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ISSN 1809-4791 VOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 Mens Agitat Periódico de Divulgação Científica e Tecnológica da Academia Roraimense de Ciências

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ISSN 1809-4791

VOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014

MensAgitatPeriódico de Divulgação Científica e Tecnológica

da Academia Roraimense de Ciências

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MensAgitat

VOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014

Editores

Prof. Dr. Robson Fernandes de Farias – UFRR (Editor -Chefe)

Prof.Dr. José Maria Filardo Bassalo – Fundação

Minerva, PA (Editor Adjunto)

Miguel Gustavo de Campos Batista – UFRR (Convidado)

Conselho Editorial

Prof. Dr. Ricardo Ferreira – UFPE

Prof. Dr. Gilberto Fernandes de Sá – UFPE

Prof. Dr. Claudio Airoldi – UNICAMP

Prof. Dr. Guido Nunes Lopes – UFRR

Prof. Dr. Carlos Ramón Franco – UFRR

Prof. Dr. Carlos Ernesto G. Reynaud Schaefer – UFV

Prof. Dr. Cícero Wellington Brito Bezerra – UFMA

Prof. Dr. Umberto Gomes da Silva Jr. – CEFET-PB

Prof. Dr. Moamen S. Refat – Suez-Canal University, Egypt

Prof. Dr. Jorge Fernando Silva de Menezes – UFRB

Profa. Dra. Deyse de Souza Dantas – FATERN

Prof. MSc. Thiago Oliveira Moreira (UFRN)

A Revista Mens Agitat é um periódico de divul-gação científica e tecnológica da Academia Rorai-mense de Ciências dedicado à publicação de Artigos Originais, Artigos de Revisão, Divulgação Cientí-fica, História da Ciência, Notas Técnicas, Assuntos Gerais e Short Communications.

Apreciação dos Manuscritos

Os manuscritos submetidos à revista deverão estar dentro das Normas de Publicação que encontram--se no site http://www.academiarrciencias.org. Os trabalhos serão aceitos ou recusados com base nos pareceres do Conselho Editorial, ou de consultores ad-hoc.

Responsabilidades

Embora todo o conteúdo publicado na Revista Mens Agitat seja previamente avaliado por assessores especialistas em cada área do conhecimento, os edi-tores da Revista não se responsabilizam por qual-quer informação fornecida em suas páginas, sendo a veracidade/autencidade dos dados científicos ou qualquer outra informação transmitida, de total e única responsabilidade dos respectivos autores.

Endereço para envio dos Manuscritos

Todos os trabalhos deverão ser submetidos ape-nas eletronicamente (formato .doc ou .rtf) para o seguinte endereço eletrônico:[email protected]

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Academia Roraimense de CiênciasPresidente: Prof. Dr. Robson Fernandes de FariasVice-Presidente: Prof. Dr. Carlos Ramon Franco

A Academia Roraimense de Ciências, fundada em 29 de outubro de 2004, é uma sociedade civil sem fins econômicos, com sede na cidade de Boa Vista, Roraima, tendo por objetivo contribuir para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, da educação e do bem estar social do estado de Roraima e do Brasil.

A ARC, considerados os campos do conhecimento em que têm atuação os seus Membros Titu-lares e Correspondentes, abrangerá as seguintes áreas especializadas:

a) Ciências Matemáticas;b) Ciências Físicas;c) Ciências Químicas;d) Ciências da Terra;e) Ciências Biológicas;f) Ciências Biomédicas;g) Ciências da Saúde;h) Ciências Agrárias;i) Ciências da Engenharia;j) Ciências Humanas.

Endereço: Caixa Postal 296, Ag. Praça do Centro Cívico, 69301-380, Boa Vista, RR.E-mail: [email protected]

Home page: http://www.academiarrciencias.org

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7 Editorial

Artigos

11 Energetic Control of a Theta Pinch working as a Spectroscopic Light SourceG. H Cavalcanti, E. E. Farias, F. O. Borges and A. G. Trigueiros

17 Teorias Neo-NewtonianasJúlio C. Fabris e Hermano E. S. Velten

31 Análise Mineralogia e Magnética de Solos do Norte da AmazôniaCássio Sanguini Sergio, Valdinar Ferreira Melo, José Lindolfo Renda, Roberto Câmara de Araújo e João Maria Soares

41 Virando o Princípio da Equivalência pelo Avêsso: uma proposta para facilitar a solução de alguns problemas e também introduzir noções elementares de relatividade geral no ensino médioJ. A. Souza

51 Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-SimonsMaria Teresa Thomaz

85 Sobre a Eficiência da Abordagem Eletrostática da Ligação QuímicaRobson Fernandes de Farias

89 O Bóson de Higgs e o “Fiat Lux!”José Abdalla Helayël-Neto

sumárioVOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014

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EditorialNeste ano de 2014, mas precisamente em outubro, passou uma década desde o

surgimento da Academia Roraimense de Ciências (ARC). Basicamente fundada por professores da Universidade Federal de Roraima (UFRR).

O vislumbre do tempo passado não possui locação adequada neste momento; é hora sim de nos deter no presente e apontar algumas diretrizes para o futuro.

O pensamento da ARC é em parte veinculado pela Mens Agitat, que é publicado pela ARC, e que no segundo semestre de 2014 publica os principais trabalhos apresentados no Encontro Caribenho de Física. Evento científico patrocinado parcialmente pelo Conselho Nacional de Pesquisa (CNPQ), que ocorreu nas dependências do Núcleo de Pesquisa e Pós-Graduação do Centro de Ciências e Tecnologia da UFRR. Temos conseguido editar este evento várias vezes, basicamente de dois em dois anos, aproximadamente, desde 2004.

Ainda que estejamos vivendo em uma época em que a velocidade de interação da informação seja muito grande, nos ressentimos de um certo isolamento científico, que em grande parte é reflexo do isolamento geográfico. A realização deste evento científico ganha então uma importância suplementar. Especificamente, o contato direto de nossos alunos de pós-graduação e graduação com os palestrantes, tanto de outros centros de pesquisa no Brasil, bem como do exterior. Produzindo diversos desdobramentos interessantes. Deixando de lado um pouco o exagero que me é peculiar, eu poderia traduzir a semana do Encontro Caribenho de Física em uma palavra: entusiamo.

Embora nossa participação no cenário nacional de desenvolvimento científico seja diminuta, isso não nos impede de sugerir e oferecer nossa modesta contribuição. O encontro possui características tanto de escola, bem como para tratar de temas de pesquisa de ponta que estão sendo desenvolvidos dentro e fora da UFRR. Para além de nossas motivações com características locais, vamos semear um espaço que pensamos estar comparativamente vago: a publicação na língua portuguesa do que foi tratado e discutido em nosso evento. Reconhecemos que a publicação em língua inglesa é mais adequada ao desenvolvimento e intercâmbio do conhecimento, o que pode não ser verdade em demais áreas do conhecimento, mas que em Física é uma realidade. Todavia, esta certeza não nos impossibilita de termos também um instrumento de discusão em Física na nossa língua materna.

A velocidade com que o conhecimento da Física evolui em suas diversas áreas é muita rápida, de tal modo que a quantidade de conhecimento a ser discutido pela comunidade é deveras extensa. Logo, nosso intuito é simples e claro: tratar a Física em seus princípios e avanços; realizando a discussão, na medida do possível e da conveniência, também na língua portuguesa.

Miguel Gustavo de Campos BatistaProfessor do Departamento de Física da Universidade Federal de Roraima

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Artigos

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source

G. H Cavalcanti1

E. E. Farias2

F. O. Borges3

A. G. Trigueiros4

Abstract: In this article we study the energy transfer efficiency in influence on the plasma temperature of a small theta pinch. Also we analyze the spectra produced by an argon plasma of intermediate ionization degree recorded in VUV range. We discuss a semi empirical expression used to determine the theta pinch temperature as function of plasma volume, pressure, charging voltage and an energy efficiency transfer. Using few experimental resources like a digital oscilloscope and magnetic probe and a simple thermodynamic model, the appropriate energetic operating parameters of a theta pinch may be established in advance. These predictions were verified spectroscopically and through directly measurement of plasma temperature using the experimental fly time of particle leaving the theta pinch. Two identical PZTs were used to measure the fly time. The plasma temperature versus pressure shows a nonlinear profile that could be explained according to the Paschen´s curve to extraordinary discharge [1].

1. Laboratóriod e Plasma do Instituto de Física – UFF.

2. Laboratório de Plasma e Espectroscopia Atômica (LaPEA) – Departamento de Física da Universidade Federal de Roraima, Campus do Paricarana.

3. Laboratóriod e Plasma do Instituto de Física – UFF.

4. Laboratóriod e Plasma do Instituto de Física – UFF.

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source 12

1. introduction

A theta pinch consists basically of a capaci-tor bank, a fast transmission line, a special switch known as sparkgap and a single loop solenoid, where is introduced a glass tube containing some gas at adequate pressure. At proper conditions, the magnetically induced electrical field cause the gas breakdown and a very dense and hot plasma is formed. Initially, the theta pinch devices were planed to study plasma nearby fusion regimes or in other words, to obtain high temperature and high density plasmas. Many articles [2-4] about these powerful machines were published describing stored energy bigger than 0.5 M Joules. However, due to a very poor energy transfer between the capacitor bank and the plasma volume, the plasma temperatures achieved were considerably little than the expected. Presently the theta pinches have been used in another applications like as spectroscopic light source [5-6] or thin film deposition [7-8].

Working as a spectroscopic light source, this device has some interesting features. It is a copi-ous light source where high ionization stages are obtained and comparatively to other light sources, it is a very low cost. The theta pinch is a versatil-ity machine and could be easily converted from a spectroscopic light source to other finality.

To work properly it is necessary to control the plasma temperature produced by the theta pinch and therefore to control the maximum ionization stage achieved by atoms into the plasma. This

control is made through an appropriated choice of charging voltage of the capacitor bank and the gas filling pressure. Normally the energetic control is empirical and it demands a large experience and frequently improper choices of energetic param-eters occur. The energetic control is decisive to perform the ionic classification of emitted spec-tra which is crucial to conclude the spectroscopic analysis. The ionic classification is made princi-pally comparing the difference introduced into the spectra when some energetic parameter is changed. Ideally the experiment must be carried so that the difference on the spectrum be due to inclusion of spectroscopic line corresponding to transition array of next ionic stage of the working gas.

In this article the energy transfer efficiency between the capacitor bank and the plasma vol-ume was analyzed in a small theta pinch pro-jected to work as a spectroscopic light source of gases in intermediate ionization stages. A simple RLC circuit model it is enough to give the neces-sary theoretical support. Working with 500 Joules, this machine produced an argon plasma of 100 eV approximately and it to reach an efficiency of 40% in converting electric power stored in capacitor bank into plasma kinetic energy.

2. Experimental set up

Our theoretical and experimental analysis has demonstrated that the capacitor bank must be formed preferentially with a large number of

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source 13

capacitors connected in parallel, because the total resistance and intrinsic inductance decrease. Also it is necessary to connect the capacitor bank to a fast transmission line in such way to obtain a system with low contact resistance, low coupling induc-tance and correct high voltage insulation. The theta pinch presented here has a capacitor bank of 4.5 µF and self-inductance lower than 20nH.

The transmission line plays an important role in theta pinch performance. It is responsible to drive the energy from the capacitor bank to the inductively coupled plasma. The transmission line must be projected in so way to minimize its inductance and system resistance. All electrical connection must be performed carefully to mini-mize the contact resistance. To the theta pinch described here, the transmission line and the mag-netic coil was constructed together and was made with a single copper sheet 30 cm wide. This kind of combined transmission line and magnetic coil was used before to generate a magnetic cusp con-figuration [9].

The vacuum system consists of an E2M18 Edwards rotatory pump and a 50 liters/s Balzers diffusion pump. The final pressure in the plasma chamber is better than 10-4 Torr. The plasma cham-ber was made with a 500 mm long and 100 mm of internal diameter pyrex glass tube ended by two inox flanges. A needle valve is used to adjust the working pressure within 1 to 200 mTorr range.

Our main discharge switch consists of a pressurized spark gap. Due to the simplicity of mechanical project, the maintenance is performed very quickly. Normally, maintenance is necessary only after ten thousand shots.

3. theoretical analysis

The energy transfer efficiency or the theta pinch performance was analyzed take into account a sim-ple RLC series model. The resistance RT includes the energy absorbed by plasma (Rp) and the energy wasted by the system (R0). When the discharge

doesn´t produce plasma, the recorded resistance furnish only the R0 value. As it is well known, to this system the current discharge has a sinusoidal exponentially damped form, so the magnetic field for a single loop solenoid may be expressed by:

sinB B e tmt ω φ= +α− ^ h (1)

where the damping factor is defined by LR2α =

and the natural oscillation frequency ω is given by:

LC LR14

22

2

ω = − (2)

Considering a regime where LC LR14 2

2

& .

Following Silbert [10], we define the energy efficiency transfer η as the ratio of the energy driven to the plasma to the total energy stored into the capacitor bank or

i R dt

i R dt

RR

RR R

T

p

T

p

T

T

2

2

0η = = =

##

(3)

The equation 3 may not be used directly to obtain the efficiency. There are basically two way to determine the value of η. The first one is through a non-linear fitting procedure of equation 1 to the experimental magnetic curve decay to obtain the plasma and the system resistances. The second one is rewriting the equation 3 in terms of two extreme values B1 and B2 measured experimentally, a period T apart each other. From equation 1 it is possible to obtain the resistance as:

/lnR TL

B B2

1 2= ^ h (4)

and consequently

ln

ln

TT

BBBB

1p

p

0

2

1

2

1

0η = − c

c

c

m

m

m

(5)

Where the subscripts p and 0 are related to situ-ations with and without plasma respectively.

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source 14

The inductance may be obtained using the equation (2) and in the regime of small resistance may be expressed as:

LC

T4 2

2

π= (6)

The average energy per half-cycle deposited into the plasma volume (l3) is

U NU

N

CV21

Z160

E

2

η η= = (7)

Where N is the effective number of pinches produced in a single capacitor bank discharge.

If we consider a simple model where the absorbed energy by fully ionized plasma is con-verted basically into thermal energy and we assume an equipartition this energy, it is possible to write

k T NU

NCV

nl Nn lC

pV

23

21

2

2

BP

P

L

2

3 3

η η= = = (8)

where the plasma density n is related to the gas fill-ing pressure p by Loschmith´s number nL, Np is the particle number into the reaction volume, N is the

number of effective half-cycles and Nn lC

2 L3 is a

system calibration term.

4. Experimental diagnostic

Our main diagnostic tool was a magnetic probe constructed with 5 turns wounded on a 3 mm nylon core. The coil were mounted at end of RG62B/U coaxial cable that was glass jacketed coated with a thin layer of epoxy to provide mechanic strength, insulation and vacuum seal.

The major theta pinch magnetic field is axial, so the magnetic probe plane was introduced per-pendicularly to axial direction in the middle of magnetic coil. The signals were passively inte-grated and displayed on a digital oscilloscope. The induced voltage across the probe may be written using induction Faraday´s law as:

V NA dtdB

S =− (9)

According equation 9, the magnetic field is proportional to the time integrate of voltage sig-nal. This integration may be performed experi-mentally using a passive RC integrator. To work properly the RC time must be big compare to pulse period, however there are a practical limitation to employ a passive RC integrator because the gain of this integrator is drastically reduced when the RC time increase compared to the period of signal (T). Using the phasor analysis the gain (g) of a passive RC integrator may be expressed as

g VV

RCT1

1 2

1in

out22

2

π

= = −+

c

c

m

m (10)

We have used a RC passive integrator with a 10 K - 1W resistor and a 100 nF - 250 V ceramic capacitor. With these components the integration time RC is 1.0 ms. That implies a gain of 0.6% approximately. The number of turns of mag-netic coil must be small enough to assure a good response time and big enough to produce a measur-able voltage. These two conflicting requirement is one of many practical limitation in the experimen-tal work.

For some conditions of pressure, gas type and charging voltage, the current discharge sig-nals were passively integrated and displayed on a digital oscilloscope and stored. Using theses sig-nals and the equations 1, 2 and 5 some energetic parameters of theta pinch might be determined. To determine the total inductance, for example, we use the capacitance value, measured directly using an electronic capacitor analyzer, the frequency (or period) of signal profile and the equation 2. Through the amplitude decay the damping factor could be determined and so the resistance value. Alternatively, if a digital oscilloscope it is used, the digitalized curve may be used to perform a nonlin-ear fit of equation 1 with L, R ,C, the phase and the signal amplitude being parameters to be adjusted.

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source 15

To obtain the fly time we used two commercial piezoelectric (pzt) placed at symmetry axis 60 cm and 50 cm apart of center of theta pinch. The fly time and consequently the velocity of particle leav-ing the theta pinch were obtained through the time delay between the pzt signals.

5. results and conclusions

The table 01 shows characteristic parameters of the theta pinch. Figure 1 shows the typical oscil-lograms generated by the theta pinch discharge and recorded using a TDS 210 Tectronix Digital Oscilloscope with results of the non-linear fitting procedure. Figure 2 shows typical PZT signals where the time delay may be obtained easily.

Table 1. Some experimental Parameters of theta pinch.

Parameter Value

Capacitance 4.5 µF

Unload resistance 12 mΩ

Energy ≤ 0.5kJ

Total inductance 100 nH

Plasma resistance 8 mΩ

Plasma temperature ≤ 150 eV

Magnetic coil inductance 50 nH

Efficiency 40%

Maximum shot rate 30 s-1

Figure 1. Typical oscillograms generated by the theta pinch discharge.

Figure 2. PZT signals obtained by theta pinch.

We have made exhaustively measurements of the energy transfer efficiency in 5-200 mTorr range. Figure 3 shows that the energy transfer efficiency increases with pressure reaching a saturation level. This level depends principally on sparkgap condi-tion. In the case presented here, the saturation value was around 40% to argon plasma with the capaci-tor bank charged at 10 kV. Our results show that the efficiency drops drastically when the pressure is around 2 mTorr and decreases monotonically at very high pressure (600 mTorr or more) and at intermediate values it remains approximately constant. Low energy efficiency transfer makes impossible to obtain the pinch effect. The fitted efficiency in figure 3 was used to produce the semi empiric plasma temperature given by equation 8. The temperature measured by the fly time was used

to give the calibration term Nn lC

2 L3 of equation 8

around 7.9 to voltage in kV and pressure in mTorr. This is the most favorable pressure to realize the theta pinch discharge. According Paschen´s law the maximum temperature occur at pressure corre-sponding to the minimum energy consumed to pro-duce an induced breakdown. If the applied voltage was less than the critical value associated to this minimum energy, there is no pinch effiect despite of pressure. Conversely, if the charging voltage is bigger than the minimum necessary to obtain the plasma formation, the excess energy is driven to

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Energetic Control of a Theta Pinch Working as a Spectroscopic Light Source 16

heating process. This fact explains the maximum temperature about 8 mTorr and the appearance of the temperature curve resembles in some way, a reciprocal of Paschen´s curve.

Figura 3. The energy transfer efficiency.

The theoretical model used to obtain the equa-tion 8 is very simple and it not takes into account specific MHD process, shock wave theory, influ-ence of mean free path and so on. However it may be useful if the relative changes of energetic parameters are not too big and of practical view-point this equation offers a guide to choice the charging voltage if the pressure were kept constant. Thus making a few preliminary measurements it is possible to plan a complete experiment to achieve a specific ionic stage and to realize a ionic clas-sification task. To give an idea that what this rep-resents, to obtain the efficiency and the pzt signal it is necessary only one shot to each pressure and to obtain a complete spectroscopic plate with eight spectrograms it is necessary around two thousand shots approximately.

The equation 8 may be further improved if the semi empiric term would be avoided. To a constant pressure the a relative expression is

k Tk T

VV

B

B

2

1

2

1= (11)

When the theta pinch was charged with 10 kV at 8 mTorr the maximum ionic stage to an argon plasma was Ar V, whose ionization potential is 75.02 eV. Thus to excite Ar VI ions, whose ioniza-tion potential is 91.01 eV, the equation 11 assure that we must use a new voltage V2 equal to 10

.

.75 0591 01

or 11 kV approximately.

Finally, the experimental results show a good agreement between optical and piezoelectric diag-nostic techniques. We have used the described strategy to plan experiments in theta pinch ionic assignment task in a successful way.

The theta pinch described here was projected to be a spectral light source of some ions at inter-mediated ionic stage at VUV range. At the present moment we have start a systematic experimental endeavor to produce a spectrum of alkaline metal using a theta pinch as spectral light source.

Acknowledgement: We are indebted to Adilson, Nelson, Sergio and Edmilson for technical assistance in carrying the assembly theta pinch. We are grateful to Dr. C. E. Fellows and Dr. D. Franceschini for their sugges-tions. This work was supported by Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro and Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico by project 552498/2011-46 CNPq.

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MensAgitat | ARTIGO 02 | p. 17-30VOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791MensVOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791MensAgitatVOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791

Teorias Neo-NewtonianasJúlio C. Fabris1

Hermano E. S. Velten2

Resumo: A teoria da Relatividade Geral é a moderna teoria da gravitação, tendo substituído a teoria newtoniana na descrição dos fenômenos gravitacionais. No entanto, apesar dos grandes sucessos obtidos pela teoria da Relatividade Geral, a teoria gravitacional newtoniana continua sendo largamente empregada devido ao fato que a teoria da Relatividade Geral incorpora, na maior parte dos casos, apenas pequenas correções às predições newtonianas. Além disto, a teoria newtoniana possui uma grande simplicidade técnica e conceitual quando comparada com a teoria relativista. Neste texto, discutimos a possibilidade de estender a teoria newtoniana tradicional de forma a incorporar efeitos tipicamente relativistas mas guardando a referida simplicidade técnica e conceitual. Denominamos estas extensões de teorias neo-newtonianas. Estas teorias são discutidas principalmente nos contextos cosmológico e da astrofísica de objetos compactos.

Palavras-chave: Gravitação; Relatividade geral; Gravitação newtoniana; Gravitação Neo-Newtoniana.

Abstract: General Relativity is the modern theory of gravitation. It has replaced the newtonian theory in the description of the gravitational phenomena. In spite of the remarkable success of the General Relativity Theory, the newtonian gravitational theory is still largely employed, since General Relativity, in most of the cases, just makes very small corrections to the newtonian predictions. Moreover, the newtonian theory is much simpler, technically and conceptually, when compared to the relativistic theory. In this text, we discuss the possibility of extending the traditional newtonian theory in order to incorporate typical relativistic effects, but keeping the simplicity of the newtonian framework. We denominate these extensions neo-newtonian theories. These theories are discussed mainly in the contexts of cosmology and compact astrophysical objects.Key-words: Gravitation; General relativity; Newtonian gravitation; Neo-newtonian Gravitation.

1. Departamento de Física – UFES. E-mail: [email protected]

2. Departamento de Física – UFES. E-mail: [email protected]

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1. introdução

A teoria newtoniana da gravitação, expressa matematicamente pela lei do inverso do qua-drado da distância, foi durante muito tempo um dos sucessos científicos mais notáveis da história da ciência. Durante pelo menos os dois primeiros séculos que seguiram sua formulação, a gravitação newtoniana explicou todos os fenômenos gravita-cionais observados, desde a queda dos corpos na superfície terrestre até o movimento dos plane-tas no sistema solar. Quando se acreditou que ela estava errada, pois Urano parecia seguir uma órbita distinta da prevista, a certeza que ela era uma teo-ria correta levou à predição da existência de um outro planeta, com massa e órbita bem definidas. A descoberta de Netuno, com todas as características previstas, representou um triunfo indubitável: não apenas a teoria explicava o que já se conhecia, mas tinha poder preditivo, sugerindo a existência do que ainda não havia sido observado. Mesmo hoje, quando a teoria newtoniana não é tida mais como a correta teoria gravitacional, ela continua sendo utilizada em diversas situações em astrofísica e cosmologia.

A emergência da teoria da relatividade restrita no início do século XX levou à substituição da mecânica newtoniana pela mecânica relativista. Essa última, por sua vez, empregava como grupo de simetria fundamental o grupo de Lorentz, em vez do grupo de Galileu utilizado na mecânica newtoniana. Ao mesmo tempo, em íntima relação

com o uso do grupo de Lorentz como estrutura matemática fundamental, a mecânica relativista estabelecia que há uma velocidade limite na natu-reza, a velocidade da luz c. No entanto, para velo-cidades muito inferiores à da luz, os resultados da mecânica relativista são praticamente indistinguí-veis dos resultados da mecânica newtoniana. Isto faz com que o uso de mecânica relativista, na prá-tica, ocorra apenas em algumas situações, a maior parte delas obtidas em sofisticados laboratórios e aceleradores de partículas.

A teoria da relatividade geral substituiu a gravi-tação newtoniana, sendo a moderna teoria da gra-vitação. Além de incorporar conceitos da mecânica relativista, como a velocidade da luz como veloci-dade limite, a teoria da relatividade geral substitui a ideia de força gravitacional pela de curvatura do espaço-tempo. O grupo fundamental passa a ser o grupo de difeomorfismo oriundo da geometria diferencial, e que atua em variedades geométricas. Mas, como ocorre no caso da mecânica relativista, a teoria gravitacional newtoniana é obtida da teoria da relatividade geral no limite em que as veloci-dades são pequenas comparadas com a velocidade da luz e o campo gravitacional é fraco3. Na maior parte dos casos, incluindo sistemas astronômicos como galáxias e aglomerados de galáxias, a gra-vitação newtoniana pode ser usada sem maiores problemas. Já em menores escalas, sistemas este-lares como anãs brancas também são bem descritas

3. O que significa um campo gravitacional fraco, conceito que requer um valor de referência, será definido mais tarde.

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pela teoria newtoniana, mas objetos estelares super compactos, como estrelas de nêutrons, requerem o uso da teoria da relatividade geral.

Os estudos em cosmologia, que compreendem as maiores escalas conhecidas, revelam aspectos curiosos do uso ou da Relatividade Geral ou da teoria newtoniana, segundo o domínio de aplicação de cada uma destas teorias. Quando a Relatividade Geral foi formulada com a estrutura que conhece-mos hoje, em 1915, as informações que se tinha sobre o que chamamos de nosso universo eram muito limitadas: sequer existia a noção da galáxia; os estudos cosmológicos eram incipientes, para não dizer inexistentes. A complexidade da nova teoria, seu caráter altamente não linear, forçava a busca de soluções que exibiam altas simetrias. O interesse evidente pelo estudo de estrelas (objetos sobre os quais já se tinha muitas informações), determinou a busca de soluções estáticas com simetria esfé-rica. Focalizou-se posteriormente em soluções que poderiam representar o universo, suposto inicial-mente homogêneo, isotrópico e estático, configu-ração que permitia se encontrar soluções exatas, mas que logo se revelaram instáveis. Um pouco mais tarde, soluções dinâmicas, representando o que hoje nós denominamos universo homogêneo e isotrópico em expansão, foram determinadas por Friedmann e Lemaître [1-2].

A partir deste momento, e das descoberta que o universo é formado por galáxias, e que estas galáxias estão se afastando umas das outras, caracterizando a expansão cósmica [2-3], deu-se início aos estudos mais rigorosos de cosmologia. Tudo isto foi feito dentro do contexto da teoria da Relatividade Geral. Apenas na década de 30, quando os estudos do universo feitos no contexto relativista já adquiriam bases mais sólidas, foi que se tentou construir uma cosmologia no contexto da teoria newtoniana: a teoria gravitacional mais antiga e mais simples encontrou sua aplicação em cosmologia depois que a teoria gravitacional mais recente e complexa tinha se apoderado deste campo de estudo [4-5].

No entanto, a teoria newtoniana encontrou logo um espaço de aplicação na cosmologia. Na descrição do universo que conhecemos hoje, que se expande e se esfria com o passar do tempo, o universo teria passado por quatro fases: a fase pri-mordial, ainda sob estudos, e que talvez requeira a compreensão de efeitos quânticos em gravitação; a fase radiativa, onde o universo é dominado por um gás de fótons e de partículas relativistas; a fase material, na qual as estruturas cósmicas como as galáxias se formam, onde o universo é dominado por um fluido de matéria sem pressão; e a fase atual, onde o universo parece ser dominado por um fluido exótico, dito energia escura, que con-duz à expansão acelerada do universo. A teoria da Relatividade Geral tem uma característica funda-mental que a torna imprescindível no estudo destas fases: a pressão do fluido desempenha um papel ativo, sendo também fonte do campo gravitacional, algo que não tem equivalente na teoria newtoniana.

No entanto, na fase material, onde a pressão é suposta nula, a teoria newtoniana poderia ser igual-mente aplicada. Como esta é a fase de formação das estruturas, o que exige complexos estudos per-turbativos, a teoria newtoniana encontra ali uma aplicação conveniente, dada à sua simplicidade técnica e conceitual. Aliás, os modernos estudos de formação de estruturas em um universo em expan-são utilizando simulações numéricas, requerem o uso da teoria newtoniana, mesmo que isto implique limitações ao se tentar introduzir componentes em que a pressão desempenha um papel mais impor-tante, como é o caso da energia escura.

É possível estender os estudos newtonianos para as situações onde a pressão desempenha um papel gravitacional ativo? Tenta-se responder a esta pergunta desde os anos 50. Se isto for possí-vel, teríamos uma importante ferramenta em mãos, com impactos profundos nos estudos de formação de estrutura no universo (incluindo as simulações numéricas), na determinação dos observáveis em cosmologia e gravitação (que na teoria newtoniana possuem um sentido mais direto), e da consequente

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comparação da observação com a teoria, questão central hoje nos estudos de fenômenos gravita-cionais. Denominaremos tais possíveis extensões da teoria newtoniana de teorias neo-newtonianas [6-8]. Descrever a busca de uma formação con-sistente de uma teoria neo-newtoniana é o objeto deste texto. Sugerimos também a leitura da refe-rência [9] sobre o mesmo assunto.

No que se segue, revisaremos primeiro a for-mulação newtoniana usual (próxima seção), a for-mulação relativista (seção 3), ambas no contexto cosmológico. Na seção 4 discutiremos como pode-mos tentar incorporar a pressão como fonte do campo gravitacional, o que caracterizaria a teoria neo-newtoniana, discutindo suas aplicação à cos-mologia e ao estudo de estrelas nas seções 5 e 6, respectivamente. Na seção 7, apresentamos nossas conclusões.

2. As equações do fluido newtoniano em presença de um campo gravitacional

A descrição de sistemas auto-gravitantes na teo-ria newtoniana se faz mais adequadamente usando uma descrição de fluidos, pelo menos para os pro-pósitos que temos em mente, a cosmologia e obje-tos estelares. Neste caso, o conjunto equações é,

t 0$2

2d

ρρυ+ =v^ h (1)

tp

$2

2d

dd

υυ υ ρ φ+ =− −

vv v (2)

G42d φ π ρ= (3)

Nestas equações, ρ representa a densidade do fluido, p é a pressão correspondente, υv é o campo de velocidade, φ é o potencial gravitacional. A equação (1), denominada como equação da con-tinuidade, expressa a conservação da matéria. A equação (2), denominada equação de Euler, nada mais é que a segunda lei de Newton re-expressa em termos das variáveis do fluido, sendo que o lado

direito corresponde ao balanço das forças às quais o fluido está submetido, neste caso o gradiente da pressão e a força gravitacional. A equação (3), denominada equação de Poisson, é a reformula-ção diferencial da lei do inverso do quadrado da distância do campo gravitacional. Observe-se que apenas a matéria é fonte do campo gravitacional, algo óbvio no contexto newtoniano, mas menos evidente no contexto relativista.

Consideremos agora a aplicação destas equa-ções à cosmologia. Neste caso, primeiramente ten-tamos incorporar os elementos básicos do universo observado: ele é homogêneo e isotrópico em gran-des escalas, e está em expansão. A homogeneidade e isotropia podem ser incorporadas às equações (1, 2 e 3) supondo que a densidade e a pressão são fun-ções puramente do tempo: ρ = ρ(t) e p = p(t). Por outro lado, a expansão de um universo homogêneo e isotrópico pode ser descrita pela lei de Hubble, tal que,

Hrυ =v v (4)

onde υv é o campo de velocidade dos objetos que compõem o universo, medido por um dado observador, e rv é a distância daqueles objetos a esse observador. Devido à isotropia e homogenei-dade, podemos supor que H, denominado fator de Hubble, depende unicamente do tempo, H = H(t). É conveniente escrever o fator de Hubble em ter-mos de uma função a = a(t), conhecida como fator de escala, tal que,

H aa=o

(5)

Inserindo estas definições nas equações (1, 2 e 3), obtemos as seguintes equações:

aa3 0ρ ρ+ =oo

(6)

aa G

34π

ρ=−p

(7)

Gr3

4dφ

πρ= v (8)

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Observe-se que a pressão não se faz mais pre-sente, o que é natural neste contexto, pois devido à homogeneidade e isotropia o gradiente de pressão é nulo. A solução dessas equações é direta:

,a a t aa

t/3

02 3

00

02ρ ρ ρ= = = −` j (9)

É possível estudar perturbativamente essa con-figuração. Tal estudo é fundamental para a análise do processo de formação de estruturas (galáxias, aglomerados de galáxias, etc.) em um universo em expansão. Isto é feito introduzindo pequenas flutuações em torno das soluções encontradas anteriormente:

, ,ρ ρ δρ υ υ δυ φ φ δφ= + = + = +u vu v v u (10)

onde δρ, δp, δυv e δφ representam as pequenas flu-tuações em torno das soluções encontradas ante-riormente. Um cálculo relativamente longo, mas padrão, retendo unicamente os termos lineares nas quantidades perturbadas, leva à equação para o contraste na densidade δ, definido como,

δ ρδρ

= (11)

tal que,

aa

kac

G2 4 0s22

2

δ δ π ρ δ+ + − =p o o ' 1 (12)

Nessa expressão, cp

s2

2

2

ρ= e a velocidade do

som, e k é o número de onda associado à decompo-sição de Fourier, ,f t x f t eik x= $v v v^ ^h h .

Note-se que a equação (12) tem a forma da equação de um oscilador harmônico amortecido (o amortecimento ocorrendo graças à expansão do universo), onde dois efeitos competitivos definem o crescimento do contraste da densidade: a velo-cidade do som do fluido, que gera oscilações no comportamento de δ e a atração gravitacional, que tende a induzir a condensação das perturbações.

Uma outra aplicação importante das equações (1, 2 e 3) se refere ao equilíbrio estelar. Neste caso,

consideramos uma configuração estática e radial, o que implica υv = 0 e que todas as funções res-tantes (ρ, p e φ) dependem unicamente da coorde-nada radial. Assim, o sistema acima se reduz a ao seguinte conjunto de equações:

drdp

drd

ρφ

=− (13)

' ' 'drd

rG

r r dr4 r

22

0

φ πρ= ^ h# (14)

Estas equações podem ser reescritas como,

drdp

rG m r

2

ρ=−

^ h (15)

' ' 'm r r r dr4r

2

0π ρ=^ ^h h# (16)

Em geral, as estrelas podem ser modelizadas por fluidos barotrópicos, definidos como sendo aqueles em que a pressão depende apenas da densidade da matéria, p = p(ρ). Em particular, uma dependência do tipo de lei de potência, do tipo p = Kρn, onde K e n são constantes, se revela bastante conveniente. As estrelas mais comuns, representadas no dia-grama de Hertzprung-Russel, podem ser descri-tas, grosso modo, por estas expressões. A equação (15) reescrita usando os fluidos barotrópicos sob a forma de lei de potência, e feita sem dimensão, é denominada de equação de Lane-Emden.

3. A teoria da relatividade geral

Existem duas principais diferenças da teoria da Relatividade Geral em relação à sua antecessora, a gravitação newtoniana. Em primeiro lugar, o prin-cípio relativista de uma velocidade limite na natu-reza é incorporado. Em segundo lugar, a noção de força gravitacional é substituída pela de curvatura do espaço-tempo. A introdução da velocidade limite torna a nova teoria gravitacional compatível com a teoria da relatividade restrita. A geometrização da interação gravitacional permite introduzir na nova teoria o princípio de equivalência, que estabelece

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na sua forma fraca, que todos os corpos reagem da mesma forma ao campo gravitacional, independen-temente de sua massa. Assim, todos corpos seguem geodésicas no espaço-tempo, suposto curvo e com estrutura geométrica riemanianna. Desvios das trajetórias geodésticas ocorrem apenas quando os corpos são submetidos a forças não-gravitacionais.

A geometria da teoria da Relatividade Geral é definida no espaço-tempo quadridimensional. A distância infinitesimal entre dois pontos nesta geo-metria é fornecida pela métrica,

ds g dx dx2 = µνµ ν (17)

onde adotamos a convenção da soma, segundo a qual índices repetidos supõem uma somatória, e gµν são os coeficientes métricos que definem localmente a geometria do espaço-tempo a quatro dimensões.

As equações de Relatividade Geral são equa-ções tensoriais, onde o lado esquerdo está relacio-nado à geometria do espaço-tempo, e o lado direito descreve a distribuição de matéria e energia. Essas equações têm a forma,

R g RcGT2

1 82

π− =µν µν µν (18)

0T; =µµν (19)

Na equação (18), Rµν é o tensor de Ricci, defi-nido por,

R 2 2Γ Γ Γ Γ Γ Γ= − + −µν ρ µνρ

ν ρµρ

µνρ

ρσσ

µσρ

ρνσ (20)

sendo Γµνρ a conexão christoffeliana, definida por,

g g g g21

2 2 2Γ = + −µνρ ρσ

µ σν ν σν σ µν^ h (21)

O escalar de Ricci é definido como R = gρσRρσ. Por sua vez, o tensor de momento-energia Tµν depende do tipo de matéria ou campo que estamos considerando. Para um fluido perfeito com quadri--velocidade uµ, ele tem a forma,

Tcpu u pg2ρ= + −µν µ ν µνc m (22)

A equação (19) é consequência das chamadas identidades de Bianchi, que estabelece que a qua-dri-divergência do lado esquerdo da equação (18) é identicamente zero.

Na descrição cosmológica, usa-se o fato que o universo é, em grande escala, homogêneo e isotró-pico. Assim, a métrica tem a seguinte forma,

ds c dt a t dx dy dz2 2 2 2 2 2 2= − + +^ ^h h (23)

onde assumimos que o a seção espacial tridimen-sional é plana, e a(t) é o fator de escala. Neste caso, as equações (18, 19) se reduzem a,

aa

G82

π ρ=oc m (24)

aa

aa

Gcp

2 82

2π+ =−p oc m (25)

aa

cp

3 02ρ ρ+ + =ooc m (26)

Devido às identidades de Bianchi, apenas duas destas equações são independentes. Observe que a pressão desempenha um papel determinante no comportamento de a(t) ao contrário do que ocorre na cosmologia newtoniana descrita na seção anterior.

As soluções de (24, 25 e 26) dependem da equação de estado do fluido. Para uma dependên-cia linear da pressão com a densidade, p = ωρc2, constante, essas equações podem ser facilmente resolvidas, implicando em,

a a t0 3 1

2

= ω+^ h (27)

Quando ω = -1 (que corresponde a chamada equação de estado do vácuo quântico), o fator de escala cresce exponencialmente. Apenas quando a pressão é nula, ω = 0, a solução relativista coincide com a solução newtoniana. No entanto, para o caso de um universo dominado por um fluido radiativo, caracterizado por ω = 1/3, o fator de escala evolui como a ∝ t1/2, o que difere do caso newtoniano. Para um universo dominado por energia escura, para o

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qual ω < -1/3 a diferença é ainda mais pronunciada: o universo expande aceleradamente, algo impossí-vel de se obter no caso newtoniano, devido à natu-reza puramente atrativa da gravitação. Lembramos que as observações indicam que o Universo deve ser atualmente dominado por energia escura.

As dificuldades conceituais e técnicas da teo-ria da Relatividade Geral se tornam consideráveis quando se procura estudar perturbações em torno do modelo cosmológico descrito acima. Um dos motivos é a alta não-linearidade das equações da Relatividade Geral. Outro motivo é que essas equações são invariantes por difeomorfismo, o que implica invariância por transformações gerais de coordenadas. Este último fato gera dificuldades em identificar quais são as perturbações físicas e quais são os efeitos da escolha de um sistema de coordenadas.

Estas dificuldades geraram diversos forma-lismos para abordar o problema perturbativo em cosmologia, e identificar os observáveis físicos. No entanto, o problema se simplifica considera-velmente quando a pressão é nula. Neste caso, o contraste na densidade se comporta como,

aa

G2 4 1 1 3 0δ δ π ω ω ρδ+ − + + =p o o ^ ^h h (28)

Esta equação perturbada se assemelha com a newtoniana correspondente mostrada na seção precedente, em duas situações; quando a velo-cidade do som é nula (o que implica novamente pressão nula), e neste caso as equações coinci-dem; quando o número de onda k é nulo, o que implica perturbações em grandes escalas. Neste último caso, no entanto, as soluções são diferen-tes do caso newtoniano correspondente, devido ao comportamento do fator de escala; a correspon-dência é completa unicamente no caso de pressão nula, novamente.

O caso do equilíbrio de uma estrela é bem mais complexo na teoria da Relatividade Geral. A equa-ção do equilíbrio hidrodinâmico estelar lê-se, neste caso, como [10],

drdP

rG

cp

rcGm r

m r rcp

12

4

2 2

2

32

ρπ

=− +

+c

^e

^

mho

h

(29)

Esta é equação TOV, acrônimo para Tolman-Oppenheimer-Volko, os primeiros autores a estu-dar o problema do equilíbrio estelar no contexto da relatividade geral. A equação TOV se reduz à equa-ção newtoniana correspondente apenas quando se toma o limite c → ∞, o que implica desconsiderar a existência de uma velocidade da luz na natureza, condição imposta pelo princípio relativista. De uma forma geral, as condições para o equilíbrio estelar em Relatividade Geral são bem diferentes das condições newtonianas correspondentes. Essas diferenças, no entanto, são desprezíveis quando a pressão não é muito importante, comparada com a densidade de matéria, o que ocorre para boa parte das estrelas que formam a sequência principal no diagrama de Hertzsprung-Russel. No entanto, para objetos compactos, como as estrelas de nêutrons, os resultados relativistas são diferentes dos newto-nianos, tanto qualitativa quanto quantitativamente.

Neste momento podemos definir o que enten-demos por campo fraco (quando a teoria newto-niana pode ser usada) e campo forte (quando a teoria relativista deve forçosamente ser usada). Para isto, definimos a grandeza sem dimensão k = GM/Rc2, que nada mais é que o potencial gravitacional dividido pela velocidade da luz ao quadrado. Esta quantidade fornece a razão entre o efeito gravitacional e o efeito relativista. Quando k << 1 temos o campo fraco; quando k é da ordem da unidade os efeitos relativistas são consideráveis e estamos no regime de campo forte.

4. As teorias neo-Newtonianas

A teoria da Relatividade Geral descrita na seção precedente tem como base o princípio da equiva-lência. O princípio da equivalência estabelece que todos os corpos reagem ao campo gravitacional da

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mesma forma, independentemente de sua massa. Uma das consequências diretas disto é que, local-mente, o campo gravitacional é indistinguível de um referencial acelerado. A forma de se introdu-zir a universalidade do princípio da equivalência é geometrizar a interação gravitacional, fazendo com que o campo gravitacional seja apenas um efeito da curvatura do espaço-tempo a quatro dimensões. Neste caso, todos os corpos sob ação apenas da gravitação seguirão geodésicas nesta geometria curva. Consequentemente, todos os corpos reagem igualmente à gravitação e o princípio da equivalên-cia está automaticamente incorporado.

O princípio da equivalência é baseado na igual-dade entre a massa inercial, cujo conceito está rela-cionado à segunda lei da mecânica newtoniana, e a massa gravitacional, definida pela lei da gravita-ção newtoniana. Podemos, no entanto, definir três tipos de massa: a inercial, definida acima, a gra-vitacional passiva e a gravitacional ativa. A massa inercial indica como um corpo reage a uma força arbitrária conforme a famosa lei de força F ma=v v

; a massa gravitacional passiva determina como um corpo reage ao campo gravitacional; e a massa gravitacional ativa indica como um corpo cria o campo gravitacional. O princípio da equivalência, na sua forma fraca, implica a igualdade entre a massa inercial e a massa gravitacional passiva. No entanto, existem outras formulações do princípio da equivalência, podendo implicar a igualdade dos três tipos de massa.

Nosso objetivo agora è tentar criar uma for-mulação da teoria newtoniana tal que efeitos típi-cos da Relatividade Geral sejam incorporados em um contexto espaço-temporal newtoniano (tempo como parâmetro externo universal, espaço tridi-mensional euclidiano). Uma das consequências da teoria Relatividade, enfatizado na seção anterior, é o papel gravitacional desempenhado pela pres-são, isto quando se usa um fluido ou campo como fonte do campo gravitacional. Uma tentativa neste sentido seria identificar a massa inercial e a massa gravitacional passiva como sendo dada por ρ +

p, ao passo que a massa gravitacional ativa como sendo ρ + 3p. Tais identificações parecem arbitrá-rias, no entanto a nova expressão para a massa gra-vitacional ativa está intimamente relacionada com a noção de condição de energia forte, que diz, no contexto da teoria da Relatividade Geral, quando uma configuração gravitacional (considerando a pressão) possui efeito atrativo ou repulsivo.

Segundo a proposta de construção de uma teo-ria neo-newtoniana, incorporando efeitos relativis-tas à teoria newtoniana, descrita acima, as novas equações da continuidade, de Euler e de Poisson teriam a seguinte forma:

t p 0$2

2d

ρρ υ+ + =v^ h6 @ (30)

t pp

$2

2d

dd

υυ υ

ρφ+ =−

+−

vv v (31)

G p4 32d φ π ρ= +^ h (32)

Observe-se que a corrente de matéria e a segunda lei de Newton incorporam os novos con-ceitos de massa inercial e massa gravitacional passiva, ao passo que a nova equação de Poisson utiliza o novo conceito de massa inércia ativa. Por simplicidade, nas expressões acima utilizamos um sistema de coordenadas onde c = 1.

Uma outra possibilidade de se construir uma teoria neo-newtoniana da gravitação consiste em utilizar argumentos termodinâmicos ao se reescre-ver a equação da continuidade. De fato, a iden-tificação descrita acima para a massa inercial é incompleta: na equação da continuidade, o termo com derivada temporal (associado à massa contida em um volume V) continua tendo a forma anterior. Isto foi feito para guardar contato com o limite da teoria da Relatividade Geral na aproximação de campo fraco e baixas velocidades, quando a teoria deve se reduzir à newtoniana no limite de ordem zero, com correções em primeira ordem. No entanto, podemos modificar a equação da con-tinuidade ao evocar a primeira lei da termodinâ-mica e o papel que a pressão nela exerce: a pres-

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são está relacionada ao trabalho realizado quando o volume do sistema se expande. A expansão do volume por sua vez está relacionado ao divergente do campo de velocidade.

Baseado nas considerações acima, podemos propor o novo conjunto de equações como sendo o seguinte:

t p 0$ $2

2d d

ρρυ υ+ + =v v^ h (33)

t pp

$2

2d

dd

υυ υ

ρφ+ =−

+−

vv v (34)

G p4 32d φ π ρ= +^ h (35)

As equações (30, 31 e 32) definirão o que cha-maremos daqui por diante de teoria neo-newto-niana tipo I (NNI), enquanto as equações (33, 34 e 35) definirão a teoria neo-newtoniana tipo II (NNII). Nas próximas seções analisaremos as con-sequências destas equações para a cosmologia e a condição de equilíbrio estelar.

5. teorias neo-newtonianas em Cosmologia

Como já comentado anteriormente, uma abor-dagem newtoniana para a evolução do cosmos uti-liza conceitos da mecânica dos fluidos. Nesse caso, adotando o princípio cosmológico e a lei de Hubble, define-se o campo de velocidades deste fluido que compõe o universo como sendo Hrυ =v v. Além disto, a pressão e a densidade dependem unicamente do tempo. Quando utilizamos, neste contexto, as equa-ções newtonianas usuais, (1, 2 e 3), obtemos um comportamento que independe da pressão. Isto era esperado, pois em um universo homogêneo e iso-trópico o gradiente de pressão é nulo, e consequen-temente as soluções obtidas são as mesmas para qualquer tipo de expressão que consideramos para a pressão. No entanto, as equações da Relatividade Geral dependem crucialmente da pressão, mesmo sob as hipóteses de homogeneidade e isotropia. No jargão usual, a pressão gravita.

As modificações introduzidas no âmbito da teoria newtoniana por suas extensões ditas neo--newtonianas modificam substancialmente essa situação: as equações (30, 31 e 32) e (33, 34 e 35) fornecem exatamente o mesmo tipo de evolução para a dinâmica de fundo do universo, quando se considera as hipóteses de homogeneidade e isotro-pia. Basicamente, obtemos as leis de Friedmann para o fator de escala a(t), descritas pelas equações (24, 25 e 26). A real diferença entre estes conjuntos de equações surge ao se estudar o comportamento das pequenas perturbações associadas a densidade de matéria δρ. Como nesse caso existem gradientes das perturbações da pressão, percebe-se que (30) e (33) podem conduzir a resultados distintos. Disso, como veremos a seguir, chega-se a conclusão que NNII é o sistema ideal para a cosmologia.

A introdução de pequenas perturbações em torno da solução cosmológica no contexto do con-junto de equações (30, 31 e 32), fornece (após a linearização descrita na seção 2 e da decomposição em modos de Fourier) a seguinte equação para a evolução do contraste na densidade [8]:

2 aa

ack G

aak a

ak

4 1 1 3s

2

22

2 $ d

δ δ π ω ω ρ δ

ω δ ω δ

+ + − + +

=− −

p o o

p o v o

^ ^h h' 1 (36)

Ao deduzir esta equação consideramos uma equação de estado do tipo p = ωρc2, com ω cons-tante. Esta é uma equação bastante distinta da que deduzimos anteriormente, sobretudo devido aos termos que aparecem no seu lado direito da igualdade. No entanto, quando a pressão é nula, ou quando as escalas são suficientemente grandes tais que o número de onda pode ser desprezado, então reobtemos a mesma equação que na teoria da Relatividade Geral, sob condições similares.

No caso da teoria NNII, a equação perturbada correspondente que descreve a evolução do con-traste na densidade, assume a seguinte forma:

aa

ack G2 4 1 1 3 02s

2

2

δ δ π ω ω ρ δ+ + − + + =p p o ^ ^h h' 1 (37)

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Teorias Neo-Newtonianas26

Esta ainda não é a equação relativista (cuja forma, é preciso lembrar, depende do formalismo utilizado). Em geral, a equivalência pode não ser completa [11]. No entanto, neste novo caso as dife-renças são muito menos notáveis. Em alguns casos, porém, as diferenças são muito pouco importantes, e isto não apenas para perturbações em grandes escalas: perturbações em pequena escalas tam-bém podem ser enfocadas coerentemente na teoria NNII.

A última afirmação acima foi demonstrando no artigo [12], onde se analisou o caso de um universo homogêneo e isotrópico preenchido por um fluido viscoso. Utilizando tal componente dissipativa, tenta-se dar aos fluidos cósmicos um caráter mais realista. A viscosidade foi descrita no âmbito do formalismo de Eckart. No caso relativista a pressão viscosa assume a forma,

;p u aa30 0ξ ρ µ µ ξ ρ=− =−ν νo

(38)

onde ξ0 e ν são constantes, e a hipótese de um uni-verso homogêneo e isotrópico foi utilizada. No contexto newtoniano, esta expressão é dada por,

p aa30 0$dξ ρ υ ξ ρ=− =−ν νvo

(39)

Quando se usa a teoria NNII, obtém-se, após um cádulo longo, mas direto, a seguinte expressão para a evolução no contraste na densidade:

H H

G H HH

ap

Hp p

G H HH

H

2 3 1

4 1 6 3 13

3

12 1 15 9 13

3

2

2

2

2 2

d

δ ωω

ω

δ π ρ ω ω ωωω

δ

ρ

δρδ

ρδ

π ρ ω ωωω

+ − −+

+ − + − − −+

= − +

+ − − ++

p o

o oo

o

oo

c

^

^

m

h

h

;

;

E

E

(40)

Nesta equação, H aa=o

, /pω ρ= e δp é a pertur-

bação do termo da pressão viscosa.A equação relativista correspondente no calibre

síncrono não possui uma forma simples em termos

de uma equação única. Ao contrário, as perturba-ções obedecem ao seguinte sistema de equações:

a H Hp

1 3 3 3δ ωθ

φ ωδ ρδ

=− + − + −o o^ ch m (41)

Hak p

ak

1 3 1 1

2 2

θ ω θω

ωθ

ω ρδ

φ=− − −+

++

+o o^

^h

h (42)

onde ik j jθ υ= é a divergência do velocidade per-turbada do fluido e φ está relacionado às perturba-ções na métrica.

Apesar da estrutura aparentemente muito dife-rente do caso neo-newtoniano e do caso relativista, quando se considera perturbações que se encon-tram na faixa das observações disponíveis hoje (aproximadamente entre dezenas e centenas de megaparsecs), os resultados são muito similares, como mostra, a título puramente exemplificativo, a figura 1.

O fato que, para escalas de interesse observa-cionais os resultados da teoria NNII são essencial-mente idênticos aos relativistas, abre perspectivas muito interessantes, sobretudo no que diz respeito ao estudo de simulações numéricas. Estes estudos procuram determinar a formação das estruturas locais (galáxias por exemplo), e requerem uma for-mulação newtoniana. No momento, se emprega o formalismo newtoniano usual. Mas, existe possibi-lidade de se ter, a partir dos resultados acima, um formalismo neo-newtoniano consistente.

6. teorias neo-newtonianas e o equilíbrio estelar

O problema de equilíbrio estelar é outro campo importante de aplicação de teorias gravitacionais. O equilíbrio de uma estrela é mantido pelo balanço do gradiente da pressão no seu interior, provo-cado pelas reações nucleares que geram a energia emitida pela estrela, e a atração gravitacional, que tende a colapsar a estrela. As diversas fases da vida de uma estrela, representadas em sua maioria no diagrama de Hertzsprung-Russel, revelam os

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Teorias Neo-Newtonianas 27

diversos mecanismos de queima da fusão nuclear no interior das estrelas. Estas fusões são responsá-veis pela geração de elementos químicos do Hélio até o ferro. A partir do ferro, os processos de explo-são estelar (supernovas) é que sintetizaram estes elementos mais pesados. O deutério, por sua vez, é sintetizado no universo primordial, em seus pri-meiros minutos de existência.

Para as estrelas ordinárias, o valor absoluto da pressão não é comparável à densidade de energia, mesmo que o seu gradiente possa ser muito grande. No entanto, a vida de uma estrela pode conduzir, no seu fim, a objetos compactos. O primeiro seriam as anãs brancas, estrela fria que não gera mais ener-gia e cuja configuração de equilíbrio é determinada pela degenerescência quântica eletrônica. Apesar de fazer uso de conceitos tipicamente quânticos

para a compreensão de seu estado de equilíbrio, a anã branca ainda pode ser descrita pela gravitação newtoniana.

O segundo objeto compacto, com raio e den-sidade muito maiores que as anãs brancas, seriam as estrelas de nêutrons, onde a atração gravita-cional é compensada pela degerescência quân-tica dos nêutrons. Neste caso, os efeitos gravi-tacionais relativistas já se tornam consideráveis: estrelas de nêutrons possuem massa de algumas massas solares, comprimidas em um volume de raio de alguns quilômetros. Isto implica densida-des da ordem de,

~ ~VM

cmg

cmg

1010

1018

33

315

3ρ = (43)

densidade esta que é típica da matéria nuclear.

Figura 1. Crescimento das perturbações correspondentes a galaxis anãs, k = 1000hMpc-1 (painéis superiores) e escalas galáticas, k = 0.2hMpc-1 (painéis inferiores) assumindo ν = -1/2 na teoria de Eckart. Linhas sólidas correspondente ao modelo cosmológico padrão (ΛCDM), ao passo que a linha vermelha pontilhada refere-se à teoria newtoniana usual para o caso viscoso, a linha azul para a teoria neo-newtoniana e a linha pontilhada preta ao caso relativista viscoso. As linhas horizontais delimitam o regime não linear.

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Teorias Neo-Newtonianas28

Em geral, para definir a importância dos efeitos relativistas se usa o indicador dimensional definido

na seção 3, kRcGM

2= . Quando um objeto, com raio

R e massa M possui um k 1L , os efeitos relativis-

tas não podem ser ignorados. No caso das estrelas de nêutrons, k ~ 0,1. Nesta situação, o uso da teoria da Relatividade Geral para descrever as estrelas de nêutrons não pode ser evitado.

A equação que descreve o equilíbrio estelar na teoria gravitacional newtoniana è a de Lane-Emden, mostrada ao fim da seção 2. A sua corres-pondente relativista é a equação TOV mostrada na seção 3. No caso das teorias neo-newtonianas, podemos também deduzir uma equação de equilí-brio estelar utilizando as hipóteses de estaticidade (υv = 0) e de dependência apenas da coordenada radial para a densidade, pressão e potencial gravi-tacional. Seguindo os mesmos passos que conduzi-ram à equação de Lane-Emden, obtemos a seguinte equação para o equilíbrio estelar para as duas teo-rias neo-newtonianas descritas na seção 4:

drdp

rGm r

p2 ρ=− +^^h

h (44)

drdm r

Gr p4 32π ρ= +^

^h

h (45)

Essas equações diferem tanto da sua corres-pondente newtoniana quanto da equação TOV da Relatividade Geral. No entanto, elas têm uma estrutura mais próxima da equação relativista, com a pressão tendo um papel mais relevante que no caso puramente newtoniano.

Na figura 2 utilizamos um modelo bem simples para a configuração estelar onde apenas nêutrons formam um gás de Fermi degenerado no interior estelar. Mostramos o diagrama massa-raio para as estrelas de nêutrons, para os três casos: o newto-niano, o relativista e o neo-newtoniano [13]. A equação newtoniana prevê a possibilidade de for-mação de objetos indefinidamente compactos, em contradição com a observação, que prevê um

limite neste diagrama, mostrado pelo máximo no diagrama massa-raio; as teorias neo-newtonianas reproduzem o resultado qualitativo relativista, mas prevêm a possibilidade de objetos com maior den-sidade que no caso relativista.

Figura 1. Diagrama massa-raio para as estrelas de nêutrons utilizando a teoria newtoniana, a Relatividade Geral (TOV) e a teoria neo-newtoniana. O raio é dado em quilômetros e a massa em unidades de massa solar, M9 .

Na análise neo-newtoniana há uma dificuldade que merece ser citada. Temos três definições de densidade: ρ, ρ + ρ e ρ + 3p. Qual delas devere-mos utilizar no diagrama massa-raio? Esta é uma questão cuja resposta é pouco clara. No caso da Figura 2 utilizamos a definição usual, que coincide com a newtoniana. O emprego das outras possibi-lidades preservaria qualitativamente os resultados descritos acima, mas modificaria os valores abso-lutos mostrados na Figura 2.

7. observações finais

Neste ano de 2015 se comemoram os 100 anos da teoria da Relatividade Geral, a moderna teoria da gravitação apresentada na referência [14] em 1915. A teoria da Relatividade Geral visava cor-rigir dois aspectos incompletos da teoria gravita-cional newtoniana: a ausência da noção de uma velocidade limite na natureza, a velocidade da luz, necessária devido à universalidade da teoria da Relatividade Restrita; incorporar de forma consis-

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Teorias Neo-Newtonianas 29

tente o princípio da equivalência, que estabelece a igualdade entre as massas inercial e gravitacio-nal, conforme indicado pela experiência. A teoria da Relatividade Geral logrou também explicar alguns fenômenos gravitacionais, que do ponto de vista newtoniano apareciam como anomalias não recebendo nenhuma explicação plausível, como o avanço do periélio de Mercúrio. A teoria da Relatividade Geral recebeu formidáveis confir-mações observacionais e experimentais, como des-crito na referência [15].

No entanto, a teoria newtoniana continua sendo ainda empregada na maior parte das situações. Em primeiro lugar, porque a teoria da Relatividade Geral conduz na maior parte dos casos a correções peque-nas – e, frequentemente, negligenciáveis – à teoria newtoniana. Em segundo lugar, porque o arcabouço matemático e conceitual da teoria newtoniana é sen-sivelmente mais simples; a teoria newtoniana tam-bém se acorda mais facilmente à intuição comum.

Por outro lado, existem situações onde é impos-sível ignorar a teoria da Relatividade Geral. Dois exemplos são a cosmologia, na maior parte das fases da evolução cósmica, e os objetos astrofí-sicos compactos, como estrelas de nêutrons. No caso da cosmologia, existe uma coincidência entre as predições newtonianas e relativistas para a fase material, quando a pressão é nula, mas nas fases primoridal, radiativa e acelerada do universo, a descrição newtoniana é inteiramente inadequada, principalmente porque a teoria newtoniana não é capaz de incorporar efeitos da pressão em um uni-verso homogêneo e isotrópico. No caso de objetos compactos, e especificamente no caso das estre-las de nêutrons, a teoria newtoniana é incapaz de prever a relação massa-raio observada. Devemos ainda acrescentar que a teoria newtoniana não é capaz de predizer a existência de buracos negros, objetos possivelmente existentes em sistemas astrofísicos e galáticos, que se revelam estruturas essencialmente relativistas.

No entanto, a teoria newtoniana continua a ter um papel a desempenhar devido às já mencionadas

simplicidades matemáticas e conceituais, e seria desejável estender a formulação newtoniana de forma a incorporar efeitos típicos da Relatividade Geral, isto sem comprometer os aspectos matemá-ticos e conceituais da teoria newtoniana usual. Tais extensões caracterizam as teorias neo-newtonianas discutidas neste texto. A chave para criar estas extensões se baseia em modificar a maneira como a massa é introduzida na teoria newtoniana, defi-nindo uma nova massa inercial e uma nova massa gravitacional que incorporem os efeitos da pressão.

Discutimos duas possibilidades de se proceder a estas extensões, levando às teorias neo-newtonianas tipo I e II apresentadas anteriormente. A teoria tipo II revelou-se mais promissora, sobretudo devido às suas aplicações à cosmologia: além de reproduzir a evolução do universo não perturbado em todas suas fases, ela fornece resultados perturbativos coerentes com os obtidos na teoria da Relatividade Geral, pelo menos para as escalas de interesse observacional. No entanto, apesar de reproduzir qualitativamente o diagrama massa-raio das estrelas de nêutrons, do ponto de vista quantitativo, algumas discrepâncias aparecem. Isto revela que a criação de uma teoria neo-newtoniana que incorpore o essencial dos efei-tos relativistas em um contexto matemético e con-ceitual newtoniano é um projeto ainda em anda-mento. Por sinal, além das propostas apresentadas aqui, outras propostas surgem na literatura [16].

O fato é que a construção de uma teoria neo--newtoniana seguindo o plano delineado acima teria fortes impactos sobre os estudos de simula-ção numérica, que visam a reproduzir as estruturas não lineares observadas no universo, assim como o estudo de buracos negros análogos [17]. Esperamos que este programa de pesquisa conduza a resultados de alta relevância científica em um futuro próximo.

Agradecimentos: JCF e HESV agradecem ao CNPq e à FAPES por apoio financeiro parcia. JCF agradece aos organizadores do Encontro de Física da Amazônia Caribenha pela calorosa hospitalidade em Boa Vista, Roraima, durante este evento.

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Teorias Neo-Newtonianas30

8. referências

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[17] J.C. Fabris, O.F. Piattella, H.E.S. Velten, I.G. Salako e J. Tossa, Mod. Phys. Lett. A28, 1350169 (2013).

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MensAgitat | ARTIGO 03 | p. 31-40VOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791MensVOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791MensAgitatVOLUME 09 - NÚMERO 02 - 2014 ISSN 1809-4791

Análise Mineralogia e Magnética de Solos do Norte da Amazônia

Cássio Sanguini Sergio1

Valdinar Ferreira Melo2

José Lindolfo Renda3

Roberto Câmara de Araújo4

João Maria Soares5

Resumo: As alterações ocorridas durante os processos evolutivos dos solos e as ações antrópicas, tanto na superfície quanto em subsuperficie, podem revelar indícios da dinâmica pedoambiental. Estudos das características mineralógicas e químicas dos solos por técnicas refinadas reforçam as avaliações dos fenômenos, contribuindo para identificação e interpretações dos solos. Difratometria de raios X e espectroscopia Mössbauer foram utilizadas para caracterização mineralógica e comportamento magnético de solos de Roraima. Para esse objetivo, coletaram-se amostras de solos na serra Nova Olinda (formação Boa Vista com forte influência de afloramentos da formação Apoteri), na serra do Tucano (formação Boa Vista com influência de afloramentos da formação Serra do Tucano) e também próximo à cidade de Bonfim (com influência da formação Apoteri). Os solos apresentaram predominância dos óxidos de ferro: magnetita, maghemita, goethita e hematita. Todas as amostras apresentaram magnetita, mineral herdado dos materiais de origem, quando estes apresentavam rochas básicas nas proximidades dos pontos de coleta. Apenas a amostra coletada nas proximidades de Bonfim revelou predominância de hematita, caracterizando um solo com forte influência do material de origem, basalto, e do clima quente e seco da região. As demais amostras revelaram ausência de hematita e a presença marcante de goethita e maghemita (com quantidade maior destes minerais na parte subsuperficial dos solos, se comparado com a parte superficial) por razão de maior intemperismo e condições mais úmidas das regiões.

Palavras-chave: Raios X; Mössbauer; Óxidos de ferro; Magnetita; Maghemita; Hematita.

Abstract: MAGNETIC AND MINERALOGY ANALYSIS OF SOILS OF NORTHERN AMAZON. Changes along the evolutionary processes of soils and atrópicas actions, on surface and subsurface, may reveal evidence of pedoambiental dynamics. Studies of mineralogical and chemical characteristics of soils by refined techniques reinforce assessments of phenomena that contribute to identification and interpretation of these. X-ray diffraction and Mössbauer

1. Departamento de Física da Universidade Federal de Roraima.

2. Departamento de Solos e Engenharia Agrícola da Universidade Federal de Roraima.

3. Mestrando do Programa de Pós-graduação em Física da Universidade Federal de Roraima.

4. Departamento de Física da Universidade Federal de Roraima.

5. Departamento de Física da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

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Análise Mineralogia e Magnética de Solos do Norte da Amazônia 32

1. introdução

O estado de Roraima (Brasil), na sua parte central, está recoberto por uma vasta cobertura do período Terciário, que foi denominada de formação Boa Vista. Além de cobrir toda a Bacia do Tacutu, essa unidade recobre também a área compreendida entre os Rios Mucajaí, Branco e Uraricoera, e entre os Rios Uraricoera e Tacutu [1]. A formação Boa Vista é constituída por areias, argilas e cascalhos semiconsolidados de granulação fina a grossa, e camadas lateríticas, cuja espessura pode atingir até 120 m [2].

Junto à formação Boa Vista, aflora em forma de morros residuais suaves de até 200 m de altura, a formação Serra do Tucano, de idade cretácea [3]. A formação Serra do Tucano é essencialmente are-nosa composta de arenito, médio a grosseiro, sili-cificado e caulínico. Constitui a serra do Tucano, localizada na margem da BR-401, sentido municí-pio de Boa Vista – Bonfim.

Em superfície, também aflorando de maneira associada à formação Boa Vista, ocorre a forma-ção Apoteri originada no período Jurássico (entre Mesojurássico e Neojurássico) estando a sua gênese e evolução ligadas ao processo de abertura da parte meridional do Atlântico Norte. Essa uni-dade ocorre na serra Nova Olinda (ao norte de Boa Vista), no morro Redondo (margem da BR-401) e

nas imediações da fazenda Belo Horizonte (pró-ximo a Bonfim). A formação Apoteri é composta de derrames sucessivos de basalto cinza-escuro a esverdeado, e às vezes com intercalações de areni-tos e conglomerados arcoseanos [4]. Os derrames são vários, podendo ser contados de 4 a até 18 pul-sos magmáticos [2].

A formação Serra do Tucano e a formação Apoteri influenciam a pedogênese do solo adja-cente, fornecendo material de origem que difere do material da formação Boa Vista. Pesquisas rea-lizadas pelo Projeto Radam Brasil [5], obtiveram as primeiras análises em sedimentos da formação Serra do Tucano, em amostras coletadas na serra do Tucano, onde foram evidenciados quartzo e outros minerais fortemente cimentados por óxidos de ferro. Souza et al. [6] comentam que os estudos relacionados à formação Serra do Tucano são, em geral, como para toda a Bacia do Tacutu, escassos.

Procurando contribuir para o aprofundamento do conhecimento sobre os solos adjacentes às for-mações Serra do Tucano e Apoteri, neste trabalho objetivou-se caracterizar minerologicamente amos-tras de solos da formação Boa Vista que sofrem influência dos afloramentos das formações Serra do Tucano e Apoteri, por meio de técnicas de difra-tometria de raios X e espectroscopia Mössbauer, utilizando amostras naturais e amostras com aque-cimento induzido.

spectroscopy were used to characterize the mineralogy and magnetic behavior of soils of Roraima. To this aim, soil samples were collected in the ridge Nova Olinda (Boa Vista formation with strong influence of the outcrops Apoteri formation), ridge Tucano (Boa Vista formation with influence of the ridge Tucano formation) and nearby the town Bonfim (Apoteri formation). The soils showed a predominance of iron oxides magnetite, maghemite, goethite and hematite. All samples showed magnetite mineral inherited from the parent material of basic rocks in the vicinity of the existing collection points. Only the sample of Bonfim revealed predominance of hematite, featuring a soil with a strong influence of the source material, basalt, and hot and dry climate. The others showed no significant presence of hematite and goethite and maghemite, with more of these minerals in the subsurface soil, compared with the surface, the greater weathering and wetter conditions.Key-words: X ray; Mossbauer; Iron oxides; Magnetite; Maghemite; Hematite.

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Análise Mineralogia e Magnética de Solos do Norte da Amazônia 33

2. material e métodos

Em Roraima (Brasil), foram coletadas amos-tras de solos próximo à capital, Boa Vista (BV), no km 519 da BR 174, constituindo a amostra BV, e em direção ao município de Bonfim (BF), nos km 61 e km 114 da BR 401, constituindo as amostras BF61 e BF114, respectivamente. As coordenadas geográficas são: amostra BV (serra Nova Olinda): 02° 55’ 36,3” N e 60° 42’ 43,5” W; amostra BF61 (serra do Tucano): 03° 07’ 4’’ N e 60° 18’ 4,5’’ W; e amostra BF114 (fazenda Belo Horizonte): 03° 21’ 47,1’’ N e 59° 54’ 11,1’’ W. Os pontos de coleta são assinalados na Figura 1. A coleta se efetuou em camadas superficiais (0-10 cm) e subsuperficiais (60-100 cm).

A amostra BV, coletada na serra Nova Olinda, tem como material de origem a formação Boa Vista com forte influência de afloramentos da formação Apoteri; a amostra BF61 foi coletada na serra do

Tucano onde a formação Boa Vista apresenta influ-ência delitologias da formação Serra do Tucano; e amostra BF114 foi extraída próximo à cidade de Bonfim com ocorrência da formação Apoteri. Os solos foram classificados como Latossolo Vermelho distrófico (BV e BF61) e Cambissolo Háplico Tb eutrófico (BF114) de acordo com o SiBCS [7].

As amostras de solos foram secas ao ar e em seguida foram passadas em peneira com malha de 2 mm de abertura, para a obtenção da terra fina seca ao ar (TFSA). Parte da TFSA foi aquecida a 700 ºC por duas horas. As amostras foram macera-das em almofariz de ágata para, em seguida, serem separados os concentrados magnéticos com o auxí-lio de ímã de mão [8]. O estudo foi realizado em três grupos de amostras: (I) amostras naturais de TFSA; (II) concentrados magnéticos das amostras do grupo I; e (III) concentrados magnéticos das amostras do grupo I aquecidos na temperatura de 700 ºC.

Figura 1. Mapa de localização da área de estudo e pontos de coleta das amostras (apontado por estrelas). Amostra BV: formação Boa Vista (Tbv) com influência da formação Apoteri (KTTa). Amostra BF61: formação Boa Vista com influência da formação Serra do Tucano (Kst). Amostra BF114: formação Apoteri (KTTa). O fundo é baseado nas FOLHAS NA.20-X-B e NA.20-X-D (inteiras) NA-20.X-A, NA.20-X-C, NA.21-V-A e NA.21-V-C (parciais) do Projeto Roraima Central: Brasília, 1999, Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, Ministério das Minas e Energia.

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Análise Mineralogia e Magnética de Solos do Norte da Amazônia 34

A caracterização mineralógica foi realizada, em amostra natural e em amostra aquecida, por difra-tometria de raios X, em equipamento Shimadzu, modelo XRD 6000, com radiação de cobre (CuKα). Foram obtidos os difratogramas das amostras natu-rais, dos concentrados magnéticos naturais e dos concentrados magnéticos aquecidos a 700 ºC. A varredura foi realizada no intervalo de 6 a 70º de 2θ, com espaçamento entre leituras de 0,02º de 2θ, e tempo de leitura em cada ponto de 2 s, totalizando cerca de 1 hora e 45 minutos para a varredura com-pleta das amostras.

O diâmetro médio dos cristais (DMC) foi deter-minado a partir da largura a meia-altura (LMH) das reflexões nos difratogramas de raios X, por meio da equação de Scherrer [9], de acordo com a equação 1:

cosDCMK

β θλ= (1)

Onde K é o fator de forma (fixado em 0,9); λ é o comprimento de onda da radiação de Cu (λ =

0,15418 nm); β = LMHMineral x – LMHQuartzo; e θ é a medida em graus da posição do pico. A reflexão em 0,334 nm do quartzo, revelou LMH de valor médio da ordem de: LMHQuartzo = 0,15 º2θ.

Nos concentrados magnéticos das amostras naturais, a proporção de magnetita em relação à hematita foi estimada por meio da área do pico em 0,269 nm (pertencente à hematita: 100%) e da área em 0,251 nm (magnetita: 100%; e também realçado com hematita: 50%). Os erros pela não inclusão da reflexão de intensidade melhor em 0,269 nm (goe-thita: 30%) foram considerados desprezíveis, o que resultou na relação [10], demonstrada na equação 2:

0,5,

magnetita hematitamagnetita

A AA A0 5251 269

251 269

+=

+−

(2)

Onde A251 é a área do pico em 0,251 nm (35,8 º2θ); e A269 a área em 0,269 nm (33,3 º2θ).

Como método a complementar a difração de raios X, utilizou-se a espectroscopia de absorção de Mössbauer com aceleração constante da fonte

Figura 2. Difratogramas de raios X das amostras de concentrados magnéticos da TFSA. Ct: caulinita; Qz: quartzo; An: anatásio; Gt: goethita; Hm: hematita; Mag: magnetita; Mah: maghemita. Números representam espaçamento d (nm). CuKα.

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de 57Co em matriz de Rh, 25 mCi de atividade, e com amostras em temperatura ambiente. Os deslo-camentos isoméricos foram corrigidos em relação ao αFe, padrão também usado para a calibração da escala de velocidade Doppler. Os dados foram ajustados numericamente com funções lorentzia-nas pelo método dos mínimos quadrados. A análise Mössbauer permite detalhamento da ocorrência dos óxidos de ferro em baixos teores [11].

3. resultados e discussão

Os óxidos de ferro refletem as condições pedo-ambientais impostas pela ação do intemperismo e dos processos pedogenéticos, sujeitos a contínuas modificações. Os principais óxidos de ferro encon-trados difratogramas de raios X das amostras de concentrados magnéticos foram: goethita, hema-tita, magnetita e maghemita (Figura 2).

Na Figura 2, os difratogramas da amostra BF114 apresentaram picos que se aproximam da reflexão da magnetita em 0,297 nm, enquanto que nos difratogramas das amostras BV e BF61, os picos ocorrem nas proximidades da refle-xão da maghemita em 0,295 nm – observado ao redor de 30 º2θ. Comportamento semelhante apa-rece para a reflexão da magnetita em 0,253 nm e da maghemita em 0,252 nm, visto entre 35 e 36 º2θ. Provavelmente este comportamento retrata a ausência de maghemita na amostra BF114, como será discutido posteriormente.

A maghemita (γ–Fe2O3) é o equivalente total-mente oxidado da magnetita (Fe3O4). Como o íon de oxigênio apresenta valência (–2), a magnetita é composta por dois íons de ferro férrico (Fe3+) e um íon de ferro ferroso (Fe2+); e a maghemita por dois íons de Fe3+. Durante o processo de oxidação, um íon de Fe2+ sai da rede cristalina da magne-

Figura 3. Difratogramas de raios X dos concentrados magnéticos das amostras naturais e dos concentrados magnéticos das amostras aquecidas a 700 °C da TFSA. Ct: caulinita; Qz: quartzo; An: anatásio; Gt: goethita; Hm: hematita; Mag: magnetita; Mah: maghemita. Números representam espaçamento d (nm). CuKα.

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tita (deixando uma vacância) e outro íon de Fe2+ (tamanho 0,82 Å) se transforma em Fe3+ (tamanho 0,65 Å). Por isso, a aresta a da estrutura cúbica da maghemita (a = 8,34 Å) é um pouco menor que da magnetita (a = 8,40 Å). Assim, numa varredura crescente de ângulos º2θ, as reflexões da magne-tita ficarão a esquerda das reflexões da maghemita. Vários fatores promovem a oxidação da magnetita em maghemita, dentre eles: imperfeições do cris-tal; superfície específica grande; presença de fratu-ras ou fissuras do cristal e presença de água. Como as reflexões desses minerais ocorrem próximas (diferença de 0,2 º2θ), não se pode afirmar segu-ramente quais amostras são constituídas por um ou outro mineral utilizando somente a técnica de difratometria de raios X, por isso escolhemos agre-gar informação com a espectroscopia Mössbauer.

Na única amostra com ausência de maghemita, amostra BF114, analisando o difratograma de raios

X no intervalo de 30 a 37 º2θ, foram calculadas as razões de magnetita/(magnetita + hematita), cujos valores apresentados no Quadro 1, mostraram-se homogêneos, com proporção magnetita/(magnetita + hematita) igual a 0,58, da superfície até a profun-didade de 100 cm. Estes valores são concordantes com os calculados por espectroscopia Mössbauer (0,59), reforçando a interpretação dos difratogra-mas de raios X da Figura 2. A coleta da amostra BF114 ocorreu no nordeste de Roraima, próximo ao município de Bonfim, então, os resultados desta amostra expressam as condições ambientais de clima mais seco no nordeste do estado de Roraima, solos com horizonte B incipiente formado de mate-rial basáltico, da qual a magnetitia foi herdada, conforme Fassbinder et al. [12], além dos solos não terem sofrido processos de pedoturbação e revolvi-mento de massa [13].

Figura 4. Espectros Mössbauer das amostras de concentrados magnéticos dos horizontes superficiais das amostras de TFSA na temperatura ambiente.

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Quadro 1. Razão R = magnetita/(magnetita + hematita) determinadas por difratometria de raios X (DRX) e por espec-troscopia Mössbauer (MS), para as amostras de concentrados magnéticos.

Amostra Profundidade R (DRX) R (MS)

BF114 0 – 10 cm 0,58 0,59

BF114 60 – 100 cm 0,58 0,59

Os valores do diâmetro médio dos cristais (DMC), determinados pela largura a meia-altura (LMH) da reflexão em 0,269 nm, representativo da goethita e hematita, são apresentados no Quadro 2. A amostra BF114 possui DMC duas a três vezes maior que o DMC das amostras BV e BF61. Isso sugere que as partículas possuem morfologia ou forma externa dos cristais distintas. A morfologia da goethita (α–FeOOH) é principalmente acicular, enquanto que a da hematita (α– Fe2O3) é romboé-drico. Estudos mostram que o DMC da hematita é, em média, igual a duas vezes o DMC da goe-thita [14]. As medidas de Mössbauer (ver parâme-tros no Quadro 3) reforçaram a interpretação dos difratogramas de raios X das amostras BV e BF61, que apresentam o pico 0,269 nm como reflexão da goethita (Figura 2), e também do difratograma da amostra BF114, onde a mesma reflexão refere-se ao pico da hematita (Figura 2).

Os difratogramas de raios X dos concentra-dos magnéticos das amostras aquecidas a 700 ºC, com destaque para os horizontes subsuperficiais (Figura 3), evidenciam a desidratação da goethita das amostras BV e BF61 (intervalo de 19 a 23 º2θ), que em temperaturas entre 200 a 400 ºC se trans-forma em hematita. Por outro lado, na temperatura ao redor de 500 ºC ocorre inversão da maghemita e magnetita para a estrutura da hematita [15]. Este colapso da maghemita e da magnetita aparecem no intervalo de 30 a 37 º2θ da Figura 3, próximo das posições 0,295 nm; 0,251 nm; 0,208 nm; 0,160 nm e 0,147 nm.

A Figura 4 mostra os espectros Mössbauer das amostras de concentrados magnéticos na tempe-ratura ambiente (são apresentados os espectros dos horizontes superficiais) e cujos parâmetros de

Mössbauer são listados no Quadro 3. Os espectros Mössbauer das amostras BV e BF61 apresentaram ajustes com material ferromagnéticos (magnetita e maghemita) e também com não magnético (goe-thita). A razão maghemita/magnetita na superfície destes solos é praticamente igual a 1,0; enquanto que na parte subsuperficial (60 a 100 m), varia de 1,5 a 1,9. Isso indica maior quantidade de maghe-mita em profundade dos solos BV e BF61.

Quadro 2. Largura a meia-altura (LMH) e diâmetro médio dos cristais (DMC) das reflexões em 0,269 nm, para as amostras de concentrados magnéticos.

AmostraProfundidade LMH DMC

Mineralcm °2θ nm

BF61 0 – 10 0,40 34 goethita

BF61 60 – 100 0,32 50 goethita

BV 0 – 10 0,40 34 goethita

BV 80 – 100 0,32 50 goethita

BF114 0 – 10 0,24 96 hematita

BF114 60 – 100 0,24 96 hematita

A magnetita, mineral litogênico, é herdada do material de origem de rochas básicas, como o basalto, presente na formação Apoteri que aflora nas adjacências do ponto de coleta do solo BV, e ao nordeste do ponto de coleta do solo BF61 (Figura 1). Já a maghemita é um mineral pedogê-nico, formada principalmente por dois caminhos: situação 1 – pela oxidação da magnetita litogênica presente nas rochas e nos solos; e situação 2 – pela queima de outros óxidos de ferro presentes nos solos, como a goethita e a hematita, na presença de material orgânico. Tal processo é comum em solos de regiões tropicais, pela alta frequência de quei-madas [16]. Ambas as situações, sugerem ocorrer com maior facilidade na superfície dos solos, visto que nos horizontes mais profundos, pode ser que não haja oxigênio suficiente para ocorrer oxidação da magnetita e, fisicamente, é um local mais difí-cil do fogo atingir. Esta última hipótese tem levado alguns autores a contestarem o caminho da situa-ção 2 para a formação de maghemita em solos de maior profundidade [17].

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A razão goethita/(magnetita + maghemita) é igual a 0,10 na superfície dos solos BV e BF61, e chega a 0,35 na parte subsuperficial destes solos. Isso sugere que por se tratar de região mais úmida, as amostras mais profundas exibem maior concen-tração de goethita. Isto também é forte indício para descartarmos a influência de queimadas (situação 2) como processo que leva ao acúmulo de maghe-mita em horizontes subsuperficiais dos solos. Outra hipótese para explicar o acúmulo de maghemita em profundidade, poderia levar em conta a situação 1 na superfície e o movimento dentro do solo de

partículas pequenas (como é o caso da maghemita) com o auxílio da água [14].

A composição da amostra BF114 sugerida pela espectroscopia Mössbauer difere da composição das outras amostras (BV e BF61). O ajuste mais harmonioso foi com o ferromagnético magnetita e o fracamente ferromagnético hematita. O perfil (superficial – subsuperficial) apresentou a razão hematita/magnetita igual a 0,70; o que indica um solo que preserva grande parte do material de origem (magnetita), provavelmente da formação Apoteri que aflora na região de coleta desta amos-

Quadro 3. Parâmetros Mössbauer das amostras de concentrados magnéticos da TFSA na temperatura do ambiente. Bhf: Campo Magnético Hiperfino; DQ: Desdobramento Quadrupolar; DI: Deslocamento Isomérico; Gt: goethita; Hm: hematita; Mag: magnetita; Mah: maghemita.

Amostra Fase Tipo Bhf DQ DI Área Área Relativa

BF610–10 cm

Gt Dubleto – 0,9932 0,4856 1,63 8,0%

Mah Sexteto 49,9233 – 0,1485 0,3685 8,85 43,7%

Mag, sítio A Sexteto 48,4568 0,0032 0,3233 5,13 25,4%

Mag, sítio B Sexteto 45,6609 – 0,0357 0,3323 4,64 22,9%

BF6160–100 cm

Gt Dubleto – 0,5785 0,3340 1,12 11,3%

Mah Sexteto 49,7408 – 0,1324 0,3837 5,68 57,3%

Mag, sítio A Sexteto 49,0834 – 0,2153 0,1298 1,17 11,8%

Mag, sítio B Sexteto 45,6005 – 0,0055 0,3558 1,95 19,6%

BV0–10 cm

Gt Dubleto – 0,6298 0,3861 1,08 8,8%

Mah Sexteto 50,3966 – 0,1848 0,3763 5,64 45,5%

Mag, sítio A Sexteto 48,9148 – 0,0010 0,3128 3,29 26,6%

Mag, sítio B Sexteto 45,7555 0,0716 0,3457 2,37 19,2%

BV80–100 cm

Gt Dubleto – 0,6226 0,3460 2,13 25,5%

Mah Sexteto 50,3358 – 0,1881 0,3671 3,71 44,4%

Mag, sítio A Sexteto 48,8282 – 0,0175 0,3517 1,22 14,6%

Mag, sítio B Sexteto 45,8744 – 0,0498 0,3155 1,29 15,5%

BF1140–10 cm

Hm Sexteto 51,7124 – 0,1835 0,3639 3,81 30,2%

Mag, sítio A Sexteto 49,1438 – 0,0607 0,3236 3,53 27,9%

Mag, sítio B Sexteto 46,0204 0,0576 0,6631 1,95 15,4%

Wuestite Dubleto – 0,7685 1,0034 2,25 17,8%

Dubleto 1 Dubleto – – 0,6103 0,3589 1,11 8,9%

BF11460–100 cm

Hm Sexteto 51,5234 – 0,1831 0,3438 3,91 30,9%

Mag, sítio A Sexteto 49,7792 – 0,0602 0,3135 3,53 27,9%

Mag, sítio B Sexteto 46,0004 0,0563 0,6938 2,01 15,9%

Wuestite Dubleto – 0,7642 1,0034 2,13 16,8%

Dubleto 1 Dubleto – – 0,6103 0,3589 1,08 8,5%

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tra. A hematita é produto final de vários caminhos de transformação dos óxidos de ferro [15]. Fontes et al. [18] estudaram solos magnéticos de várias partes do Brasil e encontraram que a magnetita se transformou diretamente em um mineral antifer-romagnético, provavelmente hematita, por oxida-ção. Outra explicação para a presença de hematita no perfil do solo BF114 envolve calor e matéria orgânica [14], processo muito provável de aconte-cer por causa da temperatura elevada da região de Bonfim, ambiente de menor precipitação pluvial e a propagação constante de queimadas.

4. Conclusões

1. O material de origem das formações Apoteri e Serra do Tucano e o intemperismo local influenciaram a composição dos óxidos de ferro encontrados nos solos estudados, pois, todas as amostras possuem magnetita, mine-ral herdado do material de origem de rochas básicas existentes nas proximidades dos pontos de coleta.

2. A amostra coletada ao nordeste de Roraima (BF114) apresentou ausência de goethita e maghemita e a presença marcante de hema-tita, que pode ser explicado pelo baixo intemperismo do basalto e as das condições climáticas mais secas e quente, com ocor-rência de solo jovem do tipo Cambissolo.

3. As amostras BV e BF61 revelaram ausência de hematita e a presença marcante de goe-thita e maghemita, com quantidade maior destes minerais no horizante subsuperficial dos solos, se comparado com o horizonte superficial.

Agradecimentos: À CAPES, MCT e FINEP pelo apoio financeiro.

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Virando o Princípio da Equivalência pelo Avêsso: uma proposta para facilitar a solução de alguns problemas

e também introduzir noções elementares de relatividade geral no ensino médio

J. A. Souza1

Resumo: Abordaremos neste trabalho algumas dificuldades de aprendizagem dos alunos do ensino médio em Física no contexto da Mecânica Newtoniana, quando os problemas envolvem referenciais não inerciais. Enunciaremos o principio inverso da equivalência, que será utilizado para obter a solução de exercícios que aparecem nos livros de nível médio envolvendo referenciais acelerados. Nestes textos os problemas são resolvidos com o uso da formulação newtoniana, que, a rigor, não deveria ser utilizada em tais casos. Esperamos mostrar, no decorrer desta monografia, que o principio mencionado acima é uma ferramenta vantajosa para a compreensão dos efeitos presentes em tais referenciais, além de possibilitar ao professor de nível médio a ocasião de dizer aos seus alunos, sem nenhum remorso, pois não os está enganando, que eles estão sendo apresentados a um dos pilares da teoria mais famosa de Einstein, a Relatividade Geral.

Palavras-chave: Ensino de Física; Referenciais acelerados; Relatividade geral; Contextualização.

1. Instituto de Física – Universidade Federal Fluminense. E-mail: [email protected]

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1. introdução

As dificuldades dos alunos na aprendizagem dos conceitos da física tanto em nível médio quanto no básico das universidades, têm sido relatadas em diversos artigos publicados em revistas especiali-zadas. As conclusões obtidas pelos vários pesqui-sadores são, em geral, bastante semelhantes: as dificuldades seriam devidas a alguns fatores, sendo os mais citados: a deficiência dos alunos em mani-pular o ferramental matemático que é normalmente exigido; dificuldade na interpretação de gráficos; e raciocínios muito semelhantes a uma “Pré-Física”, ou “Física Aristotélica”, fator este que afeta até alunos do ciclo básico universitário e, por incrível que pareça, também alguns alunos do ciclo profis-sional dos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Física, conforme nós mesmos constatamos em nossa prática docente diária.

Isto é particularmente grave, para não dizer alarmante, no caso dos alunos de Licenciatura, pois eles, caso terminem o curso, serão os professores que irão realimentar os cursos universitários de Física, Engenharia e áreas correlatas com os novos alunos, que, conforme constatamos também em nossa prática diária na Universidade, a cada semes-tre chegam à Universidade com maiores deficiên-cias em Física e Matemática, mesmo no caso das carreiras mais disputadas (Em nossa opinião, os exames de admissão ao ensino superior, inclusive o ENEM, são em parte responsáveis por esta situa-ção). Ou seja, deixando que alunos sem uma sólida

formação conceitual e sem uma competência téc-nica adequada, além de não demostrarem vocação para o magistério, consigam obter um diploma de Licenciatura, estamos alimentando um CÍRCULO VICIOSO.

Essas deficiências apresentadas pelos estudan-tes, as metodologias de ensino utilizadas por alguns professores, que perduram a mais de meio século, aquela aula tradicional e desmotivante (é claro que um professor sem vocação, e ainda por cima mal pago, não pode estar motivado, não podendo assim motivar os alunos. Na maior parte das vezes este professor deixa os alunos confusos, impede o aluno de reconhecer suas tendências profissionais e realimenta a mística negativa existente associada à Fìsica e à Matemática), muitas vezes sem a utili-zação de meios pedagógicos modernos (que podem ajudar, mas não são essenciais, e só dão algum resultado em uma aula ministrada por um profes-sor com alta competência na disciplina, no caso a Física, e também fortemente motivado, por estar trabalhando em algo de que gosta, ou seja, alguém que tenha VOCAÇÃO PARA PROFESSOR. É claro que salários aviltantes, que infelizmente são a norma, e não a exceção no sistema educacional brasileiro, podem minar o entusiasmo mesmo do mais motivado dos professores. E não há recurso pedagógico que substitua um professor compe-tente, bem formado e que gosta do que faz) tornam a Física uma disciplina não muito atraente. Estes problemas não se restringem somente ao Brasil, estando presentes em vários países (Duas honrosas

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exceções, que só fazem confirmar a regra: Cuba e Finlândia).

Algumas faculdades brasileiras, e de outros países, aplicaram em alunos ingressantes do ensino médio, alunos do sexto período dos cursos de física, química e outros, e em estudantes do segundo ano do ensino médio, os testes diagnósticos deno-minados Teste Básico de Mecânica “Mechanics Baseline Test” e “Force Concept Inventory” [1] e verificaram que os alunos tiveram desempenho sofrível nas questões formuladas. Uns dos pri-meiros e mais alarmante resultado destes estudos foram o decepcionante nível de compreensão con-ceitual de alunos que completam disciplinas ou “cadeiras” de Física em nível universitário.

Quando confrontado com o seguinte problema, se um objeto for solto ao mesmo tempo em que um outro é atirado na horizontal, a partir da mesma altura na ausência de resistência do ar, qual deles atingirá primeiro o solo? A resposta (errada), fre-quentemente indicada pela maioria dos alunos é que o objeto solto chegará primeiro.

Outro exemplo: quando uma bola é largada por um corredor em movimento com velocidade cons-tante qual a trajetória descrita pela bola no referencial da terra (vista por um observador parado em relação ao solo)? As respostas foram que as trajetórias seriam uma parábola no sentido contrário ao movimento do corredor, ou queda livre, na maioria dos casos.

E quanto à trajetória de um projétil? A resposta foi descrita com base no ímpeto que lhe é transmi-tido e no ímpeto do seu peso (ímpeto é um conceito Aristotélico). O movimento é descrito em três fases: o ímpeto transmitido é superior ao seu peso (trajetó-ria retilínea); o ímpeto inicial vai-se dissipando gra-dualmente (trajetória curvilínea); existe ainda algum ímpeto fornecido no lançamento mas o dominante é o do peso do projétil (trajetória retilínea); o ímpeto inicial esgotou-se e o projétil cai verticalmente devido exclusivamente o ímpeto de seu próprio peso (trajetória retilínea). Passemos agora a uma discus-são sobre o Princípio da Equivalência.

O princípio da equivalência, enunciado pela 1ª vez por Einstein [2], em essência afirma que as observações realizadas num Campo Gravitacional Newtoniano são indistinguíveis daquelas realiza-das no interior de um sistema de referencia acele-rado, cuja aceleração tem, em cada ponto, sentido oposto e módulo idêntico aos do campo gravita-cional considerado. Este enunciado pode ser inver-tido: suponha que um elevador está em queda livre sob a ação da gravidade terrestre (o cabo quebrou). Um outro elevador está parado no espaço sideral bem distante de qualquer massa apreciável. Para alguém dentro de qualquer desses dois elevadores, um objeto solto ficará parado onde está. Nenhum desses observadores saberá distinguir uma situação da outra. Logo, as duas situações são equivalentes. Para todos os efeitos, no elevador em queda livre, o movimento acelerado “gera” um campo gravita-cional que anula o campo da Terra. Esta situação ilustra o princípio inverso da equivalência.

A idéia de Inércia, como muitos outros concei-tos utilizados em mecânica, já era usada, de modo vago e impreciso nos raciocínios dos estudiosos (filósofos naturais) da Antiguidade Clássica e da Idade Media. Coube a Galileu formar, pela primeira vez, um enunciado um pouco mais rigoroso, que pode ser apresentado assim: “Um corpo não pode, sem ação de uma interferência externa, alterar seu estado de repouso ou movimento”. Devemos sem-pre lembrar que, quando falamos em repouso ou movimento, está implícito um outro corpo, o refe-rencial, em relação ao qual analisamos o estado dinâmico no corpo.

Um referencial onde o enunciado acima (o Princípio da Inércia) é valido, é chamado refe-rencial inercial. Como qualquer mudança, seja no módulo ou na orientação da velocidade do corpo, requer a ação de um agente externo a ele, o único movimento possível para um corpo sobre o qual não atuam influências externas, neste referencial, é o retilíneo uniforme (note que o repouso é um caso particular de M.R.U. com V = 0).

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Mas, quando o referencial utilizado (que, não esqueça, também é um corpo) está em movimento acelerado (em relação a outro corpo, usado agora como “referencial do referencial”), o Princípio da Inércia não se aplica mais a esta situação, e o objeto cujo movimento esta sendo analisado em relação a este sistema de referência acelerado parece estar sofrendo a ação de influências, mas sem que possa-mos notar nenhum agente físico óbvio responsável por estas influências (dois bons exemplos são as forças de Coriolis e centrífuga, que aparecem num referencial em rotação [2].

No entanto, o estudo de movimentos em rela-ção a referenciais acelerados não faz parte do cur-rículo do Nível Médio. Sendo assim, não deveriam aparecer, nos livros textos deste nível, problemas que envolvessem este conceito.

A situação porém, na prática, é outra. Em quase todos os textos de física de Nível Médio encontra-mos exercícios, propostos ou resolvidos, envol-vendo referenciais acelerados, o mais conhecido sendo a análise das forças sobre uma pessoa dentro de um elevador em movimento vertical acelerado (subida ou descida).

Além disso, outros problemas (como o pêndulo preso ao teto de um veículo acelerado em relação à Terra) não podem ser, a rigor, resolvidos no con-texto do nível médio, onde nem sequer são mencio-nadas as forças de inércia.

Vamos utilizar neste trabalho o já mencionado princípio inverso de equivalência, ao qual daremos o seguinte enunciado:

Os efeitos devidos à aceleração de um referen-cial podem ser simulados por um campo gravi-tacional fictício (de acordo com o significado Newtoniano do termo), de mesmo módulo, coli-near e sentido contrário à aceleração do referen-cial, seja esta aceleração constante ou variável.

Na próxima seção vamos aplicar este princí-pio a vários exemplos de situações que podem ser encontradas no cotidiano do aluno de nível médio e também a algumas outras em pouco menos comuns,

mas que podem ser perfeitamente compreendidos por um aluno deste nível utilizando o principio que acabamos de enunciar.

2. Alguns exemplos

2.1. Elevador

Todos nós já entramos em um elevador. No iní-cio ficamos com um pouco de receio: o que acon-teceria se parasse no meio de seu percurso? E se os cabos arrebentassem, ele cairia em queda livre, como acontece em alguns filmes? O elevador não é, em geral, tão perigoso como vemos no cinema: é um ambiente bem interessante para estudarmos alguns conceitos da Física, por exemplo, os movi-mentos retilíneos uniforme, acelerado e retardado. Vamos então analisar o comportamento de um corpo no interior de um elevador em movimento.

Consideremos uma pessoa de massa m sobre uma balança colocada dentro do elevador, exer-cendo sobre o prato da balança uma força Fn

enquanto o prato exerce sobre a pessoa uma força de mesma intensidade, porém de sentido contrário; portanto, o mostrador da balança indicará um valor de massa correspondente ao módulo da força Fn.

No caso do elevador em repouso ou deslo-cando-se verticalmente com velocidade constante, subindo ou descendo, a resultante das forças sobre a pessoa é nula (supondo, como usual, uma pes-soa de massa constante. Não há tempo, em nossa experiência, para a pessoa sofrer qualquer variação apreciável de massa). Logo:

Fn = P → Fn = mg

Quando o elevador entra em movimento acele-rado, um corpo em repouso em relação à Terra no interior do elevador, por inércia, tende a continuar parado. Com o início do movimento no sentido ascendente este corpo pressiona o prato da balança ocasionando uma Fn maior que P, produzindo uma força resultante Fr no mesmo sentido da V. Quando o elevador, inicialmente em repouso, acelera pra baixo, ocorre o efeito inverso.

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Para calcular a força resultante sobre a pessoa dentro do elevador acelerado, não podemos, a rigor, aplicar a formulação newtoniana da mecânica como ela é estudada no nível médio, pois o elevador, estando acelerado em relação a Terra, não é um refe-rencial inercial. Este é um caso onde é vantajoso apli-car o Princípio Inverso da Equivalência, com a van-tagem adicional de podermos dizer aos alunos, com a consciência tranquila, pois é a mais pura verdade, que eles estão lidando com uma das ideias básicas que levaram Einstein a formular a Teoria Covariante da Gravitação (mais conhecida como Relatividade Geral, um nome que não é muito apropriado).

Vamos começar analisando o caso do eleva-dor subindo, com aceleração no mesmo sentido da velocidade (Figura 1).

De acordo com o nosso Princípio, podemos ignorar a aceleração para cima do elevador, se ima-ginarmos que o sistema está na presença de dois campos gravitacionais: o da Terra, g e outro campo g’, de módulo igual à aceleração do elevador, mas de sentido contrario. Neste caso é fácil notar que estes dois campos produzem um efeito resultante dado pela soma g + g’. Assim, como uma balança é na realidade um medidor de peso com a escala cali-brada em valores de massa, ela indicará um valor maior de massa em relação àquele indicado com o elevador em repouso.

Vamos agora analisar a situação ilustrada na Figura 3 (o elevador desce com movimento acele-rado). Utilizando raciocínio idêntico ao caso ante-rior, chegamos facilmente à conclusão que a balança, neste caso, indicará uma leitura menor que quando o elevador está em repouso (puxa, um método rápido e fácil de emagrecimento! Pena que a ilusão dure tão pouco!). Faz parte desta situação um caso particu-lar interessante, que é explorado em alguns parques de diversões (em um brinquedo conhecido como Cabum). Se a aceleração do elevador para baixo tiver o mesmo módulo que a aceleração local da gravidade (ou seja, se o elevador entrar em queda livre), é fácil perceber (inclusive por uma análise da Figura 3) que a aceleração da gravidade resultante

dentro do elevador é nula, ou seja, o peso aparente dos corpos neste referencial (o elevador) é zero.

O leitor pode agora, com grande facilidade, analisar o que acontece nos outros dois casos, ilus-trados nas Figuras 2 e 4.

Figura 1. Elevador subindo acelerado.

Figura 2. Elevador subindo em movimento retardado.

Figura 3. Elevador descendo acelerado.

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Figura 4. Elevador descendo em movimento retardado.

2.2. Pêndulo no interior de um veículo em movimento horizontal retilíneo acelerado

Consideremos agora um pêndulo preso no teto de um vagão por um fio, em repouso (ou em MRU) em relação à Terra (Figura 5). Repentinamente, ele arranca para a direita. Vamos aplicar o principio inverso de equivalência a esta situação: a acele-ração do veículo para direita equivale, de acordo com nosso princípio, a um campo gravitacional para a esquerda, de módulo igual àquela acelera-ção (Figura 6).

O pendulo está agora sob a ação de dois cam-pos gravitacionais, como vemos na Figura 6. Supondo a aceleração constante, o pêndulo vai se estabilizar na nova posição de equilíbrio, deter-minada pela resultante dos dois campos gravita-cionais, g e g’:

Figura 5. Vagão em repouso em relação à Terra.

Figura 6. Vagão acelerando para a direita em relação à Terra.

Desta figura é fácil notar que

Tang θ = g’/g → g’ = gTang θ (1)

Suponhamos agora o pêndulo do item acima dentro de um vagão que se move em linha reta e com velocidade constante Vo para a direita em relação à Terra (Figura 7). Se repentinamente o vagão frear, a tendência do pêndulo será manter-se, por inércia, em movimento em relação a Terra, logo o pêndulo será projetado para frente do vagão (Figura 8). Isto corresponde a um campo g’ na mesma direção, de mesmo módulo e sentido oposto à aceleração, de acordo com o princípio inverso da equivalência.

Figura 7. Vagão em movimento retilíneo e uniforme.

Figura 8. Vagão em movimento retardado.

Estes efeitos mecânicos são experimentados, com bastante frequência, por uma pessoa em pé usando um transporte coletivo.

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2.3. Estação espacial em órbita

Uma estação espacial é uma estrutura colocada no espaço (fora da atmosfera terrestre) projetada para servir de moradia para seres humanos por períodos prolongados, que podem ser semanas, meses e até anos. Assim como os satélites, elas não possuem sistemas destinados ao seu retorno à Terra, tendo que ser obrigatoriamente servidas por veículos de carga e transporte de astronautas.

Tal como a Lua, giram hoje ao redor da Terra estações espaciais e vários satélites artificiais. Entre eles encontram-se satélites para previsão do tempo, para comunicações telefônicas, para enviar imagens televisionadas, para auxílio à navega-ção terrestre, aérea e marítima (GPS) e satélites que funcionam como observatórios astronômicos, muito acima da atmosfera terrestre.

E como é a física no interior da estação? Se considerarmos a órbita como circular (Figura 9), sendo M a massa da Terra, m a massa da estação ou satélite, V a velocidade de translação da estação ou satélite e R a distância entre o centro da Terra e o centro da estação, a força de atração gravitacional entre a Terra e a estação, fornece a força centrípeta necessária para manter a estação em órbita.

Em Da Terra a Lua (De la Terre à la Lune), romance de ficção científica de Júlio Verne, os pas-sageiros da cápsula, que se afasta em movimento aproximadamente retilíneo da Terra, flutuam livre-mente apenas ao atingir a região próxima ao ponto da trajetória em que as forças de atração da Terra e da Lua se compensam (ponto de Laplace), mas sofrem o efeito gravitacional dominante de um dos dois fora desse ponto.

Na realidade a estação ou satélite, de acordo com o nosso principio encontra-se na presença de dois campos gravitacionais, o da Terra, g e outro campo g’, conforme ilustra a Figura 6, de módulo igual à aceleração da gravidade, mas de sentido contrário. Neste caso é fácil notar que estes dois campos produzem uma resultante dada pela soma g + g’, que é igual a zero. Este efeito é análogo ao

caso do elevador em queda livre; logo, desde o ini-cio da trajetória orbital uma pessoa dentro da esta-ção está o tempo todo flutuando. Achamos que este é outro caso em que é vantajoso aplicar o principio inverso da equivalência para descrever a situação para alunos do ensino médio.

Figura 9.

/a V R W R2 2c = =v

g = GMt / R2

a resultante = g – g’ = 0 (g = g’)

G → constante gravitacionalMt → massa da TerraR → raio da órbita

3. Bolha de ar na garrafa

Vamos agora apresentar um sistema físico com um comportamento não intuitivo, onde a aplica-ção do nosso Princípio Inverso da Equivalência facilita muito a compreensão do que acontece. Consideremos uma garrafa, inicialmente em repouso, cheia de água, na horizontal, contendo uma bolha de ar na parte superior, conforme a Figura 10 (é melhor utilizar uma garrafa de vidro transparente ou de plástico transparente lisa). Quando aplicamos uma força F repentinamente da esquerda para a direita, criamos, de acordo com o principio inverso da equivalência, um campo gra-vitacional g’ com mesma direção, mesmo módulo

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e sentido contrário a aceleração a adquirida pela garrafa. Pergunta-se: em qual direção se deslocará a bolha, imediatamente após a aplicação da força?

Figura 10.

Neste exemplo temos, atuando sobre a bolha, o campo gravitacional g’ e o empuxo. Se a garrafa estivesse na vertical, o comportamento da bolha seria o bem conhecido deslocamento para cima, ou seja, em sentido contrario ao campo gravitacional da terra. Com a garrafa na horizontal, ao puxar-mos a garrafa para direita estamos, de acordo com o principio inverso da equivalência, gerando um campo gravitacional g’ para a esquerda. Aparecerá então um empuxo na horizontal, atuando sobre a bolha. Como a densidade do ar dentro da bolha é menor que a do líquido, o empuxo será maior que o peso (que neste caso também atua na horizontal), logo a bolha se deslocará para a direita. Este sis-tema é análogo ao nível de bolha utilizado pelos pedreiros e carpinteiros.

3.1. Carrossel de bolas

Suponhamos agora um carrossel contendo dois reservatórios cheio d’água, diametralmente opos-tos, onde estão colocadas duas esferas (Figura 11) (este aparelho também é denominado, na Casa da Descoberta localizada no Instituto de Física da UFF, acelerômetro, um nome, em nossa opinião, pouco apropriado). Uma delas de densidade maior do que da água, fixada no topo do reservatório por um fio e outra, de densidade menor do que da água, fixada no fundo do reservatório também por um fio. Quando o carrossel encontra-se em repouso as esferas estão posicionadas na mesma vertical (con-forme Figura 11 e 12). Quando o sistema está em

movimento circular uniforme (M C U), a esfera de densidade maior será deslocada para fora, enquanto que a de densidade menor será deslocada para den-tro (Figura 13 e 14). Neste caso, de acordo com o Princípio Inverso da Equivalência, do mesmo modo que na estação espacial em órbita, aparecerá um campo gravitacional g’ na direção radial e sen-tido do centro para a periferia (já que os recipien-tes e seus conteúdo estão acelerados em direção ao centro pela aceleração centrípeta) do carrossel, perpendicular ao campo gravitacional terrestre.

Figura 11. Carrossel em repouso.

Figura 12. Foto Carrossel de Bolas em repouso (Casa da Descoberta UFF).

Figura 13. Carrossel em M C U.

Figura 14. Foto do Carrossel de Bolas em M C U (Casa da Descoberta UFF).

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Neste caso a esfera vermelha(mais densa que o líquido) terá comportamento semelhante àquela pendurada no teto de um vagão acelerado, e a esfera preta(menos densa que o líquido) com-portar-se-á como a bolha na garrafa acelerada horizontalmente.

4. Considerações finais

Este trabalho tem por objetivo principal pro-por uma metodologia nova para o ensino apren-dizagem de referenciais acelerados, utilizando o enunciado do principio inverso da equivalência. Esta ferramenta inovadora e a utilização de experi-mentos são capazes de auxiliar o professor de física a melhorar a compreensão e facilitar a resolução de exercícios envolvendo referenciais acelerados pelos discentes, já que nos livros didáticos a apre-sentação e resolução de tais problemas utilizam a formulação newtoniana. A proposta apresentada nesta monografia é um recurso viável para a com-preensão dos efeitos mecânicos que ocorrem nos referenciais acelerados, e pode ser aplicada nos ensinos médio e universitário.

5. referências

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[6] PEDUZZI, L. O. Q.; PEDUZZI, S. S. O Conceito de Força no Movimento e as duas Primeiras Leis de Newton. Florianópolis, SC, Departamento de Física – UFSC, 1985: 10p.

[7] HEINECK, R.; VALIATI, E. R. A.; DA ROSA, C. T. W. Software educativo no ensino de Física: análise quantita-tiva e qualitativa. Universidade de Passo Fundo, Brasil. 12p.

[8] NUSSENZVEIG, H. M. Curso de Física Básica – Mecânica. São Paulo: Editora Edgard Blücher LTDA, 1981. 340p.

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[10] SEARS, F. W.; ZEMANSKY, W. Fisica II, 10. ed. São Paulo: Pearson, 2003, Cap 14, Ex. 14.80.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons

Maria Teresa Thomaz1

Resumo: A partir do princípio de mínima ação reobtemos as equações de movimento clássicas reescritas através das equações de Lagrange. Mostramos como estender esse princípio para obter as equações de movimento dos campos clássicos e o aplicamos ao caso dos campos eletromagnéticos de Maxwell. Como apoio ao formalismo que iremos desenvolver, estudaremos a noção de tensores que utilizaremos para descrever as leis de transformação da Relatividade Restrita e escrever as equações de Maxwell de uma forma mais simples (forma covariante). Finalmente discutiremos os campos elétrico e magnético em termos dos campos escalar e vetor e mostrar como a invariância de calibre é implementada nestes campos.

Palavras-chave: Campos clássicos; Princípio de mínima ação; Equações de Lagrange; Campos eletromagnéticos de Maxwell; Equações de Maxwell; Relatividade restrita, Forma covariante; Campo escalar; Campo vetorial; Invariância de calibre.

Abstract: From the principle of least action we derive the classical equations of motion through the Lagrange equations. We show how to extend this principle to write down the equations of motion of the classical fields and apply it to the case of the Maxwell electromagnetic fields. In support to the formalism that we present, we study the notion of tensors we apply them to describe the laws of transformation of relativity and write Maxwell’s equations in a simpler form (covariant form). Finally we discuss the electric and magnetic fields in terms of vector and scalar fields and show how the gauge invariance is implemented in these fields.Key-words: Classical fields; Principle of least action; Lagrange equations; Maxwell electromagnetic fields; Maxwell’s equations; Theory of relativity; Covariant form; Scalar field; Vector field; Gauge invariance.

1. Instituto de Física, Universidade Federal Fluminense. E-mail: [email protected]

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 52

1. Princípio de mínima ação

Todos nós aprendemos a descrever quantitati-vamente o movimento dos corpos que nos cercam através da aplicação das três Leis de Newton [1]:

1. Um corpo se mantém em repouso ou em movimento retilíneo uniforme a menos que uma força atue sobre ele.

2. Um corpo sobre o qual atua uma força se move de tal forma que a taxa de variação do momento é igual a essa força.

3. Se dois corpos exercem força um sobre o outro, essas forças são iguais em intensi-dade e direção, mas têm sentidos opostos.

A 2ª Lei de Newton dá a dinâmica do movi-mento de uma partícula pontual:

dtdp

F t=vv^ h, (1)

onde p tv^ h é o momento linear da partícula no ins-tante t e F tv^ h a força que age sobre a partícula neste instante. Na descrição do movimento dos corpos, a 2ª Lei de Newton relaciona a causa (a força que age sobre a partícula) com a consequência (o movi-mento induzido no corpo). Portanto, se conhece-mos a expressão da força que age sobre a partícula em todos os instantes e os valores iniciais da posi-ção e velocidade da partícula, a partir da solução da 2ª Lei de Newton determinamos a sua trajetória: x tv^ h. Em alguns casos é possível obter a expressão algébrica para essa trajetória, mas na maioria das vezes o que se obtém é a solução numérica.

A equação que dá a dinâmica de uma partícula de massa constante é:

mdt

d x tF t2

2

=v

v^

^h

h. (2)

Vocês já estudaram várias aplicações [1] da 2ª Lei de Newton; dentre elas destacamos:

Exemplo 1. Partícula sujeita a uma força con-servativa: neste caso definimos a função potencial V xv^ h cuja relação com a força que atua sobre a partícula é:

F x V xd=−v v v v^ ^h h. (3)

Para partículas sujeitas a forças conservativas a equação de movimento é:

mdt

d x tV x2

2

d=−v

v v^

^h

h. (4)

Exemplo 2. Partícula sujeita a uma força con-servativa descrita pela função potencial V xv^ h e uma força F tv^ h dependente do tempo. Neste caso a equação de movimento fica:

mdt

d x tV x F t2

2

d=− +v

v v v^

^ ^h

h h. (5)

Será que é possível obter através de um outro conjunto de postulados a equação (2) que descreve a dinâmica de partícula pontual?

Vamos então começar a discutir o Princípio de Hamilton [2] em 1 dimensão espacial. A sua exten-são para 2 e 3 dimensões espaciais é direta.

O princípio de Hamilton não vai dar nenhuma equação de movimento nova para a partícula não-

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 53

-relativística2. No entanto, o Princípio de Hamilton é geral, de maneira que a partir dele podemos obter as equações que governam a evolução dinâmica tanto de partículas quanto de campos, como por exemplo os campos eletromagnéticos.

Enunciado do Princípio de Hamilton:Dentre todos os caminhos em que um sistema

dinâmico poderia se mover de um ponto a outro dentro de um intervalo de tempo fixo (consistente com todos os vínculos que o sistema deve satis-fazer), o caminho escolhido por ele é aquele que minimiza a integral no tempo da função lagran-geana L:

; , , ;S x t t t dt L x t x t tft

t

0

f

0

= o^ ^ ^^h h h h6 @ # , (6)

onde S é a ação. A cada trajetória x(t) entre os pon-tos fixos x(t0) e x(tf) associamos um número que é o valor da ação. A ação é uma quantidade dimensio-nal, e sua dimensão igual à dimensão do momento angular.

Se xcl(t) é a trajetória que a partícula clássica segue para ir da posição x(t0) à posição x(tf) no intervalo de tempo (tf − t0), então qualquer traje-tória que passe nestas mesmas posições nestes mesmos instantes e que corresponda uma pequena modificação na trajetória clássica pode ser escrita como:

;x t x t tclα αη= +^ ^ ^h h h, (7a)

onde α é uma constante e η(t) uma função arbitrá-ria que corresponde a uma pequena deformação da trajetória clássica mas com os extremos fixos (veja a Figura 1):

t t 0f0η η= =^ ^h h . (7b)

2. Partícula não-relativística é aquela cuja velocidade é muito menor que a velocidade da luz.

Figura 1. A curva 1 representa a trajetória clássica, enquanto que as curvas 2 e 3 representam curvas que diferem da trajetória clássica por pequenas deformações.

A expressão matemática correspondente ao Princípio de Hamilton para trajetórias que difiram pouco da trajetória clássica é:

;S x t S x t S x tS x t t S x t 0

cl

cl cl

δ ααη

= −= + − =

^ ^ ^

^ ^ ^

h h h

h h h

6 6 66 6

@ @ @@ @ .

(8)

Para entendermos porque o Princípio de Hamilton é dado pela eq.(8) (δS[x(t)] = 0), note-mos que para t0 e tf fixos, a ação S[x(t); t0, tf] é uma função de α:

, ;G dt L x x tcl clt

tf

0

α αη αη= + +o o^ ^h h# . (9)

Dizer que a trajetória xcl(t) minimiza a ação é equivalente a dizer que a função G(α) tem um mínimo em α = 0. O que caracteriza o mínimo de uma função é que o valor d sua derivada no ponto é igual a zero. Portanto,

0 0G S

0&

2

2

2

2

αα

αα= =

α=

^ h. (10)

Vejamos como obter a equação de Lagrange a partir da condição da ação ser um mínimo quando expandimos as possíveis trajetórias em torno da trajetória clássica.

A ação de qualquer trajetória representada pela eq. (7a) é:

; , ;S x t dt L x x tcl clt

tf

0

α αη αη= + +o o^ ^h h6 @ # . (11)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 54

Da condição de extremo (10), obtemos que:

Sdt x

L xxL x

dt xL

txL

t

t

t

t

t

0

f

f

0

0

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

α α α

η η

= +

= +

α= o

o

oo^ ^h h

'

'

1

1

#

# .

(12)

Ao se escolher a função η(t) estamos também escolhendo a função tηo ^ h, de forma que os dois termos do lado direito (l.d.) da equação (12) não são independentes entre si. Usamos então integra-ção por partes3 para reescrever o termo em tηo ^ h no l.d. da eq. (12):

,

dtxL

t txL

dt dtd

xL

t

dt dtd

xL

t

t

t

t t

t t

t

t

t

t

f f f

f

0 0 0

0

2

2

2

2

2

2

2

2

η η η

η

= −

=−

=

=

oo

o o

o

^ ^ c ^

c ^

h h m h

m h

# #

# (13)

uma vez que o valor da função η(t) para t = t0 e t = tf é igual a zero.

Finalmente, a condição de extremo da ação é escrita como:

Sdt x

Ldtd

xL

t 0t

t

0

f

02

2

2

2

2

2

αη= − =

α= oc ^m h' 1# . (14)

Para que a igualdade (14) seja válida para qual-quer pequena deformação η(t), cujo valor em t = t0

e t = tf é nula, é necessário que o integrando seja identicamente nulo:

xL

dtd

xL

02

2

2

2− =o

c m , (15)

onde, para o cálculo das derivadas parciais, as variáveis x(t) e x to ^ h da lagrangeana L são tratadas como independentes.

A equação (15) é chamada de equação de Lagrange.

Para que a equação de Lagrange faça algum sentido para nós e possamos ver se ela reobtém,

3. Integração por partes:

ud u vdυ υ υ= − ## .

Escolhemos no nosso caso:

uxL

e d dt2

2υ η= =

oo .

no caso das partículas pontuais, a eq. (2), precisa-mos definir a lagrangeana em termos das quantida-des cinemáticas ,x t x to^ ^^ h hh, que caracterizam de forma unívoca o movimento da partícula.

De uma maneira geral, a forma que se escolhe para a lagrangeana depende do sistema que esta-mos tratando: partículas não-relativísticas, partícu-las relativísticas, campos eletromagnéticos, ...

Nesta seção vamos nos restringir a postular as lagrangeanas de partículas não-relativísticas que correspondem aos dois exemplos que apresenta-mos no início da seção.

A lagrangeana associada a um certo sistema é escolhida como função das quantidades cinemáti-cas que caracterizam o sistema, de tal forma que a eq. (15) nos dê a equação de movimento clássica (2) para partículas não-relativísticas.

Exemplo 1. Partícula sujeita a uma força conser-vativa em 1 dimensão: a relação entre a força F(x) que atua na partícula e a função potencial V (x) é:

F x dxdV x

=−^^

hh

. (16)

A lagrangeana de partículas sujeitas a forças conservativas é:

, ;L x t x t t mx t V x21 2= −o o^ ^^ ^ ^h h h h h, (17a)

pois,

xL

mx2

2 =o

o , (17b)

xL

dxdV x

2

2 =−^ h

. (17c)

e, substituindo as eqs. (17b-c) na equação de Lagrange (15), obtemos

dxdV x

dtd mx

mdt

d x tdxdV x

0 2

2

&− − = =−o^ ^ ^ ^h h h h

. (18)

Exemplo 2. Partícula sujeita a uma força con-servativa descrita pela função potencial V(x) e uma força F(t) dependente do tempo.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 55

A lagrangeana que descreve este sistema é:

, ;L x t x t t mx t V x F t x t21 2= − +o o^ ^^ ^ ^ ^ ^h h h h h h h, (19a)

pois,

xL

mx2

2 =o

o , (19b)

xL

dxdV x

F t2

2 =− +^

^h

h. (19c)

Substituindo as eqs. (19b-c) na equação de Lagrange (15) obtemos

,

dxdV x

F t dtd mx

mdt

d x tdxdV x

F t

0

2

2

&

&

− + − =

=− +

o^^

^

^ ^^

hh

h

h hh

(20)

que é idêntica a eq. (5) em 1-dimensão.Uma propriedade importante que se obtém

a partir do Princípio de Hamilton é que, se duas lagrangeanas diferem entre si por uma derivada total, ou seja

, ;

, ;, ;

L x t x t t

L x t x t t dtdG x t x t t

1 =

= +

o

oo

^ ^^

^ ^^^ ^^

h h h

h h hh h h ,

(21)

então as duas lagrangeanas darão origem as mes-mas equações de movimento.

Para vermos isso, relacionemos as ações obti-das a partir das lagrangeanas L e L1:

; , , ;S x t t t dt L x t x t tft

t

0

f

0

= o^ ^ ^^h h h h6 @ # (22a)

e

; ,

, ;, ;

, ;

, ; , ; .

S x t t t

dt L x t x t t dtdG x t x t t

dt L x t x t t

G x t x t t G x t x t t

f

t

t

t

t

f f f

1 0

0 0 0

f

f

0

0

=

= +

= +

+ −

oo

o

o o

^

^ ^^^ ^^

^ ^^

^ ^^ ^ ^^

h

h h hh h h

h h h

h h h h h h

6 @

) 3##

(22b)

Como as pequenas deformações η(t) são reali-zadas com as extremidades fixas, η(t0) = η(tf) = 0,

então a diferença S1 − S é constante e independente do parâmetro α (eq. (7a)) uma vez que a contribui-ção da função , ;G x t x t to^ ^^ h h h para S1 em t = t0 e t = tf não depende de α. Portanto,

S S12

2

2

2

α α= . (22c)

Como a equação de Lagrange é obtida a partir da condição de mínimo da ação e como as ações S e S1 têm o mesmo mínimo, então ambas as ações darão a mesma equação de Lagrange.

As lagrangeanas dos Exemplos 1 e 2 foram escolhidas de forma a recuperar as equações de movimento clássicas que já conhecíamos. Portanto, o Princípio de Hamilton não traz nenhuma Física nova para a Mecânica Clássica. A primeira vista, tudo o que fizemos foi complicar o estudo de sis-temas de partículas clássicas. No entanto, são os formalismos lagrangeano e hamiltoniano [3] que indicam como estender a teoria de forma a descre-ver sistemas quânticos.

A reinterpretação dos formalismos lagrangeano e hamiltoniano nos permite formular a Mecânica Quântica [4], que é a teoria através da qual des-crevemos a Física do mundo microscópico (átomo, núcleo, nucleon, etc...).

2. Campos eletromagnéticos: equações de maxwell

Na presença de campos elétricos e magnéticos, partículas carregadas sofrem a ação da força de Lorentz [5], de maneira que sua equação de movi-mento é4:

, ,mdt

d x teE x t e c

v tB x t2

2

#= +v

v vv

v v^

^^

^h

hh

h, (23)

onde m é a massa da partícula, e a sua carga elétrica e v tv^ h a sua velocidade no instante t. ,E x tv v^ h é o vetor campo elétrico, ,B x tv v^ h o vetor campo mag-

4. Estamos usando o sistema de unidades CGS para escrever as equações envolvendo os campos eletromagnéticos [5].

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 56

nético e c a velocidade da luz5. Estes campos tam-bém são chamados de campos eletromagnéticos.

No entanto, a presença e o movimento de car-gas elétricas (correntes) geram campos elétricos e magnéticos. As equações de Maxwell descrevem a evolução no tempo dos campos eletromagnéticos na presença de cargas elétricas e correntes.

As equações de Maxwell [5] na sua forma glo-bal e local são:

,

, , ,

E x t nds Q t

E x t x t

4

4

S

2

$

$d

π

πρ

=

=

v v t

v v v v

^ ^

^ ^

h h

h h

# (24a)

,

, ,

B x t nds

B x t

0

0

S

2

$

$d

=

=

v v t

v v v

^

^

h

h

# (24b)

, ,

,,,

E x t d l c dtd

B x t nds

E x t c tB x t

1

1

S

2

$ $

#d2

2

=−

=−

Γ

v v v v v t

v v vv v

^ ^

^^

h h

hh

; E## (24c)

, , ,

,,

, ,

B x t d l c dtd

E x t nds c x t nds

B x t c tE x t

c x t

1 4

1 4

S S

2

$ $ $

#

.

d2

2.

π

π

= +

= +

Γ

v v v v v t v v t

v v vv v

v v

^ ^ ^

^^

^

h h h

hh

h

; E# ## (24d)

sendo ,x tρ v^ h a densidade de carga elétrica na posição xv e no instante t, e ,j x tv v^ h a densidade de corrente. Q(t) é a carga elétrica total contida dentro do volume V delimitado pela superfície fechada S:

5. A velocidade da luz é: c = 299.792.456,2 ± 1,1 m/seg.

, .Q t d x x tV

3 ρ= v v^ ^h h# (25)

,B x t ndsS

$v v t^ h# é o fluxo de campo magné-tico que atravessa a superfície S no instante t e

,E x t ndsS

$v v t^ h# o fluxo de campo elétrico que atra-vessa a superfície S no instante t. nt é o vetor unitá-rio normal à superfície S em cada ponto, ds é a área infinitesimal e d lv o vetor infinitesimal tangente a curva Γ. A curva Γ é a fronteira da superfície S.

Para obtermos as equações de Maxwell na sua forma local a partir de sua formulação global basta aplicar os Teoremas de Gauss e Stokes, que estão enunciados no Apêndice A.

Para resolver exatamente o problema do movi-mento da carga elétrica na presença de campos ele-tromagnéticos e sua influência sobre eles, teríamos de resolver simultaneamente as eqs. (23) e (24a-d). Entretanto, não sabemos resolver esse conjunto de equações acopladas. O que faremos é estudar situa-ções físicas em que o efeito da variação dos campos eletromagnéticos é pequeno sobre o movimento das partículas com carga elétrica. Neste caso, vamos supor que conhecemos a distribuição de cargas e correntes em todos os pontos do espaço em cada instante, e que estas distribuições não são afetadas pelos campos eletromagnéticos.

Durante o mini-curso iremos trabalhar com as equações de Maxwell na sua forma local.

Até agora temos chamado de campo aos veto-res elétrico e magnético. A razão de usarmos essa nomenclatura para esses vetores é que no caso de uma partícula pontual, x tv^ h corresponde a posição que a partícula ocupa no instante t. Portanto x tv^ h representa uma única posição do espaço no ins-tante t e é toda a informação que você precisa para localizar a partícula neste instante. No entanto, dizer que você conhece os campos eletromagnéti-cos no instante t implica que você sabe os valo-res dos vetores ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h em cada ponto xv do espaço neste instante. Neste contexto o vetor xv é um parâmetro da mesma forma que o tempo, e representa um índice utilizado para localizar os diferentes pontos do espaço.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 57

Na posição do espaço que uma partícula carre-gada eletricamente ocupa no instante t, a força de Lorentz que ela sente é:

, , ,F x t eE x t e cv t

B x tL #= +v v v vv

v v^ ^^

^h hh

h, (26)

sendo ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h os campos elétrico e mag-nético, respectivamente, na posição da partícula, e a sua carga elétrica e v tv^ h a sua velocidade.

Em resumo, temos que as componentes dos veto-res eletromagnéticos são funções definidas em todos os pontos do espaço; daí se dizer que são campos.

Para termos a força de Lorentz (eq. (26)) que age sobre partículas carregadas precisamos conhe-cer: ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h, sendo que cada um desses vetores tem três componentes. Logo, para descre-vermos a força de Lorentz necessitamos de seis funções. Entretanto, essas seis funções não são independentes entre si, uma vez que as equações de Maxwell (24a-d) acoplam os campos elétrico e magnético. A partir da eq. (24c) vemos que a variação do fluxo do campo magnético através da superfície aberta S depende da integral de linha do campo elétrico ao longo da fronteira Γ da área S. Por outro lado, a variação do fluxo do campo elétrico através da superfície aberta S depende da integral de linha do campo magnético ao longo da fronteira Γ que delimita a área S e o fluxo da den-sidade de corrente que atravessa a mesma área S. Em resumo, temos que a evolução no tempo dos campos elétrico e magnético é interrelacionada.

Vamos introduzir campos auxiliares em que temos um número menor de funções a serem deter-minadas e a partir das quais podemos determinar os campos ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h. Para isso, usaremos as equações de Maxwell na sua forma local e as pro-priedades de Análise Vetorial que estão apresenta-das no Apêndice A.

Da equação (24b), temos que

,B x t 0$d =v v v^ h , (27a)

que pela propriedade (A.5) da divergência de um vetor implica em que

, ,B x t A x t#d=v v v v v^ ^h h. (27b)

,A x tv v^ h é denominado de potencial vetor. Substituindo a eq. (27b) na eq. (24c) obtemos que

,,

E x t c tA x t1

0#d2

2+ =v v v

v v^

^e h

ho . (27c)

Pela propriedade (A.6) do rotacional concluí-mos que

,,

,E x t c tA x t

A x t1 0

2

2d+ =−v v

v vv v^

^^h

hh, (27d)

onde ,A x t0 v^ h é denominado de potencial escalar.Em resumo, temos que os campos físicos ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h que aparecem na força de Lorentz

(eq. (26)) podem ser obtidos a partir dos campos auxiliares ,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h através das relações:

, ,B x t A x t#d=v v v v v^ ^h h (28a)

e

, ,,

E x t A x t c tA x t10d2

2=− −v v v v

v v^ ^

^h h

h. (28b)

Vamos mostrar agora que as quatro funções: A0,Ax,Ay e Az não são independentes entre si. Para vermos isso usaremos o fato de que, dadas as fun-çes ,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h através das relações (28a-b), obtemos um único vetor ,E x tv v^ h e um único vetor

,B x tv v^ h; no entanto, a operação inversa não é ver-dadeira, ou seja, dados os campos ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h temos um conjunto infinito de pares de funções

, , ,A x t A x t0 v v v^ ^^ h hh que podem dar origem a esses campos físicos.

Vamos mostrar então que não é possível inver-ter as relações (28a-b). Para explorarmos essa ambiguidade, lembremos que pela propriedade (A.6), temos que

,G x t 0#d d =v v v^^ hh , (29)

onde ,G x tv^ h é uma função qualquer que não pos-sui singularidades. Então, o potencial vetor ' ,A x tv v^ h definido como:

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 58

' , , ,A x t A x t G x td= +v v v v v v^ ^ ^h h h, (30a)

dá o mesmo campo magnético que o obtido pelo potencial vetor ,A x tv v^ h, ou seja

' , , ,, .

A x t A x t G x tA x t

# # #

#

d d d d

d

= +=

v v v v v v v v v

v v v

^ ^ ^^

^

h h hh

h

(30b)

Entretanto, pela eq. (28b), temos que o poten-cial ' ,A x tv v^ h não gera o mesmo campo elétrico que o potencial vetor ,A x tv v^ h, a menos que, simultane-amente, o potencial escalar seja modificado para:

' , ,,

A x t A x t c tG x t10 0

2

2= −v v

v^ ^

^h h

h. (30c)

Neste caso,

' ,' ,

,,.

A x t c tA x t

A x t c tA x t

1

1

0

0

d2

2

d2

2

− − =

=− −

v vv v

v vv v

^^

^^

hh

hh

(30d)

As funções potenciais ' ,A x t0v v^ h e ' ,A x tv v^ h geram os mesmos campos eletromagnéticos

,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h que os potenciais ,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h. Concluímos que os campos físicos ,E x tv v^ h

e ,B x tv v^ h são invariantes sob a transformação simultânea (30a) e (30c). As transformações (30a) e (30c) são as chamadas transformações de calibre:

' , ,,

A x t A x t c tG x t10 0

2

2= −v v

v^ ^

^h h

h (31a)

e

' , , ,A x t A x t G x td= +v v v v v v^ ^ ^h h h (31b)

onde ,G x tv^ h é uma função qualquer cujas deriva-das espaciais e temporal estão definidas em todos os pontos do espaço e em qualquer instante.

Para podermos trabalhar com os potenciais escalar e vetorial precisamos impor uma condição arbitrária adicional sobre estes campos. Esta con-dição adicional é chamada de fixação de calibre. Como exemplo de condições de calibre usual-mente utilizadas temos:

1. Calibre de Coulomb:

,A x t 0$d =v v v^ h . (32a)

2. Calibre de Lorentz:

,,

A x t c tA x t1

00

$d2

2+ =v v v

v^

^h

h. (32b)

3. Calibre de Weyl:

,A x t 00 =v^ h . (32c)

Os potenciais escalar e vetorial têm que satis-fazer as equações de Maxwell e uma escolha arbitrária de calibre. As expressões obtidas para

,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h dependem da escolha do calibre; no entanto, os campos físicos ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h não dependem da particular escolha de calibre que se faça. Daí dizermos que as quantidade físicas são independentes da particular escolha que se faz para fixar o calibre e sermos então capazes de calcular as funções potenciais: ,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h.

Apesar dos campos ,A x t0 v^ h e ,A x tv v^ h não serem físicos, eles são importantes para a descrição da teoria, uma vez que a lagrangeana que descreve campos eletromagnéticos interagindo com partícu-las carregadas eletricamente é escrita através des-ses campos auxiliares, como veremos mais adiante.

3. Espaço de minkowski

Estamos interessados em estudar neste mini--curso a lagrangeana dos campos de cali de Maxwell (campos eletromagnéticos), e os campos de calibre de Maxwell-Chern-Simons. Em parti-cular, os campos eletromagnéticos (luz) possuem velocidade c em qualquer referencial, de maneira que este é um sistema relativístico.

Na Mecânica Não-Relativística o tempo é um parâmetro que é o mesmo em qualquer referencial, o que não é verdade com o vetor posição da partícula medido a partir de diferentes referenciais inerciais.

Na Mecânica Relativística cada referencial inercial tem o seu conjunto de réguas e relógios

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 59

com os quais realiza as medidas dos fenômenos físicos. Num sistema relativístico o instante em que a partícula ocupa uma certa posição do espaço depende do referencial a partir do qual o movi-mento da partícula está sendo observado. Em cada referencial inercial o movimento de uma partícula é descrito como um evento que contém quatro informações: x t e tv^ h . Desta forma para sistemas relativísticos não podemos dissociar o conceito de espaço do conceito de tempo, daí usarmos a nomenclatura de espaço-tempo para representar o quadri-vetor ,ct xv^ h. O quadri-vetor ,ct xv^ h repre-senta o instante t em que a partícula ocupa a posi-ção xv . Todas as componentes de um quadri-vetor têm que ter a mesma dimensão, daí multiplicarmos o tempo t pela velocidade da luz c no quadri-vetor ,ct xv^ h. Lembrando que a velocidade da luz é a

mesma em qualquer referencial.Não discutiremos a Relatividade Especial neste

mini-curso; para aqueles que estejam interessados numa introdução ao assunto sugerimos a leitura da referência 6.

Em 1908 H. Minkowski propôs um formalismo matemático em que o espaço e o tempo formam um espaço com 4 dimensões. No espaço 4-dimensio-nal o eixo do tempo é perpendicular aos eixos das coordenadas espaciais. Na linguagem de espaço--tempo fica simples descrever as transformações de Lorentz na Relatividade Especial.

Da Análise Vetorial temos que o vetor não depende de eixos coordenados para ser definido. Qualquer que seja o conjunto de eixos coordenados que escolhemos para decompor o vetor em termos de suas componentes, o módulo do vetor tem sem-pre o mesmo valor. Este resultado é um caso par-ticular da invariância do produto escalar entre dois vetores uv e vv quaisquer. O ângulo relativo entre esses vetores é independente dos eixos coordena-dos que utilizamos. Seja α o ângulo relativo entre os vetores uv e vv , o produto escalar entre esses dois vetores é

cosu v u v$ α=v v v v , (33)

que escrito em termos das componentes num con-junto de eixos coordenados cartesianos (x, y, z) fica:

u v x x y y z z$ υ ν υ ν υ ν= + +v v . (34)

Apesar da soma dos termos do l.d. da eq. (34) ser independente dos eixos coordenados esco-lhidos, cada termo do l.d. da eq. (34) depende da escolha feita para estes eixos.

Apenas para simplificar, exemplificaremos o que se segue com vetores no plano (vetores bi-dimensionais).

Vejamos como as componentes de um vetor bi--dimensional variam ao serem escritas em relação a dois conjuntos de eixos coordenados cujas ori-gens coincidem mas cujos eixos estão girados de um ângulo θ.

Considere o vetor Vv na Figura 2.

Figura 2. Os vetores i e j são os vetores unitários dos eixos coordenados (x, y), e, i′ e j′ são os vetores unitários dos eixos coordenados (x′, y′). O vetor V é o mesmo nos dois conjuntos de eixos coordenados, enquanto que as suas componentes depen-dem dos eixos coordenados que utilizamos para obtê-las.

Os vetores unitários nas direções x e y são -t e .t respectivamente. Os vetores unitários nas direções x’ e y’ são -lt e .lt respectivamente. O resultado do produto escalar entre os vetores unitários é:

cos sine$ $- - - .θ θ= =−l lt t t t , (35a)

sin cose$ $. - . .θ θ= =l lt t t t . (35b)

O vetor Vv escrito em termos das componentes nos dois conjuntos de eixos coordenados:

V x y- .ν ν= +v t t (36a)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 60

x y- .ν ν= +l l l lt t . (36b)

Para obtermos as componentes xνl e yνl em ter-mos das componentes xν e yν , usamos que

V e Vx y$ $- .ν ν= =l l l lv t v t , (36c)

e os resultados (35a)-(35b) dos produtos escalares dos vetores unitários, de maneira que, finalmente, escrevemos a transformação das coordenadas numa forma matricial:

cossin

sincos

x

y

x

y

νν

θθ

θθ

νν

=−

l

le e eo o o. (36d)

Todos os vetores satisfazem a lei de transfor-mação (36d) sob uma mudança de eixos coordena-dos que corresponda a uma rotação rígida dos eixos de um ângulo θ.

A matriz

cossin

sincostR

θθ

θθ

=−^ eh o, (36e)

é a matriz de rotação que liga as componentes de um mesmo vetor escrito em dois conjuntos de eixos coordenados girados entre si de um ângulo θ. Para qualquer ângulo θ temos que

det 1R θ =^^ hh . (36f)

Para vermos porque as transformações de Lorentz das coordenadas espaço-temporais entre dois referenciais inerciais podem ser escritas como uma rotação no espaço-tempo, consideremos as transformações de Lorentz para a posição da par-tícula e para o instante em que a medida de posi-ção é feita. Por simplicidade, vamos supor que o movimento da partícula é ao longo da direção x que coincide com a direção do movimento relativo entre os referenciais inerciais (veja Figura 3).

Na Figura 3, V V-=v t é a velocidade do refe-rencial inercial S’ medida por um observador em repouso no referencial inercial S.

Figura 3. O referencial inercial S′se desloca com velocidade V = Vî em relação ao referencial S.

Assumindo que no instante t = 0 as origens dos dois conjuntos de eixos coordenados (x, y) e (x′, y′) coincidem, a transformação de Lorentz é [6, 7]:

x x x0 0 1γ β= −l ^ h, (37a)

x x x1 0 1γ β= − +l ^ h, (37b)

onde x0 = ct e x1 = x, x′0 = ct′ e x′1 = x′, e c é a velocidade da luz. As constantes β e γ são definidas como sendo

cV

e11

2β γ

β= =

−. (37c)

Das relações (37c) temos que −1 ≤ β ≤ 1 e 1 ≤ γ ≤ ∞.

As transformações de Lorentz escritas na forma matricial ficam:

''xx

xx

0

1

0

1

γβγ

βγγ

=−

−e e eo o o, (38)

e possuem uma forma similar a rotação de vetores num plano6 também representada pela transforma-ção (36d).

Os elementos da matriz que aparecem do l.d. da expressão (38) não podem ser escritos como funções trigométricas, pois o produto βγ assume

6. Girar os eixos coordenados (x′, y′) de um ângulo θ em relação aos eixos (x, y) é equivalente do ponto de vista de transforma-ção de coordenadas a manter os eixos coordenados (x, y) fixos e rodar de −θ o vetor vv em relação a origem desses eixos.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 61

valores no intervalo [0,∞), e os valores de γ estão no intervalo [1,∞).

Como os valores que a constante β pode assu-mir estão no intervalo [−1, 1], podemos usar a parametrização:

tanhβ ζ= . (39a)

De maneira que,

tanhcosh

11

11

2 2&γ

β ζγ ζ=

−=

−= (39b)

e

tanh cosh sinh&$βγ ζ ζ βγ ζ= = . (39c)

Portanto, as transformações de Lorentz (37a) e (37b) do espaço-tempo são finalmente escritas como

coshsinh

sinhcosh

xx

xx

0

1

0

1

ζζ

ζζ

=−

−l

lc e em o o (40)

De forma análoga ao produto escalar de veto-res bi-dimensionais, no espaço de Minkowski é possível definir uma operação de produto esca-lar que obtenha como resultado um número que seja o mesmo em todos os referenciais inerciais7. Podemos tentar obter a expressão de escalares de Lorentz através de várias tentativas de funções das coordenadas e usar a transformação (40) para veri-ficar se o resultado é independente do referencial inercial escolhido.

Mas ao invés de procedermos dessa maneira, utilizamos o postulado da Mecânica Relativística que afirma que a velocidade da luz é a mesma em qualquer referencial. A equação de uma frente de onda luminosa em qualquer instante, vista de dois referenciais inerciais distintos é:

x c t0 2 2 2=− + (41a)

x c t2 2 2=− +l l , (41b)

de forma que o resultado da combinação (x0)2 − (x1)2 é o mesmo em qualquer referencial inercial.

7. Um número que é o mesmo em todos os referenciais inerciais cujas quadri-coordenadas estão relacionadas através das trans-formadas de Lorentz é denominado de escalar de Lorentz.

Logo, esta particular combinação das 4-coordena-das forma um escalar de Lorentz.

Definimos um 4-vetor de Lorentz como aquele cujas componentes, sob uma transformação de Lorentz (37a) e (37b), satisfaçam a relação (40). Então, para qualquer 4-vetor de Lorentz a combi-nação acima é também um escalar de Lorentz.

O produto escalar (41a) não pode ser escrito diretamente na forma (34). No entanto, se definimos os vetores contra-variantes xμ, μ = 0, 1, como [7]

, ,x x x x x0 1 0/=µ ^ ^h h, (42a)

e os vetores covariantes xμ, μ = 0, 1, como

, ,x x x x x0 10/= −µ ^ ^h h, (42b)

sendo x0 = ct e x a coordenada x usual, então o pro-duto escalar no espaço de Minkowski é definido como:

.

x c t x x x x

x x

2 2 20

01

1

0

1− + = +

= µµ

µ=

/ (42c)

Definimos a regra da soma implícita dizendo que somamos sobre índices repetidos num mesmo termo, ou seja,

x x x x0

1

/µµ

µµ

µ=

/ , (42d)

Os índices somados (contraídos) estão ao longo da diagonal, ou seja, cada parcela da soma (42d) é o produto da componente do vetor covariante pela componente do vetor contra-variante.

A extensão do que fizemos em d=2 (1+1) (uma dimensão espacial e uma dimensão temporal) para d=4 (3+1) (três dimensões espaciais e uma dimen-são temporal) está contida nas Referências 6 e 7.

De agora em diante trataremos o caso em d=4 (3+1) e utilizaremos a regra da soma implícita.

Em quatro dimensões espaço-temporal o 4-vetor posição é

,x x x0=µ v^ h, (43a)

,x x x0= −µ v^ h. (43b)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 62

O produto escalar é então

.

x x x x c t

x x0

32 2$=− +

=

µµ

µ

µµ

=

v v/ (43c)

Como relacionar os vetores covariantes e os vetores contra-variantes? A partir das definições (43a) e (43b), vemos que a relação entre esses veto-res é linear homogênea, de maneira que podemos escrevê-la como:

x g x=µ µνν , (44a)

onde estamos somando sobre o índice ν, ν = 0, 1, 2, 3. A matriz gμν, também chamada de métrica, em d=4 (3+1) é representada por

g g

1000

0100

0010

0001

= =−

−−

µνµν

J

L

KKKKK

N

P

OOOOO. (44b)

A matriz gμν é simétrica (par) pela troca dos índices (gμν = gνμ) e

g g

1000

0100

0010

0001

δ= =µνν

µx x

J

L

KKKKK

N

P

OOOOO. (44c)

Seja ,B B B0=µ v^ h um 4-vetor qualquer. A rela-ção entre a forma covariante e contravariante de qualquer 4-vetor é dada pela eq. (44a),

,B g B B B B0&= = −µ µνν

µv^ h. (44d)

Como exemplo de 4-vetores de Lorentz temos:a) 4-posição:

,x ct x=µ v^ h, (45a)

b) 4-momento8

,p cEp=µ vc m, (45b)

8. A expressão da energia relativística total da partícula livre é: E p c m c c

Ep m c const2 2 2 2 4

22 2 2&= + − = =v v .

Portanto, a quantidade cE é a componente zero do 4-vetor

momento.

onde E é a energia relativística total da partícula.c) 4-potencial vetor:

, , , ,A x t A x t A x t0=µ v v v v^ ^ ^^h h hh, (45c)

onde ,A x t0 v^ h é o potencial escalar e ,A x tv v^ h o poten-cial vetor associados aos campos eletromagnéticos.

d) 4-densidade de corrente:

, , , ,x t c x t x t. .ρ=µ v v v v^ ^ ^^h h hh, (45d)

onde ,x tρ v^ h é a densidade de carga elétrica na posi-ção xv no instante t e ,x t.v v^ h é a densidade de cor-rente elétrica na posição xv no instante t.

Os operadores diferenciais possuem uma defi-nição diferente da apresentada em (44d):

,x x042

2

2

2

2/ =µ µ

vc m (46a)

e

,x x042

2

2

2

2/ = −µ

µ

vc m. (46b)

Comparando as expressões (46a) e (46b) vemos que a relação entre os operadores diferen-ciais covariante e contra-variante ainda é dada pela relação (44a),

g2 2=µ µνν , (46c)

onde estamos somando sobre o índice ν, ν = 0, 1, 2, 3.

O operador diferencial d’Alambertiano,

c t122 2

2

d2

24 = − +c m, (47a)

onde x y z

22

2

2

2

2

2

d2

2

2

2

2

2= + + , pode ser escrito na forma

2 24 = µµ . (47b)

O operador diferencial d’Alambertiano 4 apa-rece na equação de ondas eletromagnéticas como veremos na seção 4.1.

A relação entre tensores covariantes e contra--variantes de qualquer ordem é:

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 63

a) 4-vetor:

gΒ Β=µ µνν , (48a)

b) tensor de ordem 2:

g g1 1 1 1 2 21 2Β Β=µ ν µ ν µ νν ν , (48b)

c) tensor de ordem n:

g g g......

n n nn

1 2 1 1 2 21 2fΒ Β=µ µ µ µ ν µ ν µ νν ν ν . (48c)

Para concluirmos esta seção, notemos que as transformações de calibre (31a)-(31b), ou seja

, ,,

x t x t c tG x t10 0

2

2Α Α= −l v v

v^ ^

^h h

h (49a)

e

, , ,x t x t G x t4Α Α= +lv v v v v v^ ^ ^h h h, (49b)

podem ser escritas na forma covariante

,G x t2Α Α= −µ µ µl v^ h. (50)

A condição de calibre de Lorentz (eq. (32b)) é escrita como um escalar de Lorentz:

,,

0 0x t c tx t1 0

&$d2

22Α

ΑΑ+ = =µ

µv v vv

^^

hh

. (51)

4. Lagrangeana de Campos de Calibre Clássicos

Nesta seção aplicaremos o Princípio de Hamilton a campos clássicos. Exemplificaremos essa aplicação considerando campos de calibre de Maxwell e de Maxwell-Chern-Simons. Os cam-pos de Maxwell são aqueles que até este momento temos chamado de campos eletromagnéticos (luz), enquanto os campos de calibre de Maxwell-Chern-Simons só existem (se existirem) quando estamos em dimensão espaço-temporal ímpar.

Para uma partícula, associamos a cada trajetória um número através da definição da ação (eq. (6)):

; , , ;S x t t t dt L x t x t tft

t

0

f

0

= o^ ^ ^^h h h h6 @ # . (52)

No caso de partícula, o único parâmetro da trajetória é o tempo. Entretanto, no caso de cam-pos, como por exemplo os campos eletromagné-ticos que discutimos na seção 2, as coordenadas espaciais são parâmetros assim como o tempo. De forma análoga ao sistema de uma partícula, quere-mos associar a cada configuração do campo, que evolui num intervalo de tempo fixo, um número a que chamamos de ação.

Para simplificar a discussão vamos supor um único campo que denotaremos por ,x tΦ v^ h.

A ação associada a cada configuração é defi-nida como:

; , , , , ; ,S t t dt d x x t x t x tLft

t

V0

3f

0

2Φ Φ Φ= µ3

v v v v^ ^^ h h h6 @ # # , (53)

onde L é a densidade de lagrangeana associada ao campo. Em (53) integramos sobre todos os pontos do espaço uma vez que os campos têm uma depen-dência espacial. Além da dependência na derivada temporal, L em geral depende também das deriva-das espaciais.

No Apêndice B mostramos como derivar a equação de Euler-Lagrange para campos clássi-cos. Aqui nesta seção, apresentaremos apenas as traduções dos termos que aparecem na equação de Lagrange, que descreve o movimento de uma par-tícula, para os termos que aparecem na equação de Euler-Lagrange, que dão a equação dinâmica para campos clássicos.

Um ponto importante a ser discutido é que a ação de sistemas relativísticos é um escalar de Lorentz. Isto por que a trajetória que uma par-tícula percorre, vista de um dado referencial inercial, é o mínimo da ação neste referencial. A trajetória da mesma partícula vista de outro refe-rencial inercial tem que ser aquela que é obtida da primeira por uma transformação de Lorentz, e portanto tem que também ser um mínimo da ação. Logo, o valor da ação associada a trajetória que a partícula percorre num dado referencial inercial tem que ser um escalar de Lorentz de maneira a independer da particular forma que a trajetória (ou

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 64

configuração) tem em cada referencial inercial. Como o produto dtd x3 v é um escalar de Lorentz, a densidade de lagrangeana L também tem que ser um escalar de Lorentz.

Obtemos a equação de Euler-Lagrange a par-tir da equação de Lagrange fazendo as seguintes substituições:

,xL

x tL

$2

2

2

2

Φ v^ h (54a)

.

dtd

x

Lt

tx

t

L L

L

ii 1

3$

2

2

2

2

22

2

2

2

2

22

2

2

22 2

2

Φ Φ

Φ

+ =

= µµ

=oc

fc

f

^

mp

mp

h

/ (54b)

A evolução no tempo dos campos clássicos é dada pela equação de Euler-Lagrange (eq. (B.16))

0L L

2

222 2

2

Φ Φ− =µ

µ^ h. (54c)

4.1. Campos eletromagnéticos: Campos de Maxwell

Antes de começarmos a discutir a densidade de lagrangeana L a partir da qual obtemos as equa-ções de Maxwell (24a-d), discutiremos o tensor covariante de ordem 2 definido como [8]:

, , , , , , , ,F x t A x t A x t 0 1 2 32 2 µ ν= − =µν µ ν ν µv v v^ ^ ^h h h , (55)

onde ,c t1

422

2=µvc m e , , , ,x t x t A x t0Α Α= −µ v v v v^ ^ ^^h h hh.

Note que Fμν é um tensor antisimétrico pela troca dos índices (Fμν = − Fνμ). Portanto, dos 16 elemen-tos do tensor9 Fμν, temos 4 elementos nulos (os ele-mentos da diagonal são nulos) e apenas 6 elemen-tos podem ser distintos entre si. Relacionaremos esses 6 elementos distintos com as componentes dos campos eletromagnéticos ,x tΕv v^ h e ,x tΒv v^ h,

9. Usamos a convenção de que os índices gregos: α, μ, τ, ... assumem os valores 0,1,2,3, enquanto os índices arábicos: i, j, k, ... assumem os valores 1,2,3, ou seja

, , , , , , , , , , ,e i j k0 1 2 3 1 2 3f fµ ν τ = = .

,,

, , , , ,

, ,.

F c tA

xA

x t c tx t

x t i

Fx

A x tx

A x t

1 1

1 2 3

i

i

ii

i

ij j

i

i

j

0

00

2

2

2

2d

2

2

2

2

2

2

ΑΑ

Ε

=− − = − −

= =

= −

v vv v

v

v v

^^

^

^ ^

hh

h

h h

= G

(56)

Comparando a expressão acima para Fij, com a expressão (27b) para o campo magnético,

, , , , ,B x t x t k 1 2 3kk kij i

j4# 2εΑ Α= = =v v v v^ ^^h hh , obte-mos que

, , , , .F B x t F B x t F B x tz y x12 13 23=− = =−v v v^ ^ ^h h h (57)

Portanto, o tensor Fμν escrito em termos das componentes dos campos elétrico e magnético fica,

FEEE

E

BB

EB

B

EBB

00

00

x

y

z

x

z

y

y

z

x

z

y

x=−−− −

−−µν

J

L

KKKKK

N

P

OOOOO. (58)

O tensor de Levi-Civita, kijε , está definido no Apêndice A.

Exercício:Determine os elementos do tensor Fμν. Utilize a eq.(48b) para obter as componentes do tensor Fμν a partir da expressão (58).

A densidade de lagrangeana dos campos ele-tromagnéticos tem que ser um escalar de Lorentz. Queremos representar através da densidade de lagrangeana, os campos eletromagnéticos e sua interação com partículas que possuem carga elétrica, de maneira que as equações de Euler-Lagrange nos dêm as equações de Maxwell.

Seja jμ a 4-densidade de corrente elétrica, , , , ,j x t c x t x t.ρ=µ v v v v^ ^ ^^h h hh, onde ,x tρ v^ h é a densi-

dade de carga elétrica e ,x t.v v^ h a densidade de cor-rente elétrica. A densidade de lagrangeana para os campos eletromagnéticos (campos de Maxwell) interagindo com matéria carregada eletricamente é [9]:

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 65

, A F F c j161 1

L u2π

Α Α=− −µ ν µ µνµν µ^ h (59a)

E Bcj

8

2 2

0$

πρΑ

Α=

−− +

v v v v. (59b)

Exercício:Usando o tensor Fμν na forma (58) mostre que:

F F B E2 2 2= −µνµν v v^ h.

Verifiquemos se a densidade de lagrangeana L (eq.(59a)) substituída na equação de Euler-Lagrange (eq.(54c)) dá as equações de Maxwell (24a)-(24d). A equação de Euler-Lagrange no caso dos campos de Maxwell fica,

0, 0,1,2,3.L L

2

222 2

Α Α− = =

α α

x

x^ h (60)

Calculemos os termos que aparecem no l.e. da eq. (60).

O primeiro termo do l.e. da eq.(60) fica,

F F c j A

AFF F A

Fc j A

161 1

161 1

L

2

2

2

2

2

2

2

2

2

π

Α Α

Α

= − −

=− + −

α αµν

µνµ

µ

α

µνµν

µνα α

µµ

µν

;

; 6

E

E @. (61a)

Como

F A A AF

AF

0&2 22

2

2

2ν= − = =µ ν µ

α α

µν

µν

µν

. (61b)

Além disso10

c A j A c j AA

c j

c A j A c j

1 1 1

1 1&

22

22

22

- =- =-

- =-

an

n n

a

n nd

an

n a

na7

7

A

A .

(61c)

Portanto, temos que

c j1L

2

2

Α=−

α

α . (61d)

10. Devemos notar que pela relação (48a), temos que:

j A g j g A g g j A j A j AT T δ= = = =µµ

µαα µ

µαµτ α

αα α

αx x

x .

A troca da posição dos índices que estão sendo contraídos não altera o resultado.

Calculando as derivadas de L em relação a AT2 α

.

A AF F c j A

AF

F FAF

c Aj A

FAF

c j AA

161 1

161 1

81 1

L

2 2

2

2 2

2

2 2

2

2 2

2

2 2

2

2 2

2

2 2

2

π

π

= − −

=− + −

=− −−

α α

µνµν

µµ

α

µνµν

µν

α

µν

α

µµ

µν

α

µν

µ

α

µ

x x

x x x

x x

^ ^

^ ^ ^

^ ^

h h

h h h

h h

;

= 6

E

G @

(62a)

Entretanto, como

.

F A AAF

AA

AA

AF

&

&

2 22 2

2

2 2

2 2

2 2

2 2

2 2

2δ δ δ δ

= − = −

= −

µν µ ν ν µ

α

µν

α

µ ν

α

ν µ

α

µν

µ να

ν µα

x x x

x

x x

^ ^

^

^

^

^

h h

h

h

h

h

(62b)

Consequentemente temos que

FAF

F

F F F

81

81

81

41

2 2

2

π πδ δ δ δ

π π

− =− −

=− − =−

µν

α

µνµν

µ να

ν µα

α α α

x

x x

x x x

^^

^

hh

h , (62c)

uma vez que F αx é um tensor anti-simétrico.Além disso temos que

0c j AA1

2 2

2− =µ

α

µ

x^ h. (62d)

Substituindo os resultados (62c)-(62d) em (62a) decorre que

AF F4

141L

2 2

2

π π=− =

α

α ατ

x

x

^ h. (62e)

Usando os resultados (61d) e (62e) a equação de Euler-Lagrange para os campos eletromagnéti-cos fica:

, 0,1,2,3F c j4

α= =α αxx . (63)

Observando atentamente a eq. (63) notamos que ela representa apenas 4 equações, enquanto que as equações de Maxwell (24a)-(24d) são 8 equações!!!

Vejamos quais das equações de Maxwell são descritas pela eq. (63). Na verdade como do l.d.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 66

da eq.(63) temos jμ, então são as equações inomo-gêneas de Maxwell (24a) e (24d) que são repro-duzidas pelas suas componentes. Para vermos isto, reescrevemos a eq.(63) em termos das componen-tes do tensor Fμν:

a) α = 0

, ,F x t x t4jj02 πρ=v v^ ^h h, (64a)

onde o índice j, sobre o qual estamos somando implicitamente, assume os valores: j = 1, 2, 3.

Mas,

,, , ,

, .

F x t xE x t

yE x t

zE x t

E x t

jj

x y z0

$

22

2

2

2

2

2

d

= + +

=

vv v v

v v v

^^ ^ ^

^

hh h h

h

(64b)

A componente α = 0 da eq.(63) nos dá a lei de Gauss:

, 4 ,E x t x t$d πρ=v v v v^ ^h h. (64c)

b) α = 1

c tF

yF

zF

c j1 4

x

01 21 31

2

2

2

2

2

2 π+ + = . (65a)

Reescrevendo os elementos de Fμν em termos dos campos eletromagnéticos, a eq. (65a) passa a ser

, , ,,

, ,,.

c tE x t

yB x t

zB x t

c j x t

B x t c j x t c tE x t

1 4

4 1

x z y

x

x x

x

&

& #

2

2

2

2

2

2

d2

2

π

π

− + − =

= +

v v vv

v v v vv

^ ^ ^^

^^ ^^

h h hh

hh hh

(65b)

Procedendo de forma análoga, para α = 2 e α = 3 encontramos que

c) α = 2

, ,,

B x t c j x t c tE x t4 1

y y

y#d

2

2π= +v v v vv

^^ ^^

hh hh

, (65c)

d) α = 3

, ,,

B x t c j x t c tE x t4 1

z z

z#d

2

2π= +v v v vv

^^ ^^

hh hh

. (65d)

As componentes espaciais (α = 1, 2, 3) da eq. (63) nos dão a lei Ampére corrigida11

, ,,

B x t c j x t c tE x t4 1

d2

2π# = +v v v v v

v v^ ^

^h h

h. (65e)

Como obter as equações homogêneas de Maxwell (24b) e (24c)?

Na verdade as equações homogêneas de Maxwell decorrem da definição do tensor Fμν em termos do 4-potencial vetor Aμ, ou seja,

F A A2 2= −µν ν ν µµ , (66)

que satisfaz a seguinte identidade:

F F F 02 2 2+ + =α µν µ να ν αµ , (67)

válida para qualquer configuração ,x tΑµ v^ h.A identidade (67) é conhecida como a identi-

dade de Bianchi.

Exercício:Usando a expressão (66) para o tensor Fμν mostre a identidade de Bianchi (67).

Para obtermos as equações de Maxwell (24b) e (24c) a partir das componentes da eq. (67), calcule--mo-la explicitamente para conjuntos distintos de valores de (α, μ, ν):

a) α = 0, μ = 1, ν = 2

, .

F F F c tB

xE

yE

E x t c tB

01

0

1

z y x

z

z

0 12 1 20 2 01 &

& #

2 2 22

2

2

2

2

2

d2

2

+ + = − − + =

=−v v v^^ hh

(68a)

b) α = 0, μ = 1, ν = 3

, .

F F F c tB

xE

yE

E x t c tB

01

0

1

y z x

y

y

0 13 1 30 3 01 &

& #

2 2 22

2

2

2

2

2

d2

2

+ + = − + =

=−v v v^^ hh

(68b)

11. A lei de Ampére original é: B c j4

# =v v v. Entretanto,

Maxwell adicionou a esta relação o termo de corrente de des-

locamento c tE12

2v de forma a fechar de forma auto-consistente

as que hoje são conhecidas como as leis de Maxwell [10].

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 67

c) α = 0, μ = 2, ν = 3

, .

F F F c tB

yE

zE

E x t c tB

01

0

1

x z y

x

x

0 23 2 30 3 02 &

& #

2 2 22

2

2

2

2

2

d2

2

+ + = − − + =

=−v v v^^ hh

(68c)

d) α = 1, μ = 2, ν = 3

. , .

F F F xB

yB

zB

B x t

0 0

0

x y z1 23 2 31 3 12 &

&

2 2 22

2

2

2

2

2

d

+ + = − − − =

=v v v^ h

(68d)

Em resumo, as eqs. (68a)-(68c) nos dão a lei de Faraday

,,

E x t c tB x t1

d2

2# =−v v v

v v^

^h

h (69)

e, a eq. (68d) nos dá a equação de Gauss para o campo magnético,

, 0B x t$d =v v v^ h . (70)

A eq.(70) representa a ausência de monopólos magnéticos nas equações de Maxwell.

Portanto, a partir da densidade de lagrangeana (59a)/(59b) e da definição do tensor Fμν obtemos todas as equações de Maxwell (24a)-(24d).

Todos nós já ouvimos falar na conservação da carga elétrica. Vamos mostrar que essa lei de conservação é uma consequência das equações de Maxwell (eqs. (24a)-(24d) ou (63)).

Usando as equações de Maxwell escrita na forma covariante (eq.(63)),

, 0,1,2,3F c j4

α= =α αxx , (71)

calculamos a sua derivada em relação a xα, e soma-mos sobre α, de forma que

F c j4

2 2 2π=α

αα

αxx . (72a)

Como os índices α e x no l.e. da eq. (72a) são índices mudos (índices sobre os quais estamos somando), então podemos mudar o nome dessas variáveis, de maneira que se fazemos a mudança de

variáveis: ?α x , o l.e. da eq. (72a) não se modi-fica, ou seja,

,F F F FF 0&

2 2 2 2 2 2 2 2

2 2

= =− =−=

α ττα

αατ

τ ατα

α ττα

α τ

x

τα

(72b)

onde usamos que 2 2 2 2=α αx x mas que F F=−α ατx .Consequentemente podemos escrever a eq.

(72a) como sendo

, 0,

, 0j x t tx t

j x t& $22

2d

ρ= + =α

α vv

v v v^^

^hh

h , (72c)

que nos dá a lei de conservação da carga elétrica. A partir da equação de conservação da carga elé-trica temos que a variação da densidade de carga elétrica na posição xv no instante t é igual a menos o fluxo da densidade de corrente elétrica que no instante t atravessa um volume infinitesimal que contém o ponto xv . Para j 04$ 2v v temos um fluxo positivo atravessando o volume infinitesimal. Essa relação descreve a situação em que temos mais cor-rente saindo do volume infinitesimal, que contém o ponto xv , do que entrando. Essa quantidade maior de corrente que sai, se dá as custas da diminuição da densidade de cargas elétricas dentro do volume infinitesimal que contém o ponto xv . No processo inverso, fluxo negativo, temos um aumento de carga elétrica em xv , que corresponde a um acú-mulo de carga elétrica neste ponto.

A densidade de lagrangeana L (59a) não é inva-riante sob transformações de calibre (eq. (50)) uma vez que é proporcional a Aμ. Apesar disso as equa-ções de movimento para os campos são invariantes sob essas transformações. Qual o mecanismo da teo-ria que garante a invariância das equações de movi-mento? Vejamos como a densidade de lagrangeana l(59a) se modifica sob transformações de calibre

, , ,A x t A x t G x t2= −µ µ µl v v v^ ^ ^h h h. (73)

Note que a transformação de calibre (73) corres-ponde a dizer que todas as configurações ,A x t∝ v^ h são modificadas, sendo que a cada uma delas é sub-traído o 4-gradiente da mesma função ,G x tv^ h.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 68

A densidade de lagrangeana (59a) sob a trans-formação (73) fica:

,A A F F c j A

F F c j A c j G161 1

161 1 1

L 2

2

π

π

=− −

=− − +

µ ν µ µνµν

µµ

µνµν

µµ

µµ

l l l l l^ h

. (74a)

Exercício:Os elementos do tensor Fμν (eq.(58)), são as com-ponentes dos campos físicos ,E x tv v^ h e ,B x tv v^ h. Os campos físicos são invariantes sob a transforma-ção de calibre (73).Prove que F F=µν µνl e, portanto, que F F F F=µν

µνµν

µνl l .

Usando a conservação da carga elétrica, eq. (72c), temos que

, , , ,

, ,

, , .

c j x t G x t c j x t G x t

c G x t j x t

c j x t G x t

1 1

1

1

2 2

2

2

=

=

µµ µ

µ

µµ

µµ

v v v v

v v

v v

^ ^ ^ ^^

^ ^

^ ^^

h h h hh

h h

h hh

(74b)

Usando o resultado (74b) em (74a), obte-mos que a densidade de lagrangeana dos campos de Maxwell se transforma sob transformação de calibre como

, ,

, , .

A A

c j x t G x t1L L' '2 2

2

Α Α= +

+

µ ν µ µ ν µ

µµ v v

^ ^

^ ^^

h h

h hh (74c)

Vemos que a densidade de lagrangeana dos campos eletromagnéticos só é invariante sob trans-formação de calibre na ausência de partículas com carga elétrica. No entanto, na presença de cargas e correntes elétricas, a densidade de lagrangeana sob uma transformação de calibre se modifica por uma derivada total. O fato da densidade de lagrangeana se modificar, sob uma transformação de calibre, por uma derivada total, é consequência da lei de conservação da carga elétrica.

Da eq.(53) temos que a ação associada a confi-guração do 4-potencial vetor é,

; , , ; , .S A t t dt d x A A x tLft

t

V0

3f

0

2=µ µ ν µ3

v v^ h6 @ # # (75a)

A ação associada aos campos A’μ obtidos de Aμ a partir da transformação de calibre (73) é

; , , ; ,S A t t dt d x A A x tLft

t

V0

3f

0

2=µ µ ν µ3

l l l lv v^ h6 @ # # (75b)

Utilizando-se o resultado (74c), relacionamos S’[A’μ] e S[Aμ]

; , , ; ,

, ,

; , , ,

S A t t dt d x A A x t

c dt d x j x t G x t

S A t t c dt d x j x t G x t

1

1

Lft

t

V

t

t

V

ft

t

V

03

3

03

f

f

f

0

0

0

2

2

2

=

=

+

+

+

µ ν µ

µµ

µµ

µ

3

3

3

µl l v v

v v v

v v v

^

^ ^^

^ ^^

h

h hh

h hh

6

6

@

@

# ## #

# # . (75c)

Entretanto,

, ,

, ,

, ,

, , , ,

, ,

, , , , .

c dt d x j x t G x t

d x dt t x t G x t

c dt d x j x t G x t

d x x t G x t x t G x t

c dt G x t j x t ds

d x x t G x t x t G x t

1

1

1

t

t

V

V t

t

t

t

V

Vf f

t

t

S

Vf f

3

3

3

30 0

30 0

f

f

f

f

0

0

0

0

4$

$

2

2

ρ ρ

ρ ρ

=

= +

+

= − +

+

= −

µµ

3

3

3

3

3

3

v v v

v v v

v v v v v

v v v v v

v v v v

v v v v v

^ ^^

^ ^^

^ ^^

^ ^ ^ ^

^ ^

^ ^ ^ ^

h hh

h hh

h hh

h h h h

h h

h h h h

6

6

@

@

# #

# #

# #####

(75d)

Para passarmos da primeira linha para a segunda linha da expressão anterior utilizamos o Teorema de Gauss (eq. (A.9)). Para escrevermos o resultado final (75d) utilizamos a hipótese de sis-tema fechado e portanto ,j x t 0=v v^ h , em qualquer ponto da superfície S∞ que delimita o volume V∞.

Finalmente, podemos escrever que

; , ; ,

, , , ,

S A t t S A t t

d x x t G x t x t G x tf f

f fV

0 0

30 0ρ ρ

= +

+ −µ µ

3

l l

v v v v v^ ^ ^ ^h h h h

6 66@ @

@# . (76)

A segunda integral que aparece do l.d. da expressão (76) é a mesma para qualquer configu-ração de Aμ ,x tv^ h. Portanto, as configurações que correspondem ao mínimo de S’[A’μ] são aquelas que foram obtidas de Aμ por uma transformação de calibre e que são as configurações que dão os mínimos de S[Aμ]. Como Aμ e A’μ estão ligadas por uma transformação de calibre, então ambas as

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 69

configurações geram os mesmos campos eletro-magnéticos. Como consequência da ação variar da mesma quantidade para todas as configurações, os 4-potenciais vetores que minimizam cada uma das ações, apesar de diferentes, representam os mes-mos campos físicos. Por tudo isso, as equações de movimento obtidas pela aplicação do Princípio de Hamilton à densidade de lagrangeana (59a) são invariantes sob transformações de calibre.

Cabe ressaltar mais uma vez que foi funda-mental para demonstrar a invariância da equação de movimento dos campos eletromagnéticos sob transformações de calibre a lei de conservação da carga elétrica.

Para concluir esta seção, consideraremos as equações de Maxwell numa região distante da região onde estão as cargas e correntes elétricas que geraram os campos eletromagnéticos. Na região em que estamos interessados em estudar a evolução no tempo dos campos eletromagnéticos, as equações de Maxwell são:

,E x t 04$ =v v v^ h , (77a)

, 0B x t4$ =v v v^ h , (77b)

,,

E x t c tB x t1

4#2

2=−v v v

v v^

^h

h, (77c)

,,

B x t c tE x t1

4#2

2=v v v

v v^

^h

h. (77d)

Para obtermos a equação de movimento das componentes do campo elétrico ,E x tv v^ h calculamos o rotacional da eq. (77c),

, ,E x t c t B x t1

04# 4# 42

2#− =v v v v v v v^^ ^^hh hh . (78a)

Usando a relação (A.7) e substituindo a eq. (77d) na expressão anterior, obtemos que

, ,

,

,

.

E x t E x t

c tE x t

c tE x t

1

1

0

2

22 2

2

2 2

2

&4 4$ 4

42

22

2−

=

=

−v v v v v v

v v

v v^^ ^

c ^

^hh h

m h

h

(78b)

Utilizamos que ,E x t 04$ =v v v^ h para escrevermos (78b) na sua forma final. A eq. (78b) é válida para cada componente do campo elétrico:

, , , ,c t

E x t i1

0 1 2 3i22 2

2

42

2− = =vc ^m h . (78c)

Usamos a notação: E1 = Ex,E2 = Ey e E3 = Ez.

O operador c t122 2

2

42

2−c m é igual a menos o ope-

rador d’Alambertiano 4^ h que definimos na eq. (47a). Usando a notação covariante do operador d’Alambertiano (eq. (47b)), a equação de movi-mento das componentes do campo elétrico livre fica:

,E x t 0i2 2 =µµ v^ h . (78d)

Procedendo de forma análoga, mas agora usando as eqs. (77d) e (77c) obtemos as mesmas equações para as componentes do campo magné-tico livre,

, ,c t

B x t B x t1

0 0i i22 2

2

&42

22 2− = =µ

µv vc ^ ^m h h . (79)

Estudemos agora as soluções de onda plana da eq. (78c), ou equivalentemente, da eq. (79). Supomos que essas equações têm solução da forma

,E x t ei i i k x tε= $ ω−v v v^ ^h h , (80a)

onde εi é uma constante que dá a amplitude do campo elétrico, kv é o vetor de onda que determina a direção e o sentido em que a onda plana se pro-paga e ω sua frequência angular. No entanto, não é para qualquer valor de kv e ω que a solução tenta-tiva (80a) é solução da equação diferencial (78c). Substituimos a solução (80a) em (78c) para encon-trarmos que relação kv e ω devem satisfazer para que (80a) seja sua solução. Assim,

,c t

E x t e kc

10 0i i i k x t2

2 2

22

2

2

&42

ω− = − =$ ω−v vv vc ^ c^m h mh . (80b)

Como a igualdade (80b) tem que ser verdadeira em todos os pontos do espaço e em todos os ins-

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 70

tantes, então a única forma de garantirmos isto é impondo que

ck2

22ω = v . (80c)

A relação de dispersão (80c) é satisfeita por partículas de massa zero [4].

Podemos nos perguntar: como a densidade de lagrangeana (59a) deve ser modificada para que a luz possua massa?

Em 1936, A. Proca foi o primeiro a propor uma modificação na densidade de lagrangeana (59a) para que a luz tivesse massa. A densidade de lagrangeana [7]

,A A F F c j A A A161 1

8LProca 2π π

µ=− − +3ν ν

ν αα

αx x x

x^ h , (81a)

é conhecida como a densidade de lagrangeana de Proca.

A equação de movimento obtida a partir de (81a) é,

0,1,2,3F A c j422 µπ

α+ = =α α αxx . (81b)

A eq.(81b) escrita em termos dos 4-potenciais A∞, no calibre de Lorentz (∂αAα = 0) e na ausência de 4-correntes externas, fica

, , 0 0,1,2,3c t

A x t A x t122 2

224

2

2µ α− − = =α αv vc ^ ^m h h . (82a)

A solução tipo onda plana (eq.(80a)),

,A x t ei k x tΑ= $α α ω−v v v^ ^h h , (82b)

substituída na eq. (82a), leva a relação de dispersão:

ck

22 2

2

ωµ= +v . (82c)

A relação (82c) é igual a relação de dispersão satisfeita por partículas livres relativísticas de massa |μ|.

A partir da eq. (81b), vemos que a equação de movimento obtida do modelo de Proca depende

explicitamente dos campos ,A x tα v^ h, de maneira que ela não é mais invariante sob a transformação de calibre (73). Com a perda da invariância de calibre, os campos ,A x tα v^ h perdem o seu caráter auxiliar e passam a ser campos físicos, o que vai contra o fato de serem os campos elétrico e magnético os campos físicos, enquanto que os 4-potencias vetorias foram introduzidos apenas para levar em conta que campos eletromagnéticos possuem interdependência.

Portanto, é preciso procurar outro mechanismo que a Natureza possa ter lançado mão para dar massa a luz, mas sem abrir mão da invariância de calibre da teoria.

A densidade de lagrangeana dos campos de Maxwell (campos eletromagnéticos)

,A A F F c j A161 1

L 2π

=− −µ ν µ µνµν

µµ^ h , (83)

pode ser escrita em qualquer dimensão espaço--temporal. Na seção 4.1 apresentamos os cálculos em d=4(3+1). Entretanto, a forma da equação de movimento não muda se consideramos dimensões de espaço-tempo iguais a: d=2 (1+1), d=3 (2+1).

4.2. Campos de calibre de Maxwell-Chern-Simons

Os físicos teóricos nunca estão satisfeitos com a densidade de lagrangeana que eles têm a mão. É parte de sua natureza especular como seria o universo se a densidade de lagrangeana tivesse outros termos. Que novos fenômenos a Natureza lhe revela nestes novos termos de sua tão amada densidade de lagrangeana?

A Teoria Eletromagnética não foge à regra de provocar esta incansável curiosidade que os teóri-cos possuem. A regra que temos que seguir para tentar adicionar novos termos à densidade de lagrangeana dos campos eletromagnéticos (eq. (83)) é de que ela tem que continuar a ser um esca-lar de Lorentz. Além disso, na ausência de partí-culas que possuam carga elétrica, a densidade de lagrangeana é invariante sob transformações de

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 71

calibre. Portanto uma ideia possível que se tem para estender a densidade de lagrangeana (83), na ausência de partículas carregadas eletricamente, é adicionar-lhe o escalar de Lorentz

F Fεγναβ γν αβ . (84a)

A lagrangeana estendida dos campos eletro-magnéticos passaria a ser

,A A F F c j A g F F161 1

Lest 2π

ε=− − +γ ν γ γνγν

γγ γναβ

γν αβ^ h , (84b)

onde g é uma constante e εγναβ é o tensor de Levi-Civita em 4 dimensões12.

Entretanto, o termo εγναβFγνFαβ é igual a uma derivada total, ou seja,

F F 2ε Ω=γναβγν αβ ν

ν . (84c)

Exercício:Mostre que: F F 2ε Ω=γναβ

γν αβ νν ,

onde 2 A FεΩ =ν νγαβγ αβ

Lest difere da lagrangeana (83) por uma deri-vada total. Pelo que mostramos na seção 1, densi-dades de lagrangeanas que difiram por uma deri-vada total geram o mesmo conjunto de equações de movimento. Portanto, ao adicionarmos o termo (84a) a (83) não estamos descrevendo nenhum fenômeno físico novo. Por simplicidade, usamos a densidade de lagrangeana (83) para descrever os campos eletromagnéticos.

Em dimensões espaço-temporal ímpar pode-mos definir os termos de Chern-Simons. Os termos de Chern-Simons não são invariantes sob transfor-mações de calibre (eq. (73)); entretanto, veremos que as equações de movimento dos campos obti-das, continuam invariantes mesmo com a adição desses termos.

Neste mini-curso nos restringiremos a discutir o termo de Chern-Simons abeliano em d=3(2+1).

12. O tensor de Levi-Civita εγναβ é definido de forma análoga ao tensor de Levi-Civita em 3 dimensões (Apêndice A); ε0123 = 1, assim como para todas as permutações pares dos índice (0, 1, 2, 3) , -1 para todas as permutações ímpares dos índi-ces (0, 1, 2, 3) e 0 se dois ou mais índices forem iguais.

Em d=3(2+1) o movimento dos campos e partícu-las está restrito a um único plano, que chamaremos de plano (x, y).

A densidade de lagrangeana do termo de Chern-Simons abeliano em d=3(2+1) é:

, ,A A F A4LC S v2µε=γ γγνα

γν α− ^ h (85)

sendo εγνα o tensor de Levi-Civita (Apêndice A) em 3 dimensões13.

A lagrangeana dos campos de calibre, incluindo o termo de Chern-Simons, fica sendo

,A A F F F A161

4LG 2π

µε=− +γ ν γ γν

γν γναγν α^ h , (86)

que é conhecida na literatura [11-12] como a densi-dade de lagrangeana de Maxwell-Chern-Simons. O primeiro termo do l.d. de (86) é chamado de densi-dade de lagrangeana de Maxwell.

A ação tem dimensão de momento angular:

S TML2=6 @ , (87)

onde M representa a dimensão de massa, L a dimen-são de comprimento e T a dimensão de tempo. Como todos os termos de uma expressão têm que ter a mesma dimensão, então a partir da ação podemos determinar em d=3(2+1) a dimensão do 4-potencial vetor Aν e da constante de Chern-Simons μ.

Usando a expressão geral (53) da ação para campos clássicos, temos que em d=3(2+1) a ação para os campos de Maxwell-Chern-Simons é,

; , , , , ; , .S A t t dt d x A x t A x t x tLft

t

G vV

02

f

0

2=γ γ γ3

v v v v^ ^^ h h h6 @ # # (88)

A análise dimensional para se determinar a dimensão de Aμ e μ é a seguinte:

a) a partir da densidade de lagrangeana de Maxwell:

; .

S TML

TL F F TLLA

A TM L

F LA

TM

22 2

2

2

2

1

2

1

&

&

= = =

= = =

γµγµ

γ

γ γν

γ

6 6

6 66

@ @

@ @@

(89a)

13. Definimos ε012 = 1.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 72

b) as densidades de Maxwell e de Chern-Simons têm a mesma dimensão:

F A F L2 1&µ γ µ= =γν γν−6 6 6 6 6@ @ @ @ @ . (89b)

A constante de Chern-Simons μ tem dimen-são do inverso do comprimento. O modelo de Maxwell-Chern-Simons tem uma constante que

caracteriza um comprimento: 1μ , ao contrário da

teoria de Maxwell que na ausência de cargas e cor-rentes elétricas não possui nenhuma constante com dimensão.

O termo de Chern-Simons (85) não é invariante sob transformações de calibre (73) uma vez que depende diretamente de Aγ; porém, como a densi-dade de lagrangeana LC−S se modifica sob transfor-mações de calibre (73)?

Sob a transformação de calibre (73)

, , ,A x t A x t G x t2= −µ µ µl v v v^ ^ ^h h h, (90)

a densidade de lagrangeana de Chern-Simons passa a ser

,

,

A A F A G

A A F G

4

4

L

L

C S

C S

2 2

2 2

µε

µε

= −

= −

γ ν γγνα

γν α α

γ ν γγνα

γν α

l l^ ^

^

h h

h . (91)

Mas

F G GF G F2 2 2ε ε ε= −γναγν α

γναα γν

γναα γν^ h . (92a)

Porém, como F A A2 2= −µν µ ν ν µ , então,

,G F G A A

02 2 2 2 2ε ε ε= −

=

γναα γν

γναα γ ν

γναα γ γ6 @

(92b)

uma vez que somamos sobre os índices (α, γ) no primeiro termo do l.d. de (92b) e sobre (α, ν) no segundo termo da mesma expressão e εγνα é um ten-sor ímpar (εγνα = −εγαν), enquanto que 2 2α γ e 2 2α ν são tensores pares , ,e2 2 2 2 2 2 2 2= =α γ γ α α ν ν α^ h.

Logo,

F G GF2 2ε ε=γναγν α α

γναγν^ h. (92c)

Finamente, podemos afirmar que sob uma transformação de calibre a densidade de lagran-

geana de Maxwell-Chern-Simons se transforma como:

, ,A A A A F G4L LC S C S2 2 2µ

ε= −γ ν γ γ ν γ αγνα

γν− −l l^ ^ ^h h h (93)

Como no caso dos campos de Maxwell a densi-dade de lagrangeana de Maxwell-Chern-Simons se modifica por uma derivada total sob uma transfor-mação de calibre (90). Mostramos na seção 4.1 que neste caso a ação que descreve o sistema gera equa-ções de movimento invariantes sob transformações de calibre. A grande diferença entre as duas teorias é que a densidade de lagrangeana de Chern-Simons não é invariante sob transformações de calibre nem mesmo na ausência de interação com partículas. Entretanto o que é importante é que a lagrangeana gera equações de movimento que são invariantes sob transformações de calibre.

Antes de discutirmos as equações de movi-mento decorrentes da densidade de lagrangeana de Maxwell-Chern-Simons com os campos de calibre Aν acoplados a correntes e cargas elétricas, veja-mos as componentes do tensor Fγν em termos dos campos eletromagnéticos em d=3(2+1).

Como o tensor Fγν tem a mesma definição em qualquer dimensão espaço-temporal,

, , , , , , ,F x t A x t A x t 0 1 22 2 γ ν= − =γν γ ν ν γv v v^ ^ ^h h h , (94)

em d=3(2+1) o tensor Fγν tem 3 componentes inde-pendentes de um total de 9 elementos.

Lembramos que os elementos da diagonal do tensor Fγν são nulos.

Os elementos independentes do tensor ,F x tγν v^ h são:

, , , ,F x t c tA

xA

E x t i1

1 2i

i

ii

0

0

2

2

2

2=− − = =v v^ ^h h , (95a)

e

, ,F x txA

xA

yA

xA

B x tx y

12 1

2

2

1

2

2

2

2

2

2

2

2=− + = − =−v v^ ^h h. (95b)

Das expressões (95a)-(95b), vemos que em d=3(2+1) o campo elétrico é um vetor com duas

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 73

componentes contidas no plano (x, y) enquanto que o campo magnético é um escalar. Note que F12 em d=4(3+1) corresponde a componente z do campo magnético; em d=3(2+1) a componente z é perpendicular ao plano fixado de maneira que em d=3(2+1) o campo magnético é um escalar.

O tensor Fγν escrito na sua forma matricial fica,

F EE

E

B

EB

000

x

y

x y

= −−

−−γν

J

L

KKK

N

P

OOO. (95c)

Em resumo, temos que

, ,E x t F x t c tA

xA1i

i

i

i0

0

2

2

2

2= =− −v v^ ^h h (96a)

e

, ,B x t F x t Aiji

j12 2ε=− =v v^ ^h h , (96b)

onde εij , i, j,= 1, 2, é o tensor de Levi-Civita em duas dimensões (ε12 = 1, ε21 = −1, ε11 =ε22 = 0).

Iremos derivar agora as equações de movimento obtidas da densidade de lagrangeana LG dos cam-pos de Maxwell-Chern-Simons acoplados a corrente e carga elétricas. Neste caso temos que a densidade de lagrangeana que descreve o sistema é:

, ,A A A A c j A

F F F A c j A

1

161

41

L Lv G2 2 γ

πµε

= −

=− + −

γ γ γ ν γγ

γνγν γνα

γν α γγ

^ ^h h

. (97)

Substituindo a densidade de lagrangeana (97) na equação de Euler-Lagrange (eq.(60)),

0A AL L

2

222 2

2− =

α α

x

x^ h, (98)

obtemos a equação de movimento dos campos de calibre de Maxwell-Chern-Simons na presença de carga e corrente elétricas.

Dos resultados (61d) e (62e) temos que

A F F c j A c j161 1 1

2

2

π− − =−

αγν

γνγ

γ αc m , (99a)

.A

F F c j A F161 1

41

2 2

2

π π− − =

α

γνγν

γγ α

x

x

^ch

m (99b)

Além disso,

A F A F F4 4 42

2 µε

µε δ

µε= =

α

λνγλν γ

λνγλν γ

α λναλνc m , (99c)

e

.

AF A A

AF

A

A

A

4 4

4

4

2

2 2

2

2 2

2

α

µε

µε

µε δ δ δ δ

νε ε

µε

=

= −

= −

=

λνγλν γ

λνγγ

α

λν

λνγγ λ ν

αν λ

α

γαγ α γ

αγγ

x x

x x

x x

x

^c

^

^

^

hm

h

h

h

(99d)

Usamos o resultado (62b) para escrevermos a segunda linha da expressão (99d).

Substituindo os resultados (99a)-(99d) na eq.(98), obtemos que

0F c j F A41

41

22µε

πµε− − − =γνα

γνα

τατ αγ

γxc m . (99e)

Entretanto,

.

A A A

A A

F F

4 4

4

4 4

2 2 2

2 2

µε

µε ε

µε

µε

µε

=− +

=− −

=− =−

αγγ

α γγ

αγτγ

α γγ γ

α γγ

αγνγν

xx

xx x

xx x

xx

^

^

h

h (99f)

Substituindo (99f) em (99e), encontramos que a equação de movimento dos campos de Maxwell-Chern-Simons é

, , ,F F c j41

21

0 1 22π

µε α+ = =γ

γα αγνγν

α . (100)

Note que as equações de movimento (100) só dependem do 4-potencial vetor através do tensor Fγν; logo elas são invariantes sob transformações de calibre (90).

Reescrevendo as componentes da equação de movimento em termos dos campos ,E x tv v^ h e

,B x tv^ h temos:

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 74

a) Lei de Gauss: α = 0

,

, 4 , 4 , .

F F x t

E x t B x t x t41

2ii ij

ij0 0 &

4$

µε ρ

πµ πρ

+ =

− =

v

v v v v v

^

^ ^ ^

h

h h h

(101a)

b) α = 1

,

,

,4 , ,

,.

F F c j x t

c tF

yF

F c j x t

yB x t

E x t c j x t c tE x t

41

21

41 1 1

4 1

01

y x

x

1 1 1

21

021&

&

2

2

2

2

2

2

2

2

2

πµε

πµ

πµπ

+ =

+ − =

− = +

γγ γν

γν v

v

vv v

v

^

^

^^ ^

^

h

h

hh h

h

= G

(101b)

c) α = 2

,

,

,4 , ,

,.

F F c j x t

c tF

xF

F c j x t

xB x t

E x t c j x t c tE x t

41

21

41 1 1

4 1x y

y

2 2 2

02 12

012&

&

2

2

2

2

2

2

2

2

2

πµε

πµ

πµπ

+ =

+ + =

− + = +

γγ γν

γν v

v

vv v

v

^

^

^^ ^

^

h

h

hh h

h

; E

(101c)

Seja kt um vetor unitário constante perpendicu-lar ao plano (x, y). As eqs. (101b) e (101c) podem ser reescritas como:

, ,

,,.

B x t k k E x t

c j x t c tE x t4

4 14# #

2

2

πµπ

+ =

= +

v v t t v v

v vv v

^^ ^

^^

h h h

hh

(101d)

Como a definição do tensor Fγν é a mesma que para os campos de calibre de Maxwell, a eq. (67) (identidade de Bianchi) continua sendo válida,

0F F F2 2 2+ + =α γν γ να ν αγ . (102a)

A única escolha que temos para os três índices α, γ, ν distintos é: α = 0, γ = 1 e ν = 2.

Neste caso a identidade de Bianchi fica,

,,

.

F F F xE

yE

c tB

E x t c tB x t k

01

1

y x0 12 1 20 2 01 &

&4#

2 2 22

2

2

2

2

2

2

2

+ + = − =−

=−v v vv t

^^

hh

(102b)

Em resumo temos que as equações que gover-nam os campos de calibre Maxwell-Chern-Simons são:

, 4 , ,E x t B x t x t44$ πµ πρ− =v v v v v^ ^ ^h h h, (103a)

, ,

,,,

B x t k k E x t

c j x t c tE x t4

4 14# #

2

2

πµπ

+ =

= +

v v t t v v

v vv v

^^ ^

^^

h h h

hh

(103b)

,,

E x t c tB x t k1

4#2

2=−v v v

v t^

^h

h, (103c)

onde kt é um vetor unitário constante perpendicular ao plano (x, y). Da lei de Gauss (eq. (103a)) vemos que, para os campos de Maxwell-Chern-Simons, as cargas elétricas são fontes tanto para o campo elétrico quanto para o campo magnético.

Para μ = 0 em (103a)-(103c) re-obtemos as equações de Maxwell em d=3(2+1).

Mostraremos agora que a eq.(100) também leva a conservação da 3-densidade de corrente elétrica.

A equação de movimento dos campos de Maxwell-Chern-Simons é (eq.(100))

, , ,F F c j41

21

0 1 22π

µε α+ = =γ

γα αγνγν

α , (104)

de forma, que calculando a derivada covariante ∂α de ambos os lados da expressão anterior obtemos:

, 0,1,2F F c j41

21

2 2 2 2π

µε α+ = =α γ

γα αγνα γν α

α . (105a)

Em (72b) mostramos que o primeiro termo l.e. da expressão acima é zero. Analisemos o segundo termo do l.e. da eq.(105a),

.

F A A2 20

2 2 2 2 2µε

µε= −

=

αγνα γν

αγνα γ ν α ν γ^ h (105b)

Portanto, das eqs. (72b) e (105b) decorre a con-servação da 3-densidade de corrente elétrica:

, 0,

,j x t tx t

j x t 0& 4$22

2ρ= + =α

α vv

v v v^^

^hh

h . (105c)

As equações de Maxwell-Chern-Simons (103a)-(103c) também acoplam os campos elétrico e magnético. No caso de campos livres (ausência

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 75

de carga e corrente elétricas) as equações desses campos podem ser desacopladas. O desacopla-mento das equações dos campos físicos livres fica mais simples se definimos o dual do tensor Fαν,

, ,F x t F x t2/ενναγ

αγu v v^ ^h h (106)

Exercício:Usando o fato de que o tensor εναγ é anti-simétrico pela troca de dois índices, εναγ = −εανγ, e que Fαγ = ∂αAγ − ∂γAα, mostre que , 0.F x t2 =ν

νu v^ h

A relação (106) pode ser invertida usando a identidade:

.ε ε δ δ δ δ= −ανβαγ

νγ

β ν βγx x x (107)

Para isso basta multiplicar ambos os lados da eq. (106) por ενγλ e somar sobre o índice ν que obtemos

, , .F x t F x tε=γλ γλννv u v^ ^h h (108)

Exercício:Mostre a igualdade: .ε ε δ δ δ δ= −ανβ

αγτνγ

β ν βγx x

Usando a definição (106) escrevemos as com-ponentes do vetor dual em termos das componen-tes do campos elétrico e magnético,

,F F F F F B210 021

12012

21 120&ε ε= + = =−u u6 @ (109a)

,F F F F F E21

y1 102

02120

20 201&ε ε= + = =−u u6 @ (109b)

.F F F F F E21

x2 201

01210

10 012&ε ε= + = =u u6 @ (109c)

Portanto, o vetor dual ao tensor Fγν tem componentes

, , , , , , .F x t B x t E x t E x ty x= − −νu v v v v^ ^ ^ ^^h h h hh (109d)

Para desacoplarmos as equações dos campos livres, consideremos a eq. (104) na ausência de partículas carregadas (jα = 0),

0 0F F F F41

2 41

&2 2π

µε

πµ+ = + =γ

γα αγνγν γ

γα αu . (110a)

Usando a eq. (108) para reescrever a equação dos campos (110a) em termos do vetor dual Fαu , temos então que

0F F41

2πε µ+ =γαλ

γ λαu u . (110b)

Multiplicando ambos os lados da eq. (110b) por εαντ, somando sobre o índice α e usando a igualdade (107) obtemos que

.

F F

F F F

41

0

41

0

&

&

2

2 2

πε ε µε

πµ

+ =

− + =

ανγαλ

γ λ αντα

ν ν ν

x

x x x

u u

u u6 @ (110c)

Derivando (110c) em relação a ∂ν e somando sobre o índice ν, temos que

0.F F F412 2 2 2 2

πµ− + =ν

ν νν ν

νx x xu u6 @ . (110d)

No entanto, usando que 0F2 =ννu e a eq. (110a),

a equação anterior é reescrita como:

, ,

F F

F x t41

4 0

4 0

2

2

&

&

2 2

πµ

πµ

− − =

+ =

νν x x

x

u u

u v^^ ^h h h

(110e)

onde x = 0, 1, 2.Devemos lembrar que as componentes do vetor

dual Fxu são os campos físicos ,E x tv v^ h e ,B x tv^ h

A eq. (110e) é a equação dos campos físicos livres de Maxwell-Chern-Simons.

A presença do termo de Chern-Simons na teoria acarreta algumas modificações em relação a teoria de Maxwell pura. Para vermos isto, consideremos a equação de movimento dos campos livres de Maxwell-Chern-Simons (eq. (110e)),

, 0

,

E x t

c tE x t

41

4 0

i

i

2

22 2

22

&

& 42

2

4 πµ

πµ

+ =

− − =

v

v

^^ ^

^c ^

h h h

h m h . (111a)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 76

Como no caso dos campos de Maxwell, vamos procurar soluções de ondas plana para a eq. (111a), ou seja,

, , , ,E x t e l 1 2.l l l k x tε= =ω−v v v^ ^h h (111b)

onde εl é uma constante que dá a amplitude do campo elétrico, kv é o vetor de onda que determina a direção e o sentido em que a onda plana se pro-paga e ω a sua frequência angular. Substituímos (111b) em (111a) para saber que relação kv e ω devem satisfazer para que a onda plana (111b) seja solução dos campos livres de Maxwell-Chern-Simons em todos os pontos do espaço e em todos os instantes. Assim,

0e kc

4l i k x t 2

2

22ε

ωπµ− + − =$ ω− vv v ^c^ h mh . (111c)

Para que a igualdade anterior seja verdadeira para qualquer posição xv e em qualquer instante t, temos que ter

ck 42

22 2ω

πµ= +v ^ h . (111d)

Esta relação de dispersão é satisfeita por par-tículas que possuem massa. A partir da (111d) o valor da massa dos campos físicos de Maxwell-Chern-Simons é:

m c4

c s'πµ=− , (112)

sendo h2'π

= e h é a constante de Planck14.Os campos de Maxwell-Chern-Simons pos-

suem massa, mas apesar disso, a teoria é invariante sob transformações de calibre (90).

Esse mecanismo de gerar massa para os cam-pos de calibre sem abrir mão da invariância de calibre da teoria, é certamente uma das caracterís-ticas mais apreciadas desse modelo.

14. Veja a Referência [4] para saber como relacionar a eq. (111d) e a massa da partícula. O valor da constante de Planck é: h = 6, 626 × 10−34 Jseg.

A partir da eq. (105a), após algumas mani-pulações algébricas, mostra-se que na pre-sença de carga elétrica pontual estática

, , , )x t x j x t 0ρ ρδ= =v v v v^ ^^ ^h hh h a equação do campo magnético é:

4 B x x42 2 24 πµ π µρδ− =v v^ ^ ^ ^^ h h h h hh, (113)

sendo ρ uma constante que dá a intensidade da den-sidade de carga elétrica em x 0=v .

A solução de (113) nos dá a função de Green [13] da equação do campo magnético e permite determinar B xv^ h para qualquer distribuição xρ v^ h.

Usando a transformada de Fourier do campo é simples mostrar que a solução da equação diferen-cial não-homogênea (113) é:

,

B xd k

ke

r e para r

42 4

22

41

ik x

r

22

2

2 2

42

1

+ &

π µπ πµ

ρ

πρµ

π µ

=−+

$

π µ

vv

vv v^ ^

^ ^

c

h hh h

m

#

, (114)

sendo que r x= v .

Exercício:Seja B ku v^ h a transformada de Fourier de B xv^ h definida como:

B x d k B k e21 ik x

22

π= $−v v u v v v^^

^hh

h# .

A transformada de Fourier da função δ-Dirac em duas dimensões espaciais é

.x d k e21 ik x

22δ

π= $−v v v v^^

hh#

Mostre que a eq.(113) escrita no espaço dos kv é

4

.

k B k

B kk

4

44

2 2 2

22 2

&

&

πµ π µρ

π µπµ

ρ+ =−

=−+

v u v

u vv

^^ ^ ^

^ ^^

h h h h

h hh

A presença da massa 4πμ no denominador da eq. (114), faz com que o campo magnético do modelo de Maxwell-Chern-Simons seja de curto alcance. No caso das componentes do campo elé-trico, elas também vão a zero para x " 3v mais

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 77

rapidamente que na teoria de Maxwell pura, uma vez que E el

r4+ π µ− para x " 3v .Vejamos como o 3-potencial vetor Aν se com-

porta na fronteira do plano infinito ( x " 3v ). Para isso, consideremos a lei de Gauss (eq. (103a)) do modelo de Maxwell-Chern-Simons,

, , ,E x t B x t x t4 44$ πµ πρ− =v v v v v^ ^ ^h h h, (115a)

que integrando sobre todos os pontos do plano fica,

, ,d x E x t d x B x t Q t4 4S S

2 24$ πµ π− =3 3

v v v v v v^ ^ ^h h h# # , (115b)

sendo Q(t) a carga elétrica total contida no plano (x, y),

,Q t d x x tS

2 ρ=3

v v^ ^h h# . (115c)

Usando o Teorema de Gauss (eq. (A.9)) em duas dimensões espaciais, temos que

, ,E x t d l d xB x t Q t4 4S

2$ πµ π− =Γ3 3

v v v v v^ ^ ^h h h## , (115d)

sendo Γ∞ o contorno da que delimita a área S∞.Mostramos anteriormente que o campo elétrico

vai a zero para x " 3v , de maneira que a integral de linha do campo elétrico ao longo de Γ∞ é nula. Assim, a lei de Gauss escrita na forma global é,

4 , .d x B x t Q t4S

2πµ π− =3

v v^ ^h h# , (115e)

Entretanto, o campo magnético pode ser escrito como sendo

,B x t A x z4#=v v v v^ ^^h hh , (115f)

sendo z a direção perpendicular ao plano (x, y). Substituindo (115f) em (115e) e aplicando o Teorema de Stokes (eq. (A.10)), obtemos finalmente que

,A x t d l Q t$µ− =Γ3

v v v^ ^h h# , (115g)

que mostra que apesar dos campos físicos serem de curto alcance, o 3-potencial vetor é de longo alcance. A solução assintótica dos 3-potenciais vetores que satisfazem a (115g) é:

, arctanA x tQ t

yx

8x 2π µ−

"3v v

v^^

chh

m, (115h)

O potencial vetor ,A x tv v^ h é localmente um campo de calibre puro. Ele possui o mesmo com-portamento do efeito Aharanov-Bohm [14].

Agradecimentos: Desejo agradecer a M.C. Batoni Abdalla e E. Abdalla por discussões sobre invariância de calibre na Eletrodinâmica Clássica, a J.S. Já Martins pela leitura do texto, correções e sugestões, e, a A. T. Costa Jr. pela ajuda na colocação das figuras no texto. Tenho um agradecimento especial ao International Center for Theoretical Physics, Trieste, Itália, onde parte deste texto foi pensado e escrito.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 78

APÊNDiCE A. A revisão de análise vetorial e teoremas de gauss e stokes

A.1 revisão de análise vetorial [15]

Seja v xv v^ h um vetor com componentes escritas em coordenadas cartesianas:

v x v x i v x j v x kx y z= + +v v v t v t v t^ ^ ^ ^h h h h ; (A.1)

,i j e kt t t são vetores unitários nas direções x, y e z respectivamente.O operador gradiente 4v escrito em coordenadas cartesianas é:

i x j y k z42

2

2

2

2

2= + +v t t t . (A.2)

Divergência de um vetor em coordenadas cartesianas:

v x xv x

yv x

zv xx y z

4$2

2

2

2

2

2= + +v v v

v v v^

^ ^ ^h

h h h. (A.3)

Rotacional de um vetor em coordenadas cartesianas:

, , , , , ,

v x i yv y

zv x

j zv x

xv x

k xv x

yv x

v i j k 1 2 3

z y x z y x

ijk jk

4#2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

= − + − + −

= =

v v v tv v

tv v

tv v

^^ ^

e^ ^

e^ ^

ehh h

oh h

oh h

o (A.4)

onde estamos usando a regra da soma implícita e a notação: v1 = vx, v2 = vy, v3 = vz.εklm é o tensor de Levi-Civita, e é definido como:

ε123 = ε231 = ε312 = 1

ε213 = ε132 = ε321 = -1

εklm = 0 se dois ou mais índices forem iguais.

Propriedades gerais da divergência e rotacional:

v x 04$ 4#v v v v^^ hh , (A.5)

g x 04# 4 =v v v^^ hh , (A.6)

v x v x v x24# 4# 4 4$ 4= −v v v v v v v v v v^^ ^^ ^hh hh h, (A.7)

onde g xv^ h é uma função não-singular e

x y z2

2

2

2

2

2

2

42

2

2

2

2

2= + + . (A.8)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 79

A.2 teorema de gauss [16]

Seja f xv v^ h um vetor definido em todos os pontos dentro de um volume V e na área fechada S que delimita este volume. O Teorema de Gauss nos dá que:

d x f x f x ndsv S

3 4$ $=v v v v v v t^ ^h h# # , (A.9)

onde ds é uma área infinitesimal sobre a superfície S e nt é um vetor unitário perpendicular em cada ponto à superfície S. O vetor nt aponta para fora do volume delimitado.

A.3 teorema de stokes [17]

Seja Γ uma linha fechada e S qualquer superfície delimitada pela linha Γ. Seja f xv v^ h um vetor definido em todos os pontos da superfície S inclusive ao longo da linha Γ. Pelo Teorema de Stokes temos que:

ds n f x f x d lS

$ 4# $=Γ

t v v v v v v^^ ^hh h# # , (A.10)

onde d lv é um vetor infinitesimal tangencial a linha Γ e nt é o vetor unitário perpendicular em cada ponto à superfície S. O sentido dos vetores nt e d lv é dado pela regra da mão direita.

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 80

APÊNDiCE B. Princípio de Hamilton para campos clássicos [18]

Ao discutirmos os campos eletromagnéticos na seção 2, vimos que, no caso em que estamos descre-vendo um campo, a posição xv é um parâmetro para indexar os pontos do espaço da mesma forma que o tempo t o é para representar a que instante você se refere. Portanto, ao contrário do que temos no caso de partículas, as coordenadas xv não são variáveis dinâmicas do problema, mas sim parâmetros para indicar em que ponto do espaço você está medindo o seu campo, este sim a sua variável dinâmica.

Apenas como simplificação, vamos supor que temos um único campo que denominaremos por: ,x tΦ v^ h. ,x tΦ v^ h representa a configuração do campo em todos os pontos do espaço no instante t.

Como no caso de partículas, queremos associar a cada configuração ,x tΦ v^ h um número que chamamos de ação. Na definição da ação no caso de campos, precisamos integrar no intervalo de tempo fixado e em todos os pontos do espaço, uma vez que os campos também possuem uma dependência espacial:

; , , , , ; ,S t t dt d x x t x t x tLft

t

V0

3f

0

2Φ Φ Φ= µ3

v v v v^ ^^ h h h6 @ # # , (B.1)

onde L é a densidade de lagrangeana associada aos campos. Como os campos dependem das coordenadas espaciais, em geral L depende não apenas das derivadas do campo em relação ao tempo, mas também de suas derivadas espaciais, todas elas representadas pela derivada covariante , , , , ,x t 0 1 2 32 µΦ =µ v^ h . Como no caso de partículas, a ação também tem a mesma dimensão que o momento angular.

Para obter a equação de movimento para os campos ,x tΦ v^ h, vamos proceder de forma análoga ao que fizemos na seção 1 para derivar a equação de Lagrange para partículas.

Desejamos obter a equação satisfeita pelo campo clássico que parte da configuração inicial ,x t0Φ v^ h, e, que em t tf= tem a configuração ,x tfΦ v^ h, sendo que ambas são, por hipótese, conhecidas.

Chamemos ,x tφ v^ h o campo clássico para o qual a ação é mínima. O campo ,x tφ v^ h satisfaz as condições de contorno:

, ,x t x t0 0φ Φ=v v^ ^h h (B.2a)

e

, ,x t x tf fφ Φ=v v^ ^h h. (B.2b)

As configurações que coincidem com ,x t0Φ v^ h e ,x tfΦ v^ h em t = t0 e t = tf respectivamente mas que tenham pequenas modificações em relação ,x tφ v^ h, podem ser escritas como,

, ; , ,x t x t x tα φ αηΦ = +v v v^ ^ ^h h h, (B.3)

onde ,x tη v^ h é uma função infinitesimal qualquer da posição e que varia de instante para instante. A função ,x tη v^ h satisfaz as condições de contorno:

, ,x t x t 0f0η η= =v v^ ^h h . (B.4)

α é uma constante arbitrária.O Princípio de Hamilton (seção 1) aplicado a trajetórias que diferem pouco da trajetória clássica implica

em que

, , ,S S x t x t S x t 0/δ φ αη φΦ + − =v v v^ ^ ^h h h6 6 6@ @ @ . (B.5)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 81

Como na discussão do Princípio de Hamilton para partículas (seção 1) definimos

, ; , ;G dt d x x tLt

t

V

3f

0

2 2α φ αη φ α η α= + +µ µ3

v v^ ^h h# # , (B.6)

que é uma função de α. Como ,x tφ v^ h minimiza a ação, isto corresponde a dizer que G(α) tem um mínimo em α = 0. A condição de Hamilton (B.5) corresponde a esta condição de mínimo de G(α) em α = 0:

;G S0 0

0 0&

2

2

2

2

αα

ααΦ

= =α α= =

^ h 6 @. (B.7)

A diferença está em que, agora, a densidade de lagrangeana L depende não apenas do campo e de sua derivada temporal, mas também das suas derivadas espaciais. A implementação da eq. (B.7) é:

;Sdt d x 0

L L L L L

t

t

Vx

x

y

y

z

z

t

t3

f

02

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

αα

α α α α αΦ

ΦΦ= + + + + =

3

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

Φ

Φ

Φ

Φ

Φ

Φ

Φ

Φ

v`

`

`

`

`

`

`

`

j

j

j

j

j

j

j

j6 @* 4# # . (B.8)

Como estamos considerando campos ,x tΦ v^ h que são representados pela eq. (B.3), então substituindo-a na eq. (B.8), temos

,, , , ,

dt d x x t xx t

yx t

zx t

tx t

0L L L L L

t

t

Vx y z t

3f

0 2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

η η η ηΦ

+ + + + =2

2

2

2

2

2

2

2Φ Φ Φ Φ3

v vv v v v

^`

^

`

^

`

^

`

^h

j

h

j

h

j

h

j

h* 4# # . (B.9)

Não podemos fazer nenhuma afirmação geral sobre o integrando da eq. (B.9) uma vez que as funções ,x tη v^ h e ,x t2 ηµ v^ h não são funções independentes. Vamos reescrever os termos do lado esquerdo (l.e.) da

eq. (B.9) e colocá-la de forma mais conveniente.Vamos tratar apenas de um dos termos que envolve derivadas em relação as coordenadas espaciais. Os

outros dois termos que envolvem derivadas espaciais são tratados de forma similar.Consideremos o termo:

, ,dt d x x

x tdt dydz dx x

x tL L

t

t

Vx

t

t

L

L

L

L

x

3f f

0 02

2

2

2

2

2

2

2η η=

2

2

2

2Φ Φ− −3

vv v

`

^

`

^

j

h

j

h# # # # # , (B.10)

onde x, y, z = ±L correspondem aos pontos na superfície que delimita o volume. No limite de V∞ temos que L→∞.

Para realizar a integração por partes a integral em x do l.d. da eq. (B.10), escolhemos

u e dv dx xL

x2

2

2

2η= =

2

2Φ` j

(B.11a)

de maneira que a integral passa a ser:

, ,dx xx t dx x x t

L L L

L

L

x x x L

x L

L

L

x2

2

2

2

2

2

2

2

2

2η η η= −2

2

2

2

2

2Φ Φ Φ−=−

=

v v` `

^

`f ^

j j

h

jp h# # , (B.11b)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 82

onde, ao calcularmos a derivada parcial xx

L

2

2

22

2

2

Φc

fmp, estamos tomando y, z e t constantes.

Os termos η(±L, y, z; t) correspondem a valores da função ,x tη v^ h na superfície que delimita o volume V dentro do qual os campos evoluem. Assumiremos a hipótese de sistema fechado, que corresponde a supor que nenhum campo atravessa a superfície que delimita o volume V em que ocorre o fenômeno. Por essa hipótese temos então que

η(±L, y, z; t) = 0, (B.12)

pois o campo clássico e suas pequenas deformações são nulas na superfície que delimita o volume V.Incluindo a hipótese de sistema fechado, a relação (B.11b) passa a ser

,dx x dx x x tL L

L

L

xL

L

x2

2

2

2

2

2

2

2ηη=−

2

2

2

2Φ Φ− −v

` `f ^

j jp h# # . (B.13)

Fazendo agora a integração por partes do termo com a derivada do campo em relação ao tempo, onde escolhemos as variáveis u e v de forma similar a eq. (B.11a) obtemos que

, , .dt tt

x t dt t x tL L L

t

t

t t t

t t

t

t

t

f f f

0

0

02

2

2

2

22

2

2

2

2

2

2η η ηΦ

= −2

2

2

2Φ Φ

=

=v v` c

^

`f ^

j m

h

jp h# # (B.14a)

A função ,x tη v^ h no l.d. da eq. (B.14a) está definida nos instantes t = t0 e t = tf. Como a função ,x tη v^ h satisfaz a condição (B.4), então a expressão (B.14a) pode ser finalmente escrita como:

, .dt t dt t x tL L

t

t

tt

t

t

f f

0 02

2

2

2

2

2

2

2ηη=−

2

2

2

2Φ Φv

` `f ^

j jp h# # (B.14b)

Substituindo os resultados (B.13) e (B.14b) na eq. (B.9), obtemos que

,dt d x x y z t x t 0L L L L L

t

t

Vx y z t

3f

0 2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

Φ− − − − =

2

2

2

2

2

2

2

2Φ Φ Φ Φ3

v v`

f`

f`

f`

f ^jp

jp

jp

jp h* 4# # . (B.15)

A única forma da eq. (B.15) ser verdadeira para qualquer função infinitesimal ,x tη v^ h é que o integrando seja identicamente nulo. Escrevendo o integrando na sua forma covariante temos então a equação de Euler-Lagrange para campos clássicos:

0L L

2

222 2

2

Φ Φ− =µ

µ^ h. (B.16)

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Campos de Calibre Clássicos: Maxwell, Chern-Simons 83

5. referências

[1] H. Moysés Nussenzveig; Curso de Física Básica, 1-Mecânica, 2.a edição, Edgard Blücher Ltda (1992), cap. 4.

[2] Jerry B. Marrion; Classical Dynamics of Particles and System, 3rd edition, Academic Press (1988), cap.6.

[3] Herbert Goldstein; Classical Mechanics, 2nd edition, Addison-Wesley (1980), cap. 7.

[4] Dentre as possíveis referências para uma introdução a Mecânica Quântica, sugerimos: A.P. French; An Introduction to Quantum Physics, W.W. Norton & Co (1978).

[5] Edward Purcell; Electricity and Magnetism, Berkeley Physics Course-vol. 2, cap. 7 e Apêndice, Mcgraw-Hill Co (1965).

[6] A.P.French; Special Relativity, Thomas Nelson and Sons Ltd. (1968), cap.3.

[7] John D. Jackson; Classical Electrodynamics, 2nd edition, John Wiley & Sons(1975), seção 11.3.

[8] Referência 7, seção 11.9.

[9] Referência 7, seção 12.8; Referência 3, pág. 366.

[10] Referência 5, cap. 7.

[11] J. Schonfeld; A Mass Term for Three-Dimensional Gauge Fields, Nucl. Phys. B185 (1981) 157.

[12] S. Deser, R. Jackiw, S. Templeton; Topological Massive Gauge Theories, Ann. of Phys. 140 (1982) 372.

[13] Referência 7, seções 1.7 e 1.10; Referência 2, seção 3.10.

[14] Y. Aharanov, D. Bohm; Significance of Electromagnetic Potencials in the Quantum Theory, Phys. Rev. 115 (1959) 485; R.P. Feynman, R.B. Leighton, M. Sands; The Feynman Lectures on Physics, vol. II, Addison-Wesley Publ. Co. (1972), cap. 15.

[15] Referência 5, cap. 2. 54.

[16] Referência 5, seções 1.9 e 1.10.

[17] Referência 5, seções 2.15 e 2.16.

[18] Referência 3, cap. 11.

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Sobre a Eficiência da Abordagem Eletrostática da Ligação Química

Robson Fernandes de Farias1

Resumo: Nesse artigo, discorre-se sobre a eficiência/eficácia da abordagem eletrostática da ligação química, abordagem a qual, embora menos sofisticadas do ponto de vista de seu formalismo físico-matemático (comparativamente à TOM e à TLV, por exemplo), mostra-se possuidora de poder preditivo e explicativo, mesmo para compostos de estequiometria não usual, como NaCl3 e Na3Cl.

Palavras-chave: Ligação química, ligação iônica, NaCl3, Na3Cl.

Abstract: In this commentary it is shown that, even to unexpected compounds such as NaCl3 and Na3Cl, the ionic approach of the chemical bonding it is reliable, providing results in agreement with the experimental achievements. Key-words: Chemical bond; Ionic bond; NaCl3; Na3Cl.

1. Universidade Federal do Amapá-UNIFAP. E-mail: [email protected]

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1. introdução

Quando comparada às abordagens mais sofis-ticadas para explicar e prever a natureza da liga-ção química, e.g. Teoria da Ligação de Valência, TLV (incluindo-se o modelo de orbitais híbridos) e a Teoria dos Orbitais Moleculares, TOM, a abordagem eletrostática pode parecer por demais simplista.

Afinal, muito embora mais modernamente mesmo os possíveis efeitos relativísticos nas liga-ções químicas possam ser considerados, a aborda-gem eletrostática é a de mais fácil entendimento e “visualização” considerando-se as espécies carre-gadas (cátions e ânions) que a formam como cargas pontuais, e que interagem entre si de acordo com a lei de Coulomb:

Frq q

r41

02

1 2

πε=v t

Assim, das abordagens atualmente emprega-das, a abordagem eletrostática é a mais primitiva (no sentido de intuitiva) remontando aos primór-dios das concepções pré-científicas e científicas sobre a natureza da ligação química [1], como a teoria das afinidades, de Berzelius [2].

Contudo, devemos nos lembrar que, além de fornecerem uma explicação satisfatória para a formação e estabilidade das ligações nos sólidos tipicamente iônicos (com o cloreto de sódio, NaCl, sendo o exemplo mais emblemático), as atrações de natureza eletrostáticas entre espécies químicas não podem ser desconsideradas, nem mesmo nos

chamados compostos covalentes. Não esqueçamos que a ligação de hidrogênio, bem como as ligações de Van der Waals, por exemplo, são de natureza eletrostática.

Ademais, nos compostos de coordenação, por exemplo, a chamada Teoria do Campo Cristalino, TCC, na qual cátions metálicos (ácidos de Lewis) e ligantes (bases de Lewis) são também tratados como cargas pontuais, etc., explica o desdobra-mento (quebra da degenerescência) dos orbitais d na presença do campo (eletrostático) dos ligantes, permitindo explicar e prever uma séria de proprie-dades dos compostos de coordenação, desde pro-priedades termodinâmicas (com base na chamada Energia de Estabilização do Campo Cristalino, EECC), até propriedades espectroscópicas, como as absorções na região do UV-Vis (responsáveis pela cor dos compostos), bem como o momento magné-tico de spin, e mesmo a geometria dos compostos.

Recentemente [3], mediante o emprego de pressões elevadas, compostos “não usuais”, mais especificamente, cloretos de sódio de fórmulas NaCl3 e Na3Cl foram sintetizados, mostrando-se, uma vez formados, estáveis à temperatura e pres-são ambientes.

Num primeiro momento, poderia-se pensar que a formação detais compostos fosse “proibida” do ponto de vista termodinâmico. Afinal, para o NaCl3, por exemplo, teria-se que calcular a entalpia reticular levando-se a segunda e terceira energias de ionização do sódio (empregando-se o ciclo de Born-Haber), calculando-se uma entalpia elevada-mente endotérmica.

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Contudo, tomando-se os volumes do cátion e do ânion fornecidos [3] e, a partir deles, calculando os respectivos raios, e empregando a equação de Kapustinskii [4] ( a qual só fornece bons resultados para compostos iônicos), calcula-se uma entalpia de -398 kJ mol-1 para a formação do NaCl3, justificando, assim, a estabilidade termodinâmica do mesmo.

U Kr r

v z zr rd

1L $$ $

$=+

−++ −

+ −

+ −c m

Logo, quer para “velhos”, quer para novos compostos, a abordagem eletrostática da ligação química funciona muito, muito bem.

2. referências

[1] R. F. de Farias, L. S. das Neves, Naturam matrem – da natureza da ligação química. Campinas: Átomo, 2005.

[2] Jensen, W. B. Electronegativity form Avogadro to Pauling. J. Chem. Ed., v. 73, n. 1, p. 11-20, 1996.

[3] Zhang, W.; Oganov, A. R.; Goncharov, A. F.; Zhu, Q., Boulfelfel, S. E.; Lyakhov, A. O.; Stavrou, E.; Somayazulu, M.; Prakapenka, V. B; Konôpková, Z. Unexpected stable stoichiometries of sodium chlorides. Science., v. 342, n. 6165, p. 1502-1505, 2013.

[4] Kapustinskii, A. F. Lattice energy of ionic crystals. Quart. Rev. Chem. Soc., v. 10, p. 283-294, 1956.

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O Bóson de Higgs e o “Fiat Lux!”José Abdalla Helayël-Neto

LAFEX – CBPF/MCTIGrupo de Física Teórica José Leite Lopes

A Física contemporânea descreve os fenôme-nos naturais em termos de quatro interações fun-damentais que, para efeitos de compreensão num contexto mais próximo da Física Newtoniana, podemos pensar como sendo descritas por cam-pos de forças. A força gravitacional e a eletro-magnética são as interações fundamentais que se fazem sentir no mundo macroscópico, inclusive em escala humana. As outras duas, a força nuclear forte e a força nuclear fraca, não se revelam em escala macroscópica. Aparecem apenas em escala subatômica – na verdade, como o nome indica, nas escalas nuclear e subnuclear, portanto a distâncias tão pequenas ou ainda menores que o décimo do trilionésimo do centímetro (10-13 cm), o que corres-ponde ao centésimo de milésimo da escala atômica ou à milionésima parte da nanoescala.

A força gravitacional é a responsável pelos movimentos planetários e pela organização da estrutura em larga escala de nosso Universo. A força eletromagnética é a interação que responde pela formação dos átomos, pelas ligações molecu-lares e pelos processos biológicos fundamentais, por exemplo. Já a força nuclear forte responde pela coesão dos prótons e dos nêutrons no interior dos núcleos atômicos e pela ligação dos quarks no inte-rior dos hádrons; finalmente, a interação nuclear fraca é a responsável pelos processos radioativos,

em que núcleos atômicos instáveis decaem e emi-tem partículas.

Cada um destes campos de força é descrito por uma teoria. A força gravitacional, em sua escala macroscópica, é descrita pela Mecânica Newtoniana, sempre que as velocidades envol-vidas forem baixas se comparadas à velocidade da luz; ainda em escala macroscópica, e mesmo cosmológica, mas no regime em que fenôme-nos relativísticos começam a operar, a descrição do campo gravitacional fica a cargo da Teoria da Relatividade Geral. A descrição microscópica da gravitação, que constitui o que se chama na litera-tura de Gravitação Quântica, é um campo de inves-tigação com várias questões ainda em aberto. De fato, abordagens mais recentes como a das Teorias de Supercordas são novos encaminhamentos no sentido de, entre outras questões, resolver os pro-blemas da Gravitação Quântica.

Já a Eletrodinâmica Quântica descreve os fenô-menos que envolvem a força eletromagnética. Foi desenvolvida a partir do início da década de 1930 e ajudou a entender o mundo das chamadas partícu-las elementares – ou seja, partículas ‘indivisíveis’. Trabalhos publicados entre 1956 e 1968 ajudaram a formular a teoria que unificou tanto os fenômenos eletromagnéticos quanto aqueles regidos pela força nuclear fraca. A Teoria Eletrofraca ou o Modelo de

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Salam-Glashow-Weinberg – como ficou conhecido – mostra, portanto, que essas duas forças, apesar de se nos apresentarem com características marca-damente distintas, têm uma origem comum, sendo possível propor para elas um cenário de unificação que ilustra como ambas se separam no regime da Natureza em que fazemos as nossas observações.

A Cromodinâmica Quântica (QCD) é a teoria física que incorpora o conhecimento experimental e a fenomenologia das interações nucleares fortes; a sua formulação ficou estabelecida em 1973, com os trabalhos de David Gross e Frank Wilczek, e inde-pendentemente, de David Politzer, o que valeu a estes três autores o Prêmio Nobel de Física de 2004. Esta é uma teoria que ainda ocupa uma parte con-siderável da comunidade dos teóricos e apresenta desafios estimulantes a serem esclarecidos, como por exemplo, a resolução do problema do confina-mento dos quarks e glúons no interior dos hádrons, o desenvolvimento de técnicas matemáticas e com-putacionais para o estudo dos chamados fenômenos não-perturbativos (ou fenômenos de longas distân-cias) e a compreensão da teoria incluindo efeitos de temperatura finita, a fim de elucidar mais clara-mente o seu rico diagrama de fases.

Neste cenário das quatro interações fundamen-tais, devidamente organizadas em termos de teo-rias microscópicas, que incorporam tanto as leis do mundo quântico quanto a Teoria da Relatividade Especial, percebe-se que o conceito-chave para a formulação das mesmas é o conceito de simetria, e, ao lançar mão da idéia de simetria, as teorias de Yang-Mills-Shaw, propostas em 1954, estabelecem o cenário teórico e matemático para a formulação das teorias acima mencionadas. Do ponto-de-vista matemático, cada interação tem associado a si um grupo de simetria, estrutura matemática que obe-dece a um conjunto de regras bem específicas; no que diz respeito às características de cada campo de força, o grupo de simetria organiza e sistema-tiza grandezas de natureza física como as cargas e outros atributos das partículas envolvidas na inte-ração considerada. Os fenômenos eletromagnéti-

cos são descritos em termos de um grupo de sime-tria designado por U(1), associado à carga elétrica; a fenomenologia das interações fracas acomoda-se na estrutura imposta pelo grupo SU(2), que res-ponde pelo chamado isospin fraco; a QCD é for-mulada em termos do grupo SU(3), que descreve a carga de cor e, finalmente, subliminar à gravitação está o grupo SO(1,3), conhecido como o grupo de Lorentz, associado a uma grandeza intrínseca das partículas elementares, a que nos referimos como spin, sobre o qual ainda comentaremos a seguir.

A natureza quântica da luz já estava clara desde o início dos anos 1900, com os experimentos e a fenomenologia que levaram ao estabelecimento por Niels Bohr, em 1913, de seu Modelo Atômico, publicado em seus dois clássicos trabalhos, de Julho e Setembro. Bohr sabia estar diante de um modelo, e estava convicto de que a sua compre-ensão do espectro de absorção e de emissão dos átomos ainda não tinha o status de uma verdadeira teoria física. Tinha a clara percepção de que o seu modelo atômico devesse ser apenas a manifestação de uma teoria realmente mais ampla e fundamental.

Os fantásticos anos de navegação nas ondas de luz, entre 1923 e 1925, estão contados no clás-sico “The Story of Spin”, de Sin-ItiroTomonaga e Takeshi Oka. Neste período, verdadeiras catedrais barrocas, sob a forma de expressões algébricas, foram apresentadas para tentar reproduzir as cha-madas séries espectrais. Era mais um desafio lan-çado pela luz no cenário quântico. Algo faltava, um elo perdido deveria ser encontrado; Bohr sempre aludia a esta peça tão esperada para completar o quadro de compreensão.

Eis, então, que George Uhlenbeck e Samuel Goudsmit chegam ao conceito de spin do elé-tron, um atributo completamente novo no mundo elementar, uma propriedade advinda do espaço--tempo, mas mensurada pela Mecânica Quântica, através de sua constante fundamental, a constante de Planck, h. Tal como ter massa e ter carga elétrica, apresentar spin é uma característica das partículas fundamentais da matéria. O interessante é que o

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spin está relacionado a como uma partícula física pode perceber as rotações realizadas no espaço. A simetria a ele associado é codificada pela estrutura matemática SO(3), que se refere a rotações em um espaço tridimensional, e o interessante é que o spin só pode aparecer como um múltiplo inteiro de um valor fundamental – um quantum de spin – ligado à constante de Planck.

Com este novo atributo para o elétron, além de sua massa e de sua carga elétrica, a questão era ter uma teoria para o elétron. Wolfgang Pauli pro-põe um modelo para o spin, através de sua cele-brada Equação de Pauli. Mas, faltava aí o elemento Relatividade Especial. Pauli compreendera o spin, mas num mundo que ainda não incorporava os Princípios estabelecidos por Einstein para a com-preensão do espaço-tempo.

Em 1928, Paul Dirac deduz e publica – o tra-balho foi enviado para publicação no dia 1º de Janeiro de 1928 – o artigo que o tornou o Homem-Equação, em associação à chamada Equação de Dirac. Esta, sim, é uma teoria para o elétron; uma teoria quântica e relativística para a primeira das partículas elementares.

É esta a pedra angular do Modelo-Padrão da Física de Partículas e das Interações Fundamentais: a compreensão de Dirac do que é o elétron. E a luz tem, nesta equação, um papel preponderante: é da invariância da velocidade da luz, do fato de sua velocidade ser a mesma em todo e qualquer sistema de referência inercial, que Dirac deduz a teoria quântico-relativística para o elétron.

A este ponto, é importante, para compormos a sequência cognitiva da relação entre o bóson de Higgs e a luz, chamar a atenção para o fato de que, de novo Dirac, havia, em 1927, lançado o trabalho pioneiro sobre a descrição quântica para o campo eletromagnético, campo este que descreve a propa-gação da luz.

Até este trabalho de Dirac, “On the Absoprtion and Emission of Radiation”, o fenômeno eletro-magnético era descrito pelas celebradas Equações de Maxwell, sintetizadas por James Clerk Maxwell

em 1865, há exatos 150 anos. Dirac, neste trabalho de 1927, eleva o campo eletromagnético à catego-ria do que se conhece como campo quântico; com isso, o campo do fóton, o campo da luz, adquire um novo status matemático e deve ser interpretado de forma radicalmente diferente do que representa nas Equações de Maxwell.

O elétron e a o campo do fóton, com estes dois trabalhos de Dirac, têm agora uma compre-ensão no mundo quântico-relativístico. A terceira partícula elementar até então conhecida, o próton, que havia sido descoberto em 1919 por Ernest Rutherford, merecia, como os seus dois parceiros, o elétron e o fóton, ser compreendido e descrito nos mesmos termos, isto é, através de uma teoria quântico-relativística.

Em 1930, Dirac escreve um artigo conciso, pro-fundo e altamente conseqüente, “The Proton”, que publica na Nature. Este trabalho é um tratado que arrebata pela clareza, pela concisão e pelo arrojo. Nele, o Homem-Equação, nas linhas finais, acena para a possibilidade de existência de algo impen-sável para a época: a existência da anti-matéria. E, aqui, a luz é, ainda uma vez, central: luz intera-gindo com luz podendo criar um par de (matéria, anti-matéria).

Esta publicação do Prof. Dirac é o passo defi-nitivo para o seu celebrado trabalho “três-em-um” de 1931, “On the Quantised Singularities of the Electromagnetic Field”. Neste artigo, três resul-tados de impacto que ecoa até hoje são lançados: a previsão de uma nova partícula – o monopolo magnético – a compreensão da carga do elétron como sendo a carga fundamental da Natureza (ao que nos referimos como a quantização da carga) e a previsão de existência do anti-elétron (o pósitron) e do anti-próton. De novo, a luz, subliminarmente presente no trabalho, está nos bastidores de resulta-dos de impacto sem precedentes naquele contexto da Física de Interações Fundamentais, que estava nascendo.

Em meio a esta pluralidade de idéias e deba-tes, Enrico Fermi propõe, em 1933, a existência

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de uma nova interação no mundo sub-atômico: o decaimento-beta do nêutron determina um campo de força própria, a que denominou interação nuclear fraca. Lançou o seu trabalho, “Tentativo di Una Teoria dei Raggi-β”, e, assim, se abre um caminho – muito ainda no escuro – para a previsão do bóson de Higgs e a compreensão de sua atuação determinante para a compreensão da luz no âmbito de uma teoria unificada para o campo eletromag-nético e para o campo de força nuclear fraca; a esta teoria, que estará composta em 1968, nos referimos correntemente como a Teoria Eletrofraca.

Ao formular a sua teoria para o decaimento--beta como um novo tipo de interação fundamen-tal, Fermi assimila a existência do neutrino, par-tícula hipotética introduzida por Pauli em 1931 e só descoberta experimentalmente em 1956. Mas, apostando na idéia de tal “partícula teórica”, Fermi combina o elétron e o neutrino em uma estrutura única, chamada de corrente leptônica. Aqui, está a semente do que virá a ser, cerca de 20 anos mais tarde, o campo escalar de Higgs e, quase 30 anos mais tarde, a partícula de Higgs.

Seguindo a acumulação estética para situarmos objetivamente a relação entre o bóson de Higgs e a luz, podemos dar um salto diretamente à década de 1950, pois os anos subseqüentes à formulação da interação nuclear fraca por Fermi (período de 1934 – 1939 e, em seguida, os anos da II Grande Guerra e o imediato pós-guerra) foram marcados pela priorização no avanço da compreensão das intera-ções nucleares fortes e da interação eletromagné-tica, por razões de interesses até mesmo políticos.

A descoberta dos mésons-pi em 1948, partícu-las escalares, isto é, com spin igual a zero (na ver-dade, pseudo-escalares, por um aspecto inerente ao conceito de simetria) e aparecendo em três estados de cara elétrica (um positivamente carregado, π+, um com carga negativa, π–, e um terceiro neutro, π0) estabelece um novo desafio para a teoria eletro-magnética e, conseqüentemente, para a luz.

Como a luz e a radiação eletromagnética, em geral, interagem com matéria carregada não-eletrô-

nica? Como a natureza escalar (spin nulo) dos por-tadores de carga poderia incidir sobre a natureza da luz? As cargas de nossa matéria atômica são todas eletrônicas (spin = ½) , isto é, são elétrons ligados a núcleos atômicos pela atração eletromagnética. Agora, com portadores de carga sem spin, como deveríamos rever o fenômeno luminoso?

Esta questão aberta e muito original é eluci-dada por Abdus Salam em sua Tese de Doutorado, defendida no Imperial College of Science em 1951. Salam estuda, compreende e lança a sua versão da teoria quântica completa à qual nos referimos como Eletrodinâmica Escalar. Salam percebe, já neste momento, que campos escalares teriam muito mais do que estabelece a Eletrodinâmica Escalar a acrescentar à nossa compreensão da matéria em suas instâncias mais fundamentais. Ele cristalizará esta sua percepção poucos anos mais tarde.

Em 1956, o impacto do trabalho dos chine-ses Tsung-Dao Lee e Chen-Ning Yang, apresen-tado na Conferência Internacional de Física de Partículas em Seattle, foi determinante para vários acontecimentos de marco na Física de Interações Fundamentais. Entre estes, ocupa destaque o traba-lho de Salam, em 1956 mesmo, logo após os dias de Seattle, quando lança o conceito de simetria quiral em associação a férmions de massa nula (os neutrinos hipotéticos de 1931 haviam sido desco-bertos e os resultados experimentais lhes atribuíam massa nula). Salam reevoca a corrente leptônica de Fermi, imagina um mundo simétrico, com elétrons e neutrinos de massa nula (condição imposta pela simetria quiral) e percebe que os seus objetos de estudo no Doutorado, os escalares, poderiam ser a origem dinâmica da massa dos elétrons, mantendo não-massivos os neutrinos. Este aspecto é crucial neste contexto e define os anos futuros da busca de uma verdadeira teoria fundamental para as intera-ções fracas.

Estamos, assim, em um momento particular para a construção da Teoria Eletrofraca e para a nossa compreensão final da relação do campo e do bóson de Higgs como as entidades responsáveis

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O Bóson de Higgs e o “Fiat Lux!” 93

pelo “Fiat lux!”. Como organizar as idéias a este ponto, já que o momento é como um plasma de pensamentos, propostas e hipóteses que são cons-truídas e que se desfazem ao final de debates, semi-nários e conferências?

Os pontos fundamentais, na percepção de Salam, eram:

1. as Teorias de Yang-Mills-Shaw, formula-das em 1954 por Chen-Ning Yang e Robert Mills, e, de forma independente, por Ronald Shaw, este último trabalhando em sua Tese de Doutorado sob a orientação de Salam;

2. a necessidade de se compreender as inte-rações fracas como mediadas por bósons intermediários, da mesma forma como o fóton é o quantum transmissor da interação eletromagnética;

3. a busca de um mecanismo de geração de uma escala subnuclear, da ordem do milésimo da dimensão típica de um núcleo atômico, ou seja, um milionésimo do trilionésimo de metro (10-18 m), para o processamento das interações fracas;

4. a hipótese de uma simetria quiral que justifi-que os neutrinos sem massa. Neste contexto, a premissa de que o elétron também seja sem massa completa o quadro da simetria quiral;

5. a necessidade de se compreender um meca-nismo dinâmico que gere elétrons massivos, mas que mantenha os neutrinos com massa nula;

6. não perder de vista a simetria relativística, isto é, buscar resolver todas estas questões sem abrir mão da Teoria da Relatividade Restrita.

Salam conclui que tudo isto é possível se hou-ver na Natureza um campo escalar fundamental – com o qual tem toda familiaridade – e que tenha interações de tipo já conhecido (as chamadas inte-rações de Yukawa) com o setor de férmions, isto é, com o elétron, o pósitron, o neutrino e o anti-neu-trino. Em seu trabalho de 1952, em que propunha

uma teoria de campos quânticos para o fenômeno da supercondutividade, Salam também percebeu o quanto os campos escalares podem ser essenciais em fenômenos de natureza mais fundamental.

Yoichiro Nambu, também inspirado por Seattle-1956, reafirma a importância do fenômeno da supercondutividade para a compreensão da Física de Partículas Elementares em uma escala mais fundamental e a idéia dos objetos escala-res se cristaliza através do chamado mecanismo de quebra espontânea de simetrias. Este consiste em introduzir algum princípio de invariância em teorias físicas através da função que descreve a energia de um sistema físico em estudo, sem que a simetria seja, porém, manifesta em termos de labo-ratório. Trata-se de um mecanismo sutil, por meio do qual a simetria está presente no sistema físico, mas de forma escondida, presente apenas em uma entidade matemática denominada Hamiltoniano e que contabiliza a energia de uma configuração genérica do dado sistema. Entretanto, a experiência não percebe a simetria de forma direta. A simetria está camuflada sob a forma de relações não-casuais entre grandezas fisicamente mensuráveis do sis-tema sob inspeção.

Nomes como Jeffrey Goldstone, Abdus Salam e Steven Weinberg foram os ases da discussão, compreensão e introdução deste conceito – quebra espontânea de simetria – implementado na Física de Partículas através, justamente, dos campos escalares. Procedendo – e estamos em 1964/1965 – nomes como Peter Higgs, François Englert, Robert Brout, Thomas Kibble, Gerald Guralnik, Carl Hagen e Steven Gilbert aprofundaram o mecanismo de quebra espontânea de simetria em presença dos chamados campos de Yang-Mills-Shaw e elucidaram o processo pelo qual os cam-pos escalares podem estabilizar o sistema físico ao qual estão associados, encontrando para este uma situação de equilíbrio estável, e estudando como o sistema oscila em torno de sua configuração de equilíbrio, Higgs, Englert e Brout perceberam mais claramente que, ao realizarem as suas oscilações

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O Bóson de Higgs e o “Fiat Lux!”94

em torno do equilíbrio, os escalares geram ondas estáveis, interpretadas como partículas físicas legí-timas, denominadas posteriormente (em 1976) bósons de Higgs. Esta é a situação geral.

No caso particular da interação fraca, a mudança de tipo de partícula no processo de decaimento (nêutron se transforma em próton) sugere que o processo fraco tenha uma vinculação intrínseca com a carga eletromagnética. Desta forma, Salam e Weinberg propõem duas teorias. Salam propõe uma teoria unificada para o Eletromagnetismo e as interações fracas; neste mesmo quadro, Weinberg propõe uma teoria para os chamados léptons, dos quais o elétron é o representante mais popular.

É neste ponto que o campo de Higgs e seu asso-ciado bóson de Higgs cumprem a sua missão de fazer a luz: a Teoria Eletrofraca estipula que exis-tam quatro campos escalares para a compreensão da origem em comum dos fenômenos eletromag-néticos e fracos. Este campos entram em intera-ção com o elétron, o pósitron, o neutrino, o anti--neutrino e os portadores – ou mediadores – das interações em seu estágio unificado, quando ainda não se distingüem as interações eletromagnéticas e fracas. O sistema encontra-se em sua fase plena-mente simétrica.

Destes quatro escalares fundamentais, um deles, sozinho, consegue determinar a configu-ração de equilíbrio de todo o sistema de campos eletrofracos. Neste momento, este escalar solitário realiza a quebra espontânea da simetria e os outros três escalares podem sair de cena, por se demons-trarem sem consequências físicas; na verdade, o sistema eletrofraco mantém a sua situação de equi-líbrio sem estes três escalares, e mais: ao oscilar em torno desta situação de equilíbrio estável, as ondas geradas por estes três escalares não conseguem ter existência física detectada por qualquer tipo de medição. Em outra linguagem, isto quer dizer que se pode calibrar a física do sistema sem que as ondas destes três escalares apareçam. Aparece, sim, a onda que se apresenta como partícula asso-ciada ao escalar que determina o estado de equilí-

brio em torno do qual o sistema eletrofraco oscila. Este é o bóson de Higgs, recentemente (em 2012) detectado no LHC do CERN pelas Colaborações ATLAS e CMS.

Ao determinar o estado de equilíbrio do sis-tema, o campo de Higgs organiza o que chamamos de espectro físico, isto é, o conjunto de partículas físicas com suas propriedades: massa, carga elé-trica e interações mútuas. Ao entrar na fase que equilibra o sistema, o campo de Higgs produz o bóson de Higgs, e, no processo, emergem o elétron e o pósitron com suas propriedades e interações de natureza eletromagnética e de natureza fraca, emergem os neutrinos e anti-neutrinos, sem massa e sem carga, e com suas interações exclusivamente fracas e, finalmente, a luz – representada pelo fóton – se desprende do setor de partículas mediadoras e emerge com suas propriedades definidas: massa nula, eletromagneticamente neutra e acoplada a toda e qualquer partícula com carga elétrica. Finalmente, houve luz!

Neste processo, emerge ainda, em companhia do fóton, uma espécie de “luz pesada”: uma partí-cula neutra como o fóton, porém muito massiva, e que não possui interação eletromagnética. Apenas aparece com um intermediador neutro das intera-ções fracas. Este chamado bóson Z0 já foi detec-tado experimentalmente, no final de 1982, no ace-lerador de partículas “avô” do LHC, o chamado SPS, Super Proton Synchrotron.

Assim, ao longo de um período rico de idéias, debates e confrontos, que se estabelece a partir do advento do conceito de spin para as partículas fun-damentais da Natureza, ergue-se uma grande teoria, a chamada Teoria Eletrofraca, Teoria SU(2) x U(1) ou o Modelo de Salam-Glashow-Weinberg, que nos dá uma descrição da origem unificada de duas interações que se apresentam em nosso mundo de formas tão distintas e que nos permite compreender como se dá o “Fiat lux!” a partir de um campo esca-lar que viveu como um elo perdido nas profundezas da Natureza por cerca de 80 anos, até ser encontrado nos processos de colisão próton-próton do LHC e

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O Bóson de Higgs e o “Fiat Lux!” 95

que foi detectado em dois canais diversos: o canal luz-luz, ou seja, fóton-fóton, e o canal Z0 - Z0. O Higgs decai, principalmente, em luz.

Ao celebrarmos o Ano Internacional da Luz, é muito oportuno trazermos ao público, sobre-tudo de não-especialistas e de interessados em Física de forma geral, que a construção da Teoria Eletrofraca, parte do Modelo-Padrão da Física de Partículas e Interações Fundamentais, foi um pro-cesso intelectual contínuo, aberto a muitas ideias que quebraram paradigmas quase sacrossantos da Física e dentro de um embate muito rico entre conceitos, novos princípios, abstração matemá-tica, experimentação e fenomenologia. Este equi-líbrio propiciou a construção de uma das maiores

teorias científicas desenvolvidas no Século XX. E o mais importante: a teoria não está concluída; ao contrário, pode-se dizer que, agora, é que está realmente nascendo. O bóson de Higgs tendo sido encontrado e o “Fiat lux!” tendo sido elucidado, o grande desafio que resta é saber a real origem do campo de Higgs e de suas ditas auto-interações, que permitem o estabelecimento do equilíbrio do sistema eletrofraco. O pensamento vigente é que o campo de Higgs seja apenas a manifestação mais tangível de alguma Física muito mais fundamental. Como no caso do Modelo Atômico de Bohr, buscar esta teoria por trás do bóson de Higgs é uma grande questão de nossos dias e ocupará as mentes de tan-tas gerações futuras.

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