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1 Urgências Traumáticas Gestão para Educação Permanente dos Profissionais da Rede de Atenção às Urgências GEPPRAU Urgências traumáticas Módulo 3 Tema 2 - Hipotermia e lesões por frio

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Urgências Traumáticas

Gestão para Educação Permanente dos Profissionais da Rede de Atenção às Urgências

GEPPRAU

Urgências traumáticas

Módulo 3Tema 2 - Hipotermia e lesões por frio

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Urgências Traumáticas

Este conteúdo foi elaborado por Thiago Rodrigues Araújo Calderan, médico, cirurgião geral e do trauma, mestre em ciências da cirurgia e seus direitos foram cedidos ao Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC) que desenvolveu este material em parceria com o Ministério da Saúde (MS) no âmbito do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS). A parceria entre o Ministério da Saúde e as entidades de saúde portadoras do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social em Saúde (CEBAS-SAÚDE) e de Reconhecida Excelência, a exemplo do HAOC, é regulamentada pela Lei

Federal nº 12.101, de 27 de novembro de 2009.

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URGÊNCIAS TRAUMÁTICASNeste material, serão apresentadas as principais emergências na área da cirurgia do trauma. O profissional de saúde que atua na área terá informações importantes sobre anatomia, fisiologia, manejo e principais condutas a serem tomadas no atendimento ao traumatizado.

Tema 2Hipotermia e lesões por frio

Objetivos de aprendizagem

Conhecer a fisiologia da hipotermia.

Conhecer a fisiologia das lesões por frio.

Conhecer os tipos de lesões por frio.

Saber reconhecer os sinais de hipotermia.

Saber como tratar as lesões por frio.

Saber como tratar a hipotermia.

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Hipotermia e lesões por frio 5

1. Introdução ......................................................................................... 62. Fisiologia ........................................................................................... 7

2.1. Hipotermia .................................................................................. 72.2. Lesões por frio ............................................................................. 8

3. Tipos de lesões por frio ........................................................................ 93.1. Crestadura (frostnip) .................................................................... 93.2. Congelamento (frostbite) .............................................................. 93.3. Lesão não congelante ................................................................. 103.4. Frieira ou pérnio ........................................................................ 11

4. Classificação da hipotermia ................................................................ 115. Tratamento ...................................................................................... 13

5.1. Das lesões por frio ..................................................................... 135.2. Da hipotermia ............................................................................ 14

Síntese ............................................................................................... 16Referências bibliográficas....................................................................... 17

Sumário

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Hipotermia e lesões por frio

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s lesões causadas por frio aparentemente são pouco frequentes em um país tropical como o Brasil, porém a hipotermia pode ocorrer em qual-

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Introdução1.

Aquer situação de trauma, quando o paciente apresenta temperatura abaixo de 35ºC.

Há poucas informações epidemiológicas relacionadas às lesões por frio. His-toricamente, houve diversos relatos de morte por hipotermia em situações de guerra, desde o período antes de Cristo em batalhas romanas na traves-sia dos Alpes, passando pela época de Napoleão, motivo registrado da sua derrota na União Soviética, até as Grandes Guerras do século passado. Já na Guerra do Vietnã, não foram registrados óbitos, porém houve lesões e seque-las pelo frio. Nos EUA, há informações de uma média de 699 óbitos por ano entre os anos de 1978 e 1998.

No Brasil, vemos frequentemente relatos na mídia de óbitos por frio, princi-palmente de moradores de rua e idosos, com frequência nas regiões Sul e Sudeste.

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2.Fisiologia

A hipotermia é definida como temperatura abaixo de 35ºC. As funções vitais de nosso corpo ocorrem em temperatura corporal ideal, por volta de 36 a 37ºC, em que as proteínas e enzimas funcionam normalmente.

Na situação de hipotermia, as proteínas do nosso corpo não funcionam adequadamente. Encontram-se inativadas, principalmente aquelas que têm correlação direta no contexto de trauma: a hemoglobina e os fatores de coa-gulação (enzimas).

Com a hemoglobina inativada, não há como levar oxigênio às células, o que agrava a situação de hipóxia. Sem os fatores de coagulação ativos, há um qua-dro de coagulopatia com consequente persistência de sangramento (quando presente).

A associação entre coagulopatia, hipotermia e acidose forma um ciclo vicioso conhecido como tríade letal.

O trauma pode envolver algumas situações que originam a hipotermia: exposi-ção do paciente com perda de calor para o ambiente, principalmente em caso de roupas úmidas; sangramento (quando presente) que leva calor com a perda; em situações iatrogênicas, erroneamente, pela reposição de fluidos não aquecidos e por não promover proteção externa na exposição do paciente.

2.1.Hipotermia

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Há dois sistemas presentes nos seres humanos para regular e manter a temperatura corporal: sistema comportamental (relacionado à sensa-ção do indivíduo) e termorregulação fisiológica (em que o hipotálamo é o centro regulador).

A ação direta do frio pode originar lesões no paciente vítima de trauma. A gra-vidade da lesão depende de alguns fatores, com maior gravidade em tempera-turas mais baixas, com exposição prolongada ao frio, em ambiente úmido, com pouca proteção conferida pelas roupas do traumatizado e em pacientes com doença vascular periférica e com feridas abertas.

2.2.Lesões por frio

Anotações:

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3.Tipos de lesões por frio

A crestadura é uma lesão cutânea da pele por ex-posição ao frio, com quadro clínico de dor, palidez e diminuição da sensibilidade. Ocorre mais frequen-temente em áreas da face, nariz e orelhas.

É revertida com o aquecimento, exceto em casos de exposição recorrente.

3.1.Crestadura (frostnip)

As lesões por congelamento decorrem de lesão celular direta por formação de cristais de gelo dentro das células, com consequente hipóxia teci-dual. Pode haver lesão de reperfusão no reaquecimento. Ocorrem mais fre-quentemente nas áreas periféricas: nariz, orelha, mãos e pés.

São clinicamente similares às queimaduras e apresentam quatro graus de classificação:

3.2.Congelamento (frostbite)

Grau Achados clínicos Foto

1º grau Hiperemia e edema

2º grau Hiperemia, edema e grandes vesículas. Há necrose parcial da pele.

3º grauVesículas de conteúdo hemorrágico. Há necrose total da pele e do tecido subcutâ-neo.

4º grau Associação de necrose muscular e óssea.

Frostnip

Frostbite

Saudável

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As lesões não congelan-tes são conhecidas como “pé de trincheira” ou “pé de imersão” e decorrem de lesão microvascular, com estase e oclusão vascular, alternando entre vasoes-pasmo e vasodilatação.

Resultam da exposição contí-nua a temperaturas acima do ponto de congelamento, entre 1,6°C e 10ºC, e são mais en-contradas entre marinheiros, soldados e pescadores.

Clinicamente, essas lesões apresentam pé preto, frio e anestesiado, mas pode haver integridade dos tecidos profundos. Após 24 a 48 horas, há hiperemia as-sociada a dor intensa, às vezes com lesões bolhosas, equimoses e ulcerações.

São classificadas conforme a gravidade:

Campanha norte-americana de preven-ção na 2ª Guerra Mundial

3.3.Lesão não congelante

Gravidade Clínica Sintomas após a fase aguda

MínimaHiperemia pelo aumento do fluxo san-guíneo. Alteração sensitiva presente por 2 a 3 dias após o quadro inicial.

Alteração sensitiva - 2 a 3 dias após quadro inicial

Leve Hiperemia e edema e alterações sensiti-vas leves.

Anestesia ao toque – 1 semanaEdema – 2 a 3 semanasHiperemia – 14 semanas

ModeradaHiperemia e edema. Bolhas e mosque-amento presentes 2 a 3 dias após o quadro inicial.

Anestesia ao toque – 1 semanaEdema – 2 a 3 semanasHiperemia – 14 semanasLesões permanentes em alguns

GraveEdema intenso. Extravasamento de san-gue para tecidos ao redor e gangrena ocorrem 2 a 3 dias após o quadro inicial.

Anestesia de todo o pé – 1 semanaParalisia e hipotrofia muscular

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Lesão dermatológica decorrente da exposição crônica e repetida ao frio úmido (entre pescadores) ou ao frio seco (entre alpinistas) em áreas desprotegidas.

Clínica de lesões cutâneas purpúreas e pruriginosas que podem ulcerar e san-grar com a cronificação.

A prevenção das lesões deve ser feita com proteção adequada. Deve-se se-car bem o local após a exposição ao frio e pode ser indicado por médico o uso de antiadrenérgico e bloqueadores de canal de cálcio.

3.4.Frieira ou pérnio

A hipotermia é classificada de acordo com a temperatura central do pa-ciente.

Porém, em situações de trauma, a hipotermia é considerada grave sempre que a temperatura estiver abaixo de 32ºC.

4.Classificação da hipotermia

Temperatura (ºC) Classificação

32-35 Leve

30-32 Moderada

30 Grave

A demanda de oxigênio cerebral cai de 6 a 10% a cada 1ºC de queda da temperatura corporal.

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Temperatura (ºC) Características

35 Máximo de termogênese pelo tremor

34Amnésia, desorientação. Taquicardia seguida por bradicardia progressiva (a bradicardia decorre do efeito direto do frio na despolarização das células de marcapasso e progressão mais lenta no sistema de condução)

33 Ataxia e apatia. Taquipneia seguida da diminuição da ventilação

32 Torpor. Diminuição de 25% no consumo de oxigênio

30 Arritmias, débito cardíaco reduzido, insulina ineficaz

29 Pupilas dilatadas

28 Diminuição do limiar para fibrilação ventricular. Diminuição de 50% no consu-mo de oxigênio e pulso

27 Perda de reflexos

26 Importantes distúrbios ácido-base. Ausência de reflexos e respostas à dor

25 Fluxo cerebral a 1/3 do normal. Perda da autorregulação cerebral. Pode haver edema pulmonar

24 Hipotensão e bradicardia intensas

23 Ausência de reflexo corneopalpebral. Arreflexia

22 Risco máximo de fibrilação ventricular. Diminuição de 75% no consumo de oxigênio

20 Menor nível possível de recuperação da atividade eletromecânica cardíaca. Pulso a 20% do normal

19 Sem manifestação no eletrocardiograma (ECG)

18 Assistolia

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5.Tratamento

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Alguns princípios importantes do tratamento das lesões por frio (crestadura, congelamento e lesão não congelante):

• retirar roupas úmidas e apertadas;

• aquecimento úmido com água corrente a 40ºC;

• evitar calor seco e esfregar e massagear a região;

• analgesia – reaquecimento é doloroso;

• manter feridas limpas e secas;

• manter as bolhas por 7 a 10 dias;

• evitar agentes vasoconstritores;

• evitar atividades físicas até a resolução do edema.

5.1.Das lesões por frio

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A hipotermia deve ser tratada externamente com aquecimento do paciente (co-bertor, manta aquecida, manta aluminizada, etc.) e internamente com adminis-tração de fluidos endovenosos aquecidos.

Em situações de hipotermia grave (abaixo de 32ºC), podem ser necessárias téc-nicas invasivas para reaquecimento do paciente, como lavado peritoneal aque-cido, lavado torácico aquecido, bypass cardiopulmonar e reaquecimento arterio-venoso.

O paciente deve estar monitorizado desde o início, já que podem ocorrer arrit-mias. A mais frequente é a fibrilação ventricular, principalmente em temperatu-ras abaixo de 28ºC.

Em situações de parada cardiorrespiratória (PCR), deve-se iniciar medidas ime-diatas para a reanimação. Deve-se promover o reaquecimento do paciente e só encerrar os recursos ou as compressões quando ele estiver reaquecido e persis-tir em PCR.

Algumas medicações não funcionam em baixa temperatura, como a lidocaína. A única droga vasoativa que funciona um pouco em situações de hipotermia é a dopamina. Um antiarrítmico de escolha para a situação de hipotermia é o tosi-lato de bretílio.

5.2.Da hipotermia

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Anotações:

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Síntese

Neste tema refletimos que as lesões por frio podem ser frequentes em nosso meio e o trauma pode gerar hipotermia pela perda de calor decorrente de um sangra-mento e pela exposição. A presença de hipotermia agrava o quadro do paciente por não ativar os recursos fisiológicos que dependem do funcionamento das proteínas.

É preciso reconhecer a situação de hipotermia e promover a sua prevenção e tratamento, bem como das demais lesões causa-das pelo frio, possibilitando um cuidado integrado ao traumatizado.

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