3 - editorial

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7 Editorial Como gostava de lembrar Bento Prado Júnior, retomando a co- nhecida frase de Sartre: “filosofar é pensar contra si mesmo”. Ava- liando o alcance da tradição filosófica, o filósofo de Jaú pensava o conceito de ipseidade como capacidade de um “si mesmo” de referir- -se ao sentido “próprio” das coisas, implicando algo de estranho a si na coisa pensada, algo sem o qual o sentido não poderia se realizar. Como na ironia do poema Ipseitas, a que devemos a ideia que norteia a revista: A grama de meu quintal propaga-se em todas as direções – nada de falhas, buracos, nada de irregular na superfície do Mundo. Nada de i-mundo no (meu)* mundo (e em mim mesmo)** Há o Bush, é claro, but no bushes in my private Garden. Le moi est haïssable, bien sûr, mais pourrai-je être autrement ? Para além de meu quintal, do lado de lá dos muros, O Mundão explode suas crises. 1 Sob essa tônica, nosso autor percorreu, problematizando, di- versas formas de expressão da “filosofia do sujeito”, reunindo-as em torno da pergunta sobre o que faz de nós algo como uma identidade. Com a escrita, os filósofos exteriorizam e tornam outra — para além e para aquém da expressão de si — a experiência de sua própria ipsei- dade, como um Outro na qual escritor, leitor e interlocutor se encon- tram num horizonte de pertença e de expressão mútuas. * Acrescentado após a escrita da frase no manuscrito original. ** Suprimido no manuscrito original. 1 Cf. PRADO JR, Bento. Ipseitas. In: Olhar/ Centro de Educação e Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos. Ano 10, Número Especial (2008). São Carlos: UFSCar, 2008, p. 69.

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  • 7Editorial

    Como gostava de lembrar Bento Prado Jnior, retomando a co-nhecida frase de Sartre: filosofar pensar contra si mesmo. Ava-liando o alcance da tradio filosfica, o filsofo de Ja pensava o conceito de ipseidade como capacidade de um si mesmo de referir--se ao sentido prprio das coisas, implicando algo de estranho a si na coisa pensada, algo sem o qual o sentido no poderia se realizar. Como na ironia do poema Ipseitas, a que devemos a ideia que norteia a revista:

    A grama de meu quintal propaga-se em todas as direes nada de falhas, buracos, nada de irregular na superfcie do Mundo.Nada de i-mundo no (meu)* mundo (e em mim mesmo)**H o Bush, claro, but no bushes in my private Garden.Le moi est hassable, bien sr, mais pourrai-je tre autrement ?Para alm de meu quintal, do lado de l dos muros,O Mundo explode suas crises. 1

    Sob essa tnica, nosso autor percorreu, problematizando, di-versas formas de expresso da filosofia do sujeito, reunindo-as em torno da pergunta sobre o que faz de ns algo como uma identidade. Com a escrita, os filsofos exteriorizam e tornam outra para alm e para aqum da expresso de si a experincia de sua prpria ipsei-dade, como um Outro na qual escritor, leitor e interlocutor se encon-tram num horizonte de pertena e de expresso mtuas.

    * Acrescentado aps a escrita da frase no manuscrito original.

    ** Suprimido no manuscrito original.

    1 Cf. PRADO JR, Bento. Ipseitas. In: Olhar/ Centro de Educao e Cincias Humanas da Universidade Federal de So Carlos. Ano 10, Nmero Especial (2008). So Carlos: UFSCar, 2008, p. 69.