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8 P2 Domingo 13 Abril 2008 Cristiano Ronaldo A imprensa internacional está rendida aos golos, aos truques e aos números de circo de Ronaldo. Nós também. Bruno Prata, que segue há anos a carreira do jogador, acha que ele é o melhor jogador português de todos os tempos e, finalmente, o melhor jogador do mundo a Cristiano Ronaldo é “o fora-de- série perfeito” e “o verdadeiro protótipo futebolístico do terceiro milénio”, escreveu o diário desportivo italiano Tuttosport, que enumerou as qualidades do jogador do Manchester United: “forte, rápido, explosivo, acrobático, duro no combate, tecnicamente sublime, agora também cada vez mais cínico nos momentos cruciais do jogo. Se quisermos resumir tudo numa palavra: determinante. Se fosse mais simpático e menos arrogante com os adversários no campo, seria um verdadeiro extraterrestre”. O inglês The Guardian diz que Ronaldo “traz paixão ao futebol e é o jogador mais excitante” a jogar em Inglaterra, o Daily Mail questiona mesmo se “é o melhor jogador que a Premier League já viu”, enquanto o Mirror usa o título Simply the Best, num trocadilho com o nome do craque inglês que, pouco antes de morrer, escolheu Ronaldo como o seu digno sucessor. A imprensa internacional está definitivamente rendida aos golos, aos truques e às fintas de Ronaldo. Mas também ao sorriso e aos músculos peitorais que ele gosta de mostrar. Já ninguém tem dúvidas de que irá receber os principais troféus individuais, incluindo o de melhor jogador do mundo. Mesmo os mais renitentes vergaram-se, inebriados pelas exibições de Ronaldo, como no jogo da primeira mão dos quartos- de-final da Liga dos Campeões, em Roma. “Muito Ronaldo”, “Ave, Cristiano Ronaldo” e “Ronaldo ao sétimo céu” foram os títulos usados pelos italianos da La Gazzetta dello Sport, pelos espanhóis da Marca e pelos franceses do L’Equipe, respectivamente. O que torna Ronaldo tão especial no supercompetitivo mundo do futebol? Analisado sob o plano físico (1,85m de altura para 85 kg de peso), percebe-se que tem uma relação antropometria/potência digna de um titã. Foi também abençoado com genes raros, quiçá formatados como os gomos de uma bola. São eles que lhe garantem aquele jeito único de correr com passinhos demasiado curtos (mas rápidos) para o tamanho das pernas longas. O talento inato percebe-se também quando domina a bola com a biqueira das chuteiras, nos arranques supersónicos e nos dribles sem fim por entre a floresta de pernas adversárias. Mas já a escritora brasileira Clarice Lispector dizia que “pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir”. Ronaldo possui as características congénitas dos verdadeiros craques, mas o verdadeiro segredo do seu sucesso tem sido a procura incessante da superação. Insuperável no trabalho Cristiano trabalha mais do que os colegas de equipa e do que os adver- sários. É quase sempre o primeiro a chegar ao centro de treino do Manchester, hábito já dos tempos em Alvalade. Na sua biografia (Momentos, editada pela Ideia & Rumos), diz que isso acontece por gostar de “fazer tudo com calma” e ter adoptado uma espécie de ritual: “Equipo-me, por vezes é lá que tomo o pequeno-almoço, vou para o ginásio, de vez em quando brinco sozinho com a bola, muitas vezes faço trabalho específico de preven- ção de lesões, elástico, balance e ainda jogo basquetebol com um ou outro companheiro que entretanto chegue.” Tudo na intimidade do balneário e antes de começar o ver- dadeiro treino. forma, mas também por gosto. É também por isso que, antes dos jogos e mal o treinador anuncia a equipa, pega na bola e começa a brincar com ela ainda no ginásio. Continua com as habilidades antes de iniciar o aquecimento no relvado. Não por puro exibicionismo, mas porque é a sua “forma de desanuviar, de afastar a pressão do jogo”. A vontade de aprender A atenção que dedica à profissão pode ser medida em muitos outros pormenores. Após cada partida, tem sempre à sua espera em casa a cassete com a gravação do jogo que passou no MUTV (canal codificado do Manchester United). Analisa os seus lances, com cuidado especial nas situações em que fez opções erradas. E só depois é que vai dormir as oito horas de que nunca abdica, mesmo que a adrenalina da competição lhe atrase o sono. Ronaldo abandonou cedo a escola quando o futebol lhe roubou o tempo quase todo e o resto da vontade. Nunca foi um bom aluno, embora gostasse muito das aulas de geografia. Mas quem lida com ele de perto reconhece-lhe o gosto pelo conhecimento. Em Julho de 2003, na véspera de se apresentar pela primeira vez em Manchester, deu uma entrevista ao PÚBLICO, que depois o acompanhou no carro até ao hotel. A meio da conversa, Ronaldo pediu que o jornalista lhe explicasse o significado de uma palavra. Alguns minutos depois, interrompeu um dos outros presentes, para nos dizer. “É uma palavra interessante, vou passar a usá-la.” Assim, com uma simplicidade desarmante, o jovem craque confirmou a vontade de aprender que rapidamente o ajudou a transformar-se na principal figura do Manchester. Aquele episódio repete-se com uma frequência quase diária, designadamente quando se senta à frente da televisão para assistir na RTP a concursos como o Quem Quer Ser Milionário ou o sucedâneo Um Contra Todos. Quem estiver lá em casa não só é obrigado também a assistir, mas igualmente a participar, porque Ronaldo gosta de competição até quando procura antecipar as respostas certas. “Sou, por natureza, um curioso, que tem o gosto pelo conhecimento e pela aprendizagem. Sinto fascínio em aprender coisas novas. Deixo- me entusiasmar por programas educativos”, confirma na sua biografia, onde também reconhece não gostar “de perder a nada”. O suporte da família Rigoroso nos horários, abstémio e antitabagista fervoroso, Ronaldo tem no núcleo familiar o grande sustentáculo da sua estabilidade psicológica. O seu companheiro e confidente de todas as horas é o cunhado José Pereira. De facto, o “Zé” já se separou da sua irmã Cátia (conhecida por Ronalda no meio musical), mas continua a ser como um irmão mais velho para Ronaldo. É uma espécie de secretário pessoal, mas que faz também de motorista e de cozinheiro. Visita habitual na mansão é igualmente Rogério Mendes, empregado de restaurante emigrado há uma década. Os irmãos Elma, Cátia e Nuno também por lá passam frequentemente. Mas quem assenta arraiais lá em casa é a mãe, Maria Dolores, uma adepta ferrenha do Sporting que já desmaiou por se emocionar nos jogos do filho. Ronaldo adora-a (sabe O fora-de-série perfeito No fim de cada sessão, e enquanto os companheiros já estão nos balneários, Ronaldo permanece no relvado a ensaiar os livres. Uma vez, dez vezes, vinte vezes, as que forem necessárias para que saia com a direcção, o efeito e a força adequadas. Tantas vezes que o veterano treinador Alex Ferguson confessa não ter paciência para ficar a ver. “Prefiro ir tomar chá”, brinca o bonacheirão escocês. Recentemente, Ronaldo marcou um livre extraordinário ao Portsmouth. No outro dia, os tablóides falavam no “Rocket Ronaldo”, alusão à forma como a bola disparada a mais de 30 metros entrou na baliza do estático David James. “O que é que podia fazer?”, questionou o guarda-redes, enquanto Ferguson garantia ter sido o “livre directo mais espectacular de toda a história da Premier League”. Seguiu-se um sem-número de textos jornalísticos a tentar provar que o segredo dos pontapés com o “efeito-banana” estava relacionado com a forma como Ronaldo coloca a bola no relvado, com a válvula virada para si. Não é verdade. A única coisa certa é que Ronaldo posiciona a bola na relva, dá cinco ou seis passos atrás, abre e finca na relva as pernas enquanto respira fundo. Depois, a bola entra na baliza como um míssil. Mas Cristiano continua a ser profissional mesmo quando deixa os estádios. Em casa, nada com frequência na piscina interior e exercita os músculos nas máquinas de que é cliente desde tenra idade. Se for uma semana ao Funchal, é certo que um ginásio próximo vai contar com ele diariamente. O mesmo acontece se o destino for a Ásia ou a América. Fá-lo para se manter em

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8 • P2 • Domingo 13 Abril 2008

CristianoRonaldoA imprensa internacional está rendida aos golos, aos truques e aos números de circo de Ronaldo. Nós também. Bruno Prata, que segue há anos a carreira do jogador, acha que ele é o melhor jogador português de todos os tempos e, fi nalmente, o melhor jogador do mundo

a Cristiano Ronaldo é “o fora-de-série perfeito” e “o verdadeiro protótipo futebolístico do terceiro milénio”, escreveu o diário desportivo italiano Tuttosport, que enumerou as qualidades do jogador do Manchester United: “forte, rápido, explosivo, acrobático, duro no combate, tecnicamente sublime, agora também cada vez mais cínico nos momentos cruciais do jogo. Se quisermos resumir tudo numa palavra: determinante. Se fosse mais simpático e menos arrogante com os adversários no campo, seria um verdadeiro extraterrestre”. O inglês The Guardian diz que Ronaldo “traz paixão ao futebol e é o jogador mais excitante” a jogar em Inglaterra, o Daily Mail questiona mesmo se “é o melhor jogador que a Premier League já viu”, enquanto o Mirror usa o título Simply the Best, num trocadilho com o nome do craque inglês que, pouco antes de morrer, escolheu Ronaldo como o seu digno sucessor.A imprensa internacional está defi nitivamente rendida aos golos, aos truques e às fi ntas de Ronaldo. Mas também ao sorriso e aos músculos peitorais que ele gosta de mostrar. Já ninguém tem dúvidas de que irá receber os principais troféus individuais, incluindo o de melhor jogador do mundo. Mesmo os mais renitentes vergaram-se, inebriados pelas exibições de Ronaldo, como no jogo da primeira mão dos quartos-de-fi nal da Liga dos Campeões, em Roma. “Muito Ronaldo”, “Ave, Cristiano Ronaldo” e “Ronaldo ao sétimo céu” foram os títulos usados pelos italianos da La Gazzetta dello Sport, pelos espanhóis da Marca e pelos franceses do L’Equipe, respectivamente.

O que torna Ronaldo tão especial no supercompetitivo mundo do

futebol? Analisado sob o plano físico (1,85m de altura para 85 kg de peso), percebe-se que tem uma relação antropometria/potência digna de um titã. Foi também abençoado com genes raros, quiçá formatados como os gomos de uma bola. São eles que lhe garantem aquele jeito único de correr com passinhos demasiado curtos (mas rápidos) para o tamanho das pernas longas. O talento inato percebe-se também quando domina a bola com a biqueira das chuteiras, nos arranques supersónicos e nos dribles sem fi m por entre a fl oresta de pernas adversárias. Mas já a escritora brasileira Clarice Lispector dizia que “pode-se ter vocação e não ter talento, isto é, pode-se ser chamado e não saber como ir”. Ronaldo possui as características congénitas dos verdadeiros craques, mas o verdadeiro segredo do seu sucesso tem sido a procura incessante da superação.

Insuperável no trabalhoCristiano trabalha mais do que os colegas de equipa e do que os adver-sários. É quase sempre o primeiro a chegar ao centro de treino do Manchester, hábito já dos tempos em Alvalade. Na sua biografi a (Momentos, editada pela Ideia & Rumos), diz que isso acontece por gostar de “fazer tudo com calma” e ter adoptado uma espécie de ritual: “Equipo-me, por vezes é lá que tomo o pequeno-almoço, vou para o ginásio, de vez em quando brinco sozinho com a bola, muitas vezes faço trabalho específi co de preven-ção de lesões, elástico, balance e ainda jogo basquetebol com um ou outro companheiro que entretanto chegue.” Tudo na intimidade do balneário e antes de começar o ver-dadeiro treino.

forma, mas também por gosto. É também por isso que, antes dos jogos e mal o treinador anuncia a equipa, pega na bola e começa a brincar com ela ainda no ginásio. Continua com as habilidades antes de iniciar o aquecimento no relvado. Não por puro exibicionismo, mas porque é a sua “forma de desanuviar, de afastar a pressão do jogo”.

A vontade de aprenderA atenção que dedica à profi ssão pode ser medida em muitos outros pormenores. Após cada partida, tem sempre à sua espera em casa a cassete com a gravação do jogo que passou no MUTV (canal codifi cado do Manchester United). Analisa os seus lances, com cuidado especial nas situações em que fez opções erradas. E só depois é que vai dormir as oito horas de que nunca abdica, mesmo que a adrenalina da competição lhe atrase o sono.

Ronaldo abandonou cedo a escola quando o futebol lhe roubou o tempo quase todo e o resto da vontade. Nunca foi um bom aluno, embora gostasse muito das aulas de geografi a. Mas quem lida com ele de perto reconhece-lhe o gosto pelo conhecimento. Em Julho de 2003, na véspera de se apresentar pela primeira vez em Manchester, deu uma entrevista ao PÚBLICO, que depois o acompanhou no carro até ao hotel. A meio da conversa, Ronaldo pediu que o jornalista lhe explicasse o signifi cado de uma palavra. Alguns minutos depois, interrompeu um dos outros presentes, para nos dizer. “É uma palavra interessante, vou passar a usá-la.” Assim, com uma simplicidade desarmante, o jovem craque confi rmou a vontade de aprender que rapidamente o ajudou

a transformar-se na principal fi gura do Manchester.

Aquele episódio repete-se com uma frequência quase diária, designadamente quando se senta à frente da televisão para assistir na RTP a concursos como o Quem Quer Ser Milionário ou o sucedâneo Um Contra Todos. Quem estiver lá em casa não só é obrigado também a assistir, mas igualmente a participar, porque Ronaldo gosta de competição até quando procura antecipar as respostas certas. “Sou, por natureza, um curioso, que tem o gosto pelo conhecimento e pela aprendizagem. Sinto fascínio em aprender coisas novas. Deixo-me entusiasmar por programas educativos”, confi rma na sua biografi a, onde também reconhece não gostar “de perder a nada”.

O suporte da famíliaRigoroso nos horários, abstémio e antitabagista fervoroso, Ronaldo tem no núcleo familiar o grande sustentáculo da sua estabilidade psicológica. O seu companheiro e confi dente de todas as horas é o cunhado José Pereira. De facto, o “Zé” já se separou da sua irmã Cátia (conhecida por Ronalda no meio musical), mas continua a ser como um irmão mais velho para Ronaldo. É uma espécie de secretário pessoal, mas que faz também de motorista e de cozinheiro. Visita habitual na mansão é igualmente Rogério Mendes, empregado de restaurante emigrado há uma década. Os irmãos Elma, Cátia e Nuno também por lá passam frequentemente. Mas quem assenta arraiais lá em casa é a mãe, Maria Dolores, uma adepta ferrenha do Sporting que já desmaiou por se emocionar nos jogos do fi lho. Ronaldo adora-a (sabe

O fora-de-série perfeito

No fi m de cada sessão, e enquanto os companheiros já estão nos balneários, Ronaldo permanece no relvado a ensaiar os livres. Uma vez, dez vezes, vinte vezes, as que forem necessárias para que saia com a direcção, o efeito e a força adequadas. Tantas vezes que o veterano treinador Alex Ferguson confessa não ter paciência para fi car a ver. “Prefi ro ir tomar chá”, brinca o bonacheirão escocês. Recentemente, Ronaldo marcou um livre extraordinário ao Portsmouth. No outro dia, os tablóides falavam no “Rocket Ronaldo”, alusão à forma como a bola disparada a mais de 30 metros entrou na baliza do estático David James. “O que é que podia fazer?”, questionou o guarda-redes, enquanto Ferguson garantia ter sido o “livre directo mais espectacular de toda a história da Premier League”.

Seguiu-se um sem-número de textos jornalísticos a tentar provar que o segredo dos pontapés com o “efeito-banana” estava relacionado com a forma como Ronaldo coloca a bola no relvado, com a válvula virada para si. Não é verdade. A única coisa certa é que Ronaldo posiciona a bola na relva, dá cinco ou seis passos atrás, abre e fi nca na relva as pernas enquanto respira fundo. Depois, a bola entra na baliza como um míssil.

Mas Cristiano continua a ser profi ssional mesmo quando deixa os estádios. Em casa, nada com frequência na piscina interior e exercita os músculos nas máquinas de que é cliente desde tenra idade. Se for uma semana ao Funchal, é certo que um ginásio próximo vai contar com ele diariamente. O mesmo acontece se o destino for a Ásia ou a América. Fá-lo para se manter em

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as difi culdades que teve para o criar) e não pára de a mimar. Ofereceu-lhe uma mansão no Funchal e ainda há poucos meses a surpreendeu no aniversário com um Mercedes. “Fui sempre o seu menino e ainda hoje ela continua a tratar-me como se eu fosse um bebé. (...) É também uma amiga, a quem recorro numerosas vezes para pedir a sua opinião sobre quase tudo”, diz Ronaldo, que recorda os tempos em que, com 12 anos, deixou a Quinta do Falcão para ir viver para o lar de jogadores do Sporting. Chorou no avião e todas as semanas em que telefonava à mãe. Hoje é habitual os dois viajarem no charter aéreo fretado por Ronaldo.

Sopa para crescerQuando Ronaldo jogava nos infantis do Andorinha, era um miúdo franzino e baixinho. Um dia a mãe disse-lhe que a solução era passar a comer dois pratos de sopa antes das refeições. Seguiu a receita e não tardou a deixar de ser conhecido pelo “abelhinha”, pelo físico limitado e por correr aos ziguezagues e com os passinhos curtos que ainda hoje o distinguem. Nas festas dos títulos em Old Traff ord, os jogadores são autorizados a levar até ao relvado os fi lhos e os sobrinhos. Mas, no ano passado, houve momentos hilariantes quando D. Dolores, de saltos altos enterrados na relva

lamacenta, surgiu lá em baixo abraçada e aos beijos ao fi lho campeão. E ambos dançaram ao ritmo dos cânticos que os adeptos dedicam ao português. “Ele joga na esquerda, ele joga na direita, o rapaz Ronaldo...”

O momento mais difícil na vida de Ronaldo aconteceu na véspera de um jogo em Moscovo, frente à Rússia. Luís Felipe Scolari chamou-o ao seu quarto para lhe comunicar a morte do pai. “Nunca esquecerei a conversa. (...) Marcou-me de forma profunda. Percebi que ele também tinha vivido algo idêntico quando lhe morreu o pai e chorámos os dois”, contou Ronaldo. Há muito que Dinis Aveiro (antigo técnico de equipamentos no clube popular onde Ronaldo deu os primeiros pontapés na bola) lutava contra a insufi ciência hepática e renal, herança dos problemas de alcoolismo. De pouco valeram os esforços de Ronaldo para que fosse tratado pelos melhores especialistas em Londres. Scolari autorizou-o a ir embora, mas Ronaldo não aceitou. “Vou fazer um jogo de homenagem ao meu pai, vou jogar para ele”, respondeu-lhe. Não conseguiu marcar (o jogo terminou sem golos), mas fê-lo logo a seguir frente ao Cazaquistão, tendo os fotógrafos registado o momento em que ele levantou o dedo a apontar para o céu.

A casa de Souto MouraRonaldo vive numa enorme mansão que comprou por uma fortuna nas redondezas de Manchester. Mas está a construir uma casa de sonho em Santo Estêvão, na região de Benavente. O terreno tem 20 mil metros quadrados, onde será instalado um lago artifi cial e um campo de futebol. Diz que será “um lar, grande, familiar”. O projecto é do arquitecto Eduardo Souto Moura. Tem ainda um apartamento na Expo e, juntamente com o seu empresário Jorge Mendes e outros jogadores conhecidos, está a investir num hotel-resort em Porto Santo. Os investidores gastaram oito milhões de euros só na compra do terreno, com 80 mil metros quadrados.

Além de Scolari, há pelo menos duas pessoas que fazem parte do restrito círculo de amigos: Jorge Mendes e Ferguson. O primeiro gere-lhe a carreira e os investimentos

através da empresa Gestifute, mas é ainda um confi dente. Ferguson adora-o e foi o próprio Ronaldo a admitir que só o treinador o fez desistir de deixar Inglaterra, depois do incidente no Euro 2004 com a selecção inglesa, quando Rooney foi expulso. Ferguson chegou a ir ao Algarve garantir-lhe que o clube o ajudaria a ultrapassar a situação. Foi muito à custa disso e do apoio familiar que Ronaldo soube conviver com os assobios que os adversários lhe tributavam sempre que tocava na bola.

Craque na publicidadeConsiderado o jogador mais mediático do mundo, segundo os estudos de mercado, Ronaldo adora fazer publicidade. Um dos primeiros a apostar nele foi o Banco Espírito Santo, que tem pago quatro milhões de euros por cada contrato assinado de três em três anos. A Nike paga-lhe 12 milhões de euros. A lista de contratos é enorme. Em 2006 fi lmou um anúncio para a Coca-Cola exclusivamente dirigido ao mercado chinês, recebendo por isso 1,5 milhões de euros.

Diz só promover produtos com que se sinta identifi cado. Os fotógrafos e os operados de câmara elogiam-lhe o à-vontade.

Ronaldo não precisa de recorrer ao que o Manchester lhe paga só de ordenado, que poderá passar dos actuais 8,5 milhões de euros/ano para mais de 10 milhões quando voltar a renovar. Isto se o clube inglês continuar a resistir aos 120 milhões de euros oferecidos há um ano pelo Real Madrid.

Longe vão os tempos em que Ronaldo recebia 50 euros de mesada na formação do Sporting. O seu primeiro contrato foi de 250 euros, que depois aumentou para 600, permitindo-lhe passar a viver numa pensão no Marquês do Pombal, em Lisboa. Quando saiu de Alvalade, ganhava 1500 euros. “Não gosto de ser escravo do dinheiro”, assevera.

Ronaldo recebe milhares de cartas dos fãs. Chegam pedidos de autógrafos, fotografi as, camisolas e cartões de aniversários. Mas também de fi nanciamentos. Houve um para investir na criação de caracóis em viveiro. E há quem envie o NIB para onde deve ser dirigido o

dinheiro. Ronaldo reserva um dia por semana para a correspondência já seleccionada pelos seus colaboradores. Gasta mais de duas mil libras por mês só em envelopes e selos. Assina a maior parte das cartas com a rubrica CR7, marca registada que também dá o nome à loja de roupa que ajudou a irmã Elma a abrir no Funchal – à outra irmã proporcionou o lançamento de um CD.

Entre a correspondência chegam-lhe pedidos de casamento e convites para férias a dois. Uma jovem holandesa não lhe saía da porta de casa. Ronaldo pagou-lhe o bilhete de avião de regresso à Holanda, mas a fã voltou. O assunto resolveu-se com a ameaça de uma queixa na polícia.

Conhecido por ser um bon vivant, Ronaldo garante ser “uma pessoa tranquila e que aprecia estar em casa”. Os mais próximos confi rmam que ele gosta de ver televisão (tem uma boa fi lmoteca), ouvir música e jogar ténis e pingue-pongue”.

Já lhe foram atribuídas mil e uma namoradas, entre as quais a actriz brasileira Karina Bacchi e a modelo inglesa Gema Atkinson. Mas, depois da apresentadora Merche Romero, em 2006, só agora parece ir assumir publicamente uma nova relação. A própria irmã Cátia Aveiro confi rmou às revistas do coração que ele namora com a modelo espanhola Nereida Gallardo, de 24 anos, que conheceu numa discoteca em Palma de Maiorca. Ronaldo diz que quer casar quando tiver 30 anos, mas admite que gostaria de ter um fi lho antes disso.

Assumidamente vaidoso, adora boa roupa e cintos vistosos, relógios e jóias com diamantes, como os brincos que já são uma das suas imagens de marca. Patrick Evra diz que ele passa horas a tratar do cabelo e a pôr gel. “O Ronaldo ama o seu corpo. Ele é o nosso playboy”, brinca o defesa francês.

Ronaldo gosta de ouvir os elogios que cada vez mais surgem de todo o lado, mas garante que ser considerado o melhor do mundo nunca foi para ele uma obsessão. Mas a camisola 7, que também já foi de George Best, Eric Cantona e David Beckham, é cada vez mais a do melhor jogador do mundo. Ronaldo tem o mundo a seus pés.

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