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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ______ VARA CÍVEL DA COMARCA DE GURUPI – TO. O Ministério Público Estadual, por sua promotora de Justiça, no exercício da legitimação extraordinária que lhe foi outorgada pela Constituição da República, artigo 129, III; pela Lei Federal n. 7.347/85, artigo 5º, caput; pela Lei Federal n. 8.078/90, artigo 82, I; e pela Lei Federal n. 8.625/93, artigo 25, IV, ‘a’, vem perante Vossa Excelência propor Ação Civil Pública com Pedido de Liminar em desfavor de CELTINS - Companhia de Energia Elétrica do Estado do Tocantins, pessoa jurídica de direito privado, sediada na avenida 104 norte, conjunto IV, lote 12A, Palmas – TO, inscrita no CNPJ/MF sob o nº. 25.086.034/0001-71, empresa pertecente ao Grupo REDE, representada legalmente por sua presidente Carmem Campos Pereira e vice-presidente da Celtins Milton Umino, pelos fatos e fundamentos que a seguir seguem declinados. DA LEGITIMIDADE A legitimidade do Ministério Público decorre da sua missão constitucional de defesa do consumidor, especialmente, a de propor ações civis públicas em defesa dos direitos difusos e coletivos (art. 129, III da Constituição Federal). Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e do Consumidor de Gurupi/TO Avenida Rio Grande do Norte, 1797, Centro, CEP. 77.410-080 1 Fones: (063) 3312-1369 / 3315-2055

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Page 1: 2014 02 03 Acp Modelo CIA de Energia Eletrica

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ______ VARA CÍVEL DA COMARCA DE GURUPI – TO.

O Ministério Público Estadual, por sua promotora de

Justiça, no exercício da legitimação extraordinária que lhe foi outorgada pela

Constituição da República, artigo 129, III; pela Lei Federal n. 7.347/85, artigo 5º,

caput; pela Lei Federal n. 8.078/90, artigo 82, I; e pela Lei Federal n. 8.625/93, artigo

25, IV, ‘a’, vem perante Vossa Excelência propor Ação Civil Pública com Pedido de Liminar em desfavor de CELTINS - Companhia de Energia Elétrica do Estado do Tocantins, pessoa jurídica de direito privado, sediada na avenida 104 norte, conjunto

IV, lote 12A, Palmas – TO, inscrita no CNPJ/MF sob o nº. 25.086.034/0001-71,

empresa pertecente ao Grupo REDE, representada legalmente por sua presidente

Carmem Campos Pereira e vice-presidente da Celtins Milton Umino, pelos fatos e

fundamentos que a seguir seguem declinados.

DA LEGITIMIDADE

A legitimidade do Ministério Público decorre da sua missão

constitucional de defesa do consumidor, especialmente, a de propor ações civis

públicas em defesa dos direitos difusos e coletivos (art. 129, III da Constituição

Federal).

Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e do Consumidor de Gurupi/TOAvenida Rio Grande do Norte, 1797, Centro, CEP. 77.410-080

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Na esfera infra constitucional, diga-se singelamente que a

legitimidade decorre do Código de Defesa do Consumidor, pois a combinação dos

artigos 81 e 82 permitem o ajuizamento de ação civil de qualquer natureza para

tutela dos interesses dos consumidores.

Por fim, ressalte-se que a lei da ação civil pública autoriza o

ajuizamento da ação em defesa dos consumidores, também o requerimento de

medida liminar em defesa da coletividade.

A legitimidade relaciona-se ao objeto da ação, pois a

requerida mantém na sua carteira de clientes milhares de consumidores de água no

município de Gurupi, por força de um contrato celebrado com a ANEEL (fls. ).

A dimensão da presente demanda pode ser medida pela

notória grandeza da atividade da requerida, pois ao tomar a si a proposta de

fornecimento de energia elétrica ao povo de Gurupi e municípios abrangidos por essa

comarca e abraçou um universo de mais de 70.000 (setenta mil) pessoas.

O traço coletivo da presente demanda exsurge da própria

situação da coletividade local que está presa e dependente, em sentido genérico ,da

execução daquele ajuste, denominado de contrato de fornecimento de energia.

(CDC, art. 81,II).

DOS FATOS

Como se sabe, a requerida, por força de contrato de

concessão de serviço público celebrado com a União, é a responsável pela

distribuição de energia elétrica aos lares, propriedades rurais e empresas da

comarca de Gurupi, bem como de todo o Estado do Tocantins. Presumivelmente por

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deter, nesta região, o monopólio do fornecimento de energia elétrica, a requerida tem

levado a cabo condutas que vão de encontro às normas que regulam as relações

consumeristas e, em última análise, à Constituição da República, causando, desse

modo, inaceitáveis prejuízos aos consumidores locais.

Com efeito, consta dos elementos de convicção agrupados

pela Promotoria de Justiça da comarca de Gurupi, que consumidores que têm o

fornecimento de energia elétrica suspenso por força de inadimplemento das tarifas

são obrigados a arcar com o pagamento da tarifa de religação (termo de

declarações anexo) cujo valor, dependendo da circunstância, pode atingir absurdos

R$ 51,55 (cinquenta e um reais e cinquenta e cinco centavos). Mais ainda:

implementado o pagamento da tarifa atrasada, os funcionários da CELTINS invariavelmente sujeitam os consumidores a ficar mais 24 horas sem energia elétrica,

sob o pretexto de que assim procedem em virtude de determinação da ANEEL.

Expedientes que, consoante se sustentará nos tópicos

seguintes, constituem procedimentos eivados de abuso e de iniqüidade, sendo, pois,

nulos e suscetíveis de correção judicial.

DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOSA conduta da ré frente ao Código de Defesa do Consumidor e à nova teoria contratual.

Sendo o contrato um acordo de vontades para o fim de

adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direitos, está ele, portanto, comprometido

com a função social, isto é, cercado pelos princípios da probidade, eqüidade, boa fé

e menos influenciados pelo dogma da autonomia da vontade.

Isso porque, em contraposição aos denominados contratos

descontínuos, como é o caso da compra e venda, caracterizados pela transação

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instantânea, completa, rápida e impessoal, os contratos relacionais criam relações

jurídicas complexas, na qual o consumidor mantém vínculo de dependência com o

fornecedor (v.g. seguros em geral, previdência privada, instituições financeiras e

seguro-saúde, fornecimento de energia elétrica, água, etc).

Inicialmente, importa considerar que de acordo com a política

nacional das relações de consumo devemos reconhecer, desde logo, a

vulnerabilidade do consumidor (CDC, art., I), tendo em vista sua hipossuficiência,

marcadamente presente nesse tipo de contrato no qual a dependência se protrai por

longos anos, sendo uma de suas principais características.

Nesse particular, observa-se na descrição dos fatos, o

quanto a requerida está se aproveitando da vulnerabilidade dos consumidores ao

impor-lhes a cobrança de uma taxa de religação após ter promovido o corte no

fornecimento do produto, diga-se de passagem essencial para a vida humana.

Vê-se, pois, que requerida impõe concomitantemente duas

penalidades aos consumidores: A primeira promovendo o corte no fornecimento do

produto e a segunda ao exigir o pagamento de uma taxa de religação para voltar a

fornecê-lo, no valor exorbitante de R$ 51,55, levando-se em conta que a maioria das

famílias carentes paga mensalmente uma tarifa que vai de R$7,00 a R$10,00.

Preciso lembrar que a nova realidade contratual (contratos

cativos de longa duração) não afasta os instrumentos tradicionais do direito, mas

serve de base ao intérprete para dar respostas mais claras e eqüitativas aos conflitos

atuais.

Na esteira desse raciocínio, invoca-se a aplicação dos

princípios norteadores na interpretação dos denominados contratos relacionais,

especialmente, os da boa-fé, da eqüidade, da solidariedade e da cooperação.

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Isso tudo nos permite afirmar que a conduta da requerida é

abusiva à luz do que dispõe os artigos 4º, III, 39, V e 51, IV, todos do Código de

Defesa do Consumidor.

E não se alegue que em razão do serviço prestado pela ré

ser público não haveria incidência da Lei 8.078/90. Isto porque o art. 22 da referida

lei determina que as concessionárias de serviços públicos devem prestá-los com

eficiência, segurança e de modo contínuo, o que fortifica sua condição de

fornecedora e sua submissão aos ditames do CDC.

Em verdade, o regime jurídico de Direito Público há de ser

aplicado à ré, de regra, somente em suas relações com o Poder Público concedente.

Já nos seus liames com os particulares que desfrutem dos serviços prestados, a

demandada deve observar todo o disposto na Lei 8.078/90.

Da nulidade da cobrança da tarifa de religação

Prevalecendo-se de seu poderio econômico e da natureza

essencial do serviço que fornece, a requerida perpetra práticas abusivas marcadas

pela imoralidade econômica e pela opressão, a exigir do Ministério Público a

veiculação desta pretensão cuja finalidade consiste em compeli-la a retroceder em

tais comportamentos, respeitando, pois, a vulnerabilidade e a hipossuficiência que

caracteriza os consumidores da comarca de Gurupi, bem como a paridade de forças

que deve pautar, sempre e sempre, as relações de consumo.

Em verdade, a cobrança desta religação consiste, apenas e

tão-somente, em cláusula penal disfarçada de tarifa, na exata medida em que,

juntamente com o corte no fornecimento de energia e com os encargos defluentes da

inadimplência (multa contratual e juros de mora), tem finalidade precipuamente

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punitiva. Constitui, à evidência, bis in idem de natureza penal, atingindo o consumidor

de forma ilegal e abusiva. Ilegal porque, ao ser interrompida a prestação de energia

elétrica, por inadimplência do consumidor, é conseqüência lógica que, com o

pagamento, ocorra o restabelecimento do fornecimento, pela concessionária.

E é evidente que, nessas condições, não está a requerida a

prestar qualquer serviço ao consumidor. Na realidade, o restabelecimento do

fornecimento de energia ao consumidor que retornou à situação de pontualidade

nada mais é do que uma obrigação legal, insuscetível, obviamente, de qualquer

espécie de exigência pecuniária, posto que, nos termos do Código de Defesa do

Consumidor, artigo 22, os órgãos públicos, por si ou por suas empresas,

concessionárias, permissionárias ou sob qualquer forma de empreendimento, são

obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos

essenciais, contínuos.

Abusiva porque cria obrigação iníqua, ditada unilateralmente

e em benefício exclusivo da requerida que, além de vender seu produto a um custo

elevado, cobra do consumidor para ter acesso a ele. Não se perca de vista que a

requerida, como as demais concessionárias desta modalidade de serviço público, já

usufrui da fabulosa e deveras coercitiva prerrogativa de suspender o fornecimento de

energia ao consumidor, apenando-o abruptamente sem a necessidade de recurso ao

Poder Judiciário. Procedimento que não passa de uma espécie de justiça privada,

consentida pelo Legislador (Lei Federal n. 8.957/95, artigo 6º, § 3º, II). E, como se

não bastassem o constrangimento e os prejuízos decorrentes da interrupção de um

serviço caracterizado pela suprema essencialidade, o consumidor, invariavelmente

hipossuficiente, é compelido a arcar com pena pecuniária acessória, nitidamente

ilegal, para poder novamente usufruir da energia elétrica.

Nesse particular, importante colacionar a brilhante sentença

prolatada pela excelentíssima Juíza de Direito da Comarca de Barra do Garças-MT,

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Dra. Eulice Jaqueline da Costa Silva Cherulli, em 17 de abril de 2001, ação civil

pública em desfavor da CEMAT – Centrais Elétricas Matogrossenses S/A:

“...A empresa requerida presta serviços sob regime de

remuneração, sendo certo que o inadimplemento pode determinar

o corte do fornecimento do produto ou serviço...

Em havendo o pagamento após o corte no fornecimento

dos serviços é obrigação da concessionária o pronto

restabelecimento do serviço, sem que para isso, se veja o

consumidor obrigado a pagar qualquer taxa extra, além daquelas

já mencionadas.

Ora, ao religar o fornecimento, a empresa não está

fazendo favor nenhum ao consumidor. Pelo contrário! Tem o

dever, repito, de, uma vez pago o consumo, restabelecer, de

imediato, o fornecimento.

...O corte no fornecimento já penaliza o cidadão; o atraso

no pagamento gera reaviso que também é cobrado; seguido de

multa por mora e juros. Sentindo no bolso o pesado valor do

produto vendido pela requerida, só atrasa ou se sujeita ao corte de

fornecimento quem realmente não dispõe de meios para

pagamento na data aprazada. Ninguém passa por tal humilhação

(corte) quando dispõe de dinheiro.”

Daí por que se há de reconhecer a flagrante ilicitude da

cobrança, mormente se confrontada com a dicção do Código de Defesa do

Consumidor, artigo 51, IV:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas

contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

Omissis...

IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, que coloquem

o consumidor e desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis

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com a boa-fé ou a eqüidade.

Vale frisar, por fim, que a tarifa censurada também não pode

ser cobrada nem sob o pretexto de que se trata de expediente de urgência, na razão

em que o caráter urgencial deflui da própria natureza do serviço, e é, repita-se,

obrigação legal da concessionária.

De resto, os Tribunais, quando concitados a analisar a

vexata quaestio, reconhecem o gritante desequilíbrio contratual nela existente,

mormente se considerada a circunstância de que a cobrança é imposta de forma

padronizada, unilateral e à socapa, sem que os consumidores possam ao menos

discuti-la ou questioná-la:

EMENTA - AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA CONTRAS AS

CENTRAIS ELÉTRICAS MATOGROSSENSES S.A. – CEMAT –

TAXA DE RELIGAÇÃO DE ENERGIA INSTITUÍDA PELA

CONCESSIONÁRIA – ILEGALIDADE – LIMINAR CONCEDIDA

PELO MAGISTRADO E EM GRAU DE RECURSO MANTIDA –

RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO. A

taxa de religação de energia nada mais é do cláusula penal

disfarçada e travestida de tarifa direcionada a dirimir a

inadimplência. ( TJMT, 1ª Câmara Cível, agravo de instrumento n.

10.670, relator Licínio Carpinelli Stefani, j. 3.4.2000 )

EMENTA - AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL

PÚBLICA AFORADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM FACE DE

CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA (CEMAT) –

DECISÃO QUE CONCEDEU TUTELA ANTECIPADA PARA

CESSAÇÃO IMEDIATA DA TAXA DE RELIGAÇÃO –

PROCEDÊNCIA – PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA

ABSOLUTA DA JUSTIÇA ESTADUAL, DE ILEGITIMIDADE ATIVA

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“AD CAUSAM” DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DE FALTA DE

INTERESSE PROCESSUAL – NÃO CONHECIMENTO –

RECURSO IMPROVIDO. A taxa de religação cobrada pela

concessionária de energia elétrica configura-se como medida

ilegal e abusiva. Ilegal, por ser imposta como condição para obter

novamente o consumo, após cessada a inadimplência por contas

em atraso; abusiva, porque fere o artigo 6º, inciso X, da Lei nº

8.078/90, que concede ao consumidor o direito de receber

“adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”.

( TJMT, 2ª Câmara Cível, agravo de instrumento n. 14.081, relator

Mariano Alonso Ribeiro Travassos, j. 12.3.2002).

EMENTA: TAXA DE RELIGAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA –

MULTA - COBRANÇAS ILEGÍTIMAS. A taxa de religação de

energia elétrica, por não configurar prestação de serviço, não pode

ser cobrada do consumidor. ( TJMG, 1ª Câmara Civel, embargos

infringentes n. 000.188.016-0/01, relator Antônio Helio Silva, j.

14.4.2001, DJE 4.5.2001).

É de se exigir, portanto, que a requerida abstenha-se de

persistir em tal comportamento, já que, para punir o consumidor inadimplente, dispõe

de inúmeras opções, que vão desde a cobrança de multa até a também questionável

suspensão do fornecimento do serviço de energia elétrica.

Da imposição constitucional e legal de restauração célere do serviço ao usuário que saldou suas dívidas com a concessionária – inteligência da Constituição da República, artigo 37, caput, do Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º, X, e 22, caput, e da Lei Federal n. 8.987/95, artigo 6º, § 1º.

Como afirmado, outra irregularidade cometida pela requerida

consiste no fato de seus funcionários se recusarem a restabelecer rapidamente o

fornecimento de energia, mesmo cientes de que as pendências atrasadas dos

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consumidores haviam sido liquidadas. Aliás, nesse particular, as infrações cometidas

pela requerida adquirem feições odiosas, posto que, ao que tudo indica, são

animadas por mero capricho, displicência e mesquinhez de seus prepostos que,

podendo restaurar prontamente o fornecimento de energia, o fazem ao seu livre

alvedrio, no momento em que bem entendem.

Não se desconhece que o “contrato de prestação de serviço

público de energia elétrica para unidades consumidoras atendidas em baixa tensão”

de fl. 148 fornece à requerida o prazo de 24 horas para providenciar a religação da

energia elétrica após o pagamento (item 15).

Ocorre que tal cláusula, além de ter sido estipulada

unilateralmente, em avença adesiva, draconiana e abusiva, constitui violência

repugnante e inaceitável ao princípio da eficiência insculpido a talho de foice na

Constituição da República, artigo 37, caput, sendo, em conseqüência, de nenhuma

consistência jurídica.

Vale aqui notar que a instituição do princípio da eficiência em

sede constitucional visa justamente a determinar que a Administração reveja o seu

modo usual de proceder e passe, doravante, a priorizar a boa qualidade do serviço

público prestado. Sobre o tema, aliás, extremamente pertinentes são as lições de

ODETE MEDAUAR, as quais o Ministério Público pede vênia para abaixo

reproduzir:

“Agora a eficiência é princípio que norteia toda a atuação da

Administração Pública. O vocábulo liga-se à idéia de ação, para

produzir resultado de modo rápido e preciso. Associado à

Administração Pública, o princípio da eficiência determina que a

Administração deve agir, de modo rápido e preciso, para produzir

resultados que satisfaçam as necessidades da população.

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Eficiência contrapõe-se a lentidão, a descaso, a negligência, a

omissão – características habituais da Administração Pública

brasileira, com raras exceções.”

Se não bastasse a determinação que é feita pela

Constituição da República, o legislador ordinário também cuidou de assegurar aos

cidadãos o direito de exigir serviços públicos satisfatórios.

De fato, o Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º e 22,

caput, preceitua que ao usuário deve ser assegurada a adequada e eficaz prestação

dos serviços públicos em geral, os quais devem ser, também, seguros e, quanto aos

essenciais, contínuos.

Posteriormente, a Lei Federal n. 8.987/95, que dispõe sobre

o regime de concessão e prestação de serviços públicos, veio, através do artigo 6º,

intensificar o direito subjetivo à prestação de serviços públicos adequados ao pleno

atendimento dos usuários, que satisfaçam as condições de regularidade,

continuidade, eficiência, atualidade, generalidade e cortesia no seu fornecimento.

Consegüintemente, afigura-se inconcebível que o usuário –

após haver cumprido com todas as suas obrigações, inclusive com o pagamento de

multa e juros de mora - fique privado por longas horas do serviço de energia elétrica,

às vezes tendo de passar a noite às escuras, quando os funcionários da

concessionária poderiam perfeitamente abreviar tal expiação.

De tanto resulta que tais abusos merecem imediato e

enérgico corretivo, de sorte a resguardar as prerrogativas dos consumidores que, ao

retornarem à situação de pontualidade, não podem ficar sujeitos à perduração de

injustificada solução de continuidade no fornecimento de energia.

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Da nulidade dos artigos 2º e 3º, da Resolução n. 499 da ANEEL

Um dos subterfúgios de que se valerá a requerida em sua

defesa é o de que, cobrando a tarifa de religação, está ela apenas seguindo normas

de conduta definidas nas Resoluções nº 499, de 3 de julho de 2007, da ANEEL.

Como se sabe, ANEEL integra o conjunto de agências

reguladoras, que surgiram concomitantemente com o fim do monopólio estatal de

diversos serviços ou atividades públicas. Expressão máxima do Direito Regulatório,

as agências reguladoras foram criadas justamente para que o Executivo possa

melhor exercer seu poder normativo de regrar as atividades e serviços que

originariamente eram prestados diretamente pela Administração.

Estão, pois, as agências reguladoras, em suma, a exercer o

poder regulamentar, pelo qual o Poder Executivo emite comandos destinados à

correta aplicação da lei. E os atos administrativos normativos, por limitarem-se a

explicitar a norma legal a ser observada pela Administração e pelos administrados,

não podem contrariar a lei ou ir além do que ela permite. No que o ato normativo,

expedido pela Administração no exercício do poder regulamentar, extravasar ou

afrontar a lei, é írrito e nulo, por flagrante vício de ilegalidade.

Com efeito, conquanto tenha a tarifa em exame previsão nos

artigos 109, IV e V, da Resolução n. 456, e no artigo 1º, da Resolução n. 457, da

ANEEL, ambos não resistem a um exame superficial de legalidade, na exata medida

em que, ao mais completo arrepio do Código de Defesa do Consumidor, artigos 22, e

51, IV, outorgam vantagem exagerada às concessionárias de energia elétrica, em

manifesto prejuízo ao consumidor, notadamente se for considerada a natureza do

serviço, bem essencial à vida moderna. Investem, portanto, contra a lei formal,

circunstância que os inquina inapelavelmente, e que torna ambos de nenhum efeito

jurídico.

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O mesmo se diga do artigo 108 da Resolução n. 456 da

ANEEL que confere à concessionária o prazo de até 48 horas para o

restabelecimento do fornecimento após a constatação do pagamento. Ora,

consoante sedimentada posição jurisprudencial, o serviço de energia elétrica está

claramente incluído dentre aqueles essenciais, estando, ipso facto, subordinado ao

princípio da permanência, o qual impõe a necessidade continuidade do serviço. Em

vista disso, é de todo inadmissível que o usuário que esteja com suas obrigações

quitadas tenha que aguardar até 48 horas para que a concessionária se digne a

restaurar o seu abastecimento. Novo e hialino vilipêndio ao Código de Defesa do

Consumidor, artigo 22, caput, e, desta vez, também, à Lei Federal n. 8.987/95, artigo

6, § 1º.

DO PEDIDO LIMINAR

Além do poder geral cautelar que a lei processual lhe confere

(Código de Processo Civil, artigos 798 e 799), agora o Código de Defesa do

Consumidor, dispensando pedido do autor e excepcionando, assim, o princípio

dispositivo, autoriza o magistrado a antecipar o provimento final, liminarmente, e a

determinar de imediato medidas satisfativas ou que assegurem o resultado prático da

obrigação a ser cumprida (artigo 84).

Sublinhe-se que essa regra é aplicável a qualquer ação civil

pública que tenha por objeto a defesa de interesse difuso, coletivo ou individual

homogêneo (artigo 21 da Lei de Ação Civil Pública, com a redação dada pelo artigo

117 do Código de Defesa do Consumidor).

Na espécie, imperiosa é a concessão de medida liminar com

esse conteúdo inovador, para sujeitar a requerida à abstenção de suas práticas, com

as quais vem insultando a ordem jurídica.

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Como necessária que é, a plausibilidade – fumus boni juris –

reside nos argumentos acima consignados, vale repetir: a requerida exerce sua

atividade lucrativa em desarmonia com o ordenamento jurídico em vigor, valendo-se

de seu poder financeiro e da essencialidade do produto que distribui para increpar

aos consumidores inadmissíveis prejuízos e constrangimentos.

O periculum in mora, por sua vez, se faz sentir se salientado

que, se nenhuma providência for adotada, a requerida persistirá ignorando a

Constituição e o ordenamento federal, colocando às escuras lares como instrumento

de coação para a satisfação de suas leoninas exigências, exigindo pecúnia indevida

para restaurar serviços a consumidores que purgaram a mora, impondo, enfim, a

todos eles desnecessário sofrimento consistente na privação de serviço que poderia

ser, com um mínimo de boa vontade, brevemente restabelecido.

Dessas ponderações pode-se recolher a probabilidade de

que a pretensão mereça, ao final, procedência, e, ainda, o perigo da demora, de

sorte a fornecer ao juiz alta dose de segurança para a concessão da liminar

pretendida.

Presentes, na forma demonstrada, os requisitos inerentes à

cautela, o Ministério Público requer o deferimento de liminar para, sob pena de

pagamento de multa não inferior a R$ 500,00 (quinhentos reais) por cada caso de

descumprimento da decisão, determinar à requerida que: (a) se abstenha de cobrar

dos usuários a taxa de religação; (b) constatado o pagamento de tarifa vencida,

proceda à restauração da energia elétrica, em prazo não superior a 4 horas, em caso

de unidade consumidora situada na zona urbana, e em prazo não superior a 8 horas,

em caso de unidade consumidora situada na zona rural; e (c) se abstenha de

ameaçar ou de suspender o fornecimento de energia elétrica a usuários que estejam

questionando administrativamente o valor de pendências tarifárias.

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DO PEDIDO

Ex positis, o Ministério Público requer:

a) Sem prejuízo das penas pelo crime de desobediência

(Código Penal, artigo 330), e, nos termos da Lei Federal n. 7.347/85, artigo 12, do

Código de Defesa do Consumidor, artigo 84, § 4º, e do Código de Processo Civil,

artigos 287 e 461, § 4º, sob a cominação de multa não inferior a R$ 500,00

(quinhentos reais) para cada caso de descumprimento, a concessão de medida

liminar para determinar à requerida que:

1 - se abstenha de exigir dos usuários o pagamento da tarifa

de religação;

2 - constatado o pagamento de tarifa vencida, proceda à

restauração do fornecimento de energia elétrica, em prazo não superior a 4 horas,

em caso de unidade consumidora situada na zona urbana, e em prazo não superior a

8 horas, em caso de unidade consumidora situada na zona rural;

3 - se abstenha de ameaçar ou de suspender o fornecimento

de energia elétrica a usuários que estejam questionando administrativamente o valor

de pendências tarifárias;

b) Na hipótese de deferimento da liminar, a remessa de cópia

da decisão aos postos de atendimento da CELTINS na comarca de Gurupi, para que

seus funcionários e prepostos sejam cientificados da ordem judicial e das

cominações decorrentes de seu descumprimento;

c) Seja a requerida, nos termos do Código de Processo Civil,

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artigo 224, e com as faculdades do artigo 172, § 2º, na pessoa de seu representante

legal, citada para, querendo, contestar a pretensão;

d) A produção de todas as provas em direito admitidas,

máxime o depoimento pessoal do representante legal da requerida, a realização de

perícia, e a oitiva de testemunhas;

e) A publicação do edital a que se refere o Código de Defesa

do Consumidor, artigo 94, para se dar conhecimento a terceiros interessados e à

coletividade, tendo em vista o caráter erga omnes da demanda;

f) A procedência do pedido em todos os seus aspectos para

transformar em definitiva a liminar pleiteada, fixando-se, com fundamento no Código

de Processo Civil, artigo 461, § 4º, e no Código de Defesa do Consumidor, artigo 84,

§ 4º, na sentença, multa para a hipótese de descumprimento dos seus comandos;

g) A condenação da requerida ao pagamento das custas e

despesas processuais e demais consectários decorrentes da sucumbência.

Nos termos do Código de Processo Civil, artigo 258, dá-se à

causa o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Pede deferimento.

Gurupi, 16 de maio de 2.008.

Maria Juliana Naves Dias do CarmoPromotora de Justiça

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