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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CLÁUDIA DA SILVA FARACHE
A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.
NATAL– RN
2007
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CLÁUDIA DA SILVA FARACHE
A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL:
DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação. ORIENTADORA Profª Drª Neide Varela Santiago.
Natal - RN 2007
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CLÁUDIA DA SILVA FARACHE
A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação.
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________________________________________ Profª. Drª Neide Varela Santiago. – Orientadora
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN
__________________________________________________________________ Profª. Drª Marisa Del Cioppo Elias – Examinadora Externa
Pontifícia Universidade Católica – PUC – SP
___________________________________________________________________ Profª. Drª Tânia Câmara Araújo de Carvalho – Examinadora Externa
Faculdade do CDF Ponta Negra – NATAL-RN
__________________________________________________________________ Prof. Dr Francisco de Assis Pereira – Examinador Interno
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
_________________________________________________________________ Profª. Drª Luzia Guacira dos Santos Silva – Examinadora Interna
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
___________________________________________________________________ Prof. Dr Walter Pinheiro Barbosa Júnior
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Suplente
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Dedico esta tese a todos os componentes: crianças, professoras, famílias, coordenadoras e funcionários do CMEI Carmem Reis, e em especial a Professora Olga Regina, pelo empenho, competência e dedicação com que rege essa tão afinada e harmônica orquestra.
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AGRADECIMENTOS
Um sonho que se sonha só, é apenas um sonho, um sonho
que se sonha em conjunto, torna-se realidade.
Autor desconhecido
Na impossibilidade de nominar todos os que conosco sonharam esse sonho,
contribuindo assim para a sua realização, agradecemos de coração a cada um, e pedimos permissão para nomear os que seguem abaixo, agradecendo-os igualmente:
Inicialmente, agradecemos a Deus – inteligência suprema, causa primária de
todas as coisas, sem o qual não existiríamos; e a Jesus, o espírito mais perfeito que já habitou a terra, se constituindo em nosso guia e modelo.
Aos meus pais – Carlos e Wilda e a minha querida Vó Vanda, pelo empenho,
sacrifício, carinho, dedicação e apoio que sempre me deram, incondicionalmente, em toda a trajetória da minha existência. Todas as palavras do mundo são insignificantes para traduzir a alegria que sinto em ser sua filha e neta; e o reconhecimento e agradecimento que lhes devoto não caberia em todo o papel existente, considerando que gosto do que sou, e tudo o que sou, devo a vocês!
Ao meu esposo Eden – um pouco do paraíso que tive a ventura de encontrar
na terra; e as minhas filhas Vanda Luíza e Luana Cecília, com certeza as maiores vítimas de tantos estudos - para Ele e Elas traduzidos em muitas ausências, o meu sincero agradecimento e a certeza de que sem vocês, nada disso seria possível, nem teria sentido!
Ao meu sogro, Sebastião de Lessa Lemos - in memorian, grande incentivador
da busca pelo conhecimento. Embora a saudade da sua presença física, do seu temperamento alegre e expansivo, a certeza da continuidade da sua vida em outra dimensão, nos alegra e anima a prosseguir!
Aos grandes amigos, Sandra e Assis – verdadeiros tesouros encontrados na
nossa trajetória terrena, a minha grande admiração, o meu imenso carinho, e a minha eterna gratidão.
À Profª Drª Neide Varela Santiago - Como colocar na pequenez e singeleza
das palavras a sua imensurável contribuição a minha vida, a não ser testemunhando que aprendi muito com você, não apenas pelo que você me diz e ensina, mas principalmente pela oportunidade grandiosa que tive de vivenciar a experiência de ser sua aluna e bolsista na graduação, sua orientanda na especialização, no mestrado e no doutorado, bebendo nas fontes do seu saber e, principalmente, da sua postura ética e generosa de grande ser humano. Como já lhe disse uma vez: ter uma orientadora como você, ainda mais durante tanto tempo, é um privilégio, e eu agradeço sempre a Deus por isso!
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À todos os que fazem o Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Maria Reis: crianças, famílias, professores, funcionários, coordenadoras e gestoras, pelas grandes oportunidades de aprendizagem e crescimento que tive ao lado de vocês.
À minha amiga Olga Regina, sem dúvida um ser humano maravilhoso. Em
você encontrei, pelos laços do coração, a irmã que o sangue não me deu. Obrigada pela sua presença constante, pelo seu carinho, pelo ombro sempre amigo e disponível, e por todos os momentos compartilhados, que tanto me enriqueceram, como profissional e como ser humano.
À amiga Cristina Leandro: contabilizar o tempo que faz que nos conhecemos,
seria esquecer que ainda temos 25 anos – embora não saibamos bem se de educação ou de idade, mas não importa! O importante é o companheirismo que nos une e irmana, nas trajetórias da educação e da vida.
À Profª Drª Marisa Del Cioppo Elias, pelo carinho e competência com que
vem acompanhando, e contribuindo com o crescimento da minha trajetória acadêmica e pessoal, desde a banca do mestrado. E também pela postura lúcida, objetiva e humilde com que distribui os grandes saberes que possui, com todos os que dela se acercam. É motivo de muita alegria e orgulho para mim, a sua presença na minha vida. Obrigada!
À Profª Drª Tânia Câmara Araújo de Carvalho, pelas imensas contribuições que sempre dispensou à minha formação acadêmica e pessoal, e, em especial, pelas contribuições que deu a esse trabalho, enriquecendo-o bastante. Obrigada também pelo exemplo de compromisso, competência e dedicação que é para todos nós que trabalhamos na área da Educação e, principalmente, da Educação Infantil. Ao Profª Dr Francisco de Assis Pereira, pelo acompanhamento desvelado e competente dos meus trabalhos, desde a monografia de especialização até esta tese... faltam as palavras para dizer da minha alegria e do meu agradecimento! À Profª Drª Luzia Guacira dos Santos Silva, pela amizade e carinho que nos une, e pela competência, seriedade e dedicação com que contribuiu para o enriquecimento desse trabalho. Ao Profº Dr. Walter Pinheiro Júnior, pelo carinho e gentileza com que aceitou participar da nossa banca de defesa. À Profª Drª Lígia Maria Motta Lima Leão de Aquino – da Universidade católica de Petrópolis e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro pela gentileza com que aceitou ser a suplente externa da nossa banca. À todos os professores e professoras do PPGEd da UFRN, principalmente aqueles com quem interagimos mais de perto nas disciplinas e seminários, no decorrer da nossa formação: Profª Drª Aparecida Queiroz, Profº Dr Assis Pereira, Profª Drª Denise Carvalho, Profª Drª Estela Campelo, Profº Drº João Valença, Profª Drª Márcia Gurgel, Profª Drª Tânia Câmara, dentre outros cujos nomes nos escapam agora à memória. À Profª Justina Iva de Araújo Silva – Secretária Municipal de Educação de Natal, pelo convite para assumir a direção do CMEI Carmem Reis, me possibilitando
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vivenciar a experiência aqui apresentada, que tanto me enriqueceu como profissional e como ser humano. À Profª Mariza Guerra, coordenadora do Setor de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação de Natal, e a todas as colegas da equipe de Educação Infantil da SME. À Maria Isabel Medeiros – nossa querida Bel, pelo carinho e competência com que contribuiu com a parte técnica e normativa desse trabalho. Á Luana Cecília Farache Lemos – minha filha mais nova, que na beleza e plenitude dos seus 11 anos de idade, com muito carinho, solidariedade e companheirismo, contribuiu enormemente com a impressão e organização final das páginas desse trabalho. Em especial, as crianças e famílias com as quais interagimos no decorrer dessa experiência, e a todos os atores e protagonistas aqui não nominados, porém, igualmente importantes na realização desse trabalho.
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Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais; caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar. Ao andar faz-se o caminho, e ao olhar-se para trás vê-se a senda que jamais se há de voltar a pisar. Caminhante, não há caminho, somente sulcos no mar.
Antônio Machado.
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RESUMO
O presente trabalho se constitui em uma tese de doutorado, na área da Educação, que tem como objetivo descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e instituição de Educação Infantil, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, localizado na cidade de Natal-RN. A nossa pretensão com esse trabalho é compartilhar algumas das idéias e ações construídas coletivamente a partir dessa experiência, com a intenção de trazer uma contribuição para os debates acerca das temáticas relativas à Educação Infantil – enquanto modalidade de ensino, de uma maneira geral; e as relações entre famílias e Instituições de Educação Infantil, de forma mais específica. O trabalho aqui apresentado se encontra respaldado pelos postulados da pesquisa qualitativa com características de uma pesquisa-ação, tendo como principais instrumentos de construção dos dados às entrevistas abertas ou semi-estruturadas, o caderno pessoal de registros, as fichas de caracterização das crianças e as observações participantes. Autores como Áries (1981); Bassedas, Huguet e Solé (1999); Bhering e Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 – 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi e Martín (2003); Marschal e Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), dentre outros, embasaram teoricamente este trabalho. A experiência aqui descrita aponta para as possibilidades de compartilhamento de ações de cuidado e educação entre família e Instituição de Educação Infantil, enfatizando a relevância de uma práxis participativa no interior da instituição, para que o trabalho da mesma possa propiciar esse compartilhamento com as famílias, a partir de atividades como reuniões, palestras, oficinas, participação em projetos didáticos, exposições abertas à comunidade, festas comemorativas e valorização da cultura local, dentre outras oportunidades de diálogo e interação entre a instituição educativa e as famílias. Palavras Chaves: Família, instituição de Educação Infantil, cuidado e educação.
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ABSTRACT The present paper is a doctorate thesis, in the area of Education, that has as a goal to describe and to reflect on the construction/systematization of a relation between family and institution of Childhood Education, in favor of sharing the care and education actions of children, in the context of creation of a County Center of Childhood Education, located in the city of Natal-RN. Our intension with this paper is to share some of the ideas and actions collectively constructed by this experience, with the intention of bringing a contribution for the thematic debates concerning Childhood Education - as modality of education, in a general way; and the relations between families and Institutions of Childhood Education, in a more specific way. The paper presented here is endorsed by the postulates of the qualitative research with characteristics of a research-action, having as main instruments of the data construction the open or half-structuralized interviews, the personal notebook of registers, the participant’s index cards characterizing the children and comments. Authors as Aries (1981); Bassedas, Huguet and Solé (1999); Bhering and Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 - 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi and Martín (2003); Marschal and Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), amongst others, had theoretically based this paper. The experience described here points to the possibilities of sharing the care and education actions between family and Institution of Childhood Education, emphasizing the relevance of participative praxis in the interior of the institution, so that its job can propitiate this sharing with the families, throughout activities as meetings, lectures, workshops, participation in didactic projects, open expositions to the community, commemorative parties and valuation of the local culture, amongst other chances of dialogue and interaction between the educative institution and the families. KEYWORDS: Family, Institution of Childhood Education, Care and Education.
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RÈSUMÈ L’objectif de notre travail, dans le cadre d’une thèse de doctorat en Sciences de l’Éducation, est de décrire et de réfléchir sur la construction/systématisation d’une relation entre la famille et l’Institution d’Enseignement Infantile, en faveur du partage des actions de soin et d’éducation des enfants. A partir de cette expérience, dont le contexte est la création d’un Centre Municipal d’Éducation Infantile dans la ville de Natal-RN, nous souhaitons partager certaines des idées et actions construites collectivement dans le but d’amener une contribution aux débats autour des thèmes relatifs à l’éducation des enfants – en tant que modalités d’enseignement, d’une manière générale, et des relations entre les familles et les institutions, de façon spécifique. Le présent travail, soutenu par les postulats de la recherche qualitative avec des caractéristiques d’une recherche-action, s’est construit à partir d’entretiens ouverts ou semi-structurés, de données du cahier personnel de registres, des fiches d’évaluation des enfants et des observations participantes. Des auteurs tels que Áries (1981); Bassedas, Huguet et Solé (1999); Bhering et Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 – 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi et Martín (2003); Marschal et Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), entre autres, constituent les bases théoriques de notre recherche. Ainsi, l’expérience ici décrite nous oriente vers les possibilités de partage des actions de soin et d’éducation entre la famille et l’Institution d’Éducation Infantile. Autrement dit, il s’agit de souligner l’importance d’une praxis participative à l’intérieur de l’institution afin que celle-ci puisse promouvoir ce partage avec les familles à partir d’activités telles que des réunions, des conférences, des ateliers, la participation autour de projets didactiques, des expositions ouvertes à la communauté locale, des fêtes commémoratives et la valorisation de la culture native, parmi d’autres opportunités de dialogue et d’interaction entre l’institution et les familles.´
MOTS CLEFS: Famille, Institution d’Education Infantile, soin et éducation.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 01 - Práxis participativa 21FIGURA 02 - Referenciais norteadores 30FOTO 01 - Área gramada na frente do prédio 61FOTO 02 - Área livre e caixa de areia 61FOTO 03 - Parque infantil 61FOTO 04 - Tenda em área cimentada 61FOTO 05 - Aula para formação de um grupo de capoeira 63FOTO 06 - Apresentação do grupo de pastoril da I.E.I 63FOTO 07 - Leitura na biblioteca 64FOTO 08 - Momento do faz-de-conta 64FOTO 09 - Brincadeiras no parque e caixa de areia 64FOTO 10 - Escrevendo textos que se sabe de cor 64QUADRO 01- Caracterização da equipe técnica-docente-administrativa 65QUADRO 02- Nº de crianças por nível. 2004 matutino 68QUADRO 03- Nº de crianças por nível. 2004 vespertino 68QUADRO 04- Nº de crianças por nível. 2005 matutino 68QUADRO 05- N} de crianças por nível. 2005 vespertino 68FOTO 11 - Equipe da I.E.I. efetuando as matrículas (1) 138FOTO 12 - Equipe da I.E.I. efetuando as matrículas (2) 138FOTO 13 - Professoras confeccionando material (1) 138FOTO 14 - Professoras confeccionando material (2) 138FOTO 15 - Equipe da I.E.I. comemorando aniversário do trimestre 139FOTO 16 - Café da manhã com equipe da I.E.I 139FOTO 17 - Funcionário tocando violão p/ as crianças 141FOTO 18 - Funcionárias fazendo doces p/ dia das crianças 141FOTO 19 - Livre acesso das famílias á I.E.I (1) 148FOTO 20 - Livre acesso das famílias á I.E.I (2) 148FOTO 21 - Oficina sobre a hora do parque 152FOTO 22 - Oficina sobre desenho 153FOTO 23 - Oficina sobre escrita c/ alfabeto móvel 153FOTO 24 - Festa junina 154FOTO 25 - Famílias visitando exp. De trabalhos das crianças 154FOTO 26 - Reunião com as famílias 160FOTO 27 - Dramatização sobre limites (1) 165FOTO 28 - Dramatização sobre limites (2) 165FOTO 29 - Brincando de roda c/ famílias e crianças 168FOTO 30 - Construindo brinq. de sucata c/ famílias e crianças 168FOTO 31 - 1º encontro da família na I.E.I 171FOTO 32 - Pastoril estrela do amanhã 171FOTO 33 - Pescador, e avô de 1 aluno, visita a I.E.I 173FOTO 34 - Pescador ensina como tratar o peixe 173FOTO 35 - Crianças visitam a casa das rendeiras na Vila 174FOTO 36 - Rendeira, e avó de 1 aluna, visita a I.E.I 174FOTO 37 - Exposição dos trabalhos sobre a Vila (1) 174FOTO 38 - Exposição dos trabalhos sobre a Vila (2) 174
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LISTA DE ANEXOS
ANEXO 1 - Ficha de Caracterização das Crianças e Famílias 217ANEXO 2 - Roteiro das Entrevistas Iniciais com as Famílias 221ANEXO 3 - Roteiro das Entrevistas Finais com as Famílias 222ANEXO 4 - Autorização para o uso do projeto “Rendeiras da Vila” 223ANEXO 5 - Autorização para o Uso das Fotos 224
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LISTA DE SIGLAS
C.M.E.I -- Centro Municipal de Educação Infantil CMEICAR -- Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Mª Reis
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente FUNDEB – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica FUNDEF – Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental
I.E.I – Instituição de Educação Infantil LDB – Lei de Diretrizes e Bases NEI – Núcleo de Educação Infantil PPGEd – Programa de Pós Graduação em Educação PROBÁSICA – Programa de Qualificação Profissional para a Educação Básica
PROFA – Programa de Formação de Professores Alfabetizadores SEMTAS – Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social. SEI – Setor de Educação Infantil SME – Secretaria Municipal de Educação UFRN -- Universidade Federal do Rio Grande do Norte
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO 18
INTRODUÇÃO 21
1 REVISITANDO CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS, EM BUSCA DE NOVAS PAISAGENS
43
1.1 REFLETINDO SOBRE A MONOGRAFIA 43
1.2 REFLETINDO SOBRE A DISSERTAÇÃO 46
2 CONSTRUINDO DIRETRIZES PARA NOVOS CAMINHOS 54
2.1 REFLETINDO SOBRE REFERENCIAIS METODOLÓGICOS 54
2.2 DETALHANDO INSTRUMENTOS DE CONSTRUÇÃO DOS DADOS 57
2.3 CARACTERIZANDO O CAMPO E PESQUISA 60
2.4 CARACTERIZANDO O CORPO TÉCNICO-DOCENTE 65
2.5 APRESENTANDO OS FUNCIONÁRIOS 66
2.6 CARACTERIZANDO AS CRIANÇAS E SUAS FAMÍLIAS 67
3 BUSCANDO CAMINHOS DO PASSADO, PARA CONSTRUIR O FUTURO
73
3.1 REFLEXÕES INICIAIS EM TORNO DA TEMÁTICA 73
3.1.1 EM BUSCA DA VISÃO DE INFÂNCIA DA IDADE MÉDIA 75
3.1.2 O SENTIMENTO DE INFÂNCIA NA IDADE MODERNA 80
3.1.3 REFLEXÕES SOBRE AS CONTRADIÇÕES DA HISTÓRIA DA INFÂNCIA NA CONTEMPORANEIDADE
83
3.2 AS I.E.I. AO LONGO DA HISTÓRIA 93
3.3 AS FAMÍLIAS E SUAS HISTÓRIAS 105
4 APRESENTANDO CAMINHOS TRILHADOS 112
4.1 AÇÕES INICIAIS COM AS PROFESSORAS 113
4.2 AÇÕES INICIAIS COM OS FUNCIONÁRIOS 139
4.3 ALGUMAS AÇÕES REALIZADAS COM AS CRIANÇAS 142
4.4 AÇÕES REALIZADAS COM AS FAMÍLIAS 147
5 DESCREVENDO E REFLETINDO SOBRE OS CAMINHOS PERCORRIDOS
158
5.1 REUNIÕES COM AS FAMÍLIAS 159
5.2 PALESTRAS E VIVÊNCIAS COM AS FAMÍLIAS 165
16
5.3 OFICINAS COM AS FAMÍLIAS SOBRE ATIVIDADES REALIZADAS COM AS CRIANÇAS NO COTIDIANO DA INSTITUIÇÃO
169
5.4 FESTAS COMEMORATIVAS 170
5.5 INCENTIVO A PARTICIPAÇÃO DAS FAMÍLIAS EM PROJETOS DIDÁTICOS-EDUCATIVOS VIVENCIADOS PELAS CRIANÇAS
172
5.6 INTERVENÇÃO INDIVIDUAL JUNTO A ALGUMAS FAMÍLIAS 175
5.7 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS FINAIS COM AS FAMÍLIAS 177
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 197
7 REFERÊNCIAS 206
8 ANEXOS 217
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APRESENTAÇÃO
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APRESENTAÇÃO
Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.
Fernando Pessoa.
O presente trabalho se constitui em uma descrição reflexiva da experiência
por nós vivenciada nos anos de 2004 e 2005, em um Centro Municipal de Educação
Infantil (CMEI), na cidade de Natal-RN. A experiência se refere à vivência coletiva do
processo de construção de uma relação com as famílias, em prol do
compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças matriculadas
nesta Instituição, no contexto de criação e implantação da mesma.
A nossa pretensão com esse trabalho é compartilhar algumas das idéias e
ações construídas coletivamente a partir dessa experiência, visando trazer uma
contribuição para os debates acerca das temáticas relativas à Educação Infantil –
enquanto modalidade de ensino, de uma maneira geral; e as relações entre famílias
e Instituições de Educação Infantil – I.E.I., de forma mais específica.
O trabalho aqui apresentado se encontra respaldado pelos postulados da
pesquisa qualitativa com características de uma pesquisa-ação, tendo como
principais instrumentos de construção dos dados as entrevistas abertas ou semi-
estruturadas, o caderno pessoal de registros, as fichas de caracterização das
crianças e as observações participantes.
É importante dizer que no processo de construção coletiva dessa experiência,
além das possibilidades vislumbradas, encontramos também problemas e desafios:
saída de algumas pessoas da equipe inicial, divergências de opiniões e de ações,
perda e recuperação da esperança, dúvidas e inquietações, mas optamos por ficar
com a melhor parte de tudo isso, que foram os momentos de realizações positivas
em prol do objetivo proposto. E são esses os momentos que vamos buscar
compartilhar a partir de agora no corpo desse trabalho, reservando o espaço das
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considerações finais para fazermos algumas referências aos percalços e desafios
que surgiram ao longo dessa trajetória.
Utilizamos ainda o espaço dessa apresentação inicial, para colocarmos um
pouco da nossa vivência como educadora.
Como professora da rede municipal de ensino da cidade do Natal desde
1989, já vivenciamos a experiência de atuarmos como professora das séries iniciais
do Ensino Fundamental; como formadora e coordenadora dos Parâmetros em Ação
de Educação Infantil; como formadora de formadores de professores
alfabetizadores, e coordenadora geral do Programa de Formação de Professores
Alfabetizadores (PROFA); formadora de professores do Setor de Educação Infantil
(SEI), da Secretaria Municipal de Educação – SME, de Natal e diretora de um Centro
Municipal de Educação Infantil – CMEI, dentre outras funções pedagógicas e
administrativas.
Em outras Instituições educacionais, como a Universidade Federal do Rio
Grande do Norte - UFRN, já atuamos como monitora da disciplina Psicologia
Educacional; como professora do Programa de Qualificação de Professores para a
Educação Básica - PROBÁSICA nas cidades de Nova Cruz, Arês e Macaíba; como
docente também em cursos de aperfeiçoamento e extensão nas áreas de Educação
Infantil e Educação de Jovens e Adultos, bem como ministrante de disciplinas
vinculadas a alfabetização e letramento na Especialização em Educação de Jovens
e Adultos promovida por esta universidade em parceria com a SME -Natal, no biênio
2006/2007.
Ainda no biênio 2006/2007 atuamos como professoras do Departamento de
Educação dessa mesma Instituição de Ensino Superior, ministrando as disciplinas
de Fundamentos da Educação Infantil, Prática Pedagógica na Educação Infantil,
Alfabetização na Educação Infantil e Oficinas Pedagógicas de Educação Infantil,
todas do núcleo temático dessa modalidade de ensino, no curso de Pedagogia.
É a partir, então, não apenas dessa nossa trajetória de 18 anos como
educadora, mas da nossa própria trajetória como seres humanos, produto e
produtores de história e de cultura, influenciando e sendo influenciada por todos os
que conosco interagem e convivem, que ousamos compartilhar, através dessa tese,
essa experiência de construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I,
vivenciada coletivamente por ocasião da criação do Centro Municipal de Educação
Infantil Profª Carmem Maria Reis – CMEICAR.
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INTRODUÇÃO
21
INTRODUÇÃO
Para quem ousa inovar, o processo de conhecimento não é linear.
Marisa Del Cioppo Elias.
Nesse trabalho, o nosso objeto específico de estudo é a relação da família
com a Instituição de Educação Infantil - I.E.I. Porém, como o lócus desse estudo foi
uma I.E.I. que estava sendo criada naquele momento, numa perspectiva de práxis
participativa – e nós participamos ativamente de todo esse processo inicial de
implantação e sistematização da mesma; nos propomos aqui a descrever e refletir,
também, no decorrer desse trabalho, sobre alguns outros aspectos e procedimentos
iniciais desse processo, na certeza de que estão todos interligados:
Uma pedagogia centrada na práxis de participação procura responder à complexidade da sociedade e das comunidades, do conhecimento, das crianças e de suas famílias, com um processo interativo de diálogo e confronto entre crenças e saberes, entre saberes e práticas, entre práticas e crenças, entre esses pólos em interação e os contextos envolventes. Por essa razão, é um modo de fazer pedagogia mais complexo do que o modo transmissivo. (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e PINAZZA, 2007, p.15)
Figura 1 – Práxis Participativa
Comunidade
Funcionários
Professores Práxis
Participativa
Crianças
Gestão
Famílias
Equipe Técnica
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Assim sendo, apesar do nosso objetivo geral ser descrever e refletir sobre a
construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do
compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de
criação de um Centro Municipal de Educação Infantil - CMEI, no decorrer desse
trabalho, mesmo tendo clareza de que não daremos conta da totalidade de todo
esse processo de construção da práxis participativa no interior da Instituição,
vamos enfocar alguns aspectos da mesma.
Porém, buscando sempre privilegiar o nosso objeto específico delimitado para
esse estudo, que é a relação entre família e I.E.I., até mesmo porque “Quase todas
as pesquisas realizadas sobre a qualidade da escola destacaram que a participação
dos pais é um dos fatores que diferenciam as escolas eficazes das ineficazes”
(MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.128).
Em relação a essas pesquisas realizadas sobre a relação das famílias com as
instituições educativas, sabemos que:
As pesquisas realizadas sobre a influência da participação dos pais na escola podem ser organizadas em dois blocos principais: as que estudam o papel do ambiente familiar e as que analisam as conseqüências dos programas que envolvem os pais nas escolas (MARCHESI e MARTÍN, 2003, p.128)
A nossa experiência se insere no segundo bloco proposto pelos autores
acima citados, considerando que a proposta da mesma é que a Instituição educativa
busque a participação das famílias em atividades do seu cotidiano, objetivando a
discussão e o compartilhamento de ações de cuidado e educação a serem
realizadas com as crianças.
Dessa forma, iniciando esse processo de construção da descrição reflexiva da
experiência vivenciada, vamos dividir essa introdução em dois momentos que,
embora distintos, se entrelaçam e se complementam em busca do alcance do
objetivo proposto. No primeiro momento, vamos apresentar a relevância que
conseguimos perceber na temática proposta, bem como retratar um pouco do nosso
envolvimento com ela; no segundo, vamos discutir acerca de algumas concepções
importantes que norteiam o desenvolvimento da mesma, para depois podermos
visualizar a organização de todo o corpo dessa tese.
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I - Apresentando a temática. Escrever já é, por si só, uma tarefa complexa – na medida em que precisamos
sistematizar e colocar num espaço já predeterminado, com regras estabelecidas á
priori – linguagem escrita, gramática, coesão, coerência textual -- idéias, sonhos e
até devaneios que, nascidos no domínio do pensamento e da imaginação – mesmo
que a partir de experiências concretas, são livres e despojados de qualquer medida
e tamanho, desconhecendo obstáculos e limites.
Escrever novamente sobre um mesmo tema – esta realmente uma tarefa
bastante desafiadora! Além da complexidade acima descrita, ainda podemos
incorrer no equívoco de nos tornarmos enfadonhas e repetitivas. Porém vamos
aceitar este grande desafio, encorajadas e alentadas pelas sábias palavras do
inesquecível Mestre e Educador Paulo Freire (1921 - 1997):
Não creio, porém, que a retomada de problemas entre um livro e outro e no corpo de um mesmo livro enfade o leitor. Sobretudo quando a retomada do tema não é pura repetição do que já foi dito. No meu caso pessoal retomar um assunto ou tema tem que ver principalmente com a marca oral da minha escrita. Mas tem que ver também com a relevância que o tema de que falo e a que volto tem no conjunto de objetos a que direciono minha curiosidade. Tem que ver também com a relação que certa matéria tem com outras que vêm emergindo no desenvolvimento da minha reflexão (FREIRE, 1996, p. 14)
Poderíamos acrescentar que, escrever sobre um mesmo tema, tem também a
grande relevância de nos proporcionar a oportunidade de aprofundarmos a reflexão
em torno de uma mesma problemática, buscando novos caminhos - e refazendo
alguns, na tentativa de vislumbrar, sobre um outro prisma, paisagens antes
apreciadas de forma apressada, unilateral e incompleta. Essa é a nossa proposta,
ao encararmos este mesmo e novo desafio!
Dessa forma, vamos retornar à temática da relação da família com a I.E.I.,
relembrando um pouco a nossa trajetória com o tema.
Na nossa prática enquanto educadora, sempre nos chamou muito à atenção
esta relação, principalmente nas Instituições de Educação Infantil. Essa chamada
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de atenção se deve ao fato de compreendermos que, uma relação participativa entre
a família e a escola é fundamental para o sucesso da grande responsabilidade
formativa que estas duas instituições possuem no seio da nossa sociedade.
Nos reportamos de forma mais específica a esta relação nas instituições de
Educação Infantil, exatamente pela faixa etária das crianças que freqüentam estas
instituições – 0 a 6 anos, ser apontada pela grande maioria dos estudiosos da
psicologia, antropologia, educação e outras ciências, como a mais propícia para a
aprendizagem e o desenvolvimento humano.
Assim sendo, desde que ingressamos na especialização do Programa de Pós
Graduação em Educação - PPGEd da UFRN, em 1999, e no mestrado desta mesma
Instituição em 2002, tivemos a preocupação de aprofundar os estudos nesta área.
Para tanto, realizamos duas pesquisas de campo, sendo a primeira numa creche,
vinculada a Secretaria Municipal de Trabalho e Ação Social (SEMTAS), e a segunda,
num Centro Municipal de Educação Pré-escolar, vinculado a SME.
Essas duas pesquisas contribuíram muito para aumentar a nossa curiosidade
científica em torno da relação família e Instituição de Educação Infantil, apontando o
quanto ela ainda precisa ser discutida e estudada. Outra grande contribuição, foi no
sentido de nos fazer perceber que esta relação pode acontecer de várias formas,
nas diferentes instituições, de acordo com as propostas e o nível de entendimento
das pessoas que formam as mesmas, como também a partir das compreensões e
necessidades das famílias envolvidas no processo.
Conscientes das diversas possibilidades e formas sobre as quais esta relação
família e I.E.I. pode acontecer, já no nosso projeto de tese, elaborado para a
tentativa de ingresso no nível de doutorado da Pós-graduação em Educação, nós
identificamos duas situações, ou dois níveis dessa relação, encontrados nas I.E.I.
nas quais já atuamos. Apontamos também uma terceira situação, ou nível que,
embora ainda não tenhamos encontrado na prática das Instituições que
conhecemos, entendemos como sendo uma outra possibilidade viável para esta
relação, objetivando que a instituição de Educação Infantil e a família, possam
compartilhar as ações de cuidado e educação, indispensáveis a criança dessa faixa
etária, através de um trabalho formativo com essas famílias que precisa ser
desenvolvido pelas instituições educativas.
A primeira situação, ou o primeiro nível que identificamos, é o daquelas
instituições que mantém uma relação com a família dos alunos, pautada, mesmo
25
que de forma inconsciente, na necessidade de preservação do espaço físico da
instituição. Ou seja, os familiares, sob solicitação da direção ou coordenação da
Instituição, e por não terem outro lugar para deixar as suas crianças, prestam
serviços gratuitos, como marceneiros, encanadores, eletricistas, pedreiros e etc,
para que seus filhos possam freqüentar estes espaços, que, na maioria das vezes,
carecem de recursos e manutenção por parte dos órgãos públicos.
Uma segunda situação, ou nível, por nós identificado, é o daquelas
instituições que conseguem manter uma relação de cordialidade, interação e troca
com as famílias dos alunos, no sentido de conhecer quem é este aluno, as situações
vivenciadas por ele na família, de escutar os anseios dos pais, de discutir alguns
aspectos dos processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, enfim,
uma relação recíproca de respeito, aceitação e diálogo, embora esse diálogo e
essas discussões não sejam sistematizadas em torno de um objetivo claramente
definido e que tenha relação com as ações de cuidado e educação que devem
permear o trabalho realizado com a criança pequena.
E a terceira situação ou nível, este, como já dissemos, ainda no campo das
nossas conjecturas e nas propostas e experiências de autores como Marques
(1999); Bassedas; Huguet e Solé (1999); Bhering e Blatchford (1999), dentre outros,
seria um nível de relação mais profunda, orientada por um trabalho dirigido,
sistemático, onde as instituições educativas trariam para si a função de organizar
junto ás famílias, a discussão de conhecimentos, valores, crenças, expectativas, em
torno das necessidades de cuidado e educação que as crianças da Educação
Infantil precisam, para que pudesse haver um compartilhamento real e efetivo do
trabalho destas duas grandes instâncias formativas junto à criança, buscando
atender o que propõe a própria Lei de Diretrizes e Bases - LDB:
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até os 6 anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL,1996)
É importante frisar que, embora consideremos esta terceira situação como
uma proposta bastante interessante e produtiva, no sentido das contribuições
26
positivas que pode trazer para os processos de cuidado e educação das crianças,
não podemos deixar de considerar a relevância das outras duas situações
apresentadas – e a de tantas outras que permeiam a realidade das diversas
instituições do País, pelo fato de sabermos que cada instituição, cada criança, cada
infância e cada família, possuem as suas peculiaridades que, com certeza, acabam
influenciando e até mesmo definindo, o tipo de relação possível, num determinado
momento e numa determinada realidade.
O mais importante é que esta relação exista; tanto a família, quanto a
Instituição de Educação Infantil reconheçam a relevância da mesma e busquem
caminhos para realizá-la e vivenciá-la de forma que haja benefícios para todos os
envolvidos, principalmente as crianças, que devem ser o motivo maior e principal do
estabelecimento da mesma, até porque:
É preciso realçar aqui que o envolvimento dos pais com a escola e a educação escolar é um processo (projeto) que se desenvolve á medida que as necessidades vão sendo identificadas e as pessoas envolvidas vão se aproximando e se conhecendo mais. Este processo-projeto tem, basicamente, um caráter flexível e móvel. Anda sempre em direção à necessidade de todas as partes envolvidas, e, principalmente, em favor das crianças (BHERING & BLATCHFORD, 1999, p. 204)
Partindo dessas questões inicialmente elencadas, bem como de outras que
serão apresentadas e explicitadas ao longo dessa tese, foi que nos propomos a
construir este trabalho com o objetivo de, como já anunciamos anteriormente,
através dos postulados da pesquisa-ação, descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil.
O problema que nos propomos, a partir do objetivo apresentado é: é possível que juntos – direção, equipe técnica-pedagógica, professoras e funcionários, construam, no contexto de surgimento de uma I.E.I., uma relação com as famílias, objetivando o compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças?
27
Embora considerando que no capítulo 3 vamos nos deter, de forma mais
detalhada, numa reflexão sobre a história das funções da Educação Infantil e sobre
esta função na atualidade, entendemos pertinente, neste momento, dizer, mesmo
que de forma sintética, o que compreendemos como educar e cuidar.
Em primeiro lugar, compreendemos que são duas ações indissociáveis:
ninguém educa sem cuidar, nem cuida sem educar, embora didaticamente, até para
facilitar mais a compreensão, se costume dizer que as ações de cuidar estejam mais
relacionadas à preocupação com o bem estar físico: sono, alimentação, higiene;
bem como com a organização de espaços, tempos e materiais a serem usados
pelas crianças, porém sem esquecer de considerar os outros aspectos do
desenvolvimento infantil: emocional, psicológico, motor, social...
Já as ações de educar, devem estar mais voltadas para a ampliação do
conhecimento de mundo dessas crianças, sem esquecer de tomar o conhecimento
prévio delas como ponto de partida, valorizando o universo cultural das mesmas e
colocando estas culturas e os conhecimentos que elas possibilitam, bem como
aqueles que são construídos e reconstruídos nas interações vivenciadas no
cotidiano da instituição infantil, como campo central do currículo a ser trabalhado
nessas instituições.
Realizadas estas considerações iniciais sobre educar e cuidar, vamos
retomar a nossa fala sobre a temática em estudo. Como já dissemos no início dessa
introdução, estamos retomando um tema que já foi nosso objeto de estudo em
outros momentos e sobre o qual já realizamos duas pesquisas de campo e
produzimos dois documentos acadêmicos – uma monografia e uma dissertação,
além de alguns outros artigos e estudos.
Com base nos trabalhos e estudos já realizados, se podemos dizer que existe
um consenso hoje em torno da relação da família com a escola, é o fato da quase
unanimidade das pessoas potencialmente envolvidas nesta relação – famílias,
professores, funcionários; compreenderem e ressaltarem a relevância da mesma
para um bom encaminhamento e andamento do processo formativo das novas
gerações, embora haja, ainda, muitos desencontros e paradoxos na
operacionalização dessas relações.
Os depoimentos abaixo são fragmentos das entrevistas realizadas com
professoras e familiares de alunos da creche e da pré-escola municipal nas quais
realizamos a pesquisa para elaboração da nossa monografia e da nossa
28
dissertação, para a conclusão da especialização e do mestrado no PPGEd da
UFRN:
É importante a participação dos pais, eles precisam estar cientes do que estão fazendo na Creche com os filhos deles. Da rotina, eles precisam participar ativamente de tudo o que acontece. Precisam ter consciência das fases do desenvolvimento da criança, para poderem entender melhor o filho. ( coordenadora de creche)
É importante (a participação dos pais), porque o trabalho do pai é educar e da professora também, então é importante que eles venham na Escola para colaborar também com a professora. ( prof.ª de creche)
Eu acho importante (a participação dos pais). Primeiro porque é bom eles saberem como a gente trabalha, como os filhos passam o dia, e também porque as crianças só tem 3 ou 4 anos e é bom os pais dizerem as coisas ao professor, conversarem. ( prof.ª de creche)
A participação dos pais ajuda. As crianças que os pais participam são mais afetivas. Tem uma mãe na minha sala que é super-mãe, participa muito. Quando a gente pede alguma coisa 90% colabora, ( profª de creche)
É importante demais. A participação deles (os pais) é muito importante porque ajuda os monitores.( funcionária de creche)
Eu acho importante (a participação dos pais) para saber o que os filhos precisam, para ter cuidado com eles. (funcionária de creche)
Acho importante (a participação dos pais), porque vai participando, vai ficando por dentro, vai vendo o desenvolvimento do filho na Creche, a participação dele. ( mãe de aluno de creche)
Acho importante a minha participação na creche, porque eu acompanho como ele vai crescendo, se desenvolvendo. ( mãe de aluno de creche)
Eu acho que tem que haver cooperação da família com a escola, porque é aquela coisa: eu tô ali, olhando o dever dele, se ele fez direitinho. E no colégio também tem que ser assim: a professora ensinar direitinho, olhar o dever de casa, saber se a mãe ajudou no dever, essas coisas .(mãe de aluno da pré-escola)
A família com a escola... eu acho importante. É bom a mãe saber o que se passa na escola, e a escola saber o que se passa em casa, né? ( mãe de aluno da pré-escola)
Todos os pais tem que ter um relacionamento com a escola, não precisa ele vir só na escola quando for chamado não, pra festa ou pra reunião. Pelo menos
29
dois dia na semana é importante ele freqüentar a escola, perguntar como vai o seu filho, como o filho ta se comportando na escola, conversar com a direção, as professora, é importante sempre ele vir. ( mãe de aluno da pré-escola)
A relação família e escola é fundamental, porque é um elo importante nos primeiros anos da vida das crianças, pois a pré-escola é a base de tudo. ( profª da pré-escola)
Pelo fato do dia-a-dia da criança ser em casa precisamos nos unir a família. Para promover a unidade do trabalho ( profª da pré-escola)
Além desses atores contemporâneos acima citados, grandes estudiosos da
educação, já desde o final do século XVII, consideravam e se referiam à relevância
da família no processo educativo do indivíduo, e/ou recomendavam uma boa relação
entre estas duas instituições – escola e família, responsáveis pela educação das
novas gerações:
Que o primeiro cuidado dos filhos incumbe aos pais, poderia parecer inútil recordá-lo, uma vez que a todos os seres vivos foi concedido pelo sapientíssimo Criador, o amor pela prole, de modo que mesmo a maior parte dos animais brutos consagra a sua própria vida às suas crias (COMÊNIO, 1971, p. 200)
Em suma, importa admitir que é naturalíssimo que os filhos tenham como primeiros educadores aqueles que tiveram como pais, e que aqueles que foram autores da sua vida sejam também para eles autores de uma vida honesta, santa e feliz. No entanto, porque nem todos os pais, embora o desejem, podem, devido às suas ocupações, dispor de tempo para a educação dos filhos, contratam, à custa de pedidos e dinheiro, pedagogos e preceptores, como auxiliares da educação (COMÊNIO, 1971, p. 202) Há ofícios tão nobres que ninguém pode fazê-los por dinheiro sem se mostrar digno de fazê-los; é o caso do soldado, e também o do preceptor. Quem, então, educará meu filho? Eu já disse: tu mesmo. Não posso. Não podeis?... Arruma um amigo. Não vejo outra saída. ( ROUSSEAU, 1999, p. 26) Coadjuvemos metodicamente a acção da escola infantil, organizando em casa a vida activa dos nossos filhos. Na medida do possível, deixemos-lhes um espaço reservado; demos-lhes utensílios e materiais para os seus jogos e trabalhos; arranjemos-lhes um horário ao qual nós próprios devemos nos submeter. (FREINET, 1974, p. 80)
30
Compreendendo bastante justificada e referendada a relevância da temática,
por nós tão insistentemente estudada e retomada, vamos agora apresentar algumas
das principais idéias e concepções que nortearam o estudo da mesma:
II - Apresentando idéias e concepções.
Partindo do objeto e do objetivo proposto, bem como considerando todo o
contexto de implantação e sistematização do Centro Infantil no qual realizamos o
nosso trabalho, entendemos pertinente, ainda nessa introdução, apresentarmos
algumas concepções que, direta ou indiretamente, subsidiaram teoricamente a
realização da nossa proposta, dentre as quais vamos privilegiar as seguintes:
Figura 2 – Referenciais Norteadores
Além das concepções apresentadas acima, as concepções de criança e
infância, dentre algumas outras, também são muito importantes para o nosso
trabalho. Porém, até mesmo para poder aprofundá-las mais, optamos por discutir as
mesmas no capítulo 3. Dessa forma, iniciaremos o nosso diálogo agora refletindo
sobre a conjuntura social-econômica-histórica-cultural-política-ideológica que nos
rodeia, buscando situar e refletir sobre a mesma, a partir da seguinte afirmação:
Embora a incerteza faça parte intrínseca do mundo que vivemos, embora seja parte do presente, há sociedades e povos inteiros que não estão preparados para enfrentá-la. Não há nada seguro sob o
Currículo
Família
Conjuntura Atual
Instituição De Ed. Inf.
Desenvol-vimento Inf.
Educação
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sol: encontramo-nos diante de uma nova forma de ver o tempo, o poder, o trabalho, a comunicação, a relação entre as pessoas, a informação, as instituições, a velhice, a solidariedade (IMBERNÓN, 2000, P.19)
Na realidade, sabemos que, uma nova forma de ver o tempo, faz parte das
mudanças sociais, dos chamados novos tempos que vão surgindo, porém, a grande
maioria - tanto das instituições, quanto das pessoas na atualidade, não estão
preparadas para as mudanças e as transformações, e acabam não percebendo que,
até mesmo pelas conquistas da tecnologia, essas novas formas de visão vão
mudando rapidamente, embora dentro de um grande paradoxo, que é o fato dessas
novas tecnologias não serem acessíveis a todos, muito pelo contrário – é uma
minoria de privilegiados que se beneficiam das mesmas, enquanto a grande maioria
não tem acesso nem a chamada satisfação das suas necessidades básicas –
alimentação, moradia, saúde.
Ou seja, vivemos em um momento da nossa história em que a desigualdade
social, econômica, cultural, política; paralela a rapidez das mudanças – inclusive dos
valores e das tradições, e o incentivo ao consumismo, paradoxalmente, parece ser o
ponto de convergência, o lugar comum, a forma mais adequada de caracterizar a
sociedade contemporânea.
Embora seja importante frisar também que, no meio dessa situação eclodem
as contradições próprias dos momentos de transição, que já apontam, conforme nos
elucida BOFF (2003), para a necessidade de uma ética do cuidado, voltada para a
compaixão e a solidariedade, como forma de preservação da própria vida no
planeta.
Sintetizando, podemos dizer que vivemos um momento de transição, onde o
grande e rápido crescimento das tecnologias, precisa ser ancorado em bases éticas
e morais sólidas, para que a exclusão social, possa dar lugar a uma solidariedade
capaz de propiciar a continuidade da vida no planeta terra. São essas questões e
necessidades de mudança, muitas vezes imperceptíveis pela grande maioria das
pessoas, que precisam ser elucidadas.
E a educação, que lugar ocupa nessa sociedade contemporânea,
informacional, globalizada, desigual e consumista? E que contribuições pode
oferecer no sentido de modificar esta realidade?
32
A educação, representada pelas instituições escolares, continua sendo
protagonista do seguinte embate: “um dos debates mais insistentes e repetidos em
torno da instituição escolar sempre foi a questão de evidenciar se o seu papel era
“reprodutor” ou “transformador”, isto é, se contribuía para conservar a sociedade, ou
para mudá-la” (ENGUITA, 2004, p.13)
Compreendendo a educação como uma práxis social multifacetada, e tendo
clareza de que, conforme nos aponta o autor acima citado, ela é reprodutora, na
medida em que nenhuma sociedade poderia subsistir sem formar seus membros em
certos valores, habilidades, etc., mas, ao mesmo tempo, é transformadora,
considerando que nenhuma sociedade atual seria, sem a escola, o mesmo que
chegou a ser com ela, é que nos propomos a investir nesse caráter transformador da
educação escolar, buscando aliá-lo também as possibilidades educativas da família,
como uma forma de não nos distanciarmos da seguinte assertiva: “Educar é a mais
avançada tarefa social emancipatória”. (ASSMANN, 2007, p. 26)
Porém, para que a educação promova realmente a emancipação da
sociedade, é preciso que se perceba a profundidade e complexidade da mesma, ou
seja, seu caráter multifacetado, fazendo um investimento planejado e mais amplo no
âmbito social, econômico, político, ético, moral, e também um investimento que
podemos denominar de pedagógico, não apenas no âmbito do conhecer, mas nos
vários aspectos que constituem a totalidade do ser humano, pois, na realidade: “A
sociedade informacional requer uma educação intercultural quanto aos
conhecimentos e aos valores, assim como a vontade de corrigir a desigualdade das
situações e das oportunidades. ” (FLEXA & TORTAJADA, 2000, p. 27), e é por essa
educação que precisamos trabalhar, tendo clareza de que:
A educação tem um papel por si mesma no desenvolvimento das pessoas, em seu enriquecimento cultural e no progresso de seus conhecimentos. A educação deve contribuir também para a igualdade de oportunidades de todos os alunos, procurando compensar as desigualdades de origem social. No desenvolvimento desses objetivos, a educação influi na orientação das mudanças sociais e econômicas (MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.13).
33
Nesse sentido, uma contribuição que consideramos importante de ser
valorizada, é a proposta dos quatro pilares da educação (DELORS, 2003): aprender
a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver.
Compreendemos que a consideração e valorização dessa visão mais
abrangente de educação, onde o educando é visto na sua totalidade e unicidade,
sendo incentivado não apenas a conhecer, mas a agir concretamente sobre o meio
que o circunda, num processo de interação e cooperação com o outro, a partir de
uma construção de valores e crenças interiores, é fundamental, tanto para a
proposta que nos propomos a vivenciar, como para o redimensionamento da
educação de forma geral, trazendo mudanças positivas para o próprio contexto
social vigente.
É preciso, portanto, que a educação cumpra esse papel emancipatório,
contribuindo para que essa conjuntura de incertezas, mudanças e transição, possa
dar lugar a uma conjuntura mais ética, mais humana, menos excludente.
Nesse sentido, colaborando e complementando, as proposições dos autores
acima citados, nós compreendemos que a seguinte afirmativa:
Ganha força, hoje em dia, o pressuposto de que a educação não pode mais ficar limitada aos muros escolares, mas deve se estender ao bairro e à comunidade aos quais atende, incluindo as relações com as famílias dos estudantes e as demais pessoas que convivem no entorno. Sem abrir mão de suas especificidades como instituição responsável pela educação entende-se que a escola deva estar em contato direto com seu entorno e com aqueles que ali vivem, de forma que a comunidade participe, dentro de suas condições e responsabilidades, dos processos educativos. Isso ajudará na construção desse ambiente ético de que estamos falando. (ARAÚJO, 2007,p.56)
é uma das propostas viáveis de operacionalização de uma primeira mudança
positiva, em prol de uma educação emancipatória. Acreditamos que a experiência
descrita nesse trabalho, aponta as possibilidades de implantação dessa proposta.
Assim sendo, nos perguntamos: e a família, que posição ocupa nesse atual
contexto, e que possibilidades apresenta para contribuir com as mudanças acima
propostas?
34
A família, principalmente após os estudos de Marx (1818 - 1883) e Engels
(1820 - 1895), quando passou a ser compreendida como uma construção sócio-
histórica, vivencia também todo esse contexto de incertezas e mudanças, embora
continue a ser reconhecida como “o grande fundamento da sociabilidade humana”
(MORAES, 2001, p.17), sendo também universalmente reconhecida:
Todas as sociedades reconhecem a existência de certas unidades cooperativas, intimamente entrelaçadas e internamente organizadas, que ocupam lugar intermediário entre o indivíduo e a sociedade total de que ele faz parte. ( LINTON, 1976, p.165)
Ou seja, mesmo que com estruturas diferentes e variadas, a família é uma
instituição que faz parte da vida do indivíduo desde tempos imemoriais, o que, por si
só, já aponta a relevância dessa instituição para os seus integrantes, e para a
sociedade de um modo geral.
Outro ponto fundamental a ser considerado quando nos reportamos a família,
é o fato da sua estrutura se modificar a partir do contexto social, econômico e
político, bem como dos valores de cada época e de cada sociedade, sem deixar de
considerar que, em uma mesma época, numa mesma sociedade, no seio das várias
classes sociais, podemos encontrar também estruturas familiares variadas, embora
sempre exista uma estrutura predominante em cada momento histórico.
Todas essas contingências e variáveis, nos levam a concordar que:
O termo família, do ponto de vista científico, é extremamente difícil de definir, particularmente nos tempos pós-modernos. A idéia de pós-modernidade, caracterizada pelo rompimento com visões universalistas e pela busca da descentralização de modelos predeterminados (Vaitsman, 1994), tem caracterizado a ciência de modo geral , e, consequentemente, a psicologia da família. Essa idéia teve implicações importantes para o conceito e a caracterização de família, em diferentes enfoques disciplinares. (DESSEN & COSTA JUNIOR , 2005, p.116)
Dessa forma, é importante registrar que o que estamos compreendendo como
família no trabalho que nos propomos a realizar, são aqueles agrupamentos de
35
pessoas que, independente de estrutura ou de vínculos consangüíneos, vivem e
convivem num mesmo ambiente doméstico, interagem e se relacionam entre si –
enquanto adultos, e com as crianças pelas quais são responsáveis, direta ou
indiretamente; num processo constante e permanente de influência mútua, que faz
da família a primeira instituição responsável, tanto pela sobrevivência, como pela
formação da personalidade e dos valores que o indivíduo começa a construir nas
suas interações iniciais com o contexto no qual está inserido, e com as pessoas que
o rodeiam.
Outro ponto fundamental a ser considerado em relação à família é que, tenha
ela a estrutura que tiver, a mesma possui um papel fundamental na formação do
indivíduo, papel esse que é diferente do exercido pela instituição de Educação
Infantil, embora o trabalho de uma, deva complementar o trabalho da outra.
Porém, para que esse trabalho de complementaridade de ações aconteça,
além dessas mudanças propostas acima para á educação, é preciso que as famílias
se reinventem, pois essa reinvenção “[...] se trata de um processo necessário para
transformar quase toda família ‘tradicional’ em uma família capaz de lidar com as
condições da pós-modernidade e até de florescer nelas.” (MARSHALL & ZOHAR
2006, p. 358)
Segundo ainda esses mesmos autores, principalmente dois níveis da vida
familiar, que embora diferentes, estão relacionados, precisam ser reinventados:
inicialmente a questão do significado da família, que passa pela questão dos
fundamentos morais e espirituais, tanto do relacionamento íntimo do casal, quanto
das relações entre estes e os filhos. Depois o problema da estrutura da família, que
é a questão de como ela se organiza para enfrentar os desafios cotidianos da
cooperação, do compromisso, do poder e da autoridade entre os seus membros.
Ou seja, é preciso que se repense as relações dentro e entre as famílias,
buscando um ponto de convergência, um ponto de união, de encontro, que leve
cada um dos seus membros a deixar as posturas mais narcisistas em prol de
posturas mais coletivas, mais abrangentes, mais éticas e mais humanas,
entendendo as suas próprias famílias como parte integrante de uma rede maior de
relações, capaz de influenciar e transformar as relações do seu entorno e de toda
uma coletividade.
Considerando que Marshall e Zohar (2006) apontam ainda que muitas vezes
as famílias atuais, a partir das transformações pelas quais vem passando, se
36
encontram vinculadas socialmente apenas pela escola dos filhos e por alguns
poucos amigos, compreendemos que a instituição escolar, mesmo sem perder de
vista a sua grande responsabilidade com a construção do conhecimento junto às
novas gerações, precisa colaborar também com as famílias, incentivando o
compartilhamento de ações educativas, a partir de uma proposta de diálogo e
interação com as mesmas.
No tocante as Instituições de Educação Infantil, sabemos que as mesmas
surgiram depois das escolas destinadas às crianças maiores de 7 anos –
aproximadamente no século XVIII, a partir da revolução industrial, como
conseqüência do ingresso da mulher no mercado de trabalho, do surgimento de uma
nova estrutura familiar: a conjugal ou nuclear, composta por pai, mãe e filhos; como
também das idéias de especialistas que passaram a estudar mais as crianças,
embora a grande maioria defendesse a idéia de que as crianças precisavam dessas
instituições – principalmente as das classes menos favorecidas, para vencer as más
inclinações que lhes eram atribuídas, mais notadamente a preguiça e a
vagabundagem, conforme nos afirma Bujes (2001).
Como podemos perceber, estas instituições já nascem entrelaçadas a
instituição família, considerando que as mudanças que ocorreram na estrutura
familiar nesse período, favoreceram o surgimento das instituições infantis, sendo
determinantes até para as funções assumidas pelas mesmas que, neste momento
inicial, era de guardar/cuidar das crianças cujas mães trabalhavam fora de casa,
sendo muito mais um direito dessas mães trabalhadoras, do que das próprias
crianças.
E hoje, no Brasil, como está a Educação Infantil, cujo atendimento surgiu no
contexto acima apresentado?
No Brasil, é impossível negar que a Educação Infantil obteve várias
conquistas, principalmente no âmbito da legislação. A constituição de 1988,
colocando a Educação Infantil como direito da criança e dever do Estado; o Estatuto
da Criança e do Adolescente - ECA, sistematizando e legislando sobre aspectos
específicos dos direitos das crianças e dos adolescentes; a LDB 9394/96, alçando a
Educação Infantil à condição de primeira etapa da Educação Básica, além do próprio
crescimento do número de vagas nesta modalidade de ensino nos últimos 30 anos,
conforme aponta Didonet (2002), são algumas dessas conquistas, que, mesmo não
37
tendo sido ainda aplicadas na prática em sua totalidade, e apresentando até
algumas contradições, não podem deixar de ser comemoradas.
Por contradições estamos entendendo o fato de, por exemplo, apesar de,
desde 1988, a Educação Infantil ser dever do estado, o mesmo não ser intimado
legalmente a matricular toda a demanda existente. O fato também de, mesmo
considerada como primeira etapa da Educação Básica, a Educação Infantil não ter
sido incluída no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
de Valorização do Magistério - FUNDEF – fundo proposto pelo governo federal que
beneficiou, como o próprio nome já aponta, apenas o Ensino Fundamental. Outro
fato contraditório é que, enquanto quase 90% das crianças das classes mais
favorecidas da sociedade, freqüentam uma instituição pré-escolar privada, menos de
50% das crianças das classes populares, tem acesso a uma instituição pública de
Educação Infantil, por ausência de vagas nas mesmas, conforme aponta Didonet
(2002).
No tocante a função proposta para a Educação Infantil na atualidade, também
percebemos que aconteceram muitos avanços, deixando-se aquela postura mais
guardiã e assistencialista, e propondo-se uma Educação Infantil que tenha a função
de cuidar e educar, compreendendo estes dois aspectos como indissociáveis e
complementares no dia-a-dia da instituição infantil.
A própria literatura na área da Educação Infantil avançou muito na discussão
sobre os aspectos pedagógicos dessa modalidade de ensino. Até aproximadamente
o final da década de 80, a maioria dos autores escrevia para externar a importância
da Educação para a primeira infância, numa tentativa de sensibilizar, principalmente
os gestores e legisladores públicos, para a preocupação e o atendimento a essa
demanda.
Já na década de 90, as preocupações se voltam para os aspectos
pedagógicos, as especificidades do trabalho com a criança nas instituições de
Educação Infantil. Este também é um grande avanço que precisamos registrar e
comemorar. Porém é inegável que muitas questões ainda precisam sair do papel,
para se consolidarem no cotidiano, principalmente das crianças das classes
populares e dos seus familiares.
Acreditamos que o atual Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica - FUNDEB, que entrou em vigor a partir de março de 2007,
objetivando financiar e garantir toda a Educação Básica, e portanto, também, a
38
Educação Infantil, trará grandes benefícios para esta modalidade de ensino, na
medida em que garantirá o financiamento da mesma, originando recursos para o
investimento dos municípios.
Porém, sabemos que além dos recursos a serem investidos em construção,
equipamentos e manutenção das instituições de Educação Infantil, é necessário e
imperioso, um investimento também na formação dos profissionais que irão trabalhar
com as crianças, tanto formação inicial com caráter específico, quanto formação
continuada e em serviço, para que as especificidades das crianças e das funções de
cuidar e educar as mesmas, sejam conhecidas, debatidas e trabalhadas no cotidiano
das instituições infantis, na busca de promover o desenvolvimento integral das
crianças, complementando a ação da família e da comunidade, conforme preconiza
a LDB 9394/96, ou seja, é preciso que se saiba que:
Falar em professor de educação infantil é diferente de falar em professor de séries iniciais e isso precisa ser explicitado para que as especificidades do trabalho dos professores junto às crianças de 0 a 6 anos em instituições educativas sejam respeitadas. (CERISARA, 2002,p.113)
Outro aspecto que também merece ser considerado, além desse maior
investimento na formação dos professores da Educação Infantil, é um investimento
na melhoria salarial e nas condições de trabalho desses profissionais, o que vai
contribuir, com certeza, para a valorização social da profissão, aumentando a auto-
estima dos professores e, consequentemente, melhorando também a qualidade do
trabalho realizado com as crianças.
Por fim, retomando a questão principal que norteia o nosso trabalho - e a
relação família e Instituição de Educação Infantil, como acontece na
contemporaneidade?
Com base tanto nos estudos, artigos e pesquisas divulgados, quanto na
nossa própria experiência de pesquisadora da temática e de formadora de
professoras dessa modalidade de ensino, podemos afirmar que, infelizmente, essa
relação não anda muito bem, com várias queixas de ambas as partes: a instituição
reclama que os pais não comparecem, não se interessam pela vida escolar dos
filhos e querem delegar a escola responsabilidades e funções que seriam
39
específicas da família; a família por sua vez, reclama que a escola não cumpre seu
papel, não ensina, não educa, e só busca a família para fazer reclamações relativas
a procedimentos e desempenhos negativos dos seus filhos.
Embora esta seja basicamente a tônica da relação família e instituições
educativas na atualidade – fruto, obviamente, de todas as transformações pelas
quais estas instituições vem passando, é inegável que nas contradições próprias da
dialética dos momentos de transição, já existe também uma preocupação, por parte
de algumas pessoas que formam estas instituições – tanto a família, como a escola,
no sentido de procurar caminhos para mudar esta realidade, por já compreenderem,
como nós, que estas duas instituições formativas da nossa sociedade, precisam ter
funções complementares para darem conta da responsabilidade educativa que
possuem.
Responsabilidade educativa esta que, a nosso ver, precisa ser cada vez mais
compartilhada, considerando que, com a descrença em relação ás teses
exclusivistas e reducionistas, tanto do inatismo, quanto do behaviorismo, sabemos
hoje que o desenvolvimento humano se dá num contexto, numa perspectiva de
interação, influenciado por inúmeros determinantes e podendo se orientar em
múltiplas direções, mas principalmente, a partir das relações iniciais que acontecem
no seu contexto social mais intimo, pois:
Desde os primeiros dias de desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é produto de um processo profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. ( VIGOTSKI, 1999, p.40)
Partindo então desses pressupostos interacionistas sobre o desenvolvimento
infantil, percebe-se a necessidade de uma ampla conexão interativa entre os adultos
que compõem esse seu ambiente, constituintes da história social que rodeia a
criança, e, portanto, também da sua história individual, considerando as inter-
relações entre ambas, o que aponta também para a implementação de um currículo
que seja criado a partir do que é produzido na interação educacional, e não em
40
conhecimentos preexistentes, conforme nos aponta Bujes (In: CRAIDY;
KAERCHER, 2001), currículo este, capaz de impulsionar as I.E.I a uma relação
cada vez mais próxima com a cultura dos seus integrantes e, portanto, buscando
compartilhar com a comunidade e as famílias, ações de cuidado e educação das
crianças.
Essas são algumas das principais concepções e questões que envolvem a
nossa compreensão sobre a temática, e que nortearam também a experiência aqui
descrita.
Com o objetivo de tornar a descrição dessa experiência mais clara e objetiva,
incentivando os que se dispuserem a conhecê-la através da leitura dessa tese, e
tendo clareza também de que o conhecimento não é linear, conforme aponta
Elias(2000), compreendemos que esse nosso trabalho se assemelha a uma longa
viagem, onde os caminhos não estão previamente traçados - Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais; caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar - precisando ser abertos a partir da certeza do lugar onde se quer chegar
– considerando a decisão coletiva de todos os viajantes; e utilizando como
parâmetro, também, as experiências adquiridas em outras viagens. Dessa forma,
dividimos a mesma, a partir de agora, em cinco capítulos assim intitulados e
organizados:
No capítulo 1, intitulado Revisitando caminhos já percorridos em busca de novas paisagens, retomamos algumas considerações em torno de experiências
anteriores com a mesma temática – monografia e dissertação, buscando, através
dessas experiências construídas em viagens anteriores, estabelecer relações que
nos possibilitem elencar alguns pontos de partida para os caminhos que nos
propomos a construir nesse momento.
No capítulo 2, intitulado Construindo diretrizes para novos caminhos,
caracterizamos os outros viajantes que se aventuraram conosco em busca de novos
caminhos, bem como os instrumentos e possibilidades de que nos utilizamos –
procedimentos e instrumentos metodológicos, para a vivência dessa empreitada,
explicitando os detalhes da mesma.
No capítulo 3, intitulado Buscando caminhos do passado, para construir o futuro, enveredamos por caminhos já trilhados e percorridos por viajantes que nos
antecederam – história da criança, da infância, das I.E.I., e das famílias, buscando
no passado, elementos para compreender o presente e vislumbrar o futuro.
41
No capítulo 4, cujo título é Apresentando caminhos trilhados, mostramos a
trajetória inicial da nossa viagem, bem como os caminhos que foram possíveis de
serem trilhados com cada um dos segmentos de viajantes que conosco interagiram
– professoras, funcionários, crianças e famílias.
No capítulo 5, intitulado Descrevendo e refletindo sobre os caminhos percorridos, descrevemos pormenores das construções de alguns caminhos,
analisando-os, a partir da ótica dos viajantes mais diretamente envolvidos – as
famílias.
Finalmente, a guisa de considerações finais, vamos buscar algumas sínteses,
mesmo tendo clareza de que serão provisórias, que possam retratar a situação
vivida, e os caminhos descobertos e trilhados, com seus desafios e possibilidades.
42
CAPÍTULO 1
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1. REVISITANDO CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS, EM BUSCA DE NOVAS PAISAGENS
A educação não é um destino, mas uma construção social.
Antônio Nóvoa.
Neste capítulo, vamos voltar ao início da nossa história com este tema –
monografia e dissertação, para que, através da retomada dos objetivos e de
algumas considerações acerca desses dois trabalhos, possamos refazer a nossa
trajetória com a temática em questão, buscando elementos que nos ajudem na
construção/sistematização da experiência que nos propomos a vivenciar agora,
cientes de que educar-se e educar, são construções sociais que existem e se
renovam constantemente.
1.1 – Refletindo sobre a monografia
Na nossa monografia, realizada como já explicitamos numa creche vinculada
a Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Social - SEMTAS, o nosso objetivo foi
Identificar a possibilidade de existir uma relação entre família e Instituição de Educação Infantil, em prol do desenvolvimento da criança. Foi uma pesquisa de
natureza exploratória, onde através de observações assistemáticas e entrevistas
semi-estruturadas com coordenadora, professoras, funcionários e famílias, nós
procuramos atingir o objetivo proposto.
Foi um trabalho muito produtivo na medida em que nos possibilitou perceber o
enorme campo de investigação que se abria a nossa frente sobre a temática, bem
como a relevância da mesma para todos os envolvidos na desafiante tarefa de
formar as crianças da Educação Infantil. Esta relevância pode ser observada
através de alguns depoimentos de professores, funcionários e famílias da creche
campo do nosso estágio, apresentadas na introdução deste trabalho.
Nossas observações, e as análises das entrevistas com os sujeitos da
pesquisa nos indicaram que, embora todos os envolvidos pontuem e reconheçam a
44
relevância de uma parceria entre a família e a I.E.I, como importantes para o
trabalho educativo que precisam realizar com a criança, cada um coloca essa
parceria e essa participação, a partir do seu próprio ponto de vista:
Participam. Alguns pais, quando chegam mais cedo, ajudam na cozinha, nas salas-de-aula, trazem material que a Creche necessita para doação, outros participam na manutenção hidráulica e elétrica, nos serviços gerais e outras coisas que precisa. ( coordenadora da creche)
Os meninos que dão mais trabalho são os que os pais vem menos, os que os pais participam mais, são menos trabalhosos. Era bom que todos os pais viessem, para saber o que a creche faz com os filhos. ( Professora da creche)
Eles (os pais, no sentido masculino do termo) não participam não, quem participa são as mães, elas participam, elas colaboram nas brincadeiras, nas festas.( funcionária da creche)
Acho muito boa ( a creche). Nestes três anos foi o que ajudou bastante a gente. Não tenho família perto e não tinha com quem deixar o menino. ( mãe de aluno da creche)
Eu sempre ajudo, coloco fechaduras nas portas, tudo que a coordenadora pede eu faço. ( pai de aluno da creche)
Na época em que fizemos a análise das respostas da coordenadora, dos
professores, funcionários e pais à entrevista realizada na creche, com o objetivo de,
como já dissemos, “Identificar a possibilidade de existir uma relação entre família e
Instituição de Educação Infantil, em prol do desenvolvimento da criança”, as
considerações a que conseguimos chegar foram as seguintes:
Um primeiro fato que nos animou muito nos dados coletados, foi a
comprovação de que todos os professores, funcionários e pais entrevistados
entendem que a participação dos pais é fundamental naquela instituição de
Educação Infantil. Outro fato relevante é que todos os entrevistados também
colocaram que realmente os pais das crianças dessa instituição participam do dia-a-
dia da mesma, embora cada um coloque essa participação como sendo mais efetiva
no âmbito específico no qual trabalha, ou pelo qual são responsáveis de forma mais
direta. Por exemplo; a coordenadora ressalta mais a participação dos pais no que
45
diz respeito a manutenção física da creche e aos eventos realizados de forma mais
pontual; já as professoras valorizam mais o fato da participação dos pais melhorar o
comportamento das crianças e a relação professor-aluno; os pais já ressaltam a
participação deles da forma como percebem que atuam mais: uns contribuindo com
a manutenção da instituição, outros estando sempre presentes para trazer e levar os
filhos, outros na sala-de-aula, outros nas datas festivas e outros até se esquivando
pela falta de tempo, enfim, cada um destacando a participação de acordo com a
própria atuação e entendimento.
Entendemos que os dados colhidos na Creche foram fundamentais para a
nossa pesquisa, porque foi através deles que podemos perceber que uma parceria
com esse objetivo: o de contribuir para o desenvolvimento da criança pequena,
precisa ser muito bem discutida junto a pais e escola para que possa surtir os efeitos
esperados.
No nosso entendimento, a Creche estudada, ainda não conseguiu pontuar
muito bem esta questão e por isso fica complicado perceber nesta instituição que
contribuições efetivas a participação dos pais, que é inegável neste local, traz para o
desenvolvimento da criança, de maneira bem específica
Por outro lado, percebe-se que a instituição possui realmente um diferencial,
um ponto de partida que pode propiciar um trabalho desse jaez que é este fato da
maioria dos pais estarem sempre presentes na mesma, colaborando com a
manutenção da creche, mesmo que seja apenas quando a coordenadora solicita,
além do fato de realizar também programações sistemáticas tentando envolver os
pais. Entendemos que este é um primeiro passo porque em muitas instituições não
existe nem esta participação que nós vamos denominar de pontual. Outro ponto que
consideramos fundamental para iniciar o estabelecimento de uma parceria é o fato
de ambas as instituições, (família e creche), se mostrarem cientes da importância
dessa parceria. Nas entrevistas, tanto a coordenadora, como os pais, professores e
funcionários da creche, reconheceram a importância de um bom relacionamento
entre eles.
Entendemos que esta breve retomada deste nosso primeiro trabalho realizado
sobre a temática da relação da família com a escola, nos permite compreender que
esta é uma das formas pelas quais esta relação se estabelece – em prol da
manutenção do espaço físico, onde cada um contribui como pode, dentro das
46
limitações e possibilidades que o entendimento que possuem acerca da mesma
possibilita.
Como já dissemos anteriormente, essa é uma das formas como a relação da
família com a instituição de Educação Infantil pode se apresentar em alguns
momentos e algumas realidades. Sabendo que este tipo de relação é fruto de um
contexto e de uma contigência, que tem as suas nuances individuais, sociais,
econômicas, políticas, ideológicas e histórico-culturais, não nos cabe julgar ou
classificar, apenas analisar, a partir de outros pontos de vista, de outros olhares,
buscando contribuir com a ampliação da mesma, na medida das nossas
possibilidades.
1.2 - Refletindo sobre a dissertação
No nosso segundo trabalho sobre a temática, que teve como objetivo refletir sobre ações e estratégias realizadas pela escola, que possam contribuir para o fortalecimento da relação desta Instituição com a família do aluno,
entrevistando também gestoras, professoras, pais e funcionários, conseguimos
perceber igualmente, a unanimidade de todos em relação á relevância da relação
família e instituição de Educação Infantil, embora haja algumas diferenças na forma
como compreendem a mesma. Vejamos o que dizem gestoras e professoras:
Entendemos que a participação dos pais tem muito a contribuir para que o aluno aprenda mais. Para que o professor e o aluno façam um trabalho melhor. A parceria maior é a aprendizagem, não apenas a limpeza da escola. No momento que o pai conhece a proposta, ele pode ajudar em casa.
EXEMPLO: Uma dificuldade que os pais tem é com relação a leitura e a escrita. Colocamos a alfabetização dos pais como uma proposta. Uma professora já se propôs a dar aula aos pais. Não descartamos o pai ajudar na limpeza da escola, porém quando o pai se propõe a ajudar ao aluno, o desempenho dele é melhor.( Gestora da pré-escola)
como estamos dando prioridade a aprendizagem, os pais estão mais interessados na aprendizagem da criança. Um exemplo disso são as atividades de casa: antes era o pai ou o irmão que fazia, agora os pais estão deixando a criança fazer e estão nos dizendo que deixam que a criança faça. Porque agora
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sabem que a criança faz do jeito dela, que é diferente do jeito dos pais. ( Gestora da pré-escola)
Uma boa relação família e escola é fundamental para ajudar nos processos de aprendizagem e desenvolvimento do aluno. ( professora da pré-escola)
No tocante aos pais, todos reconheceram que a escola foi importante e
ensinou algo aos filhos, bem como a importância de participar das reuniões:
Muito boa, porque elas ensinam muito, tanto ensina pras crianças, como pra gente também nas reuniões. ( mãe de aluno da pré-escola)
-Eu acho muito importante né? Porque é essa relação que tem que haver mesmo, porque eu não vou deixar meu filho aqui ao léu. Pronto, se eu for deixar ele na casa de um parente, eu vou perguntar se ele arengou, se brigou, o que fez de errado, o que fez certo. Do mesmo jeito tem que ser na escola.Assim, porque o pedaço que ele fica em casa eu sei: toma café, assiste televisão, depois toma banho, almoça para vir pró colégio, aí eu tenho que vir saber o que ele está fazendo aqui também. Na reunião é que a gente discute, acho muito interessante as reuniões, e acho importante todos os pais comparecer. (mãe de aluno da pré-escola)
Elas são bastante assim, conversam muito com as mães, elas, até os problema da escola passam tudo pra gente.( mãe de aluno da pré-escola)
Em relação a este segundo trabalho, nossas considerações finais foram as
seguintes:
O nosso objetivo, conforme já foi explicitado, foi refletir sobre ações e
estratégias realizadas pela escola que possam contribuir para o fortalecimento da
relação dessa instituição com a família do aluno e, para isso, foi preciso também
discutir a relevância de um trabalho educativo integrado entre escola e família,
principalmente na Educação Infantil, bem como refletir sobre a família e a escola no
atual contexto sócio-econômico-cultural, buscando caminhos que se tornem viáveis
para fortalecer a integração dessas duas instituições.
A experiência no Centro Municipal de Educação Pré-escolar, subsidiou toda a
nossa reflexão na medida em que apontou caminhos para viabilizar o fortalecimento
dessa relação, nos mostrando que a mesma é possível. Acreditamos que essa
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experiência, poderá servir de estímulo á outras instituições que queiram, também,
encarar esse desafio de fortalecer sua relação com a família dos alunos.
Antes de especificarmos melhor esses caminhos apontados pela experiência
do Centro de Educação Pré-Escolar, entendemos pertinente dizer que, para nós, a
importância maior desse trabalho está na própria temática que ele traz a tona,
suscitando a oportunidade de maiores estudos e reflexões sobre a relevância do
estabelecimento/fortalecimento da relação entre duas instituições tão vitais para a
sociedade, em todos os seus momentos históricos, tais quais a família e a escola,
como também possibilitar esse estímulo a outras instituições educativas, sem
contudo ser uma receita, ou um modelo a ser seguido.
Só para retomar, as questões que nortearam esse nosso trabalho, e para as
quais buscamos algumas respostas, mesmo que provisórias, foram:
1) Quais as funções da escola e da família na atualidade?
2) É importante que a escola e a família possuam uma boa relação? Por que? 3) É possível, construir uma boa relação entre escola e família? Como?
4) Quando escola e família caminham juntas, acontecem mudanças no processo de formação das crianças? Quais?
No tocante as funções dessas duas instituições na sociedade atual,
considerando algumas discussões já iniciadas, principalmente no que diz respeito às
novas demandas formativas que a sociedade impõe à escola na atualidade, bem
como á todas as transformações pelas quais a família vem passando no seio dessa
mesma sociedade, o que nós inferimos é que, realmente, as funções dessas duas
instituições não devem ser tão diferentes, nem mesmo tão separadas ou
dissociadas, mas complementares.
Embora, seja importante relembrar que, no tocante aos processos de ensino e
aprendizagem do saber sistematizado, a tarefa é, prioritariamente, da escola,
cabendo a família porém, no intuito de complementar esse trabalho da escola,
ajudar e incentivar os filhos em casa, criando horários e momentos de estudo, bem
como valorizando a escola e o conhecimento.
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Ambas precisam assumir e discutir, em conjunto, as reais condições de cada
uma delas para atender aos interesses e necessidades das novas gerações, visando
à integração das mesmas na sociedade, ou seja, cada escola, juntamente com as
famílias dos seus alunos, precisa refletir sobre a colaboração efetiva que pode estar
oferecendo para a socialização/integração do indivíduo no contexto social do qual
faz parte, pois:
Assumir um trabalho de acolhimento às diferentes expressões e manifestações das crianças e suas famílias significa valorizar e respeitar a diversidade. Cada família e suas crianças são portadoras de um vasto repertório que se constitui em material rico e farto para o exercício do diálogo, aprendizagem com a diferença, a não discriminação e as atitudes não preconceituosas. (BRASIL, 1998. Vol I, p. 77).
Que homem precisamos formar? Não para atender aos interesses da
sociedade, no sentido de reproduzir o modelo social vigente, que é muito
excludente, mas no sentido de modificar, de mudar o que está posto, objetivando a
formação de uma sociedade mais igualitária e justa. Entendemos que é dessa forma,
observando os interesses e necessidades dos sujeitos alunos, e envolvendo as
famílias nessa discussão, que a escola vai deixar de ser “transmissora de ideologias
dominantes”, para se tornar agente de mudanças sociais efetivas.
Em relação à segunda problematização que norteou nossos estudos,
entendemos que, durante todo o percurso, ficou muito claro que escola e família
precisam caminhar juntas. Diante da grande demanda que se apresenta para a
escola hoje, de todas as mudanças pelas quais a família vem passando, bem como
pelas próprias falas de gestoras, professoras e famílias por nós entrevistadas, não
se pode mais conceber que as duas instituições responsáveis pela formação das
novas gerações, não se unam em torno desse ideal.
Portanto, buscar em conjunto diretrizes educativas comuns, que possibilitem
ao indivíduo uma reflexão e atuação crítica e responsável, objetivando tornar o
mundo globalizado menos excludente e mais igualitário, deve ser o grande objetivo
da escola e da família hoje.
As possibilidades para o fortalecimento dessa relação, principalmente no
tocante ao que cabe a escola, segundo o que aponta a nossa pesquisa, são muito
50
grandes, basta apenas que haja uma compreensão da relevância dessa relação, e
que se inicie um processo de conscientização de todos os que fazem a escola, para
que se discuta em conjunto estratégias que venham a fortalecer essa questão.
No que diz respeito ao que a escola deve fazer para fortalecer sua relação
com a família do aluno, o primeiro passo é entender e aceitar que a família pode
contribuir com o processo formativo dos filhos e que ela – escola, não consegue dar
conta sozinha das demandas que as transformações sociais estão lhe cobrando:
Cabe, portanto, às instituições estabelecerem um diálogo aberto com as famílias, considerando-as como parceiras e interlocutoras no processo educativo infantil. (BRASIL, 1998. Vol I, p. 76).
A família também, pelas bruscas mudanças que tem vivenciado na sua
estrutura, precisa reconhecer na escola a sua grande aliada no processo educativo
dos seus filhos, buscando se unir a ela para melhor desempenhar essa tarefa.
Depois de todo o percurso aqui analisado, compreendemos que essa relação
é possível: compreensão da relevância desse entendimento, união em torno desse
objetivo e boa-vontade para colocar as idéias em prática, foi o caminho trilhado pelo
Centro Pré-escolar pesquisado, com resultados positivos.
Quando falamos em resultados, não estamos entendendo que chegamos ao
final do percurso, mas que conseguimos iniciá-lo.
Aumento na frequência dos alunos, uma média de mais de 50% de presença
dos pais nas reuniões, maior interesse e participação dos pais nas atividades dos
filhos, reconhecimento, por parte dos pais, de que os filhos aprenderam muito na
escola, opinião favorável, da grande maioria dos pais entrevistados, em relação ao
trabalho desenvolvido pela escola, reconhecimento das gestoras e das professoras
de que houve uma melhoria no relacionamento da escola com a família, são, para
nós, indícios seguros de que o trabalho realizado foi positivo.
Olhando novamente para as entrevistas dos pais, percebemos que as
opiniões - em relação á forma como são recebidos e tratados na escola, a segurança
que a escola oferece as crianças, a fala clara e compreensível com que as pessoas
da escola (gestoras, professoras e funcionários), se dirigem aos pais, a preocupação
da escola em melhorar sempre o trabalho com a criança, solicitando a opinião dos
51
pais; demonstram uma coerência, uma unidade que nos permite inferir que o
trabalho realizado está sendo realmente positivo.
Assim sendo, entendemos que o objetivo maior desse nosso estudo: “refletir
sobre ações e estratégias realizadas pela escola, que possam contribuir para o
fortalecimento da relação dessa instituição com família do aluno” foi alcançado,
considerando, obviamente, todas as questões já elencadas no início dessas
considerações.
Compreendemos que esses dois estudos apontam na direção de que:
[...] quando se estabelece uma relação construtiva baseada em objetivos compartilhados, no respeito mútuo e no conhecimento do que o outro proporciona no processo educativo, cria-se um contexto mais favorável à aprendizagem do aluno, tanto na escola como na família. (MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.128)
Dessa forma, acreditando na relevância de uma relação participativa entre
famílias e instituições educativas, e a partir de alguns estudos já realizados sobre
esta temática, bem como das pesquisas efetuadas na especialização e no mestrado,
defendemos algumas teses que são importantes de serem lembradas, e que, com
certeza, serão consideradas no trabalho que nos propomos a empreender agora:
• É possível estabelecer uma boa relação entre a escola e a família, apesar das dificuldades a serem enfrentadas. • Cabe a escola dá o primeiro passo em busca de fortalecer a sua relação com a família do aluno. • Uma boa relação entre a família e a instituição de educação infantil é fundamental para a aprendizagem e o desenvolvimento da criança. • A escola e a família, embora possuindo funções específicas, possuem também funções que podem ser compartilhadas. • A família, tenha ela a estrutura que tiver, é fundamental no processo formativo das suas crianças. • Precisamos ter um olhar para a relação que se estabelece no interior das famílias e não para as estruturas que elas apresentam.
52
• Escola e Família são instituições historicamente construídas. • Chegar a um consenso em torno do horário mais adequado para fazer uma reunião de pais, considerando a opinião dos próprios pais, é um passo muito importante para se conseguir a adesão e comparecimento dos mesmos a escola.
Entendemos pertinente ressaltar também que, ampliar os espaços de
interação entre escola e família, possibilitando que estas duas instituições
compartilhem ações de cuidado e educação, significa uma grande contribuição para
o processo formativo das crianças pequenas, principalmente neste momento de
busca de novos paradigmas para um mundo em permanente transformação.
Partindo destes postulados, e conscientes de que uma relação dessa natureza
é uma construção coletiva, com avanços e recuos, idas e vindas, acertos e
equívocos, vamos apresentar a experiência que conseguimos realizar buscando
construir num Centro Municipal de Educação Infantil, que dirigimos durante dois
anos, uma relação com a família que objetivasse compartilhar as ações de cuidado e
educação das crianças que estavam sob a nossa responsabilidade.
Compartilhamento esse que só entendemos possível, através da
sistematização de um trabalho educativo junto ás famílias, pautado, principalmente,
no diálogo e na interação entre as pessoas que compõem estas duas grandes
instâncias formativas da nossa sociedade.
Dessa forma, considerando a grande contribuição desses caminhos já
percorridos, para a ampliação/aprofundamento dos novos caminhos a serem
construídos, vamos prosseguir na descrição reflexiva da nossa experiência.
53
CAPÍTULO 2
54
2. CONSTRUINDO DIRETRIZES PARA NOVOS CAMINHOS
Espaço e tempo não são somente coordenadas entre as quais nossa vida transcorre, mas dimensões que nos constituem.
J. Gimeno Sacristán.
Dando continuidade ao nosso trabalho, vamos agora apresentar as diretrizes
que traçamos e vivenciamos para a concretização do mesmo. Dessa forma, nesse
capítulo, nos propomos a realizar uma reflexão em torno dos referenciais
metodológicos que nortearam o nosso trabalho, descrevendo os procedimentos
metodológicos utilizados, bem como fazendo uma caracterização do campo de
pesquisa e dos sujeitos envolvidos no processo.
2.1 - Refletindo sobre referenciais metodológicos
Ao iniciarmos uma reflexão em torno de como realizar uma pesquisa na área
das ciências sociais e, mais especificamente, na área da Educação, a primeira
questão que se coloca para nós é: qual o referencial teórico metodológico que vai nortear o nosso trabalho de pesquisa?
Entendemos de fundamental relevância essa questão, pelo fato de
compreendermos que os postulados metodológicos são á base de sustentação de
todo o processo de pesquisa, principalmente quando se trata dos fenômenos sociais
e educativos, já que “o caráter subjetivo e complexo destes requer uma metodologia
de investigação que respeite sua natureza.” (GÓMEZ, 2000, p. 99)
Segundo ainda este mesmo autor, durante muitos séculos as pesquisas foram
realizadas tendo como referencial teórico metodológico a perspectiva positivista, que
alcançou grandes progressos nas ciências sociais e nas aplicações tecnológicas.
Foi assim que, quando decidiu superar o estado de pura especulação
filosófica, ou especulativa, as ciências sociais, mesmo com todas as suas
55
complexidades e subjetividades, aderiu a este mesmo modelo padrão de
cientificidade, como única garantia de rigor e eficiência.
Segundo os estudos de André (2002) e Bogdan & Biklen (1994), foi a partir do
final do século XIX, que os cientistas sociais começaram e indagar sobre a validade
desse tipo de metodologia para os estudos dos fenômenos humanos e sociais,
considerando toda a complexidade e dinamicidade desses fenômenos, que os
tornam impossibilitados de se submeterem a leis gerais como na física ou na
química.
Segundo Gómez (2000), os fenômenos sociais em geral, e os educativos em
particular, manifestam duas características que o diferenciam claramente dos
fenômenos naturais:
O caráter radicalmente inacabado dos mesmos, sua dimensão criativa, autoformadora, aberta à mudança intencional. A dimensão semiótica de tais fenômenos. A relação em parte indeterminada e, portanto, polissêmica entre o significante observável e o significado latente de todo fenômeno social ou educativo ( GÓMEZ, 2000, p. 100)
Assim sendo, foi a partir desses questionamentos e considerações acerca das
especificidades dos fenômenos sociais, que começou a surgir uma nova abordagem
ou um novo paradigma de pesquisa conhecida como naturalística ou qualitativa por
alguns estudiosos; não convencional no dizer de Fazenda & Soares (1992), ou ainda
abordagem interpretativa, como propõe Gómez (2000).
Entendemos esse novo paradigma de pesquisa, que vamos optar por chamar
de qualitativa, como um grande avanço para os estudos das ciências sociais,
principalmente pelas considerações que faz a não-neutralidade do pesquisador e a
sua possibilidade de participar efetivamente na construção do seu objeto de
pesquisa, embora estejamos de acordo com André (2002), quando ela diz que nem
todas as pesquisas que se dizem qualitativas o são, considerando que qualitativa
não é, apenas, antônimo de quantitativa, e também que uma pesquisa qualitativa,
não obrigatoriamente, tem que prescindir de aspectos quantitativos.
56
Dessa forma, não podemos estar denominando as pesquisas apenas de
qualitativas, não convencionais ou interpretativas, para não cairmos em
generalizações que acabem designando muitas coisas, sem caracterizar nenhuma.
É importante detalhar melhor o tipo de investigação que queremos fazer,
especificando as características das mesmas, as técnicas utilizadas para a
construção dos dados, bem como as formas utilizadas para se compreender estes
dados dentro do contexto pesquisado, para podermos classificar este estudo ou
investigação com mais propriedade, ou até mesmo eleger aspectos mais
significativos de um ou outro tipo de pesquisa.
Estamos nos utilizando da terminologia compreender dados, ao invés de
explicar dados, porque concordamos que:
A compreensão é própria do comportamento humano, portanto está sempre implicada com o singular, com a consciência-aí com a subjetividade. A explicação, por seu lado, é peculiar as ciências da natureza, o que a torna sempre implicada com o “regular”, o contínuo, com a consciência-tipo (consciência em si, o conceito geral de uma série regular) – com a objetividade. (GALEFFI, 2000, p. 17)
É exatamente esse caráter singular e subjetivo, que nos leva a refletir
bastante sobre qual a abordagem de pesquisa que melhor vai responder as
questões que nos propomos a investigar, embora tenhamos a certeza de que
nenhuma delas terá condições de atender a todas as especificidades do nosso
processo de pesquisa. Dessa forma, vamos eleger uma abordagem de pesquisa de
natureza qualitativa, abraçando postulados da pesquisa-ação, por entendermos que,
no momento é a que melhor responderá a natureza do nosso campo empírico e dos
fenômenos que nos propomos a observar.
Uma das principais singularidades e subjetividades do trabalho que nos
propomos a realizar, já que o nosso objetivo é descrever e refletir sobre a construção
de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de
cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de
Educação Infantil, dizem respeito ao fato das ações que nos propomos a realizar
serem tanto nossas – enquanto pesquisadoras, quanto de todos os outros atores
envolvidos no processo. Nessa questão encontramos respaldo na pesquisa-ação:
57
[...] a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social, com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.(THIOLLENT, 2004, p.14)
Uma outra singularidade, embora intrinsecamente ligada a primeira, é o fato
de fazermos parte do cotidiano desta Instituição onde nos propomos a construir esta
ação. Assim sendo, nos colocamos como uma pesquisadora que vai influenciar,
participar diretamente de todo o processo de sistematização do trabalho,
participação esta que, no nosso entendimento, também se encontra bastante
respaldada nos postulados da pesquisa-ação:
Não se trata de simples levantamento de dados ou de relatórios a serem arquivados. Com a pesquisa-ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos observados. (THIOLLENT, 2004, p.16)
Dessa forma, após justificarmos a nossa opção por realizar uma pesquisa
qualitativa com características de uma pesquisa-ação, passaremos agora a explicitar
os instrumentos e procedimentos metodológicos utilizados, bem como a caracterizar
o campo de pesquisa e os sujeitos envolvidos na mesma.
2.2 - Detalhando instrumentos de construção dos dados
Os instrumentos metodológicos utilizados para a construção dos nossos
dados foram: caderno pessoal de registro, ficha de caracterização dos alunos,
(Anexo 1) entrevistas abertas ou semi-estruturadas com familiares das crianças
(Anexos 2 e 3) e observações participantes.
58
O nosso caderno pessoal de registro começou a ser elaborado desde as
primeiras reuniões com as professoras, antes da Instituição começar a funcionar. Foi
com base nas anotações realizadas nesse caderno que pudemos resgatar todo o
percurso de formação inicial das professoras, inclusive os depoimentos registrados,
principalmente, no capítulo 4; bem como o processo de acolhimento dos funcionários
e as propostas discutidas e elaboradas para os trabalhos com as crianças e as suas
famílias.
A ficha de caracterização dos alunos, elaborada em conjunto por toda a
equipe técnico-pedagógica da Instituição logo nas primeiras reuniões, com o objetivo
de obter informações sobre os alunos e suas famílias, tanto ajudou no sentido de
fazer as caracterizações aqui apresentadas, quanto na organização do próprio
trabalho com as crianças e as famílias de forma mais específica.
Estas fichas foram preenchidas pelos pais e/ou responsáveis no ato da
matrícula. A pessoa da escola encarregada de fazer a matrícula, explicava o objetivo
da ficha aos pais e/ou responsáveis e ia fazendo as perguntas e anotando as
respostas. Depois a ficha foi analisada e tabulada pela secretária geral da
Instituição, o que nos possibilitou o acesso as porcentagens e números na
caracterização das crianças e suas famílias, que será apresentada em seguida.
Foi através da consultas ás fichas de caracterização, que também foi possível
saber o que os pais esperavam da Instituição, o motivo pelo qual estavam
matriculando nela o seu filho, o melhor horário para o comparecimento as reuniões,
bem como informações relativas aos cuidados especiais que se deveria ter com a
saúde das crianças, as suas singularidades e histórias de vida; o que muito
contribuiu com o trabalho realizado.
A opção pelas entrevistas semi-estruturadas, foi pelo fato desse tipo de
entrevistas, permitir que o entrevistado se coloque mais, fale e opine melhor sobre a
temática em questão, já que as perguntas são mais abertas e menos direcionadas.
As entrevistas abertas ou semi-estruturadas, conforme afirmam Bogdan e
Biklem (1994), deixam o entrevistado mais a vontade para se expressar. Essas
entrevistas foram realizadas com os familiares das crianças, e aconteceram em dois
momentos distintos: o primeiro momento, constando de aproximadamente 1 ou 2
perguntas apenas (Anexo 2) – se constituindo quase que numa conversa informal,
embora gravada, aconteceu, após os eventos realizados com as famílias, com o
objetivo de se perceber a opinião das mesmas sobre o evento em questão. O
59
segundo momento foram as entrevistas realizadas no final do ano de 2005, cujo
roteiro está no anexo 3 , com o objetivo de se obter uma visão geral dessas famílias
sobre as atividades realizadas pela instituição, e a relação da mesma com as
famílias, de forma mais geral. A opção por esses dois tipos de entrevistas foi
respaldada pela seguinte afirmação:
[...] podem-se utilizar diferentes tipos de entrevistas, em diferentes fases do mesmo estudo. Por exemplo, no início do projecto pode parecer importante utilizar a entrevista mais livre e exploratória, pois nesse momento o objectivo é a compreensão geral das perspectivas sobre o tópico. Após o trabalho de investigação, pode surgir a necessidade de estruturar mais as entrevistas de modo a obter dados comparáveis num tipo de amostragem mais alargada. (BOGDAN & BIKLEM, 1994)
Todas as entrevistas foram gravadas, transcritas e alguns desses
depoimentos estarão sendo apresentados e discutidos no decorrer desse trabalho.
Optamos por fazer as entrevistas em dois momentos distintos, por
compreendermos que cada momento desse tinha um objetivo diferente: as
entrevistas realizadas logo após os eventos com os pais, objetivavam uma opinião
mais específica sobre a atividade em questão. Já as entrevistas realizadas ao final
do ano de 2005, com familiares das crianças, objetivavam uma opinião sobre o
trabalho da Instituição como um todo, procurando perceber também qual a
atividade/evento que os pais entrevistados consideraram mais significativo para eles.
Essa entrevista final foi realizada apenas com pessoas de 8 famílias, por
entendermos que as entrevistas realizadas após cada evento já apresentavam
dados bastante significativos sobre o objeto de estudo em questão.
As observações participantes aconteceram durante o decorrer dos anos
letivos de 2004 e 2005, e, até mesmo pelo fato de atuarmos profissionalmente na
Instituição, procurávamos aproveitar todos os momentos possíveis para observar
como acontecia essa relação família e escola no cotidiano da Instituição, junto a
familiares, professoras, funcionários e crianças.
É importante registrar que, embora consideremos a relevância das falas, da
participação e da opinião de toda a comunidade escolar, nesse processo de
construção da relação família e I.E.I, conforme já elucidado na introdução desse
60
trabalho, não foi possível construir dados a partir das falas das crianças e dos
funcionários, considerando que, por razões de tempo e também do recorte
priorizado, registramos mais efetivamente as falas e opiniões das famílias e das
professoras.
Como já colocamos, pelo fato de fazermos parte diretamente do grupo que
realiza o trabalho em pauta, a observação participante foi uma das técnicas de
construção utilizadas, considerando que:
A observação participante, ou observação ativa, consiste na participação real do observador na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada. Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um membro do grupo. Daí por que se pode definir observação participante como a técnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo. (GIL, 1994, p.108)
É importante frisar que, no nosso caso, a observação participante é definida
por Gil (1994), como natural, pelo fato de fazermos realmente parte do grupo, e de
não termos nos integrado ao mesmo, apenas com essa função de observar.
É interessante perceber que essa situação promove vantagens e
desvantagens. Vantagem porque nos proporciona um olhar privilegiado, pelo fato de
fazermos parte do grupo, não sermos um elemento estranho ao mesmo, o que,
realmente, proporciona uma observação muito mais natural. Desvantagens no
sentido da subjetividade do pesquisador que fica muito mais presente, já que ele
está observando e pesquisando, num ambiente e numa situação em que o vínculo
emocional é muito maior e muito mais forte.
Dessa forma, entendemos que um dos nossos grandes desafios nesse
trabalho, foi a busca por ultrapassar esse vínculo emocional, procurando fazer, na
medida do possível, uma descrição reflexiva da experiência que possa realmente
retratar, não unicamente uma visão pessoal, mas, também, a visão de todos os
outros atores/protagonistas dessa história. O desafio está lançado...
2.3 - Caracterizando o campo e pesquisa
61
O Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Maria Reis
(CEMEICAR), está localizado na Vila de Ponta Negra, possuindo 4 salas de aula,
sendo duas menores: uma com capacidade para apenas 15 alunos e outra, no
máximo, para vinte alunos. E duas maiores, com capacidade para 25 alunos. Possui
ainda uma sala destinada a direção, coordenação e secretaria, um almoxarifado,
uma cozinha, uma dispensa, uma área de serviço com lavanderia coberta, dois
banheiros destinados aos adultos, um masculino e outro feminino, além de 2
banheiros adaptados para as crianças pequenas: um para as meninas e outro para
os meninos.
Além dessa área interna, a Instituição possui uma área externa toda gramada
nas duas laterais, e na frente do prédio, uma área toda recoberta por areia de praia,
e um quadrado de 16m feito com cimento, e cheio de areia branca - que é a caixa de
areia, onde as crianças brincam também, além do parque infantil, situado atrás do
prédio. Neste local foi também colocada um
a tenda de 8mt por 6mt, objetivando que as crianças tivessem uma área coberta e
cimentada, como opção para a realização de outras atividades.
FOTO 1: Área gramada na frente do prédio.
Fonte: arquivo do CMEICAR. ANO: 2005
FOTO 2: Caixa de areia e área livre.
Fonte: arquivo do CMEICAR. ANO: 2005
FOTO 3: Parque infantil.
Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 4: Tenda em área cimentada.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
62
Em relação ao mobiliário e utensílios, a Instituição também foi toda equipada
com materiais novos e adequados as necessidades e objetivos a que se
destinavam. Dessa forma, a cozinha recebeu freezer, geladeira, fogão industrial,
liquidificador industrial, armários, panelas, frigideiras, colheres, garfos, facas, pratos
e copos plásticos para serem usados na merenda das crianças, enfim, o material
básico necessário ao trabalho a ser realizado.
Cada uma das salas de aula foi equipada com um quadro negro, mesinhas de
madeira e fórmica, com quatro cadeirinhas cada, adaptadas ao tamanho das
crianças, além de um armário para guardar o material e de uma mesinha com um
filtro de barro, reabastecido diariamente com água, para que as crianças não
precisassem sair da sala para beber água.
A Instituição recebeu também um aparelho de som, um vídeo cassete e uma
televisão de 21”, além de um acervo de livros infantis com 80 títulos
aproximadamente e 3 unidades de cada um; brinquedos como carrinhos, bolas,
bonecas; jogos como damas, dominós, boliches; material didático pedagógico e de
expediente, como papel ofício, papel madeira, cartolina, tinta guache, tinta a dedo,
massa de modelar, lápis grafite, giz de cera, coleção de madeira, pincel atômico,
isopor, papel crepom e outros materiais necessários ao trabalho com as crianças.
Este Centro Infantil foi criado para atender a um pedido da comunidade da
Vila de Ponta Negra que, através da sua associação de moradores, enviou uma
comissão à SME solicitando que fosse criado um espaço educativo para atender a
uma demanda de crianças, na faixa etária de 4 a 6 anos, que tinha sido registrada
desde o início do ano e continuava sem este espaço definido.
Inicialmente, estas crianças iriam freqüentar uma instituição de Educação
Infantil vinculada ao projeto pré-escola para todos1 que já funcionava na Vila de
Ponta Negra, desde o ano de 2003. Só que em 2004 esta escola fechou o prédio
localizado na própria Vila e estava se propondo a atender os alunos na sua matriz,
localizada no Conjunto Ponta Negra, distante uns 3 a 4 KM da Vila, o que dificultava
o acesso das crianças e dos seus pais.
Ao tomar conhecimento dessa situação, a Secretária Municipal de Educação
compreendeu a necessidade de criar uma Instituição Municipal de Educação Infantil
1 Projeto mantido pela Prefeitura Municipal de Natal, com o objetivo de comprar vagas, em instituições de Educação infantil particulares e filantrópicas, para crianças na faixa etária de 4 a 6 anos que não conseguem vagas nas instituições públicas de ensino da cidade.
63
na Vila de Ponta Negra, considerando que as crianças dessa faixa etária, precisam
de um atendimento de qualidade, e que esta qualidade passa também pela
facilidade de acesso as instituições educativas.
Podemos inferir então que, foi a solicitação da comunidade, e a compreensão
da necessidade e urgência da mesma, que fez com que no dia 10 de março de
2004, fosse criado o CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PROFESSORA CARMEM MARIA REIS, situado num prédio alugado na Rua João
de Deus de Lima, S/N CEP 59.090-318, Vila de Ponta Negra.
Apesar de não ser um espaço construído especificamente para ser uma
Instituição de Educação Infantil, e de possuir uma área - principalmente a área
coberta, de dimensões muito pequenas – inclusive as salas de aula, consideramos
que, depois da reforma a Instituição ficou bastante agradável, possibilitando,
obviamente que dentro das condições possíveis, a realização de um trabalho que
respeitasse a criança enquanto ser sócio-histórico-cultural, promovendo o acesso
das mesmas ás interações e aprendizagens próprias do seu grupo cultural, como a
brincadeira, as artes, o movimento, a linguagem oral e escrita, a matemática, as
ciências naturais e sociais, enfim, as várias linguagens que o ser humano precisa
utilizar no seu cotidiano:
FOTO 5: Aulas do grupo de capoeira.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 6:Grupo de pastoril do CMEICAR. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
64
FOTO 7: Leitura na biblioteca
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 8: Momento do faz-de-conta.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004.
FOTO 9: brincadeiras no parque e caixa de areia. Fonte: Arquivo do CMEICAR.
Ano: 2004
FOTO 10: Escrevendo textos que se
sabe de cor.
65
2.4 - Caracterizando o corpo técnico-docente
A contratação e o encaminhamento das professoras e coordenadoras
pedagógicas, foi realizado pelo próprio setor de carga horária da SME,
obedecendo aos critérios gerais estabelecidos por este órgão. É importante
registrar que, hoje, só se ingressa no magistério público municipal de Natal
mediante concurso. O último concurso para este cargo aconteceu no final do
ano de 2003, para nomear os professores logo no início de 2004.
Dessa forma, a equipe técnico-docente que iniciou os trabalhos no
Carmem Reis era composta por 8 professoras, 2 coordenadoras pedagógicas,
1 secretária geral, 1 vice-diretora e nós, como diretora. A caracterização
dessas profissionais será feita no quadro abaixo:
FUNÇÃO FORMAÇÃO EXPERIÊNCIA NA
EDUCAÇÃO EXPERIÊNCIA NA
ED. INFANTIL Diretora Pedagoga com
mestrado 15 anos 8 anos
Vice-diretora Pedagoga com especialização
16 anos 10 anos
Secretária geral Pedagoga 25 anos 10 anos
Coordenadora 1 Pedagoga com especialização
13 anos ----------
Coordenadora 2 Pedagoga com especialização
20 anos 16 anos
Professora 1 Pedagoga 04 anos 4 anos
Professora 2 Pedagoga Recém-concursada -----------
Professora 3 Pedagoga 12 anos -----------
Professora 4 Pedagoga 06 anos ------------
Professora 5 Pedagoga Recém-concursada ------------ Professora 6 Pedagoga com
especialização 05 anos 05 anos
Professora 7 Pedagoga com especialização
20 anos 16 anos
Professora 8 Pedagoga com especialização
04 anos 04 anos
Quadro 1 - Caracterização da equipe técnico-docente-administrativa
66
Além dessa caracterização que vamos chamar de técnica-burocrática, é
importante registrar que todas essas profissionais estavam muito empolgadas
com o fato de irem trabalhar em uma instituição recém-criada, onde havia a
proposta de uma construção coletiva de todos os saberes e fazeres que iriam
nortear o cotidiano da mesma.
Tanto as que já tinham experiência na área da Educação Infantil, como
as que ainda não tinham atuado nessa modalidade de ensino, se apresentaram
bastante dispostas, motivadas e ansiosas em partilhar esta experiência, o que,
na nossa opinião, foi muito positivo para o trabalho que nos propúnhamos a
realizar, considerando que, acreditamos que é a motivação interior, a nossa
disposição enquanto seres humanos, que vai impulsionar verdadeiramente as
nossas ações.
Esse trabalho inicial de reflexão, estudo e interação do grupo de
professoras será melhor detalhado no capítulo 4 dessa tese.
2.5 - Apresentando os funcionários
A Instituição possui 9 funcionários, sendo 4 vigias – 2 noturnos e 2
diurnos; 2 merendeiras; 2 Auxiliares de Serviços gerais - ASGs e 1 auxiliar de
secretaria. Todos esses funcionários são contratados por uma firma que presta
serviços a SME, trabalhando num regime de 8 horas diárias, exceção dos
vigias que trabalham numa escala de 12 horas de serviço por 36 horas de
folga.
É importante dizer que, embora estes profissionais não possuam
nenhuma qualificação técnica na área da educação, tendo no máximo o ensino
médio, durante o ano de 2004, a SME, através do seu Setor de Educação
Infantil (SEI), realizou um curso de formação para todos esses funcionários que
atuavam em Centros de Educação Infantil da rede Municipal, e em escolas de
Ensino Fundamental que também trabalhavam com essa modalidade de
ensino. O objetivo desse curso era orientar e discutir com estes profissionais as
especificidades do trabalho com a criança, refletindo desde a função da
Educação Infantil – educar e cuidar, até noções de primeiros socorros e a
relação família e escola.
67
Outro ponto importante que merece destaque em relação aos
funcionários que chegaram ao Carmem Reis, é o fato dos mesmos serem
terceirizados, ou seja, não fazerem parte do quadro técnico-funcional
permanente da Prefeitura de Natal, o que faculta que os mesmos trabalhem
num regime de 44 horas semanais, sendo 8 horas diárias e 4 horas aos
sábados, possibilitando uma vivência e um envolvimento maior dos mesmos
com a Instituição, além do fato – cujos condicionantes sócio-históricos-
econômicos não serão nosso objeto de discussão no momento, que é a
questão de poderem ser demitidos a qualquer momento em que não estiverem
correspondendo as expectativas, o que os leva a se empenharem mais nas
tarefas que realizam.
Acreditamos que estes fatores contribuíram de forma positiva também,
para a disponibilidade e o envolvimento desses profissionais no trabalho
proposto, bem como as disposições e motivações íntimas de cada um, como já
explicitamos anteriormente.
Outro fator que consideramos importante foi o fato da Instituição estar
sendo criada numa filosofia de envolvimento, participação e gestão
democrática, ou seja, os caminhos estavam sendo traçados ao se caminhar,
embora já existisse um desejo, uma vontade, uma diretriz, indicando aonde se
queria chegar: a realização, através de uma práxis participativa, de um
trabalho de qualidade com as crianças (DAHLBERG, MOSS e PENSE, 2003),
e a construção de uma relação entre a Instituição e as famílias que
promovesse o compartilhamento das ações de cuidado e educação, que são
as principais funções da Educação Infantil hoje, funções estas que serão
melhor discutidas no capítulo 3.
2.6 - Caracterizando as crianças e suas famílias
Esta caracterização foi realizada através da análise e sistematização dos
dados das crianças e das suas famílias, construídos através da ficha de
caracterização que consta nos anexos deste trabalho. (Anexo 1)
68
Tanto no ano de 2004, como no de 2005, o CMEI Carmem Maria Reis,
matriculou 170 crianças, divididas em 2 turnos, de acordo com as turmas
abaixo especificadas:
ANO DE 2004 – TURNO MATUTINO NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV
15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio.
20 crianças na faixa etária de 4 anos
25 crianças na faixa etária de 5 anos
25 crianças na faixa etária de 6 anos
Quadro 2 - nº de crianças por nível: 2004 - matutino
ANO DE 2004 – TURNO VESPERTINO
NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio
20 crianças na faixa etária de 4 anos
25 crianças na faixa etária de 5 anos
25 crianças na faixa etária de 6 anos.
Quadro 3 - nº de crianças por nível: 2004 vespertino
ANO DE 2005 – TURNO MATUTINO NÍVEL II A NÍVEL II B NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 4 anos
20 crianças na faixa etária de 4 anos
25 crianças na faixa etária de 5 anos
25 crianças na faixa etária de 6 anos
Quadro 4 - nº de crianças por nível: 2005 matutino
ANO DE 2005 – TURNO VESPERTINO
NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio
20 crianças na faixa etária de 4 anos
25 crianças na faixa etária de 5 anos
25 crianças na faixa etária de 6 anos.
Quadro 5 - nº de crianças por nível: 2005 vespertino
Considerando que no ano de 2005, a demanda de crianças com 3 anos
e meio foi menor que a de crianças com mais de 4 anos. A turma de nívelI, do
turno matutino foi substituída por uma turma de nívelII.
Ainda em relação à caracterização dessas crianças apresentada abaixo,
a mesma foi realizada a partir da análise das respostas de 164 pais as fichas
de caracterização. Não foram analisadas as 170 fichas, porque 6 fichas
continham muitas informações incompletas, por se tratar de crianças vindas do
69
interior para morar com outros familiares, que não dispunham de todas as
informações necessárias.
Após a análise e tabulação dos dados dessas 164 fichas, foi possível
saber que 77 crianças são do sexo masculino, enquanto 87 são do sexo
feminino. Dessas crianças, 60% moram com os pais, 15% só com a mãe, 5%
com a mãe e o padrasto, 12% com a mãe e os avós, e os 8% restantes com
tias, avós e/ou outros adultos, sejam da mesma família consangüínea, ou não.
Esses dados nos levam a compreender que estas crianças fazem parte de
várias estruturas familiares diferentes, com a predominância da chamada
família nuclear, composta por pai, mãe e filhos.
Em relação ao número de irmãos, 15% dessas crianças não tem irmãos;
38% possui apenas 1 irmão, 32% entre 2 e 3 irmãos; e os outros 15% possuem
entre 4 e 7 irmãos. Estes dados nos surpreenderam, na medida em que
mostraram, diferentemente do que geralmente acontece nas chamadas
famílias das classes populares, um número pequeno de irmãos nessas
famílias, considerando que apenas 15% das mesmas possuem 4 ou mais
filhos; o que contribui para que 45% dessas crianças morem em casas com até
4 pessoas no máximo; 38% morem com 5 a 7 pessoas, e apenas 17% residam
com mais de 7 pessoas na mesma casa.
Ainda com o objetivo de conhecer melhor as crianças com as quais
iríamos trabalhar, a ficha de caracterização mostrou que 95% delas
brincam/convivem e interagem com outras crianças; 68% fazem isso dentro da
própria casa, enquanto 13% brincam na rua e 19% brincam e interagem com
crianças em outros ambientes, diferentes da casa e da rua. No tocante ao lazer
de final de semana, 58% dessas crianças freqüentam a praia, 29% ficam em
casa, 5% vão à igreja e os outros 10% passeia, visita parentes e viaja .
È importante frisar que o alto número de crianças que freqüentam a
praia no final de semana deve-se ao fato do bairro aonde residem está
localizado numa praia, que muitas vezes, é também o meio de subsistência da
própria família, já que a grande maioria trabalha e vive em função de
atividades, formais ou informais, realizadas nessa praia que possui um fluxo
turístico muito grande, sendo um dos principais cartões postais da cidade.
Vamos agora, a partir também da análise e tabulação da ficha de
caracterização, conhecer um pouco mais as mães e os pais dos nossos alunos.
70
Vamos caracterizar mãe e pai separadamente porque foi assim que foi
perguntado na ficha, e não foi possível analisar em conjunto.
Das mães que responderam a ficha, 75% se apresentaram como
católicas; 17% como evangélicas e as 8% restantes como outras religiões ou
não professando nenhuma religião. Em relação ao grau de instrução, 12% se
disseram analfabetas, 28% como tendo cursado entre a 1ª e a 4ª série; 29%
como tendo cursado entre a 5ª e a 8ª série; 7% como tendo o ensino médio
incompleto; 6% como tendo concluído o fundamental; 8% como tendo
concluído o Ensino Médio e os outros 10% não souberam informar o grau de
escolaridade, embora não se declarassem analfabetas. Uma mãe declarou ter
o curso superior completo.
Dando continuidade a caracterização das mães, em relação a profissão;
44% se apresentaram como sendo do lar, trabalhando apenas em casa e
cuidando dos filhos; 23% se disseram empregadas domésticas, faxineiras e
diaristas; 8% trabalham em hotéis, bares ou restaurantes, como cozinheiras ou
auxiliares de cozinha. As 25% restantes se colocaram como artesãs,
ambulantes, garçonetes, camareiras, ASGs, manicures e outras profissões que
podem ser chamadas de liberais, pela ausência de vínculo empregatício, já que
são exercidas mais no chamado período de veraneio, pela presença maior de
turistas e visitantes na praia do bairro no qual residem, e nos estabelecimentos
comerciais ao redor da mesma.
Em relação à caracterização dos pais dos alunos, das 164 fichas
respondidas, apenas 145 possuem informações sobre os pais, as 18 restantes
foram respondidas por pessoas que não tinham essas informações, ou eram
fichas de crianças em cujo registro não constava o nome do pai. Nas fichas
respondidas, em relação à instrução, vamos encontrar que, 4% são
analfabetos; 10% se consideram alfabetizados – escrevem o nome; 36%
cursaram entre a 1ª e a 4ª série; 30% entre a 5ª e a 8ª série; 3% possuem o
Ensino Médio incompleto; 3% concluíram o Ensino Fundamental e 5% o Ensino
Médio; os outros 9% não informaram e um pai disse ter o curso superior.
Em relação à profissão, 15% dos pais trabalham na construção civil,
como pedreiros e/ou auxiliares de pedreiro; 10% são zeladores, eletricistas e
funcionários públicos; 18% se colocam como autônomos, exercendo as
profissões de ambulante e artesão, dentre outras; 13% são garçons,
71
cozinheiros e/ou auxiliares de cozinha; os outros 44% restantes não possuem
profissão fixa, ficando desempregado e/ou subempregado. É importante frisar
que esses subempregos aparecem principalmente no período de veraneio,
quando a praia – vizinha ao bairro em que habitam, fica repleta de turistas,
oferecendo oportunidades de trabalho, mesmo que temporárias.
Finalizando este capítulo, é importante dizer que estes dados
construídos, principalmente a partir das fichas de caracterização, foram
fundamentais para nortear todo o trabalho que realizamos com as crianças e
suas famílias.
No início do ano letivo, cada professora ficava com as fichas dos seus
alunos por um período de aproximadamente 30 dias, consultando-as e fazendo
registros quando necessário. Após esse período, as fichas eram guardadas no
armário da sala da coordenação e secretaria, onde, tanto as professoras,
quanto a equipe técnico-administrativa-pedagógica tinha acesso as mesmas
sempre que se fazia necessário e, primordialmente, quando ia se discutir
especificidades de alguma criança e/ou família.
Vamos agora, retomar a concepção de criança, Instituição de Educação
infantil e família que norteia a nossa proposta de trabalho, procurando, no
próximo capítulo, fazer um resgate histórico das mesmas, até situá-las na
contemporaneidade, por acreditarmos que esse resgate vai contribuir com o
trabalho que nos propomos a realizar, considerando que, sendo concepções
historicamente construídas, é preciso que as conheçamos para que possamos
compreender melhor as nossas crenças, posturas e práticas, sabendo que,
conforme aponta Weisz (2001), cada uma delas é norteada por uma concepção
que a sustenta, ressaltando assim a grande relação entre teoria e prática.
Dessa forma, prosseguindo na construção dos caminhos a serem
trilhados, vamos retomar um pouco o passado, procurando no mesmo alguns
elementos para construir o futuro.
72
CAPÍTULO 3
73
3 - BUSCANDO CAMINHOS DO PASSADO, PARA CONSTRUIR O FUTURO
A história é o exercício da memória realizado para compreender o presente e para nele ler as possibilidades do futuro, mesmo que seja de um futuro a construir, a escolher a tornar possível.
Franco Cambi.
Neste capítulo, antes de descrevermos a nossa experiência propriamente
dita, vamos procurar situar melhor as principais concepções que embasaram a
mesma, realizando um passeio pela história da criança, da infância, da família
e das funções das instituições destinadas à atender as crianças, na certeza de
que toda prática, toda experiência, toda proposta é embasada por referenciais
teóricos que a sustentam, como também de que conhecer a história é
importante para que possamos compreender o presente, e vislumbrar
perspectivas para o futuro
3.1- Reflexões iniciais em torno da temática Para Freitas & Kuhlmann Jr. (2002, p. 7), “A constituição do campo das
ciências da infância é objeto de perplexidade àqueles que se ocupam com o
estudo sistemático da história da criança”. Perplexidade esta, que segundo
ainda estes mesmos autores, têm a sua intensidade, já no fato das próprias
formas distintas com que as palavras infância e criança são empregadas.
Desta forma, vamos optar por iniciar este capítulo refletindo sobre o significado
dos termos criança e infância, bem como sobre as suas histórias, para que os
mesmos possam nortear todo o nosso trabalho:
Podemos compreender a infância como a concepção ou a representação que os adultos fazem sobre o período inicial da vida, ou como o próprio período vivido pela criança, o sujeito real que vive esta fase da vida. A história da infância seria então a história da relação da sociedade, da cultura, dos adultos, com essa classe de idade e a história da criança seria
74
a história da relação das crianças entre si e com os adultos, com a cultura e a sociedade. (FREITAS & KUHLMANN Jr, 2002, p. 7)
Embasados pelas idéias apresentadas pelos autores acima citados,
vamos buscar, neste capítulo, a partir de alguns historiadores e outros
estudiosos desta temática, fazer uma retomada da história da infância, e da
própria criança, bem como da família e das instituições de Educação Infantil.
Antes de iniciarmos este passeio pela história da infância e das crianças,
porém embasados pela mesma linha de raciocínio já exposta, entendemos
pertinente ainda, lembrarmos que “a imaturidade das crianças é um fato
biológico, mas a forma como ela é compreendida e se lhe atribuem significados
é um fato da cultura” ( PROUT & JAMES, apud, HEYWOOD, 2004, p. 12)
É com base neste novo paradigma da sociologia da infância, proposto
por Alan Prout, Allison James e Chris Jenks em 1998, que Heywood ( 2004)
destaca três proposições bastante frutíferas para quem quer estudar, com base
na história, a infância. São elas:
A primeira é de que a infância deve ser compreendida como uma construção social . Em outras palavras, os termos “criança” e “infância” serão compreendidos de formas distintas por sociedades diferentes. O segundo elemento do novo paradigma é de que a criança é uma variável da análise social, a ser analisada em conjunto com outras, como a famosa tríade classe, gênero e etnicidade. A terceira afirmação era de que as crianças devem ser consideradas como partes ativas na determinação de suas vidas e das vidas daqueles que estão a seu redor. ( HEYWOOD, 2004, p. 12)
Com base nestes postulados teóricos, vamos passar a fazer uma reflexão
sobre a história da infância, retomando algumas épocas históricas com suas
respectivas características e contextualizações, como também alguns teóricos,
estudiosos da educação e da própria criança, que deixaram contribuições
valiosas para a nossa compreensão acerca do assunto, procurando, na medida
75
do possível, estabelecer relações entre esta história, a história das famílias e
das Instituições dedicadas ao trabalho com as crianças
É importante registrar que, apesar de estarmos nos utilizando das
classificações por idades, com que a historiografia tradicional marca a
passagem do tempo e as mudanças ocorridas no mundo, temos a clareza de
que as mudanças na forma das pessoas perceberem a infância, possuem toda
uma ligação com os contextos sociais, econômicos, políticos e culturais de
cada época – ultrapassando assim, a idéia de que fatos isolados são
responsáveis pelas mesmas.
3.1.1- Em busca da visão de infância da idade média
Para Ariès (1981), na sua conhecida obra História social da criança e da família, considerada por Heywood (2004), como sendo uma “descrição
abrangente e dramática sobre a ‘descoberta’ da infância e um trabalho
verdadeiramente seminal,” a infância não foi considerada no período medieval,
ou seja, não existia um sentimento de infância que caracterizasse este período
da história da humanidade, como podemos perceber nas citações abaixo:
A primeira refere-se inicialmente a nossa velha sociedade tradicional. Afirmei que essa sociedade via mal a criança, e pior ainda o adolescente. A duração da infância era reduzida a seu período mais frágil, enquanto o filhote do homem ainda não conseguia bastar-se; a criança então, mal adquiria algum desembaraço físico, era logo misturada aos adultos, e partilhava de seus trabalhos e jogos. ( ARIÈS, 1981, p. 10) Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo. ( ARIÈS, 1981, p. 50)
São essas afirmações de Ariès (1981), baseadas em sua grande maioria
no estudo e observação da iconografia da época, que fazem com que,
76
principalmente historiadores, refutem algumas das suas colocações sobre o
sentimento de infância da idade média:
É muito fácil atacar Ariès, e suas afirmações arrebatadoras sobre a infância podem fascinar o intelecto, mas também são muito arriscadas. Em primeiro lugar, os críticos o acusam de ingenuidade no trato das fontes históricas, e são particularmente severos em relação a suas evidências iconográficas. Ariès fez a famosa afirmação de que, até o século XII, a arte medieval não tentou retratar a infância, indicando que “ não havia lugar” para ela em sua civilização. Tudo o que os artistas produziram foi a figura minúscula ocasional lembrando um homem em escala reduzida: um “ anãozinho horrendo” no caso do menino Jesus. Ninguém questiona a idéia de que as crianças costumam estar ausentes da arte da Alta Idade Média. No entanto, como observa Anthony Burton, a concentração nos temas religiosos fez com que muitas outras coisas também estivessem ausentes, notadamente “ quase toda a vida secular”, o que impossibilita que se isole a criança como ausência significativa. ( HEYWOOD, 2004, p. 24)
Analisando as afirmações de Ariès, bem como as críticas a alguns
aspectos do seu trabalho e, mais detidamente sobre a ausência do sentimento
de infância na idade média, e tomando como base o fato de cada sociedade,
em cada época distinta, ter a sua história da infância, ou seja, a sua visão
acerca desse período da vida, concordamos com estas críticas, até porque
entendemos que o que acontece na realidade é que a maioria das pessoas
partem do princípio de que as idéias e práticas sobre a infância são ‘fatos
naturais’, e acabam se chocando ao descobrirem que outras sociedades
divergem dessas idéias e práticas, ou seja, apresentam dificuldades para
compreender que a infância é um fato social, conforme nos elucida Miranda
(1987).
Assim sendo, o que fica patente é que Ariès (1981), acabou
apresentando algumas conclusões apressadas da história da infância na idade
média, contribuindo assim para que não se considerasse a idéia de infância
dessa sociedade: É incrível, mas há quase quarenta anos atrás o próprio Jacques Le Goff perguntou: “teria havido crianças no Ocidente Medieval?” seguindo a trilha deixada por Philippe Ariès, ele
77
buscou a criança na arte e não a encontrou. É verdade. Apressadamente concluiu então que a criança foi um produto da cidade e da burguesia e, portanto, o mundo rural não a conheceu. Pior: a conheceu sim, mas a desprezou, marginalizando-a. Deixo claro que minha perspectiva será bastante diferente. ( COSTA, 2005, p.1-2)
Concordando com esta afirmação, não estamos querendo negar a
grande contribuição deste autor - Ariès, para os estudos acerca da história
social da criança e da família, até porque, temos clareza de que, na realidade,
“Há uma marginalidade conceptual no que respeita á idéia ou imagem de
infância no passado, que é correlata da marginalidade social em que foi tida”
(SARMENTO, In: VASCONCELOS E SARMENTO, 2007, p.26-27), e essas
questões só começam a se tornar mais perceptíveis na atualidade, a partir de
outros estudos, pesquisas e descobertas mais recentes.
Dessa forma, o nosso objetivo com o aprofundamento desse estudo,
com base em autores como Miranda (1987), Cambi (1999), Heywood (2004),
Costa (2005), Sarmento (2007), dentre outros, é buscar alguns elementos e
reflexões que vão, com certeza, corroborar com a seguinte opinião:
Nas palavras da historiadora Doris Desclais Berkvam, isso deixa aberta a questão da possibilidade de existência, na idade média, de “uma consciência da infância tão diferente da nossa, que não a reconhecemos. ( HEYWOOD, 2004, p. 26).
Um dos elementos apresentados por alguns historiadores que criticam a
tese de inexistência do sentimento de infância na idade média, defendida por
Ariès, é baseado na análise de códigos jurídicos da época, que demonstram
que já havia algum reconhecimento das especificidades da infância.
Além desses códigos jurídicos que continham algumas concessões ao
status de minoridade da infância, defendendo os direitos de herança dos
órfãos, livrando da morte os menores de 15 anos envolvidos em roubo e
exigindo, em alguns casos, até o consentimento de crianças com relação a um
casamento; o próprio discurso greco-romano sobre o sujeito, apresentando
78
estudos detalhados sobre a infância, demonstram a fragilidade da tese de que
o sentimento de infância não existia na idade média.
Diante dessas evidências, concordamos com a seguinte afirmação: “Uma
abordagem mais frutífera é buscar essas diferentes concepções sobre a
infância em vários períodos e lugares, e tentar explicá-las à luz do material e
das condições culturais predominantes” (HEYWOOD 2004, p.27). É isso que
estamos nos propondo a fazer, considerando também as contradições, que
como veremos mais adiante, sempre estiveram presentes na história da
infância.
“Uma pesquisa francesa recente proclama que a criança nunca foi tão
celebrada como na idade média” (HEYWOOD, 2004, p.28), e um bom exemplo
disso é o próprio papa da época – Leão, o grande, que fazendo suas
pregações no século V dizia que “Cristo amou a infância, mestra da humildade,
lição de inocência, modelo de doçura”. O próprio culto ao menino Jesus, tão
presente durante o século XII, é outro exemplo de exaltação á infância.
Costa (2005), também se reporta a grande revolução que o Cristianismo
representou para a visão de criança, embora ressalte que o processo tenha
sido lento, demorado, levado à cabo pela igreja. Referendando esta idéia ele
cita que:
Os monges criaram verdadeiros “jardins de infância” nos mosteiros, recebendo indistintamente todas as crianças entregues, vestindo-as, alimentando-as e educando-as, num sistema integral de formação educacional. (COSTA, 2005, p. 4)
Ainda com base nos autores já citados, vimos que alguns estudos
recentes sugerem que a Idade Média compreendia a infância como um
processo, ao invés de um estado fixo, ou seja, neste período já existia uma
compreensão de toda esta dinâmica do crescimento, apresentando as
sucessivas etapas vivenciadas pelas crianças até atingir a idade adulta. Este
fato fica patente quando analisa-se a literatura médica, didática e moralizadora
deste período, deixando claro, também, que a Europa medieval reconhecia
algumas qualidades positivas na infância, principalmente nos mais jovens, já
79
que os adolescentes eram vistos com algum desagrado pela própria
licenciosidade e lascívia que apresentavam nesta fase da vida.
Não se pode negar que os autores medievais preferiam escrever sobre a
idade adulta, não se dedicando muito à infância, o que fica retratado no fato de
um levantamento de histórias e crônicas da alta idade média ter concluído que
elas eram bastante vazias em relação à infância, como também no fato de que
há um silêncio de mil anos com relação ás crianças entre Santo Agostinho e a
reforma.
Uma reflexão em torno desses fatos nos leva realmente a perceber que,
na verdade, o que acontecia na Idade Média não era um desconhecimento da
idéia de infância, mas uma forma diferente de tratar a infância, talvez mais
vaga ou indefinida até:
De qualquer maneira, o fato é que, historicamente, o papel da criança sempre foi definido pelas expectativas dos adultos, e esse anseio mudou bastante ao longo da história, embora a família elementar e o amor tenham existido em todas as épocas. (COSTA, 2005,p. 2)
No tocante a existência, em todas as épocas, do sentimento de família
elementar e de amor, podemos exemplificar com o fato citado pelo próprio
Costa (2005), de que “Fredegunda, uma das mulheres mais cruéis da história,
apesar de filha do seu tempo bárbaro, chora a morte de seus filhos e afirma
que perdeu o que tinha de mais belo”.
Ou seja, a idade média, como todas as outras épocas da história da
humanidade, teve o seu sentimento, a sua visão de infância, embasados,
obviamente, pelos contextos e conjunturas que a sociedade vivia naquele
período. Vamos prosseguir, analisando outras formas de se considerar a
infância ao longo do tempo, cientes também de que em uma mesma época,
numa mesma sociedade, podem conviver formas diferentes de se pensar e
vivenciar a infância, embora haja a predominância de uma sobre as outras em
cada um desses momentos.
80
3.1.2- O sentimento de infância na idade moderna
Apesar das críticas feitas a alguns aspectos do trabalho de Ariès, não se
pode negar que:
Ao se procurarem transformações de longo prazo nas concepções acerca da infância, mais uma vez foram Philippe Áries e sua História Social da Criança e da Família que, em princípio, estabeleceram a agenda para os historiadores. Sua principal preocupação, evidentemente, era documentar o surgimento, durante o período moderno, de um sentiment de l’enfance: uma expressão ambígua, que transmite tanto a idéia de uma consciência da infância quanto de um sentimento em relação a ela. (HEYWOOD, 2004, P. 33) Independente da crítica historiográfica a que a obra de Áries tem sido submetida, há, no entanto, um conjunto de aspectos pelos quais é considerada como uma referência incontornável, a ponto de, de alguma maneira, não apenas a História da infância, mas os estudos da infância em geral, terem sofrido, a partir dela, uma mudança de rumo significativa. (SARMENTO, In: VASCONCELOS E SARMENTO, 2007, P. 27)
Para Ariès ( 1981), foi o fato novo de mães e amas começarem a tratar
as crianças como fonte de prazer, valorizando seus gracejos, espontaneidades
e doçuras, como também a valorização que as famílias passaram a dispensar
a educação, que possibilitaram o surgimento, do que ele classifica como
sentimento de infância na idade moderna, e até mesmo de um novo sentimento
de família:
A família tornou-se o lugar de uma afeição necessária entre os cônjuges e entre pais e filhos, algo que ela não era antes. Essa afeição se exprimiu sobretudo através da importância que se passou a atribuir a educação. Não se tratava mais apenas de estabelecer os filhos em função dos bens e da honra. Tratava-se de um sentimento inteiramente novo: os pais se interessavam pelos estudos de seus filhos e os acompanhavam com uma solicitude habitual nos séculos XIX e XX, mas outrora desconhecida.( ARIÈS,1981, p.11-12)
81
Além de Ariès, vários outros historiadores se reportam a fatos diferentes
para justificarem o nascimento de um novo sentimento de infância, ou a
descoberta deste sentimento, na idade moderna:
C. John Sommerville sustenta que “ um interesse permanente pelas crianças na Inglaterra começou com os puritanos que foram os primeiros a se questionar sobre sua natureza e seu lugar na sociedade” ( HEYWOOD, 2004, p. 36) Okenfuss afirma de forma inequívoca que “a infância foi descoberta na Rússia na década de 1690”, tomando como evidência a série de cartilhas eslavas produzidas por Karion Istomin (1640-1717) em Moscou. ( HEYWOOD, 2004, p. 36).
Enquanto alguns historiadores observam a esfera cultural para explicar o interesse renovado nas crianças durante este período, outros destacaram o impacto das transformações econômicas, argumentando que o período entre os séculos XV e XVIII testemunhou o surgimento do capitalismo na Europa Ocidental. ( HEYWOOD, 2004, p. 37)
Como podemos observar, cada autor citado acaba fazendo uma espécie
de reducionismo, colocando o surgimento, ou a mudança no sentimento de
infância na idade moderna, como tendo origem em um único fator, seja ele
emocional, cultural, econômico ou social.
As teses que temos defendido até agora, nos permitem perceber este
reducionismo e afirmar que na realidade, cada época, cada momento histórico,
partindo das transformações de ordem social, econômica, política, cultural,
psicológica, enfim, de todo um contexto mais amplo que cerca as relações em
sociedade, apresenta idéias diferentes sobre a criança e a infância, embora
com a predominância de umas sobre as outras. Com a chamada idade
moderna, não poderia ser diferente!
Com o fim do quatrocentos ( tomando 1453 como ano-chave e ano-símbolo, com a queda do império do oriente, ou 1492, com a descoberta da América, a morte de Lorenzo, o Magnífico, e a expulsão dos mouros de Granada, ou 1494, com o início das dominações estrangeiras na Itália), fecha-se um longo ciclo histórico e preparara-se outro, igualmente longo e talvez ainda inconcluso, que é geralmente designado como Modernidade. Trata-se de um ciclo histórico que tem características
82
profundamente diferentes do anterior, em relação ao qual ele opera uma ruptura consciente, manifestando estruturas substancialmente homogêneas e orgânicas. (CAMBI, 1999, p. 195).
Segundo ainda este mesmo autor, como não poderia deixar de ser, as
mudanças no âmbito educacional também são muito grandes e profundas
neste período:
Mudam assim os fins da educação, destinando-se esta a um indivíduo ativo na sociedade, liberado de vínculos e de ordens, posto como artifex fortunae suae e do mundo em que vive; um indivíduo mundanizado, nutrido de fé laica e aberto para o cálculo racional da ação e suas conseqüências. Mas mudam também os meios educativos: toda a sociedade se anima de locais formativos, além da família e da igreja, como ainda da oficina; também o exército, também a escola, bem como novas instituições sociais ( hospitais, prisões e manicômios) agem em função do controle e da conformação social, operando no sentido educativo; entre essas instituições, a escola ocupa um lugar cada vez mais central [...] (CAMBI, 1999, p. 198-199)
Diante de tantas e tão profundas mudanças, fica para nós a seguinte
interrogação: Mesmo considerando todos os fatos, sem reduzir a este ou
aquele único fator as mudanças ocorridas, será que realmente todas as
crianças passaram a usufruir dessas transformações? E a história da infância?
Será que modificou-se por completo, a partir das transformações de ordem
social, econômica, emocional, legal e cultural que se realizaram com o
chamado advento da modernidade?
Na realidade, apesar das grandes contribuições para a história da
criança e da infância, deixadas por todo o contexto sócio-econômico-político-
cultural-filosófico da chamada idade moderna, na nossa opinião, muitas dessas
indagações, só começaram a fazer sentido, a partir de algumas reflexões da
contemporaneidade, principalmente as que dizem respeito as contradições
relativas as concepções de criança e infância que se fazem perceptíveis, não
apenas de uma época, ou de uma sociedade para outra, mas em uma mesma
época, no seio de uma mesma sociedade.
83
3.1.3 - Reflexões sobre as contradições da história da infância na contemporaneidade Mesmo considerando as afirmações com que encerramos o item anterior
sobre a idade moderna, para termos uma idéia mais precisa do quanto a
criança, a infância e a história de ambas, ainda precisam ser mais conhecidas,
debatidas e discutidas, principalmente no campo da educação, precisamos
saber que, apesar de todos os avanços já evidenciados acima:
Entretanto, somente em 1990, os sociólogos da infância reuniram-se pela primeira vez no Congresso Mundial de Sociologia para debater sobre os vários aspectos que envolvem o processo de socialização da criança e a influência exercida sobre esta pelas instituições e agentes sociais com vistas à sua integração na sociedade contemporânea. (QUINTEIRO, 2006, p. 01))
Não estamos querendo dizer com isto que, durante os primeiros tempos
da idade contemporânea não aconteceram mudanças ou avanços na história
da criança e da infância, pelo contrário. Estamos querendo apontar o quanto
que ainda precisamos avançar, pois:
A natureza contraditória das idéias e emoções relacionadas à infância é como um fio que percorre a literatura histórica. É impressionante a freqüência com que as palavras ambivalência e ambigüidade aparecem em relação a períodos muito diferentes da história, o que pode não surpreender se partirmos do pressuposto de que as sociedades tendem a abrigar concepções conflitantes de infância. ( HEYWOOD, 2004, p. 49)
Neste momento, em que de forma mais específica, nos propomos a
estudar a criança e a infância na contemporaneidade, vamos nos deter um
pouco mais nesta ambivalência e ambiguidade, optando por aprofundar as
discussões, agora, nas seguintes contradições: impureza/inocência;
inato/adquirido e independência/dependência. É importante ressaltar que,
mesmo que algumas destas contradições tenham sido herdadas até mesmo de
84
antes da idade média, vamos estudá-las agora, por compreendermos, como já
frisamos anteriormente, que foi sob a lente das idéias contemporâneas que
passamos a enxergá-las melhor.
Segundo Heywood (2004), tanto a idéia da criança como impura, quanto
como inocente são heranças do Cristianismo, pois foi Santo Agostinho, um dos
chamados pais da Igreja, quem concluiu que a mancha do pecado original fora
transmitida de geração a geração, não poupando nem os recém-nascidos; e foi
o próprio Cristo quem disse, segundo São Mateus, que aquele que não se
converter e se tornar como criança, não entrará no Reino dos Céus.
Como podemos observar tanto pela afirmação acima, como pelos outros
aspectos já apontados no item 1.1, existia uma oscilação, entre dois extremos,
sobre a natureza boa ou má das crianças, desde a mais tenra idade, gerando
opiniões e posições diferentes em relação ao tema, mesmo entre os que
professavam a mesma crença.
O que entendemos mais importante para nós neste momento, é a
reflexão a que a seguinte afirmação nos conduz:
Na verdade, a associação da infância à inocência tornou-se profundamente arraigada na cultura ocidental, especialmente após os românticos deixarem sua marca, no século XIX. Ainda assim, uma coisa era proclamar a natureza angelical da infância em um poema, e outra, bastante diferente, seria criar personagens bem definidas em um romance, ou lidar com moleques de rua, que estavam longe de ser inocentes.(HEYWOOD, 2004, p. 51)
É essa contradição entre uma visão romântica - atemporal e
descontextualizada, que define a criança como um ser angelical, puro,
inocente, espontâneo, naturalmente bom, independente de qualquer coisa; e
algumas realidades vivenciadas por várias crianças, hoje, e ao longo de toda a
história da humanidade, que nos move a continuar estudando e buscando uma
nova forma de compreender a infância e a criança.
Outra ambivalência e ambigüidade bastante presente nos relatos do
passado e do presente sobre a infância é a questão sobre de que natureza é a
personalidade, os chamados dons e/ou aprendizagens da criança. Seriam
85
todos herdados biologicamente ou construídos/transmitidos a partir das
experiências do contexto do indivíduo?
Com base ainda nos autores já citados, podemos perceber que a idade
média, de uma maneira geral, tinha uma visão de inteligência e de
personalidade como algo herdado; em alguns momentos dos pais, em outros
da própria classe social a qual o indivíduo pertencia: “Para a mente medieval,
segundo Berkvem, a natureza com a qual se nasce é a influência mais
importante na vida, a matéria-prima sem a qual a criação mais refinada será
desperdiçada” (HEYWOOD, 2004, p. 52)
Embora a denominada Baixa Idade Média estivesse já familiarizada com
a idéia de criança como uma cera mole, possível de ser moldada de várias
formas: “Os educadores identificavam a infância como o período da vida em
que as pessoas eram mais receptivas ao ensinamento, e assim enfatizavam a
importância de se proporcionarem bons exemplos para que os jovens
seguissem.” (HEYWOOD, 2004, p. 52), a predominância ainda era a do
inatismo, ou seja, das características já definidas biologicamente, a partir de
heranças genéticas.
Essa contradição, com certeza, também influenciou muito o tratamento
dado à infância, facultando as discriminações e diferenças, a partir de questões
já pré-definidas e previamente estabelecidas.
Na realidade, foi só a partir do renascimento que o equilíbrio entre o
inato e o adquirido foi mudando, começando uma predominância de idéias em
torno do segundo. “A idéia de que a ‘mão que embala o berço define os
destinos da sociedade’ tornou-se sabedoria aceita.” (HEYWOOD, 2004, p. 52)
Porém, as contradições prosseguiram. De um lado, John Locke, com a
polêmica afirmação de que “de todos os homens que encontramos, nove entre
dez são o que são, bons ou maus, úteis ou não, por sua educação”.
(HEYWOOD, 2004, p. 52), dando origem à questão, que passou para a
posteridade como sendo a idéia de que a criança é uma folha em branco. De
outro, os avanços científicos já do final do século XIX, início do XX, negando
que a criança viesse ao mundo como uma folha em branco e questionando o
que havia em seus genes.
Foi ainda no contexto dessas contradições que surgiram os chamados
testes de QI – propostos inicialmente por Binet & Simon - para aprofundamento
86
dessa questão, sugerimos a leitura de Fontana e Cruz, 1997, p. 11-23 - que
acabaram gerando mais motivos para contradições, na medida em que foram
usados também para processos de discriminação de crianças, a partir da
identificação de QIs superiores ou inferiores, oferecendo, inclusive, um
processo educativo diferenciado, com base no nível de inteligência
apresentado por cada criança.
Essa contradição encontra-se hoje já bastante dirimida, até porque a
tendência atual é enfatizar a relação, a interação, entre o inato e o adquirido,
ao invés de priorizar um em detrimento do outro. Neste sentido, foi fundamental
a contribuição dos chamados autores interacionistas, notadamente Piaget
(1896-1980), Vigotski (1896-1934) e Waloon (1879-1962), cujas principais
idéias consideramos relevante retomar nesse momento, mesmo que de forma
breve.
Segundo La Taille (1992), embora Piaget (1896-1980) costume ser
criticado pelo fato de não considerar o papel do social no desenvolvimento
humano, essa crítica é injusta, considerando que o mesmo, embora não tenha
se detido longamente sobre esta questão, deixou balizas muito importantes,
não apenas na sua teoria, mas para a temática de uma forma geral, deixando
sempre muito claro, nas vezes em que se reportou ao assunto que “a
inteligência humana somente se desenvolve no indivíduo em função de
interações sociais que são, em geral, demasiadamente negligenciadas.”
(PIAGET, apud LA TAILLE, In: LA TAILLE, OLIVEIRA E DANTAS,1992, p. 11.)
Ou seja, apesar de propor estágios seqüenciais pelos quais todas as
crianças devem passar, e colocar que o desenvolvimento antecede a
aprendizagem, Piaget (1896-1980) contribuiu muito com a perspectiva
interacionista, esclarecendo, a partir das suas experiências com os próprios
filhos, e de outros estudos e experimentos realizados, que a criança se
desenvolve num intricado processo de trocas e interações entre o biológico e o
meio.
Diferentemente de Piaget (1896-1980), Vigotski (1896-1934) enfatizou
muito o social, o historicamente construído, enfatizando também que não é
preciso esperar por determinadas etapas do desenvolvimento para possibilitar
o acesso à aprendizagem, já que esta última pode impulsionar o primeiro.
Quando afirma que:
87
O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. (VIGOTSKI, 1999, p. 40)
Vigotski (1896-1934) está demonstrando, de forma muito clara, o valor que
atribui ás interações sociais no processo de formação dos aspectos tipicamente
humanos do comportamento. Essa proposta de Vigotski (1896-1934) bem
como os estudos sobre a chamada zona de desenvolvimento proximal, dentre
outros, são fundamentais para todos os educadores que desejam realizar uma
intervenção positiva e produtiva no processo de aprendizagem dos educandos.
Como interacionista, considerando também a relevância do inato e do
adquirido, do biológico e do social, Wallon (1879-1962) deixou uma grande
contribuição para os estudos acerca do desenvolvimento humano, afirmando
inclusive que:
Não há, portanto, hiato inicial entre o social e o individual, ainda que exista naturalmente toda uma série de conflitos entre o que se costuma designar por falta de jeito ou inaptidão da criança e as necessidades de acção imposta pelo meio, estando estas faltas de jeito ou estas inaptidões muitas vezes ligadas a sistemas de actividade cuja estrutura psicológica ou instintiva deve ser modificada pelas estruturas da vida técnica ou social. (WALLON, 1975, p.11)
Outro aspecto fundamental de Wallon (1879-1962), é que na sua
psicogenética “ a dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista
da construção da pessoa quanto do conhecimento”. (DANTAS, In: LA TAILLE,
OLIVEIRA E DANTAS 1992, p.85)
Consideramos pertinente abrir esse parágrafo para nos referirmos
brevemente a algumas idéias básicas de Piaget (1896-1980), Vigotski (1896-
1934) e Wallon (1879-1962), por compreendermos que as mesmas deram um
novo impulso aos estudos e entendimentos acerca do desenvolvimento
humano e, embora encontremos, em alguns aspectos, pontos de vista
88
divergentes entre os mesmos, temos clareza de que é possível um diálogo
entre os três, numa perspectiva de complementaridade, a partir de um
entendimento maior do objeto de estudo de cada um, bem como dos
condicionantes sociais, históricos, culturais, ideológicos e de formação
acadêmica dos mesmos.
Vamos prosseguir agora retomando as contradições da história da
infância que, infelizmente, apesar dos avanços teóricos, e até legais, ainda
persistem.
Uma outra contradição também muito presente na história da infância é
a questão da dependência ou independência da criança, principalmente em
relação a idade na qual este processo deve estar mais consolidado. A maioria
dos autores – Heywood, Freitas e Kulmann Jr, Cambi, Costa, dentre outros,
quando se reportam ao assunto são unânimes em afirmar que, embora a idade
de 7 anos fosse referência em algumas culturas e algumas épocas, não existia
uma definição precisa, sendo a classe social a qual a criança pertence um
outro forte indicador de como e quando ela se tornará independente, ou
permanecerá na dependência da família:
Os seres humanos nascem desamparados e, quando se tornam independentes, com o próprio lar, considera-se que tenham deixado para trás a infância e a juventude. Alguns jamais conquistam a independência completa, como no caso de escravos e servos, e assim sofrem da indignidade de serem considerados parcialmente como ‘crianças’ por toda a vida. [...] Ainda no século XIX, a maioria das crianças no ocidente era estimulada a se sustentar muito cedo. A idade de 7 anos era o momento informal da virada, quando geralmente se esperava que os filhos de camponeses e artesãos começassem a ajudar os pais com pequenas tarefas na casa, na fazenda ou no ateliê. (HEYWOOD, 2004, p. 54)
Hoje essa contradição dependência/independência ainda persiste, tendo
também, não somente a idade, mas principalmente as diferenças entre classes
sociais e entre concepção de infância de cada família, ou grupo social, como
fatores determinantes dessa questão: enquanto crianças das chamadas
classes populares, aos 5 ou 6 anos já tomam conta de casa e de irmãos
89
menores para que as mães trabalhem fora; nesta mesma idade, e até maiores,
as crianças das classes mais favorecidas economicamente falando, ainda se
encontram pajeadas por babás, que as banham , alimentam e cuidam delas
integralmente.
Na nossa opinião, essas questões que Heywood trata como sendo as
ambigüidades e ambivalências da infância, possuem toda uma relação com as
tratadas por Leite Filho In: Leite Filho; Garcia (2001, p. 50) como sendo os
paradoxos da infância: “ Para Pinto & Sarmento (1997), a maneira como a
sociedade ‘dos adultos’ considera as crianças e suas circunstâncias e
condições de vida dá a infância um caráter paradoxal [...]”
A partir dessa afirmação, o autor supra citado vai colocando o que, para
ele, seriam os inúmeros paradoxos da infância na contemporaneidade.
Partindo do que é proposto pelo autor, porém com uma estrutura textual
diferente, vamos elencar os mesmos:
• Embora a formulação de Leis Nacionais e Internacionais - Constituição
de 88, a convenção dos Direitos da criança em 1989 – aprovada pelas Nações
Unidas, o ECA, a LDB 9394/96, dentre outras, que garantem um conjunto de
direitos fundamentais, próprios e inalienáveis às crianças; elas constituem o
grupo etário onde há mais pobreza, sendo a população mais sujeita a opressão
e afetação das condições de vida; são as principais vítimas dos conflitos
contemporâneos; pertencem a um dos grupos que possui um crescimento
significativo no aumento do número da Aids; São vítimas freqüentes da
prostituição infantil associada ao turismo sexual, do aumento no número de
crianças presas ao trabalho precocemente, bem como vítimas também de
perseguição e assassinato.
• Num mundo que proclama gostar tanto de crianças, o número delas
decresce a cada dia, e as mesmas vão dispondo de muito menos tempo e
espaço.
• Embora acreditando que as crianças precisam estar junto aos pais,
nunca foi tão grande o número de pais que vivem separados.
• Mesmo os adultos dizendo que valorizam a espontaneidade das
crianças, a vida delas é cada dia mais submetidas as regras.
90
• As crianças são importantes e sem importância ao mesmo tempo:
embora pareça um consenso que se deve dar prioridade as crianças, as
mesmas continuam alijadas das decisões políticas e econômicas.
• As crianças permanecem longo tempo afastadas do convívio social,
embora os adultos acreditem e preguem que deve ser dada as crianças a
melhor iniciação à vida.
• Há uma crítica as infantilidades das crianças, embora se ache que elas
devam se comportar como crianças
• Ora se cobra da criança uma adultização, tratando-as como adulto em
miniatura; ora elas são infantilizadas, sendo consideradas como imaturas e
despreparadas.
• Mesmo defendendo que as crianças devem ser educadas para a
liberdade e a democracia, a organização das instituições e serviços dedicados
à infância, se utilizam muito do controle e da disciplina.
Na realidade, o que podemos inferir de todos estes paradoxos, é que:
Apesar do ordenamento legal ter avançado no Brasil, no sentido de conceitos e estabelecimento de direitos para as crianças, a situação da infância brasileira ainda não é boa, ou mesmo razoável. Muito ainda se tem por fazer. Educadores, pesquisadores, governantes e em especial professores precisam, vigilantemente, lutar para assegurar as conquistas já alcançadas ‘no papel’, mas que não se concretizaram na realidade. (LEITE FILHO, In: LEITE FILHO E GARCIA, 2001, p. 52)
Essa afirmação nos leva a inferir que, além de todas as ambigüidades,
ambivalências e paradoxos já mencionados, existe uma outra questão que
permeia também toda a história da criança e da infância: é a contradição entre
o legal e o real; entre o discurso e a prática.
Comênios (1592-1657), ainda no século XVII, pregava a necessidade de
“uma educação que ensinasse tudo a todos”; em pleno século XXI, a escola
continua segregando e discriminando crianças, jovens e adultos. Esse mesmo
autor se refere ainda a importância de uma educação voltada para as crianças
91
menores de 6 anos de idade, designada por ele como ‘escola maternal’, aberta
também para todas as crianças indistintamente; ainda hoje – séc. XXI, as
estatísticas dizem o seguinte:
Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2003, apenas 37,7% do total de crianças com idade entre 0 e 6 anos freqüentam uma instituição de Educação Infantil ou de Ensino fundamental. (BRASIL, 2005, p.06)
Rousseau (1712-1772), ainda no século XVIII, igualmente a Comênios
(1592-1657), redimensiona a idéia de infância, propondo que a criança
deixasse de ser vista como um adulto em miniatura e passasse a ser
considerada e respeitada como um indivíduo que vive um período especial da
vida, a infância; Pestalozzi (1746-1827), também se referia à pedagogia do
afeto; porém, ainda hoje, vemos nos paradoxos já apresentados, as
dificuldades de se levar esse respeito, essa consideração, esse afeto, para a
convivência diária com as crianças. Os chamados educadores da infância –
Froebel (1782-1852), Decroly (1871-1932) e Montessori (1879-1952), dentre
outros, ainda no final do século XIX, início do século XX, afirmam a
necessidade de uma educação mais livre, que respeite a subjetividade, a
espontaneidade das crianças; um espaço arejado, amplo, específico para o
trabalho com a criança pequena, porém, ainda hoje – séc. XXI, encontramos as
crianças abafadas em cubículos, submetidas a rigidez de rotinas repetitivas:
Refiro-me a experiências que trazem para a pré-escola, especialmente, o modelo da escola fundamental, as atividades com lápis e papel, os jogos ou atividades realizadas na mesa, a alfabetização ou a numeralização precoce, o cerceamento do corpo, a rigidez dos horários e da distribuição das atividades, as rotinas repetitivas, pobres e empobrecedoras. (BUJES In: CRAIDY; KAERCHER, 2001, p. 17)
Tem razão Heywood (2004) quando afirma a existência de um fio de
ambivalências e ambigüidades percorrendo toda a história da criança e da
92
infância. Esta constatação nos leva também a afirmar que, realmente a infância
é socialmente construída, cada sociedade tem a sua concepção, e várias
concepções subsistem num mesmo período e numa mesma época, embora
precisemos reconhecer que, apesar de tudo isso, existem características que
são próprias, inerentes ao período da infância, e que elas – as crianças, não
podem deixar de ser consideradas: “ [...] como sujeitos que vivem um
momento em que predominam o sonho, a fantasia, a afetividade, a brincadeira,
as manifestações de caráter subjetivo.” (BUJES, In: CRAIDY; KAERCHER,
2001, p. 17)
Entendemos que só essa percepção da infância como fato social,
construída historicamente, nos possibilita a compreensão e o respeito ás
especificidades da mesma, bem como a luta por uma Educação Infantil que
considere essas especificidades, promovendo a vivência das cem linguagens
da criança, conforme nos propõe Malaguzzi (In: Edwards, Gandim e Formam,
1999) no seu belo poema:
AO CONTRÁRIO, AS CEM EXISTEM (Loris Malaguzzi.)
A criança É feita de cem.
A criança tem cem mãos Cem pensamentos
Cem modos de pensar De jogar e de falar. Cem sempre cem Modos de escutar
De maravilhar e de amar. Cem alegrias
Para cantar e compreender. Cem mundos
Para descobrir Cem mundos Para inventar Cem mundos Para sonhar. A criança tem
Cem linguagens ( e depois cem cem cem)
mas roubaram-lhe noventa e nove. A escola e a cultura
Lhe separaram a cabeça do corpo. Dizem-lhe:
93
De pensar sem as mãos De fazer sem a cabeça
De escutar e de não falar De compreender sem alegrias De amar e de maravilhar-se
Só na páscoa e no Natal. Dizem-lhe:
De descobrir um mundo que já existe E de cem roubaram-lhe noventa e nove.
Dizem-lhe: Que o jogo e o trabalho A realidade e a fantasia
A ciência e a imaginação O céu e a terra
A razão e o sonho São coisas
Que não estão juntas. Dizem-lhe enfim:
Que as cem não existem. A criança diz:
Ao contrário as cem existem.
3.2- As I.E.I. ao longo da história
Em falando de crianças e infância, não poderíamos deixar de nos
reportar as instituições que, historicamente, também foram criadas para
atender a estas crianças:
As creches e pré-escolas surgiram depois das escolas e o seu aparecimento tem sido muito associado com o trabalho materno fora do lar, a partir da revolução industrial. Devemos lembrar, no entanto, que isto também esteve relacionado a uma nova estrutura familiar, a conjugal, na qual pai/mãe/seus filhos passaram a constituir uma nova norma, diferente daquelas famílias que se organizavam de forma ampliada, com vários adultos convivendo num mesmo espaço, possibilitando um cuidado que nem sempre estava centrado na figura materna. (BUJES, In: CRAIDY E KAERCHER, 2001, p. 14)
94
É interessante percebermos que, da mesma forma que Bujes (In:
CRAIDY e KAERCHER, 2001), mais recentemente, estabelece relações entre
as mudanças na estrutura familiar e o surgimento das instituições que atendem
a criança pequena, Ariès, (1981), antes dela, também relaciona um novo
sentimento de família com a educação.
Para nós fica patente, mais uma vez, a estreita relação entre família e
escola – referendando ainda mais a relevância da temática que trazemos
novamente à tona nesse trabalho. Vamos agora fazer uma breve retrospectiva
das funções exercidas pelas creches e pré-escolas ao longo da história, nos
detendo um pouco mais na função proposta na contemporaneidade.
O contexto histórico desse atendimento tem revelado, ao longo do tempo, uma divergência de ênfase no que se refere às funções da pré-escola. Inicialmente, o atendimento proposto às classes populares foi médico e sanitário; em seguida, passou a incorporar o aspecto nutricional e social, e só mais recentemente incluiu uma preocupação educacional. Essas funções, por um lado, acompanham as profundas transformações sociais que os países em desenvolvimento vêm enfrentando e, por outro, são influenciadas pelas descobertas da psicologia e da pedagogia modernas, no que se refere ao processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança. (SOUZA, In: KRAMER; SOUZA, 1991 p.13)
Este texto de Souza, escrito em 1991, e por isso não contemplando
ainda a função proposta para a Educação Infantil na atualidade – educar e
cuidar, se reporta a uma questão importante que merece ser discutida e
refletida: o fato da função atribuída á Educação Infantil, na época do escrito da
autora ainda denominada de pré-escola, passar realmente por muitas
divergências, no tocante ao que é, ou não, enfatizado em cada época, cada
sociedade e, por que não dizer, cada classe social a qual o trabalho era
destinado.
Igualmente a concepção de infância, podemos afirmar que as funções
atribuídas a Educação Infantil, também são, muitas vezes, ambíguas,
ambivalentes e paradoxais, chegando a coexistir, numa mesma sociedade e
em um mesmo período histórico, funções tão diferentes, que se torna difícil
95
perceber que estamos tratando da mesma modalidade de ensino. Saber que as
transformações sociais, bem como as novas descobertas das ciências,
contribuem para mudanças nas funções da Educação Infantil, nos ajuda a
compreender um pouco o porque de algumas dessas ambigüidades.
Vamos agora, com base em estudos de Abramovay e Kramer (In:
SOUZA e KRAMER, 1991), retomar algumas funções que a Educação Infantil
vem assumindo ao longo da história, para depois prosseguirmos nas nossas
reflexões:
» Guardar as crianças – função guardiã
Esta função aparece, a partir do próprio surgimento das instituições de
Educação Infantil, por volta do século XVIII, como reflexo das
transformações sociais, econômicas e políticas. Tem um caráter
assistencialista, objetivando guardar as crianças para as mães poderem
ingressar no mercado de trabalho.
É interessante perceber que, nessa proposta inicial de surgimento das
I.E.I., o objetivo das mesmas não era atender as necessidades das
crianças, mas das mães trabalhadoras. Essa percepção nos ajuda, não a
aceitar, mas a entender muitas das questões que até hoje permeiam o
trabalho realizado por algumas dessas I.E.I.
» Compensar as carências infantis - função preparatória
Essa função surge, por volta do Séc. XIX, a partir da influência de
Froebel (1782 - 1852) nas favelas da Alemanha; de Montessori (1870 -
1952) nas favelas da Itália e de Reabodif nas favelas americanas.
Compensar as deficiências das crianças, sua miséria, sua pobreza e a
negligência das suas famílias era o objetivo dessa função atribuída a
Educação Infantil.
96
Após a 2ª Guerra Mundial, influenciadas, de um lado pela psicanálise e
pelas teorias do desenvolvimento infantil; de outro pelos estudos lingüísticos
e antropológicos, aliados as pesquisas que correlacionavam linguagem e
pensamento com rendimento escolar, dando origem a abordagem da
chamada “privação cultural”, essa abordagem foi fortalecida. No Brasil, o
auge foi a década de 70, onde a chamada pré-escola, foi considerada
como a solução para todos os males, capaz de suprir todas as carências e
deficiências, atribuídas, principalmente, as crianças das classes populares.
» Promover o desenvolvimento global e harmônico da criança - Objetivos em si mesma.
Com uma filosofia bastante ampla – promover o desenvolvimento global
e harmônico da criança, essa proposta acabou facultando um
esvaziamento da função da pré-escola. Sob o disfarce de que tem funções em si mesma, cabe tudo, sem uma discussão mais aprofundada sobre um
trabalho que traga contribuições reais para as crianças. “Já que a pré-
escola não é responsável pelo desempenho no 1º grau, ela até não
necessita de qualidade, podendo ser informal, não-convencional,
assistemática etc” (ABRAMOVAY & KRAMER, In: SOUZA; KRAMER, 1991,
p. 28)
» Instrumentalizar as crianças – função pedagógica
Considerar a realidade e os conhecimentos infantis como ponto de
partida, buscando ampliá-los através de atividades que possuam um
significado concreto para a vida das crianças, assegurando
simultaneamente a aquisição de novos conhecimentos, é a proposta dessa
nova função atribuída a Educação Infantil. A mesma preconiza também uma
confiança nas possibilidades de desenvolvimento das crianças e uma
97
valorização das suas manifestações, organizando um trabalho sistemático
e intencional.
Mesmo considerando a brevidade com que foram apresentadas, estas
são, em linhas gerais, as principais funções atribuídas/assumidas pela
Educação Infantil ao longo do tempo. Porém, é preciso acrescentar que, a
predominância, e até mesmo a existência - ou não, de uma ou outra dessas
funções, está atrelada, não apenas ao tempo cronológico e/ou histórico,
mas também - e até mesmo principalmente, a classe social a qual a criança
pertence.
Dessa forma, tanto a função guardiã, quanto à preparatória,
estiveram/estão muito mais presentes nas instituições que trabalham com
as crianças das classes populares, enquanto aquelas funções mais voltadas
para a educação e o desenvolvimento de forma mais ampla, estão mais
presentes no trabalho voltado para as crianças das classes mais abastadas.
É importante que se diga também que, mesmo que de forma implícita,
disfarçada apenas sobre a capa da guarda, da assistência, ou até mesmo
do cuidado, todas essas funções possuem um caráter educativo/formativo
que precisa ser desvelado e discutido, para que não continue a ser
direcionado apenas para a submissão e a aceitação da ideologia neo-
liberal.
Após essas considerações, vamos discutir a função proposta para a
educação infantil na atualidade, buscando perceber também, seus desafios
e possibilidades.
» Educação Infantil na contemporaneidade - Educar e Cuidar
Segundo Tiriba (2006), foi após a primeira metade da década de 80, que
a expressão guarda – até então utilizada por textos acadêmicos e documentos
oficiais para se referir as atividades assistenciais desenvolvidas pelas creches,
passou a ser substituída pelas palavras cuidado e cuidar. E foi só na década de
90, com a possibilidade das creches e pré-escolas serem incorporadas aos
sistemas de ensino como primeira etapa da educação básica, que se começou
98
a pensar sobre a possibilidade de integração entre as atividades de cuidado,
realizada pelas creches, e as de cunho pedagógico, desenvolvidas nas pré-
escolas.
Essas propostas de mudança estão respaldadas por todo um amparo
legal, que surgiu também nesse período, impulsionado pela Constituição de 88,
e sistematizado e detalhado pelo ECA de 1990, pela LDB 9394/96, e por
algumas outras leis e documentos referendados pelo próprio Ministério da
Educação, onde a Educação Infantil, que antes era considerada,
primordialmente, um direito das mães trabalhadoras, passa a ser um direito da
criança: “Hoje, pelo ordenamento legal, temos assegurada no Brasil uma
concepção de criança cidadã e de Educação Infantil como direito da criança.” (
LEITE FILHO, In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001, p. 46)
Retomando as nossas reflexões iniciais sobre a função da Educação
Infantil, e após tomar conhecimento de algumas dessas funções que
predominaram ao longo da história, bem como das mudanças propostas para a
nomenclatura, e dos aportes legais impulsionados pela Constituição de 88, nos
deparamos com a função proposta para essa modalidade de ensino na
contemporaneidade, cuja “solução conceitual encontrada foi o binômio educar
e cuidar.” (TIRIBA, 2006, p. 2)
Porém, essa solução conceitual não foi suficiente para dirimir um
impasse que continua presente na Educação Infantil, que é discutir e refletir
sobre duas ações indissociáveis – educar e cuidar que, equivocadamente, são
vivenciadas de forma totalmente dissociada na prática pedagógica da maioria
das instituições infantis. Dissociação esta que pode ser compreendida a partir
da seguinte afirmativa:
A visão negativa de creche, como uma instituição que cuida de crianças pobres, as quais não podem desfrutar do convívio de seus pais que estão sempre ausentes do lar, trabalhando, e a visão positiva de pré-escola ou jardim-de-infância, freqüentados por crianças ricas, cujas famílias optam por deixar as crianças por um determinado período de tempo, a fim de que convivam com outras crianças de seu meio social e recebam ensinamentos morais , manuais e intelectuais pode ter dado início à separação entre cuidar, educar e brincar que ainda hoje marca as práticas pedagógicas das instituições de Educação Infantil. (ASSIS, In: ANGOTTI, 2006, p.97)
99
Essa marca citada pela autora, na nossa visão, pode ser compreendida,
primordialmente, a partir de duas situações bem presentes nas práticas dessa
modalidade de ensino: primeiro, a desvalorização da função/ação de cuidar,
que leva a uma relação direta com a maternagem, o que acaba desvalorizando
as profissionais que atuam nessa área, distanciando-as inclusive do processo
de formação profissional tão necessário e urgente, considerando as
especificidades do trabalho com as crianças da Educação Infantil:
A injusta estrutura social brasileira espelha-se sobremaneira nas instituições educacionais, onde as atividades de cuidado são empurradas para os de menor salário e status, dado que a elas é atribuído um menor valor que àquelas denominadas educativas. (ROSSETI-FERREIRA, 2003, p.10)
Em segundo lugar, essa aparente dicotomia entre educar e cuidar,
principalmente nas instituições públicas, destinadas as crianças das classes
populares, acaba prejudicando o trabalho realizado, na medida em que,
disfarçada em uma prática equivocada só de cuidados, essas instituições
trabalham, mesmo que implicitamente, uma educação voltada para a
subserviência, totalmente distanciada do seu caráter emancipatório, caráter
esse, já apontado como primordial na introdução desse trabalho, a partir da
proposta de Assmann (2007).
Para ilustrar essa situação, vamos lembrar um exemplo de uma rotina de
banho numa creche, que se assemelhava “as linhas de montagem das fábricas
ironizadas por Charles Chaplin no filme Tempos Modernos” (ROSSETI-
FERREIRA, 2003, p.10), tanto pelas ações mecânicas realizadas pelas
professoras, quanto pela situação de submissão, silêncio e passividade as
quais as crianças eram submetidas, sem o mínimo incentivo e possibilidade de
iniciativa e autonomia, numa atividade permanente da rotina diária, como é a
atividade do banho, onde as crianças poderiam estar sendo estimuladas a
desfrutar o prazer da água escorrendo no corpo, bem como a interagir e brincar
umas com as outras, dentre outras possibilidades.
100
Essas duas questões explicitadas acima, como também a da
escolarização precoce – onde a Educação Infantil continua a ser vista apenas
como tendo a função de preparar para o nível posterior da escolaridade, dentre
outras vivenciadas no cotidiano das I.E.I., apontam para a urgência da
superação dessa dicotomia, superação essa que, conforme aponta Haddad
(2003), passa pela necessidade de se profissionalizar o cuidado e também de
se ampliar o conceito de educação. Aproveitamos para acrescentar a
pertinência também de se incluir o brincar como um outro elo importante nesse
processo, devendo ser percebido mesmo como um eixo norteador fundante do
trabalho realizado com a criança na Educação Infantil:
É importante que se processe uma nova forma de interpretar o educar na Educação Infantil, uma prática educativa a partir da brincadeira talvez seja um caminho. Na brincadeira, a professora pode intervir pedagogicamente nas ações de cuidado e educação, a fim de promover o desenvolvimento das crianças nas instituições de Educação Infantil. Assim, reconhecendo a intencionalidade do trabalho educativo que se configura pela mediação que a professora estabelece entre a criança e o conhecimento, há de se considerar que a Educação Infantil é um direito da criança, por meio do qual ela encontra condições para se apropriar ativamente do mundo, através da tríade cuidar-educar-brincar. ( ASSIS, In: ANGOTTI, 2006, p.99)
Considerando que a pertinência da inclusão do brincar já ficou
referendada pelas afirmações acima, e que a sua relevância para o
desenvolvimento infantil será melhor explicitada e discutida no próximo
capítulo, onde ele constará como uma das temáticas estudadas/trabalhadas,
tanto com as professoras, como com as crianças e suas famílias, vamos agora
prosseguir com as nossas reflexões em torno do cuidar e do educar, buscando,
nas propostas dos autores que serão citados a seguir, compreender, ampliar e
profissionalizar essas ações, para que elas possam ser incorporadas à prática
pedagógica das instituições de Educação Infantil, trazendo uma contribuição
efetiva para os processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças.
101
Apesar de termos clareza de que essas ações são indissociáveis,
conforme já apontamos acima, compreendemos também que as mesmas
possuem especificidades que precisam ser apresentadas e discutidas, para
que possam ser trabalhadas de forma integrada. Porém, considerando que as
maiores polêmicas giram em torno do cuidar, pela desvalorização histórica que
essa prática carrega, vamos nos deter, inicialmente, um pouco mais na
discussão da mesma.
Ao refletirmos sobre o cuidar na Educação Infantil, não podemos deixar
de nos reportar a famosa fábula número 220 de Higino (43 a.C. -17 d.C),
resgatada por Boff (2003), e que nós pedimos permissão para reproduzir aqui:
Certo dia, cuidado, passeando nas margens do rio, tomou um pedaço de barro e moldou-o na forma do ser humano. Nisso apareceu Júpiter e, a pedido de Cuidado, insuflou-lhe espírito. Cuidado quis dar-lhe um nome, mas Júpiter lho proibiu, querendo ele impor o nome. Começou uma discussão entre ambos. Nisso apareceu a Terra, alegando que o barro é parte de seu corpo e que, por isso, tinha o direito de escolher um nome. Gerou-se uma discussão generalizada e sem solução. Então todos aceitaram chamar Saturno, o velho deus ancestral e senhor do tempo, para ser o árbitro. Este tomou a seguinte sentença, considerada justa: - você Júpiter, que lhe deu o espírito, receberá o espírito de volta quando essa criatura morrer. Você, Terra, que lhe forneceu o corpo, receberá o corpo de volta, quando essa criatura morrer. E você, Cuidado, que foi o primeiro a moldar a criatura, acompanhá-la-á por todo o tempo em que ela viver. E, como vocês não chegaram a nenhum acordo sobre o nome, decido eu: chamar-se-á homem, que vem de húmus, que significa “terra fértil”. (p.28-29)
Dessa forma, podemos dizer que: “O cuidado é o a priori ontológico,
aquilo que deve existir antes, para que possa surgir o ser humano. O cuidado,
portanto, está na raiz frontal da constituição do ser humano. Sem ele, o
humano não existiria” (BOFF, 2003, p. 29). O que nos leva a compreender a
relevância e a necessidade desse redimensionamento em torno da questão do
cuidado na Educação Infantil, retirando-o da perspectiva apenas dos chamados
cuidados primários – que apesar de necessários e relevantes também, estão
102
sempre, meio que de forma pejorativa, condicionados a maternagem,
ampliando-o, conforme propõem os autores abaixo elencados:
Segundo Bujes (In: CRAIDY E KAERCHER, 2001), cuidar, envolve não
só os cuidados primários como higiene, sono e alimentação, mas também
prover ambientes acolhedores, seguros, alegres, instigadores, com adultos
bem preparados, organizados para oferecer experiências desafiadoras e
aprendizagens adequadas às crianças de cada idade, o que precisaria envolver
também a organização de horários e de espaços, bem como a atenção aos
materiais e brinquedos e o respeito ás manifestações individuais.
Para Costa (2005), os cuidados na Educação Infantil estão relacionados,
tanto à sobrevivência, como ao desenvolvimento da identidade das crianças, o
que propicia que se leve em conta as necessidades integrais das mesmas,
suas peculiaridades e sua condição de sujeito ativo do seu processo de
desenvolvimento.
Assis (In: ANGOTTI, 2006), em se referindo ao cuidar, diz que o mesmo
não é a parte menos nobre, ou o mal necessário do fazer na Educação Infantil,
mas sim, é parte integrante do fazer docente nessa modalidade de ensino,
sendo tão importante quanto à educação. Já Didonet (2003), aponta que:
Não há um conteúdo “educativo” na creche descolado dos gestos de cuidar. Não há um “ensino”, seja um conhecimento ou um hábito, que use via diferente da atenção afetuosa, alegre, disponível e promotora da progressiva autonomia da criança. (p. 6)
Compreendendo já bastante referendada, tanto a relevância e a
necessidade do cuidado na Educação Infantil, quanto a sua abrangência e
complexidade, vamos agora explicitar o que compreendemos como educar, de
forma mais específica, e retomar a indissociabilidade entre o cuidar e o educar,
para que possamos refletir sobre como está a vivência dessa nova função nas
instituições de Educação Infantil, atualmente.
Para Bujes (In: CRAIDY; KAERCHER, 2001), educar, considerando
educação como o processo através do qual a criança passa a participar de
uma experiência cultural que é própria do seu grupo social, tendo direito a
103
acolhimento, segurança, lugar para a emoção, para o gosto, para a
sensibilidade, o desenvolvimento de habilidades sociais, o domínio do espaço e
do corpo, a curiosidade e a investigação; é considerado como a condição de
promover todos estes aspectos.
Essa abrangência do educar, retirando-o da esfera apenas do cognitivo,
do conceitual, clarifica mais ainda o caráter realmente complementar e
indissociável que existe entre o educar e o cuidar, nos levando a perceber
também que;
A compreensão de que uma ação não exclui a outra é muito importante para compreender que a criança deve ser tratada como um ser único e não dividida em cognitivo e físico. Consequentemente, a postura da professora não deve se diferenciar entre as atividades de higiene/saúde e as pedagógicas, até porque, em ambas ela está educando e cuidando, e essa ação indissociável é o objeto de trabalho da professora de Educação Infantil. (DUTOIT, consultora do RCNEI, texto mimeografado)
Após todas essas considerações sobre a função da Educação Infantil na
atualidade, bem como da necessidade de continuar refletindo sobre as
ambivalências, ambigüidades e paradoxos, que, além de permear a história
da infância, aparecem também na história desta modalidade de ensino,
podemos nos indagar: será que, pelo fato de estar amparada por todo um
aporte legal, bem como pela valorização que demonstra para com os
processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, essa nova
função está promovendo mudanças na realidade das mesmas, e sendo
realmente contemplada nas instituições de Educação Infantil?
Infelizmente, com base em todo um estudo, é o autor Leite Filho (In:
LEITE FILHO; GARCIA, 2001), que nos responde, afirmando que, embora todo
este aparato em torno da nova função, e mesmo a legislação apresentando a
Educação Infantil como um direito de criança:
Isto não assegura, no entanto, que a realidade das crianças brasileiras tenha mudado, nem mesmo que as creches e pré-escolas tenham modificado suas propostas e seus trabalhos
104
pedagógicos no sentido de, coerentemente com novas leis e diretrizes, desenvolverem um cuidar das/educar as crianças de acordo com uma pedagogia cidadã, que sem dúvida passou a ser demandada na última década do final do século passado (LEITE FILHO, In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001, p. 46)
Ou seja, mais uma vez, vamos nos deparar com um paradoxo,
considerando que, embora definida e assegurada em lei, a função da
Educação Infantil continua sem atender aos interesses das crianças, na medida
em que a grande maioria das instituições que trabalham com esta modalidade
de ensino, ainda não modificaram as suas propostas no sentido de contemplá-
la.
Essa é a realidade com a qual nos deparamos na nossa prática de
formadoras de professoras da Educação Infantil. Na verdade, a afirmação mais
coerente é a de que todas essas funções atribuídas a Educação Infantil ao
longo da história, ainda se encontram presentes nas instituições infantis do
nosso estado e, porque não dizer, do nosso País.
Muitas das nossas instituições – apesar dos avanços legais já
conquistados no papel, ainda se apresentam como verdadeiros depósitos de
crianças, apenas ‘guardando-as’, enquanto suas mães buscam o trabalho fora
do lar, sem nenhuma preocupação efetiva com os processos de aprendizagem
e desenvolvimento dessas crianças. Outras se estruturam como verdadeiras
‘escolas preparatórias’, objetivando, através de exercícios e treinamentos
monótonos e repetitivos, com base mnemônica - sem nenhum incentivo a
reflexão e a criatividade, deixar o aluno ‘pronto’ para o ingresso no Ensino
fundamental.
Essa realidade, ainda tão preocupante, nos leva a uma clareza maior da
relevância de estarmos, cada vez mais, estudando, discutindo e refletindo
sobre a formação das crianças, bem como buscando o fortalecimento da
relação entre família e Instituição de Educação Infantil, como uma forma de
possibilitar que os direitos dessas crianças ultrapassem a letra das leis, e
cheguem à realidade das nossas instituições, principalmente as instituições
públicas, onde estão ás crianças das classes populares que, na maioria das
vezes, dispõem apenas desse espaço como oportunidade de se tornarem
atores, sujeitos da sua própria história.
105
3.3 - As famílias e suas histórias Em pesquisa anterior, Farache (2004), já citada na introdução e no
capítulo 1 desse mesmo trabalho, fizemos uma retrospectiva da história da
família, retomando desde a chamada família consangüínea, passando pelas chamadas famílias punaluana, sindiásmica e patriarcal, que se
caracterizavam, respectivamente, por se fundarem sobre matrimônios de várias
irmãs carnais e colaterais com os maridos de cada uma das outras no interior
de um grupo, ou de vários irmãos com as mulheres dos outros, passando pelos
matrimônios entre casais singulares, mas sem obrigação de coabitação
exclusiva, bem como sobre o matrimônio de um homem com diversas
mulheres, até chegarmos na chamada família nuclear, composta por pai, mãe e
filhos, entre outras estruturas atuais.
Dessa forma, considerando o estudo já realizado anteriormente,
optamos, neste capítulo, por discutir e refletir um pouco mais sobre os
impactos das transformações sociais, econômicas, tecnológicas, culturais e
políticas sobre as várias estruturas familiares da contemporaneidade, sempre
com a convicção de que: tenha a estrutura que tiver, a família é fundamental na
vida e na formação do indivíduo.
Outro ponto importante que vale a pena ressaltar é que:
Embora a cada momento histórico corresponda um modelo de família preponderante, ele não é único, ou seja, concomitante aos modelos dominantes de cada época, existem outros, com menor expressão social, como é o caso das famílias africanas escravizadas. Além disso, o surgimento de uma tendência não elimina imediatamente a outra, prova disso é que neste início de século podemos identificar a presença do homem patriarca, da mulher “rainha do lar” e da mulher trabalhadora. Assim, não podemos falar de família, mas de famílias, para que possamos tentar contemplar a diversidade de relações que convivem em nossa sociedade. (PEQUENO, 2004, p.3)
106
Ou seja, apesar da família ser uma instituição social e historicamente
construída, tendo estruturas diferenciadas em cada momento histórico e
contexto sócio-econômico-cultural diversos, várias estruturas familiares
diferentes acabam convivendo e existindo num mesmo período e no interior de
uma mesma cultura. É importante termos clareza desse fato, para buscarmos
vencer o preconceito de que é preciso haver um único modelo de família e/ou
de que apenas esse único modelo possui uma estrutura capaz de contribuir, de
forma positiva, com a formação das novas gerações.
Podemos dizer que a nossa sociedade contemporânea é campeã na
coexistência de várias estruturas familiares: famílias nucleares – pai, mãe e
filhos; famílias alargadas – pai, mãe, filhos, avós, tios, primas; famílias sem
laços consanguíneos – crianças adotadas por casais ou por uma única pessoa;
as chamadas famílias monoparentais, que são chefiadas só por mulheres ou só
por homens – pai ou mãe e os filhos do casamento desfeito; famílias
compostas por casais homossexuais e filhos adotivos ou filhos de um dos
membros do casal; as chamadas famílias unidas ou reconstituídas - formadas
por um casal, os filhos de cada um - frutos de uniões anteriores, e os filhos de
ambos, dentre outras estruturas que por ventura nos escaparam.
Conforme já foi apresentado e discutido no decorrer desse trabalho,
existe uma relação direta entre as transformações sociais e as estruturas
familiares. Considerando que, como nos aponta Assmann (2007), nunca
houve, ao longo da evolução da espécie humana, mutações e transformações
tão profundas e rápidas em vários aspectos da vida cotidiana, como podemos
constatar no atual período histórico, fica mais fácil compreender essa
diversidade de estruturas familiares da contemporaneidade.
Vamos agora refletir um pouco mais sobre algumas dessas
transformações e mutações, e seus principais impactos sobre as famílias,
partindo da seguinte afirmação:
As mudanças decorreram de vários fatores: impacto da tecnologia e das novas idéias sobre a economia, com as modificações correspondentes da natureza, da organização e da divisão do trabalho; transformações demográficas e sociais ligadas ao crescimento populacional e que levam a uma rápida industrialização e urbanização; migrações étnicas e políticas, e,
107
como conseqüências de todos esses fenômenos, ameaças implícitas aos sistemas de valores tradicionais. (HUGHES, In: DELORS, 2005, p. 39-40)
Como podemos perceber, as mudanças de ordem tecnológica e
econômica, que levaram, inicialmente, as famílias a deixarem o campo e se
mudarem para as cidades, desde o final do século XVIII - com a chamada
revolução industrial, modificaram enormemente a estrutura das famílias,
propiciando que as mesmas rompessem com as chamadas famílias alargadas
- onde pais, avós, tios e vizinhos, possuíam uma responsabilidade maior e mais
direta com as crianças com as quais conviviam; para as chamadas famílias
nucleares, que diminuíram muito de tamanho quando chegaram as cidades –
ficando reduzida a pai, mãe e filhos, perdendo assim, não apenas a
possibilidade de vários adultos para cuidar e educar a criança no próprio
ambiente doméstico, como também, alguns valores e tradições arraigados a
esses ambientes e transmitidos a essas novas gerações, em sua grande
maioria, a partir da tradição oral e da própria convivência no dia-a-dia.
Podemos afirmar que esse foi o primeiro grande impacto, seguido por
outros, decorrentes deste e, mais notadamente, os que dizem respeito a
independência e emancipação feminina que, infelizmente, mesmo sem nos
arvorarmos aqui a discutir o aspecto moral e ético da questão, contribuíram
também para as modificações nas estruturas familiares, a partir do momento
em que, saindo para o mercado de trabalho e buscando, através das lutas
feministas, não apenas sair do estado de subserviência em que vivia em
relação aos homens – o que consideramos válido; mas buscando ultrapassá-
los em questões que vão de encontro a sua própria natureza biológica e
emocional, acabou sendo protagonista e vítima, ao mesmo tempo, de uma
crise de valores que contribuiu, a nosso ver, com alguns problemas que
enfrentamos hoje - com nossas crianças, jovens e até mesmo adultos.
Principalmente os que dizem respeito a busca desenfreada do individualismo,
do consumo, do ter, em detrimento do ser; mesmo reconhecendo aí, também,
as questões de ordem econômica e política, principalmente hoje, com as novas
tecnologias da informação e do conhecimento (TIC), que transformam o mundo
108
numa aldeia, onde as notícias e tendências se espalham e são absorvidas
numa velocidade alarmante.
A grave crise de valores que se alastra no mundo contemporâneo tem
chegado a um patamar que nos leva a perder os parâmetros do que seria ético,
moral e humano, devendo ser apresentado e discutido nos processos
formativos das novas gerações. Antes das bruscas e profundas mudanças as
quais já nos referimos, aonde fosse, a criança e o jovem se deparavam com os
mesmos valores e tradições, que, embasados por princípios comuns,
chegavam a ser inquestionáveis.
Longe de nós a intenção de difundirmos e alimentarmos um saudosismo,
ou retorno ao passado - incompatível, nós sabemos, com as conjunturas e
contingências do mundo atual. Nossa intenção é apenas a de refletir sobre a
busca de alguns parâmetros, de alguns valores - alguns estudiosos já se
reportam a essa questão, com os quais algumas sociedades já começam a se
preocupar: “Inúmeras culturas começam a se dar conta agora de que
inadequados não são simplesmente seus métodos, mas também seus
objetivos e seus valores fundamentais”. (HUGHES, In: DELORS, 2005, p. 41)
A solidariedade, o sentimento de pertencimento, o engajamento social
representam alguns desses parâmetros, desses valores, que não podem mais
ser desprezados e esquecidos pela nossa sociedade:
Em sua análise da sociedade ocidental, Eckersley fala de uma derrocada dos valores: “ os flagelos modernos da civilização ocidental, como o suicídio de jovens, o uso de drogas e a delinqüência, costumam ser explicados em termos pessoais, sociais e econômicos: desemprego, pobreza, maus-tratos infligidos às crianças, dissolução das famílias e outros fatores. Minhas pesquisas pessoais e outros trabalhos parecem indicar algo mais fundamental na natureza das sociedades ocidentais. Penso que esse ‘algo mais’ é um fracasso profundo e crescente da cultura ocidental, uma incapacidade de dar um sentido, um sentimento de fazer parte e um objetivo ás nossas vidas, assim como um sistema de valores. As pessoas precisam acreditar em alguma coisa e viver para alguma coisa, sentir que pertencem a uma comunidade e que são membros estimados da sociedade, além de terem um sentimento de realização espiritual, isto é, o sentimento de estarem ligadas e incorporadas ao mundo e ao universo em que vivem. (ECKERSLEY, 1994, apud HUGHES, 2005,p. 41)
109
Apesar de longa, a citação acima referenda a nossa preocupação com
essas questões das buscas e das necessidades que reconhecemos na
atualidade, e que, apesar de forjadas e alimentadas pelo contexto sócio-
econômico-cultural, transcendem o mesmo, impulsionando-nos a refletir,
conforme já elucidado, sobre estratégias que nos levem a essa transcendência.
Dessa forma, finalizando este capítulo, onde nos propomos a retomar e
refletir sobre as concepções de criança e infância, bem como as histórias das
I.E.I. e das famílias, compreendemos que, com base em todas essas reflexões
sobre os impactos e transformações vivenciadas pelas estruturas familiares na
atualidade, bem como sobre as imperiosas necessidades da sociedade atual
como um todo, as instituições de Educação Infantil, não podem mais estar se
perguntando que estrutura familiar seria a mais adequada para educar as
crianças e qual, ou quais, seriam estruturadas e desestruturadas. O que
precisa ser perguntado e refletido é: quais as melhores estratégias para
trabalhar com as famílias dos alunos, contemplando a diversidade com a qual
elas se apresentam?
A partir dessa pergunta inicial, deve-se procurar refletir e discutir com essas
famílias as necessidades que se apresentam para a grande tarefa educativa
que elas possuem junto as novas gerações, buscando – enquanto instituição
escolar, compartilhar com as mesmas esta função.
Procurar conhecer cada uma dessas famílias, dialogando e
estabelecendo uma relação de confiança, de troca e buscando realmente o
compartilhamento das funções de cuidado e educação, é o urgente desafio que
se apresenta para as instituições infantis que querem realmente, cumprir a
função que está posta para ela na contemporaneidade – educar e cuidar,
considerando a criança como cidadã, como sujeito de direitos.
Mesmo reconhecendo que na atualidade a escola já possui muitas
demandas que até fogem a sua função precípua, de possibilitar as novas
gerações que se apropriem dos conhecimentos acumulados pelas gerações
antigas, sendo capazes também de criar/recriar novos conhecimentos,
finalizamos essa nossa reflexão propondo que a escola assuma também essa
nova demanda, que é convocar as famílias dos seus alunos para uma reflexão
constante em torno do processo educativo das novas gerações, propondo que
110
o mesmo seja realmente compartilhado por estas duas instituições – escola e
família, que no decorrer da história da humanidade são responsáveis mais
diretas por esse trabalho formativo.
No próximo capítulo, considerando todas as questões aqui discutidas,
vamos descrever a experiência que vivenciamos, buscando este
compartilhamento de ações entre Instituição de Educação Infantil e família, a
partir de atividades realizadas pela instituição educativa.
Dessa forma, vamos apresentar os caminhos trilhados, sabendo que os
mesmos foram alicerçados pelas experiências e estudos aqui já elencados e
discutidos, o que aponta para o entrelaçamento, a relação dialética entre teoria
e prática, saberes e fazeres, ação e reflexão, embora a forma didática
escolhida para apresentá-los possa dar uma idéia equivocada de dicotomia
e/ou fracionamento.
111
CAPÍTULO 4
112
4 - APRESENTANDO CAMINHOS TRILHADOS
As instituições dedicadas à primeira infância são socialmente construídas. Elas não têm características inerentes, qualidades essenciais, nem propósitos necessários. Para que elas servem, a questão do seu papel e do seu propósito, não são auto-evidentes. Elas são o que nós, “como uma comunidade de agentes humanos”, fazemos delas”. DAHLBERG, MOSS & PENCE,
Conforme já explicitado na introdução desse trabalho, embora o nosso
recorte e o nosso foco maior, enquanto pesquisadora, seja a construção de
uma relação entre a família e a I.E.I, em prol do compartilhamento das ações
de cuidado e educação das crianças, tanto pelo fato dessa pesquisa ter sido
realizada no contexto de surgimento dessa Instituição, quanto pela função que
nós ocupávamos na mesma – a de gestora; participamos de todo o processo
de implantação da proposta do Centro Infantil, coordenando-o, registrando-o,
e buscando encaminhá-lo na perspectiva da práxis participativa, conforme
apresentado também na introdução desse trabalho.
Dessa forma, com base nas concepções de criança, infância, função da
Instituição de Educação Infantil e família, dentre outras discutidas, tanto no
capítulo anterior, quanto nos outros capítulos desse trabalho, bem como nas
questões elencadas no final do capítulo 1 - como sínteses possíveis, a partir
dos dois trabalhos de pesquisa realizados e dos estudos e experiências que
tivemos com a temática em pauta, vamos agora, descrever algumas das ações
que foram realizadas com professoras, funcionários, crianças e famílias, que
foram relevantes para a concretização da nossa proposta de um trabalho
pedagógico centrado em uma práxis participativa, tendo como foco maior a
construção da relação família e Instituição de Educação Infantil.
É importante registrar que todas essas ações iniciais foram pensadas e
planejadas em conjunto com a professora que assumiu conosco a gestão da
Instituição, na função de vice-diretora. Essa professora já tinha sido nossa
parceira de trabalho em outras experiências, como os parâmetros em ação de
113
Educação infantil e o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores -
PROFA, além de sermos, também, assessoras pedagógica do Setor de
Educação Infantil da SME, ou seja, já tínhamos toda uma história de
envolvimento e trabalho, tanto com a Educação Infantil em si, quanto com a
formação de professores dessa modalidade de Ensino, e das séries iniciais do
Ensino Fundamental.
Com certeza, foi essa nossa experiência anterior como formadoras de
professores, bem como o conhecimento de que “Pesquisas indicam que a
qualidade da Educação Infantil está relacionada diretamente com a formação
dos profissionais” (KISHIMOTO, In: CERIZARA, 2002, p.8), que nos motivou a
iniciar todo o processo de implantação desse novo Centro Municipal de
Educação Infantil, por um trabalho de diálogo, discussão e estudo com os
profissionais que lá iriam atuar, objetivando a construção de uma proposta de
trabalho interativa entre toda a comunidade escolar, em prol das ações de
cuidado e educação das crianças.
Assim sendo, este capítulo está subdividido em 4 tópicos: no primeiro,
apresentamos todo o trabalho inicial realizado com as professoras, antes
mesmo da inauguração da Instituição; no segundo, explicitamos o processo de
contratação e recepção dos funcionários; no terceiro descrevemos uma das
propostas de trabalho realizada com as crianças, com base na metodologia de
projetos; no quarto e último tópico, mostramos a proposta pensada e realizada
para o trabalho com as famílias.
4.1- Ações iniciais com as professoras
Os 30 anos do bem-sucedido projeto da Ponte assentaram na reelaboração da cultura pessoal e profissional dos seus professores. Toda a mudança passa por aí. Se a pessoa não muda, como poderá mudar a escola? Dito de outro modo: onde não houver uma pessoa, será possível encontrar um professor? (PACHECO, 2006, p.1)
114
Concordando plenamente com a afirmação acima do Prof José Pacheco,
e tendo a convicção de que qualquer projeto de trabalho, e mais ainda um
projeto que busca o envolvimento da família, só daria resultados positivos se
fosse um projeto coletivo de toda a equipe da Instituição – perspectiva da
práxis participativa, nossa primeira providência, após assumir a direção da
escola, conforme já explicitado no início desse capítulo, foi pensar como
faríamos, tanto esse processo inicial de conhecimento, acolhimento e
sensibilização do corpo técnico-docente da Instituição, como também o
processo de formação continuada do mesmo.
Foi com esse pensamento, e com o objetivo de conhecer melhor as
professoras que iriam trabalhar conosco, como também de propiciar a
formação de um vínculo e de um gosto pelo estudo, pela leitura, pela reflexão
em torno do trabalho realizado com as crianças e suas famílias, que
planejamos os nossos primeiros encontros com as futuras professoras da
Instituição, e todos os outros que se seguiram a esses.
Dessa forma, no dia 10 de março de 2004, no 7º andar da SME, tivemos
o nosso primeiro encontro com o grupo, tendo como pauta a necessidade de
nos conhecermos melhor, facultando que cada uma se apresentasse, falasse
das suas experiências profissionais, bem como das expectativas que trazia
para o novo desafio que se apresentava, que era realizar um trabalho de
qualidade, a partir de uma interação e participação de todos os envolvidos, no
CMEI Carmem Reis.
Considerando que registramos por escrito todas essas reuniões, vamos
colocar abaixo alguns depoimentos das professoras nesse primeiro encontro:
Sou professora da rede municipal há treze anos, mas nunca
trabalhei com Educação Infantil. Considero que vai ser um grande desafio, mas gosto de desafios, entendo que são eles que nos movem, que nos incentivam novas e grandes realizações.
Já estou no município há dez anos, tenho experiência, tanto com Educação Infantil, quanto com EJA – Educação de Jovens e Adultos, e, apesar de está na sala de leitura de uma escola há três anos, resolvi retornar a sala de aula, aceitando o desafio de trabalhar num Centro Infantil que vai começar agora.
115
Minha história com a educação vem do berço. Tenho um pouquinho de tudo, não sou especialista em nada, sou especialista no novo. Tem que ter preparação, mas tem que ter ousadia, por isso estou aqui.
Já tenho alguma experiência com Educação Infantil na escola particular, passei no concurso do município agora, e fiquei feliz de vir trabalhar num Centro de Educação Infantil que está sendo criado agora.
Uma das questões que mais nos chamam a atenção nos depoimentos
das professoras nesse primeiro encontro, é o fato delas se referirem muito ao
desafio do novo, ao fato da Instituição está sendo criada, deixando a
possibilidade da participação e do envolvimento de todos nesse processo.
Acreditamos que essa disposição para vivenciar o novo, para participar e
contribuir com o estabelecimento de uma nova estrutura educacional, foi
fundamental para o envolvimento de todos na Instituição.
Dessa forma, esse primeiro encontro foi muito produtivo e importante, na
medida em que possibilitou que nos conhecêssemos melhor, que cada uma
abrisse o seu coração, falando das suas experiências e das suas expectativas.
Neste primeiro encontro, estavam presentes 6, das 8 professoras do
Centro, além da secretária geral, das 2 coordenadoras e da direção e vice-
direção. Todas essas profissionais estão devidamente caracterizadas no
capítulo 1.
A partir desse conhecimento inicial do grupo, e da disposição do mesmo
para estudar e aceitar os desafios de realizar um bom trabalho numa Instituição
de Educação Infantil; fizemos, junto ao mesmo, um levantamento de temáticas
relevantes para a realização desse trabalho. As temáticas sugeridas pelo grupo
nesse primeiro momento foram:
• Adaptação da criança na Instituição
• O brincar da criança
• Os conteúdos da Educação Infantil
• A rotina
• A leitura e a escrita
• O desenvolvimento da criança
116
• O papel do professor da Educação Infantil
• Como ensinar matemática na escola infantil
• A relação com a família da criança
• Metodologias na escola infantil
• Especificidades da criança
Levando em conta a relevância de todas as temáticas propostas pelas
professoras, foi muito difícil selecionar as que seriam contempladas nesse
primeiro momento. Porém, a exigüidade do tempo disponível, nos forçava a
fazer essa seleção; e a mesma foi realizada com o objetivo de priorizar as que
iriam subsidiar melhor o início do processo, ficando as outras para os estudos
posteriores. Dessa forma, as temáticas inicialmente contempladas nos nossos
estudos foram:
• Concepção de criança e infância
• Processo de adaptação da criança
• A rotina da Instituição de Educação Infantil
• O brincar na Educação Infantil
• Alfabetização na Educação Infantil
• A relação família e Instituição de Educação Infantil e suas funções.
A função da Educação infantil – educar e cuidar, embora não tenha sido
contemplada como um conteúdo específico desse primeiro momento de
estudos, permeou todas as discussões que aconteceram, em virtude de está
presente em todas as ações que envolvem o trabalho com a criança na
instituição infantil. Em especial, essa temática permeou os estudos relativos a
relação família e I.E.I.
Estes estudos foram realizados nos dois turnos, sendo que o grupo que
iria assumir o turno matutino na escola vinha pela manhã e o grupo que iria
trabalhar no vespertino vinha à tarde, enquanto eu e a vice-diretora,
participávamos dos encontros nos dois turnos, discutindo a mesma temática
117
em ambos, e procurando estabelecer as pontes e as relações em termos de
idéias e procedimentos a serem adotados.
Vamos apresentar abaixo as principais concepções norteadoras dos temas
estudados, bem como um pouco da metodologia e das reflexões vivenciadas. É
importante registrar também que os estudos relativos a esses temas não se
esgotaram nesse momento inicial. Pela relevância e desdobramentos que
apresentam em relação a outros conteúdos do dia-a-dia da Instituição de
Educação Infantil, os mesmos continuaram a ser explorados em outros
momentos de estudos, que foram organizados levando em consideração a
situação abaixo especificada:
Nos anos de 2004 e 2005, período em que se deu a experiência aqui
descrita, os professores da rede Municipal de ensino da cidade do Natal,
possuíam uma carga horária de trabalho de 30 horas semanais, das quais,
segundo a SME, 24 horas deviam ser dedicadas a regência, e ás 6 horas
restantes as atividades extra-classe, dentre as quais estavam incluídas os
planejamentos e encontros de estudos dos professores.
Essa situação acima descrita sempre foi motivo de muita polêmica entre
os professores e a própria SME, considerando que o tempo de estudo e
planejamento não se encontrava regulamentado oficialmente no calendário da
Secretaria, ficando cada instituição com a responsabilidade de discutir e
combinar esse horário com os professores, o que levou uma grande maioria
dessas instituições a eleger um dia da semana, de quinze em quinze dias, em
que as aulas terminariam após o recreio, para que o tempo restante fosse
usado em reuniões e planejamentos com os professores.
Diante dessa realidade, e considerando a importância do estudo e do
planejamento para a realização de um bom trabalho pedagógico, combinamos
inicialmente com as professoras e, posteriormente com os pais, que, ao invés
de pararmos meio período de aula, de quinze em quinze dias, iríamos escolher
uma sexta-feira de cada mês – previamente agendada e comunicada, para que
as crianças não viessem à Instituição, e as professoras pudessem se reunir
para planejar. Essa sugestão foi aceita, tanto pelas professoras, quanto pelos
pais, que preferiram não trazer a criança à escola um dia no mês, do que
durante dois dias, vir deixá-la as sete, para pegar ás nove horas e quinze
minutos. Em relação ás professoras, também houve o consenso de que seria
118
melhor utilizar quatro horas e meia direto para planejar, do que apenas duas
horas e quinze minutos a cada quinze dias.
No que diz respeito aos estudos, partindo da experiência inicial que será
melhor detalhada ainda nesse capítulo, as próprias professoras sentiram
necessidade de dar continuidade aos mesmos, por isso, combinamos que um
sábado por mês, para não prejudicar o tempo letivo dos alunos, iríamos nos
reunir na Instituição para estudar. Foi combinado também que, a cada três
meses, ao final do estudo, comemoraríamos os aniversariantes do trimestre,
com direito a bolo, salgados, refrigerantes e presentes, comprados com a
contribuição financeira de todos.
No início desse processo a proposta pedagógica da Instituição ainda não
existia, posto que a mesma foi sendo construída ao longo dos encontros e
interações, nesses momentos de estudo e reflexão. Esses estudos e reflexões,
realizados logo no início do processo de implantação da Instituição, serviram
de baliza, de parâmetro inicial para as nossas ações, e, a continuidade dos
mesmos contribuiu para a elaboração coletiva do projeto político pedagógico
da Instituição, cuja primeira versão só foi apresentada a SME em 2006.
Vamos fazer a descrição dos estudos iniciais, realizados, conforme já
explicitamos, com as temáticas selecionadas a partir da lista proposta pelas
professoras.
» Concepção de criança e infância
No tocante as concepções de criança e infância, percebemos que
algumas professoras ainda possuíam uma visão de infância como fato natural;
uma visão que podemos denominar de romântica, pois, quando solicitadas a
dizer o que lhes vinha à cabeça quando pensavam em criança, muitas ainda se
referiam a bondade, pureza, inocência, alegria, espontaneidade, sem
estabelecer relação com o contexto sócio-econômico-político-familiar e cultural
dessas crianças:
“Criança lembra alegria, pureza, inocência”
“Criança é brincadeira, liberdade, risos”
119
“Criança lembra alegria, embora nem todas sejam felizes”
“É um momento mágico da vida”
Partindo dessas palavras iniciais, procuramos estabelecer com as
mesmas uma relação entre esses atributos colocados por elas e a situação de
algumas crianças que a mídia apresenta diariamente, bem como da grande
maioria que nós encontramos nas instituições públicas de ensino.
Após essas reflexões iniciais, com base em autores como Miranda
(1987); Ariès (1981); Oliveira (2002); Bazílio & Kramer (2003), dentre outros,
além de estudos do Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil e dos
Parâmetros em Ação de Educação Infantil, discutimos e refletimos com as
professoras sobre a relevância de se considerar a criança como um sujeito
sócio-histórico-cultural e a infância, também como socialmente construída.
Essa compreensão das concepções de infância e criança como
socialmente construídas, nos mostra que as mesmas não podem ser vistas
como fatos naturais, determinados apenas por características de ordem
biológicas e cronológicas, mas como possuindo também, determinantes
sociais, culturais e históricos, se apresentando, portanto, diferentes em cada
momento histórico, em cada sociedade, bem como em cada classe social, e
geralmente envolvidas por visões ambíguas, ambivalentes e paradoxais,
conforme vimos no capítulo 3, deste trabalho.
Porém, considerando também todas as especificidades dessa situação,
e desse sujeito, que dizem respeito mais diretamente, conforme nos aponta
Bujes (In: CRAIDY; KAERCHER, 2001), ao predomínio do sonho, da fantasia,
da afetividade, da brincadeira, enfim, das manifestações de caráter mais
subjetivo.
Estas discussões sobre as concepções de criança e infância, se fazem
indispensáveis para que os profissionais da Educação Infantil, possam refletir,
tanto sobre as especificidades da infância, quanto sobre uma criança concreta,
contextualizada, situada numa família, num bairro, numa classe social, numa
cultura, enfim, numa sociedade que lhe constitui enquanto sujeito, sem deixar,
também, de ser por ela influenciada; e não numa criança abstrata, atemporal e
universal.
120
Compreendemos que essa discussão é fundamental para que possamos
abrir mão das nossas posturas adultocêntricas no trabalho com as crianças,
conforme propõe Leite Filho (In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001), abraçando
assim a postura da pedagogia da participação, buscando dar voz e vez as
crianças (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e
PINAZZA, 2007) .
» Processo de adaptação da criança.
Nesse estudo sobre a adaptação da criança na instituição de educação
infantil, o que nos chamou mais a atenção foi o fato das professoras,
principalmente aquelas que nunca haviam trabalhado com essa modalidade de
ensino, estabelecerem uma relação direta entre adaptação, choro de criança,
cobrança de pais e uma sensação de desespero e impotência que isso devia
desencadear nas professoras:
“Meu Deus, é uma loucura esse momento de adaptação”
“A vontade é ir embora e só voltar depois que passar as primeiras semanas” “Precisa ter segurança e tranqüilidade para viver esse momento”
“Dá um pouco de desespero, pois é um choro só.”
Partindo dessas falas, procuramos, com a colaboração também das
professoras presentes que já tinham experiência com Educação Infantil, discutir
um pouco as mesmas, buscando compreender os motivos desse choro, bem
como da cobrança dos pais e do suposto desespero das professoras.
Após essas reflexões iniciais, a adaptação da criança na escola foi
estudada com base em autores como Balaban (1988); Freire, M. & Davini
(1999) e Rosseti-Ferreira et al (2002), dentre outros, bem como nos estudos do
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, buscando ser
compreendida sempre como um processo, que envolve não apenas a criança,
121
mas a família e também o professor. Todos e cada um, neste momento inicial
de cada ano letivo, estão passando por um processo adaptativo que não possui
um tempo determinado para acontecer, mas que vai se constituindo nas
relações estabelecidas e tendo como base também as experiências do
passado de cada um nesta área.
Dessa forma, outra questão importante a ser considerada, é que cada
criança passa pelo seu processo de adaptação, bem como cada família e cada
educador: nenhum processo de adaptação é igual ao outro, apresentando cada
um suas diferenças e especificidades, bem como imprevisibilidades também.
Essa compreensão da adaptação como um processo com
especificidades e particularidades, que envolve não apenas as crianças, como
também as famílias e os educadores, é fundamental para que os profissionais
da instituição vivenciem esse momento, na maioria das vezes tão complexo, de
forma mais tranqüila e equilibrada, buscando transformar o mesmo em uma
situação mais prazerosa e menos angustiante.
Particularmente, consideramos que esse estudo sobre adaptação foi um
dos mais relevantes e produtivos para as professoras, deixando-as mais
seguras e tranqüilas. Outro ponto que contribuiu muito para a construção dessa
segurança inicial foi o fato de termos combinado que as atividades dessas
primeiras semanas de aula seriam mais lúdicas, mais voltadas as artes, ao
movimento e seriam planejadas em conjunto com a coordenação pedagógica e
direção. Outro fator também relevante foi o de combinarmos que,
principalmente nas primeiras semanas - além das professoras, todas as
pessoas da Instituição – coordenadoras, gestoras e funcionários, estariam
atentos as necessidades das crianças, promovendo intervenções e
colaborando diretamente com as professoras, quando necessário.
Consideramos também que a decisão coletiva, após algumas
discussões e reflexões, de que os pais deveriam, desde o primeiro dia de aula,
entrar na Instituição, deixar os seus filhos na porta da sala e permanecer um
tempo na mesma, se necessário, foi muito importante.
Para que possamos também conhecer a opinião das professoras sobre
essa vivência, vamos apresentar abaixo alguns depoimentos registrados na
primeira reunião com as mesmas, após as duas primeiras semanas de aula:
122
Foi muito bom esse planejamento inicial, essas atividades mais
soltas, essa intenção de deixar as crianças se colocarem mais, se soltarem. Pude perceber que essas crianças estavam aquém do que eu esperava. Vou ter que planejar uma intervenção que atenda aos interesses e as necessidades delas, pensando mais nos valores que elas precisam construir, na carência de afeto que elas trazem, na autonomia que elas não tem.
A forma como vivenciamos essas duas primeiras semanas foi muito legal. A discussão sobre adaptação, como sendo também dos pais e professoras, me ajudou a ficar mais tranqüila, menos ansiosa, a trabalhar melhor com as crianças.
Me surpreendi positivamente com a minha turma. Apesar da grande maioria nunca ter freqüentado a creche, ( eram crianças de 3 anos e meio a quatro), penso que o fato de deixar os pais entrarem na escola, na sala, bem como todo o material, os brinquedos que disponibilizamos, e o planejamento mais flexível, fez com que apenas uma criança chorasse, e só por pouco tempo. Estou muito feliz!
Confesso que no começo fiquei receosa com a questão dos pais terem livre acesso a entrar aqui no centro e até na sala de aula, mas depois, até mesmo porque senti a presença e o apoio da direção, da coordenação e dos funcionários, fiquei mais tranqüila e até achei legal a presença deles, embora alguns, realmente, tumultuem um pouco.
Compreendemos que esses depoimentos referendam a relevância do
estudo e do planejamento pensado para as primeiras semanas de aula, a partir
das reflexões sobre adaptação. Queremos registrar que esses estudos e
reflexões sobre adaptação, como também a própria vivência desse processo,
não se esgotaram nessas duas primeiras semanas. Prosseguiram além, pois,
considerando que é um processo com inúmeras variáveis e especificidades,
não possui tempo determinado para se consolidar.
» A rotina da I.E.I.
Os estudos sobre rotina na Educação Infantil também foram muito
interessantes e desencadearam discussões muito produtivas. A primeira delas
foi sobre a necessidade e a importância da rotina na nossa vida de maneira
geral. Iniciando o estudo, fizemos uma tempestade de idéias, pedindo que cada
uma definisse rotina em uma palavra. Eis algumas delas:
123
“Monotonia”
“Mesmice”
“Organização”
“Repetição”
“Trajetória”
“Perfeccionismo”
Dessa forma, antes de trabalharmos a importância da rotina na
Educação Infantil, fomos discutir o que cada um entendia por rotina, e o real
sentido da palavra, muito mais numa perspectiva de planejamento, de
caminhos a serem percorridos, de jornada, conforme propõe Faria (In: FARIA;
PALHARES, 2000). Após estas reflexões iniciais, a rotina foi estudada como sendo
fundamental nas instituições de Educação Infantil, principalmente pelas
possibilidades que faculta a criança de construir suas concepções de tempo e
espaço, se for trabalhada de forma a representar, tanto para elas, quanto para
as professoras, uma orientação segura, capaz de possibilitar uma previsão do
que vai acontecer, sem transformar isto em mera repetição de atos mecânicos
e enfadonhos.
Para os estudos sobre essa temática, além do livro de Freire, M. (1992),
utilizamos um texto mimeografado de autoria das professoras Vânia e Elba do
Núcleo de Educação Infantil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte -
NEI, intitulado A Rotina Escolar, bem como a proposta curricular de Educação
Infantil, elaborada pela equipe de Educação Infantil da SME de Natal, na
década de 90.
Para promover uma rotina com essas características, é necessário que
as atividades sejam planejadas levando em consideração os conhecimentos
prévios dos alunos, bem como suas potencialidades e possibilidades, com
situações e momentos diversificados, que promovam para as crianças o
exercício das suas várias linguagens: artística, musical, escrita, oral, corporal,
124
teatral, enfim, as inúmeras possibilidades de manifestação e expressão das
quais os seres humanos são capazes.
Uma questão muito discutida no momento em que refletíamos sobre a
rotina, foi a questão do espaço, já que o mesmo tem uma grande contribuição e
importância para a elaboração e vivência dessa rotina. No caso específico da
Instituição na qual iríamos trabalhar, e espaço é um aspecto limitador desse
processo, na medida em que, como já afirmamos anteriormente, apesar das
modificações e adaptações que foram possíveis de serem realizadas, o espaço
da Instituição não foi construído especificamente para tal fim, o que gera
problemas e limitações na operacionalização do seu uso. Mesmo assim, foi
pensada e planejada a melhor rotina possível, diante das adversidades do
espaço, procurando incentivar e possibilitar a manifestação das várias
linguagens das crianças.
No tocante ao espaço, uma observação importante de registrar é que,
logo no início, quando as professoras foram conhecer o espaço físico da
Instituição que estava terminando de passar pela reforma antes da
inauguração, as mesmas se disseram positivamente surpreendidas.
Segundo elas, a partir das informações que tínhamos passado – nós e a vice-
diretora que já conhecíamos o prédio, elas tinham feito uma idéia bem pior.
Seguem abaixo alguns desses depoimentos:
Ah, não é tão pequeno assim! Pelo menos as salas são ventiladas, iluminadas, dá para fazer um trabalho. Não está nos padrões ideais, mas não é das piores.
Apesar de algumas salas, como a 1 e a 2, serem pequenas – não vai caber 25 crianças, né? Mas pelo menos, são arejadas e claras, estão pintadinhas... e tem o espaço externo, que depois que colocar areia limpa, vai ficar agradável.
Não é o ideal, mas não é dos piores, pelo menos vai ter parque, caixa de areia e lugar para brincar lá fora, e as salas, apesar de pequenas, são ventiladas.
Ah! Só é ruim mesmo aquela salinha menorzinha. Acho que não dá nem para fazer a rodinha. Quantos alunos vão ficar nela?
125
Achamos estes depoimentos importantes, porque eles mostram que as
professoras, desde o início, souberam valorizar os pontos positivos do espaço,
bem como de todas as outras situações, para pensar a rotina da melhor forma
possível. Durante a realização de todo o trabalho, esta sempre foi a nossa
tônica: procurar as possibilidades de trabalhar, sem nos apegarmos as
dificuldades, como desculpa para que o trabalho não acontecesse, tendo
clareza de que:
Um contexto físico, por si só, não faz uma escola; para que um edifício escolar seja uma escola, são necessárias diversas condições. Uma escola é um contexto social constituído por atores que partilham metas e memórias, por indivíduos em interdependência com o contexto que constroem intencionalidade educativa. (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e PINAZZA, 2007, p.23)
Dentro dessa proposta, a rotina inicial da Instituição com as crianças, foi
pensada, em linhas gerais, de forma a contemplar, em cada espaço físico e de
tempo, as atividades abaixo especificadas, e outras que possam surgir a partir
das demandas das crianças e da comunidade:
» Quinzenalmente ou mensalmente
• Atividade prática de higiene: Banho, corte de unha, salão de beleza, etc,
ou
• Passeio ou atividade mais prática relativa a algum projeto didático em
andamento: visitas, exposições na escola, peças teatrais, etc
» Semanalmente – 1 ou 2 vezes
126
• Faz-de-conta
• Execução do hino Nacional
• Cinema com vídeo ou DVD
• Atividades de artes.
• Recreação com professora de Educação Física
• Música e/ou dança.
• Atividades relativas ao projeto didático em andamento.
• Atividades de relaxamento
• Visita à biblioteca.
» Diariamente
• Rodinha de conversa
• Leitura e/ou contação de histórias
• Parque
• Lanche
• Escovação de dentes
• Acolhimento: com livros, ou brinquedos, ou jogos de encaixe, ou massa
de modelar.
• Atividade relativa à temática estudada.
• Atividade livre.
» O brincar na Educação Infantil
Essa temática sobre o brincar, ou a brincadeira, na verdade permeou
muitos dos nossos estudos, até mesmo pela profundidade, importância e
complexidade da mesma no trabalho das instituições de Educação Infantil,
127
considerando que brincar é um atividade primordial para o desenvolvimento da
criança.
Quando iniciamos esse estudo, nas primeiras reuniões, a grande
questão inicial, após o levantamento de conhecimentos prévios, foi: o que é
brincar, o que é brincadeira, e como devemos trabalhá-la com as crianças?
Embora as professoras compreendessem a relevância da garantia de
um espaço para as brincadeiras nas instituições de Educação Infantil:
Brincar é muito importante
Toda criança gosta, e precisa brincar
Toda instituição que trabalha com criança pequena tem que
promover a brincadeira
percebemos a necessidade de um aprofundamento maior sobre o papel da
brincadeira para o desenvolvimento da criança, bem como sobre as várias
formas de se trabalhar a brincadeira.
Segundo Borba (2001), existem várias formas de se conceber a
brincadeira na Educação Infantil, dentre elas, a concepção estruturalista
organicista – calcada numa visão de natureza infantil, biologicamente
determinada, onde a brincadeira é vista como atividade recreativa, permitindo
apenas que as crianças liberem energias e relaxem; a concepção tradicional –
onde a brincadeira é vista como um estorvo na situação de aprendizagem; a
brincadeira como instrumento didático, talvez a mais comum – onde a
brincadeira é vista como preparação para a escolaridade futura, servindo como
meio para o ensino de noções e habilidades como cores, formas, numerais,
entre outras.
Essa mesma autora chama a atenção também para o fato de que,
embora as crianças se beneficiem, tanto do aspecto lúdico, quanto da diversão,
do prazer e da aprendizagem nas atividades recreativas e nas brincadeiras
instrucionais, “é importante que o educador saiba que as maiores contribuições
do brincar ficam em segundo plano, sobretudo, naquelas brincadeiras que
evidenciam apenas os objetivos instrucionais”. ( BORBA, 2001, p.5)
128
Assim sendo, buscamos estudar e refletir sobre o brincar a partir das
idéias de estudiosos como Vigotski (1999), Wajskop (2005), Borba (2001),
dentre outros, que apresentam o brincar como sendo fundamental para o
desenvolvimento da criança: “É enorme a influência do brinquedo no
desenvolvimento de uma criança” Vigotski, (1999, p.126), principalmente pelo
fato de possibilitar que a criança recrie a realidade, se mostrando maior do que
realmente é, ou seja, atuando na chamada zona de desenvolvimento proximal:
Assim, o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo é como se ela fosse maior do que é na realidade. ( VIGOTSKI, 1999, p. 134)
Os estudos realizados sobre a brincadeira nos levam a considerá-la
como uma construção social, espaço privilegiado de interação e de constituição
da criança como um sujeito humano, que é produto e produtor de história e de
cultura, ou seja, “A brincadeira pressupõe uma aprendizagem social. Aprende-
se a brincar” (WAJSKOP, 2005, p.29).
Na perspectiva histórico-cultural, a incorporação da brincadeira nas práticas pedagógicas significa desenvolver diferentes formas de jogos e brincadeiras que contribuam para inúmeras aprendizagens e para a ampliação da rede de significados construídos pelas crianças. Dentre essas diferentes modalidades de brincadeiras que podem ocorrer na creche a na pré-escola, citamos: as brincadeiras de faz-de-conta organizadas pelas próprias crianças; a transmissão e a recriação das brincadeiras tradicionais da nossa história e cultura; os jogos de construção; e os jogos educativos propiciadores de aprendizagens em diferentes áreas do conhecimento. (BORBA, 2001, p.5)
Essa concepção sobre a brincadeira, aponta para a percepção de que
as implicações práticas da mesma nos remete a repensar a rotina, os tempos
e os espaços das instituições infantis, bem como a compreender a grande
responsabilidade dessas instituições, considerando que: “...organizada em
torno da brincadeira infantil, a pré-escola poderia cumprir sua função
129
pedagógica, ampliando o repertório vivencial e de conhecimentos das crianças,
rumo à autonomia e à cooperação.” (WAJSKOP, 2005, p.28).
O impacto desses estudos sobre a brincadeira numa perspectiva
histórico-cultural, foi tão grande, que, como poderemos verificar no decorrer
desse trabalho, o brincar foi, realmente, um dos eixos norteadores do trabalho
pedagógico realizado com as crianças, e foi estendido também até as famílias,
chegando a ser, conforme depoimentos que veremos ainda neste capítulo e no
seguinte, uma das atividades mais citadas e elogiadas pelos familiares, tanto
pela contribuição que deixou para a interação entre estes e as crianças, como
pela compreensão que propiciou acerca da relevância da brincadeira na vida e
no desenvolvimento das mesmas.
» Alfabetização na Educação Infantil
Sabemos que os estudos e reflexões sobre alfabetização são
geralmente polêmicos, até mesmo pelo fato de estarmos diante de um dos
maiores desafios do nosso país, que é alfabetizar uma boa parcela das suas
crianças, jovens e adultos, que ainda não são usuários efetivos da leitura e da
escrita.
No nosso grupo, os estudos também suscitaram muitas questões, fato
que pode ser constatado através da apreciação de depoimentos como os que
se seguem:
Eu já alfabetizei, mas não sei como. Será que eu realmente ensinei?
Não tem tempo certo para se alfabetizar. Acontece no decorrer de várias séries.
Para a alfabetização, o desejo de aprender é muito importante, mas o professor tem que ensinar também.
130
Hoje fala-se muito em função da escrita. Quando fomos alfabetizadas não se falava disso não.
O fato é que, apesar de todas as pesquisas, as crianças das escolas públicas demoram a aprender a ler e escrever.
Em se tratando da Educação Infantil, sempre vem aquela pergunta: é, ou não é, para alfabetizar?
Dessa forma, uma das primeiras discussões no nosso grupo acerca
dessa temática, foi exatamente esse questionamento sobre se deve-se, ou
não, alfabetizar na Educação Infantil. Questionamento esse que encontrou
respaldo para ser compreendido principalmente na seguinte afirmação:
[...] escrevi um artigo com um título em forma de pergunta: “ Deve-se ou não se deve ensinar a ler e escrever na pré-escola?”. Esse artigo circulou bastante e foi traduzido para o português e o italiano. Ali não respondo nem sim, nem não. O que digo é que a pergunta está malfeita, porque pressupõe que a resposta NÃO equivale a deixar essa responsabilidade para o Ensino Fundamental, e a resposta SIM pressupõe introduzir na pré-escola as más práticas tradicionais do Ensino Fundamental. O que proponho é substituir a pergunta centrada no ensino por outra centrada na aprendizagem: deve-se permitir ou não que as crianças aprendam sobre a língua escrita na pré-escola? Nesse caso a resposta é redondamente afirmativa. (FERREIRO, 2001, p.146)
Partindo dessa premissa, e de outras grandes contribuições dessa
mesma autora, principalmente sobre a psicogênese da língua escrita – Ferreiro
(1985), foi que encaminhamos as nossas discussões sobre a alfabetização,
refletindo sobre a mesma como sendo um processo, que a criança não pede
permissão ao adulto para iniciar, embora o adulto tenha o papel fundamental
de mediar, de colaborar com a criança, possibilitando que ela interaja com
vários portadores de texto, com vários gêneros textuais, refletindo e se
apropriando dos vários usos sociais da linguagem oral e escrita na nossa
sociedade.
131
É importante registrar que a grande maioria das professoras já
apresentava essa concepção de alfabetização como processo, embora
sentissem necessidade de aprofundar a discussão, principalmente, sobre as
etapas desse processo, possíveis e necessárias, de serem vivenciadas na
Educação Infantil.
Algumas conseqüências práticas mais imediatas desse primeiro estudo
sobre alfabetização na Educação Infantil, foi a implantação dos seguintes
aspectos:
• Além do acervo de livros da biblioteca – que seria visitada
semanalmente, obedecendo a uma escala, cada sala de aula teria um
pequeno acervo de 20 ou 25 livros, remanejados regularmente, que poderiam
ser manuseados pelos alunos diariamente.
• A leitura e/ou contação de história pela professora aos alunos, faria parte
da rotina diária.
• O trabalho com o nome próprio – a partir do uso de crachás, de
pesquisas sobre a origem dos nomes, bem como do cartaz com a listagem
dos nomes dos alunos da sala, dentre outras possibilidades, seria realizado
por todas as professoras.
Uma outra discussão presente nesse primeiro momento reflexivo sobre a
alfabetização, foi sobre o uso da letra cursiva ou de imprensa. As professoras
que ainda não tinham trabalhado com Educação Infantil, em sua grande
maioria, apresentaram essa questão como uma dúvida. Porém, as mais
experientes, se colocaram logo a favor do uso da letra de imprensa, ou bastão,
alegando que ela é mais fácil de ser escrita e de ser lida, no início do processo
de alfabetização.
Aprofundando um pouco mais esse aspecto, introduzimos a questão de,
em iniciando com a letra de imprensa, qual seria o momento mais adequado
para utilizar a letra cursiva. Após algumas reflexões, relembramos, mais uma
vez, as pesquisas sobre a psicogênese e discutimos o fato do momento mais
adequado para a criança passar a escrever com a letra cursiva, ser aquele
momento em que ela já percebe a escrita na perspectiva da hipótese
alfabética, conforme preconiza Emília Ferreiro.
132
Essa primeira discussão foi muito interessante e produtiva, porém a
temática, pela própria complexidade que apresenta, voltou a tona em muitos
outros estudos e discussões, e, particularmente para nós, se concretizou
realmente, no momento em que, como paraninfas das turmas que concluíram a
Educação Infantil no Carmem Reis no ano de 2006, a grande maioria das
crianças – algumas com 6 anos e outras com 7, segundo podemos constatar,
tanto na fala das professoras e coordenadoras, quanto nas próprias
apresentações realizadas pelas crianças na solenidade, estavam saindo da
Instituição para o ensino fundamental já com um domínio da leitura e da
escrita bastante considerável, ou seja, fazendo a leitura de textos significativos
para o seu cotidiano e pensando a escrita já nas hipóteses alfabética, ou, pelo
menos, silábica com valor sonoro, conforme classificação apresentada nos
estudos realizados por Ferreiro (1985).
» Relação família e I.E.I. Foi durante estes estudos iniciais, que fizemos a proposta do trabalho que
nos propúnhamos a realizar com a família, e contamos com a adesão e
envolvimento de todas as professoras. É importante dizer que antes de
iniciarmos o estudo sobre a relação família e I.E.I, solicitamos que as
professoras opinassem sobre a relação da família com a escola. Dessas
opiniões, destacamos as seguintes:
A relação da família com a instituição de Educação Infantil é fundamental para que as ações realizadas sejam concretizadas de forma eficaz.
É de fundamental importância a relação da família com a escola, pois fortalece os laços de compromisso com a educação de qualidade, por ter apoio direto com os pais que irão ter um outro olhar sobre a aprendizagem dos filhos.
É muito importante que a escola busque compartilhar com as famílias todo o trabalho formativo das crianças..
133
Dessa forma, a temática foi trabalhada partindo das opiniões e
experiências das professoras, bem como da nossa própria vivência com o
tema, e da discussão da experiência vivenciada em um outro Centro Infantil –
O Centro de Educação Pré-escolar Profª Stella Lopes da Silva, por ocasião da
nossa pesquisa para o mestrado.
Autores como Barbosa & Dornelles (1998), Bassedas, Huguet & Solé
(1999), Paro (2000), Kaloustian (2002), Carvalho (2002), dentre outros já
citados, também nortearam a nossa discussão, principalmente no tocante a
compreensão sobre o respeito e a consideração às várias estruturas familiares
da atualidade, bem como a relevância das famílias para o processo de
escolaridade das suas crianças, mesmo quando são analfabetas. Outro ponto
bastante discutido sobre essa temática foi a necessidade da instituição
educativa procurar dar o primeiro passo na busca de construir/sistematizar a
sua relação com a família do seu aluno.
No momento desse estudo, uma das questões que discutimos bastante
foi sobre o papel, a função da Instituição de Educação Infantil e da família. As
professoras ficavam se perguntando, e nos perguntando: onde começa um, e
termina o outro; até onde a Instituição deveria fazer, e até onde iria á
responsabilidade da família; os papéis seriam os mesmos, ou seriam
diferentes, considerando a abrangência e a complexidade do cuidar e educar?
Acreditamos, que já foi possível identificar, pelos estudos e propostas
aqui apresentadas, que, particularmente, temos a convicção de que famílias e
instituições educativas possuem papéis diferentes, que se devem
complementar. A grande questão é: refletir e discutir sobre essas diferenças e
possibilidades de complementaridade. Eis o desafio que surgiu nesse primeiro
estudo, e acabou permeando boa parte do nosso trabalho no Carmem Reis.
Quando nos reportamos ás questões relativas ás famílias e as
instituições educativas, não podemos nos esquecer de que são ambas
instituições construídas historicamente, que passam na atualidade por muitas
mudanças e transformações, o que acaba repercutindo também nas funções
que lhe são atribuídas socialmente.
134
Dessa forma, as nossas discussões e reflexões sobre esta temática com
as professoras, nos levaram a inferir que, diante da crescente diversidade de
estruturas familiares da atualidade – muitas das quais já identificadas no
capítulo anterior desse trabalho, bem como da compreensão da infância como
um fato social, e da amplitude e complexidade da função proposta para a
Educação Infantil hoje – educar e cuidar, é complicado, á priori, tentar
determinar e dividir, de forma muito fechada, o que seria realmente função de
uma e de outra instituição, sem um conhecimento mais aprofundado da
realidade, do contexto, do universo que permeia o cotidiano dessas duas
instituições, considerando também que:
A família, em decorrência dos avanços sociais, econômicos e tecnológicos, tem mudado os seus papéis, suas obrigações e sua estrutura tradicionais. Mães e pais tem cada vez mais negociado entre si as tarefas domésticas e responsabilidades no geral. A escola tem também avançado para oferecer aos alunos uma educação pertinente à nossa época. A aproximação das duas instituições é também uma tentativa de rever esses papéis tradicionais e, acima de tudo, visando melhorar a condição de vida e educação das nossas crianças. (BHERING & BLATCHFORD, 1999, p. 192)
Foi a partir dessas reflexões, bem como do consenso coletivo de que o
principal papel de ambas as instituições (família e instituição educativa), – e aí
deve se encontrar, realmente, o grande campo de convergência de ambas; é
promover o bem estar e o desenvolvimento integral das crianças, considerando
as suas necessidades de cuidado e educação, que optamos por construir os
limites e possibilidades da nossa atuação, após um conhecimento mais
detalhado de cada realidade.
Dessa forma, a partir dessas discussões, e da concordância em aceitar
o desafio de buscar implantar um trabalho de construção e sistematização das
relações entre Instituição de Educação Infantil e famílias, objetivando o
compartilhamento das ações de cuidado e educação, a primeira providência foi
refletir sobre essa implantação, concluindo que deveríamos iniciar por uma
reunião de pais, antes mesmo do início das aulas, e elaborar uma ficha de
caracterização dos alunos e das suas famílias, para que elas pudessem ser
135
um importante aliado nosso nesse trabalho, pelo conhecimento que nos
proporcionariam acerca das especificidades dessa nossa clientela.
Assim sendo, podemos dizer que, inicialmente, foi a consulta à ficha de
caracterização dos alunos, bem como o diálogo constante com as famílias, e a
preocupação com os processos de cuidado e educação das crianças, que
possibilitaram o processo de reflexão em torno das funções específicas e
complementares da família e da Instituição de Educação Infantil, servindo como
elementos balizadores da construção da nossa relação com as famílias no
C.M.EI. Carmem Reis.
Porém, é importante frisar também que um outro elemento balizador
desse processo, foi a reflexão de que as instituições educativas não podem
abrir mão da sua tarefa de contribuir efetivamente com a construção do
conhecimento pelas crianças, e, portanto, não devem nem se transformar
numa continuidade da família, num segundo lar, nem tentar substituir estas
famílias na ausência da mesma:
A escola imagina que pode se estruturar, para seus alunos, de forma que compense a falta da família. Como se isso fosse possível... Não é, e ponto final. A pior conseqüência desse rumo que a escola tomou é que, desse modo, os alunos ficam carentes de família e de escola também. Ou seja, querendo ser família, a escola deixa de ser escola. (AQUINO e SAYÃO 2004 p. 62-63)
A nossa proposta é que cada uma das instituições – família e escola,
dialoguem em busca da complementaridade de funções, porém, cada uma
respeitando as especificidades da função da outra. O referencial teórico
utilizado para embasar os estudos e discussões sobre a relação família e I.E.I.,
e as suas respectivas funções, foi o mesmo já apresentado no capítulo 3 desse
trabalho, por isso nos eximimos de repeti-lo neste item.
Enfim, o processo de adaptação, tanto das crianças, quanto dos pais; a
rotina como norteadora da construção dos conceitos de tempo e espaço; a
importância do brincar na Educação Infantil; a relação família e I.E.I e suas
funções, o processo de alfabetização; o trabalho com o nome próprio; a
136
relevância de conhecermos a criança com a qual vamos trabalhar, bem como a
sua família; o respeito a diversidade religiosa presente na escola; os horários
de funcionamento da Instituição; os horários de planejamento e estudo;
resumindo: temas relativos ao cotidiano, ao dia-a-dia, tanto da Instituição como
um todo, quanto da sala de aula, foram estudados, debatidos, discutidos e
refletidos, tanto durante estes dias iniciais, quanto durante todos os nossos
outros encontros, e sempre que surgia alguma dúvida, ou questão que
precisava ser resolvida.
Entendemos essa disposição para o diálogo, como também a dialética
entre reflexão-ação-reflexão e ação-reflexão-ação, como fundamental para o
bom andamento da nossa proposta.
Nesses encontros iniciais, além da já citada ficha de caracterização dos
alunos (Anexo 1), elaboramos também um outro documento que aponta
caminhos discutidos e propostos coletivamente para a realização do trabalho
no cotidiano da Instituição, se constituindo num marco inicial para a elaboração
do projeto político pedagógico da mesma. Vamos apresentar abaixo esse
documento, conservando a forma original como o mesmo foi construído pelo
coletivo das pessoas envolvidas:
COMBINADOS ESTABELECIDOS NOS ENCONTROS INICIAIS DO GRUPO DE PROFESSORAS, COORDENADORAS E GESTORAS DO CARMEM
REIS: MARÇO/2004
• A necessidade de acolher também os pais, nesse período inicial de adaptação das crianças, já que os mesmos também estão se adaptando a uma nova situação, vivenciando receios, medos e conflitos. • Os pais deverão entrar na escola para deixar os seus filhos na porta da sala de aula, ocasião em que terão a oportunidade de conversar com as professoras, bem como as professoras com os pais, quando sentirem necessidade. • Ficou combinado que os horários de aula na escola seriam os seguintes: # turno matutino: 7:15 ás 11:15 # turno vespertino: 13:30 ás 17:30 • É importante que as professoras e coordenadoras cheguem sempre uns 10 a 15 minutos antes, para encaminharem algumas questões referente ao bom desenvolvimento das aulas.
137
• Reconhecendo a nossa condição de profissionais da educação devidamente qualificadas para tal função, bem como todo o processo histórico de desvalorização que permeia a nossa profissão, como também o fato de que o afeto não passa pelo nome pelo qual a criança chama a professora, concordamos que não devemos incentivar o fato de sermos chamadas de tia, mas sim de professoras. • Compreendendo que medicar uma criança é tarefa para profissionais qualificados na área de saúde, chegamos ao consenso de que evitaremos, ao máximo, medicar autonomamente as crianças na escola, chamando sempre os pais e/ou encaminhando-as a um posto de saúde quando necessário. • No tocante a religião, também compreendemos que é uma opção e tarefa da família, Portanto, em sala de aula, quando a professora entender pertinente, será realizada uma prece, oração ou reza de agradecimento ou louvor a Deus, sem fórmulas, rituais ou gestos específicos de nenhuma religião em particular, como forma de respeito e consideração ás várias crenças religiosas professadas pelos nossos alunos e seus familiares. • A alfabetização é um processo e, como tal, não acontece em um único ano letivo ou momento específico, devendo ser uma construção prazerosa e significativa, onde a criança tenha contato com livros, gibis, músicas, textos variados e outros materiais gráficos do cotidiano, tendo a professora como propiciadora de momentos de aprendizagem, pensando desafios possíveis para cada aluno. • A brincadeira livre e a brincadeira dirigida precisam estar presentes no cotidiano das instituições de Educação infantil, propiciando lazer, divertimento, desenvolvimento e aprendizagens significativas para as crianças. • Considerando a necessidade de se estudar, discutir e planejar em conjunto, ficou decidido que teríamos reuniões quinzenais, sendo uma vez no mês em um dia da semana em que as aulas seriam suspensas, após a aprovação dos pais, e outra vez aos sábados a tarde.
No dia 25 de março, considerando que a reforma do prédio da Instituição
já estava quase concluída, passamos a nos reunir no mesmo, iniciando o
processo de confirmação das matrículas dos alunos já pré-matriculados no
início do ano.
Nesse processo contamos com o apoio direto das professoras, que
participaram efetivamente das matrículas, entrevistando os pais para o
preenchimento da ficha de caracterização aqui já apresentada. Essa
participação inicial foi muito importante, até porque foi propiciando um contato e
138
um conhecimento maior entre a equipe da escola e os pais, familiares, enfim, a
comunidade de forma mais geral.
FOTO 11: Equipe da I.E.I efetuando
matrículas (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 12: Equipe da I.E.I efetuando
matrículas (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
Entre 25 de março e 02 de abril, a equipe se reuniu diariamente no
prédio da escola, efetivando as matrículas, arrumando as salas de aula e
finalizando o planejamento para as semanas iniciais.
FOTO 13: Professoras confeccionando
materiais (1) Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 14: Professoras confeccionando
materiais. (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
É importante registrar que esses momentos iniciais de estudos e
discussões do grupo de professoras, equipe técnica e gestoras, foi de
fundamental importância para todo o trabalho realizado na escola, tendo sido,
inclusive, a semente de um grupo de estudos, formado por professoras,
coordenadoras pedagógicas e gestoras, que se reúne mensalmente, sempre
aos sábados, desde a fundação da Instituição, até os dias atuais, numa
demonstração concreta da relevância do processo de formação em serviço
para esses profissionais.
139
Outro ponto fundamental sobre o qual não poderíamos deixar de nos
reportar é que: antes do professor, existe o ser humano, essa convicção nos
levou a proporcionar também na escola momentos de acolhimento, de
confraternização, enfim, de uma convivência mais humana e fraterna, que nos
permitisse a criação e o fortalecimento de vínculos afetivos mais consistentes.
Dentre esses momentos vamos destacar os seguintes: reuniões
trimestrais para comemoração dos aniversários de professores e funcionários;
café da manhã para acolher professores e funcionários no início do 1º
planejamento do ano; reuniões de avaliações onde o trabalho da direção
também era avaliado e aberto para críticas, comentários e sugestões;
comemoração do dia do professor e do funcionário, dentre outros.
FOTO 15: Aniversariantes do trimestre FOTO 16: Café da manhã na I.E.I Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005 Fonte: Arquivo do CMEICAR. ANO: 2005
4.2 - Ações iniciais com os funcionários
Conforme iam chegando os funcionários encaminhados pela firma, cujos
serviços a SME terceirizava, nós íamos nos reunindo com eles para falar sobre
as especificidades do trabalho com a criança da Educação Infantil, colocando
que eles também eram educadores, na medida em que iriam atuar diretamente
com as crianças.
Em relação a essa questão, a primeira discussão que promovíamos era
no sentido de que os funcionários pudessem perceber a importância do
momento da infância que as crianças com as quais iríamos trabalhar estão
vivendo, bem como a importância das mesmas serem tratadas como cidadãos,
140
sujeitos também dos seus processos de aprendizagem e desenvolvimento,
necessitando, portanto, de serem ouvidos, respeitados e considerados, nas
suas especificidades e singularidades.
Orientávamos também acerca da importância do tratamento que deveria
ser dado a família, enfatizando a importância de um bom relacionamento entre
a Instituição e a família dos seus alunos, lembrando, para isso, o respeito, a
gentileza e a simpatia com que as famílias dos alunos precisavam ser
recebidas na Instituição.
Neste momento colocávamos também as tarefas de cada um, tanto no
particular da função – vigia, merendeira, ASG, quanto na colaboração com o
educar e cuidar das crianças. É importante frisar que, desde o início os
funcionários se mostraram disponíveis para colaborar com a proposta da
Instituição.
Queremos registrar que hoje, retomando toda essa proposta de trabalho
e refletindo sobre a mesma, percebemos que deveríamos ter feito com os
funcionários uma proposta de trabalho mais efetiva, promovendo também a
participação deles nos momentos de planejamento e estudo. Infelizmente essa
questão, apesar de ter sido até pensada em alguns momentos, não foi posta
em prática.
É certo que alguns pontos da própria especificidade do trabalho deles –
como por exemplo, o fato da faxina geral mensal da Instituição ser realizada
por eles, exatamente no dia de planejamento, quando as crianças não se
encontravam presentes, dificultaram um pouco esse envolvimento maior, mas,
com certeza, se tivéssemos apostado mais nessa possibilidade, teríamos
encontrado uma saída.
Porém, mesmo considerando essa questão, é importante dizer que
fazíamos também reuniões periódicas com os funcionários, onde eles podiam
se colocar, e também que os mesmos participavam - juntamente com as
professoras e toda a equipe, das reuniões semestrais para avaliação geral do
trabalho, bem como das reuniões trimestrais para a confraternização em torno
dos aniversariantes do trimestre.
Feitos esses esclarecimentos, é importante registrar que, apesar dessa
lacuna que apresentamos acima, o envolvimento e a participação dos
funcionários foi muito importante em todas as atividades realizadas, tanto junto
141
as crianças, como as famílias, considerando que os mesmos faziam parte da
escala diária da Instituição, tanto no horário do lanche, como do parque e da
higiene bucal das crianças, bem como de outras atividades realizadas com as
crianças, contribuindo efetivamente com as professoras nas tarefas de cuidado
e educação das mesmas nestas atividades; bem como se faziam presentes,
com tarefas definidas e relevantes em todos os encontros e reuniões
promovidas com as famílias.
Outro fato que queremos destacar, é que a grande maioria dos
funcionários, em sendo informados das tarefas que a escola pretendia e/ou
necessitava realizar, colocavam as suas habilidades pessoais a serviço das
mesmas: como cantores, como atores de peças infantis, como costureiras de
bonecas e das suas roupas, como recuperadores de livros e brinquedos, enfim,
naquilo que fosse possível e indispensável para o êxito das atividades em
questão.
FOTO 17: Funcionário tocando violão para
as crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.
FOTO 18: Funcionárias fazendo docinhos
para festa das crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.
É importante dizer também que nós, enquanto direção da escola,
procurávamos sempre incluir esses funcionários nas atividades já citadas de
incentivo e valorização ao ser humano, como cafés da manhã, jantares,
almoços, e outros momentos de confraternização promovidos ao longo do ano,
até mesmo pelo fato de compreendermos que todos os que atuam nas
Instituições educativas, independente da função específica que exercem, são
também educadores no sentido amplo e irrestrito da palavra.
142
4.3 - Algumas ações realizadas com as crianças
O nosso objeto específico de estudo nessa tese, é a relação entre
família e I.E.I, com uma ênfase, portanto, para o trabalho realizado com as
famílias em prol desse objetivo; porém, como trabalhamos numa perspectiva
da práxis participativa - conforme já discutido na introdução deste trabalho,
estamos apresentando algumas ações gerais do contexto inicial de surgimento
e organização da Instituição, e compreendemos ser importante também
apresentar alguns aspectos do trabalho realizado com as crianças.
Um dos maiores desafios da Educação Infantil na contemporaneidade,
diante de todas as ambivalências e ambigüidades que permeiam a história da
infância – conforme apresentado e discutido no capítulo 3 desse trabalho, é
promover um trabalho pedagógico que considere a criança como sujeito de
direitos, ativo e reflexivo na construção das suas aprendizagens e do seu
desenvolvimento, para tanto, concordamos que:
O trabalho pedagógico precisa favorecer a experiência com o conhecimento científico e com a cultura, entendida tanto na sua dimensão de produção nas relações sócias cotidianas e como produção historicamente acumulada, presente na literatura, na música, na dança, no teatro, no cinema, na produção artística, histórica e cultural que se encontra nos museus. Essa visão do pedagógico ajuda a pensar sobre a creche e a escola em suas dimensões políticas, éticas e estéticas. A educação, uma prática social, inclui o conhecimento científico, a arte e a vida cotidiana. (KRAMER, 2006, p. 19)
Dessa forma, compreendemos que a organização do trabalho
pedagógico a partir da perspectiva de projetos didáticos, é uma alternativa que
contempla as dimensões propostas acima, principalmente porque “Essa forma
de estruturar o ensino leva em conta possibilidades, necessidades e
características das crianças, favorecendo um estudo multidisciplinar” (HORN,
2005, p.3), ou seja, possibilita que a criança seja respeitada nas suas
especificidades, tenha os seus conhecimentos prévios, a sua cultura e o seu
143
contexto considerados, mas também a oportunidade de ampliação do seu
universo de conhecimentos, através de uma proposta que trabalhe com as
suas várias linguagens.
Foi o reconhecimento das várias possibilidades de aprendizagem e
desenvolvimento que o trabalho com projetos didáticos descortina para as
crianças, que levou os profissionais do Carmem Reis a adotar os mesmos
como uma das estratégias de trabalho realizada com os alunos da Instituição.
No biênio 2004/2005 vários projetos foram realizados pelas professoras.
Alguns mais restritos, e de menor duração, para trabalhar conteúdos
específicos como identidade pessoal, família, animais, vegetais, higiene
pessoal, dentre outros. Outros mais amplos, envolvendo conteúdos
procedimentais, atitudinais, conceituais; bem como abrangendo vários eixos
temáticos propostos pelo Referencial Curricular Nacional para Educação
Infantil - RCNEI para o trabalho pedagógico na Educação Infantil, como foi o
caso do projeto Brinquedos e brincadeiras: um resgate cultural; No mundo
encantado dos contos de fadas; Desvendando a vida e a cultura da Vila; além
de outros.
Para efeito da nossa descrição nesse momento, vamos nos deter no
projeto intitulado Rendeiras da Vila: a preservação de uma cultura, pelo fato
do mesmo ter despertado muito o interesse dos alunos, além de ter trabalhado
com uma temática que valorizou bastante a cultura do bairro no qual o Centro
Infantil está localizado, como também pelo fato da professora ter
disponibilizado esse projeto, para que o mesmo pudesse ser apresentado no
nosso trabalho.
É importante registrar que esse projeto fez parte de uma temática maior
– Desvendando a vida e a cultura da Vila, proposta pela Instituição como uma
forma de construir um currículo que, conforme nos aponta Bujes (In: CRAIDY;
KAERCHER, 2001), surja das interações que ocorrem no cotidiano da
instituição educativa, valorizando a cultura e o conhecimento da comunidade
local.
O mesmo foi realizado no segundo semestre do ano de 2005, na turma
do nível I vespertino, composta por 15 crianças na faixa etária de 4 anos, teve
uma duração de aproximadamente 3 meses, e foi organizado pela professora
titular da sala, com os seguintes objetivos:
144
• OBJETIVO GERAL:
o Conhecer e valorizar o trabalho das rendeiras da Vila de Ponta Negra, reconhecendo a importância desse ofício para a preservação da cultura local.
• OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
o Compreender como se deu o aprendizado do ofício de rendar.
o Conhecer os principais instrumentos de trabalho das rendeiras. o Saber que tipos de peças são produzidas pelas rendeiras.
o Reconhecer a importância do trabalho das rendeiras para a
cultura da Vila de Ponta Negra.
A temática específica do projeto nasceu de uma atividade realizada com
as crianças, sobre as profissões exercidas pelos seus familiares. Considerando
que algumas crianças da sala eram parentes, sobrinhas e netas de rendeiras, e
que esse é um ofício que faz parte do universo cultural do bairro desde a
década de 1960, tendo perdurado até os dias atuais, sendo repassado de uma
geração a outra, praticamente dentro das mesmas famílias, além do fato das
crianças terem demonstrado interesse por conhecer melhor esse trabalho, foi
que a professora optou pela realização desse projeto. Segue abaixo um trecho
da escrita da professora na justificativa do projeto:
A escolha do tema deu-se primordialmente pelo fato de estarmos realizando uma roda de conversa sobre as profissões dos familiares dos alunos. Numa dessas conversas, uma das alunas afirmou: “minha avó é rendeira”. Fiquei realmente muito entusiasmada e curiosa com a afirmação, e as crianças também, pois queríamos saber um pouco mais sobre este ofício e sobre os instrumentos utilizados pela avó da aluna para realizá-lo. Por outro lado, como toda a escola estava interessada em elaborar um projeto sobre a comunidade e os aspectos sócio-econômicos e culturais da Vila de Ponta Negra, o estudo sobre as rendeiras da Vila seria uma excelente oportunidade para a realização de um projeto, o qual seria um dos subtemas relacionados.
145
Outro aspecto que influenciou na escolha do tema foi o fato de tal ofício ser um dos principais da Vila, sendo repassado de mãe para filhas, ou seja, de uma geração para outra até os dias atuais. Muitas rendeiras da Vila, já idosas, aprenderam a rendar com as mães, sustentaram os filhos através desse trabalho e passam para as filhas e aprendizado dessa função nos dias atuais. Desse modo, desenvolveremos o projeto “Rendeiras da Vila: a preservação de uma cultura”, durante o segundo semestre do corrente ano.
Segundo o relato da professora, após a opção pelo tema do projeto, a
primeira atividade realizada foi uma roda de conversa para o levantamento dos
conhecimentos prévios das crianças, bem como para sentir o nível de
participação e interesse das mesmas pelo projeto, para que se pudesse
estruturá-lo da melhor forma possível. Foi assim que, a partir dos seguintes
questionamentos:
Você conhece alguém da sua família que sabe rendar?
Como é que a rendeira faz a renda?
O que será que as rendeiras usam para rendar?
apresentados inicialmente pela professora - dentre outros surgidos no diálogo e
na interação com as crianças no momento da roda, que o levantamento de
conhecimentos prévios foi realizado, obtendo respostas como as que se
seguem:
Minha avó sabe rendar
A minha também sabe
Ela usa almofada para rendar
Eu nunca vi uma mulher rendando. Quero ver!
146
Tendo essas questões iniciais relativas ao levantamento de
conhecimentos prévios como parâmetro, a professora organizou o referido
projeto, através do qual foram vivenciadas as seguintes atividades:
• Rodas de conversa sobre o trabalho das rendeiras, objetivando sistematizar as atividades a serem realizadas. • Visita a casa das rendeiras da Vila, para observação do trabalho e realização de perguntas, considerando a curiosidade e o interesse dos alunos. • Roda de conversa sobre a visita a casa das rendeiras, registrando a fala das crianças para a elaboração de um texto coletivo. Desenhos livres das crianças sobre essa visita. • Elaboração coletiva de um convite escrito para que uma rendeira – avó de uma aluna da turma, viesse até a Instituição para ser entrevistada. • Elaboração e realização coletiva da entrevista com a rendeira na Instituição • Ensaio da conhecida canção popular “mulher rendeira”.
• Confecção, pelas crianças, com a mediação da professora, da almofada de bilro usada pelas rendeiras no seu ofício. • Exposição das almofadas de bilro confeccionadas pelas crianças, bem como de todas as atividades individuais e coletivas ( desenhos, textos, entrevista, etc) para a comunidade, sendo este o produto final do projeto.
No dia dessa exposição final do trabalho realizado por esta turma, e por
todas as outras turmas da Instituição, dentro do projeto maior intitulado
Desvendando a vida e a cultura da Vila, três rendeiras do núcleo sediado na
Vila de Ponta Negra, denominado Casa das Rendeiras, se fizeram presentes
na Instituição, com suas almofadas e bilros, apresentando esta arte para todos
os que compareceram ao evento.
Segundo a professora, após a realização de todo o projeto, na avaliação
final, quando solicitadas a opinar sobre o trabalho realizado, as crianças deram
os seguintes depoimentos:
147
Eu gostei de ver a mulher rendando.
Eu gostei de fazer a almofada.
Eu também gostei de fazer a almofada.
Eu gostei de tudo.
Esse foi apenas um dos aspectos do trabalho realizado com as crianças
no cotidiano da Instituição, mas que, no nosso entendimento, retrata a
preocupação, a responsabilidade e o compromisso de todos os que fazem a
equipe administrativa-técnica-pedagógica-funcional do CMEI Carmem Maria
Reis, com um trabalho pedagógico de qualidade, que valorize os
conhecimentos prévios das crianças, respeite a sua cultura, e contribua com a
ampliação dos conhecimentos das mesmas.
4.4 – Ações realizadas com as famílias
Partindo dos princípios já elencados no início desse trabalho – a grande
maioria construídos após as duas experiências de pesquisa sistematizadas já
apresentadas, bem como dos estudos e discussões realizadas junto a toda a
equipe de profissionais do CMEI Carmem Reis, vamos expor as linhas gerais
que nortearam a nossa proposta de trabalho nesta área, explicando como a
mesma foi sendo construída ao longo do processo.
Compreendendo a relevância de um trabalho dessa natureza ser uma
construção coletiva, nossa primeira preocupação foi envolver as professoras e
toda a equipe técnica administrativa da Instituição nessa proposta desde os
primeiros dias de estudo, quando levamos este tema para ser refletido, e já
fomos construindo coletivamente algumas diretrizes para a vivência do
mesmo, começando pela elaboração de uma ficha de caracterização das
crianças e suas famílias, onde iríamos encontrar, também, alguns subsídios
para nortear o nosso trabalho.
Outro passo importante, logo nos primeiros dias de contato com a futura
equipe de educadores do Centro Infantil, foi o consenso de que os pais
deveriam ter livre acesso a Instituição, deixando e pegando os filhos na porta
148
da sala de aula, ocasião em que poderiam, dentre outras coisas, conversar
com a professora, e conhecer/observar o cotidiano da Instituição, bem como a
recepção dada ao seu filho(a) na mesma.
FOTO 19: Livre acesso das famílias a I.E.I.
(1) Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 20: Livre acesso das famílias a I.E.I.
(2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
Combinar que teríamos momentos de reuniões, tanto de caráter
formativo, quanto informativo, bem como outros momentos de
interação/troca/vivência com os pais durante o ano letivo, foi outro
compromisso firmado com todos que faziam o corpo técnico-docente-
administrativo da Instituição desde o início, embora as ações específicas só
tenham sido definidas ao longo do ano letivo, considerando as demandas que
foram surgindo na interação do processo.
Dessa forma, vamos agora apenas citar, após termos agrupado em
blocos, as atividades desenvolvidas durante os anos de 2004 e 2005,
elegendo, a partir das nossas próprias observações, das observações das
professoras e das falas dos entrevistados, uma ou duas atividades mais
significativas de cada bloco, para serem analisadas no capítulo seguinte:
• Reuniões com os pais.
• Palestras sobre temas relevantes para os processos de aprendizagem e
desenvolvimento das crianças.
• Vivência com os pais de atividades realizadas com as crianças no
cotidiano da instituição
• Festas comemorativas
149
• Incentivo a participação dos pais em projetos didáticos vivenciados pelas
crianças
• Intervenção individual, junto a algumas famílias.
a) Reuniões entre Famílias e Instituição de Educação Infantil.
É importante frisar que estamos sempre designando “reuniões entre
famílias e I.E.I.”, como aqueles encontros de caráter mais informativos, bem
como destinados a ouvir os pais, sobre questões que entendemos serem
necessárias e pertinentes ao dia-a-dia da Instituição. Outros encontros, com
um caráter mais de trocas de idéias e reflexões sobre as ações de cuidado e
educação das nossas crianças, terão outra denominação.
Inicialmente, estas reuniões foram previstas em número de 4 ao ano: 1
no início do 1º semestre, outra no final; uma no início do 2º semestre e outra
também no final. Porém, no transcorrer do ano letivo, essas reuniões
ultrapassaram a previsão inicial, e aconteceram sem uma periodicidade pré-
estabelecida, mas, sempre com o objetivo de informar as famílias sobre
acontecimentos da escola, solicitar a opinião e colaboração das mesmas
nesses acontecimentos, como também, principalmente no início do ano letivo,
apresentar a escola, sua proposta e seu corpo técnico-docente-administrativo,
aos familiares dos alunos.
Tanto no início do ano de 2004, quanto no início do ano de 2005,
realizamos, com a presença de todos os funcionários docentes e não docentes
da Instituição, uma primeira reunião com as famílias dos nossos alunos,
objetivando apresentar a Instituição, a nossa proposta de trabalho, algumas
regras necessárias ao funcionamento da mesma, bem como ouvir os familiares
– inclusive apresentado a professora responsável por cada turma, e abrindo já
um espaço para aqueles que quisessem tratar de alguma questão específica
sobre o filho; como também dizendo aos mesmos que nós – direção,
coordenação, professoras e funcionários, estaríamos disponíveis para atendê-
los em qualquer dúvida, sugestão ou outra necessidade que eles sentissem.
Para tanto, os portões da Instituição, tanto no início, quanto no final de cada
150
turno de aulas, estariam abertos, para que eles pudessem entrar e conversar,
deixando e recebendo de volta as suas crianças na porta das respectivas salas
de aula.
Além dessas primeiras reuniões no início de cada ano letivo, e das
reuniões para entrega dos relatórios de desempenho dos alunos ao final de
cada semestre, outras reuniões aconteceram durante o ano, sempre com o
objetivo de discutir e ouvir a opinião dos pais sobre algum assunto relevante ao
funcionamento da Instituição, organização de passeios, festividades, horário de
início das aulas, merenda, bem como para tratar e retomar os nossos
combinados com as famílias sobre horário de entrada e saída das crianças,
uso da farda, higiene pessoal dos alunos, uso da carteirinha de identificação ao
vir pegar a criança na Instituição, dentre outras questões relevantes ao
trabalho.
b) Palestras e vivências sobre temas relevantes para as ações de cuidado e educação das crianças.
Durante os anos de 2004 e 2005, realizamos algumas palestras com as
famílias sobre temas relevantes para o cuidado e a educação das crianças,
entre eles destacamos os seguintes: a relevância da brincadeira para o
desenvolvimento da criança, a importância do limite na educação da criança; a
relação entre pais e filhos; a higiene bucal e tratamento e prevenção de
doenças de pele e pediculose.
Essas temáticas foram trabalhadas pela equipe da escola, a partir da
observação e vivência de algumas questões do cotidiano na Instituição:
• No caso da higiene bucal e do tratamento e prevenção de doenças de
pele e pediculose, a idéia nasceu a partir da constatação, realizada pela equipe
da Instituição, da necessidade de cuidado que as crianças necessitavam
nessa área. Dessa forma, através de uma parceria com o posto de saúde do
bairro, convidamos pais e crianças a participarem desse evento. Na ocasião,
além da palestra de esclarecimento, foi distribuída escova dental e as mães
presentes foram convidadas a escovar, sob a orientação do dentista, os dentes
151
da sua criança, participando também da aplicação de flúor. Na palestra sobre
pediculose e outras doenças da pele, a enfermeira também atendeu alguns
casos específicos, encaminhando mães e crianças, quando necessário para
uma consulta médica, ou distribuindo e orientando sobre o uso da medicação
adequada.
• No caso da temática sobre a importância da brincadeira, a necessidade
de se trabalhar a mesma surgiu, também, a partir das observações da equipe
da Instituição, principalmente as professoras, sobre a questão de algumas
mães não ficarem satisfeitas com o fato das crianças se sujarem no parque,
brincarem com areia; além de outras que alegavam, em alguns momentos,
que, como a criança vinha “só para brincar”, elas não se preocupavam muito
com o cumprimento do horário, chegando atrasadas com os filhos, ou
querendo sempre levá-los mais cedo, a partir de uma conveniência delas.
• No tocante as palestras sobre limites e relação pais e filhos, a idéia
nasceu partindo de algumas observações realizadas pela equipe técnica-
docente no dia-a-dia da Instituição, tais como: era comum as crianças usarem
uma espécie de “chantagem emocional” com a mãe, tipo: traga confeito
quando vier me buscar, se não, não vou para casa ; ou então espernear,
chegar na escola correndo e a mãe correndo atrás; as mães reclamarem que
não sabiam mais o que fazer com as crianças. Partindo dessas observações,
resolvemos fazer as citadas palestras com o objetivo de compartilhar com as
famílias estas funções de cuidar e educar as crianças, discutindo, refletindo e
procurando dirimir algumas dúvidas.
c) Oficina com as Famílias de atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição
Partindo da necessidade, que entendemos imperiosa, das famílias
conhecerem o trabalho que é realizado no cotidiano da Instituição de Educação
Infantil com os seus filhos, e concordando que: “As relações entre a família e o
Centro Educativo devem proporcionar que os pais e as mães possam
152
compreender, aceitar e valorizar a tarefa educativa da escola”.( BASSEDAS,
HUGUET & SOLÉ,1999, p.289), foi que nos propomos a realizar estas oficinas,
com o objetivo de proporcionar as famílias um conhecimento mais aprofundado
das atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição.
Essas oficinas foram planejadas por toda a equipe da escola e
realizadas pelas professoras, na própria sala de aula, cada uma com os pais
dos seus alunos. As temáticas trabalhadas foram organizadas, tanto com base
nas atividades da própria rotina da Instituição, quanto nas falas espontâneas de
alguns familiares, dentre as quais destacamos as seguintes:
mulher, eu nem trouxe ele ontem, também é só pra brincar, não faz mal não, né?
Diretora, esse menino não vai aprender a ler não? Quando é que vai ter dever escrito de casa todo dia?
Diretora, essa menina está chegando em casa muito suja de areia, suada, eu vou pedir a professora para ela não ir mais para o parque não.
Esses são pequenos exemplos de falas das famílias dos alunos que,
para nós, atestam, tanto o desconhecimento das funções da Educação Infantil,
como a necessidade de um conhecimento maior acerca das atividades
vivenciadas pelas crianças na Instituição.
Dessa forma, algumas das temáticas discutidas e vivenciadas foram: a
hora do parque, a atividade de desenho, a hora da história, o momento do
vídeo, o trabalho com o nome próprio, dentre outras.
FOTO 21: Oficina sobre a hora do parque. Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
153
FOTO 22: Oficina sobre desenho.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 23: Oficina sobre escrita com
alfabeto móvel. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
O objetivo maior de cada uma dessas oficinas, foi apresentar e fazer uma
reflexão com as famílias sobre a nossa proposta de trabalho, mostrando, por
exemplo, o quanto a hora da história é importante para que a criança se
aproxime da linguagem escrita, perceba a estrutura dos vários gêneros
textuais, amplie o seu conhecimento de mundo; a relevância das atividades
com desenho, com o vídeo, ou então no parque, explorando as muitas
linguagens e formas de expressão das crianças, etc.
d) Festas comemorativas
Algumas datas comemorativas foram lembradas pela Instituição como
uma forma de resgatar aspectos da cultura da comunidade, bem como com o
objetivo de reunir as famílias em torno de uma atividade de caráter mais lúdico,
mais divertido, propiciando assim convivência, troca de experiências e lazer no
ambiente em que os filhos estudam.
Dentre essas comemorações destacamos a páscoa, as festas juninas, o
dia do folclore, a comemoração alusiva ao Natal, bem como as datas
comemorativas do dia das mães e dos pais, que acabaram se transformando
nos Encontros da Família Carmem Reis, onde todos os familiares dos
alunos, independente de serem apenas mães ou pais, no sentido biológico do
termo, eram convidados a se fazerem presentes, participando de atividades
informativas, artísticos-culturais, ou de lazer.
154
FOTO 24: Festa junina.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 25: Famílias visitando exposição de
trabalhos das crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
e) Incentivo a participação dos pais em projetos didáticos vivenciados pelas crianças Desde o início das nossas reuniões pedagógicas, o projeto didático foi
discutido como sendo uma metodologia possível e adequada de ser utilizada
para se trabalhar alguns conteúdos junto com as crianças. Dessa forma, dentro
da organização geral da rotina, nas nossas reuniões mensais de planejamento,
sempre se pensava um projeto, buscando contemplar algum tema relevante
para os processos de desenvolvimento e aprendizagem das crianças. Dentre
os temas trabalhados a partir dessa metodologia, destacamos: brinquedos e
brincadeiras; desvendando a vida e a cultura da Vila e o mundo encantado do
imaginário infantil.
Considerando as especificidades das nossas crianças, bem como todo o
seu contexto sócio-histórico-cultural, pensávamos um tema maior, como os já
citados anteriormente, e cada professora, tendo esse tema maior como eixo
condutor, e respeitando os interesses, necessidades e conhecimentos prévios
dos seus alunos, pensava o projeto específico da sua sala de aula, construindo
o título, a justificativa, os objetivos, as etapas e atividades a serem vivenciadas,
bem como o produto final de cada projeto, procurando também, durante o
mesmo, propiciar o envolvimento das famílias das crianças.
Esse envolvimento das famílias se dava de várias formas, dependendo
da temática, do objetivo de cada turma, e do produto final proposto. Em
algumas salas havia um envolvimento no tocante a coleta de dados e materiais
para subsidiar o projeto; em outras alguns familiares eram convidados para
155
entrevistas, depoimentos e/ou vivências juntamente com os alunos na própria
sala de aula; em outras situações ainda, o envolvimento das famílias acontecia
por ocasião do momento das atividades dos produtos finais ou culminâncias
dos projetos.
f) Intervenção individual junto a algumas famílias Nas nossas reflexões coletivas, em busca de aperfeiçoar o trabalho
realizado com a família dos nossos alunos, sentimos necessidade de, além das
intervenções gerais, pensadas e realizadas com o coletivo das famílias,
fazermos também algumas intervenções de caráter mais individual, procurando
colaborar, de forma mais específica com o processo de formação de algumas
crianças que, a nosso ver, precisavam de um acompanhamento mais direto,
mais direcionado, acompanhamento esse que, sem dúvida nenhuma, tinha
início com um diálogo mais aberto e mais direto com a família dos mesmos.
Nessa perspectiva, sempre que as professoras, coordenadoras,
gestoras, ou os próprios funcionários, percebiam alguma mudança de
comportamento de alguma criança, que apontava para a necessidade de um
diálogo mais direto com as famílias, a questão era discutida no coletivo e,
dependendo da situação, pensávamos uma estratégia para que, a professora,
a coordenadora e/ou a direção, realizasse esse trabalho. No capítulo seguinte
vamos especificar e refletir sobre uma intervenção dessa natureza que
aconteceu no ano de 2005.
Estas foram, em linhas gerais, as ações realizadas junto a professoras,
funcionários e famílias, objetivando a sistematização de ações que
possibilitassem o fortalecimento das relações entre as famílias e a Instituição, e
o compartilhamento das ações de educação e cuidado que precisam ser
realizadas junto ás crianças da Educação Infantil.
No capítulo seguinte, buscando atender de forma mais específica ao
objetivo ao qual nos propomos nesta tese – descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no
156
contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, vamos,
conforme já citado anteriormente, eleger, de cada um desses denominados
blocos de atividades, uma ou duas atividades consideradas mais significativas,
a partir das nossas próprias observações, como também da opinião de
professoras e famílias, e da repercussão que a atividade teve na Instituição,
para refletirmos melhor sobre as mesmas. Vamos também, no capítulo que se segue, apresentar uma análise
reflexiva da última entrevista realizada com familiares dos alunos em 2005.
Dessa forma, após apresentarmos, em linhas gerais, os contornos dos
caminhos percorridos, vamos agora procurar descrever e refletir sobre algumas
especificidades dos mesmos, a partir de um diálogo maior com os outros atores
que construíram/compartilharam conosco essa trajetória.
157
CAPÍTULO 5
158
5 - DESCREVENDO E REFLETINDO SOBRE OS CAMINHOS PERCORRIDOS.
Cabe, portanto, ás instituições estabelecerem um diálogo aberto com as famílias, considerando-as como parceiras e interlocutoras no processo educativo infantil. Brasil (1998)
Nesse capítulo, onde nos propomos a refletir sobre algumas
especificidades dos caminhos percorridos, vamos descrever e analisar as
ações e intervenções mais significativas de cada um dos blocos de atividades
desenvolvidas com as famílias, bem como apresentar uma análise mais
detalhada e sistemática das entrevistas finais realizadas com familiares dos
nossos alunos, buscando perceber a opinião dos mesmos sobre a experiência
aqui vivenciada.
É importante lembrar que, conforme já explicitado no capítulo 2, as
nossas entrevistas foram realizadas em dois momentos distintos: o primeiro,
com duas perguntas (Anexo 2), sempre após alguma atividade realizada com
as famílias, procurando perceber a opinião e percepção delas sobre a atividade
específica; o segundo momento, constando de uma entrevista semi-estruturada
com sete perguntas (Anexo 3), e realizada ao final do ano letivo de 2005, com
o objetivo de perceber a opinião mais geral das famílias, sobre todo o trabalho
realizado pela escola.
Alguns trechos e opiniões das entrevistas do primeiro momento, estão
aqui apresentados nos blocos específicos de análise de cada atividade. Já as
entrevistas finais, serão catalogadas por perguntas, e analisadas a partir das
respostas apresentadas pelas famílias entrevistadas.
Vamos citar novamente abaixo os blocos de atividades realizadas com
as famílias, lembrando que, de cada um desses blocos, vamos eleger uma ou
duas atividades para serem descritas e analisadas de forma mais específica
nesse capítulo.
159
a) Reuniões com as famílias. b) Palestras e vivências sobre temas relevantes para as ações de cuidado e educação das crianças. c) Oficinas com as famílias sobre atividades realizadas com as crianças no cotidiano da instituição. d) Festas comemorativas. e) Incentivo a participação das famílias em projetos didático-educativos vivenciados pelas crianças. f) Intervenção individual, junto a algumas famílias.
5.1. Reuniões com as famílias Das reuniões realizadas com as famílias, vamos nos deter na análise da
1ª reunião do ano de 2004 e da última reunião do ano de 2005, por
compreendermos que as mesmas nos apontam vários elementos para reflexão
sobre o nosso trabalho.
Na primeira reunião do ano de 2004, realizada, conforme já colocado
anteriormente, com o objetivo de conhecer as famílias com as quais iríamos
trabalhar, bem como de apresentar a Instituição a estas famílias, um dos
aspectos que mais chamou a nossa atenção, foi o elogio das mesmas a
reforma que tinha sido realizada no espaço físico da Instituição. Os pais, que
conheciam o espaço que, como já dissemos, era ocupado por uma escola
particular, conveniada com a Prefeitura, deram os seguintes depoimentos
quando se depararam com a reforma que havia sido feita:
ah! Agora sim o espaço está mais seguro para as crianças: posso deixar meu filho sem medo!
Vocês se preocuparam com tudo: até a areinha do parque está limpinha, e tem um lugarzinho separado, onde ninguém pisa, só para as criança brincar com areia!!
160
A escola ta toda pintadinha, as cadeirinha e mesa novinha, os banheiro do tamanho dos menino, isso sim que nossos filho precisa!
Que diferença, nem parece o mesmo lugar: tem parque, tem brinquedo, areia limpa, sem mato!
Esses depoimentos nos mostram o quanto as famílias percebem e
valorizam a organização dos espaços, a limpeza, a segurança, enfim a
preocupação com o bem estar dos filhos delas. Essa foi uma das nossas
primeiras preocupações: dentro dos limites possíveis, oferecidos por um
espaço que não foi projetado com o objetivo de atender uma Instituição infantil,
adequá-lo da melhor forma possível, objetivando atender as necessidades de
cuidado e educação dessas crianças.
FOTO 26: Reunião de pais.
Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
Outra questão também muito elogiada pelas famílias nessa primeira
reunião foi o fato de todo o corpo técnico-docente-administrativo e funcional da
escola, desde a direção até o vigia e a merendeira, estarem presentes à
reunião, se apresentando e se colocando a disposição delas.
As professoras também ficaram muito satisfeitas com essa primeira
reunião, principalmente pelo fato dos familiares dos alunos terem reconhecido
todo o esforço que foi realizado para melhorar o espaço físico da Instituição,
bem como o empenho das professoras em se fazerem presentes e
161
participarem ativamente de todo o movimento das matrículas e arrumação do
espaço interno, tornando-o o mais agradável possível.
Bassedas, Huguet & Solé (1999), chamam bastante a atenção sobre a
importância dos contatos iniciais entre famílias e escolas, lembrando que os
mesmos são fundamentais para o estabelecimento de uma relação mais sólida
e produtiva entre essas duas instituições, principalmente no sentido de
conhecer quem é esta criança, seus gostos, preferências, sentimentos:
Quando a criança ingressa na escola, por pequena que seja – e quanto maior, ainda mais – já viveu, em sua família, um conjunto de experiências transcendentes a si. Os professores e as professoras necessitam saber como é esta criança, quais os seus ritmos, que pautas de relação está estabelecendo e com que pessoas, o que lhe agrada, o que não lhe agrada, etc. Frequentemente essas informações são obtidas mediante uma entrevista inicial que serve também para marcar os primeiros contatos entre a escola e a família. (BASSEDAS, HUGUET & SOLÉ, 1999, p. 285)
No nosso caso específico esse contato inicial se deu, a partir da
matrícula, com a ficha de caracterização, e dessa primeira reunião com as
famílias, onde toda a equipe da Instituição se fez presente, se colocando a
disposição para conhecer melhor, e dialogar com as famílias das crianças.
De nossa parte, a partir das observações e do registro das falas de
familiares e professoras – algumas dessas falas já apresentadas no corpo
desse trabalho; percebemos a importância desse primeiro contato com os
pais, como sendo fundamental para o fortalecimento de todo o trabalho
posterior. Outra questão muito relevante de ser lembrada nesse momento, é o
fato de que, no início do ano, até pelo interesse das famílias em conhecer o
lugar e garantir a vaga dos filhos, o comparecimento das mesmas é maior,
tornando, realmente, esse momento privilegiado para o início de um processo
exitoso de relação entre família e escola.
Acreditamos assim que todas essas questões já expostas apontam para
a relevância de um trabalho bem estruturado e direcionado desde o início do
ano letivo, desde as primeiras oportunidades de contato com as famílias, para
o fortalecimento da relação da família com as instituições de Educação Infantil,
162
como acreditamos também que a nossa relação inicial foi muito produtiva, na
medida em que abriu os caminhos para todo o processo aqui descrito.
A última reunião de pais do ano de 2005 foi escolhida para ser analisada
nesse capítulo, pelo fato de ter sido um momento no qual, a grande maioria das
famílias já com 2 anos de convivência na Instituição, pôde fazer uma avaliação,
um balanço do trabalho realizado:
Eu gosto desta escola porque as crianças são bem tratadas, elas gostam de vir para cá, elas são felizes, e toda mãe quer ver seus filho feliz
Eu tenho pena porque a minha já vai embora, não pode mais ficar. Aqui eu fico tranqüila, porque sei que quando ela entra, só sai comigo, ou com gente de confiança, não vai ficar solta na rua – mesmo se não tiver aula, elas ficam com as criança, não mandam sozinha para casa.
A segurança daqui é muito boa, a limpeza também, e as pessoa, que trata a gente bem, atende a gente, dá informação, fala pra gente entender.
Eu gosto muito daqui, as vez até tenho pena porque não posso vir mais, elas chamam pra muita coisa, mas eu trabalho e as vezes não posso vir, minha mãe, ou minha irmã é que vem, mas eu gosto de vir, só não venho quando não posso.
Uma das questões que mais chamam a nossa atenção, desde as
primeiras entrevistas que começamos a fazer com os pais da Instituição, é o
fato da grande maioria deles se referir ao bom tratamento que recebem, e ao
fato de terem acesso fácil à direção e aos outros profissionais da Escola, como
se isso fosse uma dádiva, uma benção ou um favor. Na nossa visão isso é uma
obrigação de todos os que fazem ás instituições, principalmente as instituições
públicas, considerando que são pagos pelo povo, para prestar um serviço ao
povo, além, é óbvio, do grande compromisso social que possuem na formação
das novas gerações.
Em uma das nossas entrevistas, exatamente por estranharmos os
entrevistados elogiarem a forma como são tratados e o fato de terem acesso
163
fácil a direção da Instituição, perguntamos a entrevistada o porque desse
elogio, e ela respondeu:
mulher, tem escola que trata muito mal a gente, parece que a gente vai lá só pra falar mal, pra atrapalhar. Falar com diretor, aí é que é difícil! Pra você ter uma idéia, faz mais de uma semana que quero falar com o diretor da escola onde meu outro filho estuda e não consigo.
Infelizmente, sabemos que a fala dessa mãe ainda é uma realidade
presente em muitas escolas. É como se os pais fossem inimigos, pessoas que
não pudessem contribuir com a escola ou, pior ainda, fossem atrapalhar, ou
apenas criticar o cotidiano da instituição. As experiências que já tivemos em
relação ao livre acesso dos pais à Instituição escolar, demonstram que esse
fato é muito importante, fazendo com que os pais se sintam mais responsáveis,
mais atuantes, mais presentes. É lógico que para a instituição é uma
responsabilidade, uma preocupação a mais, já que os pais estão observando
mais de perto o que acontece no interior da mesma, porém, quando se tem um
compromisso coletivo com um trabalho de qualidade, essa presença maior dos
pais passa a ser um incentivo, uma contribuição para a continuidade do
trabalho, pois, do mesmo jeito que os pais criticam e reclamam quando
percebem que o trabalho não está adequado às necessidades das crianças,
eles também elogiam e reconhecem o esforço que a escola faz para oferecer
um trabalho de qualidade.
Outro ponto importante que foi colocado pelas famílias nessa última
reunião, é em relação à segurança, como um ponto positivo assegurado pela
Instituição, segurança essa que se torna mais visível pela implementação da
chamada carteirinha de identificação - carteira com a foto e os dados da
criança, que é confeccionada e distribuída pela Instituição no início do ano
letivo, com a recomendação de que a criança só sairá da escola, após o
período de aula, acompanhada da pessoa que trouxer esta carteirinha.
Esta prática adotada pela Instituição em relação à carteira de
identificação, é discutida com as famílias desde a primeira reunião do ano, e
recebe sempre o apoio total de todos os presentes, embora a vivência diária da
164
mesma cause, às vezes, alguns contratempos e dificuldades, principalmente
quando as famílias delegam a tarefa de pegar os filhos na escola a outras
pessoas e se esquecem de falar na carteira. Porém, sempre que o problema
aconteceu, foi contornado pela equipe da escola, principalmente porque as
famílias sempre pegam as crianças com as respectivas professoras, na porta
das salas de aula, o que facilita uma identificação, um conhecimento e uma
interação maior entre as mesmas.
Nos poucos casos em que foi necessário solicitar que o portador que
veio pegar a criança voltasse para buscar a carteira, ou tivemos que telefonar
aos pais, usando as informações da ficha de caracterização, para confirmar a
idoneidade do portador - embora os transtornos do momento às vezes
gerassem alguns mal entendidos, posteriormente as questões eram
esclarecidas, e as famílias reconheciam que as providências eram necessárias
e importantes para preservar a segurança das crianças.
Uma outra questão relevante que a fala dos familiares aponta é essa
questão de, muitas vezes, eles não comparecerem por causa do trabalho, ou
de outro compromisso igualmente importante.
Por ocasião do terceiro Encontro da Família Carmem Reis, tivemos o
cuidado e a curiosidade de procurar saber de todas as famílias ausentes –
através de uma entrevista informal, o motivo da ausência, e constatamos que
90% dos ausentes alegaram trabalho e doença como os motivos que os
levaram a não comparecer ao encontro. Apenas os 10% restantes é que
afirmaram não ter comparecido por esquecimento ou por terem outro
compromisso de lazer já programado e ao qual não podiam faltar.
Esse fato para nós foi motivo de muita alegria e estímulo para o trabalho,
considerando que a maioria dos ausentes lamentou profundamente não ter
comparecido, alegando que gostavam muito das atividades programadas pela
Instituição, além da convicção que nos proporcionou de que algumas famílias
não comparecem a instituição escolar, não apenas por descaso, ou falta de
interesse, mas porque possuem também toda uma necessidade de luta pela
sobrevivência que as impossibilitam de comparecer.
Essa constatação foi fundamental para que pudéssemos refletir sobre a
necessidade de conhecer mais as realidades, para criticá-las menos, e
compreendê-las melhor.
165
5.2. Palestras e vivências com as famílias
O tema relativo ao limite na educação da criança, foi trabalhado pela
coordenadora pedagógica do turno matutino, partindo de uma dramatização de
um diálogo entre mãe e filha, onde ficava claro as dúvidas e contradições da
mãe no tocante a questão de colocar um limite, tanto em relação ao horário,
quanto em relação ao tipo de programação que a filha poderia assistir na TV.
FOTO 27: Dramatização sobre limites. (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
FOTO 28: Dramatização sobre limites. (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004.
Partindo dessa dramatização, encenada por uma das professoras e por
nós próprias, a coordenadora pedagógica do turno matutino, iniciou um diálogo
com as famílias presentes sobre esta questão do limite. A participação das
famílias foi bastante significativa neste momento, cada uma colocando a forma
como agia, as dúvidas que tinha, as incertezas. Na entrevista realizada ao final
dessa atividade, onde perguntamos a opinião dos presentes sobre a mesma,
as respostas foram as seguintes:
Gostei muito. É bom a gente conversar sobre estas coisas para poder saber como tratar melhor esse povo de hoje, que é muito diferente de quando eu era menina, e obedecia o que meu pai e minha mãe dizia.
Foi um encontro muito bom, ri muito com a filha teimosa, perecendo a que eu tenho lá em casa, e achei bom falar sobre essas coisas de ter respeito, de obedecer, de ter hora para fazer as coisa. Foi muito bom, é bom que tenha outros desse.
166
Gostei. Gostei de rir, de conversar, de escutar Kátia falar, de saber
que em toda casa tem confusão por causa de teimosia e de saber que a gente precisa de botar rédea, de ter hora prá esses menino fazer as coisa.
Essa conversa foi muito boa, as vezes não sei o que fazer com essa menina, mas como trabalho muito, acabo fazendo o que ela quer, para não ter confusão. Vou pensar um pouco no que vocês disseram aqui.
Gostei mulher! É igualzinho o que acontece lá em casa, eu mando fazer as coisa, eles não me obedece e eu as vezes acabo batendo e não resove. É bom conversar sobre essas coisa pra gente ficar sabendo mais agir com essas crianças danada.
Essas falas dos familiares presentes foram muito importantes para a
nossa reflexão, por que mostram claramente, a relevância da Instituição
escolar está abraçando essa nova demanda que é discutir, refletir com as
famílias, sobre temáticas relevantes para o processo educativo dessas
crianças. Considerando a grave crise de valores da sociedade moderna, é
fundamental que as duas maiores instâncias formativas dessa sociedade –
família e instituição educativa, busquem trabalhar princípios educativos
comuns.
Outra temática trabalhada, que despertou muito o interesse das famílias
foi sobre a importância do brincar para o desenvolvimento da criança. Como já
dissemos a decisão de discutir esse tema com os pais nasceu das
observações, tanto nossa, quanto das professoras, sobre o fato de algumas
mães reclamarem muito porque os filhos ficavam meio sujos e brincavam de
areia, e suavam no parque; algumas chegando até a solicitar que os filhos não
fossem mais ao parque, não brincassem mais, para não se sujar, nem suar.
Partindo dessas observações e constatações, e tendo como parâmetro
os estudos realizados desde o início do ano de 2004, que nos mostravam o
quanto a brincadeira, o jogo simbólico, é importante para o desenvolvimento
infantil, discutimos bastante o assunto com as professoras e a coordenação
pedagógica, e juntas, elaboramos algumas ações a serem realizadas com as
famílias sobre essa temática.
A primeira delas foi uma conversa, numa reunião mesmo de pais, onde
nós informávamos sobre a importância desse brincar, retomávamos com as
167
famílias os cuidados que tínhamos com o horário do parque – pela manhã,
sempre no início do turno; e a tarde sempre no final, quando o sol não estava
muito quente, como também o fato do cuidado que tínhamos de varrer, de
aguar e de trocar a areia regularmente, principalmente a da chamada caixa de
areia – local reservado, onde as crianças mais brincavam com esse material.
Mesmo depois dessa reunião, sentimos necessidade de uma ação mais
efetiva, mais específica com o tema, foi aí que, em reunião com as professoras,
surgiu a idéia de uma vivência com as famílias sobre o tema.
Dessa forma, as próprias professoras, com a ajuda da equipe
pedagógica e administrativa, realizaram uma vivência sobre o brincar com as
famílias, partindo de um resgate de memória sobre as brincadeiras que elas
faziam na infância, promovendo a vivência de algumas dessas brincadeiras, e
depois, após pedir que cada participante expressasse os sentimentos vividos
naquele momento, foi realizada uma discussão sobre a importância do brincar
para as crianças. Segue abaixo alguns depoimentos das famílias após o
evento:
Foi muito bom voltar a ser criança, eu até comentei que agora, a partir de hoje, acho que vou até mudar com Marília, vou deixar ela brincar mais, porque eu prendo muito: não suje aqui, não suje ali. Mas hoje eu extravasei e vou deixar ela um pouco mais livre para brincar.
A gente aprende as coisas por brincadeira, só que não brinquei porque não posso com as pernas. Sentada fiquei, o abacaxi chamava e eu não saia do canto. Mas foi ótimo.
Aprendi a brincar mais com a minha filha, a ficar mais com ela, pois o tempo também é pouco. Mas vou tirar mais um tempinho para brincar com ela, para conviver mais com ela.
Achei maravilhoso, porque o senhor está conosco, e ele nos guia, levantando pessoas para melhorar o nosso dia, a nossa convivência com as crianças, porque é muito importante ter esses momentos assim. Não temos tempo para parar, mas Deus levanta outras pessoas para nos ajudar.
Maravilhoso. Agora dá para entender porque meus filho não ver a hora de vim para o colégio: para se divertir. Foi maravilhoso.
168
Particularmente para nós, esse encontro com as famílias sobre o brincar,
foi uma das melhores contribuições que a Instituição conseguiu dar aos pais
para a compreensão deles em torno da relevância da brincadeira como parte
integrante das ações de cuidado e educação dessas crianças. Essas atividades
sobre o brincar ainda tiveram outro desdobramento, que foi a realização de um
projeto didático sobre brinquedos de sucata, cuja culminância foi um grande
encontro com as famílias, para que, juntamente com as crianças, elas
construíssem brinquedos com os materiais disponíveis.
FOTO 29: Brincando de roda com famílias
e crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 30: Construindo brinquedos de
sucata com as famílias e crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.
Pelos depoimentos das famílias é possível identificar a percepção deles,
após este trabalho, sobre a relevância do brincar para as crianças.
Os depoimentos que mais nos chamaram a atenção, foi o das mães que
colocaram que iriam tirar mais um tempo para dedicar aos filhos, que iriam
permitir que eles brincassem mais, mesmo se sujando ou bagunçando.
Tivemos a preocupação de acompanhar um pouco mais de perto essas mães,
principalmente as mães do 1º e do 3º depoimento citado acima e tivemos a
grata satisfação de constatar que as mesmas, realmente, passaram a dedicar
um tempo maior as filhas, valorizando mais o brincar na vida delas. Esse
acompanhamento foi possível pelo fato das duas mães estarem sempre muito
presentes na Instituição, sendo que uma delas é funcionária da mesma. Dessa
forma, através de diálogos e interações constantes com essas mães e as suas
crianças, nos foi possível acompanhar, observar e registrar efetivamente esse
processo de mudança.
169
Entendemos que são iniciativas como essa que promovem realmente o
compartilhamento, entre instituição de Educação Infantil e famílias, das ações
de cuidado e educação das crianças pequenas, e concordamos que “o trabalho
de formação de pais e mães na escola, como uma tarefa coletiva, aos poucos,
irá ocupar seu lugar em nosso contexto social” (BASSEDAS,HUGUET & SOLÉ,
1999, p. 289)
5.3. Oficinas com as famílias sobre atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição
Essas oficinas, como já registramos no capítulo anterior, foram
realizadas com o objetivo de proporcionar as famílias um conhecimento mais
aprofundado das atividades realizadas com as crianças no cotidiano da
Instituição, por termos clareza de que as famílias precisam conhecer o trabalho
educativo da escola, para poder aceitá-lo, respeitá-lo e valorizá-lo.
Vamos optar por analisar nesse momento a oficina relativa “A hora da
história”, tanto pelo fato dessa atividade fazer parte da rotina diária da
Instituição, como pelo fato da mesma envolver, também, a linguagem escrita,
que se constitui numa preocupação sempre presente na fala das famílias.
A referida oficina foi trabalhada pela professora do nível IV – crianças de
5 a 6 anos, e teve como objetivo discutir com as famílias a importância do
manuseio, do acesso aos livros, bem como da leitura de história, para a
aprendizagem e o desenvolvimento das crianças.
A professora trabalhou com as famílias inicialmente, a diferença entre ler
e contar histórias, procurando discutir a questão da diferença entre a linguagem
oral e escrita, bem como a necessidade das crianças terem acesso desde cedo
ao universo dos livros, como uma forma de ampliar os seus conhecimentos de
mundo e ir ingressando paulatinamente no universo da linguagem escrita.
Uma das propostas mais interessantes a partir dessa oficina, foi a da
criação de uma estratégia de empréstimos de livros por parte da Instituição
para que as crianças levassem para casa e compartilhassem a leitura com os
seus pais. A idéia foi muito bem aceita e funcionou de forma adequada, na
medida em que muitas crianças começaram a levar os livros para casa,
170
proporcionando que algumas pessoas da família começassem também a se
interessar em ler os mesmos para as crianças, estimulando e colaborando com
a aprendizagem e o desenvolvimento das mesmas na área da linguagem.
5.4. Festas comemorativas Apesar de termos o cuidado de não transformarmos o currículo da
Educação Infantil num mero cumprimento de calendário de festas já pré-
estabelecidas, não podemos nos furtar a comemoração de algumas datas,
históricas-cultural e emocionalmente importantes para as crianças, até porque
também nos utilizamos dessas datas para promover uma integração maior com
as famílias, e com a comunidade de uma forma geral. Dessa forma, as datas
que elegemos para comemorar, além do caráter cultural e da valorização da
simbologia da mesma, tinham também como objetivo a integração família-
escola.
Assim sendo, nos utilizamos, principalmente das datas relativas ao dia
das mães e dos pais, para realizarmos o que convencionamos chamar de “
Encontro da Família Carmem Reis”. Vamos citar um desses encontros,
procurando refletir sobre a relevância do mesmo para o nosso trabalho junto às
famílias:
O encontro que vamos destacar é o I Encontro da Família Carmem Reis, que aconteceu em Agosto de 2004, tendo as manifestações culturais da
comunidade como o mote do mesmo, onde, tanto os alunos da Instituição
apresentaram suas danças, cantos e outras manifestações, como também o
Pastoril Estrela do Amanhã, formado por um grupo de idosos da Vila de Ponta
Negra, apresentou para todos os presentes, esta manifestação cultural tão
presente e viva no Bairro. Foi um momento muito importante, dando início a
uma tradição de se perceber o C.M.E.I Carmem Reis como um espaço,
também, de vivências e convivências da comunidade local.
171
Foto: 31: 1º enc. da família na I.E.I Foto 32. Pastoril estrela do amanhã. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004
Para referendar a relevância que as famílias e a própria comunidade
deram a esse evento, vamos apresentar alguns depoimentos, colhidos tanto na
entrevista informal realizada ao final do evento, quanto,nas falas espontâneas
dos presentes:
Fazia tempo que eu não passava uma tarde tão gostosa! Esqueci até meus probrema. Devia ter uma dessa toda semana.
Foi muito bom. Eu nasci aqui na Vila, dancei pastoril, mas não me canso de gostar de pastoril não!
As escola devia fazer sempre isso! A gente não tem dinheiro pra ir em festa, então faz a festa na escola.
Gostei muito dessa festa aqui na escola do meu filho. Pude me divertir junto com meu filho, não paguei nada, ainda lanchei (risos), e vi o povo do pastoril que fazia tempo que não via. Quando tiver outra dessa, eu venho de novo!
Animação minha gente! A festa ta muito boa, vamos dançar e aproveitar e pedir mais festa como essa.
É muito bom saber que a escola também pensa que a gente precisa de se divertir e não só de estuda. (Risos)
Pelo conteúdo das falas apresentadas, fica claro o sucesso do
evento. Uma questão importante de se destacar é que esse evento foi um dos
primeiros grandes eventos realizados pela escola, envolvendo as famílias e a
172
comunidade em geral. Foi uma forma que nós encontramos de trazer as
famílias para a Instituição, apenas para uma tarde de lazer, uma aproximação
maior, mais interativa, tanto com o espaço, como quanto com o corpo técnico-
docente-administrativo da Instituição. É uma forma de mostrar que a escola
precisa convidar os pais para participarem de eventos os mais variados, e não
apenas para reclamar do mau comportamento e da ausência de estudo dos
seus filhos.
Compreendemos que esses foram momentos muito especiais
para estreitar os laços, as relações entre as famílias e o Centro infantil.
5.5. Incentivo a participação das famílias em projetos didáticos-educativos vivenciados pelas crianças.
No capítulo 4 deste trabalho, no tópico reservado a descrição reflexiva
do trabalho realizado com as crianças, já abordamos a relevância pedagógica
da metodologia do projeto didático, justificando assim, a opção pelo trabalho
com a mesma. Agora vamos apresentar como se deu a participação das
famílias em um desses projetos.
Dentre os projetos didáticos vivenciados com as crianças e que tiveram
também a participação das famílias, queremos destacar o projeto intitulado
Desvendando a vida e a cultura da Vila, onde cada turma elegeu um aspecto
da Vila de Ponta Negra para ser trabalhado e solicitou a participação dos pais e
da própria comunidade das mais variadas maneiras.
É importante lembrar que esse tipo de atividade, no nosso entendimento,
é muito rico, pois possibilita várias situações de aprendizagem, de interação, de
desenvolvimento, tanto para as crianças – conforme já explicitado
anteriormente, quanto para as professoras, as famílias e a comunidade de
uma maneira geral.
A idéia desse projeto nasceu a partir do entendimento do corpo técnico-
docente da Instituição de que é importante um resgate da cultura local, das
vivências de cada comunidade, para que o indivíduo se sinta integrado, se
sinta parte da mesma, conhecendo e valorizando as suas origens. Após o
173
surgimento da idéia, em uma reunião de professoras, coordenação e direção,
convidamos um historiador da própria Vila – Profº Ângelo, para conversar com
a equipe técnica-docente sobre a história da Vila, e nos fornecer também
algumas fontes de consulta para que pudéssemos elaborar o projeto a ser
vivenciado com as crianças.
Após esse contato inicial com o historiador da Vila, e com as fontes de
pesquisa que conseguimos, começamos a estudar em equipe e preparar o
projeto maior da Instituição, com as possibilidades que eram vislumbradas para
o trabalho com as crianças.
Posteriormente, em novos encontros de planejamento e estudos com as
professoras e coordenação, fomos pensando algumas temáticas específicas
possíveis de serem exploradas, e as professoras foram planejando seus
objetivos, suas atividades, enfim, o projeto que iriam desenvolver com as
crianças, inclusive os produtos finais ou culminâncias e as possibilidades de
participação das famílias em cada uma das turmas e temáticas específicas,
realizando também um levantamento de conhecimentos prévios com as
crianças, e de opiniões das mesmas para a elaboração final do projeto.
Vamos elencar e ilustrar abaixo, alguns momentos de participação
efetiva das famílias e da própria comunidade durante a construção desse
projeto, mostrando também a interação, envolvimento e participação efetiva
das crianças nos mesmos:
FOTO 33: Pescador, e avô de 1 aluno, em
visita a I.E.I. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 34: Pescador apresentando peixe às
crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
174
FOTO 35: Crianças visitam a casa das
rendeiras na Vila. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
FOTO 36: Rendeira, e avó de uma aluna,
em visita a I.E.I. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
Além dessas atividades mostradas nas fotos, aconteceram também
passeios a pontos turísticos do bairro – inclusive a lugares onde familiares das
crianças trabalhavam; entrevista com uma das moradoras mais antigas do
bairro – as crianças se deslocaram até a casa da mesma; Visitas a praia –
observando a paisagem atual e comparando com fotos antigas, dentre outras
atividades.
A culminância final dos projetos de todas as turmas foi uma grande
exposição realizada na Instituição com as produções, fotografias, atividades e
apresentações de cada turma, aberta para as famílias e todas as pessoas da
comunidade que quisessem comparecer. A referida exposição foi bem aceita
pelas famílias e pela comunidade, tendo contado com a participação e a visita
de, aproximadamente, 180 pessoas distribuídas nos dois turnos em que os
trabalhos estiveram expostos e foram apresentados. Segue abaixo algumas
fotos do evento:
FOTO 37: Exposição final dos trabalhos do
projeto. (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.
FOTO 38: Exposição final dos trabalhos do
projeto (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005
175
Compreendemos este tipo de iniciativa, como uma das grandes
possibilidades de construção/sistematização das relações entre famílias e
instituições educativas, bem como de compartilhamento de funções entre
ambas, além de ser uma grande oportunidade de valorização da cultura e das
vivências da comunidade onde a Instituição está inserida, e, conforme já
discutido no capítulo 4, uma excelente metodologia para desenvolver o trabalho
pedagógico junto às crianças.
5.6. Intervenção individual junto a algumas famílias
Dentre as intervenções individuais realizadas com os pais, queremos
destacar uma feita com a mãe de uma aluna que, de forma fictícia, vamos
denominar de Alice. Alice era uma criança muito bem cuidada, muito limpa,
que se negava sistematicamente a brincar e a se sujar. A professora,
observando e estranhando esse comportamento pouco habitual em uma
criança de 5 anos de idade, trouxe a questão para ser discutida com a
coordenação pedagógica e a direção.
Após alguns dias de observação mais sistemática por parte de toda a
equipe – onde constatamos também a realidade da situação apresentada pela
professora, resolvemos, numa reunião conjunta entre professora, coordenadora
pedagógica e direção, convidar a mãe para uma conversa conosco.
O convite foi feito e ficou a cargo da coordenadora pedagógica e da
professora a conversa com a mãe. Segundo conversa informal com a
coordenadora, tomamos conhecimento de que a mãe alegou que não deixava
a criança brincar, nem conviver muito com outras crianças, porque a mesma
era muito doente. Tanto a coordenadora, quanto a professora, fizeram
intervenções perguntando a mãe se a criança estava deixando de ficar doente
por ser privada de brincar, se ela percebia como a criança se sentia, qual a
opinião dela sobre o fato da criança ser muito adulta; enfim, fornecendo
elementos para ela refletir sobre a conduta dela em relação à criança. A mãe
agradeceu e ficou de pensar sobre o assunto.
176
Algum tempo depois dessa conversa, com a continuidade também das
intervenções da professora em relação à menina, começou-se a perceber
mudanças no comportamento da criança: a mesma passou a ir para o parque,
a conversar mais com as colegas, a participar das atividades de artes, enfim,
começou a apresentar um comportamento mais infantil e menos adulto.
No final do ano resolvemos chamar novamente a mãe para uma
conversa entre ela, a professora e a coordenadora. Só que, infelizmente, por
conta do novo horário do emprego da mãe – das 7:00h as 13:00h, não tinha
como a professora e a coordenadora esperá-la, o que fez com que nós –
enquanto gestoras, ficássemos com a responsabilidade dessa conversa,
procurando saber a opinião dela sobre a filha, bem como sobre a intervenção
realizada.
Para nós foi muito gratificante quando, nessa conversa com a mãe da
aluna, no final de novembro de 2005, ela nos deu o seguinte depoimento,
extremamente emocionada:
Eu não percebia o que estava fazendo com a minha filha não! eu estava proibindo-a de viver, de ser criança. Na verdade, não era ela que não gostava de se sujar, de brincar, era eu que não permitia, e não me dava conta disso. Agradeço muito a vocês, a esta escola, que se preocupa realmente com as crianças, que olha, que tem a coragem de chamar as mães para conversar, para dizer o que vocês estão vendo, estão sentindo. Tenho muito o que agradecer. Hoje minha filha é mais feliz, é mais viva, é mais criança.
Tanto a mudança no comportamento da criança – que passou a brincar,
a participar das aulas de pintura, a ir ao parque; quanto esse depoimento da
mãe, atestam o êxito do trabalho realizado. É óbvio que outras intervenções
foram realizadas também, com outras famílias, e não surtiram o efeito
esperado, até porque, nem todas as pessoas estão preparadas para esse tipo
de intervenção. Algumas famílias compreendem isso como intromissão, como
querer mandar nelas e nos filhos, mas mesmo correndo esse risco, a instituição
educativa precisa continuar investindo nessa abordagem, principalmente
177
quando reconhece a relevância de um trabalho integrado entre escola e família,
envolvendo as ações de cuidado e educação das crianças.
5.7. Análise das entrevistas finais com as famílias Vamos apresentar agora as nossas reflexões em torno da entrevista
final, realizada com oito pessoas das famílias das crianças matriculadas na
Instituição. O critério de escolha dessas pessoas entrevistadas foi o da
disponibilidade de tempo para realizar a entrevista, bem como a vontade e pré-
disposição para o fazê-lo.
Essas pessoas foram por nós abordadas no momento em que iam
deixar, ou pegar as crianças, sobre a possibilidade de responder algumas
perguntas sobre a Instituição, sabendo de antemão que essa conversa seria
gravada. Apesar de se tratar de uma entrevista semi-estruturada, onde as
perguntas são mais amplas, podendo haver a inserção de outras perguntas ou
sub-perguntas para esclarecer melhor algumas respostas, optamos por fazer
apenas as perguntas já previamente formuladas, deixando o entrevistado falar
livremente, sem interferências outras da nossa parte.
Para efeito da análise dessas entrevistas, vamos proceder da seguinte
forma: Primeiramente apresentaremos as questões, buscando explicitar a
nossa intenção, o nosso objetivo, quando formulamos a mesma. Depois
apresentaremos uma breve síntese das respostas dos entrevistados, citando
alguns trechos das mesmas, e analisando-as a partir das nossas concepções,
com base nos referenciais teóricos aqui já discutidos, buscando também,
quando possível, estabelecer relações entre as nossas análises e as opiniões
de alguns autores que abordam a temática trabalhada.
≈ 1ª questão: Quando você matriculou seu (sua) filho(a) nessa Instituição, o que você esperava que ele(a) aprendesse aqui?
178
Quando elaboramos esta primeira questão, partimos do princípio de que as
instituições de Educação Infantil tem algo a ensinar, tem um papel, tem uma
função extremamente relevante a cumprir, pois concordamos que:
[...] as creches e pré-escolas vão ainda, por muito tempo, constituir um importante espaço de “descoberta do mundo” para um sem número de crianças. Ora, cumprir essa responsabilidade social de compartilhar com as crianças esta descoberta tão instigante não é pouca coisa. Ela nos desafia, nos compromete e nos convoca. Cabe a nós a opção. (BUJES, In: CRAIDY; KAERCHER, 2001, p. 21)
Outra questão relevante a se considerar nesse aspecto é que as famílias,
embora muitas vezes não tenham a noção exata deste papel, dessa
responsabilidade, possuem também uma expectativa em relação à Instituição
onde matriculam os seus filhos, expectativa essa que gera uma preocupação,
e, “ De fato, a preocupação é pertinente. Ao matricular a criança, estamos
praticamente assinando uma procuração, passando para terceiros – mesmo
que seja a melhor escola do mundo – a formação dos nossos filhos.” (
ZAGURY, 2002, p. 21)
O nosso objetivo, portanto, com essa questão é perceber as expectativas
que as famílias traziam em relação a Instituição, até mesmo para,
posteriormente podermos identificar até que ponto essas expectativas foram,
ou não, atendidas. Analisando as respostas dadas nessa entrevista,
percebemos que algumas famílias apresentavam expectativas muito amplas,
tais como:
Aprendesse a ser gente, a se comportar, tivesse educação... aprendesse tudo que a escola tem que ensinar.”
que ele aprendesse a ser gente, a se comportar
Aprendesse as coisa de acordo com a idade dele
As coisa que ele precisa para se dá bem no mundo de hoje
179
A amplitude e complexidade dessas expectativas apresentadas pelas
famílias em relação à Instituição de Educação Infantil, nos leva a perceber o
quanto o papel dessas instituições precisa ser refletido, repensado e discutido.
Principalmente entre nós, profissionais que atuamos nessas instituições, para
que percebamos que os conteúdos que essas famílias propõem, são, não
apenas de natureza conceitual, mas, principalmente atitudinais e
procedimentais, indo ao encontro da proposta aqui já discutida dos quatro
pilares da educação: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e
aprender a conviver, ou seja, a família matricula os seus filhos nas instituições
educativas, esperando uma formação:
[...] quer no que se refere ao conteúdo programático que será desenvolvido, que terá influência no seu futuro profissional, como no que concerne à formação de hábitos, atitudes e, acima de tudo, da formação mais ampla e importante, a mente dos nossos filhos, a forma de ver o mundo e a sociedade. (ZAGURY, 2002, p. 21)
Outro ponto fundamental, ao qual a análise dessas respostas nos
remete, é o da relevância de estarmos constantemente discutindo, também
com as famílias, o papel das Instituições de Educação Infantil, e da própria
família, nesse caráter de complementaridade que os mesmos apresentam,
pois, considerando um velho ditado africano que diz que “ é preciso uma aldeia
para educar uma criança”, bem como a amplitude das expectativas
depositadas nas instituições educacionais, é imprescindível esse fortalecimento
da relação das mesmas com as famílias, para darem conta da tarefa educativa
a que estão sendo convocadas.
É inegável também que ainda existe muito a expectativa, do aprender a
ler e escrever – das 8 pessoas entrevistadas, 5 se referiram a ler e escrever
como expectativas que traziam para a Instituição.
É importante relembrar que, desde a ficha de caracterização, já
havíamos feito esse questionamento aos pais, com o mesmo objetivo aqui
exposto, por compreendermos que é importante sabermos as expectativas das
180
famílias, até mesmo por considerá-las como ponto fundamental para ser
refletido pela Instituição.
Na análise das respostas das famílias a ficha inicial de caracterização,
estas duas questões, ou seja, a amplitude das expectativas que as famílias
trazem para as instituições de Educação Infantil, bem como uma grande
expectativa em torno do aprender a ler e escrever já tinham sido percebidas e
embasaram também o nosso trabalho, na medida em que nos apontaram para
a necessidade de realizarmos ações onde estas questões fossem discutidas.
Foi a partir dessas expectativas das famílias que realizamos algumas
atividades com as mesmas, como as oficinas sobre atividades vivenciadas com
as crianças na Instituição; como as palestras discutindo aspectos relativos ao
cuidar e educar, enfocando a participação e responsabilidade das famílias em
relação a estas questões, e todos os outros blocos de atividades realizadas nos
anos de 2004 e 2005.
A partir das respostas as próximas questões vamos perceber como
estas expectativas foram, ou não, sendo atendidas e até que ponto as ações
atenderam aos objetivos propostos, segundo a opinião das próprias famílias.
≈ 2ª questão: Na sua opinião, essa Instituição atendeu ao que você esperava? Justifique a sua resposta.
Nessa segunda questão, o nosso maior objetivo era perceber até que
ponto as expectativas das famílias tinham, ou não, sido atendidas, até mesmo
porque temos convicção de que “ para que a união família-escola dê certo, é
preciso que os pais estejam convencidos de que fizeram, de fato, a melhor
opção” ( ZAGURY, 2002, p. 25), quando matricularam os seus filhos em uma
instituição educativa, e convicção no acerto dessa escolha, passa,
incondicionalmente, pelo atendimento, ou não, dessas expectativas que as
famílias depositaram na instituição escolhida. Pelo que podemos observar,
houve o atendimento, pelo menos, de algumas dessas expectativas:
181
Atendeu né? Minha filha gosta daqui, gosta das amiguinhas, brinca muito, faz pecinha de teatro
Eu acho que atendeu
Eu gosto daqui e acho que ele aprendeu coisa sim dentro da capacidade de idade dele
essa Instituição superou até as minhas expectativas
ele aprendeu umas coisa sim
dentro da idade dele, acho que atendeu
“Ela ta aprendendo as coisa né?”
As falas transcritas acima, revelam que os entrevistados reconhecem
que as expectativas foram atendidas, na medida em que colocam que houve
algum tipo de aprendizagem por parte das crianças. Uma única entrevistada
coloca que a Instituição superou as suas expectativas. Vamos prosseguir
analisando uma outra percepção que as respostas dos entrevistados nos
possibilitou.
Na nossa percepção, a partir da visão da complexidade e da
abrangência das expectativas que as famílias traziam para a Instituição, que
ficou bastante perceptível nas respostas a questão 1, um fato que nos chamou
a atenção nas respostas a questão 2, foi o de que, no nosso entendimento,
começou a haver uma espécie de redimensionamento das expectativas
apresentadas inicialmente, e um reconhecimento das aprendizagens
construídas pelas crianças, mesmo quando essas aprendizagens não
corresponderam plenamente as expectativas iniciais, o que fica mais patente
nas seguintes respostas:
Ela ainda não sabe ler e escrever bem, bem mesmo não, mas escreve o nome, passa as folha dos livrinho, das revista e conta as história. Isso é legal, né?
ele brinca muito aqui, ele lê livrinho, as vezes leva prá lê em casa, não lê bem, bem não, mas lê com as figura. Ele já conta os número, ele fez
182
um trabalho aqui sobre a vila, chegou em casa falando umas coisa, de como era o morro antes, a praia, essas coisa.
Olhe, ler, escrever e contar bem bem, ele não aprendeu não. Até já conversei com a professora e ela me explicou que ele ainda é muito pequeno, e me mostrou uns trabalhinho dele aqui na escola, dizendo que ele tinha aprendido coisa sim: sabia achar o nome dele, sabia o nome dos coleguinha, se interessava por contar a história dos livrinho, se dava bem com os coleguinha, brincava muito, era esperto pra responder as pergunta da professora, essas coisa. Essas outras coisa ele vai aprendendo depois, com o tempo, né?
Na nossa visão, conforme já dito acima, essas falas demonstram que as
famílias percebem e entendem que houve aprendizagem por parte das
crianças, mesmo que não tenham sido as aprendizagens que elas esperavam
inicialmente.
Até mesmo nas questões mais específicas sobre a leitura e a escrita, as
famílias reconhecem que, apesar das crianças não se apresentarem ainda
como leitores e escritores autônomos, elas estão num processo dessa
conquista. Outro ponto importante que nós identificamos é que há uma
confiança na professora, e consequentemente na Instituição, quando a mãe
coloca que conversou com a professora, ela enumerou as aprendizagens que a
criança estava construindo e a mãe entendeu que a criança estava
aprendendo, estava avançando e, no próprio dizer dela: com o tempo iria
aprendendo mais.
Consideramos essa confiança demonstrada pela mãe na sua fala, como
extremamente relevante para a consolidação de uma boa relação entre a
família e a Instituição de Educação Infantil. Dessa forma, a partir das respostas
das famílias a questão acima, compreendemos que o trabalho realizado pela
Instituição contribuiu muito, também, com esse maior entendimento das
mesmas em relação a compreensão das aprendizagens efetuadas.
≈ 3ª questão: E você, enquanto pai, mãe, responsável, enfim, familiar de aluno matriculado nessa instituição, como se sente aqui? O que tem a dizer das pessoas que trabalham aqui, das reuniões e eventos
183
que são realizados com as crianças e as famílias, enfim, da instituição como um todo?
Nessa terceira questão, o nosso objetivo maior é perceber como as
famílias se sentem na Instituição, e qual a opinião delas sobre as pessoas, bem
como sobre as atividades que foram realizadas, sempre com a intenção de
acolhê-las, fortalecer a relação entre as famílias e a Instituição e compartilhar
com elas o processo de cuidado e educação das crianças.
Pelas respostas, podemos perceber que a grande maioria das famílias
se sente bem na Instituição, gosta de todas as pessoas e se considera bem
tratada e respeitada por todos:
Eu também gosto muito daqui né? Todos que trabalham aqui tratam a gente bem, falam com a gente.
Eu gosto daqui. A gente pode falar com todo mundo na hora que precisa. Pode deixar e buscar as crianças na sala, conversar com a professora, perguntar dos menino, elas até gostam quando a gente pergunta.
Olhe, eu gosto muito daqui. A gente se sente bem, é bem tratado.
Eu gosto muito dessa escola, das pessoas, do trabalho, de tudo.
Eu gosto. Sou bem tratada, todo mundo é simpático
Eu gosto de tudo aqui, é todo mundo muito bom, muito amigo
Eu gosto muito daqui. As pessoas são simpáticas, tratam a gente bem.
Eu gosto de tudo aqui, são todos muito bom.
Consideramos este reconhecimento das famílias de que são bem
tratadas, e a afirmação de que gostam da Instituição, como um reconhecimento
ao trabalho que é realizado pela Instituição, no sentido de envolvê-las, de
valorizá-las, de respeitá-las, e reconhecemos este aspecto como muito
184
relevante, pois concordamos que: “A requerida coordenação entre escola-
família passa pelo respeito e pela estima mútuos.” ( LÓPEZ, 2002, p. 83)
No tocante as atividades realizadas para envolver as famílias e buscar o
compartilhamento das funções de educar e cuidar, também percebemos que as
mesmas foram reconhecidas e valorizadas pelas famílias:
Gosto também das festa, das reunião que fazem, perguntam a opinião da gente, o que a gente achou, faz umas atividade pra gente participar, brincar, essas coisa.
Gosto das reunião, das festa, das palestra. Só não venho, quando não posso mesmo, quando estou trabalhando.
sempre tem atividade pra gente participar, é divertido, a gente aprende as coisa, é legal.
Gosto das reuniões, das festas, dos encontros, enfim, gosto de tudo.
Os depoimentos acima apontam para o fato das famílias gostarem
também das atividades realizadas, afirmam que só não comparecem quando
não podem, por causa do trabalho. Outra questão importante é o fato de haver
o reconhecimento de que elas podem opinar nas reuniões, participar das
festas, dos eventos, pois “ a eficácia da educação escolar depende do grau de
implicação, enfim, do grau de participação dos pais.” (LÓPEZ, 2002, p. 82)
Por fim, conseguimos perceber que a Instituição conseguiu realizar um
trabalho de tal forma, que as famílias estão se sentindo envolvidas, acolhidas,
o que consideramos fundamental para a construção/sistematização dessa
relação, objetivando o compartilhamento das ações de cuidado e educação
entre essas duas instituições formativas.
≈ 4ª questão: O que você mudaria nessa instituição? Se dependesse de você, o quê seria diferente?
185
Fizemos esta pergunta com o objetivo de perceber quais as propostas
de mudança que os pais poderiam sugerir para a melhoria do trabalho
realizado pela Instituição, pelo fato de partirmos do princípio de que todo
trabalho pode ser aperfeiçoado e de que as famílias tem condições de opinar,
de participar realmente do processo educativo dos seus filhos, sugerindo e
propondo mudanças no mesmo.
Algumas entrevistadas não sabiam como responder a esta pergunta, se
expressando apenas da seguinte forma:
Não sei nem o que diga. Até agora to gostando.
Nem sei o que dizer.
Eu gosto tanto daqui, que num sei nem o que diga.
Analisando estas respostas, podemos compreender que esta ausência
de um pensamento mais crítico, de uma proposta de mudança, de uma opinião
mesmo, pode ter como causa o fato das classes populares serem tão alijadas
do seu poder de decisão, de participação, de opinião, que quando se sentem
convidados, conclamados a participar, a opinar sobre a possibilidade de
mudanças não o conseguem fazer de imediato.
Um outro fator também, que pode estar por trás dessa questão é o fato
das pessoas acharem que, por que gostam da Instituição e das pessoas, não
devem propor mudanças; ou ainda que a Instituição pública é uma espécie de
“favor’ que elas recebem do governo, dos profissionais que lá estão, o que as
leva a ter receio de reclamar. Essas são algumas das interpretações que
entendemos possíveis de serem feitas a partir das respostas transcritas acima.
Já as outras pessoas entrevistadas, estas em número maior,
apresentaram as seguintes respostas:
Se fosse um prédio maior, com sala maior, com quadra, acho que seria milhó.
186
Só não gosto é quando falta professora e não tem aula. Eu sei que elas adoece, tem as coisa dela pra fazer, mas era pra ter outra professora para ficar com as criança, pra elas não voltar pra trás. Até já conversei aqui, mas a senhora explicou que é a secretaria lá que não manda ninguém, essas coisa que a gente até entende, mas não gosta não. É muito ruim trazer o filho pra escola e ter que levar de volta pra trás de novo.
Eu só mudaria uma coisa: colocaria professoras substitutas para que quando as professoras titulares tirassem licença, as crianças não ficassem nenhum dia sem aula. Só isso. Ah!, melhoraria também o prédio, o espaço físico, principalmente o interno, algumas salas são muito pequenas.
eu fazia umas salas maior, mais banheiro
Olhe, eu construiria salas de aula maiores e colocaria mais professoras, mais gente pra ajudar também. Quando tem festa eu vejo que vocês trabalham muito, é uma loucura, e quando falta uma professora, muitas vezes a gente tem que levar a criança de volta porque, como vocês explicam pra gente, não tem quem fique com as crianças daquela sala e as salas são muito pequenas para caber crianças de 2 salas.
Se fôssemos nos utilizar da análise categorial para as reflexões em torno
dessas respostas, com certeza, poderíamos abrir duas únicas categorias:
espaço físico e ausências de professoras. Concordamos plenamente com
essas respostas das entrevistadas acima. Realmente, tanto o espaço físico,
principalmente o interno – o espaço das salas de aula; quanto o fato da
ausência de substituição imediata para as professoras que tiram licença
médica ou precisam se ausentar por algum outro motivo plenamente
justificado, são dois problemas que enfrentamos na Instituição e para os quais,
infelizmente, não conseguimos vislumbrar nenhuma solução à curto prazo.
O problema do espaço físico, ao qual já nos referimos no início desse
trabalho, é um problema real. O espaço não foi previamente planejado para
abrigar uma Instituição de Educação Infantil, sendo uma casa que foi adaptada
para tal fim. E, embora tenhamos conseguido fazer algumas adaptações, a
partir da reforma aqui já descrita, que melhoraram consideravelmente o espaço
– tendo o mesmo até sido elogiado pelas famílias que o conheciam antes da
reforma; no que diz respeito, principalmente ao tamanho das salas, não nos foi
187
possível mexer, e as possibilidades de construção de um prédio próprio,
adequado as necessidades de uma Instituição de Educação Infantil, estão cada
dia mais distantes, até mesmo pela grande especulação imobiliária vivenciada
pelo bairro de Ponta Negra, que eleva muito o valor dos terrenos, o que,
segundo o setor de engenharia da SME, inviabiliza a compra dos mesmos por
parte dos órgãos públicos.
No tocante as ausências das professoras e ao fato de, em algumas
dessas ausências, a Instituição se achar impossibilitada de receber as
crianças, conversando com as famílias e encaminhando as mesmas de volta
para casa, esse também é um fato real, que nos preocupou muito e ainda nos
preocupa, mas para o qual, infelizmente, também, não conseguimos vislumbrar
solução à curto prazo.
As professoras da rede municipal de ensino da cidade do Natal,
trabalham todas no regime estatutário, e são também regidas por um estatuto
que permite que, durante o mês, possam ser apresentados até 3 atestados
médicos ou odontológicos, sem a necessidade de passar na chamada junta
médica do município. Após este número de 3 dias de atestado médico é
necessário passar na junta médica, que avalia a solicitação do médico
requisitante, e emite o seu parecer, o que ampara o professor em caso de
problemas de saúde.
Porém, o setor de carga horária da SME, encarregado de encaminhar os
professores às escolas, avisa aos diretores que, em caso de licença médica, só
enviará professor substituto quando a licença for superior a 15 dias. Nos casos
de licenças menores que 15 dias, a própria Instituição teria que dar um jeito de
não enviar as crianças para casa. No caso específico da Instituição aqui
estudada, esta situação se torna muito complicada, considerando que o
referido Centro é muito pequeno, contando apenas com as professoras de sala
de aula, a coordenadora pedagógica, a diretora e a vice, como professoras
devidamente habilitadas para o exercício do magistério, sendo que estas três
últimas profissionais citadas possuem as suas funções específicas, tanto de
caráter pedagógico, quanto administrativo, a partir do próprio cargo que
ocupam, o que dificulta a possibilidade de estarem sempre disponíveis para
substituir as professoras, em suas ausências, mesmo que plenamente
justificadas.
188
O fato das salas de aula serem muito pequenas, também dificulta a
opção por colocar as crianças da professora ausente para participarem de
atividades nas salas das outras professoras. Deslocar um dos funcionários
para ficar com essas crianças, na nossa opinião, foge a proposta da Instituição
principalmente por dois motivos: primeiro porque compreendemos que o
trabalho com a criança precisa ser planejado e executado por um profissional
com formação e competência apropriada para o exercício dessa tarefa;
segundo porque iríamos desfalcar a função exercida por esse profissional,
criando outro problema mais adiante.
Dessa forma, sempre que era possível, e considerando a antecipação
com a qual a professora comunicava a sua ausência, a questão era discutida
pela coordenação e direção, e uma dessas profissionais – coordenadora,
diretora ou vice-diretora, assumia a sala de aula, encaminhando o trabalho com
as crianças, a partir da rotina e do planejamento da referida turma.
Infelizmente, quando isso não era possível, chamávamos os familiares que
tinham ido deixar as crianças na Instituição, explicávamos a questão e
pedíamos a compreensão de retornar com as crianças para casa.
Essa é uma questão que reconhecemos extremamente séria, mas,
infelizmente, cuja solução não estava na vontade individual de nenhum dos
componentes da Instituição. É importante dizer que esse fato não acontecia
com uma freqüência muito grande, até porque, como já colocamos, sempre
que possível, buscávamos uma forma para que as crianças não voltassem para
casa sem aula. Porém, compreendemos que a solução definitiva da questão
passa por uma decisão mais ampla, por uma vontade política de encaminhar
uma solução mais viável, seja a partir de um trabalho compartilhado em sala de
aula, de uma equipe permanentemente preparada para assumir estas
substituições, ou de outro encaminhamento qualquer que solucione a questão.
≈ 5ª questão: O que você mais gosta nesta Instituição? Com esta pergunta, o nosso objetivo era perceber os pontos mais
relevantes do trabalho da Instituição, a partir daquilo que as famílias
189
apontassem como sendo o que elas mais gostavam na mesma. Vejamos
algumas dessas respostas:
O jeito de tratar a gente, sempre escutando e perguntando, e as
festas e comemoração que fazem aqui, é muito legal.
Gosto do cuidado que tem com as criança, da segurança, tem sempre o vigia na porta, na entrada e na saída, tem a carteirinha, pra não entregar as criança a gente estranha, essas coisa.
olhe, eu gosto da limpeza, das pessoa daqui que trata a gente bem, das reunião , das festa que faz pra gente e pras criança, das opinião da gente que sempre pedem, escutam a gente, essas coisa.
Gosto da limpeza, da organização, da segurança, do trabalho com as crianças, das pessoas.
Das pessoas, desde o porteiro até vocês da direção, e da forma como todos aqui trabalham com as crianças e atendem a gente.
De tudo, também num sei nem o que diga que gosto mais, mas acho que gosto mesmo é do povo daqui, povo simpático, que conversa, que ri, que conhece a gente, que fala com a gente, que explica as coisa.
Percebemos que nestas respostas as famílias apresentam uma série de
motivos que as fazem gostar do trabalho realizado pela Instituição. Vamos
procurar destacar primeiramente as que consideramos como sendo de caráter
mais físico, mais administrativo, mais passível de ser mensurado e analisado,
tais como a limpeza, higiene e organização do prédio, a segurança que a
Instituição oferece as crianças, bem como todo o trabalho que realiza com as
mesmas e os eventos e festas realizadas.
Na nossa percepção, essas questões só foram percebidas e
consideradas pelas famílias, porque elas tiveram acesso a Instituição, não
apenas em determinadas ocasiões preestabelecidas, mas ao cotidiano, ao dia-
a-dia da mesma, na medida em que podiam entrar para deixar e pegar as
crianças nas salas de aula, como também na hora em que necessitavam de
190
procurar a secretaria da Instituição, a coordenação, a direção, ou outro
qualquer setor ou funcionário.
Os outros motivos apresentados pelas famílias nós consideramos que
são de caráter mais humano, mais subjetivo, tais como a simpatia, o diálogo, a
atenção e o respeito que elas dizem encontrar na Instituição. Particularmente,
consideramos que são esses aspectos, que denominamos mais subjetivos e
menos mensuráveis, que dão o diferencial do trabalho e impulsionam o
mesmo.
No nosso entendimento, precisamos compreender que, antes de sermos
profissionais, pais, tios, avós, etc, somos seres humanos, dotados de
características cognitivas, políticas, econômicas, ideológicas, mas também,
emocionais, psicológicas, sociais, culturais, enfim, características que nos
tornam altamente susceptíveis e vulneráveis aos sentimentos, aos valores, a
comportamentos e atitudes.
Esse foi um dos aspectos que nós mais enfatizamos na nossa proposta
de fortalecimento da relação com as famílias, daí a nossa preocupação em
acolhê-las, em recebê-las da melhor forma possível, abrindo sempre as
possibilidades de diálogo e negociação.
Outro ponto que consideramos muito importante nessa relação das
Instituições educativas com as famílias, é o fato de considerarmos que as
famílias, tenham elas a estrutura e os níveis sociais e educacionais que
tiverem, são também responsáveis e influenciam na educação das crianças,
por isso concordamos que: “Um passo importante para a construção de uma
parceria entre escola e pais é considerá-los também como educadores, que
tem o que transmitir e o que aprender.” (SZYMANSKI, 2001, p. 10)
≈ 6ª questão: Dos eventos realizados com as famílias, qual o que você mais gostou?
Nesta questão, o nosso objetivo maior foi perceber, dos eventos
realizados com o objetivo de construir/sistematizar as relações com as famílias
191
e compartilhar as ações de cuidado e educação, quais os que despertaram
mais o interesse e a atenção das mesmas.
Gostei do que veio o pastoril da vila e o que pesquisou os costumes da vila.
Gostei muito do das brincadeiras
Olhe, eu gostei do das brincadeiras e daquele sobre a Vila.
Gostei daquele sobre a importância das brincadeiras para as crianças.
Gosto das festa, Gostei muito daquele das brincadeira.
Gostei do do pastoril, daquele das brincadeira que fizeram com a gente.
Olha eu gostei muito daquele que falou sobre o comportamento das crianças de hoje, aquele que teve a história da mãe e da filha sobre o horário da televisão.
Gostei de todos, num perdi nenhum.
Pelas respostas, fica evidenciado que o evento que mais chamou a
atenção das famílias foi o trabalho realizado sobre as brincadeiras.
Compreendemos que esse trabalho foi muito marcante, tanto pelo fato da
temática despertar o interesse de crianças e adultos, bem como pelo mesmo
ter sido trabalhado, tanto através do resgate de experiências, quanto das
vivências de brincadeiras da infância de cada um, como também pelas
situações práticas de construção de brinquedos, e interação entre crianças e
adultos que o mesmo proporcionou.
Outras reflexões que as respostas das famílias a esta questão nos
proporcionou, foi no sentido de podermos identificar também alguns indícios
que apontem até que ponto as famílias perceberam, ou não, esse objetivo que
a Instituição tinha, ao realizar determinadas atividades com as mesmas, de
192
contribuir com as ações de cuidado e educação dessas crianças.
Compreendemos que as respostas abaixo, possibilitam essa identificação:
A gente brincou, lembrou o passado de quando era criança, viu que é bom brincar com os filho da gente, pena que a gente cresce, não tem tempo e esquece de brincar.
do que veio a enfermeira do posto e deu remédio pra coceira e ensinou a tratar os piolho
As crianças de hoje não brincam mais, não são mais crianças, acho legal a escola alertar para isso. Acho legal essa coisa de trazer a família para a escola, para participar de várias formas.
Eu achei muito legal discutir essas coisas de como educar, de como tratar os filhos. Outro que gostei muito foi o das brincadeiras, até passei a brincar mais com os meus dois filhos, o que estuda aqui e a menina menor.
Analisando os depoimentos apresentados acima, podemos identificar
que as ações realizadas trouxeram contribuições positivas no sentido de
proporcionarem as famílias condições de perceberem a necessidade de
algumas modificações na maneira como tratam as suas crianças, como
também no tempo que dedicam as mesmas.
Outro fator que nos chama a atenção nessas falas das famílias é que
elas apresentam sim uma abertura para a vivência de um trabalho
informativo/formativo realizado pela instituição educativa, ou seja, percebe-se
que as famílias estão atendendo ao chamado da Instituição no sentido de
discutir/dialogar sobre processos formativos necessários ao desenvolvimento e
aprendizagem das crianças.
≈ 7ª questão: Na sua opinião, as atividades realizadas aqui na instituição ajudaram você a entender, a cuidar e educar melhor a sua criança?
193
Esse questionamento, feito de forma bem mais explicita e direta, foi
realizado com a intenção de observar se as famílias reconheciam, ou não,
mudanças no processo educativo delas em relação ás crianças, a partir das
ações e atividades propostas pela Instituição, ou seja, se o trabalho realizado
pela Instituição, atingiu, na opinião das famílias, o objetivo a que se propunha,
que era, compartilhar com as famílias as ações de cuidado e educação junto ás
crianças. Vamos apresentar algumas respostas para, a partir das mesmas,
fazermos algumas análises.
Ah sim! o dentista ensinou a gente a escovar direito os dente das criança. A enfermeira que falou e deu remédio pra doença de pele. Tudo é bom, tudo ajuda a gente a saber mais, né? Pena que nós não tem o tempo todinho pra viver aqui.
Ah mulher foi esse que eu já disse, o do brincar, ele ajudou muito a gente a deixar mais as criança brincar, bagunçar, essas coisa.
Com certeza. Como eu já disse é importante a escola e a família se entenderem bem, participarem. Foi muito bom pra mim ter matriculado minha filha aqui, me ajudou a participar mais da vida dela.
Ajudaram! Teve aquela do piolho, que ensinou o remédio. Aquelas conversa da gente dá mais atenção, ter mais calma, mais tempo pras criança. Eu gosto sim.
Ajudaro sim, a gente vê que tem que tê mais paciênça, conversá mais, entendê mio, esses minino de hoje são muito diferente dos meu.
Sim, ajudaram bastante. Podia até ter tido mais encontros pra conversar mais.
As respostas das famílias evidenciam que elas reconhecem que houve
uma contribuição das atividades realizadas pela Instituição, para que elas
pudessem interagir melhor com as crianças, embora seja perceptível que cada
pessoa entrevistada tenha apreendido mais um aspecto ou outro, enfatizando
apenas uma ou outra atividade, ao invés da totalidade do trabalho.
194
Apesar dessa observação que fizemos acima, entendemos que houve
um reconhecimento por parte das famílias de que as atividades realizadas
contribuíram para que elas compreendessem melhor algumas especificidades
das crianças, para que elas respeitassem mais certos aspectos do
comportamento ou das necessidades de desenvolvimento das mesmas, enfim,
o objetivo proposto foi atendido, na medida em que as famílias apontam
algumas mudanças na forma como educam e cuidam das suas crianças,
considerando atividades, diálogos e propostas sistematizadas pela Instituição
educativa.
Ou seja, após a análise dessas entrevistas finais, a percepção que
temos é que o trabalho realizado surtiu um determinado efeito, atendendo, em
boa parte, aos objetivos propostos, na medida em que as famílias reconhecem
o trabalho da Instituição, se sentem bem na mesma e apresentam mudanças
na forma de cuidar e educar as suas crianças, a partir de ações realizadas pela
Instituição.
Outro ponto que podemos considerar como relevante na percepção de
que foi possível alcançar o objetivo proposto de construir e sistematizar uma
relação participativa entre família e a I.E.I., buscando compartilhar ações de
cuidado e educação, é o fato de haver uma coerência, uma relação direta, em
todas as respostas as entrevistas, bem como nos depoimentos das famílias,
em vários momentos e situações do processo vivenciado.
Dessa forma, embasadas por estes depoimentos acima, e incentivadas
pelas perspectivas de diálogo, pela abertura das famílias em atender aos
chamados da Instituição, na experiência aqui descrita e analisada, defendemos
a tese de que as instituições educativas precisam se preparar, se qualificar,
para assumir essa nova demanda de implantar/sistematizar e/ou fortalecer as
suas relações com as famílias, buscando construir com elas um trabalho de
compartilhamento das ações de cuidado e educação junto às crianças pelas
quais são responsáveis mutuamente.
Para uma tarefa como esta, sabemos que os desafios são inúmeros –
iremos refletir sobre alguns nas nossas considerações finais; mas as
possibilidades também existem, e podem ser multiplicadas, a partir da
compreensão da relevância do fortalecimento dessa relação, bem como da
195
grande contribuição que o compartilhamento de funções entre I.E.I. e famílias
pode proporcionar as crianças.
Dessa forma, buscando elaborar algumas sínteses possíveis de serem
realizadas nesse momento, vamos apresentar as considerações finais, mesmo
tendo clareza de que esse final é provisório e inacabado.
196
CONSIDERAÇÕES FINAIS
197
CONSIDERAÇÕES FINAIS Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado.
Paulo Freire.
É essa condição de, histórica e socialmente, nos sabermos inacabados,
porém com perspectivas de irmos sempre mais além, que nos permite afirmar
que, embora chegando as chamadas considerações finais desse trabalho -
onde descrevemos e refletimos sobre uma experiência vivenciada durante dois
anos, não nos sentimos concluindo ou finalizando nada em definitivo, apenas
encerrando um pequeno trecho de uma longa trajetória, como uma espécie de
pausa, de balanço, em busca da sistematização de elementos que nos
possibilitem novas vivências e experiências na área da relação família e I.E.I,
que continuamos a considerar como sendo um dos grandes desafios das
instituições educativas no século XXI.
Essa compreensão acerca do nosso inacabamento, mas também das
nossas possibilidades de superação de nós mesmos, é que nos impulsiona à
retomarmos o nosso objetivo nesse trabalho: descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, e perceber que, ao
lado das grandes possibilidades e realizações já apontadas no decorrer desse
trabalho, com base na experiência vivenciada, também existem lacunas,
percalços e desafios sobre as quais não podemos deixar de nos referir, para
que possamos estar alimentado essa capacidade de superação, buscando que
ela se transforme em desejo para a busca de novas experiências, que, embora
igualmente inacabadas, avançarão sempre, umas a partir das outras.
198
Partindo das percepções apresentadas acima, vamos agora, refletir
sobre essas lacunas, percalços e desafios, iniciando pela questão sobre a qual
mais refletimos ultimamente, que é a percepção de que deveríamos ter reunido
mais as famílias, para que elas próprias escolhessem e opinassem, por
exemplo, sobre os temas das palestras, das oficinas e, por que não, até
mesmo de alguns projetos didáticos a serem trabalhados com as crianças.
Na realidade o que conseguimos perceber hoje, é que, apesar das
reuniões, das discussões e das afirmações das famílias entrevistadas de que
gostaram das atividades realizadas; as temáticas trabalhadas não partiram de
uma necessidade expressa por elas, mas das necessidades que nós, enquanto
Instituição, entendíamos que as famílias apresentavam.
Essa é uma das grandes indagações que nos fazemos agora: será que a
sistematização desse compartilhamento com as famílias das tarefas de cuidado
e educação das crianças, não teria sido mais efetivo se nós tivéssemos ouvido
mais as mesmas, procurando sondar as demandas que elas traziam, ao invés
de apenas pensar as temáticas e as ações partindo das percepções da equipe
da escola?
Ou será que o caminho trilhado foi o caminho possível no início de um
processo como esse, considerando, principalmente, a falta de tempo dos pais,
bem como, em alguns aspectos, o desconhecimento de alguns pontos
específicos e relevantes para o cuidado e educação das crianças, a escassez
de tempo que os profissionais da educação, e o próprio calendário escolar,
apresentam para esse tipo de atividade?
Com certeza, essa é uma indagação que não será respondida nesse
momento, porém, o acompanhamento, mesmo que de longe, das ações
realizadas pela Instituição no ano de 2006, quando já nos achávamos
afastadas oficialmente da mesma para a escrita desse trabalho, aponta para o
fato de que a busca, o investimento por parte da instituição nessa
sistematização da relação família e I.E.I. continua a ser realizado, e que a
participação das famílias é uma realidade muito presente e crescente na
mesma, o que nos dá, pelo menos, a tranqüilidade de que as ações iniciais
realizadas frutificaram na Instituição, e foram abraçadas realmente pela
equipe, considerando que, mesmo com o meu afastamento, o trabalho teve
199
continuidade e inovações que demonstram o crescimento e fortalecimento do
mesmo.
Conforme já tínhamos colocado desde a apresentação deste trabalho,
reservamos este espaço das chamadas considerações finais, para fazermos,
também, algumas reflexões sobre os percalços, as dificuldades, os desafios
que surgiram na construção desses novos caminhos . É isto que nos propomos
a fazer agora!
Agora chegou o momento de evidenciarmos um pouco os medos, as
angústias, as dificuldades e as dúvidas, que também fizeram parte da
experiência e foram, igualmente importantes, para as possibilidades de
crescimento apresentadas que se descortinaram.
Além das questões das dificuldades do espaço físico e das ausências de
professoras apresentadas pelas famílias na última entrevista, e descritas e
analisadas por nós no final do capítulo 5, vamos relembrar outras questões e
aspectos que também dificultaram o trabalho.
O primeiro que registramos, diz respeito a exigüidade do tempo que
temos para planejar e estudar, frutos, principalmente, das duras jornadas de
trabalho as quais a grande maioria das nossas professoras precisam se
submeter para poderem enfrentar a árdua luta pela sobrevivência. É uma
questão de ordem política, econômica, social e cultural, que acaba produzindo
uma conseqüência pedagógica meio desastrosa, na medida em que influencia
diretamente os processos de ensino e aprendizagem, comprometendo
amplamente os mesmos.
No caso específico da Instituição, campo da experiência aqui descrita e
analisada, apesar de termos o estudo mensal aos sábados e o planejamento
também mensal em uma sexta feira onde as crianças eram dispensadas,
conforme já explicitado no início do capítulo 5, percebemos que as duas
situações, além de não serem suficientes, são extremamente inadequadas, na
medida em que a primeira sacrifica mais diretamente as professoras, retirando-
as do convívio familiar e das obrigações domésticas em um dia – o sábado,
que poderia ser dedicado a estas situações, já que de segunda a sexta feira
elas estão nas Escolas.
200
E a segunda acaba sendo até ilegal, na medida em que priva os alunos
de um dia de aula, diminuindo assim os 200 dias letivos que são um direito dos
alunos.
Em relação a estas duas questões, que foram, como já apontamos,
desafios enfrentados, acreditamos que a partir do ano de 2006, com a
implantação do plano de cargos, carreira e salários, que diminuiu a jornada
semanal para 20 horas, sendo 16 horas em sala de aula e 4 horas,
semanalmente, para planejamento, houve uma melhora dessa questão, pelo
menos no que se refere a não diminuir os dias letivos e oferecer um tempo
para planejamento das aulas; já que enquanto o professor titular da sala
planeja com a coordenação um dia por semana, as crianças ficam com os
professores de artes e educação física. É importante dizer que os professores
dessas duas áreas do conhecimento, também fazem o seu planejamento em
conjunto com a coordenação da Instituição em dias e horários também já
previamente organizados.
Porém, uma outra questão igualmente importante e determinante para o
sucesso dos processos de ensino e aprendizagem, continua sem período
definido oficialmente para acontecer, que são as reuniões de estudo em grupo,
bem como as reuniões com toda a equipe da Instituição para as decisões
coletivas, em torno de projetos, passeios, feiras de ciências, exposições e
operacionalização das propostas de interdisciplinaridade, que compreendemos
relevantes de acontecerem regularmente nas instituições educativas.
Acreditamos que esta questão continua a ser um desafio, embora o
grupo de estudos que se reúne mensalmente aos sábados, continue a se reunir
normalmente, realizando estudos e discussões, em busca do aperfeiçoamento
do trabalho da instituição.
Outra situação vivenciada na Instituição, e que se constituiu para nós em
um grande desafio, foram ás mudanças de professoras ocorridas durante o
biênio 2004/2005, o que, de certa forma, dificultou tanto o processo de
formação continuada das mesmas, quanto o próprio andamento das turmas.
Os motivos que ocasionaram essas mudanças foram os mais variados
possíveis, indo desde pedidos de demissão – por questões pessoais; passando
por doenças sérias, com afastamentos prolongados; até necessidades de
201
mudanças no horário dos turnos, que acabaram por ocasionar a saída de
algumas professoras da Instituição.
Sabemos que esta mobilidade de professoras possui também influência
de aspectos sociais, políticos e econômicos, no sentido de que a
desvalorização social pela qual a profissão vem passando, além dos baixos
salários, e, muitas vezes, das difíceis condições de trabalho oferecidas, vão,
paulatinamente, minando as resistências, enfraquecendo os ânimos,
ocasionando comprometimentos orgânicos, psicológicos, emocionais, que
acabam contribuindo com os problemas e as dificuldades que explodem, ou
implodem..., nas alarmantes estatísticas que enfeitam o sistema educacional
público do nosso País. Acreditamos que esse foi um dos nossos maiores
desafios!
Uma outra questão que foi também um desafio na vivência da nossa
proposta de construção/sistematização das relações com as famílias e
compartilhamento das ações de cuidado e educação, foi a dificuldade que
algumas famílias apresentavam em comparecer a Instituição, tanto para
acompanhar as crianças no dia-a-dia, como para participar das atividades
propostas.
Inicialmente tivemos aquela tendência em achar que o não
comparecimento se devia ao descaso, a falta de interesse pela vida escolar
das crianças, porém, após uma breve pesquisa, onde procuramos saber o
motivo da ausência dessas pessoas, chegamos a conclusão, embasadas pelos
fatos apresentados, de que a grande maioria dos que não compareciam ,
possuíam motivos extremamente justos, como a acirrada luta pela
sobrevivência, problemas de saúde – as vezes originados por vícios, além de
violência doméstica e outros problemas dessa ordem.
Entendemos que essa nossa preocupação em procurar nos informar
acerca dos motivos das ausências, registrando e analisando os mesmos, foi
fundamental para modificarmos a nossa postura em relação a ausência dessas
famílias. O que inicialmente era visto como descaso, passou a ser
compreendido como dificuldades que justificavam plenamente a ausência das
pessoas, e não se constituía numa desvalorização, nem das responsabilidades
que tinham com as crianças, nem do trabalho realizado pela Instituição.
202
Essas questões nos levam a refletir que, ao realizar um trabalho com as
famílias, por mais que nos esforcemos, ele não vai atingir a totalidade das
mesmas, considerando que existem questões alheias as vontades das
instituições – família e escola, que interferem, que dificultam o fortalecimento
das relações entre ambas, impossibilitando até, um contato mais direto.
Ou seja, não existe uma receita única, pronta, nem caminhos já
determinados a serem trilhados de forma regular pelas instituições que
objetivam suas relações com as famílias e compartilhar ações de cuidado e
educação. O que podemos apontar, após as três experiências vivenciadas com
a temática e os estudos efetuados, são desafios e possibilidades: desafios que
são variados, multifacetados; e possibilidades que são inúmeras, sempre
relacionadas com o contexto em que ambas as instituições – família e escolas
estão inseridas, bem como com a intensidade da relevância que as pessoas
envolvidas dão a estas relações, e a disponibilidade que demonstram para
vivenciá-las.
Dessa forma, além dos aspectos já apontados no capítulo 1, a partir das
duas primeiras experiências vivenciadas, vamos eleger algumas outras
questões, igualmente relevantes, que podem se constituir em novas
possibilidades para estas relações.
Inicialmente podemos dizer que é imprescindível que o fortalecimento
das relações entre as instituições educativas e as famílias, façam parte do
próprio currículo escolar, ou seja, que componha os pilares de sustentação das
propostas das mesmas. Depois, que as principais concepções que embasam a
proposta da instituição – criança, educação, função da instituição, valores,
normas, entre outras, sejam discutidas e estudadas por toda a sua equipe, e
levadas também para serem refletidas com as famílias.
Outro ponto importante é que a Instituição e todos os seus profissionais
se qualifiquem para a realização desse trabalho informativo e formativo junto as
famílias, incluam este aspecto como um dos pontos relevantes das
especificidades da sua formação enquanto profissionais, sempre lembrando
que, principalmente a formação de valores, procedimentos e atitudes, antes de
serem verbalizados para as crianças, precisam ser vivenciados entre as
pessoas que compõem, que fazem parte, das duas maiores instituições
responsáveis diretamente pela educação das mesmas, pois aquilo que se
203
ensina pelo exemplo e pela vivência é melhor apreendido, do que o que é
ensinado apenas pelas palavras.
Nesse aspecto, consideramos fundamental que essa vivência se inicie
pela libertação de alguns preconceitos por parte das instituições educativas,
principalmente aqueles que dizem respeito á uma convicção equivocada de
que só uma família estruturada dessa, ou daquela forma padrão, pode
contribuir com a formação adequada das suas crianças, desvalorizando e
desqualificando as famílias reais presentes na grande maioria das nossas
instituições de ensino, e se negando a dialogar e buscar fortalecer as relações
com as mesmas, em prol do compartilhamento das ações educativas.
Finalizando essas considerações, vamos retomar o nosso problema de
pesquisa: é possível que juntos – direção, equipe técnica-pedagógica,
professoras e funcionários, construam, no contexto de surgimento de uma
I.E.I., uma relação com as famílias, objetivando o compartilhamento das ações
de cuidado e educação?, buscando refletir sobre o mesmo, procurando, no
nosso trabalho, elementos que apontem as respostas possíveis de serem
encaminhadas nesse momento.
De uma maneira geral, a partir das questões que foram descritas e
analisadas aqui, e apesar dos percalços e desafios que elencamos
anteriormente, compreendemos que o nosso problema de pesquisa pode ser
respondido de forma afirmativa, ou seja, é perfeitamente possível que a
direção, equipe técnica-pedagógica, professoras e funcionários, juntos,
construam uma relação com as famílias, objetivando as ações de cuidado e
educação das crianças. Aliás, podemos, inclusive, afirmar que é exatamente
essa ação conjunta, que viabiliza o atendimento do objetivo proposto, conforme
já explicitado um pouco mais acima.
Dessa forma, queremos registrar a importância de termos vivenciado
essa experiência, o quanto ela foi enriquecedora das nossas potencialidades
enquanto educadora. Queremos registrar também, que consideramos que a
mesma, ao ser divulgada, pode contribuir com outras instituições e/ou pessoas
que tenham interesse em realizar um trabalho desse jaez.
Além das contribuições específicas na área do fortalecimento das
relações entre instituições de Educação Infantil e famílias, vislumbramos
também contribuições para as áreas de formação de professores, de
204
funcionários, além do incentivo as gestões participativas e ao envolvimento dos
gestores, funcionários, enfim, de toda a equipe da instituição educativa com o
processo pedagógico vivenciado nas mesmas.
Esperamos ter conseguido dar conta do enorme desafio que foi, e é,
está refletindo sobre uma experiência da qual somos parte integrante, tendo
compartilhado a mesma, com uma dedicação integral, por um período de dois
anos, e que esse envolvimento não nos tenha embotado totalmente a visão,
no sentido de nos impossibilitar uma posição mais crítica sobre a situação
vivida.
Porém, temos clareza de que, a partir do momento que esse trabalho sai
das nossas mãos, se torna público, abre-se a possibilidade de enriquecimento
do mesmo, motivadas, exatamente, por essa condição de incompletude, de
inacabamento, conforme discutido no início dessas considerações, que vão
impulsionar o descortinamento de outras possibilidades de se pensar/vivenciar
as relações entre famílias e Instituições de Educação Infantil, bem como outros
percalços e desafios também.
E são exatamente esses percalços, desafios e possibilidades que devem
alimentar a nossa alma de educadores, nos impulsionando sempre para a
busca de alternativas e estratégias possíveis de serem vivenciadas, em prol da
grandiosa tarefa de contribuir com o processo educativo das novas gerações!
Assim sendo, relembramos que, se educar é a mais avançada tarefa
social emancipatória – Assmann (2007), e se a participação dos pais diferencia
as escolas eficazes das ineficazes – Marchesi e Martín (2003), para colocar um
ponto e vírgula nesse trabalho, defendemos a tese de que, para que a
educação assuma essa tarefa emancipatória, é urgente e imprescindível que
as instituições educativas abracem e idéia de envolver as famílias, buscando o
compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças.
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ANEXOS
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ANEXO 1
PREFEITURA MUNICIPAL DO NATAL SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PROFª CARMEM Mª REIS
FICHA DE CARACTERIZAÇÃO DA CRIANÇA
- NÍVEL: ( ) I = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) II = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) III = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) IV = ANO _______________ TURNO ______________________
- DADOS DO ALUNO:
Nome da criança:_________________________________________________
Data de nasc. ____/_____/_____ sexo: ( ) masc. ( ) fem.
Nacionalidade: ( ) brasileira ( ) outra______________________
Etnia: ( ) parda ( ) branca ( ) negra
End:___________________________________________ Nº______________
Bairro: _______________________tel: ________________ ( ) res. ( ) orelhão
Ponto de referência: _______________________________________________
- DADOS DO PAI:
Nome do pai:_____________________________________________________
Data de nasc:________________________
Profissão_____________________
Religião: ( ) católica ( ) evangélica ( ) outras__________________________
Grau de instrução: ( ) analfabeto ( ) alfabetizado ( ) 1ª a 4ª série ( ) 5ª a 8ª
série ( ) Fund. Completo ( ) médio incompleto ( ) médio completo ( )
superior incompleto ( ) superior completo
Nome, end. E tel do local de trabalho do pai: ___________________________
- DADOS DA MÃE:
Nome da mãe:___________________________________________________
Data de nasc: ___/___/___. Profissão: ( ) do lar ( ) outra ________________
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Religião: ( ) católica ( ) evangélica ( ) outras__________________________
Grau de instrução: ( ) analfabeto ( ) alfabetizado ( ) 1ª a 4ª série ( ) 5ª a 8ª
série ( ) Fund. Completo ( ) médio incompleto ( ) médio completo ( )
superior incompleto ( ) superior completo
Nome, end. E tel do local de trabalho da mãe: __________________________
-SITUAÇÃO FAMILIAR:
Renda: ( ) Menos de 1 salário mínimo ( ) 1 salário mínimo ( ) não tem renda
fixa ( ) 1 a 3 salários mínimos ( ) 3 a 5 salários mínimos.* Residência: ( )
casa própria ( ) casa alugada ( ) outros ( ) alvenaria ( ) barraco ( ) 1 a 2
cômodos ( ) 2 a 5 cômodos.
Número de pessoas que residem em casa: ( ) 1 a 4 pessoas ( ) 5 a 7
pessoas ( ) mais de 7 pessoas
Número de irmãos: ( ) masc ( ) fem ( ) mais novos ( ) mais velhos
Com quem a criança mora: ( ) com os pais ( ) pais separados: ( ) mãe ou ( )
pai ( ) com os avós ( ) outra situação _________________________________
Quando a criança vem para a escola, fica alguém em casa: ( ) não ( ) sim
Quem? ___________________________________________
- CARACTERÍSTICAS DA CRIANÇA:
A criança costuma fazer 3 refeições ao dia: ( ) sim ( ) não
Que alimentos a criança gosta: ( ) sopa de legumes ( ) cuscuz com leite ( )
cuscuz com carne ( ) canjicão ( ) arroz doce 9 ) leite ( )
outros__________________________________________________________
Com quem a criança dorme: ( ) quarto sozinha ( ) quarto com irmãos ( ) com
os pais ( ) outros
Que doenças a criança já teve? ( ) convulsão ( ) hepatite ( ) problemas
cardíacos ( ) sarampo ( ) outras _____________________________________
A criança toma algum remédio diariamente: ( ) não ( ) sim ______________
Motivo: _________________________________
219
A criança vivencia situações como: ( ) piolho ( ) bicho de pé ( ) coceira ( )
dor de dente ( ) outros_____________________________________________
A criança costuma usar o sanitário sozinha: ( ) sim ( ) não
De que a criança mais gosta de brincar? ______________________________
Costuma brincar com outras crianças ( ) não ( ) sim. Em que espaço: ( )
quintal ( ) dentro de casa ( ) na rua ( ) outros__________________________
0 que a criança faz no final de semana: ( ) passeia com os pais ( ) vai a praia (
) fica em casa ( ) visita parentes ( ) outros ______________________
Qual a sua opinião sobre o seu
filho:___________________________________________________________
Quando seu filho age de forma incorreta, o que você faz: ( ) conversa ( )
castiga ( ) bate ( ) outros:__________________________________________
Quando você promete alguma coisa ao seu filho, costuma cumprir ( ) sim ( )
não
Por que você está matriculando a criança nesta escola? _________________
A criança já estudou em outra escola? ________________________________
O que você espera que a criança aprenda aqui? ________________________
Como você pode colaborar para que a criança se saia bem na escola? ( )
comparecendo aos eventos promovidos sempre que solicitado ( ) se fazendo
presente no dia a dia, conversando com a professora ( ) Acompanhando as
atividades realizadas na escola e as tarefas de casa. ( ) não dispõe de tempo
Quem vem buscar a criança na escola?
Qual o melhor horário para você comparecer a reunião de pais? ( ) horário de
estudo do filho ( ) início do turno ( ) final do turno ( ) a noite
220
Nome da pessoa que forneceu as informações sobre a criança e grau de
parentesco. _____________________________________________________
Assinatura: ______________________________________________________
Nome da pessoa da escola que preencheu a ficha: ______________________
Data do preenchimento da ficha:_____________________________________
Observações: ____________________________________________________
221
ANEXO 2
ROTEIRO DAS ENTREVISTAS INICIAIS COM AS FAMÍLIAS NO CARMEM REIS
1- O que o(a) sr(ª) achou desse evento? 2- Que mais poderia dizer: que fazer alguma crítica, alguma reclamação,
alguma sugestão?
222
ANEXO 3
ROTEIRO DAS ENTREVISTAS FINAIS COM AS FAMÍLIAS NO CARMEM REIS
1- Quando você matriculou seu (sua) filho(a) nessa instituição, o que você
esperava que ele(a) aprendesse aqui? O que você esperava dessa escola?
2- Na sua opinião, essa instituição atendeu ao que você esperava?
Justifique a sua resposta.
3- E você, enquanto pai, mãe, responsável, enfim, familiar de aluno
matriculado nessa instituição, como se sente aqui? O que tem a dizer das pessoas que trabalham aqui, das reuniões e eventos que são realizados com as crianças e as famílias, enfim, da instituição como um todo?
4- O que você mudaria nessa instituição? Se dependesse de você, o quê
seria diferente? 5- O que você mais gosta nesta instituição? 6- Dos eventos realizados com as famílias, qual o que você mais gostou? 7- Na sua opinião, as atividades realizadas aqui na instituição ajudaram
você a entender, a cuidar e educar melhor a sua criança?
223
ANEXO 4
TERMO DE AUTORIZAÇÃO
Eu, NINODJA THAISE BARBALHO DA SILVA, Brasileira, casada,
Professora da rede municipal de ensino da cidade de Natal-RN, portadora da
identidade nº 1.513702, autorizo a pesquisadora CLÁUDIA DA SILVA
FARACHE – doutoranda do Programa de Pós-graduação da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte – UFRN – e sua orientadora, a Profª Drª
NEIDE VARELA SANTIAGO, a utilizar o projeto didático intitulado “Rendeiras
da Vila: a preservação de uma cultura”, por mim elaborado e vivenciado, na
turma de nível I, do turno vespertino – no Centro Municipal de Educação Infantil
Profª Carmem Maria Reis, no ano de 2005; na sua tese de doutorado, podendo
também disponibilizar o mesmo na rede mundial de computadores – Internet –
e permitir a reprodução por meio eletrônico da OBRA, a partir da data abaixo.
.
Natal, 21 de Junho de 2007
Ninodja Thaise Barbalho da Silva
224
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