violaÇÃo de sigilo funcional por polÍcia federal

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VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLICIAL FEDERAL

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Page 1: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR

POLICIAL FEDERAL

Brasília

2010

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VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR

POLICIAL FEDERAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Academia Nacional de Polícia como exigência parcial para a obtenção do título de Especialista em Gestão de Política de Segurança Pública.

Brasília

2010

Page 3: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLICIAL

FEDERAL

Trabalho de Conclusão de Curso submetido à banca examinadora da Academia Nacional de Polícia como exigência parcial para a obtenção do título de Especialista em Gestão de Política de Segurança Pública.

______________________________________

___________________________________________

Examinador 1:

__________________________________________

Examinador 2:

Aprovado em ____/____/____.

Brasília

2010

Page 4: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Dedico este trabalho aos colegas policiais federais, especialmente aos que contribuíram para este trabalho.

Page 5: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Agradeço primeiramente a Deus, em razão da

oportunidade de apresentação deste trabalho.

Agradeço à minha família pela compreensão

deste trabalho e pelas horas deixadas de

convívio, além do esforço para meus estudos

por parte de minha mãe, que está torcendo por

mim, junto ao Senhor.

Page 6: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

RESUMO

Trata-se de estudo sobre o crime de violação de sigilo funcional, constante do artigo 325 do Código Penal, perpetrado por policial federal, bem como as implicações decorrentes desta violação em uma operação policial, para a administração pública, para o alvo da operação, para o jornalista e para o policial. Expõe-se sobre o direito à informação e à publicidade, bem como sobre a possibilidade de ação de dano moral pela pessoa exposta indevidamente. Ao mesmo tempo mostra a imprescindibilidade do sigilo para o inquérito policial, assim como faz um paralelo sobre os crimes de divulgação de segredo e violação de segredo profissional. Mostra também as implicações de ordem administrativas e penais. Explana sobre o risco à integridade física do jornalista, do policial e sobre a imagem do investigado, alvo da operação policial, quando exposta indevidamente.

Palavras-Chave: Crime de violação. Sigilo funcional. Policial Federal. Aspectos penais e administrativos.

Page 7: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

ABSTRACT

The current study focuses on the crime of revelation of secrets by public agents, capitulated in the section 325 of the Penal Code, committed by a federal police officer. It also covers the implications generated by this revelation in a police operation, regarding the public administration, the target, the journalist and the police officer involved. It deals with the right to information and publicity, also touching the possibility of lawsuit for emotional distress, by the person unrightfully exposed. At the same time, the study shows how essential the secrecy of police investigation is, making a link to the crimes of unveiling secret and professional secret revelation. It also shows its administrative and penal implications. Finally, it comprehends the risk to the physical integrity of the journalist, the police officer and over the image of the person being investigated, when unrightfully exposed.

Key-words: Crime revelation. secrets by public agents. Federal Police. Penal and administrative aspects.

Page 8: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.............................................................................................................8

1 O SIGILO NA INVESTIGAÇÃO POLICIAL............................................................11

1.1 Inquérito Policial................................................................................................11

2 DIREITO À INFORMAÇÃO E À PUBLICIDADE....................................................13

2.1 Lei De Imprensa (Lei Nº 5.250/67) E Dano Moral.............................................16

2.2 Lei Da “Mordaça”...............................................................................................17

2.3 A Comunicação Social No DPF........................................................................18

3 ASPECTOS PENAIS E ADMINISTRATIVOS DA VIOLAÇÃO DO SIGILO...........20

3.1 Aspectos Penais: Art. 325 do Código Penal....................................................20

3.1.1 Conceito de Servidor Público para fins Penais............................................22

3.1.2 Dos Crimes de Divulgação de Segredo e Violação do Segredo

Profissional..............................................................................................................23

3.2 Aspectos Administrativos.................................................................................24

3.2.1 Transgressão Disciplinar...............................................................................26

4 A IMPORTÂNCIA DO SIGILO PARA O INQUÉRITO POLICIAL..........................29

4.1 O Risco à Integridade Física do Jornalista......................................................32

4.2 O Risco ao Policial e à Efetividade da Investigação.......................................33

4.3 A Imagem do Investigado..................................................................................35

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................39

REFERÊNCIAS.........................................................................................................42

Page 9: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

INTRODUÇÃO

Este Trabalho de Conclusão de Curso pretende estudar o sigilo funcional no

âmbito das operações da Polícia Federal, bem como suas implicações criminais e

operativas, além dos direitos fundamentais, em caso de violação desse sigilo para o

policial federal, o jornalista e a pessoa alvo da operação.

A relevância do estudo leva em conta o interesse midiático sobre as

operações da Polícia Federal que, via de regra, são objeto de ampla cobertura

jornalística.

Observa-se, contudo, que se a regra é a de que a investigação é acobertada

pelo sigilo, a fim de que permita seu êxito, bem como preserve a imagem do

investigado, uma vez repassada a informação de que a operação será deflagrada,

esse vazamento de informação importa em violação de sigilo funcional ou a polícia

está apenas zelando pela transparência de seus atos e atendendo ao interesse da

sociedade à informação?

Embora a divulgação controlada não gere, necessariamente, prejuízo à

investigação, resta claro que a divulgação da investigação, sobretudo de

informações sigilosas, uma vez que não ocorreu julgamento final do processo

criminal, pode prejudicar a imagem do investigado caso este não seja considerado

culpado.

Ademais, diferentemente da cobertura jornalística em uma guerra, a

operação policial tem um objetivo específico, que pode ser a prisão de um

investigado ou a obtenção de provas. Assim sendo, em razão da presença do

jornalista no palco da operação policial, ele poderá vir a ser alvo de atentado contra

sua integridade física.

O estudo do crime de violação de sigilo funcional, perpetrado, obviamente

por funcionário público no exercício de suas funções, no caso um policial federal,

que transmite uma informação sigilosa a um jornalista, que visando obter um furo de

reportagem, comparece ao local em que a operação será realizada e grava imagens

do suposto criminoso, que está sendo preso em flagrante delito ou em cumprimento

a mandado de prisão, transmitindo posteriormente, após edição, parte das imagens

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Page 10: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

da pessoa presa, sem que haja uma decisão judicial já transitada em julgado

referente à condenação ou não do acusado, o que também poderá acarretar direito

à indenização na seara cível.

Dentro da temática para este trabalho, qual seja, o sigilo das operações da

Polícia Federal, o problema da pesquisa é: “Qual a relevância do sigilo funcional nas

operações da Polícia Federal, no que se refere ao sucesso da ação policial, à

preservação da imagem do investigado e à integridade física do jornalista?”

Assim, caso a operação policial não obtenha êxito, em razão de possível

vazamento de informação por um policial à imprensa, este poderá ser

responsabilizado. Outro ponto que será abordado em momento posterior deste

trabalho, diz respeito ao papel do jornalista e o direito à informação.

Existe a possibilidade real de ocorrência de algum dano à integridade física

do jornalista, assim sendo, não parece viável que a equipe de policiais seja

responsabilizada, pois o repórter entrou no palco de operação por sua conta e risco.

Nesse caso, parece ser prudente, na reunião que antecede à operação policial,

deixar pré-estabelecido que se hipoteticamente comparecer uma equipe de

reportagem, esta não deverá ingressar no perímetro operacional.

Caso a imagem do investigado seja divulgada por televisão, jornal ou outro

meio de comunicação e posteriormente seja demonstrada sua inocência, como

justificar a divulgação da informação em face do princípio da presunção de não

culpabilidade? Como fica o direito à intimidade e à preservação da imagem do

investigado?

Não parece prudente aceitar que o direito à informação prevaleça sobre a

necessidade de preservação do sigilo.

Faz-se mister levar em consideração o possível dano que possa ocorrer,

caso a imagem do investigado seja divulgada, sendo ele posteriormente, inocentado.

Ressalte-se que este trabalho pretende refletir acerca da importância do sigilo e do

direito à informação, a fim de contribuir para o aprimoramento das operações

policiais no âmbito da Polícia Federal, além de pesquisar sobre a importância do

sigilo nas operações policiais no DPF.

Almeja também discutir, no âmbito do direito brasileiro, acerca da garantia

ao sigilo em contrapartida com o direito à informação, levando-se em consideração a

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investigação policial e suas características essenciais (sigilo, inquisitividade,

oficialidade etc.).

Discutir sobre a importância do sigilo como forma de garantir o êxito da

operação policial, da imagem do investigado e da integridade física do jornalista.

Conforme Lopes Jr. (2003, p. 120):

No plano garantista, a publicidade abusiva dos atos da investigação preliminar é, desde o ponto de vista do sujeito passivo, o mais grave prejuízo que pode sofrer um inocente (e assim se presume a todos, até a sentença definitiva), pois coloca-o prematuramente no banco dos acusados. Essa situação leva a que, principalmente nos delitos graves, a imprensa induza a opinião pública a condenar sem prévio juízo. Uma eventual absolvição posterior – ao cabo de alguns anos – não tem o poder de “restabelecer” na sociedade uma situação que jamais poderia ter sido abandonada: a de inocente.

É a partir dessa perspectiva teórica que iremos abordar o tema do sigilo das

operações policiais.

A metodologia utilizada será a pesquisa bibliográfica, a partir da consulta em

livros de doutrina e publicações especializadas na área jurídica, além de consultas

pela internet e possíveis entrevistas.

O Trabalho de Conclusão de Curso utilizará um método descritivo-

explicativo, a partir do qual pretendemos descrever o funcionamento das operações

policiais e explicar as implicações de eventual vazamento sobre o trabalho policial,

apresentando exemplos.

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Page 12: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

1 O SIGILO NA INVESTIGAÇÃO POLICIAL

Um dos componentes mais relevantes para o sucesso da investigação

policial, sobretudo quando persecução penal estatal se dirige a grupos ou

organizações criminosas, é o sigilo.

O inquérito policial, principal peça jurídica que consubstancia a investigação,

como veremos a seguir, não pode desprezar essa característica tão relevante que,

além proteger à própria persecução, assume o papel de proteger o investigado e as

pessoas que cercam atividade policial de investigação.

1.1 Inquérito Policial

Não se pode deixar de traçar algumas linhas sobre a importância do

Inquérito Policial para os delegados de polícia federal, que é um instrumento de

suma relevância para a elucidação dos fatos, sem que, contudo, exista um lado a

escolher, isto é, há a preocupação de buscar a prova para que os fatos sejam

esclarecidos. Não paira sequer a pretensão de constar em nossos currículos a

quantidade de pessoas que prendemos e são mantidas na prisão, mas se procura,

apesar da pressão exercida pelos exíguos prazos, esclarecer os fatos, e se por

acaso tivermos em nossa consciência a certeza de que uma pessoa é culpada, não

mediremos esforços, dentro das possibilidades jurídicas, de fornecer subsídios para

que o representante do parquet federal possa dar andamento à próxima fase da

persecução penal.

Fernando da Costa Tourinho Filho (apud DAURA, 2006, p. 100), diz que: “[...]

o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma

infração penal e sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em

juízo, denomina-se inquérito policial”.

A respeito do inquérito policial, em seu site, Damásio de Jesus (2010), diz

que:

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O inquérito policial é um procedimento administrativo destinado a obtenção de indícios ou elementos que apontem a ocorrência de um crime e sua autoria. Tem natureza investigatória, escrita e sigilosa. É procedimento investigatório porque irá colher os necessários componentes de fundamentação da existência do delito, possuindo, portanto, caráter inquisitivo. Vale ressaltar que caráter inquisitivo, num Estado de Direito, também significa estar subordinado às normas jurídicas; nem acima delas, nem à sua margem. Por ser um instrumento legal, pré-processual, de natureza administrativa, embora não obedeça a um rito específico, o qual fatalmente comprometeria a investigação, é dotado de formalidades as quais devem ser respeitadas, principalmente no que tange a escrituralidade e ao sigilo. A investigação não deve pairar sobre espaços etéreos e desconhecidos, necessitando ser rigorosamente documentada e formalizada, para que excessos não ocorram. Quanto ao sigilo, ele é válido para se preservar a investigação e mais, para se preservar a pessoa humana nela envolvida. Até que os adequados elementos indicativos surjam e tomem contorno suficiente para embasar a acusação, não pode haver publicidade dos atos e a divulgação, também interesse da sociedade, deve seguir rigoroso critério de moderação e sensatez. Se o inquérito é preparatório da ação penal, considerando-o a lei até mesmo dispensável quando forem fornecidas sólidas e precisas informações documentais de autoria e materialidade, de acordo com o artigo 27 do CPP, não pode jamais servir, em seu decurso, como meio para formação de juízo da opinião pública sobre a pessoa tratada na investigação.

Indo além, Daura (2006, p. 102), afirma que:

Desta forma adjetivação negativa de ‘simples peça informativa dispensável’ imputada ao inquérito policial, somente serve a discursos tendenciosos, precipitados e preconceituosos que, sem sombra de dúvidas, colidem com a realidade cotidiana de nosso vasto sistema repressivo criminal brasileiro.

E Manoel Pedro Pimentel (1975, apud DAURA, 2006) diz que:

O inquérito policial ‘não é uma simples peça informativa como sustentam alguns autores’. Mais do que isso; é um processo (procedimento) preparatório, em que existe formação de prova, dispondo a autoridade policial de poderes para investigação. Não se trata, portanto, de um procedimento estático, em que o delegado de polícia se limita a recolher os dados que, eventualmente, cheguem ao seu conhecimento.

Sobre a preservação da vida privada do investigado, segue correio

eletrônico recebido de Célio Jacinto dos Santos (2010):

Ainda há que se observar à inviolabilidade da intimidade e da vida privada do investigado, nesta fase da investigação pré-processual, o que recomenda conferir um sigilo externo às investigações nesta fase que antecede a imputação ou indiciamento, sob pena de estigmatização prematura e indevida do cidadão investigado.

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2 DIREITO À INFORMAÇÃO E À PUBLICIDADE

Segundo o disposto no artigo 5º, inciso IX, da Constituição Federal é livre a

expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação,

independentemente de censura ou licença. Nesse diapasão presume-se que o

jornalista poderia apresentar o que quisesse, incluindo-se a imagem da pessoa

presa em cumprimento a mandado de prisão.

Entretanto, diante do conflito entre a liberdade de imprensa e o contido no

inciso X do mesmo artigo 5º, o legislador concedeu à pessoa que teve sua

intimidade violada, o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de

sua violação.

Neste sentido, Moraes (2005, p. 46) discorre que

A liberdade de imprensa em todos os seus aspectos, inclusive mediante a vedação de censura prévia, deve ser exercida com a necessária responsabilidade que se exige em um Estado Democrático de Direito, de modo que o desvirtuamento da mesma para o cometimento de fatos ilícitos, civil ou penalmente, possibilitará aos prejudicados plena e integral indenização por danos materiais e morais, além do efetivo direito de resposta.

A Constituição Federal, em seu artigo 220, disciplina a Comunicação Social,

estabelecendo que a “manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a

informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer

restrição, observado o disposto nesta Constituição.”

Referente ao assunto, Silva (1999, p. 249) afirma que:

A liberdade de informação jornalística de que fala a Constituição (art. 220, § 1º) não se resume mais na simples liberdade de imprensa, pois está ligada à publicação de veículo impresso de comunicação. A informação jornalística alcança qualquer forma de difusão de notícias, comentários e opiniões por qualquer veículo de comunicação social. Temos, pois, informações jornalísticas que são publicadas mediante: (a) veículos impressos de comunicação; (b) veículo de difusão (radiodifusão) sonora, de sons e imagens.

Assim, concluímos que a liberdade de imprensa constitucionalmente

definida, inclui a divulgação de imagem.

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Conforme Di Pietro (2003, p. 75), [...] “o inciso XIV (do artigo 5º da

Constituição Federal de 1988) assegura a todos o acesso à informação e

resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.

Sobre a investigação jornalística, Carvalho (2009, p. 256) afirma que,

A partir da reconhecida deficiência do aparelho policial para investigar crimes, a imprensa passou a chamar para si a tarefa de investigá-los e denunciá-los à sociedade, no que constitui uma das facetas do jornalismo investigativo, especificamente denominado, por alguns, de crônica policial e/ou crônica judicial.

Rui Barbosa, citado por Carvalho (2009, p. 255), afirma que:

A imprensa é a vista da Nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que ameaça.

Por outro lado, temos a investigação jornalística, que percorre os mais

diversos caminhos para obter a notícia. Nela a imprensa desenvolve modelos para a

obtenção da informação, mantendo contatos com policiais e até mesmo com

criminosos.

Referente a estes últimos, geralmente, quando existem imagens

transmitidas, essas são encobertas, desfigurando o rosto dos criminosos, ou mesmo

de outras pessoas em razão de segurança. Aí sim o jornalista invoca, quando

instado pelas autoridades, a Constituição Federal, resguardando o sigilo da fonte.

Conclui Carvalho (2009, p. 258) sobre a permanência de repórteres no palco

de uma operação policial:

Do mesmo modo, o ingresso em domicílio para acompanhamento de diligência judicial de busca a apreensão, não é possível tolerar-se. Quando o Judiciário quebra qualquer sigilo constitucional, o faz para fins de prova no processo e somente para esse fim, não podendo ocorrer a utilização da diligência para outro desiderato. Pronunciando-se exatamente sobre a hipótese aventada, a Corte de Nova York decidiu, em 1994, em uma ação cível movida contra a CBS que ‘a única razão pela qual a CBS estava presente na busca era para estimular a satisfação e o divertimento dos outros’ e que ‘a CBS não tem maior direito do que o de um ladrão de estar em sua casa.”

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Page 16: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Sobre o assunto, Carvalho (2009, p. 256) assevera que,

Assim, a investigação jornalística encontra também os seus limites em outros direitos fundamentais, especialmente os relacionados à intimidade das pessoas. Não se pode investigar tudo sem qualquer comedimento, até porque o que pode parecer ao jornalista um ato contrário aos interesses da sociedade, pode não representar absolutamente nada de imoral ou ilegal. E pode acontecer que, ao chegar a esta conclusão, os direitos individuais já tenham sido seriamente comprometidos.

Não parece coerente deixar o direito à informação, principalmente, a

informação oriunda de escândalos, que chamam a atenção do povo, onde não se

tem certeza dos fatos, sobrepujar o direito à imagem, uma vez que pode não ser

possível uma reparação eficaz. Naturalmente a legislação deverá ser revista, pois o

sensacionalismo jornalístico não pode ser mais importante que a Justiça.

Sabe-se da importância de ter uma imprensa livre de qualquer interferência,

e não se pretende impedir que ela venha a expor os fatos ou sua opinião, mas o que

se pretende é regrar a divulgação de nomes e imagens. Isto porque a simples

divulgação pelos meios de comunicação não fará com que o mal acontecido seja

desfeito, mas é evidente o interesse do público pela desgraça alheia, por notícias

escabrosas que em nada alteram o bem comum. Há que se ter um limite que não

afronte a liberdade jornalística nem o direito à imagem.

Lendo Évora, referente à liberdade, somos remetidos aos bancos das

faculdades de direito, onde a simplicidade é o mais difícil de todos os temas e

também o mais elementar, pois a liberdade não quer dizer ausência total de limites,

pois a todo direito corresponde a um dever e que a liberdade individual tem como

limite a liberdade dos outros e o respeito ao bem coletivo.

A Constituição de Portugal, assim como a do Brasil, asseguram a liberdade

de expressão e a de informação e novamente remete-se a Évora1. Entretanto, por

diversas vezes esse direito à informação entra em conflito com outros direitos

fundamentais, daí, segundo Évora (2010)

1 A liberdade de expressão, e a própria liberdade de informação – conhecida como liberdade de imprensa –, não é um privilégio particular de cada jornalista, nem um benefício para aquela

comunidade profissional, globalmente entendida. A liberdade de imprensa justifica-se no direito à informação que todos os cidadãos têm, traduzido na sua tríplice vertente: “o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações” (CRP: 1997, 36).

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Page 17: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Assim, revela-se óbvio que existe o conflito, teoricamente inevitável e praticamente frequente, entre os direitos, em princípio, de igual hierarquia – digamos, de forma sintética e compreensiva, o “direito à honra” de uma parte, e o “direito de informação”, de outra parte, um e outro, direitos fundamentais das pessoas, constitucionalmente reconhecidos e garantidos ao mesmo título, sendo certo que o direito de informar, articulado, embora, com a necessidade de vender, não pode e nem deve ofender a honra, violar a imagem, desvendar a vida privada alheia, ainda que este modo de fazer jornalismo vá ao encontro do gosto do público.

2.1 Lei De Imprensa (Lei Nº 5.250/67) E Dano Moral

Em recente julgamento no Supremo Tribunal Federal, a corte máxima do

país revogou, em sua totalidade a chamada Lei de Imprensa, em razão de não ser

compatível com a Constituição de 1.9882.

Assim sendo, não há que fazer qualquer menção quanto à atuação do

repórter que cobriu a matéria referente à operação policial, tirando fotos e

publicando imagens ou notícias do suposto criminoso, alvo da ação policial, à luz da

Lei Imprensa.

Porém, quanto à indenização por dano moral, David (2001, p. 470), ressalta

que:

Pretensão indenizatória por dano moral, emergente da exposição indevida e desautorizado da imagem do autor, em órgão de imprensa, como suspeito de crime hediondo, cuja autoria, depois, não lhe foi atribuída, diante das investigações policiais, foi acolhida pela r. sentença de fls., cujo relatório é também adotado, condenada a ré ao pagamento de indenização equivalente a trinta salários mínimos, na época da liquidação, com juros de mora, desde a citação, mais honorários advocatícios, à base de quinze por cento sobre o valor da condenação.

2Supremo julga Lei de Imprensa incompatível com a Constituição Federal. Por maioria, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou que a Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67) é incompatível com a atual ordem constitucional (Constituição Federal de 1988). Os ministros Eros Grau, Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso e Celso de Mello, além do relator, ministro Carlos Ayres Britto, votaram pela total procedência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130. Os ministros Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Gilmar Mendes se pronunciaram pela parcial procedência da ação e o ministro Marco Aurélio, pela improcedência. Na sessão desta quinta-feira (30/04/09), a análise da ADPF foi retomada com o voto do ministro Menezes Direito. O julgamento do processo, ajuizado pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) contra a norma, teve início no último dia 1º, quando o relator, ministro Carlos Ayres Britto, votou pela procedência integral da ação. Naquela oportunidade, Ayres Britto entendeu que a Lei de Imprensa não pode permanecer no ordenamento jurídico brasileiro, por ser incompatível com a Constituição Federal de 1988. O ministro Eros Grau adiantou seu voto, acompanhando o relator” (BRASIL, 2009).

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David (2001, p. 473) cita também decisão judicial, referente à exposição

indevida de alguém na mídia, após prisão em flagrante

Não subsiste respaldo para o alvitre de suposta prisão em flagrante do autor, nem se justifica sua exposição, pura e simples, açodada e gravosa, desde logo, embora se tratasse de pessoa com antecedentes criminais, o que não lhe retira, porém, os direitos fundamentais, dentre eles o que tem por cerne a honra pessoal e a própria dignidade; não foi assim, seria como regredir à civilização das castas, contestando uma categoria de párias, posta à margem da sociedade, sem oportunidade útil de reabilitação, na medida em que, à primeira suspeita, desse ou daquele crime acontecido, se divulgasse e ilustrasse a suposição de autoria, mais do que suficiente para estancar qualquer tentativa de reerguimento social ou de construção de vida nova, no processo de ressocialização do indivíduo.

E, por último, na mesma decisão judicial referente a crimes de imprensa,

David, chama atenção para o fato da indenização, havendo entendimento doutrinário

e jurisprudencial do cabimento de dano moral

Afinal, a indenização por dano moral tem caráter dúplice, pois tanto visa à punição do agente quanto à compensação pela dor sofrida, porém a reparação pecuniária deve guardar relação com o que a vítima poderia proporcionar em vida, ou seja, não pode ser fonte de enriquecimento e tampouco inexpressiva (RT 742/320), o que, mutatis mitandis, bem se amolda à espécie em exame, não sendo demasia aludir a que “a indenização por dano moral é arbitrável mediante estimativa prudencial que leve em conta a necessidade de, com a quantia, satisfazer a dor da vítima e dissuadir, de igual e novo atentado, o autor da ofensa (TJSP, 2ª Câm., rel. Des. Cezar Peluso, j. em 21;12.1993, JTJ-Lex 156/94, RT 706/67). Merece, destarte, mantida a r. sentença hostilizada, por seus fundamentos e pelos ora adicionados. Diante do exposto, nego provimento aos recursos (TJSP, 10ª C.D. Privado, AC nº 83.675-4, j. em 29.6.1999, rel. Des. Quaglia Barbosa, v.u., JTJ-Lex 228/68-71).

2.2 Lei Da “Mordaça”

Tão somente a título de menção, inclui-se o título referente ao denominado

Projeto de Lei da Mordaça, em que se suprime a possibilidade de se comentar sobre

assuntos sub judice aos membros da magistratura e do ministério público, além do

pagamento por danos morais.

Consta do Projeto de Lei nº 265/2007, a denominada “Lei da Mordaça”, que

faz menção ao pagamento de danos morais por membros do Ministério Público, que

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Page 19: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

intentarem ações temerárias ou por má fé, quando comprovadamente ocorrer dano

materiais, morais e à imagem, conforme ementa:

Altera as Leis no 4.717, de 29 de junho de 1965, n° 7347, de 24 de julho de 1985 e n°8.429, de 2 junho de 1992, de modo a deixar expressa a responsabilidade de quem ajuíza ação civil pública, popular e de improbidade temerárias, com má-fe, manifesta intenção de promoção pessoal ou visando perseguição política. (BRASIL, 2007).

Segundo Carvalho (2009, p. 270):

[...] são dois os projetos em andamento que tratam do assunto. O primeiro é um projeto de emenda constitucional, inserido na reforma do Judiciário, que proíbe juízes e promotores de: ‘revelar ou permitir indevidamente que cheguem ao conhecimento de terceiro fatos ou informações de que tenham ciência em razão do cargo e que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada, a imagem e honra das pessoas, especialmente nos meios de comunicação’[...].

Assim, de certa maneira o que se almeja é preservar a vida privada, a

imagem e a honra das pessoas. Não se está aqui expondo o ponto de vista sobre o

projeto de lei, mas apenas informando acerca da tendência do legislador em

preservar a vida particular das pessoas.

2.3 A Comunicação Social No DPF

Vale lembrar que no âmbito do DPF vigora a Instrução Normativa nº 013-

DG/DPF, de 30 de outubro de 2008, que Institui a Política de Comunicação Social da

Polícia Federal e dá outras providências, estando na Seção II as informações sobre

a Designação dos Servidores e na Subseção II encontram-se os Programas de

Imprensa e Divulgação.

Ressalte-se que no Capítulo VIII da referida Instrução Normativa,

encontram-se as Condutas que deverão ser obedecidas na Divulgação de

informações que digam respeito ao trabalho policial.

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Page 20: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

CAPÍTULO VIII

DAS CONDUTAS NA DIVULGAÇÃO

Art. 31. Em consonância com os Princípios, Diretrizes e Fundamentos Jurídicos e Regimentais da Política de Comunicação Social da PF, deverão ser adotadas as seguintes condutas na divulgação:

I – os fins de informar, preservando-se, sempre, a imagem da Instituição, de seus servidores e dos custodiados;

II – a abordagem isenta de conceitos ou afirmações que indiquem pré-julgamento de fatos ou pessoas envolvidas;

[...]

IX – evitar a apresentação detalhada de documentos arrecadados ou apreendidos que possam identificar pessoas envolvidas ou investigadas;

X – evitar a exposição de policiais, de equipamentos e de armamentos, sendo vedada a exposição de custodiados;

[...]

XVI – a proibição de se divulgar os meios empregados na investigação policial;

XVII – a proibição de se divulgar dificuldades, limitações ou deficiências de recursos humanos, técnicos, financeiros e materiais, necessários às operações policiais ou ao desempenho das atividades;

Desta forma, não há previsão interna para que qualquer informação seja

encaminhada a qualquer órgão de imprensa, sem que haja prévio conhecimento da

pessoa que detenha a informação, ou pela administração, nesta englobando-se a

direção superior.

Saliente-se que caso ocorra uma prisão em flagrante, a polícia não tem

como impedir que a imprensa trabalhe, devendo preservar, na medida do possível, a

imagem dos suspeitos ou flagranteados.

Lembrar que os atos administrativos que envolvem uma operação policial

estão previstos pela doutrina e pela jurisprudência, assim ressaltamos o que diz

Meirelles (1993, p. 132):

[...] a prática de atos administrativos cabe, em princípio e normalmente, aos órgãos executivos, mas as autoridades judiciárias e as Mesas legislativas também os praticam restritamente, quando ordenam seus próprios serviços, dispõe sobre seus servidores ou expedem instruções sobre matéria de sua competência. Esses atos são tipicamente administrativos, embora provindos de órgãos judiciários ou de corporações legislativas, e, como tais, se sujeitam a revogação ou anulação no âmbito interno ou pelas vias judiciais, como os demais atos administrativos do executivo.

19

Page 21: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

3 ASPECTOS PENAIS E ADMINISTRATIVOS DA VIOLAÇÃO DO

SIGILO

A intenção deste capítulo é tratar os aspectos penais e administrativos, ou

melhor, as conseqüências no campo penal e administrativo no que diz respeito à

violação do sigilo.

3.1 Aspectos Penais: Art. 325 do Código Penal

Conforme argumenta Delmanto, (2002, p. 646) o objeto jurídico do crime de

violação de sigilo funcional é a administração pública, especialmente a regularidade

de seu funcionamento.

O sujeito ativo é o funcionário público, isto é, trata-se de crime próprio.

Para Bitencourt (2010, p. 176),

Bem Jurídico protegido é a Administração Pública, sua moralidade e probidade administrativa. Protege-se, na verdade, a probidade de função pública, sua respeitabilidade, bem como a integridade de seus funcionários, mas particularmente, neste dispositivo legal, a fidelidade do funcionário público com os misteres da liturgia do cargo que exerce; acrescida, é verdade, da relevantíssima circunstância de o segredo do fato, que deve ser mantido, chegar ao conhecimento do sujeito ativo em razão de cargo público. Convém registrar, no entanto, que esse dispositivo incrimina somente a divulgação de segredo relativo ao exercício de função pública (em razão do cargo público), visto que o sigilo relacionado à atividade privada é protegido pelos arts. 153 e 154, ambos do CP.

O que o legislador quis resguardar com o acréscimo do parágrafo segundo

do artigo 325 do Código Penal é o bom funcionamento da administração pública,

uma vez que a violação poderá acarretar prejuízo à ela, nesse caso

compreendendo-se a justiça, já que o dano pode ser irreparável, além do fato de

que a polícia está apurando a ocorrência de um crime, que em decorrência da

natureza do próprio inquérito policial, deve ser sigiloso.

Referente ao parágrafo 2° do artigo 325 do Código Penal, incluído pela Lei

nº 9.983 de 2.000, conforme mencionado por Franco e Stoco (2001, p. 3921), [...] “o

20

Page 22: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

crime é agravado pelo resultado, com substancial aumento de pena (dois a seis

anos de reclusão), se da ação ou omissão resultar dano à Administração Pública ou

a outrem.”

A equipe de reportagem que gravou as imagens e, posteriormente, as

divulgou, o fez de forma voluntária, isto é, tinha conhecimento acerca do fato de a

pessoa investigada ser considerada inocente até o trânsito em julgado da

persecução criminal e agindo de forma temerária a imprensa divulga notícias com o

único intuito do furo de reportagem, olvidando e desrespeitando os direitos

constitucionais do preso.

Segundo Delmanto (2002, p. 325), “o particular pode ser co-autor ou

partícipe, desde que saiba da condição de funcionário público do agente (CP, art.

30)”.

Para Toledo (2000, p. 82),

Ação (ou conduta) compreende qualquer comportamento humano, comissivo ou omissivo, abrangendo, pois, a ação propriamente dita, isto é, a atividade que intervém no mundo exterior, como também a omissão, ou seja, a pura inatividade. Todavia, para que um comportamento humano, comissivo ou omissivo, possa ter a aptidão para qualificar-se como crime, é necessário que se tenha desenvolvido sob o domínio da vontade.

Não obstante a boa intenção do jornalista em mostrar a notícia em primeira

mão, há que se ter em conta que possivelmente não tenha havido manifestação

final da justiça.

Cabe ainda informar que no jargão policial, segundo Ferro Júnior (2008, p.

200),

[...] a expressão “vazar”, no contexto da informação policial, pode ser compreendida como o ato de divulgar, sem autorização da autoridade competente que preside a investigação policial, ou que sobre ela exerça algum poder de ofício, dados ou conhecimentos considerados sigilosos.

Nucci (2005, p. 1003), assevera que:

[...] revelar significa fazer conhecer ou divulgar: facilitar a revelação quer dizer tornar sem custo ou esforço a descoberta. O objeto é o fato que deva permanecer em segredo.

21

Page 23: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

[...]

Classificação: trata-se de crime próprio (aquele que demanda sujeito ativo qualificado ou especial): formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente em prejuízo para a administração ou para outra pessoa com a revelação); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando no tempo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); unissubsistente (um único ato perfaz o tipo penal) ou plurissubsistente (via de regra, vários atos integram a conduta), conforme o caso; admite a tentativa na forma plurissubsistente.

Unicamente a título de informação, o consentimento do servidor que possui

o segredo, é uma das causas excludentes da ilicitude, conforme Capez (2004, p.

464),

Se a violação do sigilo funcional estiver autorizada por lei, o fato será atípico, sendo desnecessária a arguição de exclusão da ilicitude pelo estrito cumprimento do dever legal. Se havia autorização judicial, não existiu violação, pois violar significa agredir, ofender, atentar, condutas que não se configuram quando a quebra se dá de acordo com o ordenamento jurídico.

Segundo a doutrina e jurisprudência dominantes, trata-se de crime próprio,

ou seja, apenas o funcionário público, atualmente denominado servidor público pode

cometer tal crime.

3.1.1 Conceito de Servidor Público para fins Penais

Primeiramente há que se fazer um breve relato sobre o conceito de servidor

público. Segundo Bandeira de Mello (2008, p. 248),

Servidor público, como se depreende da Lei Maior, é a designação genérica ali utilizada para englobar, de modo abrangente, todos aqueles que mantém vínculos de trabalho profissional com as entidades governamentais, integrandos em cargos ou empregos da União, Estados, Distrito Federal, Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público. Em suma: são os que entretêm com o Estado e com as pessoas de Direito Público da Administração indireta relação de trabalho de natureza profissional e caráter não eventual sob vínculo de dependência.

Compreendem as seguintes espécies: Servidores titulares de cargos públicos na Administração Direta (anteriormente denominados funcionários públicos), nas autarquias e fundações de Direito Público da União, dos

22

Page 24: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como no Poder Judiciário e na esfera administrativa do Legislativo.

Assim sendo, têm-se que o Policial Federal é um servidor público, que

poderá vir a revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva

permanecer em segredo.

Para o legislador, a simples revelação já configura crime, porém, neste

estudo, busca-se delimitar na modalidade criminosa prevista no parágrafo 2º do

artigo 325 do Código Penal, que se trata de delito qualificado pelo resultado, ou seja,

o dano ocorrerá com a divulgação indevida, por intermédio da imprensa, da imagem

do investigado.

Queda-se luzente que o dano causado pela divulgação indevida da imagem

do investigado será irreversível e, consequentemente, irreparável.

Administração Pública, segundo Di Pietro (2003, p.61),

Em sentido material ou objetivo, a Administração Pública pode ser definida como atividade concreta e imediata que o Estado desenvolve, sob regime jurídico de direito público, para consecução dos interesses coletivos.

[...]

em sentido subjetivo, como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado.

3.1.2 Dos Crimes de Divulgação de Segredo e Violação do

Segredo Profissional

Não somente contra o servidor público há o crime de violação de sigilo, uma

vez que se o particular, neste caso representado pelo não servidor público, violar

algum segredo, responderá pelos crimes previstos nos artigos 153 e 154 do Código

Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) os crimes de Divulgação de Segredo e Violação

do Segredo Profissional.

SEÇÃO IV

DOS CRIMES CONTRA A INVIOLABILIDADE DOS SEGREDOS

Divulgação de segredo

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Page 25: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Art. 153 - Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

§ 1º Somente se procede mediante representação. (Parágrafo único renumerado pela Lei nº 9.983, de 2000)

§ 1o-A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

§ 2o Quando resultar prejuízo para a Administração Pública, a ação penal será incondicionada. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Violação do segredo profissional

Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante representação. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm>, com acesso em 20/08/2010.

Em ambos os casos, o objeto jurídico é a liberdade individual, sendo no

crime de divulgação de segredo, especialmente a proteção de segredos cuja

divulgação possa causar dano a outrem, estando o contido em documento particular

ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, sendo que no

crime de violação de segredo profissional a proteção inclui também o segredo oral, e

não apenas o segredo contido em documento (DELMANTO, 2002, p. 332).

Assim, conclui-se que o legislador quis diferenciar o crime cometido pelo não servidor público e por este.

3.2 Aspectos Administrativos

De proêmio, destaca-se que a administração pública, regida pela

Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2010), tem como um de seus princípios a

publicidade dos atos administrativos (artigo 37, em conformidade com a Emenda

Constitucional nº 19 de 1998).

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Page 26: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Assim, a publicidade dos atos administrativos é regra, porém certos atos

administrativos, incluídos, por óbvio, alguns atos policiais, deverão ser sigilosos, em

razão do caráter de perda da oportunidade que são revestidos. Nesse sentido, não é

possível dar publicidade geral a uma determinação de cumprimento de um mandado

de prisão, pois, pode haver perda da oportunidade de se encontrar a pessoa que

deverá responder judicialmente, além do fato de que se colocará em risco a

segurança dos policiais envolvidos no cumprimento da referida ordem judicial.

O próprio legislador, nos incisos XXXIII e LX da Constituição Federal de

1988, determinou que:

XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; (grifo nosso);

LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem; (BRASIL, 2010).

Segundo preceitua Meirelles (1993, p. 132),

a prática de atos administrativos cabe, em princípio e normalmente, aos órgãos executivos, mas as autoridades judiciárias e as Mesas legislativas também os praticam restritamente, quando ordenam seus próprios serviços, dispõe sobre seus servidores ou expedem instruções sobre matéria de sua competência. Esses atos são tipicamente administrativos, embora provindos de órgãos judiciários ou de corporações legislativas, e, como tais, se sujeitam a revogação ou anulação no âmbito interno ou pelas vias judiciais, como os demais atos administrativos do executivo.

Conforme Meurer (2010), em seu artigo, Violação de Sigilo Funcional:

As atividades desenvolvidas pelo Legislativo e pelo Judiciário distinguem-se daquelas praticadas pela Administração Pública, pois legislar é editar o Direito Positivo, julgar é aplicar a lei contenciosamente, mas administrar é aplicar a norma ex officio.

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Page 27: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

3.2.1 Transgressão Disciplinar

Nessa seara vale ressaltar que além da imputação criminal, o policial que

violar sigilo responderá por transgressão disciplinar, prevista no inciso IX do artigo

132 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1.990: “A demissão será aplicada nos

seguintes casos: IX - revelação de segredo do qual se apropriou em razão do

cargo”.

Evidentemente, com as informações sobre as operações da Polícia Federal

mostradas pela mídia, muito prestígio foi angariado ao órgão policial, decorrente da

prisão de várias pessoas, algumas de projeção nacional e internacional. Todavia, há

que se ter por princípio que toda “publicidade” positiva em favor do DPF, não poderá

servir de fundamento para desrespeitar a garantia constitucional da preservação da

imagem da pessoa.

Vale lembrar que o jornalista não precisa divulgar a fonte, no caso de uma

operação policial, preservando nome do policial, que lhe transmitiu a informação,

conforme disposto no inciso XIV do artigo 5º da Constituição Federal, desse modo,

não há como obrigá-lo a identificar o policial que lhe passou a informação.

Se o legislador não teve a intenção de comprometer a pessoa que detém a

informação, há que ser respeitado, entretanto, talvez fosse possível, por

determinação judicial que essa informação fosse divulgada no interesse de algum

processo, em defesa de interesses maiores.

Havendo um direito maior a ser protegido, o judiciário e, somente ele, poderá

obrigar que a fonte seja revelada, sem que com isso ocorra uma afronta

Constitucional. No entanto, tal assunto poderá ser abordado em outra pesquisa, em

virtude de outros aspectos, sobretudo pela densidade do tema. Ademais, não se tem

notícia de haver no Brasil alguma decisão nesse sentido, ou seja, o judiciário

determinando que a fonte fosse revelada.

Sobre o tema, interessante a decisão de um juiz norte americano, que

determinou a prisão de uma repórter que se negou a revelar a fonte de quem lhe

informara o nome de funcionário da agência de inteligência daquele país (CIA)3.3 Repórter do New York Times é presa por não revelar fonte. O juiz da corte federal de Washington, EUA, Thomas Hogan determinou que a repórter do The New York Times Judith Miller seja presa mediatamente. A determinação foi dada depois de ela se recusar a cooperar com as investigações

26

Page 28: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Outro aspecto a ser abordado, é quanto ao crime de abuso de autoridade,

previsto na Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1.965, salientando-se a conduta

prevista na letra b, do artigo 4º, em que a pessoa sob sua guarda ou custódia é

submetida a vexame ou a constrangimento não autorizado por lei.

Uma das maiores dificuldades em se apurar o delito de violação de sigilo

funcional reside no fato da preservação do sigilo da fonte. Como já mencionado, o

legislador deveria deixar alguma brecha na lei para que, em casos excepcionais, o

judiciário pudesse decidir, como o caso de sequestro ou em crimes sexuais. Não se

trata aqui de resguardar o sigilo da fonte quando necessário ao pleno exercício

profissional, mencionado no inciso XIV do artigo 5º da Constituição Federal, mas sim

do segredo para encobertar um crime, como é o caso da violação de sigilo funcional,

perpetrado por policial, não obstante para o profissional de imprensa devam ser

observadas as garantias para seu trabalho. Uma dúvida deixada é que com a

revogação da Lei de Imprensa pelo STF, o jornalista ou repórter não estará

abrangido pelo exercício da profissão mencionado?

Pinheiro (2009) aborda em seu trabalho, dentre outros assuntos

Na quebra de sigilo, se for por servidor policial da União, poderá ser punido criminalmente e administrativamente. Se for servidor estadual ou distrital, será dependendo da legislação do ente federado, somente punido criminalmente pela parte de violação de sigilo funcional. Se também quebrou sigilo de Inteligência, será punido administrativamente dependendo da legislação local aplicável. Na União existe tanto a proteção ao crime de violação de sigilo funcional como sanção administrativa, punível com demissão. Encontra-se tipificada a conduta de violação de sigilo funcional no art. 325 do Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei nº. 2848 de 7 de dezembro de 1940).

Já a sanção administrativa, encontra respaldo legal no art. 132, inciso IX da Lei nº. 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que é o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. in verbis:

sobre o vazamento da identidade de uma funcionária da CIA, o serviço de inteligência americano. As informações são do Times. Matthew Cooper, repórter da revista Time que responde à mesma ação, concordou em prestar testemunho ao grande júri sobre quem foi a fonte do governo que revelou o nome da agente da CIA. Assim, ele evitará a prisão. Segundo o jornalista, a decisão decorreu do fato de que sua fonte liberou-o da promessa de confidencialidade. O juiz Hogan negou pedido dos advogados de Judith para que ela pudesse cumprir prisão domiciliar e ordenou que ela seja levada para a prisão no distrito de Columbia até outubro ou até que mude de idéia sobre sua decisão de não prestar declarações à Justiça. Para o juiz, a medida é mais coercitiva do que punitiva. Ou seja, quando falar, a jornalista volta para casa. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2005-jul-06/reporter_new_york_times _presa_nao_revelar_fonte>, com acesso em 06/10/2010.

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Page 29: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Art. 132.  A demissão será aplicada nos seguintes casos:

IX - revelação de segredo do qual se apropriou em razão do cargo;

No caso específico dos policiais federais e civis do Distrito Federal, que são regidos pela Lei nº. 4.878, de 3 de dezembro de 1965, que dispõe sobre o regime jurídico peculiar aos funcionários policiais civis da União e do Distrito Federal, consta ainda no seu art. 43, inciso XLIII, como infração disciplinar a divulgação do conteúdo de documento, in verbis:

Art. 43. São transgressões disciplinares:

XLIII - publicar, sem ordem expressa da autoridade competente, documentos oficiais, embora não reservados, ou ensejar a divulgação do seu conteúdo, no todo ou em parte;

A Lei nº. 4.878, de 3 de dezembro de 1965, em seu art. 48 também prevê que a sanção administrativa para divulgação de conteúdo de documento oficial será a de demissão.

4 A IMPORTÂNCIA DO SIGILO PARA O INQUÉRITO POLICIAL

A informação é um dos direitos assegurados pela atual Constituição Federal.

De todas as oito Constituições que a República Federativa do Brasil já possuiu –

incluindo-se a Emenda Constitucional n° 1 de 17/10/1969, o constituinte de 1988,

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Page 30: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

jamais deu tanta importância ao direito à informação. De proêmio, em razão do

direito à informação estar disposto dentre os Direitos e Garantias Fundamentais, no

artigo 5°, inciso XIV. Em segundo plano, encontra-se, no inciso IV, que é livre a

manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. Daí, para que a cobertura

jornalística não sofra qualquer influência, transmitindo a informação de forma

serena.

Imagine-se a seguinte situação hipotética:

O contexto: Três horas da madrugada de um dia qualquer do mês de julho

de 2009. Cinco equipes formadas por um delegado, um escrivão e dois

agentes de Polícia Federal chegam à sede da SR/SP para a reunião

preparatória a Operação X.

O caso: Após meses de investigação, indícios e provas dão conta de que

uma empresa de compra e venda de automóveis vem utilizando o negócio

como fachada para a remessa ilegal de valores para o exterior, que ajudam

a financiar um grupo paramilitar que detém o poder em uma região central

de um conhecido país da América do Sul e produtor de cocaína.

A reunião: Durante a reunião preparatória para execução da operação

policial, o coordenador e responsável pela investigação informa às equipes

os alvos da ação policial e o tipo de diligência a ser executada: cumprimento

de mandados de busca e apreensão no endereço contido na ordem judicial

e prisão do alvo.

Execução e desfecho 1: De posse dos mandados judiciais, as equipes se

dirigem ao endereço informado e executam as ordens, sem qualquer

resistência do morador.

A partir do cumprimento dos mandados judiciais, foi possível a arrecadação

de provas e a prisão temporária dos indiciados. Não foi necessário o

emprego de força e a imagem dos investigados foi preservada durante toda

execução.

Execução e desfecho 2: De posse dos mandados judiciais, as equipes se

dirigem ao endereço informado para executarem as decisões judiciais de

busca e prisão. Já na saída do prédio a viatura policial é seguida por um

veículo pertencente a uma empresa televisiva.

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Page 31: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Cumpridas as ordens judiciais foi possível de igual forma a arrecadação de

provas e a prisão temporária dos indiciados. Contudo, a equipe de TV local

filmou e divulgou em rede nacional imagens da residência e da pessoa do

alvo sendo presa pela polícia.

Execução e desfecho 3: De posse dos mandados judiciais, as equipes se

dirigem ao endereço informado para executarem as decisões judiciais de

busca e prisão. Ao se aproximarem do local, a equipe C se depara com um

veículo pertencente a uma empresa televisiva, previamente avisada da ação

policial. No local, a equipe não consegue prender o indiciado, que havia

viajado na noite anterior a execução da diligência e nenhuma evidência

relevante é encontrada.

Execução e desfecho 4: Com a chegada da equipe de policiais ao local em

que deverão ser cumpridos os mandados judiciais, esta é recebida por

outros bandidos da quadrilha, que atira nos policiais. Neste caso, a violação

de sigilo teve o que pode ser considerado um dos piores desfechos, pois

com a possível troca de tiros, além dos policiais, várias pessoas inocentes

podem ser atingidas por projeteis de arma de fogo.

Como foi chegar ao conhecimento dos repórteres a operação policial, que

até o momento da reunião, em razão do sigilo judicial imposto e pela

compartimentação exigida nesses casos, somente cerca de seis pessoas

dentro da Polícia Federal, além de poucos servidores da Justiça e do

Ministério Público, ambos Federais possuíam as informações?

Partindo do pressuposto de que a informação foi repassada ao jornalista por

um policial federal, não obstante a operação policial tenha sido finalizada dentro das

expectativas, com obtenção das informações necessárias para que o dominus litis

da ação penal pudesse firmar sua convicção e denunciar os acusados à Justiça, e

não tenha havido nenhum percalço com relação à presença da equipe de

reportagem, entende-se ter havido uma violação de sigilo funcional, previsto no

artigo 325 do Código Penal:

Violação de sigilo funcional

Art. 325 - Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:

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Page 32: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave.

§ 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

I - permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

II - se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000).

Segundo Barros (2010), existe diferenças entre sigilo e segredo

Embora comumente utilizados como sinônimos, sigilo e segredo não possuem idêntico significado. A individualização é necessária para o perfeito dimensionamento das palavras. De Plácido e Silva anota que sigilo vem do latim sigillum, significando marca pequena, sinalzinho, selo. Então, imperando a idéia de algo que está sob selo, o sigilo traduz, com maior rigor, o segredo que não pode nem deve ser violado. Para Bernardino Gonzaga, segredo é o informe que, sendo do conhecimento apenas do seu titular ou de determinado número de pessoas, não deve, por disposição de lei ou por vontade juridicamente relevante do interessado, ser transmitido a outrem. Acquaviva vai mais além ao afirmar ser impossível confundi-los, pois segredo é o fato que se pretende desconhecido em nome da ordem pública, e sigilo é o meio, o instrumento de que se servem os interessados para manter íntegro o desconhecimento de tal fato. Com o rompimento do sigilo opera-se a revelação do segredo. Logo, segredo é o que não pode ser revelado e sigiloso é o informe a que se tenha atribuído a qualidade de secreto e que se revelado a terceira pessoa possa acarretar um dano para o seu titular.

4.1 O Risco à Integridade Física do Jornalista

Outro aspecto a ser analisado diz respeito ao risco à integridade física do

jornalista, pois, não obstante nas operações realizadas pela polícia federal,

geralmente em razão dos crimes apurados, não ocorra grande potencial de haver

algum ato de desespero por parte do investigado, tornando-se agressivo, atentando

contra a vida de algum policial da equipe, faz-se mister, como precaução, que toda

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Page 33: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

operação policial seja tratada de forma que o confronto direto com o investigado seja

evitado. Contudo, em uma situação de desespero e stress, existe a possibilidade,

como em toda operação policial, de o investigado vir a agredir, ferindo o policial.

Geralmente quando ocorre uma operação conjunta, quando a polícia federal

é chamada para apoiar outro órgão, verbi gratia, Receita Federal do Brasil, ou

mesmo garantir o cumprimento de determinações judiciais por oficiais de justiça, a

polícia federal atua para que as determinações sejam cumpridas, garantindo a

integridade física do servidor de outro órgão, coibindo qualquer ato atentatório, haja

vista a qualidade e preparação dos policiais federais.

Uma pessoa estranha, no caso hipotético de ser um jornalista e sua equipe,

caso seja agredido pelo investigado, poderá entrar com ação contra a União

Federal?

Para melhor elucidar essa questão, deve-se levar em consideração que a

equipe policial não tinha o dever jurídico de salvaguardar a integridade física da

equipe jornalística, uma vez ter ela entrado na cena de ação por conta própria,

s.m.j., não há que se falar em culpa, por negligência, imprudência ou imperícia dos

policiais.

Ademais, sempre haverá risco para o jornalista. Cite-se, por exemplo, os

jornalistas que cobrem guerras, sobre o tema, Luana Lila (2007) postou na internet,

sobre o correspondente de guerra português, Carlos Fino, que foi o primeiro

jornalista a informar sobre a guerra do Iraque em tempo real,

Em meio às bombas e à pressão ideológica gerada pelos governos envolvidos, os jornalistas devem se desdobrar para apreender a realidade de modo imparcial.

O jornalista português Carlos Fino ficou mundialmente conhecido por ter sido o primeiro a transmitir, em tempo real, o início da guerra do Iraque, em 2003. Na época era enviado especial a Bagdá pela emissora RTP (Rádio e Televisão Portuguesa).

Com uma vasta experiência na cobertura de conflitos, Fino, que registrou suas atividades no livro A Guerra ao Vivo, concedeu, no dia 13 de outubro de 2007, uma entrevista coletiva aos estudantes do curso Jornalismo em Situação de Conflito Armado, módulo do projeto Repórter do Futuro, promovido pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

Fino nasceu no final da década de 40, em Lisboa. Durante o regime ditatorial Salazarista em Portugal exilou-se em Moscou. Mais tarde, em 1976, começou sua carreira jornalística no país que lhe servira de abrigo, local onde acompanhou os conflitos provocados pelo fim do regime soviético. Foi também correspondente em Bruxelas e Washington e,

32

Page 34: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

posteriormente, cobriu as desavenças no Oriente Médio, as guerras do Golfo, do Afeganistão e do Iraque. Em 2004 deixou a RTP, emissora para qual trabalhou mais de 20 anos, para assumir o cargo de conselheiro de imprensa da Embaixada de Portugal em Brasília.

Além de relatar momentos difíceis de sua vida de repórter, principalmente no Iraque, fez uma importante reflexão sobre o papel e a influência do jornalismo nas guerras.

Fino afirma que o jornalismo é uma profissão de fronteira entre a propaganda e a informação. Essa linha tênue que separa o informe imparcial do manipulado pode ser observado no âmbito de atuação dos jornalistas que estiveram ou estão na Guerra do Iraque.

Para atuar no país os correspondentes deveriam obter permissão de uma das partes em conflito. Fino estava credenciado pelo regime de Saddam Hussein, portanto sabia que seu motorista e tradutor eram informantes do governo. Além disso, o Ministério de Comunicação do Iraque era quem estabelecia os locais a serem visitados, sempre lugares onde havia ocorrido bombardeios (LILA, 2007).

Pelo que se entendem, os correspondentes de guerra são repórteres que

cobrem os conflitos ocorridos em uma guerra, estando sujeitos aos mesmos

percalços dos combatentes e dos civis.

4.2 O Risco ao Policial e à Efetividade da Investigação

Não somente os jornalistas podem ser vítima de algum ato desesperado do

alvo da operação, mas também a própria equipe de policiais pode vir a sofrer algum

atentado, caso alguma informação possa chegar ao conhecimento do alvo da

operação, uma vez que em toda operação policial, embora seja possível supor a

potencialidade agressiva do suspeito, há que se ter em conta que uma emboscada

pode acontecer.

Na atividade policial já existe, pela própria natureza do trabalho, a

potencialidade do risco à integridade física, além da psicológica dos policiais, porém,

quando desencadeada alguma operação policial, existe a real possibilidade de

enfrentamento direto com os criminosos.

Na maioria das vezes, a polícia conta com a surpresa, que é um dos fatores

determinantes para que a operação obtenha êxito. Ocorre que se o jornalista obtém

uma informação de que haverá determinada operação, nada impede que essa

informação seja transmitida aos criminosos, que podem, como é mais comum

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deixarem o local em que se encontram, fugindo da polícia. Entretanto, mesmo não

havendo a presença jornalística no palco da operação, existe a possibilidade da

informação ser transmitida, fazendo com que as provas, eventualmente existentes

no local desapareçam, ou o alvo não seja encontrado.

Quando se fala de operação policial, em que há gravação e transmissão

pelas redes de televisão, geralmente essas operações são realizadas em grandes

cidades ou capitais, no entanto, em razão dos mais diversos crimes investigados

pela polícia federal, existem aqueles praticados em locais ermos, cuja dificuldade

para se chegar é grande, como é o caso de extração de madeira ilegal na região

norte do Brasil e o trabalho escravo, em que se houver um vazamento de

informação, pode ocorrer uma emboscada com risco à integridade física dos

policiais.

Referente à integridade física de policiais, é importante rememorar, que em

meados de 2010, ocorreu um massacre de policiais federais mexicanos, conforme

notícia divulgada no Jornal La Jornada, com titulo “En Zitácuaro, una masacre de

federales” (FERRER, 2010). A emboscada foi realizada pelo grupo marginal

conhecido como La Familia Michoacana, conforme se depreende do referido jornal.

Como é notório, o tráfico de drogas no México tomou proporções

alarmantes, não só com as brigas entre os vários grupos de narcotraficantes, mas

também para a população e também para os policiais.

Há uma reportagem4 em que narra o massacre de policiais federais

mexicanos que retornavam de uma missão, em um comboio com cerca de 40

policiais fortemente armados, em vários veículos, quando um grupo de

narcotraficantes realizou uma emboscada, utilizando armas AK-47 e AR-15 matando

e ferindo cerca de 30 policiais. Não se tem notícia de que a emboscada ocorreu em

4 Comboio com 40 agentes da Polícia Federal foi emboscado segunda-feira em uma estrada a 146 quilômetros da capital mexicana. Veículos dos policiais foram fechados por dois ônibus e os policiais atingidos por rajadas de metralhadoras. Pelo menos 12 policiais morreram. Atentado expõe clima de crescente violência no México. Autoridades acreditam que ataque pode ter sido uma reação do crime organizado pela série de apreensões de armas e drogas que a Polícia Federal realizou no final de semana passado. O artigo é de Eduardo Ferrer, do La Jornada. Sim, foi um massacre, dizem testemunhas, quando contam que o comboio formado por cerca de 40 agentes da Polícia Federal foi emboscado por um grupo de supostos narcotraficantes no município de Zitácuaro, localizado a aproximadamente 146 quilômetros da capital mexicana. O saldo oficial: 12 policiais mortos e pelo menos 15 feridos, dos quais sete em estado grave. Vários dos agressores perderam a vida e outros ficaram feridos, mas foram retirados por seus cúmplices, relatou a Secretaria de Segurança Pública federal (SSP).

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razão de vazamento de informação, todavia, não é de se estranhar que possa ter

havido um vazamento de informação do caminho utilizado pelos policiais federais

mexicanos.

Caso semelhante ocorreu com equipe de policiais federais lotados na

Delegacia de Polícia Federal em Vilhena/RO, quando em missão para prender

traficantes de droga entre o Brasil e a Bolívia, no final do ano de 1999, quando

ocorreu uma emboscada, tendo vitimado fatalmente um policial federal e ferido

outros (BRASIL, Departamento de Policia Federal, 2010).

4.3 A Imagem do Investigado

Veja o exemplo do ocorrido na “Escola Base” em São Paulo, em que os

proprietários tiveram seus nomes divulgados, por um delegado de polícia civil, sobre

abuso sexual de alguns alunos, sendo posteriormente concluído que o crime não

ocorreu, porém, as conseqüências de tal ato impensado foram desastrosas, já que a

referida escola foi depredada e os envolvidos, cujos nomes haviam sido divulgados,

acusados injustamente, restando somente a via judicial para buscarem reparação

por danos morais (ENTENDA, 2006).

Em ação movida pelos representantes da Escola Base contra o jornal “O

Estado de São Paulo”, há o acórdão na apelação cível com revisão nº 360.031-4/2-

00, relativamente ao dano moral,

Em que pese o direito à liberdade de informação e de imprensa, é de se ressaltar que há, no caso dos autos, outro direito que deve ser sopesado: o direito de inviolabilidade da honra e imagem das pessoas ou, por outras palavras, o direito à liberdade de informação não é absoluto e sem limites. Antes, tem sempre que situar-se no plano da legalidade e no cuidado prévio quanto à exposição pública da imagem e da honra da pessoa humana.

Em sede de dano moral, tem-se por prescindível a demonstração de repercussão patrimonial, bastando a comprovação da lesividade do fato e sua potencialidade danosa contra o ofendido. Isto é, uma vez demonstrado o fato lesivo e sua potencialidade danosa, a ofensa à honra e boa-fama do ofendido, bem assim à sua dignidade e imagem no meio social em que vive e exerce suas atividades, enseja o dever de indenizar, independentemente de demonstração, direta e concreta, de prejuízo patrimonial. Aliás, até mesmo o dano moral puro, insuscetível de acarretar um prejuízo material mensurável, enseja indenização. Essa, com efeito, a orientação pretoriana, na conformidade da jurisprudência do Colendo STJ:

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A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente que opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto".( STJ, 4ª Turma, REsp 196.024, Rei.: Min. César Asfor Rocha, RSTJ 124/397 (apud STOCO, 2004, p. 1332)).

No caso sub judice, no entanto, nem mesmo dessa ausência de repercussão patrimonial se havia de cogitar, porque resultou patente e inconcussa na vida pessoal e profissional dos autores. Daí porque, irrecusavelmente, a hipótese era mesmo de pleito indenizatório pelo dano moral, porque seus pressupostos estão bem delineados e comprovados.

Sabe-se, com efeito, que a indenização por dano moral, sobre não ser tarifária, há de ser estabelecida segundo o prudente arbítrio do juiz. Os princípios que, de um modo geral, informam os critérios para fixação do valor indenizatório, condizem, de um lado, com a gravidade da ofensa, sua repercussão negativa ou prejudicial ao ofendido, bem como a sua condição social e econômica; e, de outro lado, há de considerar-se o porte econômico do ofensor, sua responsabilidade social e ética, bera como haver-se-á de considerar, finalmente, que a quantia indenizável haja de servir como fator de alerta e de desencorajamento de atitudes e ofensas desse jaez, mas não podendo essa mesma indenização também servir como incentivo à busca de dano moral desnecessariamente, no campo da assim chamada `indústria indenizatória por danos morais'. No caso dos autos, nem é preciso reiterar a extrema gravidade das matérias divulgadas e da enorme repercussão prejudicial ao extremo aos autores. O porte econômico-financeiro da ré-apelada, assim como a sua responsabilidade no campo ético do jornalismo, não podem ser olvidados.

Daí por que, no caso, o quantum da indenização deve ser o valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinqüenta mil reais) para cada autor, valor este compatível com a reparação do dano moral sofrido pelos autores-apelantes. Aliás, tal cifra foi justamente aquela em que outro órgão da mídia televisiva veio também de ser condenada, pela divulgação desses mesmos fatos, que resultaram verificados inverídicos.

Evidentemente, com as informações transmitidas pelo delegado de polícia à

imprensa, e esta vislumbrando “informar” a qualquer custo a sociedade, estigmatizou

os proprietários da Escola Base, que tiveram seus nomes jogados ao nível mais

baixo de caráter da humanidade.

Sobre o estigma, a que foram injustamente imputados, leciona Bacila (2008,

p. 24):

Estigma é um sinal ou ma marca {6} que alguém possui, que recebe um significado depreciativo {7}. No início era uma marca oficial gravada a fogo nas costas ou no rosto das pessoas. {8} Entretanto, não se trata somente de atributos físicos, mas também de imagem social que se faz de alguém para inclusive poder-se controlá-lo {9} e até mesmo de linguagem de relações, para empregar expressão de Erving Goffman, {10} que compreende que o estigma gera profundo descrédito e pode também ser entendido como

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defeito, fraqueza e desvantagem. {11} Daí a criação absurda de duas espécies de seres: os estigmatizados e os “normais”, {12} pois, afinal, considera-se que o estigmatizado não é completamente humano. {13} Então, a idéia pretérita de estigma significando somente um sinal material já não existe mais, há muito tempo, ou se ainda subsiste, não é esta que será aqui considerada. (sic)

Assim, tem-se que ocorreu uma injusta estigmatização dos proprietários e

funcionários da Escola Base em São Paulo, o que feriu de morte a dignidade da

pessoa humana prevista na constituição federal como um dos seus princípios

fundamentais.

Na Escola Base não ocorreu violação de sigilo funcional, mas o tema foi

inserido em razão de divulgação, por delegado de polícia civil e, sobretudo por

jornalistas, que precipitadamente divulgam fatos inconsistentes, que foram levados à

imprensa não diretamente pela autoridade policial, mas pelas mães de alguns

alunos.

O que levou o delegado de polícia civil a informar a imprensa sobre os fatos,

possivelmente tenha sido a pressão sofrida por ele pela sociedade, que não aceita a

impunidade de tais crimes e pela imprensa, que algumas vezes apresenta a matéria

sem confirmar a veracidade das informações, contudo, a autoridade policial deve ser

firme no exercício de seu mister, não sendo razoável que pressões externas

influenciem seu trabalho.

Nesse sentido, Carvalho (2009, p. 269),

Quando os fatos que estão em julgamento atingem a importância jornalística para serem divulgados pela mídia, os profissionais que atuam no processo, naturalmente, são levados ao cenário público dos noticiários e submetidos também às poderosas luzes dos refletores. Aí é que a natureza humana pode ser traída a revelar os seus defeitos como a vaidade, o orgulho, a pretensão à infalibilidade, e até comportamentos mais atávicos como agressividade e mesmo a violência com as partes, testemunhas etc.

Por derradeiro, temos parte de decisão do STJ (BRASIL, 2004):

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL. ATO PRATICADO POR DELEGADO DE POLÍCIA. DIVULGAÇÃO TEMERÁRIA DA PRÁTICA DE ABUSO SEXUAL CONTRA ALUNOS DA ESCOLA DE BASE. NOTÍCIA POSTERIORMENTE DESMENTIDA. AUMENTO DO VALOR FIXADO PELA CORTE DE ORIGEM. POSSIBILIDADE DE REVISÃO POR ESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

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Restaram regularmente analisadas as matérias discutidas no recurso especial, razão pela qual não há violação ao artigo 535 do Código de Processo Civil.

Não se aplica, na hipótese, a Lei de Imprensa, visto que, "o que levou os litigantes ao absurdo de serem repudiados e quase linchados pela população, perdendo não só a honra, mas o estabelecimento de ensino e o sossego de viver honesta e tranqüilamente, não foi a veiculação jornalística provocada pela imprensa, e sim a irresponsável conduta do agente estatal (voto proferido pela Ministra Eliana Calmon).

Comprovada a responsabilidade subjetiva do agente público, impõe-se-lhe o dever de ressarcir o erário do valor preciso e certo do desfalque provocado, sem que se possa para tal limitá-lo às condições econômicas do obrigado" (voto proferido pela Ministra Eliana Calmon).

Na oportunidade em que se fizer a liquidação por artigos, novos honorários serão devidos e, assim, à vista de um quantitativo certo e determinado, será de todo pertinente a fixação dos honorários, nos termos do dispositivo aqui invocado pelos autores (art. 20, § 3º). (voto proferido pela Ministra Eliana Calmon).

Obviamente o prejudicado poderá impetrar ação visando ao recebimento de

indenização por danos morais e eventualmente materiais, sendo a doutrina e

jurisprudência pacífica nesse sentido. Não se deseja um maior aprofundamento no

assunto, em razão não ser o objeto deste trabalho, mesmo porque demandaria

muito tempo e pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não apenas a violação de sigilo funcional deve ser combatida, mas a

recriminação encontrada na pena no artigo 325 do Código Penal pode não ser

compatível com o dano causado para a pessoa que teve sua imagem exposta,

sendo que apenas com a indenização por danos morais, no âmbito civil, será

possível a reparação.

É preciso que seja estabelecido um padrão para que as informações sejam

apresentadas para a imprensa pelo DPF. Possivelmente com as imagens gravadas,

no caso de grandes operações, por próprios integrantes da polícia federal, sendo

posteriormente apresentadas à imprensa, sem qualquer distinção ou preferência de

empresas jornalísticas.

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Page 40: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

Não se quer com a medida suprimir o direito à imprensa de exercer sua

atividade, sendo a atividade jornalística se suma importância, capaz de modificar

governos, sendo dito por alguns tratar-se do quarto poder, principalmente na

atualidade, em que a tecnologia está cada vez mais simplificada, sendo possível

gravar imagens de telefones celulares e transmitir as imagens quase que

instantaneamente.

Coibir que jornalistas inescrupulosos divulguem imagens de supostos

criminosos, seria um ato impossível, porém conscientizar policiais sobre a

importância da preservação dessas imagens talvez fosse mais viável, fazendo com

que o Departamento de Polícia Federal fosse preservado e não sofresse qualquer

injustiça com as ações que tem respaldo do judiciário e de grande parte da

população.

Outro fator a ser considerado é a exposição desnecessária de policiais, que

pode causar risco à família deste ou a ele próprio, contando-se com a periculosidade

dos criminosos. No trabalho policial deve ser resguardada a sua figura, sendo que a

exposição nos meios de comunicação, quando não imperativa pode causar futura

represália por criminosos.

Vale lembrar que o simples fato de ser policial, já traz inúmeras

consequências negativas, principalmente em um assalto, quando na maioria das

vezes ocorre uma execução sumária, com a descoberta da identidade funcional.

Como na maiorias das vezes as informações repassadas à imprensa são

realizadas com certa antecedência, pois não parece ser plausível haver uma equipe

de repórteres à disposição a qualquer hora do dia ou da noite, acredita-se que essas

informações sejam transmitidas por pessoas que detém informações importantes

relativas à operação. Não se propõe aqui investigar todos os participantes da

equipe, cuja informação foi transmitida à imprensa e ocorreu prejuízo à investigação

ou mesmo ao alvo, que muitas vezes está sob custódia da polícia, porém há que se

restringir e alertar todos os que dela possam ter contatos, no início das

investigações, quando houver possibilidade, mesmo que remota de ocorrer uma

exposição de algum preso.

Contudo, quando a equipe de reportagem já estiver no local, palco da

operação, ou chegar com tempo de fazer filmagens, parece oportuna a intervenção

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policial, advertindo que não serão toleradas imagens do custodiado, ou mesmo de

fatos que levem à sua identificação.

Com a advertência verbal do policial ao repórter, não se restringirá a

liberdade de imprensa, porém, caso não respeite os limites estabelecidos, inclusive

os perímetros delineados, poderá ser responsabilizado criminalmente respondendo

pelo crime de desobediência (art. 329 do CP).

É notório que as operações da polícia federal estão cada vez mais precisas,

com menos falhas, e certamente ainda há muito que se especializar, quer com

estudos por nossos integrantes, quer por cursos realizados por intercâmbio entre

países. Antes da chamada globalização, havia alguns países considerados paraísos

fiscais, com contas numeradas, sem nomes de seus possuidores, porém

atualmente, há inúmeros interesses dos governos em enfrentar a denominada

lavagem de dinheiro, que muitas vezes escondem valores utilizados por terroristas

ou por governantes inescrupulosos que dilapidam as nações em detrimento de seus

habitantes.

Enalteça-se quase que a totalidade das operações realizadas pela polícia

federal, com seus integrantes que diuturnamente estão incumbidos de fazer do

nosso país um lugar em que possamos nos orgulhar de que a polícia federal seja

exemplo para outras polícias.

Por derradeiro, lembremos que o pensamento de um povo, e,

consequentemente, dos políticos pode evoluir e que o direito não é uma ciência

exata, razão pela qual o próprio crime de violação de sigilo funcional pode mudar ou

mesmo ser suprimido, ou mesmo as garantias relacionadas ao sigilo da fonte pode

ser retificado, caso um bem maior seja protegido.

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Page 42: VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL POR POLÍCIA FEDERAL

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