você gostaria de participar de uma experiência artística? + nbp (vol2)
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tese de doutorado, arte experimental, arte conceitual, teoria de artistaTRANSCRIPT
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Ricardo Roclaw Basbaum
Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? (+ NBP)
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais, rea de Concentrao Poticas Visuais, Linha de Pesquisa Processos de Criao em Artes Visuais, da Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo, como exigncia parcial para obteno do Ttulo de Doutor em Artes, sob a orientao do Prof. Dr. Martin Grossmann.
Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais Escola de Comunicaes e Artes Universidade de So Paulo So Paulo 2008
VOLUME 2
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Ricardo Roclaw Basbaum
Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? (+ NBP)
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais, rea de Concentrao Poticas Visuais, Linha de Pesquisa Processos de Criao em Artes Visuais, da Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo, como exigncia parcial para obteno do Ttulo de Doutor em Artes, sob a orientao do Prof. Dr. Martin Grossmann. Programa de Ps-Graduao em Artes Visuais Escola de Comunicaes e Artes Universidade de So Paulo So Paulo 2008 VOLUME 2
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Sumrio
Volume I Resumo ........................................................................................................ 4
Abstract ........................................................................................................ 5
Agradecimentos ........................................................................................... 7
Advertncia .................................................................................................. 8
A: Knstlertheorie, Sistemas de revezamento plstico-discursivos ............. 15
B: 5 diagramas, extrao conceitual ............................................................ 57
C: 8 blocos, escrita retro-prospectiva ...........................................................82
D: qual o lugar deste texto? ......................................................................... 206
Bibliografia ................................................................................................... 212
Volume II Anexos Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? .......................... 5
Textos .......................................................................................................... 14
Imagens ....................................................................................................... 79
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Voc gostaria de participar de uma experincia artstica?
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Voc gostaria de participar de uma experincia artstica?
Breve e sucinta descrio do projeto de trabalho Voc gostaria de participar de uma
experincia artstica?, em suas linhas gerais, indicando as etapas atravs das quais
o projeto se desdobra e desenvolve, desde seu incio, em 1994, at a atualidade
incluindo a instalao apresentada na documenta 12 (Kassel, 2007), que veio a ser
a primeira apresentao pblica do projeto em todas as suas etapas.
objeto, circulao
Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? um projeto acerca do
envolvimento do outro como participante em um conjunto de protocolos indicativos
dos efeitos, condies e possibilidades da arte contempornea.
Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? se inicia com o
oferecimento de um objeto de ao pintado (125 x 80 x 18 cm) para ser levado para
casa pelo participante (indivduo, grupo, coletivo ou instituio), que ter um certo
perodo de tempo (em torno de um ms) para realizar com ele uma experincia
artstica. Fig. 58
As decises acerca do tipo de experincia a ser realizada, locais onde ser
desenvolvida e como o objeto ser utilizado, dependem diretamente dos
participantes. Todos os que participam de Voc gostaria de participar de uma
experincia artstica? seja sujeito individual ou coletivo , desenvolvem
experincias de livre proposio e escolha, movimentando-se em terreno prprio.
No colocado nenhum limite ou fornecida qualquer instruo acerca do que deve
ou pode ser feito logo, a partir do momento em que recebe o objeto, este passa a
ser de inteira responsabilidade do participante.
A nica exigncia que Voc gostaria de participar de uma experincia artstica?
impe aos participantes que a experincia realizada seja documentada e os
registros sejam enviados ao website do projeto de modo que se tornem pblicos. A
documentao das experincias realizadas tambm de inteira responsabilidade do
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participante, que deve decidir acerca do meio a ser utilizado e da maneira de realizar
os registros. Assim, os participantes enviam os resultados de suas experincias sob
a forma de textos, imagens, vdeos ou objetos, para serem disponibilizados em
http://www.nbp.pro.br cada participante tem acesso a ferramentas para edio
prpria da documentao enviada.
Ainda que o objeto fsico seja o elemento real e concreto que deflagra os processos
e inicia as experincias, seu papel de fato trazer para o primeiro plano certos
conjuntos invisveis de linhas e diagramas, relativos a diversos tipos de relaes e
dados sensoriais, tornando visveis redes e estruturas de mediao. Alm de uma
srie de tpicos e problemas trazidos pelo prprio projeto e portanto mobilizados
diretamente pelo participante durante as experincias Voc gostaria de participar
de uma experincia artstica? toca em questes em torno da arte e da vida,
abordando o relacionamento entre o sujeito e o outro, conduzindo diretamente a
processos de transformao. Os participantes tm em mos um instrumento para
realizao de suas prprias intervenes e proposio de problemas.
O objeto utilizado em Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? tem
sua forma estabelecida de acordo com o projeto NBP - Novas Bases para a
Personalidade, um projeto em desenvolvimento contnuo compreendendo desenhos,
diagramas, objetos, instalaes, textos e manifestos, iniciado em 1990. O projeto
NBP conecta prticas e conceitos da arte contempornea a estratgias
comunicacionais, associando-se com alguns dos recentes desenvolvimentos do
campo das polticas da subjetividade. A forma especfica NBP foi desenhada para
ser memorizada to facilmente quanto sua sigla: ao experienciar qualquer trabalho
NBP o espectador sai com NBP e sua forma especfica em seu corpo, tal qual um
vrus so utilizadas estratgias de contaminao a partir da mobilizao dos
campos sensorial e conceitual. O projeto NBP busca deflagrar processos de
transformao, na mesma medida em que assimila e incorpora transformaes
como resultado de sua prpria histria e processo.
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Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? claramente um projeto de
trabalho-em-curso, e encontra seu modo de desdobramento no processo mesmo de
seu desenvolvimento. Virtualmente, o projeto no apresenta qualquer fim imediato a
curto prazo, uma vez que sua continuidade deriva diretamente da intensidade e do
prosseguimento das experincias e no depende do tempo de vida do
autor/propositor o objeto concebido como um mltiplo, e novos objetos podem
ser produzidos sempre que se fizer necessrio. Os objetos em circulao no devem
retornar ao artista e portanto seguem um ritmo prprio de circulao atravs dos
diversos participantes.
De 1994 a 2008, Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? teve
construdos e colocados em circulao um total de 23 objetos (o primeiro deles, um
prottipo). At 2006 haviam sido construdas apenas trs peas, sendo que sempre
houve um nico objeto circulando de cada vez, na seguinte seqncia: o objeto
prottipo circulou em julho de 1994; um segundo objeto, de 1994-1999; um terceiro
(objeto clonado por participante), entre 1999-2006.
Com o convite para desenvolver a participao na documenta 12, o projeto Voc
gostaria de participar de uma experincia artstica? passou a ser desenvolvido em
uma escala maior: foram produzidos 20 novos objetos, distribudos inicialmente em
nove pases de trs continentes. Na Europa, foram enviados seis objetos para
Kassel, na Alemanha; um para Liverpool, Inglaterra; um para Viena, ustria; e um
para Ljubljana, Eslovnia. Foi enviada uma pea para Dakar, Senegal, na frica. Na
Amrica Latina, foi enviado um objeto para Valparaiso, Chile; um para Buenos Aires,
Argentina; um para a Cidade do Mxico, Mxico; e sete peas para Florianpolis,
Curitiba, So Paulo, Rio de Janeiro, Rio Branco e Fortaleza, no Brasil. Neste
momento (maio de 2008), existem 18 peas em circulao em 8 pases.
At maio de 2008, esto registradas 107 participaes, envolvendo diversos
indivduos, grupos, coletivos e instituies, em 37 diferentes cidades de 9 pases.
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website
Desde setembro de 2006 o projeto Voc gostaria de participar de uma experincia
artstica? desenvolve-se com apoio de website prprio, hospedado em
http://www.nbp.pro.br, desdobrando-se pelo espao informtico-meditico como
parte integrante da esfera pblica contempornea. A utilizao da internet se d
enquanto rea diretamente integrada dinmica do mundo, permevel aos embates
sociopolticos da atualidade. Tal trao importante para este projeto na medida em
que as atividades e aes realizadas em locais especficos, por participantes
estreitamente conectados s suas reas de atuao sejam espaos de vida
privada, comunitria ou institucional , tm seus registros organizados em relao
direta com a arena pblica do espao eletrnico, incorporando continuidades e
descontinuidades entre os espaos presencial e virtual.
Alm de funcionar como ferramenta de utilizao direta para publicao e edio
das experincias pelo participantes (organizado em forma de blog de atualizao
contnua), o site composto pelo arquivo de documentos do projeto Voc gostaria
de participar de uma experincia artstica? (apresentando textos, diagramas,
folhetos de instrues), e por uma breve apresentao do projeto NBP, em conjunto
com alguns documentos a ele relacionados. A pgina de abertura do site est
desenvolvida atravs de programao dinmica, que permite visualizao do
percurso de deslocamento de cada objeto pelos diversos participantes: os pontos na
tela correspondem aos participantes do projeto; ao passar o mouse sobre cada um
deles, um desenho em linhas azuis revela quais deste pontos esto reunidos em
torno de cada objeto. Fig. 75 Assim medida que novos participantes so incorporados a Voc gostaria de participar de uma experincia artstica?, novos
pontos so acrescentados pgina inicial.
As experincias esto indexadas por data, nome do participante e cidade de
realizao, indicando sempre o perodo correspondente ao incio (recebimento do
objeto) e fim (devoluo do objeto circulao) das aes. Na rea correspondente
a cada participante podem ser postados textos, imagens, arquivos de vdeo e udio:
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cada participante recebe uma senha de acesso e assim pode organizar a
documentao da maneira que melhor lhe convir.
H ainda uma rea aberta para desenvolvimento de comentrios crticos ao projeto
ali, alguns convidados (artistas, crticos e escritores de diversas reas) utilizam a
escrita para tecer um discurso polifnico coletivo que contribuir para a construo
de um corpo crtico acerca de Voc gostaria de participar de uma experincia
artstica?
Desta forma, o espao ocupado na internet vai progressivamente constituindo o
banco de dados do projeto com documentao de todas as experincias
realizadas, descrio do projeto e documentos relacionados ao mesmo tempo que
configura uma constelao polifnica na qual se percebem as vozes de participantes
diversos: trata-se de um processo de construo de pensamento coletivo em torno
de Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? que assim vai sendo
continuamente atualizado.
instalao arquitetnico-escultrica Para apresentao de Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? na
documenta 12 de fato a primeira apresentao pblica do projeto em todas as
suas etapas foi desenvolvida uma instalao multimdia, na forma de uma
estrutura arquitetnico-escultrica. Esta instalao oferece ao pblico visitante a
possibilidade de acessar documentao sobre as experincias realizadas, a partir de
navegao pelo website, da exibio de vdeos produzidos pelos prprios
participantes a partir de suas experincias e da apresentao de uma seqncia de
imagens de experincias na forma de slide-show. O aspecto arquitetnico-
escultrico da instalao permite que o visitante ocupe tanto o exterior como o
interior da estrutura. Fig. 70-73
A instalao arquitetnico escultrica que integra o projeto Voc gostaria de
participar de uma experincia artstica? construda em ferro, revestida com telas
perfuradas tambm de ferro, formando uma estrutura compacta e resistente e ao
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mesmo tempo permitindo transparncia, sem impedir que o olhar percorra o interior
do espao ou mesmo se desloque das reas internas para o lado de fora. As reas
externa e interna so organizadas de dois modos diferentes, ambas porm
oferecendo espaos para que o visitante se acomode: a parte externa composta
de duas arquibancadas, em que os visitantes podem se sentar; a parte interna
formada por duas salas forradas de carpete, oferecendo ainda colchonetes e
almofadas para acomodao do visitante. As duas salas so divididas por uma porta
vazada, permitindo a passagem atravs dos dois espaos. Assim, a estrutura como
um todo permite o contnuo deslocamento entre o exterior e o interior. Um conjunto
de oito cmeras de circuito-fechado est instalado por toda a estrutura, formando um
conjunto de captao de imagens em tempo-real que conduz diretamente rea
interna, dialogando com outras instalaes da srie sistema-cinema.1
Cada uma das salas da rea interna est equipada com quatro monitores de 19, de
modo a transmitir quatro diferentes tipos de imagem: (1) acesso online ao website;
(2) compilao de vdeos realizados pelos participantes da experincia Voc
gostaria de participar de uma experincia artstica?;2 (3) slide-show em DVD de
imagens de experincias realizadas pelos participantes de Voc gostaria de
participar de uma experincia artstica?; (4) imagens em tempo-real enviadas pelas
cmeras de circuito-fechado (4 cmeras transmitem para o monitor da primeira sala,
e 4 para o monitor da segunda sala). Dois pares de fones de ouvido, conectados aos
monitores com o website e com a compilao de vdeos, permitem acesso ao udio
sem que uma transmisso interfira na outra. Dois teclados com mouse trackball, um
em cada sala, permitem acesso ao website.
A estrutura externa da instalao desenvolvida na forma de uma arquibancada,
com 4 nveis so oferecidos espaos para que os visitantes sentem-se para
conversar ou olhar o espao circundante. Alm disso, a rea em torno da estrutura
1 sistema-cinema o nome de um procedimento de captao, transmisso e gravao de imagens, em tempo real, que tenho utilizado, a partir de 2001, em conjunto com a construo de instalaes, intervenes e objetos. Cf. Ricardo Basbaum, roteiro para sistema-cinema. Texto escrito para o livro Transcinemas, de Ktia Maciel (Org.), indito. V. Anexos, neste Volume. 2 Existem at o momento (maio 2008) trs compilaes de vdeos realizados pelos participantes, perfazendo um total de 22 vdeos. Uma quarta compilao est em preparao.
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arquitetnico-escultrica est organizada com painis sobre Voc gostaria de
participar de uma experincia artstica?: so apresentadas informaes conceituais,
lista de participantes e o diagrama do projeto. Fig. 74
Assim, o visitante que percorrer o espao da instalao ter acesso s suas reas
externa e interna: ao mesmo tempo que a prpria estrutura arquitetnico-escultrica
prope um espao a ser vivenciado pelo visitante, so oferecidos ainda elementos
audiovisuais e informativos ali diretamente integrados. Na rea interna, duas salas
exibem documentao referente aos participantes do projeto, composta de registros
das experincias realizadas; na rea externa so apresentados painis informativos
e diagramas, alm de se oferecer uma rea para que cada visitante possa sentar-se
e observar o espao em torno. A acentuada demarcao dos espaos interno (salas
para abrigo) e externo (arquibancadas), tambm se relaciona em termos
escultricos ao prprio objeto utilizado pelos participantes de Voc gostaria de
participar de uma experincia artstica?: pode-se perceber a experincia de
apreenso sensvel da estrutura arquitetnico-escultrica como homloga
experincia de utilizao do objeto.
Existe ainda um detalhe importante na estrutura arquitetnico-escultrica de Voc
gostaria de participar de uma experincia artstica?: um objeto, exatamente igual ao
utilizado pelos participantes, est localizado em uma das reas internas da estrutura,
tendo seu acesso bloqueado por uma porta trancada chave. Assim, este objeto
est apenas disponvel ao olhar atravs das grades metlicas deve permanecer
sempre ali, avesso a qualquer tipo de circulao, alheio ao toque. Desta forma se
estabelece um contraste entre os objetos que esto em circulao por diversos
pases, disponveis para a produo de experincias, e este, que integra, imvel e
inacessvel, uma instalao em espao expositivo.
A estrutura arquitetnico-escultrica de Voc gostaria de participar de uma
experincia artstica? pea que pode ser continuamente atualizada, de acordo com
o prosseguimento do projeto: novos vdeos e imagens podem ser continuamente
acrescentados. De modo que funciona concretamente como estrutura de
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armazenamento e conservao da memria do projeto (vdeos, imagens, website)
uma certa modalidade de escultura-museu aberta a um duplo acesso por parte do
pblico: tanto pode ser apreendida como elemento portador das informaes sobre o
desenvolvimento de Voc gostaria? como ser objeto de experincia esttica,
sensvel.
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Textos
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OLHOS (1985) a questo, ou no a questo da pintura, da marca pessoal do artista a questo da comunicao de massa a questo da sociedade de consumo questo de colocar e juntar os objetos que existem por a, em estado bruto questo de economia de meios questo do souvenir, comprado para presente a questo de estar em todos os lugares ao mesmo tempo a questo questo ou no? a questo questo ou no?
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Caderno de Notas 1990/1991
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O que NBP? (1990) o que NBP ? uma sigla, formada por trs letras, uma espcie de motivao geral ou pretexto de trabalho (quase um programa para aes), um meio para impregnao do espao. Quase um lugar-comum atpico. NBP impregna e contamina. NBP desenvolve-se atravs de trs idias-vetores principais: 1 imaterialidade do corpo A matria orgnica dissolve-se nos ritmos tecnolgicos, na velocidade. Corpos que podem ocupar muitos lugares no espao ao mesmo tempo. Temporalidades que impulsionam espaos; espaos que configuram-se no tempo: continuidades e descontinuidades. Nossos corpos transitando atravs destas oscilaes. 2 materialidade do pensamento O pensamento como algo que pode ser lanado, moldado, construdo, acumulado, recolhido, contrado, expandido, amassado, jogado, corrodo, revelado, ampliado, amplificado, estilhaado, dissolvido, etc. O pensamento envolve as coisas entre elas existe a atmosfera, com Oxignio, Nitrognio, Gs Carbnico, Enxofre, Chumbo, Alumnio, mas tambm partculas de pensamento. Estas partculas desprendem-se de nossos corpos-crebros em fluxos alm de nosso controle, aderindo aos objetos ou a outros pensamentos. Possuem campos gravitacionais e magnticos potentes, que distorcem e alteram imagens todas as imagens das coisas. O pensamento , portanto, essencialmente carregado de potencialidade plstica. 3 logos instantneo o conhecimento visual: arrebatador, sbito, envolvente, imediato, instantneo. Queremos nos instalar, pretenciosamente, dentro deste intervalo mnimo, no interior da instantaneidade melhor dizer ao lado, mas do lado de dentro. No como testemunhas, simples testemunhas oculistas, mas como estratgia para a gerao de outros processos, mltiplos e variados, a partir deste lapso: o intervalo de tempo entre meio emissor (Me - mensagem emitida) e meio receptor (Mr - mensagem recebida):
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t Mr - Me Zero NBP um programa para sbitas mudanas. Quais? Como? Quando? Deixe-se contaminar: elas sero fruto de seu prprio esforo. NBP Novas Bases para a Personalidade
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Dentre essas coisas
(1991)
Trecho extrado do livro Novas Bases para a Personalidade, a sair pela Editora
Incorpus, em 1991. Reproduzido com autorizao do autor.
()
Dentre essas coisas lanadas no mundo, aos milhes, que acontecem ser
chamadas obras de arte, existem aquelas que apelam ao espectador, exigindo
ateno, admitindo incompletude. Que provocam uma ginstica em nossa
percepo; ativam mecanismos formadores dos sentidos; causam um fino
estremecimento, reverberao, disritmia.
Essas coisas no so todas as coisas, so apenas algumas, com certeza as mais
interessantes, pulsantes e ativas. Mas esta abertura de atuao no se acrescenta
simplesmente ao objeto, assim como se adiciona sal ao alimento: o germe da
inconcluso deve ser inoculado na estrutura da coisa, em precisos momentos de seu
desenvolvimento nos estgios de sua formao para que se processe o
adequado entrelaamento entre presena, fluidez e acontecimento. Como resultado,
a coisa surge j moldada enquanto incompletude, voltada ao movimento,
impregnada, em diferentes nveis de sua estrutura, com dispositivos receptores e
ativadores. Os primeiros, reafirmam continuamente o imperativo da autonomia
(fundando para si lugar e territrio); os ltimos, garantem transversalidade
(afirmando abertura, transparncia, trnsito para sentidos, significados, percepes).
Todo o problema, ento, inicia-se, aparentemente, com um processo de inoculao
e contaminao seguido das etapas, tanto instantneas quanto seqenciadas, do
processo de desenvovlimento ontogentico, sempre muito importante. neste
momento, precisamente, que as questes de escolha e deciso avolumam-se,
obrigando a mltiplos ()
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roteiros
(1992 - reviso 2007)
1 volta
Estou dentro. Sei que estou. Caminho, passo por todas as partes, ando, percorro,
subo, deso. No h horizonte, no h frente ou trs ou direito ou esquerdo, apenas
este espao que percorro. No h nada para ser visto e nem possvel enxergar.
Talvez alguns traos de luz, mas nem isso, pois muito pouco. Mas estas mnimas
frestas permitem identificar um quase-desenho, um contorno, algo que desliza, onde
eu deslizo, como espelhos ou verniz. Curvas seguidas de dobras, seguidas de
desvios, seguidos de retas quebradas, seguidas de ngulos contorcidos, seguidos
de falsos sinais, seguidos de impresses digitais, seguidas de grandes plancies.
Quase no h luz, no preciso, no h necessidade, pois este tipo de no-luz
acolhe os passos seqenciados. Muitas voltas iguais no interior da mesma estrutura,
em torno do mesmo orifcio, rbitas paralelas simultneas simtricas no-lineares. O
fluxo percorre movimento ondular neste acelerador, movimento vertiginoso naquele
desvio, movimento mltiplo naquela variante de repetio. Nunca as trajetrias se
superpem, nunca o rebatimento incessante deixa de indicar a acelerao positiva,
mesmo se a permanncia em torno do mesmo ponto implica em velocidade zero,
mas muita insistncia, e contante intensidade, e freqente vibrao, e
conseqncias absolutamente imprevisveis
2 volta
Ainda dentro, uma sucesso de retas, seguidas de curvas angulares. Duas retas
mais longas, duas menores, quatro ainda mais curtas. O som dos passos, a
escurido, o silncio, mais uma volta; respirao, outra volta, outro ciclo, insistncia.
Um tanto estreito este caminho, que no entanto repito. Um passo aps o outro: no
sou eu quem anda, mas o espao dentro do qual caminho que se move. Enquanto
este espao se move, vejo pequenas bordas de luz, alguns poucos raios estriados,
pequenos eclipses, como se formas se sobrepusessem s fontes de luz. A luz
escapa pelas bordas. E este espao que se move parece nunca repetir-se, como se
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eu andasse sempre em frente e o espao sempre em ciclos. Como uma grande
cpsula que se move flutuando por sobre outras cpsulas, que esto sobre outras
cpsulas, rodeadas por outras cpsulas, imersas em lquido oleoso e viscoso,
deslizando. Esta estrutura espacial quem impulsiona, quem liberta a fora do
movimento, quem detona as outras foras: o espao como estrutura-motriz, como
impulsionador temporal, como figura topolgica que exige o fim da fora de
gravidade para o incio de sua existncia. Quem?
3 volta
Desta vez em um tubo, longo, que se abre apenas por dois orifcios, um deles
diretamente conectado ao espao principal, a estrutura cujo interior composto por
esteiras deslizantes, onde ficamos de p com a iluso de estarmos parados, mas
logo ressoamos em um conjunto em que tudo movimento. Desequilbrio. Mas esse
orifcio prolonga-se pelo tubo ao mesmo tempo em que promove uma possvel
conexo com seu interior; no sabemos. Com certeza a configurao da
possibilidade de atravessar: uma transversalidade, que mais do que um corte,
mais do que uma seo. O brilho indica a luz sendo atrada, mesmo no escuro. O
prolongamento trans-in-out-on-cross (trans-inverso-reverso) encurta as distncias e
indica um fim, que no fim mas o local de outra conexo, indica novos receptores
para a estrutura, estabelecendo seu raio de ao: a rede assim formada pretende
irradiar-se por conta prpria ( claro) mas tambm dissolver-se no invisvel ( claro),
como uma presena constante que pode ser ativada em qualquer tempo e em
qualquer momento.
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SUBLIME/SUBLIMINAR
(1992)
Um novo funcionamento perceptivo, duplicado, em que dispositivos de texto e
imagem atuam juntos, simultaneamente, como dois focos emissores/receptores de
partculas sensveis, ressonantes em diversas faixas de freqncia.
Texto e imagem plstica invadem a memria do espectador, instalando-se em seu
crebro, utilizando-se de seu corpo como veculo para deslocamentos no espao e
no tempo, numa estratgia de impregnao e contaminao.
Circuitos SUBLIMINARES ativam possibilidades de transformao, atravs (1) da
SUBLIMAO dos limites e (2) da intensificao da plasticidade, como vias de
acesso instrumentalizao do novo e a processos de complexidade e
irreversibilidade do tempo, aproximando turbulncia e ampliao de campo dos
efeitos de valorao do SUBLIME.
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(?)? Pergunta dentro de pergunta3 (1996) Boa noite a todos. Gostaria de aproveitar a ocasio para comentar junto com vocs alguns aspectos de meu projeto de trabalho, em progresso desde 1989, chamado NBP, que a sigla que criei para a frmula Novas Bases para a Personalidade. Preocupa-me neste momento fugir de um apanhado 'retrospectivo', para no lanar a conversa no passado; preocupa-me tambm a idia de uma especulao voltada para o 'futuro'. Mas certo que no escaparei aqui da oportunidade de fazer um balano das aes realizadas nos ltimos anos: balano em aberto, junto com vocs que tm acompanhado de perto muito do que mostrarei aqui , que sero convidados explicitamente a intervir em tudo o que eu vier a colocar daqui para a frente, nesta conversa. Mas o principal desafio desta noite, creio, ser lanar tudo o que tenho feito em uma atualidade, mostrar que as pesquisas aqui demonstradas pulsam junto aos nervos dos dias de hoje, participam desta vibrao, produzem junto com as coisas que os outros aqui presentes fazem reverberaes decisivas e decididas. Cabe ainda a pergunta, afinal, "o que NBP?" ? (No sei se puderam perceber, mas acabei de enunciar uma pergunta dentro de uma pergunta. Como responder a tal artefato sinttico? Com uma resposta dentro de uma resposta?) Na primeira vez em que foi enunciada, eu certamente estava apenas perguntando algo a mim mesmo, que por um 'acidente qualquer de percurso', veio a pblico. Est claro que no perguntei antes a vocs "o que NBP?". Hoje sim, eu devolvo a pergunta, como pergunta dentro de pergunta, querendo ouvir, querendo saber, querendo arrancar alguma coisa como efetivamente tem acontecido, est acontecendo e acontecer no projeto que desenvolvi, estou desenvolvendo e desenvolverei em torno de uma "experincia artstica", em que recebo de volta respostas quanto ao uso de um objeto NBP (falo disto mais tarde). 1 Imaterialidade do Corpo, 2 Materialidade do Pensamento, 3 Logos Instantneo; corpo, mente, instante; invisibilidade, visibilidade, velocidade; pele, pensamento, comunicao; gesto, ao, estratgia; vocs, eu, agora. Estes traos configuram a
3 Apresentado originalmente em palestra realizada no Centro Cultural Oduvaldo Vianna Filho (Castelinho do Flamengo), no Rio de Janeiro, em 29/01/96, a convite de Aimber Cesar.
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primeira resposta. As linhas de um rpido plano de trabalho, pairam como vetores de um projeto. Uma primeira pausa:
trabalhar com projeto, hoje, indica uma certa opo no rol das escolhas possveis e impossveis, pelas quais somos colhidos, antes que possamos escolher. Resolvi colocar-me nessa direo, compondo uma obra que vai se alastrando de uma proposio a outra, como um conjunto de serpentes deslizando pela areia, combinando entre si a construo de um labirinto oiticiqueano no o "Grande Labirinto", mas aqueles do tipo "newyorkaises", mais 'entertainment'. Configura tambm talvez no to diretamente quanto parece, mas uma conseqncia inevitvel a ser assumida um posicionamento frente ao circuito de arte nos termos de um outro funcionamento, de circulao mais difcil: nas curvas de um projeto de trabalho em progresso superpem-se muitas vezes as determinaes do artista e do crtico, do escritor e do artista, as exigncias da fluncia de um pensamento. As malhas desta rede so delicadas, e circunstancialmente posicionadas em direo diversa de uma demanda mais imediata, exigente de uma identidade clara e transparente s necessidades de um certo tipo de mecanismo de circuito e mercado. Ser? Vejam bem: nada do que disse ancora-se numa posio pr-concebida, mas em resultados e respostas concretas advindas do processo de circulao e recepo do trabalho que tenho feito. E se coloco isto, aqui, na importncia que cada novo exerccio possui na construo deste espao que me interroga, que se anuncia outro, diverso.
(tento comentar muito rapidamente um aparente caso de delay na recepo da obra, que de resto tipicamente brasileiro: "e agora, como vocs respondem minha pergunta, se j deveriam t-la respondido?" Marcel Duchamp, se aqui nascido, jamais escreveria O Ato Criador, onde discute o papel do pblico na recepo da obra de arte.) Estratgia, apenas? No. Assinatura, ento? Nunca. Hipnotismo? Talvez. Reducionismo? Pouco. Exoterismo? Qual nada.
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Subliminaridade? Um pouco. Propaganda? Algumas doses. Narcisismo? No desconfio Interveno pouco modesta, nos registros visual e verbal da arte, ambicionando a produo de marcas em voc. Repito: Interveno ambicionando conectar os registros visual e verbal da arte, querendo ser produtivo, para que voc fale (eu quis dizer, participe). Repito: Estratgia de continuidade no universo das conversas artsticas de modo a prosseguir por meio de novas aes. Repito: Estratgia envolvendo trabalhos em registros diversos, num exerccio de provao da elasticidade do verbo e do seu ouvido. Afirmo (eis, agora, finalmente, a resposta dentro da resposta): NBP estratgia que interveno que verbivisual que mergulho afetivo que fale-voc-mesmo (speak-it-yourself) que imprinting ou estampagem que atualizao que envolvimento e incorporao que compresso sgnica que enigma generoso que distanciamento ntimo que obra em progresso que foi foi foi foi foi. Desculpem-me pela derivao onomatopica, que soa como foyer, que no est longe de nossa galeria nem de nossa galera.
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A memria da memria, esta jia delirante: at aqui, hoje, fiz mais do que evocar a memria de fatos produzidos vividos ou testemunhados. Trago fatos novos, ainda que sob imagens com a sensao de j vistas. Existem aquelas que no cansamos de ver, e aquelas que nos provocam enjos. Entre as primeiras, aquelas que convocamos em momentos especiais, que nos socorrem; entre as ltimas, as que evitamos cordialmente e aquelas das quais fugimos as que nos perseguem! Quero ocupar-me por um instante das ltimas entre as ltimas, as que vm atrs de ns e as que nos vem. As imagens que nos perseguem, muitas vezes s vm atrs de ns por que fugimos delas e demonstramos reaes corporais, suores, outras respiraes ainda que por movimentos de poucos centmetros, registrados por sensores apenas. Trata-se de caso semelhante aos mais modernos artefatos blicos, os msseis termo-sensveis. Vejam: talvez, se no for notado nosso pequeno volteio do rosto, os olhos que piscaram um pouco mais acentuadamente ou o espasmo do msculo da coxa esquerda, no ocorrer a incmoda perseguio. Ou seja, sejamos indiferentes e protegeremo-nos contra vises e divises assim dito, parece simples, fcil, indolor. Mas receio ter que admitir que no existe assim escape to fcil. A imagem que caracterizo deste modo to ativo, de fato nos v, arranca em nossa direo, chispa em nosso encontro, derrama-se pegajosa s vezes, outras como um vento suave ou brisa-leve insistente. Estratgias de defesa atravs da indiferena s alcanam realmente efeito se aquela imagem que nos ataca no existir para ns, se sua existncia jaz naqueles outros mundos dos quais o nosso no faz parte outro regime, outro territrio. Mas ao mnimo indcio de co-habitao, de sincronicidade espao-temporal estamos expostos, localizados, vulnerveis. Imagens que agem, acham, caam, correm, fluem; que vm e vem, bizarramente emancipadas. Muitas nos descobrem pela memria, no de fatos passados isto seria absurdo! Pois o problema aqui o da memria como recurso de tempo presente, da experincia aqui e agora, do inesperado e impensado. Talvez a resida nossa falta de defesa: forjar, num timo, resistncia quilo que nos surpreende, captur-lo, desmont-lo, analisar os pontos fracos e preparar o contra-ataque haver tempo, ainda? Indiferena, o nico escape? Implantes de memria, foi do que falamos. Mas estes, s se processam atravs de mecanismos sgnicos de compactao, da reduo sucessiva, da concentrao de energia.
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"quanto mais poetamenos poesia" (no sei se a grafia est correta), a frmula simptica de Augusto de Campos que importamos, no tardiamente, mas como sinal moderno-redundante de um processo precisamente condensado. Anunciamos, sem pompa, a presena da compresso (vejam: no colocar mais onde cabia menos, atravs do acmulo absoluto de dados em um espao limitado. Esta compresso sgnica de que falamos passa pela produo de mnimos-significantes, com funo deflagradora de contedos que, no caso aqui, so artsticos nem sempre possvel produzi-los, pois exige-se adequao da proposta ao processo). Anunciamos, igualmente sem pompa, a presena de uma fabricao de memria, levada a cabo no mesmo processo. Resumindo: somente no corpo de algum, como suporte (eu, ns, vocs, eles, elas), que o signo comprimido funciona, ativando algo ou sendo desativado (o que a mesma coisa). Admito que creio que, a partir da, algo acontece. E isso nunca ser pouco. Deste ponto, exatamente, partem meus mapas: do que acontece ou pode acontecer. Como quando duas pessoas se encontram, eu e voc, you and me ou se desencontram. E tambm quando se dividem, divergem, embaraam-se; nodulam e modulam-se. Enrolam, envolvem, amarram-se. Convergem ou escapam: linhas de fuga ou de demarcao, atrao e repulso, contigidade, vizinhana. Vazios, cheios, laterais, transversais, fluxos e refluxos. O tema do invisvel est presente, em termos fsicos, maneira do espao desta sala compreendido enquanto coleo de ondas de rdio, televiso, radiaes de todos os tipos, sejam csmicas ou eletromagnticas, ultravioletas ou infravermelhas, atmicas ou subatmicas, raios-X, beta ou gama. Acrescentem, a todo este movimento, as linhas ondulantes do corpo orgnico e psicolgico: vejam, os mapas tornam-se nem tanto representaes cartogrficas mas muito mais superfcies de registro das coisas que acontecem nossa volta, indo e voltando de e para nossos corpos campo afetivo irradiado. Quanto a indicar algumas pistas, recorremos a outros mapas, maneira de roteiros. "Algum j passou por ali?" "Poderia dar-me tal informao?" Impossvel, as referncias mudam muito rpido, o que parecia, se foi, mas posso perfeitamente ter-me enganado. "Vamos, olhe de novo." Sim, insista, mas, aparentemente, tudo que havia para ser visto j o foi. Olhe uma, duas, trs, quatro, cinco, seis n vezes deixe-se conduzir. Gostaria, apenas que a sensao de poucos caminhos fosse
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substituda pelas muitas opes de cadncias e ritmos, numa topografia minimamente divertida, nenhum deserto rido (que , afinal, uma das opes). Sob o risco calculado de voltar a um ponto j aqui delineado, o problema que se repete de que modo desenhar/escrever um diagrama como roteiro de acontecimentos em pleno processo de sua efetivao. No h um depois suficientemente seguro, como abrigo para elaborao to sutil, nem h qualquer antes que valha a pena sem nossos roteiros. Ento Francamente, quem nunca pediu socorro ao outro, quando a situao se afigura incmoda? Ah, mas nem sempre assim; tudo, afinal, se inverte. Vejam, como poderamos ser interpretados se, ao invs disso, pedirmos ajuda ao outro para produzir uma situao no necessariamente cmoda? (nova talvez soe melhor). Pois recorrer ao outro pode ser provoc-lo(a), pression-lo(a), para arrancar algo que no sabemos ainda o que pode ser, mas no qual apostamos, investimos. E que ser aceito como o que nos far desviar (ou do que desviaremos). Quero comentar onde estou agora, por quais flancos inclino-me, curvas de derrapagem. "Voc gostaria de participar de uma experincia artstica? Aceitaria utilizar este objeto em sua casa por um ms?" O contra-senso de ir ao encontro de algum que no conheo, sem local ou hora marcados, acharia equivalncia, talvez, em narrativas de viajantes, exploradores, navegantes, todos os que embrenham-se por passagens e paisagens desconhecidas. Mas todos possuam em mente um esboo de seus desejos, do que desejavam encontrar: ouro, riquezas, terras, descobertas cientficas o elo perdido! Mas uma experincia artstica no pode funcionar com o desejo prvio de qualquer resultado, pois isto seria colocar-me no lugar de quem experimenta Imponho-me um limite, at onde posso e devo ir, o que me permitido fazer, etc. Ou melhor, entender o objeto e a proposta de trabalho enquanto portadores desse eu que recua e recusa, desse bater em retirada estratgico em prol da futura invaso deles! Naquele container no entro, no posso nem devo, de jeito nenhum ser que porque j estou l? Nunca! Perigosa armadilha, que evita que eu tambm seja produzido, transformado e alterado por esse processo. Vejam: pedir para que outras pessoas faam algo com o objeto a minha proposta de experiment-lo! (camos numa cadeia em regresso infinita). No seria ainda exato. Esforo-me, aqui, para minimizar a presena de um gesto inicial, inaugural, mas exatamente no ponto ao lado do objeto fora dele, como uma nuvem por cima, ou um bater de ondas ao lado
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e em baixo que indicam-me como local para constituir-me, posicionar-me, ocupar espao. Garante-se assim a consistncia da proposta e um possvel trnsito, no tempo presente. Esta experincia sobrevive na tenso entre meu desejo de fuga e desaparecimento e a razoabilidade da existncia de um possvel artista. Obrigado.
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Forum Internacional de Revistas de Arte Contempornea
sinopse de apresentao (1999)
Tema III: A crtica como literatura, como filosofia, como interpretao, como fbula e
como prosa
ttulo: "A crtica de arte como um terreno privilegiado da fico contempornea"
Como entender esta afirmao e articul-la nos termos estratgicos da produo de
uma revista de arte? Que tipo de exerccio ficcional interessante hoje como
programa de ao? Trata-se de compreender as possibilidades das ferramentas de
produo do discurso crtico, articulando-o com as condies do campo da arte (e da
cultura) contempornea: produzir sempre um encontro estranho, tenso, sinuoso,
divertido, entre textos e trabalhos de arte de modo a confundir e sobrepor suas
fronteiras e limites. Hoje impe-se um uso da palavra no mais sob o modo reativo
(em que os discursos so produzidos aps os acontecimentos, servindo apenas
para legitim-los ou critic-los, sob a forma do comentrio) mas principalmente
prospectivo, configurando mais do que nunca uma forma de ao, produo de
espao e criao de um territrio. Neste jogo de espacialidades crtica e trabalhos de
arte estabelecem um frtil protocolo de confrontaes: enquanto que os trabalhos de
arte estabelecem as estratgias concretas de ocupao, lanando-se aqui e ali sob
a forma de objetos, imagens, instalaes, performances, etc, o discurso crtico tece
suas linhas atravs de todas essas obras, propondo jogos narrativos ou anti-
narrativos de reordenao e conduo do pensamento. Mas no basta ocupar com
invenes e experimentaes visuais e discursivas este imenso campo de vertigem
verbal-visual: a atualidade nos convida a agenciar esta produo com as demandas
da vida e da cultura, colocando em jogo a fabricao transitria de identidades, a
interveno em contextos locais, o estabelecimento de virtualidades e coordenadas
de ao, o desenvolvimento de circuitos, membranas e regies de contato. a que
entra em cena a revista, como suporte estratgico de um projeto que se quer
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necessariamente coletivo em sua demanda. Escrevo a partir de um determinado
circuito, o contexto da arte brasileira, com suas idiossincrasias e particularidades,
limites e potencialidades. Dentro desta locaizao geogrfica e cultural chamada
Brasil necessrio um esforo imaginativo e ficcional para produzir um jogo de
consistncia discursiva como parte de um projeto efetivo de interveno que se
torna visvel a partir das obras produzidas pelos artistas contemporneos e
entrelaamento com o panorama da atual globalizao e transculturalidade.
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NBP x eu-voc
(2000)
O 'x' do problema
Este 'x' est no lugar da palavra 'versus'. de confronto, portanto, a situao
configurada: esperemos ansiosos, ento, pelo resultado. Posicionem suas cadeiras,
escolham os melhores lugares do estdio. Mas uma vez comeada a partida as
cadeiras de pista, arquibancadas, cadeiras especiais, numeradas e camarotes iro
transportar-se automaticamente para dentro do gramado. a que se passa o jogo:
no lugar de onde se assiste, com quem se assiste, e no o contrrio.
Confronto. A nica continuidade que se efetiva aos saltos. Oportunidade nica
para trazer superfcie conjuntos de relaes especiais, importantssimas,
atraentes, envolventes e sedutoras (boatos urgentes: todos seremos capturados)
"h os que as colocam em dvida, relaes, mas vocs nos arrancam, puxam,
movimentam, exteriorizam, evidenciam, ora pois!" Ateno: nunca os que se
confrontam so eliminados: estaro l, durante e depois, para conferir os resultados,
interagindo novamente, com todas as suas diferenas irredutveis, inevitavelmente,
transmutados em outra classe.
Quando a histria da arte escrita em tempo real como agora todo cuidado
pouco. Uma parte desta histria alimenta o mercado e assim pode sustentar-se
frente s agruras do dia-a-dia (os tempos de hoje no esto fceis). Outra parte
diverte e faz a alegria da mdia, fornecendo pistas para as notcias ou para as
entrelinhas dos noticirios e cadernos culturais. E ainda uma terceira parte (enfim)
aventura-se em caminhos no privilegiados pela percepo ou pelas tramas
habituais da visibilidade, arriscando-se a um traado que no imprime palavras mas
que explora possibilidades (quando possibilidades despertam ateno?). H uma
quarta parte que aparentemente receia o impacto frontal, o confronto que implicar
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no desenvolvimento de outros mecanismos crticos, novos saberes mesmo,
interessantes; esta parece semi-adormecida, em sonmbula atuao.
A situao exige um clculo, sim, pois a tendncia geral das ltimas dcadas
mesmo a da acelerao sempre mais avanada dos processos. Teremos portanto
alguma chance ainda de usarmos os terminais e constituirmos algum tipo de banco
de dados que nos disponibilize pelo planeta. No como uma estratgia de fuga, mas
de disseminao, espalhamento, contaminao se ainda quisermos insistir na
metfora biolgica, agora coisa concreta e mida. Assim, por favor, nada da iluso
de que "entrar para a histria" (expresso de anacrnico som) resolver, quase
anedoticamente, uma parte de nossos problemas (refiro-me queles bsicos, de
sobrevivncia, sob outra temporalidade, aquela da existncia).
Talvez o artista devesse se calar frente ao que faz: "que venha o pblico" (sim, o
silncio uma grande forma de hospedagem). Mas, se falo e ainda assim alguns
vm at aqui, o que devo pensar? Que minhas palavras funcionam como alguma
espcie de filtro, algum tipo de membrana seletiva?
O principal confronto do artista ser sempre consigo mesmo? Sim, livrando-se de
seus 'eus' interiores (personagens remanescentes de uma fico ingnua),
deslocados na medida do possvel para a retaguarda do combate. O grande
confronto que esta posio, este local estrutural (e mvel) do artista almeja localiza-
se alm de um 'ps-eu', caoticamente fragmentado, dissolvido nos olhos dos outros.
Indivduo inventando lugares que criam em torno do outro tal iluso de linguagem
a que pode ocorrer alguma tempestade, tormenta, turbulncia, conflito ou disputa.
"Criar problemas para si prprio", o nome carinhoso desta insensatez.
NBP x eu-voc
Parmetros do projeto NBP so desdobrados sobre inflexes EU-VOC que
constituem pontos de curvatura deste plano.
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NBP entrar em voc pelo lado de fora, encostando em sua pele, mobilizando-o de
leve. Este afinal o processo, ou seja, envolvimento fsico sem demasiado
exerccio ou transpiraes enquanto processo mental: mexer-se sempre, colocar-
se de lado, seguir em frente olhando direita, esquerda, em cima e em baixo.
NBP funciona atraindo o espectador para um encontro perceptivo que envolve
subliminaridade, persuaso e repetio, como tcnicas de uma transformao
instantnea, um implante de memria. Sentir seu corpo obsoleto, obrig-lo a
alongar-se por dentro de um lugar no especialmente confortvel mas nem por
isso menos acolhedor , refaz-lo, reconstru-lo: processar a sensorialidade
(processar-a-sensorialidade), ao mesmo tempo e depois; continuamente.
EU-VOC funciona como tecnologia de visualizao das linhas de inflexo, sob o
impacto destes dois importantes lugares: aquele de quem fala; aquele do outro. Eu
falo, voc ouve. Eu ouo, voc fala. Ambos falam ao mesmo tempo: voc quer ser
eu lanando-me a voc; no mais quero ser eu, contento-me em agir como voc.
A partcula EU-VOC a instaurao do conflito, dinmica no determinista das
relaes onde o resultado imprevisvel. ndice de um jogo de flexibilidades, convite
a viver a vida sob o impacto sinttico de elsticos: o espao aqui simples campo
de atraes, repulses, sobreposies, sob o risco da dissoluo quando de sua
captura no espao ativo do outro. Implanta-se um lugar de jogos, imantao dos
olhos atravs do corpo, do corpo atravs dos olhos, sendo o pensamento parte do
mesmo impulso de sabor forte que tudo percorre aos poucos.
De Como Retirar os Traos de Infinito Secularmente Acumulados no Delrio
Como obter o delrio?
Estado de coisas fundamental como proposio de colocao de coisas.
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Pois vocs sabem, as coisas colocadas formam algo, uma configurao, no mnimo,
ao menos uma demarcao, apenas um local. Pode-se tramar algo como um anti-
local ou um buraco negro em sua concepo antiga, quando ainda trabalhava-se
com a noo de infinito. Quero um delrio afastado do infinito, prximo do desejo,
distante do incomensurvel, isso porque quero por minhas mos sobre ele. Acarici-
lo(la). Vend-lo. Como tocar com os dedos ou com botes, teclados, chaves
conectoras, aquela regio cerebral responsvel pelo comportamento responsvel,
alterando a neurologia do infinito sinptico?
Repito que as coisas encontram-se multidimensionadas, virtualidades empacotadas,
pr-embalsamadas, pr-natalizadas tudo como pretexto de latncia, nada como
muralhas, ao menos se os materiais forem elsticos, extensveis.
Como pensar fronteira e rompimento simultneos? Adoraria obter o delrio, mas no
o infinito clssico, nem a orgia ritualizada, apenas um plano perceptivo amplo,
simplificado, como pacote turstico sem preocupar-me com idas e voltas, cartes
de crdito e cheques bancrios. Delrio eficiente, impulsionador temporal compacto.
Agora os nmeros transpareceriam em suas modalidades lingsticas, em seus
aspectos simblicos, em sua natureza como elementos estruturadores de um
sistema complexo mas que guardam a capacidade de deslocamentos no tempo e
no espao.
Algo que no me obrigue a agir, mas que acontea. Algo como organismos dos
quais se alcance seus pontos-chave. Artifcio eficiente desencolerizado. Delrio
desempregado.
Um acontecimento vivel sob a geografia localizada, nos terrenos da urbe-fantasma,
aqui no circuito eletrificado, o n exerccio de deslocamento do imaginrio ao sol.
Esta tiragem se completar nunca, ao mesmo tempo menor e maior que o infinito,
esse nmero mental localizado, radiografado, com obteno de um copo de gua
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pesada. As infiltraes de substncia branca e substncia cinzenta influem no peso
dos sistemas. O alvo absorve fisiologicamente a viso. Esqueam a contagem
regressiva vdeo-popularizada, pois j iamos o infinito de maneira prtica e sem a
utilizao de guindastes pesados: ele est em rbita, naquela cpsula de chumbo.
Boa sorte.
Esta advertncia matemtica.
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superpronome
(2000)
convergncia de pronomes pessoais
em uma nica palavra.
euvoc voceu
mistura, hibridizao, contaminao recproca
de um pelo outro, de eu por voc, de voc por eu,
numa s coisa. xtase do objeto,
sntese ideal do desejo.
instrumento de negociao para aes
de uma alteridade incorporada, em fuga.
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passagens (NBP) (2001)
Imagens de um cinema expressionista sem sombras, determinadas em um preto e branco de enquadramentos distorcidos, na repetio incessante do percurso das cmeras as mesmas, sempre. Sempre apontando para as passagens, para a moldura das portas, a silhueta que passa. Parecem novas a cada ciclo que insiste em se repetir fazendo-se diferente. (Por qu?) Uma estranha expectativa reaparece sempre e sempre: de momento em momento limpam-se os olhos, sem deixar traos. (EU) olho para um lado, olho para o outro. Fecho os olhos, apuro os ouvidos, baixo a cabea, dobro os joelhos, relaxo os braos, solto os ombros, repuxo a coxa, afrouxo o estmago. to rpido o comeo da nova sesso podemos colocar sob suspeita se de fato tanta coisa aconteceu. Imagens sem sombras que obedecem a si mesmas e no correm atrs de quem passa: procuram lugares que vivem em si prprios e vibram de alegria por reconhecerem, celebrarem e comunicarem sua prpria importncia. Intil espectro de acelerao imprevista.
"...todas as tardes..."
Sim. Aceitar as condies no implica necessariamente "estar em condies de". O que se repete o hbito, o costume de ficar feliz devido s mesmas eternas aes. Querer dar um basta nisso desejo latente, o risco o caos e o impulso pode ser a alegria que pode explodir de tal encapsulamento. Projees como esta podem configurar-se de modo muito idealizado, talvez demasiadamente, no sei. No posso esquecer de sua expresso quando abriu a porta e me viu de repente, ou quando em meio multido ca e fiquei para trs enquanto voc seguia em ritmo constante, imperturbvel. Imperturbvel. Imperturbvel. Imperturbvel.
"...entrementes..."
Muito azar. Azulejos que refletem sombras de corpos errantes. Almofadas oferecendo aconchego a quem se cansa dos passeios rebeldes. Ondas de um mar revolto que se altera a cada olhar. Sons repetidos. O que se conta que as conversas estenderam-se at muito tarde. Seu corpo pode deslizar ao lado da parede e as mensagens que enviar sero bem recebidas, decifradas e redirecionadas para mim. Elas nunca perdem de vista as rampas, elas adoram descer lentamente, elas balanaram todo o cho, elas desapareceram de uma s vez. Treinamentos em excesso. O atraso foi de apenas alguns segundos mas a coincidncia maior no foi comprometida. Derrubar as
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coisas no tem sentido final, a menos que se precipitem por todas as sadas os conjuntos e grupos transformados, transtornados. Sabe, muito se diz a respeito do espao de intimidade de cada pessoa; caberia agora produzir um afastamento das colnias de habitantes que ali se instalaram ao longo dos anos. Nem calor, nem frio.
"...se considerarmos que..."
Se voc no se importar eu no ligo. No insistirei. Voc saiu na frente, avanou primeiro, atravessou. Percebi quando seus olhos reviram-se percorrendo todo o espao. Olhando para baixo, para os cantos, enquanto saltava. Saltando, enquanto andava e sentia na pele impactos diversos. Pensava e buscava equilbrio com os braos no metal frio. Um giro completo do corpo e o percurso percorrido em curvas. Requebrando em meio ao xtase sensorial, logo abandonado antes do clmax. Mudanas sbitas de sentido, planto 24 horas.
"...conforme previamente acertado..."
Confortavelmente desci a rampa, olhos relaxados, sem contar com qualquer imprevisto. Os rudos estavam numa taxa entre o controlvel e o suportvel, mas eu acreditava que se deslocariam agora para a regio do "muito agradvel". Controlar o espao em torno pela dinmica dos sons requer mais do que um envolvimento automtico nas coisas do dia a dia; implica em ateno com a pele. As camadas entre meu rosto e todas as fontes sonoras do mundo neste instante imediato so algo que felizmente escapa determinao, adquirindo autonomia alm dos recursos perceptivos de que dispomos. Tambm as temperaturas do corpo funcionam como ondas, fenmenos parecidos com as mars e correntes, onde a pele, a sub-pele, as camadas que se sobrepem acima e abaixo (ao lado dos ossos?) so sentidas como um ambiente prprio com caprichos e impulsos particulares, ainda que inter-relacionados. Vibraes maiores sob os ps quando se est muito cansado. Em meio multido na praa, ao cair da tarde, depois de horas ao sol, sem querer desviei-me da mensagem que prometia surpresa. A cada mudana de imagem senti que era aquele mesmo o instante de insinuar-me, antes que um cataclisma qualquer destes dirios desviasse completamente a ateno daqueles que gostaria de conservar em meu raio de ao.
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mdulo de transatravessamento do artista-etc.1
(2002)
transatravessamento
autoconteno
o trabalho no est dentro de sala nenhuma, ele mesmo a sala que o contm
oferecer espaos, jogos, gua, almofadas
convite ao esforo de atravessar portas: performance obrigatria
ser visvel ao longe, sem privacidade qualquer, ao mesmo tempo ver
ir com os olhos sem corpo at onde o corpo no pode ir e configurar assim os espaos
sistema em tempo real:
atravessar, jogar, olhar, perceber as aes no mapa, descobrir relaes no mapa
onde estou, onde estamos?
grande escultura, deambular em torno, mirar ao longe
transatravessamento & obstculos
repetio da marca, trauma, obsesso: livrar-se dela e sair de si
envolvimento do pequeno outro e do grande outro coletivo
fantasmtica do mundo interior transformada em anedota bioqumica de domingo
transatravessamento & acelerao
fruio fsica, beleza rompendo a pele atravs do cansao e do acolhimento
jogar: alegria ps encoste a cabea imagens que passam e pensam
contgio rpido todo o pouco tempo do mundo repeties
mirar o alvo apressado sorrisos de sucesso sem premiao, ainda assim satisfeito
sorriso ao crculo em torno de seu pescoo atravesse as passagens msculos em forma
atravs da forma desformat-los em ngulos desfavorveis portadores de promessa
euvoc aqui agora aqui voceu leve deslocamento
processo metlico gigantismo quase que solto junto s coisas desviando ventos
transatravessamento & outros
eu quero ver: gelia adversa
V.C.P.: vivncia crtica participante sem sada, meu bem
entrar e sair permanecendo ali dentro atento aos sons
sim, transatravessamento de segunda a domingo
ver sem olhos ou com olhos nos ps
paisagem cinema registro de pistas e sombras rumo a novos lances
deflagrar a fala na sala discursos considerados voz como importncia fundamental
& passagens: ultra movimentos sensveis transbordantes de
1 Sobre a categoria artista-etc. cf. meu texto Mistura + Confronto no catlogo da exposio homnima, Central Elctrica do Freixo, Porto, Portugal, 2001.
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Sistema-Cinema
(2002)
transatravessamento
acelerao positiva ou negativa: sua velocidade jamais ser a mesma depois deste
contato. No se esquea: o pensamento mais rpido que a velocidade da luz (j
foi dito). Sensorialidade como deslizamento entre o catico e o prazeroso, tocando a
superfcie das coisas (ir e vir, ir e vir, ir e vir so parte do processo ritmos
ocenicos). Afetos criam ligaes de seda com a fora de cabos de ao: conexes,
redes, teias e outras coisas tranadas imersas em tal vocabulrio.
adversa gelia
olhares para o entorno, despindo-se de alguns automatismos, aceitando a fluncia
de outros. Mergulhando no que imensamente nos escapa e resiste e ao mesmo
tempo estranhamente familiar: passando ao lado nos captura e transmite ao longe
sempre. Estado momentneo quase chegando a ser junto comigo.
artista-etc a imagem do que se faz misturando-se ao que no se faz; (des)construindo
enquanto se aponta em mil direes e se apronta em prestaes. Frgil resistncia,
sutil insistncia: nunca apenas um lugar nem a mesma rotina de procedimentos;
sempre as simultaneidades e o olhar magntico, a confiana no lugar. Compactao
impossvel do potico singular que escapa sempre, tudo arrastando em volta. Voraz.
Conteno. Saltos.
Sistema-Cinema V.C.P. 2002
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agentedupla://
(2002)
iniciativa que se prope a:
(1) constituir interfaces membranosas de agenciamento para microeventos
(membranas so permeveis);
(2) costurar redes e tramas cmplices e limtrofes de acelerao e desacelerao do
pensamento;
(3) instaurar um campo crtico que no rejeite os ns afetivos (manifesto-adesivo ns
ns);
(4) investigar a presena, permanncia e pertinncia dos suportes tecno pero no
mucho correr atrs dos dispositivos mecnico-eletro-eletrnicos-digitais enquanto
valiosa ferramenta de ao;
(5) agir e articular projetos definidos a partir de uma profuso de siglas, que
encontram terreno conjunto de movimentao e revelam uma face de trabalho
voltada para o corporativo e/ou comunicativo:
ILA Instituto de Legitimao do Artista e/ou do Amor
PUPA Produtos de Uso Pessoal do Artista
NBP Novas Bases para a Personalidade
VCP Vivncia Crtica Participante
etc
(6) a prtica a da afirmao, onde no se abre mo da ao-arte enquanto
instauradora de territorialidade prpria;
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(7) a pragmtica se dar (vertente B) atravs de intervenes pontuais do tipo
escavaes pseudo-arqueolgicas, confrontos construdos, compilaes de micro-
histria, anti-histria, trans-histria (prefixos multiplicados ao infinito)
(8) parcerias de trabalho (vertente A): entrelaamento de nossas poticas com
(in)consciente permissividade: acreditamos em misturas vitaminadas;
[daniela mattos & ricardo basbaum]
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Circuito de arte em deslocamento
(2003)
1.
O ttulo desta palestra guarda j uma redundncia, na medida em que a prpria idia
de circuito j traz em si a idia de deslocamento: h entrada [input] e sada
[output], entre as quais se do processamentos diversos dentro da caixa preta. Fala-
se tambm em sistema. No que se queira aqui discutir o deslocamento disto ou
daquilo, mas perceber deslocamento como movimento ou estado de coisas com o
qual se trabalha.
2.
Logo, trata-se de pensar o circuito da arte, ou seja, quais os trnsitos que se
estabelecem atravs de seus vrios ns, entre as diversas componentes do
sistema. Fala-se sobretudo em termos de se traar uma economia do sentido ou do
significado da obra e seu jogo de relaes, de modo a dinamiz-lo. A obra de arte
em um circuito, ou um circuito de arte, surgem como noes para este meio a partir
do momento em que a modernidade executa uma dobra sobre si mesma, uma
inflexo em que o moderno deixa de ser apenas crtica da tradio e comea
dobrar-se sobre si: torna-se contemporneo, ps-moderno.
3.
V-se isso claramente nos anos 50, por exemplo, quando diversos rituais do prprio jogo da arte so encenados pela arte: ver os trabalhos e aes de Yves Klein, Piero Manzoni, Robert Rauschenberg e Jasper Johns. Nestes gestos h um esforo para se comear a articular um outro modo de pensar por sistemas, por circuitos. No mais um pensamento linear, evolutivo, em que se supera o anterior tendo como fim a redeno do espao histrico idealizado. Este novo pensamento sistmico em circuito se faz agora por redes, vizinhana, afinidades, afetos (olhar para si mesmo atravs do outro sem aniquil-lo, deixar-se tocar, constituir um campo de relaes, um teatro de eventos), desvios. Quando se tem o movimento do circuito como estado de coisas no h pureza, linearidade, projeto ou fim.
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4.
No campo das artes visuais constuma-se dizer que a noo de circuito ou sistema
de arte consolidou-se de modo muito claro nos anos 60, com a chamada arte
conceitual, que tomou para si a tarefa de investigar a produo de sentido especfica
do campo atravs de um trplice conjunto de manobras: (1) em que o circuito se
torna visvel, evidenciado, lanado a um primeiro plano figurativo e operacional; (2)
em que as obras so desmontadas em conjuntos de relaes, como a muitssimo
utilizada relao entre texto e imagem, mas tambm outras sries envolvendo som,
espao, espectador, etc: temos a as instalaes como meio em que se colocam
diversos destes termos em relao; (3) em que a arte separada da esttica para
que se discuta no apenas a verdade atravs do sensvel, mas sobretudo se
investigue a natureza da obra de arte, as propriedades de um campo artstico, que
no mais se reduz apenas a um elemento do jogo formal mas vai ser definido nas
relaes com seu prprio circuito, e se abrir para um jogo interdisciplinar abordado
atravs de diversas reas do conhecimento. As poticas so articuladas como
campo de problemas, numa via de ao que se estende da interdisciplinaridade
hipermdia. No mais se ir falar de gneros artsticos (pintura, escultura, desenho)
mas de meios sobretudo hbridos disposio do artista Exemplos: tanto o
objeto especfico minimalista (Donald Judd) quanto o no-objeto neconcreto
(Ferreira Gullar) so propostos como hbridos pintura-escultura). A se situa o
nascimento das novas categorias da performance, do objeto e da instalao, assim
como as diversas combinaes das experincias multimdia.
5. Percebe-se desse modo como circuito / sistema passa a ser um modo de pensar,
introjetado na prpria concepo do que se quer obra ou estrutura pensvel,
problematizvel. No se trata de deslocar qualquer objeto, mas de conceber as
coisas de outro modo, enquanto entidades processuais que se lanam de imediato
vertigem de jogos de relaes, ao seu destino de circulao. Estabelecer, trazer
tona os dispositivos de trnsito e circulao no simples exibio de coisas em
seus caminhos ou trilhos, mas sim perceber sentidos em percursos amplos, valorar
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desvios, determinar importncia ao processo de deslocamento como uma entidade
de grupo, elemento coletivo.
6. Organizar as questes em circuito, ordenar as informaes em caminhos,
sistematiz-las: processo muito importante, pois revela que este gesto (de construir
um circuito) modo e maneira de pensamento, que implica na construo de
interface em que se captura o outro e se prope caminhos e estruturas de produo
de valor a partir dos percursos estabelecidos: nfase na processualidade,
proximidade, vizinhana: traar uma rede, agrupar os pontos a partir do gesto de
captur-los, orden-los. Da que o simples gesto de construir o diagrama de um
circuito seja ativar um grupo de objetos-relaes-aes e produzir fios de
pensamento em rede: um circuito oposto do caldo homogneo de objetos similares
e sem valor: prope sempre diferenas dinamizadas a partir da singularidade dos
ns pelos quais atravessa. Desenhar propor relaes, construir rede, rizoma,
conectar o prximo e o distante. A beleza de se desenhar ou propor um circuito
poder arbitrar os centros de atrao, aqueles ns a partir dos quais a rede se
distribui, avana ou recua. Nesta dinmica, passagens e conexes so estruturas de
produo de valor.
7. Da a importncia de projetos como brcolis vhse cinema marginal, onde a simples
construo do site reveste-se de significado por ser exatamente interface a partir do
qual o pensamento se ordena enquanto produo de um circuito que produz valor
para o prprio trabalho constri valor , lanando-se ao mesmo tempo para dentro
de si mesmo e para o exterior. Atravs do website as coisas no so acessadas
diretamente, mas atravs do circuito / interface em que todos os elementos
presentes se reforcem mutuamente, produzindo o efeito de gerao de sentido. Uma
das mais importantes consequncias so as possibilidades que se abrem de
acoplamento com outras estruturas homlogas. Exemplo: The Atas Group e seu
projeto de articulao de vrios meios e suportes, que deslizam uns sobre os outros.
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8.
A prpria arte do vdeo j nasce nessa condio de passagem entre linguagens e
da sua inteligncia ter sempre sido esta: hibridaes, combinaes de
procedimentos de diversos campos. Ou seja: o especfico do vdeo se materializa
sempre em encontros, seja da imagem eletrnica com o cinema, da imagem com o
objeto-instalao, da imagem com a msica, etc. Qual sentido haveria em se buscar
o puro especfico do vdeo? A singularidade deste meio se localiza mais nos
encontros do que em sua auto-definio. Isto est claramente colocado por Nan
June Paik j em sua Exposition of Experimental Television, na Galerie Parnass,
Wuppertal (1963), onde os trabalhos propostos organizam-se como objetos em que
os recursos do aparelho de TV se voltam para si prprios, mas ao mesmo tempo
dialogam com o lugar da comunicao e da construo de redes telemticas. No
h mais como olhar o meio sem considerar sua ampla rede de conexes.
9. A combinao principal para esta compreenso a associao entre ciberntica e
arte conceitual: noo de circuito + ferramentas para discutir o prprio circuito. No
h como negar a influncia de tal combinao nos mais diversos campos do
conhecimento, quando se percebe claramente a dificuldade metodolgica de se
isolar um objeto de contornos estveis cada visada fruto de negociaes de
fronteiras e limites, assim como proposio de campo conectivo, rede, territrio.
Pode-se tambm acrescentar a topologia, como ferramenta renovadora de
visualizao dos objetos construdos dentro destas possibilidades das coisas em
deslocamento.
10.
Deslocar o circuito s pode ser pens-lo, utiliz-lo, reconfigur-lo para mais uma
interveno redesenh-lo. H a uma imperatividade do presente: funcionamento e
permanente atualizao. Um circuito no tem futuro, s o presente de seus usos e
deslocamentos aqui e agora. Entretanto uma dimenso virtual se faz presente na
medida em que mobiliza possibilidades de seu programa. Enquanto for capaz de
viabilizar encontros e conexes um circuito permanece existindo; sem isso,
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cristaliza-se, hibernando at sua prxima possibilidade conectiva. Sejam dinmicas
de grupo, coletivos, revistas, laboratrios, a eficincia das mutaes propostas por
todas estas possibilidades de interveno se d na medida da habilidade de se
perceber conexes entre as coisas, mantendo sua capacidade vibratria de produzir
desvios e redesenhar ainda que momentaneamente seu mapa de ligaes ou
de modo mais perene impor um novo traado para os processos, faz-los
literalmente passar por aqui.
11.
Assim, circuito tambm o informe, o redesenho, o ultrapassamento de limites
olhando para fora de si no exerccio de uma voracidade conectiva. Talvez aqui,
nesse voltar-se para o exterior, se encontrem pistas estticas: o xtase sensorial se
d sempre como o prximo link ou conexo ao mesmo tempo consumo e
transgresso, pois as ligaes em um circuito se do sobretudo entre heterogneos
(relaes, afinal): a diferena a partcula que acopla. Seja oficial ou aternativo,
tudo so circuitos diferindo entretanto em termos de amplitude, maleabilidade,
alcance e fluncia das conexes, potencial de auto-remisso que busca valor em si,
na qualidade das conexes (isto , ligaes fortes, fracas, estveis ou instveis,
conforme o caso). Abre-se o caminho para uma compreenso poltica das dinmicas
afetivas, quando se tem a amizade como forma poltica de construo da
proximidade na distncia, enfatizando as membranas e regies de contato e
agrupamento entre sujeitos singulares e acreditando no potencial transformador de
tais processos (nada de amizade fraterna crist, pacto de sangue ou intimidade
compulsria com o poder: o que se quer aqui o trnsito afetivo como poltica de
alianas entre aqueles que vibram na dimenso de um combate que aquele da
dinmica produtiva das aes coletivas. Ver Francisco Ortega, Para uma poltica da
amizade: Arendt, Derrida, Foucault, Rio de Janeiro, Relume-Dumar, 2002).
12. Diante das poticas do processo, sob a dinmica do trabalho em progresso, no h
como concluir, mas sim colaborar na continuidade (imprevista e acidentada) destes
percursos.
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Diferenas entre ns e eles4
(2003)
Permita-me comear este breve artigo com uma ligeira contradio: convidado para
escrever sobre ns e eles, colocarei a minha nfase em um outro pronome, o mais
do que comum pronome pessoal da primeira pessoa do singular, eu. Nas prximas
pginas, minha inteno conduzir o discurso em torno desse pronome bvio e
superutilizado, movendo-o atravs de caminhos tortuosos e diferenciados que nos
conduziro a muitos fins, antes de finalmente alcanar as reas dominadas por ns
e eles. Assim, voc est convidado a seguir um processo no qual poder
testemunhar os procedimentos de transformao de eu em ns e eu em eles. Se
voc considera essas passagens ou processos particulares de constituio de ns
uma simples questo de adio de vrios eus (eu + eu + eu + eu + eu + eu...), ou a
formao de eles atravs da reunio de vrios eles e elas (ele + ela + ele + ela + ele
+ ela ...), no teramos um problema interessante com o qual lidar. muito mais
desafiador procurarmos outras formas de relao entre os vrios pronomes pessoais
tentemos achar outros modos de chegar a ns e eles escapando da frmula fcil
da simples adio do mesmo. Outros modos de operao e transformao das
palavras sero oferecidos aqui. As principais referncias sero extradas de algumas
imagens que compem certos trabalhos de arte (ou dispositivos similares) que
produzi, organizei ou coordenei nos ltimos anos.
1. jogos e exerccios eu & voc O primeiro processo que gostaria de discutir envolve um projeto em que convido
grupos para vestirem camisas estampadas com os pronomes eu e voc. A
proposta de sempre realizar e participar de jogos e exerccios desenvolvidos
coletivamente (embora s vezes instrues prvias possam ser utilizadas). um
4 Differences between us and them foi publicado em Static Pamphlet [http://www.static-ops.org/archive_october/essay_12.htm] em outubro de 2003, como parte de uma srie de artigos que tinham como ponto de partida questes em torno de us and them. Originalmente escrito em ingls, foi traduzido para o portugus por Jorge Menna Barreto. (N. do A.)
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trabalho sobre dinmica de grupo ao qual sempre me refiro como person ou group
specific5. Todas as vezes os resultados diferem, de acordo com as pessoas que
participam e os grupos que so constitudos durante o tempo em que praticamos
juntos (que pode variar entre um dia e duas semanas). Os resultados so
organizados em duas direes diferentes: uma, o registro estabelecido em relao
memria do corpo, acessvel somente aos que compartilharam da intensidade da
experincia, sendo refratria documentao; a outra, seu oposto, constituda
atravs de imagens e vdeos produzidos durante as aes. Essas imagens so
concebidas e administradas sem o compromisso de representar a realidade da ao
e, portanto, abrem espao para a fico e a narrativa atravs da edio em vdeo e
reenquadramento fotogrfico ou seja, a inteno afastar-se da pura
documentao e estar livre para jogar com as imagens de acordo com propsitos
expositivos, que incluam os principais conceitos do projeto. Portanto, cada
proposio de jogos e exerccios eu-voc acaba resultando em duas experincias:
uma para os participantes e outra para a audincia. Ambas pretendem ser
intensivas. A fotografia abaixo, mostrando um momento desse projeto, nos leva
primeira parada:
eu-voc, serigrafia, camisas, jogos, exerccios. Realizado em Diamantina, Brasil, 2000.
5 Ou seja, que leva em conta e definido a partir da especificidade de cada grupo ou pessoa. Esses termos foram mantidos em ingls para que continuem fazendo relao com o termo site-specific, expresso da lngua inglesa comumente utilizada na discusso sobre arte e que no costuma ser traduzida para o portugus. Sobre esse assunto, ver [www.corpos.org/anpap/2004/textos/chtca/jorge_e_raquel.pdf] (N. do T.)
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Quando proponho uma performao6 de tal conjunto de jogos e exerccios, sempre
insisto em fazer parte do grupo, vestindo uma camisa eu ou voc: no vejo sentido
algum em ficar de fora, atuando como uma espcie de diretor ou coordenador de
atividades, separado do grupo. O trabalho no opera como um conjunto de aes e
movimentos pr-estabelecidos: qualquer instruo ou deciso deve vir a partir (do
interior) do coletivo. Se eu quiser contribuir, devo ser um integrante, como os outros.
O que vemos na imagem acima um conjunto de pronomes eu e voc que poderia
ser descrito como:
eu + voc + eu + voc + eu + voc + eu + voc + eu + voc Claramente, sendo eu mesmo um dos pronomes em ao, s posso me referir ao
grupo como ns qualquer um do grupo, suponho, falar da mesma forma:
estamos jogando juntos, vamos pensar o que ns vamos fazer para o prximo
exerccio. A frmula que representaria a transformao de eu e voc em ns, seria
algo como:
n(eu+ voc) = ns No entanto, difiro do grupo pelo fato de operar como aquele que traz a proposio
para os outros. Todas as vezes que os jogos & exerccios eu-voc re-acontecem (e
eles nunca so os mesmos, devido no somente s especificidades da pessoa ou
grupo, mas tambm relao direta com o lugar), tenho que desempenhar o papel
de facilitador, ajudando a criar as ligaes necessrias a partir das quais o grupo e
no apenas um monte de pessoas ir emergir como entidade. Mesmo que eu vista
as camisas como os outros participantes, minha condio no pode ser nivelada
(note-se que no estou me referindo a nenhum tipo de hierarquia, mas enfatizando
um papel diferente) em um padro homogneo que me igualasse aos outros 6 O termo performao foi apropriado da noo de espao de performao discutido por Regina Melim em sua tese de Doutorado. Trata-se de uma idia vinculada experimentao e participao, como tentativa de alargamento e deslocamento do conceito de Performance Art. Refere-se performance do participador que surge do encontro entre obra e espectador como possibilidade de criao de um espao comunicacional ou relacional. Ver Regina MELIM, InCORPOrAES: agenciamentos do corpo no espao relacional. Tese de Doutorado, PUC, So Paulo, 2003. (N. do T.)
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integrantes do grupo. mais importante enfatizar as diferenas e os papis de cada
um do que pressupor erroneamente que a estrutura do grupo transforme todos os
integrantes em um s, indiferenciado. Assim, se tiro minha camisa durante as
performaes, perco o direito de dizer ns; a partir desse momento (para mim), o
grupo passa para a condio de eles:
eu n(eu + voc) = eles Essa mudana de ns pra eles aproxima-se do deslocamento a que qualquer um de
ns submetido quando confrontado com a passagem de dentro para fora de um
grupo ou coletivo. Como qualquer outro, o processo de passagem possui sua
prpria dinmica, trazendo algumas circunstncias espao-temporais que apontam
para as particularidades de certos entrecruzamentos. O trao mais evidente que o
espao que hospeda o grupo majoritariamente paradoxal, no sentido em que ele
de fato depende de ligaes e linhas invisveis pertencentes ao afeto e foras
similares que precisam ser permanentemente re-negociadas por seus membros.
Estar dentro ou fora pode ser a mesma coisa; na verdade, estamos sempre
desempenhando ambos os papis, administrando a superposio de diversas
estruturas inclusivas e lutando para no sermos devorados ou sufocados, presos
dentro de um beco sem sada (sempre) persuasivo. No caso particular dos jogos &
exerccios eu-voc, desempenho o duplo papel de propositor e ator o que significa
atuar tanto como sujeito quanto como objeto, em relao a mim mesmo e aos
outros. Entramos aqui em uma discusso relativa ao campo da arte: a dinmica
entre ns e eles tida como o padro habitual atravs do qual o papel e a imagem
do artista so negociados em nossa sociedade, em termos de estruturas
institucionais e de mercado. Comumente, os artistas entram nesse campo atravs
de um processo de transformao, em que abandonam progressivamente seu
estado estrangeiro para habitar a moldura institucional essa condio convencional
reduzida no representa uma norma, mas um conjunto de traos re-territorializantes
que alimentam a arte, tornando-a um lugar com limites seguros e garantidos em
nossa sociedade. Essa uma bvia supersimplificao, ligada a esteretipos do
senso comum. Uma perspectiva mais interessante pode ser buscada em termos do
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que foi mencionado acima como processo de passagem. O artista contemporneo
rompe as linhas que vo diretamente de eles para ns, tornando essa conexo
complexa, isto , enfatizando entre suas caractersticas o fluxo contnuo entre
indivduos, grupos, coletivos e instituies indo e vindo de um para outro,
desempenhando papis simultneos e ocupando mais de uma posio ao mesmo
tempo. Enquanto o artista superinstitucionalizado algum preso linearidade |eles
ns|, o artista interessante de hoje se moveria no duplo sentido ns eles,
encontrando a sua singularidade no em cada extremo, mas no conjunto de
mltiplas relaes envolvidas em diversos processos de transformao.
Um ltimo comentrio sobre os jogos & exerccios eu-voc: se observarmos um
membro do grupo individualmente, poderemos trazer mais algumas pistas para a
nossa discusso no que diz respeito relao entre os pronomes pessoais. No
sentido em que criam padres para o grupo, funcionando como uma espcie de
identificador, podemos considerar as camisas como uniformes elas do visibilidade
aos processos e experincias conduzidos coletivamente. possvel dizer, em uma
breve mirada, quem faz ou no faz parte do grupo em atividade o observador v
se o grupo est disperso no local ou se ele se concentra em torno de um lugar com
os participantes reunidos (ex: agrupamentos de vrios eus e vocs). Como em
qualquer grupo, podemos dirigir a ateno para indivduos isolados que, com suas
prprias caractersticas, compartilham, nesse momento especfico, de certas
expectativas e possibilidades de ao. Um nico indivduo vestido com uma camisa
eu (vermelha) ou voc (amarela) incorpora, na verdade, uma cadeia de pronomes
com mltiplas camadas: eu (ou voc) como sua interface externa (a camisa),
seguido de um ele ou ela (aquele que veste a camisa: Alan ou Jane?); e uma
terceira camada composta pelo sujeito que atua, eu (eu sou eu, eu sou voc).
Essas vrias camadas fazem emergir (tornam visvel) o complexo circuito
incorporado pelo participante dos jogos & exerccios eu-voc, indicando como as
camisas so apenas a camada mais externa de um fluxo de significantes que
disparado de forma nova. Se considerarmos:
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um nico indivduo com uma camisa vermelha
e
um nico indivduo com uma camisa amarela,
ento poderemos re-trabalhar as frmulas ns e eles apresentadas anteriormente:
Como resultado, a condio de estar com ou sem o grupo torna-se muito mais
misturada, envolvendo pelo menos trs estados:
(1) a estrutura pessoal do sujeito, experienciada como uma reduo de seu
espao privado em relao ao grupo: eu ns
(2) a condio de ser um objeto para os que o observam, isto , um ele ou ela
atuando e em movimento: ela, ele eles;
(3) a condio de ser portador de um identificador externo (as camisas eu e
voc ) que marcam o indivduo como membro do grupo atuante:
eu, voc ns, eles.
Assim, os jogos & exerccios eu-voc so planejados para proporcionar, tanto a mim
quanto aos participantes, uma investigao intensiva sobre os pronomes em
deslocamento. Em termos de dinmica de grupo o padro comum ns e eles
retrabalhado e expandido atravs desse processo.
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eu-voc, serigrafia, camisas, jogos, exerccios. realizado no Pas de Gales, Gr-Bretanha, Brasil ,1999.
2. superpronome
Outro tpico interessante para discutirmos aqui a criao do superpronome.
Comeando como uma proposio em que as palavras eu e voc foram colocadas
lado a lado sem nenhuma estrutura conectiva (hfen ou espao) entre elas, o
superpronome pretende ser um novo pronome que inclui ao mesmo tempo o sujeito
(eu) e o objeto (voc). Pode ser usado em ambas as direes, formando duas
possibilidades diferentes de partculas verbais: euvoc, voceu. Em um enunciado
recente, o superpronome foi assim delineado:
convergncia de pronomes pessoais
em uma nica palavra.
euvoc, voceu
mistura, hibridizao, contaminao recproca
de um pelo outro, de eu por voc, de voc por eu,
numa s coisa. xtase do objeto,
sntese ideal do desejo.
instrumento de negociao para aes
de uma alteridade incorporada, em fuga.
Tal palavra refere-se a enunciados relacionados a circunstncias em que
importante enfatizar os vnculos (afetos, membranas, interfaces) entre sujeito e
objeto, revelando o quanto j h de alteridade instalada na matria constitutiva do
sujeito. Os superpronomes seguem a famosa proposio de Rimbaud Je est un
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autre, reduzindo-a a uma forma mais compacta. Seria necessrio desenvolver
posteriormente o uso do superpronome em frases como euvoc estou indo
embora, voceu venha mais perto, etc, para provocar sua presena efetiva e
senti-la no uso cotidiano da lngua. Inseri-los no discurso promover uma
interveno na linguagem, introduzindo significados que no poderiam ser
articulados antes. Em termos da dinmica ns-eles, como poderemos localizar os
superpronomes? Com certeza, algo que ainda deve ser realizado. Somente
atravs do seu uso em aes e proposies concretas que as sutis conexes que
ligariam o aglomerado sujeito-objeto aos processos de agrupamento e
desagrupamento podem ser indicadas. Na verdade, o superpronome parece ser
um grupo em si, em tamanho mnimo: no que as partculas euvoc ou voceu
correspondam a dois indivduos, mas que funcionam naquele campo de significado
que considera impossvel desenvolver um sujeito singular sem a presena intensiva
do outro. H uma lacuna entre euvoc voceu e ns eles o primeiro parece
circular e tautolgico, o segundo indica um processo entre concentrado e
disperso (algo como um arco) que se assemelha a ordem desordem (entropia).
Assim, parece que duas conexes diferentes e independentes deveriam ser
estabelecidas, colocando os superpronomes em contato direto com ns e eles,
separadamente. A frmula ns eles ser, ento, re-mixada:
(euvoc, voceu ns) (euvoc, voceu eles)
Quando o superpronome submetido a foras externas, estranhas sua
organizao autocontida, ele ao mesmo tempo exposto aos seus limites (o crculo)
e expandido a uma gama de outras possibilidades (agrupamentos,
desagrupamentos). Espero que esse processo encontre seu prprio modo de
realizar-se, inteira ou parcialmente, significando que o superpronome ir
progressivamente negociar o seu modo de ao no campo das manobras coletivas.
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superpronome, metal, terra, plantas, 2000.
3. ns ns
Prxima parada: um breve pargrafo para descrever o enunciado ns n