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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL BEATRIZ SUELLEN PEREIRA DA SILVA EXPANSÃO DA REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA NA CIDADE DE NATAL-RN E O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL NATAL/RN 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

BEATRIZ SUELLEN PEREIRA DA SILVA

EXPANSÃO DA REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA NA

CIDADE DE NATAL-RN E O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE

SOCIAL

NATAL/RN

2017

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

BEATRIZ SUELLEN PEREIRA DA SILVA

EXPANSÃO DA REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA NA

CIDADE DE NATAL-RN E O EXERCÍCIO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE

SOCIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Serviço Social sob a orientação da Profª Drª Ilka de Lima Souza.

NATAL/RN

2017

Catalogação da Publicação na Fonte.

UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA

Silva, Beatriz Suellen Pereira da.

Expansão da rede de educação profissional e tecnológica na cidade

de Natal-RN e o exercício profissional do assistente social/ Beatriz

Suellen Pereira da Silva. - Natal, RN, 2017.

91 f.

Orientadora: Profa. Dra. Ilka de Lima Souza.

Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade Federal do

Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas.

Departamento de Serviço Social.

1. Serviço social - Monografia. 2. Educação - Monografia. 3. Rede de

Educação Profissional e Tecnológica - Monografia. I. Souza, Ilka de Lima.

II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/BS/CCSA CDU 364:377

Aos meus pais, por todo o incentivo e

confiança que depositaram em mim, cada

um ao seu modo, durante minha jornada

até aqui e por poder dar-lhes a honra de

realizar um sonho coletivo. Aos meus avós,

em especial à Marlene Pereira da Silva que

pode ver sua primeira neta ingressar e

concluir o ensino superior.

AGRADECIMENTOS

Chegar até aqui só foi possível porque tive em quem me apoiar durante todo o

caminho e em meio a tantos desafios. Assim, sou apenas gratidão neste momento tão

singular. Meu primeiro e maior agradecimento vai a Deus, criador de tudo o que sou,

em quem deposito minhas esperanças e sempre encontro descanso, repouso e paz

nos momentos mais difíceis.

Aos meus pais que sempre foram a minha maior motivação para concluir esta

significativa etapa, agradeço por todo amor e confiança depositada em mim. Em

especial a minha mãe que esteve em todos os momentos me dando suporte, amor e

ânimo, com palavras encorajadoras.

Ao meu querido companheiro, com quem decidi partilhar a vida, que foi um

alicerce fundamental, motivação e força nesta caminhada. Sem você com certeza teria

sido mais difícil.

Aos meus familiares, irmão e irmãs, tias, avós, primos e primas por partilharem

a alegria de cada conquista.

Agradeço especialmente a minha querida orientadora Prof. Drª Ilka de Lima

Souza que foi excelente, sempre compreensiva e positiva no trabalho que estava

sendo construído. Muito obrigada por todas as contribuições, reflexões e sugestões

feitas, sem dúvidas, foram fundamentais para chegar até aqui.

Meu muito obrigada aos membros da banca de defesa do TCC (Trabalho de

Conclusão de Curso) Prof. Drª Maria Célia Correia Nicolau e Me. Ana Paula de Moura

Cordeiro pelo incentivo e ricas contribuições realizadas. Obrigada também pela

oportunidade de ter sido supervisionada pelas duas, na academia e no campo,

durante o período do estágio curricular obrigatório, onde através das importantíssimas

discussões e análises realizadas me auxiliaram na delimitação do meu objeto de

estudo.

Agradeço às entrevistadas do Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia do Rio Grande do Norte que se dispuseram a contribuir com este estudo.

De modo mais amplo, ao próprio IFRN que foi um divisor na minha vida, onde construí

laços fortes de amizade e auxilio, e tive diversas oportunidades antes jamais

imaginadas, além de ter sido através do contato durante o período de bolsista no

Serviço Social que me fez escolher esta profissão.

Ao corpo docente do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal

do Rio Grande do Norte por todos os ensinamentos nas diversas esferas durante a

minha formação profissional.

Ao Programa de Educação Tutorial – Conexões de Saberes/Comunidades

Urbanas que foi o diferencial durante toda a graduação, o qual me oportunizou

experiências únicas na tríade de ensino, pesquisa e extensão, me auxiliou na

permanência na universidade e onde pude me encontrar e sentir que pertencia a um

grupo tão especial. Agradeço a todos os integrantes que passaram por ele, em

especial a tutoria da Prof. Drª Iris Maria de Oliveira que me ensinou sobre

compromisso e ética de maneira única.

Aos queridos velhos e novos amigos, pelo apoio e companheirismo durante a

vida. Aos fortes laços de amizade construídos dentro da universidade, às amigas Ana

Clara de Oliveira, Elizabeth Elizeuda de Sena Sebastião, Juliana Ribeiro da Silva e

Luana Brenda da Silva Nogueira que foram base, apoio constante, solidariedade e

partilha coletiva de desafios, tristezas e alegrias, não apenas academicamente, mas

na vida.

Agradeço ainda a minha turma que com tantas diferenças me ensinaram

constantemente. Por fim, aos que de alguma forma contribuíram direta ou

indiretamente para que chegasse até aqui. Sou resultado de todas as relações que

vivi e esta conquista é também coletiva. Meu muitíssimo obrigada!

RESUMO

O trabalho enfatiza a expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica do RN e suas consequências para o exercício profissional do assistente social. Assim, busca-se responder como a expansão vem interferindo no exercício profissional dos assistentes sociais; quais as demandas apresentadas ao Serviço Social após o processo de expansão; e quais os limites e possibilidades expressos dentro deste cenário para o exercício profissional. Dessa forma, a abordagem da realidade partirá da teoria crítica pensando os processos sociais a partir de sua historicidade e dinâmica, com base nas determinações macroestruturais. Integrando os processos metodológicos, foi realizada a pesquisa qualitativa e como técnica para a coleta de informações a entrevista semiestruturada com questões previamente definidas. O locus da pesquisa foi os três Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia da cidade de Natal-RN (campi Natal-Central, Natal-Zona Norte, Natal-Cidade Alta); foram entrevistadas cinco assistentes sociais. A discussão da educação destacada tem como base a sua compreensão enquanto parte do desenvolvimento humano em sua perspectiva ontológica, mas que é redirecionada no capitalismo, especialmente, no contexto neoliberal. Contrária às demais políticas sociais, a educação ganha centralidade com o no neoliberalismo, e a expansão da Rede insere-se neste cenário. As transformações sociais requisitam a inserção mais ampla dos assistentes sociais na esfera educacional e impõe novas exigências, além da atualização do perfil profissional. Desse modo, as repercussões decorrentes da expansão para a prática do Serviço Social nos Institutos Federais se manifestam de modo dialético. Em momentos expressam aspectos positivos, em outros, dificuldades para a ampliação dos horizontes do fazer profissional. Sendo necessária a constante atualização profissional e o tensionamento nos espaços ocupacionais para o pleno desenvolvimento do seu exercício, com a vinculação sistemática aos grupos pertencente à classe trabalhadora no intuito de fortalecer o avanço das lutas sociais em um contexto de retrocesso e redução de direitos, o qual marca, inclusive, o fim do processo da expansão educacional vivido nos últimos anos. Palavras-chave: Educação. Serviço Social. Rede de Educação Profissional e Tecnológica.

ABSTRACT

This monograph emphasize the expansion of the Federal Network of Professional, Scientific and Technological Education of the state of Rio Grande do Norte and its consequences for the social assistant’s professional practice. Thus, it is aimed to answer how the expansion has interfered in the professional practice of social assistants; what are the demands submitted to the Social Service after the expansion process; and what limits and possibilities are expressed within this scenario for the professional exercise. Therefore, the approach of reality will start from critical theory, thinking the social processes from their historicity and dynamics, based on the macrostructural determinations. Integrating the methodological processes, a qualitative research was carried out and, as an information collecting technique, a semistructured interview with previously defined questions. The locus of the research was the three Federal Institutes of Education, Science and Technology of Natal-RN (Natal-Central Campus, Natal-Zona Norte, Natal-Cidade Alta), were interviewed five social assistants. The discussion of education highlighted in this research is based on its understanding as part of human development in its ontological perspective, but redirected in capitalism, especially in the neoliberal context. In opposition to other social policies, education gains centrality in neoliberalism, and the expansion of the Network is part of this scenario. The Social transformations demand wide insertion of social assistants into the educational sphere and imposes new requirements beyond updating the professional profile. In this way, the repercussions resulting from the expansion to the practice of Social Service in the Federal Institutes are manifested in a dialectical way. At times they express positive aspects, in others, difficulties for the expansion of the horizons of professional doing. It makes the constant professional updating necessary and the tension in the occupational spaces for the full development of its exercise, with systematic attachment to the groups belonging to the working class in order to strengthen the advance of the social struggles in a context of retrocession and reduction of rights, which marks the end of the process of educational expansion in the last years.

Keywords: Education. Social Service. Professional and Technological Education Network.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

CAL – Campus Cidade Alta

CBAS – Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais

CCQ – Círculo de Controle de Qualidade

CEFET – Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET)

DC – Desenvolvimento de Comunidade

EAD – Ensino à Distância

EJA – Educação de Jovens e Adultos

ETFRN – Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte

FMI – Fundo Monetário Internacional

IFRN – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação

MARE – Ministério de Administração e da Reforma do Estado

MEC – Ministério da Educação

PROEP – Programa de Expansão da Educação Profissional

PT – Partido dos Trabalhadores

RDH – Relatório de Desenvolvimento Humano

SETEC – Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica

USAID – United States Agency for International Development

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO................................................................................................. 11

2. A EDUCAÇÃO NO CAPITALISMO E SEU SIGNIFICADO SOCIAL.............. 15

2.1 OFENSIVA NEOLIBERAL E A EDUCAÇÃO NO CONTEXTO

BRASILEIRO........................................................................................................

18

2.1.1 Principais elementos na trajetória da educação brasileira................... 31

2.2. EXPANSÃO DA REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA E SUA CONFIGURAÇÃO SOCIAL..........................................

40

3. O SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO: PERSPECTIVAS DE ANÁLISE DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL E A EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA...................................................................

49

3.1. O SERVIÇO SOCIAL E SUA VINCULAÇÃO HISTÓRICA À EDUCAÇÃO.........................................................................................................

50

3.2. CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA CIDADE DE NATAL/RN INSERIDO NO CONTEXTO EXPANSIVO...........................................................

60

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 76

REFERÊNCIAS.....................................................................................................

83

APÊNDICE........................................................................................................... 91

11

1. INTRODUÇÃO

A proposta de pesquisa que resultou neste trabalho partiu do interesse da

pesquisadora com a área da educação desde o início da graduação e da maior

aproximação com a temática a partir da vivência no estágio curricular supervisionado

obrigatório no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do

Norte (IFRN) - campus Cidade Alta, em Natal-RN. A partir da observação da dinâmica

cotidiana da instituição e o exercício profissional das assistentes sociais, notou-se que

no campus Cidade Alta houve um processo de expansão quantitativa do número de

vagas ofertadas para a educação profissional técnica de nível médio integrado, em

decorrência da criação de uma nova unidade situada no bairro das Rocas para este

nível de ensino; mas não se evidenciou a referida expansão em termos qualitativos.

Assim, a expansão alterou os processos de trabalho dos diversos profissionais da

instituição, todavia, o corpo técnico-administrativo e docente continuou sendo o

mesmo, dividindo-se entre as duas unidades.

A criação da nova unidade no bairro das Rocas também acarretou

consequências para o Serviço Social da instituição com o significativo aumento das

demandas, maior desgaste e dificuldades no aprimoramento profissional. Assim, este

cenário despertou a reflexão sobre como o processo mais amplo de expansão da

Rede de Educação Profissional e Tecnológica dos Institutos Federais,

especificamente, na cidade de Natal/RN, interfere na dinâmica profissional do Serviço

Social e quais as consequências disto.

Deste modo, a pesquisa desenvolvida teve como objeto o processo de

expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica do RN,

evidenciando-se suas consequências para o exercício profissional do assistente

social. Assim, buscou-se responder através dos objetivos específicos delineados

como a expansão vem interferindo no exercício profissional dos assistentes sociais;

quais as demandas apresentadas ao Serviço Social após o processo de expansão; e

quais os limites e as possibilidades expressas dentro deste cenário para o exercício

profissional.

Compreende-se que discutir a referida temática possui relevância social para

toda a comunidade que faz parte do IFRN/Natal, visto que o processo de expansão

alcança as diversas categorias profissionais presentes no espaço educacional, os

discentes e também a comunidade externa, em virtude da nova concepção político-

12

pedagógica institucional, a qual se propõe a permitir um progresso socioeconômico

local e regional.

Assim, definiu-se que a análise realizada a partir da realidade vivenciada nos

três campi da cidade de Natal, quais sejam: Natal-Central; Zona Norte e Cidade Alta,

poderia permitir uma reflexão mais aprofundada sobre a expansão da Rede de

Educação Profissional e Tecnológica na referida localidade.

De forma específica para o Serviço Social, compreender os processos da

dinâmica educacional no contexto do capitalismo contemporâneo sob a ótica do

neoliberalismo é fundamental para pensar a atuação profissional neste campo sócio-

ocupacional, pois desvela a complexidade da educação enquanto constitutiva da

dinâmica social e como um espaço próprio de disputas ideológicas, a qual possui

papel estratégico na reprodução do sistema capitalista. Entretanto, também pode

apontar para a construção de valores contra hegemônicos, a depender do viés

adotado.

Ademais, também se intencionou com o desenvolvimento da pesquisa

contribuir com o repensar do fazer profissional na educação, com vistas a construir

novas estratégias de enfrentamento aos ditames neoliberais com a organização do

trabalho coletivo. E, ainda, estimular mais debates internos no âmbito da categoria

profissional sobre a área, oportunizando a ampliação das discussões já existentes

acerca deste espaço ocupacional, que, na cena recente, se difundiram mais

amplamente a partir dos anos 1990, assim como a maior aproximação do Serviço

Social com a área.

Dessa forma, a análise metodológica fundamentou-se na abordagem da

realidade a partir da teoria crítica pensando os processos sociais com base em sua

historicidade e dinâmica, segundo as determinações macroestruturais. Buscando ir

além da “aparência fenomênica, imediata e empírica” para “apreender a essência (ou

seja: a estrutura e a dinâmica) do objeto.” (NETTO, 2009, p.8).

Incluído a isto, a pesquisa foi realizada a partir de abordagem qualitativa. Nessa

perspectiva, a revisão de literatura integrou os procedimentos metodológicos de modo

a nos aproximarmos ou aprofundarmos as reflexões e análises que norteiam o objeto

de pesquisa. Como técnica para a coleta de informações foi utilizada a entrevista

semiestruturada com um roteiro guia com questões previamente definidas, articuladas

aos objetivos propostos. As entrevistas foram gravadas com o consentimento das 05

13

(cinco) profissionais entrevistadas e, posteriormente, transcritas. A etapa seguinte

consistiu na realização da sistematização e análise das informações obtidas.

Ressalta-se que ao serem destacados trechos dos relatos das entrevistas,

estes foram mantidos ipsis litteris e a identificação das profissionais participantes da

pesquisa foi feita através da sigla “AS” seguida de um numeral sequencial até 5

(cinco), que corresponde à quantidade total de profissionais, como supracitado.

Conforme mencionado, o universo da pesquisa englobou os três IFRN’s da

cidade de Natal-RN. A princípio, tinha-se o objetivo de direcionar a entrevista

semiestruturada para duas assistentes sociais de cada unidade, na expectativa de

obtermos maior apreensão e concepções de profissionais do Serviço Social acerca

do objeto de estudo. Todavia, no campus da zona norte uma das profissionais estava

afastada para concluir o mestrado e em seguida entraria de férias. Assim, o período

após seu retorno era muito próximo ao prazo para concluir este trabalho, por isso, não

foi refeito o contato posteriormente. Desse modo, contabilizou-se um total de cinco

entrevistadas.

A escolha dos três campi deu-se, inicialmente, devido à experiência no estágio

obrigatório no campus Cidade Alta, zona leste de Natal, e em seguida da observação

da necessidade de aprofundamento sobre o processo expansivo da Rede no

município e a ampliação para as demais zonas administrativas da cidade, em que se

faz presente a instituição: zona sul e zona norte, sendo possível, assim, se

desenvolver uma análise com mais dados entre as unidades.

Portanto, para alcançar os objetivos expostos e melhor discutir as dimensões

que envolvem a temática, o trabalho ora exposto se divide em três partes. A primeira

– “A educação no capitalismo e seu significado social” – trata sobre questões voltadas

para a análise da educação, referenciando-a a partir de sua dimensão ontológica,

todavia determinada pela sociabilidade capitalista e reorganizada de acordo com os

processos históricos. Relacionando-a, ainda, às políticas sociais, com foco na

trajetória educacional na sociedade brasileira, elucidando-a enquanto campo de

disputas ideológicas, que no contexto neoliberal ganha centralidade e incide nas

diversas dimensões da vida. Assim, se apresenta o contexto de expansão da

educação no Brasil decorrente do reconhecimento enquanto direito social, entretanto,

também em virtude das orientações dos organismos internacionais. Associado a isso,

tem-se a expansão da Rede de Educação Profissional e Tecnológica, que responde

de modo contraditório aos interesses do capital e gera avanços para a sociedade.

14

A segunda parte – “O Serviço Social na educação: perspectivas de análise do

exercício profissional e a expansão da educação profissional e tecnológica” – refere-

se à discussão própria do Serviço Social em que se apresenta e se discute o exercício

do assistente social na educação, através de sua vinculação histórica com o campo,

a partir do fundamento de que a profissão desenvolve uma “[...] atividade de cunho

eminentemente educativo” (ABREU; CARDOSO, 2009, p.1-2), materializada ao longo

da trajetória profissional por três tendências de perfis pedagógicos: da “ajuda”, da

“participação” e da emancipação, elucidados por Abreu (2016). Ademais, apresenta-

se as consequências do processo expansivo dos Institutos Federais na cidade de

Natal/RN para o Serviço Social, através da leitura feita por assistentes sociais

atuantes no espaço e reflexões desenvolvidas sobre a temática.

Por fim, são expostas as considerações finais, com as quais se ressalta uma

síntese dos resultados obtidos a partir do estudo realizado.

15

2. A EDUCAÇÃO NO CAPITALISMO E SEU SIGNIFICADO SOCIAL

Entende-se a educação enquanto processo de construção de conhecimento e,

portanto, parte do desenvolvimento humano desde os seus primórdios, ou seja, é

anterior à estrutura de classes. Dessa forma, se constitui como uma dimensão ampla

e histórica da vida social, não restrita à educação escolarizada nem aos moldes

conhecidos hoje. Seus processos formativos remetem às sociedades primitivas onde

os objetivos eram direcionados aos interesses comuns das comunidades e à

propagação da cultura, sendo assim coletiva. Com o surgimento do capitalismo e a

necessidade de uma instituição que propague as ideologias necessárias para

sustentação do sistema e auxilie no desenvolvimento das forças produtivas, a

educação adquire um patamar diferenciado.

O novo modo de produção e sua estrutura social marcada pela polarização

entre classes antagônicas, os detentores dos meios de produção e a classe que vende

sua força de trabalho, faz com que a educação passe a ser controlada por um grupo

social específico. E, como analisa Marx e Engels (2007), a classe que detêm os meios

de produção material também detêm os meios de produção espiritual e, assim, os

meios com os quais se transmite o saber social sobre a produção da vida. Isso

significa dizer que o controle da educação passa a ser da burguesia e resultante desse

processo surge a escola1 com um conhecimento formal institucionalizado, necessário

para a expansão do sistema através da socialização – restrita e fragmentada para a

classe trabalhadora – do saber crucial para o desenvolvimento capitalista.

Ao analisar a obra de Marx, Almeida (2007) afirma que a educação ao ser

inserida na esfera de regulação pública assume um novo significado, o qual

possibilitou a subordinação dessa instância aos interesses da burguesia, sendo

perpassada por um corte claro de classe, em consequência do reflexo das

contradições presentes na sociedade.

A educação institucionalizada faz parte do aparato ideológico legitimador de

valores dominantes. O filósofo Mészáros (2008) considera essa instância como peça

basilar no processo de acumulação com o objetivo de estabelecer consenso ou

conformidade, o máximo que puder, dentro dos limites formais e legalmente

1 O objetivo aqui não é trazer a ampla trajetória histórica da educação e suas modificações dentro do capitalismo, mas apontar alguns aspectos gerais sobre a alteração do seu significado no modo de produção capitalista.

16

sancionados, integrando um sistema global de internalização que tem por objetivo

gerar condições de legitimação da exploração através da indução à aceitação passiva.

O sistema global de internalização é composto por outros aparelhos

ideológicos, como a família, a religião, o Estado e a mídia, que são mutuamente

responsáveis pela criação de consenso. Desse modo, mesmo a educação sendo uma

parte importante do sistema de aceitação ela não é “a força ideologicamente primária

que consolida [...] o capital; tampouco ela é capaz de, por si só, fornecer uma

alternativa emancipadora radical.” (MÉSZÁROS, 2008, p.45, grifos do autor).

Nesse sentido, é indispensável na análise sobre a educação compreender que

os processos históricos a tornam mais complexa, e de acordo com as transformações

e necessidade sociais modifica-se seu caráter, sendo determinada historicamente

como um reflexo do momento em que a sociedade vive. De modo amplo, esta

dimensão da vida social deve ser analisada sob a ótica do seu caráter ontológico, o

que significa dizer que ela faz parte dos modos de existência humana, do ser social e

da organização da vida em sociedade (ALMEIDA, 2007). Além de se relacionar

estritamente com o trabalho, como processo criativo de modificação da natureza.

Sobre educação e ontologia, Ivo Tonet (2016) elucida aspectos primordiais

dessa relação afirma que a educação tem papel fundamental na reprodução do ser

social, sendo esta responsável pelo processo de aquisição de conhecimentos,

habilidades, comportamentos, dentre outros elementos, que permitam ao indivíduo

tornar-se apto a participar conscientemente da vida social, ou seja, inserir-se no

processo social. (ibidem, p.122-123). Acerca da vinculação com o trabalho o autor

compreende que há uma dependência ontológica, uma autonomia relativa e uma

determinação recíproca entre os dois âmbitos. Referente ao primeiro ponto, a

dependência ontológica ocorre devido à educação possibilitar a organização dos

homens para a transformação da natureza, que é o processo do trabalho; o segundo

aspecto, referente à autonomia relativa, sucede devido a educação possuir uma

esfera e função específicas, diferente do trabalho, que cumpre função própria,

organizando-se de maneira independente dele; por fim, a determinação recíproca

significa que existe uma relação de interferência mútua entre a educação e todos os

processos da totalidade social e não apenas o trabalho. (Ibidem, p.120).

Isso significa dizer que a valorização dada à educação se relaciona com a forma

de trabalho presente na sociedade, o lugar deste diz onde está a educação, de acordo

com Mészáros (2008). A articulação entre essas duas dimensões ontológicas pode

17

gerar processos emancipatórios através da associação com ações coletivas de

alteração da estrutura social. É a universalização conjunta da educação e do trabalho

que possibilita uma atividade humana autorrealizadora.

A compreensão de que os homens são produtores da história permite ter um

olhar não unilateral sobre os processos educacionais, isto significa dizer que

[...] não existe atividade humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual [...] todo homem [...] partilha de uma concepção do mundo [...] contribui assim para manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para promover novas maneiras de pensar. (GRAMSCI, 1995, p.7-8).

A análise de Gramsci demonstra que é possível ir além do que está posto, não

fosse essa clareza estaríamos destinados unicamente às determinações

hegemônicas do capital e a educação formal permaneceria a seu favor.

Por meio disto, é entendível que a educação é um campo de disputas

ideológicas, mas que sob a lógica do capital tem um papel estratégico no processo de

expansão capitalista e que “[...] as determinações gerais do capital afetam

profundamente cada âmbito particular com alguma influência na educação, e de forma

alguma apenas as instituições educacionais formais” (MÉSZÁROS, 2008, p. 43, grifos

do autor).

Neste espaço estão presente diversos sujeitos, dentre eles os assistentes

sociais que encontram na esfera educacional um ambiente propício para o

desenvolvimento de sua intervenção e da sua dimensão pedagógica. No âmbito

contraditório da educação esta “[...] pode ser considerada um espaço privilegiado para

o enriquecimento ou empobrecimento do gênero humano” (CFESS, 2012, p.33).

Assim, as contribuições profissionais na área são extremamente significativas por a

categoria ter como defesa educacional a perspectiva emancipatória e o

desenvolvimento de processos para o fortalecimento dos indivíduos coletivos na

direção contra hegemônica.

De acordo com o CFESS (2012, p.18), a educação “sob a prisma do capital, se

converte em um conjunto de práticas sociais que contribuem para a internalização dos

consensos necessários à reprodução ampliada deste sistema metabólico”. O

documento ainda apresenta que na raiz contraditória da constituição do Serviço Social

está a participação no estabelecimento de consensos dentro da sociedade de classes,

decorrente da dependência dos insumos institucionalizados das políticas sociais para

18

exercer seu trabalho (idem, p.21). Os elementos dialéticos que permeiam a atuação

dos assistentes sociais demonstram que existem incidências não apenas na forma

como a educação se estrutura dentro da lógica capitalista, mas também nas

condicionalidades impostas para o exercício profissional.

Portanto, ao observamos a nova fase de expansão do capitalismo no

desenvolvimento do neoliberalismo associado ao capital financeiro2, o lugar adotado

pela educação é o de mercantilização das relações sociais, sendo fundamental para

difundir valores que auxiliem na propagação do ideário neoliberal. Esses princípios só

são possíveis de serem expandidos se articulados às diversas dimensões da vida,

com seus processos culturais, econômicos e políticos.

Desse modo, o próximo item discutirá a forma em que a nova organização do

capitalismo incide sobre a educação, trazendo a trajetória das políticas sociais e seu

reordenamento no contexto do neoliberalismo.

2.1. OFENSIVA NEOLIBERAL E A EDUCAÇÃO NO CONTEXTO BRASILEIRO

Pensar a educação na sociedade capitalista regulada pelo Estado é relacioná-

la às políticas sociais. Por isso, inicialmente, abordaremos neste tópico, uma breve

trajetória histórica das políticas sociais elucidando aspectos fundamentais e as

transformações relacionadas a estas. Nessa perspectiva, será feito destaque as

características dessas políticas no cenário neoliberal, e, posteriormente, uma

contextualização da educação brasileira.

De modo amplo, pode-se considerar que o surgimento das políticas sociais

remete à emergência da industrialização na sociedade capitalista no século XIX.

Momento que coincide com a generalização do trabalho livre, da expansão urbana e

do pauperismo vivenciado pela classe trabalhadora. Este processo também está

associado à emersão da questão social, a qual Iamamoto (2015, p.156) afirma que

seus fundamentos derivam da produção coletiva e apropriação privada da própria

atividade humana. Isto relaciona-se ao “processo de formação e desenvolvimento da

classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu

2 Segundo Iamamoto (2015), o capital financeiro é o atual estágio de desenvolvimento do capitalismo, caracterizado pelo processo de mundialização da economia, ancorado nos grupos industriais transnacionais, resultante da fusão e aquisição de empresas em um contexto de desregulamentação e liberalização da economia. O capitalismo financeiro integra processos econômicos, políticos e ideológicos que incidem sobre as diversas dimensões da vida, com base na valorização do capital e a subsunção da sociedade à sua lógica.

19

reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado.” (IAMAMOTO,

2014, p.84).

Assim, percebe-se que a questão social possui um duplo movimento: é ao

mesmo tempo conquista da luta da classe trabalhadora, devido sua organização, e

também resposta do Estado com o objetivo de garantir condições mínimas de

sobrevivência para a reprodução da força de trabalho, assumindo parcela das

reivindicações. O fundamento da questão social é o conflito de interesses entre capital

e trabalho, em que o primeiro, através de suas relações sociais, expropria a riqueza

produzida socialmente e faz com que os trabalhadores não se reconheçam no produto

de seu trabalho, processo definido por Marx de alienação3.

O capitalismo e suas relações de produção exigem que o Estado passe “[...] a

atuar sistematicamente sobre as sequelas da exploração do trabalho expressas nas

condições de vida do conjunto dos trabalhadores.” (IAMAMOTO, 2014, p.85). Visto

que é necessário, através do avanço do desenvolvimento social, atuar além da

repressão e da caridade, instaurando uma regulamentação jurídica para o

enfrentamento desta questão. Desse modo, as políticas sociais possuem um papel

fundamental na reprodução da força de trabalho e correspondem, também, à

necessidade de contenção e controle dos que questionam a ordem. Além disso, elas

ainda são

[...] na sua realidade substancial [...] uma forma transfigurada de parcela do valor criado pelos trabalhadores e apropriado pelos capitalistas e pelo Estado, que é devolvida a toda sociedade [...] sob a forma transmutada de serviços sociais. (IAMAMOTO, 2014, p.99, grifos da autora).

Importante destacar que o surgimento das políticas sociais foi gradativo e

diferenciado entre os países, a depender dos movimentos de organização

reivindicatória da classe trabalhadora e da correlação de forças presente na esfera do

3 Marx considerava “[...] o ato da alienação da atividade prática humana, do trabalho, em dois aspectos: 1) A relação entre o trabalhador e o produto do trabalho, como objeto alheio e dotado de poder sobre ele. Esta relação é ao mesmo tempo a que coloca ante um mundo exterior sensível, ante os objetos da natureza como ante um mundo estranho e hostil; 2) a relação entre o trabalho e o ato de produção, dentro do trabalho. Esta relação é a que se estabelece entre o trabalhador e sua própria atividade, como uma atividade alheia e que não lhe pertence, a atividade da passividade, a força como impotência, a procriação como castração, a própria energia física e espiritual do trabalhador, sua vida pessoal – pois a vida não é outra coisa que atividade – como uma atividade que se volta contra ele mesmo, independente dele, que não lhe pertence. Autoalienação como acima, a alienação da coisa.”. (MARX, 2004, p.66).

20

Estado, de acordo com Behring e Boschetti (2007). Todavia, sua generalização só

ocorre na transição do capitalismo concorrencial4 para o capitalismo monopolista

devido às novas mudanças da dinâmica político-econômica e social, que necessita da

intervenção estatal para auxiliar na elevação das taxas de lucro.

Assim, fica evidente que em consonância com a perspectiva marxista, as

políticas sociais “devem ser entendidas como produto concreto do desenvolvimento

capitalista, de suas contradições, da acumulação crescente do capital e, assim, um

produto histórico, e não consequência de um desenvolvimento ‘natural’” (PASTORINI,

1997, p.85, apud PIANA, 2009, p.35).

Referente a nova fase do capitalismo, a era dos monopólios surge nas últimas

décadas do século XIX, em decorrência do desenvolvimento das forças produtivas e

do avanço tecnológico que faz com que as grandes fábricas se expandam e sejam

eliminadas as menores – através da alta concorrência –, agregando-se em uma rede

única, criando assim monopólios em áreas produtivas específicas.

Este movimento garante a concentração e centralização de capital, fazendo

com que o capital industrial se associe ao bancário, e estes sistemas tenham “seu

papel econômico-financeiro substantivamente redimensionado” (NETTO, 1996, p.16),

e influam diretamente na vida das empresas. José Paulo Netto (1996) considera que

a conjugação desses processos permite o desdobramento da sociedade burguesa à

sua maturidade histórica, além de serem geradas novas contradições e antagonismos

sociais.

O autor faz, ainda, uma análise esclarecedora sobre a reformulação da

intervenção estatal e afirma que

[...] o capitalismo monopolista conduz ao ápice a contradição elementar entre a socialização da produção e a apropriação privada: internacionalizada a produção, grupos de monopólios controlam-na por cima de povos e Estados. [...] Assim, para efetivar-se com chance de êxito, ela demanda mecanismos de intervenção extra-econômicos. Daí a refuncionalização e o redimensionamento da instância por excelência do poder extra-econômico, o Estado. [...] Na idade do monopólio, ademais da preservação das condições externas de produção capitalista, a intervenção estatal incide na organização e na dinâmica econômicas desde dentro, e de forma contínua e sistemática. Mais exatamente, no capitalismo monopolista, as funções

4 O capitalismo concorrencial constitui-se na fase do capitalismo que teve início com o aparecimento de máquinas movidas por energia não-humana. Inicia-se na Inglaterra com a máquina a vapor, por volta de 1746 e finda com o início dos monopólios (BEHRING, 2000, p.32).

21

políticas do Estado imbricam-se organicamente com as suas funções econômicas. (NETTO, 1996, p.20-21, grifos do autor)

Percebe-se que o Estado deixa de interferir de forma mínima nas relações

econômicas e passa a atuar como organizador da economia sendo “um administrador

dos ciclos de crise” (NETTO, 1996, p.22), com um papel protecionista por meio de

medidas que facilitam a expansão. Dessa forma, investe em infraestrutura, como a

construção de estradas e ferrovias, nas próprias indústrias, em pesquisa e tecnologia,

e, principalmente, em políticas sociais que garantam a reprodução física da força de

trabalho esgotada pelos altos níveis de superexploração. O Estado no capitalismo

monopolista assume o papel de preservação e controle contínuos da força de

trabalho, ocupada e excedente, como uma função de primeira ordem. (idem).

Netto (1996) considera que para o Estado burguês se legitimar politicamente

necessita articular suas funções políticas e econômicas através da incorporação de

novos protagonistas sociais, desse modo, alarga-se sua base de sustentação e

legitimação sócio-política, mediante a generalização e institucionalização de direitos

e garantias cívicas e sociais, assim, permite organizar um consenso que assegura seu

desempenho.

Como os movimentos históricos não são unilaterais, a ampliação das respostas

sociais dadas pelo Estado também faz parte do processo de conquista da classe

trabalhadora através das lutas sociais e de sua organização política. Piana (2009)

argumenta que as primeiras ações de políticas sociais ocorreram na relação de

continuidade entre Estado liberal e Estado social, ambos partem do ponto em comum,

que é o reconhecimento de direitos sociais sem afetar os fundamentos do capitalismo.

Considera a autora que não houve ruptura radical entre o Estado liberal (século XIX)

e o Estado social capitalista (século XX), houve apenas a emersão de uma nova

concepção de Estado com a incorporação de demandas sociais democratas devido o

novo contexto socioeconômico e de luta de classes. (ibidem, p.25).

Behring e Boschetti (2007) reafirmam que o fortalecimento e a organização da

classe trabalhadora foram determinantes para a mudança da natureza do Estado

liberal no final do século XIX e a generalização dos direitos políticos e sociais do

século XX.

As mudanças na dinâmica social ainda interferem no mundo do trabalho e

alteram os processos produtivos de gestão e organização da indústria. Associado a

22

este momento histórico, têm-se a revolução tecnológica que permitiu o avanço do

setor industrial e com isso surgem tentativas sistemáticas para racionalizar a produção

e, consequentemente, aumentar a produtividade com a adoção de métodos científicos

na organização do trabalho. Dentre os métodos adotados está o taylorista-fordista. O

primeiro vincula-se ao controle dos tempos e movimentos regulados pelo cronômetro

e o segundo à produção em série.

O taylorismo-fordismo surge após a Grande Depressão, nos anos 30 do século

passado, e possui como elementos constitutivos básicos a produção maciça de

mercadorias; rígido controle dos processos de trabalho; linha de montagem e de

produtos mais homogêneos; trabalho parcelar e fragmentação das funções;

separação entre elaboração e produção no processo de trabalho; concentração e

verticalização das unidades fabris e constituição/consolidação do operário-massa, o

trabalhador coletivo fabril, dentre outros. (ANTUNES, 2015, p.35).

De forma geral, a lógica do sistema fordista-taylorista, com produção e

consumo em série, estava associada ao Estado de Bem-Estar Social5 presente em

países da Europa e nos Estados Unidos da América. Esta etapa do desenvolvimento

capitalista tinha por pressupostos o pleno emprego e a alta regulação estatal na oferta

e garantia de serviços sociais com um mínimo padrão de vida comum para os

cidadãos. O Estado de Bem-Estar atendia ao mesmo tempo às reivindicações da

classe trabalhadora e às do mercado, por meio do incentivo ao consumo que

possibilita o giro da economia, decorrente das garantias sociais que proporcionava

aos trabalhadores um saldo no salário para consumo de mercadorias.

Esse período é marcado pela ampla difusão das políticas sociais com o objetivo

de assegurar um acordo de neutralidade entre as classes sociais e amortecer a crise

do capitalismo com medidas anticíclicas. (PIANA, 2009, p.31). Todavia, nos países

subdesenvolvidos com economia dependente, como o Brasil, não ocorre a

universalização dos direitos sociais por meio da política do Estado de Bem-Estar.

O declínio do Welfare State inicia-se em meados da década de 70 do século

XX e altera-se em virtude de mudanças no cenário político-econômico mundial com

5 O Estado de Bem-Estar Social ou Welfare State se expressou de diferentes formas e regimes a depender do país implementado. Ele modifica-se de acordo com os processos históricos e lutas políticas específicas em cada país, variando em relação à abrangência da cobertura e critérios de acesso. Entretanto, sua política concentra-se em países da Europa e nos Estados Unidos e não ocorre no Brasil em nenhuma época do seu desenvolvimento em virtude das características do capitalismo no país e das políticas sociais brasileiras.

23

uma nova crise do capitalismo, que exige reformulações dos processos produtivos,

das concepções ideológicas presentes na sociedade e do papel do Estado.

O novo sistema é denominado de acumulação flexível ou reestruturação

produtiva com base no modelo toyotista precedido por altas taxas inflacionárias,

desequilíbrio das contas externas, aumento do valor do petróleo, com as crises na

década de 1970, e instabilidade na variação do dólar.

O toyotismo baseia-se na flexibilização da produção e dos direitos trabalhistas.

No processo de produção os produtos deixam de ser fabricados em série para

responder a um mercado mais individualizado por meio do just in time com estoque

mínimo, e respostas voltadas diretamente à procura; os trabalhadores passam a ser

polivalentes, com a intervenção máxima em todas as etapas da produção – contrário

a lógica do fordismo, onde a divisão técnica e minuciosa das funções permitia a

intervenção mínima nos processos através da mecanização dos movimentos e

intensificação do trabalho –; além do trabalho ser realizado em equipe.

Somado às características supracitadas, Antunes (2015) destaca a

flexibilização, terceirização, subcontratação, controle de qualidade total por meio dos

CCQ (Círculo de Controle de Qualidade), eliminação de desperdícios, sindicalismo de

empresa e gerência participativa como elementos constitutivos da organização do

trabalho. Ainda segundo o autor, o sistema supõe a intensificação da exploração do

trabalho com a eliminação da organização autônoma dos trabalhadores; envolve

também rápidas mudanças nos padrões de desenvolvimento desigual, sendo

imprescindível a flexibilização e desregulamentação dos direitos enquanto aspectos

necessários para o capital adequar-se à sua nova fase.

Atrelado à crise do Welfare State e a decorrente reestruturação no mundo do

trabalho, surge o neoliberalismo6 no campo ideo-cultural, como uma possibilidade

social após a crise global da sociedade contemporânea, a qual envolveu a crise

supracitada e a crise do socialismo real na década de 1980. O contexto de derrocada

6 De acordo com Piana (2009, p.29-30) o “Neoliberalismo, como arcabouço teórico e ideológico não é algo novo. Nasce com o combate implacável, no início da década de 1940, às teses keynesianas e ao ideário do Estado de Bem-Estar, sobretudo aos direitos sociais e aos ganhos de produtividade da classe trabalhadora. Seu postulado fundamental é de que o mercado é a lei social soberana. Friederich Hayek, teórico principal do neoliberalismo expõe suas teses básicas no início da década de 1940. A ele se juntam, entre outros, M. Friedman, e K. Popper. A adoção das teses neoliberais e a implementação econômica e político-social têm início, todavia, apenas no contexto da crise e do colapso do socialismo real. É uma ideologia capitalista que defende o ajuste dos Estados nacionais às exigências do capital transnacionalizado, portanto, contrária aos pactos que subordinam o capital a qualquer forma de soberania popular ou instituições de interesse público.”.

24

do Estado de Bem-Estar Social demonstrou a incapacidade do sistema capitalista de

proporcionar em ampla escala seu crescimento econômico. Ademais, a lógica interna

do capitalismo respalda-se em crises cíclicas, as quais geram ondas de crescimento,

a exemplo do Welfare State, e ondas largas de recessão. Percebe-se que em

contextos de crise o capitalismo reconfigura-se por meio de novos arranjos sociais

que alteram toda a dinâmica da vida em sociedade, ao modelo do neoliberalismo.

A lógica neoliberal representa a retração do Estado enquanto garantidor de

direitos sociais e sua mínima intervenção na regulação do mercado, apenas com

interferências de acordo com os interesses do capital, através da retomada das ideias

do liberalismo clássico. Netto (1995) afirma que a ordem capitalista alcançou um

determinado nível que para sua reprodução requisita, progressivamente, a eliminação

de garantias mínimas sociais e do controle mínimo a qual foi obrigado no arranjo social

anterior. Sua ressonância alcança a esfera pública e social e outros âmbitos da vida.

O autor também considera que o neoliberalismo ataca o plano teórico, social e político

e o ideo-cultural, através do combate ao keynesianismo, aos direitos sociais e a

regulação do Estado, além de contrapor-se à cultura democrática e igualitária, que

implica igualdade civil e política para todos e a redução das desigualdades. (ibidem,

p.78).

O significado social da expansão do neoliberalismo envolve a despolitização

das relações sociais e o alargamento das desigualdades em esfera mundial

decorrente do capital globalizado. Incorporado à sua racionalidade, é o mercado que

irá determinar o espaço de atuação do Estado e seu papel esgota-se em apenas duas

funções: gerar uma estrutura para o mercado e promover serviços este não pode

oferecer. Opõe-se ainda o sistema de previdência social e admite-se alguma ação

estatal em face do pauperismo, com medidas compensatórias. (NETTO, 1995). Ou

seja, o papel último do Estado é ser garantidor de medidas que assegurem sua forma

máxima para o capital, e mínima para os direitos sociais. Assim, o capital necessita

da atuação estatal para garantir suas condições de produção e reprodução.

Como já vem sendo explanado, a emersão do neoliberalismo e a crise do

Welfare State colocou em questão “as funções estatais como indutoras de

crescimento econômico e promotoras de bem-estar” além de demonstrar uma

“insustentabilidade de uma economia planejada”. (ibidem, p.77).

Esses movimentos provocam o redirecionamento das políticas sociais que

passam a ter centralidade no indivíduo como o responsável por seu provimento social

25

por meio do mercado. A noção de individualidade que embasa o novo ordenamento

social associa-se ao de liberdade7 gestada pelo mercado, ou seja, a liberdade

econômica, sendo ela quem funda a liberdade política e civil, que só é possível sob o

mercado livre, conforme observa Netto (1995).

Ainda referente às políticas sociais, Elaine Behring (2003) afirma que estas são

perpassadas por um discurso nitidamente ideológico, geradoras de desequilíbrio, com

custo excessivo de trabalho, e devem ser acessadas via mercado, como já citado.

Desse modo, é notório que deixam de ser vistas enquanto direito social, são

mercantilizadas e transformadas em negócios. Isso gera a degradação dos serviços

públicos e o consequente corte de gastos sociais, os quais impelem a um processo

de privatização. Tais traços se associam ainda à reorientação do fundo público,

cooptado pela burguesia com a direção voltada aos seus interesses.

Destarte, Behring (2003, p.59) considera que as políticas neoliberais têm

algumas orientações gerais que se combinam entre si com o objetivo de inserir um

país na dinâmica do capitalismo contemporâneo, são elas: a atratividade, flexibilidade

e competitividade, todas marcadas pela busca de rentabilidade do capital em meio a

reestruturação produtiva e da mundialização. A autora afirma que a alteração na

estrutura do Estado garante de forma contundente, em seu interior, a hegemonia

burguesa, cujas políticas compõem uma concepção singular de democracia, que

despreza a perspectiva de Estado liberal de direito e de uma organização social mais

densa e participativa. Assim, o Estado exige uma atuação mais forte com a finalidade

de garantir a “lei e ordem” sob a orientação das instituições financeiras

(HUSSON,1999, apud BEHRING, 2003).

Obviamente, o Estado forte é destinado ao controle e repressão da classe

trabalhadora para asseverar o consenso mais facilmente dentre os questionadores.

Além disso, sua atuação possui um viés antidemocrático que ignora as exigências

populares, ou, como citado, atende apenas parcela das reivindicações.

Dentro do contexto brasileiro as políticas sociais têm um desenvolvimento

diferenciado devido às características constitutivas do país com uma economia

desigual e dependente das grandes potências e a implementação tardia do

7 Esta concepção de liberdade é caracterizada por Friedman, um dos pais do neoliberalismo, e denomina-se “tese da indivisibilidade da liberdade” em que considera que só é possível haver liberdade sob o mercado livre e a não intervenção do Estado, temática que pode ser aprofundada em Netto (1995) e Sader; Gentili (1995).

26

capitalismo na nação com a chegada do processo industrial apenas na década de

1930. A formação brasileira, em linhas gerais, sempre foi constituída por um alto nível

de desigualdade social8 com concentração de renda e riqueza, e grande

hierarquização de grupos específicos que se revezavam no poder através dos ciclos

econômicos marcados pela polarização de classes.

Os aspectos econômicos, políticos e sociais, delineiam o perfil das políticas

sociais brasileiras que são sempre, dentro de todos os ciclos e contextos históricos,

de caráter assistencialista, paternalista e clientelista, com medidas estatais paliativas

e fragmentárias com o objetivo de manter a ordem social, além da formatação a partir

de um contexto autoritário no interior de um modelo econômico concentrador de renda

e socialmente excludente. (PIANA, 2009, p.38). Ademais, a inserção do Brasil no

mundo globalizado o fará dependente das determinações e decisões do capital e das

potências mundiais hegemônicas. (ibidem, p.34).

Conforme Iamamoto e Carvalho (2014, p.141), as políticas sociais no Brasil

emergem na transição para os anos 1920, em um contexto marcado pelo liberalismo

excludente, com iniciativas embrionárias de pequeno relevo e alcance social, em que

há a negação por parte do Estado em reconhecer as sequelas da questão social.

Naqueles anos algumas medidas são tomadas, todavia sua aplicação se limitará aos

dois principais centros urbanos, apenas a alguns setores vitais à agroexportação,

como ferroviários, marítimos e portuários, de grande participação estatal.

Na década seguinte o país experimenta as primeiras ações mais amplas de

proteção social com a expansão da industrialização durante a era getulista, que

coincide também com o surgimento da massa operária9 e, consequentemente, da

questão social no cenário político, sendo reconhecida como uma problemática que

deve ser enfrentada pela burguesia e o Estado. Essas transformações associam-se à

crise do comércio internacional em 1929, à denominada Revolução de 1930 e ao

declínio da burguesia cafeeira, que alteram a estrutura organizacional das esferas

8 Os elementos históricos da formação brasileira de desigualdade social permanecem até os dias de hoje. Para exemplificar, de acordo com dados divulgados em março do presente ano pelo Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), com base no Indíce de Gini, o Brasil ocupa a 10º posição no ranking dos países mais desiguais do mundo, mesmo sendo uma das principais economias do mundo, o que é explicado, dentre os vários fatores, pela disparidade e concentração de renda. 9 Conforme Iamamoto e Carvalho (2014, p.137), a massa operária começa a surgir de forma embrionária no início do século XX com a aglutinação dispersa nos maiores centros urbanos de empresas industriais, com condições de vida e trabalho insalubres. A população constituinte deste grupo era uma minoria populacional composta majoritariamente por imigrantes marginalizados socialmente e ecologicamente dentro das cidades, onde predominava ainda o modelo agroexportador na formação da economia brasileira.

27

estatal e econômica "[...] apressando o deslocamento do centro motor da acumulação

capitalista das atividades de agro-exportação para outras de realização interna.”

(ibidem, p.136).

Com o fenômeno da industrialização emerge uma nova burguesia10 que

necessita de mecanismos os quais possibilitem sua dominação. Nesse sentido, e

segundo Iamamoto e Carvalho (2014), isto

[...] implica a organização do proletariado, ao mesmo tempo em que implica sua desorganização enquanto classe. A tentativa de controle da organização do proletariado implica que este seja reconhecido pelo Estado enquanto classe, e enquanto classe social espoliada. Implica leis de exceção que rompam a ortodoxia liberal, intervindo abertamente no mercado de trabalho. A hegemonia burguesa não pode basear-se apenas na coerção, necessitando estabelecer mecanismos de integração e controle. (p.141).

Percebe-se que para a expansão do capitalismo é necessária a intervenção

estatal e o reconhecimento da questão social no cenário político-social com respostas

destinadas ao proletariado, que naquele momento inicial de industrialização não havia

interiorizado a ideologia da alienação e expropriação da riqueza enquanto natural.

Assim,

Na medida em que se trata de uma ou duas gerações recém-integradas ao trabalho fabril, para as quais as formas de existência a que a industrialização capitalista sujeita o proletariado ainda não foram interiorizadas como naturais e imanente, torna-se necessária uma ação externa que complemente a coerção existente no nível das relações de produção e dos mecanismos extraeconômicos que se estabelecem no interior da empresa a partir desse âmbito. (ibidem, p.146, grifos dos autores).

É nesta conjuntura da necessidade de mecanismos externos em relação ao

controle privado existente na esfera da produção que se têm os protótipos do Serviço

Social, o qual nasce com o objetivo de contribuir para o disciplinamento moral da

10 Florestan Fernandes (2006) afirma que a constituição e consolidação da burguesia no Brasil não decorre de um processo linear, mas é realizado através de lapsos de rupturas e continuidades com as estruturas de poder que antecedem o desenvolvimento do capitalismo propriamente dito no país. Isto significa que a forma aqui apresentada é apenas um modo elucidativo para caracterizar brevemente a burguesia. Todavia, é importante destacar que segundo o autor a Revolução Burguesa se dá no momento em que há “[...] um conjunto de transformações econômicas, tecnológicas, sociais, psicoculturais e políticas que só se realizam quando o desenvolvimento do capitalismo atinge o clímax de sua evolução industrial.” (p.239).

28

classe operária e sua família colaborando no auxílio à sociedade para ser uma

extensão da fábrica, dentro da lógica positivista11.

Fundamental destacar que os contraditórios avanços sociais adquiridos nas

primeiras décadas do século XX também decorreram da organização dos operários

em ligas e sindicatos que reivindicavam condições mínimas de sobrevivência para a

reprodução da sua força de trabalho. Conforme analisa Romanelli (2005), a

intensificação do capitalismo industrial neste período no Brasil coloca novas

exigências para o campo educacional, que serão melhores discutidas na continuação

deste capítulo.

Contrário ao movimento macrossocial, as políticas sociais brasileiras ganham

maior destaque na década de 1980, devido ao processo de redemocratização no país

e a forte organização social de efervescência política na luta pela reconquista dos

direitos civis e legitimação dos direitos sociais. Desse modo, é apenas neste período

que se conquista de forma ampla, pela primeira vez, em aparatos jurídico-políticos, o

reconhecimento dos direitos para a população brasileira através da Constituição de

1988 com a inserção de diversas políticas públicas, como saúde, assistência social,

previdência e educação, com impactos positivos na vida dos trabalhadores. Neste

cenário surgem novos protagonistas sociais, os quais ocupam espaço político-social

através do controle social das políticas, com densa participação na formulação,

implementação e gestão das mesmas.

Todavia, Vieira (1997, p.68, apud Piana, 2009, p.73) considera que a política

social brasileira mantém características históricas na sua constituição, desse modo

[...] compõe-se e recompõe-se, conservando em sua execução o caráter fragmentário, setorial e emergencial, sempre sustentada pela imperiosa necessidade de dar legitimidade aos governos que buscam bases sociais para manter-se e aceitam seletivamente as reivindicações e até as pressões da sociedade.

Pensamento que se associa ao defendido por Iamamoto (2014), a qual afirma

que os capitalistas, com o objetivo de resguardar seus interesses, tomam cuidado

11 A lógica positivista analisa os sujeitos enquanto indivíduos que devem estar vinculados ao harmonioso movimento da sociedade para que esta possa desenvolver-se plenamente, assim, aqueles que se encontram fora dos valores definidos enquanto o ideal, necessitam, portanto, de ajustamento e correções com o objetivo de serem integrados à sociedade.

29

para que as conquistas dos trabalhadores não afetem significativamente a

continuidade do capital e suas relações de exploração.

Contraditoriamente ao movimento de avanço democrático e conquistas de

direitos, os anos 1980 são marcados pelo agravamento da questão social, com a

elevação dos índices de pobreza e desigualdade social, endividamento interno e

externo, com uma profunda crise econômica – conhecida como a década perdida

neste aspecto – em decorrência das medidas tomadas durante a Ditadura Militar.

Esses elementos políticos, econômicos e sociais dão abertura às propostas de

cunho neoliberal com a implementação deste modelo durante o governo de Fernando

Henrique Cardoso (1995-2003). Tem-se a refuncionalização do Estado na intervenção

das relações sociais adaptando-se às requisições do capitalismo mundial através de

uma nova ofensiva burguesa.

A implementação do neoliberalismo no Brasil possui algumas particularidades

em decorrência da dinâmica interna do capitalismo retardatário presente em nosso

país. Este se diferencia do contexto global, pois não se constitui apenas enquanto um

novo modo de organização do capital para superar uma crise, mas é proposto com

base nas orientações dos organismos internacionais, os quais determinam ações

específicas para os países periféricos como condições à inserção na economia

mundial, a exemplo do Consenso de Washington12.

Conforme Behring (2003, p.61), o modelo de ajuste estrutural proposto pelo

Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) para a periferia gera a perda

da autonomia dos Estados nacionais já que reorientam a parte mais competitiva da

economia para exportação, contém o mercado interno e bloqueiam o crescimento dos

12 O Consenso de Washington foi um encontro internacional ocorrido em 1989 o qual apresentou um

conjunto de recomendações e reformas para a implementação e ampliação do neoliberalismo na América Latina, com objetivo de combater o atraso continental, por meio de dois eixos, conforme Bresser-Pereira (1991, p.6): a) o excessivo crescimento do Estado, traduzido em protecionismo, excesso de regulação e empresas estatais ineficientes e em número excessivo; e b) o populismo econômico, definido pela incapacidade de controlar o déficit público e de manter sob controle as demandas salariais tanto do setor privado quanto do setor público. O autor ainda afirma que para tanto se tinha como orientação a realização de 10 (dez) reformas: a) disciplina fiscal visando eliminar o déficit público; b) mudança das prioridades em relação às despesas públicas, eliminando subsídios e aumentando gastos com saúde e educação; c) reforma tributária, aumentando os impostos, se isto for inevitável, mas “a base tributária deveria ser ampla e as taxas marginais deveriam ser moderadas”; d) as taxas de juros deveriam ser determinadas pelo mercado e positivas; e) a taxa de câmbio deveria ser também determinada pelo mercado, garantindo-se ao mesmo tempo em que fosse competitiva; f) o comércio deveria ser liberalizado e orientado para o exterior; g) os investimentos diretos não deveriam sofrer restrições; h) as empresas públicas deveriam ser privatizadas; e, por fim, i) as atividades econômicas deveriam ser desreguladas; j) o direito de propriedade deve ser tornado mais seguro (idem).

30

salários e dos direitos sociais, além de aplicarem políticas monetaristas

macroeconômicas. Assim, encontram dificuldade para desempenhar suas funções de

regulação socioeconômicas internas, como fortes impedimentos para o avanço da

democracia.

A reestruturação produtiva no país foi intitulada pelo próprio então presidente

Fernando Henrique Cardoso como “Reforma do Estado” com o discurso de

modernização das estruturas político-administrativas. Todavia Behring (2003), a

entende como uma contrarreforma – perspectiva também defendida por nós – já que

as mudanças iam no sentido contrário aos avanços adquiridos na década passada,

com significativos retrocessos sociais em benefício de poucos. Tal aspecto

impossibilita o processo de redemocratização política e econômica, inclusive dos

trabalhadores e da maior parte da população brasileira. A autora afirma, ainda, a

existência de uma coerência interna na contrarreforma que articulada às mediações e

determinações políticas, econômicas, culturais e sociais, em âmbito nacional e

internacional do país, delineiam a direção e o conteúdo presente na nova política de

Estado. (ibidem, p.24).

O ajuste neoliberal é sintetizado através do Plano Diretor da Reforma do Estado

elaborado pelo Ministério de Administração e da Reforma do Estado (MARE) em 1995,

que encontra no Plano Real a máxima da experiência neoliberal no país. As medidas

adotadas se baseiam na abertura do comércio para o mercado internacional,

privatização de órgãos estatais, redução dos gastos públicos, desregulamentação e

flexibilização do mercado de trabalho e aumento dos recursos orçamentários

destinados ao superávit primário. No campo das políticas sociais há como orientação

a focalização, fragmentação e seletividade, com a predominância de programas de

transferência de renda13 como mecanismo de enfrentamento à pobreza. Isso também

implica na difusão de organizações filantrópicas e não governamentais, com estímulo

à solidariedade e organização da sociedade civil.

Verifica-se, segundo Pereira (2000a, p.56 apud PIANA, 2009, p.33), que há

13 Com a instauração do neoliberalismo e o novo caráter das políticas sociais adota-se como critério principal no combate à pobreza a transferência de renda, limitando-a enquanto aspecto referente a insuficiência de renda e de consumo, negando-se seu caráter multidimensional, estrutural e complexo, definido por Yazbek (2012, p.153) como um elemento “para além das carências materiais, considerando também as carências de direitos, oportunidades, informações, possibilidades e esperança, como expressão direta das relações vigentes na sociedade, relações extremamente desiguais, em que convivem acumulação e miséria.”. No Brasil o principal programa de transferência de renda é o Bolsa Família que atende mais e 13,9 milhões de famílias, de acordo com dados da Caixa Federal.

31

[...] o desmonte das políticas nacionais de garantias sociais básicas, cujas principais implicações estão voltadas aos cortes de programas sociais à população de baixa renda, à diminuição dos benefícios da seguridade social e à criminalização da pobreza com o incentivo às práticas tradicionais de clientelismo, à filantropia social e empresarial, à solidariedade informal e ao assistencialismo, revestidos de práticas alternativas e inovadoras para uma realidade de pobreza e exclusão social.

Em consequência, tem-se como herança um cenário de desemprego

generalizado, um país endividado, privatizado, com restrição de consumo para a

classe popular e altas taxas de juros. A configuração da hegemonia neoliberal foi

permeada por contradições, as quais foram expostas por Guimarães (1996, apud

BEHRING, 2003) do seguinte modo: a) a primeira e principal trata-se da relação entre

Estado e mercado, que exigiu o fortalecimento do mercado ao mesmo tempo em que

há a refuncionalização do Estado para atender as demandas existentes. Pode-se citar

a relação entre o controle da inflação e o crescimento da dívida pública; b) a segunda

é a perda de autonomia e soberania nacional, como já foi citado, através da

conciliação das requisições da ordem mundial com o equilíbrio interno; c) as últimas

referem-se à crise social e a contradição democrática. As duas dizem respeito à

fragilidade da legitimidade social, que coloca em questão as medidas adotadas, que

em um primeiro momento atenuam temporariamente os efeitos da crise da década de

1980, mas em uma segunda etapa não são capazes de assegurar a continuidade da

legitimação social, considerando que se ampliam as restrições políticas e econômicas

com reflexo direto para a classe trabalhadora. Além disso, o forte uso da força na

repressão por parte do Estado para a sociedade civil com o objetivo de garantir a

ampliação dos interesses privados nacionais e internacionais aumenta a corrupção e

é questionada pela sociedade.

Por fim, chega-se à “[...] constatação do caráter destrutivo não criador e

conservador da agenda neoliberal no Brasil.” (BEHRING, 2003, p.121, grifos da

autora), a qual acarretou na ampliação dos lucros para os burgueses em detrimento

da redução de direitos e aumento da pobreza para a classe trabalhadora, além de

criar um cenário de grandes retrocessos sociais.

2.1.1 Principais elementos na trajetória da educação brasileira

32

Ao analisar a educação brasileira no âmbito das políticas sociais, verifica-se

que sua trajetória “[...] reflete a relação direta entre a mesma e o processo de

desenvolvimento capitalista no país” (BÜLL, 2011, p.68). De modo histórico, a

educação no Brasil foi pautada durante anos em uma perspectiva puramente elitista

e excludente, onde o acesso à escolarização era detido por grupos privilegiados. E

apenas passou a ser vista com mais preocupação social com o início do processo de

industrialização, ou seja, como resposta às necessidades impostas pelo capitalismo

na época.

Freitag (1980, apud PIANA, 2009) delimita o curso da educação brasileira em

três etapas, correlacionando-as aos modelos de economia existentes no país, quais

sejam, o agroexportador, o de substituição de importações e o de internacionalização

do mercado interno – classificação que assevera a relação supracitada estabelecida

por Büll. As etapas delimitadas correspondem, respectivamente: a primeira de 1500

até 1930, abrangendo da Colônia à Primeira República; a segunda de 1930 a 1960,

aproximadamente; e a terceira de 1960 adiante.

Assim, será feita uma breve contextualização da historicidade da educação no

Brasil, com o objetivo de delinear os aspectos mais gerais que marcam o nosso

desenvolvimento a fim de perceber quais características predominam diante da

modificação dos ciclos econômicos. Para isso, é importante entender que a trajetória

da educação e, posteriormente, sua política, resulta de formas historicamente

determinadas de enfrentamento às contradições que particularizam a sociedade

capitalista, não apenas marcada por mudanças institucionais e legislativas, mas trata-

se se ações institucionalizadas em resposta ao acirramento da questão social em

meio a sua dinâmica e consequentes crises. (CFESS, 2012, p.19).

A história da educação brasileira inicia com a chegada dos jesuítas no território

colonial sob o predomínio da Igreja Católica na definição do sistema educacional

durante dois séculos de forma praticamente exclusiva; atuavam de forma a contribuir

para a difusão dos valores eurocêntricos14 que auxiliavam na perpetuação do poder

da Metrópole sobre a Colônia.

14 Os valores eurocêntricos baseavam-se no que era entendido na Europa enquanto modo de vida ideal, superior às demais organizações sociais, assim, definiam elementos econômicos, políticos, sociais e culturais com o objetivo destes tornarem-se a maneira de viver na Colônia, não apenas a brasileira, mas em todos os territórios colonizados por europeus.

33

A escola neste período era destinada a um grupo extremamente limitado de

pessoas pertencentes à classe dominante, ou seja, apenas aos filhos homens dos

senhores de engenho e de terras. Durante a existência do regime escravocrata o

ensino foi mantido à margem, já que não era visto como necessário para a economia,

que se fundava na agricultura simples, além de ser totalmente alheio à realidade de

vida da Colônia, sem nenhuma preocupação em contribuir para modificações na

estrutura da vida social e econômica do país, como afirma Romanelli (2005).

Havia, assim, a inexistência de um sistema educacional de responsabilidade

estatal, pois não existia interesse por parte dos portugueses em estruturar política-

economicamente e, consequentemente, educacionalmente a Colônia, já que seu

objetivo único era obter lucros. Mesmo após a expulsão dos jesuítas em 1759 os

fundamentos da estrutura educacional, excludente, seletiva e para as elites, se

manteve. No entanto, houve uma decadência maior da educação até a chegada, em

1808, da Coroa Portuguesa e da família real no país.

Com a reorganização administrativa, D. João VI introduz pequenas mudanças

no ensino no Brasil, criando os primeiros cursos superiores, com um objetivo

profissional prático, e outras instituições de educação e cultura. Esse novo quadro

exigia a formação de pessoal para atender à demanda dos serviços emergentes.

Junto a isso, a destinação do ensino superior para as elites aristocrática e nobre gerou

abandono dos demais níveis de educação.

Romanelli (2005, p.38) afirma que a educação era vista como questão de status

e hierarquia social, sendo, assim, fator coadjuvante na construção da estrutura de

poder. A autora retrata que as alterações político-econômicas e sociais no século XIX

decorrentes da Independência, em 1822, fez com que surgissem novos estratos

sociais e o aumento da demanda escolar pelos grupos médios. A emergente pequena

burguesia contribuiu para que houvesse a vitória dos ideais burgueses sobre a

ideologia colonial, que se concretizou em um primeiro momento com a abolição da

escravatura e a proclamação da república e, após, com a implantação do capitalismo

industrial.

No período que antecede o desenvolvimento capitalista no Brasil não se

verifica, do ponto de vista da análise da sociedade, a necessidade da expansão

ampliada da educação para todas as camadas sociais, sendo assim, não existia

disparidade entre as exigências econômicas do modelo agroexportador e a oferta

educacional da época.

34

É apenas com as transformações ocorridas com a denominada Revolução de

1930 e a implantação do capitalismo industrial que o sistema se reformula em

decorrência das novas exigências sociais. Nas décadas anteriores do século XX têm-

se a tentativa de reformular a educação no país através de diversas reformas no

ensino, todavia, todas elas são incapazes de modificar a real estrutura da educação e

de criarem uma política educacional.

O capitalismo no Brasil se expande durante a Era Vargas (1930-1945) após o

governo investir na indústria nacional. Esse momento marca a mudança do ciclo

econômico agroexportador para o de substituição de importações. Tal processo exige

o reajustamento do Estado na formulação das políticas sociais, como já demonstrado,

e também na oferta da educação. Já que para a ampliação do capitalismo é

necessária uma mínima qualificação para a realização da produção e a competição

dos trabalhadores no mercado de trabalho e consumo.

Entretanto, é importante destacar que a atuação do Estado não se dá de forma

voluntária, mas sim devido à criação da demanda social por educação – em que parte

da sociedade, especificamente a urbana, passa a enxergar este elemento como

mecanismo de ascensão social – e à luta de classes desse período. Ou seja, é a

demanda social que impulsiona o processo de expansão educacional. A

caracterização da expansão da educação deste período aconteceu de forma desigual

entre as zonas territoriais, já que foram priorizadas as áreas em que se intensificou o

capitalismo. Assim, Romanelli (2005, p.61) considera que a expansão do sistema

escolar se deu “de forma atropelada, improvisada, agindo o Estado mais com vistas

ao atendimento das pressões do momento do que propriamente com vistas a uma

política nacional de educação.”.

Ainda segundo a autora, o sistema educacional pode manter duas formas de

relação com o desenvolvimento global da sociedade: na primeira, a escola é tida como

fator de mudança social, com uma coerência interna e externa, se readaptando

constantemente com participação ativa no desenvolvimento. Já na segunda, a escola

é mantida em atraso em relação ao desenvolvimento, em que o sistema escolar

conserva-se inerte em relação ao desenvolvimento e só se expande mediante pressão

da demanda, desse modo, esta comanda a expansão. (Ibidem, p.69).

Fica evidente na assertiva supracitada que o desenvolvimento escolar no Brasil

tem como atributo a segunda função, onde durante anos sua expansão foi inócua e

conservou os fundamentos dos modelos anteriores à expansão industrial no país. Esta

35

consideração demonstra que na sociedade capitalista, de modo especial nos países

periféricos, a educação se distancia de seu caráter ontológico e deixa de prezar pela

socialização da produção humana com objetivo de contribuir para o pleno

desenvolvimento dos sujeitos.

No mesmo decênio, tem-se a criação em 1930 do Ministério dos Negócios da

Educação e Saúde Pública, que marca a história da educação brasileira, pois

direciona para o Estado a função de legislar, orientar e coordenar a respeito desta

dimensão da vida. Em 1932 surge o “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova” com

um viés de luta ideológica para a transformação da educação no país na perspectiva

de se relacionar com o atual desenvolvimento, com o objetivo de construir um

programa de reorganização educacional em âmbito nacional. Este movimento é

dialético e permeado por contradições, ao mesmo tempo em que propicia um avanço

se contrapondo ao privilégio de classe no direito à educação e reivindica a

responsabilidade do Estado na prestação do ensino laico e de modo público para

todos, marca também a plena aceitação e adequação ao novo regime social, sem

questionamentos.

Todavia, o Movimento trouxe consequências positivas na elaboração das

Constituições de 1934 e 1937. A primeira foi marcada por um avanço maior no que

diz respeito a tornar facultativo o ensino religioso com a descentralização do mesmo,

sendo responsabilidade dos Estados e Distrito Federal a oferta gratuita – apenas para

o primário e os demais níveis há a “tendência à gratuidade”, como afirma o próprio

texto – em conjunto com a família. Além de tratar a educação como direito de todos.

Já na sucessiva Carta Constitucional, após a instauração do Estado Novo, a ênfase é

dada ao ensino profissional destinado às classes “menos favorecidas”, onde se

instaura o dever das indústrias e sindicatos de criarem escolas de aprendizes,

destinadas aos filhos dos operários e associados. Mesmo com os avanços à época,

ainda se têm traços na educação de uma sociedade atrasada, que prezava pela moral,

o estímulo à eugenia15 e a liberdade privada no ensino.

15 Na Carta Constitucional de 1934 o Art. 138 afirma que “Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas” na alínea “b) estimular a educação eugênica;”. A eugenia baseava-se na supremacia de uma raça-etnia sobre as demais, desse modo, combatia-se a miscigenação, através da busca pelo branqueamento e a regeneração racial. Este movimento advém de influências europeias, todavia no Brasil se relaciona a formação histórica do país e aos fundamentos do racismo arraigados em nossa sociedade.

36

Após o fim do Governo Vargas e o processo de retorno democrático, tem-se a

promulgação da Constituição de 1946, com tendências liberais-democráticas, que

preza pelos direitos individuais e estabelece no referente à educação a

responsabilidade da União em legislar sobre as diretrizes e bases da educação

nacional, com a previsão de dotação orçamentária mínima destinada a esta área –

conforme o Art. 169 que diz: “a União aplicará nunca menos de dez por cento, e os

Estados, o Distrito Federal e os Municípios nunca menos de vinte por cento da renda

resultante dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino”. Esse

entendimento, mesmo sendo incapaz de garantir o direito à educação, demonstra

relativa preocupação em estabelecer condições mínimas para implementar o direito.

Baseado neste contexto, reacendem-se as lutas ideológicas, constituídas por

estudantes, operários e intelectuais ligados ao grupo dos “Pioneiros”, em prol do

avanço da educação, que culmina na promulgação da Lei 4.024, em 1961, a qual fixa

as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Essa edição da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação (LDB) foi a primeira lei geral de educação no país; dentre os avanços,

amplia a orçamento da União para no mínimo doze por cento da receita e mantém o

mesmo valor para Estados e Municípios, descrito na Constituição anterior, com o

objetivo de assegurar o acesso à escola para o maior número possível de educandos;

a melhoria progressiva do ensino e o aperfeiçoamento dos serviços prestados; além

de tratar sobre o ensino técnico-científico e o desenvolvimento das ciências, letras e

artes. Preserva, ainda, a supervisão do Estado nos estabelecimentos particulares e o

no nível superior. Entretanto, define que o ensino primário pode ser ministrado pela

esfera pública e privada, assim extingue a obrigatoriedade do ensino gratuito nesse

ciclo.

Já durante o período que compreendeu o Golpe Militar, de 1964 a 1985, o

quadro da educação amplia-se, inclusive o ensino superior, todavia tem-se uma crise16

no sistema educacional assinalada pelo descompasso entre oferta e demanda social

de ensino. Nesse momento, a crise serviu de justificativa para estabelecer acordos

entre o Ministério da Educação e a United States Agency for International

Development (USAID), a qual prestava cooperação financeira e assistência técnica

para a reorganização do ensino através de programas predominantemente relativos

16 Análise aprofundada sobre a construção histórica da crise na educação e os sucessivos acordos estabelecidos entre MEC-USAID pode ser encontrada em Romanelli (2005).

37

ao ensino superior, com o objetivo de inserir o país, através da adequação da

educação, no contexto do capitalismo global.

Com a redemocratização do país e o contexto de luta sociais por mais direitos,

que marcaram a década de 1980, emergem novas propostas educacionais que

respondem aos interesses populares, fundadas na democratização do ensino, e ao

mesmo tempo os do capital. Sintonizado com o ao período, um marco significativo

para a modificação real na estrutura educacional foi a Constituição “Cidadã”, de 1988,

que estabelece a educação como um direito social de todos e dever do Estado e da

família, visando ao pleno desenvolvimento dos sujeitos, seu preparo para o exercício

da cidadania e sua qualificação para o trabalho (conforme expressa seu Art. 205),

além de incorporar os sujeitos historicamente excluídos.

Todavia, através da configuração da política neoliberal no país, dentre as

muitas requisições impostas pelo novo ideário, a educação tem uma posição

estratégica, pois, como afirma Martins (1978 apud BÜLL, 2011), ela é tida como um

instrumento de difusão da cultura dominante, com o objetivo de reproduzi-la e

conservá-la, evidenciando que o modo capitalista de produzir é também o modo

capitalista de pensar e dele não se separa.

A centralidade dada à educação no Brasil a partir da década de 1990 está

vinculada aos ditames neoliberais e às exigências dos organismos internacionais,

como o Banco Mundial e o FMI, os quais passam a requerer maior adequação ao

processo de reestruturação produtiva para o desenvolvimento do país e resolução dos

problemas referentes à inserção no mundo globalizado, movimento que já estava

presente anteriormente quando o capital internacional retoma sua influência no país.

Sobre o processo de valorização da educação a partir de 1990, Barone (2000,

p.8) considera que

[...] vem se mostrando impregnado por uma concepção alicerçada nos pressupostos da economia, ou seja, educar para a competitividade, educar para o mercado, educar para incorporar o Brasil no contexto da globalização. Essa visão restrita acabou por deixar de lado muitos dos valores que anteriormente vinham informando o fazer educacional: educar para a cidadania, educar para a participação política, educar para construir cidadania, educar para a participação política, educar para construir cultura, educar para a vida em geral.

Este processo refere-se ao contexto global de reformulação da educação que

no Brasil se contrapõe aos avanços sociais obtidos na década anterior. Assim, a

38

educação passa a ser reorientada em sincronia com a reforma do Estado na área

econômica e social. Todavia, contrariamente à lógica das políticas sociais, a educação

se expande – questão que posteriormente terá um maior destaque neste trabalho.

Então, dentro da reforma educacional tem-se em 1996 a aprovação da nova

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que estabelece princípios, diretrizes

e parâmetros da educação nacional. A LDB em seu texto define a relação constante

com o mundo do trabalho, evidenciando a flexibilidade no processo formativo como

estratégia de preparo para o progresso no trabalho e para as novas exigências, ponto

que se faz presente desde a Educação Básica. A flexibilidade também é retratada na

responsabilidade da oferta do ensino, onde este pode ser da livre iniciativa privada,

ou seja, traduz-se, minimamente, na desresponsabilização por parte do Estado na

oferta integral do direito à educação.

Martins (2007) analisa que a LDB possui um caráter minimalista, compatível

com o Estado mínimo, afirma ainda que a política de educação é fragmentada,

focalizada e com ênfase na educação básica, em especial o ensino médio, em

detrimento dos demais graus de ensino. Mesmo considerando os avanços que esta

legislação traz, pode-se afirmar que “a política educacional não se estrutura como

forma de assegurar modos autônomos de pensar e agir.” (CFESS, 2012, p.20).

As transformações na educação e a associação com o processo de

reordenamento global podem ser compreendidas a partir da análise de Tonet (2016),

que considera:

[...] o sentido da educação não é determinado por ela mesma. [...] Este é definido pelas necessidades mais gerais da reprodução do ser social. Ora, como o trabalho é o fundamento ontológico do ser social, é óbvio que em cada momento e lugar históricos, uma determinada forma de trabalho será a base de uma determinada forma de sociabilidade e, portanto, de uma certa forma concreta de educação. (p.124)

A nova configuração do trabalho, de modo flexibilizado e com mais exploração,

exige, consequentemente, devido ao modelo taylorista, um trabalhador polivalente,

com maior qualificação para as múltiplas exigências do capital, reformula a educação

nesse contexto com o objetivo de capacitar o trabalhador para se adequar ao mercado

de trabalho. Assim, especificamente sobre a escola esta perde uma de suas

dimensões. Segundo Gramsci (1995, p.121), a escola deveria ter como tarefa se

39

propor a “[...] inserir os jovens na atividade social, depois de tê-los levado a um certo

grau de maturidade e capacidade, à criação intelectual e prática e a uma certa

autonomia na orientação e na iniciativa”. Ou seja, estimular modos de pensar que

pudessem gerar transformação social através da elevação cultural.

A proposta neoliberal desloca a educação para o âmbito do mercado, sendo

responsabilidade do indivíduo obtê-la de acordo com a capacidade e interesses de

cada um para que, assim, possam se capacitar a fim de inserir-se no mercado de

trabalho. O novo contorno social da educação também é definido por vários encontros

internacionais que substanciam as diretrizes da mesma. Eventos em que o Brasil é

consignatário e tratam a dimensão educacional como a responsável pelo progresso

social, como já abordado. Dentre os eventos, podemos citar a Conferência Mundial

de Educação em Jomtien, Tailândia (1990); a Cúpula de Nova Délhi na Índia (1993);

a Conferência Nacional de Educação para Todos em nosso país (1994); e a VI

Conferência Ibero-Americana da Educação no Chile (1996).

Por fim, fica evidente que a educação muda de acordo com os processos

históricos. Assim, com o novo modelo produtivo e a incorporação de novas

tecnologias, o ensino ganha centralidade e as transformações legislativas estão

sincronizadas com as exigências internacionais.

No entanto, a visão da política de educação não pode ser percebida apenas

como uma resposta às requisições dos ditames neoliberais, mas, por ser um espaço

de disputas, também é fruto de mobilização da classe trabalhadora nos movimentos

sociais, estudantis e populares, os quais defendem uma educação pública, gratuita e

de qualidade, contrapondo-se à hegemonia do capital, que subordina a educação aos

valores econômicos.

A educação no período em questão expande-se a partir da definição jurídica

desta enquanto direito social, mas também para atender ao capital. Esse aspecto é

verificado especialmente na modalidade profissional e tecnológica, a qual garante a

criação de mão de obra qualificada. A expansão da Rede de Educação Profissional e

Tecnológica tem um salto quantitativo e qualitativo durante os governos que

compreendem as duas gestões de Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro mandato de

Dilma Rousseff. A ampliação da rede se apresentou de forma contraditória: atendendo

as demandas da população e às do sistema capitalista. Uma das explicações para

40

isso é o projeto petista de conciliação de classes17 e o direcionamento principal para

a política de educação de formar força de trabalho com orçamento público. A análise

referente a esse aspecto será feita no próximo item com foco para a realidade dessa

ampliação na cidade de Natal/RN.

2.2. EXPANSÃO DA REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL, CIENTÍFICA E

TECNOLÓGICA E SUA CONFIGURAÇÃO SOCIAL

As características da sociedade brasileira marcaram o desenvolvimento da

educação escolarizada. Como citado anteriormente, esta se fundou em mecanismos

excludentes e durante o predomínio do pensamento jesuíta no país a educação era

associada ao ócio, baseada em uma perspectiva reflexiva e puramente propedêutica.

Antes da implementação do capitalismo o foco da educação não era destinado ao

trabalho, ao considerar que este era visto socialmente de forma estigmatizada. Assim,

a ampliação do ensino técnico se inicia com o capitalismo industrial no país e a

recorrente necessidade de mão-de-obra qualificada. O ensino profissionalizante foi a

princípio destinado à população pobre, o que ampliou a dualidade que prevaleceu

durante anos: para a classe trabalhadora a destinação de trabalhos que exigiam

pouca qualificação e para as elites o ensino superior e reflexivo-científico.

Desse modo, com o objetivo de tratar a composição da Rede de Educação

Profissional, Científica e Tecnológica, especialmente na cidade de Natal/RN, esta

parte do trabalho iniciará com a trajetória da educação profissional no Rio Grande do

Norte e após deteremos a atenção para os aspectos da expansão da rede no contexto

neoliberal e a transformação de sua direção ideológica.

Assim, a trajetória18 histórica da educação profissional no Rio Grande do Norte

se inicia dentro do contexto nacional com a criação das Escolas de Aprendizes de

Artífices por meio do Decreto 7.566, de 23 de setembro de 1909, do então presidente

17 A forma de governo empreendida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) foi a partir da conciliação de classes, ou seja, significa afirmar que as ações desenvolvidas durante as gestões seguidas atenderam de forma contraditória às demandas da população, vinculando-se, assim, a direção política de esquerda, todavia também respondeu aos interesses da burguesia nacional, em que suscitou, por exemplo, a ampliação das taxas bancárias de lucro. 18 Elementos da trajetória aqui destacados têm como base o Cenário Institucional elaborado no período de 2016.1 durante o estágio curricular supervisionado obrigatório realizado no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRN) – Campus – Natal Cidade Alta, com informações gerais retiradas do site <http://portal.ifrn.edu.br/institucional/historico> e dos Decretos mencionados.

41

Nilo Peçanha. O decreto instituiu a criação de 19 (dezenove) escolas nas capitais

brasileiras, dentre elas a cidade de Natal.

As Escolas ofereciam ensino profissional primário gratuito para os filhos

homens de trabalhadores, na faixa etária de 10 a 13 anos, com o objetivo de facilitar

às classes proletárias alternativas de sobrevivência, ao mesmo tempo permitia com

que fossem adquiridos hábitos de trabalho que os afastassem da “ociosidade

ignorante, escola do vício e do crime” (BRASIL, 1909), e principalmente, formar

operários e contramestres. Esta medida estava estritamente relacionada a uma

perspectiva política de controle social dos grupos subalternizados.

Em Natal, a Escola de Aprendizes de Artífices foi instalada inicialmente em

1910 no antigo Hospital da Caridade, onde hoje funciona a Casa do Estudante de

Natal, com a oferta de curso primário, de desenho e oficinas de trabalhos manuais.

No ano de 1914, a instituição foi transferida para a Avenida Rio Branco, ocupando,

durante 53 anos, o edifício nº 743, construído no início do século XX, anteriormente

ocupado pelo Quartel da Polícia Militar.

A partir dos anos de 1930, com a transmissão da responsabilidade das Escolas

de Artífices do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio para o Ministério dos

Negócios da Educação e da Saúde Pública, criado por meio Decreto nº 19402, passou

a existir no país uma remodelação do ensino técnico com modificações nas Escolas

de Aprendizes Artífices para a denominação de Liceu Industrial. Em Natal, no ano de

1937, a escola de educação profissional passa a chamar-se Liceu Industrial de Natal.

Tais modificações se inserem no contexto de expansão do processo de

industrialização no Brasil e da necessidade de mão de obra mais qualificada para

atender as demandas do nascente capitalismo brasileiro.

A reestruturação educacional se expandiu em 1942 com a promulgação da Lei

Orgânica do Ensino Industrial a qual propunha uma maior adequação e preparação

profissional para a indústria. A Lei estabelece as bases organizacionais e regimentais

do ensino industrial, destinado ao segundo grau com a preparação de trabalhadores

da indústria, das atividades artesanais além dos trabalhadores dos transportes, das

comunicações e da pesca. Sendo assim,

a Lei Orgânica do Ensino Industrial tinha por finalidade formar profissionais aptos ao exercício de ofícios e técnicas nas atividades industriais; dar aos trabalhadores jovens e adultos da indústria, não diplomados, uma qualificação profissional; aperfeiçoar ou especializar

42

os conhecimentos e capacidades de trabalhadores diplomados ou habilitados a divulgar conhecimentos de atualidades técnicas. (NETA, et al., 2012, p.102)

Na capital norte-rio-grandense a dinâmica formativa da escola foi bastante

alterada, sendo inseridos novos elementos, com o aumento até mesmo do espaço

físico destinado às atividades. Em 1965, o Liceu de Natal muda sua titulação para

Escola Industrial Federal e incorpora em seu quadro formativo a oferta de cursos

técnicos de nível médio.

As transformações permanecem com a mudança, em 1967, das instalações da

Escola Industrial para a Avenida Senador Salgado Filho, no bairro do Tirol, onde hoje

funciona o Campus Natal-Central do IFRN, recebendo, no ano seguinte, a

denominação de Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte (ETFRN).

A ETFERN, com os anos, incorpora à sua estrutura o ensino profissionalizante

de 2º grau e deixa de lado os cursos industriais básicos. Em 1975 há um significativo

avanço com o ingresso de estudantes do sexo feminino nos cursos da instituição. Esta

possibilidade de as mulheres participarem do ensino profissionalizante nas escolas

técnicas estava decretada desde 1942, onde na lei colocava-se: “O direito de

ingressar nos cursos industriais é igual para homens e mulheres. A estas, porem, não

se permitirá, nos estabelecimentos de ensino industrial, trabalho que sob o ponto de

vista da saúde, não lhes seja adequado” (BRASIL, 1942, p.2). O que significa que o

aspecto da inserção tardia das mulheres nos espaços educacionais preparatórios para

o mundo do trabalho vincula-se ao papel construído socialmente sobre estas, o qual

destina, na perspectiva histórica, o espaço doméstico como “próprio” para as

mulheres, além da permanência dos ideais pautados no patriarcado19 na estrutura da

nossa sociedade.

Em 1994, inicia-se a transição de ETFRN para Centro Federal de Educação

Tecnológica (CEFET), com o denominado processo de "cefetização", que culminou

em 1999. Os novos desafios apresentados incluíam a oferta de educação profissional

de níveis básico, técnico e tecnológico, além do ensino médio. A atuação no ensino

de 3º grau começou com a oferta de cursos de graduação tecnológica, ampliando-se,

19 O patriarcado é, segundo Saffioti (1987), o sistema de dominação e exploração do homem sobre a mulher o qual estabelece posições sociais diferentes com base no gênero e delineia muito claramente os campos em que podem operar cada um. Assim, a educação foi um espaço negado historicamente para as mulheres e sua inserção se deu tardiamente decorrentes das lutas feministas para se ocupar este ambiente.

43

posteriormente, para as licenciaturas com a formação de professores. Mais

recentemente, a instituição expande sua oferta e passa a atuar na educação

profissional vinculada ao ensino médio na modalidade de Educação de Jovens e

Adultos (EJA) e no ensino à distância (EAD).

No mesmo ano de 1994, a Rede Federal de Educação Profissional, Científica

e Tecnológica no Rio Grande do Norte começa a expandir-se com a inauguração da

Unidade de Ensino Descentralizada de Mossoró. Em 2006, o Ministério da Educação,

por meio da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC), dá início à

1ª fase da expansão da Rede Federal de Educação Profissional, implantando, em

2006, 03 (três) novas Unidades no Estado do RN: Zona Norte de Natal, Ipanguaçu e

Currais Novos.

A criação de novas unidades no RN destacada acima está inserida no processo

de expansão da Rede de Educação Profissional e Tecnológica, que é proposta no

governo Lula a partir de 2005, mas só entra em vigor, de forma efetiva, em 2008, com

o decreto de Lei nº 11.892, de 29 de dezembro. Esta lei institui a Rede Federal de

Educação Profissional, Científica e Tecnológica e cria os Institutos Federais de

Educação, Ciência e Tecnologia, por meio da unificação dos Centros Federais de

Educação Tecnológica (CEFETs), das Escolas Agro técnicas Federais e das Escolas

Técnicas vinculadas às Universidades Federais.

Entretanto, o processo de expansão da Rede de Educação Profissional e

Tecnológica não se inicia neste período, ela se expande em diversos momentos

históricos, que correspondem às necessidades sociais de desenvolvimento

econômico e industrial do país para suprir a carência de mão de obra qualificada.

Contudo, em 1999 existe um marco para a expansão da educação profissional, que

se deu por meio de um acordo entre o governo brasileiro e o Banco Interamericano

de Desenvolvimento (BID), o qual estabelecia a implementação do Programa de

Expansão da Educação Profissional (PROEP). Esse contexto reflete as modificações

ocorridas nas políticas sociais brasileiras e na educação, que se alinhavam e se

submetiam às exigências dos organismos financeiros internacionais, de acordo com

o crescente projeto neoliberal.

No Estado foram criados mais 16 (dezesseis) campi em outras duas fases: a

segunda, com os Institutos localizados em Apodi, Pau dos Ferros, Macau, João

Câmara, Santa Cruz e Caicó, iniciada em 2007 e inaugurados em 2009; nesta mesma

fase foram construídos os campi de Natal – Cidade Alta, Nova Cruz, Parnamirim e

44

São Gonçalo do Amarante. Paralelamente ao plano de expansão física, o Instituto

investiu também na criação do Campus de Educação à Distância, que funciona nas

instalações do Campus Natal-Central. A terceira fase, já no governo Dilma Rousseff,

beneficiou o Estado a partir de 2013, com mais cinco campi: Ceará-Mirim,

Canguaretama, São Paulo do Potengi, Lajes e Parelhas - esses dois últimos

concluídos em 2015 e 2014, respectivamente.

Os Institutos Federais são entendidos enquanto uma instituição que articula a

educação superior, a básica e a profissional, a pluricurricular e multicampi, com base

humanística-técnico-científica, vinculada ao princípio da primazia do bem social, de

acordo com Brasil (2010a).

Ainda têm por finalidades e características, segundo a referida lei

I - ofertar educação profissional e tecnológica, em todos os seus níveis e modalidades, formando e qualificando cidadãos com vistas na atuação profissional nos diversos setores da economia, com ênfase no desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional; II - desenvolver a educação profissional e tecnológica como processo educativo e investigativo de geração e adaptação de soluções técnicas e tecnológicas às demandas sociais e peculiaridades regionais; III - promover a integração e a verticalização da educação básica à educação profissional e educação superior, otimizando a infra-estrutura física, os quadros de pessoal e os recursos de gestão; IV - orientar sua oferta formativa em benefício da consolidação e fortalecimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais, identificados com base no mapeamento das potencialidades de desenvolvimento socioeconômico e cultural no âmbito de atuação do Instituto Federal; V - constituir-se em centro de excelência na oferta do ensino de ciências, em geral, e de ciências aplicadas, em particular, estimulando o desenvolvimento de espírito crítico, voltado à investigação empírica; VI - qualificar-se como centro de referência no apoio à oferta do ensino de ciências nas instituições públicas de ensino, oferecendo capacitação técnica e atualização pedagógica aos docentes das redes públicas de ensino; VII - desenvolver programas de extensão e de divulgação científica e tecnológica; VIII - realizar e estimular a pesquisa aplicada, a produção cultural, o empreendedorismo, o cooperativismo e o desenvolvimento científico e tecnológico; IX - promover a produção, o desenvolvimento e a transferência de tecnologias sociais, notadamente as voltadas à preservação do meio ambiente. (BRASIL, 2008, p.3-4)

Ainda referente à criação dos Institutos Federais, Santos e Rodrigues (2015)

analisam que “a recente criação dos Institutos [...] demonstram cabalmente a

expansão da educação, no contexto neoliberal”, respondendo às demandas de

geração de mão de obra qualificada para a expansão do próprio sistema capitalista.

45

Com o objetivo de alcançar “condições estruturais necessárias para o

desenvolvimento educacional e socioeconômico” com foco na “competitividade

econômica e a geração de novas tecnologias” para dar “suporte aos arranjos

produtivos locais” e proporcionar o “desenvolvimento integral do cidadão trabalhador”

(BRASIL, 2010a, p.3).

A análise feita por Almeida (2007) indica que as transformações na esfera da

produção também trazem a necessidade de modificar o modo de pensar a realidade

para que a reprodução das relações sociais incorpore determinadas práticas sociais,

nas diversas esferas, que são necessárias para a garantia de um modo de

organização social da produção combinado com a da reprodução.

Sendo assim, pode-se atestar que a transformação da direção ideológica, que

altera os Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs) para Institutos

Federais de Educação, Ciência e Tecnologia está imersa nessa lógica e auxilia na

criação de concepções sobre a realidade em sintonia com as necessidades do

sistema, e são expressas também nos objetivos dos Institutos.

Todavia, esse processo não é unilateral, mas sim permeado por contradições.

O que também gera benefícios sociais para a comunidade devido à nova política

institucional-pedagógica contextualizada com a realidade local. Em conformidade com

esta análise, Pacheco (2011) afirma que as finalidades e características dos Institutos

trazem um novo modelo institucional absolutamente inovador no aspecto referente à

proposta político-pedagógica, a qual propõe uma atuação na educação não apenas

no aspecto de formar cidadãos aptos ao mercado de trabalho, mas também com o

objetivo de desenvolver um senso crítico dentro de uma formação contextualizada

com a realidade local e articulada com o trabalho, ciência e cultura, possibilitando uma

maior abrangência durante todo o processo formativo.

Percebe-se que a ampliação e a constituição da rede se apresentaram de forma

contraditória: atende as demandas da população e ao do sistema capitalista. Na

perspectiva da ampliação do atendimento das demandas populacionais, Pereira

(2009) afirma que a implantação dos Institutos Federais tem por objetivo desenvolver

uma educação profissional cidadã, que alcance diferentes grupos e espaços sociais,

além de se propor a incorporar setores historicamente excluídos do processo de

desenvolvimento e modernização do Brasil.

As contradições que permeiam o processo de expansão da Rede em larga

escala de modo interiorizado e regionalizado, não se encerram nos elementos já

46

destacados. No documento do Ministério da Educação ao tratar sobre as concepções

e diretrizes dos Institutos Federais designa-se ao seu caráter de política pública a

“criação de oportunidade, para a redistribuição dos benefícios sociais, visando à

diminuição das desigualdades” além da “construção e o resgate da cidadania e da

transformação social.” (BRASIL, 2010a, p.20-21).

Entretanto, a problemática referente a esta questão diz respeito ao

direcionamento da educação tecnológica e profissional enquanto um mecanismo

capaz de gerar transformação social e a incompatibilidade na destinação orçamentária

para as demais redes de educação brasileira. Mesmo sendo evidente que a educação

pode gerar melhorias sociais, ela por si só não é capaz de transformar a realidade,

ainda mais considerando a estrutura do país marcada por altos índices de

desigualdade sociais, exclusão e concentração de renda. Para isto, seria necessário

a articulação com outras dimensões da vida e a organização coletiva na perspectiva

da construção da consciência de classe.

Um dos elementos que demonstra a deficiência do processo de expansão da

educação no contexto neoliberal é a incompatibilidade do acesso à escola com a

infraestrutura local, em especial nas esferas municipais e estaduais nos níveis

fundamental e médio, que destinam aos pobres um ensino aligeirado e sem o

desenvolvimento de formas de pensar mais amplas. Frigotto (1993 apud LESSA,

2012, p.123) afirma que a posição periférica ocupada pelo Brasil na divisão

internacional do trabalho está em consonância com o modelo de escola pouco

atraente e de má qualidade existente, que não produz ciência e tecnologia em larga

escala. A perspectiva adotada é educar para o emprego simples e precário, para a

vida alienada e conformada. Assim, têm-se um modelo de educação simplificadora,

aligeirada e precarizada alinhada ao quadro exposto.

Os aspectos citados demonstram que a expansão da educação é muito

específica, corresponde a nichos mais necessários para a reprodução capitalista,

onde possa haver a criação de mão de obra mais qualificada, como é o caso dos

Institutos Federais e do ensino superior, este pelo viés majoritariamente privado com

aumento dos lucros.

Referente à expansão da Rede de Educação Profissional e Tecnológica, a

região Nordeste é a que mais recebe novos institutos, em decorrência de dois fatores,

de acordo com Santos e Rodrigues (2015): o primeiro devido o enfoque do governo

do Partido dos Trabalhadores, a partir de 2003, na redução das desigualdades

47

regionais; o segundo em decorrência da análise governamental, de que o capital

migraria das regiões mais ricas do país para o Nordeste e, assim, buscou-se prover a

área com a infraestrutura necessária para dar suporte ao crescimento do capital, com

maior investimento orçamentário na região. Além disso, a migração também se

relaciona com a busca do capital por mão de obra mais barata. Nesse sentido, os

autores consideram que

é irrefutável a afirmação de que no governo de Luiz Inácio Lula da Silva e no da sua sucessora Dilma Rousseff a formação de força de trabalho com financiamento público foi o carro-chefe da gestão do Partido dos Trabalhadores, em termos de política pública para a educação. (ibidem, p.101)

Portanto, durante a permanência do governo petista houve um real avanço

social na expansão das vagas técnicas, mesmo com as contradições que permeiam

esse processo. Todavia, considerando que capitalismo sempre se reconfigura para

responder às crises, com o intuito de superá-las, e desse modo altera sua organização

social, temos a partir de 2008 uma nova crise mundial que vem afetando o Brasil de

maneira mais drástica no último triênio. Com a ascensão de Michel Temer ao poder,

por meio do que entendemos ter sido um golpe parlamentar, têm-se mais uma vez a

reformulação da LDB com objetivos claros de ampliar as desigualdades sociais e

educacionais, através de uma agenda governamental sintonizada com a

implementação das expressões neoliberais no país, o que marca, mais

evidentemente, o fim do processo da expansão educacional vivido nos últimos anos.

Lessa (2013) ao tratar sobre o contexto da maximização do papel da escola e

da educação faz uma afirmação importante elucidativa que pode ser associada a atual

reformulação da LDB, assim

[...] as instituições escolares são transformadas em espaços em que cabem quase todas as aprendizagens e onde o ato de educar pode ser realizado por todos. Neste sentido, voluntários podem oferecer aprendizagens esportivas, culturais, artísticas, religiosas e até de suporte às disciplinas, numa clara alusão ao fato de que educar é uma tarefa simples, não especializada, que pode ser realizada por qualquer um, em claro processo de “desprofissionalização” e desqualificação desta atividade. (p.123-124)

48

Portanto, a forma em que está se reestruturando a educação coloca inúmeros

desafios para a sociedade e os profissionais que atuam no campo educacional, dentre

eles, o assistente social. Assim, é fundamental que a categoria permaneça sintonizada

com as bandeiras de luta do momento, em contraposição aos retrocessos e

desmontes de direitos, além do constante fortalecimento da profissão através da

reflexão sobre o exercício profissional, seu significado e os rebatimentos da atual

conjuntura para a população usuária e os serviços ofertados. Desse modo, o próximo

capítulo tem por objetivo contribuir nesta direção analisando as consequências para o

exercício profissional dentro do contexto da expansão da educação profissional e a

significativa contribuição do Serviço Social na área.

49

3. O SERVIÇO SOCIAL NA EDUCAÇÃO: PERSPECTIVAS DE ANÁLISE DO

EXERCÍCIO PROFISSIONAL E A EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

E TECNOLÓGICA

O Serviço Social é uma profissão especializada inscrita na divisão sociotécnica

do trabalho que atua na produção e reprodução das relações sociais e, por isso,

interfere nos processos reprodutivos20 da classe trabalhadora, seja de modo material,

através da força de trabalho, ou de forma político-ideológica. Portanto, atende de

modo contraditório às necessidades do capital e do trabalho. Todavia, possui

direcionamento claro em seu Projeto Ético-Político Profissional e se vincula às

demandas da classe trabalhadora com a orientação de sua atuação na perspectiva

da transformação social.

A profissão tem como objeto de trabalho as múltiplas expressões da questão

social e atua na perspectiva da implementação e formulação de respostas para seu

enfrentamento. Por estar inserida no processo contraditório da lógica do capital tem

incidência direta das dimensões macro e micro estruturais, as quais delineiam o perfil

profissional de acordo com os processos sociais.

As recentes alterações na sociedade capitalista trazem implicações para todas

as dimensões da vida, seja no campo ideológico, no político, no social, no cultural ou

no mundo do trabalho. Referente à dimensão do trabalho, Iamamoto (2015, p.143)

considera que a reestruturação produtiva “[...] afeta radicalmente a organização dos

processos de trabalho: o consumo e gestão da força de trabalho, as condições e

relações de trabalho, assim como o conteúdo do próprio trabalho.”.

Esta reorganização acarreta na ampliação das desigualdades em escala global

e delineia novas determinações para a configuração da questão social, a qual na cena

contemporânea representa, conforme Iamamoto (2015, p.125), mais do que

expressões de pobreza, miséria e “exclusão”, todavia condensa a banalização do

20 Yazbek (2009, p.3-4) considera que a “[...] a reprodução das relações sociais é entendida como a

reprodução da totalidade da vida social, o que engloba não apenas a reprodução da vida material e do modo de produção, mas também a reprodução espiritual da sociedade e das formas de consciência social através das quais o homem se posiciona na vida social. [...] Dessa forma, a reprodução das relações sociais é a reprodução de determinado modo de vida, do cotidiano, de valores, de práticas culturais e políticas e do modo como se produzem as ideias nessa sociedade.”. Portanto, se constitui um processo complexo que ao mesmo tempo cria condições para a reprodução da sociedade de classes como recria os conflitos resultantes dessa relação e as possibilidades de superação. E é inserido nesta dinâmica contraditória que atuam os assistentes sociais.

50

humano traduzida na barbárie social através da subordinação da sociabilidade

humana às coisas.

Assim, a reorganização e modificação das estruturas do trabalho coletivo

refletem nos espaços sócio-ocupacionais dos assistentes sociais. Logo, ao dispor da

questão social enquanto objeto de trabalho e inserir-se no movimento histórico-político

da sociedade, o Serviço Social em seu cotidiano depara-se com a ampliação e

complexificação das demandas, resultado da própria reformulação da questão social.

Isso exige do corpo profissional um redimensionamento voltado para decifrar novas

mediações que subsidiem na análise e na compreensão das demandas apresentadas,

vislumbrando perceber as possibilidades e criação de estratégias para o

enfrentamento.

O contexto neoliberal também ocasiona a expansão de postos de trabalho na

política educacional para a profissão, em decorrência da centralidade assumida por

esta, especialmente na Rede de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.

Portanto, os próximos itens terão como objetivo apresentar aspectos do exercício

profissional dos assistentes sociais na educação, sua vinculação histórica com o

campo e a definição do seu papel pedagógico, e as consequências do processo

expansivo dos Institutos Federais na cidade de Natal/RN para o Serviço Social, sendo

esta última dimensão também evidenciada a partir da leitura que fazem assistentes

sociais atuantes nesse espaço.

3.1 O SERVIÇO SOCIAL E SUA VINCULAÇÃO HISTÓRICA À EDUCAÇÃO

A emersão do Serviço Social enquanto profissão se dá dentro do contexto de

expansão capitalista na era dos monopólios e o consequente processo de

urbanização, massificação da classe trabalhadora e surgimento da questão social,

com novas exigências do modelo produtivo que se baseava no fordismo-taylorismo.

Com a instauração da indústria e a nova forma de produzir era necessária a

construção de aparatos ideológicos direcionados à interferência nos modos de pensar

e agir da classe trabalhadora e, de acordo com Yazbek (2009), também nos

comportamentos e valores dessa classe. Nessa perspectiva, a profissão é requisitada

pela classe dominante para dar respostas mais especializadas, além da repressão e

da filantropia, através da formação de quadros especializados pela Igreja, o Estado e

outros setores da sociedade civil. Todavia, a sua emersão não é realizada de forma

51

linear, mas é “síntese de um conjunto de determinações históricas” (ABREU, 2016,

p.49), ou seja, é resultado da “intercorrência do conjunto de processos econômicos,

sócio-políticos e teórico-culturais” (NETTO, 1996, p.65).

Portanto, desde o surgimento da profissão verifica-se a constituição de uma

dimensão educativa que foi requisitada nos processos de organização da cultura –

esta aqui entendida enquanto modo de vida, que engloba o sentir, o pensar e o agir –

realizada através dos “perfis pedagógicos” construídos ao longo dos anos e que de

acordo com as transformações societárias e as determinações históricas altera seu

direcionamento.

A discussão referente à vinculação histórica da profissão com a educação será

abordada através de sua dimensão educativa ampla, que imprime direções político-

ideológicas relacionadas com a hegemonia21 em disputa na sociedade capitalista,

apresentando-se brevemente algumas características da inserção do Serviço Social

na educação escolarizada. A partir do fundamento de que a profissão desenvolve uma

“[...] atividade de cunho eminentemente educativo” (ABREU; CARDOSO, 2009, p.1-2)

e que “[...] a gênese do Serviço Social no espaço da escola identifica-se com a gênese

do Serviço Social na divisão sócio-técnica do trabalho.” (WITIUK, 2006, p.3). Neste

sentido, Abreu (2016) considera que

[...] a função pedagógica do assistente social em suas diversidades é determinada pelos vínculos que a profissão estabelece com as classes sociais e se materializa, fundamentalmente, por meio dos efeitos da ação profissional na maneira de pensar e agir dos sujeitos envolvidos nos processos da prática. (p.21)

Portanto, o vínculo da função pedagógica da profissão com as classes sociais

supõe o caráter histórico das relações sociais, suas modificações no decorrer do

tempo e a forma como são estabelecidas, mediadas através dos vínculos entre Estado

e sociedade civil. Dessa forma, ao longo dos anos a categoria profissional alterou

substancialmente seu perfil pedagógico e a maneira de lidar com os usuários. Com

três tendências de perfis pedagógicos históricos: da “ajuda”, da “participação” e da

emancipação, elucidados por Abreu (2016). A dimensão educativa ou pedagógica é

desenvolvida nos inúmeros espaços sócio-ocupacionais e tem sua influência no modo

21 O conceito de hegemonia fundamenta-se na análise gramsciana que a entende enquanto processo

de busca por direção intelectual e moral para a conquista do poder, assim, garantindo a direção e o domínio da sociedade com a construção de uma direção ideológica coletiva.

52

de pensar e agir dos sujeitos e deve estar presente durante todo o contato com os

usuários. A orientação da intervenção será definida de acordo com os princípios que

pautam a prática profissional, ou seja, seu vínculo com a dimensão teórica e ético-

política, condicionadas historicamente.

Pertinente às tendências supracitadas, a autora destaca que o perfil da

“ajuda”22 está presente nos primórdios da profissão a partir de um aspecto educativo

na perspectiva de controle social23 e busca por consenso e adesão das classes

subalternas ao novo tipo de organização do capital, em virtude da necessidade de

criação de um novo tipo de homem. Assim, Abreu (2016, p.46) considera que o

aspecto educativo se dava devido à necessidade histórica de imbuir um novo modelo

de conduta individual, familiar e política aos trabalhadores e suas famílias,

adequando-os às necessidades da produção e reprodução social da época. Ou seja,

a necessidade de intervenção para criar uma nova cultura alcança todas as

dimensões da vida.

Portanto, naquele contexto, a prática profissional era realizada através de

[...] estratégias e mecanismos sociopolíticos, culturais e institucionais, necessários para o enquadramento da reprodução social aos padrões morais de sociabilidade e do controle político sobre os subalternizados. O princípio educativo que funda a estruturação destas funções traduz-se na necessidade de estabelecimento de um conformismo social no seio da sociedade. O princípio educativo, a rigor, significa uma adequação do processo ideológico formador de determinado modo de vida – cultura – às necessidades e imperativos de um tipo de racionalização produtiva. (ibidem, p.51, grifos da autora)

Assim, o perfil pedagógico da ajuda foi o primeiro a ser desenvolvido pela

profissão a partir 192024 com a atuação profissional na perspectiva de análise dos

22 A análise feita por Abreu (2016) parte dos marcos da organização do americanismo a partir da análise de Gramsci e a instituição do fordismo/taylorismo e a necessidade de se instaurar um conformismo mecanicista dentre os trabalhadores para garantir a reprodução do capital. Posteriormente a autora discute esse processo engendrado nas sucessivas transformações do capitalismo, todavia o objetivo aqui será destacar os aspectos mais gerais para se pensar a dimensão educativa e seu vínculo com a educação. 23 Importante destacar que o controle social não era realizado exclusivamente pelas profissionais de Serviço Social da época, todavia suas bases eram concretizadas pelo próprio empresariado, em conjunto com diversos mecanismos, como a igreja, o Estado, a família, a religião, o aparato coercitivo policial-militar, para garantir a nova dominação social, segundo Abreu (2016, p.55). 24 Aqui trata-se da discussão referente à emersão da profissão no contexto americano. Na América Latina o Serviço Social é introduzido no início da década de 1920 sob influência da vertente franco-belga, todavia no Brasil a partir dos anos 1930 têm-se a influência do desenvolvimento americano, como parte da necessidade do movimento expansionista estadunidense.

53

fenômenos sociais como questões individuais e enfrentamento das expressões da

questão social, agravadas com o capitalismo industrial, por meio de um papel

moralizador, corretivo, direcionado à reintegração social, reforma moral e “ajuda”

psicossocial. Neste sentido, Abreu (2016) afirma que eram priorizados os

componentes individuais e subjetivos da questão social em detrimento de suas

expressões materiais e coletivas.

A “pedagogia da ajuda” tinha um papel persuasivo e coercitivo com ações

direcionadas à inspeção e ao acompanhamento do trabalhador e sua família. Esta

prática atendeu às requisições da burguesia e da Igreja Católica, através da

orientação positivista e, ao mesmo tempo, neotomista, sendo por meio desses

movimentos que conformava-se “[...] a base de justificação teórico-ideológica da

prática pedagógica do Serviço Social e o seu arcabouço técnico-operativo, bem como

as condições sócioinstitucionais de formação de seus intelectuais.” (ibidem, p.71).

Assim, as diretrizes conservadoras permeavam a profissão sem divergências, em

razão da associação entre os valores balizadores que justificavam e naturalizavam as

desigualdades sociais como problemas individuais e reificavam os trabalhadores

através de condutas moralizantes.

O modo como se apresenta o papel educativo da profissão neste período se

associava diretamente ao capital e aos seus interesses, com o objetivo de “educar” a

classe trabalhadora para a aceitação passiva do novo modo de vida de acordo com o

estabelecido pela classe dominante. A psicologização das relações sociais combinada

com as ações autoritárias influíam para “[...] o aprofundamento de elementos

ideológicos mistificadores subalternizantes no processo de reprodução da força de

trabalho.” (ibidem, p.115).

Desse modo, com a industrialização no Brasil e as transformações sociais do

período há o processo de se pensar e ampliar a educação com o objetivo de a difundir

mais entre a população buscando responder às novas necessidades postas na época

e criar mecanismos ideológicos para asseverar a reprodução do nascente sistema

capitalista.

Em decorrência disso, os assistentes sociais são requisitados para estabelecer

vínculos entre o lar e a escola na perspectiva de compreender os problemas sociais

presentes nos processos de aprendizado, que eram analisados sob o viés de

disfunções familiares, e no ambiente escolar. Percebe-se que sua atuação era

54

sintonizada com as características presentes no perfil da “ajuda” e atuavam ainda com

o objetivo de harmonizarem

[...] as relações no processo de vigilância da moral e da sociabilidade das famílias empobrecidas. As modalidades interventivas serão objetivadas para a integração social dos indivíduos no espaço escolar, comunitário e doméstico, reforçando a identidade subalterna por meio da inculcação de valores dominantes e da interferência no seu modo de vida com adoção de condutas comportamentais adequadas aos parâmetros morais. (WITIUK, 2004, p.24)

O Serviço Social no espaço da escola ainda tinha como atribuição “curar e

prevenir desajustamentos, contribuir com eficiência em todos os setores escolares

para o desenvolvimento harmonioso e integral da criança, [através de] métodos

adequados” (GUILHERME, 1945, p.79 apud WITIUK, 2004, p.27).

Na década de 1940, com as transformações na educação e a promulgação da

Constituição de 1946, que estabelece a educação como direitos de todos25, se “[...]

reforça o requerimento do Serviço Social no espaço da escola”, em que o Estado e as

autoridades escolares públicas “[...] passaram a requisitar o Assistente Social para

atuar no sistema escolar público, na busca da garantia da permanência da criança na

escola.” (WITIUK, 2004, p. 28).

Portanto, as transformações no âmbito do Serviço Social são sínteses de

rupturas e continuidades. Assim, a transição do perfil da “ajuda” para o da

“participação” não anula o já posto, todavia reflete características do modelo anterior

com o acréscimo de novos elementos de acordo com as transformações societárias.

Desse modo, a pedagogia da “participação” é materializada a partir dos anos

50 e 60 do século passado, no contexto da América Latina, a qual tinha como

fundamento o Desenvolvimento de Comunidade (DC)26 vinculado a estratégias do

desenvolvimentismo modernizador, com o objetivo de assegurar aos Estados Unidos

condições políticas, administrativas e culturais mais propícias para integrar e

dinamizar a ampliação do capitalismo.

A pedagogia da participação associa-se, ainda, à perspectiva da modernização

conservadora, a qual direciona para o campo da comunidade a responsabilidade do

25 A Constituição Federal de 1946 estabelecia em seu “Art. 166 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve inspirar-se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana.”. 26 Análise detalhada sobre a gênese e as características da estratégia de Desenvolvimento de Comunidade no Brasil pode ser encontrada em Ammann (2009).

55

grupo em alcançar as melhorias locais para superarem as condições de pobreza e

pauperismo. O foco na integração da participação popular através da reorganização

da cultura tinha por objetivo alinhar, mais uma vez, os valores e costumes da classe

trabalhadora às exigências da acumulação do capital.

Nesse sentido, a atuação do Serviço Social contribuía para o controle e

subalternização das massas populares para o alcance do “bem-estar social”,

reiterando o ideal de “ajuda-mútua” nas relações comunitárias para a integração no

processo de expansão do capital.

Segundo Abreu (2016, p.127), a função educativa da profissão era plasmada

sobre três vetores: a psicologização das relações sociais; a manipulação material e

ideológica de necessidades sociais e recursos institucionais via estratégias de

assistência social; e a combinação entre processos persuasivos e coercitivos para a

obtenção da adesão e do consentimento ao “novo” ordenamento econômico e social

sob o domínio do capital. Assim, verifica-se que existem características que marcam

a continuidade do perfil anterior, entretanto tais vetores “acentuam processos de

subalternização das massas trabalhadoras pauperizadas e de controle sobre as

mesmas” (idem).

Esta pedagogia se faz presente desde o governo de Juscelino Kubitschek

(1956-1961) até a Ditadura Militar (1964-1985), neste período a questão social era

ocultada, já que dentro da lógica desenvolvimentista sua explicação baseava-se “[...]

pelo dualismo econômico e cultural, ou seja, pela presença no país de áreas

atrasadas” (ibidem, p.137). Além de ser tratada sobre o binômio repressão-

assistência, em que há, contraditoriamente, a expansão das políticas sociais e

programas governamentais, na perspectiva assistencialista, com o objetivo de

amenizar os conflitos sociais. Tais ações se difundiram, principalmente, durante o

período militar considerando a necessidade de ganhar aceitação e controle mais

efetivo no contexto autocrático.

Portanto, a ação educativa neste período foi marcada pela visão harmônica da

sociedade com o objetivo de alcançar o bem comum e ao alterar o direcionamento

profissional, sem questionar a realidade e associar-se à autocracia burguesa,

confundia-se “[...] o projeto profissional com o de modernização conservadora.”

(ibidem, p.141).

Durante a lógica desenvolvimentista, a intervenção do profissional nas

instâncias escolares era “[...] voltada para a preparação social dos indivíduos, a fim

56

de torná-los, segundo suas aptidões, cidadãos produtivos e úteis ao capital” (AMARO,

2011, p.19). As ações realizadas eram: examinar a situação social e econômica dos

alunos e suas famílias; identificar situação de desajuste social e indicar tratamento

adequado; realizar triagem de alunos que necessitassem de material escolar,

transporte, e tratamento médico; preparar relatórios e prestar informações sobre suas

atividades; orientar famílias e comunidades para assumirem suas responsabilidades

no processo educativo; e, por fim, manter constante articulação com os profissionais

da escola e outras entidades comunitárias (ibidem, p. 20).

Dialeticamente, com a autocracia burguesa, as exigências profissionais de

qualificação técnico-operativa e a ampliação do mercado de trabalho, abrem-se

possibilidades para “[...] a deflagração de um amplo processo de redimensionamento

profissional” (ABREU, 2016, p.133). O que exigiu do corpo profissional atualização

para responder com mais efetividade às novas exigências decorrentes do contexto

político-econômico vigente.

Desse modo, o redimensionamento foi marcado pelo Movimento de

Reconceituação no continente latino americano, que visou questionar as bases

profissionais e construiu um grupo progressista dentro da categoria, que deflagrou,

posteriormente, na aproximação com a teoria marxista e a Renovação do Serviço

Social27.

Netto (2015) compreende por Renovação

[...] o conjunto de características novas que, no marco das constrições da autocracia burguesa, o Serviço Social articulou, à base do rearranjo de suas tradições e da assunção do contributo de tendências do pensamento social contemporâneo, procurando investir-se como instituição de natureza profissional dotada de legitimação prática, através de respostas a demandas sociais e da sua sistematização, e de validação teórica, mediante a remissão às teorias e disciplinas sociais. (p.172)

Ainda referente à discussão dentro do contexto autocrático, Abreu (2004)

afirma que a participação popular nos processos de resistência política à ditadura

militar consistiu em um elemento estratégico para a redefinição da atuação

27 A Renovação do Serviço Social não é um processo linear, mas permeado pela confluência de fatores conjunturais e político-econômicos, além do acúmulo profissional e a inserção em múltiplos espaços que incidem sobre a revisão profissional. Este processo é marcado por três tendências: a modernização conservadora, a reatualização do conservadorismo e a intenção de ruptura, que são definidas por Netto (2015) e podem ser aprofundadas em sua obra.

57

profissional através do processo de politização das relações sociais e da intervenção

crítica e consciente das classes subalternas no movimento histórico e de

desenvolvimento teórico-político da profissão.

Por fim, Abreu (2010) afirma que o Serviço Social constrói uma “pedagogia

emancipatória” em decorrência do vínculo estabelecido com as classes populares

devido à instauração de condições sócio-históricas e políticos-ideológicas de

elaboração e desenvolvimento de um projeto profissional identificado com os

interesses das citadas classes. Este processo tem como marco o já citado Movimento

de Reconceituação, que se inicia a partir dos anos 1960, e vai alterando-se por meio

de processos de ruptura com o conservadorismo e a adoção de uma base teórico

crítica.

A atuação profissional adquire um caráter contestador da ordem vigente, cuja

intervenção pauta-se na construção educativa de mecanismos para mobilização,

capacitação e organização das classes subalternas, se contrapondo à cultura

dominante. O vínculo da profissão com a classe trabalhadora através de práticas

educativas é a tendência, nas últimas décadas, de atuação preconizada no Projeto

Ético-Político Profissional, com suas diretrizes apontadas na Lei de Regulamentação

(nº 8.662/93), no Código de Ética do (a) Assistente Social de 1993 e nas Diretrizes

Curriculares da ABEPSS de 1999. Então, considerando-se os elementos

apresentados, referentes aos perfis pedagógicos, é notório que

[...] a vinculação do Serviço Social com a Política de Educação foi sendo forjada desde os primórdios da profissão como parte de um processo de requisições postas pelas classes dominantes quanto à formação técnica, intelectual e moral da classe trabalhadora, a partir de um padrão de escolarização necessário às condições de reprodução do capital em diferentes ciclos de expansão e de crise. (CFESS, 2012, p.16)

Todavia, Almeida (2000) analisa que a inserção do Serviço Social na área da

Educação se deu, de modo mais amplo, em consequência dos novos significados que

o campo educacional passou a ter para os assistentes sociais por meio de dois eixos:

a posição estratégica que a educação começa a ocupar no contexto de adaptação do

Brasil à dinâmica da globalização e o movimento interno da categoria, de redefinição

58

da amplitude do campo educacional para a compreensão dos seus espaços e

estratégias de atuação profissional.

Referente ao processo de adaptação à globalização, esta ocorreu devido

exigências internacionais vinculadas à dinâmica estrutural do capitalismo, que

apontavam a necessidade de formação e qualificação da força de trabalho para o novo

milênio. A expansão da educação e sua definição como um direito social estabelecido

na Constituição Federal de 1988 e a promulgação da LDB de 1996 corroboraram para

o recrudescimento do campo, através de novas requisições socioinstitucionais para a

ampliação das condições de acesso e permanência nas instituições de ensino em

seus diversos níveis.

Estes marcos trazem para a categoria profissional novas possibilidades de

campo de atuação com a provocação do debate interno, que iniciou nos anos 1990

através da realização das edições do 8° e 9° Congresso Brasileiro de Assistentes

Sociais (CBAS) em Salvador (1995) e Goiânia (1998).

Dentro da Política de Educação, na cena recente, os assistentes sociais são

designados, majoritariamente, para atuarem na gestão e execução das ações,

programas e projetos da Assistência Estudantil com o objetivo de contribuírem para a

garantia do acesso e permanência. A atuação profissional nesta área justifica-se,

dentre outros aspectos, devido à definição contida na LDB, em seus princípios e

finalidades, onde se afirma que o ensino deve permitir "igualdade de condições para

o acesso e permanência na escola" (BRASIL, 1996).

Associado a isto, os instrumentos normativos da profissão conferem direção à

atuação profissional no sentido de também contribuir para a gestão democrática da

educação e sua qualidade, com um trabalho que não se restringe ao segmento

estudantil nem às abordagens individuais, mas esteja em constante diálogo com a

comunidade, famílias e os diversos trabalhadores da educação, além de vincular-se

às instâncias de controle social e aos movimentos sociais, o que presume ações

pautadas em um caráter coletivo, administrativo-organizacional, investigativo, de

articulação e formação profissional.

Portanto, a concepção de educação que deve subsidiar a intervenção

profissional é a de que esta é um complexo constitutivo da vida e do ser social, por

isso, uma dimensão ontológica, vinculada organicamente ao trabalho. Sua apreensão

deve se dar na perspectiva de sua totalidade, como integrante de várias dimensões

da vida social, perpassada por um “[...] o conjunto de práticas sociais necessárias à

59

continuidade de um modo de ser, às formas de sociabilidade que particularizam uma

determinada sociedade.” (CFESS, 2012, p.16).

Desse modo, a educação não se restringe aos ambientes educacionais

voltados para a educação formal, e por ser reflexo da forma de sociabilidade que

vivemos, é marcada por lutas e contradições de classes. Assim, “as demandas

apresentadas aos (às) assistentes sociais em relação à educação nunca estiveram

limitadas a uma inserção restrita aos estabelecimentos educacionais tradicionais.”

(idem).

O Serviço Social, nesse campo, tem contribuição elementar, pois os espaços

institucionais são permeados por expressões da questão social, onde os estudantes

levam para a esfera educacional necessidades concretas de sobrevivência e,

consequentemente, de permanência, como alimentação, transporte e saúde. Isto

requisita a atuação de outros profissionais, além do corpo docente e outros da área

pedagógica, para intervir em tais situações com respostas mais qualificadas e trabalho

mais direto sobre tais necessidades, como os assistentes sociais. Com ênfase para o

trabalho interdisciplinar e a percepção dos indivíduos enquanto sujeitos complexos e

multideterminados.

Nesse sentido, Almeida (2005) afirma que

O reconhecimento da presença desses elementos no universo escolar, por si só, não constitui uma justificativa para a inserção dos assistentes sociais nesta área. Sua inserção deve expressar uma das estratégias de enfrentamento desta realidade na medida em que represente uma lógica mais ampla de organização do trabalho coletivo na esfera da política educacional, seja no interior das suas unidades educacionais, das suas unidades gerenciais ou em articulação com outras políticas setoriais. Caso contrário, estará implícito, nas defesas desta inserção, a presunção de que tais problemas seriam exclusivos da atuação de um determinado profissional, quando na verdade seu efetivo enfrentamento requer, na atualidade, não só a atuação dos assistentes sociais, mas de um conjunto mais amplo de profissionais especializados. O que parece ser central aqui e que já vem sendo observado pelos profissionais da área de educação é que o professor não vem conseguindo dar conta, sozinho, desses problemas e que o processo de enfrentamento dessa complexa realidade não é de competência exclusiva de nenhum profissional. (p.18)

Esta assertiva elucida a importância do trabalho interdisciplinar e o significado

do Serviço Social neste campo, o qual contribui para o processo de democratização

da educação a partir do momento em que observa, numa perspectiva crítica e de

60

totalidade, os diversos fatores que perpassam o campo educacional na cena

contemporânea – manifestado pelo acirramento das expressões da questão social em

tempos de redução dos direitos e crise do capital.

A educação como um espaço de disputa ideológica e, tradicionalmente,

disseminador dos valores hegemônicos, contribui para a reprodução do sistema

capitalista, todavia, neste mesmo âmbito existem possibilidades de construção de

uma educação emancipatória. Nesta perspectiva, o trabalho dos assistentes sociais

deve contribuir para a ressignificação da educação numa direção contra hegemônica,

com a articulação da escola às outras políticas sociais, fortalecimento do direito à

educação e ratificação de uma educação pública, laica, gratuita, presencial e de

qualidade, que preze pelo respeito à diversidade humana, na afirmação dos direitos

sociais e no combate às discriminações aos grupos socialmente excluídos, exercendo

constantemente o seu papel pedagógico.

Entretanto, as transformações sociais dentro do contexto neoliberal incidem

diretamente na constituição das políticas sociais e, consequentemente, nos espaços

sócio-ocupacionais. Assim, Abreu e Cardoso (2009, p.10) afirmam que a função do

assistente social é tensionada no desempenho dos processos de mobilização e

organização da classe trabalhadora, e determinam inflexões no campo profissional

em decorrência das demandas postas pelo reordenamento das relações entre

capital/trabalho e Estado/sociedade civil. Nesse sentido, se objetiva apresentar no

próximo item os elementos presentes no exercício profissional nos Institutos Federais

de Natal/RN e as consequências decorrentes do processo de expansão da Rede

Profissional e Tecnológica no cotidiano do Serviço Social.

3.2 CARACTERIZAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NO INSTITUTO FEDERAL DE

EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA CIDADE DE NATAL/RN INSERIDO NO

CONTEXTO EXPANSIVO

A análise do Serviço Social inserido nos espaços sócio-ocupacionais deve

partir de alguns pressupostos, não dissociáveis entre si. Os dois primeiros dizem

respeito à compreensão, conforme Iamamoto e Carvalho (2014, p.79-80), de que a

profissão se estabelece como realidade vivida e representada na e pela consciência

de seus agentes profissionais, a qual se expressa pelo discurso teórico e ideológico

61

sobre o exercício profissional; o outro se refere à atividade profissional como

socialmente determinada pelas circunstâncias sociais objetivas que imprimem certa

direção social ao exercício profissional, que independem de sua vontade e ou da

consciência de seus agentes individuais. A terceira premissa, segundo Raichelis

(2009, p.4), é sobre a particularidade do trabalho do assistente social na esfera estatal,

que deve remeter necessariamente ao tema das relações, simultaneamente

recíprocas e antagônicas, entre Estado e sociedade civil, que se transforma e se

particulariza em diferentes formações sociais e contextos históricos.

Sendo assim, a análise das consequências da expansão da Rede de Educação

Profissional e Tecnológica para o exercício profissional dentro da lógica neoliberal

partirá de tais pressupostos, considerando as determinações sociais que estabelecem

as condições objetivas para o exercício profissional. Todavia, destacando o papel

profissional no desempenho de sua relativa autonomia, a qual através das

competências teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa é capaz de

tensionar os espaços institucionais para imprimir determinada direção ao seu

exercício.

Neste sentido, se situa que os espaços institucionais são ambientes permeados

por disputas ideológicas, expressas através de correlações de força, ou seja, há a

existência de diferentes sujeitos sociais que correspondem a diferentes interesses. E

“é nesse terreno denso de tensões e contradições sociais que se situa o protagonismo

profissional.” (IAMAMOTO, 2015, p.219).

Dentro da lógica neoliberal o Estado reorienta-se e é cooptado para atender às

exigências do mercado, através do preceito: o mínimo para os direitos sociais e o

máximo para o mercado. Período em que marca a subordinação dos direitos sociais

e as garantias institucionais à lógica orçamentária e aos interesses do mercado, com

a nítida redução das políticas sociais. Todavia, no movimento contrário tem-se a

centralidade dada à educação e a expansão da Rede de Educação Profissional e

Tecnológica, vista enquanto fator de transformação social e de elevação econômica,

principalmente nos países periféricos, segundo recomendações dos organismos

internacionais.

Essas transformações redefinem o campo de atuação profissional e requisitam

atualização profissional para uma intervenção mais qualificada através de “[...] novas

exigências às práticas profissionais, aos processos da formação profissional e à

organização dos sujeitos da profissão.” (KOIKE, 2009, p.1).

62

Assim, o Serviço Social ao inserir-se na lógica contraditória da sociedade

capitalista recebe incidência dos fatores macroestruturais, do lugar em que ocupa na

divisão sociotécnica do trabalho, da sua condição de trabalhador assalariado e da

necessidade de compra e venda de sua força de trabalho. Nessa perspectiva, o

significado social da profissão se particulariza e se transforma de acordo com os

processos sócio-históricos dentro da sociabilidade capitalista e depende das relações

que estabelece com os sujeitos.

Portanto, iremos apresentar aqui uma caracterização do exercício profissional

nos Institutos Federais de Natal/RN com base nos dados coletados a partir de

entrevistas realizadas com assistentes sociais inseridas nos três campi (Natal Central,

Zona Norte e Cidade Alta, com suas duas unidades) traçando os elementos centrais

presentes nas mesmas.

O ingresso na instituição de todas as profissionais entrevistadas deu-se a partir do

processo expansivo, havendo a maioria delas iniciado sua atuação nos campi do interior

– sendo posteriormente remanejadas – a partir do processo de interiorização, em que

foram requisitadas, junto com outros profissionais, com o “intuito de cobrir essa expansão,

as novas unidades” (AS1). Referente ao grau de formação, todas possuem especialização

e três delas mestrado, dois na área de Serviço Social e um em Educação Profissional, e

trabalham na instituição há pelo menos oito anos, cada uma delas.

O cotidiano profissional é constituído basicamente pelo planejamento,

implementação, acompanhamento e gerenciamento dos programas de Assistência

Estudantil28, composta pelo Auxílio Transporte, o Programa de Formação Estudantil e o

Auxílio Alimentação, os quais representam uma demanda histórica apresentada para

o Serviço Social no Instituto. Como afirmam as profissionais:

28 De acordo com Nascimento (2013, p.382) a Assistência Estudantil se constitui enquanto “política de enfrentamento ao velho e crônico enigma da evasão, da repetência, e, especialmente das desigualdades econômicas, sociais e culturais, como traços presentes na educação brasileira.”. Assim, ela tem como principal objetivo possibilitar condições de igualdade de oportunidade aos estudantes pertencentes às classes populares, com o intuito de criar mecanismos mínimos que viabilizem a permanência nas instituições de ensino, principalmente federais, e reduzam as desigualdades sociais no sentido de atuar em fatores que causam desvantagem no processo ensino-aprendizagem, como alimentação, transporte, saúde, moradia, dentre outros. Desse modo, perpassa diversos tipos de direitos. Essa proposta está fundamentada no novo Plano Nacional de Assistência Estudantil, aprovado em 2010 por meio do Decreto nº 7.234, que também define em seu Artigo 4º, parágrafo único, que as ações de Assistência Estudantil devem “[...] contribuir para a melhoria do desempenho acadêmico e agir, previamente, nas situações de retenção e evasão decorrentes da insuficiência de condições financeira” direcionadas, prioritariamente, aos “[...] estudantes oriundos da rede pública de educação básica ou com renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio, sem prejuízo de demais requisitos fixados pelas instituições federais de ensino”, como afirma em seu Artigo 5º.

63

As demandas constantes é em relação a esses três programas. Seleção, acesso do estudante e o funcionamento do dia-dia deles. [...] Esses três programas é o que envolve a grande parte do nosso tempo, o acesso e a permanência do estudante neles. (AS2) [...] especificamente, assim, as demandas que são voltadas para os programas, né, de permanência escolar, que são os programas de iniciação profissional que hoje é o Programa de Apoio à Formação Estudantil, a nomenclatura, de alimentação, de auxílio transporte. (AS3)

Surgem outros elementos relacionados a questões de saúde,

encaminhamentos para a Rede Socioassistencial, visitas domiciliares quando há

necessidade, atendimento e orientação aos estudantes, pais e familiares, participação

em reuniões, realização de trabalho interdisciplinar – principalmente com a psicologia

e pedagogia –, dentre outras demandas trazidas pelos usuários que interferem

diretamente no universo do ensino-aprendizagem.

Referente a tais apontamentos, uma das profissionais destacou a concepção

institucional que visa formar e, consequentemente, atender os alunos na perspectiva

humano-integral, e esta visão integra a atuação com a compreensão do estudante em

sua totalidade. Conforme o relato: “[..] a própria função da instituição tá lá dizendo que

a gente trabalha nessa perspectiva de uma formação humano-integral, então a gente

entende o aluno aqui no seu todo.” (AS3).

Nesse sentido, as diversas demandas são reflexos da questão social no

ambiente institucional, as quais expressam no cotidiano “[...] situações singulares

vividas por indivíduos e suas famílias, grupos e segmentos populacionais, que são

atravessadas por determinações de classes.” (IAMAMOTO, 2015, p.220).

Ao questionar sobre as ações desenvolvidas na instituição que ultrapassem a

Assistência Estudantil, as profissionais afirmaram que esta perspectiva fica mais no

âmbito da projeção e tentativas de realização, em decorrência do grande número de

demandas, da necessidade de responder às questões mais imediatas e do quadro

quantitativo reduzido quanto aos recursos humanos. Trata-se de dimensão percebida

enquanto um desafio para o exercício profissional no IFRN.

Assim, esse é um problema que a gente discute, um desafio, né, porque a própria equipe de assistentes sociais de todos os IF’s, a gente já discute a algum tempo que um grande desafio nosso é ir além dessas ações (AS2).

64

Evidenciou-se, de modo geral, que há a ausência de ações mais efetivas que

saiam do gerenciamento dos programas, mesmo as profissionais percebendo a

necessidade destas, principalmente para conhecer melhor o público alvo de suas

ações. Entretanto, quando conseguem realizar alguma intervenção é mais direcionada

aos estudantes participantes do programa de formação estudantil.

Uma problemática que se expressa diante dos elementos apresentados é a “[...]

necessidade de que o trabalho profissional mobilize para além dos procedimentos

técnico-instrumentais que já se encontram presentes em seu cotidiano” (CFESS,

2012, p.42). Pois, no cotidiano as demandas chegam às instituições e aparecem para

o Serviço Social de maneira "imediatizadas, fragmentadas e heterogêneas" (SANTOS

et al., 2012, p.21), sendo imperativo intervenções além das que estão postas, por meio

de mediações que reflitam sobre o papel profissional, suas dimensões, o caráter mais

amplo das demandas apresentadas e sua relação com a realidade.

Ademais, às respostas dadas no cotidiano, expressas na dimensão técnico-

operativa, constituem a "forma de aparecer" da profissão, o modo pelo qual “a

profissão é conhecida e reconhecida”, seu “modo de ser”, a maneira como aparece

no movimento das três dimensões” (SANTOS, et al., 2012, p.16).

Dessa forma, é preciso um processo contínuo de conhecimento e aproximação

com o público atendido e da realidade objetiva para pensar, propor e implementar

ações com vistas a atender mais efetivamente as demandas. Além da análise do

trabalho profissional de modo sistemático para que seja possível traçar estratégias

coletivas de superação do cotidiano profissional, articulando as dimensões teórico-

metodológica, ético-política, e técnico-operativa através da totalidade das ações em

uma relação de unidade.

Outra questão apresentada foi sobre a importância e necessidade de um

planejamento mais direcionado para o grupo, com o objetivo de conhecer o que os

estudantes estão “[...] colocando como dificuldades pra ter a permanência e o êxito na

instituição” (AS1). Planejamento este que deve ser empreendido na perspectiva crítica

enquanto parte de apreensão da realidade em sua totalidade histórica presente no

cotidiano para contribuir na construção de processos de conscientização de classe,

nas “[...] formas de luta, de organização e resistência” (YAZBEK, 2009, p.14),

ampliando, assim, os horizontes da intervenção através do estabelecimento de

objetivos claros.

65

O Serviço Social também é designado para exercer outras atividades, de

acordo com o Ofício Circular nº 015/2005/CGGP/SAA/SE/MEC, o qual traz a descrição

dos cargos técnico-administrativos nas instituições federais de ensino. Trata-se de:

orientar indivíduos, famílias, grupos, comunidades e instituições, com o

esclarecimento de dúvidas sobre direitos e deveres, e acesso a direitos instituídos;

planejar políticas sociais no âmbito institucional por meio de planos, programas e

projetos específicos; pesquisar a realidade social; pesquisar interesses da população,

perfil dos usuários e características da área de atuação; monitorar as ações em

desenvolvimento e coordenar equipes e atividades.

Estas diretrizes se encontram de acordo com as definições estabelecidas na

Lei de Regulamentação da Profissão no Art. 4º, das competências profissionais, com

destaque para os incisos:

II – elaborar, coordenar, executar e avaliar planos, programas e projetos que sejam do âmbito de atuação do Serviço Social com participação da sociedade civil; [...]; V - orientar indivíduos e grupos de diferentes segmentos sociais no sentido de identificar recursos e de fazer uso dos mesmos no atendimento e na defesa de seus direitos; [...]; XI – realizar estudos socioeconômicos com os usuários para fins de benefícios e serviços sociais junto a órgãos da administração pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades. (BRASIL. Lei n. 8.662/1993).

As particularidades da profissão na sociedade já vêm sendo elucidadas a partir do

entendimento de que o trabalho profissional é condicionado objetiva e subjetivamente,

com o intuito de evitar análises unilaterais, conforme Yazbek (2009, p.5). A autora ainda

afirma que as condicionalidades objetivas dizem respeito às determinações sócio-

históricas do exercício profissional em diversas conjunturas, ou seja, o movimento da

sociedade incide diretamente sobre a profissão. E as subjetivas referem-se a aspectos

singulares a partir do direcionamento que o assistente social imprime ao seu trabalho.

Com base no exposto, explanaremos o eixo central de nossa investigação

referente às implicações da expansão da Rede de Educação Profissional e Tecnológica

para o Serviço Social em contexto de organização neoliberal. As consequências da

expansão têm dois focos de análise: uma para a sociedade e outra para o exercício

66

profissional. Esta última relacionada a dimensões positivas e negativas, de acordo com

os relatos das entrevistadas.

Concernente aos impactos para a sociedade foi destacada a significativa

importância que a expansão trouxe, através da interiorização dos campi e a ampliação do

acesso, para o desenvolvimento de uma educação profissional de qualidade, o que vem

trazendo bons resultados, dentre esses a geração de crescimento para o Estado e a

possibilidade de continuidade da trajetória educacional com a verticalização do ensino

superior.

Relativo ao exercício, se conseguiu ampliar o mercado de trabalho, além da

possibilidade de ingresso efetivo na Rede Tecnológica e da constituição de um grupo mais

coeso e com solidez profissional na esfera educacional, em decorrência do aumento

quantitativo de assistentes sociais. A expansão acaba também por propiciar mais

visibilidade para a profissão na área de Educação, devido a percepção social

indispensável desses profissionais na referida área e em virtude da grande ampliação dos

recursos destinados à Assistência Estudantil, a qual coloca no centro do debate as

necessidades dos estudantes e faz com que o corpo institucional pense mais sobre e

reconheça as contribuições advindas do Serviço Social na instituição.

Todavia, por o trabalho profissional ser “[...] indissociável dos dilemas vividos

pelo conjunto dos trabalhadores” (IAMAMOTO, 2015, p.431), os desafios para o

exercício do Serviço Social se apresentam de modo mais amplo, resultante da própria

organização do capital que reorganiza as condições e relações de trabalho.

Assim, as entrevistadas apontaram como consequências o aumento de

demandas e a apresentação de novas e, decorrente disso, a intensificação do trabalho

e a dificuldade para ocupar os espaços de capacitação. Relataram, ainda, que o

ingresso nos Institutos se deu de forma precarizada e posteriormente encontraram

limites nesta condição para o exercício profissional, considerando-se a defasagem

entre o número de servidoras e a ampliação das demandas.

Como o movimento da sociedade não ocorre de maneira linear, mas permeado

por contradições, os elementos que atravessam o processo de expansão da Rede de

Educação Profissional e Tecnológica e as repercussões para a prática do Serviço

Social se manifestam de modo dialético. Portanto, ao mesmo tempo em que o

crescimento dos polos de educação profissionalizante engendra novos postos de

trabalho e solidez ao grupo, a inserção das assistentes sociais se dá de modo

precarizado, decorrente da existência de apenas uma profissional em cada unidade

67

e, nos casos das que iniciaram nos campi do interior, o elevado custo para manter-se

nas cidades e a ausência de instalações e infraestrutura adequada. Com a

organização e luta da categoria, alguns anos depois conquistou-se o ingresso de mais

uma trabalhadora da área para cada unidade, entretanto, atualmente este número é

insuficiente para responder às inúmeras demandas.

Então assim você ingressa no mercado de trabalho, mas ingressa de forma precarizada [...] Mas é o que se tem, né, então você enquanto trabalhador topa a relação de trabalho. Então a gente teve essa precarização e aí o que é que a gente mostrou, a gente mostrou que precisava, demandas demais pro assistente social, então a gente precisava de outro colega na instituição, outro profissional e isso a gente conseguiu, né, depois de uns três, quatro anos, mais ou menos, a gente conseguiu. (AS1)

A entrada de um contingente maior de estudantes na instituição e a política de

democratização do acesso, através das cotas raciais e sociais, apresentam novas

demandas para o Serviço Social, além das já existentes, pois se amplia a necessidade

de os estudantes requisitarem os programas de Assistência Estudantil para

conseguirem permanecer no ambiente escolar. Considerando que para efetivar o

direito à educação não se deve apenas ampliar as possibilidades de acesso, mas criar

mecanismos que viabilizem a permanência e conclusão de curso dos ingressantes.

(NASCIMENTO, 2013, p.382). Ademais, o aprofundamento das desigualdades

sociais, a reconfiguração da questão social e seus impactos para a vida dos

trabalhadores e suas famílias também exponenciam a “entrada de pessoas com

demandas maiores, com maiores dificuldades socioeconômicas e a demanda pela

Assistência Estudantil, pelos programas, aumentando cada dia mais” (AS2).

Ainda referente a esse aspecto, as profissionais afirmam:

Então, eu acho que a expansão acontece isso, aumentou a demanda [...] por aquelas ações antigas como também sugiram novas demandas, novos desafios. E isso com uma quantidade restrita de profissionais. Então a gente tem sofrido na pele isso, a quantidade de profissionais não é suficiente. (AS2)

Assim, cresceu [...] o público alvo. E teve mais.... realmente teve mais demandas, a questão das cotas que foi nesse período, [...] até mesmo como aumentou o número de alunos, né, vem aumentando, né, a

68

questão de acompanhamento dos alunos ficou em maior quantidade. (AS4).

O papel da instituição em destinar demandas aos profissionais acaba por

elencar funções que não cabem ao Serviço Social, conforme afirma a profissional: “A

Instituição ainda não entendeu muito isso não e colocando umas demandas que não

tem nada a ver com a gente, muito comum” (AS5). Dentre elas têm-se a problemática

da análise de cotas, citada pelas entrevistadas, que ocupa muito tempo do exercício

por sempre existirem processos seletivos dos mais diversos níveis e por tratar-se

apenas de uma aferição socioeconômica. Nesse sentido, as profissionais têm se

articulado para que isto seja melhor discutido no ambiente de trabalho.

Iamamoto (2009) traz uma discussão importante relacionada a esses aspectos

que agregam condições, relações de trabalho e atribuições do assistente social.

A condição assalariada – seja como funcionário público ou assalariado de empregadores privados, empresariais ou não – envolve, necessariamente, a incorporação de parâmetros institucionais e trabalhistas que regulam as relações de trabalho, consubstanciadas no contrato de trabalho. Eles estabelecem as condições em que esse trabalho se realiza: intensidade, jornada, salário, controle do trabalho, índices de produtividade e metas a serem cumpridas. Por outro lado, os organismos empregadores definem a particularização de funções e atribuições consoante sua normatização institucional, que regula o trabalho coletivo. Oferecem, ainda, o background de recursos materiais, financeiros, humanos e técnicos indispensáveis à objetivação do trabalho e recortam as expressões da “questão social” que podem se tornar matéria da atividade profissional. (p.31-32, grifo da autora)

A expansão gera a ampliação das demandas e a imposição de outras,

atribuídas pela instituição que, às vezes, não dizem respeito ao Serviço Social, estes

elementos acarretam na intensificação do trabalho e dificultam que as assistentes

sociais possam ocupar mais espaços de capacitação e discussão coletiva, além de

outros limites. O relato a seguir expressa perfeitamente o supracitado:

Tá ficando muito, muito pesado assim o trabalho... a gente tá vendo que cada ano a gente tem notado que tem se intensificado, aí isso vai agravando a questão da gente só dar conta do imediato, o que vai surgindo na hora a gente tem que ir resolvendo, né. (AS2)

69

Relacionado aos desafios decorrentes da nova forma de organização do

trabalho no campo educacional, Almeida (2007, p.14) afirma que eles dizem respeito

ao aumento das requisições para o desenvolvimento de uma rotina mais burocrática,

o que acarreta na redução progressiva do tempo e das condições de realização de

uma atuação mais pedagógica. Elementos que se verificam no cotidiano dos Institutos

Federais associados às várias problemáticas discutidas.

As análises realizadas vinculadas aos objetivos do trabalho estão em constante

diálogo e se relacionam entre si. Portanto, ao tratar das demandas que foram

apresentadas à instituição com a expansão, destacaram a diversificação do perfil dos

usuários, especialmente no caso do Campus Cidade Alta (CAL), pois se abre uma

nova modalidade de ensino – o técnico integrado –, além de apresentarem-se, como

já citado, novas e maiores demandas em decorrência do processo de democratização

do ensino e da complexidade que a sociedade vive hoje, que se reflete nos espaços

ocupacionais, através do impacto da questão social sobre a escola.

Sobre a alteração do perfil estudantil, afirma-se que

[...] tem todo uma demanda bem especifica e bem diversificada, então a gente tá atendendo demandas de estudantes de famílias que antes nós não tínhamos, questões que não tínhamos antes, quanto mais o público se expande mais desafios aparecem. (AS2).

Relatam, ainda, sobre a existência de novas requisições, acompanhadas da

necessidade de mais articulação e preparo da equipe.

Bom, houve ampliação das demandas que agora a gente assim tem um grande número de adolescente na instituição que nós não tínhamos com a abertura do ensino médio [...] e aí esses adolescente requer outras demandas, os cuidados, né, de toda equipe em relação voltada pra esse público, e aí requer que a gente tenha mais articulação, mais planejamento, a equipe toda tá se preparando exatamente pra atendar essas novas demandas que foi com o ensino médio, ne. [...] Então a entrada do ensino médio trouxe pra gente agora maior demanda pra Psicologia e pro Serviço Social também. (AS1)

Os apontamentos expostos direcionam a discussão para as condições de

trabalho, que na dinâmica do reordenamento do capital, de acordo com Raichelis

(2010, p.751), aprofundam a precarização das circunstâncias em que este se realiza,

conforme o estatuto de trabalhador assalariado do assistente social, o qual se

70

subordina a “[...] processos de alienação, restrição de sua autonomia técnica e

intensificação do trabalho a que estão sujeitos os trabalhadores assalariados em seu

conjunto.” (idem). A autora ainda afirma que este quadro acarreta para a prática do

Serviço Social a pressão pelo aumento da produtividade e de resultados imediatos, a

ausência de horizontes profissionais de mais longo prazo e de qualificação e

capacitação, dentre outros. (ibidem, p.758-759).

Associa-se a isto a explanação dos limites postos para o exercício em

decorrência da expansão, conforme a apreensão das entrevistadas. Os limites estão

interligados às consequências, já indicadas, portanto, reafirmam a ampliação do

número de demandas, que restringe o exercício às respostas imediatas e a

inviabilidade de participar de espaços de capacitação.

Todavia, aparece como elemento novo a “grande dificuldade na estrutura física

do campus” (AS1) que impede, em dois dos três ambientes pesquisados, a garantia

do atendimento de maneira individual – de forma a resguardar o sigilo profissional –

em razão do espaço em que se desenvolve o serviço. Outro limite que também

ultrapassa o processo expansivo é a ineficiência da Rede Socioassistencial, que

dificulta maior articulação com instituições externas. Dentre as profissionais

entrevistadas, duas delas não avaliam que foram postos limites para o exercício

profissional, entretanto apontam que em alguns campi podem encontrar dificuldades

com relação à gestão para o desenvolvimento da profissão, por meio da disputa por

correlação de forças.

Para apresentar as possibilidades inerentes ao exercício profissional no âmbito

do Instituto, partiremos do fundamento descrito por uma profissional, a qual afirma que

dentro dos limites “[...] a gente tem que encontrar uma possibilidade” (AS2).

Portanto, as possibilidades estão no campo do reconhecimento e

respeitabilidade que o corpo profissional conseguiu ganhar na instituição, e,

consequentemente, mais força política. Isto, em parte, vincula-se ao aumento dos

recursos para a Assistência Estudantil e o, pífio, porém importante, ingresso de mais

profissionais na Rede.

Ao se referir ao reconhecimento, verifica-se nos relatos: “[...] a gente tem uma

certa… reconhecimento hoje, mais do que nunca tem reconhecimento, principalmente

também, também não vamos desarticular da questão de recurso” (AS5). Outra

profissional também afirma: “[...] a gente também tem uma, eu acho que é uma

71

conquista pra gente, a gente tem uma diretoria sistêmica [...] assim, a gente já tem

uma respeitabilidade” (AS3).

Além disso, foi destacado que “[...] a instituição não limita o exercício” (AS3)

como também a boa relação com a gestão, conforme o trecho: “A gente aqui tem uma

flexibilidade muito boa com gestores. O que o Serviço Social identificar como

demanda e trouxer... assim, raramente, a gente não é atendida, raramente.” (AS1).

Desse modo, tais aspectos apontam a existência de condições para a

realização da autonomia profissional. Logo, as assistentes sociais devem enxergar

este espaço enquanto campo de viabilidade para atuarem de modo mais crítico e

propositivo, indo além do gerenciamento dos programas.

É imprescindível buscar estratégias coletivas para direcionar o trabalho de

acordo com o que as próprias profissionais apontam enquanto necessidade: a

fundamentação para possuírem mais respaldo nas solicitações feitas à instituição,

conforme o explicitado: “[...] a gente assim, tem que se fundamentar pra poder solicitar,

pra mostrar pros gestores o que a gente precisa” (AS1). Ademais, apresenta-se como

possibilidade a tentativa de

[...] romper esse limite que esse dia-a-dia, esse imediatismo tá trazendo pra gente muitas demandas e a gente se policiar pra realmente organizar, sistematizar melhor o nosso trabalho de ter momento pra planejar, momento pra pensar, realizar projeto, alguma coisa, e não ficar só executando, executando... (AS2)

Nesse sentido, os assistentes sociais do IFRN têm demonstrado a necessidade

de ampliar os encontros coletivos para discutir o exercício profissional, objetivando

uniformizar os processos de trabalho em âmbito estadual e trocar experiências para

construir coletivamente estratégias de atuação. Aspecto primordial, pois é apenas “[...]

por meio da ação coletiva que são criadas condições concretas para a melhoria das

condições de trabalho.” (RAICHELIS, 2010, p.767).

A ampliação dos horizontes de atuação não depende apenas dos profissionais,

todavia, não se pode negá-la completamente, já que em meio aos desafios do

exercício profissional e das exigências institucionais, o assistente social é dotado de

relativa autonomia na condução do seu trabalho e tem “a possibilidade de imprimir

uma direção social ao exercício profissional [...] – moldando o seu conteúdo e o modo

de operá-lo” (IAMAMOTO, 2015, p.220, grifos da autora). Mesmo a autonomia sendo

dependente da “[...] correlação de forças econômica, política e cultural em nível

72

societário e se expressa, de forma particular, nos distintos espaços ocupacionais, que

envolvem relações com sujeitos sociais determinados” (idem, grifos da autora).

Essa perspectiva evita análises que caiam no fatalismo, no sentido de

naturalizar o já posto e impedir as possibilidades de atuação, ou no messianismo, o

qual privilegia a atuação individual enquanto mecanismo capaz de gerar a

transformação social.

É, portanto, através do cotidiano dinâmico da prática do Serviço Social que se

expressa a direção política dos profissionais. É nele ainda que estão dados os limites,

mas também o espaço para o desenvolvimento das possibilidades, em que ainda se

concretiza as dimensões da profissão. Constata-se, dessa forma, que o cotidiano

profissional é permeado por contradições. Assim, é necessário trazer a vinculação do

exercício profissional com o Projeto Ético Político Profissional, seus princípios e

valores.

Netto (2012) analisa que do ponto de vista estritamente profissional, esse

Projeto implica o compromisso com a competência baseada no aperfeiçoamento

intelectual do assistente social, fundado em concepções teórico-metodológicas

críticas e sólidas capazes de viabilizar uma análise concreta da realidade social, ainda

estimulando a dimensão investigativa.

Concluindo a análise referente às entrevistas, as profissionais ao serem

questionadas sobre como analisam as consequências da atual conjuntura para o

exercício profissional e os serviços desenvolvidos na Rede de Educação Profissional

e Tecnológica demonstraram preocupação referente à redução das questões

orçamentárias – mesmo até o momento isto não ter acontecido para a Assistência

Estudantil, mediante a qual se têm conseguido responder às demandas imediatas dos

estudantes e expandido algumas ações –, que podem futuramente implicar diretamente

nas condições de permanência dos estudantes e gerar aumento da evasão e seletividade

aos programas. Sobre essa dimensão, apresenta-se o relato da profissional.

Então essa conjuntura que a gente tá vivendo atualmente, é... tem trazido assim um pensar profissional, de até onde a gente vai tá podendo ir e atender e isso vai implicar em quê? Em consequências muito diretamente nesse processo de os alunos permanecerem na instituição porque não dá pra gente ter permanência escolar se a gente não tiver orçamento financeiro pra isso e isso vai implicar em muito, [...] a gente teme a questão, assim, também de evasão. (AS3)

73

Também foi relatado por uma profissional que devido à condição de trabalhadores,

será agravada a dificuldade de se ampliar o quadro profissional, o que traz inúmeros

impactos para o exercício profissional, como já citado, e em virtude do acirramento do

neoliberalismo terá, cada vez mais, o agravamento da questão social.

E pro nosso lado também, né, enquanto trabalhadores, enquanto assistentes sociais, a gente vai ter mais dificuldade de aumentar esse número de profissionais já que tudo aponta pra dificuldade de concursos... pra chamar, então isso vai aumentar, vai dificultar também nosso lado enquanto trabalhador, né, de ter menos possibilidades, menos vagas no mercado de trabalho e a gente ficar sobrecarregada. (AS2)

Por fim, ressalta-se que a égide do capital financeiro sobre os espaços sócio-

ocupacionais exige, segundo Iamamoto (2009, p.12), um sujeito profissional com

competência para propor, para negociar com a instituição, para defender o seu campo de

trabalho, suas qualificações e atribuições profissionais, além de buscar apreender, na

realidade, as tendências e possibilidades, ali presentes, passíveis de serem apropriadas

pelo profissional, desenvolvidas e transformadas em projetos de trabalho.

A autora indica, ainda, outras requisições que devem compor o perfil dos

assistentes sociais, no sentido de que sejam capazes de formular, recriar e avaliar

propostas

[...] que apontem para a progressiva democratização das relações sociais. Exige-se, para tanto, compromisso ético-político com os valores democráticos e competência teórico-metodológica na teoria crítica em sua lógica de explicação da vida social. Esses elementos, aliados à pesquisa da realidade, possibilitam decifrar as situações particulares com que se defronta o assistente social no seu trabalho, de modo a conectá-las aos processos sociais macroscópicos que as geram e as modificam. Mas, requisita, também, um profissional versado no instrumental técnico-operativo, capaz de potencializar as ações nos níveis de assessoria, planejamento, negociação, pesquisa e ação direta, estimuladora da participação dos sujeitos sociais nas decisões que lhes dizem respeito, na defesa de seus direitos e no acesso aos meios de exercê-los. (IAMAMOTO, 2015, p.208).

Por consequência, é preciso ter uma clara compreensão das atribuições e

competências profissionais, se vincular ou se aproximar dos sujeitos coletivos da

classe trabalhadora presentes na própria instituição para fortalecê-los e construir

espaços mais democráticos, amplos e reflexivos, considerando a dimensão

pedagógica da profissão. Já que os assistentes sociais por atuarem “[...] na tensão

74

entre re-produção da desigualdade” intervém também na “produção da rebeldia e

resistência” (ibidem, p.160).

Além disso, é essencial apreender as formas contemporâneas como as

expressões da questão social através das demandas chegam à instituição e como

isso se vincula ao contexto global da sociedade. Pensando coletivamente em soluções

para o enfrentamento através da construção de novas mediações.

A conjugação de tais elementos permite que não sejamos reconhecidos

socialmente apenas enquanto executores das políticas sociais ou

“‘solucionadores/as’” das expressões da questão social” (CFESS, 2012, p.27), e, no

caso dos IFRN, exclusivamente como gerenciadores dos programas de Assistência

Estudantil, mas segundo o vasto potencial de intervenção que temos.

Nessa perspectiva, Miranda (2011, apud SANTOS et al., 2012) afirma que a

educação, sob a ótica do neoliberalismo, é o único direito social que efetivamente se

expande, porém permeada de contradição, onde há, por um lado, a elevação do

quantitativo de vagas e, por outro, a precarização das condições de trabalho. Inseridas

nessa totalidade, as instituições como reflexo dos processos mais amplos, definem os

limites e as possibilidades para o trabalho profissional por meio das condições

objetivas impostas. Entretanto, mesmo assim, é necessário não cair no fatalismo,

fortalecendo a ideia de que nada possa ser modificado, e permanecer na luta pela

construção coletiva de espaços contra hegemônicos, que apontem para a superação

da ordem vigente.

Contudo, é importante ressaltar que a educação por si só não é capaz de alterar

esta sociabilidade, já que os limites do seu alcance estão postos dentro da

configuração do capital. Entretanto, é possível estruturar, de modo coletivo, dentro do

ambiente educacional, ações que redirecionem o pensamento e a reflexão para outros

valores. E, por meio disso, gerem instrumentos de luta e organização social que se

articulem com outras esferas da vida e membros da classe trabalhadora na direção

da construção de uma consciência coletiva, ou de classe. Logicamente que isto não

ocorre de modo linear, é permeado por contradições e disputas sociais, além de serem

necessárias condições objetivas para a realização de tal processo. Assim, neste

campo, os assistentes sociais têm significativa contribuição através do seu

direcionamento ético-político e do desenvolvimento da dimensão educativa.

Ademais, pensar a educação como instância necessária para a expansão do

capitalismo é dizer, conforme Santos e Rodrigues (2015), que ela tende à

75

mercantilização e, assim, faz parte dos ciclos de expansão e contração do capital, de

acordo com o desenvolvimento da economia do momento. Sendo assim, ao

vivenciarmos mais uma crise que vem se acirrando, pode-se presumir os riscos de

que também chegue ao fim o relativo processo de expansão da educação nas suas

mais diversas modalidades.

76

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A discussão sobre a expansão da Rede de Educação Profissional e

Tecnológica e as consequências desta para o Serviço Social presente no IFRN

envolve, necessariamente, a forma como o capitalismo se estrutura na atualidade,

através do ideário neoliberal que direciona as iniciativas do Estado em relação ao

campo social, incluindo-se a educação, alterando as diversas dimensões da vida da

população.

No decorrer da pesquisa que resultou neste trabalho ficou evidente a dinâmica

contraditória do movimento da sociedade e suas incidências para o conjunto das

políticas sociais, ou para o aspecto referente à configuração da profissão, à

constituição da educação, da formação brasileira ou à maneira em que ocorreu a

expansão da Rede de Educação Profissional e Tecnológica e seus impactos para

Serviço Social.

A educação é constituída enquanto uma dimensão ontológica relacionada ao

trabalho, sendo, assim, caracterizada de forma ampla e histórica, não restrita à

educação escolarizada nem aos moldes conhecidos hoje. Entretanto, no capitalismo

subordina-se aos interesses da burguesia, sendo perpassada por um claro corte de

classe, em consequência do reflexo das contradições presentes na sociedade. Mas

por alterar-se de acordo com os processos históricos e ser ambiente de disputas

ideológicas, também pode apontar para uma direção contra hegemônica por meio da

compreensão de sua dinâmica interna e da organização coletiva para buscar espaços

de resistência.

Conforme o desenvolvimento da sociedade, a educação se complexifica e

modifica seu caráter, sendo, portanto, determinada historicamente como reflexo do

momento vivido. Desse modo, com a reestruturação produtiva e a reorganização da

configuração do trabalho sob a orientação neoliberal, a educação contraria a direção

das demais políticas sociais e ganha destaque enquanto um mecanismo capaz de

transformar a sociedade, instruir o trabalhador para se adequar a demandas do

mercado de trabalho e combater as desigualdades sociais.

O surgimento do neoliberalismo se instaura no campo ideo-cultural após a

derrocada do Welfare State e a crise do socialismo real na década de 1980, o que

implica na redução do papel do Estado em ser garantidor dos direitos sociais com

influência mínima na regulação do mercado, interferindo apenas de acordo com os

77

interesses do capital. Nesse cenário, as políticas sociais são redirecionadas passando

o indivíduo a ser responsável por seu provimento social através do mercado. Assim,

a concepção de direitos sociais enquanto dimensão pública e coletiva é reduzida à

esfera privada e individual.

Referente às políticas sociais, seu surgimento foi gradativo e diferenciado entre

os países de acordo com o desenvolvimento do capitalismo. Desse modo, no Brasil

em decorrência das características da nossa formação marcada por uma economia

desigual e dependente das grandes potências, as políticas sociais têm seus protótipos

a partir da implementação da indústria e, consequentemente, do capitalismo tardio,

na década de 1920, sendo ampliadas no decênio seguinte.

Piana (2009, p.38) afirma que as políticas sociais brasileiras se caracterizam

historicamente por uma natureza assistencialista, paternalista e clientelista, com

medidas estatais paliativas e fragmentárias, com o objetivo de manter a ordem social,

as quais responderam durante os diversos ciclos à necessidade de alcançar

legitimidade social a partir do contexto autoritário e modelo econômico concentrador

de renda e excludente.

Relacionado a isso, a educação brasileira passa a ser objeto de maior

preocupação estatal neste período resultante de novas exigências sociais e de

refuncionalização do Estado na formulação das políticas sociais. Todavia,

historicamente foi pautada em uma perspectiva puramente elitista e excludente, em

que o acesso à escolarização era detido por grupos privilegiados.

Portanto, as formas de enfrentamento às contradições da sociedade capitalista

marcam a trajetória da educação e, posteriormente, sua política. Romanelli (2005) ao

analisar o desenvolvimento educacional brasileiro, especialmente no período em que

a industrialização era insipiente, considera que sua expansão ocorre mediante a

criação da demanda social por educação.

Assim, conclui-se que na sociedade capitalista, com mais evidência nos países

periféricos, a educação se distancia de seu caráter ontológico e da socialização da

produção humana com objetivo de contribuir para o pleno desenvolvimento dos

sujeitos.

Os avanços democráticos do país na década de 1980 possibilitam a emersão

de novas propostas educacionais. A partir da Constituição Federal de 1988 a

educação avança no seu reconhecimento enquanto direito social de todos e dever do

Estado. Nesse sentido, existe espaço para que ela avance e modifique sua estrutura.

78

Todavia, a instauração do neoliberalismo no Brasil e a contrarreforma do Estado

reorienta o enfoque da educação, passando a ser sincronizada aos valores do

mercado e às orientações dos organismos internacionais.

Associado a isto, em 1996 é aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional no contexto da reforma educacional que estabelece relação constante com

o mundo do trabalho e da flexibilização do processo formativo como, também, na

responsabilidade da oferta do ensino, livre à iniciativa privada. Isto, demonstra a

desresponsabilização por parte do Estado na oferta integral do direito à educação,

conectando-se às novas exigências do papel estatal. Assim, a LDB possui caráter

minimalista, compatível com o Estado mínimo, segundo Martins (2007).

Empreender que “o sentido da educação não é determinado por ela mesma”

(TONET, 2016, p.124), remete aos significados sociais presentes na sociedade e ao

movimento contraditório da realidade. Assim, pelo fato de o ideário neoliberal

direcionar a educação para o mercado e necessitar de mão-de-obra mais qualificada,

têm-se a expansão, de forma mais efetiva, da educação profissional com a instituição

da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica e criação dos

Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, por meio da Lei nº 11.892, de

29 de dezembro de 2008. A expansão da Rede no contexto neoliberal foi marcada por

um processo de correlação de forças, em que em momentos respondeu ao capital,

em outros contribuiu para os avanços regionais através da condução de sua política.

Nessa perspectiva, a educação profissional e tecnológica ainda assume no

cenário nacional um papel importante para o desenvolvimento, mas encontra limites

na ausência efetiva de articulação com as outras políticas sociais de modo a gerar

avanços maiores na conquista de direitos. Para a educação tecnológica houve um

grande contingente de destinação orçamentária para expandir-se, e para as demais,

redução. Entretanto, sabe-se que essa característica se alinha à própria configuração

do Estado neoliberal no sentido de sua responsabilização com tais políticas, o qual

impõe a centralidade na educação e, de modo oposto, a redução das demais direitos

através da focalização e retração das políticas sociais.

Verifica-se também que a alteração dos Centros Federais de Educação

Tecnológica (CEFETs) para Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia

transforma a direção ideológica até então vigente, em que se tem por foco alcançar a

competitividade econômica para dar suporte aos arranjos produtivos locais e

possibilitar o desenvolvimento integral do cidadão trabalhador (BRASIL, 2010a, p. 3).

79

Isto se associa à necessidade decorrente da esfera da produção de criar concepções

sobre a realidade para que a reprodução das relações sociais tenha determinada

orientação.

Esses processos de mudanças na dinâmica social interferem nas diversas

dimensões da vida e exponenciam as expressões da questão social, objeto de

intervenção do Serviço Social, que refratam nos espaços sócio-ocupacionais. Dessa

forma, o assistente social é requisitado para dar respostas mais qualificadas nas

diversas áreas de atuação, dentre elas a educação.

O Serviço Social vincula-se historicamente a este campo decorrente do cunho

educativo presente na constituição da profissão, que ao transcorrer dos anos realiza-

se através de “perfis pedagógicos” que, de acordo com as transformações societárias

e as determinações históricas, altera seu direcionamento atuando nos processos de

organização da cultura, entendida enquanto modo de vida, de pensar e de agir. Ao

longo dos anos a categoria profissional mudou substancialmente seu perfil

pedagógico e a maneira de lidar com os usuários. E, segundo Abreu (2016), com a

representação de três tendências de perfis pedagógicos históricos: da “ajuda”, da

“participação” e da emancipação.

O primeiro perfil, da “ajuda”, foi desenvolvido pela profissão a partir de sua

emersão, onde a atuação profissional baseava-se na análise dos problemas sociais e

enfrentamento da questão social enquanto dimensões de ordem individual, por meio

de um papel moralizador, corretivo, direcionado a reintegração social e reforma moral.

O segundo, da “participação”, se expressa na América Latina a partir da década

de 1950 e 1960 do século passado, o qual se fundamentava as estratégias do

Desenvolvimento de Comunidade, associado à modernização conservadora, com o

objetivo global de assegurar aos Estados Unidos condições políticas, administrativas

e culturais, mais propícias para integrar e dinamizar a expansão do capitalismo.

O último tem como marco o Movimento de Reconceituação que vai modificando

o caráter histórico conservador da profissão através de processos de ruptura com o

conservadorismo e adoção de uma base teórica crítica, vinculada a construção de

uma pedagogia emancipatória associada às classes subalternas. A atuação

profissional nesta tendência orienta-se no sentido de contribuir para a mobilização,

capacitação e organização das classes subalternas, se contrapondo à cultura

dominante com um olhar contestador da ordem vigente.

80

Este perfil é o que orienta a intervenção profissional atualmente, por

estabelecer vínculos com a classe trabalhadora e estar preconizado no Projeto Ético-

Político Profissional, com suas diretrizes apontadas na Lei de Regulamentação (nº

8.662/93), no Código de Ética do (a) Assistente Social de 1993 e nas Diretrizes

Curriculares da ABEPSS, de 1999.

Todavia, mesmo a profissão tendo uma vinculação histórica com o campo, é a

partir da década de 1990 que sua inserção ocorre de maneira mais ampla, devido ao

significado que a educação passa a ocupar na sociedade e à ampliação do debate

interno na categoria.

O contexto neoliberal também ocasiona a expansão de postos de trabalho no

âmbito da política educacional para a profissão, em especial na Rede de Educação

Profissional, Científica e Tecnológica. Portanto, os profissionais são requisitados para

atuarem na gestão e execução dos programas de Assistência Estudantil a partir da

compreensão de que é necessária a ação de outros profissionais, além do corpo

docente para intervirem nas condições de acesso e permanência nas instituições, em

razão da presença das expressões da questão social nos espaços institucionais.

Nesse sentido, a prática dos assistentes sociais é condicionada objetiva e

subjetivamente, o que se associa à discussão feita por Iamamoto e Carvalho (2014,

p.79-80) de que a profissão é estabelecida através da realidade vivida pelos seus

profissionais, todavia determinada pelas circunstâncias sociais objetivas que

imprimem certa direção social ao exercício profissional.

Ao buscar por meio da abordagem qualitativa de pesquisa compreender quais

as consequências da expansão da Rede de Educação Profissional na cidade de

Natal/RN para o exercício profissional do assistente social através da realização de

entrevista semiestruturada com cinco profissionais dos três campi da cidade (Natal –

Central, Natal – Zona Norte e Natal – Cidade Alta), foi possível responder às

indagações levantadas mediante as análises dos dados obtidos.

Portanto, o exercício profissional nos Institutos Federais, como em outros

espaços ocupacionais, recebe incidência dos fatores macroestruturais, do lugar em

que a profissão ocupa na divisão sociotécnica do trabalho e de sua condição de

trabalhador assalariado.

Referente à caracterização do Serviço Social nos Institutos, verificou-se que o

cotidiano profissional se constitui, basicamente, pelos aspectos que envolvem os

programas de Assistência Estudantil e algumas outras demandas que se relacionam

81

as condições de acesso e permanência na instituição. Todavia, as diversas demandas

que surgem pelos sujeitos individuais são marcadas por determinações de classe,

nesse sentido, são expressões da questão social.

Constatou-se que há a ausência de ações mais efetivas que saiam do

gerenciamento dos programas, em decorrência do grande número de demandas, da

necessidade de responder às questões mais imediatas e do quadro de recursos

humanos reduzido.

Entretanto, é preciso que as profissionais mobilizem além do já posto, a partir

de sua capacitação teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa, por meio

da autonomia profissional, capaz de imprimir direção às ações realizadas, e tensionar

os ambientes de trabalho. Como uma das estratégias, pode-se utilizar o planejamento

sistemático das ações, refletindo-se coletivamente sobre o alcance da intervenção.

Como consequências do processo expansivo para o exercício foram

apresentadas contribuições para a sociedade e para o Serviço Social. Relacionado à

profissão, conquistou-se a ampliação do mercado de trabalho e a possibilidade de

ingresso na Rede Tecnológica de modo mais efetivo, além de gerar um grupo mais

coeso e com solidez profissional devido ao ingresso de mais profissionais.

Todavia, também observou-se o aumento de demandas e a apresentação de

novas e, decorrente disso, a intensificação do trabalho e a dificuldade para ocupar os

espaços de capacitação, além da diversificação do perfil dos usuários. O ingresso na

Instituição foi caracterizado de modo precarizado, o que acarreta um trabalho também

relativamente precarizado, considerando que o número de profissionais não

acompanha a ampliação das demandas. Esses elementos também são apontados

enquanto limites mais significativos para o exercício profissional.

Concernente às possibilidades, têm-se o reconhecimento e respeitabilidade do

corpo profissional na instituição e a boa relação nos campi com as gestões que não

limitam o exercício profissional. Ademais, a expansão trouxe um expressivo aumento

dos recursos destinados à Assistência Estudantil, os quais conseguem atender às

demandas imediatas apresentadas no cotidiano.

Nesta perspectiva, se aferiu o constante diálogo e relação presente nas

análises referentes aos objetivos do trabalho, além da apreensão do movimento

contraditório que permeiam o processo expansivo e o exercício profissional.

Assim, para que se possa avançar nas importantes contribuições que o Serviço

Social pode proporcionar na educação é preciso permanecer refletindo sobre o

82

trabalho profissional a fim de apreender os movimentos e determinações da sociedade

e o modo como incidem sobre o cotidiano dos assistentes sociais, além de buscar

compreender o significado da educação na sociedade capitalista, todavia, pensando

em sua dimensão ontológica associada ao trabalho enquanto dimensão fundante do

ser social.

Destaca-se, ainda, a importância da aproximação com as organizações

coletivas e o desenvolvimento mais amplo da capacidade pedagógica dos

profissionais, no sentido de contribuir para o processo de democratização da

educação e da construção de espaços de resistência. Fazendo-se isto por meio de

reflexões sobre as refrações da questão social no contexto contemporâneo com o

público atendido e a comunidade que integra o ambiente institucional.

Ademais, é fundamental dentro do contexto no qual vivemos de acirramento da

agenda neoliberal ampliar as lutas pela permanência e avanço dos direitos, não só na

esfera da educação, mas em todos os âmbitos, além da organização coletiva para

construir estratégias na perspectiva da “contrainternalização”, como bem discute

Mészáros (2008), para redirecionar os eixos da educação atual e construir valores

contra hegemônicos que se associem com a luta geral dos trabalhadores.

Por fim, decorrente do contexto atual de acirramento dos ditames neoliberais

no país, presume-se que chega ao fim o processo da expansão educacional vivido

nos últimos anos em suas diversas modalidades, com projeção para o

aprofundamento das desigualdades sócioeducacionais e estrita relação dessa

dimensão da vida com o mercado.

Destarte, reconhecemos os limites analíticos da presente produção,

considerando que a construção do conhecimento se dá de forma contínua através da

aproximação da realidade. E que os apontamentos aqui realizados não são capazes

de esgotar a discussão referente à expansão da Rede e as consequências para o

exercício profissional. Entretanto, espera-se que o estudo contribua para a discussão

interna da categoria para pensar o seu fazer profissional e os processos educacionais.

83

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APÊNDICE A

ROTEIRO DE ENTREVISTA

Pesquisa: EXPANSÃO DA REDE FEDERAL DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL,

CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA NA CIDADE DE NATAL-RN E O EXERCÍCIO

PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL

1. Há quanto tempo trabalha na instituição?

2. Quando se graduou? Fez algum tipo de especialização ou pós-graduação?

3. Como se constitui o cotidiano profissional na instituição? Quais as demandas

frequentemente apresentadas?

4. Quais ações são desenvolvidas pelo Serviço Social na Instituição? Existem ações

além da Assistência Estudantil ?

5. Observando o processo expansivo da Rede de Educação Profissional e

Tecnológica na cidade, iniciado em 2006, você percebe que houve consequências

para o exercício profissional? Em caso afirmativo, quais?

6. Em decorrência do processo expansivo quais demandas passaram a ser

apresentadas ao Serviço Social?

7. Você observa que foram postos limites ao exercício profissional em decorrência da

expansão? E quanto às possibilidades para esse exercício? Quais são estas?

8. Como você analisa as consequências da atual conjuntura para o exercício

profissional e os serviços desenvolvidos na Rede de Educação Profissional e

Tecnológica?