universidade federal do rio grande do … · resumo a percepÇÃo da desertificaÇÃo e da mudanÇa...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO A PERCEPÇÃO DA DESERTIFICAÇÃO E DA MUDANÇA NA PAISAGEM NO MUNICÍPIO DE PARELHAS/RN JANE AZEVEDO DE ARAÚJO NATAL/RN 2016

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

    PR-REITORIA DE PS-GRADUAO

    A PERCEPO DA DESERTIFICAO E DA MUDANA NA

    PAISAGEM NO MUNICPIO DE PARELHAS/RN

    JANE AZEVEDO DE ARAJO

    NATAL/RN

    2016

  • Jane Azevedo de Arajo

    A PERCEPO DA DESERTIFICAO E DA MUDANA NA PAISAGEM NO

    MUNICPIO DE PARELHAS/RN

    Tese de Doutorado apresentada ao Curso de Doutorado em

    Desenvolvimento e Meio Ambiente, associao ampla em

    Rede, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como

    parte dos requisitos obteno do Ttulo de Doutor.

    Orientador (a): Prof. Dr. Raquel Franco de Souza

    NATAL/RN

    2016

  • Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

    Catalogao de Publicao na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Biocincias - CB

    Arajo, Jane Azevedo de. A percepo da desertificao e da mudana na paisagem no municpio de Parelhas/RN / Jane Azevedo de Arajo. - Natal, 2016. 138 f.: il.

    Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do

    Norte. Centro de Biocincias. Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente.

    Orientadora: Profa. Dra. Raquel Franco de Souza.

    1. Degradao Ambiental - Tese. 2. Serid Potiguar - Tese. 3. Comunidades Rurais - Tese. 4. Cermica Vermelha - Tese. 5. Recursos Naturais - Tese. I. Souza, Raquel Franco de. II.

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Ttulo.

    RN/UF/BSE-CB CDU 504.123

  • APRESENTAO

    A Tese tem como ttulo A percepo da desertificao e da mudana na paisagem no

    municpio Parelhas/RN e, conforme padronizao aprovada pelo colegiado do DDMA local,

    se encontra composta por uma Introduo geral (embasamento terico e reviso bibliogrfica

    do conjunto da temtica abordada, incluindo a identificao do problema da Tese), uma

    caracterizao geral da rea de estudo, metodologia geral empregada para o conjunto da obra

    e por, quatro captulos que correspondem a artigos cientficos; Todos os captulos/artigos esto

    no formato do peridico ao qual esto submetidos; os endereos dos sites onde constam as

    normas dos peridicos esto destacados em cada captulo/artigo.

  • Na vida precisamos aprender

    que tudo que tem valor custa

    tempo e esforo. S barato

    aquilo que no vale a pena

    (Pe. Lo).

  • Dedico,

    Aos meus pais, Jos Arcanjo

    de Arajo e Josefa Barros

    Azevedo de Arajo, com

    muito amor e gratido.

  • AGRADECIMENTOS

    A Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ao Doutorado em Desenvolvimento e

    Meio Ambiente (DDMA/UFRN), pela oportunidade. Coordenao de Aperfeioamento de

    Pessoal de Nvel Superior (CAPES) pela bolsa de estudo concedida. professora orientadora

    dessa pesquisa Dr. Raquel Franco de Souza, pela pacincia, ateno e excelente orientao, a

    mais sincera gratido. Aos demais professores do DDMA/UFRN, pelas contribuies em suas

    aulas. Aos Secretrios do DDMA/UFRN, David e rica, pela ateno prestada.

    Deus, minha fortaleza, por todas as graas concedidas. minha famlia, meus pais Jos

    Arcanjo de Arajo e Josefa Barros Azevedo de Arajo, pelo amor e tudo que fazem por mim,

    aos meus cinco irmos e aos meus trs sobrinhos Erika Carla, Sinthya Baruma e Juan Felipe. A

    Cleiton Duarte Dantas, meu amor, pelo apoio, carinho e solicitude.

    Aos Ceramistas, aos moradores da zona urbana de Parelhas e das comunidades rurais

    Cachoeira, Juazeiro e Cobra que responderam aos formulrios. Especialmente, ao senhor Joo

    Cassimiro de Medeiros (Seu Joquinha in memoriam) e sua esposa Severina Clemncia de

    Medeiros (Dona Silva in memoriam), pela acolhida e receptividade quando estive na

    comunidade Cobra e esses ainda usufruam da vida.

    Ao professor Renato de Medeiros Rocha, pelo apoio e incentivo quando ainda cursava a

    graduao. Aos meus colegas de doutorado, em especial a Ana Carla Iorio Petrovich, pelo

    carinho e amizade. A Robson Rafael de Oliveira, tcnico do Laboratrio de Geoqumica da

    UFRN e aos demais colegas com os quais convivi.

    A Neusiene Medeiros da Silva, Margarida Arajo de Mendona, Erinaldo Tavares de

    Lima e Silva, Monalise Arajo de Lima e ao senhor Larcio Pereira da Silva, por terem me

    acompanhado na zona rural e na cidade, obrigada por tudo. professora Gildete Maria da Silva

    pela solicitude sempre que precisei. Aos meus amigos Luan Gomes dos Santos de Oliveira,

    Manoel Circio Pereira Neto, Ana Maria de Carvalho, Rosalina Maria da Anunciao de Brito

    e Lenine Azevedo de Souza, por sempre estarem presentes.

    Aos professores que constituram a banca de defesa, pelas contribuies e sugestes feitas

    para aprimorar esta tese, Prof. Dr. Maria Jos Nascimento Soares (DDMA/UFS), Prof. Dr.

    Mrcia Regina Farias da Silva (UERN), Prof. Dr. Maria de Ftima Freire de Melo Ximenes

    (DDMA/UFRN), Prof. Dr. Fernando Moreira da Silva (PRODEMA/UFRN).

    E a todos que fizeram uma prece Deus por mim, que apoiaram, incentivaram e

    acreditaram que chegaria at aqui. Deus os abenoe! Muito obrigada!

  • RESUMO

    A PERCEPO DA DESERTIFICAO E DA MUDANA NA PAISAGEM NO

    MUNICIPIO DE PARELHAS/RN

    A inter-relao sociedade/natureza ocasiona mudanas ao meio ambiente. Essas

    mudanas ocorrem por meio do trabalho do homem, que utiliza os recursos naturais, em prol

    do seu desenvolvimento. Por essa razo, a sociedade, tem a capacidade construir e reconstruir

    os lugares onde vive, deixando registradas na paisagem as transformaes ocorridas. A

    paisagem modificada ao longo dos anos, e o homem fundamental para esse processo, pois

    alm de ser o autor das mudanas, consegue descrev-las atravs da percepo que tem de um

    mesmo lugar, seja referente ao passado ou ao presente. O objetivo geral dessa pesquisa foi

    compreender a percepo dos moradores do municpio de Parelhas/RN em relao

    desertificao e mudana na paisagem. A pesquisa foi realizada na rea urbana e em trs

    comunidades rurais Juazeiro, Cachoeira e Cobra. Foram aplicados 26 formulrios com os

    empresrios, gerentes e/ou responsveis pelas cermicas e 176 com parte da populao urbana

    (102) e nas comunidades rurais, Juazeiro, Cachoeira e Cobra (74). Os mtodos estatsticos

    utilizados para a anlise dos dados foram Qui-quadrado de Person (), o teste de Fisher e a

    Anlise de Correspondncia. Para a descrio dos dados sociais dos respondentes, elaboraram-

    se tabelas de contingncia e quadros. Os resultados mostraram que a indstria de cermica

    existe no municpio desde meados da dcada de 1980. Os produtos fabricados pelas indstrias

    so telhas, tijolos, lajotas, casquilhos, blocos e manilhas, sendo a telha o artefato mais

    produzido. A principal fonte energtica utilizada pelas cermicas a lenha, e 73% ainda fazem

    uso exclusivamente da lenha. A retirada sem tcnica da vegetao deixa reas desnudas e solos

    expostos a eroso, contribuindo para aumentar a susceptibilidade ao fenmeno da desertificao

    no municpio. A anlise comparativa da percepo dos moradores da zona rural e urbana sobre

    desertificao mostrou que a maioria dos respondentes j ouviu falar a respeito do tema; no

    entanto, as pessoas que residem na cidade (79,41%) ouviram falar mais do que as que moram

    na zona rural (52,70%). Dentre as alternativas sobre os causadores do processo de desertificao

    no municpio, a atividade ceramista foi a mais indicada. Acredita-se que essa escolha esteja

    relacionada com o alto consumo dos recursos naturais locais (lenha, argila e gua) que a

    atividade demanda na fabricao de seus produtos. Os resultados da percepo sobre mudana

    na paisagem dos moradores das comunidades rurais Juazeiro, Cachoeira e Cobra, mostraram

    que a maioria percebe mudana da paisagem local. Do mesmo modo, mudanas na vegetao,

    no solo e nas pastagens foram relatadas. Aqueles na faixa etria de 25 a 59 anos foram os que

    mais perceberam mudanas na paisagem. Os respondestes que estudaram at o Ensino

    Fundamental foram os que menos perceberam a mudana na paisagem, enquanto aqueles com

    ensino mdio completo/incompleto e ensino superior completo/incompleto foram os que mais

    perceberam mudanas na paisagem. Esses resultados podem servir de subsdio definio de

    polticas pblicas a serem implementadas no semirido do Estado do Rio Grande do Norte, sob

    a tica da conservao dos recursos naturais, em uma rea suscetvel ao fenmeno da

    desertificao. Sugestes de aes so apresentadas.

    Palavras-chave: Semirido; Serid Potiguar; Comunidades Rurais; Cermica Vermelha;

    Recursos Naturais; Degradao Ambiental.

  • ABSTRACT

    THE PERCEPTION OF DESERTIFICATION AND CHANGE IN THE LANDSCAPE IN

    THE CITY OF PARELHAS/RN

    The interrelation society/nature causes changes to the environment. These changes occur

    through the work of man, which uses natural resources, to support his development. For that

    reason, the society has the ability to build and rebuild the places where lives, leaving registered

    on the landscape the changes occurred. The landscape is modified over the years, and the man

    is critical to this process because, in addition to being the author of the alterations can describe

    them through the perception from a same place, either from the past or from the present. The

    general objective of this research was to understand the perception of the residents of the city

    of Parelhas/RN in relation to desertification and to the change in the landscape. The survey was

    conducted in the urban area and in three rural communities-Juazeiro, Cachoeira and Cobra.

    Twenty-six forms were applied with the entrepreneurs, managers and/or responsible for

    ceramics and 176 with part of the urban population (102) and in rural communities Juazeiro,

    Cachoeira and Cobra (74). Statistical methods used for data analysis were Person Chi-square

    (), the Fisher test and correlation analysis. To describe the social data of the respondents,

    contingency tables and data frames were prepared. The results showed that the ceramic industry

    exists in the city since the mid-1980. The products manufactured by the industries are roofing

    tiles, bricks, tiles, bushings, blocks and shackles, being tile the most produced artifact. The main

    energy source used for ceramics is the firewood, and 73% still make exclusively use of wood.

    The withdrawal of vegetation without any technique leaves bare areas and exposed soils to

    erosion, contributing to increase the susceptibility to the phenomenon of desertification in the

    municipality. The comparative analysis of the perception of the residents of the rural and urban

    area on desertification, showed that most respondents have heard on the subject; however, the

    people living in the city (79,41%) have heard more than those who live in the rural area

    (52,70%). Among the alternatives on the causes of desertification in the municipality, the

    ceramic industry was the most indicated activity. It is believed that this choice is related to the

    high consumption of the local natural resources (wood, clay and water) that this activity

    demands in manufacturing their products. The results of the perception of change in the

    landscape of the inhabitants of the rural communities Juazeiro, Cachoeira and Cobra, showed

    that most of them noticed changes in the local landscape. Likewise, changes in vegetation, soil

    and grassland have been reported. Those aged 25 to 59 years were the ones who most noticed

    changes in the landscape. The ones who studied until elementary school were the ones that least

    realized the modifications in landscape, while those with complete/incomplete secondary

    education and complete/incomplete higher education were the ones that most noticed changes

    in the landscape. These results can serve as a subsidy to the definition of public policies to be

    implemented in semi-arid of Rio Grande do Norte State, from the perspective of conservation

    of natural resources, in an area susceptible to the phenomenon of desertification. Suggestions

    of actions are presented.

    Keywords: Semi-arid; Serid Potiguar; Rural Communities; Red Pottery; Natural Resources;

    Environmental Degradation.

  • SUMRIO

    INTRODUO GERAL..................16

    CARACTERIZAO GERAL DA REA DE ESTUDO...................24

    METODOLOGIA GERAL...................30

    CAPITULO I: Abordagens sobre o processo de desertificao: uma reviso das evidncias no

    Rio Grande do Norte .............................................................................33

    CAPITULO II: O consumo de recursos naturais pela indstria de cermica vermelha no

    municpio de Parelhas/RN ....................49

    CAPITULO III: Uma anlise comparativa das percepes sobre a desertificao entre

    habitantes das reas rural e urbana em um municpio de regio semirida no Brasil

    ...................................................................65

    CAPITULO IV: Percepo sobre mudanas na paisagem de moradores rurais em rea suscetvel

    desertificao no Semirido Potiguar .....................87

    CONSIDERAES FINAIS E SUGESTES DE AES...........................107

    REFERNCIAS..................114

    APNDICES...........................................................................................................................118

    ANEXOS.................................................................................................................................127

  • LISTA DE FIGURAS

    CARACTERIZAO GERAL DA REA DE ESTUDO

    Figura 1: Localizao do municpio de Parelhas/RN.................................................................25

    Figura 2: Cermica localizada em comunidade rural no municpio de Parelhas/RN..................26

    Figura 3: rea de vegetao esparsa na comunidade Cachoeira................................................27

    Figura 4: Extrao artesanal a cu aberto em rocha pegmattica no stio Cumbe,

    Parelhas/RN.................................................................................................................. .............28

    CAPITULO I Abordagens sobre o processo de desertificao: uma reviso das

    evidncias no Rio Grande do Norte

    Figura 1: Localizao do municpio de Parelhas/RN.................................................................41

    Figura 2: Pilha de lenha em ptio de cermica no municpio de Parelhas/RN....43

    Figura 3: Argila disposta em ptio de cermica no municpio de Parelhas/RN..43

    CAPITULO II O consumo de recursos naturais pela indstria de cermica vermelha no

    municpio de Parelhas/RN

    Figura 1: Mapa de localizao do municpio de Parelhas/RN....................................................52

    Figura 2: Tempo de desenvolvimento da atividade ceramista do municpio de Parelhas/RN.....54

    Figura 3: rea de vegetao esparsa na comunidade rural Juazeiro...........................................58

    Figura 4: rea de vegetao esparsa na comunidade rural Sussuarana......................................58

    Figura 5: Fontes energticas utilizadas nas indstrias de cermica vermelha no municpio de

    Parelhas/RN...............................................................................................................................61

    CAPITULO III Uma anlise comparativa das percepes sobre a desertificao entre

    habitantes das reas rural e urbana em um municpio de regio semirida no Brasil

    Figura 1: Mapa de localizao do municpio de Parelhas/RN....................................................70

    Figura 2: Anlise de correspondncia da associao entre o local de residncia e a pergunta J

    ouviu falar em desertificao?.................................................................................................76

    Figura 3: Anlise de correspondncia da associao entre a resposta Alteraes climticas e

    o local de residncia dos respondentes.......................................................................................79

    Figura 4: Anlise de correspondncia da associao entre a resposta Aumento de temperatura

    e o local de residncia dos respondentes....................................................................................79

    Figura 5: Anlise de correspondncia da associao entre a resposta Eroso do solo e o local

  • de residncia dos respondentes..................................................................................................80

    Figura 6: Anlise de correspondncia da associao entre a resposta Poluio e o local de

    residncia dos respondentes.......................................................................................................80

    Figura 7: Anlise de correspondncia entre a pergunta Voc acha que o municpio de Parelhas

    est em processo de desertificao? e o local de residncia dos respondentes..........................81

    CAPITULO IV Percepo sobre mudanas na paisagem de moradores rurais em rea

    suscetvel desertificao no Semirido Potiguar

    Figura 1: Mapa de localizao do muncipio de Parelhas/RN....................................................91

    Figura 2: Anlise de correspondncia da mudana na paisagem..............................................100

    Figura3: Anlise de correspondncia da mudana na vegetao..............................................100

    Figura 4: Anlise de correspondncia da faixa etria...............................................................102

    Figura 5: Anlise de correspondncia da Escolaridade............................................................102

    LISTA DE TABELAS

    CAPITULO I Abordagens sobre o processo de desertificao: uma reviso das

    evidncias no Rio Grande do Norte

    Tabela 1: Evoluo do consumo da lenha na indstria ceramista...............................................42

    CAPITULO II O consumo de recursos naturais pela indstria de cermica vermelha no

    municpio de Parelhas/RN

    Tabela 1: Nmero de unidades produtivas e evoluo do consumo da lenha na indstria

    ceramista do Rio Grande do Norte, na Regio do Serid e em Parelhas/RN..............................57

    CAPITULO III Uma anlise comparativa das percepes sobre a desertificao entre

    habitantes das reas rural e urbana em um municpio de regio semirida no Brasil

    Tabela 1: Perfil dos entrevistados no municpio de Parelhas/RN...............................................75

    Tabela 2: Cruzamento entre a pergunta J ouviu falar em desertificao? e o local de

    residncia...................................................................................................................................75

    Tabela 3: Cruzamento entre meio de comunicao e local de residncia dos respondentes.......77

    Tabela 4: Cruzamento da pergunta Em sua opinio, a desertificao est relacionada com o

    qu? com o local de residncia dos respondentes.....................................................................78

  • Tabela 5: Cruzamento da pergunta Voc acha que o municpio de Parelhas est em processo

    de desertificao? com o local de residncia dos respondentes................................................81

    Tabela 6: Cruzamento da pergunta Caso sim, o que seria o causador desse processo no

    muncipio? com o local de residncia dos respondentes...........................................................82

    CAPITULO IV Percepo sobre mudanas na paisagem de moradores rurais em rea

    suscetvel desertificao no Semirido Potiguar

    Tabela 1: Perfil dos entrevistados por comunidade rural............................................................96

    Tabela 2: Associaes entre mudana na paisagem, vegetao, solo, pastagens e as

    comunidades..............................................................................................................................99

    Tabela 3: Associaes entre idade, tempo de residncia, escolaridade e a mudana na

    paisagem........................................................................................................................... .......101

    LISTA DE QUADROS

    CAPITULO II O consumo de recursos naturais pela indstria de cermica vermelha no

    municpio de Parelhas/RN

    Quadro 1: Produo mensal dos artefatos cermicos produzidos no municpio de

    Parelhas/RN...............................................................................................................................55

    Quadro 2: Espcies vegetais utilizadas na queima dos fornos das cermicas de Parelhas/RN e

    local onde so adquiridas...........................................................................................................59

    Quadro 3: Justificativas dos ceramistas com relao aquisio de lenha.....60

    CAPITULO IV Percepo sobre mudanas na paisagem de moradores rurais em rea

    suscetvel desertificao no Semirido Potiguar

    Quadro 1: Sntese das percepes dos entrevistados sobre mudana na paisagem.....................96

    Quadro 2: Sntese das percepes dos entrevistados sobre mudanas no solo, vegetao e

    pastagens...................................................................................................................................98

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ABCERAM Associao Brasileira de Cermica

    ADESE Agncia de Desenvolvimento Sustentvel do Serid

    ASD reas Susceptveis Desertificao

    BNB Banco do Nordeste

    CAAE Certificado de Apresentao para Apreciao tica

    CAPES Comisso de Aperfeioamento de Pessoal do Nvel Superior

    CAOPMA Centro Operacional s Promotorias de Meio Ambiente

    CPRM Servio Geolgico do Brasil

    EMPARN Empresa de Pesquisa Agropecuria do Rio Grande do Norte

    IA ndice de Aridez

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    INSA Instituto Nacional do Semirido

    NUDES Ncleo Desenvolvimento Sustentvel do Serid

    ODM Objetivos de Desenvolvimento do Milnio

    ODS Objetivos de Desenvolvimento Sustentvel

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PAE/RN Programa de Ao Estadual de Combate Desertificao e Mitigao dos Efeitos

    da Seca do Rio Grande do Norte

    PAN/BRASIL Programa de Ao Nacional de Combate Desertificao e Mitigao dos

    Efeitos da Seca

    PNCD Poltica Nacional de Combate e Preveno Desertificao e Mitigao dos Efeitos

    da Seca

    RN Rio Grande do Norte

    SEBRAE/RN Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do

    Norte

    SEMARH Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hdricos

    SIAB Sistema de Informao de Ateno Bsica

    SIELO Scientific Electronic Library Online

    TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

    UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

    UNCCD United Nations Convention to Combat Desertification

    UNCOD United Nations Conference on Desertification

    UNFCCC United Nations Framework Convention on Climate Change

    http://portal2.saude.gov.br/sisnep/cep/caae.cfm?VCOD=405721http://www.ciesin.org/docs/002-478/002-478.htmlhttps://unfccc.int/
  • 16

    INTRODUO GERAL

    A humanidade, ao produzir os chamados espaos geogrficos, interfere na natureza com

    diferentes graus de transformao, com a preocupao de gerar riquezas, emprego e renda.

    Essas intervenes transformam agressivamente os ambientes naturais, promovendo

    modificaes marcantes nos fluxos de energia e matria, alterando a intensidade da

    funcionalidade intrnseca existente entre os componentes da natureza fato que tambm atinge

    a prpria sociedade (ROSS, 2006).

    Nesse sentido, no espao geogrfico em que todas as atividades vitais ao homem so

    desenvolvidas. Ao tocar nesse espao, o ser humano tem a capacidade de modificar a fisionomia

    do lugar onde est presente. Todavia, este precisa satisfazer suas necessidades, para isso

    desempenha papel importante sobre o meio ambiente e nas formas de uso e ocupao do solo.

    Conforme Santos; Souza (2011), ao longo do seu processo histrico, a humanidade sempre

    buscou na natureza as condies necessrias para o seu desenvolvimento. Para tanto, elaborou

    tcnicas para transformar os espaos naturais e extrair os recursos necessrios para satisfazer

    suas necessidades. Esse processo, contudo, deu-se de forma desequilibrada, sem considerar as

    limitaes naturais impostas.

    Esse desequilbrio na utilizao de recursos naturais fundamentais vida, tais como as

    plantas, a gua, o solo, entre outros, ocasiona transformaes ambientais que, segundo Aquino;

    Almeida; Oliveira (2012) podem ser identificadas a partir da superexplorao dos solos, do

    comprometimento dos recursos hdricos em quantidade e qualidade, da perda e/ou reduo da

    diversidade biolgica, e ainda da reduo da cobertura vegetal, resultando no empobrecimento

    dos ecossistemas.

    Desse modo, os estudos sob a perspectiva do desenvolvimento sustentvel so

    fundamentais, pois possibilitam constatar as causas e as consequncias de impactos ambientais,

    compreender a dinmica de construo e modificao de determinado lugar, identificar o nvel

    de degradao da cobertura vegetal, do solo, dos recursos hdricos, igualmente, propor medidas

    mitigadoras e sustentveis de usos.

    Ao longo do tempo, as interaes da interface sociedade-natureza vo modificando a

    fisionomia dos lugares. A ocorrncia dos processos naturais, associados aos processos

    econmicos, sociais e culturais, proporcionam transformaes ao meio ambiente, sendo esses,

    registrados na paisagem. As mudanas so contnuas e, por essa razo, a paisagem, est em

    um processo constante de desenvolvimento ou dissoluo e substituio (SAUER, 1998, p.

    42).

    Do ponto de vista do autor Del Picchia,

  • 17

    Desde tempos imemoriais, o Homem tem ordenado a paisagem nos locais que habita.

    Como uma caracterstica da espcie humana o fato de o Homem no ter um nicho restrito na face da Terra e o fato de ser cosmopolita determinou a necessidade de

    modificar o meio ambiente segundo as suas necessidades de sobrevivncia. A

    concepo da natureza e o desenho da paisagem desenvolvem-se acompanhando a

    evoluo histrica da Humanidade (DEL PICCHIA, 2009, p. 18).

    Some-se a isso a argumentao dos autores Rodriguez; Silva; Cavalcanti (2010), sobre

    a importncia do enfoque antropognico no estudo das paisagens, pois desde a poca do

    aparecimento do homem, o processo de interao de dois sistemas inter-relacionados (Natureza

    e Sociedade) tem se convertido em um dos principais processos de desenvolvimento do planeta.

    Este complicado, contraditrio e irregular processo de desenvolvimento, transformou a

    sociedade no principal fator antropognico no desenvolvimento da geosfera.

    O termo paisagem apresenta ao longo de sua histria significados e, desde o incio do

    sculo XX, vem retomando sua importncia nos estudos que tratam tanto da natureza quanto

    da cultura. A paisagem foi introduzida como termo cientfico-geogrfico no incio do sculo

    XIX pelo alemo Alexander Von Humboldt (1769-1859), o grande pioneiro da moderna

    geobotnica e geografia fsica (NUCCI, 2009). De acordo com Pissinati; Archela (2009), o

    Brasil conheceu a discusso sobre a paisagem em 1968, por meio do artigo do biogegrafo

    francs Georges Bertrand, intitulado Paisagem e geografia fsica global: esboo

    metodolgico, o qual foi traduzido pela professora Olga Cruz, do Departamento de Geografia

    da Universidade de So Paulo, em 1971. Para Bertrand,

    A paisagem no a simples adio de elementos geogrficos disparatados. , em uma

    determinada poro do espao, o resultado da combinao dinmica, portanto

    instvel, de elementos fsicos, biolgicos e antrpicos que, reagindo dialeticamente

    uns sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto nico e indissocivel, em

    perptua evoluo (BERTRAND, 2004, p. 141).

    Outrossim, Santos (1997), considera a paisagem como um constituinte do espao

    geogrfico. O mesmo argumenta que a paisagem um conjunto de formas heterogneas, de

    idades diferentes, pedaos de tempos histricos representativos das diversas maneiras de

    produzir as coisas, de construir o espao (SANTOS, 1997, p. 68). A sociedade tem papel

    importante na construo dos espaos nos quais est inserida e no pode ser excluda dos

    estudos da paisagem, pois essencial nas modificaes que nesta se sucedem. Alm disso,

    capaz de perceber as mudanas ocorridas, ao longo do tempo, contribuindo para a compreenso

    da paisagem. Para Werner,

    A unificao dos aspectos obtidos da paisagem e nos estudos de percepo deve ser

    compreendida de forma a mostrar a riqueza que a interao de informaes fsicas

    e comportamentais da populao residente numa determinada paisagem. Estudar a

  • 18

    paisagem excluindo os valores locais dos residentes um enxergar de maneira parcial,

    negando a participao fundamental daqueles que mais transformam a paisagem, os seres humanos (WERNER, 2012, p. 30).

    Nesse sentido, a transformao da paisagem no acontece apenas em decorrncia dos

    fenmenos naturais, o indivduo tambm participa. A paisagem existe, segundo Berque (1998,

    p. 84), em primeiro lugar, na sua relao com o sujeito coletivo: a sociedade, que a produziu,

    que a reproduz e a transforma. Ou seja, toda mudana resultado do coletivo, a sociedade

    muda a paisagem. No entanto, o faz de acordo com seus valores, suas atitudes, seus sentimentos,

    cada grupo social constri seus comportamentos e suas percepes a partir do local que vive.

    Do ponto de vista de Del Rio (1995), dos olhares diversos sobre a paisagem destaca-se a

    importncia da percepo da paisagem, ou percepo ambiental. Para ele a percepo o

    processo mental por meio do qual nos relacionamos com o mundo, a partir de sensaes

    transmitidas ao crebro pelos cinco sentidos. De acordo com Tuan (1980, p. 4), percepo

    tanto a resposta dos sentidos aos estmulos externos, como a atividade proposital, na qual certos

    fenmenos so claramente registrados, enquanto outros retrocedem para a sombra ou so

    bloqueados.

    No que se refere a percepo ambiental, Kuhnen; Higuchi (2011, p. 250), ressaltam que

    est relacionada ao modo como as pessoas experienciam os aspectos ambientais presentes em

    seu entorno, para o que so importantes no apenas os aspectos fsicos, mas tambm os aspectos

    sociais, culturais e histricos.

    No mbito dos estudos abordados do ponto de vista da percepo ambiental, Oliveira et

    al. (1989), destacam que os estudos geogrficos incluem temas relevantes como riscos e

    impactos ambientais, valorizao de paisagens e de lugares, gesto e manejo do meio ambiente,

    parques nacionais, preferncias geogrficas, mapas mentais, percepo do meio ambiente

    urbano, percepo das pragas e dos praguicidas na agricultura e de qualidade ambiental. Dentre

    eles, o estudo da percepo de paisagens e de lugares tem assumido cada vez mais papel de

    destaque, pois expressa a preferncia, o gosto e as ligaes afetivas dos seres humanos e de

    suas comunidades para com os lugares, as paisagens e com prprio meio ambiente.

    Esses estudos so importantes para conhecer o cotidiano dos grupos sociais, assim como

    suas condutas e percepes sobre o meio ambiente que vivem. Igualmente, podem contribuir

    sobremaneira para identificar mudanas ambientais e/ou estruturais em tempo decorrido,

    investigar degradaes, compreender a dinmica local das sociedades que transformam as

    paisagens. A partir dos resultados pode-se compreender a relao entre sociedade e natureza;

    fomentar medidas, elaborar projetos que visem o desenvolvimento sustentvel do meio

    ambiente.

  • 19

    A participao social pode contribuir com a cincia e os gestores pblicos na tomada de

    decises para mitigar e/ou solucionar problemas ambientais e executar prticas sustentveis. O

    estudo de Sandoval; Flanders; Kozak (2010) objetivou ajudar comunidades rurais locais do

    Mxico a obterem um equilbrio sustentvel, dessa maneira, os autores descreveram e

    analisaram um processo de planejamento da paisagem que, entre outros fatores, inclua o

    envolvimento das comunidades. Com isso concluram que existe a necessidade urgente de

    compreender as comunidades rurais, seja no Mxico ou em outros lugares, para se alcanar a

    sustentabilidade; o envolvimento das comunidades um meio eficaz para alcanar o

    desenvolvimento sustentvel.

    As pesquisas voltadas para a questo da desertificao tambm valorizam a participao

    da sociedade, pois o conhecimento popular pode contribuir com o conhecimento cientfico para

    amenizar as causas e consequncias do fenmeno. Nesse sentido, Seely; Moser (2004) destacam

    que o combate desertificao requer o envolvimento de pessoas que vo desde comunidades

    afetadas que, experimentam os efeitos diariamente, cientistas; e concluram ser possvel

    grupos de ao comunitria e cientistas interagirem. O conhecimento local associado ao saber

    cientfico pode alcanar resultados positivos no controle da desertificao SEELY (1998), LEE;

    ZHANG (2004), YANG (2015).

    O conhecimento local dos habitantes de reas com problemas ambientais deve ser levado

    em considerao, pois percebem melhor o que acontece no ambiente vivido e colaboram na

    indicao de solues para os problemas diagnosticados. O conhecimento cientfico, por sua

    vez, investiga as solues e aperfeioa as sugestes de resoluo. Um exemplo disso o estudo

    de Wei, et al. (2009) que pesquisou a percepo de agricultores em uma regio deserta, pobre

    e remota da China sobre a degradao ambiental e sua adoo de prticas de gesto melhorada.

    Estes concluram que era possvel melhorar a percepo dos agricultores e a gesto, mas que

    era difcil de conseguir na prtica. Ento, uma abordagem abrangente se fez necessria,

    integrando tcnicas novas com polticas e solues institucionais, incluindo servios de

    extenso, formao, subsdios para as prticas de gesto sustentvel e incentivos polticos.

    Desse modo, as estratgias de gesto pblica com a participao popular so

    imprescindveis. Segundo Cunha e Coelho (2009), a formulao e a execuo de polticas

    ambientais tm-se enfatizado a ampliao dos mecanismos de participao dos diversos atores

    sociais envolvidos com a gesto dos recursos naturais. Destacam ainda que as dcadas de 1980

    e 1990 foram marcadas pela busca de modelos alternativos de participao da sociedade civil

    nos processos de tomada de deciso de polticas e implementao de programas e projetos com

    carter ambiental.

  • 20

    Leff (2009) enfatiza que se as cincias tm sido o meio mais eficaz para o domnio e a

    explorao da natureza e controle social na modernidade; o saber tem sido, e continua sendo, o

    processo que intervm nas formas simblicas de significao e apropriao do mundo. Esse

    saber, de acordo com Boeira (2002), concebido como um processo em construo, complexo,

    por envolver aspectos institucionais tanto de nvel acadmico, quanto de nvel sociopoltico,

    por meio de movimentos sociais e de prticas tradicionais de manejo dos recursos naturais.

    Em sntese, o conhecimento local e o cientfico devem andar juntos na busca de

    resolues dos problemas ambientais, haja vista que todo o mundo passa por mudanas

    antropognicas ou, conforme enfatizam Bastos e Cordeiro (2012), por uma forte complexidade

    de fatores que so de ordem geolgica, hidroclimtica, geomorfolgica, pedolgica e

    fitogeogrfica. Um exemplo que os autores citam o semirido brasileiro que abrange uma rea

    de cerca de 10% do territrio nacional, concentrando-se basicamente na regio Nordeste e, que

    possui uma grande diversidade paisagstica. De fato, o semirido possui encantadora

    diversidade paisagstica em toda a sua dimenso territorial, tendo em vista que:

    De forma especfica, essas pores territoriais apresentam feies variadas, pois so

    submetidas a condies particulares de clima, solo, vegetao, relaes sociais de

    produo e, em conseqncia [sic], a distintos modos de vida. As variaes na

    paisagem podem ser mais ou menos acentuadas. Nessas reas, h momentos em que

    chove mais ou menos; em que o solo frtil, j se degradou ou se encontra submetido

    a intensos processos de desnudamento; em que a vegetao passa a ser mais rala e

    menos vigorosa... (BRASIL, 2004, p. 3).

    Segundo a Instituto Nacional do Semirido INSA, a regio semirida brasileira

    composta por 1.135 municpios. Esse espao geogrfico do Semirido brasileiro estende-se por

    oito estados da regio Nordeste (Alagoas, Bahia, Cear, Paraba, Pernambuco, Piau, Rio

    Grande do Norte e Sergipe) mais o Norte de Minas Gerais, totalizando uma extenso territorial

    de 980.133,079 km2. Nessa rea h uma populao residente que alcanou a marca de

    22.598.318 habitantes em 2010, representando 11,85% da populao brasileira, 42,57% da

    populao nordestina e 28,12% da populao residente na regio Sudeste (muncipios

    setentrionais do estado de Minas Gerais inseridos na poro semirida). Equiparando as

    populaes das regies Norte e Centro-Oeste com a da regio semirida, observa-se que esta

    ltima supera facilmente as dessas regies em termos de nmero de habitantes (INSA, 2012).

    Com relao ao estado do Rio Grande do Norte, este apresenta mais de 80% de sua rea

    territorial inserida na regio semirida. Os problemas de degradao ambiental nesta regio so

    preocupantes e exigem aes urgentes e eficazes, visando a reverso do quadro atual para um

    cenrio de sustentabilidade (RIO GRANDE DO NORTE, 2005). Na regio do Serid Potiguar,

    inserida na rea semirida do estado, a degradao ambiental ocorre em decorrncia do mau

    uso da vegetao, do solo e dos recursos hdricos, considerando algumas atividades

  • 21

    econmicas, que fazem parte do seu contexto histrico: a pecuria, o cultivo do algodo, a

    minerao, e atualmente, a cermica.

    Essas atividades, quando realizadas sem nenhum controle, so capazes de intensificar o

    quadro de degradao de determinadas reas. No caso da regio do Serid podem aumentar as

    reas susceptveis ao fenmeno da desertificao, visto que, na regio, est localizado o Ncleo

    de Desertificao do Serid. Para Macdo (1998), a regio do Serid Potiguar [...]

    caracterizada por um processo histrico de uso dos recursos naturais (principalmente os

    minerais e vegetais) para uma srie de atividades por parte das populaes humanas que a se

    instalaram, onde at hoje so mantidos estreitos laos de inter-relao homem/natureza.

    A Agncia de Desenvolvimento Sustentvel do Serid ADESE, afirma que as

    atividades econmicas hoje existentes no Serid, cermicas, queijeiras, panificadoras, olarias,

    caieiras, carvoarias, casas de farinha, doceiras, fabricao de biscoitos caseiros, indstrias de

    laticnios, engenho, alambique, minerao, indstria de sabo e margarina, indstria txtil e de

    torrefao se destacam pelo uso indiscriminado dos recursos naturais, principalmente da

    vegetao usada como matriz energtica (ADESE, 2008).

    A atividade ceramista se destaca na regio pelo nmero de unidades fabris existentes.

    Essa a atividade pode potencializar a degradao ambiental, pois alm da fumaa emitida pelas

    chamins dos fornos, o consumo de lenha como fonte energtica, e argila como matria-prima

    para a fabricao de seus artefatos de cermica vermelha considervel. Segundo dados da

    pesquisa realizada pelo Servio de Apoio s Micro e Pequenas Empresas do RN, doze

    municpios da regio do Serid possuem cermicas: Currais Novos (05), Acari (05), Cruzeta

    (06), So Jos do Serid (02), Ouro Branco (04), Jardim do Serid (06), Carnaba dos Dantas

    (20), Parelhas (33), Santana do Serid (07), Caic (04), Ipueira (01), Jardim de Piranhas (01)

    (SEBRAE/RN, 2013).

    Dentre esses municpios, Parelhas, se destaca com o maior nmero de empresas do ramo

    ceramista. A maioria dessas cermicas so localizadas na zona rural do municpio. De acordo

    com Rio Grande do Norte (op. cit.) no municpio,

    constata-se que a expanso dessa atividade ocorreu de forma desordenada e da mesma

    forma, a obteno de matria-prima liderada pela argila e lenha. Atualmente os

    proprietrios de cermica s conseguem adquirir argila e energticos florestais

    (vegetao nativa) de localidades distantes at 60 km das unidades de produo,

    encarecendo sobremaneira os custos de produo. Consequentemente visvel uma

    crescente degradao ambiental dos ecossistemas locais, inclusive nas comunidades

    Cachoeira, Juazeiro e Santo Antonio da Cobra, contribuindo de forma significativa

    para a exausto das atividades produtivas e o surgimento de reas sujeitas

    desertificao (RIO GRANDE DO NORTE, op. cit., p. 9).

  • 22

    Da a importncia desta pesquisa, que alm de trazer dados da percepo da populao

    parelhense sobre a desertificao e a mudana na paisagem, apresenta dados atuais da atividade

    ceramista. H estudos na regio Serid referentes a atividade ceramista e ao consumo dos

    recursos naturais que essa demanda, mas com destaque para Parelhas, que detm o maior

    nmero de cermicas, no h estudos nesta linha investigativa. Essa pesquisa traz uma

    contribuio nova, indita e original para o municpio, para o meio acadmico e a sociedade em

    geral.

    Partindo desses pressupostos tem-se como objetivo geral da pesquisa compreender a

    percepo dos moradores do municpio de Parelhas/RN em relao desertificao e a mudana

    na paisagem. Os objetivos especficos consistem em: elaborar uma reviso de literatura sobre

    desertificao, destacando o panorama do fenmeno no estado do Rio Grande do Norte, na

    regio do Serid, especialmente no municpio de Parelhas; evidenciar a situao da indstria de

    cermica vermelha no municpio de Parelhas/RN no que concerne ao uso de recursos naturais,

    com nfase para o consumo de lenha; analisar comparativamente a percepo da populao

    rural e a urbana sobre desertificao no municpio de Parelhas/RN; mensurar a percepo sobre

    mudanas na paisagem dos moradores das comunidades rurais Juazeiro, Cachoeira e Cobra no

    municpio de Parelhas/RN.

    Nesse contexto, pretende-se responder as seguintes questes: O uso dos recursos naturais,

    sobretudo, a utilizao da lenha pela atividade ceramista contribui para intensificar a

    degradao ambiental no municpio de Parelhas/RN? Qual a percepo dos moradores do

    municpio de Parelhas/RN sobre o tema desertificao, j que esse, localiza-se em rea

    susceptvel ao fenmeno? Qual a percepo dos moradores das comunidades rurais Juazeiro,

    Cachoeira e Cobra sobre mudana na paisagem local, uma vez que h o uso dos recursos

    naturais locais para atender a demanda da indstria de cermica vermelha presente nas

    comunidades?

    Considera-se como hipteses que com o incio da atividade ceramista em meados da

    dcada de 1980, houve um aumento do consumo das espcies vegetais no municpio, que se

    mantm constante at hoje, causando o desgaste dos recursos naturais e a mudana na paisagem;

    e que os moradores que residem no municpio h mais tempo conseguem perceber melhor o

    ambiente vivido e as modificaes nele ocorridas.

    Os estudos de Cosme Jnior (2011) e Arajo (2012) desenvolvidos no municpio,

    apresentaram dados interessantes que sinalizam a importncia da continuidade de pesquisas. Os

    resultados do primeiro estudo indicaram que em Parelhas/RN, h um declnio nas reas de solo

    exposto em 11,6% entre os anos de 1990 e 2010, devido ao comportamento da precipitao;

    entretanto a poro oeste e sudeste do municpio apresentaram reas em que a cobertura da

  • 23

    vegetao no se recuperou devido extrao de lenha para abastecer os fornos das indstrias

    do municpio. O estudo de Arajo (2012) mostrou a percepo dos moradores de quatro

    comunidades rurais sobre mudanas na paisagem. Setenta por cento dos entrevistados

    perceberam mudanas na paisagem local nos ltimos 20 anos, admitindo que houve

    modificaes na vegetao, no solo, e at mesmo nos corpos hdricos, ocasionando

    transformao na fisionomia do lugar. Essa percepo evidenciou-se entre os entrevistados com

    maior tempo de moradia. O tempo maior de residncia nas comunidades confere aos moradores

    conhecimento diferenciado da realidade que os cerca.

    Sendo assim, o desenvolvimento de pesquisas no municpio de Parelhas/RN possibilita o

    aperfeioando de temas abordados; monitorar dados coletados e buscar novas metodologias,

    com o intuito de promover medidas viveis para conservao, planejamento e gesto dos

    recursos naturais do municpio, contribuindo para o desenvolvimento sustentvel local e

    regional. Os dados e resultados obtidos permitiro que a sociedade esteja ciente da situao

    ambiental que a cerca, podendo, desta forma, participar da elaborao de estratgias para

    subsidiar a conservao, o planejamento, o monitoramento e gesto dos recursos naturais.

    Dentre as motivaes para desenvolver esta pesquisa sobre a percepo da desertificao

    e da mudana na paisagem no municpio de Parelhas/RN, encontram-se a importncia de

    estudar uma rea susceptvel ao fenmeno da desertificao, na qual a convivncia do homem

    com o semirido constitui um desafio dirio, alm da inquietao pessoal da autora acerca do

    quadro ambiental local e o anseio em dar continuidade s suas pesquisas no municpio,

    contribuindo dessa maneira, para a implantao e implementao de polticas pblicas voltadas

    para a gesto sustentvel dos recursos naturais locais.

    A tese constituda por quatro captulos. O primeiro captulo (artigo 1) traz uma reviso

    bibliogrfica sobre o tema desertificao, pois a rea de pesquisa considerada susceptvel ao

    fenmeno. Este artigo teve como objetivo fazer uma reviso de literatura sobre o processo de

    desertificao, com destaque para o panorama do fenmeno no estado do Rio Grande do Norte,

    na regio do Serid, especialmente no municpio de Parelhas.

    O segundo captulo (artigo 2) apresenta um levantamento de dados das indstrias de

    cermica vermelha em atividade no municpio, abordando o tempo de desenvolvimento da

    atividade, produo, consumo de lenha. Devido ao consumo contnuo de gua, argila e lenha,

    associa-se atividade a alguns impactos ambientais. O corte irrestrito da lenha, por exemplo,

    aumenta as reas descobertas de vegetao, deixa o solo desprotegido e vulnervel a processos

    erosivos. A lenha ainda o principal insumo energtico utilizado nas cermicas de Parelhas.

    Alm disso, outros fatores como, atividades agropecurias, prticas de minerao inadequadas,

    secas consecutivas, contribuem para aumentar a suscetibilidade desertificao no municpio.

  • 24

    Nesse captulo enfatiza-se uso da lenha pelas cermicas existentes no municpio e procurou-se

    responder questo O uso dos recursos naturais, sobretudo, a utilizao da lenha pela atividade

    ceramista contribui para intensificar a degradao ambiental no municpio de Parelhas/RN?,

    com base na hiptese que com o incio da atividade ceramista em meados da dcada de 1980,

    houve um aumento do consumo das espcies vegetais no municpio, causando o desgaste dos

    recursos naturais e a mudana na paisagem.

    O terceiro captulo (artigo 3) mostra a anlise comparativa das percepes sobre

    desertificao entre a populao rural e a urbana do municpio. Contribuiu para responder

    questo: Qual a percepo dos moradores do municpio de Parelhas/RN sobre o tema

    desertificao, j que esse localiza-se em rea susceptvel ao fenmeno?. O quarto captulo

    (artigo 4) avalia a percepo sobre mudana na paisagem de moradores rurais em trs

    comunidades. Buscou-se responder questo Qual a percepo dos moradores das

    comunidades rurais Juazeiro, Cachoeira e Cobra sobre mudana na paisagem local, uma vez

    que h o uso dos recursos naturais locais para atender a demanda da indstria de cermica

    vermelha presente nas comunidades?. Considera-se como hiptese para esses captulos

    (terceiro e quarto) que os moradores que residem no municpio h mais tempo conseguem

    perceber melhor o ambiente vivido e as modificaes nele ocorridas.

    CARACTERIZAO GERAL DA REA DE ESTUDO

    A pesquisa foi desenvolvida no municpio de Parelhas/RN (Figura 1), localizado na

    poro centro-sul do estado, na microrregio do Serid Oriental, distante 240 km da capital

    Natal. Parelhas o terceiro maior municpio da regio do Serid. Tem uma populao de

    20.354 habitantes, sendo 17.084 zona urbana e 3.270 zona rural, sua rea territorial de

    513,507 km (IBGE, 2010). A pesquisa compreendeu a rea urbana e trs comunidades da

    zona rural.

  • 25

    Figura 1: Mapa de localizao do municpio de Parelhas/RN

    Fonte: Elaborado por Manoel Circio Pereira Neto, 2012.

    A vegetao a caatinga, caracterizada por formaes vegetais lenhosas de porte baixo

    ou mdio, formado por plantas xerfilas, ou seja, adaptadas a lugares secos, tambm so

    caduciflias, pois perdem as folhas para diminuir a transpirao e evitar assim, a perda de gua

    armazenada (NUNES, 2006, p. 63). O clima semirido, apresentando temperaturas elevadas,

    como mximas de 35C e chuvas com ndices pluviomtricos em mdia de 600 mm anuais

    (EMPARN, 2016).

    Os solos so pedregosos, do tipo neossolos litlicos e luvissolos crmicos; no Brasil

    comum a presena desses tipos de solos na regio semirida nordestina (IBGE, 2007, p. 231).

    As formaes geolgicas consistem em rochas cristalinas. Segundo o Servio Geolgico do

    Brasil CPRM (2005), o municpio est inserido na Depresso Sertaneja; os terrenos mais

    antigos se encontram no Planalto da Borborema formados por rochas Pr-Cambrianas como

    granito, onde encontram-se as serras e os picos mais altos.

    O municpio de Parelhas apresenta caractersticas econmicas e sociais semelhantes s

    verificadas nos demais municpios da regio do Serid. A vida econmica, social e poltica foi

    estruturada a partir dos princpios bsicos da pecuria, do cultivo do algodo e da extrao

    mineral. Com o declnio da explorao da cultura algodoeira nas dcadas de 1980 e 1990, as

    populaes envolvidas nos processos anteriormente descritos buscaram novas alternativas para

    gerao de renda e consequente sobrevivncia no ambiente semirido seridoense (RIO

    GRANDE DO NORTE, op. cit.).

  • 26

    Uma das alternativas foi a indstria de cermica vermelha, essa, nos ltimos anos, tem

    tido expresso significativa no municpio (Figura 2).

    Figura 2: Cermica localizada em comunidade rural no municpio de Parelhas/RN

    Fonte: Jane Azevedo de Arajo, 2014.

    As cermicas geram emprego e renda, dinamizando a economia local. Esto situadas

    predominantemente em reas rurais e operam em nveis tecnolgicos distintos. As empresas

    que no possuem estufas para secar a umidade de seus artefatos, antes de lev-los ao forno,

    utilizam a luz solar; desse modo, expem-se os produtos sob o sol, no ptio das cermicas

    (Figura 2), at que estes sequem.

    A principal fonte energtica utilizada pelas cermicas de Parelhas/RN a lenha; em vista

    disso, atribuem-se a essa atividade, o surgimento de reas desnudas de vegetao nativa, devido

    ao corte de lenha sem tcnicas adequadas. Assim, possvel verificar reas com vegetao

    esparsa nas comunidades rurais onde h a presena da atividade ceramista (Figura 3).

  • 27

    Figura 3: rea de vegetao esparsa na comunidade Cachoeira

    Fonte: Jane Azevedo de Arajo, 2013.

    Outra atividade de base mineral existente no municpio, alm da cermica vermelha,

    o garimpo em pegmatitos. Na extrao artesanal em rocha pegmattica (Figura 4), exploram-se

    minerais tais como quartzo, feldspato, columbita/tantalita, cassiterita e gemas, dentre as quais

    podem ser citadas berilo e turmalina (ANGELIM, 2006). Esses so importantes minerais

    industriais, com ampla aplicao para usos especficos, sendo que informaes detalhadas

    podem ser encontradas em Luz e Lins (2008).

  • 28

    Figura 4: Extrao artesanal a cu aberto em rocha pegmattica no stio Cumbe, Parelhas/RN

    Fonte: Jane Azevedo de Arajo, 2010.

    A populao residente na zona urbana est distribuda em oito bairros. H servios de

    fornecimento de gua, energia eltrica, telefonia fixa, mvel e internet. Para o atendimento de

    sade, a cidade dispe de um hospital e uma maternidade municipais, assim como de postos de

    assistncia bsica de sade nos bairros. No que diz respeito educao existem escolas

    municipais, estaduais, federal (campus do Instituto Federal do Rio Grande do Norte IFRN) e

    escolas particulares.

    Atualmente as atividades econmicas compreendem o comrcio, o setor de atividades de

    base mineral, como as empresas de minerao, de garimpagem artesanal e a cermica,

    empregando boa parte da populao. Com relao ao setor agropecurio, esse enfrenta

    dificuldades para se manter, pois so quatro anos consecutivos de seca no municpio. Com a

    escassez das chuvas no possvel captar e armazenar gua nos reservatrios, acarretando a

    diminuio da produo agrcola e dos rebanhos.

    Em relao s comunidades rurais pesquisadas, so elas: Santo Antnio (conhecida

    popularmente como comunidade Cobra), Juazeiro e Cachoeira, localizadas na rea de

    abrangncia da microbacia do rio Cobra. Apesar da localizao privilegiada, enfrentam o quarto

    ano de seca consecutivo. Essas comunidades rurais localizam-se a uma distncia da sede

    municipal de 18 km, 15 km e 12 km, respectivamente. Juntas s comunidades a populao de

    1.677 pessoas, segundo dados do SIAB (Sistema de Informao de Ateno Bsica) de 2014,

    obtidos na Secretaria Municipal de Sade de Parelhas.

  • 29

    As razes pelas quais essas comunidades rurais foram escolhidas para a pesquisa tm

    como justificativa a existncia da atividade ceramista, pois cada comunidade possui uma

    indstria de cermica vermelha em atividade; alm disso essas comunidades integraram o

    Ncleo de Desenvolvimento Sustentvel do Serid NUDES, a primeira rea piloto a ser

    implantada na regio do Serid/RN.

    As aes sustentveis no NUDES estavam pautadas na gesto dos recursos hdricos

    (construo de barragens subterrneas e construo de barramentos assoreadores); de solos

    (recuperao de reas degradadas e construo de renques); florestais e da agricultura

    (reflorestamento e tcnicas agro sustentveis); da pecuria (manejo semi-intensivo, produo e

    conservao de forragens); e na promoo da diversificao agropecuria, da educao

    ambiental e da incorporao de novas matrizes energticas (RIO GRANDE DO NORTE, 2010).

    O NUDES foi idealizado pelo Ministrio Pblico, atravs do Centro de Apoio

    Operacional das Promotorias de Justia de Proteo ao Meio Ambiente CAOPMA, que

    convocou instituies governamentais e no governamentais para uma discusso sobre as reas

    em processo de desertificao. No Serid/RN, que apresenta nvel de susceptibilidade

    considerado muito grave, foi proposta a criao e implantao do NUDES no ano de 2004. A

    rea de atuao envolveu as comunidades Juazeiro, Cobra e Cachoeira, ambas localizadas as

    margens do Rio Cobra. As comunidades foram selecionadas em funo dos problemas causados

    pela atividade de cermica, o grau de organizao das comunidades rurais envolvidas, o

    desmatamento da mata ciliar e o assoreamento da microbacia hidrogrfica do rio Cobra (RIO

    GRANDE DO NORTE, Op. cit.).

    Essas comunidades so bem organizadas e estruturadas, possuem escolas, creches, postos

    de sade, associaes de moradores, pequenos comrcios e bares, energia eltrica, internet,

    servios de telefonia fixa e mvel. H tambm ruas pavimentadas em duas comunidades,

    Juazeiro e Cobra. Esta ltima possui fbrica do setor txtil direcionada a produo de confeco

    de roupas para empresas desse ramo. A indstria de cermica vermelha est presente nas trs

    comunidades; atualmente, cada comunidade possui uma cermica em atividade. Essas geram

    emprego e renda para a populao local; entretanto, o consumo da lenha como fonte energtica

    e da argila como matria-prima, tem contribudo ao longo dos anos para o aumento de reas

    desnudas de vegetao. O corte desordenado de lenha, associado seca prolongada, pode causar

    a eroso do solo, e consequentemente estgios de degradao preocupantes.

    Por essa razo, no municpio de Parelhas, bem como na regio do Serid so primordiais

    estudos que sinalizem medidas para a conservao, recuperao e o uso sustentvel dos recursos

    naturais, tento em vista o processo histrico de explorao destes recursos locais.

  • 30

    METODOLOGIA GERAL

    Na primeira etapa da pesquisa realizou-se uma reviso bibliogrfica junto ao acervo da

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte e outras instituies, informaes atravs de

    entrevistas e via internet nos Peridicos da CAPES, SCIELO, o que ajudou no complemento

    de informaes. Desta primeira etapa foi escrito o primeiro captulo (artigo 1) da pesquisa. A

    reviso bibliogrfica continuou at o trmino da pesquisa para a atualizao das referncias

    utilizadas e acrscimo de outras obtidas ao longo do estudo.

    No que diz respeito percepo sobre a desertificao e mudana na paisagem, foram

    aplicados 176 formulrios, com parte da populao urbana (102) e em trs comunidades rurais

    pesquisadas, Cobra, Juazeiro e Cachoeira (74). Com esses dados foram escritos o terceiro e

    quarto captulos (artigos 3 e 4). Aplicou-se ainda formulrios com os proprietrios de cermicas

    do municpio.

    No perodo da pesquisa de campo desse estudo, encontrou-se no municpio de Parelhas,

    34 indstrias de cermica vermelha; dentre essas, seis estavam desativadas e 28 em atividade.

    Visitou-se as 28 empresas ativas, sendo que duas no aceitaram responder ao formulrio; desse

    modo foram aplicados 26 formulrios. Com esses dados foi escrito o segundo captulo (artigo

    2).

    A aplicao dos formulrios foi realizada nos meses de junho e julho de 2014, na sede

    municipal (Apndice I), nas comunidades rurais Juazeiro, Cachoeira e Cobra (Apndice II) e

    nas indstrias de cermica vermelha (Apndice III). A tcnica utilizada para a investigao e

    interpretao dos dados foi a aplicao de formulrios; nesse caso, "o pesquisador est presente

    e ele quem registra as respostas" (Gil, 2002, p. 119). Estes foram compostos por perguntas

    fixas.

    Quanto forma, as perguntas, abrangeram as categorias abertas, as que permitem ao

    informante responder livremente, usando linguagem prpria, e emitir opinies; fechadas,

    aquelas que o informante escolhe sua resposta entre duas opes: sim e no; e de mltipla

    escolha, perguntas fechadas, mas que apresentam uma srie de possveis respostas,

    abrangendo vrias facetas do mesmo assunto (MARCONI; LAKATOS, 2003). A aplicao de

    cada formulrio, tanto na cidade quanto nas comunidades rurais, durou em mdia 30 minutos.

    J com os ceramistas durou em mdia 15 minutos.

    O convite para participar da pesquisa foi feito porta a porta. O participante que aceitou

    responder ao formulrio, a princpio, assinou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

    TCLE (Apndice IV), j que a pesquisa foi realizada de acordo com as orientaes ticas da

  • 31

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sendo aprovada pelo Comit de tica em

    Pesquisa da universidade CAAE 31267214.6.0000.5537, parecer n 709.440 (Anexo I).

    O tamanho da amostra para estimar a proporo (p) de uma populao finita dado pela

    equao a seguir (MARTINS, 2002). Para valores de proporo amostral desconhecidos,

    substitui-se P e Q por 0,5 (LEVINE; BERENSON; STEPHAN, 2000).

    Onde:

    N = tamanho da populao

    Z = abscissa da normal padro (encontrado na tabela da normal)

    P = estimativa da proporo (populao desconhecida p = 0,5)

    Q = 1 P = 1 0,5 = 0,5

    d = erro amostral

    n = tamanho da amostra

    Para uma populao N de 1677 pessoas, como no caso das nas trs comunidades rurais,

    Z = 1,645 (nvel de confiana de 90%) e erro mximo de estimativa de 10%, foi calculado o

    nmero mnimo de indivduos da amostra n = 68. O mesmo procedimento foi utilizado para

    encontrar o tamanho da amostra para a cidade, obtendo-se tambm n = 68 como nmero mnimo

    de indivduos da amostra.

    Foi estabelecido um critrio temporal de 20 anos de residncia para participar da pesquisa,

    com base na hiptese de que quem reside h mais tempo no local consegue perceber melhor o

    ambiente vivido e as transformaes ocorridas. A hiptese baseou-se no estudo de Arajo

    (2012) que pesquisou a percepo de moradores rurais em quatro comunidades no mesmo

    municpio; foi identificado que aqueles com 20 anos ou mais de moradia nas comunidades

    rurais pesquisadas (Almas, Domingas, Sussuarana II e Colonos) foram os que mais perceberam

    as mudanas ocorridas na paisagem.

    Os formulrios foram instrumentos essenciais para compreender a percepo dos

    participantes tanto sobre o tema desertificao quanto sobre mudana na paisagem. Foram

    produzidos dois conjuntos de dados: um com base nas respostas das perguntas fechadas (Sim,

    No, No sabe) e nas de mltipla escolha; outro conjunto com as respostas das perguntas

    abertas. Ambos foram tratados de forma diferenciada para a apresentao dos resultados.

  • 32

    De posse dos dados referentes s perguntas fechadas, estes foram submetidos a testes

    estatsticos. Utilizou-se o teste Qui-quadrado de Person (), que consiste em testar a hiptese

    de que duas variveis nominais so independentes (VIEIRA, 2010).

    Utilizou-se tambm o teste de probabilidade exata de Fisher para tabelas 2 x 2, que uma

    tcnica muito til para analisar dados discretos (nominais ou ordinais), quando o tamanho de

    amostras independentes pequeno (SIEGEL; CASTELLAN JR., 2006).

    O teste Qui-quadrado de Person () e o teste exato de Fisher possuem a mesma finalidade,

    sendo este utilizado quando 25% das clulas tiveram valores esperados inferiores a 5. Aplicou-

    se ainda a anlise de correspondncia para verificao de associao entre variveis.

    Foi estabelecido um nvel de significncia () de 5% e 10%. Segundo Vieira (Op. cit.), o

    nvel de significncia a probabilidade de rejeitar a hiptese de nulidade (H) quando ela

    verdadeira, ou seja, o pesquisador deve estabelecer o valor mximo da probabilidade de errar,

    quando diz que existe diferena entre os grupos, e essa diferena, na realidade, no existe.

    Os dados obtidos foram digitados e armazenados no programa Microsoft Excel verso

    2013. O banco de dados foi exportado para o software SPSS verso 20.0, o qual foi utilizado

    neste trabalho como principal ferramenta para fazer anlises estatsticas. Utilizou-se tambm o

    programa R verso 3.1.3. As respostas abertas foram listadas e apresentadas em forma de

    quadros. Para a descrio dos dados sociais dos participantes, elaborou-se tabelas de

    contingncia. Os dados coletados nas cermicas foram apresentados em forma de quadros,

    tabelas e grficos.

  • 33

    CAPITULO I

    Esse artigo foi submetido Revista Geosul da Universidade Federal de Santa Catarina

    (https://periodicos.ufsc.br/index.php/geosul). Qualis B1 na rea de Cincias Ambientais. Est

    formatado de acordo com as recomendaes desta revista (anexo III).

    ABORDAGENS SOBRE O PROCESSO DE DESERTIFICAO: UMA REVISO DAS

    EVIDNCIAS NO RIO GRANDE DO NORTE

    Resumo

    Os problemas relacionados desertificao abrangem dimenses globais. As principais regies

    atingidas so a poro ocidental da Amrica do Sul e dos Estados Unidos, a Austrlia, a poro centro meridional da Eursia, o norte-nordeste e o sul do continente africano. A desertificao tornou-se tema

    relevante nos debates sobre a degradao das terras, feitos pela Organizao Mundial das Naes

    Unidas, que empenhada em, junto com os pases afetados, combat-la. As reas criticamente atingidas pelo fenmeno no Brasil esto localizadas na regio Nordeste. O estado do Rio Grande do Norte, por

    exemplo, apresenta uma rea fortemente afetada, denominada de Ncleo de Desertificao do Serid,

    compreendendo seis municpios. Este artigo tem como objetivo apresentar uma reviso de literatura

    sobre o processo de desertificao, com destaque para o panorama do fenmeno no estado do Rio Grande do Norte, na regio do Serid, especialmente no municpio de Parelhas. Sendo assim, o artigo

    poder ser consultado como base para futuros estudos na rea e em outros locais que apresentem

    caractersticas semelhantes.

    Palavras-chave: degradao ambiental; semirido; Parelhas; cermica.

    APPROACHES ON THE PROCESS OF DESERTIFICATION: A REVIEW OF THE

    EVIDENCES IN RIO GRANDE DO NORTE STATE

    Abstract

    The problems related to desertification reach global dimensions. The main affected areas are the

    western portion of South America and the United States, Australia, the Southern Center of Eurasia, the north-northeast and the south of the African continent. Desertification has become a relevant theme in

    the debates about the lands degradation, conducted by the United Nations Organization. This

    Organization is committed to, along with the affected countries, to combat desertification. The areas critically affected by the phenomenon in Brazil, are located in the northeastern region. The State of Rio

    Grande do Norte, for example, features a heavily affected area, called the Serid Desertification Core,

    which comprises six municipalities. This article aims to present a literature review on the process of

    desertification, emphasizing the panorama of the phenomenon in the State of Rio Grande do Norte, in the Serid region, in the northeastern region of Brazil, especially in the city of Parelhas. Thus, the article

    may be referred to as the basis for future studies in this area and in other places with similar

    characteristics.

    Keywords: environmental degradation; semiarid; Parelhas; ceramics.

  • 34

    INTRODUO

    A discusso a respeito da desertificao tem ganhado fora ao longo dos anos, visto que o

    fenmeno vem se tornando cada vez mais evidente. As regies ridas, semiridas e submidas secas so as mais vulnerveis a tal ocorrncia, seja por fatores naturais ou por ao antrpica. Atualmente, os

    estudos a respeito da desertificao abrangem dimenses globais, pois o fenmeno atinge as chamadas

    regies de terras secas de todo o planeta (ZHA; GAO, 1997; SEELY, 1998; SALES, 2002; Wu; Ci, 2002; ROSRIO, 2004; YANG et al, 2005; BEEKMAN, 2006, CAVALCANTE; COUTINHO;

    SELVA, 2007; MORAIS, 2010; NASCIMENTO, 2013).

    A histria do conceito de desertificao, de acordo com Matallo Jr. (1999), tem incio nos anos 1930, quando intensos processos de degradao ocorreram em alguns estados do meio oeste americano.

    Desmatamentos e intensificao da explorao dos solos por meio da agricultura e pecuria, somados

    forte seca entre os anos de 1929 e 1932, foram as causas principais do processo que ficou conhecido

    como Dust Bowl. Verdum et al. (2001) apontam o francs Aubreville, em 1949, como o precursor da conscientizao sobre a desertificao, quando do uso do conceito para identificar o surgimento de

    verdadeiros desertos nas ex-colnias europeias no norte da frica, nos pases onde a precipitao

    anual varia entre 700 a 1.500 mm. Nesse contexto, dentre as regies ridas, semiridas e susceptveis seca, destacou-se a regio do

    Sahel (continente africano), onde, assim como em outras regies secas, a chuva escassa e varivel. De

    acordo com Hare et al. (1992), a seca atingiu severamente essa regio entre 1968 e 1973. Em 1970, a precipitao anual foi de 149 mm, em 1971, foi de 126 mm e, em 1972, foi a pior seca de todas, com

    registro de apenas 54 mm, uma situao tpica, mas que se tornou catastrfica no ano de 1973. Houve

    muitas mortes e a ocorrncia de grandes migraes e campos de refugiados.

    Esse quadro de anos sucessivos de seca desencadeou danos sociais, ambientais e econmicos regio do Sahel. Dessa forma, a gravidade da situao na regio chamou a ateno mundial,

    serviu de estmulo imediato para o apelo, em 1974, da Assemblia [sic] Geral das

    Naes Unidas cooperao internacional para combater a desertificao, incluindo

    a convocao de uma conferncia internacional sobre a desertificao qual seria submetido um plano de ao (HARE et. al., op. cit. p. 14).

    Assim, no ano de 1977, na cidade de Nairbi, Qunia, aconteceu a Conferncia das Naes Unidas

    de Combate Desertificao. Na ocasio, discutiu-se especificamente o fenmeno da desertificao e a importncia de criar medidas para enfrent-la mundialmente, suscitando, assim, um Plano de Ao

    Mundial de Combate Desertificao. Desde ento, outros importantes eventos aconteceram, por

    exemplo, a Rio-92, que resultou no documento da Agenda 21, o qual tem um captulo dedicado luta

    contra a desertificao e a seca, bem como fruns, congressos e convenes. No que diz respeito ao conceito de desertificao, a Organizao das Naes Unidas (ONU)

    define como sendo a degradao da terra nas regies ridas, semiridas e submidas secas, resultante

    de vrios fatores, entre eles as variaes climticas e as atividades humanas (ONU, 1994, p. 4). Essa a definio oficial da ONU e mesmo que alguns autores apresentem conceitos generalistas, h um

    consenso entre as conceituaes, j que esto relacionadas a fatores climticos, degradao do solo,

    da vegetao e ao antrpica em regies de clima rido, semirido e submido seco. Conti (2008) ressalta que a desertificao pode ser entendida, preliminarmente, como um

    conjunto de fenmenos que conduz determinadas reas a se transformarem em desertos ou a eles se

    assemelharem. Pode, portanto, resultar de mudanas climticas determinadas por causas naturais ou pela

    presso das atividades humanas sobre ecossistemas frgeis, sendo, nesse caso, as periferias dos desertos (ou reas transicionais) as de maior risco de degradao generalizada, em virtude de seu precrio

    equilbrio ambiental. Garduo (1992) refere-se desertificao como o empobrecimento de ecossistemas ridos e

    semiridos, tambm de alguns midos, causado pelo impacto das atividades do homem. um processo

    de mudana que leva reduo da produtividade, a alteraes na biomassa e na diversidade das formas de vida, degradao acelerada do solo e ao aumento dos riscos inerentes ocupao da terra pelo

    homem. Assim, a desertificao o resultado da utilizao abusiva da terra.

    No entanto, Matallo Jr. (2001) enfatiza que o conceito desse fenmeno aponta para algumas fragilidades tericas. O autor, analisando o que atualmente aceito pelas Naes Unidas, ressalta que:

  • 35

    A ideia de "degradao da terra" ela mesma uma ideia complexa, com diferentes

    componentes. Esses componentes so: a) degradao de solos, b) degradao da

    vegetao, c) degradao de recursos hdricos, e d) reduo da qualidade de vida da

    populao. Esses 4 componentes dizem respeito a 4 grandes reas de conhecimentos:

    fsicos, biolgicos, hdricos e socioeconmicos (MATALLO JR., 2001, p. 24).

    Para Cavalcanti; Coutinho; Selva (2007), essas fragilidades tericas levam diretamente necessidade de delineamento do objeto de estudo e da abordagem multidisciplinar requerida, que se

    constituem, sem dvida, em desafios ao tradicional modelo de conhecimento presente nas instituies

    de ensino e pesquisa. Nesse sentido, h diferentes aspectos que envolvem a questo da desertificao e cada um deles

    requer uma metodologia especfica. Existe uma srie de ameaas sobre o modo de vida das populaes

    que habitam reas susceptveis desertificao ou desertificadas. Isso mostra claramente que o problema

    tambm de ordem social, econmica, poltica e de carter urgente quanto necessidade de se atuar para combat-lo e/ou mitig-lo. Diante disso, necessrio conhecer a realidade local das reas a serem

    estudadas, para que se possa formular medidas preventivas e de conscientizao pertinentes a cada

    situao. Este artigo tem como objetivo apresentar uma reviso de literatura do processo de desertificao, com destaque para o panorama do fenmeno no estado do Rio Grande do Norte, na regio

    do Serid, especialmente no municpio de Parelhas.

    AS REGIES SECAS E A DESERTIFICAO NO MUNDO

    As regies secas so constitudas pelas reas ridas, semiridas e submidas secas, que esto

    espalhadas por todos os continentes do globo terrestre e apresentam risco de desertificao. Nessas reas, esse fenmeno vem se instaurando devido s prticas inadequadas de uso da terra, atividades

    agropastoris, associadas ainda s condies climticas desfavorveis e secas consecutivas.

    Em termos ambientais, as terras secas caracterizam-se por precipitaes pouco frequentes, irregulares e imprevisveis, grande diferena entre as temperaturas diurnas e noturnas, solos com pouca

    matria orgnica e ausncia de gua, plantas e animais adaptados s variveis climticas resistentes

    seca, tolerantes salinidade, resistente ao calor e capazes de sobreviver em condies de falta de gua

    (UNCCD, 2012). As terras secas, que representam quase 34% da superfcie terrestre e so a principal garantia de

    segurana alimentar, principalmente para os mais pobres, esto se degradando diariamente; o sustento

    de milhes de pessoas em todo o mundo depende de pequenos agricultores (UNCCD, 2014). Esses pequenos agricultores que tm suas terras afetadas pela desertificao so obrigados a migrar para outras

    reas em busca de terras produtivas e gua. De acordo com Sampaio; Arajo; Sampaio (2005, p. 103),

    as consequncias ambientais da degradao do solo so bastante graves por si prprias, mas seu aspecto mais danoso na reduo da capacidade de produo das terras, principalmente quando esta reduo

    irreversvel. A falta de recursos tecnolgicos para cultivar, as condies climticas adversas e a falta

    de acesso a parcelas maiores de terras contribuem tambm para o aumento de reas em processo de

    desertificao. Quanto desertificao no mundo, as principais regies atingidas so a poro ocidental da

    Amrica do Sul e dos Estados Unidos, a Austrlia, a poro centro meridional da Eursia, o norte-

    nordeste e o sul do continente africano. Para exemplificar, em Portugal, 36% da rea continental est includa em condies de susceptibilidade desertificao; dos restantes 64%, h tambm um nmero

    significativo de reas que, apesar de diferentes condies climticas, apresentam solos com elevada a

    muito elevada susceptibilidade seca e desertificao (ROSRIO, 2004).

    Na Nambia, a seca uma caracterstica recorrente do clima e a desertificao um problema nacional grave (UNFCCC, 2002). De acordo com Seely (1998), 34% da Nambia rida, 58%

    semirida e apenas 8% pode ser classificado como submido seco. O autor enfatiza, ainda, que para

    combater a desertificao e fornecer solues viveis para amenizar a degradao da terra necessria a participao da comunidade local e da cincia para juntos compartilharem conhecimento e atuarem a

    favor de um ambiente menos degradado.

    Conforme Lu; Wang (2003), a China, em termos de gravidade da desertificao, possui, da rea total de terras degradadas, 20% ligeiramente desertificada, 33% moderadamente desertificada, 21%

    muito desertificada e 26% seriamente desertificada. No ano de 1970, a desertificao teve uma taxa

  • 36

    anual de expanso de 1.560 km, em 1980, foram 2.460 km e, em meados da dcada de 1990, foram

    3.436 km.

    Outros estudos desenvolvidos na China (ZHA; GAO, 1997; WU; CI, 2002; YANG et al., 2005)

    assinalaram o aumento da desertificao especialmente nas regies de clima rido e semirido do pas. Destacaram que as condies naturais adversas (clima, solo, vegetao) e as atividades humanas

    (agricultura, pecuria, corte de lenha e de espcies vegetais medicinais) so responsveis pela expanso

    das reas desertificadas, tendo em vista que esto intrinsecamente ligadas. A princpio, as abordagens internacionais sobre desertificao estiveram exclusivamente

    associadas incidncia de fatores naturais e antrpicos. Contudo, ao longo dos anos, essas abordagens

    esto sendo aprimoradas, levando-se em considerao aspectos sociais, polticos, econmicos e culturais, isto , os estudos do fenmeno ganharam novos olhares, novas metodologias e planejamentos

    conjuntos por parte das naes afetadas. Um exemplo disso a formulao de sistemas e metodologias

    de indicadores da desertificao. Segundo Matallo Jr. (2001, op. cit.), o esforo que vem sendo feito na

    Amrica Latina e no Caribe para o desenvolvimento de metodologias menos padronizadoras (em relao s metodologias existentes em outros continentes) e voltadas para sistemas de indicadores da

    desertificao muito significativo.

    No continente sul-americano, est sendo implementado o Programa de Combate Desertificao e Mitigao dos Efeitos da Seca, com o objetivo de elaborar uma base slida para a identificao de

    zonas ridas degradadas e secas na Argentina, no Brasil, na Bolvia, no Chile, no Equador e no Peru, de

    acordo com os princpios da Conveno das Naes Unidas de Combate Desertificao. Para isso, polticos, tcnicos e cientistas reuniram-se com o propsito de formular indicadores comuns a serem

    usados em escala regional para medir os processos de desertificao. Assim, no ano de 2006, foi lanado

    o livro Indicadores de la Desertificacin para Amrica Del Sur: Recopilacin y armonizacin de

    indicadores y puntos de referencia de la desertificacin a ser utilizados em el programa Combate a la desertificacin y mitigacin de los efectos de la sequa en Amrica del Sur.

    Fazem parte do programa supracitado seis pases: Argentina, Bolvia, Brasil, Chile, Equador e

    Peru. De acordo com Beekman (2006), aproximadamente 15% das terras do Brasil so semiridas, das quais grandes pores esto sujeitas ao processo de degradao. Na Argentina, 70% do territrio

    continental est sujeito desertificao. No que diz respeito Bolvia, aproximadamente 41% das terras

    encontram-se afetadas. J no Chile, as reas consideradas vulnerveis representam cerca de 45% da

    superfcie terrestre nacional. No Equador, as reas geogrficas degradadas so relativamente pequenas, mas significativas em termos de populao afetada. Por fim, no Peru, cerca de 22% das terras so

    vulnerveis desertificao.

    Esse quadro ambiental preocupante e requer empenho da sociedade civil e das autoridades competentes. Embora algumas medidas estejam sendo tomadas para a reverso, fundamental

    acompanhar, fiscalizar e monitorar essas aes, seja a nvel local, regional e/ou mundial.

    Diante disso, as proposies para a mitigao dos efeitos da seca e da desertificao requerem cooperao internacional. As trocas de informaes e experincias ajudam os pases a melhorar suas

    polticas de combate, tornando-as mais eficientes. Aumentar o conhecimento da populao local sobre

    os agentes causadores da desertificao e inclu-los na luta contra seus efeitos essencial, uma vez que

    a proximidade das pessoas com os ambientes naturais propicia o desenvolvimento de relaes ntimas entre os seres humanos e os recursos naturais disponveis, dando a estas pessoas conhecimentos

    especficos sobre o meio ambiente no qual vivem (SIEBER; MEDEIROS; ALBUQUERQUE, 2010,

    p. 02).

    A DESERTIFICAO NO BRASIL

    O processo da desertificao passou a ser estudado no Brasil na dcada de 1970. A maioria dos

    estudiosos da matria concorda com as proposies da Conveno das Naes Unidas de Combate

    Desertificao a respeito dos fatores determinantes desse fenmeno, isto , que resultante de vrios

    fatores, incluindo variaes climticas e atividades humanas (BRASIL, 2005b). O precursor dos estudos da desertificao em nosso pas foi o professor Joo Vasconcelos

    Sobrinho, da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Conforme Sales (2002), os primeiros

    trabalhos nos quais aparece o conceito de desertificao como degradao das terras produtivas no semirido foram conduzidos na regio Nordeste pelo professor e, sem dvida alguma, deve-se a esse

    pesquisador o mrito do pioneirismo nesses estudos.

  • 37

    Na concepo de Vasconcelos Sobrinho, desertificao o processo de degradao dos

    ecossistemas por causas naturais ou pela ao do homem, ou por ambas conjugadas, tornando as reas

    onde ocorre imprprias para a ocupao humana e podendo conduzir formao de desertos. Para ele,

    so nas terras ridas e semiridas e nas marginais submidas onde se produz a desertificao, cujas causas so necessrias determinar. O autor destacou tambm que a humanidade ainda no se

    conscientizou do perigo do fenmeno, que existe o processo no Brasil e que amplo e grave, j sendo

    possvel encontrar ncleos de desertificao (FUNDAO VINGT-UN ROSADO, 1990). As reas afetadas e/ou susceptveis desertificao no Brasil encontram-se, predominantemente,

    na regio semirida, e as consideradas em estgio mais avanado esto situadas no Nordeste. De acordo

    com o Instituto Nacional do Semirido INSA (2012), o espao geogrfico do semirido brasileiro estende-se por oito estados da regio Nordeste (Alagoas, Bahia, Cear, Paraba, Pernambuco, Piau, Rio

    Grande do Norte e Sergipe), alm do norte de Minas Gerais, totalizando uma extenso territorial de

    980.133,079 km. A populao residente no semirido brasileiro alcanou a marca de 22.598.318

    habitantes em 2010, representando 11,85% da populao brasileira, 42,57% da populao nordestina, 28,12% da populao residente na regio Sudeste.

    Na regio Nordeste, o processo de desertificao evidencia-se na poro semirida, em uma rea

    aproximada de 788.064 km ou 48% da regio. Desse total, Paraba, Bahia e Cear so os mais afetados; esse ltimo, por exemplo, detm 136.328 km de reas semiridas suscetveis desertificao. O Cear

    tem 92,1% de seu territrio distribudo no permetro da semiaridez, ou seja, a maior rea proporcional

    do Nordeste seco (NASCIMENTO, 2013). O Brasil, cumprindo seus compromissos como pas signatrio da Conveno das Naes Unidas

    de Combate Desertificao, elaborou o Programa de Ao Nacional de Combate Desertificao e

    Mitigao dos Efeitos da Seca PAN/Brasil. O espao objeto da atuao do PAN/Brasil caracterizado

    como reas Susceptveis Desertificao ASD (BRASIL, 2005b, op. cit. p. 14). Dessa forma, as ASD compreendem 1.340.863km2, abraando 1.488 municpios de nove estados da regio Nordeste,

    alm de alguns municpios setentrionais dos estados de Minas Gerais e Esprito Santo (PEREZ-MARIN

    et al., 2012, p. 88). Assim, h reas nos estados do Maranho e Esprito Santo onde as caractersticas ambientais, hoje

    vislumbradas, sugerem a ocorrncia de processos de degradao tendentes a transform-las em reas

    tambm sujeitas desertificao, caso no sejam adotadas medidas de preservao e conservao

    ambiental (BRASIL, 2005b, op. cit.). Essas reas so consideradas como reas do entorno, pois apresentam caractersticas comuns s semiridas e submidas secas (ocorrncia de secas e enclaves da

    vegetao caatinga).

    De acordo com o Atlas das reas Suscetveis Desertificao do Brasil, as ASD foram determinadas seguindo os pressupostos norteadores da Conveno das Naes Unidas de Combate

    Desertificao, que propem a adoo do ndice de Aridez (IA), base da classificao climtica de

    Thornthwaite, de 1941, sendo calculado pela razo entre a precipitao pluviomtrica e a evapotranspirao. De acordo com esse ndice, quando a razo estiver entre 0,05 e 0,20, o clima

    considerado rido; na faixa entre 0,21 e 0,50, o clima caracterizado como semirido; quando estiver

    entre 0,51 e 0,65, considera-se submido seco e, por fim, acima desse valor, submido mido ou mido

    (BRASIL, 2007). Foram estabelecidas trs categorias de susceptibilidade desertificao em conformidade com o IA, sendo estas: muito alta (de 0,05 at 0,20), alta (de 0,21 at 0,50) e moderada

    (de 0,51 at 0,65) (MATALLO JR., 1999, op. cit.).

    Nas ASD, as prticas agrcolas insustentveis, a pecuria, o corte de lenha, a retirada de argila, entre outras contribuem sobremaneira para intensificar a degradao nessas reas. Nos locais onde a

    degradao maior, esto os ncleos de desertificao. Segundo Perez-Marin et al. (op. cit.), o eclogo

    Joo Vasconcelos Sobrinho apresentou as primeiras ideias sobre os Ncleos de Desertificao em 1971, na obra intitulada Ncleos de Desertificao no polgono das secas. Com a colaborao do professor

    Vasconcelos Sobrinho, foi realizado um estudo com o objetivo de identificar as reas mais atingidas

    pelo fenmeno e as mais crticas.

    Foram selecionadas seis reas consideradas ncleos de desertificao ou reas piloto. Tais reas esto nos estados do Piau (rea piloto 1 Ncleo de Gilbus), Cear (rea piloto 2 Ncleo de

    Irauuba), Rio Grande do Norte (rea piloto 3 Ncleo do Serid), Paraba (rea piloto 4 Ncleo

    Cariris Velhos), Pernambuco (rea piloto 5 Ncleo de Cabrob) e Bahia (rea piloto 6 Ncleo do Serto de So Francisco). Os ncleos de Gilbus, Irauuba, Serid e Cabrob foram caracterizados como

    de alto risco desertificao (BRASIL, 2005b, op. cit.).

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    Na tentativa de hierarquizar os nveis de gravidade dos processos nas reas afetadas pelo

    fenmeno, foi formulada uma metodologia de estudo de indicadores de desertificao pelo Instituto

    Desert, organizao no governamental que, ao longo de sua existncia, contribuiu de forma pioneira

    para as discusses ligadas desertificao no Brasil; foi formada por professores da Universidade Federal do Piau (PIAU, 2005, p. 11).

    Foram utilizados 19 indicadores para representar os componentes fsicos, biolgicos e

    socioeconmicos. Com base na aplicao dos indicadores, classificam-se as reas desertificadas em: muito grave (15 a 19 indicadores), grave (11 a 14 indicadores) ou moderada (6 a 10 indicadores). Apesar

    de tal metodologia ter sido questionada e necessite de aprimoramentos, sua contribuio deve ser

    reconhecida, afirma Matallo Jr. (2001, op. cit.).

    O QUADRO DA DESERTIFICAO NO RIO GRANDE DO NORTE

    O estado do Rio Grande do Norte abrange uma rea de 52.811.047 km, com 167 municpios e populao de 3.168.027 habitantes, sendo 2.464.991 na zona urbana e 703.036 na zona rural (IBGE,

    2010a). As economias fundadoras do estado foram a cana-de-acar, no litoral (primeira atividade

    econmica que serviu de base para o povoamento), a pecuria, da qual surgiram as primeiras fazendas de criatrio implantadas no serto, no incio do sculo XVIII, e a economia algodoeira no espao

    sertanejo, que foi objeto de exportao (FELIPE; ROCHA; CARVALHO, 2011).

    No que se refere s condies climticas, o Rio Grande do Norte caracteriza-se por apresentar temperatura mdia anual em torno de 25,5C, com mxima de 31,3C e mnima de 21,1C, pluviometria

    bastante irregular (em termo