades Entrada Saída

Distribuição de adubação orgânica

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Quadro 1. PB, CI, VAB, D e VAL das atividades. Para se conhecer o produto bruto foi usado às quantidades vendidas e consumidas dos

produtos e multiplicou-se pelo preço recebido de cada produto, sendo considerado para isso uma média dos últimos três anos. No caso do leite, foram vendidos 192.000 l/ano e recebeu-se em média R$ 0,48/l, evidenciando ser o sistema que apresenta maior PB da UPA.

O cálculo do consumo intermediário foi feito a partir dos produtos adquiridos e o preço pago por cada um deles. O sistema leite é o que apresenta maior consumo, 39,59% do valor recebido por litro, sendo este custo com pastagem, silagem, sal mineral, farelo de soja, medicamentos, vacinas, inseminação, material de limpeza, entre outros. Este resultado expressa em números um CI de R$ 0,19 por litro. Quanto ao VAB por hectare é de R$ 3.706,83.

A unidade possui depreciação total anual de R$ 6.387,72, sendo que o subsistema leite utiliza a maior proporção destes custos, por utilizar a maior parte da infra-estrutura, maquinário, etc.

Subtraindo-se o valor da depreciação do VAB, obtém-se a sobra para a unidade de forma liquida anual, ou seja, o VAL no montante de R$ 481.464,21, deste valor subtraindo o pagamento de encargos, que segundo o produtor na UPA são Funrural, imposto de renda e juros com financiamentos (Pronaf) - denominada como DVA3 – que totalizam R$ 2.604,40, gera a Renda Agrícola.

Assim, a renda agrícola gerada pela unidade de produção é de R$ 78.858,80. Sendo visível a importância da atividade leiteira, pois está gera um valor de R$ 50.452,72, ou seja, 63,97% do total, quanto as demais atividades geram: suinocultura com 18,26%, a piscicultura com 1,14% e a soja com 1,61%, representando assim a renda monetária de 84,98% (R$ 67.003,20). Quanto à subsistência que representa a renda não monetária, a proporção está sendo de 14,99%.

Diante dos dados econômicos obtidos, pode-se afirmar que a unidade está se reproduzindo, pois sua renda anual por UTF é de R$ 27.914,68 e sua renda mensal é de R$ 2.147,28, valor referente a 7,15 salários4 ultrapassando, de forma considerável, o nível de reprodução simples (NRS) 5.

Na Figura 2, é expresso a combinação da renda obtida com cada atividade do sistema de produção, composta de uma linha formada pelas curvas contíguas de cada atividade. Esta combinação representa a SAU por UTF.

A partir da figura pode-se visualizar a relevância da atividade leite para a unidade, pois ela consegue sozinha ultrapassar o nível de reprodução simples de forma expressiva. Porém qualquer flutuação dentro da unidade, ou seja, nas atividades quanto à rentabilidade, hectares e mão-de-obra modificará esta figura e, portanto deverão ser consideradas na tomada de decisão.

3 DVA: Distribuição do Valor Agregado, valor que não está expresso na tabela. 4 O valor do salário mínimo é referente ao ano de 2005, ou seja, R$ 300,00. 5 NRS: um salário mínimo, para fins de cálculos utilizou-se 13 meses.

Suinocultura 16.670,00 180,00 16.490,00 1.700,65 14.789,35 Piscicultura 1.250,00 67,66 1.182,34 250,00 932,34 Grãos 2.025,00 617,48 1.407,52 90,00 1.317,52 Subsistência 13.527,42 1.466,50 12.060,92 235,32 11.825,60 TOTAL 126.142,42 38.290,52 87.851,90 6.387,72 81.464,21

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Renda proporcionada pelas atividades (UTF/ha)

27.914,16

17.859,30

-2.261,13

22.958,49

23.278,3323.728,15

-5.000,00

0,00

5.000,00

10.000,00

15.000,00

20.000,00

25.000,00

30.000,00

0 2 4 6 8 10

SAU/UTF

RA

/UT

F

Leite Suinocultura Psicultura Grãos Subsistência NRS

Figura 2. Renda proporcionada pelas atividades em SAU/UTF

8. LEITE: UMA ESTRATÉGIA RENTÁVEL PARA A AGRICULTUR A FAMILIAR No cenário de estudos a respeito do sistema leite como uma estratégia de reprodução, podem-se destacar alguns autores, como por exemplo, Kageyama (2001), Corona e Possamai (2003) e Campos et al (2002), estes evidenciam a importância da atividade leiteira para a agricultura familiar. Dessa forma, o presente trabalho, na análise da unidade de produção, familiar Perlin, detectou a relevância que assume o sistema leite para a reprodução social e desenvolvimento econômico da família.

Quanto à importância e viabilidade da atividade leiteira pode-se ser expressa pelas seguintes características:

• A importância da presente análise revelou-se, em especial, pela capacidade em que a propriedade apresentou em conseguir ótima renda em uma pequena área de terra. Observa-se que as unidades da região, onde a UPA está situada, apresentam em média 18,7 hectares, enquanto que a unidade em estudo possui 25 hectares, neste caso pode-se se dizer que ela é típica da região. Porém ao se considerar a rentabilidade, ou renda agrícola, percebe-se que esta encontra-se em um patamar mais elevado que as demais. Assim, pode-se considerar que a atividade leiteira apresenta-se como uma alternativa rentável e mostra-se como uma tendência futura para as demais unidades características da agricultura familiar.

• Quando observado o valor agregado por hectare pode-se visualizar que o leite utiliza uma área de 20,39 hectares, e possui VAB de R$ 56.711,12, valor que por hectare é de R$ 2.781,32, se comparado este dado com a atividade soja (grãos) que ocupa área de 2,5 hectares e possui VAB por hectare é de R$ 563,01. Assim, pode-se dizer que o leite possui VAB 4,94 vezes maior que a soja.

• Outro fato que comprova a eficiência da atividade é quanto ao tamanho do rebanho que é de 61 cabeças, raça (holandesa) e a média da produção mensal na unidade que é de 16.060 litros tendo uma produtividade por vaca de 20,5 l/dia. Dados superiores aos observados em relatórios da Embrapa gado leite, INCRA/FAO, Emater.

• A unidade ultrapassa o NRS por UTF apenas com a atividade leite, pois está apresenta renda de R$17.859,30, possibilitando ainda que a família desenvolva outras atividades e com isso elevando a renda da mesma. Resultado bastante expressivo em unidade de produção familiar, ou seja, de 7,15 salários mensais por UTF. Para TESTA et al. (1996), a

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atividade leiteira apresenta determinadas particularidades sendo a atividade mais adequada à produção de caráter familiar, pois apresenta alta absorção de mão-de-obra e exerce um importante papel na formação da renda dos agricultores (melhorando o fluxo de caixa), mas não deve ser especializada, para permitir menor escala de produção, facilitar a reciclagem de dejetos, maior capacidade de absorção das crises de mercado, etc.

• Também destaca-se o retorno de capital que o leite proporciona, ou seja, a cada real investido na atividade retorna R$ 2,58 (PB/CI). Observa-se que as demais atividades proporcionam maior retorno, no entanto tal cálculo é desprezível, no caso da suinocultura por se tratar de uma atividade em parceria e as demais por não apresentarem o mesmo nível de importância para o proprietário e assim não possuem o mesmo investimento.

• O leite e a suinocultura são as principais atividades, no entanto o leite apresenta maior renda. No caso da suinocultura trata-se de um sistema de prestação de serviço, onde o agricultor vende sua mão-de-obra e suas instalações, sendo os demais gastos de responsabilidade da integradora.

• Outro elemento importante refere-se à renda mensal que a atividade leite proporciona, ao contrário de algumas atividades como grãos remuneram a família em apenas um período do ano, deixando-a mais vulnerável as oscilações do mercado e aos riscos e incertezas presentes nas atividades.

• Importância da associação para conseguir diminuir custos, melhorar a genética e eficiência da atividade, pois consegue ter auxilio de um médico veterinário, preços melhores dos insumos de produção e barganha em preço.

• Quanta as políticas públicas observa-se que são importantes para a unidade, em especial para financiamentos como forma de possuir capital de giro, as quais também foram essenciais para o inicio da atividade, ou seja, seu fomento. Também é destaque a IN 51 a qual proporciona ao produtor ter uma propriedade considerada Top de linha, por apresentar boas características de higienização e instalações e assim conseguir melhores preços. 9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A unidade de produção analisada apresenta interação entre os sistemas de produção e criação (grãos, leite, suinocultura, piscicultura e subsistência). Os mesmos desenvolvem-se em uma área de 23,7 hectares com bom nível tecnológico. Evidencia-se a diversidade de atividades desenvolvidas, sendo esta de suma importância para a agricultura familiar, pois reduz os riscos e incertezas e aumenta a rentabilidade da unidade de produção.

A adoção do sistema leite como estratégia de reprodução na propriedade é uma alternativa que gera resultados positivos, pois apresenta rentabilidade relativamente alta, remunera o capital investido e a mão-de-obra e, sobretudo, permite o desenvolvimento de outras atividades.

Salienta-se a importância de políticas públicas de incentivo a atividade leiteira. O PRONAF investimento é uma forma de política de fomento a mecanização e aquisição das instalações necessárias para o produtor se adequar ao sistema, bem como pode se ressaltar a própria Normativa 51 como uma política de adequação e elevação da qualidade do leite.

No quesito políticas públicas, percebe-se que nas décadas de 1970, 1980 e 1990 o setor leiteiro passou por importantes transformações. A década de 70 e 80 é marcada pela estagnação, enquanto que na década de 90 houve um aumento significativo na produção de leite, junto com a concentração da produção e redução do número de produtores. No entanto, é na década atual que se percebe acentuado crescimento da produção.

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Percebe-se, dessa forma, que a produção de leite conduz a uma diferenciação socioeconômica mais acentuada entre os agricultores, além de apresentar-se como uma tendência futura visível para a agricultura familiar. Deixando os cultivos em grande escala, como a soja, trigo, arroz, etc., para as “grandes” propriedades e introduzindo atividades como o leite, em função do alto valor agregado que esta atividade apresenta, os pequenos agricultores familiares obtêm resultados que garantem sua reprodução. Portanto, o leite mostra-se como atividade em expansão pelas suas várias peculariedades, capacidades adaptativas e pela rentabilidade, demonstrando ser uma alternativa econômica interessante.

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