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4 1 IDENTIFICAÇÃO E LEVANTAMENTO DE INFORMAÇÕES 1.1 Propósito O objeto deste planejamento ambiental é a ressocialização dos internos do sistema prisional, em específico o Centro de Observação Penal (COP) situado na cidade de Salvador-BA. 1.2 Informações gerais sobre o tema O sistema prisional brasileiro abarca, segundo os dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) em 2005, 361.402 mil internos, sendo o número de vagas reais de 206.559 mil. A imputação penal que o caracteriza visa o pagamento pelo crime cometido, a prevenção de novos crimes e a reabilitação do indivíduo. Contudo, o que ocorre é uma fragmentação das políticas de ressocialização, sobretudo devido às práticas de preconceito que segregam o indivíduo da sociedade e diminuem a possibilidade de uma construção de outros meios de existência. As condições as quais o sujeito está exposto enquanto presidiário também o afastam dessa possibilidade, tendo em vista o fato de estar privado de liberdade, com um menor espaço para comunicação, exposto à violência tanto por parte dos agentes quanto dos demais detentos, além de haver uma diminuição da rede social e contato afetivo. Tais limitações implicam em uma maior dificuldade de ressocialização, o que possibilita um aumento no índice de reincidência criminal, estimado em 2003 pelo DEPEN em 82%. De acordo com MTJR Penal “a privação da liberdade não ressocializa o detento e consequentemente impossibilita a sua reintegração social, reduzindo então a pena de prisão a um mero e desesperado instrumento de tentativa de redução da violência e criminalidade”. Percebe-se no contexto atual brasileiro que se está diante de um sistema carcerário com grandes necessidades, apresentando uma falta de espaço para a humanização e recuperação do sujeito encarcerado o que resulta numa reinserção desses sujeitos na sociedade realizada de forma inadequada. No contexto da realidade brasileira, a Lei de Execução Penal (LEP) estabelece que a pena privativa de liberdade tenha duas funções:

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1 IDENTIFICAÇÃO E LEVANTAMENTO DE INFORMAÇÕES

1.1 Propósito

O objeto deste planejamento ambiental é a ressocialização dos internos do sistema

prisional, em específico o Centro de Observação Penal (COP) situado na cidade de

Salvador-BA.

1.2 Informações gerais sobre o tema

O sistema prisional brasileiro abarca, segundo os dados do Departamento Penitenciário

Nacional (DEPEN) em 2005, 361.402 mil internos, sendo o número de vagas reais de

206.559 mil. A imputação penal que o caracteriza visa o pagamento pelo crime

cometido, a prevenção de novos crimes e a reabilitação do indivíduo. Contudo, o que

ocorre é uma fragmentação das políticas de ressocialização, sobretudo devido às

práticas de preconceito que segregam o indivíduo da sociedade e diminuem a

possibilidade de uma construção de outros meios de existência.

As condições as quais o sujeito está exposto enquanto presidiário também o afastam

dessa possibilidade, tendo em vista o fato de estar privado de liberdade, com um menor

espaço para comunicação, exposto à violência tanto por parte dos agentes quanto dos

demais detentos, além de haver uma diminuição da rede social e contato afetivo. Tais

limitações implicam em uma maior dificuldade de ressocialização, o que possibilita um

aumento no índice de reincidência criminal, estimado em 2003 pelo DEPEN em 82%.

De acordo com MTJR Penal “a privação da liberdade não ressocializa o detento e

consequentemente impossibilita a sua reintegração social, reduzindo então a pena de

prisão a um mero e desesperado instrumento de tentativa de redução da violência e

criminalidade”.

Percebe-se no contexto atual brasileiro que se está diante de um sistema carcerário com

grandes necessidades, apresentando uma falta de espaço para a humanização e

recuperação do sujeito encarcerado o que resulta numa reinserção desses sujeitos na

sociedade realizada de forma inadequada. No contexto da realidade brasileira, a Lei de

Execução Penal (LEP) estabelece que a pena privativa de liberdade tenha duas funções:

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a punitiva e a recuperativa. Lê - se no Art. 10 que a assistência ao preso e ao internado

é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em

sociedade, mas o que é notável é que o presídio tradicional não tem cumprido seu papel,

focando o seu trabalho na privação de liberdade e na punição dos detentos. (COSTA,

2007)

Para MTJR Penal a pena de prisão não deve ser vista como instrumento de vingança,

pois tem o objetivo de restituir o preso à sociedade, de forma mais humana. Entretanto,

é sabido que a “reeducação” dos presos envolve a coerção, ou seja, utilizar punição ou

ameaça para garantir que o interno se comporte da maneira desejada por quem o está

punindo ou ameaçando.

Dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre principalmente com

a prática de torturas e de agressões físicas. Os abusos e as agressões cometidas por

agentes penitenciários e por policiais ocorrem de forma acentuada principalmente após

a ocorrência de rebeliões ou tentativas de fuga. Após serem dominados, os amotinados

sofrem a chamada "correição", que nada mais é do que o espancamento que acontece

após a contenção dessas insurreições, o qual tem a natureza de castigo. (MTJR PENAL)

Diante da falta de respeito aos direitos humanos básicos, afasta-se a idéia de reinserção

à sociedade já que o sujeito encarcerado distancia-se cada vez mais de uma realidade

digna:

Dessa maneira o que se tem observado é que há uma dificuldade de recuperação dos

indivíduos encarcerados, além de ser perceptível o aumento crescente da violência

urbana no país. O crescente índice de reincidência e o aumento da criminalidade têm

levado as autoridades competentes a ampliar o número de instituições prisionais,

visando minimizar o problema da superlotação e acreditando, dessa maneira, que a

privação de liberdade seria castigo suficiente para conter o comportamento criminal.

Dessa forma, através do recrudescimento da prisionização há um

“incremento da vulnerabilidade do interno perante a sociedade e perante

o sistema punitivo e, consequentemente, um incremento da relação de

antagonismo entre o interno e a sociedade, bem como dos laços que o

prendem ao grupo dos demais internos, enfim,dos marginalizados” (SÁ, 2007, p.19).

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Mas o que se percebe, entretanto, é que o estabelecimento de novas prisões não tem se

mostrado suficiente para garantir a diminuição de atos criminosos, visto que no

estabelecimento da pena da prisão é perceptível a falta de medidas de recuperação,

deixando o detento cada vez mais longe do sonho da reinserção. (MONTEIRO;

COELHO, 2006)

Segundo Monteiro e Coelho (2006) o que parece faltar nas políticas de combate à

violência é o estabelecimento de novos métodos para lidar com a criminalidade, e a

consideração de que o sentenciado às penas privativas de liberdade retornará à

sociedade após um tempo. Dessa maneira é função do Estado ressocializá-lo, o que

exige um questionamento sobre a funcionalidade da prisão. Ou seja, é necessária a

verificação de como tem se dado o processo de encarceramento e que condições são

oferecidas aos detentos, procurando o estabelecimento de ações mais efetivas, fazendo

com que o tempo em que estes se mantêm alheios do convívio social servisse não

apenas como punição, mas como possibilidade de uma re-inserção social.

1.3 Revisão de literatura

Em contextos sociais fechados, como em unidades prisionais, podemos admitir que a

modificação do comportamento criminoso pode trazer resultados satisfatórios,

diferentemente de contextos naturais. Se utilizando disso, alguns analistas

comportamentais planejam e administram programas objetivando uma modificação

comportamental efetiva, devendo esta ser operada devidamente, com ressalvas quanto

aos danos causados aos sujeitos envolvidos.

Segundo Fetal, sem a compreensão das variáveis ambientais que influenciam o

comportamento das pessoas, retrocederemos na área comportamental utilizando a

punição como uma estratégia para combate ao crime. Devemos focar as atenções na

relação do sujeito com o seu meio, sendo ele cultural, econômico e social. O ambiente é

o responsável pelo comportamento, devendo este sofrer alterações.

O primeiro trabalho na área visando à modificação de comportamentos com

delinqüentes adultos ocorreu em Elmore, Alabama. Instalou-se na penitenciária de

Draper, um programa de economia de fichas baseado no esquema de reforçamento

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positivo contínuo ao preso que colaborava com a manutenção do estabelecimento. Esta

incluía tanto a organização pessoal quanto o desempenho no trabalho e estudo. As

recompensas atribuídas ao programa eram contato com televisores, cinema, sinuca,

cigarros, dentre outros (IENNACO, 2010).

Outro programa ocorreu na prisão de segurança máxima de Somers, Connecticut no ano

de 1964. Como uma espécie de “tratamento” destinado aos criminosos sexuais, eram

projetadas numa tela fotos de crianças nuas tiradas de revistas pornográficas. Ao

olharem as imagens, recebiam um choque através de eletrodos presos à parte interior

das coxas. O choque, que funcionava como punição em conseqüência à resposta de

olhar as imagens, liquidaria as fantasias sexuais, a partir da associação com a sensação

de mal-estar. Esse método se utiliza da punição visando a diminuição dos

comportamentos sexuais de pedófilos, entretanto desconsidera-se os danos causados ao

grupo além dos efeitos deletérios da utilização da mesma, acima descritos (IENNACO,

2010).

Em 1972, com base no modelo intitucional da penitenciária de Patuxent de Maryland

foi idealizado o “Tratamento Especial e Treinamento de Reabilitação” para presos

agressivos, em Springfield, Missúri. Eram introduzidos num ambiente estratificado,

cada qual com responsabilidades e privilégios específicos. Iniciava-se em confinamento

solitário, onde o detento deveria conquistar sua liberdade paulatinamente, adequando o

seu comportamento ao regulamento da penitenciária. A cada transferência de nível, era

recompensado com maior conforto. Para alcançar o último nível, deveria demonstrar

capacidade de controlar o comportamento agressivo. Este modelo mereceu ressalvas em

meio a acusações de seleção e tranferência forçada dos participantes, assim como a

utlização de punições e violação de direitos constitucionais, tendo sido abandonado em

1974 (IENNACO, 2010).

No livro “A New Learning Environment”, Cohen e Filipczak, descrevem um projeto

aplicado no Texas que teve como objetivo criar um ambiente de aprendizagem para a

prisão, com redução significativa do índice de reincidência no Estado.

Segundo Fetal apud Sidman (1995), o projeto proporcionou cursos de leitura básica,

escrita, conversação, cálculo e memória, dentre outras habilidades mais avançadas. Os

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cursos iam preparando o aluno para os próximos, e eram exigidas notas altas para que

pudessem avançar. Ninguém era forçado a participar nem utilizava-se de punição para

quem preferisse a rotina usual da prisão. De início, para que os internos tivem acesso

aos benefícios que as habilidades podiam trazer foram utilizados reforçadores artificiais

até que fossem substituídas por conseqüências mais naturais.

Os detentos eram pagos para aprender e conseguiam um espaço privativo quando

atingiam notas altas. Nesse espaço continha uma mesa, uma cadeira, uma prateleira de

livros e uma lâmpada. O espaço poderia ser equipado a partir dos créditos para comprar

objetos numa loja como mobílias, enfeites de parede, aparelhos de som, TV e

posteriormente chamadas telefônicas, visitas privativas de parentes e amigos,

privacidade e passeios externos supervisionados. O pagamento do aprendizado

proporcionou a relação da escola como um outro trabalho, que estava disponível para

todos os internos. Ao sairem da prisão, estavam aptos a fazer coisas que tornavam

novos reforçadores disponíveis, favorecendo a diminuição da reincidência.

No Brasil, existiram algumas intervenções com o objetivo de recuperar o sujeito que

cometeu um ato anti-social, uma alternativa apresentada é o método utilizado pelo

Centro de Reintegração Social (CRS) preconizado pela Associação de Proteção e

Assistência aos Condenados (APAC).

O método APAC, idealizado por Mário Ottoboni em 1972, visa ao resgate do humano

intrínseco ao criminoso por meio do incentivo à supressão do crime e do fornecimento

de condições necessárias ao processo de humanização e, portanto, recuperação dos

encarcerados (OTTOBONI apud COSTA, 2007).

Segundo Costa (2007) a filosofia da APAC sugere que se mate o criminoso e salve o

homem presente nos sujeitos anti-sociais por meio da valorização humana, do trabalho,

do convívio com os familiares (em dias de visita e aniversários), e, em especial, por

meio do discurso religioso que é um dos principais fundamentos do método. O método

tem como propósito evitar a reincidência no crime e oferecer alternativas para o

condenado se recuperar. Ottoboni (apud COSTA, 2007) afirma que o método tem uma

tripla finalidade: é órgão auxiliar da justiça, protege a sociedade e é um órgão de

proteção aos condenados

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A APAC tem como finalidade desenvolver no presídio, uma atividade relacionada com

a recuperação do preso, buscando suprir a deficiência do Estado nessa área, atuando na

qualidade de Órgão Auxiliar da Justiça e da Segurança na Execução da Pena. É,

portanto, um modelo de penitenciária que busca, através de sua filosofia, resgatar o

humano intrínseco ao criminoso. (COSTA, 2007)

Segundo Ottoboni (apud COSTA, 2007) o método APAC proporciona ao condenado

co-responsabilidade pela sua recuperação, tendo como aliados assistência espiritual,

médica, psicológica e jurídica, todas essas prestadas pela comunidade. A metodologia

aplicada fundamenta-se no estabelecimento de uma disciplina rígida, que tem como

características o respeito, a ordem, o trabalho e o envolvimento da família do

sentenciado. A organização se mantém atualmente por meio de contribuições mensais

de seus sócios, de algumas doações e de convênio com o Poder Público. Para que o

preso possa ser transferido para a APAC é necessário que haja uma autorização judicial.

Hoje, segundo o Superior Tribunal de Justiça-STJ- (apud COSTA, 2007), se tem mais

de cem unidades pelo Brasil e em diversos países no mundo, tais como Canadá,

Argentina, Estados Unidos dentre outros. Segundo Alves (apud COSTA, 2007) o índice

de recuperação dos que se submetem ao método APAC é de 91%. Já nos modelos

tradicionais o índice é de 15% de recuperação.

Apesar de existirem intervenções como o método APAC existe uma grande carência

desse tipo de atuação no cenário prisional brasileiro. Ciente disso e dos efeitos

negativos da punição - adotada em larga escala no Brasil - bem como da grande

reincidência de crimes, propõe-se nesse trabalho um planejamento ambiental para o

desenvolvimento de competências que favoreçam a ressocialização dos internos

residentes no Centro de Observação Penal na cidade de Salvador, Bahia.

1.4 Objetivos comportamentais úteis

1.4.1 Objetivo Geral

- Desenvolver competências que favoreçam a ressocialização dos internos residentes no

Centro de Observação Penal na cidade de Salvador.

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1.4.2 Objetivos Específicos

- Diminuir comportamentos agressivos ou anti-sociais dos internos nas dependências da

instituição;

- Aumentar comportamentos pró-sociais dos internos, como comunicação, cooperação,

responsabilidade, respeito e percepção das conseqüências de suas ações;

- Aumentar a socialização entre os internos do COP;

- Favorecer o aumento da participação social dos internos (compras, voto, trabalho,

acesso à informação).

1.5 Visão sobre o tema (prognose)

1.5.1 Análise de viabilidade

DISCRIMINAÇÃO DA DESPESA VALORES

ESTIMADOS

Material de Construção (cimento, tijolos, pás, etc)

R$1460,00

Bolas de Futebol de Salão

R$120,00

Uniformes de time de Futebol R$ 250,00

Material para Artesanato

R$1200,00

Painel de Cumprimento de Pena e fichas

R$120,00

Itens para Comércio Interno

DOAÇÃO DE INSTITUIÇÃO

RELIGIOSA

Material para Horta (Sementes, Regadores, Pás, Adubo,

mangueira)

R$1230,00

TOTAL R$4.380

2 Análise da situação

Comentado [G1]: Esse itens serão apenas arrecadados??? Não serão também comprados???

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2.1 Determinação da seqüência de análise

2.1.1 Método de análise

Anteriormente à coleta de dados, foi feito o contato com o diretor do Centro de

Observação Penal, para que ele pudesse autorizar e agendar as visitas de acordo com os

horários possíveis. O procedimento de coleta empregado teve como base a realização de

entrevistas semi-dirigidas com profissionais que trabalham no COP (diretor, assistente

social e agente penitenciário). As entrevistas foram gravadas após a autorização dos

entrevistados (ANEXOS 1, 2 e 3). Isto posto, o procedimento para análise de dados foi

feito mediante a transcrição das gravações das entrevistas e a conseqüente análise do

conteúdo das mesmas, observando-se, sobretudo, a descrição das principais demandas

da instituição. Além das entrevistas, houve uma conversa informal com quatro internos

da instituição que expuseram um pouco do trabalho artesanal que realizam e falaram

sobre como este trabalho é realizado dentro da instituição.

2.1.2 Resultados

As instituições prisionais de Salvador compreendem: presídios, penitenciarias,

manicômio e Colônia Agrícola, nos quais se concentram agrupamentos de pessoas que

convivem em comunidade, dando origem a um sistema social controlado e vigiado

dentro de uma sociedade livre. Esses estabelecimentos são dotados de leis e regras

próprias, que englobam finalidades em comum, como o confinamento, punição,

intimidação, ordem interna e regeneração ou reinserção na sociedade.

O Centro de Observação Penal (COP) foi inaugurado no ano de 1991, situado no

Complexo Penitenciário no bairro de Mata Escura, abriga condenados ao cumprimento

de pena privativa de liberdade em regime fechado. Com capacidade para 48 internos, o

COP custodia nos dias de hoje entre 103 e 105 presos. No Centro são realizados exames

criminológicos e de classificação, para remanejar ou não a progressão ou a regressão do

regime de execução da pena dos internos.

De acordo com os profissionais da instituição (diretor, agente penitenciário e assistente

social), não há um índice considerável de reincidência no Centro de Observação Penal.

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Além disso, não há um grande número de violência ou comportamentos agressivos. Há

uma valorização e prática do respeito, tanto no que se refere aos internos entre si,

quanto entre eles e os profissionais da instituição. Ainda que funcionários, como o

agente penitenciário, precisem mostrar autoridade, isso é feito de forma respeitosa e a

resposta é mútua, havendo um seguimento das regras e normas estabelecidas.

(ANEXOS 1 e 2)

Segundo a assistente social e o diretor da instituição, há um alto índice de reincidência

em outras penitenciárias, sobretudo, em virtude do tráfico de drogas.

“Ah, existem vários, mas o que domina é o tráfico. Ele precisa continuar com

o vicio dele e o que alimenta isso é o roubo. Aí quando ele chega lá fora, não

encontra emprego fácil, precisa alimentar seu vício e aí, vamos reincidir... É

a característica maior, por exemplo, do presídio de Salvador. Eu venho de

lá, tenho poucos meses aqui, e lá é essa característica. Mas aqui você não

percebe isso por causa da característica da unidade”. (Assistente Social)

No COP essa realidade se diferencia pelos próprios perfis dos internos. Tratam-se, nesse

caso, de ex-policiais, idosos e detentos em risco de vida. Dessa forma, torna-se mais

difícil a reincidência. Uma característica da unidade é a divisão dos internos em

galerias, de acordo com cada uma das especificidades supracitadas.

A partir das entrevistas e diálogos realizados, foi possível ainda identificar as maiores

demandas da instituição, que se referem à falta de estrutura e necessidade de projetos

que envolvam a possibilidade de ressocialização – como cursos e oficinas

profissionalizantes – estando uma interligada à outra. Isto é, a própria falta de estrutura

e espaço dificulta a inserção de projetos dessa espécie. Tal defasagem se dá, entre outros

aspectos, pela própria origem da unidade, que foi criada com o intuito de ser um centro

de observação e acabou se tornando praticamente uma penitenciária, mas sem uma

estrutura adequada para isso.

Foi visto ainda que alguns internos do COP realizam atividades artesanais dentro da

instituição, como confecção de luminárias, bolsas, bonés e objetos como porta-jóias

feitos com sabonete. As pesquisadoras conversaram com quatro deles e seus produtos

foram mostrados para as mesmas.

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Tendo em vista o que foi exposto, foram discutidas as principais demandas da

instituição, com base no objetivo do planejamento – pautado no desenvolvimento de

competências que favoreçam a ressocialização dos internos – e, a partir daí, formulados

planos de ações para a operacionalização do projeto.

3 Alvos a atingir

3.1 Plano de ações

- APRESENTAÇÃO DO PROJETO DE INTERVENÇÃO

O trabalho desenvolvido no COP terá início com a apresentação pessoal das

facilitadoras, dos internos e com a apresentação da proposta de intervenção. Serão

apresentados os objetivos do planejamento ambiental e o programa de atividades

propostas. Uma delas será a implementação do sistema de fichas, cuja opinião dos

internos será consultada, tanto para adequar o programa às necessidades deles, quanto

para estimular a participação dos mesmos. Após a apresentação, eles poderão tirar

dúvidas sobre as propostas, e sugerir modificações. Será analisada a viabilidade das

sugestões para que sejam incluídas ao longo do processo de intervenção. Só serão

aceitas sugestões que estejam de acordo com as normas da instituição.

- IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE FICHAS

O sistema de fichas foi criado com o objetivo de estimular a participação dos internos

nas atividades propostas, reforçando arbitrariamente comportamento pró socias através

de pontos que serão trocados por recompensas, a saber: objetos materiais necessários

para eles.

Esse sistema consiste em um determinado número de fichas que cada interno obterá,

pela inscrição e cumprimento de qualquer uma das atividades propostas no

planejamento ambiental. Cada atividade terá um valor de fichas correspondente. O

valor varia de 2 a 10 fichas por tarefa cumprida, podendo o interno se envolver em

diversas tarefas. Os internos não receberão as fichas. Elas serão contabilizadas e

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depositadas em uma espécie de fundo monetário fictício. Cada interno terá um extrato

de fichas, no qual constará uma lista com seu saldo, e as atividades que foram realizadas

para aquisição das mesmas. As fichas poderão ser trocadas semanalmente por objetos

fornecidos pelo mercado interno do COP. A troca semanal não é obrigatória, podendo o

interno acumular fichas e trocá-las no momento que for oportuno. Entretanto, as fichas

só poderão ser trocadas por objetos do mercado interno do COP, não sendo possível

trocá-las por dinheiro. Só receberá as fichas quem tiver realizado a inscrição na

atividade de interesse, bem como tê-la executado.

Estarão disponíveis no mercado interno os seguintes objetos:

- Objetos de higiene pessoal (sabonete, creme dental, shampoo, condicionador, entre

outros);

- Calçados;

- Bonés;

- Jogos;

- Revistas;

- Livros;

- Cigarro;

- Cd’s;

- Aparelho de som;

- Vale refeição (cesta com ingredientes de alguma refeição diferenciada).

Os objetos do mercado interno serão arrecadados através de doações da comunidade, e

Instituições religiosas, e estarão de acordo com as normas do COP. Não serão aceitos

nem disponibilizados aos internos celulares, objetos cortantes e qualquer coisa que

esteja fora do permitido pela Instituição.

Segue abaixo o número de fichas correspondente às atividades propostas:

Atividade Número de fichas por

interno

Inscrição no COPeonato de Futebol 2

Vitória do COPeonato de futebol 10

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Inscrição como aluno no Ensino COPerado 2

Inscrição como professor no Ensino COPerado 5

Inscrição na atividade de Artesanato 10/dia

Inscrição na atividade da horta do COP 10/dia

Inscrição na atividade de limpeza do COP 10/dia

Inscrição na atividade de construção de uma sala 10/dia

Obs: O produto do artesanato será vendido e o dinheiro será depositado na poupança

que cada interno do COP já possui, ou poderá ser destinado à família do interno, caso

ele opte por isto. Além disso, a participação nas atividades laborativas (horta, limpeza,

construção e artesanato) acarretará na redução de pena do interno. Três dias

participando das atividades reduzirá um dia na pena do interno. Será construído um

painel visível a todos, para que cada interno acompanhe a quantidade de dias de pena

que ele reduziu, decorrentes de seu envolvimento nas atividades. Esse painel pode

reforçar negativamente o comportamento do interno de trabalhar, caso o observado no

painel seja associado com o trabalho realizado pelo interno. Cada visualização poderá

levar o interno a trabalhar mais para reduzir os dias de sua pena.

- OFICINAS COPERE

Visando o aumento de comportamentos relacionados à comunicação, cooperação,

responsabilidade e participação social dos internos será proposta as Oficinas COPere,

que consistem em, uma vez por semana, um interno se responsabilizará por ensinar para

os demais interessados alguma competência que tenha domínio. Podendo abarcar de

esportes (capoeira, futebol e basquete) a aprendizados de artesanato ou pintura.

Primeiramente serão realizadas as inscrições dos interessados em ministrar as oficinas.

Essas serão divulgadas para que os demais internos interessados possam se inscrever

para assisti-las. O prazo de inscrições para novas oficinas estará sempre aberto e caso

haja alguma semana sem oficina inscrita as facilitadoras irão utilizar esse horário para a

realização de reuniões com os internos visando ouvir opiniões e críticas acerca do

trabalho que está sendo realizado.

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Nesta atividade será utilizado reforço arbitrário, que serão as fichas, sendo cinco para

quem se habilitar a ministrar as oficinas e duas para os que se interessarem por

participar. Essas fichas serão utilizadas, posteriormente, para troca por recompensas.

Através destes reforços acredita-se que comportamentos relacionados à cooperação,

comunicação, responsabilidade e o aprendizado de novas competências possam se

tornar naturalmente reforçadores.

- COPEONATO DE FUTEBOL

Uma das atividades proposta será um campeonato de futebol, com o tema:

“COPeonato”. Serão formados times com escolha aleatória e o campeonato contará com

a participação de um juiz. As regras serão diferenciadas e incluirão tanto os jogadores

em campo, quanto a torcida. A tabela de pontos do campeonato vai ser preenchida ao

final de cada jogo.

· O time que tiver um cartão vermelho estará com três pontos negativos.

· O time que tiver um cartão amarelo estará com dois pontos negativos.

· Cada comportamento agressivo verificado pelo juiz com ajuda das bandeirinhas

(facilitadoras), tanto dentro como fora de campo pela torcida, o time estará com um

ponto negativo.

· O gol valerá dois pontos na tabela.

Essa atividade tem como objetivo contemplar a socialização, diminuição da

agressividade e o desenvolvimento de comportamentos pró-sociais como cooperação e

respeito. Vale ressaltar que os sujeitos terão opção de escolher em participar ou não do

campeonato, que resultará no total de 2 fichas para todos os inscritos e 10 fichas para

cada jogador do time vencedor, podendo ser trocado por produtos disponibilizados no

mercado interno.

As fichas serão utilizadas como reforços arbitrários e a troca pelos produtos do mercado

interno, recompensas. O reforço natural será advindo pela própria vitória do time.

- COP&Arte

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Provando a importância do labor e sua relação com a ressocialização, será proposta uma

oficina profissionalizante de produtos artesanais, inicialmente tapetes. As inscrições

para este programa serão opcionais, podendo ser feitas com as facilitadoras ou assistente

social, e valerão 10 fichas por dia de trabalho, posteriormente utilizadas na compra de

produtos no mercado interno.

Os materiais para confecção dos tapetes serão disponibilizados pelo Governo e estes

estariam à venda no Instituto Mauá, em parceria com a Unidade. A renda dos produtos

seria revertida para uma poupança individual onde os internos poderão optar por poupar

o dinheiro num programa já existente no COP, ou doar para a família. Além disso, os

dias de trabalho serão contabilizados no Programa de Redução da Pena, onde três dias

de trabalho equivalerão a menos um dia de pena, podendo ser acompanhado numa

Tabela visivelmente localizada no pátio.

As etapas do processo estarão divididas de modo que o produto final só se concretizará

com ajuda e eficiência de todos. Assim, os comportamentos pró-sociais como a

cooperação, comunicação e responsabilidade, serão imprescindíveis para a finalização

do trabalho. Do mesmo modo, o trabalho interno, venda e consumo fomentarão o

aumento da participação social dos internos.

Serão utilizados reforços arbitrários como as fichas (positivo) e tabelas de redução da

pena (negativo), assim como recompensas através do consumo de produtos no mercado

interno. Espera-se, entretanto, que após a saída dos internos, esses comportamentos

necessários para a produção tornem-se naturalmente reforçadores.

- HORTA

Tendo em vista o aumento de comportamentos pró-sociais, como cooperação e

percepção das conseqüências de suas ações, além da importância do trabalho como

meio de participação social e ressocialização, será proposta a realização de uma Horta

na instituição. As plantações deverão ser feitas por aqueles que se interessarem pela

atividade e valerão 10 fichas por dia de trabalho, posteriormente utilizadas na compra de

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produtos no mercado interno. Os produtos da horta serão destinados à cozinha da

instituição para o uso de todos.

O espaço da horta poderá ser utilizado simultaneamente por determinado número de

internos, devendo haver um rodízio entre eles para o cultivo. Os materiais e ferramentas

disponíveis serão limitados e eles deverão negociar e trocar entre si de forma

democrática e sem emitir comportamentos de agressividade.

Os comportamentos necessários para realização da atividade da horta formam uma

metacontingência, pois envolvem a colaboração de todos nos processos de preparação

da terra, escavação, plantação, cuidado e colheita, tendo em vista que haverá um rodízio

e cada um se responsabilizará por dar continuidade ao trabalho dos demais para que se

atinja um produto final em comum. Assim, favorecem os comportamentos pró-sociais

referidos, além de aumentar a participação social no âmbito laboral.

As fichas adquiridas funcionariam como um reforço positivo arbitrário e a aquisição dos

produtos para uso comum funcionaria como reforço positivo natural.

- LIMPEZA:

Atualmente no COP já existem internos cuidando da limpeza do local. Geralmente são

os internos considerados de bom comportamento. Em troca do que fazem, de acordo

com a assistente social, passarão a receber a redução de pena. A proposta agora é que

além de redução de pena, internos que se inscrevam para a parte de limpeza ganhem 10

fichas por dia de trabalho. Essas fichas funcionam como reforço arbitrário e podem ser

trocadas por produtos do mercado interno. A oportunidade de participar das atividades

de limpeza não será restrita a internos de bom comportamento, entretanto, espera-se que

o interno que se engajar respeite as normas da Instituição e não aja com agressividade.

O objetivo da atividade é favorecer o aumento da responsabilidade, cooperação e

comunicação entre os internos. Será formado um grupo de pessoas para limpar o COP, e

a quantidade delas dependerá da área que necessita ser higienizada.

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- CONSTRUÇÃO

Com o objetivo de aumentar a participação social dos internos por meio do trabalho

assim como promover comportamentos pró-sociais, como cooperação, responsabilidade

e percepção das conseqüências de suas ações será proposta a construção de uma sala na

instituição, que posteriormente poderá ser usada como um espaço para a execução de

oficinas de projetos, inclusive governamentais, que também envolvam a possibilidade

de ressocialização.

Os internos deverão se organizar em grupos e dividir os responsáveis por cada etapa da

construção. Poderá haver um rodízio de participantes assim como de materiais, devendo

ser promovida uma troca e negociação dos recursos disponíveis. Durante toda a

atividade e negociação, deverá ser prezado o respeito e a não-emissão de

comportamentos de agressividade.

Além da redução de pena, os internos que participarem da construção receberão 10

fichas por dia de trabalho, como reforço arbitrário, podendo ser trocadas por produtos

do mercado interno. Ademais, a ampliação do espaço da instituição como produto final

(a sala construída), funcionaria como reforço positivo natural, podendo favorecê-los –

assim como a futuros internos –, a longo prazo, com a viabilidade da implantação de

maiores projetos.

3.2 Sistema de monitoramento

Durante todo o processo, os sujeitos envolvidos (internos e instituição) poderão propor

sugestões e reclamações acerca do projeto desenvolvido. Levando em consideração que

pode não haver uma comunicação verbal direta devido à grande exposição do emissor,

haverá uma urna no pátio em que todos poderão, anonimamente, opinar. Visando

alcançar a todos, nos papéis serão impressos smiles (ANEXO 6) com expressões

variadas de modo a facilitar a avaliação, além de espaços para a escrita.

Será feita uma eleição para escolha de um representante em cada galeria, que funcione

como o porta-voz do grupo. Este líder deverá comunicar às facilitadoras, toda e

qualquer manifestação do público acerca do projeto.

20

Ao final de toda atividade proposta haverá um espaço de diálogo onde será sugerida

uma avaliação individual, avaliação do grupo, além dos objetivos que foram propostos e

os que foram realmente atingidos. Isso acontecerá também passado um tempo do início

dessas atividades, para que sejam constatados os pontos positivos e negativos da

intervenção. Caso sejam desenvolvidos os comportamentos pró-sociais desejados, e haja

uma menor freqüência de agressividade, o planejamento ambiental obterá êxito.

Além disso, as facilitadoras aplicarão a escala de agressividade traduzida e adaptada

(ANEXO 5), com intuito de verificar se, de fato, houve uma diminuição de

comportamentos agressivos nos internos. Para tal, a escala seria aplicada duas vezes: no

início e no final do projeto, que irá durar cerca de seis meses. Essa escala auxiliará na

verificação da presença ou ausência de comportamentos agressivos ('Inventário CBCL

de Achenbach na Escala de Comportamento Agressivo - Adaptado'). Os itens do

questionário serão lidos em voz alta pelas facilitadoras a fim de atingir a todos. Ao final

da apuração dos dados, estes serão revelados e discutidos no grupo, evidenciando o

índice de comportamentos agressivos. O grupo deverá listar alguns dos comportamentos

que consideram agressivos com ajuda das facilitadoras.

21

REFERÊNCIAS:

BRIGUENTI, E. Uma Apreensão Crítica Do Cárcere Feminino: A Intervenção Do

Serviço Social Á Luz Da Liberdade. Disponível em:

http://www.buscalegis.ccj.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/33496/32652 >

Acesso em 27 de agosto de 2010.

CANTO, Dilton Ávila. Regime inicial de Comprimento de Pena Reclusiva ao

reincidir. Dissertação em Mestrado de Direito, 2000 Disponível em:

<http//www.margen.org/margen29/medeir.html>Acesso em setembro de 2010.

COSTA, L. PARREIRAS, A. APAC: Alternativa na Execução Penal. Disponível em:

<http://www.carceraria.org.br/fotos/fotos/admin/SistemaPenal/SistemaPenitenciario/Apac_alter

nativa na execucao penal.pdf> Acesso em 16 de agosto de 2010.

FETAL, L. Direito e Análise do Comportamento: Evidências Científicas contra o uso

exclusivo da coerção no sistema penal. Disponível em

<www.facs.br/revistajuridica/edicao_outubro2008/discente/dis4.doc > Acesso em 15 de agosto

de 2010.

IENNACO, R. Behaviorismo e criminologia: controle do comportamento desviante.

Disponível em

<http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/11672/11237 >

Acesso em 15 de agosto de 2010.

DEPEN. Departamento Penitenciário Nacional. In.: Ministério da Justiça. Disponível

em: <http://portal.mj.gov.br/depen/data/Pages/MJC4D50EDBPTBRNN.htm> Acesso

em 17 de agosto de 2010.

MONTEIRO, L. COELHO, M. Percepções do Cárcere. Disponível em <

http://revistas.unifacs.br/index.php/sepa/article/viewFile/49/43> Acesso em 18 de agosto de

2010.

PENAL, MTJR. O Sistema prisional brasileiro. Disponível em: < http://www.radialcuritiba.edu.br/pdf/ARTIGO_SISTEMA_PRISIONAL_BRASILEIRO_PSEU

DONIMO_MTJR_PENAL.pdf. Acesso em 21 de agosto de 2010.

PEREIRA JÚNIOR, Paulo Roberto Cardoso; BOREAU, Tatiana Pereira; Ferreira,

Tiago Alfredo da Silva. Análise Funcional do Centro de Observação Penal. Disponível

em < http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/TL0128.pdf> Acesso em 15 de agosto de

2010.

SKINNER, B. F. Ciência e Comportamento Humano. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

ANEXOS

22

ANEXO 1

Entrevista com o diretor da Unidade

Entrevistadora: Como é a relação entre os internos do COP?

Diretor: A relação do sistema penal geralmente é de conflito de poder, o grupo que tem

o maior poder e mais destaque começa a se agrupar e começa a maltratar os outros.

Aqui no COP, como a quantidade é menor, em média 40 divididos por galerias, o poder

não fica muito aparente, quando tentam se destacar, tentamos amenizar mas sempre

aparece.

Entrevistadora: Como é a relação dos internos com os agentes penitenciários?

Diretor: A relação com os agentes aqui é de respeito e de confiança porque os internos

só têm ao agente para recorrer. O conflito é mínimo. A violência aqui é a menor

possível, é mínima em comparação com as outras. Sempre há um tapa em um e ao

outro, mas nada que chegue ao nosso conhecimento.

Entrevistadora: Os internos são violentos entre si?

Diretor: É difícil definir se são ou não violentos, mas na realidade do sistema são na

maioria violentos. A violência impera com bastante freqüência.

Entrevistadora: Existem agrupamentos aqui no COP?

Diretor: Sempre que existe procuramos separar para que não haja. Quando vemos um

muito amigo do outro, mudamos de galeria para evitar maiores problemas de poder.

Entrevistadora: Existe reincidência aqui no COP?

Diretor: A reincidência no nosso caso é mínima porque os ex-policiais militares não

reincidem, tem um amparo social maior. Os idosos são mais velhos, existem casos, mas

é mais difícil. Os presos que correm risco de morte já vem condenados, tendo que

cumprir muitos anos de cadeia.

Entrevistadora: A que se deve a dificuldade de ressocialização?

Diretor: Primeiro a falta de estrutura familiar, financeira e o apoio do estado. Tem

alguns projetos aqui na secretaria que dão acompanhamento a estudos, profissão, e

também acompanhamento lá fora para que não retornem. A realidade é que a maioria

não tem oportunidade de estudar, a camada mais pobre, mais carente.

Entrevistadora: Já existiram programas aqui?

23

Diretor: Já teve um relacionado à educação, um outro com educação e trabalho e outro

com acompanhamento quando os internos saiam daqui, porque muitos saem

desamparados, voltam à periferia e ao crime.

Entrevistadora: O que define a mudança de regime?

Diretor: Podem ser condenado ao regime aberto, semi-aberto ou fechado. Este grupo

geralmente se encontra em presídios, que cometeram crimes mais graves. Caso tenham

bom comportamento, não tiverem histórico de reincidência, pode haver alteração de

regime. No aberto geralmente eles trabalham e no semi tem liberdade restrita, podem

sair, trabalhar e retornar. Muitos voltam, outros não, os que não mereciam ter saído.

Entrevistadora: Qual o maior problema do COP?

Diretor: O COP é uma unidade diferenciada, e o problema maior é de ordem estrutural.

O resto conseguimos manter até por ser uma unidade pequena.

Entrevistadora: Como é a equipe do COP?

Diretor: Temos aqui uma psiquiatra que vem duas vezes no mês, um médico que faz

acompanhamento, uma enfermeira e uma assistente social.

24

ANEXO 2

Entrevista com o agente penitenciário

Data: 23/09/10

Entrevistadora: Como é o seu trabalho?

Agente: Primeiro, a gente toma conta da segurança, tanto nossa como dos internos

também, né, e o que precisar pra entrevista com assistente social, acompanhar visita de

família tudo que tiver, com relação a interno, nós fazemos também, acompanhamos.

Entrevistadora: Mas, você diz assim, quando precisa sair também, ou quando a família

vem pra cá?

Agente: Não, quando a família vem pra cá. Aí a gente... Cadastra a família, revista o

que tiver de refeição pra eles, algum alimento, algum produto de (não entendi essa

parte) algum parente, depois, nós encaminhamos pra lá pro pátio...

Entrevistadora: Ah, vocês vão para o pátio...

Agente: É, nós ficamos também no pátio, nós acompanhamos toda a movimentação.

Entrevistadora: São quantos agentes aqui?

Agente: Por plantão em média de dez pessoas por plantão.

Entrevistadora: E dá conta?

Agente: Tem que dá conta, né, porque o número não é tão grande de agentes, mas tem

que dar conta, né.

Entrevistadora: Mas, no caso, plantão de quantas horas?

Agente: De 24h.

Entrevistadora: E faz quantos anos que você trabalha aqui?

Agente: 13. Eu sou um dos mais novos.

Entrevistadora: Mas o senhor já trabalhou em outros...?

Agente: (Interrompeu a entrevistadora): Não.

Entrevistadora: E assim, como é que é o relacionamento entre os internos?

Agente: De respeito é... São...existe é..., determinação, existe leis internas e leis

externas também, do Direito Penal, né, a gente respeita essas normas internas e eles

também respeitam, agora quando há uma quebra disso aí, aí é, aí não anda, né, aí já tem

alguma coisa que gente tem que adequar, né, voltar pras normas de novo, tanto é que cê

vê aí, alguma coisa que mude, eles já adéquam a norma aí, tá aí na portaria, né.

25

Entrevistadora: Mas o que seria essa portaria exatamente?

Agente: O que é... É os internos, um respeitar o outro, não se agredirem, tem que

respeitar a lei de execuções penais... Os direitos que eles têm, alimentação, visita, é.

Entrevistadora: Mas isso realmente ocorre? Esse respeito...

Agente: Ocorre.

Entrevistadora: E quando não ocorre, o que tem que fazer? Qual é a saída, digamos

assim?

Agente: Ahh, aí já seria em vias de comunicar ao juiz , se for uma queixa, né, vai pra

delegacia prestar queixa, como se fosse na rua, você não vai, infringiu a lei, você tem

que responder por ela, né.

Entrevistadora: Mas é normal ocorrer algum tipo de violência, não necessariamente

um ao outro, mas em relação à Instituição mesmo?

Agente: Aqui é muito difícil, aqui nunca ocorreu assim, não, já ocorreu surto, alguns

malucos dão surtos aí, mas, sempre ocorre alguma discussão, alguma coisa, agora não é

muito comum não, porque você quando segrega alguma turbulência há.

Entrevistadora: E aí quando ocorre esse tipo de briga, de confusão, qual é o, digamos,

o protocolo?

Agente: Apurar, apurar o que foi que houve, tomar algumas medidas, se for pra ir pra

delegacia, alguma coisa a mais, vai e apura, separa, tira do convívio...

Entrevistadora: E vocês ficam no pátio durante o tempo que eles ficam fora?

Agente: Talvez seja a única... Unidade no Brasil que o agente ainda está dentro do

pátio, talvez, não tenho certeza, não.

Entrevistadora: Por que normalmente eles ficam onde?

Agente: Porque agora, é...Botam monitoramento, e o agente fica do lado de fora, aí só

vai na hora de (interrupção da gravação).

Entrevistadora: E você vê aqui muito caso de reincidência?

Agente: Se você for na execuções penais ele pode te dizer, tem um histórico lá e acho

que a reincidência é total porque a reincidência aqui é alarmante, é grande, às vezes os

internos saem e não acha o que fazer na rua, aí volta.

Entrevistadora: E aqui tem algum espaço onde eles realizam atividades?

Agente: Não tem um galpão, não tem nada, um trabalho laborativo, é, um espaço pra

não só eles arrumarem alguma coisa pra fazer, mas também estudarem.

Entrevistadora: Nem no pátio daria?

26

Agente: É pequeno. Já teve projetos aqui, mas... Foi, mas num anda porque a

rotatividade aqui também é grande, não passa muito tempo aqui e vai pra outro.

Entrevistadora: É? Por quê?

Agente: Aqui era Centro de Observação Penal, só tinha exame criminológico, mas ele

vem perdendo essa característica há muito tempo, hoje... Não funciona mais como isso,

mas a rotatividade ainda é grande.

Entrevistadora: Então o intuito daqui era ser então só isso?

Agente: É, no início, quando eu vim trabalhar aqui era Centro de Observação Penal, era

exame criminológico, tinha uma equipe toda técnica, pra isso aí, não é mais, mas a

rotatividade é grande.

Entrevistadora: E esse exame criminológico, como é?

Agente: É o exame que passa por vocês, que é da área de Psicologia, pra ver o perfil

criminológico, todo aquele, é, psiquiatra, psicanalista, tinha tudo aqui.

Entrevistadora: Hoje qual a média de tempo que eles ficam por aqui normalmente?

Agente: Pra eu achar uma média fica difícil, pode ser que leve meses, pode ser que leve

até anos, mas muitos levam meses e passam anos aqui e vai ficando, e aí volta pra

unidades de origem.

Entrevistadora: O diretor comentou com a gente que alguns que correm risco de vida

também ficam aqui. E idosos e...

Agente: (Interrompeu a entrevistadora) É, vem pra cá, depende das características de

cada um.

Entrevistadora: E eles convivem entre si?

Agente: Convivem porque aqui tem galeria A, B e C. É... Abre-se em horários

diferentes, hoje é visita, mas é em alas separadas, praticamente não se encontram muito

não.

Entrevistadora: Mas quando se encontram não há muito problema, não?

Agente: Não, nada.

Entrevistadora: E nos que ficam na mesma ala, há uma comunicação entre todos os

presos? Eles interagem?

Agente: Da ala, se for uma ala superior com uma inferior, não há, não, a não ser como

um dia desse aqui.

Entrevistadora: Não? Mas por exemplo, tem dias que eles vão pro pátio, né? Cada um

vai em um horário,aí vamos supor, tem a A... A A é de idosos?

27

Agente: Não, é misturado, às vezes corre o risco de ficar mais em uma galeria que em

outra, mas mistura, aí não dá, o espaço físico não dá pra você separar muito não.

Entrevistadora: Então as galerias ficam dividias em relação a o que, exatamente?

Agente: Quem vai chegando vai ficando e aí vai separando entre A e C, B, aí por

comportamento.

Entrevistadora: Como você faz pra mostrar autoridade?

Agente: Eu procuro dar respeito, não precisa muita coisa não, porque tem regra, eu sigo

minha regra, eles seguem as regras deles.

Entrevistadora: Então há essa coisa de respeito?

Agente: Há, há.

Entrevistadora: Isso é uma coisa só sua ou com todos?

Agente: Com todo mundo é assim.

Entrevistadora: Isso realmente funciona?

Agente: Funciona, eles obedecem.

Entrevistadora: O que você acharia que seria uma boa idéia para trabalhos

relacionados à profissão que trouxessem o interesse dos internos?

Agente: Trabalhar alguma coisa laboral aqui é difícil, a não ser artesanato. Se colocasse

alguma profissão que eles fossem usar lá na rua.

Entrevistadora: E em relação a lazer?

Agente: De vez em quando eles jogam futebol...

28

ANEXO 3

Entrevista com a Assitente Social – 23/09/10

(A entrevistadora aborda acerca do trabalho que está sendo realizado e seus objetivos e

questiona a respeito da reincidência já referida pelo diretor na primeira entrevista)

Assistente Social: Essa questão de reincidência você veria mais fácil numa unidade

maior, porque aqui é difícil, são pessoas que ficam muito marcadas e normalmente são

penas grandes. Então não vemos muita reincidência aqui por isso, mas numa unidade

onde tem internos de 18 a 20 e poucos anos a reincidência é enorme.

Entrevistadora: Mas o que você acha que é o maior motivo pra reincidência?

Assistente Social: Ah, existem vários, mas o que domina é o tráfico. Ele precisa

continuar com o vicio dele e o que alimenta isso é o roubo. Aí quando ele chega lá fora,

não encontra emprego fácil, precisa alimentar seu vício e aí, vamos reincidir... É a

característica maior, por exemplo, do presídio de Salvador. Eu venho de lá, tenho

poucos meses aqui, e lá é essa característica. Mas aqui você não percebe isso por causa

da característica da unidade.

Entrevistadora: E qual é exatamente o seu trabalho aqui?

Assistente Social: O serviço social daqui funciona vendo as necessidades básicas de

documentação, de contato com recursos da comunidade com eles e com familiares. Eu

agora mesmo to tentando arranjar uma forma de engajar nesse trabalho direito porque só

trabalho dois dias na semana aqui. É muito pouco pra fazer isso, se pelo menos eu

conseguisse colocar todos com documentação, problemas médicos, encaminhar logo

tudo de cara, se eu conseguisse isso, já seria muito bom, m as não tem uma estrutura

legal, bacana pra fazer esse trabalho, a gente vai aos pouquinhos.

Entrevistadora: Você faz entrevistas com vários internos por dia?

Assistente Social: Aqui ainda não consigo vários, mas vou atendendo 4, 6... Vou

levando assim, só tem eu de assistente social aqui. Na verdade sou da casa do albergado,

mas como a unidade está sem assistente social fico dois dias aqui p ver as maiores

necessidades.

Entrevistadora: E quais são as maiores necessidades?

Assistente Social: O que tenho mais conseguido p eles é a carteira de identidade,

relatório p quem quer trabalhar lá fora. A parte psicológica seria ideal, se eles tivessem

29

alguém pra conversar. Tem um mesmo que não tem visita cadastrada, uma menina se

cadastrou em fevereiro e nunca veio, a mãe tem problema de saúde...

Entrevistadora: A maioria aqui então é usuários de drogas?

Assistente Social: As estatísticas em qualquer unidade, uma boa porcentagem reinicia

desde criança, falta esse trabalho psicológico e social desde as escolas. Eu acho que

psicologia deveria ser matéria básica, psicologia, professor, nutricionista... As

profissões básicas de uma sociedade pra ninguém ficar em débito ou em cadeia.

Entrevistadora: Mas aqui existe socialização entre eles? Percebemos com o diretor que

eles separam para que não haja conflito...

Assistente Social: Existe a separação realmente, existem os ex-policiais que não

aceitam a situação em que estão e não podem ficar com os outros. Existem os idosos

que já ficam numa galeria separada porque tem toda uma característica especial, eu

estou até preparando uma apresentação pra eles do estatuto do idoso, pra eles se

sentirem mais valorizados e até pra conhecerem a lei, os direitos deles e os deveres

também, até porque não podemos carregar ninguém no colo, ninguém aqui é inocente,

como nós também não somos, então vamos ver nossos direitos e deveres. Mas existe

realmente... Semana passada veio um interno que queria que tirasse ele de uma cela e

colocasse em outra, senão ele ia bater no outro interno que tava do lado dele... Então

temos que informar imediatamente a segurança porque todos os internos estão sob

custódia do Estado, se acontece alguma coisa, o diretor responde... “Você soube e não

conseguiu evitar?” Mas eles se afinam no grupo, se apóiam, se suportam, mas tem as

galerias.

Entrevistadora: Mas é comum você ouvir essas histórias de atrito?

Assistente Social: É esporádico, pois quando eles já vêm pra unidade, passam pela

coordenação de segurança, o diretor já conhece, tem o histórico se vier, já colocam de

acordo com o perfil que ele ta fazendo para evitar o atrito, quando acontece, procura

separar. No presídio, por exemplo, tínhamos um local onde ficavam os homossexuais,

pra evitar justamente isso. Tem o pessoal religioso, o grupo religioso, eles mesmos

pedem uma cela só pra eles, pois lêem a bíblia ate tarde, cantam... Aí a gente tenta fazer

o melhor possível dentro das características da unidade, aqui é pequeno, mas o que a

gente pode a gente faz.

Nós temos vários psicólogos no sistema, na casa dos albergados mesmo tem um

psicólogo muito bom. Aqui quanto necessita de um trabalho do psicólogo, a gente pede

nas outras unidades e ele vem conversar aqui. No presídio tem duas, na feminina não sei

30

quantas tem, mas só aqui que ainda está faltando, mas vai chegar... Mas quando tem

necessidade a gente chama.

Entrevistadora: E quando tem necessidade?

Assistente Social: As duas vezes que tivemos que chamar foi tentativa de suicídio, um

tomou água sanitária e conversa vai, conversa vem... Foi só pra chamar atenção

mesmo... Mas justifica, né, porque perder a liberdade é de deixar qualquer um

agoniada... Tem um francês aqui que tem dias que ta chateado com a vida pois não

aceita a situação de preso, e o trabalho psicológico é fundamental, pois mesmo que

esteja só querendo chamar a atenção, já é um sintoma de que ele precisa de um

acompanhamento psicológico, né? Ai a gente chama, a gente conversa... Tem ex-

funcionários também, que pra um ex-funcionário ser preso é muito pesado

psicologicamente falando, aí a psicóloga vem conversar com eles.

Entrevistadora: Na casa do albergado tem cursos profissionalizantes?

Assistente Social: Não, tem um curso de alfabetização à noite, mas a característica do

albergado é que eles saem às 6 horas da manhã e só volte a noite, ele tem que ter

emprego, curso, tem que mostrar a agenda se tem condição de engajar de novo na

sociedade. Fim de semana ta tendo um trabalho de estudantes, com professor de

educação física, são obrigados a ficarem na casa, é no sábado e a noite tem o curso de

alfabetização, pois a noite são obrigados a ficarem na casa

Entrevistadora: O que a gente ouve muito de reclamação de pessoas que estão dentro

de sistemas prisionais é essa coisa do ócio, você perde a liberdade e fica num lugar que

não tem muitos objetivos, está acostumado com a rotina, e mesmo que esteja ligado ao

crime você pode pensar no que pode fazer amanha, o ócio pesa muito no sistema

prisional...

Assistente Social: Não só no sistema prisional, mas na sociedade em geral, o que você

vê de adolescente fazendo errado por causa do ócio... Aqui é só um mini exemplo do

que está acontecendo na sociedade. É um recorte. Isso ta um perigo muito grande, é daí

que rola toda a violência social e vem parar uma ‘virgulazinha’ no sistema penitenciário

porque o resto está lá fora. O ócio é o grande veneno social. Nós temos em algumas

unidades algumas coisas. Aqui vamos fazer um trabalho com os idosos, no presídio tem

uma empresa trabalhando lá de reciclagem, de alfabetização, na PLD, como já é uma

penitenciária, já tem mais atividade laborativa, mais empresas trabalhando dentro,

inclusive um dos internos já está empregado numa dessas empresas que estão lá na

PLD, tem alfabetização também lá, a própria secretária de educação libera os

31

profissionais da educação pra trabalhar nessas unidades e a sede fica na PLD, tem várias

turmas lá de alfabetização e se não me engano tem aulas de ensino fundamental

também. Na colônia, tem atividades lá, Lafaiete Coutinho, no HCT também tem

atividades, terapia ocupacional, e nos interiores também, cada interior tem algum tipo

de atividade, nenhuma unidade ta totalmente zerada, mas nenhuma unidade tem 50%

dos internos em atividade, juntando atividade laborativa, educacional e esportiva.

Quando não tem uma coisa tem outra, mas não atinge os 100%.

Entrevistadora: Mas não atinge por causa de estrutura ou porque eles não querem? Por

que não tem voluntários?

Assistente Social: As duas coisas. Ontem mesmo eu recebi um e-mail da secretaria

solicitando todo tipo de espaço que eu tenha na unidade e os horários que eles estão

ocupando, justamente pra maximizar o uso dos espaços e os profissionais que são

poucos. Inclusive, como voluntários, pra ver o que a gente faz de máximo possível.

Mas, por exemplo, semana passada nós tivemos que fazer uma reunião com os internos

que, mesmo matriculados, estão faltando e isso é ruim pra caramba, pra eles mesmos,

vai prejudicar eles mesmos, pois a juíza precisa saber. Vamos ver com o material

humano e o pouco espaço que temos... Pois são unidades antigas, não foi construída

com uma arquitetura voltada pra ressocialização mesmo, se existem salas, existem.

Toda unidade tem uma sala, mas não é suficiente. Tem artesanato, tem biblioteca, pouca

coisa, mas tem.

Entrevistadora: Mas aqui tem? No COP?

Assistente Social: Bom, estou aqui no COP há pouco tempo. Aqui estava tendo o

trabalho do cinema, uma vez por mês colocava o filme pra eles assistirem, tem toda a

aparelhagem aí, não temos sala, usávamos o pátio, é o que nós temos aí. A outra

assistente social que tava aqui implantou esse trabalho, com toda dificuldade, mas

implementou e quando ela foi transferida me pediu pra tentar voltar, colocar isso em

prática de novo, mas não conseguimos ainda, pois não depende só de mim... E ela

ficava todos os dias, era melhor, era tranqüilo.

Entrevistadora: É isso, porque pra um planejamento ambiental dá certo tem que ter

estrutura, tem que ter condições e o que a gente ta tentando fazer é ter idéias de ação

baseado no pouco que se tem aqui, e sabemos que é complicado.

Assistente Social: É... Ela dizia, não temos sala não? Vamos fazer o encontro dos

internos pra ver os filmes, tal dia galeria tal, fecha todas as outras galerias e aquela

32

galeria vai ser presenteada com o filme, bota as cadeiras no pátio mesmo e todo mundo

assiste o filme ali mesmo.

Entrevistadora: Tem uma média de quantas pessoas aqui dentro hoje?

Assistente Social: Tem 103, 105... Lá na casa do albergado ta com 130 e poucos, mais

ou menos, mas lá tem uma sala coberta, tem um auditoriozinho e tem uns livrozinhos

que a gente diz que é a nossa bibliotecazinha.

Entrevistadora: O que a gente percebeu também na nossa conversa com o diretor foi

essa questão de que, na verdade, a maior falta que ele sentia aqui era de projetos que

envolvessem a possibilidade de ressocialização, que inclusive no presídio Salvador tem.

Então assim, nos outros ele percebe essa existência e aqui talvez pelo fato de o espaço

ser limitado, esse projeto não conseguiu chegar aqui e abarcar o número de internos.

Então a gente pensou realmente, na verdade nossa primeira idéia foi focar na questão de

reincidência.

Assistente Social: Por que vocês escolheram o COP?

Entrevistadora: Sinceramente, foi pela facilidade que tivemos de comunicação e

acesso. O diretor foi muito solícito, quando ligamos de novo ele se lembrou da gente,

disse que pudéssemos vir, chegamos aqui e fomos muito bem recebidas. Pra gente ficou

fácil o contato. E percebemos que a demanda que a gente procurava que era a da

reincidência, que tem nas outras instituições e que aqui não era tão forte, não vai mudar,

ta... Então, já que a reincidência não é o foco, vamos procurar o que é o foco. E aí ele

trouxe essa questão da ressocialização mesmo, essa preparação dos internos pro mundo

lá fora no dia em que eles saírem. A gente vê na literatura que isso é uma das maiores

causas da reincidência, a não preparação. Então, o diretor trouxe pra gente essa questão

de os projetos não chegarem até aqui... >>deixa isso???

É porque essa unidade na verdade foi criada pra ser um centro de observação e terminou

virando tipo uma penitenciária mesmo, mas não tem a estrutura adequada pra isso, então

a gente foi levando...

Entrevistadora: Mas quais são as medidas pra conseguir essa estrutura, vocês falam

com a secretaria, pedem pra criar...?

Assistente Social: Exatamente, tudo através de ofício, a gente solicita, dentro das

possibilidades da secretaria as coisas são feitas, tem a enfermeira, tem a dentista, foi

feito um espaço pra elas aqui, pra defensoria pública. Aos pouquinhos a gente vai

conseguindo as coisas, pois essa parte administrativa de investimentos, só a parte da

33

administração lá da secretaria que define. Mas na medida do possível, as coisas vão

acontecendo, são muitas unidades!

Entrevistadora: Quais são as demandas deles, fora a questão de documentos?

Assistente Social: Quando um interno chega ali na porta, a primeira coisa que ele quer

saber é questão jurídica. Ele quer saber como ta o processo dele, quando é que ele sai, se

chegou tal papel. Gente, essa parte jurídica você tem que conversar com a defensora

pública. E a parte social? Vamos conversar. Sua mãe ta vindo? Como está sua esposa?

Cadê sua identidade? Pra poder entrar no clima, porque a gente também não pode bater

de frente, senão aí a gente não tem retorno nenhum. E aí vou conversando, peço o

telefone da mãe, ligo, converso com ela... A ligação com o pessoal lá fora, através do

telefone, e um funcionário que pergunte... Ai eu peço autorização ao chefe de segurança

se ele pode falar um pouco com a mãe, a gente não vai abrir pra uma comunicação

externa de qualquer forma... Aí pronto, já conquista logo, ele já vê que pode ter

confiança, começa a pedir a documentação, pois quando ele sai, ele precisa ter pelo

menos a carteira de identidade. Eu já recebi o apoio do Pedro Melo, tem um posto aqui

na PLD, e aí quando tenho uma demanda de 5, 6 internos, ligo pra lá, consigo a

identidade dos presos de graça, sem pagar nada... Aí a gente adianta CPF, identidade,

alguma demanda de aposentadoria, INSS, auxílio reclusão – que o filho, esposa ou

dependente que tenha lá fora tem direito.

Entrevistadora: Em questão do que a gente poderia fazer aqui dentro, pra preparar lá

fora, em termos profissionais, em termos de preparação pro mercado de trabalho, pra

lidar com o preconceito, comunicação com as pessoas, o que você acha que podíamos

fazer?

Assistente Social: É complicado, pois essa questão de discriminação ta tão grande que

se você não foi um preso, você vai ser discriminado porque usa boné, porque é homem,

porque é mulher etc. Então, se ele não foi um ex-interno, vai sofrer outro tipo de

discriminação. Então, psicologicamente, nós temos que nos preparar pras diversas

discriminações que estão ocorrendo aí fora e dentro de cada um de nós. Porque a gente

já olha pro outro discriminando. Mas o que fazemos aqui? Eles vêm aqui e nós os

tratamos como seres humanos que são, ninguém trata eles aqui por apelido. Tem um

interno aqui que só vivia deprimido, cabisbaixo, eu comecei a conversar com ele, ele

começou a me contar a vida dele, tudo que ele passou em relação ao crime, a família,

hoje em dia ele já ta se sentindo gente, fala em projeto quando sair. Então, o mínimo

que a gente pode fazer na nossa estada aqui na unidade, é tratar eles como seres

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humanos que são, independentemente do crime, porque a maioria que comete crime não

está preso, aqui é só uma amostra e, se eu puder resolver alguma coisa que facilite mais

tarde a colocação dele num emprego quando ele sair daqui eu vou fazer, por mais que

digam que to perdendo tempo, não to perdendo tempo, to fazendo aquilo que sou paga

pra fazer.

Entrevistadora: Hum... Porque quando você falou assim que eles mesmos pedem pra

ficar separados, religiosos, com religiosos... De certa forma, já há uma discriminação

porque eles não estão se sentindo bem com outras pessoas, né?

Assistente Social: Exatamente! Já começa daí.

Entrevistadora: Então, há alguma intervenção que você considera interessante, no

sentido de trabalhar essa questão do preconceito e tal?

Assistente Social: É, seria um trabalho interessante, mas algo que existe num sistema

fechado, é a sociedade marginal. Eles consideram nós que estamos aqui fora

marginalizados à realidade deles e a realidade pra nós, que é marginal à sociedade, é

exatamente o comportamento que eles cometeram, porque uns são estupradores, outros

preferem as drogas, têm as características deles. E eles se fecham no grupo. Se você vir

num dia de visita, como eles arrumam as celas, a unidade em si pra receber os parentes,

é incrível o respeito que eles têm pela visita, pelo parente dele que ele vai receber. Aí se

você chega, ele ta conversando com a companheira e olham de canto de olho pra

companheira dele, é motivo pra no outro dia amanhecer espancado ou até morto. Porque

eles têm as regras e as normas deles. Não é dizer que eles estão soltos no mundo não.

Eles tem as normas, as regras, o jeito de ver a realidade até como auto-defesa. E se a

gente for entrar num trabalho desse, a gente tem que ir com essa realidade, sabendo que

existe isso e é maduro. Isso não é só Bahia, isso é Brasil, e quiçá mundo. Qualquer

presídio que você for, qualquer grupo social que você for, antes de tudo já saiba que

existe aquilo lá. E você pode até conversar, mostrar outros pontos de vista, saber o que

vão achar disso, mas eles já vão estar na defesa. Pra deixar entrar uma coisa diferente, é

difícil. Nunca podemos achar que nosso ponto de vista é que é o ideal pra ele, ou pra

quem quer que seja, até pra um filho nosso.

Entrevistadora: A gente pensou muito na possibilidade de trabalhar as atividades

profissionalizantes, as oficinas...

Assistente Social: É isso que eu ia falar, existe um trabalho que a própria juíza ta

exigindo, na sociedade toda e ta sendo incluído aqui também nas unidades prisionais, é

o Começar de Novo. Vai formar um banco de dados com os nomes dos internos, de

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todas as unidades e manda pro banco de dados central, aí quando vem a solicitação de

emprego, ou de curso profissionalizante – que são diversas opções que eles colocam o

que eles preferem –, aí havendo a demanda pra curso ou pra trabalho, aí a pretensão é

que mande esse pequeno laudo: “surgiu vaga pra construção civil”, ou pra curso ou pra

trabalho, aí eles já têm lá o nome do pessoal interessado e vai mandar quantas vagas...

São tantas vagas pra unidade tal, tal e tal. Eu espero que dê prioridade ao albergado, que

é onde os internos têm que ter trabalho.

Entrevistadora: Mas isso é enquanto eles estão dentro da instituição, né?

Assistente Social: É, mas a sociedade toda, o pessoal ta se inscrevendo também, a

competição vai ser grande, porque eles estão tão dentro quanto a sociedade em geral...

Tem várias instituições ligadas a essa trabalho, de antemão tem essas opções, mas

podem surgir outras. Hoje no jornal estava falando de vagas para profissionalização

para construção civil. Eu estou esperando... O primeiro aviso é que viria para o interior

e depois para a capital. Mas eu espero que vindo pra cá, eles não se esqueçam do nosso

albergado.

Entrevistadora: São vagas disponíveis pra ex-presidiários?

Assistente Social: Não, eu espero que exista uma cotazinha pra cá, mas não tenho

certeza.

Entrevistadora: Mas tem cursos voltados para formação profissional aqui?

Assistente Social: Do interno? Deixa eu me lembrar... Já tivemos. Atualmente, nas

unidades onde estou não tem. Tem a alfabetização. Mas já tivemos, o convênio era com

a UNEB, vinham os professores de lá, fizemos agricultura, várias hortas, teve

informática básica, vários cursos na época. Mas atualmente não sei se nas unidades está

tendo não, pelo menos aqui não.

Entrevistadora: Então você acha que a construção civil seria a maior demanda deles?

Assistente Social: É, se você for fazer uma estatística, uma boa parte dos internos vem

da construção civil, pedreiros, mestre de obras, ajudante de pedreiros, marceneiros,

carpinteiros... De quando entrei no sistema pra hoje, a quantidade de internos com mais

um pouquinho de estudo aumentou bastante, antigamente era só analfabeto e semi-

analfabeto, mas hoje em dia já tem segundo grau, tem alguns de nível superior também,

mas ainda é minoria.

Entrevistadora: E essas vagas funcionam de que maneira? Eles recebem algum salário

que depositam em alguma conta? Como é? No caso de internos que entram numa vaga

dessas...?

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Assistente Social: Se for pra trabalho, vai ter tudo legalizado direitinho, tudo dentro da

lei.

Entrevistadora: Mas isso é no caso pra quem ta em regime semi-aberto?

Assistente Social: Se for pra regime fechado, as vagas que vierem vai ter um salário

mínimo recolhido o pecúlio, mas sistema aberto não recolhe o pecúlio.

Entrevistadora: É porque tem a Dasprê, em que presos fazem coisas, não só roupas e

conseguem redução da pena e o dinheiro é depositado numa poupança que quando ela

sair ela pode usar...

Assistente Social: É o pecúlio, é obrigatório para regime fechado. E essa parte de

costura, as femininas, aqui do lado, o trabalho era maravilhoso, com a parte de

artesanato e costura também, tinham máquinas industriais, computadorizadas, tudo

diretinho, não sei como funciona agora, porque apesar de ser aqui do lado tem muito

tempo que eu não vou lá. Mas o trabalho delas era quase 100% das internas trabalhando,

inclusive tinham estrangeiras também.

Entrevistadora: E na questão do lazer, o que você acha que eles fariam mais?

Assistente Social: O que eles mais gostam é o futebol, nós aqui temos pelo menos um

lugar pra eles jogarem futebol, mas tem capoeirista, adoram lutar boxe, gostam muito de

competição de baralho, dominó. No albergado a gente quer ver se resgata os

capoeiristas, nem que sejam 50 minutos à noite. A gente vai tentando assim, porque lá

também eu só fico 3 dias.

Entrevistadora: Mas, e essa questão da quadra, como é pra utilização da quadra?

Assistente Social: Aqueles que gostam de jogar bola vão se chegando, não existe

discriminação entre as galerias, inclusive até Sr. P. que é um idoso diz que gosta de

jogar a bolinha dele lá na defesa, e ele é um idoso, então ta interagindo com os outros,

agora na hora de dormir, cada um vai pra sua... Em unidades grandes tem dia pra tudo,

mas uma unidade que é pequena não tem assim, aqui não tenho certeza...

Entrevistadora: E o pátio aqui é grande, daria pra todos?

Assistente Social: Vamos lá dar uma olhada?

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ANEXO 4

Inventário CBCL de Achenbach na Escala de Comportamento Agressivo.

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ANEXO 5

Escala de Agressividade Adaptada

1. Você discute muito com outras pessoas?

2. Você é muito vaidoso?

3. Você demonstra crueldade, intimidação ou maldade para com as pessoas?

4. Você precisa de muita atenção?

5. Você destrói seus objetos pessoais?

6. Você destrói objetos de terceiros?

7. Você sente ciúmes facilmente?

8. Você se envolve em muitas brigas?

9. Você ataca outras pessoas fisicamente?

10. Você grita muito?

11. Você gosta de se mostrar e contar piada?

12. Você é teimoso, mal humorado ou irritado?

13. Você fala muito?

14. Você está mal-humorado?

15. Você perturba os outros com freqüência?

16. Você tem crises de raiva?

17. Você ameaça as pessoas?

18. Você fala muito alto?

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ANEXO 6

Painel de Smiles

BOM DIVERTIDO MOTIVANTE

LEGAL REGULAR CANSATIVO

RUIM ÓTIMO DESMOTIVANTE

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