universidade paulista programa de … banco central do brasil bmf/bovespa bolsa de valores cgu...

88
UNIVERSIDADE PAULISTA PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO A AÇÃO DA AUDITORIA INTERNA FRENTE À CORRUPÇÃO: lógicas institucionais e a relação com as estratégias da organização financeira Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Paulista – UNIP, para a obtenção do título de Mestre em Administração. ANDERSON LUIZ DE SOUZA SÃO PAULO 2016

Upload: trinhnhan

Post on 15-Dec-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE PAULISTA

PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAO

A AO DA AUDITORIA INTERNA FRENTE CORRUPO: lgicas institucionais e a relao com as estratgias

da organizao financeira

Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade Paulista UNIP, para a obteno do ttulo de Mestre em Administrao.

ANDERSON LUIZ DE SOUZA

SO PAULO 2016

UNIVERSIDADE PAULISTA

PROGRAMA DE MESTRADO EM ADMINISTRAO

A AO DA AUDITORIA INTERNA FRENTE CORRUPO: lgicas institucionais e a relao com as estratgias

da organizao financeira

Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade Paulista UNIP, para a obteno do ttulo de Mestre em Administrao. Orientador: Prof. Dr. Arnaldo Luiz Ryngelblum rea de Concentrao: Estratgias e seus Formatos Organizacionais Linha de Pesquisa: Estratgia Organizacional.

ANDERSON LUIZ DE SOUZA

SO PAULO 2016

Souza, Anderson Luiz. A Ao da Auditoria Interna frente Corrupo: Lgicas Institucionais e a relao com as Estratgias da Organizao Financeira./ Anderson Luiz de Souza - 2016. 86 f: il. color. + CD-ROM. Dissertao de Mestrado Apresentado ao Programa de Ps- Graduao em Administrao da Universidade Paulista, So Paulo, 2016. rea de concentrao: Estratgias e seus formatos Organizacionais. Orientador: Prof. Dr. Arnaldo Luiz Ryngelblum. 1. Lgicas Institucionais. 2. Estratgias Institucionais. 3. Corrupo. I. Ryngelblum, Arnaldo Luiz (orientador). II. Ttulo.

ANDERSON LUIZ DE SOUZA

A AO DA AUDITORIA INTERNA FRENTE CORRUPO: lgicas institucionais e a relao com as estratgias da organizao financeira

Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade Paulista UNIP, para a obteno do ttulo de Mestre em Administrao.

Aprovado em:____/_____/______

BANCA EXAMINADORA

______________________________/___/___ Prof. Dr. Arnaldo Luiz Ryngelblum

Universidade Paulista UNIP

______________________________/___/___ Prof. Dr. Edson Ronaldo Guarido Filho

Universidade Positivo UP

______________________________/___/___ Prof. Dr. Celso Augusto Rimoli Universidade Paulista UNIP

DEDICATRIA

Dedico este trabalho minha esposa Vanusia por no desistir dos meus

sonhos e me acompanhar nesta jornada de sacrifcios e escolhas. A minha filha

Lorena que, apesar de sua pouca idade, me transmite foras para continuar e no

desistir.

AGRADECIMENTOS

Agradeo a Deus as dificuldades que me foram colocadas no caminho, pois

me permitiram evoluir.

Ao Prof. Dr. Arnaldo Luiz Ryngelblum agradeo pelos conhecimentos

transmitidos na orientao do trabalho. Ao Prof. Dr. Flvio Macau (Coordenador do

Programa) espero ter retribudo sua generosidade e confiana. Aos Professores

Doutores Edson Ronaldo Guarido Filho e Celso Augusto Rimoli, obrigado pelas

contribuies trazidas banca.

Aos demais Professores Doutores do Programa de Ps-Graduao em

Administrao da Universidade Paulista UNIP: Ademir Antnio Ferreira, Ernesto

Michelangelo Giglio, Joo Maurcio Gama Boaventura, Nadia Wacila Hanania

Vianna, Pedro Lucas de Resende Melo, Roberto Bazanini e Snia Maria Ribeiro de

Souza, agradeo o conhecimento transmitido.

Finalmente, agradeo CAPES (Coordenao de Aperfeioamento de

Pessoal de Nvel Superior) pela concesso da bolsa de estudos que possibilitou o

suporte necessrio para a realizao deste trabalho.

Daria tudo que sei pela metade do que

ignoro.

(Ren Descartes)

RESUMO

No Brasil e no mundo, as diferentes organizaes, inclusive financeiras, esto

sujeitas s fraudes corporativas, dentre as quais a corrupo uma de suas facetas.

Apesar do estabelecimento de regras especficas contra essas prticas, tanto por

rgos pblicos como pelas prprias organizaes, o fenmeno continua a se

manifestar. Nesse contexto, as organizaes constitudas por aes so conhecidas

por manterem estruturas voltadas preveno e ao combate prtica da corrupo.

Desse modo, Quais fatores permitem que as instituies de controle e a AI sejam

contornadas levando a organizao corrupo? A pesquisa prope responder

pergunta ao identificar aspectos que permitem a prtica da corrupo e se a (AI)

Auditoria Interna capaz de reconhec-los. Adicionalmente, buscou-se analisar se o

controle corrupo, pautado na lgica do auditor, pde ser deturpado por outras

lgicas institucionais. Quanto ao debate terico, adotou-se o recorte institucional

voltado relao entre Lgicas e Estratgias Institucionais. Como metodologia de

pesquisa, utilizou-se o Estudo de Caso descritivo/explicativo e mtodo caso nico.

Para a anlise dos dados, as tcnicas utilizadas foram combinao de padro e

anlise temtica. O instrumento de coleta aplicado s entrevistas foi o roteiro de

perguntas abertas, estruturado por pr-testes. Quanto aos resultados, pode-se

adiantar que as Lgicas Institucionais influenciam a escolha da organizao

financeira, levando-a a combinao de Estratgias Institucionais. Tais estratgicas

equivalem a prticas organizacionais, sendo um fator que permite AI ser

contornada levando a organizao corrupo. Detalhes sobre os outros fatores

requerem leitura aprofundada do trabalho, j que associados ao primeiro sugerem

contribuio abordagem Institucional. Finalmente, a contribuio de pesquisa, pela

qual o comportamento de uma determinada organizao financeira pode ser descrito

e explicado, sugere que somente h fora por parte da AI, como uma instituio de

controle, quando a disputa entre as Lgicas de Corrupo e de Controle revela a

esta ltima proximidade com os interesses e objetivos de quem toma as decises

(Lgica de Mercado). Desta forma, a pesquisa apresentou relevantes informaes

para entender os efeitos da corrupo e tangibilizar espao para desenvolvimento de

estudos futuros.

Palavras-chave: Lgicas e estratgias institucionais. Corrupo. Auditoria interna e

organizao financeira.

ABSTRACT

In Brazil and in the world, different organizations, including financial ones, are subject

to corporate fraud, among which corruption is one of its facets. Despite the

establishment of specific rules against these practices, both by public bodies and by

the organizations themselves, the phenomenon continues to manifest itself. In this

context, organizations constituted by actions are known to maintain structures aimed

at preventing and combating the practice of corruption. Thus, "What factors allow

control institutions and IA to be circumvented leading the organization to corruption?"

The research proposes to answer the question by identifying aspects that allow the

practice of corruption and whether (IA) - Internal Audit is able to recognize them.

Additionally, it was tried to analyze if the control to the corruption, based on the logic

of the auditor, could be misrepresented by other institutional logics. As for the

theoretical debate, we adopted the institutional cut-off focused on the relationship

between Logics and Institutional Strategies. As a research methodology, the

descriptive / explanatory case study and the "single case" method were used. For the

analysis of the data, the techniques used were "combination of pattern" and "thematic

analysis". The collection instrument applied to the interviews was the open questions

script, structured by pre-tests. As for the results, it can be anticipated that Institutional

Logics influence the choice of financial organization, leading to the combination of

Institutional Strategies. Such strategies are equivalent to organizational practices,

being a factor that allows the AI to be circumvented leading the organization to

corruption. Details on the other factors require in-depth reading of the work, since

associated with the first suggest contribution to the Institutional approach. Finally,

research contribution, by which the behavior of a particular financial organization can

be described and explained, suggests that there is only strength on the part of AI as

an institution of control when the dispute between the Logic of Corruption and Control

Reveals to the latter closeness to the interests and objectives of those who make the

decisions (Market Logic). In this way, the research presented relevant information to

understand the effects of corruption and make space for the development of future

studies.

Keywords: Logics and institutional strategies. Corruption. Internal audit and financial

organization.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Informao do campo estudo de caso nico...................................... 44

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Trabalhos selecionados para integrar o referencial terico................. 21 Quadro 2 Exemplo de lgica central (dominante) e a lgicas subsidirias.......... 28 Quadro 3 Estratgias institucionais...................................................................... 35

Quadro 4 Estratgias influenciadas por lgicas institucionais............................. 38 Quadro 5 Protocolo de estudo de caso................................................................. 41 Quadro 6 Mtricas da anlise.............................................................................. 48

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AI Auditoria Interna

AE Auditoria Externa

BACEN Banco Central do Brasil

BMF/Bovespa Bolsa de Valores

CGU Controladoria Geral da Unio

COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras CVM Comisso de Valores Imobilirios

EBSCO Information Services

IIA Instituto Internacional dos Auditores

SPELL Scientific Periodicals Electronic Library SUSEP Superintendncia de Seguros Privados

SUMRIO

1 INTRODUO ......................................................................................................... 15 1.1 Problema de pesquisa......................................................................................... 19 1.2 Objetivo geral....................................................................................................... 19

1.3 Objetivos especficos.......................................................................................... 19 1.4 Justificativa........................................................................................................... 20 1.5 Levantamento bibliogrfico................................................................................ 20 1.6 A corrupo Institucionalizada........................................................................... 22

2 FUNDAMENTAO TERICA ............................................................................... 24 2.1 Instituies........................................................................................................... 24 2.2 Lgicas institucionais.......................................................................................... 26

2.3 Conflitos, complementaridade e o hibridismo entre lgicas........................... 31 2.4 Lgicas ditando estratgias................................................................................ 34

3 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS ................................................................. 40

3.1 Protocolo de pesquisa......................................................................................... 40 3.2 Descrio da metodologia................................................................................... 42 3.3 Tipologia e estratgia de pesquisa..................................................................... 42 3.4 Mtodos de coleta de dados............................................................................... 45 3.5 Mtodo de anlise de dados................................................................................ 47

4 RESULTADOS DA PESQUISA ............................................................................... 48 4.1 Caracterizao da organizao pesquisada...................................................... 48 4.2 A organizao financeira em governana......................................................... 49

5 APRESENTAO E DISCUSSO DOS RESULTADOS ....................................... 50 5.1 Lgica do controle............................................................................................... 51 5.2 Lgica de mercado............................................................................................... 53

5.3 Lgica da corrupo............................................................................................ 56 5.4 Lgicas influenciando estratgias organizacionais......................................... 58

6 CONCLUSES ........................................................................................................ 61

REFERNCIAS ........................................................................................................... 67

APNDICE A............................................................................................................... 73 APNDICE B............................................................................................................... 76

APNDICE C............................................................................................................... 83 APNDICE D............................................................................................................... 84 ANEXO A..................................................................................................................... 85

15

1 INTRODUO

No Brasil e no mundo, as diferentes organizaes, inclusive financeiras, esto

sujeitas s fraudes corporativas, dentre as quais a corrupo uma de suas facetas

(COSTA, 2011). Em outras palavras, fraude gnero e a corrupo a sua

espcie. (SANTOS et al., 2010, p.6). Desta forma, a corrupo como uma espcie

de fraude, tambm apresenta modalidades, as quais estimulam a busca por formas

que possibilitem proteger as organizaes de possveis turbulncias.

A corrupo um tema recorrente, nocivo, desafiador capacidade de

deteco preventiva. Nesse contexto, as organizaes constitudas por aes (Lei

6.404/76 de 15 de dezembro de 1976 Caractersticas e Natureza da Companhia

ou Sociedade Annima) so conhecidas por manterem estruturas (tecnologia e

profissionais qualificados) destinadas atividade de negcios e s aes

estratgicas de discutir, prevenir e combater a corrupo. Segundo o Institute of

Internal Auditors (IIA, 2015), os profissionais envolvidos com as aes de preveno

e combate corrupo atuam como conselheiros da alta administrao e como

fiscais das gerncias voltadas aos processos organizacionais. A presena desses

profissionais, entretanto, no afasta as responsabilidades dos gestores de fiscalizar

as atividades de seus departamentos, de forma que a conformidade de suas rotinas

sejam constantemente autoavaliadas.

Para o IIA (2015), os gestores devem exercer a denominada Primeira Linha

de gerenciamento do risco de corrupo. Na Segunda Linha, destacam-se as aes

de Compliance, que envolvem a verificao de conformidade dos processos,

comparada s diretrizes da organizao. A Terceira Linha representada pelas

avaliaes, pareceres e recomendaes das Auditorias Internas (AIs). Espera-se

que as linhas de gerenciamento no sobreponham funes, pois so controles

distintos e complementares, sendo que sua efetividade interessa a vrios grupos,

dentro e fora das organizaes, j que interfere na lgica pela qual o mercado se

reconhece e atua, ou seja, interfere na forma com que os empresrios, o Estado e a

sociedade se relacionam.

Carcello (2011) sugere o que poderia ser considerada a Quarta Linha de

gerenciamento do risco de corrupo ao enfatizar a importncia da transparncia na

formao e na deliberao das decises tomadas pelos Conselhos de Administrao

16

e Comits de Auditoria em que o primeiro define as diretrizes estratgicas e

supervisiona a alta direo de uma empresa, e o segundo define e fiscaliza as

diretrizes operacionais de atuao das AIs cuja transparncia esperada em

decises colegiadas um fator preponderante para que o trabalho do auditor seja

realizado com a imparcialidade e a seriedade necessrias aos interesses de toda a

organizao.

Nesse processo, a deciso individual do CEO Chief Executive Officer ou

pessoa equivalente, no deve interferir na escolha dos auditores ou na tcnica com

a qual as auditorias internas sero conduzidas, cabendo apenas solicitar a

realizao de trabalhos e levar a cabo as recomendaes dos auditores. Em outras

palavras, os atos colegiados devem estar livres de interesses particulares. Um

exemplo disso a escolha das equipes de Auditoria Externa (AE), cujas

responsabilidades envolvem avaliar os balanos e as demonstraes contbeis

publicados aos acionistas e opinio pblica. Se existirem interesses em conflito na

escolha do profissional, a independncia, a transparncia e a imparcialidade do

auditor externo estaro comprometidas.

Quanto s equipes de AI, a falta de iseno gera desconfianas em relao

s tcnicas empregadas para checar a conformidade de processos e protocolos que

mitiguem possveis irregularidades (IIA, 2015). A prestao de contas ao Conselho

de Administrao ou aos Comits, por parte das auditorias AI e AE, tambm deve

ser respeitada satisfazendo periodicidade previamente definida pelas organizaes

e por rgos reguladores que regem o setor. Contudo, eventualidades podem alterar

esse rito, sendo funo e responsabilidade das equipes de AI produzir atas,

polticas, relatrios e pareceres que atestem as irregularidades relacionadas s

perdas objetivas (valores) e subjetivas (imagem) referentes aos processos do

negcio e conduta de colaboradores ou terceiros.

Mesmo na ausncia de irregularidades, os documentos produzidos pelas

equipes de AI devem estar disposio dos rgos reguladores externos, tais como:

BACEN Banco Central do Brasil; COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras; CVM Comisso de Valores Imobilirios; SUSEP Superintendncia

de Seguros Privados e BMF/Bovespa Bolsa; todos responsveis por fiscalizar o

funcionamento do mercado financeiro, e a CGU Controladoria Geral da Unio

(2015), responsvel por fiscalizar os negcios mantidos entre as empresas pblicas

e as privadas, nesse caso, representadas pelas organizaes financeiras e pelo

17

governo. Dessa forma, espera-se que a atuao das Auditorias preencha as

expectativas de suas organizaes e do mercado.

Quanto s legislaes sobre a corrupo, institudas pelo governo federal e

operacionalizada pela CGU Controladoria Geral da Unio (agora Ministrio da

Transparncia, Fiscalizao e Controle), a Lei Anticorrupo Brasileira (12.846/13,

de 1 de agosto de 2013) imputa s organizaes penalidades de ordem

administrativa e civil pela prtica de atos de corrupo contra a administrao

pblica (BRASIL, 2015). A Lei Anticorrupo respeita e incentiva o sistema de

governana corporativa do mercado financeiro [...] pelo qual as empresas e demais

organizaes so dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os

relacionamentos entre scios, conselho de administrao, diretoria, rgos de

fiscalizao e controle e demais partes interessadas. (IBGC, 2016). Por isso, a

legislao anticorrupo conta com os esforos internos das organizaes, ou seja,

reconhece a importncia dos controles internos, geralmente representados em

polticas e manuais voltados aos processos e s pessoas. Tais medidas destinam-se

informao e conscientizao dos funcionrios e colaboradores quanto ao risco

de corrupo (ITA, 2015; SANTANDER, 2015).

A corrupo inclui diferentes modalidades. O suborno configura-se,

principalmente, pela ao de oferecer ou pagar valores, prestar favores ou conceder

vantagens a algum com o objetivo de obter benefcios. O termo suborno

geralmente empregado com o significado de corrupo, no entanto, o suborno

apenas uma de suas particularidades (WELLS, 2008 p. 240). As gratificaes

indevidas ou ilegais so outra vertente da corrupo. Sua incidncia pode influenciar

as decises de negcios, por exemplo, em um processo licitatrio. Muitas empresas

privadas e entidades pblicas probem seus funcionrios de receberem gratificaes

(WELLS, 2008, p. 252). A extorso, por sua vez, a corrupo caracterizada pelo

ato de constranger algum mediante ameaa, cujo intuito principal obter vantagem

econmica indevida para si ou para terceiros (WELLS, 2008, p. 252). Finalmente, os

conflitos de interesses impem outro tipo de corrupo baseado em motivao

oculta, no explcita na relao de negcio que, devido a sua contraposio,

resultam em subverses (WELLS, 2008, p. 253).

Visto isso, no faltam s organizaes e ao poder pblico opes para

identificar e neutralizar os malefcios causados pela corrupo. Todavia, ainda que

os deveres e as responsabilidades sejam delineados com o estabelecimento de

18

distintos controles, observam-se desmandos cada vez maiores nas gestes pblica

e privada. As iniciativas de conter o avano da corrupo no tm surtido efeitos

positivos, resultando em expressivas perdas financeiras e de credibilidade, tanto

para as organizaes, quanto para o mercado financeiro. Uma dessas situaes

ocorreu na Petrobras, uma organizao genuinamente brasileira, conhecida pela

solidez em anos recentes, que se exps a perdas superiores a R$ 6 bilhes devido

corrupo.

A Petrobras no conseguiu mitigar suas deficincias e um dos motivos

alegados correspondeu inadvertncia, por parte da AE, sobre problemas nos

balanos e demonstraes da companhia. Outra alegao de que no houve

auditorias internas, suficientes e especficas, para identificar a corrupo. Apesar de

os problemas sugerirem que as auditorias realmente no foram demandadas pelo

Conselho de Administrao da companhia, essa justificativa sozinha perde sua

fora, visto que a solicitao de auditorias especficas est ao alcance de qualquer

departamento da organizao petrolfera (PETROBRAS, 2015). Mediante isso, no

cerne de um drama sociopoltico e econmico, as irregularidades na Petrobras

revelaram fraudes em licitaes, pagamento de propina aos dirigentes da instituio

e o envolvimento de partidos polticos (BENITES, 2015; PASSARINHO, 2015).

A crise relacionada imagem institucional da companhia continua, de modo

que no mais permite Petrobras restituir a confiana ou a notoriedade outrora

conquistada nas bolsas de valores do Brasil e do mundo. O passado era promissor e

palpvel, atualmente, lgubre e indefinido, uma combinao que levou a Petrobras

perda do selo de bom pagador estipulado pelas agncias de classificao de risco

Fitch Ratings, Moody's e Standard & Poor's (S&P) denominadas The Big Three.

Para se ter uma ideia da importncia e da influncia, as trs agncias de risco

detinham mais de 90% do mercado global de classificao de crdito em 2013 (AFP,

2013).

Assim, o contexto atual nacional apresenta-se imerso no debate acerca da

corrupo, o que deve levantar cuidados aos pesquisadores quanto s

generalizaes e as limitaes que os resultados da pesquisa podem trazer, uma

vez que os respondentes vivenciam uma sequncia de acontecimentos que podem

ser encarados de maneira particularizada e irracional.

Aberto o devido parntese, os modelos de governana e as legislaes sobre

corrupo (UK Bribery Act, 2010; LEI 12.846/13; FCPA, 2015) transmitem relativa

19

segurana ameaa de corrupo, mas organizaes financeiras se veem tentadas

a cometer prticas contrrias aos parmetros de conformidade previamente

institucionalizados. Na literatura, a justificativa de que mudanas ampliam as

fronteiras daquilo que j se conhece sobre determinado assunto (MACHADO, 2003)

culmina na formao de novos modelos necessrios organizao e promoo de

significados (CRUZ, 2015, p. 99). A interao constante de elementos objetivos e

subjetivos moldam as estruturas, as prticas e os valores organizacionais

(THORNTON; OCASIO, 2008). Dessa forma, parece imprprio atribuir aos motivos

que conduzem conformidade, j institucionalizados pelos atores, um nvel de

inflexibilidade que inexiste no cotidiano suscetvel s instabilidades de fatores

sociais, econmicos e organizacionais.

Consequentemente, esta dissertao prossegue estruturada da seguinte

forma: aps essa introduo so apresentados o problema e os objetivos que

incitaram o estudo, acompanhados do levantamento sobre quantidade de

publicaes relacionadas temtica envolvida, alm da teoria de base. Em seguida,

so expostos o delineamento metodolgico, as anlises sobre os resultados e,

finalmente, as concluses com as limitaes e sugestes para estudos futuros.

1.1 Problema de pesquisa

Apesar da existncia de distintas instituies de controle, ainda assim, as

organizaes lidam com recorrentes casos de corrupo, ou seja, a ao fora das

normas. Dessa forma, a pergunta que o trabalho formula :

Quais fatores permitem que as instituies de controle e a AI sejam

contornadas levando a organizao corrupo?

1.2 Objetivo geral

Identificar os aspectos que permitem a prtica da corrupo e se a AI capaz

de reconhec-los.

1.3 Objetivos especficos

20

Analisar a relao entre lgicas institucionais e as respostas estratgicas de

combate corrupo, sob o olhar dos colaboradores de uma organizao.

Analisar se o controle corrupo, pautado na lgica do auditor, pode ser

deturpado por outras lgicas institucionais.

Identificar se a organizao combina suas estratgias a depender das

presses exercidas pela interao de lgicas institucionais.

Indentificar a relao entre lgicas institucionais e as respectivas estratgias

de combate corrupo em uma organizao.

1.4 Justificativa

No h um pas no planeta onde a corrupo seja permitida. H uma

tendncia de convergncia nas regulaes anticorrupo. Mais recentemente, at

mesmo o Brasil fez sua lei. As empresas tm de entender que no h mais

escapatria. (AGOSTINI, 2015). Retomando a opinio citada pela notcia, esta

pesquisa adota como justificativa emprica a crena de que a corrupo pode ser

atenuada, mesmo que os seus controles passem por sucessveis questionamentos.

J no mbito acadmico, a contribuio situa-se na tentativa de agregar novos

conhecimentos ao paradigma Institucional Sociolgico. Espera-se identificar

alternncia e simultaneidade entre os tipos de estratgias institucionais

estabelecidas pela taxonomia de Oliver (1991), ao lidar com os conflitos e as

disputas geradas por mltiplas lgicas institucionais (THORNTON; OCASIO, 2008).

At ento, a reviso da literatura no apresentou relevantes trabalhos relacionados

associao do modelo de estratgias institucionais o qual assume caractersticas

pragmticas e definitivas aos conceitos de lgicas institucionais em que as

instabilidades das instituies trazem caractersticas de abstrao ao contexto.

1.5 Levantamento bibliogrfico

Diante do que foi apresentado na introduo, seguem-se algumas das

principais obras a respeito da corrupo e os enfoques de cada uma.

Para os prximos passos, preciso ressaltar que o pesquisador no pode

propor novas consideraes sem antes fundamentar suas observaes com o

estudo detalhado do que j se discute sobre um determinado assunto ou fenmeno.

21

Dessa forma, o Quadro 1 apresenta os principais trabalhos cujos termos, conceitos e

expresses sero revisitados nos tpicos a seguir.

Quadro 1 Trabalhos selecionados para integrar o referencial terico Autor Termos-chave Conceito Relevncia para a

pesquisa Ashforth, B. E. Gioia, D. A. Robinson, S. L. Trevino, L. K. (2008).

Corrupo "[...] a corrupo pode ser exemplificada pela predisposio dos indivduos em faltar com a verdade e noes distorcidas sobre tica e moral".

Apresentao dos nveis distintos de anlise sobre corrupo.

Carcello, J. V. Neal, T. L. Palmrose, Z. V. Scholz, S. (2011)

A independncia e autonomia dos Conselhos de Administrao.

A independncia dos Conselhos de Administrao e Comits de Auditoria um importante fator que deve ser mantido para que suas aes no sejam questionadas ou consideradas imprprias aos interesses dos acionistas.

Consideraes relacionadas transparncia e aos conflitos de interesses.

Costa, A. P. P. D. (Doctoral dissertation - 2011).

Relacionamento entre organizaes financeiras, fraude e corrupo.

"[...] as diferentes organizaes esto sujeitas s fraudes corporativas, das quais uma de suas facetas a corrupo".

O campo organizacional em que se situam as organizaes financeiras pode ser suscetvel corrupo.

Lanyon, R. I. Goodstein, L. D. (2004)

Corrupo Organizacional.

A corrupo como um comportamento organizacional emanado da vontade coletiva.

A corrupo nascida no interesse coletivo no exclui a investigao no mbito individual.

Santos, R. Amorin, C. Hoyos, A. (2010)

A corrupo como uma espcie do gnero fraude.

A corrupo um tipo de fraude [...] em outras palavras, fraude gnero e corrupo espcie."

Corrupo um fenmeno tipificado.

Toffler, B. L. (2004)

Conflitos de interesses ultrapassando a tica e a legalidade.

A Corrupo apresenta uma relao com os negcios, influenciada por interesses econmicos que determinam a conduta de seus agentes.

A corrupo atendendo aos interesses econmicos.

Wells, J. T. (2008)

Tipos de Corrupo.

So tipos de corrupo reconhecidos mundialmente: - Suborno; - Gratificaes Indevidas; - Extorso Econmica; - Conflitos de Interesse.

Taxonomia da corrupo.

Fonte: Adaptado pelo autor de Bibliotecas eletrnicas Spell e Ebsco (2016).

22

1.6 A corrupo Institucionalizada

Entre os acadmicos, o tema corrupo tambm desperta interesse

principalmente quanto a sua origem, elementos e desdobramentos. Dentre os

trabalhos acadmicos considerados relevantes pesquisa, estudiosos classificam a

corrupo nas organizaes como um fenmeno institucionalizado em nveis

distintos de anlise e discusso. Esses nveis englobam a sociedade e seus

elementos constituintes: organizaes e indivduos (GETZ, 2006). No nvel

elementar desses debates, a corrupo pode ser exemplificada pela disposio

humana em faltar com a verdade, ou ainda, em noes distorcidas sobre tica e

moral (ASHFORTH; GIOIA et al., 2008). Outros pesquisadores so cautelosos com

as generalizaes, pois acreditam que tais afirmaes comprometem somente a

reputao dos indivduos ou, quando referidas s organizaes, o profissionalismo

de seus funcionrios e colaboradores. Restringir a corrupo aos vcios pessoais

subestimar seus efeitos e desconsiderar que a corrupo pode chegar s

organizaes por meio de estmulos exgenos vontade e pr-disposio dos

indivduos (LANYON; GOODSTEIN, 2004).

Todavia, o debate sobre a corrupo no acaba nas esferas individuais ou

corporativas. Pesquisadores avaliam a magnitude desse fenmeno, ampliando o

campo de viso acerca de seus efeitos polticos, econmicos e sociais. Dessa

forma, observa-se a corrupo por meio da combinao de dois movimentos: o

primeiro deles a prtica da corrupo como um hbito. No Brasil, o aparelho

poltico do pas um exemplo desse costume. O outro movimento

sistematicamente complementar ao primeiro, pois composto por aqueles que

patrocinam a corrupo, logo, so aqueles que promovem o ato de corromper, por

exemplo: organizaes privadas que compram facilidades dos rgos pblicos

(GETZ, 2006).

Toffler (2004) apresenta um estudo que complementa essa perspectiva, uma

vez que analisa a corrupo como o resultado de relaes influenciadas por

interesses econmicos. Em suas anlises sobre o comportamento da extinta

empresa de auditoria externa Arthur Andersen, verificou-se que auditores veteranos,

reconhecidos pela reputao tica e profissional, foram corrompidos ao pactuar com

prticas organizacionais deletrias, destaque para a contabilidade criativa da Enron

em 2002:

23

A contabilidade criativa um processo de uso de normas, onde a flexibilidade e as omisses dentro delas, podem fazer com que os estados contbeis paream algo diferente ao que estava estabelecido pelas normas. Consiste em dar voltas s normas para buscar uma escapatria. (JAMERSON, 1988, p.20 apud MARCELO; CORDEIRO, 2003, p. 43).

Alm de aceitar os riscos da corrupo envolvidos em artifcios como a

contabilidade criativa, a conduta praticada pela Arthur Andersen encontrava

estmulos exgenos exercidos pela concorrncia, na poca, formada pelo grupo Big

Five (PWC Price Waterhouse Coupers, Deloitte, Ernest Young, KPMG e a prpria

Arthur Andersen).

Conforme possvel observar, os estudos acadmicos sobre corrupo

apresentam perspectivas distintas, porm conviventes. Em resumo, pode-se

relacionar a corrupo ao desvio tico e moral do indivduo (ASHFORTH; GIOIA et

al., 2008), aos valores internos das organizaes e mercado (LANYON;

GOODSTEIN, 2004), aos interesses econmicos de profissionais e dirigentes

(TOFFLER, 2004) e ao fenmeno enraizado em diversos nveis de anlise: micro,

meso e macrossocial (GETZ, 2006). Alm disso, a corrupo pode ser constituda

por prticas voltadas ao suborno, s gratificaes indevidas, extorso, aos

conflitos de interesses (WELLS, 2008) e, ainda, analisada por perspectivas distintas,

assume a forma de instituio j que, para isso, admite estmulos externos e valores

simblicos com os quais indivduos e organizaes produzem e reproduzem sentido

a suas funes, alm de organizar o tempo e o espao de suas atividades

(FRIEDLAND; ALFORD, 1991).

Consideradas as devidas observaes, este estudo no se limita a analisar a

corrupo relacionada ao indivduo, tampouco tem o interesse de abordar a

infinidade de conjecturas que o assunto revela em seu campo macrossocial (GETZ,

2006). O ponto a ser observado o momento em que a corrupo alcana

caractersticas de uma instituio social passvel de incentivos a sua continuidade ou

de controles a sua prtica. A seguir, sero abordados tpicos da teoria Institucional

Sociolgica visando seleo de pressupostos necessrios discusso de

resultados.

24

2 FUNDAMENTAO TERICA

Para auxiliar no dilogo que a pesquisa acadmica mantm entre a teoria e a

prtica organizacional, adota-se o paradigma Institucional Sociolgico com o intuito

de analisar a corrupo como uma forma de contornar as instituies, dentre as

quais se destaca a AI.

2.1 Instituies

Thornton e Ocasio (2008, p.100) sugerem que o dilogo entre as instituies

e a ao organizacional no esto mais limitados ao Isomorfismo contido na

sociedade ou nos campos organizacionais (MEYER; ROWAN, 1977; DIMAGGIO;

POWELL et al., 1983). A ateno est voltada para os efeitos que as prticas,

valores e estruturas, diversas e expressas em uma variedade de contextos,

provocam e so provocadas por mudanas empreendidas por indivduos e

organizaes. A partir do surgimento do termo Lgica Institucional, que segundo

Thornton e Ocasio (2008, p.101) foi introduzido para descrever as prticas e crenas

contraditrias nas sociedades ocidentais modernas, foi possvel perceber que as

instituies se modificam como resultado da interao entre as foras econmicas e

comportamentais.

Para Friedland e Alford (1991, p. 241), as instituies podem ser vistas como

[...] simultaneamente materiais e simblicas. As principais instituies que exercem

influncia na organizao e na conduo do cotidiano o mercado capitalista, o

estado burocrtico, as famlias, a democracia e a religio, pois cada uma possui sua

prpria lgica central, regida pelo comportamento do indivduo, da organizao e da

sociedade. Enquanto as instituies restringem a ao, tambm so fontes de

mudana capazes de transformar identidades. Desta forma, existe uma conexo nas

abordagens institucionais, notado quando se distingue o que so as instituies

centrais/macro da sociedade (mercado, profisses, famlia) e as lgicas de campo,

situadas em um nvel meso, como as lgicas de corrupo, possivelmente derivadas

ou subvertidas de lgicas de mercado e controle.

Para Thornton e Ocasio (2008, p.101), as instituies tambm so

representadas por regras, prmios e sanes que homens e mulheres, em contextos

especficos, criam e recriam para regular seus comportamentos e perspectivas.

25

Conforme os argumentos de Cruz (2015), as instituies podem ser definidas como

resultados das necessidades e das presses do cotidiano, exercidas e absorvidas

pelos indivduos que compem a sociedade e com ela interagem. No contexto

organizacional, Scott (1991, 2004) sinaliza que as instituies so o resultado da

combinao dos padres culturais e cognitivos que integram um setor. Nesse

contexto, os significados organizacionais so justificados pela verdade pragmtica

(NEJM et al., 2015, p. 390) a qual indica que uma instituio no apenas reflete um

agregado de decises individuais, mas sim o resultado dessa combinao

(KIRSCHBAUM et al., 2011).

Em relao ao lugar onde as instituies residem, definido com setor

societrio por Scott (1991), ou ainda, campo organizacional por DiMaggio e Powell

(1983), l so localizadas as afinidades entre os atores que os aproximam,

aparentemente, no mais em funo da necessidade de se tornarem isomrficos,

mas sim, porque partilham intenes e ideais parecidos os quais os conduzem a

aes motivadas pelas mesmas lgicas institucionais:

O campo organizacional composto por organizaes que, em conjunto, constituem uma rea reconhecida da vida institucional: fornecedores chaves, consumidores de recursos e produtos, agncias reguladoras e outras organizaes que produzem servios ou produtos similares. (DIMAGGIO; POWELL, 1983, p.76).

Entretanto, atualmente Cruz (2015) encontra problemas em delimitar as

fronteiras do campo organizacional devido dificuldade de se analisar a dinmica

institucional, ou como Costa e Mello (2012, p. 13) definem: a dinmica da mudana

institucional. Isso porque o campo organizacional no mais se limita reproduo

de rotinas estabelecidas por atores proeminentes uma forma encontrada pelas

organizaes para suprir a dependncia por recursos (OLIVER, 1991; GULATI et al.,

1998). Agora, a dinmica das mudanas amplia as fronteiras conceituais do campo

organizacional a uma realidade alm da totalidade dos atores relevantes

(MACHADO et al., 2010, p.113). Mediante isso, torna-se impreciso limitar as

fronteiras do campo organizacional, uma vez que os fornecedores-chave, os

consumidores de recursos e produtos e as agncias reguladoras, ou seja, os atores

proeminentes do campo esto sujeitos a um cotidiano suscetvel a instabilidades em

que se revelam o conflito e a luta pelo poder, alm dos mecanismos de

aprendizagem social e os de experimentao (COSTA; MELLO, 2012). O ambiente

26

institucional instvel privilegia o fortalecimento de laos institucionais com uma

srie de atores potenciais, at ento, considerados irrelevantes (GRANOVETTER,

1973). Cruz (2015) complementa:

Torna-se relevante a considerao de um espao no qual as organizaes atuem como participantes que interagem ativamente em um campo ao mesmo tempo igual e mutante. Que as organizaes esto imersas em um espao que, ao mesmo tempo, as condiciona a serem semelhantes e que tambm as inspira a serem diferentes. (CRUZ, 2015, p.100).

Dessa forma, o conceito de instituio a ser considerado por esta pesquisa

associa a dinmica retratada por Costa, Mello, (2012) e Cruz (2015) com os

aspectos que definem o campo organizacional como uma [...] arena funcionalmente

especfica [...] (MACHADO et al., 2010, p.114) em que atores influenciam o

comportamento de outros levando s semelhanas entre as organizaes.

Considero o termo instituies como uma forma de representar os padres (rotinas, processos, representaes), as convenes (normas, regras, tradies), as prticas estabelecidas (rituais, hbitos, cerimnias), os valores e crenas que so socialmente e historicamente construdos/consolidados nas relaes entre indivduos. (CRUZ, 2015, p.100, grifo nosso).

A apresentao dos argumentos tericos para justificar o aparecimento das

instituies no contexto das organizaes leva para o prximo tpico, da discusso

terica, o aprofundamento sobre a definio de lgicas institucionais.

2.2 Lgicas institucionais

Thornton e Ocasio (1999, p. 804) definem as lgicas institucionais como [...]

padres histricos, socialmente construdos a partir dos quais os indivduos: (a)

organizam o tempo e o espao; (b) reproduzem sua substncia material; e (c)

provm significado a sua realidade social. (CRUZ, 2015, p. 99). Formadas pela

interao constante de elementos objetivos e subjetivos, as lgicas institucionais

correspondem s prticas, aos valores e s estruturas organizacionais

(THORNTON; OCASIO, 2008).

Para trazer tona exemplos prticos do que so lgicas institucionais em sua

representao macro, construdas por ordens centrais da sociedade ocidental como

famlia, democracia e capitalismo (FRIEDLAND; ALFORD, 1991), alm de sua

27

influncia nas organizaes financeiras situadas em um nvel meso de

representao (THORNTON; OCASIO, 2008), pode-se considerar as situaes em

que a comunidade bancria atrela suas transaes de crdito s garantias do

tomador, relao determinada pela interao das lgicas de mercado, de legislao

e de governana corporativa. Stiglitz (1990) explica que a prtica financeira de

atrelar emprstimos s garantias do tomador est pautada no temor dos bancos em

tomar um calote. Na realidade, sob a tica de lgicas institucionais, possvel

explicar o comportamento, no somente pela averso ao risco dos bancos em

conceder os emprstimos s empresas que podero no honr-los, mas tambm

pela necessidade de proteger a liquidez e a reputao do sistema financeiro

(LOUNSBURY, 2012).

Os valores organizacionais que compem lgicas institucionais centradas na

prospeco de mercado, por exemplo, sugere-se que os bancos, como instituies

que administram dinamicamente o seu patrimnio, sejam suscetveis a manobras

que busquem rentabilidade, passando, assim, a influenciar o ndice de financiamento

da economia e, consequentemente, os gastos e o nvel de atividade econmica

(PAULA, 1998, p.38). Segundo Stiglitz (1990), a recusa dos bancos na renovao de

emprstimos pode acarretar efeitos adversos sobre as empresas, forando-as a agir

de acordo com as exigncias do mercado financeiro. Essa outra condio em que

os valores, agora de quem necessita de capital, so influenciados por lgicas

estipuladas pelo mercado financeiro que, se no atendidas, impedem a captao de

crdito na praa.

Com relao influncia das lgicas institucionais nas estruturas do mercado

financeiro, possvel associ-las reduo das perspectivas de rentabilidade dos

bancos, frente aos ajustes monetrios do plano real. Nesse contexto, o sistema

bancrio entrou em uma fase de adaptao e de ajustamento s novas regras, o que

envolveu mudanas no seu padro de receita, passando por ajustes em suas

estruturas patrimoniais e operacionais, como os processos de fuses e

incorporaes utilizados para enfrentar crises econmicas relacionadas

competitividade (PAULA, 1998).

Um olhar detalhado para o surgimento de inmeras lgicas institucionais

revela que prticas, valores e estruturas organizacionais no esto inertes ao tempo

(LOUNSBURY, 2007, 2012), imunes s presses (OLIVER, 1991), ou ainda,

indiferentes s ordens institucionais (FRIEDLAND; ALFORD, 1991; COSTA M et al.,

28

2013, p.102). Com isso, as organizaes desenvolvem semelhanas ao seguir

padres (DIMAGGIO; POWELL, 1991; MEYER; ROWAN, 1977) suscetveis a

mudanas de tempos em tempos (THORNTON; OCASIO, 2004; CRUZ, 2015),

influenciadas por atores denominados empreendedores institucionais (BATTILANA;

DOURADO, 2010) responsveis por reordenar a prioridade de lgicas

(LOUNSBURY, 2012).

Dessa forma, a aceitao, a recusa ou at mesmo a manuteno de

parmetros ou rotinas organizacionais passam a ser um processo de

institucionalizao decorrente da influncia de lgicas que regem e extrapolam um

campo organizacional. Compreender processos de institucionalizao, em certa

medida, significa analisar o condicionamento organizacional a normas vlidas

socialmente, implicando aceitao e credibilidade de estruturas e prticas.

(GUARIDO FILHO, 2008, p.83).

Uma vez que o processo de institucionalizao pode ser decorrente da

influncia de lgicas, torna-se importante observar suas razes. Para isso, Friedland

e Alford (1991, p. 248) tipificam as lgicas centrais da sociedade ocidental: (a)

Lgica do Mercado Capitalista pautada pela acumulao e acomodao de atividade

humana; (b) Lgica do Estado em que a racionalizao e a regulao de atividade

humana ocorrem por meio da hierarquia legal e burocrtica; (c) Lgica da

Democracia pela qual se estabelece a participao e a extenso do controle popular

sobre a atividade humana; (d) Lgica da Famlia com a qual a comunidade

motivada por uma incondicional lealdade aos seus membros; e (e) Lgica da

Religio ou da Cincia que considera como verdade a realidade com a qual todas as

atividades humanas se acomodam em torno de parmetros considerados normais,

transcendentais ou simblicos. A seguir, um estudo realizado na indstria editorial de

livros acadmicos revela no apenas a existncia de lgicas centrais, mas tambm

os aspectos que as tornam mltiplas e hierarquizadas.

Quadro 2 Exemplo de lgica central (dominante) e a lgicas subsidirias Lgica Dominante Subsidiria

Caracterstica Lgica de Mercado Lgica Editorial

Sistema econmico Capitalismo de mercado Capitalismo pessoal

29

Fontes de identidade Publicar como um negcio Publicao como uma profisso

Fontes de legitimidade Posio de mercado da empresa Valor da Ao Reputao pessoal Valor Educacional

Fontes de autoridade CEO

Hierarquia corporativa Propriedade pblica

Editor-fundador Redes pessoais de trabalho

Propriedade privativa

Fonte: Adaptado de Thornton e Ocasio (1999, 2008).

O quadro proposto por Thornton e Ocasio (1999) traz o estudo emprico

realizado na indstria editorial. A principal constatao dos autores a de que,

durante certo perodo, a indstria de livros era regida por decises editoriais que

valorizavam as regras operacionais do negcio, como a forma e os requesitos

necessrios para publicar um livro, porm, mais adiante, os negcios passaram a

ser regidos por uma lgica dominante voltada ao mercado (FRIEDLAND; ALFORD,

1991) a qual enfatiza a competitividade e a busca pelo controle corporativo na

organizao. As lgicas citadas nos estudos sobre mercado editorial revelam uma

caracterstica: as lgicas institucionais se relacionam entre si, ora como dominante,

ora como subsidiria ao atenderem s demandas por manuteno, mudana ou

contorno de instituies.

Com isso, no relacionamento entre dominante e subsidiria que o papel da

lgica institucional ganha relevncia, o que permite a formulao das seguintes

categorias a serem retomadas como critrios metodolgicos para anlise e

discusso dos resultados obtidos aps a visita organizao financeira, palco do

estudo: Lgica de Mercado, composta por prticas, valores e estruturas

(THORNTON; OCASIO, 1999) de busca por lucro, por baixo custo, pelo menor risco

e pela preferncia do investidor. A Lgica de Mercado pode ser identificada, entre

outros, no que Rossoni e Machado (2010, p.185) denominam de sistema de

compensao de executivos e conselheiros. Esse sistema constitudo por prticas

alinhadas s decises de conselheiros e executivos em prol do alcance de objetivos

que tragam a maximizao de resultados para a companhia e, concomitantemente,

maior remunerao alta cpula.

Segundo Roe (2008), boa parte da remunerao dos executivos e

conselheiros composta de bnus representados por shares of stock exchange

30

(aes da bolsa de valores). Dessa forma, quando bem empregado, ou seja, livre de

interesses particulares, o sistema de compensao de executivos e conselheiros

revela uma lgica de mercado benfica no somente aos tomadores de decises,

mas tambm aos acionistas que compram e vendem as aes e aos funcionrios

que recebero maior participao nos lucros, tendo em vista a valorizao da

companhia. Os estudos de Carcello; Neal et al. (2011), reforam os benefcios da

lgica de mercado se associada transparncia nas decises tomadas pelos

conselhos de administrao. Os exemplos de Rossoni e Machado (2010), Roe

(2008), Carcello e Neal et al. (2011) sugerem a formao de uma lgica institucional

de mercado, a qual est presente em outros segmentos.

Aglutinadas sob a categoria de Lgica da Corrupo, apresentam-se as

prticas, os valores e as estruturas voltadas ao suborno, extorso, gratificao

indevida e ao conflito de interesse: todas sob o modelo de corrupo sugerido por

Wells (2008) que, segundo Ashforth e Gioia (2008), so motivadas pela disposio

humana em faltar com a verdade e pelas noes distorcidas sobre tica e moral, ou

ainda, podendo chegar s organizaes por meio de estmulos exgenos vontade

e pr-disposio dos indivduos, conforme afirmam Lanyon e Goodstein (2004),

configurando o que Getz (2006) denomina de desvios enraizados em escalas micro,

meso e macrossocial.

Para contrapor a Lgica da Corrupo, organizaes e sociedade lanam

respostas para combat-la. Nesse sentido, categoriza-se a Lgica do Controle,

constituda por prticas, valores e estruturas de regulao, de normatizao/

profisso e de governana. Estudos sobre a governana corporativa, por exemplo,

destacam o processo de institucionalizao de prticas gerenciais, apontando a

eficincia dos sistemas de controle (ROSSONI et al., 2010) com o qual a

organizao ganha legitimidade (SUCHMAN, 1995; DEEPHOUSE, 1996).

importante salientar que a escolha das categorias mercado, corrupo e controle,

em detrimento de outras, se deu por meio do exerccio em se identificar quais

lgicas centrais (FRIEDLAND; ALFORD, 1991) melhor representam o campo

organizacional em que se situam as organizaes financeiras, pormenorizado

frente na seo de metodologia. Assim, aps a avaliao terica sobre o enfoque

institucional, chegou-se aos tipos de lgicas que serviro de parmetro para

comparar e contrastar comportamentos e significados a serem analisados como

resultados desta pesquisa.

31

Os argumentos tericos para justificar a importncia das lgicas institucionais

no contexto das organizaes levam ao prximo tpico da discusso, a reflexo

sobre os conflitos, complementaridade e o hibridismo entre lgicas institucionais.

2.3 Conflitos, complementaridade e o hibridismo entre lgicas

Os conflitos, a complementaridade e o hibridismo entre lgicas institucionais

so tpicos da teoria institucional, aliados a conceitos como dinmica da mudana e

complexidade institucional (COSTA; MELLO, 2012; GREENWOOD et al., 2011).

Para Cruz (2015, p.7), [...] a lgica institucional est inserida na dinmica

institucional, onde a mudana enfatizada. Conforme analisam Costa e Mello

(2012, p.11), [...] as organizaes confrontam complexidade institucional, por

estarem imersas em um ambiente constitudo por mltiplas e contraditrias lgicas

institucionais, cada uma delas com uma diferente racionalidade.

Considerando a multiplicidade de lgicas institucionais, a complexidade o

sinal de que as organizaes no esto em zona de conforto: [...] as organizaes

enfrentam a complexidade institucional sempre que se confrontam com prescries

incompatveis, advindas de mltiplas lgicas institucionais (GREENWOOD et al.,

2011, p. 317). Para a pesquisa, a complexidade institucional pode ser traduzida

como o conflito de privilegiar lgicas voltadas proteo de princpios e quelas

vinculadas magnitude de novos eventos sociais, econmicos ou tecnolgicos

(THORNTON; OCASIO, 2008; GREENWOOD et al., 2011).

Nos instantes em que as organizaes enfrentam essa dualidade, os conflitos

e as disputas entre as lgicas aumentam, todavia, perdem intensidade medida que

a lgica dominante e outras subordinadas so definidas no campo (THORNTON;

OCASIO, 2008). A dominao de uma lgica, entretanto, no possui sentido

absoluto, pelo contrrio, assume papel transitrio, uma vez que a disputa pelo

protagonismo inerente s lgicas institucionais.

Como exemplo, vide o discurso possivelmente empregado por profissionais

de Recursos Humanos (RH). Nessas circunstncias, comum esses profissionais

promoverem analogias entre empresa e famlia. Mesmo representando ordens

institucionais distintas, conforme sugerem Friedland e Alford (1991), a lgica familiar

encontra-se muitas vezes subordinada lgica do trabalho em funo dos

resultados comerciais. Entretanto, quando o apelo muda, ou seja, o foco a

sensibilizao do funcionrio para atingir tais resultados, a lgica familiar

32

enfatizada pelo RH, isto porque, a lealdade e o respeito encontrados na ordem

familiar so elementos valorizados quando se pretende humanizar os

relacionamentos e o ambiente de trabalho.

Dessa forma, as lgicas institucionais podem assumir quaisquer papis, ou

seja, pode ser propensa valorizao de prticas familiares ou comerciais e, nesse

ponto, a complexidade institucional assume a funo de explicar com quais lgicas

as organizaes esto sujeitas prova, uma vez que um novo ciclo de mudanas

altera os padres organizacionais anteriormente conhecidos (LOUNSBURY et al.,

2012).

Reay e Hinings (2005) sugerem essa dinmica ao pesquisarem o campo

organizacional da sade na cidade de Alberta no Canad. Naquela ocasio,

descobriram duas lgicas institucionais em disputa: a do profissionalismo e a de

mercado. As mudanas na estrutura do campo evidenciaram que a lgica dominante

era a de mercado, uma vez que as aes do governo incentivavam a busca por

eficincia e efetividade no atendimento ao cliente. Todavia, ainda que a lgica de

mercado tenha se fortalecido naquele determinado momento, a antiga lgica

dominante a do profissionalismo, baseada na valorizao da relao mdico-

paciente e na qualidade do servio mdico no foi esquecida, sendo apenas

sublocada em detrimento de uma ordem institucional voltada ao mercado. A lgica

de mercado e do profissionalismo, ento, manteve relao de coexistncia, fato que

possibilitou ao servio de sade no se distanciar do conceito de empresa

necessrio quando se analisa a sade como um negcio e do aspecto profissional

que a medicina necessita ao lidar com vidas. Ao analisar tambm o setor da sade,

Scott (2000) fornece, em outro momento e local, a perspectiva de coexistncia entre

lgicas. Nesse estudo possvel verificar relativo equilbrio e hierarquia entre as

lgicas pblicas, as lgicas de mercado e as lgicas das profisses.

Vale a pena mencionar alguns estudos adicionais envolvendo a relao de

conflito, subordinao e complementaridade das lgicas institucionais no mercado

financeiro. Lawrence (2008), ao pesquisar as formas de poder exercidas em uma

organizao do segmento financeiro, verificou que a regulamentao externa, a qual

exigia maior transparncia nas transaes de crdito, alterou as prticas daquela

organizao. medida que uma auditoria externa foi iniciada, a organizao

financeira no mediu esforos para atender s exigncias, ainda que as informaes

requisitadas pelos rgos fiscalizadores no fossem habituais. Passado o tempo,

33

entretanto, a organizao financeira deixou de subvencionar a lgica pblica voltada

regulamentao do processo de concesso de crdito e retomou a forma com a

qual conduzia seus negcios, ou seja, a transparncia na realizao das transaes

encontrava-se novamente subordinada ao alcance de metas financeiras.

Lounsbury (2012) aponta outra situao. Em seus estudos, nem sempre a

coexistncia entre lgicas demonstrou ser possvel no campo organizacional. Essa

circunstncia ocorreu quando a desconfiana se instaurou no mercado financeiro. As

incertezas levaram a mudanas, principalmente, na forma com a qual os negcios

eram orientados. Em um dado momento, uma nova lgica institucional voltada ao

controle suplantou as velhas prticas organizacionais que privilegiavam maiores

riscos, dentre eles, o legal e o tico, em funo de maiores lucros.

Consequentemente, lgicas dominantes podem combinar-se a outras lgicas

de ordem secundria, o que pode levar formao de uma terceira lgica de

concepo hbrida. Segundo Rao, Monin e Durand (2003), uma lgica de concepo

hbrida formada pelo movimento de conciliao entre as novas demandas que

advm do ambiente e da identidade tradicional da organizao. Diante de lgicas

combinadas, atores unem elementos legtimos de suas prticas, crenas e

estruturas de trabalho a novos apelos, os quais tambm levantam urgncia de serem

atendidos e, para isso, destituem de significado, antigas lgicas consideradas

conflitantes ou desnecessrias organizao.

Suddaby e Greenwood (2005) apontam que a indstria contbil um exemplo

de lgicas hbridas, para isso demonstram que os profissionais da rea fazem uso

de estratgias retricas ou vocabulrios institucionais a fim de reinterpretar e

manipular smbolos e prticas existentes. Ainda que as lgicas institucionais se

proliferem por meio de conflitos e disputas, isso no as impedem de coexistir, sejam

em situao de subordinao, complementaridade, ou ainda, combinadas a uma

forma hbrida.

Analtico em suas colocaes, Lawrence (2008) e outros autores anteriores,

como Oliver (1991), pontuam as possveis divergncias internas enfrentadas pelas

organizaes em face de presses por mudanas, as quais podem ser traduzidas

como o conflito de privilegiar lgicas favorveis proteo de princpios ou aquelas

partidrias magnitude de novos eventos sociais, econmicos ou tecnolgicos

(THORNTON; OCASIO, 2008; GREENWOOD et al., 2011).

34

Tendo sido apresentados argumentos para compreender a importncia do

relacionamento entre lgicas institucionais no contexto das organizaes, o prximo

tpico da discusso terica apresenta a reflexo sobre a influncia das lgicas na

adoo de estratgias institucionais.

2.4 Lgicas ditando estratgias

Nesse ponto dos argumentos, fala-se da relao entre lgicas e estratgias

ao se considerar as afirmaes de que as organizaes sofrem presses: (1) para

tornarem-se mais homogneas em estruturas e processos e, (2) para lidarem, de

tempos em tempos, com mudanas em suas prticas, valores e estruturas, as quais

resgatam o conceito de heterogeneidade com a qual as organizaes administram a

complexidade do ambiente institucional (FRIEDLAND; ALFORD, 1991; THORNTON;

OCASIO, 2008; GREENWOOD et al., 2011). O resgate dessas perspectivas

possvel, uma vez que o atendimento, por vezes concomitante s diversas lgicas

empregadas para se alcanar legitimidade (SUCHMAN, 1995) e poder

(LAWRENCE, 2008) no podem ser satisfeitas ao mesmo tempo. Isto resulta em

estratgias influenciadas pelo que Machado (2003) identifica como Lgica de Ao.

A lgica de ao pressupe-se que os atores sociais, entre os quais se incluem as organizaes, orientam seus interesses com base em uma tica racional utilitarista de custo-benefcio, ou ainda, [...] decorrente de um conjunto de conhecimentos culturalmente difundidos e socialmente aceitos, os quais constituem parmetros para aquilo que os atores sociais concebem como realidade. (MACHADO, 2003, p.66).

Assim, a lgica de ao faz ponte entre a ideia de isomorfismo e de

heterogeneidade, o que promove, segundo Rossoni (2013), certo nvel de

recursividade, atributo com o qual as organizaes se protegem, ao passo que

tambm aceitam mudanas empreendidas no campo organizacional em uma

contnua ciranda de mediao dos conflitos institucionais. A recursividade incentiva

o conflito entre lgicas, das quais as respostas s presses do ambiente equivalem

s prticas manifestadas por estratgias de manuteno, mudana ou contorno de

instituies (THORNTON; OCASIO, 2008; BATTILANA; DOURADO et al., 2010). Em

uma situao emprica, possvel que as prticas, os valores e as estruturas

organizacionais, j existentes ou ainda em formao, influenciem a escolha de

35

Estratgias Institucionais (OLIVER, 1991) que, ao serem combinadas, podem levar

uma organizao financeira a atitudes como: (1) fazer um acordo com o agente

pblico para a compra de isenes tributrias e (2) negar veementemente o ocorrido,

quando as autoridades tomam conhecimento sobre o fato. Comportamentos como

esses so observados por empresas que pagam propina e so alvos de investigao

do Ministrio Pblico. Essas circunstncias so demonstraes de estratgias

diferentes, combinadas por atores de um campo para alcanar um objetivo.

Quando aborda o termo estratgias, este estudo adota o modelo de Oliver

(1991, p.151, grifo nosso), o qual classifica cinco tipos de estratgia para promover

respostas s presses do ambiente: i) concordar com presses por mudana ou

conformidade, ii) comprometer-se em atender s presses, iii) esquivar-se das

presses, iv) desafiar as presses por mudana ou conformidade, v) manipular as

presses.

Quadro 3 Estratgias institucionais Estratgias Tticas Comportamento da Organizao

Consentimento

Hbito Seguir os preceitos sem questionamentos.

Imitar Imitar modelos institucionais empregados.

Complacncia Obedecer e aceitar os preceitos impostos, por iniciativa prpria e antecipada.

Compromisso

Equilibrar Equilibrar as expectativas no tocante ao atendimento s exigncias. Pacificar Conciliar e acomodar as exigncias impostas.

Barganhar Negociar o cumprimento das exigncias.

Esquiva

Dissimular Disfarar a no conformidade, ou aparentar uma conformidade fictcia. Distanciar Enfraquecer os laos institucionais estabelecidos.

Escapar Alterar as metas, atividades ou os domnios da organizao, de modo que o fato gerador da inconformidade no mais exista.

Confronto

Rejeitar Ignorar normas explcitas.

Desafiar Contestar os preceitos e requerimentos.

Atacar Atacar a fonte da presso institucional em prol dos objetivos internos da organizao.

Manipulao

Cooptar Propor coalizes no campo organizacional.

Influenciar Conseguir o apoio necessrio para obter reformulaes convenientes.

Controlar Dominar o campo organizacional de modo a minar a legitimidade das exigncias. Fonte: Oliver (1991, p.152).

O Quadro 3 estratgias institucionais, expressa exemplos de como uma

organizao pode reagir, em face de exigncias do campo. Essas estratgias so

36

decises que residem na capacidade com a qual o ator interpreta o ambiente e

planeja o seu prximo passo. No contexto organizacional, isso no diferente, pois

as decises de uma organizao impactam toda a sociedade e, por isso, tendem a

ser pensadas e planejadas estrategicamente (PACHE; SANTOS, 2010a) para

administrar necessidades objetivas e subjetivas como conflitos, disputas ou

coexistncia entre uma lgica dominante e outras subordinadas ou hbridas

(BATTILANA; DOURADO, 2010). Vale lembrar que a preferncia pelo modelo

proposto por Oliver (1991) reside em seu potencial, uma vez que parece razovel

associ-lo dinmica com que as lgicas institucionais atuam em resposta s

presses por mudana, manuteno e contorno das instituies. Fala-se em

potencial, visto a pretenso de aplicar o modelo a uma proposta diferente do que

fora desenvolvida j que, originalmente, Oliver (1991) concebeu os tipos de

estratgia institucional para avaliar a resposta da organizao em face de sua

dependncia por recursos situados no campo organizacional (DIMAGGIO; POWELL,

1983; SCOTT, 1991; GULATI, 1998). A dependncia por recursos uma escolha

racional e objetiva em que as organizaes reconhecem a falta de algo que

necessitam e, por isso, adotam uma estratgia de carter positivista, ou seja, prtica

e definitiva para a sua conquista. Isso quer dizer que, se a organizao concorda

com algo, ela acredita na legitimidade daquilo, de forma que se torna resistente a

mudanas. Esta teoria apenas comentada, no sendo uma lente a ser utilizada

neste estudo, pois as mudanas fazem parte das aes organizacionais, assim, no

se pode falar de dependncia por recursos negligenciando o efeito do tempo sobre

aquilo que prioritrio em um momento e que pode deixar de s-lo em outro, j que,

se assim fosse, as instituies seriam imutveis, um ponto de vista superado pela

arguio dos pensadores institucionais (FRIEDLAND; ALFORD, 1991; LOUNSBURY,

2012; CRUZ, 2015). Afinal, mais de uma vez apresentam-se exemplos e conceitos

sobre a dinmica pela qual as mudanas institucionais ocorrem (COSTA; MELLO,

2012; CRUZ, 2015). Mais especificamente, o estabelecimento das estruturas de

controle nas organizaes representado por conselhos administrativos, comits,

auditorias, entre outros rgos de deliberao e fiscalizao. Toffler (2004) sinaliza

que o emprego desses controles no ao acaso, constitui-se de prticas objetivas e

subjetivas, que no possuem carter vitalcio, patrocinadas pela coerncia com a

qual, em um dado momento, foram eleitas predominantes e permaneceram nessa

condio.

37

Com isso, parece justo que as organizaes escolham cumprir uma

determinao ou deixar de faz-la, total ou parcialmente, ainda que tais alternativas

conduzam ilegalidade ou s aes imorais, considerando uma mescla de aspectos

culturais, tcnicos, legais e comerciais, mutveis em relao ao tempo, de

procedncia interna ou que ainda sero internalizados (SCOTT, 2000; THORNTON;

OCASIO et al., 2008). Para administrar a miscelnea de aspectos objetivos e

subjetivos como, por exemplo, prtica e cultura organizacional, um dos mecanismos

institucionais citados pela literatura o emprego do decoupling o que, nessas

circunstncias, resume-se desconexo dos atos cerimoniais de atividades de

natureza prtica relacionadas operao da organizao: tudo visando nada menos

do que fluidez do negcio. Presume-se que a liberdade do decoupling possa

ocorrer facilmente, uma vez que se acredita existir um controle tcito nas aes

organizacionais, baseado na boa f com que as pessoas conduzem suas atividades

(MEYER; ROWAN, 1977, p. 357).

O emprego da desconexo repercute uma vez que o controle baseado na

confiana e na boa f no parece apropriado para prevenir atitudes baseadas na

ambio e na improbidade das pessoas, como o caso da corrupo (GETZ et al.,

2006). No contexto em que o controle assume a forma de uma prtica contrria

crena que se tinha sobre a sua importncia e a sua contribuio no alcance de

objetivos, Oliver (1991) sugere que a estratgia possivelmente adotada pela

organizao ser de esquiva s exigncias, transparecendo fictcia conformidade.

Pache e Santos (2010b) so menos taxativos quanto ao tipo de estratgia, mas

defendem que as escolhas dependem da intensidade com a qual a complexidade,

formada entre o ator e o seu campo, determina a priorizao das instituies sociais

a serem seguidas. O processo de priorizao das instituies sociais ainda pode

convergir ao que Oliver (1991) denominou de Estratgia do Compromisso. Ao

assumir o compromisso em atender s presses do ambiente, s organizaes

obtm vantagens, pois passam a negociar os prazos de atendimento s solicitaes

externas ao contrrio de serem apenas demandadas e penalizadas pelo seu no

cumprimento.

Observadas as devidas consideraes, o modelo a seguir empregado para

analisar a influncia das lgicas na escolha de estratgias institucionais destinadas a

responder s presses do ambiente. O Quadro 4 apresenta exemplos do

comportamento de organizaes sob os conceitos das estratgias de

38

Consentimento, Compromisso, Esquiva, Confronto e Manipulao, por sua vez,

influenciados por Lgicas de Mercado, Corrupo e Controle.

Quadro 4 Estratgias influenciadas por lgicas institucionais Prticas, Valores,

Estruturas Estratgias Comportamento da Organizao

Lgica de Mercado

Consentimento

Compromisso

Esquiva

Confronto

Manipulao

Seguir os preceitos sem questionamentos.

Imitar modelos institucionais empregados. Obedecer e aceitar os preceitos impostos, por iniciativa prpria e

antecipada. Equilibrar as expectativas no tocante ao atendimento s exigncias.

Conciliar e acomodar as exigncias impostas.

Negociar o cumprimento das exigncias.

Lgica da Corrupo

Disfarar a no conformidade, ou aparentar uma conformidade fictcia.

Enfraquecer os laos institucionais estabelecidos. Alterar as metas, atividades ou os domnios da organizao, de

modo que o fato gerador da inconformidade no mais exista. Ignorar normas explcitas.

Contestar os preceitos e requerimentos.

Lgica do Controle

Atacar a fonte da presso institucional em prol dos objetivos internos da organizao.

Propor coalizes no campo organizacional. Conseguir o apoio necessrio para obter reformulaes

convenientes. Dominar o campo organizacional de modo a minar a legitimidade da

exigncia. Fonte: Adaptado de Oliver (1991, p.152); Friedland e Alford (1991); Thornton e Ocasio (2008).

Tomando por base o quadro, um exemplo que se pode extrair dessa proposta

vem das organizaes de capital aberto. Tais organizaes, por influncia de uma

forte legislao, so regidas por Lgicas de Controle responsveis por estratgias

combinadas de Aceite e Compromisso s regras. Essas organizaes servem de

indicadores para que os rgos de fiscalizao saibam se uma nova legislao ter

a aderncia dos demais atores do campo. Estudos sobre o segmento financeiro

(LOUNSBURY, 2007) indicam que as organizaes, orientadas por prticas de

normatizao e Lgicas de Mercado preferem, como estratgia, concordar com as

exigncias impostas por sindicatos e rgos de classe, pois entendem que tais

reivindicaes no so necessariamente contrrias continuidade de seus

negcios, ou seja, no sero sempre opostas e desconexas as suas realidades

operacionais (POWELL, 1991, p. 183).

Dessa forma, os principais conceitos e argumentos abordados pela teoria

39

institucional, utilizados em momento futuro para discorrer sobre as concluses de

pesquisa, devem ser elencados: (1) o paradigma institucional revela que o campo

organizacional produz inmeras instituies duradouras, mas suscetveis a

mudanas de tempos em tempos. (2) As lgicas institucionais equivalem ao conjunto

de prticas, crenas e estruturas que nascem e se renovam no campo

organizacional. (3) Uma lgica institucional especfica, mesmo que dominante, no

ser a todo instante a protagonista do campo organizacional e quando uma lgica

est subordinada a outra, a relao nunca ser em p de igualdade. (4) Ao observar

o campo organizacional e os estudos sobre isomorfismo e heterogeneidade das

instituies, possvel perceber a interao de mltiplas lgicas que, aliadas a

ordens institucionais como mercado, Estado, democracia, cincia e religio podem

descrever os motivos por traz das escolhas de uma ou mais estratgias

(FRIEDLAND; ALFORD, 1991; OLIVER, 1991; THORNTON; OCASIO, 2008; CRUZ

et al., 2015).

Aps a apresentao dos argumentos para sinalizar uma possvel relao

entre as lgicas e as estratgias institucionais, no contexto das organizaes

financeiras, segue, no prximo captulo, o detalhamento do plano metodolgico.

40

3 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

Como forma de sintetizar, no apenas os detalhes da metodologia, mas

tambm os passos que envolvem uma dissertao segue o protocolo de pesquisa

que proporcionar aos leitores a viso geral deste estudo de caso.

3.1 Protocolo de pesquisa

Um estudo de caso estruturado carece de um protocolo com vistas a

aumentar a confiabilidade da pesquisa e evitar a perda de foco (KOSTIK, 2016). A

funo do Protocolo de Estudo de Caso extrapola a finalidade de detalhar o mtodo

de pesquisa, isso porque possibilita delinear todo o processo de construo da

dissertao, que se inicia com a definio de um problema e termina com a

concluso daquilo que se pde inferir sobre os resultados. Todo esse trabalho

justificado quando se pretende levar a outros pesquisadores a compreenso

necessria acerca das etapas que, se seguidas corretamente, permitem replicar a

forma com a qual o estudo foi realizado (YIN, 2010). O Protocolo de Estudo de Caso

conta com seguintes etapas:

Cronograma: Delimitao do escopo para fortalecer o tema; amadurecimento de um problema de pesquisa; organizao dos objetivos a serem perseguidos; estruturao das questes de campo; aplicao do pr-teste para a validao do roteiro e questionrios de entrevistas; retorno base para os ajustes e os dimensionamentos de pesquisa. Fundamentos Tericos: Imerso na teoria; realizar as leituras essenciais ao desenvolvimento do constructo terico utilizado. Metodologia: Congnere a um modelo operacional; estabelecer ordem s etapas imprescindveis realizao do Estudo de Caso. (YIN, 2010, p.153, grifo nosso).

O desenvolvimento do protocolo, tal como demonstrado no Quadro 5, como

um documento formal pautado nas etapas de cronograma, fundamentos tericos e

metodologia, concede uma viso geral do estudo de caso, pois abrange aspectos

como: tema, questes de estudo, leituras norteadoras, procedimentos a serem

adotados para a coleta dos dados (observao em campo, entrevistas, anlise

documental) e o plano de anlise dos dados coletados, com discriminao da

natureza das informaes colhidas (YIN, 2010).

41

Quadro 5 Protocolo de estudo de caso

Cronograma

Maro a Maio/15 - Incio das pesquisas; consulta a sites, jornais e revistas para encontrar um problema de pesquisa relevante. Junho e Julho/15 Buscar teorias na linha de estratgia para explicar o fenmeno a ser estudado. Agosto e Setembro/15 Formular o construto terico a ser empregado e as questes do pr-teste para a coleta de dados. Outubro/15 Aplicao do pr-teste para formulao do roteiro e questionrios de entrevistas. Novembro e Dezembro/15 Ajustes na fundamentao da metodologia e nos instrumentos de coleta dos dados. Janeiro a Maio/16 Estruturao do projeto para submisso ao processo de qualificao. Junho/16 Aprovao no processo de qualificao. Julho Setembro/16 Entrevistas em campo. Outubro e Novembro/16 Transcrio das entrevistas e anlise dos resultados. Dezembro/16 Depsito Fevereiro/17 Defesa 1.1 PROBLEMA DE PESQUISA Apesar da existncia de distintas instituies de controle, ainda assim, as organizaes lidam com recorrentes casos de corrupo, ou seja, a ao fora das normas. Desta forma, a pergunta que o trabalho formula : Quais fatores permitem que as instituies de controle e a AI sejam contornadas levando a organizao corrupo? 1.2 OBJETIVO GERAL Identificar aspectos que permitem a prtica da corrupo e se a (AI) capaz de reconhec-lo. 1.3 OBJETIVOS ESPECFICOS Analisar se o controle corrupo, pautado na lgica do auditor, pode ser deturpado por outras lgicas institucionais. Identificar se a organizao combina suas estratgias a depender das presses exercidas pela interao de lgicas institucionais. 1.4 JUSTIFICATIVA No h um pas no planeta onde a corrupo seja permitida. H uma tendncia de convergncia nas regulaes anticorrupo. Mais recentemente, at mesmo o Brasil fez sua lei. As empresas tm de entender que no h mais escapatria. (PASSARINHO, 2015).

Fundamentos

Base do referencial: Teoria Institucional Friedland e Alford (1991) Lgicas Institucionais; Meyer e Rowan (1977) Mitos e Cerimonialismo; DiMaggio e Powell (1983) Isomorfismo, Campo Organizacional; Oliver (1991) - Presses e Estratgias Institucionais; Suchman (1995) Legitimidade; Getz (2006) Corrupo; Thornton e Ocasio (2008); Greenwood; et al., (2011) Lgica Institucional. Entre outros.

Metodologia de

pesquisa

Estudo de caso nico descritivo/explicativo (YIN, 2010; CRESWELL, 2010; BARDIN, 2007; et al.).

Fonte: Adaptado pelo autor (2015) de Yin (2010).

42

3.2 Descrio da metodologia

Nesta seo so explorados os aspectos metodolgicos utilizados pelo

pesquisador em sua ida ao campo de pesquisa. Segundo Kostik (2016, p.41), a [...]

metodologia pode ser interpretada como sendo um caminho que o pesquisador

escolhe percorrer para realizar seu estudo [...]. Dessa forma, a metodologia leva em

conta as escolhas que o pesquisador precisa fazer para alcanar os objetivos por ele

propostos, geralmente relacionados s contribuies empricas, metodolgicas e

tericas. Antes, porm, o mtodo tem como funo estabelecer as condies para

que se possa responder ao problema de pesquisa. Para isso, processam-se as

informaes coletadas no campo de forma a elucidar as dvidas no somente dos

leitores especializados sobre o assunto, mas tambm daqueles que buscam

respostas a problemas semelhantes.

Nesse contexto, a metodologia de pesquisa rene os elementos necessrios

para responder: Quais fatores permitem que as instituies de controle e a AI sejam

contornadas levando a organizao corrupo? A seguir, sero apresentados os

termos que classificam a pesquisa quanto ao seu tipo, estratgia, e os mtodos de

coleta e anlise dos dados. As consideraes finais decorrem desse processo, de

forma que estabelecem as implicaes do trabalho e elencam possveis limitadores

do mtodo a serem superados por estudos futuros.

3.3 Tipologia e estratgia de pesquisa

Esta pesquisa assume caractersticas descritivas e explicativas, pois visa

esclarecer, por meio de significado e opinies, as diferentes representaes de um

caso e as razes que o motiva. De procedncia qualitativa, a pesquisa aborda

aspectos subjetivos relacionados percepo dos entrevistados (YIN, 2010;

CRESWELL et al., 2010).

Quanto estratgia, adotado o Estudo de Caso de modalidade Caso nico,

pois tal caminho permite entender fenmenos sociais complexos dos quais o

pesquisador no possui o controle sobre os eventos (YIN, 2010, p. 29). O estudo de

caso uma estratgia de pesquisa que possibilita analisar acontecimentos

existentes numa configurao, [...] permite empregar mltiplos nveis de anlise

dentro de um estudo. (EISENHARDT, 1989, p. 534). Alm disso, a opo pelo

43

estudo de caso possibilita [...] expor os fatos necessrios ao entendimento de uma

determinada situao [...]. (CRESWELL, 2010, p. 26).

Para especificar com clareza o caso em estudo, cabe ressaltar que este

estudo de caso est examinando as explicaes de corrupo em uma determinada

Organizao Financeira, ainda que percebidos por seus colaboradores atravs de

comentrios referentes a exemplos extrados dos casos de corrupo reportados

pelos meios de comunicao (sites, jornais e revistas).

Outro elemento essencial do estudo de caso a unidade de anlise, j que

ela define o objeto e o prprio estudo de caso (YIN, 2010). Nesse estudo, a unidade

de anlise representada por um campo que inclui a organizao financeira. A razo

de escolha dessa organizao financeira se deve diversidade de operaes que

ela administra, as quais abrangem o relacionamento com governo, autoridades e

investidores proeminentes do mercado financeiro.

Quanto aos respondentes, a organizao financeira disps de seu auditor

externo, gerente e assistente de auditoria interna e o membro do comit de auditoria.

Externamente, o outro respondente foi a CGU Controladoria Geral da Unio.

Demais atores como: o BACEN Banco Central do Brasil; o COAF Conselho de

Controle de Atividades Financeiras e a CVM Comisso de Valores Mobilirios

quando procurados, declinaram participar das entrevistas. O motivo declarado foi de

que a informao solicitada ao rgo pblico, cuja finalidade atender aos estudos

de natureza privada, torna o atendimento aos pedidos de informao um ato

discricionrio ( vontade) do administrador pblico. Nesse caso, no havendo a

obrigatoriedade na letra da lei (LAI Lei de Acesso a Informao) ou o interesse dos

rgos em participar, os convites foram recusados.

Segue-se uma breve apresentao dos entrevistados que aceitaram participar

das entrevistas:

Entrevistado 1: Auditor Externo com experincia em Auditoria Interna e 14

anos de atuao em organizaes financeiras.

Entrevistado 2: Conselheiro do Comit de Auditoria com experincia em

Auditoria Interna e Externa e 25 anos de atuao em organizaes financeiras.

Entrevistado 3: Gestor de Auditoria Interna com experincia em Gesto de

Riscos e Compliance e 17 anos de atuao em organizaes financeiras.

Entrevistado 4: Assistente de Auditoria Interna com experincia em Anlise

de Fraudes Corporativas e nove anos de atuao em organizaes financeiras.

44

Entrevistado 5: CGU Controladoria Geral da Unio, responsvel por

fiscalizar a aplicao da lei brasileira anticorrupo Lei n 12.846/13 e outras

iniciativas contra a corrupo, envolvendo agentes pblicos e organizaes

privadas. O contato com a CGU foi realizado via Sistema Eletrnico do Servio de

Informaes ao Cidado1 e as respostas formalizadas por e-mail (Vide o ANEXO A).

Quanto identificao dos entrevistados, reserva-se o sigilo, tanto das

pessoas, quanto da organizao, especialmente pela confidencialidade que envolve

o setor financeiro, contudo, o pesquisador se compromete a apresentar aos

participantes os resultados do trabalho, proporcionando a confiabilidade esperada ao

estudo de caso (YIN, 2010, CRESWELL, 2010).

Outro aspecto permitido ao estudo de caso expor diagramao do campo

de pesquisa, sempre que possvel, visando trazer ao leitor uma ilustrao dos

elementos necessrios a sua compreenso. Dessa forma, segue a representao

grfica dos componentes do campo de pesquisa, bem como o relacionamento

mantido com a Unidade de Anlise.

Figura 1 Informao do campo estudo de caso nico

Fonte: Elaborado pelo autor (2016).

___________________________________________

1 O Sistema Eletrnico do Servio de Informaes ao Cidado (e-SIC) permite que qualquer pessoa, fsica ou jurdica, encaminhe pedidos de acesso informao, acompanhe o prazo e receba a resposta da solicitao realizada para rgos e entidades do Executivo Federal.

45

Apresentadas as particularidades do mtodo de pesquisa: tipologia,

estratgia, unidade de anlise e a representao do campo de pesquisa do Estudo

de Caso nico, inicia-se o detalhamento do mtodo de coleta de dados, necessrio

no apenas para organizar os esforos do pesquisador em sua ida ao campo, mas

tambm para estabelecer uma relao lgica entre as informaes obtidas e sua

pertinncia aos objetivos da pesquisa.

3.4 Mtodos de coleta de dados

Na primeira fase da coleta dos dados, buscaram-se informaes em

repositrios de contedo acadmico (Spell e Ebsco), de contedo jornalstico (Folha

de So Paulo, UOL, Estado de So Paulo) e por meio de questionrios de aplicao

eletrnica via ferramenta Survey Monkey2. A ferramenta eletrnica possibilitou a

realizao de pr-testes para validar o instrumento de coleta dos dados Roteiro de

Perguntas.

Aps tais cuidados, realizaram-se as entrevistas em profundidade com

observaes no participantes (EISENHARDT, 1989, p. 534). As entrevistas so

relevantes fontes de informao, pois abordam assuntos contemporneos e

comportamentais. Em uma entrevista, entrevistados bem informados podem

proporcionar insights importantes sobre assuntos ou eventos, fornecendo atalhos

para ajudar o pesquisador a identificar concluses relevantes (CRESWELL, 2010).

Para instrumentalizar as entrevistas, desenvolveu-se o roteiro de perguntas (Vide o

Apndice B), o qual aborda o conhecimento dos pesquisados, sobretudo dos

profissionais de AI, acerca do tema corrupo: suas implicaes, seus controles e

suas legislaes, quando analisados sob a perspectiva do relacionamento entre

mltiplas lgicas institucionais e das estratgias resultantes para administrar as

presses do ambiente. As perguntas do roteiro trazem exemplos de corrupo

retratados pelos meios de comunicao, uma forma de abordar o assunto sem expor

as particularidades vividas pelo entrevistado na organizao financeira, as quais

eventualmente no se queira comentar. O cuidado com a elaborao e a aplicao

do roteiro de perguntas visa promoo da triangulao necessria validao das ___________________________________________

2 Survey Monkey um fornecedor de questionrio de pesquisa pela web: Aplicao de questionrios on-line - Pr-teste.

46

fontes de dados utilizadas pelo pesquisador (YIN, 2010). A etapa de coleta dos

dados ainda reserva algumas consideraes relacionadas ao enredo do roteiro de

perguntas (YIN, 2010; CRESWELL et al., 2010). Nesse sentido, o enredo deixa de

ser uma mera formalidade, pois busca os significados necessrios para validar as

respostas dos entrevistados (CRESWELL et al., 2010). Ao trabalhar com um roteiro

de perguntas com sentenas abertas, pode-se incorrer em erros, dos quais a

abstrao ou o equvoco por parte dos entrevistados fazem parte do processo.

Dessa forma, cabe ao pesquisador seguir uma ordem previamente estipulada,

isto , seguir uma teia de raciocnio que o conduza verificao prvia das

respostas, ainda no campo de pesquisa, visando identificar a pertin