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V Í T I M A S D E T R A U M A C R Â N I O - E N C E F Á L I C O E S E U R E T O R N O A P R O D U T I V I D A D E A P Ó S 6 M E S E S E 1 A N O . * H E A D I N J U R Y V I C T M S A N D T H E I R R E T U R N T O PRODUCTIVITY A F T E R 6 M O N T H S A N D 1 Y E A R . Regina Mareia Cardoso de Sousa* Maria Sumie Koizumi** SOUSA. R.M.C.de; KOIZUMI, M.S. Vítimas de trauma crânio-encefálico e seu retorno a produtividade após 6 meses e 1 ano. Rev.Esc.Enf.USP. v.33, n.3, p. 313-22, set. 1999. RESUMO Traia-se de um estudo prospectivo que analisa o retorno a produtividade de vítimas de trauma crânio-encefálico (TCE) de diferentes gravidades, com idade entre 12 e 60 anos. As vítimas foram examinadas aos 6 meses e 1 ano pós-trauma e seu retorno à produtividade foi analisado, considerando as variáveis nível de escolaridade e tipo de ocupação anterior ao trauma. A maioria (73,6%) retomou a atividade produtiva aos 6 meses e a freqüência de retorno à produtividade foi maior 1 ano após TCE. Quanto ao retorno ao trabalho remunerado e nível de escolaridade ou tipo de ocupação anterior, não houve associação estatística significativa. UNITERMOS: Traumatismos da cabeça. Recuperação. ABSTRACT A prospective anel longitudinal study about head injury victims was carried out in order to identify their return to productivity after 6 months and 1 year post-trauma and to analyze the relationship between their return to work and their educational level as well as to determine the relationship between their return to work and their type of job before the onset of the injury. Of the 72 patients who were students or employees pre-injury, or housewives at the time of injury, the majority (73,6%) had returned to productivi '.y 6 months after onset of injury. Of the victims who had returned to productivity, 25.0% had changed their original occupations or reported significant problems when returning to productivity. Baseline return was achieved in 48.6% of the victims at 6 months. Return to productivity was higher at 1 year after injury than at 6 months. When the relationship between return to work and educational level and job type was analyzed, return to work was not related to educational level or job type. U N I T E R M S : H e a d injuries. Recovery. 1 INTRODUÇÃO O traumatismo crânio-encefálico (TCE) é uma causa comum de morte e incapacidades, particularmente na primeira metade da vida, sendo apontado como a causa de morte mais freqüente entre 2 e 42 anos de idade 1520212â . O seu papel dentro dos traumas em geral é relevante quando se observa que em cerca de 50% dos pacientes politraumatizados há TCE associado e que este tipo de trauma tem se mostrado um grande agravante no prognóstico das vítimas, visto que o sistema nervoso central possui uma grande vulnerabilidade à agressão e a sua capacidade de recuperação é limitada 24 ' 5920 . As vítimas que sobrevivem ao TCE podem apresentar deficiências e incapacidades temporárias ou permanentes, que interferem na capacidade do indivíduo desempenhar funções e cumprir papéis que dele são esperados. Trabalho baseado em tese de doutoramento apresentada ao Programa Interunidades de Doutoramento EEUSP/EERP. Apresentado em 7th World Federation of Neurocience Nurses Congress/Plenary session, Amsterdam/The Netherlands, July, 1997. ** Professor Doutor do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem da Universidade de Sao Paulo. *" Professor Titular da Escola de Enfermagem da Universidade de Sao Paulo.

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V Í T I M A S D E T R A U M A C R Â N I O - E N C E F Á L I C O E S E U R E T O R N O A P R O D U T I V I D A D E A P Ó S 6 M E S E S E 1 A N O . *

H E A D I N J U R Y V I C T M S A N D T H E I R R E T U R N T O P R O D U C T I V I T Y A F T E R 6 M O N T H S A N D 1 Y E A R .

Regina Mareia Cardoso de Sousa* Maria Sumie Koizumi**

S O U S A . R.M.C.de; KOIZUMI, M . S . V í t i m a s de t r a u m a c r â n i o - e n c e f á l i c o e s e u r e t o r n o a p r o d u t i v i d a d e após 6 m e s e s e 1 ano . R e v . E s c . E n f . U S P . v .33 , n .3 , p . 313 -22 , se t . 1999 .

R E S U M O

Traia-se de um estudo prospectivo que analisa o retorno a produtividade de vítimas de trauma crânio-encefálico (TCE) de diferentes gravidades, com idade entre 12 e 60 anos. As vítimas foram examinadas aos 6 meses e 1 ano pós-trauma e seu retorno à produtividade foi analisado, considerando as variáveis nível de escolaridade e tipo de ocupação anterior ao trauma. A maioria (73,6%) retomou a atividade produtiva aos 6 meses e a freqüência de retorno à produtividade foi maior 1 ano após TCE. Quanto ao retorno ao trabalho remunerado e nível de escolaridade ou tipo de ocupação anterior, não houve associação estatística significativa.

U N I T E R M O S : T r a u m a t i s m o s d a c a b e ç a . R e c u p e r a ç ã o .

A B S T R A C T

A prospective anel longitudinal study about head injury victims was carried out in order to identify their return to productivity after 6 months and 1 year post-trauma and to analyze the relationship between their return to work and their educational level as well as to determine the relationship between their return to work and their type of job before the onset of the injury. Of the 72 patients who were students or employees pre-injury, or housewives at the time of injury, the majority (73,6%) had returned to productivi '.y 6 months after onset of injury. Of the victims who had returned to productivity, 25.0% had changed their original occupations or reported significant problems when returning to productivity. Baseline return was achieved in 48.6% of the victims at 6 months. Return to productivity was higher at 1 year after injury than at 6 months. When the relationship between return to work and educational level and job type was analyzed, return to work was not related to educational level or job type.

U N I T E R M S : H e a d i n j u r i e s . R e c o v e r y .

1 I N T R O D U Ç Ã O

O traumat ismo crânio-encefálico (TCE) é uma c a u s a c o m u m de m o r t e e i n c a p a c i d a d e s , par t icularmente na pr imeira metade da vida, sendo apontado como a causa de morte mais freqüente en t re 2 e 42 anos de i d a d e 1 5 2 0 2 1 2 â . O seu pape l dentro dos t r aumas em geral é re levante quando se obse rva que em c e r c a de 50% dos p a c i e n t e s politraumatizados há TCE associado e que este tipo de t rauma tem se mostrado um grande agravante

no prognóst ico das v í t imas , v is to que o s i s tema nervoso cen t ra l possui uma grande vulnerabil idade à agressão e a sua capacidade de recuperação é l i m i t a d a 2 4 ' 5 9 2 0 .

As v í t imas que sobrevivem ao TCE podem apresentar deficiências e incapacidades temporárias ou pe rmanen te s , que interferem na capacidade do indivíduo desempenhar funções e cumpr i r papéis que dele são esperados.

Trabalho b a s e a d o e m t e s e de d o u t o r a m e n t o a p r e s e n t a d a ao P r o g r a m a I n t e r u n i d a d e s de D o u t o r a m e n t o E E U S P / E E R P . A p r e s e n t a d o e m 7th World F e d e r a t i o n of N e u r o c i e n c e N u r s e s C o n g r e s s / P l e n a r y s e s s i o n , A m s t e r d a m / T h e N e t h e r l a n d s , Ju ly , 1997.

** Professor Doutor do D e p a r t a m e n t o de E n f e r m a g e m Médico -Cirúrg ica da Esco la de E n f e r m a g e m da U n i v e r s i d a d e de Sao Paulo . *" Professor Ti tular da Esco la de E n f e r m a g e m da U n i v e r s i d a d e de S a o Paulo .

U m a das p r inc ipa i s m e t a s da r ecuperação consiste em re to rna r o indivíduo a sua at ividade anterior, isto é, re torno ao emprego, à escola ou às atividades domésticas ou outra r e l evan te 1 9 . Assim considerado, o retorno à produtividade é uma das formas de medida de recuperação de um t r a u m a ou doença e é pa r t i cu la rmente re levante quando se examina o ônus individual ou social do t rauma, onde a maioria dos atingidos é o adul to jovem.

Na análise do re torno a produt iv idade, um o u t r o a spec to a ser c o n s i d e r a d o é o t r a b a l h o r e m u n e r a d o . E le é t r a d i c i o n a l m e n t e v i s to n a sociedade moderna como proposta cen t ra l de vida, e assume, papel pr incipal no supr imento tanto das necessidades de auto-est ima como econômicas 7

O r e t o r n o à a t i v i d a d e r e m u n e r a d a é par t icu larmente uma medida re levante quando se examina as ví t imas de t r a u m a visando delinear seu ônus social. A p e r d a da p r ó p r i a i n d e p e n d ê n c i a econômica, muitas vezes vinculada a prover recursos a outros elementos da família; a necessidade de destinar verbas pa ra supr i r f inanceiramente a esses i n d i v í d u o s e a p e s s o a s a e l e s v i n c u l a d a s economicamente e o desgaste social pela perda da produtividade de um indivíduo com habilitação pa ra o trabalho, torna de par t icu la r interesse a análise do retorno a esse tipo de ocupação.

As c o n s e q ü ê n c i a s da i m p o s s i b i l i d a d e do indivíduo re tornar às suas atividades empregatícias, vão além da perda financeira e interferem também na capacidade das ví t imas de reconst rui r sua vida social. ODDY et a l 2 3 ana l i s ando v í t imas de TCE grave, 2 e 7 anos após t r auma , observaram que o reajustamento social era acen tuadamente restr i to aos poucos que t rabalhavam. Pa ra os demais, muitos p r o b l e m a s fo ram e n c o n t r a d o s , os q u a i s se assemelhavam aos de uma pessoa desempregada: a perda de uma distribuição de tempo e s t ru tu r ada no cotidiano e de um grupo de amigos; a pe rda de objetivos p a r a a l cança r ou o p o r t u n i d a d e s p a r a mostrar competência e a ausência de a lguma fonte de identidade ou posições.

A capacidade de r e to rna r ao t rabalho após o t rauma ou doença tem sido relacionada não somente a condições físicas, cogni t ivas e emocionais mas também a fatores que não são relativos à si tuação de saúde . Os r e su l t ados de ou t ros es tudos têm a p o n t a d o f a to re s econômicos e p e s s o a i s como importantes de te rminantes do retorno ao t rabalho r e m u n e r a d o . E n t r e e s s e s f a t o r e s , a p o u c a escolaridade e alguns tipos de ocupação têm sido indicados como uma das condições que influenciam negat ivamente esse r e t o r n o 1 1 1 8 1 9 , 2 4 ' 2 7

É importante sal ientar que se dist inguem, nos es tudos dos fa tores r e l ac ionados ao r e t o r n o ao t r a b a l h o r e m u n e r a d o , g r u p o s com d i f e r e n t e s

necess idades de a t enção p a r a esse re to rno e ao m e s m o t e m p o d e s t a c a m - s e c e r t o s g r u p o s de i n d i v í d u o s q u e t ê m p a r t i c u l a r m e n t e m a i o r e s probabilidades de não re to rnar ao trabalho.

2 O B J E T I V O S

Carac te r i za r o r e to rno à produt iv idade da vít ima de TCE aos 6 meses e 1 ano pós-trauma.

Analisar re torno ao t raba lho remunerado e as possíveis associações com o nível de escolaridade e o tipo de ocupação anter ior ao t rauma.

3 M A T E R I A L E M É T O D O

A população de es tudo foi const i tuída por v í t imas de TCE a d m i t i d a s p a r a t r a t a m e n t o no Inst i tuto Central do HCFMUSP no período de março a j u n h o de 1993, em decorrência de acidente ou violência ocorridos nesse mesmo período.

Os critérios de inclusão das ví t imas foram: ter e n t r e 12 e 60 anos de idade ; a p r e s e n t a r dados registrados no seu prontuár io ou cadastro geral do hospital para sua localização; residir na Grande São Paulo; comparecer ao ambulatório por convocação e consentir em part icipação da pesquisa.

Excluíram-se aqueles que solicitaram alta a pedido ou evadiram-se do hospital devido à baixa poss ib i l idade de sua ade rênc i a a um estudo de s e g u i m e n t o e a p o s s i b i l i d a d e de d i f e r e n t e s c o n s e q ü ê n c i a s do t r a u m a em v í t i m a s que não c o m p l e t a r a m t r a t a m e n t o n a fase a g u d a pós-t raumát ica . Foram também excluídos vítimas que apresen ta ram reincidência de t r auma , em período inferior a 6 meses.

Os d a d o s d a s v í t i m a s fo ram ob t idos , in ic ia lmente , em l is ta fornecida pela Divisão de A r q u i v o Médico , c o n f i r m a d o s pe los dados do p ron tuár io de cada paciente e pelas entrevis tas i n d i v i d u a i s fe i ta por u m a d a s p e s q u i s a d o r a s , du ran te o período de setembro de 1993 a agosto de 1994.

Da l i s t a da D iv i são de Arqu ivo Médico constaram, além da informação referente ao tipo de TCE, pene t ran te ou fechado, os seguintes dados: número de registro do paciente no hospital; idade; sexo; óbitos ocorr idos na i n t e r n a ç ã o ; tempo de permanência hospi ta lar e da ta de internação e alta.

Nesta l ista foram selecionados os pacientes sobreviventes, in te rnados nos meses de março, abril, maio e junho de 1993, das faixas etárias de 12 a 60 anos. Na situação em que a idade era um

dado não mencionado na lista, o paciente foi mantido na coleta de dados até ser possível a obtenção deste dado, confirmando ou não sua inclusão na população. Os pacientes reinternados só foram incluídos quando sua primeira internação também ocorreu no período especificado.

Fe i t a e s ta p r i m e i r a se leção , in ic iou-se o processo de busca de prontuários através do número do r e g i s t r o g e r a l dos p a c i e n t e s no h o s p i t a l . Localizado o pron tuár io e confirmados os demais dados de seleção foi r ea l i zada convocação p a r a comparecimento ao Ambulatório.

Para cada paciente foi enviada carta solicitando comparecimento ambulatorial, em data marcada entre 6 e 8 meses após a ocorrência do trauma. Neste período era realizada a I a entrevista desde que o paciente concordasse em p a r t i c i p a r do e s t a d o . N e s t e comparecimento tomou-se o cuidado de verificar a disponibilidade das vítimas para uma 2 a entrevista realizada entre 12 e 14 meses após o t rauma, período em que os pacientes também foram notificados através de carta para comparecimento ambulatorial.

Q u a n t o à c o n v o c a ç ã o de p a c i e n t e s , determinou-se ainda que quando ocorria a falta em pr ime i ra convocação u m a s e g u n d a c a r t a p a r a comparecimento ambulatorial era enviada, tanto na I a como na 2 a entrevista. Nos casos em que não havia c o m p a r e c i m e n t o , m e s m o p e r a n t e a s d u a s correspondências, o paciente era automat icamente eliminado do seguimento pós-traumático. Quando havia menção de número telefônico em alguma das fontes de dados do paciente, este também era um dos meios utilizados para localização das vít imas, em a m b a s e n t r e v i s t a s . S o m e n t e os p a c i e n t e s i n t e r n a d o s n a época d a s a v a l i a ç õ e s e r a m entrevistados nas instituições e os impossibilitados de comparecer ao Ambulatório, no próprio domicílio.

P rodu t iv idade p ó s - t r a u m a foi def inida no presente estudo como retorno ao emprego, escola ou a faze res do l a r , c o n s i d e r a n d o - s e a s s i m como MORRIS et a l 2 2 t a i s a t i v i d a d e s de e s s e n c i a l importância pa ra produção nacional à medida que contribuem ou fornecem es t ru tura para manutenção de sua ocorrência.

P a r a poss ibi l i tar a aval iação do re to rno à p rodu t iv idade p ó s - t r a u m a , a ca tegor ização das vítimas quanto à ocupação principal e à análise da condição o c u p a c i o n a l p ó s - t r a u m a , f i z e r a m - s e necessárias.

Através de dados da pr imeira entrevista , cada paciente era classificado de acordo com sua ocupação principal. Ocupação principal foi então definida como a mais importante atividade exercida antes do TCE, referida pelo pac ien te . Devido à dificuldade em estabelecer prioridades ent re atividades das ví t imas estudantes e com ocupação remunerada , ambas as

atividades foram consideradas conjuntamente como ocupação pr incipal quando assim presentes . Dentro dessa classificação estabeleceu-se então as seguintes c a t e g o r i a s : ocupação r e m u n e r a d a ; e s t u d a n t e s ; e s t u d a n t e s que t a m b é m m a n t i n h a m ocupação remunerada ; aposentados e desempregados.

A condição pós- t rauma, em relação à ocupação principal, foi classificada, tendo como base o retorno à produt ividade, ou seja, a t ividade interrompida, a l te rada devido ao t r a u m a e re torno com o mesmo desempenho.

Os dados estão apresentados em freqüência absoluta e re la t iva sendo mostrados em forma de t a b e l a s e f i g u r a s . A l g u m a s p r o v a s e s t a t í s t i c a s t ambém fizeram-se necessár ias du ran t e o estudo pa ra complementar a análise dos dados obtidos.

•Prova de associação pelo Qui-quadrado: foi empregada p a r a verificar as eventuais associações ent re re torno ao t raba lho e tipo de ocupação que as ví t imas m a n t i n h a m an te r io rmente ao t rauma.

•Prova de Fisher: foi empregada ao analisar o retorno ao t rabalho e escolaridade e pa ra a lgumas análises de retorno ao t raba lho e tipo de ocupação, uma vez que as condições de aplicação do teste Qui-quadrado não foram satisfeitas em tabela 2x2.

Todas as provas estat ís t icas uti l izadas foram feitas admit indo um erro de pr imeira espécie de 5%.

4 R E S U L T A D O S E D I S C U S S Ã O

P o p u l a ç ã o E s t u d a d a

Ent r e março e junho de 1993, 385 vít imas de t r a u m a com diagnóstico de TCE foram admitidas no Ins t i tu to Cent ra l do HCFMUSP. Destas , 73 (19,0%) morreram antes da al ta hospi talar ; 65 (16,9%) eram sob rev iven t e s m e n o r e s de 12 anos e 34 (8,8%) sobreviventes maiores de 60 anos. Por tanto, foram 213 as ví t imas selecionadas pa ra inclusão no estudo.

Dessas 213 vítimas de TCE, 4 foram excluídas (1 por alta a pedido; 2 evadiram-se do hospital no período agudo de atendimento e 1 por ter reincidência de t rauma num período inferior a 6 meses); 5 moravam fora da Grande São Paulo; 38 não apresentavam dados de prontuário ou de cadastro geral que possibilitasse sua localização (umas não t inham residência fixa; outras não possuíam qualquer referência de endereço ou telefone e a maioria apresentava registros de dados incorretos ou incompletos).

Foram, portanto, 166 os indivíduos convocados para a I a en t revis ta e destes, foram 83 (50,0%) as ví t imas que ao final da coleta de dados pode-se conhecer a evolução de 1 ano pós- t rauma. Estes part icipantes t inham como principais características as descri tas a seguir.

• A p r e s e n t a r d i fe ren tes n íve is de g rav idade do t rauma, estabelecido pelo s is tema AIS/ISS* : 44,6% t rauma leve; 43,4% moderado e 12% grave.

- Ter diferentes níveis de alteração de consciência na primeira avaliação feita pela equipe de neurocirurgia: 8,4% com ECG1 (Escala de Coma de Glasgow) < 8; 15,6% com ECG1 entre 9 e 12; 72,3% com ECG1 > 13.

- As ví t imas t inham idade ent re 12 e 60 anos sendo que a maioria, 69.9%, t inha até 35 anos.

Tabela 1 1993/94.

Ocupação principal

. remunerada

. estudante e ocupação remunerada

. estudante

. desempregado

. atividades do lar

. aposentado

TOTAL

A maioria das ví t imas (56,7%) t inha ocupação remunerada como at ividade principal. Além disso, entre os 22 es tudantes , a maioria (13) também t inha atividade remunerada. Devido ao critério de inclusão na população de ví t imas de até 60 anos, a menor f r e q ü ê n c i a foi a de a p o s e n t a d o s (2 ,4%) . O desemprego ocorreu em 10,8% dos avaliados, sendo tal freqüência compatível com a taxa de desemprego da região no per íodo . S e g u n d o informações da Fundação Sistema de Análise de Dados (SEADE) 8 , a taxa de desemprego na G r a n d e São Paulo, no primeiro semestre de 1993, foi em média de 15,4.

Na época do evento t raumát ico , 72 (86,8%) pessoas ap re sen t avam a t iv idades ocupacionais e fo ram a n a l i s a d a s q u a n t o a s eu r e t o r n o à produtividade tan to aos 6 como aos 12 meses após o t rauma. Pa ra subsidiar ta l análise, agrupou-se os t raumat izados, segundo sua condição em relação a ocupação principal em 3 categorias conforme descrito na metodologia e a seguir discr iminadas.

- At iv idade i n t e r r o m p i d a : n e s t a ca tegor ia foram incluídos i n d i v í d u o s que após o t r a u m a mant inham-se afastados do t raba lho r emunerado exercido r e g u l a r m e n t e e e s t u d a n t e s e pessoas envolvidas em afazeres do lar a fas tadas de suas atividades. Quando o indivíduo m a n t i n h a ocupação

R e t o r n o a P r o d u t i v i d a d e

Nas 83 vítimas das quais conhecia-se a evolução de 1 ano analisou-se comparativamente seu retorno à produtividade, considerando-se o período de 6 meses e 1 ano. Para tal análise inicialmente essas vítimas foram classificadas segundo sua ocupação principal, sendo apresen tada sua distr ibuição segundo essa categorização na Tabela 1.

n %

47 56,7 13 15,7 09 10,8 09 10,8 03 3,6 02 2,4

83 100,0

r emunerada e era es tudante , só era incluído nessa categoria se afastado das duas atividades.

- Alterada devido ao t r auma: foram incluídos n e s t a c a t e g o r i a i n d i v í d u o s com m u d a n ç a de ocupação conseqüente às condições pós-traumáticas; re torno à ocupação anter ior sem conseguir o mesmo nível de desempenho; retorno à ocupação anterior reduzindo o tempo dedicado ao seu desempenho; d e s e m p r e g a d o após t r a u m a , p o r é m m a n t e n d o t rabalho r emunerado exercido de forma irregular; es tudantes e pessoas envolvidas em atividades do lar que re tornaram a essas atividades sem conseguir m a n t e r o mesmo d e s e m p e n h o . F i z e r a m p a r t e t ambém desse grupo indivíduos que man t inham t a n t o o c u p a ç ã o r e m u n e r a d a como a t i v i d a d e s escolares, caso estivessem afastados de uma dessas duas at ividades, ou ainda, se numa delas ou ambas apresentassem al teração de desempenho.

- Retorno com o mesmo desempenho: neste grupo foram incluídos indivíduos que re tornaram a sua ocupação principal com o mesmo nível de desempenho.

P a r a anál i se compara t iva apresenta-se na Tabela 2 as v í t imas que m a n t i n h a m at ividades p r o d u t i v a s s e g u n d o ocupação p r i n c i p a l e sua condição em relação a essa atividade após o t rauma, nos 2 diferentes períodos de avaliação.

- Distribuição das v í t imas com evolução de 1 ano segundo sua ocupação principal. São Paulo,

A AIS (Abbrev ia ted Injury Sca l e ) é u m s i s t e m a a v a l i a t i v o , d e base a n a t ô m i c a q u e c lass i f ica cada l e s ã o d e c o r r e n t e d e um trauma, reg ião corpórea e e s t a b e l e c e u m e s c o r e que ind ica g r a v i d a d e de u m a l e s ã o i s o l a d a m e n t e . A g r a v i d a d e global do t r a u m a é obtida pelo ISS (Injury S e v e r i t y Score) e s c o r e m a t e m a t i c a m e n t e ca lcu lado a par t i r do A I S 1 .

Tabe la 2 - Distribuição das ví t imas com atividade produt iva no período anter ior ao t r a u m a segundo ocupação principal e condição ocupacional aos 6 e 12 meses após TCE. São Paulo, 1993/94.

Condição c ocupacional

Remun

n° %

>cupação ]

Ativ. do lar

n° %

arincipal

Remun +

estud.

n° %

( 6 meses'

Estud.

n° %

TOTAL

n° %

Remun

n° %

ocupaçãc

Ativ. do lar

n° %

) principa

Remun +

estud.

n° %

1 (1 ano)

Estud.

n° %

TOTAL

n° %

- atividade interrompida 15 20, - alterada devido ao trauma 08 11, - retorno com o mesmo desempenho 24 33,

01 1,4

02 2,8

02 2,8

07 9,7

04 5,5

01 1,4

03 4,2

05 6,9

19 26,

18 25,

35 48,

11 15,

05 6,9

31 43,

01 1,4

02 2,8

01 1,4

07 9,7

05 6,9

01 1,4

08 11,

12 16,

14 19,

46 63,

TOTAL 47 65, 3 4,2 13 18, 9 12, 72 10 47 65, 3 4,2 13 18, 9 12, 72 10

No geral, o percentual de vítimas que retornou à produtividade aos 6 meses foi de 73,6% (25,0% + 48,6%) e aos 12 meses de 83,3% (19,4% + 63,9%) quando vítimas que re tornaram a ocupação principal mantendo o mesmo nível de desempenho ou com limitações, foram consideradas produtivas.

Resu l t ado s e m e l h a n t e foi e n c o n t r a d o por MACKENZIE et al 1 9 no seguimento de ví t imas de t rauma em geral. Eles verificaram que após 1 ano da alta hospi ta lar , 17,0% dos t r auma t i zados em seguimento a inda encon t r avam-se incapazes de t rabalhar , ir à escola ou realizar as atividades do lar. Resultados menos favoráveis foram obtidos por MORRIS et a l 2 2 quando anal isam vít imas de t r a u m a cujo custo da internação superou a 100.000 dólares. Nesses i nd iv íduos o r e t o r n o à p r o d u t i v i d a d e , avaliado pelo menos 1 ano pós-trauma, era de 54,5%. Entretanto, nesse mesmo estudo, ao se anal isarem separadamente as ví t imas de TCE observou-se que o retorno à ocupação principal foi de 72,0%.

No p e r í o d o de 1 a n o , t o d a s a s p e s s o a s envo lv ida s em a t i v i d a d e s do l a r ou s o m e n t e es tudantes antes do t r a u m a haviam re tornado à p r o d u t i v i d a d e . O m e s m o n ã o o c o r r e u com os indivíduos que mant inham atividades remuneradas . Dos 13 es tudantes que t rabalhavam, 1 cont inuava afastado e das 47 ví t imas com t rabalho remunerado 11 c o n t i n u a v a m com a t i v i d a d e i n t e r r o m p i d a , atingindo assim proporção de aproximadamente 1 afastado para cada 4 indivíduos.

Ainda que o pe r íodo de 1 ano p o s s a se r considerado suficiente pa ra pelo menos iniciar o preparo dos afastados do t rabalho remunerado pa ra outra função compatível com sua incapac idade 1 8

nenhuma das 12 ví t imas que continuavam afastadas na FASE 2, encontrava-se em ta l si tuação. Além disso, 2 v í t imas , que não t inham possibilidade de retorno à sua função anterior, queixavam-se também de ausência de apoio social pa ra p reparo em outra área de a tuação. Out ro sent imento expresso pelos afastados era a vontade de re to rna r ao t rabalho, c o n t r a p o n d o - s e ao r e c e i o de d e s e m p r e g o em conseqüência da incapacidade de man te r o mesmo nível de desempenho em sua função.

C o n s i d e r a n d o - s e t o d o s i n d i v í d u o s que m a n t i n h a m a t i v i d a d e r e m u n e r a d a , i s to é, es tudantes ou não que apresen tavam esse tipo de ocupação, t inha-se 60 ví t imas. Destas , no período de 1 ano, 12 não hav iam re tornado ao seu t rabalho remunerado , perfazendo percen tua l de 20,0%

Em estudos que anal i sam separadamente o re torno à a t iv idade r e m u n e r a d a no período após t rauma, observa-se que resultados diferenciados das ví t imas de TCE são apresentados quando o retorno a q u e l a a t i v i d a d e é a v a l i a d a . R H O D E S et a l 2 8

verificaram que 75,3% dos indivíduos, atendidos em c e n t r o de t r a u m a , r e t o r n a r a m a s u a s i t u a ç ã o anter ior de t raba lho r emunerado ent re 6 meses e 2 anos e meio após o acidente ou violência, e que 46% dos de sempregados i n i c i a lmen te r e t o r n a r a m ao t r aba lho r e m u n e r a d o n u m período subseqüente . F R U T I G E R et a l 7 a p r e s e n t a m r e s u l t a d o s semelhantes , aval iando t raumat izados após 5 anos de t rauma. Es tes autores especificam, entre tanto , que dos 79% dos pac i en te s que se encon t ravam t raba lhando, 11% t iveram necessidade de mudar de ocupação e 35% referiram significantes problemas no t rabalho. Ressal tam ainda que o desemprego é

pra t icamente inexis tente na Suíça, local onde foi r e a l i z a d o o e s t u d o , e m e s m o p e s s o a s que são i n c a p a z e s , d i f i c i lmen te sofrem o r i sco de não conseguir emprego. Mesmo as ví t imas de t r a u m a grave, com valores do ISS em média de 39 e com lesões em pelo m e n o s q u a t r o r eg iões do corpo analisadas por KIVIOJA et a l 1 6 ap resen ta ram níveis de retorno ao t rabalho de 72% quando examinados entre 5 e 20 anos após o t r auma . MACKENZIE et al 1 9 es tudando os resu l tados do t r a u m a e fatores relacionados a recuperação, observaram que 57% dos indivíduos que e s t a v a m t r a b a l h a n d o em tempo i n t e g r a l , a n t e s do t r a u m a , r e a s s u m i r a m seu e m p r e g o da, m e s m a f o r m a , d e n t r o de 1 ano . Ent re tan to , observaram também que as ví t imas de TCE ou lesão m e d u l a r g r a v e são a q u e l a s que apresentam o mais alto risco de não re to rna rem ao trabalho remunerado.

Corroborando tais resultados, uma capacidade bem menor de re to rno ao emprego é encon t rada especificamente nos estudos referentes às ví t imas de TCE. TATE et a l 2 9 ana l i s ando conseqüências psicossociais do t r auma craniano grave, observaram que um qu in to da sér ie de pac i en t e s ava l iados encontravam-se normalmen te empregados após 3 anos de TCE e somente 40% dos indivíduos do grupo que a p r e s e n t a r a m boa recuperação m a n t i n h a m e m p r e g o n e s s e p e r í o d o . G E N S E M E R et a l 1 0 , acompanhando ví t imas de TCE com aparen te boa r ecupe ração , mas com que ixas cogn i t ivas e de mudança de personal idade, ap resen tam resul tados semelhantes , encont rando 65% da sua população desempregada e 35% t raba lhando. RAPPAPORT et al 2 4 , anal isando os resul tados do TCE ent re 5 e 10 anos após sua ocorrência, verificaram que somente 11% dos indivíduos entrevis tados consideravam-se capazes de man te r um emprego sem modificações que atendessem suas limitações. Observaram ainda, que 6 1 % d a s v í t i m a s de T C E e n t r e v i s t a d a s , e n c o n t r a v a m - s e d e s e m p r e g a d a s n a época da en t rev is ta , e n q u a n t o an te s do t r a u m a todas se e n c o n t r a v a m e m p r e g a d a s . A p r o x i m a - s e dos resultados de RAPPAPORT et a l 2 4 aqueles indicados por GROSWASSER; SAZBON 1 2 . Neste últ imo são i n c l u í d a s v í t i m a s de T C E q u e e s t i v e r a m i n c o n s c i e n t e s p o r m a i s de 30 d i a s , m a s q u e r ecupe ra r am a consciência. Observa-se em seus resultados, baseados em informações coletadas pelo menos um ano após al ta do hospital de reabil i tação, que somente 11,1% das v í t imas ava l i adas e ram capazes de reassumir t raba lho em mercado aberto e 48,6% e r a m i n c l u í d a s em e m p r e g o s e spec ia i s . Analisando mater ia l referente a t r a u m a craniano do banco de ciados da Univers idade da Virginia, JANE; RIMEL 1 4 descrevem que não houve retorno ao t rabalho até 3 meses pós- t rauma nos indivíduos com TCE grave; naque les com TCE moderado o

retorno foi de 33% e no grupo de TCE leve de 66%. Por outro lado, ODDY et a l 2 3 , analisando retorno ao trabalho, 2 e 7 anos após TCE grave, verificaram que aqueles que eram desempregados 2 anos após a injúria man t inham a mesma condição 7 anos após o t r auma.

Melhores resul tados de retorno ao trabalho remunerado são apresentados no presente estudo, quando comparados com publicações direcionadas especificamente a vítimas de TCE. Nessas pesquisas, eram diferentes a gravidade do t r auma das vítimas e o período em que avaliações foram realizadas. Há po r t an to , pe r spec t i va s d i s t i n t a s n a comparação desses r e su l t ados , quando se considera que no p r e sen t e es tudo v í t imas de todas as gravidades foram anal isadas , enquanto a maioria das incluídas nos estudos comentados são pessoas gravemente t r a u m a t i z a d a s , g rupo que tem at ingido cerca de 10,0% daqueles in ternados por TCE 1 7 .

Ainda que os 6 pr imei ros meses possa ser c o n s i d e r a d o como i n t e r v a l o de t e m p o de estabilização da recuperação do t raumatizado e uma época em que a maior ia das v í t imas re to rna às at ividades que exercia an te r io rmente ao t rauma, deficiências ou incapacidades residuais permanecem por períodos superiores a 1 ano as quais interferem na capacidade da ví t ima exercer papéis e funções que dela são esperados.

Embora o evento t raumát ico geralmente leve s o m e n t e s e g u n d o s p a r a o c o r r e r , s e u s efeitos permanecem por longos períodos na vít ima e seus familiares, sendo poucos eventos na vida, que como o TCE, podem precipi tar mudanças tão acentuadas em papéis, relações e objetivos de suas ví t imas 3 0 .

A n e c e s s i d a d e de a s s i s t ê n c i a de s se s t r a u m a t i z a d o s p e r m a n e c e , po r t an to , por longos períodos após TCE, e vão além da necessidade de auxílio pa ra re tomar suas capacidades funcionais. Controle dos riscos em potencial e da sintomatologia a p r e s e n t a d a , s u p o r t e p a r a r e i n s e r ç ã o social à medida que dificuldades se estabeleçam, apoio para estabil ização emocional de indivíduo e família e obtenção de informações factuais são importantes d e m a n d a s de a s s i s t ê n c i a a p r e s e n t a d a pe los t raumat izados as quais deveriam ser atendidas com recursos e por equipe multiprofissional de saúde p repa rada pa ra esse a t e n d i m e n t o 3 3 0 . A ausência de tais condições de assistência, para o atendimento de mui tas ví t imas t raumat izadas , conduz a maior dimensão do problema, tanto a indivíduos e famílias, como aumen tam a magni tude das conseqüências do TCE na sociedade.

De fato, o TCE afeta a ví t ima pessoalmente, interpessoalmente e o seu sistema social. Além disso, seu impacto financeiro está duplamente presente. Por um lado, pelo custo hospi ta lar seguido de longo

período de necessidade de suporte do s is tema de saúde para reabilitação e por outro, compondo esse impacto es tão as s e m a n a s e anos de p e r d a de produtividade. Claramente, as ocorrências do TCE e suas conseqüênc i a s têm a t i n g i d o proporções epidêmicas justificando atenção como um grande problema de saúde da sociedade.

F a t o r e s R e l a c i o n a d o s a o R e t o r n o a o T r a b a l h o R e m u n e r a d o

No presente estudo, pa ra anal isar o retorno ao t rabalho r e m u n e r a d o e as possíveis associações com o nível de escolaridade, apresenta-se na Figura 1 a d is t r ibuição das 60 v í t imas que m a n t i n h a m a t i v i d a d e r e m u n e r a d a no p e r í o d o a n t e r i o r ao t r auma , segundo seu nível de escolaridade e retorno à ocupação r emune rada , t an to no período de 6 como de 12 meses pós- t rauma.

Como mostra a Figura 1, o retorno ao t rabalho rem unerado das vítim a s com escolaridade > 9 anos foi semelhante entre os 2 períodos de avaliação. No grupo com escolaridade < a 8 anos o número de indivíduos afastados de sua atividade r emunerada era aos 6 meses a p r o x i m a d a m e n t e m e t a d e das vítimas, en t re tan to aos 12 meses tal proporção é reduzida a menos que 1/3.

Para de terminar a significância da diferença entre os grupos com escolaridade menor ou igual e maior que 8 anos, aplicou-se a prova exata de Fisher. Ainda que p r o p o r c i o n a l m e n t e p a r e ç a h a v e r comportamento diferente entre os grupos quanto ao retorno ao t rabalho a diferença observada não foi estat ist icamente significativa.

Tais resultados diferem dos de outros estudos que mos t r am m e n o r f r eqüênc i a de r e t o r n o ao t rabalho em ví t imas de t r a u m a com mais baixa escolar idade 1 1 , 1 8 , 2 7 . En t re tan to , é in teressante mais uma vez mencionar que o presente estudo englobou vítimas de TCE de diversas gravidades, enquanto nas publicações mencionadas, os part icipantes eram vítimas de t r auma em geral ou de TCE leve.

Por outro lado, resul tados do presente estudo são c o n c o r d a n t e s com o de R I M E L et a l 2 8 que anal isam ví t imas de TCE moderado e verificam que o re to rno ao t r aba lho não foi s ignif icat ivamente associado com o nível de escolaridade. MORRIS et al 2 2 também concluíram que escolaridade está entre os fatores que es ta t i s t icamente não indicam baixa probabil idade de re torno ao t raba lho nas ví t imas de t r auma.

O u t r o fa tor que t e m sido a p o n t a d o como re lac ionado com re to rno ao t r aba lho é o tipo de o c u p a ç ã o . A l g u n s e s t u d o s t êm m o s t r a d o que indivíduos envolvidos em ocupações tipo "blue collar" têm menos re torno ao t rabalho que os d e m a i s 1 8 1 9 , 2 4 . RIMEL 2 6 , referindo-se a t r aba lhadores envolvido neste tipo de ocupação, descreve estes indivíduos como aqueles que exercem ofícios ins t rumenta i s e semi- ins t rumenta is .

P e n s a n d o - s e n u m a p rováve l s imi la r idade , classificou-se inicia lmente as ocupações conforme F O N S E C A 6 em m a n u a i s n ã o e s p e c i a l i z a d a s , m a n u a i s e s p e c i l a i z a d a s , s e n d o que as dema i s ocupações foram categorizadas como outras .

Os cr i tér ios p a r a essa ca tegor ização estão apresentados no ANEXO I, assim como a relação de ocupações considerada em cada uma das categorias.

Designou-se de Grupo A, aquele que incluía i n d i v í d u o s com o c u p a ç õ e s m a n u a i s n ã o especilalizadas, GrupoB, manua i s especializadas e Grupo C, outras ocupações. Pelo teste Qui-quadrado não se observou associação en t r e cada grupo de ocupação e o retorno ao trabalho remunerado quando testados isoladamente.

Considerando-se e n t r e t a n t o que ocupações "blue collar" incluem ocupações manuais de forma genérica, outra análise dos dados foi realizada. Na Figura 2, estão apresen tadas de forma agrupada as vít imas com ocupações manuais especializadas e não especializadas as quais são anal isadas segundo seu retorno ao trabalho em comparação com aquelas com outros tipos de ocupação.

Observa-se na F igura 2 que aos 6 meses pós-t r a u m a o r e to rno ao t r a b a l h o ocorreu de forma semelhante nesses dois grupos, sendo en t re tan to no g r u p o de v í t i m a s com o c u p a ç ã o m a n u a l proporc iona lmente maior o con t ingen te dos que r e t o r n a r a m ao t r aba lho no período de 1 ano, se comparado àqueles de out ras ocupações. Assim como nível de escolaridade, o t ipo de ocupação não foi um fator relacionado significativamente ao retorno ao t r a b a l h o . Tais r e s u l t a d o s foram obse rvados na aplicação da Prova exata de Fisher ut i l izada pa ra de terminar a significância de diferenças en t re os g rupos r e u n i d o s n a c o m b i n a ç ã o g r a f i c a m e n t e apresentada.

Resultados contradi tór ios foram observados por outros autores. O tipo de ocupação foi associada com r e t o r n o ao t r a b a l h o nos e s t u d o s de MACKENZIE et a l 1 8 1 9 e de RIMEL et a l 2 7 quando anal isaram ví t imas de TCE leve. Em outros estudos tal associação não foi o b s e r v a d a 1 3 2 2 2 8 . É possível que diferentes períodos de aval iação pós- t raumát ica , diferenças sócio-econômicas e cul turais , assim como níveis ocupacionais desiguais t e n h a m ocasionado essas diferenças.

No p r e s e n t e es tudo n e n h u m a das v í t imas incluídas poderia ser categorizada como profissional l i b e r a l ou como o c u p a n t e de c a r g o s de a l t a administração. Provavelmente, a homogeneidade da s i tuação sócio-econômica do grupo aval iado não p e r m i t i u que d i f e r e n ç a s s ign i f i ca t ivas fossem observadas. Segundo RIMEL et a l 2 7 , pacientes com m a i s b a i x o s n í v e i s o c u p a c i o n a i s são m e n o s motivados e usam seu t r a u m a como uma desculpa p a r a não r e t o r n a r ao t r aba lho remunerado . Por o u t r o lado, a q u e l e s com a t iv idade prof iss ional d e f i n i d a , g e r a l m e n t e t ê m m a i s r e c u r s o s que permitem amenizar efeitos indesejáveis do t rauma nesse retorno.

Há c laramente outros fatores que não foram c o n s i d e r a d o s n a p r e s e n t e a n á l i s e que podem influenciar na si tuação empregatícia pós-trauma. Es tes incluem salár io, idade, suporte familiar, a quant idade e qualidade da reabilitação vocacional a s s i m como t r a ç o s de p e r s o n a l i d a d e e compor tamento anter iores ao t r auma . A falta de incentivo financeiro pa ra o t rabalho também pode ser estimulada através de recebimento de pagamento devido à incapacidade, podendo prolongar o período

de a fas tamento e a q u a n t i d a d e de pessoas que re tornam ao t raba lho após o t r a u m a , embora os r e su l t ados obt idos n ã o a p r e s e n t e m ev idênc ia s consistentes a esse respeito.

5 C O N C L U S Õ E S

O estudo das ví t imas de TCE com diferentes níveis de gravidade do t rauma, diferentes níveis de alteração de consciência na pr imeira avaliação feita pelo neuroci rurgião e idade en t re 12 e 60 anos permitiu as conclusões enunciadas a seguir.

Quanto ao retorno à produtividade

- Aos 6 meses: A maioria (73,6%) dos traumatizados já havia retornado à produtividade, havendo entretanto entre eles, 25,0% que apresentavam em conseqüência do trauma alterações em sua ocupação principal.

• 1 ano após TCE:. Retorno à produtividade ocorreu numa freqüência de 83,3% e destes, 19,4% t inham alterado a sua ocupação principal.

- Entre 6 meses e 1 ano:. Alterações favoráveis na produtividade das ví t imas ocorreram nesse período tanto pelo aumento da freqüência de indivíduos que retornaram a produtividade, como pela diminuição daqueles que a l te raram sua atividade.

Quanto ao re torno ao t rabalho remunerado e as variáveis níveis de escolaridade e tipo de ocupação a n t e r i o r ao t r a u m a , n ã o h o u v e a s s o c i a ç ã o estatisticamente significativa, seja aos 6 meses como 1 ano após o evento t raumático.

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A N EX O I

T ipos de o c u p a ç ã o a n t e s d o t rauma.

(Baseado nos níveis ocupacionais apresentados por FONSECA^)

A Ocupações manuais não especializadas: aquelas que envolvem trabalho manua l e que não exigem experiência profissional prévia ou preparo profissional formal.

B

Ocupações manua i s especializadas: aquelas que envolvem tarefas manua i s que são precisas, minuciosas e conseqüentemente exigem elevado grau de habil idade manual . Ao contrár io das ocupações manuais não especializadas, exigem experiência profissional anter ior ou preparo formal.

C Outras ocupações: aquelas que envolvem tarefas não manuais que exigem diferentes graus de especialização e portanto, exigem níveis mínimos de escolaridade e/ou experiência profissional anterior . Inclui cargos de supervisão, de gerência e técnico de nível médio.

Ocupações incluídas na categoria Ocupações incluídas na categoria Ocupações incluídas na categoria A: B: C:

. repositor de mercadoria em . artesão em metal; . assistente de faturamento; supermercado: . meio oficial de manutenção; . comerciante; . faxineiro e vigilante; . massagista e caldereiro em . decorador; . lavadeira; sauna; . empreiteiro; . ajudante de motorista; . mecânico de retifica de motor; . assistente financeiro; . ajudante geral (fábrica de . pedreiro; . vendedor de loja de móveis; margarina); . mecânico de manutenção; . conferente (restaurante); . ajudante em metalúrgica; . cabeleireiro; . caixa de banco; . lombador (carregador de carne); . cozinheira; . vendedor de anúncio de jornal e . ajudante de montagem de . colocador de papel de parede; fotógrafo; "stand"; . costureira; . controlador operacional da . ajudante geral de construção . taxista; CETESB; civil; . operador de fundaria industrial e . encarregado geral em loja de . empregada doméstica; caldereiro; material de construção; . montador em linha de produção . jogador de futebol júnior; . professor; (plástico); . técnico de exaustores; . chefe de secção em metalúrgica; . segurança; . mecânico de produção; . cobrador de ônibus; . servente de pedreiro; . reparos gerais (pintor, . supervisor técnico em . borracheiro (empresa de ônibus); carpinteiro, encanador); metalúrgica; . faxineiro; . funileiro; . fiscal de ônibus; . vigia: . bombeiro. . proprietário de lavanderia . caseiro; industrial; . auxiliar de embalagem; . gerente operacional de empresa . ajudante geral (casas de transportes; pré-moldadas); . vendedor de auto-peças. . office-boy; . balconista de padaria.