8/3/2019 VILANOVA ARTIGAS_CARTA

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Gilberto Bellezapublicado em Arquitetos.

24 de Novembro de 2011 21:37

Para mudar um pouco de assunto,esta carta do Artigas um timo exemplo da importnciade um projeto:

POR QUE CONTRAT-LOEsta carta do Arquiteto Joo Batista Vilanova Artigas ilustra de maneira clara a importnciada contratao de um arquiteto.

Carta ao cliente

Confesso que no me assustei muito ao ler sua carta contando o resultado da confernciapara autorizao de um projeto para o So Lucas. Estas coisas acontecem sempre porque,por falta de costume, quem constri, nem sempre avalia o plano de como deveria faz-lo. Seeu insisto em aconselh-lo mais uma vez para que consiga um arquiteto para dirigir ostrabalhos de seu hospital, no somente porque desejo muito trabalhar para um hospitalmodelo, mas porque, e principalmente porque, no posso crer que uma obra, da

importncia da sua, possa nascer sem estudo prvio. vezo brasileiro fazer as coisas semplano inicial perfeitamente elaborado; quando se pergunta sobre como ficaro estes eaqueles pormenores, a resposta sempre a mesma: Ah! Isso depois, na hora, veremos.

Assim fazem-se as casas, os prdios, as cidades; nesse empirismo vive a lavoura, a indstriae o prprio governo. O planejamento, mercadoria altamente valorizada em todo mundo paraqualquer realizao, no encontrar entre ns o ambiente propcio enquanto ns moos nonos capacitarmos da sua necessidade imprescindvel. Poderia continuar conversando comvoc sobre a grande vantagem de planejar com antecedncia, at amanh, sem esgotartodos os argumentos e provavelmente terminaria por dizer que at demonstrao depatriotismo e inteligncia. Mas com isso no convenceramos ningum; talvez muito maisvantajoso seria confinar a discusso entre os limites das vantagens particulares, individuais

de aplicar o mtodo. Ento vejamos.. A pergunta sempre a mesma; -"que vantagempoderamos ter em gastar CR$ 65.000,00 em um projeto somente? O projeto no oprdio; muito pelo contrrio, somente uma despesa a mais! Contratando a construo oprojeto viria de graa, feito pelo prprio construtor e ns economizaramos 5% sobre o valordo prdio. Com esses 5%, no caso de querermos gast-lo, at poderamos melhoraralgumas condies do edifcio; enriquecer alguns materiais etc..."

Garanto que os argumentos acima lhe foram expostos mais de uma vez. So os que semprevejo empregados em ocasies dessas e nunca mudam. So tambm os mais fceis derebater e os menos inteligentes.

Seno vejamos: "...O projeto sempre custa alguma coisa. O construtor que o fizer ter, sem

dvida que empregar engenheiros e desenhistas para isso. Ter de empregar gente paracalcular concreto, para calcular aquecimento, eletricidade, etc... O construtor cobrar essadespesa do proprietrio atravs da comisso para a construo.. Tanto isso verdade que,se voc apresentar aos construtores um projeto completamente pronto, ele cobrarpercentagem menor para a construo porque dir, "no terei despesas no escritrio".Suponhamos que a taxa de honorrios para a construo seja de 10 a 12%, inclusive oprojeto. Se voc der o projeto, encontrar quem lhe faa por 6 ou 8%. Da voc conclui queo projeto que voc pagou ao arquiteto 5%, j representa nessa ocasio somente 1% ou 2%a mais do que o preo geralmente previsto.

Mas eu desejo provar que o plano geral, feito com antecedncia, economia e no despesa.Ento vamos continuar. Ningum pode negar, nenhum construtor, nenhum cliente, que oprojeto feito pelo tcnico, contm em si uma previso maior dos diversos detalhes do que oprojeto rabiscado pelo construtor e verificado pelo proprietrio. Faa uma experincia. Tomeum plano que esteja em incio de construo e pergunte a quem o dirige: por onde passam

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os canos de aquecimento? Por onde passam os canos de esgoto? O senhor vai fazer antesisso ou aquilo? Garanto que no sabem.

Respondero: "provavelmente passaro por aqui ou ali, farei isto ou aquilo antes. Se naocasio de executar um servio, verificar-se um contratempo qualquer, um cano que nopode passar porque tem uma porta, um esgoto vai ficar aparecendo no andar de baixo; oconstrutor resolve em funo do problema, no momento. Ele d voltas com o cano ou fazum forro falso para esconder o esgoto que iria aparecer em baixo. Entretanto se isso tivessesido previsto, no precisaria de forro falso ou qualquer outra coisa. No papel, teria sidoprocurada e encontrada a soluo mais econmica, para o caso, a mais bonita.

Consulte um construtor experimentado ou algum que j tenha construdo e todos serounnimes em contar-lhe pequenas calamidades que apareceram. Eu j ouvi diversas vezes,por exemplo: "Quando colocamos as fundaes no terreno ns vimos que o quarto ficariaenterrado. Ento levantamos as fundaes mais cinqenta centmetros para dar certo. Porisso deu uma escada na entrada e ficou com um poro, etc... Se voc calcular quanto maiscaro ficou a impreviso, voc ver a vantagem de ter um projeto estudado. O arquiteto teriadado uma disposio diferente nos cmodos de maneira que o tal quarto no ficasse

enterrado, sem ter que aumentar as fundaes e assim economizaria o dinheiro com o qualse faria pagar.

Se o proprietrio no ganhasse nada, ainda teria para si uma soluo melhor e um motivopara valorizar seu imvel. O construtor por exemplo no projetaria as instalaes eltricas.Ele chamaria um instalador "prtico" e o homem disporia a coisa sua vontade. Usaria oscanos que ele quisesse e os fios que achasse melhores. Bem curioso, no ? Poucosentendem disso e ningum iria fiscalizar o homem. Acontece, porm que os fios, quando sofios demais em relao corrente que transportam, do muitas perdas, e essas se traduzemem despesa mensal maior de energia para voc durante os 50 ou 100 anos defuncionamento do hospital; assim voc pagaria 100 vezes um bom projeto de distribuio deeletricidade. Estou apenas repetindo casos cotidianos.

Do funcionamento do hospital ainda mais, o construtor provavelmente no entende e nemter tempo suficiente para estudar. Ele no especializado em hospitais porque isto Brasile depois no estudam porque no o seu mtier. Ora, assim sendo, ele vai confiar em voc.

Voc conhece hospitais j feitos e em funcionamento, como hospitais, no comoconstrues. Os seus preconceitos, a respeito, o construtor repetir com o dinheiro de seubolso. As solues que, para alguns casos que voc viu, so solues econmicas poderoconstituir solues carssimas, no seu caso. Rematando, sua casa de sade no teria omelhor aspecto porque faltou um artista.

Arquitetura, construo e arte. Arte. Arte no tem livro de regulamento que ensine. Nascedentro de cada um e desenvolve-se como conjunto de experincias. Procure um homem quepossa das sua casa de sade, alm das caractersticas de um hospital eficiente peloperfeito planejamento das diversas sesses, um valor artstico indiscutvel.

O valor artstico um valor perene, enorme, inestimvel. um valor sem preo e semdesgaste. Pelo contrrio, aumenta com os anos proporo que os homens se educam parareconhec-lo. O valor artstico subsiste at nas runas. Os anos correm e desgastam omaterial, enquanto valorizam o espiritual.

Com a conscincia limpa termino minha proposta. Est em suas mos a responsabilidade dedecidir entre os caminhos. De um lado eu me coloco, no s, mas como representante dosarquitetos brasileiros, defendendo a economia, a ordem e acima de tudo, o futuro. De outrolado, o empirismo, a reao, a impreviso.

Qualquer soluo que voc venha a dar no mudar as relaes entre ns, nem sua opiniofutura sobre o que acabo de escrever. Se o prdio for bom, bem projetado, bem planejado,

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por um bom arquiteto, voc gostar, todos gostaro; se ele no prestar, se custar muito, seno funcionar, ser for feio ou sem personalidade, sem valor artstico, sem plano nenhum, oresultado ser o mesmo. Em todos os dois casos voc adquirir experincia e acabar portrabalhar sempre do meu lado e com os meus argumentos. Ns venceremos sempre comoeu queria demonstrar.

Pague pois o que eu pedi. pouco em relao s vantagens futuras. Ou no pague, e asvantagens sero as mesmas, para a sociedade evidentemente, no para voc.

Com um abrao afetuoso do amigo certo,

Vilanova ArtigasSo Paulo, julho de 1945

Carta retirada do livro Vilanova Artigas Srie Arquitetos Brasileiros, paginas 49, 51 e 52