5 – concepÇÃo, conteÚdos e seus respectivos … · 2012-02-10 · ensino fundamental e médio...

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Colégio Estadual Rotary Ensino Fundamental e Médio 5 – CONCEPÇÃO, CONTEÚDOS E SEUS RESPECTIVOS ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS “A investigação dos temas geradores ou da temática significativa do povo , tendo como objetivo fundamental a captação dos seus temas básicos , só a partir de cujo conhecimento é possível a organização do conteúdo programático para qualquer ação com ele, se instaura como ponto de partida do processo da ação, como síntese cultural.” (FREIRE, 2005. p. 209. Grifos nossos) A Concepção, Conteúdos e Encaminhamentos Metodológicos, a seguir apresentados, foram organizados em regime de colaboração coletiva, envolvendo os professores da rede pública estadual das diversas áreas do conhecimento, nos cursos de formação continuada promovidas pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná. 5.1. Ensino Fundamental – Fase II e Ensino Médio DISCIPLINA DE LÍNGUA PORTUGUESA CONCEPÇÃO DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA Considerando-se as indicações das Diretrizes Curriculares Estaduais da Educação de Jovens e Adultos que propõem o compromisso com a formação humana e com o acesso à cultura geral, bem como o respeito à diversidade cultural, à inclusão e ao perfil do educando, o estudo da linguagem na organização da proposta pedagógica do ensino de Língua Portuguesa está pautado na concepção sociointeracionista, a qual dá ênfase ao uso social dos diferentes gêneros textuais. Nesse sentido, a escola está sendo entendida como um espaço onde se produz o conhecimento e tem por objetivo propiciar uma formação intelectual, cognitiva e política, por meio de pesquisas, leituras, estudos que favoreçam o respeito aos diferentes falares e aos saberes próprios da cultura do educando, preparando-o para produção de seu próprio texto, oral ou escrito, adequado às exigências dos diversos contextos sociais. O trabalho pedagógico proposto para as práticas de linguagem está fundamentado nos pressupostos teóricos de alguns estudiosos que entendem a linguagem como interação. VYGOTSKY (1989) dedicou-se a estudos sobre a origem cultural das funções superiores do ser humano, isto é, o funcionamento psicológico, a partir da interação social e da relação linguagem-pensamento. Por isso, propõe que se estudem as mudanças ocorridas no desenvolvimento mental, inserindo o indivíduo num determinado contexto cultural, a partir da interação com os membros de seu grupo e de suas práticas sociais. Para esse autor, a cultura é uma espécie de palco de negociações. Seus membros estão

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Colégio Estadual Rotary

Ensino Fundamental e Médio

5 – CONCEPÇÃO, CONTEÚDOS E SEUS RESPECTIVOS ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

“A investigação dos temas geradores ou da temática significativa do povo, tendo como objetivo fundamental a captação dos seus temas básicos, só a partir de cujo conhecimento é possível a organização do conteúdo programático para qualquer ação com ele, se instaura como ponto de partida do processo da ação, como síntese cultural.” (FREIRE, 2005. p. 209. Grifos nossos)

A Concepção, Conteúdos e Encaminhamentos Metodológicos, a seguir apresentados, foram organizados em regime de colaboração coletiva, envolvendo os professores da rede pública estadual das diversas áreas do conhecimento, nos cursos de formação continuada promovidas pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná.

5.1. Ensino Fundamental – Fase II e Ensino Médio

DISCIPLINA DE LÍNGUA PORTUGUESA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Considerando-se as indicações das Diretrizes Curriculares Estaduais da Educação de Jovens e Adultos que propõem o compromisso com a formação humana e com o acesso à cultura geral, bem como o respeito à diversidade cultural, à inclusão e ao perfil do educando, o estudo da linguagem na organização da proposta pedagógica do ensino de Língua Portuguesa está pautado na concepção sociointeracionista, a qual dá ênfase ao uso social dos diferentes gêneros textuais.

Nesse sentido, a escola está sendo entendida como um espaço onde se produz o conhecimento e tem por objetivo propiciar uma formação intelectual, cognitiva e política, por meio de pesquisas, leituras, estudos que favoreçam o respeito aos diferentes falares e aos saberes próprios da cultura do educando, preparando-o para produção de seu próprio texto, oral ou escrito, adequado às exigências dos diversos contextos sociais.

O trabalho pedagógico proposto para as práticas de linguagem está fundamentado nos pressupostos teóricos de alguns estudiosos que entendem a linguagem como interação.

VYGOTSKY (1989) dedicou-se a estudos sobre a origem cultural das funções superiores do ser humano, isto é, o funcionamento psicológico, a partir da interação social e da relação linguagem-pensamento. Por isso, propõe que se estudem as mudanças ocorridas no desenvolvimento mental, inserindo o indivíduo num determinado contexto cultural, a partir da interação com os membros de seu grupo e de suas práticas sociais. Para esse autor, a cultura é uma espécie de palco de negociações. Seus membros estão

em movimentação constante de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significados.

Nessa mesma direção, BAKHTIN (2003) afirma que os seres humanos apreendem a realidade e a constroem na medida em que se relacionam com o outro, atribuindo assim, sentido ao seu próprio viver, permeado pelo exercício efetivo da linguagem. Esse autor propõe o confronto dos diversos discursos a partir de temáticas do cotidiano, com ênfase na polifonia, dialogismo e polissemia. O primeiro constitui as diversas vozes do discurso oral e escrito; o segundo, consiste na interação do “eu” com o “outro”; por último, a polissemia, que compreende os diferentes significados da palavra, de acordo com a vivência sociocultural de cada sujeito.

As ideias de BAKHTIN e FREIRE (2004) convergem, no sentido de que a prática pedagógica deve se dar numa relação dialógica, entre os sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Para FREIRE, a relação pedagógica consiste no diálogo entre educador e educando, como sujeitos mediatizados pelo mundo.

As propostas teóricas dos autores citados valorizam o processo interativo como espaço de construção dos sentidos do texto, confrontando situações a partir do contexto histórico, político, filosófico, social, entre outros.

Nessa perspectiva, GERALDI (2001, p. 41) identifica, historicamente, três concepções de linguagem: como expressão do pensamento, destacada nos estudos tradicionais; como instrumento de comunicação; como uma forma de interação humana.

A linguagem como interação propõe estudar as relações que se constituem entre os sujeitos no momento em que falam, e não simplesmente estabelecer classificações e dominar os tipos de sentenças. Portanto, o objeto de estudo da língua deve ser o texto oral e escrito produzido nas diversas situações de interação social.

A partir desses pressupostos, Val (1993, p.3) estabelece como propriedades do texto, a unidade sociocomunicativa – interação social e a unidade semântica – em que a coerência é o fator responsável pela unidade formal e material, ou seja, “pode-se definir texto ou discurso como ocorrência linguística falada ou escrita, de qualquer extensão, dotada de unidade sociocomunicativa, semântica ou formal”.

Essa autora afirma que, para o texto ser compreendido, precisa ser avaliado sob três aspectos: o pragmático, que se pontua em situação informal e comunicativa; o semântico, que depende da coerência; e o formal, que diz respeito à coesão.

Ainda de acordo com a autora, “a textualidade é o conjunto de características que fazem com que um texto seja um texto, e não apenas uma seqüência de frases” (VAL, 1993, p.5). Embasada em Beaugrande e Dressler, VAL relaciona sete fatores responsáveis pela textualidade de um discurso qualquer: coerência, coesão, intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e intertextualidade.

Portanto, pode-se afirmar que o texto, em suas diferentes formas de apresentação ou gêneros, se constrói no aspecto sociocomunicativo por meio dos fatores pragmáticos funcionais, em constante interação entre os sujeitos.

Os gêneros, segundo BAKHTIN (1997, p.179), são caracterizados pelo conteúdo temático, pelo estilo e pela construção composicional, que numa esfera de utilização apresentam tipos relativamente estáveis de enunciados, tais como o conto, o relato, o texto de opinião, a entrevista, o artigo, o resumo, a receita, a conta de luz, os manuais, entre outros. A escolha do gênero depende do contexto imediato e, consequentemente, da finalidade a que se destina, dos destinatários e do conteúdo.

O trabalho com a diversidade de gêneros textuais possibilita o confronto de diferentes discursos sobre a mesma temática e ainda, permite uma metodologia “interdisciplinar com atenção especial para o funcionamento da língua e para as atividades culturais e sociais” (MARCUSCHI, 2005, p.18). Além disso, contribui para que o educando perceba a organização e os elementos de construção dos diferentes gêneros ou tipos textuais para que o educando possa reconhecer a finalidade, as características e

produzir textos, seja do tipo narrativo, descritivo, argumentativo ou expositivo, entre outros.

A enunciação é dotada de tema e significação. O tema dá sentido na realização da enunciação, uma vez que ele é determinado não só pelas formas lingüísticas, mas também pelos elementos não verbais da situação. Segundo Bakhtin (1986, p. 132) “ toda palavra usada na fala real possui não apenas tema e significação no sentido objetivo, de conteúdo, desses termos, mas também um acento de valor ou apreciativo, isto é, quando um conteúdo objetivo é expresso (dito ou escrito) pela fala viva, ele é sempre acompanhado por um acento apreciativo determinado. Sem acento apreciativo não há palavra”.

O tema e a significação indicam as particularidades de estilo e composição do enunciado, esclarecendo a que gênero pertence o texto, se é composto por um ou por diferentes tipos de discurso, considerando um acento de valor, ou seja, “convém discernir igualmente o grau de firmeza ideológica, o grau de autoritarismo e de dogmatismo que acompanha a apreensão do discurso” Bakhtin (1986, p.149). Nesse enfoque há que se considerar o contexto de produção e o conteúdo temático que o sujeito utiliza para produzir um texto, envolvendo os três mundos distintos, interiorizados por ele: o mundo físico, o mundo social e o mundo subjetivo, Assim, o contexto de produção ou a situação comunicativa exercem influências na forma como um texto se apresenta.

Ler um texto, nessa perspectiva, significa perceber o contexto histórico, social, econômico, filosófico e político em que ele se insere, assim como a ideologia, a finalidade do texto, a posição do autor e o possível interlocutor, dentre outros elementos tais como a escolha pela linguagem utilizada, os elementos gramaticais e seus efeitos na construção do texto nos diferentes gêneros textuais nos momentos de reflexão sobre a língua.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

A concepção assumida em Língua Portuguesa pressupõe ações pedagógicas pautadas na construção do conhecimento de forma crítica, reflexiva, engajada na realidade, de modo a privilegiar a relação teoria-prática, na busca da apreensão das diferentes formas de apresentação do saber. Nesse sentido, a organização do planejamento pedagógico pressupõe a reflexão sobre a linguagem a partir de temáticas que exploram os diferentes gêneros discursivos e tipos de textos, com o objetivo de analisar as práticas de linguagem, ou seja, leitura, análise lingüística e produção textual.

A prática de leitura pressupõe a análise de diferentes linguagens, seja na forma verbal ou não verbal: iconográfica (imagens, desenhos, filmes, charges, outdoors, entre outros), cinética (sonora, olfativa, tátil, visual e gustativa) e alfabética, nos diferentes níveis.

Os diferentes níveis de leitura constituem-se num meio para identificar, nos diversos gêneros, os elementos de construção do texto, localizar as informações explícitas, subentender as implícitas, fazer ligação entre o conhecimento do educando e o texto, bem como estabelecer relações intertextuais.

Os gêneros textuais apresentados aos educandos precisam contemplar as possíveis situações de uso social da linguagem nas atividades propostas, tendo por objetivo identificar a finalidade do texto, a posição assumida pelo autor, o contexto social, político, histórico, econômico, filosófico, entre outros, com destaque para as variedades lingüísticas, os mecanismos gramaticais e os lexicais na construção do texto.

Nesse contexto, salienta-se a importância de apreender os dados sobre o autor (biografia), a fonte referencial (data, local, suporte de texto), além do interlocutor a quem se destina o texto.

Os mecanismos gramaticais e lexicais não são estudados de forma descontextualizada ou com a intenção da apropriação da metalinguagem, mas a partir do

texto para que o educando possa reconhecê-los como elementos de construção textual dos gêneros estilísticos e do cotidiano, uma vez que o objetivo do ensino da língua é orientar para o uso social da linguagem, de acordo com a norma padrão.

Para isso, faz-se necessária a prática orientada da produção oral e escrita de textos dos diferentes gêneros do discurso. O desenvolvimento dessa prática é importante porque o texto do educando revela, além do conhecimento de mundo, os conteúdos aprendidos e os que devem ser priorizados no planejamento do educador.

Para a seleção de conteúdos essenciais do Ensino Fundamental e Médio, bem como para as práticas de linguagem , foram utilizados os seguintes critérios: o perfil do educando da EJA; a diversidade cultural; a experiência social construída historicamente e os conteúdos significativos a partir de atividades que facilitem a integração entre os diferentes saberes. É importante destacar que embora os conteúdos sejam os mesmos para os dois níveis de ensino, o que difere é o grau de complexidade dos textos apresentados para a reflexão sobre a linguagem.

A avaliação precisa ser entendida como instrumento de compreensão do nível de aprendizagem dos alunos em relação às práticas de linguagem: leitura, produção de texto e análise linguística, para que o educador possa reencaminhar seu planejamento.

O processo avaliativo deve ser coerente com os objetivos propostos e com os encaminhamentos metodológicos. Desse modo, a avaliação deve ser dialética, ou seja, o educando confronta-se com o objeto do conhecimento, com participação ativa, valorizando o fazer e o refletir. Sendo assim, o erro no processo ensino-aprendizagem indica os conteúdos que devem ser retomados. Portanto, o trabalho com as práticas de linguagem deve partir das necessidades dos educandos.

Para isso, é importante que o educador dê significado ao objeto do conhecimento, lance desafios aos educandos, incentive os questionamentos e exerça a função de mediador da aprendizagem, valorizando a interação.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

Variedades linguísticas

Norma culta, dialetos, gírias, regionalismos, outras formas de registros.Funções da linguagem.Linguagem verbal e não-verbal.

Gêneros textuais ou discursivos

Elementos da construção dos diferentes gêneros discursivos e tipos de textos (informativo, instrucional, poético, narrativo, carta, bilhete, sinopse, etc.)

Análise do discurso: linguagem, aspecto formal, finalidade, estilo, ideologia, posição do autor, ideologia, contexto histórico, social, econômico, político, entre outros.

Elementos coesivos e coerência textual: unidade temática, elementos lógico-discursivos, tese, organização dos parágrafos, contexto discursivo, interlocutor, ideia central, sequência lógica, progressão, retomada dos elementos coesivos, título como elemento coesivo entre outros.

Discurso direto e indireto.Recursos visuais, sonoros, olfativos, gráficos, etc.Relações referenciais: elipse, repetição, sinais de pontuação.Aspectos formais do texto: acentuação, pontuação, ortografia, paragrafação, título ,

legibilidade, aceitabilidade, entre outros.Ambiguidade como recurso de construção do texto.

Ambiguidade como problema de construção do texto.Informações explícitas, implícitas e intertextualidade.Relações entre imagem e texto.

Elementos Gramaticais na construção do texto

Pontuação e seus efeitos de sentido na construção do texto: vírgula, ponto-e-vírgula, ponto final, ponto de interrogação, exclamação, dois pontos, aspas, parênteses, travessão, reticências, entre outros.

Emprego da crase na construção do texto.Classes de palavras: substantivo, adjetivo, verbo, preposição, conjunção, artigo,

numeral, pronome, advérbio e interjeição na construção do texto.Sujeito e predicado na construção do texto.Vozes do verbo na construção do texto.Adjunto adnominal e complemento adnominal na construção do texto.Aposto e vocativo na construção do texto.Orações coordenadas, subordinadas, reduzidas e intercaladas na construção do

texto.Concordância verbal e nominal na construção do texto.Colocação pronominal na construção do texto.Figuras de linguagem na construção do texto.Formação de palavras: prefixo, sufixo, radical, derivação e composição.

Para o Ensino Ensino Médio devem ser acrescidos os seguintes conteúdos de Literatura:

Arte literária e as outras artes.História e literatura.Os gêneros literários e os elementos/recursos que os compõem.Periodização e estilos de época da literatura brasileira: O Quinhentismo brasileiro

(literatura de informação), Barroco, Arcadismo, Romantismo, Realismo e Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, vanguarda europeias, Pré - Modernismo, Modernismo, Pós - Modernismo.

Os períodos literários e a relação com o período histórico, as artes e o cotidiano.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Mikhail (In: VOLOSHINOV, V.N). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1986.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

PARANÁ. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos no Estado do Paraná (versão preliminar), Curitiba, 2004.

FARACO, Carlos Alberto; CASTRO, Gilberto de. Por uma teoria lingüística que fundamente o ensino de língua materna (ou de como apenas um pouquinho de gramática nem sempre é bom). In: Educar, n.15, Curitiba: UFPR, 1999.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática pedagógica educativa. 30. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

GERALDI, João Wanderlei (org.). O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2001.

MARCUSCHI, Luiz antônio. Gêneros textuais: configuração, dinamicidade e circulação. In: KARWOSKI, Acir Mário; GAYDECKZKA, Beatriz; BRITO, Karim S. (Orgs.) Gêneros textuais: reflexões e ensino. União da vitória: Gráfica Kaygangue, 2005.

VAL, Maria da Graça Costa. Redação e textualidade. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

VYGOTSKI, L.S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

DISCIPLINA DE EDUCAÇÃO ARTÍSTICA E ARTE

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE EDUCAÇÃO ARTÍSTICA E ARTE

Encontramos o ensino da Arte presente no Brasil desde o século XVI, com a ação dos jesuítas. A Arte era parte dos ensinamentos, cujo objetivo principal era a catequização dos grupos que aqui habitavam e que incluía a Retórica, a Literatura, a Escultura, a Pintura, a Música e as Artes Manuais. Com a expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal e a posterior Reforma Educacional Brasileira (1792-1800) – Reforma Pombalina - o ensino da Arte tornou-se irrelevante e o Desenho, por exemplo, foi associado à Matemática na forma de Desenho Geométrico.

Mesmo com o incentivo de D. João VI ao ensino da Arte no início do século XIX – o que resultou na Academia de Belas Artes do Rio de Janeiro (1826) – nas escolas, o ensino ainda era influenciado pelo Iluminismo, priorizando a área científica. Essa visão foi ratificada na 1ª. Reforma Educacional do Brasil República em 1890, realizada por Benjamin Constant, cujo objetivo ainda era valorizar a Ciência e a Geometria. A partir de 1931, com a implantação do ensino da Música por meio do Canto Orfeônico, o ensino da Arte fez-se presente no primeiro projeto de educação pública de massa.

No Paraná, em 1954, foi criada a Escola de Artes no Colégio Estadual, na cidade de Curitiba, envolvendo Artes Plásticas, Teatro e Música.

O ensino da Arte somente passa a ser obrigatório nas escolas brasileiras em 1971, com a Lei 5692/71, porém, com conteúdo reduzido, fundado em uma visão tecnicista e entendendo o educador de Artes como um profissional polivalente, ou seja, aquele que deve dominar os conteúdos de Artes Plásticas e Música. Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação ratifica a obrigatoriedade do ensino da Arte na Educação Básica, porém, a Arte passa a compor a área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, abrangendo Música, Artes Visuais, Dança e Teatro.

Esse breve passeio pela história nos dá uma ideia dos conceitos que permearam a educação de Artes no Brasil, abrangendo desde um caráter religioso, com a catequização dos nativos, até aquela com fins puramente tecnicistas. Passamos de um extremo a outro, do “sensibilizador” para o “científico racional”. É importante frisar que a educação pública no Brasil até o início do séc. XX estava voltada para uma elite basicamente masculina. Verificamos também que, após a expulsão dos jesuítas, o pensamento iluminista e positivista foi preponderante no ensino público brasileiro.

Atualmente, o trabalho na disciplina de Arte exige do educador reflexões que contemplem a arte efetivamente como área de conhecimento fundamental na formação dos educandos e das educandas.

Quando Regina Migliori (1993 p.14) propõe uma “perspectiva de abordagem global” como sendo “a possibilidade de lidarmos com tudo o que se nos apresenta e não somente com os aspectos artificialmente eleitos”, a ideia é que se busque uma nova leitura da realidade. O entendimento de Migliori nos remete para uma perspectiva de uma formação omnilateral,1 crítica e autônoma do educando e da educanda, ou seja, “temos que aprender a lidar com as divergências de forma não excludente” (MIGLIORI, 1993 p. 14).

Quando privilegiamos a produção artística de um determinado grupo, povo ou etnia, fragmentamos a realidade e automaticamente criamos um juízo de valor no qual os recortes do conhecimento que fazemos passam a ser os verdadeiros ou os únicos. “Essa visão fragmentada, geradora dos incluídos e excluídos, gera uma outra verdade cruel: a marginalidade que não é alternativa” (MIGLIORI. 1993 p.14). Isso implica que ao apresentarmos em nossa seleção de conteúdos curriculares outras vozes que estão presentes na ação histórica da construção do conhecimento, possibilitamos ao educando e a educanda outras leituras diferentes daquelas que vêm sendo oficialmente apresentadas.

A Arte – fruto da percepção e da necessidade da expressão humana – revela a realidade interior e exterior ao homem e à mulher. Essa expressão artística é concretizada utilizando-se de sons, formas visuais, movimentos do corpo, representação cênica, dentre outras, que são percebidas pelos sentidos. Isso contribui para outras possibilidades de leituras da realidade e, portanto, com mais subsídios para repensá-la. O objetivo dessa proposta é gerar um ser reflexivo, autônomo e inserido criticamente na realidade em que vive. A Arte nos ajuda nesse processo, na medida em que nos fornece uma simbologia própria e portanto, outras leituras do mundo que nos cerca. Segundo Isabel Marques2: “Um dos elementos essenciais que caracteriza o ensino da Arte no ambiente escolar é o fato de que, na escola, temos a possibilidade de relacionar, questionar, experimentar, refletir e contextualizar os trabalhos artísticos a fim de que façam sentido em nossas próprias vidas e na construção da sociedade brasileira.”

A discussão em torno da arte como linguagem pondera o entendimento de que a arte não apenas suscita sentimentos, mas pressupõe uma relação de transmissão e recepção de ideias, ou seja, de comunicação. Portanto, a Arte aqui é entendida como linguagem, que se utiliza de símbolos e de elementos próprios que estão presentes na Dança (movimento e não movimento), na Música (sons), no Teatro (dramatização) e nas Artes Visuais (forma e luz).

Ler o produto artístico em suas diversas relações, nos diversos prismas e no que tange aos seus significados socialmente construídos pressupõe que o produto artístico como seja um “veículo portador de significado” (ver Bakhtin 1995, p.132). Nesse sentido, os símbolos são fundamentais para a vida social, pois é por meio deles que nos comunicamos e manifestamos nossa capacidade de sentir e de pensar.

Na cultura escolar, os saberes são apropriados pela escola de maneira singular, dando-lhes um sentido pedagógico (Sacristan J.G., 2001). Na escola, esse trabalho, ressignifica os saberes e os conceitos científicos produzidos na sociedade. É com base nestes pressupostos que trataremos a Arte como linguagem. Linguagem artística.

1 Explicar omnilateralidade em função do trabalho e da educação nos reporta no tempo em que o homem tinha a necessidade de conhecimento do todo, ou seja, pensar o objeto, fazer o objeto e vender o objeto. Como na educação, que se preocupava com as ciências exatas, as artes, a sociologia, e o espiritual, quando os quatro eixos eram de extrema importância e tinham o mesmo peso em valor.2 Esta citação é transcrição da fala da Profª Dra Isabel Marques no Simpósio Estadual de Educação Artística, Paraná abril, 2005.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

O encaminhamento metodológico para a disciplina de Artes do ensino fundamental e médio da Educação de Jovens e Adultos da rede pública do Estado do Paraná está fundamentado nas Diretrizes Curriculares Estaduais de EJA, onde estão identificados três eixos articuladores: cultura, trabalho e tempo. Com base nesses eixos que norteiam o currículo na EJA, elegemos ARTE E ESTÉTICA, ARTE E IDENTIDADE e ARTE E SOCIEDADE como eixos específicos da disciplina de Artes, dos quais derivarão as temáticas propostas e os conteúdos que serão desenvolvidos em células de aula.

ARTE E ESTÉTICA

Hoje se utiliza o termo estética para indicar... no campo das belas artes, uma concepção especial, uma maneira de fazer, uma escola ou tendência determinada (Zamacois, 1986)

A experiência estética se revela com a sensibilização, com a descoberta do olhar, um encontro com as emoções, libertando o ser para perceber o mundo em si e ao seu redor, permitindo um pensar filosófico, crítico e reflexivo. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, em seu Dicionário da Língua Portuguesa, apresenta, dentre outros, os seguintes significados para a palavra estética: “1- estudo das condições e dos efeitos da criação artística. 2- (...) estudo racional do belo, quer quanto à possibilidade da sua conceituação, quer quanto à diversidade de emoções e sentimentos que ele suscita no homem”.

Partindo dessas definições e as ampliando, a Estética aqui é entendida como sendo “toda teoria que se refira à beleza ou à arte" (Pareyson, 1997, p. 2), sendo ela derivada de uma experiência filosófica ou concreta. E por ser uma reflexão sobre a experiência, inclui-se aqui o fazer artístico, que é a manipulação dos elementos da linguagem artística, presentes nas Artes Visuais, na Música, no Teatro e na Dança. Portanto, entendemos que ao adotar um eixo articulador para a disciplina de Educação Artística e Arte baseado no entendimento acima exposto, devemos possibilitar as experiências estéticas e compreender como aproximar e proporcionar o olhar estético para as produções artísticas e para o cotidiano. E assim sendo, “o educando da EJA torna-se sujeito na construção do conhecimento mediante a compreensão dos processos de trabalho, de criação, de produção e de cultura.”(Diretrizes Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos, p. 30)

ARTE E IDENTIDADE

É comum ouvirmos falar de crise de identidade, mas o que é identidade e como essa identidade se revela a partir da arte que produzimos? A identidade está em crise?

O que é identidade? É idêntico, igual, registro... Para o dicionário Houaiss identidade é:

1- estado que não muda <a identidade das impressões digitais> 2- consciência da persistência da própria identidade, 3- o que faz com que uma coisa seja a mesma que outra, 4- conjunto de características e circunstâncias que distinguem uma pessoa ou uma coisa e graças às quais é possível individualizá-la.

A identidade singulariza e faz com que nos sintamos diferentes dos demais. Identificar pode ser aplicado a indivíduos e grupos, ou seja, tornar idêntico, fazer (se) reconhecer, distinguir traços característicos como gosto, música, festas, folguedos, crenças de grupos urbanos, rurais, etnias e outros tantos que usam da linguagem artística para expressar-se e assinar suas características sociais, antropológicas e psicológicas.

Diferentes modos de vida social são constituídos a partir das ideias que as pessoas têm sobre si, e das práticas que emergem dessas ideias e como afirma Candau (2002, p. 24), “identidade é um conceito polissêmico, podendo representar o que uma pessoa tem de mais característico ou exclusivo e ao mesmo tempo, indica que pertencemos ao mesmo grupo”, a identidade cultural de um indivíduo ou grupo permite que este seja localizado em um sistema social. Em um mundo onde as mudanças são rápidas, face à globalização e aos eventos tecnológicos e científicos vertiginosos, a arte é um dos elementos que faz parte da identidade dos povos. As mudanças globais aceleradas influenciam a identidade dos indivíduos e a sua manifestação artística.

Podemos ver com Marques (2003, p. 157) que:Não se domina um país pela invasão territorial, mas principalmente pela superposição e diluição de repertórios culturais e sociais. Caso nossos repertórios não estejam enraizados de forma significativa, ou seja, relacional, consciente e crítica, poderemos ser massacrados pela pasteurização de ideias estéticas.

A nossa identidade pessoal e social é um importante mediador das relações com os demais. A proposta deste eixo temático na Educação de Jovens e Adultos do Ensino Fundamental e Médio do Estado do Paraná preocupa-se em uma educação pela arte que transmita significados que estão próximos da vida concreta do educando, produzindo aprendizagem. É um processo que mobiliza tanto os significados e os símbolos quanto os sentimentos e as experiências a que se propõe.

Quando um indivíduo desenvolve sua percepção estética e tem consciência do poder destas representações, textos e imagens na produção das identidades, compreende a força persuasiva da arte, no sentido de criar e reforçar representações que possuímos como indivíduos e como identidade coletiva.

ARTE E SOCIEDADE

... concernem à determinação social da atividade artística, seja do ponto de vista da finalidade social das obras – por exemplo, o culto religioso ou o mercado de arte – seja o lugar ocupado pelo artista – por exemplo, iniciado numa seita secreta, financiado por um mecenas renascentista, profissional liberal ligado ao mercado de arte, etc – seja das condições de recepção da obra de arte – a comunidade de fiéis, a elite cultivada e economicamente poderosa, as classes populares, a massa, etc. (CHAUÍ, 2003, p. 153)

A arte não é uma produção fragmentada ou fruto de modelos aleatórios ou apartados do contexto social nem tampouco mera contemplação, e sim, uma ciência que trabalha com o conhecimento presente em diferentes instâncias sociais.

A profunda relação entre arte e sociedade é possível na medida em que pensarmos a arte como construção social e não como um dom natural, talento ou mera produção. As pessoas são construções sociais que necessariamente influem e são influenciados pelo fazer e pensar arte. A música rap, por exemplo, constrói um determinado tipo de consciência social, propaga os conhecimentos de um grupo popular, que são absorvidos e muitas vezes até revivificados em outras formas artístico-culturais. A abordagem crítica e intertextualizada é necessária para que no cotidiano se problematizem as relações entre arte e sociedade e se permita, assim, a formação de sínteses pessoais enriquecedoras. Em outras palavras, o conceito de arte e sociedade abrange grandes temas da vida social como: a relação do homem com o trabalho; as relações de gênero; a ocupação do espaço urbano e outros. Também através deles podemos compreender, inclusive, a influência da indústria cultural, segundo a qual, muitas vezes a (pseudo) cultura de massa tenta impor uma ordem social passiva e alienada. Em contrapartida, o conhecimento da arte em seu aspecto social, deve desvelar-se de modo que o ser humano possa pertencer, dialogar e transformar a realidade que o circunda.

No que concerne à Educação de Jovens e Adultos, não podemos perder de vista as concepções de mundo e de sociedade que queremos construir e vivenciar com os educandos, pois o grande desafio do trabalho pedagógico em arte nos dias de hoje não se resume somente em aceitar e respeitar a diversidade, mas principalmente em trabalhar, partilhar, dialogar e recriar conjuntamente a fim de educar para uma sociedade mais justa e igualitária. “A ação da escola será de mediação entre o educando e os saberes, de forma que o mesmo assimile estes conhecimentos como instrumentos de transformação de sua realidade social” (Diretrizes Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos, p. 31).

Os temas de estudo são temas que direcionam, motivam e articulam a construção do conhecimento em arte, propiciando diferentes leituras de mundo, de cidadania participativa, reflexiva e crítica. O educador escolherá um tema de estudos abrangente e articulado entre os eixos – identificados na disciplina de Educação Artística e Arte e os indicados nas Diretrizes Curriculares para a EJA – de maneira a englobar o conteúdo que fará parte do planejamento da célula de aula. Os temas de estudo terão a flexibilidade necessária para que possam ser adequados ao contexto do educando e da educanda.

Os temas de estudo são perpassados por um processo, denominado “validação”, ou seja, o tema só será adequado para continuar o planejamento se passar positivamente pelas seguintes perguntas:

1. É relevante? É importante? Para quem? Perpassa pelos eixos definidos nas Diretrizes Curriculares Estaduais de EJA - Cultura, Trabalho e Tempo?;2. Gera conhecimento em arte? Perpassa pelos eixos Arte e Identidade, Arte e Sociedade e Arte e Estética?3. É abrangente? Contempla o local e o global (regional, nacional e mundial)? É flexível?4. É possível adequá-lo às necessidades dos educandos e educandas da EJA (Idade, condições físicas, espaciais, etc)?

Uma vez escolhido o tema de estudo, o próximo passo é a elaboração da célula de aula, que serão compostas por (MARQUES, 2001, p.91-102):

1. Textos – Repertórios.2. Subtexto – Elementos da linguagem (conteúdos da disciplina).3. Contexto – Elementos históricos, sociais e culturais.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

Cada linguagem artística possui um elemento básico por meio do qual ela se manifesta, ou seja: o som (Música), o movimento e o não movimento (Dança), a forma e a luz (Artes Visuais) e a dramatização (Teatro). Destes elementos básicos derivam-se os elementos de linguagem específicos da arte. Portanto, os conteúdos para o Ensino Fundamental e Médio devem contemplar os elementos de cada linguagem artística (Música, Teatro, Dança e Artes Visuais), sua articulação e organização. Esses elementos permitirão ao educando e a educanda ler e interpretar o repertório, assim como elaborar o seu próprio trabalho artístico. A leitura, interpretação e produção artística avalia a apreensão por parte educando e da educanda dos conteúdos propostos na célula de aula.

ARTES VISUAIS

a) Forma

Composição, Experimentação (como os elementos da linguagem visual se articulam?);

Suportes (onde está proposta a ideia imagética?);Espacialidade – bidimensionais e tridimensionais (como está projetada, composta ou

representada no espaço?);Texturas / acabamentos (como se apresenta?);Movimento: dinâmica, força, fluência e equilíbrio (como se alternam, ritmo?).

b) LuzDecomposição da luz branca;Cor /pigmento / percepção da corTonsValores / classificação das cores;Sombras e luz;Contraste.

MÚSICA

a) distribuição dos sons de maneira sucessiva (intervalos melódicos/ melodia).b) distribuição dos sons de maneira simultânea (intervalos harmônicos/ harmonia),c) qualidades do som e suas variações:

- intensidade (dinâmica)- duração (pulsação/ ritmo)- altura (grave/ agudo)- timbre (fonte sonora/ instrumentação)

d) estruturas musicais (organização e articulação dos elementos da linguagem musical/ forma musical).

TEATRO

a) Elementos dramáticos:- a personagem: agente da ação;- enredo: como desdobramento de acontecimentos, desenvolvidos pela

personagem;- espaço cênico: local onde se desenvolve a ação cênica.b) Signos da Representação Teatral:- da personagem:- visuais: figurinos, adereços, gestual;- sonoros: fala (entonação)- do espaço cênico:

visuais: cenário, adereços de cena, iluminação;sonoros: sonoplastia;

c) Gêneros Teatrais:- Tragédia e suas características: a fatalidade, o sofrimento, o pesar;- Comédia e suas características: o riso, a sátira, o grotesco;- Drama e suas características: o conflito.

DANÇA

a) corpob) espaçoc) tempod) peso

e) fluênciaf)esforçog) fatores do movimento (espaço, peso, tempo e fluência)

REFERÊNCIAS

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_____________. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 8ª ed. São Paulo: Terra e Paz, 1998.

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MARQUES, Isabel A. Ensino de dança hoje: textos e contextos. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2001

_________________. Dançando na escola. São Paulo: Cortez, 2003.

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SANTAELLA, Lucia. (Arte) & (Cultura): Equívocos do elitismo. São Paulo: Cortez, 3ª. Ed, 1995.

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ZAMACOIS, Joaquin. Temas de estética y de historia de la música. Barcelona: Labor, 1986.

DISCIPLINA DE LINGUA ESTRANGEIRA MODERNA (LEM) - INGLÊS

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE LINGUA ESTRANGEIRA MODERNA (LEM) - INGLÊS

A Língua Estrangeira Moderna - LEM - é um espaço em que se pode ampliar o contato com outras formas de perceber, conhecer e entender a realidade, tendo em vista que a percepção do mundo está, também, intimamente ligada às línguas que se conhece. Ela se apresenta também como um espaço de construções discursivas contextualizadas que refletem a ideologia das comunidades que a produzem. Desta maneira, o trabalho com LEM parte do entendimento do papel das línguas nas sociedades como mais do que meros instrumentos de acesso à informação: as LEM são também possibilidades de conhecer, expressar e transformar modos de entender o mundo e construir significados. (SEED, 2005)

É um instrumento de inclusão social a partir do momento em que oportuniza o acesso a outras comunidades e conhecimentos, permitindo o alargamento de horizontes e a expansão das capacidades interpretativas e cognitivas dos educandos. Através da LEM se reconhece a diversidade cultural, e torna-se possível oportunizar o educando a vivenciar criticamente a cultura do outro ao mesmo tempo em que valoriza a própria.

A LDB 9394/96, estabelece o caráter compulsório de uma língua estrangeira a partir da 5a série do Ensino Fundamental, facultando ao Ensino Médio a possibilidade da inclusão de uma segunda língua estrangeira.

Segundo Gimenez (2005), a língua se constitui como um espaço de comunicação intercultural, exercendo “o papel de mediadora das relações entre pessoas de diferentes línguas maternas.”, tendo em vista que existem, aproximadamente, mais de 300 milhões de falantes nativos e mais de 1 bilhão de usuários no mundo todo, sendo a língua principal em livros, jornais, aeroportos e controle de tráfego aéreo, negócios internacionais e conferências acadêmicas, ciência, tecnologia, medicina, diplomacia, esportes, competições internacionais, música pop e propaganda.

Partindo desse pressuposto, a LEM é um instrumento para que o educando seja capaz de construir e não somente consumir o conhecimento oferecido por outros, propiciando “reflexões sobre a relação entre língua e sociedade e, consequentemente, sobre as motivações subjacentes às escolhas linguísticas em situações de comunicação (oral e escrita).” (PARANÁ, 2005). Ao serem expostos às diversas manifestações da língua na sociedade, os educandos podem entender as implicações político-ideológicas.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

O trabalho a ser desenvolvido com a língua segue uma abordagem onde a língua é vista como instrumento de interação, investigação, interpretação, reflexão e construção, norteada pelos três eixos articuladores: cultura, trabalho e tempo. Nessa

concepção, levar-se-á em consideração a realidade do educando, valorizando sua bagagem de conhecimentos e respeitando suas necessidades e características individuais, na certeza de que o adulto aprende melhor e desenvolve maior autonomia e responsabilidade quando se vê envolvido no processo ensino-aprendizagem.

Há que se pensar que ao ensinar uma LEM deve-se buscar a autenticidade da Língua, a articulação com as demais disciplinas e a relevância dos saberes escolares frente à experiência social construída historicamente pelos educandos.

Para a definição das metodologias a serem utilizadas, é necessário levar em conta que o educando é parte integrante do processo e deve ser considerado como agente ativo da aprendizagem, visto que ele traz saberes e estes vão interagir com os saberes que ele vai adquirir.

Na busca desta interação, deve-se buscar uma metodologia que leve em consideração que as habilidades da LEM – leitura, escrita, compreensão oral e compreensão auditiva – não são únicas, elas interagem de acordo com o contexto e precisam ser vistas como plurais, complexas e dependentes de contextos específicos.

Deve-se levar em conta, ainda, que a língua não pode ser entendida como algo fechado ou abstrato, na forma de uma gramática, onde toda a transformação, o aspecto vivo da LEM, sua capacidade de se transformar em contextos diferentes, toda diversidade da LE se perde.

Portanto, as metodologias a serem aplicadas devem levar em conta, principalmente, o contexto em que estão sendo aplicadas, de acordo com as necessidades regionais, que levem o educando a criar significados, posto que estes não vêm prontos na linguagem.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS

ENSINO FUNDAMENTAL

No caso do ensino da Língua Inglesa na EJA, dadas as suas características, o trabalho parte da exploração de diversos gêneros textuais que propiciam a exposição do educando à língua dentro de um contexto, possibilitando a análise e estudo de sua estrutura, servindo também como ponte para o criar a interação entre as habilidades em cada contexto.

1. Textos (Escritos, orais, visuais, dentre outros)

Identificação de diferentes gêneros textuais, tais como: informativos, narrações, descrições, poesias, tiras, correspondência, receitas, bulas de remédios, folders, outdoors, placas de sinalização, etc.

Identificação da ideia principal de textos. (skimming)Identificação de informações específicas em textos. (scanning)Identificação de informações expressas em diferentes formas de linguagem (verbal e

não verbal).Inferência de significados a partir de um contexto. Trabalho com cognatos, falsos cognatos, afixos, grupos nominais, etc

1.1. Foco linguístico

Substantivos.Adjetivos.

Pronomes: pessoais, possessivos, demonstrativos e interrogativos.Verbo to be e there to be. (afirmativa, interrogativa e negativa).Tempos verbais: presente simples e contínuo, passado simples (regular e irregular

de verbos mais comuns) e futuro com will.Imperativo: afirmativa e negativaPreposições (in, on, at, from, to…)Advérbios de tempo, lugar e frequência.

1.2. Vocabulário básico

saudações, apresentações, horas, família, partes do corpo, cores, dias da semana, meses do ano, estações do ano, profissões, roupas, animais, locais públicos, condições do tempo (rainy, sunny, windy, cloudy / cold, hot, cool, warm), partes da casa, refeições, adjetivos, numerais (cardinal e ordinal).

ENSINO MÉDIO

1. Textos (Escritos, orais, visuais, dentre outros)

Identificação de diferentes gêneros textuais tais como: informativos, narrações, descrições, poesias, tiras, correspondência, receitas, bulas de remédios, folders, outdoors, placas de sinalização, etc.

Identificação da ideia principal de textos. (skimming)Identificação de informações específicas em textos. (scanning)Identificação de informações expressas em diferentes formas de linguagem (verbal e

não verbal).Inferência de significados a partir de um contexto. Trabalho com cognatos, falsos cognatos, afixos, grupos nominais, etcInferência de significados das palavras a partir de um contexto. (cognatos, etc...)

1.1. Foco Linguístico

Tempos verbais: presente simples e contínuo, passado simples (regular e irregular) e contínuo e futuro com will e going to, nas formas afirmativa, interrogativa e negativa.

Comparativo e superlativo. (graus dos adjetivos)Verbos Modais: Can, may, could, should, must.Substantivos contáveis e incontáveis.Some, any, no e derivados.

1.2. Vocabulário

O vocabulário relacionado aos temas abordados nas unidades de estudo.

REFERÊNCIAS

PENNYCOOK, Alastair. English and the discourses of Colonialism. London: Routledge. 1999.

PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação, Diretrizes Curriculares da Educação Fundamental da Rede de Educação Básica do Estado do Paraná : Língua Estrangeira Moderna. Versão Preliminar. 2005.

GIMENEZ, Telma. Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental: Línguas Estrangeiras Modernas – Questões para Debate. In: PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação Fundamental da Rede de Educação Básica do Estado do Paraná: Língua Estrangeira Moderna.

DISCIPLINA DE EDUCAÇÃO FÍSICA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE EDUCAÇÃO FÍSICA

Vivenciamos nos últimos quinze anos a afirmação gradativa do ensino da Educação Física numa perspectiva cultural e é a partir desse referencial que se propõe essa disciplina como área de estudo da cultura humana, ou seja, que estuda e atua sobre o conjunto de práticas ligadas ao corpo e ao movimento, criadas pelo homem ao longo de sua história. Trata-se, portanto, privilegiar nas aulas de Educação Física além da aprendizagem de movimentos, a aprendizagem para e sobre o movimento.

Neste sentido, como enfatizam Taborda e Oliveira (apud PARANÁ, 2005, p.10) os objetivos da Educação Física devem estar voltados para a humanização das relações sociais, considerando a noção de corporalidade, entendida como a expressão criativa e consciente do conjunto das manifestações corporais historicamente produzidas. Esse entendimento permite ampliar as possibilidades da intervenção educacional dos professores de Educação Física, superando a dimensão meramente motriz de uma aula, sem no entanto negar o movimento como possibilidade de manifestação humana e, desse modo contemplar o maior número possível de manifestações corporais explorando os conhecimentos já trazidos pelos educandos e a sua potencialidade formativa.

Segundo Soares et al (1992, p. 50) a Educação Física é conceituada como:

“(...) uma prática pedagógica que, no âmbito escolar, tematiza formas de atividades expressivas corporais como: o jogo, esporte, dança, ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos chamar de cultura corporal. Esses conteúdos expressam um sentido/significado nos quais se interpenetram.”

A partir desse entendimento a proposta para a disciplina de Educação Física deve favorecer o estudo, a integração e a reflexão da cultura corporal de movimentos, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir das atividades proposta em beneficio da sua inserção social, levando-o a descobrir motivos e sentidos nas práticas corporais que favoreçam o desenvolvimento de atitudes positivas, contemplando assim todas as manifestações corporais e culturais, partindo da realidade local para as diferentes culturas.

Cabe aos professores de Educação Física mediar o processo de ensino-aprendizagem deflagrado nas aulas de Educação Física quanto à construção de um ambiente que proporcione ao aluno a aprendizagem dos conteúdos significativos para o seu processo de conhecimento e desenvolvimento, incrementando sua capacidade para tomar decisões relacionadas à atividade física, isto é, movimento corporal humano.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

A Educação de Jovens e Adultos – EJA, atende um público diverso (jovens, adultos, idosos, povos das florestas, ribeirinhos, indígenas, populações do campo, entre outros) que não teve acesso ou não pode dar continuidade à escolarização mesma por fatores, normalmente, alheios a sua vontade. Esses educandos possuem uma gama de conhecimentos adquiridos em outras instâncias sociais, visto que, a escola não é o único

espaço de produção e socialização de saberes. O atendimento a esses alunos não se refere, exclusivamente, a uma determinada faixa etária mas a diversidade sócio-cultural dos mesmos.

Se considerarmos que os educandos frequentadores dessa modalidade de ensino encontram-se em grande parte, inseridos no mundo do trabalho, é importante que o trabalho pedagógico nas aulas de Educação Física seja compatível com as peculiaridades dessa parcela de educandos. Desse modo, a aprendizagem do movimento deve ceder espaço às práticas que estejam direcionadas para e sobre o movimento, focalizando preponderantemente aspectos relacionados ao desenvolvimento de atitudes favoráveis à realização de atividades físicas e ao aprofundamento do entendimento de conceitos relacionados a essas atividades.

Numa primeira aproximação, tendemos a nos precipitar na constatação da incompatibilidade quase paradoxal de se relacionar a Educação Física com adolescentes, adultos e até idosos na escolarização de Jovens e Adultos. Se nos apoiarmos, por exemplo, nas práticas tradicionais que enfatizam atividades como as “bicicletas” do futebol ou os saques “viagem ao fundo do mar” do voleibol como referências absolutas das possibilidades de movimento corporal humano e como tipos de conteúdo e de aprendizagem presentes na Educação Física, de fato sua adequabilidade será mínima.

Podemos assumir, portanto, que o propósito da intervenção do professor que atua no campo da Educação Física no contexto da EJA é potencializar as possibilidades de participação ativa de pessoas com demandas educacionais específicas, em programas com foco na atividade física/movimento corporal humano. Outrossim, há que se considerar que a sustentação para ações pedagógicas direcionadas ao processo de escolarização dessas mesmas pessoas encontra-se em fase de construção, carecendo ainda da produção de conhecimento capaz de contribuir para a consolidação da participação da Educação Física nessa modalidade de ensino.

Duas questões essenciais precisam nortear e servir de eixo orientador para o trabalho pedagógico da disciplina de Educação Física com jovens e adultos:

- Quem são os alunos da EJA?- Como pode ser desenvolvida a Educação Física para esses alunos?Compreendendo o perfil do educando da EJA, a Educação Física deverá

valorizar a diversidade cultural dos educandos e a riqueza das suas manifestações corporais, a reflexão das problemáticas sociais e a corporalidade “entendida como a expressão criativa e consciente do conjunto das manifestações corporais historicamente produzidas” (PARANA, 2005), considerando os três eixos norteadores do trabalho com a EJA que são a cultura, o trabalho e o tempo1.

É, portanto, imprescindível que tempo, cultura e trabalho se manifestem na prática pedagógica do educador, expressando ideias e ações relacionadas a: seqüenciação (organização do conteúdo em função do tempo escolar), comprometimento na condução do processo ensino-aprendizagem (efetivação da aprendizagem dos conteúdos) e avaliação do trabalho pedagógico (critérios de acompanhamento das conseqüências do processo ensino-aprendizagem), conforme representados na figura 1:

1 Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos no Estado do Paraná (versão preliminar).

Avaliação

Sequenciação

Trabalho

Cultura

A Educação Física na Educação de Jovens e Adultos representa importante possibilidade de contato dos educandos com a diversidade da cultura corporal de movimento, sem perder de vista o papel da EJA, que segundo KUENZER (apud PARANÁ, 2005, p. 28),

deve estar voltado para uma formação na qual os educandos-trabalhadores possam aprender permanentemente; refletir criticamente; agir com responsabilidade individual e coletiva; participar do trabalho e da vida coletiva; comportar-se de forma solidária; acompanhar a dinamicidade das mudanças sociais; enfrentar problemas novos construindo soluções originais com agilidade e rapidez.

O planejamento das aulas para o perfil do educando da EJA necessita de um levantamento junto aos mesmos, de como foram suas aulas e experiências anteriores, para haver maior clareza de como o educador poderá planejar o trabalho pedagógico. Outra perspectiva a ser considerada é o trabalho com a cultura local, buscando a origem de suas práticas, transformações e diferenças em cada região.

Desse modo, os conteúdos a serem abordados devem levar em conta as características peculiares do perfil de educador dessa modalidade de ensino, seja de caráter presencial ou semi-presencial. Os conteúdos que apresentamos – constituintes da cultura corporal de movimento – devem ser selecionados em função do projeto pedagógico elaborado pela escola, considerando os interesses dos alunos observados nas interações iniciais com o educador .

Vários são os princípios que abrangem o ensino da Educação Física (BETTI, 2002), destacando-se: o Princípio da Inclusão que tem como meta a participação e reflexões concretas e efetivas de todos os membros do grupo, buscando reverter o quadro histórico da área de seleção entre indivíduos aptos e inaptos para as práticas corporais, resultando na valorização exacerbada no desempenho e da eficiência, e consequentemente na exclusão do educando .

O Princípio da Diversidade aplica-se à construção da aprendizagem na escolha de objetivos e de conteúdos, que ampliem as relações entre os conhecimentos da cultura corporal de movimento e o perfil dos sujeitos da aprendizagem. Com isso pretende-se legitimar as possibilidades de aprendizagem que se estabelece nas dimensões afetivas, cognitivas, motoras e sócio-culturais dos alunos.

Já no Princípio da Autonomia a relação com a cultura corporal de movimento, não se dá naturalmente, mas é fruto da construção e do esforço conjunto de professores e alunos através de situações concretas e significativas. A busca da autonomia pauta-se

Tempo Comprometimento

Figura 1: relação dos eixos tempo, cultura e trabalho com a intervenção pedagógica.

Figura 1: relação dos eixos tempo, cultura e trabalho com a intervenção pedagógica.

na ampliação do olhar da escola sobre o nosso objeto de ensino e aprendizagem. Essa autonomia significa a possibilidade de construção pelo educando dos seus conceitos, atitudes e procedimentos, ao invés de simples reprodução e memorização de conhecimentos.

Tais princípios precisam estar presentes ao se buscar uma aprendizagem significativa, entendida como a aproximação entre o conhecimento do educando e o construído ao longo do tempo, não perdendo de vista que os mesmos estão inseridos numa cultura e expressam uma aprendizagem social regida por uma organização política e social.

O professor deve mediar o trabalho pedagógico para que o educando compreenda o seu “eu” e o relacionar-se com o outro, a partir do conhecimento do seu corpo, como instrumento de expressão e satisfação de suas necessidades, respeitando experiências anteriores e dando-lhe condições de adquirir e criar novas formas de expressão.

A avaliação proposta para a EJA entende a necessidade da avaliação qualitativa e voltada para a realidade. Proceder a avaliação da aprendizagem clara e consciente, é entende-la como processo contínuo e sistemático de obter informações, de perceber progressos e de orientar os alunos para a superação das suas dificuldades. Reforçando este pensamento Vasconcelos (apud PARANÁ, 1994, p. 44) diz que:

o professor que quer superar o problema da avaliação precisa a partir de uma autocrítica: abrir mão do uso autoritário da avaliação que o sistema lhe faculta e autoriza; rever a metodologia do trabalho em sala de aula; redimensionar o uso da avaliação (tanto do ponto de vista da forma como do conteúdo); alterar a postura diante dos resultados da avaliação; criar uma nova mentalidade junto aos alunos, aos colegas educadores e aos pais.

Atualmente a perspectiva tradicional de avaliação cede espaço para uma nova visão que procura ser mais processual, abrangente e qualitativa. Não deve ser um processo exclusivamente técnico que avalia a práxis pedagógica, mas que pretende atender a necessidade dos educandos considerando seu perfil e a função social da EJA, com o reconhecimento de suas experiências e a valorização de sua história de vida. Isso torna-se essencial para que o educador reconheça as potencialidades dos educandos e os ajude a desenvolver suas habilidades para que os mesmos atinjam o conhecimento na busca de oportunidades de inserção no mundo do trabalho e na sociedade.

A avaliação deverá portanto compreender formas tais como: a linguagem corporal, a escrita, a oral, por meio através de provas teóricas, de trabalhos, de seminários e do uso de fichas, por exemplo, proporcionando um amplo conhecimento e utilizando métodos de acordo com as situações e objetivos que se quer alcançar. Devemos levar em consideração que educando idosos, ou com menos habilidades, os com necessidades especiais e o grau de desenvolvimento que possuem, bem como as suas experiências anteriores

Pautados no princípio que valoriza a diversidade e reconhece as diferenças, a avaliação precisa contemplar as necessidades de todos os educandos. Nesse sentido, sugere-se o acompanhamento contínuo do desenvolvimento progressivo do aluno, respeitando suas individualidades. Desse modo a avaliação não pode ser um mecanismo apenas para classificar ou promover o aluno, mas um parâmetro da práxis pedagógica, tomando os erros e os acertos como elementos sinalizadores para o seu replanejamento. Dentro dessa perspectiva, para que a avaliação seja coerente e representativa é fundamental que a relação entre os componentes curriculares se apoie em um diálogo constante.

É importante lembrar no princípio da inclusão de todos na cultura corporal de movimento. Assim, a avaliação deve propiciar um auto-conhecimento e uma análise possível das etapas já vencidas no sentido de alcançar os objetivos propostos.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

Os conteúdos são definidos como conhecimentos necessários à apreensão do desenvolvimento sócio-histórico das próprias atividades corporais e à explicitação das suas significações objetivas. Os mesmos foram estruturados de forma a garantir aprendizagens novas e significativas, despertando o interesse e a atenção dos educandos a consciência da necessidade de atitudes favoráveis a prática de atividades físicas ao longo da sua vida, valorizando a cultura corporal, logo “a cultura humana é uma cultura corporal, uma vez que o corpo realiza as intenções humanas” (FREIRE, 2003 p. 34).

Desse modo a Educação Física deve considerar conteúdos e práticas que contemplem:

- a relação entre o conhecimento social e escolar do educando;

- a identidade e as diferenças sócio-culturais dos educandos na proposição das praticas educativas;

- ensino com base na investigação e na problematização do conhecimento;- as diferentes linguagens na medida em que se instituem como significativas

na formação do educando;- as múltiplas interações entre os diferentes saberes;- articulação entre teoria, prática e realidade social;- atividades pedagógicas que priorizem o pensamento reflexivo.

Baseado na perspectiva dos educadores, propomos a articulação do trabalho docente em torno dos seguintes conteúdos: saúde, esportes, jogos, ginástica, dança e lazer.

Ultrapassando a tendência dominante de conceber a saúde como investimento individual, o conteúdo deve oferecer condições de articular o individual com o cultural, social e político. Ou seja, a saúde é um bem que se adquire, além de, pelas atividades físicas e corporais, por intermédio de: alimentação, saneamento básico, moradia, educação, informação e preservação do meio ambiente, enfim, o direito de acesso às condições mínimas para uma vida digna. Esse conteúdo permite compreender a saúde como uma construção que requer uma dimensão histórico-política e social.

O esporte pode ser abordado pedagogicamente no sentido de esportes “da escola” e não “na escola”, como valores educativos para justificá-lo no currículo escolar da EJA. Se aceitarmos o esporte como prática social, tema da cultura corporal, devemos questionar suas normas resgatando os valores que privilegiam o coletivo sobre o individual, o compromisso da solidariedade e respeito humano, que se deve jogar com o outro e não contra o outro. Por isso esse conteúdo deve ser apresentado aos alunos de forma a criticá-lo, promovendo a sua resignificação, e sua adaptação a realidade que a prática cria e recria, colocando-o como um meio e não fim em si mesmo.

Os jogos oportunizam ao jovem e ao adulto experimentar atividades prazerosas, que envolvam partilhas, negociações e confrontos que estimulem o exercício de reflexão sobre as relações entre as pessoas e os papéis que elas assumem perante a sociedade, bem como a possibilidade de resgatar as manifestações lúdicas e culturais.

O estudo da ginástica pretende favorecer o contato do educando com as experiências corporais diversificadas, seu caráter preventivo, modismo, melhora da aptidão física, tem o objetivo de conscientizar os educandos de seus possíveis benefícios, bem como os danos causados pela sua prática inadequada ou incorreta.

A dança a ser trabalhado na EJA contribui para o desenvolvimento, conhecimento e ritmo do corpo. Ao relacionar-se com o outro, cada gesto representa sua história, sua cultura, como manifestação de vida, por meio de um processo continuo de integração e relacionamento social.

O estudo sobre o lazer proporciona reflexões a cerca do uso do tempo livre, com atividades que lhe propiciem prazer, descontração, alegria, socialização, conscientização clareza das necessidades e benefícios que serão adquiridos e que contribuam para o seu bem estar físico, mental e social.

Os conteúdos propostos poderão ser distribuídos de forma informativa, prática ou teórica e poderão ser modificados de acordo com cada realidade. Os conteúdos esporte, jogos, dança, lazer e ginástica são comuns ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio, o conteúdo saúde mantêm a especificidade de cada ensino.

C ONTEÚDOS ENSINO FUNDAMENTAL E ENSINO MÉDIO

SAÚDE (Ensino Fundamental)

- Definição de saúde.- Atividade física na produção de saúde.- Sedentarismo.- Postura.- Anabolizantes e suas consequências.- Controle de frequência cardíaca.

SAÚDE (Ensino Médio)

- Definição de saúde.- Obesidade.- Stresse.- Hábitos alimentares.- LER e DORT.- Ergonomia.- Corpo do trabalhador e seus sacrifícios.- Controle de frequência cardíaca.- Envelhecer com saúde.

ESPORTES(Ensino Fundamental e Médio)

- Definições de esporte.- História e origem.- Princípios básicos (fundamentos).- Táticas e regras.- Esporte como fenômeno global.- Atividades práticas.

JOGOS(Ensino Fundamental e Médio)

- Definição de jogo.- Aspectos históricos sociais.- Tipos de jogos: jogos cooperativos, jogos recreativos/ jogos lúdicos,

jogos intelectivos, jogos de dramatização e jogos pré-desportivos.- Diferentes manifestações culturais.- Atividades práticas.

GINÁSTICA(Ensino Fundamental e Médio)

- História e origem.- Tipos de ginástica: ginástica artística, ginástica rítmica, ginástica

laboral e ginástica de academia.- Princípios básicos.- Atividades práticas.

DANÇA(Ensino Fundamental e Médio)

- História e origem- Tipos de dança: danças folclóricas, danças circulares, danças de

salão, danças criativas.- Expressão corporal/atividades rítmicas.- Danças da cultura local.- Atividades práticas.

LAZER(Ensino Fundamental e

- Definição de lazer.- Aproveitamento do tempo livre.- Lazer e benefícios para saúde.

Ficaram definidos como temas

Médio)

REFERÊNCIAS

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DISCIPLINA DE MATEMÁTICA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DA MATEMÁTICA

A Educação Matemática é um importante ramo do conhecimento humano. A sua origem remonta à antiguidade clássica greco-romana. Os gregos conceberam a Matemática como um dos conteúdos da filosofia, portanto, como um dos instrumentos da arte de conhecer o mundo em sua totalidade.

Dessa forma, o educador além de dominar os conteúdos matemáticos, deve também conhecer os fundamentos histórico-filósoficos da Matemática, e ainda, o(s) processo(s) pelo(s) qual(is) o educando aprende; aquisição do conhecimento.

Nesse sentido, é importante que o educador tenha conhecimento das práticas pedagógicas que norteiam o ensino da Matemática na atualidade. Para tanto, é necessário resgatar o processo educacional vivenciado, especialmente, a partir da década de 60 do século passado.

O ensino da Matemática, desde então, tem sofrido alterações na sua forma de organização e de conceber os conteúdos. Pode-se destacar as seguintes fases: até meados de 1960, prevaleceu a chamada “Matemática Tradicional”, em que predominava a valorização do conteúdo desvinculado da prática e com ênfase na memorização de regras. Depois, surgiu o “Movimento da Matemática Moderna”, cujo objetivo principal era a unificação dos vários campos da Matemática, tais como, a Aritmética, a Álgebra e a Geometria. O seu grande objetivo era o trabalho pedagógico por meio da linguagem dos conjuntos, mas que ficou reduzida a um simbolismo exagerado a ser memorizado pelo aluno.

Os membros da comissão do Movimento da Matemática Moderna, por sua vez, assinalaram vários defeitos no currículo tradicional difundido, afirmando a importância de se abandonar o conteúdo tradicional em favor dos novos conteúdos, entre eles a álgebra abstrata, a topologia, a lógica simbólica e a álgebra de Boole. Vejamos como Morris Kline exemplifica, como sugestão, uma aula de Matemática, nos moldes da Matemática Moderna:“A professora pergunta:― Por que 2 + 3 = 3 + 2 ?― Porque ambos são iguais a 5 – respondem os alunos sem hesitar.― Não, a resposta exata é porque a propriedade comutativa da soma assim o sustenta. ― A segunda pergunta é: Porque 9 + 2 = 11 ?Novamente os alunos se apressam a responder:― 9 e 1 são 10 e mais um é 11.― Está errado! – exclama a professora. – A resposta exata é que pela definição 2,9 + 2 = 9 + (1 + 1) [...] .Vê-se, portanto, neste exemplo que as propriedades dos Números Naturais, Teoria dos Conjuntos, se sobrepõe ao algoritmo da adição, Aritmética, no mesmo conjunto numérico. No caso, essa sobreposição faz com que a professora classifique as respostas indicadas pelos alunos como erradas, e, logo a seguir, a mesma reforça novamente a resposta correta através da propriedade comutativa.(PETRONZELLI, 2002, pp.40-1)

Com o advento da Lei 5692/71, a ênfase passou a ser a metodologia, justificada pela necessidade do aluno poder desenvolver toda sua potencialidade, ou seja, valorizou-se a manipulação de materiais concretos, relegando-se a segundo plano a fase de automação, priorizando-se o atendimento à criança em sua fase de desenvolvimento, mas descuidando-se da sistematização dos conhecimentos matemáticos sócio-históricos acumulados pela humanidade. A grande dificuldade dos professores foi, então, a passagem do concreto para o abstrato, o que é fundamental para a matemática.

Na atual proposta pedagógica para a EJA, procura-se a interação entre o conteúdo e as formas. A perspectiva, nesse sentido, é estabelecer uma relação dialética - teoria e prática - entre o conhecimento matemático aplicado no processo de produção da base material de existência humana e as manifestações teórico-metodológicas que estruturam o campo científico da própria Matemática. Dessa forma, o ensino da Matemática deve ser concebido de modo a favorecer as necessidades sociais, tais como: a formação do pensamento dialético, a compreensão do mundo social e natural, a ciência como obra decorrente do modo de cada sociedade - Grega, Feudal, Moderna – produzir a vida.

Concebida desta forma, a Educação Matemática desempenhará um papel fundamental na aquisição da reflexão filosófica por parte dos educandos, isto é, da consciência crítica que supera o senso comum que toma a aparência das coisas como sendo verdades absolutas, ou seja, a Matemática deve ser vista, como uma ciência viva e dinâmica, produto histórico, cultural e social da humanidade.

Ao revelar a Matemática como uma produção humana, demonstrando as necessidades e preocupações das diferentes culturas em diferentes épocas e ao relacionar os conceitos matemáticos de hoje com os construídos no passado, o educador permite que o educando reflita sobre as condições e necessidades que levaram o homem a chegar até determinados conceitos, ou seja, o educador estará proporcionando no processo de ensino-aprendizagem a reflexão da construção da sobrevivência dos homens e da exploração do universo, dessa forma, estará caracterizando a relação do homem com o próprio homem e do homem com a natureza.

O produto do desenvolvimento da humanidade pode ser demonstrado através da historicidade. Isto indica que ao trabalhar nos bancos escolares a abstração, o conhecimento sistematizado e teórico, o educando entenderá o avanço tecnológico, a elaboração da ciência, a produção da vida em sociedade.

Portanto, a abordagem histórica da matemática permite ao educando jovem, adulto e idoso, compreender que o atual avanço tecnológico não seria possível sem a herança cultural de gerações passadas. Entretanto, essa abordagem não deve restringir-se a informações relativas a nomes, locais e datas de descobertas, e sim ao processo histórico, viabilizando com isso a compreensão do significado das idéias matemáticas e sociais.

Mas, além de compreender que o conhecimento matemático é sócio-histórico, faz-se necessário que o educando estabeleça relações entre os elementos internos da própria Matemática - conteúdos escolares - e os conceitos sociais.

Esse conhecimento prescinde de um tratamento metodológico que considere a especificidade da Educação de Jovens e Adultos - EJA e deve constituir o ponto de partida para todo o ensino-aprendizagem da Matemática, ou seja, os educandos devem ter oportunidades de contar suas histórias de vida, expor os conhecimentos informais que têm sobre os assuntos, suas necessidades cotidianas, suas expectativas em relação à escola e às aprendizagens em matemática.

Embora, os jovens, adultos e idosos, com nenhuma ou pouca escolaridade, dominem algumas noções básicas dos conteúdos matemáticos que foram apreendidas de maneira informal nas suas vivências, a EJA tem a função de transformar essas noções elementares, conceitos espontâneos, em conceitos científicos, fazendo o educando

dominar a Linguagem Matemática e suas Representações, os Conceitos Matemáticos e Sociais, os Cálculos e os Algoritmos, a História da Matemática e a Resolução de Problemas.

A compreensão e apreensão desses pressupostos metodológicos por parte dos educandos e dos educadores, dão significado aos conteúdos escolares a serem ensinados e estudados. Embora seja importante considerar que esses significados também devem ser explorados em outros contextos, como por exemplo, nas questões internas da própria Matemática e em problemas históricos.

Desconsiderar esses pressupostos metodológicos na Educação de Jovens e Adultos uma prática centrada no desenvolvimento do pensamento linear e fragmentado, numa concepção de ciência imutável, estabelecendo definitivamente o rompimento entre o lógico e o histórico, entre o conteúdo e as formas, entre a teoria e a prática, entre a lógica formal e a lógica dialética, entre a totalidade e as unidades, enfim, entre o mundo social e natural.

A Educação Matemática deve ter, então, os seus pressupostos bem definidos e delimitados, uma vez que a teoria se desdobra em “prática científica”:

Ao professor, como um profissional do ensino, é dada a responsabilidade não só de dominar a teoria como a de inscrevê-la no universo de um cotidiano que a justificaria(...). As abstrações reunidas na teoria, organicamente dispostas em definições e conceitos, devem transitar por um caminho inverso. O professor precisa demonstrar a utilidade ou funcionamento do sistema teórico no real. A teoria precisa transmutar-se em dados ou exemplos concretos, que garantam, justifiquem ou expliquem o já defendido (hipoteticamente) no discurso. Nesse sentido, a teoria precisa desmembrar-se, na voz do professor, no relato de múltiplas interações ou mediações que repõem o problema no rastro de sua solução.(NAGEL, pp. 3-4, 2003) (Grifos nossos)

Nessa perspectiva, há de se considerar como ponto de partida a construção do conhecimento, os saberes desenvolvidos no decorrer da vivência dos educandos, que se manifestam em suas interações sociais e compõem suas bagagens culturais, que são frequentemente desconsiderados na prática pedagógica da EJA. No entanto, a superação desses saberes e a incorporação dos conceitos científicos são trabalhos que a escola deve planejar e executar.

É importante enfatizar que, os conteúdos matemáticos quando abordados de forma isolada, não são efetivamente compreendidos nem incorporados pelos educandos como ferramentas eficazes para resolver problemas e para construir novos conceitos, pois, é perceptível que o conhecimento só se constrói plenamente quando é mobilizado em situações diferentes daquelas que lhe deram origem, isto é, quando é transferível para novas situações. Isto significa que os conhecimentos devem ser descontextualizados, abstraídos, para serem novamente contextualizados, isto é, fazer a transposição didática.

Nesse sentido, a educação matemática para o educando jovem, adultos e idoso deve ter como objetivo a reversão do atual quadro em que se encontra o ensino da Matemática, ou seja, a definição dos conteúdos anteriormente fragmentados deve ser visto em sua totalidade, sem o qual não é possível querer mudar qualquer prática pedagógica consistente.

Dessa forma, é necessário que o ensino de Matemática e o seu significado sejam restabelecidos, visto que, o ensino e a aprendizagem de Matemática devem contribuir para o desenvolvimento do raciocínio crítico, da lógica formal e dialética, da coerência e consistência teórica da Ciência – o que transcende os aspectos práticos. Com isso faz-se necessário repensar o ensino de Matemática, pois o processo de emancipação política e social da humanidade estão diretamente ligados ao domínio do conhecimento. Ele é parte constitutiva da elaboração do pensamento reflexivo.

ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO

Para dimensionar o papel da Matemática na formação do jovem, adulto e idoso é importante que se discuta a natureza desse conhecimento, suas principais características e seus métodos particulares, e ainda, é fundamental discutir suas articulações com outras áreas do conhecimento.

As diversas contingências históricas têm levado os professores a deixar de lado a importância do conhecimento teórico, no entanto, é de fundamental importância que o(a) educador(a) tenha clareza que, sem o qual, não é possível mudar qualquer prática pedagógica de forma significativa. Com isso, só se tem conseguido mudanças superficiais no que se refere à reposição de conteúdos, por meio de estratégias metodológicas tradicionais que não levem os educandos a uma transposição didática.

É perceptível que, a mera seleção de conteúdos não assegura o desenvolvimento da prática educativa consistente. É necessário garantirmos, como dissemos anteriormente, a relação entre a teoria e a prática, entre o conteúdo e as formas, entre o lógico e o histórico.

Portanto, é de suma importância que o educador se aproprie dos encaminhamentos metodológicos do ensino da Matemática, e acrescente, esses elementos a reflexão pedagógica da Educação de Jovens e Adultos.

Nessa perspectiva, a

contextualização do saber é uma das mais importantes noções pedagógicas que deve ocupar um lugar de maior destaque na análise da didática contemporânea. Trata-se de um conceito didático fundamental para a expansão do significado da educação escolar. O valor educacional de uma disciplina expande na medida em que o aluno compreende os vínculos do conteúdo estudado com uma contextualização compreensível por ele(...). O desafio didático consiste em fazer essa contextualização sem reduzir o significado da idéias matemáticas que deram ao saber ensinado.” (PAIS, 2001, pp. 26-27).

De forma equivocada, a abordagem de determinados conceitos fundamentais na construção do conhecimento matemático é muitas vezes suprimida ou abreviada, sob a alegação de que não fazem parte do cotidiano dos educandos. Tal concepção de ciência e de conhecimento viabiliza na escola uma visão reducionista da Matemática, cuja importância parece ficar restrita a sua utilidade prática; ao pragmatismo.

Nesse contexto, a noção de contextualização permite ao educador uma postura crítica priorizando os valores educativos, sem reduzir o seu aspecto acadêmico (PAIS, 2001, p.27).

O processo de seleção dos conteúdos matemáticos escolares, envolve um desafio, que implica na identificação dos diversos campos da Matemática e o seu objeto de estudo; processo de quantificação da relação do homem com a natureza e do homem com o próprio homem.

No entanto, não devemos deixar de identificar os conteúdos escolares matemáticos que são socialmente relevantes para a EJA, pois os mesmos devem contribuir para o desenvolvimento intelectual dos educandos.

As Diretrizes Curriculares da Educação de Jovens e Adultos da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, versão preliminar, em seu capítulo “Orientações Metodológicas”, aponta quatro critérios para a seleção de conteúdos e das práticas educativas. São eles:

. a relevância dos saberes escolares frente à experiência social construída historicamente.

. os processos de ensino e aprendizagem, mediatizados pela ação docente junto aos educandos.

. a organização do processo ensino-aprendizagem, dando ênfase às atividades que permitem a integração entre os diferentes saberes. . as diferentes possibilidades dos alunos articularem singularidade e totalidade no processo de elaboração do conhecimento.

Nessa forma de organização curricular, as metodologias são um meio e não um fim para se efetivar o processo educativo. É preciso que essas práticas metodológicas sejam flexíveis, e que adotem procedimentos que possam ser alterados e adaptados às especificidades da comunidade escolar.

Nessa perspectiva, é de suma importância evidenciar que o ensino-aprendizagem de Matemática sejam permeados pela(os): História da Matemática; Resolução de Problemas; Conceitos Matemáticos e Sociais; Linguagem Matemática e suas Representações; Cálculos e/ou Algoritmos; Jogos & Desafios. Estes elementos devem permear a Metodologia de Ensino da Matemática, pois eles expressam a articulação entre a teoria e a prática, explicitando no ato pedagógico a relação entre o signo, o significado e o sentido dos conteúdos escolares nos diversos contextos sociais e históricos.

É importante enfatizar que a relação de conteúdos não deve ser seguida linearmente, mas desenvolvida em conjunto e de forma articulada, proporcionando ao educando a possibilidade de desenvolver a capacidade de observar, pensar, estabelecer relações, analisar, interpretar justificar, argumentar, verificar, generalizar, concluir e abstrair. Dessa forma, serão estimulados a intuição, a analogia e as formas de raciocínio indutivo e dedutivo.

Os conteúdos matemáticos presentes no ensino fundamental, a serem ensinados nas escolas de EJA, estão organizados por eixos. são eles: números e operações, geometria, medidas e tratamento de informação, que compreendem os elementos essenciais da organização curricular.

Os eixos e seus respectivos conteúdos deverão ser trabalhados de forma articulada. esta relação pode ser viabilizada entre os eixos e/ou entre os conteúdos.

É importante ter clareza da especificidade de cada eixo, bem como, que estes não devem ser trabalhados de maneira isolada, pois, é na inter-relação entre os conteúdos de cada eixo, entre os eixos de conteúdos e entre os eixos metodológicos, que as ideias matemáticas ganham significado.

Os conteúdos matemáticos presentes no Ensino Médio, a serem ensinados nas escolas de EJA, deverão propiciar o desenvolvimento de conceitos: numéricos, algébricos, geométricos e gráficos e da mesma forma, devem ser trabalhados como um conjunto articulado. Isso significa que o tratamento dos conteúdos em compartimentos estanques deve dar lugar a uma abordagem em que as conexões sejam favorecidas e destacadas.

Nesse contexto, a avaliação em Matemática na EJA deve permitir ao educador fazer observações sistemáticas de aspectos quantitativos e qualitativos da apreensão do conhecimento pelo educando, estabelecendo inter-relações entre o conhecimento matemático e o contexto social.

É fundamental que a avaliação seja coerente com a metodologia utilizada pelo educador, bem como, com os objetivos que se pretende alcançar, visto que, esta tem a finalidade de fornecer informações do processo de desenvolvimento do educando - a ele mesmo e ao educador. Essas informações permitem ao educador, uma reflexão crítica sobre a sua prática pedagógica, no sentido de captar seus avanços, suas resistências, suas dificuldades e possibilitar uma tomada de decisão sobre o que fazer para superar os obstáculos, uma vez que os educandos possuem diferentes tempos de aprendizagem.

O processo avaliativo deve ser um recurso pedagógico, que considera erros e acertos como elementos sinalizadores para seu replanejamento, ou seja, toma o erro como ponto de partida para rever caminhos, para compreender e agir sobre o processo de construção do conhecimento matemático.

No que se refere à avaliação em matemática, considerando o perfil do educando jovem, adulto e idoso, pontua-se alguns indicativos a serem contemplados pelos educadores:

- considerar todas as formas de raciocínio, ou seja, os procedimentos/métodos utilizados pelo educando para resolver uma determinada situação-problema;

- resultado não é o único elemento a ser contemplado na avaliação matemática, pois, mesmo que este não esteja de acordo, ele pode ter utilizado-se de métodos coerentes, equivocando-se em apenas parte do processo de desenvolvimento do raciocínio matemático.

- erro deve ser considerado como ponto de partida para rever caminhos, compreendendo todo o processo de construção do conhecimento matemático.

Portanto, a avaliação da aprendizagem matemática considerada como mecanismo diagnóstico, deverá englobar todas as instâncias que compõem a escola: currículo, planejamento, metodologia, conteúdos, o educando, o educador e a própria escola.

Entendida como processo, a avaliação deverá possibilitar uma constante elaboração e reelaboração não só do conhecimento produzido, mas da ação pedagógica como um todo.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS

ENSINO FUNDAMENTAL

Números e Operações

Construção do conceito de número (IN, Z, Q, I e R): classificação e seriação.Conjuntos numéricos: abordagem histórica.Algoritmos e operações.Raciocínio Proporcional.Porcentagem.Grandezas diretas e inversamente proporcionais.Regra de três.Juros simples e composto.Expressar generalizações sobre propriedades das operações aritméticas.Potenciação e radiciação.Traduzir informações contidas em tabelas e gráficos em linguagem algébrica e vice-

versa.Operações com monômios e polinômios.Equações de 1º e 2º graus.Sistema de equações de 1º grau – com duas variáveis.Cálculo Mental e Estimativa.

Geometria

Conceitos de: direção e sentido; paralelismo e perpendicularismo.Reconhecimento dos sólidos (faces, arestas e vértices).Classificação dos sólidos (poliedros e corpos redondos).Conceituação dos poliedros.Identificar poliedros e polígonos:

cubo – quadrado.paralelepípedo – retângulo.pirâmide – triângulo.

Trabalhando a relação de figuras espaciais e percepção espacial.Noção de planificação (espaço para o plano).Planificação – construção das figuras espaciais (plano para o espaço).Identificar - faces, arestas e vértices.Identificar figuras planas.Classificação dos polígonos.

Ângulos - construção

Soma dos ângulos internos de um polígono.Classificação de triângulo quanto aos lados e ângulos.Ampliação e redução de figuras (percepção e criatividade).Ângulos notáveis (articulado com simetria e a construção de gráficos de setores).Relações entre figuras espaciais e planas.Decomposição e composição de figuras.Congruência e semelhança: figuras planas, triângulos.Simetria (conceitos/aplicações).Teorema de Tales.Teorema de Pitágoras.

Medidas deTempo: calendário, relógio e relações com o sistema de numeração decimal uso das medidas de tempo e conversões de Temperatura (Corporal e Climática).

Sistema Monetário e sua relação com SND.conversões e relação entre as principais moedas: real, dólar, euro, pesquisa de

mercado.Medidas de:

- ângulos.- comprimento.- superfície.- capacidade.- volume.

Razão entre áreas de figuras semelhantes.Perímetro e área de figuras planas.Cálculo de volume de alguns sólidos geométricos.Medidas de Massa.

Tratamento de Informação

Probabilidade: experimentos e situações-problema.Estatística: problematização, coleta, organização, representação e análise de dadosMedidas de posição.Análise Combinatória: agrupamentos e problemas de contagem.Porcentagem, linguagem gráfica com análise quantitativa.

ENSINO MÉDIO

Números e Álgebra

Organização dos Campos Numéricos.Razão e Proporção.Regra de três simples e composta.Possibilidade de diferentes escritas numéricas envolvendo as relações entre as

operações:números decimais em forma de potência de 10, notação científica e potências de expoente negativo.

Radicais em forma de potência.A potenciação e a exponenciação.Propriedades da potenciação.A linguagem algébrica: fórmulas matemáticas e as identidades matemáticas.Decodificação, codificação e verificação de equações de 1º e 2º graus.Sistema de Equações (com duas variáveis).

Funções

Função afim.Função quadrática.Sequências.Progressão Aritmética.Progressão Geométrica.Noções de:

- Matrizes;- Determinantes;- Sistemas Lineares (3x3).

Geometria e Trigonometria

Relações entre formas:- espaciais e planas;- planas e espaciais.

Representação geométrica dos números e operações.

Geometria Espacial e Plana:

- Relações entre quadriláteros quanto aos lados e aos ângulos, paralelismo e perpendicularismo.

- Congruência e semelhança das figuras.- Propriedades de lados, ângulos e diagonais em polígonos.- Ângulos entre retas e circunferências e ângulos na circunferência.- Reta e plano no espaço, incidência e posição relativa.- Sólidos geométricos: representação, planificação e classificação.- Cilindro, cone, pirâmide, prismas e esfera.- Cálculo de volumes e capacidades.

Geometria Analítica:

o ponto (distância entre dois pontos e entre ponto e reta) a reta (distância entre retas)a circunferência.

Trigonometria:

Ângulos, processo de triangulação, triângulo retângulo, semelhança de triângulos.As razões trigonométricas e o triângulo retângulo.Leis do seno e coseno.Tangente como a razão entre o seno e o coseno.Construção de tabelas de senos, cosenos e tangentes de ângulos.Cálculos de perímetros e áreas de polígonos regulares pela trigonometria.Ciclo Trigonométrico – Trigonometria da 1ª volta.Gráfico de funções trigonométricas.

Tratamento de Informação

Estatística:- Gráficos e tabelas- Medidas e tendência central- Polígonos de frequência- Aplicações- Análise de dados- Sistematização da contagem:- Princípio multiplicativo;- Análise Combinatória;- Probabilidade:- Probabilidade de um evento;- União e intersecção de eventos;- Probabilidade condicional- Relação entre probabilidade e estatística

Noções de Matemática Financeira:

- Porcentagem;- Juro composto;- Tabela Price (aplicação e construção).

REFERENCIAS

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DISCIPLINA DE CIÊNCIAS NATURAIS

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE CIÊNCIAS

A Educação de Jovens e Adultos - EJA, no Estado do Paraná, de acordo com suas Diretrizes Curriculares e em consonância com as discussões realizadas com os professores da rede pública estadual de ensino, apresenta os fundamentos teóricos, metodológicos e avaliativos do ensino de Ciências, que norteiam a elaboração da proposta curricular desta disciplina.

Partindo do pressuposto que a ciência não se constitui numa verdade absoluta, pronta e acabada, é indispensável rever o processo de ensino e aprendizagem de Ciências no contexto escolar, de modo que o modelo tradicional de ensino dessa disciplina, no qual se prioriza a memorização dos conteúdos, sem a devida reflexão, seja superado por um modelo que desenvolva a capacidade dos educandos de buscar explicações científicas para os fatos, através de posturas críticas, referenciadas pelo conhecimento científico.

É necessário distinguir os campos de atuação da ciência, seus contextos e valores, como também, os objetivos dispensados à disciplina de Ciências no contexto escolar. Para tanto,

“deve-se reconhecer que a ciência é diferente da disciplina escolar ciências. A ciência realizada no laboratório requer um conjunto de normas e posturas. Seu objetivo é encontrar resultados inéditos, que possam explicar o desconhecido. No entanto, quando é ministrada na sala de aula, requer outro conjunto de procedimentos, cujo objetivo é alcançar resultados esperados, aliás planejados, para que o estudante possa entender o que é conhecido. A ciência sabe como procurar mas não conhece resultados de antemão. O ensino, ao contrário, conhece muito bem quais são os objetivos a encontrar, mas as discussões de como proceder para alcançá-los apontam para diferentes caminhos. Existe portanto uma diferença fundamental entre a comunicação de conhecimento em congressos científicos, entre cientistas, e a seleção e adaptação de parcelas desse conhecimento para ser utilizado na escola por professores e alunos”. (BIZZO, 2002, p.14)

Nessa perspectiva, a disciplina de Ciências tem como fundamento o conhecimento científico proveniente da ciência construída historicamente pela humanidade.

Os fatos cotidianos e os conhecimentos adquiridos ao longo da história podem ser entendidos pela interação das várias áreas do conhecimento, revelando a importância da Química, da Física, da Biologia, da Astronomia e das Geociências, que se complementam para explicar os fenômenos naturais e as transformações e interações que neles se apresentam.

Os fenômenos não são explicados apenas por um determinado conhecimento, portanto, é importante estabelecer as relações possíveis entre as disciplinas, identificando a forma com que atuam e as dimensões desses conhecimentos, pois o diálogo com as outras áreas do conhecimento gera um movimento de constante ampliação da visão a respeito do que se estuda ou se conhece.

Outro aspecto a ser desenvolvido pelo ensino de Ciências na EJA é a reflexão sobre a importância da vida no Planeta. Isso inclui a percepção das relações históricas, biológicas, éticas, sociais, políticas e econômicas, assim como, a responsabilidade humana na conservação e uso dos recursos naturais de maneira sustentável, uma vez que dependemos do Planeta e a ele pertencemos.

O caminho evolutivo da ciência promoveu o avanço tecnológico que deve ser discutido no espaço escolar, de tal maneira que o educando possa compreender as mudanças ocorridas no contexto social, político e econômico e em outros meios com os quais interage, proporcionando-lhe também o estabelecimento das relações entre o conhecimento trazido de seu cotidiano e o conhecimento científico e, partindo destas situações, compreender as relações existentes, questionando, refletindo, agindo e interagindo com o sistema.

Essa relação entre ciência e tecnologia, aliada à forte presença da tecnologia no cotidiano das pessoas, já não pode ser ignorada no ensino de Ciências, e sua ausência aí é inadmissível. Consideram-se, ainda, os efeitos da ciência/tecnologia sobre a natureza e o espaço organizado pelo homem, o que leva à necessidade de incluir no currículo escolar uma melhor

compreensão do balanço benefício-malefício da relação ciência-tecnologia (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2002, p.68-69).

É importante que o educando tenha acesso ao conhecimento científico a fim de compreender conceitos e relações existentes entre o ambiente, os seres vivos e o universo, numa concepção flexível e processual, por meio do saber questionador e reflexivo. Da mesma forma, se faz necessário possibilitar ao educando perceber os aspectos positivos e negativos da ciência e da tecnologia, para que ele possa atuar de forma consciente em seu meio social e interferir no ambiente, considerando a ética e os valores sociais, morais e políticos que sustam a vida.

O conjunto de saberes do educando deve ser considerado como ponto de partida para o processo de ensino e aprendizagem, estabelecendo relações com o mundo do trabalho e com outras dimensões do meio social.

As Ciências Naturais são compostas de um conjunto de explicações com peculiaridades próprias e de procedimentos para obter essas explicações sobre a natureza e os artefatos materiais. Seu ensino e sua aprendizagem serão sempre balizados pelo fato de que os sujeitos já dispõem de conhecimentos prévios a respeito do objeto de ensino. A base de tal assertiva é a constatação de que participam de um conjunto de relações sociais e naturais prévias a sua escolaridade e que permanecem presentes durante o tempo da atividade escolar (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2002, p.131).

Dessa forma, é importante que o ensino desenvolvido na disciplina de Ciências na EJA, possibilite ao educando, a partir de seus conhecimentos prévios, a construção do conhecimento científico, por meio da análise, reflexão e ação, para que possa argumentar e se posicionar criticamente.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

Na medida em que se acredita numa Ciência aberta, inacabada, produto da ação de seres humanos inseridos num contexto próprio relativo ao seu tempo e espaço e, no estudo na disciplina de Ciências, como uma das formas de resgate e de construção de melhores possibilidades de vida individuais e coletivas, há que se optar por uma metodologia de ensino e de aprendizagem adequada à realidade do educando da EJA, em consonância com as Diretrizes Curriculares Estaduais propostas para esta modalidade de ensino. Segundo RIBEIRO (1999, p.8),

“criar novas formas de promover a aprendizagem fora dos limites da organização tradicional é uma tarefa, portanto, que impõem, antes de mais nada, um enorme desafio para os educadores (...), romper o modelo de instrução tradicional implica um alto grau de competência pedagógica, pois para isso o professor precisará decidir, em cada situação, quais formas de agrupamento, sequenciação, meios didáticos e interações propiciarão o maior progresso possível dos alunos, considerando a diversidade que inevitavelmente caracteriza o público da educação de jovens e adultos”.

Nessa perspectiva, destaca-se a importância de propiciar aos educandos, a compreensão dos conceitos científicos de forma significativa, ou seja, que o conhecimento possa estar sendo percebido em seu contexto mais amplo, não somente nos afazeres diários, mas na forma de perceber a realidade local e global, o que lhe permitirá posicionar-se e interferir na sociedade de forma crítica e autônoma. Para tanto, o educador da EJA deve partir dos saberes adquiridos previamente pelos educandos, respeitando seu tempo próprio de construção da aprendizagem, considerando

- que o educador é mediador e estimulador do processo, respeitando, de forma real, como ponto de partida, o conjunto de saberes trazidos pelos educandos;

- as experiências dos educandos no mundo do trabalho;- a necessária acomodação entre o tempo e o espaço do educando, ainda, o

tempo pedagógico e o tempo físico;- as relações entre o cotidiano dos educandos e o conhecimento científico.Nesse aspecto, ressalta-se a importância de trabalhar a disciplina de Ciências

de forma contextualizada, ou seja, com situações que permitam ao educando jovem e adulto a inter-relação dos vínculos dos conteúdos com as diferentes situações com que se deparam no seu dia-a-dia. Essa contextualização pode acontecer a partir de uma problematização, ou seja, em lançar desafios que necessitem de respostas para determinadas situações. “A essência do problema é a necessidade (...), um obstáculo que é necessário transpor, uma dificuldade que precisa ser superada, uma dúvida que não pode deixar de ser dissipada" (SAVIANI, 1993, p.26). As dúvidas são muito comuns na disciplina de Ciências, devendo ser aproveitadas para reflexão sobre o problema a ser analisado, e assim, para o educador, o desafio consiste em realizar esta contextualização, sem reduzir os conteúdos apenas à sua aplicação prática, deixando de lado o saber acadêmico.

Um aspecto importante a ser considerado no trabalho com a disciplina de Ciências é a retomada histórica e epistemológica das origens e evolução do pensamento da Ciência, propiciando condições para que o educando perceba o significado do estudo dessa disciplina, bem como a compreensão de sua linguagem própria e da cultura científica e tecnológica oriundas desse processo.

É importante salientar o uso criativo das metodologias pelo educador, que será indispensável em todos os momentos do seu trabalho, bem como o olhar atento e crítico sobre a realidade trazida pelos educandos.

A busca de soluções para as problematizações constitui-se em referência fundamental no ensino de Ciências. Quando elaborada individual ou coletivamente deve ser registrada, sendo valorizados os saberes trazidos pelos educandos e a evolução do processo de aprendizagem. É importante lembrar que a cultura científica deve ser incentivada mesmo que de forma gradual, respeitando o tempo de cada grupo ou indivíduo.

Uma estratégia comum em Ciências é a utilização de experimentos e práticas realizadas em laboratório. É importante que seja definido com clareza o sentido e o objetivo dessa alternativa metodológica, visto que muitas vezes, situações muito ricas do cotidiano são deixadas de lado em detrimento do uso do laboratório. Deve-se considerar a possibilidade de aproveitamento de materiais do cotidiano, assim como lugares alternativos, situações ou eventos para se desenvolver uma atividade científica. A utilização de experimentos e práticas realizadas em laboratório devem ser vistas como uma atividade comum e diversificada e que não abrem mão do rigor científico, devendo ser acompanhada pelo professor. Segundo BIZZO (2002, p.75),

é importante que o professor perceba que a experimentação é um elemento essencial nas aulas de ciências, mas que ela, por si só, não garante bom aprendizado. (...) a realização de experimentos é uma tarefa importante, mas não dispensa o acompanhamento constante do professor, que deve pesquisar quais são as explicações apresentadas pelos alunos para os resultados encontrados. É comum que seja necessário propor uma nova situação que desafie a explicação encontrada pelos alunos.

Um outro aspecto a ser considerado no trabalho docente, é a utilização do material de apoio didático como uma das alternativas metodológicas, de tal forma que não seja o único recurso a ser utilizado pelo educador. A respeito do livro didático, BIZZO (2002, p. 66), propõe

que ele deve ser utilizado como um dos materiais de apoio, como outros que se fazem necessários, cabendo ao professor, selecionar o melhor material disponível diante de sua própria realidade, onde as informações devem ser apresentadas de forma adequada à realidade dos alunos.

Ao pensar na organização dos conteúdos, o educador deve priorizar aqueles que possam ter significado real à vida dos educandos jovens e adultos. Os conteúdos devem possibilitar aos mesmos a percepção de que existem diversas visões sobre um determinado fenômeno e, a partir das relações entre os diversos saberes, estimular a autonomia intelectual dos mesmos, através da criticidade, do posicionamento perante as situações-problemas e da busca por mais conhecimentos. Os conteúdos podem ser organizados sem a rígida sequência linear proposta nos livros didáticos. Para tanto, deve ser avaliada a relevância e a necessidade desses conteúdos, assim como a coerência dos mesmos no processo educativo.

O processo avaliativo precisa ser reconhecido como meio de desenvolver a reflexão de como vem ocorrendo o processo de aquisição do conhecimento por parte do educando. A verificação da aquisição do conhecimento deve ser ponto de partida para a revisão e reconstrução do caminho metodológico percorrido pelo educando e, principalmente, pelo educador.

O ensino de Ciências na EJA deve propiciar o questionamento reflexivo tanto de educandos como de educadores, a fim de que reflitam sobre o processo de ensino e aprendizagem. Desta forma, o educador terá condições de dialogar sobre a sua prática a fim de retomar o conteúdo com enfoque metodológico diferenciado e estratégias diversificadas, sendo essencial valorizar os acertos, considerando o erro como ponto de partida para que o educando e o educador compreendam e ajam sobre o processo de construção do conhecimento, caracterizando-o como um exercício de aprendizagem.

Partindo da ideia de que a metodologia deve respeitar o conjunto de saberes do educando, o processo avaliativo deve ser diagnóstico no sentido de resgatar o conhecimento já adquirido pelo educando permitindo estabelecer relações entre esses conhecimentos. Desta forma, o educador terá possibilidades de perceber e valorizar as transformações ocorridas na forma de pensar e de agir dos educandos, antes, durante e depois do processo.

A avaliação não pode ter caráter exclusivamente mensurável ou classificatório, deve-se respeitar e valorizar o perfil e a realidade dos educandos da EJA em todos os seus aspectos, oportunizando-lhe o acesso e a permanência no sistema escolar. Há necessidade, tanto por parte do educador, quanto da comunidade escolar, de conhecer o universo desses educandos, suas histórias de vida e suas trajetórias no processo educativo, visto que, cada um seguirá seu próprio caminho, dentro dos seus limites. Portanto, a avaliação tem como objetivo promover um diálogo constante entre educador e educandos, visando o seu êxito nos estudos e, de modo algum, a sua exclusão do processo educativo.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS

É indispensável que a organização dos conteúdos da disciplina de Ciências na proposta curricular esteja vinculada ao espaço e ao tempo de estudo dos educandos e à experiência cotidiana destes, procurando apresentar os conteúdos como instrumentos de melhor compreensão e atuação na realidade.

Ao pensar nessa organização, o educador deve priorizar os conteúdos que possam ter significado real à vida dos educandos, possibilitando-lhes a percepção das diversas abrangências sobre um determinado fenômeno. Dessa forma, o ensino de Ciências não pode se restringir apenas ao livro didático ou ao material de apoio. “A seleção de conteúdos é tarefa do professor; ele pode produzir uma unidade de ensino que

não existe no livro ou deixar de abordar um de seus capítulos, pode realizar retificações ou propor uma abordagem diferente” (BIZZO, 2000, p.66).

Considerando as Diretrizes Curriculares Estaduais para a Educação de Jovens e Adultos e as especificidades desta modalidade de ensino, principalmente no que tange ao tempo de ensino do educador e o tempo de aprendizagem dos educandos, a proposta de conteúdos essenciais da disciplina de Ciências, contempla:

Universo.Sistema Solar.Planeta Terra.Matéria e Energia.Materiais, Átomos e Moléculas.Ligações, Transformações e Reações Químicas.Tipos de Energia, Movimentos, Leis de Newton.Calor, Ondas, Luz, Eletricidade e Magnetismo.Água, Ar e Solo.Desequilíbrios Ambientais.Biosfera.Ecossistemas.Seres Vivos.Organismo Humano.Saúde e Qualidade de vida.Biotecnologia.Ciência, Tecnologia e Sociedade.

REFERÊNCIAS

BIZZO, Nélio. Ciências: fácil ou difícil? São Paulo: Ática, 2002.

BORGES, R. M. R. Em debate: cientificidade e educação em Ciências. Porto Alegre: SE/CEC/RS, 1996.

CANIATO, R. O céu. São Paulo: Ática, 1990.

_____. O que é astronomia. São Paulo: Brasiliense, 1981.

_____. A terra em que vivemos. Campinas: Papirus, 1985.

CHASSOT, A. I. Catalisando transformações na educação. Ijuí: Editora Unijuí, 1994.

_____. Para que(m) é útil o ensino? Canoas: Editora da ULBRA, 1995.

_____.A ciência através dos tempos. São Paulo: Moderna, 1994.

CHASSOT, A. I. & OLIVEIRA, R. J. (Org.) Ciência, ética e cultura na educação. São Leopoldo: Unisinos, 1998.

DELIZOICOV, D.; ANGOTTI, J. A. Metodologia do ensino de Ciências. São Paulo: Cortez, 1992.

DELIZOICOV, D.; ANGOTTI, J. .A.; PERNAMBUCO, M. A. Ensino de Ciências: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002.

GASPAR, Alberto. Experiências de Ciências para o Ensino Fundamental. São Paulo: Ática, 2003.

GIL-PEREZ, D. & CARVALHO, A. M. P. Formação de professores de ciências: tendências e inovações. São Paulo: Cortez.

HAMBERGER, A. I. & LIMA, E.C. A. S. Pensamento e ação no ensino de ciências. São Paulo: Instituto de Física, 1989.

KRASILCHIK, M. O professor e o currículo das ciências. São Paulo: EPU/USP, 1987.OLIVEIRA, Renato José de. A escola e o ensino de ciências. São Leopoldo: Unissinos, 2000.

RIBEIRO, Vera Masagão. A formação de educadores e a constituição da educação de jovens e adultos como campo pedagógico. Educação & Sociedade. v.20, n. 68, Campinas: UNICAMP, dez, 1999.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. São Paulo: Cortez, 2001.

SAVIANI, Dermeval. A filosofia na formação do educador. In: _______. Do senso comum à consciência filosófica. Campinas: Autores Associados, 1993, p.20-28.

STENGERS, Isabelle. Quem tem medo da ciência? São Paulo: Siciliano, 1989.

DISCIPLINA DE BIOLOGIA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE BIOLOGIA

A Educação de Jovens e Adultos - EJA, no Estado do Paraná, de acordo com suas Diretrizes Curriculares e em consonância com o documento apresentado como a segunda proposta preliminar das Diretrizes Curriculares Estaduais para o ensino Médio de Biologia da Rede Estadual de Ensino do Paraná, apresenta os fundamentos teóricos, metodológicos e avaliativos do ensino de Biologia, que norteiam a elaboração da proposta curricular desta disciplina.

Partindo do pressuposto que a ciência não se constitui numa verdade absoluta, pronta e acabada, é indispensável rever o processo de ensino e aprendizagem da Biologia no contexto escolar, de modo que o modelo tradicional de ensino dessa disciplina, no qual se prioriza a memorização dos conteúdos, sem a devida reflexão, seja superado por um modelo que desenvolva a capacidade dos educandos em buscar explicações científicas para os fatos, através de posturas críticas, referenciadas pelo conhecimento científico.

É necessário distinguir os campos de atuação da ciência, seus contextos e valores, como também, os objetivos dispensados à disciplina de Biologia no contexto escolar.

Segundo as Diretrizes Curriculares de Biologia - Ensino Médio, desta Secretaria de Estado da Educação, “é objeto de estudo da Biologia o fenômeno vida em toda sua diversidade de manifestações. Esse fenômeno se caracteriza por um conjunto de processos organizados e integrados, quer no nível de uma célula, de um indivíduo, ou ainda, de organismos no seu meio. Um sistema vivo é sempre fruto da interação entre seus elementos constituintes e da interação entre esse mesmo sistema e os demais componentes de seu meio. As diferentes formas de vida estão sujeitas a transformações que ocorrem no tempo e no espaço, sendo, ao mesmo tempo, transformadas e transformadoras do ambiente”.

Nas Diretrizes, ainda, afirma-se que “ao longo da história da humanidade várias foram as explicações para o surgimento e a diversidade da vida, de modo que os modelos científicos conviveram e convivem com outros sistemas explicativos como, por exemplo, os de inspiração filosófica ou religiosa. Elementos da História e da Filosofia tornam possível, aos alunos, a compreensão de que há uma ampla rede de relações entre a produção científica e os contextos sociais, econômicos e políticos. É possível verificar que a formulação, a validade ou não das diferentes teorias científicas está associada a seu momento histórico.”

As Diretrizes do Ensino Médio para a disciplina de Biologia consideram que “o conhecimento do campo da Biologia deve subsidiar a análise e reflexão de questões polêmicas que dizem respeito ao desenvolvimento, ao aproveitamento de recursos naturais e a utilização de tecnologias que implicam em intensa intervenção humana no ambiente, levando-se em conta a dinâmica dos ecossistemas, dos organismos, enfim, o modo como a natureza se comporta e a vida se processa. Sabe-se que desde o surgimento do planeta Terra, a espécie humana, ou Homo sapiens, não foi o ser predominante, e muito menos, o ser vivo mais importante dentre todos os diversos seres vivos que por aqui passaram. Por outro lado, ao longo deste processo de humanização, que durou aproximadamente três milhões de anos, o homem criou a linguagem, a escrita e a fala, diferenciando-se de todas as demais formas de vida. Isso possibilitou ao homem a socialização, a organização dos espaços físicos, a fabricação de instrumentos utilitários e o início das atividades agrícolas”.

Ressaltam também, “o papel da Ciência e da sociedade como pontos articuladores entre a realidade social e o saber científico. Cabe aos seres humanos, enquanto sujeitos históricos atuantes num determinado grupo social, reconhecerem suas fragilidades e buscarem novas concepções sobre a natureza (...) É preciso que estes sujeitos percebam que sua sobrevivência, enquanto espécie, depende do equilíbrio e do respeito a todas as formas de vida que fazem do planeta o maior ser vivo conhecido”.

É importante que o educando jovem e adulto tenha acesso ao conhecimento científico a fim de compreender conceitos e relações existentes entre o ambiente, os seres vivos e o universo, numa concepção flexível e processual, por meio do saber questionador e reflexivo. Da mesma forma, se faz necessário que perceba os aspectos positivos e negativos da ciência e da tecnologia, para que possa atuar de forma consciente em seu meio social e interferir no ambiente, considerando a ética e os valores sociais, morais e políticos que sustentam a vida.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

O conjunto de saberes do educando deve ser considerado o ponto de partida para o processo de ensino e aprendizagem, estabelecendo relações com o mundo do trabalho e com outras dimensões do meio social.

Conforme as Diretrizes Curriculares para a disciplina de Biologia- Ensino Médio – SEED-PR, “ na escola, a Biologia deve ir além das funções que já desempenha no

currículo escolar. Ela deve discutir com os jovens instrumentalizando-os para resolver problemas que atingem direta ou indiretamente sua perspectiva de futuro”.

As Diretrizes, ainda, consideram que

para a discussão de todas estas características socioambientais e do papel do ensino formal de Biologia, as relações estabelecidas entre professor-aluno e aluno-aluno são determinantes na efetivação do processo ensino-aprendizagem, e para isto, há necessidade de leitura e conhecimento sobre metodologia de ensino para que as aulas de Biologia sejam dinâmicas, interessantes, produtivas, e resultem em verdadeira aprendizagem.

Ressaltam também que, “pensar criticamente, ser capaz de analisar fatos e fenômenos ocorridos no ambiente, relacionar fatores sociais, políticos, econômicos e ambientais exige do aluno investigação, leitura, pesquisa. No ensino de Biologia, diferentes metodologias podem ser utilizadas com este propósito. A metodologia de investigação, por exemplo, permite ao aluno investigar a realidade buscando respostas para solucionar determinados problemas”.

Na medida em que se acredita numa Ciência aberta, inacabada, produto da ação de seres humanos inseridos num contexto próprio relativo ao seu tempo e espaço e, ainda na disciplina de Biologia, como forma de resgate e de construção de melhores possibilidades de vida individuais e coletivas, há que se optar por uma metodologia de ensino e aprendizagem adequada à realidade do aluno da EJA. Segundo RIBEIRO (1999, p.8),

criar novas formas de promover a aprendizagem fora dos limites da organização tradicional é uma tarefa, portanto, que impõem, antes de mais nada, um enorme desafio para os educadores (...), romper o modelo de instrução tradicional implica um alto grau de competência pedagógica, pois para isso o professor precisará decidir, em cada situação, quais formas de agrupamento, sequenciação, meios didáticos e interações propiciarão o maior progresso possível dos alunos, considerando a diversidade que inevitavelmente caracteriza o público da educação de jovens e adultos.

Nessa perspectiva, destaca-se a importância de propiciar aos educandos, a compreensão dos conceitos científicos de forma significativa, ou seja, que o conhecimento possa estar sendo percebido em seu contexto mais amplo, não somente nos afazeres diários, mas na forma de perceber a realidade local e global, o que lhe permitirá posicionar-se e interferir na sociedade de forma crítica e autônoma. Para tanto, o educador da EJA deve partir dos saberes adquiridos previamente pelos educandos, respeitando seu tempo próprio de construção da aprendizagem, considerando

- que o educador é mediador e estimulador do processo, respeitando, de forma real, como ponto de partida o conjunto de saberes trazidos pelos educandos;

- as experiências dos educandos no mundo do trabalho;- a necessária acomodação entre o tempo e o espaço do educando, o

tempo pedagógico e o físico, visto que os mesmos interferem na sua “formação” científica;

- as relações entre o cotidiano dos educandos e o conhecimento científico.Nesse contexto, ressalta-se a importância de trabalhar a disciplina de forma

contextualizada, ou seja, com situações que permitam ao educando jovem e adulto a inter-relação dos vínculos do conteúdo estudado com as diferentes situações com que se deparam no seu dia-a-dia. Essa contextualização pode-se dar a partir de uma problematização, ou seja, em lançar desafios que necessitem de respostas para determinadas situações. “A essência do problema é a necessidade (...), um obstáculo que é necessário transpor, uma dificuldade que precisa ser superada, uma dúvida que não pode deixar de ser dissipada” (SAVIANI, 1993, p.26)”. As dúvidas são muito comuns na disciplina de Biologia, devendo ser aproveitadas para reflexão sobre o problema a ser

analisado, e assim, para o educador, o desafio consiste em realizar esta contextualização, sem reduzir os conteúdos apenas à sua aplicação prática, deixando de lado o saber acadêmico.

Um aspecto importante a ser considerado no trabalho com a disciplina de Biologia é a retomada histórica e epistemológica das origens e evolução do pensamento da Ciência, propiciando condições para que o educando perceba o significado do estudo dessa disciplina, bem como a compreensão de sua linguagem própria e da cultura científica e tecnológica oriundas desse processo.

É importante salientar o uso criativo das metodologias pelo educador, que será indispensável em todos os momentos do seu trabalho, bem como o olhar atento e crítico sobre a realidade trazida pelos educandos.

A busca de soluções para as problematizações constitui-se em referência fundamental no ensino de Biologia. Quando elaborada individual ou coletivamente deve ser registrada, sendo valorizados os saberes trazidos pelos educandos e a evolução do processo de aprendizagem. É importante lembrar que a cultura científica deve ser incentivada mesmo que de forma gradual, respeitando o tempo de cada grupo ou indivíduo.

Uma estratégia comum em Biologia é a utilização de experimentos e práticas realizadas em laboratório. É importante que seja definido com clareza o sentido e o objetivo dessa alternativa metodológica, visto que muitas vezes, situações muito ricas do cotidiano são deixadas de lado em detrimento do uso do laboratório. Deve-se considerar a possibilidade de aproveitamento de materiais do cotidiano, assim como espaços alternativos, situações ou eventos para se desenvolver uma atividade científica. A utilização de experimentos e práticas realizadas em laboratório devem ser vistas como uma atividade comum e diversificada e que não abrem mão do rigor científico, devendo ser acompanhada pelo professor. Segundo BIZZO (2002, p.75),

é importante que o professor perceba que a experimentação é um elemento essencial nas aulas de ciências, mas que ela, por si só, não garante bom aprendizado. (...) a realização de experimentos é uma tarefa importante, mas não dispensa o acompanhamento constante do professor, que deve pesquisar quais são as explicações apresentadas pelos alunos para os resultados encontrados. É comum que seja necessário propor uma nova situação que desafie a explicação encontrada pelos alunos.

Um outro aspecto a ser considerado no trabalho docente, é a utilização do material de apoio didático como uma das alternativas metodológicas, de tal forma que não seja o único recurso a ser utilizado pelo educador. A respeito do livro didático, BIZZO (2002, p. 66) propõe que ele deve ser utilizado como um dos materiais de apoio, como outros que se fazem necessários, cabendo ao professor, selecionar o melhor material disponível diante de sua própria realidade, onde as informações devem ser apresentadas de forma adequada à realidade dos alunos.

Ao pensar na organização dos conteúdos, o educador deve priorizar aqueles que possam ter significado real à vida dos educandos jovens e adultos. Os conteúdos devem possibilitar aos mesmos a percepção de que existem diversas visões sobre um determinado fenômeno e, a partir das relações entre os diversos saberes, estimular a autonomia intelectual. Os conteúdos podem ser organizados sem a rígida seqüência linear proposta nos livros didáticos. Para tanto, deve ser avaliada a relevância e a necessidade dos mesmos, bem como a coerência dos mesmos no processo educativo.

O processo avaliativo precisa ser reconhecido como meio de desenvolver a reflexão, de como vem ocorrendo o processo de aquisição do conhecimento por parte do educando. A verificação da aquisição do conhecimento deve ser ponto de partida para a revisão e reconstrução do caminho metodológico percorrido pelo educando e, principalmente, pelo educador.

O ensino de Biologia na EJA deve propiciar o questionamento reflexivo tanto de educandos como de educadores, a fim de que reflitam sobre o processo de ensino e aprendizagem. Desta forma, o educador terá condições de dialogar sobre a sua prática a fim de retomar o conteúdo com enfoque metodológico diferenciado e estratégias diversificadas, sendo essencial valorizar os acertos, considerando o erro como ponto de partida para que o educando e o educador compreendam e ajam sobre o processo de construção do conhecimento, caracterizando-o como um exercício de aprendizagem.

Partindo da ideia de que a metodologia deve estar respeitando o conjunto de saberes do educando, o processo avaliativo deve ser diagnóstico no sentido de resgatar o conhecimento já adquirido pelo educando permitindo estabelecer relações entre esses conhecimentos. Desta forma, o educador terá possibilidades de perceber e valorizar as transformações ocorridas na forma de pensar e de agir dos educandos, antes, durante e depois do processo.

A avaliação não pode ter caráter exclusivamente mensurável ou classificatório, visto que o ensino de Biologia deve respeitar e valorizar a realidade do educando em todos os seus aspectos, principalmente naqueles que deram origem à sua exclusão do processo educativo.

CONTEÚDOS – BIOLOGIA ENSINO MÉDIO

A proposta de sugestão de conteúdos básicos para a elaboração do currículo da disciplina de Biologia na Educação de Jovens e Adultos – EJA, fundamenta-se nas “Diretrizes Curriculares de Biologia – Ensino Médio”, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná– SEED – PR.

É importante considerar que a organização dos conteúdos curriculares da disciplina de Biologia na EJA tem o objetivo de contemplar as necessidades e o perfil dos educandos desta modalidade de ensino da Educação Básica.

Segundo as Diretrizes Curriculares de Biologia – Ensino Médio – SEED-PR,

os conteúdos básicos são entendidos como os saberes mais amplos da disciplina que podem ser desdobrados nos conteúdos pontuais que fazem parte de um corpo estruturado de saberes construídos e acumulados historicamente e que identificam a disciplina como um campo do conhecimento. Dentro da perspectiva dos conteúdos escolares como saberes, o termo "conteúdo" não se refere apenas a fatos, conceitos ou explicações destinados aos alunos para que estes conheçam, memorizem, compreendam, apliquem, relacionem, etc. Hoje, o critério que decide se certos conhecimentos concretos devem ser incluídos no currículo não se restringe ao seu valor epistemológico e aceitação como conhecimento válido: a relevância cultural, o valor que lhes é atribuído no âmbito de uma cultura particular em um determinado momento histórico, entra em cena.

Segundo as Diretrizes,

estabelecer os conteúdos básicos para o ensino de Biologia requer uma análise desse momento histórico, social, político e econômico que vivemos; da relevância e abrangência dos conhecimentos que se pretendem serem desenvolvidos nessa modalidade de ensino; da atuação do professor em sala de aula; dos materiais didáticos disponíveis no mercado; das condições de vida dos alunos e dos seus objetivos. A decisão sobre o que e como ensinar Biologia no Ensino Médio deve ocorrer de forma a promover as finalidades e objetivos dessa modalidade de ensino e da disciplina em questão. Não se trata de estabelecer uma lista de conteúdos em detrimento de outra por manutenção tradicional ou por inovação arbitrária. Referimo-nos aos conceitos e concepções que têm a ver com a construção de uma visão de mundo; outros práticos e instrumentais para a ação, e ainda aqueles que permitem a formação de um sujeito crítico.Precisaremos estabelecer conteúdos básicos que, por sua abrangência, atendem às realidades regionais e, ao mesmo tempo garantem a identidade da disciplina.

Na proposta, elaborada a partir das discussões com os professores do Ensino Médio Regular, propõe-se ampliar a integração entre os conteúdos básicos, destacando

os aspectos essenciais sobre a vida e a vida humana que vão ser trabalhados por meio dos conhecimentos científicos referenciados na prática.

A sugestão de conteúdos básicos estão descritos a seguir:

ORGANIZAÇÃO EDISTRIBUIÇÃO

DOS SERES VIVOS

BIODIVERSIDADE

PROCESSO DEMODIFICAÇÃO

DOSSERES VIVOS

IMPLICAÇÕESDOS AVANÇOS

BIOLÓGICOS NOCONTEXTO DA

VIDAOrganização celulare molecular:- membrana,- citoplasma e

núcleo- divisão celular- tecidos

Os seres vivos e oAmbiente

Saúde

Biomas terrestre eAquáticos

Ecossistemas

CiclosBiogeoquímicos

Desequilíbrioambiental urbano erural

Origem e evolução da Vida

Origem das espécies

Genética,

Embriologia,

Fisiologia comparada

Ciência e saúde

PesquisascientíficasBiológicas

Bioética

Biotecnologia

Ainda no que consta nas Diretrizes Curriculares de Biologia – Ensino Médio – SEED-PR, há a justificativa para a organização e distribuição dos Conteúdos básicos, descrita a seguir:

Os Conteúdos básicos de Biologia ao mesmo tempo agrupam as diferentes áreas da Biologia e proporcionam um novo pensar sobre como relacioná-los sem que se perca de vista o objetivo do ensino da disciplina no Ensino Médio. A nova proposta pretende modificar a estrutura firmada pela trajetória que o ensino de Biologia vem atravessando nestas últimas décadas. Estabelece os conteúdos básicos e um novo olhar de forma a relacioná-los com seus conteúdos pontuais sob os pontos de vista vertical, transversal e horizontal, procurando uma lógica dialética que leve o professor a integrá-los e relacioná-los de maneira que o aluno não tenha mais uma visão fragmentada da biologia.

Organização e distribuição dos seres vivos

O estudo acerca da organização dos seres vivos, iniciou-se com as observações macroscópicas dos animais e plantas da natureza.

Somente com o advento da invenção do microscópio por Robert Hooke século XVII, com base nos estudos sobre lentes de Antonie von Leewenhoeck, o mundo microscópico até então não observado foi evidenciado à luz da Ciência e da Tecnologia.

A descoberta do mundo microscópico colocou em xeque várias teorias sobre o surgimento da vida e proporcionou estudos específicos sobre as estruturas celulares. Como exemplos desta influência têm-se o estudo da anatomia das células das plantas pelo holandês Jan Swammerdam e, o aperfeiçoamento das Teorias Evolucionistas ambas no séc. XVII.

No séc. XIX, à luz destas descobertas e Teorias, o alemão Christian Heineich Pander e o estoniano Karl Ernst von Baer desenvolveram estudos sobre a embriologia que estabeleceram as bases para estudos da Teoria Celular. Hugo von Mohl descobriu a existência do núcleo e do protoplasma da célula; Walther Fleming estudou o processo de mitose nos animais e Eduard Strasburger estudou este processo nas plantas.

Assim, como relatam GAGLIARD & GIORDAN (apud BASTOS, 1998, p 255)

... a relação entre o nível microscópico e o macroscópico é um conceito básicos: uma vez que o aluno tenha adquirido poderá entender que a compreensão de todos os fenômenos de um ser vivo requer um conhecimento dos níveis moleculares subjacentes.

Justifica-se este conteúdo básico por ser a base do pensamento biológico sobre a organização celular do ser vivo, relacionando-a com a distribuição dos seres vivos na Natureza, o que proporcionará ao aluno compreender a organização e o funcionamento dos fenômenos vitais e estabelecer conexões com os demais conteúdos básico da disciplina.

Biodiversidade

A curiosidade humana sobre os fenômenos naturais e a necessidade de caçar para se alimentar e vestir, tentar curar doenças, entre outras atividades vitais, fizeram com que o homem passasse a estudar e observar a Natureza. Tem-se registros deste conhecimento biológico empírico das atividades humanas, através das representações de animais e plantas nas pinturas ruprestes realizadas nas cavernas e também de alguns manuscritos deixados pelos Babilônios por volta do ano 1800 a.C.

A organização dos seres vivos começou a ser registrada em documentos com o Filósofo Aristóteles, que viveu no século IV a.C. e através de suas observações ele escreveu o livro “As Partes dos Animais”. Seu discípulo Teofasto deteve-se mais aos estudos das plantas, iniciando uma pré-classificação dos vegetais agrupando-as em espécies afins. Pelos seus estudos detalhados dos órgãos vegetais e descrição dos tecidos que as formam, Teofasto é considerado o fundador da anatomia vegetal.

Percebe-se que as primeiras áreas da Biologia foram a zoologia e a botânica, não só pela curiosidade e necessidade, mas também pela facilidade de observação.

Justifica-se estudá-las pelos mesmos motivos dos povos antigos que seria conhecer a diversidade de plantas e animais que habitam a Terra, qual sua utilidade para a nossa sobrevivência e a sobrevivência de todos os seres vivos.

Além destes aspectos, há a necessidade de se estudar outras implicações decorrentes da história da humanidade que permeiam hoje as atividades agrícolas, de manejo de Florestas, o mau uso dos recursos naturais, a destruição das espécies de animais e vegetais, a construção de cidades em lugares impróprios para habitação, como também, a influência da tecnologia em nosso cotidiano. Esclarecer que ao estudar a Biodiversidade estaremos diante de grandes desafios diante do progresso científico

O significado científico, econômico e ético do estudo da diversidade biológica deve ser compreendido pelos alunos, não só como análise de espécimes mas entendendo que a observação e sistematização do observado é uma atividade científica relevante que se consolida nos sistemas de classificação e na taxionomia. (KRASILCHIK,2004)

Processo de modificação dos seres vivos

No século XVII com a invenção do microscópio pelo holandês Antonie van Leewenhoock (ROOSI, 2001), a biologia chamada celular e molecular tiveram um grande avanço significativo em suas descobertas. Marcelo Malpighi examinou grande quantidade de tecidos animais e vegetais, Robert Hooke descobriu a estrutura celular, e os primeiros micoorganismos, inicialmente denominados animáculos, foram observados (ROSSI, 2001).

Houve muitos avanços tecnológicos decorrentes do advento do microscópio, inclusive a formulação de novas teorias sobre o surgimento da vida, colocando à prova teorias tão dogmáticas como foi a Teoria da Geração Espontânea. Diferentes idéias transformistas foram se consolidando entre os cientistas, mas o grande marco para o mundo científico e biológico foi a publicação do livro “Origens das Espécies” de Charles

Darwin, no século XIX. Foi também, na mesma época que Louis Pasteur, demonstrou o papel desempenhado pelos microorganismos no desenvolvimento de doenças infecciosas e realizou estudos sobre a fermentação.

No século XX com o advento da invenção do microscópio eletrônico foi possível em 1953, a descoberta do DNA (ácido desoxirribonucléico), material químico que constitui o gene. Foram desenvolvidas técnicas de manipulação do DNA, que permitem modificar espécies de seres vivos; produzir substâncias como a insulina, através de bactérias; criação de cabras que produzem remédios no leite; criação de plantas com toxinas contra pragas e, de porcos com carne menos gordurosa. Além disso, a terapia gênica tem sido bastante estudada com fins de eliminar doenças geneticamente transmitidas.

A Biologia ajuda a compreender melhor essas e outras técnicas que podem transformar a nossa vida e aprofundar o conhecimento que temos de nós mesmos. Daí a importância do seu estudo, dar o mínimo de conhecimento a todas as pessoas, para que elas possam opinar e criticar a utilização dessas técnicas, uma vez que o controle delas e a aplicação destas descobertas científicas são função importante da própria sociedade.

Implicações dos avanços biológicos no contexto da vida

Os avanços científicos atuais permitiram que a genética e a biologia molecular alcançassem uma formidável capacidade tecnológica, que se torna cada vez mais efetiva, como, por exemplo, em poder-se modificar substancialmente um vírus, bactérias, plantas, animais e os próprios seres humanos. (SIDEKUM, 2002)

Esse acelerado desenvolvimento científico e tecnológico nos deixa atordoados, sem saber exatamente até onde podemos chegar e do que realmente podemos nos apropriar, mas por outro lado, estes avanços nos proporcionam um enorme conhecimento sobre a natureza, nos colocando muitas vezes acima dela.

É importante o estudo da biotecnologia, dos avanços científicos e de suas implicações éticas e morais na sociedade, para que os estudantes no caso, de biologia, possam discutir questões como nutrição, saúde, emprego e preservação do ambiente que indiretamente influenciam suas vidas.

A análise de fenômenos biotecnológicos serve também para diminuir a divisão entre a escola e o mundo em que os estudantes vivem, na medida em que estes podem constatar as relações entre a pesquisa científica e a produção industrial ou a tecnologia tradicionalmente usada em sua comunidade. A busca das raízes científicas destas tecnologias tradicionais e de maneiras de aprimorá-las, a fim de que melhor sirvam à necessidade de elevar a qualidade de vida é uma forma de vincular o ensino à realidade em que vive o aluno. (KRASILCHIK, 2004, p. 186)

Quanto às questões éticas, a atual discussão sobre a manipulação genética do ser humano provoca inúmeras controvérsias sobre o uso da tecnologia (biotecnologia) e

as perspectivas de mudanças de valores morais. Para CHAUÍ, 1995, “nossos sentimentos e nossas ações exprimem nosso senso moral” e movidos pela sensibilidade, somos

capazes de reagir, de questionar, de nos manifestar contra ou a favor de determinadas atitudes para procurar esclarecer ou resolver problemas.

Porém, questões sobre aborto, eutanásia, clonagem, transgenia, geram dúvidas quanto à decisão a ser tomada e põem à prova, além do nosso senso moral, nossa consciência moral, “... pois exigem que decidamos o que fazer, que justifiquemos para nós mesmos e para os outros as razões de nossas decisões e que assumamos todas as consequências delas, porque somos responsáveis por nossas decisões”. (CHAUÍ, 1995).

Caberá ao professor de Biologia indicar temas de discussão ética e auxiliar o aluno na análise “à luz dos princípios, regras e direitos alternativos, além de levar em conta a avaliação intuitiva do aluno” (KRASILCHIK, 2004).

REFERÊNCIAS

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DISCIPLINA DE FÍSICA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DA FÍSICA

Os princípios que norteiam a proposta da elaboração do currículo da disciplina de Física para a Educação de Jovens e Adultos – EJA, baseiam-se na Fundamentação Teórico-Metodológica, contida na parte da “Introdução” das “Orientações Curriculares de Física – Texto Preliminar - Ensino Médio”, da Secretaria de Estado da Educação do Paraná– SEED – PR.

O processo ensino-aprendizagem em Física tem sido objeto de pesquisas por aqueles que se interessam ou se identificam com esse objeto. Parece haver um certo consenso que "... a preocupação central tem estado na identificação do estudante com o objeto de estudo. Em outras palavras, a questão emergente na investigação dos pesquisadores está relacionada à busca por um real significado para o estudo dessa Ciência na educação básica - ensino médio" (ROSA & ROSA, 2005, p.2).

Os livros didáticos, de uma maneira geral, apresentam um discurso que mostra uma preocupação com a Física como uma ciência que permite compreender uma imensidade de fenômenos físicos naturais, que seriam indispensáveis para a formação profissional ou como subsídio para a preparação para o vestibular e a compreensão e interpretação do mundo pelos sujeitos-educandos. No entanto, neles a ênfase recai nos aspectos quantitativos em detrimento dos qualitativos e conceituais, privilegiando a resolução de “Problemas de Física” que, quase sempre, se traduzem em exercícios matemáticos com respostas prontas. Esse discurso tem norteado o trabalho de muitos professores e, mais que isso, as estruturas curriculares por eles organizadas.

Não é leviano afirmar que as estruturas curriculares se valem dos livros didáticos para se organizarem. A opção de tal e tal livro didático determinará, a princípio, a constituição das disciplinas que assumem seu espaço curricular, demarcado pelo tempo (número de aulas) e profundidade. Mesmo que o discurso didático do professor seja amplo, abrangente e propicie contextualizações, em geral, ele fará uso de exercícios e problemas do livro didático e sua avaliação terá como base a literatura disciplinar do livro adotado. É importante lembrar que os livros didáticos dirigidos ao Ensino Médio refletem o mesmo enfoque disciplinar presente no meio universitário, levando os professores a consolidarem, na sua prática pedagógica, o estilo reprodutivista e disciplinar adquirido em sua formação. (...) Os currículos de Física nos cursos de graduação também colaboram para a manutenção do conhecimento físico ensinado nos moldes ditados internamente pelas disciplinas. (...) Certamente este indicador pode ser estendido, sem muitas ressalvas, à maioria dos cursos de formação de professores de Física e para a maioria das licenciaturas em ciências. O peso de uma tradição disciplinar, historicamente constituída, se impõe fortemente aos currículos dos cursos universitários, entre outros motivos, pela sua proximidade (mesmo que virtual) com as comunidades de produtores de conhecimento (PIETROCOLA; ALVES; PINHEIRO, s/d, p. 6-7).

Nessa perspectiva, "... via de regra, os conteúdos acabam por ser desenvolvidos como se estabelecessem relações com eles mesmos, sendo desconsideradas as diversas relações com outros tópicos da própria Física e de outros campos de conhecimento" (GARCIA; ROCHA; COSTA, 2001, p. 138).

Essa concepção faz com que o ensino de física se transforme num ensino livresco, descontextualizado em sua história, não permitindo a compreensão de que a ciência é uma construção humana, com todas as implicações que isso possa ter, inclusive os erros e acertos decorrentes das atividades humanas, levando o estudante

... a ter uma ideia distorcida do que é a Física e quase sempre ao desinteresse pela matéria. Os estudantes devem ser levados a perceber que os modelos dos quais os pesquisadores lançam mão para descrever a natureza são aproximações válidas em determinados contextos, mas que não constituem uma verdade absoluta. Muitas vezes ideias como as de partícula, gás ideal, queda livre, potencial elétrico e muitas outras são apresentadas sem nenhuma referência à realidade que representam, levando o estudante a julgá-los sem utilidade prática. Outras

vezes modelos como o de um raio luminoso, de átomo, de campo, de onda eletromagnética, etc., são apresentados como se fossem entes reais. (ALVARES, 1991, p. 42).

Assim, a Física deixa de ser mais um instrumento para a compreensão do mundo, não permitindo ao aluno o acesso à compreensão conceitual e ao formalismo próprio deste campo de conhecimentos, essencial para o desenvolvimento de uma cultura em ciência, tendo em vista que "... um número elevado dos estudantes brasileiros, ou, não tem acesso aos estudos superiores, ou, segue cursos para os quais a Física não tem caráter propedêutico" (ALVARES, 1991, p. 25). Além disso, apesar do incentivo que deve ser dado à carreira universitária, esta deveria ser mais uma possibilidade e não o objetivo principal do ensino desta disciplina no nível médio.

Também parece haver um consenso entre os professores em torno da idéia de que a Física é uma ciência experimental. No entanto, apesar de enfatizarem esse caráter experimental da matéria e a importância dessa consideração no sentido de contribuir para uma melhor compreensão dos fenômenos físicos, é comum

... adotarem textos que, além de não apresentarem uma só sugestão de experimento a ser realizado pelo professor ou pelos seus alunos, tratam os assuntos sem nenhuma preocupação com seu desenvolvimento experimental. Ou, outros, que se dizem preocupados com um curso voltado para a compreensão dos conceitos, escolherem textos que tratam matematicamente os tópicos abordados, sem trabalharem aspectos cognitivos da aprendizagem. (Ibidem, 1991, p. 25)

Assim,

... como um empreendimento humano, a ciência é falível, ela pode degenerar ou pode responder as supremas aspirações dos homens. Como parte da sociedade, a Ciência também está aberta a influências externas, como qualquer atividade social, pode ser bem ou mal usada. (KNELLER, 1980, prefácio da obra)

Deriva-se daí que a Ciência não é neutra visto que o cientista faz parte de um contexto social, econômico e cultural, influenciando e sendo influenciado por esse contexto, fato que não pode ser ocultado de nossos estudantes. Isso significa mostrar que a ciência não está pronta nem acabada e não é absoluta, mas, revelar aos nossos estudantes “... como é penoso, lento, sinuoso e, por vezes, violento, o processo de evolução das ideias científicas” (PONCZEK, 2002, p. 22).

Se o conhecimento físico é ou foi produzido pelos sujeitos sociais que vivem ou que viveram num determinado contexto histórico, então, ele faz parte da cultura social humana e, portanto, é um direito dos estudantes conhecê-lo.

Alem disso, se queremos contribuir para a formação de sujeitos que sejam capazes de refletir e influenciar de forma consciente nas tomadas de decisões, não podemos deixá-los alheios às questões relativas à Ciência e à tecnologia. Por isto é importante buscarmos o entendimento das possíveis relações entre o desenvolvimento da Ciência e da tecnologia e as diversas transformações culturais, sociais e econômicas na humanidade decorrentes deste desenvolvimento que, em muitos aspectos, depende de uma percepção histórica de como estas relações foram sendo estabelecidas ao longo do tempo.

Mas, considerando que também as tecnologias são historicamente construídas e entendendo que

... tecnologia refere-se à forma específica da relação entre o ser humano e a matéria, no processo de trabalho, que envolve o uso de meios de produção para agir sobre a matéria, com base em energia, conhecimento e informação. (...) refere-se a arranjos materiais e sociais que envolvem processos físicos e organizacionais, referidos ao conhecimento científico aplicável. No entanto, a tecnologia não é propriedade neutra ligada à eficiência produtivista, e não determina a sociedade, da mesma forma que esta não escreve o curso da transformação

tecnológica. Ao contrário, as tecnologias são produtos da ação humana, historicamente construídos, expressando relações sociais das quais dependem, mas que também são influenciados por eles. Os produtos e processos tecnológicos são considerados artefatos sociais e culturais, que carregam consigo relações de poder, intenções e interesses diversos. (OLIVEIRA,2001, p. 101-102)

Considerando ainda que, como nos ensina Paulo Freire, ensinar exige respeito aos saberes dos educandos, o processo de ensino-aprendizagem em Física deve partir do conhecimento prévio dos alunos respeitando seu contexto social e suas concepções espontâneas a respeito de ciência.

Em primeiro lugar, de acordo com MOREIRA (s/d, p.2), devemos abandonar o papel de ser apenas transmissores de conhecimentos e passarmos a ver, de fato, os sujeitos como elaboradores do saber físico, mas que precisam do professor como mediador. O autor parte do pressuposto que o objetivo do ensino é compartilhar, professor e aluno, significados e promover a aprendizagem significativa. Mas, isso acontecerá somente quando o educando internalizar esses significados de maneira não arbitrária e não literal, quando as novas informações adquirirem significado por interação com o conhecimento prévio do aluno e, simultaneamente, derem significados adicionais, diferenciarem, integrarem, modificarem e enriquecerem o conhecimento já existente.

Em segundo, é preciso considerar que os sujeitos constroem suas idéias, sua visão do mundo tendo em vista os objetos a que têm acesso nas suas experiências diárias e nas suas relações afetivas. Segundo Novak, citado por MOREIRA (1999), os seres humanos fazem três coisas: pensam, sentem e atuam (fazem). Ou seja, ao se pensar uma metodologia de ensino para a Física é preciso ter em vista o que os estudantes já conhecem. Esta ideia remete aos estudos das concepções espontâneas ou ideias alternativas dos sujeitos:

(...) Os estudos realizados sob essa perspectiva revelaram que as ideias alternativas de crianças e adolescentes são pessoais, fortemente influenciadas pelo contexto do problema e bastante estáveis e resistentes à mudança, de modo que é possível encontrá-las mesmo entre estudantes universitários (...). Realizadas em diferentes partes do mundo, as pesquisas mostraram o mesmo padrão de ideias em relação a cada conceito investigado. (MORTINER, 1996, p.2)

O educando será apresentado a princípios, concepções, linguagem, entre outros elementos utilizados pela Física, em que o discurso do professor deve permitir que ele perceba as diferenças entre a sua forma e a forma utilizada pela ciência para explicar um determinado fenômeno. Esse processo contribuirá para que o educando reformule as suas ideias tendo em vista a concepção científica. Assim, espera-se que esteja reelaborando seus conceitos, mas não necessariamente, que abandone suas ideias espontâneas. Poderá estar negociando ou adequando sua interpretação e linguagem ao contexto de utilização. Ou seja, seus conceitos serão mais elaborados ou menos elaborados, ou mais próximos do científico quanto maior for a necessidade ou interesse deste sujeito em utilizar esses conhecimentos no contexto da comunidade científica.

Entendemos, então, que a Física deve educar para cidadania, contribuindo para o desenvolvimento de um sujeito crítico, "... capaz de compreender o papel da ciência no desenvolvimento da tecnologia. (...) capaz de compreender a cultura científica e tecnológica de seu tempo" (CHAVES & SHELLARD, 2005, p. 233).

Cabe colocar aqui que a cidadania da qual estamos falando não é a cidadania para o consumo, não é a cidadania construída através de intervenções externas, doações da burguesia e do Estado moderno, mas, a cidadania que se constrói no interior da prática social e política de classes. Estamos entendendo que a

... nossa maneira de estar no mundo e com o mundo, como seres históricos, é a capacidade de, intervindo no mundo, conhecer o mundo. Mas, histórico como nós, o nosso conhecimento do mundo tem historicidade. (...) Daí que seja tão fundamental conhecer o conhecimento existente quanto saber que estamos abertos e aptos à produção do conhecimento ainda não existente" (FREIRE, 1996, p.31). Por isso

entendemos que a contribuição da Física no Ensino Médio é a contribuição para a formação dos sujeitos através das "... lutas pela escola e pelo saber, tão legítimos e urgentes (...). Por este caminho nos aproximamos de uma possível redefinição da relação entre cidadania e educação (...) a luta pela cidadania, pelo legítimo, pelos direitos, é o espaço pedagógico onde se dá o verdadeiro processo de formação e constituição do cidadão. A educação não é uma precondição da democracia e da participação, mas é parte, fruto e expressão do processo de sua constituição. (ARROYO, 1995, p.79)

ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO

Apesar dos avanços científicos e tecnológicos, o conhecimento físico na EJA ainda é tratado como enciclopédico, resumindo-se a um aparato matemático que, normalmente, não leva a compreensão dos fenômenos físicos e ainda, acaba por distanciar o interesse dos educandos pela disciplina.

Nessa perspectiva o ensino de Física apresenta conceitos simplificados e reduzidos, bem como, leis e fórmulas desarticuladas do mundo vivencial. Além disso, é tratado como um campo de conhecimentos acabados, como verdades absolutas, fruto de alguns gênios da humanidade, contribuindo para que os educandos tornem-se passivos em sala de aula.

É preciso repensar os aspectos metodológicos, para que propiciem condições de ensino que aproxime educadores e educandos da aventura da descoberta, tornando o processo de ensino e aprendizagem prazeroso, criativo e estimulador.

Criar novas formas de promover a aprendizagem fora dos limites da organização tradicional é uma tarefa, portanto, que impõem, antes de mais nada, um enorme desafio para os educadores (...), romper o modelo de instrução tradicional implica um alto grau de competência pedagógica, pois para isso o professor precisará decidir, em cada situação, quais formas de agrupamento, sequenciação, meios didáticos e interações propiciarão o maior progresso possível dos alunos, considerando a diversidade que inevitavelmente caracteriza o público da educação de jovens e adultos. (RIBEIRO, 1999, p 7-8)

A partir desse pressuposto, para romper com o modelo tradicional de ensino é necessário rever os meios de apresentação dos conteúdos, priorizando os conceitos físicos e optando por metodologias de ensino que se adaptem às necessidades de aprendizagem dos educandos. (...),

não vemos como necessário, no momento, grandes alterações nos conteúdos tradicionais, mas sim, na forma como eles serão desenvolvidos. Entendemos que o avanço nos conhecimentos de Física deverá ser dado por uma inovação na metodologia de trabalho e não em termos de conteúdos. (GARCIA; ROCHA;COSTA, 2000, p.40)

Na reflexão desenvolvida com professores de Física da Educação de Jovens e Adultos, identificou-se algumas estratégias para o desenvolvimento metodológico da disciplina de Física, considerando que essas estratégias metodológicas podem contribuir para o ensino e a aprendizagem dos educandos. Dessa forma, deve ser levado em conta a formação do professor, o espaço físico, os recursos disponíveis, o tempo de permanência do educando no espaço escolar e as possibilidades de estudo fora deste, para que as estratégias metodológicas possam ser efetivadas. Os indicativos discutidos com os professores contemplam:

A abordagem da Física enquanto construção humana

No desenvolvimento dos conteúdos é necessário abordar a importância da Física no mundo, com relevância aos aspectos históricos, o conhecimento enquanto construção humana e a constante evolução do pensamento científico, assim como, as relações das descobertas científicas com as aplicações tecnológicas na contemporaneidade.

A história da física não se limita à história de seus protagonistas. Antes ao contrário: é uma história do pensamento em que ideias surgem e desaparecem, em que pensamentos, muitas vezes completamente despropositados na época em que aparecem, tomam forma e ultrapassam as barreiras profissionais contemporâneas. Afinal, a física é hoje – num mundo em que a tecnologia permite revoluções e promete saídas para ao mais graves problemas – uma das manifestações de maior transparência de nossa cultura. (BARROS, 1996, p.7)

O papel da experimentação no ensino de Física

O uso da experimentação é viável e necessário no espaço e tempo da EJA, mesmo que seja por meio de demonstração feita pelo educador, ou da utilização de materiais alternativos e de baixo custo, na construção ou demonstração dos experimentos. Assim, “quando o aluno afirma que um imã atrai todos os metais, o professor sugere que ele coloque essa hipótese à prova com pedaços de diferentes metais. Por mais modesta que pareça esta vivência, é rica em ensinamentos ” (AXT, s/d, p.78).

O lúdico – Brinquedos e jogos no ensino de Física

Por meio desta estratégia de ensino o educando será instigado a pesquisar e propor soluções, visto que a ludicidade “... decorre da interação do sujeito com um dado conhecimento, sendo portanto subjetiva. Seu potencial didático depende muito da sensibilidade do educador em gerar desafios e descobrir interesses de seus alunos.” (RAMOS; FERREIRA, 1993, p.376)

O cuidado com os conceitos e definições em Física

O educando traz ideias e contextos para as coisas, para compreender e atuar no mundo. Essas ideias podem ser aproveitadas como ponto de partida para a construção do conhecimento científico, mas será necessário fazer a transposição destes conceitos espontâneos ou do senso comum para o conhecimento científico, com os cuidados necessários.

Atualmente o entendimento do ensino de física é fortemente associado às ideias de conceitos espontâneos. Tais ideias indicam que quando as pessoas vêm para a escola, elas já têm um contexto para as coisas. Por outro lado, à medida que vamos inserindo os assuntos na sala de aula, queremos que o aluno vá montando aquela estrutura que nós temos, ligando os conceitos da forma como nós o fazemos. Entretanto, à medida que vamos ensinando, ele vai fazendo as ligações que quer. (...). Que pode, que consegue. E assim, os mesmos conceitos podem ser ligados de maneiras diferentes, em estruturas diferentes. É comum pensarmos que a lógica, a maneira de raciocinar, de inserir algo em contextos mais amplos, utilizados por nós, professores, para construirmos nossas estruturas, seja algo absoluto, algo transcedental. Mas não é. A lógica depende do contexto em vigor. (...), sempre achamos que com a informação que fornecemos aos alunos eles farão as ligações que nós fizemos, mas isso não é necessariamente verdade. Não há nada que nos assegure que o aluno faz as ligações que nós gostaríamos que ele fizesse. O que dizemos em sala de aula pode ser interpretado de várias maneiras diferentes. (ROBILOTTA;BABICHAK, 1997, p.22)

O cotidiano dos alunos/contextualização

O educador deve ser o responsável pela mediação entre o saber escolar e as experiências provenientes do cotidiano dos educandos, as quais devem ser aproveitadas no processo da aprendizagem.

Quanto mais próximos estiverem o conhecimento escolar e os contextos presentes na vida pessoal e no mundo no qual eles transitam, mais o conhecimento terá significado. Contextualizar o ensino significa incorporar vivências concretas e diversificadas, e também, incorporar o aprendizado em novas vivências. (SEED-PR, 2000, s/d)

O papel do erro na construção do conhecimento

Os erros e acertos no processo de ensino e aprendizagem devem ser considerados como elementos sinalizadores para a reconstrução dos conceitos e melhor compreensão dos conteúdos. Cabe ao educador administrar este processo no qual os educandos da EJA necessitam de apoio, principalmente pelo processo diferenciado de estudo e o tempo que permanecem no espaço escolar. É essencial valorizar os acertos e tornar o erro como algo comum, caracterizando-o como um exercício de aprendizagem.

O incentivo à pesquisa e a problematização

É importante incentivar os educandos para que ampliem seus conhecimentos por meio de pesquisa, como atitude cotidiana e na busca de resultados. Para tanto,

será útil distinguir entre pesquisa como atitude cotidiana e pesquisa como resultado específico. Como atitude cotidiana, está na vida e lhe constitui a forma de passar por ela criticamente, tanto no sentido de cultivar a consciência crítica, quanto no de saber intervir na realidade de modo alternativo com base na capacidade questionadora. (...). Como resultado específico, pesquisa significa um produto concreto e localizado, (...), de material didático próprio, ou de um texto com marcas científicas. (...). Os dois horizontes são essenciais, um implicando o outro. No segundo caso, ressalta muito mais o compromisso formal do conhecimento reconstruído, enquanto o primeiro privilegia a prática consciente. (DEMO, 1997, p. 12-13)

A problematização consiste em lançar desafios que necessitem de respostas para determinadas situações. “A essência do problema é a necessidade.(...), um obstáculo que é necessário transpor, uma dificuldade que precisa ser superada, uma dúvida que não pode deixar de ser dissipada” (SAVIANI, 1993, p.25-26). As dúvidas são ocorrências muito comuns na Física, porém, poderão ser aproveitadas para as reflexões sobre o problema a ser analisado.

Os recursos da informática no ensino da Física

O uso da informática na educação vem se tornando uma ferramenta cada vez mais importante e indispensável para o enriquecimento das aulas teóricas e à melhor compreensão dos estudos elaborados. A familiarização do educando com o computador se faz necessária dentro da escola, visto que a tecnologia se faz presente nos lares, no trabalho e aonde quer que se vá. É necessário o mínimo de entendimento sobre as tecnologias usuais e como utilizar-se desta ferramenta para ampliar os conhecimentos.

O uso de textos de divulgação científica em sala de aula

Os textos científicos encontrados em jornais, revistas, sites e em outros meios de divulgação científica, podem conter conteúdos significativos ao ensino de Física e serem explorados de diversas formas. Deve-se ter o cuidado de estar selecionando textos validados por profissionais da área e que tenham cunho científico, observando a existência de erros conceituais ou informações incorretas.

A utilização do material de apoio

O ensino da Física não deve estar apenas pautado no uso do material didático fornecido pela entidade mantenedora, é fundamental utilizar-se de outros recursos, como os apontados anteriormente, para enriquecer as aulas e tornar o processo de ensino mais harmonioso e agradável. Assim, o material deve servir de apoio, tanto ao educador como ao educando, ao lado de outras alternativas de ensino e aprendizagem que complementem o conhecimento proposto.

CONTEÚDOS DE FÍSICA – ENSINO MÉDIO

Considerando-se a amplitude dos conhecimentos físicos, é necessário pensar a importância e essencialidade dos conteúdos, visando contemplar aprendizagens significativas aos educandos da EJA.

Para isso, é indispensável que a organização dos conteúdos na proposta curricular esteja vinculada ao espaço e ao tempo de estudo dos educandos e a experiência cotidiana destes, procurando apresentar esses conteúdos como instrumentos de melhor compreensão e atuação na realidade. Para a maioria dos educandos da EJA, como também

... para uma grande parte da população, os conhecimentos de Física do Ensino Médio têm grande possibilidade de serem os únicos dessa disciplina aos quais os alunos terão acesso pela via escolar. Percebemos, então, a pertinência e necessidade de reorganização dos componentes curriculares de física - entendida aqui a ideia de currículo como sendo algo muito mais amplo do que mera listagem de conteúdos de tal forma que possam dar conta, tanto das demandas de continuidade dos estudos e das de natureza profissional como, e principalmente, daquelas exigidas pela vida no seu dia-a-dia. (GARCIA; ROCHA; COSTA, 2000, p. 139-140)

Ao pensar os conteúdos a serem trabalhados, o educador deve priorizar os essenciais, ou seja, àqueles que possam ter significado real à vida dos educandos. Os conteúdos devem possibilitar a percepção das diversas abrangências sobre um determinado fenômeno, portanto, o ensino não pode se restringir apenas ao livro didático ou ao material de apoio. “A seleção de conteúdos é tarefa do professor; ele pode produzir uma unidade de ensino que não existe no livro ou deixar de abordar um de seus capítulos, pode realizar retificações ou propor uma abordagem diferente” (BIZZO, 2000, p.66).

Considerando-se ainda as Diretrizes Curriculares Estaduais para a Educação de Jovens e Adultos e as especificidades desta modalidade de ensino, principalmente no que tange ao tempo de ensino do educador e o tempo da aprendizagem dos educandos, a proposta de conteúdos básicos da disciplina de Física, segue o disposto a seguir.

INTRODUÇÃO À FÍSICA

Campo de estudo e atuação da Física.História da Física.

A Física contemporânea e suas aplicações tecnológicas.

MECÂNICAMovimento retilíneos.Movimentos curvilíneos.Movimento circular uniforme. Queda-livre.Os Princípios da Mecânica (Leis de Newton).Energia. Trabalho. Potência.

Impulso e quantidade de movimento.A Gravitação Universal.A Hidrostática.

FÍSICA TÉRMICAFenômenos térmicos.O calor e a temperatura.O fenômeno da dilatação nos sólidos, líquidos e gases.As mudanças de estado físico da matéria.Trocas de calor. Transmissão de calor.Comportamento térmico dos gases.As Leis da Termodinâmica.

ONDULATÓRIAFenômenos ondulatórios.Ondas mecânicas e eletromagnéticas.

Natureza ondulatória e quântica da luz.ÓPTICA

Fenômenos luminosos.Princípios da Óptica Geométrica.Aplicações do fenômeno da reflexão e refração da luz.Lentes e instrumentos ópticos de observação.Espelhos.A óptica e o olho humano.

ELETRICIDADE E MAGNETISMOFenômenos elétricos e magnéticos.Aspectos estáticos e dinâmicos da eletricidade.

A Lei de Coulomb.O campo elétrico . Potencial elétrico.

A corrente elétrica. Geradores e circuitos elétricos.O campo magnético.Indução magnética.

ENERGIAEnergia e suas transformações.Fontes e tipos de energia.Energia, meio ambiente e os potenciais energéticos do Brasil.A energia elétrica nas residências.

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DISCIPLINA DE QUÍMICA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE QUÍMICA

A consolidação da Química como ciência foi um dos fatos que permitiu o desenvolvimento das civilizações, determinando maneiras diferenciadas no modo de viver. A Química está inserida nas ações e nos recursos utilizados nas diversas atividades diárias das pessoas e, segundo BIZZO (2002, p.12),

o domínio dos fundamentos científicos hoje em dia é indispensável para que se possa realizar tarefas tão triviais como ler um jornal ou assistir à televisão. Da mesma forma, decisões a respeito de questões ambientais, por exemplo, não podem prescindir da informação científica, que deve estar ao alcance de todos.

Assim, a Química fundamenta-se como uma ciência que permite a evolução do ser humano nos aspectos ambientais, econômicos, sociais, políticos, culturais, éticos, entre outros, bem como o seu reconhecimento como um ser que se relaciona, interage e modifica, positiva ou negativamente, o meio em que vive.

A Química como ciência contempla as tradições culturais e as crenças populares que despertam a curiosidade por fatos, propiciando condições para o desenvolvimento das teorias e das leis que fundamentam as ciências. BIZZO (2002, p.17), afirma que

a ciência não está amparada na verdade religiosa nem na verdade filosófica, mas em um certo tipo de verdade que é diferente dessas outras. Não é correta a imagem de que os conhecimentos científicos, por serem comumente fruto de experimentação e por terem uma base lógica, sejam “melhores” do que os demais conhecimentos. Tampouco se pode pensar que o conhecimento científico possa gerar verdades eternas e perenes.

Desta forma, é importante considerar que o conhecimento químico não é algo pronto, acabado e inquestionável, mas em constante transformação.

A Química, trabalhada como disciplina curricular do Ensino Médio, deve apresentar-se como propiciadora da compreensão de uma parcela dos resultados obtidos a partir da Química como ciência.

A ciência realizada no laboratório requer um conjunto de normas e posturas. Seu objetivo é encontrar resultados inéditos, que possam explicar o desconhecido. No entanto, quando é ministrada na sala de aula, requer outro conjunto de procedimentos, cujo objetivo é alcançar resultados esperados, aliás planejados, para que o estudante possa entender o que é conhecido. (...) Existe portanto uma diferença fundamental entre a comunicação de conhecimento em congressos científicos, entre cientistas, e a seleção e adaptação de parcelas desse conhecimento para ser utilizado na escola por professores e alunos. (BIZZO, 2002, p.14)

Essa percepção deve fazer parte do trabalho pedagógico realizado nas escolas e conforme MALDANER (2000, p.196),

compreender a natureza da ciência química e como ela se dá no ensino e na aprendizagem passou a ser um tema importante, revelado a partir das pesquisas educacionais, principalmente as pesquisas realizadas na década de 1980 sobre as ideias alternativas dos alunos relacionadas com as ciências naturais. No âmbito da pesquisa educacional, mais ligado à educação científica, estava claro, já no início dos anos 90, que era fundamental que os professores conhecessem mais o pensamento dos alunos, bem como, a natureza da ciência que estavam ensinando. No entanto, isso não era prática usual nos cursos de formação desses professores

Tal consideração vem de encontro com a forma com que muitos educadores têm trabalhado esta disciplina, priorizando fatos desligados da vida dos educandos, em

que os educadores abordam, principalmente, os conteúdos acadêmicos, enfatizando a memorização, o que torna a disciplina desvinculada da realidade dos seus alunos e sem significação para sua vida.

Considerando que uma das funções do aprendizado dos conhecimentos químicos na escola deve ser a de perceber a presença e a importância da Química em sua vivência, para DELIZOICOV | et.al.| (2002, p.34),

a ação docente buscará constituir o entendimento de que o processo de produção do conhecimento que caracteriza a ciência e a tecnologia constitui uma atividade humana, sócio-historicamente determinada, submetida a pressões internas e externas, com processos e resultados ainda pouco acessíveis à maioria das pessoas escolarizadas, e por isso passíveis de uso e compreensão acríticos ou ingênuos; ou seja, é um processo de produção que precisa, por essa maioria, ser apropriado e entendido.

Assim, é importante que o ensino desenvolvido na disciplina de Química na EJA, possibilite ao educando, a partir de seus conhecimentos prévios, a construção do conhecimento científico, por meio da análise, reflexão e ação, para que possa argumentar e se posicionar criticamente.

ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO

Considerando os encaminhamentos metodológicos contidos na proposta pedagógica de ensino para a disciplina de Química no Ensino Médio Regular, faz-se necessário refletir as especificidades do trabalho com a Química na Educação de Jovens e Adultos (EJA), considerando as Diretrizes Curriculares Estaduais para essa modalidade de ensino da educação básica.

Nesse sentido, para o trabalho metodológico com essa disciplina, uma alternativa seria partir da sequência: “fenômeno–problematização–representação-explicação” (MALDANER, 2000, p.184). Para o autor,

episódios de alta vivência dos alunos passariam a ser importantes no processo de ensino e aprendizagem e não obstáculo a ser superado (...) O importante é identificar situações de alta vivência comuns ao maior número possível de alunos e a partir delas começar o trabalho de ensino. (MALDANER, 2000, p. 184)

Nessa ótica, não cabe ao educador apresentar apenas fórmulas, classificações, regras práticas, nomenclaturas, mas sim, trabalhar conteúdos com os quais o educando venha a apropriar-se dos conhecimentos de forma dinâmica, interativa e consistente, respeitando os diferentes tempos de aprendizagem e propiciando condições para que o mesmo perceba a função da Química na sua vida.

Criar novas formas de promover a aprendizagem fora dos limites da organização tradicional é uma tarefa, portanto, que impõem, antes de mais nada, um enorme desafio para os educadores (...), romper o modelo de instrução tradicional implica um alto grau de competência pedagógica, pois para isso o professor precisará decidir, em cada situação, quais formas de agrupamento, sequenciação, meios didáticos e interações propiciarão o maior progresso possível dos alunos, considerando a diversidade que inevitavelmente caracteriza o público da educação de jovens e adultos. (RIBEIRO, 1999, p.8)

Conforme SCHNETZLER (2000) citada em MALDANER (2000, p. 199), “Aprender significa relacionar”. A aprendizagem dos vários conceitos químicos terá significado somente se forem respeitados os conhecimentos e as experiências trazidos pelo educando jovem e adulto, de onde sejam capazes de estabelecer relações entre conceitos micro e macroscópicos, integrando os diferentes saberes – da comunidade, do educando e acadêmico.

Segundo FREIRE (1996, p.38), “a educação emancipatória valoriza o ’saber de experiência feito’, o saber popular, e parte dele para a construção de um saber que ajude homens e mulheres na formação de sua consciência política.”

Para que isso se evidencie no ambiente escolar, para a disciplina de Química, considera-se a afirmação de MALDANER (2000, p. 187), de que “o saber escolar deve permitir o acesso, de alguma forma, ao conhecimento sistematizado. Assim ele será reconstruído e reinventado em cada sala de aula, na interação alunos/professor, alunos/alunos e, também, na interação com o entorno social”. Dessa forma, o ensino da disciplina de Química deve contribuir para que o educando jovem e adulto desenvolva um olhar crítico sobre os fatos do cotidiano, levando-o a compreensão dos mesmos de forma consciente, dando-lhe condições de discernir algo que possa ajudá-lo, daquilo que pode lhe causar problemas.

Nesse sentido, ressalta-se a importância de trabalhar a disciplina de forma contextualizada, ou seja, com situações que permitam ao educando jovem e adulto a inter-relação dos vínculos do conteúdo estudado com as diferentes situações com que se deparam no seu dia-a-dia. Essa contextualização pode-se dar a partir de uma problematização, ou seja, lançando desafios que necessitem de respostas para determinadas situações. “A essência do problema é a necessidade (...), um obstáculo que é necessário transpor, uma dificuldade que precisa ser superada, uma dúvida que não pode deixar de ser dissipada.” (SAVIANI, 1993, p.26) As dúvidas são muito comuns em Química, devendo ser aproveitadas para a reflexão sobre o problema a ser analisado. Sendo assim, para o educador, o desafio consiste em realizar esta contextualização sem reduzir os conteúdos apenas a sua aplicação prática, deixando de lado o saber acadêmico.

Um aspecto importante a ser considerado no trabalho com a disciplina de Química é a retomada histórica e epistemológica das origens e evolução do pensamento na ciência Química, propiciando condições para que o educando perceba o significado do estudo dessa disciplina, bem como a compreensão de sua linguagem própria e da cultura científica e tecnológica oriundas desse processo, pois as diversas contingências históricas têm levado os professores a deixar de lado a importância do saber sistematizado, resultando numa prática pedagógica pouco significativa.

É fundamental mencionar, também, a utilização de experimentos e as práticas realizadas em laboratório como um dos recursos a serem utilizados no trabalho docente, a fim de que o educando possa visualizar uma transformação química, inserindo conceitos pertinentes e estabelecendo relações de tal experimento com aspectos da sua vivência. Segundo BIZZO (2002, p.75), é

importante que o professor perceba que a experimentação é um elemento essencial nas aulas de ciências, mas que ela, por si só, não garante bom aprendizado. (...) ...a realização de experimentos é uma tarefa importante, mas não dispensa o acompanhamento constante do professor, que deve pesquisar quais são as explicações apresentadas pelos alunos para os resultados encontrados. É comum que seja necessário propor uma nova situação que desafie a explicação encontrada pelos alunos.

Nesse sentido, um aspecto importante a ser considerado é o fato de que o educador não deve se colocar como o verdadeiro e único detentor do saber, apresentando todas as respostas para todas as questões. Conforme BIZZO (2002, p.50),

o professor deveria enfrentar a tentação de dar respostas prontas, mesmo que detenha a informação exata, oferecendo novas perguntas em seu lugar, que levassem os alunos a buscar a informação com maior orientação e acompanhamento. Perguntas do tipo “por quê?” são maneiras de os alunos procurarem por respostas definitivas, que manifestem uma vontade muito grande de conhecer. Se o professor apresenta, de pronto, uma resposta na forma de uma longa explicação conceitual, pode estar desestimulando a busca de mais dados e informações por parte dos alunos.

Ao proceder dessa forma, o educador leva o educando a pensar e a refletir sobre o assunto trabalhado, estimulando-o a buscar mais dados e informações.

Um outro aspecto a ser considerado no trabalho docente, é a utilização do material de apoio didático como uma das alternativas metodológicas, de tal forma que não seja o único recurso a ser utilizado pelo educador. MALDANER (2000, p. 185), afirma que

é por isso que não é possível seguir um “manual” de instrução, do estilo de muitos livros “didáticos” brasileiros originados dos “cursinhos pré-vestibulares”, para iniciar o estudo de química no ensino médio. A lógica proposta nesses “manuais” é a da química estruturada para quem já conhece a matéria e pode servir, perfeitamente, de revisão da matéria para prestar um exame tão genérico como é o exame vestibular no Brasil.(...) O que seria adequado para uma boa revisão da matéria, característica original dos “cursinhos pré-vestibulares”, tornou-se programa de ensino na maioria das escolas brasileiras.

A respeito do livro didático, BIZZO (2002, p. 66) propõe que ele deve ser utilizado como um dos materiais de apoio, como outros que se fazem necessários, cabendo ao professor, selecionar o melhor material disponível diante de sua própria realidade, onde as informações devem ser apresentadas de forma adequada à realidade dos alunos.

Ao pensar os conteúdos a serem trabalhados, o educador deve priorizar os essenciais, ou seja, aqueles que possam ter significado real à vida dos educandos jovens e adultos. Os conteúdos trabalhados devem possibilitar aos mesmos a percepção de que existem diversas visões sobre um determinado fenômeno e, a partir dessa relação, poderem constituir a sua própria identidade cultural, estimulando sua autonomia intelectual. Os conteúdos podem ser organizados sem a rígida sequência linear proposta nos livros didáticos. Para tanto, deve ser avaliada a relevância e a necessidade desses conteúdos, assim como a coerência dos mesmos para o processo educativo.

CONTEÚDOS DE QUÍMICA – ENSINO MÉDIO

O programa de Química contempla os seguintes conteúdos, considerados essenciais para a conclusão da disciplina de Química no Ensino Médio na modalidade Educação de Jovens e Adultos.

Matéria e substânciasReações QuímicasFunções Orgânicas e InorgânicasLigações QuímicasLigações entre as moléculasTabela periódica e periodicidadeEstrutura atômicaEstequiometriaEstudo dos GasesRadioatividadePropriedades coligativasEletroquímicaEquilíbrio QuímicoSoluçõesTermoquímica

É importante ressaltar que cabe ao educador, a partir da investigação dos conhecimentos informais que os educandos têm sobre a Química, sistematizar as

estratégias metodológicas, planejando o que será trabalhado dentro de cada um dos conteúdos mencionados anteriormente, qual a intensidade de aprofundamento, bem como a articulação entre os mesmos ou entre os tópicos de cada um.

Para a organização dos conteúdos é indicado que seja utilizada a problematização, cujo objetivo consiste em gerar um tema para contextualização. Os temas são baseados em fatos locais, regionais, nacionais ou mundiais, que possam refletir sobre os acontecimentos que relacionam a Química com a vida, com o ambiente, com o trabalho e com as demais relações sociais.

A partir do contexto abordado, devem ser selecionados os conteúdos que possam ser trabalhados, independentemente da sequência usual presente nos livros didáticos da disciplina. Nesse sentido, ao organizar os conteúdos, bem como, a forma como serão desenvolvidas as atividades para aprofundamento e avaliação, o educador terá condições de desenvolver metodologias que visem evitar a fragmentação ou a desarticulação dos conteúdos dessa disciplina.

Na perspectiva que se propõe, a avaliação na disciplina de Química vem mediar a práxis pedagógica, sendo coerente com os objetivos propostos e com os encaminhamentos metodológicos, onde os erros e os acertos deverão servir como meio de reflexão e reavaliação da ação pedagógica como um todo. É essencial valorizar os acertos, considerando o erro como ponto de partida para que o educando e o educador compreendam e ajam sobre o processo de construção do conhecimento, caracterizando-o como um exercício de aprendizagem.

Nessa ótica, a avaliação deve considerar que a cultura científica é repleta de falhas, de pontos de vista diferenciados e, muitas vezes, sem consenso.

A avaliação é sempre uma atividade difícil de se realizar. Toda avaliação supõe um processo de obtenção e utilização de informações, que serão analisadas diante de critérios estabelecidos segundo juízos de valor. Portanto, não se pode pretender que uma avaliação seja um processo frio e objetivo; ele é, em si, subjetivo, dependente da valorização de apenas uma parcela das informações que podem ser obtidas. Essas características são importantíssimas para que possamos compreender a utilidade e os limites da avaliação e como ela pode ser utilizada pelo próprio professor para reorientar sua prática. (BIZZO, 2002, p.61)

Assim, ao avaliar, o educador deve superar o autoritarismo, o conteudismo e o ato de avaliar como objeto de punição, perpassando por vários caminhos, fundamentados na concepção teórica e no encaminhamento metodológico da disciplina de Química, estabelecendo uma perspectiva de torná-la reflexiva, crítica, que valoriza a diversidade e reconhece as diferenças, voltada para a autonomia do educando jovem, adulto e idoso.

REFERÊNCIAS

BIZZO, N. Ciências: fácil ou difícil? São Paulo: Ática, 2002.

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RIBEIRO, Vera Masagão. A formação de educadores e a constituição da educação de jovens e adultos como campo pedagógico. Educação & Sociedade. v.20, n. 68, Campinas: UNICAMP, dez, 1999.

SAVIANI, Dermeval. Do senso comum à consciência filosófica. Campinas: Autores Associados, 1993, p.20-28.

DISCIPLINA DE HISTÓRIA

CONCEPÇÃO DO ENSINO DE HISTÓRIA

A História é um conhecimento construído pelo ser humano em diferentes tempos e espaços. É a memória que se tornou pública, em geral, expressão das relações de poder. De acordo com BEZERRA, (2003 pg. 42) “o objetivo primeiro do conhecimento histórico é a compreensão dos processos e dos sujeitos históricos, o desvendamento das relações que se estabelecem entre os grupos humanos em diferentes tempos e espaços”.

Diferentes historiadores e sujeitos históricos contam a História a partir de sua visão de mundo. Nesse sentido não há uma verdade única, mas sim aquela que foi tecida por um grupo social. Trata-se de um conhecimento científico, que precisa ser interpretado.

Hoje, por exemplo a História busca os diversos aspectos que compõem a realidade histórica e tem nisso o seu objeto de estudo, deixando de lado uma História que a partir do século XIX privilegiava o fato político, os grandes feitos e os heróis em direção a um progresso pautado pela invenção do estado-nação que precisava ser legitimado. Nesse contexto, é criada a disciplina de História que tinha como função legitimar a identidade nacional.

Até a década de 80, do século XX, a disciplina de História manteve seu conteúdo eurocêntrico e sua divisão quadripartite, até hoje presente no currículo de muitos cursos universitários. Numa outra perspectiva algumas universidades, começaram a abrir espaço ao estudo da História Oriental e da História da África. No entanto, essa é uma prática bem recente.

A História trata de toda ação humana no tempo em seus múltiplos aspectos: econômicos, culturais, políticos, da vida cotidiana, de gênero, etc. Para se perceber como sujeito da História, o educando precisa reconhecer que essa ação transforma a sociedade, movimenta um espiral de mudanças, na qual há permanências e rupturas.

O homem/mulher como sujeito da História, deve ser conhecedor dos porquês, dos problemas, das ideias, das ideologias e que só com uma visão holística do mundo e da sociedade ele se entenderá como cidadão ativo e conhecedor de seus direitos e de seus deveres.

Na Educação de Jovens e Adultos deve-se levar em consideração o fato de que os seus educandos possuem maior experiência de vida e que essa modalidade tem como finalidade e objetivos o compromisso com a formação humana e o acesso à cultura geral. A diversidade presente na sala de aula, a partir dos diferentes perfis sociais, deve ser utilizada a favor do trabalho pedagógico no ensino de História. Pode-se recorrer às diferenças para estabelecer comparações, levantar diferentes concepções de mundo e ainda buscar trabalhar com o respeito e a aceitação das diferenças.

É preciso que o ensino de História na Educação de Jovens e Adultos seja dinâmico e que o educando perceba que a História não está sepultada, mas em constante transformação. Nesse sentido, pode-se tomar sempre como ponto de partida e de chegada o próprio presente, onde estão inseridos educandos e educadores. Há que se considerar que o passado explica o presente, mas também o presente explica o passado. Isso não significa, no entanto, que se possa abrir mão do rigor na interpretação do passado, pois não se pode incorrer em anacronismos ou em posturas teleológicas. É preciso estimular o interminável diálogo entre o presente e o passado levando em consideração as especificidades de cada contexto histórico.

É fundamental que o educador de História não atue como reprodutor de um conhecimento pronto, de uma coleção inesgotável de fatos do passado. Mas, que torne possível desconstruir na sala de aula os múltiplos olhares da História, criar argumentos que possam concordar ou discordar de um autor, tomar posição diante do que já ocorreu e ainda está ocorrendo. Não se pode ser um cidadão pleno sem que se realize uma análise crítica dos caminhos percorridos pelo homem/mulher ao longo da história.

Por fim, reconhecer que esses sujeitos são produtores de signos e utopias, capazes de transformar a natureza e escrever sua própria História. Portanto, a História é uma construção coletiva em que todos os sujeitos tem um papel principal e suas ações são de suma importância para uma participação consciente na transformação da sociedade e do mundo em que vivem.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

De acordo com as contribuições da historiografia, nas últimas décadas a aprendizagem histórica se efetiva quando o conhecimento passa a ser experiência para o educando no sentido de que ele se aproprie do que aprendeu para ler e explicar o seu mundo.

No mundo contemporâneo um constante (re)pensar sobre a cultura escolar é fundamental para acompanhar as mudanças que ocorrem quotidianamente e que implicam diretamente na vida de educandos e educadores. Nesse sentido, a partir de discussões teórico-metodológicas significativas e que colocam o educando na centralidade do processo ensino-aprendizagem, pretende-se contribuir para uma prática de qualidade e de reflexão nas ações pedagógicas.

Para isso, propõem-se a abordagem dos conteúdos a partir de temáticas, no ensino de História, para os educandos (as) da Educação de Jovens e Adultos rompendo, dessa forma, com a narrativa linear e factual num diálogo permanente com a realidade imediata sobre a qual se constituem os diversos saberes. Pretende-se com isso priorizar uma prática pautada na associação ensino-pesquisa e no uso de diferentes fontes e linguagens.

Nessa perspectiva, exige-se uma abordagem problematizadora dos conteúdos de História, em que educadores e educandos possam dialogar e nesse diálogo, propiciar condições de pensar, argumentar e fundamentar suas opiniões através dos conteúdos socialmente significativos relacionados ao contexto político e social, reconhecendo a pluralidade étnica e cultural onde esses sujeitos estão inseridos.

Esta problematização deve propiciar uma análise crítica da realidade social, distinguindo-se da “educação bancária” em que o educador apresenta os conteúdos aos educandos, impondo-lhes um saber desprovido de reflexão (FREIRE, 1987).

É impossível, ensinar tudo a todos, desta forma se faz necessário a seleção e a escolha de conteúdos essenciais que possibilitem o êxito no processo ensino-aprendizagem e permitam satisfazer as necessidades dos educandos, respeitando suas especificidades, objetivando sua formação humanista e a busca de sua autonomia intelectual e moral.

Considerando a concepção do ensino de História pautada pela linha da cultura, optou-se por três eixos articuladores: Cultura, Trabalho e Tempo, que também orientam o documento das Diretrizes Curriculares para EJA no Estado do Paraná. Esses eixos estabelecem relações entre si e articulam-se às temáticas que por sua vez articulam-se aos conteúdos, sendo que o eixo Tempo, presente nessa concepção, refere-se ao tempo histórico.

Os conteúdos selecionados, foram organizados em quatro temas plurais no Ensino Fundamental: Identidade e Cultura; Estado e Relações de Poder; Terra e Propriedade; Cidadania e Trabalho e tres temas para o Ensino Médio: Diversidade Cultural; Relações de Poder e Movimentos Sociais; Mundo do Trabalho e Cidadania . É

importante que na abordagem desses conteúdos o educador crie situações de aprendizagem, que respeitem o perfil dos educandos da EJA e possibilitem o diálogo entre os conceitos construídos cientificamente e a cultura do educando, considerando a sua História de vida, o ambiente cultural e a identidade do grupo.

A abordagem pode ser realizada partindo do não conhecido ao conhecido ou do conhecido ao conhecido de outra forma. Os conteúdos não devem ser trabalhados de forma isolada ou compartimentada, o estudo deve se dar de forma abrangente no tempo e no espaço, como por exemplo, no que refere as questões sociais, as contradições, a Histórica local, conteúdos estes que estabeleçam relação entre o local e o global e possibilitem aos educandos, compreender as semelhanças e diferenças, as permanências e as rupturas do contexto histórico.

Transformar os conteúdos em “situações problemas” é imprescindível para demonstrar a relevância do que se vai estudar. O questionamento deve levar a reflexão crítica e permanente, possibilitando a construção de saberes socialmente significativos para que o educando interfira no sentido de transformar a sociedade, em que vive. Dessa forma o ensino de História será sempre possibilidade e nunca determinação.

É essencial no processo ensino-aprendizagem que a teoria esteja em sintonia com a prática, respeitando os níveis de compreensão dos educandos sobre a própria realidade.

Em suma, esse processo deve contribuir para formar um educando leitor e escritor, que se aproprie dos conhecimentos históricos, a partir da leitura, análise e interpretação de diversas linguagens, bem como da produção de textos orais e escritos, que valorizem o fazer e o refletir. Também é importante que o educando da EJA possa ampliar a sua leitura de mundo percebendo-se como sujeito da História na busca da autonomia e da cidadania.

ORGANIZAÇÃO DOS CONTEÚDOS

Ensino Fundamental e Médio

EIXOS ORIENTA-

DORESTEMAS

CONTEÚDOS – ENSINO FUNDAMENTAL

CULTURA

TRABALHO

TEMPO

IDENTIDADE

CULTURAL

CONSTRUÇÃO DO SUJEITO HISTÓRICO: o homem um sujeito histórico, atuação do sujeito histórico-memória.

PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO: conceito de ciência histórica, como o historiador reconstrói a história?

diferentes temporalidades, fontes históricas, patrimônio cultural, a origem do homem e o começo dos tempos.

ENCONTRO ENTRE DIFERENTES CULTURAS: o Paraná no Século XV, ocupação do espaço paranaense, o domínio cultural e político europeu, principais etnias, dominação e resistência, patrimônio cultural paranaense.

TERRA E PROPRIEDADE

NOS DIFERENTES

PERÍODOS

HISTÓRICOS

DIFERENTES MODOS DE DISTRIBUIÇÃO DA TERRA:Capitalista, socialista, primitiva, feudal e escravista.CONCENTRAÇÃO DE TERRAS NO BRASIL:Capitanias hereditárias, sesmarias, reduções, engenhos,

rendeiros/meeirosQuilombos, comunidades indígenas, leis de terras, imigração

europeia.TENTATIVAS DE REFORMA AGRÁRIA NO BRASIL

REPÚBLICA:Plano de metas, reforma de base, ditadura militar, proposta

de Tancredo Neves, a questão da terra nos governos; Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva.CONFLITOS AGRÁRIOS PELA TERRA NO BRASIL:

Canudos, Contestado, ligas camponesas, demarcação das terras indígenas, luta dos povos da floresta, movimento dos trabalhadores rurais sem terra.

O ESTADO

E AS RELAÇÕ

ES DE PODER

ESTADO NEOLIBERAL: origem, emprego, flexibilização dos direitos sociais, neoliberalismo no Brasil .

ESTADO DITATORIAL E TOTALITARIO: ditadura militar no Brasil, ditadura na América espanhola, princípios fundamentais do totalitarismo, contexto da Segunda Guerra.

ESTADO POPULISTA: o populismo no Brasil e na América espanhola.

ESTADO INTERVENCIONISTA: revolução de 1930, Crise de 1929, Constituição de 1934.

ESTADO OLIGARQUICO: Coronelismo, Revolução Federalista no Paraná, Tenentismo.

ESTADO LIBERAL CLÁSSICO: Século das Luzes, Imperialismo, Primeira Guerra Mundial.

FORMAÇÃO DO ESTADO NACIONAL: O Estado Absolutista, O poder da Igreja no Brasil colônia. Separação entre Estado e Igreja no Brasil.

CIDADANIA E

TRABALHO

CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO: Conceitos de Cidadania e trabalho, direitos civis, políticos e sociais.

CIDADANIA EM OUTRAS SOCIEDADES: Sociedade árabe, sociedade chinesa, Grécia e Roma. Servidão feudal.

CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO: o humanismo no renascimento cultural ,Revoluções burguesas e Iluminismo, formação da classe operária, relação capital e trabalho. Apartheid.

DESAFIOS E OBSTÁCULOS NA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA BRASILEIRA: trabalho escravo e infantil, movimento operários e sociais, a Constituição cidadã de 1988

EIXOS ORIENTA-

DORESTEMAS

CONTEÚDOS – ENSINO MÉDIO

CULTURA

TRABALHO

TEMPO

DIVERSIDADE

CULTURAL

CONSTRUÇÃO DO SUJEITO HISTÓRICO: o homem/mulher como sujeitos históricos, formação da identidade e alteridade, História local.

PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO: história como ciência, natureza e cultura, diferentes temporalidades, fontes históricas, as primeiras civilizações, patrimônio cultural.

DIFERENTES CULTURAS: dominação e resistência na formação da sociedade brasileira, o mundo árabe, a cosmovisão africana., cultura oriental, os diversos Brasis.

RELAÇÕES DE

PODER E

MOVIMENTOS

SOCIAIS

A RELAÇÃO COLONIZADOR/COLONIZADO NA AMÉRICA: dominio cultural e político europeu, assimilação e aculturação.

HISTÓRIA DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL E NOS ESTADOS UNIDOS: trabalho escravo,

Formas de resistência, movimentos abolicionistas, guerra de secessão.

LIBERALISMO E NEOLIBERALISMO: Estado liberal clássico, as ideias iluministas, a partilha do mundo, Primeira Guerra Mundial.SÉCULO XX MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS: formação dos estados totalitarios, o mundo em guerra, descolonização afro-asiática, movimentos sociais no pós-guerra, conflitos culturais na América espanhola.

FORMAÇÃO DO ESTADO NACIONAL: emancipação política das colônias americanas, a construção do estado brasileiro, o período republicano.

LUTAS PELA POSSE DA TERRA: conflitos agrários pela posse da terra no Brasil e na América espanhola, conflito árabe-israelense.

MUNDO DO

TRABALHO E

CIDADANIA

CIDADANIA E PARTICIPAÇÃO: Conceitos de Cidadania e trabalho, direitos civis, políticos e sociais.

CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO: o humanismo no renascimento cultural, Revoluções burguesas e Iluminismo, Apartheid, o leste europeu, sociedade árabe, sociedade chinesa.

DESAFIOS E OBSTÁCULOS NA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NO SÉCULO XXI: movimento operários e sociais, a Constituição cidadã de 1988, a paz no mundo, desigualdade social.

MUNDO DO TRABALHO: flexibilização do emprego, trabalho escravo e infantil,

relação capital e trabalho, movimentos sindicais, a tecnologia no mundo globalizado.

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e Terra, 1987.

KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2003.

SILVA, Marcos A. da (Org.). Repensando a história. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1984.

SILVA, Thelma Nobre Machado Bittencourt & RABELLO, Heloisa de Jesus. O ensino da história. Niterói, RJ: Eduff, 1992.

DISCIPLINA DE GEOGRAFIA –

CONCEPÇÃO DO ENSINO DA GEOGRAFIA

Atualmente, a grande velocidade com que vem ocorrendo as transformações no espaço planetário, tem levado a escola a rever conceitos e metodologias, pois esses refletem diretamente nos elementos fundamentais do ensino da Geografia.

Para iniciar a reflexão sobre o ensino de Geografia se colocam algumas questões: O que é Geografia? Para que serve? Como ensinar Geografia?

Para responder a essas questões, faz-se necessário esclarecer que a Geografia como ciência, sofreu ao longo da história profundas transformações, tanto em nível teórico quanto metodológico. Até as primeiras décadas do século XX, predominavam nas escolas concepções tradicionais e os livros se limitavam a uma Geografia puramente descritiva e enumerativa, tipo catálogo. Os educandos eram obrigados a memorizar listas intermináveis de nomes e números, ou confundiam a Geografia com a topografia e a cartografia.

Esta Geografia tradicional, centrada na observação e na descrição principalmente do quadro natural estrutura-se em três aspectos: os físicos, os humanos e os econômicos.

Os aspectos físicos, nesta concepção, são considerados os mais importantes. Abrangem especialmente a hidrografia (rios, bacias hidrográficas, redes fluviais e tudo o que se refere ao mundo das águas); o relevo (planícies, planaltos, serras – ou seja, as formas da superfície terrestre); o clima ( calor, frio, geada, neve e estados do tempo em geral); e a vegetação (florestas, campos, cerrados, caatinga e temas relacionados à distribuição das espécies vegetais pela superfície terrestre).

Os aspectos humanos referem-se ao homem “inserido” no quadro natural, como se a paisagem tivesse sido moldada para recebê-lo e fornecer-lhe suas “dádivas”, ou seja, seus recursos: solo, água, animais, vegetais e minerais, por exemplo.

Por fim, na parte econômica busca-se explicar como o homem explora e transforma o ambiente por meio das atividades econômicas, expressas pela seguinte ordem: extrativismo, agricultura, pecuária, indústria, comércio, serviços e meios de transporte – a circulação no território.

Observa-se que, na Geografia tradicional, o ensino desenvolve-se por meio de blocos (Geografia física, humana e econômica) que não se relacionam nem internamente, nem entre si, desarticulados no espaço e no tempo. Na Geografia física, por exemplo, não é estabelecida uma relação entre clima, solo, relevo e hidrografia, faz-se uma descrição sem correlações entre os elementos. Com tudo isso, segundo MORAES (1993, p.93), no Brasil, “a partir de 1970, a Geografia Tradicional está definitivamente enterrada; suas manifestações, dessa data em diante, vão soar como sobrevivências, resquícios de um passado já superado”.

Assim, se faz necessário repensar o ensino e a construção do conhecimento geográfico, bem como a serviço de quem está esse conhecimento. Qual o papel do ensino de Geografia na formação de um cidadão crítico da organização da realidade socioespacial.

A partir da compreensão do espaço geográfico como “um conjunto indissociável, solidário e também contraditório de sistemas, de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como quadro único no qual a história se dá”, Santos (1996, p.51), propõe uma concepção de geografia que possibilite ao educando desenvolver um conhecimento do espaço, que o auxilie na compreensão do mundo, privilegiando a sua dimensão socioespacial. Para MORAES (1998, p.166), “formar o indivíduo crítico implica estimular o aluno questionador, dando-lhe não uma explicação pronta do mundo, mas elementos para o próprio questionamento das várias explicações. Formar o cidadão democrático implica investir na sedimentação no aluno do respeito à diferença, considerando a pluralidade de visões como um valor em si”.

Nesse contexto, a Geografia explicita o seu objetivo, de analisar e interpretar o espaço geográfico, partindo da compreensão de que o espaço é entendido como produto das múltiplas, reais e complexas relações, pois, como mostra SANTOS (2001, p.174) “vive-se em um mundo de indefinição entre o real e o que imagina-se dele”. E, em conformidade com RESENDE (1986, p.181) “é preciso reconhecer a existência de uma saber geográfico, que é próprio do educando trabalhador, um saber que está diretamente ligado com sua atitude intelectiva, respondendo sempre ao seu caráter social, objetivo, de um todo integrado, um espaço real”.

Desse modo, à Geografia escolar cabe fornecer subsídios que permitam aos educandos compreenderem a realidade que os cerca em sua dimensão espacial, em sua complexidade e em sua velocidade, onde o espaço seja entendido como o produto das relações reais, que a sociedade estabelece entre si e com a natureza. Segundo CARLOS (2002, p.165) “A sociedade não é passiva diante da natureza; existe um procedimento dialético entre ambas que reproduz espaços e sociedades diferenciados em função de momentos históricos específicos e diferenciados. Nesse sentido, o espaço é humano não porque o homem o habita, mas porque o produz”.

Compreender as contradições presentes no espaço é o objetivo do conhecimento geográfico, ou seja, perceber além da paisagem visível.

Torna-se urgente, assim, romper com a compartimentalização do conhecimento geográfico. Neste sentido, faz-se necessário considerar o espaço geográfico a partir de vários aspectos interligados e interdependentes, os fenômenos naturais e as ações humanas, as transformações impostas pelas relações sociais e as questões ambientais de alcance planetário, não desprezando a base local e regional.

Nesse contexto, o homem passa a ser visto como sujeito, ser social e histórico que produz o mundo e a si próprio. Segundo CAVALCANTI (1998, p.192) “O ensino de geografia deve propiciar ao aluno a compreensão de espaço geográfico na sua concretude, nas suas contradições, contribuindo para a formação de raciocínios e concepções mais articulados e aprofundados a respeito do espaço, pensando os fatos e acontecimentos mediante várias explicações”.

O ensino de Geografia comprometido com as mudanças sociais revela as contradições presentes na construção do espaço, inerentes ao modo como homens e

mulheres transformam e se apropriam da natureza. Nesta perspectiva, há que se tornar possível ao educando perceber-se como parte integrante da sociedade, do espaço e da natureza. Daí a possibilidade dele poder (re)pensar a realidade em que está inserido, descobrindo-se nela e percebendo-se na sua totalidade, onde revelam-se as desigualdades e as contradições. Sob tal perspectiva, o ensino de Geografia contribui na formação de um cidadão mais completo, que se percebe como agente das transformações socioespaciais, reconhecendo as temporalidades e o seu papel ativo nos processos.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

Percebe-se que a prática metodológica no tocante ao ensino de Geografia, tem sido assentada em aulas expositivas, na leitura de textos e em questionários com respostas pré-determinadas, tendo como objetivo a memorização dos conteúdos. Porém, tal prática tem se mostrado insuficiente para que se concretize a construção do conhecimento geográfico. Portanto, faz-se necessário repensar a metodologia para que, de fato, se assegurem os objetivos a que a disciplina de Geografia se propõe.

É preciso que o educando se perceba enquanto sujeito, como produto e ao mesmo tempo transformador do espaço, por meio de suas ações e até mesmo de suas omissões.

É importante que a escolha da metodologia possibilite ao educando mecanismos de análise e reflexão sobre sua condição. Segundo FREIRE (1983, p.61): “não há educação fora das sociedades humanas e não há homens isolados”, portanto, é importante a valorização dos saberes que os educandos possuem e que foram acumulados ao longo de suas existências. Esses saberes devem ser o ponto de partida para a construção de outros saberes. No caso da Geografia, tais pressupostos se tornam mais evidentes e necessários.

A realidade dos educandos deve ser valorizada e a metodologia deve tornar os conteúdos significativos para que, por intermédio do diálogo, se busque explicitar e oportunizar a observação, a análise e a reflexão, categorias essenciais para o desenvolvimento de “um olhar geográfico” da realidade, ou seja, do mundo vivido.

Nessa perspectiva a problematização surge como metodologia para a abordagem dos conteúdos ou temas. Problematizar significa levantar questões referentes ao tema e ao cotidiano dos educandos, o que implica em expor as contradições que estão postas, buscar explicações e relações e construir conceitos. Exemplo: ao trabalhar o tema “Indústrias no Brasil”, escolher uma indústria local e questionar:

1- Qual a necessidade de termos uma indústria na nossa cidade?2- Quais mudanças foram provocadas por sua instalação?3- Qual a sua importância para o município, estado, país?4- Qual sua importância para a população?5- Por que ela se instalou nessa região?6- Como é seu processo produtivo?7- Quais impactos vem causando no ambiente?

Se não houver indústria local, problematizar a razão disso e questionar se é necessário uma indústria para garantir qualidade de vida na comunidade ou na cidade.

A problematização pressupõe que se estabeleça o diálogo, ou seja, que o educando seja ouvido, o que significa envolve-lo na construção do conhecimento.

Considerando a concepção do ensino de Geografia, numa perspectiva crítica e dialética e tendo em vista que no seu encaminhamento metodológico é fundamental considerar os saberes que os educandos trazem consigo, vinculados a sua história de vida, optou-se pela organização do currículo de Geografia, em três grandes eixos: Espaço, Relações Sociais e Natureza.

Esses eixos estabelecem relações entre si e permitem a compreensão da totalidade do espaço geográfico. Vale ressaltar, que a totalidade aqui não é a soma, mas o conjunto da formação socioespacial. A compreensão da migração campo-cidade, por exemplo, só ganha sentido quando a ela se relaciona a estrutura fundiária, a questão da má distribuição das terras, a industrialização das grandes metrópoles, a periferização e a qualidade de vida em si.

O conjunto dos eixos, o Espaço, as Relações Sociais e a Natureza articula-se as temáticas expostas no quadro de conteúdos. Dessa maneira, os conteúdos selecionados, devem ser trabalhados nas suas interrelações, rompendo-se com a compartimentalização e com a linearidade do conhecimento geográfico, possibilitando a explicitação do processo de produção do espaço pelas sociedades.

Cabe ao professor, como mediador na construção do conhecimento, criar situações de aprendizagem, tomando como ponto de partida as experiências concretas dos educandos no seu local de vivência, seja uma área rural, uma aldeia indígena ou no meio urbano, de modo a permitir a resignificação de sua visão de mundo.

Nessa perspectiva, para que a avaliação cumpra o seu papel como parte integrante do processo ensino-aprendizagem, se faz necessário definir o objetivo da atividade avaliativa e o conteúdo a ser avaliado. E ainda utilizar instrumentos diferenciados, analisar e qualificar os resultados, para que a partir deles o educando possa refletir e opinar sobre os saberes construídos e os conhecimentos organizados e para que o educador possa rever a sua prática pedagógica.

A avaliação deve contemplar situações formais e informais e utilizar diversas linguagens.

Os objetos da avaliação no ensino de Geografia, são os três eixos mencionados: Espaço, Relações Sociais e Natureza. A partir deles, utilizar-se-á da descrição, da representação, da interpretação, da localização e da análise para a compreensão das transformações que se processam no espaço e na maneira como homens e mulheres organizam e produzem o espaço por eles vivido.

Dessa forma, o educador deve encaminhar as ações do dia-a-dia, possibilitando a construção de conceitos e, ao mesmo tempo, acompanhando o desenvolvimento da aprendizagem dos educandos, para que, de fato, possa se efetivar a construção da sua autonomia e cidadania plena.

CONTEÚDOS DE GEOGRAFIA

Ensino Fundamental e Médio

Os conteúdos propostos são os mesmos para o Ensino Fundamental e para o Ensino Médio. A abordagem dos conteúdos, deve ser diferenciada nos níveis de ensino a partir do grau de aprofundamento e de complexidade dos textos.

Os conteúdos devem ser trabalhados em diferentes escalas: local, regional, nacional e mundial.

Porém é necessário que o educador perceba que o espaço geográfico só pode ser entendido em sua totalidade, sendo que os recortes de análise espacial, devem ser apenas procedimentos operacionais para decompor o espaço, para depois recompô-lo, sobretudo para facilitar a compreensão do educando.

EIXOS TEMÁTICA CONTEÚDOSESPAÇO

RELAÇÕS SOCIAIS NATUREZA

RELAÇÃO CIDADE–CAMPO ORGANIZAÇÃO SOCIOESPACIAL

DEMOGRAFIA: dinâmica da população, pirâmide etária, padrão de vida, movimentos migratórios,.

ATIVIDADES ECONÔMICAS: cadeias

CIDADANIA

produtivas, redes de distribuição, transporte e comunicação, espaço agrícola, fontes de energia, comércio, indústria, turismo, circuitos produtivos, Divisão Internacional do Trabalho, flexibilização do trabalho, economia solidária.

POLÍTICAS PÚBLICAS: agricultura familiar, reforma agrária, assistência social, educação, meio ambiente, habitação, cultura, saúde.

URBANIZAÇÃO: expansão urbana, infra-estrutura, plano diretor urbano.

AGRÁRIA: estrutura fundiária, modernização do campo, conflitos no campo, agricultura familiar, políticas agrárias.

GEOPOLÍTICA: organização socioespacial, fronteira, estado, nação, território, territorialidade.

REPRESENTAÇÃO SOCIOESPACIAL: Planeta Terra, localização espacial, orientação, coordenadas geográficas, cartografia.

QUESTÕES SOCIOAMBIENTAIS: degradação ambiental, desenvolvimento sustentável, qualidade de vida.

REFERÊNCIAS

CARLOS, Ana Fani A. A Geografia brasileira hoje: Algumas reflexões. São Paulo: Terra Livre/AGB, vol. 1, nº 18, 2002.

CASTROGIOVANNI, Antônio Carlos, (org.) Geografia em sala de aula: Práticas e Reflexões. Porto Alegre, RS: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul/AGB, 1999.

CAVALCANTI, L.S. Geografia: escola e construção de conhecimentos. Campinas: Papirus, 1998.

FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

MORAES, Antonio C R. Geografia: Pequena História Crítica. São Paulo: Hucitec, 1993.

MOREIRA, Ruy. O que é Geografia. São Paulo: Brasiliense, 1981.

RESENDE, M.S. A Geografia do aluno trabalhador. São Paulo: Loyola, 1986.

RODRIGUES, Neidson. Por uma nova escola. São Paulo: Cortez, 1987.

SANTOS, Milton. A Natureza do Espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.

_______ Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2001.