yvonne whittal - um erro por amor

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UM ERRO POR AMOR Yvonne Whittal Um erro por amor This one ningth Yvonne Whittal Coleção Sabrina, nº 510 Série Romances Nova Cultural, 1986 Quando Rollo abandonou Sherry, dois anos atrás, não lhe fez nenhuma promessa, não lhe deu nenhuma esperança. Tudo o que lhe deixou foi um bilhete e o filho que ela carregava no ventre. Agora ele estava de volta, furioso e implacável, reclamando seus direitos de pai e obrigando-a a se casar com ele pelo bem do menino. O que seria de Sherry, cheia de desejo e apaixonada, nas mãos, de um homem que se transformara num cínico amargurado?

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  • UM ERRO POR AMOR

    Yvonne Whittal

    Um erro por amor

    This one ningth

    Yvonne Whittal

    Coleo Sabrina, n 510

    Srie

    Romances Nova Cultural, 1986

    Quando Rollo abandonou Sherry, dois anos atrs, no lhe fez

    nenhuma promessa, no lhe deu nenhuma esperana. Tudo o que

    lhe deixou foi um bilhete e o filho que ela carregava no ventre.

    Agora ele estava de volta, furioso e implacvel, reclamando seus

    direitos de pai e obrigando-a a se casar com ele pelo bem do

    menino. O que seria de Sherry, cheia de desejo e apaixonada, nas

    mos, de um homem que se transformara num cnico amargurado?

  • CAPITULO I

    Com os dedos nervosos deslizando sobre a gola do seu uniforme de enfermeira,

    Sherry Jeager falava ao telefone. Do outro lado da linha, Brenda Lewis, sua amiga de

    muitos anos, a convidava para uma festa.

    - Eu sinto muito, querida. Mas no posso ir.

    - O que voc quer dizer com no posso? Voc tem de vir, Sherry! meu

    vigsimo primeiro aniversrio, e fao questo que voc participe insistiu Brenda,

    decepcionada.

    Sherry respirou fundo, um tanto desanimada. Ela j sabia como eram as festinhas

    de Brenda, e a simples idia de tomar parte de uma algazarra daquelas a fazia sentir-se

    mal. Principalmente porque uma pessoa querida, que estivera sob seus cuidados, morrer

    naquela manh. Preferia ficar em casa noite e, finalmente sozinha, dar vazo s lgrimas

    que contivera durante todo o dia.

    Por outro lado, tornava-se difcil recusar o convite de Brenda, justamente no seu

    aniversrio.

    - Est bem, Brenda. Eu irei concordou Sherry, com relutncia, pondo fim

    conversa, assim que a chefe das enfermeiras entrou na sala de descanso.

    - A famlia do Sr. Peterson est na recepo. Eles vieram buscar os objetos

    pessoais dele informou a Sra. Naude. Voc cuida disso, enfermeira Jeager?

    Sherry assentiu com a cabea, tensa pela tarefa desagradvel que teria que

    desempenhar, e retirando-se logo em seguida. Um homem morreu, pensou ela,

    abatida, enquanto caminhava pelo corredor. Mas a vida continua como se nada tivesse

    acontecido. A famlia do Sr. Peterson deve estar lamentando sua passagem, mas a rotina

    do Hospital Geral da Cidade do Cabo no mudar.

    Aps cinco anos de enfermagem, ela ainda se perguntava, em momentos como

    aquele, se escolhera a profisso certa. Com um suspiro foi atender o pedido da chefe.

    Propositalmente, Sherry chegou bastante atrasada festa da amiga, para evitar o

    tumulto do incio. O barulho que ouviu ao chegar porta do apartamento quase a fez

    voltar atrs. Entretanto, criando coragem, Sherry entrou, sentindo-se logo aturdida pelo

  • som ensurdecedor da msica. Era incrvel que os vizinhos jamais tivessem reclamado. O

    som estava to alto que o cho vibrava sob seus ps.

    Sherry olhou ao redor, apreensiva, tentando reconhecer rostos familiares, mas, no

    meio de tanta baguna, era quase impossvel conseguir cumprimentar algum. Poe isso,

    foi com grande alvio que ela vislumbrou Brenda aproximar-se, trajando um belo vestido

    verde que contrastava com o tom de sua pele e com seus cabelos sedosos.

    - Pensei que voc no viria mais! gritou Brenda, tentando se fazer ouvir,

    enquanto recebia o presente e os cumprimentos de Sherry. Tenho algo para contar-

    lhe! E puxou-a para um aposento mais tranqilo a fim de conversar a ss.

    A alegria e o brilho no olhos de Brenda eram evidentes demais para que Sherry

    no os percebesse.

    - No me diga que voc est grvida, Brenda!

    - Estou confirmou ela sorrindo. Mas no era s isso que eu queria dizer-lhe.

    Jonathan e eu nos casamos hoje, de manh. Portanto, esta uma tripla comemorao.

    - Oh! Fico to feliz! exclamou Sherry, mais descontrada.

    - Sabia que ficaria! Voc nunca aprovou que Jonathan e eu morssemos juntos

    sem sermos casados, no ?

    - Sei que voc me acha um tanto antiquada.

    - verdade! Mas tambm uma amiga maravilhosa! completou Brenda, fitanto

    o rosto belo e suave de Sherry. por isso que voc a primeira a saber das novidades.

    Emocionada, Sherry no pde conter as lgrimas ao abraar a amiga.

    - Estou muito feliz por voc e por Jonathan!

    - Agora, vamos voltar festa e nos divertir sugeriu Brenda, tambm

    emocionada, reconduzindo Sherry sala. H comida e bebidas nas mesas; ali, naquele

    canto. Sirva-se e fique vontade.

    - Obrigada!

    Sherry estava justamente abrindo caminho por entre as pessoas para pegar uma

    bebida quando Jonathan surgiu sua frente. Sem dizer nada, ele tomou-a nos braos e

    comeou a danar com ela, sem dar-lhe tempo de protestar. Embora no estivesse

    disposta a acompanh-lo naquele rock to agitado, ela ensaiou alguns passos para see

    educada.

    - Brenda j lhe contou as novidades? perguntou Jonathan, aproximando-se mais

    de Sherry para que ela pudesse ouvi-lo.

    - Sim. Meus parabns!

  • - E ento? Isso muda a imagem que fazia de mim?

    - Sempre simpatizei com voc, Jonathan afirmou ela, com honestidade.

    Apenas achava que vocs dois deviam regularizar suas vidas.

    Assim que a msica chegou ao fim, Sherry respirou aliviada, uma vez que seus

    ouvidos j no aguentavam mais tanto barulho. Polidamente, desculpou-se e rumou para

    a outra extremidade da sala, servindo-se de um pouco de vinho. Porm, nem bem tomou

    o primeiro gole, o som estridente das guitarras comeou outra vez. Resolveu ento

    procurar refgio no terrao. No que ali o som fosse menos irritante, mas, pelo menos,

    havia uma brisa fresca, e ela poderia escapar fumaa dos cigarros.

    Para Sherry aquela noite parecia uma tortura infindvel! Recostada parede, de

    quando em quando tomava um gole de vinho, ainda tensa e aborrecida com os

    acontecimentos do dia. Uma mecha dos cabelos castanhos-claros lhe caa sobre os olhos,

    e Sherry puxou-a para trs, irritada. Nesse instante, vislumbrou a figura de um homem

    em p, ao lado da esttua de Vnus que havia no jardim. Engraado!, pensou ela, ele

    no estava ali um segundo atrs. Por alguma razo inexplicvel, Sherry no conseguia

    afastar os olhos do desconhecido.

    Ele tinha cabelos castanhos e crespos, sombrancelhas grossas, lbios sensuais e

    queixo firme. Quando Sherry correu os olhos pelo seu corpo msculo e percebeu o

    quanto era alto, sentiu um friozinho no estmago.

    Como se pressentisse que estava sendo observado, o homem voltou a cabea em

    direo a Sherry e a fitou nos olhos, fazendo-a corar. Para disfarar seu embarao, ela

    sorriu e ergueu o copo oferecendo-lhe vinho.

    Ele agradeceu, mas no fez nenhum movimento para aproximar-se de Sherry. No

    decorrer da festa, porm, Sherry reparou que aquele homem a observava, pois seus

    olhares cruzaram-se vrias vezes.

    Ela servia-se de uma segunda taa de vinho e de alguns salgadinhos, quando

    Brenda aproximou-se, proporcionando-lhe uma tima chance de matar a curiosidade.

    - Quem aquele homem de blazer azul que est l fora Brenda?

    - um amigo de Jonathan. Que conhec-lo?

    - Oh, no! S estava curiosa. No precisa se incomodar Sherry tentou disfarar.

    - Bem, mas, ao que parece, ele vem vindo para c observou Brenda, olhando

    para Sherry com malcia e retirando-se em seguida.

    - Est gostando da festa? ele perguntou. Sua voz era grossa e modulada.

    - Sim Sherry respondeu, sentindo as pernas trmulas e tomando flego.

  • A msica continuava alta, e os convidados danavam animadamente. De repente,

    num movimento mais brusco, algum empurrou Sherry de encontro ao estranho, que

    estava a um passo dela, forando-a a escorar-se nele. O incidente inesperado eliminou a

    distncia entre os dois, e Sherry surpreendeu-se fitando um belo para de olhos azuis. Um

    arrepio percorreu-lhe a espinha. Ela nunca o vira antes, mas tinha a estranha impresso

    de j conhec-lo. Os olhos brilhantes como jias, pareciam t-la hipnotizado e, por alguns

    instantes, Sherry deixou-se envolver por aquele magnetismo.

    O corao ainda batia acelerado no peito quando ele retirou a taa de vinho de

    suas mos trmulas e gentilmente a conduziu pelo brao at a sacada. Sherry sentia as

    palmas das mos suadas, ao suave contato daquele homem, mas acalmou-se diante da

    paisagem que divisava l embaixo: o mar acariciado pelos reflexos dourados da lua cheia.

    Se lhe perguntassem, Sherry no saberia dizer como chegara at ali.

    - Voc est melhor? indagou o estranho, apreensivo.

    Sherry nem ao menos percebera que se sentira mal; mas sem dvida ficar ali fora,

    sentindo aquele ar fresco, propiciava-lhe agradvel sensao.

    - O que aconteceu? quis saber, meio sem jeito, tentando recompor-se.

    - Voc ficou muito plida explicou ele, bem-humorado. Sentiu-se mal ou fiz

    algo que a assustou?

    - No...no sei... respondeu ela, confusa, afastando-se. melhor eu ir embora.

    - Meu nome Rollo Van Cleff apresentou-se ele, abrindo-lhe caminho -, e, se

    isso serve de referncia, Jonathan e eu nos conhecemos desde os tempos da faculdade.

    Uma festa barulhenta como esta no o meu divertimento preferido, mas no seria

    educado de minha parte no comparecer a este aniversrio. No pude deixar de perceber

    que voc tambm no est se divertindo. E baixou os braos, que barravam-lhe a

    passagem.

    - De fato, no estou confessou Sherry, balbuciante, sentindo-se ainda perturbada

    com a proximidade daquele homem alto, de ombros largos. Se ao menos o aroma da

    colnia que ele usava no fosse to embriagante...

    - Qual o seu nome?

    - Sherry Jeager.

    - Sherry repetiu ele, devagar e de forma acariciante. Eu gosto! refinado,

    potico, doce; e combina perfeitamente com voc.

    Havia uma certa intimidade naquele comentrio, que poderia ser perigosa. As

    mos midas de Sherry alisaram nervosamente seu vestido azul de chiffon.

    - Preciso ir agora, Sr. Van...

  • - Rollo corrigiu ele, barrando-lhe a passagem outra vez. Mas acabamos de nos

    conhecer, no vai ficar s mais um pouco?

    - Infelizmente eu tenho que ir! J quase meia-noite!

    - No v me dizer que uma carruagem a espera l fora e vai transformar-se numa

    abbora se voc no sair da festa antes da meia-noite!

    - Quem sabe? respondeu ela, no mesmo tom zombeteiro. Agora se me d

    licena...

    - Sherry... Ele retirou as mos do batente da porta, repousando-as nos ombros

    nus de Sherry. Conheo um caf aqui perto que bem tranqilo.

    Por alguns instantes, Sherry ficou sem ao e sem saber o que falar. Alguma coisa

    lhe dizia para afastar-se daquele homem, que tinha o poder de atra-la tanto...

    - Por favor! Eu preciso ir para casa e...

    - Eles fazem um timo caf, e a casa fica aberta a noite inteira insistiu ele,

    deslizando os dedos pelos ombros dela, numa carcia persuasiva, que lhe esvaa as foras.

    Vamos l! No gostaria de me acompanhar em um cafezinho bem quente? Depois eu a

    levarei para casa, est bem?

    Ela pensou em recusar, mas o barulho irritante que vinha da sala de repente

    pareceu-lhe insuportvel.

    - Esta bem...est bem! Eu aceito!

    - Enquanto voc se despede de seus amigos, eu vou indo na frente. Espero-a na

    porta sugeriu ele, com um sorriso triunfante.

    Com as pernas trpegas, Sherry afastou-se de Rollo, em direo sala, a fim de

    apanhar a sua bolsa. Quando finalmente encontrou Brenda, esta no pde esconder o

    seu descontentamento.

    - No diga que j vai!

    - J tarde, Brenda, e eu tive um dia muito duro explicou Sherry.

    - Vou pedir ao Jonathan que a leve para casa.

    - No ser necessrio disse ela com certo nervosismo. Rollo Van Cleef se

    prontificou a isso.

    - Ah, sim! exclamou Brenda, olhando para Sherry com curiosidade.

    Mas, antes que a amiga comeasse a fazer mil perguntas, Sherry despediu-se s

    pressas e saiu.

  • Rollo a aguardava porta e quando ele novamente a tomou pelo brao Sherry

    ficou indecisa sobre se devia mesmo acompanh-lo. O toque das mos msculas e firmes

    continuava a despertar-lhe sensaes estranhas; e, toda vez que ele a olhava nos olhos,

    Sherry tinha a ntida impresso de j conhec-lo.

    Quando a brisa fresca do mar se fez sentir em seu corpo, ao sarem do prdio,

    Sherry sentiu-se vontade. O silncio da praia de Clifton parecia algo sobrenatural

    comparado ao barulho infernal do apartamento de Brenda.

    - Espero que no tenha levado a mal o meu convite disse Rollo, adivinhando os

    temores de Sherry - , minha inteno das melhores...

    - Estou certa de que sim... afirmou Sherry, encarando-o por alguns momentos,

    corada mas, de qualquer forma, sempre bom tomar cuidado com os homens, hoje

    em dia.

    - Voc tambm enfermeira? indagou Rollo, enquanto caminhavam pela rua

    quase deserta.

    - Sim, Brenda e eu estudamos juntas e dividimos um apartamento por algum

    tempo.

    - Vocs de davam bem?

    - A princpio, sim. Apenas quando Brenda insistiu para que Jonathan viesse morar

    conosco que os problemas comearam. Eu no concordei com a idia, e decidimos que

    seria melhor nos separarmos.

    Sherry nunca comentara com ningum os motivos que a levaram a no mais

    dividir o apartamento com Brenda, mas parecia incapaz de ocultar qualquer coisa de

    Rollo. Este, por sua vez, no fez qualquer comentrio. Assim, permaneceram em silncio

    enquanto caminhavam.

    - O que voc acha de um homem e uma mulher viverem juntos sem serem

    casados? indagou Rollo, de repente.

    - No tenho nada contra, mas no desejo essa situao para mim.

    Droga! Provavelmente causara uma pssima impresso a Rollo, demonstrando-lhe

    o quanto era antiquada, pensou Sherry.

    Mas, por algum estranho motivo, sentira-se obrigada a dizer-lhe a verdade.

    - muita ingenuidade sua pensar que o sexo s vem depois do casamento

    comentou Rollo.

    - Sei disso. Brenda me acha uma puritana, mas esse o meu ponto de vista; e no

    pretendo mud-lo para satisfazer os impulsos de homem nenhum.

  • - Cada qual deve seguir seus prprios princpios, Sherry observou Rollo, srio,

    j entrada do bar. Um dia desses voc vai encontrar algum que realmente a ame

    ele disse e acariciou-lhe a face com ternura.

    Aquelas palavras, de repente, fizeram-na sentir-se muito carente e com uma

    enorme vontade de chorar. Porm Sherry conseguiu controlar-se e, aparentemente

    calma, deixou-se conduzir para dentro de um bar com caractersticas tipicamente

    europias.

    J passava de meia noite, mas o local ainda estava bastante movimentado.

    Tranquilamente, as pessoas tomavam caf e conversavam. A luz era tnue, e a msica,

    suave. Rollo escolheu uma mesa de canto e pediu dois cafs ao garom.

    - Fale-me de voc sugeriu ele, enquanto aguardavam.

    De repente, Sherry viu-se contando-lhe que o pai morrera quando ela tinha

    apenas oito anos de idade; que sua me casara-se recentemente e mudara-se para o

    Canad; e que o irmo era mdico na Austrlia. Estranho! Depois que comeara a falar,

    no conseguia mais conter-se e, provavelmente, contara mais do que Rollo gostaria de

    saber.

    - No sei por que falei tanto de mim a algum que mal conheo declarou

    Sherry, embaraada, exatamente no momento em que o caf chegou.

    - s vezes mais fcil desabafar com um estranho observou ele, querendo

    tranquiliz-la. E sinto que hoje voc est muito infeliz!

    As palavras de Rollo constituam uma grande verdade, Sherry conclui para si

    mesma. Aquele fora um longo dia! Um dia que se iniciara com a morte de um amigo

    querido e transcorrera rduo. Trabalhara intensamente, escondendo seus sentimentos

    diante dos pacientes atrs de um sorriso plido. A festa de Brenda anestesiara-lhe a dor

    temporariamente, mas apenas aquele comentrio de Rollo lhe trouxera algum conforto.

    - No me diga que voc tem poderes sobrenaturais! Exclamou ela, sorrindo,

    tentando conter as lgrimas.

    - Fiquei um longo tempo observando-a, l na festa, e notei que no era apenas por

    causa do barulho que voc estava to triste...- explicou ele, tocando-lhe as mos

    ternamente. Quer me contar o verdadeiro motivo?

    Sherry hesitou por alguns segundos, antes de conseguir vencer as barreiras

    emocionais que seu treinamento de enfermeira impusera-lhe.

    - Uma pessoa muito querida, a quem eu respeitava profundamente, faleceu esta

    manh. A principio ela no estava muito vontade, mas, aos poucos, foi contando a

    Rollo tudo sobre o Sr. Peterson, seu paciente predileto, que passara vrios meses no

    hospital. Sherry apegara-se a ele pela sua sabedoria e compreenso; e agora, era-lhe

  • difcil aceitar seu desaparecimento. Eu sei que no deveria deixar que isso me afetasse

    tanto assim, mas Eddie Peterson era algum especial conclui ela.

    Rollo no disse nada, deixando que a presso de sua mo sobre a dela

    demonstrasse o quanto a compreendia. Mais uma vez Sherry experimentou aquela

    agradvel sensao de conforto. Sentia-se aliviada por ter desabafado, e o estranho era

    que s conseguira abrir-se com Rollo; no entanto pouco sabia sobre ele. Ele lhe contara

    que fora colega de faculdade de Jonathan, da ela calcular que ele deveria ter uns trinta

    anos. De repente estava curiosa para saber tudo sobre aquele homem to atraente.

    - Agora a sua vez de me falar sobre voc. O que voc faz? perguntou Sherry,

    retirando as mos das dele.

    - Sou cientista contou Rollo, com o ar despreocupado de sempre.

    - Deve ser fantstico!

    - s vezes um trabalho enfadonho, mas eu gosto.

    - No acredito que se possa sentir tdio nessa profisso.

    - No? Ele abriu um largo sorriso, fazendo com que Sherry corasse.

    Seus olhares encontraram-se por alguns segundos, at que a risada de algum, na

    mesa ao lado, quebrasse o encanto.

    Sherry desviou rapidamente os olhos para sua caneca de caf, encabulada. Era

    impossvel ignorar o grande magnetismo que Rollo exercia sobre ela. Eles conversaram

    longa e despreocupadamente, enquanto saboreavam o caf, sobre os mais variados

    assuntos.

    Ao sarem da cafeteria, a noite continuava maravilhosa, e Sherry quis, de repente,

    que ela no terminasse mais.

    - Voc est de visita Cidade do Cabo ou mora aqui? indagou ela, querendo

    dar continuidade ao dilogo interrompido.

    - Eu moro aqui respondeu ele, apenas iniciando a curta caminhada em direo

    ao apartamento de Sherry.

    - Desculpe-me se fui indiscreta disse ela, um tanto sem jeito.

    - Est uma bela noite de lua cheia comentou ele, com um sorriso nos lbios,

    mudando de assunto, ao perceb-la aborrecida. tima para um passeio na praia, no

    acha?

    - Perfeito! concordou Sherry, contrariando seus instintos e deixando-se levar

    para o outro lado.

  • A praia de Clifton no estava totalmente deserta. Um pequeno grupo de pessoas

    resolvera dar um mergulho noturno no oceano ndico, por isso Rollo decidiu seguir em

    outra direo. Sherry podia sentir o frescor da brisa em seu rosto e num impulso retirou

    as sandlias para andar com mais liberdade sobre a areia fina e fria. Ela jamais caminhara

    na praia noite. A paz e a tranqilidade que experimentava eram muito reconfortantes,

    depois de um dia to agitado. De vez em quando sentia um friozinho no estmago, mas

    uma estranha fora dentro de si reagia contra aquele medo absurdo.

    Rollo tambm experimentava uma certa emoo, e Sherry sabia disso: era como

    se, de alguma maneira, ambos pudessem se comunicar interiormente. Mesmo assim, o

    seu sexto sentido de mulher continuava a alert-la de algo.

    - Onde voc mora? indagou Rollo com voz suave.

    - Meu apartamento fica logo ali, no final desta rua respondeu Sherry, apontando

    vagamente com a mo que levava as sandlias.

    - Voc deve aproveitar bastante a praia, nos seus dias de folga.

    - Para dizer a verdade, no confessou ela com o corao acelerado, pressentindo

    que aquela conversa era o prembulo para algo mais emocionante. Tenho muito que

    fazer quando no estou de servio, mas, sempre que sobra um tempinho, tomo um

    banho de mar.

    Aquelas palavras tmidas e roucas seriam mesmo suas? Ela perguntou-se. Alguma

    coisa dentro dela dizia-lhe que devia correr antes que fosse tarde demais. Mas o toque de

    Rollo em seus ombros nus a impediu de reagir. Ele a trouxe para perto de si sob a luz do

    luar, fazendo-a sentir as pernas moles. Algo estava acontecendo entre eles, algo de que

    Sherry no podia escapar.

    - Sherry...h uma certa magia no ar esta noite ele murmurou, acariciando-lhe os

    ombros, provocando-lhe arrepios na espinha. Posso senti-la em minha pele.

    - Eu tambm sinto o mesmo confessou ela.

    - Voc muito bonita, Sherry afirmou ele, com ternura, retirando-lhe uma

    mecha de cabelo no rosto, levada pelo vento.

    Tudo aquilo s poderia ser um sonho; era a nica explicao para aquela

    deliciosa impresso de estar flutuando, pensava Sherry ao sentir o meigo contato dos

    lbios de Rollo em sua boca.

    O beijo dele fora leve e provocante, despertando-lhe desejos h muito tempo

    contidos.

    Enquanto Rollo procurava controlar suas emoes, Sherry parecia cada vez mais

    entregue a elas, ao sentir os braos fortes que deslizavam por suas costas levando-a para

    junto daquele corpo msculo.

  • Em seus vinte e trs anos de idade, ela jamais se deixara envolver daquela forma

    por homem nenhum... Sempre soubera defender-se quando algum rapaz tentava um

    relacionamento mais ntimo logo no primeiro encontro. Entretanto, apesar de conhecer

    Rollo h apenas poucas horas, estava gostando do que se passava entre eles.

    - Rollo, ns... ns mal nos conhecemos ela murmurou, interrompendo o beijo.

    - Que importncia tem o tempo, num momento como este? ele argumentou

    com suavidade, fitando-a nos olhos e retirando-lhe o blazer de linho, que caiu sobre a

    areia, ao lado das sandlias e da bolsa. Amanh o mundo pode acabar sem que

    tenhamos desfrutado estes momentos preciosos.

    - No seja to fatalista! Sherry sorriu, sentindo o corpo amolecer quando Rollo a

    envolveu pela cintura.

    - A vida assim! Nunca sabemos como ser o dia seguinte. H tanta tristeza neste

    mundo que devemos aproveitar o mximo toda felicidade que pudermos ter; mesmo que

    por alguns minutos.

    - O Sr. Peterson me disse algo assim uma vez Sherry se lembrou.

    - E aposto que voc no o levou a srio...

    - Tem razo admitiu ela, com a voz rouca. Mas pensando bem... uma

    grande verdade!

    Aquele era o momento precioso, e Sherry no pretendia dispens-lo. O

    importante era o hoje; o amanh que ficasse para depois, pensou ela, oferecendo os

    lbios para outro beijo.

    Cedendo, afinal, aos impulsos, Rollo passou a beij-la com sensualidade, na boca

    e no pescoo, causando-lhe um arrepio gostoso e fortes ondas de desejo.

    Quase sem perceber, Sherry passou a corresponder s carcias dele. Sentiu as

    pernas amolecerem e seu corpo frgil lentamente abaixar-se, indo de encontro areia

    macia, ao lado de Rollo.

    O barulho suave do mar parecia envolv-la ainda mais naquele doce feitio, e era

    como se o resto do mundo no mais existisse. Sherry entreabriu a boca para receber a

    lngua quente e mida de Rollo. Conduzida a um mundo s imaginado em sonhos, ela

    estava exultante! Era impossvel ignorar a sensao de intenso prazer, quando ele lhe

    acariciou com volpia e suavidade os seios trgidos e sensveis.

    - Espere! pediu Sherry, subitamente assustada, erguendo-se com o auxlio de

    Rollo. Sentir o que estou sentindo agora por algum que mal conheo me amedronta.

    - No tenha medo. No tem com o que se preocupar sussurrou ele, tocando-lhe

    o rosto com ternura.

  • Apanhando os pertences de Sherry e limpando-lhe a roupa suja de areia, Rollo a

    tomou pelo brao, para prosseguirem o passeio pela praia.

    J na calada, ela calou as sandlias, e ambos dirigiram-se ao prdio onde Sherry

    morava.

    Ainda zonza, como se tivesse bebido a noite toda, Sherry no conseguia acreditar

    no que estava acontecendo. S poderia ser um sonho. Mas o homem a seu lado era real!

    Assim como o sabor de seus beijos sensuais. Estava apaixonada!

    Rollo no era um desconhecido. Logo ao primeiro contato percebera uma

    identificao mtua entre ambos. Soube por instinto que aquele era o homem da sua

    vida. E sabia tambm que seus sentimentos eram correspondidos.

    - Foi uma noite maravilhosa! disse Sherry, porta do apartamento.

    - Maravilhosa e inesquecvel complementou Rollo.

    O longo beijo que se seguiu reacendeu em Sherry as chamas do desejo. Mas

    Rollo afastou-se, acariciando-lhe o rosto. Em seguida, tomou-lhe as chaves das mos para

    abrir-lhe a porta.

    - Boa noite, Sherry! At algum dia! ele disse, solene.

    - Por que se despede de mim como se nunca mais fssemos nos ver? indagou

    ela, com tristeza.

    - melhor que no nos vejamos mais. Acredite em mim Sherry respondeu ele.

    Aquelas palavras deixaram Sherry perplexa e sem reao. Quando ele se afastou

    bruscamente, ela quis cham-lo de volta, exigir-lhe uma explicao; mas tudo o que fez

    foi observ-lo partir.

    O breve sonho de Sherry transformara-se num sbito pesadelo. Por que Rollo

    entrara em sua vida to bruscamente, roubara-lhe o corao, para, depois, sair daquela

    forma? Eles se pertenciam... era impossvel neg-lo. Aquela fora uma noite maravilhosa,

    como ele mesmo dissera. Porm, todo o encanto se quebrara aos ps de Sherry como

    um cristal estilhaado

  • CAPITULO II

    O cheiro de desinfetante tomava conta do corredor do hospital. Sherry estava de

    volta dura realidade, aps ter passado a noite em claro. Pensamentos confusos haviam

    tumultuado sua mente, tirando-lhe o sono.

    - Sinto-me horrvel esta manh! Fui me deitar s quatro e tive de levantar-me s

    seis Brenda comentou ao encontrar Sherry, quando ambas retomavam o trabalho.

    - bom cuidar-se melhor, de agora em diante. Festas como as de ontem e

    gravidez no combinam! advertiu Sherry, expressando preocupao em seus olhos

    verdes.

    - Tem razo, mas voc tambm no me parece muito bem.

    - Estou com um pouco de dor de cabea mentiu Sherry, tentando explicar sua

    pssima aparncia.

    - Ah! mesmo! Exclamou a colega, curiosa. O que aconteceu entre Rollo e

    voc ontem noite?

    - Nada respondeu, evasiva.

    - Ora, Sherry! Brenda riu, descrente.

    Sherry teve mpetos de confessar amiga como fora tola e romntica, mas

    conteve-se a tempo. E ficou aliviada ao ver a chefe das enfermeiras aproximar-se.

    - A sra. Naude vem vindo a sussurrou ela.

    - Droga! Ela jamais gostou de mim, e aposto que vai reclamar de minhas olheiras.

    A enfermeira-chefe se aproximou antes que Brenda pudesse evitar o encontro e,

    medindo as duas moas dos ps cabea, no escondeu sua desaprovao.

    - Pelo que vejo, vocs aproveitaram bem a noite passada!

    - Para ser franca, sim confessou Brenda com sarcasmo. Dei uma festinha na

    minha casa para comemorar a vinda do meu beb e o meu casamento.

    A enfermeira-chefe ficou momentaneamente atnita, e Brenda aproveitou a

    oportunidade para sair dali, seguindo direto para a ala em que estava de planto.

    - Ela fala a srio, Sherry? indagou a Sra. Naude, recobrando a postura.

    - Sim. Mas as coisas no aconteceram exatamente nesta ordem. Primeiro ela ficou

    grvida e depois casou-se, claro.

  • - Antes assim! a Sra. Naude comentou, sem esconder a sua desaprovao. Um

    novo paciente ser internado daqui a pouco e vai ficar no antigo leito do Sr. Peterson.

    Portanto, quero que voc tome as providncias necessrias.

    - Sim, senhora disse Sherry, ressentida pela frieza com que o nome do Sr.

    Peterson fora pronunciado.

    - Posso lhe dar um conselho? indagou a superior a Sherry, em tom brando, ao

    perceb-la um tanto abatida. Nunca se envolva com os pacientes. Posso parecer um

    pouco dura e sem sentimentos, mas os meus primeiros anos de enfermagem ensinaram-

    me muita coisa. Voc uma tima enfermeira, com grande potencial, mas ter de

    aprender a tratar os pacientes pensando estritamente no mbito profissional, assim como

    eu fiz.

    Pela primeira vez aps tantos anos, Sherry podia ver a mulher oculta por trs

    daquela mscara fria. A enfermeira Naude no era a criatura insensvel que aparentava.

    Sob aquela aparncia austera, havia um corao que sofria e alegrava-se por seus

    pacientes, e Sherry passou a respeit-la e a admir-la por isso.

    - Obrigada, chefe agradeceu Sherry sorrindo.

    - melhor correr ou ir atrasar-se sugeriu a senhora de cabelos grisalhos,

    readquirindo o tom austero novamente.

    Com o corao mais leve, Sherry sentiu-se estranhamente enriquecida e

    estimulada durante sua ronda na ala masculina, quase esquecendo-se das interminveis

    horas de angstia da noite anterior.

    - O senhor parece bem melhor Sr. Agnew comentou ela com um dos pacientes

    mais idosos enquanto outras enfermeiras arrumavam-lhe a cama.

    - Esta ala no e mais a mesma sem o Peterson afirmou o doente, respirando

    fundo.

    - Mas claro que . verdade que um rosto familiar no est mais entre ns, mas

    as enfermeiras Van Rensburg e Walters continuam conosco.

    - Creio que tem razo concordou o Sr. Agnew, pensativo. que sinto falta do

    Peterson aqui a meu lado e dos nossos bate-papos matinais.

    - Todos ns sentimos falta dele, Sr. Agnew, mas ele deve estar bem onde est, e

    no creio que gostaria que lamentssemos sua partida.

    - Bem, isso verdade respondeu ele e permaneceu em silncio por alguns

    instantes. Acho que, agora, vou ler o jornal, enfermeira.

    Sherry passou-lhe o jornal e, enquanto ele colocava os culos, foi ajudar as outras

    enfermeiras a fazerem as camas dos demais pacientes.

  • A manh passou rpida e agitada, como sempre. Sherry mal tivera tempo de parar

    para uma xcara de ch, na copa. O novo paciente chegara: um homem magro, de rosto

    abatido e que ignorava completamente as tentativas de aproximao do Sr. Agnow. Por

    isso, logo tornara-se indesejvel na ala.Na hora do almoo, o movimento diminuiu, e

    Sherry sentiu-se aliviada.

    Rapidamente foi at a lanchonete do hospital, onde sentou-se ao lado de Brenda.

    Pediu um sanduche de carne e um suco de frutas, sentindo-se feliz por poder descansar

    um pouco e conversar com a amiga, at que Brenda mudou de tema de repente.

    - O que aconteceu ontem noite, Sherry?

    Aquela pergunta a fez perder o apetite subitamente. No seria fcil responder

    amiga. Nem mesmo ela prpria sabia o que realmente tinha acontecido. Vivera um

    sonho louco, por algumas horas. E nele encontrara o homem da sua vida. Depois ele se

    fora to repentinamente quanto chegara! Era s.

    - No sei o que houve... Sherry murmurou, depois de alguns instantes de

    silncio.

    - Como no sabe?

    - Acho que... eu pensei... droga! Arrasada, Sherry pressionou a cabea com as

    mos. Ontem eu me apaixonei... entende? Foi um amor primeira vista! Nada

    parecido com isso aconteceu comigo antes. Estava certa que meus sentimentos eram

    correspondidos, mas, quando Rollo se despediu, disse-me apenas que seria melhor no

    nos vermos mais.

    - Vocs fizeram amor?

    - No! assegurou Sherry.

    - Rollo devia estar louco!

    - Ou ento casado!

    - Ele mencionou alguma coisa sobre isso, Sherry?

    - No, mas s o fato deter uma esposa explicaria o seu comportamento

    reafirmou Shelly, ressentida. No dormi esta noite tentando descobrir um motivo lgico

    para aquele afastamento brusco. Cheguei at a pensar que minhas emoes foram to

    fortes que eu imaginei coisas que no existiam.

    - Voc no acredita mesmo nisso, no ? - duvidou Brenda.

    - A noite passada eu poderia at jurar... Sabe, as palavras de ternura que ele me

    disse fizeram-me crer que ele correspondia aos meus sentimentos, mas... ela

    interrompeu-se, emocionada, e esfregou a palma das mos, num gesto de desespero.

    Eu simplesmente no entendi nada!

  • Sherry e Brenda costumavam dialogar francamente sobre seus problemas, o que

    sempre as ajudava a resolv-los; mas, aquela vez, pareciam no chegar a nenhuma

    concluso.

    - Hoje, voc est com a cabea fria, como se sente em relao a Rollo?

    - Sinto como se ele fizesse parte de um sonho do qual eu infelizmente acordei...

    Ontem foi muito difcil para mim; estava cansada e muito vulnervel.

    - Estranho! Brenda lembrou, franzindo a testa. Quando comentei com

    Jonathan que voc e Rollo haviam ido embora juntos, ele ficou preocupado quanto s

    intenes do amigo a seu respeito.

    - No aconteceu nada de mais... fique tranqila. Agora acho melhor encerrarmos

    esse assunto e esquecer a noite passada.

    - Por mim, tudo bem! Mas e voc? Ser que vai conseguir esquecer?

    - Tenho de retornar ao trabalho disse Sherry, fugindo pergunta da amiga e

    levantando-se.

    - Eu tambm! Vejo-a mais tarde.

    Depois daquele dia, as duas amigas no tocaram mais no assunto e, ao poucos,

    Sherry foi se recuperando daquela estranha experincia. Numa tarde, porm, ao chegar

    em casa, ela encontrou um bilhete embaixo da porta. No reconheceu a letra, mas a

    mensagem contida naquele pedao de papel fez seu corao bater mais forte.

    Se estiver livre encontre-me no caf s sete e trinta da noite. Rollo. As mos de

    Sherry ficaram trmulas, e sua mente, confusa. Rollo fora bastante enftico ao despedir-se

    dela, naquela noite. Destrura todo o encanto das poucas horas que haviam passado

    juntos, sem a menor explicao. Agora, depois de quatro dias, por que ele iria querer v-

    la outra vez?

    Uma estranha suspeita veio-lhe mente, impelindo-a a ligar imediatamente para

    Brenda.

    - Voc ou Jonathan viram Rollo depois daquela festa? Sherry perguntou de

    supeto.

    - No! informou a amiga, surpresa. Por que?

    - Por nada... respondeu Sherry, envergonhada por ter imaginado que os amigos

    haviam intercedido por ela. que recebi um bilhete dele marcando um encontro

    comigo hoje.

    - E voc vai?

  • Sherry hesitou, pensativa.

    - Acha que eu deveria ir? Tenho medo de ser magoada outra vez! Por outro lado,

    estou morrendo de curiosidade para saber o que ele quer...

    - Se no for, poder se arrepender mais tarde... Entretanto caso voc v, acho

    bom se preparar para o pior. Alertou a amiga.

    - Sei disso, Brenda.

    - Bem, e ento? O que decide?

    Sherry no costumava agir impulsivamente em momentos delicados como aquele,

    pois, uma vez que decidisse algo, no retrocederia depois.

    - O que vai fazer? insistiu Brenda.

    - Eu irei! respondeu ela, apreensiva.

    - Boa sorte, ento! desejou Brenda, e Sherry nem sabia que precisaria de toda a

    sorte do mundo naquela noite.

    Os lindos cabelos de Sherry esvoaavam ao vento. Estava deslumbrante dentro de

    uma saia justa, que delineava as pernas bem-feitas, e uma blusa de seda branca. Os

    rapazes paravam para admir-la, mas Sherry no lhes dava a menor ateno.

    Sob a luz de neon do caf ela ainda hesitou alguns instantes, mas, finalmente,

    endireitou o corpo sensual e entrou.

    O local estava lotado, e no ar havia um aroma agradvel de caf torrado. No

    demorou muito at que ela vislumbrasse Rollo, que se levantou de sua mesa e foi ter com

    ela. Os olhares de ambos se encontraram, e o corao de Sherry disparou. Ela caminhou

    em sua direo, lentamente, ignorando as demais pessoas como se estivesse hipnotizada.

    Rollo estava elegante, todo vestido de preto, mas havia um brilho perigoso em seu

    olhar. A iluminao fosca do recinto conferia-lhe tambm uma aparncia sobrenatural e,

    por um instante, Sherry tremeu. Entretanto, seu timbre de voz agradvel e carinhoso a

    tranqilizou.

    - Obrigado por ter vindo ele disse, conduzindo-a gentilmente at a mesa.

    Sentaram-se frente a frente. Enquanto ele fazia o pedido ao garom, Sherry

    tentava a todo custo controlar suas emoes. Ela pretendia manter-se serena e impassvel,

    mas o desejo de beijar e abraar Rollo ardia em seu peito.

    - Pensei que voc no quisesse mais me ver... disse Sherry com naturalidade.

    - Isso seria o mais sensato, mas precisava v-la novamente.

  • Os olhares se reencontraram, refletindo a ternura que sentiam, dando a

    impresso de que ambos eram transportados para um outro mundo onde apenas eles

    existiam. A chegada do garom quebrou a magia daquele momento. Deixando os cafs

    sobre a mesa, ele retirou-se em seguida.

    - Voc casado, Rollo? interpelou ela, tentando pr fim, de uma vez, dvida

    que a atormentava desde o primeiro encontro. por isso que no pode me ver mais?

    - Ele sorriu, irnico.

    - Gostaria que tudo fosse to simples assim! No, no sou casado, e nem o serei

    por um bom tempo.

    - Ento, o que est acontecendo? perguntou Sherry, curiosa, porm mais

    aliviada.

    - Vou embora daqui, Sherry. Ele tomou-lhe as mos entre as suas ternamente.

    Daqui a duas semanas, chefiarei uma expedio de cientistas e bilogos da Marinha at a

    Antrtida, e no seria justo envolv-la num relacionamento sem futuro imediato.

    - Quanto tempo ficar fora? indagou ela, com o corao apertado.

    - Ainda no sei ao certo! Talvez um ano, talvez mais. Pensativo, ele tomou um

    gole de caf.

    - No compreendo... murmurou ela, servindo-se de leite e acar. Se acredita

    mesmo que no h futuro para ns, por que me chamou aqui?

    - Queria deixar bem claro que no estou em condio de me comprometer com

    ningum, mas, se voc puder aceitar esta situao, poderemos prosseguir com nosso

    relacionamento.

    Sherry nada respondeu. Bebeu vagarosamente o caf, tentando refletir sobre

    aquilo que acabara de ouvir. Se ele no queria nenhum envolvimento emocional, por que

    aquele encontro? No fazia sentido.

    - O que voc quer de mim, Rollo? ela perguntou finalmente.

    - Quero passar o tempo que me resta na Cidade do Cabo com voc. Quero v-la

    sempre que possvel, mas, quando o navio zarpar, tudo estar acabado.

    Sherry sabia que Rollo estava sendo egosta, porm honesto. Por isso respondeu

    com a mesma sinceridade.

    - Prefiro v-lo por duas semanas a no v-lo nunca mais!

    - Eu no sou uma coisa boa para voc! Advertiu ele, magoado consigo mesmo.

  • - A razo me diz para sair deste bar e tambm de sua vida, mas meu corao me

    pede para ficar. E, para mim, o corao tem sempre a ltima palavra. ela confessou

    com um sorriso molhado de lgrimas.

    - s vezes, o corao mais sbio que a razo ele disse, tentando convencer

    muito mais a si prprio do que a ela. E quem que pode garantir o contrrio? Mas,

    numa deciso em que se pode sair magoado, no seria melhor deixar o corao de lado?

    Sherry teve medo. Se Rollo estava querendo erguer uma barreira entre eles, ela

    no o permitiria e, de repente, at aquela mesa a separ-los pareceu demais!

    - Temos de ficar aqui, neste lugar cheio de gente? indagou ela, forando Rollo a

    sorrir.

    - Podemos passear pela praia, se voc quiser.

    - Ou ir at meu apartamento sugeriu Sherry corando ante as recordaes do seu

    ltimo passeio na praia.

    - Tenho uma idia melhor! Vamos dar uma volta de carro decidiu Rollo,

    levantando-se.

    Sherry o seguiu. Ele estava to perto que ela podia sentir a deliciosa fragrncia

    masculina.

    Ambos saram do bar e desceram a rua correndo. A alguns metros dali estava

    estacionado um Rover branco. Rollo abriu a porta, e Sherry entrou no carro. Em seguida,

    ele tomou seu lugar ao volante. Por um instante, Ela se perguntou se teria tomado a

    deciso correta, mas suas dvidas logo se dissiparam, assim que Rollo ps o automvel

    em movimento.

    Ele dirigia em alta velocidade, mas com tal preciso que Sherry sentiase

    absolutamente segura ao seu lado. Percebeu que seguiam em direo a Sea Point,

    entretanto nada perguntou a respeito, preferindo no romper o agradvel silncio.

    - Vou levar voc ao local mais bonito da Cidade do Cabo disse ele subitamente.

    Sherry apenas sorriu e logo imaginou que estavam indo para Signal Hill. E estava

    certa.

    Ao chegarem ao mirante de Signal Hill, Rollo estacionou o carro para apreciarem

    a espetacular vista da cidade, e uma paz relaxante se fez entre os dois quando ele desligou

    o motor do carro.

    - Acho que nunca me cansarei de olhar esta paisagem noturna suspirou Rollo,

    voltando-se para Sherry. J esteve aqui antes?

    - Duas vezes contou ela, sorrindo.

    - Na companhia de algum especial? ele quis saber.

  • - Vim pela primeira vez quando era criana, em companhia de alguns parentes; a

    segunda vez foi h trs amos, com um rapaz da Austrlia, amigo de meu irmo.

    - Vocs chegaram a namorar?

    - Claro que no! Ele esteve aqui apenas de passagem. Nunca mais o vimos depois

    daquela noite, nem mesmo recebemos uma carta. Sherry interrompeu seu relato ao

    perceber que Rollo estava sorrindo. Do que voc est achando graa?

    - S estou contente por ser o primeiro namorado a traz-la a este lugar

    maravilhoso. Voc tambm a primeira moa que vem comigo aqui.

    Sherry sentiu o rubor queimando-lhe as faces quando Rollo aproximou-se.

    - Voc est feliz? indagou ele, acariciando-lhe suavemente os cabelos.

    - Acho que nunca me senti to feliz em toda a minha vida! Ela respondeu,

    expressando no rosto toda a ternura que lhe ia no corao.

    - Sherry, eu no tinha o direito de querer levar adiante o nosso relacionamento.

    Sinto-me um cretino s de pensar nisso. Voc uma boa moa. E eu no queria me

    aproveitar dos seus sentimentos Rollo desabafou, de repente muito emocionado.

    - Voc quer me deixar outra vez, como naquela noite, sem me dar escolha?

    perguntou ela, ressentida.

    - o que eu deveria fazer, mas no consigo!

    - Pois eu no vou deixar, ouviu bem? disse Sherry, tocando-lhe o rosto

    entristecido.

    - Sherry... ele murmurou.

    - No me importa o dia de amanh, desde que voc me abrace agora... pediu

    ela, disposta a no perd-lo. Pelo menos por enquanto.

    - Voc ainda no teve tempo de refletir direito sobre o assunto rebateu Rollo,

    tentando mant-la a distncia.

    Talvez ele tivesse razo, mas o corao de Sherry j havia decidido o que fazer.

    - Eu sei o que quero, Rollo. No se preocupe!

    - S espero que no se arrependa mais tarde...

    - No me arrependerei.

    No instante seguinte, Sherry estava nos braos de Rollo, exatamente como tinha

    desejado desde o momento em que se encontraram no bar. Ele a abraava com fora,

    dando vazo quele desejo at ento reprimido. Sherry aconchegou-se a ele, a cabea em

    seu peito forte, aspirando o aroma inebriante de sua colnia.

  • Rollo acariciou-lhe os cabelos sedosos e beijou-lhe a fronte com doura,

    causando-lhe sensaes jamais imaginadas. Controle-se, pensava, sentindo-se, porm,

    cada vez mais fraca. O beijo sensual em sua boca tirava-lhe o raciocnio e a razo. Tudo o

    que queria era sentir o toque mgico das mos de Rollo em seu corpo, causando-lhe

    intensas ondas de prazer.

    Delicadamente, Rollo desabotoou-lhe a blusa de tecido fino, soltando-lhe o suti.

    Uma vez livres, os seios foram afagados com carinho.

    Sherry jamais permitiria tal intimidade antes, com ningum, mas Rollo era

    diferente. Ela no tentou impedi-lo quando os dedos experientes alcanaram-lhe os

    mamilos rijos. Queria ser tocada daquela maneira e, mais do que isso, queria entregar-se

    a ele completamente. No auge do desejo, Sherry no pde conter um gemido de prazer,

    ao sentir os lbios macio de Rollo deslizando por sua pele nua, aguando-lhe os sentidos,

    levando-a loucura.

    Querendo retribuir-lhe o carinho, ela abriu a camisa de Rollo e afagou-lhe o peito

    msculo, coberto de plos.

    De repente, Rollo abraou-a com mais fora, louco de desejo. Entretanto,

    segundos depois, afastou-se dela bruscamente e deu partida no carro.

    Frustrada e decepcionada, Sherry mal conseguia abotoar a blusa. Afinal o que

    acontecera de errado? Por que ele estava to calado? Teria ela feito algo que o

    aborrecera?

    - O que aconteceu, Rollo?

    - Voc virgem, no ? perguntou ele, de repente.

    - Sim, eu sou. Mas qual o problema?

    - O problema que eu no vou seduzi-la. Sinto que voc ainda no est

    preparada.

    Ao chegarem ao apartamento de Sherry, Rollo deu-lhe um beijo rpido e partiu

    em seguida, deixando-a completamente confusa...

  • CAPITULO III

    No dia seguinte, Sherry estava um pouco relutante em satisfazer a curiosidade de

    Brenda sobre o seu encontro com Rollo, pois o que ocorrera era algo por demais

    pessoal. Alm disso, a incerteza e a confuso em sua mente eram problemas que s ela

    mesma poderia resolver.

    luz do dia e longe de Rollo, Sherry podia imaginar o futuro desastroso que a

    aguardava. Sentia-se como se tivesse cado em um rio cuja forte correnteza a impelia para

    o desconhecido e no havia como escapar.

    Naquele mesmo dia Rollo lhe telefonou, falando como se nada tivesse

    acontecido.

    - Tenho duas entradas para o teatro hoje. Voc quer ir?

    - Eu adoraria aceitou ela, sem hesitar.

    - Mas voc nem sabe qual a pea! Ele riu.

    - Eu confio no seu gosto afirmou Sherry, convicta.

    - Se eu fosse voc, no confiaria tanto... ele prosseguiu, brincando.

    - Mas acontece que no posso evitar! Certo? ela respondeu, bem-humorada.

    - Eu a apanho s sete e meia. Depois, desligou o telefone abruptamente,

    deixando Sherry pasma por alguns instantes.

    - Alguma coisa errada, enfermeira Jeager?

    Sherry voltou-se, surpresa, deparando com a enfermeira Naude, que a observava,

    apreensiva. Balanando a cabea negativamente, ela respondeu:

    - Eu s estava pensando...

    - Pensando em qu? insistiu.

    - possvel algum ter a impresso de j conhecer uma pessoa estranha h muito

    tempo?

    - Acredito que isso j tenha me acontecido algumas vezes.

    - Mas a ponto de saber detalhes sobre essa pessoa dos quais nunca ouviu falar

    antes?

    - Tambm possvel! Voc encontrou algum que a fez sentir-se assim?

    - Sim.

  • - Um homem?

    - Isso mesmo! confessou Sherry, corando.

    - Quer um conselho? No se deixe influenciar tanto por isso... No quero que se

    magoe! aconselhou a mulher com um certo ar de preocupao.

    Depois disso, Sherry passou o resto do dia preocupada, ponderando sobre os

    temores da enfermeira Naude, que eram os seus prprios. Sherry sabia que seria

    magoada, porm no havia nada que pudesse ser feito para evitar aquele futuro triste.

    Naquela noite, Sherry ficou esperando por Rollo tensa e insegura; mas, quando

    ele tomou-lhe as mos na penumbra do teatro, suas dvidas terminaram.

    - Voc esteve muito calada esta noite comentou Rollo, no apartamento de

    Sherry, aps o teatro, enquanto terminava o cafezinho que ela lhe oferecera. Por acaso,

    arrependeu-se de ter sado comigo?

    Sherry o contemplou em silncio por alguns instantes. Ele estava sem o palet e

    afrouxara o n da gravata, mas no era aquilo o que a preocupava. Ela queria poder

    desvendar-lhe os pensamentos, saber do que ele tinha medo. Por fim sentou-se ao seu

    lado, no sof.

    - No vou negar que tive dvidas em continuar saindo com voc. Mas quero que

    saiba que no estou arrependida. Voc tem uma misso a cumprir, na Antrtida, e ns

    temos pouco tempo juntos. Tudo bem! Eu aceito esta situao.

    Subitamente feliz, ele a tomou nos braos, beijando-a e acariciando-a to

    calorosamente que Sherry ficou emocionada.

    No dia seguinte, na lanchonete do hospital, Sherry e Brenda almoavam juntas e

    conversavam sobre Rollo.

    - Voc no sabia que ele professor em cincias e que partir dentro de duas

    semanas para o Plo Sul? Ele no lhe contou que permaneceria la por um ano,

    Sherry?

    Realmente, Sherry no sabia que Rollo era um professor, mas preferiu no

    comentar nada com a colega sobre isso.

    - Afaste-se dele, Sherry. Ele no quer um compromisso logo s vsperas de sua

    partida, e s Deus sabe o que acontecer at ele voltar.

    Brranda estava ceta. O prprio Rollo j a prevenira para no ter iluses com

    relao a ele, mas Sherry no queria pensar nisso.

    - Obrigada pelo conselho, Brenda, mas prefiro tomar uma deciso sozinha.

    - Est bem! Desculpe-me! S espero que no se machuque muito, quando tudo

    acabar Disse Brenda, ainda preocupada.

  • - Sei cuidar de mim. Fique tranqila!

    A verdade, porm, era que, bem no fundo do corao, Sherry alimentava uma

    tnue chama de esperana, que lhe dava foras para continuar.

    - Vamos? Temos de voltar ao trabalho. lembrou Sherry, sorrindo.

    - Vamos l...

    Nos dias que se seguiram, Sherry preocupou-se exclusivamente em viver o

    presente. A cada minuto que passava, ela amava Rollo mais e mais. Amava seu sorriso

    simptico, o seu modo de ser, as constantes gentilezas e o carinho que lhe dedicava. Os

    beijos dele eram como um ritual mgico, que a faziam sentir-se completamente feliz!

    Agora, ela sabia o que significava amar e ser amada!

    Todos os momentos livres dos quais dispunham, Sherry e Rollo passavam juntos

    e, ento, o tempo voava! Numa tarde, fizeram um passeio at o topo de Mountain Table.

    L, tomaram um lanche e Rollo falou de suas aventuras quando criana.

    Dentro do bondinho que os levaria montanha abaixo, ambos se divertiram

    tirando fotos da paisagem. Sherry queria deixar registrada, por sua cmera, aqueles

    instantes to felizes... Algum dia, haveria de record-los com satisfao.

    Naquele domingo, Sherry aguardava por Rollo, que viria busc-la em casa, de

    carro, para mais um passeio. Entretanto ele no apareceu.

    A princpio ela pensou tratar-se apenas de um atraso, mas, com o passar das

    horas, convenceu-se de que algo de grave acontecera. Assim, terrivelmente preocupada,

    decidiu procur-lo. Dirigiu o mais rpido que pde at Five Oaks, mas, ao chegar perto

    da casa de Rollo, estacionou o carro e procurou refletir friamente. E se ele no quisesse

    mais v-la? Ou, pior ainda, se ele tivesse partido sem ao menos despedir-se?

    Criando coragem, Sherry desceu do carro, caminhou at a porta da residncia e

    um pouco hesitante tocou a campainha. Aguardou por alguns segundo, sentindo o

    corao acelerado, at que uma senhorita idosa, usando uniforme de empregada abriu-

    lhe a porta.

    - O professor Van Cleef est? indagou Sherry, aflita.

    - O professor no est se sentindo bem e no pode receber ningum informou a

    criada.

    Sherry no se enganara. Havia lago de errado com Rollo.

    - Sou enfermeira, talvez possa ajud-la prontificou-se ela. Leve-me ao quarto

    dele.

    A empregada hesitou um instante, mas depois concordou.

  • - Venha... Subindo a escada, no final do corredor, esquerda.

    Sherry seguiu as instrues da criada e, apressadamente, entrou no quarto de

    Rollo. Sentindo o corao disparar, deparou com ele deitado na cama. O rosto plido, os

    olhos fechados. Percebendo a presena dela, Rollo despertou assustado.

    - O que faz aqui? perguntou ele.

    Sentindo as pernas fraquejarem, Sherry sentou-se ao lado dele, na cama.

    - Fiquei preocupada porque voc no apareceu. Vim at aqui, e sua empregada

    me contou que voc estava doente. Ento me ofereci para ajudar.

    - s uma enxaqueca, no se preocupe. s vezes tenho essas crises, mas logo

    passam!

    - Voc j tomou algum remdio? perguntou Sherry, observando atentamente a

    expresso de sofrimento em seu rosto.

    - Sim. Pare de se preocupar tanto! ele reclamou e virou-se na cama, dando-lhe

    as costas.

    Entretanto, Sherry percebeu que Rollo necessitava de cuidados. Com o auxilio da

    empregada, foi cozinha providenciar uma bacia com gua, gelo e algumas toalhas. Ao

    voltar ao quarto, ela achou Rollo na mesma posio em que o deixara.

    Sentando-se ao seu lado, Sherry embebeu uma toalha na gua gelada, torceu-a e,

    em seguida, colocou-a sobre a testa de Rollo. Repetiu o processo durante meia hora, at

    que o percebeu mais relaxado.

    - Sente-se melhor?

    - Muito afirmou ele, sorrindo. E provarei isso a voc. - Rollo puxou-a para

    junto de si e deu-lhe um beijo prolongado. Sherry correspondeu com a mesma paixo e

    escorregou as mos para dentro do palet do pijama semi-aberto, acariciando-lhe o trax

    musculoso e peludo. O tempo que lhes restava era pouco, e s Deus sabia como seria

    sua vida depois que ele partisse.

    Os dedos de Rollo percorreram suavemente os traos suaves do rosto de Sherry;

    depois ele tomou-lhes as mos, beijando-as.

    - O que vamos fazer? No quero perder voc murmurou ela, contendo as

    lgrimas.

    Subitamente irritado, Rollo levantou-se de um salto. Vestiu o roupo, caminhou

    at a janela e ficou olhando para o jardim.

    - Partirei em breve, Sherry. No posso lev-la comigo, nem tampouco lhe pedir

    que espere por mim.

  • - Voc no gostaria que eu o esperasse?

    - Sherry! advertiu ele, sem voltar-se.

    - Desculpe, Rollo. Sei que voc no me prometeu nada, mas...

    - Ento, melhor deixar as coisas como esto.

    - No posso! Ela ergueu-se, nervosa, e aproximou-se dele. Rollo, ser qie as

    ltimas semanas no significaram nada para voc? No suporto a idia de v-lo sair assim

    da minha vida, sem dar-me nenhuma esperana para o futuro.

    - Droga, Sherry! explodiu Rollo. Se compromisso o que pretende, est

    olhando para o homem errado. Eu j avisei sobre isso antes!

    Naquele momento, Sherry percebeu que estava nas mos de Rollo. Somente ele

    poderia decidir sobre seu futuro, que poderia ser o cu, ao lado dele, ao o inferno, sem

    ele. Tomada de desespero, ela no se conformava.

    - No sei por que me deixei envolver por voc e aceitei uma situao to absurda!

    desabafou ela.

    - Eu tambm no sei! rebateu Rollo, em tom seco, deixando bem claro para

    Sherry que aquilo era apenas o incio de seus sofrimentos.

    Sherry porm recusava-se a acreditar em seus ouvidos. Ele no podia estar

    falando a srio! Entretanto, as feies sombrias de Rollo permaneceram inalteradas,

    demonstrando que ele no parecia disposto a reconsiderar sua posio. Uma dor aguda

    tomou conta do corao de Sherry, ao ver o homem de sua vida dar-lhe as costas daquela

    forma e trat-la com tanta indiferena.

    Estava tudo acabado! Sherry abandonou o quanto de Rollo, com os olhos

    molhados de lgrimas e com aquelas palavras cruis ecoando-lhe nos ouvidos.

    Perturbada pelos acontecimentos daquele dia, Sherry no conseguiu dormir. J

    era lata madrugada, e ela ainda se lembrava das palavras de Rollo. Ele simplesmente a

    expulsara de sua vida e do seu corao.

    Sem ter pregado os olhos um s minuto, Sherry levantou-se cedinho e foi

    trabalhar. Afinal, o trabalho era a nica sada para tentar superar aquela crise emocional

    em que se encontrava.

    Nos dias subseqentes, dedicou-se tanto ao servio de rotina do hospital que a

    Sra. Naude estranhou.

    - Sherry, venha at minha sala para conversarmos! a enfermeira-chefe a chamou.

    Sherry obedeceu, preocupada, pois aquilo s acontecia em caso de repreenso. O

    que teria ela feito de errado?

  • - Quero que tire a tarde de folga! declarou a Sra. Naude, ao sentar-se a sua

    mesa.

    Sherry a encarou, surpresa, e detestou aquela idia. Preferia mil vezes ficar ali

    trabalhando duro a ter de enfrentar a solido do seu apartamento vazio e silencioso.

    - No preciso! protestou ela.

    - Por algum motivo que eu desconheo, voc est trabalhando demais

    ultimamente. Se continuar nesse ritmo vai acabar tendo um colapso argumentou a

    enfermeira Naude, preocupada. Estou lhe dando a tarde livre para que voc possa

    resolver seus problemas.

    Como explicar enfermeira-chefe que no havia nenhum problema a resolver?

    Tudo j estava definido; restava-lhe apenas a dor da perda do homem amado.

    - Isso uma ordem, enfermeira Jeager completou a chefe de Sherry, deixando

    bem claro que seria intil tentar argumentar.

    - Sim, senhora Sherry respondeu, sem outra alternativa. E retirou-se da sala,

    sentindo as lgrimas inundarem-lhe os olhos.

    Ao sentar no carro, Sherry ficou imaginando o que faria o resto do dia. Ficar em

    casa com aquele tempo chuvoso e nublado decerto no lhe faria bem. Pensou em visitar

    Brenda, mas no estava disposta a dar-lhe satisfaes. Como explicar amiga que se

    envolvera com um homem que mal conhecia e que nada lhe prometera? Como fazer

    Brenda compreender algo que nem ela mesma entendia?

    Dando partida no carro, Sherry deixou a hospital e dirigiu-se ao seu apartamento,

    em Clifton, pois no lhe ocorreu nada melhor a fazer.

    Assim que chegou em casa, tratou logo de ocupar-se com alguma coisa. Decidiu-

    se por uma boa faxina, e, ao final, poliu tanto a moblia que podia ver-se refletida nela.

    Depois preparou o jantar. Entretanto no conseguiu comer, pois sentia um n na

    garganta que lhe tirava o apetite. Serviu-se mais tarde de uma taa de sorvete, antes de

    comear a lavar os pratos. J passava das oito horas, quando finalmente terminou de

    arrumar a cozinha.

    Era ainda muito cedo para dormir, e Sherry aproveitou a oportunidade para lavar

    a cabea e tomar um banho prolongado e reconfortante.

    Mais relaxada, vestiu o roupo e enrolou a cabea numa toalha, guisa de um

    turbante. Ao deparar com sua imagem refletida no espelho, viu um par de olhos tristes e

    vermelhos, irritados pelo xampu, e um rosto desanimado.

    Droga!, pensou, pondo-se a enxugar os cabelos com a toalha, nervosamente.

    Precisava melhorar a aparncia. Pensando assim, procurou dar um jeito nos cabelos e

  • passou um creme hidratante no rosto. Olhou-se outra vez no espelho, mas seu semblante

    refletia a mesma preocupao.

    - Coragem, menina! disse para si mesma. No se entregue desse jeito!

    De repente, a campainha soou, interrompendo seus pensamentos. Intrigada.

    Sherry voltou-se para o relgio sobre o criado-mudo. Nove e meia! Quem poderia ser

    quela hora? S poderia ser uma pessoa... Saiu do quarto e atravessou a sala correndo.

    Ao olhar pelo olho-mgico da porta, deparou co Rollo, do lado de fora. Seu corao

    encheu-se de esperanas e comeou a bater descompassadamente. De certo, estava

    arrependido pela frieza com que a tratara no ltimo encontro.

    Apressada e feliz, Sherry destrancou a porta, mal contendo o impulso de atirar-se

    em seus braos.

    - Posso entrar?

    Sem dizer uma palavra, ela deu-lhe passagem.

    Rollo entrou, e Sherry fechou a porta atrs dele; depois o conduziu at a sala

    aconchegante.

    - Voc aceita um cafezinho? ela ofereceu, nervosa.

    - No, oborigado. E retirou o palet, pondo-o sobre o sof.

    Em seguida olhou-a atentamente, percebendo que Sherry no usava nada alm do

    roupo.

    Ao ser observada, Sherry cruzou os braos, encabulada.

    - melhor eu vestir algo! disse. Mas, quando se virou para ir ao quarto, Eollo a

    segurou pelo pulso.

    - No preciso. No vou me demorar disse ele, sem alterar a expresso sria,

    fazendo Sherry gelar. Vim apenas dize-lhe adeus.

    - Oh, no, Rollo! Ainda no... por favor! gritou ela, tentando abra-lo.

    - Sinto muito, Sherry. No tenho outra opo. O navio parte amanh de manh.

    - Oh, meu Deus! Trmula, ela afastou-se de Rollo antevendo um futuro solitrio

    e sem perspectivas. Gostaria de ir com voc sussurrou.

    Os olhos de Rollo dispensavam palavras, e Sherry perguntava-se por que a vida

    lhe preparara aquela armadilha cruel. Rollo estava ali, sua frente, to vivo, to real e, no

    entanto, to distante!

    Distraidamente, Sherry arrancou uma flor murcha do vaso sobre a mesa, dizendo:

    - No creio que voc v me escrever, no ?

  • - Nunca fui bom com cartas.

    - O tom frio de sua voz a assustou, pois ela o conhecia o suficiente para saber que

    no deveria esperar mais nada dele. Bem, se ele queria mesmo pr um ponto final em

    tudo, que o fizesse de uma vez, pensou ela.

    - Voc precisa ir agora ou pode ficar um pouco mais? ela perguntou, temendo

    que Rollo partisse antes que ela pudesse dizer-lhe tudo o que queria.

    - Estou livre at amanh, na hora da partida.

    - Rollo, voc... Sherry hesitou por alguns instantes, procurando criar coragem.

    No era fcil contrariar princpios em que sempre acreditara. Mas amava-o to

    desesperadamente que nada mais tinha importncia naquele momento, a no ser a

    esperana de que ele voltasse algum dia... Voc quer passar a noite comigo?

    - Houve um breve silncio, durante o qual Sherry no teve coragem de encar-lo.

    Seu rosto ardia como brasa.

    - Voc sabe o que est me propondo? Quer realmente que eu fique e faa amor

    com voc?

    Ainda estava em tempo de voltar atrs, de agarrar-se a um resqucio de amor-

    prprio que lhe restasse e mand-lo embora; mas o desejo, a nsia de t-lo a seu lado no

    lhe permitiam.

    - J que no o verei mais... Fez uma pausa para conter as lgrimas. J que

    temos de dizer adeus, quero que voc fique e que me ame!

    - Sherry... Ele a tocou suavemente nos ombros, voltando-a para si, com os olhos

    cheios de ternura. No vai se arrepender amanh ou depois?

    - No importa o amanh! desabafou ela, em prantos, abraando Rollo

    desesperadamente. A nica coisa que me importa ter voc comigo, ao menos por uma

    noite!

    - No pense que no quero ficar com voc, Sherry querida... disse ele,

    enxugando-lhe as lgrimas com carinho. Eu a desejo mais do que tudo neste mundo,

    mas...

    - Eu o amo! ela o interrompeu, temendo uma recusa.

    - Oh, Sherry... Sherry, meu bem! Por que as coisas tm de ser to difceis?

    - Voc no vai me rejeitar, vai? indagou ela, abraando-o com desespero.

    Ele ento a beijou sfrega e apaixonadamente, envolvendo-a nos braos fortes,

    deixando bem claro o quanto a queria.

  • Sherry escorregou as mos at o pescoo de Rollo, acarinhando-o com ternura.

    Alucinado de desejo, ele a tomou nos braos e a carregou at o quarto, abrindo-lhe o

    roupo. Os seios de Sherry saltaram redondos e lindos! Rollo os afagou gentilmente

    enquanto suas bocas uniram-se num beijo ardente e sensual. A chama inconfundvel da

    paixo tomou conta de ambos, apagando todas as dvidas.

    De repente, Rollo desprendeu-se de Sherry e afastou-se, confuso.

    - Sherry, sinto-me um canalha. Voc tem certeza de que isso o que quer?

    - Sim sussurrou ela, convicta.

    Levando as mos at a cintura, Sherry soltou o lao que prendia o roupo,

    despindo-o, vagarosamente. Ao deix-lo cair ao cho, percebeu um brilho selvagem nos

    olhos de Rollo, que a admirava, completamente extasiado.

    - Sherry! Voc linda! murmurou ele, comeando a se despir sem deviar os

    olhos da linda imagem sua frente.

    Era excitante ver o corpo msculo e bonito de Rollo nu. Ele era alto, ombros

    fortes, trax largo, abdome firme e pernas musculosas. Assim, belo e bronzeado, sua

    frente, ele parecia uma esttua de Apolo que tomava vida e estava ali, prestes a aam-la.

    Sherry aproximou-se e o envolveu pela cintura. Um delicioso arrepio percorreu

    todo seu corpo ao sentir o contato do peito msculo de Rollo contra os seios macios.

    Ela ergueu a cabea, com um sorriso tmido, e foi surpreendida com um beijo

    ardente que lhe explorou toda a doura da boca; enquanto suas costas eram acariciadas,

    causando-lhe reaes jamais imaginadas, Sherry queria desfrutar de cada segundo ao lado

    de Rollo, desejando que aquela noite durasse uma eternidade.

    Finalmente, Rollo a carregou nos braos, levando-a para a cama. Depois,

    deitando-se ao lado dela, acariciou-a habilmente, provocando-lhe loucos desejos. Suas

    mos deslizavam, por entre as coxas de Sherry, vagarosamente, fazendo-a quase

    desfalecer de prazer.

    Com voz rouca, ela pediu:

    - Venha! Agora!

    Ele ento cobriu o delicado corpo de Sherry com o seu, forte e msculo, e

    cuidadosamente, a possuiu.

    Sherry sentiu um pouco de dor a princpio, mas as deliciosas sensaes que se

    seguiram fizeram com que ela esquecesse tudo... Abraando-o com fora, ela entregou-se

    completamente quele prazer inebriante, desejosa de que ele no parasse mais...

    Juntos, atingiram o clmax total; mesmo assim permaneceram abraados um ao

    outro, imveis e deliciados.

  • Sherry sentia-se feliz! Rollo a fizera verdadeiramente mulher e lhe proporcionara

    uma sensao inebriante de paz e, ao mesmo tempo, uma energia indescritvel.

    Porm, quando ele se afastou para deitar-se ao seu lado, ela sentiu o medo tomar

    conta de seu corao frgil. Era porque de repente, lembrava-se de que aqueles

    momentos de felicidade seriam muito breves...

    Como que adivinhando os pensamentos dela, Rollo a abraou com ternura.

    Sherry encostou a cabea no ombro forte, tentando prolongar ao mximo a sensao de

    estar junto do homem a quem amava desesperadamente!

  • CAPTULO IV

    Sherry permaneceu longo tempo abraada a Rollo, ainda sob o efeito magntico

    dos preciosos momentos que desfrutara com ele.

    - Em que voc est pensando agora? indagou Rollo, acariciando-lhe os cabelos.

    - Estou pensando que jamais me esquecerei desta noite enquanto viver

    respondeu ela, suspirando e apoiando-se nos cotovelos para admir-lo melhor. E voc

    em que est pensando?

    - Eu penso que somos dois loucos por no termos nos lembrado de que voc

    poderia engravidar disse ele, um tanto preocupado.

    - Esse foi um risco que eu j havia imaginado quando lhe pedi que ficasse.

    - Mas e se voc...

    Sherry o fez calar-se, pondo as mos gentilmente em sua boca.

    - No se preocupe! Vai dar tudo certo...

    Rollo beijou-lhe as pontas dos dedos e, em seguida, a palma da mo, causando-

    lhe arrepios... Depois, voltou a abra-lo. Preguiosamente, ela deslizou o corpo para

    junto dele e repousou a cabea no seu ombro outra vez.

    Aquele despertar de sensaes esentimentos era lago totalmente novo e

    assombroso para Sherry!

    Ambos sabiam que, infelizmente, aquela noite terminaria, mas no queriam falar

    sobre isso. Tambm no havia necessidade de palavras para expressarem o que sentiam.

    Assim, preferiam permanecer calados, um juntinho do outro...

    De repente, Rollo puxou-a de encontro a si, lbios e mos exigindo e obtendo

    uma resposta instantnea e, mais uma vez impelidos pela paixo, eles se amaram. E no

    houve corpo, mente, alma ou individualidade naquele contato. Tudo parecia ter se

    transformado em uma nica energia, controlada pela corrente de emoes que se

    apoderara de ambos, deixando-os exaustos ao se separarem.

    Instantes depois, extenuada e envolvida pelo abrao carinhoso de Rollo, Sherry

    perguntou-lhe:

    - Acha que fui muito imprudente por ter me entregado a voc?

    - Talvez... mas jamais me esquecerei desta noite murmurou ele, beijando-lhe

    docemente os cabelos.

  • Aquelas palavras a trouxeram de volta realidade, soando-lhe como um preldio

    doloroso da manh seguinte. Voltando-se para Rollo, acarinhou seu belo rosto com a

    ponta dos dedos. No era suficiente falar com ele, era preciso toc-lo. Ela queria ser

    corajosa e no chorar, mas o sorriso triste nos lbios de Rollo a desconcertou. Era como

    se ele tivesse adivinhado os pensamentos dela; ento lgrimas incontrolveis rolaram

    pelas faces de Sherry.

    - Oh, Rollo, querido... como poderei viver sem...

    Ele impediu que ela terminasse a frase, calando-a com um longo beijo.

    - No vamos tornar as coisas mais difceis do que j so advertiu ele, estendendo

    o brao e apagando a luz do abajur. Durma, e sonhe comigo! Eu tambm vou sonhar

    com voc!

    Sherry concordou, submissa, mas sabia que no conseguiria dormir. Ficaria ao

    lado dele, sentindo-lhe a proximidade e o calor do corpo viril. Tudo o que queria era

    aproveitar ao mximo aquelas ltimas horas ao lado do homem amado.

    O relgio ao seu lado, sobre o criado-mudo, roubava-lhe os segundos preciosos

    em batidas constantes e impiedosas. Enquanto isso a respirao suave de Rollo alertou

    Sherry de que ele j estava dormindo.

    Como ele pode dormir numa hora dessas?, Sherry perguntou-se, magoada.

    Sabendo que logo estaremos distantes... Mesmo assim, ela no estava arrependida. No

    se arrependeria nunca de t-lo amado e de ter sido feliz...

    Gentilmente, ela deslizou a mo pelo trax de Rollo, sentindo as batidas

    compassadas do seu corao. Afinal, um ano no era tanto tempo assim... valeria a pena

    esperar! At l, aquela noite de amor seria o nico lenitivo para a sua solido...

    Apesar de sua determinao em permanecer acordada, Sherry acabou caindo no

    sono profundo... Acordou assustada, com o barulho estridente do despertador, em sua

    cabeceira, na manh seguinte. Meio zonza, ela virou-se para travar o relgio. S ento

    percebeu que as roupas de Rollo no estavam mais cadas no cho, como ele as deixara

    na noite anterior.

    Voltou-se rapidamente para o outro lado da cama e constatou desesperada, que o

    lugar de Rollo estava vazio. O frio dos lenis indicava que ele partira h um bom tempo,

    enquanto ela dormia, sem ao menos dizer-lhe adeus.

    - Por que no me acordou? ela gritou, mas sua voz encontrou o vazio.

    Agarrou o travesseiro sobre o qual Rollo dormira, comprimindo-o contra o rosto.

    Naquele instante vislumbrou um bilhete sobre a cabeceira. Sherry pulou da cama e

    apanhou-o rapidamente. Ao abri-lo reconheceu a letra de Rollo e sentiu o corao

    apertado. Foram preciso alguns segundos para que ela pudesse controlar-se e ler o bilhete

    dele:

  • Sherry querida, voc dormia como uma criana, e no tive coragem de acord-la.

    Tambm no queria dizer-lhe adeus, pois prefiro lembrar-me de voc sorrindo...

    Se por acaso voc insistir nessa idia maluca de esperar por mim, desista! Um ano

    muito tempo! Muitas coisas podem acontecer... As pessoas mudam, e os sentimentos

    tambm. Portanto, se voc encontrar algum que possa faz-la feliz, case-se! No perca

    seu tempo esperando por um homem a quem voc deu tanto sem receber nada em

    troca.

    Jamais me esquecerei de sua ternura, nem desta noite...

    Rollo

    Havia algo de estranho naquele bilhete, mas Sherry no sabia explicar o que era.

    Releu o bilhete com mais ateno. Nele, Rollo lhe dizia que no esperasse por ele, que se

    casasse com outro...

    Sherry sentiu-se enormemente humilhada com aquele pedido absurdo, depois

    dos momentos incrveis de amor. Entregara-lhe seu corpo, despira sua alma, mas ele no

    lhe dissera, nem ao menos uma vez, que a amava. Acalentara um sonho impossvel, sem

    dvida! E agora Rollo a despertava para a dura realidade...

    - O que voc esperava, afinal? perguntou-se ela, sem conseguir conter as

    lgrimas. Rollo no havia avisado que no existiria compromisso nenhum? Ele no a

    enganara, em nenhum momento...

    Sherry encolheu-se na sua cama, sentindo-se miservel. Rollo partira, e

    provavelmente nunca mais voltariam a se ver. Aquela era a fria verdade! Enxugando as

    lgrimas, ela prometeu a si mesma no chorar mais...

    Sherry agarrou-se ao trabalho como a uma tbua de salvao. Procurava no

    pensar em Rollo, mas era difcil esquecer algum que se tornara to importante em sua

    vida em to pouco tempo. Quando Brenda lhe perguntava sobre o assunto, ela

    simplesmente lhe respondia que estava tudo acabado. Entretanto a amiga sistia, curiosa,

    querendo saber detalhes.

    Um ms depois, Brenda pediu licena do trabalho, em virtude do seu estado, e

    Sherry de certa forma sentiu-se aliviada por no t-la mais por perto aborrecendo-a com

    perguntas s quais no queria responder. Entretanto, passado algum tempo, Sherry,

    sentido falta da amiga, foi visit-la.

    - At que enfim voc veio me ver! exclamou Brenda, feliz, ao recepcionar a

    colega. sua tarde de folga?

    - Sim respondeu Sherry ao entrar na sala de estar, sentando-se. Voc est

    muito bem! comentou ela, olhando para o ventre da amiga bastante saliente.

  • - ... Jonathan est cuidando bem de mim. Nunca fui to mimada como agora!

    Voc teve notcias de Rollo?

    - No. J lhe disse vrias vezes que ns terminamos tudo, no foi?

    - Mesmo assim, achei que talvez voc pudesse ter alguma notcia dele. No tive

    inteno de irrit-la.

    Seguiu-se um silncio constrangedor entre as duas, e Sherry cerrou os punhos,

    tensa. Aquela visita tinha um motivo especial. Era algo que ela precisava contar a Brenda,

    mas no estava sendo fcil. Finalmente, criando coragem, Sherry disse, de chofre:

    - Brenda, vou deixar a Cidade do Cabo dentro de duas semanas - O que?

    exclamou Brenda, arregalando os olhos, surpresa. No acredito! Voc sempre disse

    que jamais conseguiria viver em outro lugar! O que a fez mudar de idia?

    - Estou precisando mudar um pouco de ares. . Vou passar algum tempo com

    minha tia, depois no sei para onde vou.

    - No possvel! Ser que esta deciso tem algo a ver com Rollo?

    - Ora, Brenda! exclamou Sherry, com um sorriso pouco convincente nos lbios.

    Por que voc no acredita que a paixo que eu tinha por Rollo morreu, depois que

    ele se foi?

    - Fico mais tranqila, ento... murmurou Brenda, olhando para a amiga com

    certa desconfiana.

    Apesar de sua aparncia alegre, Sherry se remoa por dentro. No gostava de

    mentir para Brenda, mas para que preocup-la?

    - Preciso fazer tanta coisa antes de partir! Creio que no terei tempo de vir v-la

    novamente afirmou Sherry, mais tarde, enquanto tomava uma xcara de ch com a

    amiga. De qualquer forma, assim que me estabelea, escreverei.

    - Tem certeza de que isso o que voc quer?

    - Absoluta! respondeu Sherry, colocando a xcara sobre a mesinha da sala.

    Brenda, gostaria que me fizesse um favor...

    - s dizer o que respondeu Brenda, solcita.

    - Se, por um acaso, algum dia Rollo perguntar por mim, no quero que lhe d

    meu endereo.

    - Voc acha que isso poder acontecer?

    - No. Mas, se ele me procurar, no lhe diga onde eu estou. Voc promete?

    - Est bem. Se voc quer assim...

  • Sherry no sabia por quanto tempo conseguiria manter as aparncias, por isso

    no prolongou a visita. Brenda era inteligente e a conhecia bem demais; logo iria

    desconfiar de alguma coisa... Abraou Brenda, despedindo-se, apressada. Sentiu-se como

    se tivesse rompido um elo que lhe era muito importante. Porm, aquilo era o melhor a

    ser feito. Em poucos meses, Sherry no conseguiria encarar Brenda sem ficar

    envergonhada; tambm no queria piedade de ningum.

    Naquela mesma noite, aps o banho, Sherry examinou minuciosamente as

    formas do seu corpo diante do espelho, no quarto. Os seios eram firmes e proporcionais

    ao resto de seu corpo, os braos e as pernas, bem torneadas. Sua aparncia, no geral, no

    a desagradou, mas, ao passar as mos pelo ventre, franziu a testa, preocupada. Em breve

    todos saberiam do seu segredo.

    Desanimada, procurou uma camisola para vestir. Pensou em Margaret Jeager,

    sua nica parenta, na frica do Sul, e a nica pessoa que poderia ajud-la. Era irm de

    seu pai e jamais se casara. Tambm tinha sido enfermeira e, ao se aposentar, mudara-se

    para Kromriver, uma pequena cidade do interior. Tia Margaret saberia o que fazer, por

    isso Sherry decidiu procur-la.

    As duas semanas que se seguiram passaram com rapidez, e Sherry sentiu um n

    na garganta ao deixar o hospital. Disse adeus enfermeira Naude, que ficou bastante

    surpresa com aquela deciso repentina. Justamente a mais promissora das enfermeiras!

    Sherry, ento, explicou-lhe que necessitava de uma mudana de ares.

    Kromriver situava-se numa regio quase deserta, muito quente naquela poca do

    ano. Os trinta quilmetros que ainda restavam para o final da viagem pareciam trezentos,

    e Sherry sentia-se fatigada. Entretanto no diminui a velocidade do carro.

    Quando finalmente avistou, ao longe, a torre da igreja, ela pisou mais forte no

    acelerador, ansiosa por rever a tia, que certamente dia estar esperando-a com uma

    refeio saborosa.

    Ao chegar a Kromriver, Sherry constatou que a temperatura estava bem baixa por

    ali. As estradas no eram asfaltadas, as lojas eram pitorescas, mas muito antigas; e, pelas

    ruas, galinha corriam assustadas, na frente do carro, medida que este se aproximava. A

    maioria das casas estava fechada, pois os fazendeiros do distrito vinham apenas nos fins

    de semana, para fazer compras na cidade e assistir missa, no domingo.

    Dobrando esquerda, Sherry entrou em uma rua estreita e estacionou o carro em

    frente a um belo jardim. Chegara, afinal, casa de sua tia. Foi recebida de braos

    abertos pela simptica senhora de cabelos brancos e olhos claros.

    - Sherry! Que bom rev-la! disse ela, abraando a sobrinha. Vamos entrar e

    comer alguma coisa antes de cuidarmos da sua bagagem.

  • As duas tinham muito sobre o que conversar no tocante famlia e enfermagem.

    Apenas depois do jantar, foi que Sherry teve a oportunidade de tocar no assunto que a

    levara a Kromriver. Ela aproveitou a chance quando Margaret comentou:

    - Se eu tivesse a sua idade, Sherry, jamais passaria minhas frias com uma tia

    velha neste fim de mundo. Diga-me, honestamente, por que veio at aqui?

    Sherry enfrentou o olhar desconfiado da tia, encorajada pelo seu sorriso bondoso,

    e respondeu com sinceridade:

    - Estou grvida.

    A longa experincia como enfermeira ensinara Margaret a manter a calma.

    - Voc sabia o que estava fazendo, Sherry?

    - Sim disse ela, igualmente calma.

    - Voc o amava?

    - Muito!

    - Mas ele no correspondeu aos seus sentimentos, no ?

    - A princpio, pensei que sim, mas depois vi que me enganei. Ele seguiu viagem

    para o Plo Sul, h trs meses. Provavelmente ficar l um ano ou mais. Se ele me

    amasse, pediria que eu o esperasse; entretanto preferiu romper comigo antes de partir.

    - Voc no vai lhe contar que est esperando um filho dele?

    - No! Sherry meneou a cabea, com lgrimas nos olhos. a ltima coisa que

    eu faria...No quero que ele saiv. Jamais!

    - No pretendo influir na sua deciso, Sherry, mas acho que esse homem tem o

    direito de saber que ser pai.Ou voc quer dar o beb para adoo?

    - No! Sherry arregalou os olhos, assustada. Quero esse filho! Ele tudo o

    que eu tenho na vida!

    - Voc acha que suficientemente forte para suportar os obstculos que a

    aguardam?

    - Suportarei tudo! Contanto que tenha meu filho ao meu lado! A velha senhora

    sorriu, mais tranqila.

    - Fico feliz em ouvi-la falar assim, minha filha. claro que voc vai ficar aqui

    comigo. H muito espao para ns. Cuidarei de voc durante a gravidez, e discutiremos o

    seu futuro depois que o beb nascer.

    - Oh, tia! Vim aqui procura de ajuda e de conselhos, mas no esperava receber

    tanto!

  • - Ora, para mim, como se voc fosse minha filha! Exclamou Margaret,

    sorrindo.

    Sherry ergueu-se para abraar a tia, que a acolheu nos braos com carinho. Pela

    primeira vez, desde que engravidara, ela sentia-se segura e reconfortada.

    O nico mdico da localidade estava necessitando de uma enfermeira para

    assessor-lo, e Margaret tratou logo de apresentar-lhe a sobrinha.

    O dr. Gordon Shaw era um homem alto, forte, corpulento e beirava os quarenta

    anos. Seus cabelos despenteados e os olhos vivos cor de avel davam-lhe um ar de

    menino desprotegido, e Sherry logo gostou dele. Por sua vez, o mdico a recebeu com a

    mesma simpatia, reconhecendo logo suas qualificaes profissionais.

    - Voc pode comear daqui a duas semanas informou ele ao final dos testes.

    Embora tivesse ficado feliz com o resultado, Sherry sentiu-se na obrigao de ser-

    lhe honesta.

    - H um problema... comeou a falar, mas foi interrompida.

    - Sei que est grvida disse o mdico, recostando-se na cadeira. Arranjarei

    algum que a substitua, quando for o momento, mas o emprego por enquanto seu.

    - O senhor muito bondoso, dr. Shaw.

    - Estou apenas precisando de uma pessoa experiente. S isso afirmou ele,

    erguendo-se dando a entrevista por terminada. No esquea, daqui a duas semanas!

    - No esquecerei! ela respondeu, alegre. E retirou-se do consultrio.

    De volta casa da tia, Sherry sentia-se muito mais leve. Tinha sido uma excelente

    idia a da tia Margaret, retomar suas funes ali em Kromriver. O trabalho ajudaria a

    esquecer suas decepes...

    Com o passar do tempo, o dr. Gordon transformara-se em algo mais que simples

    patro, para Sherry. Alm de seu mdico, era tambm seu amigo. A alma sensvel

    daquele homem sabia perceber os sentimentos que as pessoas ocultavam por trs de uma

    falsa aparncia. Ela gostava muito de conversar com ele, e o nico assunto que no

    abordavam era Rollo, o que era compreensvel.

    O beb nasceu em uma fria tarde de outubro. Emocionada, Sherry o tomou nos

    braos, contemplando o rosto rosado do menino. Agora as dificuldades seriam muito

    mais amenas...

  • Nos meses seguintes Sherry manteve-se o tempo todo ocupada com a criana,

    com o auxlio da tia. David era uma criana linda e extremamente parecida com o pai!

    Aquela semelhana trazia-lhe recordaes distantes, mas que j no a faziam sofrer.

    Afinal, o pouco tempo em que ela e Rollo estiveram junto tinha sido simplesmente

    maravilhoso... Entretanto a dor daquela sbita separao no a abandonava nunca!

    Certa noite Gordon levou Sherry para jantar no restaurante do hotel local. Aquela

    no era a primeira vez que jantavam ali, mas Sherry pressentia que algo diferente iria

    ocorrer ento.

    Durante o jantar conversaram normalmente, mas, aps o garom ter-lhes servido

    o cafezinho tradicional, Gordon conduziu o assunto justamente para o lado que Sherry

    temia.

    - H quanto tempo ns nos conhecemos Sherry?

    - H quase dois anos. E voc tem sido um grande amigo!

    - Procurei ajud-la no que me foi possvel e fico contente por isso. E tomou-lhe

    as mos, olhando-a nos olhos. Mas ser que posso ter esperanas de algum dia ser para

    voc mais do que um simples amigo?

    - Eu gosto muito de voc, Gordon, mas... comeou ela, cuidadosa.

    - Quando uma mulher fala assim, o homem percebe logo que no tem muita

    chance, mas advirto-a de que sou paciente disse ele, com um sorriso nos lbios. Vou

    venc-la pelo cansao. Voc ver!

    - Oh, Gordon! exclamou ela. Voc uma pessoa maravilhosa. Merece algum

    melhor do que eu.

    - Se voc tem um conceito to bom assim a meu respeito, ento j tenho um

    ponto a favor brincou ele, apesar do desapontamento. Atualmente acho que est

    precisando de umas frias. Tenho sido um grande egosta em fazer voc trabalhar tanto!

    Gordon mudou de assunto de repente.

    - No quero tirar frias agora Sherry protestou diante da idia de ficar dias e dias

    desocupada.

    - Mesmo assim vou dar-lhe umas frias. J arranjei uma substituta que chegar

    amanh; portanto, voc tem dois dias para ensinar-lhe o servio, antes de sair.

    - Voc quer dizer que estou de frias a partir de segunda?

    - Sim. Trinta dias.

    Sherry estava de mau humor quando Gordon a deixou na casa da tia, mais tarde.

    Frias! Droga! O que iria fazer durante todo aquele tempo?

  • - Voc tem trabalhado muito e precisa de um descanso ponderou Margaret

    durante o desjejum, no dia seguinte, quando Sherry comentou sobre o assunto.

    - Mas no tenho nada para fazer, tia!

    - Eu tenho uma idia, Sherry. Voc precisa se distrair um pouco... Por que no

    faz uma viagem? No poder levar David junto, claro, seno no conseguir descansar.

    - No posso deixar David...

    - Ele ficar bem comigo! interrompeu a tia, autoritria. Tome um trem,

    Sherry, e v at a Cidade do Cabo visitar seus amigos! Isso ajudar voc a relaxar um

    pouco.

    - No irei at l.

    - No h motivo para voc no ir mais l! Aceite meu conselho, querida. Enterre

    o passado de uma vez por todas e pense no seu futuro. No futuro de David... e talvez no

    de Gordon.

    - Voc... voc sabe? indagou Sherry, surpresa.

    - No sou cega, sabia? Ele est apaixonado por voc desde que a viu pela primeira

    vez, mas voc andou desligada demais para perceber isso.

    - Nunca haver mais que amizade entre ns!

    - o que voc diz agora, mas poder mudar de idia mais tarde, quando

    esquecer o passado. Tomou as mos da sobrinha, carinhosa. Vale a pena tentar!

    Ambas se entreolharam por um momento, e Sherry percebeu que a tia tinha

    razo. J era tempo de ela enfrentar a realidade, e para isso deveria voltar Cidade do

    Cabo.

    - Est bem, toa Sherry concordou finalmente.

    - timo! Fico feliz em v-la reagir diante do passado.

  • CAPITULO V

    De manh bem cedo, Sherry partiu de trem para a Cidade do Cabo, deixando

    para trs sua tia Margaret e David. Alguns minutos antes de chegar ao seu destino, sentia-

    se ainda tensa e nervosa; tinha vontade de desistir. Nem de longe aquelas frias seriam

    relaxantes. Olhou, atravs da janela, a paisagem da montanha prxima cidade, e o

    manto de nvoa que a cobria, apesar do dia ensolarad