79689366 agrimensura psicologia do trabalho

Upload: adriana-alves

Post on 02-Mar-2016

57 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

  • Escola Estadual deEducao Profissional - EEEPEnsino Mdio Integrado Educao Profissional

    Curso Tcnico em Agrimensura

    Psicologia do Trabalho

  • Governador

    Vice Governador

    Secretria da Educao

    Secretrio Adjunto

    Secretrio Executivo

    Assessora Institucional do Gabinete da Seduc

    Coordenadora da Educao Profissional SEDUC

    Cid Ferreira Gomes

    Domingos Gomes de Aguiar Filho

    Maria Izolda Cela de Arruda Coelho

    Maurcio Holanda Maia

    Antnio Idilvan de Lima Alencar

    Cristiane Carvalho Holanda

    Andra Arajo Rocha

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    1

    SUMRIO

    Introduo ..................................................................................................................................................... 02

    Histrico a Psicologia como Cincia .......................................................................................................... 03

    O Conceito de Trabalho ............................................................................................................................... 06

    Texto Reflexivo Trabalho, Alienao e Explorao ................................................................................... 12

    Texto Reflexivo A Crise da Sociedade do Trabalho .................................................................................. 13

    A Diviso Social do Trabalho ....................................................................................................................... 22

    Valores e Atitudes ........................................................................................................................................ 28

    Trabalho e Remunerao ............................................................................................................................. 30

    Psicopatologias no Trabalho: Aspectos Contemporneos .......................................................................... 33

    As Transformaes do Trabalho e do Acidente: Uma concepo Sociopsicolgica ................................... 48

    Psicologia do Trabalho ................................................................................................................................. 51

    Abordagens Psicolgicas ............................................................................................................................. 52

    Psicologia no Trabalho Bases do Comportamento Humano - Introduo ................................................ 53

    Comportamento Operante X Respondente .................................................................................................. 55

    Reforo Positivo e Negativo ......................................................................................................................... 56

    A Punio ..................................................................................................................................................... 56

    Motivao e Treinamento de Pessoal .......................................................................................................... 58

    As Necessidades Psicolgicas..................................................................................................................... 60

    O Processo de Treinamento ........................................................................................................................ 62

    As Relaes Humanas e Dinmica de Grupo .............................................................................................. 65

    Desenvolvimento Interpessoal Treinamento em Grupo ............................................................................ 69

    Fundamentos da Psicologia Cognitiva do Trabalho..................................................................................... 71

    As Comunicaes ........................................................................................................................................ 77

    As Regulaes ............................................................................................................................................. 86

    As Competncias ......................................................................................................................................... 91

    Texto de Apoio N 01 Sade Mental e Psicologia do Trabalho ............................................................... 100

    Qualidade de Vida no Trabalho - QVT ....................................................................................................... 106

    Texto de Apoio N 02 Contribuies da Andragogia na Educao para a Segurana ............................ 110

    Psicologia do Desenvolvimento Sigmund Freud..................................................................................... 116

    Jean Piaget ................................................................................................................................................. 117

    Lev Vigotsky ............................................................................................................................................... 118

    Henri Wallon ............................................................................................................................................... 119

    Burrhus F. Skinner ..................................................................................................................................... 120

    Albert Bandura............................................................................................................................................ 120

    Urie Bronfenbrenner ................................................................................................................................... 121

    Bibliografia ..................................................................................................................................................... 51

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    2

    INTRODUO

    A Segurana do Trabalho, enquanto cincia multidisciplinar, requer o estudo de muitas outras disciplinas como fundamentao, suporte e apoio s suas aes e entre elas, destacamos a Psicologia do Trabalho, pois pelo estudo e compreenso dessa cincia, podemos compreender melhor os diferentes tipos de comportamentos e personalidades observados nos trabalhadores, nas suas diferentes realidades e poder interferir de modo positivo a fim de identificar, prevenir e neutralizar potenciais situaes de risco que possam levar os trabalhadores a provocar ou envolver-se em acidentes do trabalho que possam por em risco a sua vida, o patrimnio das empresas, o meio-ambiente ou a vida dos seus colegas.

    VIDA DE GRUPO

    Vida de grupo d frustrao... Porque enquanto educando tenho de romper com minha acomodao quieta,

    autoritria... esperando as ordens do educador... e quando elas no vm, descubro que s eu posso lutar, conquistar, construir meu espao...

    O educador pode possibilitar o rompimento da quietude mas no a ao do

    construir, do conhecer. Essa s o educando pode... Vida de grupo d medo... Porque atravs do outro constato que sou dono do meu saber. Sou dono da

    minha incompetncia e portanto responsvel pela minha busca-procura de conhecer, de construir minha competncia.

    Vida de grupo d desnimo... Porque em muitas situaes nos confrontamos com o caos: acmulo de temas,

    processos de adaptao, hipteses heterogneas... Cada situao nos demanda uma reestruturao... demanda uma procura de

    forma original prpria e nica adequada ao novo momento. Vida de grupo d muito trabalho e muito prazer... Porque eu no construo nada sozinho, tropeo a cada instante com os limites do

    outro e os meus prprios, na construo da vida, do conhecimento da nossa histria.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    3

    HISTRICO

    A PSICOLOGIA COMO CINCIA

    A Psicologia uma cincia que estuda os comportamentos e processos mentais, partindo da sua descrio para a explicao desses comportamentos de modo a poder prever e controlar as respostas comportamentais

    Tradicionalmente a psicologia foi referida como o estudo da Alma [psiqu + logos = mente + conhecimento], mas tal interpretao levou a informaes erradas baseadas na f e crenas populares bem como ao surgimento da parapsicologia.

    Como atingir o estatuto de cincia?

    Esta a questo que se colocou nos finais do sculo XIX Psicologia e que obteve respostas diferenciadas, levando diversos autores a definirem objetos e mtodos especficos, consoante os problemas estudados.

    Os caminhos possveis para a Psicologia:

    Estudar a conscincia ou os comportamentos ? Os comportamentos so inatos ou adquiridos ? Estudar os fatos isolados ou numa perspectiva de conjunto ?

    Analisando o sofrimento mental do trabalhador como resultado de uma m adaptao do homem ao meio (trabalho) podemos, numa anlise mais ampla, concluir que os acidentes ou o adoecimento podem ser resultantes de uma condio inadequada de produo ou de distrbios de comportamento coletivo do conjunto da classe trabalhadora ou de alguns indivduos, apresentando uma estreita relao entre o modo de trabalhar e suas condies de vida.

    Da a importncia de se estudar a Psicologia do Trabalho como cincia e como

    forma de melhorar a produtividade garantindo a sanidade mental dos trabalhadores e sua integridade fsica.

    Esse o primeiro e maior de todos os mitos relacionados com a Psicologia, defendido conjuntamente por cristos e no cristos: a psicoterapia (incluindo aconselhamentos psicolgicos com todas suas tcnicas e teorias), uma cincia - o jeito de se entender e socorrer a humanidade, com base em evidncias concretas, colhidas de dados consistentes e mensurveis.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    4

    Ao estudarmos a Palavra de Deus, descobrimos que homens e mulheres de Deus buscam sabedoria e conhecimento em ambos: a Palavra revelada e o mundo fsico. Paulo ensina que todos ns somos responsveis diante de Deus por causa da evidncia que a criao d de Sua existncia:

    Estudo cientfico um caminho vlido para se entender as obras de Deus e pode perfeitamente ser usado com enorme benefcio em muitas reas da vida. Cincia verdadeira desenvolve teoria com base em observaes. Ela examina cada teoria com rigorosidade para testar se se descreve realidade cientfica como resposta. O mtodo cientfico posto em evidncia quando se observam e registram dados comprovveis para chegar a uma concluso que vai confirmar ou anular a teoria.

    Durante a metade do sculo XIX, filsofos quiseram estudar a natureza humana, aplicando mtodos cientficos para a observao, registro e tratamento do comportamento humano. Eles criam que se o ser humano pudesse ser estudado sob uma perspectiva comprovadamente cientfica, sem dvida teramos uma frmula precisa para entender o comportamento presente, predizer o comportamento futuro e alterar os possveis desvios provenientes da utilizao de ferramentas cientficas.

    Psicologia, em seu maior expoente, a Psicoterapia, tem-se gabado de ocupar uma postura cientfica. Entretanto, do ponto de vista estritamente cientfico, ela no tem alcanado, nem de perto, as condies para se enquadrar no campo da cincia.

    Na tentativa de avaliar o status da Psicologia, a Associao Psicolgica Americana apontou Sigmundo Koch para planejar e dirigir um estudo que foi subsidiado pela Fundao Nacional da Cincia. Esse projeto envolveu 80 dos mais destacados estudiosos que deveriam pesquisar e comparar os fatos, teorias e mtodos da Psicologia. Os resultados foram publicados numa srie de 7 volumes intitulada Psychology: a Study of Science. A equipe escreveu sobre a iluso de considerar Psicologia como cincia, nestes termos:

    Devido a insistncia de se atribuir qualidades cientficas Psicologia, elevando assim a sua credibilidade, a esperana de uma cincia psicolgica tornou-se quase indistinguvel do fato em si. A histria inteira da Psicologia pode ser vista como um intento ritualista de se apropriar dos mtodos da cincia a fim de sustentar que a Psicologia cientfica.

    Koch ainda afirma que "atravs da histria da Psicologia como cincia, o que se tem podido ver como resultado no passa de uma coleo desordenada de dados, sem uniformidade e com resultados caracterizados pelo insucesso, o que no condizente com os princpios claros e definidos da cincia."

    O fato que aquelas afirmaes que descrevem o comportamento humano ou apresentam os resultados provindos de pesquisas comprovveis, podem ser tidas como cientficas. No entanto, quando nos movemos do ponto de descrever esse comportamento para o de explicar e tentar mudar isso, ns deixamos o campo da cincia e adentramos o da opinio.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    5

    A mudana de descrio para prescrio sinnimo de mudana de objetividade para a opinio subjetiva, e opinio sobre o comportamento humano, quando apresentada como sendo absoluta, e conseqentemente um fato cientfico, meramente a evidncia clara de uma pseudocincia. As diversas opinies sero resultantes de premissas incertas (opinies, explanaes subjetivas, suposies) o que leva direto a falsas concluses.

    O Dicionrio define pseudocincia como "um sistema de teorias, suposies e mtodos erroneamente tidos como cientficos."3 Pseudo cincia ou pseudocientismo inclui o uso de rtulos cientficos para proteger e promover opinies que no so, na sua inteireza, comprovveis ou refutveis (so confusos). Psicoterapia serve para ilustrar a idia de pseudocincia: se ela tivesse se aprovado como cincia, ns te damos hoje um consenso entre os profissionais a respeito dos problemas comportamentais provenientes das nossas desordens psico-emotivas e como trat-las. A verdade que este campo est cheio de teorias e tcnicas contraditrias, que quando postas lado a lado expressam a confuso que nega a possibilidade de ser enquadrado no campo da cincia onde a lei da comprovao imperativo absoluto.

    Com tudo isso, a Psicoterapia cresceu e tem crescido muito, apresentando incontveis explicaes a respeito do homem e seus problemas comportamentais. O psiclogo Roger Mills, no seu artigo "Psicologia insana quando quer fazer-se cincia", escreve:

    O campo da Psicologia hoje literalmente uma confuso. O nmero de tcnicas, mtodos e teorias se iguala ao nmero de terapeutas. Eu tenho visto, pessoalmente, terapeutas convencerem seus clientes de que todos os seus problemas vieram de sua infncia, de seus pais, das estrelas, da dieta que adotaram, de seu estilo de vida, de seu passado.4

    Com mais de 250 sistemas diferentes de psicoterapia, cada um proclamando superioridade sobre os demais, difcil de ver um resultado que confirme a pressuposio de que Psicoterapia tenha alguma coisa a ver com cincia.

    Os atuais fundamentos da psicologia no so cientficos, mas sim a juno de vrios pontos de vista filosficos, especialmente envolvidos com determinismo, comportamento, humanismo, existencialismo e at mesmo evolucionismo. O psiquiatra famoso, E. Fuller Torrey, desabafou-se contra isso com palavras contundentes:

    As tcnicas usadas por psiquiatras ocidentais esto, com rarssimas excesses, no mesmo nvel das tcnicas usadas pelos doutores de bruxaria.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    6

    O CONCEITO DE TRABALHO

    No dicionrio de cincias sociais lemos que o homem se colocou acima do reino animal pelo fato mesmo de sua capacidade criadora; foi definido com muito acerto como o animal que produz. Mas o trabalho no para o homem apenas uma necessidade inevitvel. tambm o seu libertador em relao natureza, seu criador como ser social e independente. No processo de trabalho, isto , no processo de moldar e mudar a natureza exterior a ele, o homem molda e modifica a si mesmo.

    Dos primrdios da Humanidade at aos nossos dias o conceito trabalho foi sofrendo alteraes, preenchendo pginas da histria com novos domnios e novos valores. Do Egito Grcia e ao Imprio Romano, atravessando os sculos da Idade Mdia e do Renascimento, o trabalho foi considerado como um sinal de oprbrio, de desprezo, de inferioridade. Esta concepo atingia o estatuto jurdico e poltico dos trabalhadores, escravos e servos. Com a evoluo das sociedades, os conceitos alteraram-se. O trabalho-tortura, maldio, deu lugar ao trabalho como fonte de realizao pessoal e social, o trabalho como meio de dignificao da pessoa.

    Comeamos por apresentar alguns significados das palavras trabalho e

    trabalhar de acordo com o que definido por um dicionrio da lngua portuguesa. Trabalho significa: exerccio de atividade humana, manual ou intelectual, produtiva; servio; lida; produo; labor; maneira como algum trabalha. Trabalhar exercer alguma profisso; dar determinada forma a; fazer com arte; labutar; empenhar-se; executar alguma tarefa; desempenhar as suas funes.

    Apresentamos tambm uma breve abordagem histrica do conceito trabalho. BREVE ABORDAGEM HISTRICA DO CONCEITO TRABALHO Segundo R. Cabral (1983), a palavra trabalho, na sua origem etimolgica,

    significa tripalium, instrumento de tortura composto de trs paus ou varas cruzadas, ao qual se prendia o ru (p. 1774).

    Segundo Lobo (2004), a necessidade da delimitao de tal fronteira no que se refere proteo de trabalho de menores vai de encontro quelas situaes especiais em que o velho prolquio de Larcordaire merece acolhimento, funda detena e larga considerao: entre o rico e o pobre e o forte e o fraco a Lei que liberta e a liberdade que mata (p.4).

    A palavra trabalho, esclarece o historiador Jacques Le Goff, no existia antes

    do sculo XI. De acordo com Godelier, citado por Correia (1999), o significado da palavra trabalho, conhecido como obra a fazer, ou execuo de uma obra, surge somente nos finais do sculo XV e o significado da palavra trabalhador aparece nos finais do sculo XVII.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    7

    No sculo XVIII, o trabalho aparece como uma actividade que implica um esforo

    penoso. Alis, Jos Alberto Correia (1999) refere esta noo sublinhando que ela est relacionada com significados que nos referenciam o exerccio de atividades penosas.

    Para Brito Correia (1981), a palavra trabalho usada correntemente com vrios

    sentidos: a) Esforo ou aplicao para fazer uma coisa, ou como ao que altera a natureza ou a forma de uma coisa (Larousse); neste sentido, tambm um animal pode prestar trabalho; b) Atividade manual ou intelectual prpria do homem, frequentemente (mas no necessariamente) penosa e dirigida a um fim til: no de mero prazer ou como jogo, mas para ganhar a vida (por necessidade); neste sentido, o trabalho contrape-se a actividades realizadas por amor do prximo (caridade), para alcanar prestgio (um lugar na vida social), por amor Ptria (caso do soldado voluntrio) ou para glria de Deus (caso dos religiosos);

    c) Produto ou resultado dessa atividade ( o sentido usado quando se diz que se vai entregar um trabalho);

    d) Emprego, colocao, lugar ou posto de trabalho;

    e) Coletividade dos trabalhadores, isto , daqueles que se encontram numa particular relao de produo ou pertencem a certa classe social; usado por exemplo, na expresso o capital e o trabalho (p. 3). De acordo com Giddens (1997), podemos definir o trabalho como a realizao de

    tarefas que envolvem o dispndio de esforo mental e fsico, com o objectivo de produzir bens e servios para satisfazer necessidades humanas p. 578).

    Aris e Duby (1989) referem que, o trabalhador era considerado socialmente

    inferior, mas tambm um ser ignbil (p. 124). Estes autores referem tambm que so necessrias algumas chaves de leitura para a compreenso das atitudes antigas perante o trabalho: o desdm pelo seu valor significava desdm social pelos trabalhadores.

    Este desdm manteve-se at perto do tempo dA Cartuxa de Parma; depois, para manter a hierarquia das classes sociais, reduzindo sempre os conflitos, foi necessrio saudar no trabalho um verdadeiro valor e um valor de todos; foi a paz social dos coraes hipcritas. O mistrio do desprezo antigo pelo trabalho reside muito simplesmente no fato de os acasos da guerra social no terem ainda conseguido este provisrio armistcio de hipocrisia. Uma classe social, orgulhosa da sua superioridade, canta a sua prpria glria ( isto a ideologia) (p.124).

    De acordo com os mesmos autores, a partir de Marx e Proudhon, a noo de

    trabalho tornou-se um valor social universal, um conceito filosfico.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    8

    Poder-se-ia dizer que o trabalho, tal como hoje o descrevemos, historicamente recente. O trabalho fonte de riqueza dos pases. As sociedades desenvolveram-se, desde sempre, atravs do trabalho produzido por agricultores, pescadores, comerciantes, artesos e operrios.

    H uma caracterstica comum, relativamente ao trabalho, que atravessa todos os

    tipos de sociedades, desde a escravagista at industrial passando pela feudal: a subordinao de quem vive do trabalho prestado a outrem, quer seja rei, imperador, senhor feudal, industrial ou entidade patronal. A Histria mostra-nos que s os pases que se organizaram e apostaram nas foras de trabalho atingiram patamares de bem-estar elevados, mas sempre por fora daqueles que produziram a riqueza - os trabalhadores. Foi com a Revoluo Industrial que a ideia de subordinao de quem vive do seu trabalho se acentuou e que a dependncia daqueles que tm como nico meio de subsistncia os rendimentos do trabalho se efectivou. Consequentemente, ganham expresso as novas necessidades de proteco, uma vez que com a produo industrial em grande escala, os operrios deixaram de ter outra fonte de rendimento que no fosse a sua fora de trabalho.

    Face a esta realidade de dependncia econmica, emergiu a necessidade de

    assegurar normas de proteco queles que, por razes de sobrevivncia, ficavam coarctados na sua liberdade de escolha, de deciso.

    As primeiras leis protetoras dos trabalhadores por conta de outrm aparecem em

    tempos diferentes, de acordo com o grau de desenvolvimento e de capacidade de organizao desses trabalhadores. Os trabalhadores constituem a parte mais dbil na relao de trabalho. As leis, enquanto normas de proteco dos trabalhadores, so factor de combate explorao a que os mesmos esto sujeitos.

    No seu conjunto, e sobretudo nos pases do Norte da Europa, h uma

    evoluo histrica positiva desde uma situao de proletarizao, caracterstica de todo o sculo XIX, at quilo que vem a configurar um novo mundo do trabalho em que se vo conquistando melhores condies de vida, de trabalho e de proteco social.

    poca da Segunda Guerra Mundial, muitos destes avanos sociais

    cristalizaram, abrindo-se, no entanto, uma frente importante de afirmao terica e prtica do direito ao trabalho.

    Em Portugal, as primeiras leis protetoras foram publicadas na ltima dcada do

    sculo XIX, dirigidas s mulheres e aos menores. Tiveram como fundamento razes higieno-sanitrias, dado que na poca da sua publicao as condies de trabalho, de higiene e de sanidade eram de tal forma graves que constituam um perigo para a sade pblica, e em particular para o desenvolvimento das crianas e das prprias mulheres, tendo em conta a sua funo gentica na reproduo da espcie.

    Foi na linha da proteo dos trabalhadores que esteve a origem da Organizao

    Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919, em consequncia do Tratado de Versalhes, desenvolvendo intensa atividade normativa da para c. A Conveno n. 1 sobre a Durao do Trabalho na Indstria foi publicada nesse mesmo ano de 1919.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    9

    A criao de todos estes instrumentos de proteo no significava que estava

    tudo resolvido e que as condies de trabalho fossem as ideais. Convm lembrar que se tratava do trabalho em cadeia, massificado, com ritmos

    de produo acelerados e com controlo apertado, o que s por si caracteriza bem a faceta desumanizadora da poca. Hierarquizando: no so as pessoas a prioridade, mas a racionalidade econmica a mxima expresso. Segundo Rebollar (1998), a racionalidade econmica triunfou de tal modo - convertendo a pessoa que trabalha em produtor-consumidor, ainda que com perda da sua autonomia - que superou a necessidade que teve no princpio de recorrer represso. Esta tcnica que tipifica a publicidade comercial, passava por persuadir os indivduos de que os consumos que lhes eram propostos compensavam os sacrifcios a que teriam de se sujeitar para a obteno de tais bens, e que estes constituiriam um nicho de felicidade privada que lhes permitia afastarem-se da sorte comum. Por outro lado, o Estado protetor, o Estado providncia oferecia ao trabalhador-consumidor umas compensaes sociais pela perda da sua autonomia. Estas compensaes assumiam a forma de direito a prestaes e a servios sociais.

    Com a evoluo das sociedades tambm os conceitos evoluem. Assim o trabalho

    adquire um novo sentido associado criao de valores teis. Segundo Manuel Carvalho da Silva (2000), assume-se a problemtica do trabalho tomando este como valor, ou seja, considerando que a sociedade actual sobre a qual nos debruamos tem o trabalho como referncia estrutural e estruturante (p.39). O mesmo autor considera, ainda, que o conceito trabalho , atualmente, alvo de reflexo necessria e profunda, dado que se assiste a uma grande mutao no que diz respeito s formas de prestao de trabalho.

    O Papa Joo Paulo II (1989) refere que:

    Com a palavra trabalho indicada toda a atividade realizada pelo mesmo homem, tanto manual como intelectual, independentemente das suas caractersticas e das circunstncias, quer dizer, toda a atividade humana que se pode e deve reconhecer como trabalho, no meio de toda a riqueza de actividades para as quais o homem tem capacidade e est predisposto pela prpria natureza, em virtude da sua humanidade (p. 7).

    Para a Liga Operria Catlica - Movimento de Trabalhadores Cristos LOC/MTC o trabalho humano a chave essencial de toda a questo social e, por isso, ele constitui o centro das suas prioridades na aco que desenvolve.

    Trabalho justo Trabalho digno Trabalho reconhecido

    Por trabalho justo entende-se, geralmente, salrio justo.

    O salrio para ser justo implica ser calculado de forma a permitir uma vida digna para o/a trabalhador/a e sua famlia.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    10

    O clculo remuneratrio deve integrar os esforos inerentes a esse trabalho, os

    riscos que comporta para a sade e o tempo necessrio para a sua execuo. O trabalho deve ser remunerado de tal modo que permita ao homem e famlia

    levar uma vida digna, tanto material ou social, como cultural ou espiritual, tendo em conta as funes e a produtividade de cada um, e o bem comum. (G.S.,67)

    Quando se refere trabalho digno, significa que se fala de condies de

    trabalho. Trabalhar sem quaisquer constrangimentos, nem discriminaes, em razo do sexo, da etnia ou de qualquer minoria. Significa tambm o exerccio pleno da liberdade cvica, como poder reunir-se em associaes, sem que da decorram quaisquer prejuzos para quem nelas participe. Implica ainda proteo da sade, acesso segurana social, estabilidade de emprego e um horrio e um ritmo de trabalho que lhe permita ao trabalhador e trabalhadora sentir-se bem e planificar a sua vida.

    corrente, mesmo em nossos dias, tomarem-se os trabalhadores, em certo

    sentido, escravos do prprio trabalho. O que, de nenhum modo, justificado pelas chamadas leis econmicas. Importa, portanto, adaptar todo o processo de trabalho produtivo s necessidades da pessoa e s suas condies de vida; sobretudo da vida domstica, em particular no que se refere s mes de famlia, tendo sempre em conta o sexo e a idade. Facilite-se aos trabalhadores a possibilidade de desenvolverem as suas qualidades e a sua personalidade no prprio exerccio do trabalho. Depois de haver aplicado a um trabalho o seu tempo e as suas foras, de uma maneira conscienciosa, todos devem gozar de um tempo de repouso e de descanso suficiente para se dedicarem vida familiar, cultural, social e religiosa. Devem ainda ter possibilidade de desenvolver livremente faculdades e capacidades, que, no trabalho profissional, no puderam desenvolver muito, por falta de oportunidade. (G.S. 67).

    O trabalho reconhecido significa que quem trabalha deve poder fazer a

    experincia de sentir que o seu trabalho reconhecido e valorizado. Isto vlido no s para o trabalho remunerado, mas tambm para as numerosas actividades no remuneradas tradicionalmente assumidas pelas mulheres - tais como tarefas domsticas, prestao de cuidados a crianas, pessoas portadoras de deficincia, pessoas idosas, atendimento a situaes de dependncia transitria ou prolongada e variadas atividades cvicas e de voluntariado. Daqui surge a chamada trade do trabalho:

    - Trabalho remunerado, aquele que geralmente reconhecido e valorizado. - Trabalho em casa (lides domsticas, educao dos filhos, prestao de

    cuidados a doentes e idosos) - Trabalho social (atividades cvicas e de voluntariado), na sade, na educao,

    na cultura, no desporto, na vida associativa Os dois ltimos, porque no so remunerados, tambm no so valorizados.

    Vejamos, por exemplo, as pessoas que trabalham em casa (geralmente mulheres) no tm acesso segurana social, alm de no terem uma remunerao. Do mesmo modo,

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    11

    numerosas atividades cvicas e de voluntariado poderiam e deveriam ser remuneradas. Muitas das atividades que hoje so remuneradas comearam por ser voluntrias, por exemplo nas Instituies Particulares de Solidariedade Social - IPSS.

    A abordagem que aqui apresentamos sobre o conceito de trabalho, provm da reflexo de vrios autores. Nela no se limita o conceito de trabalho ao trabalho remunerado como acontece na generalidade com os aparelhos estatsticos, quadros legais e na literatura cientfica. Na opinio de Helosa Perista, se restringssemos o conceito de trabalho apenas idia de salrio ou pagamento, estvamos a excluir uma parte significativa do trabalho, com particular peso para o trabalho exercido pelas mulheres e que no tem visibilidade na sociedade. Trata-se de todo o trabalho no pago associado reproduo, ligado execuo de tarefas domsticas e de prestao de cuidados; tarefas s quais no atribudo valor social ou econmico e que no so sequer reconhecidas como trabalho(p.102).

    Refletir sobre o conceito de trabalho implica levantar questes sociedade sobre a sua organizao, sobre o funcionamento da economia, das relaes laborais e do mercado. Implica ainda questionar a diviso tradicional entre as esferas privada e pblica.

    Refletir sobre o conceito de trabalho, refletir sobre os modelos dominantes ao

    nvel das relaes sociais de gnero e o questionamento sobre os princpios e fundamentos da igualdade entre mulheres e homens. A conciliao entre vida pessoal, familiar e profissional , ento, outra das vertentes que no pode deixar de integrar o questionamento sobre uma nova atitude, um novo olhar sobre o trabalho humano.

    Na opinio do grupo de trabalho Economia e Sociedade coordenado por

    Manuela Silva a conciliao entre o trabalho familiar, o trabalho criativo e o trabalho comunitrio com o trabalho mercantil, assalariado ou no, constitui um dos desafios que temos que enfrentar, neste comeo de novo sculo e milnio, quando a prtica generalizada os adultos de uma mesma famlia procurarem trabalho na atividade econmica. Como lembra Joo Paulo II: Dado que temos condies histricas para o conseguir () tempo de introduzir uma nova cultura do trabalho com uma melhor gesto e equilbrio entre trabalho remunerado e socialmente til, trabalho e repouso, com uma nova perspectiva sobre as relaes humanas e a convivibilidade e uma converso de estilos de vida e de comportamento de consumos suprfluos e mesmo nocivos (CA, n 36).

    Sistematizando as contribuies diversas apresentadas at o momento podemos destacar os seguintes elementos constitutivos do trabalho:

    a) pressupe uma ao; b) realizado por homens e mulheres; c) com determinado dispndio de energia; d) dirigido para um fim determinado e conscientemente desejado; e) exige sempre o uso da inteligncia; f) com um auxlio instrumental e g) que, de algum modo produz efeitos sobre a condio do agente.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    12

    Trabalho, Alienao e Explorao

    Rodrigo Gurgel Escritor e editor.

    O presente texto foi extrado do Caderno do Aluno Trabalho e Tecnologia, Programa Integrar CNM-CUT (1998)

    Em algum momento da evoluo humana, ainda no determinado pelos arquelogos e

    antroplogos, o homem ou seu ancestral , motivado por algum tipo de dificuldade, observou demoradamente a natureza que o circundava, escolheu um ponto determinado uma rvore, uma curva de rio, um animal, uma pedra , mentalmente interrogou-se sobre como poderia transform-lo de maneira a conseguir resolver seu problema e, aps elaborar um plano mental, debruou-se sobre aquela parcela da natureza e transformou-a segundo a sua necessidade.

    Assim nasceu o trabalho, essa atividade proposital, orientada pela inteligncia, e produto,

    unicamente, da espcie humana. Atividade que no se limita apenas a transformar o material sobre o qual o homem decide operar, mas que busca imprimir nele o projeto que, conscientemente, o ser humano tem em mira.

    Para ns, acostumados civilizao do trabalho, na qual a variedade de mercadorias criadas

    pelas mos humanas parece ter chegado a nmeros quase incalculveis, talvez fique difcil compreender a fora e a energia que, naquele momento do nosso passado, foram desencadeadas. Mas, a partir do instante no qual o trabalho deixou de ser uma mera atividade do instinto, passando a ser o reflexo de um plano previamente elaborado, ali teve incio a espcie humana, com sua capacidade original e nica de transformar a realidade de acordo com os seus desejos. De l para c, ela vem criando e recriando no somente o mundo, mas tambm a sua prpria forma de ser e de se comportar.

    Cada ser humano , portanto, proprietrio de uma parte da fora de trabalho total da comunidade,

    da sociedade e de toda a nossa espcie. Fora essa que se inclui numa categoria especial, diferente de todas as outras, pelo simples fato de ser humana (pois um recurso exclusivo da nossa espcie).

    Assim, impossvel e inaceitvel confundir essa fora com qualquer outro meio existente de se

    executar tarefas, ainda que os patres insistam em tratar o vapor, a energia eltrica, os animais, o diesel, a energia solar ou das guas e a fora humana como se fossem equivalentes, pois para eles o que interessa apenas o resultado da produo, ou seja, o lucro.

    O trabalho, em sua forma original, passou por sculos de transformao das formas primitivas

    de artesanato e agricultura, at as corporaes de ofcio da Idade Mdia, chegando s modernas fbricas at atingir o complexo sistema de explorao que hoje conhecemos.

    Do sculo XIII, perodo no qual o capitalismo comeou a ser gerado, at os dias de hoje, em pleno

    sculo XXI, o trabalho organizou-se, estruturou-se e alcanou nveis de especializao e lucro nunca imaginados. Pois os processos de trabalho, nos diferentes ramos da economia, tm sido incessantemente transformados pelos patres, que buscam sempre uma maior acumulao de capital. Contudo, importante no esquecer que, para o trabalhador que vende a sua fora de trabalho, essas transformaes nunca representaram algum tipo de melhoria ou ganho duradouro e significativo.

    Se, num primeiro momento, ao vender sua fora de trabalho para os patres, aceitando apenas

    apertar sempre os mesmos parafusos da linha de produo, o trabalhador alienado da sua capacidade de criao, da sua capacidade de inventar, depois, quando os mesmos patres desejam aumentar a produo ou medida que os meios de produo se aperfeioam , essa alienao aprofundada e ampliada, ganhando inclusive contornos cientficos.

    o que ocorreu, por exemplo, com a adoo, nos meios industriais, das teorias que propem

    diversos sistemas de normas para o controle e o aumento da produo, conhecidas como fordismo e taylorismo. Se j no havia mais o uso da mente no trabalho isso consome tempo, dizem os patres , agora os processos fsicos tambm so executados cegamente, sob o comando dos outros; tudo cronometrado e os movimentos dos trabalhadores so medidos e reprimidos. O trabalhador se torna, ele prprio, um parafuso ou uma alavanca.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    13

    No mundo injusto do trabalho, um grupo em particular duplamente atingido: as mulheres, cuja

    maioria, aps enfrentar a jornada de trabalho na fbrica, v-se obrigada, por injustos padres culturais e sociais, a desempenhar uma segunda jornada de trabalho, dedicada aos servios domsticos. Como se ainda no fosse suficiente, enfrentam tambm a segregao do emprego os melhores postos so sempre ocupados por homens e a segregao salarial pois mesmo desempenhando funes iguais, as mulheres recebem, na maioria dos casos, salrios menores. Dessa forma, as relaes de trabalho acabam por reforar as desigualdades de gnero, que se reproduzem no interior da classe social e desunem homens e mulheres em nome de velhas e ultrapassadas formas de patriarcalismo.

    A necessidade de submeter o trabalhador ao trabalho em sua forma capitalista tornou-se um

    aspecto permanente da nossa sociedade. Assim, a transformao de homens e mulheres em fora de trabalho, meros instrumentos do capital, um processo incessante e interminvel. A situao humilhante para os trabalhadores, seja qual for o seu salrio, porque viola as condies humanas do trabalho.

    Contudo, homens e mulheres, ainda que explorados, no so completamente destrudos como

    seres humanos, preservando suas inteligncias e seu poder de crtica e contestao. Sero sempre, portanto, em algum grau, uma ameaa ao capital, por mais enfraquecidos e diminudos que estejam.

    A CRISE DA SOCIEDADE DO TRABALHO

    O mundo do trabalho em mutao: as reconfiguraes e seus impactos Por Marco Aurlio Santana

    Introduo

    As ltimas trs dcadas do sculo XX foram palco de transformaes rpidas e radicais que varreram a sociedade contempornea e cujas reverberaes vo sendo sentidas at hoje. Podemos dizer que as pocas de crise e de mudana sempre se prestaram ao aparecimento de prognsticos e avaliaes que, por estarem embasados em uma realidade movedia,muitas vezes, acabam por indicar mais as desesperanas ou expectativas dos avaliadores do que cenrios realmente existentes. Nos dias atuais, temos, no mercado de anlises, um espectro de posies bastante dspares acerca das transformaes sofridas pela sociedade em geral e pelo mundo do trabalho em particular. Tais anlises tm como um dos dados principais de diferenciao a qualificao dos cursos e sentidos dessas mudanas. Para onde nos levariam? Este artigo visa a indicar alguns eixos das transformaes contemporneas no mundo do trabalho e seus impactos na vida social. Nesse sentido, tomaremos como foco as mudanas nos processos de trabalho, nas formas de contratao e regulao do trabalho e aqueles que seriam seus novos requerimentos em termos de qualificao dos trabalhadores. Mudanas no cenrio global As transformaes no mundo do trabalho vm afetando, de modo intenso, as sociedades industriais em todo o mundo. Formas de produo, consideradas superadas pelo desenvolvimento de um capitalismo monopolista, retornam numa outra dimenso, reincorporadas a uma lgica de acumulao que enfatiza a competitividade e a qualidade. O processo de reestruturao das atividades produtivas, principalmente a partir da dcada de 1970, inclui inovaes tecnolgicas e novas formas de gesto da fora de trabalho. O resultado tem sido um aumento significativo nos ndices de produtividade, profundas alteraes no relacionamento entre as empresas e nas formas de organizao da produo, interferindo nas relaes de trabalho e no processo de negociao com as instituies de defesa dos trabalhadores. Essa reestruturao, no entanto, vista por muitos como inevitvel na racionalidade do mercado, tem trazido tambm graves problemas sociais quanto ao nvel de emprego e garantia dos direitos conquistados pelos trabalhadores ao longo do sculo XX. Ao mesmo tempo que os ndices de desemprego se tornam

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    14

    elevados, inclusive nas economias centrais, em muitos pases do mundo, se aplica uma poltica de desmantelamento da ao do estado nas reas sociais. Nos pases subdesenvolvidos, a flexibilizao das relaes de trabalho s faz aumentar o mercado de trabalho informal e o desemprego. Fala-se em globalizao. da produo industrial. De fato, as empresas multinacionais, em busca de maiores taxas de lucro, estendem sua presena por regies geogrficas e econmicas que oferecem uma fora de trabalho com salrios baixos e menos dispndios com benefcios sociais. No que se refere a inovaes tecnolgicas e de gesto, estratgias derivadas do chamado modelo japons., embora efetivas em apenas algumas grandes empresas no prprio Japo, vm sendo anunciadas como soluo para todos os males resultantes da falta de competitividade e das dificuldades no controle da fora de trabalho. Novas formas de gesto se associam ao anncio da modernidade.. No Brasil e na Amrica Latina, aparecem como o caminho inexorvel da produo industrial e expresses, como qualidade total., just in time, etc. passam, de repente, a fazer parte do vocabulrio das empresas, que impingem aos trabalhadores um discurso .civilizador. sobre a necessidade de aderir aos novos tempos. A exigncia de maior competitividade vem introduzindo estratgias de racionalizao e reduo de custos com srias conseqncias para os nveis de emprego. Postos de trabalho, que tradicionalmente garantiam estabilidade, se reduziram drasticamente. A insegurana passou a fazer parte do cotidiano do assalariado que detm algum tipo de emprego formal. Formas precrias de trabalho, de subcontratao, passaram a ser utilizadas como norma, incorporando-se s prticas das empresas. Fragilizou-se a instituio sindical como representao legtima dos trabalhadores. O desemprego adquiriu dimenses mais amplas, mudando hbitos e trazendo pobreza e desesperana, e o trabalho informal tornou-se uma alternativa freqente para os excludos do mercado de trabalho formalizado, principalmente nos pases subdesenvolvidos. De forma bastante esquemtica, poderamos indicar, guisa de introduo, as principais transformaes na esfera produtiva: em um cenrio crescentemente globalizado, de abertura de mercados e de forte competio internacional, as unidades produtivas de grande porte ficam mais enxutas. e aumentam a produtividade (a chamada lean production); a atividade produtiva passa a exigir trabalhadores polivalentes/flexveis que, de posse de ferramentas flexveis, teriam como resultado de seu trabalho um produto flexvel; a parcela do trabalho fora do .foco. principal da empresa passa a ser subcontratada de outras empresas (ou terceirizada); o setor industrial perde volume diante do setor de servios e a flexibilizao das atividades produtivas leva tambm a um aumento da precarizao nos contratos de trabalho; na esfera sociopoltica, os sindicatos passam a lutar para se desvencilhar de uma realidade marcada pelo grande porte, pela exterioridade s empresas, pela rigidez e pelo enfrentamento direto, que os estava levando a uma diminuio na sindicalizao e a uma dificuldade de competir em velocidade e adequao aos impasses trazidos pela nova realidade. Junte-se a isso o desemprego e a informalizao que corroem grandemente o poder de agenciamento das instituies sindicais. Em meio a tantas mudanas, nem mesmo a idia de Estado permaneceu intocada. Pelo menos desde o segundo ps-guerra, era viso corrente a idia de que o Estado deveria cumprir no s tarefas referentes ao controle e regulao da economia, mas tambm de assegurar bem-estar social aos cidados (da o nome welfare state), o que o sobrecarregaria de outros atributos redistributivos. Foi atravs deste tipo de formulao que o Estado se encarregou do que seriam encargos sociais ligados, por exemplo, educao e sade. Nesse momento de crise da sociedade industrial, passa-se a argumentar que o Estado deve restringir sua interveno na economia e nos setores sociais. O Estado de bem-estar social ou Estado Providncia deveria ceder lugar a um novo formato de Estado, o chamado Estado mnimo. Segundo esta lgica, o Estado deveria reduzir sua insero na economia, privatizando suas empresas, enxugando seus quadros e repassando ao setor privado a tarefa de gerir a economia sem muitas regulamentaes que impedissem o livre trnsito econmico. Mais ainda, quanto ao que seriam as inseres sociais do Estado, deveria imperar a chamada lgica do mercado, de modo que deixasse de pesar sobre os ombros dos agentes econmicos e dos prprios cidados, tornando- se mais gil e dinmico. Com este quadro de transformaes, Claus Offe lanou seu questionamento acerca da validade de se manter a centralidade da categoria trabalho como chave para o entendimento sociolgico. Segundo ele, o trabalho estaria deixando de situar- se como o fato social principal. Dessa forma, as esferas do trabalho e da produo diminuiriam radicalmente sua capacidade de estruturao e de organizao da vida social, abrindo espao para novos campos de ao, caracterizados por novos agentes e por uma nova forma de racionalidade. Podemos perceber, ento, que, diante desse novo contexto, exige-se cada vez mais explicaes da parte dos atores envolvidos, e da parte dos pesquisadores que lidam com temticas centradas, de alguma maneira, no mundo do trabalho. Em um momento no qual, em escala planetria, a humanidade passa por processos que levam a transformaes materiais e simblicas, a

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    15

    velocidade vertiginosa com que muda a realidade tem dificultado ainda mais a sua compreenso e interpretao. O quadro se agrava ao percebermos que se pode estar tentando este movimento com ferramentas tericas ultrapassadas e que quaisquer formas de proposio e interveno prtico-poltica dependem de anlises e conceituaes mais precisas. A sociologia do trabalho, buscando dar conta das transformaes quantitativas e qualitativas por que passa o mundo do trabalho, tem levantado uma srie de hipteses com relao s origens, o desenvolvimento e os destinos destas mudanas. Essas alteraes foram conceituadas por uns como especializao flexvel e por outros como um novo conceito de produo. Alm disso, j foram analisadas pela escola da regulao francesa e pelos tericos do ps-fordismo. O debate gira em torno da crise e continuidade do sistema de produo denominado fordismo, da emergncia e vigncia de uma nova forma produtiva, vinculada a novos padres de demanda a especializao flexvel . e dos limites e possibilidades de expanso desta nova forma produtiva, muitas vezes identificada com os processos que lhes serviram de base, o toyotismo ou o modelo japons. Sobressai, no debate, a preocupao com o lugar dos trabalhadores em meio turbulncia atual. Uma grande ateno dada ao processo de qualificao/desqualificao ao qual estariam submetidos os trabalhadores no processo produtivo, sobre o que se esperaria deles nesses novos processos, e como seriam suas formas de insero. Alm disso, para completar, que tipo de respostas os trabalhadores podem dar em um quadro como este? As interpretaes oriundas de tais anlises so importantes, na medida em que constroem um mapa que pode servir de orientao na leitura de processos em curso. As novas formas de gestodo trabalho e da produo tm se implantado, ainda que, de forma desigual, ao redor do globo. Caberia discutir agora algumas linhas interpretativas das transformaes mundiais e indicar de que forma as alteraes nas lgicas da produo e do trabalho tm se dado na realidade brasileira. A crise do fordismo e a especializao flexvel Os estudos voltados temtica do trabalho, tentando dar conta das transformaes do sistema fordista, tm apresentado, para alm de algumas especificidades, posies variadas que podem ser agrupadas em dois conjuntos: aqueles que defendem a existncia de um movimento de superao do fordismo, apontando novos rumos possveis; e aqueles que sustentam que as mudanas so uma readequao e um ajuste ante a crise do sistema produtivo. Ambas as posies concordam que as mudanas esto relacionadas com uma crise no sistema fordista. neste contexto que se confrontam noes, tais como as de especializao flexvel e de neofordismo, e que tambm se verifica que tanto o entendimento da crise como seus possveis desdobramentos tm relao direta com a definio do que vem a ser o sistema fordista. Como lembra David Harvey (1993), a implantao do fordismo muito mais complexa do que faz supor a mera apropriao do nome de Henry Ford para o processo. Sem desqualificar o papel de Ford que introduziu o sistema de um dia de trabalho de oito horas com o pagamento de cinco dlares aos trabalhadores da linha automtica de montagem de carros de sua fbrica neste processo, ele, na verdade, articulou, de forma singular, certas tendncias correntes poca. Para alm do uso de inovaes tecnolgicas e organizacionais, bem como do formato corporativo nos empreendimentos de que Ford se apropriou e que j estavam em curso, muitos desde o sculo XIX, vale lembrar a apropriao que ele faz das idias de Frederik W. Taylor, centradas na noo de administrao cientfica. Taylor, julgando o trabalhador um ser indolente (natural ou intencionalmente), advogava uma radicalizao do processo de separao entre a concepo e a execuo do trabalho ( gerncia caberia o trabalho intelectual, e ao trabalhador, o manual). Defendia uma decomposio minuciosa do processo de trabalho em movimentos e tarefas fragmentadas e rigidamente controladas pelo tempo, resultando em um maior grau de hierarquizao e desqualificao no interior do processo de trabalho. Tudo isso, disposto em uma linha de montagem e com recompensa salarial separada do esforo empreendido pelo trabalhador. Desta forma, se articulam, como idias formadoras da singularidade do fordismo, a separao entre concepo/execuo, a fragmentao/ rotinizao/ esvaziamento das tarefas; a noo de um homem/uma tarefa com especializao desqualificante; o controle do tempo de execuo das tarefas estritamente orientadas por normas operacionais em um processo onde a disciplina se torna o eixo central da qualificao requerida; pouca ou nenhuma aceitao do saber dos trabalhadores, tendo em vista contribuir para a melhoria do processo produtivo, e, conseqentemente, do produto; e produo em massa de bens a preos cada vez menores para um mercado tambm de massa. O exguo aproveitamento do saber operrio teria como rebatimento poltico-organizacional o fato de que os sindicatos, embora aceitos, fossem pensados sempre como corpos estranhos, essencialmente oponentes e externos produo, e interessados em estimular o choque de interesses antagnicos entre empregadores e empregados.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    16

    Por mais geral que seja a forma pela qual tentemos reconstruir as caractersticas do sistema fordista, dependendo do caminho escolhido, podemos refaz-lo de outras maneiras, acrescentando, retirando ou realando certas noes. exatamente pela distino no entendimento da definio do sistema fordista, de sua crise e de seu destino que podemos lanar luz sobre as noes e posies no debate. Isso se faz mais facilmente tendo como pano de fundo aquilo que seria o paradigma da especializao flexvel, sistema produtivo que teria superado o paradigma fordista ou pelo menos, em meio crise, estaria em vias de super-lo. Para alm da sentida fluidez e amplitude na qualificao de processos que caracterizam a chamada especializao flexvel levando-se ao risco de que esta prpria conceituao permita dizer qualquer coisa que se deseje ., algumas caractersticas podem ser identificadas. Para este paradigma, tendo Michael Piore e Charles Sabel, no livro The second industrial divide (1984), como autores de ponta, a crise do sistema fordista foi deflagrada no plo do sistema que externo produo, isto , na demanda e no consumo, os quais, ao se institurem sobre novos padres de exigncia, tornaram o fordismo obsoleto a partir de uma de suas bases. A produo em massa, verticalizada, de produtos estandardizados, teria se defrontado com mercados cada vez mais saturados. No foi, porm, apenas neste nvel que teria havido um estrangulamento. A partir dos anos de 1970, outros mecanismos institucionais que davam suporte ao sistema, como as formas creditcias e a prpria noo de estado de bem-estar, s para dar alguns exemplos, tambm comearam a ser repensadas e restringidas. A resposta crise no surgia de elementos totalmente inusitados; antes, viria de uma certa recuperao de formas produtivas que sucumbiram, sem se extinguirem, diante do sistema fordista. Aquilo que poderamos chamar de sistema de manufatura, concorreu com idias que se articulariam mais tarde no fordismo e, devido, sobretudo, interveno de ordem poltica, sustentada pela viso evolutiva com seu rebatimento tecnolgico, acabou sendo derrotada, embora continuasse a existir ao longo do tempo em experincias isoladas. As idias do sistema de manufatura, nesse novo contexto, auxiliariam teoricamente a compreenso das transformaes pelas quais passamos e, na prtica, se implementadas, poderiam levar superao da crise da produo em massa. Se fizermos um recorte na teoria da especializao flexvel e tomssemos, como indicamos, a saturao dos mercados e seus novos padres de exigncia como marco de partida, perceberamos um dos pontos nodais de inflexo do sistema fordista. Sem seus amplos espaos de mercado, tendo que se adaptar busca de nichos em um grau de concorrncia extrema, as empresas teriam que produzir com versatilidade e qualidade. A produo de bens estandardizados precisaria buscar uma tecnologia, um complexo homem/mquina, flexvel. s mquinas e ferramentas flexveis se agregariam trabalhadores flexveis. A flexibilizao no processo de trabalho imporia o deslocamento da relao um homem/um posto/uma tarefa e a aproximao das etapas concepo, execuo e controle, baseando-se na incorporao progressiva da competncia dos trabalhadores no processo produtivo. Ao trabalhador parcializado e semidesqualificado ou desqualificado do fordismo, se contrapunha o trabalhador coletivo., organizado em grupos ou .ilhas. que, com a reduo da hierarquia gerencial no interior do processo e, muitas vezes, subsidiado pelo suporte microeletrnico, passa a ter sobre si a responsabilidade de agir qualificadamente sobre pontos diversos do processo. Estes ajustes se estabeleceriam tambm na estrutura das prprias firmas. Seria sensvel uma desverticalizao organizacional (desmembramento da empresa faz tudo), baseada na focalizao em processos e produtos, com respectiva reduo no porte e no nmero dos trabalhadores. Esta desverticalizao ou, em muitos casos, descentralizao (conforme ocorrido na experincia italiana), baseando-se na cooperao e na confiana, estabeleceria um vnculo interempresas, forando uma relao mais estreita entre comprador e fornecedor; tendo como pontos principais as noes de qualidade e rapidez, esta ltima fundamental, tendo em vista que um dos aspectos essenciais do processo o just in time, isto , a capacidade de operar com estoques reduzidos de matria-prima com inputs regulados no tempo. Tendo em vista a inter-relao e a velocidade das trocas e dos fornecimentos, a proximidade geogrfica tornou-se ponto essencial, e a constituio de distritos industriais passou a ser uma tendncia mundial. Como exemplo destes procedimentos, temos as experincias concretas das pequenas e mdias empresas da regio da Emilia Romana, a chamada Terceira Itlia.; da planta da Volvo, em Kalmar, na Sucia; e do fenmeno mais marcante, a experincia da Toyota, no Japo. Conforme j assinalamos, este tipo ideal de desenvolvimento industrial, puro na teoria, possui forma hbrida na realidade. Nesses termos que vrios autores percebem uma srie de possibilidades de implantao e coabitao de processos produtivos. Se a noo de especializao flexvel, de alguma forma se encontra presente nas condies identificadas com o chamado ps-fordismo, ela no o esgota. Um problema que as chamadas teorias ps-fordistas so tratadas homogeneamente, no se dando ateno suficiente s suas diferentes razes e implicaes.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    17

    Processo de trabalho e qualificao: da degradao s competncias O debate acerca das modificaes no mundo do trabalho tem, como um de seus pontos centrais, aquele que se refere ao papel desempenhado pelos trabalhadores no processo produtivo. As mudanas em curso abriram uma srie de indagaes acerca dos impactos que trariam para as funes operrias na produo. O livro Trabalho e Capital Monopolista (1977), de Harry Braverman, serviu, ao longo de muitos anos, como lente de anlise para a compreenso das inseres dos trabalhadores no processo produtivo. Ele partia da idia de que o trabalho nos marcos do sistema capitalista de produo era degradado. Haveria uma tendncia inexorvel no interior do processo de trabalho que levaria a uma desqualificao progressiva, como conseqncia do aprofundamento da diviso do trabalho no capitalismo. Este processo simplificaria ao mximo as tarefas, exigindo-se maior especializao parcial; e menor, ou reduzida, qualificao global. Segundo este autor, o modo de produo capitalista destri, sistematicamente, todas as percias sua volta, dando nascimento a qualificaes e ocupaes que correspondem s suas necessidades. Toda fase do processo de trabalho divorciada do conhecimento e preparo especial, sendo reduzida a simples trabalho. Nesse nterim, as poucas pessoas para quem se reservam instruo e conhecimento, so isentas, tanto quanto possvel, da obrigao de simples trabalho. Assim, a modernizao tecnolgica produziria, no processo de trabalho, dois setores polarizados em termos de suas qualificaes: de um lado, um pequeno setor de trabalhadores altamente qualificados; de outro, toda uma massa de trabalhadores desqualificados. Isso se agravaria com a introduo de novas tecnologias que, ao reforarem os delineamentos da diviso do trabalho, intensificariam a desqualificao da fora de trabalho. No processo de trabalho capitalista, se quebraria a unidade natural do trabalho, separando-se a concepo da execuo. Frutos de tal separao, teramos a desqualificao e o controle, marcando a insero dos trabalhadores no processo de produo capitalista. Ambos visariam a assegurar a subordinao real do trabalho, convertendo fora de trabalho em trabalho real. Alm disso, para os trabalhadores, significariam a reduo de seu grau de interferncia/resistncia, individual ou coletiva, no processo. As gerncias teriam a um papel destacado no sentido de controlar o trabalho e garantir que a lgica geral se efetivasse. O aumento do controle gerencial se daria com a correlata diminuio da influncia operria sobre os meios e a natureza da produo. O controle sobre o processo de trabalho passaria das mos operrias para a dos capitalistas, promovendo uma alienao cada vez maior dos trabalhadores frente ao processo produtivo. Apesar da anlise de Braverman referir-se a um momento no qual o mundo das tcnicas de produo dava passos iniciais em termos de sua automao e informatizao; nem por isso, suas idias deixaram de vigorar no cenrio atual de transformaes, j que, para alguns autores, o mesmo aparato conceitual pode ser usado em ambos os cenrios. Para esta perspectiva, as novas formas organizacionais ou tecnolgicas surgiriam exatamente da exigncia de renovao das tcnicas de controle sobre o trabalho, em um contexto no qual o trabalho parcelado e repetitivo entra em crise de eficincia. Devemos assinalar, contudo, que outras pesquisas indicam que as mudanas no mundo do trabalho trazem consigo fenmenos que podem ser relativos a outros processos que no o da desqualificao. interessante notar que, em alguns casos, tais pesquisas foram realizadas por autores que antes defendiam a viso da polarizao das qualificaes. Para Horst Kern e Michael Schumann (1984), por exemplo, a racionalizao na produo capitalista teria atingido tal ponto que as gerncias s conseguiriam aumentar a eficincia do trabalho se flexibilizassem os rgidos contornos da diviso do trabalho. Eles vo questionar a idia de que s pela reduo radical do trabalho vivo e/ou pela desqualificao, se conseguiria obter o mximo de eficincia. Esses mesmos autores chegaram a defender a idia de que nem o mercado, nem o produto, no estgio de racionalizao da indstria, poderiam se compatibilizar com o padro de racionalizao do modelo taylorista-fordista. O incremento da valorizao do capital no poderia mais se dar sem uma nova forma de conceber a utilizao da mo-de-obra. Nesse quadro, a introduo de novos conceitos produtivos garantiria a tendncia, diferentemente do paradigma anterior, para a formao e reprofissionalizao da mo-de-obra industrial, bem como para o esmaecimento da rgida diviso do trabalho. Assim, este novo conceito de produo, representaria uma ruptura com o taylorismo e o fordismo, possibilitando indagar se isso no significaria o prprio fim da diviso do trabalho. Em muitos estudos, o chamado modelo japons virou referncia como exemplo maior dos efeitos qualificadores do novo paradigma produtivo que estaria suplantando o fordismo. A forma de organizao do trabalho, em algumas empresas japonesas, estaria fundada em um trabalho cooperativo, de equipe, com ausncia de demarcao das tarefas a partir dos postos de trabalho sob prescrio individual. Dessa forma, teramos, como efeito central, o surgimento da polivalncia, com rotatividade das

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    18

    tarefas. O trabalhador dessas empresas japonesas seria, portanto, o exemplo da polivalncia e multifuncionalidade, dando conta dos mais variados aspectos da produo, tais como fabricao, manuteno, controle de qualidade e gesto da produo. As qualificaes exigidas neste novo modelo produtivo contrastariam com a lgica geral taylorista, na medida em que se exigiria do trabalhador a capacidade de pensar, ter iniciativa e decidir. Na literatura pertinente, percebemos que uma larga parcela de pesquisadores, apesar das diferenas, tem aceitado o fato de que, neste novo quadro produtivo, a qualificao dos trabalhadores seria uma exigncia central para a reproduo do sistema, assim como a desqualificao o fora para o momento anterior. A exigncia destas novas qualificaes teria colocado em questo a prpria maneira de se conceber a noo de qualificao. Helena Hirata (1994) afirma j se reconhecer que os componentes implcitos e no organizados da qualificao desempenham papel tambm importante junto aos componentes organizados e explcitos, como educao escolar, formao tcnica e educao profissional. Todo este processo levaria, em termos tericos, a uma quase superao da tese da polarizao das qualificaes, dando surgimento ao chamado modelo da competncia. Este poderia ser definido como um novo modelo, ps-taylorista, de qualificao, no estgio de adoo de um novo modelo, ps-taylorista, de organizao do trabalho e de gesto da produo. Nele, a qualificao real dos trabalhadores passa a constituir-se a partir de caractersticas, tais como o conjunto de competncias implementados no trabalho, articulando vrios saberes, que seriam advindos de mltiplas esferas. As empresas passariam a utilizar e apropriar-se das aquisies individuais da formao, sobretudo escolar. O modelo da competncia, que parece assumir espao central no debate, ainda est marcado por controvrsias. Para alguns autores, entre eles, Helena Hirata (1994), a noo de competncia estaria perdendo a multidimensionalidade contida na noo de qualificao e estaria marcada, poltica e ideologicamente, por sua origem (discurso empresarial), deixando de lado a idia de relao social, essencial na definio do conceito de qualificao. Tendo tal indicao em vista, podemos identificar alguns problemas no tocante insero dos trabalhadores no processo produtivo gerenciado pela competncia. Ela pode reduzir-se a formas que visem a adequar, pura e simplesmente, a forma o ao atendimento dos interesses e necessidades do capital, dando mais importncia aos resultados do que ao seu processo de construo. Alm disso, a insero dos trabalhadores no processo pode se dar sob um ponto de vista individualizante. No quadro geral da ao e organizao dos trabalhadores, isso pode representar um grande problema, j que acordos individualizados acabam por enfraquecer as prticas e aes coletivas, minando o poder sindical. O pressuposto do aumento progressivo dos requisitos de qualificao no novo paradigma produtivo, associado ao aumento do desemprego, levou alguns analistas criao do conceito de empregabilidade. Em torno de tal noo, que toca tambm ao universo do mercado de trabalho, tem transcorrido parte do debate mais recente sobre a questo da qualificao versus desqualificao. Empregabilidade poderia ser definida como a capacidade da mo-de-obra de se manter empregada ou encontrar novo emprego, quando demitida, em suma, tornar-se empregvel. Na viso de Marcia Leite (1997), a noo de empregabilidade seria um deslocamento da idia de que o desemprego se daria pelo descompasso entre a populao economicamente ativa e a oferta de trabalho. O desemprego seria, para esta nova viso, o resultado das inadequaes desta populao s exigncias de qualificao do novo paradigma produtivo. A oferta de trabalho estaria garantida para toda a populao economicamente ativa, conquanto houvesse uma adaptao s demandas da nova situao. Alguns argumentos, no entanto, identificam fragilidades na noo de empregabilidade. Um deles se refere ao fato de que, apesar de todos os investimentos feitos na qualificao profissional, no se tem conseguido atenuar as tendncias do desemprego. A idia de que a educao, como uma panacia, seria a sada para este quadro no tem sustentao ao observarmos o nmero de pessoas capacitadas, com terceiro grau de escolaridade, que tem encontrado dificuldades para encontrar emprego. Alm disso, o treinamento puro e simples da mo-de-obra no parece ter sido suficiente para aumentar as ofertas de trabalho. Mais delicada ainda a nfase na responsabilidade individual do trabalhador por sua situao de desemprego. A partir do momento em que se coloca sobre os ombros do desempregado a responsabilidade de tornar-se empregvel, acaba-se por justificar sua excluso do mercado de trabalho pelo fato de ser inadequado quanto s demandas de qualificao exigidas. O caso brasileiro O Brasil no escapou, nos anos de 1990, da onda de reestruturao produtiva que j vinha ocorrendo no mundo industrializado. Novas formas de gesto do trabalho, flexibilizao, terceirizao, entre outras prticas, tm sido experimentadas pelas empresas brasileiras. verdade que isso vem ocorrendo de

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    19

    modo desigual, e se j possvel identificar alteraes no processo produtivo propriamente dito, na maioria dos casos, podemos constatar que as novas estratgias empresariais tm se preocupado mais em cortar custos, eliminando, em definitivo, postos de trabalho, como demonstrado em Jos Ricardo Ramalho e Helosa Martins (1994). A precarizao do trabalho pode ser considerada uma tendncia que se afirma com a abertura de mercado e o aumento da competitividade, alm de haver uma tendncia perda na qualidade do emprego e das relaes de trabalho. Para alm da quase eterna discusso terica sobre a possibilidade de transferncia de modelos de uma realidade outra, percebemos que, na prtica dos indivduos, h uma busca incansvel de exemplos ou experincias que orientem aes, mesmo que em contextos renovados. sensvel na realidade brasileira dos ltimos anos, a tentativa por setores empresariais da implantao de novas tcnicas de organizao e gesto do trabalho e da produo. Ainda que visem ao chamado modelo japons, acabam por contextualiz-lo em termos de interesses empresariais de curto prazo e/ou da situao nacional, muitas vezes, usando isoladamente mtodos e tcnicas que antes, articulados, compunham o modelo. O contexto brasileiro no chega a ser o da crise clssica do fordismo em suas claras referncias ao mercado saturado. Aqui, o contexto das inovaes tem relao direta com a tentativa de acesso ao mercado mundial e seus padres de preo e qualidade dos produtos e a abertura comercial atabalhoada promovida durante o governo de Fernando Collor. Este processo forou competitividade uma economia em grande parte, seno em sua totalidade, desenvolvida sob o guarda-chuva protecionista. A estreiteza de mercado interno imps tambm sua contribuio a esse contexto, tendo em vista que, apesar de potencialmente amplo, ele altamente restringido pela concentrao de renda, que transforma o quantitativo em qualitativo, abrindo janelas, nichos de espaos de consumo e alta lucratividade, duramente disputadas. Na disputa de tais espaos, entretanto, as empresas esto precisando lidar, nem sempre de forma satisfatria, com problemas que lhes so tanto de ordem interna como externa. Haveria um escasso dinamismo tecnolgico e um correlato atraso relativo da indstria brasileira. Conforme j constatado por Ruy de Quadros Carvalho (1994), isso poderia ser explicado por um padro de industrializao, marcado pela explorao predatria de mo-de-obra barata e de recursos naturais abundantes e pela manuteno de um protecionismo generalizado e ilimitado no tempo. Deste quadro, resultariam a permanncia de processos de trabalho convencionais com pouco espao e aceitao da inovao e o uso predatrio de uma fora de trabalho pouco qualificada, que por isso justificaria seu baixo salrio. No que diz respeito baixa qualificao e at mesmo baixa escolaridade da fora de trabalho no Pas, muitas vezes, utilizada como argumento justificativo dos obstculos modernizao, devemos chamar a ateno para o fato de que as mesmas foram resultado, entre outros fatores, de uma demanda que vinha sendo formada de h muito, por um processo de recrutamento taylorista. Porm, apesar das limitaes, a flexibilizao vai ganhando espao no mundo da produo. Entretanto, isso se d de forma bastante desigual entre setores produtivos e esferas de relao (empresa, inter-empresa, regulamentao do trabalho, etc.), com resultados tambm variados. De forma geral, se observarmos a tentativa de implementao da flexibilizao via introduo de mtodos e tcnicas do que j foi chamado de nova escola de gesto da produo (modelo japons), perceberemos que ela tem enfrentado barreiras, que vo desde o interior fabril at a regulao geral, por parte da interveno do Estado (ausncia de infra-estrutura, poltica industrial, investimento em qualificao profissional, poltica salarial, etc.). Assim, , a flexibilizao na produo foi marcada pela introduo de sistemas, tais como o just in time, kan-ban e os Crculos de Controle de Qualidade (CCQs), muitas vezes, isoladamente e com seu sentido transformado. O trabalho, como regra, continuou tendo prescrio individual, via carta de processos, roteiros de fabricao ou ordens orais. A polivalncia pareceu ser antes multitarefa do mesmo teor que um desenvolvimento de mltiplas habilidades por uma fora de trabalho altamente qualificada. A isso se agregou o fato de que as gerncias apresentaram uma grande dificuldade em incorporar a competncia dos trabalhadores no processo, deixando explcita uma longa herana de autoritarismo no interior fabril. Com isso, teramos o desenvolvimento de um processo que adiciona a adoo de novas tcnicas e novos mtodos s relaes de trabalho retrgradas, que tem por base os baixos salrios e a falta de procedimentos que visem estabilizao da mo-de-obra. A flexibilizao avanou muito, aproveitando-se da flexibilidade preexistente, na esfera da contratao do trabalho. Podemos caracterizar este processo como o que John Humphrey (1994) chamou de flexibilidade defensiva, que deixa a organizao da produo intocada e aumenta, sobremaneira, a flexibilidade dos contratos de trabalho. Nesse sentido, vemos pipocar terceirizao por todos os lados e das mais variadas formas, intensificando, cada vez mais, o processo de precarizao do trabalho. O que est ocorrendo uma verdadeira exportao de tenses, conflitos e da prpria legislao trabalhista para fora das unidades produtivas, j que, mesmo alocados dentro de seu espao, os terceirizados so trabalhadores de um

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    20

    terceiro. Isso se explicita mais quando as grandes empresas transformam as casas de seus funcionrios em minifbricas para familiares e amigos em geral, numa cruel reapropriao do trabalho domstico, corroendo, entre outras, a legislao trabalhista e a representatividade sindical. Tudo isso, com um pano de fundo caracterizado pelo desemprego ampliado e de longa durao. Os trabalhadores, na maior parte das vezes, tm tido pouco espao para expressar suas posies e imprimir um pouco de suas demandas e perspectivas. Em um contexto como esse, a flexibilizao tem sido vista com reservas, quando no rechaada pelo movimento sindical, que j traz, ao longo de sua histria, uma trajetria na qual, pelas circunstncias, a pr-ao sempre cedeu lugar a propostas reativas e resistncia. Apenas em alguns casos e/ou em alguns setores de ponta, se verifica a inteno de se negociar a implantao das inovaes, dando-lhes, inclusive, novos sentidos. As diferentes foras atuantes no meio sindical de nosso pas, conforme as suas orientaes poltico-sindicais, tm tentado enfrentar todas essas questes, apresentando, obviamente, sugestes de carter variado e, muitas vezes, antagnico. No existe, at aqui, uma proposta que unifique as diversas posies no movimento sindical no sentido do enfrentamento da crise. Elas possuem leituras diversas do quadro em curso e proposies de interveno tambm diferentes. Um dos pontos que tem sido recorrente, e polmico, no debate no interior do movimento sindical, a preocupao dos trabalhadores com a qualificao profissional e com a disputa de espaos nessa rea, questo da qual esteve afastado durante muito tempo e que, apesar das limitaes, foi alada novamente ao primeiro plano. Buscando alternativas: os trabalhadores e suas organizaes Embora haja certo consenso na literatura acerca da radicalidade das mudanas em curso e que estas teriam duros efeitos sobre os sindicatos, existe pouco consenso se os impactos seriam to letais e terminais assim. Uns alegam que h uma crise mundial de sindicalizao; outros, qualificando diferentemente os nmeros, apontam o relativismo de tal afirmao. Uns indicam que o legado dos sindicatos como elemento central da representao dos interesses dos trabalhadores est acabado, dando lugar outras formas identitrias e de representao mais parciais; outros, aceitando, em parte, tal indicao, continuam apontando a importncia dos sindicatos na conquista e manuteno de direitos para a classe trabalhadora. preciso lembrar que a luta dos trabalhadores atravs da histria, se deu sempre de forma bastante particular e especificada, dependendo, sobremodo, do contexto onde buscava atuar. De certa maneira, a ao dos sindicatos experimentou constantes crises e instabilidades, como do fundamento da existncia de qualquer organizao em busca do ajuste e adequao de suas formas de estruturao e interveno. A partir disso, podemos dizer que, diante do quadro de mudanas que varrem a sociedade contempornea, o sindicalismo no poderia ficar parado, como no est. Talvez no esteja se alterando to rapidamente como gostaramos, ou projetamos, mas no podemos dizer que outras perspectivas no estejam se abrindo, apontando para diferentes possibilidades. Dentre essas, j so sensveis as articulaes que tm sido promovidas pelos sindicatos dentro e fora de seu universo, buscando incorporar novos temas e demandas, ampliando, assim, suas esferas e formas de ao. Em um contexto que conjuga informalidade e desemprego, ou, para sermos mais diretos, precarizao e aumento da excluso, em uma lgica que visa a destituir os trabalhadores at mesmo de seus mais elementares direitos, como sobreviveria a mquina de organizao sindical sem que muitas de suas premissas sejam alteradas, no sentido de agilizar sua capacidade de dar conta de novas questes, impedindo a corroso de sua representatividade? A investigao sociolgica sobre a crise do sindicato tem levado tambm antecipao de cenrios, desdobramentos e tendncias para o futuro. As alternativas propostas variam, basicamente, entre os cenrios que enfatizam mudanas nas atividades sindicais mais tradicionais de representao coletiva e aquelas que sugerem uma ampliao de atividades no sentido de incluir a representao de trabalhadores desempregados, precarizados ou excludos do ncleo central da produo e at de um sindicalismo comunitrio que, com outros movimentos sociais, voltar-se-ia para atender s necessidades dos que se encontram excludos do mundo do trabalho" (Larangeira, 1998,p.181-3). Isso, a nosso ver, resgataria, em muito, uma tradio que foi se enfraquecendo ao longo da histria do movimento operrio mundial, por conta de sua institucionalizao. Tais indicaes, baseando-se em experincias concretas, vo apresentando as novas configuraes e prticas que o sindicalismo vem assumindo.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    21

    A idia de um sindicalismo tipo movimento social, avanada por Moody (1997, p. 5), prope um sindicalismo mais dinmico, aberto s novas demandas, de escopo internacional e informado por uma poltica socialista renovada. Mais que uma estrutura ou uma rea de abrangncia e jurisdio, bases da organizao do sindicalismo de corte industrial, essa idia traria, em seu bojo, um tipo de orientao. Esse sindicalismo seria democrtico, como a melhor maneira de mobilizar os trabalhadores; militante, no sentido de que perceberia que um recuo em qualquer dos pontos de sua rede de lutas levaria to somente a mais recuos; lutaria pelo poder e pela organizao nos locais de trabalho; seria poltico, embora agindo independentemente dos partidos; multiplicaria o alcance de seu .poder poltico e social na articulao com outros sindicatos, organizaes de bairro ou outros movimentos sociais.; finalmente, lutaria por todos os oprimidos, ampliando seu poder neste processo. Indo ainda mais frente em termos experimentais alternativos, Osterman et al. (2001), em uma anlise menos politizada que a de Moody (1997), assinalam que o sindicalismo do futuro deve assumir uma feio de redes ampliadas. Para os autores, .trabalhadores e suas famlias necessitam e merecem uma voz forte, independente e inovativa nos locais de trabalho, em suas comunidades e nas formulaes de polticas nacionais (Idem, p. 96). Este processo vai requerer, alm da ampliao de seu escopo, as necessidades e os interesses dos mais variados setores ocupacionais. Mas, para que este tipo de sindicalismo se torne uma realidade, algumas pr-condies devero ser preenchidas. Alm da mudana nas estratgias de recrutamento e manuteno de membros, no sentido de que tero de recrutar e ficar com os indivduos ao longo de toda sua trajetria profissional, ao invs de perd-los assim que mudam ou perdem empregos; deve-se buscar uma modificao nas leis trabalhistas e na cultura gerencial, para que incorporem tal possibilidade, permitindo aos sindicatos cumprirem seu novo papel e garantindo aos trabalhadores a liberdade de organizao nos locais de trabalho, a mesma que, alis, eles j possuem na sociedade civil. No caso brasileiro, as buscas de alternativas tm apontado tambm para diversas propostas e direes. Embora ainda se tenha dificuldade de avaliar com maior profundidade os resultados. desses esforos, j possvel assinalar o desenvolvimento de experincias mltiplas e variadas, nos diversos setores que compem o movimento sindical brasileiro. Mesmo que no sejam consensuais, elas servem de indicativo das movimentaes no novo quadro, no qual a excluso social e o desemprego assumem papel de destaque na lista de preocupaes do sindicalismo de nosso pas. A este respeito, podemos indicar, entre outras: A tentativa de articulao com outros movimentos sociais, como, por exemplo, os movimentos pela terra, por moradia e outros relativos cidadania, justia etc. A busca da abertura para novos temas e demandas. Tem-se dado, por exemplo, maior nfase em polticas concretas para as questes de gnero e raa, de cidadania, dentro e fora dos locais de trabalho, e para uma maior ateno educao dos trabalhadores, a qual agora ultrapassa a formao poltico-sindical, passando tambm a discutir a educao geral e profissional. A incorporao de prticas alternativas de organizao e negociao. Isso pode ser visto atravs de prticas que visam a inserir os sindicatos na luta pelas definies de novas institucionalidades, como as Cmaras Setoriais e tentativas recentes de articulao de organizao e aes no mbito regional (por exemplo, o Mercosul). Alm disso, tem-se intentado sanar uma dificuldade j tradicional de nosso sindicalismo que diz respeito manuteno de vnculos e organizao de trabalhadores desempregados. A tarefa para os sindicalistas no das mais fceis. Tero que, incorporando sua experincia histrica . o que constitui um acervo fundamental conseguir analisar e atuar corretamente na conjuntura presente, olhando o futuro de forma aberta e atenta s novas condies. Nesse sentido, muito de sua cultura poltico-sindical precisa ser colocada em questo. O sindicalismo, para sobreviver, em meio a tantas ameaas reais ou virtuais, necessita no s ampliar seu espectro com outras demandas e preocupaes, como tambm com formas diversas de luta e estruturao. Isso pode lhe oferecer condies de ser mais propositivo e antecipador de cenrios, os quais lutar para construir ou obstar. Desse modo, o sindicalismo continuaria a desempenhar seu importante papel na luta pela conquista e manuteno dos direitos dos trabalhadores, levando em conta includos e excludos do mundo do trabalho. Por certo, no h muitas razes para sermos otimistas, mas nem por isso devemos nos seduzir por um pessimismo paralisante. Nessa nova era das desigualdades em que vivemos, os sindicatos no podem deixar de estar presentes, a um s tempo, garantindo aos trabalhadores um lugar digno na sociedade e pleiteando um mundo mais justo e igualitrio.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    22

    Consideraes finais As mudanas no mundo do trabalho tm exigido novos requerimentos de processos e de seus trabalhadores. Como podemos ver em muitos casos, tais requerimentos endeream suas demandas qualificao e formao dos trabalhadores, o que, porm, feito de forma individualizada, solicitando investimento e empenho pessoal do trabalhador. A prpria noo de educao se v sob presso daquilo que seria educar para o trabalho. No s se submete o que deveria ser uma tica formativa mais plena e crtica a uma perspectiva mais restrita de determinao da lgica de mercado, como tambm se impe ao trabalhador a necessidade (e o risco) de buscar incansavelmente preencher requisitos definidos pela lgica empresarial. Se a educao vem assumindo foro de centralidade nesse debate (e em termos de requerimentos prticos), necessrio que a sociedade como um todo se indague de que formao se est falando e necessitando. O fato de que, possivelmente, tenha ficado para trs a demanda taylorista, substituda pelo operrio-boi, no pode, por si s, indicar que as demandas educacionais, feitas pelos novos modelos produtivos sejam positivas para a sociedade em geral e para o trabalhador em particular. Como em todos os demais aspectos, a sociedade e no o mercado, quem deve definir e guiar os eixos de desenvolvimento social e econmico. A perspectiva de dilogo entre as duas demandas, no qual a social deve ter primazia, parece ser um caminho frtil. Tendo em vista a centralidade atribuda ao trabalho na sociedade moderna, sua relevncia em termos da organizao social e sua importante dimenso para o pensamento social, uma crise que transforme esse campo tende a trazer modifica es tambm em suas diversas dimenses. o que estamos presenciando. Podemos perceber mudanas substanciais no mundo do trabalho, nas anlises sobre ele e mesmo nas formulaes polticas dele oriundas ou a ele direcionadas. provvel que os trabalhadores e as suas instituies de representao nunca tenham passado por uma quadra to adversa. Em um processo conjugado, no s se agravam as condies de vida e trabalho da maioria da populao pelo mundo, como tambm est ameaada a existncia dos organismos responsveis pela ao que poderia servir de contraponto a esse processo. O trabalho vai sendo precarizado, a legislao de proteo a ele diminui, e suas formas de organizao enfrentam srios desafios. Algumas questes ainda esto em aberto. Como ficar esta sociedade que vinculou grande parcela de sua sociabilidade ao trabalho e agora prescinde dele? Durante muito tempo, foi do trabalho que espraiaram movimentos universalizantes de direitos para toda a sociedade. Ser ela, agora, prescindindo daqueles atores, capaz de formular novos direitos inclusivos ou continuar acelerando o passo atual em direo a novas desigualdades e ao aumento da excluso? Enfim, tais perguntas no parecem ter muitas respostas fceis, seja no campo da teoria, seja no campo da prtica dos agentes sociais.

    A DIVISO SOCIAL DO TRABALHO

    A diviso social do trabalho o modo como se distribui o trabalho nas diferentes sociedades ou estruturas scio-econmicas e que surge quando grupos de produtores realizam atividades especficas em consequncia do avano dum certo grau de desenvolvimento das foras produtivas e de organizao interna das comunidades. Com a determinao de funes para as formas variadas e mltiplas do trabalho constituem-se grupos sociais que se diferenciam de acordo com a sua implantao no processo de produo. Tais grupos correspondem ao estatuto que adquirem dentro da sociedade e ao trabalho que executam.

    Numa fase inicial, a diviso do trabalho limitava-se a uma distribuio de tarefas entre homens e mulheres ou entre adultos, ancios ou crianas, em virtude da fora fsica, das necessidades ou do acaso, sem que tal conduzisse ao aparecimento de grupos especializados de pessoas com os seus prprios interesses ou caractersticas, no originando portanto diferenas de natureza social.

  • Escola Estadual de Educao Profissional [EEEP] Ensino Mdio Integrado Educao Profissional

    Tcnico em Agrimensura

    PSICOLOGIA DO TRABALHO

    23

    O desenvolvimento da agricultura originou profundas divises sociais no trabalho. Os arroteamentos florestais, os grandes saneamentos de zonas pantanosas, a introduo de pesados instrumentos agrcolas, a lavra da terra com a ajuda de animais de trao, tornaram-se trabalhos demasiado pesados que acentuaram uma separao de atividades entre homens e mulheres, com a concomitante passagem do matriarcado ao patriarcado.

    Esta mudana abriu uma brecha na organizao gentlica e refletiu-se na posse dos