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Mestrado em Comunicação A reinvenção do jornalismo na era digital: manual de orientação para a apuração, construção e divulgação da notícia em tempo real Dissertação para obtenção do grau de: Mestre em Comunicação - Jornalismo Apresentado por: Leandro Donatti BRMMMC1855363 Orientadora: Michelle Moreira

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Mestrado em Comunicação

A reinvenção do jornalismo na era digital: manual de orientação para a apuração, construção e divulgação da notícia em tempo real

Dissertação para obtenção do grau de:Mestre em Comunicação - Jornalismo

Apresentado por:Leandro Donatti

BRMMMC1855363

Orientadora: Michelle Moreira

PARIS, FRANÇAMAIO DE 2017

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DEDICATÓRIA

À França e especialmente a Paris, que tão bem me

acolheram num momento de mudança e vida nova,

tempo e confiança que me ajudaram neste projeto.

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AGRADECIMENTOS

Ao eterno companheiro, Luis Otávio Dias, que, nos momentos

bons e ruins, com sua sensibilidade e olhar científicos, me tocou...

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TERMO DE COMPROMISSO

Eu, Leandro Donatti, portador do documento de identidade Passaporte FI 172496 – Polícia Federal do Paraná e aluno do programa acadêmico Mestrado em Comunicação - Jornalismo, declaro que:

O conteúdo do presente documento é um reflexo do meu trabalho pessoal e manifesto que, diante de qualquer notificação de plágio, cópia ou prejuízo à fonte original, sou responsável direto legal, financeira e administrativamente, sem afetar a Orientadora do trabalho, a Universidade e as demais instituições que colaboraram neste trabalho, assumindo as consequências derivadas de tais práticas.

Assinatura:

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Paris, 2017

Att: Direção Acadêmica

Venho por este meio autorizar a publicação eletrônica da versão aprovada de meu Projeto Final com título “A reinvenção do jornalismo na era digital: manual de orientação para a apuração, construção e divulgação da notícia em tempo real”, no Campus Virtual e em outras mídias de divulgação eletrônica desta Instituição. Informo abaixo os dados para descrição do trabalho:

TítuloA reinvenção do jornalismo na era digital: manualde orientação para a apuração, construção e divulgação da notícia em tempo real

Autor Leandro Donatti

Resumo

Esta pesquisa analisa o jornalismo na era digital. Para responder à problemática em que medida a internet dialoga com os princípios e fundamentos do jornalismo e sugere novas práticas profissionais frente à convergência, instantaneidade, multimidialidade e interatividade digitais, realizou-se uma revisão bibliográfica qualitativa. Dentre as reflexões, a constatação de que o valor do jornalismo aumenta com a internet; as audiências estão mais poderosas; e a necessidade de pensar diferente para acompanhar os avanços tecnológicos.

Programa Mestrado em Comunicação – Jornalismo

Palavras-chave

jornalismo digital, práticas, manual, fundamentos, tecnologia

Contato [email protected]

Atenciosamente,

Assinatura:

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Mostra de documentos pesquisados e analisados.............................

Quadro 2 – Seleção das unidades de registro e variáveis....................................

Quadro 3 – Análise de resultado – Base unidade de registro Manual..................

Quadro 4 – Análise de resultado – Base unidade de registro Tecnologia.............

Quadro 5 – Análise de resultado – Base unidade de registro Princípios e

fundamentos..........................................................................................................

Quadro 6 – Análise de resultado – Base unidade de registro Audiência...............

Quadro 7 – Análise de resultado – Base unidade de registro Novas práticas.......

Quadro 8 – Análise de resultado – Base unidade de registro Profissão...............

Quadro 9 – Análise de resultado – Base unidade de registro Notícia..................

Quadro 10 – Análise de resultado – Base unidade de registro Linguagem..........

Quadro 11 – Análise de resultado – Base unidade de registro Convergência......

Quadro 12 – Análise de resultado – Base unidade de registro Informação.........

Quadro 13 - Classificação de Laswell..................................................................

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ÍNDICE GERAL

Introdução............................................................................................................4

Marco teórico.......................................................................................................7

1. Manual para novas práticas

1.1. Por que e para quem um manual de jornalismo na era digital.....................9

1.2. Novas práticas jornalísticas se transformam com a tecnologia..................14

2. O jornalismo e a internet

2.1. Tecnologias da informação e comunicação, avanço sem volta................. 17

2.2. A internet como um meio de massa versus mídias tradicionais.................22

2.3. Crise a superar: era digital muda o jeito de se fazer jornalismo.................26

3. O novo papel do jornalista

3.1. Os princípios e os fundamentos que ditam o “bom jornalismo”..................36

3.2. Revolução tira receptor da passividade e favorece interação....................46

3.3. Uma profissão que precisa (com urgência) ser reinventada......................55

4. Mudanças no modus operandi

4.1. Conceito e valor do que é notícia em tempos de internet...........................64

4.2. Instantaneidade e memória viram palavras de ordem................................74

4.3. Linguagem interativa, multimidialidade e os hipertextos............................84

4.4. Convergência potencializa e ajuda a repensar modelos............................93

4.5. Divulgação é parte da estratégia e passa pelas redes sociais...................97

Marco empírico................................................................................................101

5. Unidade de estudo/mostra............................................................................

6. Variáveis........................................................................................................

7. Técnica e métodos........................................................................................

8. Resultados....................................................................................................

Conclusões gerais............................................................................................

Recomendações...............................................................................................

Bibliografia.........................................................................................................

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RESUMOEsta pesquisa traz elementos para a elaboração de conteúdo de um manual de jornalismo na era digital e analisa o impacto da internet no jornalismo, seus reflexos de ordem operacional e a necessidade de reinvenção e adoção de novas práticas profissionais. A partir das hipóteses de que os princípios e fundamentos do jornalismo permanecem os mesmos no ambiente digital, de que os jornalistas se adaptam às tecnologias da informação e comunicação, que a internet introduz métodos inéditos no quotidiano profissional, e que há um potencial de demanda por manuais, entre os profissionais, questiona-se em que medida a internet dialoga com os princípios e fundamentos do jornalismo, sugere novas práticas frente ao universo digital, marcado pela convergência, instantaneidade, multimidialidade e interatividade, e serve de base para a elaboração de um manual. Buscou-se nos autores sobre jornalismo, comunicação, internet e manuais os elementos teóricos para embasar e fomentar a discussão proposta, sobre a importância de os jornalistas contemporâneos pensarem a profissão na era digital e as suas práticas. A metodologia conta com revisão bibliográfica associada aos métodos qualitativo e análise do conteúdo. Dentre as conclusões e reflexões, destaque para a necessidade de princípios e fundamentos do jornalismo no ambiente digital; um novo jeito de fazer jornalismo, com várias mídias, incluindo as redes sociais; a memória e a base de dados como facilitadores da atividade jornalística; uma linguagem interativa, multimídia e hipertextual. O valor do jornalismo se expande na era digital porque os jornalistas atuam como filtro; os receptores – também chamados públicos ou audiências - assumem um papel mais ativo que avança com a inclusão digital. Diante desse quadro, os jornalistas do século XXI devem negociar e dialogar com outras vozes da sociedade; conhecer novas mídias com profundidade; adquirir novas formas de pensar para saber como agir frente às novas ondas de inovação tecnológica.

Palavras-chave jornalismo digital, práticas, manual, fundamentos, tecnologia

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ABSTRACT

This research, for the elaboration of contents of a journalism manual in the digital age, analyzes the impact of the internet on journalism, its operational repercussions and the need for reinvention and adoption of new professional practices. From the hypothesis that the principles and foundations of journalism remain the same in the digital environment, that journalists adapt to information and communication technologies, the internet introduces methods unprecedented in daily life and and that there is a potential demand for manuals among professionals, it is questioned to what extent the internet dialogues with the principles and foundations of journalism, suggests new practices facing the digital universe, marked by convergence, instantaneity, multimedia and interactivity, and it serves as the basis for the development of a manual. We searched the authors about journalism, communication internet and manuals, the theoretical elements to support and to foment the proposed discussion, on the importance of the contemporary journalists think the profession in the digital age and its practices. As methodology, the bibliographic technique associated to the qualitative method and content analysis. Among the conclusions and reflections, highlight the need for principles and fundamentals of journalism in the digital environment; a new way of doing journalism, with various media, including social networks; the memory and the database as facilitators of the journalistic activity; an interactive, multimedia and hypertextual language. The value of journalism expands in the digital age because journalists act as a filter; the receivers - they also read publics or audiences - assume a more active role that advances with digital inclusion. Faced with this situation, journalists of the 21st century must negotiate and dialogue with other voices of society; to know new media with depth; acquire new ways of thinking to act in the face of new waves of technological innovation.

Keywords digital journalism, practices, manual, fundamentals, tecnology

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INTRODUÇÃO

A internet1, impulsionada pelas novas tecnologias da informação e

comunicação2, consolidou-se como meio de comunicação de massa. Este novo

status fez emergir um jeito próprio de fazer jornalismo, específico da era digital

e com impacto direto no quotidiano da profissão. Essas mudanças, permeadas

de complexidades, criam um quadro ainda incerto que merece olhar atento

tanto dos jornalistas em atividade quanto dos futuros profissionais.

É nesse contexto que nasce o tema central desta pesquisa, A

reinvenção do jornalismo na era digital3: manual de orientação para a

apuração, construção e divulgação da notícia em tempo real, proposta de

publicação traduzida pela seguinte problemática: em que medida a internet

dialoga com os princípios e os fundamentos do jornalismo; sugere novas

práticas profissionais frente ao universo digital, marcado por um ambiente de

convergência, instantaneidade, multimialidade e interatividade; e serve de base

para a elaboração de um manual?

Um manual de novas práticas, segmentado em subáreas como

apuração e definição do que é notícia na internet, o novo papel do jornalista

nesse ambiente, o uso de uma linguagem hipertextual, dentre outras

características, ajuda no debate e na organização do conhecimento em relação

ao tema, servindo de apoio técnico para os profissionais que estão chegando

assim como para os que já estão no mercado e precisam se atualizar.

Algumas hipóteses emergem a partir desse cenário, inesgotável em

possibilidades. A primeira delas é que os princípios e fundamentos do

jornalismo permanecem válidos independente do ambiente, se tradicional ou

digital. A segunda indica uma tendência natural de adaptação da profissão

1 Rede mundial que, pela troca virtual de dados e mensagens, une computadores particulares, organizações de pesquisa, institutos de cultura, institutos militares, bibliotecas, corporações. Sinônimo: web. Disponível em: https://www.dicio.com.br/internet/ Acessado em 16/5/2017.2 A ideia de tecnologia está associada aos conhecimentos, às técnicas e aos dispositivos que possibilitam a aplicação do saber científico. Comunicação, por sua vez, com a transmissão de informação entre um emissor e um receptor que partilham um mesmo código. Em geral, a noção é usada juntamente com o conceito de tecnologia da informação, que alude ao uso de computadores e outros equipamentos para armazenar, processar e transmitir dados. Por isso, é habitual falar tecnologias da informação e comunicação, TIC. Disponível em: http://conceito.de/tecnologias-da-informacao Acessado em 16/5/2017.3 Neste trabalho, usaremos o termo jornalismo na era digital para designar o jornalismo que se faz na internet, valendo-se também de sinônimos trabalhados por inúmeros autores, dentre os quais ciberjornalismo, webjornalismo, jornalismo online e jornalismo digital.

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frente aos avanços tecnológicos, que surgem de tempos em tempos. A terceira

hipótese é que a internet introduziu métodos inéditos no modus operandi do

jornalismo, mais integrados aos receptores (também como públicos ou

audiências). E a quarta, e última hipótese formulada nesta pesquisa, é que

existe uma potencial demanda por manuais entre os profissionais do

jornalismo.

A escolha do tema se dá pela atualidade do objeto e também por um

interesse profissional, como jornalista, em ampliar o conhecimento e

aprofundar a análise à luz de um olhar científico. O impacto da internet sobre o

jornalismo está em pauta desde os anos 1990 e ainda suscita o debate,

mostrando-se fonte inesgotável de pesquisas e de formulações sob pontos de

vista teórico e prático.

É por isso que a presente pesquisa é um misto de investigação teórica e

prática. O jornalista, cuja missão é informar com isenção e verdade, por mais

distantes e utópicos que esses princípios norteadores da profissão possam

parecer, precisa entender o que move a sociedade da informação, suas

engrenagens, e as audiências cada vez mais ativas, para atuar

profissionalmente mais conectado ao tecido social contemporâneo.

O objetivo geral da pesquisa é indicar diretrizes de conteúdo para um

manual de jornalismo na era digital, observando as características do ambiente

internet; analisando as questões relacionadas ao que se espera do jornalista,

que passa a desempenhar um novo papel nesse ecossistema da informação; e

mensurando o impacto da internet nas atividades básicas do profissional, para

servir de orientação ao jornalista em transformação.

Dentre os objetivos específicos estão analisar os fundamentos do

jornalismo tradicional, sob a perspectiva da era digital, e a sua necessidade de

adaptação à nova realidade; propor um modus operandi na atuação

profissional; caracterizar os traços essenciais de atividades do jornalista, como

apuração, construção da notícia e sua publicação, no contexto digital; e

identificar reflexões teóricas que possam orientar os profissionais.

Esta pesquisa está dividida em oito capítulos, os quatro primeiros,

teóricos, e os demais, relacionados à investigação empírica. O primeiro,

intitulado Manual para novas práticas, fala sobre manuais no jornalismo. O

segundo, O jornalismo e a internet, faz um apanhado das principais

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características da internet na sociedade contemporânea assim como a sua

interface com o jornalismo. O capítulo 3 – O novo papel do jornalista -, aponta

elementos-chave para embasar uma reinvenção da profissão. O capítulo 4 –

Mudanças no modus operandi – orienta um diferente modelo de produção. O

capítulo 5 apresenta a unidade de estudo desta pesquisa e sua mostra. O

capítulo 6, as variáveis utilizadas para se dissecar o tema. O capítulo 7 explica

a técnica e os métodos de trabalho escolhidos para se fazer a investigação e o

capítulo 8 traz os principais resultados apurados.

A proposta é construir, com isso, uma linha de raciocínio que parte de

conceitos inerentes ao ambiente digital, passa pela redefinição do profissional e

mudanças de suas rotinas, e finaliza com propostas concretas para a

elaboração de um manual que estimule a prática e o pensar do jornalismo do

século XXI.

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MARCO TEÓRICO

Esta pesquisa apresenta elementos que servem de base para a

elaboração de conteúdo para manual de jornalismo na era digital, tendo em

consideração a importância de os jornalistas refletirem sobre a profissão, o

impacto da internet sobre suas rotinas e a implementação de novas práticas.

Foi realizada uma “visita” a textos de autores com saber reconhecido em

jornalismo, comunicação e internet, e especialistas em manuais. O desafio foi

selecionar referências-chave entre os autores, uns com incidência mais teórica,

da academia, e outros com uma reflexão mais prática, própria do mercado.

Alguns critérios informais de seleção foram conjugados e levados em

conta nesse “garimpo”, cujo resultado pode ser conferido nas referências

bibliográficas, ao final deste manual: a notoriedade dos autores; a área

geográfica de atuação dos autores; a multidisciplinariedade e a diversidade de

pesquisas e, por consequência, de pontos de vista, um conjunto que, ao final,

pudesse garantir um diálogo mais amplo possível.

No primeiro capítulo, para discorrer sobre manuais de uma forma geral,

além da necessidade de um manual de orientação para o jornalismo na era

digital, trazemos o enfoque de Elias Machado, autor brasileiro, reconhecido

tanto na área do jornalismo como em educação. O jornalista Paulo Nogueira,

com sua experiência na criação de manuais de jornalismo, também dá a sua

contribuição.

No segundo capítulo, para contextualizar o jornalismo em tempos de

internet, optou-se por referências internacionais, como Zygmunt Bauman e

Dominique Wolton, para falar de globalização e suas nuances; Manuel Castells,

para esmiuçar a sociedade em rede; e Pierre Lévy e André Lemos, para traçar

um pensamento sobre cibercultura. Chris Anderson empresta seu olhar mais

econômico e Pollyana Ferrari e Magaly Prado, a prática na web.

Para tratar do novo papel do jornalista, desafio do terceiro capítulo, a

escolha recai em Nelson Traquina, e na sua teoria da comunicação com foco

nos valores-notícias, ética e fundamentos da profissão. Ainda neste capítulo,

Guillermo Orozco demonstra sua visão crítica sobre o ainda limitado papel ativo

das audiências. Ramón Salaverría analisa a crise das empresas jornalísticas e

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a linguagem multimídia da web. E Philip Meyer, Seth Lewis, Kim Pearson e

Jeannette Wing, apresentam seus apontamentos sobre novas tendências,

como o jornalismo de base de dados e o pensamento computacional.

No quarto capítulo, sobre mudanças no modus operandi do jornalismo,

dialogam sobre “pirâmide invertida” e o conceito de notícia na internet autores

como Adelmo Genro Filho e João Canavilhas. Axel Bruns explica sua ideia de

gatewatching em detrimento ao gatekeeper, Paul Bradshaw fala do poder da

instantaneidade e Maria Cristina Gobbi, sobre a interatividade. Marcos Palacios

explora a memória que fica armazenada no ciberespaço. E Raquel Recuero

analisa o papel das redes sociais na construção e difusão da notícia.

Três ícones do jornalismo – dois deles ainda vivos – também estão entre

as referências bibliográficas: Marshall Mcluhan, com a ideia de aldeia global,

sempre atual, e Gay Talese e Peter Laufer, ativistas contrários ao jornalismo

acelerado imposto com a consolidação da internet como meio de massa.

Sobre questões envolvendo a investigação empírica, técnicas e métodos

de pesquisa, temas dos capítulos 5, 6, 7 e 8, destaque para Laurence Bardin,

Uwe Flick, Antonio Carlos Gil, Klaus Krippendorff e Roque Moraes.

A intenção é criar um mosaico não apenas de ideias, mas também de

países e de formações que conversam entre si. Autores do Brasil, França,

Portugal, Espanha, Canadá, Estados Unidos, Alemanha, Noruega, México,

Polônia, Inglaterra, Austrália, dentre outros países. Jornalistas, comunicadores,

sociólogos, psicólogos, filósofos, arquitetos, advogados, antropólogos,

pedagogos, cientistas políticos, especialistas em tecnologia da informação e

comunicação, dentre outras profissões. Diversas origens, diversos saberes.

Assim como na literatura de referência, esta pesquisa também buscou

informações e apoio em revistas científicas e institutos de pesquisa

reconhecidos por suas análises a respeito da internet. Alguns dados coletados

e reproduzidos só têm em versão online. Não seria coerente ignorá-los, ou

evitar a aproximação, justamente na elaboração de um manual sobre

jornalismo na era digital.

Esta pesquisa situa-se na análise do jornalismo na internet, como

fenômeno, tema explorado por autores no mundo todo. Desta forma, o que se

propõe é uma análise de parte desse conteúdo produzido, o que contribui para

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o debate, para a reflexão e para a formatação de um manual de jornalismo

digital.

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MANUAL PARA NOVAS PRÁTICAS

1.1. Por que e para quem um manual de jornalismo na era digital

A revolução tecnológica4 transformou a forma de se fazer jornalismo no

século XXI, assim como os modos de se comunicar da sociedade

contemporânea se remodelaram com o avanço da internet. No campo da

comunicação e das novas tecnologias, criaram-se múltiplas possiblidades para

o ofício da profissão jornalista, que foram do analógico ao digital, e que

interferem diretamente nas fases de produção da notícia e na relação com o

público. Nessa esfera é que se concentra esta pesquisa, expondo uma

reflexão do papel do jornalista na sociedade da informação, a mudança de

suas rotinas e a necessidade de um manual de novas práticas do jornalismo na

era digital.

Manual é um termo com diversos significados5, dentre os quais faz

alusão à ideia de um guia prático, um livro - impresso ou online - que contenha

elementos de um determinado assunto com recomendações. De acordo com o

dicionário6 de língua portuguesa, manual significa “um compêndio, um livro

pequeno que encerra os conhecimentos básicos de uma ciência, uma técnica,

um ofício: manual do agricultor, do carpinteiro.” A expressão inglesa handbook

(livro de mão, em português), sinônimo de manual, segundo os dicionários de

negócios7, é descrita como “trabalho abrangente e detalhado sobre um tópico

específico para profissionais, estruturado para referência rápida e, muitas

vezes, usado como um suplemento de outra publicação.

No jornalismo, o termo manual está geralmente relacionado à prática

profissional e o seu emprego se dá por inúmeras frentes. Os meios de 4 Revolução é uma mudança ou transformação radical relativa ao passado imediato, que pode ter lugar em distintos âmbitos (social, econômico, cultural, religioso, etc.). O termo é geralmente aplicado às alterações/evoluções tecnológicas, como sucedeu com a chamada Revolução Industrial (marcando assim uma época diferente graças ao uso de novas técnicas, fontes de energia, invenção de máquinas e novos meios de transporte). Disponível em: http://conceito.de/revolucao Acessado em 16/5/2017.5 Existem varios tipos de manuais. Quando compramos máquinas, computadores, celulares, entre outros aparelhos eletrônicos, eles vêm com o manual explicativo que orienta não somente como fazê-los funcionar, mas também as principais funções que possuem. Outro tipo é o chamado Manual de Procedimento, um documento com a descrição das atividades e como devem ser realizadas as funções nas unidades administrativas ou em várias delas. Disponível em: https://conceitos.com/manual/ Acessado em 23/5/2017.6 Conceito tirado do Dicio – Dicionário Online de Português. Disponível em: https://www.dicio.com.br/manual/ Acessado em 23/5/2017.7 O termo handbook reproduzido nesta pesquisa consta no Business Dictionary. Disponível em: http://www.businessdictionary.com/definition/handbook.html Acessado em 23/5/2017.

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comunicação de massa, como o rádio, a tevê, o jornal, e agora a internet,

dispõem de seus próprios manuais de orientação, redigidos por suas equipes,

assim como as grandes corporações que mantêm departamentos de

comunicação. As entidades representativas, como a Federação Nacional dos

Jornalistas (Fenaj), também produzem manuais. E, por fim, os teóricos do

jornalismo se valem igualmente de manuais para preparar os futuros jornalistas

na universidade, assim como para expor seus estudos num viés mais científico.

Machado8 (2007), ao prefaciar o Manual de Laboratório de Jornalismo na

Internet9, afirma que o ensino das práticas profissionais em qualquer área do

conhecimento “exige a elaboração de material didático adequado que possa

ser adotado pelos professores e servir de referência para os alunos”. Um bom

manual, afirma o autor brasileiro, pode ter uma dupla função:

1) difundir conhecimentos, com apresentação de conceitos e sugestão de exercícios práticos sobre áreas emergentes ou campos consagrados de atuação profissional e 2) propor metodologias específicas de ensino adaptadas às diversas modalidades de uma prática profissional. Nem sempre as duas dimensões são contempladas em todos os manuais. Muitas vezes, acaba-se privilegiando uma delas, o que, a priori, em nada compromete os objetivos da obra em questão. Trata-se de uma opção metodológica dos autores (MACHADO, 2007, p. 9).

Como o jornalismo envolve questões prático-teóricas, os manuais são de

fundamental relevância, apesar de, na perspectiva de Machado (2007), serem

pouco explorados ainda como objeto de pesquisa. Entre os manuais

brasileiros, impressos antes do advento da internet, nos anos 1990, ele destaca

os escritos por Vitorino Prata Castelo Branco (Curso de Jornalismo, 1945);

Natalício Norberto (Manual do Jornalista, 1962); Luiz Beltrão (Teoria e Técnica

de Jornal, 1964); Joaquim Douglas (A Técnica do Título, 1966); Paulo Oliveira

(Formação Jornalística, 1970); Nilson Lage (Estrutura da Notícia, 1987); Vera

Paternostro (O texto na TV, 1987); Maria Elisa Porchat (Manual de

8 Elias Machado é jornalista pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e doutor em Jornalismo pela Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Entre maio de 2012 e maio de 2016, foi diretor do Departamento de Projetos na Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Tem experiência nas áreas de Teorias do Jornalismo, Metodologias de Pesquisa, Ensino de Jornalismo, Jornalismo Digital e Impresso, Elaboração de Projetos Institucionais de Pesquisa, Gestão e Administração de Sociedades Científicas e Acadêmicas e instituições universitárias. Como jornalista foi diretor, editor, repórter e colaborou com rádios, jornais, revistas e assessoria no Brasil, Espanha e Portugal. Disponível em: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4723592Z4 Acessado em 23/5/2017.9 Manual de autoria de Marcos Palacios e Beatriz Ribas, professores de jornalismo da Universidade Federal da Bahia (UFBA). O manual foi editado em 2007 pela EDUFBA.

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Radiojornalismo Joven Pan, 1993). No mundo, ele destaca iniciativas na

Espanha e nos Estados Unidos.

Na Espanha, a redação do primeiro manual coube ao jornalista Rafael Mainar (El arte del periodista, 1906), livro reeditado em 2005, em comemoração aos cem anos da primeira edição. Nas décadas seguintes destacamos Curso General de Redacción Periodística, 1974, de José Luiz Martinez Albertos e Manual para Periodismo,1991, de Luis Núñez Lavedeze. Nos Estados Unidos, o pioneirismo na produção de manuais ficou por conta de Willard Bleyer (Types of News Writing, 1916), considerado como o desbravador neste tipo de literatura entre os estadunindenses. Entre os seguidores de Bleyer, citamos Curtis Mcdougall (Interpretative Reporting, 1938) e John Hohenberg (Professional Journalist, 1960) (MACHADO, 2007, p. 10).

Para Beltrão10 (1969), citado por Machado (2007), “o uso de compêndios –

que alguns pedagogos condenam, especialmente no ciclo superior de ensino –

justifica-se como ponto de apoio para o desenvolvimento do pensamento

reflexivo do aluno, pois sistematiza as informações prestadas em classe, ao

mesmo tempo que reduz o seu esforço de tomar apontamentos”. Os manuais,

no entendimento de Beltrão, precisam conter indicações bibliográficas, citações

e dados que estimulem os alunos a buscar mais informações e aprofundar seu

conhecimento (BELTRÃO, 1969, p.17 apud MACHADO, 2007).

Machado (2007) critica a baixa produção de manuais de jornalismo na era

digital, sobretudo no Brasil. Ele cita as primeiras obras do gênero produzidas

por teóricos no país. A mais antiga delas é o Manual de Jornalismo na Internet

(1996), de Marcos Palacios e Beatriz Ribas. Depois, vieram o Manual de Estilo

Web (2000), de Luciana Moherdaui, com a terceira edição lançada em 2007; o

Jornalismo na Internet (2003), de José Benedito Pinho; e Jornalismo Online

(2004), de Luciano Miranda.

Em termos internacionais consideramos como manuais de relevância os de Roland de Wolk, Introduction to Online Journalism: Publishing News and Information, de 2001; de Mike Ward, Journalism Online, de 2002 e traduzido em 2007 para o português; de Javier Diaz Noci e Ramon Salaverria, Manual de Redacción Ciberperiodística, 2003; de Mindy McAdams, Flash Journalism: How to Create Multimedia News Packages, 2005 e de Ramon Salaverria, Redacción ciberperiodística en Internet, de 2005 (MACHADO, 2007, p. 10).

10 Luiz Beltrão de Andrade Lima foi um jornalista, escritor e pesquisador brasileiro, pioneiro nos estudos da comunicação popular no Brasil. Disponível em http://www.portalintercom.org.br/publicacoes/jornal-intercom/banner-da-home/2015/11/estreia-2/vencedores-dos-premios-luiz-beltrao-e-jose-marques-de-melo-em-2016 Acessado em 24/5/2017.

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A baixa produção brasileira de manuais sobre jornalismo na internet,

criticada por Machado (2007), continua atual. Numa pesquisa, por meio de um

buscador com palavras-chave como “manual de jornalismo digital” e as

variantes “manual de jornalismo na internet”; “manual de webjornalismo”;

“manual de jornalismo online” e “manual de ciberjornalismo”, são poucos os

títulos que se apresentam. O Manual de Jornalismo na Internet (2007)11, de

Palacios e Ribas, é um título que se repete em todas as buscas, seguido do

Manual de Jornalismo Digital (2016)12, de Diogo Queiroz de Andrade; do Para

um Manual de Redação do Jornalismo On-line (2001)13, de Eduardo de

Carvalho Viana; do Manual de Redação da Presidência da República (2002)14,

de Gilmar Ferreira Mendes e Nestor José Forster Júnior; e de Somente a

verdade – Manual de Jornalismo da EBC (2013)15, coordenado por Nereide

Beirão.

Josh Fredman, um consultor independente que presta serviços para

companhias norte-americanas, corrobora com a discussão sobre manuais, ao

afirmar que são instrumentos de excelente aplicação no campo da escrita

técnica, por exemplo. Um bom manual de instruções16, no seu entendimento,

dirá ao usuário tudo que ele precisa fazer para ser capaz de dar sequência a

uma determinada tarefa de maneira eficiente e com segurança. Fredman

(2017) indica 8 passos, para a elaboração de um manual, que reproduzimos a

partir de agora: 1. Identifique as pessoas para quem a tarefa será destinada e

escreva pensando no nível de compreensão delas. Saber seu público-alvo é

uma parte fundamental na escrita técnica; 2. Escreva um sumário na frente do

manual se ele for ter mais do que algumas páginas. Se o manual for muito

longo, inclua um índice remissivo na parte de tras; 3. Escreva uma breve

introdução que descreva a tarefa em termos qualitativos. Dê ao usuário uma

11 Disponível em: http://gjol.net/wp-content/uploads/2012/12/book-manual-laboratorio.pdf Acessado em 24/5/2017.12 Disponível em https://leanpub.com/manualjornalismodigital Acessado em 24/5/2017.13 Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4204433/4101395/estudos1.pdf Acessado em 24/5/2017.14 Disponível em: http://www4.planalto.gov.br/centrodeestudos/assuntos/manual-de-redacao-da-presidencia-da-republica/manual-de-redacao.pdf Acessado em 24/5/2017.15 Disponível em http://www.ebc.com.br/institucional/sites/_institucional/files/manual_de_jornalismo_ebc.pdf Acessado em 24/5/2017.16 Tema do texto Como fazer um manual de instruções, escrito por Josh Fredman e traduzido por Sergio Mosquim Junior. Publicado no site e-How – Conselhos Confiáveis, endereço do tipo how-to, com artigos e vídeos que oferecem passo a passo em diversos temas. Disponível em: http://www.ehow.com.br/manual-instrucoes-como_10867/ Acessado em 23/5/2017.

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ideia da tarefa e qual será o resultado final. Esta oportunidade deve ser usada

para fornecer conselhos importantes que ajudarão o usuário a fazer a tarefa

correta e eficientemente; 4. Conforme necessário, dê uma lista de

equipamentos e itens relevantes que o usuário precisará para completar a

tarefa. Se o seu manual de instruções for para a montagem de um produto e

acompanha o produto a ser montado, inclua uma lista separada de todas as

partes que devem ter sido fornecidas ao usuario; 5. Cite claramente qualquer

risco significante que possa causar machucados, morte, danos a propriedade e

outros perigos. Use uma linguagem apropriada com as leis do local onde o

manual será vendido; 6. Escreva cada ação da instrução em um passo distinto,

provendo toda informação que o usuário precisará para concluir aquele passo.

A escrita deve ser literal, direta ao ponto e não pode ser ambígua; 7. Se houver

espaço em seu manual, inclua figuras e diagramas toda vez que for esclarecer

uma etapa difícil para o usuario; e 8. Caso julgue necessário, crie e inclua uma

lista de conselhos para guiar o usuário a completar a tarefa.

Nogueira17 (2010) afirma que manuais rígidos, no jornalismo, são

ineficazes, porque, segundo ele, podem inibir a criatividade dos jornalistas. “Se

o repórter tiver que consultar o manual antes de escrever cada texto, isso é um

problema para ele e para o leitor. Um manual simples, direto e flexível é a

melhor solução. Traz disciplina sem criar gesso. Outra virtude de um manual —

que não seja tirânico — é criar cultura editorial” (NOGUEIRA, 2010). Ele conta

como foi sua experiência em criar, em parceria com o também jornalista José

Roberto Guzzo, um manual básico de redação no início dos anos 2000, quando

ainda era superintendente de uma das unidades de negócios da Editora Abril.

Apesar de o manual ser de redação jornalística, as dicas de Nogueira (2010)

valem como orientação na seleção de conteúdos para a elaboração de um

manual de novas práticas jornalísticas na era digital, objeto desta pesquisa.

1 – Seja simples. Palavras curtas são melhores que palavras longas. Frases curtas são melhores que frases longas. Verbos simples são melhores que verbos pomposos. “Paulo diz” ou “Paulo afirma” é melhor que “Paulo explica” ou “Paulo ensina”.

17 Paulo Nogueira é um jornalista brasileiro, fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo. Entre seus textos, um deles que destaca a importância de um bom manual para a profissão de jornalismo. Disponível em: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/pequeno-manual-basico-de-jornalismo/ Acessado em 23/5/2017.

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2- Seja desconfiado. As pessoas mentem. Cheque informações relevantes ou se proteja com uma técnica adequada de redação. “Paulo diz que caminha uma hora por dia” é melhor que “Paulo caminha uma hora por dia”.3- Seja original. Responda rápido: existe início de matéria mais desinspirado que “responda rápido”? Fuja dos clichês e dos lugares comuns. “Brasileiro” é melhor que “brazuca”. A busca da originalidade vale tanto para o texto como a matéria em si. Qualquer matéria sobre uma nova tendência é melhor que uma matéria sobre a morosidade da justiça.4- Seja “plagiador”. Leia sistematicamente, pedagogicamente as publicações internacionais que sejam referência para o tipo de revista em que você trabalha. Isso encurta o caminho. Preste atenção em tudo: das chamadas de capa às legendas.5- Seja versátil. O jornalista ideal é o que é capaz de apurar, escrever e editar. Ele vale por três. E pode ganhar por três.6- Seja engraçado. Senso de humor é fundamental, qualquer que seja a natureza da revista. Instruir e divertir: este é o nome do jogo.7- Seja humano. Pessoas estão por trás de tudo sobre que escrevemos, de ciência e TI a hotéis e times de futebol. A presença de gente nas matérias só as melhoram.8- Seja claro. Só termine de apurar quando você entender de verdade o que apurou. Só comece a escrever quando tiver certeza de entender o que estará escrevendo.9- Seja consciente. Você precisa saber exatamente o que quer escrever. 10- Seja lógico. Comece pelo começo; vá direto até o fim; aí pare (NOGUEIRA, 2010).

1.2. Novas práticas jornalísticas se transformam com a tecnologia

A tecnologia muda as rotinas do jornalismo, como discutiremos ao longo

da apresentação desta pesquisa. E as práticas profissionais são alteradas, por

consequência, com as invenções que nascem da tecnologia. Atualmente, para

se ter uma ideia, drones18 tornaram-se aliados de jornalistas na África19, na

captura de imagens aéreas – em formato de fotos e de vídeos - utilizadas como

suporte para a realização de conteúdos. Mas este é apenas um exemplo. Só

no século XX, tivemos o telefone, o telégrafo e a máquina de escrever como

invenções. E agora é bastante comum ouvir falar em realidade virtual e em

vídeos 360 graus20, designações inimagináveis há alguns anos, também em 18 Drone é uma palavra inglesa que significa "zangão", na tradução literal para a língua portuguesa. No entanto, este termo ficou mundialmente popular para designar todo e qualquer tipo de aeronave que não seja tripulada, mas comandada por seres humanos a distância. Disponível em: https://www.significados.com.br/drone/ Acessado em 25/5/2017.19 Tema de reportagem de Irene Wangui - 4 dicas para melhores matérias de jornalismo drone. Publicado pelo site da IJNET - Rede de Jornalistas Internacionais em 23/5/2017 Disponível em: https://ijnet.org/pt-br/blog/4-dicas-para-melhores-mat%C3%A9rias-de-jornalismo-drone Acessado em 24/5/2017.20 O vídeo 360 e a realidade virtual são baseados no mesmo conceito: as imagens, gravadas de forma omnidirecional, permitem ao usuário contemplar uma cena como se estivesse no centro dela. Assim, ele pode ver o que acontece em todas as direções: para a frente, para trás, para a direita, para a esquerda,

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países de regiões como a da América Latina, com experiências que começam

a ganhar corpo e a simpatia das massas que experimentam novas mídias.

Lemos21 (2013) trata do fenômeno tecnológico por meio da história,

percorrendo desde as origens pré-históricas, as primeiras civilizações e os

gregos, passando pelo Império Romano, Idade Média e Renascimento, e

finalizando na Revolução Industrial e no que denominou Tecnocultura e

modernidade. A história do desenvolvimento tecnológico pode ser pensada em

três fases, no seu entendimento, sendo que a contemporânea é a da

ubiquidade22. O transporte da informação agora é móvel, não precisa mais

estar ligado a um ente físico. Com os limites de velocidades vencidos, as

distâncias se tornaram praticamente nulas, a viagem, que antes era primitiva,

agora zerou seu tempo de percurso, e, com os custos de produção e

distribuição cada vez mais baixos, a comunicação na sociedade

contemporânea23 ganhou liberdade de movimento, conforme afirma Bauman24

(1999).

A separação dos movimentos da informação em relação aos movimentos dos seus portadores e objetos permitiu por sua vez a diferenciação de suas velocidades; o movimento da informação ganhava velocidade num ritmo muito mais rápido que a viagem dos corpos ou a mudança da situação sobre a qual se informava. Afinal, o aparecimento da rede mundial de computadores pôs fim – no que diz respeito à informação – à própria noção de “viagem” (e de “distância” a ser percorrida), tornando a informação instantaneamente disponível em todo o planeta, tanto na teoria como na prática (BAUMAN, 1999, p. 21-22).

para cima ou para baixo. O assunto é tema da reportagem Realidade virtual na América Latina: apresentando ao público uma nova forma de ver o mundo, produzida por César López Linares, divulgada no Blog Jornalismo nas Américas e no livro eletrônico Jornalismo Innovador na América Latina, editado por Teresa Mioli e Ismael Nafría e lançado no dia 23 de abril de 2017, durante o 10º Colóquio Ibero-Americano de Jornalismo Digital, organizado pelo Centro Knight para Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas em Austin. Disponível em: https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/blog/00-17886-realidade-virtual-na-america-latina-apresentando-ao-publico-uma-nova-forma-de-ver-o-mu e https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ebook/jornalismo-inovador-na-america-latina-pt-br Acessado em 25/5/2017.21 André Lemos é um pesquisador brasileiro, doutor em sociologia pela Universidade Réne Descartes, Paris 5, Sorbonne. É atualmente professor da Faculdade de Comunicação da UFBa (Universidade Federal da Bahia), coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em Cibercultura (Ciberpesquisa). Disponível em: http://www.editorasulina.com.br/autor_det_2.php?id=160 Acessado em 16/5/2017.22 Estar presente ao mesmo tempo em todos os lugares. É a propriedade do que é ubíquo, que é a capacidade de estar ao mesmo tempo em diversos lugares. Disponível em: https://www.significados.com.br/ubiquidade/ Acessado em 17/5/2017.23 Contemporâneo é um adjetivo que faz referência ao que é do mesmo tempo, que viveu na mesma época. Designa quem ou o que partilha ou partilhou o mesmo tempo. O sentido de sociedade contemporânea é sociedade atual. Disponível em: https://www.significados.com.br/contemporaneo/ Acessado em 16/5/2017.24 Zygmunt Bauman foi um filósofo e sociólogo polonês, professor emérito de sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia. Morto em 2017, foi o grande pensador da modernidade. Perspicaz analista de temas contemporâneos, deixou uma vasta obra - com destaque para o best-seller Amor líquido. Disponível em: http://www.zahar.com.br/autor/zygmunt-bauman Acessado em 16/5/2017.

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A informação se deslocou de seus portadores, levando a uma libertação

em relação ao físico e a uma nova condição de poder aos que, agora,

tornaram-se “extraterritoriais”. Uma “nova liberdade” que se vislumbra no

“ciberespaço eletronicamente sustentado, onde a “a desterritorialização do

poder anda de mãos dadas, portanto, com a estruturação cada vez mais estrita

do território (BAUMAN, 1999, p. 27). Desterritorização que Lévy25 (1999) chama

de virtual, quando o portador direto do saber é o ciberespaço, a região dos

mundos virtuais.

As condições de trabalho encontram também outro patamar a ser

enfrentando e entendido pelo jornalista que não está mais na condição de local,

fixo, mais sim de global, ainda que passe o dia sentado entre quatro paredes.

Diferente de paredes de uma prisão, o isolamento aparente em estar frente a

um dispositivo portátil ou móvel tem outro contexto na globalização26. O

trabalho é flexível, mesmo que dependa dos interesses econômicos dos

investidores, esta flexibilidade é uma variável da qual o jornalista terá que se

adaptar e isso muda sua postura frente ao seu produto maior: a notícia. Muda

também frente aos seus colegas de profissão, à sua localidade, ao tempo e ao

espaço, agora comprimidos. A pressão, hoje, é para romper os hábitos de trabalho regular, permanente cronometrado, fixo - o que mais significaria o lema do “trabalho flexível”? [...] A mão de obra só pode tornar-se realmente “flexível” se os empregados, efetivos ou em perspectiva, perderem os hábitos adquiridos do trabalho cotidiano, dos turnos diários, de um local permanente de trabalho e de uma empresa com colegas fixos; só se não se habituarem a qualquer tipo de emprego e, sobretudo, se evitarem (ou forem impedidos de) desenvolver atitudes vocacionais em relação a qualquer trabalho realizado no momento e abandonarem a tendência mórbida de fantasiar direitos à manutenção do emprego e as responsabilidades inerentes (BAUMAN, 1999, p 120).

A condição em que Baumam (1999) coloca o trabalho no mundo

globalizado é de transformação, mudanças de hábitos tradicionais do cotidiano,

de um local permanente e, por que não, de mudanças de paradigmas nesse

“oceano” de informações na internet em que o jornalista se apresenta como

ator indispensável para garantir validade e legitimidade ao conteúdo que chega

25 Pierre Lévy nasceu na Tunísia em 1956. É filósofo, sociólogo e pesquisador em ciência da informação e da comunicação. Ele estuda o impacto da internet na sociedade, as humanidades digitais e o mundo virtual. Disponível em: https://pierrelevyblog.com/ Acessado em 16/5/2017.26 A globalização é um fenômeno moderno que pode ser analisado sob diversos ângulos. O termo provém do inglês globalization, em que global equivale a mundial. Em termos gerais, globalização consiste na integração das sociedades internacionais num único mercado capitalista mundial. O fenômeno é defendido com base em teorias como a referente ao neoliberalismo. Disponível em: http://conceito.de/globalizacao Acessado em 14/5/2017.

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aos usuários na forma de informação, independente do suporte (WOLTON27,

2011), no contexto da cibercultura, de trocas permanentes de ideias e serviços

em comunidades virtuais pelas redes móveis, em uma realidade de criação

compartilhada, constituída com a cultura na sociedade contemporânea. “A

internet encarna a presença da humanidade e ela própria, já que todas as

culturas, todas as paixões aí se entrelaçam. Já que tudo é possível, ela

manifesta a conexão do homem com a sua própria essência, que é a aspiração

da liberdade” (LÉVY in: LEMOS, 2013, p. 13).

O JORNALISMO E A INTERNET

2.1 Tecnologias da informação e comunicação, avanço sem volta

Nos últimos 25 anos, e de forma exponencial, a comunicação passou

dos computadores pessoais aos smartphones, fazendo com que o acesso à

informação, principalmente por meio das mídias sociais28, esteja nas mãos de

cada um. O universo digital do multimídia - do ciberespaço e da cibercultura29 –

criou um entusiasmo e utopias que refletem na vida das pessoas e no futuro da

comunicação. Nesse período, desde o início da internet em 1995, o número de

brasileiros conectados à rede mundial de computadores ultrapassa os 100

milhões, número que está em constante crescimento. O modo de consumo de

mídia sofreu alterações, se deslocando do impresso para a internet, e uma

nova geração de jovens se apresenta como consumidores inteiramente

familiarizados com o mundo virtual, em todas as formas de serviços.

Algumas constatações e evidências desvendam esse cenário,

esclarecem e definem o corpus desta pesquisa. As novas tecnologias da 27 Licenciado em direito pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris, Dominique Wolton é um intelectual francês reconhecido internacionalmente por suas pesquisas e conceitos. Wolton é doutor em Sociologia e diretor da revista internacional Hermès, criada em 1988 para difundir a pesquisa científica. Disponível em: http://www.wolton.cnrs.fr/spip.php?rubrique1 Acessado em 16/5/2017.28 Diferente dos meios de comunicação tradicionais, mídias sociais são canais de relacionamento na internet nos quais existem diferentes possibilidades de interação e participação entre usuários. Disponível em: https://www.internetinnovation.com.br/blog/midias-sociais-conceito-e-definicao/ Acessado em 16/5/2017.29 Cibercultura é a cultura que surgiu, ou surge, a partir do uso da rede de computadores, e de outros suportes tecnológicos, como o smartphone e o tablet. Ela é produzida no ciberespaço, esse novo meio que surge a partir da interconexão de computadores. Fonte bibliográfica: LÉVY, Pierre (1999, p. 17).

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informação e da comunicação modificaram as relações humanas e sociais,

dominam agora o tempo e espaço e dão autonomia para que cada um possa

agir de forma livre, sem filtros, sem hierarquias e em tempo real (pela ótica de

que todos são iguais em frente a um computador), dando mais liberdade para a

resposta e obtenção de resultados imediatos aos que surfam na internet

(WOLTON, 2012).

O poder das tecnologias estava cercado de incertezas e utopias no início

dos anos 2000 e até de um certo ceticismo e de “repetição de promessas”30

sobre o futuro que se vislumbrava. Características desse avanço compreendem

a liberdade e capacidade de dominar o tempo e o espaço, na velocidade, na

abundância e fartura, em um mundo aberto e acessível a todos, de prateleiras

infinitas e custos perto de zero, de fronteiras dilatadas, (in)existentes, em que o

saber está no ciberespaço, num mundo de bibliotecas desterritorializadas

(ANDERSON31, 2006; BAUMAN, 1999; LÉVY, 1999; WOLTON, 2012).

Tempo e espaço são dois fatores que acompanham a rotina de trabalho

do jornalista desde que existe a profissão32. Das rotativas de jornais impressos,

que ainda resistem ao tempo, ao clique para publicar uma notícia na internet,

encontramos em Bauman (1999) o caminho para compreender como distância

e velocidade interferem diretamente no modo da produção e distribuição da

informação no século XXI, e, consequentemente, na constituição das

sociedades para a qual o jornalismo presta os seus serviços.

Vivemos praticamente em um mundo de fronteiras inexistentes, segundo

Bauman (1999), ao falar do fim das geografias. “As distâncias já não importam,

ao passo que a ideia de uma fronteira geográfica é cada vez mais difícil de

sustentar no “mundo real”” (p. 19). Ele considera a distância como um produto

social, sendo que a sua extensão depende diretamente da velocidade pela qual

30 Para Wolton (2012), a publicidade dada às novas tecnologias gerou um progresso incontestável e que no fim dos anos 1990 girava em tono de realidades e mitos, entusiasmo que só poderia ser percebido em dez anos. No final de 1998, a França ainda mantinha 14 milhões de conectados ao Minitel, sistema de informática francês, hoje totalmente substituído pela internet como a conhecemos. 31 Inglês de nascimento e físico por formação, Chris Anderson é um escritor bastante conhecido no mundo por seu livro A cauda longa: do mercado de massa para o mercado de nicho, escrito nos Estados Unidos em 2006. Disponível em: https://about.me/andersonchris Acessado em 16/5/2017.32 Não se sabe ao certo a origem exata do jornalismo e qual foi o primeiro jornal do mundo, mas os historiadores atribuem ao lendário Imperador Romano Júlio César. Para poder divulgar suas conquistas militares, e informar o povo da expansão do Império (fazendo obviamente muita propaganda pessoal), o imperador criou a chamada Acta Diurna, o primeiro jornal de que se tem notícia no mundo. Fonte: Uma história breve do jornalismo no Ocidente, de Jorge Pedro Sousa, 2010. Como profissão, o jornalismo nasceu mais tarde, no século XIX, impulsionado pela Revolução Industrial. Bibliografia pesquisada: TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo, porque as notícias são como são, de 2012.

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pode ser vencida e pelo custo de produção dessa velocidade. Sobre isso, há

implicações econômicas, uma vez que falar em perto e longe não faz mais

sentido para aqueles que acessam a velocidade da mensagem eletrônica. Mas

ao longo dos últimos anos o privilégio do acesso à internet está deixando de

ser apenas das elites e se transferindo para a maioria da população no mundo.

O Brasil é um bom exemplo para percebermos como esse avanço está

acontecendo e refletirmos sobre o impacto que ele traz para a sociedade, a

comunicação e o jornalismo. A primeira edição da pesquisa F/Nazca Saatchi &

Saatchi33, realizada em 2007, sobre o comportamento da população na

internet, mostrou que 49,7 milhões de brasileiros tinham o hábito de acessar a

rede, 39% da população de acordo com a amostra da coleta. Nessa época, de

acordo com o perfil dos entrevistados, a classificação econômica medida pelo

Critério Brasil, apontou que a maior concentração de brasileiros está na classe

C (45%), sendo que outros 31% estão D e E, apenas 3% fazem parte da classe

A, dos mais ricos, e 21% da B. Historicamente, esse cenário avança para uma

melhor condição de vida da população, mas o Brasil continua sendo um país

de população majoritariamente pobre, assim como a maioria da América

Latina.

A edição mais recente da pesquisa da mesma agência34, realizada em

2015, traz o boom móvel que a internet causou no país agora com 107 milhões

de brasileiros conectados à rede. Nessa amostra, 65% da população brasileira

com mais de 12 anos estão na internet. O crescimento maior ocorreu nas

classes C (70%), e D e E (30%).

Ao observamos os dados da Pesquisa Brasileira de Mídia35 realizada em

2016 pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República

(Secom), com o objetivo de conhecer os hábitos de consumo de mídia da 33 A metodologia da pesquisa quantitativa tem por base dados do Censo populacional de 2000 e estimativas de 2005 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Foram realizadas 2.166 entrevistas num universo de brasileiros com 16 anos ou mais. Disponível em: http://www.fnazca.com.br/wp-content/uploads/2007/03/fradar_1a_edicao_marco2007.pdf. Acessado em 25/2/2017. 34 A 15ª edição da pesquisa quantitativa, realizada pela F/Nazca Saatchi & Saatchi, em maio de 2015, entrevistou ao todo 2.296 pessoas, com 12 anos ou mais, em 144 municípios brasileiros. O universo da pesquisa levou em consideração o censo populacional feito em 2010 com estimativa de 2014, do IBGE de 164.901.589 habitantes. Disponível em: http://www.fnazca.com.br/wp-content/uploads/2015/10/f_radar-2015-revisado.pdf. Acessado em 25/2/2017. 35 A pesquisa foi realizada com a população de 16 anos ou mais da área em estudo, de todas as classes econômicas (ABCDE), de ambos os sexos. O tamanho total da amostra nacional foi fixado em 15.050 entrevistas, distribuídas em todo o país. Disponível em: http://www.secom.gov.br/atuacao/pesquisa/lista-de-pesquisas-quantitativas-e-qualitativas-de-contratos-atuais/pesquisa-brasileira-de-midia-pbm-2016.pdf/view Acessado em 26/2/2017.

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população brasileira, os dados também refletem números expressivos de como

a população usa a internet. O telefone celular é o dispositivo que 72% utilizam

para acessar internet, enquanto 25% o fazem pelo computador. Os brasileiros

passam em média 5 horas por dia conectados, de segunda à sexta-feira. A

desvantagem ainda está no nível de confiança do que é consumido como

notícia na internet em comparação com outros meios. 62% confiam poucas

vezes no que é publicado na web. Um dado que mostra um grande desafio

para a comunicação e o jornalismo na era digital (BRASIL, 2016).

Outros dados compravam que os brasileiros estão abertos às novas

tecnologias. A 11ª edição da pesquisa TIC Domicílios 201536 mostrou que 58%

da população brasileira usam a internet, o que representa no total 102 milhões

de internautas. O telefone celular é o dispositivo mais utilizado para o acesso

individual pela maioria: 89%, seguido pelo computador de mesa (40%),

computador portátil ou notebook (39%), tablet (19%), televisão (13%) e

videogame (8%). Nessa pesquisa, observa-se que a proporção entre as

classes A e as classes B, C, D e E para os que mais usam a internet está

equilibrada, sendo que a classe A ainda é a que mais usa (cerca de 95%); a B

fica com 82%; a C 57%; e a D/E, 28% (CGIBR, 2015).

Esses levantamentos, então, mostram também que estamos num

caminho sem volta, em que se criou um outro espaço cibernético do mundo

humano, emancipado das restrições naturais do corpo físico. “Elementos desse

espaço, de acordo com Paul Virilio37 são “desprovidos de dimensões espaciais,

mas inscritos na temporalidade singular de uma difusão instantânea””

(BAUMAN, 1999, p. 24).

A instantaneidade veio acompanhada pela redução dos custos de

transmissão da informação, refletindo no que Anderson (2006) estabelece

como as “três forças da Cauda Longa38”, o que é determinante para viabilizar o 36 A pesquisa foi realizada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) e pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br). Entrevistas em 23.465 domicílios do território nacional, entre novembro de 2015 e junho de 2016. Disponível em http://www.brasil.gov.br/ciencia-e-tecnologia/2016/09/pesquisa-revela-que-mais-de-100-milhoes-de-brasileiros-acessam-a-internet Acessado em 26/2/2017. 37 Filósofo, urbanista francês, arquiteto, polemista, ensaista, pesquisador e autor de vários livros sobre as tecnologias da comunicação. Nascido em Paris, na França, é autor de vários livros sobre o tema. Disponível em: http://www.editions-galilee.fr/f/index.php?sp=livAut&auteur_id=2051 Acessado em 13/5/2017.38 Conceito criado por Chris Anderson para demonstrar que o mercado dos grandes sucessos, como os hits musicais, está competindo com o mercado de nichos, de qualquer tamanho, de produtos que não figuram no topo dos mais vendidos, mas que se mantêm ativos somados ao número de variedades

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deslocamento das esferas físicas para o virtual. A primeira força é a

democratização das ferramentas de produção. Hoje, milhões de pessoas

produzem conteúdos e disponibilizam para o mundo. “O resultado é que o

universo de conteúdo disponível está crescendo mais rápido do que em

nenhuma outra época.” A força 2: democratização das ferramentas de

distribuição reduziu o custo de consumo.

O PC39 transformou todas as pessoas em produtores e editores, mas foi a internet que converteu todo o mundo em distribuidores. Em sua forma mais drástica, essa é a economia dos bits40 versus átomos, ou seja, a diferença entre as frações de cents41 para distribuir conteúdo online e os múltiplos de dólares para fazê-lo com caminhões, depósitos e prateleiras (ANDERSON, 2006, p. 53).

Além do PC, atualmente os telefones inteligentes, os smartphones42,

também se transformaram em equipamentos de produção e de distribuição de

informações.

A terceira força, Ligação entre oferta e procura, relaciona-se com a

economia em reduzir os custos de busca para encontrar o conteúdo num

mundo de nichos. Isso inclui qualquer coisa que facilite encontrar o que se

procura ao preço que se quer reduz os custos de busca. Neste ponto, os

consumidores atuam como guias quando deixam seus comentários na internet

sobre algo.

disponíveis e à possibilidade livre de escolha dos consumidores. O sistema broadcast de levar um programa a milhões de pessoas tem a sua eficiência comprovada, mas não faz o contrário, de fazer chegar um milhão de programas para uma pessoa, exatamente o que a internet faz tão bem. A economia da era do broadcast exigia programas de grande sucesso - algo grandioso – para atrair audiências enormes. Hoje, a realidade é oposta. Servir a mesma coisa para milhões de pessoas ao mesmo tempo é demasiado dispendiosos e oneroso para as redes de distribuição destinadas à comunicação ponto a ponto (ANDERSON, 2006, p.5).39 Sigla de Personal Computer, ou computador pessoal em português. O primeiro PC foi lançado pela IBM em 1981. Depois vieram os XTs, 286s, 386s até chegar nos dias de hoje. Originalmente, PC poderia ser usado em relação a qualquer computador doméstico, mas o mais comum é o uso em relação aos computadores derivados da arquitetura da IBM. Os Macintoshs, também são computadores pessoais, mas são chamados de Macs. Disponível em: http://www.hardware.com.br/termos/pc Acessado em 19/5/2017.40 O termo bit, ou binary character em inglês, é empregado como nome de unidade, de símbolo invariável bit, seja para exprimir o tamanho de uma memória ou de um arquivo, seja em combinação com uma unidade de tempo, geralmente o segundo, para exprimir um débito de transmissão. Disponível em: http://www.culture.fr/franceterme/result?francetermeSearchTerme=bit&francetermeSearchDomaine=0&francetermeSearchSubmit=rechercher&action=search Acessado em 15/5/2017.41 Centavos de Dólar (U$$)42 Pesquisa do Instituto Datafolha divulgada em julho de 2015, realizada com brasileiros de 16 a 24 anos, mostra que 78% têm smartphone, percentual que é de 52% entre os que têm 25 anos ou mais. 76% dos mais jovens costumam acessar a rede pelo celular, índice maior que qualquer dos outros aparelhos pesquisados -- notebook, computador de mesa, tablet, videogame e smart TV.

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A conjugação dessas forças levou os consumidores de produtos ou de

conteúdo a se transformarem em produtores (ANDERSON, 2006) sem

precisarem de nenhuma ligação com seu ambiente terrestre para afirmar,

fundar ou manifestar o seu poder. Um poder que, em Bauman (1999), estava

reservado apenas às elites, mas que agora ganha contornos mais

democráticos e se espalha pelo planeta.

2.2. A internet como meio de massa versus mídias tradicionais

A informação, que hoje circula nas novas mídias e estão disponíveis nas

redes sociais43 e aplicativos dos smartphones, teve seu conteúdo

disponibilizado na internet por meio da web, como foi apresentada ao mundo

pelo WWW (Word Wide Web) no início dos anos 1990. O conteúdo foi

apresentado à época de forma estática, sem interatividade com o público, fase

chamada de web 1.0.

Nos seus estudos sobre o conteúdo que se apresentava na web, no

início da comunicação na internet, Wolton (2013) classificou em quatro

categorias os tipos de informação disponíveis pelas instituições, ou ofertas

organizadas por elas, como definiu. Seriam elas os “serviços” que congregam

divulgações de espetáculos, cinema, shows; informações sobre meteorologia,

sites de busca, etc. “Lazer”, como jogos interativos. A terceira, “informação-

notícia”, as fornecidas por agências ou jornais; e por último as do tipo

“informação-conhecimento” disponibilizadas em bancos de dados. Nesse

contexto, Wolton diz que, com a web, veio a crença da urgência de satisfazer

as necessidades de informação do público, mas que oferta superou a

demanda. Uma demanda que teve seu aumento significativo depois, devido a

fatores já vistos mais acima, o que acabou por legitimar o novo mercado da

web.

43 Rede social é uma aplicação da web cuja finalidade é relacionar as pessoas. Assim, quem integra uma rede social pode conectar-se entre si e criar vínculos. A rede permite a criação de um perfil com limitações em sua acessibilidade que pode ser compartilhado ou não com quem solicite. Exemplos: Facebook, Youtube, Instagram, etc. Disponível em: https://conceitos.com/rede-social/ Acessado em 14/5/2017.

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Ainda haveria uma desigualdade sociocultural na utilização das quatro

categorias, na maneira de construir, de apresentar e no acesso a essas

informações (seletivas pelos conteúdos e procedimento de pesquisa), o que

está ligado aos “esquemas culturais”, segundo Wolton. Sob essa ótica, o

sociólogo francês sinaliza que os meios de massa, como jornais, televisão e

rádio, promovem um acesso menos “segregativo” se revelando mais

democráticos, na esfera do “Um-Todos”, pois são “instrumentos de

comunicação que atuam no universal e não no particular” (p.94) em

contraposição à segmentação dos conteúdos em função dos meios sociais.

Um fator a ser considerado sobre as novas mídias diz respeito à

participação do indivíduo. Relembremos com Wolton das categorias clássicas

de Harold Lasswell44, de que para haver comunicação é necessária a ligação

entre emissor, mensagem e receptor, numa representação de quem diz o quê,

a quem, por qual mensagem, com qual intenção e por qual canal. Wolton

explica que o público ou a falta de se medir para que público está se dirigindo

diferencia a comunicação na internet da mídia tradicional, que supõe a

construção prévia do público. [...] “o que explica a diferença da sedução da Net

cuja utopia consiste, ao contrário, não construir a priori esse público, uma vez

que pode estar em qualquer lugar do mundo” (WOLTON, 2012, p. 97).

Nessa perspectiva, o sociólogo espanhol Manuel Castells, um dos mais

importantes cientistas sociais da atualidade, esclarece como a diversificação da

audiência de massa mudou com a internet e interfere no relacionamento com o

indivíduo. [...] a nova mídia determina uma audiência segmentada, diferenciada que, embora maciça em termos de números, já não é uma audiência de massa em termos de simultaneidade e uniformidade da mensagem recebida. Na nova mídia não é mais mídia de massa no sentido tradicional do envio de um número limitado de mensagens a uma audiência homogênea de massa. Devido à multiplicidade de mensagens e fontes, a própria audiência torna-se mais seletiva. A audiência visada tende a escolher suas mensagens, assim aprofundando sua segmentação, intensificando o relacionamento individual entre o emissor e o receptor (SABBAH apud CASTELLS, 1999, p. 424).

44 Harold Lasswell foi um cientista político norte-americano, conhecido por estudos sobre relações de poder e de personalidade e política. Autor de mais de 30 livros e 250 artigos acadêmicos sobre temas diversos, incluindo relações internacionais, psicanálise e educação jurídica. Características do modelo de Lasswell: a comunicação é intencional, consciente e voluntária; a comunicação é individual e os papéis do emissor e receptor são isolados; sem reciprocidade. Disponível em: https://www.britannica.com/biography/Harold-Lasswell Acessado em 16/5/2017.

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Essa falta de controle leva uma liberdade à informação, que, por

séculos, foi sempre suprimida da população, protegida por batalhas jurídicas e

políticas. No momento atual, um grande “bazar” se instala, livre de qualquer

regulamentação. Como bem observa Wolton, nem os jornalistas reivindicam

esse controle, já que todos podem publicar na rede. A questão que se coloca, e

não se pretende aqui resolvê-la, mas sim enunciá-la, pois o que se vislumbra

para o futuro ainda é incerto, no que diz respeito à essa liberdade, está

exatamente nas contradições que a conquista dessa liberdade representa para

a sociedade da informação45.

Não se pretende aqui travar uma guerra entre as mídias tradicionais e as

digitais, até por que tevê, rádio e jornais impressos não deixaram de existir e

continuam alimentando uma demanda que vem, logicamente, da oferta de

informação por parte desses veículos de comunicação. Inclusive todos esses

meios migraram para a internet e estão adaptando seus modelos para tal. A

busca pela audiência agora também é medida pelos números de curtidas,

likes46, visualizações e compartilhamentos. Nem mesmo queremos reduzir a

comunicação apenas à técnica, muito utilizada pelo ambiente digital, mas sim

de introduzir uma reflexão mais aprofundada sobre o que essa técnica

representa para o jornalismo hoje, uma vez que os profissionais se utilizam

dela para promover novas práticas jornalísticas.

Nesse caso, Wolton (2013) diz que a tevê, como mídia generalista, não

está defasada em relação à internet, houve sim um progresso técnico entre

uma e outra, mas não devemos nos concentrar apenas numa definição

tecnológica da comunicação, e que o desafio é justamente “compreender que a

comunicação é mescla de três dimensões: técnica, cultural e social” (p. 118).

Para Wolton (2013, p.128), as mídias generalistas, como a tevê, não

estão condenadas pelo multimídia. O papel da tevê é de continuar

disponibilizando conteúdo gratuito a um maior número de pessoas possível, em

45 A Sociedade da Informação tem por base tecnologias de informação e comunicação que envolvem a aquisição, o armazenamento, o processamento e a distribuição da informação por meios eletrônicos, como rádio, tevê, telefone e computadores. Essas tecnologias não transformam a sociedade por si só, mas são utilizadas pelas pessoas em seus contextos sociais, econômicos e políticos, criando uma nova comunidade local e global: a Sociedade da Informação. Gouveia, Luis Borges. Notas de contribuição para uma definição operacional. 2004. Disponível em: http://homepage.ufp.pt/lmbg/lg_textos.htm Acessado em 16/5/2017.46 O botão like é um dispositivo criado para analisar o quanto uma pessoa está sendo bem avaliada pelos usuários de uma rede social como o Facebook. Disponível em: http://www.i9socialmedia.com/o-significado-do-%E2%80%9Clike%E2%80%9D-no-facebook/

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contraposição a um sistema onde tudo está à disposição de maneira temática,

interativa e paga. Há de se considerar que é nesse sistema que se encontra o

jornalismo na era digital, cercado das suas técnicas, habilidades e

competências.

O sociólogo francês esclarece que as mídias tradicionais47 representam

mais uma escala coletiva da comunicação, portanto mais complexa do que a

escala individual à qual se encaixam as novas tecnologias. Os pontos-chave

para a compreensão do papel das mídias de massa e das tecnológicas estão

centrados então na compreensão de que o progresso não freou as antigas

mídias, mas represetou um avanço em termos de comunicação, o que, nas

palavras de Wolton, acontece “somente se existe um encontro entre uma

inovação técnica e uma mudança de modelo cultural e de concepção da

comunicação na sociedade” (p. 120).

É preciso ter em mente ainda que, numa escala global, onde tudo é

permitido, com a informação circulando livremente na rede independente de

quem a publica, não podemos dizer que o acesso cada vez mais acelerado da

população à internet, signifique uma “repartição mundial mais equitativa das

riquezas técnicas ou humanas”. Assim como compreender que tipo de

comunicação esse acesso gera é desafio para as civilizações em diferentes

partes do mundo, uma vez constatado que as competências exigidas aos

usuários em um mesmo dispositivo numa compra na internet e o acesso a um

banco de dados de uma biblioteca não são equivalentes.

Para dizer de outra maneira, a facilidade de consulta e de acesso à informação expõe às claras a questão evidentemente cultural e muito mais complexa dos meios cognitivos que dispõe o indivíduo para contextualizar a informação e de se servir. O acesso direto não muda em nada a divisão e a hierarquia dos conhecimentos (WOLTON, 2012, p. 134).

Wolton alerta que a imprensa tem um papel fundamental nesse processo

e deveria chamar a reponsabilidade para si também quando se trata do

fenômeno das novas mídias e ter curiosidade de como tudo isso acontece,

olhar para as novas mídias como faz com “outras atividades sociais, técnicas e

47 O termo mídias tradicionais é utilizado para designar meios como rádio, tevê e jornal impresso, em oposição às novas mídias ou também chamadas de mídias alternativas, dentre as quais a internet, especificamente blogs e redes sociais. Disponível em: https://www.internetinnovation.com.br/blog/midias-sociais-conceito-e-definicao/ Acessado em 19/5/2017.

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econômicas: avaliar os pontos fracos e fortes, os defeitos e as qualidades.

Informar, criticar, explicar” (p. 139).

A internet nasceu sendo sinônimo de gratuidade e liberdade de acesso e

expressão. Há uma conexão direta entre os que se propõem a fazer um

jornalismo colaborativo e o acesso gratuito dos leitores, uma vez que a própria

prática dos colaboradores também não tem custo. Há sim, uma relação de

troca, em que o autor/jornalista divulga seu canal de trabalho na web ou nas

redes sociais, mas não um ambiente de patrão, empregado e direitos

trabalhistas. Embora existam barreiras econômicas e fronteiras virtuais que

garantam ou não essa ideia, a questão sobre o acesso gratuito à informação

jornalística tem sido alvo de debates e incertezas para as empresas de

comunicação, além de amplamente discutidas pela comunicação acadêmico-

científica.

Assim, esta pesquisa, em torno da concepção de conteúdo para um

manual de jornalismo na era digital, coloca o jornalista e o fazer jornalismo

como parte dessa problemática. Seu lugar no mundo do trabalho exige uma

compreensão das duas mídias (tradicionais e novas), uma vez que ambas se

encontram no ciberespaço, mas, como assinala Wolton, estão em posição

simétrica. Quanto à performance técnica da prática jornalística, a intenção

aqui, não é equipará-la a uma redução simplista de sinônimo de comunicação,

mas sim de compreender que papel ela tem no jornalismo na internet.

2.3. Crise a superar: era digital muda o jeito de fazer jornalismo

Alguns aspectos sobre essas novas questões tecnológicas e,

consequentemente, sociais merecem destaque neste trabalho, para

localizarmos o momento de transformação pelo qual passa o jornalismo na

contemporaneidade e as interferências práticas no seu modo de produção e

veiculação, assim como os desdobramentos das discussões teóricas dos seus

fundamentos.

As tecnologias presentes em todas as atividades tornaram-se vetores de

novas formas e agregação social (comunitárias) e criaram uma nova relação

entre a técnica e a vida social. A cultura contemporânea está associada às

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tecnologias digitais (ciberespaço) e é a essa vida social moderna que o

jornalismo serve e se desenvolve. A cibercultura nasce justamente dessa

relação estreita com a sociedade e a cultura contemporânea na pós-

modernidade.

Lemos (2013) nos permite compreender como nasce a cibercultura e

seu impacto na sociedade moderna, ou pós-moderna, como ele mesmo utiliza

para definir de que tempo e espaço estamos falando. É na pós-modernidade

que a cibercultura se desenvolve por aspectos que congregam evolução e

tecnologia e uma cultura social. Para Lemos (2013), a sociedade de consumo e

o mass media tiveram influência na delimitação histórica na passagem para a

era pós-moderna, na segunda metade do século XX, acompanhada de um

sentimento de mudança cultural e social no pós-industrialismo (anos 1940-

50)48. Numa fase em que nos anos seguintes encontra-se o capitalismo

multinacional, da globalização.

Assim como vimos em Bauman (1999) e Andreson (2006), vivemos a

quebra de fronteiras e outra forma de consumo e disseminação de cultura

(artes e espetáculos) com as possibilidades oferecidas pelas novas

tecnologias. É o tempo do declínio do individualismo (em oposição à

modernidade) ao nos depararmos aos múltiplos papéis dos sujeitos sociais que

concentram no aqui e agora, “com um presente vivido coletivamente” (p. 67),

em uma nova fase espaço-temporal. Tempo e espaço comprimidos

“desterritorializam (desespacializam) a cultura, tendo um forte impacto nas

estruturas econômicas, sociais, políticas e culturais. O tempo é, assim, um

modo de aniquilar o espaço. Esse é o ambiente comunicacional da

cibercultura” (LEMOS, 2013, p. 68), em oposição ao ambiente do impresso, da

tecnologia do individualismo.

Agimos sem filtro, nem hierarquia e em tempo real, como corrobora

Wolton (2012) na sua análise sobre o tempo e espaço, quando “a adversidade

do tempo é vencida sem a dificuldade da presença do outro. E pode-se assim

navegar ao infinito, com uma mobilidade extrema” (p. 83). Para Wolton (2012),

as novas tecnologias funcionam como uma emancipação individual, de 48 Lemos mostra a relação temporal entre modernidade e pós-modernidade com base em definições e conceitos de filósofos como Giddens, Daniel Bell, Jemesson, Baudrillard, Rouanet, Maffesoli, Kroker. A intenção neste capítulo foi de situar a cibercultura na sociedade contemporânea, pelos estudos de Lemos, focando no seu desdobramento e reflexos na comunicação de massa. A obra de Lemos traz o aprofundamento teórico, mais específico, para consulta.

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liberdade, em que cada um é capaz de se emancipar por si mesmo. Mas o

sociólogo francês também faz um alerta de que a liberdade de acesso não

substitui competência prévia, para saber qual informação procurar e o que

fazer com ela. “O acesso direto não suprime a hierarquia do saber” (WOLTON,

2012, p. 85). Outro aspecto observado por Wolton caracteriza o indivíduo na

sociedade pós-moderna, em rede, livre e solidária, diante do avanço

tecnológico: a necessidade de agir e a capacidade de interação.

A internet, após a televisão e o rádio em suas épocas, relança um imaginário, uma procura de estilos e de forma que exprimem a modernidade. Essas técnicas são ao mesmo tempo veículos de outras formas de cultura e de espaços de criação da cultura contemporânea. Se é necessário não confundir novas técnicas e nova cultura, pode-se contudo salientar que esse novo suporte facilita uma expressão cultural e de linguagem em gestão, mas ainda é muito cedo para saber se serão finalmente uma ruptura cultura importante (WOLTON, 2012, p. 85).

Seguindo com Lemos (2013), comprova-se que esse é o ambiente onde

a evolução do digital da mídia de massa (tevê, rádio, impressa e cinema) para

outras formas de produção, difusão e estoque da informação, onde a circulação

da informação passou da forma hierárquica de “Um-Todos” para a

“multiplicidade do rizoma49 todos-todos”. Com as novas tecnologias de

informação, a centralidade da comunicação deu espaço para a interatividade e

descentralização da informação, distribuição e armazenamento são

independentes, os novos media são “tecnologias da liberdade50”, em que não

se pode controlar o conteúdo. Agora há interação, o leitor seleciona o que quer

ler, sem determinantes que o induzam a escolher essa ou aquela notícia, em

um ambiente de convergência midiática, ele pode manipular som, imagens,

texto e comentar em tempo real o que está sendo publicado, elementos que

vão além da cobertura do impresso (textos, fotos e gráficos). Ele não obedece

a percursos definidos, pois a ação deixou de ser linear, uma característica do

que chamamos de mídia tradicional, fora da internet, para uma navegação

49 Rizoma é um tubérculo, cujas raízes expandem-se em todos os sentidos. É caracterizado por sua conectividade, de um ponto que o compõe com qualquer outro ponto. É multiplicidade, pois não tem sujeito, nem objeto; sem unidades de medida, mas grandezas. Viviani, Ana Elisa. Labirinto e rizoma. Disponível em: http://www.cencib.org/simposioabciber/PDFs/CC/Ana%20Elisa%20Antunes%20Viviani.pdf Acessado em 16/5/2017.50 Lemos (2013) utiliza o conceito de Pool para designar tecnologias da liberdade como “aquelas que não se pode controlar o conteúdo, que colocam em questão hierarquias, que proporcionam agregações sociais e que multiplicam o polo da emissão não centralizada” (p. 70).

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feitas por desvios dos hiperlinks51, hipertextos52, ele surfa na página da internet

e passa o olho pelas notícias como um scanner. O próprio texto, como

complementa Ferrari53 (2012), já não é mais definitivo. Um comentário de leitor

pelas redes sociais ou pelo e-mail pode conter novas informações, um outro

ponto de vista, uma nova pauta pode surgir a partir dessa interação, fazendo

parte da cobertura jornalística. O desafio está em preparar redações e

jornalistas para o momento atual da profissão. “Além da necessidade de

trabalhar com vários tipos de mídia, é preciso desenvolver uma visão

multidisciplinar, com noções comerciais e de marketing” (FERRARI, 2012, p.

40). Pode-se acrescentar ainda noções de administração e de

empreendedorismo aos novos profissionais jornalistas que enfrentarão cada

vez mais um mercado volátil, com novas possibilidades de negócios em

jornalismo surgindo a cada dia. Além disso, o trabalho do jornalista que era até

então um pouco solitário, passa a ter outras características, funções às vezes

desempenhas sozinhas, como a apuração e finalização de uma matéria,

ganham outros contornos com a ajuda de profissionais de outras áreas como

webmaster (gerenciador de sites) e videomaker (profissional de vídeo).

Vivemos o tempo da convergência tecnológica que o jornalismo se

apropria diariamente, o que o permite trazer as outras mídias como tevê

(vídeo), rádio (áudio) e impressa (texto e fotos) para um único ambiente na

internet.

As novas tecnologias são o resultado de convergências tecnológicas que transformam as antigas através de revisões, invenções ou junções. Ao modelo Um-Todos dos media tradicionais opõe-se o modelo Todos-Todos54, ou seja, a forma descentralizada e universal (tudo pode ser convertido em bits – sons, imagens, textos, vídeo...) de circulação das informações. Os novos media permitem a comunicação individualizada, personalizada e bidirecional, em tempo real. Isso vem causando mudanças estruturais na produção e distribuição da informação, tanto em jornais, televisões, rádios e revistas quanto no setor do entretenimento como o cinema e a música. A tecnologia digital proporciona, assim, uma dupla ruptura: no modo de conceber a informação (produção por processos microeletrônicos) e no

51São elementos, trechos ou palavras destacadas, capazes de (com um clique) conectar e redirecionar o usuário para outros elementos, documentos ou sites. Disponível em: https://www.dicio.com.br/link/ Acessado em 17/5/2017.52 A grosso modo, são sistemas de organização da informação, no qual certas palavras de um documento estão ligadas a outros documentos, exibindo o texto quando a palavra é selecionada. Disponível em: https://www.dicio.com.br/hipertextos/ Acessado em 17/5/2017.53 Pollyana Ferrari é escritora, pesquisadora em comunicação digital e professora de hipermídia e narrativas transmídias. Disponível em: https://pollyanaferrari.wordpress.com/about/ Acessado em 17/5/201754 Lévy apud Lemos. Lévy, P. Construire l’intelligence collective. In Le Monde Diplomatique. Manie de Voir Hors-série. Internet et L’Extase de L’Effroi. Octobre 1996, p. 35.

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modo de difundir as informações (modelo Todos-Todos) (LEMOS, 2013, p. 80).

Jenkins55 (2009) diz que a convergência de mídias transformou os

mercados midiáticos e causou uma mudança de paradigmas na relação entre

empresas e consumidores como destacado em Baumam (1999). A tendência

aqui foi de que as empresas tiveram que acelerar o fluxo dos seus conteúdos

e, viram, numa escala exponencial, consumidores a participar mais da sua

cultura. Para compreender essa relação de forma mais completa, usaremos a

definição de convergência de Jenkins, sobre a circulação de conteúdos,

sistemas de mídias e participação ativa de consumidores.

Convergência é fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de mídia, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam. Convergência é uma palavra que consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando (JENKINS, 2009, p. 29).

Tal conceito vai além do aspecto puramente tecnológico, seu argumento

se sustenta na transformação cultural pela participação do público consumidor

de informação, pelo incentivo que recebe em buscar informações e fazer

conexões, numa cultura participativa, permitindo a interação entre produtores e

consumidores.

A convergência tecnológica proporcionou uma nova fase para o

jornalismo na era digital e as consequências atingiram diretamente o modo de

trabalho do jornalista. Se as técnicas permitem um novo agrupamento das

atividades jornalísticas em um único ambiente em diferentes plataformas, a

rotina do jornalista também se viu impactada quase que automaticamente por

meio da convergência das mídias. Ele, agora, é um jornalista multimídia,

imerso em equipamentos e multitarefas na produção da notícia. Assumiu o

papel de social media56, ao publicar e administrar a audiência da seu conteúdo

jornalístico nas redes sociais, de interação com público, que nunca antes teve

participação tão ativa e em tempo real, além de fazer as vezes de editor,

55 Henry Jenkins é um norte-americano estudioso dos meios de comunicação, considerado “um dos pesquisadores da mídia mais influentes da atualidade". Fonte: NAVARRO, Vinicius. Os Sentidos da Convergência. Entrevista com Henry Jenkins, Contracampo, no 21, ago. 2010, p. 14.56 Social media é a nova forma das pessoas comunicarem, interagirem e partilharem informação online através das redes sociais, que são estruturas sociais compostas por pessoas ou organizações conectadas por um ou vários tipos de relação partilhando valores e objetivos (Twitter, Facebook, etc).

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repórter fotográfico (imagem), cinematográfico (vídeo) e de rádio (áudio). Tudo

ao mesmo tempo, online. “A multimídia abre uma outra história da

comunicação, do trabalho, das relações pessoais, dos serviços. Tudo se abre

novamente, tudo pode ser redesenhado, tudo é possível [..] sem o peso da

hierarquia social” (WOLTON, 2012, P. 86).

Jornalista pioneira no mundo da internet, com passagem pelos principais

portais de notícias no Brasil, Pollyana Ferrari anunciou há alguns anos que a

definição de ciberjornalismo ou webjornalismo (PRADO57, 2011) começava a

fazer parte dos bancos acadêmicos, sendo que hoje esse termo está mais do

que consolidado, fortalecidas as atividades de um jornalista de redação digital.

Criar e manter um blog, mediar chats, escrever em um fórum, enfim, todas as tarefas que envolvem a criação de textos para os produtos do meio podem ser chamadas de ciberjornalismo. O cenário mais apropriado para descrever um ciberjornalista é registrar o seu dia a dia dentro de uma redação web. [...] Quem é capaz de mexer em várias mídias ao mesmo tempo e, além disso, escrever corretamente e em português culto, tem grandes chances de se tornar um ciberjornalista. Para quem cresceu com a interface gráfica do Windows, fez tarefa escolar escutando música no fone de ouvido ao mesmo tempo em que “zapeava” a TV sem som, ser ciber não é difícil. A dificuldade está em você saltar de surfador58 para repórter e depois editor. Não basta ser multitarefa e esperto com a tecnologia presente na web: é preciso ter background cultural para conseguir contextualizar a informação é empacotá-la de um jeito diferente a cada necessidade editorial (FERRARI, 2012, p. 41).

Para Prado (2011), a internet permite incluir todos os formatos

jornalísticos, como também “incita a convergência das mídias”. O internauta lê,

vê, ouve, curte, compartilha, opina, em todas as formas jornalísticas na mesma

página, formando, assim, o jornalismo multimídia: áudio, imagem, vídeo, texto,

infográficos animados, games, tudo em uma reportagem (PRADO, 2011). Este

estado de convergência não se limita apenas ao aspecto tecnológico para sua

evolução e predominância no jornalismo, mas diz respeito aos mercados

midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos (JENKINS, 2009), às

57 Magaly Prado é doutora em comunicação e semiótica com a tese Radiojornalismo na cibercultura: por uma nova experiência do rádio em tempos de redes sociais e hipermobilidade e mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital com a dissertação Audiocast nooradio: redes colaborativas de conhecimento, ambas pela PUC/SP. Disponível em: https://casperlibero.edu.br/?s=prado Acessado em 17/5/2017.58 Ferrari (2012) define o jornalista surfador como “jovem, frequenta os primeiros anos de um curso de jornalismo e foi contratado, como estagiário, para manter uma sala de bate-papo aberta com convidados, para dar manutenção a uma lista de links e também responder os e-mails da redação; sem contar o domínio do HTML básico – limitado a tarefas como inclusão de links, títulos, textos, fotos e âncoras” (p.41).

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práticas dos usuários e à sua interatividade com a informação que circula nas

múltiplas plataformas, se tornando também um ator convergente nesse

processo. No contexto das novas tecnologias, da web e das novas mídias, o

receptor passou a ocupar outro patamar com possibilidades muito maiores de

escolher que tipo de informação quer acessar em múltiplos canais e diferentes

plataformas e de agir instantaneamente, em tempo real, à informação-notícia

que está consumindo.

Para Castells (1999, p.414), trata-se de uma transformação de

dimensões históricas, quando há a integração de vários modos de

comunicação em uma rede interativa. “A integração potencial do texto, imagens

e sons no mesmo sistema - interagindo a partir de pontos múltiplos, no tempo

escolhido (real ou atrasado) em uma rede global, em condições de acesso

aberto e de preço acessível – muda de forma fundamental o caráter da

comunicação.”

Com o hipertexto, que será tratado nos capítulos seguintes, o texto que

leva a outro texto e a outro, por meio dos links, numa leitura que Prado (2011)

chamou de rizomatizada, em uma metáfora ao termo da biologia, que tem

raízes, conexões. Podem ser chamados também de nós ou elos associativos

(FERRARI, 2012), permitindo que leitores naveguem pela página, seja qual for

o dispositivo utilizado, sem ser obrigado a seguir uma ordem linear. Bem-vindo

ao mundo da não-linearidade da rede hipertextual59. As publicações na internet

têm muitas conexões, um dos aspectos que transforma o modo de fazer

jornalismo e entender o que é ser jornalista no século XXI. A exposição do

conteúdo em uma página na internet também mudou, as editorias,

segmentadas em cadernos no impresso, então todas juntas na mesma página,

à disposição e à escolha do leitor, que com a web 2.0, passa os olhos nas

reportagens como se fosse um scanner, numa leitura não-linear e interativa,

como vimos, características predominantes no jornalismo multimídia (PRADO,

2011; FERRARI, 2012).

A produção de notícias sofreu mudanças e é preciso ter um olhar crítico

sobre elas a partir da internet. O que Ferrari (2012) descreve como

59 “Para o pai do hipertexto, Ted Nelson, o conceito de texto elástico (strech text), aquele que se expande e se contrai conforme as solicitações do leitor, faz com que o internauta assuma o comando da ação, trocando filmes, vídeos diálogos, textos, imagens como se estivesse em uma grande biblioteca digital” (FERRARI, 2012, p. 43).

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empacotamento de informação se aproxima da prática de curadoria de notícias,

comum em novos modelos de jornalismo exclusivos em redações digitais. O

termo parece novo, mas tem muita similaridade com a prática de refazer ou

reescrever um material recebido de uma agência de notícias, dar uma cara

nova, às vezes modifica-lo ou dar ênfase a aspectos que vão mais ao encontro

da linha editorial do veículo. Apesar disso, não significa que fundamentos

básicos da teoria do jornalismo devam ser descartados ou estejam à margem

dessa realidade, como apuração e, de alguma forma, o respeito pela

imparcialidade, como veremos mais adiante. Segundo Ferrari (2012), o jornal

virtual está sempre em movimento: é global, instantâneo, sem horas fixas e

página fechadas.

Para que o jornalismo seja multimídia, é preciso que o jornalista seja

multimídia (além do texto, ele utiliza áudios, gráficos, fotos, links, dentre outros)

e isso implica em mudanças na sua concepção e entendimento de como se dá

a comunicação com o avanço das tecnologias e suas implicações perante à

sociedade, e, assim, o que é fazer jornalismo na era digital. “A multimídia abre

uma outra história da comunicação, do trabalho, das relações pessoais, dos

serviços. Tudo se abre novamente, tudo pode ser redesenhado, tudo é possível

[...] sem o peso da hierarquia social” (WOLTON, 2012, p. 86). O repórter

multimídia precisa entender que a sua história precisa ser contada de forma

diferente do que em outras mídias.

Os repórteres de mídias impressas, por exemplo, privilegiam a informação: os de TV buscam cenas emocionantes, sons e imagens para serem transmitidos junto com o texto da notícia. Já os jornalistas on-line precisam sempre pensar em elementos diferentes e em como eles podem ser complementados. Isto é, procurar palavras para certas imagens, recursos de áudio e vídeo para frases, dados que poderão virar recursos interativos e assim por diante (FERRARI, 2012, p. 48).

Ferrari (2012), ao citar Dube, explica como se constrói uma reportagem

para o digital, reforçando para, quando possível, gravar a entrevista, pois, como

vimos, o áudio será utilizado. Cuidado com as fotos, fuja de sombras e

degradés, ou com muita riqueza de detalhes, para que possam ser enxergadas

no tamanho reduzido do monitor, principalmente em tempos de telas cada vez

menores. Abuse dos vídeos, são altamente acessados e têm adesão maior

pelos internautas, nesse caso prefira fundos planos e imagens mais próximas

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possíveis. O texto no multimídia é mais conciso do que no impresso e mais

literal detalhado do que na tevê. Segundo Ferrari, deve-se utilizar menos a voz

passiva e sentenças mais curtas. Também é mais livre, dependendo da

plataforma e público a que se dirige, uma vez que o público do online é mais

receptivo a estilos não convencionais. Sobre a velocidade da apuração,

encontramos na pesquisadora e jornalista (2012, p. 49) uma fala conceitual

sobre os fundamentos do jornalismo: “Uma notícia superficial, incompleta ou

descontextualizada causa péssima impressão. É sempre melhor coloca-la no ar

com qualidade, mesmo que dez minutos depois dos concorrentes”.

Apesar de sempre ter existido, a internet também deixou mais evidente o

papel do jornalista colaborativo, feito por quem não é jornalista, com

participação de especialistas em blogs, por exemplo, muito comum nos portais

de notícias chamados pure players60, com versões presentes unicamente na

internet.

Portais investem na personalização de conteúdos. O internauta escolhe

e define o que quer ler, quais são suas preferências, de forma mais prática e

gratuita. O internauta está cada vez mais com a informação nas suas mãos,

tamanho o avanço tecnológico dos smartphones, assim como, o acesso da

população ao dispositivo nos últimos anos. Vive-se uma “revolução do bolso”,

como destaca o título de ampla reportagem publicada pelo TAB UOL61. A

internet móvel e os telefones inteligentes transformaram o comportamento

humano, afirma a reportagem com base em dados como: a portabilidade que

os aparelhos adquiriram (fazer o mesmo que um desktop ou laptop); são

economicamente viáveis; e facilidade de uso oferecida pelas telas sensíveis ao

toque. Esses aparelhos são abastecidos de diversos aplicativos, entre eles

estão as mídias em geral (rádios, tevês, jornais impressos, portais de notícias)

não apenas as brasileiras, mas do mundo todo, numa conclusão estrita de que

a informação está nos dedos de milhões de pessoas pelo planeta.

60 Pure player é uma empresa que exerce atividade comercial somente na internet, sem loja física. O termo ainda se aplica a outros atores da web como editores que publicam suas obras exclusivamente em formato online. Disponível em: http://www.journaldunet.com/business/pratique/dictionnaire-du-marketing/web-marketing/19354/pure-player-definition-traduction-et-synonymes.html Acessado em 17/5/2017.61 O TAB UOL é um produto jornalístico do portal de notícias brasileiro UOL, no ar desde 2006. Oferece conteúdos temáticos jornalísticos publicados uma vez por semana. A reportagem “Revolução de bolso” foi produzida pelos jornalistas Juliana Carpanez, Natália Eiras e Rodrigo Bertolotto; ux/design de Marcelo Gerab, Mariana Roman e Solenn Robic; vídeos de Mariah Kay e Ugo Soares; edição de Daniel Tozzi e direção de Rodrigo Flores. Disponível em http://tab.uol.com.br/smartphone/. Acessado em 8/3/2017.

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Para chegar até aqui, houve uma profunda transformação entre o que esses aparelhos faziam quando vieram ao mundo e o que fazem hoje. No “antes” estão chamadas de voz (caríssimas), troca de mensagens de texto e, vá lá, armazenamento de meia dúzia de contatos. A descrição do “depois” deixamos para Philip Schiller, vice-presidente de marketing da Apple, em pronunciamento nos dez anos do iPhone: “Fazemos chamadas de voz e de vídeo, registramos e compartilhamos fotos e vídeos, ouvimos música, usamos redes sociais, jogamos, nos localizamos e descobrimos novos lugares, fazemos pagamentos, navegamos na internet, trocamos e-mails, administramos contatos e calendários, ouvimos podcasts, assistimos à TV, a filmes e a esportes, além de gerenciarmos nossas atividades físicas e nossa saúde” (TAB UOL, 2017).

O mundo está conectado. A reportagem traz que o número de linhas de

celulares ativas é de 7,5 bilhões, superando a população mundial de 7,3

bilhões62. 55% dessas linhas são de smartphones63. O fato é que o celular virou

artigo pessoal, o qual as pessoas levam para onde forem, mesmo se mudarem

de uma cidade, por exemplo, ele continua com elas, diferente de antigamente,

quando o telefone era fixo, como um móvel da casa.

Essa mobilidade também faz com o jornalista seja móvel e multimídia,

como estamos reforçando desde o início deste manual. Que compreendam a

força da hipermídia64 de não informação mais de fora linear (com começo, meio

e fim) mas de construir matérias múltiplas sobre o mesmo assunto. Dar

oportunidade ao leitor de avançar em links correlatos. Para que isso aconteça,

o jornalista precisa conhecer esses recursos técnicos, de modo que possa

encadear os fatos de uma maneira multimídia para que possa atingir o

indivíduo digital (FERRARI, 2012, p. 52-53). A rotina das redações em tempos

de internet também mudou. Está cada vez mais raro o jornalista de uma

redação sair à rua, porque os fatos chegam até ele pela internet. Aquele vídeo

do atentado, de uma manifestação, circula primeiro nas redes sociais pelas

publicações de particulares do que pela imprensa. Cabe ao jornalista, nesse

caso, que é rotineiro, ter senso crítico e boa apuração para aproveitar desse

material multimídia para colocar sua matéria no ar.

62 Cálculo baseado em dados do The World Factbook, da Cia. Disponível em http://tab.uol.com.br/smartphone/ Acessado em 8/3/2017.63 Ericsson Mobility Report/2016. Disponível em http://tab.uol.com.br/smartphone/. Acessado em 8/3/2017.64 É o conjunto de meios que permite acesso simultâneo a textos, imagens e sons de modo interativo e não linear, possibilitando fazer links entre elementos de mídia, controlar a própria navegação e, até, extrair textos, imagens e sons cuja sequência constituirá uma versão pessoal desenvolvida pelo usuário. Trata-se do meio e a linguagem das “novas mídias”, às quais pertencem a internet, os jogos de computador, o cinema interativo, o vídeo interativo, a TV interativa, as instalações informatizadas interativas e os sistemas de comunicação funcionais, entre outros e suas respectivas interfaces. GOSCIOLA, Vicente. Roteiro para as novas mídias, 2003.

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Outras características diferenciam o jornalismo na internet daquele que é

feito pelas mídias tradicionais. Além das características já comentadas, como

não-linearidade, instantaneidade e custos de produção, Pinho65 (2003) destaca

ainda a “fisiologia”, quando se trata da condição de leitura na tela do

computador e no papel. À luz do monitor se lê mais devagar do que no papel,

por isso recomenda-se que os textos online sejam mais curtos. A

“pessoalidade” reforça a noção de individual e da proximidade com o indivíduo.

A “acessibilidade” permite acesso ilimitado 24/766, a qualquer instante com um

“receptor ativo” cada vez mais conectado. O “custo de produção e veiculação”

são mais baratos que os da tevê e jornais impressos. Somam-se a essas

características os espaços ilimitados da rede e a ideia de prateleiras infinitas de

Anderson (2006). E para reforçar a interatividade garantida por várias

aplicações como chats, salas de bate-papo, fóruns, e-mails, comentários nas

redes sociais e nas transmissões ao vivo. Interatividade essa que leva à

“pessoalidade”.

As especificidades e conceitos abordados neste capítulo, que serão

retomados ao longo desta pesquisa, dão conta de uma visão não apenas sobre

o futuro da profissão do jornalista na era digital, mas também das

transformações sociais e culturais que o cercam.

As tecnologias trouxeram mudanças de comportamento, mexeram com

a economia de mercado e colocaram a comunicação numa escala bem mais

abrangente de livre escolhas para o indivíduo. Concepções sobre os

fundamentos do jornalismo também estão em xeque neste século que se inicia.

O desafio está em preservá-las uma vez que, deontologicamente67, alguns

conceitos seriam inatingíveis, ou de repensar ou readequar problemáticas

surgidas em virtude justamente de tais conceitos por meio dos quais nos

deparamos não só com conflitos éticos, mas da teoria do próprio jornalismo.

O NOVO PAPEL DO JORNALISTA65 José Benedito Pinho é doutor em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Universidade Federal de Viçosa. Tem larga experiência na área de Comunicação. Disponível em: http://cienciaparaeducacao.org/pesquisador/jose-benedito-pinho/ Acessado em 17/5/2017.66 O equivalente a 24 horas, durante os sete dias da semana.67 Referente a um conjunto de regras e princípios que regem a conduta de um profissional. Disponível em: http://por-entrelinhas.blogspot.fr/2009/06/etica-e-deontologia-jornalistica.html). Acessado em 7/5/2017.

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3.1. Os princípios e os fundamentos que ditam o “bom jornalismo”

Num processo aparentemente mais lento que o das práticas

jornalísticas, que passam por uma rápida e constante transformação devido às

mudanças provocadas pela internet, a discussão acerca da imutabilidade (ou

não) dos princípios e fundamentos do jornalismo na era digital ainda é um

campo a ser explorado. A tendência, entre os autores, é que tais princípios e

fundamentos, baseados na ética e na deontologia68, permaneçam estáveis, já

que, em sua essência, constituem-se valores que servem de base para o

conceito de “bom jornalismo” construído e institucionalizado como profissão há

mais de 150 anos. Os jornalistas não foram exceção à tendência histórica da

profissionalização. Pelo contrário, acompanharam, embora com algum atraso,

todo um processo que se intensificou […] com a industrialização e a

urbanização das sociedades no século XIX (TRAQUINA, 2012, p.109).

Traquina69 (2012) fala dessa construção, quando os jornalistas passaram

a reivindicar um know-how, para exercer a atividade, e a serem reconhecidos

por isso. Os jornalistas são detentores de conhecimento técnico, que o balizam

como profissionais, quais sejam o domínio de técnicas de apuração, de

elaboração de estruturas narrativas precisas com uma linguagem própria. Sem

falar do saber que qualifica os jornalistas a distinguir o que é noticia, tema de

estudo feito por Ericson, Baranek e Chan70 (1987) sobre esse “faro para a

notícia” próprio dos profissionais da área. E das análises de Bourdieu71 (1998),

68 Entende-se por ética o pensamento moral, conjunto de valores e princípios aceitos ou descobertos de forma livre e consciente, que regulam o comportamento do homem. E por deontologia um conjunto de regras e princípios que regem a conduta de um profissional. A ética jornalística é um conjunto de aspectos morais do jornalista, é uma obrigação prática profissional baseada na livre ação da pessoa e do seu caráter moral. É por assim dizer, o bom senso do jornalista. Já a deontologia jornalística diz respeito a um conjunto de regras e obrigações que se exigem do profissional, através de códigos deontológicos. Disponível em: http://por-entrelinhas.blogspot.fr/2009/06/etica-e-deontologia-jornalistica.html). Acessado em 7/5/2017.69 Nelson Traquina é um intelectual português, professor de jornalismo e doutor em sociologia pela Paris 5, autor de inúmeros livros e publicações sobre temas como ética e cultura jornalísticas. Disponível em: http://www.carloscorreia.net/dcc/curriculo_traquina.html Acessado em 17/5/2017.70 Richard V. Ericson; Patricia M. Baranek; e Janet B. L. Chan são pesquisadores. A contribuição de Ericson nos campos da sociologia, criminologia e direito é reconhecida pela academia. Seus temas mais frequentes: jovens infratores, o trabalho da polícia, a divulgação de crimes pela mídia, etc. Baranek é consultora especializada em política e pesquisa de saúde independente, professora na Universidade de Toronto. E Chan também é professora, focada em reformas e inovações da justiça criminal, policiamento e, mais recentemente, criatividade nas artes e ciências. Disponível em: https://www.irwinlaw.com/authors/janet-b-l-chan e http://amindfulsociety.org/speaker-lineup/patricia-baranek/ Acessados em 15/5/2017.

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citado por Traquina, sobre o que designou de “monopólio de saberes” para

demonstrar que a atividade jornalística está localizada num campo intelectual.

Segundo Traquina, existe uma “constelação de valores” e “um conjunto

de normas profissionais”. Ele exemplifica que ser jornalista é acreditar nesses

valores. Dentre os valores, como próprios do jornalismo – “uma atividade

intelectual em sintonia com a democracia e especializada em contar estórias72

na sociedade contemporânea” - estão a liberdade; a independência e

autonomia; a credibilidade; a verdade; o rigor e exatidão; a honestidade; e a

objetividade e equidade (TRAQUINA, 2012, p. 132).

O jornalismo mantém-se, em tempos de internet, como uma tarefa

intelectual que requer atenção, perspicácia, vivacidade de espírito e

inteligência, associadas ao domínio da língua. Gradim73 (2000) cita algumas

características éticas e deontológicas necessárias para essa composição do

perfil jornalístico ideal, também válidas para os jornalistas da web uma vez que

insidem sobre valores inerentes à profissão.

- Aceitar críticas fundamentadas, refletir sobre elas, agradecê-las quando for o caso disso; mas nunca, por nunca, ceder a pressões de qualquer tipo. O jornalista na realização do seu trabalho é soberano.

- Não agir com um deslumbramento misturando-se com acontecimentos e personalidades. Nunca será uma delas, e está a um passo de ser utilizado – como o tolo da aldeia que faz recados a toda a gente – provocando danos irreparáveis na sua reputação profissional.

- O jornalista não é amigo de seus entrevistados, nem parte das causas que relata, quando o for, deve rejeitar o serviço porque sabe que a proximidade excessiva prejudica a sua isenção.

- As fontes devem ser cultivadas, evitando porém (…) a promiscuidade. Em meios pequenos esta questão é muito sensível porque o jornalista se vê compelido a recorrer amiude as mesmas fontes, criando inadvertidamente relações de familiaridade que dificultam o seu trabalho. Deverá sempre preferir ser respeitado a estimado (GRADIM, 2000, p. 34-35).

O jornalista, e aqui não importa se é no meio tradicional ou no meio

digital, precisa de liberdade para trabalhar, sob o risco de não poder exercer a

71 Pierre Bourdieu (1930-2002) foi um importante sociólogo e pensador francês, autor de uma série de obras que contribuíram para renovar o entendimento da sociologia e da etnologia no século XX. Disponível em: https://www.ebiografia.com/pierre_bourdieu/ Acessado em 17/5/2017.72 Traquina utiliza o termo estória em vez de história, para tratar de narrativa jornalística. Segundo ele, os jornalistas são os modernos contadores de ‘estórias’. Ele reproduz a afirmação de Gaye Tuchman para justificar sua opção: “dizer que uma notícia é uma ‘estória’ não é de modo algum rebaixar a notícia, nem acusá-la de ser fictícia. Melhor, alerta-nos para o fato de que a notícia, como todos os documentos públicos, ser uma realidade construída possuidora da sua própria validade interna”. TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo, porque as notícias são como são. Florianópolis, Insular, 3. ed. rev., 2012.73 Anabela Gradim é professora do Departamento de Comunicação e Artes da Universidade Beira do Interior, em Portugal. É ainda pesquisadora do LabCom.IFP - Comunicação Filosofia e Humanidades. Disponível em: http://www.ubi.pt/Pessoa/agradim Acessado em 17/5/2017.

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sua função. A liberdade de pensamento e de expressão é elemento essencial

para o exercício da profissão, constituindo-se o centro de uma “relação

simbiótica” entre o jornalismo e a democracia. Traquina (2012) cita o pensador

político, historiador e escritor francês Alexis Tocqueville; o presidente e autor

da declaração de independência dos Estados Unidos, Thomas Jefferson; e o

pensador liberal, filósofo e economista britânico John Stuart Mill, para reforçar

esses laços e mostrar que “os jornalistas estiveram e estão na frente da luta

pela liberdade e na luta pela defesa da liberdade perante qualquer tentativa de

limitar essa liberdade […]” (TRAQUINA, 2012).

A independência e autonomia dos profissionais em relação a outros

agentes sociais também asseguram o exercício do “bom jornalismo”, sobretudo

nesse contexto de revolução tecnológica em que “todos” podem ser portadores

e podem trabalhar a informação, num ambiente de pressão que agora vem de

todos os lados e não apenas das empresas de comunicação. Traquina se vale

do ensinamento do sociólogo britânico, Phillip Elliott (1978), que afirma que a

ideologia do profissionalismo está centrada na ideia de que o membro da

profissão, no caso o jornalista, deve ter independência e autoridade nas suas

relações de trabalho.

Outro valor é a credibilidade, traduzida por uma relação de confiança

decorrente da busca pela verdade. Linkados à verdade, estão mais dois

fundamentos, o rigor e a exatidão capazes de dar credibilidade às notícias.

Durante o seu estudo etnometodológico em diversas redações jornalísticas norte-americanas, a socióloga Gaye Tuchman74 relata (1978:83) fatos pelos quais apreendeu rapidamente a importância da credibilidade para os jornalistas. A importância de manter a credibilidade leva a um trabalho constante de verificação dos fatos e de avaliação das fontes de informação. A exatidão da informação é também vital: por exemplo, o notável trabalho de jornalismo de investigação que assumiu um lugar mítico na história de jornalismo, o Caso Watergate, ilustra como UM erro factual pode pôr em causa toda a credibilidade da informação. Em Portugal, (…) um semanário perdeu a sua credibilidade quando publicou uma notícia extensa sobre uma reunião do Conselho de Revolução do Movimento de Forças Armadas, com uma descrição detalhada das discussões, quando ficou conhecido que a reunião tinha sido desconvocada e nunca teve lugar. O caso “Janet Cooke”, uma jovem jornalista do Washington Post que teve de devolver o prestigioso Prêmio Pulitzer quando foi descoberto que a personagem central da reportagem premiada era uma personagem fictícia, provocou um enorme

74 As áreas de interesse de Gaye Tuchman são a sociologia da cultura (incluindo mídia), do gênero e do ensino superior. Segundo o site da Universidade de Connecticut, onde trabalha como professora, ela acredita no “ditado de Simmel”, de que quase tudo pode ser transformado em um interessante problema sociológico. Embora se considere etnógrafa, também publicou trabalhos sobre métodos históricos. Disponível em: http://sociology.uconn.edu/tuchman/ Acessado em: 17/5/2017.

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escândalo no meio jornalístico norte-americano porque pôs em causa a credibilidade da comunidade (TRAQUINA, 2012, p. 134-135).

A honestidade, assim como os demais valores que compõem a

“constelação” a que se refere Traquina, não se institucionalizaram como

fundamentos do jornalismo do dia para a noite. É fruto de um proceso histórico

que liga o jornalismo, a liberdade e a verdade, e que vem sendo reforçado ao

longo dos anos. O autor português resgata algumas declarações para

descrever a construção desses valores do jornalismo, cuja revisão se torna

importante também com o ciberjornalismo praticado. Uma delas, do diretor de

um jornal inglês em 1926, citado por Elliot (1978) e que afirma que o jornalismo

implica honestidade, clareza, coragem, justeza, e um sentido do dever para

com o leitor e a comunidade. A profissão tem como ofício apurar notícias,

atentando para que esse prestígio, decorrente da apuração, não se perca.

Outras duas declarações são analisadas por Traquina (2012), uma do

jornalista Georges Bourdon, do Sindicato dos Jornalistas Franceses, e outra de

José Pedro Castanheira, à época da primeira edição do livro, presidente da

Comissão Organizadora do 3º Congresso dos Jornalistas Portugueses. Em

1931, Bourdon, citado por Ruellan75 (1997), escreveu que o jornalista, na

intimidade da sua consciência, deve agir como um “servidor da verdade e da

justiça”, defendendo honestamente o interesse público. Castanheira, por seu

turno, diz que a verdade é um valor inatingível, que não há uma verdade

absoluta. “Não basta gritar bem alto o dever de cada jornalista de não mentir,

de não enganar, de não falsear. Há que ir mais longe, seguir os exemplos dos

códigos de todo o mundo e proclamar, de forma inequívoca e solene, o dever

de cada jornalista de perseguir, de procurar a verdade, de informar com

verdade” (TRAQUINA, 2012, p.136).

A busca pela verdade deve ser um valor presente na apuração

jornalística, seja ela na internet ou não. Jornalismo não se faz sem verdade, ou

sem esse espírito de busca pela verdade tratado por Castanheira. No caso da

web, o impacto das notícias é praticamente imediato devido a sua rápida

propagação. Como podemos acompanhar com os recorrentes casos de fake

75 Dénis Ruellan é jornalista, professor na Universidade Rennes 1, na França. Estudioso do jornalismo e das ciências da informação e da comunicação, sua linha de pesquisa aborda as transformações do jornalismo como prática social e profissão, sob a abordagem histórica, antropológica e sociológica. Disponível em: http://www.crape.univ-rennes1.fr/membres/ruellan_denis.htm Acessado em: 17/5/2017.

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news76, termo cuja tradução para o português quer dizer notícias falsas e que

vêm sendo alvo do chamado fact checking, movimento77 que concentra

iniciativas de checagem do discurso público ou de verificação das notícias e

dos rumores que se proliferam nas redes sociais.

Para Traquina (2012), “no calor da luta contra a tirania do tempo, as

empresas jornalísticas e os jornalistas não podem fazer esquecer as regras

elementares do trabalho, como, por exemplo, a verificação da informação, ou o

respeito total pela fronteira entre ‘fato’ e ‘ficção’.” Uma postura ética e

deontológica também é esperada desse profissional.

Esta constelação de valores, a qual podemos acrescentar outros valores como o rigor, a exatidão, a honestidade e uma noção de equidistância, muitas vezes consagrada com o conceito de objetividade [...] está consagrada nos códigos deontológicos que foram elaborados por jornalistas em inúmeros países a partir do principio do século XX. Num estudo comparativo dos códigos deontológicos em 51 países, o acadêmico Profírio Ansejo (1979) descobriu que os valores como o rigor e a verdade aparecem em quase todos os códigos (TRAQUINA, 2005, p. 134).

A ética no webjornalismo é objeto de estudo de Prado (2011), que

abordou o tema durante entrevista exclusiva com Rosental Calmon Alves78. O

jornalista brasileiro radicado nos Estados Unidos classifica que o jornalismo na

internet criou situações novas, nunca vistas antes. Segundo Alves, “é preciso

manter os mesmos princípios éticos, que vêm de antes do jornalismo, que vêm

da filosofia, que vêm da vida, retrato do sentido comum, e adaptá-los”. Mas é

importante, para Alves, entender que as dimensões da revolução digital são

76 Luciano Pires, do Portal Café Brasil, define assim fake news: "o termo diz respeito a sites e blogs que publicam intencionalmente notícias falsas, imprecisas ou simplesmente manipuladas, com a intenção de ajudar ou combater algum alvo, normalmente político. Eles também copiam notícias verdadeiras de outros veículos, mas mudam as manchetes, alterando o sentido ou colocando algo sensacionalista para atrair leitores". Disponível em: http://www.portalcafebrasil.com.br/artigos/fake-news/ Acessado em 25/5/2017.77 Existem 115 iniciativas ativas de fact checking do mundo, segundo um levantamento de fevereiro deste ano do Dukes Reporters’ Lab. O Existem 115 iniciativas ativas de fact checking do mundo, segundo um levantamento de fevereiro deste ano do Dukes Reporters’ Lab. O tema é pauta do livro eletrônico Jornalismo Inovador na América Latina, editado por Teresa Mioli e Ismael Nafría e lançado no dia 23 de abril de 2017, durante o 10º Colóquio Ibero-Americano de Jornalismo Digital, organizado pelo Centro Knight para Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas em Austin. Disponível em: https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ebook/jornalismo-inovador-na-america-latina-pt-br Acessado em 25/5/2017.tema é pauta do livro eletrônico Jornalismo Innovador na América Latina, editado por Teresa Mioli e Ismael Nafría e lançado no dia 23 de abril de 2017, durante o 10º Colóquio Ibero-Americano de Jornalismo Digital, organizado pelo Centro Knight para Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas em Austin. Disponível em: https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ebook/jornalismo-inovador-na-america-latina-pt-br Acessado em 25/5/2017.78 Brasileiro, é membro do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos. Rosental Alves é atualmente professor na Universidade do Texas, onde exerce a cátedra Knight em Jornalismo e a cátedra Unesco em Comunicação. É também diretor fundador do Centro Knight para o Jornalismo nas Américas. Disponível em: http://investigativereportingworkshop.org/people/advisory_board/rosental-calmon-alves/ Acessado em 17/5/2017.

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amplas e que se trata de algo muito profundo, em relação ao conhecimento, o

que ele denomina de um “ecosistema novo, no qual a ética precisa ser revista e

readaptada, mas não alterada profundamente”.

Eu acho que uma das características do jornalismo antes era o acesso que o jornalista tinha ao meio de comunicação de massa. O que está acontecendo agora é que as barreiras que faziam os meios de comunicação de massa serem escassos e serem atuantes num ambiente de escassez informativa mudaram, o ambiente agora é diferente, qualquer pessoa pode se transformar numa mídia. Isso cria uma grande cacofonia, onde está todo mundo falando, onde é difícil inclusive diferenciar o que é jornalismo daquilo que parece que é jornalismo mas não é jornalismo. A ética é parte fundamental dessa deontología, o que caracteriza o que é auténticamente jornalismo (PRADO, 2011. E-book).

A objetividade, como fundamento do jornalismo, também é elemento a

ser analisado em tempos de web. Rossi79 (1980) considera a objetividade,

sinônimo de imparcialidade, como “mito”, uma vez que os fatos, no seu

entendimento, são mediados por um jornalista que carrega consigo opiniões

pessoais, uma formação cultural e ideologias. Crítico da técnica jornalística que

prefere reproduzir declarações a fornecer informações apuradas, Rossi

defende, para escapar do subjetivismo, uma verificação dos fatos por meio de

estatísticas, avaliações e antecedentes. Alves, citado por Prado (2011),

também é favorável a uma disciplina da verificação, porque, no seu

entendimento, os jornalistas têm uma obrigação primeiro com a comunidade,

com a verdade, com o processo que é a busca da verdade. Ele descreve

(abaixo) o ambiente atual como de caos, criação e revoluções.

As coisas são destruídas muito mais rapidamente que novas coisas são construídas. Agora, nesse período, o jornalismo está sendo chamado a exercer um papel importante, porque todo mundo fala, mas na hora da verdade se busca quem são os jornalistas, as marcas da empresa, aqueles que já desenvolveram uma reputação, que são os que checam. Por isso sou otimista na sobrevivência do jornalismo. A partir desse caos, o jornalismo vai emergir como algo novo, mas o que caracteriza o jornalista é a credibiliddade e a reputação (PRADO, 2011, E-book).

Traquina (2012) trata a objetividade na sua obra. A objetividade, como

valor, nasceu no século XX em decorrência do novo olhar aos fatos e não às

opiniões (modelo em vigor no século XIX). O autor contextualiza que Michael

79 Clóvis Rossi é um jornalista brasileiro. Atualmente, é colunista do jornal Folha de S. Paulo. Com mais de 50 anos de carreira, trabalhou em três dos quatro grandes jornais do Brasil: O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e Jornal do Brasil. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (Estados Unidos) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/clovisrossi/ Acessado em 17/5/2017.

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Schudson80 (1978) descobriu, durante a sua tese de doutorado sobre

objetividade em diversas profissões, que o conceito de objetividade no

jornalismo não surgiu como negação da subjetividade, mas como

reconhecimento da sua inevitabilidade. Nasceu, segundo Traquina, “não como

expressão final de uma fé que já existia no jornalismo no culto dos fatos, mas,

pelo contrário, um método concebido em função de um mundo novo no qual

mesmo os fatos não mereciam confiança”. Schudson (1978) cita dois fatos que,

na época, teriam contribuído para essa desconfiança, a propaganda na

Primeira Guerra Mundial e o nascimento de uma nova profissão – a de

relações públicas. É nesse contexto que as ideias de Walter Lippmann81 (1922)

ganham vazão, no entendimento de Traquina (2012). Segundo Lippmann, a

crise na democracia ocidental no início do século XX era uma crise no

jornalismo. E a receita para os males do jornalismo era a ciência, tornar a

atividade algo mais profissional.

A “objetividade jornalística”, entre aspas de acordo com Genro Filho82

(2012), esconde uma ideologia, que, segundo ele, é uma ideologia burguesa,

“cuja função é reproduzir e confirmar as relações capitalistas”. Essa

objetividade implica uma compreensão do mundo como um agregado de “fatos”

prontos e acabados, cuja existência, portanto, seria anterior a qualquer forma

de percepção e autônoma em relação a qualquer ideologia ou concepção de

mundo (GENRO FILHO, 2012, p. 197).

Assim, a objetividade passa a ser um conjunto de procedimentos que os

jornalistas se valem para assegurar credibilidade como parte não interessada e

para reduzir o risco de críticas. Traquina (2012) afirma que, nas palavras de

Gaye Tuchman, a objetividade dever ser vista como um “ritual estratégico”,

com procedimentos de rotina capazes de neutralizar eventuais críticas.

Tuchman, citada por Traquina (2012), identifica quatro procedimentos. O

80 Formado em Sociologia pela Harvard, Michael Schudson é autor de sete livros e coeditor de três outros sobre a história e sociologia da mídia americana, publicidade, cultura popular, Watergate e memória cultural. Disponível em: https://journalism.columbia.edu/faculty/michael-schudson Acessado em 17/5/2017.81 Foi um escritor, jornalista e comentarista político norte-americano. Morreu em Nova York em 1974. Disponível em: www.encyclopedia.com/topic/Walter_Lippmann.aspx Acessado em 17/5/2017.82 Adelmo Genro Filho foi um jornalista, teórico e político brasileiro. Formou-se como jornalista em 1975 pela Universidade Federal de Santa Maria. Desde adolescente exerceu atividade política, como líder estudantil e membro de organizações políticas que resistiam ao regime militar. Em 1976, foi eleito vereador em Santa Maria, exercendo mandadato até 1982, quando transferiu-se para Florianópolis e ingressou, através de concurso, como professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Disponível em: http://www.adelmo.com.br/index1.htm Acessado em 17/5/2017.

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primeiro é a apresentação de posibilidades conflituosas, sempre ouvindo os

dois lados da questão. O segundo procedimento identificado com a

objetividade é a apresentação de provas auxiliares, fatos complementares ao

alegado. O terceiro procedimento é o uso judicioso das aspas, para

desaparecer a presença do repórter. A ideia aqui, de acordo com Tuchman, é

informar. O quarto procedimento é a estruturação da informação numa

sequência apropriada, assemelhando-se à “pirâmide invertida”83 e ficando, a

cargo do jornalista, a capacidade de escolher “objetivamente” entre “fatos”

concorrentes, para decidir quais são os “fatos” que são mais “importantes” ou

“interessantes” (TRAQUINA, 2012, p.143).

A objetividade é útil aos jornalistas, sempre pressionados pelo fator

tempo. Na era digital, a rapidez nas entregas é ainda mais exigida. A

objetividade ajuda o jornalista a vencer as “horas de fechamento”, porque como

explica Philips84 (1976), citado por Traquina, a maioria dos jornalistas é

generalista, e não especialista de uma área específica. O jornalista não tem

intenção de julgar, muito menos de usar critérios científicos para justificar o que

escreve, por isso evita fazer afirmações cuja verdade não possa ser facilmente

provada. Traquina também afirma que, apesar de criticada, a objetividade é

ainda associada ao jornalismo contemporâneo, que tem como um dos pilares a

noção de equidistância entre o profissional e os agentes sociais.

A objetividade, ou uma outra designação de uma noção de equilíbrio (balance), está associada pela esmagadora maioria dos cidadãos ao papel do jornalista, e é consagrada nas leis que estabelecem as balizas do comportamento dos profissionais, em particular os que trabalham nas empresas de comunicação social do setor público. Está presente, pelo menos de uma forma implícita, se não explicitamente, nos códigos deontológicos dos jornalistas nos países democráticos e está no centro de toda uma mitología que representa os jornalistas em diversas narrativas que ocupam um papel central na cultura profissional (TRAQUINA, 2012, p.145).

83 É uma técnica de redação jornalística, na qual a notícia caminha do "mais importante" para o "menos importante". A partir dela nasce a ideia do lide, equivalente ao primeiro parágrafo da notícia, contendo respostas às perguntas tidas como chave para a boa compreensão de um texto jornalístico: o que, quem, quando, onde, como e por quê. O termo “pirâmide invertida” é utilizado porque a base desta, aquilo que é noticiosamente mais importante, se encontra no topo. A primeira notícia redigida sob esse formato teria aparecido no The New York Times em abril de 1861. Alguns aceitam a tese de que a pirâmide invertida surgiu por uma deficiência técnica, um acaso que contemplou, ao mesmo tempo, o comodismo dos leitores e o interesse dos jornais em suprimir os parágrafos finais quando chegava um anúncio de última hora. Adelmo Genro Filho diz que a técnica não se sustenta como elemento de uma teoria da comunicação. Disponível em: http://www.adelmo.com.br/bibt/t196-09.htm Acessado em 17/5/2017.84 Barbara Phillips foi diplomata dos Estados Unidos na África e na Índia, jornalista e editora do Social Science Journal e professora emérita de Sociologia Urbana na Universidade de São Francisco. Disponível em: http://www.legacy.com/obituaries/sfgate/obituary.aspx?pid=185294163 Acessado em 17/5/2017.

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Karam85 (2010) propõe uma discussão em torno da relevância (ou não)

da informação do tipo jornalística na era digital. Um debate pertinente haja vista

que, em tempos de internet, a informação pode ser obtida de diferentes formas

e por diferentes protagonistas e fontes, em curcuitos que passam à margen do

processo tradicional jornalístico. Como conclusão, Karam acredita que o

jornalismo continua relevante para traduzir informações complexas aos

cidadãos. Sobretudo porque está assentado em princípios e fundamentos

éticos e deontológicos, como a credibilidade e interesse público, que o

distinguem de outras profissões. Segundo ele, o jornalista tem o preparo e a

capacidade para oferecer “mensagens precisas, claras e contextualizadas por

quaisquer suportes tecnológicos”. Resultado de uma teoria e de uma ética

aplicada ao exercício profissional, com seus valores, métodos e técnicas.

O jornalismo é simultaneamente gerador de informação e produtor de conhecimento. Gerador porque dissemina, de forma massiva, pública e imediata os fatos e versões e interpretações sobre o presente que são referências para as pessoas. Ao levar informação, de diferentes áreas (da biotecnologia ao comportamento individual, da economia à política parlamentar) permite conhecer mais o entorno, por meio de fontes que conhecem ou deveriam conhecer – porque estudam e se envolvem – suas áreas. São especialistas, conhecedores, portadores de conhecimento. O jornalismo pode não ter o conhecimento profundo da sociologia ou da história, da antropologia ou da medicina, mas todas estas áreas se manifestam imediatamente pelo jornalismo, com as especificidades deste, em termos de método, técnica, linguagem, procedimentos ético-deontológicos, estética e outras (KARAM, 2010).

Para Karam, por mais que haja ambiente tecnológico favorável e por

mais que haja inclusão social na era digital – e, portanto, acesso e domínio da

tecnologia digital e de sua convergência, sociedades complexas como a nossa

primam pela infinitude do conhecimento e, simultaneamente, por

desdobramentos que só são possíveis por meio de saberes específicos. No

entendimento de Karam, é nesse hiato que vislumbra-se a necessidade de

alguém trabalhar num campo específico de pautas, na busca de informações,

no detalhamento, na contextualização e no relato, no caso o jornalista. Valores

como legitimidade, credibilidade e liberdade estão no “epicentro” da atividade

85 Francisco José Castilhos Karam possui graduação em Comunicação Social - Jornalismo, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, mestrado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo, doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e pós-doutorado em Comunicação pela Universidade Nacional de Quilmes, Argentina. Disponível em: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4700059Y3 Acessado em 17/5/2017.

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jornalística. O que, no entendimento de Bernier86 (2004), citado por Karam

(2010), sustenta a profissão, ampliando o reconhecimento da utilidade e

legitimidade do jornalismo dentro de uma sociedade pluralista e complexa, qual

seja a Sociedade da Informação com pessoas recebendo e enviando

mensagens.

Karam (2009) também sustenta a tese defendida por Loum87 (2004,

p.299) de que a ética assume preponderância até mesmo em relação ao

direito, no cenário extremamente mutante do ciberespaço no século XXI. Para

responder tantas perguntas, de forma ágil, é preciso partir de pressupostos,

dentre os quais o de que o jornalismo se consolidou como “acompanhamento

imediato da humanidade, em suas múltiplas perspectivas econômicas,

políticas, culturais…”, não podendo abrir mão de princípios ético-deontológicos

que lhe dão sustentação como “interrogador público contemporâneo”.

Por isso, os valores clásicos do jornalismo significam defender a própria atividade como específica e incontornável; que o jornalismo é mais do que aventura ou acaso; é a razão de ser da controvérsia pela qual se valora e decide sobre o mundo imediato da forma mais lúcida possível; e que está na base da vitalidade democrática. Sem valores que o sustentem como fundamentação ética e procedimentos deontológicos, sempre morre um pouco mais da democracia e do espaço público (KARAM, 2009).

E isso vale, reforça Karam (2009), para as velhas e novas mídias, de

referência ou populares, globais ou segmentadas, em diferentes suportes

tecnológicos e em distintas regiões do planeta, representando diferenciadas

perspectivas ideológicas. Uma questão que não pode passar despercebida no

novo jeito, praticamente instantâneo de fazer jornalismo.

3.2. Revolução tira receptor da passividade e favorece interação

Com a internet, a informação em primeira mão não é mais exclusividade

dos meios de comunicação de massa, mas é projetada para todos que, direta

ou indiretamente, podem incluir-se no universo digital. A forma de informar, no

86 Marc-François Bernier é professor de comunicação na Faculdade de Artes de Ottawa, no Canadá. Seu campo de pesquisa atualmente é a ética jornalística, o direito das mídias e a sociologia do jornalismo. Disponível em: https://uniweb.uottawa.ca/#!/members/610/profile Acessado em 17/5/2017.87 Ndiaga Loum é doutora em Comunicação, pesquisadora do Departamento de Comunicação, Informação e Sociedade da Universidade do Quebec. No pós-doutorado, estudou a internet associada à globalização na África. Disponível em: http://www.er.uqam.ca/nobel/gricis/even/gricis/CV_PDF/CV_Loum.pdf Acessado em 17/5/2017.

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século XXI, é outra assim como os receptores – também chamados de públicos

ou de audiências neste trabalho - passaram de uma posição relativamente

passiva para tornarem-se parte ativa no processo comunicacional. Além dos

princípios e fundamentos ético-deontológicos do jornalismo, que permanecem

válidos na era digital, como discutimos na seção anterior, o profissional do

jornalismo impactado pela internet precisa estar atento ao que Wolton (2011)

classificou como uma ruptura em termos de comunicação.

A revolução do século XXI não é a da informação, mas a da comunicação. Não é a da mensagem, mas a da relação. Não é a da produção e da distribuição da informação por meio de tecnologías sofisticadas, mas a das condições de sua aceitação ou de sua recusa pelos milhões de receptores, todos sempre diferentes e raramente em sintonia com os emissores. Os receptores, destinários da informação, complicam a informação. A informação esbarra no rosto do outro. Sonhava-se com a aldeia global88. Estamos na torre de Babel89 (WOLTON, 2011, p.15).

Wolton parte do pressuposto que o aumento da circulação de

informações, uma realidade trazida pela internet, nem sempre facilita a

comunicação ou a compreensão. Pelo contrário, cria um paradoxo, qual seja

quanto mais informação maior a dificuldade de comunicação. Os receptores do

processo comunicacional, que antes entregavam-se à passividade num fluxo

unidirecional, resistem agora às informações que o “incomodam”, sempre

buscando versões e dados que reforcem seus pontos de vista. Essa

“incomunicação” exige uma certa dose de negociação, sobretudo porque as

mensagens trocadas atualmente são infinitamente mais frequentes e dispersas

para o que o sociólogo francês classifica como “receptores sempre mais

numerosos, heterogêneos e reticentes”.

88 O conceito de aldeia global foi cunhado por Marshall McLuhan na década de 1960, como forma de explicar os efeitos da comunicação de massa sobre a sociedade contemporânea. Pela teoria, a abolição das distâncias e do tempo, bem como a velocidade cada vez maior que ocorreria no processo de comunicação em escala global, nos levaria a um processo de retribalização, onde barreiras culturais, étnicas, geográficas, entre outras, seriam relativizadas, nos levando a uma homogeneização sociocultural. Neste caso, imaginava ele, ações sociais e políticas, por exemplo, poderiam ter inicio simultaneamente e em escala global e as pessoas seriam guiadas por ideais comuns de uma “sociedade mundial”. Disponível em: https://aboutmarshallmcluhan.wordpress.com/category/aldeia-global/ Acessado em 17/5/2017.89 Termo bíblico para designar a suposta construção uma torre que pretendia alcançar o céu. De acordo com a passagem bíblica, Deus teria então castigado a soberba daqueles homens, tomando a decisão de confundir suas línguas para que não se entendessem. O fato de não poderem se comunicar com normalidade fez com que os homens abandonassem o projeto e assim a torre não pôde ser construída. Com esta atitude, Deus demonstrou aos homens que ninguém tinha mais autoridade que Ele. Esta construção inacabada foi chamada de “babel”, que em hebraico significa confusão. Disponível em: https://conceitos.com/torre-babel/ Acessado: 17/5/2017.

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Informação já foi sinônimo de comunicação. Hoje, não é mais.

Comunicar é algo mais profundo. Para diferenciar os dois processos, Wolton

(2011) fala da informação-notícia ligada à imprensa; de informação-serviço, em

expansão devido à internet; de informação-conhecimento, ligada ao

desenvolvimento de bancos e bases de dados. E ainda da informação

relacional, segundo ele em falta e que trabalharia a comunicação, permeando

todas as outras modalidades de informação. Já a comunicação vai além da

informação, é um processo que acontece geralmente motivado pelo desejo de

contato entre as pessoas. O compartilhamento, troca de ideias; a sedução,

inerante às relações humanas e sociais; e a convicção, para explicar e

responder objeções, são impulsos que levam à comunicação. Na era digital,

um desafio imposto aos jornalistas frente a receptores motivados e

empoderados tecnicamente a interagir.

O receptor, para Wolton, leia-se aqui receptor, público ou audiência,

nunca foi passivo, mas hoje, graças à internet, está mais ativo. “Os receptores

negociam, filtram, hierarquizam, recusam ou aceitam as incontáveis

mensagens recebidas, como todos nós, diariamente.” É o chamado “receptor-

ator”, que, segundo Wolton exige uma “revalorização” da própria problemática

da comunicação. Ele critica a visão simplista dos teóricos que subestimam os

receptores, sempre os categorizando como manipuláveis no processo

comunicacional. E avança ao afirmar que comunicação é fruto de uma relação

a três. O receptor nem sempre está com a razão, mas suas opiniões não

podem ser simplesmente descartadas sem um processo de negóciação,

composição.

Ontem, comunicar era transmitir, pois as relações humanas eran frequentemente hierárquicas. Hoje, é quase sempre negociar, pois os indivíduos e os grupos se acham cada vez mais em situação de igualdade. O conceito de negociação pertece, de resto, à cultura democrática. […] Quando se olha bem a realidade, vê-se que cada um passa o seu tempo, atualmente, negociando, na relação conjugal, na familia, na escola, na empresa, na sociedade (WOLTON, 2011, p.19).

De acordo com a teoria da comunicação, formulada por Wolton, tanto a

comunicação entre humanos quanto a mediada por tecnologias passa por

cinco etapas, quais sejam: Etapa 1 – a comunicação é inerente à condição

humana e está baseada na troca, seja individual ou coletiva; Etapa 2 – os seres

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humanos se comunicam para compartilhar, seduzir e convencer; Etapa 3 – a

comunicação esbarra na incomunicação; Etapa 4 – negociação serve para

mitigar a incomunicação; Etapa 5 – a negociação com êxito gera a convivência,

ou seja, sinaliza que houve comunicação e evitam-se consequências danosas.

O empoderamento dos receptores com a internet e essa relação que se

dá com os jornalistas também são analisados sob uma ótica de poder. Castells

(1999) fala de uma sociedade conectada pela internet, a qual cunhou com a

expressão “Sociedade em Rede”.

[…] os procesos dominantes na era da informação estão cada vez mais organizados em torno de redes. Redes constituem a nova morfología social de nossas sociedades e a difusão lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura. Embora a forma de organização social em redes tenha existido em outros tempos e espaços, o novo paradigma da tecnología da informação fornece a base material para sua expansão penetrante em toda a estrutura social. Além disso, eu afirmaria que essa lógica de redes gera uma determinação social em nível mais alto que a dos intereses sociais específicos expressos por meio das redes: o poder dos fluxos é mais importante que os fluxos do poder. A presença na rede ou a ausência dela e a dinâmica de cada rede em relação às outras são fontes cruciais de dominação e transformação de nossa sociedade: uma sociedade que, portanto, podemos apropriadamente chamar de sociedade em rede, caracterizada pela primazia da morfologia social sobre a ação social (CASTELLS, 1999, p. 565).

Esse impacto das tecnologias de comunicação e informação sobre a

estrutura social fez o sociólogo espanhol evoluir para o que denominou de

“autocomunicação das massas”. Autocomunicação porque, no seu

entendimento90, traz autonomia na emissão de mensagens, autonomia na

seleção da recepção de mensagens, autonomia na organização de redes

sociais próprias e na organização de um hipertexto cognitivo e formativo em

que estão todas as informações digitalizadas. Tudo isso, segundo Castells

(2008), com potencial para desencadear movimentos sociais autônomos e uma

comunicação em massa, razão pela qual o campo de atuação do jornalista

90 Extrato retirado do site Projeto Fronteiras do Pensamento, uma iniciativa que tem por objetivo promover, por meio de conferências com intelectuais da atualidade, uma profunda análise da contemporaneidade e das perspectivas para o futuro. O link, disponível em http://www.fronteiras.com/noticias/a-autocomunicacao-de-massas-segundo-castells-1427130204 e acessado em 10/5/2017, traz declarações do sociólogo espanhol durante conferência. A iniciativa nasceu em Porto Alegre, no ano de 2006. Em 2007, primeira edição, nomes como Christopher Hitchens, Jorge Castañeda, Luc Ferry, Michel Maffesoli e Michel Houellebecq subiram ao palco do Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E assim consecutivamente nos anos posteriores, Em 2013, sob a temática Ideias fazem diferença, o Fronteiras trouxe ao Brasil 24 convidados. Dentre eles, o neurocientista português António Damásio, o Prêmio Nobel da Paz José Ramos-Horta e Manuel Castells.

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tornou-se mais difícil, haja vista que não é mais, assim como a empresa

jornalística, dono do processo de comunicação e formação da opinião pública.

Com isso, o sociólogo ressignifica o conceito tradicionalmente aplicado a mídias de emissão unilateral, como televisão e rádio, cujas mensagens o receptor recebe em “estado vegetativo”. Diferentemente das mídias de massa tradicionais, a internet dá voz ao receptor. É possível a qualquer internauta, como o próprio Castells apontou, produzir, selecionar, armazenar e recuperar informações em diversos formatos. A mídia não é mais privilégio de celebridades, de políticos e da intelectualidade. Qualquer um (que tiver rompido a barreira do acesso) pode ter suas festas e baladas documentadas, publicar suas opiniões num blog ou criar mobilizações pelas redes sociais (PROJETO FRONTEIRAS DO PENSAMENTO, 2013).

O pensamento de Lemos (2013) também traz elementos que reforçam a

internet como uma mídia de emissão multilateral. O ciberespaço, de acordo

com o autor, é um ambiente de circulação de discussões pluralistas,

“reforçando competências diferenciadas e aproveitando o caldo de

conhecimento que é gerado dos laços comunitarios”. Para Lemos (2013), tudo

isso associado à dinâmica atual do desenvolvimento das redes de

computadores e seu crescimento exponencial faz do ciberespaço “um

organismo complexo, interativo e autorganizante”. O ciberespaço não tem,

portanto, um controle centralizado, multiplicando-se de forma anárquica e

extensa, desordenadamente, “a partir de conexões múltiplas e diferenciadas”,

permitindo agregações ordinárias, ponto a ponto, formado comunidades. Em

oposição a um sistema hierarquicamente fechado, afirma Lemos, o

ciberespaço cria, por conta dessas comunicações muldirecionais, um sistema

complexo onde a comunicação não pertence a uma entidade central, mas a

este “organismo-rede”.

Com o ciberespaço, as pessoas podem formar coletivos mesmo vivendo em cidades e culturas bem diferentes. Criam-se assim territorialidades simbólicas. Nesse sentido, as comunidades formadas a partir das redes telemáticas mostram como as novas tecnologias podem atuar não apenas como vetores de alienação e desagregação, mas também como máquinas de comunhão, de compartilhamento de ideias e sentimentos, de formação comunitária (LEMOS, 2013, p. 140).

Outras perspectivas vêm ao encontro do tema. A web é controlada em

parte por todos os poderes, inclusive o jornalismo, considerado por muitos

autores como o quarto poder. Essa relação sempre foi assim no entendimento

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de Castells91. Poderes controlam e vigiam os cidadãos e a diferença é que

agora os cidadãos também podem vigiar os poderosos, incluindo o jornalista

que desempenha um papel nesse contexto, tema deste capítulo. Qualquer

pessoa com celular, de acordo com Castells, pode capturar um poderoso

fazendo algo errado. “Temos menos tecnologia do que o poder, mas somos

milhões e milhões de olhos vigiando alguns milhares de poderosos. Com isso,

todos se vigiam mutuamente. Assim, há certo reequilíbrio.”

Orozco92 (2009) concorda que a convergência tecnológica que multiplica

as combinações de formatos, linguagens e estéticas, nas diversas telas, abre

novos cenários e possibilidades que, por sua vez, contribuem para facilitar

outros modos de interação comunicativa às suas audiências. No seu

entendimento, as audiências vão deixando de ser apenas isso e vão se

tornando usuárias, produtoras e emissoras, uma vez que a interatividade que

as novas telas possibilitam ultrapassa a mera interação simbólica entre elas.

O autor mexicano fala ainda da “condição comunicacional”, cunhada por

ele mesmo para explicar a convergência e que “é marcada pela possibilidade

histórica de sermos emissores e não só receptores nos processos de

comunicação, sendo fundamental a compreensão de várias interações,

clássicas e novas, dos sujeitos sociais” (OROZCO, 2010, p. 13).

A interpretação da obra de Orozco (2010, p. 16) nos leva a compreender

que a condição comunicacional representa um up grade, uma espécie de

evolução na medida que consiste numa troca de perfil. As sociedades atuais

estariam se libertando da ideia de audiência passiva, anônima e de massa,

para ser reconhecidas por um perfil mais criativo na produção e nas emissões

comunicacionais. O processo, no entanto, depende de vários fatores, dentre os

91 Extrato retirado da série em celebração aos 10 anos do Projeto Fronteiras do Pensamento. O link disponível em http://www.fronteiras.com/artigos/fronteiras-10-anos-manuel-castells e acessado em 10/5/2017 disponibiliza respostas formuladas em primeira pessoa pelo sociólogo espanhol a diversas dúvidas enviadas pelo público participante do Projeto.92 Nascido no México, Guillermo Orozco é doutor em Educação pela Universidade de Harvard e autor de numerosos trabalhos sobre comunicação e meios. Tem focado a sua linha de pensamento e investigação nos estudos da recepção e alfabetização audiovisual. Publicou diversos livros, dentre eles Televisión y audiencias, un enfoque cualitativo (1996); La investigación en comunicación dentro y fuera de América Latina (1997); Televisión, audiencias y educación (2001), Recepción y mediaciones, coord., (2002). Disponível em: http://www.infoamerica.org/teoria/orozco1.htm Acessado em 17/5/2017.

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quais um acesso digital mais homogêno. Orozco, Navarro93 e García Matilla94

(2012), ao investigar as mudanças vividas pela sociedade em rede e as

interações das audiências diante das telas, detectaram que na América Latina,

por exemplo, o acesso à internet ainda é um desafio.

O acesso instrumental à tecnologia, pelos setores sociais, está longe de

ser o ideal. Eles citam o México como exemplo, dizendo que a realidade

mexicana vela para toda a América Latina. Apenas 40% dos mexicanos tinham

em 2012, ano em que o estudo foi publicado, algum tipo de internet. Já a

Espanha, na mesma época, o percentual se elevava para 64,2% da população.

O passado político e uma educação mais focada à leitura que à escrita também

teriam peso nesse processo, sobretudo entre os latino-americanos, onde o

autoritarismo e a verticalidade da comunicação de massa, por meio da tevê,

“nos acostumou a ser e até nos posicionou como audiências passivas, tímidas,

para expressar nossas reações que não encontravam eco, já que não havia

canais de réplica nem a possibilidade de uma interação real, não simbólica,

com as mensagens de massa” (Orozco, Navarro & García Matilla, 2012).

Outro desafio, levantado pelos autores e que serve para a nossa

reflexão sobre o futuro do jornalismo da era digital, diz respeito ao consumo

das notícias, que sirva mais que para pensar. Que sirva para criar “uma aspiral

ascendente de criatividade e empoderamento” de todos os participantes. A

formação de audiências ativas implica a criação de “modelos de ensino-

aprendizagem”, inseridos nos currículos universitários, que estimulem os

futuros jornalistas a pensar como proceder diante das mudanças.

Nem a interatividade, nem as possibilidades tecnológicas que lhes são oferecidas às atuais audiências são suficientes para o desenvolvimento de uma sociedade do conhecimento: só uma formação integral que aproveite as imensas potencialidades da nova cadeia de valor que oferece o atual contexto digital poderá converter as novas audiências em emirecs95 e

93 Eva Navarro Martínez é professora e pesquisadora na Universidade de Valladolid, Espanha. Sua atuação está vinculada aos Departamentos de História Moderna, Contemporânea e da América, Jornalismo e Comunicação Audiovisual e Publicidade. Conhecimento na área de Comunicação Audiovisual e Publicidade, é autora de livros e inúmeros artigos científicos, tratando temas como a televisão e a internet. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/autor?codigo=314856 Acessado em 16/5/2017.94 Agustín García Matilla é professor e pesquisador espanhol, reconhecido por seu trabalho em educomunicação. As funções da televisão e a teoria e técnica de informação audiovisual, com ênfase no uso das novas tecnologias, fazem parte do corpus de sua pesquisa. É professor na Universidade de Valladolid. Disponível em: http://comunicacion.uva.es/export/sites/comunicacion/96d6cb8a-271e-11e6-8d97-d59857eb090a/ Acessado em 17/5/2017.95 Equivalente àquela pessoa que passa do status de receptor-consumidor para preceptor-criador, conforme a lógica da “linguagem total” do canadense e pai da Teoria do Emirec, Jean Cloutier (1975), e

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usuários críticos de uma comunicação autenticamente global e integradora (OROZCO, NAVARRO & GARCÍA MATILLA, 2012).

Os empresários da comunicação assim como o jornalistas passam,

dessa forma, a se posicionar no âmbito da comunicação através da internet.

Castells (2008) explica que os principais meios de comunicação, por exemplo,

estabelecem vínculos diretos com a rede e com seus usuários, ao mesmo

tempo que exploram a blogosfera para selecionar temas e questões de

interesse potencial para seus receptores/públicos/audiências. Já os atores que

lutam pela mudança social com frequência usam a internet como uma forma de

influenciar a agenda de notícias dos principais meios de comunicação. E as

elites políticas, outro elo estudado pelo autor, se valem cada vez mais das

formas e meios de autocomunicação de massa, porque a sua flexibilidade, seu

caráter instantâneo e sua capacidade sem limites para difundir qualquer tipo de

material são relevantes para a prática da política mediática em tempo real

(CASTELLS, 2008).

Nesse contexto, todos são obrigados a dialogar com tantas outras vozes

com poder – leia-se com internet, porque emissor e receptor devem trabalhar

juntos, ser parceiros na era digital. Disso dependerá o sucesso dos jornalistas e

do jornalismo na definição do seu novo papel. Mais que concorrentes, os dois

polos, cada um com sua habilidade, se completam. Pavlik96 (2014) diz que o

conteúdo gerado por cidadãos em um mundo globalmente conectado pode ter

um papel central para complementar o conteúdo jornalístico e midiático

produzido profissionalmente. O autor afirma que a ubiquidade da internet é a

principal característica para demonstrar o potencial dessa rede interativa em

tempo real. Ubiquidade implica que qualquer um, em qualquer lugar, pode não

apenas acessar notícias e entretenimento, mas participar e fornecer sua

própria contribuição com conteúdos para compartilhamento e distribuição

global.

O conteúdo noticioso, que não está mais nas mãos apenas dos

profissionais do jornalismo, é construído por uma variedade de fontes cada vez

tema do livro Comunicación Digital, un modelo basado en el fator R-Elacional, de Carmen Marta-Lazo e José Antonio Gabelas, 2016.96 John V. Pavlik é professor de Jornalismo e Estudo de Mídias na Universidade de Nova Jersey. É autor de vários livros sobre o impacto das novas tecnologias no jornalismo e na sociedade. Entre as suas obras, Converging media; Media in the digital age; Journalism and new media; e The people’s right to know. Escreveu mais de 100 capítulos de livros e artigos em revistas científicas. CANAVILHAS, João (organizador). Webjornalismo, 7 caraterísticas que marcam a diferença. 2014.

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mais ubíquas, incluindo câmeras de segurança ou vigilância bem como

sensores de muitos tipos e formatos, frequentemente ligados à internet. A

internet móvel com tecnologia ubíqua está, em muitos sentidos, alimentando a

concretização do pensamento de Marshall Mcluhan (1964), de uma aldeia

global (PAVLIK, 2014).

Na era da mídia analógica, parecia ser impossível e impraticável para os jornalistas ou para as empresas jornalística estarem em todo e o lugar o tempo todo para cobrir os acontecimentos. Na era digital, esta situação está mudando. Com a banda larga ubíqua, especialmente com a tecnologia wireless, a conectividade móvel está redefinindo os preceitos básicos do jornalismo e da mídia (PAVLIK, 2014).

Esse processo tem consequências e Pavlik cita algumas delas. A

ubiquidade faz nascer um novo jornalismo, o chamado jornalismo cidadão que,

apesar de ainda não dispor de um monopólio de saberes, como o jornalismo

profissão, coleta e distribui informações e notícias. O advento da internet

ubíqua e o surgimento das mídias de comunicação móvel têm acelerado muito

a ampla participação cidadã.

Pavlik (2014) cita William Dutton, professor da Universidade de Oxford, para

aprofundar o tema. Dutton (2011) sustenta que o termo “indivíduo em rede” é

superior a jornalista cidadão. Ele argumenta que falta a muitos cidadãos

qualquer treinamento formal como jornalista, tornando ausente a habilidade

necessária para fazer jornalismo de verdade. Ao invés disso, quando usam

câmeras ou outros dispositivos para recolher notícias, eles o fazem como

indivíduos em rede ao invés de repórteres (Pavlik, 2014).

Dutton (2011) dá um exemplo prático, mostrando que as pessoas hoje em

dia recorrem muito à internet para compreender uma receita médica. Uma vez

online, as pessoas navegam sem um destino específico. Esse processo de

navegação sem rumo cria uma fonte pessoal de informação independente de

instituições como o governo, as universidades e o jornalismo. É um processo,

que no entendimento de Dutton, aumenta o poder comunicativo do usuário em

relação às instituições.

Esse ambiente é o que o autor denomina Quinto Poder97, espaço o qual as

pessoas acessam não apenas para obter informações, mas para contribuir,

97 Segundo Dutton (2011), o termo Quinto Poder (Fifth Estate, em inglês) nasceu a partir de um paralelo com o papel da imprensa. E ele explica: no século XVIII, Edmund Burke identificou a imprensa como Quarto Poder, mediando a relação entre as três propriedades feudais - clero, nobreza e os comuns.

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clicando ou postando links, enviando, comentando, classificando, publicando

fotos, blogando, tweeting, crowdsourcing - criando conteúdo (DUTTON, 2011).

O Quinto Poder torna-se mais independente, reforça o autor:

É claro que instituições como a imprensa também usam a internet para aumentar seu poder comunicativo. Mas você e outros podem reconfigurar o acesso a fontes alternativas de informação e depender menos das fontes tradicionais. Ao fazê-lo, você está abrindo novas formas de aumentar a responsabilidade dos políticos, especialistas e outros atores vinculados ao poder (DUTTON, 2011).

O Quinto Poder é habilitado pela web, moldado por quadros legais e

regulatórios e também por padrões de uso, de acordo com o autor. Tratá-se de

um avanço realista na democracia - só requer uma massa crítica de indivíduos

em rede. No entanto, seus inimigos podem prejudicá-la, restringindo a

liberdade de expressão online e reduzindo a autonomia do usuário por meio de

vigilância ou regulamentação. Assim como o Quarto Poder depende de uma

imprensa livre, o Quinto Poder depende da independência do controle do

governo e das outras propriedades do mundo da internet (DUTTON, 2011).

Independente da denominação ser jornalismo cidadão ou indivíduos em

rede, Pavlik (2014) diz que é fato que os cidadãos equipados com

smartphones se tornarão, no século XXI, repórteres continuamente engajados,

capturando com seus telemóveis fotografias e vídeos de notícias que acabam

de acontecer. Eles usam mídias sociais como Youtube, Facebook e Twitter

para compartilhar amplamente suas notícias. Diante desse quadro, cabe aos

jornalistar reagir.

3.3. Uma profissão que precisa (com urgência) ser reinventada

Não há uma fórmula pronta para definir um perfil do jornalista ideal na

era digital. O que é certo é que esse jornalista contemporâneo tem um novo

papel a desempenhar, devido a várias razões que vão além da reengenharia

provocada pelas novas tecnologias e que exige novas formas de agir, de

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pensar e de se posicionar como profissional. Dentre as razões que se colocam

como mais preocupantes, visto que se mal conduzidas podem provocar danos

irreversíveis ao novo modelo de jornalismo que se constroi a partir da internet,

uma relacionada às empresas de comunicação, em profunda crise de caixa e

de criatividade na gestão de seus negócios, e outra que diz respeito às

redações cada vez mais enxutas, desmotivadas e desmobilizadas.

Salaverría98 (2015) trata do tema e aponta dois motivos para o momento

delicado das empresas de comunicação. Primeiro, a crise econômica de 2008

que reduziu o poder aquisitivo dos cidadãos e o poder de investimento das

empresas, provocando queda nas vendas de produtos culturais e de anuncios

publicitários. Segundo, a transformação tecnológica à qual foi submetida a

indústria da comunicação desde os anos de 1990, quando surgiu a internet,

tendo, por consequência, de evoluir do analógico para o digital.

Segundo o autor espanhol, a digitalização, pela qual vem passando as

empresas de comunicação, nos últimos 25 anos, internacionalizou os

mercados de comunicação fazendo com que empresas tradicionais perdessem

em competitividade e aumentando a oferta informativa, boa parte dela gratuita.

Os suportes de difusão continuam se multiplicando, tanto os fixos

(computadores) quanto os móveis (celulares), tornando o processo cada vez

mais complexo. E, por fim, a internet quebrou o que Salaverría chama de

“monopólio da palavra”, ou seja, as empresas – assim como os jornalistas -

passaram a ser vigiados e avaliados permanentemente pelos

receptores/públicos/audiencias, como tratamos com detalhar na seção anterior.

As redações, impactadas pelo fenômeno da internet que passou a exigir

novas práticas jornalísticas, também sofrem com a crise financeira e de gestão

dos patrões. A recessão nas empresas de comunicação se reflete em

demissões e no enxugamento gradativo e contínuo das estruturas, justamente

quando o que se esperava era uma ampliação de quadros e um reforço

tecnológico, já que o jornalismo da era digital pede conteúdos cada vez mais

98 Rámon Salaverría é professor de Jornalismo na Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra, Espanha. Tem vasta experiência como diretor e pesquisador em diversos projetos de pesquisa nacionais e internacionais no campo de novas mídias. Entre a sua bibliografia, destacam-se os livros Periodismo integrado (2008), Cibermedios (2005), Redacción Periodística en Internet (2005). Publicou ainda centenas de artigos científicos e capítulos de livros sobre géneros e ciberjornalismo. CANAVILHAS, João (organizador). Webjornalismo: 7 caraterísticas que marcam a diferença. 2014.

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customizados, diferenciados e multimídias, para públicos segmentados e

exigentes.

[…] Quase todas as empresas jornalísticas há anos vêm realizando cortes que, em muitas ocasiões, levaram ao fechamento de títulos e publicações. Estas medidas afetam todos os tipos de meios de comunicação – jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão, agências de notícias, portais de internet – e em qualquer escala, seja local, regional, nacional e, inclusive, internacional. Uma das principais vítimas desse colapso é o coletivo dos jornalistas (SALAVERRÍA, 2015).

Para superar os desafios postos, os jornalistas precisam se reinventar.

Salaverría diz que não são apenas as empresas jornalísticas que precisam se

modernizar, mas também os profissionais que delas fazem parte. Os jornalistas

precisam definir o papel que vão desempenhar nos novos modelos de

negócios, gerados com a internet. “Não se podem operar meios do século XXI

com rotinas profissionais do século XX.” O autor espanhol crítica a resistência

de muitos profissionais em aderir ao novo modelo, acusando-os de ficar

ancorados no passado. Salaverría (2015) reforça a importância de se manter

princípios e fundamentos do “bom jornalismo”. Segundo ele, o jornalismo busca

proporcionar às pessoas “informações verdadeiras, inéditas e interessantes,

com o triplo objetivo de formar, informar e entreter”, sem definir a forma de

cumprir a função.

A sociedade precisa de jornalismo, mas não necessariamente de jornais, rádios, televisões ou inclusive de internet. Toda tecnologia é passageira e, como tal, cedo ou tarde, caduca. Cada meio de comunicação é uma forma histórica de cumprir com a função jornalística, que responde, ela sim, a uma necessidade permanente nas sociedades modernas. Por isto, não tem sentido santificar qualquer um dos meios: assim como um meio pode triunfar em um dado momento, alavancado por suas vantagens técnicas e sua melhor adaptação às particularidades de uma sociedade, também é seguro que chegará a seu declínio, quando se veja encurralado por outro novo suporte que cumpra melhor essa mesma função. Este é o cerne da mudança em que se encontra o jornalismo na atualidade. Não se trata de uma simples necessidade de renovar os modelos de negócio, e nem é suficiente, claro, adotar simples mudanças de tecnologia ou de design. […] Trata-se de redefinir os modos de informar para seguir cumprindo uma função que a sociedade precisa. E essa redefinição também cabe aos jornalistas, que têm sua parte a fazer (SALAVERRÍA, 2015).

O autor espanhol defende uma maior abertura dos profissionais frente

aos desafios que se colocam e sugere quatro aspectos sobre os quais os

jornalistas deveriam refletir, como ponto de partida para a mudança. 1)

Destreza tecnológica – O jornalista precisa demonstrar vontade permanente

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em se reciclar, como é recorrente em outras profissões, e “rejuvenescer a

mentalidade”, para valer-se das vantagens oferecidas pelas novas tecnologias

e colocá-las a serviço “do jornalismo, da apuração e da busca do contraditório”.

2) Tratamento da informação – o jornalista precisa se adaptar aos novos

tempos, de superabundância de informações, cabendo a ele ser o intérprete de

dados, o filtro diante da enxurrada de informações e o responsável por dar o

devido valor à cada informação. 3) Meios e linguagens – o jornalista deve

dominar os códigos próprios de cada meio (jornalismo impresso, jornalismo

radiofônico ou o webjornalismo) e valer-se de possibilidades como o hipertexto

e conteúdos interativos e multimídias. Há muito espaço para se explorar. 4)

Processos editoriais - a digitalização fez com que os meios mudassem e

passasem a trabalhar em ambientes multiplataformas. Levando em conta esse

contexto, os jornalistas precisam redefinir as suas rotinas e os fluxos de

trabalho.

Quando um grupo de comunicação distingue a informação mais balanceada da notícia instantânea, é preciso organizar o trabalho editorial de modo diferente: repensar os gêneros para cada tipo de informação, organizar as equipes de um modo eficiente, reconsiderar os filtros editoriais, buscar formas de aproveitar a interatividade com os leitores (SALAVERRÍA, 2015).

Pearson99 (2009) aconselha os jornalistas contemporâneos a dominar os

fundamentos do que os cientistas da computação começaram a identificar, na

última década, como “pensamento computacional”. Ela busca no Centro de

Pensamento Computacional norte-americano, da Carnegie Mellon University,

elementos para exemplificar o que de fato quer dizer esse novo agir.

Pensamento computacional significa: 1. criar e fazer uso de diferentes níveis de

abstração, para entender e resolver problemas de forma mais eficaz; 2. pensar

algoritmicamente100 e com a habilidade de aplicar conceitos matemáticos como

indução para desenvolver soluções mais eficientes, justas e seguras; 3.

entender as consequências da escala, não apenas por razões de eficiência,

mas também por razões econômicas e sociais.

99 Formada em jornalismo pela Universidade de Nova York, Kim Pearson é professora no TCNJ, o Colégio de Nova Jersey. Pesquisadora na área de diversidade computacional e envolvimento cívico, Pearson ensina redação para meios interativos e multimídias. Fonte: http://english.tcnj.edu/faculty-staff/kim-pearson/ Acessado em 18/5/2017.100 Pensar por meio de algoritmos, que são sequências de raciocínios ou operações que oferecem a solução de certos problemas. Fonte: https://www.dicio.com.br/algoritmos/ Acessado em 18/5/2017.

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Wing101 (2006) reforça observando que o pensamento computacional é uma

habilidade fundamental para todos, não apenas para cientistas da computação.

Segundo ela, esse modo de pensar deve ser adicionado à leitura, à escrita e à

matemática, desde criança.

O pensamento computacional envolve a resolução de problemas, a concepção de sistemas e a compreensão do comportamento humano, baseando-se nos conceitos fundamentais da ciência da computação. O pensamento computacional inclui uma gama de ferramentas mentais que refletem a amplitude do campo da ciência da computação. […] Tendo que resolver um problema específico, podemos perguntar: o quão difícil será de resolver? E qual é a melhor maneira de resolver? A ciência da computação baseia-se em fundamentos teóricos sólidos para responder perguntas com precisão. Declarar a dificuldade de um problema explica o poder subjacente da máquina - o dispositivo de computação que executará a solução. Devemos considerar o conjunto de instruções da máquina, suas restrições de recursos e seu ambiente operacional. […] O pensamento computacional reformula um problema aparentemente difícil em um saber como resolver, talvez por redução, incorporação, transformação ou simulação (WING, 2006).

Pearson afirma que a dependência do jornalismo à computação vem

muito antes da explosão da internet nos anos 1990. Assim como o uso de

bases de dados para a realização do jornalismo investigativo. Ou seja, não

existe mais espaço para questionar a necessidade de os jornalistas serem

“digitalmente alfabetizados”. É uma obrigação. O cenário atual exige

profissionais com habilidades digitais e domínio de tecnologias de mídias

sociais para organizar, por exemplo, comunidades online em torno de questões

comuns. Ela defende que os jornalistas se tornem criadores e não somente

consumidores de tecnologias da computação.

Não estou dizendo que os jornalistas precisam se tornar programadores. Estou dizendo que precisamos ser capazes de raciocinar abstratamente sobre o que fazemos, entender a paleta completa de ferramentas computacionais à nossa disposição, e colaborar para implementar essas ferramentas com a máxima eficiência e eficácia. Isso significa entender as estruturas e processos subjacentes da criação de mídia (PEARSON, 2009).

Segundo Pearson (2009), o conhecimento em estruturas e processos de

computação subjacentes é importante para os jornalistas do século XXI porque

101 Jeannette M. Wing é vice-presidente corporativo da Microsoft Research, responsável por seus laboratórios de pesquisa básica em todo o mundo. Antes de 2013, ela atuou como professora na Universidade de Carnegie Mellon, em Pittsburgh, nos Estados Unidos. Wing é membro ativo da comunidade de métodos formais e apoiadora do Pensamento Computacional. Fonte: https://www.h-its.org/sab-members/about-jeannette-wing/ Acessado em 18/5/2017.

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aumenta a produtividade e a eficiência da operação de notícias. A partir disso,

nascerão práticas que servirão de base para a educação jornalística no futuro.

As ferramentas reais que usamos para implementar essas práticas continuarão a mudar. No entanto, se nos educarmos adequadamente, podemos ajudar a liderar essa mudança, garantindo que essas práticas em evolução sirvam os melhores interesses da democracia (PEARSON, 2009).

Wing (2006) esclarece que ciência da computação é o estudo da

computação - o que pode ser computado e como calculá-lo. Assim, descreve

características do pensamento computacional aplicável ao jornalismo. Pensar

como um cientista da computação vai muito além de programar um

computador, por exemplo. O que se deseja de quem tem um pensamento

computacional é um pensar em múltiplos níveis de abstração. O computador

servirá como apoio à inteligência humana, na solução de problemas.

Para reforçar a ideia de que o jornalista da era digital precisa pensar

diferente, duas últimas características construídas por Wing em relação ao

pensamento computacional:

Não são apenas os artefatos de software e hardware que produzimos que estarão fisicamente presentes em todos os lugares e tocarão nossas vidas o tempo todo; serão os conceitos computacionais que usamos para abordar e resolver problemas, gerenciar nossas vidas diárias e comunicar e interagir com outras pessoas; e para todos, em toda parte. O pensamento computacional será uma realidade quando for tão integral aos esforços humanos que desaparece como uma filosofia explícita (WING, 2006).

A reinvenção do jornalista, na era digital, passa por novos campos como a

multimidialidade e a destreza tecnológica, apontados por Salaverría (2015), por

novos modelos de enxergar a realidade, como o pensamento computacional,

sugerido por Pearson (2009) e Wing (2006), e também pela análise de bases

de dados, como prega Meyer102 (2002) desde os anos 1970, antes mesmo da

existência da internet. Meyer acredita que a aplicação de técnicas de pesquisa

em ciências sociais no jornalismo dá densidade e profundidade às entregas.

Ele mostra aos jornalistas e estudantes de jornalismo como analisar dados e

102 Philip Meyer é professor emérito da Universidade da Carolina do Norte, Estados Unidos. Começou no jornal impresso e depois migrou para a docência. Sua obra mais citada é sobre métodos de jornalismo de precisão. Para Meyer, o jornalista de redação deveria se valer de métodos científicos para apurar a notícia. Sua premissa, incomum para o tempo, era que os repórteres deveriam entender de método, não apenas para escrever sobre, mas para aplicar em seu próprio trabalho. Fonte: http://pmeyer.web.unc.edu/ Acessado em 18/5/2017.

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colher informações de forma precisa e rápida. Gray103, Bounegru104 e

Chambers105 (2012) trazem depoimento de Meyer sobre a importância do

jornalismo de dados. De acordo com Meyer, quando a informação era escassa,

a maior parte dos esforços dos jornalistas era reunir dados. Agora que a

informação é abundante, processá-la tornou-se mais importante. O

processamento acontece em dois níveis: 1) análise para entender e estruturar

um fluxo infinito de dados; e 2) apresentação para fazer com que os dados

mais importantes e relevantes cheguem ao consumidor. Como acontece na

ciência, o jornalismo de dados revela seus métodos e apresenta seus

resultados de uma forma que possam ser replicados (MEYER apud GRAY,

BOUNEGRU e CHAMBERS, 2012).

Gray, Bounegru e Chambers falam das mudanças provocadas pela

internet e dessa nova realidade que repercutiu no dia a dia dos jornalistas. Eles

convidam os jornalistas a trabalharem com base de dados, o que pode

despertar o interesse dessa massa de pessoas com informações facilmente

acessíveis. O uso de dados ajuda a transformar algo abstrato em algo que

todos podem entender e se relacionar. Uma base de dados, exemplificam,

pode criar calculadoras personalizadas para ajudar as pessoas a tomarem

decisões, seja comprar um carro, decidir um rumo profissional ou ainda

verificar os custos de se manter sem dívidas. Bem como pode analisar a

dinâmica de uma situação complexa, como protestos ou debates políticos, e

ajudar todos a verem as possíveis soluções para problemas complexos.

O jornalismo está sitiado. No passado, nós, como uma indústria, contávamos com o fato de sermos os únicos a operar a tecnologia para multiplicar e distribuir o que havia acontecido de um dia para o outro. A imprensa servia como um portão: se alguém quisesse impactar as pessoas de uma cidade ou região na manhã seguinte, deveria procurar os jornais.

103 Jonathan Gray é bolsista do Instituto de Pesquisa de Políticas da Universidade de Bath, onde atualmente está escrevendo um livro sobre Data Worlds e as políticas de informação pública. Isso inclui o uso de abordagens de Ciência e Tecnologia, História e Filosofia da Ciência e Novos Estudos de Mídia para explorar os ideais, imaginários, epistemologias, práticas, métodos e tecnologias associadas com dados abertos, jornalismo de dados, ativismo de dados e transparência. Fonte: http://jonathangray.org/about/ Acessado em 18/5/2017.104 Liliana Bounegru trabalha, no momento, em um livro sobre métodos digitais para estudos de jornalismo. O livro aborda uma perspectiva metodológica relacionada a plataformas digitais para compreender gêneros existentes no jornalismo de dados. É também pesquisadora da Digital Methods Initiative da Universidade de Amsterdã. Fonte: http://lilianabounegru.org/about/ Acessado em 18/5/2017.105 Lucy Chambers é coordenadora comunitária na Open Knowledge Foundation. Ela trabalha no projeto OpenSpending da OKF e coordena as atividades de jornalismo baseadas em dados da fundação, incluindo a execução de sessões de treinamento e ajudando a simplificar a produção de um manual escrito em colaboração para o jornalismo de dados. Fonte: http://www.journalismfestival.com/speaker/lucy-chambers Acessado em 18/5/2017.

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Isso acabou. Hoje as notícias estão fluindo na medida em que acontecem, a partir de múltiplas fontes, testemunhas oculares, blogs, e o que aconteceu é filtrado por uma vasta rede de conexões sociais, sendo classificado, comentado e, muito frequentemente, ignorado (GRAY, BOUNEGRU & CHAMBERS, 2012).

López106 (2017) vai além de Gray, Bounegru e Chambers (2012) e

formula orientações práticas para a formação simplificada de equipes de

jornalismo de dados. No seu entendimento, se há cinco anos os jornalistas que

“garimpavam” revelações em bases de dados, ajudados por hackers107 ou

desenvolvedores, eram considerados os nerds108 das redações, hoje o mundo

conhece desde histórias pontuais de corrupção até investigações globais,

graças à aliança repórteres e tecnólogos (LÓPEZ, 2017, p. 74).

O desafio fundamental dos repórteres de uma equipe de jornalismo de dados não está em aprender a usar as ferramentas digitais mais sofisticadas, mas sim em pensar de uma maneira diferente sobre os problemas que devem ser investigados para construir novas maneiras de perguntar, buscar informação, formular hipóteses e métodos de trabalho. No jornalismo tradicional, o repórter se concentrava em identificar um caso revelador. No jornalismo com bases de dados, ele busca padrões, tendências e fenômenos agora identificáveis. Seu trabalho já não é mais uma atividade solitária, mas sim de uma equipe que, apoiada na tecnologia, vai fornecer fórmulas e cruzamento de fontes corretas para fazer uma gigantesca quantidade de perguntas a bases de dados em pouco tempo e encontrar pistas e provas antes inimagináveis (LÓPEZ, 2017, p. 75).

A autora põe em evidência a importância de se apostar na diversidade

de perfis para a composição de uma boa equipe de jornalismo de dados. E no

papel-chave do desenvolvedor web, seja profissional ou autodidata com

diversos conhecimentos em computação. “Uma equipe de jornalismo de dados

precisa de desenvolvedores com dois tipos de perfis: o backend, que trabalha

do lado do servidor e na gestão de bases de dados, e o frontend, responsável 106 Fabiola Torres López é fundadora e editora de OjoPúblico, um meio digital com equipe especializada em investigações com bases de dados, entre as quais se destaca Memoria Robada, que ganhou o Terceiro Prêmio Latinoamericano de Jornalismo Investigativo de 2016. Foi a primeira grande investigação regional com dados massivos que evidenciou a escala do tráfico de patrimônios culturais na América Latina e sua condição de crime organizado. Disponível em: https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ebook/jornalismo-inovador-na-america-latina-pt-br Acessado em 25/5/2017.107 Termo usado para designar pessoa apaixonada em computador que, por divertimento, curiosidade, desafio pessoal ou por causa da notoriedade, sonda, aleatoriamente, ao invés de usar manuais técnicos, capacidades de sistemas de computador de hardware e software. Disponível em: http://www.culture.fr/franceterme/result?francetermeSearchTerme=hacker&francetermeSearchDomaine=0&francetermeSearchSubmit=rechercher&action=search Acessado em 25/5/2017.108 Nerd é o termo utilizado para definir uma pessoa muito dedicada aos estudos, alcançando níveis intelectuais acima dos previstos para sua idade. A origem da palavra nerd não é exata. Disponível em: https://www.significadosbr.com.br/nerd Acessado em 25/5/2017.

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pela parte visível de uma plataforma.” Dentre as vantagens de se trabalhar

nesse formato, López (2017) destaca o reconhecimento das audiências, ou

seja, os leitores gostam de métodos transparentes, demonstrando como foi o

processo de apuração. Além disso, a forma de trabalho das equipes de

jornalismo de dados “permite projetar investigações sobre diversos temas com

enfoques originais e inovadores, desde a forma como estabelecemos os

esquemas comprobatórios até as narrativas para apresentar as revelações”.

A presença da web em todos os lugares e ao mesmo tempo possibilita

uma série de novas habilidades que envolvem a coleta de grande volume de

informação, feita por sensores de vários tipos conectados à internet (Pavlik,

2014). Muitos desses dados estão disponíveis livremente para a mídia e

também para os jornalistas. O autor norte-americano alerta para o fim da

privacidade e sua substituição por uma sociedade da vigilância global. Em

muitos países, a privacidade é uma liberdade civil altamente valorizada. No

entanto, na era da mídia ubíqua e do Big Data, a privacidade está sendo

rapidamente corroída.

Lewis109 (2014) chama a atenção para um aspecto relevante do tema.

Segundo ele, “o jornalismo se expande em meio à abundância de dados,

exploração computacional e ênfase algoritmica - desenvolvimentos com

significado amplo na tecnologia e na sociedade em geral, e aqueles com

significado crescente para a indústria de mídia e para o jornalismo como prática

e profissão”. Ele afirma que os conjuntos de dados em larga escala e sua

coleta, análise e interpretação estão se tornando cada vez mais salientes para

dar sentido e derivar valor da informação digital, em grande escala.

Lewis e Westlund110 (2014) sugerem quatro “lentes conceituais” para o

jornalismo se apropriar dessa fonte inesgotável de informação, que é a base de

109 Seth C. Lewis é professor na Escola de Jornalismo e Comunicação da Universidade de Oregon, Estados Unidos. Sua pesquisa explora a transformação digital do jornalismo, com ênfase nas implicações sociais das tecnologias de mídia para a dinâmica do trabalho de mídia e inovação. Seu trabalho centra-se em três áreas principais: a interação de seres humanos e máquinas em notícias, como na ascensão da inteligência artificial e automação no jornalismo; o papel da reciprocidade na mudança dinâmica entre jornalistas, públicos e comunidades; e as dimensões sociais do jornalismo e suas fronteiras. Disponível: http://journalism.uoregon.edu/member/lewis_seth/ Acessado em 18/5/2017.110 Oscar Westlund é professor associado da JMG - Departamento de Jornalismo, Mídia e Comunicação da Universidade de Gothenburg, na Suécia. Ele defendeu em 2012 tese de doutorado sobre a evolução da mídia móvel. A pesquisa de Westlund tem como foco as transformações e relacionamentos entre velhos e novos meios. Ele investiga a evolução da dinâmica e da interação do jornalismo, internet e TICs, em geral, e a interseção de jornais e mídia móvel, em particular. Disponível: http://jmg.gu.se/english/about-us/staff?languageId=100001&userId=xwesos&userName=Oscar+Westlund Acessado em 18/5/2017.

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dados: epistemologia111, especialização, economia e ética. Só assim, de acordo

com os autores, será possível entender as aplicações atuais e potenciais de

grandes dados para a lógica profissional do jornalismo e sua produção

industrial.

Essas abordagens conceituais, distintas mas inter-relacionadas, mostram "como os jornalistas e as organizações de mídia buscam dar sentido, agir e derivar o valor de grandes dados". Em última análise, o desenvolvimento de grandes dados podem ter efeitos transformadores, um significado "para as formas de conhecimento do jornalismo (epistemologia) e de fazer (expertise), bem como sua negociação de valor (economia) e valores (ética) (LEWIS & WESTLUND, 2014 apud LEWIS, 2014).

À medida que o jornalismo quantitativo se torna mais central no núcleo

profissional do jornalismo e como técnicas computacionais e algorítmicas

também se entrelaçam com os modelos de negócios em que o jornalismo é

apoiado, questões críticas irão surgir continuamente sobre a relação sócio-

material dos grandes dados, jornalismo e trabalho de mídia em geral (Lewis,

2014).

Reverter o que parece ruim – o excesso de informação – em jornalismo

útil, bem apurado e com credibilidade é o desafio que se coloca. Se bem

internalizado pelos profissionais, obviamente pelas empresas de comunicação,

será útil na conquista públicos/audiência/receptores. Cabe ao jornalista, hoje

provocado a sair de uma zona de conforto, valer-se dos dados, transformando-

os em histórias. Gray diz que ter conhecimento sobre busca, limpeza e

visualização de dados é “transformador” para o exercício da reportagem,

porque produção será a partir de fatos e ideias, “com menos adivinhação,

menos busca por citações”. Assim, o jornalista poderá construir uma posição

forte sustentada por dados, contribuindo para o papel social do jornalismo,

contando boas histórias.

Prado (2011) traz na sua obra um compilado112 do pensamento de Emily

Bell113, jornalista britânica que na época da edição do livro ainda era diretora de

111 Teoria do conhecimento; reflexão sobre a natureza, o conhecimento e suas relações entre o sujeito e o objeto. Disponível em: https://www.dicio.com.br/epistemologia/ Acessado em 18/5/2017.112 O blog Novo em Folha (extensão do Programa de treinamento em jornalismo da Folha, produzido pela equipe da Editoria de Treinamento, pelos trainees e por outros colaboradores da Redação da Folha de S.Paulo) traduziu e resumiu artigo do blog The Rooter of the matter, que dita os principais pontos de uma palestra dada por Bell sobre jornalismo digital. (Prado, 2011)113 Emily Bell é diretora fundadora do Tow Center for Digital Journalism da Columbia Journalism School, e uma importante pensadora, comentarista e estrategista em jornalismo digital. Sob o seu comando, o centro construiu rapidamente uma reputação internacional para a pesquisa no cruzamento entre tecnologia e jornalismo. A maioria da carreira de Emily foi passada no Guardian News and Media, em

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conteúdo digital do Guardian. Uma previsão feita pela profissional de como

será o jornalismo em dez anos a contar de 2011, uma análise bastante

pertinente para a nossa reflexão, sobre a reinvenção do jornalismo, e por

consequência dos jornalistas, na era digital.

1. Irá até a audiência – Em vez de esperar que as pessoas vão até tal site para ler ou asistir notícias, os jornalistas terão que levar suas histórias até o público. Isso significa, hoje, publicar as histórias no Twitter, no YouTube, no Facebook, podcasts no iTunes, etc. Em dez anos, essas plataformas poderão estar diferentes, mas o princípio será igual.

2. O jornalismo será em rede (networked) – Jornalistas terão que se envolver com leitores e espectadores, em vez de apenas publicar e pronto. Terão que linkar e conectar leitores em outras histórias e pessoas interessantes, não necesariamente de sua própria empresa.

3. Jornalistas terão que ser confiáveis, fidedignos – Os leitores poderão – e irão – usar os comentários para colocar pingos nos is, acrescentar informações, desconstruir barrigas. O sucesso de um jornalista dependerá de seu conhecimento e de sua capacidade de escrever coisas com credibilidade.

4. Jornalistas terão que estar prontos para compartilhar informações sempre que as tiverem e da melhor forma para comunicá-las à audiência – Isso significa que eles terão que ter habilidades técnicas múltiplas para atuar em varias ferramentas e plataformas diferentes.

5. Não será mais possível jornalismo sem audiência – Graças ao avanço da tecnología, quase todo mundo carrega grabadores e câmeras digitais, e, assim, há “testemunhas digitais” em todos os cantos. É o famoso jornalismo colaborativo (PRADO, 2011).

MUDANÇAS NO MODUS OPERANDI

4.1. Conceito e valor do que é noticia em tempos de internet

A notícia é um elemento central da cultura jornalística. Na era digital, sua

identificação ganha mais relevância frente ao grande fluxo de informações que

circulam na chamada sociedade em rede, conceituada por Castells (1999),

tema do capítulo anterior. Construir a notícia, por meio de critérios técnicos,

como estamos defendendo neste manual, traz mais segurança para a função

básica do jornalista, que é informar, assim como confere ao conteúdo um algo

a mais, que o diferencia do que é e o que não é jornalismo. Por outro turno,

não se pode pensar mais em um jornalismo com controle sobre o que pautará

Londres, trabalhando como diretora de conteúdo digital e editora, vencedora de prêmios, impressos e online. Disponível em: http://towcenter.org/academics/emily-bell/ Acessado em 15/5/2017.

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o noticiário, muito menos na elaboaração de uma notícia de forma isolada, sem

levar em conta a presença ativa e potencializada dos

receptores/públicos/audiências, que terão participação direta ou indireta, mais

cedo ou mais tarde, na construção, adaptação e difusão dessa notícia.

Primeiramente, cabe uma breve conceitualização sobre o que é

informação, como elemento distintivo da notícia jornalística. A grosso modo,

informação é um conhecimento inscrito (gravado) sob a forma escrita (impressa

ou numérica), oral ou audiovisual. O termo, etimologicamente, vem do grego e

do latino. Do grego, morphe eidos significa aquilo que se vê ou se configura.

Do latim informatio onis designa os verbos delinear, conceber ideia, dar forma

ou moldar a mente humana, instruir, educar e formar.

Para Le Coadic114 (1996), a informação comporta um elemento de sentido,

traduzindo-se em um significado transmitido por um ser consciente por meio de

uma mensagem inscrita em um suporte espaço-temporal: impresso, sinal

elétrico, onda sonora, etc. Esta inscrição é feita graças a um sistema de signos

(a linguagem), signo este que é um elemento da linguagem que associa um

significante a um significado, qual seja signo alfabético, palavra, sinal de

pontuação (LE CODIAC, 1996, p. 5). Segundo ele, a informação é um produto,

uma substância, uma matéria.

O valor da informação, afirma Serra115 (2007) respaldado pelo trabalho de

Claude Shannon116, varia de acordo com os indivíduos, as necessidades e o

contexto em que é produzida e compartilhada. Uma informação pode ser

altamente relevante para um indivíduo e a mesma informação pode não ter

significado nenhum para outro indivíduo.

114 Yves-François Le Coadic graduou-se em 1964 em engenharia, o que o credenciou a fazer um doutorado no laboratório do Professor Neel, Prêmio Nobel de Física. Interessou-se pela política da ciência e da informação científica, depois de ter passado um tempo no Canadá. De volta à França, preparou-se para uma tese sobre a “Estrutura e dinâmica dos sistemas de informação científica”. Depois de uma estadia de pesquisa nos Estados Unidos, montou entre 1982-1993, programas de pesquisa em ciência da informação. É desde 1987 professor de ciência da informação no Conservatoire National des Arts et Métiers (CNAM) em Paris. Seus principais tópicos de pesquisa são a necessidade de informaçõees; o uso da informação e sistemas de informação; os usuários da informação e sistemas de informação, dentre outros. Disponível em: https://www.puf.com/wiki/Auteur:Yves-Fran%C3%A7ois_Le_Coadic Acessado em 18/5/2017.115 Joaquim Paulo Serra é presidente da Sociedade Portuguesa de Ciências da Comunicação (Sopcom), autor de inúmeros livros, dentre os quais Manual de Teoria da Comunicação; Informação e Sentido. O Estatuto Epistemológico da Informação; e a A Informação como Utopia. São temas recorrentes da sua obra, questões relacionadas à credibilidade na internet. Disponível em: http://www.labcom-ifp.ubi.pt/people/cfc90b822788c306172b1c8b57f0aaff Acessado em 18/5/2017.116 Serra se refere ao ensaio “A Mathematical Theory of Communication”, publicado originalmente em The Bell System Technical Journal, vol. 27, p. 379-423, 623-656, julho, outubro, 1948, e retomado, com o título “The Mathematical Theory of Communication” em Claude E. Shannon, Warren Weaver, em 1949.

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Com efeito, para o leigo ou para aquele que não conhece o código de uma mensagem secreta, esta aparecerá como destituída de “sentido” e, como tal, “não informativa”; mas, para o criptógrafo, ela pode conter informação, e informação sumamente importante – ou não teria sido enviada. O “sentido” da informação – o que determina que algo seja ou não informação para um determinado sujeito ou grupo de sujeitos – está, assim, totalmente dependente do conhecimento do código por parte do sujeito ou grupo de sujeitos, o que nada muda à objetividade intrínseca da mensagem. Por outras palavras, e utilizando uma distinção que, a propósito de um outro problema, Kant pôs em circulação, a informação nunca é um “em si”, mas sempre um “para mim” – significando este “para mim” não o homem em geral, como era o caso em Kant, mas o grupo restrito dos que conhecem a “chave” da mensagem (SERRA, 2007, p. 94 e 95).

É nesse contexto de muita informação disponível, graças à internet, que o

jornalismo pode se sobressair, fazendo o que melhor sabe: notícias. Noticiar é

expor um fato com o objetivo de informar. Para Genro Filho (2012), em alguns

momentos, é a informação transformada em mercadoria, numa economia

capitalista na qual consumir notícias faz parte da lógica de mercado. Turmo117 &

Lassa118 (2009) definem notícia como um texto em forma de narrativa que

descreve e se aprofunda em algum tema. Clareza, concisão e foco são

algumas das características da notícia, que, diferente da informação, é

trabalhada, apurada, conectada e redigida por um profissional com “monopólio

de saberes” (Bourdieu, 1997), no caso o jornalista. Trata-se, no entendimento

de Turmo & Lassa, de um texto jornalístico sobre fatos recentes, verídicos e

com novidades que geram um clima de opinião pública assim que publicados

por meios de comunicação de massa. As notícias precisam ser avaliadas

tecnicamente sobretudo porque devem conter algumas características, como

ser atual, impactante, ter proximidade, abordar algo estranho ou inovador e

assim por diante (TURMO & LASSA, 2009, p. 50, 51 e 52).

O tempo é um elemento básico para distinguir a notícia de outras informações. Há três aspectos referentes ao tempo que são considerados na hora de publicar as notícias na imprensa diária. Para que uma informação seja notícia, requer a conjugação de três fatores: a. que seja imediata; b. que seja recente; e c. que circule. Quer dizer, que se acabe de produzir (ou de se descobrir), que se publique ou se dê a conhecer no

117 Fernando Sabés Turmo é professor titular do Departamento de Jornalismo e Comunicação da Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Doutor em Comunicação Audiovisual, suas principais linhas de pesquisa são participação e cidadania ativa, cibermeios, jornalismo, políticas e estruturas da comunicação. Disponível em: http://www.uab.cat/web/department/fernando-sabes-1302242487444.html Acessado em 17/5/2017.118 José Juan Verón Lassa é formado em jornalismo pela Universidade de Navarra, na Espanha, e tem doutorado em Jornalismo e Ciências da Comunicação pela Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Suas linhas de pesquisa são concentradas em temas como a comunicação política, a gestão da comunicação nas administrações públicas e o desenvolvimento da sociedade da informação. Disponível em: https://www.ull.es/publicaciones/latina/072paper/1152/cv1.html Acessado em 18/5/2017.

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mínimo espaço de tempo possível e que esse conhecimento circule entre um público amplo e massivo (DE FONTCUBERTA119, 1980, p.13, apud TURMO & LASSA, 2009).

Traquina (2008) afirma que para se chegar a uma definição do que é

notícia é preciso compreender alguns elementos centrais da cultura jornalística

tratados por ele como “valores-notícia”. Até entre os jornalistas, o objeto não é

claro. Segundo Traquina, a visão dos profissionais sobre o tema é “simplista e

minimalista”, ao mesmo tempo. Simplista, porque de acordo com a ideologia

jornalística, o jornalista é um mediador que relata, capta, reproduz ou

retransmite o acontecimento. Minimalista, porque, segundo a maioria, o papel

do jornalista como mediador é reduzido. A investigação de Traquina sobre

valores-notícia como critérios de noticiabilidade passa por três épocas

históricas, descritas em sua obra, pela análise e contribuição dada pela

academia, e também pela conclusão de que tais valores-notícia não são

imutáveis.

Por meio de Wolf120 (1987), Traquina (2008) chega a duas categorias,

que passaremos a tratar, por entendê-las como relevantes para o jornalismo

desempenhado tanto em plataformas tradicionais como digitais, quais sejam:

os valores-notícia de seleção e os valores-notícia de construção. Traquina

afirma que o sociólogo italiano foi um dos raros autores a apontar que os

valores-notícia estão presentes ao longo do processo de produção jornalística,

sendo alguns acionados para selecionar o acontecimento que merece virar

notícia e outros, inerentes ao processo em si de contrução da notícia.

Para Wolf, os valores-notícia de seleção referem-se aos critérios que os jornalistas utilizam na seleção dos acontecimentos, isto é, na decisão de escolher um acontecimento como candidato à sua transformação em notícia e esquecer outro acontecimento. Os valores-notícia de seleção estão divididos em dois sub-grupos: a) os critérios substantivos que dizem respeito à avaliação direta do acontecimento em termos na sua importância ou interesse como notícia; e b) os critérios contextuais que dizem respeito ao contexto de produção da notícia. Os valores-notícia de construção são qualidades da sua construção como notícia e funcionam como linhas-guia para a apresentação do material, sugerindo o que deve ser realçado, o que

119 Mar de Fontcuberta é doutora em Jornalismo e Ciências da Comunicação pela Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Atualmente, é diretora de Mestrado em Comunicação e Educação da Pontifícia Universidade Católica do Chile e também do Mestrado em Comunicação e Educação do Departamento de Jornalismo da Faculdade de Ciências da Comunicação da UAB. Disponível em: https://www.planetadelibros.com/autor/mar-de-fontcuberta/000025004 Acessado em 17/5/2017.120 Mauro Wolf foi um sociólogo, professor e ensaísta italiano, especializado em comunicação de massa. Desenvolveu importantes trabalhos no campo da sociologia da comunicação e da mídia, sendo referenciado pela comunidade científica. Disponível em: http://www.baskerville.it/h/wolf/ Acessado em 17/5/2017.

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deve ser omitido, o que deve ser prioritário na construção do acontecimento como notícia (WOLF, 1987 apud TRAQUINA, 2008, p. 78).

Dentre os valores-notícia de seleção estão a morte, a notoriedade, a

proximidade, a relevância, a novidade, o tempo, a notabilidade, o inesperado, o

conflito, a controvérsia, a infração, o escândalo, a disponibilidade, o equilíbrio,

a visualidade, a concorrência e o dia noticioso.

A morte, razão que, segundo Traquina (2008), explica o negativismo do

mundo jornalístico traduzido nos noticiários. A notoriedade também é levada

em conta, quer dizer o nome e a posição da pessoa têm peso como

determinantes de noticiabilidade, justificando assim que tudo o que o

presidente da República faz, por exemplo, é importante, uma vez que ele,

presidente da República, é importante. Outro valor-notícia apontado por

Traquina, e que deve ser considerado na hora de se construir uma notícia, é o

da proximidade, tanto geográfica como cultural, despertando o interesse e

trazendo o receptor para mais próximo. A novidade é um valor-notícia

relacionado ao inédito, àquilo que será noticiado pela primeira vez e que, por

consequência, despertará a curiosidade e terá repercussão. O fator tempo

também é valor-notícia, enumerado por Traquina (2008) e que assume

diversas formas, dentre as quais as ideias de atualidade e memória. O

inesperado, o conflito, a controvérsia, a infração e o escândalo também são

valores-notícia de seleção, porque, quando transformados em notícia, têm o

poder de despertar o interesse. E, por fim, a disponibilidade, o equilíbrio, a

visualidade, a concorrência e o dia noticioso fecham a lista de valores-notícia

de seleção. A disponibilidade está relacionada ao esforço que será dispensado

pela empresa jornalística, traduzido pela questão: a notícia vale tal

investimento? O equilíbrio faz com que o jornalista ou a empresa jornalística

racionalize por vezes devido ao tema já ter sido notícia recentemente. O valor-

notícia visualidade leva em conta a presença de elementos visuais para ilustrar

a notícia. A concorrência faz sempre jornalistas e empresas jornalísticas

perseguirem o “furo”, a informação em primeira mão antes dos que disputam os

mesmos receptores/públicos/audiências. E o dia noticioso, no qual o

desencadeamento de eventos que concorrem entre si faz que os jornalistas e

empresas jornalísticas tenham de optar por uns e deixar de lado outros

acontecimentos, por impossibilidade de englobar todos.

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Simplificação, amplificação, relevância, personalização, dramatização e

consonância são valores-notícia de construção, ou seja “critérios de seleção

dos elementos dentro do acontecimento dignos de serem incluídos na

elaboração da notícia” (Traquina, 2008).

A simplificação, identificada por Ericson, Baranek e Chan (1987), citados

por Traquina, mostra que quanto mais o acontecimento for desprovido de

complexidade, maior será a sua compreensão. Os jornalistas têm obrigação de

escrever de uma forma simples, que todos compreendam, reduzindo

ambiguidades e polissemias121. A amplificação, tratada por Galtung122 e Ruge123

(1965) e retomada por Traquina (2008), tem como lógica: “quanto mais

amplificado é o acontecimento, mais possibilidades tem a notícia de ser notada,

quer seja pela amplificação do ato, do interveniente ou das supostas

consequências do ato”. Outro valor-notícia de construção é a relevância, ou

seja, quando mais “sentido” a notícia dá ao acontecimento, mais a notícia tende

a ser notada, competindo tornar o acontecimento relevante para as pessoas,

demonstrar que tem significado para elas (Traquina 2008). A personalização

ajuda a notícia ser notada, devido à valorização das pessoas envolvidas no

acontecimento. A dramatização é o apelo ao lado emocional, à natureza

conflitual. E, por fim, a consonância, valor-notícia segundo o qual quanto mais

a notícia insere o acontecimento numa narrativa mais chance tem a notícia de

ser notada, implicando na inserção de uma novidade num contexto já

conhecido.

Os valores-notícia são um elemento básico da cultura jornalística que os

membros desta comunidade interpretativa124 partilham. Na era digital, serão de 121 Que apresenta um grande número significados numa só palavra; cujo significado dependerá do contexto em que a palavra está inserida; por exemplo: cabo - cabo de vassoura, cabo militar, cabo da faca. Disponível em: https://www.dicio.com.br/polissemia/ Acessado em 15/5/2017.122 Johan Galtung é um experiente mediador e pioneiro nos estudos de paz. Norueguês, é reconhecido como 'pai' da disciplina acadêmica Pesquisa de Paz e mentor no campo da mediação e da transformação de conflitos. Desempenhou papel decisivo na mediação e prevenção da violência em 45 conflitos armados no mundo nos últimos 40 anos. É autor do primeiro manual das Nações Unidas para multiplicadores e participantes do programa "Transformação de Conflitos por Meios Pacíficos: a Abordagem TRANSCEND" (2000). Disponível em: http://www.comitepaz.org.br/Galtung.htm Acessado em 17/5/2017.123 Mari Louise Holmboe Ruge é uma cientista social norueguesa. Ela desempenhou um papel central na criação do Instituto de Pesquisa Internacional da Paz, em 1959, juntamente com Johan Galtung e Ingrid Eide. Sua formação acadêmica passa pela Sociologia e pela Ciência Política. Disponível em: https://www.prio.org/People/Person/?x=5287 Acessado em 18/5/2017.124 O termo comunidade interpretativa, cunhado por Stanley Fish, é definido como aquele ponto de intersecção a partir do qual se constrói uma certa estabilidade significativa, a partir do momento em que os indivíduos que ali se agrupam compartilham regras e estratégias de leitura que emolduram a aceitabilidade interpretativa e que permitem a comunicabilidade, o intercâmbio e a coincidência de interpretações. Disponível em: http://edtl.fcsh.unl.pt/business-directory/6366/comunidade-interpretativa/

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extrema valia para ajudar os jornalistas no momento de ‘garimpar’ o que

merece ser noticiável.

Os valores-notícia servem de “óculos” para ver o mundo e para o construir. Sublinhamos, como o historiador Mitchell Stephens125, as “qualidades duradouras” do que é notícia ao longo do tempo: o insólito, o extraordinário, o catastrófico, a guerra, a violência, a morte, a celebridade. Mas os valores-notícia não são imutáveis, com mudanças de uma época para outra, com sensibilidades diversas de uma localidade para outra, com destaques diversos de uma empresa jornalística para outra, tendo em conta as políticas editoriais. As definições do que é notícia estão inseridas historicamente e a definição de noticiabilidade de um acontecimento ou de um assunto implica um esboço da compreensão contemporânea do significado dos acontecimentos como regras do comportamento humano e institucional. O leque de valores-notícia é vasto; a paleta tem imensas cores. Mas, como foi sublinhado pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu, as diferenças mais evidentes escondem semelhanças profundas: os produtos jornalísticos são “muito mais homogêneos do que se pensa” (TRAQUINA, 2008, p. 94 e 95).

Genro Filho (2012) fala que a importância da informação jornalística

parece estar ligada não aos fenômenos de baixa probabilidade, mas a eventos

significativos, ou seja, mais qualificados. Os fatos previsíveis com segurança

deixam de entrar na lista de prioridades na hora de se eleger a informação que

ganhará tratamento de notícia. Ou seja, um acontecimento com alta

probabilidade não despertará interesse jornalístico. Já se a probabilidade for

mínima, a taxa de interesse aumentará. Genro Filho exemplifica:

Se temos um jogo de futebol entre duas equipes, A e B, sendo que A é reconhecidamente superior e sempre venceu a equipe B com larga vantagem, o resultado mais importante, jornalisticamente, seria a vitória da equipe B por 8x0 e não o inverso. A vitória surpreendente da equipe B coloca potencialmente algumas questões que tendem à universalidade, à conexão, com outros fenômenos e à mudança de conceitos estabelecidos. Teria havido corrupção? Boicote dos jogadores da equipe A que estavam com os salários atrasados? […] (GENRO FILHO, 2012, p. 81 e 82).

A “totalidade histórico-social”, envolvendo uma hierarquia dos procesos,

também faz parte desse processo de seleção do que virará notícia, de acordo

com a compreensão de Genro Filho. O autor brasileiro afirma em sua obra que

a natureza da informação jornalística está ligada a dois aspectos: 1) a

indeterminação real dos processos sociais e naturais; e 2) a qualidade e o grau

Acessado em 18/5/2017.125 Mitchell Stephens (nascido em 16 de agosto de 1949) é professor de jornalismo e comunicação de massa no Arthur L. Carter Journalism Institute da Universidade de Nova York. Ele também é um respeitado jornalista e historiador com várias obras publicadas, dentre as quais History of News, uma longa história do jornalismo que foi traduzido em cinco línguas e recebeu um New York Times "Notável Livro do Ano". Disponível em: https://journalism.nyu.edu/about-us/profile/mitchell-stephens/ Acessado em 16/5/2017.

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das possibilidades concretas de escolha que se colocam para os homens

diante das alternativas nascidas da indeterminação do processo objetivo que

eles vão constituindo. A isso pode-se chamar, em sentido filosófico, liberdade

(GENRO FILHO, 2012, p. 82). Com base nisso, ele alerta para a problemática

de se transpor, para a sociedade, noções da Teoria da Informação, buscando

definir as notícias jornalísticas por meio de critérios precisos. A natureza

peculiar do sistema social não permite isso, de acordo com o pesquisador.

Mas não são somente os valores-notícia que têm peso na definição da

notícia em tempos de internet. Os receptores, como já foi dito anteriormente,

ganharam poder no ciberespaço, sobretudo depois do aparecimento e

consolidação das redes sociais, como Facebook, Twitter, YouTube, Blogger.

Canavilhas126 (2010) afirma que essas aplicações que alavancaram o sucesso

da web, empoderando os receptores, passaram da mesma forma a ser

incorporadas no dia a dia dos jornalistas, nos trabalhos de apuração e

distribuição das notícias e também na briga pela atenção das audiências.

Segundo ele, diante do comportamento verificado junto aos receptores que

também passam a filtrar o que lhes interessam em meio à enxurrada de

informações na web, o percurso da notícia se altera colocando em xeque

conceitos antes tidos como absolutos, dentre os quais o do gatekeeping127.

Isso nos leva a acreditar que os jornalistas continuam a se valer de

valores-notícia para selecionar os acontecimentos que reúnem condições para

se transformar em notícia, como destaca Traquina (2008), mas sem mais ter a

certeza, como antes, de como será o comportamento das audiências, que, por

sua vez, passam a desempenhar um papel de gatewatching, termo cunhado

pelo pesquisador australiano Axel Bruns128 para demonstrar o papel editor

também desempenhado pelas audiências, especificamente os usuários de

notícias.126 João Canavilhas é formado em Comunicação Social pela Universidade da Beira Interior, em Portugal, e doutor pela Universidade de Salamanca (Espanha). É professor das disciplinas de Webjornalismo, Jornalismo Radiofônico e Infografia Multimédia. Como pesquisador, seu corpus é a comunicação e novas tecnologias, particularmente na influência da internet e dos dispositivos móveis no jornalismo e na política. Webjornalismo: 7 caraterísticas que marcam a diferença. (2014)127 A expressão gatekeeping apareceu pela primeira vez relacionada ao contexto da comunicação nos anos 1950, mas ainda no século XXI é aplicável à realidade da seleção de notícias. No século XX, cabia ao jornalista, por meio de valores-notícia, assumir o papel de gatekeeper e definir o que seria ou não publicado. WHITE, David Manning (1950). The ‘Gatekeeper’: A Case Study in the Selection of News. Journalism Quaterly, vol. 27, n. 4, p.382-394.128 Doutor em Filosofia, Axel Bruns é professor na QUT - Universidade Tecnológica de Queensland, Austrália. Sua pesquisa tem como foco a internet, indústrias criativas, estudos culturais, estudos de mídia, comunidades online, etc. Disponível em: http://staff.qut.edu.au/staff/bruns/ Acessado em 16/5/2017.

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O antigo monopólio de gatekeeping mantido pela mídia de massa tem sido desafiado pela nova prática de gatewatching: feita pelos blogueiros individuais e pelas comunidades de comentaristas que podem não fazer reportagem das notícias de primeira mão, porém fazem a curation129 e avaliam as notícias e outras informações fornecidas pelas fontes oficiais, e assim prestam um serviço importante. E isto ocorre […] com cada vez mais rapidez, quase em tempo real: usando as redes sociais mais recentes, que divulgam, compartilham, comentam, questionam e desacreditam as matérias noticiosas dentro de minutos, e usando plataformas adicionais que possibilitam a colaboração ad hoc rápida e eficaz entre os usuários (BRUNS, 2011).

Sem limitações espaciais, como as que havia antes, o jornalista pode

publicar na web uma maior quantidade de notícias nos mais variados formatos

e com possibilidade de ligação a outras fontes e documentos através de links.

É nesse emaranhado, portanto, que as audiências farão suas opções. Ou seja,

essa disponibilidade espacial tendencialmente infinita acaba por se transformar

num potencial obstáculo para os leitores, pois a cada segundo que passa são

disponibilizadas milhares de notícias na web (CANAVILHAS, 2010).

Bruns (2011) afirma que o jornalismo se tornou uma atividade com

participação da massa e que o relacionamento entre os jornalistas e as suas

audiências está em constante evolução, flexibilizando conceito e valor do que é

notícia em tempos de internet. Esse cenário anuncia a morte lenta dos modelos

de cima para baixo de elaboração das notícias, e até do próprio gatekeeping, e,

em vez disso, migra para um relacionamento colaborativo mais igual entre os

profissionais do jornalismo e os usuários das notícias.

Aliás, como já foi afirmado, os jornalistas não detêm mais a

exclusividade, e fazem parte de uma gama crescente de grupos e atores

sociais envolvidos com as notícias. As audiências, nesse caso os usuários de

notícias, são cada vez mais capazes de até ignorá-los totalmente para acessar

informações em primeira mão de uma variedade de outras organizações e

fontes (BRUNS, 2011).

[…] a chave de todas as suas operações será o desenvolvimento de um equilíbrio entre a geração de conteúdo noticioso original e valioso, inserido em um espaço atualmente compartilhado, distribuído e descentralizado das

129 Etimologicamente, a palavra curadoria tem origem do latim "curator", que quer dizer "aquele que administra", "aquele que tem cuidado e apreço". O conceito de curadoria abrange um extenso campo de atividades, desde o artístico-cultural até as perspectivas comerciais. Para o autor australiano, comunidades na internet desempenham esse papel. O ato de "curar" está relacionado com o zelo, cuidado e atenção com alguma coisa. Disponível em: https://www.significados.com.br/curadoria/ Acessado em 18/5/2017.

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notícias que existe nos múltiplos espaços e plataformas on-line e da mídia social, e a curation dos materiais disponíveis das fontes externas e internas utilizando maneiras únicas que agregam um valor suficiente para atrair os usuários das notícias. Além disso, nada deste trabalho ocorre mais em isolamento – pelo contrário, tem que ser feito à vista dos e em cooperação e até em colaboração com os usuários das notícias, evitando a posição altiva e às vezes condescendente com relação às suas audiências que os jornalistas adotavam tantas vezes no passado (BRUNS, 2011).

Por conta de todos esses fatores, a conquista das audiências torna-se

um desafio para os profissionais do jornalismo. Monteiro130 (2017) diz que

primeira e mais importante tarefa de desenvolvimento de audiência no

jornalismo é produzir um bom conteúdo. Segundo ele, curtidas nas redes

sociais, elogios de amigos ou número de cliques não são suficientes. É preciso

usar ferramentas especializadas que contabilizem variáveis de modo confiável

e que possam cruzar dados para esclarecer os motivos de sucesso ou fracasso

de uma história (MONTEIRO, 2017, p. 78). Assim, sugere alguns passos para

jornalistas fidelizarem audiências, dentre os quais conhecer com profundidade

a audiência que se pretende atingir, valendo-se de softwares e soluções de

medição131 de audiências. A partir dos dados, o jornalista poderá saber quais

canais de distribuição são mais importantes para seu conteúdo atualmente e

em quais é preciso trabalhar.

No desenvolvimento da audiência, a execução da estratégia deve ser feita ao mesmo tempo em que se acompanha as métricas. Mas além do monitoramento em tempo real, é preciso acompanhar sua evolução ao longo do tempo considerando períodos maiores. É importante, portanto, parar de tempos em tempos para fazer um mergulho mais profundo em seus dados para entender o que está funcionando ou não e os motivos, para que novas ações possam ser tomadas. Também é interessante acompanhar veículos concorrentes ou semelhantes, para que se tenha um alvo palpável a perseguir (todo mundo adora um desafio) e também um ponto de referência externo. Você dificilmente terá os mesmos dados detalhados de outros veículos, mas use informações públicas de empresas como a ComScore (que, além dos dados só fornecidos a clientes, costuma divulgar rankings com dados gerais) ou serviços que estimam tráfego, como SimilarWeb, Alexa ou Semrush (todos com dados gratuitos e versões pagas mais detalhadas) (MONTEIRO, 2017, p. 80).

Monteiro (2017) alerta que o desenvolvimento da audiência em veículos

sem fins lucrativos e em veículos tradicionais segue lógicas diferentes. Para os

que não objetivam o lucro, o que vale mesmo é ganhar visibilidade e relevância

130 André Monteiro é jornalista de dados da Folha de S. Paulo.131 Entre as ferramentas comerciais mais conhecidas, citadas por André Monteiro, estão Adobe Analytics, Chartbeat e Google Analytics 360. Todas funcionam a partir de códigos que, a cada visualização de um site, recolhem uma série de informações que depois são processadas e se transformam em métricas.

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- o que ajuda na tarefa de atrair patrocínios e parcerias que viabilizem a sua

missão. “Para a mídia tradicional, a audiência ainda hoje está diretamente

ligada à geração de receita publicitária, já que os anúncios digitais, na maioria

dos casos, são comercializados com base em visualizações (“impressões”,

como são chamadas no setor).”

Mesmo considerando a tendência geral de queda da publicidade como fonte de receita, o crescimento da audiência também é importante --como no modelo de assinatura paga com paywall poroso, estratégia comercial mais frequente dos grandes veículos. Nesses casos, a audiência serve de um lado como chamariz para novos assinantes e de outro as estratégias de distribuição facilitam alcançar quem já é assinante, pois chega onde ele está e reforça as razões que o levaram a pagar pelo conteúdo. (MONTEIRO, 2017, p. 81)

4.2. Instantaneidade e memória viraram palavras de ordem

O imediatismo, que faz parte da atividade jornalística, foi potencializado

pela internet, sobretudo porque a concorrência aumentou assim como o

número de canais para divulgação de notícias ou informações com potencial

para virar notícia. O processo avança gradualmente. Nos anos 1990, quando a

internet comercial fez surgir os primeiros portais de informação, oriundos de

empresas jornalísticas, os seguidores queriam suas telas de computador

invadidas pela instantaneidade do rádio.

Martinez132 (2014) explica que a tela do hipertexto carrega uma

característica que o rádio não tem, e que colocou em risco a credibilidade do

webjornalismo nos primeiros anos de internet comercial: ela preserva, em suas

páginas virtuais, a informação escrita ao longo do tempo. Nesse contexto, é

que surge o que a autora classifica de “afã publicador”, justificado como

necessário para atualizar as páginas. Nascia assim, com a prática, a ideia de

apuração por partes. Apuração que sempre foi atropelada pelo fator tempo,

com a possibilidade de correção, bastando registrar o horário no qual o novo

texto, imagem foto ou infográfico foi publicado.

132 Adriana Garcia Martinez é uma jornalista e gerente de produção editorial brasileira, com foco em internet, comunicações, inovação, startups, design thinking e tecnologia, suas especialidades. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/adriana-garcia-martinez/?ppe=1 Acessado em: 18/5/2017.

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Nos anos 2000, prossegue Martinez (2014), os portais prometem

publicar uma notícia por minuto, criando um “labirinto informacional” que

modificou a técnica até então utilizada para construir a notícia. A notícia não

precisava, a partir de então, estar pronta para ser publicada. As regras básicas

de apuração, dentre as quais cruzar informações entre fontes e ouvir o outro

lado em questões polêmicas, foram sendo flexibilizadas em nome de “o

importante é sair na frente”. A cada novo título, a notícia se completava e se

atualizava, o que ainda ocorre atualmente. O problema é que esta técnica

requer atenção redobrada devido à sua relativa eficiência, já que, ao final do

dia, uma pessoa que queira acompanhar a cobertura jornalística de

determinado evento pode se deparar com “retalhos”, migrando, por conta disso,

para mídias tradicionais a hora de se informar (MARTINEZ, 2014).

Traquina cita frase de Weaver133 (1975/1993) para reforçar a ideia de

que o fator tempo define o jornalismo como “relatos atuais sobre

acontecimentos atuais”. O imediatismo é definido como um conceito temporal

que se refere ao espaço de tempo (dias, horas, segundos) que decorre entre o

acontecimento e o momento em que a notícia é transmitida, dando existência a

esse acontecimento (TRAQUINA, 2008, p.37). A velocidade é valorizada pelos

membros da comunidade jornalística, analisada por Traquina, porque as

notícias são percebidas como algo perecível, que precisa ser “quente” e de

preferência “em primeira mão”. Em termos logísticos, o valor do imediatismo

ganha força com as novas tecnologias.

Com as capacidades tecnológicas atuais, o valor do imediatismo dá primazia, nesta era audiovisual, ao “direto”, que representa o estado “puro” do imediatismo. No campo marcado pela concorrência (Bourdieu, 1997), a importância deste valor estabelece a própria lei do ganho do jornalismo: quem ganha é quem primeiro dá a notícia (TRAQUINA, 2008, p. 38).

133 Paul H. Weaver, pesquisador em temas relacionados ao jornalismo, é um intelectual norte-americano com várias obras. Ele já foi professor adjunto de Ciências Políticas em Harvard. Disponível em: http://www.independent.org/aboutus/person_detail.asp?id=414 Acessado em 18/5/2017.

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Gay Talese134 é crítico do imediatismo incorporado pelo jornalismo e que

se acelerou ainda mais com a internet. Em entrevista a Duarte135 (2015), o

jornalista norte-americano afirma que a abordagem jornalística é cada vez mais

rara, por conta da pressa imposta aos profissionais. Um dos problemas da

tecnologia, segundo ele, é que “não vemos o grande retrato, mas sim um

pequeno, o do laptop, e vemos o mundo por meio dele”.

Quando eu era um repórter principiante no New York Times, em 1956, um dos repórteres mais velhos me aconselhou: “Nunca use o telefone, jovem. Nunca entreviste por telefone. É fácil e rápido, no entanto se está perdendo tudo. Busque as pessoas. Tire o seu traseiro da cadeira, pegue um táxi, um metrô, um trem e olhe para as pessoas.” É o que sempre fiz. Os grandes jornalistas precisam ver as pessoas comuns. [...] Na verdade, é preciso dedicar tempo às pessoas e não somente a uma classe de pessoas, porque as pessoas que controlam a tecnologia são a classe educada. [...] É muito conveniente, mas isso não é um bom jornalismo. Quero o lado humano. Todas as histórias têm um lado humano. Porém, a tecnologia acelera mais e mais o jornalismo, rápido, seja alguém mais, é a hora do fechamento, chegue primeiro, e chega primeiro no entanto sem nada. O jornalismo está decaindo no modo como eu vejo o jornalismo. [..] Sou um homem velho agora, mas trabalho como trabalhava em minha juventude, com minhas ferramentas. Porém claro: tempo, tempo, tempo. Um jornalista não pode deixar que o tempo dite seu talento (DUARTE, 2015).

Em outra entrevista, para Oliveira e Maurique136 (2011), Talese assinalou

que a internet acabou limitando, restringindo o trabalho jornalístico porque os

jornalistas não apuram mais, mas trocam informações entre si e buscam

informações na própria rede. As entrevistas estão sendo deixadas de lado, em

nome da agilidade para sair na frente. Esse comportamento, no entendimento

de Talese, está tornado o jornalismo previsível. O jornalismo está se tornando

preguiçoso, no seu entendimento. “A primeira coisa que fazem quando

acordam é abrir um pequeno laptop e começar a apertar botões. [...] A internet

joga contra esta curiosidade. Ela proporciona todas as respostas de maneira

fácil. Você coloca o nome de alguém no Google e descobre muito sobre ela. Se

é verdade ou não, você não vai saber a diferença” (OLIVEIRA & MAURIQUE,

2011).

134 É um escritor norte-americano, reconhecido internacionalmente. Entre 1955 e 1965 trabalhou no New York Times e a partir de 1960 tornou-se colaborador de várias revistas, em especial a Esquire. Editor e ensaísta, é um dos mais talentosos praticantes do New Jornalism (embora não goste do rótulo), gênero que combina as técnicas descritivas do romance com o realismo da não-ficção. Disponível em: http://www.companhiadasletras.com.br/autor.php?codigo=01239 Acessado em 17/5/2017.135 Juan David Torres Duarte é atualmente jornalista do site colombiano El Espectador. Disponível em: https://www.vice.com/es_co/contributor/juan-david-torres-duarte Acessado em 18/5/2017.136 Fernando Oliveria e Thiago Maurique são jornalistas brasileiros.

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Para Talese, a influência da tecnologia sobre o jornalismo não começou

com a internet, mas com o gravador. Os jornalistas começaram a utilizá-lo e,

então, na opinião do jornalista norte-americano, se preocuparam mais com o

que as pessoas disseram na gravação do que com as pessoas que eles

entrevistaram. […] as pessoas respondiam perguntas e, algumas vezes, com suas habilidades, mudavam as histórias, contavam não o que realmente acreditam, e sim o que elas gostariam de ouvir ou o que o jornalista gostaria de ouvir. Então o gravador é uma forma de mentir, mesmo que todas as palavras sejam verdadeiras. São palavras que não significam muito. São apenas sons transformados em bites. Muito do que é reportagem, hoje, são apenas sons transformados em bites. São mentiras, meias-verdades, e o repórter tem que investigar pessoalmente (OLIVEIRA & MAURIQUE, 2011).

Lemos (2013) faz uma análise do tempo, espaço e hierofania137 de

dados no ciberespaço. Ele lembra que o ciberespaço acolhe um tempo

diferenciado, qualitativamente outro, qual seja, o tempo real. E que proporciona

aos usuários uma forma de tempo e espaço diferenciados através de artefatos

tecnológicos digitais. “Com os computadores experimentamos, na banalidade

do quotidiano, o uso de uma máquina imagética, escriturística e

hiperconectada, desempenhando uma forma lúdica e espetacular” (LEMOS,

2013, p. 133). Diferente de Talese, Lemos (2013) descreve a internet de forma

filosófica quando diz que as pessoas passam horas a fio conectadas sem se

dar conta e participam de uma “manifestação do sagrado”, de adesão à outra

realidade.

Corroborando esse sentimento de hierofania, o tempo real (acesso instantâneo, como todo toque de uma “varinha de condão”) é similar ao tempo sagrado, circular e reversível, descrito por Eliade138 (1965) como presente na estrutura do mito. O tempo sagrado do mito é um tempo repetitivo que fixa determinada memoria coletiva; e ele é reversível, pois o passado é a fonte do saber na preparação do presente e do futuro (LEMOS, 2013, p. 134).

137 Seria uma manifestação do sagrado- tornando uma simples forma profana, em sagrada. As hierofanias podem vir de diversas origens, desde pedras até imagens, profetas e espaços. Fonte: http://www.dicionarioinformal.com.br/hierofania/ 138 Mircea Eliade (1907-1986) é considerado um dos mais importantes historiadores das religiões. Nascido na Romênia, licenciou-se em Filosofia pela Universidade de Bucareste. Disponível em: http://www.muscaria.com/eliade.htm Acessado em 15/5/2017.

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A instantaneidade em rede, descrita por Bradshaw139 (2014), trata-se de

uma instantaneidade não apenas em publicar, mas também em consumir, e,

sobretudo, em distribuir notícias. Em tempos de internet, aumentou o consumo

de notícias, o hábito de compartilhar, e o comportamento consumidor continua

em transformação. Esse novo ritmo em ascensão, no consumo de notícias, foi

identificado em 2008 numa pesquisa etnográfica realizada pela The Associated

Press140, interpretada pelo autor britânico. A pesquisa traça um perfil sobre o

hábito de consumo de notícias e mostra que as pessoas estão mais

conectadas do que parece, tanto nos meios tradicionais como rádio e tevê,

como na web, por meio da internet e das redes sociais, como podemos

observar:

Jill, uma corretora de seguros de Brighton, é representativa na amostragem: • Ela assistia ao noticiário da TV pela manhã enquanto se preparava para o trabalho e tomava o pequeno almoço; • Ouvia o rádio no carro a caminho para a empresa; • Verificava o e-mail a cada hora, lendo as manchetes do Yahoo dez vezes ao dia; • Recebia SMS (mensagens de texto por celular) e alertas de e-mail; • Tinha um placar ao vivo no desktop; • Ouvia mais rádio a caminho de casa, enquanto conduzia; • À noite, obtinha notícias via Facebook e e-mail enquanto assistia à TV (BRADSHAW, 2014, p. 114).

A instantaneidade na publicação – não mais dependente das máquinas

de impressão ou da programação de tevê ou rádio – é outra mudança bastante

significativa. Para Bradshaw (2014), a digitalização e a convergência141

oferecem novas formas de ganhar dinheiro a partir do mesmo conteúdo, mas

também perturba o ritmo da linha de produção. O ambiente multiplataforma é

altamente competitivo e as empresas jornalística, por meio de seus

profissionais, começaram a adotar as primeiras estratégias web.139 Paul Bradshaw coordena mestrado online em Jornalismo oferecido pela Universidade Birmingham City e é professor visitante da Escola de Jornalismo da mesma universidade, com sede em Londres. Bradshaw foi listado na Journalism.co.uk "como um dos principais inovadores em jornalismo e mídia" e pelo Instituto Poynter "como uma das pessoas mais influentes em mídias sociais". Em 2010, foi nomeado pela Multimedia "Editor do ano" e, em 2011, ficou em 9.º lugar na lista PeerIndex de jornalistas britânicos mais influentes no Twitter. Webjornalismo: 7 caraterísticas que marcam a diferença. 2014.140 Criada em 1846, a agência de notícias The Associated Press se autodenomina como uma cooperativa de notícias independente, sem fins lucrativos. Sediada em Nova York, nos Estados Unidos, é propriedade de donos de jornais e estações de rádio e televisão norte-americanas. A agência, considerada a mais antiga do mundo, mantém equipes de apuração em mais de 100 países. Disponível em: https://www.ap.org/about/. Acessado em 14/5/2017.141 Convergência digital foi um conceito que surgiu com o movimento de aproximação dos setores das telecomunicações e da tecnologia da informação, devido à digitalização das telecomunicações. A tecnologia da informação - que diz respeito ao hardware e software dos computadores - constitui um mundo por natureza digital. A grosso modo, convergência digital é uma integração de mídias que se convergem para interagir em um único ambiente. Telefone móvel, televisão, rádio, jornal são programados para interagir em um único canal. Disponível em: http://www.apagina.pt/?aba=7&doc=9619 Acessado em 15/5/2017.

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Os jornalistas do impresso tiveram de se adaptar para produzir cobertura ao vivo, enquanto os de televisão se transformaram em bloggers – ambos ainda estão tentando encontrar uma maneira de combinar a demanda de preencher um boletim de meia hora ou uma página dupla com o espaço elástico proporcionado pela Web e pelas propriedades dos dispositivos móveis. O desafio fundamental é que agora as notícias estão a ser produzidas sem as limitações do espaço físico que sustentava a organização das redações. A captação de notícias, a produção e distribuição podem, agora, ocorrer simultaneamente – e serem potencializadas. [...] Neste contexto, não é suficiente falar apenas em “velocidade”. Imediaticidade seria uma melhor palavra a ser empregada. Esta é uma qualidade que se faz sentir em todas as notícias, em que os usuários podem agora ultrapassar o jornalista e a estória, chegar à testemunha, à cena; ao que está ocorrendo no momento (BRADSHAW, 2014, p. 116).

O pesquisador britânico se vale também de dados apurados numa

pesquisa realizada pela especialista em Mídia e Informação Sonya Song142,

sobre o compartilhamento de notícias em redes sociais, para descrever o que

Bradshaw chama de uma “tensão fascinante” entre o jornalismo instantâneo,

aquele compartilhado nas redes sociais, e o jornalismo mais profundo, que

gera o engajamento de consumidores e anunciantes. Bradshaw (2014) enxerga

a coexistencia natural entre os dois modelos. Song, citada por Bradshaw,

baseia-se no trabalho de Daniel Kahneman143, cujo livro Thinking, Fast and

Slow explora dois modos de pensamento dos humanos. Um deles, chamado de

sistema 1, refere-se ao que ficou convencionado como rápido, ou seja, as

reações inconscientes em nosso comportamento. Já o sistema 2 refere-se ao

devagar, com reações elaboradas. O ‘rápido’ e o ‘devagar’ pensar por parte

dos consumidores, argumenta Song, resulta em diferentes tipos de atenção.

Imagens, mensagens emocionais e formatação como letras em caixa

alta ou em texto em negrito, por exemplo, geram rapidamente respostas

‘sistema 1’ de um grande número de usuários que postam ‘like’ ou retwittam –

mas não se engajam. Ao contrário, textos mais complexos e narrativas com um 142 Sonya Song é uma estudiosa da mídia e suas variantes, incluindo a economia de mídia, psicologia da mídia, comportamento do usuário, mídia social, conteúdo distribuído, desenvolvimento de público, censura e propaganda. Os resultados de suas pesquisas são divulgados com bastante frequência por grupos como o New York Times e o Nieman Lab. Sonya especializou-se pela Universidade do Estado de Michigan, nos Estados Unidos, em Economia da Mídia. Antes de mudar para os Estados Unidos, estudou Ciências da Computação na Universidade de Tsinghua, na China, e Jornalismo na Universidade de Hong Kong. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/sonya2song/ Acessado em 18/5/2017.143 Professor e pesquisador sênior da Escola de Assuntos Públicos e Internacionais Woodrow Wilson, nos Estados Unidos, é membro do Centro de Racionalidade da Universidade Hebraica de Jerusalém, em Israel. Foi reconhecido com o Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 2002 por seu trabalho pioneiro integrando insights da pesquisa psicológica em ciências econômicas, especialmente no que diz respeito ao julgamento humano e à tomada de decisões sob incerteza. Mais informações sobre o pesquisador, disponíveis em: https://kahneman.socialpsychology.org/

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ponto de vista ‘forçam’ um menor número de usuários ao pensamento

consciente (‘sistema 2’) e a engajarem-se mais diretamente com o conteúdo,

resultando em comentários (BRADSHAW, 2014, p. 132 e 133).

A solução de Song, válida para jornalistas e empresas jornalísticas que

buscam a atenção dos consumidores de notícias e informações em circulação

na web, é combinar ambas abordagens em direção ao mesmo objetivo:

Há várias formas de atrair atenção na mídia social. Fotos bonitas, mensagens simples e palavras em caixa alta comummente atraem o sistema 1 para alguma atenção inconsciente. Para atrair atenção mais consciente e de significado, podemos endereçar surpresas, linguagem sofisticada e pontos de vista em nossas mensagens. Ambas abordagens ajudariam a ganhar mais atenção e, assim, mais tráfego na mídia social (SONG apud BRADSHAW, 2014, p. 133).

Enquanto isso, publishers144 estão migrando sua atenção dos anúncios

para fontes múltiplas de receita como eventos, merchandise e assinaturas, já o

jornalismo dedicado a artigos longos com bastante conteúdo está desfrutando

um período de interesse sustentado, na avaliação de Bradshaw (2014) ao

reforçar que, num mundo onde cada um é o primeiro com suas próprias

notícias, ser o primeiro a noticiar nem sempre é vantagem competitiva. A

velocidade sempre desempenhará, no seu entendimento, um papel importante

na distribuição, como demonstra Sonya Song: esta ‘joga’ com o instintivo,

partes inconscientes de nosso comportamento, enquanto a grande reportagem

vale nada se ninguém ouve sobre esta. “Todavia, a velocidade precisa ser

complementada com a profundidade que as pessoas estão dispostas a pagar

[…]. Como é frequente se ouvir em discussões sobre a nova tecnologia: não é

como ter a escolha entre uma coisa e outra, mas sim a habilidade de escolher

e combinar velocidade e profundidade no tempo correto com o objetivo certo”

(BRADSHAW, 2014, p.134).

Para Prado (2011), a segmentação também pode ser uma estratégia

para escapar de possíveis armadilhas do imediatismo e suas implicações.

Não é de hoje que a segmentação é uma saída possível para o retorno de aceitação de determinados meios de comunicação, seja a das revistas impressas ou on-line, e mesmo de demais veículos como o rádio. Na rede,

144 Editores que fazem a seleção e o filtro de informações, que decidem o que é relevante para uma determinada publicação, mesmo que o dado não tenha sido inteiramente apurado. Editorar, segundo o Dicionário de Comunicação – Nova edição revista e atualizada, de Carlos Alberto Rabaça e Gustavo Guimarães Barbosa (Campus, 2001), é "reunir, organizar, anotar e, eventualmente, prefaciar, posfaciar ou copidescar texto de um ou de vários autores".

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espaço que pode (e deve) ser segmentado por natureza, vemos as revistas segmentadas tomando seu lugar (PRADO, 2011).

O modus operandi do jornalismo ganhou uma nova identidade e processos

com a internet. Essas mudanças começaram nos anos 1990 embaladas pela

restruturação organizacional das redações em todo o mundo, com impacto

mais forte nas redações de jornais impressos nesse primeiro momento.

Redefinição de cargos e também mudanças nas etapas de produção.

Antes da internet, descreve Martinez (2014), as funções jornalísticas eram

bem definidas. As agências de notícias forneciam material amplo e vasto dos

fatos mundiais para que editores o aproveitassem, conforme critérios de

noticiabilidade. O repórter era repórter e o editor era editor. Assim como o

fotógrafo e o pauteiro. As tarefas numa redação estavam claramente definidas

em texto, foto e arte, todas parte de um processo industrial, com tempos

cronometrados por horas de fechamento.

Aquela rotina, que hoje só está na memória dos profissionais mais antigos,

se alterou e as mudanças por certo ainda não acabaram passados mais de 25

anos da prática jornalística na internet. A ordem imposta pelos meios

industriais, na qual o trabalho dos jornalistas é apenas uma etapa, foi

substituída por um ritmo frenético do noticiário o ciberespaço, que passou a

ser instantâneo. Novas funções surgem: produtor de notícias, gerente de

informação e editor multimídia, por exemplo (Martinez, 2014).

O jornalista contemporâneo, que se dedica ao ofício na internet,

desempenha muitas tarefas ao mesmo tempo porque, de acordo com o novo

modelo de produção de notícias web, todo o processo está sob a sua

responsabilidade: coleta, administração, filtro, edição, publicação e

repercussão. Ocorre então, segundo Martinez (2014), “uma pressa que passa

por desleixo, com a publicação de dados errados ou imprecisos e português

sofrível”. Esse ímpeto em divulgar em tempo real tem consequências, dentre as

quais o risco do descrédito, não que os outros meios tradicionais, como rádio,

tevê e jornais, sejam imunes.

Martinez (2014) atenta para o bom exemplo das agências de notícias, em

métodos e práticas de apuração, que, infelizmente, não foi absorvido pelo

jornalismo na era digital.

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Em agência de notícias, atualizar uma materia é chave, e deveria ser assim também nos portais e sites noticiosos. O problema é que, nas agências, quando um texto é atualizado, os clientes são avisados, seja por lembretes no texto ou no título. Na internet, não. O texto é modificado e basicamente a informação que o leitor tem é o horario da atualização e não a informação do que foi acrescentado ao original. Outra confusão muito comum: às vezes o ciberleitor clica em uma notícia que acabou de acontecer e que, portanto, tem apenas um ou dois parágrafos. Ele passa a acreditar que aquilo é tudo, ou incorpora a maneira como o texto foi exibido, assumindo o parcial como a totalidade do fato. Deixar transparente o processo noticioso, informando ao leitor os próximos passos ou capítulos de uma história que se desenrola pode ser uma maneira, próxima aos recursos da TV, de educar o leitor para entender o processo de construção da mensagem jornalística. Não há vergonha nenhuma nisso. Nesses tempos de “Big Brother”145 e blogs informativos, revelar às audiencias o modo produtivo dos jornalistas tende não só a aumentar a transparência e a credibilidade, mas também o sucesso do site (MARTINEZ, 2014).

O “jornalista da urgência”, assim denominado por Martinez (2014) para

classificar o dia a dia profissional gerado com a internet, também precisa

guardar provas, da sua apuração, como o fazem com mais facilidade os

profissionais de rádio e tevê. Uma estratégia é sempre obter, por exemplo,

aspas que confirmem exatamente o fato descrito. Por isso, sempre perguntas

abertas, para escapar de lacônicos “sim” e “não”. Pesquisa prévia e

planejamento também são sugeridos, assim como uma boa intimidade na

navegação por sites, sempre deprendendo o que de melhor podem oferecer.

[…] O Google foi uma salvação para os jornalistas – mas também pode ser uma perdição para os mais jovens. Tem gente que sai hoje da faculdade e acha que “dar um Google” é suficiente em termos de pesquisa. Ajuda muito, é verdade, mas não pode ser tomado como fonte de informação, porque eles erram, e muito, e muitas notícias caducam ou ficam desatualizadas com o tempo. Por isso, ainda é preciso ir a campo, sim senhor, seja pelo telefone ou na rua. Bom jornalismo ainda se faz na rua, e isso ainda não mudou (MARTINEZ, 2014).

Palacios146 (2014) aponta a internet como facilitadora na criação de

conteúdos jornalísticos detentores de memória. A possibilidade de dispor de

145 A expressão big brother, que significa "grande irmão", ganhou popularidade através do romance 1984, de George Orwell (pseudônimo de Eric Arthur Blair), publicado em 1948. Neste romance, o Big Brother (personagem inspirado em Josef Stalin) controla o povo como um irmão mais velho, abusando da sua autoridade e não respeitando a privacidade dos cidadãos. Nesta sociedade oprimida pelo totalitarismo, existem cartazes na rua que dizem: "O Grande Irmão está de olho em você". Mais tarde, a obra de Orwell serviu de inspiração para a criação do reality show mundialmente conhecido como Big Brother, onde os participantes são monitorados 24 horas por dia. Disponível em: https://www.significados.com.br/brother/ Acessado em 17/5/2017.146 Marcos Palacios é doutor em Sociologia pela Universidade de Liverpool. Atualmente, é professor titular de Jornalismo na faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Bahia (Brasil) e professor catedrático visitante na Universidade de Beira Interior (Portugal). A sua investigação centra-se no campo do jornalismo e novas tecnologias da comunicação. Participou em 18 projetos de investigação a nível nacional e internacional e criou vários grupos de investigação na área da cibercultura. Webjornalismo - 7 caraterísticas que marcam a diferença. 2014.

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espaço ilimitado para a apresentação de material noticioso é a maior ruptura

resultante do advento da web como suporte midiático para o jornalismo

(Palacios, 2003, p. 24), tendo como efeito, juntamente com a facilidade de

produção de conteúdos através de tecnologia digitais amigáveis, a

multiplicação dos espaços para a memória em rede, fazendo de cada usuário

um produtor potencial de memória, de testemunhos (Canavilhas, 2004).

[…] Testemunhos tornados públicos a cada dia, disponibilizados na Web por incontáveis escribas (anônimos ou não), acabam por incorporar-se aos produtos jornalísticos contemporâneos, à medida que o jornalismo se torna mais aberto a uma certa plurivocalidade, a um certo teor conversacional (PALACIOS, 2014, p. 95).

Os efeitos da digitalização da informação, da multiplicação e sofisticação

das bases de dados, no que diz respeito à memória, são sentidos nas redações

e podem se tornar aliados na produção de conteúdos. Palacios (2014) cita

quatros efeitos, que trataremos brevemente a seguir, por entendê-los como

relevantes para a compreensão dos impactos da internet no jornalismo. O

primeiro deles, como já dissemos, diz respeito às rotinas produtivas das

redações, com a crescente facilidade de consultas e apropriação de

informações em bases de dados internas e externas ao veículo, alargando as

oportunidades de incorporação de memória como elemento de criação de

contexto e aprofundamento à cobertura jornalística (PALACIOS, 2014, p. 97).

O autor acredita também que a memória ajudará remodelação de negócios,

com possíveis incorporações de elementos “como parte do negócio

estabelecido para os jornais online, não apenas através dos modelos mais

simples (e talvez já superados) de acesso seletivo e pago à informação de

arquivo”, mas com a criação de novos produtos para atrair e fidelizar

audiências. O terceiro efeito, percebido por Palacios (2014), está na produção

de narrativas diferenciadas, com distintos modos de incorporação de memória

(background, contexto, contraposição etc), em seus diferentes formatos (áudio,

vídeo, fotos, textos, fac-símiles etc). E quarto efeito está nas formas de

interação com o usuário. Este, a partir de agora, dispõe de recursos para

investigar, no próprio site, aspectos históricos/memorialísticos em torno do

material que lhe é oferecido.

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Uma importante consequência desse crescente potencial para o uso de recursos de memória verifica-se na estruturação e edição dos textos jornalísticos. Não somente tornou-se mais fácil para os jornalistas incorporarem elementos de memória na produção do texto (comparações, analogias, nostalgia, desconstrução etc.), mas igualmente tornou-se praxe uma forma de edição que remete à memória. textos relacionados passam a ser indexados hipertextualmente (Leia mais; Veja também; Notícias relacionadas etc.), seja através de um trabalho de edição humana, seja por um processo (nem sempre bem-sucedido!) de associação algorítmica, através de tags e palavras-chave dos textos estocados nos arquivos e bases de dados dos veículos (PALACIOS, 2014, p. 97).

Para Palacios (2014), é importante ressaltar-se que a memória − na

medida em que funciona como um elemento de produção de contexto e adição

de profundidade para o produto jornalístico − deve ser considerada uma das

variáveis no processo de avaliação de qualidade dos jornais digitais. E que a

capacidade de armazená-la com facilidade, impulsionada pela web, ajuda a

sociedade a enfrentar o imediatismo que lhe é imposto com as novas

tecnologias da informação e comunicação. O autor brasileiro afirma que: “a

velocidade de nosso tempo é tal que nos sentimos obsessivamente compelidos

a salvar imagens do presente, com o propósito de a ele voltarmos mais tarde,

em um tempo futuro idealizado e mais calmo que – obstinadamente –

insistimos em sonhar que um dia possa vir a existir” (PALACIOS, 2014, p. 105).

4.3. Linguagem interativa, multimidialidade e os hipertextos

Salaverría (2005) diz que a linguagem jornalística na era digital se

caracteriza por três particularidades, que convivem mutuamente:

hipertextualidade, interatividade e multimidialidade. O aproveitamento desses

três elementos, no entanto, alerta o autor espanhol, não é homogêneo variando

de meio para meio.

Obviamente, a qualidade do conteúdo informativo não depende do uso da hipertextualidade, da multimidialidade ou da interatividade. Um conteúdo jornalístico pode ser excelente sem recorrer a essas possibilidades linguísticas e, ao contrário, uma produção jornalística com uma infinidade desses recursos pode carecer de valor informativo algum. Dito de outra forma, um texto jornalístico não é melhor (nem pior) pelo fato de ser mais hipertextual, interativo ou multimídia. No entanto, o emprego desses recursos denota um avanço linguístico e uma adequação ao novo meio que, sem dúvida, convém valorizar (SALAVERRÍA, 2005).

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Para Canavilhas (2014), o texto ainda é o formato mais usado no

jornalismo feito na internet para expressar conteúdo, por pelo menos duas

razões: sua relação histórica com o jornalismo, manifestado inicialmente pela

escrita; e sua baixa complexidade exigindo menos velocidade de acesso. Em

tempos de internet, o texto cedeu lugar ao hipertexto, um conceito de

hipermídia147 e existente desde os anos 1960, que tomou impulso nos anos

1990 com o jornalismo em rede. Não só o texto, mas também imagens fixas,

imagens em movimento, sons ou infografia. No caso do texto, hipertexto

diferencia-se do texto tradicional por sua não linearidade e possibilidade de

associação entre conteúdos relacionados. Salaverría (2005) diz “que o

hipertexto jornalístico se encontra num plano em que se entrecruzam o

hipertexto literário e o documental”. Opinião também compartilhada por

Canavilhas (2014):

Na Web, o texto [...] mais do que um mero conjunto de palavras ou frases organizadas segundo um conjunto de regras preestabelecidas, transforma-se numa tessitura informativa formada por um conjunto de blocos informativos ligados através de hiperligações (links), ou seja, num hipertexto (CANAVILHAS, 2014, p. 4).

A palavra hipertexto foi utilizada pela primeira vez nos anos 1960 pelo

filósofo e sociólogo norte-americano Theodor Nelson, citado por Canavilhas

(2014) e que definiu o conceito como uma escrita não sequencial, um texto

com várias opções de leitura que permite ao leitor efetuar uma escolha. Evoluiu

com o passar dos anos e hoje caiu na preferência dos produtores de conteúdos

para a internet. Mas autores alertam para alguns riscos do hipertexto, como

Landow148 (1995), citado por Canavilhas, que sublinha que essa ideia de

fragmentação (atomização) de texto e as diversas possibilidades de leitura

oferecidas podem transformar o texto num caos.

Martinez (2014) defende que os hipertextos tragam informações em

evolução, podendo ou não, no caso dos textos, os títulos e lides se alterarem

ou permanecerem os mesmos. Para a autora, a internet oferece muitas

147 É a reunião de várias mídias num ambiente computacional, suportada por sistemas eletrônicos de comunicação. Diferentemente de multimídia, hipermídia não é a mera reunião dos meios existentes, e sim a fusão desses meios a partir de elementos não-lineares. Fonte: BAIRON, Sérgio. Hipermídia. São Paulo Brasiliense, 2011.148 George Paul Landow é professor de Inglês e História da Arte na Universidade Brown, nos Estados Unidos, autor de diversos livros sobre hipertexto, hipermídia e novas formas de se escrever com a internet.. Disponível em: http://www.victorianweb.org/cv/landow_ov.html Acessado em 18/5/2017.

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possibilidades para se fundamentar bem o texto, cabendo aos jornalistas

aproveitá-las. É preciso incluir fontes que ratifiquem, por exemplo, a tese do

lide. As atualizações devem naturalmente buscar a opinião de especialistas,

repercutir e ouvir o outro lado. A notícia importante funcionaria como o “tronco”

de uma “arvore informacional”, assim denominada por Martinez. Nesses casos,

de um grande acontecimento, como por exemplo a queda de um avião com

mortos, é sempre recomendável existir um único texto disponível com todas as

informações relevantes. “É muito fácil de se perder no ciberespaço… Por isso,

também é importante criar notícias laterais, chamadas de “galhos” dessa

“árvore informativa”. “Galhos sempre interligados ao tronco” (MARTINEZ,

2014).

O tamanho do texto varia, não podendo ser muito pequeno nem tão

extenso, já que estudos sinalizam que o comportamento do usuário de internet

é ler vários conteúdos ao mesmo tempo, fazendo seu próprio percurso de

leitura. No campo dos blocos informativos, a dimensão do texto é um elemento

fundamental na arquitetura noticiosa. Um bloco textual demasiado curto

deixará o leitor insatisfeito por conter pouca informação, enquanto um bloco

demasiado longo pode tornar-se cansativo para uma leitura em monitor

(Salaverría, 2005). Por isso mesmo, as técnicas de redação devem ser

adaptadas a cada meio, procurando-se que o leitor se sinta confortável na

leitura (Canavilhas, 2014).

Canavilhas cita Mitra149 (1999) para destacar uma outra característica

importante do hipertexto, que é a descentralização. “O ponto de entrada na

leitura da notícia pode ser um bloco informativo mais afastado do bloco inicial,

ou ponto de entrada, o que dificultará a identificação de um centro.” O profesor

indiano radicado nos Estados Unidos assinala que a leitura dinâmica gerada

pela circulação do leitor entre blocos informativos aprofunda essa dificuldade, o

que obriga o jornalista a produzir blocos com sentido, independentemente do

contexto oferecido pelos restantes blocos informativos.

149 Ananda Mitra é indiano, professor do Departamento de Comunicação da Universidade Wake Forest, nos Estados Unidos. Suas publicações incluem uma série de 10 volumes sobre tecnologia digital e seu impacto social, um exame crítico da série de TV indiana Mahabharat, um exame do retrato da Índia no cinema ocidental, um livro sobre as formas em que as novas tecnologias digitais estão cada vez mais alienando os usuários, um livro sobre as questões culturais que envolvem o uso de mídias sociais e dois livros sobre metodologia de pesquisa. Disponível em: http://users.wfu.edu/ananda/ e https://us.sagepub.com/en-us/nam/author/ananda-mitra Acessado em 18/5/2017.

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Embora esta situação tenda a gerar uma rede não-hierárquica (Aarseth150, 1992), a própria natureza do jornalismo implica a existência de algum tipo de marca que indique ao leitor qual o ponto focal do trabalho. O objetivo não é impor uma ordem de importância na perspectiva do jornalista, mas dar indicações sobre a forma como a notícia chegou à situação descrita no bloco informativo onde o leitor se encontra (CANAVILHAS, 2014, p.7).

A técnica de redação chamada de “pirâmide invertida”, que privilegia as

informações mais importante como o quê, quem, onde, quando, como e por

que, logo no início do texto, já era alvo de contestação entre os jornalistas e

teóricos porque tendia a uma padronização dos textos, que acabavam ficando

muito parecidos. Com a internet, o texto “pirâmide invertida” – do mais para o

menos importante - perde sua força sobretudo porque no ciberespaço não há

limite de espaço. O jornalista não é confrontado com a necessidade de cortar

informação, podendo manter tudo aquilo que considera essencial para o leitor

perceber a mensagem (Canavilhas, 2014).

A possibilidade de separar a informação em blocos informativos ligados através de hiperligações abre uma diversidade de itinerários de leitura tão vasta quanto o número de arranjos e combinações possíveis. A oferta de várias possibilidades de leitura implica o recurso a dois tipos de coerência: local e global (Engebretsen151, 2000). A coerência local refere-se à relação entre dois blocos informativos próximos, podendo ser “intratextual” (regras de sintaxe e semântica de qualquer texto) ou “intertextual” (coerência na forma como se ligam os blocos informativos lidos sequencialmente) (CANAVILHAS, 2014, p.9).

As notícias na web, para Canavilhas, devem obedecer a arquiteturas

abertas e interativas, para o que ele classificou de dois tipos de leitores. Um

deles reúne as pessoas que procuram uma informação específica, e por isso

estão disponíveis para explorar itinerários. E um segundo, estudado por Lowrey

e Choi (2006)152, citado por Canavilhas, que simplesmente navega numa

150 Espen J. Aarseth é um pesquisador dinamarquês, professor na Universidade IT de Copenhagen. Dedica-se a uma pesquisa acerca de aspectos ideológicos, narrativos, semióticos e ontológicos de jogos e comunicação de jogos, bem como tópicos como o vício em jogos, jogos e significado, e também a cultura literária digital e estética (o que algumas pessoas costumavam chamar de "nova mídia"). Disponível em: https://pure.itu.dk/portal/en/persons/espen-aarseth%28487cead7-277a-461f-9b82-9d6c4c18c276%29.html Acessado em 18/5/2017.151 O norueguês Nils Martin Engebretsen é professor na Universidade de Agder, no Departamento de Estudos Nórdicos e Mídia. Investiga temas como texto e discurso, multimodalidade, hipertexto, jornalismo, fotografia e multimídia. E ensina teoria, análise da linguagem e do texto, análise de mídia e comunicação, hipertexto e mídia digital e jornalismo online. Disponível em: http://www.uia.no/en/kk/profil/martineAcessado em 18/5/2017.152 Wilson Lowrey é professor de Jornalismo na Universidade do Alabama, Estados Unidos.cursos em sociologia da mídia, teoria e pesquisa da comunicação e edição. Suas pesquisas têm como foco a sociologia do trabalho de notícias, organizações e ocupações. Jinmyung também é pesquisadora e escreveu com Lowrey o capítulo do livro Internet Users: the making of a mainstream médium. 2006. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/wilson-lowrey-8335032b/ Acessado em 18/5/2017.

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notícia e precisa ser guiado pelas qualidades estruturais do formato. Dessa

forma, é preciso desenvolver técnicas específicas de redação hipertextual e

estimular arquiteturas abertas.

Um estudo efetuado por Nielsen153 e Morkes154 (1997), citado por

Canavilhas (2005), também tem pertinência e contribui para nossa análise. A

pesquisa revela que a esmagadora maioria das pessoas que navegam na

internet (79%) não lê as notícias palavra por palavra, limitando-se a fazer uma

leitura por varredura visual (scan the page) à procura de palavras ou frases.

Esses dados levaram seus autores a sugerir aos webjornalistas a utilização de

"texto esquadrinhável" (scannable text), usando para isso algumas regras: a)

Destacar palavras-chave com hiperligações ou cores; b) Utilização de

subtítulos; c) Exprimir uma ideia por parágrafo; d) Ser conciso; e) Usar listas

sempre que a notícia o permita (Nielsen & Morkes, 1997, apud Canavilhas,

2005). A pesquisa que deu base para as conclusões de Nielsen e Morkes

(1997) é confirmada por um estudo mais recente155, organizado em 2013 pela

agência de análise de tráfego Chartbeat156. De acordo com a agência, a maioria

dos leitores não chega além da metade de um artigo online. Na verdade, 10%

dos usuários não passam do primeiro scroll157 e esse detalhe poderia indicar

que o jornalismo de longo formato, cujo conteúdo é de maior extensão e

profundidade, não faria muito sucesso no ambiente digital.

A interatividade, outra característica citada por Salaverría (2005), para

descrever a linguagem do jornalismo na web, não nasceu com a internet, mas

153 Jakob Nielsen é um cientista dinamarquês, diretor do Nielsen Norman Group, especializado em interação homem-máquina. Fundou um movimento de "engenharia de usabilidade de desconto" para melhorias rápidas e baratas com a interface dos usuários e inventou vários métodos de usabilidade, incluindo avaliação heurística. Disponível: https://www.nngroup.com/people/jakob-nielsen/ Acessado em 18/5/2017.154 John Morkes é um pesquisador norte-americano especilista em ajudar clientes a alcançar seus objetivos de negócios através de produtos e sites úteis e atraentes. Estuda aplicações complexas e websites e inovação UX, bem como realiza testes de utilidade e usabilidade de conteúdos. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/johnmorkes/ Acessado em 18/5/2017.155 O estudo da Chartbeat é explorado no livro eletrônico Jornalismo Innovador na América Latina, editado por Teresa Mioli e Ismael Nafría e lançado no dia 23 de abril de 2017, durante o 10º Colóquio Ibero-Americano de Jornalismo Digital, organizado pelo Centro Knight para Jornalismo nas Américas, da Universidade do Texas em Austin. Disponível em: https://knightcenter.utexas.edu/pt-br/ebook/jornalismo-inovador-na-america-latina-pt-br Acessado em 25/5/2017.156 Chartbeat é uma companhia norte-americana, com sede em Nova York, especializada em analisar sites e o comportamento das pessoas que navegam por eles, rastreando o que elas leem e consomem. Disponível em: https://chartbeat.com/company/ Acessado em: 25/5/2017.157 Barra horizontal ou vertical localizada na parte lateral ou inferior do ecrã, que permite o deslocamento com o rato na área ativa; barra de deslocamento. Disponível em: https://www.infopedia.pt/dicionarios/lingua-portuguesa/Scroll Acessado em 25/5/2017.

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é anterior ao seu surgimento. Gobbi158 e Bernardini159 (2013), durante revisão

bibliográfica sobre o tema, afirmam haver referências ao termo interatividade já

na primeira metade do século XX, citando o rádio como um canal aberto à

participação direta do público. Há autores, lembram as pesquisadoras, que

destacam que o termo surgiu nos anos 1960, derivado do neologismo inglês

interactivity que descreve uma relação simples que faz a mediação entre

humanos e o computador.

Assim, a relação estabelecida entre humano-computador descreve a interação do homem com a máquina, e computador – humano, o computador cria a interatividade com o homem, instituindo assim a troca de experiências entre homem e máquina, supondo as relações de contato entre ambos (GOBBI & BERNARDINI, 2013).

As autores dizem que interatividade não é a mesma coisa que interação.

Esta não necessariamente precisa de um meio para acontecer, enquanto que a

interatividade sim. A interação pode ocorrer em um conversa informal, pessoal

e presencial, mas utiliza-se da interatividade para se trocar mensagens em

uma rede social. Gobbi e Bernardini (2013) citam McLuhan (1964), que, no

início dos anos de 1960, descreveu as formas de interação através dos meios,

dividindo-os em “meios quentes” e “meios frios”. Os quentes seriam aqueles

que não permitiam ou possibilitavam pouca interação do usuário. Já os frios

são os que o usuário teria que ter um interesse e querer participar. Assim, o

meio frio além de abrir um canal para a interação, tem que criar uma vontade

de participação.

[...] o telefone é um meio frio, ou de baixa definição, porque ao ouvido é fornecida uma magra quantidade de informação [...]. Enquanto, os meios quentes não deixam muita coisa a ser preenchida ou completada pela audiência (MCLUHAN, 1964, p. 38 apud GOBBI & BERNARDINI, 2013).

158 Livre-Docente em História da Comunicação e da Cultura Midiática na América Latina (2014). Concluiu o Pós-doutorado (2008) no Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo - PROLAM/USP, o doutorado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (2002). Disponóvel em: http://www.bv.fapesp.br/pt/pesquisador/92731/maria-cristina-gobbi/Acessado em 18/5/2017.159 Mestre em Comunicação pela Unesp de Bauru, São Paulo. Especialista em Linguagem, Cultura e Mídia. Possui experiência como professora universitária, assessora de imprensa e jornalista profissional. É pesquisadora das áreas de TV Digital, Interatividade, Internet e Internet das coisas. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/gleicebernardini/?ppe=1 Acessado em 18/5/2017.

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Os meios quentes são as mídias tradicionais com seu canal de feedback

restrito ou nulo, e as novas mídias ou mídias tecnológicas meios frios, pois

além de terem um canal amplo para a participação do público também, muitas

vezes, necessitam dessa interatividade para existir, concluem as

pesquisadoras.

A interatividade, intensificada com a internet, alterou a relação das

pessoas envolvidas nos processos de comunicação, requerendo assim ajustes

na prática profissional. O jornalista e o leitor, produtor e o consumidor, a fonte e

o receptor, entre muitos outros sujeitos integrados no processo comunicativo

começaram a trocar de papéis e lugares de forma efetiva, assim como os

sistemas e as mídias se alteraram, agregando novas possibilidades e

diferentes graus de interatividade (GOBBI & BERNARDINI, 2013).

Segundo elas, a interatividade vem se aperfeiçoando com o passar do

tempo. Os diálogos entre os autores de notícias e seus públicos estão mais

efetivos e a troca é mútua, até porque os públicos também atuam como autores

de notícias, opinião reforçada por Canavilhas (2005) que mostra com um

exemplo como se alterou a relação e isso impacta nas práticas jornalísticas na

internet.

Num jornal tradicional o leitor que discorda de uma determinada ideia veiculada pelo jornalista limita-se a enviar uma carta para o jornal e a aguardar a sua publicação numa edição seguinte, tendo habitualmente que invocar a Lei de Imprensa para o conseguir. Por vezes a carta só é publicada dias depois e perde completamente a atualidade. Outras vezes o jornalista não responde, ou fá-lo de forma a encerrar a discussão, fechando a porta a réplicas. No webjornal a relação pode ser imediata. A própria natureza do meio permite que o webleitor interaja no imediato (CANAVILHAS, 2005).

A tevê, o rádio e o jornal conseguiram com êxito despertar no receptor

capacidades para a apreensão das suas linguagens. A internet, no

entendimento de Canavilhas (2005), precisa fazer o mesmo, por isso os

jornalistas da web precisam estar atentos. Não basta juntar à notícia elementos

multimídia que não dialogam, mas, ao contrário, redundam, podendo até

causar ruído. A introdução de novos elementos não-textuais permite ao leitor

explorar a notícia de uma forma pessoal, mas obriga o jornalista a produzi-la,

transformando-se num produtor de conteúdos multimídia.

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Por sua vez, o utilizador do serviço não pode ser identificado apenas como leitor, telespectador ou ouvinte já que a web notícia integra elementos multimídia, exigindo uma "leitura" multilinear. A utilização destes recursos obedece a critérios diretamente ligados com o conteúdo informativo e com as características daqueles elementos multimídia (CANAVILHAS, 2005).

O autor cita exemplos dessa integração que deve ser perseguida pelo

jornalista no ciberespaço. As hiperligações são recomendadas em textos

extensos, ligando várias pirâmides invertidas da notícia, notícias anteriores em

arquivo, bases de dados ou textos externos ao jornal. É recomendável que

estas ligações abram em novas janelas de forma a manter o utilizador ligado ao

webjornal. Já os vídeos devem ser usados em situações de difícil descrição ou

que exijam muito texto. Os infográficos são ideais para notícias mais pesadas,

com grande quantidade de informações técnicas. Servem para dar leveza a

temas mais ardidos. Os áudios são ideais em situações em que é difícil

descrever por exemplo o estado emocional do entrevistado, eles ajudam dessa

forma a dar um elemento interpretante à notícia.

A multimidialidade, a terceira característica da linguagem web que

analisaremos neste manual, faz parte da natureza humana e está relacionada

aos sentidos: tato, olfato, paladar, audição e visão. O homem que há 30.000

anos habitava nas cavernas já era um comunicador multimídia (Salaverría,

2014, p.25). Segundo ele, multimídia não é apenas uma combinação de texto,

sons e imagens, como comumente se identifica, mas um pouco mais, no

entendimento do autor. A visão simplista pode limitar um conceito cuja

imprecisão terminológica é tema de intensa discussão teórica.

Depois de sublinhar as três acepções relacionadas ao tema, multimídia

como multiplataforma, como polivalência e como combinação de linguagens,

Salaverría (2014, p. 26) afirma que multimidialidade já tem quase dois séculos

de história no jornalismo e que pode ser definida como uma combinação de

pelo menos dois tipos de linguagem em apenas uma mensagem. Quais sejam:

1. texto; 2. fotografia; 3. gráficos, iconografia e ilustrações estáticas; 4. vídeo; 5.

animação digital; 6. discurso oral; 7. música e efeitos sonoros; 8. vibração.

Um conteúdo pode expressar-se, efetivamente, através de um único tipo de linguagem – texto, som, fotografia... – ou através de vários tipos de linguagem em simultâneo. Quando o conteúdo se expressa através de um único tipo de linguagem, encontramo-nos perante um conteúdo monomídia. Seguindo o mesmo critério, se combinarmos dois tipos de linguagem

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estamos perante um conteúdo bimídia; se forem três, trimídia, e assim sucessivamente. Segundo este critério, todos os conteúdos que contam com pelo menos dois tipos de linguagem associados entre si são, por natureza, multimídia. Dito de outro modo, qualquer mensagem que não seja monomídia é multimídia (SALAVERRÍA, 2014, p. 30).

Diferente do cinema e da imprensa, o rádio não evoluiu para a

multimidialidade, permaneceu sempre com a mesma linguagem, no caso o

som, que se expressa de diversas formas: palavra falada, som ambiente e

efeitos sonoros. Já o mesmo não se pode dizer da tevê, que tem sua história

linkada à ideia de multimidialidade e multisonoridade, e da internet, cujo

hipertexto foi potencializado, segundo Salaverría, abrindo terreno para a

apresentação simultânea de vários tipos de elementos multimídia.

O autor alerta ainda os profissionais do jornalismo na web para que

combinem de forma compatível os elementos multimídia, para que os mesmos

não se tornem um problema de comunicação. Existem critérios, tratados por

Salaverría (2014), que facilitam a correta coordenação de elementos multimídia

na composição de uma informação: 1. compatibilidade; 2. complementaridade;

3. ausência de redundância; 4. hierarquização; 5. ponderação; e 6. adaptação.

Salaverría (2014) afirma que a narrativa multimídia está diante de um

excelente terreno para se desenvolver. Ele cita alguns fatores como a

simplificação dos processos de publicação de conteúdos audiovisuais na

internet; a dinâmica de comunicação unilateral facilitada pelas redes sociais,

que proporcionam uma contribuição de conteúdos cada vez mais ativa por

parte dos internautas; o auge dos dispositivos móveis, enquanto dispositivos de

captação, distribuição e consumo de conteúdos multimídia; e a estratégia de

diferenciação adoptada por certos meios de comunicação e pelos seus

concorrentes, procurando oferecer formatos multimídia bastante avançados

(Salaverría, 2014, p. 47 e 48).

Dube160 (2003) também dá dicas úteis para quem pensa o texto em

tempo real. Citado por Martinez (2014), o ciberjornalista norte-americano

sugere a verificação se o texto que se está escrevendo vai ser bem entendido

por uma audiência local, nacional e internacional, direcionando assim o tipo de

160 Jonathan Dube é especialista em mídias digitais. Ele dirigiu grandes empresas de mídia digital para Disney, CBS e CBC, e atuou como presidente da Associação Internacional de Notícias Online. Ele atualmente supervisiona a estratégia digital e negócios para William Morris Endeavor/IMG Worldwide, focada em vídeo OTT. Ele também é consultor de startups digitais. Disponível em: https://www.linkedin.com/in/jondube/?locale=fr_FR Acessado em 18/5/2017.

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escrita e a sua profundidade. Antes de escrever, é preciso planejar a história e

pensar na possibilidade de agregar fotos, áudios, infográficos, dentre outros,

além do texto. Os feedbacks quanto à apuração, entre repórteres e editores,

também são extremamente importantes para a construção da notícia.

O texto pode ficar entre o impresso e o televisivo, sendo mais literal e escrito na voz ativa, nunca na passiva. Outras velhas máximas do jornalismo permanecem, como concisão, uso de verbos de ação e substantivos, em vez de adjetivos. Também é preciso lembrar que, em geral, o usuário de portais aceita o uso do humor (e nunca do desleixo) bem mais que do que em outras plataformas ou veículos (DUBE, 2003 apud MARTINEZ, 2014).

O jornalista não deve se deixar pegar pela mentalidade de serviço 24/7,

aconselha Dube (2003), porque os leitores raramente notam, ou se importam

com quem foi o primeiro a divulgar. As pessoas querem saber não apenas o

que aconteceu, mas por que isso importa. “Escreva e edite todas as suas

histórias com isso em mente.” Outra dica diz respeito à ordem das notícias na

página. Para o ciberjornalista, é recomendável sempre manter a notícia mais

importante na cabeça, na liderança da página, sobretudo porque os leitores

raramente visitam o site mais de uma vez por dia.

A maioria das histórias on-line é muito longa para uma audiência na web, e imagino que poucos leitores as finalizem. Roy Peter Clark escreveu um ensaio maravilhoso argumentando que qualquer história pode ser contada em 800 palavras - uma boa orientação para a escrita on-line. Mas que seja uma diretriz, não uma regra. Os leitores ficarão com histórias mais longas on-line se houver uma razão convincente para que uma história seja tão longa - e se ela continuar cativando sua atenção (DUBE, 2003).

O jornalismo online é uma indústria nova e em evolução. Duben (2003)

sugere a formação de uma massa crítica entre os profisisonais, para que se

desafiem a questionar a maneira como as coisas estão sendo feitas e esticar

os limites do que pode ser feito. “Não há regras, apenas ideias. Assumir riscos.

Experimente algo diferente. Mas não se esqueça dos fundamentos do

jornalismo.” Segundo o autor, é preciso tirar proveito do lado bom da internet.

4.4. Convergência potencializa e ajuda a repensar modelos

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Durante muito tempo, os vários dispositivos para comunicação,

entretenimento e computação, dentre os quais o telefone, a televisão, o rádio, o

aparelho de som, o computador e a calculadora eram concebidos e produzidos

de forma que cada dispositivo era indissociável de sua função. Um telefone161,

possuía apenas uma função, que era própria daquele dispositivo e nenhum

outro a possuía. Para executar várias funções, as pessoas tinham de possuir

vários dispositivos.

No embalo da web, a indústria do setor passou a operar transformações,

ampliando as funcionalidades do telefone, que, desde então, nunca mais seria

apenas um telefone. O smartphone que conhecemos hoje é um dispositivo que

passou a congregar diferentes funções de comunicação, entretenimento e

computação, permitindo mensagens instantâneas, e-mail, visualização de

filmes, filmagem, videoconferência e, claro, ligações telefônicas.

A convergência virou palavra de ordem mundial, com repercussão não

apenas nos setores como o da comunicação, mas também em seus eixos,

dentre os quais o do jornalismo, o que nos interesse neste manual. Vários

autores têm se debruçado sobre o assunto, para melhor compreendê-lo, e dão

pistas sobre como o tema impacta o dia a dia das empresas jornalísticas e,

consequentemente, o trabalho dos profissionais.

Para Jenkins162 (2009), convergência define mudanças tecnológicas,

industriais, culturais e sociais no modo como as mídias circulam em nossa

cultura. Algumas das ideias comuns expressas pelo termo incluem o fluxo de

conteúdos por meio de várias plataformas de mídia, a cooperação entre as

múltiplas indústrias midiáticas, a busca de novas estruturas de financiamento

das mídias, e o comportamento migratório da audiência, que vai a quase

qualquer lugar em busca das experiências de entretenimento que deseja

(JENKINS, 2009, p. 385 e 386). Segundo ele, “convergência é uma palavra que

consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e

161 Exemplo dado pelo Instituto Nacional para a Convergência (INC) no site da entidade: http://incod.blogspot.fr/p/o-que-e-convergencia-digital.html 162 Henry Jenkins é um norte-americano estudioso dos meios de comunicação. Ele é considerado “um dos pesquisadores da mídia mais influentes da atualidade”. Durante os anos de 1993 e 2009 ele esteve a frente do programa de Estudos de Mídia Comparada do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Atualmente, Jenkins atua como professor de Comunicação, Jornalismo e Artes Cinematográficas na Universidade da Carolina do Sul. Disponível em: http://henryjenkins.org/aboutmehtml Acessado em 18/5/2017.

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sociais, dependendo de quem está falando e do que imaginam estar falando”

(2009, p.30).

Dessa forma, com a internet, o fenômeno da convergência chegou com

força nas indústrias midiáticas, tornando imprecisas as fronteiras entre os

meios de comunicação. O pesquisador norte-americano afirma que essa

nebulosidade atinge tanto as comunicações ponto a ponto (correio, telefone e

telégrafo) como as de massa (imprensa, rádio e tevê). E o efeito disso é um

enfraquecimento na relação entre o meio e o seu uso, acompanhado de fluxos

que antes não pareciam possíveis.

Um único meio físico – sejam fios, cabos ou ondas – pode transportar serviços que no passado eram oferecidos separadamente. De modo inverso, um serviço que no passado era oferecido por um único meio – seja a radiodifusão, a imprensa ou a telefonia – agora pode ser oferecido de várias formas físicas diferentes (JENKINS, 2009, p. 38).

Jenkins (2009) desenvolve, com base nos estudos da especialista Lisa

Gitelman163, sobre modelos de mídia, a ideia de meio de comunicação como

uma parte integrante de um sistema cultural. Por esta razão, a sua visão

teórica de que as tecnologias vêm e vão o tempo todo, mas os meios de

comunicação persistem “como camadas dentre de um extrato de

entretenimento e informação cada vez mais complicado”.

O conteúdo de um meio pode mudar (como ocorreu quando a televisão substituiu o rádio como meio de contar histórias, deixando o rádio livre para se tornar a principal vitrine do rock and roll), seu público pode mudar (como ocorre quando as histórias em quadrinhos saem de voga, nos anos 1950, para entrar num nicho, hoje) e seu status social pode subir ou cair (como ocorre quando o teatro se desloca de um formato popular para um formato de elite), mas uma vez que um meio se estabelece, ao satisfazer alguma demanda humana essencial, ele continua a funcionar dentro de um sistema maior de opções de comunicação. Desde que o som gravado se tornou uma possibilidade, continuamos a desenvolver novos e aprimorados meios de gravação e reprodução do som. Palavras impressas não eliminaram as palavras faladas. O cinema não eliminou o teatro. A televisão não eliminou o rádio (JENKINS, 2009, p. 41).

Salaverría e Negredo164 (2008) entendem a convergência como um

processo dinâmico e multidimensional (tecnológico, empresarial, profissional e 163 Lisa Gitelman é uma historiadora da mídia cujas pesquisas dizem respeito à cultura impressa americana, técnicas de inscrição e os novos meios de comunicação de ontem e de hoje. Ela está particularmente preocupada em traçar os padrões de acordo com os quais as novas mídias se tornam significativas dentro e contra os contextos dos meios de comunicação mais velhos. Seu livro mais recente intitula-se Paper Knowledge: Toward a Media History of Documents. Ela também é doutora em Inglês e Literatura Comparada pela Universidade de Columbia, nos Estados Unidos. Disponível em: http://english.fas.nyu.edu/object/LisaGitelman.html Acessado em 18/5/2017.

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de conteúdo). Eles afirmam que, diante desse cenário de tanta mudança, a

convergência jornalística é uma oportunidade para transformar uma

organização de empresas jornalísticas do século XX em empresas informativas

do século XXI (SALAVERRÍA e NEGREDO, 2008, p. 17).

Os autores propõem repensar os meios tradicionais, apontando para o

que denominam de um jornalismo integrado. Assim como Jenkins (2009),

Salaverría e Negredo (2008) compreendem convergência não como mudança

de produto, mas como mudança do processo de produção. No entanto, para

isso, a transformação também perpassa pelos jornalistas, que precisam buscar

o seu espaço e seu papel nesse novo modelo produtivo.

Além da adoção de uma linguagem que extraia o melhor de cada mídia, levando em consideração as características de cada região que pretende atingir, há também a questão estrutural da redação, a metodologia, a capacitação dos profissionais para desempenharem o trabalho, entre outros aspectos (SALAVERRÍA & NEGREDO, 2008, p. 45).

Para Jenkins (2009), a internet torna possível o desenvolvimento de

uma “cultura participativa”, em contraste à antiga passividade que ligava os

espectadores aos meios tradicionais. Produtores e consumidores de mídia

agora interagem. A convergência não ocorre por meio de aparelhos, por mais

sofisticados que venham a ser, alerta o autor. A convergência ocorre dentro

dos cérebros de consumidores individuais e em suas interações sociais com

outros.

Cada um de nós constrói a própria mitologia pessoal, a partir de pedaços e fragmentos de informações extraídos do fluxo midiático e transformados em recursos através dos quais compreendemos nossa vida cotidiana. Por haver mais informações sobre determinado assunto do que alguém possa guardar na cabeça, há um incentivo extra para que conversemos entre nós sobre a mídia que consumimos. Essas conversas geram um burburinho cada vez mais valorizado pelo mercado das mídias (JENKINS, 2009, p. 31).

O consumo tornou-se um processo coletivo, o que Jenkins entende por

inteligência coletiva, expressão cunhada por Lévy (1999). Ou seja, ninguém

pode saber tudo; cada pessoa sabe algo; e, ao juntar as peças, as pessoas

associam seus recursos e unem suas habilidades. “A inteligência coletiva pode

164 Samuel Negredo é um jornalista espanhol, integrante da equipe de pesquisadores do Departamento de Projetos Jornalísticos da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra. Um dos seus temas de interesse, para estudos futuros, é a convergência no jornalismo. Disponível em: https://inmediapost.wordpress.com/samuel-negredo/ Acessado em 18/5/2017.

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ser vista como uma fonte alternativa de poder midiático”, acredita Jenkins

(2009).

Jenkins (2009) é contra a ideia de que a convergência deve ser

compreendida como um processo tecnológico que une múltiplas funções dentro

dos mesmos aparelhos. “Em vez disso, a convergência representa uma

transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a

procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos de mídia

dispersos”.

O autor explica que a convergência engloba tanto um processo

corporativo, de cima para baixo, quanto um processo de consumidor, de baixo

para cima. A convergência corporativa coexiste com a convergência alternativa.

As empresas de mídia, segundo ele, estão aprendendo a acelerar o fluxo de

conteúdo de mídia pelos canais de distribuição para aumentar as

oportunidades de lucros, ampliar mercados e consolidar seus compromissos

com o público. Já os consumidores estão aprendendo a utilizar tecnologias

diversas para controlar melhor o fluxo da mídia e para interagir com outros

consumidores. As promessas desse novo ambiente de mídia provocam

expectativas de um fluxo mais livre de ideias e conteúdos (JENKINS, 2009, p.

48).

Inspirados por esses ideais, os consumidores estão lutando pelo direito de participar mais plenamente de sua cultura. Às vezes, a convergência corporativa e a convergência alternativa se fortalecem mutuamente, criando relações mais próximas e mais gratificantes entre produtores e consumidores de mídia. Às vezes, essas duas forças entram em guerra (...) (JENKINS, 2009, p. 48).

4.5. Divulgação é parte da estratégia e passa pelas redes sociais

A velocidade na web, um ponto de reflexão que emerge mais de uma vez

neste manual, também impacta na distribuição de notícias. As Redes Sociais

(Facebook, Twitter, Instagram, Youtube, dentre outros) deram a vazão que as

informações e as notícias jornalísticas precisavam para se disseminar no

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ciberespaço. Recuero165 (2009) afirma que essas redes sociais tornaram-se as

protagonistas da difusão, sobretudo porque revelaram ter uma forte capacidade

de mobilização entre seus atores, quase sempre impulsionados por processos

ou de conflito, de cooperação ou de competição.

A divulgação das informações e notícias jornalísticas segue uma lógica

epidêmica, segundo Recuero (2009). Ela cita Barabási166 (2003) para explicar,

tecnicamente, porque na web esse fenômeno flui com tanta rapidez. A

existência de conectores, indivíduos extremamente bem conectados em uma

ou varias redes sociais, seria a principal razão. A difusão de informações pelas

redes sociais obedece ainda uma lógica envolvendo valores, uma espécie de

“capital social”, percebido por “atores sociais, com interesses, percepções,

sentimentos e perspectivas” (Recuero, 2009, p. 117). Ou seja, existe, segundo

a autora, uma conexão entre aquilo que alguém decide publicar e a visão de

como a sua rede perceberá isso (a referida informação).

O capital social seria, assim, uma motivação fundamental para criar e manter um blog e poderia ser acionado como diferentes padrões de fluxo de informação percebidos na blogosfera. E assim como nos blogs, nos demais sites de redes sociais a possibilidade é a mesma. Os atores são conscientes das impressões que desejam criar e dos valores e impressões que podem ser construídos nas redes sociais mediadas pelo computador. Por conta disso, é possível que as informações que escolhem divulgar sejam diretamente influenciadas pela percepção de valor que poderão gerar (RECUERO, 2009, p. 118).

Recuero (2009) analisa dois principais tipos de capital social que transitam

pelas redes sociais e as razões que os motivam: o relacional (marcado pela

interação) e o cognitivo (pela informação informação).

O capital social relacional tem um apelo mais emotivo, mobiliza elementos

como o prestígio pessoal estabelecendo níveis maiores de confiança entre os

atores. O apelo é a integração e o estreitamento dos laços sociais. As

informações que apelam para o capital social relacional tendem a espalharem-

165 Raquel Recuero é jornalista, professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação e do curso de Comunicação Social da UCPel – Universidade Católica de Pelotas. Suas áreas de interesse são redes sociais e comunidades virtuais na Internet, conversação e fluxos de informação e capital social no ciberespaço e jornalismo digital. Disponível em: http://www.raquelrecuero.com/ Acessado em 18/5/2017.166 Albert-László Barabási é um físico húngaro-americano de origem romena, conhecido por seu trabalho na pesquisa da teoria de redes.Introduziu em 1999 o conceito de redes sem escala e propôs o modelo Barabási-Albert para explicar sua generalizada emergência em sistemas naturais, tecnológicos e sociais, do telefone celular à World Wide Web ou comunidades online. Disponível em: http://barabasi.com/Acessado em 19/5/2017.

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se primeiro entre os laços mais fortes, só depois percorrendo os laços mais

fracos e atingindo nós mais distantes na rede.

Já o capital social cognitivo tem um apelo informacional e não relacional. É

o caso das notícias e dos vídeos. Aqui, explica a autora, o objetivo é mobilizar

elementos ligados ao conhecimento. O objetivo de difundir uma notícia de um

jornal em uma rede não é aumentar laços sociais, mas informar ou gerar

conhecimento. Recuero (2009) diz que o comportamento mais comum neste

caso é replicar o conteúdo cognitivo, mesmo sem levar em conta se credível ou

não. As pessoas em rede têm uma tendência de querer “informar” umas às

outras. Mesmo que não seja verdadeira, há uma obrigação de repassá-la aos

conhecidos para que todos saibam (RECUERO, 2009, p. 119 e 120).

A conclusão é que existem dois tipos de conteúdos em circulação pelas

redes sociais, cada qual com um comportamento e abrangência, informação

útil para os jornalistas, que atuam cada vez mais na internet. Os conteúdos

mais emotivos, denominados pela autora como “capital social relacional”,

difundem-se entre elos ou nós mais próximos da rede. Enquando que os

conteúdos informativos, chamados de “capital social cognitivo”, expandem-se

mais longe, espalham-se mais apesar de não atingirem tantos nós ou elos da

rede.

Recuero (2011) questiona se as redes sociais estariam retirando as funções

dos jornalistas, tanto na elaboração quanto na difusão das notícias. No

entendimento da autora, há espaço para a atuação amigável.

(...) o papel do jornalismo, senão mais aquele de "dar" a notícia, é aquele de prover a legitimação e o aprofundamento das informações, ancorado na credibilidade e em seu papel social. Ou seja, o jornalismo continua a deter o "lugar de fala" da credibilidade, que é alargado aos veículos jornalísticos e, em menor medida, aos jornalistas. Em outras palavras, as redes sociais na Internet, apesar de todo o potencial colaborativo de produção de informação continuam dando ao Jornalismo a credibilidade e construindo uma função de legitimação das notícias (RECUERO, 2011).

A autora brasileira apresenta dados que demonstram não haver uma clima

de animosidade no ciberespaço entre jornalistas e audiências. Segundo ela,

redes como o Twitter, por exemplo, só tratam notícias como legitimadas e

confirmadas quando há a publicação da informação por um veículo jornalístico.

“Assim, enquanto os atores que repassam uma determinada informação obtida

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por um veículo jornalístico concedem credibilidade e visibilidade ao veículo e à

notícia, também recebem, por sua vez, credibilidade e visibilidade pelo repasse

da notícia à rede social” (RECUERO, 2011).

Outra vantagem, para se conquistar as redes sociais, apontada pela autora,

é que os jornalistas e as empresas para as quais trabalham continuam na

liderança em número de seguidores. Além disso, Recuero (2011) informa que

produção própria das audiências no Twitter, por exemplo, ainda é baixa. Os

veículos de jornalísticos têm, na sua avaliação, além da credibilidade, o poder

de filtro e hierarquização das notícias em seu favor. O jornalismo, assim,

também possui uma função de organização do espaço informativo, através da

filtragem e hierarquização das informações relevantes. “Esse papel é

construído através de uma troca com as redes sociais presentes na

ferramenta”. Enquanto as redes dão credibilidade e visibilidade aos veículos

pelo compartilhamento, esses veículos organizam as informações relevantes. A

prática aqui é de troca (RECUERO, 2011).

Os veículos necessitam da visibilidade concedida pela rede, que atua também filtrando aquilo que é publicado pelo jornalismo. Se o Jornalismo não mais dá o furo da notícia, a ele cabe o aprofundamento e a seleção das informações que serão apresentadas, a filtragem e o desenho do espaço social (RECUERO, 2011).

Pavlik (2014) contribui com a reflexão ao assinalar que, embora exista

grande valor em veicular notícias precisas à velocidade da luz para uma

comunidade global, há também o risco de os jornalistas espalharem

rapidamente erros, fruto de matérias mal apuradas devido ao fator tempo.

O jornalista e educador Peter Laufer167, citado por Pavlik (2014), convoca

um movimento Slow News, para segurar essa onda acelerada do

webjornalismo. Em vez disso, ele sugere o uso de mecanismos de apuração e

de reflexão mais rigorosos no processo noticioso. Laufer (2013) diz que, apesar

de ser jornalista, está convencido que toda notícia pode esperar. E, na analogia

que faz à comida168, afirma que “temos de nos informar para sobreviver”. Ele

167 Peter Laufer é professor na Escola de Jornalismo e Comunicação da Universidade de Oregon, nos Estados Unidos, além de autor premiado, radiodifusor, documentarista e jornalista. Relatou, escreveu e produziu vários documentários como um correspondente da NBC News sobre temas que vão desde as crises enfrentadas pelos veteranos da Guerra do Vietnã até o analfabetismo e a fome na América. Disponível em: http://journalism.uoregon.edu/member/laufer_peter/ Acessado em 18/5/2017.168 Fundado por Carlo Petrini em 1986, o Slow Food se tornou uma associação internacional sem fins lucrativos em 1989. Atualmente conta com mais de 100.000 membros e tem escritórios na Itália, Alemanha, Suíça, Estados Unidos, França, Japão e Reino Unido, e apoiadores em 150 países. O

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assinala que informações precisas podem ser requisito para essa

sobrevivência. No entanto, a busca de informações instantâneas tornou mais

difícil encontrar a verdade e enxergar o contexto (LAUFER, 2013).

Precisamos decidir por nós mesmos o que as chamadas notícias valem a pena, não apenas nos permitimos ser submetidos a uma infinidade de assaltos à mídia não filtrada. Estamos em perigo de perder a história por causa do barulho. [...] Precisamos nos perguntar o que é importante e por quê. As apresentações de notícias quase histéricas - especialmente nas emissoras e na Internet - podem levar-nos a acreditar que a informação que está sendo imposta a nós é fundamental saber agora (e ouvir e ver repetidamente), embora ela possa garantir apenas algumas linhas nas últimas páginas do jornal de amanhã. Quando a notícia é um elemento importante de nosso currículo societário (...) devemos evitar fragmentos e esperar por relatórios detalhados e análise ponderada, uma vez que os fatos críticos são verificados (LAUFER, 2013).

O Slow News pode levar ao maior esclarecimento e compreensão do

público sobre os eventos atuais e assuntos de importância pública, além de

menor desinformação e imprecisão. No entanto, alerta Pavlik (2014), numa era

de reportagens em tempo real e mídia ubíqua, é provável que este movimento

somente ocorra se a mídia assumir um papel ativo e afirmativo para colocá-lo

em prática.

Os jornalistas cidadãos provavelmente irão desacelerar apenas se

vislumbrarem grande capital social em retardar as notícias, em vez de apressar

sua publicação online. Além do mais, poderia qualquer pessoa eticamente

argumentar contra a emissão de alertas móveis em períodos de crise, quando

pequenos atrasos poderiam fazer uma diferença drástica, até mesmo

constituindo uma questão de vida ou morte? (PAVLIK, 2014)

MARCO EMPÍRICO

Para a formulação de um manual de jornalismo na era digital, como se

propõe nesta pesquisa, foi necessária uma aproximação empírica com os

elementos relacionados ao jornalismo praticado na internet, trabalhados pelos

princípio básico do movimento é o direito ao prazer da alimentação, utilizando produtos artesanais de qualidade especial, produzidos de forma que respeite tanto o meio ambiente quanto as pessoas responsáveis pela produção, os produtores. O Slow Food opõe-se à tendência de padronização do alimento no Mundo, e defende a necessidade de que os consumidores estejam bem informados, se tornando co-produtores. Disponível em: http://www.slowfoodbrasil.com/slowfood/o-movimento Acessado em 18/5/2017.

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autores. A intenção, reforçada neste marco empírico, é evidenciar o que eles

pensam, por meio de suas teorias, sobre o tema.

A investigação também leva em conta, nesta etapa, a proximidade do

pesquisador com o objeto, traduzida em 25 anos de atuação como jornalista

profissional. Essa vivência contribui para a compreensão do pensamento dos

autores e da sua relevância para o jornalismo bem como ajuda a projetá-lo

para esse novo ambiente, sob a influência da internet.

A coleta de dados se dá de forma direta, como sugerem os fundamentos

norteadores da pesquisa empírica. Neste caso, se opera por meio do manuseio

de documentos como leitura dos livros, artigos científicos e textos

disponibilizados em papel e virtualmente. Esse contato direto, mais do que

adequado para evitar alterações ou distorções, dá mais dinamismo e sentido à

investigação.

Por fim, o entendimento acerca da complementariedade entre as

investigações teórica e prática. A conjugação dos dois métodos, manifestada

nesta pesquisa, traz benefícios, porque torna o estudo do objeto mais rico,

mais completo assim como leva o pesquisador a manter contato tanto com as

teorias como com a experiência de campo.

Embora alvo de críticas, sobretudo sob a alegação de a experimentação

exige trabalho eminentemente braçal, a apuração empírica quando

devidamente formulada e executada ajuda a validar o estudo teórico bem

como, muitas vezes, o torna mais próximo da realidade. É o que se verifica

nesta pesquisa em especial: a elaboração de um quadro, qualificando

elementos para a composição de um manual de jornalismo na era digital,

tornou a compreensão mais didática.

UNIDADE DE ESTUDO/MOSTRA

A unidade de estudo, que tem como mostra o conteúdo para um manual

de jornalismo na era digital, é composta pelos seguintes documentos: livros,

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artigos e materiais disponíveis na internet, produzidos por autores de

jornalismo, comunicação, internet e manuais.

Ao todo, são 50 autores, 61 documentos em forma de texto, dos quais

38 livros, 21 artigos científicos, 1 e-book e 1 matéria jornalística, conforme

tabela abaixo. Do total, cinco textos foram redigidos anteriormente a 1995. Os

demais, 56, após 1995, ano que a internet comercial entrou em operação.

Os documentos, de uma forma geral, tratam do jornalismo e sua

interface com a internet. A exceção da matéria jornalística, acima indicada, os

livros e artigos foram selecionados por sua pertinência, alcance, olhar científico

e capacidade de dialogar com as rotinas e práticas jornalísticas.

A tabela a seguir foi organizada por autor, título, tipo e ano do

documento, seguindo uma ordem alfabética do sobrenome do autor, como

sugere as regras técnicas para bibliografia. O número de documentos em

análise é maior que o número de autores porque há autores com mais de um

texto.

Autor Título Tipo Ano

1.ANDERSON, Chris 1. A Cauda Longa. Do mercado de massa para o mercado de nicho

Livro 2006

2.BAUMAN, Zygmunt 2. Globalização: as consequências humanas

Livro 1999

3.BELTRÃO, Luiz 3. Imprensa Informativa: Técnica da Notícia e da Reportagem

Livro 1969

4.BRADSHAW, Paul 4. Instantaneidade: Efeito da rede, jornalistas mobile, consumidores ligados e o impacto no consumo, produção e distribuição

Livro 2014

5.BRUNS, Axel 5. Gatekeeping, Gatewatching, Realimentação em Tempo Real: novos desafios para o Jornalismo

Artigo 2011

6.CANAVILHAS, João 6. A Internet como Memória Livro 2004

7.CANAVILHAS, João 7. Do gatekeeping ao gatewatcher: o papel das redes sociais no ecossistema mediático

Artigo 2010

CANAVILHAS, João 8. Hipertextualidade: novas Livro 2014

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arquiteturas noticiosas

CANAVILHAS, João 9. Webjornalismo: considerações gerais sobre jornalismo na web

Artigo 2005

8.CASTELLS, Manuel 10. A sociedade em rede Livro 1999

9.DUBE, Jonathan 11. Writing News Online Artigo 2003

10.DUTTON, William H.

12. A Networked World Needs a Fifth Estate

Artigo 2011

11.ELLIOT, Phillip 13. Professional Ideology and Organizational Change: The Journalist since 1800

Livro 1978

12.FERRARI, Pollyana

14. Jornalismo digital Livro 2012

13.FREDMAN, Josh 15. Como fazer um manual de instruções

Artigo 2017

14.GENRO FILHO, Adelmo

16. O segredo da pirâmide: para uma teoria marxista do jornalismo

Livro 2012

15.GOBBI, Cristina & BERNARDINI, Gleice

17. Interatividade: um conceito além da internet

Artigo 2013

16.GRADIM, Anabela 18. Manual de Jornalismo. Estudos em Comunicação

Livro 2000

17.JENKINS, Henry 19. Cultura da Convergência Livro 200918.KARAM, Francisco José Castilhos

20. Apontamentos e um futuro aberto: sociedade da informação e do conhecimento, convergência tecnológica, diversidade midiática e ciberjornalismo

Artigo 2010

KARAM, Francisco José Castilhos

21. Jornalismo e ética no século XXI

Artigo 2009

19.LANDOW, George 22. Hipertexto. La convergencia de la teoría crítica contemporánea y la tecnología

Livro 1995

20.LAUFER, Peter 23. Join the 'slow news' movement: It's OK to read yesterday's news tomorrow

Artigo 2013

21.LEMOS, André 24. Cibercultura: tecnologia e vida social na cultura contemporânea

Livro 2013

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22.LÉVY, Pierre 25. Cibercultura Livro 1999

23.LEWIS, Seth C. 26. Journalism In An Era Of Big Data - Cases, Concepts, and Critiques

Artigo 2014

LEWIS, Seth C. & WESTLUND

27. Actors, actants, audiences, and activities in cross-media news work: A matrix and a research agenda

Artigo 2014

24.LÓPEZ, Fabiola Torres

28. Criação de uma equipe de jornalismo de dados

Livro 2017

25.LOUM, Ndiaga 29. Internet y regulación: la ética y la deontología prevalecen sobre el derecho

Livro 2004

26.MACHADO, Elias 30. Manual de Laboratório de Jornalismo na Internet

Livro 2007

27.MARTINEZ, Adriana Garcia

31. A construção da notícia em tempo real

Livro 2014

28.MCLUHAN, Marshall

32. Os meios de comunicação como extensão do homem

Livro 1995

29.MEYER, Philip 33. Precision Journalism: Reporter's Introduction to Social Science Methods

Livro 2002

30.MONTEIRO, André 34. Como veículos e jornalistas podem desenvolver sua audiência

Livro 2017

31.NOGUEIRA, Paulo 35. Pequeno Manual Básico de Jornalismo

Artigo 2010

32.OLIVEIRA, Fernando & MAURIQUE, Thiago

36. Gay Talese: “O jornalismo está se tornando preguiçoso”

Matéria

2011

33.OROZCO, Guillermo

37. Educomunicação: recepção midiática, aprendizagens e cidadania

Livro 2014

OROZCO, Guillermo, NAVARRO, Eva & GARCÍA MATILLA, Agustín

38. Desafíos educativos en tiempos de auto-comunicación masiva: la interlocución de las audiências

Artigo 2012

34.PALACIOS, Marcos

39. Memória: Jornalismo, memória e história na era digital

Livro 2014

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PALACIOS, Marcos 40. Ruptura, continuidade e potencialização no jornalismo online: o lugar da memoria

Artigo 2003

35.PAVLIK, John V. 41. Ubiquidade: o 7º princípio do jornalismo na era digital

Livro 2014

36. PEARSON, Kim 42. How Computational Thinking is Changing Journalism & What’s Next

Artigo 2009

37.PINHO, José Benedito

43. Jornalismo na Internet: planejamento e produção da informação on-line

Livro 2003

38.PRADO, Magaly 44. Webjornalismo E-book 2011

39.ROSSI, Clóvis 45. O que é jornalismo Livro 1980

40.RECUERO, Raquel

46. Redes sociais na internet Livro 2009

41.RECUERO, Raquel

47. Deu no Twitter, alguém confirma? Funções do Jornalismo na Era das Redes Sociais

Livro 2011

42.SALAVERRÍA, Ramón & NEGREDO, Samuel

48. Periodismo integrado: convergencia de medios y reorganización de redacciones

Artigo 2008

SALAVERRÍA, Ramón

49. Hipertexto periodístico: mito y realidad

Artigo 2005

SALAVERRÍA, Ramón

50. Mídia e jornalistas, um futuro em comum?

Artigo 2015

SALAVERRÍA, Ramon

51. Multimedialidade: informar para cinco sentidos

Livro 2014

43.SERRA, Joaquim Paulo

52. Manual de Teoria da Comunicação

Artigo 2007

44.TRAQUINA, Nelson

53. Teorias do jornalismo, porque as notícias são como são

Livro 2012

TRAQUINA, Nelson 54. Teorias do jornalismo. A tribo jornalística – uma comunidade interpretativa transnacional

Livro 2008

45.TUCHMAN, Gaye 55. Making News: a Study in the Construction of Reality

Livro 1978

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46.TURMO, Fernando Sabés & LASSA, José Juan Verón

56. La eficacia de lo sencillo. Introducción a la práctica del periodismo

Livro 2009

47.WEAVER, Paul H. 57. As notícias de jornal e as notícias de televisão

Livro 1993

48.WING, Jeannette M.

58. Computational Thinking Artigo 2006

49.WOLF, Mauro 59. Teorias da comunicação Livro 1987

50.WOLTON, Dominique

60. Internet, e depois? Livro 2012

WOLTON, Dominique 61. Informar não é comunicar Livro 2011

Quadro 1 - Mostra de documentos pesquisados e analisadosFonte: Autor

VARIÁVEIS

Para analisar o conteúdo, foram definidas 10 unidades de registro,

segmentadas por temas, cada qual com três variáveis, totalizando 33,

conforme tabela abaixo. As unidades de registro servem como balizadoras

neste processo de apuração e qualificação de conceitos desenvolvidos pelos

autores, que, em seguida serão interpretados e focados no nosso objetivo geral

que é indicar diretrizes de conteúdo para um manual de jornalismo na era

digital.

Unidades de registro Variáveis

1. Manual 1.1.Utilidade1.2.Formato1.3.Frequência

2. Tecnologia 2.1.Sociedade em rede2.2.Ciberespaço2.3.Globalização

3. Princípios e fundamentos 3.1. Ética3.2.Valores

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3.3.Credibilidade

4. Audiência 4.1.Ação4.2.Participação4.3.Concorrência

5. Novas práticas 5.1.Ferramentas5.2.Multitarefa5.3.Paradigmas

6. Profissão 6.1.Sobrevivência6.2.Reinvenção6.3.Crise

7. Notícia 7.1.Valores-notícia7.2.Instantaneidade7.3.Apuração gradual

8. Linguagem 8.1.Multimidialidade8.2.Interatividade8.3.Hipertextualidade

9. Convergência 9.1.Velhas e novas mídias9.2.Fluxo de conteúdo9.3.Redes sociais

10. Informação 10.1.Análise de dados10.2.Memória10.3.Potencial de consumo

Quadro 2 – Seleção das unidades de registro e variáveisFonte: Autor

A seguir, um descritivo de cada uma das unidades de registro e suas

variáveis para o entendimento da lógica que move esta investigação empírica.

Analisadas individualmente, ao final, formam um quadro a ser interpretado.

A unidade de registro Manual, com as variáveis Utilidade, Formato e

Frequência, serve para mensurar a opinião dos autores em relação à existência

ou não de uma potencial demanda por manuais entre os profissionais de

jornalismo, uma das hipóteses lançadas nesta pesquisa.

A unidade de registro Tecnologia, sob os viéses Sociedade em rede,

Ciberespaço e Globalização, dá uma ideia de como as tecnologias da

informação e comunicação são absorbidas e impactam na sociedade,

tornando-a mais interativa virtualmente, porém não menos complexa.

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Princípios e fundamentos, unidade de registro com as variáveis Ética,

Valores e Credibilidade, é uma oportunidade para visitar aspectos da cultura

jornalística, regulada por valores éticos e códigos deontológicos, e verificar a

sua manutenção – ou não - no ambiente digital.

A unidade de registro Audiência, em seus eixos Ação, Participação e

Concorrência reflete o olhar dos autores sobre o empoderamento dos

receptores/públicos/audiências com a internet, que passaram a ser

concorrentes em potencial dos jornalistas graças ao acesso ampliado às

informações.

A quinta unidade de registro desta pesquisa, Novas práticas, com as

variáveis Ferramentas, Multitarefa e Paradigmas, espelha a compreensão dos

autores sobre o novo jeito de se fazer jornalismo, sob o impacto da internet e

das tecnologias no modus operandi.

Em Profissão, unidade de registro com as variáveis Sobrevivência,

Reinvenção e Crise, a análise de conteúdo recai sobre como os autores

enxergam a reação (ou não) da Profissão frente ao novo cenário, altamente

mutante e instantâneo.

A unidade de registro Notícia apura o posicionamento dos autores em

relação às variáveis Valores-notícia, Instantaneidade e Apuração gradual, três

elementos-chave no processo de produção da notícia, uma das razões para a

existência do jornalismo.

Em Linguagem, unidade de registro com as variáveis Multimidialidade,

Interatividade e Hipertextualidade, é possível verificar o que os autores de

jornalismo, comunicação e internet, veem como inovação nesse quesito.

A unidade de registro Convergência, sob os viéses Velhas e novas

mídias, Fluxo de conteúdo e Redes sociais, permite qualificar as

transformações geradas pela convergência digital no jornalismo.

E, para finalizar a apresentação das unidades de registro selecionadas

nesta pesquisa, a unidade de registro Informação, com as variáveis Análise de

dados, Memória e Potencial de consumo. Nesta unidade, é possível conhecer o

que os autores dizem à respeito do tema, que tem alterado as rotinas não

apenas dos jornalistas e suas audiências, mas também das empresas

jornalísticas.

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TÉCNICA E MÉTODOS

A pesquisa bibliográfica qualitativa com análise de conteúdo é o caminho

seguido para a elaboração deste manual sobre novas práticas do jornalismo na

era digital. Antes de descrevermos a técnica e os métodos utilizados, um

parênteses acerca da importância de se estudar cientificamente os fenômenos

sociais e se realizar a chamada pesquisa social, o que se buscou neste caso.

Como ensina Gil169 (2008), pode-se definir pesquisa como o processo

formal e sistemático de desenvolvimento do método científico. O objetivo é

descobrir respostas para problemas mediante o emprego de técnicas. “A partir

dessa conceituação, pode-se, portanto, definir pesquisa social como o

processo que, utilizando a metodologia científica, permite a obtenção de novos

conhecimentos no campo da realidade social” (GIL, 2008, p. 26). Realidade

social em sentido bastante amplo, investigada sob o viés das ciências sociais,

incluindo sociologia, antropologia, ciência política, psicologia, economia.

Voltando especificamente a este manual, a técnica bibliográfica, primeira

opção que tivemos de tomar, está sustentada a partir de material já publicado,

constituído principalmente de livros, artigos científicos e atualmente com

material disponibilizado na internet, como já sinalizamos no marco teórico.

O principal ponto positivo de quem opta pela pesquisa bibliográfica,

segundo Gil (2008), reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de

uma gama de fenômenos muito mais ampla. Esta vantagem se torna

particularmente importante quando o problema de pesquisa requer dados muito

dispersos pelo espaço, como é o caso deste manual que se propõe a analisar o

ambiente internet como um todo, algo quase impossível de ser mensurado.

A partir da formulação do problema, foi fechado um cronograma com

etapas a serem cumpridas, dentre elas a elaboração de um plano de trabalho;

a identificação das fontes; a localização das fontes e obtenção do material; a

169 Graduado em ciências sociais e pedagogia, Antonio Carlos Gil fez doutorado em saúde pública pela Universidade de São Paulo (USP) e atualmente é professor dos programas de doutorado e mestrado em administração da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). Sua área de estudo abrange a elaboração de projetos de pesquisa, didática de ensino superior, gestão de pessoas, sociologia e pesquisa social. Disponível em: http://www.livrariacultura.com.br/e/antonio-carlos-gil Acessado em 20/5/2017.

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leitura do material; a confecção de fichas; a construção da lógica do trabalho; e

a redação, como sugere Gil (2008). O cumprimento do cronograma, contendo

uma etapa final de revisão do conteúdo, levou em média cinco meses.

A escolha pelo método qualitativo se dá porque o jornalismo na internet

tem se revelado um fenômeno social. Para tais situações, Flick170 (2009)

sugere a análise qualitativa. “Em vez de partir de teorias e testá-las, são

necessários conceitos sensibilizantes (essencialmente influenciados por um

conhecimento teórico anterior) para a abordagem dos contextos sociais a

serem estudados”.

A mudança social acelerada e a consequente diversificação das esferas de vida fazem com que, cada vez mais, os pesquisadores sociais enfrentem novos contextos e perspectivas sociais. Tratam-se de situações tão novas para eles que suas metodologias dedutivas tradicionais – questões e hipóteses de pesquisa obtidas a partir de modelos teóricos e testados sobre evidências empíricas – agora fracassam devido à diferenciação dos objetos (FLICK, 2009, p. 21).

Gil (2008) busca em Berelson171 (1952, p.13) a definição de análise de

conteúdo, método utilizado nesta pesquisa, qual seja, "uma técnica de

investigação que, através de uma descrição objetiva, sistemática e quantitativa

do conteúdo manifesto das comunicações, tem por finalidade a interpretação

destas mesmas comunicações". Krippendorff172 (1990, p. 28), por seu turno,

descreve-a como “uma técnica de pesquisa para fazer inferências reprodutíveis

e válidas dos dados ao contexto dessa pesquisa”. De forma prática, o que é

relevante assinalar é que a definição do autor alemão incorpora a ideia de que

esta técnica não só descreve, mas permite inferências173 e deduções. Nesta

pesquisa em específico, se traduzirá por meio da reprodução e qualificação das

170 Uwe Flick é psicólogo e sociólogo. Professor titular de pesquisa qualitativa na Universidade Alice Salomon, em Berlim, na Alemanha, nas áreas de enfermagem, gerontologia e serviço social. Tem como principais interesses de pesquisa os métodos qualitativos, as representações sociais nos campos da saúde individual e pública e a mudança tecnológica na vida cotidiana. FLICK, Uwe. Introdução à Pesquisa Qualitativa. Tradução Joice Elias Costa - 3ª edição. Porto Alegre: Artmed, 2009.171 Bernard Berelson foi um sociólogo norte-americano que se dedicou aos estudos do comportamento, sobretudo os comportamentos eleitorais. Disponível em: http://www.universalis.fr/encyclopedie/bernard-r-berelson/ Acessado em 25/5/2017.172 O alemão Klaus Krippendorff é formado em engenharia e design. Ph.d em comunicação, vive atualmente nos Estados Unidos, onde leciona cibernética, linguagem e cultura na Universidade da Pennsylvania. Disponível em: http://web.asc.upenn.edu/usr/krippendorff/ Acessado em 25/5/2017.173 Inferência é a ação e o efeito de inferir (deduzir algo, tirar uma conclusão de outra coisa, conduzir a um resultado). A inferência surge a partir de uma avaliação mental entre distintas expressões que, ao serem relacionadas como abstracções, traçam uma implicação lógica. Disponível em: http://conceito.de/inferencia Acessado em: 25/5/2017.

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vozes de autores sobre o fenômeno jornalismo e internet, matéria-prima para a

elaboração de um manual de jornalismo na era digital.

Para Moraes174 (1999), a análise de conteúdo constitui uma metodologia

de pesquisa usada para descrever e interpretar o conteúdo de toda classe de

documentos e textos. Essa análise, conduzindo a descrições sistemáticas,

qualitativas ou quantitativas, ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir

uma compreensão de seus significados num nível que vai além de uma leitura

comum (MORAES, 1999). A análise de conteúdo se dá em três fases, segundo

Bardin175 (1977, p. 95), citada por Gil (2008) e que também comunga com a

ideia de que a análise de conteúdo é um método que trabalha com inferências

cujo foco é qualificar, interpretar: pré-análise; exploração do material; e

tratamento dos dados, inferência e interpretação. A pré-análise é a fase de

organização. Inicia-se geralmente com os primeiros contatos com os

documentos (leitura flutuante).

A seguir, procede-se à escolha dos documentos, à formulação de hipóteses e à preparação do material para análise. É a fase longa e fastidiosa que tem como objetivo administrar sistematicamente as decisões tomadas na pré-análise. Refere-se fundamentalmente às tarefas de codificação, envolvendo: o recorte (escolha das unidades), a enumeração (escolha das regras de contagem) e a classificação (escolha de categoria) (BARDIN, 1977, p. 95 apud Gil, 2008, p. 153)

Já o tratamento dos dados, a inferência e a interpretação, terceira fase

na tipologia de Bardin, têm como objetivo tornar os dados válidos e

significativos. Para tanto, são utilizados procedimentos estatísticos que

possibilitam estabelecer quadros, diagramas e figuras que sintetizam e põem

em relevo as informações obtidas. Nesta pesquisa, optou-se pela elaboração

de quadros, sustentados em variáveis, unidades de pesquisa e conceitos, com

o objetivo de localizar e qualificar, em meio ao universo de autores, elementos

para embasar a proposta de manual. Optamos ainda pelo modelo descrito por

Moraes (1999), que prevê 5 fases: 1 - Preparação das informações; 2 -

Unitarização ou transformação do conteúdo em unidades; 3 - Categorização ou

classificação das unidades em categorias; 4 - Descrição; 5 - Interpretação.

174 Doutor em Educação, Roque Moraes é professor das faculdades de educação e química da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Disponível em: http://www.pucrs.br/quimica/professores/roque/roqueindex.htm. Acessado em 26/5/2017.175 Professora-assistente de Psicologia na Universidade de Paris V, a francesa Laurence Bardin aplicou as técnicas da análise de conteúdo na investigação psicossociológica e no estudo das comunicações de massas. Disponível em: https://www.puf.com/Auteur%3ALaurence_Bardin Acessado em 25/5/2017.

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A matéria-prima da análise de conteúdo, afirma Moraes (1999) pode

constituir-se de qualquer material oriundo de comunicação verbal ou não-

verbal, como cartas, cartazes, jornais, revistas, informes, livros, relatos auto-

biográficos, discos, gravações, entrevistas, diários pessoais, filmes, fotografias,

vídeos, etc. Contudo os dados advindos dessas diversificadas fontes chegam

ao investigador em estado bruto, necessitando, então ser processados para,

dessa maneira, facilitar o trabalho de compreensão, interpretação e inferência a

que aspira a análise de conteúdo.

Naturalmente haveria muitas formas de categorizar possíveis objetivos de pesquisas realizadas utilizando análise de conteúdo. Entretanto historicamente estes têm sido definidos em seis categorias, levando em consideração os aspectos intrínsecos da matéria-prima desta análise, do contexto a que as pesquisas se referem e das inferências pretendidas. Esta classificação se baseia numa definição original de Laswell, em que este caracteriza a comunicação a partir de seis questões: 1) Quem fala? 2) Para dizer o que? 3) A quem? 4) De que modo? 5) Com que finalidade? 6) Com que resultados? Utilizando esta definição podemos categorizar os objetivos da análise de conteúdo de acordo com a orientação que toma em relação a estas seis questões (MORAES, 1999, p.3).

Desta forma, por meio da revisão bibliográfica e dos métodos qualitativo

e análise do conteúdo, encontramos elementos para sustentar a elaboração de

um manual de jornalismo na era digital, com caráter orientativo, além de

despertar uma reflexão profissional sobre o tema.

RESULTADOS

Os resultados desta pesquisa são demonstrados neste capítulo de duas

maneiras. Primeiramente, por meio de uma interpretação, em forma de texto,

do conteúdo tratado nos 61 documentos, produzidos por 50 autores em

jornalismo, comunicação, internet e manuais, o que só foi possível a partir da

mostra, da técnica e métodos utilizados. Em seguida, a demonstração se dará

por meio da apresentação de 11 quadros, dez deles cruzando as unidades de

registro e variáveis mobilizadas nesta análise com conceitos-chave propostos

pelos autores, e um quadro final, respondendo seis questões básicas, mas

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fundamentais nesta pesquisa, base para a elaboração de um manual de

jornalismo na era digital.

Para os autores, pelo que se depurou, o jornalismo na era digital se

mostra como um desafio para os profissionais do século XXI, por conter

elementos que pedem (e ao mesmo tempo forçam) mudanças nas práticas e

rotinas, havendo assim, desta forma, espaço para a edição de um manual de

jornalismo com esse viés. A internet tira os jornalistas da zona de conforto,

abre novos horizontes, dialoga com os princípios e fundamentos do jornalismo

e exige dos profissionais uma compreensão sistêmica, acompanhada de

práticas, de como se opera numa sociedade conectada e globalizada, como a

descrita por Castells (1999) e Bauman (1999), na qual as pessoas estão

interligadas num espaço sem fronteiras e se movem por meio de redes

complexas onde a troca de informações é uma constante.

Os princípios e fundamentos do jornalismo, traduzidos por Traquina

(2012), Wolf (1987) e Karam (2009), como esquemas ético-deontológicos

apoiados por valores-notícia, devem permanecer presentes no jornalismo

praticado no ambiente digital. Apesar de não serem imutáveis, fazem parte de

uma história construída coletivamente pelos profissionais há mais de 150 anos

e reforçam o valor e o papel dos jornalistas, como detentores de saberes na

elaboração da notícia, matéria-prima no processo de informar o mais próximo

possível da verdade.

O modus operandi da profissão, por outro lado, se altera com a internet.

O que aparece são mudanças no processo de fazer o jornalismo, se

comparado com o praticado nos meios tradicionais (rádio, tevê e jornal), como

mostram Ferrari (2012), Prado (2011) e Recuero (2009) ao alertar sobre a

necessidade de se trabalhar com vários tipos de mídia, com visão

multidisciplinar associada a noções comerciais e de marketing, e conhecer

redes sociais como Facebook, Instagram, Yotube, Twitter, dentre outras. A

memória e a base de dados, ressaltadas por Palacios (2014), Lewis (2014) e

Meyer (2002), facilitam o dia a dia dos jornalistas, que esbarra na busca pela

convergência e na superação da instantaneidade, teorizadas por Jenkins

(2009) e Bradshaw (2014).

A linguagem do jornalismo na era digital também é outra. É marcada

pela hipertextualidade, interatividade e multimidialidade, como ensina

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Salaverría (2005). E mitos, como o da técnica de redação da “pirâmide

invertida”, do “furo” jornalístico e o do papel do jornalista como gatekeeper, na

selação das notícias, características predominantes da imprensa analógica,

perdem força, como descrevem Canavilhas (2014), Bruns (2011) e Genro Filho

(2012) por não caberem mais nesse novo desenho esboçado com a internet.

São inúmeras as reflexões aplicáveis à prática profissional, conforme

apurado nesta pesquisa. Uma delas, sustentada por Wolton (2012) e Salaverría

(2015), é que o valor do jornalismo se expande na era digital, na medida que

atua como um filtro em meio a tantas informações em circulação. Outra

reflexão sinaliza que, em tempos de internet, os receptores – também

chamados nesta pesquisa de públicos ou audiências - assumem um papel mais

ativo, de acordo com Lemos (2013) e Wolton (2012), apesar da existência

ainda de inúmeros desafios relacionados à inclusão digital, como alerta Orozco

(2012). Este empoderamento dos receptores convida os jornalistas a negociar

e a dialogar com outras vozes, segundo Pavlik (2014) e Canavilhas (2014).

Os jornalistas do século XXI precisam conhecer com profundidade as

mídias tradicionais e as novas mídias, com destreza tecnológica e domínio dos

códigos próprios de cada meio (Salaverría, 2015). Por isso, a importância de

um conjunto de saberes ampliado e sustentado, que pode ser enriquecido com

o pensamento computacional, apresentado por Wing (2006) e Pearson (2009),

e que prevê diferentes níveis de abstração, olhar algoritmo e compreensão de

consequências da escala, para a solução de problemas. Esse conhecimento do

todo, além de facilitar e atualizar práticas, ajuda os profissionais a se

prepararem para a próxima onda tecnológica, já que cada meio é uma forma

histórica de cumprir com a função jornalística (Salaverría, 2015).

A seguir, 10 quadros com os conceitos-chave dos autores, matéria-prima

neste processo de análise do conteúdo.

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

1. Manual 1.1.Utilidade O ensino das práticas profissionais exige a elaboração de materiais didáticos (MACHADO, 2007).

Apoio para o desenvolvimento do pensamento reflexivo (BELTRÃO, 1969).

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Difundir conhecimento, propor metodologías, e relevancia por envolver questões prático-teóricas (MACHADO, 2007).

1.2.Formato Simples, direto e flexível (NOGUEIRA, 2010).

Ilustrar com figuras e escrever cada Ação da instrução em um passo distinto (FREDMAN, 2017).

Conter indicações bibliográficas, citações e dados que estimulem o aprofundamento (BELTRÃO, 1969).

1.3.Frequência Baixa produção de manuais na era digital (MACHADO, 2007).

Quadro 3 – Análise de resultado – Base unidade de registro ManualFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

2. Tecnologia 2.1. Sociedade em rede

Transformação de dimensão histórica, quando há integração de vários modos de comunicação em rede interativa (CASTELLS, 1999).

Os procesos dominantes na era da informação estão cada vez mais organizados em torno de redes. Redes constituem a nova morfología social de nossas sociedades e a difusão lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura (CASTELLS, 1999).

A internet móvel com tecnologia ubíqua está, em muitos sentidos, alimentando a concretização do pensamento de Marshall Mcluhan, de uma aldeia global (PAVLIK, 2014).

2.2.Ciberespaço Uma nova liberdade que se vislumbra no ciberespaço eletrônico sustentado, onde a desterritorialização do poder anda de mãos dadas (BAUMAN, 1999).

O portador direto do saber é o ciberespaço, a região dos mundos virtuais (LÈVY, 1999).

O ciberespaço é um ambiente de circulação de discussões pluralistas, reforçando competências e aproveitando o caldo do conhecimento que é gerado dos laços comunitarios (LEMOS, 2013).

O saber está no ciberespaço, num

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mundo de bibliotecas desterritorializadas (LÈVY, 1999).

É na pós-modernidade que a cibercultura se desenvolve por aspectos que congregam evolução e tecnologia e uma cultura social (LEMOS, 2013).

Agimos sem filtro, nem hierarquia e em tempo real (WOLTON, 2102).

O ciberespaço não tem controle centralizado (LEMOS, 2013).

2.3.Globalização As novas tecnologias da informação e comunicação modificam as relações humanas e sociais e dão autonomia para que cada um possa agir de forma libre, sem filtros, sem hierarquia e em tempo real (WOLTON, 2012).

As distâncias já não importam, ao passo que a ideia de uma fronteira geográfica é cada vez mais difícil de se sustentar no mundo real (BAUMAN, 1999).

Quadro 4 – Análise de resultado – Base unidade de registro TecnologiaFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

3. Princípios e fundamentos

3.1.Ética A ética assume preponderância até mesmo em relação ao direito no cenário mutante do ciberespaço no século XXI (LOUM, 2004).

O jornalista não é amigo de seus entrevistados, nem parte das causas que relata (GRADIM, 2000).

As fontes devem ser cultivadas, evitando-se porém a promiscuidade (GRADIM, 2000).

3.2.Valores Constelação de valores associada a um conjunto de normas profissioonais (TRAQUINA, 2012).

Esta constelação, a qual podemos acrescentar outros valores como o rigor, a exatidão, a honestidade e uma noção de equidistância, está consagrada nos códigos deontológicos (TRAQUINA, 2005).

A “objetividade jornalística” esconde uma ideologia burguesa cuja função é reproducir e confirmar relações capitalistas (GENRO FILHO, 2012).

A objetividade ajuda o jornalista a vencer as horas de fechamento

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(PHILIPS, 1976). A objetividade dever ser vista como

um “ritual estratégico”, com procedimentos de rotina capazes de neutralizar eventuais críticas (TUCHMAN, 1978).

Para escapar do subjetivismo, uma verificação dos fatos por meio de estatísticas, avaliações e antecedentes (ROSSI, 1980).

3.3.Credibilidade Uma notícia superficial, incompleta ou descontextualizada causa péssima intenção. É sempre melhor colocá-la no ar com qualidade, mesmo que dez minutos depois dos concorrentes (FERRARI, 2012).

A ideologia do profissionalismo está centrada na ideia de que o membro da profissão deve ter independência e autoridade nas relações de trabalho (ELLIOT, 1978).

A importância de manter a credibilidade leva a um trabalho constante de verificação dos fatos e de avaliação das fontes de Informação (TRAQUINA, 2012).

No calor da luta contra a tirania do tempo, as empresas jornalísticas e os jornalistas não podem fazer esquecer as regras elementares do trabalho, como, por exemplo, a verificação da informação ou o respeito total pela fronteira entre ‘fato’ e ficção’ (TRAQUINA, 2012).

Quadro 5 – Análise de resultado – Base unidade de registro Princípios e fundamentosFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

4. Audiência 4.1.Ação O leitor seleciona o que quer ler, sem determinantes que o induzam a escolher essa ou aquela notícia (LEMOS, 2013).

Um comentário do leitor pelas redes sociais ou pelo e-mail pode conter novas informações, um outro ponto de vista, uma nova pauta (FERRARI, 2012).

A acessibilidade permite acesso

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ilimitado 24/7 a qualquer instante com um receptor ativo cada vez mais conectado (PINHO, 2003).

Os receptores negociam, filtram, hierarquizam, recusam ou aceitam as incontáveis mensagens recebidas (WOLTON, 2011).

Nem a interatividade, nem as possibilidades tecnológicas que lhes são oferecidas às atuais audiências são suficientes para o desenvolvimento de uma sociedade do conhecimento (OROZCO, NAVARRO & GARCÍA MATILLA, 2012).

As pessoas podem ser emisoras e não só receptoras na comunicação (OROZCO, NAVARRO & GARCÍA MATILLA, 2012).

O acesso instrumental à tecnologia, pelos setores sociais, está longe de ser o ideal. O passado político e uma edução mais focada à leitura que à escrita também têm peso no processo, sobretudo entre os latino-americanos onde o autoritarismo e a tevê acostumaram à passividade (OROZCO, NAVARRO & GARCÍA MATILLA, 2012).

4.2.Participação O PC transformou todas as pessoas em produtores e editores, mas foi a internet que converteu todo mundo em distribuidores (ANDERSON, 2006).

Temos menos tecnologia do que poder, mas somos milhões e milhões de olhos vigiando alguns milhares de poderosos (CASTELLS, 1999).

As audiências se tornam usuárias, produtoras e emisoras, uma vez que a interatividade que as novas telas possibilitam ultrapassa mera interação simbólica entre elas (OROZCO, 2009).

4.3. Concorrência A ubiquidade faz nascer um novo tipo de jornalismo, o chamado jornalismo cidadão, que coleta e distribui informação e notícias em tempo real (PAVLIK, 2014).

Os cidadãos equipados com seus smartphones se tornarão, no século XXI, futuros repórteres continuamente engajados na sociedade (PAVLIK, 2014).

O Quinto Poder é um espaço o qual as pessoas acessam não

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apenas para obter informações, mas para contribuir, clicando, postando, comentando, publicando e criando conteúdo (DUTTON, 2011).

Quadro 6 – Análise de resultado – Base unidade de registro AudiênciaFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

5. Novas práticas 5.1.Ferramentas É preciso usar ferramentas especializadas que contabilizem variáveis de modo confiável e que possam cruzar dados para esclarecer os motivos de sucesso ou fracasso de uma história (MONTEIRO, 2017).

É interessante acompanhar veículos concorrentes ou semelhantes, para que se tenha um alvo palpável a perseguir (todo mundo adora um desafio) e também um ponto de referência externo (MONTEIRO, 2017).

O jornalista dificilmente terá os mesmos dados detalhados de outros veículos, mas pode usar informações públicas de empresas como a ComScore (que, além dos dados só fornecidos a clientes, costuma divulgar rankings com dados gerais) ou serviços que estimam tráfego, como SimilarWeb, Alexa ou Semrush (todos com dados gratuitos e versões pagas mais detalhadas) (MONTEIRO, 2017).

5.2.Multitarefa Quem é capaz de mexer em varias mídias ao mesmo tempo e, além disso, escrever corretamente, e em português culto, tem grandes chances de se tornar um ciberjornalista (FERRARI, 2012).

O jornalista contemporâneo, que se dedica ao ofício na internet, desempenha muitas tarefas ao mesmo tempo porque, de acordo com o novo modelo de produção de notícias web, todo o processo está sob a sua responsabilidade: coleta, administração, filtro, edição, publicação e repercussão

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(MARTINEZ, 2014).

5.3.Paradigmas A mão de obra só pode tornar-se realmente flexível se os empregados, efetivos ou em perspectiva, perderem hábitos adquiridos do trabalho quotidiano (BAUMAN, 1999).

A multimídia abre uma outra história da comunicação, do trabalho, das relações pessoais, dos serviços…(WOLTON, 2012).

A revolução do século XXI não é a da informação, mas a da comunicação. Não é a da mensagem, mas a da relação. Não é a da produção e da distribuição da informação por meio de tecnologías sofisticadas, mas a das condições de sua aceitação ou de sua recusa pelos milhões de receptores, todos sempre diferentes e raramente em sintonia com os emissores (WOLTON, 2011).

Quadro 7 – Análise de resultado – Base unidade de registro Novas práticasFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

6. Profissão 6.1.Sobrevivência O acesso direto, conferido pela internet, não muda em nada a divisão e a hierarquia dos conhecimentos, da qual os jornalistas fazem parte (WOLTON, 2012).

Os jornalistas precisam repensar suas rotinas se quiserem trabalhar em ambientes de multiplataformas (SALAVERRÌA, 2015).

O jornalista precisa compreender duas mídias, as velhas e as novas (WOLTON, 2012).

O jornalismo continua relevante para traduzir aquelas informações mais complexas aos cidadãos (KARAM, 2010).

O jornalista deve dominar os códigos de cada meio e valer-se das possibilidades do hipertexto e dos conteúdos interativos e multimídia (SALAVERRÍA, 2015).

O jornalista precisa demonstrar

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vontade permanente em se reciclar, como é recorrente em outras profissões, e valer-se das vantagens oferecidas pelas novas tecnologias (SALAVERRÌA, 2015).

O jornalista tem preparo e capacidade para oferecer mensagens precisas, claras e contextualizadas por quaisquer suportes tecnológicos (KARAM 2010).

O jornalismo é simultaneamente gerador de informação e productos de conhecimento. Os jornalistas são especialistas, conhecedores, portadores de conhecimento (KARAM, 2010).

Há otimismo em relação à sobrevivência do jornalismo. A partir do caos, emergirá como algo novo (PRADO, 2011).

O papel do jornalismo, senão mais aquele de "dar" a notícia, é aquele de prover a legitimação e o aprofundamento das informações, ancorado na credibilidade e em seu papel social (RECUERO, 2011).

O jornalismo continua a deter o "lugar de fala" da credibilidade, que é alargado aos veículos jornalísticos e, em menor medida, aos jornalistas (RECUERO, 2011).

6.2.Reinvenção Além da necessidade de trabalhar com varios tipos de mídia, é preciso desenvolver visão multidisciplinar, com noções comerciais e de marketing (FERRARI, 2012).

O jornalista precisa se adaptar aos novos tempos de superabundância de informações, devendo atuar como intérprete de dados, um filtro (SALAVERRÍA, 2015).

Não se podem operar meios do século XXI com rotinas profissionais do século XX (SALAVERRÍA, 2015).

Se o jornalismo não mais dá o furo da notícia, a ele cabe o aprofundamento e a seleção das informações que serão apresentadas, a filtragem e o desenho do espaço social (RECUERO, 2011).

Redefinir os modos de informar para seguir cumprindo uma função que a sociedade precisa (SALAVERRÍA, 2015).

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Pensar algoritmicamente, criar e fazer uso de diferentes níveis de abstração, para entender e resolver problemas de forma eficaz (PEARSON, 2009).

O pensamento computacional envolve a resolução de problemas baseando-se em conceitos fundamentais da ciência da computação (WING, 2006).

Não estou dizendo que os jornalistas precisam se tornar programadores. Mas precisam ser capazes de raciocinar abstratamente sobre o que fazem (PEARSON, 2009).

O pensamento computacional será uma realidade quando for tão integral aos esforços humanos que desaparecerá como filosofia explícita (WING, 2006).

6.3.Crise A digitalização, pela qual vem passando as empresas de comunicação, nos últimos 25 anos, internacionalizou os mercados de comunicação fazendo com que empresas tradicionais perdessem em competitividade e aumentando a oferta informativa, boa parte dela gratuita (SALAVERRÌA, 2015).

A crise econômica de 2008 reduziu o poder aquisitivo dos cidadãos, que cortaram gastos com entretenimento, e o investimento das empresas em anúncios publicitários, por exemplo (SALAVERRÌA, 2015).

Quase todas as empresas jornalísticas fizeram cortes que levaram ao fechamento de títulos e publicações (SALAVERRÍA, 2015).

Quadro 8 – Análise de resultado – Base unidade de registro ProfissãoFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

7. Notícia 7.1.Valores-notícia Notícia é um texto jornalístico sobre fatos recentes, verídicos

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e com novidades que geram um clima de opinião pública assim que publicados por meios de comunicação de massa (TURMO 7 LASSA, 2009).

Precisamos decidir por nós mesmos o que as chamadas notícias valem a pena, não apenas nos permitimos ser submetidos a uma infinidade de assaltos à mídia não filtrada. Estamos em perigo de perder a história por causa do barulho (LAUFER, 2013).

Os valores-notícia de seleção referem-se aos critérios que os jornalistas utilizam na seleção dos acontecimentos, isto é, na decisão de escolher um acontecimento como candidato à sua transformação em notícia (WOLF, 1987).

Dentre os valores-notícia de seleção estão morte, notoriedade, proximidade, relevância, novidade, tempo, a notabilidade, o inesperado… (TRAQUINA, 2008).

Valores-notícia são elemento básico da cultura jornalística que os membros desta comunidade interpretativa partilham (TRAQUINA, 2008).

Diante do comportamento verificado junto aos receptores que também passam a filtrar o que lhes interessam em meio à enxurrada de informações na web, o percurso da notícia se altera colocando em xeque conceitos como o gatekeeping (CANAVILHAS, 2010).

O antigo monopólio de gatekeeping mantido pela mídia de massa tem sido desafiado pela nova prática de gatewatching: feita pelos blogueiros individuais e pelas comunidades de comentaristas que fazem uma espécie de curation e avaliam as notícias e outras informações fornecidas pelas fontes oficiais, e assim prestam um serviço importante (BRUNS, 2011).

7.2.Instantaneidade Informação instantaneamente disponível em todo o planeta, tanto na teoria como na prática

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(BAUMAN, 1999). Jornalismo como “relatos

atuais sobre acontecimentos atuais” (WEAVER, 1993).

Nos anos 2000 os portais prometem publicar uma notícia por minuto, criando um “labirinto informacional” que modificou a técnica até então utilizada para construir a notícia (MARTINEZ, 2014).

A internet limitou, restringiu o trabalho jornalístico porque os jornalistas não apuram mais, mas trocam informações entre si e buscam informações na própria rede. As entrevistas estão sendo deixadas de lado, em nome da tão perseguida agilidade (OLIVEIRA e MAURIQUE, 2011).

O ciberespaço acolhe um tempo diferenciado, qualitativamente outro, qual seja, o tempo real. E que proporciona aos usuários uma forma de tempo e espaço diferenciados através de artefatos tecnológicos digitais (LEMOS, 2013).

A instantaneidade em rede é uma instantaneidade não apenas em publicar, mas também em consumir, e, sobretudo, em distribuir notícias (BRADSHAW, 2014).

Não é suficiente falar apenas em “velocidade”. Imediaticidade seria uma melhor palavra a ser empregada. Esta é uma qualidade que se faz sentir em todas as notícias, em que os usuários podem agora ultrapassar o jornalista (BRADSHAW, 2014).

As apresentações de notícias quase histéricas - nas emisoras de tevê e na internet - podem levar-nos a acreditar que a informação que está sendo imposta a nós é fundamental saber agora (e ouvir e ver repetidamente), embora ela possa garantir algumas linhas nas últimas páginas do jornal que chegará até as pessoas amanhã (LAUFER, 2013).

7.3.Apuração gradual A notícia não precisava, com a

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internet, estar pronta para ser publicada. As regras básicas de apuração, dentre as quais cruzar informações entre fontes e ouvir o outro lado em questões polêmicas, foram sendo flexibilizadas em nome de “o importante é sair na frente” (MARTINEZ, 2014).

A cada novo título, a notícia se completava e se atualizava, o que ainda ocorre atualmente. O problema é que esta técnica requer atenção redobrada devido à sua relativa eficiência, já que, ao final do dia, uma pessoa que queira acompanhar a cobertura jornalística de determinado evento pode se deparar com “retalhos”, migrando, por conta disso, para mídias tradicionais a hora de se informar (MARTINEZ, 2014).

Às vezes, o ciberleitor clica em uma notícia que acabou de acontecer e que, portanto, tem apenas um ou dois parágrafos. Ele passa a acreditar que aquilo é tudo, ou incorpora a maneira como o texto foi exibido, assumindo o parcial como a totalidade (MARTINEZ, 2014).

Deixar transparente o processo noticioso, informando ao leitor os próximos passos ou capítulos de uma história que se desenrola pode ser uma maneira, próxima aos recursos da tevê, de educar o leitor para entender o processo de construção da mensagem. Não há vergonha nenhuma nisso (MARTINEZ, 2014).

Para o ciberjornalista, é recomendável sempre manter a notícia mais importante na cabeça, na liderança da página, porque os leitores raramente visitam o site mais de uma vez por dia (DUBE, 2003).

Quando a notícia é um elemento importante de nosso currículo societário, devemos evitar fragmentos e esperar por relatórios detalhados e análise ponderada, uma vez que os fatos críticos são verificados

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(LAUFER, 2013).

Quadro 9 – Análise de resultado – Base unidade de registro NotíciaFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

8. Linguagem 8.1.Multimidialidade O internauta lê, vê, ouve, curte, compartilha, opina, em todas as formas jornalísticas na mesma página formando o jornalismo multimídia: áudio, imagen, vídeo, texto, infográficos animados (PRADO, 2011).

A multimidialidade faz parte da natureza humana e está relacionada aos sentidos: tato, olfato, paladar, audição e visão. O homem que há 30.000 anos habitava nas cavernas já era um comunicador multimídia (SALAVERRÍA, 2014).

Todos os conteúdos que contam com pelo menos dois tipos de linguagem associados entre si são, por natureza, multimídia. Dito de outro modo, qualquer mensagem que não seja monomídia é multimídia (SALAVERRÍA, 2014).

8.2.Interatividade A relação estabelecida entre humano-computador descreve a interação do homem com a máquina, e computador – humano, o computador cria a interatividade com o homem, instituindo assim a troca de experiências entre homem e máquina, supondo as relações de contato entre ambos (GOBBI & BERNARDINI, 2013).

O telefone é um meio frio, ou de baixa definição, porque ao ouvido é fornecida uma magra quantidade de Informação, enquanto que os meios quentes não deixam muita coisa a ser preenchida ou completada pela audiência (MCLUHAN, 1964).

O jornalista e o leitor, produtor e o consumidor, a fonte e o

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receptor, entre muitos outros, começaram a trocar de papéis e lugares de forma efetiva, assim como os sistemas e as mídias se alteraram, agregando novas possibilidades e diferentes graus de interatividade (GOBBI & BERNARDINI, 2013).

Os diálogos entre os autores de notícias e seus públicos estão mais efetivos e a troca é mútua, até porque os públicos também atuam como autores de notícias (CANAVILHAS, 2014).

No webjornalismo, a relação pode ser imediata. A própria natureza do meio permite que o webleitor interaja no imediato (CANAVILHAS, 2005).

8.3.Hipertextualidade O texto que leva a outro texto e a outro, por meio de links (PRADO, 2011).

Na web, o texto, mais do que um mero conjunto de palavras ou frases organizadas, transforma-se numa tessitura informativa formada por um conjunto de blocos informativos ligados através de hiperligações (links), ou seja, num hipertexto (CANAVILHAS, 2014).

Essa ideia de fragmentação (atomização) de texto, e as muitas possibilidades de leitura oferecidas, podem transformar o texto num caos (LANDOW, 1995).

A notícia importante funcionaria como o “tronco” de uma “árvore informacional” (MARTINEZ, 2014).

A coerência local refere-se à relação entre dois blocos informativos próximos, podendo ser “intratextual” (regras de sintaxe e semântica de qualquer texto) ou “intertextual” (coerência na forma como se ligam os blocos informativos lidos) (CANAVILHAS, 2014).

O texto pode ficar entre o impresso e o de tevê, sendo mais literal e escrito na voz ativa, nunca na voz passiva (DUBE, 2003).

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Outras velhas máximas do jornalismo permanecem, como concisão, uso de verbos de ação e substantivos, em vez de adjetivos. Também é preciso lembrar que, de uma forma geral, o usuário de portais aceita o uso do humor (e nunca do desleixo) bem mais que do que em outras plataformas ou veículos (DUBE, 2003).

Quadro 10 – Análise de resultado – Base unidade de registro LinguagemFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

9. Convergência 9.1.Velhas e novas mídias

O público diferencia a comunicação na internet da mídia tradicional, que supõe a construção prévia do público (WOLTON, 2012).

O que explica a diferença da sedução da net cuja utopia consiste, ao contrário, não construir a priori esse público, uma vez que pode estar em qualquer lugar do mundo (WOLTON, 2012).

As mídias generalistas, como a tevê, não estão condenadas pelo multimídia (WOLTON, 2013).

As mídias tradicionais representam mais uma escala coletiva da comunicação, portanto mais complexa de que a escala individual à qual se encaixam as novas tecnologias (WOLTON, 2013).

Ao modelo “Um-Todos” dos meios tradicionais opõe-se o “Todos-Todos”, ou seja, a forma descentralizada e universal de circulação das informações (LEMOS, 2013).

A convergência jornalística é uma oportunidade para transformar uma organização de empresas jornalísticas do século XX em empresas informativas do século XXI (SALAVERRÍA e NEGREDO, 2008).

9.2.Fluxo de conteúdo

As empresas tiveram de acelerar o fluxo dos seus conteúdos e viram consumidores participar mais da sua cultura (JENKINS, 2009).

Convergência é o fluxo de conteúdos através de múltiplas plataformas de

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mídia (JENKINS, 2009). Convergência define mudanças

tecnológicas, industriais, culturais e sociais no modo como as mídias circulam em nossa cultura (JENKINS, 2009).

Com a internet, o fenômeno da convergência chegou com força nas indústrias midiáticas, tornando imprecisas as fronteiras entre os meios de comunicação (JENKINS, 2009).

Um único meio físico – sejam fios, cabos ou ondas – pode transportar serviços que no passado eram oferecidos separadamente. De modo inverso, um serviço que no passado era oferecido por um único meio – seja a radiodifusão, a imprensa ou a telefonia – agora pode ser oferecido de várias formas físicas diferentes (JENKINS, 2009).

Convergência não deve ser compreendida apenas como um processo tecnológico que une múltiplas funções dentro dos mesmos aparelhos. Em vez disso, a convergência representa uma transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos de mídia dispersos (JENKINS, 2009).

9.3.Redes sociais

As Redes Sociais (Facebook, Twitter, Instagram, Youtube, dentre outros) deram a vazão que as informações e as notícias jornalísticas precisavam para se disseminar no ciberespaço (RECUERO 2009).

As redes sociais na internet, apesar de todo o potencial colaborativo de produção de informação continuam dando ao jornalismo a credibilidade e construindo uma função de legitimação das notícias (RECUERO, 2011).

Quadro 11 – Análise de resultado – Base unidade de registro ConvergênciaFonte: Autor

Unidade de registro Variáveis Conceitos-chave dos autores

10. Informação 10.1.Análise de Quando a informação era

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dados escassa, a maior parte dos esforços dos jornalistas era reunir dados. Agora que a informação é abundante, processa-la tornou-se mais importante (MEYER, 2002).

No jornalismo com base de dados, o repórter busca padrões, tendências e fenómenos agora identificáveis (LÓPEZ, 2017).

O jornalismo se expande em meio à abundancia de dados, exploração computacional e ênfase algoritmica (LEWIS, 2014).

O deafio dos repórteres de uma equipe de jornalismo de dados não está em aprender a usar as ferramentas digitais mais sofisticadas, mas pensar de maneira diferente sobre os problemas que devem ser investigados para construir novas maneiras de perguntar, de buscar Informação, formular hipóteses e métodos de trabalho (LÓPEZ, 2017).

O desenvolvimento de grandes dados pode ter efeitos transformadores, um significado para as formas de conhecimento do jornalismo e de fazer, bem como uma negociação de valor e valores éticos (LEWIS & WESTLUND, 2014).

10.2.Memória Com a crescente facilidade de consultas e apropriação de informações em bases de dados internas e externas ao veículo, alargando as oportunidades de incorporação de memória como elemento de criação de contexto e aprofundamento à cobertura jornalística (PALACIOS, 2014).

Uma importante consequência desse crescente potencial para o uso de recursos de memória verifica-se na estruturação e edição dos textos jornalísticos (PALACIOS, 2014).

10.3.Potencial de consumo

A democratização das ferramentas de distribuição reduziu o custo do consumo (ANDERSON, 2006).

A notícia é a informação

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transformada em mercadoria, numa economia capitalista na qual consumir notícias faz parte da lógica de mercado (GENRO FILHO, 2012).

O consumo de notícias aumentou, assim como o hábito de compartilhar, e o comportamento consumidor continua em transformação (BRADSHAW, 2014).

O valor da informação varia de acordo com os indivíduos, as necessidades e o contexto em que é produzida e compartilhada. Uma informação pode ser relevante para um indivíduo e não para outro (SERRA, 2007).

Quadro 12 – Análise de resultado – Base unidade de registro InformaçãoFonte: Autor

A seguir, um quadro-resumo, conforme modelo teorizado por Moraes

(1999), para tornar mais didática a compreensão.

Quem fala? Cinquenta autores especializados em jornalismo, comunicação, internet e manuais, por meio de 61 documentos em forma de texto (livros, artigos científicos, e-book e matéria jornalística).

Para dizer o quê? Eles falam sobre a internet, e seu impacto nas rotinas e práticas jornalísticas, assim como sobre os desafios e oportunidades desse novo cenário, abrindo espaço para se discutir a elaboração de um manual de jornalismo na era digital.

A quem? Os autores se dirigem sobretudo aos jornalistas do século XXI, impactados de forma positiva – ou não – por essas mudanças.

De que modo? Por meio da defesa de diversas teorias e pontos de vista, com base em conceitos teóricos e também em experiências práticas.

Com que finalidade? Contribuir com o debate sobre o tema e ajudar os jornalistas a repensar a profissão, estabelecida como tal há mais de 150 anos e com uma história influenciada por ondas tecnológicas.

Com que resultados Os resultados, como é possível observar por meio do texto interpretativo e dos quadros cruzando unidades de registro, variáveis e conceitos-chave dos autores, reproduzidos mais acima, indicam, de uma forma geral, a importância de se compreender o jornalismo na era digital. Nesta pesquisa, a sugestão é a produção de um manual com elementos orientativos em relação ao contexto que se coloca.

Quadro 13 - Classificação de LaswellFonte: Moraes (1999)

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CONCLUSÕES GERAIS

A reinvenção do jornalismo na era digital passa por algumas etapas

envolvendo as rotinas, os processos, os princípios e fundamentos e o que se

projeta e espera da profissão nos próximos anos. A questão verificada nesta

pesquisa é que o jornalismo, como profissão, não perde espaço. Pelo contrário,

é um ofício que ganha em possibilidades.

O resultado dessa equação depende dos caminhos a serem seguidos

pelos profissionais e pelas empresas jornalísticas, o que, num cenário otimista,

pode representar ganho em notoriedade e reafirmação do papel social do

jornalismo, que é informar por meio de notícias intelectualmente apuradas,

produzidas, disseminadas e repercutidas.

A profissão precisa manter-se atual, fiel aos códigos ético-deontológicos,

deve acompanhar os avanços da tecnologia absorvidos pelas audiências, mas

precisa, sobretudo, estar alinhada aos anseios da sociedade, a razão da sua

existência. A internet abriu um campo para o novo. Uma onda tecnológica

como a já enfrentada pela profissão em outros momentos.

Esta pesquisa mostra que a discussão não se encerra aqui, mas

estimula a busca por mais conhecimento e estabelece um marco, no espaço e

no tempo, que ajuda a compreender o jornalismo na era digital como processo

próprio em constante transformação, influenciado pela tecnologia.

RECOMENDAÇÕES

Com base nesta pesquisa, recomenda-se que, quanto ao seu conteúdo,

o Manual de boas práticas e de orientação para a apuração, construção e

divulgação da notícia em tempo real seja disposto em capítulos, conforme a

estrutura utilizada na análise de conteúdo dos autores, qual seja: Manual;

Tecnologia; Princípios e fundamentos; Audiência; Novas práticas; Profissão;

Notícia; Linguagem; Convergência; e Informação.

As variáveis, utilizadas para medir as unidades de registro (ver capítulo

Variáveis), podem atuar como subtítulos do manual. Por exemplo, no capítulo

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Notícia, o debate e as orientações do manual ficariam em torno dos subtemas

Valores-notícia, Instantaneidade e Apuração gradual. Já em Convergência, a

circunscrição englobaría Velhas e novas mídias, Fluxo de conteúdo e Redes

sociais. E assim por diante.

Quanto à linguagem empregada no manual, a recomendação é que se

opte pela simplicidade, haja vista que será manuseada tanto por profissionais

já no mercado; por futuros profissionais e pelo universo acadêmico entre

docentes e alunos de jornalismo, aliada ao uso de conceitos, sustentados por

exemplos práticos. É importante que se dê nome aos autores de termos em

uso no jornalismo da era digital, como reconhecimento e parte de um processo

de aprendizagem, contribuindo, de certa forma, para uma aproximação cada

vez maior entre academia e mercado.

Os capítulos Profissão e Novas práticas merecem um tratamento

editorial de destaque, no manual, por envolverem orientações e reflexões em

questões de alto impacto, uma delas em relação ao futuro do jornalismo como

atividade profissional alterada com a internet (traduzida pelas variáveis

Sobrevivência, Reinvenção e Crise), e outra questão, sobre o que mudou na

prática (Ferramentas, Multitarefa e Quebra de paradigmas).

Também recomendá-se a inclusão de um glossário sobre a definição

dos termos usuais de internet e expressos no decorrer do referencial teórico,

para rápido entendimento e localização dos leitores.

Por fim, recomendá-se a utilização, com adaptações, do texto produzido

nesta pesquisa. O manual como um todo deve despertar o interesse dos

leitores, estimulando-os a buscar mais informações e elementos para a

formação de sua convicção, haja vista que o jornalismo na era digital é

mutável. O que hoje é uma regra, amanhã pode não ser mais.

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