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BANCA. OS ANGOLANOS QUE VAO GERIR O MAIOR BANCO PRIVADO OS NOVOS LÍDERES DO BCP A maioria tem pouco mais de 50 anos, dois até são cunhados e alguns são próximos deJosé Eduardo dos Santos. Estãotodos ligados àSonangol. Por Patrícia Silva Alves Quando o currículo chegou aos administradores do BCP cau- sou surpresa. Em 1986, o ban- co era quase desconhecido e, por isso, não havia candidatu- ras espontâneas. Os únicos quadros que en- travam eram sugeridos por accionistas e par- ceiros. "Soube [queobanco estava a ser for- mado] através de amigos da universidade e fui fazendo contactos até saber para onde mandar o CV", recorda José Iglésias Soares, actual administrador, à SÁBADO. Foi a pri- meira candidatura espontânea que o BCP recebeu. "Enviou o currículo a dizer que ti- nha acabado o curso e que queria fazer par- te do banco. Trazia uma fotografia com um sorriso simpático e achámos que tinha al- gum mérito dirigir-se a uma associação que ainda não existia", recorda um dos envolvi- dos na escolha. Foi contratado. Pouco depois, Iglésias Soares, com 26 anos, estava a trabalhar na agência da Av. 5 de Outubro, em Lisboa. E foi que conheceu um jovem deputado do PSD, também com 26 anos, que tinha aberto conta no banco, Mi- guel Relvas, o actual ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares - Iglésias Soares era o seu gestor de conta. Ambos passaram a in- fância em Angola (nasceram lá) e vieram para Portugal com o 25 de Abril. Ficaram amigos. Em 2008, Iglésias Soares, então director do BCP, pediu uma licença sem vencimen- to. Foi trabalhar para o Atlântico (antigo BPA), em Angola, e regressou ao BCP em 2011, como administrador. Entretanto, a participação da Sonangol, accionista do Atlântico, tinha passado de 7 para 12,44%. Foi por intermédio do gestor, nos anos 80, que Relvas conheceu e se tornou amigo do futuro vice-presidente do Conselho de Ad- ministração do banco, Carlos fosé da Silva, O CV de Iglésias Soares foi o I 9 recebido pelo BCP - e ele foi gestor de conta de Miguel Relvas que deve iniciar funções depois da assem- bleia-geral, a 28 de Fevereiro. Fundador do Atlântico em Angola, em 2006, Carlos Silva, 45 anos, é um angolano que cresceu em Portugal - saiu de Angola em criança, licenciou-se em Direito na Clássica e voltou a Angola em 1991. Mas sabe o que esperam dele. um homem que [du- rante uma negociação] tem muito presen- te a defesa dos interesses angolanos", jus- tifica uma fonte com quem trabalhou. Mas se os funcionários do BCP ainda não conhe- cem este lado do futuro administrador, o mesmo não se pode dizer dos colegas da administração. Alguns dos membros da Co- missão Executiva, como José Iglésias Soa- res, Conceição Lucas ou Baptista Sumbe, que presidirá ao Conselho de Remunera- ções (em substituição de Joc Bcrardo), têm um ponto em comum nos currículos: todos passaram pelo Atlântico, o banco angolano de que Carlos Silva é presidente. Não é coincidência. A Sonangol é tanto accionista do BCP (a maior) como do Atlântico (tem 23%). E basta olhar para a lista dos órgãos sociais para perceber o reforço do poder angolano. Entre os 27 mem- bros, sete têm ligações à So- nangol. No anterior modelo de gestão, eram apenas quatro em 30 - Carlos Silva, Manuel Vicente, ex-presidente da Sonangol, Iglé- sias Soares e António Monteiro, que pas- sará a liderar o Conselho de Administração. Carlos Silva reparte o tempo por Angola, onde vive, e Portugal (tem uma moradia em Cascais). É raro passar uma semana inteira em Lisboa. Uma das excepções foi quando se anunciou a saída de Carlos Santos Ferrei- ra do BCP e teve de se reunir com Nuno Ama- do, futuro presidente do banco. O gestor,

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BANCA. OS ANGOLANOS QUE VAO GERIR O MAIOR BANCO PRIVADO

OS NOVOSLÍDERES DO BCPA maioria tem pouco mais de 50 anos, dois até são cunhados e alguns são próximosdeJosé Eduardo dos Santos. Estãotodos ligados àSonangol. Por Patrícia Silva Alves

Quando

o currículo chegou aos

administradores do BCP cau-

sou surpresa. Em 1986, o ban-

co era quase desconhecido e,

por isso, não havia candidatu-

ras espontâneas. Os únicos quadros que en-

travam eram sugeridos por accionistas e par-ceiros. "Soube [queobanco estava a ser for-

mado] através de amigos da universidade e

fui fazendo contactos até saber para onde

mandar o CV", recorda José Iglésias Soares,

actual administrador, à SÁBADO. Foi a pri-meira candidatura espontânea que o BCP

recebeu. "Enviou o currículo a dizer que ti-nha acabado o curso e que queria fazer par-te do banco. Trazia uma fotografia com umsorriso simpático e achámos que tinha al-

gum mérito dirigir-se a uma associação queainda não existia", recorda um dos envolvi-

dos na escolha. Foi contratado.

Pouco depois, Iglésias Soares, com 26

anos, estava a trabalhar na agência da Av. 5

de Outubro, em Lisboa. E foi lá que conheceu

um jovem deputado do PSD, também com 26

anos, que tinha aberto conta no banco, Mi-

guel Relvas, o actual ministro adjunto e dos

Assuntos Parlamentares - Iglésias Soares era

o seu gestor de conta. Ambos passaram a in-

fância em Angola (nasceram lá) e vieram para

Portugal com o 25 de Abril. Ficaram amigos.

Em 2008, Iglésias Soares, então director

do BCP, pediu uma licença sem vencimen-

to. Foi trabalhar para o Atlântico (antigoBPA), em Angola, e regressou ao BCP em

2011, já como administrador. Entretanto,a participação da Sonangol, accionista do

Atlântico, tinha passado de 7 para 12,44%.Foi por intermédio do gestor, nos anos 80,

que Relvas conheceu e se tornou amigo do

futuro vice-presidente do Conselho de Ad-

ministração do banco, Carlos fosé da Silva,

O CV de Iglésias Soares foi oI 9 recebido pelo BCP - e ele foi

gestor de conta de Miguel Relvas

que deve iniciar funções depois da assem-

bleia-geral, a 28 de Fevereiro.

Fundador do Atlântico em Angola, em

2006, Carlos Silva, 45 anos, é um angolano

que cresceu em Portugal - saiu de Angola em

criança, licenciou-se em Direito na Clássica

e só voltou a Angola em 1991. Mas sabe o

que esperam dele. "É um homem que [du-rante uma negociação] tem muito presen-te a defesa dos interesses angolanos", jus-tifica uma fonte com quem já trabalhou. Mas

se os funcionários do BCP ainda não conhe-

cem este lado do futuro administrador, o

mesmo não se pode dizer dos colegas da

administração. Alguns dos membros da Co-

missão Executiva, como José Iglésias Soa-

res, Conceição Lucas ou Baptista Sumbe,

que presidirá ao Conselho de Remunera-

ções (em substituição de Joc Bcrardo), têm

um ponto em comum nos currículos: todos

passaram pelo Atlântico, o banco angolanode que Carlos Silva é presidente.

Não é coincidência. A Sonangol é tantoaccionista do BCP (a maior)como do Atlântico (tem23%). E basta olhar para a

lista dos órgãos sociais paraperceber o reforço do poder

angolano. Entre os 27 mem-bros, sete têm ligações à So-

nangol. No anterior modelo de gestão, eram

apenas quatro em 30 - Carlos Silva, Manuel

Vicente, ex-presidente da Sonangol, Iglé-sias Soares e António Monteiro, que pas-sará a liderar o Conselho de Administração.

Carlos Silva reparte o tempo por Angola,onde vive, e Portugal (tem uma moradia em

Cascais). É raro passar uma semana inteira

em Lisboa. Uma das excepções foi quandose anunciou a saída de Carlos Santos Ferrei-

ra do BCP e teve de se reunir com Nuno Ama-

do, futuro presidente do banco. O gestor,

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? que não abdica do iPad nem do iPhone, tra-

balhou em coordenação com Manuel Vi-

cente, na altura membro do Conselho Geral

e de Supervisão do BCP. São amigos.

CARLOS SILVA foi casado com Katila Araújo

(já se divorciaram), filha do general Fernan-

do Araújo, da Força Aérea angolana. Segun-do a publicação África Monitor, é amigo de

António Van-Dunem, conhecido como Toni-

nho e antigo secretário do Conselho de Mi-nistros. Terá sido através de Van-Dunem queconheceu José Eduardo dos Santos, o Presi-

dente angolano. "É uma pessoa que tem gos-tos requintados, aprecia os bons vinhos por-

tugueses e a boa comida, mas é muito di scre-

to e nada ostensivo", conta o empresárioHipólito Pires, accionista da InterOceânico,

empresa gestora luso-angolana de que Car-

los Silva é presidente."Uma vez telefonou-me porque a mãe de

um colaborador teve um acidente e pergun-tou-me se eu poderia fazer alguma coisa

através da embaixada portuguesa na África

do Sul", conta o antigo embaixador Antó-

nio Monteiro, que participou nas negocia-ções de paz em Angola. Nas férias, costuma

ir para a zona de Vale do Lobo, no Algarve,e é frequentador do restaurante Gigi. Já no

trabalho, conta António Monteiro, admi-nistrador não executivo do Atlântico, parti-cipa nos festejos anuais que assinalam a fun-

dação do banco, em Luanda. A norma é ha-

ver um grande jantar acompanhado de

música. Por ser um banco jovem (70% das

pessoas têm menos de 30 anos), estas fes-

tas acabam com todos a dançar - da secre-

tária ao presidente, diz António Monteiro,

que está sempre entre os convidados

A partir de 28 de Fevereiro, vão

instalar-se no banco que será li-derado por Nuno Amado três no-

vas pessoas ligadas à Sonangol:Francisco Lemos, actual presiden-te da petrolífera; César Paxi Pedro,

advogado; e Baptista Sumbe, ad-

ministrador executivo. E vai haveruma es-

treia absoluta: Conceição Lucas, 55 anos, é

a primeira mulher em 25 anos a chegar à

administração do BCP. A gestora não só

sabe isso, como vários colegas seus do

Atlântico Europa, onde ainda trabalha, brin-

caram com o facto. "Então, Conceição, vais

fazer História?", gracejaram (não res-

pondia - é discreta e não gosta de es-

tar no centro das atenções).A gestora, a quem os amigos tratam

como Concha, é casada, tem dois fi-

lhos e, diz quem a conhece, é uma"autêntica enciclopédia viva [dosistema financeiro]". Em comum

com os restantes colegas que se

estreiam no BCP tem a ligação a An-

gola - nasceu lá. Por isso, se um dia

voltar ao país e decidir passar um

domingo de manhã no bairro Ne-lito Soares, em Luanda, encontra-rá provavelmente Francisco Lemos,

que vai ser vice-presidente do Conse-

lho Estratégico Internacional. É queo actual presidente da Sonangol (subs-

titui Manuel Vicente) vai todas as semanas à

missa na Igreja de Santa Maria de Fátima, re-

lata um artigo da África Monitor. O adminis-

trador terá herdado a ligação à Igreja do pai,funcionário das finanças durante o tempocolonial e conhecido no meio católico como"irmão Zé Maria".

JA NA SONANCOL, onde é conhecido porChiquinho, Francisco Lemos, 55 anos, des-

taca-se por ter um perfil tecnocrata (tuteloua parte financeira) e não se envolver na po-

Carlos da Silva foi um dos

angolanos que negociaram aida de Nuno Amado para o BCP

lítica. Chegou a recusar o convite do Presi-

dente José Eduardo dos Santos para ser mi-nistro das Finanças em 2009. E quando foi

convidado para ser director de Recursos Hu-

manos na Sonangol, recusou. Na altura terá

dito, de acordo com o portal informativo

angolano Club-K: "Não estou velho para es-

tar nos recursos humanos."

Francisco Lemos foi consultor do Ban-

co Mundial e encabeçou as negociaçõesentre o governo de Angola e o Fundo

Monetário Internacional - quemnão aprecia o seu estilo diz quetem mau feitio. Conta-se que se

zangou com Desidério Costa, vice-

ministro dos Petróleos, que o con-vidou para a Sonangol, porque lhe

exigiu "que justificasse uma ope-ração a suportar por fundos da So-

nangol", lê-se num artigo da Áfri-ca Monitor.

[á quando vier a Lisboa, Francis-

co Lemos poderá sentir-se em famí-

lia quando estiver a percorrer os cor-redores do BCP: é que Baptista Sum-

be, 50 anos, futuro presidente do

Conselho de Remunerações e ac-

tual vice-presidente do Atlântico, é

seu cunhado. •

Miguel Relvas é amigode Iglésias Soares e de Carlos Silva

- conhecem-se há mais de 20 anos

Armando

Vara, ex-

-administrador

do BCP, com

Carlos Silva

e Manuel

Vicente, ex-

-presidente

da Sonangol

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