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Preço - 6,50 J Nº 101 MAIO DE 2006 Modelo Industrial Novo regime das obrigações hipotecárias Fiança: obrigações futuras Despedimento ilícito Arrendamento Servidão de passagem Fiança Marcas & Patentes Jurisprudência Legislação Análise Finalmente um regime jurídico para o transporte de crianças Em foco Unidade de missão para a reforma penal Habilitação de herdeiros 9 720002 006053 00962

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Preço - 6,50 J

Nº 101MAIO

DE 2006

Modelo Industrial

Novo regime das obrigações hipotecárias

Fiança: obrigações futurasDespedimento ilícitoArrendamentoServidão de passagemFiançaR

evis

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200

6Pr

eço:

6,5

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Vida

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ria

Marcas & Patentes

Jurisprudência

Legislação

Análise

Finalmente um regime jurídico para o transporte de crianças

Em foco

Unidade de missão para a reforma penal

Habilitação de herdeiros9

7200

0200

6053

00962

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Todos os profissionais que se relacionam com questões fiscais e tributárias sentem as dificuldades provocadas

pela crescente complexidade do nosso sistema fiscal e pela dispersidade e abundância das normas legais

para além das contínuas alterações.

O Grupo Editorial Vida Económica apresenta a nova edição do livro da autoria do Dr. Joaquim Fernando

Ricardo.

Esta edição, actualizada em Março de 2006, compila e sistematiza num só volume todo o sistema fiscal

português e inclui numerosa legislação fundamental e doutrina administrativa.

Principais Destinatários:

• Técnicos Oficiais de Contas

• Funcionários da DGCI

• Consultores fiscais

• Gerentes e Quadros das Empresas

• Profissionais Liberais tais como Advogados

e Solicitadores que necessitam de uma infor-

mação completa e actualizada

• Edição especialmente recomendada para

todos aqueles que necessitam actualizar os

seus conhecimentos no âmbito do sistema

fiscal e do direito tributário processual e

profissionais que se relacionem com

questões fiscais

NOVIDADE

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tributário/2006tributário/2006tributário/2006tributário/2006tributário/2006

Autor: Joaquim Ricardo

Formato: 17,5x25 cm

Nº págs: cerca de 1250

P.V.P: A 43 (IVA incl)

P.V.P assinantes VE/BC e/ou

trabalhadores dos impostos: A 38

Pedidos para:

Vida Económica - R. Gonçalo Cristóvão, 111, 6º esq. • 4049-037 PORTO

Tel. 223 399 400 • Fax 222 058 098 • E-mail encomendas: [email protected]

�����Nome

Morada C. Postal

Nº Contribuinte E-mail

� SIM. Solicito o envio de exemplar(es) do livro DIREITO TRIBUTÁRIO - Colectânea de Legislação/2006

por � A 43 � A 38

No caso de tratar de funcionário das Contribuições e Impostos necessário enviar fotocópia de comprovativo com o pedido de encomenda.

Se Assinante indique o Nº de Assinante.

� Solicito o envio do CD Rom Direito Tributário - Colectânea de Legislação, no valor de 30 euros.

� Para o efeito envio cheque/vale nº , s/ o , no valor de A

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Cód. Seg. emitido em nome de

e válido até / .

� Solicito o envio à cobrança. (Acrescem A 4 para despesas de envio e cobrança).

ASSINATURA

Inclui todos os Códigos fiscais

actualizados, extensa legislação

complementar e doutrina

adminsitrativa

Direito Tributario cor 2006.pmd 19-04-2006, 9:421

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3 Vida Judiciária

Maio/06 101 Revista Mensal

Director

João Luís de Sousa

Coordenadora de edição

Sandra Silva

Direcção Comercial

Porto:

Teresa Claro

Madalena Campos

Paginação

Flávia Leitão

Assinaturas

Maria José Teixeira

E-mail: assinaturas@vidaecono

mica.pt

Impressão

Uniarte Gráfica / Porto

Proprietário

Editorial Peixoto de Sousa

Redacção, Administração

e assinaturas

Sede: Porto

Rua Gonçalo Cristóvão, 111

6º Esq. 4049-037 Porto

Telef. 223 399 400

Fax. 222 058 098

Delegação de Lisboa

Campo Pequeno, 50, 5º Esq.

1000-081 Lisboa

Telef. 217 815 410

Fax. 217 815 415

E-Mail: [email protected]

Publicação inscrita no Instituto

da Comunicação Social nº 120738

Empresa Jornalística nº 208709

Um notariado sem rumo

Portugal foi o último país da Europa a abandonar o regime do

notariado público. Nos Estados ocidentais, os notários nunca

deixaram de ser profissionais privados que exerciam funções

de interesse público. Pelo contrário, no nosso país, o Estado

Novo decidiu “nacionalizar” a profissão nos anos 40, para lhe

dar mais dignidade, e esse equívoco demorou mais de 60 anos

a ser corrigido.

Entretanto, os países da Europa de Leste foram muito mais

rápidos do que Portugal a repor o notariado na esfera do sector

privado.

No nosso país, o início da reforma foi sucessivamente adiado. E

quando finalmente se concretizou gerou todo o tipo de reacções

e contra vapor por parte daqueles que, sendo profissionais do

notariado, não queriam abdicar das benesses do funcionalismo

público.

Depois deste intrincado processo, corremos agora o risco de

comprometer novamente as vantagens do regresso da profissão

ao sector privado.

O Governo quer ir mais longe, tornando dispensável a interven-

ção dos notários em praticamente todos os actos das empresas e

dos cidadãos. A existência dos notários é tolerada, mas assumida

como não necessária. Progressivamente, o seu papel pode ser

assegurado pelas conservatórias, ao nível do registo público, e

pelos advogados e consultores jurídicos ao nível do aconselha-

mento privado.

A matriz de notariado romano-germânico resume-se em Portugal

à possibilidade de os notários continuarem a existir, embora sem

grandes expectativas quanto ao seu papel futuro.

Em tudo o resto, o nosso país pretende ser como os países an-

glo-saxónicos onde os notários não existem, mas onde a cultura

e tradição também são diferentes e não são necessariamente

compatíveis com a realidade portuguesa.

O grande avanço que se pretende obter com a esvaziamento do

papel do notariado pode não ser mais do que um considerável

retrocesso.

João Luís Peixoto de Sousa

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Joaquim Barata Lopes, bastonário da Ordem

dos Notários

Em Foco Finalmente um regime jurídico

para o transporte de crianças 11

Actualidades

Informações jurídicas 15

Registos & Notariado

Habilitação de herdeiros 24

Análise

Unidade de missão para a reforma penal 25

Marcas & Patentes

Modelo industrial 28

JurisprudênciaResumos de Jurisprudência 33Jurisprudência do STJ e das Relações 42Sumários do Supremo Tribunal de Justiça 49

Legislação

Novo regime das obrigações hipotecárias 56Principal legislação publicada

(Iª e 2ª séries do Diário da República) 60

“Portugal é o único país

da Europa onde o Estado não

protege os notários”

Vida Judiciária 05/2006

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5 Vida Judiciária Maio/2006

Ana Santos Gomes

Bastonário da Ordem dos Notários lamenta postura do Governo

“Portugal é o único país da Europa onde o Estadonão protege os notários”

O primeiro bastonário da Ordem dos Notários dispara várias críticas contra medidas, diplomas e atitudes do Gover-no português, a quem acusa de estar a querer tirar importância aos notários. Joaquim Barata Lopes não aceita con-correr em desvantagem com outros funcionários dos Estado.

Vida Judiciária - Um mês depois

da sua tomada de posse, já esteve em Bruxelas e Madrid para participar em reuniões do notariado europeu. Que balanço faz destes primeiros encontros internacionais em que participou?

Joaquim Barata Lopes - Venho de lá com sentimentos de angústia por veri-ficar que em todos os parceiros da União

Encontro uma grande diferença na relação entre o notariado e os respectivos governos, que geralmente têm excelentes relações, o que não acontece em Portugal.

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6Vida Judiciária Maio/2006

Em Portugal, é o próprio Estado que vai considerando no texto da lei que a intervenção do notário é dispensável aqui e ali e considera isso uma mais--valia para a Economia.

Europeia há um notariado pujante e que em Portugal as coisas não correm tão bem assim. É curioso que o meu colega espanhol me referiu até que o notariado em Espanha está melhor que nunca e que geralmente os governos do PSOE propi-ciam melhores relações com o notariado do que os governos do PP porque os go-vernos da esquerda espanhola estão mais preocupados com questões de natureza social e têm a preocupação de assegurar que qualquer das partes de um contrato, ainda que sejam pessoas de menores re-cursos, são sempre assessoradas por um especialista na matéria, a custos reduzi-dos, e que intervém em representação do Estado, como o notário. Infelizmente, tive de lhe dizer que em Portugal não é assim. Qualquer outro país comunitário é melhor exemplo que Portugal. Os polacos têm um notariado cheio de dinamismo. Em Itália, há 5400 notários para uma população de 58 milhões de habitantes. Em Espanha

há 2800 notários para uma população de 40 milhões de habitantes. Em França, para 60 milhões de habitantes há 8000 notários. Em todos estes países, os notários são mui-to respeitados e exercem uma função muito apreciada. Além disso, o notariado nestes países constitui uma boa saída profissional para licenciados em Direito.

Mas a grande novidade é que em Maio já deveremos ter uma reunião em Portugal, com os representantes dos 19 países da União Europeia que entregam a Conferência dos Notariados da União Europeia (CNUE). Esta entidade promove reuniões regulares para discutir assuntos de interesse do notariado da Europa. Neste último encontro, por exemplo, to-mámos conhecimento de uma resolução importante do Parlamento Europeu, que diz respeito ao artigo 43º do Tratado da União Europeia, que estabelece a livre circulação dos profissionais liberais entre os Estados-membros, e ao artigo 45º, que retira a aplicação destas disposições a ac-tividades que estajam ligadas ao exercício da autoridade pública. Esta discussão já é antiga e visava saber se os notários estavam aqui abrangidos ou não. E a reso-lução do Parlamento Europeu veio agora informar que, efectivamente, os notários estão incluídos no conteúdo do artigo 45º, integrando o leque de excepções à regra, pois exercem uma autoridade pública.

VJ - Que outras questões estão ainda em cima da mesa?

JBL - Uma das questões que tem vindo a ser muito debatidas prende-se com a harmonização nos diversos países comuni-tários em termos de Direito da Sociedade e Direito Civil. Fala-se na possibilidade de serem criados códigos da própria União Europeia, o que será extremamente difícil, mas vale a pena tentar que exista alguma harmonização, para que uma sociedade criada em qualquer país da UE possa cir-cular livremente, sendo reconhecida nos outros países comunitários.

VJ - Encontrou muitas diferenças no notariado dos restantes Estados-membros?

JBL - Encontro uma grande diferença na relação entre o notariado e os res-

Joaquim Barata Lopes diz ter boas razões para pensar que a intenção do Governo é dispensar a intervenção do notário em tudo.

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7 Vida Judiciária Maio/2006

Joaquim Barata Lopes diz ter boas razões para pensar que a intenção do Governo é dispensar a intervenção do notário em tudo.

Ninguém pode afirmar que não ir ao notário fica mais barato porque se alguém não for ao notário terá que ir a outro especialista que seguramente também lhe vai cobrar.

pectivos governos, que geralmente têm excelentes relações, o que não acontece em Portugal. Os meus colegas até têm alguma dificuldade em perceber que tipo de relação é esta que existe em Portugal entre o notariado e o Governo.

VJ - E que tipo de relação é?

JBL - Se continuarem a ser aprova-dos diplomas como aquele relativo às sociedades comerciais, temos boas razões para pensar que a intenção do Governo é dispensar a intervenção do notário em tudo. Mas, se assim for, o Governo tem obrigação de nos dar essa indicação porque há uma quantidade de pessoas que deixaram a sua profissão para se de-dicarem ao notariado. Os Estados dos 19 países da CNUE consideram que o papel do notário é essencial para o bom funcio-namento do sistema jurídico e da socieda-de. Em Portugal, é o próprio Estado que vai considerando no texto da lei que a intervenção do notário é dispensável aqui e ali e considera isso uma mais-valia para a Economia. Os Estados têm que decidir que tipo de política querem seguir: ou um sistema de justiça preventiva, como acontece nestes países de que falo, em que o notário intervém como primeiro controlo da legalidade, dando garantias de segurança jurídica e evitando o aumen-to da litigiosidade, ou seguir o exemplo da Inglaterra e dos Estados Unidos da América, onde não há notários tal como nós os conhecemos, os riscos são cobertos por seguradoras e há assessores jurídicos para as transacções. Qualquer dos siste-mas é possível, mas é preciso haver uma clara opção. Se Portugal não quer um sistema de justiça preventiva como tem tido, se considera que, afinal, não vale a pena proteger a segurança jurídica, mas sim a celeridade das transacções comer-ciais e aquilo que for mais barato, se não há qualquer preocupação com o aumen-to da litigiosidade em tribunal, então que se opte pelo modelo anglo-saxónico. Para nós, a escolha devia ser óbvia. Por um lado, Portugal tem um ordenamento jurídico integrado na mesma família a que pertencem os países da UE com um notariado semelhante ao nosso. Por outro

lado, um dos nossos principais problemas em matéria de justiça é precisamente a litigiosidade nos tribunais, que já estão sobrecarregados. Não faz nenhum sentido que se opte pelo sistema anglo-saxónico. Mas o Governo tem de decidir de uma vez por todas o que quer.

VJ - Citou o diploma relativo à dispen-sa de escritura pública nas sociedades comerciais. O que mais o indigna nesse diploma?

JBL - Este diploma diz coisas abso-lutamente incríveis. No preâmbulo, o legislador emite juízos de valor, ao dizer que estão a ser criadas condições para que as empresas e os cidadãos optem por ir ao notário ou directamente à conservatória, acrescentando que se as pessoas forem ao notário terão um serviço mais complexo e mais caro e se forem à conservatória terão um serviço mais simples e mais barato. Isto ultrapassa tudo o que é admissível!

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8Vida Judiciária Maio/2006

O mesmo serviço prestado pelo Estado num cartório público custa 11 euros e numa conservatória custa 8 euros.

Ninguém pode afirmar que não ir ao no-tário fica mais barato porque se alguém não for ao notário terá que ir a outro espe-cialista que seguramente também lhe vai cobrar. E hoje ir ao cartório de um notário não é nada complexo, o cidadão faz a es-critura quando quer e é acompanhado por especialistas, pois não há nenhum outro profissional mais habilitado que o notário para negócios jurídicos relacionados com sociedades e imóveis.

VJ - Manifestou ao Governo a sua indignação relativamente a esta ma-téria. Como foram recebidas as suas críticas?

JBL - As minhas críticas são sempre recebidas da mesma forma. Dizem-me que o que consta no Programa do Go-verno é o caminho que vão seguir e que não querem tirar nada aos notários, mas que estão antes a criar condições para que haja concorrência. Expliquei que não é nada disso que está a acontecer,

até porque se nós pudéssemos concorrer em igualdade de circunstâncias com ou-tros profissionais teríamos capacidade para prestar um serviço de qualidade a preços baixos. Mas nós não estamos a concorrer em igualdade, como acontece com a Empresa na Hora. O Estado diz que essa é uma criação deles e logo não é extensível aos notários, o que significa que uma pessoa que queira recorrer ao sistema de Empresa na Hora pode esco-lher na conservatória entre uma panóplia de firmas e pactos sociais e tratar de tudo na hora, enquanto que, se for ao notário, tem de esperar oito ou dez dias porque é preciso esperar pelo certificado do Registo Nacional de Pessoas Colectivas. Mas na conservatória, o utilizador não vai ter ninguém a explicar-lhe, por exemplo, qual é a vantagem de ter ou não uma cláusula de amortização de quotas. Mas tudo se mede pela celeridade. Eu não posso ser mais rápido porque não me dão o certificado mais cedo.

Mas há outras questões que nos preo-cupam. Agora passa a haver a possibilida-de de as conservatórias do registo predial, comercial e os advogados, entre outros, reconhecerem assinaturas, inclusive em procurações que permitem a transacção de imóveis. Isso é uma aberração jurídica. Reconhecer uma assinatura é passar um termo de autenticação, que é, por defi-nição, um termo lavrado por um oficial público que confere autenticidade a um documento particular. Se o termo de au-tenticação é lavrado por alguém que não é oficial público, estamos perante a negação da própria autenticidade. Vamos ao ponto de ser criada uma tabela de emolumentos para os reconhecimentos de assinatura e que prevê um preço inferior aos reco-nhecimentos de assinatura que o notário pratica. Eu tenho que cobrar 11 euros por um reconhecimento de assinatura, que é feito na hora e não tem nada de burocrá-tico. Mas não posso cobrar nem mais nem menos, que é para igualar o preço partica-do pelos cartórios públicos, que é também de 11 euros. Agora estabelecem um preço mais baixo para as conservatórias, o que significa que o mesmo serviço prestado pelo Estado num cartório público – e já nem falo do privado – custa 11 euros e

Joaquim Barata Lopes diz ter boas razões para pensar que a intenção do Governo é dispensar a intervenção do notário em tudo.

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9 Vida Judiciária Maio/2006

O nosso objectivo é que exista, pelo menos, um notário por cada concelho.

“Os Estados têm que decidir que tipo de política querem seguir: ou um sistema de justiça preventiva ou o exemplo da Inglaterra e dos Estados Unidos da América”, alega o bastonário da Ordem dos Notários.

numa conservatória custa 8 euros. Logo, tudo vai no sentido de desaconselhar as pessoas a ir aos notários.

VJ - Pensa em recorrer à Autoridade da Concorrência?

JBL - Claro que sim. Já pedi uma reunião e já dei conta dessa intenção ao Governo.

VJ - E que resposta teve?

JBL - O Governo diz que está disposto a alterar a nossa tabela de emolumentos, de forma a que possamos praticar preços semelhantes àqueles que foram fixados para as conservatórias.

VJ - O Governo está a associar os no-tários ao peso da burocracia?

JBL - Claro que está. E esta postura é completamente despropositada nesta altu-ra. Há dois anos atrás, eu até admitia que o notariado fosse sinónimo de burocracia, mas actualmente isso não é verdade. E se ainda somos algo burocratas é porque o próprio Estado se encarregou de entregar aos notários uma série de controlos a exer-cer antes da celebração de uma escritura. Além disso, nos cartórios de antigamente as pessoas encontravam más instalações e filas de espera, mas hoje os cartórios pri-vados são instalações agradáveis, onde há uma grande preocupação com a qualidade do serviço prestado.

VJ - Quantos notários privados estão a operar actualmente?

JBL - Há 242 notários privados. O número total de licenças que consta no mapa do notariado é de 543. Temos 120 novos notários a acabar o estágio e prestes a tomar posse.

VJ - Quais são as principais vanta-gens de termos cartórios notariais privados?

JBL - A principal vantagem é a manu-tenção das características de serviço pú-blico e das garantias de segurança jurídica com a mais-valia do profissional liberal depender da sua clientela para sobreviver, pelo que o consumidor passou a dispor da intervenção do notário no horário em que

precisa, sem ter de andar a percorrer a cidade à procura de um notário que trate do seu assunto mais depressa.

VJ - Há concorrência entre notários públicos e privados?

JBL - Eles vão coexistir por pouco tempo. Os notários públicos já nem deviam existir. Só há notários públicos porque o processo de transição que deve-ria ter ficado concluído a 9 de Fevereiro se atrasou.

VJ - E quando deverá estar concluído o processo de transição?

JBL - Se até ao final do ano forem feitas todas as provas e estágios pode ser que no final deste ano ou no princípio do próximo deixem de existir notários públicos.

VJ - A Ordem dos Notários passa a ter uma palavra a dizer em matéria

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10Vida Judiciária Maio/2006

O Estado não perdeu dinheiro com a reforma do notariado. O Ministério da Justiça teve uma quebra nas receitas directas, mas, em contrapartida houve um aumento das receitas de IVA e IRS, que compensam as receitas predidas.

de formação dos profissionais. Que novidades são esperadas?

JBL - Neste período de transição foi necessário encontrar soluções rápidas para dar resposta à falta de notários no país. O nosso objectivo é que exista, pelo menos, um notário por cada concelho. Para isso é que existe o Fundo de Com-pensação, para onde todos descontamos, que garante o pagamento de um rendi-mento apelativo para o notário, no caso de a actividade naquele concelho não ser rentável. No novo modelo, o acesso à profissão é feito através de provas ao nível nacional, a que concorreram 1451 candidatos para serem apurados 121 nesta primeira fase.

Entretanto, já foi publicado o anúncio de abertura do segundo concurso, que ainda deverá ser coordenado pelo Minis-tério da Justiça, por estar a acontecer no decurso do período transitório. No futu-ro, acredito que será a própria Ordem dos Notários, em parceria com o Con-selho do Notariado, a coordenar estes concursos. Os formandos deverão fazer o seu estágio em cartórios e posteriormen-te prestar provas de acesso à profissão. As faculdades de Direito já ministram cursos de dois meses de preparação para estas provas e por isso, uma vez mais, insisto na ideia de que é preciso que o Governo esclareça o que pretende para o futuro do notariado, porque há muitos jovens licenciados em Direito que estão a investir nestes cursos e nesta profis-são. Aliás, a publicidade negativa que o Governo tem estado a fazer ao notariado já teve os seus reflexos.

No primeiro curso apareceram 1451 candidatos e no segundo já só aparece-ram 720. Há grandes reservas sobre esta saída profissional para os licenciados em Direito, que estavam bastante carentes de saídas profissionais.

VJ - Mas, em seu entender, o nota-riado é actualmente uma boa saída profissional para os licenciados em Direito?

JBL - Eu sou optimista e não desisto de lutar, sobretudo quando estou con-victo que a minha solução é a melhor. E

continuo absolutamente convencido de que a solução que defendo é a que me-lhor serve o país. Espero que, mais cedo ou mais tarde, haja razoabilidade para seguir o caminho correcto.

VJ - Está tudo preparado para o bom funcionamento da bolsa dos notá-rios?

JBL - Para a bolsa funcionar é preci-so que existam notários. Mas eu estou convencido de que, quando acabar esta primeira fase de estágios, alguns dos notários possam estar interessados em integrar a bolsa, em vez de investirem já num cartório, com os legítimos receios no futuro.

Esperamos, a pouco e pouco, criar uma bolsa com um conjunto de notários, a quem é garantido um determinado vencimento mensal pago pela Ordem, e que deverão estar disponíveis para substituir colegas nos seus impedimentos temporários.

Naturalmente, temos de ser cautelosos relativamente ao número de notários que vai integrar a bolsa. O regulamento está ainda a ser preparado e espero que seja aprovado em Maio, na Assembleia Geral. Nesta primeira fase, se a bolsa tiver três ou quatro notários, já fico satisfeito. Mais tarde, quando todos os notários privados estiverem a trabalhar, é provável que se justifique que 10 ou 20 notários integrem a bolsa.

VJ - Desde o dia da sua tomada de posse até hoje, o seu discurso tem-se tornado mais amargo. Está desaponta-do com aquilo que encontrou?

JBL - Estou. Às vezes fico indignado. Os Governos têm responsabilidades e têm o dever de ter outro tipo de postura. O Estado nem sequer perdeu dinheiro com a reforma do notariado. O Ministério da Justiça teve uma quebra nas receitas directas, mas, em contrapartida, houve um aumento das receitas de IVA e IRS, que compensam as receitas predidas. E nunca houve um responsável político que salientasse um aspecto positivo na reforma do notariado. Eu tenho o direito e o dever de estar indignado.

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11 Vida Judiciária Maio/2006

Finalmente um regime jurídico para o transporte de crianças

Por: Pedro Iria

De acordo com os dados divulgados pela Asso-ciação para a Promoção da Segurança Infantil (APSI), entre Outubro de 1998 e Junho de 2000, houve, em Portugal, 26.478 vítimas de acidentes rodoviários entre os 0 e os 17 anos, inclusive (6482 peões, 14.191 passageiros e 5805 condu-tores!).

O número médio de vítimas de acidentes rodoviá-rios dos 0 aos 17 anos (mortos e feridos) foi, em 1998, de 27,5 por dia, de 23,7 por dia, em 1999, e de 21 por dia, em 2000.

Entre os 0 e os 17 anos, morreram nesses 3 anos:

• 116 peões, entre os quais 47% tinha menos de 6 anos, 23% tinha entre 6 e 9 anos, 19% entre 10 e 14 anos e 7% entre 15 e 17 anos;

• 219 passageiros, entre os quais 22% dos 0 aos 5 anos, 14% dos 6 aos 9 anos, 21% dos 10 aos 14 anos e 43% dos 15 aos 17 anos;

• 82 condutores (sim, não é engano, são menores ao volante!), dos quais 27% entre os 10 e os 14 anos e 73% entre os 15 e os 17 anos.

Acresce que dos 116 peões e 219 passageiros ví-timas fatais, 80% e 40%, respectivamente, morreu dentro das localidades.

Por outro lado, assume particular relevância que em 19 acidentes envolvendo especificamente o transporte de crianças tenham resultado 200 vítimas (8 mortos e 192 feridos, dos quais 15 com gravidade).

Os acidentes em causa são variados e incluem travagens bruscas, despistes e colisões, revelando situações como atropelamentos à entrada e saída dos veículos, transporte de crianças em pé em autocarros sobrelotados e menores projectados contra vidros.

Num outro estudo levado a cabo pela APSI, sobre a utilização de sistemas de retenção em crianças dos 0 aos 12 anos, em ambiente de auto-estrada, verificou-se que 60% das crianças continuam a via-jar no automóvel sem qualquer tipo de protecção, ao colo ou à solta.

Como se pode verificar pelo gráfico seguinte, Por-tugal lidera, pela negativa, o número de crianças mortas em acidentes de viação.

Taxa de mortalidade por acidente rodoviário em crianças até aos 14 anos, na união Europeia e por 100.000 habi-

tantes (Fonte OMS 1994-1995).

As preocupações resultantes da análise destes números conduziram a uma acção de fiscalização promovida pela Direcção-Geral de Viação, em cola-boração com a Brigada de Trânsito da GNR e a PSP, levada a cabo no Verão de 2002, nas imediações de várias praias do país.

Desta iniciativa e em apenas 5 dias, foi possível levantar 61 autos de contra-ordenação, em 58 veí-culos inspeccionados, distribuídos pelas seguintes anomalias:

• Excesso de lotação - 14 autos;• Irregularidades associadas a tacógrafos (falta

e má utilização do disco, bem como excesso de velocidade) - 15 autos;

• Mau estado de conservação do veículo (ausência de dispositivo quebra-vidros e de extintor, pára-brisas partido, mau estado dos pneumáticos, derrame de óleo, etc...) - 12 autos;

• Irregularidades documentais (licenças de transporte e fichas de inspecção periódica) - 20 autos.

Face a esta triste realidade e após 7 anos, com vários governos a anunciarem projectos-lei sobre o transporte de crianças, foi finalmente aprovado em sessão da Assembleia da República do passado dia 09/02/2006 o regime jurídico do transporte colectivo de crianças. Após a fusão dos dois projectos-lei exis-tentes sobre a matéria, um da responsabilidade do Partido Ecologista os Verdes (PEV) e outro do Partido Popular (CDS-PP), foi possível aprovar o diploma por unanimidade.

O regime jurídico ora instituído aplica-se ao trans-

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porte colectivo de crianças e jovens até aos 16 anos, em automóvel ligeiro ou pesado de passageiros, público ou particular, efectuado como actividade principal ou acessória, de e para os estabelecimentos de educação e ensino, creches, jardins-de-infância e outras instalações ou espaços em que decorram actividades educativas ou formativas, designadamente, os transportes para locais destinados à prática de actividades desportivas ou culturais, visitas de estudo e outras deslocações organizadas para ocupação de tempos livres.

Fora do âmbito de aplicação desta Lei ficam os táxis e os transportes públicos de passageiros, salvo quando contratualizados especificamente para o transporte de crianças.

Quando o transporte de crianças seja desenvolvido como actividade principal, carece de licenciamento, titulado por alvará emitido pela Direcção-Geral de Trans-portes Terrestres (DGTT), válido pelo prazo de cinco anos, intransmissível e renovável por idêntico período.

Os requisitos de acesso ao exercí-cio, a título de actividade principal, do transporte de crianças são a idoneida-de, capacidade técnica e profissional dos gerentes e administradores das pessoas colectivas, ou do próprio, quando se trate de empresário em nome individual.

Em matéria de idoneidade rele-vam, negativamente, a declaração judicial de delinquente por tendência ou a condenação, por decisão transi-tada em julgado, em pena de prisão efectiva, pela prática de qualquer crime que atente contra a vida, a integridade física ou a liberdade pes-soal, bem como pela prática de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual.

Os requisitos de capacidade técnica e das condições de idoneidade são preenchidos nos termos a definir por portaria do membro do Governo com tutela sobre os transportes, sendo que a capacidade profissional con-sistirá na existência de recursos humanos adequados ao exercício da actividade.

Por seu turno, os automóveis usados no transporte de crianças, que não poderão ter mais de 16 anos, contados desde a data da primeira matrícula, passam também a carecer de licença especial, emitida pela DGTT, válida pelo período de dois anos e renovável por igual período, após inspecção específica realizada pela DGV que ateste o cumprimento das condições de segurança agora definidas, a saber:

• Todos os lugares dos automóveis devem estar

equipados com cintos de segurança, com três pontos de fixação - excepto para os automóveis matriculados antes da entrada em vigor da presente Lei, que poderão dispor de cintos subabdominais (tipo avião) -, bem como com sistema de retenção para crianças (SRC) devida-mente homologados e de utilização obrigatória;

• As portas dos automóveis só podem ser abertas pelo exterior ou através de sistema comandado pelo motorista e fora do alcance das crianças;

• As janelas dos automóveis deverão possuir vidros inamovíveis ou travados a um terço da abertura total, com excepção da janela do motorista;

• Os automóveis deverão estar equipados com ta-cógrafo devidamente homologado;

• Os automóveis deverão estar providos de extintor de incêndios e caixa de primeiros socorros, de características a fixar por despacho do Director-Geral de Viação.

Os motoristas afectos ao trans-porte de crianças passam também a carecer de um certificado emitido pela DGTT, válido por cinco anos, cujas condições são definidas por portaria do membro do Governo que tutela os transportes, tendo em conta, designadamente, os seguintes requisitos:a) Habilitação legal para conduzir a categoria de automóvel em causa;b) Experiência de condução de, pelo menos, dois anos;c) Documento comprovativo de inspecção médica, aferidor das aptidões físicas e psicológicas, nos mesmos termos do exigido para os motoristas de automóveis pesados de passageiros;

d) Idoneidade dos motoristas;e) Frequência de, pelo menos, uma acção de forma-

ção profissional, que lhes garanta conhecimentos, designadamente sobre as regras e medidas de segurança específicas do transporte de crianças e sobre primeiros socorros e relacionamento in-terpessoal, e cuja regulamentação, promoção ou apoio caberá ao Governo, através da tutela dos transportes.

No tocante à idoneidade dos motoristas, o diploma legal caracteriza como indiciador da sua falta, além dos supra referidos para a idoneidade necessária ao acesso ao exercício da actividade do transporte de crianças, a prática dos crimes de condução perigosa de automó-vel rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou

“No tocante à idoneidade dos motoristas, o diploma legal caracteriza como indiciador da sua falta, a prática dos crimes de condução perigosa de automóvel rodoviário e de condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas”.

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13 Vida Judiciária Maio/2006

substâncias psicotrópicas, previstos, respectivamente, nos artigos 291.º e 292.º do Código Penal, bem como a prática, nos últimos cinco anos, de qualquer contra-or-denação grave de condução sob influência de álcool.

Outra das inovações deste regime jurídico é a obri-gatoriedade de presença no transporte de um acompa-nhante adulto – o vigilante, a quem competirá zelar pela segurança das crianças, controlando a lotação do veículo, a utilização dos cintos de segurança e SRC, bem como o acompanhamento das mesmas no atra-vessamento da via, usando colete reflector e raquete de sinalização, devidamente homologados. A presença do vigilante só será dispensada quando o transporte for efectuado em automóvel ligeiro de passageiros. Porém, se o automóvel pesado de passageiros possuir dois pisos ou transportar mais de 30 crianças, deverão estar presentes, pelo menos, dois vigilantes.

A responsabilidade por assegurar a presença do vigilante e comprovar a sua idoneidade (mesmos indícios estipulados para a idoneidade ne-cessária ao acesso ao exercício da actividade do transporte de crianças) é da responsabilidade da entidade que organiza o transporte.

No tocante à responsabilidade e além dos demais seguros exigidos por lei, no exercício a título principal da actividade de transporte de crianças passa a ser obrigatório seguro de responsabilidade civil pelo valor máximo legalmente permitido, que inclua os passageiros transportados e respectivos prejuízos. A lotação dos automóveis nunca poderá ser excedi-da, sendo que cada criança correspon-de a um lugar sentado. Ressalvando os automóveis até nove lugares, as crianças de 12 anos não poderão sentar-se nos lugares contíguos ao motorista, nem nos lugares da primeira fila, excepto quando os veículos possuam separadores de protec-ção, devidamente homologados, entre o motorista e os passageiros.

Em trânsito, as viaturas de transporte de crianças deverão manter as luzes de cruzamento acesas, sen-do proibido o transporte de volumes, cuja dimensão, peso e características não permitam o seu acondicio-namento nos locais apropriados e seguros, para que não constituam qualquer risco ou incómodo para os passageiros. A fiscalização do regular cumprimento destas regras ficará a cargo da GNR, PSP, Inspec-ção-Geral do Trabalho, Inspecção-Geral de Obras Públicas e Transportes, Direcção-Geral de Viação e

da Direcção-Geral de Transportes Terrestres e po-derá dar lugar a coimas entre J 1000,00 a J 3000,00 (contra-ordenações muito graves), entre J 500,00 a J 1500,00 (contra-ordenações graves) e entre J 150,00 e J 1000,00 (contra-ordenações leves), para além das sanções acessórias de apreensão e perda do objecto da infracção, incluindo o benefício obtido pelo infractor através da prática da contra-ordenação, interdição temporária do exercício pelo infractor da profissão ou da actividade a que a contra-ordenação respeita ou revogação do alvará ou licença.

Um aspecto curioso assenta no tratamento dife-renciado dos operadores afectados por esta Lei. Na verdade, estipula-se no artigo 29.º que ao prazo geral estipulado para a entrada em vigor desta Lei (30 dias

após a sua publicação) acrescerão:a) 6 meses, para a generalidade das entidades transportadoras;b) 1 ano, para as câmaras munici-pais;c) 2 anos, para as juntas de fre-guesia, instituições particulares de solidariedade social e outras pessoas colectivas sem fins lucrativos;d) 3 anos, para as pessoas colectivas sem fins lucrativos, cujo objecto so-cial seja a promoção de actividades culturais, recreativas e desportivas.

Apesar de muito bem-vinda, esta Lei não está isenta de algumas críti-cas, tendo alguns aspectos sido desde logo apontados em fase de discussão do projecto-lei por algumas associa-ções interessadas, v.g. ANTROP e Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), sendo que as recomendações acolhidas acabaram por ser, salvo o devido respeito e em

nossa opinião, as que menos se imporiam, por apenas visarem a suavização das imposições e do impacto económico-financeiro para os operadores.

Ora, um dos aspectos que desde logo salta à vista é a imprecisão do conceito de transporte colectivo de crianças. Senão, vejamos:

Um automóvel pesado de passageiros, com a lotação de 50 lugares sentados, transporta para uma escola pública, 50 crianças, das quais apenas 10 têm idades inferiores a 17 anos. Podemos classificar este trans-porte como de crianças? Em nossa opinião, sim. Mas concordamos que será uma das questões susceptíveis de dar origem a interpretações diversas e que poderia ter sido solucionada desde logo, como chegou a ser proposto pela ANTROP.

Outra questão que nos merece o reparo prende-se

Os requisitos de acesso ao exercício, a título de actividade principal, do transporte de crianças são a idoneidade, capacidade técnica e profissional dos gerentes e administradores das pessoas colectivas, ou do próprio, quando se trate de empresário em nome individual.

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14Vida Judiciária Maio/2006

com as circunstâncias reveladoras de falta de idonei-dade para o acesso ao exercício, a título de actividade principal, do transporte de crianças, bem como das funções de motorista e vigilante.

Ora, por um lado, não se entende que se exija a condenação em pena de prisão efectiva pela prática de qualquer crime que atente contra a vida, a inte-gridade física ou a liberdade pessoal, quando se sabe, à partida, que apenas em casos muito graves ou de reincidência haverá lugar à aplicação de pena de prisão efectiva. Por outro lado, também não se vê com bons olhos que a condenação na prática destes crimes não afecte a idoneidade, quando o agente tenha sido reabilitado, nem impeça a DGTT de considerar, de forma justificada, que estão reunidas as condições de idoneidade, tendo em conta, nomeadamente, o tempo decorrido desde a prática dos factos. Recordemo-nos que falamos de crianças e da sua segurança, impondo-se que ponderemos sempre, na análise da situação, como se dos nossos filhos se tratassem.

No que respeita aos cintos de segurança exigíveis para os veículos matriculados antes da entrada em vigor do diploma ora aprovado, lamentamos que não se tenha ido mais longe, sufragando nesta matéria o projecto-lei do PEV, que exigia, sem excepção, a existência de cintos de segurança de três pontos de

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fixação. Na verdade, teria sido preferível exigir, desde logo, a adaptação dos veículos já matriculados, como acontecerá quanto a outras condições e equipamen-tos, também no que respeita aos cintos de segurança, dado que os cintos de segurança subabdominais não protegem convenientemente a criança em caso de acidente.

Finalmente e voltando às exigências para acesso à função de motorista deste tipo de transporte, somos da opinião que o certificado a emitir tem validade demasiado extensa (cinco anos), sendo, ao invés, a experiência de condução exigida demasiado curta (dois anos). A isto acresce o facto de, apesar de exigida, pelo menos, uma acção de formação específica por parte do motorista, nada se estipular quanto à necessidade de formação complementar e contínua.

Apesar de tudo, voltamos a afirmar que o diploma já remetido para promulgação é uma batalha ganha na prevenção rodoviária, colmatando uma lacuna legislativa de há vários anos, sendo ainda certo que muito poderá vir a ser ainda melhorado por via da regulamentação para a boa execução da Lei, que ca-berá ao Governo aprovar no prazo de 120 dias após a sua publicação.

*Advogado - CSM Advogados

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15 Vida Judiciária Maio/2006

Documento Único Automóvel aplicável às Regiões Autónomas

No Conselho de Ministros do passado dia 23 de Março, foram aprovados diversos diplomas que

regulamentam o Código da Estrada e alteram outros diplomas em matéria de prevenção e segurança rodoviária e legislação fiscal.

Assim, foi criado o registo de infracções de outros infractores (RIO) ao Código da Estrada e à legislação complementar e especial cuja aplicação está cometida à Direcção-Geral de Viação (o regime jurídico do ensino da condução, dos exames de condução e da actividade de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques). Pretende-se que as infracções dos infractores não condu-tores (indivíduos não habilitados com carta de condução,

instrutores, subdirectores e directores de escola de con-dução, centros de exames de condução, examinadores e responsáveis de centro, entidades autorizadas pela Direcção-Geral de Viação a proceder à inspecção técnica de veículos, respectivos centros e inspectores) passem a ficar sujeitas às regras registrais previstas para o infractor condutor, nomeadamente, quanto à medida da sanção, atenuação especial da sanção acessória, suspensão da sanção acessória, revogação da suspensão da sanção acessória e reincidência.

O diploma ora aprovado estabelece a definição do conteúdo e das regras de organização e manutenção da base de dados do RIO.

Alterações ao regime dos recursos em processo civil. Proposta de Lei

No Conselho de Ministros do passado dia 6 de Abril, foi aprovada, na genaralidade, a Proposta

de Lei que autoriza o Governo a alterar o regime dos recursos em processo civil, o regime dos conflitos de competência e a competência dos julgados de paz.

As alterações a introduzir ao regime jurídico dos recursos cíveis visam a simplificação e a racionalização do sistema de recursos, bem como a obtenção de maior celeridade na Justiça.

Em matéria de simplificação, propõe-se que a tramitação dos recursos cíveis se torne mais simples, mediante as seguintes medidas:

- Eliminação da distinção entre recurso de agravo e recurso de apelação, por forma a evitar os frequentes recursos interlocutórios que hoje são interpostos du-rante o processo e que só depois, com a sentença final, sobem ao tribunal superior. As decisões interlocutórias continuam a poder ser objecto de recurso, mas agora, em regra, só no momento da impugnação final;

- A apresentação do requerimento de recurso passa a ter de ser logo acompanhado das alegações;

- Os vistos dos vários juízes que englobam o colectivo passam a realizar-se preferencialmente por meios elec-trónicos e simultaneamente, quando hoje o processo vai à vez, sequencialmente, a cada um dos juízes;

- O tribunal superior passa a poder decidir através de mera remissão para decisões anteriores, quando a simplicidade da causa o permita.

O sistema de resolução de conflitos de competências também se torna mais simples e expedito porque a deci-são de uma questão desta natureza passa a realizar-se através de decisão do Presidente do Supremo Tribunal

de Justiça ou do tribunal da relação, consoante os casos. Evita-se, assim, que a resolução dos conflitos de competências seja um processo judicial complexo, que envolva uma decisão de um colectivo de magistrados, com uma tramitação processual e formalismos que não se justificam. No âmbito da racionalização do sistema de recursos, pretende-se evitar, por um lado, que os tribunais superiores e, em especial, o Supremo Tribunal de Justiça sejam sistematicamente convocados a decidir questões de escassa importância ou que já tenham me-recido várias decisões judiciais no mesmo processo.

Assim, o valor da alçada da primeira instância passa de 3740,98 euros para 5000 euros e o valor da alçada da segunda instância passa de 14.963,94 euros para 30.000 euros. Também deixa de haver recurso para o STJ em terceira instância quando a primeira instância e o tri-bunal da relação tenham decidido no mesmo sentido, no mesmo processo. Incentiva-se agora a a intervenção do tribunal superior e, em especial, do STJ, quando se trate de apreciar uma causa original.

Desta forma, o STJ poderá sempre apreciar um recurso quando seja necessário para uma melhor apli-cação do direito ou quando estejam em causa interesses de particular relevância social.

Por outro lado, é permitido um novo fundamento de recurso, quando a decisão do tribunal seja contrária à jurisprudência consolidada do STJ. É ainda criado um recurso extraordinário para o pleno do STJ em matéria de uniformização de jurisprudência, quando esteja em causa um acórdão de uma das secções do STJ que contrarie outro anteriormente proferido pelo mesmo tribunal.

Informações Jurídicas

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16Vida Judiciária Maio/2006

Programa Simplex 2006 – Medidas no âmbito empresarial e comercial

Com vista a racionalizar a actividade da Ad-ministração Pública e a facilitar a vida dos

cidadãos e das empresas, o Executivo criou o programa Simplex, que agrega 333 iniciativas a aplicar já no corrente ano de 2006 e que se tra-duzem na eliminação de certidões, na eliminação do papel ou desmaterialização, na simplificação ou desburocratização, na desregulamentação, na facilitação de acessos aos serviços públicos e na harmonização e consolidação de regimes jurídicos.

Uma das várias vertentes do SIMPLEX prevê a aprovação de medidas específicas na área comercial e empresarial, as quais passamos a enunciar:

I - No âmbito da iniciativa “Eliminação de

certidões”, que consiste no reforço dos canais de comunicação dentro da Administração e de partilha da informação pública, no respeito dos direitos dos cidadãos, nomeadamente em matéria de protecção de dados pessoais, na área empresarial e comercial, foram aprovadas as seguintes medidas:

- Certidão permanente das empresas: até Dezem-bro de 2006 deverá ser criado um sítio na internet, gerido pelos serviços do Ministério da Justiça, para colocação e publicitação de certidões permanentes das empresas que adiram e paguem o respectivo serviço.

De referir que, enquanto a certidão estiver on-line, nenhuma entidade pública poderá exigir das empresas aderentes qualquer certidão probatória de factos dela constantes.

II - No âmbito da iniciativa “Eliminação do papel/desmaterialização”, que consiste no aproveitamento das facilidades oferecidas pelas tecnologias da infor-mação e da comunicação para eliminar os actuais circuitos do papel, facilitando o acesso e diminuindo os custos de gestão, em matéria empresarial e comer-cial, foram aprovadas as seguintes medidas:

- Formulários electrónicos: no próximo mês de Junho será disponibilizado, no sítio Internet do Mi-nistério da Justiça e no âmbito do projecto “Empresa na Hora”, o formulário electrónico para adesão plena e imediata aos centros de arbitragem do consumo, bem como o formulário electrónico para a celebração automática de convenções arbitrais.

- Procedimentos electrónicos: também nesse mês de Junho de 2006 será disponibilizada no sítio Internet do Ministério da Justiça a possibilidade de constituição de empresas on-line.

Em Dezembro de 2006, concretizar-se-á a des-

materialização dos actos de registo, passando a ser possível requerer actos de registo on-line, no sítio da Internet do Ministério da Justiça, sem que seja, portanto, necessária a deslocação física às Conser-vatórias.

No final de 2006, o Governo conta desmateriali-zar as declarações de exportação, com informatiza-ção e simplificação de procedimentos.

Assim, a declaração de exportação em papel será substituída por uma declaração electrónica.

III - No âmbito da iniciativa “Simplificação e desburocratização”, a qual consiste no combate à complexidade dos processos, procedendo à sua re-organização, reduzindo o volume dos documentos e a rigidez das práticas administrativas, foram aprovadas as seguintes medidas em matéria em-presarial e comercial:

- Eliminação de formalidades – prestação de contas das empresas: até Dezembro de 2006 será criado um novo modelo de prestação de contas que permitirá às empresas a sua apresentação por via informática, num único ponto, em conjunto e de uma só vez com outras declarações obrigatórias, desig-nadamente no âmbito das Finanças, do Trabalho e da Segurança Social.

Esta medida permitirá o tratamento das contas das empresas para fins estatísticos e a consequente eliminação de um conjunto de inquéritos feitos, en-tre outros, pelo Banco de Portugal e pelo Instituto Nacional de Estatística.

- Simplificação de actos societários: em Junho de 2006 deverão concretizar-se as medidas de sim-plificação:

- do processo de fusão e cisão de sociedades;- do processo de redução do capital social, elimi-

nando-se a escritura e a intervenção do tribunal no processo;

- e do processo de dissolução e liquidação de sociedades.

- Escrituras públicas facultativas: no próximo mês de Junho também se prevê que passem a ser facultativas as escrituras notariais relativas a actos societários, passando apenas a ser obrigatório o respectivo registo na Conservatória.

- Simplificação de actos de registo: em Dezembro

próximo prevê-se a eliminação da delimitação da competência territorial das Conservatórias, possi-bilitando-se a realização de registos em qualquer conservatória independentemente da localização da sede da empresa.

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17 Vida Judiciária Maio/2006

Durante o mês de Junho do corrente ano está previsto:

1. eliminar actos de registo, designadamente, a autorização para que se mantenha na firma social o nome ou apelido do sócio que se retira ou faleça; o registo da aprovação do projecto de fusão e o registo da aprovação do projecto de cisão;

2. Transformar registos “normais” em registos por declaração do depósito. Esta medida será aplicável, entre outras situações, à deliberação de aquisição de bens a sócios pela sociedade, à deliberação de amor-tização/conversão de acções, à emissão de obrigações por oferta particular e ao mandato comercial.

3. Atribuir mais competências em matéria de registos, a ajudantes e escriturários das Conserva-tórias.

4. Alargar as competências de autenticação de documentos e de reconhecimentos de assinaturas.

De acordo com esta medida, conservatórias, advogados, solicitadores e câmaras de comércio e indústria passam a poder autenticar documentos e a efectuar reconhecimentos presenciais. As Conser-vatórias passam também a poder fazer reconheci-mentos por semelhança e na qualidade.

IV - No âmbito da iniciativa “Simplificação de pro-cedimentos”, a qual consiste na eliminação dos con-trolos e dos constrangimentos prévios, desenvolvendo o princípio da confiança e da responsabilização, em matéria empresarial e comercial, foram aprovadas as seguintes medidas:

- “Associações na hora”: até Dezembro de 2006 será possibilitada a constituição de associações “na hora”, mediante atendimento presencial único nas conservatórias.

Com a implementação desta medida os interessados dirigem-se a uma Conservatória e, no mesmo balcão de atendimento e no mesmo acto, indicam o nome preten-dido, escolhem um modelo de estatutos pré-aprovados por despacho do Director-Geral dos Registos e do Nota-riado. A Conservatória regista imediatamente a nova associação e procede à publicação electrónica do acto de registo, em site web do Ministério da Justiça.

- “Marca na hora”: em Setembro próximo serão simplificados, no âmbito do projecto “Marca na Hora”, os processos de registo de títulos de proprie-dade sobre firmas e marcas, passando a poder ser feitos numa hora, em vez dos 12 meses actuais, de uma só vez e num único balcão, designadamente, nos Centros de Formalidades das Empresas.

V - No âmbito da iniciativa “Facilitar o relacio-namento e o cumprimento de obrigações”, a qual consiste na articulação dos diferentes organismos públicos que actuam no âmbito do mesmo procedi-mento, numa lógica de integração de serviços e de partilha da informação, foram aprovadas as seguin-tes medidas em matéria empresarial e comercial:

- Consulta gratuita de sinais de marca: até ao final do corrente ano será permitida a consulta, gratuita e on-line, de sinais de marca e de outros sinais distintivos registados e disponíveis e também a consulta sobre invenções e design protegidos, bem como será permitido o acompanhamento, gratuito e on-line, de todos os requerimentos de marcas, patentes e design que entrem no Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

- Simplificação dos processos de licenciamento: com vista a simplificar os processos de licenciamento, em Junho de 2006, o licenciamento prévio obrigatório de estabelecimentos de comércio alimentar e certos estabelecimentos de comércio não-alimentar e de prestação de serviços será transformado num regi-me de declaração prévia ao exercício da actividade comercial em causa.

VI - No âmbito da iniciativa “Desregulamenta-

ção”, que consiste em desenvolver o princípio da confiança, eliminando constrangimentos legais e regulamentares e acções de duplo controlo, foram aprovadas as seguintes medidas em matéria empre-sarial e comercial:

- Simplificação da escrita comercial: até ao pró-ximo mês de Junho será simplificada a actividade dos comerciantes pela eliminação dos encargos burocráticos e financeiros inerentes à manutenção dos livros de inventário, balanço, razão e copiador, actualmente exigidos na escrita comercial..

Os livros de actas mantêm-se, eliminando-se, no entanto, a obrigação da sua legalização prévia nas conservatórias.

- Cadastro industrial – eliminação: o acto ad-ministrativo autónomo de registo obrigatório dos estabelecimentos industriais, vulgo Cadastro Indus-trial, será eliminado até ao próximo mês de Junho, assim como a Ficha de Estabelecimento Industrial: MOD.106-DGI/Modelo nº 387 (INCM).

VII - No âmbito da iniciativa “Facilitação do aces-so aos serviços públicos”, que consiste em melhorar a qualidade do atendimento e o acesso à informação, em matéria empresarial e comercial, foram aprova-das as seguintes medidas:

- Base de dados de estabelecimentos comerciais: até ao final do corrente ano será criada uma base de dados, centralizada na Direcção-Geral de Empresas, de registo dos estabelecimentos comerciais, bem como será permitido o acesso a esta base de dados pelas Direcções Regionais da Economia.

- Balcão único: a partir de Março último começou a ser melhorada a prestação de serviços dos Centros de Formalidades das Empresas e disponibilizado um conjunto mais vasto de serviços às empresas, numa lógica integrada, por via do alargamento de compe-tências e do reforço do princípio do balcão único.

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18Vida Judiciária Maio/2006

Actividade seguradora

Pela Lei n.º 11/2006, de 4.4, o Governo foi auto-rizado a regular o acesso e o exercício da acti-

vidade de mediação de seguros ou de resseguros e a adaptar o regime geral das contra-ordenações às especificidades desta actividade na sequência da transposição da Directiva n.º 2002/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de De-zembro, relativa à mediação de seguros.

No âmbito da actividade de mediação de seguros e de resseguros, o Governo fica autorizado, nome-adamente, a:

- Instituir um regime para o acesso e exercício da actividade de mediação de seguros e de resse-guros adequado a garantir a efectiva protecção dos interesses de todos os intervenientes do mercado e, em especial, dos tomadores, segurados e bene-ficiários de seguros, associados, participantes e beneficiários de fundos de pensões;

- Definir o regime jurídico das contra-ordena-ções, incluindo os aspectos processuais.

Quanto ao regime de acesso e exercício, o Go-verno poderá, nomeadamente:

- Fazer depender o acesso e o exercício da acti-vidade de mediação de seguros ou de resseguros da inscrição em registo junto do Instituto de Seguros de Portugal e do preenchimento de requisitos de qualificação profissional, idoneidade, garantias financeiras e organização adequados ao tipo de actividade que se pretende desenvolver;

- Considerar incompatível com o acesso e exer-

cício da actividade de mediação de seguros ou de resseguros actividades ou funções susceptíveis de gerar potenciais conflitos de interesses;

- Prever a possibilidade de cancelamento do re-gisto de mediador de seguros ou de resseguros com fundamento na falta originária ou superveniente das condições de acesso à actividade ou no exercício de actividade em condições que prejudicam os inte-resses dos tomadores, segurados e beneficiários de seguros, associados, participantes e beneficiários de fundos de pensões ou inviabilizam uma adequada supervisão;

- Atribuir ao Instituto de Seguros de Portugal a responsabilidade pela criação, manutenção e actu-alização permanente de um registo electrónico dos mediadores de seguros ou de resseguros residentes ou cuja sede social se situe em Portugal;

- Atribuir ao Instituto de Seguros de Portugal a responsabilidade pela criação, manutenção e actualização permanente de um registo central relativo a processos de contra-ordenação, sem pre-juízo da observância das normas procedimentais, das normas de protecção de dados e das medidas especiais de segurança previstas na Lei da Protec-ção de Dados Pessoais;

- Determinar em que termos os mediadores de seguros autorizados à data da entrada em vigor do novo regime são enquadrados nas novas categorias de mediadores previstas e qual o regime aplicável durante o período transitório.

Sociedades gestoras de participações sociais

No Conselho de Ministros do passado dia 6 de Abril, foi aprovado o diploma que deter-

mina a aplicação do projecto «Documento Único Automóvel» às regiões autónomas dos Açores e da Madeira.

Este diploma estende o projecto «Documento Único Automóvel» a todo o território nacional, aplicando-o às regiões autónomas dos Açores e da Madeira e permitindo que os órgãos competentes dos governos regionais procedam às necessárias adaptações.

Por outro lado, este diploma vem clarificar al-gumas disposições dos diplomas, nomeadamente do Regulamento do Registo de Automóveis, altera-dos pela legislação que criou o «Documento Único Automóvel» (DL n.º 178-A/2005, de 28.10), com o objectivo de eliminar dúvidas de interpretação.

Assim, esclarece-se que a desafectação ao regi-me de aluguer sem condutor é registada através de menção especial efectuada no registo da cons-tituição ou transmissão e que, quando se prevê o registo do aluguer por prazo superior a um ano, o acto que está sujeito a inscrição obrigatória é a sujeição do veículo ao regime do aluguer de longa duração.

Por último, procede-se a pequenas alterações ao Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, eliminando incoerências, incentivando o fornecimento em suporte electrónico de mapas estatísticos e estabelecendo uma redução emo-lumentar no registo de reboques solicitado por entidades licenciadas que exerçam a actividade de transportes rodoviários de mercadorias por conta de outrem.

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19 Vida Judiciária Maio/2006

Código da Estrada – Criado o registo de infracções de não condutores

No Conselho de Ministros do passado dia 23 de Março, foram aprovados diversos diplomas

que regulamentam o Código da Estrada e alteram outros diplomas em matéria de prevenção e segu-rança rodoviária e legislação fiscal.

Assim, foi criado o registo de infracções de outros infractores (RIO) ao Código da Estrada e à legislação complementar e especial cuja aplicação está cometi-da à Direcção-Geral de Viação (o regime jurídico do ensino da condução, dos exames de condução e da actividade de inspecção técnica de veículos a motor e seus reboques).

Pretende-se que as infracções dos infractores não condutores (indivíduos não habilitados com carta de

condução, instrutores, subdirectores e directores de escola de condução, centros de exames de condução, examinadores e responsáveis de centro, entidades autorizadas pela Direcção-Geral de Viação a proceder à inspecção técnica de veículos, respectivos centros e inspectores) passem ficar sujeitas às regras registrais previstas para o infractor condutor, nomeadamente, quanto à medida da sanção, atenuação especial da sanção acessória, suspensão da sanção acessória, revogação da suspensão da sanção acessória e rein-cidência.

O diploma ora aprovado estabelece a definição do conteúdo e das regras de organização e manutenção da base de dados do RIO.

Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas

No Conselho de Mi-nistros do passado

dia 23 de Março, foram aprovados diversos di-plomas que regulamen-tam o Código da Es-trada e alteram outros diplomas, por forma a adaptá-los às novas real idades, quer em matéria de prevenção e segurança rodoviária, quer no que respeita à legislação fiscal, quer ainda no âmbito das políticas ambientais.

Assim, foi aprovada a Proposta de Lei do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas.

Esta Proposta de Lei visa criar condições para a fiscalização sistemática da condução sob efeito de substâncias psicotrópicas e optimizar o processo de fiscalização da condução sob efeito do álcool.

Para esse efeito estabelecem-se os métodos a uti-lizar na fiscalização da condução sob a influência do álcool ou de substâncias psicotrópicas, enumeram-se as substâncias psicotrópicas que podem influenciar a capacidade para conduzir, designam-se as entidades públicas responsáveis pela execução dos exames médicos e laboratoriais e atribui-se competência à Direcção-Geral de Viação para aprovação dos equipa-

mentos utilizados nesta fiscalização. No que res-peita à fiscalização da condução sob influência de substâncias psicotró-picas, o rastreio prévio, até agora feito através de exame médico, passa a ser substituído por um teste rápido a realizar numa amostra de urina, saliva ou suor, subme-tendo-se o indivíduo a um exame de confirma-ção, em amostra de san-gue apenas no caso de o resultado ser positivo.

A idêntica prova de rastreio, mas a realizar no sangue, são submetidos os intervenientes em acidentes de viação que, por razões de saúde, não estejam em condições de lhes serem colhidos outros fluidos biológicos.

Os examinados que apresentem resultado positi-vo em qualquer daqueles exames de rastreio devem, em seguida, ser submetidos a exame de confirmação em amostra de sangue.

Por último, tendo em conta que o exame médico é de difícil realização, moroso e não consegue a precisão de resultados atingida pelos exames labo-ratoriais, confere-se agora carácter residual àquele exame, que apenas será realizado nos casos em que não for possível colher sangue ao examinando.

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20Vida Judiciária Maio/2006

Governo avança com projecto de “licenciamento na hora”

O Governo foi recentemente autorizado (pela Lei n.º 10/2006, de 4.4) a estender o regime contra-

-ordenacional aplicável à actividade seguradora às sociedades gestoras de participações sociais sujeitas à supervisão do Instituto de Seguros de Portugal e às companhias financeiras mistas por infracções às normas legais e regulamentares que regem a super-visão complementar dos conglomerados financeiros. No âmbito da supervisão complementar de instituições de crédito, empresas de seguros e empresas de investi-mento de um conglomerado financeiro, o Governo fica autorizado a: tipificar como ilícitos de mera ordenação

social as infracções pelas sociedades gestoras de par-ticipações sociais sujeitas à supervisão do Instituto de Seguros de Portugal às normas de supervisão pru-dencial que lhes sejam aplicáveis e as infracções pelas companhias financeiras mistas às normas legais ou regulamentares que regem a supervisão complementar dos conglomerados financeiros; prever o tratamento de dados pessoais relativos à vida privada dos accionistas e membros dos órgãos de administração e fiscalização das entidades dos conglomerados financeiros, bem como permitir o acesso de terceiros aos dados pessoais dos mesmos titulares.

Restrições à concessão de subsídio de desemprego

O Governo pretende alterar o regime de atribuição do subsídio de desemprego, limitando a possi-

bilidade de acumulação de uma indemnização por rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo com a atribuição do subsídio de desemprego.

De acordo com a versão final do diploma, o acesso ao subsídio de desemprego para quem rescinda con-trato de trabalho por mútuo acordo fica limitado a um máximo de 3 trabalhadores ou 25% do quadro de pessoal, por triénio, nas empresas que empregam até 250 trabalhadores. No caso das empresas com mais de 250 trabalhadores, o novo regime permite o acesso ao subsídio de desemprego até 62 trabalhadores por ano, ou até 20% dos trabalhadores, com um limite máximo de 80 trabalhadores, em cada triénio. Por seu lado, os desempregados vão passar a ser obrigados a aceitar em-prego com uma remuneração ilíquida igual ou superior ao subsídio de desemprego auferido, acrescido de 25%. Se ao fim de 6 meses o desempregado continuar sem emprego, fica obrigado a aceitar um salário equivalente ao subsídio acrescido de 5% do seu valor.

Refira-se ainda que o período de concessão do subsídio de desemprego terá em consideração não só

a idade do beneficiário, como acontece actualmente, mas também o número de meses com remunerações registadas no período imediatamente anterior à data do desemprego. Assim, será reduzido de 12 para 9 meses o período de concessão das prestações do subsídio de desemprego para os beneficiários que tenham idade inferior a 30 anos de idade e até 24 meses de carreira contributiva.

Para os beneficiários com mais de 24 meses de descontos, o período de concessão passa para um ano, com um acréscimo de 30 dias para os beneficiários que possuam um registo de remunerações de cinco anos.

Para os beneficiários com idade igual ou superior a 30 e inferior a 40 anos, propõe-se um período de con-cessão de 1 ano, no caso de 48 meses ou menos de des-contos, e de 18 meses, no caso da carreira contributiva ser superior a 48 meses. Esta última terá um acréscimo de 30 dias por cada período de cinco anos de carreira contributiva com registo de remunerações nos últimos 10 anos. Para os beneficiários com idade igual ou supe-rior a 40 e inferior a 45 anos, é sugerido um período de concessão de 18 meses para aqueles com uma carreira contributiva igual ou inferior a 60 meses.

“Empresa na Hora”- novos postos de atendimento

Em conformidade com regime especial de cons-tituição imediata de sociedades (“Empresa na

Hora”), foram recentemente criados novos postos de atendimento. O regime “Empresa na Hora” foi alargado às Conservatórias do Registo Comercial do Porto, Gondo-mar, Ponta Delgada, Faro, Angra do Heroísmo e Maia, bem como ao Centro de Formalidades das Empresas do Porto. Este regime ficará disponível nestas localidades nas seguintes datas:

- Até finais de Março de 2006 - Conservatória do Registo Comercial do Porto e Centro de Formalidades das Empresas do Porto;

- Até finais de Abril de 2006 - Conservatória do Re-gisto Comercial de Gondomar e de Ponta Delgada;

- Até finais de Maio de 2006 - Conservatória do Re-gisto Comercial de Faro;

- Até finais de Junho de 2006 - Conservatórias do Registo Comercial de Angra do Heroísmo e da Maia.

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21 Vida Judiciária Maio/2006

Sociedades comerciais. Simplificação dos actos notariais e registais. Alterações ao Código das Sociedades Comerciais

Conforme referimos na anterior edição da “Vida Judiciária, o DL n.º 76-A/2006, de 29.3, vem

actualizar e “flexibilizar os modelos de governo das sociedades anónimas, adoptar medidas de simplificação e eliminação de actos e procedimen-tos notariais e registrais e aprovar o novo regime jurídico da dissolução e da liquidação de entidades comerciais.

As medidas de simplificação e eliminação de actos e procedimentos registais e notariais, ora adoptadas são as seguintes:

- Este diploma torna facultativas as escrituras públicas relativas a actos da vida das empresas. Portanto, deixam de ser obrigatórias, designada-mente, as escrituras públicas para constituição de uma sociedade comercial, alteração do contrato ou estatutos das sociedades comerciais, aumento do capital social, alteração da sede ou objecto social, dissolução, fusão ou cisão das sociedades comerciais. Apenas ficam ressalvadas as situações em que se verifique a transmissão de um bem imóvel, pois nes-tes casos continua a ser exigida a forma legalmente determinada para negócios jurídicos que envolvam bens desta natureza.

Evita-se desta forma o duplo controlo público que se exigia às empresas através da imposição da obriga-toriedade de celebração de uma escritura pública no cartório notarial e, posteriormente, do registo desse acto na conservatória do registo comercial.

Desta forma, quando uma empresa pretenda uti-lizar um processo mais complexo e minucioso, pode utilizar os serviços do cartório notarial, aí celebrando uma escritura pública e, depois, solicitar o registo do acto na respectiva conservatória. Se, ao invés, pretender utilizar um procedimento mais célere e barato, que é igualmente apto para assegurar a se-gurança jurídica do acto pretendido, o Estado passa a garantir a possibilidade de praticar esse acto num único local.

- Em 2.º lugar, elimina-se a obrigatoriedade de existência dos livros da escrituração mercantil nas empresas e, correspondentemente, a imposição da sua legalização nas conservatórias do registo comer-cial. Logo, os livros de inventário, balanço, diário, razão e copiador deixam de ser obrigatórios, apenas se mantendo os livros de actas. Consequentemente, elimina-se a obrigatoriedade de legalização dos livros, incluindo dos livros de actas.

- Em 3.º lugar, o diploma ora aprovado aborda a matéria da dissolução de entidades comerciais, incluindo sociedades comerciais, cooperativas e estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada.

Por um lado, é criada uma modalidade de «dis-solução e liquidação na hora» para as sociedades comerciais, assim se permitindo que se extingam e liquidem imediatamente, num atendimento presen-cial único, nas conservatórias de registo comercial, quando determinados pressupostos se verifiquem. Também se adopta uma modalidade de dissolução e liquidação administrativa e oficiosa de entidades comerciais, por iniciativa do Estado, quando existam indicadores objectivos de que a entidade em causa já não tem actividade embora permaneça juridicamente existente. Esta medida é especialmente relevante tendo em conta o elevado número de sociedades co-merciais criadas sem actividade efectiva na economia nacional.

Finalmente, acolhe-se igualmente um procedi-mento administrativo da competência da conserva-tória para os casos legais de dissolução e liquidação de entidades comerciais, a requerimento de sócios e credores da entidade comercial.

- Em 4.º lugar, modifica-se substancialmente o regime da fusão e cisão de sociedades, tornando-o muito mais simples e barato.

Com as novas regras bastarão dois registos na conservatória e duas publicações num sítio na Inter-net, a efectuar por via electrónica, para concretizar uma fusão ou cisão.

- Em 5.º lugar, actua-se no domínio da autentica-ção e do reconhecimento presencial de assinaturas em documentos, permitindo que tanto os notários como os advogados, os solicitadores, as câmaras de comércio e indústria e as conservatórias passem a poder fazê-las.

- Em 6.º lugar, prevê-se a possibilidade de praticar actos de registo on-line, que estará em funcionamento até ao final do ano de 2006, estipulando-se que o preço destes registos seja mais barato.

- Em 7.º lugar, adoptam-se as medidas legislativas necessárias para criar a certidão permanente. Com este serviço, a entrar em vigor no 2.º semestre de 2006,

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22Vida Judiciária Maio/2006

permite-se que as empresas possam ter uma certidão permanentemente disponível num sítio na Internet, assegurando-se que, enquanto essa certidão estiver on-line, nenhuma entidade pública possa exigir de quem aderiu a este serviço uma certidão em papel, pois ficará obrigada a consultar o site sempre que pre-tenda confirmar a informação que lhe foi declarada.

- Em 8.º lugar, reduzem-se e clarificam-se muitos dos actuais custos da prática dos actos da vida das empresas.

- Em 9.º lugar, adoptam-se medidas destinadas a facilitar a relação dos cidadãos e das empresas com as conservatórias de registo comercial, enquanto serviços públicos.

Assim, consagra-se a eliminação da competência territorial das conservatórias de registo comercial, a partir de 1 de Janeiro de 2007. Trata-se de permitir que qualquer cidadão ou empresa possa praticar qualquer acto de registo comercial em qualquer con-servatória do registo comercial do território nacional, independentemente da conservatória da sede da sociedade em causa.

Finalmente, eliminam-se ainda no registo co-mercial outros actos e práticas que não acrescentem valor, a título de exemplo, reduz-se o número de actos sujeitos a registo, adopta-se a possibilidade de praticar determinados actos através de um registo «por depósito», cria-se um novo regime de registo de transmissão de quotas e reformulam-se actos e proce-dimentos internos, sempre com garantia da segurança jurídica e da legalidade.

O presente diploma visa também actualizar a legislação societária nacional, de forma a adaptar os modelos societários previstos no actual Código das Sociedades Comerciais.

Pretende-se uma maior transparência e eficiência das sociedades anónimas portuguesas.

impunha-se agora dar continuidade a este regi-me, proporcionando três modelos de organização da administração e da fiscalização igualmente credíveis, somando aos dois figurinos actuais a possibilidade de se optar por um terceiro modelo de organização, típico das sociedades anglo-saxónicas, que compreende a existência obrigatória de uma comissão de auditoria dentro do órgão de administração.

De modo a concretizar as medidas enunciadas, este diploma procede à alteração, revogação e aprovação dos seguintes diplomas e regimes jurídicos:

- Alteração ao Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo DL n.º 262/86, de 2 de Setembro, in-cluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao Código do Registo Comercial, apro-vado pelo DL n.º 403/86, de 3 de Dezembro, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao Código Comercial, aprovado pela Carta de Lei, de 28 de Junho de 1888, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao regime dos agrupamentos comple-

mentares de empresas, aprovado pela Lei n.º 4/73, de 4 de Junho;

- Alteração à Lei Orgânica dos Serviços dos Regis-tos e do Notariado, aprovada pelo DL n.º 519-F2/79, de 29 de Dezembro;

- Alteração ao regime jurídico das cooperativas de ensino, aprovado pelo DL n.º 441-A/82, de 6 de Novembro;

- Alteração ao regime jurídico das «régies coopera-tivas» ou cooperativas de interesse público, aprovado pelo DL n.º 31/84, de 21 de Janeiro;

- Alteração ao regime do estabelecimento indivi-dual de responsabilidade limitada, aprovado pelo DL n.º 248/86, de 25 de Agosto, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao regime jurídico do crédito agrícola mútuo e das cooperativas de crédito agrícola, apro-vado pelo DL n.º 24/91, de 11 de Janeiro;

- Alteração ao regime das competências atribu-ídas aos notários nos processos de constituição de sociedades comerciais, aprovado pelo DL n.º 267/93, de 31 de Julho, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao regime jurídico da habitação perió-dica, aprovado pelo DL n.º 275/93, de 5 de Agosto;

- Alteração ao regime que permite a constituição e a manutenção de sociedades por quotas e anónimas unipessoais licenciadas para operar na Zona Franca da Madeira, aprovado pelo DL n.º 212/94, de 10 de Agosto;

- Alteração ao Código do Notariado, aprovado pelo DL n.º 207/95, de 14 de Agosto, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao Código Cooperativo, aprovado pela Lei n.º 51/96, de 7 de Setembro, incluindo a revogação de algumas disposições;

- Alteração ao regime jurídico das sociedades des-portivas, aprovado pelo DL n.º 67/97, de 3 de Abril;

- Alteração ao regime do acesso e exercício da ac-tividade das agências de viagens e turismo, aprovado pelo DL n.º 209/97, de 13 de Agosto;

- Alteração ao regime das condições de acesso e de exercício da actividade seguradora e resseguradora no território da Comunidade Europeia, incluindo a exercida no âmbito institucional das zonas francas, aprovado pelo DL n.º 94-B/98, de 17 de Abril;

s) Alteração ao regime do Registo Nacional de Pessoas Colectivas, aprovado pelo DL n.º 129/98, de 13 de Maio;

- Alteração à lei das empresas municipais, inter-municipais e regionais, constante da Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto;

u) Alteração ao regime dos serviços da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado na Loja do Cidadão, aprovado pelo DL n.º 314/98, de 17 de Outubro;

- Alteração à Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro;

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23 Vida Judiciária Maio/2006

- Alteração ao Código de Procedimento e de Pro-cesso Tributário, aprovado pelo DL n.º 433/99, de 26 de Outubro;

- Alteração ao regime jurídico das cooperativas de habitação e construção, aprovado pelo DL n.º 502/99, de 19 de Novembro;

- Alteração ao regime jurídico das cooperativas de comercialização, aprovado pelo DL n.º 523/99, de 10 de Dezembro;

- Alteração à Lei Orgânica da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, aprovada pelo DL n.º 87/2001, de 17 de Março;

- Alteração ao Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo DL n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro;

- Alteração ao Código da Insolvência e da Recu-peração de Empresas, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de Março;

- Alteração ao Regime Jurídico das Sociedades Anónimas Europeias, aprovado pelo DL n.º 2/2005, de 4 de Janeiro;

- Alteração ao regime especial de constituição ime-diata de sociedades, aprovado pelo DL n.º 111/2005, de 8 de Julho;

- Revogação do artigo 1497.º do Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro de 1961;

- Revogação do Regulamento do Registo Comer-cial, aprovado pela Portaria n.º 883/89, de 13 de Outubro;

- Aprovação do regime jurídico dos procedimentos administrativos de dissolução e liquidação de entida-des comerciais.

Este diploma também revoga diversas disposições dos seguintes diplomas legais:

- Código de Processo Civil;

- Código das Sociedades Comerciais;- Código do Registo Comercial;- Código Comercial;- Regime do Estabelecimento Individual de Res-

ponsabilidade Limitada;- Regulamento do Registo Comercial;- Código do Notariado;- Código Cooperativo.De referir que as sociedades constituídas an-

tes de 30 de Junho próximo e que não procedam, no prazo de um ano a contar daquela data, à alteração dos respectivos estatutos em matéria de administração e fiscalização, aplicam-se as seguintes regras:

- Nas sociedades estruturadas segundo a mo-dalidade de conselho de administração e conselho fiscal, é adoptada a modalidade prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 278.º do Código das Sociedades Comerciais(Conselho de administração e conselho fiscal);

- Nas sociedades estruturadas segundo a moda-lidade de direcção, conselho geral e revisor oficial de contas, é adoptada a modalidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 278.º do Código das Sociedades Comerciais (Conselho de administração executivo, conselho geral e de supervisão e revisor oficial de contas).

2 - As disposições sobre convocatória e funciona-mento da assembleia geral, acesso à informação por parte dos sócios e exercício de direito de voto, cuja aplicação possa ser afastada pelos estatutos, são apli-cáveis às sociedades acima referidas imediatamente, por sua opção, ou a partir de 30 de Junho de 2007, obrigatoriamente.

Este diploma entra em vigor no dia 30 de Junho de 2006.

Código da Estrada – Circulação de veículos sem matrícula nacional

No Conselho de Ministros do passado dia 23 de Março, foram aprovados diversos diplomas

que regulamentam o Código da Estrada e alte-ram outros diplomas, por forma a adaptá-los às novas realidades, quer em matéria de prevenção e segurança rodoviária, quer no que respeita à legislação fiscal, quer ainda no âmbito das polí-ticas ambientais.

Assim, foi aprovado um diploma que estabelece as condições de circulação em território nacional, dos veículos novos provenientes da União Europeia, sem anterior matrícula, bem como dos veículos im-portados após desalfandegamento, até à obtenção de matrícula nacional.

Este diploma centraliza na Direcção-Geral de

Viação a competência, para atribuição das chapas de trânsito, anteriormente atribuída ao Grémio dos Importadores e uniformiza o regime de circulação dos veículos novos sem matrícula, quer sejam im-portados, quer sejam construídos ou montados em Portugal.

Estabelecem-se agora as condições de circulação, em território nacional e até obtenção de matrícula portuguesa, dos automóveis e seus reboques, bem como dos ciclomotores, motociclos, triciclos e quadri-ciclos novos, sem anterior matrícula, provenientes de Estado-membro da União Europeia, importados após desalfandegamento ou montados ou fabricados em Portugal, em instalações industriais devidamente licenciadas.

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24Vida Judiciária Maio/2006

Habilitação de herdeiros

A habilitação de herdeiros consiste na declaração de que os habilitandos são herdeiros do falecido e não há quem lhes prefira na sucessão ou quem concorra com eles.

Essa declaração fica a constar de escritura pública e pode ser efectuada por três pessoas, que o notário considere dignas de crédito ou, em alternativa, por quem desempenhar o cargo de ca-beça-de-casal, devendo, nesse caso, ser-lhe feita a advertência de que incorre nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público se, dolosamente e em prejuízo de outrem, prestar declarações falsas.

Esta declaração (habilitação de herdeiros) deve conter a menção do nome completo, do estado, da

naturalidade e da última residência habitual do au-tor da herança e dos habilitandos e, se algum destes for menor, a indicação dessa circunstância.

A escritura de habilitação é instruída com os seguintes documentos:

- Certidão de óbito do autor da herança;- Certidão de teor do testamento ou da escritura

de doação por morte (caso a sucessão se fundamente em qualquer um destes actos);

- Documentos justificativos da sucessão legíti-ma, quando nesta se fundamente a qualidade de herdeiro de algum dos habilitados.

O exemplo que a seguir publicamos traduz uma minuta de escritura de habilitação de herdeiros, em que o declarante é o cabeça-de-casal.

Escritura de habilitação de herdeiros[Data], no [n.º]Cartório Notarial de [localidade], perante mim, [nome]., compareceu como outorgante:-..................................................................[Identificação: nome, estado civil, natural da freguesia de............................................................, concelho de............................................................,

residente na Rua,............................................................ contribuinte nº............................................................., portador do Bilhete de Identidade nº............................................................., emitido em............................................................, pelo Arquivo............................................................].

E por ele foi dito: Que, foi casado em primeiras núpcias com [Identificação: nome, estado civil, natural da freguesia de, ............................................................ concelho

de ............................................................, contribuinte nº............................................................., portador do Bilhete de Identidade nº............................................................ emitido em,............................................................ pelo Arquivo............................................................, falecida em --/--/---.]--------------------tendo como última residência habitual [Rua............................................................ , da freguesia de............................................................, concelho

de............................................................].- Que a falecida não fez testamento, nem qualquer outra disposição equivalente, tendo-lhe sucedido, como únicos herdeiros, seu marido [nome] e

seu filho [nome, estado civil, maior/menor, natural da freguesia de,............................................................ concelho de............................................................, contribuinte fiscal n.............................................................º e residente na Rua............................................................].

- Que não há outras pessoas que, segundo a lei, prefiram aos mencionados herdeiros ou que com eles possam concorrer na sucessão à herança da falecida.-----------------------------------------

- Assim o disse e outorga.(Assinatura)

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25 Vida Judiciária Maio/2006

sempre que mudam as direcções ou directórios nacionais.

Estando o País como está, tal situação, nos dois casos, é mais do que lamentável.

E, diga-se de passagem, sempre o seria ainda que estivéssemos a nadar em dinheiro – o desper-dício é sempre um factor negativo (mesmo quando as ideias propostas são más, ou venham a assim ser consideradas, como nos ensina a sabedoria popular, é da discussão e não da ocultação que nasce a luz).

2Eu sei que tanto o Senhor Presidente da República como o Senhor Primeiro-Minis-tro são corredores de fundo – o segundo no

sentido literal do termo e, quanto ao primeiro, é agora reconhecido por todos que houve uma bem sucedida estratégia, que terá durado talvez uma década, com o objectivo de alcançar a Presidência da República – o que não se me afigura ser um mal, bem pelo contrário.

Todavia e sem qualquer desprimor para qual-quer deles (ou para quem quer que seja; cada um sabe do que sabe e ninguém é omnisciente), nem um nem outro estão familiarizados com os saberes desta arte e terão, por isso, que apoiar-se e confiar nas pessoas do meio que escolheram para os auxiliar nas suas decisões. O que, muito sinceramente, me deixa um pouco ansioso, já que, porque o sistema judiciário nunca foi alvo de uma qualquer real auditoria e análise crítica que tivesse como ponto de partida a verificação do grau de sucesso do sistema no alcançar dos objectivos que para o mesmo se encontram cons-titucionalmente definidos, não é improvável que as propostas submetidas à sua apreciação não sejam mais do mesmo.

Onde chegámos com esse tipo de “soluções”, já se vai tornando evidente para muitos.

Por outro lado, essa situação poderá levá-los (ao PR e ao PM, entenda-se) a ser extremamente cautelosos nos passos que pretendem dar (o que é natural e até saudável – eu também ajo dessa maneira no que respeita às matérias que não domino), daí a lentidão que para mim é exaspe-rante.

Terei, talvez, a meu favor (mas é lamentável que

Unidade de missão para a reforma penal

(Parte 1)

Por: Eurico Reis

1O primeiro dos meus escritos de 2006 para o “Justiça e Cidadania” comportava uma manifestação de esperança – não muita,

claro, porque, como aí referi, já há muito deixei de ser ingénuo.

E, passado que está o primeiro trimestre, não encontro razões para abandonar esse meu cepti-cismo; de facto, continua a não ser perceptível, ou, pelo menos, não o é para mim, uma qualquer perspectiva estratégica na abordagem do sistema judiciário.

E sem essa visão global não será possível pôr fim à chamada “crise da Justiça”.

A não ser, claro, como sustentam os defensores da teoria da conspiração, que exista uma agenda oculta, agenda essa que, por definição, é sempre mal intencionada.

Para manter a minha tranquilidade e paz de espírito, como é essencial que mantenha até para poder continuar a exercer a minha profissão, não alinho em tais teorias.

Contudo, tenho que confessar que tenho por inexplicável que a chamada “Unidade de Missão para a Reforma Penal”, depois de produzir um documento que conduziu à elaboração de um Anteprojecto da Lei-Quadro da Política Criminal, em vez de avançar para a indispensável reformu-lação do Código de Processo Penal, tenha gasto o seu tempo a preparar uma revisão do Código Penal.

E isso é, repito, segundo o meu ponto de vista, ainda mais bizarro quando me recordo que, es-tando o PS ainda na oposição, durante os tempos dos Governos da Coligação PPD/PSD/CDS/PP, naquele partido se discutiu oficialmente – e a meu ver bem – uma proposta de revisão do Código de Processo Penal.

Porque, para pôr termo à crise da Justiça, é pelos Códigos de Processo, nomeadamente o Civil e o Penal, que importa começar. E, como não me canso de repetir, já vamos tarde.

Afinal, não é só quando mudam os Governos que o trabalho antes realizado é deitado para o caixote do lixo – aparentemente, mesmo dentro de cada um dos partidos, isso ocorre também

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isso esteja a acontecer) a circunstância de, objectiva-mente e apesar da capacidade de resistência que os portugueses têm demonstrado ao longo dos 900 anos que levamos de existência (entendo que, como quase sempre, o Povo precedeu a constituição e o reconhe-cimento internacional do Estado), ser insustentável para o País a manutenção do actual status quo na área do sistema judiciário. Ou mais exactamente, isso está a ser percepcionado e reconhecido por um número cada vez maior de pessoas.

Não obstante, é meu dever, especialmente tendo em conta a função social que desempenho (Juiz num Tribunal Superior que actua em última instância num número cada vez mais significativo de casos), manifestar a minha opinião – e o que digo é que este não é o caminho certo.

O que importa mudar urgente-mente é o sistema de formação das várias profissões jurídicas, nomea-damente pondo fim a essa perversa e socialmente perigosa ideia da equiparação dos Agentes do Mi-nistério Público (ou Delegados do Procurador da República) aos Juí-zes, é a configuração da organização judiciária (o que não se resume à alteração do mapa das comarcas ou à substituição destas por unidades territoriais de outra natureza) e são os Códigos de Processo (no sentido da sua radical simplificação, com a consagração de verdadeiras garan-tias materiais para as partes, para que todos os intervenientes possam ver conveniente-mente salvaguardados os seus direitos e interesses legítimos). Os Códigos substantivos podiam esperar. E deveriam ter esperado.

Mas, sendo as coisas o que são e não aquilo que gostaríamos que fossem, eis-nos confrontados com uma proposta de alteração do Código Penal em vigor.

3Desta vez (escrevo este texto, no dia 22 de Março), procurei comportar-me como um vulgar cidadão interessado e, ao invés do que

normalmente faço (pedir a alguém “dos de dentro” que me facultasse uma cópia do documento em causa), usei a ligação à Internet.

No site do Ministério da Justiça (aliás “Portal da Justiça”) apenas encontrei uma espécie de “Ex-posição de Motivos” – cujas primeiras palavras, curiosamente, são estas: «A revisão parte de pres-suposto de que o Código Penal é um bom Código, embora careça de aperfeiçoamentos» (sic) – e não

o articulado propriamente dito, o qual também não consegui encontrar nem no site da Ordem dos Advogados nem no do Conselho Superior da Magistratura (não obstante essas entidades terem representantes seus no Conselho da UMRP – Uni-dade de Missão para a Reforma Penal).

Sem prosseguir a busca nos sites da Assembleia da República ou do Conselho Superior do Ministério Público, desisti de procurar esse articulado e pedi que mo enviassem – irei analisá-lo mais detalhada-mente no próximo “Justiça e Cidadania”. Por hoje, fico-me com aquela, vamos chamar-lhe, Declaração que encontrei no referido “Portal” que nos esclarece que «Alguns desses aperfeiçoamentos são impostos por decisões quadro da quadro da União Europeia

e por outros instrumentos inter-nacionais que vinculam o Estado Português» (sic). Pois...

Não é que tenha uma ideia globalmente negativa sobre as propostas concretas – por exem-plo, satisfaz-me que esteja a ser formalmente reconhecido que só as pessoas com intervenção directa nos processos-crime, em especial os Agentes do Ministério Público ou das várias Polícias, os Oficiais de Justiça, os Advogados, os Juí-zes, os arguidos, os suspeitos, os ofendidos ou as partes civis, e não outras, podem ser consideradas agentes na prática do crime de violação do segredo de justiça

– mas custa-me que se façam reformas a reboque das instâncias internacionais. Se for esse o caso, acrescento.

Será que somos incapazes de pensar pela nossa própria cabeça e de agir segundo a nossa própria vontade?

Por mim, sei que não.

4Os Códigos Penais são peças essenciais, verda-deiras traves mestras, que servem de suporte e dão consistência às Comunidades de que ema-

nam – são a corporização dos Valores Essenciais da formação social que os produziu. E por isso deveriam ser tratados com maior respeito.

Ao contrário do que geralmente se pensa, não é por se criminalizar uma conduta infractora que os problemas sociais por ela gerados se resolvem ou são eliminados; ao invés, a banalização do Direito Penal torna-o ineficaz. Se a proibição contida numa qual-quer norma jurídica não consegue ser imposta, são todas as normas do Ordenamento Jurídico que ficam

Se a proibição contida numa qualquer norma jurídica não consegue ser imposta, são todas as normas do Ordenamento Jurídico que ficam afectadas

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afectadas – e que perdem credibilidade perante os cidadãos.

É a própria consistên-cia do tecido social que fica afectada e, em últi-ma análise, se esboroa. Os actos anti-sociais que devem ser considerados crimes – ou, dito de outro modo, os Valores Éticos que merecem ser salva-guardados mediante a pro-tecção do Direito Penal–, têm que ser aqueles que uma maioria significativa da Comunidade entende serem completamente ina-ceitáveis e merecedoras de opróbrio e de repulsa.

Se a contenção dessa actividade socialmente danosa e dos seus pernicio-sos efeitos puder ser feita de outra forma (através, por exemplo, do direito de mera ordenação social), é essa medida eticamente menos valorada que deve ser usada.

Como em quase tudo na vida, está em causa a proporcionalidade da res-posta da Comunidade ao acto perturbador da ordem social estabelecida (vamos deixar de ter medo das palavras) pacificamente aceite pelos membros da Sociedade.

É claro que a Maioria nem sempre tem razão – nor-malmente até nem a tem; a título de mero exemplo, recordo aqui o chamado “julgamento público” de Jesus que antecedeu a sua crucificação (na verdade, está já demonstrado que, sociologicamente, não existe uma Maioria e uma Minoria, mas sim várias minorias que conjunturalmente se aliam ou afastam, entrando ou não em conflito umas com as outras) – mas a verdade é que não é bom que os valores éticos consagrados na legislação e os comportamentos sociais que lhes correspondem não tenham pelo menos a não oposição da maioria das minorias sociais, sejam estas as mais activas ou não, da Comunidade. As reformas dos Códigos Penais não podem, portanto, ser feitas de forma casuística, ao sabor de modas, quase sempre passageiras, ou de acordo com a superficialidade das

agendas mediáticas. Mal estamos se o Conselho da UMRP sentiu necessidade de escrever no texto que se encontra disponível no “Portal da Justiça” que «Nenhum processo concreto foi ponderado na revisão do Código Penal, independen-temente da sua maior ou menor repercussão mediá-tica» (sic).

Se assim é, por que ra-zão haveria que sublinhar essa “evidência”?

Aliás, por que razão deverá ser desprezada ou até ignorada a experiência social adquirida através dos processos concretos que correm termos nos Tribunais e antes disso nas Delegações do Ministério Público?

Nos países em que a qualidade de vida dos cida-dãos é melhor (e naqueles que os Mestres Doutrina-dores responsáveis pelos “nossos” Códigos tanto se inspiram – e cujas leis tão acriticamente copiam), é exactamente a prática quotidiana da Jurispru-dência que serve da base

à Legislação.Não tenho a pretensão de ser o detentor da ver-

dade ou de ser mais inteligente ou mais perspicaz do que as outras pessoas (apenas me orgulho de pro-curar ser o mais rigoroso possível nas análises e nos julgamentos que faço), mas, do meu ponto de vista, é sempre mau tentar “esconder o Sol com a peneira”. Não digo que seja o caso, mas trata-se, sem dúvida, de uma expressão pouco feliz.

Porque os cidadãos portugueses, podendo ser pouco esclarecidos e até mal informados, não são estúpidos.

Permitam-me um desabafo: confesso que gostaria que, sempre que isso acontecesse, os portugueses tratassem esses que os tratam como mentecaptos da maneira que tais pessoas merecem.

*Juiz Desembargador([email protected])

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28Vida Judiciária Maio/2006

certo que estes consistem essencialmente numa embarcação branca e com a forma de um cisne, com duas asas, apoiada em dois flutuadores late-rais, com um volante e movida a pedais;

São titulares de licença emitida pela Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais do Centro, para, na Barrinha da Praia de Mira, manterem 23 gaivotas, 3 barcos a remos e 3 cais de embarque, amovíveis, sucedendo que, apesar de esta licença se referir só aos meses de Julho, Agosto e Setembro, a verdade é que veio entretan-to a ser requerido pelo A. marido que o exercício da sua actividade se iniciasse, durante o ano em curso, mais cedo, precisamente durante o mês de Abril, o que veio a ser deferido pela entidade responsável;

Em 8 de Junho do ano anterior, os RR. fizeram colocar na mesma Barrinha embarcações idênticas às dos AA., passando a partir de então a utilizá-las na sua actividade comercial de aluguer que também desenvolvem no local, vindo a causar com tal utilização elevados prejuízos patrimoniais e morais aos AA., já que, aos olhos do observador normal, essas embarcações se confundem com o modelo dos AA.;

As sobreditas embarcações dos RR consistem também elas num modelo que tem a forma de um pato, de cor branca, com uma asa em cada bordo, apoiada em dois flutuadores laterais e movida a pedais, pelo que, dada a semelhança, facilmente se confundem com as “gaivotas” dos AA.;

Existe a vontade expressa e manifesta de con-fundir o consumidor menos atento, por parte dos RR., vontade e intenção estas que se mostram mais reforçadas com o facto de os mesmos terem recentemente procedido a nova alteração nas suas “gaivotas pato”, aditando desta feita às suas em-barcações, com o intuito de as tomarem ainda mais parecidas com as dos AA., um volante igual ao que existe nas embarcações destes últimos, e que consta também do referido modelo industrial;

Até terem os RR. começado a utilizar as suas “gaivotas pato” nesse local, imitando abusiva-mente as referidas embarcações dos AA., sempre tiveram estas últimas procura superior à das restantes embarcações ali alugadas;

Situação que é tanto mais grave para os AA.,

Modelo industrialAcórdão do STJ de 16-05-2002

Por: Sílvia Ferreira*

Sumário:

I – O grau de semelhança entre dois modelos

industriais é dado pela possibilidade de

confusão entre ambos, dando lugar a que se

estabeleça e potencie a sua associação mental

por parte dos respectivos consumidores ou

utilizadores.

II – É o que se passa com dois modelos de

embarcação designados por “gaivota-cisne”

e “gaivota- pato”, ambas com a forma de

um cisne contendo a cabeça dessa ave como

constitutiva das respectivas figuras de proa

e uma asa em cada bordo nas quais tomam

assento os passageiros que accionam os pedais

sitos à sua frente.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I – A. e mulher B., ids. A fls. 2, intentaram esta acção declarativa ordinária contra C. e marido D., aí ids., pedindo que os RR. sejam condenados a não colocar no comércio, e a não utilizar por qual-quer forma, as suas embarcações que imitam um modelo seu, que descrevem, ou, em alternativa, que sejam compelidos a mudar a forma das suas embarcações de modo a permitir a diferenciação com as embarcações dos AA.

Para o efeito alegam que:O A. é autor de um modelo de embarcação de

recreio conhecido por gaivota, cujo processo de re-gisto se iniciou em 24/04/98, tendo sido objecto de publicação no Boletim da Propriedade Industrial n.º 1/99 e estando tal modelo industrial definitiva-mente registado em nome do A. com o n.º 28461;

Desde 24/04/98, têm os AA. vindo a fabricar, armazenar e introduzir no comércio de aluguer de embarcações de recreio, que desenvolvem na Barrinha da Praia de Mira, tais modelos, sendo

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29 Vida Judiciária Maio/2006

quanto é certo que a actividade por si exercida se traduz numa actividade sazonal, que tem a sua maior procura durante os meses de Junho a Agosto inclusive, sucedendo que é com os lucros que obtêm nesse curto espaço de tempo que os AA. custeiam e a suportam todas as despesas e encargos familiares durante o resto do ano; e

Para além dos danos patrimoniais, têm os AA., mormente a A., irmã da R., sofrido graves danos morais, resultantes de tensões e conflitos perma-nentes que têm abalado a harmonia e estabilidade familiares, não apenas da família nuclear dos AA., mas também da restante família da A., vindo tais desavenças e conflitos provocado aos AA. desgostos, angústias e aborrecimentos constantes.

Citados, os RR. contestaram e alegaram, em suma, que:

Não põem em causa o modelo industrial já defi-nitivamente registado em nome do A., mas a existência desse modelo não colide com a existência do mo-delo utilizado pelos RR.;

Trata-se de facto de objectos de tal modo diferentes que não são confundíveis por ninguém;

O modelo da R. tem como di-ferenças: a) reproduz a figura animal- pato; b) os flutuadores ultrapassam, em qualquer das extremidades, o corpo do animal que suportam; c) o formato das asas é mais quadrangular; d) a traseira termina em bico; e) o peito do animal é mais curvo; f) o forma-to do pescoço é mais grosso; g) há diferenças na altura do pescoço, que é mais curto; h) o formato dos olhos é maior e com sobrancelhas; j) o formato do bico é mais espalmado e grosseiro; j) há diferenças nos assentos para os tripulantes; l) tem agora ainda cores diferentes, porque o pato possui uma faixa laranja de cada lado da embarcação, igual ao bico, e os frisos das asas são coloridos, com riscas cor de laranja; não sofreram quaisquer prejuízos.

Concluem, pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição dos pedidos ou, quando não en-tenda, que seja admitida a alteração já efectuada pelos RR., que transformaram as embarcações alterando-lhes a cor ou outros pormenores, sempre aproveitando as embarcações.

Os AA. responderam, dizendo não aceitar a alegada alteração feita pelos RR. nas embarcações “gaivotas-pato”, por modificação da cor, por a dita alteração não consubstanciar uma transformação

das embarcações, continuando a consubstanciar imitação das embarcações dos AA. e a possibilitar confusão por parte de um consumidor médio.

Proferiu-se saneador-sentença que conheceu do mérito da causa e, julgando-se a acção provada e procedente, condenaram-se os RR. a não colocar no comércio e a não usar as embarcações “gaivota-pato” por as mesmas imitarem o modelo registado em nome do A. marido com o n.º 28461 descrito.

Dessa decisão apelaram os RR. para a Relação de Coimbra que, por Acórdão de 4/12/01, de fls. 148 a 157, confirmou o julgado respectivo. Ainda inconformados, os RR. recorreram de revista para este Supremo, requerendo que se julgue procedente o recurso e, em consequência, se declare nula a sen-tença e se ordene que os autos prossigam até final ou, caso assim se não entenda, se revogue a mesma e se admita a coexistência dos modelos industriais

em causa.Para o efeito alegam os recor-

rentes o contido a fls. 167 a 169 e concluem que:

1. O modelo industrial dos recorrentes e o modelo industrial dos recorridos são diferentes, não podendo ser confundíveis, tendo ambos protecção, atento o art. 139º do CP Industrial, sucedem ao decidir em sentido diverso o tribu-nal “ad quo” violou essa norma;

2. O Acórdão recorrido inter-pretou erradamente essa norma do CPIndustrial; e

3. Dado o art. 668.º, n.º 1 e al.. d), do CPCivil, a sentença é nula por não se ter pronunciado sobre matéria fundamental, não

permitindo que fosse produzida prova necessária à sustentação da tese dos recorrentes no que res-peita à inconfundibilidade dos modelos industriais em causa.

Os recorridos, contra-alegando, pedem se man-tenha o julgado das Instâncias.

II - Após os vistos, cumpre decidir:A - Factos:1. O A. é autor de um modelo de embarcação

de recreio conhecido por “gaivota”, cujo processo de registo iniciou em 24/04/98, que foi objecto de publicação no Boletim da Propriedade Industrial nº 1/99, encontrando-se presentemente tal modelo industrial definitivamente registado em nome do A. marido com o n.º 28461, com a seguinte descri-ção: “Trata-se, em resumo, de um objecto flutuante que reveste a forma de um cisne, com a cabeça do

“O art. 141.º do referido Código dispõe que “só gozam de protecção legal os modelos ou desenhos novos e os que, não o sendo inteiramente, realizem combinações novas de elementos conhecidos”.

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30Vida Judiciária Maio/2006

referido animal constituindo a figura de proa do aludido objecto, uma asa em cada bordo, assentos nos quais podem tomar lugar os utilizadores, uns pedais sitos em frente dos referidos assentos, dois flutuadores e um volante que permite accionar o leme” – referência à figura adoptada na interpre-tação desse resumo, contida na certidão de fls. 33, aqui dada por reproduzida;

2. Os AA. têm vindo, desde 24/04/98, a fabricar, armazenar e introduzir no comércio de aluguer de embarcações de recreio, que desenvolvem na Bar-rinha da Praia de Mira, aqueles modelos, sendo titulares de licença emitida pela Direcção Regional do Ambiente e Recursos Naturais do Centro para, na Barra manterem 23 gaivotas, 3 barcos a remos e 3 cais de embarque amovíveis;

3. Os RR. desenvolvem a actividade de aluguer de embarcações de recreio na mesma Barrinha;

4. Os RR. utilizam, desde 8/06/99, nessa activi-dade as embarcações de aluguer denominadas gaivotas em forma de pato, de cor banca, com uma asa em cada bordo, apoiada em dois flutuadores laterais movida a pedais;

5. A R. é titular do alvará de licença n.º 239/97 para manter nesse Barrinha vinte gaivotas, três barcos a remos e três cais de embarque;

6. As “gaivotas-cisne” dos AA. têm o aspecto dado pelas fotogra-fias de fls. 15 e 16, aqui tidas por reproduzidas; e

7. As “gaivotas-pato” dos RR. apresentam o aspecto dado pelas fotografias de fls. 19 e 20, também aqui dadas por reproduzidas.

B – Direito:1. À luz do estatuído nos art.º 684.º, nos 2 e 3, e

690.º , n.º 1 a 4, ambos do CPCivil, as conclusões do alegado pelo recorrente delimitam o objecto do recurso. .

O âmbito de aplicação do recurso de revista está fixado no art. 26.º da LOFTJ (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais- Lei n.º 3/99, de 13/01), ao dizer que, “fora dos casos pre-vistos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça ape-nas conhece de matéria de direito” e no art. 729.º, n.º 2, do CPCivil, ao regular que “a decisão da 2.º Instância, quanto à matéria de facto, não pode ser alterada, salvo o caso excepcional do n.º 2 do art. 722.º, à luz do qual “o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode

ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”.

2. Dadas as conclusões dos recorrentes, são duas as questões suscitadas no recurso.

Tais questões consistem em saber se: a) A decisão recorrida por errada interpretação viola o art. 139º do CPIndustrial; e b) Essa decisão é nula à luz do art. 668.º, n.º 1, e al. b), do CPCivil.

Antes de nos debruçarmos sobre essas questões, faremos breves considerações sobre o regime pre-visto no CPIndustrial para a protecção dos modelos, já que o Código distingue entre modelo de utilidade (art. 122.º e segs.) e modelo industrial (art.º 139º e segs.).

A distinção entre os dois modelos radica no facto de, no nº 1 (modelo de utilidade), relevar a novidade funcional da forma, de que, como diz o art. 122º,

nº 1, “resulte o aumento da sua utilidade ou a melhoria do seu aproveitamento”, enquanto, no nº 2 (modelo industrial), se tutela ou protege a novidade da forma geométrica ou ornamental, dado o art. 139º, nº 2.

Este último artigo, enquanto no nº 1 diz que “podem ser prote-gidos como modelos industriais os moldes, formas, padrões, relevos, matrizes e demais objectos que sirvam de tipo na fabricação de um produto industrial, definin-do-lhe a forma, as dimensões, a estrutura ou a ornamentação”, no nº 2, estabelece que “nestes mode-

los é protegida apenas a forma sob o ponto de vista geométrico e ornamental”, sendo, assim, totalmente indiferente que com uma nova forma beneficiados ou prejudicados a utilidade e/ou o aproveitamento, como nos refere Oliveira Ascensão, in Lições de Direito Comercial, vol. II, págs. 208 e segs.

Com interesse para a solução é de lembrar ainda o art. 141.º do referido Código onde se dispõe que “só gozam de protecção legal os modelos ou desenhos novos e os que, não o sendo inteiramente, reali-zem combinações novas de elementos conhecidos, ou disposições diferentes de elementos já usados, que dêem aos respectivos objectos aspecto geral distinto”.

Do mesmo modo é de trazer à discussão o conti-do na al. c) do art. 143.º do dito Código que dispõe não poderem ser objecto de registo “os modelos ou desenhos desprovidos de novidade”.

Vê-se do art. 141.º que novidade significa inconfundibilidade e deve aferir-se em relação ao conjunto ou, na própria expressão do preceito, ao seu “aspecto geral”.

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31 Vida Judiciária Maio/2006

Aliás, deve-se recusar o registo “se se reconhecer que existe registo anterior de modelo ou desenho confundível com pedido” (cfr. art. 158.º, n.º 1, al. b), do CPI).

Não deve olvidar-se ainda o previsto no n.º 1 do art. 162.º deste Diploma, em virtude do qual “o registo dá o direito ao uso exclusivo em todo o território português, produzindo, fabricando, ven-dendo ou explorando o objecto do registo” e, ainda, no n.º 2 do mesmo art., com referência ao art. 96.º, n.º 2, também desse Diploma, que confere “ao seu titular o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização do produto” a que o modelo serviu de tipo.

Pode-se dizer, diz o Acórdão recorrido, que “o modelo industrial é, portanto, uma forma de pro-priedade industrial, um direito industrial, cuja eficácia constitutiva resulta do registo e que tem como requisito fundamental de atribuição a novidade” .

Vê-se do art. 141.º que novidade significa inconfundibilidade e deve aferir-se em relação ao conjunto ou, na própria expressão do preceito, ao seu “aspecto geral”.

É ponto assente que não impede a semelhança o facto de um ou ou-tro elemento singular ou parcelar ser diverso, pois que podem surgir situações em que dois modelos, con-tendo embora elementos diferentes são susceptíveis de gerar confusão e também pode suceder que dois modelos, com elementos iguais, não possibilitem confusão entre si pela forma diferente como esses elementos estão em si combinados.

Flui do art. 263º do CPI que um modelo não pode ser igual ou semelhante a outro já registado, integrando a sua reprodução ou imitação um ilícito penal.

O grau de semelhança entre dois modelos objecto de confronto ou de juízo comparativo é dado pela possibilidade de confusão de um com o outro, po-dendo dizer-se que há imitação quando, postos em confronto ou comparados entre si, esses modelos se confundem ainda que apenas “em alguma das suas partes características”. .

O caso vertente respeita a modelo industrial (cfr. artºs. 139.º e segs. do CPlndustrial).

E, dito isto, vamos agora focar as questões sus-citadas pelos RR. recorrentes.

Quanto à questão referida em a) - “a decisão re-corrida, por errada interpretação, viola o art 139.º

do CPlndustrial” - diremos desde que é evidente a sua falta de fundamento, por não ter havido erro de interpretação e violação do antes transcrito art. 139.º do CPI.

O que está em causa nos autos é saber se as em-barcações “gaivotas-pato” são ou não semelhantes e confundíveis com as “gaivotas-cisne” ou, o que é igual, se essas embarcações dos RR. recorrentes imitam ou não o modelo das embarcações dos AA. recorridos.

O modelo de “gaivota”, definitivamente regista-do em nome do A. marido com o n.º 28461, tem a seguinte descrição: “trata-se, em resumo, de um objecto flutuante, que reveste a forma de um cis-ne, com a cabeça do referido animal constituindo a figura de proa do aludido objecto, uma asa em cada bordo, assentos nos quais podem tomar lugar os utilizadores, uns pedais sitos em frente dos referidos assentos, dois flutuadores e um volante

que permite accionar o leme”, por referência à figura adoptada para interpretação desse resumo, cons-tante da certidão a fls. 33.

O aspecto das “gaivota-cisne” dos AA. recorridos resulta das fotografias juntas a fls. 15 e 16 e o das “gaivota-pato” dos RR. vê-se nas fotografias juntas a fls. 19 e 20 dos autos.

Da análise dessas fotografias e dos factos tidos como provados não pode negar-se a evidência da seme-lhança e da real susceptibilidade de a mesma originar confusão entre as embarcações dos RR. e as dos AA.,

dando com isso lugar a que se estabeleça e potencie a sua associação mental por parte do consumidor ou utilizador respectivo.

Não podemos pois deixar de ter como correcto o entendimento de que, não obstante ter o modelo de embarcação dos recorridos forma de cisne e a embarcação dos recorrentes ter forma de um pato, as mesmas são confundíveis.

Face ao acabado de dizer, não é razoável a tese da necessidade de produção de prova em audiência de julgamento propugnada pelos RR. recorrentes, já que, “in casu”, é bem óbvia a possibilidade e até dever legal da prolação de decisão na fase do sa-neamento por a mesma se impor a todas as luzes, dado o estado do processo – com todos os elementos nele contidos – o “permitir sem necessidade de mais provas” .

Decorre do explanado, quanto à questão focada em a), que as Instâncias ao decidirem nos termos em

Flui do art. 263º do CPI que um modelo não pode ser igual ou semelhante a outro já registado, integrando a sua reprodução ou imitação um ilícito penal.

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32Vida Judiciária Maio/2006

que o fizeram, não interpretaram erradamente a Lei nem violaram normas adjectiva ou substantivas.

Fizeram, isso sim, adequada aplicação do Direito aos factos.

Sobre a questão referida em b) - A decisão re-corrida é nula à luz do art. 668.º, n.º 1 e al. b), do CPCivil, por não se ter pronunciado sobre matéria fundamental, não permitindo que fosse produzida prova necessária à sustentação da tese dos recor-rentes no que respeita à inconfundibilidade dos modelos industriais em causa – também é notória a carência de razão dos RR, recorrentes como ampla e aprofundadamente se disse no Acórdão recorrido que, por isso, vamos transcrever por merecer o nosso cabal acolhimento.

Por na apelação os RR. arguirem a citada nuli-dade, disse-se no Acórdão recorrido que “a nulidade prevista na citada al.) d), 1ª parte, do n.º 1, do art 668.º do CPCivil, como as demais nulidades enume-radas no citado dispositivo legal, diz unicamente respeito a vícios formais da sentença e não a vícios

substanciais, ou seja, a erros de julgamento” e, de-pois, concluiu-se que o decidido dela não padece.

Na verdade, pelo que antes se deixou dito a pro-pósito da questão focada em a) e pela flagrante falta de razão do argumentado pelos RR., já amplamente dissecado nas Instâncias e também antes debatido no presente Acórdão, nada justifica que voltemos ao tema de fundo em que, como se deixou dito, se decidiu correctamente no saneador.

Improcede em consequência o alegado pelos RR., mantendo-se inalterado o decidido. III - Dado o exposto, nega-se a revista, com custas pelos RR. recorrentes.

Lisboa, 16 de Maio de 2002.Joaquim de MatosFerreira de AlmeidaAbílio Vasconcelos

*Gabinete de AdvogadosAntónio Vilar & Associados

[email protected]

O acórdão transcrito versa sobre os modelos in-dustriais, fazendo uma breve referência à distinção entre estes e os modelos de utilidade. Actualmente, aqueles dois direitos continuam a distinguir-se um do outro, mas o CPI de 2003 introduziu uma alte-ração aos modelos de utilidade.

Na verdade, considera-se, agora, não existirem diferenças conceptuais entre a figura da patente e do modelo de utilidade, já que o artigo 117º do actual CPI estabelece que a mesma invenção pode ser ob-jecto, simultânea ou sucessivamente, de um pedido de patente e de um pedido de modelo de utilidade (nº 4 do artigo), dependendo da opção do requerente a protecção da sua invenção por patente ou por mo-delo de utilidade (desde que a invenção preencha o requisito da novidade, da actividade inventiva e da susceptibilidade de aplicação industrial).

Antes, porém, da entrada em vigor do CPI de 2003, os modelos de utilidade visavam a protecção de modelos de objectos destinados a um uso prático que, por terem uma nova forma ou novo mecanismo, aumentavam ou melhoravam o aproveitamento desses objectos.

Protegia-se, assim, o aspecto funcional. A proxi-midade entre os modelos de utilidade e as patentes era, pois, evidente, razão pela qual em 2003 se aproximou o regime legal destes dois Direitos de Propriedade Industrial.

A diferença reside, neste momento, no facto de, no modelo de utilidade, se exigir um menor grau de actividade inventiva e nos procedimentos de conces-são do modelo de utilidade, que são mais simples do que os de concessão da patente.

COMENTÁRIO:Já os modelos industriais protegiam as caracte-

rísticas estéticas da forma de um produto. O actual CPI alterou a sua designação para “desenho ou mo-delo” e a sua protecção depende de dois requisitos: a novidade e o carácter singular.

Não obstante, também é concedida protecção legal aos desenhos ou modelos que, não sendo in-teiramente novos, realizem combinações novas de elementos conhecidos ou disposições de elementos já usados, de forma a conferir aos respectivos objectos carácter singular.

Quanto ao requisito da novidade, esta existe quando os modelos não tenham sido divulgados ao público dentro ou fora do país antes do pedido de registo, nem tenham sido divulgados desenhos ou modelos idênticos.

Já o carácter singular existirá sempre que a impressão que o desenho ou modelo suscita no utilizador informado diferir da impressão global causada por qualquer outro desenho ou modelo anteriormente divulgado.

Tanto a violação do modelo de utilidade como a do desenho ou modelo constitui um ilícito criminal, punido, em ambos os casos, com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa até 360 dias (art. 321º e 322º do CPI). Também a obtenção de má fé de desenhos ou modelos ou de modelos de utilidade é punida com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.

As penas aplicáveis são, assim, as mesmas, ape-sar de ambos os direitos de propriedade industrial continuarem a distinguir-se claramente quanto ao seu objecto e quanto aos requisitos de concessão.

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33 Vida Judiciária Maio/2006

Despedimento ilícitoReintegração de trabalhador e pedido reconvencional: admissibilidade

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26/01/2006Fonte: Site do STJ – www.stj.pt

“AA” instaurou acção emergente de contrato indi-vidual de trabalho contra a Empresa-A, pedindo que, declarada a ilicitude do seu despedimento por falta de justa causa, seja aquela sociedade condenada a reintegrá-la no seu posto de trabalho e no pagamento de determinada quantia, a título de remunerações vencidas, retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal, trabalho suplementar e outros créditos salariais que discriminou, bem como no pagamento dos salários e subsídios que se vencerem desde a data do despedimento até à reintegração no seu posto de trabalho, com juros de mora até efectivo e integral pagamento.

A ré contestou, alegando, por um lado, que nada deve à autora a título de retribuições, férias, sub-sídios de férias e de Natal, trabalho suplementar e outros créditos salariais peticionados, e, por outro lado, que a autora violou gravemente os seus deveres de lealdade, honestidade, respeito, zelo e diligência, o que torna imediata e praticamente impossível a sub-sistência da relação de trabalho, consubstanciando justa causa de despedimento, nos termos do artigo 9.º, n.º 1 e n.º 2, alíneas a), d) e e), do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, tendo aproveitado para deduzir pedido reconvencional, com o fundamento de que «atenta a elevada posição da A. na empresa da R. e atento o dever de lealdade, obediência e res-peito a que está sujeita, quer se tenha apoderado e feitas suas as importâncias em falta, quer tenha permitido o seu furto por terceiros, o que é facto é que a R. incorreu em inúmeros prejuízos originados pelo comportamento grave, ilícito e culposo da au-tora», pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe determinada quantia, a título de indemnização pelos prejuízos que lhe causou com a sua conduta ilícita, acrescida de juros de mora à taxa legal de 7%, desde a data da notificação da autora do pedido reconven-cional, até integral e efectivo pagamento.

No despacho saneador, decidiu-se não admitir o pedido reconvencional deduzido, «face à não verifica-

ção, desde logo, dos requisitos de natureza substan-cial que condicionam a sua admissibilidade»

Inconformada, a ré agravou para a Relação, que confirmou o despacho recorrido, negando provimento ao agravo, sendo contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante agravo de 2.ª instância.

Está apenas em causa saber se, no caso, a recon-venção é ou não admissível.

O artigo 30.º do Código de Processo do Trabalho estipula:

«Artigo 30.º(Reconvenção)1 - A reconvenção é admissível quando o pedido

do réu emerge do facto jurídico que serve de fun-damento à acção e no caso referido na alínea p) do artigo 85.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, desde que, em qualquer dos casos, o valor da causa exceda a alçada do tribunal.

2 - Não é admissível reconvenção quando ao pedido do réu corresponda espécie de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor».

Por sua vez, dispõe a alínea p) do artigo 85.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), que com-pete aos tribunais do trabalho conhecer, em matéria cível, das questões reconvencionais que com a acção tenham as relações de conexão referidas na alínea anterior, ou seja, «questões entre sujeitos de uma re-lação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, comple-mentaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente», salvo no caso de compensação, em que é dispensada a conexão.

A admissibilidade da reconvenção está, assim, dependente da verificação de requisitos de natureza substantiva, que se traduzem na exigência de uma certa relação de conexão entre o pedido principal e o pedido reconvencional, a par de outros, agora de carácter processual ou adjectivo, referentes à forma do processo e competência do tribunal. O acórdão recorrido não põe em causa a falta de qualquer re-quisito de cariz processual, pelo que deles não há que

Resumos de Jurisprudência

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conhecer. Relativamente aos requisitos de natureza substantiva, o citado artigo 30.º prevê três situações de admissibilidade da reconvenção: i) quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de funda-mento à acção; ii) quando o pedido reconvencional está relacionado com o pedido do autor por acessoriedade, complementaridade ou dependência; iii) quando o réu invoca a compensação de créditos.

Saliente-se que, enquanto a alínea a) do n.º 2 do artigo 274.º do Código de Processo Civil admite a reconvenção «[quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção ou à defesa», o n.º 1 do artigo 30.º do Código de Processo do Trabalho restringe essa admissi-bilidade à situação em que o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção, pelo que, no domínio do processo laboral, não é admissível reconvenção com base no facto jurídico que serve de fundamento à defesa.

E é precisamente neste ponto que o despacho proferido na primeira instância alicerça a fundamentação conducente à inadmissibilidade da reconvenção em causa, ao enten-der que o pedido reconvencional resultava da própria defesa da ré (desvio das importâncias em falta, feitas suas, ou a permissão do seu furto por terceiros), factos esses susceptíveis de consubstanciarem a justa causa para o despedimento por violação dos deveres de lealda-de, obediência e respeito por parte da trabalhadora, e, por isso, seria inadmissível.

Nessa perspectiva, emergindo o pedido reconvencional de facto que serve de funda-mento à defesa, verificar-se-ia a apontada restrição consagrada no específico regime de admissibilidade da reconvenção que vigora no direito processual laboral. Porém, como bem se sublinha no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 21 de Outubro de 1998, proferido no processo n.º 108/98 (revista) da 4.ª secção, «o problema não apresenta esta aparente linearidade».

Na verdade, prossegue o mesmo acórdão, «[u]ma reflexão mais cuidada levar-nos-á a indagar da razão por que tais factos servem de fundamento à defesa.

«Crê-se que isso resulta da inversão do ónus da prova consagrada no n.º 4 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro.

«E diz-se inversão do ónus da prova, porquanto a acção de impugnação judicial do despedimento tem, materialmente, como causa de pedir um des-pedimento ilícito.

«E quando essa ilicitude advém da falta de justa causa, o autor deve fundamentar o seu pedido (de reintegração, indemnização, etc.) no facto do des-pedimento no âmbito de um contrato de trabalho subordinado sem justa causa e, por isso, ilícito.

«Mas a alegação “sem justa causa” implica a ale-gação de que os factos em que a entidade patronal fundou o despedimento não são idóneos a integrar o conceito legal de justa causa.

«O que, no jogo normal das regras probatórias, implicaria a prova de que tais factos não existiriam ou não têm a relevância pretendida.

«Todavia, o legislador, por razões que agora não importam, mas que se aceitam e compreendem, im-pôs, naquele n.º 4 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 64--A/89, de 27 de Fevereiro, essa prova à entidade patronal.

«Daqui a ideia, demasiado sim-plista, de que tais factos servem de fundamento à defesa.»

No caso em apreço, a autora cumulou diversos pedidos contra a ré, sendo diferentes os factos ju-rídicos em que alicerça essas suas pretensões. Assim, no que respeita aos pedidos de reintegração da au-tora no seu posto de trabalho e de pagamento dos salários e subsídios que se vencerem desde a data do despedimento até à reintegração, a causa de pedir reconduz-se à alegada

ilicitude do despedimento, ilicitude essa que advém da imputada falta de justa causa para o despedimento promovido pela empregadora e que gera os efeitos estipulados no n.º 1 do artigo 13.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato a termo, aprova-do pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, adiante designado por LCCT.

Já quanto ao pedido de pagamento de determi-nada quantia, a título de remunerações vencidas e outros créditos salariais que discriminou, a causa de pedir assenta no não cumprimento ou no defeituoso cumprimento do próprio contrato de trabalho cele-brado entre as partes, que investe o trabalhador e a entidade empregadora num complexo de direitos e obrigações, que a lei lhes reconhece e impõe (cf.

“O citado artigo 30.º prevê três situações de admissibilidade da reconvenção: i) quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção; ii) quando o pedido reconvencional está relacionado com o pedido do autor por acessoriedade”.

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35 Vida Judiciária Maio/2006

artigos 1.º e 19.º a 21.º do Regime Jurídico do Con-trato Individual de Trabalho, anexo ao Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de Novembro de 1969, designado por LCT).

Com o pedido reconvencional, a ré pretende obter o pagamento de determinada quantia, a título de indemnização pelos prejuízos originados pelo com-portamento ilícito e culposo da autora, «quer se tenha apoderado e feitas suas as importâncias em falta, quer tenha permitido o seu furto por terceiros».

Portanto, os factos ilícitos e culposos que terão dado causa aos prejuízos cuja indemnização se pede são, precisamente, os mesmos que integram a justa causa de despedimento, fundando-se esse pedido indemnizatório na violação grave e culposa dos de-veres decorrentes do contrato de trabalho [deveres de lealdade, honestidade, respeito, zelo e diligência previstos nas alíneas a), b), e e) do n.º 1 do artigo 20.º da LCT], susceptível de integrar justa causa de despedimento [artigo 9.º, n.º 1 e n.º 2, alíneas a), d) e e), da LCCT]. Em suma: a autora formulou pedidos assentes na ilicitude do despedimento, por conside-rar que os factos constantes da nota de culpa que a entidade empregadora contra ela deduziu eram

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24/01/2006Fonte: Site do STJ – www.stj.pt

“A” e marido B intentaram acção ordinária contra C e marido D pedindo a condenação destes a paga-rem-lhes determinada quantia e juros legais desde a citação até integral pagamento.

O processo correu termos com contestação dos R.R., vindo, após audiência de julgamento, a ser proferida sentença a condenar aqueles a pagar aos autores a titulo do invocado enriquecimento sem causa (art.º 473 e seguintes do C. Civil) determinada quantia e juros legais desde a citação até integral pagamento. Inconformados com tal decisão, dela in-terpuseram os Réus recurso de apelação, sem êxito, recorrendo agora de revista.

Como se sabe, na base do instituto do enriqueci-mento sem causa encontra-se a ideia de que pessoa alguma deve locupletar-se injustificadamente à custa

insubsistentes, e são esses mesmos factos, embora numa perspectiva oposta, que suportam o pedido reconvencional.

Tanto basta para que se possa concluir que o pedido reconvencional emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção. Aliás, tendo o tribunal de conhecer da matéria de facto vertida na referida nota de culpa para poder ajuizar sobre as concretas pretensões deduzidas pela autora, o simultâneo conhecimento da reconvenção não implicará maior actividade por parte do tribunal, nem determinará embaraço de relevo para o julgamento da causa.

Face a todas as precedentes considerações, a reconvenção, tal como se encontra formulada pela ré, é admissível com base no disposto na primeira parte do n.º 1 do artigo 30.º do Código de Processo do Trabalho.

Pelos fundamentos expostos, decidiu-se conceder provimento ao agravo e, assim, revoga-se o acórdão recorrido, bem como o despacho da primeira instân-cia, na parte em que não admitiu o pedido reconven-cional formulado, determinando-se que seja substi-tuído por outro a julgar a reconvenção admissível, prosseguindo a acção seus regulares termos.

Arrendamento- Caducidade – recusa de restituição de imóvel: enriquecimento sem causa

alheia (art.º 473, nº 1, C. Civil). E, assim, para que haja uma pretensão de enriquecimento, quer dizer, uma obrigação em que é devedor o enriquecido e credor aquele que suporta o enriquecimento, mos-tra-se indispensável a verificação cumulativa de três requisitos:

1 - A existência de um enriquecimento;2 - Que esse enriquecimento se obtenha à custa

de outrem;3 - A falta de causa justificativa.Ora no caso presente face à matéria provada pelo

Tribunal da Relação no acórdão recorrido (e é com esta e só com esta que temos de decidir o objecto deste recurso, sendo de todo injustificado o alegado pelos recorrentes quanto à violação do art.º 364 C. Civil. e 668º, nº 1, d) C.P.Civ.), não há dúvidas de que tais requisitos se verificam.

Na verdade, como também salienta o Prof. Al-meida Costa, Direito das Obrigações, 9ª edição, pág. 450, é, em primeiro lugar, indispensável que

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se produza um enriquecimento da pessoa obrigada à restituição. Há-de traduzir-se numa melhoria da sua situação patrimonial, que se apura segundo as circunstâncias.

Ora aqui há o provado enriquecimento dos réus, que beneficiaram economicamente da utilização do rés do chão em questão, o qual não teve qualquer causa justificativa, já que havia sido decidido, por sentença transitada em julgado, que o contrato de arrendamento em causa caducou por morte do usu-frutuário, não tendo, portanto, os Réus qualquer tí-tulo que justificasse a sua permanência no imóvel.

E, finalmente, tal enriquecimento foi obtido à custa dos autores, proprietários do imóvel em causa (continuando a possuir o imóvel, os réus privaram os autores do mesmo, causando-lhes danos ressar-cíveis).

Assente isto, há necessariamente lugar a uma indemnização a pagar pelos Réus aos Autores pelo atraso na restituição da coisa que foi locada por estes àqueles.

O tribunal de 1ª instância calculou essa indemni-zação na base do valor do locado no mercado e com os factores de correcção anual das rendas comercial, com isso concordando o Tribunal da Relação no acórdão recorrido. Cremos, contudo, que não é esse o valor a ter em conta para tal fim, mas sim o valor mensal da renda.

Na verdade, estabelece-se no nº 1 do art.º 1045 C. Civil que:

“Se a coisa locada não for restituída por qualquer causa, logo que finde o contrato, o locatário é obriga-

do, a título de indemnização, a pagar até ao momento da restituição a renda ou aluguer que as partes tenham estipulado, excepto se houver fundamento para consignar em depósito a coisa devida.

Como se sabe, a razão de ser desta norma é a de que, extinto o contrato, continua a renda, apesar de tudo, a ser o referencial de equilíbrio entre as pres-tações da relação de liquidação. E isso com base na ideia de que a renda, tendo resultado da auto-regu-lação das partes, representa, em regra, o justo valor do lucro cessante derivado da indisponibilidade da coisa locada. (v. o Acórdão deste Supremo Tribunal de 19/4/05, 6ª Secção, que também subscrevemos e Ac. T.C. de 24/11/99 - Proc. 954/98 - 2ª Sec.).

Resta agora decidir a questão posta pelos recor-rentes da prescrição do direito dos autores, já que o mais são questões novas de que este Tribunal não pode conhecer.

Ora aqui carecem os recorrentes de razão, já que, como se salienta no acórdão recorrido, a presente ac-ção foi instaurada em 17/12/2001 - logo no terceiro mês seguinte ao do reconhecimento por parte dos autores do direito que lhe competia decorrente da decisão judi-cial de caducidade do aludido arrendamento, sem ter decorrido, portanto, o prazo de três anos estabelecido para a prescrição no art.º 482 C. Civil.

Face ao exposto, decidiu-se, no STJ, em conceder--se parcialmente a revista e revogar-se o acórdão re-corrido na parte em que condena os Réus a pagar aos Autores a quantia de 11.177.074$00, condenando-se os mesmos a pagar apenas a quantia de 12.300$00, mantendo-se o mais decidido naquele.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26/01/2006Fonte: Site do STJ – www.stj.pt

“A” intentou, no Tribunal da comarca de Coimbra-acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra B e mulher C, peticionando a condenação destes a:

- reconhecerem que é dona e legítima possuidora de prédio misto, devidamente identificado;

- reconhecerem que o prédio deles, composto por terra de semeadura, com oliveiras, pinhal e mato, devidamente identificado, confinante com aquele

Servidão de passagem- Acção de reivindicação – caso julgado

prédio dos autores, se encontra onerado a favor desse prédio com uma servidão de passagem de pé e carro, camiões e demais veículos;

- reconhecerem que tal servidão vem sendo por si utilizada por sinais visíveis e permanentes;

- reconhecerem o seu direito à água extraída de um furo artesiano e que o seu prédio é serviente do dos autores no dever de suportar o depósito, canalização e condução de água e fios de electricidade e permanência da cabina ou posto de seccionamento;

- a absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam o acesso à unidade fabril, à utilização do portão eléctrico e da portaria e ao fornecimento de

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água e energia eléctrica. Fundamentam o seu pedido na existência de um direito de servidão de passagem, de condução de água e de electricidade através do prédio dos réus, servidões essas constituídas por destinação de pai da família aquando da aquisição daqueles prédios ou, quando assim se não entenda, por usucapião, e no facto dos réus se oporem ao exer-cício desse direito, o que a acontecer, quanto ao não fornecimento de energia eléctrica e de água à unidade fabril, determinarão a sua paralisação.

Contestaram os réus, excepcionando com o caso julgado, por a questão ter sido objecto de discussão em acção ordinária cuja decisão final já transitou em julgado, e sustentando ainda que o prédio da requerente tem vários acessos para as vias e cami-nhos públicos, não necessitando de qualquer servidão.

Deduziram reconvenção, para o caso da acção proceder, em que pedem a extinção das servidões por desnecessidade.

Exarado despacho saneador, nele foi julgada improcedente a excepção do caso julgado, com o que os réus se não conformaram, agravando desse despacho.

Condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria de facto controvertida, vindo depois a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou os réus a reconhecer que: a) a autora é dona e legítima possuidora do prédio identificado no artigo 1º da petição inicial; b) o seu prédio se encontra onerado a favor do prédio referido em a) com uma servidão de passagem de pé e carro, camiões e demais veículos; c) a autora tem direito a aceder à água extraída do furo artesiano através do depósito e canalização de condução de água e à electricidade através dos fios de electricidade e permanência da cabina ou posto de seccionamento implantado no seu prédio; d) a abster-se de praticar quaisquer actos que impeçam o acesso à unidade fabril e ao fornecimento de água e energia eléctrica (no mais os absolvendo do pedido).

Inconformados, apelaram os réus. Na sequência, conhecendo de ambos os recursos

interpostos, o Tribunal da Relação de Coimbra de-cidiu negar provimento quer ao recurso de agravo quer ao recurso de apelação interpostos pelos réus, confirmando as decisões recorridas.

Interpuseram, então, os réus recurso de revista,

pugnando pela revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que julgue improcedentes os pedidos da autora/recorrida.

Importa, na apreciação do objecto do recurso de revista, conhecer das seguintes questões:

I. Saber se ocorre ou não a excepção do caso julgado invocada pelos réus.

II. Determinar se o acórdão recorrido enferma da nulidade prevista no art. 668º, nº 1, al. c), do C.Proc.Civil.

Começando pela análise da questão do caso julgado, cumpre que nos movamos no âmbito da situação pro-cessual que se nos depara, especificamente na acção nº 15/97, tal como, aliás, foi considerada no acórdão recorrido:

Tal acção foi instaurada pelos aqui réus contra a aqui autora, e ainda contra “E, Projectos e Gestão Ind. Cerâmica, SA”.

Preceitua o art. 673º do C. Proc.Civil que “a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga”.

Doutro passo, conforme prescre-ve o art. 671º, n° 1, “transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelo artigo 497º e seguintes...”.

Certo que, neste âmbito, se impõe distinguir “o efeito negativo da im-possibilidade duma segunda acção (proibição de repetição: excepção de caso julgado) e o efeito positivo da constituição da decisão proferida

em pressuposto indiscutível de outras decisões de mérito (proibição de contradição: autoridade do caso julgado)”.

“A função da excepção do caso julgado é tanto a de proibir que o tribunal da segunda acção, dada a sua vinculação ao caso julgado da decisão transitada, profira uma decisão contraditória com a anterior, como a de obviar que esse órgão seja obrigado, numa situação de identidade de causas, a repetir a decisão transitada”.

Coerentemente, o caso julgado (excepção dilatória de conhecimento oficioso - arts. 494º, al. i) e 495º) pres-supõe a repetição de uma causa, que ocorre sempre que se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir (arts. 497º, nº 1, e 498º, nº 1).

Sendo que, para tal efeito, há identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas do ponto de vista da

“O demandado apenas pode opor-se à reivindicação e consequente entrega da coisa reivindicada se impugnar a titularidade do direito de que o reivindicante se arroga”.

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sua qualidade jurídica, existe identidade do pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mes-mo efeito jurídico e ocorre identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico (art. 498º, nºs 2, 3 e 4).

Doutro passo, e porque o caso julgado ocorre apenas quanto aos precisos limites e termos em que a decisão julga (art. 673º), a força desta vigora para qualquer processo futuro, “mas só na exacta correspondência com o seu conteúdo. Não pode, portanto, impedir que em novo processo se discuta e dirima aquilo que ela mesma não definiu”.

Vejamos, pois, partindo do princípio de que o que está em causa é apenas saber se, como sustentam os recorrentes, existe caso julgado resultante da decisão proferida na acção nº 15/97 ou se, como em contrário se opina no acórdão recorrido, não se verifica tal excepção.

Não se suscitam, “in casu”, quaisquer dúvidas acerca da identidade dos sujeitos: ambas as partes intervieram na acção anterior e é idêntica (não obs-tante a ora autora ter sido ré na primeira das acções e os aqui réus terem naquela sido autores) a qualidade jurídica em que actuaram e actuam.

Já o mesmo não acontece, em nossa opinião, no que concerne à identidade em ambas as acções dos pedidos e da causa de pedir.

Pode afirmar-se que ocorre identidade de pedidos quando existe coincidência na enunciação da forma de tutela jurisdicional pretendida pelo autor e do con-teúdo e objecto do direito a tutelar, na concretização do efeito que, com a acção, se pretende obter.

Por outro lado, a identidade da causa de pedir pressupõe que o acto ou o facto jurídico de onde o autor pretende ter derivado o seu invocado direito é idêntico em ambas as acções.

Ou seja, a causa de pedir consiste na relação ma-terial, tal como vem configurada, de onde o autor faz derivar o correspondente direito e, dentro dessa rela-ção material, concretamente nos factos constitutivos do direito (facto jurídico de que procede a pretensão deduzida), em consonância, assim, com o princípio da substanciação consagrado pelo nosso ordenamen-to jurídico. Por seu turno, o pedido reconduz-se ao efeito jurídico que o autor pretende retirar da acção intentada, traduzindo-se na providência que o autor solicita ao tribunal – trata-se de um elemento fun-damental, considerando as imposições do princípio do dispositivo: são os interessados que accionam os mecanismos jurisdicionais como ainda quem realiza a escolha das providências que os direitos subjectivos invocados garantem.

A acção ordinária nº 15/97, na justa medida em que os ali autores (e aqui réus) visavam (e vieram

a consegui-lo pela sentença judicial, já transitada, ali proferida) essencialmente o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre os prédios rústicos acima identificados, assente (como causa de pedir) num contrato de compra (judicial) que efectuaram dos mesmos e bem assim na presunção resultante do registo que efectuaram dessa aquisição derivada (a qual, como da sentença consta, veio a ser decisiva para o reconhecimento de tal direito), constituiu uma típica acção de reivindicação de propriedade, prevista no art. 1311º do C.Civil, que tinha por objecto o re-conhecimento do direito de propriedade por parte do autor e a consequente restituição da coisa por parte do possuidor ou detentor dela.

Por sua vez, na presente acção, a autora (ré naquela outra) visa, não já obter o reconhecimento do direito de propriedade sobre aqueles dois prédios dos réus (objectivo esse por si prosseguido, através da recon-venção, naquela acção nº 15/97), mas antes e tão só obter o reconhecimento de que a favor do seu prédio misto, inscrito na matriz sob os arts 798º e 919º e sobre o acima identificado prédio rústico, inscrito na matriz sob o art. 920º existem (onerando este) servidões de passagem de pé, carros, camiões e demais veículos e bem assim de condução de água e de energia eléctri-ca, constituídas (aí radicando a sua causa de pedir) por destinação do pai de família ou, se assim se não entendesse, por usucapião.

Certo é, todavia (e aqui reside o núcleo da divergên-cia dos recorrentes em relação ao acórdão recorrido) que os ora recorrentes sustentam que, tendo sido reconhecido na sentença anterior (da acção nº 15/97) que aquele prédio inscrito sob o art. 920º lhes pertence em propriedade plena e exclusiva, nunca poderá estar onerado com direito real limitado, designadamente com qualquer servidão.

Atento, essencialmente, o disposto no art. 498º, nº 4, e porque se trata de acção real (a causa de pedir é o facto jurídico de que deriva o direito real), com-preende-se que a acção de reivindicação só possa ser admitida em juízo, quando intentada por quem es-teja em condições de alegar e alegue, efectivamente, ser o titular do direito de propriedade sobre a coisa reivindicada. Cabe, por isso, ao reivindicante, e só a ele, o ónus da prova dessa titularidade ou mais pre-cisamente, dos factos por efeito dos quais a adquiriu (título de aquisição).

Ademais, são dois os pedidos que integram e carac-terizam a acção de reivindicação: o reconhecimento do direito de propriedade “pronuntiatio”, por um lado, e a restituição da coisa “condemnatio” por outro.

Desta sorte, o demandado apenas pode opor-se à reivindicação e consequente entrega da coisa reivin-dicada se impugnar a titularidade do direito de que

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o reivindicante se arroga ou, a proceder o primeiro pedido, impugnar o seu dever de restituir com fun-damento em qualquer relação (obrigacional ou real) que lhe confira a posse ou a detenção da coisa. Ora foi precisamente esta situação que se verificou na aludida acção n° 15/97: os aqui réus, ali na qualida-de de autores, intentaram a acção contra os ali réus (entre os quais se encontrava a aqui autora) visando, fundamentalmente, o reconhecimento do seu alegado direito de propriedade sobre aqueles dois prédios rústicos (entre os quais se encontrava o referido nº 920º) pedindo ainda que os réus fossem condenados a entregarem-lhos, já que não possuíam qualquer título que legitimasse a ocupação que, contra a sua vontade, deles vinham fazendo.

Em contrapartida, a ali ré (ora autora) usou a sua contestação para reagir, im-pugnando, por um lado, o direito de propriedade por aqueles invocado, mas também para, por via reconven-cional, sustentar a sua propriedade sobre os aludidos prédios, alegando que os mesmos faziam parte inte-grante do seu prédio misto com os arts. 798º e 919º, o que legitimava, por direito próprio, a ocupação que deles vinham fazendo.

Nessa acção (de reivindicação) estava-se, assim, perante um con-flito entre dois invocados direitos de propriedade, envolvendo os referidos prédios, que importava dirimir, uma vez que os direitos de propriedade in-vocados nunca poderiam coexistir.

Nesta contingência, a sentença proferida decidiu resolver tal conflito a favor dos ali autores (ora réus), declarando, a final, e com base nos fundamentos nela exarados, que os prédios referidos e identificados no artigo 1º da petição inicial pertencem em propriedade plena e exclusiva aos autores e que a ocupação das rés dos mesmos prédios, por não lhe corresponder qualquer título que a legitime ou seja subsistente, ofende o direito de propriedade dos au-tores e é, pois, abusiva, ilícita e não pode permanecer (como consequência, condenou ainda as rés, além do mais, a entregarem aos autores os prédios referidos com a reposição natural dos mesmos ao estado em que eles se encontravam antes de efectuada qualquer intervenção das rés sobre eles).

Foi, portanto, no essencial, tão só decidido o conflito de direitos de propriedade sobre os referidos prédios, cuja resolução as partes haviam submetido à aprecia-ção do tribunal, no sentido de que a propriedade de

tais prédios era dos ali autores, não possuindo as ali rés qualquer título legítimo que justificasse a recusa da respectiva restituição.

Será, pois, nesse sentido e com tal alcance apenas que, sobretudo, deverá ser entendida e interpretada tal decisão, nomeadamente quando na sentença se utilizou a expressão pertencem em propriedade plena e exclusiva aos autores, expressão essa que, aliás, traduz cópia tabelar da que foi utilizada pelos ali autores ao deduzirem, na petição inicial, a sua pretensão reivindicatória.

Jamais em algum lado ou alguma vez, quer ao longo dos articulados, quer mesmo ao longo da sen-tença final, a questão discutida nesta acção sobre a existência ou não das sobreditas servidões (alegada-mente constituídas por destinação do pai de família

ou, então, por usucapião), sobre um daqueles prédios (o do art. 920º) dos ali autores e a favor daquele outro prédio da ali ré A, foi ali discutida ou sequer mesmo referida (seja a que nível fosse).

E não se diga, como defendem os ora recorrentes, que não tendo a ora autora ali feito valer aquele seu direito, ficou o mesmo defini-tivamente precludido, nos termos do disposto no art. 489º, ficando, assim, a questão a ele subjacente definitivamente dirimida. É que, desde logo, tal conclusão está desprovida de qualquer suporte legal: na verdade, do princípio da preclusão consagrado no citado art. 489º apenas decorre para o réu “o ónus de, na contestação, impugnar (directa ou motivadamente) os factos alegados pelo autor, alegar

os factos que sirvam de base a qualquer excepção dilatória ou peremptória (...) e deduzir as excepções não previstas no art. 289-2”.

Ora, a aqui autora impugnou não só os factos con-substanciadores do direito de propriedade ali invocado pelos agora réus, como foi, na contestação, ainda mais longe, a ponto de invocar para si o reconhecimento tal direito; era, pois, unicamente, a questão da proprie-dade sobre os referidos prédios que ali se discutia, e não outra, sendo até contraditório (se não mesmo incompatível entre si em termos de alegação e defe-sa) que, tendo a ora autora ali invocado o direito de propriedade sobre tais prédios, fosse depois invocar um direito de servidão sobre os mesmos, sendo que as servidões prediais pressupõem, desde logo, a existên-cia de dois prédios pertencentes a donos diferentes,

O direito é exclusivo “jus excluendi omnes alios”, porque o proprietário pode exigir que terceiros se abstenham de invadir a sua esfera jurídica, quer usando ou fruindo a coisa, quer praticando actos que afectem o seu exercício.”

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o que não poderia acontecer se algum dos referidos prédios (nomeadamente o do art. 920º) viesse a ser reconhecido como propriedade da reconvinte, aqui autora.

Acresce que a plenitude da propriedade é tão só a explicitação do conteúdo do art. 1305º do C.Civil, em cujos termos “o proprietário goza de modo pleno e ex-clusivo dos direitos de uso e fruição e disposições das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas”.

Esta “afirmação de que o proprietário goza de modo pleno dos seus direitos significa que, acima deles, não existe qualquer outro poder. O contrário acontece, por exemplo, com o usufruto ou com uma servidão. O direito é exclusivo “jus excluendi omnes alios”, porque o proprietário pode exigir que terceiros se abstenham de invadir a sua esfera jurídica, quer usando ou fruindo a coisa, quer praticando actos que afectem o seu exercício.”

Assim, “o direito de propriedade é pleno, antes de mais, porque nele se condensam, virtualmente, os mais amplos poderes de senhorio e aproveitamento da coisa-objecto, razão por que o seu conteúdo potencial se apresenta como maximamente compreensivo e vo-cacionado para se expandir imediatamente. Nisto se distingue de todos os demais direitos reais integrados por um feixe de determinados poderes mais ou menos restritos, o que justifica a designação que doutrinaria-mente lhes é dada, de direitos reais limitados”, sendo que “a plenitude do direito de propriedade significa também que aquele direito surge como uma figura jurídica autónoma, na medida em que não depende nem, por sua essência, pode depender, como sucede com outros direitos reais, de qualquer direito real mais extenso”.

Mas não pode significar que está afastada a pos-sibilidade, sempre configurável face à característica da elasticidade do direito de propriedade, da demons-tração da existência de qualquer ónus ou restrição que, desse modo, venha tornar mais compreendido o conteúdo daquele direito (designadamente através da figura dos “jus in re aliena”).

Com efeito, “a propriedade concede a universali-dade dos poderes que se podem referir à coisa. Por isso, o proprietário tem a vocação para o gozo. Este pode em concreto faltar, sem que em nada se toque a essência do direito. A propriedade fica então reduzida a um elemento qualitativo a que podemos também nós chamar casco ou raiz; mas como os poderes foram concedidos como universalidade, eles automatica-mente se expandem quando a restrição desaparecer” ou, acrescentamos, se restringem quando qualquer restrição surgir.

Assim, considerando ainda que o direito de servi-

dão invocado pela autora nesta acção consubstancia uma das restrições ou limitações legal e tipicamente previstas ao exercício do direito de propriedade (cujos conteúdos e origem são diferentes), há que concluir que a autoridade ou força de caso julgado da sentença proferida na aludida acção n° 15/97 não foi posta em causa nesta acção. Nesta medida, não pode aceitar-se, como pretendem os recorrentes, que ocorre a excepção do caso julgado por eles invocada, assim improceden-do, nesta parte, a sua pretensão recursória.

Afirmam os recorrentes que o acórdão recorrido enferma da nulidade prevista no art. 668º, nº 1, al. c), do C.Proc.Civil, traduzida na oposição entre os fundamentos (o facto dado por provado no ponto 21) e a decisão final.

Tal nulidade foi já, no âmbito da apelação, assacada à sentença da 1ª instância, sem êxito, porquanto no acórdão ora impugnado se entendeu que a mesma não ocorria.

Não vemos, também agora, salvo o devido respeito, que tal nulidade se verifique no caso “sub judice”.

“A lei refere-se, na alínea c) do nº 1 do art. 668º, à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às simples hipóteses de contradição aparente (...); há um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.

Noutros termos, “a oposição referida na alínea c) do nº 1 é a que se verifica no processo lógico, que das premissas de facto e de direito que o julgador tem por apuradas, este extrai a decisão a proferir. Não é, por isso, relevante, para este efeito, a contradição que se diga existir entre os factos que a sentença dá como provados e outros já apurados no processo, designa-damente por haverem sido incluídos na especificação. Poderá haver neste caso erro de julgamento, mas não nulidade da decisão”.

Deste modo, “o vício formal, lógico, prevenido na alínea c) do nº 1 do art. 668º nada tem a ver com eventual, substancial, erro de julgamento”.

O facto tido como provado e constante do número 21 (acima xx) é o seguinte: “essa passagem desenvolve-se desde o seu ponto inicial até ao seu ponto terminal no terreno dos réus e processou-se desde 1982 até 5 de Setembro de 1995, à vista de todos, sem qualquer oposição de terceiros, ininterruptamente, no convenci-mento do seu anterior dono que exercitava um direito próprio e sem prejuízo de outrem”.

Tal passagem aparece devidamente identificada e concretizada quanto ao seu exercício nos pontos x) a xvii) da matéria de facto: em 1982, o dono daqueles prédios era o mesmo e neles implantou uma unidade industrial de fabricação de pavimentos cerâmicos (a D) e, desde então até 1996 - à aquisição referida

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em vi) - utilizou um acesso que ocupava esses dois prédios em conjunto para passar para outros prédios donde extraía barro para a sua indústria; este acesso é utilizado, com referência à forma supra referida, por carros, camiões e máquinas para o transporte de matérias-primas e para o escoamento de ladrilhos; o acesso sempre foi utilizado por todas as pessoas, in-cluindo trabalhadores, administradores, fornecedores e clientes da D, primeiro em terra batida, trilhada pela passagem das pessoas e camiões, e depois em asfalto, aspectos visíveis à data da aquisição referida em vi) e constituído por caminho de terra batida, desprovida de vegetação e com sulcos que ali permanecem a evi-denciar essa passagem; essa passagem foi alargada e asfaltada pela D; essa passagem, considerando o sentido norte/sul, apresenta 7,5 metros de largura e dista do caminho público (EN Tavei-ro/Condeixa) até à portaria e portão eléctrico, que foram da D e que estão implantados em terreno dos réus, 148 metros; junto à portaria, essa passagem inflecte para o lado direito, prosseguindo no sentido Nascente/Poente, numa distância de cerca de 90 metros (caminho que fica ao lado do armazém), até desembocar no lado poente da uni-dade industrial da autora; na parte em que inflecte para o lado direito, atento o sentido nascente/poente, desde a portaria até às portas dos escritórios, sector de produção e armazém de produtos acabados implantados em terrenos da autora e dos réus, há um largo asfaltado, com a área de cerca de 2.000 m2, que sempre foi utilizado pela D; na portaria, implan-tada em terreno dos réus, existe um pequeno edifício em alvenaria e um portão eléctrico accionado pelos membros encarregues da segurança da unidade fa-bril da autora, elementos que estão implantados em terreno dos réus e sempre foram utilizados pela D; o acesso, largo, portaria e toda a unidade fabril foram construídos pelo anterior proprietário dos prédios referidos em i) e v), aquando da implantação da D, em 1982, mantendo-se essa situação desde 1982 até à 1995 (aquisição referida em vi).

A decisão final, como já vimos (na medida em que o acórdão confirmou a sentença da 1ª instância) reco-nheceu, além do mais, que a autora é dona e legítima possuidora do prédio identificado no artigo 1º da petição inicial, assim como que o prédio dos réus se encontra onerado a favor do prédio daquela com uma servidão de passagem de pé e carro, camiões e demais

veículos. Pretendem os recorrentes – independente-mente do absurdo do reconhecimento de servidões na presente acção, questão meramente académica que não qualificam como impugnatória da decisão recorrida – que ocorre insanável contradição entre os factos descritos e o conteúdo da decisão. Mas a verda-de é que não vemos, confrontando aquela matéria de facto e respectiva motivação com a decisão proferida e a fundamentação de direito que a precede, qualquer contradição ou vício lógico de raciocínio.

A decisão final surge precisamente como corolário dos aspectos tácticos referidos, mostra-se inequivo-camente baseada neles e o caminho sequencial per-corrido até à conclusão não deixa de apontar para o sentido decisório a que nela se chegou.

Sendo que, neste aspecto, o acórdão recorrido assen-ta num discurso lógico irrepreensí-vel, limitando-se a decidir no exacto sentido preconizado pela respectiva fundamentação sem qualquer que-bra ou desvio de raciocínio que per-mita detectar a existência de visível contradição entre as premissas e a conclusão. Com efeito, estabelecida de facto e de direito a relação de serventia entre os prédios bem como a existência de sinais visíveis e per-manentes, a decisão que reconheceu a servidão por destinação do anterior proprietário, concorde-se ou não com ela, é a única que, em termos de silogismo judiciário, se afigura coerente com o raciocínio percorrido pelos julgadores. Não concordará a recorrente com a argumentação nele expendida, em sede de interpretação

e aplicação do direito aos factos, que conduziu, sem qualquer contradição ou sofisma, à solução adoptada quanto ao reconhecimento e qualificação da servidão e consequências daí resultantes. Todavia, tal discor-dância (que apenas traduz, como é evidente, uma divergência entre o decidido e o pretendido, eventual erro de julgamento) não admite a imputação ao acórdão da nulidade prevista no art. 668º, nº 1, al. c), do C.Proc.Civil, que manifestamente não ocorre.

Em consequência, não enfermando o acórdão recorrido da nulidade que lhe vem imputada pelos recorrentes, improcede, também nesta parte, o recurso interposto.

Pelo exposto, decidiu-se, no STJ, em:a) - julgar improcedente o recurso de revista inter-

posto pelos réus B e C;b) - confirmar inteiramente o acórdão recorrido;c) - condenar os recorrentes nas custas da revista.

“O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso e fruição e disposições das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas”.

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Jurisprudência do STJ e das Relações

Fiança - Obrigações futuras

ASSUNTO: Admissibilidade de cláusulas de irresponsabilidadeReferências: Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03/11/2005Fonte: site do TRL – “www.dgsi.pt”

Sumário: I - Uma fiança de obrigações futuras, pela qual os fiadores assumem todas as responsabilidades provenientes do contrato de venda a prestações de uma viatura de determinada marca e modelo, com o conteúdo e âmbito de uma “fiança solidária”, é de considerar válida.II – Pois que está perfeitamente definida em função da operação a realizar, como está suficientemente determinado o limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e o limite temporal de validade dessa responsabilidade, ainda que não traduzidos ainda em números ou dados concretos, por o contrato de venda a prestações da viatura se não ter ainda celebrado. III - Uma cláusula de irresponsabilidade em benefício do vendedor não é admissível, pois que é nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a quaisquer dos direitos que lhe são facultados nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, ou seja, entre outros, os direitos de exigir o cumprimento da obrigação ou uma indemnização pelo prejuízo sofrido, bem como o de operar a resolução do contrato. IV - Sucede é que a nulidade de tal cláusula não determina outra consequência que não seja a de haver essa cláusula como não escrita, razão pela qual essa nulidade nunca implicaria a nulidade do próprio contrato, mas apenas a sua redução. E tal nulidade só relevaria para os autos se neles viesse formulada pretensão com fundamento na mesma.

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

I. objecto do recurso e questões a solucionar. No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, na

presente acção declarativa, com processo ordinário, em que são autores A e B e ré C, vieram aqueles pedir seja declarada a nulidade do contrato de fiança junto aos autos, alegando que:

Os autores constituíram-se fiadores da Sociedade D nos termos da declaração junta aos autos;

O referido termo de fiança, referindo-se a pres-tações futuras, não fixa objectivamente critérios de determinação do seu objecto, que não é determina-do nem determinável.

Citada para contestar, veio a ré requerer a inter-venção do chamado E e pedir a sua absolvição do pedido por improcedência da presente acção.

Além disso deduziu pedido reconvencional contra os autores e o chamado, pedindo a condenação dos mesmos solidariamente a pagarem à ré a quantia de Esc.: 7.652.855$00, acrescida da quantia de Esc.: 1.638.339$00 de juros vencidos até 16.05.1994, e dos juros que se vencerem à taxa de 16% sobre Esc.: 7.652.855$00 desde 17.05.1994 até integral pagamento.

Mais pediu a condenação dos autores como liti-gantes de má fé em multa e no pagamento à ré da quantia de Esc.: 800.000$00 para ressarcimento dos prejuízos e reembolsos das despesas causadas pela lide dolosa dos autores.

Os autores vieram apresentar a sua réplica, e a ré respondeu com tréplica.

Admitida a intervenção provocada do chamado, veio o mesmo declarar fazer seus os articulados dos autores.

Proferiu-se despacho saneador, onde se julgou improcedente o pedido formulado pelos autores de declaração de nulidade do contrato de fiança dos autos e onde se elaborou base instrutória para o pedido reconvencional.

Inconformados com a decisão, vieram os AA. interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, pedindo que a decisão recorrida seja substituída por outra que

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julgue nula a fiança dos autos. Prosseguindo os autos os seus trâmites, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, sendo depois proferida sen-tença, julgando procedente o pedido reconvencional e condenando no mesmo os AA. e o chamado.

Inconformados com a decisão, vieram os AA. in-terpor recurso para este Tribunal da Relação, apre-sentando doutas alegações, pedindo que a sentença recorrida deve ser substituída por outra que julgue a acção procedente e improcedente a reconvenção.

Não houve contra-alegação. Admitidos os recursos na forma, com o efeito e no

regime de subida devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação, sendo que, nada obstando ao conhecimento dos mesmos, cumpre decidir.

As questões a resolver são as de saber: a) Se a fiança dos autos é nula;b) Se o conteúdo das cláusulas 7.ª, 8.ª, 9.ª, 11.ª e

13.ª inseridas no contrato dos autos ultrapas-sam o limite imperativo traçado por Lei, sendo nulas, com a consequência de proceder a acção e improceder a reconvenção.

II. Fundamentos de facto.(…)

III. Fundamentos de direito.

a) Da alegada nulidade da fiança: Fiança é o vínculo jurídico pelo qual um terceiro

assegura com o seu património o cumprimento de obrigação alheia, ficando pessoalmente responsável perante o respectivo credor (627º/1 do CC)[1].

Trata-se de uma garantia pessoal que tem por finalidade juntar à garantia geral do património do devedor a garantia particular do património de ter-ceiro, sendo que, não se estando em face de garantia real, não é dotada de sequela, da força característica dos direitos reais (direitos absolutos), ficando ao sabor das vicissitudes do património do fiador.

A fiança, não podendo exceder a dívida principal, nem ser contraída em condições mais onerosas, por regra, mantém-se enquanto se mantiver a obriga-ção principal, só a extinção desta determinando a extinção daquela, e pode ser oferecida para garantia de obrigações futuras (art. 628º/2, 631º/1 e 651º do CC).

A fiança pode ser prestada de modo genérico, o que acontece quando o fiador garante o pagamento das obrigações de um determinado devedor, sem proceder à sua discriminação e/ou sem estabelecer o limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e o limite temporal da sua validade.

Sendo a fiança prestada em termos genéricos,

pode ainda destinar-se a garantir o pagamento de obrigações presentes ou o pagamento de obrigações futuras.

Em qualquer dos casos, importa apreciá-la à luz do estatuído nos artigos 280º e 400º do CC.

Nos termos do art. 280º/1 do CC, é nulo o negócio cujo objecto seja indeterminável, mas nada obsta a que o objecto do negócio seja indeterminado. Isto porque, por via do disposto no art. 400º do CC, a determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes, a terceiro ou ao tribunal, sempre segundo juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados.

Assim, no tocante a obrigações já constituídas, a fiança geral é de considerar válida quando, apesar de indeterminado o montante afiançado, este possa concretizar-se ou através de uma operação aritmé-tica ou com base num qualquer outro processo de apuramento da obrigação.

Porém, em relação a obrigações futuras, como se entendeu no Ac. do STJ, de 25.11.97[2], a fiança será válida quando no respectivo contrato se es-tabeleça o limite máximo do montante a garantir, bem como o prazo de validade da fiança, isto é, um limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e um limite temporal de validade dessa responsabilidade.

Ou, por outras palavras, como se veio a estabele-cer pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2001, de 23.1.2001[3], “é nula, por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabili-dades provenientes de qualquer operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha”.

A justificação para assim decidir é a de o fiador não poder e não dever correr o risco de se expor à ruína por efeito da imprudência com que o credor consen-tiu na dívida principal e o devedor na multiplicação dos seus débitos só porque lhes tenha garantido o pagamento.

Ora, no caso vertente, os fiadores declararam que “constituem-se como fiadores de todas e quaisquer obrigações que para Transportes (…).”, resultem do contrato de venda a prestações, incluindo da sua ... tendo por objectivo 1 viatura MAN modelo 19.372 FGLT com a matrícula... celebrado em ... com a (…). Mais declaram que a presente garantia tem o conteúdo e o âmbito legais de uma fiança solidária incluindo assunção das obrigações do afiançado”.

Como se vê, estamos em face de uma fiança de obrigações futuras, pela qual os fiadores assumem

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todas as responsabilidades provenientes do contrato de venda a prestações de uma viatura de determi-nada marca e modelo, com o conteúdo e âmbito de uma “fiança solidária”, o que só pode ter o significa-do de os fiadores terem renunciado ao benefício da excussão.

A fiança está perfeitamente definida em função da operação a realizar, como está suficientemente de-terminado o limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e o limite temporal de validade dessa responsabilidade, ainda que não traduzidos ainda em números ou dados concretos, por o contrato de venda a prestações da viatura se não ter ainda celebrado, o que não parece relevante.

Não têm razão, por isso, os Apelantes quando ale-gam que o objecto de fiança é vago e indeterminado e que não existe qual-quer critério para lograr a respectiva determinação, pois que a fiança dos autos mostra-se bem definida quan-to ao seu objecto e aos limites em que deve ser entendida.

Acresce que o facto de o termo de fiança estar incompleto e apresen-tar espaços em branco em relação a algumas especificações que podia conter, não tem relevância, por se tratar de elementos cuja ausência não interfere com o objecto e limites da fiança em causa, por se tratar de referências dispensáveis. Do que se conclui que a finança dos autos não pode ser havida por nula.

b) Da pretensa nulidade das cláusulas 7.ª, 8.ª, 9.ª, 11.ª e 13.ª in-seridas no contrato dos autos.

A resposta às questões suscitadas sobre a pretensa nulidade das cláu-sulas contratuais em discussão, em face da matéria de facto considerada por assente, foi dada de forma acertada e categórica na sentença re-corrida, que na análise das questões em apreço, como de resto das questões instrumentais consideradas, invocou com rigor a lei aplicável, interpretando-a de acordo com o melhor entendimento da doutrina e da jurisprudência, e efectuou uma ponderação exaustiva da facticidade dada por assente, para concluir, con-vincentemente, pelo entendimento de improcederem as alegações que produziram os Apelantes no sentido de as nulidades invocadas determinarem a nulidade do contrato de venda a prestações de que os Apelan-tes e o chamado se assumiram fiadores. E a sentença sindicada mostra-se correctamente estruturada e

devidamente fundamentada, pelo que este Tribunal considera dever seguir a fundamentação doutamente deduzida pelo Mmo juiz recorrido, sem necessidade de reproduzir todos os raciocínios ou explanar mais convincentes argumentos, pelo que, nos termos do art. 713º, n.º 5, do CPC, se remete, pois, para os fun-damentos da decisão impugnada, que, no essencial, se acolhem. No entanto, sempre importará refutar os argumentos principais, aparentemente válidos, deduzidos pelos apelantes.

Alegam os Apelantes que a questão a decidir con-siste em apurar se o conteúdo da cláusula 7.ª inserida no contrato dos autos ultrapassa o limite imperativo traçado por Lei, sendo que, em sua opinião, tal cláu-sula viola do direito comum –, arts. 934° e 935° do

Código Civil - estando abrangidos pela alínea c) do art. 19° do Decreto-Lei 446/85, de 25/10, estando, por isso, a Ré proibida legalmente de inserir tal cláusula nos contratos-tipo de compra e venda de automó-veis, a prestações, com reserva de propriedade.

Ora, antes de mais, como se en-tendeu na sentença, o instrumento contratual junto aos autos não in-dicia minimamente que estejamos perante um contrato de adesão, na justa medida em que nele se não contém qualquer clausulado geral que deva ser havido como padronizado.

Na ausência desse clausulado, competia aos Apelantes alegar e provar que o contrato tinha as ca-racterísticas acima mencionadas, ou seja, que o mesmo fora celebrado por iniciativa exclusiva do outor-gante-vendedor, sem qualquer discussão prévia e ao qual o com-

prador teria forçosamente de anuir caso pretendesse adquirir a viatura que constitui o objecto mediato desse contrato. Mas como essa alegação nem sequer foi produzida, a eventual nulidade de alguma ou algumas das suas cláusulas não possa ser apreciada à luz do disposto no citado diploma legal.

Daí que essa pretensa nulidade só poderia ser aferida à luz dos preceitos gerais do Cód. Civil.

A cláusula 7.ª do referido contrato diz o seguinte: “a falta de pagamento, no prazo do seu vencimento, de qualquer prestação do preço em dívida, qualquer que seja o seu montante e qualquer que seja a fracção do saldo do preço em débito que representa, mesmo que tituladas por letras, implica automaticamente,

“A falta de pagamento, no prazo do seu vencimento, de qualquer prestação do preço em dívida, qualquer que seja o seu montante e qualquer que seja a fracção do saldo do preço em débito que representa, mesmo que tituladas por letras, implica automaticamente, o imediato vencimento de todas as restantes prestações e a resolução imediata do presente contrato”.

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45 Vida Judiciária Maio/2006

se a (…) assim o entender, e independentemente de qualquer comunicação ao comprador, o imediato vencimento de todas as restantes prestações e a resolução imediata do presente contrato, devendo o comprador restituir então imediatamente à (…) o equipamento e ficando esta com o direito de, por intermédio de qualquer seu agente ou auxiliar, desde que devidamente credenciado, dele se apossar, e de todos os seus pertences e acessórios, pela forma que melhor entender, esteja onde estiver e em poder de quem for”.

Aceita-se que a cláusula em apreço, na parte em que refere que a falta de pagamento, no prazo do seu vencimento, de qualquer prestação do preço em dí-vida, qualquer que seja o seu mon-tante e qualquer que seja a fracção do saldo do preço em débito implica a resolução imediata do contrato, poderá não se harmonizar com o regime imperativo do 934° (primei-ra parte) do Cód. Civil, segundo o qual a falta de pagamento de uma única prestação na venda a pres-tações apenas dá lugar à resolução do contrato se a prestação exceder a oitava parte do preço.

Como, no caso dos autos, o paga-mento foi estipulado em 13 presta-ções iguais, uma delas não excede-ria a oitava parte do preço, pelo que a cláusula em apreço naquela parte se poderá considerar nula por con-trária à norma imperativa citada. Mas tal não prejudica a validade da cláusula na parte restante.

Sucede que, no caso dos autos, não se verificou apenas a falta de pagamento de uma das prestações, mas antes da 3.ª à 13.ª, pelo que, ao abrigo do art. 934º do CC, sempre havia lugar à resolução do contrato e ao vencimento das prestações seguintes às não pagas.

Alegam os Apelantes que não fará sentido falar do pagamento das ulteriores prestações, atenta a circunstância de a Ré se ter apossado do veículo em Maio de 1993.

Mas a falta de pagamento da 3.ª prestação veri-ficou-se em 7.2.1993, pelo que, em Maio de 1993, já estavam em falta, pelo menos, duas prestações, o que já facultava a resolução do contrato e ao vencimento das prestações seguintes nos termos do art. 934º.

Note-se que, estando em falta duas ou mais pres-tações, ainda que não excedam 1/8 do preço, já não funciona o impedimento previsto naquele preceito,

como decorre da sua linear interpretação. Também alegam os Apelantes que a cláusula 8.ª é

nula, por consagrar cláusula penal desproporcionada aos alegados danos a ressarcir.

A cláusula em apreço estabelece que “no caso de resolução do presente contrato a (…) fica com o direito de negociar imediata e livremente o equipa-mento, e terá ainda e sempre o direito de ficar com todas as importâncias e valores que houver recebido do comprador, bem como com quaisquer pertences e acessórios do equipamento, a título de indemnização devida pelo comprador pela utilização e diminuição do valor do equipamento. A indemnização por falta de cumprimento do presente contrato por parte do

comprador é, por si só, pelo menos, de montante igual a cinquenta por cento do valor do preço total ajustado”.

Confrontada esta cláusula com o estatuído no art. 935° do Cód. Civil, tem de concluir-se que a primeira não é nula, por se conter nos limites de metade do preço, estabelecido naquele normativo.

Nem se trata de cláusula inseri-da num contrato de adesão, padro-nizado, como alegam os Apelantes, nem consagra cláusula penal des-proporcionada aos alegados danos a ressarcir.

Acresce que a ré, no seu pedido reconvencional, não pretende exer-cer qualquer direito relacionado com a cláusula penal inserida na cláusula 8.ª do contrato.

Invocam também os Apelantes a nulidade das cláusulas 9.ª e 11.ª, por a ré pretender a exclusão da sua responsabilidade pelos prejuízos

resultantes de eventuais defeitos do equipamento. Na cláusula 9.ª diz-se que: “o comprador declara

ter escolhido de sua livre vontade o equipamento, bem como o respectivo fornecedor e/ou fabricante, tendo determinado com este as especificações técni-cas e o preço do mesmo, assumindo plenamente a res-ponsabilidade da sua escolha, mais reconhecendo ter inspeccionado o equipamento e ter verificado o seu estado e funcionamento, e que as suas características são conformes as exigências dele, comprador”.

E na cláusula 11.ª consigna-se que “o comprador renuncia ao exercício de quaisquer direitos contra a (…), ficando esta expressamente exonerada de toda a responsabilidade quanto à construção, instalação, funcionamento, e/ou rendimento do equipamento”.

“É nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a quaisquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, ou seja, entre outros, os direitos de exigir o cumprimento da obrigação ou uma indemnização pelo prejuízo sofrido, bem como o de operar a resolução do contrato”.

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46Vida Judiciária Maio/2006

A cláusula 9.ª é uma cláusula de conteúdo ge-nérico, que se limita a estabelecer o que é suposto acontecer por parte de um comprador diligente e responsável, que é o de escolher livremente o produto pretendido e de o examinar devidamente quanto ao seu estado, funcionamento e características possu-ídas, não se vendo que o conteúdo de tal cláusula esteja em desconformidade com algum preceito de natureza imperativa. Já o mesmo se não pode dizer da cláusula 11.ª, que se traduz numa cláusula de irresponsabilidade em benefício do vendedor e que não é admissível face ao estatuído no art. 809° do Cód. Civil, segundo o qual é nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a quaisquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões an-teriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, ou seja, entre outros, os direitos de exigir o cumprimento da obrigação ou uma indemnização pelo prejuízo sofrido, bem como o de operar a reso-lução do contrato.

Sucede é que, como bem se entendeu na sentença sindicada, a nulidade de tal cláusula não determina outra consequência que não seja a de haver essa cláusula como não escrita, razão pela qual, ao con-trário do que pretendiam os Apelantes, essa nulidade nunca implicaria a nulidade do próprio contrato, mas apenas a sua redução.

E tal nulidade só relevaria para os autos se neles viesse formulada pretensão com fundamento na mesma, situação que não se verifica. Finalmente, alegam os Apelantes a nulidade da cláusula 13.ª do referido contrato, por não estar identificado no contrato qualquer cessionário.

A cláusula 13.ª do referido contrato é do seguinte teor: “a (…) poderá ceder, total ou parcialmente, o seu crédito sobre o comprador a terceiro ou terceiros”.

Ora, nos termos do disposto no art. 577°/1 do Cód. Civil, é livre a cedência do crédito, total ou parcial, independentemente do consentimento do devedor, conquanto a cessão não seja interdita por determi-

nação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor.

No caso dos autos, não ocorre qualquer das li-mitações assinaladas na parte final do citado pre-ceito legal, não apenas pela natureza do contrato mas também porque os créditos em causa não têm carácter estritamente pessoal. E, ao contrário do que alegam os Apelantes, não releva para o caso o disposto no art. 18°, alínea l), do Decreto-Lei 446/85, de 25/10, que proíbe as cláusulas contratuais gerais que consagram a favor de quem as predisponha a possibilidade de cessão da posição contratual, de transmissão de dívida ou de subcontratar, sem acor-do da contratante, salvo se a identidade do terceiro constar do contrato inicial.

Isto porque o diploma em questão não tem aqui qualquer aplicação, como bem se salientou na sentença recorrida (pg. 414) e acima já se deixou consignado, não tendo os Apelantes sequer tentado demonstrar o contrário.

Deste modo, a dita cláusula não padece de qual-quer nulidade.

Conclui-se do que vem expendido, e de quanto consta das decisões recorridas, que improcedem, no essencial, as conclusões das doutas alegações dos recursos interpostos pelos Apelantes, sendo de manter as mesmas decisões.

IV. Decisão:

Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se provimento às apelações e confirmam-se as decisões recorridas.

Custas nas instâncias pelos apelantes. Lisboa, 3 de Novembro de 2005. Os Desembargadores, Fernando Pereira Rodrigues Fernanda Isabel Pereira Maria Manuela Gomes

Junto do Tribunal da Relação de Lisboa surgiu um recurso de Apelação, no âmbito do qual as questões a resolver são as seguintes:

a) Se a fiança dos autos é nula;

[1] Vd. Almeida Costa, in Noções Fundamentais de Direito Civil, pg. 217.

[2] processo nº 260/97, 1ª Secção, citado no AUJ nº 4/2001, de 23.1.2001, no DR., IA, de 8.3.2001.

[3] in DR., IA, de 8.3.2001.

b) Se o conteúdo das cláusulas 7.ª, 8.ª, 9.ª, 11.ª e 13.ª inseridas no contrato dos autos ultrapassam o limite imperativo traçado por Lei, sendo nulas, com a consequência de proceder a acção e improceder a reconvenção.

I - Da alegada nulidade da fiança: Fiança é o vínculo jurídico pelo qual um terceiro assegura

com o seu património o cumprimento de obrigação alheia, ficando pessoalmente responsável perante o respectivo credor

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47 Vida Judiciária Maio/2006

(627º/1 do CC). Trata-se de uma garantia pessoal que tem por finalidade juntar à garantia geral do património do devedor a garantia particular do património de terceiro, sendo que, não se estando em face de garantia real, não é dotada de sequela, da força característica dos direitos reais (direitos absolutos), ficando ao sabor das vicissitudes do património do fiador.

A fiança, não podendo exceder a dívida principal, nem ser contraída em condições mais onerosas, por regra, mantém-se enquanto se mantiver a obrigação principal, só a extinção desta determinando a extinção daquela, e pode ser oferecida para garantia de obrigações futuras (art. 628º/2, 631º/1 e 651º do CC). A fiança pode ser prestada de modo genérico, o que acontece quando o fiador garante o pagamento das obrigações de um determinado devedor, sem proceder à sua discriminação e/ou sem estabelecer o limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e o limite temporal da sua validade. Sendo a fiança prestada em termos genéricos, pode ainda destinar-se a garantir o pagamento de obrigações presentes ou o pagamento de obrigações futuras.

Em qualquer dos casos, importa apreciá-la à luz do estatuído nos artigos 280º e 400º do CC.

Nos termos do art. 280º/1 do CC, é nulo o negócio cujo objecto seja indeterminável, mas nada obsta a que o objecto do negócio seja indeterminado. Isto porque, por via do disposto no art. 400º do CC, a determinação da prestação pode ser confiada a uma ou outra das partes, a terceiro ou ao tribunal, sempre segundo juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados. Assim, no tocante a obrigações já constituídas, a fiança geral é de considerar válida quando, apesar de indeterminado o montante afiançado, este possa concretizar-se ou através de uma operação aritmética ou com base num qualquer outro processo de apuramento da obrigação.

Porém, em relação a obrigações futuras, como se entendeu no Ac. do STJ, de 25.11.97, a fiança será válida quando no respectivo contrato se estabeleça o limite máximo do montante a garantir, bem como o prazo de validade da fiança, isto é, um limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e um limite temporal de validade dessa responsabilidade.

Ou, por outras palavras, como se veio a estabelecer pelo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 4/2001, de 23.1.2001, “é nula, por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer operação em direito consentida, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha”.

A justificação para assim decidir é a de o fiador não poder e não dever correr o risco de se expor à ruína por efeito da imprudência com que o credor consentiu na dívida principal e o devedor na multiplicação dos seus débitos só porque lhes tenha garantido o pagamento.

Ora, no caso em apreço, os fiadores declararam que “constituem-se como fiadores de todas e quaisquer obrigações que para Transportes (…).”, resultem do contrato de venda a prestações, incluindo da sua ... tendo por objectivo 1 viatura MAN modelo 19.372 FGLT com a matrícula... celebrado em ...

com a (…). Mais declaram que a presente garantia tem o conteúdo e o âmbito legais de uma fiança solidária incluindo assunção das obrigações do afiançado”.

Como se vê, estamos em face de uma fiança de obrigações futuras, pela qual os fiadores assumem todas as responsa-bilidades provenientes do contrato de venda a prestações de uma viatura de determinada marca e modelo, com o conteúdo e âmbito de uma “fiança solidária”, o que só pode ter o significado de os fiadores terem renunciado ao benefício da excussão.

A fiança está perfeitamente definida em função da operação a realizar, como está suficientemente determinado o limite quantitativo da responsabilidade assumida pelo fiador e o limite temporal de validade dessa responsabilidade, ainda que não traduzidos ainda em números ou dados concretos, por o contrato de venda a prestações da viatura se não ter ainda celebrado, o que não parece relevante.

Não têm razão, por isso, os Apelantes quando alegam que o objecto de fiança é vago e indeterminado e que não existe qualquer critério para lograr a respectiva determinação, pois que a fiança dos autos mostra-se bem definida quanto ao seu objecto e aos limites em que deve ser entendida.

Acresce que o facto de o termo de fiança estar incompleto e apresentar espaços em branco em relação a algumas especi-ficações que podia conter não tem relevância, por se tratar de elementos cuja ausência não interfere com o objecto e limites da fiança em causa, por se tratar de referências dispensáveis.

Do que se conclui que a finança dos autos não pode ser havida por nula.

II - Da pretensa nulidade das cláusulas 7.ª, 8.ª, 9.ª, 11.ª e 13.ª inseridas no contrato dos autos.

A resposta às questões suscitadas sobre a pretensa nulidade das cláusulas contratuais em discussão, em face da matéria de facto considerada por assente, foi dada de forma acertada e categórica na sentença recorrida, que na análise das questões em apreço, como de resto das questões instrumentais consideradas, invocou com rigor a lei aplicável, interpretando-a de acordo com o melhor entendimento da doutrina e da jurisprudência, e efectuou uma ponderação exaustiva da facticidade dada por assente, para concluir, convincentemente, pelo entendimento de improcederem as alegações que produziram os Apelantes no sentido de as nulidades invocadas determinarem a nulidade do contrato de venda a prestações de que os Apelantes e o chamado se assumiram fiadores.

E a sentença sindicada mostra-se correctamente estruturada e devidamente fundamentada, pelo que este Tribunal considera dever seguir a fundamentação doutamente deduzida pelo Mmo juiz recorrido, sem necessidade de reproduzir todos os raciocínios ou explanar mais convincentes argumentos, pelo que, nos termos do art. 713º, n.º 5, do CPC, se remete, pois, para os fundamentos da decisão impugnada, que, no essencial, se acolhem.

No entanto, sempre importará refutar os argumentos principais, aparentemente válidos, deduzidos pelos apelantes.

Alegam os Apelantes que a questão a decidir consiste em apurar se o conteúdo da cláusula 7.ª inserida no contrato dos autos ultrapassa o limite imperativo traçado por Lei, sendo que, em sua opinião, tal cláusula viola do direito comum - arts. 934° e 935° do Código Civil – estando abrangidos pela alínea c) do

art. 19° do Decreto-Lei 446/85, de 25/10, estando, por isso, a Ré proibida legalmente de inserir tal cláusula nos contratos-tipo de compra e venda de automóveis, a prestações, com reserva de propriedade. Ora, antes de mais, como se entendeu na sentença, o instrumento contratual junto aos autos não indicia minimamente que estejamos perante um contrato de adesão, na justa medida em que nele se não contém qualquer clausulado geral que deva ser havido como padronizado.

Na ausência desse clausulado, competia aos Apelantes alegar e provar que o contrato tinha as características acima mencionadas, ou seja, que o mesmo fora celebrado por iniciativa exclusiva do outorgante-vendedor, sem qualquer discussão prévia e ao qual o comprador teria forçosamente de anuir caso pretendesse adquirir a viatura que constitui o objecto mediato desse contrato. Mas como essa alegação nem sequer foi produzida, a eventual nulidade de alguma ou algumas das suas cláusulas não possa ser apreciada à luz do disposto no citado diploma legal.

Daí que essa pretensa nulidade só poderia ser aferida à luz dos preceitos gerais do Cód. Civil.

A cláusula 7.ª do referido contrato diz o seguinte: “a falta de pagamento, no prazo do seu vencimento, de qualquer prestação do preço em dívida, qualquer que seja o seu montante e qualquer que seja a fracção do saldo do preço em débito que representa, mesmo que tituladas por letras, implica automaticamente, se a (…) assim o entender, e independentemente de qualquer comunicação ao comprador, o imediato vencimento de todas as restantes prestações e a resolução imediata do presente contrato, devendo o compra-dor restituir então imediatamente à (…) o equipamento e ficando esta com o direito de, por intermédio de qualquer seu agente ou auxiliar, desde que devidamente credenciado, dele se apossar, e de todos os seus pertences e acessórios, pela forma que melhor entender, esteja onde estiver e em poder de quem for”.

Aceita-se que a cláusula em apreço, na parte em que refere que a falta de pagamento, no prazo do seu vencimento, de qualquer prestação do preço em dívida, qualquer que seja o seu montante e qualquer que seja a fracção do saldo do preço em débito implica a resolução imediata do contrato, poderá não se harmonizar com o regime imperativo do art. 934° (primeira parte),do Cód. Civil, segundo o qual a falta de pagamento de uma única prestação na venda a prestações apenas dá lugar à resolução do contrato se a prestação exceder a oitava parte do preço.

Como no caso dos autos o pagamento foi estipulado em 13 prestações iguais, uma delas não excederia a oitava parte do preço, pelo que a cláusula em apreço naquela parte se poderá considerar nula por contrária à norma imperativa citada. Mas tal não prejudica a validade da cláusula na parte restante.

Sucede que, no caso dos autos, não se verificou apenas a falta de pagamento de uma das prestações, mas antes da 3.ª à 13.ª, pelo que, ao abrigo do art. 934º do CC, sempre havia lugar à resolução do contrato e ao vencimento das prestações seguintes às não pagas.

Alegam os Apelantes que não fará sentido falar do paga-mento das ulteriores prestações, atenta a circunstância de a Ré se ter apossado do veículo em Maio de 1993.

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48Vida Judiciária Maio/2006

Mas a falta de pagamento da 3.ª prestação verificou-se em 7.2.1993, pelo que, em Maio de 1993, já estavam em falta, pelo menos, duas prestações, o que já facultava a resolução do contrato e ao vencimento das prestações seguintes nos termos do art. 934º.

Note-se que, estando em falta duas ou mais prestações, ainda que não excedam 1/8 do preço, já não funciona o impedimento previsto naquele preceito, como decorre da sua linear interpre-tação. Também alegam os Apelantes que a cláusula 8.ª é nula, por consagrar cláusula penal desproporcionada aos alegados danos a ressarcir.

A cláusula em apreço estabelece que “no caso de resolução do presente contrato a (…) fica com o direito de negociar imediata e livremente o equipamento, e terá ainda e sempre o direito de ficar com todas as importâncias e valores que houver recebido do comprador, bem como com quaisquer pertences e acessórios do equipamento, a título de indemnização devida pelo comprador pela utilização e diminuição do valor do equipamento. A indemnização por falta de cumprimento do presente contrato por parte do comprador é, por si só, pelo menos, de montante igual a cinquenta por cento do valor do preço total ajustado”.

Confrontada esta cláusula com o estatuído no art. 935° do Cód. Civil, tem de concluir-se que a primeira não é nula, por se conter nos limites de metade do preço, estabelecido naquele normativo.

Nem se trata de cláusula inserida num contrato de adesão, padronizado, como alegam os Apelantes, nem consagra cláusula penal desproporcionada aos alegados danos a ressarcir.

Acresce que a ré, no seu pedido reconvencional, não pretende exercer qualquer direito relacionado com a cláusula penal inserida na cláusula 8.ª do contrato.

Invocam também os Apelantes a nulidade das cláusulas 9.ª e 11.ª, por a ré pretender a exclusão da sua responsabilidade pelos prejuízos resultantes de eventuais defeitos do equipamento. Na cláusula 9.ª diz-se que: “o comprador declara ter escolhido de sua

livre vontade o equipamento, bem como o respectivo fornecedor e/ou fabricante, tendo determinado com este as especificações técnicas e o preço do mesmo, assumindo plenamente a respon-sabilidade da sua escolha, mais reconhecendo ter inspeccionado o equipamento e ter verificado o seu estado e funcionamento, e que as suas características são conformes as exigências dele comprador”.

E na cláusula 11.ª consigna-se que “o comprador renuncia ao exercício de quaisquer direitos contra a (…), ficando esta expressamente exonerada de toda a responsabilidade quanto à construção, instalação, funcionamento, e/ou rendimento do equi-pamento”. A cláusula 9.ª é uma cláusula de conteúdo genérico, que se limita a estabelecer, o que é suposto acontecer por parte de um comprador diligente e responsável, que é o de escolher livremente o produto pretendido e de o examinar devidamente quanto ao seu estado, funcionamento e características possuídas, não se vendo que o conteúdo de tal cláusula esteja em des-conformidade com algum preceito de natureza imperativa. Já o mesmo se não pode dizer da cláusula 11.ª, que se traduz numa cláusula de irresponsabilidade em benefício do vendedor e que não é admissível face ao estatuído no art. 809° do Cód. Civil, segundo o qual é nula a cláusula pela qual o credor renuncia antecipadamente a quaisquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, ou seja, entre outros, os direitos de exigir o cumprimento da obrigação ou uma indemnização pelo prejuízo sofrido, bem como o de operar a resolução do contrato.

Sucede é que, como bem se entendeu na sentença sindicada, a nulidade de tal cláusula não determina outra consequência que não seja a de haver essa cláusula como não escrita, razão pela qual, ao contrário do que pretendiam os Apelantes, essa nulidade nunca implicaria a nulidade do próprio contrato, mas apenas a sua redução. E tal nulidade só relevaria para os autos se neles viesse formulada pretensão com fundamento na mesma, situação que não se verifica.

Código Civil

Artigo 577ºAdmissibilidade da cessão

1 - O credor pode ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito independentemente do consentimento do devedor, contanto que a cessão não seja interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação ligado à pessoa do credor.

Artigo 627Noção. Acessoriedade

1 - O fiador garante a satisfação do direito do crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor.

2 - A obrigação do fiador é acessória da que recai sobre o principal devedor.

Artigo 628ºRequisitos

1 - A vontade de prestar fiança deve ser expressa-

Finalmente, alegam os Apelantes a nulidade da cláusula 13.ª do referido contrato, por não estar identificado no contrato qualquer cessionário.

A cláusula 13.ª do referido contrato é do seguinte teor: “a (…) poderá ceder, total ou parcialmente, o seu crédito sobre o comprador a terceiro ou terceiros “.

Ora, nos termos do disposto no art. 577°/1, do Cód. Civil, é livre a cedência do crédito, total ou parcial, independentemente do consentimento do devedor, conquanto a cessão não seja interdita por determinação da lei ou convenção das partes e o crédito não esteja, pela própria natureza da prestação, ligado à pessoa do credor.

No caso dos autos, não ocorre qualquer das limitações assi-naladas na parte final do citado preceito legal, não apenas pela natureza do contrato mas também porque os créditos em causa não têm carácter estritamente pessoal.

E, ao contrário do que alegam os Apelantes, não releva para o caso o disposto no art. 18°, alínea l), do Decreto-Lei 446/85, de 25/10, que proíbe as cláusulas contratuais gerais que consagram a favor de quem as predisponha a possibilidade de cessão da posição contratual, de transmissão de dívida ou de subcontratar, sem acordo da contratante, salvo se a identidade do terceiro constar do contrato inicial.

Isto porque o diploma em questão não tem aqui qualquer aplicação, como bem se salientou na sentença recorrida e acima já se deixou consignado, não tendo os Apelantes sequer tentado demonstrar o contrário. Deste modo, a dita cláusula não padece, de qualquer nulidade.

Conclui-se do que vem expendido, e de quanto consta das decisões recorridas, que improcedem, no essencial, as conclusões das doutas alegações dos recursos interpostos pelos Apelantes, sendo de manter as mesmas decisões.

Em conformidade com os fundamentos expostos, a Relação de Lisboa negou provimento às apelações e confirmou as decisões recorridas.

mente declarada pela forma exigida para a obrigação principal.

2 - A fiança pode ser prestada sem conhecimento do devedor ou contra a vontade dele, e a sua prestação não obsta o facto de a obrigação ser futura ou condicional.

Artigo 631ºÂmbito da fiança

1 - A fiança não pode exceder a dívida principal nem ser contraída em condições mais onerosas, mas pode ser contraída por quantidade menor ou em menos onerosas condições.

Artigo 651ºExtinção da obrigação principal

A extinção da obrigação principal determina a extinção da fiança.

Artigo 934ºFalta de pagamento de uma prestaçãoVendida a coisa a prestações, com reserva de propriedade,

e feita a sua entrega ao comprador, a falta de pagamento de uma só prestação que não exceda a oitava parte do preço não dá lugar à resolução do contrato, nem sequer, haja ou não reserva de propriedade, importa a perda do benefício do prazo relativamente às prestações seguintes, sem embargo de convenção em contrário.

Artigo 935ºCláusula penal no caso de o comprador

não cumprir1. A indemnização estabelecida em cláusula penal, por o

comprador não cumprir, não pode ultrapassar metade do preço, salva a faculdade de as partes estipularem, nos termos gerais, a ressarcibilidade de todo o prejuízo sofrido.

2. A indemnização fixada pelas partes será reduzida a metade do preço, quando tenha sido estipulada em montante superior, ou quando as prestações pagas superem este valor e se tenha conven-cionado a não restituição delas; havendo, porém, prejuízo excedente e não se tendo estipulado a sua ressarcibilidade, será ressarcido até ao limite da indemnização convencional pelas partes.

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49 Vida Judiciária Maio/2006

Supremo Tribunal de Justiça

Sumários

ARRENDAMENTOReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 2274/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Contrato de arrendamento - Obras de conservação ordinária

I - Constituindo uma das obrigações do locador as-segurar ao locatário o gozo do bem locado para os fins a que o mesmo se destina (art. 1031, al. b), do CC), resulta para aquele, do impositivo legal decorrente de tal dever genérico, a obrigação específica de efectuar as reparações indispensáveis à manutenção do referido gozo (art. 12 do RAU).

II - Por sua vez, incumbe ao locatário, a fim de asse-gurar ao senhorio a possibilidade de exercício daquela obrigação, o dever jurídico de o avisar imediatamente, relativamente aos vícios que descubra na coisa (art. 1038, al. h), do CC).

III - Caso o senhorio nada responda quanto à interpe-lação tendente à realização das referidas obras, assiste ao inquilino a faculdade de proceder à denúncia do facto perante a respectiva Câmara Municipal (arts. 9 a 12 do RGEU) ou, em alternativa, a de propor a competente acção judicial contra o respectivo locador, pedindo a condenação deste na realização das aludidas obras, com a subsequente eventual instauração da execução para prestação de facto.

IV - Situação diversa tem lugar no caso das repa-rações a efectuar revestirem carácter urgente, v.g., no caso do telhado danificado pelo temporal que deixa entrar a chuva no arrendado, no rebentamento de um cano de água ou de gás, no interior de uma parede, na ameaça de ruína de uma parede mestra ou na iminência de abatimento do tecto, ou seja, quando tenham ocorrido deteriorações no locado, que, pela sua gravidade, sejam susceptíveis de tornar absolu-tamente impossível a utilização do mesmo para os fins a que foi destinado, ou quando, em consequência de tais ocorrências, se encontre em risco a vida dos respectivos utentes.

V - Perante tais deteriorações carenciadas de ur-gente e imediata reparação, o inquilino pode proceder às obras adequadas (art. 1036, nº 2, do CC), incum-bindo-lhe depois provar - na acção em que peticione a condenação do senhorio no reembolso das respectivas

despesas - que as deteriorações careciam de reparação urgente.

VI - Não pode merecer acolhimento o pedido de reembolso dos quantitativos despendidos pelos inqui-linos nas obras realizadas no locado se estes não só não provaram o carácter urgente das mesmas, como nem sequer demonstraram ter existido mora do locador, atenta a falta de fixação, por acordo ou pela via judicial, do prazo a que se reporta o nº 2 do art. 777 do CC.

VII - Constitui facto notório, cujo conhecimento não se mostra vedado a este Supremo, que o critério legal de actualização anual das rendas redunda em facto impeditivo de uma actualização em valores pecuniários minimamente aceitáveis, obstaculizante da atribuição ao senhorio de uma rentabilidade económica susceptí-vel de lhe permitir a realização de obras de renovação, como as efectuadas pelos inquilinos no locado.

VIII - Para além dessas obras se terem traduzido, não em reparações, mas na completa renovação de várias das assoalhadas do arrendado, excedendo o puro âmbito do dever de manutenção da coisa locada imposto ao locador, também a manifesta disparidade entre o valor da renda (Esc. 16.2003$00 à data da pro-positura da acção) e o quantitativo peticionado a título de obras realizadas (11.996,98 Euros) é demonstrativa de uma absoluta falta de equivalência entre tais atri-buições patrimoniais que impendem sobre o inquilino e o senhorio.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 2361/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Acção de reivindicação - Contrato de arrendamento

I - Invocando a recorrida como causa de pedir a titularidade um direito de propriedade sobre o imóvel reivindicado, e não a existência, relativamente a este, de qualquer relação de arrendamento, a acçãode rei-vindicação (art. 1311 do CC) é o meio processual idóneo e adequado ao reconhecimento do invocado direito de propriedade, bem como o local próprio para a argui-ção e prova por parte da recorrente da titularidade e qualquer contrato legitimador da detenção do prédio em causa (art. 342, nº 2, do CC).

II - Deve aplicar-se, por analogia, o art. 824, nº 2, do

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CC no que respeita à caducidade do arrendamento na sequência da venda judicial de imóvel sobre o qual in-cida uma garantia real, cuja constituição, em benefício do respectivo adquirente, haja tido lugar em momento anterior à celebração do contrato de arrendamento.

III - A finalidade desse normativo é pôr cobro a todos os direitos que, traduzindo-se num ónus quanto aopotencial aproveitamento do bem objecto de garantia real anteriormente registada, hajam sido constituídos em momento posterior em benefício de terceiros, já que só dessa forma se assegura um maior valor venal ao referido bem, obviando ao previsível prejuízo do credor que decorreria da prática de actos do devedor tendentes à oneração do referido bem.

IV - Não sendo taxativa a enumeração constante do art. 1051 do CC, são, portanto, inoponíveis ao comprador em execução judicial, as relações locativas constituídas posteriormente ao registo de qualquer garantia real constituída em benefício daquele.

V - Sendo a recorrida titular de várias hipotecas so-bre o prédio reivindicado, todas registadas em momento anterior ao da celebração do contrato de arrendamento invocado pela recorrente, decorre, em conformidade com o preceituado no nº 2 do art. 824 do CC, que com a aquisição, através dearrematação judicial por parte da recorrente do referido imóvel, se extinguiram – por caducidade “ipso iure” – os efeitos decorrentes da cele-bração do invocado contrato de arrendamento, assim procedendo a acção de reivindicação.

CIVILReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 1685/04 - 2.ª SecçãoAssunto: Acção inibitória

I - É nula a cláusula contratual geral constante das apólices de seguros facultativos comercializados pela ré referidos nos autos – assim concebida: «Qualquer das partes pode, a todo o tempo, reduzir ou resolver o contrato, mediante aviso registado, ou por outro meio do qual fique registo escrito, à outra parte, com ante-cedência mínima de 30 dias em relação à data em que a redução ou resolução produz efeitos.» –, por verificar uma das hipóteses desenhadas na al. b) do nº 1 do art. 22 do DL nº 446/85, de 25-10, ao permitir à predispo-nente a resolução do contrato independentemente de qualquer violação do mesmo pelo segurado.

II - É igualmente nula, por consubstanciar uma cláusula penal desproporcionada na acepção da al. c) do art. 19 do citado diploma, a cláusula contratual geral incluída nas mesmas apólices do seguinte teor: «Quando a redução ou resolução se operar por iniciativa do tomador de seguro, a seguradora poderá reter, para

fazer face aos custos fixos, 50% do prémio correspon-dente ao tempo não decorrido, excepto se a resolução derivar da não aceitação das condições exigidas pela seguradora, face ao agravamento do risco, caso em que o tomador de seguro será reembolsado da totalidade do prémio correspondente ao período de tempo não decorrido.» Com efeito, a retenção de 50% do prémio apresenta-se na situação hipotizada manifestamente excessiva para fazer face a custos fixos da apólice, quando estes representam segundo a experiência comum uma pequena percentagem do prémio total, cuja parte mais substancial se destina à cobertura do risco de sinistro.

III - A acção inibitória assume neste aspecto feição de declaração negativa, mercê da qual incumbe ao réu o ónus probatório dos factos constitutivos do direito que se arroga (art. 343, nº 1, do CC), ou seja, no caso “sub iudicio”, a prova dos factos reveladores ou inte-gradores da proporcionalidade da cláusula, a saber, custos acrescidos relativamente aos apontados pelo autor como abrangidos no prémio do seguro, os quais exactamente não foram provados pela ré, em termos de possibilitarem qualquer quantificação que lhe seja favorável.

IV - A alteração introduzida “motu” proprio pela ré seguradora na redacção das cláusulas contratuais abusivas, de forma a expurgá-las dos vícios arguidos, não determina a inutilidade superveniente da lide, posto que, conforme o art. 32, nº 1, do DL nº 446/85 - redacção do DL nº 220/95, de 31-08 –, apenas da de-cisão inibitória com trânsito resulta a tutela cautelar definitiva dos interesses a proteger.

COMERCIALReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-10-2005Revista nº 527/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Falência - Acção executiva - Fiança

I - A extinção da instância da acção executiva contra a sociedade, imposta pela respectiva falência, não acar-reta ou conduz à extinção da obrigação assumida pelos “seus” fiadores (co-executados), responsabilidade essa que é, além do mais, solidária, e que lhes impõe que satisfaçam o crédito afiançado na sua globalidade, por-quanto, face à natureza do instituto da fiança, ficaram eles colocados na situação de pessoalmente obrigados perante o credor, pelo quantum correspondente ao valor que a dívida afiançada detinha ab initio.

II - E se é certo que a obrigação do fiador não pode ser superior à do devedor principal, também o é que, eles, fiadores, beneficiam do facto (como se verifica “in casu”) de verem a sua obrigação “diminuída”, caso parte da dívida vier a ser satisfeita.

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Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-10-2005Revista nº 1058/05 - 2.ª SecçãoAssunto: Acções ao portador - Acções nominativas

I - No caso presente, o autor demandou as rés, impugnando a qualidade de accionista (da 1.ª ré) no capital social da “Público”; o pedido formulado consiste na declaração de nulidade do contrato de aquisição de acções, bem como dos actos que esta 1.ª ré praticou, in-vocando aquela qualidade (de accionista da “Público”); o que o autor pretende consiste, no essencial, na negação da qualidade de accionista no capital da “Público” que a 1.ª ré se arroga.

II - Consequentemente, estamos perante uma acção declarativa de simples apreciação negativa; neste tipo de acção, em conformidade com o disposto no nº 1 do art. 343 do CC, incide sobre o réu o ónus da prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.

III - No que concerne à transmissão, fora da bolsa, de acções nominativas ou ao portador, há que observar as formalidades estabelecidas nos art.s 326, nº 1, e 327, nº 1, do CSC; tais formalidades são “ad substanciam”, constitutivas, essenciais para que se dê a transmissão da participação social ou das acções.

IV - Ora, na situação em apreço não lograram as rés provar que qualquer daquelas formalidades tenham sido observadas no contrato de transmissão de acções; logo, o referido contrato é nulo (art. 294 do CC).

CONTRATOSReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25-10-2005Revista nº 3083/05 - 1.ª SecçãoAssunto: Contrato de empreitada - Defeito da obra

I - Se na execução da empreitada houve defeitos construtivos (tomando este termo no sentido de se compreenderem dentro do que o concreto contrato de empreitada obrigava), ao empreiteiro competia a sua eliminação (existirem significa o não respeito das regras da arte e ou das especificações técnicas, que o cumprimento foi defeituoso).

II - Existindo defeitos, provando-se a sua existência, presume-se a culpa do empreiteiro, ainda que, na exe-cução da obra, este tenha sido fiel ao projecto da obra ou ao caderno de encargos – é que além desse respeito se lhe exige a conformidade com as regras da arte e as normas técnicas exigidas em matéria de construção.

III - Porque técnico da arte, tem a obrigação de avisar o dono da obra dos defeitos que note no projecto ou no caderno de encargos, quer antes de iniciada a obra quer durante a sua execução, podendo, inclusive, responder pelos defeitos que não descubra mas que lhe incumbisse descobrir e apontar.

IV - Embora não prevendo o projecto da obra a dre-nagem do chão mas sendo necessária realizá-la, por a

imporem as regras da arte e as normas de segurança e salubridade públicas, o empreiteiro, ao efectuá-la, estava a cumprir uma obrigação sua; a culpa (presun-tiva) que lhe possa ser assacada reside no modo como cumpriu essa sua obrigação.

V - Face ao sinalagma, quer o genético (o na sua origem) quer o funcional (o reflectido ao logo de toda a sua execução), ao empreiteiro, que cumpra com defeitos em dimensão que se não possam considerar pequenos, não assiste direito a exigir o respectiva contraprestação enquanto não os corrigir.

FAMÍLIAReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-10-2005Agravo 2406/05 - 1.ª SecçãoAssunto: Acção de divórcio - Causa de pedir

I - Tudo o que não seja pela lei expressamente atri-buído à competência dos tribunais de família em acções de divórcio, sai da competência destes tribunais e cai por isso na competência dos tribunais de competência genérica: art. 77 da LOFTJ.

II - Não são razões relacionadas com a impossi-bilidade de cumulação de pedidos, derivada da di-versidade da forma de processo, que hoje se podem eventualmente considerar afastadas com a reforma processual de 1995/96 (alterações aos art.s 31 e 470 e aditamento do art. 265-A do CPC, introduzidas pelos DL 329-A/95 e 180/96), mas sim razões relacionadas com a competência material dos tribunais de família, que impossibilitam estes de conhecerem do pedido de indemnização pelos danos resultantes dos factos ilícitos que constituem a causa de pedir na acção de divórcio: art. 31, nº 1, parte inicial do CPC, por remissão do art. 470, nº 1, do mesmo CPC.

III - A incompetência material é absoluta, não po-dendo ser postergada, ladeada ou iludida por razões processuais.

IV - Não ocorre, na interpretação restritiva do art. 1792 do CC (que é tradicional, pelo menos até à reforma processual de 95/96), qualquer inconstitucionalidade, como o demonstrou o TC no acórdão nº 118/01, de 23-03-2001, no DR, 2.ª série, de 24-04-2001, sendo que a específica razão do que aqui se decide não é a interpre-tação restritiva do dito art. 1792, mas as normas dos art.s 81 e 77 da LOFTJ e do art. 31, nº 1, do CPC.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 1991/05 - 1.ª SecçãoAssunto: Divórcio por mútuo consentimento - Partilha dos bens do casal

I - A declaração de que não existiam bens comuns a partilhar, feita no âmbito do disposto no art. 1419, nº

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1, do CPC, com o manifesto fim de viabilizar o divórcio por mútuo consentimento, não impede que se instaure processo de inventário.

II - No âmbito do divórcio por mútuo consentimento, a declaração dos cônjuges quanto aos bens comuns a partilhar não se destina a fixar os bens objecto de fu-tura partilha, uma vez que, no decorrer do processo de inventário, novos bens podem ser relacionados, como podem ser excluídos alguns dos declarados no requeri-mento inicial de divórcio por mútuo consentimento.

III - Tal declaração dirige-se ao Conservador, não constituindo uma confissão, pois não há aqui o reco-nhecimento de qualquer facto desfavorável a uma das partes e que favoreça a outra.

IV - Mesmo que se entenda tratar-se de uma confis-são, sempre seria uma declaração de livre apreciação pelo juiz e não um meio de prova vinculada (art. 358, nº 4, do CPC).

V - Sendo os certificados de aforro titulados por ambos os cônjuges, qualquer um deles tem poderes para os levantar, o que constitui um acto de simples administração ordinária.

VI - Mas a destinação dos valores, mormente a apro-priação dos mesmos, na sua totalidade, em proveito próprio, traduz-se num acto de disposição para o qual é necessário o consentimento de ambos os cônjuges.

VII - Estando consumado o divórcio, tem o ex-cônju-ge o direito a reclamar o valor da metade do dinheiro apropriado pelo outro, seja por força do disposto no art. 1681, nº 1, seja por força do disposto no nº 4 do art. 1682, direito a exercer pela forma prevista no art. 1689, todos do CC.

VIII - Formulando o Autor pedido de condenação dos Réus a reconhecer que a Ré, sua ex-mulher, procedeu ao levantamento de certificados de aforro no valor de 24.880,88 Euros, quantia da qual exclusivamente se apoderou, bem sabendo que tal importância fazia parte do património comum do casal e nunca fora partilhada, não se mostra violado o disposto no art. 668, nº 1, do CPC, se a Ré foi condenada a pagar ao Autor a dívida de compensação equivalente a metade dos montantes levantados dos certificados de aforro de que ela abusi-vamente se apoderou.

IX - Na substância das coisas e considerando a econo-mia do pedido, a condenação em causa não ultrapassa, em quantidade ou qualidade, o que foi pedido, já que o seu resultado útil é exactamente o mesmo que o Autor visava conseguir. É irrelevante a “forma” da condena-ção, desde que, substancialmente se contenha dentro dos limites do pedido.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20-10-2005Revista nº 2152/05 - 7.ª SecçãoAssunto: Acção de divórcio - Cumulação de pedidos

I - Uma vez que a acção de alimentos segue a forma

de processo comum e a acção de divórcio é um processo especial regulado nos art.s 1407 e 1408, a dedução na acção de divórcio do pedido de alimentos definitivos não era admissível, em vista da falta de identidade de formas processuais exigida pelo nº 1 do art. 470, todos do CPC.

II - O nº 2 desse artigo integra actualmente norma excepcional introduzida pela reforma processual de 1995/96, que veio permitir a cumulação do pedido de alimentos definitivos na acção de divórcio litigioso.

III - Nada igualmente impede a dedução do pedido de atribuição definitiva da casa de morada da família na pendência, e como dependência, de processo de divórcio litigioso, a processar por apenso, consoante art. 1413 do CPC, que regula o competente processo incidental de jurisdição voluntária, e tal assim com vista, até, a que o juiz, sobrestando nessa decisão até ao decretamento do divórcio, possa decidir, no mesmo momento temporal, da procedência da acção de divórcio e da atribuição da casa de morada da família a um dos cônjuges nos termos do art. 1793 do CC ou da transferência do direito ao arrendamento nos termos do art. 84 do RAU.

IV - Como decorre dos art.s 47, nº 1, 692, nº 2, als. c) e d), e 723 do CPC, as providências cautelares especí-ficas da acção de divórcio previstas no art. 1407, nº 7, do CPC, podem ser executadas imediatamente.

V - Requerido na petição inicial o decretamento das providências cautelares específicas da acção de divórcio previstas no art. 1407, nº 7, destinadas a vigorar e manter-se na pendência dessa acção, isto é, até ao trânsito em julgado da decisão final, a atribui-ção definitiva da casa de morada da família importa condenação além do pedido proibida pelo art. 661, nº 1, e integrante da nulidade prevenida no art. 668, nº 1, al. e), todos do CPC.

VI - Decisivo, à luz do disposto no nº 2 e na parte final do nº 3 do art. 9 do CC, o inciso, no art. 612 do CPC, “sempre que o julgue conveniente”, está-se perante poder discricionário, insusceptível de sindicância pelas instâncias superiores, consoante art. 679 do CPC.

VII - Mesmo quando considerado que, ao invés do que o inciso referido inculca, o art. 612 CPC institui poder vinculado, ou seja, poder-dever, cujo não exer-cício está sujeito à censura dos tribunais de recurso, a inspecção judicial é diligência que, em vista do disposto no art. 266 do CPC, só deve deferir-se quando julgada realmente necessária ou conveniente.

PENALReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-10-2005Proc. nº 2421/05 - 3.ª SecçãoAssunto: Tráfico de menor gravidade

I - Para efeitos de enquadramento da conduta do

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recorrente no art. 25.º, al. a), do DL 15/93, de 22-01, im-porta atender fundamentalmente à natureza e quanti-dades de estupefacientes vendidos. Daí que não possam ser relevadas para esse efeito as afirmações genéricas sobre o tráfico, como as que têm por objecto as entregas de estupefacientes a consumidores sem especificação do número de entregas e quantidades, ainda que de forma aproximada, e natureza dos estupefacientes.

II - Havendo que atender apenas, neste caso, à detenção pelo recorrente, na sua residência, de 1,458 g de heroína, distribuída por sete embalagens, e não obstante se tratar de um estupefaciente pertencente ao grupo das chamadas «drogas duras», de acentuada danosidade para a saúde dos consumidores, a reduzida quantidade do mesmo implica necessariamente uma acentuada diminuição da ilicitude, integrando a condu-ta do recorrente o crime de tráfico de menor gravidade p. e p. pelo art. 25.º, al. a), do DL 15/93, e não pelo art. 21.º, nº 1, do mesmo diploma, que corresponde à matriz da punição dos crimes de tráfico de estupefacientes, pensada para os médios e grandes traficantes.

III - Dentro da moldura penal correspondente àquele ilícito, de prisão de 1 a 5 anos, e considerando que:

- não se provaram circunstâncias que deponham a favor do recorrente;

- o recorrente tinha 27 anos de idade à data dos factos;

- não tem actividade profissional regular, realizando esporadicamente serviços como «segurança»;

- constam do seu registo criminal cinco condenações criminais, entre 1999 e 2004, uma das quais por tráfico de estupefacientes, suspensa na sua execução e já de-clarada sem efeito, três por ofensas corporais, e outra por condução sem habilitação legal;

- resulta da matéria de facto provada que a conduta do recorrente, no plano subjectivo, é merecedora de um acentuado juízo de censura, não obstante a referida di-minuição do grau de ilicitude em função da quantidade de estupefaciente objecto do tráfico;

- prementes razões de prevenção geral e especial são de ter em conta neste tipo de criminalidade; mostra-se adequada a pena de 2 anos e 6 meses de prisão, cuja execução não é de suspender dado resultar do exposto que a conduta anterior do arguido e o seu modo de vida não permitem formular um prognóstico favorável sobre o seu comportamento futuro.

IV - Estando em causa objectos sem outra finalidade de aplicação que não seja a de servirem de instrumen-tos de agressão, não basta a mera circunstância de poderem ser utilizados de forma a causar a morte para se considerarem como armas proibidas.

V - É necessário para tal que o objecto, pelas suas características, ao ser manuseado pelo agente, sem recurso a uma anormal forma de utilização, designada-mente pela multiplicidade de actos agressivos ou excep-

cional violência de um deles, seja apto a desencadear o processo letal. O objecto pode ser adequado a produzir ofensas corporais graves, mas para constituir uma arma proibida tem de comportar um perigo acrescido, adequado a causar a morte em condições de normal utilização em função das suas características: de outro modo teria de se considerar que uma simples pedra, de pequenas dimensões, utilizada em pancadas fortes e repetidas em zona vital do corpo, designadamente na cabeça, seria um instrumento de agressão letal.

VI - Um dispositivo eléctrico atordoante, utilizado pelas forças policiais de alguns países como instrumento punitivo, ao nível da ofensa corporal, destina-se a pro-vocar choques eléctricos cujo efeito é o atordoamento de pessoas, pelo que, não constando dos autos elementos caracterizadores desse objecto que apontem para a adequação a produzir a morte, não pode ser considerado arma proibida.

VII - Um bastão, sendo um instrumento vocacionado para ser utilizado para ofensas corporais, também não se enquadra nesse conceito.

VIII - Uma matraca, constituída por dois segmentos de madeira, de 20 cm cada, unidos por uma corrente de aço com 13 cm de comprimento, está vocacionada para ser brandida em golpes de grande impacto, dadas as suas características, sendo inerente à sua utilização numa zona vital do corpo uma razoável probabilidade de causar lesões letais, devendo por isso considerar-se arma proibida.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-10-2005Proc. nº 2253/05 - 5.ª SecçãoAssunto: Burla informática e nas comunicações

I - O direito penal tem por missão proteger bens jurídicos indispensáveis para a convivência humana nacomunidade, podendo os preceitos penais tutelar um ou vários bens jurídicos.

II - No crime de burla informática do art. 221.º do CP o bem jurídico protegido é não só o património - mais concretamente, a integridade patrimonial - mas também os programas informáticos, o respec-tivo processamento e os dados, na sua fiabilidade e segurança.

III - Se, depois de roubarem uma carteira, os agentes descobrem nela um cartão multibanco e respectivo có-digo e decidem então utilizá-lo até esgotarem o saldo, o que executam, sem estarem autorizados, cometem um crime de roubo e, em concurso real, um crime de burla informática.

IV - No caso há igualmente uma autonomia e plura-lidade de resoluções que sempre afastaria a consunção da burla informática pelo roubo.

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Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-10-2005Proc. nº 3130/05 - 5.ª SecçãoAssunto: Extradição – Prescrição

I - Por força do disposto no art. 55.º, nº 2, da Lei 144/99, de 31-08, a oposição do extraditando à am-pliação só pode fundamentar-se em não ser o detido a pessoa reclamada ou em não se verificarem os pressu-postos da extradição.

II - Portanto, o processo especial de extradição não é o adequado para o exercício do competente direito de defesa quanto à acusação de que o extraditando seja objecto, antes e só, para o exercício do competente direito de oposição à pretensão de extradição, ou seja, a fase judicial do processamento da extradição passiva tem a finalidade de permitir ao extraditando discutir, contra-ditoriamente, o pedido de extradição de que é objecto.

III - No processo de ampliação de extradição não deve proceder-se à renovação de todo o processo de extradi-ção anteriormente findo com decisão transitada.

IV - Em matéria de prescrição vigora o princípio da aplicação do direito do Estado requerente – cf. arts. 8.º, nº 1, al. c), e 12.º, nº 1, al. a), da Lei 144/99.

V - A admissão e a concessão da extradição levam implícito - na decorrência da própria aceitação das ga-rantias oferecidas - o seu condicionamento (resolutivo) ao cumprimento, pelo Estado requisitante, de tais ga-rantias, condicionamento que, posto que não explícito, conferirá ao Estado requisitado (oficiosamente ou a pedido do interessado), em caso de inobservância, o direito de, oportunamente (e pelos apropriados ca-nais diplomáticos ou judiciários), exigir a devolução - cf. acórdão deste Supremo de 01-03-2001, Proc. nº 606/2001 – 5.ª Secção.

PROCESSO CIVIL Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-10-2005Revista nº 2404/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Junção de documento - Nulidade sanável

I - Não tendo a 1.ª instância ordenado a junção da tradução de documento, como resulta do art. 140, nº 1, do CPC, que o devia ter sido oficiosamente, ou seja, mesmo sem requerimento da parte, verificou-se uma omissão de um acto imposto por lei susceptível de in-fluir na decisão da causa, o que integra nulidade nos termos do art. 201, nº 1, do CPC.

II - Só que tal nulidade tem carácter secundário e não principal, encontrando-se contemplada, quanto ao regime de arguição, no disposto no art. 205 do CPC, pelo que deveria ter sido arguida, quando muito, até ao termo do acto das respostas (dito art. 205, nº 1, primeira parte), ou seja, até ao momento em que o digno man-

datário da ora recorrente tomou a palavra que lhe foi concedida parafins de reclamação quanto às mesmas, o que, como se vê da referida acta, não fez, pelo que tem tal nulidade de se considerar sanada.

PROPRIEDADE INDUSTRIALReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 2596/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Denominação social - Princípio da novidade

I - O princípio da novidade consagrado no art. 3, nº 1, do DL 129/98, de 13-05, visa assegurar às firmas a diferenciação relativamente a outros sinais distintivos previamente registados, de modo a evitar situações de confusão ou erro.

II - O critério de apreciação do risco de erro ou con-fusão é o do cidadão comum, medianamente ponderado e atento, um consumidor cauteloso ou um fornecedor avisado.

III - Perante tais princípio e critério, não existe risco de erro ou confusão entre a designação social da recor-rida “Hot Pizza - Video e Hotelaria, Lda.” e as marcas previamente registadas “Pizza Hut”.

RESPONSABILIDADE CIVILReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 04-10-2005Revista nº 2284/05 - 6.ª SecçãoAssunto: Acidente de viação - Limite da indemnização

I - A indemnização fundada em acidente de viação, quando não haja culpa do responsável, tem como limi-te máximo o capital mínimo do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, nos termos do artigo único, do DL 59/04, de 19 de Março.

II - Por força do AC UNIF JURISP nº 3/04, de 25-03-2004, o segmento do art. 508, nº 1, do CC, em que se fixam os limites máximos da indemnização a pagar aos lesados de acidente de viação causados por veículos sujeitos ao regime do seguro obrigatório automóvel, nos casos em que não haja culpa do responsável, foi tacitamente revogado pelo art. 6 do DL 522/85, de 31 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo DL 3/96, de 25 de Janeiro.

III - A alteração do art. 6 do DL 522/85, pelo citado DL 3/96 (que veio elevar para 120.000.000$00 o capital mínimo obrigatoriamente seguro por sinistro), produz efeitos desde 1 de Janeiro de 1996, aplicando-se a nova redacção introduzida neste art. 6 aos contratos vigentes com capital inferior a 120.000.000$00.

IV - Assim, a partir de 01-01-1996, ficaram abolidos

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55 Vida Judiciária Maio/2006

os limites máximos de indemnização, então previstos no art. 508, nº 1, do CC.

V - O AC UNIF JURISP nº 3/04 tem natureza in-terpretativa, pelo que se aplica retroactivamente a um acidente ocorrido em 20-03-1997.

TRABALHOReferências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 1758/05 - 4.ª SecçãoAssunto Educador de infância

I - Por ensino infantil entende-se o ensino pré-escolar, que é destinado a crianças com idades com-preendidas entre os três anos e o ingresso no ensino básico (art. 3.º da Lei nº 5/97, de 10-02, Lei Quadro da Educação Pré-escolar).

II - Daí que a actividade das creches, que apenas recebem crianças até aos três anos de idade, e é uma actividade eminentemente social, não se integre no ensino infantil, não fazendo, por isso, parte do ensino pré-escolar.

III - O CCT outorgado entre a AEEP – Associação de Representantes de Estabelecimentos do Ensino Particular e a FNE – Federação Nacional dos Sindi-catos de Educação e outros, ou o CCT outorgado entre a referida AEEP e a FENPROF – Federação Nacional dos Professores e outros (publicados, respectivamente, no BTE, 1.ª série, n.ºs 34 e 37, de 15 de Setembro de 1990 e 8 de Outubro de 1990), que foram objecto de PE (publicada no BTE, nº 5, de 08-02-91), apenas abran-gem a actividade do ensino particular e cooperativo em todos os graus de ensino, a partir do ensino infantil, excluindo do seu âmbito de aplicação a actividade ministrada pelas creches.

IV - Consequentemente, embora a autora possua a habilitação profissional (curso e estágio) de educadora de infância, e desempenhe as funções de educadora de infância, sendo as mesmas exercidas na creche da ré, que acolhe crianças entre os 3 meses de idade e os 3 anos, não lhe é aplicável qualquer dos referidos CCT.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11-10-2005Revista nº 784/05 - 4.ª SecçãoAssunto TIR - Regulamentação colectiva

I - É admissível – quer por acordo entre a entidade patronal e o trabalhador, quer unilateralmente através de um compromisso vinculativo para o empregador – a alteração da retribuição fixada em instrumento de regulamentação colectiva, desde que dela resulte um regime mais favorável para o trabalhador.

II - Sendo invocada pela entidade patronal a al-teração da retribuição fixada em instrumento de re-

gulamentação colectiva – porque se trata de matéria modificativa do direito invocado pelo trabalhador (art. 342.º, nº 2, do CC) – caberá àquela o ónus de provar-não só a existência de um acordo quanto à prática, na empresa, de um esquema remuneratório especial, em substituição do regime retributivo consignado no dito instrumento, como também o facto daquele regime (decorrente da alteração) ser mais vantajoso do que este (osubstituído).

III - Se a entidade patronal não lograr demonstrar um desses requisitos, o acordo de alteração/subs-tituição do regime remuneratório estabelecido no CCT aplicável ao caso é nulo, com as consequências previstas no nº 1 do art. 289.º do CC (para a ré, a obrigação de pagar ao autor tudo o que lhe era devido nos termos da respectiva condenação colectiva; para o autor, a obrigação de restituir à ré tudo o que dela recebeu nos termos do regime remuneratório efecti-vamente praticado).

IV - Tendo sido acordado entre autor e ré, aquando da celebração do contrato de trabalho, que para além da remuneração base mensal fixa e subsídio de férias e de Natal, a ré pagaria ao autor 13$00 por cada qui-lómetro por ele percorrido e tendo a ré, em recibos de vencimento, discriminado pagamentos efectuados ao abrigo da cláusula 74.ª, nº 7, do CCT (celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU publicado no BTE, 1.ª série, nº 9, de 8 de Abril de 1980, com revisão publicada no BTE, 1.ª série, nº 16, de 29 de Abril de 1982), era licito à 1.ª instância extrair a ilação de facto de que o pagamento ao abrigo desta cláusula não se encontrava incluído na-quele pagamento ao quilómetro e, consequentemente, condenar a ré em tal pagamento.

Referências: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-10-2005Revista nº 1761/05 - 4.ª SecçãoAssunto: Violação do direito a férias

I - São dois os requisitos do direito à indemnização por violação do direito a férias: que o trabalhador não as tenha gozado e que tal tenha acontecido por a isso ter obstado, sem fundamento válido, a entidade empregadora.

II - A simples não marcação das férias não é suficien-te para concluir que o empregador obsto ao seu gozo.

III - O termo obstar exige mais do que a simples inércia do empregador na concessão do gozo de férias; pressupõe uma atitude voluntária e consciente nesse sentido.

IV - Compete ao autor alegar e provar aqueles dois factos, por serem factos constitutivos do direito àquela indemnização.

V - O facto das escalas de organização dos turnos não conterem os períodos de férias dos respectivos tra-balhadores não permite concluir que eles não gozaram férias e muito menos que tenham sido impedidos de o fazer pela entidade empregadora.

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56Vida Judiciária Maio/2006

Novo regime das obrigações hipotecárias

O regime aplicável às obrigações hipotecárias e às instituições de crédito hipotecário, bem como o regime aplicável às obrigações sobre o sector público, foi recentemente aprovado.

Este diploma altera o regime legal das obrigações hipotecárias, em vigor desde 1990, visando aproxi-mar o regime deste instrumento financeiro à figura das covered bonds, ou seja, obrigações em que o serviço da dívida é assegurado por uma carteira de activos específica em lugar do património total da sociedade mutuária. A característica mais importan-te destas obrigações é o seu baixo risco, baseado no privilégio creditório de que gozam os seus titulares relativamente aos activos de suporte.

Outra inovação deste diploma consiste no alar-gamento do leque de entidades habilitadas a emitir obrigações hipotecárias, por forma a oferecer uma maior garantia de segregação dos créditos afectos a essas obrigações.

Assim, introduz-se uma nova espécie de instituição de crédito - as instituições de crédito hipotecário –, também utilizada em outros Estados membros da União Europeia, cujo objecto consiste na concessão e aquisição de créditos hipotecários, ou de créditos sobre, ou com a garantia de, administrações centrais

ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia, para emissão de obriga-ções hipotecárias ou de obrigações sobre o sector públi-co, respectivamente. De referir, ainda o alargamento do âmbito dos activos de suporte a créditos sobre a Administração Central ou autoridades regionais e locais, com a criação das «obrigações sector público».

O diploma prevê, também, a possibilidade, de outros activos serem afectos às obrigações hipotecá-rias, designadamente depósitos bancários ou outros activos de baixo risco e elevada liquidez.

Com o intuito de conferir maior segurança ao regime, institui-se a necessidade um auditor inde-pendente que supervisiona o cumprimento desta le-gislação, bem como se atribui poderes de supervisão e regulamentação ao Banco de Portugal.

Fica revogada a anterior legislação existente nesta matéria, concretamente o DL n.º 125/90, de 16.4, que veio regular pela primeira vez, na nossa ordem jurídica as denominadas obrigações hipotecárias.

Nesta edição transcrevemos o Decreto-Lei n.º 59/2006, de 20.30, que estabelece o novo regime aplicável às obrigações hipotecárias e às instituições de crédito hipotecário, bem como às obrigações sobre o sector público.

Decreto-Lei n.º 59/2006, de 20 de Março

O Decreto-Lei n.º 125/90, de 16 de Abril, veio regular pela primeira vez, na nossa ordem jurídica, as denominadas obrigações hipotecárias, tendo sido posteriormente alterado pelos Decretos-Leis n.os 17/95, de 27 de Janeiro, e 52/2006, de 15 de Março.

Este produto financeiro bem conhecido e já largamente utilizado em diversos Estados membros da União Europeia, com especial relevo na Alemanha, foi concebido com preocupações de desburocratização e flexibilidade.

Os desenvolvimentos ocorridos e a experiência entretanto colhida justificam a introdução de algumas alterações, tal como a possibilidade de utilização de instrumentos financeiros derivados para cobertura dos riscos cambiais, de taxa de juro ou de liquidez, ou ainda a possibilidade de utilização de outros activos.

Uma das principais inovações deste decreto-lei respeita ao alarga-mento dos créditos elegíveis, passando a permitir-se um instrumento financeiro que tenha por subjacente, em alternativa aos créditos hipotecários, créditos sobre, ou com garantia de, administrações centrais ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia. Neste caso, as obrigações assumem a denominação de «obri-gações sobre o sector público», sendo-lhes aplicável, com as necessárias adaptações, o mesmo regime das obrigações hipotecárias.

Outra inovação deste decreto-lei consiste no alargamento do leque de entidades habilitadas a emitir obrigações hipotecárias, por forma a oferecer uma maior garantia de segregação dos créditos afectos a essas obrigações.

Assim, introduz-se uma nova espécie de instituição de crédito – as instituições de crédito hipotecário –, também utilizada em outros Estados membros da União Europeia, cujo objecto consiste na concessão e aquisição de créditos hipotecários, ou de créditos sobre, ou com a garantia de, administrações centrais ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia, para emissão de obrigações hipotecárias ou de obrigações sobre o sector público, respectivamente.

Não se afasta, contudo, que, numa fase ulterior e em função da experiência entretanto adquirida, possa vir a ser ponderado um novo alargamento das entidades habilitadas a emitir este tipo de instrumentos financeiros com a criação de uma nova espécie de sociedade financeira vocacionada para a emissão de obrigações hipotecárias e de obrigações sobre o sector público.

Foram ouvidos o Banco de Portugal, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, o Instituto de Seguros de Portugal, a Ordem dos Revisores Oficiais de Contas e a Associação Portuguesa de Bancos.

Assim:Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição,

o Governo decreta o seguinte:

CAPÍTULO IDisposições gerais

Artigo 1.º - Âmbito1 - O presente decreto-lei estabelece o regime aplicável às obrigações

hipotecárias e às instituições de crédito hipotecário.2 - O presente decreto-lei estabelece ainda, nos termos do artigo

32.º, o regime aplicável às obrigações sobre o sector público.3 - A designação de «obrigações hipotecárias» ou de «obrigações

sobre o sector público» só pode ser utilizada relativamente às obrigações reguladas nos termos previstos no presente decreto-lei.

Artigo 2.º - Entidades emitentesApenas podem emitir obrigações hipotecárias as instituições

de crédito legalmente autorizadas a conceder créditos garantidos por hipoteca que disponham de fundos próprios não inferiores a (euro) 7 500 000.

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57 Vida Judiciária Maio/2006

Artigo 3.º - Privilégio creditório1 - Os titulares de obrigações hipotecárias gozam de privilégio

creditório especial sobre os créditos hipotecários que lhes subjazem, bem como sobre os outros activos previstos no artigo 17.º, com precedência sobre quaisquer outros credores, para efeitos de reembolso do capital e recebimento dos juros correspondentes às obrigações hipotecárias.

2 - As hipotecas que garantam os créditos referidos no número ante-rior prevalecem sobre quaisquer privilégios creditórios imobiliários.

3 - O privilégio referido no n.º 1 não está sujeito a registo.

Artigo 4.º - Afectação e segregação patrimonial

1 - Para garantia das obrigações hipotecárias, são afectos os créditos hipotecários que lhes subjazem, incluindo o produto de juros e reembolsos, bem como os outros activos previstos no artigo 17.º

2 - Os créditos hipotecários e outros activos afectos às obrigações hipotecárias, incluindo o produto dos respectivos juros e reembolsos, constituem património autónomo e não respondem por quaisquer dívidas da entidade emitente até ao pagamento integral dos montantes devidos aos titulares das obrigações hipotecárias.

3 - Os créditos hipotecários e outros activos que em cada momento integrem o património autónomo afecto às obrigações hipotecárias devem ser adequadamente registados em contas segregadas da enti-dade emitente e identificados sob forma codificada nos documentos das emissões.

4 - Do registo referido no número anterior devem constar, em relação a cada crédito, designadamente, as seguintes indicações:

a) Montante ainda em dívida;b) Taxa de juro;c) Prazo de amortização;d) Cartório notarial onde foi celebrada a respectiva escritura de

hipoteca, quando aplicável;e) Referências relativas à inscrição definitiva das hipotecas na

conservatória do registo predial.5 - A chave do código a que alude o n.º 3 fica depositada no

Banco de Portugal, o qual estabelece, por aviso, as condições em que os titulares de obrigações hipotecárias, em caso de incumprimento, podem ter acesso à mesma.

Artigo 5.º - Continuidade das emissões1 - Em caso de dissolução e liquidação da entidade emitente, os

créditos e os activos a que se refere o artigo anterior são separados da massa insolvente, tendo em vista a sua gestão autónoma, nos termos de procedimento a fixar por aviso do Banco de Portugal, até pagamento integral dos montantes devidos aos titulares das obrigações hipotecárias.

2 - Em caso de dissolução e liquidação da entidade emitente é igualmente separado da massa insolvente o produto dos juros e reembolsos dos créditos hipotecários e dos outros activos afectos às obrigações hipotecárias.

3 - Na situação a que se referem os números anteriores, e sem prejuízo do disposto nas condições de emissão, a assembleia de obrigacionistas referida no artigo 14.º pode deliberar, por maioria não inferior a dois terços dos votos dos titulares das obrigações hipotecárias, o vencimento antecipado destas obrigações, caso em que a entidade designada para a gestão dos créditos deve proceder à liquidação do património afecto às obrigações hipotecárias, nos termos previstos no aviso do Banco de Portugal referido no n.º 1.

4 - O disposto no presente artigo não produz quaisquer efeitos

sobre o pontual cumprimento da obrigação de pagamento de juros e reembolsos por parte dos devedores dos créditos hipotecários e dos outros activos afectos às obrigações hipotecárias.

CAPÍTULO IIInstituições de crédito hipotecário

Artigo 6.º - Instituições de crédito hipotecário

1 - As instituições de crédito hipotecário são instituições de crédito que têm por objecto social a concessão, aquisição e alienação de créditos garantidos por hipoteca sobre bens imóveis a fim de emitir obrigações hipotecárias.

2 - As instituições de crédito hipotecário podem também conceder, adquirir e alienar créditos sobre administrações centrais ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia e créditos com garantia expressa e juridicamente vinculativa das mesmas entidades, tendo em vista a emissão de obrigações sobre o sector público.

3 - As instituições de crédito hipotecário podem, acessoriamente, efectuar os actos de administração dos bens que lhes hajam sido restituídos em reembolso de créditos, bem como realizar as restantes actividades necessárias à prossecução do seu objecto.

Artigo 7.º - Outros recursos financeiros das instituições de crédito hipotecário

Para financiamento da sua actividade, as instituições de crédito hipotecário podem ainda:

a) Emitir papel comercial e obrigações de qualquer espécie nas condições previstas na lei e sem obediência aos limites fixados no Código das Sociedades Comerciais;

b) Obter financiamentos concedidos por outras instituições de crédito ou por instituições financeiras internacionais;

c) Contrair os financiamentos previstos nas alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 9.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

Artigo 8.º - Direito subsidiárioÀs instituições de crédito hipotecário é aplicável, em tudo o que não

esteja disposto no presente capítulo, o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e legislação complementar.

CAPÍTULO IIIEmissão de obrigações hipotecárias

Artigo 9.º - Formalidades da emissão1 - A emissão de obrigações hipotecárias deve ser objecto de

deliberação expressa do órgão de administração da entidade emitente, da qual constam as características das obrigações a emitir e as condições da emissão.

2 - A deliberação referida no número anterior pode incluir um programa que preveja várias emissões, desde que constem os elementos referidos no número anterior e o prazo máximo no qual serão emitidas as obrigações.

Artigo 10.º - Regime1 - À oferta pública ou particular de obrigações hipotecárias é

aplicável o disposto no Código dos Valores Mobiliários com as devidas adaptações.

2 - Não são aplicáveis à emissão de obrigações hipotecárias:

a) Sem prejuízo do disposto no artigo 14.º, o capítulo IV do título IV do Código das Sociedades Comerciais;

b) A alínea l) do artigo 3.º do Código do Registo Comercial.

Artigo 11.º - Modalidades de emissão1 - A emissão de obrigações hipotecárias pode ser efectuada de

forma contínua ou por séries.2 - À emissão de obrigações hipotecárias não é aplicável o disposto

no artigo 169.º do Código dos Valores Mobiliários.

Artigo 12.º - PrazoAs obrigações hipotecárias não podem ser emitidas com um prazo

de reembolso inferior a 2 anos nem superior a 50 anos.

Artigo 13.º - Mercado secundário1 - As obrigações hipotecárias podem ser admitidas à negociação em

mercado nos termos da legislação e regulamentação em vigor.2 - As obrigações hipotecárias são equiparadas a títulos cotados

em bolsas de valores nacionais para efeitos de composição das reservas das instituições de segurança social.

Artigo 14.º- Assembleia de obrigacionistas e representante comum

1 - É aplicável às emissões de obrigações hipotecárias ou obriga-ções sobre o sector público o disposto nos artigos 355.º a 359.º do Código das Sociedades Comerciais, com as especificidades constantes dos números seguintes.

2 - O representante comum dos obrigacionistas é inicialmente designado pelo órgão de administração da entidade emitente e é único para todas as emissões de obrigações hipotecárias ou sobre o sector público emitidas pela mesma entidade.

3 - Para além das entidades referidas no n.º 2 do artigo 357.º do Código das Sociedades Comerciais, pode ser representante comum dos obrigacionistas uma instituição de crédito ou outra entidade autorizada a prestar serviços de representação de investidores em algum Estado membro da União Europeia, desde que não se encontre em relação de domínio ou de grupo com a entidade emitente ou com a entidade cedente dos créditos.

4 - Os termos da designação prevista nos números anteriores são estabelecidos nas condições da emissão, designadamente no que respeita à remuneração do representante comum, aos custos e encargos inerentes ao desenvolvimento das suas funções, às despesas de convocação e realização de assembleias de obrigacionistas, aos limites aplicáveis à responsabilidade do representante comum e aos termos das responsabilidades que perante ele são assumidas pela entidade emitente de obrigações hipotecárias e demais intervenientes na emissão em causa.

5 - A assembleia de obrigacionistas delibera sobre a nomeação, remuneração e destituição do representante comum dos obrigacionistas, bem como sobre a alteração das condições iniciais da respectiva designação.

6 - A remuneração do representante comum, os demais custos e encargos inerentes ao desenvolvimento das suas funções e as despesas de convocação e realização de assembleias de obrigacionistas, quando incorridas com respeito pelas condições da emissão, são encargos do património autónomo correspondente às emissões de obrigações hipotecárias e beneficiam do privilégio creditório previsto no n.º 1 do artigo 3.º

7 - As condições da emissão podem estabelecer os poderes de representação dos obrigacionistas conferidos ao representante comum e a

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58Vida Judiciária Maio/2006

forma da sua articulação com a assembleia de obrigacionistas, podendo ser atribuídos ao representante comum poderes para:

a) Executar as deliberações da assembleia de obrigacionistas que tenham decretado o vencimento antecipado das obrigações em causa;

b) Exercer, em nome e representação dos obrigacionistas, os direitos que lhes sejam conferidos pelo presente decreto-lei ou pelas condições da emissão;

c) Representar os obrigacionistas em juízo, em qualquer tipo de acções.

Artigo 15.ºDeveres de informação sobre as emissõesO Banco de Portugal pode definir, por aviso ou instrução,

os termos em que lhe deve ser prestada informação sobre as emissões de obrigações hipotecárias, nomeadamente para fins estatísticos, sobre activos subjacentes e sobre a respectiva gestão dos riscos.

CAPÍTULO IVActivos subjacentes e regime prudencial

Artigo 16.ºActivos subjacentes

1 - Apenas podem ser afectos à garantia de obrigações hipo-tecárias:

a) Créditos pecuniários vincendos e não sujeitos a condição, que não se encontrem dados em garantia nem judicialmente penhorados ou apreendidos e de que sejam sujeitos activos as entidades emitentes, garantidos por primeiras hipotecas constituídas sobre bens imóveis destinados à habitação ou para fins comerciais e situados num Estado membro da União Europeia;

b) Os activos referidos no artigo seguinte.2 - O disposto na alínea a) do número anterior não obsta à

afectação de créditos garantidos por hipotecas de grau inferior desde que todos os créditos que beneficiem de hipoteca de grau superior sobre o mesmo imóvel sejam da titularidade do emitente e afectos à garantia da mesma emissão.

3 - Consideram-se ainda abrangidos na alínea a) do n.º 1 os créditos garantidos por fiança de uma instituição de crédito ou por adequado contrato de seguro, com contragarantia por hipoteca que reúna as condições indicadas nos números anteriores.

4 - O montante de um crédito hipotecário afecto à garantia de obrigações hipotecárias não pode exceder o valor das hipotecas, nem 80% do valor do bem hipotecado, no caso de imóveis destinados à habitação, nem 60% do valor do bem hipotecado, nos imóveis para fins comerciais.

Artigo 17.ºOutros activos

1 - Para além dos créditos pecuniários referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, podem ainda ser afectos à garantia de obrigações hipotecárias os seguintes activos:

a) Depósitos, no Banco de Portugal, de moeda ou títulos elegíveis no âmbito das operações de crédito do Eurosistema;

b) Depósitos à ordem ou a prazo constituídos junto de institui-ções de crédito com notação de risco igual ou superior a «A-» ou equivalente;

c) Outros activos que preencham simultaneamente requisitos de baixo risco e elevada liquidez, a definir por aviso do Banco de Portugal.

2 - As instituições de crédito referidas na alínea b) do número anterior não podem encontrar-se em relação de domínio ou de grupo com a entidade emitente.

3 - A soma do valor dos outros activos referidos no n.º 1 não pode exceder 20% do valor total dos créditos hipotecários e dos outros activos afectos à garantia das obrigações hipotecárias.

4 - Sem prejuízo da aquisição de novos créditos ou da amortização das obrigações hipotecárias, o produto do reembolso dos créditos e os respectivos rendimentos apenas podem ser aplicados nos outros activos referidos no presente artigo.

Artigo 18.º - Facilidades de crédito1 - Para fazer face a necessidades temporárias de liquidez, podem ser

contratadas linhas de crédito irrevogáveis que, em caso de necessidade, podem ser activadas, sendo estes fundos utilizados exclusivamente para pagamento de reembolsos e juros devidos no âmbito das emissões de obrigações hipotecárias.

2 - As facilidades de crédito referidas no número anterior apenas podem ser contratadas com instituições de crédito com notação de risco igual ou superior a «A-», ou equivalente.

Artigo 19.º - Limites prudenciais1 - O valor nominal global das obrigações hipotecárias em circulação

não pode ultrapassar 95% do valor nominal global dos créditos hipote-cários e dos outros activos afectos às referidas obrigações.

2 - O vencimento médio das obrigações hipotecárias em circulação não pode ultrapassar, em cada momento, o vencimento médio dos créditos hipotecários e dos outros activos que lhes estão afectos.

3 - O montante global dos juros a pagar em consequência de obrigações hipotecárias não deve exceder, em cada momento, o montante dos juros a receber referentes aos créditos hipotecários e aos outros activos afectos às obrigações hipotecárias.

4 - O Banco de Portugal pode estabelecer, por aviso, os termos para o cálculo dos limites referidos nos números anteriores, bem como outros limites ou condições e respectivo métodos de cálculo, nomeadamente em matéria de cobertura e gestão dos riscos.

5 - O Banco de Portugal estabelece ainda, por aviso, a ponderação a aplicar, para efeitos de cálculo do rácio de solvabilidade, aos elementos do activo representados por obrigações emitidas nos termos definidos no presente decreto-lei.

Artigo 20.º - Utilização de instrumentos financeiros derivados

1 - Exclusivamente para efeitos de cobertura de riscos, nomeadamen-te risco de taxa de juro, cambial ou de liquidez, podem ser realizadas operações sobre instrumentos financeiros derivados, os quais fazem parte integrante do acervo patrimonial afecto às respectivas obrigações hipotecárias e devem ser considerados para efeitos do apuramento dos limites e do registo referido no artigo 4.º

2 - As operações previstas no número anterior devem ser realizadas num mercado regulamentado de um Estado membro da União Euro-peia, num mercado reconhecido de um membro de pleno direito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), ou ter por contraparte instituições de crédito com notação de risco igual ou superior a «A-» ou equivalente.

3 - O privilégio creditório referido no n.º 1 do artigo 3.º é extensível às contrapartes das operações sobre instrumentos financeiros derivados previstas no n.º 1, relativamente aos créditos emergentes dessas operações.

4 - O Banco de Portugal pode definir, por aviso, os termos em que os instrumentos financeiros derivados são considerados para efeitos do apuramento dos limites estabelecidos no artigo anterior ou impor outras condições à utilização de instrumentos financeiros derivados.

5 - Do registo referido no n.º 3 do artigo 4.º devem também constar, em relação a cada instrumento financeiro derivado, designadamente, as seguintes condições:

a) Obrigações hipotecárias objecto de cobertura por esse instrumento;

b) Activo ou activos subjacentes a essas obrigações hipotecárias;c) Montante da operação;d) Identificação da contraparte;e) Data de início e data de vencimento.

Artigo 21.º - Regularização de incumprimentos

1 - Se, por qualquer causa, os limites referidos no n.º 4 do artigo 16.º e nos n.os 1 a 3 do artigo 19.º sejam, ou seja expec-tável que venham a ser, ultrapassados, a entidade emitente deve, de imediato, regularizar a situação, através de um ou mais dos seguintes procedimentos:

a) Afectação de novos créditos hipotecários, com ou sem substituição dos créditos hipotecários afectos às obrigações hipotecárias;

b) Aquisição no mercado secundário das obrigações hipotecárias;c) Afectação de outros activos previstos no artigo 17.º, respeitando

os limites estabelecidos.2 - As obrigações hipotecárias, enquanto estiverem na posse da

entidade que as emitiu, não gozam do regime previsto nos artigos 3.º e 4.º do presente decreto-lei.

3 - Podem permanecer afectos às obrigações hipotecárias créditos hipotecários que entrem em incumprimento em momento posterior à respectiva afectação enquanto esse incumprimento não for igual ou superior a 90 dias.

4 - Os créditos hipotecários afectos às obrigações hipotecárias só podem ser alienados ou onerados na medida em que a entidade emitente proceda à afectação de novos créditos hipotecários às obrigações em questão, nos termos do presente decreto-lei.

Artigo 22.º - Valor dos bens hipotecados1 - A determinação do valor dos bens hipotecados a que se refere

o n.º 4 do artigo 16.º e o n.º 3 do presente artigo é da exclusiva responsabilidade da entidade emitente, devendo a avaliação dos bens hipotecados ser efectuada nos termos a definir por aviso do Banco de Portugal.

2 - Na ausência de contrato de seguro adequado aos riscos inerentes à natureza do bem hipotecado efectuado pelo proprietário do mesmo, devem as entidades emitentes proceder à sua celebração, suportando, nesse caso, os respectivos encargos.

3 - O contrato de seguro a que se refere o número anterior deverá garantir, em caso de perda total, um capital que permita a reconstrução do bem hipotecado.

4 - A indemnização que eventualmente venha a ter lugar é directamente paga pela entidade seguradora ao credor hipotecário, até ao limite do capital do crédito hipotecário.

Artigo 23.º - AvaliaçãoO Banco de Portugal define, por aviso ou instrução, os métodos de

avaliação dos créditos hipotecários, dos activos previstos no artigo 17.º, dos instrumentos financeiros derivados previstos no artigo 20.º e das

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59 Vida Judiciária Maio/2006

obrigações hipotecárias, bem como a periodicidade da sua avaliação e o conteúdo e a sua forma de divulgação.

CAPÍTULO VCessão de créditos hipotecários

Artigo 24.º - Entidades cedentesPara os efeitos previstos neste decreto-lei, só as instituições de

crédito legalmente autorizadas a conceder créditos garantidos por hipoteca podem ceder créditos.

Artigo 25.º - Créditos susceptíveis de cessãoSó podem ser objecto de cessão os créditos cuja transmissibilidade

não esteja sujeita a restrições legais ou convencionais.

Artigo 26.º - Deliberação de cessão1 - As cessões de créditos devem ser objecto de deliberação expressa

do órgão de administração da entidade cedente.2 - As deliberações previstas no número anterior têm a validade

de seis meses, caducando no termo desse prazo.

Artigo 27.º - Efeitos da cessão1 - A cessão de créditos produz efeitos em relação aos respectivos

devedores no momento em que se tornar eficaz entre o cedente e o cessionário, não dependendo do conhecimento, aceitação ou notificação desses devedores.

2 - Dos meios de defesa que lhes seria lícito invocar contra o cedente, os devedores dos créditos objecto de cessão só podem opor ao cessionário aqueles que provenham de facto anterior ao momento em que a cessão se torne eficaz entre o cedente e o cessionário.

3 - Para os efeitos previstos no presente decreto-lei, a cessão de créditos respeita sempre as situações jurídicas de que emergem os créditos objecto de cessão e todos os direitos e garantias dos devedores oponíveis ao cedente dos créditos ou o estipulado nos contratos celebrados com os devedores dos créditos, designadamente quanto ao exercício dos respectivos direitos em matéria de reembolso antecipado, cessão da posição contratual e sub-rogação, mantendo estes todas as relações exclusivamente com o cedente.

4 - No caso de cessão de quaisquer créditos hipotecários con-cedidos ao abrigo de qualquer dos regimes previstos no Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de Novembro, as entidades cessionárias passam, por efeito da cessão, a ter também direito a receber quaisquer subsídios aplicáveis, não sendo os regimes de crédito previstos naquele decreto-lei de forma alguma afectados pela cessão dos créditos em causa.

Artigo 28.º - Forma do contrato de cessão de créditos

1 - O contrato de cessão dos créditos pode ser celebrado por documento particular.

2 - Para efeitos de averbamento ao registo da transmissão dos créditos hipotecários, o documento particular referido no número anterior constitui título bastante desde que contenha o reconhecimento presencial das assinaturas nele apostas, efectuado por notário ou, se existirem, pelos secretários das sociedades intervenientes.

Artigo 29.º - Gestão dos créditos1 - Simultaneamente com a cessão de créditos, pode ser

celebrado contrato pelo qual a entidade cedente fique obrigada, em nome e em representação da entidade cessionária, a praticar todos os actos que se revelem adequados à boa gestão dos créditos e das respectivas garantias, a assegurar os serviços de cobrança, os serviços administrativos relativos aos créditos, todas as relações com os respectivos devedores e os actos conservatórios, modificativos e extintivos relativos às garantias.

2 - Os montantes que estejam na posse da instituição de crédito gestora dos créditos afectos às obrigações hipotecárias não podem em caso algum ser penhorados ou de qualquer forma apreendidos, mesmo em caso de liquidação dessa instituição de crédito.

3 - Em caso de revogação da autorização da instituição de crédito gestora dos créditos, bem como no caso de saneamento ou de liquidação da mesma, o Banco de Portugal determina a sua substituição na gestão dos créditos, mediante contrato a celebrar pela instituição de crédito e entidade habilitada para o efeito, o qual deve ser notificado aos respectivos devedores.

Artigo 30.º - Tutela dos créditos1 - A cessão dos créditos hipotecários:a) Só pode ser objecto de impugnação pauliana no caso de os

interessados provarem a verificação dos requisitos previstos nos artigos 610.º e 612.º do Código Civil, não sendo aplicáveis as presunções legalmente estabelecidas, designadamente no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas;

b) Não pode ser resolvida em benefício da massa falida, excepto se os interessados provarem que as partes agiram de má fé.

2 - Não fazem parte da massa falida da entidade cedente os mon-tantes pagos no âmbito de créditos hipotecários cedidos anteriormente à falência e que apenas se vençam depois dela.

Artigo 31.º - Substituição de créditosDesde que essa possibilidade conste da deliberação referida no

n.º 1 do artigo 26.º, o contrato de cessão de créditos pode prever a obrigação de a entidade cedente substituir os créditos relativamente aos quais se verifique incumprimento por prazo superior ou igual a 90 dias ou relativamente aos quais as demais condições previstas neste decreto-lei não sejam cumpridas, até ao limite estabelecido na deliberação.

CAPÍTULO VIObrigações sobre o sector público

Artigo 32.º - Obrigações sobre o sector público

1 - Salvo disposição em contrário, às obrigações sobre o sector público, a que se refere o n.º 2 do artigo 1.º, é aplicável o regime das obrigações hipotecárias previsto no presente decreto-lei, com as devidas adaptações, sem prejuízo das especificidades constantes dos números seguintes.

2 - Em substituição dos créditos hipotecários referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 16.º, apenas podem ser afectos à garantia de obrigações sobre o sector público os créditos sobre administrações centrais ou autoridades regionais e locais de um dos Estados membros da União Europeia e créditos com garantia expressa e juridicamente vinculativa das mesmas entidades.

3 - O limite a que se refere o n.º 1 do artigo 19.º corresponde a 100% do valor global dos activos afectos às obrigações sobre o sector público.

4 - O registo referido no artigo 4.º deve ser realizado por

forma a assegurar a segregação entre os activos afectos às obrigações hipotecárias e os activos afectos às obrigações sobre o sector público.

CAPÍTULO VIISupervisão e auditor independente

Artigo 33.º - SupervisãoSem prejuízo das competências da Comissão do Mercado de Valores

Mobiliários quanto ao disposto no capítulo III, compete ao Banco de Portugal supervisionar o disposto no presente decreto-lei.

Artigo 34.º - Auditor independente1 - O órgão de administração da entidade emitente designa um

auditor independente que, na defesa dos interesses dos titulares das obrigações, verifica o cumprimento dos requisitos legais e regulamen-tares aplicáveis às obrigações hipotecárias e às obrigações sobre o sector público.

2 - Este auditor independente está sujeito a registo junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, é considerado independente o auditor que não esteja associado a qualquer grupo de interesses específicos na entidade emitente nem se encontre em alguma circuns-tância susceptível de afectar a sua isenção de análise ou de decisão, nomeadamente em virtude de:

a) Ser titular ou actuar em nome ou por conta de titulares de participação qualificada igual ou superior a 2% do capital social da entidade emitente;

b) Ter sido reeleito por mais de dois mandatos, de forma contínua ou intercalada.

4 - O auditor independente elabora um relatório anual sobre o cumprimento pela entidade emitente dos requisitos legais e regulamen-tares a que se refere o n.º 1.

5 - O Banco de Portugal pode estabelecer, por aviso, ouvida a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e a Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, o conteúdo e as formas de divulgação do relatório do auditor.

CAPÍTULO VIIIDisposições finais e transitórias

Artigo 35.º - Cancelamento de ónusO cancelamento dos ónus registados ao abrigo da legislação

anterior é efectuado com base em declaração da instituição de crédito credora.

Artigo 36.º - Norma revogatóriaÉ revogado o Decreto-Lei n.º 125/90, de 16 de Abril, com as

alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.os 17/95, de 27 de Janeiro, e 52/2006, de 15 de Março.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 23 de Fevereiro de 2006. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Fernando Teixeira dos Santos.

Promulgado em 5 de Março de 2006.Publique-se.

O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.Referendado em 6 de Março de 2006.O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de

Sousa.

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60Vida Judiciária Maio/2006

Principal legislação publicada– 1ª e 2ª. Série do Diário da República de 28 de Março a 20 de Abril de 2006

Resumos de Jurisprudência

Acesso à actividade de seguros

Lei nº 11/2006, de 4.4

- Autoriza o Governo a regular o acesso e o exercício da actividade de mediação de seguros ou de resseguros e a adaptar o regime geral das contra-ordenações às especificidades desta actividade na sequência da transposição da Directiva nº 2002/92/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de Dezembro, relativa à mediação de seguros.

Centro de Arbitragem

Despacho nº 7813/2006, de 6.4 (2.ª série)

- Autoriza a criação do Centro de Arbitragem de Conflitos, Ho-téis, Viagens e Turismo. Este centro tem carácter especializado, âmbito nacional e funcionará na Rua do Duque de Palmela, 2, 1º, direito, em Lisboa. O Centro tem como objectivo a resolução de litígios das agências de viagens e turismo associadas da As-sociação Portuguesa das Agências de Viagens e Turismo e dos empreendimentos turísticos associados da Associação dos Hotéis de Portugal ou entre estas e as pessoas ou entidades com quem mantenham relações comerciais, excluindo os consumidores, seus clientes.

Conselho Superior da Magistratura – nomeações

Decr. do Pres. da Repúbl. nº 44/2006, de 10.4

- Nomeia vogais do Conselho Superior da Magistratura o Juiz Conselheiro Álvaro José Brilhante Laborinho Lúcio e o Prof. Doutor Manuel da Costa Andrade.

Convenções para evitar dupla tributação

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 28/2006, de 6.4

- Aprova a Convenção entre a República Portuguesa e a República do Chile para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento.

Lei da nacionalidade

Lei Org. nº 2/2006, de 17.4

- Quarta alteração à Lei nº 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Na-cionalidade).

Regime contra-ordenacional – companhias financeiras

Lei nº 10/2006, de 4.4

- Autoriza o Governo a estender o regime contra-ordenacional aplicável à actividade seguradora às sociedades gestoras de par-ticipações sociais sujeitas à supervisão do Instituto de Seguros de Portugal e às companhias financeiras mistas por infracções às normas legais e regulamentares que regem a supervisão complementar dos conglomerados financeiros.

Parques de estacionamento

DL nº 81/2006, de 20.4

- Aprova o regime relativo às condições de utilização dos parques e zonas de estacionamento, revogando o Decreto Regulamentar nº 2-B/2005, de 24 de Março.

Junta médica da ADSE

Decr. Legisl. Reg. nº 8/2006/M, de 17.4

- Regulamenta a dependência orgânica e funcional e a composi-ção, competência e funcionamento da junta médica da ADSE na administração regional autónoma da Madeira.

Sociedades – simplificação de actos notariais e registais

DL nº 76-A/2006, de 29.3 (1º Supl.)

Actualiza e flexibiliza os modelos de governo das sociedades anónimas, adopta medidas de simplificação e eliminação de actos e procedimentos notariais e registrais e aprova o novo regime jurídico da dissolução e da liquidação de entidades comerciais.

REGIÕES AUTÓNOMAS

- Açores

Apoio educativo

Decr. Legisl. Reg. nº 15/2006/A, de 7.4

- Estabelece o regime jurídico da educação especial e do apoio educativo visando a criação de condições para a adequação do processo educativo aos requisitos das crianças e jovens com necessidades educativas especiais ou com dificuldades na apren-dizagem, que impeçam o sucesso educativo.

- Madeira

Junta médica da ADSE – organização funcional

Decr. Legisl. Reg. nº 8/2006/M, de 17.4

- Regulamenta a dependência orgânica e funcional e a composi-ção, competência e funcionamento da junta médica da ADSE na administração regional autónoma da Madeira.

Contribuições à segurança social

Decr. Legisl. Reg. nº 12/2006/M, de 20.4

- Aplica e adapta à Região Autónoma da Madeira o Decreto-Lei nº 8-B/2002, de 15 de Janeiro, que estabelece as regras destinadas a assegurar a inscrição das entidades empregadoras no sistema de segurança social e a gestão do processo de cobrança e pagamento das contribuições e quotizações devidas à segurança social.

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61 Vida Judiciária Maio/2006

Trabalho e segurança social

CCT - Industriais de ourivesaria

Port. nº 308/2006, de 28.3

Aprova o regulamento de extensão das alterações dos CCT entre a Associação dos Industriais de Ourivesaria e Relojoaria do Norte e outras e a FEQUIMETAL - Federação Intersindical da Metalur-gia, Metalomecânica, Minas, Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás e entre as mesmas associações de empregadores e o SINDEL - Sindicato Nacional da Indústria e da Energia.

Comparticipação de medicamentos

Port. nº 314/2006, de 3.4

- Prorroga o prazo para apresentação da declaração e do documento comprovativo aos pensionistas que pretendam beneficiar do regime especial de comparticipação de medicamentos.

CCT - Industriais da madeira

Port. nº 352/2006, de 11.4

- Aprova o regulamento de extensão das alterações do CCT entre a Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal e outras e o SETACCOP - Sindicato da Construção, Obras Públicas e Serviços Afins e outra e do CCT entre as mesmas associações de empregadores e a FEVICCOM - Fe-deração Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro.

Apoios ao ensino especial

Port. nº 353/2006, de 11.4

- Estabelece os apoios financeiros a vigorar durante o ano lectivo de 2005-2006 nas associações e cooperativas de ensino especial.

CCT - Comércio e serviços - Guarda

Port. nº 363/2006, de 12.4

- Aprova o regulamento de extensão das alterações do CCT entre a Associação do Comércio e Serviços do Distrito da Guarda e outras e o CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal.

CCT - Retalhistas de carnes - Porto

Port. nº 370/2006, de 13.4

- Aprova o regulamento de extensão do CCT entre a ARCDP - As-sociação dos Retalhistas de Carnes do Distrito do Porto e outras e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Ramo Alimentar e Similares.

CCT - Industriais de fotografia

Port. nº 382/2006, de 18.4

- Aprova o regulamento de extensão das alterações dos CCT entre a ANIF - Associação Nacional dos Industriais de Fotografia e o Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa e outros e entre a mesma associação de empre-gadores e a FETESE - Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e outros.

CCT - Comércio e serviços - Aveiro

Port. nº 383/2006, de 18.4

- Aprova o regulamento de extensão das alterações dos CCT entre a

Associação Comercial de Aveiro e outras e o SINDCES - Sindicato do Comércio, Escritórios e Serviços e entre as mesmas associações de empregadores, à excepção da Associação Comercial de Espinho, e o CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal.

Transporte de crianças

Lei nº 13/2006, de 17.4

- Transporte colectivo de crianças.

Tributação dos rendimentos da poupança

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 26/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Território Dependente da Coroa Britânica de Jersey, por troca de cartas, respectivamente de 22 de Junho e de 19 de Novembro de 2004, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança e à Respectiva Aplicação Provisória.

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 27/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Território Dependente da Coroa Britânica das Ilhas Turcas e Caicos, por troca de cartas, respectivamente de 29 de Dezembro de 2004 e de 17 de Abril de 2005, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança.

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 29/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Territó-rio Dependente da Coroa Britânica de Anguilla, por troca de cartas, respectivamente de 29 de Dezembro de 2004 e de 21 de Janeiro de 2005, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança, que aprova a Convenção entre a República Portu-guesa e Anguilla Relativa à Troca Automática de Informação em Matéria de Rendimentos da Poupança sob a Forma de Pagamentos de Juros.

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 30/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Território Dependente da Coroa Britânica da Ilha de Man, por Troca de Cartas, respectivamente de 22 de Junho e de 19 de Novembro de 2004, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança e à Respectiva Aplicação Provisória.

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 31/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Território Dependente da Coroa Britânica das Ilhas Virgens Britânicas, por troca de cartas, respectivamente de 29 de Dezembro de 2004 e de 11 de Abril de 2005, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança.

Res. da Assembl. da Repúbl. nº 33/2006, de 6.4

- Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e o Território Dependente da Coroa Britânica de Montserrat, por troca de cartas, respectivamente de 29 de Dezembro de 2004 e de 7 de Abril de 2005, Relativo à Tributação dos Rendimentos da Poupança.

Veículos – inspecções

Port.nº 309/2006, de 29.3

- Actualiza as tarifas devidas pela realização das inspecções periódicas e das reinspecções de veículos automóveis, reboques e semi-reboques, bem como pela realização das inspecções extraordinárias e das inspecções para atribuição de nova matrícula e, ainda, pela emissão da segunda via da ficha de inspecção.

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62Vida Judiciária Maio/2006

Acidente de trabalhoSumário: “1. Resulta globalmente das normas destinadas a garantir a segurança no trabalho, que o uso do cinto de segurança é obri-gatório, para além dos casos especialmente previstos, quando o trabalhador estiver exposto a um risco efectivo de queda livre e esse risco não possa ser evitado ou suficientemente limitado por meios técnicos de protecção colectiva;

2. No caso, o sinistrado, empregado de limpeza, estava a trabalhar em cima de um tecto falso, instalado a 6 metros do solo e constituído por uma armação metálica, com lâminas em forma de L, formando espaços de cerca de um metro quadrado, que recebiam por encaixe placas de vedação, que não tinham resistência para suportar o peso de um homem, e não existindo meios técnicos de protecção colectiva, configurava-se um efectivo risco de queda nas deslocações que fossem levadas a efeito em cima do tecto falso, fora dos locais onde estavam instaladas tábuas de madeira para colocação do aspirador e para apoio dos trabalhadores, pelo que se impunha a utilização de equipamento individual de protecção antiqueda (cinto de segurança), incum-bindo ao empregador fornecer tal equipamento, nos termos dos conjugados artigos 8º, n.os 1, 2, alíneas a) e b), e 3, do Decreto-Lei nº 441/91, de 14 de Novembro, 4º, 6º e 7º do Decreto-Lei nº 348/93, de 1 de Outubro, e do Anexo II da Portaria nº 988/93, de 6 de Outubro;

3. O ónus da prova dos factos que agravam a responsabilidade da entidade empregadora cabe a quem dela tirar proveito, no caso, à seguradora, nos termos do nº 2 do artigo 342º do Código Civil;

4. Assim, incumbia à seguradora alegar e provar não só a ino-bservância por parte da entidade empregadora de regras sobre segurança no trabalho, mas também a existência de nexo de causalidade entre essa inobservância e o acidente;

5. Não tendo a seguradora alegado e provado, que a entidade empregadora não tinha posto à disposição do sinistrado o necessário equipamento individual de protecção antiqueda ou que este, ainda que existente, não estava acessível à vítima, e provando-se, apenas, que o sinistrado caiu sobre uma das placas de vedação, quando se deslocava sobre a armação metálica do tecto, ignorando-se a razão dessa queda, não é possível imputar o não uso do necessário equipamento individual de protecção antiqueda à entidade empregadora, nem concluir que o aci-

dente resultou da inobservância de regras de segurança por parte da mesma entidade, pelo que não estão preenchidos os pressupostos da responsabilização da empregadora, previstos no nº 1 do artigo 18º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro. (Proc. nº 05S4027, de 30/03/2006)

CompropriedadeSumário: “1- A convocatória feita por dois dos comproprietários de prédio urbano ao outro comproprietário (até aí administrador) para uma reunião tendo por objecto deliberar ao abrigo do disposto no artº 1407 C. Civil quanto à forma como futuramente aquele imóvel passaria a ser administrado deve ter um mínimo de antecedência razoável para o convocado dispor da sua vida e se preparar convenientemente para tal reunião.

2 - Não obedece manifestamente a esse mínimo a convocatória feita por carta registada com aviso de recepção datada de 8 de Julho de 2002 para uma reunião em 12 de Julho de 2002.

3 - Assim, procede o pedido formulado pelo autor, convocado comproprietário, no sentido de ser declarada a nulidade da de-liberação tomada pelos outros dois convocantes compropritários em tal reunião.” (.Proc. nº 06A591, de 04/04/2006)

Cheque – acção cambiáriaSumário:I. O portador de um cheque apenas pode exercer a acção cam-biária quando a verificação da recusa de pagamento do mesmo, prevista no art. 40º da LUC conste de acto formal (protesto) ou de declaração do sacado ou duma câmara de compensação aposta no mesmo cheque dentro do prazo previsto no art. 29º da mesma lei, salvo o caso de força maior previsto no art. 48º da mesma Lei.

II. O acórdão da Relação que conheceu da apelação pode decidir pela irrelevância do conhecimento de factos alegados pelo embargado, sem que a 1ª instância tenha conhecido dessa questão antes, ao abrigo do disposto no art. 715º do Cód. de Proc. Civil.

III. O cheque que não possa valer como título de crédito por falta de certificação atempada da recusa de pagamento, não pode valer como título executivo previsto na al. c) do art. 46º do C. P. Civil, apesar de o exequente alegar no requerimento inicial que o mesmo titula um contrato de mútuo cujo valor, nos termos do art. 1143º do Cód. Civil exigia a redução a escritura pública.- (Proc. nº 06A736, de 04/04/2006).

ACÓRDÃOS DO STJ

disponíveis em www.dgsi.pt

RECTIFICAÇÕES

Valores mobiliários – oferta pública

Decl. de Rect. nº 21/2006, de 30.3

De ter sido rectificado o Decreto-Lei nº 52/2006, do Ministério das Finanças e da Administração Pública, que, no uso das autorizações legislativas concedidas pelas Leis n.os 55/2005, de 18 de Novembro, e 56/2005, de 25 de Novembro, transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva nº 2003/6/CE, do Parlamento e do Conselho, de 28 de Janeiro, relativa ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado, e a Directiva nº 2003/71/CE, do Parlamen-to Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro, relativa ao prospecto

a publicar em caso de oferta pública de valores mobiliários ou da sua admissão à negociação.

NRAU

Decl. de Rectifi nº 24/2006, de 17.4

- De ter sido rectificada a Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro [aprova o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), que estabelece um regime especial de actualização das rendas antigas e altera o Código Civil, o Código de Processo Civil, o Decreto-Lei nº 287/2003, de 12 de Novembro, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis e o Código do Registo Predial], publicada no Diário da República, 1.ª série-A, nº 41, de 27 de Fevereiro de 2006.

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estruturais do nosso país limitam a adopção de boas práticas nesta matéria, sendo por isso, necessário implementar

uma cultura de segurança que comece em cada um de nós e possa convergir nas organizações, públicas e privadas.

Portugal tem acompanhado a dinâmica legislativa europeia, mas carece de encontrar as soluções e medidas que na

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trabalho (técnicos superiores e técnicos de

segurança e higiene do trabalho e

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(médicos e enfermeiros do trabalho);

• Quadros das empresas nos diversos

sectores de actividade.

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Saude Higiene e Saude no Trabalho.pmd 19-04-2006, 10:341

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