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Zoom // Ensino Superior
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Estatuto de Estudante Internacional (EEI)
Universidade. Da Austrália, ao Curdistão iraquiano, passando pela Líbia
Portugal já não é só um país de sol e praia. As universidades estão cada vez mais na rota dos estrangeiros que vêm não só para estudar como também para descobrir o mundo
MELISSA LOPES melissa.lopes(ajonline.pt
Hawreen Ahrned não tinha qualquer informação sobre o país que escolheu para estudar. Só depois de uma pesqui-sa no Google é que ficou a conhecer a localização de Portugal no mapa. Quan-do a "oportunidade de fazer um inter-câmbio surgiu", a iraquiana optou por um destino diferente do da maioria dos seus amigos, que foram para o Reino Unido e Estados Unidos. "Vim porque
gosto de arriscar", justifica, entre risos. Hawreen partiu de um país destruído pela guerra para um que lhe era com-pletamente estranho.
Assim que chegou, o "primeiro grande choque" foi ver que os portugueses não tinham a aparência que pensara. "No Médio Oriente julgamos que os europeus são todos loiros e de olhos azúis, mas quando cheguei apercebi-me que os por-tugueses até são parecidos aos iraquia-nos, morenos e de olhos castanhos". As semelhanças físicas são tantas que toda a gente se dirige a si convicta de que é portuguesa.
Hawreen é a primeira mulher cur-do-iraquiana a tirar um doutoramen-to em Portugal e a experiência tem sido muito boa. "'É o país mais pacífico que conheci até hoje", confessa a estudan-te que veio já há dois anos para estu-dar Engenharia Civil. no Instituto Supe-rior Técnico. No início. conta, "tinha muito cuidado na forma como falava e como agia", porque sabia que poderia existir um estereótipo de que os ira-quianos são agressivos. Com o tempo, começou a comportar-se naturalmen-te, adaptando-se facilmente às pessoas
O que é o EEI? Um estatuto, publicado em Diário da República a 10 de Março do ano passado, que permite aos estudantes estrangeiros terem acesso a um concurso especial de acesso ao ensino superior português, candidatando-se sem passar pelas provas de ingresso que os estudantes nacionais
Quais são as novidades do EEI? Os estudantes admitidos através deste estatuto não são considerados no âmbito do financiamento público das instituições de ensino superior. Em contrapartida, e esta é a principal alteração introduzida pelo EEI, as universidades e politécnicos podem fixar o limite máximo do valor das propinas para estes estudantes, tendo em consideração "o custo real da formação". Foi a primeira vez que Portugal regulamentou sibre o estatuto dos alunos que vêm de fora e que se conferiu autonomia às instituições.
Quem está abrangido pelo estatuto de aluno internacional? Todos os alunos que não tenham nacionalidade europeia e que não pertencem aos países de língua oficial portuguesa. Os que, não sendo nacionais de um Estado-membro da UE, mas que residam legalmente em Portugal há mais de dois anos, de forma interrupta, assim como os filhos que residem com eles, não são abrangidos pelo EEI. Para os alunos oriundos de países africanos de expressão oficial portuguesa (PALOP) é criado um programa especial de bolsas de estudo.
Que instituições de ensino podem ter alunos EEI? Todas as instituições de ensino superior, quer sejam públicas ou privadas. Com excepção da Universidade Aberta e das escolas de ensino superior militar e policial.
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e à universidade. "E Sintra... Sintra tem um lugar especial no coração. Faz-me lembrar o cheiro fresco das montanhas do meu país, no norte do Iraque", sus-pira.
A história dc vida de Hawreen con-funde-se com a de muitos curdos, um povo que tem sido perseguido "desde sempre" naquele país. "A minha famí-lia sempre foi vítima de guerras: perdi o meu pai e três tios. Lutamos para sobreviver, para nos defendermos. Mas não faço da minha história um caso especial, porque muitas outras famílias passaram e passam pelo mesmo. É o normal", explica, acrescentando que as lutas travadas no seu país envolvem sempre interesses económicos - e a reli-gião é apenas um embuste - de todo o lado, motivados pelo petrólero. "O Ira-que é como uma mesa de onde todos comem", lamenta a jovem. Hawreen conta ainda que o facto de estar a estu-dar longe de casa fé-la perceber o quão atrasado, a vários níveis, é o seu país. "Sinto isso na pele todos os dias".
Agora, q principal problema do Iraque, resume, é que não se consegue "repro-gramar o cérebro de alguém que viveu
uma guerra", nem tão pouco se conse-guem "sarar feridas de quem perdeu tudo". "Imagina alguém que perdeu a família, a casa e o emprego, e que é pos-ta de parte pelo governo, depois dos EUA terem deixado tudo destruído. E depois há um grupo [ISIS] que te aceita e que te promete um futuro". É assim que Hawreen olha para o crescimento do autoproclamado Estado ISlâmico, a actual grande ameaça do povo curdistão. "Há muita revolta e espírito de vingança. E armas à disposição...". Sobre a crise dos refugiados do Médio Oriente, Hawreen diz-nos que apesár de se ter intensifica-do agpra, aqueles movimentos migrató-rios sempre existiram. "São pessoas que estão fartas dos regimes políticos onde vivem e que procuram uma vida melhor, e têm esse direito", responde de forma assertiva.
A mágoa de Hawreen não a faz, porém, desistir do seu país. E, embora não sai-ba o que o "futuro lhe reserva", quando terminar os estudos, pensa regressar e tornar-se professora universitária. "Há três anos estava longe de imaginar que iria estudar num país europeu. E agora aqui estou a conversar contigo".
GEORDIE, HAWREEN E SAAD O bom tempo e a hospitalidade dos portugueses são o que de melhor encontram em Portugal. A baixa pombalina, o rio e a noite segura também são características que colocariam num cartão de visita da cidade que escolheram para estudar MANUEL VICENTE
DO OUTRO LADO DO MUNDO Ao contrá-rio de Hawreen. Geordie já conhecia bem Portugal e os portugueses. Antes de se lançar no mestrado de Engenharia Naval. também no IST. jogou rugby por cá. duran-te dois anos. "Apercebi-me que não esta-va feliz com as perspectivas do primei-ro curso que tirei, em Engenharia Mecâ-nica Percebi que tinha de me especializar nalguma coisa", conta-nos, confessando que o "interesse por barcos e navegação" o fizeram querer ficar mais tempo em terras lusas.
Apesar de pagar uma propina anual de 7000 euros, sete vezes mais do que os estudantes europeus pagam, Geordie acaba por pagar um preço muito infe-rior ao que é praticado na Austrália Adap-tou-se "perfeitamente" ao mundo acadé-mico, embora reconheça que fora da uni-versidade, em casa, as coisas não sejam assim tão simples para quem estuda nou-tro país: o apoio da familia e dos amigos mais chegados é o que mais falta lhe faz. Mesmo assim, não tem qualquer dúvi-da de que a experiência tem contribuí-do, e muito, para o crescimento pessoal. "As vantagens superam largamente as desvantagens". Espera terminar o cur-so dentro de dois anos e, depois disso, procurar por oportunidades de trabalho, não necessariamente em Portugal ou na Austrália, mas de certeza por esses mares fora. Nessa altura, um pastel de nata e uma bica como pequeno-almoço é uma coisa que vai sentir muita falta, prevê Geordie.
UMA NOIVA A ESPERA Saad Howaiw é líbio e já tinha estudado em Lisboa durante o ano passado. A sua faculdade e o Ins-tituto Superior Técnico tinham um inter-câmbio, mas "infelizmente" esse acordo entre as universidades terminou e tive-ram, ele e os seus colegas, de regressar para a Líbia. Este ano voltou por si só e por isso paga uma propina de sete mil euros anuais, tal como Geordie. Saad con-sidera o custo de vida português barato, comparado com o do seu país. Mas nem tudo são rosas: "Ninguém imagina como é dificil estudar longe da família e ami-gos, e estar sempre preocupado com a segurança na Líbia", desabafa o jovem.
Por outro lado, "vim para aqui para des-envolver o meu conhecimento e desco-brir o mundo. Lisboa é o portão para o meu futuro", sintetiza. Daqui a dois anos, quando terminar o mestrado em Enge-nharia Civil, vai regressar ao país e casar com a namorada, que está à sua espera e de quem tem, naturalmente, muitas saudades. Sobre os portugueses, encon-tra algumas diferenças, mas a que lhe salta mais à vista é a religiosa , ou não viesse Saad de um país islâmico.
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92 GUINÉ-BISSAU
88 UCRÂNIA
86 ESPANHA
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MINJI KANG Está cá há menos de dois meses
mas já sabe o que há-de recomendar: o pastel de nata e o
vinho do Porto. Para quem quer ir à Coreia, garante que irá ficar
surpreendido com a atmosfera, os templos e as lojas de moda
RICARIX)CANIVIA)
MELISSA LOPES melissa.lopes@ionline. pt
Minji Kang soube que queria estudar num país europeu, depois de ter visita-do Londres e Viena. no ano passado. Pen-sou que seria vantajoso estudar num sítio "bonito e calmo", como é o Porto. Com 22 anos, deixa a electrizante capital da Coreia, Seul. para viver uma experiên-cia de vida "mais relaxada", contrastan-do com a do seu país que vive a mil à hora. "Os coreanos levam a vida com muita velocidade", diz.
Minji está no Porto há menos de dois
meses. Veio estudar Engenharia Mecãe-nica no•Instituto Superior de Engenha-ria. Confessa que o plano inicial era ficar só um semestre, mas já está a pensar estender esse período para ficar um ano lectivo completo. porque está mesmo a apreciar a calmaria portuguesa. O Jar-dim das Virtudes é o sítio onde mais gos-ta de ir "para ter um tempo para reflec-tir". Deixa-a "confortável e relaxada".
Minji confirma-nos que Portugal tem de facto andado nas bocas do mundo e que até na Coreia se ouve falar maravi-lhas do país. "Hoje em dia, muitos estu-dantes coreanos querem vir para a Euro-
pa, e em particular para Portugal, por-que querem aproveitar para viajar ao mesmo tempo". Para já, afirma que está a ser "fácil" compreender a matéria que é dada nas aulas, porque os professores falam inglês, mas também porque a tur-ma tem só quatro alunos, espelho da fra-ca adesão que os cursos de engenharia tiveram este ano lectivo. Minji está, no entanto, a frequentar as aulas do primei-ro ano do curso, quando era suposto ir às de segundo e terceiro anos. Não vai porque as aulas destes anos são dadas só em português, que ainda não percebe.
A comunicação é, de resto, a única e grande barreira para Minji. "Muitos por-tugueses falam inglês, mas muitas vezes não conseguimos comunicar. Quando vou às compras é complicado", afirma. No entanto, dos portuenses só tem coisas boas a dizer. "São simpáticos e muito pres-táveis", sublinha. E as vantagens de aqui estar a estudar permanecem inabaláveis. 'Tenho a oportunidade de conhecer outros estudantes estrangeiros, o que não é mui-to comum na Coreia. Depois, ao estudar e ao conversar com eles, posso melhorar o meu inglês". E a cereja em cima do bolo: "Com o tempo, posso aprender a perce-ber o que os portugueses dizem". Essa sim, é a tarefa mais complicada. Para Min-ji, é tão dificil para um coreano aprender português, como um português aprender hangul (alfabeto coreano). É certo que para nós, portugueses, coreano. japonês e chinês parece tudo igual ("isso é tudo chinês", dizemos) mas tecnicamente não é e Minji tem muito orgulho na especifi-cidade da sua língua que considera ser "sofisticada e complexa".
Quem também faz do Porto a sua casa é o indiano Mohamed. Está no mesmo
TOP PAÍSES PORTO
BRASIL
377 ESPANHA
165 ITÁLIA
117 POLÓNIA
70 ALEMANHA
65 REPÚBLICA CHECA
42 FRANÇA
29 TURQUIA
24 ROMÉNIA
18 ESLOVAQUIA
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Universidade do Porto. Uma porta escancarada para o mundo
Entre o primeiro e o segundo semestre do ano, as universidades do Porto esperam receber quatro mil estudantes estrangeiros
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M°. de Fátima Marinho Vice-reitora da Universidade do Ibrto
MOHAMED SHABEER O pôr-do-sol portuense é das
melhores coisas que este indiano já viu. Está a adaptar-se à gastronomia
portuguesa, mas tem um reparo a fazer: falta-lhe condimentos
RICATUX) CASTELO
"Há necessidade de adequar o ensino a realidade multicultural "
curso - Engenharia Mecânica - e na mes-ma turma que Minji. Veio para o Porto porque um amigo alemão lhe falou da enorme reputação da universidade, con-vencendo-o de que tirar uma licenciatu-ra no ISEP seria uma excelente forma de começar uma carreira.
A língua também é um problema para Mohamed. "Apesar do esforço da univer-sidade e dos professores para que tudo se torne mais fácil para os estudantes estrangeiros, ainda há muitas coisas que estão só cm português. E para quem não percebe nada, as primeiras semanas podem ser um grande desafio", explica-
nos, deixando a garantia de que também "está a fazer a sua parte" para aprender português.
Se tivesse de falar Portugal aos seus conterrâneos diria que os portugueses são "muito abertos e simpáticos" e que sabem receber quem vem de fora. Aliás, Mohamed está tão apaixonado pela cida-de que até já convenceu alguns amigos a virem estudar para o Porto. Ainda este ano vão juntar-se mais alunos indianos aos cinquenta que chegaram no primei-ro semestre. Da cidade em si, Mohamed conta que gosta de um sítio perto de São Bento, mesmo ao lado do rio. "Adoro ver
o pôr-do-sol lá. É das coisas mais boni-tas que vi até hoje".
Ao contário da sua colega coreana, que não paga propinas porque há um acordo entre as duas universidades, Mohamed paga uma propina anual de 4500 euros. Mas isso não constitui nenhum proble-ma para Mohamed. Garante que a expe-riência está a ser muito positiva, embora as saudades da família, dos amigos, e até das especiarias da sua terra, já apertem.
Mohamed também pretende ficar um ano no Porto. Depois disso quer aprovei-tar o facto de estar na Europa e viajar tanto quanto possível.
Qual tem sido o impacto da implementação do Estatuto do Estudante Internacional? Dado que o estatuto de estudante internacional só entrou em vigor no ano lectivo passado, ainda é precoce uma análise bem fundamentada. Nos últimos dois anos tem havido uma estabilização do número de estudantes internacionais que procuram a Universidade do Porto para fazer um grau completo.
A nível financeiro foi uma lufada de ar fresco? Em que medida? Para já, não tem sido muito significativo, dado que a Universidade do Porto optou por valores moderados e faz, na sua maioria, uma redução de 50% para os estudantes oriundos da CPLP
Que alterações tiveram de ser feitas para receber alunos estrangeiros? A Universidade do Porto tem acolhido muitos estudantes de mobilidade pelo que as suas estruturas já estão preparadas para lidar com a multiculturalidade inevitável; tem havido também nos últimos anos um esforço em reforçar a formação em inglês, sobretudo ao nível do mestrado e doutoramento.
Qual a importância da multiculturalidade no ensino superior? O beneficio em ter muitos estudantes de diferentes culturas nas mesmas aulas é permitir aos estudantes portugueses, que não têm oportunidade de realizar um período de mobilidade no estrangeiro, o contacto com diferentes línguas, culturas e modos de ser; numa perspectiva mais institucional. Há também a necessidade de a U.Porto adequar as formas de ensino à nova realidade multicultural, enriquecendo-se e enriquecendo os novos paradigmas de educação.
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Alunos estrangeiros. Dar a volta ao mundo nas universidades de Lisboa e Porto // PÁGS. 24-27