a abordagem territorial como alternativa de diminuiÇÃo das ... · resumo no debate sobre...

20
1 A ABORDAGEM TERRITORIAL COMO ALTERNATIVA DE DIMINUIÇÃO DAS DESIGUALDADES: O ESTUDO DE CASO DO TERRITÓRIO DA CIDADANIA SERRA GERAL Ana Alice B. P. Garlipp Núcleo de Estudos Agrários e Territoriais (NEAD) Universidade Federal de Uberlândia-UFU [email protected] Ester William Núcleo de Agricultura do Instituto de Economia Universidade Federal de Uberlândia-UFU [email protected] Resumo No debate sobre desenvolvimento territorial muitos são os conceitos de Território adotados para interpretar os recortes das atuais políticas públicas, a despeito do ora utilizado pelas políticas locais de desenvolvimento territorial. A partir deles, objetiva-se dar sequência a pesquisa sobre as mudanças espaciais ocorridas no norte de Minas Gerais, pelo estudo de caso do Território da Cidadania Serra Geral, com base nas atuais condições sociais e econômicas desse espaço, a fim de contribuir para um diagnóstico sobre sua reterritorialização. Palavras-chave: Espaço. Território. Políticas Públicas. Território da Cidadania Serra Geral. Introdução Os debates em torno do chamado “desenvolvimento territorial” parecem evoluir para a consolidação de uma alternativa estratégica de enfrentamento das desigualdades econômicas e sociais no âmbito do desenvolvimento capitalista, num contexto de exaustão das teorias até então vigentes. Em meio a uma situação de crise econômica, após os choques do petróleo na década de 70 do século passado, surgem interpretações teóricas e experiências de desenvolvimento alternativas. Sob nova perspectiva, o desenvolvimento passa a ser visto como multidimensional e territorial, e é almejado por meio de políticas que buscam valorizar as diversidades econômicas, sociais, culturais e políticas existentes nos territórios na tentativa de encontrar respostas autônomas de desenvolvimento para os espaços locais. A despeito dos avanços alcançados por meio dessas políticas, o que parece permanecer é a lógica do capital, que em busca do seu processo de reprodução e valorização, não permite igualar níveis de desenvolvimento, pois do que se alcança, em termos de

Upload: dangthu

Post on 09-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

A ABORDAGEM TERRITORIAL COMO ALTERNATIVA DE DIMINUIÇÃO DAS DESIGUALDADES: O ESTUDO DE CASO DO

TERRITÓRIO DA CIDADANIA SERRA GERAL

Ana Alice B. P. Garlipp Núcleo de Estudos Agrários e Territoriais (NEAD)

Universidade Federal de Uberlândia-UFU [email protected]

Ester William

Núcleo de Agricultura do Instituto de Economia Universidade Federal de Uberlândia-UFU

[email protected]

Resumo No debate sobre desenvolvimento territorial muitos são os conceitos de Território adotados para interpretar os recortes das atuais políticas públicas, a despeito do ora utilizado pelas políticas locais de desenvolvimento territorial. A partir deles, objetiva-se dar sequência a pesquisa sobre as mudanças espaciais ocorridas no norte de Minas Gerais, pelo estudo de caso do Território da Cidadania Serra Geral, com base nas atuais condições sociais e econômicas desse espaço, a fim de contribuir para um diagnóstico sobre sua reterritorialização. Palavras-chave: Espaço. Território. Políticas Públicas. Território da Cidadania Serra Geral. Introdução Os debates em torno do chamado “desenvolvimento territorial” parecem evoluir para a

consolidação de uma alternativa estratégica de enfrentamento das desigualdades

econômicas e sociais no âmbito do desenvolvimento capitalista, num contexto de

exaustão das teorias até então vigentes. Em meio a uma situação de crise econômica,

após os choques do petróleo na década de 70 do século passado, surgem interpretações

teóricas e experiências de desenvolvimento alternativas.

Sob nova perspectiva, o desenvolvimento passa a ser visto como multidimensional e

territorial, e é almejado por meio de políticas que buscam valorizar as diversidades

econômicas, sociais, culturais e políticas existentes nos territórios na tentativa de

encontrar respostas autônomas de desenvolvimento para os espaços locais.

A despeito dos avanços alcançados por meio dessas políticas, o que parece permanecer

é a lógica do capital, que em busca do seu processo de reprodução e valorização, não

permite igualar níveis de desenvolvimento, pois do que se alcança, em termos de

2

transformações econômicas, sociais e políticas, evidenciadas no recorte territorial,

indicam manifestações espaciais de uma dinâmica maior, que é romper todas as

barreiras regionais/espaciais/temporais, para sua reprodução.

A bem da verdade, o capital, em seu processo de reprodução e valorização, não tem

como objetivo igualar níveis de desenvolvimento. As transformações econômicas,

sociais e políticas, explicitadas no âmbito geográfico, representam manifestações

espaciais de uma dinâmica maior – a dinâmica dos movimentos de acumulação do

capital. Em meio aos processos que se originam desses movimentos observa-se uma

heterogeneidade espacial do dinamismo econômico, que se revela na persistente

desigualdade entre os países desenvolvidos e os chamados “países em

desenvolvimento”, mas que se encontra, simultânea e contraditoriamente, caminhando

ao lado da busca da homogeneização do espaço.

Mas todo o processo é contraditório, e essa aparência é apenas uma das manifestações

da essência. À medida que o capital engendra um processo de homogeneização, gesta

também a diferenciação. Ao mesmo tempo em que se move sem fronteiras dirige-se a

lugares específicos para sua valorização e, portanto, explicita uma contraface – a

territorialização. A globalização que, por fim, parece ser uma “festa homogeneizadora”

(Brandão, 1996), reafirma, sob nova roupagem, as assimetrias advindas com o processo

de reprodução do capital, num quadro de produção de um desenvolvimento temporal e

geográfico desigual (Harvey, 2004). Como afirma Brandão (2007a), esse processo se

mostra, em sua expressão espacial, de forma mutável, parcial, diversa, regular e com

alta seletividade. As manifestações no espaço da valorização e da riqueza são altamente discriminatórias. Existe, assim, um processo de busca e seleção por pontos do espaço que ofereçam maior capacidade de apropriação privada de rendimentos e onde “valorizar o valor” seja mais fácil (Brandão, 2007a, p.52).

Em meio a uma pretensa homogeneização do globo, num processo que promove uma

contínua “desterritorialização” dos territórios a partir da “anulação do espaço pelo

tempo” (Harvey, 2004), engendra-se, simultaneamente, a reterritorialização desses

espaços ou a intensificação da territorialização no sentido de uma “multerritorialidade”,

como afirma Haesbaert(2006),num “(...) processo concomitante de destruição e

construção de territórios mesclando diferentes modalidades territoriais (...), em

múltiplas escalas e novas formas de articulação territorial (p.32).

3

A partir do reconhecimento da importância da abordagem territorial no âmbito do

debate sobre o desenvolvimento no sistema capitalista, pontua-se como se deu a

construção dessa nova abordagem (seção dois), destacando alguns dos aportes teóricos

que contribuíram para sua formulação, ainda em construção. Na sequência são listadas

algumas das principais estratégias de desenvolvimento e de combate à pobreza no Brasil

que incorporaram a perspectiva do desenvolvimento territorial, tomando como estudo

de caso o Território da Cidadania Serra Geral localizado no norte de Minas Gerais, para,

a partir dele, dar continuidade à compreensão dos limites e desafios que essas

estratégias encontram para tornar reais suas potencialidades.

A abordagem territorial do desenvolvimento Marginalizado durante algumas décadas, o debate sobre o desenvolvimento capitalista

assumiu novos contornos a partir do final do

século XX. Diante das profundas transformações vivenciadas em escala mundial, ainda

em curso, manifestas na intensificação do processo de mundialização do capital, e em

meio à crise do planejamento centralizado, o grande desafio para pensar o

desenvolvimento passou a residir na discussão sobre o papel que devem desempenhar o

local, a região, o espaço nacional num contexto em que o global é hasteado como

bandeira da globalização.

As transformações ocorridas no sistema capitalista no período mais recente,

especialmente desde as últimas três décadas do século passado, construíram

determinantes, tanto de natureza estrutural quanto conjuntural, que corroboraram para

processar profundas alterações na ordem mundial.

Diversas dimensões desse processo têm sido exaustivamente tratadas no âmbito dos

debates acadêmicos: o processo de financeirização da riqueza; a reorientação produtiva

e organizacional, com ênfase na flexibilização da produção e das relações de trabalho; a

redefinição do papel do Estado como conseqüência da hegemonia do ideário neoliberal

a partir dos anos 1990, implicando na defesa da redução da intervenção do Estado na

economia; a precarização das relações de trabalho; a relocalização econômica; e a

agudização da marginalização social (Brandão, 2007b).

As implicações dessas transformações sistêmicas no capitalismo evidentemente

repercutem sobre os territórios de maneira diferenciada. Como ressalta Brandão (2007b,

4

p.40), “(...) não há determinações lineares e fáceis, reclamando-se estabelecer inúmeras

mediações teóricas e históricas delicadas entre essas duas dinâmicas” para a melhor

compreensão dessas implicações.

A crise das políticas desenvolvimentistas fundamentadas em estratégias de

planejamento centralizado abre caminho para a defesa da descentralização política e

administrativa, defendida e recomendada pelas agências multilaterais como a alternativa

necessária à orientação das políticas públicas. Essa proposta (descentralização) adquiriu extensão universal ocupando um espaço cada vez maior no discurso programático de todos os partidos políticos, independentemente de sua posição no espectro político-ideológico clássico (Fiori, 1995, p.20).

Em consonância com o diagnóstico de crise da governabilidade das democracias, e com

a solução proposta de reduzir a participação pública do Estado, ganha força o enfoque

territorial como estratégia de possibilitar o desenvolvimento a partir de projetos com

autonomia local. Surgem, a partir daí, interpretações teóricas e experiências de

desenvolvimento alternativas.

Nessa direção, o debate sobre o desenvolvimento se amplia ao incorporar a dimensão

territorial na busca pela superação das desigualdades por meio de políticas públicas

orientadas no sentido de reforçar as bases sociais locais, assumindo que essas “são

capazes de promover uma ação pactuada entre os diferentes atores locais em prol do

desenvolvimento” (Ortega, 2008, p.73).

Contudo, como afirma Brandão (2007a), é preciso entender que o território, tomado

numa escala local, não tem poder ilimitado de promoção do desenvolvimento, como

têm sugerido muitas concepções que invadiram o debate sobre o desenvolvimento

territorial no Brasil e no mundo. Essa “endogenia exagerada” das localidades crê piamente na capacidade das vontades e iniciativas dos atores de uma comunidade empreendedora e solidária, que tem controle sobre seu destino e procura promover sua governança virtuosa lugareira. Classes sociais, oligopólios, hegemonia, etc. seriam componentes, forças, características de um passado totalmente superado, ou a ser superado (Brandão, 2007a, p.38).

A partir do entendimento de que o território é uma “construção social, por natureza

conflituosa; uma produção coletiva, dinâmica, multidimensional, com trajetória

5

histórica em aberto” (Brandão, 2007b, p.54), o enfoque territorial não pode ser utilizado

como panacéia para a solução de todos os problemas relativos ao desenvolvimento.

Expressão e produto das interações que seus atores protagonizam, o território é

caracterizado por assimetrias de poder, por conflitos inter e intraclasses que podem ser

tencionados pelas próprias políticas de descentralização fazendo-se necessário, portanto,

pensar o território e o desenvolvimento a partir da articulação das escalas, arenas, níveis

e instâncias que se encontram tramados (Brandão, 2007b).

Em adição, há que se discutir o território na complexidade que impõe o processo atual

de mundialização do capital, em que o capitalismo “desenha e redesenha novas

geografias, produzindo novas escalas, novos pontos nodais, rearranjando as forças da

polarização, da heterogeneidade e da dominação territorial” (Brandão, 2007b, p.42),

num movimento em que promove, ao mesmo tempo, a integração das localidades,

quadro que evidencia a própria natureza desigual e combinada do desenvolvimento

capitalista.

É nesse contexto amplo e complexo que se deve buscar o desenvolvimento dos espaços

caracterizados pela pobreza e miséria crescentes. A abordagem do enfoque territorial,

no âmbito das políticas públicas de desenvolvimento, constitui, nesse sentido,

importante estratégia para a redução das disparidades produzidas pelo modo de

produção capitalista ao buscar a inclusão socioespacial da população que compõe esses

espaços.

A experiência brasileira: estratégias de desenvolvimento sob a perspectiva do enfoque territorial O uso da abordagem territorial no âmbito das políticas públicas de desenvolvimento e

de combate à pobreza no Brasil começou a ganhar maior expressão nos anos 1980.

Como dito anteriormente, num contexto de crise econômica, iniciativas autônomas de

desenvolvimento para os espaços locais passaram a ser incentivadas desde cima pelos

organismos multilaterais. Conjuntamente, no caso brasileiro, a sociedade civil, num

processo de luta pela conquista da democracia em oposição ao regime militar,

reivindicava mais espaço na formulação e gestão de políticas públicas, buscando, assim,

a construção de um desenvolvimento desde baixo, que fosse capaz de levar em

6

consideração as opiniões dos agentes locais com respeito aos projetos formulados pelo

governo central (Ortega e Mendonça, 2007)i.

A Constituição de 1988 reflete o resultado desses processos reivindicatórios ao

fortalecer a descentralização na distribuição das responsabilidades atribuídas aos

estados e aos municípios. Na gestão das políticas descentralizadoras, foram instituídos

conselhos (arranjos sociais locais) a partir dos quais os municípios teriam acesso aos

recursos repassados pelo Governo Federal – por exemplo, conselhos municipais de

saúde, conselhos municipais de educação, conselhos municipais de Desenvolvimento

Rural Sustentável (CMDRS), entre outros (Ortega e Mendonça, 2007). Esse processo de descentralização, na formulação e gestão de políticas públicas, vem valorizando a concertação social na busca de alternativas de desenvolvimento. Esses novos espaços constituem-se, na opinião de muitos cientistas sociais, como a mais importante inovação institucional das políticas públicas no Brasil pós sua redemocratização, com a construção de uma nova cidadania (Dagnino, 1994) (Ortega e Mendonça, 2007, p.94, grifo do autor).

No cenário da década de 1990, a disseminação e a hegemonia do ideário neoliberal vem

acompanhado de um intenso processo de desregulamentação da economia, num

contexto em que, diante do problema de endividamento dos países em desenvolvimento,

a solução imposta pelas agências multilaterais, especialmente pelo Banco Mundial e

pelo Fundo Monetário Internacional, estava na redução da participação do Estado na

economia, cabendo a este controlar suas contas públicas para a geração de superávit

primário a fim de resolver o problema do endividamento público.

Nessa direção, o incentivo à adoção de políticas de desenvolvimento local caminhava

em consonância com o objetivo de diminuição dos gastos públicos, à medida que as

localidades, ao buscar um desenvolvimento autônomo e endógeno, mediante a indução

dos governos centrais na constituição dos arranjos socioprodutivos locais,

desobrigariam o Estado de ações mais intervencionistas (Ortega e Mendonça, 2007).

De outro lado, esse movimento, por diversas razões, foi ao encontro das reivindicações

e aspirações dos militantes do localismo, que objetivavam maior participação na gestão

pública. A bem da verdade, segundo Ortega e Mendonça (2007, p.95), essas posições,

contribuem, atualmente, para “(...) embaralhar as discussões em torno do papel do

Estado, pois criam um aparente consenso em torno do tema do desenvolvimento local

7

(...)”, uma vez que ambos – agências multilaterais e militantes localistas - querem a

construção de um modelo de desenvolvimento local autônomo e endógeno.

Pode-se identificar, de forma mais evidente, a implementação de estratégias de

desenvolvimento com enfoque territorial nas políticas públicas brasileiras a partir do

final da década de 1990. Essas estratégias partiram dos seguintes consensos

identificados por Ortega (2008, p.16): . Os déficits nutricionais e a pobreza se concentram nos ambientes rurais (campo e cidades rurais); o rural é tomado como espaço e diferencia-se da abordagem que o identifica com o setor agropecuário; . o processo de desenvolvimento deve se dar com a inserção em mercados dinâmicos (regionais, nacionais e internacionais); . com a introdução de inovações tecnológicas produtivas e organizacionais, a reforma institucional, com a criação de novos modelos de governança local, deve levar a cabo a descentralização administrativa e/ou política; . essa nova governança se sustentaria em virtude de uma concertação social, cujo resultado é um pacto territorial (inter e intraclasses e público-privado).

No governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), uma das primeiras

experiências no âmbito das políticas de desenvolvimento local foi a criação do

Programa Comunidade Solidária (PCS), em 1995, sob uma nova perspectiva de

enfrentamento da pobreza e exclusão social vis-à-vis os programas sociais até então

implementados, caracterizados por práticas assistencialistas e clientelistas, que

acabavam por reproduzir a exclusão e as desigualdades sociais. O objetivo principal do

PCS, segundo Cardoso (2000a, p.3 in Ortega, 2008, p.156) era: o enfrentamento da pobreza e da exclusão social com base em um “novo referencial” de atuação do Estado no campo social. [...] Combater a pobreza não é transformar pessoas e comunidades em beneficiários passivos e permanentes de programas assistenciais. Combater a pobreza é fortalecer as capacidades de pessoas e comunidades de satisfazer necessidades, resolver problemas e melhorar sua qualidade de vida.

Constituindo-se um espaço de debates entre o governo e as organizações da sociedade

civil, com vistas à convergência de projetos a serem implementados mediante a

formação de parcerias, o PCS realizou diversas discussões em torno do tema

desenvolvimento local, resultando, em 1999, na criação do Programa Comunidade

Ativa (PCA), coordenado pela Secretaria-executiva do Programa Comunidade Solidária,

“(...) com o objetivo principal de combater a pobreza e promover o desenvolvimento por

meio da constituição de fóruns locais de concertação, que elaborariam seus projetos de

8

Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DLIS)” (Ortega, 2008, p.157).

Buscava-se, com o PCA, viabilizar o desenvolvimento dos municípios mais deprimidos

do país, e isto em parceria com os governos estaduais e municipais e o Serviço

Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE).

Sob o entendimento do “local” como qualquer recorte socioterritorial cuja delimitação

se dá por meio de uma característica identitária eletiva, vislumbrava-se o

desenvolvimento que fosse capaz de levar em conta não apenas a necessidade de

articulação entre os atores que interagem no âmbito local, mas também a necessidade de

articulação entre os diversos fatores que interferem no desenvolvimento (econômicos,

sociais, culturais, político-institucionais, físico-territoriais, científico-tecnológicos),

numa concepção de “sustentabilidade” que defendia a redução das carências presentes

sem comprometer a capacidade de satisfação das gerações futuras (Ortega, 2008).

Não obstante, o PCA, por meio da constituição dos fóruns DLIS, tenha estabelecido

importantes diferenças em relação aos programas sociais anteriores do governo federal,

não obteve, segundo Graziano da Silva e Takagi (2004 in Ortega, 2008), o sucesso

esperado no que se refere à dinamização das economias locais, à integração das políticas

públicas e à construção de novos arranjos para gestão de projetos inovadores

específicos, embora, deve-se ressaltar, tenha contribuído para aumentar o “capital

social” das comunidades.

No âmbito rural, a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura

Familiar (PRONAF), em 1996, representou um marco importante na política de

desenvolvimento rural do país. A fim de promover o “desenvolvimento sustentável” dos

agricultores familiares, elevar sua capacidade produtiva, gerar empregos e melhorar sua

renda (Ortega, 2008), o PRONAF foi concebido tendo como referência os resultados de

um estudo do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e da FAO

(Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação), cujas conclusões

apontavam para a importância da agricultura familiar na economia brasileira e para a

necessidade de uma política de crédito especial para esse segmento da produção

agropecuáriaii.

Estruturado em três linhas principais de financiamento – Capacitação, Infra-estrutura e

Serviços e Crédito -, o PRONAF assumiu, inicialmente, no governo FHC, um caráter

municipal. A partir dos recursos controlados pelo SNCR (Sistema Nacional de Crédito

9

Rural), oriundos de quatro fontes - do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), dos

Fundos Constitucionais, das exigibilidades do Manual de Crédito Rural do Banco

Central e dos Recursos do Tesouro Nacional –, estabeleceu-se a necessidade dos Planos

Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável (PMDRS), a fim de orientar a

alocação de recursos para as duas primeiras linhas de financiamento. Os PMDRS

deveriam ser elaborados pelos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural

Sustentável (CMDRS) cuja constituição era obrigatória para os municípios

selecionados. A linha de Crédito, por sua vez, de caráter individual, é concedida pelas

instituições bancárias, com base em análise de projetos elaborados pelos agricultores

(Ortega, 2008).

Ainda que não seja objeto deste trabalho discutir os resultados alcançados pelo

PRONAF desde sua criação até o presente, há que se ressaltar que esse programa

tornou-se a principal proposta do governo brasileiro para a promoção do

desenvolvimento rural, evidenciando inegável possibilidade de inclusão social e

econômica da população inserida em espaços rurais.

Num quadro de reinstitucionalização da estrutura de administração pública, criou-se, em

1999, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e, nesse mesmo ano, o

Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS), que deveria

deliberar sobre os Planos Nacionais de Desenvolvimento Rural Sustentável (PNDRS),

elaborados nos municípios e aprovados pelos Conselhos Estaduais de Desenvolvimento

Rural Sustentável. Por meio da estruturação desse aparato, o governo buscava promover

o desenvolvimento local dando um “empurrão inicial” (Veiga, 2001 in Ortega, 2008)

com vistas a induzir a formação de novas articulações institucionais locais. Ao lado

dessa empreitada tornou-se cada vez mais premente a necessidade prover aos arranjos

socioprodutivos capacitação, financiamento e outros ativos que os tornassem capazes de

caminhar por conta própria (Ortega, 2008).

Em que pese os avanços observados no governo FHC no que tange às políticas de

desenvolvimento rural, constatou-se, naquele período, um claro protagonismo das

políticas liberalizantes – abertura comercial, privatizações, focalização das políticas

sociais, etc. -, que corroboraram para gerar uma insatisfação crescente em alguns

segmentos da população e para formar uma grande expectativa de mudanças nos rumos

das políticas públicas em torno do governo do novo presidente eleito, Luiz Inácio Lula

10

da Silva. No âmbito das políticas voltadas ao desenvolvimento rural, o governo manteve

a abordagem territorial como fizera o governo FHC. Contudo, diferentemente das

políticas descentralizadoras de caráter municipal, o governo Lula inovou ao centrar o

foco de suas políticas nos espaços socioprodutivos intermunicipais.

A partir de uma pesquisa realizada em 2003, do Ministério do Desenvolvimento Social

e Combate à Fome (MDS), que apontou vários municípios com baixo Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH) em todos os estados brasileiros, foram criados os

chamados Territórios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (Consad’s)iii,

formados por consórcios de municípios. Inserido na política de segurança alimentar, os

Consad’s (...) constituem-se num espaço de cooperação entre poder público e a sociedade civil voltado para o fomento, o apoio logístico e a canalização de recursos para as iniciativas territoriais, projetos e ações estruturantes, visando à geração de emprego e renda com a garantia de segurança alimentar e desenvolvimento local (Ortega e Mendonça, 2007, p.113).

Buscava-se, uma condição de segurança alimentar que não seria gestada somente

mediante políticas e ações compensatórias - em geral utilizadas para socorrer a

população ameaçada de desnutrição -, mas por meio de uma dinamização econômica

dos territórios a serem atendidos, “(...) criando as condições para que as carências e

necessidades transformem-se em incentivo ao empreendedorismo local e à fixação da

renda nestas sub-regiões” (Franca in Ortega e Mendonça, 2007, p.113).

Não obstante as ações dos Consad’s objetivem a construção de bases sólidas que

possibilitam às populações mais pobres obter trabalho e renda, um dos maiores desafios

dessa estratégia encontra-se na dificuldade de construção de um pacto territorial que

viabilize a elaboração de um projeto de desenvolvimento, uma vez que, para tal

construção, faz-se necessário a articulação entre grupos de municípios que devem se

unir por laços de identidade social, cultural, ambiental, tecnológico ou econômico

(Ortega e Mendonça, 2007). Dada a diversidade constitutiva dos municípios,

intensificada pelas grandes carências daqueles com baixos índices de Desenvolvimento

Humano, com pequena população, e que se encontram excluídos dos principais eixos de

acumulação de riqueza, essa articulação torna-se mais difícil e carece da atuação do

Estado para operacionalizá-la.

11

Como proposta de reorientação estratégica da política de desenvolvimento rural

brasileira, criou-se, em 2003, a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), no

âmbito do MDA.

Com a criação da SDT, a linha de financiamento Infra-estrutura e Serviços, do

PRONAF, mudou sua unidade de atendimento, passando a atuar “(...) como suporte ao

desenvolvimento de ‘territórios rurais’, de caráter intermunicipal (Ortega e Mendonça,

2007, p.116). Como dito anteriormente, o objetivo era o de unir os municípios em um

projeto de desenvolvimento territorial por meio dos arranjos socioprodutivos não mais

de caráter municipal, mas intermunicipal, procurando uma melhor alocação dos

recursos, antes pulverizados nos municípios, e aproveitando a sinergia gerada por uma

ação mais abrangente, sem perder de vista a valorização dos potenciais endógenos na

promoção do desenvolvimento local.

O desafio inicial da SDT consistia em definir e identificar o que seriam os chamados

Territórios Rurais (TRs)iv a partir de elementos de coesão social e territorial.

Apresentou-se, assim, uma definição operacional de território, conforme citado por

Ortega (2008, p.165): Espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial (Brasil, 2003f, p.34).

Uma vez definidos os territórios rurais, caberia à SDT apoiar e promover o

desenvolvimento dos mesmos, por meio da articulação dos Planos Territoriais de

Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS). Nesse processo, assumiriam papel

fundamental os Conselhos de Desenvolvimento Rural (municipais, territoriais, estaduais

e nacional) no que tange à organização e pactuação em torno dos PTDRS, configurando

um quadro em que a participação no planejamento, na negociação, na gestão, etc. dos

territórios é fundamental para o alcance do desenvolvimento. A bem da verdade, a

construção dessas novas institucionalidades com perfil intermunicipal representou um

avanço na condução das políticas públicas de desenvolvimento territorial rural.

A partir dos TRs foi constituído o programa Territórios da Cidadania (TCs), em 2008,

como um dos eixos de ação do governo federal com o objetivo de reduzir as

12

desigualdades. Visando à integração e coordenação das ações do Governo Federal, dos

governos estaduais e municipais em um plano desenvolvido em cada território, com a

participação da sociedade, busca-se promover um desenvolvimento mais equânime e

inclusivo.

Uma das novidades desse programa refere-se ao seu público alvo: populações inseridas

nos territórios mais carentes dentro dos territórios rurais. Além de necessariamente

pertencer ao programa TRs, os territórios a serem selecionado para o programa TCs

devem atender os seguintes critérios: “possuir os menores IDH; maior concentração de agricultores familiares e assentados de reforma agrária; maior concentração de população quilombolas e indígenas; maior número de beneficiários do programa Bolsa Família; maior número de municípios com baixo dinamismo econômico; maior organização social; pelo menos um território por estado da federação” (Brasil, Decreto de 22 de fevereiro de 2008, citado por Ortega, 2008, p.170).

Consideradas as diferenças do TCs, relativamente a outros programas com enfoque

territorial no que se refere à sua concepção e operacionalização, os problemas

enfrentados começam já na gestão local do programa. “A presença de membros de

diferentes esferas de poder e de segmentos sociais, por si só, já implica dificuldades em

se obter consenso (Ortega, 2008, p. 171). Ademais, a ampliação das ações, oriundas dos

diversos ministérios, requer coordenação e integração a fim de não ocorrer a

sobreposição de políticas e, com isso, dificultar a organização dos atores sociais e a

ineficiência na alocação dos recursos.

Isto posto, pode-se afirmar que as experiências de desenvolvimento territorial no Brasil,

ao contrário do que propõem os neoliberais quando defendem a menor participação do

Estado nas estratégias de desenvolvimento dos espaços locais, mostraram que a

descentralização demanda uma forte atuação intervencionista do governo central, não

somente devido à maior capacidade deste em “(...) financiar a infra-estrutura básica de desenvolvimento local como, também, de exercer o seu poder junto aos fortes grupos políticos locais que podem fazer valer seus poderes para uma distribuição assimétrica dos investimentos governamentais” (Ortega, 2008:32).

As políticas de desenvolvimento territorial dos governos FHC e Lula, tomadas em

linhas gerais, valorizam as diversidades locais e enaltecem a necessidade de organização

e pactuação da sociedade em torno de objetivos comuns para a construção de seus

13

projetos de desenvolvimento endógeno. A partir da construção de arranjos

socioprodutivos locais, a motivação principal dessas políticas tem sido “(...) contribuir com o combate à pobreza e à exclusão, e vêm constituindo-se em alternativas de inclusão social e inserção competitiva dos territórios em circuitos econômicos regionais, nacionais e internacionais mais dinâmicos” (Ortega, 2008, p. 40).

Assim parece ser o caso dos Territórios da Cidadania, implantados com vistas a induzir

os espaços de baixa capacidade autônoma de desenvolvimento, através de políticas

focalizadas.

Ainda jogando luz nesta discussão, pretende-se dar continuidade a este estudo pelas

lentes do que Raffestin (1993) definiu como espaço e território. Ele é visto como um

espaço, quando recebe as ações de políticas públicas pelas suas condições naturais, e

como um território, pelas possibilidades de construção social advindas com a

implantação do Programa Territórios da Cidadania. Bem como, pela mescla dos

conceitos de Território interpretadas dada por Pecqueur (2000) de, “Território dado”

aquele estabelecido por decisões político-administrativas num processo de cima para

baixo, e de “Território Construído”, que é o formado a partir de interesses comuns dos

atores sociais, presentes, em um dado espaço geográfico.

Considerando-se estes dois “movimentos” de interpretação dos conceitos de espaço e

território, para compreender as conformações sócio-econômicas do Território Serra

Geral, à luz de alguns de seus indicadores, já é possível apontar resultados obtidos pela

via das políticas setoriais, bem como dos que expressam as políticas focalizadas. Em

continuidade com a pesquisa, aponta-se que as ações de governo se cruzam e podem

corroborar em prol de uma dinâmica mais inclusiva, no entanto, não parece ainda

permitir a diminuição das diferenças sociais e econômicas entre os seus municípios.

O caso do Território da Cidadania Serra Geral Diante das questões levantadas nos apontamentos teóricos sobre

Territorialização/Reterritorialização, instiga-se a compreensão das transformações

ocorridas num determinado espaço geográfico, que ao se tornar alvo das recentes

políticas públicas voltadas ao desenvolvimento, foi definido e delimitado como um

14

território, compondo um dos oito Territórios da Cidadania de Minas Gerais, que é o

Território da Cidadania Serra Geral (TSG) )v.

Mapa 1- Território Serra Geral

Fonte:IBGE ( Elaboração Própria)

Chama atenção a conjunção de apoios institucionais de valorização do território ali

direcionados a partir da década de 2000, muitos dos quais, almejam diminuir as

diferenças sociais, econômicas e culturais existentes entre os municípios que o compõe.

Ainda, instiga-se conhecer a realidade deste espaço porque alguns municípios de Serra

Geral também fazem parte da SUDENE e dos programas estruturantes de

desenvolvimento implantados nas décadas de 1970 e 1980, através das ações da

CODEVASF, os quais proporcionaram a alguns deles, inserção em mercados mais

dinâmicos, tanto fora do estado e também no comércio internacional, pela atividade da

fruticultura, como são os casos dos municípios de Jaíba e Janaúba.

15

Para que se tenha noção dos impactos causados pelas ações de políticas públicas quanto

às possíveis melhorias de qualidade de vida no espaço Território Serra Geral, inicia-se

levantamento de dados pelos indicadores que comumente são usados para medir

desenvolvimento econômico e social. Através deles, já se visualiza as significativas

diferenças entre os municípios que compõem este Território e os enfrentamentos das

atuais políticas públicas no sentido de levar a um desenvolvimento mais homogêneo ou

uma reterritorialização includente.

Indicadores Sociais No que tange aos indicadores de qualidade de vida, verifica-se que os 16 municípios

que formam o TSG possuem características semelhantes quanto ao Índice de

Desenvolvimento Humano (IDH-Municipal) que apresentam (Quadro 1).

Quadro 1- IDH-M dos municípios do Território Serra Geral, 1991 e 2000. Município IDHM, 1991 IDHM, 2000 IDHM-Renda, 1991 IDHM-Renda, 2000

Janaúba 0,641 0,716 0,557 0,614Nova Porteirinha 0,598 0,685 0,475 0,564Mato Verde 0,575 0,669 0,507 0,557Espinosa 0,572 0,657 0,494 0,554Monte Azul 0,569 0,657 0,48 0,522Serranópolis de Minas

0,536 0,655 0,429 0,519Jaíba 0,527 0,652 0,474 0,559Porteirinha 0,549 0,633 0,486 0,544Mamonas 0,527 0,621 0,443 0,529Catuti 0,498 0,605 0,404 0,474Riacho dos Machados

0,534 0,604 0,455 0,483Manga 0,545 0,603 0,581 0,514Verdelândia 0,502 0,602 0,438 0,458Matias Cardoso 0,494 0,602 0,436 0,463Gameleiras 0,488 0,581 0,421 0,473Pai Pedro 0,461 0,575 0,406 0,486 Fonte: Fundação João Pinheiro, 2012 ( Elaboração Própria)

Outro dado revelador de carências de qualidade de vida é a baixa distribuição de terras

no espaço do Território Serra Geral, traduzida pelo número de famílias assentadas em

grande parte de seus municípios. Estes dados permitem verificar que justamente os

municípios em que o IDH-M é menor são os que apresentam maior volume de

assentamentos.

16

Quadro 2- Número de famílias assentadas nos municípios do Território Serra Geral, 2006 a 2011.

Famílias assentadas2006-2011

Manga 895Matias Cardoso 605Porteirinha 446Verdelândia 415Janaúba 275Jaíba 208Nova Porteirinha 70Riacho dos Machados 7

Município

Fonte: Dataluta,2011 ( Elaboração Própria)

Indicadores Econômicos Quanto ao panorama econômico dos municípios do Território Serra Geral, alguns dos

seus indicadores apontam através de suas participações na redistribuição das receitas

geradas os que parecem ser mais dinâmicos. Na Tabela 1 verifica-se que os municípios

de Janaúba e Jaíba são os que apresentam as maiores participações, no entanto, chama a

atenção quão expressiva é a participação de Janaúba frente aos primeiros maiores

contribuintes do VAF, demonstrando assim uma dinâmica econômica diferenciada dos

demais.

Tabela 1- Valor Adicional Fiscal (VAF) dos municípios do TSG, 1999 a 2009. Valor Adicionado total (R$mil)

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009

Janaúba 129.042 138.841 165.794 196.379 207.838 232.001 260.536 344.743 394.452 476.529 478.051

Jaíba 58.111 67.047 69.397 78.447 78.835 92.466 113.180 141.971 170.160 213.623 262.987

Porteirinha 51.464 55.550 59.725 71.939 80.245 89.130 100.349 106.202 116.792 137.774 146.806

Espinosa 42.015 44.718 50.395 57.280 65.262 73.069 81.840 89.871 100.630 120.213 131.405

Manga 34.662 35.438 38.704 46.044 56.122 62.170 75.223 78.000 84.753 96.619 119.751

Monte Azul 37.231 34.808 40.774 48.107 49.719 56.132 62.459 66.153 75.528 87.141 92.428

Matias Cardoso 17.609 18.170 17.889 21.774 33.200 32.909 35.999 53.117 53.558 71.025 86.412

Verdelândia 16.335 19.271 19.573 25.004 27.723 30.899 36.887 47.795 44.362 60.420 63.585

Nova Porteirinha 17.559 21.732 23.093 25.118 27.784 32.810 38.638 51.712 47.718 60.434 63.427

Mato Verde 18.008 21.650 22.029 25.913 27.845 32.593 37.367 40.785 44.741 51.372 56.896

Riacho dos Machados 14.380 15.110 16.246 20.267 20.218 20.277 22.896 21.829 32.281 52.623 52.525

Gameleiras 9.179 11.231 11.286 15.181 15.612 15.895 17.668 17.724 22.530 29.455 33.462

Pai Pedro 6.944 7.962 8.036 9.877 10.928 12.589 14.234 15.241 18.659 23.798 25.685

Mamonas 8.462 9.460 8.373 11.763 11.900 13.486 15.207 14.320 18.752 23.717 25.403

Catuti 6.275 7.787 7.896 9.859 10.746 12.543 13.570 14.212 16.300 19.903 21.523

Serranópolis de Minas 5.666 5.677 6.018 7.308 7.628 8.588 10.435 11.428 14.183 17.443 18.592

Município

Fonte: Secretaria da Receita Estadual de Minas Gerais ( Elaboração Própria)

17

Quanto ao perfil da produção, toma-se como referência atividades econômicas que estão

incluídas em políticas governamentais de apoio a Arranjos Produtivos Locais (APLs)

como é o caso da atividade de fruticultura em Minas Gerais. Dentre os municípios que

compõem os APLs de Fruticultura no estado verifica-se importante participação de

municípios do Território Serra Geral. Segundo estes dados, dos seis municípios do TSG

presentes neste arranjo, dois deles participam com o maior número de estabelecimentos

da cadeia produtiva, como são os casos de Janaúba e Nova Porteirinha.

Tabela 2 - Municípios dos APLs de Fruticultura em MG, por número de estabelecimentos, 2010. Municípios de APLS Cultiv. frutas de lav. perm. Fabric. Fabric.de frutas, % de estab. nos APLs Fruticultura em M Gerais exceto laranja e uva de conserv. de frutas hortaliças e legumes de Fruticultura Capitao Eneas 3 0 0 3 1,09Espinosa 4 0 0 4 1,45 Jaíba 39 0 0 39 14,18 Janaúba 76 1 1 78 28,36 Januária 1 0 0 1 0,36 Matias Cardoso 32 2 0 34 12,36 Montes Claros 11 2 0 13 4,73 Muriae 4 0 0 4 1,45Nova Porteirinha 44 0 0 44 16,00 Pirapora 5 0 0 5 1,82 Verdelandia 10 0 0 10 3,64 Ponte Nova 2 1 1 4 1,45Santos Dumont 0 0 0 0 0,00Ubá 6 2 1 9 3,27 Viçosa 9 0 3 12 4,36 Visconde do R.Branco 11 3 1 15 5,45Total 257 11 7 275 100,00

Total

Fonte: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e RAIS- Ministério do Trabalho, 2010. ( Elaboração Própria)

Outro indicador importante, que denota uma das ações de fomento à produção agrícola

presente nos municípios do Território Serra Geral, é o Programa de Aquisição de

Alimentos do governo federal. Com vistas ao estímulo a produção local dos agricultores

familiares, sobretudo dos de pequeno porte, o PAA está presente em quase todos os

municípios do TSG. Dentre estes municípios destacam-se Jaíba, Nova Porteirinha e

Manga, pelo maior número de agricultores atendidos e pelos valores recebidos. (Tabela

3)

18

Tabela 3. Municípios do TSG atendidos pelo Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)

Municípios contemplados nos anos Valores destinados (%)Agricultores atendidos (%)Jaíba (2008,2009,2010,2011,2012) 35,87 37,19Nova Porteirinha (2008,2009,2010,2011,2012) 19,55 19,16Manga (2008,2009,2010,2011) 13,33 13,81Porteirinha (2008,2010,2011) 12,34 11,71Riacho dos Machados (2019,2010,2011) 6,08 5,64Pai Pedro (2008,2010,2012) 5,04 4,64Espinosa (2010,2011) 2,97 2,66Janaúba (2010,2012) 2,48 2,52Serranópolis de Minas (2012) 0,92 0,91Mato Verde (2010) 0,55 0,73Verdelândia (2009) 0,25 0,27Monte Azul (2010) 0,23 0,25Matias Cardoso (2011) 0,23 0,19Catuti (2009) 0,17 0,31 Fonte: Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), 12/09/2011. ( Elaboração Própria)

Considerações finais As políticas públicas de desenvolvimento sugeridas, a partir da década de 1990, pelas

agências multilaterais aos países em desenvolvimento têm no enfoque territorial a

defesa de uma alternativa estratégica de enfrentamento das disparidades produzidas pelo

modo capitalista de produção. Diante da exaustão das teorias de desenvolvimento

associadas à disseminação do padrão de consumo dos países desenvolvidos, somada à

crise das políticas centralizadas e à hegemonia das idéias liberalizantes, as estratégias

propostas visam à promoção do desenvolvimento dos espaços locais a partir da atuação

das instituições, das empresas e dos atores sociais inseridos nesses espaços, que devem

explorar as potencialidades endógenas e estimular o desenvolvimento autônomo e

endógeno. Nessa direção, o Estado estaria “liberado” da responsabilidade das questões

sociais desses espaços.

À parte esse ideário liberalizante, a incorporação das estratégias de desenvolvimento

local nas políticas públicas, ao valorizar e fortalecer o capital social presente nos

territórios, ao impulsionar a cooperação e a articulação dos agentes locais

O mesmo se pode dizer das experiências brasileiras, em que o Estado tem promovido,

por meio das políticas públicas de desenvolvimento territorial rural, o aparato

institucional e o aporte de recursos necessários para que os territórios, alguns deles antes

assistidos por políticas assistencialistas e clientelistas, possam ter condições de explorar

ou de criar potencialidades que lhes proporcionem a inclusão na sociedade capitalista.

19

É certo que o desenvolvimento local não deve ser tomado como solução para todo e

qualquer problema do desenvolvimento. Muitos são os desafios a serem enfrentados no

caminho da busca pela justiça e equidade social. Mesmo no interior do processo de

reprodução desigual e combinada do capital, a abordagem territorial constitui

importante estratégia na tentativa de reduzir as desigualdades e promover o

desenvolvimento dos espaços locais.

Com vistas a identificar e compreender ações de políticas focalizadas através do estudo

de caso do Território da Cidadania Serra Geral, é possível dizer, preliminarmente, pelos

indicadores sociais e econômicos aqui apresentados, e que ora expressam a realidade

daquele espaço, que ainda não geram efeitos multiplicadores importantes para diminuir

as diferenças sócio-econômicas dos dezesseis municípios que compõem este Território.

Ainda mais, podem aumentar tais assimetrias, uma vez que a maior parte dos recursos

se concentra em poucos municípios.

Notas

i A partir dessas iniciativas, pode-se identificar duas estratégias de planejamento que vão balizar as políticas de desenvolvimento territorial: uma em que o desenvolvimento local é planejado de cima para baixo (top-down), ou seja, orientado principalmente pela esfera federal; e outra em que os planos de desenvolvimento local são construídos de baixo para cima (button-up), a partir da participação das esferas públicas e privadas locais, portanto, de forma descentralizada (Ortega,2008). ii Só para se ter uma idéia da dimensão dessa importância, constatou-se que 75% dos estabelecimentos rurais, no Brasil, apresentavam características de produção familiar, representavam 22% da área total, contavam com 60% do pessoal ocupado e detinham 28% do valor total da produção agropecuária. Contudo, do total de estabelecimentos que obtiveram financiamentos, 44,2% eram familiares, mas estes captaram apenas 11% do valor total dos recursos de fontes formais de financiamento (Ortega, 2008). iii Atualmente, há, no Brasil, 40 territórios, englobando 585 municípios e uma população de mais de 11 milhões de habitantes. (Informação retirada do site, em janeiro de 2011: http://www.mds.gov.br/segurancaalimentar/desenvolvimentoterritorial/consad). iv A SDT atua, atualmente, em 164 territórios rurais de todo o País, conforme http://www.mda.gov.br/portal/sdt/programas//territoriosrurais. iv O Território Serra Geral está localizado no norte de Minas Gerais e sua delimitação geográfica coincide com a delimitação do IBGE para a microrregião de Janaúba em treze dos seus dezesseis municípios.

Referências BAGNASCO, A. Desenvolvimento regional, sociedade local e economia difusa. In: Urani, A., Cocco, G., e Galvão, A.P. (orgs.). Empresários e empregos nos novos

20

territórios produtivos: o caso da terceira Itália. Rio de Janeiro, DP&A Editores, 1999, p.33-43. BRANDÃO, C. A. Revisitando a questão das diversidades regionais: notas preliminares para uma agenda de pesquisas. Economia Ensaios, Uberlândia, 10(2): 29-44, dez. 1996. ________. Território e desenvolvimento: as múltiplas escalas entre o local e o global. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2007a, capítulo 1. ________. Territórios com classes sociais, conflitos, decisão e poder. In: Ortega, A.C. e Almeida Filho, N. (orgs.). Desenvolvimento territorial, segurança alimentar e economia solidária. Campinas, SP: Editora Alínea, 2007b, p. 39-61. HARVEY, D. Espaços de Esperança. São Paulo, 2004, capítulos 2, 4 e 5. HAESBAERT, R. Introdução. In: Haesbaert, R. O mito da desterritorialização. Do “fim dos territórios” à multiterritorializadade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006, p.19-34. ORTEGA, A.C. Territórios Deprimidos: desafios para as políticas de desenvolvimento rural. Campinas, SP: Editora Alínea; Uberlândia, MG: EDUFU, 2008. ORTEGA, A.C.; MENDONÇA, N. C.Territórios rurais. Uberlândia: IEUFU, 2005 (mimeo). ORTEGA, A.C.; MENDONÇA, N. C. Estratégias de desenvolvimento territorial rural no Brasil: continuidades e rupturas. In: Ortega, A. C.; Almeida Filho, N. (orgs.). Desenvolvimento territorial, segurança alimentar e economia solidária. Campinas, SP: Editora Alínea, 2007, p.93-121. Putnam, R. D. Capital social e desempenho institucional. In: Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. Rio de Janeiro: FGV Editora, 2000. (2ªEdição). RAFFESTIN, C.1993. Por Uma Geografia do Poder. São Paulo. Ed. Ática. VEIGA, J. E. A face territorial do desenvolvimento. Revista Internacional de Desenvolvimento Local. Vol. 3, No. 5, p. 5-19, Set. 2002. Disponível em: http://www.econ.fea.usp.br/zeeli/Textos/ArtigosCientificos/%5B20%5Dface_territorial.htm#_ftn25. Acesso outubro de 2010. Sites Consultados: www.mda.gov.br www.ibge.gov.br www.mte.gov.br www.fundacaojoaopinheiro.org.br www.mds.gov.br