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VANESSA ANDRADE DANTAS LIBERALINO DA NÓBREGA A ATIVIDADE PROBATÓRIA PROATIVA DO JUIZ: alcance e limites dos poderes instrutórios de ofício Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Alexandre Freire Pimentel Recife 2009 1

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VANESSA ANDRADE DANTAS LIBERALINO DA NÓBREGA

A ATIVIDADE PROBATÓRIA PROATIVA DO JUIZ:alcance e limites dos poderes instrutórios de ofício

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre.

Orientador: Prof. Dr. Alexandre Freire Pimentel

Recife2009

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N754a Nóbrega, Vanessa Andrade Dantas Liberalino A atividade probatória proativa do juiz: alcance e limites dos poderes instrutórios de ofício/Vanessa Andrade Dantas Liberalino da Nóbrega – Recife: UNICAP, 2009. 164f.

Dissertação (Mestrado) – Pós-Graduação em Ciências Jurídicas. Universidade Católica de Pernambuco, 2009.

1. Poder instrutório - Juiz 2. Princípio jurídico 3. Prova 4. Instrução processual 5. Processo Civil I – Título

BIBL/JFPB CDU: 347.993

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VANESSA ANDRADE DANTAS LIBERALINO DA NÓBREGA

A ATIVIDADE PROBATÓRIA PROATIVA DO JUIZ:alcance e limites dos poderes instrutórios de ofício

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre.

Aprovada em ___ de _______ de 2009.

___________________________________________________

Professor Doutor Alexandre Freire Pimentel (UNICAP)

(Orientador)

__________________________________________________

Professor Doutor Lúcio Grassi de Gouveia (UNICAP)

(Examinador Interno)

__________________________________________________

Professor Doutor Leonardo José Carneiro da Cunha (UNICAP)

(Examinador Interno)

___________________________________________________

Professor Doutor Vallisney de Souza Oliveira

(Examinador Externo)

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Aos meus pais Fátima e Jailson,

os maiores alicerces do meu sucesso pessoal e profissional.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, manifesto a Deus os meus agradecimentos. Sem Ele, certamente, a realização deste sonho não seria possível;

Aos meus pais, Fátima e Jailson, pelos ensinamentos, exemplo, amor e dedicação ilimitados;

Ao meu amor, Heuder Romero Liberalino da Nóbrega, pelo carinho, amor e compreensão; Aos meus irmãos, Talmany e Jailson Filho, com quem sempre dividi os sonhos de crescimento pessoal e profissional;

Aos Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, agradeço o apoio e a confiança em mim depositados;

Ao Prof. Dr. Alexandre Freire Pimentel, meu orientador científico, pelo conhecimento, dedicação e paciência na confecção desta dissertação;

Aos professores do Programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco, João Paulo Allain Teixeira, José Elias Dubard de Moura Rocha, Leonardo José Carneiro da Cunha, Lúcio Grassi de Gouveia, Manoel Severo, Sérgio Torres, Virgínia Colares, que, em suas aulas, dividiram os seus conhecimentos, permitindo nosso enriquecimento intelectual;

À amiga Ivanoska Maria Esperia da Silva Leite Fontes, aquela que, desde o início, dividiu comigo todas as vitórias e obstáculos. Apesar de tudo, o sucesso é nosso;

Aos novos amigos do Mestrado, Roberto, Mateus, Paulo Roberto, Isabella, Carlos Alberto, Rosalina, Viviane, Alcides e todos que faziam parte da 3ª turma do Mestrado em Direito da UNICAP, foi muito bom dividir com vocês esse novo aprendizado.

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RESUMO

Partindo-se de uma concepção publicista de processo, o qual é tido como instrumento para garantia da tutela jurisdicional efetiva, não mais se admite a idéia de um juiz passivo, mero espectador da atividade das partes. Na conjuntura processual atual, espera-se do juiz uma atuação proativa na condução do processo, pelo que se estuda a dogmática da legislação processual civil sobre a atividade probatória proativa do juiz. A pesquisa inicia-se pela análise dos principais sistemas processuais no enfoque da atividade do juiz no processo, examinado também a evolução dos poderes instrutórios do juiz no processo civil brasileiro. Aborda os fundamentos principiológicos da atividade probatória proativa do juiz no processo civil. Disserta algumas noções elementares sobre a prova, com destaque para as regras de distribuição do ônus da prova e sua relação com os poderes instrutórios do juiz. Analisa algumas classificações apresentadas por doutrinadores sobre os poderes que o juiz, uma vez que este é o representante do Estado no exercício da função jurisdicional. Dessa forma, entende-se que amplos devem ser os poderes instrutórios do juiz no processo civil e que deve ele se valer de todos os seus poderes, atuando proativamente na busca da verdade real. No ordenamento jurídico brasileiro, o alicerce dos poderes instrutórios do juiz é o art. 130 do CPC, mas, além desse, outros dispositivos também lhe conferem poderes instrutórios específicos, constituindo, no entanto, enumeração exclusivamente taxativa. Por fim, não se pode olvidar que, para evitar abusos e desmandos por parte dos juízes, o próprio ordenamento jurídico previu limites à atividade instrutória do magistrado, devendo o mesmo observar os princípios jurídicos em sua atuação. Dessa forma, a presente dissertação destaca a real atividade probatória proativa do juiz, seu alcance e seus limites.

Palavras-chave: Poder instrutório – Juiz; princípio jurídico; Prova; Instrução

processual; Processo Civil.

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ABSTRACT

Starting from a publicist conception of procedural law, which is considered to be an instrument for guaranteeing an effective jurisdictional tutelage, we cannot any longer admit the idea of a passive judge, a mere spectator of the activities on the side. In the current procedural conjuncture, we expect from the judge a proactive performance during the carrying out of the procedure, by studying the dogma of civil procedural law on the proactive probative practice of judges. The research begins with an analysis of the principal procedural systems by focusing on the practices of the judges during the procedures and examining also the fact-finding powers of the same judges during Brazilian civil procedures. It broaches the ground principles of the proactive probative practices of judges in civil proceedings. Some elementary notions on proof and the shedding of light on the distribution rules with regard to the burden of proof and its relation to the fact-finding powers of judges are also discussed. It analyses some classifications as shown by PhDs on the powers of judges when they are the State representative in the carrying out of judicial power. In this way, we understand that the fact-finding powers of judges in civil procedures must be very ample, and they must use all their powers in the proactive performance in their search for the real truth. In the Brazilian legal system, the foundation for fact-finding powers of judges is in the CPC article number 130, moreover, other devices also give the judges specific fact-finding powers, however, constituting exclusive emphatic enumeration. Finally, we cannot forget that in order to avoid abuse and trespassing by the judges, the judicial power itself foresaw limitations to the fact-finding activities by the magistrates, as they must observe the judicial principals in their carrying out of duties. In this way this dissertation sheds lights on the real proactive probative activity of judges, their ranges and limits.

Key words: Fact-finding powers – Judge; judicial principle; Proof; Regulation Procedure; Civil Procedure.

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LISTA DE SIGLAS

ADCT Ato das Disposições Constitucionais TransitóriasADI Ação Direta de InconstitucionalidadeCC Código CivilCDC Código de Defesa do ConsumidorCF Constituição FederalCF/88 Constituição Federal de 1988CLT Consolidação das Leis do TrabalhoCPC Código de Processo CivilCPP Código de Processo PenalCTN Código Tributário NacionalPL Projeto de LeiSTF Supremo Tribunal FederalSTJ Superior Tribunal de JustiçaTJPE Tribunal de Justiça de PernambucoTJPB Tribunal de Justiça da Paraíba TRF Tribunal Regional FederalUNICAP Universidade Católica de Pernambuco

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................112 A ATIVIDADE INSTRUTÓRIA DO JUIZ E OS SISTEMAS PROCESSUAIS ...152.1 Sistema adversarial ......................................................................................162.1.1 O direito inglês..............................................................................................18

2.1.2 O modelo norte-americano ..........................................................................20

2.2 Sistema de ativismo judicial ........................................................................212.2.1 Tendência de ampliação dos poderes instrutórios do juiz ...........................23

2.2.2 Redução da atividade do juiz na instrução do processo ..............................24

2.3 A evolução dos poderes instrutórios do juiz no processo civil brasileiro. .............................................................................................................253 PRINCÍPIOS PROCESSUAIS E A ATIVIDADE DO JUIZ NA INSTRUÇÃO DO PROCESSO ..........................................................................................................313.1 Princípio dispositivo .....................................................................................353.1.1 O princípio dispositivo e os poderes do juiz .................................................38

3.1.2 Inércia da jurisdição .....................................................................................40

3.1.3 Princípio da demanda ..................................................................................41

3.2 Princípio da cooperação ..............................................................................423.3 Princípio da imparcialidade .........................................................................473.3.1 O princípio da imparcialidade e a atividade probatória proativa do juiz........49

3.3.2 Imparcialidade e neutralidade.......................................................................51

3.4 O princípio da igualdade: dever do magistrado .........................................533.5 Princípio do devido processo legal..............................................................573.6 Princípio do contraditório.............................................................................603.6.1 Conteúdo do princípio do contraditório.........................................................63

3.6.2 O contraditório e a atividade probatória proativa do juiz...............................64

3.7 Princípio da motivação das decisões judiciais...........................................654 NOÇÕES ELEMENTARES SOBRE A PROVA.................................................684.1 Conceito de prova..........................................................................................694.2 Objeto da prova..............................................................................................734.2.1 Fatos probandos...........................................................................................74

4.2.2 Fatos que independem de prova..................................................................75

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4.2.3 Prova do direito.............................................................................................78

4.3 Meios de prova...............................................................................................794.3.1 Provas obtidas por meios ilícitos...................................................................81

4.4 Momentos da prova.......................................................................................854.5 Sistemas de apreciação da prova................................................................864.6 O ônus da prova e a atividade instrutória do juiz.......................................894.6.1 Aspectos do ônus da prova...........................................................................91

4.6.2 Distribuição estática do ônus da prova.........................................................95

4.6.3 Inversão do ônus da prova............................................................................97

4.6.4 Distribuição dinâmica do ônus da prova.....................................................103

4.6.5 O ônus da prova e os poderes do juiz........................................................106

5 PROATIVIDADE - ALCANCE E LIMITES DOS PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ NO PROCESSO CIVIL...............................................................................1085.1 Os poderes do juiz e a efetividade do processo.......................................1105.2 Classificação dos poderes do juiz.............................................................1145.3 Poderes instrutórios do juiz........................................................................1185.3.1 A instrução do processo..............................................................................118

5.3.2 Natureza jurídica dos poderes instrutórios do juiz......................................120

5.3.3 Poderes instrutórios do juiz em geral..........................................................122

5.3.4 Poderes instrutórios específicos.................................................................125

5.3.4.1 Interrogatório informal..............................................................................125

5.3.4.2 Prova documental....................................................................................128

5.3.4.3 Prova testemunhal...................................................................................131

5.3.4.4 Prova pericial...........................................................................................132

5.3.4.5 Inspeção judicial......................................................................................134

5.3.5 Preclusão para o juiz em matéria de prova.................................................136

5.4 Alcance dos poderes instrutórios do juiz..................................................1385.5 Limites aos poderes instrutórios do juiz...................................................1416 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................145REFERÊNCIAS...................................................................................................151

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1 INTRODUÇÃO

Para um Brasil tão carente de ética e de esperança, não é bastante ao juiz que se limite a cumprir seu dever de ofício. A História e o futuro reclamam sacrifício maior ao juiz brasileiro1.

Um dos temas do processo civil moderno que se apresentam em

destaque no momento diz respeito à atividade probatória proativa do juiz, como

mecanismo de busca da verdade dos fatos para se atingir a justiça da decisão.

Hoje, não se pode mais compreender o processo, apenas, como “coisa

das partes”. Em razão da sua visão publicista e instrumentalista, a idéia de um

juiz passivo e in rte deu lugar a uma nova postura mais atuante, ativa, em que

este colhe elementos para formar seu convencimento e melhor decidir o pleito.

A insatisfação com a justiça é tema corrente no direito. Fala-se em

crise2 do Poder Judiciário, principalmente, em razão de sua falta de eficiência ou

efetividade, a qual não se manifesta apenas no campo jurídico, derivando também

de fenômenos culturais, econômicos, políticos e sociais.3

A Emenda Constitucional n. 19,4 de 05.06.1998, acrescentou a

eficiência como princípio fundamental a ser observado por todo o serviço público.

Não se trata de um problema isolado do Poder Judiciário, mas de toda a

administração pública, que deve ser combatido, a fim de atender às demandas da

sociedade.

O Poder Judiciário mostra-se imerso na estagnação e no conformismo

e precisa urgentemente romper com esse ciclo para cumprir, com eficiência, a sua

função jurisdicional. Multiplicam-se as reformas nas legislações processuais em

todo o mundo, a fim de se atingir os escopos social, político e jurídico do 1 NALINI, José Renato. A rebelião da toga. Campinas: Millennium, 2008, p. 201.2 Pode se entender por crise, as “transformações decisivas em qualquer aspecto da vida social”. (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 222).3 Como afirma José Renato Nalini, “a formação dogmática e positivista está na raiz da chamada crise da Justiça. Ela tem uma face que não é apreensível pela ciência jurídica, pois envolve questões políticas, sociais, econômicas, históricas e até psicológicas”. (NALINI, José Renato. A rebelião da toga. Campinas: Millennium, 2008, p. XVI.)4 Determina o art. 37, caput da CF/88, com redação determinada pela Emenda Constitucional n. 19/1998 que: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:”.

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processo.5 No entanto, essas reformas não são suficientes para atender aos

reclamos da sociedade. Faz-se mister que o juiz, consciente de seu papel, exerça

plenamente seus poderes no processo, atuando proativamente para garantir a

efetividade e eficiência necessárias.

Destarte, torna-se imprescindível uma análise teórica sobre a atividade

probatória proativa do juiz, por entender que o verdadeiro juiz deve estar

comprometido com a reconstrução real dos fatos para oferecer uma melhor

prestação jurisdicional.

A escolha do tema ora em estudo se deu em razão da relevância da

instrução processual para o julgamento final da demanda, bem como da

necessidade de modificarem os paradigmas formulados pelo Estado privatista,

que ainda se encontram, consciente ou inconscientemente, arraigados à

magistratura brasileira como um todo.

Tem-se, por conseguinte, como objetivo geral analisar a atividade

probatória proativa do juiz, através dos seus poderes instrutórios de ofício, a qual

objetiva modificar as crenças básicas da inércia judicial para conferir ao

jurisdicionado a tutela jurisdicional justa e efetiva, através do amplo conhecimento

do fato litigioso.

Apontam-se como objetivos específicos do tema os seguintes

aspectos, quais sejam: analisar como se dá a participação do juiz na atividade

probatória em alguns sistemas processuais, bem como no ordenamento jurídico

brasileiro; verificar quais os princípios jurídicos que norteiam a atividade instrutória

do juiz; estudar algumas noções relativas ao direito à prova e de que modo se

relacionam com os poderes instrutórios do juiz, assim como analisar quais os

poderes instrutórios gerais e específicos do juiz no processo, seu alcance e seus

limites.

Para o desenvolvimento da pesquisa, aplica-se o método científico

dedutivo, de modo que se inicia o estudo de uma análise geral do tema para uma

particular, com o objetivo de alcançar embasamento teórico sobre o assunto e,

posteriormente, melhor compreender suas especificidades. Da mesma forma,

5 “Os escopos social, político e jurídico da jurisdição reafirmam que o processo não é mero instrumento técnico. Possuindo tríplice finalidade, assume cada vez mais importância para um projeto de sociedade”. MENDONÇA JÚNIOR, Delosmar. Princípios da ampla defesa e da efetividade no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 7.

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utiliza-se o método hermenêutico, pelo qual se analisam as diversas

particularidades do regramento jurídico relacionado à matéria em discussão, bem

como os métodos analítico e conceitual, para uma compreensão dos diversos

aspectos tratados.

O estudo realiza-se através de uma pesquisa bibliográfica6 - utilizando

publicações de autores nacionais e estrangeiros que tratam do assunto em

debate.

O presente trabalho analisa a atividade do juiz no processo, estando

este sob o enfoque instrumental, compreendendo cinco capítulos, neles incluídos

a presente introdução, que disserta sobre as motivações, necessidades e

objetivos de realizá-la.

No segundo capítulo, verifica-se a atividade do juiz dentro dos dois

grandes sistemas processuais, o do common law e do civil law, bem como a

evolução dos poderes do juiz no processo civil brasileiro, em que se aprecia a

legislação que trata da matéria desde os primórdios do direito brasileiro.

O terceiro capítulo analisa a compatibilidade entre os princípios

jurídicos e a atuação proativa do juiz na instrução processual, com destaque para

os princípios do dispositivo, da imparcialidade, do devido processo legal, do

contraditório e da ampla defesa, da igualdade, da motivação das decisões

judiciais e da cooperação.

Há algumas noções elementares acerca da prova que são

indispensáveis à compreensão do tema. De modo que, no quarto capítulo,

aprecia-se o conceito de prova, o seu objeto, os meios, os momentos e os

sistemas de apreciação, não se esquecendo do debate sobre o ônus da prova,

em que se examinam os seus aspectos objetivo e subjetivo, as regras de

distribuição estática e dinâmica, a possibilidade de inversão e sua relação com os

poderes instrutórios do juiz.

No quinto capítulo, abordam-se os poderes do juiz no processo,

oportunidade em que se apresentam algumas classificações formuladas por

6 A pesquisa bibliográfica “constitui parte da pesquisa de campo ou de compilação, enquanto é feita com o intuito de recolher informações e conhecimentos prévios, acerca de um problema para o qual se procura resposta, para uma hipótese que se quer experimentar. A pesquisa bibliográfica é meio de formação por excelência. Como trabalho científico original constitui a pesquisa propriamente dita na área das ciências humanas”. (MACEDO, Magda Helena Soares. Manual de metodologia da pesquisa jurídica. 2. ed. Porto Alegre: Sagra Luzzato, 2001. p. 87).

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renomados autores, bem como a relação entre os poderes do juiz e a efetividade

processual.

O juiz cônscio de sua função trabalha sempre para alcançar a justiça

de sua decisão e a pacificação social e, para isso, deve descobrir com qual das

partes está o direito. Deve, então, envidar todos os esforços para chegar o mais

perto possível da verdade e, assim, no exercício pleno da sua função jurisdicional,

dar a cada um o que é seu.

Dessa forma, amplos devem ser os seus poderes instrutórios, o que

torna imprescindível o estudo mais detalhado sobre os poderes instrutórios gerais

e específicos do juiz, como também a possibilidade da ocorrência de preclusão

para o juiz em matéria de prova, matéria analisada ainda no quinto capítulo desta

dissertação.

Apesar de nosso Código de Processo Civil determinar, em seu art. 130,

que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas

necessárias à instrução do processo”, mesmo assim, remanescem divergências

quanto ao alcance dos poderes instrutórios do juiz, pelo que, no quinto capítulo,

também se reflete sobre o assunto.

O juiz moderno não pode ficar parado, aguardando a manifestação dos

litigantes para o desenvolvimento do processo; ele não se contenta em ser mero

espectador. Ao contrário, mostra-se protagonista7 da marcha processual.

Entretanto, a fim de evitar abusos e desmandos e mesmo uma “ditadura do Poder

Judiciário”, a atuação probatória proativa do juiz encontra limites no próprio

ordenamento jurídico, temática a ser discutida ainda no quinto capítulo desta

dissertação.

Desse modo, espera-se evidenciar qual a real atividade do juiz na

instrução processual civil brasileira e de que modo ele pode contribuir para a

oferta de uma tutela jurisdicional justa e efetiva.

7 De acordo com José Renato Nalini, o protagonismo judicial “só poderá advir de consciência sensível e desperta para um exercício ético da função”. (NALINI, José Renato. A rebelião da toga. Campinas: Millennium, 2008, p. XV).

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2 A ATIVIDADE INSTRUTÓRIA DO JUIZ E OS SISTEMAS PROCESSUAIS

O mundo contemporâneo apresenta-se unificado, principalmente, em

razão da globalização. Já não se pode mais isolar um Estado de outro, todos são

interdependentes, mantendo, entre si, relações sociais, políticas, econômicas e

jurídicas.

Apesar de cada nação, em regra, dispor de um direito próprio, pode-se

agrupá-las em famílias, que estão ligadas por “elementos, mais fundamentais e

mais estáveis, com a ajuda dos quais se podem descobrir as regras, interpretá-las

e determinar o seu valor”.8

Dessa forma, para uma melhor compreensão da atividade probatória

proativa do juiz, é importante estudar os sistemas9 processuais, verificando suas

características, seus princípios, no que toca à divisão do trabalho entre o juiz e as

partes no desenvolvimento do processo.

O estudo dos sistemas processuais, conquanto se apresente deveras

amplo, será realizado de forma limitada aos aspectos que se relacionam com o

tema. Propõe-se a apreciação dos principais sistemas processuais,

especialmente, quanto à participação do juiz na instrução processual civil.

Evidenciar-se-á, basicamente, dois grupos jurídicos principais, o do

civil law, de origem romano germânica, e o do common law, de procedência

anglo-saxônica,10 uma vez que a eles estão ligados a maior partes dos sistemas

jurídicos nacionais da atualidade.11

8 DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. (Les grands systèmes du droit contemporains). 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 21.9 Para Kant, sistema é “a unidade de múltiplos conhecimentos, reunidos sob uma única idéia”. Caracterizando-se pela unidade em torno de um único princípio. (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 909).10 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 40. Segundo o autor: “a essas duas famílias acrescentava-se, até alguns anos atrás, a dos ordenamentos do chamado “bloco socialista”. Sistemas de tal corte remanescem nos poucos países onde ainda vigoram regimes socialistas, mas a dimensão do fenômeno, é óbvio, encolheu notavelmente.” Acrescenta René David que esses três grupos de direito “estão longe de dar conta de toda a realidade do mundo jurídico contemporâneo. Ao lado das concepções que representam, ou combinando-se com essas concepções, outros modos de ver relativos à boa organização da sociedade persistem e continuam a ser determinantes num grande número de sociedades”. (DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. (Les grands systèmes du droit contemporains). 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 23) 11 SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 26.

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O sistema do common law, também conhecido como “sistema

adversarial”, é adotado pelo direito inglês e norte-americano, assim como pelos

países a eles agregados. Já o sistema do civil law ou de ativismo judicial

compreende os países de família romano-germânica, cujo direito teve como

alicerce o direito romano, neles incluído o Brasil.

Vale ressaltar, contudo, que cada país apresenta sua própria legislação

civil e processual civil, as quais estão ligadas a uma família jurídica por

características próprias externadas de maneira semelhantes em diversas nações.

Apesar de se apresentarem de formas distintas, as famílias jurídicas também

manifestam pontos em comum, os quais são ampliados ou reduzidos de acordo

com o momento histórico.12

2.1 Sistema adversarial

O adversary system típico dos ordenamentos anglo-saxônicos

caracteriza-se por apresentar regras de direito mais abstratas, cujo objetivo

principal é solucionar o processo.13

Refuta-se a idéia de uma atuação ativa do magistrado, apresentando-

se este de forma passiva na instrução do processo.14 O relacionamento entre o

juiz e as partes dá-se de forma neutra, atuando aquele como árbitro a intermediar

o confronto entre os contendores.

12 Como lenciona René David, “países de direito romano-germânico e países de common law tiveram uns com os outros, no decorrer dos séculos, numerosos contatos. Em ambos os casos, o direito sofreu a influência da moral cristã e das doutrinas filosóficas em voga puseram em primeiro plano, desde a época da Renascença, o individualismo, o liberalismo e a noção de direitos subjetivos. A common law conserva hoje a sua estrutura, muito diferente da dos direitos romano-germânicos, mas o papel desempenhado pela lei foi aí aumentado, e os métodos usados nos dois sistemas tendem a aproximar-se; sobretudo a regra de direito tende, cada vez mais a ser concebida nos países de common law como o é nos países da família romano-germânica. Quanto à substância, soluções muito próximas, inspiradas por uma mesma idéia de justiça, são muitas vezes dadas às questões pelo direito nas duas famílias de direito”. (DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. (Les grands systèmes du droit contemporains). 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 26).13 Ibid., p. 25 14 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43.

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Ao lado do juiz passivo, as partes têm assegurado a plena iniciativa

probatória, ficando esta tarefa a cargo dos advogados, que trabalham para

oferecer ao magistrado elementos probatórios robustos para a formação do seu

convencimento.

Veda-se qualquer iniciativa do juiz ou mesmo impulsos oficiais que não

sejam requeridos pelos litigantes. “A força do processo está na atividade das

partes”.15 São elas que devem se esforçar para demonstrar suas versões dos

fatos e, assim, formar a convicção judicial.

Nesse sistema, os litigantes, através de seus defensores, determinam

os moldes do processo, competindo ao magistrado tão-somente dirigir a

audiência, fiscalizar a produção de provas orais e decidir as questões de direito

possivelmente suscitadas no curso da ação.16 Ultrapassar esses limites fere

sobremaneira o seu ideal, e ele deve se manter inerte diante do processo.17 O juiz

da família anglo-saxônica apresenta-se estático e meramente aplicador da lei.18

O procedimento, no sistema adversarial, em regra, é dividido em duas

etapas: pré-trial, ou fase de preparação, e o trial, em que efetivamente ocorre a

sessão de julgamento19.

Caracteriza-se pela supremacia das provas orais, bem como pela

concentração da sua produção que ocorrerá exclusivamente no trial.20 Não

existem autos da ação; na audiência, dá-se a realização das provas, os debates,

e, em seguida, é proferida a sentença.21

15 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 54. Consultar também MICHELI, Gian Antonio; TARUFFO, Micheli. A prova. Revista de Processo, n.16. ano IV. Out.-Dez. 1979, p. 155-168.16 Exemplo interessante é citado por Barbosa Moreira. “Narra-se, ao propósito, o caso de certo juiz inglês que, há décadas teve anulado julgamento que presidira, por haver feito muitas perguntas às testemunhas – comportamento reprovado como violador da garantia do fair trial. Foi-se ao extremo de induzir o magistrado a renunciar ao cargo.” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 43).17 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 54.18 MENDES, Francisco de Assis Filgueira. Interrogatório informal das partes – art. 342 do CPC: revisitando um velho e atual (embora olvidado) instituto processual. In MEDINA, José Miguel Garcia et al. (coord). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais: estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim Wambier. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 135. 19 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 69/7020 Ibid., p. 69.21 DAVID, René. O direito inglês. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 41.

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As decisões judiciais, nesse sistema, não necessitam de motivação,

podendo a sentença conter exclusivamente o dispositivo. Contudo, mesmo não

fazendo parte, tecnicamente, da decisão, os juízes, em sua maioria, apresentam

suas razões de decidir, pois estas são levadas em consideração como

precedentes judiciais,22 os quais detém grande força, por se apresentar

vinculantes para os juízes e tribunais.

2.1.1 O direito inglês

Mesmo sendo o precursor do sistema adversarial, em que o juiz deve

se manter passivo no tocante à instrução do processo, o direito inglês tem sofrido

mudanças com o decorrer dos tempos, principalmente, em razão da insatisfação

com a sua justiça civil.

Censuras foram feitas ao processo judiciário inglês, em razão do alto

custo, da morosidade e da sua complexidade. De sorte que a causa apresentada

para essas imperfeições estava principalmente no modelo adversarial, que

confere às partes o papel preponderante na direção e instrução do processo.23

Apesar das críticas, compete aos litigantes realizar as diligências

probatórias necessárias à direção da instrução processual. Entretanto, no que

toca à ampliação dos poderes do juiz, percebe-se certa evolução no sistema

adversarial inglês já com o Civil Evidence Act de 1972, que teve como principal

alteração a possibilidade de acesso do magistrado as provas produzidas no pré-

trial, tornando-o mais preparado para participar da sessão de julgamento.24

22 Ibid., p. 45.23 Segundo Barbosa Moreira, “a máquina judiciária era criticada pelo custo exorbitante, pela excessiva lentidão e pela complexidade do funcionamento. Pareceu a muitos que as causas de tais defeitos se originavam em grande parte, da feição exageradamente adversarial do modelo tradicional, e em particular do fato de se deixarem aos cuidados das partes (rectius: dos advogados), com exclusão praticamente total do juiz, o andamento do pleito e a instrução probatória”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 71). 24 “De início, o juiz incumbido de presidir o trial não tinha acesso, antes desse momento, a peças processuais; partia-se da premissa de que ele devia chegar à sessão de julgamento sem prévio conhecimento do assunto, a fim de conjurar o risco de que sua mente, em vez de ficar aberta às impressões colhidas ao vivo no trial, já sofresse alguma inclinação prematura. A ignorância era havida por garantia de imparcialidade e barreira contra o prejulgamento.” (Ibid., p. 44).

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Essa mudança de mentalidade teve seu impulso, na Inglaterra, com o

Civil Procedure Rules de 1999, que modificou o sistema inglês ao ponto “de

conferir aos juízes o poder de agir de ofício inclusive no que concerne à produção

de provas”.25

Tem-se, hoje, uma aproximação do sistema inglês com o do ativismo

judicial, no entanto aquele ainda apresenta características do sistema adversarial.

A legislação inglesa pretendeu tornar mais participativa a atuação do juiz no

processo, passando este a ter acesso aos fatos antes do Day in Court.26

No direito inglês, o júri, em matéria cível, tornou-se uma exceção.27

Hodiernamente, via de regra, o julgamento cível se dá por um juiz único. Ao

chegar à sessão de julgamento (trial), o magistrado não tem qualquer

conhecimento sobre o litígio, passando a ouvir os debates entre os litigantes,

para, ao final, proferir a sentença.

O juiz inglês deve conduzir a audiência, atuando, para garantir a

observância das regras de lealdade no que toca ao acolhimento das provas e

evitando desordens.28

2.1.2 O modelo norte-americano

O modelo norte-americano de processo considera o juiz como um

árbitro do processo, que deve atuar de forma neutra no duelo entre as partes.

25 JOLOWICZ, J. A. A reforma do processo civil inglês: uma derrogação ao “adversary system”, trad. José Carlos Barbosa Moreira. Revista de Processo. São Paulo, v. 19, n. 75, p. 64-75, jul./set. 1994, p. 65 e 72 e ss.26 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 57.27 Como lenciona René David, “o júri tornou-se excepcional; em matéria cível, só é prescrito para certas categorias de processo: ações de indenização por difamação, seqüestro arbitrário, ou ações em que o réu é acusado de ter cometido uma fraude”. (DAVID, René. O direito inglês. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 42).28 “O juiz inglês também fala pouco. Seu papel é concebido essencialmente como o de um árbitro, que ouve uns e outros e assim se convence. O papel que lhe cabe é, antes de mais nada, o de dirigir os trabalhos da audiência; ele deve impedir que estes se dispersem e garantir sua perfeita lealdade, fazendo notadamente respeitar as regras relativas à admissibilidade da prova e impedindo que sejam introduzidos nos debates elementos que gerem confusão. O juiz pode fazer perguntas para esclarecer o debate, mas não deve substituir os advogados e interrogar, no lugar destes, as testemunhas”. (Ibid., p. 44).

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Veda-se “maiores iniciativas ao juiz ou quaisquer impulsos oficiais que não sejam

determinados por iniciativa das partes”.29

A modificação de comportamento do direito inglês não atingiu, da

mesma maneira, o modelo norte-americano. Nos Estados Unidos, a participação

das partes ainda é primordial para a instrução do processo.

O júri é o principal instituto do processo civil americano, através do qual

se realizam os julgamentos das questões de fato suscitadas pelos litigantes.30 Ao

juiz compete a decisão sobre as questões de direito, estando impedido de discutir

a apreciação das provas pelos jurados.31

O processo americano, tanto criminal como o cível, apresenta duas

fases: pre-trial e o trial.32 A primeira fase, do pre-trial,33 processa-se perante o juiz

singular e tem como objetivo delimitar os prontos controvertidos da demanda a

serem apreciados pelo júri na fase do trial. Não cabe ao juiz apreciar se há ou não

a necessidade de outras provas para a formação do convencimento dos jurados,

é das partes tal tarefa. Ao magistrado compete apenas atuar nos casos de

posicionamentos divergentes dos litigantes, sempre agindo com neutralidade.34

A fase do trial é realizada em uma única audiência, na presença do juiz

e dos jurados, e nela são produzidas as provas, especialmente, a testemunhal, e

29 SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 104.30 Conforme salienta Guido Soares, o jury nos EUA, “quando desacompanhado de adjetivos, entende-se ser o petit ou petty jury, colégio de 12 leigos (laymem), os jurados (jurors) e seu porta-voz (foreman), cuja competência é julgar questões de fato, estando as de direito reservadas ao juiz (judge);” (Ibid., p. 104).31 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006. Ver também TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Considerações sobre o direito norte-americano. Revista de Processo. a. 4, n.16, p. 113-133, out.-Dez. 1979.32 De acordo com Antonio Gidi, “The structural division of proceedings into pre-trial and trial phases allowed development of a system of discovery, which, in turn, justified the relaxation of the rule of pleading”. (GIDI, Antonio. Class actions in Brasil – a model for civil law countries. The American journal of comparative law, 2000, p. 316)33 Consoante Sálvio de Figueiredo Teixeira, a fase do pre-trial objetiva “preparar o processo para a fase do trial, esclarecendo as partes suas posições reais e preparando as provas para o trial. Em outras palavras, consiste o pré-trial na alimpação da causa, na simplificação e redução dos pontos litigiosos, além de buscar conciliar as partes (...). O juiz geralmente não participa do pre-trial, exceto se convocado, quando terá função mais de fiscalizador (e o faz de forma vigorosa), saneado o feito, considerado que, a exemplo dos pleadings, o pre-trial tem caráter meramente preparatório, visando ao trial. ” (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Considerações sobre o direito norte-americano. Revista de Processo. a. 4, n.16, p. 115, out.-Dez., 1979.)34 SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 116.

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realizado o julgamento. O magistrado detém principalmente o papel de fiscalizar o

júri, contendo seu arbítrio ou estabelecendo suas atribuições.35

O juiz, nesse sistema, é um legislador36, e não instrutor. Cumpre às

partes proceder ao desenvolvimento do processo e produzir provas para

reconstruir a verdade dos fatos.

Todavia, apesar de se manterem ligados à postura passiva do órgão

judicial, é certo que algumas reformas legislativas conferiram ao magistrado norte-

americano maiores poderes para o controle da atividade das partes.37

2.2 Sistema de ativismo judicial38

Esse sistema, também denominado de civil law, está representado

pelos países de origem romano-germânica e apresenta suas raízes ligadas à lei

escrita, apresentando como uma de suas características a codificação de sua

legislação. O objetivo primeiro do sistema era a sua racionalidade e logicidade, e,

por isso, a preocupação maior a ser enfrentada era o casuísmo da lei.39

Associada à ideia de Montesquieu de separação de poderes, apresenta

uma concepção piramidal do direito, segundo a qual o Poder Judiciário tem 35 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 60.36 “O caráter específico que tem o juiz na common law, de ser o legislador (e relembre-se que se diz judge-made law), em contrate com o statute law, o direito criado pela legislatura), faz com que as discussões sobre normas referentes a procedimentos probatórios sejam, na verdade, discussões sobre normas geradoras do próprio direito material e do próprio direito processual;” (SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 134).37 Afirma Amendoeira Jr. que, “o processo adversarial está enfrentado enormes pressões por mudança nos últimos tempos, de modo que alguns juízes passaram a assumir papéis mais ativos na condução de seus processos, principalmente in the settlement process, during the pretiral conference stage, and in the various management thecniques by wich courts are responding to complex modern litigation”. (AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 60). Neste sentido, ver também MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 46.38 “Ativismo seria a consequência de uma postura menos inerte do julgador, que não mais tem que se restringir as solicitações das partes para produzir provas que julgar indispensável para a formação do seu livre convencimento, mas pode solicitá-las sempre que as entender imprescindíveis à boa consecução da justiça”. (RIBEIRO, Isabela Lessa de Azevedo Pinto. Ativismo judicial: o papel da jurisdição num paradigma constitucionalmente adequado. Recife: Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP, 2008. p. 92) (Dissertação de Mestrado).39 SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos EUA. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 28.

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amplas funções, sem sofrer controle de nenhum outro poder, estando limitado,

contudo, pela res judicata, e não possui iniciativa no processo.40

Ocorre que, apesar de manter-se inerte quanto à iniciativa processual,

o juiz, no civil law, participa ativamente do desenvolvimento do processo, sendo o

responsável pela direção e fiscalização da produção de provas.41

Fala-se que tal modelo está ligado ao princípio inquisitivo, em que o

juiz mostra-se dinâmico e participativo na produção da prova.42 No entanto, é

importante destacar que nem todos os países dessa família apresentam a mesma

postura quanto à atividade do juiz e das partes no processo.

Observa-se, na atualidade, que alguns países de tradição romano-

germânica seguem a tendência de ampliação dos poderes do juiz, enquanto

outros, na contramão do processo evolutivo, têm reduzido a participação do juiz

no processo.

2.2.1 Tendência de ampliação dos poderes instrutórios do juiz

Tanto a França, quanto a Alemanha, países ligados à família romano-

germânica têm realizado reformas no sentido de alargar os poderes instrutórios

do juiz.

40 Ibid., p. 29. Ver também MICHELI, Gian Antonio; TARUFFO, Micheli. A prova. Trad. Teresa Celina de Arruda Alvim. Revista de Processo, a. 4, n.16, p. 155-168, out.-Dez. 1979.41 Na lição de Barbosa Moreira, “No universo do civil law, toda a atividade instrutória leva-se a cabo em juízo, ou pelo menos sob a direção do juiz e em regra na sua presença”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 59). Também nesse sentido, afirma Gioconda Fianco Pitt que: “na civil law o juiz é responsável pela obtenção da prova e das evidências necessárias para obter a verdade dos fatos trazidos aos autos” (PITT, Gioconda Fianco. Dever de veracidade no processo civil brasileiro e sua relação com o instituto do Discovery do processo norte-americano da common law. In KNIJNIK, Danilo (Coord.). Prova judiciária: estudos sobre o novo direito probatório. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 125.42 MENDES, Francisco de Assis Filgueira. Interrogatório informal das partes – art. 342 do CPC: revisitando um velho e atual (embora olvidado) instituto processual. In MEDINA, José Miguel Garcia et al. (coord). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais: estudos em homenagem à professora Teresa Arruda Alvim Wambier. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 135.

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A França, através do Code de Procédure Civile, de 1975, conferiu ao

juiz o poder de determinar de ofício todas as medidas de instrução legalmente

admissíveis.43

A legislação processual civil alemã, por sua vez, já apresentava o juiz

dotado de uma postura ativa na instrução probatória, a qual foi ampliada com a

reforma da ZPO, por lei de 27.07.2001.44 A nova legislação concedeu ao

magistrado, além do poder de requisitar documentos à que a parte contrária se

refira, também a possibilidade de exigi-lhe de terceiros, com algumas poucas

exceções (§142, 1ª e 2ª alíneas).45

2.2.2 Redução da atividade do juiz na instrução do processo

Ao contrário da maioria dos países de origem românico-germânica, a

Espanha e a Itália têm reformulado seus ordenamentos jurídicos, para reduzir a

participação do juiz na instrução do processo.

43 O art. 10 do referido Diploma Legal determina que: “Le juge a le pouvouir d’ordonner d’office toutes lês mesures d’instruction, légalemente admissibles” (FRANÇA. Code de Procédure Civile de 1975. Disponível em: http://www.lexinter.net/NCPC/index.htm. Acesso em 08.01.09).

Os arts. 143 e 144 do Code de Procédure Civile também conferem poderes instrutórios ao juiz francês, ao prescrever que: “Article 143. Les faits dont dépend la solution du litige peuvent, à la demande des parties ou d’office, être l’objet de toute mesure d’instruction légalement admissible. Article 144. Les mesures d’instruction peuvent être ordonnées em tout état de cause, dès lors que le juge ne dispose pás d’éléments suffisants pour statuer”. A legislação francesa prevê ainda limite aos poderes instrutórios do juiz no art. 146, que determina: “Article 146. Une mesure d’instruction ne peut être ordonnée sur um fait que si la partie qui l’allègue ne dispose pás d’elements suffisants pour lhe prouver. Em aucun cas une mesure d’instruction ne peut être ordonnée em vue de suppléer la carence de la partie dans l’administration de la preuve”. (FRANÇA. Code de Procédure Civile de 1975. Disponível em: http://www.lexinter.net/NCPC/index.htm. Acesso em 08.01.09.)44 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 47. Até a reforma da ZPO alemã, ocorrida em 27.07.2001, a legislação alemã admitia a iniciativa probatória do juiz, com exceção da prova testemunhal que dependia exclusivamente da parte. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 61)45 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 203.

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O Codice di Procedura Civile italiano outorga, em vários dispositivos,

poderes instrutórios de ofício ao juiz.46 No entanto, a moderna doutrina italiana,

interpretando a legislação, entendeu que a lei limitou a atividade probatória do juiz

ao fixar taxativamente seus poderes instrutórios de ofício.47 Da mesma forma,

também na instrução processual penal, reduziu-se a atividade do juiz, ao se

restringir às hipóteses de atuação ex officio do magistrado.48

Na Espanha, a nova Ley de Enjuiciamento Civil, de 2000, em oposição

à reforma francesa, reduziu os poderes instrutórios do juiz, limitando-os às

hipóteses expressamente previstas.49 46 MATTOS, Sérgio Luís Wetzel. Da iniciativa probatória do juiz no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 02. 47 O art. 281-ter do Codice di Procedura Civile, acrescentado em 1998, determina que: “Il giudice può disporre d’ufficio la prova testimoniale formulandone i capitoli, quando le parti nella esposizione dei fatti si sono riferite a persone che appaiono in grado di conoscere la veritá.” Apud CÂMARA, Alexandre Freitas. Poderes instrutórios do juiz e o processo civil democrático. Revista de Processo, a. 32, n. 153, Nov.2007. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 37. (MATTOS, 2001 apud CÂMARA, 2007, p. 37)48 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 48.49 O art. 282 da Ley de Enjuiciamiento Civil espanhola prescreve que: “artículo 282. Iniciativa de la actividad probatoria. Las pruebas se practicarán a instancia de parte. Sin embargo, el tribunal podrá acordar, de oficio, que se practiquen determinadas pruebas o que se aporten documentos, dictámenes u otros medios e instrumentos probatorios, cuando así lo establezca la ley.” Acrescenta a legislação em comento que:”artículo 434. Sentencia. 1. La sentencia se dictará dentro de los veinte días siguientes a la terminación del juicio. 2. Si, dentro del plazo para dictar sentencia y conforme a lo prevenido en los artículos siguientes, se acordasen diligencias finales, quedará en suspenso el plazo para dictar aquélla. 3. Se podrá suspender el plazo para dictar sentencia en los procedimientos sobre la aplicación de los artículos 81 y 82 del Tratado de la Comunidad Europea o de los artículos 1 y 2 de la Ley de Defensa de la Competencia cuando el tribunal tenga conocimiento de la existencia de un expediente administrativo ante la Comisión Europea, la Comisión Nacional de la Competencia o los órganos competentes de las Comunidades Autónomas y resulte necesario conocer el pronunciamiento del órgano administrativo. Dicha suspensión se adoptará motivadamente, previa audiencia de las partes, y se notificará al órgano administrativo. Este, a su vez, habrá de dar traslado de su resolución al tribunal. Contra el auto de suspensión del proceso sólo se dará recurso de reposición. Artículo 435. Diligencias finales. Procedencia. 1. Sólo a instancia de parte podrá el tribunal acordar, mediante auto, como diligencias finales, la práctica de actuaciones de prueba, conforme a las siguientes reglas: 1.º No se practicarán como diligencias finales las pruebas que hubieran podido proponerse en tiempo y forma por las partes, incluidas las que hubieran podido proponerse tras la manifestación del tribunal a que se refiere el apartado 1 del artículo 429. 2.º Cuando, por causas ajenas a la parte que la hubiese propuesto, no se hubiese practicado alguna de las pruebas admitidas. 3.º También se admitirán y practicarán las pruebas pertinentes y útiles, que se refieran a hechos nuevos o de nueva noticia, previstos en el artículo 286. 2. Excepcionalmente, el tribunal podrá acordar, de oficio o a instancia de parte, que se practiquen de nuevo pruebas sobre hechos relevantes, oportunamente alegados, si los actos de prueba anteriores no hubieran resultado conducentes a causa de circunstancias ya desaparecidas e independientes de la voluntad y diligencia de las partes, siempre que existan motivos fundados para creer que las nuevas actuaciones permitirán adquirir certeza sobre aquellos hechos. En este caso, en el auto en que se acuerde la práctica de las diligencias habrán de expresarse detalladamente aquellas circunstancias y motivos. Artículo 436. Plazo para la práctica de las diligencias finales. Sentencia posterior. 1. Las diligencias que se acuerden según lo dispuesto en los artículos anteriores se llevarán a cabo, dentro del plazo de veinte días, en la forma establecida en esta Ley para las

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A novel legislação espanhola estabeleceu que “as diligências

destinadas a esclarecer dúvidas antes do julgamento, denominadas providencias

para mejor proveer, somente podem ser realizadas após a fase normal de

instrução probatória e tão-só por iniciativa das partes”.50 Apenas,

excepcionalmente, o magistrado poderá determinar de ofício a realização de

novas provas, desde que digam respeito a fatos relevantes, oportunamente

alegados pelos litigantes, sempre que existam motivos reais para acreditar que a

sua produção permitirá certeza sobre aqueles fatos litigiosos.

Percebe-se que a lei espanhola mostra-se sobremaneira limitadora da

atividade instrutória do juiz no processo, conferindo às partes a plena iniciativa

quanto à produção de provas no processo. Algumas exceções que lhe

estabelecem poderes instrutórios de ofício restringem-se às circunstâncias

previamente estabelecidas na lei.

2.3 A evolução dos poderes instrutórios do juiz no processo civil brasileiro

No Brasil, na época das Ordenações, os juízes não dispunham de

autonomia para a produção de provas, seus poderes eram resumidos à iniciativa

para esclarecer algumas dúvidas por ventura existentes.51 “Desde aquela época,

o magistrado já era considerado como parte do processo, parte imparcial, a quem

cabia julgar a causa nos estritos ditames dos pedidos formulados e de acordo

com os fatos trazidos aos autos”.52 No entanto, o juiz não tinha participação sobre

a instrução do processo, cabia-lhe apenas dirigi-lo, para que se alcançasse a

verdade.

pruebas de su clase. Una vez practicadas, las partes podrán, dentro del quinto día, presentar escrito en que resuman y valoren el resultado. 2. El plazo de veinte días para dictar sentencia volverá a computarse cuando transcurra el otorgado a las partes para presentar el escrito a que se refiere el apartado anterior”. Disponível em: <http://civil.udg.es/normacivil/estatal/lec/L2T1.htm>. Acesso em 08.01.09. Ver MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 48.50 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 72.51 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 57.52 AMENDOEIRA JR. Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 43.

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Mesmo após a Independência do Brasil, o processo civil brasileiro

continuou a ser disciplinado pelas Ordenações Filipinas, as quais, juntamente

com outras leis complementares e modificativas, foram compiladas na

Consolidação das Leis do Processo Civil, tornando-se obrigatória por meio de

Resolução Imperial em 28 de dezembro de 1876.53 Nessa época, vigorava o

Regulamente no. 737, de 1850, que disciplinava os feitos comerciais, e, em

relação às causas de natureza cível, aplicava-se a Consolidação das Leis do

Processo Civil54.

É proclamada a República, e, através do Decreto no. 763, de 19 de

setembro de 1890, determinou-se que também se aplicaria às causas cíveis o

Regulamento 737, salvo algumas exceções.55 Nessa época, o citado

Regulamento já conferia poderes instrutórios ao juiz, como se verifica pelo seu

art. 230, que prescrevia: “se examinados os autos o juiz entender necessária para

julgar afinal alguma diligência, ainda que lhe não tenha sido requerida nas

alegações finais, a poderá ordenar, marcando para isso prazo conveniente”.56

Com o advento da Constituição Federal de 1891, distribui-se entre a

União e os Estados-Membros a competência para legislar acerca do processo

civil, a União Federal legislava sobre processo da justiça federal, e os Estados,

sobre o processo em geral.57 Foram, então, elaborados os códigos estaduais de

processo dos Estados de São Paulo, Bahia, Minas Gerais e Distrito Federal.58

No que se refere aos poderes instrutórios do juiz no processo, o Código

de Processo do Estado da Bahia, de 1915, determinava, em seu art. 127, que: “o

juiz pode ordenar ex officio as diligências que julgar necessárias para apurar a

53 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 27.54 O art. 147 da Consolidação Ribas, já determinava que: “o juiz pode ex-officio mandar abrir a conclusão para exigir provas, esclarecer as existentes, ou sanar qualquer êrro suprível do processo”. (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e no comercial. v.1, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1952, v. 1, p. 113).55 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. v.1, 20 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 53.56 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e no comercial. v.1, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1952, p. 113.57 ROSAS, Roberto. Direito processual constitucional: princípios constitucionais de processo civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 24.58 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 27.

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verdade dos fatos alegados, depois de realizadas as que forem requeridas pelas

partes”.59

Em sede doutrinária, o rompimento com a postura inativa do juiz surgiu

da ideia do professor Alexandre Gusmão, que, já em 1922/1924, baseado no

direito estrangeiro, defendia “a possibilidade de o juiz ordenar de ofício qualquer

diligência que lhe parecesse necessária à apuração dos fatos debatidos no

processo” 60.

Posteriormente, a Constituição de 1934 retirou a competência dos

Estados-Membros de legislarem sobre processo civil, mantendo a unidade da

legislação processual.61 Revogaram-se os códigos estaduais.

Em 18 de setembro de 1939, foi promulgado o Código de Processo

Civil unificado do Brasil, que já trazia uma ideia publicística de processo.62 Seguiu

a referida compilação a tendência de ampliação dos poderes do juiz, o que se

colhe da Exposição de Motivos do Código de Processo Civil de 1939, a saber:

A direção do processo deve caber ao juiz; a este não compete apenas o papel de zelar pela observância formal das regras processuais por parte dos litigantes, mas também o de intervir no processo de maneira que este atinja pelos meios adequados, o objetivo de investigação dos fatos e descoberta da verdade. Daí a largueza com que lhe são conferidos poderes, que o processo antigo, cingido pelo rigor de princípios privatísticos, hesitava em reconhecer. Quer na direção do processo, quer

59 Ao comentar o artigo, Eduardo Espínola assevera que: “Êste artigo, como outros do Projeto, procura pôr o processo no fôro baiano na mesma altura a que chegaram os códigos mais perfeitos da Europa. É de notar que a doutrina, naqueles próprios países que não conseguiram uma reforma processual que banisse de todo o gasto e anacrônico princípio da inércia do juiz, não cessa de louvar os códigos que se inspiram no princípio oposto. O assunto é tão bem estudado que melhor não posso fazer do que reproduzir passagens de alguns escritores de competência indiscutível. Ouçamos em primeiro lugar CHIOVENDA, ilustre professor da Universidade de Roma: “Mais profundo e mais grave sobressai o contraste entre a direção do pensamento científico moderno, inimigo por natureza de todo preconceito, de todos os formalismos, de todo vínculo nas indagações da verdade, e dos limites de toda espécie, positivos ou negativos, que o imposto ao pensamento do juiz na procura da verdadeira situação dos fatos da causa.” (...) Em outro estudo observa: “Um outro característico fundamental do processo germânico e, mais particularmente, do austríaco é o do aumento dos poderes do juiz. De um lado ele é estreitamente ligado aos princípios da oralidade e da concentração, que sòmente são permitidos na atuação prática; mas tem pouca importância em si mesmo, por isso que tal aumento de poderes é a consequência necessária do conceito moderno do processo civil. A ingerência do juiz na lide, como tutela do interêsse do Estado para a rápida e melhor finalidade dos processos, representa, mais do que um princípio, o espírito geral que anima estas leis.” (ESPÍNOLA, Eduardo. Código de Processo civil da Bahia. 1913, v.1, nota 188).60 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 58.61 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 27.62 Ibid., p. 34.

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na formação do material submetido a julgamento, a regra que prevalece, embora temperada e compensada como manda a prudência, é a de que o juiz ordenará quanto for necessário ao conhecimento da verdade.63

O art. 112 do referido Diploma Legal estabelecia o juiz como diretor do

processo, responsável pelo seu desenvolvimento e celeridade, sem prejuízo do

interesse das partes.64

Seguindo essa postura, o art. 117 do Código de 1939 determina que:

O juiz poderá, a requerimento, ou ex officio, em despacho motivado, ordenar as diligências necessárias à instrução do processo e indeferir as inúteis em relação ao seu objeto, ou requeridas com propósito manifestamente protelatório.

Esse dispositivo constituía um progresso em relação ao processo civil

anterior, que só possibilitava ao magistrado determinar a realização de ofício de

algumas provas previamente fixadas em lei e, com o advento do Código de 1939,

permitiu-se ao juiz ordenar toda e qualquer diligência necessária à instrução do

processo, ampliando os seus poderes instrutórios.65 Dessa forma, “ao juiz inerte e

passivo sucedeu o juiz ativo”.66

Consolidando a concepção publicística de processo que enseja a

ampliação dos poderes do juiz, o Código de Processo Civil de 1973, já no art.

125, prescreve que o juiz deve dirigir o processo de acordo com as disposições

do Código, competindo-lhe assegurar as partes igualdade de tratamento, velar

63 Exposição de motivos do Código de processo civil de 1939. Apud. NALINI, José Renato. O juiz e o acesso à justiça. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 125/126.64 Francisco Campos interpretando o dispositivo afirma que “o juiz é o órgão ao qual o Estado atribui a realização do seu fim de reintegrar o equilíbrio do direito. Ele deve dirigi-lo, imprimir-lhe o ritmo adequado, viver a vida do processo”. (Francisco Campos, exposição de motivos, ao Código de processo civil. Apud. SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 2. ed. São Paulo: Max Limons, 1952, p. 119).65 “Explicou Pedro Batista Martins que tal dispositivo era um avanço em relação ao processo civil anterior, porque os diplomas legais pretéritos somente permitiam ao juiz ordenar ex officio algumas diligências previamente determinadas na lei. Ao contrário, o diploma de 39 concedeu o poder judicial de ordenar toda e qualquer diligência necessária à instrução do processo”. (MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 36). Acrescenta Moacyr Amaral Santos que: “sempre se concedeu, no direito probatório brasileiro, atribuições mais ou menos equivalentes ao juiz. Certamente o Código atual foi mais longe. “O Código atual foi mais longe e atribui ao juiz a incumbência de, mediante despacho motivado, ordenar, oficialmente ou a requerimento, não só exames periciais, mas toda e qualquer diligência necessária à instrução do processo. Por outro lado, a bem da economia processual, deu-lhe também autoridade para indeferir as diligências que, em relação ao objeto da causa, sejam realmente inúteis””. (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e no comercial. v.1, 2. ed. São Paulo: Max Limonad, 1952, p. 120).66 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 34.

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pela rápida solução do litígio e prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à

dignidade da justiça.

O referido Diploma Legal determina que o processo civil comece por

iniciativa da parte, mas se desenvolva por impulso oficial (Art. 262, CPC).

Ademais, estabelece que o juiz não se exime de sentenciar, vedando o non liquet

(Art. 126, CPC).

Assim, para formar seu convencimento, deve o magistrado determinar

a realização de provas de ofício, conforme preceitua o art. 130 do CPC: “caberá,

ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à

instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente

protelatórias”.

Esse é o principal dispositivo que confere poderes instrutórios ao juiz.

No entanto, outros artigos dispersos pelo Código de Processo Civil vigente

também demonstram a possibilidade de atuação de ofício do magistrado, os quais

serão analisados ao longo deste trabalho.

A Lei n. 9.099/95 que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e

Criminais, seguindo a tendência de participação ativa do juiz no processo,

determinou, em seu art. 5º, que: “o juiz dirigirá o processo com liberdade para

determinar as provas a serem produzidas, para apreciá-las e para dar especial

valor às regras de experiência comum ou técnica”.

Observa-se, pois, que não é de hoje a ideia de que o juiz deve deter

poderes instrutórios de ofício para instruir o processo e, dessa forma, melhor

proferir sua decisão. Todavia, percebe-se que a interpretação quanto à amplitude

e aos limites a esses poderes ainda não encontram unanimidade na doutrina nem

na jurisprudência.

Em busca da verdade real do processo, estudar-se-á até onde o juiz

pode e/ou deve ir para atingir o ideal de justiça baseado na reconstrução dos

fatos objeto da demanda, sem, contudo, ferir os princípios jurídicos constitucionais

ou processuais que limitam sua atuação resguardando, principalmente, o Estado

Democrático de Direito.

É, portanto, indispensável estudar os princípios constitucionais e

processuais que se relacionam com a atividade do juiz na instrução processual

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civil, a fim de destacar quais os reais limites aos amplos poderes instrutórios do

juiz no processo civil brasileiro.

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3 PRINCÍPIOS PROCESSUAIS E A ATIVIDADE DO JUIZ NA INSTRUÇÃO DO PROCESSO

No estudo da atividade proativa do juiz na instrução do processo, torna-

se imprescindível analisar os princípios processuais que se correlacionam com o

tema, posto que a atuação do juiz no processo, sua participação ativa, o exercício

de seus poderes de direção e instrução devem respeitar sempre os princípios

processuais.67

Princípio origina-se do latim principium e, etimologicamente, significa

“início, começo, origem, causa, momento inicial.68 Além dessa concepção,

também se reporta à ideia de principal, de importante.

Nos países de família romano-germânica como o Brasil, os princípios

são considerados fontes do direito,69 sendo utilizados para suprir lacunas.70 Nesse

sentido, fala-se em princípios gerais do direito que, enquanto suporte subsidiário

da lei, servem como auxiliar na função integrativa da aplicação do direito.71

Contudo, aqui, fala-se em princípios enquanto princípios jurídicos.

Em 1956, Josef Esser definiu princípio como “normas que estabelecem

fundamentos para que determinado mandamento seja encontrado”.72 Tem-se uma

diferenciação qualitativa entre os princípios e as regras.

Para Dworkin, princípio é uma norma que é necessária observar, não

porque seja possível ou assegure uma situação econômica, política ou social que

67 Consoante afirma Sérgio Alves Gomes, “somente quando o juiz exerce corretamente todos os poderes que lhe são conferidos para bem dirigir e participar da instrução do processo, respeitando e fazendo respeitar nestes seus princípios fundamentais, é que se pode dizer que os sujeitos do processo estão atuando no devido processo legal”.

p

(GOMES, Sérgio. Alves. Os poderes do juiz na direção e instrução do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 41).68 Definição do Dicionário da Língua Portuguesa Larousse Cultural. São Paulo: Universo, 1992.69 DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. (Les grands systèmes du droit contemporains). 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 116.70 Conforme art. 4º da Lei de Introdução do Código Civil, art. 126 do Código de Processo Civil, art. 108 e 109 do CTN, art. 3º do Código de Processo Penal, além do §1º do art. 5 da Constituição Federal de 1988.71 ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.33.72 ESSER, Josef. Grundsatz und norm in der richterlichen fortbildung des privatrechts. 4. t. Tubingen, Mohr, Siebeck: 1990, p. 51. Apud ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 35.

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se julga conveniente, mas por ser um imperativo de justiça, de honestidade ou de

alguma outra dimensão da moral.73

Eles contêm valores que devem ser compartilhados com outros valores

de outros princípios. A partir daí, afirma-se que apresentam uma dimensão do

peso ou importância, pelo que, havendo conflito entre os mesmos, deve-se

observar “a força relativa de cada um”.74 As regras, no entanto, não manifestam

essa perspectiva e havendo conflitos entre elas, não se aprecia o peso maior,

mas a validade das mesmas.

Segundo Dworkin, “as regras são aplicáveis de maneira do “tudo ou

nada”, porque, uma vez apresentados os fatos, ou serão válidas, e o conteúdo

nelas previsto deverá ser aplicado, ou serão inválidas, em nada contribuindo para

a solução do caso. Esse “tudo ou nada” ou “all or nothing” significa a aplicação de

uma regra com a total desconsideração da outra”.75

Apoiado nas ideias de Dworkin, Robert Alexy76 considera os princípios

como “uma espécie de normas jurídicas por meio da qual são estabelecidos

deveres de otimização aplicáveis em vários graus, segundo as possibilidades

normativas e fáticas” 77.

73 “una norma que es menester observar, no porque haga posible o asegure una situación econômica, política o social que se juzga conveniente, sino por ser un imperativo de justicia, de honestidad o de alguna outra diménsion de la moral” (DWORKIM, R. M. “Es el derecho um sistema de normas?”, Filosofia do Direito (trad. Javier Sainz de Los Terreros), Cidade do México, Fondo de Cultura Enconómica, 1980, p. 86. Apud. MENDONÇA JÚNIOR, Delosmar. Princípios da ampla defesa e da efetividade no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 12).74 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 39. Apud. CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 15.75 Ibid., p. 15. 76 De acordo com Alexy: “La teoría de Dworkin de una única respuesta correcta plantea una gran cantidad de cuestiones (...) los criterios de Dworkin para la distinción entre reglas y principios afectan ciertamente a puntos importantes, pero no al núcleo. Si se los analiza a fondo, queda claro que una teoría de los principios por sí sola no está en condiciones de sostener la tesis de la única respuesta correcta, lo que, sin embargo na hace que disminuya su importancia para la filosofia jurídica, la metodología jurídica y la dogmática jurídica (...) pretendo captar los déficits de la teoría de los princípios a través de una teoría de la argumentación jurídica orientada de acuerdo con el concepto de razón prática. La unión de ambas teorías constituye la base de una teoría del Derecho en la que rige una versión débil de la tesis de la única respuesta correcta”. (ALEXY, Robert. Derecho y razón práctica. 2. ed. México: BEFDP – Biblioteca de Ética, Filosofia y Política, 1998, p.8).77 ALEXY, Robert. Rechtsregeln und Rechtsprinzipien, Archives Rechts und Sozialphilosophie, Separata, Frankfurt am Main, 1985, 20-25. Apud ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 37.

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Devem-se distinguir os princípios jurídicos e as regras pelas diferenças

quanto à colisão e quanto à obrigação que instituem.78 No que respeita ao conflito

entre aqueles, deve haver uma limitação recíproca entre os mesmos. “Haverá

prevalência de um princípio sobre o outro com base na dimensão de pessoa que

cada um possui no caso concreto, cedendo um para que o outro permaneça”.79

Havendo colisão entre regras, observar-se-á a validade de uma delas que deve

prevalecer sobre a outra.

Quanto à obrigação que instituem, Robert Alexy distingue os princípios

das regras por considerar que estas instituem obrigações absolutas, não

superadas por normas contrapostas, enquanto aqueles determinam obrigações

prima face, à medida que podem ser superadas ou derrogadas em função dos

outros princípios colidentes.80

Compreendido dentro do sistema jurídico regular como norma, também

Canotilho propôs, com propriedade, uma distinção entre os princípios jurídicos e

as regras.

A partir das ideias de Dworkin e, posteriormente, de Alexy, que

concebia a Constituição como “um sistema aberto de regras e princípios”,

Canotilho, utilizando cinco critérios, delimitou as duas espécies de norma,81 de

acordo com: a) o grau de abstração, pelo que os princípios apresentam um grau

de abstração mais elevado do que as regras; b) grau de determinabilidade na

aplicação do caso concreto, já que os princípios são vagos e indeterminados,

necessitando serem concretizados através da atividade do legislador ou do juiz,

enquanto as regras se apresentam de aplicação imediata; c) caráter de

fundamentabilidade no sistema de fontes de direito, por se apresentarem

fundamentais ou estruturantes dentro do sistema jurídico; d) proximidade da ideia

de direito, os princípios são standards arraigados na idéia de “justiça” (Dworkin)

ou na “idéia de direito” (Larenz), ao passo que as regras mostram-se de conteúdo

78 Ibid., p. 38.79 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 16.80 ALEXY, Robert. Rechtsregeln und Rechtsprinzipien, Archives Rechts und Sozialphilosophie. Frankfurt am Main, 1985, 20-25, apud ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 39.81 Na atualidade, alguns autores espanhóis como Perez Luño, Prieto Sanchis e García de Enterria falam na divisão da norma em três espécies, quais sejam, princípios, regras e valores. Para Aragon, “os valores diferentemente dos princípios, só teriam eficácia interpretativa” (ARAGON, Manuel. Constitución y Democracia. Madrid: Tecnos, 1990, p. 85-97).

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meramente formal; e) natureza normogenética, em que os princípios são a base

ou o fundamento das regras.

No Brasil, a maioria dos doutrinadores82 entende que, juntamente com

a regra, o princípio constitui uma espécie de norma jurídica, que “possui forte

índice de abstração, com uma referência direta de valor”.83 Equivalem aos

mandamentos nucleares de um sistema jurídico84 que apresentam natureza

normativa.85

Pode-se concluir que a ciência jurídica moderna atribui caráter

normativo aos princípios, assim como às regras, os quais servem para unificar o

sistema normativo, bem como para direcionar a atividade do intérprete, a fim de

observar os valores da sociedade.86

Em decorrência de sua relevância dentro do sistema jurídico, os

princípios apresentam diversas funções, quais sejam: fundamentadora,

82 “Diferente é a compreensão do professor Ivo Dantas, que não concebe as normas como gênero ao qual pertencem os princípios e as regras, para ele princípios e normas representam dois institutos jurídicos distintos. Interpretando a principiologia constitucional brasileira, Ivo Dantas adverte que ao lado dos princípios fundamentais, que não se identificam através de processo dedutivo, mas se inferem por meio de juízo apriorístico, queda-se uma outra categoria de princípios: a dos princípios gerais, vertidos para subsistemas ou setores específicos do ordenamento constitucional. O autor reconhece que ambas as espécies são superiores, hierarquicamente falando, às normas, mas os princípios gerais encontram-se em nível inferior ao dos princípios que pairam sobre todas as demais categorias, principiológicas ou normativas.” (PIMENTEL, Alexandre Freire. Principiologia juscibernética. Processo telemático. Uma nova teoria geral do processo e do direito processual civil. Recife: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), 2004, p. 752 (Tese de Doutorado).83 LOPES, Maria Elizabeth de Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 27.84 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de direito administrativo. São Paulo: RT 1986, p. 230. Para o autor, “princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico (...)”.85 Noberto Bobbio é um dos defensores do caráter normativo dos princípios. Para o autor, “os princípios gerais são, apenas, a meu ver, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais. A palavra princípios leva a engano, tanto que é velha a questão entre os juristas se princípios são normas. Para mim, não há dúvida: os princípios gerais são normas como todas as outras”. (BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 8. ed. Brasília: UNB, 1996, p. 158.)86 Como ensina Luís Roberto Barroso, “os princípios dão unidade e harmonia ao sistema, integrando suas diferentes partes e atenuando tensões normativas. De parte isto, servem de guia para o intérprete, cuja atuação deve pautar-se pela identificação do princípio maior que rege o tema apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie. Estes são os papéis desempenhados pelos princípios: a) condensar valores; b) dar unidade ao sistema; c) condicionar a atividade do intérprete”. (BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, v. 1, n. 6, p. 20, set. 2001.

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interpretativa, integrativa, diretiva e limitativa.87 Destarte, ao mesmo tempo em

que a normatização destes amplia os poderes instrutórios do juiz, permitindo-lhe a

busca da verdade real do processo para alcançar a justiça de sua decisão,

também limita a atividade proativa do magistrado, à medida que o mesmo deve

seguir o conteúdo axiológico dos princípios que lhe servem de direção.88

Suplantada a análise do conceito de princípios jurídicos, passa-se,

então, ao estudo dos princípios constitucionais e processuais que se relacionam

com o tema.

3.1 Princípio dispositivo

O princípio dispositivo constitui um dos mais importantes acerca do

tema em debate, especialmente, por “que deriva da própria natureza do direito

substantivo, do qual, por meio do processo, pede-se a proteção”.89 Todavia, não

há consenso doutrinário quanto a sua definição.

Para os doutrinadores clássicos, o estudo desse princípio remete aos

brocardos iudex iudicare debet allegata et probata partium, ne eat iudex ultra

petita partium, nemo iudex sine actore, ne procedat iudex ex officio etc.90

87 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo : Malheiros, 2000, p. 254.88 Conforme destaca o Prof. Alexandre Pimentel, “os próprios princípios servem como limite ao subjetivismo do julgador, ao mesmo tempo em que permitem a busca de uma solução mais justa pela superação do estrito legalismo, desaguando numa decisão sempre motivada. Tudo isto está a depender tão somente da postura dos juízes: se se apresentarem tímidos estarão a renunciar, como dito por José Carlos Barbosa Moreira, em extrair da Constituição suas maiores virtudes; se forem virtuosos, e exercerem soberanamente a jurisdição, estarão a implementar a justiça pela superação constitucional do normativismo positivista, que somente se auferirá pela admissão de uma ordem jurídica axiológica. Isto demonstra o acerto de Nelson Saldanha em atrelar a ideia de jurisdição à de justiça. E é nesse contexto que o processo surge como instrumento efetivador da jurisdição e da concreção de um direito justo, legitimado pelo procedimento isonômico ofertado aos contendores”. PIMENTEL, Alexandre Freire. Principiologia juscibernética. Processo telemático. Uma nova teoria geral do processo e do direito processual civil. Recife: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), 2004, p. 755-756. (Tese de Doutorado). 89CAPPELLETTI, Mauro. O processo civil no direito comparado. Belo Horizonte: Líder, 2001, p. 20. 90 LOPES, Maria Elizabeth de Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 91. Ver também ALVES, Jones Figueirêdo. Da aplicação prática dos princípios processuais: uma proposta de estudo. Recife: TJ/PE, 1990, p. 19.

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Dessa forma, de acordo com a concepção tradicional do princípio

dispositivo, o juiz deve julgar o processo com base naquilo que for alegado e

provado pelas partes, estando impossibilitado de agir de ofício ou de apreciar

pedidos não formulados.91 Assim, o juiz tem seus poderes instrutórios restritos,

cabendo exclusivamente às partes a iniciativa e condução do processo,

competindo àquele determinar supletivamente a realização de provas de ofício,

quando, concluída a instrução, não tiver formado seu convencimento.

Nesse caso, por meio do princípio dispositivo, confere-se às partes

toda a iniciativa processual, pelo que o juiz não poderá instaurar o processo de

ofício, estabelecer seu conteúdo, limites e direção, nem mesmo produzir provas.92

Em contrapartida ao princípio dispositivo, tem-se o princípio inquisitivo,

segundo o qual o juiz possui ampla liberdade de iniciativa, tanto para iniciar o

processo, quanto para sua direção.93 Aqui, é papel do juiz investigar os fatos,

agindo livremente em busca da verdade real, não estando submetido às

afirmações das partes.94 Os litigantes podem indicar os fatos e meios de provas,

mas o magistrado não está restrito ao conteúdo processual delimitado por eles.

91 De acordo com Robert Winess Millar, “dicho principio implica que las partes tienen el pleno dominio de sus derechos materiales y processuales involucrados em la causa, y reconoce su potestad de libre decisíon respecto del ejercicio o no ejercicio de estos derechos”. (MILLAR, Robert Wyness. Los princípios formativos del procedimiento civil, trad. de Catalina Grossmann, Buenos Aires: Ediar [s.d.], p. 65).92 Interpretando o princípio dispositivo, Maurício Lindenmeyer Barbieri afirma que “a parte, sendo titular do direito controvertido do processo, é quem melhor saberá agir para vê-lo reconhecido em juízo. Ao juiz cabe julgar. À parte cabe alegar os fatos do seu interesse e prová-los”. (BARBIERI, Maurício Lindenmeyer. Implicações do princípio dispositivo nos poderes instrutórios do juiz. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de (Coord.). Prova cível. 2. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 104).93 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Princípios gerais do direito processual civil. Revista de Processo, n. 23. Ano VI. Jul.-set. 1981, p. 180.94 Conforme Maurício Lindenmeyer Barbieri, “a inquisitoriedade ganhou grande prevalência na legislação prussiana no final do século XVIII, iniciada sob o império de Frederico II, o Grande. A inspiração, como é de se imaginar, estava na obsessão do imperador de que a causa da pouca efetividade da justiça civil tinha como principal causa a conduta dos advogados, responsáveis os letrados pelas pouco satisfatórias condições da justiça. O novo regime, cujo germe radicava no código provisional adotado para a Pomerânia em 1747 – a qual, como se dizia em tempos antigos, era chamada Terra Litigiosa – foi convertido em 1781 na lei geral – e, finalmente, quando Frederico II foi coroado, transformou-se na Ordenança Judicial Geral. Segundo esse sistema, as alegações das partes eram formuladas por um juiz-delegado ou por funcionários judiciários subordinados (os comissários de justiça), que formavam um único corpo reconhecido de profissionais juristas. Os ditos comissários compareciam também na recepção da prova, patrocinando as partes. A representação por advogados se limitava à discussão (por escrito) das questões de direito envolvidas na causa. Dessa maneira, a acumulação do material do juízo quedou sujeita ao controle do tribunal. (BARBIERI, Maurício Lindenmeyer. Implicações do princípio dispositivo nos poderes instrutórios do juiz. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de (Coord.). Prova cível. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 106-107).

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Para atingir a verdade e, assim, realizar a correta aplicação da lei, o juiz poderia

de ofício investigar todos os fatos e elementos do processo.

Esses dois princípios, nos moldes como propostos, não são aplicados

intactamente, sendo adotados pela maioria das legislações de forma conjunta.

Com efeito, a ideia do princípio dispositivo como limitação aos poderes

instrutórios do juiz é característica do modelo individualista de processo, em que o

interesse individual sobrepunha-se ao geral.

Durante o Estado Liberal, em que se imperava o regime absolutista, o

juiz era visto como mero espectador, devendo, apenas, aplicar a lei, sem

interpretá-la.95 Com a Segunda Guerra Mundial, rompeu-se com a neutralidade, o

formalismo e o individualismo do Estado Liberal, passando-se à concepção

publicística do processo, a qual busca a justiça da decisão e a pacificação

social.96

O Código de Processo Civil brasileiro segue o princípio dispositivo ao

determinar que o processo comece por iniciativa da parte (art. 262, 1ª parte). No

entanto, não impede a atuação ativa do magistrado na direção do processo,

inclusive em matéria de prova, pois, como determina a parte final do art. 262 do

CPC, o processo deve se desenvolver por impulso oficial, não estando sobre

exclusiva responsabilidade dos litigantes.

A moderna ciência processual, embasada pela idéia publicística do

processo, entende que o princípio dispositivo limita o juiz, apenas, no que tange à

disponibilidade do direito material, sem qualquer ligação com a instrução da

causa.97 As partes teriam plena liberdade para renunciar, transacionar, desistir,

reconhecer a procedência do pedido, entre outros atos possíveis, sem que o juiz

possa interferir na sua decisão. Todavia, nada impede a postura ativa do

magistrado quanto à direção do processo e à produção de provas, já que, nesse

caso, estará agindo em busca do cumprimento de sua função de julgar.

95 Conforme Luiz Guilherme Marinoni, “o juiz do direito liberal, como é sabido, estava proibido de assumir uma postura ativa no processo. Em nome da liberdade do indivíduo, chegou-se, até mesmo, nos países onde o pensamento de Montesquieu era mais vivo, a se proibir ao juiz a interpretação da lei”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 66).96 NOBREGA, Vanessa Andrade Dantas L. da. O papel do juiz na condução da instrução do processo: um novo paradigma. Revista Dialética de direito processual n. 64, p. 123. São Paulo, 2008.97 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 71.

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3.1.1 O princípio dispositivo e os poderes do juiz

Com o advento da idéia publicista de processo, o princípio dispositivo

reduziu seu conceito, restringindo-se à liberdade das partes em determinar os

fatos e os pedidos, sem limitar, contudo, a liberdade de investigação do

magistrado.98

Essa postura, no entanto, não é aceita por todos os doutrinadores que

entendem, no princípio dispositivo, um limite aos poderes instrutórios do juiz e a

veem como violação ao princípio da imparcialidade.99

A doutrina clássica considera que as partes possuem a exclusividade

na produção de provas no que se refere aos direitos disponíveis, uma vez que

apenas elas detêm interesse no processo. Só elas conhecem os fatos e, dessa

forma, melhor poderiam colher as provas necessárias para o deslinde do feito e “a

eventual iniciativa probatória do juiz importaria a própria negação do direito

subjetivo material”100.

Em relação aos direitos disponíveis, a atuação positiva do juiz, na

produção de provas, fere o princípio da imparcialidade, à medida que ele estará

substituindo a parte na busca de provas e elementos capazes de demonstrar a

ocorrência dos fatos.

No entanto, poderia o juiz agir de ofício nos casos de direitos

indisponíveis, uma vez que constituem interesses que se sobrepõem aos das

partes. Nesse caso, ao determinar a produção de provas de ofício, o juiz não 98 Conforme ensina Vallisney de Souza Oliveira, “quando se fala em princípio dispositivo, não se quer mais dar aquela elasticidade de que se revestia na época do modelo liberal do direito, mas entendê-lo como a disposição da parte quanto a fazer valer em juízo o seu direito material, porquanto, nos atos processuais, inclusive nos de colheita das provas, o magistrado tem poderes para agir com oficiosidade, praticando atos investigatórios e decisórios, sem necessidade de sempre ser provocado”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Nulidade da sentença e o princípio da congruência. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 77).99 Afirma Rui Portanova: “Tratando-se de um resquício da ideologia liberal-individualista, o princípio dispositivo resiste. Resiste pela falsa sedução do discurso liberal. A resistência se faz através da hipertrofia e do sentido equívoco que se dá ao princípio. Mas também, como mostra Barbosa Moreira (1985, p. 147), através de certos setores (inclusive da mais autorizada doutrina), que vê com reserva, quando não com aberta desconfiança, a atuação espontânea do juiz na pesquisa da verdade. Costuma-se usar o argumento ad terrorem quanto ao temor da parcialidade judicial, “como se não existissem outros meios, bastante eficazes, de conjurar o risco””. (PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 124.)100 BARBIERI, Maurício Lindenmeyer. Implicações do princípio dispositivo nos poderes instrutórios do juiz. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de (Coord.). Prova cível. 2. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 116.

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estaria violando o princípio da imparcialidade, pois não se trata de direito

individual.

Ocorre que a ideia de atuação do magistrado atrelada à disponibilidade

do direito material não é correta, posto que aquele age sempre com o desiderato

de atingir os escopos do processo, não devendo observar qual o tipo de direito

tutelado.

É majoritária, hoje, no Brasil, a concepção de que é livre a investigação

probatória pelo magistrado. Diante da ideia de processo como instrumento capaz

de alcançar a tutela jurisdicional efetiva, atenuou-se a amplitude do princípio

dispositivo, restringindo-o à disponibilidade do direito pela parte, que poderá ou

não procurar o Poder Judiciário em busca da satisfação do seu direito, fixando os

limites da demanda.

Tolhido pelos limites do pedido, o juiz não se contém à atividade

probatória das partes. O Código de Processo Civil brasileiro adota, em seu art.

130, a possibilidade do juiz de ofício determinar a produção de provas

necessárias à instrução do processo. Outros artigos do referido Diploma Legal

conferem poderes instrutórios ao juiz.

Contudo, mesmo se outorgando amplos poderes instrutórios ao juiz,

não se extinguiu o encargo de produção de prova pelas partes, uma vez que

continua perfeitamente compatível a aplicação dos artigos 130 e 333 do CPC.

Portanto, é necessário o trabalho conjunto de cooperação entre o juiz e as partes

para melhor instrução do processo.

A atividade probatória proativa do juiz é uma tendência que objetiva

garantir a concretização dos escopos do processo, através da justiça da decisão e

da pacificação social.101

Pode-se conciliar o princípio dispositivo com os poderes instrutórios do

juiz. Destarte, compete aos litigantes formular suas pretensões, bem como

101 Conforme lenciona Sálvio de Figueiredo Teixeira, “adotado hoje o conceito de que a finalidade do processo não é a proteção pura e simples dos direitos subjetivos, mas sobretudo a atuação do direito objetivo, não mais se admitindo o juiz inerte, passivo, a ampliação desse poderes se torna pressuposto fundamental à realização das atividades judicantes, merecendo registro a lição de Sebastião de Souza de que a mesma, no tocante à direção do processo, não é característica do inquisitorialismo, nem do processo dispositivo, mas sim da natureza das funções do juiz”. (TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. O juiz em face do código de processo civil. Revista de processo. a. 3, n. 10, p. 225 . abr./jun. 1978.)

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comprová-las nos autos, e ao juiz conduzir o processo efetivando todos os seus

poderes, para, ao final, proferir uma decisão justa.

3.1.2 Inércia da jurisdição

Determina o art. 2º do Código de Processo Civil que nenhum juiz

prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer.

No mesmo sentido, o art. 262 dispõe que o processo civil começa por iniciativa

das partes.

Trata-se de princípio processual de estreita relação com a atividade do

juiz no processo e com o princípio dispositivo, o qual garante às partes o

monopólio da jurisdição, não tendo qualquer vínculo com a disponibilidade do

direito material pleiteado. Dessa forma, não se pode confundir o princípio

dispositivo com o da inércia da jurisdição, já que está ligado à atividade do juiz,

quanto à sua condução, enquanto este se refere à iniciativa de instauração do

processo.

Ao vedar a autotutela, o Estado tomou para si a obrigação de prestar a

tutela jurisdicional através de um representante seu, o qual tem o dever de ser

imparcial e independente.102 Contudo, a possibilidade de instauração do processo

de ofício poderia violar a imparcialidade do magistrado, já que haveria um vínculo

psicológico do juiz com a questão litigiosa.103 Dessa maneira, para se evitar

prejuízos à atividade jurisdicional, o ordenamento jurídico previu o princípio da

inércia da jurisdição como regra, por meio do qual o processo só se inicia por

requerimento da parte.104

Tal princípio não deve, no entanto, ser utilizado para prejudicar a

efetividade do processo. É notório o desejo de melhoria do sistema processual,

102 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 29. 103 Ibid., p. 29. 104 Nos casos da tutela de direitos indisponíveis, a Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Ministério Público a iniciativa de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, caput), bem como o monopólio da ação penal pública(inc.I) e a titularidade da ação civil pública (inc. III). (MATTOS, Sérgio Luís Wetzel. Da iniciativa probatória do juiz no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 15).

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com a busca incessante pela prestação da tutela jurisdicional célere e efetiva.

Destarte, deve-se conceber o princípio da inércia da jurisdição apenas como

garantidor de um juiz isento, não devendo servir de subsídio para uma postura

inerte do magistrado que deve agir participativamente no processo.105

Verifica-se que a própria legislação prevê exceções a esse princípio.

Pode-se citar a possibilidade de instauração de ofício do processo de inventário,

conforme previsão do art. 989 do CPC.106 Também poderá o juiz de ofício

conceder ordem de hábeas corpus, de acordo com o que prevê o §2º do art. 654

do CPP.

3.1.3 Princípio da demanda

Assim como o princípio da inércia da jurisdição, o princípio da demanda

tem seu fundamento jurídico nos arts. 2º e 262 do Código de Processo Civil. “A

inércia é analisada pelo lado passivo: é a jurisdição que aguarda passivamente a

iniciativa da parte pela demanda. Já a demanda é vista pelo lado ativo: é a parte

que movimenta a jurisdição que, por princípio, é inerte”.107

Para Ovídio Batista,108 o princípio da demanda constitui restrição

quanto à postura do juiz no tocante ao direito subjetivo das partes. Entretanto,

deve-se entender que esse princípio concede ao interessado a faculdade de

mobilizar ou não o Poder Judiciário em busca da solução do conflito.109 Trata-se

de decisão particular do cidadão de movimentar a jurisdição, todavia, iniciado o

curso do processo, seu andamento é de interesse oficial.

105 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 37.106 Art. 989 do CPC: “O juiz determinará, de ofício, que se inicie o inventário, se nenhuma das partes mencionadas nos artigos antecedentes o requerer no prazo legal”. 107 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 115.108 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 63.109 Para Gian Antonio Micheli, “é o princípio da demanda que representa a projeção processual da tutela dos direitos subjetivos, entendidos como o reconhecimento da autonomia privada dos particulares. Mas, quando o processo tenha sido iniciado com a demanda, a maneira de decidir, e assim os poderes do juiz para decidir o processo e para formar o próprio convencimento podem (e devem) estar desvinculados da iniciativa das partes. (MICHELI, Gina Antonio. Teoria Geral da Prova. Revista de processo. a.1, n.3, p. 166, jul.-set. 1976.

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É certo que essa faculdade de iniciativa da demanda é mais ampla

quando se fala em direitos disponíveis. Em relação aos direitos indisponíveis para

as partes, da mesma forma, o juiz deve se manter inerte quanto à sua iniciativa.

Entretanto, o Estado atribui ao Ministério Público a possibilidade de substituir-se

às partes nesses casos, para iniciativa processual.

3.2 Princípio da cooperação

Diante da nova concepção do princípio dispositivo, atrelado à

disponibilidade do direito material e não à limitação dos poderes do juiz, deve-se

ter em mente que este e as partes devem trabalhar juntos para recompor a

realidade fática ensejadora do litígio, para que, a partir da compreensão da

verdade, o magistrado possa prestar a tutela jurisdicional da melhor maneira

possível, realizando a justiça da decisão e a pacificação social.

A função precípua do juiz é julgar e, sempre que possível, com justiça.

Para isso, faz-se mister que, ao longo do processo, tenham colhido elementos

para formação do convencimento judicial.

Nesse contexto, é imprescindível sobrelevar a relevância da

cooperação das partes e do juiz no processo, uma vez que os litigantes estão

diretamente ligados aos fatos, possuindo maior contato com as provas e, por isso,

dispondo de melhores condições de trazê-las aos autos. Por sua vez, o

magistrado deve buscar garantir a justiça da sua decisão, o que só será possível

através da plena cognição dos fatos.110

110 Segundo Cândido Rangel Dinamarco, “para cumprir a exigência constitucional do contraditório, todo modelo procedimental descrito em lei contém e todos os procedimentos que concretamente se instauram devem conter momentos para que cada uma das partes peça, alegue e prove. O autor alega e pede na demanda inicial; instituído o processo mediante o ajuizamento desta, o réu é admitido a pedir logo de início, podendo alegar fundamentos de defesa e postular a improcedência da demanda ou a extinção do processo; o autor pode pedir a antecipação da tutela, o que obterá se concorrerem os requisitos postos em lei (CPC, art, 273); ambas as partes são admitidas a produzir provas dos fatos alegados”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 215.

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Desse modo, pelo princípio da cooperação111, devem o juiz e as partes

dialogar, procurando esclarecer dúvidas, fornecendo orientações, prevenindo

irregularidades, tudo com o desiderato de alcançar a verdade real e, assim,

implementar os escopos do processo.

O princípio, ora em debate, origina-se no direito alemão,112 em que “tem

o juiz o dever de esclarecer os fatos do litígio (Aufklarungspflicht ou

Hinweispflicht) e de incitar as partes a trazerem para os autos os complementos

de informação ou as provas necessárias à solução do litígio”.113 Contudo, não se 111 GOUVEIA, Lúcio Grassi. Congnição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007. e DIDIER JÚNIOR, Fredie. O princípio da cooperação: uma apresentação. Revista de Processo, São Paulo, n. 127, p. 75-79, 2005. Ver também MARINHO, Érika de Sá. O princípio da colaboração intersubjetiva no processo civil brasileiro: uma análise acerca da sua influência no poder geral de cautela do juiz. Recife: Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), 2007. (Dissertação de Mestrado).112 § 139 da ZPO Alemã, alterado pela Lei de 27.07.2001: “Materielle Prozessleitung (1)Das Gericht hat das Sach- und Streitverhaltnis, soweit erforderlich, mit den Parteien nach der tatsachlichen und rechtlichen Seite zu erortern und Fragen zu stellen. Es hat dahin zu Wirken, dass die Parteien sich rechtzeitig und vollstandig uber alle erheblichen Tatsachen erklaren, insbesondere ungenungende Angaben zu den geltend gemachten Tatsachen erganzen, die Beweismittel bezeichnen und die sachienlichen Antrage stellen. (2) Auf einen Gesichtspunkt, den eine Partei erkennbar ubersehen oder fur unerheblich gehalten hat, darf das Gericht, soweit nicht nur eine Nebenforderung betroffen ist, seine Entscheidung nur stutzen, wenn es darauf hingewiesen und Gelegeheit zur Auβerung dazu gegeben hat. Dasselbe gilt fur einen Gesichtspunktm den das Gericht anders beuteilt als beide Parteien. (3) Das Gericht hat auf die Bedenken aufmerksam zu machen, die hinsichtlich der von Amts wegen zu berucksichtigenden Punkte bestehen. (4) Hinweise nach dieser Vorschirft sind so fruh wie moglich zu erteilen und aktenkunding zu machen. Ihre Erteilung kann nur durch den Inhalt der Akten bewiesen warden. Gegen den Inhalt der Akten ist nur der Nachweis der Falschung zulassing. (5) Ist iner Partei eine sofortige Erkalarung zu einem gerichtlichen Hinweis nicht moglich, so soll auf ihren Antrag das Gericht eine Frist bestmmen, in der sie die Erklarung in einem Schriftsatz nachbringen kann.” Em vernáculo, de acordo com a tradução de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, Titular de Processo Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Sul: “§139 – Condução material do processo. (1) O órgão judicial deve discutir com as partes, na medida do necessário, os fatos relevantes e as questões em litígio tanto do ponto de vista jurídico quanto fático, formulando indagações, com a finalidade de que as partes esclareçam de modo completo e em tempo suas posições concernentes ao material fático, especialmente para suplementar referências insuficientes sobre fatos relevantes, indicar meios de prova, e formular pedidos baseados nos fatos afirmados. (2) O órgão judicial só poderá apoiar sua decisão numa visão fática ou jurídica, que não tenha a parte, aparentemente, se dado conta ou considerado irrelevante, se tiver chamado a sua atenção para o ponto e lhe dado oportunidade de discuti-lo, salvo se se tratar de questão secundária. O mesmo vale para o entendimento do órgão judicial sobre uma questão de fato ou de direito, que divirja da compreensão de ambas as partes. (3) O órgão judicial deve chamar a atenção sobre as dúvidas que existam a respeito das questões a serem consideradas de ofício. (4) As indicações conforme essas prescrições devem ser comunicadas e registradas nos autos tão logo seja possível. Tais comunicações só podem ser provadas pelos registros nos autos. Só é admitido contra o conteúdo dos autos prova de falsidade. (5) Se não for possível a uma das partes responder prontamente a uma determinação judicial de esclarecimento, o órgão judicial poderá conceder um prazo para posterior esclarecimento por escrito.” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. O princípio da cooperação: uma apresentação. Revista de Processo. São Paulo, n.127, p.75-76, 2005).113 GOUVEIA, Lúcio Grassi. Congnição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007, p. 185.

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limita àquele país, apresentando-se também no direito francês114 e português115,

com penetração no direito brasileiro.

No ordenamento jurídico brasileiro, o processo civil começa por

iniciativa das partes, mas se desenvolve por impulso oficial. De acordo com o art.

130, do Código de Processo Civil, o juiz pode ordenar qualquer diligência

necessária à instrução do processo.

É das partes a iniciativa quanto ao exercício da jurisdição, conforme

determinação prevista nos arts. 2º e 262 do CPC. Contudo, a partir do momento

em que é iniciada a ação, é dever do juiz dirigir o processo, impulsionando-o até

sua conclusão.

Como interessados diretos dos fatos, os litigantes dispõem de

melhores condições de comprovar suas alegações e reconstruir os fatos para

formar o convencimento do magistrado. No entanto, a legislação brasileira não

conferiu exclusividade às partes quanto à iniciativa para a produção da prova.

O Código de Processo Civil, no artigo 130, estabelece que “caberá o

juiz de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à

instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente

protelatórias”.116

114 “Art. 16 do novo Código de Processo Civil francês determina que: “Le juge doit, em toutes circonstances, faire observer et observer lui-même le príncipe de la contradiction. Il ne peut retenir dans sa décision, lês moyens, lês explications et lês documents invoques ou produits par lês parties que si celles-ci ont été à même d’em débattre contradictoirement. Il ne peut fonder sa décision sur Le moyens de droit qu’il a releves d’office sans avoir au préalable invite lês parties à présenter leurs observartions”. Em vernáculo, segundo a tradução de EDUARDO FERREIRA JORDÃO, “O juiz deve, em todas as circunstâncias, fazer observar e observar ele mesmo o princípio do contraditório. Ele não pode considerar, na sua decisão, as questões, as explicações e os documentos invocados ou produzidos pelas partes a menos que estes tenham sido objeto de contraditório. Ele não pode fundamentar sua decisão em questões de direito que suscitou de ofício, sem que tenha, previamente, intimado as partes a apresentar suas observações”.” (DIDIER JÚNIOR, Fredie. O princípio da cooperação: uma apresentação. Revista de Processo. São Paulo: RT, 2005, n.127, p.76)115 “Art. 266 do Código de Processo Civil português: “1. Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio”. Ibid., p. 76.116 Conforme o prof. Lúcio Grassi de Gouveia, “não pode assim o magistrado, diante da prova colhida nos autos e ainda quando os fatos não lhe parecerem devidamente esclarecidos, adotar o cômodo entendimento de que se trata de um poder discricionário a ser ou não exercido por ele. Trata-se de poder-dever de esclarecer os fatos, se necessário determinando a produção de provas de ofício. Ultrapassada esta etapa, só então poderá aplicar o ônus da prova, que, geralmente, em relação aos fatos constitutivos caberá ao autor e aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, ao réu”. (GOUVEIA, Lúcio Grassi. Cognição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007).

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Ao admitir que o juiz e as partes produzam provas sobre os fatos

controvertidos do processo, o legislador estabeleceu equivalência entre estes

quanto à iniciativa probatória.117

Quando distribuiu o ônus da prova entre autor e réu (art. 333 do CPC),

o ordenamento jurídico fixou regras de conduta em relação às partes, que

deverão segui-las, a fim de reduzir o risco de um julgamento desfavorável, e

regras de julgamento para o magistrado, que deverão ser consideradas apenas

por ocasião da sentença e em última hipótese.

De sorte que, não estando convencido sobre os fatos em litígio, o juiz

deve determinar a produção de outras provas de ofício e tão somente, após

deduzidos todos os esforços, poderá se valer das regras de distribuição do ônus

da prova para julgar o feito.118 O julgamento com base nessas regras não se

baseia na realidade fática, sendo temerário, já que pode acarretar julgamentos

injustos, por isso deve ser evitado ao máximo.

Da mesma forma, o art. 339 do Código de Processo Civil determina

que “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o

descobrimento da verdade”.

Não existe incompatibilidade entre a atividade das partes e do juiz na

produção de provas. Ao inverso, a concepção moderna de processo busca

compatibilizar de forma dialética e conjunta a participação dos litigantes e do

magistrado em busca da verdade.119 Os litigantes devem provar suas alegações

117 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 101.118 Para José Roberto dos Santos Bedaque, “as regras referentes à distribuição do ônus da prova devem ser levadas em conta pelo juiz apenas e tão-somente no momento de decidir. São regras de julgamento, ou seja, destinam-se a fornecer ao julgador meios de proferir a decisão, quando os fatos não restaram suficientemente provados. Antes disso, não tem ele de se preocupar com as normas de distribuição do ônus da prova, podendo e devendo esgotar os meios possíveis, a fim de proferir julgamento que retrate a realidade fática e represente a atuação da norma a situação apresentada em juízo. Os princípios estabelecidos no art. 333 só devem ser aplicados depois que tudo for feito no sentido de se obter a prova dos fatos. E quando isso ocorre, não importa sua origem, isto é, quem a trouxe para os autos.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 86/87). 119 “O ativismo judicial exibe-se perfeitamente conciliável com o ativismo das partes, conscientes e cooperadoras”. (OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 138). Para Lúcio Grassi de Gouveia, “tem sido uma preocupação constante dos processualistas modernos, além da entrega da prestação jurisdicional de forma rápida e eficiente, que os procedimentos tenham um caráter eminentemente dialético, com ampla participação das partes, que devem cooperar com o juiz na busca da verdade real, devendo ter este uma participação ativa no processo”. (GOUVEIA, Lúcio Grassi. Congnição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007).

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para obterem a tutela jurisdicional pleiteada, por sua vez o juiz deve investigar a

verdade, com o intuito de proferir uma decisão judicial justa e alcançar a

finalidade social do processo.

Destaca-se o princípio da cooperação entre o juiz e as partes como

necessidade da vida moderna, como mecanismo apto a alcançar a finalidade

social e pública do processo, a qual deve ser materializada pelo diálogo, que

“amplia o quadro de análise, constrange a comparação, atenua o perigo de

opiniões preconcebidas e favorece a formação de um juízo mais aberto e

ponderado”.120

É importante frisar que esse trabalho conjunto é de extrema relevância

para a justa composição do litígio, uma vez que as partes e seus advogados têm

melhores meios de reconstruir a versão prática dos fatos, pelo que se deve

incentivar sua participação, enquanto o juiz deve se servir das informações

apresentadas pelos contendores e atuar para alcançar a correta definição da

causa, sempre garantindo a paridade de armas entre as partes.121

O processo civil moderno exige um processo jurisdicional de estrutura

cooperativa, que, a partir da colaboração entre os litigantes e o magistrado,

garante a imparcialidade da jurisdição. Além de ampliar as chances de um

provimento judicial favorável para aquele que tem razão, a participação do juiz e

das partes no processo significa também cooperação no exercício da jurisdição.122

3.3 Princípio da imparcialidade

120 OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 139.121 Ibid., p. 152.122 GRINOVER, Ada Pellegrini. Novas tendências do direito processual civil ( de acordo com a Constituição de 1988). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 2-3.

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O princípio da imparcialidade constitui uma característica indispensável

para o exercício da jurisdição,123 tanto que se considera redundância falar-se em

juiz imparcial.124

Sua exigência foi determinada em diversos tratados internacionais, tais

como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 10), Declaração

Americana dos Direitos do Homem (art. 26,2), Convenção Americana de Direito

Humanos (art. 8.1), Pacto Internacional de Direitos Civil e Políticos (art. 14,I),

Convênio Europeu para Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades

Fundamentais (art. 6, 1), etc,125 os quais foram incorporados ao nosso

ordenamento jurídico por meio da disposição contida no art. 5º, §2º, da

Constituição Federal de 1988, que determina: “os direitos e garantias expressos

nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por

ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do

Brasil seja parte”.

De sorte que o Brasil incorporou, por meio do Pacto Internacional de

Direito Civis e Políticos, de 19.12.1966, o direito fundamental à imparcialidade do

juiz, de acordo com o que prescreve o art. 5º, §2º, da CF.126

123 Nesse sentido Cintra, Grinover e Dinamarco afirmam que “o caráter de imparcialidade é inseparável do órgão da jurisdição. O juiz coloca-se entre as partes e acima delas: esta é a primeira condição para que se possa exercer sua função dentro do processo. A imparcialidade do juiz é pressuposto para que a relação processual se instaure validamente”. (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p.58). Ver também ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Poder Judiciário: crise, acertos e desacertos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 91.124 O Código de Ética da Magistratura Nacional determina em seu art. 8º que “o magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito. 125 SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 28.126 Ibid., p. 57.

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A imparcialidade constitui uma garantia fundamental127 do cidadão e um

dever do juiz perante seus jurisdicionados128, mas, além disso, é também uma

garantia do magistrado, quando ameaçado em sua independência funcional.129

A imparcialidade “pressupõe uma conduta que se deixa conduzir

somente por critérios lógico-racionais, fechando-se para interesses estranhos ao

circunstancialismo factual envolvente”.130 De acordo com esse princípio, o juiz

deve conduzir o processo sem preferências entre os jurisdicionados, sempre

ofertando oportunidades iguais aos mesmos, e agir ativamente para alcançar a

verdade real, proferindo uma decisão justa e atingindo os escopos do processo.

É importante salientar que da imparcialidade decorre a legitimidade do

magistrado131, pois só com uma postura imparcial do juiz é que as partes sentirão

segurança em recorrer ao Judiciário na busca da decisão do litígio.132 Logo, a

ausência de imparcialidade e retidão dos juízes pode pôr em risco a própria

existência do Estado Democrático de Direito.

127 “Quando o Estado tirou do cidadão o direito à justiça privada e ao desforço pessoal, deu-lhe um terceiro imparcial e independente para resolver seu conflito: o juiz. Assim, é direito fundamental do cidadão um juiz imparcial e independente”. (PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 67). Acrescenta Artur César de Souza que “a imparcialidade, no âmbito processual, apresenta a natureza de regra jurídica. (...), porque diante das hipóteses de impedimento ou suspeição do juiz, a abstenção ou recusa do magistrado é de rigor, de maneira do tudo-ou-nada. Não há exceção, ou a regra é valida ou não é”. (SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 55).128 “A imparcialidade do juiz é um direito fundamental do acusado ou da parte e ao mesmo tempo se configura como um princípio regulador da função jurisdicional. A imparcialidade apresenta essa dupla característica: direito fundamental e princípio geral constitucional informativo do Poder Judiciário. (...). Como princípio geral de direito processual penal ou civil, o princípio da imparcialidade impõe ao Poder Judiciário cânones informadores de toda sua atividade; por sua vez, como princípio constitucional impõe-se como especial força normativa e vinculante no ordenamento jurídico brasileiro”. (Ibid., p. 58-59).129 NOBREGA, Vanessa Andrade Dantas L. da. O papel do juiz na condução da instrução do processo: um novo paradigma. Revista Dialética de direito processual n. 64. São Paulo: Dialética, 2008, p. 127. Ainda, segundo José Afonso da Silva, “onde qualquer das garantias da magistratura faltar, pode-se afirmar que o princípio da igualdade da Justiça estará sacrificado, pois o juiz, sem independência, é juiz amedrontado, e juiz amedrontado é juiz potencialmente parcial e sujeito à influência de poderosos, pois a independência do juiz é necessária para assegurar sua imparcialidade.” (SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 214).130 SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 29. 131 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 38.132 “É por saber que o juiz é um estranho em relação à matéria em debate, que o jurisdicionado tem a crença de quem nem ele nem a parte contrária serão favorecidos, de forma que o processo apenas trará para o conflito a solução condizente com o Direito, não por predileção ou favorecimento, mas por força de uma operação lógica de exame dos elementos do caso que permita a emissão de um julgamento racional baseado nas circunstâncias concretas da hipótese e no direito material vigente”. (Ibid., p. 38).

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Destarte, apenas ao se considerar seguro da imparcialidade dos

membros do Poder Judiciário, os litigantes confiarão na tutela jurisdicional

prestada pelo Estado, garantindo-lhe a legitimidade.

3.3.1 O princípio da imparcialidade e a atividade probatória proativa do juiz

Muito se questiona acerca da compatibilidade entre o princípio da

imparcialidade e a atividade probatória proativa do juiz. Para a doutrina

conservadora, o juiz ativo, para o qual se conferem amplos poderes instrutórios

desrespeita o princípio da imparcialidade, pois invade o campo de atuação das

partes, exercitando suas funções em proveito de alguma delas.

Todavia, essa ideia de juiz imparcial, como juiz inerte, espectador, era

característica do Estado Liberal, em que o processo apresentava-se como “coisa

das partes”. O juiz, então, não poderia ter poderes instrutórios, uma vez que, ao

requerer a produção de provas, estaria beneficiando uma delas.

No entanto, em geral, “quando o juiz determina a realização de alguma

prova, não tem condições de saber, de antemão, seu resultado”.133 Nesse caso, o

magistrado não tem conhecimento prévio do resultado, nem sabe se a prova

beneficiará o autor ou o réu; atua, exclusivamente, para formar seu

convencimento sobre os fatos.134

Diante da atual concepção publicística do processo, não mais se pode

entender o princípio da imparcialidade como entrave à atividade probatória

proativa do juiz, uma vez que deve o juiz agir para buscar elementos de convicção

sobre a verdade dos fatos.135

Não fere o princípio da imparcialidade o juiz que exerce em sua

plenitude os poderes instrutórios de ofício que lhe são conferidos pela legislação 133 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 80.134 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 97.135 Sobre o tema, afirma Amendoreira Jr que “existe um dever de participação das partes e do próprio juiz na busca da efetividade da tutela, de modo que qualquer ato que determine a produção de determinada prova ou que permita ao juiz combater a dessídia processual, muito ao contrário de tornar o juiz parcial, estaria colocando-o na vanguarda do sistema, na busca da verdade real e da maior efetividade da tutela”. (AMENDOREIRA JÚNIOR, Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006).

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processual civil, posto que agirá para atingir a verdade real do processo e garantir

o resultado justo da demanda.

Nesse caso, deve-se entender que, ao determinar a produção de

provas de ofício, o juiz perde a sua neutralidade que, no caso, corresponde aos

valores do juiz dentro do processo.136 Com essa atitude, não violará o princípio

sob comento, até porque não sabe a quem beneficiará a prova; “ao contrário,

supõe-se, na fase atual, que parcial é o juiz que, sabendo que uma prova é

fundamental para a elucidação da matéria fática, queda-se inerte”,137 devendo

atuar sempre para cumprir seu dever de prestar uma tutela jurisdicional efetiva. 138

Ciente de que determinada prova reconstruirá a realidade fática objeto

do litígio, o magistrado tem o dever de determinar a sua realização, sob pena de

tornar-se parcial, já que a não realização da mesma, favorecerá a parte que não

tem razão.139

A atividade probatória proativa do juiz objetiva, ainda, garantir a

isonomia entre os contendores no processo, evitando um concreto desequilíbrio

entre eles na relação jurídica processual.140 Para que se tenha um julgamento

justo, é necessário que o juiz se mantenha equidistante das partes, garantindo a

igualdade de tratamento entre elas, conforme exige o art. 125, inc. I, do CPC.

136 “Así cuando se afirma que el órgano jurisdiccional al practicar actividad probatória pierde la imparcialidad, lo que em realidad se quiere decir es que deja de ser neutral, perdiendo su condición de árbitro.” (CABIALE, José Antônio Díaz. Princípios de aportación de parte y acusatório: La imparcialidad del juez. Granada: Comare, 1996, p.416).137 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 67.138 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 80/81. Acrescenta o autor: “Para que o juiz mantenha a imparcialidade, diante de uma prova por ele determinada, é suficiente que permita às partes sobre ela se manifestar. O perfeito funcionamento do princípio do contraditório é a maior arma contra o arbítrio do julgador. Assim, a concessão de poderes instrutórios ao juiz encontra seu limite natural no contraditório, que impede a transformação da arbitragem em arbitrariedade, da discricionariedade em despotismo.” (p. 83)139 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 121.140 SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 104-105. Nesse contexto, para Tereza Arruda Alvim, o juiz “seria parcial se assistisse inerte, como um espectador a um duelo, ao massacre de uma das partes, ou seja, se deixasse de interferir para tornar iguais partes que são desiguais. A interferência do juiz na fase probatória, vista sob este ângulo, não o torna parcial. Ao contrário, pois tem a função de impedir que uma das partes venha a vencer o processo, não porque tenha o direito, que assevera ter, mas porque é economicamente mais favorecida que a outra”. (ALVIM, Tereza Arruda. Reflexões sobre o ônus da prova. In CRUZ E TUCCI, José Régio (Coord.). Processo civil: estudos em comemoração aos 20 anos de vigência do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 248).

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Dessa forma, é imparcial o juiz que atua para garantir a igualdade real entre as

partes, desigualando-as na medida da suas desigualdades.

A conduta positiva do juiz não fere o direito fundamental à

imparcialidade, posto que, na colisão de princípios, deve-se levar em

consideração a proporcionalidade e a razoabilidade para sua aplicação.141

Destarte, um juiz proativo não significa um juiz parcial, mas, apenas, que ele

exerce sua atividade com a finalidade de alcançar os escopos do processo.

Outrossim, ao se utilizar de seus poderes instrutórios, o magistrado não

contraria o princípio da imparcialidade, à medida que também está adstrito à

observância dos princípios constitucionais do contraditório e da motivação das

decisões judiciais, os quais, se não seguidos, tornam nula a decisão judicial

proferida.

3.3.2 Imparcialidade e neutralidade

Importante, para a melhor compreensão do tema, é fazer a distinção

entre imparcialidade e neutralidade.142 É imparcial o juiz que não apresenta

interesse seja próprio ou de terceiro no julgamento final do processo.143

Por meio da imparcialidade, exige-se do juiz que ele não seja parte e

juiz no processo, ou seja, que não julgue em seu próprio interesse, evitando 141 “O princípio constitucional da imparcialidade permite uma dupla perspectiva, ou seja, se por um lado o princípio da imparcialidade exige a atuação de um juiz sem qualquer vinculação ou interesse pessoal em favor de umas das partes, ou que possa realizar qualquer discriminação entre elas, por outro lado, reconhece a necessidade de o órgão jurisdicional levar em consideração as diferenças sociais, culturais e econômicas daqueles que se encontram envolvidos na relação jurídica processual, desde que essas diferenças possam de alguma maneira afetar o contraditório e ampla defesa, bem como o próprio interesse da sociedade no resguardo da observância das normas legais, a fim de que não se ponha em risco a própria estabilidade do Estado de Direito Democrátivo”. (SOUZA, Artur César de. A parcialidade positiva do juiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 64-65).142 Conforme manifesta Luciana Amicucci Campanelli, “não se deve confundir o juiz imparcial com o juiz neutro, inerte ou pacífico. Entende-se por juiz imparcial não aquele juiz inerte que assiste pacificamente ao duelo entre as partes, limitando-se a proferir a decisão, mas, ao contrário, o julgador preocupado com o resultado concreto da sentença na vida dos litigantes e, portanto, comprometido com a entrega da prestação jurisdicional justa, fundamentada essencialmente na verdade.” (CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 95).143 JORGE, Mário Helton. A garantia da imparcialidade do órgão jurisdicional e as hipóteses de aparente parcialidade. Jus Navigandi, Teresina, a. 10, n. 1173, 17 set. 2006. Disponível em:HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8934. Acesso em 13 ago. 2008, p. 2.

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beneficiamento próprio ou violação aos princípios do contraditório e da

igualdade.144

De toda forma, requerer que um juiz seja imparcial não significa que ele

tenha que ser neutro. É imprescindível, na atualidade, que o magistrado esteja em

contanto com a realidade social de seu tempo, com a busca de um processo

justo, célere e efetivo.145

Não se pode afastar o juiz do mundo exterior, exigir-lhe que não seja

cidadão, que não tenha ideias, pensamentos e opiniões pessoais sobre os fatos

do cotidiano, para que, então, possa proferir sua decisão.146 Essa blindagem é

irreal e utópica. Tal neutralidade ideológica do juiz não existe, “salvo na forma de

apatia, irracionalismo ou decadência do pensamento, que não são virtudes dignas

de ninguém e menos ainda de um juiz (...)”.147

A própria atividade do juiz de interpretar a lei exige-lhe algum tipo de

posicionamento, afastando-o da neutralidade absoluta, uma vez que estará

optando por uma ou outra concepção, de acordo com os valores de sua

consciência.

Em sua atividade processual, é impossível ao juiz não se valer de sua

experiência para proferir uma decisão. Contudo, ao agir dessa forma, não estará

violando os princípios da imparcialidade ou da legalidade, posto que, só a partir

da observação da realidade extrajudicial, o magistrado amealha conhecimento

que será utilizado quando decidir o processo.148 Desse modo, a neutralidade do

144 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 43.145 Nesse sentido, expressa-se Ada Pellegrini Grinover: “Tem-se salientado que o acesso à ordem jurídica justa pressupõe um corpo adequado de juízes, com sensibilidade para captar a realidade social e suas vertiginosas transformações. E que isso postula exigência da mudança da mentalidade do juiz, inserido que há de ser no corpo social e comprometido com o objetivo de realização da justiça material. A aderência do juiz á realidade demanda, por sua vez, um constante aprimoramento, inclusive por intermédio de estudos interdisciplinares permanentes e, antes ainda, exige critérios de seleção e métodos de recrutamento que transcendam a avaliação de conhecimento puramente técnicos”. (GRINOVER, Ada Pellegrini. Processo em evolução. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996, p. 25).146 Para Humberto Theodoro Júnior, “o juiz atual não pode ser um estranho ao meio em que vive e aos calores éticos nele dominantes. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direito e processo: Direito processual civil ao vivo. v.5. Rio de janeiro: Aide, 1997, p. 114).147 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Poder Judiciário: crise, acertos e desacertos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 92. 148 Inclusive o Código de Processo Civil determina, em seu art. 335, que: “Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a esta, o exame pericial”. Nesse sentido, afirma Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira que “o juiz, como homem culto, no decidir e aplicar o direito, necessariamente usa

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juiz é relativa, pois, através dos valores adquiridos da sua formação social,

política e cultural cotidianas, o juiz realiza seus atos no processo e, ao final,

profere sua decisão.149

Vale ressaltar que, apesar de se aceitar e mesmo se exigir uma

postura ativa do magistrado no tocante à busca da realização dos escopos do

processo, não é de se admitir uma atuação político-partidária do mesmo. Embora

se deseje que o juiz trabalhe observando a conjuntura social, não é possível

aceitar qualquer tipo de engajamento político, seja a um partido, seja a uma

ideologia própria, uma vez que, assim, estará promovendo seus interesses e

ferindo a imparcialidade, princípio indispensável ao exercício da jurisdição.150

3.4 O princípio da igualdade: dever do magistrado

O princípio da igualdade é um dos mais relevantes do Estado

Democrático de Direito e norteia a atividade do juiz no processo151. Está previsto

no caput do art. 5º da Constituição Federal de 1988, que o consagra, ao

de uma porção de noções extrajudiciais, fruto de sua cultura, colhida de seus conhecimentos sociais, científicos e artísticos ou práticos, dos mais aperfeiçoados aos mais rudimentares”. (DIDIER JR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 54).149 “Na medida em que se interessar pelo drama de seu tempo, o juiz poderá perceber a verdadeira dimensão e a inserção histórica de seu trabalho, situando e compreendendo a ordem jurídica no contexto humano global. Na medida em que acresça ao seu saber técnico uma visão de mundo tão dilatada quanto possível, o juiz enriquecer-se-á interiormente, podendo melhor avaliar os dados reais, humanos, que constituem a razão de ser, tantas vezes esquecida, de todo processo. (...). Nessa perspectiva o trabalho do jurista e do juiz precisa ser criativo. (...). Se tiver se preparado para ser criativo, não precisará esperar passivamente a modificação das leis para exercer na sua plenitude suas funções, até porque, como é fartamente sabido e vivenciado pelo povo e pelos juristas brasileiros, não se pode identificar a multiplicação das leis ao progresso do direito”. (AZEVEDO, Plauto Faraco. Critica à dogmática e hermenêutica jurídica. 4. reimpr. Porto Alegre: Fabris, 1989, p. 70-74). 150 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 45.151 “A igualdade, elevada à condição de Direito fundamental positivo, é princípio geral e jurídico do Direito Constitucional Processual e garantia dos direitos subjetivos expressos ou outorgados na Constituição e se reveste da condição de remédio jurisdicional eficaz para a salvaguarda dos direitos fundamentais.” (MARTINS, Nelson Juliano Schaefer. Poderes do juiz no processo civil. São Paulo: Dialética, 2004, p. 158).

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determinar que todos são iguais perante a lei, pelo que, através dele, reconhece-

se a igualdade no seu sentido jurídico-formal. 152

Além da sua previsão constitucional, o princípio da igualdade também

se encontra prescrito em diversos textos infraconstitucionais. Na esfera

processual, o Código de Processo Civil estabelece, em seu art. 125, inciso I, que

o juiz deve assegurar às partes igualdade de tratamento.153

Ocorre que a observância desse princípio não deve se limitar à

garantia da igualdade formal154 entre as partes, mas na busca da igualdade

material, em que se consideram as diversidades das classes.

Através da garantia do contraditório, mediante a concessão de

oportunidades iguais às partes, à medida de sua igualdade, resguarda-se o

princípio em questão. Deve-se implementar efetivamente o princípio da igualdade,

o que, no Estado Democrático de Direito, exige a participação ativa do

magistrado.155

É importante destacar a figura do juiz ativo, participativo, garantidor da

paridade de armas. Só assim se terá plenamente o respeito à igualdade real das

partes.156

152 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 206.153 Como ensina José Carlos Barbosa Moreira, “la credibilidad del proceso como instrumento de solución de conflitos de intereses depende esencialmente de su capacidad para ofrecer a los respectivos titulares uma perspectiva de ecunanimidad. Es indispensable, ante todo, que ambos litigantes puedan nutrir alguma esperanza de vencer; y, más aún, que puedan confiar em la ventaja práctica de la victoria. La igualdad de lãs partes se traduce aqui, em primer término, por igualdad de riesgos”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. La igualdad de las partes em el proceso civil. Revista de Processo, a. 11, n. 44, p. 177, out.-dez. 1986).154 Por igualdade formal, deve-se entender o direito “de as pessoas serem tratadas igualmente e não desigualadas senão naqueles casos determinados pela lei ou não vedados por ela. A igualdade substancial configura a incidência da isonomia entre todos os homens, com a observância das circunstâncias ensejadoras de tratamento diferenciado, pois a instituição de discrímen tem que guardar consonância lógica e fática com o motivo que a ocasionou. Assim, permite ao elaborador, ao intérprete e ao aplicador da norma a criação de diferenciações não arbitrárias”. (CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 44).155 Seguindo esse entendimento, Nelson Nery Júnior afirma que “quanto à paridade das partes no processo, deve-se buscá-la no seu sentido efetivo, de fato, escopo maior do direito processual civil, e não somente a igualdade jurídica, formal. (NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 44). Acrescenta Luiz Guilherme Marinoni que: “Um processo verdadeiramente democrático, fundado na isonomia substancial, exige uma postura ativa do magistrado. O processo, como é óbvio, exige que os fatos sejam verificados de forma adequada, ou melhor, para a jurisdição dos nossos dias não é concebível que os fatos não sejam devidamente verificados em razão da menor sorte econômica ou da menor astúcia de um dos litigantes”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 66).

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Observa-se, na atualidade, situações em que as diferenças entre as

partes são gritantes, sendo indispensável a presença ativa do magistrado para

resguarda o princípio da igualdade e garantir os escopos do processo. É dever do

magistrado atuar para efetivar a igualdade de participação das partes no

processo, evitando falhas na atividade de qualquer delas.157

Pretende-se, com a observância a esse princípio, garantir a igualdade

substancial entre os litigantes, evitando-se a supremacia do poder econômico ou

intelectual de uma parte em relação à outra.158 Como assevera José Roberto dos

Santos Bedaque, o processo não é um jogo, em que o mais capaz sai vencedor,

mas um instrumento de justiça, com o qual se pretender encontrar o verdadeiro

titular de um direito. 159

Ao cumprir esse princípio, não se deve observar exclusivamente a

igualdade formal entre as partes, mas buscar “o tratamento desigual das

situações de vida desiguais, na medida de sua desigualação.” 160 Reconhecida a 156 Salienta José Roberto dos Santos Bedaque que “a real igualdade das partes no processo é um valor a ser observado sempre, ainda que possa conflitar com outro princípio processual.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p.73/74). Nesse sentido, afirma Luciana Amicucci Campanelli que “uma das formas para incidência da igualdade processual é a produção probatória do juiz, prevista como regra geral no art. 130 do Código de Processo Civil”. (CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 1). Para Vallisney de Souza Oliveira, a “preservação da igualdade possibilita atuação jurisdicional sem privilégios a uma das partes, pois todos possuem os mesmos direitos, as mesmas obrigações e os mesmos deveres, salvo exceções legais aceitas pelo bom senso e pelo interesse público. (...) Diante da situação concreta é encargo do juiz dispensar tratamento equânime às partes e agir de forma a que a desigualdade inerente às pessoas não seja elemento de flagrantes injustiças estampadas no processo”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. O juiz na aplicação do justo processo. Revista do Tribunal Regional Federal 1. Região, v. 1, 2008).157 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 415. Para Luciana Amicucci Campanelli, “a igualdade entre os litigantes não se efetiva por si só, e para sair do campo meramente formal e atingir o plano real, necessita da participação ativa do magistrado, considerando que a isonomia somente é obtida ao retificar a desigualdade por intermédio de ações, sendo uma delas a produção probatória de ofício”. (CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 53).158 Seguindo esse entendimento Joan Picó I Junoy afirma que “concretamente, a respeito da aportação de fatos ao processo, o direito a igualdade de armas tem por objeto evitar uma situação de privilégio ou supremacia de uma das partes, garantindo assim a igualdade efetiva das possibilidades e cargas do autor e do demandado na alegação e prova dos fatos controvertidos para lograr a plenitude do resultado probatório”. (JUNOY, Joan Picó I. Las garantias contitucionales del proceso. Barcelona: Bosch, 2002, p. 132). 159 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 74.160 TAVARES, André Ramos. Direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 399. “Aristóteles preconizou que as categorias justiça e igualdade estão sintonizadas e que para que haja justiça “a igualdade não admite nenhuma diferença entre os que são iguais”. Por conseqüência, ao mesmo tempo em que sugere que os iguais sejam tratados do mesmo modo, admite que seja dado tratamento desigual aos desiguais, especialmente no que se refere à

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desigualdade, deve o Estado agir para garantir o tratamento desigual e, assim,

assegurar o respeito ao princípio em comento.

Para se resguardar a isonomia dos litigantes no processo, deve-se

oferecer às partes iguais oportunidades de vencer a demanda, conferindo-se

equivalentes possibilidades de produção de atos capazes de comprovar suas

alegações e formar o convencimento judicial.161

Nesse contexto, dá-se a atuação proativa do juiz, para, através de seus

poderes, determinar medidas que eliminem ou reduzam as diferenças entre os

litigantes, sejam de natureza material, social, cultural, religioso ou políticas. Um

dos modos de evitar a desigualdade no processo é, justamente, a atividade

probatória proativa do juiz, que, ao exercitar os seus poderes instrutórios de

ofício, determina a realização de certa prova, não em benefício ou prejuízo de

uma das partes, mas com a finalidade de alcançar a verdade e, por meio dela,

distribuir a justiça com quem tem razão.

De sorte que se pode dizer que os poderes instrutórios do juiz

apresentam duas funções, quais sejam: garantir o princípio da igualdade,

possibilitando a eliminação das desigualdades entre as partes, bem como buscar

a verdade real, para que, plenamente convencido das alegações constantes dos

autos, possa, então, alcançar a justiça da decisão e a pacificação social.162

Vale ressaltar que existem, em nosso ordenamento jurídico, algumas

hipóteses de garantia desse princípio, em que o legislador já reconheceu a

desigualdade entre as partes e tenta saná-la. Podemos citar o art. 6, inciso VIII,

do CDC, que prevê a possibilidade de inversão do ônus da prova em favor do

consumidor, quando for verrossímil a alegação ou for ele hipossuficiente.163

No mesmo sentido, tem-se, ainda, como exemplo a previsão legal do

tratamento preferencial na tramitação de todos os atos e diligências em qualquer

superioridade de méritos”. (MARTINS, Nelson Juliano Schaefer. Poderes do juiz no processo civil. São Paulo: Dialética, 2004, p. 160).161 ALVES, Jones Figueirêdo. Da aplicação prática dos princípios processuais: uma proposta de estudo. Recife: Tribunal de Justiça de Pernambuco, 1990, p. 35/36. 162 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 54.163 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 40.

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instância dos procedimentos judiciais em que as partes ou intervenientes tenham

mais de 60 (sessenta) anos.164

É, pois, dever do magistrado buscar a implementação do princípio da

igualdade, podendo, para isso, valer-se de seus poderes no processo para

transformar a abstração normativa em realidade jurídica.165 Destarte, a atuação

probatória proativa do juiz não fere o princípio da igualdade. Ao contrário, o

exercício pleno dos poderes do juiz, garante aos litigantes a efetiva realização do

princípio em comento, uma vez que o magistrado atuará para reduzir as

desigualdades processuais, respeitando sempre os princípios do devido processo

legal, do contraditório e da ampla defesa.166

3.5 Princípio do devido processo legal

Constitui princípio fundamental do processo civil previsto pela primeira

vez no ordenamento jurídico brasileiro,167 através do art. 5, inc. LIV, da

Constituição Federal de 1988, que determina: “ninguém será privado da liberdade

ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Essa garantia tem origem no direito anglo-saxão,168 que utilizava a

expressão due process of law para denominá-la.169 Inicialmente, esse princípio

aplicava-se tão somente ao processo penal, tendo caráter exclusivamente

164 Art. 71 da Lei n. 10.741, de 2003 prevê que: “É assegurada prioridade na tramitação e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60(sessenta) anos, em qualquer instância”.165 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 47.166 Como determina o art. 9º do Código de Ética da Magistratura Nacional, “ao magistrado, no desempenho de sua atividade, cumpre dispensar às partes igualdade de tratamento, vedada qualquer espécie de injustificada discriminação”.167 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 109.168 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 27.169 A Declaração Universal dos Direitos do Homem tratava do princípio do devido processo legal no art. XI, no. 1, que dispõe: “todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa”.

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processual.170 Todavia, tal acepção foi ampliada ao longo do tempo, sendo

adotada explicitamente nas normas legais substanciais.

Trata-se de garantia das partes e da própria jurisdição, pois, através

dele, assegura-se o respeito às garantias necessárias a um provimento

jurisdicional justo e efetivo.171 Dessa forma, dentro de tal princípio, englobam-se

outros como os da ampla defesa, do contraditório, do juiz natural, da celeridade,

os quais se encontram igualmente previstos na Carta Constitucional.

O devido processo legal constitui garantia de que a tutela jurisdicional

será prestada pelo Estado de forma ampla, significativa e efetiva,172 tanto no que

diz respeito ao direito à liberdade, quanto à possibilidade de ampla defesa e

contraditório.173

Caracteriza-se pelo respeito aos preceitos constitucionais e

infraconstitucionais do processo tanto pelo Estado, quanto pelos cidadãos. Extrai-

se que esse princípio pode ser considerado como uma garantia de que a

prestação jurisdicional será ofertada às partes de maneira correta, sempre com

observância a todas as normas constitucionais e legais para a defesa dos direitos

lesados ou ameaçados de lesão. 174

170 NERY JÚNIOR. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 33.171 PIRES, Adriana. Prova e contraditório. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. (Org.). Prova cível. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 67. Nesse sentido, acrescenta Humberto Theodora Júnior que “o devido processo legal, assegurado como instrumento indispensável à composição dos litígios em juízo, não é visto apenas como uma simples forma de obter o provimento judicial. Somente se entende como tal aquele que se organize e se desenvolva de maneira a cumprir a tarefa que lhe foi reservada, ou seja, a de proteger o direito subjetivo individual de qualquer lesão ou ameaça. O due processo of law tem de ser, portanto, o processo justo. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direito e processo: Direito processual civil ao vivo. v.5. Rio de janeiro: Aide, 1997, p. 50).172 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 145. Ver também THEODORO JÚNIOR, Humberto. Princípios gerais do direito processual civil. Revista de Processo. a. 6, n. 23. p. 173-191, Jul.-set. 1981.173 De acordo com Maria Elizabeth de Castro Lopes, “este princípio é considerado por grande parte da doutrina processual o mais importante dentre todos os princípios processuais, uma vez que representa a “garantia de acesso à justiça”, consagrada, expressamente, no inc. LIV do art. 5º da CF/88”. (LOPES, Maria Elizabeth de Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 32) Ainda de acordo com Vallisney de Souza Oliveira, “o devido (justo) processo constitui a base dos direitos e garantias individuais e coletivas contra qualquer atuação perniciosa ou arbitrária do poder, aliás, poder escolhido pelo próprio cidadão”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. O juiz na aplicação do justo processo. Revista do Tribunal Regional Federal 1. Região, v. 1, 2008).174 De acordo com Cintra, Grinover e Dinamarco, “a garantia do acesso à justiça (...) e o direito à defesa (...) tem como conteúdo o direito ao processo, com as garantias do devido processo legal. Por direito ao processo não se pode entender a simples ordenação de atos, através de um procedimento qualquer. O procedimento há de realizar-se em contraditório, cercando-se de todas as garantias necessárias para que as partes possam sustentar suas razões, produzir provas, influir

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Alguns doutrinadores percebem a acepção de dois sentidos ao

princípio do devido processo legal, um substancial e outro processual. Em sua

face substancial, “o devido processo legal se manifesta em todos os campos do

direito”,175 confundindo-se, em alguns casos, com o princípio da legalidade.176

O princípio do devido processo legal substancial confere ao juiz a

possibilidade de analisar, “além dos aspectos meramente formais, a razoabilidade

da disposição material da norma”.177 Essa verificação, por sua vez, deverá

considerar os valores sociais da época, servindo como concretizador dos valores

da sociedade.

No aspecto processual, o princípio do devido processo legal objetiva

garantir os mecanismos necessários à obtenção de um processo justo e efetivo.

Exprime os instrumentos oportunizados às partes do processo para empregar

todos os meios jurídicos existentes.178 “Seu conteúdo identifica-se com a

exigência de ‘paridade total de condições com o Estado persecutor e plenitude de

defesa’”.179

Pelo princípio do devido processo legal, garante-se à parte a prestação

de uma tutela jurisdicional justa, adequada e efetiva, podendo ser considerado

sobre a formação do convencimento do juiz. E mais: para que este procedimento garantido pelo devido processo legal, legitime o exercício da função jurisdicional”. (CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p.89/90). Ver também CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 111.175 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 34.176 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 145. De acordo com Sandra Aparecida Sá dos Santos, “a incidência do devido processo substantivo compreende as normas de direito material inseridas na Constituição como, por exemplo, direito à liberdade, à propriedade, bem como nas demais legislações que tragam, em seu bojo, dispositivos de direito material. (SANTOS, Sandra Aparecida Sá dos. A inversão do ônus da prova: como garantia constitucional do devido processo legal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 52).177 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 68.178 De acordo com Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, “É nesse sentido apenas processual que a doutrina brasileira, com honrosas exceções (e.g., Castro, Devido processo legal, 34 e ss.; Grinover, As garantias const. 35 ss.; Tucci-Tucci, Processo, 15), vem entendendo a claúsula due process. O tipo de processo (civil, penal ou administrativo) é que determina a forma e o conteúdo da incidência do princípio (...) São manifestações da claúsula devido processo legal, em sentido processual, garantir-se ao litigantes: acesso à justiça (direito de ação e de defesa), igualdade de tratamento, publicidade dos atos processuais, regularidade do procedimento, contraditório e ampla defesa, realização de provas, julgamento por juiz imparcial (natural e competente), julgamento de acordo com provas obtidas licitamente, fundamentação das decisões judiciais etc.” (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 79).179 TAVARES, André Ramos. Direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 483.

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“como verdadeiro princípio informativo de todos os princípios ligados ao processo

e ao procedimento”.180

Ao realizar a atividade jurisdicional, exercendo seus poderes, o juiz

interfere na vida da sociedade, de forma que sua atividade “encontra limitação

nos direitos individuais e no conjunto de garantias constitucionalmente

asseguradas”.181

Esse princípio liga-se à atividade probatória proativa do juiz, à medida

que serve de limite à atuação do magistrado que deve respeitar os preceitos

constitucionais e legais do processo, ao mesmo tempo em que deve prestar uma

tutela jurisdicional justa e efetiva.182

3.6 Princípio do contraditório

O inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal de 1988, determina

que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em

geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos

a ela inerentes”.

A expressão “contraditório” surgiu na Constituição de 1937, em seu art.

122, n. 11, que dizia que a instrução criminal seria contraditória.183

Entende-se o contraditório como “a necessidade de dar-se

conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes”,

assim como “a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhes sejam

desfavoráveis”. Dessa forma, os litigantes dispõem do direito de suscitar suas

180 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 147.181 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Jaurez de Oliveira, 2001, p. 66.182 Conforme Vallisney de Souza Oliveira, “para ser justo, o processo de resolução de controvérsias precisa ser praticado de acordo com as garantias constitucionais: conservar o direito de defesa, a imparcialidade do julgador, a igualdade e a ética, a celeridade, a efetividade das normas processuais, a adequação e a publicidade, apesar das exceções legítimas. O julgador precisa adubar o terreno para fazer nascer um veredicto reto, ético e justificado, sendo imprescindível o humo da probidade, material útil para o juízo da verdade, isto é, evitando-se deturpações, erros ou desvios de finalidade da justiça.” (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. O juiz na aplicação do justo processo. Revista do Tribunal Regional Federal 1. Região, v. 1, 2008). 183 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 124.

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pretensões e defesas, produzirem as provas que entenderem necessárias para a

demonstração da existência do seu direito, ou seja, “direito de serem ouvidos

paritariamente no processo em todos os seus termos”. 184

Através do contraditório, confere-se às partes processuais a

oportunidade de participar efetivamente do processo, tomando conhecimento

sobre o pedido e todos os demais atos processuais, bem como dispondo de

mecanismos de reação permitidos pelo ordenamento jurídico.185

Constitui direito de todos invocar o princípio do contraditório em seu

favor,186 e sua incidência se dá em todos os campos do direito, seja civil, penal ou

administrativo, aplicando-se, da mesma forma, tanto às pessoas físicas como às

jurídicas.187

Está intimamente ligado ao princípio da igualdade substancial, uma vez

que se deve conferir às partes paridade de armas no processo.188 O processo não

é um monológo, mas um diálogo, uma conversação, e, por isso, considera-se o

contraditório o princípio fundamental do processo, denominando-o de princípio da

dialeticidade.189

184 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 123/124. Para Artur César de Souza, “concebe-se o contraditório, portanto, como sendo uma garantia fundamental do homem, que lhe assegura a participação dialética na concretização de um determinado provimento decorrente do exercício do Poder, como forma de assegurar a legitimidade da ingerência da decisão no trinômio vida-liberdade-propriedade, mediante uma atuação efetiva, concreta e bilateral em todo arco de um procedimento configurado segundo os ditames políticos do Estado Democrático de Direito”. (SOUZA, César Artur de. Contraditório e revelia: perspectiva crítica dos efeitos da revelia em face da natureza dialética do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 170)185 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 130. Como ensina Luiz Guilherme Marinoni, “a legitimidade do processo se liga a uma possibilidade real e, não meramente formal, de participação. (MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 409).186 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 123.187 Conforme alerta Nelson Nery Jr, “nada obstante o contraditório ser garantia constitucional estampada no art. 5º, o que à primeira vista poderia parecer restringir-se ao cidadão ou à pessoa física, na verdade essa garantia pode ser invocada por pessoa física ou jurídica, na defesa não só de igualdade processual, mas também dos direitos fundamentais de cidadania, religião, liberdade sexual etc.” (NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2ª ed. rev. e aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995).188 TAVARES, André Ramos. Direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 499.189 CALAMANDREI, Piero. O processo como jogo. Genesis: Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, PR, v. 7, n. 23, p. 193-194, jan./mar. 2002. Para Calamandrei, “cada movimento feito por uma parte abre à parte adversária a possibilidade de realizar um outro movimento visando a retaliar os efeitos daquele que o precede e que, poderíamos dizer, o contém em potência. (...) Na realidade, cada movimento feito por uma parte no processo não é causa necessária e suficiente do ato sucessivo da contraparte, e sim somente uma oportunidade que é dada a esta de realizar, por sua vez, um dentre os vários movimentos juridicamente possíveis, entre os quais fica ao senso

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O autor ajuíza a ação relatando os fatos e buscando sua pretensão.

Por sua vez, o réu, para ingressar na relação processual, deverá ser validamente

citado, quando, então, poderá oferecer resposta, através da contestação, das

exceções ou da reconvenção, ou mesmo não a produzir. O juiz, por sua vez, deve

permanecer entre as partes, garantindo as mesmas a paridade de armas no

processo.190

As partes dispõem de mecanismos processuais para discussão de

suas alegações, visando a alcançar seu objetivo principal que é o convencimento

do juiz, para, enfim, obter uma decisão favorável. Deve-se ofertar aos

contendores as mesmas oportunidades processuais, de modo que a todo ato do

autor corresponda a um ato de defesa do réu. Por meio dessa dialética

processual, revela-se a cooperação entre o juiz e as partes, 191 a fim de se atingir

os escopos do processo.

3.6.1 Conteúdo do princípio do contraditório

de oportunidade escolher aquele mais adequado para neutralizar o movimento adversário”. Segundo Vallisney de Souza Oliveira, “o processo precisa do permanente dialógo entre o juiz e as partes visando à tutela jurisdicional justa e mais condizente com a verdade”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. O juiz na aplicação do justo processo. Revista do Tribunal Regional Federal 1. Região, v. 1, 2008).190 Segundo Luiz Guilherme Marinoni, “a paridade de armas não quer dizer que as partes de um mesmo processo devam ter os mesmos poderes, até porque isso seria ignorar a obviedade de que elas podem ter diferentes necessidades. O que importa é que tais poderes tenham fundamento racional na diversidade das necessidades das partes e que, diante de qualquer poder conferido a uma delas, outorgue-se à outra o correlato poder de reação”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 414).191 Nesse sentido, André Ramos Tavares afirma que “as garantias constitucionais do devido processo legal, convertem-se, de garantia exclusiva das partes, em garantias da jurisdição e transformam o procedimento em um processo jurisdicional de estrutura cooperatória, em que a garantia da imparcialidade da jurisdição brota da colaboração entre as partes e juiz. A participação dos sujeitos no processo não possibilita apenas a cada qual aumentar as possibilidades de obter uma decisão favorável, mas significa cooperação no exercício da jurisdição. Para cima e para além das intenções egoísticas das partes, a estrutura dialética do processo existe para reverter em benefício da boa qualidade da prestação jurisdicional e da perfeita aderência da sentença à situação de direito material subjacente.” (TAVARES, André Ramos. Direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 500/501).

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Inicialmente, o princípio do contraditório apresenta dois sentidos, quais

sejam informação necessária e reação possível.192

Deve-se fornecer aos litigantes as informações necessárias sobre os

atos que se passam no processo, de forma que cada um deles possa ter acesso

às alegações da parte contrária, bem como oportunidade de contestá-la.193 É

através da citação válida do réu que se garante o princípio do contraditório, na

qualidade de informação necessária. A partir daí, o promovido passa a ter

conhecimento da ação e tem-se formada a relação jurídica processual.

Além da citação válida, é preciso que as partes sejam intimadas

tempestivamente de todos os atos processuais, inclusive quanto à apresentação

de documentos no curso do processo, para que se assegure a possibilidade de

manifestação e se garanta a dialética processual. Só a partir da informação, pode-

se conferir aos contendores a oportunidade de oferecer reação.

Em seu sentido de reação possível, o princípio do contraditório se

manifesta por meio da possibilidade de utilização de mecanismos idôneos e

adequados para a obtenção do provimento judicial favorável. Deve-se, portanto,

resguardar a possibilidade de utilização de todos os instrumentos jurídicos válidos

para levar ao conhecimento do juiz sua versão dos fatos, com o objetivo de ter

sua pretensão acolhida. A reação da parte não se limita à produção de provas nos

autos, mas se estende a oferta de argumentos, impugnações ou posicionamentos

divergentes.

Ressalte-se, outrossim, que a essa concepção de contraditório como

informação-reação vem sendo acrescido o fator diálogo pertinente.194 Esse

terceiro aspecto a ser acrescentado caracteriza-se pela participação das partes e

do juiz no processo, ou seja, pela colaboração real e efetiva entre os sujeitos

processuais em busca do resultado justo do processo.195 Assim, o princípio do

192 LA CHINA, Giuseppe. Apud. DINAMARCO, Cândido Rangel. O princípio do contraditório. Fundamentos do processo civil moderno. 2. ed. São Paulo: RT, 1987, p. 93.193 PIRES, Adriana. Prova e contraditório. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. (Org.). Prova cível. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 73.194 LOPES, Maria Elizabeth de Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 37.195 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 415. Segundo Sérgio Luíz Wetzel de Mattos, “o princípio do contraditório exprime o direito de conhecimento e de participação, de participar conhecendo e de participar agindo; em síntese, o direito de participação”. (MATTOS, Sérgio Luíz Wetzel de. Iniciativa probatória do juiz e princípio do contraditório no processo civil. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. (Org.). Prova cível. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 142).

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contraditório configura “o direito fundamental de participação e de influência na

marca do procedimento”. 196

3.6.2 O contraditório e a atividade probatória proativa do juiz

Observar o princípio do contraditório significa respeitar a igualdade das

armas197 e, assim, conceder oportunidades iguais às partes na medida de sua

igualdade. Além disso, através do contraditório, dá-se conhecimento dos atos

processuais às partes e abre-se a elas oportunidade para manifestação.

O Código de Processo Civil de 1973, já no art. 125, determina que o

juiz deve dirigir o processo de acordo com as disposições do Código, competindo-

lhe assegurar as partes igualdade de tratamento, velar pela rápida solução do

litígio e prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça.

Dessa forma, é dever do juiz, como acima esposado, garantir a

igualdade de tratamento entre as partes. Contudo, deve-ser buscar a

implementação da igualdade real e não, apenas, formal.

Não se concebe mais a ideia do juiz inerte, mero espectador, sendo

necessária a participação efetiva do mesmo para se garantir o respeito ao

princípio do contraditório. Como assevera Luiz Guilherme Marinoni, “não há como

supor que o contraditório possa ser violado em razão da participação do juiz. Na

verdade, ele é fortalecido pela sua postura ativa”.198

Considerado como princípio da dialeticidade, a garantia do contraditório

se aplica também ao juiz, o qual deve manter entendimento com os litigantes,

através da garantia de igualdade de tratamento, da motivação das decisões e da

resposta adequada aos pedidos.199

196 CARPES, Artur Thompsen. Apontamentos sobre a inversão do ônus da prova e a garantia do contraditório. In. KNIJNIK, Danilo. Prova judiciária: estudos sobre o novo direito probatório. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 31.197 Para Nelson Nery Júnior, “o contraditório significa dar as mesmas oportunidades para as partes (Chancengleichheit) e os mesmos instrumentos processuais (Walffengleichheit) para que possam fazer valer os seus direitos e pretensões, ajuizando ação, deduzindo resposta, requerendo e realizando provas, recorrendo das decisões judiciais etc.” (NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 138.).198 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 415.199 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 143.

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É importante desenvolver a cooperação entre o juiz e as partes no

desenvolvimento do processo, cujo fim último é a garantia da tutela jurisdicional

efetiva.200 A atividade probatória proativa do juiz, manifestada pelo exercício de

seus poderes instrutórios de ofício, não afeta o princípio do contraditório, desde

que os litigantes sejam informados dos atos probatórios determinados pelo

magistrado e possam dele participar, ofertando impugnação ou manifestação. 201

O contraditório implementado pela participação do juiz e das partes no

processo legitima o exercício dos poderes instrutórios do juiz de ofício, sem,

contudo, torná-lo arbitrário ou autoritário. Ao respeitar o princípio do contraditório,

o juiz garante também a igualdade entre as partes, a observância ao devido

processo legal, bem como a garantia do acesso à justiça.

3.7 Princípio da motivação das decisões judiciais

O advento do Estado Social, baseado no ideal de realização do bem

comum, fez romper a inércia judicial até então vigorante, para dar lugar à

ampliação dos poderes do juiz no processo.

Diante do novo papel do juiz que não se limita mais a ser a “boca da

lei”, ganhou destaque a necessidade de justificação das decisões judiciais, a fim

de evitar arbítrios e desmandos por parte dos juízes.

O princípio da fundamentação das decisões judiciais constitui uma

garantia do Estado de Direito,202 sendo prevista na CF de 1988, em seu art. 93,

inciso IX, que determina: “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário

serão públicos e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)”.

200 “O processo civil contemporâneo exige um juiz integrado na relação jurídica processual, isto é, um participante efetivo do processo, cumprindo-lhe manter permanente contanto com as partes para ouvir suas alegações, examinar corretamente os fatos e dar a cada um o que é seu”. (LOPES, Maria Elizabeth de Castro. O juiz e o princípio dispositivo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 37/38).201 MATTOS, Sérgio Luíz Wetzel de. Iniciativa probatória do juiz e princípio do contraditório no processo civil. In OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. (Org.). Prova cível. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 144.202 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 156.

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Da mesma forma, o Código de Processo Civil prescreve, em seu art.

131, que o juiz deverá indicar na sentença os motivos que lhe formaram o

convencimento.

“Quem toma parte em um litígio certamente será atingido pelos efeitos

das decisões proferidas no processo”. Dessa forma, o juiz, no exercício de seu

poder jurisdicional, deve prestar contas aos litigantes acerca de sua decisão.203

Para se garantir a legitimidade do processo jurisdicional, deve-se, além de ofertar

a participação das partes em contraditório, garantir a publicidade dos atos

judiciais, assim como a fundamentação das decisões.

O juiz, no exercício de seus poderes, interpreta as leis e as aplica aos

jurisdicionados, e, para se evitar ofensa aos princípios democráticos, exige-se a

fundamentação das decisões judiciais como corolário do Estado Democrático de

Direito.204

Outrossim, o princípio da fundamentação das decisões judiciais

constitui garantia constitucional de extrema relevância, uma vez que, a partir dos

argumentos deduzidos pelo juiz, pode se verificar a observância deste à

Constituição e às leis, de forma que a ausência de motivação da decisão judicial

caracteriza um ilícito, tornando nula a decisão.205

Destarte, para que se garanta o controle das decisões judiciais, é

necessário que sejam motivadas, ou melhor, justificadas, revelando o magistrado

os motivos pelo qual tomou a referida decisão. Trata-se de uma imposição do

princípio do devido processo legal em que se busca a exteriorização das razões

de decidir, o revelar do prisma pelo qual o Poder Judiciário interpretou a lei e os

fatos da causa.206

203 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 407.204 Ibid.,p. 408.205 Nesse diapasão, “se a fundamentação é que permite acompanhar e controlar a fidelidade do julgador tanto à prova dos autos como às expectativas colocadas pelo sistema jurídico, sua ausência equivale à prática de um ilícito e sua insuficiência ou inadequação causa de invalidade.” CALMOM DE PASSOS, J. J. O magistrado, protagonista do processo jurisdicional? In. MEDINA, José Miguel Garcia et at. (coord.). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais. 2 tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 220.206 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 7. ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2008, p. 248. Complementando, afirma Vallisney de Souza Oliveira que “com o fundamento do decisum a parte saberá se o juiz fugiu dos fatos apresentados, quais os critérios utilizados para julgar, se seguiu o liame entre o pedido e o dispositivo e a causa de pedir remota com os fundamentos da sentença. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Nulidade da sentença e o princípio da congruência. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 113).

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A fundamentação da decisão judicial deve ser clara e coerente com o

tema abordado, permitindo que tanto as partes quanto a própria sociedade possa

compreendê-la e aceitá-la, como também fiscalizá-la.

Objetiva-se com tal princípio garantir à parte o conhecimento sobre os

motivos que levaram o juiz a decidir daquela forma, assim como conferir a

possibilidade de revisão da decisão por parte de órgão superior. Exige-se, por

meio do princípio da fundamentação das decisões judiciais, que o magistrado

exteriorize os motivos relevantes e argumentos adequados que o levaram a tomar

aquela decisão207. A partir daí, pode-se apreciar a conduta do juiz no processo,

verificando se houve abusos ou ilegalidades em sua atuação.208

Assim, pode-se dizer que a observância a esse princípio constitui a

legitimação da atuação do magistrado209, além de um limite a atividade probatória

proativa do juiz no exercício de seus poderes instrutórios de ofício.

O processo civil contemporâneo não admite mais a limitação da

atividade do juiz no processo. Ao contrário, confere-se cada vez mais poderes ao

magistrado para solucionar as diversas demandas judiciais, os quais são

controlados, através da imposição de uma rígida justificativa racional das

decisões.210

207 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 409.208 Para Piero Calamandrei, “A fundamentação da sentença é certamente uma grande garantia de justiça, quando consegue reproduzir exatamente, como num esboço topográfico, o itinerário lógico que o juiz percorreu para chegar à sua conclusão. Neste caso, se a conclusão estiver errada, poder-se-á descobrir facilmente, através da fundamentação, em que etapa do caminho o juiz perdeu o rumo”. (CALAMANDREI, Piero. Eles, os juízes, vistos por nós advogados. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, p. 175).209OLIVEIRA NETO, Olavo de. Princípio da Fundamentação das decisões judiciais. In OLIVEIRA NETO, Olavo de; LOPES, Maria Elizabeth de Castro (Coord.). Princípios processuais civis na constituição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 202.210 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil: Teoria geral do processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 412.

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4 NOÇÕES ELEMENTARES SOBRE A PROVA

Dentro do estudo da atividade probatória proativa do juiz, não se pode

deixar de tratar sobre o direito à prova. Constitui um direito fundamental

decorrente do direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla

defesa,211 posto que, por meio dele, assegura-se às partes efetiva participação no

processo, e sua ausência acarretará privação ao acesso à ordem jurídica justa.212

A finalidade primeira do processo é realizar o direito como satisfação

de um interesse público; secundariamente, objetiva alcançar a justa composição

do litígio. Para cumprir seu desiderato, o processo necessita entrar em contato

com a realidade do caso concreto litigioso, pois, se o juiz não conhece

precisamente suas particularidades, não será possível aplicar corretamente o

direito. Esse indispensável contanto com a realidade fática só se obtém através

das provas.213

Destarte, o juiz, para prestar sua tutela jurisdicional, deve reconstruir os

fatos objeto do litígio, para que, então, aplique o direito positivo à questão,

solucionando o conflito. De forma que, antes de seu julgamento, deve apreciar as

provas produzidas nos autos, as quais formarão sua convicção da verdade.214

Mesmo com toda sua relevância, o direito à prova não é absoluto e

incondicionado, estando submetido a regras e limitações sujeitas à avaliação do

magistrado. Ocorre que nem toda prova deve ser admitida no processo. Para

isso, a prova “deve ser pertinente, relevante e admissível, além de mostrar-se útil

para a decisão da causa”.215

211 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 24.212 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 113.213 ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, p. 5-6.214 Acrescentam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que “nada mais natural do que eleger, como um dos princípios essenciais do processo – senão a função principal do processo de conhecimento -, a busca da verdade substancial”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 253)215 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 137.

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Como destinatário da prova, cabe ao juiz avaliar a sua necessidade no

processo, podendo se valer das regras do art. 330 do CPC para julgar

antecipadamente o mérito, sem incorrer em cerceamento de defesa.

Verifica-se, pois, que, ao analisar a atividade probatória proativa do

juiz, é indispensável elencar algumas noções elementares acerca do direito à

prova, destacando-se o seu conceito, objeto, meios e momento da prova, bem

como quais os sistemas de que se vale o magistrado para avaliar as provas.

Também é de se evidenciar as regras de distribuição do ônus da prova, já que as

mesmas prescrevem as condutas que devem ser seguidas pelas partes na

instrução do processo, o que também interfere diretamente na atividade do juiz no

processo.

4.1 Conceito de prova

Primeiramente, deve-se sobrelevar que o direito probatório brasileiro é

formado pelas disposições dos Códigos Civil e de Processo Civil, já que ambos

trazem dispositivos que tratam da matéria. O Diploma Processual Civil dedica

todo o Capítulo IV do Livro I para as questões atinentes à prova, enquanto o

Código Civil também regula a matéria em seu Capítulo II, Título IV, do Livro III

(arts. 212 a 232).

Os dois Estatutos legais que tratam da prova devem ser aplicados

conjuntamente, apesar de apresentarem divergências pontuais216.

A palavra prova tem origem latina e significa verificação, exame,

inspeção.217 Já o Dicionário da Língua Portuguesa Larousse Cultural define prova

como:

216 Com propriedade, afirma Barbosa Moreira que “nosso direito probatório de hoje é o resultado da superposição de dois retículos normativos, com pontos e espaços que nem sempre coincidem. Os intérpretes e aplicadores da lei têm de precaver-se contra as ciladas que lhes prepara esse autêntico cipoal.” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Anotações sobre o título “da prova” no novo Código Civil. In: DIDIER JR, Fredie; MAZZEI, Rodrigo. (Org.). Reflexos do novo Código Civil no direito processual. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2007. p. 284).217 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 25.

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1. Qualquer evidência que ateste a veracidade de um fato ou a autenticidade de uma informação. 2. Demonstração que confirma essa veracidade ou autenticidade. 3. Testemunha, documento. 4. Sinal, indício. 5. Teste, ensaio. 6. Exame, concurso. 7. Degustação. 8. Competição esportiva. 9. Provação.

Como se percebe, “prova” pode apresentar muitos significados, os

quais estão, em sua maioria, ligados à ideia de busca de reconstrução da

veracidade de um fato.218

Sempre que se tem um direito violado, existe uma ação para

resguardá-lo. Dessa forma, pode-se dizer que há também um fato responsável

pela violação ou dano. Logo, para que se tenha uma decisão final, é necessária a

produção de provas sobre o fato.

Prova, no processo, é, por conseguinte, o meio destinado a convencer

o juiz a respeito da verdade de uma situação de fato.219 A sua produção objetiva

introduzir no magistrado o conhecimento sobre a existência ou inexistência dos

fatos a serem julgados.

Para que o juiz possa decidir o pleito, é imprescindível que tenha obtido

um convencimento sobre os fatos, o que ocorre, via de regra, pela produção das

provas no processo. Nesse sentido, a comprovação dos fatos, através da

identidade ou da diferença da situação suposta pela norma e da situação suposta

na lide, é o fim do processo e o objetivo do julgamento.220

A prova apresenta duas acepções: uma subjetiva, baseada na crença

da certeza dos fatos alegados em juízo, e outra objetiva, fundada nos meios

admitidos e impostos pela lei para chegar-se a certa convicção.221 Entende-se

218 Para Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “comumente, a definição de prova vem ligada à ideia de reconstrução (pesquisa) de um fato que é demonstrado ao magistrado, capacitando-o a ter “certeza” sobre os eventos ocorridos e permitindo-lhe exercer sua função”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 263). De acordo com Vallisney de Souza Oliveira, a prova “consiste na demonstração da verdade acerca de um fato ou de uma versão dele realizada e discutida na instrução processual”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Audiência, instrução e julgamento. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 3).219 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 180. Para Hernandes Devis Echandía, as provas são as razões ou os motivos que servem para levar ao juiz a certeza sobre os fatos. (ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, p. 25)220 CARNELUTTI, Francesco. A prova civil. 4.ed. Campinas: Bookseller, 2005, p.30.221 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v. 1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 17.

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como indissociáveis os dois sentidos, o que o leva a definir a prova como “a soma

dos fatos produtores da convicção, apurados no processo”.222

Dentro de uma concepção multifacetária, a prova deve ser entendida

como “todo meio retórico, regulado pela lei, dirigido a, dentro dos parâmetros

fixados pelo direito e de critérios racionais, convencer o Estado-juiz da validade

das proposições, objeto de impugnação, feitas no processo”.223

É ideia majoritária na doutrina que o juiz detém poderes ativos na

produção da prova. Essa postura ativista busca a efetividade do processo, através

de um resultado justo e equitativo.

O juiz deve obter a cognição dos fatos através do conjunto probatório

trazido ao processo e só, excepcionalmente, mediante experiência ou

conhecimento de fatos notórios.224 Destarte, o objetivo da prova é formar a

convicção do juiz sobre os fatos relevantes para a causa.

A prova se apresenta como instrumento de exercício da atividade

proativa do magistrado, que deverá buscar sempre a reconstrução dos fatos,

mesmo que se utilizando de indícios ou presunções, para alcançar a verdade e,

então, proferir uma decisão justa.225

É necessário ressaltar que a legislação determina que o juiz, mesmo

sem o convencimento pleno sobre os fatos, é obrigado a proferir uma decisão.

Assim, dispõe o art. 126 do CPC que o juiz não se exime de sentenciar ou

222 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v. 1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 21. Nesse sentido, Carnelutti afirma que “prova não se chama somente o objeto que serve para o conhecimento de um fato, mas também o próprio conhecimento fornecido por tal objeto”. (CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. Campinas: Servanda, 1999, v. II, p. 307). Para Humberto Theodoro Júnior, o conceito de prova apresenta dois sentidos: um objetivo, em que a prova é considerada o instrumento ou meio hábil para demonstrar a existência de um fato e outro subjetivo, no qual significa a convicção formada no espírito do julgador em torno do fato demonstrado. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. v. 1, 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 416.)223 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 264.224 Para Eduardo Cambi, a prova é um instrumento adequado à reconstrução dos fatos no processo, a fim de permitir que, após a discussão e a compreensão dos fatos necessários ao julgamento da causa, o juiz possa formar sua convicção. (CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 57).225 Assevera Barbosa Moreira que “a função da prova no processo consiste em proporcionar ao juiz conhecimentos de que ele precisa a fim de reconstituir mentalmente os fatos relevantes para a solução do litígio.” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Anotações sobre o título “da prova” no novo Código Civil. In: DIDIER JR, Fredie; MAZZEI, Rodrigo. (Org.). Reflexos do novo Código Civil no direito processual. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2007. p. 290.)

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despachar. Dessa forma, deve valer-se de todos os seus poderes para buscar a

certeza de seu provimento.

Deve-se ter em mente que a prova é o coração do problema dos juízes,

uma vez que é o complemento indispensável de seu conhecimento, pois, sem ela,

não poderá ofertar ao jurisdicionado uma tutela jurisdicional efetiva, cumprindo,

plenamente, sua função jurisdicional.226

“A sentença de hoje estabelecerá o certo e o errado de amanhã”.227 Por

isso, o juiz deve, através da sentença, demonstrar a coincidência das afirmações

das partes com a realidade fática, sendo indispensável que o magistrado tenha

formado seu convencimento da verdade dos fatos controvertidos do processo, o

que o faz através da prova.228

Apesar de dispor de poderes instrutórios de ofício, existem situações

em que, mesmo com os esforços, ainda restará dúvida. Nesse caso, deve o juiz

utilizar das regras de distribuição do ônus da prova, como regras de julgamento.229

Entretanto, ao juiz consciente não é suficiente proferir uma decisão

baseado nas regras de distribuição do ônus da prova. Ele precisa atuar

proativamente no sentido de aprofundar a investigação da verdade e, para isso,

deve se valer de todos os seus poderes instrutórios de ofício para obtenção das

provas necessárias e, então, decidir com acerto, baseando-se na reconstrução

dos fatos. Destarte, com adequação, pode-se dizer que: “a arte do processo não é

senão a arte de administrar as provas”.230

226 ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, p. 5.227 CARDOSO, Benjamim. A natureza do processo judicial: palestras proferidas na Universidade de Yale. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 11.228 Com precisão afirma Aureliano Gusmão: “Se ao juiz fôsse concedido decidir do direito só pelas suas impressões pessoais a respeito das contendas e litígios que ante êle se agitam, ou pelas simples alegações, desacompanhadas de prova, daqueles que comparecem à liça das lutas jurídicas; se lhe fôsse facultado julgar e cominar pena ao indigitado autor de um delito de cuja existência ou realidade não haja plena certeza e sobre cuja autoria paira dúvida; se, numa palavra, ao juiz fôsse lícito agir livremente e desprendido de quaisquer peias jurídicas ou morais, absolvendo ou condenado, sem se preocupar com o descobrimento e verificação da verdade, que deve ser o seu rumo, o seu norte invariável, o arbítrio sentar-se-ia no trono da Justiça, e esta não mais seria a garantia das pessoas honestas e dos fracos, nem a mantenedora do direito e guarda vigilante da paz, da ordem e da harmonia, que devem presidir à vida e à marcha das sociedades regularmente organizadas, mas sim a fôrça imane, despótica e tirânica, sempre pronta e aparelhada para negar, desconhecer e aniquilar o direito desprotegido e imbele.” (GUSMÃO. Aureliano. Processo civil e comercial. 1922-1924, p. 19. Apud SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 2. ed. v. 1. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 18) 229 CAMBI, Eduardo. Direito constitucional à prova no processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 56.

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4.2 Objeto da prova231

Durante a instrução do processo, acumulam-se elementos capazes de

formar o convencimento sobre os fatos alegados pelas partes.232 Logo, pode-se

dizer que os fatos sobre os quais debatem as partes é que constituem o objeto da

prova.233 Pode-se, por conseguinte, entender por objeto da prova todos os fatos

que são passíveis de comprovação ante o órgão jurisdicional do Estado.234

A doutrina moderna, no entanto, não aceita essa ilação. Para eles, “não

se provam fatos, mas afirmações sobre fatos”.235 Justificam tal posicionamento

sob o argumento de que o juiz não entrará em contato com os fatos, mas com a

230 BENTHAM, Traité dês preuves judiciaires, trad. de Ét. Dumont, 1823, p. 3. Apud SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 2. ed. v. 1. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 16.231 Distingue-se o thema probandum do objeto da prova, o primeiro designa “o conjunto de fatos que são necessários para servir de fundamento da decisão, e o segundo, ao fato particular que determinada prova tende a demonstrar.” (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 296)232 Conforme lição de Vicente Greco Filho, de nada adianta o direito em tese ser favorável a alguém se não consegue demonstrar que se encontra numa situação que permite a incidência da norma. (Direito processual civil brasileiro. v. 2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 179).233 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v. 1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 16. Também seguem esse posicionamento GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 181. THEODORO JÚNIOR. Humberto. Curso de direito processual civil. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 417. OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Audiência, instrução e julgamento. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 4.234 ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, p. 137.235 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 31. Seguindo esse entendimento, Ovídio Batista, citando João de Castro Mendes, afirma que “seria impróprio dizer que ficou provado o fato de alguém não estar em certo lugar, ou a prova de que determinado evento não ocorreu. Na hipótese de a finalidade da prova ser a demonstração de um “fatto negativo”, percebe-se facilmente que o objeto da prova não é o fato, mas, como afirma CASTRO MENDES, as alegações ou afirmações sobre o fato.” (SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 343)

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descrição dos fatos feita pelas partes.236 Entende-se que é a alegação, e não o

fato, que pode adequar-se à realidade daquilo que se passou fora do processo.237

Uma terceira posição intermediária238 entende que o objeto da prova se

distingue “entre objeto mediato, que é o fato, e o objeto imediato, que é a

afirmação”.

O nosso Código de Processo Civil239 segue a doutrina majoritária que

entende que o objeto da prova são os fatos relevantes para o deslinde do feito, os

quais se distinguem do thema probandum, que constitui o conjunto de fatos, a ser

demonstrado durante a instrução probatória, que podem influir na decisão do juiz.

São os fatos litigiosos que devem ser provados tanto pelo autor, quanto

pelo réu durante a instrução processual civil. Todavia, não sendo demonstrado

pelos litigantes, valendo-se de seus poderes instrutórios de ofício, tem o juiz o

poder-dever de determinar a realização de provas, a fim de reconstruir a realidade

fática que deu ensejo ao litígio, fazendo incidir o suporte fático à norma, para a

correta aplicação do direito.

4.2.1 Fatos probandos

Nem todos os fatos alegados nos autos precisam ser provados. Para

que desperte interesse probatório, o fato precisa ser controvertido, relevante,

pertinente e determinado.

Fato controvertido é aquele em que houve rejeição expressa ou tácita

da parte contrária em sede de contestação. Nesse caso, há controvérsia entre as

partes, e estas devem provar suas afirmações em juízo. No que respeita aos fatos

236 Para Marinoni, “o fato não pode ser qualificado de “certo”, “induvidoso” ou “verdadeiro”; ele apenas existe ou não existe. Como o direito existe independente do processo, este serve apenas para declarar que o direito afirmado existe; isto é, prova-se a afirmação de fato, para que se declare que o direito afirmado existe. (...). Não se prova que o direito existe, mas sim que a afirmação de que o direito existe é verdadeira, declarando-se a existência do direito (coisa julgada material)”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória e julgamento antecipado: parte incontroversa da demanda. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 41).237 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 265.238 CARNELUTTI, Francesco. A prova civil. 4.ed. Campinas: Bookseller, 2005, p.267. 239 Nesse sentido, pode-se citar como exemplos os arts. 332, 333 e 334 do CPC.

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incontroversos, ou seja, aqueles aceitos pela parte contrária, não há necessidade

de produção de prova, salvo quando se refere a direitos indisponíveis, quando a

lei exige forma especial como prova ou, ainda, quando o magistrado entender

necessário para formar seu convencimento.240

Todavia, mesmo sendo controvertido, se o fato não é pertinente, nem

relevante, não há necessidade de prova sobre o mesmo, uma vez que tal atitude

feriria os princípios da celeridade e da economia processual. Nesse caso, deve-se

julgar antecipadamente a lide, conforme determina o art. 330 do CPC.241

Fatos relevantes são aqueles que têm influência no julgamento final da

lide e são pertinentes ao processo, suscitando o cuidado da parte em comprová-

lo. Entende-se como pertinentes, por seu turno, os fatos que mantêm vínculo

direto ou indireto com o mérito da causa.

Por fim, fatos determinados ou precisos são aqueles que apresentam

especificações próprias relevantes para a causa. Conclui-se, dessa regra, que o

fato indeterminado, ou indefinido, não é suscetível de prova.242

4.2.2 Fatos que independem de prova

O Código de Processo Civil determina, em seu art. 334, que não

dependem de prova os fatos: notórios; afirmados por uma parte e confessados

pela parte contrária; admitidos, no processo, como incontroversos, e aqueles em

cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade.

Além desses, não precisam ser provados os fatos impertinentes, ou

seja, aqueles que não têm relação com a causa e os irrelevantes, por não influir

no deslinde final do processo. Nessas hipóteses, almeja-se garantir os princípios

da economia e celeridade processual.243 240 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 45. Ver também Moacyr Amaral Santos. Prova judiciária no cível e comercial. v.1., 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 208-209.241 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 240.242 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v.1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 220.243 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 46.

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Dizem-se notórios, os fatos que fazem parte do conhecimento do

cidadão de cultura média, situado no tempo e lugar em que a sentença é

proferida.244 Essa notoriedade deve ser apreciada em relação ao juiz que é o

destinatário da prova,245 não se limitando, contudo, ao seu conhecimento privado.

É preciso que o fato seja de cognição generalizada, sendo, assim, inútil produzir

prova sobre o mesmo.246

Em regra, o fato notório não depende de prova. No entanto, havendo

contestação sobre a notoriedade do fato, o autor pode provar o próprio fato ou a

sua notoriedade, bastando demonstrar apenas esta última.247

Apesar de dispensar a produção de provas, o juiz não fica adstrito a

formar sua convicção de acordo com o fato notório, pode divergir e, nesse caso,

exigir a prova do fato.248

Também não dependem de prova os fatos incontroversos, isto é,

aqueles que foram aceitos expressa ou tacitamente pela parte contrária. Nesse

diapasão, como não há dúvida quanto à questão de fato debatida no litígio, o

aporte de provas nos autos seria inútil e desnecessário, por isso a previsão legal.

Não se diz que o fato está provado, mas que é dispensada a prova sobre o

mesmo, uma vez que não pode ser considerado verdadeiro logo de plano,

devendo-se observar outras circunstâncias legais.249

É importante ressaltar, no entanto, que, quanto aos fatos

incontroversos, a legislação previu algumas exceções no tocante à necessidade

de prova, as quais foram expostas no tópico anterior.

244 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 32. Para Egas Moniz de Aragão, dizem-se notórios “os fatos que todos podem conhecer mediante consulta a livros, manuais etc. É notório, por exemplo, a época da colheita na região respectiva, a ocorrência de certa epidemia, a geada nos locais expostos ao fenômeno, os dias feriados etc. A esse respeito qualquer um pode informar-se, incluído o julgador, que por isso mesmo independe de o litigante proporcionar-lhe a prova a respeito”. (Apud. MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória e julgamento antecipado: parte incontroversa da demanda. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 43).245 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 46.246 DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 5.247 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 281.248 Ibid., p. 281.249 O art. 302 do CPC determina que “cabe também ao réu manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Presumem-se verdadeiros os fatos não impugnados, salvo: I – se não for admissível, a seu respeito, a confissão; II – se a petição inicial não estiver acompanhada do instrumento público que a lei considerar da substância do ato; III – se estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto”.

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Pela mesma razão, independem de prova os fatos afirmados por uma

parte e confessados pela parte contrária. Aqui, o legislador determinou que a

confissão250 deve ser compreendida como “uma circunstância determinante da

dispensa da prova sobre o fato confessado”,251 ocasionado a presunção de

veracidade dos fatos.

Da mesma forma, não necessitam de prova os fatos em cujo favor

milita presunção legal de existência ou veracidade.252 Assim, ao alegar alguma

dessas hipóteses, a parte ficará dispensada de produzir prova sobre os fatos.

Todavia, essa dispensa só se dá nos casos de presunção absoluta ou iuris et de

iure. Aqui, a realização de prova é inútil, “não importa se destinada a reforçar a

conclusão ou a tentar demonstrar que a presunção parte de um silogismo

falso”.253

As presunções legais absolutas decorrem da atividade do legislador,

devendo ser empregadas como regras de julgamento. Na realidade, elas afastam

a necessidade de produção de provas, tornando-a irrelevante, por já

estabelecerem como verdade os fatos presumidos.254

No que toca às presunções relativas ou iuris tantum, admitem a

produção de prova em contrário, já que são fixadas pela lei como verdade, até

que se prove o contrário.255

Dessa forma, fazendo uso de seus poderes instrutórios de ofício, o juiz

deverá, em observância dos princípios da celeridade e economia processual,

250 (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 284). Os autores distinguem a confissão, a não-contestação e o reconhecimento jurídico do pedido. Para os autores, o reconhecimento jurídico do pedido se relaciona com o direito, “o réu, ao reconhecer a procedência do pedido, impede que o juiz solucione o litígio, mas abre mão do seu direito material – sendo o processo encerrado com a resolução de mérito, nos termos do art. 269, II, do CPC.” Já a confissão e a não-contestação dizem respeito aos fatos. Nestas, “o réu apenas aceita determinados fatos como verdadeiros, o que pode conduzir, ou não, ao reconhecimento do direito pelo juiz, até porque dos fatos confessados podem não decorrer os efeitos jurídicos pretendidos”.251 Ibid., p 283.252 Segundo Luiz Guilherme Marinoni, “não se trata de um caso em que a prova é dispensada, mas sim de uma hipótese de inversão do ônus da prova”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória e julgamento antecipado: parte incontroversa da demanda. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 44.)253MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 289.254 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 59-61. São exemplos de presunção legal absoluta os arts. 574 e 659 do CC.255 São exemplos o art. 1201, parágrafo único, e art. 1203, ambos do Código Civil.

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estando cônscio da irrelevância do fato ou de que a prova requerida é

inadmissível, impertinente ou inútil, indeferir a solicitação da parte.256

4.2.3 Prova do direito

É dever do magistrado conhecer o direito. Logo, em regra, apenas os

fatos são objeto de prova no processo. De acordo com o art. 3º, da LICC, o juiz é

obrigado a dominar a legislação federal, bem como entender a doutrina, também

o direito estadual e municipal da sua jurisdição.257

Todavia, é impossível ao juiz conhecer todas as legislações vigentes

no mundo. Para o caso de desconhecimento da lei, o Código de Processo Civil

previu, em seu art. 337, que: “a parte, que alegar direito municipal, estadual,

estrangeiro258 ou consuetudinário, provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o

determinar o juiz.”

Observa-se, pois, que, excepcionalmente, cabe ao juiz determinar a

realização de prova do direito no que respeita ao seu teor e sua vigência e pela

parte que o alegar. Ocorre que, ao provar o teor e a vigência de uma lei, o objeto

da prova não deixa de ser o fato que, no caso, é o fato da existência.259 Nesse

caso, a prova objetiva apenas auxiliar o juiz que ignora o direito invocado.260

Diferentemente da prova dos fatos, a prova do direito dirige-se à

inteligência do juiz. Quanto ao teor do direito, a prova deve ser realizada por

qualquer documento verdadeiro que consigne a existência da lei em seu

conteúdo. Por sua vez, no que se refere à sua vigência, torna-se mais difícil,

256 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v. 1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 214.257 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 182.258 De acordo com Artur Oscar de Oliveira Deda, no conceito de direito estrangeiro, porém, não entra o “direito das gentes”, que é supraestatal. “O mesmo se diga dos tratados, uma vez que integram a legislação interna do país”. (DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 5).259 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v.1, 2. ed. v. 1. São Paulo: Max Limons, 1952, p. 17.260 Ibid., p. 207.

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podendo dar-se através de certidão pública de que não consta revogação

expressa ou por meio de pareceres de eminentes juristas.261

4.3 Meios de prova

É através das provas que o juiz forma sua convicção sobre os fatos

alegados no processo e, a partir daí, profere sua decisão. As provas, por seu

turno, devem ser realizadas através de meios adequados, legais e moralmente

legítimos, como determina o art. 332 da nossa legislação processual civil.

É preciso distinguir os meios das fontes de prova. Os meios são os

mecanismos de percepção para revelar ao juiz a verdade de um fato.262 Por seu

turno, as fontes de provas são as próprias coisas, pessoas ou fenômenos.263

O Código de Processo Civil traz, em seu bojo, alguns meios de prova,

contudo, em seu art. 332, consagrou o princípio da não taxatividade das

enumerações legais na matéria264 ao admitir a aceitação de todos os meios legais, 261 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v. 1, 2. ed. São Paulo: Max Limons, 1952, p. 186-187. Acrescenta Vicente Greco Filho que: “a prova do direito estrangeiro se faz pela apresentação dos compêndios de legislação atualizados, por certidão diplomática, por pareceres ou livros de doutrina e, se for o caso, até por testemunhas que tenham conhecimento jurídico, cabendo ao juiz o cauteloso arbítrio em valorar tal prova, especialmente se sobre o direito estrangeiro instaurar-se a controvérsia. A prova do direito estadual ou municipal se faz por repertórios oficiais ou reconhecidos, ou por certidão do Estado ou Município de que emana a norma. Impossível é a prova da vigência (apesar da exigência do art. 337), porque ninguém pode no Estado ou no Município atestar ou certificar que determinada norma está em vigor, porquanto a vigência, muitas vezes, depende de interpretação que só ao juiz cabe definir. Quando muito pode o Estado ou o Município certificar que não consta revogação expressa, cabendo à parte interessada levar ao juiz outros elementos de convicção sobre a vigência. Aliás, como as leis, em princípio, são aprovadas para vigência por tempo indeterminado, não havendo revogação expressa, presume-se, em caráter relativo, que estão em vigor, invertendo o ônus de provar que não estão para a parte contrária. A prova do direito costumeiro se faz por todos os meios admissíveis em juízo, inclusive a juntada de sentença anterior que o tenha reconhecido, ressalvada a competência das Juntas Comerciais para a expedição de certidões sobre o costume consagrado mediante assento, registrados em livros próprios. Podem, também, as Juntas fornecer atestados de costumes comerciais ainda não assentados. (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v.2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 182-183).262 Ibid., p 183. Para Hernando Devis Enchandia, os meios de prova são os elementos ou intrumentos (testemunhas, documentos, etc), utilizados pelas partes e pelo juiz, para obter a prova. (ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, p. 20).263 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 48.264 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Anotações sobre o título “da prova” no novo Código Civil. In: DIDIER JR, Fredie; MAZZEI, Rodrigo. (Org.). Reflexos do novo Código Civil no direito processual. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2007. p. 287.

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bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados para provar a

verdade dos fatos, em que se baseia a ação ou a defesa.

Por sua vez, o novo Estatuto Civil (art. 212) prevê como meios de

provas do fato jurídico: a confissão, documento, testemunha, presunção e perícia.

Esse rol, todavia, não é taxativo,265 mas exemplificativo, o que torna compatível os

dois institutos.266

São meios de provas típicos, ou seja, expressamente previstos no

Código de Processo Civil: o depoimento pessoal (arts. 342 a 347), a confissão

(arts.348 a 354), a exibição de documento ou coisa (arts. 355 a 363), a prova

documental ( arts. 364 a 399), a prova testemunhal (arts. 400 a 419), a prova

pericial ( arts. 420 a 439) e a inspeção judicial ( arts. 440 a 443).

Outros meios atípicos, mesmo não previstos, são aceitos pela nossa

jurisdição civil, como exemplo, podemos citar a prova emprestada,267 a prova

cibernética, a reconstituição de fatos. Dizem-se provas atípicas por não estarem

reguladas na lei, devendo se basear para sua produção nos princípios atinentes à

teoria geral da prova, especialmente nos princípios constitucionais do

contraditório e da ampla defesa.268

265 Assevera João Carlos Pestana de Aguiar Silva que: “Na realidade, o estatuto civil em análise, para não incorrer em inconstitucionalidade (art. 5º, LV e LVI, da CF), se cingiu às linhas mestras do instituto da prova, pelo que sequer prenuncia uma aparente taxatividade, admissível tão-somente no plano antecedente do direito material, a desde logo ser afastada perante o direito formal. Queremos dizer, o fato jurídico pode ser resguardado pelos meios de prova previstos no Código Civil. Mas sua demonstração em juízo poderá ser feita em campo probatório bem mais fértil, através de meios específicos e inespecíficos produzidos perante o juiz da causa, pois através dos meios legais e moralmente legítimos, ainda que não especificados no próprio CPC vigente (art. 332). Por isso a relação maior de meios legais do estatuto processual permanece intocável, evidente que é a enunciatividade dos meios moralmente legítimos”. (Apud DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 17).266 Comenta Moacyr Amaral Santos que, em alguns países, como Portugal e o Chile, os meios de prova são taxativamente fixados por lei. Nesse sistema, a não ser pelos meios indicados, não se consente se provem os fatos em juízo. (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v.1, 2. ed. São Paulo: Max Limond, 1952, p. 73/74)267 De acordo com Vicente Greco Filho, “a prova emprestada é a retirada de outro processo, admitindo-se a sua validade contra quem também participou do processo anterior e pode contraditá-la. A prova emprestada, todavia, terá o seu valor reapreciado pelo juiz da causa em que foi juntada, tendo em vista as novas circunstâncias da segunda ação e novos argumentos sobre elas apresentados. Não há coisa julgada sobre os fatos, que ficam sempre sujeitos à apreciação original do juiz ao decidir a causa.” (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 183)268 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p.50.

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Contudo, é importante destacar que todos os meios de prova, típicos

ou atípicos, devem ser idôneos e legítimos, não podendo estar contaminados pela

imoralidade.

4.3.1 Provas obtidas por meios ilícitos

O processo civil tem como um de seus escopos, a pacificação social,

que é obtida a partir da justa composição do litígio. Deve, para isso, seguir todos

os preceitos legais. O magistrado, então, não pode se valer de meios escusos ou

ilegítimos para proferir sua decisão e pôr fim a sua atividade jurisdicional.

É necessário, dessa forma, impor limites à atividade instrutória tanto às

partes quanto ao juiz. Não se pode permitir que, em busca da verdade, sejam

produzidas provas ilícitas no processo. Assim, fez o legislador, no art. 332 do

CPC, ao admitir no processo apenas as provas “moralmente legítimas”.269

No mesmo sentido, a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, em

seu art. 5º, inciso LVI, como direito fundamental do jurisdicionado,270 a

inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilíticos.271

Consideram-se “moralmente legítima” as provas obtidas em

observância à lei. Por sua vez, alguns doutrinadores distinguem as provas ilícitas,

das ilegítimas, sendo estas colhidas com violação às normas processuais e

aquelas obtidas em desobediência às normas de direito material, especialmente

269 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v. 1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 356.270 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil.v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 36.271 Assevera Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que “o art. 5º, LVI, da CF não nega o direito à prova, mas apenas limita a busca da verdade, que deixa de ser possível através de provas obtidas de forma ilícita. O interesse no encontro da verdade cede diante de exigências superiores de proteção dos direitos materiais que podem ser violados. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 394) Para Ricardo Raboneze, “a primeira limitação ao direito probatório em geral é a vedação constante do art. 5º, LVI, que não permite a utilização processual das provas obtidas ilicitamente. Daí, portanto, consideramos a vedação constitucional como um limite ao direito de prova da representação dos fatos em juízo, sob pena de eivar-se todo o procedimento de nulidade. (RABONEZE, Ricardo. Provas obtidas por meios ilícitos. 2. ed. Porto Alegre: Síntese, 1999, p. 29).

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as de caráter constitucional. Essa distinção, todavia, não apresenta relevância,

uma vez que ambas são inadmissíveis no processo.272

Não se deve esquecer, contudo, de que, além do direito fundamental

da inadmissibilidade das provas ilíticas, o jurisdicionado tem também o direito

fundamental à prova. “Trata-se de direitos que não se contradizem; antes, eles se

complementam: o direito à prova é limitado pela legitimidade dos meios utilizados

para obtê-la”.273 Dessa forma, mesmo no exercício de seus poderes instrutórios de

ofício, o magistrado não pode determinar a realização de provas obtidas de

maneira ilícita.

O legislador fez uma opção pela efetividade da proteção do direito

material em prejuízo do direito à descoberta da verdade, de tal forma que houve

uma ponderação entre os interesses e negou-se a possibilidade de busca da

verdade a qualquer custo.274

Por isso, muito se discute, na doutrina, acerca da admissibilidade das

provas obtidas de forma ilícita. Alguns, como Adalberto José de Camargo

Aranha275 (“interesse preponderante”) ou Trocker (“bilanciamento degli interessi”),

aceitam as provas conseguidas por meios ilícitos, quando esta seja a única

existente. Por exemplo, quando a vítima procede escuta clandestina em crime de

extorsão, pois, desse modo, estará agindo em legítima defesa.

Existe também a corrente que apoia a utilização irrestrita das provas

obtidas ilegitimamente. Para esses, deve-se punir o autor do ilícito na esfera

criminal, no entanto, sendo verdadeiro o conteúdo da prova obtida ilícitamente,

deve-se aplicá-la para a solução do conflito.276

272 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 38. “A distinção entre provas ilícitas e provas ilegítimas faz sentido quando se trata do momento e da forma de transgressão da norma: na prova ilegítima, a ilegalidade ocorre dentro do processo, no momento da introdução da prova; na prova ilícita, a violação é anterior ou concomitante ao processo, mas ocorre fora deste, quando da colheita da prova”. (COSTA, Suzana Henriques da. Os poderes do juiz na admissibilidade das provas ilíticas. Revista de Processo. São Paulo, a. 31, n. 133, p. 86, Mar. 2006.273 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 38.274 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 394.275 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 358. Ver também AZENHA, Nivia Aparecida de Souza. Prova ilícita no processo civil. Curitiba: Juruá, 2003.276 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v. 1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 358. Também Hermenegildo de Souza Rego. Natureza das normas sobre prova. São Paulo: RT, 1985, p. 114-116.

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Outros juristas defendem a aceitação das provas ilícitas apenas no

processo penal e, exclusivamente, em benefício do acusado.277 Há, ainda, os que

não admitem, sob qualquer hipótese, a utilização das provas obtidas de forma

ilícita no processo.278

Por último, a doutrina dominante baseia-se na ideia de que, na

concorrência entre as normas, deve-se aplicar o princípio da proporcionalidade,

observando o caso concreto e os interesses em litígio.279 Nesse caso, em uma

segunda apreciação, deve-se sopesar o direito afirmado pelo autor e o direito

violado pela prova ilícita, de que se poderá admitir a prova obtida de forma ilícita,

de acordo com a ponderação dada pelo juiz para solucionar o caso concreto.280

Destaca-se, contudo, que a aceitação, no processo, de provas ilíticas é uma

exceção.

Entendendo ser necessária a produção de determinada prova, o

interessado ou o agente público deve requerê-la ao juiz, o que permite a prévia

ponderação do magistrado e afasta a ilicitude a ser cometida. A aplicação do

princípio da proporcionalidade para a admissão da prova deve se dar, apenas,

277 Conforme ensina Fredie Didier Jr, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, “Os que admitem sempre a prova ilítica, ou não a admitem nunca, pecam por considerar de modo absoluto e apriorístico os direitos fundamentais em jogo. Aqueles que entendem que a prova ilícita somente é admissível excepcionalmente, e apenas no processo penal, pecam por dois motivos: primeiro, por entender que sempre, no processo penal, há discussão em torno do direito à liberdade, o que é falso, pois nem todas as penas envolvem privação da liberdade; segundo, por entender que nenhum outro direito fundamental, a não ser o direito à liberdade, pode ser mais relevante que o direito fundamental à vedação da prova ilícita, o que também é indefensável à luz da teoria dos direitos fundamentais.” (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 38). 278 Ver José de Moura Rocha. Prova ilítica e constituição. Revista da Esmape, v. 2., n. 4, p. 257, abr-jun. 1997.279 Pelo princípio da proporcionalidade se faz o balanceamento dos interesses e dos valores constitucionais em conflito, a fim de poder decidir qual dos direitos deve prevalecer e em que média o outro deve ser sacrificado. (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 71). Ver também Nelson Nery Júnior. Princípios do processo civil na constituição Federal. Op. cit., p.149-151. José Roberto dos Santos Bedaque. Poderes instrutórios do juiz. Op. cit. p. 95-100. Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Miditiero. Comentário ao código de processo civil artigo por artigo. Op. cit., p. 169.280 Acrescenta Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que: “Quando se pensa na regra da proporcionalidade nesses casos, há sempre que se considerar o valor do bem jurídico que se busca proteger através da prova ilícita. Após, verificar se havia outra prova, além da obtida de forma ilícita, capaz de demonstrar as alegações em juízo. E, por último, analisar de que modo a prova ilícita determinou a violação do direito e, especialmente, se existe a possibilidade de limitação ao direito violado, quando observados determinados requisitos legais, uma vez que a violação de um direito que sequer admite restrição legal é mais grave que a violação de um direito que pode ser objeto de restrição. Assim, há distinção entre a obtenção de um testemunho mediante tortura e a escuta ilícita de uma conversa telefônica – que pode ser licitamente gravada com autorização judicial”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 398-400).

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pelo juiz no exercício da sua função jurisdicional, o qual, valorando os interesses

jurídicos em conflito, escolhe aquele que considera mais relevante.281 No exercício

de seus poderes instrutórios, o juiz pode analisar a admissibilidade ou não das

provas ilícitas, sempre com base na proporcionalidade dos princípios de direito

em conflito.282

4.4 Momentos da prova

Em regra, pode-se falar em três momentos da prova: a proposição, o

deferimento e a produção. Em todos, devem participar o juiz e as partes, a fim de

garantir a plena validade da prova.

Primeiramente, a prova deve ser proposta pelas partes ou por terceiros

que possam fazê-lo. Deve o autor requerer a produção de provas na petição

inicial, conforme preceitua o art. 282, inciso IV, do CPC, enquanto o réu, por sua

vez, deve fazê-lo por ocasião da defesa (art. 300), em contestação, reconvenção

ou através de exceções. Por intermédio do requerimento de produção de provas,

as partes protestam pela produção de todos os meios de provas em direito

admitidas, a fim de evitar qualquer preclusão. Nesse momento, ainda não há

281 Acrescenta Eduardo Cambi que “o valor considerado menos relevante, para que se evite o risco de injustiças, somente pode ser sacrificado dentro de critérios de razoabilidade e na proporção devida, não podendo sofrer um prejuízo maior que o necessário para salvaguardar o interesse superior em conflito. (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 79).282 Conforme salienta José Roberto dos Santos Bedaque, “Caberia ao magistrado, exclusivamente, ponderar sobre a necessidade e a conveniência de sua produção. Se a conclusão for afirmativa, determinaria ele, ex officio, a vinda para os autos da prova obtida ilicitamente. Evidentemente, o julgador somente poderia utilizar-se dessa faculdade de caráter excepcional, isto é, apenas quando a produção da prova lhe pareça absolutamente imprescindível para que o escopo do processo seja alcançado. E após rigorosa ponderação dos valores que se contrapõem”. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 106).

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participação ativa do magistrado que se mantém equidistante das partes,

garantindo-lhe igualdade no processo.

O segundo momento da prova se dá quando do deferimento das

provas requeridas, que deve ser realizado pelo juiz. Quando o magistrado admite

as provas, realiza o saneamento do processo, por meio de despacho próprio ou

em sede de audiência preliminar, conforme disciplina o art. 331 do CPC. Trata-se

de apreciação objetiva, em que se verificará a pertinência e utilidade da prova

requerida e do fato que se pretende provar. Aqui, o juiz estará no pleno exercício

de seus poderes instrutórios, podendo, inclusive, complementar a participação

das partes ao determinar a realização de provas de ofício. Nesse caso, exerce

sua atividade probatória proativa, com observância dos princípios jurídicos que

regem a matéria.

Por fim, a produção da prova ocorre quando ela é incorporada ao

processo.283 Preceitua o art. 336 do CPC que as provas devem ser produzidas em

audiência, salvo disposições em contrário. O juiz, então, atuará positivamente

para fiscalizar a sua produção, garantindo a observância dos princípios

processuais, especialmente, o da imediatidade, do contraditório e da

publicidade.284

Apesar de haver regra expressa quanto ao momento da produção de

prova ser a audiência de instrução e julgamento (art. 336 do CPC), nem sempre

se pode aguardar tal evento para a sua realização. As provas a serem produzidas

por precatória, o depoimento da parte ou de pessoa enferma que pode ser ouvida

no local mais apropriado e a prova antecipada285 não são produzidas na audiência

de instrução e julgamento,286 podendo ser realizadas no momento oportuno.

283 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de Processo Civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 348.284 DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 30/31.285 Conforme lenciona João Batista Lopes, “há casos, porém, em que, não se pode retardar a colheita da prova, sob pena de inviabilizar sua produção por circunstâncias diversas (desaparecimento dos vestígios, alteração do estado da coisa, falecimento de testemunhas etc.). Procede-se, então, à produção antecipada de prova, ação cautelar que pode consistir em interrogatório da parte, inquirição de testemunhas e exame pericial (art. 846, CPC). Em sede de ação cautelar, o autor deverá justificar a necessidade da produção antecipada da prova, bem como demonstrar os fatos sobre o que há de recair a prova, a qual não poderá, no entanto, ser deferida automaticamente. (LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 61).286 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v.2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 192.

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Na produção da prova, o juiz exerce seus poderes instrutórios ao

interrogar as partes e as testemunhas, ao indeferir as perguntas que considerar

impertinentes, entre outros atos. Percebe-se, pois, que a atividade probatória do

juiz se dá em todos os momentos da prova, desde o requerimento à sua

produção, de forma ampla, e sempre com o objetivo de buscar a verdade dos

fatos para melhor formar sua convicção.

4.5 Sistemas de apreciação da prova

O magistrado não pode julgar aleatoriamente segundo seu

entendimento, devendo basear-se nas alegações e provas constantes do

processo. É finalidade da prova formar o convencimento do juiz sobre a

veracidade dos fatos controvertidos afirmados nos autos, cabendo a este avaliá-

los e proferir sua decisão. “Na busca da verdade, cumpre ao magistrado conferir a

cada meio de prova coligido o valor que merecer”.287

Existem três grandes sistemas de apreciação da prova no direito

processual civil, são eles: o sistema da prova legal, o sistema da livre apreciação

da prova e o sistema da persuasão racional da prova. De acordo com o modelo

adotado varia a atuação do magistrado quanto à apreciação das provas.

O sistema da prova legal prevalecia no direito romano primitivo e no

direito medieval e pretendia que cada prova tivesse um valor determinado, o qual

era pré-fixado pela lei e invariável. Dessa forma, ficava o juiz adstrito aos critérios

previamente estabelecidos, sem possibilidade de qualquer avaliação subjetiva.288

Encontra-se, no entanto, totalmente superado, por ser extremamente formalista e

contentar-se com a verdade formal dos fatos, não se preocupando com a

287 DEDA, Artur Oscar de Olivera. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 18.288 Ensina Ovídio Batista que “no direito medieval, onde vicejou em toda sua plenitude este sistema, o valor da prova testemunhal era rigorosamente quantificado pela lei e estabelecidas regras legais quanto à credibilidade do depoimento, de modo que o juiz ficava adstrito a essa valoração objetiva da prova. O depoimento de um servo jamais poderia ter o mesmo valor do testemunho de um nobre, mas o depoimento de dez servos equivalia ao de um nobre ou senhor feudal, embora intimamente o juiz tivesse sobradas razões para crer que o nobre mentira e o servo dissera a verdade.” (SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.)

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realidade fática ensejadora do conflito.289 Apesar de obsoleto, o sistema da prova

legal ainda deixou relevantes sequelas em nosso ordenamento jurídico.290

No sistema da livre convicção, prepondera a convicção íntima do

julgador, sem quaisquer limites quanto aos meios, origem ou qualidade das

provas. Ao contrário do sistema da prova legal, neste, o magistrado tem ampla

liberdade de apreciação da prova, independente do que existe nos autos ou das

regras legais sobre o tema.291 Tem-se como exemplo de aplicação desse sistema,

em nosso ordenamento jurídico, o julgamento dos jurados no Tribunal do Júri, os

quais não precisam fundamentar sua decisão, julgado segundo seu livre

entendimento.292

O sistema da persuasão racional consiste em uma evolução dos dois

outros modelos, em que se aproveitam elementos dos mesmos para formar um

modelo misto. De acordo com esse sistema, o magistrado tem o livre

convencimento sobre a prova. No entanto, essa liberdade é limitada pela

necessidade de fundamentação da sua decisão, devendo demonstrar as razões

de seu raciocínio e de seu convencimento.

É necessário que o juiz realize um raciocínio lógico que demonstre os

motivos que o levaram a chegar àquela decisão, não podendo fugir às provas que

constam dos autos.

289 Consoante Humberto Theodoro Júnior, “o critério legal está totalmente superado. Nele o juiz é quase um autômato, apenas afere as provas seguindo uma hierarquia legal e o resultado surge automaticamente. Representa a supremacia do formalismo sobre o ideal da verdadeira justiça.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. v.1, 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 419).290 “Todas as restrições opostas pelo Código quanto ao depoimento de menores, ou de pessoas que a lei considera suspeitas ou impedidas de depor, têm origem no princípio medieval da prova tarifada (vide art. 405 do CPC). A limitação mais severa, contudo, ao princípio do livre conhecimento judicial, em matéria probatória, afigura-se-nos, sem dúvida, a disposição contida no art. 319 do CPC, segundo o qual a revelia importa em terem-se por verdadeiros os fatos afirmados pelo autor (MOACYR AMARAL DOS SANTOS, Prova judiciária..., v. 1. §240; PONTES DE MIRANDA, Comentários...., 1973, t. IV, p. 181)”.(SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 349). Cita, ainda, Artur Oscar de Oliveira Deda, como exemplos de resíduos do sistema da prova legal no direito positivo brasileiro, as normas do Código Civil sobre a forma especial dos atos jurídicos, sobre a inadmissibilidade da prova exclusivamente testemunhal e a respeito das presunções legais. (DEDA, Artur Oscar de Oliveira. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva: 2006, p. 19).291 Na lição de Humberto Theodoro Júnior, o sistema de livre apreciação da prova vai ao extremo de permitir o convencimento extra-autos e contrário à prova das partes, pecando pelo excesso que chega mesmo a conflitar com o princípio básico do contraditório, que nenhum direito processual moderno por desprezar. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil.v.1, 24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 420)292 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v.2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 197.

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Decorre desse sistema a faculdade de iniciativa probatória ao

magistrado, já que, como é seu dever fundamentar sua decisão de acordo com

critérios lógicos, deve-se-lhe dar oportunidade de ampliar sua cognição sobre os

fatos.293 “A sentença deve convencer e não só vencer de forma arbitrária em um

Estado de Direito”.294

O sistema da persuasão racional295 é adotado pelo nosso Código de

Processo Civil, em seu art. 131, ao estabelecer que o juiz apreciará livremente a

prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não

alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe

formaram o convencimento.

Confere a lei ao juiz a livre apreciação da prova, a qual é limitada aos

fatos e circunstâncias constantes dos autos, exigindo, por fim, o dever de

fundamentar sua sentença, expondo os motivos de seu convencimento. 296

A liberdade do magistrado no tocante à valoração da prova é também

limitada pelos princípios do contraditório e do duplo grau de jurisdição, uma vez

que permitem um maior debate sobre o litígio, provocando a exposição dos

argumentos do juiz para aquela decisão.

Com efeito, possibilitou-se-lhe a concessão de amplos poderes para a

produção de prova, bem como para sua apreciação, tudo isso para que se

alcance a justiça da decisão e a pacificação social.

293 SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 351.294 ASENCIO MELLADO, José Maria. Derecho procesal civil: parte primeira. Valencia: Tirant lo Blanch, 1997, p. 158.295 “Como se vê, a inclinação do legislador por um ou outro sistema está mais ou menos ligada à maior ou menor confiança que a sociedade tenha em seus juízes, assim como a credibilidade na instituição do Poder Judiciário, no preparo cultural dos magistrados e no maior ou menor rigor de sua formação profissional. O sistema de persuasão racional, por certo o que mais condiz com os princípios da cultura ocidental moderna, exige magistrados altamente capazes e moralmente qualificados, enquanto o velho princípio da dosimetria legal das provas pode funcionar razoavelmente bem ainda que seus juízes se ressitam de maiores deficiências culturais.” (SILVA. Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. v.1, 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 352) 296 Entende Vicente Greco Filho que, “a obrigação de fundamentar permite às partes aferir que a convicção foi realmente extraída do material probatório constante dos autos e também que os motivos levam logicamente à conclusão. Essa garantia não só assegura o exame cuidadoso dos autos, mas também permite que, em grau de recurso, se faça o eventual reexame em face de novos argumentos apresentados.” (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v.2, 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 198).

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4.6 O ônus da prova e a atividade instrutória do juiz

O autor, ao ingressar em juízo pleiteado uma tutela jurisdicional do

Estado, deve indicar o ato ou fato jurídico violado para o qual pretende reparação.

Em sua defesa, por sua vez, o réu deverá apresentar suas alegações para refutar

àquelas do demandante.

Diante desse confronto de afirmações, através das provas, o juiz

reconstitui mentalmente os fatos e profere sua decisão. Destarte, é de extrema

relevância demonstrar a quem incumbe a produção da prova em juízo e as

consequência pela sua não realização.

Provar não é um dever jurídico, mas uma condição para alcançar a

vitória.297 Dessa feita, não se deve confundir ônus com dever de provar. Enquanto

o dever se dá em relação a alguém, formando uma relação jurídica entre os dois

sujeitos; o ônus não constitui relação entre sujeitos, ele é em relação a si mesmo,

e a sua satisfação é uma escolha de seu próprio interesse.298

Não se trata, por conseguinte, de uma obrigação ou imposição, mas de

uma condição para se chegar ao êxito, não um dever jurídico. Trata-se de uma

faculdade da parte de realizar aquele ato em seu próprio benefício para alcançar

outro benefício. Nesse caso, a não observância do ônus pelo contendor não gera

ilicitude, apenas o risco de consequências desfavoráveis.299

Na obrigação, por sua vez, tem-se a submissão de um benefício

próprio a outro de terceiro. Não há liberdade de ação, uma vez que o sujeito

passivo submete-se a uma sanção jurídica pelo não cumprimento da obrigação.

Nesse caso, a não observância da obrigação acarreta uma ilicitude.300

297 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 314.298 MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil, tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 253.299 “O ônus pode ser definido como a liberdade de realização de certos atos ou condutas previstas em uma norma jurídica, para a satisfação de um interesse próprio, não havendo sujeição ou um outro sujeito que tenha o direito de exigir a sua observância, visto que o seu não-cumprimento pode acarretar apenas conseqüências desfavoráveis para a pessoa beneficiada” (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 315).300 Explica o autor que “as consequências desfavoráveis resultantes do não-cumprimento do ônus decorrem da não observância, pelo sujeito interessado, da conduta prevista na norma jurídica, enquanto o não-cumprimento de uma obrigação ou de um dever acarreta uma sanção jurídica, que é imposta como efeito da ilicitude. Por isso, o que rege a categoria jurídica do ônus é um

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O ônus da prova é o encargo que tem alguém de provar um fato

alegado. É importante destacar que sua observância não garante,

impreterivelmente, ao sujeito uma decisão favorável, contudo aumenta o risco de

obtê-la.301

Em observância ao princípio da igualdade, ambos os contendores,

autor e réu, têm o ônus de afirmar e provar os fatos que devem ser apreciados

pelo magistrado. Segundo o brocardo romano onus probandi incumbit actori, o

ônus da prova de suas alegações incumbe ao autor e reus in excipiendo fit actor,

pelo que ao réu cabe a prova de sua exceção. Como se percebe, já na Roma

Antiga, aplicava-se a regra sobre o ônus da prova.

A prova rege-se pelo princípio da aquisição processual ou comunhão,

segundo o qual a prova realizada não pertence às partes, mas ao processo.

Dessa feita, o juiz deve se valer de todo o conjunto probatório para proferir sua

decisão. Logo, é importante que os demandantes demonstrem suas afirmações

através de provas robustas, a fim de formar o convencimento do magistrado e,

então, obter uma decisão judicial favorável.

É certo que a não realização das regras do ônus da prova não gera

ilicitude, mas pode trazer consequências desfavoráveis ao interessado, uma vez

que diminui o risco de vitória. Aquele que deseja um provimento judicial favorável

deve buscar demonstrar a veracidade de suas alegações, trazendo aos autos os

elementos que melhor influenciem a convicção do juiz.

4.6.1 Aspectos do ônus da prova

interesse próprio do sujeito ou uma conveniência prática, não um vínculo ou uma necessidade jurídica”. (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 315). 301 Conforme manifesta Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “a produção de prova não é um comportamento necessário para o julgamento favorável. Na verdade, o ônus da prova indica que a parte que não produzir prova se sujeitará ao risco de um resultado desfavorável. Ou seja, o descumprimento desse ônus não implica, necessariamente, um resultado desfavorável, mas o aumento do risco de julgamento contrário, uma vez que, como precisamente adverte Patti, uma certa margem de risco existe também para a parte que produziu a prova”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 269).

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O ônus da prova, estruturalmente, apresenta dois aspectos, os quais

estão interligados.302 Ao mesmo tempo que constitui regra de conduta para as

partes, indicando os fatos que cada um deve provar para diminuir o risco de uma

decisão desfavorável, o ônus da prova destina-se também ao juiz, autorizando-o a

proferir sua decisão mesmo sem o pleno convencimento sobre os fatos em

litígio.303

Dessa forma, pode-se afirmar que o ônus da prova é uma definição

processual que contém uma regra de juízo, através da qual se indica ao juiz como

deve decidir quando não encontre no processo provas que lhe deem certeza

sobre os fatos alegados e também uma regra de conduta que identifica qual das

partes interessa a prova de tais fatos, para se evitar as consequências

desfavoráveis.304

O ônus subjetivo constitui uma regra de conduta dirigida às partes, com

o objetivo de cientificá-las acerca dos fatos que a cada uma incumbe provar.

Indiretamente, trata-se de um princípio de autorresponsabilidade das partes,

meramente facultativo, posto que, ao mesmo tempo que se outorga poderes para

apresentar as provas, deixa-as em liberdade para não fazê-lo, submetendo-se,

nesse caso, às consequências adversas.305

Com as regras acerca da distribuição do ônus da prova, não se

estabelece quem deve produzir prova, mas sim quem se sujeitará ao risco de sua

não produção, mediante um julgamento desfavorável. Por isso, não constitui regra

de procedimento, mas regra de juízo, uma vez que serve para orientar o juiz em

caso de incerteza.

302 Nesse diapasão, CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.303 “Afirma-se que a regra do ônus da prova se destina a iluminar o juiz que chega ao final do procedimento sem se convencer sobre como os fatos se passaram. Nesse sentido, a regra do ônus da prova é um indicativo para o juiz se livrar do estado de dúvida e, assim, definir o mérito. Tal dúvida deve ser paga pela parte que tem o ônus da prova. Se a dúvida paira sobre o fato constitutivo, essa deve ser suportada pelo autor, ocorrendo o contrário em relação aos demais fatos”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Formação da convicção e inversão do ônus da prova segundo as peculiaridades do caso concreto. Genesis: Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, PR, v. 10, n. 38, out./dez. 2005, p.722.304 ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, t. I., p.406.305 Ibid., p. 405.

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Determina o art. 333 do CPC que o ônus da prova incumbe ao autor

quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu quanto à existência de fato

impeditivo, modificativo ou extintivo do autor.

Ocorre que, apesar de se dirigir expressamente ao autor e réu, essa

regra se aplica tanto ao juiz, quanto às partes. Para o juiz, a regra do ônus da

prova é aplicada, em seu aspecto objetivo, como regra de julgamento ou para a

formação do seu convencimento.306

Concluída a instrução do processo, deve o juiz proferir seu julgamento

de acordo com as provas que constam dos autos, sem se importar quem a

produziu. Seguindo o princípio da aquisição processual,307 o magistrado deve

analisar o conjunto probatório e proferir sua decisão.

Não importa para o juiz quem produziu a prova. Não deve ele se ater à

autoria da sua produção, até mesmo porque elas podem ter sido produzidas pelas

partes ou mesmo de ofício. O que é relevante são as provas efetivamente

produzidas no processo e os fatos que demonstram, a convicção que produzem

no magistrado ou mesmo a sua não realização.

Ao juiz é vedado o non liquet, ou seja, ao final do processo o

magistrado tem o dever de proferir uma decisão, estando ou não convencido das

alegações constantes dos autos. Dessa forma, deve se valer de todos os

mecanismos para reconstituir os fatos e chegar a um convencimento.

Todavia, em algumas situações, as provas produzidas não são

suficientes para formar a convicção do magistrado. Nesse caso, sendo incompleto

o resultado da instrução, deve o juiz aplicar a regra do ônus da prova em seu

aspecto objetivo308, buscando a quem competia o ônus de provar e não o fez. 306 “Frise-se que a separação da relevância da regra do ônus da prova, diante dessas duas últimas situações, decorre do fato de que o juiz resta convencido – ainda que da verossimilhança – ao reduzir as exigências de prova segundo as necessidades do caso concreto, enquanto que a regra do ônus da prova funciona como regra de decisão quando o juiz não forma o seu convencimento ou, em outras palavras, fica em estado de dúvida. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 270)307 De acordo com Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, pelo princípio da aquisição processual, “a prova, uma vez produzida, desgarra-se daquele que a produziu e é incorporada ao processo – não podendo ser dele extraída ou desentranhada, salvo exceções (§§1º e 2º do art. 1.215 do CPC). A prova adere ao processo, sendo irrelevante saber quem a trouxe. O que importa é sua existência e, não, sua proveniência (origem)”. (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 32)308 Para Hernando Devis Echandia, o aspecto objetivo do ônus da prova constitui “regra de juízo” para o juiz, cuja função é impedir e proibir o non liquet, e permitir-lhe decidir no fundo quando falta a prova dos fatos em que deve se basear sua sentença e inclusive muitas decisões interlocutórias;

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Deve o juiz, em caso de dúvida, investigar qual dos contendores tinha o encargo

de produzir a prova e deve assumir os prejuízos de sua omissão.309 Portanto, o

ônus da prova, em seu aspecto objetivo, permite “que o juiz alcance o conteúdo

da decisão que deverá ser proferida em semelhante hipótese”.310

Essas duas perspectivas estão extremamente ligadas, visto que o

aspecto subjetivo deve ser conhecido para se aplicar o sentido objetivo do ônus

da prova.311 Apresenta relevância, uma vez que “saber a quem incumbe a prova é

uma medida necessária para se cobrarem as despesas que a atividade probatória

pode exigir e que devem ser feitas por ocasião de cada ato processual (art. 19 do

CPC)”.312

É importante também quando se trata dos poderes instrutórios do juiz,

posto que a conduta das partes (ônus subjetivo) interfere na postura do

magistrado. Devem o juiz e as partes colaborarem para a solução do litígio.

Tanto as partes quanto o juiz podem produzir provas para o processo.

Devem todos cooperar para a justiça das decisões, uma vez que é o objetivo

primordial do processo. A prova pertence ao processo e não às partes, e, a partir

do momento em que é produzida, sua iniciativa não apresenta qualquer

importância.

Quando a convicção do julgador se firmar apenas sobre a

verossimilhança das alegações, poderá reduzir a necessidade de provas de

é dizer, regula a decisão sobre o fato incerto ou desconhecido, pelo qual se considerou como sucedâneo da prova em geral e como questão de direito (não de fato) para distribuir a falta de certeza ou convencimento do juiz a respeito da matéria de fato. (ECHANDÍA, Hernando Devis. Teoría general de la prueba judicial. 5. ed. Bogotá: Temis S.A., 2002, t. I, p. 409)309 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 74. Para José Carlos Barbosa Moreira, “as regras que distribuem esse ônus são regras destinadas a ser aplicadas em relação aos fatos que afinal não se provam, que afinal não resultam provados. O juiz não tem que preocupar-se com as regras legais da distribuição do ônus da prova, a não ser no momento de sentenciar. Aí então, verificando que determinado fato não foi provado, ele terá que imputar a alguém as consequências desfavoráveis da falta da prova daquele fato; eis aí para que servem as regras sobre a distribuição do ônus da prova daquele fato. Se ele verifica que o fato não provado era o constitutivo, atribui ao autor as consequências nefastas dessa lacuna probatória. Se ele verifica que a prova faltante e a de fato impeditivo, modificativo ou instintivo, quem suportará as consequências melancólicas será o réu”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O juiz e a prova. Revista de Processo. a. 9, n. 35, p. 181, Abr.-jun. 1984).310 PACÍFICO, Luiz Eduardo Boaventura. O ônus da prova no direito processual civil. 2. Tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001,p. 135.311 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 317.312 Ibid., p. 318.

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acordo com a natureza do direito pleiteado e aplicar a regra do ônus da prova

para a formação do seu convencimento.313

No entanto, essa concepção não atenderá a todas as realidades.

Apesar de todos os esforços, existirão situações em que o julgador, ao final da

instrução, não terá a certeza das afirmações deduzidas pelas partes. Nesse caso,

aplicará o ônus da prova como regra de julgamento.314 Por isso, a regra do ônus

da prova aplica-se também às partes, não só ao juiz. Em caso de dúvida do

magistrado, deve utilizar o disposto no art. 333 do CPC como regra de decisão,

assim, é importante os contendores estarem cientes de que a prova dos fatos

constitutivos cabe ao autor, e a prova dos fatos impeditivos, modificativos ou

extintivos ao réu. Destarte, aquele que não produziu a prova de suas afirmações

estará sujeita a uma decisão desfavorável.

4.6.2 Distribuição estática do ônus da prova

O juiz não conhece os fatos, assim, em regra, é encargo das partes

produzir as provas de suas alegações. São os contendores que estão em contato

direito com a realidade, que podem trazer ao processo os melhores instrumentos

de reconstrução da verdade. Destarte, a legislação, seguindo essa premissa,

fixou como regra que incumbe à parte a prova de suas pretensões/exceções.315

Determina o art. 333 do Código de Processo Civil que:

O ônus da prova incumbe:

313 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 270. Acrescentam os autores que: “Quando a regra do ônus da prova passa a considerar a convicção diante do caso concreto, ela passa a ser responsável pela formação da convicção, que pode ser de certeza ou de verossimilhança. Ou melhor, pode ser de verossimilhança sem ser de dúvida. Como o convencimento antecede a decisão, não há como aceitar a ideia de que a regra do ônus da prova somente tem importância para permitir a decisão em caso de dúvida, e não para a formação do convencimento. Ora, o juiz que decide com base em verossimilhança não está em estado de dúvida; ao contrário, ele está convencido de que a verossimilhança basta diante das circunstâncias do caso concreto.”314 “O ônus da prova como regra de decisão se apresenta como destinada a viabilizar a decisão do juiz em caso de dúvida ou, em outros termos, a dar ao juiz não convencido a possibilidade de decidir”. (Ibid., p. 270).315 Sobre o assunto, trata Luiz Eduardo Pacífico. Perspectiva sistemática do momento de inversão do ônus da prova: do CDC ao CPC. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 54, n. 351, p. 43-55, jan. 2007.

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I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Como se percebe, a norma acima descrita distribui o encargo da

produção de provas entre as partes. Ao autor cumpre provar os fatos constitutivos

de sua pretensão. Ao ajuizar a ação, o autor objetiva o reconhecimento de seu

direito, para isso, no entanto, incumbe-lhe provar os fatos que entende gerador de

seu direito. Destarte, pode-se dizer fatos constitutivos aqueles que “dão vida a

uma vontade concreta da lei e à expectativa de um bem por parte de alguém”.316

Diante das afirmações do autor, o réu pode se defender negado os

fatos articulados na inicial ou apresentando fatos novos capazes de modificar o

direito do autor.317 Na primeira hipótese, tem-se a defesa direta, através da qual o

réu não tem qualquer ônus de prova; na segunda, no entanto, tem-se a defesa

indireta, que deve ser comprovada pelo mesmo.

Na defesa indireta, o demandado tenta modificar o direito do

demandante, apresentado fatos extintivos, modificativos ou impeditivos. Nessa

hipótese, é encargo do réu comprovar suas afirmações.

Os fatos extintivos “são os que fazem cessar uma vontade concreta da

lei e a consequente expectativa de um bem”.318 Afasta-se essa vontade concreta

da lei, afetando o direito do autor.

Por impeditivos, entendem-se os fatos de natureza negativa que

impedem ou negam a existência do fato constitutivo, afastando seus efeitos

jurídicos pretendidos pelo autor, a exemplo da incapacidade, violência, erro, dolo.

Os fatos modificativos são os que consideram a existência do fato

constitutivo, todavia pretendem modificá-lo, a exemplo da moratória e da novação.

Ambos reconhecem a existência da dívida, mas objetivam alterar sua forma de

pagamento.

316 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinhas: Bookseller, 1998, p. 22.317 Conforme lenciona Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “não há racionalidade em exigir que alguém que afirma um direito deva ser obrigado a se referir a fatos que impedem o seu reconhecimento pelo juiz. Isso deve ser feito por aquele que pretende que o direito não seja reconhecido, isto é, pelo réu. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de Conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 266)318 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinhas: Bookseller, 1998, p. 22.

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Observa-se que a nossa legislação processual civil previu regra de

distribuição estática do ônus da prova ao determinar que incumbe ao autor a

prova dos fatos constitutivos e ao réu a prova dos fatos impeditivos, modificativos

ou extintivos.

A sistemática adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro foi baseada

nas ideias de Chiovenda, que, vivendo em um período totalitário, inspirou-se no

sistema de justiça legal, para estabelecer, previa e rigidamente, o valor das

provas, impedindo o desrespeito aos direitos subjetivos.

Ocorre que essa repartição, na maneira como se apresenta, não

atende mais às necessidades do processo civil contemporâneo, cuja concepção

de efetividade e instrumentalidade do processo garante ao juiz a ampla

participação na instrução processual.

As regras estáticas de distribuição do ônus da prova de acordo com o

que está previsto em nosso Código de Processo Civil, de certo modo, impedem

às partes o pleno acesso à justiça. O que já se permite falar de uma nova teoria

dinâmica do ônus da prova.319

4.6.3 Inversão do ônus da prova

Existem situações especiais em que se afastam as regras prescritas no

art. 333 do CPC e procede-se a inversão do ônus da prova. Essa modificação de

encargos pode ser determinada por lei (ope legis), por determinação judicial (ope

judicis) ou por convenção das partes.

A inversão legal do ônus da prova320 se dá por determinação da lei,

sem levar em consideração a situação concreta ou mesmo a atuação do juiz.

Cita-se, como exemplo desse modelo, o art. 38 do Código de Defesa do

Consumidor. Trata-se de dispositivo que excepciona o art. 333 do CPC,

319 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 78.320 Na lição de José Roberto dos Santos Bedaque, “em todas as hipóteses de inversão legal do ônus da prova (em matéria de responsabilidade civil tal ocorre com frequência), visa-se facilitar o acesso de um dos litigantes à ordem jurídica justa”. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 89)

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distribuindo, de forma diversa, o ônus da prova, e não de norma de inversão do

ônus da prova, uma vez que deve ser considerada em abstrato.321

A inversão judicial deve ser considerada a verdadeira inversão do ônus

da prova, uma vez que depende do caso concreto e da atuação do juiz. Nesse

caso, tem-se uma técnica processual que decorre da apreciação subjetiva do

magistrado, que pretende proteger a parte que tem desmedida dificuldade na

produção da prova ou àquela menos favorecida na relação jurídica

processual.322Objetiva-se garantir às partes igualdade processual, através de

medidas que adequem o tratamento dispensado aos contendores de acordo com

sua desigualdade.

Observa-se, em algumas situações, que as partes não se apresentam

de forma isonômica no processo. Para alguns sujeitos processuais, a prova de

determinado fato é excessivamente difícil ou mesmo impossível diante de sua

realidade econômica e social. Destarte, em face desse desequilíbrio, o legislador

previu a possibilidade de inversão do ônus da prova a critério do juiz para que se

atenda ao princípio da igualdade e aos escopos do processo.

Ao inverter-se o ônus da prova, não se está fazendo pré-julgamento do

processo ou mesmo prévia avaliação das provas, mas apenas se alterando o

encargo da sua produção, devendo o fato ser provado pela parte adversária.323

Destsa feita, aquele que passou a ter o ônus da prova, caso não a produza, não

será automaticamente prejudicado, tão somente, assumirá o risco de uma decisão

desfavorável.

O Código de Defesa do Consumidor prevê, em seu art. 6º, inciso VIII,

como um dos direitos básicos do consumidor, a possibilidade de inversão do ônus

da provas nas relações de consumo. Para isso, o magistrado deverá analisar a

presença de algumas hipóteses, quais sejam: verossimilhança da alegação ou

hipossuficiência do consumidor, segundo as regras ordinárias de experiência.

321 Segundo Marcelo Abelha Rodrigues, “neste caso, não há inversão, mas determinação legal ou de que, nestas causas, o ônus de provar é sempre do fornecedor”. (RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Processual Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, v. 2, p. 188). Nesse sentido, Sérgio Luís Wetzel de Mattos afirma que a previsão do art. 38 do CDC estabelece uma distribuição ordinária do encargo probatório e não sua inversão ope legis. (MATTOS, Sérgio Luís Wetzel. Da iniciativa probatória do juiz no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 56).322 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 410.323 Ibid., p. 411.

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Não se trata de imposição da lei,324 mas de apreciação subjetiva do juiz

quanto à presença dos requisitos necessários à inversão. Essa análise deve ser

feita de acordo com o caso concreto, observando a verossimilhança325 das

alegações do consumidor ou sua hipossuficiência.

Considera-se que uma alegação é verrossímil, quando aparenta

traduzir a verdade dos fatos, baseada nos acontecimentos cotidianos. O juiz,

seguindo as regras de experiência, deve verificar se as alegações do consumidor

são verossímeis. Feita a constatação, deve presumi-las verdadeira, invertendo o

ônus da prova e incumbindo ao fornecedor a prova contrária.326

A segunda hipótese se dá, quando o magistrado reconhecer a

hipossuficência do consumidor.327 Este, como parte mais vulnerável na relação

jurídica processual, deve ter um tratamento diferenciado para que se garanta a

igualdade substancial no processo.

O consumidor, via de regra, é a parte mais fragilizada na relação de

consumo, “não dispõe do acesso às informações e aos elementos técnicos do

produto ou do serviço, enquanto, por outro lado, o fornecedor detém esses dados,

encontrando-se em melhor posição para fornecê-las ao juiz”.328

Destarte, a inversão do ônus da prova ao consumidor hipossuficiente

lhe garante a efetividade do acesso à justiça, já que, em se constatando sua

324 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 48.325 De acordo com Kazuo Watanaze, “o que ocorre, como bem observa Leo Rosenberg, é que o magistrado, com a ajuda das máximas da experiência e das regras da vida, considera produzida a prova que incumbe a uma das partes. Examinando as condições de fato com base nas máximas da experiência, o magistrado parte do curso normal dos acontecimentos e, porque o fato é ordinariamente a consequência ou pressuposto de um outro fato, em caso de existência deste, admite também aquele como existente, a menos que a outra parte demonstre o contrário. Assim, não se trata de uma autêntica hipótese de inversão do ônus da prova”. (WATANABE, Kazuo. Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 5. Ed. São Paulo: Forense Universitária, 1998, p. 617).326 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 80. Ver também KRIGER FILHO, Domingo Afonso. Inversão do ônus da prova: regra de julgamento ou de procedimento. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 53, n. 337, p. 53-64, Nov. 2005.327 Segundo Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, por hipossuficiência “deve-se entender a impossibilidade de prova – ou de esclarecimento da relação de causalidade – trazida ao consumidor pela violação de uma norma que lhe dá proteção – por parte do fabricante ou do fornecedor. A hipossuficiência importa quando há inesclarecibilidade da relação de causalidade e essa impossibilidade de esclarecimento foi causada pela própria violação da norma de proteção. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 278).328 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 412.

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situação, deve o juiz inverter o encargo probatório para determinar que a parte

contrária assuma o risco da produção da prova. Nesse momento, estará fazendo

uso de seus poderes instrutórios de ofício, exercitando sua atividade probatória

proativamente.

Para a caracterização da hipossuficiência, não se distingue seja o

consumidor rico ou pobre, esse requisito deve levar em conta a dificuldade da

produção da prova para o consumidor, não só quanto aos recursos financeiros,

mas também com relação ao acesso às informações técnicas,329 grau de cultura e

meio social.330

Com a aplicação do art. 6º, inciso VIII, do CDC, confere-se ao

consumidor uma vantagem processual, por isentá-lo do encargo de provar os

fatos constitutivos de seu direito, repassando para o fornecedor essa atribuição.331

Não se trata de uma regra de aplicação automática. A legislação, com

o objetivo de proteger o consumidor, facilitando sua defesa, estabeleceu que a

definição da inversão do ônus da prova ficaria a critério do juiz, à sua livre

apreciação subjetiva. No entanto, verificando a ocorrência de uma das duas

hipóteses, deve o magistrado aplicá-la.332

No que respeita ao momento da inversão do ônus da prova, alguns

doutrinadores sustentam que a inversão deve ocorrer já no despacho inicial.

Entretanto, tal posicionamento não deve ser adotado, posto que a inversão

ocorreria antes mesmo da citação do réu e do oferecimento da sua resposta.333

Uma segunda corrente considera que a inversão do ônus da prova

deve se dar na sentença, já que se trata de uma regra de julgamento. 334

A inversão do ônus da prova, contudo, trata-se de regra de processo e

não de regra de julgamento, devendo ser realizada antes da sentença, a fim de

329 Ibid., p. 415/416.330 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 50.331 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 413.332 Nesse sentido, Eduardo Cambi afirma que “verificando-se um desses pressupostos legais, o juiz tem o dever, não a mera faculdade, de inverter o ônus da prova, motivando as razões do seu convencimento (art. 93, inc. IV, CF)”. (Ibid., p. 417).333 Apud. CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 417/418.334 BEDAQUE, José Roberto dos Santos Bedaque. Poderes instrutórios do juiz. Op. cit., p. 84. PACÍFICO, Luiz Eduardo Boaventura. O ônus da prova no direito processual civil. Op. cit., p. 160.

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evitar surpresa para a parte fornecedora que assumirá o encargo.335 Ocorrendo,

apenas, na sentença, impossibilitaria à parte contrária de produzir a prova, já que

não tinha conhecimento do encargo, acarretando violação aos princípios do

contraditório e da ampla defesa.336

Ao se realizar antes da sentença, não constitui antecipação de

julgamento pelo magistrado, mas tão somente reconhecimento da existência de

uma das duas hipóteses previstas no art. 6, inc. VIII, do CDC.

Concluída a instrução do processo, o juiz não fica adstrito a um

julgamento desfavorável ao fornecedor, até mesmo porque a inversão do ônus da

prova inverte apenas o risco de uma decisão desvaforável. Além disso, o próprio

magistrado, investido de seus poderes instrutórios de ofício, poderá determinar a

produção de provas para a formação de sua convicção.

Não é objetivo do processo proteger uma parte em desfavor de outra,

mas apenas obter a realidade fática e, dessa forma, proferir uma decisão justa. O

magistrado deve buscar sempre o diálogo, a cooperação entre as partes para a

instrução do processo, por isso é indispensável essa postura ativa do juiz na

produção da prova.337

O juiz deve estar atento e diligente em busca das provas e da verdade

dos fatos. Uma decisão legítima é aquela que se baseia na verdade e restabelece

a realidade dos fatos. Com isso, é importante se garantir aos litigantes

oportunidades para a produção de provas e para o reconhecimento da veracidade

dos fatos. Logo, considerar a inversão do ônus da prova, uma regra de

julgamento, serviria exclusivamente ao comodismo das partes e não aos escopos

do processo.338

335 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 81.336 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 418. 337 “De minha parte, vou entendendo que o juiz deve estar atento às regras do ônus da prova e ao desempenho de cada uma das partes ao longo de toda a instrução da causa. A regra do diálogo, inerente à garantia constitucional do contraditório em sua feição moderna, integra o chamado ativismo judiciário e exige que o juiz esclareça as partes sobre os rumos da instrução, conclamando-as a completar provas”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 249).338 Como assevera Eduardo Cambi, “a exarcebação do ônus da prova, como regra de julgamento, contribui com a burocracia das decisões, estimulando o comodismo, próprio da visão conservadora do imobilismo judicial, dá ampla margem às injustiças, pois as partes ficam sujeitas à sua própria sorte, como se o processo fosse um mero jogo, no qual restaria ao Estado o papel de legitimação da barbárie, ratificando o poder do litigante mais astuto ou mais esperto. Conseqüentemente, o ônus da prova, como regra de julgamento, deve ser utilizado apenas

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A fim de evitar violação os princípios constitucionais do processo, a

inversão do ônus da prova deve ser determinada na fase de saneamento do

processo, na audiência preliminar ou em despacho saneador. Em sendo o caso

de passado o saneamento do processo, o magistrado verificar que há hipótese de

inversão, deverá oferecer oportunidade de manifestação à parte contrária, para

que esta exercite seu direito de defesa.339

Por fim, tem-se a inversão convencional do ônus da prova, a qual é

permitida pelo parágrafo único do art. 333 do CPC, quando recair sobre direito

disponível e for possível o exercício do direito pela parte.

No caso de inversão convencional do ônus da prova, não se modifica a

livre apreciação das provas pelo magistrado,340 apenas quem deve assumir o risco

pela ausência da prova em juízo.341 Não há violação ao princípio do livre

convencimento do juiz, “as partes, de comum acordo, resolvem alterar as regras

da lei, de maneira que uma delas passe a fazer o que cumpria à outra realizar”.342

Para evitar abusos que violasse o direito à prova, o parágrafo único do

art. 333 do CPC estabeleceu limites à convenção sobre a distribuição do ônus da

prova, prevendo ser nula a convenção quando recair sobre direito indisponíveis

da parte ou tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

Em complementação às disposições do parágrafo único do art. 333, do

CPC, o art. 51, inciso VI, do CDC, determina a nulidade da claúsula que

estabelecer a inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor.343

Apesar dos direitos disponíveis serem de livre deliberação das partes,

a norma ainda determina que só será possível a convenção sobre o ônus da

prova, quando não tornar excessivamente difícil o exercício do direito a uma

parte. Buscou o legislador, com isso, resguardar a igualdade de tratamento entre

excepcionalmente, quando frustradas as tentativas de trazerem-se aos autos elementos suficientes de convencimento”. (CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 419/420).339 Ibid.,p. 420.340 Para CHIOVENDA, “a inversão convencional do ônus da prova restringe o poder de decisão do juiz”. (CHIOVENDA, Giusseppe. Instituições de direito processual civil. Campinhas: Bookseller, 1998, v. 2. p. 327).341 Ibid., p. 405.342 DEDA, Artur Oscar de Olivera. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. .25.343 Ibid., p. 25.

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os contendores, evitando-se maiores injustiças344 e resguardando-se a paridades

de armas no processo.

Ao determinar a inversão do ônus da prova e tornando excessivamente

difícil a realização da prova pela parte, estar-se-ia garantindo benefício para um

em prejuízo de outro, o que fere, sobretudo, o princípio da isonomia processual.345

Excessivo não quer dizer impossível. A dificuldade de inversão do ônus

da prova, que é excessiva para um dos sujeitos processuais,346 pode não ser para

o outro, que tem melhores condições de produzir a prova. “Excessivamente difícil”

é a prova que apresenta grau de dificuldade maior para ser fornecida,

ultrapassando a normalidade,347 que deve ser evitada, a fim de se garantir a

paridades de armas no processo e o efetivo acesso à ordem jurídica justa.

4.6.4 Distribuição dinâmica do ônus da prova

Como anteriormente exposto, a produção da prova objetiva levar o juiz

a alcançar a convicção sobre os fatos em litígio. Dessa forma, previu o CPC que,

em caso de dúvida, deve o magistrado valer-se das regras do ônus da prova para

decidir o pleito. Tal postura, no entanto, deve ser uma exceção em razão da

busca da efetividade do processo, já que apenas uma decisão baseada na

realidade fática poderá garantir a tutela jurisdicional efetiva.

344 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 407.345 Nesse sentido, manifesta-se Eduardo Cambi: “Como o processo não serve para tutelar o litigante mais hábil, mas aquele que tem razão, fazendo justiça no caso concreto, deve a lei evitar convenções abusivas que violem a isonomia processual”. (Ibid., p. 407).346 Segundo Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “a regra que o autor deve provar o que alega, que é o fundamento do procedimento ordinário, não é adequada a todas as situações carentes de tutela. Quando é impossível ou muito difícil a demonstração da alegação, não se deve exigir um grau de certeza incompatível com a situação concreta, devendo ocorrer a “redução do módulo da prova”, aceitando-se um grau de verossimilhança suficiente, ou a verdade possível. De nada adianta permitir alegar se ao autor é impossível, ou muito difícil, provar”. (MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil, v 5: do processo de conhecimento, arts. 332 a 363, tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 200). 347 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 408.

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Ocorre que nem todas as situações podem ser fixadas pelo legislador.

Existem casos particulares em que a observância das regras do ônus da prova

previstas no art. 333 do CPC afastaria à parte do acesso à justiça.

É certo que existe desigualdade entre os litigantes no processo. “Não

raro a dificuldade de provar é tão grande para uma das partes, que a exigência da

produção da prova pode sacrificar o direito”.348 Nesse caso, o juiz proferirá uma

decisão desfavorável em relação àquele que tinha o ônus de provar, a qual, por

sua vez, poderá ser injusta.349

Diante dessa realidade, a doutrina tem flexibilizado as regras do ônus

probatório, possibilitando a inversão do encargo em situações não previstas

expressamente na lei, quando o juiz entender necessária para garantir a justa

composição do litígio.350

Trata-se de uma nova distribuição dinâmica das provas,351 em que se

objetiva conferir à parte que tem melhores condições de produzir a prova

necessária a demonstração do fato.

Essa nova teoria surgiu na Argentina, através dos autores Jorge W.

Peryano e Augusto M. Morello que se basearam nos princípios da veracidade,

boa-fé, lealdade e solidariedade. Defende-se que, levando em conta as

circunstâncias do caso concreto, deve se atribuir o ônus da prova àquele que tem

condições de fazê-lo, independentemente da natureza dos fatos ou da posição

das partes.352

Segundo essa concepção dinâmica, o ônus da prova é distribuído entre

as partes de acordo com seu conhecimento técnico sobre o fato ou sua maior

348 DEDA, Artur Oscar de Olivera. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 24.349 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 53.350 No entender de Tereza Arruda Alvim, “se se entendesse a teoria do ônus da prova do modo tradicional, em que se reconhecia ao juiz um papel menos ativo especialmente no momento da produção de provas, o verdadeiro acesso à justiça ficaria, então, comprometido”. (ALVIM, Tereza Arruda. Reflexões sobre o ônus da prova. In CRUZ E TUCCI, José Régio (Coord.). Processo civil: estudos em comemoração aos 20 anos de vigência do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 245).351 Para João Batista Lopes, “a aplicação prática da teoria das cargas dinâmicas da prova exige, porém, especial cuidado e critério do juiz ante os riscos da indiscriminada flexibilização das regras do art. 333 do CPC”. (LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 52).352 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 91. Ver também OLIVEIRA, Breno Duarte Ribeiro de. A flexibilização das regras de distribuição do ônus da prova no processo civil brasileiro. Recife: Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), 2008. (Dissertação de Mestrado).

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capacidade de produzi-lo,353 sem observar a natureza do fato probando, mas tão

somente o caso concreto.

Adotando-se tal teoria, o magistrado mantém-se como gestor das

provas, mas tem seus poderes ampliados, uma vez que lhe compete analisar

quem detém melhores possibilidades de fornecer a prova.354

O juiz, aplicando as regras de experiência comum, previstas no art. 335

do CPC, afasta as regras estáticas e inflexíveis de distribuição previstas no art.

333 do CPC, para, de acordo com o caso concreto, determinar quem tem maior

facilidade de produção da prova, “evitando que uma das partes se mantenha

inerte na relação processual porque a dificuldade da prova a beneficia”.355

Essa moderna teoria dinâmica de distribuição do ônus da prova reflete

a preocupação com a cooperação no processo, que deve se dá em todos os

momentos, inclusive na instrução processual.

O magistrado, preocupado com a efetividade de sua decisão, não deve

poupar esforços para a reconstrução dos fatos envolvidos no litígio. Para isso,

deve valer-se de seus poderes instrutórios de ofício previsto no art. 130 do CPC.

Da mesma forma, é dever das partes colaborar com o Poder Judiciário para o

descobrimento da verdade, conforme determinar o art. 339 do mesmo Diploma

Legal.

É importante destacar que o juiz deve manifestar-se sobre distribuição

dinâmica do ônus da prova em audiência preliminar ou por meio de despacho

saneador, determinando a quem compete o encargo probatório. Nesse caso, a

353 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 341.354 De acordo com Luiz Guilherme Marinoni, “não existe motivo para supor que a inversão do ônus da prova somente é viável quando prevista em lei. Aliás, a própria norma contida no art. 333 não precisaria estar expressamente prevista, pois decorre do bom senso ou do interesse na aplicação da norma de direito material, que requer a presença de certos pressupostos de fato, alguns de interesse daquele que postula a sua atuação e outros daquele que não deseja vê-la efetivada. (...). Da mesma forma que a regra do ônus da prova decorre do direito material, algumas situações específicas exigem o seu tratamento diferenciado. Isso pela simples motivo de que as situações de direito material não são uniformes. A suposição de que a inversão do ônus da prova deve estar expressa na lei está presa à idéia de que qualquer incremento do poder do juiz deve estar definido na legislação, pois de outra forma estará aberta a possibilidade de o poder ser utilizado de maneira arbitrária”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Formação da convicção e inversão do ônus da prova segundo as peculiaridades do caso concreto. Genesis: Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, PR, v. 10, n. 38, out./dez. 2005, p. 727).355 CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 342.

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inversão deve ser anunciada para que as partes possam se preparar e evitar

decisões surpresas.356

Ao escolher quem tem melhores condições de produzir provas, o

magistrado não estará prejulgando ou violando sua imparcialidade.

Esse novo modelo foi incorporado ao Código Modelo de Processos

Coletivos para Ibero-América que, em seu art. 12, §1º, dispõe:

O ônus da prova incumbe à parte que detiver conhecimentos técnicos ou informações específicas sobre os fatos, ou maior facilidade em sua demonstração. Não obstante, se por razões de ordem econômica ou técnica, o ônus da prova não puder ser cumprido, o juiz determinará o que for necessário para suprir à deficiência e obter elementos probatórios indispensáveis para a sentença de mérito, podendo solicitar perícias à entidade pública cujo objeto estiver ligado à matéria em debate, às custas da mesma. Se assim mesmo a prova não puder ser obtida, o juiz poderá ordenar sua realização, a cargo ao Fundo de Direitos de Grupo.

O nosso sistema processual civil só prevê a distribuição estática, no

entanto, a partir de uma interpretação sistemática, a doutrina e a jurisprudência

têm reconhecido a teoria da carga dinâmica da prova, sob o fundamento de

proteção aos princípios da isonomia (art. 125, inc. I do CPC), da solidariedade

(art. 14, inc. I, 339 340, 342, etc., CPC), da boa-fé e lealdade processual, do

devido processo legal e do acesso à justiça.

Essa teoria, contudo, não deve ser aplicada irrestritamente. Ao

contrário, trata-se de uma excepcionalidade, quando a produção da prova pela

parte que detém o encargo que é excessivamente difícil ou impossível.

4.6.5 O ônus da prova e os poderes do juiz

356 Como ensinam Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, “essa repartição casuística e dinâmica do ônus da prova deve ser feita pelo magistrado antes da fase instrutória, em tempo de a parte onerada desincumbir-se do encargo, sob pena de se comprometer a segurança jurídica das partes e o seu direito fundamental à prova, como já salientado no estudo da inversão do ônus da prova. Trata-se de regra de atividade e, não, de julgamento”. (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 95).

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Ao se estudar o ônus da prova, pode-se, à primeira vista, pensar que a

atividade probatória no processo cabe tão somente às partes que, segundo o art.

333 do CPC, detêm o encargo de levar aos autos as provas dos fatos alegados,

sob pena de não obter uma decisão favorável.

Todavia, diante da nova concepção publicista de processo, em que

este passou a ser visto como instrumento da jurisdição, não se pode mais limitar a

produção de provas à exclusiva participação das partes. O juiz moderno teve seus

poderes ampliados, a fim de também contribuir para a busca da verdade e, dessa

forma, garantir uma prestação jurisdicional justa. 358

Só a partir da reconstituição dos fatos de acordo com a realidade, o

magistrado estará capacitado para decidir o pleito e cumprir sua função precípua.

As normas de distribuição do ônus da prova, em seu aspecto subjetivo,

são consideradas regras de condutas e se aplicam aos contendores. Por seu

turno, em seu sentido objetivo, constituem normas de julgamento de aplicação do

magistrado. Elas não constituem limites aos poderes do juiz, mas apenas

orientações para o julgamento em caso de dúvida e só devem ser aplicadas após

esgotados todos os esforços em busca da verdade dos fatos. É dever do juiz

buscar a verdade e, através dela, alcançar a justiça.

Destarte, não existe incompatibilidade entre as regras distribuição do

ônus da prova e os poderes instrutórios do juiz. Deve o magistrado agir de forma

a instruir o processo, a fim de ampliar sua cognição. Somente quando não

suficientemente provados os fatos,359 o juiz se valerá das regras de repartição do

ônus probatório por ocasião do julgamento final.

Com o reconhecimento da moderna teoria da carga dinâmica da prova,

debatida em tópico anterior, ampliam-se ainda mais os poderes do juiz, uma vez

que compete a ele o reconhecimento da parte que detém melhores condições de

produção da prova à luz do caso concreto.

Conclui-se que o acesso do juiz aos fatos ocorre por meio das provas

trazidas aos autos, de forma que a análise de algumas noções sobre as provas é

imprescindível para solucionar as dificuldades a surgirem no decorrer da

358 PESSOA, Flávia Moreira. As regras de divisão do ônus da prova e os poderes do juiz. Genesis: Revista de Direito Processual Civil. Curitiba, PR. n. 29. julho/setembro 2003, p. 493.359 OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 153.

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reconstrução dos fatos objeto do litígio, uma vez que tal matéria apresenta-se

decisiva para o desenvolvimento do processo.360

360 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O juiz e a prova. Revista de Processo.a. 9, n. 35, p. 178, Abr.-jun. 1984.

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5 PROATIVIDADE – ALCANCE E LIMITES DOS PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ NO PROCESSO CIVIL

Como sujeito do processo, é importante estudar a atividade do juiz,

seus poderes no processo.361 O juiz, consciente de seu papel perante a

sociedade, não pode se contentar com a realidade atual do Poder Judiciário.

Diante de sua inquietude e insatisfação, deve agir para reparar as falhas dessa

instituição.

No exercício de sua função jurisdicional, o magistrado precisa de

poderes, ao mesmo tempo que também possui deveres e responsabilidades.362

Primeiramente, destaca-se que esta dissertação se restringe ao estudo

da atividade probatória proativa do juiz na instrução processual civil, através do

exercício de seus poderes instrutórios. Todavia, para uma melhor abordagem do

tema, apresentar-se-á a relação entre os poderes do magistrado e a efetividade

do processo, além de algumas classificações dos poderes do juiz no processo

civil, aprofundando a análise quanto aos poderes instrutórios.

Para tanto, o juiz é considerado representante do Estado, não sendo

observado em sua figura individual. Ele integra a relação jurídica processual como

o Estado no exercício da função jurisdicional.363

Ao vedar a autotutela, o Estado tomou para si a concretização do

direito, quando não observado. É a ele que se dirige o particular, a fim de obter a

sua pretensão.364 São os juízes, singulares e coletivos, que representam o Estado

no exercício da função jurisdicional.

O julgamento, no campo do direito, dá-se de forma impositiva e

autoritária, compelindo, a quem for vencido, o cumprimento da decisão. Como

ensina Pontes de Miranda: “Não só o juiz declara a incidência do direito; não só

361 “Conforme já foi dito, o Juiz, representando o Estado, é um sujeito processual. Atua como dirigente do órgão que fica equidistante dos demais sujeitos e com a responsabilidade de solucionar o litígio”. (DELGADO, José Augusto. Sujeitos do processo. Revista de Processo. n. 30. Ano VIII. Abr.-jun. 1983, p. 66).362 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 73. No mesmo sentido, MARTINS, Nelson Juliano Schaefer. Poderes do juiz no processo civil. São Paulo: Dialética, 2004, p. 169363 MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas: Millennium, 1999, v. II, p. 125.364 MIRANDA, Pontes. Comentários ao código de processo civil. tomo II: arts. 46 a 153. 3. ed. rev. e aument.Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 365-366.

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ele o aplica, pois que não foi aplicado, a despeito da incidência. Mas só ele o

declara e aplica autoritativamente”. 365

Hodiernamente, em razão da ineficiência das instituições sociais, a

sociedade busca a Justiça com a perspectiva de ter seus direitos realizados.

Contudo, o que se observa, na atualidade, é que, diante da ausência de

efetividade da tutela jurisdicional, especialmente em razão da morosidade ou

mesmo das desigualdades sociais que se apresentam no processo, tem-se

recorrido cada vez mais a meios alternativos de justiça.366 O que demonstra a

importância do reforço dos poderes do juiz no processo, para que este,

exercendo-os plenamente, possa atender aos anseios da população.

Não há uma definição precisa ou mesmo uma enumeração legislativa

do que sejam os poderes do juiz. Trata-se de conceito indeterminado367, cuja

interpretação fica a critério do magistrado.

Por se tratar de um conceito indeterminado, a delimitação da definição

dos poderes do juiz se dá de acordo com os valores sociais do momento histórico

em que se encontra. Dessa forma, na atualidade, diante de uma visão publicística

e intrumentalista de processo, amplia-se a liberdade do julgador para definir o

alcance de seus poderes, observando sempre a finalidade do processo.

Não se pode confundir liberdade de interpretação do juiz com

discricionariedade.368 Aqui, a ideia de poderes do juiz constitui norma aberta, cujo

365 Ibid., p. 366.366 Com propriedade, afirma José Renato Nalini que: “A questão é muito mais séria do que se possa pensar. Não é apenas o grande capital que foge da Justiça convencional e adota arbitragem, mediação e outros mecanismos alternativos. Grupos à margem da lei assumem o papel da Justiça e se tornam as instâncias preferidas dos injustiçados. O jornalista Chico Siqueira, na reportagem “Novas escutas revelam que ‘tribunais’ do PCC julgam até ‘pequenas causas’”, no Jornal O Estado de São Paulo de 17/2/2008 – p. C1 e C3, observa que “eles começaram resolvendo disputas entre presos. Agora, são comerciantes e moradores de bairros dominados pelo tráfico que recorrem aos ‘tribunais’ do Primeiro Comando da Capital. São pessoas que não acreditam ou não tiveram problemas solucionados pela polícia ou Justiça. O pior é que a inteligência da Polícia Civil constatou que os tribunais são procurados agora por pessoas sem ligação com o PCC. É mais um espaço que o Estado deixa de ocupar com efetividade e cede à desenvoltura de organizações à margem do reconhecimento estatal”. (NALINI, José Renato. A rebelião da toga. 2. ed. Campinas: Millennium, 2008, p. 212).367 Para Karl Engisch, conceitos jurídicos indeterminados são conceitos cujo conteúdo e extensão são em larga medida incertos, carecendo de um preenchimento valorativo por parte do magistrado para concretizá-lo e fazer incidir a vontade do legislador. (ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 5. ed. Lisboa: Fundação Caluste Gulbenkian, 1964, p. 173-178).368 De acordo com José Carlos Baptista Puoli, a liberdade conferida ao juiz para preenchimento dos conceitos jurídicos indeterminados não se confundem com atividade discricionária, “pois não se trata de fazer uma opção entre duas alternativas igualmente válidas segundo o ordenamento jurídico, mas sim, de integrar o sentido da norma por intermédio da complementação de seu conteúdo com aquilo que é a única opção válida em conformidade com os valores éticos e sociais

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conceito deve ser fixado pelo magistrado de acordo com os valores da sociedade,

diferentemente do poder discricionário em que, através de uma atividade

valorativa, o magistrado realiza uma escolha entre duas opções válidas segundo

sua livre concepção pessoal.369

Outrossim o juiz, no exercício de sua função jurisdicional, deve

exercitar plenamente seus poderes, sejam eles discricionários ou vinculados, mas

sempre com a finalidade de oferecer ao jurisdicionado a concretização do seu

direito e a paz social, buscando atingir a efetividade processual.

5.1 Os poderes do juiz e a efetividade do processo

Seguindo a ideia de tripartição de funções lançada por Montesquieu,370

a Constituição Federal de 1988 repartiu seus poderes em Legislativo, Executivo e

Judiciário, independentes e harmônicos entre si (art.2º, CF).

Essencialmente, a finalidade do Poder Judiciário é julgar, a qual é

realizada pela atividade de juízes e tribunais devidamente investidos, de acordo

com as normas constitucionais.

O juiz no processo é um dos sujeitos da relação jurídica processual,

devendo dirigi-lo, julgar e comandar a efetivação dos direitos.371 No entanto, além

de integrante da relação jurídica processual, o juiz é também a personificação do

Poder Judiciário em atividade.372

Como função primeira e essencial, o juiz não pode se abster de julgar,

sendo dele esse poder-dever, conforme preceitua o art. 126 do CPC.373 A

que devem ser canalizados pelo juiz para dentro do processo”. (PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 74.)369 ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 5. ed. Lisboa: Fundação Caluste Gulbenkian, 1964, p. 182.370 NOBREGA, Vanessa Andrade Dantas L. da. O papel do juiz na condução da instrução do processo: um novo paradigma. Revista Dialética de direito processual. São Paulo, n. 64, p. 122, 2008.371 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. v. 2. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 220. 372 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 65.373 “No Estado Constitucional, o juiz tem o dever de decidir em atenção à juridicidade estatal, atribuindo sentido ao caso concreto e conformando a legislação a partir da supremacia da Constituição e dos direitos fundamentais”. (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel.

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legislação veda o non liquet e determina que o magistrado não pode deixar de

sentenciar ou despachar, sob qualquer alegação.

Entretanto, a atividade do juiz não se limita a decidir. Para garantir a

sua finalidade de prestar a tutela jurisdicional, o juiz deve dirigir o processo,

proferindo despachos, designando audiências, determinando a produção de

provas.374 É do juiz o “dominus processus”,375 ou seja, é do juiz o “papel

preponderante” no processo, sendo de sua competência a condução daquele.376

Todavia, não mais interessa ao Estado-juiz, apenas, prestar a tutela

jurisdicional às partes para sua mera satisfação.377 Como agente político no

exercício de uma função pública, o juiz deve trabalhar para garantir a efetividade

do processo.

Através da efetividade, pretende-se alcançar “a realização do Direito, o

desempenho concreto de sua função social”.378 Assim, processo efetivo é aquele

que é capaz de “cumprir integralmente toda a sua função sócio-político-jurídica,

atingindo em toda a plenitude todos os seus escopos institucionais”.379

Ademais, o processo, para a doutrina mais moderna, não é mais

considerado, apenas como um duelo de atos e relações entre os litigantes, “senão

pelo ângulo externo a partir do qual seja possível sentir a sua utilidade”.380

O mundo moderno procura garantir a efetividade do processo que

significa, substancialmente, a busca pela garantia eficiente e adequada dos

direitos do homem em via judicial.381 Essa ideia de efetividade, no entanto, não é

nova, pois já se dizia que “na medida do que for praticamente possível, o

Código de processo civil comentando artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 174-175).374 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. v. 2. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 228.375 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v. 1. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 225.376 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual. v. 1. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 329.377 PUOLI, José Carlos Baptista. Os poderes do juiz e as reformas do processo civil. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2001, p. 21.378 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas – limites e possibilidades da Constituição brasileira. 8. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 82. 379 DINAMARCO. Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12.ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 330.380 DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. Tomo I, 5. Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 592.381 Ibid., p. 592. Acrescenta o autor, “uma tutela jurisdicional sem efetividade não é, na realidade, tutela alguma” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. v. 2. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 232)

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processo deve proporcionar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente

aquilo que ele tem o direito de obter”.382

Ocorre que o Poder Judiciário, enquanto exercente da função

jurisdicional, muitas vezes, não atende às expectativas das partes de garantir o

constitucional direito de acesso à justiça.383 Ao se ater aos dogmas ultrapassados,

afasta-se dos valores do Estado Democrático de Direito, mostrando-se obsoleto e

antiquado.

Em face da nova perspectiva mundial, o Poder Judiciário, através da

jurisdição, deve garantir o bem da sociedade.384 Dessa forma, o processo,

enquanto instrumento de concretização de direitos, deve ser utilizado para

resguardar os escopos do Estado.385

Como órgão do Estado no exercício da função jurisdicional, o juiz deve

almejar a justa composição do litígio, assegurando a paz social.386 Ele deve atuar

para garantir a efetividade do processo, realizando o direito e fazendo cumpri-lo.

No entanto, para que possa realizar sua função de forma plena, é

imprescindível que detenha largos poderes no processo, “sem os quais não lhe

seria possível conhecer, decidir e dar execução às decisões, satisfazendo, desse

modo, a prestação jurisdicional visada pelo processo” 387.382 CHIOVENDA, Giuseppe. “Dell’azione nascente deal contratto preliminares”. In Saggi di direito processuale civile. Roma: Foro Italiano, 1930, p. 110. Apud. DINAMARCO. Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12.ed. ver. e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 331.383 Como lenciona Cândido Rangel Dinamarco, “o Estado falha ao dever dispensar tutela jurisdicional a quem tem direito a ela (e tem direito à tutela jurisdicional que, no processo, demonstra ter razão: v. infra, nn 422 e ss) quando, inadmite o sujeito em juízo, quando conduz mal o processo, quando julga equivocadamente e também quando, não-obstante haja julgado muito bem, não confere efetividade prática a seus julgados”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do processo civil moderno. Tomo I, 5. Ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 593)384 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 11.385 Ensina José Roberto dos Santos Bedaque que “estabelecido que a instrumentalidade do processo deve ser concebida em função do ordenamento jurídico-substancial criado pelo Estado, e cuja preservação encontra nele o maior interessado, impossível aceitar a intransigente defesa que a maioria da doutrina brasileira faz da inércia judicial no tocante à investigação probatória, postura muito comum principalmente quando os direitos em questão são disponíveis. Não há como conciliar as duas conclusões. Se o objetivo da atividade jurisdicional é a manutenção da integridade do ordenamento jurídico, deve o magistrado desenvolver todos os esforços para alcançá-lo, pois somente se tal ocorrer, a jurisdição terá cumprido sua função social. E, como o resultado da prova é, na grande maioria dos casos, fator decisivo para a conclusão do órgão jurisdicional, deve ele assumir posição ativa na fase investigatória, não se limitando a analisar os elementos fornecidos pelas partes, mas procurá-los, quando entender necessário.” (Ibid., p. 13).386 “Leibman já advertia que o fim último da atividade do juiz é a justiça. Ao lado e por meio dela, a paz social será atingida”. (LIEBMAN, Enrico Tullio. Manualle di diritto processuale. Milano: Giuffré: 1973, v. 1. Trad. Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p. 5 e 35.)387 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual. v. 1. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 329. Acrescenta Sérgio Alves Gomes que é indispensável para se atingirem os

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É dos magistrados, no exercício de sua função jurisdicional, que a

sociedade espera receber a tutela jurisdicional justa e efetiva, fazendo do

processo um instrumento de realização da justiça. Dessa forma, é indispensável

um juiz ativo, participativo, detentor de amplos poderes no processo e cônscio de

seus deveres perante a sociedade.388

Ademais, a transformação do processo do qual decorreu sua

publicização389 acarretou uma maior participação do juiz no processo, garantindo-

lhe maiores poderes a serem exercitados com o intuito de alcançar a justiça das

decisões e a pacificação social.390

No entanto, para se garantir a efetividade processual, faz-se mister que

se extraiam, além de velhos conceitos burocráticos e formalistas, os costumes

obsoletos que dificultam a adoção de uma nova postura por parte dos juízes. É

preciso, por conseguinte, modificar, além das normas, princípios e concepções,

também o pensamento do magistrado, para que se rompa a barreira do

imobilismo e, então, alcance realmente a efetividade do processo.391

escopos do processo, “que o juiz, ao dirigi-lo, assuma com amplitude os poderes que lhe são conferidos para tanto. Se assim fizer, será realmente um diretor do processo, a atitude contrária fará dele um mero espectador do feito. Por outro lado, se não respeitar os limites fixados pela lei ao poder por ele exercido, fará papel de ditador”. (GOMES, Sérgio Alves. Os poderes do juiz na direção e instrução do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 243).388 Conforme salienta Luiz Guilherme Marinoni, “com o surgimento da democracia social, intensifica-se a participação do Estado na sociedade e, por consequência, a participação do juiz no processo, que não deve mais estar preocupado com o cumprimento das “regras do jogo”, cabendo-lhe agora zelar por um processo justo, capaz de permitir (a) a justa aplicação das normas de direito material, (b) a adequada verificação dos fatos e a participação das partes em um contraditório real e (c) a efetividade da tutela dos direitos, pois a neutralidade é mito, e a inércia do juiz, ou o abandono do processo à sorte que as partes lhe derem, não é compatível com os valores do Estado atual”. (MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 66). Nesse sentido, acrescenta Ada Pellegrini Grinover, “hoje, quando o processo civil caminha para uma profunda transformação, o juiz há de saber assumir um papel mais ativo, sem perder sua imparcialidade. Assim deve ser, em um processo comum que se queira célere, social, democrático, assistencial” (GRINOVER, Ada Pellegrini. A independência do juiz brasileiro. Revista de Processo, São Paulo,a. 10, n. 39, p. 95-96, Jul.-set. 1985).389 É certo que “a publicização do processo é um caminho irreversível do direito processual civil”. (MAZZEI, Rodrigo. Código civil de 2002 e o judiciário: apontamentos na aplicação das claúsulas gerais. In: DIDIER JR, Fredie; MAZZEI, Rodrigo. (Org.). Reflexos do novo Código Civil no direito processual. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2007. p. 46).390 Para Fritz Baur, “o papel ativo do juiz é visto em estreita relação com a reivindicação de uma razoável aceleração do processo e com a função social deste”. (BAUR, Fritz. O papel ativo do juiz. Revista de Processo, São Paulo, a. 7, n.27, p. 187, Jul.-set. 1982).391 Nas palavras de Dalmo de Abreu Dallari, “a primeira grande reforma que deve ocorrer no Judiciário, e sem dúvida a mais importante de todas, é a mudança de mentalidade. (...) Ainda é comum ouvir-se um juiz afirmar, com orgulho vizinho da arrogância, que é “escravo da lei”. E com isso fica em paz com sua consciência, como se tivesse atingido o cume da perfeição, e não assume responsabilidade pelas injustiças e pelos conflitos humanos e socais que muitas vezes decorrem de suas decisões”. (DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 84.

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5.2 Classificação dos poderes do juiz

O juiz, como representante do Poder Judiciário no exercício da

jurisdição, dispõe de diversos poderes, necessários para o desenvolvimento do

processo. Esses poderes legitimam a realização de atos pelo juiz, mas,

concomitantemente, constituem deveres deste para com as partes.392

A classificação dos poderes do juiz no processo não apresenta

unanimidade na doutrina. Por isso, apresentar-se-á a opinião de alguns

doutrinadores, sem, contudo, almejar esgotar a matéria.

Moacyr Amaral Santos classifica os poderes do juiz em poderes

jurisdicionais e de polícia; estes considerados para assegurar a ordem dos

trabalhos forenses, evitando perturbações ou ameaças; aqueles decorrentes

essencialmente do exercício da função jurisdicional.

Qualifica, ainda, os poderes jurisdicionais de acordo com sua

finalidade, dividindo-os em: (a) poderes ordinatórios ou instrumentais, baseado no

tipo de provimento a ser obtido no processo; (b) poderes instrutórios, destinados à

arrecadação de provas para o processo, a fim de formar seu convencimento; (c)

poderes finais ou decisórios finais que se dividem em poderes decisórios

propriamente ditos, ou seja, do qual resultam a decisão final do processo e

poderes satisfativos ou executórios.393

Vicente Miranda, por sua vez, adota outra classificação para os

poderes do juiz, dividindo-os em poderes no processo e fora do processo.

Estando o conceito de jurisdição e processo lógica e faticamente relacionados,

este deve ser o critério para dividir as diversas atribuições do juiz. A classificação

392 Para Cândido Rangel Dinamarco, “desde quando a própria realização da justiça passou a ser vista como um dever e não um favor ou graça, sendo objeto de solene promessa constitucional (acesso à justiça), os poderes desse sujeito processual não são puros poderes, mas poderes-deveres. (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. v. 2. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 229)393 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual. v. 1. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1998, p. 330/331)

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apresentada leva em conta a finalidade do ato judicial praticado ou a ser

praticado394.

No exercício dos poderes fora do processo, o juiz somente praticará

atos administrativos, correcionais ou legislativos.395 Já os poderes no processo ou

jurisdicionais são aqueles que atingem diretamente o processo, produzindo

efeitos de constituição, desenvolvimento e extinção da relação processual.396

Esses poderes se dividem em: (a) ordinatórios que dão movimento ao processo;

(b) geral de direção, segundo o qual o juiz despacha e decide com a finalidade

última e essencial de dirigir o processo. Constitui o poder através do qual o juiz

conduz o processo, controlando e fiscalizando a atividade das partes397; (c)

instrutório, pelo qual o juiz decide sobre a conveniência da prova, determina sua

realização e procede sua apreciação; (d) decisório, exercido quando o magistrado

julga uma questão posta a sua apreciação que poderá ser processual ou de

mérito; (e) executório, que objetiva o cumprimento coercitivo da decisão.398

Carnelutti classifica os poderes do juiz em “potestades finais” e

“potestades instrumentais”, sem fazer distinção quanto ao tipo de processo.399 No

exercício dos poderes finais, o juiz presta uma tutela jurisdicional final, através de

uma decisão ou de uma medida satisfativa. Por sua vez, os poderes instrumentais

são aqueles utilizados para resolver incidentes processuais ou determinar o

desenvolvimento do processo.400

Distinguiu também os poderes do juiz em vinculados e discricionários.

Enquanto os poderes discricionários conferem ao juiz liberdade na valorização

das provas, de acordo com sua reprodução, os poderes vinculados limitam a

atividade do julgador, impedindo de considerar existentes fatos não afirmados por

394 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 119.395 Ibid., p. 74.396 Ibid., p. 75.397 Ibid., p. 120.398 Ibid., p. 125.399 CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. v.1. Campinas: Servanda, 1999, p.344.400 Sérgio Alves Gomes cita como exemplo da classificação dos poderes do juiz adotada por Carnelutti , “uma coisa é por exemplo, que o juiz decida a lide da pretensão discutida, e outra coisa que resolva um incidente; uma coisa que estabeleça o tempo e o modo da venda do bem embargado, e outra coisa que entregue o bem embargado ao credor”. (GOMES, Sérgio Alves. Os poderes do juiz na direção e instrução do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 43)

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uma das partes ou de considerar existentes fatos afirmados por uma da parte

quando não resultarem das provas dos autos.401

Para Frederico Marques402, os poderes do juiz classificam-se em

jurisdicionais, exercidos dentro do processo, e administrativos, realizados ao redor

do processo, a fim de garantir o seu regular desenvolvimento.

Os poderes jurisdicionais se subdividem em instrumentais ou

ordinatórios e decisório final, através dos quais o juiz soluciona incidentes

processuais, dando continuidade ao processo ou soluciona definitivamente o

litígio, prestando a tutela jurisdicional aos contendores. Já os poderes

administrativos são compostos pelo poder de polícia processual, exercido para

garantir a ordem dos trabalhos forense403 e o poder disciplinar executado em face

dos auxiliares subordinados.

As classificações debatidas demonstram a ausência de enumeração

legislativa404 e de unidade da doutrina. Apesar de não apresentarem uniformidade,

observar-se entre elas alguns pontos em comum, quanto à essência dos poderes

do juiz.

Em regra, todos os poderes conferidos ao magistrado decorrem do

exercício da jurisdição e são viabilizados para que se possa garantir a aplicação

do direito ao caso concreto. O juiz é, apenas, o representante do Estado no

processo. Assim, quando a lei determina que o juiz realize alguma atividade,

confere-lhe poderes, que, na realidade, constituem poderes-deveres do juiz.405

Por ser o representante do Estado no exercício da jurisdição, o juiz,

essencialmente, detém poderes jurisdicionais, os quais são praticados no curso

do processo, para cumprimento de seus escopos.

401 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 107.402 MARQUES, Frederico Marques. Instituições de direito processual civil. Campinas: Millennium, 1999, v. II, p. 137.403 Conforme ensina Frederico Marques, “ao juiz incumbe manter a ordem no desenrolar do processo, evitando e reprimindo atos tumultuários que dificultem a realização da atividade processual das pessoas que intervêm e atuam nas causas submetidas ao pronunciamento jurisdicional do Estado. Para isso, exerce o magistrado poderes de polícia processual, resguardando, assim, o decorro e o bom funcionamento da Justiça”. (Ibid.,p. 138). Esse poder de polícia, como definido por Frederico Marques, manifesta-se em nosso Código de Processo Civil através do art. 445. 404 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 73.405 GOMES, Sérgio Alves. Os poderes do juiz na direção e instrução do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 47.

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Ao mesmo tempo que detém poderes jurisdicionais, através dos quais

realiza sua função de prestar a tutela jurisdicional, o juiz possui também poderes

fora do processo, considerados poderes administrativos, utilizados para auxiliá-lo

em seu mister.

Para o regular desenvolvimento do processo, o magistrado, através de

seus poderes jurisdicionais, determina o andamento do iter processual, dirige a

atividade das partes, o que faz por meio dos seus poderes ordinatórios. Para

prestar a tutela jurisdicional efetiva e cumprir com eficiência sua função, necessita

de elementos capazes de formar seu convencimento sobre os fatos debatidos no

processo, nesse caso, estará exercendo seus poderes jurisdicionais instrutórios.

E, finalmente, concluído o processo, o juiz não pode deixar de proferir seu

julgamento. O nosso ordenamento jurídico veda o non liquet e determina que o

juiz não se exima de sentenciar ou despachar sob qualquer alegação. Dessa

forma, está o magistrado investido do poder jurisdicional decisório, de exercício

imprescindível para a função jurisdicional.

Apesar da relevância de todos os poderes conferidos ao juiz, a

dissertação ora em destaque limita-se a aprofundar o estudo acerca dos poderes

jurisdicionais instrutórios de ofício, os quais almejam a reconstrução verdadeira

dos fatos, sendo indispensáveis para a formação do convencimento judicial.

5.3 Poderes instrutórios do juiz

A atividade probatória proativa do juiz dá-se, principalmente, durante a

instrução do processo. Nesse momento processual, o juiz deve exercer todos os

seus poderes instrutórios para esclarecer a verdade dos fatos e, então, realizar

um julgamento justo.

5.3.1 A instrução do processo

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As partes deduzem fatos e normas em juízo, os quais serão

considerados pelo juiz no momento de sua decisão. Dessa forma, é importante

que os contendores demonstrem a ocorrência dos fatos suscitados, a fim de

formar o convencimento judicial.406

Para que se alcance uma decisão justa, é necessário que o juiz

compreenda a realidade fática verdadeira que desencadeou o conflito.407 Ocorre

que “a ideia de verdade e de justiça são relativas e dependem do contexto em

que estão inseridas.” 408

Nem sempre a verdade fática e verdade processual se encontram,

ocasionando julgamentos equivocados e injustos. Por isso, é primordial a atuação

ativa do magistrado em busca da verdade.409 “Quanto maior sua participação na

atividade instrutória, mais perto da certeza chegará. Ou seja, deve o juiz ir à

procura da verdade; tentar descobri-la.” 410

No entanto, através do processo se chega apenas à convicção da

verdade, já que a verdade é inatingível pelo processo.411 É preciso reconhecer

que o pleno reconhecimento da verdade fática é impossível através do processo,

atingindo-se tão somente uma verdade possível.412 O magistrado não pode se ater 406 Como ensina Vicente Miranda, “quem precisa ser convencido da verdade dos fatos alegados no processo é o juiz, vale dizer, aquele que, formada sua convicção, julgará. Daí a razão pela qual “destinatário da prova é o juiz. As afirmações de fatos, feitas pelos litigantes, se dirigem ao juiz, que precisa e quer saber a verdade quanto aos mesmos. Para esse fim é que se produz a prova, na qual o juiz irá formar sua convicção. O juiz é o destinatário principal e direto: na convicção que formar assentará a sentença.” (MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 208).407 De acordo com Gian Antonio Micheli e Micheli Taruffo, “no processo, com efeito, a verdade não é um fim por si mesma, mas é necessário buscá-la enquanto condição para que haja uma justiça “mais justa””. (MICHELI, Gian Antonio; TARUFFO, Micheli. A prova. Trad. Teresa Celina de Arruda Alvim. Revista de Processo, São Paulo, a. 4, n.16, p. 155-168, out.-Dez. 1979).408 NOBREGA, Vanessa Andrade Dantas L. da. O papel do juiz na condução da instrução do processo: um novo paradigma. Revista Dialética de direito processual, São Paulo, n. 64, p. 123, 2008.409 Para Dinamarco, “a atitude do juiz, curioso diante dos fatos a apurar, constitui fator de boa instrução no processo e, portanto, elemento positivo quanto à efetividade dos seus resultados institucionais”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 353).410 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 14.411 MARINONI, Luiz Guilherme. A questão do convencimento judicial. Revista de Doutrina da 4ª Região, n. 17. Porto Alegre, abr. 2007. Disponível em ://revistadoutrina.trf4.gov.br/artigos/edicao017/Luiz_Marinoni.htm. Acesso em: 7 maio de 2007. No texto, acrescenta o autor que “o juiz, para por fim ao conflito, deve estar convicto, dentro das suas limitações, a respeito da verdade, uma vez que a sua essência é impenetrável”. 412 “Neste sentido é o entendimento de Hermes Zaneti Júnior, ao afirmar a impossibilidade de se atingir a verdade absoluta no processo, sendo possível, no máximo, atingir um juízo de

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à busca incessante pela verdade absoluta e deixar de decidir por não atingir a

convicção plena, devendo diligenciar para atingir a certeza, no entanto pode

contentar-se com a probabilidade, sob pena de inviabilizar o provimento final.413

Sendo difícil ou mesmo impossível alcançar-se a verdade fática ou

absoluta, é imprescindível a atuação do juiz e das partes em busca do

convencimento, da certeza da verdade. Por isso, além de destinatário da prova, o

juiz deve participar ativamente da instrução, uma vez que detém o poder de

instruir.414

Entende-se por instrução a fase processual em que se forma a ampla

cognição das questões deduzidas em juízo. Na instrução, o juiz fixa as provas,

deferindo ou não sua realização, a requerimento das partes; determina de ofício

sua produção e realiza sua apreciação. Nessa fase, inclui-se toda a atividade do

juiz, seja de ofício ou por iniciativa das partes, capaz de acumular elementos para

formação de seu convencimento.415

Durante a instrução reúnem-se as provas e arrecadam-se elementos

aptos a formar a certeza do juiz sobre a verdade dos fatos. Trata-se de um

momento de preparação do juízo para decidir, pelo que se deve incluir, nessa

fase, o debate das partes por meio das alegações, que não são consideradas

pelo Código de Processo Civil (art. 454).416

De sorte que a fase instrutória não se concentra de forma perfeita em

um único momento do processo de conhecimento. Pode-se dizer de instrução, os

atos processuais que se realizam entre a decisão de saneamento (que será oral,

probabilidade ou verdade provável.” (ZANETI JÚNIOR, Hermes. O problema da verdade no processo civil: modelos de prova e de procedimento probatório. Genesis: Revista de Direito Processual Civil. Curitiva, PR, v. 8, n. 31, p. 34-68, jan./mar. 2004).413 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 390-391.414 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 208. Nesse sentido, afirma José Roberto dos Santos Bedaque que “como o resultado da prova é, na grande maioria dos casos, fator decisivo para a conclusão do órgão jurisdicional, deve ele assumir posição ativa na fase investigatória, não se limitando a analisar os elementos fornecidos pelas partes, mas procurá-los, quando entender necessário”. (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 13)415 DINAMARCO. Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12.ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 285.416 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 249.237. Acrescenta Carnelutti que “a exposição das razões e das provas, em que à primeira vista parece esgotar-se a instrução, não constitui mais que a última fase dela, a qual vai precedida de uma fase preparatória que exige, não só a ação das partes, como também uma colaboração ativa entre as partes e o juiz”. (CARNELUTTI, Francesco. Instituições de processo civil. Campinas: Servanda, 1999, v. 2, p. 43).

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após frustada a conciliação em audiência preliminar) e a audiência de instrução e

julgamento.417 Nesse iter processual, desenvolvem-se atos de cooperação entre o

juiz e as partes para que se promova a instrução do processo.

5.3.2 Natureza jurídica dos poderes instrutórios do juiz

Os poderes instrutórios do juiz no processo constituem um poder-dever

do magistrado e não apenas uma faculdade.418

Na realidade, “o poder instrutório do juiz” constitui um conceito aberto,

indeterminado, que adquire forma através da realidade social da época, das

decisões tomadas, apresentando-se dinâmico e em constante definição. Não se

trata de um poder discricionário, mas de um conceito jurídico indeterminado, à

medida que seu conteúdo e alcance não se encontram concretizados,

necessitando de preenchimento valorativo.

A missão do juiz é fazer justiça e, para isso, devem ser conferidos

amplos poderes instrutórios, de modo que, no exercício de sua função, o

magistrado alcance a verdade e, através dela, a justiça de sua decisão.

Nesse caso, havendo provas para melhor esclarecer os fatos em litígio,

o juiz tem o poder-dever de determinar sua realização de ofício.419 Não cabe ao

magistrado avaliar a conveniência ou oportunidade da realização de certa prova;

417 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 55.418 Afirma Carlos Aurélio Mota de Souza que “os poderes que incumbe ao juiz são intrinsecamente deveres, sem os quais não poderia exercer plenamente o comando jurisdicional, que o Estado lhe delegou”. (SOUZA, Carlos Aurélio Mota de Souza. Poderes éticos do juiz (a igualdade das partes no processo e a repressão ao abuso processual). Revista de Processo, São Paulo, a. 12, n. 46, p. 53, Abr.-jun. 1987).419 Para Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “o juiz, portanto, tem o dever de esclarecer os fatos, aplicando o art. 130 do CPC e, só após julgar com base na regra do ônus da prova. (...). Ademais, é sempre bom lembrar que o juiz que se omite em decretar a produção de uma prova relevante para o processo estará sendo parcial ou mal cumprindo sua função. Já o juiz que determina a realização da prova de ofício, especialmente porque lhe deve importar apenas a descoberta da “verdade”, e não aquele que resulta vitorioso (o autor ou o réu), estará voltado apenas para a efetividade do processo”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 290).

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presentes a igualdade entre os litigantes e a necessidade de busca da verdade,

deve deferi-la.420

Ao mesmo tempo que constitui um poder-dever do magistrado, os

poderes instrutórios do juiz são também garantia às partes de auxílio na atividade

de instrução do processo. Com efeito, apesar da liberdade do juiz ao exercer seus

poderes instrutórios de ofício, esse poder não é discricionário, posto que não se

baseia nos critérios de conveniência e oportunidade, mas sim, na necessidade de

formação do convencimento judicial.

O magistrado tem o dever de proferir sua decisão.421 Dessa forma, tem

também o dever de atuar para reconstruir os fatos objeto do litígio e, através das

provas produzidas, formar seu convencimento e, então, proferir sua decisão,

cumprindo efetivamente sua missão de dizer o Direito no caso concreto.

5.3.3 Poderes instrutórios do juiz em geral

O direito processual civil brasileiro confere ao juiz o poder de dirigir a

instrução do processo. Esse poder manifesta-se, principalmente, através do art.

130 do CPC que, de uma forma generalizada, atribui ao magistrado o poder-dever

de determinar a produção de provas de ofício.

A expressão “poder instrutório” tem uma acepção genérica,

significando não apenas o poder de determinar de ofício esta ou aquela prova,

mas também o de exigir a colaboração de todos, o de dirigir a instrução, o de

420 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 86.421 Acrescenta Luciana Amicucci Campanelli que “ao julgar a lide quando há insuficiência probatória, seja pela ausência de provas pelas partes ou inação judicial, fatalmente a sentença pronunciará o non liquet, caracterizando, assim, a denegação da justiça”. (CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 86).

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valorar as provas, com a finalidade última de instruir.422 Através dele, o magistrado

pode provocar e movimentar todas as provas que entenda necessária para a

formação de seu convencimento.423

As partes têm o interesse de vencerem a demanda, mas é o juiz quem

dará a decisão final. Para que tal decisão seja justa, faz-se mister que se chegue

o mais perto possível dos fatos que deram ensejo ao litígio.424

Através das provas, reconstrói-se a realidade fática exposta pelas

partes e por meio delas o juiz poderá formar seu convencimento, por isso é ele o

destinatário final da prova e compete-lhe conduzir a sua produção, observando os

princípios e normas atinentes à matéria. Não se privou às partes de sua iniciativa

probatória, apenas se ampliou ao juiz tal possibilidade, a fim de resguardar o

interesse público do processo.

Como já afirmado, o alicerce dos poderes instrutórios do juiz está no

art. 130 do CPC que determina que caberá ao juiz de ofício determinar a

realização das provas necessárias à instrução do processo. Aqui, o magistrado

encontra fundamento para uma atuação proativa na busca da verdade dos fatos,

para que possa garantir a pacificação com justiça.

No exercício de seus poderes instrutórios de ofício, o juiz dispõe de

ampla faculdade, tanto para conduzir o processo, como para determinar a

realização de provas, tudo com o desiderato de melhor formar sua convicção

sobre os fatos a serem apreciados.425

422 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 208.423 MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 398.424 Como afirma Vallisney de Souza Oliveira, “embora seja muito difícil chegar à certeza, o juiz não pode posicionar-se mais como sujeito passivo, que fica inerte à espera da desenvoltura das partes na arena do processo. Exige-se-lhe o dinamismo para a descoberta do real cenário do conflito, se possível trazendo ou mandando trazer para o mundo dos autos fatos exteriores à relação processual, mas de que teve conhecimento, mesmo de ofício. Ao Estado-Juiz só a verdade interessa e a verdade processual depende dessa atividade de averiguação do que realmente aconteceu em relação à controvérsia. A prova é pedida e produzida em função do julgador, por isso ele não pode ficar no trono da passividade e esperar o livre jogo entre autor e réu para, no final, somente no fim de tudo, proferir o veredicto”. (OLIVEIRA, Vallisney de Souza. Audiência, instrução e julgamento. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 27).425 De acordo com Teresa Arruda Alvim, “na fase probatória, segundo essa nova visão, deve o juiz agir concomitantemente e em condições de igualdade em relação às partes: ordenar que se faça uma perícia, ouvir as partes, ouvir e reouvir testemunhas. Na atividade do juiz, tem-se a garantia de que estar-se-á buscando a verdade”. (ALVIM, Tereza Arruda. Reflexões sobre o ônus da prova. In CRUZ E TUCCI, José Régio (Coord.). Processo civil: estudos em comemoração aos 20 anos de vigência do Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 245).

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Cabe ao interessado decidir se quer ou não recorrer ao Poder

Judiciário para garantir a sua pretensão. É das partes a iniciativa quanto à

propositura da ação e seus limites, são elas que apresentam os fatos a serem

julgados ao final do processo. No entanto, a partir da propositura da ação, é do

juiz o impulso processual, para, ao final, proferir uma decisão com base no

conjunto probatório constante dos autos. Destarte, sendo o destinatário final da

prova, cabe-lhe fixar o seu objeto.

No contexto da instrução processual, o poder de instrução do

magistrado manifesta-se através da fixação do objeto da prova, do deferimento ou

indeferimento das provas requeridas pelas partes e do controle da sua

produção.426

Conforme determina o §2º do art. 331 do Código de Processo Civil, na

audiência preliminar, após frustada a tentativa de conciliação e julgadas as

questões processuais pendentes, o juiz deve fixar os pontos controvertidos da

demanda, aqueles fatos relevantes, pertinentes e questionados que merecem a

produção de provas para maiores esclarecimentos.427

Não sendo o caso de realização de audiência preliminar, o juiz deverá

sanear o processo, conforme dispõe o §3º do art. 331 do CPC, fixando os pontos

controvertidos. Nesse caso, as partes devem ser intimadas, oportunizando a sua

manifestação.428

Também está incluso dentre os poderes instrutórios do juiz o de deferir

ou indeferir as provas. O art. 130 do CPC é explícito ao afirmar que caberá ao

juiz, a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do

processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Por

conseguinte, é imprescindível para o deferimento da prova que seja necessária e

que influencie no convencimento do magistrado.429 Quis o legislador afastar a

426 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 212.427 Afirma Luiz Guilherme Marinoni que “é muito importante definir se o fato controvertido representa fato constitutivo, impeditivo, modificativo ou extintivo, uma vez que o autor tem o ônus de provar o primeiro, e o réu o ônus de provas os demais (art. 333 do CPC)”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 248)428 Ibid.,p. 249.429 GOMES, Sérgio Alves. Os poderes do juiz na direção e instrução do processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 251.

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realização de provas inúteis, desnecessárias ou meramente protelatórias, a fim de

evitar a demora no deslinde do processo, onerando as partes e o Estado.430

Ao admitir ou não a realização da prova, o juiz apreciará a necessidade

e conveniência da sua produção. Essa decisão, por sua vez, não tem efeito

preclusivo e pode ser revista posteriormente, já que tem finalidade pública.431

Deferida a prova, ela será produzida, em regra, em audiência (art. 336

do CPC), competindo ao juiz proceder direta e pessoalmente à colheita, controle e

fiscalização de todo o procedimento probatório.432 O magistrado deve agir

ativamente, a fim de garantir sua produção regular, ofertando paridade de armas

às partes no processo.

Ao lado do poder de deferimento ou não das provas requeridas pelos

demandantes, o juiz detém também o poder de livre iniciativa para a produção de

prova, ou melhor, o poder instrutório de ofício, segundo o qual, conforme

determina o art. 130 do CPC, caberá ao juiz de ofício determinar as provas

necessárias à instrução do processo.

Observa-se que o referido artigo confere ao magistrado amplos

poderes para determinar a produção de provas, caso entenda necessário.433 No

entanto, deve-se fazer uma leitura ampla do dispositivo para compreender que o

legislador quis conferir às partes e ao juiz o poder de esclarecer a verdade

processual, a possibilidade de cooperação entre os sujeitos da relação jurídica

processual na produção de provas.

5.3.4 Poderes instrutórios específicos

430 Ibid., p. 252.431 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 215.432 Ibid., p. 215.433 Dessa forma, como ensina Cappelletti, “o processo deixou de ser “coisa das partes” e aboliu-se o poder monopolístico dos litigantes em matéria probatória; deixa-se ainda às partes o direito exclusivo de escolher entre pedir e não pedir a tutela jurisdicional e de determinar os limites essenciais da ação; mas o proceder foi subtraído da disposição das partes; instaurado o processo civil, o modo, o ritmo e o impulso desse processo se sujeitam à direção do juiz”. CAPPELLETTI, Mauro. La oralidad y las pruebas em el processo civil. Trad. Santiago Sentis Melendo. Buenos Aires: EJEA, p. 122-123.

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Os poderes instrutórios do juiz não se limitam à prescrição insculpida

no art. 130 do CPC, irradiando-se em vários dispositivos do sistema processual

civil brasileiro. Destarte, têm-se também os poderes instrutórios específicos, que

se encontram estabelecidos de forma esparsa na legislação processual civil.

Não se trata de poderes especiais,434 mas de poderes “expressamente

concedidos” 435 ao juiz pelo ordenamento jurídico, os quais têm caráter meramente

exemplificativo.436

5.3.4.1 Interrogatório informal437

É a parte que tem maior conhecimento sobre os fatos em litígio. É ela

quem está em contato direto com a realidade e as demais provas necessárias

para a formação da convicção judicial. Logo, mostra-se de grande relevância o

interrogatório das partes para o efetivo esclarecimento da controvérsia judicial.

O Código de Processo Civil, em seu art. 342, estabelece que o juiz

pode determinar de ofício o interrogatório das partes em qualquer estado do

processo.438

Não se trata de depoimento pessoal, já que, nesse caso, é necessário

o requerimento da parte contrária, mas de interrogatório, em que o juiz buscará

esclarecer os fatos relevantes para o deslinde do feito.439 434 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 224.435 AMENDOEIRA JÚNIOR, Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 118.436 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 56.437 Também pode ser chamado de interrogatório livre ou interrogatório de esclarecimento. (LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.102).438 Acrescenta Moacyr Amaral Santos que “pelo interrogatório se esclarecem alegações das partes, quando imprecisas ou inseguras, fixam-se os fatos dependentes de prova, justificam-se os meios de prova a serem empregados, extraem-se argumentos probatórios, além do que, conforme as respostas do interrogado, podem resultar confissão de fatos, fornecimento ao juiz de condições para bem decidir, inclusive para desde logo proferir julgamento de mérito”. (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v.2, 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 160).439 Ensina Luiz Guilherme Marinoni que “neste caso, o objetivo premente do instituto não é o de obter prova para o processo, mas, mais propriamente, o de esclarecer o juiz dos fatos da lide”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao Código de Processo Civil, v 5: do processo de conhecimento, arts. 332 a 363, tomo I. São Paulo: Revista dos

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Baseado nos princípios de que cabe ao juiz a direção do processo e no

de imediatidade entre ele e as partes, o juiz, no exercício de seu poder instrutório

de ofício, está autorizado a interrogá-las, pessoalmente, sobre os fatos da

causa.440

O interrogatório informal, apesar de estar disposto no capítulo sobre

provas, não tem específica finalidade probatório. Sua função primeira é colocar o

juiz em contato direto com as partes, para que obtenha uma melhor compreensão

sobre os fatos da causa, para bem decidi-la.441

Não se pretende, com o interrogatório informal, formar o

convencimento do julgador sobre os fatos da causa, senão permitir entre ele e os

litigantes um contato pessoal que melhor elucide o litígio, possibilitando um

julgamento mais justo.

Percebe-se também, de forma secundária, uma função probatória para

o interrogatório informal, à medida que os esclarecimentos apresentados servirão

ao magistrado como considerações lógicas e psicológicas para a valoração do

conjunto probatório. Permite-se, por conseguinte, ao juiz obter, por meio do

interrogatório informal, argumentos de prova para formação de sua decisão

final.442

O comparecimento da parte ao interrogatório se dá pessoalmente.443

Ao contrário do depoimento pessoal da parte, a sua ausência ao interrogatório

informal não produz a confissão ficta.444 Da mesma forma, não pode o juiz

determinar a condução coercitiva da parte, posto que “não existe dever legal de

comparecimento, mas simples ônus de fazê-lo”.445

A ausência da parte ao interrogatório livre, mesmo não acarretando

sanções diretas, pode trazer-lhe prejuízos, já que assumirá o risco da decisão

desfavorável por não ter fornecido os esclarecimentos necessários ao deslinde da

Tribunais, 2000, p. 260).440 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. v.2, 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 161.441 ECHANDIA, Hernando Devis. Teoria general de la prueba. Tomo 1. 5. Ed. Bogotá: Temis S.A.:2002, p. 546.442 Ibid., p. 547-548.443 “No es concebible este interrogatório con el apoderado judicial de la parte, porque pierde su finalidad esencial”. (Ibid., p. 546.)444MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 225.445 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 108.

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causa,446 além de violar o dever processual de expor os fatos em juízo conforme a

verdade (Art. 14, I, CPC).

O interrogatório da parte poderá se realizar em qualquer momento

processual, desde a instauração da relação jurídica processual até o julgamento

final, de forma única ou múltipla, a critério do magistrado.447 Além disso, admite-se

a inquirição de incapaz,448 já que não há possibilidade de pena de confissão.

Nesse caso, não se permite a imposição de consequências negativas ao

interrogado, mas tão somente que o juiz, analisando o conjunto probatório,

confronte as provas obtidas com os esclarecimentos fornecidos no interrogatório

para melhor formar sua convicção.449

Como tem a função de esclarecer os fatos da causa, “no interrogatório

livre apenas ao juiz é dado o poder de iniciativa no questionamento”.450 Pode o

magistrado, se entender necessário ou conveniente, oportunizar a manifestação

das partes, em observância ao princípio do contraditório.

5.3.4.2 Prova documental

É princípio do direito probatório que cabe à parte que alega produzir as

provas das suas alegações. No que toca à prova documental, deve ser produzida

446 Para Amendoreira Júnior, no entanto, as partes não têm apenas o ônus, mas o dever de comparecer ao interrogatório livre designado pelo juiz. “Para nós, porém, trata-se de um dever das partes de modo que o juiz, independentemente do resultado do processo, deve considerar essa conduta como afronta ao disposto no art. 340, I, do CPC (dever da parte de comparecer e responder o que lhe for perguntado), podendo ser aplicado o art. 18 do CPC por falta a este dever processual”. (AMENDOEIRA JÚNIOR, Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 118)447 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 314. Acrescenta Pontes de Miranda que “mesmo após a publicação da sentença de mérito, pode ser determinado o depoimento para corrigir inexatidão material, ou retificar erro de cálculo, ou em embargos de declaração (art.s 463-465). (MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 306).448 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil.v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 103.449 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 347.450 DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v. 2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 103.

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pelas partes já na fase postulatório, devendo, quanto aos fatos constitutivos do

autor, ser apresentada em conjunto com a petição inicial (art. 283 do CPC) e, em

relação aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos suscitados pelo réu,

acompanhar a contestação (art. 396 do CPC).

No entanto, assim como pode determinar o interrogatório da parte a

qualquer momento, o juiz também pode ordenar ex officio a juntada posterior de

documentos.

De acordo com o que prescreve o art. 355 do CPC, o juiz pode ordenar

a exibição de documento ou coisa que se ache em poder da parte.451 Tem-se, de

acordo com o dispositivo, a possibilidade do juiz atuar por requerimento da parte

ou fazê-lo de ofício.452

Em sendo uma atividade instrutória de ofício, ter-se-á apenas um

incidente processual, devendo a parte ou terceiro interveniente453 proceder à

realização do ato determinado pelo juiz, sob pena de incidir nas sanções legais

pelo descumprimento (art. 461 ou 14, V, CPC).

A determinação de exibição do documento pelo juiz é compulsória,

sendo procedida quando houver recusa da parte em apresentar documento ou

coisa que se repute necessário para o julgamento da demanda.454 No entanto, não

está a parte obrigada a produzir provas contra si, quando tal exibição possa

causar-lhe risco de sofrer ação penal. Esse limite não se estende, contudo, ao

risco de prejuízos cíveis, devendo a parte exibir os documentos exigidos, mesmo

em caso de danos processuais. 451 Ensinam Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira que “a depender da circunstância de o documento ou coisa estar em mãos da parte adversária ou de terceiro particular, o procedimento a ser seguido será distinto, porque distinta será a natureza jurídica do instituto em cada caso: contra a parte adversária, ter-se-á um incidente processual; contra o terceiro particular, um verdadeiro processo incidente.” Acrescentam, ao final, que “será, porém, mero incidente processual, se a ordem de exibição dirigida ao terceiro for determinada de ofício pelo juiz”. (Ibid., p. 177)452 “Ponham-se lado a lado o art. 130, o art. 355 e o art. 360. O primeiro atribui ao julgador o poder de determinar de ofício as provas necessárias para a instrução da causa, não limitando tal poder a este ou àquele meio de prova. Ora, onde a lei não distingue, não cabe ao intérprete distinguir. O segundo usa a expressão geral “pode ordenar” sem condicionar essa providência ao requerimento da parte. E o terceiro não alude a provocação da parte”. (MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 226)453 “O assistente litisconsorcial, o opoente, o nomeado à autoria, o denunciado à lide e o chamando ao processo participam do processo como parte. O artigo em comento, contudo, não atinge o assistente simples que é terceiro e jamais poderá ser admitido como parte. Esse se submete à ação de exibição (art. 360, CPC). MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 358.454 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 331.

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Outro exemplo de poderes instrutórios específicos do juiz está previsto

no art. 382 do Código de Processo Civil que afirma: “O juiz pode, de ofício,

ordenar à parte a exibição parcial dos livros e documentos, extraindo-se deles a

suma que interessar ao litígio, bem como reproduções autenticadas”.

Ocorre que, nessa hipótese, pela leitura do art. 381 do CPC, constata-

se que o magistrado está limitado ao requerimento da exibição parcial dos livros e

documentos comerciais, só podendo extrair deles a suma que interessar ao litígio

ou reproduções autenticadas.455 O referido dispositivo estabelece que só a

requerimento da parte pode o juiz determinar “a exibição integral daqueles

livros”.456

No caso de exibição parcial dos livros e documentos tal exigência se

aplica tanto à parte quanto ao terceiro, uma vez que este tem o dever de cooperar

com o Poder Judiciário, de acordo com o que determina o art. 341 do CPC.457

Prevê ainda a legislação processual civil (art. 399) o poder do juiz de

requisitar às repartições públicas, em qualquer tempo ou grau de jurisdição,

certidões necessárias à prova das alegações das partes, bem como os

procedimentos administrativos nas causas em que forem interessados a União, o

Estado, o Município ou as respectivas entidades da administração indireta.

Tem-se, aqui, a exigência de exibição de documentos por parte do

Poder Público, a qual poderá se dar por requerimento da parte ou mesmo de

ofício, sempre com a finalidade de contribuir para a formação do convencimento

judicial.458 455 “Distinguem os arts. 381 e 382 a exibição integral e a exibição parcial dos livros comerciais e dos documentos do arquivo. Aquela só se permite se a outra parte, ou a própria empresa de que são, requer a exibição. O juiz, de ofício, somente pode ordenar à parte que exiba parte dos livros e documentos, já no arquivo ou ainda não arquivados.” (MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. Tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 383)456 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 56.457 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 375.458 Como ensinam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, “o dever de colaboração dos órgãos públicos no esclarecimento dos fatos que estão à sua disposição (com especial ênfase em relação aos órgãos notariais) decorre não apenas da legislação processual civil ( arts. 339, 341 e 399), mas, preponderantemente, do texto da Carta Constitucional. Efetivamente, conforme se tem do estabelecido no art. 5º, XXXIII, “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado”. Nessa mesma linha, segue o art. 5º., XXXIV, b, da Lei Maior, a dizer que a todos é assegurado, independentemente do pagamento de qualquer taxa, “a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal”. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Comentários ao

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Vale ressaltar que, mesmo a prova sendo produzida por iniciativa do

juiz, através da sua atividade probatória de ofício, é imprescindível atender-se ao

disposto no art. 398 do CPC e conferir prazo de 5 (cinco) dias às partes para sua

manifestação, garantindo-se o respeito ao princípio do contraditório e, por

conseguinte, a validade da prova.459

5.3.4.3 Prova testemunhal

A testemunha é uma pessoa estranha à relação jurídica processual que

tem conhecimento sobre os fatos debatidos no processo e que é convocada pelo

Poder Judiciário para prestar depoimento, sob o compromisso de dizer a

verdade.460 A testemunha traz aos autos sua versão sobre o modo como

ocorreram os fatos relevantes para a resolução da causa.461

Mesmo sendo terceiro estranho ao processo, a testemunha tem o

dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade (art.

339 do CPC), prestando informações ao juiz sobre os fatos ou circunstâncias de

que tenha conhecimento (art. 341, inciso I do CPC). Dessa forma, o seu não

comparecimento acaretar-lhe-á a condução coercitiva, além da responsabilidade

pelas despesas do adiamento da audiência (art. 412 do CPC).

O Diploma processual civil fixa em 10 (dez) o número máximo de

testemunhas a serem arroladas por cada uma das partes. Contudo, a referida

legislação conferiu ao magistrado o poder de dispensar as testemunhas que

extrapolarem o máximo de três para a prova de cada fato (art. 407, parágrafo

Código de Processo Civil, v 5: do processo de conhecimento, arts. 364 a 443, tomo II. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 252-253).459 AMENDOEIRA JÚNIOR, Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 119.460 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p.228.461 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 389.

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único, CPC). Havendo excesso de testemunhas sobre cada fato, cabe a parte

escolher aquelas que prestarão depoimento. Ao juiz, só compete intervir quando a

parte não as escolher. “A escolha é pela parte; a dispensa é pelo juiz”.462

Objetiva-se evitar a oitiva de testemunhas desnecessárias e

protelatórias e garantir a celeridade processual. No entanto, “tal poder há de ser

utilizado com muita cautela, pois pressupõe como condição a prova suficiente de

cada fato por aquelas três testemunhas”.463

De acordo com o caput do art. 416 do Código de Processo Civil, o juiz

tem o poder de interrogar primeiramente a testemunha, facultando-se,

posteriormente, às partes a formulação de reperguntas.464 Nesse caso, o

advogado elabora a pergunta, a qual será ou não deferida pelo juiz e, sendo

deferida, será reformulada à testemunha. Em seguida, o juiz dita as respostas das

testemunhas que serão reduzidas a termo.465 Assim, é de destacar que, no

exercício de seus poderes instrutórios, o juiz “preside à inquirição, interroga a

testemunha e redige seu depoimento”.466

Quanto à prova testemunhal, detém ainda o magistrado o poder

instrutório específico de ordenar de ofício a inquirição de testemunhas referidas

nas declarações da parte ou das testemunhas (art. 418, inciso I do CPC) e a

acareação de duas ou mais testemunhas ou de alguma delas com a parte,

quando houver divergência em suas declarações sobre pontos importantes do

processo (art. 418, inc. II do CPC).

5.3.4.4 Prova pericial

462 MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 445.463 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 229.464 Como lecionam Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, “o protagonista da inquirição é o juiz, cabendo às partes a função coadjuvante de complementar ou esclarecer o depoimento”. (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil.v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008. p. 201.)465 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 380.466 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 230.

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Existem situações em que o conhecimento do magistrado não é

suficiente para compreender a demonstração de um fato, sendo necessário o

auxílio de profissionais especializados ou pessoas experimentadas sobre a

matéria.467 Nesse caso, exige-se a participação de terceira pessoa capacitada,

com conhecimento técnico específico para analisar o fato litigioso, um perito, a ser

nomeado pelo juiz, que, atuando ao lado dos assistentes técnicos indicados pelas

partes, elabora um laudo técnico-pericial que possa contribuir para o

esclarecimento da controvérsia judicial. 468

O Código de Processo Civil estabelece que a prova pericial consiste

em exame, vistoria ou avaliação (art. 420). Cabe ao juiz deferir ou não a sua

realização, podendo inclusive determiná-la de ofício, seguindo o preceito do art.

130 do CPC. Para isso, deverá examinar a necessidade e utilidade de sua

realização.469

No que se refere à prova pericial, amplos são os poderes instrutórios

do juiz,470 uma vez que lhe cabe nomear o perito, que será escolhido “entre

profissionais de nível universitário, devidamente inscritos no órgão de classe

competente” (art. 421, CPC); indeferir os quesitos impertinentes e formular os que

entender necessários ao esclarecimento da causa (art. 426, CPC); fixar prazo

para apresentação do laudo (art. 421, caput, CPC).

Ademais, pode o juiz de ofício determinar o comparecimento do perito

e dos assistentes técnicos à audiência de instrução e julgamento para prestarem

esclarecimentos sobre a perícia realizada, os quais devem ser ouvidos em

primeiro lugar, antes dos depoimentos das partes e das testemunhas. Em caso de

467 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 130.468 “Não importa que o magistrado que está tratando da causa, em virtude de capacitação técnica individual e específica (porque é, por exemplo, formado em engenharia civil), tenha conhecimento para analisar a situação controvertida. Se a capacitação requerida por essa situação não estiver dentro dos parâmetros daquilo que se pode esperar de um juiz, não há como se dispensar a prova pericial, ou seja, a elucidação do fato por prova em que participe um perito – nomeado pelo juiz –, e em que possam atuar assistentes técnicos indicados pelas partes, a qual deverá resultar em laudo técnico-pericial, que por estas poderá ser discutido”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed.. São Paulo, 2008, p. 380-381)469 DEDA, Artur Oscar de Olivera. A prova no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 88.470 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 231.

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ausência do perito à audiência de instrução e julgamento, determina-se seu

adiamento, não sendo permitida a condução coercitiva do mesmo.471

Apesar de se tratar de prova de conhecimento técnico e especializado,

não está o juiz vinculado ao laudo pericial,472 podendo se valer de outros

elementos para a formação de sua convicção (art. 436, CPC). Não satisfeito com

o laudo pericial entregue, poderá, ainda, determinar, de ofício ou a requerimento

da parte, a realização de uma nova perícia, sobre o mesmo fato (o art. 437 do

CPC).473

A segunda perícia, por sua vez, terá por objeto os mesmos fatos sobre

que recaiu a primeira, sendo, no entanto, possível a formulação de novos

quesitos, a fim de corrigir eventual omissão ou inexatidão do resultado anterior.

Com efeito, tendo como objetivo formar a convicção do juiz a respeito

dos fatos, a prova pericial determinada de ofício pelo juiz constitui manifestação

da sua atividade probatória proativa.

5.3.4.5 Inspeção judicial

Outro exemplo de poder instrutório específico do juiz está previsto no

art. 440 do Código de Processo Civil que confere ao juiz o poder de inspecionar

pessoas ou coisas, a fim de se esclarecer sobre fato de interesse à decisão da

causa.

471 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 72.472 Ensina Frederico Marques que, “o juiz é o peritus peritorum por força mesmo das funções de que está investido. Se o magistrado tivesse de ficar preso e vinculado às conclusões do laudo pericial, o experto acabaria transformado em verdadeiro juiz da causa, sobretudo nas lides onde o essencial para a decisão depende do que se apurar no exame pericial” (MARQUES, Frederico. Instituições de direito processual civil. Campinas: Millenium, 2000, v. 3, p. 426).473 “Nesse caso, não cabe uma “outra perícia”, no sentido de perícia que deve esclarecer “outro fato”, que não aquele em que recaiu a primeira perícia. Além disso, esta “segunda perícia” não apenas deve incidir sobre o mesmo fato, mas também ter a mesma finalidade da primeira perícia. Perceba-se que o mesmo fato pode levar a perícias com objetivos diferentes”. (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 385).

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Para maior compreensão dos fatos articulados pelas partes, pode o juiz

manter contanto direto e pessoal com os mesmos, realizando apreciação através

de sua percepção individual.474

A inspeção judicial, de ofício ou a requerimento da parte, pode ser

realizada em qualquer fase do processo475 e serve para colocar o julgador em

contato direto com a realidade fática de que extrairá seu convencimento.

Distingue-se da prova pericial, uma vez que se trata de meio de prova

em que o juiz mantém contato direito e pessoal com pessoas ou coisas, a fim de

aclarar os fatos litigiosos. Todavia, se entender necessário, o juiz poderá ser

assistido por um ou mais peritos de sua nomeação (art. 441, CPC). Nesse caso, o

perito servirá apenas como um assessor direto do juiz no curso, não havendo

possibilidade de indicação de assistentes técnicos pelas partes, os quais podem

apenas acompanhar as partes.476

Pode a inspeção ser realizada na sede do juízo ou em outro local,

desde que dentro dos limites de sua competência territorial.477 Destarte, de acordo

com o art. 442 do Código de Processo Civil,

O juiz irá ao local, onde se encontre a pessoa ou coisa, quando: I – julgar necessário para a melhor verificação ou interpretação dos fatos que deva observar; II a coisa não puder ser apresentada em juízo, sem consideráveis despesas ou graves dificuldades; III – determinar a reconstituição dos fatos.

A inspeção judicial pode ter como objeto pessoas ou coisas. Em

relação às pessoas, só se pode falar em submissão à inspeção judicial pela parte.

Apenas elas estão obrigadas a submeter-se a tal prova. No caso de terceiro,

apesar do dever de colaborar com o descobrimento da verdade, não se pode

obrigá-lo a participar da inspeção, sem que haja seu consentimento prévio. 478 474 Ibid., p. 396.475 Para Pontes de Miranda, é possível a realização de inspeção judicial pelo tribunal, “uma vez que a apelação devolve ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada”. (MIRANDA, Pontes de. Comentários ao código de processo civil. tomo IV: arts. 282 a 443. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 502). 476 MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 73.477 MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 396.478 “No tocante às pessoas, cumpre observar que à parte atribui a lei, expressamente, o dever de “submeter-se à inspeção judicial, que for julgada necessária”(art. 340, no. II); mas inexiste regra

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Já a parte não pode se furtar a realização da inspeção judicial, salvo

motivo justificado. Todavia, o juiz não pode coagi-la a se submeter à força à

inspeção, mas poderá considerar sua recusa “resistência injustificada ao

andamento do processo”, o que lhe acarretará as sanções legais da litigância de

má-fé, além de apreciar a sua atitude como um indício de que o resultado da

inspeção lhe seria desfavorável.479

É necessário reforçar que o juiz deve intimar as partes para assistir à

inspeção, oferecendo oportunidade a sua manifestação, em que prestará

esclarecimentos e observações que reputem de interesse da causa (art. 442,

parágrafo único, CPC).

Concluída a inspeção, o juiz mandará lavrar auto circunstanciado, em

que descreverá os fatores úteis ao julgamento da causa, o qual deverá ser

assinado pelo mesmo e pelas demais pessoas presentes ao ato. Não se pode

considerar prova aquilo que não está nos autos, devendo ser ele amplamente

instruído com todos os elementos necessários.

5.3.5 Preclusão para o juiz em matéria de prova

Entendendo o juiz ser necessária a produção de prova, pode

determinar sua produção a qualquer momento. O art. 130 do CPC não fixou prazo

para o magistrado exercer seus poderes instrutórios de ofício, logo se constatr

que não existe preclusão temporal para o juiz em matéria de provas.480

idêntica aplicável ao terceiro (v. art. 341). O preceito genérico do art. 339, consoante o qual “ninguém se exime do dever de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade”, não basta para estender ao terceiro um dever que o Código reputou indispensável criar em termos expressos para a parte. À vista do disposto no art. 5, no. II, da Constituição da República, parece-nos que o terceiro não está obrigado a submeter-se a inspeção judicial; ela só se realizará com o seu consentimento” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 73).479 Ibid., p. 74.480 MATTOS, Sérgio Luís Wetzel. Da iniciativa probatória do juiz no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 94. Assevera Galeno Lacerda que “em virtude desse enorme poder de ofício para a busca da verdade real, mesmo nos processos dispositivos, firmou-se na doutrina e na jurisprudência a tese de que, para o Juiz, não existe preclusão quanto à prova”. LACERDA, Galeno. O juiz e a justiça no Brasil. Revista de Processo, São Paulo, a. 16, n. 61, Jan-mar. de 1991, p. 167. Ver também BARBOSA, Antônio Alberto Alves. Da preclusão processual civil. 2. ed. 2. t. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.

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Ao contrário das partes que têm prazo fixado para requererem a

produção probatória, esse poder do juiz não preclui, já se que fundamenta na

busca da verdade real para o oferecimento de uma tutela jurisdicional justa.481

Por preclusão, deve-se entender a “perda da faculdade de praticar um

ato, por decurso de prazo (preclusão temporal), por já ter sido praticado referido

ato (preclusão consumativa) ou por ter sido praticado ato incompatível com o

pretendido (preclusão lógica)”.482 As regras processuais relativas à preclusão, no

entanto, aplicam-se apenas aos litigantes, uma vez que se deve buscar sempre o

normal desenvolvimento do processo.

A iniciativa probatória de ofício poderá ocorrer em qualquer fase

processual e em qualquer instância. Seja no primeiro ou segundo graus, antes de

proferida a sentença ou o acórdão, poderá o magistrado converter o julgamento

em diligência e determinar a realização de provas necessárias ao esclarecimento

dos fatos.483

Da mesma forma, na busca da verdade real do processo e da justiça

de sua decisão, o juiz não está impedido de reconsiderar decisão sua anterior que

indeferira determinada prova.484 Nesse caso, a decisão judicial também não tem

efeito preclusivo, 485 uma vez que “o juízo de admissibilidade da prova tem

481 OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 153. Para Flávia Moreira Guimarães Pessoa, “quanto à preclusão em matéria de prova, esta ocorre em relação às partes, que devem requer a sua produção no momento oportuno. Em relação ao juiz, a jurisprudência é vacilante, mas tende a considerar que inexiste tal tipo de preclusão para o magistrado”. (PESSOA, Flávia Moreira Guimarães. Pedido de reconsideração e preclusão pro judicato no processo civil. Revista IOB de Direito Civil e Processo Civil. v. 7, n. 42, p. 107, jul. ago 2006).482 LOPES, João Batista. Os poderes do juiz e o aprimoramento da prestação jurisdicional. Revista de Processo. São Paulo, na. 9, n. 35, p. 32, Abr-jun. de 1984. 483 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 218.484 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 67. Em sentido contrário, manifesta-se Daniel Amorim Assumpção Neves. Preclusões para o juiz: preclusão pro iudicato e preclusão judicial no processo civil. São Paulo: Método, 2004, p. 268 e também FERRAZ, Cristina. Os prazos no processo de conhecimento: preclusão, prescrição, decadência, perempção, coisa julgada material e formal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 56. Para quem a preclusão atinge não só os atos das partes, mas também os poderes do juiz.485 Como exceção, Manoel Caetano Ferreira Filho afirma que se deve considerar a ocorrência de preclusão consumativa em relação juiz no exercício dos seus poderes instrutórios, para proibir o indeferimento de prova cuja produção já havia sido deferida. Neste caso, em que o magistrado admitiu a realização da prova e, posteriormente, indeferiu, há violação ao direito à prova, caracterizando cerceamento de defesa. (FERREIRA FILHO, Manoel Caetano. A preclusão no direito processual civil. Curitiba: Juruá, 1991, p. 92.)

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natureza e finalidade pública, pois deve visar a evitar que se prolonguem as lides

e que se criem disputas inúteis”.486

Assim, cabe ao magistrado, no exercício de seus poderes instrutórios e

sempre com o desiderato de prestar uma tutela jurisdicional célere e efetiva,

analisar a admissibilidade ou não da prova, podendo, inclusive, reconsiderar

decisão anteriormente proferida.487 Com efeito, inexiste preclusão para o juiz,

quando no exercício de seus poderes instrutórios de ofício.

5.4 Alcance dos poderes instrutórios do juiz

486 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 215. Também José Joaquim Calmon de Passos, manifesta-se pela inexistência de preclusão para o juiz, quando no exercício de seus poderes instrutórios de ofício. Afirma o autor que: “O art. 162, ao classificar os atos do juiz, distinguiu-os em sentenças, decisões e despachos. Caracterizou a sentença pela decorrência, de sua prolação, do encerramento do processo, relacionou as decisões com a solução de questões incidentes; aos demais pronunciamentos do juiz reservou o nome de despacho. Parece-nos que o previsto no art. 473 não diz respeito a despachos que não contenham decisões. Destarte, os despachos ordinários não determinam preclusão, podendo o juiz reconsiderá-los ou modificá-los. Por força disso, é lícito ao magistrado vir a deferir prova pericial que havia negado, ou vice-versa, bem como deixar de admitir a testemunhal que deferira, se tiver razões para fazê-lo. Isso só será impossível na hipótese de o processo ter atingido uma situação incompatível com a modificação da decisão”. (CALMON DE PASSOS, J. J. Comentários ao código de processo civil. v.3, 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 471). Fredie Didier Júnior, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, ao contrário, afirmam que, em razão da preclusão, o juiz não pode, a pedido da parte, deferir a produção de dada prova e mais tarde se recusar a produzi-la, por entendê-la desnecessária. Argumentam que: “A despeito do enunciado normativo do art. 130, CPC, que admite que o julgador indefira provas inúteis ou protelatórias, o momento único e adequado para fazê-lo é o do saneador. Ao autorizar a produção das provas solicitadas, atribui-se à parte um direito à produção daquela prova (art. 5º, IV, CF) que não pode ser subtraído ao arbítrio do julgador. Operou-se a preclusão consumativa. Até porque, bem se sabe, se o juiz de primeira instância ficou satisfeito com as provas já produzidas, formando seu convencimento, o mesmo talvez não se possa dizer do tribunal que revisará o julgamento em grau de recurso”. (DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p.97-98)487 Sobre o tema, Eduardo Cambi afirma: “Como na audiência preliminar o juiz tem apenas uma visão superficial daquilo que vai ser demonstrado, pode, por força dos arts. 130 e 131 do CPC, rever, posteriormente, aquilo que havia sido fixado como pontos controvertidos, para incluir fatos que não foram considerados relevantes. Com efeito, não ocorre a preclusão pro iudicato, por se tratar de uma questão de ordem pública, que, a exemplo das condições da ação e dos pressupostos processuais (art. 267, § 3º, CPC), diz respeito à própria atividade jurisdicional, justificando tratamento isonômico. Ademais, sustenta-se que o juiz não pode indeferir as provas antes deferidas, porque isso violaria a segurança jurídica que deve prevalecer no curso do processo. No entanto, a nosso ver, esse posicionamento não se justifica quando existem nos autos elementos suficientes para o julgamento da causa, desde que o juiz fundamente a sua decisão, não incorra em cerceamento de defesa e, caso haja risco de as partes serem surpreendidas, promova o contraditório prévio”. (CAMBI, Eduardo. A prova cível: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 434-435).

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Os poderes instrutórios do juiz para a pesquisa probatória de ofício já

são reconhecidos por toda a doutrina nacional. No entanto, ainda resta a

divergência quanto ao alcance desses poderes ex officio, sua amplitude em

relação à iniciativa probatória.

Para a doutrina mais conservadora, ainda ligada à ideia de que se

aplica o princípio dispositivo ao campo probatório, a iniciativa quanto à produção

de prova de ofício pelo juiz é suplementar à atividade dos litigantes.488 Só pode

ser implementada, quando o juiz entender insuficientes as provas produzidas

pelas partes e não estiver apto a decidir o pleito naquele momento ou ainda

quando o litígio tratar de matéria de ordem pública.489

Nessa apreciação, o poder instrutório de ofício só deve ser utilizado em

casos excepcionais, a fim de evitar a perplexidade da incompletude das provas,

jamais para investigar os fatos, uma vez que, dessa maneira, estaria agindo o

magistrado de forma parcial.490 O juiz deve dispor de poderes instrutórios de

ofício, no entanto, não deve se converter “em investigador de fatos ou juiz de

instrução”.491

Em uma segunda interpretação, a doutrina mais moderna baseia-se na

ideia de instrumentalidade e efetividade do processo e considera que os poderes

488 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. v. 2. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1980, p. 309. Seguindo o pensamento de que a atividade probatória do juiz é suplementar a iniciativa das partes, pode-se citar CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006; LOPES, João Batista. Os poderes do juiz e o aprimoramento da função jurisdicional. Revista de Processo. a. 9, n. 35. p. 39, Abr.-jun. 1984. ARAGÃO, E. D. Moniz. Direito à prova. Revista de Processo. a. 10, n. 39, p. 101, Jul.-set. 1985.489 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 217. Nesse sentido, manifesta-se Vicente Greco Filho, afirmando que “não pode o juiz substituir a iniciativa probatória, que é própria de cada parte, sob pena de estar auxiliando essa parte e violando a igualdade de tratamento que elas merecem. A atividade probatória do juiz não pode substituir a atividade de iniciativa das partes. Para não inutilizar o dispositivo resta interpretar que o juiz, na verdade, poderá determinar provas, de ofício, nos procedimentos de interesse público, como, por exemplo, os de jurisdição voluntária, e nos demais processos, de maneira complementar alguma prova já requerida pela parte, quando a prova produzida for insatisfatória para o seu convencimento.” (GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. v.1. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 227/228).490 Seguindo esse entendimento, também pode-se citar Humberto Theodoro Júnior que afirma: “Sempre que as partes requererem todas as provas pertinentes ou que se fizerem presentes as presunções legais, não deverá prevalecer o poder do juiz de promover provas ex officio.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 1. v. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 422)491 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 76.

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do juiz para a produção de provas de ofício são amplos, não apresentando

restrições.492

Ao contrário, constituem um poder-dever493 de buscar a inteira

compreensão dos fatos, determinando a produção de provas de ofício, caso seja

necessário.494

É dever do magistrado agir ativamente na produção de prova, fazendo

valer os poderes que lhe são conferidos pelo art. 130 do CPC.495 Para exercer

com eficiência sua função de julgar, deve o juiz utilizar-se de todos os seus

poderes-deveres para garantir a justiça de sua decisão, e esta só será possível se

baseada na investigação fática realizada.496

Na verdade, a iniciativa probatória do juiz deve ser concomitante à das

partes497 e complementares498. Ela deve ser realizada tanto pelo magistrado,

492 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 87.. 493 Para Luciana Amicucci Campanelli, “a iniciativa instrutória prevista como regra geral no art. 130 do Código de Processo Civil é um dever do juiz e não uma faculdade porque “os poderes que incumbem ao juiz são intrinsecamente deveres, sem os quais não poderia exercer plenamente o comando jurisdicional que o Estado lhe outorgou”. (Ibid., p. 85) 494 GOUVEIA, Lúcio Grassi. Congnição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007, p. 183. Também compreendem a atividade probatória do juiz como uma atividade de cooperação entre o juiz e as partes para melhor instrução do processo, os seguintes autores: BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994; DIDIER JR. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. v.2, 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, 26 e ss.; OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003; CAMARA, Alexandre Freitas. Poderes instrutórios do juiz e processo civil democrático. Revista de processo, a. 32, n. 153, p. 33-46, Nov/2007. MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo, 2008, p. 290. 495 Nesse sentido, MATTOS, Sérgio Luís Wetzel. Da iniciativa probatória do juiz no processo civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p.100.496 A respeito da natureza jurídica dos poderes do juiz, afirma o Prof. Lúcio Grassi Gouveia que: “Não pode o magistrado, diante da prova colhida nos autos e ainda quando os fatos não lhe parecerem devidamente esclarecidos, adotar o cômodo entendimento de que possui um poder discricionário a ser ou não exercido por ele. Trata-se de poder-dever de esclarecer os fatos, se necessário determinando a produção de provas de ofício, até porque terá o dever de fundamentar sua decisão, conforme previsão constitucional. Ultrapassada esta etapa, só então poderá aplicar o ônus da prova, que em relação aos fatos constitutivos geralmente caberá ao autor e aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, ao réu. (GOUVEIA, Lúcio Grassi. Cognição processual civil: atividade dialética e cooperação intersubjetiva na busca da verdade real. In. DIDIER, Júnior. Fredie. Leituras complementares de processo civil. 5. ed. Salvador: Podivm, 2007, p. 195/196).497 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 97. 498 “Em matéria de prova, os papéis protagonizados pelo juiz e pelas partes são complementares, permitida e até recomendada a intensificação da atividade oficial desde que preservada a imparcialidade do juiz, pois o bom julgamento depende da correta aplicação da norma a fatos reconstituídos com a maior exatidão possível” (MARTINS, Nelson Juliano Schaefer. Poderes do juiz no processo civil. São Paulo: Dialética, 2004, p. 192).

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quanto pelas partes, todos como interessados no regular e célere

desenvolvimento do processo. A atividade probatória proativa do juiz não se

mostra substitutiva à atividade das partes, mas complementar a ela, seu alcance

deve ser amplo, servindo como equilíbrio processual para a garantia da

efetividade da tutela jurisdicional. 499

Não deve haver uma concorrência entre os litigantes e juiz para a

produção da provas, mas sim a cooperação entre os sujeitos da relação jurídica

processual, a fim de envidar esforços na busca da verdade para atender aos

escopos do processo. Não estando convencido sobre os fatos deduzidos pelas

partes em suas alegações, deve o magistrado determinar a produção das provas

necessárias para o deslinde do feito e, só após realizados todas as diligências,

deve se servir das regras de distribuição do ônus da prova para proferir sua

decisão.

Compreende-se, pois, que amplos devem ser os poderes instrutórios

do juiz, os quais encontram seus limites no próprio ordenamento jurídico.

5.5 Limites aos poderes instrutórios do juiz

É certa a tendência a ampliação dos poderes do juiz em todos os seus

aspectos, especialmente quanto à atividade probatória proativa na instrução

processual civil.

No entanto, “se de um lado no Estado moderno não mais se tolera o

juiz passivo e espectador, de outro sua participação ativa encontra limites ditados

pelo mesmo sistema de legalidade”.500 Dessa forma, com o intuito de evitar

abusos e desmandos dos juízes pela utilização dos poderes instrutórios de ofício,

499 Nesse diapasão, afirma José Roberto dos Santos Bedaque que: “a atividade probatória também deve ser exercida pelo magistrado, não em substituição das partes, mas junto com elas, como um dos sujeitos interessados no resultado do processo. A maior participação do juiz na instrução da causa é uma das manifestações da “postura instrumentalista que envolve a ciência processual”. Essa postura contribui, sem dúvida, para a “eliminação das diferenças de oportunidades em função da situação econômica dos sujeitos”. Contribui, enfim, para a efetividade do processo”.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 110).500 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 244.

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essa atuação ativa do magistrado encontra limitação no próprio ordenamento

jurídico. Vale ressaltar, no entanto, que não há uniformidade doutrinária quanto

aos limites da atividade probatória proativa do juiz.501

Primeiramente, é importante destacar, como limite aos poderes

instrutórios do juiz, o objeto do processo, delineados pelo pedido e pela causa de

pedir.502 De acordo com os artigos 128 e 460 ambos do CPC, é defeso ao juiz

conhecer de questões não ventiladas pelas partes. Dessa forma, deve o

magistrado conduzir sua atuação de acordo com o que foi suscitado pelo autor na

inicial e pelo réu na contestação. Ao expandir a investigação para fatos que não

são objeto do processo, estará o juiz desviando-se de sua finalidade. Portanto,

“esse poder oficial há de restringir-se ao tema probatório delimitado pelo litígio

trazido a juízo”.503 O princípio dispositivo constitui não um entrave à atividade

probatória proativa do juiz, mas um limite a sua iniciativa, no tocante à

disponibilidade do direito das partes.504

Um segundo e relevante limitador aos poderes instrutórios do juiz é o

princípio do contraditório, “que impede a transformação da arbitragem em

arbitrariedade, da discricionariedade em despotismo”.505 Como amplamente

debatido no segundo capítulo desta dissertação, ao determinar de ofício a

realização de uma prova, deve o juiz dar conhecimento aos litigantes e

oportunizar a sua manifestação, para resguardar a paridade de armas e o direito

de defesa. Essa abertura à participação das partes na produção da prova de

iniciativa judicial constitui uma forma de evitar atitudes ilegítimas por parte do juiz,

servindo como limitador de sua atuação.506

501 AMENDOEIRA JÚNIOR, Sidnei. Poderes do juiz e tutela jurisdicional: a utilização racional dos poderes do juiz como forma de obtenção da tutela jurisdicional efetiva, justa e tempestiva. São Paulo: Atlas, 2006, p. 106.502 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 136. Também entende dessa forma Luciana Amicucci Campanelli. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 200.503 MIRANDA, Vicente. Poderes do juiz no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 218.504 MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas de processo civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 67.505 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 83.506 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 137. Conforme afirma José Carlos Barbosa Moreira, “os verdadeiros modos de exorcizar o fantasma da parcialidade consistem, sobretudo, em submeter a atividade do juiz à observância do princípio do contraditório, em impor ao juiz o dever de realizar a atividade de instrução sob a égide do contraditório, e proibi-lo de levar em conta na sua decisão qualquer elemento probatório colhido sem que as partes tivessem a oportunidade de participar, tanto quanto possível, da

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Outro fator restritivo aos poderes instrutórios do juiz é a obrigatoriedade

de fundamentação das decisões judiciais, conforme exige os art. 93, inciso IV da

CF; arts. 131, 458, inciso II e 165, todos do CPC.507 Através da motivação das

decisões judiciais, o magistrado deve indicar as razões para a realização da

prova, o raciocínio utilizado, bem como demonstrar a necessidade da prova. Essa

decisão motivada servirá de norte para a fiscalização da atividade do magistrado,

impedindo-o de agir de forma parcial ou arbitrária.508

Alguns doutrinadores consideram, ainda, como limite aos poderes do

juiz a busca da verdade processual, “vedando-se medidas tendentes a prejudicar

um litigante ou outro, bem como as procrastinadoras do feito ou, ainda, aquelas

que não contribuem diretamente à descoberta da verdade.” 509

Por fim, pode-se considerar limite aos poderes instrutórios do juiz a

natureza lítica das provas a serem determinadas de ofício,510 pelo que “ao juiz é

vedada a determinação, de ofício, de provas ilícitas”.511 A justiça da decisão a ser

proferida não justifica uma conduta ilegal para a produção da prova.

Percebe-se, por conseguinte, que, a fim de evitar a ditadura do Poder

Judiciário, através dos abusos e arbitrariedades de seus membros no exercício

dos poderes instrutórios de ofício, deve-se respeitar os limites do pedido e da

causa de pedir, de que o magistrado só poderá exercer esse poder sobre os fatos

e demais elementos delineados no processo, sempre manifestando em suas

decisões os motivos que lhe formaram o convencimento.

colheita, ou pelo menos, de manifestar-se sobre os resultados obtidos”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O juiz e a prova. Revista de Processo. a. 9, n. 35, p. 181, Abr.-jun. 1984).507 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 102.508 BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 138. Como lenciona José Roberto dos Santos Bedaque, “sem dúvida alguma, a melhor maneira de preservar a imparcialidade do magistrado é submeter sua atividade ao princípio do contraditório e impor-lhe o dever de motivar suas decisões. Pode ele manter-se absolutamente imparcial, ainda que participe ativamente da instrução. Basta que suas decisões sejam fundamentadas e proferidas após efetivo contraditório entre os litigantes.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 80/81).509 CAMPANELLI, Luciana Amicucci. Poderes instrutórios do juiz e a isonomia processual. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2006, p. 104. Por sua vez, Sidney da Silva Braga considera limite à iniciativa probatória do juiz “o caráter relativo da verdade processual, pelo que sua busca pelo juiz deve ser equilibrada pelas noções de celeridade e viabilidade econômica do processo. (...). A iniciativa probatória do juiz não pode ser utilizada de forma a prolongar indefinidamente o processo em nome de uma verdade e justiça inatingíveis.” (BRAGA, Sidney da Silva. Iniciativa probatória do juiz no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 138 e 140).510 Ibid., p. 136.511 Ibid., p. 138.

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Também é inquestionável que a atividade probatória proativa do juiz

está limitada pelos princípios do contraditório e da fundamentação das decisões

judiciais, à medida que deve o magistrado observar sempre a dialética

processual, garantindo a oportunidade de manifestação das partes, bem como

demonstrar, através da fundamentação, o caminho lógico trilhado para se chegar

àquela decisão.

A partir da fundamentação da decisão judicial, extrai-se ainda o

respeito do julgador ao princípio da imparcialidade, o que configura mais um limite

à atividade probatória proativa do juiz, além de ser uma garantia dos

jurisdicionados.

Apesar de ser uma atividade devidamente legitimada pelo Código de

Processo Civil através do art. 130 e demais dispositivos legais que tratam da

matéria, a atividade probatória do juiz encontra resistência na própria mentalidade

dos juízes, sendo pouco utilizada no dia-a-dia forense. É necessário, pois,

modificar essa postura para que os magistrados brasileiros possam exercitar, por

completo, os seus poderes instrutórios de ofício, garantindo, com isso, a

igualdade de armas e a efetividade do processo.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O primeiro passo para compreender a atividade probatória proativa do

juiz dá-se com a análise dos sistemas jurídicos processuais no tocante à divisão

de trabalho entre o juiz e as partes no desenvolvimento do processo.

Basicamente, o sistema do common law ou adversarial é composto

pelos países de origem anglo-saxônica, e o sistema do civil law ou de ativismo

judicial engloba os países de origem romano-germânica, distinguindo-se por

apresentarem atuação diversa do juiz no processo. Ao lado do juiz passivo típico

do sistema adversarial, tem-se o juiz participativo do sistema de ativismo judicial,

atuando ativamente no desenvolvimento processual.

Essa distinção, contudo, não é estanque. O que se observa, na

atualidade, é que países dito de origem anglo-saxônica têm ampliado a atividade

probatória do juiz no processo, enquanto outros países de origem romano-

germânica, à margem da tendência mundial, têm reduzido os poderes do juiz no

processo.

No Brasil, a concessão de poderes instrutórios ao juiz se iniciou com o

Regulamento 737, de 1850. Posteriormente, com o Código de Processo Civil de

1939, consolidou-se o novo papel do juiz no processo, atuando ativamente na

busca da verdade dos fatos. Hoje, o alicerce da atividade probatória proativa do

juiz encontra-se no art. 130 do CPC, o qual confere amplos poderes instrutórios

de ofício ao juiz.

Assim como às partes, o juiz, além de poderes, detém também deveres

e responsabilidades no processo, estando sujeito à observância dos princípios

jurídicos processuais.

Os princípios, ao lado das regras, constituem espécie das normas

jurídicas, servindo para unificar o sistema normativo, bem como para direcionar a

atividade interpretativa do juiz de acordo com os valores da sociedade. Esses

valores, por sua vez, podem gerar conflitos entre os mesmos, o qual é

solucionado através da ponderação entre a força relativa de cada um dos

envolvidos, prevalecendo o que possua maior peso axiológico, de forma que o

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caráter normativo dos princípios, ao mesmo tempo que amplia os poderes

instrutórios do juiz, também limita sua atividade.

Não se tem consenso doutrinário quanto ao conteúdo do princípio

dispositivo. Na ideia privatista de processo, esse princípio limita os poderes

instrutórios do juiz, uma vez que seria exclusivamente das partes a iniciativa

quanto à produção de provas. Contudo, a ciência processual moderna, baseada

no caráter publicístico do processo, alia-se à ideia de que o princípio dispositivo

refere-se, apenas, à disponibilidade do direito material pelas partes, cabendo ao

juiz a direção material do processo, o que não impede a sua atividade probatória

de ofício.

Entretanto, para que se tenha uma completa instrução do processo, é

imprescindível a cooperação entre o juiz e as partes, posto que estas detêm

maiores informações sobre os fatos e aquele maiores conhecimentos sobre o

direito que lhe deve ser aplicado para alcançar a justiça da decisão. Pelo princípio

da cooperação, devem o juiz e as partes dialogar, procurando esclarecer dúvidas,

fornecendo orientações, prevenindo irregularidades, tudo com a finalidade de

alcançar a verdade real dos fatos.

Outro princípio de destaque, quando se discute acerca da atividade

probatório proativa do juiz, é o princípio da imparcialidade, segundo o qual o juiz

deve conduzir o processo sem preferências entre os jurisdicionados. Ao contrário

do que pensa a doutrina tradicional, o exercício dos poderes instrutórios do juiz

não fere esse princípio, uma vez que, ao determinar a realização de uma prova, o

juiz não sabe de antemão a quem beneficiará sua produção. Nesse caso, estará o

magistrado atuando para melhor formar sua convicção sobre a verdade dos fatos.

A atuação ativa do magistrado é indispensável para se garantir a

igualdade real das partes, pelo que se pretende, através do exercício dos poderes

instrutórios do juiz, evitar a supremacia do poder econômico, político, social ou

intelectual de uma parte em relação à outra, transformando a abstração normativa

em realidade jurídica.

Ligado ao princípio da igualdade, tem-se o princípio do contraditório,

através do qual, confere-se às partes a oportunidade de participar efetivamente

do processo, tomando conhecimento sobre todos os atos do processo e

utilizando-se dos mecanismos processuais adequados à obtenção do provimento

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judicial favorável. Ele se aplica tanto aos litigantes, quanto ao juiz, ao legitimar o

exercício de seus poderes instrutórios de ofício, sem, contudo, torná-lo arbitrário

ou autoritário.

O Estado Social, baseado na concepção publicística, fez surgir um juiz

ativo no processo, o que também revelou a necessidade de motivação das

decisões judiciais, a fim de evitar arbítrios e desmandos por parte dos juízes. O

princípio da fundamentação das decisões judiciais constitui uma garantia do

Estado de Direito e encontra-se previsto no art. 93, IX, da CF/88. Por meio dele,

assegura-se às partes o acompanhamento das decisões judiciais, através dos

argumentos e motivos deduzidos pelo juiz na sua decisão, permitindo o controle e

fiscalização dos abusos e ilegalidade eventualmente cometidos.

Dessa forma, ao mesmo tempo que o princípio da fundamentação das

decisões judiciais legitima a atuação do magistrado, também a limita pela

exigência de uma rígida justificativa racional das decisões.

O acesso do juiz aos fatos se dá por meio das provas trazidas aos

autos. Portanto, o direito à prova constitui um direito fundamental das partes,

decorrente do direito ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa,

ao mesmo tempo que é indispensável para a formação da convicção do juiz

acerca dos fatos controvertidos da demanda.

Como o destinatário da prova, o juiz detém o poder-dever de avaliar a

sua necessidade e utilidade, para isso faz uso dos seus poderes instrutórios no

processo. Por não poder se eximir de sentenciar ou despachar, de acordo com o

que determina o art. 126 do CPC, o magistrado deve se valer de todos os seus

poderes para tentar alcançar a certeza de seu provimento.

Apesar de deter amplos poderes instrutórios, o juiz não pode

determinar a realização de provas obtidas de forma ilícita. Veda-se a busca da

verdade a qualquer custo, optando-se pela efetividade da proteção do direito

material. Em casos excepcionais, contudo, admite-se a prévia aplicação do

princípio da proporcionalidade pelo magistrado, para, apreciando os interesses

jurídicos em conflito, escolher aquele que considera mais relevante. Com efeito,

no exercício da sua atividade probatória de ofício, o juiz pode analisar a

admissibilidade ou não das provas a serem obtidas por meios ilícitos, desde que

fundamentada na ponderação dos princípios de direito em conflito.

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A atividade probatória proativa do juiz manifesta-se em todos os

momentos processuais, especialmente no deferimento ou não da prova e na sua

produção, sempre com o desiderato de buscar a verdade para melhor formar sua

convicção.

São as partes que estão em contato direito com a realidade, que

podem, então, trazer ao processo melhores elementos para a reconstrução dos

fatos. Destarte, a legislação estabeleceu como regra que incumbe ao autor a

prova dos fatos constitutivos e ao réu a prova dos fatos impeditivos, modificativos

ou extintivos. Não existe incompatibilidade entre as regras de distribuição do ônus

da prova e os poderes instrutórios do juiz, pois deve o juiz agir, inclusive com a

determinação de provas de ofício, para descobrir a verdade dos fatos, formando

seu convencimento e, apenas quando remanescerem dúvidas, aplicará as regras

de distribuição do ônus da prova, para julgar em desfavor daquele que tinha o

encargo de produzir a prova e não o fez a contento.

Ocorre que essa distribuição estática do ônus da prova não atende

mais aos anseios do processo, impedindo as partes, em alguns casos, de

alcançarem o pleno acesso à justiça. Certa é a existência de desigualdade entre

os litigantes no processo. Em face dessa realidade, surge uma nova teoria

dinâmica das provas, possibilitando a inversão do encargo, conferindo-o à parte

que tem melhores condições de produzir a prova o ônus de fazê-lo, de acordo

com o caso concreto.

Ao adotar essa teoria, ampliam-se a atividade probatória do juiz no

processo, à medida que lhe compete avaliar quem tem melhores condições de

produzir a prova no processo. Constitui, no entanto, uma excepcionalidade, a ser

aplicada, apenas, quando a produção da prova pela parte que detém o encargo é

excessivamente difícil ou mesmo impossível.

Observa-se que, diante do descrédito com as instituições, na sede de

se buscar alternativas para a solução dos problemas sociais do país, a população

tem recorrido cada vez mais ao Judiciário em busca da garantia dos seus direitos.

A população clama por uma justiça célere e eficiente, e, para isso, não bastam

apenas reformas legislativas. Há de se modificar a postura do juiz brasileiro que

ainda se mantém preso à ideia de que juiz imparcial é juiz inerte e, por isso, não

pode agir em busca de uma melhor prestação jurisdicional.

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Destarte, o reforço dos poderes do juiz é importante para se possa

atender aos anseios da população. Ocorre que é preciso, principalmente,

modificar a mentalidade do juiz. Ele deve assumir o seu papel de protagonista do

processo, exercendo sua função com o objetivo de prestar uma tutela jurisdicional

efetiva. Esse é o momento de fazer valer a Constituição e garantir a todos o

direito de acesso à justiça em sua plenitude.

Para isso, faz-se mister que o magistrado trabalhe para garantir aos

jurisdicionados uma tutela justa, célere e efetiva, primando sempre pela

efetividade do processo. Deve, por conseguinte, o juiz atuar proativamente, a

partir da ampla utilização dos seus poderes instrutórios de ofício.

A doutrina nacional elaborou diversas classificações sobre os poderes

do juiz no processo, o que demonstra a ausência de enumeração legislativa sobre

o assunto. Em todas elas, no entanto, observa-se que os poderes conferidos ao

juiz são viabilizados para que possam garantir um melhor prestação jurisdicional.

Apesar da relevância dos poderes concedidos ao juiz, destacam-se os poderes

instrutórios, que lhe imprimem o poder-dever de provocar e movimentar todas as

provas que entender necessárias para a busca da verdade e, através dela, a

justiça de sua decisão.

A atividade probatória proativa do juiz manifesta-se a partir do exercício

dos seus poderes instrutórios de ofício, que tem como fundamento o art. 130 do

Código de Processo Civil, bem como pela prática de poderes instrutórios

específicos que se encontram previstos, de forma esparsa, na legislação

processual civil.

Mesmo reconhecida a existência de poderes instrutórios do juiz, ainda

remanescem, na doutrina, divergências quanto ao seu alcance no processo. Para

a doutrina mais conservadora, a atividade probatória proativa do juiz é

suplementar à atividade das partes, só podendo ser implementada quando as

provas produzidas pelos contendores forem insuficientes para a formação do

convencimento judicial e se tratar de matéria de ordem pública.

A doutrina mais moderna, no entanto, não restringe os poderes

instrutórios do juiz, entendendo que a sua atividade probatória é ampla e irrestrita,

constituindo, ao contrário, um poder-dever do juiz de buscar a verdade real dos

fatos para garantir a justiça de sua decisão.

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Na realidade, entende-se que a atividade probatória do juiz deve ser

concomitante e complementar à atividade das partes, devendo haver uma

cooperação entre os sujeitos processuais para se atingir os escopos do processo.

Mesmo ampla, a atividade probatória do juiz encontra limites no próprio

ordenamento jurídico, destacando-se o objeto do processo, o princípio do

contraditório, a obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais, a busca

da verdade processual, a natureza lícita das provas e o princípio da

imparcialidade.

Entretanto, apesar de ser uma atividade devidamente legitimada pelo

Código de Processo Civil, o que se observa é que alguns membros do Poder

Judiciário ainda se mostram resistentes a essa atuação probatória proativa do

juiz.

Conclui-se que não há necessidade de novas alterações legislativas

para que se torne efetiva a atividade probatória proativa do juiz, sendo preciso tão

somente modificar o pensamento do magistrado para que saia da inércia e torne-

se agente ativo no desenvolvimento da instrução processual.

A busca da verdade real, a consciência do poder-dever de prestar a

tutela jurisdicional eficiente e, assim, garantir o acesso à justiça devem ser os

motores da atividade do juiz no processo, especialmente, no uso dos seus

poderes instrutórios de ofício.

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