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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA
LETÍCIA MARQUES CAMARGO
A CIDADE DOS PRIMOS
Uma Etnografia da História no Distrito de Barão de Juparanã em Valença/RJ
Niterói, 2015
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA
LETÍCIA MARQUES CAMARGO
A CIDADE DOS PRIMOS
Uma Etnografia da História no Distrito de Barão de Juparanã em Valença/RJ
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Antropologia da Universidade Federal Fluminense,
como requisito parcial para obtenção do Grau de
Mestre.
Vínculos temáticos
Linha de Pesquisa do orientador:
Patrimônio Cultural, Práticas Produtivas e Categorias
Ocupacionais
Niterói 2015
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Banca Examinadora
__________________________________________
Profª Orientadora – Drª Ana Cláudia Cruz da Silva
Universidade Federal Fluminense
Programa de Pós-Graduação em Antropologia
_____________________________________________
Profª Drª Tânia Stolze Lima
Universidade Federal Fluminense
Programa de Pós-Graduação em Antropologia
_____________________________________________
Profª Drª Olívia Maria Gomes da Cunha
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social
_____________________________________________
Suplente interno: Profº Drº Antônio Rafael Barbosa
Universidade Federal Fluminense
Programa de Pós-Graduação em Antropologia
______________________________________________
Suplente externo: Drº Thiago Niemeyer
Universidade Federal de Juiz de Fora
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais
Bolsista Pós-Doutorado
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RESUMO
Acredito serem história e antropologia ciências intrinsecamente ligadas, já que
não se é possível traçar limites reais entre elas. Quando as pessoas de uma localidade
encaram suas próprias histórias como elemento central de suas reivindicações políticas,
essa ligação se torna ainda mais visível. O distrito de Barão de Juparanã, em Valença,
possui essa peculiaridade. Suas histórias são contadas atravessando gerações e de forma
oral. Estas são evocadas cotidianamente para expressar o que essas pessoas são e como
se constitui o mundo dentro dessa perspectiva. Nesta dissertação pretendi analisar como
tais histórias vão tomando forma e a maneira como elas atuam nas práticas sociais e
políticas na localidade de Barão de Juparanã, em Valença/RJ. A partir de um
“etnografia da história”, meu objetivo é compreender as múltiplas “versões” do que é a
história, seja ela utilizada para uma reivindicação política ou pela via do parentesco para
afirmar laços e a força feminina na “origem” da família, ou ainda demonstrar as
relações possíveis entre senhores e escravos. O passado contado a partir da memória e
dos arquivos vai montando pouco a pouco um mosaico que vai se assemelhando a um
retrato de família que reúne gerações diferentes (entre vivos e mortos), mas que atuam
de forma prática no presente.
Palavras-chave: etnografia, história, parentesco
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ABSTRACT
I believe History and Anthropology to be intrinsically connected sciences, since
it is not possible to determine actual limits between them. When people from a certain
place face their own histories as the main point of their political demands, this
connection becomes even more visible. The district of Barão de Juparanã, in the city of
Valença, possesses this peculiarity. Its history is told through generations and orally.
These stories are evoked with the intention of expressing who these people are and how
the world constitutes itself inside this perspective. In this dissertation I wanted to
analyze how such history takes form and the role it has in social and political practices
at the district of Barão de Juparanã in Valença, RJ. Through an "ethnography of
history", my main goal is to understand the multiple "versions' of what history is, either
if it is used for a political demand, or, through kinship, to affirm connections originated
in blood relations, to affirm the feminine power in the "origin" of the family, or to
demonstrate other possible relations between lords and slaves. The past, told through
memory and files, starts to show little by little a mosaic that begins to reveal a family
portrait uniting different generations (among living and dead), yet acting in a practical
form in the present.
Keywords: ethnography, history, kinship
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Dedico esse trabalho a Mazinho, ao seu amor e seu
carinho pela família que ficarão aqui eternizados.
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AGRADECIMENTOS
Não sei como começar a agradecer, são tantas pessoas que passaram por mim
durante esse tempo e que contribuíram de forma assustadoramente mágica para que eu
conseguisse escrever. Toda a leveza dessa escrita é proporcionalmente inversa à
facilidade que tive para escrever. Sei que para todos aqueles que passam por esse
processo, o sentimento de finalizar um trabalho desse porte é de esgotamento, de
anulação, mas também de prazer e liberdade. Agradeço, portanto, primeiramente aos
meus colegas que estão passando por isso comigo, ou que passaram durante esses dois
anos regrados em que a nossa alma é retirada do corpo, sem tempo para pensar ou
reagir. Cito aqui Natalia, André, Larissa, Bia, Talitha, Betânia, Reginaldo, Thalita
Paris8, e todos os outros que estão chegando ao final dessa jornada... Enfim,
conseguimos! Talvez tenha passado por algumas dificuldades a mais, que sem o apoio
da minha mãe, pai, irmãos e sobrinhas eu não conseguiria voltar ao campo e concluir
minhas pesquisas. Agradeço, portanto à dona Maria do Gato Preto, ao Tio Lolo, Zuzu,
Gabi, Raca, Clara e Sarah. Ao meu amigo, parceiro, incentivador e recentemente
médico Fred Griman. Às primas mais maravilhosas do mundo Lulu e Tada, que me
deram abrigo, carinho, comida e amor, que saudades... Tada também me auxiliou de
forma fenomenal na sistematização dos dados, principalmente da genealogia, todos os
dias chegava com novas informações, conversávamos e ela trabalhava completando os
quadrinhos que estão em anexo, uma parceira e tanto, que nunca poderia deixar de
exaltar.
Aos meus amigos do IPHAN de Vassouras que trabalham com muito respeito
pelo pesquisador e pelos documentos que são os guardiões. O que vocês fazem é
impagável: ao sorriso diário e às dicas de Sônia, ao carinho e boa vontade de Cris (que
subia e descia com caixas e mais caixas de arquivos para mim), ao Almir sempre
disposto a ajudar, à dona Isabel que coordena esse trabalho lindo, e é capaz de
compreeder letras que nenhuma pessoa do mundo conseguiria ler, e finalmente ao
Carlos Eduardo, que mesmo com o IPHAN em obras, abriu as portas e as caixas de
documentos para que eu trabalhasse, foi meu primeiro contato ali dentro, e portanto, é
graças a ele que temos o segundo capítulo dessa dissertação.
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Agradeço ao Mazinho, meu primo que me deu todas as dicas iniciais, os
telefones de primas que viviam em Juparanã, este falecera no último janeiro, sem ler
nenhuma frase do meu trabalho que tanto contribuiu. À dona Celeste e ao seu Luis
Otávio que me receberam em sua casa, mesmo sem me conhecer, que também me
ajudaram muito dando informações sobre o S.O.S Barão de Juparanã, onde são bem
ativos, além de dona Celeste ter me dado uma agendinha com os principais contatos
daqueles que ela sabia que conheciam mais as histórias.
À dona Anna Leite, primeira e última pessoa com quem eu falei na cidade, à sua
doçura, paciência e carinho, obrigada. Ao seu José Célio, que mesmo não se
interessando pelas histórias de família, me levou na casa de quem mais se interessava,
Seu Luiz Antônio. A este tenho um agradecimento muito especial, pois não se
importava de ficar horas contando as histórias, e aquilo o que visivelmente o dava tanto
prazer hoje já não é mais possível de ser feito. Após uma queda em Valença, ele foi
perdendo os movimentos das pernas e a fala, hoje mal consegue se comunicar, mas
agradeço por ter podido passar algumas tardes maravilhosas em sua companhia e em
companhia de sua lindíssima mãe, dona Iedda. Iedda junto com o filho foram
responsáveis por me fazer viajar no tempo em companhia deles nesses nossos
encontros. A capacidade de dona Iedda de se recordar do passado aos 91 anos é incrível,
e não há como não se emocionar com suas histórias. Obrigada, obrigada! Ao Ivo, que
além de me receber com umas cervejinhas geladas, comida maravilhosa, documentos e
histórias em sua casa em Sant’Anna, ainda me levou pela estrada de Juparanã até o
outro lado da fazenda, me mostrando os locais onde viviam cada um dos parentes, me
mostrando desde a igreja ao bambuzal. Ele, sua esposa Sandra e sobrinha Danielle,
foram maravilhosas companhias, e também pessoas muito importantes para esse
trabalho. Agradeço à Elza, mais uma que me recebeu em sua casa sem ao menos me
conhecer, me confiou seus documentos que ainda estão aqui comigo, me contou sua
história e hoje a tenho como uma grande amiga. Ao seu filho lindo Adriano Pedro, que
tem o dom de encantar as pessoas. Ao Jorge, também interessado nas histórias da
cidade, e com quem conversei muito sobre o Barão de Juparanã. À dona Zezé, tia de
Elza, que também é bisneta do Barão de Juparanã e viveu na fazenda de Santa Mônica.
Zezé é uma das mulheres mais fortes que eu conheci durante esse tempo e sua história
merece ser contada, mas em outro momento, já que está relacionada à força de trabalho
feminino em lugares onde a discriminação era muito forte. Zezé guarda ainda essa força
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na sua personalidade, no seu jeito de falar... É algo emocionante e inexplicável.
Agradeço também a Eloy, por compartilhar sua inteligência, opinião e conhecimento.
Um homem extremamente culto e elegante. Sempre será um prazer reencontrá-lo.
Obrigada por me emprestar suas revistas tão bem guardadas e por conversar comigo
sobre suas lembranças e sobre as histórias de Barão de Juparanã. Agradeço à Candoca,
por nossas conversas e encontros ao acaso, que sempre foram recheados de surpresas
agradáveis, e por pacientemente me expor seu álbum, me dizendo um por um quem
estava ali presente e em que situação. Obrigada também por suas irmãs Márcia e
Clotilde pelo carinho também com que me receberam. Agradeço a todos os moradores
da cidade que me receberam sem que aparentemente se incomodassem com minha
presença.
Não posso deixar de agradecer à Tita, por recuperar os escritos de minha avó -
dona Anny - sobre a família, o que me motivou ainda mais a continuar nesse caminho.
Ao Otto, por ter sido meu melhor amigo, meu revisor atento e apreciador discreto de
minhas letras durante todos esses anos. A toda parentada da dona Anita, amo vocês um
tantão, obrigada por estarem sempre ali no facebook, pra me ajudar com informações e
com mensagens de apoio, sem vocês não teria nada disso. Às minhas irmãzinhas Maria,
Iara, Ana Carol, Sabrina, Moara, Ana Moreira, Alice, Silvia e Marcela, só por existirem
mesmo, o que já é mais do que o suficiente para não desistir de trabalhar.
Finalmente agradeço às pessoas que estiveram mais próximas de mim nesses
últimos meses em que me dediquei exclusivamente à escrita: à Ana Claudia, minha
orientadora e amiga que não deixou que eu desistisse em momento algum. Obrigada
pela confiança. À Lucía, Antônio Rafael, e também à turma toda do Cosmopolíticas
Núcleo de Antropologia pelos debates dos últimos meses, que lógico, me deixaram mais
confusa do que clarearam meus problemas, o que para um antropólogo pode ser uma
coisa muito boa, afinal. À Ana Lúcia Ferraz e ao Laboratório do Filme Etnográfico, e
por último, aos irmãos Sheila Moreira e Alexandre Moreira. A primeira, pois desde o
dia em que me conheceu se ofereceu a me ajudar, ajuda essa irrecusável, já que todas as
prensas foram feitas em sua casa. Obrigada! E ao Alexandre, por estar ao meu lado boa
parte do tempo em que me dediquei à escrita, me dando carinho, força e muito amor.
Vocês todos foram muito importantes.
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SUMÁRIO
Introdução____________________________________________________________15
Etnografia da História_____________________________________________21
Sendo e não Sendo _______________________________________________28
Ouros Negros ___________________________________________________32
Capítulo I - Política e Parentesco em Barão de Juparanã________________________36
Memória e Histórias______________________________________________37
O tempo: dos documentos à interação com os mortos____________________46
Capítulo II - Senhores e Escravos – Os limites entre Hierarquia e Parentesco_______56
Outros Barões: Relações e desfechos_________________________________60
Capítulo III - As Relações de Sangue e outras Histórias________________________75
Laços Sanguíneos________________________________________________79
Terra e Sangue __________________________________________________83
Sangue e Incesto ________________________________________________85
A performance da história: Memória e parentesco ______________________88
O trem: personagem implícito das narrativas___________________________93
Etnografando a história. Etnografando tudo ___________________________95
Conclusão____________________________________________________________97
Referências Bibliográficas______________________________________________104
Anexos: Genealogias
Anexo I - Família da Escrava Manoela Agostina_____________________________105
Anexo II - Família da Escrava Floriana Paulina______________________________107
Anexo III - Família da Escrava Floriana Paulia (Outros Parentes)_______________ 116
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Anexo IV - Família da Escrava Semiana Florentina__________________________121
Anexo V - Família da Escrava Emília Dorothéia_____________________________122
Anexo VI – Família da Escrava Geralda ___________________________________124
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ÍNDICE DE IMAGENS
Imagem 1: Marquês de Baependi _________________________________________17
Imagem 2: Barão de Juparanã____________________________________________18
Imagem 3: Ponte de Acesso à Barão de Juparanã vindo de Vassouras_____________21
Imagem 4: Mapa da Cidade de Barão de Juparanã desenhado pelo “Seu” Milton Franco
____________________________________________________________________ 27
Imagem 5: Foto da plataforma da Estação de Barão de Juparanã em 1922_________ 31
Imagem 6: Escrava Ambrosina ___________________________________________40
Imagem 7: Vereador Naldo e Governador Pezão aproveitam a ocasião da reforma da
Estação para realizar campanha eleitoral, visto que as eleições de 2014 estavam próxima
____________________________________________________________________ 45
Imagem 8: Casarão da Fazenda de Santa Mônica, hoje Palácio Duque de Caxias – Visão
frontal _______________________________________________________________46
Imagem 9: Casarão da Fazenda de Santa Mônica, hoje Palácio Duque de Caxias – Visão
lateral _______________________________________________________________47
Imagem 10: Livreto comemorativo do centenário da Igreja N.S. do Patrocínio de
1981________________________________________________________________ 48
Imagem 11: Ruinas da Igreja de Sant’Anna, apenas a fachada continua de pé _______49
Imagem 12: Laudy, irmã de Ivo e a santa de Sant’Anna _______________________50
Imagem 13: Trecho de terras de Ivo: rio Paraíba, sua casa e o morro ______________52
Imagem 14: Seleção de café, Fazenda da Cachoeira Grande, Santa Tereza. Vassouras,
RJ__________________________________________________________________ 57
Imagem 15: Interior de uma cozinha com azulejos, Fazennda Cananéia. Vassouras, RJ
____________________________________________________________________ 59
Imagem 16: Localização de Barão de Juparanã entre os municípios de Valença e
Vassouras ___________________________________________________________64
Imagem 17: Fazenda de Guaribu na década de 1930___________________________66
Imagem 18: Vivênca na Fazenda de Guaribú ________________________________68
Imagem 19: Centro de Assessoria Jurídica Popular Mariana Criola _______________71
Imagem 20: Rozina na Fazenda do Bom Retiro (senhora mais idosa de preto)_______72
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Imagem 21: Fachada do Casarão Monte Scylene______________________________81
Imagem 22: Anna Leite (menor) e irmãos na Fazenda Bicame___________________83
Imagem 23: Mônica e José Leite__________________________________________84
Imagem 24: Anna Mafra e Arthur Marques dos Santos ________________________87
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INTRODUÇÃO
Saindo de casa. A cabeça já vai se projetando naquele espaço, sabendo que o
caminho é longo e nem um pouco fácil. Um ônibus, um trem lotado numa sexta-feira.
Um movimento sutil de corpos que se contorcem em busca da inalcançável posição
confortável. Trocas de pernas, trocas de braços. Janelas que se abrem, portas que não se
fecham mais. O trabalhador do subúrbio voltando para sua casa numa sexta-feira. Meu
caminho ainda será muito, muito longo.
A paisagem vai mudando: menos concreto, mais verde. Estações mais distantes
umas das outras. Vendedores de chocolate de marca são substituídos por aqueles que
vendem bala de coco caramelada, totalmente caseira. Os assuntos vão ficando mais
leves, o trem mais vazio. O peso do metal que nos cerca finalmente chega ao fim, minha
jornada não. Ainda tenho uma serra para cruzar. O ar vai ficando mais fresco, o cheiro
de terra e mato vão entrando pelas narinas espalhando uma sensação de pureza pelo
corpo. Já estamos muito próximos de mais uma transição na paisagem. A mata atlântica
vai ficando menos densa e dando lugar aos morros pelados, alguns com pequenos
arbustos, resquícios de uma vã tentativa de reflorestamento. Mas é terra ruim,
condenada há mais de 100 anos, onde fica claramente visível a influência da importante
economia de outrora naquelas terras hoje pobres, cercadas por pequenas cidades que
ainda guardam na lembrança os tempos de progresso, do café e do trem da linha D.
Pedro II.
Pare em qualquer uma dessas cidades onde hoje se encontram antigas estações
abandonadas e pergunte para qualquer pessoa: todo mundo tem um parente próximo que
era ferroviário. E essa lembrança começa com um orgulho e termina com uma dor
nostálgica. “Um crime”, dizem sobre o fim do meio de transporte que ligava Rio, Minas
e São Paulo por trilhos que hoje são controlados por empresas de logística, levando
metal bruto dos confins do mundo. Eu escolhi parar em uma dessas pequenas “cidades
mortas”, como dizia Monteiro Lobato referindo-se às cidades do Vale do Paraíba na
parte paulista da região. Essa cidadezinha é na realidade um distrito pertencente a
Valença no Estado do Rio de Janeiro, que possui a peculiaridade de ter sido projetada
por um Barão, ao redor da estação, que segundo a narrativa de meus interlocutores,
chegou a ser considerada a mais bela entre Rio de Janeiro e Minas Gerais. Para chegar
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até Juparanã de onde vivo é necessário percorrer o caminho que descrevi, tomando um
ônibus de Niterói/RJ até a Estação Ferroviária Central do Brasil, dali pegar o trem que
vai para Japeri e trocar para um trem menor que leva até a cidade de Paracambi, última
cidade da Baixada Fluminense. Em frente à estação existe um ônibus que em cerca de
uma hora, uma hora e meia chega a Vassouras, passando por Engenheiro Paulo de
Frontin e Mendes. Chegando em Vassouras é necessário tomar o último ônibus que sai
de meia em meia hora até Barão de Juparanã. Esse trajeto é extremamente cansativo,
apesar do campo não ser tão longe. Vi-me, assim, na necessidade de morar durante a
pesquisa de campo no distrito, pois a princípio meu grande interesse estava no
movimento político criado pelos cidadãos chamado: “S.O.S Barão de Juparanã”, que
visava, entre outras coisas, a urgente reforma da estação, que se encontrava naquela
ocasião em estado completamente precário. O interessante é que em minha última
estada na cidade, a reforma estava sendo iniciada, fechando assim um ciclo.
É necessário regressar para os motivos que me fizeram seguir para a localidade e
suas peculiaridades. O vilarejo de Barão de Juparanã, outrora chamado Desengano
Feliz, surgiu de forma planejada ao redor de uma fazenda de café do final do século
XIX, a Fazenda de Santa Mônica, pertencente ao Marquês de Baependi (Manoel
Jacintho Nogueira da Gama) e sua família: a Marquesa de Baependi (Francisca Mônica
Carneiro da Costa e Gama), e seus filhos Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama
(Conde de Baependi), Manoel Jacintho Carneiro Nogueira da Costa e Gama (Barão de
Juparanã) e Francisco Nicolau Carneiro Nogueira da Costa e Gama (Barão de Santa
Mônica).1
1 Fonte: http://www.geneaminas.com.br/genealogia-mineira/descendentes.asp?codpessoa=28803 acessado
em 04.03.2013
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Imagem 1: Marques de Baependi
Dos filhos do Marquês de Baependi, o Barão de Juparanã foi quem
especialmente se empenhou para concretizar o povoamento da localidade, já que
construiu com seus próprios recursos duas pontes ferroviárias para que fosse aprovada a
modificação do trajeto original da ferrovia D. Pedro II, onde o trajeto feito por bitola
larga se daria por Vassouras. Segundo as pesquisas feitas por um morador local, o
“Seu” Milton Franco:
A estação ferroviária de Desengano teve a sua inauguração no dia 17 de
novembro de 1895, com a presença de sua Majestade Imperial Pedro II e sua
corte. Já a vila de Desengano foi fundada dois meses após a inauguração da
estação a 31 de janeiro de 1866 (FRANCO,2007, p.11)
Segundo Cândida, ou como a chamarei aqui, “Candoca”, ainda há resquícios
das primeiras habitações feitas pelo Barão, do outro lado da linha do trem; casas que,
segundo ela, foram feitas para suas filhas. Segundo o que popularmente é divulgado, o
Barão de Juparanã “morreu viúvo e sem filhos”. Porém, como podemos observar nas
narrativas dos moradores da localidade registradas em uma matéria da TV Rio Sul2 no
ano de 2010, o Barão de Juparanã possuiu cinco escravas que viviam com ele como
2 Matéria sobre o distrito de Barão de Juparanã veiculada pela TV Rio Sul, filiada à Rede Globo no sul do
Estado do Rio de Janeiro em 22.05.2010. Ver http://riosulnet.globo.com/web/conteudo/5_269106.asp
Acessado em 04.03.2013
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suas “esposas”, já que não manteve nenhum casamento oficial. Dessas escravas
surgiram cinco ramos familiares diferentes, porém com o patriarca em comum, todos
sendo criados como irmãos. Segundo um folheto publicado pela igreja local em 1981,
que teve a ajuda dos moradores na construção da narrativa que lá consta, o Barão deixou
parte de suas terras para seus filhos como herança, aos quais chamava de “meus
protegidos”. (RAMOS, 1981).
Imagem 2: Barão de Juparanã
Em registros feitos a próprio punho por mais uma descendente do Barão, e
também professora de história, podemos observar algo que é extremamente comum nas
narrativas dos moradores da localidade, que é a exacerbação da bondade do Barão de
Juparanã:
Aos 21 dias do mês de maio do ano de 1874, surgia no cenário cafeicultor
brasileiro a ilustre estirpe de Manuel Jacinto Carneiro da Gama, ou melhor, o
Barão de Juparanã. Dotado de diversos títulos, provou ser um homem de
sensibilidade para com o próximo e um empreendedor à frente de seu tempo.
Ter tal título não se igualava aos seus modos tolerantes e brilhante
inteligência. Nem mesmo seu apelido irônico de “Tucano da Paraíba”
subestimava a súmula das suas propriedades ou mesmo a natalidade dos
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sonhos prósperos. O grande aristocrata do entreposto Valença-Vassouras,
viajou para as estrelas no dia 25 de junho de 1876. Seus restos mortais foram
guardados no sepulcro do cemitério de Desengano. Ainda assim, sua
aristocracia rendeu frutos, seus feitos renderam história, seus escravos e
ingênuos renderam dengos quites a seu sangue (Retirado de documento
escrito por Elza, p.01)
De forma doce e poética, Elza (parentesco localizado em Anexo I) vai narrando,
e provavelmente mesclando, histórias ouvidas (como sobre o apelido do Barão “Tucano
do Paraíba”) e outros registros para compor o retrato daquele responsável pela
construção das pontes ferroviárias, como já citadas, da estação (presente muitas vezes
nos escritos locais com letra inicial maiúscula, o que frisa a sua importância para os
moradores), da igreja, e de duas escolas.
Voltando ao S.O.S Barão de Juparanã, podemos agora compreender melhor os
motivos para que a reforma da estação seja a pauta principal do movimento. Segundo
bem observa Eloy, um dos moradores da localidade, o vilarejo foi construído fugindo do
padrão das pequenas cidades (aquele famoso clichê onde vemos uma praça, ao centro a
igreja e casinhas em volta). Em Juparanã, no centro da Praça Duque de Caxias, a
principal da cidade, está localizada a estação, que até então se encontrava abandonada.
Os moradores integrantes do movimento, porém, possuem também outras pautas, que
refletem as suas necessidades mais básicas. Em meus primeiros dias de campo,
participei de uma reunião entre o Conselho de Saúde de Valença e os cidadãos
pertencentes ao movimento, identifiquei as lideranças e percebi o estado de abandono
em que aquelas pessoas se encontravam. Obviamente que a configuração não era mais
tão ruim na minha penúltima visita em agosto de 2014, aproximadamente seis meses
depois, já que as eleições estavam próximas. As pessoas que estavam aguardando
atendimento médico há meses foram finalmente atendidas; a reforma da estação saiu
(um político local deixou faixas cobrando que as obras iniciassem com urgência,
quando o movimento S.O.S já sabia que as obras iriam iniciar); até mesmo uma antena
para celulares foi instalada (sendo o feito assumido por um político e desmentido pelas
pessoas do S.O.S).
Antes de ir viver em Juparanã, entrei em contato com as pessoas do movimento
pela rede social do Facebook explicando que eu estava pesquisando para o mestrado as
histórias e as relações de parentesco que se travam na cidade e que precisaria de um
lugar para ficar. Dentre algumas pessoas que foram prestativas em me ajudar, a que
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mais se empenhou naquele momento foi Dona Celeste, esposa do “Seu” Luis Otávio,
ambos muito ativos no S.O.S. Acabei me hospedando na casa deles por um mês.
Durante esse tempo conversamos muito sobre a política local e como o S.O.S surgiu.
Expliquei meu interesse para eles, tanto no movimento, quanto nos laços de parentesco
que as pessoas possuem, já que muitos dos envolvidos no movimento fazem parte dessa
grande “família”, quanto nas relações políticas que estavam sendo travadas a partir do
S.O.S., eles me falaram da polarização que existe na cidade entre os que apoiam e os
que não apoiam o vereador, e como que mesmo a maioria se dizendo contra, este está há
quase vinte anos no poder, sempre sendo eleito pela população de Juparanã. O casal
também me alertou que o vereador poderia tentar impedir minha pesquisa e, por ele já
ter ameaçado algumas pessoas, resolvi não continuá-la junto ao S.O.S Barão de
Juparanã. Por eu ser uma pessoa de fora, e diante da impossibilidade de deixar claro
para todas as pessoas quais eram minhas intenções ali, achei que a desconfiança de
algumas poderia ser prejudicial naquele momento. Além disso, havia ambicionado em
meu projeto fazer pesquisa nos arquivos da região e o trabalho de campo
especificamente sobre a família, assim, as circunstâncias fizeram com que eu me
dividisse entre os arquivos em Vassouras e os encontros com os membros da família em
Barão de Juparanã. Por isso, resolvi passar a me hospedar, na casa de primas em
Mendes (cidade próxima à Vassouras e Juparanã), que também me auxiliavam na
sistematização dos dados, principalmente da genealogia. Dona Celeste também me
auxiliou imensamente, dando-me uma agenda de contatos de todos os que ela sabia que
eram descendentes do Barão de Juparanã, o que acabou sendo o meu foco central e,
graças a essa agendinha e aos contatos que fui fazendo a partir dela, conheci pessoas
muito especiais como Anna Leite, Candoca, Ivo, Seu Luiz Antônio, Elza e Eloy, ou
seja, pessoas que acabaram sendo responsáveis pela essência desse trabalho.
Barão de Juparanã faz parte da região chamada Vale do Paraíba Fluminense,
sendo o rio Paraíba do Sul o mais importante do Estado do Rio de Janeiro. Cruzei
centenas de vezes esse rio durante o campo, e sempre era uma experiência emocionante
passar pela ponte que dá acesso à cidade, vindo de Vassouras. A paisagem é realmente
incrível: ao fundo a Serra da Concórdia, parque agora administrado pelo INEA
(Instituto Estadual do Ambiente, que possui sede localizada no distrito, uma das
conquistas creditadas ao Movimento S.O.S Barão de Juparanã), e o largo rio de água
barrenta, correndo ligeiro entre as pedras que dão o nome à região bem próxima da
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localidade (Bacia de Pedra). Parte dessa emoção também se dá pela incrível obra
arquitetônica que é a ponte encomendada pelo Barão de Juparanã para fazer cruzar o
trem para seu lado do Paraíba, que apesar dos seus quase 150 anos de uso, por ela ainda
cruzam carros, ônibus e trens diariamente.
Imagem 3: Ponte de Acesso à Barão de Juparanã vindo de Vassouras
Etnografia da História
Como em meu campo procuro compreender o papel das histórias no distrito de
Barão de Juparanã, em Valença/RJ, me vi a princípio na necessidade de acompanhar os
desenvolvimentos teóricos sobre história ou historicidades dentro da antropologia, para
poder chegar ao que me proponho a fazer, o que chamo de “etnografia da história”.
Voltemos então para a forma como Claude Lévi-Strauss divide as maneiras de lidar com
a história em três categorias, como atentam Goldman (1999) e Sztutman (2012):
(...) O primeiro diz respeito à “história dos historiadores” e é baseado na
relação de dependência com os registros escritos. O segundo se refere à
“filosofia da história”, como enraizada na tradição ocidental, que postula um
princípio de causalidade, estabelecendo que o passado, como necessidade,
determina o presente, que se apresenta simplesmente como possível. Por fim,
o terceiro remete à noção de “historicidade” e permite uma crítica aos dois
primeiros sentidos, o que reenvia diretamente à tarefa da antropologia.
(SZTUTMAN, 2012, p. 111)
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Como parte desse pensamento, que tem a história como sendo fundamental para
o entendimento do mundo, a antropologia também se constitui sob essa preeminência da
história. O evolucionismo social, primeira formulação teórica do pensamento
antropológico, buscava na história uma forma de organizar o conhecimento do mundo.
Lévi-Strauss tem, portanto, como foco de sua crítica tanto em História e Etnologia
(1991), quanto em Raça e História (1976) a teoria epistemológica do evolucionismo,
chegando ao ponto culminante de sua crítica à história nos últimos capítulos de O
Pensamento Selvagem (2012).
Em relativa continuidade com esse pensamento, porém trazendo a
intencionalidade dos sujeitos para a estrutura, Sahlins (1990, 2004 e 2012) traz o
conceito de mitopráxis, mostrando que a dialética não é totalmente estrutural, mas que
as diferentes historicidades são efeitos de diferenças cosmológicas (mesmo que os mitos
estejam em ação). Overing (1995), por sua vez, demostra o quanto o conceito de
historicidade pode acrescentar à filosofia por expor a multiplicidade da metafísica e das
noções de tempo em detrimento da unidade do pensamento racionalista e cientificista
que coloca a natureza mais próxima da verdade, enquanto a própria divisão entre
natureza e cultura é resultado de historicidades (enquanto ontologias e cosmologias)
diferentes.
Toda essa discussão sobre historicidade levanta a questão não apenas sobre o
ponto de vista antropológico da história, mas envolve todo um questionamento a
respeito da própria razão construída pelo ocidente, na qual tanto a história, quanto a
antropologia estão baseadas. Ao perceber historicidades diferentes de povos diferentes,
Lévi-Strauss está levantando um questionamento da ordem da metafísica, já que as
diferentes historicidades são respostas às diferentes ontologias e cosmologias segundo a
compreensão de Joana Overing. Essas diferentes historicidades não são, porém,
sinônimas de incapacidade de compreensão de outra forma de percepção de si e do
mundo, mas revelam um caminho para se repensar a unidade da verdade metafísica
ocidental, trazendo o múltiplo no lugar do “um”. As múltiplas historicidades não
marcam apenas uma diferença, antes essas evocam a simetria da relação entre mundos,
entre formas de percepção, entre interesses diversos e maneiras diversas de se perceber
e lidar com o complexo natureza-cultura, ou como Bruno Latour se refere:
Ora, não existem nem culturas – diferentes ou universais – nem uma
natureza universal. Existem apenas naturezas-culturas, as quais constituem a
23
única base possível para comparações. A partir do momento em que levamos
em conta tanto as práticas de mediação quanto as práticas de purificação,
percebemos que nem bem os modernos separam os humanos dos não-
humanos nem bem os outros superpõem totalmente s signos e as coisas
(LATOUR, 1994, p.102)
O caso que este trabalho analisa se refere a uma cultura que existe em um espaço
ocidental, portanto a historicidade presente nesta localidade faz parte da noção de
história ocidental. Porém, mesmo em sociedades ocidentais existem possibilidades
múltiplas de compreensão e assimilação da história. Segundo Lilia Schwarcz:
“(...) Assim, a autoconsciência histórica faz parte de culturas que
trazem para dentro de si tal movimento progressivo, o que faria da
nossa sociedade, uma “sociedade a favor da história”. Mas o perigo de
apostar nessa visão unitária é caricaturar a nós mesmos. Se outras
sociedades carregam “histórias no plural”, também o Ocidente não é
só (e sempre) um conjunto de sociedades que se pauta pela
cronologia.” (SCHWARCZ, 2005, p. 130)
Possuir os mesmos instrumentos e regras para contar o tempo não significa que
ele é visto da mesma maneira pelas mais diversas sociedades ocidentais. Vale aqui
ressaltar, que quando me propus a realizar uma “etnografia da história”, já na minha
graduação em Ciências Sociais, percebi a possibilidade de olhar para o que as pessoas
se referem quando contam e/ou dizem fazerem parte de uma história. Isto não significa
necessariamente que estou trabalhando no limiar entre as disciplinas históricas e
antropológicas, mas sim, mostrando que mesmo um conceito tão enraizado no
imaginário ocidental pode possuir formas diversas dependendo de como é acionado,
onde e por quem é acionado. Não pretendo neste trabalho entrar nos méritos da história
enquanto disciplina para desconstruí-la, mas demonstrar, a partir do trabalho de campo,
que a abstração denominada “história”, possui objetivos práticos ou políticos variáveis
de acordo com cada grupo. Mesmo sendo o conceito apenas um, ele pode, portanto,
possuir diversos significados. Por esse motivo podemos aqui propor uma etnografia da
história.
.
...
24
A localidade de Valença, antes da crise do ouro em Minas Gerais, era basicamente “uma
exuberante floresta” (Revista Chafariz, 1994, p.31) povoada pelos índios Coroados.
Toda a mata fora devastada, assim como os grupos indígenas foram dizimados, para dar
início ao maior empreendimento econômico da época no Brasil. A grande maioria dos
fazendeiros que ocuparam a região veio de São João Del Rey, de acordo com os relatos
dos moradores e minhas pesquisas nos arquivos. Segundo uma revista extinta de
publicação local, a Revista Chafariz, Manoel Jacinto Nogueira da Gama, ou Marquês de
Baependi, foi agraciado por D. João VI (a revista não revela a data desta doação), com
uma sesmaria totalmente fora dos padrões, contendo 10.800 alqueires, ou seja, mais de
520km²:
Para se ter uma ideia melhor deste “mundão de terra” basta dizer que a área
seria equivalente a 12 sesmarias de 1 légua em quadra e que se elas fossem
colocadas regularmente lado a lado, representariam um retângulo que
acompanharia o curso do Paraíba do Sul por 79 km e com uma largura de
6,6km (REVISTA CHAFARIZ 1994, p. 32)
Essas terras foram divididas em três grandes fazendas (Santa Mônica, a maior
delas, Sant’Anna e Santa Rosa), e o restante vendido. As fazendas de Santa Mônica e de
Sant’Anna eram administradas pelos irmãos Barão de Santa Mônica e Barão de
Juparanã, enquanto a Fazenda de Santa Rosa, mais próxima de Rio Preto, ficou para o
irmão mais velho, o Visconde de Baependi. A Fazenda de Santa Mônica foi por
diversas vezes local de pouso para o Imperador D. Pedro II, que lá se hospedava quando
precisava visitar a Província de Vassouras. O local também foi escolhido pelo Duque de
Caxias para passar seus últimos dias, já que uma de suas filhas era casada com o Barão
de Santa Mônica, vindo a falecer no dia 7 de maio de 1880. Apenas seis anos depois de
sua morte, a fazenda foi hipotecada, já que a família acumulava uma dívida de 436
contos de réis. Assim como outras fazendas, a Santa Mônica foi tomada pelo Banco do
Brasil, e em 1912 assumida pelo Ministério da Agricultura, sendo hoje administrada
pela EMBRAPA, que lá realiza pesquisas com gado de leite. No período militar foi
iniciada uma reforma, já que o exército pretendia fazer do palacete um museu em
memória ao Duque de Caxias, projeto abandonado no meio do caminho com o fim da
ditadura militar. Porém, neste período, alguns retratos da família do Barão de Juparanã
foram retirados da Igreja e nunca mais devolvidos, causando grande angústia aos
moradores, que perderam a única referência imagética do fundador da localidade. Essas
informações foram praticamente todas retiradas das revistas ou faladas pelos moradores,
25
porém mesmo as revistas consultadas não possuem poucas ou quase nenhuma referência
bibliográfica, o que leva a crer que seu conteúdo fora composto a partir das histórias
contadas pelas pessoas.
A região foi extremamente produtiva no cultivo do café, principalmente entre os
anos de 1850 e 1888. Com o fim da escravidão, a agropecuária passou a ser dominante,
ocupando a maior parte do território do Vale do Paraíba Fluminense até hoje. Ainda em
tempos áureos, faleceu o Barão de Juparanã, com apenas 46 anos, no ano de 1876. Este
permaneceu solteiro em função de uma artimanha de seu irmão, o Visconde de
Baependi, que estava encarregado de pedir a mão de uma senhorita em seu nome. Na
oportunidade de fazer tal pedido, o Visconde alegou que o Barão de Juparanã possuía
um “serralho” na fazenda e pediu que a moça desposasse seu “filho doutor” 3. Portanto,
solteiro e sem herdeiros obrigatórios, como explicita o próprio em seu testamento,
deixou algumas apólices e jóias para irmãos e sobrinhos (apólices prontamente
recusadas pelo Visconde de Baependi), além dos terrenos da igreja de Nossa Senhora do
Patrocínio para um amigo, Francisco de Deus Alves de Azevedo. A inauguração da
igreja só se daria anos após sua morte, em 1881, com “assistência de S.S. M.M.
Imperiais” 4, por coincidência, o dia glorioso para a família do Barão de Juparanã, fora
um dia trágico para o Visconde de Baependi, seu irmão e inimigo, já que um de seus
filhos gerado com uma escrava (Izabel Congo) morreu afogado no rio Paraíba do Sul.
Além deste que faleceu prematuramente, o Visconde de Baependi teve também outra
filha, Anelia Matheus da Costa, também com uma escrava, Maria da Conceição, que
viveu em Desengano até sua morte. Seus filhos provam, que mesmo que o Visconde de
Baependi recriminasse as relações que seu irmão possuía com suas escravas, ele
manteve hábito semelhante.
Como já comentei, a estação é o centro da cidade e das reivindicações dos
moradores, tendo sido construída com os recursos do Barão de Juparanã para que
facilitasse o escoamento de sua produção cafeeira, já que ali transitaria o trem de bitola
larga. Esse feito não se deu de forma harmônica, já que outros barões também estariam
interessados no trajeto da ferrovia. Ainda segundo a pesquisa feita por “Seu” Milton
Franco, e os relatos dos moradores e parentes, a estação foi construída na localidade
após um conflito entre o Barão de Vassouras e o Barão de Juparanã. Segundo Milton
3 FONTE: Testamento do Barão de Juparanã, p.06
4 Idem, p.07
26
Franco, havia um projeto determinado por decreto imperial pelo qual o trem deveria sair
da corte no Rio de Janeiro em direção a Rio das Velhas, em Minas Gerais, passando por
Rodeio (hoje Paulo de Frontin) na serra do Mar; Morro Azul; Palmas; Sacra Família;
Vassouras; Massambará; Paraíba do Sul; Entre Rios (hoje Três Rios), indo até a Serra
da Mantiqueira e finalmente chegando ao Vale do Rio Paraopeba, em Minas Gerais.5
Por sua influência e empenho, o Barão de Juparanã fez com que o trajeto fosse
modificado para que a ferrovia passasse por suas terras, fazendo surgir em volta da
estação o vilarejo chamado Desengano, que hoje leva seu nome. Segundo a narrativa
dos moradores, o nome Desengano Feliz seria por conta da frustração do Barão de
Vassouras, que demonstrando não guardar ressentimentos com o fato, comunicou que a
a parada seguinte, que se daria no município de Vassouras, receberia o nome de
Concórdia. O interessante é que a história é contada mesmo por pessoas que guardam
documentos que a refutam, como no caso do “Seu” Luis Antônio:
Aníbal Magalhães conta que o curioso nome Desengano teria vindo na
verdade de um sítio que existia no local da disputa entre os valencianos
comandados pelo Barão de Juparanã, Manuel Jacintho Nogueira da Gama,
presidente da Câmara de Valença, [que] venceram a disputa com os
Vassourenses, representados pela família Teixeira Leite. O Barão teria
vencido a disputa fazendo a linha passar pelo território de Valença tendo
doado à E.F.F Dom Pedro o terreno para a passagem da linha e a estação.
Para comemorar a vitória, deu o nome de Desengano por causa da decepção
de seus rivais. Por volta de 1920, seu nome foi alterado para Barão de
Juparanã. Anibal Magalhães levanta outra questão: Por que uma estação tão
grande, tendo inclusive uma torre com um relógio teria sido construída num
simples arraial como Desengano? A pergunta não ainda não tem uma
resposta concreta. Hoje o enorme prédio é ocupado pela prefeitura de
Valença (Acervo Luis Antônio Giffoni Ramos, S/d)
Em pesquisas que realizei nos arquivos jurídicos antigos, mantidos pelo IPHAN
de Vassouras, também encontrei um inventário das fazendas de Desengano Feliz e
Sant’Anna (Documento nº 102663652002, inventário da Fazenda Desengano Feliz), que
não seriam originalmente do Barão de Juparanã, porém de dois irmãos que ficaram
órfãos de um Coronel local, sem idade para assumir o patrimônio. Há em uma última
folha, uma intervenção do Barão de Juparanã no caso, e após isso não existem registros,
acredito que o caso fora resolvido em outra instância, porém, seria muita coincidência
que houvesse duas fazendas de nome Sant’Anna e Desengano Feliz na mesma região.
Como nosso interesse não é em contar o que é “real”, mas sim olhar para como essas
5 FRANCO, M. 2007, p.11
27
histórias são construídas, é muito mais interessante que a disputa de dois Barões dessem
nomes à vilarejos e estações como Desengano e Concordia, já que é dessa forma que a
história é contada, não há outra versão para este fato, até essa minha frustrante pesquisa,
e esse documento encontrado junto com outros emprestados por Seu Luis Antônio.
Imagem 4- Mapa da Cidade de Barão de Juparanã desenhado pelo “Seu” Milton Franco
Segundo ainda relatos contidos no testamento, que são como notas de rodapé6, o
vilarejo foi planejado para que ali crescesse um núcleo populacional, sendo o terreno
adjacente à estação dividido em lotes, onde foram construídas algumas edificações. Os
moradores dizem que o próprio Barão de Juparanã convidou alguns fidalgos da Capital
para manterem residência na localidade para veraneio (além de construir casas para suas
filhas, como já comentado. Segundo Luiz Antônio, Evarista7 recebera duas casas). O
Barão construiu ruas largas visando o progresso da região, além da Igreja de Nossa
Senhora do Patrocínio, da qual era devoto. A cidade, portanto, depende até hoje do
6 Não sei dizer em que contexto e nem os motivos, porém, o testamento do Barão de Juparanã foi
publicado e esta seria uma segunda edição. 7 Evarista não está localizada na Genealogia, apesar de ter sido citada por várias vezes durante as
entrevistas. Suponho que tenha algum parentesco, ou seja, a própria Evarestina, que está localizada e
grifada nos anexos II e III em “Filhos do Barão.
28
legado deixado pelo Barão de Juparanã, que é também o grande patriarca da maior parte
da população local, já que este teve com cinco escravas8 24 filhos, aos quais reconheceu
em seu testamento como “seus protegidos”, mais tarde reconhecendo o parentesco em
uma petição anexada ao testamento e escrita pelo próprio punho do Barão,
provavelmente visando diminuir as burocracias da lei para que seus herdeiros tivessem
acesso ao seu legado, já que nesses casos existia uma dificuldade muito grande perante
a justiça para que o trâmite fosse realizado. O Barão relacionava-se simultaneamente
com essas escravas, já que três de seus filhos nasceram em 1857, em 1859 dois, em
1860 dois, em 1861 dois, em 1863 dois, em 1872 dois e os demais nasceram um em
cada ano, até sua morte em 1876.
Além desses 24 filhos reconhecidos em testamento, ele ainda teve Deoclides,
última filha de Geralda, que nasceu após a morte do Barão e a única que não herdou
nenhuma terra da Fazenda de Sant’Anna (desmembrada e dividida entre seus filhos),
mas que cresceu na companhia de sua irmã Guilhermina, segundo relato de sua neta,
Dona Iedda (grifada em anexo V, em bisnetos do barão, localizada como filha de Orris)
Sendo e não sendo: Dificuldades metodológicas e posturas durante o campo
e a escrita
Antes de qualquer coisa, necessito esclarecer algo que estará localizado no
anexo (na genealogia que montei junto com parentes e moradores de Barão de
Juparanã). Eu também faço parte dessa família (ver meu parentesco localizado do
Anexo II), apesar de meus bisavós terem se mudado da fazenda de Sant’Anna há mais
de 70 anos. Alguns de meus tios avós, inclusive minha própria avó, segunda filha do
casal, nasceram no distrito de Desengano e chegaram a passar parte da infância por lá.
Como descrevo em minha monografia intitulada “A Parentada da Dona Anita –
Uma Etnografia da História a partir de imagens de família” (CAMARGO, 2012), escuto
algumas dessas histórias desde a minha infância. Quando chegava para o final de
semana na casa da minha bisavó, ela mesma, sentada na varanda, me narrava algumas
8 Os nomes das escravas preferidas eram Manoela Agostina (genealogia em anexo I), Floriana Paulina
(genealogia em anexo II e III, sendo o II exclusivamente para os descendentes de Arthur e Anita),
Semiana Florentina (genealogia em anexo IV), Emília Dorotheia (genealogia em anexo V) e finalmente,
Geralda, mãe de Deoclídes.
29
de suas histórias vividas nessa fazenda, histórias essas que povoavam meu imaginário
infantil. Foi nessa fazenda que conheceu e foi criada junto com Arthur Marques, seu
primo, que viria a ser seu esposo. Quando este já estava trabalhando na Central do
Brasil e fora transferido para a estação de Afonso Arinos, Anita, minha bisavó, não
aguentou de saudades e foi atrás. O casamento entre parentes era algo muito comum.
Irei narrar alguns casos mais à frente, alguns com desfechos felizes, como neste caso
que envolve Anita e Arthur, porém outros não tão bonitos, como o ocorrido com a
própria mãe de Anita, Dona Berta. Após a morte do casal Anita e Arthur, a minha
família se afastou e um a um foi morrendo os tios de minha mãe. As histórias foram
indo junto com eles, até chegar o momento em que minha memória já não era capaz de
acessar os relatos de minha bisavó, ficando tudo mais ou menos como um sonho
distante.
Meu reencontro com a família e o interesse por essas histórias se deu
coincidentemente junto com minha decisão de virar antropóloga, já que naquela época
estava trabalhando ainda como produtora de moda em assessorias de imprensa. Fui
corajosamente enfrentar meu terceiro vestibular, onde por acaso encontrei um primo,
Otto (filho da prima da minha mãe Anna Luiza). E desse encontro em 2007 até 2012,
tive tempo suficiente para resgatar memórias e construir novos conhecimentos sobre a
família, da qual me reaproximava de vez quando. Seguindo a “tradição” da família, eu e
este primo viramos o que chamávamos de “primorados ou namoridos”.
Somente meu interesse renovado pelas histórias de família não seria suficiente
para me arriscar em terreno tão instável, qual seja, o de escrever sobre algo tão próximo,
já que minhas pretensões e compromissos são fazer um trabalho antropológico. Foi
quando, tentando dar passos mais largos, em um momento decisivo onde eu teria de me
esforçar mais e abandonar meu emprego caso quisesse realmente me tornar cientista
social, entrei em contato com a professora Ana Claudia Cruz da Silva, hoje minha
orientadora, para participar de alguma pesquisa que estivesse desenvolvendo (mesmo eu
tendo acabado de ser reprovada em sua matéria, Antropologia IV). Expliquei meus
problemas de falta de tempo e coisas que não cabem aqui. Assim, fui fazer uma prova
para monitoria de Antropologia I para o curso de História, disciplina que seria
ministrada por Ana Claudia naquele semestre. Durante o curso, entrei em contato com
uma bibliografia cada vez mais interessante que envolvia história e antropologia, suas
intermediações e nós. Conheci assim autores que trabalhavam de uma forma muito
30
criativa e interessante com o tema. Foi durante a leitura de Joana Overing (1995) e de
Olívia Maria da Cunha (2004) que tive a ideia da pesquisa que apresento, já que poderia
resgatar as memórias de parentes a partir da antropologia. Assumi o risco para contar
como as histórias de família são importantes para as pessoas da minha família, desde
aqui pertinho, para minha tia que se emociona ao lembrar-se de fatos vivenciados por
sua mãe, até lá distante, onde a Elza, descendente de outra escrava (Manoela Agostina,
anexo I) se esforça para compreender o porquê de ter tanto primo assim dentro de sua
cidade, mesmo que ela tenha sido adotada e não carregar realmente o “sangue” dos
descendentes do Barão.
E foi pelo sangue que eu entrei no campo. Tudo se passa como se o sangue
possuísse uma agenda telefônica, onde se reconhece aqueles que são os seus e os que
não são, e você se apresenta pelo sangue de quem você carrega: “Sou bisneta de Arthur
e Anita”, e assim te reconhecem, e assim você vira um deles, por mais que uma
pesquisa antropológica traga certa desconfiança, “afinal, o que faz um antropólogo?”
Essa aqui, “parenta-antropóloga”, queria saber das histórias, e estas eles guardam e
estão sempre esperando a oportunidade de apresentar para algum interessado. A
primeira coisa que fazem é achar o álbum de família, mostrar as fotos daqueles que
nesse momento não te dizem nada, mas que lá na frente vão fazer todo o sentido.
Aqueles fantasmas vão ganhando vida a partir dos relatos que vão se misturando, se
refutando e te envolvendo numa trama bem emaranhada. Tão emaranhada quanto as
relações que se dão ali naquela cidadezinha.
Fui para lá, como já disse, com o foco no movimento S.O.S Barão de Juparanã.
Acreditei primeiramente, pelos relatos que acompanhei no grupo do Facebook, que as
pessoas estariam reivindicando, por um lado, uma tradição, sua “cultura” e seus
símbolos, os quais fariam delas “juparanenses”, e que estariam degradados pelo tempo e
descaso dos governantes. Algo que é o que aparece à primeira vista, mas a verdade não
foi isso o que eu vi. Em nenhum momento ouvi a palavra “minha cultura”, ou “nossa
cultura” sair da boca dos meus interlocutores. Por mais que a maioria dos moradores da
localidade seja negra ou descendente de negros, não é pela via racial que operam suas
reivindicações. A reforma da Estação, que virou o símbolo da luta do S.O.S, não tem
apenas em vista nem a preservação pela preservação em si da história do Barão, o
grande benfeitor do distrito, nem apenas a preservação para que atraiam turistas para a
região, como alguns mais progressistas acusam. O que as pessoas querem mesmo é
31
serem tratadas com respeito, que da estação seja feito algo de útil para a população,
como já foi um dia, época lembrada por muitos dos meus interlocutores, já que ali havia
em tempos não tão distantes um banco e uma agência dos Correios. Querem que se
transforme em um centro cultural, pois não há nenhuma opção de entretenimento na
localidade, fora a Praça Duque de Caxias, que recentemente ganhou um parquinho
infantil. Querem também poder dizer que se mobilizaram e conquistaram a reforma da
estação pela luta que travaram, mas sempre há um político para tomar a frente quando
as coisas já estão quase resolvidas.
Imagem 5: Foto da plataforma da Estação de Barão de Juparanã em 1922 (Acervo Luiz Francisco
Moniz Figueira)
Todos ali conhecem a história da cidade, mesmo quem não é “parente”. Todos se
orgulham de alguma forma de sua fundação, da forma como o Barão foi visionário.
Todos dizem o quanto ele era um bom homem, todos sabem quem são os primos, e de
que lado da família são, e as intrigas, os relacionamentos clandestinos. Todos se
reconhecem como parte, mas não se dizem cultura. Não querem se fechar, muito pelo
contrário. Lutam pela ideia de progresso que foi traçada pelo Barão, nos moldes claros
da “civilização”, termo tão em voga nos fins do XIX, e que não teve gás para continuar
após a decadência do café na região. Por conta disso, vou deixar de lado toda a
problematização que poderia fazer sobre a cultura, já que não tratam suas histórias como
algo cultural. Sim eles gostam da história, de contar suas histórias, contadas com tom de
32
orgulho e de segredo, pois não é algo reconhecido pela história que dizem “oficial”, mas
que passa ao seu lado, se mistura com ela em alguns momentos, quando percebemos
que estes buscam fontes e arquivos para que legitimem aquilo o que ouviram e que, por
sua vez, recontam.
Ouros Negros – Café e escravos
O rumo dessa prosa seria outro, caso o café não fosse se tornando um hábito
como nos conta Adelci Silva dos Santos:
(...)Seu horizonte terminava nas mesas das famílias nobres da corte e, em
suas terras [Vassouras], grassavam culturas muito mais destinadas à
alimentação; literalmente, seus produtos destinavam-se ao consumo regular,
muito mais do que a um hábito - tomar pequenas porções de café após as
refeições – que vai exigir de Vassouras e de outras vilas do Vale do Paraíba
um novo posicionamento no que se refere à produção. Assim, as roças de
marmelo e anil, bem como a criação de porcos para a fabricação de
embutidos, vão dar lugar a paralelas e contínuas fileiras e cafeeiros, que cada
vez mais vão reclamar à floresta, solos férteis para expandir suas raízes
(SANTOS, 2012, p.33)
A razão que fez com que os mineiros, sedentos por ouro, que já se encontrava
esgotado em sua região, viessem em direção ao sul do Estado do Rio foi o crescimento
do hábito mundial de se ingerir o café, transformando a planta no dito “ouro negro”. A
região se desenvolveu como a fúria de um furacão. Ainda segundo Santos, cidades com
ares europeus foram erguidas onde antes havia florestas, e o dito progresso pareceu ter
vindo com toda a força (a dos escravos, claro), porém os outros gêneros alimentícios
foram deixados de ser produzidos para dar lugar aos cafezais, causando dependência da
localidade de outras regiões produtoras agrícolas para suprir as necessidades mais
básicas de cereais e carnes, o que encarecia o produto final. Somando-se os desgastes da
terra que a super produção do gênero trouxe, e pelo modo como era cultivado, o
cafeicultor precisou encontrar saídas de forma urgente.
Alguns faziam aumentar a produção pela coerção e castigo, que muitas vezes
levavam à morte de escravos, e assim mantinham-se os lucros intactos. Porém existiam
aqueles que sabiam negociar, como João José Reis (1989) nos narra, e que deixavam
seus escravos manterem suas roças no tempo livre para que vendessem nas feiras, ou
para o próprio senhor o excedente. Havia também pequenas propriedades que
começavam a se favorecer naquele momento, já que não conseguiam concorrer com a
33
produção de café dos grandes barões. Assim, acabavam por escolher produzir artigos de
consumo diário, de primeira necessidade. Mesmo com o plantio feito por alguns
escravos que conseguiam conciliar o tempo de trabalho nos cafezais e em suas próprias
lavouras, e o reforço das pequenas propriedades para complementar os produtos
necessários para a manutenção da fazenda, os custos da produção aumentavam, pois
nada poderia frear o desgaste contínuo do solo. Era de conhecimento técnico que a
produção de café não poderia ser feita em fileiras, porém a preocupação maior do
senhor era a vigilância, principalmente naquela época em que a ameaça de uma fuga
coletiva ou revolta por parte dos escravos era o maior temor dos grandes produtores.
Manuel Tannay era um desses senhores. Imigrante francês, escreveu um manual
de gestão de uma fazenda, cujos fragmentos podem ser encontrados na obra de Stanley
Stein (1985). Tannay justifica a necessidade de um controle rígido, pois em sua
concepção “o escravo negro era, por natureza, o inimigo de todo trabalho regular”
(Tannay,1839 pp. 11-12 apud Stein 1985, p.167). Seguindo ainda Tannay, e tomando-o
como exemplo do tipo de pensamento predominante na época, os escravos africanos
estariam em um nível intermediário entre os macacos e os humanos, e, por isso,
deveriam ser tutelados para o resto de suas vidas, justificando assim os motivos de fazer
com que eles permanecessem em estado de servidão. Mas alguns escravos sabiam bem
como usar essas ideias presentes no paternalismo escravista a seu favor. Em nota, Stein
nos narra uma prática de resistência comum do cotidiano daquela época:
Os escravos manobravam habilmente o paternalismo do fazendeiro a fim de
escapar ou mitigar a punição por desobediências menores. Um escravo podia
evitar uma chicotada fugindo imediatamente depois de cometer um delito,
em direção ao proprietário de uma fazenda da vizinhança. Ao chegar o
escravo solicitaria ao fazendeiro “adotá-lo” (tomar padrinho). Se o
fazendeiro aceitasse, o escravo retornava ao seu amo com um bilhete ou algo
mais que o fazendeiro lhe houvesse dado. Em seguida o escravo seria
aconselhado a não repetir o delito ou saberia as consequências. (STEIN,
1985, p.169)
Apesar de serem tratados de maneira desumana, os escravos participavam de
jogos de negociações com seus senhores, na maioria das vezes de forma decisiva.
Mesmo que houvesse conflitos quando as negociações falhavam, os esforços eram na
maioria das vezes para que a negociação se desse, o que demonstra que escravos e
34
senhores mantinham um espaço para o diálogo. Segundo Regina Faria Arieira (2007),
as relações entre escravos-escravos em Vassouras no século XIX eram estáveis no
sentido de que estes conseguiam constituir famílias. A partir do cruzamento entre as
certidões de casamento, batismo e óbito entre 1823 e 1888, Arieira conseguiu
acompanhar a trajetória de famílias que nasceram e morreram dentro do regime de
escravatura. Para isso, logicamente seria necessário que as relações entre senhores-
escravos também se dessem de maneira estável. Faria percebe uma instituição muito
utilizada na política do paternalismo que é o apadrinhamento. É por esse recurso que se
dão os laços de solidariedade entre libertos e escravos, funcionando mais ou menos
como o descrito por Stein na citação acima. O compadrio era uma forma de diminuir a
violência já embutida inevitavelmente nas relações escravistas, além de ser um
facilitador para as alforrias que se tornavam mais constantes neste período.
Infelizmente, nem tudo se resolvia na conversa, e os castigos e torturas eram
uma constante nos tempos do café naquela região. Segundo Stein, os instrumentos de
tortura eram sofisticados; havia até um chicote chamado “bacalhau”, com a ponta de
arame e movido à água. Em muitos casos os escravos não resistiam, vindo a falecer,
constando nas certidões de óbito como causa da morte “apoplexia fulminante” ou
“congestão cerebral”, os “termos médicos” para morte por tortura. Para evitar tal
castigo, alguns cometiam suicídio, como foi o caso publicado no jornal O Vassourense
do dia 19/02/1889, quase um ano após a abolição da escravatura:
No dia 11 do corrente um escravo do senhor tenente José Florêncio de Melo,
que andava fugido tentou suicidar-se fazendo disparar uma espingarda sobre
o lado esquerdo do peito. Seu estado é grave e a autoridade policial tomou
conhecimento do fato. (O Vassourense, 1889, Acervo IPHAN- Vassouras)
O Jornal publicaria alguns dias depois o falecimento deste escravo??? É dentro
desse contexto, portanto, que se deram alguns casos que irei analisar adiante, no
próximo capítulo incluindo o caso do Barão de Juparanã. Entre os meses de abril e
agosto, estive me dividindo entre os arquivos em Vassouras e o trabalho de campo no
Distrito de Barão de Juparanã. No primeiro capítulo, me atentei para o movimento
político que surgiu a pouco tempo no distrito de Barão de Juparanã, visando
principalmente a reforma da estação de trem já citada. Olho ainda para a circulação de
arquivos entre os parentes e a forma como interagem com os mortos a partir de suas
práticas.
35
No segundo capítulo me debruço nos registros jurídicos guardados no arquivo do
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) de Vassouras, relatos
de parentes e ainda nos arquivos pessoais dos descendentes do Barão e de suas cinco
escravas, demonstrando que o caso do Barão de Juparanã está longe de ser uma exceção
no contexto das relações entre senhores e escravos na região. Para isso recorro aos
arquivos de outros barões que viveram solteiros e sem filhos “legítimos” e o desenrolar
de seus inventários, muitas vezes terminando de forma trágica graças a pressões sociais
e moralismos que existiam nas esferas familiares e jurídicas. Aqui também tento pensar
nas relações de parentesco que se deram a partir daí e nas novas relações entre senhores
e escravos, agora senhores mulatos, e escravos que seriam parentes ou considerados
como da família. Percebo, a partir daí, qual a importância da genealogia para essas
pessoas que ainda vivem na região, já que durante o meu trabalho de campo essa era a
principal motivação para que eu obtivesse ajuda, e a melhor maneira que tive para
acessar as histórias.
No terceiro capítulo, me aprofundo finalmente na família do Barão que ainda
reside na região, mostrando a partir das histórias contadas e dos arquivos de família, que
essas relações familiares estão longe de serem estáveis e harmônicas, já que estes 24
irmãos tiveram que dividir uma fazenda, a Fazenda de Sant’Anna. Demonstro a partir
de algo aparentemente abstrato como o sangue (aqui está frisado o aparentemente já que
demonstro que não o é de forma alguma a partir da minha etnografia) pode tomar
diferentes formas, servindo para unir, sendo justificativa para atitudes como por
exemplo o suicídio. Ou mesmo sendo o componente da separação por brigas entre
segmentos da família. Aprofundo-me, ainda, um pouco mais na performance do
narrador, algo que já iniciei na monografia (CAMARGO, 2012), e ainda, já tentando
estabelecer uma conclusão, tento demonstrar como e porque a etnografia da história se
fez necessária no caso que estudo.
36
I - Política e Parentesco em Barão de Juparanã
Nesse primeiro capítulo, busco iniciar minha “etnografia da história” olhando
para as relações políticas que estão relacionadas ao parentesco. Faço aqui o esforço de
abolir do meu vocabulário noções muito enraizadas no fazer diário da antropologia,
chegando o mais próximo do pensamento do dito “outro”, tentando entender esse
“outro” conforme o que é descrito em suas falas, percebendo as nuances de diferenças
que possuem os conceitos, seres e objetos mesmo dentro das sociedades ocidentais,
como a que estudo. O conceito principal do meu trabalho é o de “história”, não por
minha escolha, mas por aparecer constantemente nos discursos dos meus interlocutores.
Poder-me-ia dizer que foi um conceito apropriado e ressignificado, mas estaria
trabalhando no viés do pluralismo e não da multiplicidade. A história, como tomo aqui,
incorpora talvez algo do âmbito não-humano, pois perpassa por um fluido corporal, o
sangue, que dá a corporificação da família. Este também é capaz de conectar pessoas
vivas a pessoas já falecidas que não se retiram completamente da dinâmica familiar,
mantendo contatos, aparições em sonhos ou em momentos especiais, porém é pelos
objetos que entra em jogo a memória, sejam eles arquivos, fotografias ou relíquias
guardadas.
A história e o parentesco são indissociáveis para os descendentes de Barão de
Juparanã. Para compreender como isso se dá, é necessário primeiramente tomar a
história não como uma disciplina, mas como uma prática, isto é, algo que as pessoas
fazem como parte de sua concepção de mundo.
O trabalho que começou a ser realizado na monografia de conclusão do curso de
Ciências Sociais (CAMARGO, 2012) é um esforço de compreensão do sentido da
história em Barão de Juparanã, defendendo que esta pode possuir outros que não apenas
aquele visto como ocidental (voltado para o progresso, como expresso por Lévi-Strauss
(1991) em Raça e História) mesmo dentro de sociedades ocidentais. Para isso, busquei
fazer uma revisão do papel da história na antropologia focando inicialmente no conceito
de historicidade no sentido dado ao termo por Claude Lévi-Strauss (1991; 2012), e seu
desenvolvimento a partir de Marshall Sahlins (1990; 2004; 2012) e Joana Overing
(1995). Aproveito a aproximação que esta autora faz sobre “sociedades contra a
História”, de Lévi-Strauss e “sociedades contra o Estado”, de Pierre Clastres (como
Marcio Goldman (1999) chama a atenção), para estender essa comparação à crítica que
37
Deleuze e Guattari (1997) estabelecem à divisão entre sociedades a favor ou contra o
Estado, ou tudo ou nada, nos termos clastreanos (CLASTRES, 2001). Segundo esses
autores, essa oposição seria apenas de direções diferentes e não existiria de forma tão
extrema, uma decisão sem volta pela “servidão voluntária” (La Boetie apud Deleuze e
Guattari (1997)). Sendo o Estado moderno um espaço múltiplo e não linear, formas
contra e a favor do Estado podem ser encontradas convivendo lado a lado, segundo a
percepção de Deleuze e Guattari. Se estendermos esta crítica ao conceito de “sociedades
contra a história” de Lévi-Strauss, podemos enfim perceber diferentes historicidades
mesmo dentro de sociedades a favor da história.
Memórias e Histórias
Aqui pretendo trabalhar com os dados de campo aprofundando o relativismo
negando-o de antemão, onde natureza e cultura passam de um par binário de oposição
para um termo único talvez “natureza-cultura” como propõe Latour (1994), ou algo
mais radical como talvez o termo “ontologia”. Quando cientistas propõem a não
separação dos termos, começa-se a buscar uma origem para que esse esquema binário
tivesse início, já que a não aceitação das diferentes “ontologias” seria algo não apenas
ocidental, como poderia se localizar o momento de transição, ou quando se começa a ser
construída a oposição entre natureza e cultura dentro do pensamento ocidental. Viveiros
de Castro (2006), portanto, localiza essa transição no pensamento de Descartes.
A intenção, talvez um pouco ousada deste capítulo, é de fazer uma antropologia
heurística e não analítica ou representativa de algo anterior a ela (HENARE,
HOLBRAAD e WASELL, 2007). Levando em conta o que AnneMarie Mol propõe para
uma política ontológica, a política envolveria todos os âmbitos humanos e não-
humanos, inclusive o tempo e a relação entre ele e esses entes. Em meu trabalho de
campo, percebi que a história de família possuía um devir, não estava presa ao passado,
mas era parte do presente e possuía um papel central para ditar as práticas de parentes e
não parentes na localidade de Barão de Juparanã. Porém, em algumas ocasiões, eles
mesmos diferenciavam as histórias que contavam das histórias que diziam serem
“oficiais”. Esses momentos eram geralmente interrupções dentro das narrativas, já que
eu estava ali presente enquanto pesquisadora e parente. Em alguns momentos essas duas
figuras se confrontavam, deixando bem explícito que as pessoas sabiam bem o que
esperar dos “especialistas”, papel em que me coloquei de certa forma, e não queriam
38
passar por mentirosas. Às vezes, elas falavam sem o compromisso de estar diante de
uma pesquisadora. Por mais que estivessem sempre envoltos em seus documentos,
fossem eles registros de nascimento, fotografias ou testamentos, nesses momentos não
estavam preocupados como seriam classificadas pela pesquisadora. Essas histórias
eram, em sua maioria, contadas em tom amistoso, de quem conta um conto ou talvez
um mito. E era esse o mito de origem da cidade e da família de Barão de Juparanã. Na
cidade que recebeu seu nome as pessoas se distinguem de uma forma bem peculiar.
Há aqueles nascidos e criados em Juparanã, mas que não são primos, porém
sabem das histórias da região, da família do Barão de Juparanã, a origem da cidade etc.
Há aqueles que são os primos e entre eles existem aqueles que não se interessam muito
pela história, mas sabem quem são os seus parentes dentro da cidade. Há ainda os que
sabem as histórias, e são estes que acabei buscando por mais vezes, já que eram também
os mais receptivos.
As histórias sobre a origem nunca são contadas com o mesmo ponto de partida.
Umas começam com a vinda da corte para o Brasil, outras com o fim da corrida do ouro
em Minas Gerais, mas todas tomam o mesmo destino que é a fazenda Santa Mônica. As
memórias são, em sua maioria, adquiridas por relatos de parentes que ouviram de seus
parentes ou ex-escravos, porém elas são tão parte da vida dessas pessoas, que elas falam
de seus antepassados como se fossem seus contemporâneos. Essas histórias realmente
vão se misturando em suas memórias, chegando a casos de não saberem mais o que
vivenciaram e o que ouviram. Como me narrou Eloy, um dos meus interlocutores
indicados pelos moradores locais como um daqueles que mais sabiam das histórias, em
um dos nossos encontros em Barão de Juparanã.
Estava eu interessada principalmente nas histórias que as pessoas de Juparanã
vivenciaram quando viviam na fazenda de Sant’Anna. Eloy me pareceu ter frequentado
bastante Sant’Anna e possuía um parentesco longínquo com Laudilina, uma das
herdeiras, bisneta do Barão. Meu interesse naquela ocasião era principalmente sobre a
relação entre os moradores da fazenda e os escravos, se realmente estes haviam
permanecido por lá, como ouvi dizer, e se era verdade que havia uma escrava que
morreu com mais de cem anos naquelas terras. Eloy confirmou a informação e disse ter
conhecido a tal escrava, que se chamava Ambrosina. Após me narrar algumas histórias
sobre ela, ele parou por alguns momentos e logo disse que na verdade não sabia se a
39
havia conhecido mesmo ou se reproduzia a imagem de Ambrosina de tanto ter ouvido
seu pai falar dela.
Ao se debruçar sobre o trabalho de Bergson sobre o tempo, Deleuze (1999
[1966]) nos mostra como a lembrança pura adquire existência psicológica. Para isso,
este diferencia a “invocação da lembrança” da “evocação da imagem”. Segundo ele, a
invocação ainda é da ordem ontológica da memória, da lembrança ainda em estado
virtual. Disso se distingue a revivência, quando nos instalamos no nível em que as
lembranças se encontram e então estas se atualizam, se transformando em imagens-
lembranças que podem ser evocadas. A atualização dessas etapas e níveis é o que
Bergson chama de consciência psicológica. Deleuze chama a atenção para a revolução
bergsoniana, que ao invés de ir da percepção à lembrança, opera-se na direção oposta,
indo do passado ao presente.
Bergson explica sua idéia a partir da imagem de um cone de vértice S, que se
abre para as pontas, onde o vértice seria o presente, e quanto mais se afasta, se abre para
o passado. Mesmo que os níveis mais contraídos e próximos ao vértice S, na imagem do
cone referida por Bergson, eles ainda mantêm uma diferença de natureza com o
presente, Deleuze mostra que para atualizar uma lembrança não é preciso mudar o nível,
se assim fosse não seria possível a operação da memória, já que cada uma delas possui
seu próprio nível e sua individualidade, os quais seriam perdidos. O movimento de
translação é o movimento em que há a atualização da lembrança e de seu nível, havendo
sim uma contração para que se torne imagem no presente, porém isso não quer dizer que
a lembrança passe por níveis intermediários para que se efetue, mas sim passa por
planos de consciência que não devem se confundir com os níveis de passado:
(...) Donde a necessidade de distinguir a contração ontológica intensiva, em
que todos os níveis coexistem virtualmente, contraídos ou distendidos, e a
contração psicológica, translativa, pela qual cada lembrança, em seu nível
(por mais distendido que seja), deve passar para atualizar-se e tornar-se
imagem. (DELEUZE, 1999 [1966], p.51)
Há além desse movimento de translação o movimento de rotação, que
individualiza a lembrança, que durante o movimento de translação não se distingue do
nível em que se encontra. A rotação sobre si mesma tem como objetivo apresentar uma
face útil à lembrança. Na atualização do nível não se forma exatamente uma imagem,
porém é dessa imagem indistinta que as lembranças se distinguem e tornam-se imagens.
40
“A lembrança só pode ser dita atualizada quando se torna uma imagem” (p.52). É a
rotação que a prepara para entrar em circuito. São, portanto, dois movimentos de
atualização psíquica, o de contração e o de expansão. Existem mais dois movimentos, o
movimento dinâmico que seria a atitude corporal que se precisa para o funcionamento
das atualizações psíquicas e ainda o movimento mecânico, o último estágio da
atualização, a transformação do passado em útil ao presente:
O primeiro momento assegura um ponto de encontro do passado com o
presente: literalmente, o passado dirige-se ao presente para encontrar um
ponto de contato (ou de contração) com ele. O segundo momento assegura
uma transposição, uma tradução, uma expansão do passado no presente: as
imagens-lembranças restituem no presente as distinções do passado, pelo
menos as que são úteis. O terceiro momento, a atitude dinâmica do corpo,
assegura a harmonia dos dois momentos precedentes, corrigindo um pelo
outro e levando-os ao seu termo. O quarto momento, o movimento mecânico
do corpo, assegura a utilidade própria do conjunto [69] e seu rendimento no
presente. - Mas, precisamente, essa utilidade e esse rendimento seriam nulos
se não se juntasse aos quatro momentos uma condição que vale para todos.
(DELEUZE, 1999[1966], pp.55- 6)
Assim a lembrança pura é contemporânea ao presente que foi se atualizando em
uma imagem deste presente. Para que ela ganhe utilidade, deve encarnar no presente
atual, no qual ela assume uma função de passado. Sendo a natureza do presente a de não
parar de passar, Deleuze aponta, enfim, o quinto e último aspecto da atualização que é o
deslocamento, “onde o passado só se encarna em função de outro presente, que não
aquele que foi” (p.56).
Imagem 6 – Escrava Ambrosina – fotografia sem data do álbum de Ivo
41
No caso narrado por Eloy, a sua lembrança pura se apresenta como uma
atualização de uma imagem do presente que foi atualizado, por sua vez, por seu pai nos
momentos em que narrava as histórias de Ambrosina, causando certa confusão, já que
este devia repetir diversas vezes as mesmas histórias, mostrando a utilidade que elas
possuem no presente da família. E por que seriam as histórias contadas por uma ex-
escrava tão importantes para esta família de descendentes diretos de um Barão? A
resposta pode estar na narrativa de outro parente que nos mostra como se davam as
relações entre os escravos e os senhores mestiços, filhos do Barão de Juparanã, que
dividiam a fazenda de Sant’Anna. Em uma dessas pequenas fazendas, a Fazenda de
Bom Retiro, vivia Rozina. Em um almoço que organizei na casa de Adaury, o último
filho vivo de Anita e Arthur, Mazinho9, o primeiro narrador indicado pela minha família
nuclear como um desses que conhecem mais profundamente as histórias da família, foi
chamado por mim até a sala para conversarmos sobre as histórias, pois naquela época
(2011) já havia definido que este seria o tema do meu trabalho de campo. Como narrado
em minha monografia de conclusão do curso de Ciências Sociais pela Universidade
Federal Fluminense (CAMARGO, 2012), os outros parentes presentes não chegaram até
a sala onde estávamos eu e Mazinho, já que não queriam atrapalhar minha pesquisa.
Esta foi a minha única entrevista gravada até março de 2015, pois percebi que muitas
coisas deixavam de ser faladas ou eram contadas de forma muito peculiar, já que o
diálogo se travava a princípio com a câmera. Outro motivo seria que gravando as
entrevistas eu deixaria fechada a porta que me fazia ter um contato privilegiado com
essas histórias, que era o fato de eu ser reconhecida como uma parenta. Nesse dia,
portanto, aos poucos os outros parentes foram chegando à sala e a conversa ficou mais
leve e dinâmica, pois eu não sabia muita coisa que contribuísse para a narrativa de
Mazinho. Este, depois de percorrer os caminhos em sua narrativa do ponto que concebe
como a origem da família até os dias de hoje, enquanto aguardava a genealogia da
família que estava sendo impressa, chama a atenção para a forma como os escravos
eram tratados na fazenda da avó de Anita, aqui chamada por ele de “Vó Rozina”. Em
uma determinada ocasião em que Anita ainda era criança, a “escrava” Isabel foi
convocada por sua senhora para decidir se gostaria ou não de ir até a Fazenda ao lado, a
Fazenda do Mato Dentro, já que a dona desta estava necessitando de uma negra para
9 Mazinho é também um dos meus interlocutores mais importantes e de parentesco mais próximo. Ver
parentesco no anexo II, em trinetos do Barão
42
lavar roupa. Em resposta, Isabel deu uma banana para a dona da Fazenda do Mato
Dentro, dizendo que a “sinhá” Rozina não maltratava seus escravos, já a outra tinha esta
fama na região. Mazinho também se refere à lembrança que tinha de Ambrosina:
Mazinho: E morreu uma que eu conheci que foi escrava que as meninas da
tia Candoca conhecem e sabem o nome dela... Ela andava na estrada, no dia
em que ela me viu ela falou assim: “Esse daí é de Cati com Antônio... Você
é filho de Arthur?” “Não, eu sou neto.”
Eu: A Dani também conheceu uma escrava.
Mazinho: É essa que eu tô te falando!
Eu: Ela contava várias histórias também...
Mazinho: Ela tinha um colchão cheio de dinheiro desde o primeiro império.
Aí eu não sei, a gente não sabe o que foi feito daquilo quando ela morreu...
Porque tia Candoca dava comida, tia Laudilina dava comida, tio Ivo dava
comida. Tia Mônica e o pessoal da tia Mônica que é “Serapião Ferreira”
dava comida. Porque ela andava por todas as fazendas. Ela só andava em
terras de quem indiretamente ou inconscientemente ela sabia que era
parente. Eu não lembro o nome dela, mas ela tinha um cabelinho...
Tada: Mas ela tinha algum problema psicológico?
Mazinho: Ela? Lúcida, inteira! Se tivesse alguém doente ela chegava e fazia
as coisas pra você, mas ela tinha a casa dela. Ela conhecia o gado de
Candoca, conhecia o gado de Laudilina, conhecia o gado de não sei quem. E
a gente chamava de tia e tinha de tomar bênção. Tia Candoca tomava bênção
dela. Dani conheceu também.
Mazinho, diferente de Eloy, já se lembra de ter conhecido a Ambrosina. Ela era
uma grande contadora das histórias sobre a Fazenda de Santa Mônica, segundo Dani,
minha tia, também já falecida. Muitas das histórias sobre os bastidores do casarão foram
narradas por ela que, provavelmente, possuía um prestígio grande ainda dentro do
regime escravocrata e depois entre os filhos do Barão, já que tinha a liberdade de
transitar por entre as fazendas e possuía “um colchão cheio de dinheiro desde o primeiro
império”.
Voltando à utilidade dessas histórias para os dias de hoje: por que são
atualizadas e possuem serventia para estas pessoas? Percebo que todos os meus amigos-
parentes-interlocutores conhecem a história majoritária, “oficial” e de Estado. Essas
pessoas estão dando um “grito”, para utilizar uma expressão de Deleuze (2011), dizendo
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“aqui as coisas aconteceram de forma diferente”: aqui nestas terras foram os mulatos
que administraram suas posses com a ajuda de seus ex-escravos e parentes que ficaram
para auxiliar. Segundo Dani, Anita dizia que quando a abolição aconteceu, os escravos
não quiseram ir embora, já que ganhavam sempre presentes no natal, comiam na mesa
com seus senhores e eram tratados como parentes. Isolados em suas terras depois da
crise do café, não havia braço do Estado que chegasse para tomar o controle e, até
mesmo na cidade de Barão de Juparanã, que fora criada por seu patriarca para receber
todo o progresso que sonhava com a estação de trem da Ferrovia Pedro II, a cada dia
esse progresso se afastava um pouco. Com o capital migrando para outras regiões, o que
restou para estes pequenos agricultores e criadores de gado foi o labor da terra e suas
memórias. E o que mais marcou os moradores da cidade foi a capacidade visionária de
seu fundador, projetada com ruas largas prevendo um futuro onde aquele espaço seria
tomado por carros; hoje, por uma ironia do destino, em seus dias de maior movimento,
são os cavalos que povoam Juparanã em procissão pelo dia de São Jorge, o evento que
ainda faz com que o local não seja completamente esquecido nas redondezas.
Atualmente, ao contrário do passado, a maior presença do Estado é reivindicada,
assim como a atenção para as necessidades básicas de um cidadão, como fornecimento
de luz adequado, assistência médica e a instalação de antenas de celulares e internet.
Porém, foi justamente a preservação da memória que inspirou os moradores da cidade,
pois, eles assistiam, sem nada poder fazer, a degradação da estação de trem, esta que já
foi considerada a mais bela da ferrovia Pedro II. A igreja também estava passando por
um processo de abandono, porém os moradores, junto com o padre da localidade, se
reuniram e venderam rifas até conseguirem verba para a sua reforma.
Caso o progresso do século XX acontecesse ali, da forma como foi previsto pelo
Barão de Juparanã, será que suas histórias de família estariam hoje bem mais diluídas, o
peso de seu “sangue” não faria tanto sentido? Se toda essa memória tivesse de dividir
espaço com as preocupações dos grandes centros urbanos, estariam elas fora do circuito
do interesse deles próprios? Não acredito que as memórias e histórias são centrais
apenas por estarem à margem do “desenvolvimento”, porém elas são hoje as armas
centrais de suas lutas. Como Cholango, presidente do Ecuaruari, um movimento político
indígena do Equador, disse em carta ao Papa Bento VXI em 2007: “Nossas chamadas
“crenças” e “símbolos” não desapareceram em 500 anos” (CADENA, 2010, p.335). Por
esse motivo, penso o caso de Juparanã como um movimento de resistência minoritária
44
que utiliza de sua memória para chamar a atenção do governo para o que consideram de
importância em suas vidas. Talvez esse movimento minoritário não seja tão visível num
primeiro momento, já que estamos falando de um distrito dentro de uma cidade. Pessoas
que pagam seus impostos, contas de luz, telefone fixo, alguns conseguem até internet.
Dar voz aos problemas dos moradores é uma das funções do S.O.S Barão de Juparanã,
um movimento criado principalmente visando à reforma da estação de trem,
monumento símbolo dos tempos áureos do café, mas que foi perdendo sua função e
brilho até ser completamente abandonada com o desuso do ramal de passageiros da
Ferrovia D. Pedro II. O Estado que lucrava com a fertilidade de suas terras e com os
impostos que cobravam na produção do café não via mais serventia para dar tanta
assistência ao local. Estiveram eles calados, cochichando entre si sobre suas histórias e
seu passado, porém construíram de forma autônoma seu problema e decidiram o que
necessitavam para que esse problema fosse minimamente resolvido. Para compreender,
recorro à noção de dobra desenvolvida por Deleuze, segundo o entendimento de
Henrique Antoun:
Construir um problema é dar as condições de sua expressão, fazer
com que ele fale o que antes jazia calado. Fazer um problema falar é
produzir um acorde para além do terror e da suficiência do acordo,
deixando soar uma dissonância fora da consonância do consenso. A
política do acorde é a inclusão de uma atividade gerando um espaço
livre num território esquecido pela disputa reativa por dominação.
Pois o que faz do nosso mundo o melhor dos mundos, segundo
Deleuze, é que nele a força é capaz de dobrar-se, o novo é capaz de
incluir-se e a harmonia se faz, também, pela dissonância do acorde.
(ANTOUN, 2009, p.4)
O problema construído pelo movimento S.O.S Barão de Juparanã foi em parte
resolvido. Os participantes do movimento tinham seus mecanismos para fazer seus
barulhos (como apareceram na TV em 2012: com a pauta sobre a Cidade dos Primos, já
citada, recorreram ao veículo de comunicação e conseguiram uma nova matéria falando
sobre o abandono da estação). As obras das Estações estavam se iniciando dois meses
antes das eleições para o governo do Estado do Rio de Janeiro, e obviamente, Luiz
Fernando Pezão, candidato em 2014 e atual governador, que possui bastante influência
na região, aproveitou a ocasião para sua autopromoção.
45
As preocupações nessa ocasião eram se as obras iriam continuar em 2015, ano
de vácuo entre as eleições estaduais e municipais. Os membros do movimento não estão
satisfeitos com a resolução do problema e possuem outras pautas em suas
reivindicações, ligadas à saúde, ao abastecimento das necessidades básicas e à
educação. O S.O.S não parou após o início da reforma da estação. Seus militantes não
estão conformados; exercem uma política de “acorde”, e não do consenso ou do acordo.
Pelo pouco que estive presente, é um movimento que possui uma grande participação se
comparado a outros movimentos (mesmo que, para eles, ainda falte a participação da
população), e não possuem uma liderança específica, ou porta-vozes. As pautas são
construídas de forma coletiva e o movimento é autogestionado, encontrando, assim,
espaços para a multiplicidade dentro da política do Um, centralizadora, onde as
diferenças são subjugadas ao poder do Estado e do indivíduo, como é próprio da
maioria desses movimentos. Porém, essa seria apenas a ponta do iceberg: é a partir do
problema que os Juparanenses se tornam visíveis ao Estado, uma forma de contato e
conflito. A memória e a história são o pano de fundo para legitimar essas
reivindicações, possuindo alicerces na relação que possuem com o tempo, a qual
percebo a partir da forma como interagem com objetos e com seres não-humanos.
Imagem 7 – Vereador Naldo e Governador Pezão aproveitam a ocasião da reforma da Estação para
realizar campanha eleitoral, visto que as eleições de 2014 estavam próximas
46
O tempo – dos documentos à interação com mortos
Quando fui para Juparanã, havia acabado de escrever o projeto de pesquisa que
resultaria nesta dissertação. Ainda estava extremamente ativa - talvez hiperativa – e o
tempo realmente era algo que senti pesar. O tempo passava sim, de forma mais lenta e
para “passar o tempo” eu tinha que arrumar o que fazer: eu trabalhava, lia, ajudava na
casa de Dona Celeste. Dormia às 20h, 21h, e acordava umas seis para caminhar, ia até a
Fazenda de Santa Mônica, tirava umas fotografias e retornava pelo mesmo caminho que
havia ido. Precisava dessa rotina, já que meu celular não pegava na cidade, e mesmo
que a casa de Dona Celeste fosse privilegiada pelo acesso à internet, ela passava a maior
parte do tempo desligada, pois o fornecimento de luz na cidade era instável, dando picos
que poderiam queimar o aparelho. Descobri-me uma ‘urbanoide’, algo que não
esperava.
Imagem 8 – Casarão da Fazenda de Santa Mônica, hoje Palácio Duque de Caxias - visão frontal
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Imagem 9 – Casarão da Fazenda de Santa Mônica, hoje Palácio Duque de Caxias – Visão Lateral
O que aconteceu comigo nesse momento foi uma transição para um novo ritmo,
ao qual estava desacostumada, um ritmo muito mais tranquilo do que aquele que vivi
durante o primeiro ano do mestrado. Fui me adaptando de forma lenta, ou talvez nunca
tenha me adaptado completamente, já que não abandonei minhas rotinas de caminhada e
exercícios antes de qualquer entrevista ou pesquisa em arquivo. Pelo contrário, fui
abandonando naturalmente hábitos como o cigarro e a cerveja e passei a dormir e
acordar cada vez mais cedo.
Os moradores que permaneciam na cidade e não iam trabalhar nas redondezas se
ocupavam de tarefas rotineiras. Celeste, por exemplo, faz artesanato, crochê, ponto cruz,
tricô... Também faz depilação na casa de suas clientes, para tirar um dinheirinho. Seu
marido, Seu Luis Otávio, é transplantado. Recebeu o rim de um doador, e toma
remédios para aumentar a imunidade, sendo aposentado por invalidez. Enquanto estive
por lá ambos passavam o dia na frente da TV, ou Celeste estava atendendo uma cliente,
ou Luis Otávio estava buscando água na bica. Ambos pegaram um pouco o meu hábito
e passaram a caminhar nos finais de semana.
Dona Anna Leite, por sua vez, era muito ativa na Diocese local. Sempre estava
ocupada com algo relacionado à Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio e foi uma das
pessoas mais receptivas que lá conheci. Conhecia muitas histórias de Sant’Anna, já que
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viveu boa parte de sua vida por lá. Zé Célio Monteiro era o corretor de imóveis da
região, porém trabalhava em casa. Recebia os aluguéis em sua confortável varanda, não
gostava de falar sobre as histórias, mas era uma figura de uma prosa boa e divertida,
sempre tinha uma boa conversa para jogar fora com aqueles que cruzavam o seu
caminho. Tinha motivos para não se interessar pelas histórias de família, já que seus
parentes Monteiro se envolveram em uma disputa por terras com a família dos Leite, de
Anna Leite.
Seu Luiz Antônio também era envolvido com a Diocese, seu pai falecido foi
quem escreveu o folheto comemorativo do centenário da Igreja de Nossa Senhora do
Patrocínio em 1981 contando com a ajuda de vários membros da comunidade
eclesiástica que também eram aparentados do Barão. Talvez esse seja o registro mais
importante da localidade, no qual conseguiram reunir seus documentos e memórias para
que fossem contadas um pouco das histórias da Igreja e de seu “benfeitor”, o próprio
Barão de Juparanã. Luíz Antônio vive com a mãe, Dona Iedda Giffoni, neta de
Deoclídes, última filha do Barão. Dona Iedda está com noventa e um anos e sua
memória recente anda um pouco comprometida, porém ainda se lembra de seus tempos
de menina, quando visitava a avó que fora criada junto com a irmã mais velha,
Guilhermina, já que teria sido a única a não receber parte do desmembramento da
fazenda, provavelmente por ter nascido depois da morte do Barão de Juparanã. Na
minha última visita, infelizmente mãe e filho se encontravam bastante enfermos, o que
me deixou profundamente triste.
Imagem 10 – Livreto comemorativo do centenário da Igreja N.S. do Patrocínio de 1981
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Nos encontros que tive com mãe e filho, percebi que ambos mantinham de
forma bastante consciente suas memórias antigas. Luiz Antônio se apropriava da
memória de sua mãe, mas a mesma sabia bem de suas histórias de juventude, e gostava
de contá-las (às vezes se incomodava um pouco com as interrupções de seu filho e dizia
de forma educada “Fui eu quem viveu, deixe-me contar”). E contava como corria pelos
cafezais, e levava bronca da mãe e da avó. Lembrava de conversas que tivera com ex-
escravas, e quando se lembrava da vida em Sant’Anna, fechava os olhos com gosto, que
dava até para sentir o sabor da época de sua infância. E dizia das festas de Sant’Anna,
onde a parentada toda se reunia em volta da igreja para dançar e comemorar o dia da
Santa. Vinham até os parentes que tinham se mudado para o Rio de Janeiro. Era um
grande evento, todo promovido pelos descendentes do Barão de Juparanã. A data não
foi esquecida não só por Dona Iedda, mas também por Dona Ana Leite, Candoca e por
Ivo, filho de Laudilina, único da família que ainda possui suas terras em Sant’Anna
(Laudilina é irmã de Anita, e está localizada em anexo II e III, em bisnetos do Barão).
Imagem 11 – ruinas da igreja de Sant’Anna apenas a fachada continua de pé.
50
Imagem 12 – Laudy, irmã de Ivo e a Santa na Igreja de Sant’Anna
Fiquei hospedada dois dias em companhia de Ivo e sua esposa, Sandra. Ambos
são excepcionalmente receptivos e divertidos, sem pudores para conversar sobre
assuntos que são meio que vetados para a maior parte da família, como as relações
incestuosas e os detalhes do conflito entre os Leite e os Monteiro, os primos que se
mataram em brigas de cerca em meados do século XX. Ivo me recebeu com um almoço
e já tinha separado alguns documentos e registros fotográficos (como o que se encontra
acima) para me auxiliar na pesquisa, tudo no mais delicioso clima de outono, com uma
cervejinha gelada e uma comidinha toda feita à base das hortaliças e leguminosas que
cultiva em seu território. A casa em que ele me recebeu havia passado por uma reforma
há pouco tempo. A casa antiga, de sua mãe, na realidade ficava no alto do morro. Ele
me contou que construiu esta casa para receber a família, mas ninguém se interessava
mais em ir para lá, mesmo tendo um clima delicioso, bem calmo e bucólico, e uma
piscina para agradar as crianças. O que fez com que os parentes se afastassem da
51
fazenda foi o acidente ocorrido com Juvenal, seu irmão, que morreu com boa parte de
sua família enquanto atravessava o Rio Paraíba do Sul para chegar ao lado onde fica a
Fazenda de Sant’Anna, vindo de Demétrio Ribeiro. O rio é traiçoeiro e cheio de pedras
(a região próxima é denominada Bacia de Pedra) e a única que se salvou foi a filha
menor, que o pai conseguiu arremessar para perto da margem. A comunidade ajudou a
resgatar os corpos e presenciei Ivo dando um dinheirinho para uma pessoa que havia
localizado o corpo do irmão. Segundo uma pesquisa rápida em um dicionário didático
online de Tupi10
, Paraíba significa rio ruim, ou rio que não presta para a navegação. A
morte da família de Juvenal gerou uma comoção na família e um temor de que a canoa
que servira para atravessar virasse novamente. Pude constatar que realmente a canoa
não é totalmente segura, já que balança bastante até que todos estejam alojados dentro
dela. Antes a travessia era feita a remo. Quando estive lá, a canoa já possuía um motor,
o que dava uma segurança maior. O rio não é muito extenso em largura e estava
bastante baixo para a época, segundo o próprio Ivo. Pude ver muitas pedras, que deviam
ficar invisíveis em épocas de cheia, portanto o conhecimento prévio de cada uma delas
era importante para navegar de uma margem à outra.
Neste primeiro dia, Ivo me contou as histórias de sua família. Berta, sua avó
materna, foi casada com seu sobrinho Mário Mafra sem que soubesse disso. Ivo não
sabe explicar nem de que parte da família Mário era sobrinho de Berta nem como esta
se casou sem esse conhecimento, porém, quando descobriu o feito, já com cinco filhos
desta relação, foi para o alto daquele morro que estava ali na minha frente e ateou fogo
em seu corpo. Sua morte não ocorrera no momento, ficando com boa parte do corpo
queimada por alguns dias. Laudilina, mãe de Ivo, que era um bebê ainda na ocasião,
necessitava do leite da mãe e mamava nesta, mesmo agonizante. Berta não resistiu por
muitos dias e veio a falecer por conta dos ferimentos. Ao olhar para aquela geografia
que circundava a casa de Ivo - o rio, a água que levou o seu irmão e o morro onde o
fogo lambeu sua avó até esta vir a falecer -, podia sentir cada vez mais a força e a dor
das lembranças que aquelas visões podiam trazer, mas Ivo se relacionava com o rio e
com o morro sem temer.
52
Imagem 13: Trecho das terras de Ivo: Rio Paraíba, sua casa (centro) e Morro.
Ivo me mostrou uma árvore genealógica bem parecida com a que foi feita por
Adaury e Cidinha (segundo o relato de Mazinho), feita pela mãe de Anna Leite. Em
uma ocasião, Anna Leite disse que queria me mostrar, mas estava emprestada com Ivo,
que nunca devolvia. Por esse motivo dizia que não gostava de emprestar seus
documentos. Percebi, assim, que os documentos circulam entre os parentes interessados
nos assuntos de família. Luiz Antônio também reclamou que uma parenta de Valença,
Glorinha Nogueira, que estava escrevendo um livro sobre a família, levou alguns
documentos e nunca mais apareceu. Queria que ele fizesse o intermédio para eu falar
com ela, mas este disse que não queria ligar para não parecer que estava cobrando.
Disse que se eu conseguisse falar com ela, que eu tentasse saber alguma coisa desses
documentos e do livro, ou seja, era melhor uma estranha cobrar do que ele. Segundo
Candoca, o livro da Glorinha Nogueira já havia sido publicado pela última notícia que
havia tido. Tentei entrar em contato com ela a partir do telefone de casa e do celular,
porém nunca consegui. Candoca disse que seu irmão Vantuiu era amigo dela, que eu
tentasse por esse intermédio, porém nem mesmo Vantuiu conheci, já que mora fora da
região e não regressa constantemente. Tem outro caso, que é o da Dona Esther que não
quis nem conversar comigo, pois o último “primo” que apareceu levou todos os
documentos dela, e ela diz não saber como recuperar.
53
Os documentos são de grande importância para os descendentes de Barão de
Juparanã: Candoca mantém o álbum de fotografias que pertencia à sua mãe com
bastante zelo. Anna Leite possui uma pastinha onde guarda seus documentos dentro de
saquinhos plásticos; Eloy mantém quase que intactas revistas antigas publicadas em
Valença que contam um pouco da história da fazenda de Santa Mônica e das pessoas
que lá viveram. Ivo guarda ainda as fotografias da época de Sant’Anna. Elza escreveu
do próprio punho as histórias que sabia sobre o Barão de Juparanã para guardar também
dentro de uma pastinha. Os documentos são retirados dos armários onde são
cuidadosamente guardados para ganharem vida ilustrando os acontecimentos que
vivenciaram os antepassados de meus interlocutores. Muitos destes estão aqui comigo,
mesmo eu me oferecendo para copiar e devolver na hora, várias pessoas fizeram questão
de deixar comigo, pois confiaram que eu iria voltar. Os arquivos, portanto, por mais que
possuam um dono, circulam entre todos, são eles a materialidade de um acontecimento
ocorrido em determinado tempo e adquirem função prática fora dos armários, em
circulação.
Cardoso Jr (2005), em sua interpretação sobre a noção de acontecimento de
Deleuze, demonstra dois aspectos importantes: a ligação entre o acontecimento e a
temporalidade, e a “estrutura dupla do acontecimento”. Segundo Deleuze, existem dois
tipos de tempo: o tempo de Cronos, o tempo dos deuses, do eterno presente; e o tempo
do ator, o tempo de Aion, onde o presente se espalha e se torna passado-futuro,
esvaziando-o.
Sendo assim há um duplo no acontecimento, ou seja, parte dele se efetua no
presente, onde encarna em um estado de coisas, enquanto a outra parte nunca pode se
efetuar, por não haver presente que não seja impessoal, este mesmo que ainda se
desdobra em ainda-passado e já-futuro. Isso é a estrutura dupla que Deleuze nomeia de
efetuação e contra efetuação do acontecimento. O acontecimento não é individual nem
coletivo, por ser impessoal. É o que Deleuze chama de “quarta pessoa do
acontecimento” (CARDOSO JR., 2005, p.155), tudo seria singular: nem geral, nem
particular.
A partir dessa reflexão, tomando os documentos guardados pelos parentes como
a materialidade de um acontecimento, podemos pensar nestes também como singulares,
o que explicaria esse duplo entre o apego e o desapego. Eles necessitam que os
documentos sejam vistos e trocados, por serem impessoais, porém essas pessoas atuam
54
como guardiãs de suas histórias e documentos, por isso é necessário que os documentos
voltem ao local de origem para serem guardados novamente e revisitados, emprestados
quando necessário.
Outro fator determinante para compreender a construção do tempo, além da
relação dos descendentes e moradores de Juparanã com seus arquivos e objetos, é a
interação que estes possuem com os parentes mortos, dando-se por meio de sonhos
premonitórios e aparições. Para ilustrar esse caso, utilizo os relatos de Mazinho e Tânia
Lúcia (esta última, ver parentesco em anexo II, em trinetos do Barão) sobre dois casos
que ocorreram com a mesma pessoa: Anny, minha avó. Mazinho me contou que minha
avó havia parido a minha tia Tânia Lúcia, sozinha, com o auxilio de vó Rozina. Tânia
nasceu na madrugada do dia 25 de dezembro. Segundo Mazinho, os outros parentes
tinham ido para a Missa do Galo, deixando Anny para trás, porém ela teve uma visão de
uma senhora de preto, que reconhecera como sua avó. Esta conduziu o parto e
tranquilizou a neta neste momento. Tânia me contou que a mãe sempre recebia auxílio
desta senhora de preto em momentos de dificuldades.
Anny também sabia, a partir de sonhos, quando alguma coisa muito ruim ia
acontecer, geralmente fatos relacionados a doença e morte de pessoas próximas. Tânia
disse que isso acontecia quando esta sonhava com um parente que conviveu durante a
infância. Tânia, que era um pouco cética em relação aos sonhos da mãe, pedia para esta
revelar quando sonhasse para tentar fazer com que a mãe visse que não havia relação
entre os sonhos e os fatos, algo que na verdade Tânia nunca chegou a fazer.
Anna Luiza, filha de Adaury (ver Anexo II, em trinetos do Barão para localizar
parentesco), também se lembra de um sonho, o qual narrou pelo Facebook da seguinte
forma:
Sabe Lê, esse sonho nunca me esqueci, tenho vivo na lembrança depois de
muitos anos, após o falecimento do tio Edu. Sonhei que estava caminhando
em uma ladeira, com o tio Edu caminhando na frente, calado, só fazia sinais
pra eu continuar a segui-lo. O interessante (esquisito) é que ele virava uma
fumaça cinza e logo em seguida se “materializava” de novo. Ele me
conduziu para uma casa que estava tendo uma festa. Era festa da parentada,
pois tinham vários dos nossos, vivos e falecidos, e pessoas estranhas
também. Abracei vó Nita, tia Cici, tio Turrico e o Cacá (só me lembro
desses). Sei que havia outros. Perguntei ansiosa pela tia Naná. Vó Nita me
indicou com a cabeça a lateral da casa, quando olho, vejo tia Naná aparecer
rindo, radiante, linda, num vestido todo estampadinho de flores miúdas (já
estou chorando). Fiquei tão contente de vê-la que acabei acordando, e já sabe
como: chorando de emoção! Eu tinha uma ligação muito intensa com tia
Naná! Como uma mãe!
55
Ouvi muitas vezes essas histórias que aconteciam em encontros de família, onde
estavam presentes os mortos e os vivos interagindo normalmente. No sonho de Anna
Luiza, ela está apreensiva para encontrar aquela que já havia falecido, mas que
considerava como uma mãe, ou seja, a ligação ainda era muito forte. Os sonhos são,
portanto, um plano onde os elos entre entes vivos e mortos são relembrados e
fortalecidos.
Existiam também as assombrações, aparições de fantasmas que na verdade não
estavam ali para avisar de algo, ou auxiliar em momentos difíceis, mas só para assustar
mesmo. Durante a minha visita à Sant’anna, Ivo me mostrou uma árvore onde havia
uma assombração, narrando-me de forma muito rápida uma ocasião em que ele e alguns
primos passaram por ali e a viram. Não quis entrar em detalhes, mas deixou bem claro:
depois que todos os parentes foram pouco a pouco indo embora, até mesmo a
assombração deixou o local.
A religião é outra forma de se relacionar com os parentes já falecidos, mantendo
os costumes e crenças, ou pedindo a bênção para os mais velhos, mesmo que estes
estejam mortos há muito tempo. Um desses costumes é a reza do Angelus, uma forma
de se rezar “ave-marias” em série, o que ocorre em encontros de família às seis horas.
Esse costume de rezar às seis, como foi narrado por Luiz Antônio, remonta desde o
Marquês de Baependi, que rezava junto com seus parentes e escravos na varanda do
casarão. A religião católica, mesmo que os seus dogmas não sejam levados de forma
estrita, é um meio de ligação que permanece forte entre os vivos e os mortos.
56
II - Senhores e Escravos – Os limites entre a hierarquia e o
parentesco
Este segundo capítulo é mais descritivo. Nele, penso os arquivos e as produções
textuais locais à luz dos relatos de meus interlocutores, apropriando-me deles para ver
nos detalhes das narrativas uma sabedoria/poder que distingue uns de outros, ou seja,
aqueles que sabem e os que não sabem contar as histórias. A partir desses dados,
gostaria de poder olhar por trás da fechadura deste grande portal construído ao longo do
século XX, que silenciou a complexidade das relações entre senhores e escravos. A
simplificação da divisão entre os oprimidos e opressores retira qualquer tipo de agência
que poderia existir por parte do escravo, calando sua luta.
Um dos primeiros estudiosos a chegar ao local com interesses no início e fim do
ciclo do café, pensando em olhar para as relações entre a terra, os senhores e os
escravos, foi o americano Stanley Stein (1985), para a redação de sua tese de
doutoramento pela Universidade de Harvard. Este compôs um trabalho memorável
sobre a região, contando com dados, fotografias, entrevistas de descendentes de
senhores e escravos, gravações de pontos de candomblé e de jongos, apesar de seu
interesse estar em uma visão mais ampla das mudanças econômicas do Brasil e as
transformações que trouxeram para a região. Stein fez um verdadeiro trabalho de campo
entre os anos de 1948 e 1949. O livro que se originou deste trabalho, apesar de seus auto
explicáveis compromissos com a verdade, dadas as pretensões científicas que reinavam
nos corredores das escolas de ciências humanas naquela época, ainda pode ser útil para
observar algumas das maneiras como foram sendo construídas as relações entre
senhores e escravos, que são meu foco de interesse aqui.
57
Imagem 14 – Seleção de gãos de café -- Fazenda Cachoeira Grande, Santa Tereza. Vassouras, RJ.
Entre 1948 e 1949 (AEL, Coleção Stanley Stein, foto 179)
Segundo Stein, a sociabilidade infanto-juvenil não fazia muita distinção entre os
senhorezinhos e os jovens escravos, já que ambos não representavam utilidade para os
lucros da fazenda. Mesmo que de forma embrionária, essa distinção obviamente existia,
sendo radicalizada conforme ambos começavam gradativamente a cumprir as funções
que lhes cabiam dentro da estrutura de uma fazenda cafeicultora. O jovem senhor
aprende a controlar, e o escravo a obedecer, em complexos jogos de poder paternalistas
que podemos reconhecer mesmo hoje em dia.
Quando estive na fazenda de Sant’Anna, na parte que restou à família de
Laudilina, Ivo, seu filho, narrou um interessante caso que pode nos demonstrar como
que esses jogos de poder ainda são operados. Ivo e sua esposa Sandra, estavam se
queixando, pois não encontravam mais com facilidade pessoas que quisessem trabalhar
na roça. Do outro lado do rio de onde fica a fazenda de Ivo, existe um pequeno vilarejo
chamado Bacia de Pedra, onde este e sua esposa passam parte da semana. Havia um
bêbado que acabava sempre arrumando alguma confusão no bar deste vilarejo. Em um
lugar pequeno como aquele, uma pessoa que arruma confusão pode um dia não ter sorte
e acabar morto. Vendo aquela situação, Ivo convidou este homem para cuidar de seu
sítio, dando moradia, alimentação e umas cervejas no final de semana. Durante o tempo
que este permaneceu por lá, a relação entre os dois foi se intensificando, e obviamente
alguns conflitos começaram a aparecer. Em uma dessas vezes, Ivo proferiu o famoso
“mas você sabe que eu te amo”, que prontamente foi respondido com “ama nada, você
58
só gosta do meu trabalho”. Ivo esperou a situação contrária acontecer. Um dia foi este
homem quem disse “você sabe que eu te amo”. Ivo respondeu: “ama nada, você só quer
saber do meu dinheiro”. Depois de algum tempo, este homem arrumou uma confusão
com Sandra, e Ivo o levou de volta para o outro lado do rio, onde este permaneceu
pedindo desculpas por certo tempo, porém, mesmo perdoado não voltou a trabalhar em
Sant’Anna. Aqui podemos ver sentimentos como o amor e respeito sendo acessados
para descrever relações de trabalho.
Dona Iedda Giffoni também conheceu tia Branca e tia Landa, duas ex-escravas
que continuavam vivendo na fazenda de Guilhermina, onde sua avó Deoclides vivia, até
a sua época de infante. Elas contavam histórias de quando eram escravas e uma dessas
histórias é narrada por Luiz Antônio que nos mostra um pouco sobre como as relações
entre senhor e escravos eram travadas ainda na fazenda de Santa Mônica. Segundo a tia
Branca, que era escrava de lavoura, numa determinada ocasião em que fazia a colheita
do café, estava em estagio avançado de gravidez quando sofreu um acidente caindo ao
chão e perdendo seu filho, algo que segundo ela muitas mulheres simulavam para que o
filho não nascesse escravo (uma das estratégias praticadas pelas mulheres contra a
condição de escravatura). Mas, segundo Luiz Antonio, tia Branca afirmava que esse
não era o caso. De qualquer forma, o capataz iria levá-la para o tronco, esta implorava
por perdão quando passava por lá à cavalo o Barão de Juparanã, que prometeu à tia
Branca que isso não aconteceria a ela, e se alguém a ameaçasse, este alguém é quem iria
para o tronco. Essa história foi contada para enfatizar a bondade do Barão, algo que já
havia sido falado por RAMOS (1981), autor do folheto da igreja como já citado, que no
caso era o pai de Luiz Antonio e esposo de Iedda, já falecido. Essa bondade, a princípio
pode-se suspeitar, pois naquela época havia um intenso temor quanto a revoltas de
escravos, e as repressões violentas a qualquer tipo de prática de resistência11
deveriam
ser pensadas de forma mais inteligente, além de que dentro do paternalismo essas
práticas e negociações estavam previstas no dia a dia da gestão de uma fazenda, tanto do
lado dos escravos como do lado dos senhores, como demonstrado por João José Reis
(1989), no Capítulo “Fugas, revoltas e quilombos: Os limites da negociação” , onde o
próprio título já diz que são situações limites, porém no dia a dia as negociações eram
constantes. Se pensarmos agora, quem ganhou, foi a tia Branca que recebeu o perdão do
senhor, ou o senhor que mesmo depois de anos de sua morte continuava sendo
11
como podemos interpretar o ato de fazer com que o próprio filho não viesse a vida
59
reverenciado por tia Branca? Veremos que o caso é um pouco mais complicado do que
práticas que se encaixam adequadamente no paternalismo comumente conhecido. Se
tentarmos olhar como se existissem práticas padrões e esses casos que entrei em contato
fossem apenas exceções, não conseguiríamos ver a complexidade que estão embutidas
nessas relações.
O paternalismo presente nas relações entre escravos e senhores ultrapassa as
barreiras temporais e permanecem, portanto, presentes até hoje na gestão de uma
fazenda, por exemplo. Naquela época, porém, até mesmo as crianças e mulheres não
eram vistas como muito melhores do que os escravos, sendo que estas últimas deveriam
ser tuteladas por homens até o fim da vida na maioria das vezes. De certa forma, diz o
autor, havia até mesmo uma independência bem maior da mulher negra em relação à
mulher de “classe” (STEIN, ano 1985, p.187), já que as primeiras realizavam tanto
tarefas “femininas” quanto “masculinas” (na interpretação de Stein), participando das
colheitas, aragem da terra e ainda tinham a liberdade para comprar alforria, enquanto as
mulheres de classe dependiam de seus pais e irmãos, e posteriormente de seus maridos,
somente obtendo certa liberdade em caso de falecimento destes últimos.
Imagem 15 – Interior de uma cozinha com azulejos. Fazenda Cananéia. Vassouras, RJ. Entre 1948
e 1949 (AEL, Coleção Stanley Stein, foto 123)
60
A sociabilidade entre senhores e escravos em fase infanto-juvenil não se dava
apenas entre os homens. Senhores cresciam também na companhia de escravas e se
relacionavam sexualmente com elas de maneira aberta:
As esposas de fazendeiros certamente sabiam das intenções de seus
maridos e filhos em relação às jovens escravas. Um fazendeiro e sua esposa,
segundo um conto satírico, viviam juntos e felizes. O marido, no entanto,
tinha um “instinto inato por beleza, e adquiria escravos e escravas, cavalos,
gado, carneiros e porcos, desde que fossem bonitos”. Sua esposa era
indiferente quanto a escravos homens, cavalos, gado, carneiros e porcos –
bonitos ou feios. Mas se tratando de escravas, ela seguia o preceito de que
“quanto mais feias melhor”. Sempre que algum negociante de escravos
aparecia em sua casa, ela examinava o lote e invariavelmente simpatizava
com as escravas “de beiço grande, desdentadas, de nariz achatado ou
aleijadas”. Ela sabia também que nas fazendas onde havia muitas “escravas
pretas e mulatas, bonitas e bem tratadas, os hóspedes chegavam como uma
praga de gafanhotos. Ela temia que sua fazenda se tornasse uma casa de
hóspedes. Portanto, sempre comprava escravas cujas caras assustassem
criancinhas” (STEIN, 1985, p. 193)
Não havia, portanto, nenhum segredo quanto a essas relações sexuais e
provavelmente os filhos bastardos dos senhores com suas escravas também não eram
escondidos. O que faria, porém, com que os casos desses barões que encontrei fossem,
de certa forma, relevantes é que eles viveram solteiros por toda a vida, não constituindo,
dessa forma, uma família legítima de acordo com os costumes morais da época. Estes
desafiaram os mesmos costumes morais ao deixarem em testamento suas terras para
seus descendentes e, em alguns casos como o do Barão de Juparanã e do Barão do
Tinguá, inclusive assumindo sua paternidade. Os documentos e relatos de algumas
pessoas mostram seu interesse em não deixar que sua morte fosse o fim dos privilégios
com que seus filhos eram tratados.
Outros Barões: Relações e desfechos
Esta talvez seja a parte deste capítulo “menos etnográfica”, se formos pensar na
etnografia clássica, onde olhamos nos olhos dos nossos interlocutores, mas não deixa de
ser uma etnografia, pela forma como me preocupei em abordar estes objetos. Para
compor essa parte do trabalho, lidei com papéis cheios de fungos e bactérias perigosas,
que poderiam a qualquer momento tomar meu corpo, como já havia acontecido com
Sônia, uma das funcionárias do arquivo em que trabalhei durante os meses em que
61
estive na região. Os funcionários do IPHAN e alguns historiadores eram as pessoas com
as quais convivia fisicamente, mas concentrava minhas energias mesmo no que estava
escrito naqueles papéis antigos.
Os arquivos não são mais ou menos importantes que os relatos dos meus
interlocutores. Não são mais verdadeiros, ou mais intrigantes. São talvez mais difíceis
para se relacionar, porém o que eles dizem vai além daquilo que está escrito. Somente o
fato de esses arquivos terem sido mantidos com todo o cuidado, muitos sendo
digitalizados por iniciativa de uma universidade particular, a Severino Sombra, e a
região toda entre Vassouras e Valença terem preservado inúmeras fazendas, hoje
transformadas em museus, é porque há uma consciência histórica relevante para os
habitantes da localidade. Penso como Thiago Niemeyer:
(...) gostaria que o leitor mantivesse em mente que minha proposição de
desconsideração de evidências históricas inegáveis não é epistemológica (o
que me levaria a propor uma espécie completamente inaceitável de niilismo
generalizado), mas, obviamente, metodológica. O que gostaria de propor,
novamente, é que a existência de uma consciência histórica bem definida -
manifesta em trabalhos sobre o sul da Bahia - pode ser um problema de
pesquisa produtivo. (NIEMEYER, 2014, p.09)
Apesar de estar também focada em uma consciência histórica bastante peculiar
de Juparanã e redondezas, acredito ser relevante buscar nos arquivos aquilo que os vivos
não podem mais me fornecer como informação por não conseguir localizar os
descendentes de outros barões, ou por estes não saberem me contar o desenrolar de
algumas histórias. Mesmo que minha preocupação não seja com a veracidade dos fatos,
mas sim com a peculiaridade da centralidade da memória nas relações entre os
Juparanenses e moradores das proximidades, os documentos são úteis para informar não
apenas os fatos que são lembrados, mas aqueles que foram esquecidos, como Lilia
Schwarcz (2004) observa:
Engana-se aquele que pensa que tudo que a memória faz é lembrar.
Os arquivos estão repletos de lembranças, mas também devastados
por silêncios e omissões: assim como é função lembrar, faz parte do
ofício esquecer. (SCHWARCZ, 2004, p.785)
Por essa razão e por uma curiosidade e necessidade antropológica de se saber se
havia outros barões que se relacionaram da mesma forma que o Barão de Juparanã com
suas escravas, me vi trabalhando com documentos antigos por mais tempo do que era
esperado. O que era para ser apenas um comentário ou uma citação a título de
62
comparação, por sua relevância, se tornou parte importante para a composição deste
capítulo. Mesmo que o objeto não seja o convencional (pessoas vivas), a metodologia
aplicada foi a mais etnográfica possível. Tomando como referência Emerson Giumbelli
(2002, p.94), não acredito que por estar fazendo o trabalho etnográfico utilizando não
apenas os meios de contato direto com meus “nativos”, faça de mim menos antropóloga
do que se este trabalho fosse baseado completamente na minha vivência intensiva com
eles.
O trabalho etnográfico e a noção do que é o campo antropológico estão cada vez
mais sendo ampliadas pela complexidade das relações que vivemos hoje. O fazer
antropológico que observa e participa das dinâmicas de grupos sociais não pode se
limitar a olhar apenas nas relações tête-à-tête, encontrando outras formas de se fazer
campo que dependem muito mais da disposição, percepção e criatividade do
antropólogo. Segundo Castro e Cunha, (CASTRO; CUNHA, 2005, p.02) mesmo que
alguns dos mais importantes antropólogos reconhecidos, como Mauss e Lévi-Strauss,
não tenham feito quase nenhum trabalho de campo, esta é a metodologia distintiva da
disciplina. A partir dos anos de 1980, começa-se a utilizar os arquivos, já que esses
informam bastante sobre eles mesmos, e sobre o contexto no qual foram produzidos. Os
arquivos, segundo Olívia Maria da Cunha, não falam, porém sua pretensa marginalidade
no fazer antropológico pode ser reconsiderada se forem utilizados de forma analítica,
sendo o objetivo não aquilo o que estão dizendo, ou seja, o dado histórico, mas “(...) o
fato de os arquivos terem sido constituídos, alimentados e mantidos por pessoas, grupos
sociais ou instituições” (CUNHA, 2004, p. 293). Além de observar a forma como as
pessoas mantêm seus arquivos, também fiz algumas pesquisas em arquivos
institucionais para ilustrar o contexto da região, demonstrando que o caso do Barão de
Juparanã não foi o único da localidade.
Meu objetivo, afinal, é o conceito de história reivindicado no local, que em
muito se assemelha com o descrito por Thiago Niemyer em seu trabalho de campo
sobre a região cacaueira de Ilhéus. Talvez essa comparação seja forte por terem sido
insumos cultivados trazendo grande progresso para ambas as regiões (Sul Fluminense e
Baiano). Niemyer observa:
Quando falei em duas eras, me parece haver uma relação particular
e aparentemente contra-intuitiva com o tempo. O passado distante é
exageradamente distante, ao ponto de as missões jesuíticas, os escravos
negros e as tribos indígenas parecerem situar-se em outro tempo, sem
ligação com o nosso senão em pequenos detalhes, manifestos em ruínas
63
(missionários religiosos), “culinária”, “música” e “sincretismo religioso” (no
caso povos africanos) ou contribuições de tom quase anedótico, como nomes
de rios, montanhas e vales ou o hábito de tomar banho com frequência (caso
dos indígenas). Com relação aos portugueses brancos, a mesma sensação de
distância se faz perceber, dessa vez não pelos pequenos detalhes, mas pelo
‘englobamento’ de todo o resto: a língua, a civilização, tudo de mais
importante e ao mesmo tempo mais naturalizado e estanque. (NIEMEYER,
2014,p.17)
No caso da região por mim estudada, a história, na maior parte das vezes, não
começa com a cidade, e sim com a origem da família e a posterior vinda para a cidade,
mesmo que esta não tenha acontecido de forma muito diferente das outras famílias
produtoras de café da região, que vieram em sua maioria de Minas Gerais. Porém,
observando os relatos, livretos escritos por pessoas locais ou monografias que encontrei
na Universidade Severino Sombra sobre o assunto12
, vemos que se omite
completamente tudo aquilo que ocorreu antes do progresso trazido junto com as
milhares de mudas de café para a região. Como observamos no primeiro capítulo, toda a
noção de história que se tem na localidade está envolta na história da família, com o
progresso da região e sua posterior falência. Alguns dos descendentes legítimos do
Barão de Juparanã, herdeiros da fazenda de Sant’Anna, sobreviveram ao fim do
progresso da região, pois não eram grandes fazendeiros. Talvez essa tenha sido a sorte
de seus 25 filhos mulatos. Sorte essa, que não foi companheira de seu irmão, Barão de
Santa Mônica, já que, atolado em dívidas, teve de entregar a fazenda para o Banco do
Brasil, segundo os meus interlocutores.
Já vimos que o caso do Barão de Juparanã não é um que extrapola a realidade e
o contexto das relações entre senhores e escravos nas Fazendas de Café. Sendo essas
relações bastante comuns, o incomum seria a disposição do Barão de Juparanã em fazer
de seus filhos com negras senhores independentes com suas próprias terras. A pesquisa
nos arquivos objetivou primeiramente identificar os outros casos semelhantes entre
Barões que tivessem tanto ou mais prestígio do que o Barão de Juparanã.
Para ter acesso a esses dados, me vi na necessidade de mergulhar nos arquivos
da cidade de Vassouras, já que o arquivo público da cidade de Valença, infelizmente,
fora tomado por um incêndio antes do início de minhas pesquisas. De certa forma, os
12
Ascensão e queda da lavoura cafeeira no Vale do Paraíba na segunda metade do século XIX: O caso da
trajetória dos barões do café no município de Vassouras entre os anos de 1850 e 1900. Lima, Wayne dos
Santos. TCC 37/99H; Famílias e redes de socibilidade em valença: Um estudo de caso (província do rio
de janeiro 1823-1888). Arieira, Regina Faria. Vassouras. 2007; Nossa Senhora do Patrocínio de Juparanã:
A fé que vem pelo mar (histórias de Juparanã), Franscisco, Maria da Penha A.S. 2009, TCC 2030 FRA
NOS 2009; entre outras.
64
citadinos de Juparanã se relacionam mais com a cidade de Vassouras do que com a de
Valença, pois o centro desta se encontra mais próximo ao distrito do que o centro da
cidade à qual pertence (ver figura abaixo). Para o tipo de pesquisa que queria fazer, não
fazia tanta diferença se os dados fossem coletados em Vassouras ou Valença.
Imagem 16 : Mapa político localização de Barão de Juparanã entre os municípios de Valença e
Vassouras
Pesquisando nos arquivos entre 1850 e 1890, no acervo do IPHAN (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) de Vassouras, entrei em contato com os
testamentos de dois dos Barões sobre os quais irei me aprofundar mais à frente. O Barão
de Guaribú, Cláudio Gomes Ribeiro d’Avelar, e o Barão do Tinguá, Pedro Correa e
Castro, ambos grandes proprietários de fazendas cafeicultoras na província de
Vassouras, que correspondem hoje ao seu território, de Paty do Alferes (fazendas do
Barão de Guaribú) e de Engenheiro Paulo de Frontin (Sacra Família do Tinguá). Depois
de algum tempo debruçada nesses arquivos, percebi que ambos haviam morrido
solteiros e sem filhos legítimos, da mesma forma que o Barão de Juparanã, e também
deixaram terras para filhos que tiveram com escravas.
65
Apenas o testamento, porém, não garantia que os beneficiários recebessem o que
lhes era designado. Sendo esta atitude oposta ao moralismo da época, justiça e família
se colocavam como obstáculos para que se atrasasse ao máximo ou mesmo impedisse o
recebimento da herança. Por mais que no caso do Barão de Juparanã as terras tenham
sido de fato herdadas por seus filhos, os seus descendentes narram que o Barão de Santa
Mônica, irmão e sócio do Barão de Juparanã, queimou documentos atrás do casarão
após a morte de seu irmão, com medo de que esses tivessem direito a mais do que o que
estava registrado no testamento, pois antes de morrer, e após a feitura do testamento13
, o
Barão de Juparanã reconheceu em outro documento seus 24 filhos com as cinco
escravas como legítimos em carta assinada.
Quando entrei em contato com este documento, cuja cópia estava em posse de
Anna Leite, inicialmente questionei se havia a necessidade de assumir a paternidade dos
meninos que chamava no testamento de “meus protegidos”, já que o testamento era bem
claro quanto aos herdeiros, e a forma como se daria a partilha. Não era o suficiente, e
para saber disso precisei “viver” o drama dos filhos do Barão de Guaribú. O caso do
Barão de Guaribú, a notória demora do inventário e o suicídio do seu filho mais velho
eram de conhecimento público, já que fora publicado em um importante jornal da então
Capital Federal, o Rio de Janeiro, e provavelmente o próprio Barão de Juparanã estava a
par dos acontecimentos14
. Acompanhei passo a passo, do testamento ao inventário que
durou mais de 30 anos, cada tentativa de se conseguir as terras prometidas pelo pai aos
4 filhos de Maria das Antas.
Os registros se iniciam em 1863, quando Cláudio Gomes Ribeiro d’Avellar, que
possuía as Fazendas de Guaribú, Fazenda das Antas, Fazenda Boa União, Fazenda
Encantos e Guaribú Velho estava para falecer. Por mais que recebesse o título de Barão
de Guaribú (sua fazenda mais antiga, herdada do pai Luis Gomes Ribeiro), a fazenda
mais produtiva era a Fazenda das Antas. Deixou em testamento seus bens, que
13
O seu testamento foi publicado posteriormente, em uma versão comentada que contava um pouco do
desenrolar das histórias. A cópia desta publicação estava em posse de Anna Leite, porém foi cedida por
Glória Nogueira, a pessoa a qual os moradores de Juparanã diziam ter escrito ou estar escrevendo um
livro sobre o Barão, já que esta também seria uma das descendentes. Glorinha vive no centro de Valença
e o contato que tentei fazer com ela nunca foi bem sucedido. De qualquer forma, a informação de que o
Barão teria reconhecido seus 22 filhos em um documento posterior ao testamento, onde foi anexado, está
em um comentário nesta cópia do testamento. Não há registro de quem seja o comentador. 14
O suicídio de Manuel Avellar ocorreu em 22/08/1872, segundo Arthur, descendente direto do Visconde
da Parahyba, irmão do falecido Barão de Guaribú, ou seja, quatro anos antes da morte do Barão de
Juparanã.
66
correspondiam a todas as suas terras, benfeitorias, escravatura, safra, gado e qualquer
outra coisa que pudesse estar sobre seu território.
O Barão de Guaribú deixou as terras com apelo mais sentimental (por terem
pertencido ao pai) para seus irmãos e sobrinhos, porém deixou aos seus filhos não
legítimos as fazendas mais produtivas:
Deixo ao meu afilhado Manuel Gomes Ribeiro Avellar – Estudante, filho de
Maria das antas, e seus dois irmãos Luiz, João, nascidos todos de ventre
livre, as minhas fazendas das Antas, Boa União e Encantos, com todas as
suas benfeitorias, terras e escravos que nelas existirem (...) (p.03)
Imagem 17 - Fazenda de Guaribú na década de 1930
Segundo ainda o testamento, os filhos de Maria das Antas deveriam tomar de
volta os escravos que estavam emprestados na Fazenda de Guaribú, já que faziam parte
do legado dos meninos, mais cento e vinte escravos que seriam escolhidos por Manuel,
o filho mais velho do Barão. Seus descendentes ainda não haviam tomado posse por
serem menores e pelo fato de o Barão de Guaribú ter deixado algumas dívidas que
deveriam ser quitadas pelo inventariante (no caso o seu irmão, Visconde da Parahyba)
no prazo de um ano. O Barão de Guaribú deixou ainda a Maria das Antas, mãe de seus
filhos, a quantia anual de quatrocentos mil réis, que cessaria logo que os meninos
tomassem conta de seus legados, porque daí em diante seus filhos a sustentariam:
67
(...) e, além disto, (...) quero que ela seja sustentada pela Fazenda das Antas
e que lhe não falte nada o necessário à vida enquanto ali morar, até que seus
filhos tomem conta de seus legados. (...) Deixa ainda a mobilia da fazenda
Guaribú para os meninos (p.06)
Fiz uma busca pelo site de pesquisas Google e pelas redes sociais para tentar
encontrar os descendentes dos filhos do Barão de Guaribú. Sem sucesso nessa
empreitada, encontrei Arthur Carlos Peralta, o descendente dos últimos inventariantes
dos bens do Barão de Guaribú. O inventário que iniciou em 1863 foi ter seu último
documento anexado em 1897, quase na virada do século XIX para o século XX, mais de
trinta anos depois. Segundo Arthur, o filho mais velho do Barão morto mantinha uma
boa relação com o primeiro inventariante, porém as dívidas corriam e a justiça também
agia para que os débitos nunca cessassem. Arthur me contou que Miguel cometeu
suicídio aos 30 anos. Este já era viúvo, e vivia na Fazenda de Guaribú, sob a proteção
dos irmãos de seu pai. Segundo o que consta no inventário, este teria se matado por
conta das dívidas em que estava afundado já que não podia tomar posse da fazenda que
era legitimamente sua.
O suicídio de Miguel tornou os longos anos de inventário ainda mais dramáticos.
No ano de 1897, os irmãos João e Virgínia entraram com um processo contra o irmão
Luis, já que este tomou posse da Fazenda das Antas após a morte do primo, João Gomes
Avellar, e não estava prestando contas dos lucros aos irmãos mais novos. Foram
descobrir que este já estava vivendo na capital. Parte do inventário foi perdido, mas
Arthur revela que ao longo do tempo, muitos dos bens foram sendo vendidos para que
fossem satisfeitos credores e os pagamentos dos impostos que foram sendo acumulados
a níveis praticamente impagáveis.
Encontrei Arthur a partir do blog que mantém sobre as histórias de sua família.
Esse se diz um interessado, apenas um pesquisador autônomo, nada diferente daqueles
descendentes do Barão de Juparanã que cruzei durante meu campo. Arthur recolhe
registros, digitaliza e inclui em seu blog. Este também utiliza o espaço virtual para
relatar muitos casos ouvidos por seus parentes. Arthur me contou sobre sua ascendência
e de quem ouvia as histórias que reproduz, sendo ele tataraneto do Visconde da
Parahyba. O filho do Visconde da Parahyba, João Gomes Ribeiro de Avellar, foi
também o último inventariante. Este era conhecido pelo seu apelido, Jaco. Segundo
Arthur, Jaco fora um dos maiores comissários de café do Rio e um dos fundadores da
Cia. Docas de Santos. Este foi por fim o herdeiro das fazendas do Guaribú e do Guaribú
68
Velho, por parte do tio e também herdeiro de parte da fazenda Boa Vista em Paraíba do
Sul. Arthur conta que João morreu de febre tifoide em 1891, mal que levou também sua
esposa Ermenciana, dois meses depois. A filha de Jaco, e trisavó de Arthur, Leocádia
Calvet Avellar herdou, assim, a fazenda de Guaribú, vivendo mais de 90 anos. Dona
Herundina era, finalmente, a bisavó de Arthur e filha de Leocádia. Esta seria a
responsável por lhe contar as histórias dos velhos tempos da fazenda, onde este passou
muitos verões antes do casarão virar ruínas. A fazenda, porém, ainda pertence aos seus
parentes. Em um documento jurídico posterior, datado do início do século XX, podemos
ver João, o filho do Barão, como proprietário da Fazenda das Antas em conflito com um
dos arrendatários. Antes ou após essa data, não há mais nenhum documento que faça
referência a João, Luis ou Virgínia.
Imagem 18 - foto extraída do blog de Peralta, mostrando a vivência de seus parentes na Fazenda de
Guaribú
Outro Barão que teve filhos com uma escrava e que lhes deixou terras foi Pedro
Corrêa e Castro, o Barão do Tinguá. Este também permaneceu solteiro e teve seis filhos
com Laura do Congo, falecendo no ano de 1874. Segundo consta em seu testamento,
seus filhos viveram em sua companhia, sendo “educados com zelo e na doutrina cristã”.
Os inventariantes, segundo Stein (1985), eram homens livres casados com filhas de suas
ex-escravas. O Barão do Tinguá não só deixou em documento assinado em 1965 (nove
anos antes de sua morte) suas terras para seus filhos, como os reconheceu enquanto
legítimos perante o Imperador e a Deus, já que queria a salvação de sua alma.
69
Se esta era realmente a principal motivação de os ter assumido, nunca iremos
saber, porém, é notório que o reconhecimento dos filhos com escravas enquanto
legítimos serviu para diminuir os trâmites burocráticos nas transações de bens do
inventário. Mesmo que o interesse fosse somente o mesmo que o Barão de Guaribú
descreve em seu testamento, “evitar que seus “afilhados” vivessem na penúria”, O
Barão de Juparanã e o do Tinguá tiveram mais eficácia em suas pretensões, já que
vislumbraram assumir os filhos antes de sua morte, o que o Barão de Guaribú não fez.
Podemos ver que as relações sexuais entre senhores e escravas, mesmo com todos os
esforços e impedimentos morais impostos pela ideia de família então vigente e da
Justiça, poderiam ser capazes de transformar o status de suas concubinas a partir do
reconhecimento da legitimidade de seus filhos, passando a ser senhores de suas
próprias terras. Em sua pesquisa nos arquivos, Stein também encontrou o seguinte caso,
o qual reflete a grande influência política que as relações sexuais entre senhores e
escravas podem trazer. Trata-se de uma ação de divórcio movida pela Sra. Luiza Maria
de Carvalho contra João de Souza Vieira, após 23 anos de matrimônio:
Entregue a uma vida dissoluta, seu marido teve amásias o tempo todo e
gastava grandes somas com elas. Cerca de 10 anos atrás (1843) ele adquiriu
a liberdade da mulata escura Rosa e de seu irmão e, tornando-a sua amásia,
alimentava-a, dava-lhe roupas e construiu-lhe uma casa, onde passava quatro
meses seguidos... Muitas vezes a esposa se sentiu desgostosa e envergonhada
por tê-lo encontrado na cama dos dois com sua própria escrava... Incapaz de
tolerar suas exigências e insultos, ela primeiro tentou fugir para a residência
da mãe e depois para casas de parentes. (Luiza Maria de Carvalho vs. João
de Souza Vieira. APV, 1853 apud STEIN, 1985, p.194).
O que ocorre após isso é que o esposo de Luiza se envolve com outra escrava à
qual deu uma casa e até mesmo contratou uma empregada, sendo o limite tolerado por
Luiza. Mas o que a fez entrar com o pedido do divórcio foi ele ter levado a “amásia” em
uma missa, desmoralizando-a na frente de todos, sendo por fim, o divórcio concedido
pela igreja.
João José Reis e Eduardo Silva (1989) trabalham com o escravo enquanto um
agente político, o que também vislumbro dentro da perspectiva analisada. Não tento
perder de vista os abusos de poder e agressões que estão embutidas nas relações sexuais
entre senhores e escravos, mas é possível perceber que antes de serem apenas vítimas,
algumas mulheres escravas conquistaram ganhos como alforria, moradia, presentes e
uma vida confortável a partir da satisfação dos desejos sexuais de seus senhores.
70
Podemos ver neste tipo de relação um espaço de negociação. Aos homens escravos,
grande maioria nas fazendas agrícolas, havia uma possibilidade maior de negociação da
escravidão a partir das ameaças de fuga e insurreições, ameaças que vinham de fora
para dentro. Já as mulheres, mesmo sendo minoria, possuíam maior entrada na vivência
do interior da casa grande, e por isso podiam negociar sua liberdade de dentro para fora:
(...) é preciso ter em conta, primeiro, que as mulheres escravas eram
minoria mesmo, em termos gerais. Acresce a posição específica que
ocupavam no tocante à possibilidade de negociação dentro do sistema,
seja pelo uso do sexo e da inteligência, como “chicas da silva”, seja pelas
prendas culinárias, como “baianas de acarajé”, “quitandeiras” etc..., seja
ainda através da ascendência religiosa ou afetiva, como as mães de santo,
mães-pretas e amas-de-leite. Por último, devemos ter em conta, no
relacionamento escravo-escravo, a maior responsabilidade que assumem
as mulheres. (REIS e SILVA, 1989, p.76)
Segundo a perspectiva dos autores, as mulheres possuíam uma função de grande
importância, pois eram os elos de conexão entre escravos e senhores, além de
assumirem a posição de negociação nas relações entre os próprios escravos, que
estavam longe de serem harmônicas. Mesmo que essa postura fosse privilegiada, elas
também articulavam revoltas junto com os escravos de lavoura, sendo a história mais
famosa da região a da escrava Mariana Criola, costureira que vivia dentro da Casa
Grande, e que junto com Manuel Congo liderou as revoltas das fazendas da Manilha e
Freguesia, pertencentes ao Capitão-Mor Manoel Francisco Xavier, um grande tirano que
maltratava em demasia seus escravos.15
Hoje um centro de assessoria juridica popular
do Estado do Rio de Janeiro carrega seu nome, em homenagem a seus feitos
15
Mulheres Fluminenses do Vale do Paraíba: História de luta e conquista de cidadania feminina. CEDIM
– Conselho Estadual dos Direitos da Mulher. Governo do Estado do RJ. 2001
71
Imagem 19 - Centro de Assessoria Jurídica Popular Mariana Criola
Segundo Reis e Silva, eram em momentos de crise, quando a casa estivesse
desarrumada, que as insurreições aconteciam, e foi justamente com o assassinato de um
escravo açougueiro, à base de tortura, que estes se rebelaram. Seriam as revoltas a
quebra de um “padrão”, seguindo a forma como pensam os autores. As fugas, revoltas e
quilombos seriam os limites da negociação, sendo que o que reinariam seriam essas
negociações cotidianas mais bem sucedidas ou mais “acomodadas”, porém não isentas
de inquietude, como as figuras do pai-joão, das mães-pretas ou chicas da silva. As fugas
eram feitas em sua maioria por homens entre 20 e 29 anos, porém
é preciso tem em conta, primeiro, que as mulheres escravas eram minoria
mesmo, em termos gerais. “Acresce a posição específica que ocupavam no
tocante à possibilidade de negociação dentro do sistema, seja pelo uso do
sexo e da inteligência, como “chicas da silva”, seja pelas prendas culinárias,
como baianas de acarajé”, “quetandeiras” etc..., seja ainda através da
ascendência religiosa ou afetiva, como as mães de santo, mães-pretas e
amas-de-leite. Por último, devemos ter em conta, no relacionamento escravo
escravo, a maior responsabilidade quem assumem as mulheres (REIS e
SILVA, 1989, p.76)
Não há relatos sobre o “espírito” de revolta de Emília, Manoela, Geralda,
Floriana e Seminana, as cinco escravas às quais, segundo meus interlocutores, o Barão
de Juparanã tratava como esposa, levava para passear de carruagem e vestia como
fidalgas. No entanto, a nota de número onze do testamento contém uma descrição
vulgar destas mulheres, que mostram em exagero um pouco de suas personalidades:
72
As mães desta rapaziada afidalgada e que pertenciam ao serralho eram: 1ª
Manoela, creoula retina, bonitona e que teve 4 filhos de nome – Jorgiano,
Manoel, Braziliano e Manoelita, mora com seu genro Jorge Vieira; 2ª
Floriana, bem fula que teve 10 filhos de nomes – Rozina, Florida, Joviano,
Modestino, Jacinttho, Elisiano, Florenciana, Evarestina, Isidro e Alfredo; - 3ª
Semiana, Creoula fallecida depois de liberta e que teve 3 filhos de nomes –
Benício, Dario, Braseliza – 4ª Emília, Creoula meio fula, que teve 5 filhos de
nomes – Emiliana, Daniel, Sara, Maria e Theresinana; - 5ª Geralda, ligeira e
espevitada, creoula de vida folgada, dançadeira e que teve 2 filhos;
Guilhermina e Alvaro. Esta mora no Ypiranga, Floriana com seu genro
Belchior e Emilia com seu filho Daniel. (p.12)
Segundo algumas falas, o Barão mantinha com suas filhas que tinha com
escravas os mesmos costumes que um Barão teria com suas filhas, que era casá-las com
homens nobres de sua época. Belchior, genro de Floriana citado no testamento, fora o
alfaiate do Imperador D. Pedro II e era casado com Rozina (segundo Mazinho). Esta
vivia na fazenda do Bom Retiro, onde até hoje Ivo mantém a parte de sua mãe, neta de
Rosina.
Imagem 20: Rozina na Fazenda do Bom Retiro (senhora mais idosa toda de preto).
O que percebo ao analisar essa foto (também pela minha vivência com minha
família materna e durante o meu trabalho de campo) é a força das mulheres. Não há
traços de submissão em suas faces e estas ocupam a posição central da fotografia, sendo
que os homens estão de pé (até mesmo as crianças do sexo masculino) e em posição
73
marginal. Por mais que na nota do testamento vemos sempre a referência às mulheres,
citando sob a proteção de qual homem elas se encontram, e apesar da preocupação do
Barão de Juparanã em deixar suas filhas em mãos de homens distintos, há uma força
nesta imagem, nas mulheres com quem convivi nesses seis meses e – por que não? - em
minhas tias e primas mais próximas que não dependem ou dependiam do apoio ou da
sombra de nenhum homem. Como que durante um período tão marcado pelo
paternalismo, as mulheres pintadas inúmeras vezes como submissas adquirem tal
fisionomia de poder de dureza, poucas esboçando um fraco sorriso, todas responsáveis
pela administração de uma fazenda?
Segundo Candoca16
, Rozina era responsável pela maior produção de café
daquela região, mesmo depois da crise. Sua influência era tanta que fizera passar um
trem sobre sua propriedade para escoar a produção para os grandes centros urbanos
(“herdando” do pai, o dom de convencer as pessoas à fazer passar um trem por suas
terras, talvez). Ela e sua família, composta por essas mulheres de aparência forte, e seus
ex-escravos que “comiam na mesa” em sua companhia, conseguiram manter certo
prestigio mesmo após o declínio da produção cafeeira. A força dessas mulheres ainda
sobrevive em muitos discursos e posturas que encontrei em suas descendentes, a não
submissão está presente em algumas das poucas histórias que se referem às esposas do
Barão.
Segundo Janete Lazera, o primeiro filho de Floriana nascera negro. Este fora
renegado por sua avó, a Marquesa de Baependi, que só quis conhecer a criança durante
o batizado algum tempo depois. A segunda criança, por sua vez, nascera de cor clara, e
por esse fato a motivação da Marquesa fora diferente, querendo logo conhecer o bebê,
porém sua mãe negou o acesso ao filho, dizendo que ela o conheceria no dia do
batizado, da mesma forma como havia ocorrido com a primeira criança. Ao que parece
a vontade da mãe prevaleceu. O que faz com que essa história ainda seja contada é
justamente a postura não submissa que essas mulheres possuíam, o que, mesmo que
descrito de forma um tanto vulgar, já deixa clara a citação no testamento.
Após esses momentos na fazenda de Santa Mônica, vamos já para a vida em
Sant’Anna, mais especificamente na fazenda de Rozina, onde a produção de alimentos e
de grãos do café era feita por seus parentes e boa parte de seus ex-escravos. Me recordo
16
Esta Candoca que é minha interlocutora é neta da Candoca (Cândida) que aparece nos anexos II e III.
74
de ouvir de Dona Anita, umas das crianças que aparecem nessa imagem, que os
escravos não quiseram partir quando houve a abolição da escravatura, já que eram bem
vestidos, bem alimentados e ainda comiam com seus senhores na mesa, demonstrando o
que pode ser uma novidade que é uma maior horizontalização das relações entre
senhores e escravos. As crianças deviam tomar benção dos mais velhos sejam eles
vindos da escravidão ou tendo relações sanguíneas, o que de certa forma se confunde
no relato de Mazinho, que já não sabia quem era parente e quem não era, pois a benção
deveria ser tomada de todos. Este ainda diz a partir da sua própria experiência, que
mesmo seus tios mais velhos também tomavam benção da ex-escrava que conheceu nas
terras de Sant’Anna, a Ambrosina que já conhecemos mais acima. O que poderia chegar
mais próximo dessas relações estaria exposto no artigo de Ana Maria Rios e Hebe
Mattos:
Tratava-se, sem dúvida, de uma situação de mercado, porém que se
organizava com base no trabalho familiar em uma ética camponesa,
elementos que forneciam os parâmetros das relações de parceiria nas
fazendas locais (“o fazendeiro dividiu tudo”). (RIOS e MATTOS, 2006,
p.65)
Ou ainda:
Relações de trabalho tão complexas e com tantas variáveis, que iam
muito além de meros contratos de prestação de serviços, deviam, pela
própria natureza, continuar como entendimentos interpessoais. Qualquer
intervenção do poder público reduzia a margem de manobra garantida pela
fluidez dos contratos “de boca” e pelos inúmeros aspectos relativos à parte
não-monetária destes (RIOS e MATTOS, 2006, p.75)
Aqui nessas relações expostas por Rios e Mattos, porém, ainda há uma
verticalização mais intença do que nos caso estudado. Acredito que a tendência a essa
horizontalização se dava desde as relações construídas muito antes da abolição da
escravatura, sob o título de paternalismo inicialmente, porém se tornando relações de
parentesco de acordo com que os filhos do Barão de Juparanã iam nascendo, talvez até
modificando toda a dinâmica das relações entre senhores e escravos na fazenda de Santa
Mônica, se levarmos em conta os relatos de Iedda sobre tia Landa e tia Branca
75
III – As Relações de Sangue e Outras Histórias
Aqui neste capítulo, vamos olhar diretamente para essas histórias: o que contam,
o que pretendem afirmar, tornar público e o que negam, velam, e escondem para assim
obter algo como um “retrato de família”, baseado na minha convivência dos últimos
meses. Capturo essa imagem em três etapas distintas visando demonstrar o que pretendi
desde o princípio ao fazer uma etnografia da história. Primeiramente, foco na
importância que essas histórias tomam na localidade de Barão de Juparanã. Como
firmam as relações de parentesco através das relações de sangue que aparecem tanto
nas narrativas, assim como na feitura da genealogia, um dos motivos mais centrais para
que minhas visitas ocorressem e que enorme resultado se encontra em anexo. Em um
segundo momento aponto para a performance dos narradores, figuras de muita
importância para que essas histórias continuem sendo circuladas entre os parentes, e que
não se percam com a passagem do tempo. Assim a imagem vai ganhando uma
determinada forma e um conteúdo baseado na minha própria relação com os meus
interlocutores. Na terceira parte desse capítulo, irei fazer uma análise mais geral da
função dessas histórias, já pretendendo chegar a uma conclusão, fechando parcialmente
o que pretendi ao estabelecer esta etnografia da história.
Acredito eu, que as histórias contidas neste trabalho poderiam ser redefinidas e
recontadas de milhares de formas diferentes, já que podem também ser reagrupadas por
temáticas infinitas. A forma como foi concebida é uma escolha, e por esse motivo
talvez, a ordenação e a temática pelas quais foram separadas e contadas, também seja
uma maneira de se construir um “mito”, a arte de se construir uma narrativa a partir de
várias narrativas. Os mitos, analisados por Lévi-Strauss na sua abertura das Mitologias
em o “Cru e Cozido” (2014 [1964]), onde utiliza seu material etnográfico sobre mitos e
parentescos de forma comparada ao que ocorre à música, sendo na opinião de Mauro de
Almeida (1999), o primeiro exemplo de Bricoloeur na antropologia (p.09). Lévi-Strauss
se refere aos estudos do mito como um problema metodológico, já que não se enquadra
ao princípio cartesiano, pois ao se decompor não há nenhuma unidade que possa ser
atingida ao final.
Os temas se desdobram ao infinito. Quando acreditamos tê-
losdesembaraçado e isolado uns dos outros, verificamos que, na verdade,
76
eles se reagrupam, atraídos por afinidades imprevistas. (LÉVI-STRAUSS,
2004[1964] p.24)
De uma forma surpreendentemente sensível, Lévi-Strauss faz a já citada
comparação entre os mitos e a música que vale a reprodução na íntegra:
“A emoção musical provém precisamente do fato de que a cada
instante o compositor retira ou acrescenta mais ou menos do que prevê
o ouvinte, na crença de um projeto que é capaz de adivinhar, mas que
realmente é incapaz de desvendar devido à sua sujeição a uma dupla
periodicidade: a de sua caixa torácica, que está ligada à natureza
individual, e a da escala, ligada à sua educação. Se o compositor retira
mais, experimentamos uma deliciosa sensação de queda; sentimo-nos
arrancados de um ponto estável do solfejo e lançados no vazio, mas
somente porque o ponto de apoio que nos é oferecido não se encontra
no local previsto. Quando o compositor tira menos, ocorre o contrário:
obriga-nos a uma ginástica mais hábil do que a nossa. Ora somos
movidos, ora obrigados a nos mover, e sempre além daquilo que, sós,
nos sentiríamos capazes de realizar. O prazer estético é feito dessa
infinidade de enlevos e tréguas, esperas inúteis e esperas
recompensadas além do esperado, resultado dos desafios trazidos pela
obra e da sensação contraditória que provoca, de que as provas às
quais nos submete são insuperáveis, quando ela se prepara para nos
fornecer meios maravilhosamente imprevistos que permitirão vencê-
las. (36) (...) O desígnio do compositor se atualiza, como o do mito,
através do ouvinte e por ele. Em ambos os casos, observa-se, com
efeito, a mesma inversão da relação entre o emissor e o receptor, pois
é, afinal, o segundo que vê significado pela mensagem do primeiro: a
música se vive em mim, eu me ouço através dela. O mito e a obra
musical aparecem, assim, como regentes de orquestra cujos ouvintes
são os silenciosos executores (LÉVI-STRAUSS, 2004 [1964], p.37)
Lévi-Strauss, ainda frisa a não autoria dos mitos já que apenas existem
encarnados na “tradição”. Talvez eu substituísse esse termo por algo mais dinâmico
como “subjetividades”. Daí para frente, Lévi-Strauss faz uma diferenciação entre uma
pintura e a música, já que em sua opinião esta última estaria mais próxima da estrutura,
pois não operaria por tantos intermédios quanto a primeira. Além da “composição” dos
mitos a partir das histórias contadas, percebo meu trabalho como também uma “pintura”
de imagens: as imagens daquilo que é essa família.
Colocando todas as críticas à harmonia e à unidade que supostamente existiria
em uma família (que veremos mais à frente não serem nem meramente palpáveis),
77
acabei por olhar de tantos ângulos para pessoas, fotografias, registros e histórias, que
seria capaz de, por meio daquilo que foi capturado, ilustrar paisagens e retratos em
combinações talvez tão infinitas quanto aquelas que Lévi-Strauss comporia pelo
intermédio dos mitos. Para que não me estenda muito numa filosofia densa sobre o
assunto, cito apenas um pequeno trecho de Diferença e Repetição (1968), quando
Deleuze, referindo-se à história da filosofia, utilizou de um artifício imagético para
demonstrar as distorções inescapáveis quando estamos nos referindo, no caso de
Deleuze, à leitura de um filósofo:
Seria preciso que a resenha em História da Filosofia atuasse como um
verdadeiro duplo e que comportasse a modificação máxima própria do
duplo. (imagina-se um Hegel filosoficamente barbudo, um Marx
filosoficamente careca, do mesmo modo que uma Gioconda bigoduda). Seria
preciso expor um livro real da Filosofia passada como se se tratasse de um
livro imaginário e fingido. (DELEUZE, 1968, p.10)
A deformação da imagem do autor é o fazer do pensador, o seu ato de violência.
Aqui também pratico uma deformação. Ao colecionar histórias, como fazia Malinowski
com as magias nas ilhas Trobriandesas (1978), acabo por construir um retrato de família
feito por meio de uma colagem, um simulacro do real, imaginário, e fingido, e apenas
assim, o mais verdadeiro.
...
Olivia Maria da Cunha, nos dá uma dica metodológica de como abordar temas
que atravessam uma certa experiência em determinado local, em sua introdução à
Coletânea “Outras Ilhas”, ao falar do caso cubano.
(...) Um modo de descrever coisas, forças, pessoas e contingências que
gravitam numa certa experiência. Pareceu-me oportuno tomá-la como uma
espécie de vinheta que atravessa as várias maneiras de falar sobre Cuba,
acionando noções, imagens, conceitos relacionados a categoria de tempo e
espaço (CUNHA, 2010, p.18)
O ponto de bifurcação entre as categorias tempo e espaço que mais esteve
aparente em meu trabalho de campo foram as relações de sangue. Por esse motivo,
enfim, me volto principalmente a essas relações, contando de forma curta todas as
histórias que apareceram explicitamente relacionadas aos laços sanguíneos, sejam as em
78
que o sangue se fez maior do que a moral determinada da época; ou quando estas
relações trouxeram desentendimentos, quando esteve relacionado com disputas por
territórios; ou ainda trazendo sofrimento quando relacionado ao incesto e finalmente os
problemas genéticos e espirituais, doenças relacionadas aos casamentos entre primos e
maldições que acompanham a família pelo mesmo motivo.
Nessa última parte, modifico um pouco a forma como venho escrevendo,
nomeando as pessoas que contaram as histórias. Como pretendo dar conta do “retrato
da família” na paisagem de Barão de Juparanã, tendo em mente que todas as histórias
são singulares, não individuais, pertencendo de certa forma a todos, e também por ser
essa parte do trabalho a mais delicada e polêmica, substituirei os nomes pessoais pelo
artigo impessoal, da mesma forma como meus interlocutores se referiam na maioria das
vezes: “dizem...”, “certa vez ouvi...”, “me contaram...”. Assim preservo meus amigos,
ao mesmo tempo em que revelo aquilo o que de mais interessante possuem as histórias
de família: o segredo. Mais uma vez Lévi-Strauss nos conta como um etnógrafo se
espantou quando percebeu que na América do Sul, cada narrador conta as histórias de
um modo diverso, até mesmo para os detalhes mais importantes, porém os critérios de
validade não se prendem somente aos elementos da história:
Perseguidos isoladamente (os fatos), cada um deles seria intangível.
Mas ao menos alguns deles adquirem consistência, pelo fato de
poderem integrar-se numa série cujos termos recebem mais ou menos
credibilidade, dependendo da sua coerência global (LÉVI-STRAUSS,
2004 [1964], p.32)
Mesmo que aqui nesta parte do capítulo perdemos um pouco os detalhes dos
contextos, das contradições e das formas das narrativas, narro histórias que não foram
contadas apenas por uma pessoa, portanto, se encontram integradas ao “retrato da
família”. Seriam os pequenos detalhes que causam curiosidade e prazer aos que contam
e aos que escutam, ligando-as diretamente ao parentesco.
O parentesco, segundo Peter Gow (1997), é, um sistema de subjetividades. Peter
Gow, ao analisar o sistema de parentesco dos Piro da Amazônia peruana, os conecta
diretamente com as narrativas das histórias, onde os velhos são a fonte dessas, já que
conviveram com pessoas mais próximas no tempo dos tsrunni, que seriam as pessoas de
antigamente, do tempo mítico, e quando os mais velhos são questionados sobre, dizem
que nunca os viram, e só os conhecem por aquilo o que foi narrado por seus
antepassados, sendo seres que apenas existem no discurso dos velhos ou, “mensagens
79
que chegam de lugar nenhum” (p.45). Podemos ver algumas semelhanças sobre aqueles
que são os narradores no meu campo, como a proximidade maior no tempo com aquelas
pessoas de “antigamente”.
Voltamos mais uma vez ao que nos referimos no primeiro capítulo quando
citamos AnneMarie Mol (1999), ao falarmos das diferenças entre as realidades plurais
ou múltiplas. As realidades múltiplas não são acionadas por uma perspectiva
construtivista, mas sim intervencionista e performática, mesmo que não tanto
observada. Ela não é uma única coisa enquanto os olhos são diversos (o que estaria
conforme a perspectiva do pluralismo), mas a sua “realidade” é manipulada por
instrumentos e práticas diversas, e nesta manipulação o próprio objeto varia, porém
essas variações não são vistas como atributos do objeto, onde estaria escondida uma
essência, mas sim, o que Mol chama de versões do objeto que as práticas e os
instrumentos ajudam a performar. No seu exemplo Mol demonstra o quanto a resposta
ao “o que é a anemia?” não é algo estável ou único. Aqui eu analiso “o que é o
sangue?”, e mesmo dentro do contexto de uma família, onde seria mais fácil estabilizar
essa resposta, o que conseguimos é ver sua performance. Segue, portanto, algumas das
versões do que é o Sangue para os descendentes do Barão de Juparanã.
Laços Sanguíneos
Quase todas as histórias que se seguem nessa parte, pensei inúmeras vezes em
não contar, pois, tive um pouco de receio quanto aquilo o que tanto os antropólogos
quanto os “nativos” poderiam pensar, já que são histórias privadas, e por mais que não
pareçam, são despretensiosas, contadas muitas vezes em tons de humor e cumplicidade.
Vou, portanto, começar esse relato pelo mais polêmico: segundo algumas narrativas, o
Barão de Juparanã, seria na verdade um filho bastardo do Imperador do Brasil D. Pedro
II. Os relatos são ouvidos, geração após geração até os dias de hoje.
Antes que o Barão se relacionasse com suas escravas, outros escravos
trabalhavam em sua residência e provavelmente viam e comentavam o transitar de
nobres da corte no imenso casarão, sendo o Marquês de Baependi um reverenciado
fidalgo, que ocupava o cargo que hoje seria como o do Ministro da Fazenda, e
responsável pelas Relações Internacionais. A casa hoje abandonada, muitas vezes
hospedou a realeza, quando o Imperador tinha compromissos políticos na região. O que
faz correr ainda nos dias atuais esse boato da traição da Marquesa de Baependi é o fato
80
de que esta engravidou quando seu marido estava viajando para fora do país, na mesma
época em que teria recebido o Imperador em sua residência. Alguns conseguem
identificar traços físicos no Barão de Juparanã e em Dom Pedro II, o que comprovaria a
história, porém essas especulações não passam dos portões das casas daqueles que as
contam, não havendo nenhuma reivindicação jurídica ou algo que o valha. Apenas se
divertem imaginando o quão irônico seria possuírem tanto o sangue azul da realeza
europeia, quanto o sangue dos escravos da diáspora africana.
Daremos um salto dos “pulos de cerca” da Marquesa de Baependi para a fase
adulta e viril do Barão de Juparanã. Como já foi narrado na introdução deste trabalho, o
Barão possuía o que seu irmão mais velho, o Visconde de Baependi, chamava de um
“serralho” ou harém, onde mantinha simultaneamente relações com cinco escravas já
citadas: Manoela Agostina (genealogia em anexo I), Floriana Paulina (genealogia em
anexo II e III, sendo o II exclusivamente para os descendentes de Arthur e Anita),
Semiana Florentina (genealogia em anexo IV), Emília Dorotheia (genealogia em anexo
V) e finalmente, Geralda (anexo VI).
Suas mulheres e filhos eram tratados com privilégios até hoje lembrados com
orgulho pelos seus descendentes, onde, contrariando os valores da época, vestia as
“esposas” negras como mandava a moda e as levava para passear de carruagem. Seus
filhos também possuíam status elevado, sendo chamados por este de “meus protegidos”,
futuramente reconhecidos em testamento, herdariam uma fazenda inteira, e talvez mais
algumas coisas às quais seus descendentes nunca tomarão conhecimento, já que
segundo o que é transmitido oralmente, o Barão de Santa Mônica fez uma grande
fogueira, queimando alguns arquivos imediatamente após a morte de seu irmão.
Ainda sobre a forma de como se davam as relações dentro do casarão de Santa
Mônica, contra a vontade da nora, a Marquesa de Baependi mantinha relações afetuosas
com suas netas, chamando-as pra tomarem chá dentro do casarão por inúmeras vezes,
quando sempre as presenteavam. Incomodada com a situação, a esposa do Barão de
Santa Mônica, convenceu seu esposo e irmão do Barão de Juparanã a construir o Monte
Scylene, onde viveram por um tempo, sendo mais tarde presenteado como casa de
veraneio à Princesa Isabel e ao Conde d’Eu.
81
Imagem 21: Fachada do Casarão de Monte Scylene
O sangue é reconhecido pelas aparências físicas, como já foi narrado, por
exemplo, no caso do Barão de Juparanã e o Imperador D. Pedro II. Alguns familiares
possuem maior semelhança com os antepassados, e acabam servindo como elo entre os
vivos e os mortos, como é o caso do Itão, que se parece muito Barão de Juparanã, outras
pessoas que parecem com o Barão são Eloísa e Calhau, filhas de Enedina (Enedina
localizada em Anexo III, em netos do Barão). Ou como me descreveram que “até a
quarta geração ainda se deu traços de semelhanças na família”. A maior parte da cidade
reconhece as aparências físicas dos senhores pelos quadros da família dos fidalgos que
ficavam na igreja. Foi um padre chamado Aquiles que os retirou da parede, sem medir a
importância daquelas imagens para os citadinos. A partir dessas imagens se constatava
que, por exemplo, Visconde de Baependi, irmão e inimigo do Barão de Juparanã se
assemelhava ao “Seu” Luiz Antonio, um dos meus interlocutores mais importantes,
enquanto o Marquês de Baependi se parecia com Menotti, seu tio. Em outro lado da
família é dito que o mesmo Marquês de Baependi é semelhante a Adaury, filho do
relacionamento entre Anita e Arthur, ambos descendentes de Florencia (Anexo II
exclusivo para o relacionamento entre os dois)17
. E a semelhança sobra até para mim,
que segundo o mesmo Adaury, sou parecida com um ramo da família de sobrenome
17
O anexo dois está muito mais completo pois foi um esforço de uma prima, Tada, em completar com
dados corretos a sua parte de sua família no documento, pegando informações através do grupo “A
parentada da Dona Anita no Facebook”
82
Giffoni. Esses milhões de nomes e referências são mais para ilustrar, apesar de serem
reais e estarem presentes em uma genealogia em anexo. Sei o quanto é difícil
acompanhar toda essa gente e evitemos maiores confusões, porém é importante frisar
que essas semelhanças físicas e até mesmo gestuais são atribuídas à relação “mais
forte” que é a relação genética:
Mazinho - Tio Adaury é a cara do vô Mário, vó (Anita) sempre disse, que é
o pai dela. Mario Mafra. E tia Nely, era a cara da mãe dela, vó Berta. Tia
Anny sempre foi a cara do vô (Arthur).
Eu - eu me lembro de mim pequenininha olhando o quadro do vô Arthur e
perguntando: ‘vó (Anny), porque você tá de terno?”
Mazinho - É, sempre foi. E eu já pareço com o pai (Amaury), e o pai parecia
com a vó Anita. Só que ela não usava esses óculos forte que a gente usa.
Otto - Mas é engraçado que todos têm o mesmo olhar, assim... É o Aloy, e
meu avô (Adaury) também tem. Agora que está ficando mais velho está mais
evidente
Mazinho - É, eles olham igual a vó (Anita) assim. (faz com o olho). E eu
achei engraçado, que eu vi em Barra semana passada, Cristina da tia Anely,
curvada andando com a mão pra trás igual a vó. Ela não estava forçando
situação, ela estava andando curvada igual a vó anda curvada com a mão pra
trás, a vó andava assim, o pai andava assim...
Anna Luiza - Genética...
Mazinho - É, a gente não pode fugir dela.
O sangue, como foi falado de forma rápida na introdução, foi também a minha
porta de entrada no campo. A genealogia que está em anexo, serviu para que eu pudesse
me encontrar dentro dela, em um primeiro momento, e em seguida me identificar para
as pessoas. Essa estratégia foi bastante útil, pois fui considerada como prima, na “cidade
dos primos”, o que me colocava em uma posição privilegiada se compararmos a outros
pesquisadores (na minha última visita, uma das minhas interlocutoras me contou que
havia outra pessoa estudando o local uma semana antes de meu retorno em março de
2015, acho que historiadora da UERJ). O sangue, porém, pode ser apenas uma metáfora,
já que Elza não possui realmente a descendência do Barão de Juparanã, mas é tão ou
mais interessada nos assuntos de família quanto os outros, pois desde criança se
questiona como pode ter tanto primo numa cidade só.
83
Terra e Sangue
Acredito que na mesma proporção em que o tópico anterior é polêmico, este é
delicado. Aqui iremos tratar de parentes que se envolveram em disputas por terras
herdadas do Barão de Juparanã, mas que não conseguiram resolver de forma harmônica,
o que levou à morte de pessoas em ambos os lados. Essas brigas aconteceram mais ou
menos na metade do século XX entre os Leite e os Monteiro (indicados nos anexos II e
III, em netos e bisnetos do Barão, os Leite de Mônica e os Monteiro de Ana). Das
Fazendas que foram herdadas, alguns irmãos foram vendendo para outros e acabaram
restando apenas algumas, como a do Bom Retiro de Rozina, Retiro Ribeirão de Berta,
Bocaina de Candoca (a avó da Candoca, minha interlocutora), Bicame de Mônica.
Existia ainda em Sant’Anna de baixo a Fazenda das Cruzes.
Imagem 22: Anna Leite e irmãos na Fazenda Bicame
Os Monteiro são sempre narrados como sendo pessoas de má índole. Em dado
momento, Álvaro Monteiro comprara as terras de Evarista, uma das herdeiras, porém,
existia uma gleba no meio das terras que comprou. Para expulsar o dono desta gleba, ele
colocou fogo nos bezerros, deixando o pobre dono apavorado, fazendo com que saísse
de sua propriedade finalmente. Para mostrar ainda a propagada maldade intrínseca
84
àquele ramo da família, são narradas histórias em que João Monteiro era responsável
pela fabricação de bombas caseiras as quais jogava sem nenhum pudor nas pessoas
dentro do Barracão, no meio da festa de Sant’Anna, considerada a maior festa da região
na época.
Porém, a briga em questão que queremos narrar se dá por conta de uma dessas
compras de terras dos Monteiro, que acabava fazendo fronteira com a fazenda Bicame,
dos Leite. Uma das discussões por terra se deu na cerca, onde os primos se encontravam
armados. A primeira morte foi cometida por Isaura, do lado dos Monteiro, assassinando
José Leite, filho de Albertina (de descendência da Escrava Geralda), esposo de Mônica
Leite Sarapião e pai de Anna Leite. Isaura teve sua morte encomendada, e Bené, o
barqueiro que atravessava as pessoas para o lado do Rio onde as fazendas ficavam,
acabou apanhando muito por ter atravessado o assassino. Depois disso, Mônica mata
Álvaro Monteiro, porém seu filho Ruy assume a culpa e acaba preso. Quando Ruy é
solto, a família inteira vai até Aparecida do Norte para agradecer, porém, parece que a
mãe vendeu tudo o que possuía para soltar o filho, já que sentia remorso de vê-lo na
cadeia pelo crime que havia cometido.
Imagem 23 – Mônica e José Leite
85
Sangue e incesto: Doenças e Maldições
Segundo o que ouvi (e vivi de certa forma), o casamento entre primos era algo
muito comum até a pouco tempo atrás. A convivência por conta de uma família extensa
onde todos são criados juntos era o empurrãozinho a mais para que os casamentos
acontecessem. Anna Mafra, por exemplo, se casou com o primo de sua mãe Arthur
Marques dos Santos, que fora criado na mesma fazenda que ela. O casamento não fora
recriminado, porém, trouxe alguns maus agouros, como a morte prematura da primeira
filha do matrimônio, Alfredina, que falecera aos seis meses de idade de coqueluche,
sendo considerada pelos irmãos como um anjo que cumpriu sua missão e tomava conta
deles lá de cima. Nenhum conheceu a irmã em vida, mas esperavam conhecê-la após a
morte. Mazinho conta um pouco sobre esses relacionamentos entre primos:
E a tia Laudilina... tia Laudilina casa com tio Juvenal, que é irmã de vó
(Anita). Tio Juvenal é irmão de tio Vantuiu que casa com tia Candoca, que é
prima legítima de vó (Anita). Ela é filha de tia Bené com tio Ceção. Tia
Candoca tem um filho Ferreira que casa com tia Tereza que é filha de tia
Laudilina, os avôs são irmãos. Aí na geração do meu pai e da sua avó é que
parou de casar parente. Mas lá em Belford Roxo, o pessoal da tia Isaurinha
casou também com o pessoal de tio Brexó, que é o irmão da vó (Anita). Mas
eu não sei por que eu não os conheço.
A nossa bisavó (Florenciana, de apelido Cati), era uma pessoa muito
correta. Ela teve um irmão de vô Arthur, chamava tio Alfredo, ela teve com
Brás Giffoni... Um filho do próprio cunhado! Vó Cati, sua bisavó, mãe de vô
Arthur, teve um filho com o próprio cunhado, Brás Giffoni, que era casado
com uma das suas irmãs. Essa é a familia, “a cachorrada é velha.” A vó dizia
isso!
Na verdade Brás se relacionou com três filhas do Barão, (Florenciana (Cati)
localizada em anexo II e III; Braselisa localizada em anexo IV, e Deoclídes, localizada
em anexo IV), sendo também avô da dona Ieda Giffoni, uma de minhas interlocutoras,
pois seu último casamento foi com sua vó Quide (Deoclides).
Outro fator que faz com que o incesto seja visto como algo que traz má sorte é o
fato de considerarem certas doenças como genéticas no caso de relacionamento entre
parentes muito próximos. Grande parte dos filhos de Anita e Arthur, por exemplo, e, por
sua vez, seus filhos que já vieram a óbito, faleceram de câncer, o que leva a crer na
possibilidade de se relacionar o casamento à doença. Outras doenças que os familiares
julgam ser devido aos relacionamentos incestuosos é a “loucura”, seja esquizofrenia,
psicose, depressão, bipolaridade. Essas doenças muito frequentes dentro da família
86
podem levar ao suicídio e o suicídio por sua vez é, segundo relatos, mais uma maldição
que ficaria presente durante três gerações, Mazinho mais uma vez fala sobre esse
problema que também era um problema que o acompanhava, já que sofria de depressão:
Mazinho - Ah e uma coisa que marcou muito a família, marcou demais, não
são os surtos psicóticos e as doenças psíquicas só não, mas a quantidade de
câncer que tem na família, isso foi um negócio que marcou muito, me judia
muito.
Eu - Agora né, com a Katia. (uma parente que havia morrido há pouco
tempo)
Mazinho - Ah tá... Esse problema eu vivo 24hs por causa da depressão. A
médica me explicou que é por causa dessa consanguinidade, então é por isso
que existe esse processo depressivo. Temos vários parentes que cometem
suicídio, tanto que aqui em casa a gente tem dois né, o Vô e a tia Cici. O
mais engraçado de todos é o tio Joaquim, ele foi se matar no cemitério e eles
o enterraram lá mesmo.
Tada - Mas pra você ver como isso está no sangue, é caso da Verena, era
uma pessoa que não tinha contato com a família Marques dos Santos, mas no
entanto o sangue falou mais alto. (Verena seria uma sobrinha de Tada, de um
relacionamento extraconjugal de seu pai, que cometeu um suicídio)
Mazinho - O sangue falou mais alto. Tinha esquecido da Verena. É são três
casos na família da vó Anita. (Berta – sua mãe; Arthur - marido e Cici -
filha)
Otto - Só pela raiz nossa do lado de cá?
Mazinho - Da tia Cidinha, dois ou três lá se suicidaram! O Olivier... E eu não
lembro o nome dos outros. Eu guardo o Olivier, porque a mamãe se dava
demais com o Olivier. E ela falava muito dele...
Além da depressão que sofria, Mazinho falecera em janeiro de 2015 de um
câncer no intestino recém descoberto. O fato foi muito doloroso para mim, já que além
de primo da minha mãe, ele sempre esteve disposto a ajudar na minha pesquisa, me
indicando pessoas para conversar, muitas vezes pegando no telefone para ligar e marcar
de ir comigo à casa de algum parente (coisa que não fizemos juntos). Ele realmente
sabia de muitas histórias, tive a sorte de ter gravado nossa entrevista em vídeo. No dia
não entendia quem eram aquelas pessoas todas às quais ele se referia, mas conforme
minha pesquisa ia avançando, me familiarizava cada vez mais com a genealogia, pois
conversava com os seus descendentes, via os rostos de seus parentes em fotos e ouvia
um pouco mais de suas histórias, o que me fez criar cada vez mais intimidade tanto com
os vivos quanto com os mortos. Candoca (neta da “tia Candoca”, em anexo II e III)
infelizmente não permitiu a gravação de um vídeo, e eu me perco no meio de tantas
informações (mesmo fazendo anotações), mas ao me mostrar seu álbum muitas histórias
87
surgiram, entre elas diversas narrando casos de loucura e de suicídios também do seu
lado da família, o que atribuía da mesma forma aos relacionamentos incestuosos.
Imagem 24: Anna Mafra e Arthur Marques dos Santos
Incesto e suicídio também estão relacionados dentro de um caso já comentado
anteriormente. O relacionamento entre Berta e Mário dos Santos Mafra era incestuoso,
sem que o casal soubesse (anexo II). O drama já fora narrado, que termina com o
suicídio de Berta ateando fogo no seu próprio corpo ao descobrir que mantinha relações
com seu sobrinho. Seus filhos foram criados por sua tia Jacintha (“Tota”, casada com
Alfredo, irmão de Arthur, que viria a ser esposo de Anita) e na companhia da avó
Rozina na fazenda do Bom Retiro. Dizem que Anita viu sua mãe se matando e
coincidentemente a tragédia acabou por se repetir ao seu marido, que anos depois, em
um surto de loucura, jogou álcool na cabeça e acendeu um cigarro, morrendo logo em
seguida. A maldição do suicídio iria mais uma vez estar presente na vida de Anita,
quando sua filha mais nova se jogou na frente do trem que passa próximo à casa que
ainda recebe os familiares nos encontros de finais de semana. Uma maldição. Três
gerações.
88
A Performance da História: Memória e parentesco
“Um homem conta suas histórias tantas vezes que se
mistura a elas e elas sobrevivem a ele”
Peixe Grande (Tim Burton)
Nessa parte do capítulo, retorno a um tema iniciado de forma embrionária na
monografia, mas que aqui se faz necessário ser aprofundado, que é o caso dos
narradores. Todas as pessoas com quem conversei aceitaram falar, pois realmente
possuíam algo para dizer. Essas pessoas ouviram histórias sobre sua família ou sobre
sua cidade, por isso possuíam de certa forma o hábito de contá-las, que como
observado na monografia (CAMARGO, 2012), havia uma certa “hereditariedade” entre
os que eram considerados os mais entendidos, o que deixava claro que mesmo que essas
histórias fossem contadas em muitos encontros de família, elas se repetiriam de forma
mais constante dentro da família nuclear, ficando ainda mais fortes entre as pessoas que
ainda vivem em Barão de Juparanã e suas redondezas (no caso dos moradores da
cidade, sendo parentes ou não, estes possuem bastante conhecimento sobre as histórias).
Como pudemos observar pelas citações feitas do meu encontro com Mazinho,
durante um almoço em Mendes, cidade onde moram ainda alguns dos descendentes de
Anita e Arthur, as histórias ganham mais brilho e vão se desenvolvendo de acordo com
a participação dos outros parentes. Os narradores não são solitários, necessitando dessa
interação para que as recordações cheguem, como Ecléa Bosi expõe:
As lembranças do grupo doméstico persistem matizadas em
cada um dos seus membros e constituem uma memória ao mesmo
tempo una e diferenciada. Trocando opiniões, dialogando sobre tudo,
suas lembranças guardam vínculos difíceis de separar. (BOSI, 1994,
p.423)
Nesse meu primeiro encontro com as histórias de família, já visando minha
pesquisa que aqui está apresentada, percebi que muito deveria ainda aprender sobre
estes familiares, nunca havia ouvido falar de nenhum, não sabia porque eram
importantes, e a enxurrada de informações muitas vezes me parecia sem sentido.
Conforme fui conversando com outros parentes, fui percebendo que eu poderia começar
89
a contribuir com as narrativas, de acordo com aquilo que já havia escutado. Assim fui
tirando dúvidas sobre quem eram aquelas pessoas, que estavam nomeadas na
genealogia, mas que possuíam suas próprias histórias. Fui portanto fazendo a minha
etnografia da história, mas ao mesmo tempo construindo de forma conjunta com meus
interlocutores uma memória de família.
“A memória “gira” em torno da relação passado-presente, e envolve um
processo contínuo de reconstrução e transformação das experiências
relembradas”, em função dos relatos públicos sobre o passado. Que
memórias escolhemos para recordar ou relatar (e portanto, relembrar), e
como damos sentido a elas são coisas que mudam com o passar do tempo.
(THOMPSON, ANO, p.57)
Talvez essa memória não mude apenas com o passar do tempo, mas com aquilo
o que se quer acessar, ou seja, com o estímulo que impulsiona essa memória a se
relacionar com o momento. O que faz com que ela se atualize, e essa atualização já é
uma mudança. Eu aqui posso ter sido um dos agentes, pela minha curiosidade e
interesses antropológicos. Talvez tenha sido apenas um estopim para que as histórias
viessem mais uma vez à tona.
“(...) Ver imagens e ouvir vozes de um tempo distante, e a partir delas
produzir narrativas, memórias sobre fatos, pessoas, coisas, situações e
lugares próximos. O caráter relativo das noções de tempo e distância
não é meramente retórico. (...)”. (CUNHA, 2005, p.8)
Observei por meio desse “acesso à memória”, muitas vezes as pessoas voltarem
no tempo, seus semblantes se modificarem, e reviver os bons tempos de infância.
Adaury se emociona ao lembrar-se de quando chegou pela primeira vez à casa que
passaria boa parte de sua infância com seus irmãos (todos já falecidos), se lembra das
brincadeiras de moleque, e lá está o moleque novamente. Dona Iedda, por sua vez, ao
lembrar-se de suas estripulias na fazenda de Guilhermina, uma das filhas do Barão e
onde sua avó vivia, me pareceu ter uma visão daquele momento. E eu mesma pude
reconhecer naquela senhora de 91 anos, a menina de pés descalços que corria entre os
cafezais, ao som dos gritos de reprovação de sua avó. Anna Leite, mais discreta, me
mostra suas fotografias de infância na fazenda Bicame, e com um sorriso de canto de
boca e em silêncio, fita o retrato como se ali estivesse mais uma vez com seus irmãos,
mãe e pai: “Ah, a fazenda de papai”. Segue abaixo o relato emocionado de Adaury:
Quando eu vim para cá, chegamos a Mendes dia dois de fevereiro de 1942 às
7h40 da manhã. Até isso eu lembro! Desembarcamos e a casa que íamos
90
morar era em uma subida. Subimos. Papai ficou em Afonso Arinos. Só veio
mamãe e os filhos Anny, Aloy, Amaury, eu (Adaury), Annely, Aurely,
Dinho, Turrico, Naná. Agora não sei se Cici e o Edu nasceram aqui... Mas
subimos a ladeira e chegamos à casa. A casa estava abandonada há um
punhado de anos. Era suja, esquisita, mas era um casarão. A princípio feia,
mas depois maravilhosa, pois foi ali que eu me conheci como gente.
Muitas vezes as narrativas fluíam durante um tempo bem considerável sem o
auxílio de nenhum documento, porém, em um dado momento era necessário acessar
aqueles papéis e fotografias que poupariam os esforços da memória a qual seria
facilitada pela visualização (CUNHA, 2005, p.22). Ao retornar agora no início de março
de 2015 a Juparanã, da dissertação resolvi fazer entrevistas com algumas pessoas
filmando-as. Uma delas foi a Dona Anna Leite. Ela quis ficar de pé em sua varanda.
Encarava o lado esquerdo do céu, não sei se por timidez, ou se por estar se esforçando
ao máximo para acessar suas memórias:
Anna - O Barão de Juparanã é o Manuel Jacintho Nogueira da Gama, e ele
não era casado, mas tinha cinco mulheres. Essas mulheres eram todas
descendentes de escravas e aí vem os filhos que eu não vou falar porque não
sei, são muitos... Eu sou tataraneta.
Eu – Mas a Mônica, sua mãe, era filha de quem?
Anna – Da Florência. Florência era neta, minha mãe bisneta e eu sou
tataraneta.
Eu – E a Florência era filha da...?
Anna – Se eu não olhar no papel eu não vou lembrar, mas se eu olhar no
papel posso falar tudo... Eu já esqueci tudo, tá vendo? Não dá pra eu
guardar...
O documento é na maioria das vezes necessário para fazer com que as pessoas se
recordem. Muitas delas já possuem certa idade, o que não permite mais a facilidade das
idas e vindas na memória. Contudo, ainda estão lá os detalhes mais deliciosos em suas
narrativas. O documento é um mero suporte, ou o “meio de transporte” capaz de levar
essas pessoas para o passado, porém uma vez que lá se encontram, a lembrança aparece
de forma leve, os parentes falecidos tomam vida novamente, as festas ganham cores,
danças, prendas...
O valor do documento reside em que se mantenha intacto na sua
suposta capacidade de nos deslocar para o passado. Para tanto, quase
sempre, serve de atestado, prova material de que o tempo, pelo menos
naquele objeto, foi preservado. Em diversos encontros aprendi ser
91
possivel “ver” outras coisas: o tempo que permanece transformado.
(CUNHA, 2005, p.25)
O curioso é a transformação lenta que foi se operando em minha própria pessoa.
Eu, que não me via capaz de pronunciar um nome corretamente, já estava
completamente familiarizada com as histórias. Preferi a princípio, como já revelei, não
fazer gravações para que os meus interlocutores se sentissem o mais à vontade possível;
essa escolha foi bastante refletida, mas muito mais trabalhosa. Não possuía em meu
poder nenhum dispositivo tecnológico que me fizesse retornar às cenas que vivenciei, o
que me fez, certamente, não poder recuperar muitas histórias interessantes. Percebi que
quanto menos preocupada com isso eu ficasse, mais as histórias ficavam claras para
mim, e agora, ao me deparar com uma citação de Benjamim, em seu texto o “O
Narrador”, pude compreender melhor o que se operava. Estava eu, por uma escolha
metodológica, me tornando também uma narradora.
“Quanto mais o ouvinte se esquece de si mesmo, mais
profundamente se grava nele o que é ouvido. Quando o ritmo do
trabalho se apodera dele, ele escuta as histórias de tal maneira que
adquire espontaneamente o dom de narrá-las. Assim se teceu a rede
em que está guardado o dom narrativo. (BENJAMIM, p.05)
Por transitar de um lado a outro, também colocava em contato informações que
uns apenas tinham em partes, ou não sabiam, enquanto outros podiam acrescentar ainda
mais. Realmente estava me tornando uma conhecedora das histórias. Infelizmente o
tempo curto de um trabalho de campo para a dissertação de mestrado, não foi o
suficiente para vivenciar momentos espontâneos (no período em que fiquei trabalhando,
marcava entrevistas), onde as histórias surgem em encontros de família. Tenho
registrado em minha monografia (CAMARGO 2012), uma ocasião em que Aloy, um
dos filhos de Anita e Arthur, já falecido, inicia uma conversa que vai culminar na
narrativa de algumas histórias. Reproduzo aqui um trecho:
Era a comemoração do aniversário de dois membros da família:
Adaury, um dos filhos de Arthur e Anita, e Betão, marido de Katia. A festa
acontecia do lado de fora da casa, em volta da piscina, em um churrasco
animado, enquanto dentro da casa algumas pessoas permaneciam assistindo
a um jogo de futebol. Sentado à mesa na antessala se encontrava Aloy, um
pouco deslocado, solitário e pensativo. Foi quando fui falar com ele que,
emocionado, começou a falar de minha mãe e de minha avó. A partir daí,
muitas histórias foram lembradas da infância deles, ou de quando minha avó
foi estudar no Rio. Histórias sobre o Barão de Juparanã e Duque de Caxias
(já que, segundo Aloy, foi seu avô - pai de seu pai - quem cuidou de Duque
92
de Caxias quando senil viveu com a filha na Fazenda Santa Mônica), se
misturavam com as histórias de sua vida e de sua carreira profissional como
enfermeiro. Histórias sobre a linha do trem, esta mesma que passa na frente
da casa em que estávamos, já que seu pai foi chefe da estação velha de
Mendes. Aos poucos outras pessoas chegavam perto para participar da
conversa. A festa continuava acontecendo do lado de fora com música alta,
crianças na piscina e conversas informais, enquanto do lado de dentro se
ouviam as histórias, narradas num tom de voz baixo e tranquilo.
(CAMARGO, 2012, p.23)
O grande evento de Sant’Anna, o maior encontro de toda a família acontecia
durante a festa na igreja que ficava entre as fazendas dos primos. Como já mostrado
anteriormente, o terreno da igreja fora comprado (alguns dizem que ainda pertence à
diocese, mas não há como comprovar), e como não se interessaram pela igreja,
deixaram que virasse ruina, restando hoje apenas a fachada. Anna Leite nos conta sua
versão de como era a festa de Sant’Anna:
Mamãe e o papai faziam muitas festas lá. Festas “beleza”. Era num
morrinho, a subida toda cercada ao lado por palmeiras que estão lá até hoje,
e o papai e a mamãe faziam as festas todo ano no dia de Sant’Anna. Se não
caísse o dia 26 (de julho) num sábado ou domingo, procuravam marcar
numa data mais próxima. Era muita gente mesmo. Era assim: Um ônibus
para os músicos, um ônibus para os cantores e um ônibus pro “povão”. A
iluminação era feita com bambu gigante, são bambus mais grossos, então
colocava querosene e fazia a parte de cima. O morro era todo iluminado com
esse tipo de lampião - tipo tocha, né? Era muito bacana... Tinha o leilão! O
tipo de cobertura era igual de circo, com um tablado no centro, onde no meio
tinha uma mesa onde o pessoal colocava as prendas, e as pessoas dançavam
em volta.
A maioria era parentada, porque as tias, que eram tias da mamãe, moravam
todas nas redondezas. Então tem a casa da tia Singelo, da tia Sinhana, da tia
Evarista... E tinha uma casa também do lado, do outro lado da Maria
Singelo, que eram quartos, não eram alugados e cada parente que vinha de
fora ficava num daqueles quartos onde antigamente se colocavam aquelas
esteiras.
A mesma pessoa que necessitava dos documentos para poder acessar a memória,
faz uma descrição primorosa de como era a vivência das festas de Sant’Anna, se
recordou dos nomes das tias, do tablado, das prendas e das danças, fazendo com que sua
narrativa transparecesse todos os detalhes desses dias festivos.
93
O trem: Personagem Implícito das Narrativas
Um personagem que a todo o momento é referido nesse trabalho, é o “trem”. É
por conta de seu trajeto desviado por influência do Barão de Juparanã na corte, que a
cidade onde fui estudar foi criada. É o motivo da mobilização da população da cidade
em torno da reforma da Estação que já fora considerada a mais bela entre o Rio de
Janeiro e Minas Gerais, criando assim o S.O.S Barão de Juparanã. Os habitantes das
cidades do vale do Paraíba fluminense cruzam seus trilhos a todo o momento. Duas
pontes ferroviárias cortam o distrito de Juparanã, anunciando o seu início e seu fim.
Muitos moradores do entorno da malha ainda trabalham para empresas de logística
ferroviária, porém, vários se sentem saudosos do tempo em que a linha D. Pedro II
ainda circulava pela região. Esta fazia transporte de passageiros e seu cancelamento é
visto como um crime, segundo Dona Iedda Giffoni. Muitos dos descendentes do Barão
e moradores do distrito eram empregados pela Central do Brasil, inclusive como já foi
citado, Arthur Marques dos Santos, que fora chefe de diversas estações e seu meio
irmão e tio de dona Ieda, Alfredo Giffoni. Segundo a narrativa de Iedda e seu filho Luiz
Antônio, este possuía muito “cartaz” na Central do Brasil, por suas habilidades em
construir pontes. Mesmo que não fosse engenheiro, era sempre consultado desde que
em uma ocasião, lá para os lados de Minas Gerais, uma ponte fora projetada por um
engenheiro. Ao ver o projeto, Alfredo reprovou, dizendo que se ela fosse construída
daquela forma, iria abaixo. Sem dar ouvidos ao funcionário hierarquicamente menos
entendido do que o engenheiro, a empresa mandou construir a ponte. Algum tempo
depois, como previsto pelo tio de Iedda, a ponte caíra dentro do Rio, causando um
enorme acidente de trem. Para que fosse reconstruída chamaram, portanto, Alfredo.
Segundo Luis Antônio, a ponte se encontra até hoje no mesmo lugar e recebe o nome de
Alfredo Giffoni em homenagem àquele que a projetou com sucesso.
Mazinho narra a importância de serem preservadas as malhas ferroviárias, já que em sua
opinião:
o Brasil foi industrializado e desenvolvido à margem da ferrovia. O Governo
novo que não vê isso. Deixa ao léu. Tem até pedaços aí como no caso de
Angra que não é usado, o pedaço de Miguel Pereira... Se houver aqui na
nossa malha, nessa região algum acidente, o Rio, os portos do Rio vai ficar
acabado, por quê? Porque eles não conservaram a malha de Miguel Pereira.
E Por que que existia a Malha de Miguel Pereira?
94
Isso é história de vô Arthur: A malha de Vassouras, quando caiu um túnel
durante a Guerra aqui, na nossa serra, o Rio foi todo abastecido passando
por Vassouras, até chegar em Japeri, ali em Barão de Vassouras, fazia a
transposição. Trocava da bitola larga pra bitola estreita. Levava até Japeri e
passava de novo pra bitola larga, pra chegar pra abastecer o Rio. Tanto que
no Rio nunca ficou sem nada: leite, verdura, carne, tudo que vinha de Minas,
do interior de Minas foi. Onde? Pela malha de Vassoura. É a finalidade da
malha de Miguel Pereira, pois que ela chega à Paraíba do Sul na bitola larga.
O vô sempre me ensinou isso, eu tinha 12 anos quando o vô morreu, e ele
contava essas histórias pra a gente, quando ele contava era assim também,
enfiava a gente assim também, (cruzando as pernas) enfiava aqui e contava,
e o pai do lado confirmando e aprendendo também. Se houver algum
problema, desvia o trem lá em Paraíba do Sul, ele passa por Miguel Pereira,
e sai lá em Japeri, sai no porto de Itaguaí. E isso não tá sendo feito. Isso meu
avô me contou eu tinha 12 anos, eu vou fazer 56. Eu sempre ouvi dizer, que
a gente pegava o trem em Mendes e ia até o sertão. E onde começa o sertão?
Montes Claros em Minas, que é a capital do norte de Minas. O vô sempre
falou isso, e o pai, que é ex-ferroviário sempre falou isso. Tanto que não tem
mais trem pra lá. Você pegava o trem em São Paulo, você ia à Bolívia. Meu
avô me contou isso, meu pai, tudo isso eles contaram
Não é apenas por a uma motivação econômica, porém, que Mazinho reconhece a
necessidade do resgate das malhas ferroviárias brasileiras, mas sim às suas memórias do
tempo em que estudava em Barra do Piraí, e puderam ter uma boa educação por conta
do trem, enumerando vários dentistas e médicos locais que se formaram indo estudar de
trem.
O trem faz parte tanto da paisagem física desses lugares no vale do Paraíba,
quanto da paisagem sonora. Todo o ar bucólico e tranquilo se desestabilizam com a
passagem do trem. Seu apito nos faz recordar do tempo do progresso, do movimento
que trazia novidades e pessoas, que levavam sonhos para lugares distantes, mas logo
esse trem passa, não levando nada e nem deixando coisa alguma, apenas a esperança de
que um dia todas essas estações abandonadas, que cruzam caminhos tão distantes,
ganhem novamente serventia, como nossos amigos de Juparanã conseguiram
reinventando sua função e transformando em necessária para a população.
95
Etnografando a história, etnografando tudo
Quando me propus a realizar uma etnografia da história18
, tinha em mente ter a
história como tema central, porém, abordá-la de forma genuinamente antropológica,
realizando o trabalho de campo, o ampliando em termos metodológicos: realizei o
trabalho de campo clássico nos moldes malinowskianos, permanecendo durante o
período de seis meses entre Barão de Juparanã e redondezas batendo de porta em porta
para conversar com as pessoas; aproveitava esses momentos para coletar os mais
diversos arquivos de família, como fotos, anotações, genealogias, fotografias, certidões,
até mesmo artigos e revistas; habitei um ambiente que não seria o “meu” enquanto
antropóloga, e quase me perdi por isso. Convivi com os arquivos que são atraentes e
deliciosos de serem trabalhados. O passado falado é tão gostoso quanto o escrito, e o
que apreendi foi a imagem do pensamento daquela época (1850 à 1888, período
pesquisado), naquele local. Ao ter em mente todos os dias em que convivi com aqueles
papéis, abordá-los de forma antropológica, nos termos definidos por Olívia Maria da
Cunha (2005), acredito ter não só conseguido encontrar outros casos de nobres Barões
do café que se envolveram de forma intensa com escravas a ponto de deixarem toda sua
herança para elas e seus filhos, como pude “vivenciar” todo o preconceito da justiça e
das famílias, que chegou no ponto culminante do suicídio do primogênito do Barão de
Garibú. Ainda tendo em mente etnografar a história, olhei, mesmo que por pouco
tempo, para a forma como ela foi apropriada pela luta do movimento S.O.S Barão de
Juparanã, visando primeiramente de forma urgente a reforma da estação – símbolo da
história da cidade -, mas que hoje estão envolvidos em dezenas de pautas para a
melhoria do bem-estar das pessoas que lá vivem de uma forma geral. Observando essa
breve revisão do trabalho realizado, podemos perceber que a etnografia da história é
uma etnografia, pura e simples. O complemento “da história” possui apenas uma função
de recorte temático, antropológico e bibliográfico. Seria talvez mais fácil trabalhar com
o “parentesco”, utilizando uma temática já estabilizada, estudada desde os primórdios
das ciências sociais, ou talvez se estudasse apenas a política que está envolvida nas
relações que presenciei ou “ouvi falar”. Seria um trabalho primoroso e pretendo me
dedicar a esse campo em breve. Mas lancei-me no desafio de trabalhar com a história,
disciplina que já foi a minha escolha acadêmica durante dois anos, dos 17 aos 19 (há 14 18
Termo elaborado em conjunto com a minha Orientadora, a Profª Ana Cláudia Cruz da Silva. A
principio, chamei de ‘antropologia da história’, termo utilizado também por outros autores, notadamente
Schwarcz. A ideia de fazer uma ‘etnografia da história’, como sugerido por minha orientadora, adequa-se
melhor à proposta de perceber a história em uso pelos agentes sociais.
96
anos). Não voltei para a história por um saudosismo pueril, até mesmo porque meus
objetivos no curso de história não eram mexer nesses assuntos de família. Voltei-me
sim, para a possibilidade de que em sua relação com a antropologia eu pudesse
compreender melhor as práticas vivenciadas no campo que escolhi, suas razões e
objetivos. Sem centralizar o tema da história (mesmo que sempre o problematizando e o
questionando) esse trabalho seria outro. Se colocasse a história como apenas mais um
tema, e não o central nesta etnografia seria como renunciar àquilo o que estavam meus
interlocutores sempre repetindo. E não, não fui eu quem os induziu a isso. Antes mesmo
que eu fosse parar em Juparanã, o movimento S.O.S já estava falando de “história” em
suas reivindicações, movimento este formado tanto por parentes, quanto por não
parentes (talvez esses últimos até sejam a maioria).
97
CONCLUSÃO
Confesso que estou chegando ao fim desse trabalho com uma leve sensação de
que poderia abordar mais assuntos, porém, com o tempo curto que é imposto ao
mestrado, o trabalho não se faz suficiente para encontrar todas as possibilidades de
desdobramentos aqui dentro. Finalizo deixando essa conclusão ainda em aberto, mas
em um nível mais bem elaborado do que deixei na minha monografia em 2012
(CAMARGO, 2012). Em 2012 olhei principalmente para as narrativas a partir do
“narrador”, e das histórias que eram lembradas pelo compartilhamento de fotografias
antigas em um grupo do Facebook, “A Parentada da Dona Anita”. Aqui ampliei o olhar
e amplifiquei as histórias, buscando pela etnografia reconhecer suas utilidades práticas
nos dias de hoje para os moradores do distrito e para os descendentes do Barão de
Juparanã. Tentei me remeter a tudo, desde a paisagem ao movimento político, passando
pela circulação dos arquivos, pelos segredos que desarmonizam o tão esperado
equilíbrio de uma “família”. Esta foi também uma dissertação recheada de imagens,
pois ainda percebo que elas são recursos muito utilizados para que meus interlocutores
acessem suas lembranças e suas histórias. Vivenciei momentos únicos que tentei passar
aqui descrevendo os momentos da forma mais minusciosa possível, para que também
fossem apreendidos pelo leitor da mesma forma que o foram por mim.
Acredito ter conseguido demonstrar ao que me referia, sobre o que é fazer uma
etnografia da história, ao mesmo tempo em que realizei essa etnografia proposta durante
toda a escrita, mas para que não fique nenhum ponto desamarrado, talvez seja
necessário voltar a alguns deles. Ao tratar da história não visei em momento algum
atingir algo mais verdadeiro. A realidade não é o que mais se aproxima da natureza, a
realidade é o que é realmente construído - pois até a natureza é uma construção - , que
possui efeitos sobre as ações práticas. As práticas cotidianas, portanto, possuem uma
metafísica específica. Sendo assim, parece que voltamos ao que Lévi-Strauss coloca de
que simbolismos e práticas não são separáveis. Joana Overing (1995) acrescenta que
não podemos julgar mundos valorativos de um ponto de vista objetivo específico, já que
são diferenças incompatíveis de intenções diferentes pertencentes a histórias diferentes,
portanto os padrões de julgamentos devem ser também diferentes. Em Juparanã
podemos observar diversas intenções dentro de uma mesma perspectiva da história. Ou
98
seja, não há, nem mesmo em um espaço delimitado e num “grupo” de referência, uma
unidade dos sentidos de história.
O mais visível e o que talvez estrapole as relações entre familiares e moradores
de Juparanã, são as reivindicações pela reforma da estação abandonada. É aqui que
vemos um impulso para que o outro, que aqui é o Estado, compreenda a importância da
presença do edifício para os moradores, de forma quase que constituitiva. Muitas
pessoas do movimento se referiam ao desabamento iminente, que seria causado pelo
abandono, ao “fim de Juparanã”. Era uma questão de vida ou morte. O que podemos
deixar em aberto para as pesquisas que serão continuadas no doutorado, é: Será que o
grito que o movimento lançou, foi realmente escutado? Ao que pude perceber, já
acompanhando as eleições de 2014, houve uma utilização das pautas do movimento
S.O.S Barão de Juparanã para fins eleitorais, como foi demonstrado no folheto político
que unia o vereador local, Naldo, e o candidato na época e atual governador Luiz
Fernando Pezão. As obras se iniciaram dois meses antes das eleições. Ao retornar agora
em março de 2015, os moradores disseram que as obras estão andando lentamente, mas
a justificativa dada pelo governo seria de que os materiais e a forma como se deve
restaurar devem seguir o projeto original. Essa justificativa deu conta dos anseios dos
juparanenses. Ainda teremos muito tempo até que a estação seja inaugurada, tempo
suficiente para ouvir outras histórias, conhecer mais “primos” (tem um lado inteiro da
cidade ainda para explorar), acompanhar outras eleições... A próxima será em 2016, e
esta é muito importante de ser vista, pois segundo alguns dos fundadores do S.O.S
Barão de Juparanã, o movimento foi criado por conta do abandono a que o vereador
eleito pelo distrito mantinha a população local. Resolveram eles mesmos atuar em prol
de suas necessidades. Algumas pessoas porém, não compreendem como que ele
consegue sempre se reeleger com o voto do distrito, já que boa parte da população se
diz indignada.
Por mais que esses assuntos se encontrem pendentes, e deverão ser trabalhados
em mais profundidade no doutorado, sinto que mesmo com o curto tempo disponível
para fazer esse trabalho etnográfico, dei conta desse “retrato de família”, mostrando as
dinâmicas das relações dos descendentes do Barão de Juparanã desde os tempos em que
receberam as heranças de seu pai falecido até os dias atuais. As histórias são como
mitos, assim como mitos são como histórias, não há como fazer diferença entre ambos.
Para Levi-Strauss:
99
Mitos se reencontram como partículas agregadas em nebulosas num céu
estrelado. Só vemos aquelas poeiras míticas de nossa vizinhanca, e devemos
nos contentar em entender tendências que operam localmente, infletindo o
espaço mítico, e apontando para o fato de que ele talvez seja afinal visível
como um todo apenas para um observador virtual situado num ponto no
infinito. A análise de mitos e necessariamente local. (LÈVI-STRAUSS, 2014
[1964], p.30)
Olhei para as histórias (ou mitos) da origem dessa localidade, do pai generoso e
bom senhor de escravos; para esse caso que não se faz contraditório na localidade, nem
entre os parentes, de um homem religioso que possuia um “harém” de escravas, mas que
sempre é perdoado pelos folhetos comemorativos dos aniversários da igreja de Nossa
Senhora do Patrocínio, já que “nenhum homem é perfeito”, e também por ele ter sido o
“nobre idealizador da igreja” (RAMOS, 1981), não poupando nem dinheiro e nem
esforços para que ela fosse construída, sendo inaugurada, porém, somente após sua
morte. Além disso, foi desses relacionamentos que se originaram essas pessoas que
contam hoje suas histórias, fazendo de forma muito consciente uma exaltação dos casos
que ouviram e viveram desde então, como algo peculiar dentro do contexto das
relações, tanto entre senhores e escravos, quanto das relações entre a própria famíla.
Podemos finalizar esse trabalho com a citação de Heredina (apud Olivia Maria de
Cunha), que se adequa a uma das versões da história, talvez a mais política, concebida
pelos juparanenses e descendentes do Barão de Juparanã:
A História é uma arma na mente da comunidade, um elo com a
dimensão mais ampla e importante da pátria, uma ação das pessoas sobre o
tempo: tomar posse da memória de seus próprios fatos para guiar-se e
utilizar valores superiores diante do presente e encontrar o rumo do futuro”.
(Apud CUNHA, 2010,nota da introdução de numero 11 p. 25)
100
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Arquivos IPHAN de Vassouras
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Fundo/Convênio TJERJ – Vassouras
Testamento do Barão do Tinguá (Pedro Correa e Castro). Testamenteiro: Antonio
Agrícola Fontes - Ano do documento: 1865 - Documento 102663962038 -
Fundo/Convênio TJERJ – Vassouras
Parte do inventário do Barão de Guaribú – de 1863 à 1895 - Documento
103664154001 - Fundo/Convênio TJERJ – Vassouras
Arquivos Pessoais Consultados
Testamento do Barão de Juparanã e Escriptura de Hypotheca do Barão de Santa
Mônica. Typ. De Sant Rosa. Freguezia de Santa Thereza. 1885. Segunda Edição
Genealogia feita por Mônica Leite, de posse de Anna Leite
Certidões e registros de casamento cedidos por Anna Leite
Árvore feita por Mônica Leite, de posse de Ivo
Genealogia feita por Amaury e Cidinha
104
Anotações feitas por Elza sobre o Barão de Juparanã e outros notáveis de Valença
Anotações feitas por Anny Marques sobre a família
Documentos sobre o Andamento das obras da Estação cedido por Luiz Antônio
Álbum de fotografias de Candoca
Álbum de fotografias de Ivo
Álbum de Fotografias de Anna Leite
Álbum de Fotografias de Maria José
Álbum de Fotografias de Adaury
Álbum de Fotografias de Anny
105
ANEXOS: GENEALOGIAS
ANEXO I: FAMÍLIA DA ESCRAVA MANOELA AGOSTINA
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
MANOELA AGOSTINA
FILHOS DO
BARÃO
1) JORGIANO - (30/09/1849 CASADO EM 07/10/1875 COM IDALINA DE SOUZA
2) MANOEL JACINTHO - (21/07/1853 CASADO EM 07/02/1867 COM JOSEPHINA MARIA DA CONCEIÇÃO
3) BRASILIANO - (13/8/1860) CASADO COM JOSINA ISABEL
4) MANOELITA - (27/07/1861) CASADA EM 08/08/1882 COM JORGE VIEIRA
4) a -BERNARDINO CECILIANO
b- ZINHO
106
NETOS DO
BARÃO
c- CENAZALDA
d –TANCREDO
BISNETOS DO
BARÃO
4.A - ISIS BARBARA (LOCA)
TRINETOS DO
BARÃO
(FILHOS DE
ISIS)
1 – CONCEIÇÃO NOGUEIRA VIEIRA
2 – ANA NOGUEIRA VIERA
3 – MARIA DE LOURDES NOGUEIRA VIEIRA
4 – FRANCISCA NOGUEIRA VIEIRA
5 – ÁLVARO NOGUEIRA VIEIRA
TETRANETOS
DO BARÃO
1.A – EMÍLIA
1.B – JOSÉ CORREIA
1.C – IGNÁCIA
1.D – MARIA JOSÉ (DONA ZEZÉ COM QUEM CONVERSEI)
3.A - SOLANGE
PENTANETOS
DO BARÃO
(FILHA DE
IGNÁCIA)
1 – ELZA
EXANÉTOS DO
BARÃO (FILHO
DE ELZA)
1 – ADRIANO PEDRO
107
ANEXO II: FAMÍLIA DA ESCRAVA FLORIANA PAULINA
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
FLORIANA PAULINA
FILHOS DO
BARÃO
1- ROZINA JACINTHA DOS SANTOS (*27/10/1850) CASADA EM 21/04/1868 COM BELCHIOR MARIANO SANTOS.
2- FLORIDA (*21/11/1852) CASADA EM 04/05/1868 COM JOSÉ LUIS DE BRITO.
3- JOVIANO (*10/03/1855)
4- MODESTINO (*02/04/1857)
5- JACINTHO (*23/07/1859) CASADO EM 23/07/1826 COM MARIA MADALENA SOUTO.
6- ELIZIANO (* 16/08/1861)
7- FLORENCIANA (CATI) (*13/11/1863) CASADA COM FELIPE ALVES BAPTISTA.
8- EVARESTINA (*25/10/1866) CASADA EM 05/0/1886 COM FELIX JOSÉ DE ARAUJO.
9- ISIDRO (*09/05/1869)
10- ALFREDO (*09/04/1872)
1- a) MARIA JOSEFA DOS SANTOS SINGELO - b) ANA MONTEIRO (CASADA COM MIGUEL MONTEIRO) – c) BERTA
108
NETOS DO
BARÃO
MAFRA (CASADA COM MARIO MAFRA) - d) HOLANDINO – e) FLORENCIA ROZÁRIO DOS SANTOS (CASADA
COM CARLOS JOSÉ SERAPIÃO) – f) MARIANA (CASADA COM MARTINHO) – g) VASELINA (CASADA COM
OLIMPIO) – h) NORMANDINA (DINOCA - CASADA COM CAMILO JOSÉ DE ARAUJO) – i) JOAQUIM MARIANO (*
06/08/1888) – j) JOSÉ MARIANO – l) JACINTA (TOTA - CASADA COM ALFREDO GIFONI)
2- ??????????
3- ??????????
4- ??????????
5- ???????????
6- ???????????
7- a) ALFREDO GIFONI (CASADO COM JACINTA) – b) CINIRA – c) ARTHUR MARQUES DOS SANTOS – * 20/01/1903
+ 30/03/1968 (CASADO COM ANNA MAFRA MARQUES)
8- CAMILO JOSÉ DE ARAUJO (CASADO COM NORMANDINA)
9- ??????????
10- ??????????
BISNETOS
(ARTHUR) E
TRINETOS
(ANNA) DO
BARÃO
1C com 7C) DE ANNA E ARTHUR :
1) ALFREDINA MARQUES DOS SANTOS
2) ANNY MARQUES DE AQUINO - * 16/01/1927 + 21/3/1999
ILDEFONSO JORGE DE AQUINO E SILVA - * 19/03/1925
3) ALOY MARQUES DOS SANTOS - * 02/09/1928 + 12/02/2012
INESIA DINIZ MARQUES DOS SANTOS - * 16/03/1934 + 07/12/2004
4) AMAURY MARQUES DOS SANTOS - * 13/04/1930 + 25/04/2007
NEUSA DA SILVA MARQUES DOS SANTOS - * 25/05/1934 + 23/02/2011
5) ADAURY MARQUES DOS SANTOS – 13/07/1932
WILMA PERES MARQUES DOS SANTOS – * 17/08/1932 + 17/06/2013
6) ANNELY MARQUES DA SILVA - * 09/05/1934 + 27/12/2005
CARLOS ROCHA DA SILVA – * 31/12/1928 + 01/05/1985
7) AURELY MARQUES DOS SANTOS - * 11/02/1936 +24/05/2003
NELCY MARIA CORRÊA MARQUES DOS SANTOS – 22/07/1939
8) AURY MARQUES DOS SANTOS - * 17/04/1938 + 11/04/2001
INA MARIA ALMEIDA DOS SANTOS – 17/03/1941
109
BISNETOS
(ARTHUR) E
TRINETOS
(ANNA) DO
BARÃO
9) ANNALY MARQUES PERES – * 29/07/1939 + 13/01/1982
WALDIR COSTA PERES – * 21/08/1931 + 10/06/1993
10) ANTONNY MARQUES DOS SANTOS - * 1º/04/1941 + 27/09/1973
JEANETH CHEDID MARQUES DOS SANTOS – 06/05/1942
11) ANNACY MARQUES MULINÁRIO – * 30/04/1943 + 17/06/1991
12) ALCY MARQUES DOS SANTOS - * 22/07/1944 + 13/10/2012
TRINETOS
(ARTHUR) E
TETRANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
2a) ILDANY CECÍLIA MARQUES DE AQUINO - * 30/09/1947 + 29/07/2006
b) JOSÉ CARLOS MARQUES DE AQUINO- * 09/10/1950 + 12/11/1996
ELISABETH LIMA TEIXEIRA MARQUES - 06/07/1953
c) MARIA DE LOURDES MARQUES CAMARGO- 16/07/1953
ALOISIO ASSUMÇÃO CAMARGO – 29/11/1953
d) TANIA LUCIA MARQUES DE AQUINO – 25/12/1955
3a) KATIA REGINA MARQUES DOS SANTOS – * 06/04/1955 + 03/06/2012
HUMBERTO LUIZ DA CONCEIÇÃO – 10/07/1953
b) ALAIN JESUS D. MARQUES DOS SANTOS - * 23/02/1963 + 14/09/2009
MARCIA V. DE C. RODRIGUES DOS SANTOS – * 06/09/1961 + 16/05/1999
c) ALAINE MARIA DINIZ MARQUES DOS SANTOS – 02/09/1965
FERNANDO CÉSAR SÁ GUELPELI – 18/05/1965
d) ALLAN JOSÉ DINIZ MARQUES DOS SANTOS - 05/01/1967
MARCIA PAULA GOMES DE SOUZA MARQUES DOS SANTOS – 20/06/1971
4a) OSMAR MARQUES DOS SANTOS – 11/09/1956 (MAZINHO, um dos meus interlocutores mais citados)
b) MARIA ANNITA MARQUES DOS SANTOS- 08/06/1963
5a) ARTHUR MARQUES DOS SANTOS – 14/11/1958
SIDNEIA A. MARQUES DOS SANTOS – 30/11/1956
b) CLAUDIA VALERIA MARQUES DOS SANTOS – 07/06/1960 (TADA) responsavel por esse documento
110
TRINETOS
(ARTHUR) E
TETRANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
c) ANNA LUIZA MARQUES DOS SANTOS NEVES – 02/01/1962 – Narra história do sonho
RENY SEBASTIÃO NEVES – 02/07/1954
6a) CHRISTINA MARIA MARQUES DA SILVA – 21/04/1955
IVANI BRITO DE SOUZA – 10/02/1961
b) CARLA MARIA MARQUES DA SILVA LEAL – 20/05/1957
JOÃO LUIZ LEAL – 04/06/1961
c) CARLOS ARTHUR MARQUES DA SILVA – 01/05/1959
MARIA APARECIDA REIS DA SILVA – 02/09/1957
d) CLAUDIA MARIA MARQUES DA SILVA – 21/03/1964
SERGIO ANTÔNIO COSTA DE CASTRO – 15-06/1962
e) CARLOS LUIZ MARQUES DA SILVA – 06/07/1973
VANESSA RODRIGUES LOPES – 20/07/1980
7a) CRISANTA MARIA CORRÊA MARQUES CASANOVA – 21/06/1960
LUIS PAULO MELLO CASANOVA – 08/07/1955
9a) CLAUDIO LUIZ MARQUES PERES – 08/02/1958
CELIA REGINA MOREIRA PERES – 08/11/1959
b) ANNA MARIA MARQUES PERES DE ALMEIDA – 06/05/1959
PEDRO BITENCOURT DE ALMEIDA – 10/12/1953
c) MIRIAN ELIANE HEGI PERES – 05/12/1960
d) PAULA MARIA MARQUES PERES – 21/12/1962
DOMINGOS SAVIO DA CONCEIÇÃO – 13/02/1952
e) LUCIA HELENA PERES NOGUEIRA – 26/11/1963
CARLOS HENRIQUE NOGUEIRA – 31/05/1960
f) PAULO ROBERTO MARQUES PERES -12/10/1974
10a) CASSIA MARQUES DOS SANTOS – 05/01/1966
MARCELO STRAZZERRI – 09/02/1963
111
TRINETOS
(ARTHUR) E
TETRANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
11a) MARCELO MARCIO MARQUES MULINARIO - * 18/05/1962 + 19/09/2005
NICEIA APARECIDA SILVA MULINÁRIO – 04/05/1966)
b) AIRTON JOSE MARQUES MULINARIO – 29/03/1963
MARIA HELENA RODRIGUES MEIRELES MULINÁRIO – 07/10/1967
c) EDUARDO MARQUES MULINARIO – 13/02/196
ALESSANDRA SILVA E SOUZA –
(FILHOS DE RAFAEL MULINÁRIO)
d) ANNA PAULA MARQUES DOS SANTOS - 13/09/1978
(FILHA DE JOSÉ PAULO DA SILVA)
DEIVIS DE MORAES CARVALHO - 04/10/1975
12a) GUILHERME XAVIER MARQUES DOS SANTOS – 30/11/1975
(FILHO DE MARIA DA PENHA XAVIER DA SILVA)
ANDRÉIA MACHADO – 21/11/1987
b) CAMILA LOPES DOS SANTOS – 31/10/1971
(FILHA DE NÉSIA LOPES)
TETRANETOS
(ARTHUR) E
PENTANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
2c) a) RAQUEL MARQUES CAMARGO- 11/06/1981
b) LETICIA MARQUES CAMARGO – 03/12/1983
c) GABRIEL MARQUES CAMARGO – 19/11/1986
d) LUIZ ANTONIO MARQUES CAMARGO - 05/04/1992
2d) a) MARIA MARQUES NOGUEIRA- 07/05/1984
(FILHA DE HELIO VILELA NOGUEIRA)
d) IARA MARQUES NOGUEIRA- 1º/10/1992
(FILHA DE HELIO VILELA NOGUEIRA)
3a) a) HUMBERTO MARQUES DA CONCEIÇÃO – 14/05/1977
b) TATIANA MARQUES DA CONCEIÇÃO LOPES – 25/06/1979
ANDERSON ALVES PEREIRA LOPES – 22/01/1975
c) NAJARA MARQUES DA CONCEIÇÃO – 03/08/1983
3b) a) MARCELA DE C. RODRIGUES MARQUES DOS SANTOS – 30/10/1987
112
TETRANETOS
(ARTHUR) E
PENTANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
LEONARDO DA SILVA -
3d) a) RÔMULO GOMES DE SOUZA MARQUES DOS SANTOS – 17/11/1992
b) ACAUAN GOMES DE SOUZA MARQUES DOS SANTOS – 20/02/1997
c) ANANDA GOMES DE SOUZA MARQUES DOS SANTOS – 18/04/1999
5a) a) JULIA ANIBOLETE MARQUES HILLE- 04/12/1982
RAPHAEL DE CERQUEIRA HILLE – 18/04/1983
b) ARTHUR ANIBOLETE MARQUES DOS SANTOS – 10/05/1989
CAROLINA BINDES DO CARMO PEREIRA – 05/05/1989
5c) a) OTTO MARQUES DOS SANTOS NEVES – 06/08/1988
b) OTAVIO MARQUES DOS SANTOS NEVES – 13/04/1993
6a) a) MAIARA CHRISTINA MARQUES DA SILVA SOUZA – 10/11/1988
b) MAÍRA CHRISTINA MARQUES DA SILVA SOUZA – 14/12/1992
6b) MATHEUS MARQUES DA SILVA LEAL – 20/09/1990
6c) a) CARLOS AUGUSTO REIS DA SILVA -19/05/1981
EDNA CLEIDE DE SOUZA PAULINO – 09/11/1976
b) CARLOS ANDRÉ REIS DA SILVA – 04/01/1986
6d) a) NATHAN MARQUES DA SILVA OLIVEIRA – 30/12/1985
(FILHO DE JORGE PAULO DE OLIVEIRA)
b) PEDRO CARLOS MARQUES DA SILVA COSTA DE CASTRO – 02/02/1999
7a) a) LÍVIA MARQUES CASANOVA – 09/05/1989
b) JAMILE MARQUES CASANOVA – 14/03/1994
9a) a) FERNANDA MOREIRA PERES – 06/12/1988
(MAURICIO DONIZETI CONCEIÇÃO – 15/10/1964)
b) MARIANA MOREIRA PERES – 27/02/1983
(LUCIANO JOSÉ PORTO MENDES)
9b) a) FLAVIO PERES DE ALMEIDA – 06/02/1981
113
TETRANETOS
(ARTHUR) E
PENTANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
b) MARCIO PERES DE ALMEIDA – 23/01/1984
9c) a) RICARDO THOMAS PERES HEGI -18/12/1986
b) PRISCILLA PERES HEGI - 22/07/1989
c) PAULA MARIA PERES HEGI – 16/07/1991 (FILHOS DE THOMÁS HEGI)
9d) ALINE MARQUES PERES DA CONCEIÇÃO – 30/03/1988
9e) a) ANNA CAROLINA PERES NOGUEIRA – 20/11/1986
FÁBIO ROBERTO DAS NEVES – 02/01/1972
b) CARLOS VITOR PERES NOGUEIRA – 08/04/1988
c) MARCUS VINICIUS PERES NOGUEIRA – 21/05/1991
10a) a) NATALIA MARQUES STRAZZERRI – 22/03/1989
b) GABRIELA STRAZZERRI – 03/03/2009
c) FELIPE STRAZZERRI – 21/10/2011
11a) a) CAROLINA SILVA MARQUES DE LIMA – 12/02/1987
EDUARDO PAIVA DE LIMA – 11/05/1987
b) GABRIELA QUEIROZ RAMALHO MARQUES - 28/06/1994
(FILHA DE ROSANI ELENA QUEIROZ RAMALHO)
c) FERNANDO MORAES MARQUES – 04/08/2002
(FILHO DE ESTÉR MORAES)
11b) a) RAFAELLE RODRIGUES MEIRELES MULINÁRIO – 13/04/1987
b) ISABELLE RODRIGUES MEIRELES MULINÁRIO – 04/03/1995
11c) a) DIMITRI
b) GABRIEL SILVA SOUZA MARQUES - 29/04/2008
c) LETICIA SILVA SOUZA MARQUES - 23/05/2011
11d) BERNARDO MARQUES CARVALHO - 28/04/2011
114
PENTANETOS
(ARTHUR) E
HEXANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
PENTANETOS
(ARTHUR) E
HEXANETOS
(ANNA) DO
BARÃO
2ca) RAQUEL: a) CLARA MARQUES CAMARGO CORRÊA – 29/10/2003
(FILHA DE FLAVIO QUINTO CORRÊA)
b) SARAH MARQUES CAMARGO MANNARINO – 07/01/2010
(FILHA DE MARCELLO VERRESCHI MANNARINO)
3aa) BETINHO: a) MARIANA BOTELHO MARQUES DA CONCEIÇÃO – 29/11/1998
(FILHA DE ANA BOTELHO)
b) HUMBERTO MATHEUS B. MARQUES DA CONCEIÇÃO – 28/06/2002
(FILHO DE ANA BOTELHO)
3ab)TATIANA: a) ARTHUR MARQUES DA CONCEIÇÃO LOPES – 19/06/2002
b) ÁGATHA MARQUES DA CONCEIÇÃO LOPES – 11/08/2009
3ac) NAJARA: a) ANTHONY M. MARQUES DA C. DE OLIVEIRA – 09/02/2012
(FILHO DE ADEILTON MARCELOS DE OLIVEIRA)
3ba) MARCELA: a) CASSIO HENRIQUE DE C. MARQUES DA SILVA – 04/07/2009
5aa) JULIA: a) ANNE MARQUES HILLE – 18/01/2013
6ca) C. AUGUSTO: a) STELLA MARQUES DE SOUZA REIS – 24/05/2011
115
9ab) MARIANA: a) ANNA CLARA PERES PORTO MENDES – 11/04/2006
b) GUILHERME PERES PORTO MENDES – 29/08/2008
c) ALICE PERES PORTO MENDES – 28/03/2014
9ea) A. CAROLINA: a) ANNA LUISA NOGUEIRA DAS NEVES – 22/08/201
9eb) C. VITOR:
11aa) CAROLINA: a) MATHEUS MARQUES DE LIMA – 16/06/2008
b) MELISSA MARQUES DE LIMA – 02/05/2013
116
ANEXO III: FAMÍLIA DA ESCRAVA FLORIANA PAULINA (OUTROS PARENTES)
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
FLORIANA PAULINA
FILHOS DO
BARÃO
1- ROZINA JACINTHA DOS SANTOS (*27/10/1850) CASADA COM BELCHIOR MARIANO SANTOS
2- FLORIDA (*21/11/1852)
3- JOVIANO (*10/03/1855)
4- MODESTINO (*02/04/1857)
5- JACINTHO (*23/07/1859)
6- ELIZIANO (* 16/08/1861)
7- FLORENCIANA (CATI) (*13/11/1863)
8- EVARESTINA (*25/10/1866)
9- ISIDRO (*09/05/1869)
10- ALFREDO (*09/04/1872)
1- a) MARIA JOSEFA DOS SANTOS SINGELO - b) ANA FLORIANA DOS SANTOS MONTEIRO (* 1872) (CASADA COM
117
NETOS DO
BARÃO
MIGUEL MONTEIRO) – c) BERTA MAFRA (CASADA COM MARIO MAFRA) - d) HOLANDINO – e) FLORENCIA
ROZÁRIO DOS SANTOS (CASADA COM CARLOS JOSÉ SERAPIÃO) – f) MARIANA (CASADA COM MARTINHO) – g)
VASELINA (CASADA COM OLIMPIO) – h) NORMANDINA (DINOCA - CASADA COM CAMILO JOSÉ DE ARAUJO) – i)
JOAQUIM MARIANO (* 06/08/1888) – j) JOSÉ MARIANO – l) JACINTA (TOTA - CASADA COM ALFREDO GIFONI)
2- ??????????
3- ??????????
4- ??????????
5- ???????????
6- ???????????
7- a) ALFREDO GIFONI (CASADO COM JACINTA - TOTA) – b) CINIRA – c) ARTHUR MARQUES DOS SANTOS – *
20/01/1903 + 30/03/1968 (CASADO COM ANNA MAFRA MARQUES)
8- CAMILO JOSÉ DE ARAUJO (CASADO COM NORMANDINA)
9- ??????????
10- ??????????
BISNETOS DO
BARÃO
1a) FILHO DE MARIA SINGELO CASADA COM ANTONIO SINGELO; a) CLARIMUNDO CONCEIÇÃO (CESSÃO)
1b) FILHOS DE ANA MONTEIRO (TIA SINHANA) CASADA COM MIGUEL MONTEIRO: ÁLVARO – OSWALDO –
MIGUEL – NELSON – ISALTINO – ARI – JAIME – JOÃO – NAIR – JOAQUIM – JOSÉ - FLORISBELA
1c) FILHOS DE BERTA MAFRA CASADA COM MÁRIO MAFRA: ANNA MAFRA MARQUES - * 08/03/1906 +
19/05/1996 – EDMUNDO - LAUDILINA – BELQUIOR
1d) ?
1e) FILHOS DE FLORÊNCIA CASADA COM CARLOS SERAPIÃO: a- MÔNICA SERAPIÃO DA SILVA (QUICA) - b)
CANDIDA SERAPIÃO DA SILVA (CANDOCA) – c) BENEDITA SERAPIÃO DOS SANTOS – d) ANTÔNIO JOSÉ
SERAPIÃO
OBS: ANTÔNIO JOSÉ SERAPIÃO E FAMÍLIA SÃO DESAPARECIDOS.
1f) FILHOS DE MARIANA COM MARTINHO: JUVANDIR (VANDI) – JOANA – ELISON – CLEIDE
118
BISNETOS DO
BARÃO
1g) FILHOS DE VASELINA COM OLIMPIO: BELCHIOR – OLIMPIO – CELSO – JOSÉ- REGINA – IDUINA – CARMEM –
ERMÍNIA – DIVA
1h) ?
1i) a) FILHA DE JOAQUIM MARIANO COM CECÍLIA NEVES DOS SANTOS: ANTONIETTA DOS SANTOS LAZÉRA
(SANTA); FILHOS DE JOAQUIM MARIANO CASADO COM ? (2º CASAMENTO) - JOEL – BELCHIOR – TEREZINHA
1j) FILHOS DE JOSÉ MARIANO CASADO COM ANGELINA: CIDINHA – BRAZILICA – ARGEMIRO – OLIVIER –
NELSON – LINCOLN – GERALDO;
1l) FILHOS DE JACINTA CASADA COM ALFREDO GIFFONI: BRÁS (CASADO COM A MARINETE) – ZECA –
HOLANDINO (CASADO COM REGINA) – ALFREDO (DOCA) - LOURDES – LUSA (DEDÊ) (CASADA COM WALTER) –
ROSINA (CASADA COM SERGIO) – NICEA (CICI) (CASADA COM QUINTAS) - THEREZINHA
2- ?????????
3- ?????????
4- ?????????
5- ?????????
6- ????????
7c) FILHOS DE ARTHUR MARQUES DOS SANTOS E ANNA MAFRA MARQUES
8) ?????????
119
9) ?????????
10) ?????????
TRINETOS DO
BARÃO
1ea) FILHOS DE MÔNICA SERAPIÃO DA SILVA CASADA COM JOSÉ LEITE DA SILVA (FAMILIA DA ESCRAVA
GERALDA): a) RUY PEDRO LEITE DA SILVA b) RUTH MARIA LEITE DA SILVA–c) REGINA THEREZA LEITE DA
SILVA d) ANNA LEITE DA SILVA FILHOS: CARLOS EDUARDO – LUIS CARLOS – CARLOS HENRIQUE –
CARLOS RENATO e) MANOEL LEITE DA SILVA - f) ROMILDA APARECIDA LEITE DA SILVA - g) ROMERO JOSÉ
LEITE DA SILVA – h) ROSELY LEITE DA SILVA
1eb) FILHOS DE CANDIDA SERAPIÃO DA SILVA (CANDOCA) COM WANDUIL FERREIRA: - JOSÉ MARIA
FERREIRA – ANNA FERREIRA – ALAYR FERREIRA – DEUCY FERREIRA – MARIA APARECIDA FERREIRA (CIDA) E
SEBASTIÃO FERREIRA (GÊMEOS) – MARIA DE LOURDES FERREIRA (LOURIDINHA)
OBS; WANDUIL FERREIRA ERA IRMÃO DE JUVENAL FERREIRA QUE ERA CASADO COM LAUDELINA, IRMÃ DE
ANNA MAFRA.
1ec) FILHOS DE BENEDITA SERAPIÃO DOS SANTOS COM JOSÉ DOS SANTOS: GLORIA MARIA DOS SANTOS –
RICARDO SÉRGIO DOS SANTOS
1ed) FILHOS DE ANTÔNIO JOSÉ SERAPIÃO (TEGO) COM WALDINA GARRIDO SERAPIÃO: CARLOS JOSÉ
SERAPIÃO – JORGE JOSÉ SERAPIÃO – ZILÁ SERAPIÃO
1ia) ANTONIETTA DOS SANTOS LAZÉRA - * 01/11/1923 + 02/01/1968
DAVID MIRANDA CASTRO LAZÉRA – * 19/05/1924 + 09/05/2007
a) MARCIA DOS SANTOS LAZERA -
FILHOS: a) LEONARDO DOS SANTOS LAZERA URGABIETA -
(FILHO DE FERNANDO URGABIETA)
b) BRUNA DOS SANTOS LAZÉRA WANKE -
(FILHA DE BODO WANKE)
120
TRINETOS DO
BARÃO
b) ELIANE DOS SANTOS LAZERA -
FILHOS: a) JULIANA LAZERA CARDOSO -
b) FELIPE LAZERA CARDOSO -
c) PEDRO LAZERA CARDOSO -
(FILHOS DE ALEXANDRE CARDOSO)
c) VICTOR DOS SANTOS LAZERA -
FILHOS: a) RAFAEL NEVES LAZÉRA -
b) LÍVIA NEVES LAZÉRA -
(FILHOS DE FÁTIMA NEVES LAZÉRA)
d) JANETE DOS SANTOS LAZERA -
FILHOS; a) DIANA LAZÉRA ROEDEL -
b) RICARDO LAZÉRA ROEDEL -
(FILHOS DE SÉRGIO MARQUES ROEDEL)
e) PAULO DOS SANTOS LAZERA -
FILHOS: a) CAROLINA TORRUBIA LAZÉRA -
b) RENATA TORRUBIA LAZÉRA -
c) VANESSA TORRUBIA LAZÉRA -
d) GUSTAVO TORRUBIA LAZÉRA -
e) EDUARDO TORRUBIA LAZÉRA -
(FILHOS DE ELIANE TORRUBIA)
f) GISELE PEREIRA LAZÉRA -
(FILHA DE MARIA DE LOURDES PEREIRA LAZÉRA)
ea) DAVI TORRIBIA LAZÉRA ROCHA DE AZEVEDO -
(FILHO DE LUIS RICARDO ROCHA DE AZEVEDO)
121
ANEXO IV: FAMÍLIA DA ESCRAVA SEMIANA FLORENTINA
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
SEMIANA FLORENTINA
FILHOS DO
BARÃO
1) BENICIO – 19/01/1857 CASADO COM MARIA JOSÉ SERAPIÃO
2) DARIO – 22/12/1860
3) BRASELIZA – 23/01/1864 CASADA COM BRÁS GIFFONI (uma de suas três esposas irmãs)
NETOS DO
BARÃO
3) ENEDINA VICENTE
ONDINA
ANGELINA
MENOTI
122
ANEXO V: FAMÍLIA DA ESCRAVA EMÍLIA DOROTHEIA
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
EMÍLIA DOROTHEIA
FILHOS DO
BARÃO
1) EMILIANA – 23/03/1857 CASADA EM 06/06/1872 COM CHRISPINIANO JOAQUIM DA COSTA
2) DANIEL – 14/02/1859 CASADO EM 21/11/1881 COMMARIA JOSÉ SERAPIÃO *
3) SARA – 29/04/1861 CASADA EM 22/08/1876 COM JOSÉ MANOEL CORDEIRO DE SOUZA
4) MARIA – 27/08/1867
5) THERESIANA – 09/03/1872
6) CIPRIANO
NETOS DO
1)AMELIA
IDALINA
ERNESTINO
AURÉLIO
123
BARÃO
NETOS DO
BARÃO
2) DOCA
LULU
CAMILA
OSCAR
PEQUETITA
3) CIPRIANO
SEBASTIÃO
VALERIANO
RAUL
IRINEU
JACINTHO
MATILDE
CECÍLIA
LUIZA
TEREZA
O NOME DAS ESCRAVAS E FILHOS DAS MESMAS, FORAM TIRADOS DO TESTAMENTO DO BARÃO DE JUPARANÃ.
124
ANEXO VI: FAMÍLIA DA ESCRAVA GERALDA
DESCENDÊNCIA DE
MANOEL JACINTO CARNEIRO NOGUEIRA DA GAMA
(BARÃO DE JUPARANÃ)
FILHO DE: MARQUES DE BAEPENDI MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA (* 08/09 1765 + 15/02/1847)
E DA MARQUESA FRANCISCA MONICA CARNEIRO DA COSTA DA GAMA (* 1795 + 1869)
IRMÃO DE: BRÁS CARNEITRO DA COSTA E GAMA (VISCONDE DE BAEPENDI)
FRANCISCO NICOLAU CARNEIRO NOGUEIRA DA COSTA E GAMA (BARÃO DE SANTA MÔNICA)
NASCIMENTO: 04/04/1830
MORTE: 25/06/1876
ESCRAVAS
PREFERIDAS
DO BARÃO
GERALDA
FILHOS DO
BARÃO
1) GUILHERMINA – 06/07/1858 CASADA COM JOSÉ LEITE DE OLIVEIRA
2) ALVARO – 02/10/1858 CASADO COM FRANCISCA MARIA
3) DEOCLIDES GERALDA – 26/08/1876 CASADA EM 19/01/1892 COM BRÁS GIFFONI
NETOS DO
BARÃO
1) ALGEMIRO
CILOCA
SEBASTIÃO
ANITA
JOSÉ SILVA LEITE (PAI DE ANNA LEITE)
125
2) JOVELINA
CLOTILDE
FULGÊNCIO
ALVINHO
MANOEL
3) a - NILO
b- ORRIS
c- MENOTI
d – GALILEU
BISNETOS DO
BARÃO (FILHA
DE ORRIS)
1 – IEDDA GIFFONI (CASADA DO DEOCLER RAMOS)
TRINETOS DO
BARÃO (FILHO
DE IEDDA)
1 – LUIZ ANTÔNO RAMOS
O NOME DAS ESCRAVAS E FILHOS DAS MESMAS, FORAM TIRADOS DO TESTAMENTO DO BARÃO DE JUPARANÃ.