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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CLÁUDIA DA SILVA FARACHE A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA. NATAL– RN 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CLÁUDIA DA SILVA FARACHE

A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.

NATAL– RN

2007

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CLÁUDIA DA SILVA FARACHE

A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL:

DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação. ORIENTADORA Profª Drª Neide Varela Santiago.

Natal - RN 2007

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CLÁUDIA DA SILVA FARACHE

A RELAÇÃO ENTRE A FAMÍLIA E A INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL: DESCRIÇÃO REFLEXIVA SOBRE UMA EXPERIÊNCIA.

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do Grau de Doutora em Educação.

BANCA EXAMINADORA:

_________________________________________________________________ Profª. Drª Neide Varela Santiago. – Orientadora

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

__________________________________________________________________ Profª. Drª Marisa Del Cioppo Elias – Examinadora Externa

Pontifícia Universidade Católica – PUC – SP

___________________________________________________________________ Profª. Drª Tânia Câmara Araújo de Carvalho – Examinadora Externa

Faculdade do CDF Ponta Negra – NATAL-RN

__________________________________________________________________ Prof. Dr Francisco de Assis Pereira – Examinador Interno

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_________________________________________________________________ Profª. Drª Luzia Guacira dos Santos Silva – Examinadora Interna

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

___________________________________________________________________ Prof. Dr Walter Pinheiro Barbosa Júnior

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Suplente

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Dedico esta tese a todos os componentes: crianças, professoras, famílias, coordenadoras e funcionários do CMEI Carmem Reis, e em especial a Professora Olga Regina, pelo empenho, competência e dedicação com que rege essa tão afinada e harmônica orquestra.

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AGRADECIMENTOS

Um sonho que se sonha só, é apenas um sonho, um sonho

que se sonha em conjunto, torna-se realidade.

Autor desconhecido

Na impossibilidade de nominar todos os que conosco sonharam esse sonho,

contribuindo assim para a sua realização, agradecemos de coração a cada um, e pedimos permissão para nomear os que seguem abaixo, agradecendo-os igualmente:

Inicialmente, agradecemos a Deus – inteligência suprema, causa primária de

todas as coisas, sem o qual não existiríamos; e a Jesus, o espírito mais perfeito que já habitou a terra, se constituindo em nosso guia e modelo.

Aos meus pais – Carlos e Wilda e a minha querida Vó Vanda, pelo empenho,

sacrifício, carinho, dedicação e apoio que sempre me deram, incondicionalmente, em toda a trajetória da minha existência. Todas as palavras do mundo são insignificantes para traduzir a alegria que sinto em ser sua filha e neta; e o reconhecimento e agradecimento que lhes devoto não caberia em todo o papel existente, considerando que gosto do que sou, e tudo o que sou, devo a vocês!

Ao meu esposo Eden – um pouco do paraíso que tive a ventura de encontrar

na terra; e as minhas filhas Vanda Luíza e Luana Cecília, com certeza as maiores vítimas de tantos estudos - para Ele e Elas traduzidos em muitas ausências, o meu sincero agradecimento e a certeza de que sem vocês, nada disso seria possível, nem teria sentido!

Ao meu sogro, Sebastião de Lessa Lemos - in memorian, grande incentivador

da busca pelo conhecimento. Embora a saudade da sua presença física, do seu temperamento alegre e expansivo, a certeza da continuidade da sua vida em outra dimensão, nos alegra e anima a prosseguir!

Aos grandes amigos, Sandra e Assis – verdadeiros tesouros encontrados na

nossa trajetória terrena, a minha grande admiração, o meu imenso carinho, e a minha eterna gratidão.

À Profª Drª Neide Varela Santiago - Como colocar na pequenez e singeleza

das palavras a sua imensurável contribuição a minha vida, a não ser testemunhando que aprendi muito com você, não apenas pelo que você me diz e ensina, mas principalmente pela oportunidade grandiosa que tive de vivenciar a experiência de ser sua aluna e bolsista na graduação, sua orientanda na especialização, no mestrado e no doutorado, bebendo nas fontes do seu saber e, principalmente, da sua postura ética e generosa de grande ser humano. Como já lhe disse uma vez: ter uma orientadora como você, ainda mais durante tanto tempo, é um privilégio, e eu agradeço sempre a Deus por isso!

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À todos os que fazem o Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Maria Reis: crianças, famílias, professores, funcionários, coordenadoras e gestoras, pelas grandes oportunidades de aprendizagem e crescimento que tive ao lado de vocês.

À minha amiga Olga Regina, sem dúvida um ser humano maravilhoso. Em

você encontrei, pelos laços do coração, a irmã que o sangue não me deu. Obrigada pela sua presença constante, pelo seu carinho, pelo ombro sempre amigo e disponível, e por todos os momentos compartilhados, que tanto me enriqueceram, como profissional e como ser humano.

À amiga Cristina Leandro: contabilizar o tempo que faz que nos conhecemos,

seria esquecer que ainda temos 25 anos – embora não saibamos bem se de educação ou de idade, mas não importa! O importante é o companheirismo que nos une e irmana, nas trajetórias da educação e da vida.

À Profª Drª Marisa Del Cioppo Elias, pelo carinho e competência com que

vem acompanhando, e contribuindo com o crescimento da minha trajetória acadêmica e pessoal, desde a banca do mestrado. E também pela postura lúcida, objetiva e humilde com que distribui os grandes saberes que possui, com todos os que dela se acercam. É motivo de muita alegria e orgulho para mim, a sua presença na minha vida. Obrigada!

À Profª Drª Tânia Câmara Araújo de Carvalho, pelas imensas contribuições que sempre dispensou à minha formação acadêmica e pessoal, e, em especial, pelas contribuições que deu a esse trabalho, enriquecendo-o bastante. Obrigada também pelo exemplo de compromisso, competência e dedicação que é para todos nós que trabalhamos na área da Educação e, principalmente, da Educação Infantil. Ao Profª Dr Francisco de Assis Pereira, pelo acompanhamento desvelado e competente dos meus trabalhos, desde a monografia de especialização até esta tese... faltam as palavras para dizer da minha alegria e do meu agradecimento! À Profª Drª Luzia Guacira dos Santos Silva, pela amizade e carinho que nos une, e pela competência, seriedade e dedicação com que contribuiu para o enriquecimento desse trabalho. Ao Profº Dr. Walter Pinheiro Júnior, pelo carinho e gentileza com que aceitou participar da nossa banca de defesa. À Profª Drª Lígia Maria Motta Lima Leão de Aquino – da Universidade católica de Petrópolis e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro pela gentileza com que aceitou ser a suplente externa da nossa banca. À todos os professores e professoras do PPGEd da UFRN, principalmente aqueles com quem interagimos mais de perto nas disciplinas e seminários, no decorrer da nossa formação: Profª Drª Aparecida Queiroz, Profº Dr Assis Pereira, Profª Drª Denise Carvalho, Profª Drª Estela Campelo, Profº Drº João Valença, Profª Drª Márcia Gurgel, Profª Drª Tânia Câmara, dentre outros cujos nomes nos escapam agora à memória. À Profª Justina Iva de Araújo Silva – Secretária Municipal de Educação de Natal, pelo convite para assumir a direção do CMEI Carmem Reis, me possibilitando

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vivenciar a experiência aqui apresentada, que tanto me enriqueceu como profissional e como ser humano. À Profª Mariza Guerra, coordenadora do Setor de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação de Natal, e a todas as colegas da equipe de Educação Infantil da SME. À Maria Isabel Medeiros – nossa querida Bel, pelo carinho e competência com que contribuiu com a parte técnica e normativa desse trabalho. Á Luana Cecília Farache Lemos – minha filha mais nova, que na beleza e plenitude dos seus 11 anos de idade, com muito carinho, solidariedade e companheirismo, contribuiu enormemente com a impressão e organização final das páginas desse trabalho. Em especial, as crianças e famílias com as quais interagimos no decorrer dessa experiência, e a todos os atores e protagonistas aqui não nominados, porém, igualmente importantes na realização desse trabalho.

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Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais; caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar. Ao andar faz-se o caminho, e ao olhar-se para trás vê-se a senda que jamais se há de voltar a pisar. Caminhante, não há caminho, somente sulcos no mar.

Antônio Machado.

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RESUMO

O presente trabalho se constitui em uma tese de doutorado, na área da Educação, que tem como objetivo descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e instituição de Educação Infantil, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, localizado na cidade de Natal-RN. A nossa pretensão com esse trabalho é compartilhar algumas das idéias e ações construídas coletivamente a partir dessa experiência, com a intenção de trazer uma contribuição para os debates acerca das temáticas relativas à Educação Infantil – enquanto modalidade de ensino, de uma maneira geral; e as relações entre famílias e Instituições de Educação Infantil, de forma mais específica. O trabalho aqui apresentado se encontra respaldado pelos postulados da pesquisa qualitativa com características de uma pesquisa-ação, tendo como principais instrumentos de construção dos dados às entrevistas abertas ou semi-estruturadas, o caderno pessoal de registros, as fichas de caracterização das crianças e as observações participantes. Autores como Áries (1981); Bassedas, Huguet e Solé (1999); Bhering e Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 – 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi e Martín (2003); Marschal e Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), dentre outros, embasaram teoricamente este trabalho. A experiência aqui descrita aponta para as possibilidades de compartilhamento de ações de cuidado e educação entre família e Instituição de Educação Infantil, enfatizando a relevância de uma práxis participativa no interior da instituição, para que o trabalho da mesma possa propiciar esse compartilhamento com as famílias, a partir de atividades como reuniões, palestras, oficinas, participação em projetos didáticos, exposições abertas à comunidade, festas comemorativas e valorização da cultura local, dentre outras oportunidades de diálogo e interação entre a instituição educativa e as famílias. Palavras Chaves: Família, instituição de Educação Infantil, cuidado e educação.

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ABSTRACT The present paper is a doctorate thesis, in the area of Education, that has as a goal to describe and to reflect on the construction/systematization of a relation between family and institution of Childhood Education, in favor of sharing the care and education actions of children, in the context of creation of a County Center of Childhood Education, located in the city of Natal-RN. Our intension with this paper is to share some of the ideas and actions collectively constructed by this experience, with the intention of bringing a contribution for the thematic debates concerning Childhood Education - as modality of education, in a general way; and the relations between families and Institutions of Childhood Education, in a more specific way. The paper presented here is endorsed by the postulates of the qualitative research with characteristics of a research-action, having as main instruments of the data construction the open or half-structuralized interviews, the personal notebook of registers, the participant’s index cards characterizing the children and comments. Authors as Aries (1981); Bassedas, Huguet and Solé (1999); Bhering and Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 - 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi and Martín (2003); Marschal and Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), amongst others, had theoretically based this paper. The experience described here points to the possibilities of sharing the care and education actions between family and Institution of Childhood Education, emphasizing the relevance of participative praxis in the interior of the institution, so that its job can propitiate this sharing with the families, throughout activities as meetings, lectures, workshops, participation in didactic projects, open expositions to the community, commemorative parties and valuation of the local culture, amongst other chances of dialogue and interaction between the educative institution and the families. KEYWORDS: Family, Institution of Childhood Education, Care and Education.

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RÈSUMÈ L’objectif de notre travail, dans le cadre d’une thèse de doctorat en Sciences de l’Éducation, est de décrire et de réfléchir sur la construction/systématisation d’une relation entre la famille et l’Institution d’Enseignement Infantile, en faveur du partage des actions de soin et d’éducation des enfants. A partir de cette expérience, dont le contexte est la création d’un Centre Municipal d’Éducation Infantile dans la ville de Natal-RN, nous souhaitons partager certaines des idées et actions construites collectivement dans le but d’amener une contribution aux débats autour des thèmes relatifs à l’éducation des enfants – en tant que modalités d’enseignement, d’une manière générale, et des relations entre les familles et les institutions, de façon spécifique. Le présent travail, soutenu par les postulats de la recherche qualitative avec des caractéristiques d’une recherche-action, s’est construit à partir d’entretiens ouverts ou semi-structurés, de données du cahier personnel de registres, des fiches d’évaluation des enfants et des observations participantes. Des auteurs tels que Áries (1981); Bassedas, Huguet et Solé (1999); Bhering et Blatchford (1999); Brasil (1998); Bujes (2001); Didonet (2002 – 2003); Formosinho (2007); Gómez (2000); Heywood (2004); Kramer (2005); Marchesi et Martín (2003); Marschal et Zohar (2006); Thiollent (2004); Tiriba (2006), entre autres, constituent les bases théoriques de notre recherche. Ainsi, l’expérience ici décrite nous oriente vers les possibilités de partage des actions de soin et d’éducation entre la famille et l’Institution d’Éducation Infantile. Autrement dit, il s’agit de souligner l’importance d’une praxis participative à l’intérieur de l’institution afin que celle-ci puisse promouvoir ce partage avec les familles à partir d’activités telles que des réunions, des conférences, des ateliers, la participation autour de projets didactiques, des expositions ouvertes à la communauté locale, des fêtes commémoratives et la valorisation de la culture native, parmi d’autres opportunités de dialogue et d’interaction entre l’institution et les familles.´

MOTS CLEFS: Famille, Institution d’Education Infantile, soin et éducation.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 01 - Práxis participativa 21FIGURA 02 - Referenciais norteadores 30FOTO 01 - Área gramada na frente do prédio 61FOTO 02 - Área livre e caixa de areia 61FOTO 03 - Parque infantil 61FOTO 04 - Tenda em área cimentada 61FOTO 05 - Aula para formação de um grupo de capoeira 63FOTO 06 - Apresentação do grupo de pastoril da I.E.I 63FOTO 07 - Leitura na biblioteca 64FOTO 08 - Momento do faz-de-conta 64FOTO 09 - Brincadeiras no parque e caixa de areia 64FOTO 10 - Escrevendo textos que se sabe de cor 64QUADRO 01- Caracterização da equipe técnica-docente-administrativa 65QUADRO 02- Nº de crianças por nível. 2004 matutino 68QUADRO 03- Nº de crianças por nível. 2004 vespertino 68QUADRO 04- Nº de crianças por nível. 2005 matutino 68QUADRO 05- N} de crianças por nível. 2005 vespertino 68FOTO 11 - Equipe da I.E.I. efetuando as matrículas (1) 138FOTO 12 - Equipe da I.E.I. efetuando as matrículas (2) 138FOTO 13 - Professoras confeccionando material (1) 138FOTO 14 - Professoras confeccionando material (2) 138FOTO 15 - Equipe da I.E.I. comemorando aniversário do trimestre 139FOTO 16 - Café da manhã com equipe da I.E.I 139FOTO 17 - Funcionário tocando violão p/ as crianças 141FOTO 18 - Funcionárias fazendo doces p/ dia das crianças 141FOTO 19 - Livre acesso das famílias á I.E.I (1) 148FOTO 20 - Livre acesso das famílias á I.E.I (2) 148FOTO 21 - Oficina sobre a hora do parque 152FOTO 22 - Oficina sobre desenho 153FOTO 23 - Oficina sobre escrita c/ alfabeto móvel 153FOTO 24 - Festa junina 154FOTO 25 - Famílias visitando exp. De trabalhos das crianças 154FOTO 26 - Reunião com as famílias 160FOTO 27 - Dramatização sobre limites (1) 165FOTO 28 - Dramatização sobre limites (2) 165FOTO 29 - Brincando de roda c/ famílias e crianças 168FOTO 30 - Construindo brinq. de sucata c/ famílias e crianças 168FOTO 31 - 1º encontro da família na I.E.I 171FOTO 32 - Pastoril estrela do amanhã 171FOTO 33 - Pescador, e avô de 1 aluno, visita a I.E.I 173FOTO 34 - Pescador ensina como tratar o peixe 173FOTO 35 - Crianças visitam a casa das rendeiras na Vila 174FOTO 36 - Rendeira, e avó de 1 aluna, visita a I.E.I 174FOTO 37 - Exposição dos trabalhos sobre a Vila (1) 174FOTO 38 - Exposição dos trabalhos sobre a Vila (2) 174

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LISTA DE ANEXOS

ANEXO 1 - Ficha de Caracterização das Crianças e Famílias 217ANEXO 2 - Roteiro das Entrevistas Iniciais com as Famílias 221ANEXO 3 - Roteiro das Entrevistas Finais com as Famílias 222ANEXO 4 - Autorização para o uso do projeto “Rendeiras da Vila” 223ANEXO 5 - Autorização para o Uso das Fotos 224

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LISTA DE SIGLAS

C.M.E.I -- Centro Municipal de Educação Infantil CMEICAR -- Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Mª Reis

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente FUNDEB – Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica FUNDEF – Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental

I.E.I – Instituição de Educação Infantil LDB – Lei de Diretrizes e Bases NEI – Núcleo de Educação Infantil PPGEd – Programa de Pós Graduação em Educação PROBÁSICA – Programa de Qualificação Profissional para a Educação Básica

PROFA – Programa de Formação de Professores Alfabetizadores SEMTAS – Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social. SEI – Setor de Educação Infantil SME – Secretaria Municipal de Educação UFRN -- Universidade Federal do Rio Grande do Norte

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO 18

INTRODUÇÃO 21

1 REVISITANDO CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS, EM BUSCA DE NOVAS PAISAGENS

43

1.1 REFLETINDO SOBRE A MONOGRAFIA 43

1.2 REFLETINDO SOBRE A DISSERTAÇÃO 46

2 CONSTRUINDO DIRETRIZES PARA NOVOS CAMINHOS 54

2.1 REFLETINDO SOBRE REFERENCIAIS METODOLÓGICOS 54

2.2 DETALHANDO INSTRUMENTOS DE CONSTRUÇÃO DOS DADOS 57

2.3 CARACTERIZANDO O CAMPO E PESQUISA 60

2.4 CARACTERIZANDO O CORPO TÉCNICO-DOCENTE 65

2.5 APRESENTANDO OS FUNCIONÁRIOS 66

2.6 CARACTERIZANDO AS CRIANÇAS E SUAS FAMÍLIAS 67

3 BUSCANDO CAMINHOS DO PASSADO, PARA CONSTRUIR O FUTURO

73

3.1 REFLEXÕES INICIAIS EM TORNO DA TEMÁTICA 73

3.1.1 EM BUSCA DA VISÃO DE INFÂNCIA DA IDADE MÉDIA 75

3.1.2 O SENTIMENTO DE INFÂNCIA NA IDADE MODERNA 80

3.1.3 REFLEXÕES SOBRE AS CONTRADIÇÕES DA HISTÓRIA DA INFÂNCIA NA CONTEMPORANEIDADE

83

3.2 AS I.E.I. AO LONGO DA HISTÓRIA 93

3.3 AS FAMÍLIAS E SUAS HISTÓRIAS 105

4 APRESENTANDO CAMINHOS TRILHADOS 112

4.1 AÇÕES INICIAIS COM AS PROFESSORAS 113

4.2 AÇÕES INICIAIS COM OS FUNCIONÁRIOS 139

4.3 ALGUMAS AÇÕES REALIZADAS COM AS CRIANÇAS 142

4.4 AÇÕES REALIZADAS COM AS FAMÍLIAS 147

5 DESCREVENDO E REFLETINDO SOBRE OS CAMINHOS PERCORRIDOS

158

5.1 REUNIÕES COM AS FAMÍLIAS 159

5.2 PALESTRAS E VIVÊNCIAS COM AS FAMÍLIAS 165

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5.3 OFICINAS COM AS FAMÍLIAS SOBRE ATIVIDADES REALIZADAS COM AS CRIANÇAS NO COTIDIANO DA INSTITUIÇÃO

169

5.4 FESTAS COMEMORATIVAS 170

5.5 INCENTIVO A PARTICIPAÇÃO DAS FAMÍLIAS EM PROJETOS DIDÁTICOS-EDUCATIVOS VIVENCIADOS PELAS CRIANÇAS

172

5.6 INTERVENÇÃO INDIVIDUAL JUNTO A ALGUMAS FAMÍLIAS 175

5.7 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS FINAIS COM AS FAMÍLIAS 177

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 197

7 REFERÊNCIAS 206

8 ANEXOS 217

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APRESENTAÇÃO

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APRESENTAÇÃO

Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.

Fernando Pessoa.

O presente trabalho se constitui em uma descrição reflexiva da experiência

por nós vivenciada nos anos de 2004 e 2005, em um Centro Municipal de Educação

Infantil (CMEI), na cidade de Natal-RN. A experiência se refere à vivência coletiva do

processo de construção de uma relação com as famílias, em prol do

compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças matriculadas

nesta Instituição, no contexto de criação e implantação da mesma.

A nossa pretensão com esse trabalho é compartilhar algumas das idéias e

ações construídas coletivamente a partir dessa experiência, visando trazer uma

contribuição para os debates acerca das temáticas relativas à Educação Infantil –

enquanto modalidade de ensino, de uma maneira geral; e as relações entre famílias

e Instituições de Educação Infantil – I.E.I., de forma mais específica.

O trabalho aqui apresentado se encontra respaldado pelos postulados da

pesquisa qualitativa com características de uma pesquisa-ação, tendo como

principais instrumentos de construção dos dados as entrevistas abertas ou semi-

estruturadas, o caderno pessoal de registros, as fichas de caracterização das

crianças e as observações participantes.

É importante dizer que no processo de construção coletiva dessa experiência,

além das possibilidades vislumbradas, encontramos também problemas e desafios:

saída de algumas pessoas da equipe inicial, divergências de opiniões e de ações,

perda e recuperação da esperança, dúvidas e inquietações, mas optamos por ficar

com a melhor parte de tudo isso, que foram os momentos de realizações positivas

em prol do objetivo proposto. E são esses os momentos que vamos buscar

compartilhar a partir de agora no corpo desse trabalho, reservando o espaço das

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considerações finais para fazermos algumas referências aos percalços e desafios

que surgiram ao longo dessa trajetória.

Utilizamos ainda o espaço dessa apresentação inicial, para colocarmos um

pouco da nossa vivência como educadora.

Como professora da rede municipal de ensino da cidade do Natal desde

1989, já vivenciamos a experiência de atuarmos como professora das séries iniciais

do Ensino Fundamental; como formadora e coordenadora dos Parâmetros em Ação

de Educação Infantil; como formadora de formadores de professores

alfabetizadores, e coordenadora geral do Programa de Formação de Professores

Alfabetizadores (PROFA); formadora de professores do Setor de Educação Infantil

(SEI), da Secretaria Municipal de Educação – SME, de Natal e diretora de um Centro

Municipal de Educação Infantil – CMEI, dentre outras funções pedagógicas e

administrativas.

Em outras Instituições educacionais, como a Universidade Federal do Rio

Grande do Norte - UFRN, já atuamos como monitora da disciplina Psicologia

Educacional; como professora do Programa de Qualificação de Professores para a

Educação Básica - PROBÁSICA nas cidades de Nova Cruz, Arês e Macaíba; como

docente também em cursos de aperfeiçoamento e extensão nas áreas de Educação

Infantil e Educação de Jovens e Adultos, bem como ministrante de disciplinas

vinculadas a alfabetização e letramento na Especialização em Educação de Jovens

e Adultos promovida por esta universidade em parceria com a SME -Natal, no biênio

2006/2007.

Ainda no biênio 2006/2007 atuamos como professoras do Departamento de

Educação dessa mesma Instituição de Ensino Superior, ministrando as disciplinas

de Fundamentos da Educação Infantil, Prática Pedagógica na Educação Infantil,

Alfabetização na Educação Infantil e Oficinas Pedagógicas de Educação Infantil,

todas do núcleo temático dessa modalidade de ensino, no curso de Pedagogia.

É a partir, então, não apenas dessa nossa trajetória de 18 anos como

educadora, mas da nossa própria trajetória como seres humanos, produto e

produtores de história e de cultura, influenciando e sendo influenciada por todos os

que conosco interagem e convivem, que ousamos compartilhar, através dessa tese,

essa experiência de construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I,

vivenciada coletivamente por ocasião da criação do Centro Municipal de Educação

Infantil Profª Carmem Maria Reis – CMEICAR.

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INTRODUÇÃO

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INTRODUÇÃO

Para quem ousa inovar, o processo de conhecimento não é linear.

Marisa Del Cioppo Elias.

Nesse trabalho, o nosso objeto específico de estudo é a relação da família

com a Instituição de Educação Infantil - I.E.I. Porém, como o lócus desse estudo foi

uma I.E.I. que estava sendo criada naquele momento, numa perspectiva de práxis

participativa – e nós participamos ativamente de todo esse processo inicial de

implantação e sistematização da mesma; nos propomos aqui a descrever e refletir,

também, no decorrer desse trabalho, sobre alguns outros aspectos e procedimentos

iniciais desse processo, na certeza de que estão todos interligados:

Uma pedagogia centrada na práxis de participação procura responder à complexidade da sociedade e das comunidades, do conhecimento, das crianças e de suas famílias, com um processo interativo de diálogo e confronto entre crenças e saberes, entre saberes e práticas, entre práticas e crenças, entre esses pólos em interação e os contextos envolventes. Por essa razão, é um modo de fazer pedagogia mais complexo do que o modo transmissivo. (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e PINAZZA, 2007, p.15)

Figura 1 – Práxis Participativa

Comunidade

Funcionários

Professores Práxis

Participativa

Crianças

Gestão

Famílias

Equipe Técnica

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Assim sendo, apesar do nosso objetivo geral ser descrever e refletir sobre a

construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do

compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de

criação de um Centro Municipal de Educação Infantil - CMEI, no decorrer desse

trabalho, mesmo tendo clareza de que não daremos conta da totalidade de todo

esse processo de construção da práxis participativa no interior da Instituição,

vamos enfocar alguns aspectos da mesma.

Porém, buscando sempre privilegiar o nosso objeto específico delimitado para

esse estudo, que é a relação entre família e I.E.I., até mesmo porque “Quase todas

as pesquisas realizadas sobre a qualidade da escola destacaram que a participação

dos pais é um dos fatores que diferenciam as escolas eficazes das ineficazes”

(MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.128).

Em relação a essas pesquisas realizadas sobre a relação das famílias com as

instituições educativas, sabemos que:

As pesquisas realizadas sobre a influência da participação dos pais na escola podem ser organizadas em dois blocos principais: as que estudam o papel do ambiente familiar e as que analisam as conseqüências dos programas que envolvem os pais nas escolas (MARCHESI e MARTÍN, 2003, p.128)

A nossa experiência se insere no segundo bloco proposto pelos autores

acima citados, considerando que a proposta da mesma é que a Instituição educativa

busque a participação das famílias em atividades do seu cotidiano, objetivando a

discussão e o compartilhamento de ações de cuidado e educação a serem

realizadas com as crianças.

Dessa forma, iniciando esse processo de construção da descrição reflexiva da

experiência vivenciada, vamos dividir essa introdução em dois momentos que,

embora distintos, se entrelaçam e se complementam em busca do alcance do

objetivo proposto. No primeiro momento, vamos apresentar a relevância que

conseguimos perceber na temática proposta, bem como retratar um pouco do nosso

envolvimento com ela; no segundo, vamos discutir acerca de algumas concepções

importantes que norteiam o desenvolvimento da mesma, para depois podermos

visualizar a organização de todo o corpo dessa tese.

Page 23: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ... · possibilidades de compartilhamento de ações de cuidado e educação entre família e Instituição de Educação Infantil,

23

I - Apresentando a temática. Escrever já é, por si só, uma tarefa complexa – na medida em que precisamos

sistematizar e colocar num espaço já predeterminado, com regras estabelecidas á

priori – linguagem escrita, gramática, coesão, coerência textual -- idéias, sonhos e

até devaneios que, nascidos no domínio do pensamento e da imaginação – mesmo

que a partir de experiências concretas, são livres e despojados de qualquer medida

e tamanho, desconhecendo obstáculos e limites.

Escrever novamente sobre um mesmo tema – esta realmente uma tarefa

bastante desafiadora! Além da complexidade acima descrita, ainda podemos

incorrer no equívoco de nos tornarmos enfadonhas e repetitivas. Porém vamos

aceitar este grande desafio, encorajadas e alentadas pelas sábias palavras do

inesquecível Mestre e Educador Paulo Freire (1921 - 1997):

Não creio, porém, que a retomada de problemas entre um livro e outro e no corpo de um mesmo livro enfade o leitor. Sobretudo quando a retomada do tema não é pura repetição do que já foi dito. No meu caso pessoal retomar um assunto ou tema tem que ver principalmente com a marca oral da minha escrita. Mas tem que ver também com a relevância que o tema de que falo e a que volto tem no conjunto de objetos a que direciono minha curiosidade. Tem que ver também com a relação que certa matéria tem com outras que vêm emergindo no desenvolvimento da minha reflexão (FREIRE, 1996, p. 14)

Poderíamos acrescentar que, escrever sobre um mesmo tema, tem também a

grande relevância de nos proporcionar a oportunidade de aprofundarmos a reflexão

em torno de uma mesma problemática, buscando novos caminhos - e refazendo

alguns, na tentativa de vislumbrar, sobre um outro prisma, paisagens antes

apreciadas de forma apressada, unilateral e incompleta. Essa é a nossa proposta,

ao encararmos este mesmo e novo desafio!

Dessa forma, vamos retornar à temática da relação da família com a I.E.I.,

relembrando um pouco a nossa trajetória com o tema.

Na nossa prática enquanto educadora, sempre nos chamou muito à atenção

esta relação, principalmente nas Instituições de Educação Infantil. Essa chamada

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de atenção se deve ao fato de compreendermos que, uma relação participativa entre

a família e a escola é fundamental para o sucesso da grande responsabilidade

formativa que estas duas instituições possuem no seio da nossa sociedade.

Nos reportamos de forma mais específica a esta relação nas instituições de

Educação Infantil, exatamente pela faixa etária das crianças que freqüentam estas

instituições – 0 a 6 anos, ser apontada pela grande maioria dos estudiosos da

psicologia, antropologia, educação e outras ciências, como a mais propícia para a

aprendizagem e o desenvolvimento humano.

Assim sendo, desde que ingressamos na especialização do Programa de Pós

Graduação em Educação - PPGEd da UFRN, em 1999, e no mestrado desta mesma

Instituição em 2002, tivemos a preocupação de aprofundar os estudos nesta área.

Para tanto, realizamos duas pesquisas de campo, sendo a primeira numa creche,

vinculada a Secretaria Municipal de Trabalho e Ação Social (SEMTAS), e a segunda,

num Centro Municipal de Educação Pré-escolar, vinculado a SME.

Essas duas pesquisas contribuíram muito para aumentar a nossa curiosidade

científica em torno da relação família e Instituição de Educação Infantil, apontando o

quanto ela ainda precisa ser discutida e estudada. Outra grande contribuição, foi no

sentido de nos fazer perceber que esta relação pode acontecer de várias formas,

nas diferentes instituições, de acordo com as propostas e o nível de entendimento

das pessoas que formam as mesmas, como também a partir das compreensões e

necessidades das famílias envolvidas no processo.

Conscientes das diversas possibilidades e formas sobre as quais esta relação

família e I.E.I. pode acontecer, já no nosso projeto de tese, elaborado para a

tentativa de ingresso no nível de doutorado da Pós-graduação em Educação, nós

identificamos duas situações, ou dois níveis dessa relação, encontrados nas I.E.I.

nas quais já atuamos. Apontamos também uma terceira situação, ou nível que,

embora ainda não tenhamos encontrado na prática das Instituições que

conhecemos, entendemos como sendo uma outra possibilidade viável para esta

relação, objetivando que a instituição de Educação Infantil e a família, possam

compartilhar as ações de cuidado e educação, indispensáveis a criança dessa faixa

etária, através de um trabalho formativo com essas famílias que precisa ser

desenvolvido pelas instituições educativas.

A primeira situação, ou o primeiro nível que identificamos, é o daquelas

instituições que mantém uma relação com a família dos alunos, pautada, mesmo

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que de forma inconsciente, na necessidade de preservação do espaço físico da

instituição. Ou seja, os familiares, sob solicitação da direção ou coordenação da

Instituição, e por não terem outro lugar para deixar as suas crianças, prestam

serviços gratuitos, como marceneiros, encanadores, eletricistas, pedreiros e etc,

para que seus filhos possam freqüentar estes espaços, que, na maioria das vezes,

carecem de recursos e manutenção por parte dos órgãos públicos.

Uma segunda situação, ou nível, por nós identificado, é o daquelas

instituições que conseguem manter uma relação de cordialidade, interação e troca

com as famílias dos alunos, no sentido de conhecer quem é este aluno, as situações

vivenciadas por ele na família, de escutar os anseios dos pais, de discutir alguns

aspectos dos processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, enfim,

uma relação recíproca de respeito, aceitação e diálogo, embora esse diálogo e

essas discussões não sejam sistematizadas em torno de um objetivo claramente

definido e que tenha relação com as ações de cuidado e educação que devem

permear o trabalho realizado com a criança pequena.

E a terceira situação ou nível, este, como já dissemos, ainda no campo das

nossas conjecturas e nas propostas e experiências de autores como Marques

(1999); Bassedas; Huguet e Solé (1999); Bhering e Blatchford (1999), dentre outros,

seria um nível de relação mais profunda, orientada por um trabalho dirigido,

sistemático, onde as instituições educativas trariam para si a função de organizar

junto ás famílias, a discussão de conhecimentos, valores, crenças, expectativas, em

torno das necessidades de cuidado e educação que as crianças da Educação

Infantil precisam, para que pudesse haver um compartilhamento real e efetivo do

trabalho destas duas grandes instâncias formativas junto à criança, buscando

atender o que propõe a própria Lei de Diretrizes e Bases - LDB:

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até os 6 anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (BRASIL,1996)

É importante frisar que, embora consideremos esta terceira situação como

uma proposta bastante interessante e produtiva, no sentido das contribuições

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26

positivas que pode trazer para os processos de cuidado e educação das crianças,

não podemos deixar de considerar a relevância das outras duas situações

apresentadas – e a de tantas outras que permeiam a realidade das diversas

instituições do País, pelo fato de sabermos que cada instituição, cada criança, cada

infância e cada família, possuem as suas peculiaridades que, com certeza, acabam

influenciando e até mesmo definindo, o tipo de relação possível, num determinado

momento e numa determinada realidade.

O mais importante é que esta relação exista; tanto a família, quanto a

Instituição de Educação Infantil reconheçam a relevância da mesma e busquem

caminhos para realizá-la e vivenciá-la de forma que haja benefícios para todos os

envolvidos, principalmente as crianças, que devem ser o motivo maior e principal do

estabelecimento da mesma, até porque:

É preciso realçar aqui que o envolvimento dos pais com a escola e a educação escolar é um processo (projeto) que se desenvolve á medida que as necessidades vão sendo identificadas e as pessoas envolvidas vão se aproximando e se conhecendo mais. Este processo-projeto tem, basicamente, um caráter flexível e móvel. Anda sempre em direção à necessidade de todas as partes envolvidas, e, principalmente, em favor das crianças (BHERING & BLATCHFORD, 1999, p. 204)

Partindo dessas questões inicialmente elencadas, bem como de outras que

serão apresentadas e explicitadas ao longo dessa tese, foi que nos propomos a

construir este trabalho com o objetivo de, como já anunciamos anteriormente,

através dos postulados da pesquisa-ação, descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil.

O problema que nos propomos, a partir do objetivo apresentado é: é possível que juntos – direção, equipe técnica-pedagógica, professoras e funcionários, construam, no contexto de surgimento de uma I.E.I., uma relação com as famílias, objetivando o compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças?

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Embora considerando que no capítulo 3 vamos nos deter, de forma mais

detalhada, numa reflexão sobre a história das funções da Educação Infantil e sobre

esta função na atualidade, entendemos pertinente, neste momento, dizer, mesmo

que de forma sintética, o que compreendemos como educar e cuidar.

Em primeiro lugar, compreendemos que são duas ações indissociáveis:

ninguém educa sem cuidar, nem cuida sem educar, embora didaticamente, até para

facilitar mais a compreensão, se costume dizer que as ações de cuidar estejam mais

relacionadas à preocupação com o bem estar físico: sono, alimentação, higiene;

bem como com a organização de espaços, tempos e materiais a serem usados

pelas crianças, porém sem esquecer de considerar os outros aspectos do

desenvolvimento infantil: emocional, psicológico, motor, social...

Já as ações de educar, devem estar mais voltadas para a ampliação do

conhecimento de mundo dessas crianças, sem esquecer de tomar o conhecimento

prévio delas como ponto de partida, valorizando o universo cultural das mesmas e

colocando estas culturas e os conhecimentos que elas possibilitam, bem como

aqueles que são construídos e reconstruídos nas interações vivenciadas no

cotidiano da instituição infantil, como campo central do currículo a ser trabalhado

nessas instituições.

Realizadas estas considerações iniciais sobre educar e cuidar, vamos

retomar a nossa fala sobre a temática em estudo. Como já dissemos no início dessa

introdução, estamos retomando um tema que já foi nosso objeto de estudo em

outros momentos e sobre o qual já realizamos duas pesquisas de campo e

produzimos dois documentos acadêmicos – uma monografia e uma dissertação,

além de alguns outros artigos e estudos.

Com base nos trabalhos e estudos já realizados, se podemos dizer que existe

um consenso hoje em torno da relação da família com a escola, é o fato da quase

unanimidade das pessoas potencialmente envolvidas nesta relação – famílias,

professores, funcionários; compreenderem e ressaltarem a relevância da mesma

para um bom encaminhamento e andamento do processo formativo das novas

gerações, embora haja, ainda, muitos desencontros e paradoxos na

operacionalização dessas relações.

Os depoimentos abaixo são fragmentos das entrevistas realizadas com

professoras e familiares de alunos da creche e da pré-escola municipal nas quais

realizamos a pesquisa para elaboração da nossa monografia e da nossa

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dissertação, para a conclusão da especialização e do mestrado no PPGEd da

UFRN:

É importante a participação dos pais, eles precisam estar cientes do que estão fazendo na Creche com os filhos deles. Da rotina, eles precisam participar ativamente de tudo o que acontece. Precisam ter consciência das fases do desenvolvimento da criança, para poderem entender melhor o filho. ( coordenadora de creche)

É importante (a participação dos pais), porque o trabalho do pai é educar e da professora também, então é importante que eles venham na Escola para colaborar também com a professora. ( prof.ª de creche)

Eu acho importante (a participação dos pais). Primeiro porque é bom eles saberem como a gente trabalha, como os filhos passam o dia, e também porque as crianças só tem 3 ou 4 anos e é bom os pais dizerem as coisas ao professor, conversarem. ( prof.ª de creche)

A participação dos pais ajuda. As crianças que os pais participam são mais afetivas. Tem uma mãe na minha sala que é super-mãe, participa muito. Quando a gente pede alguma coisa 90% colabora, ( profª de creche)

É importante demais. A participação deles (os pais) é muito importante porque ajuda os monitores.( funcionária de creche)

Eu acho importante (a participação dos pais) para saber o que os filhos precisam, para ter cuidado com eles. (funcionária de creche)

Acho importante (a participação dos pais), porque vai participando, vai ficando por dentro, vai vendo o desenvolvimento do filho na Creche, a participação dele. ( mãe de aluno de creche)

Acho importante a minha participação na creche, porque eu acompanho como ele vai crescendo, se desenvolvendo. ( mãe de aluno de creche)

Eu acho que tem que haver cooperação da família com a escola, porque é aquela coisa: eu tô ali, olhando o dever dele, se ele fez direitinho. E no colégio também tem que ser assim: a professora ensinar direitinho, olhar o dever de casa, saber se a mãe ajudou no dever, essas coisas .(mãe de aluno da pré-escola)

A família com a escola... eu acho importante. É bom a mãe saber o que se passa na escola, e a escola saber o que se passa em casa, né? ( mãe de aluno da pré-escola)

Todos os pais tem que ter um relacionamento com a escola, não precisa ele vir só na escola quando for chamado não, pra festa ou pra reunião. Pelo menos

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dois dia na semana é importante ele freqüentar a escola, perguntar como vai o seu filho, como o filho ta se comportando na escola, conversar com a direção, as professora, é importante sempre ele vir. ( mãe de aluno da pré-escola)

A relação família e escola é fundamental, porque é um elo importante nos primeiros anos da vida das crianças, pois a pré-escola é a base de tudo. ( profª da pré-escola)

Pelo fato do dia-a-dia da criança ser em casa precisamos nos unir a família. Para promover a unidade do trabalho ( profª da pré-escola)

Além desses atores contemporâneos acima citados, grandes estudiosos da

educação, já desde o final do século XVII, consideravam e se referiam à relevância

da família no processo educativo do indivíduo, e/ou recomendavam uma boa relação

entre estas duas instituições – escola e família, responsáveis pela educação das

novas gerações:

Que o primeiro cuidado dos filhos incumbe aos pais, poderia parecer inútil recordá-lo, uma vez que a todos os seres vivos foi concedido pelo sapientíssimo Criador, o amor pela prole, de modo que mesmo a maior parte dos animais brutos consagra a sua própria vida às suas crias (COMÊNIO, 1971, p. 200)

Em suma, importa admitir que é naturalíssimo que os filhos tenham como primeiros educadores aqueles que tiveram como pais, e que aqueles que foram autores da sua vida sejam também para eles autores de uma vida honesta, santa e feliz. No entanto, porque nem todos os pais, embora o desejem, podem, devido às suas ocupações, dispor de tempo para a educação dos filhos, contratam, à custa de pedidos e dinheiro, pedagogos e preceptores, como auxiliares da educação (COMÊNIO, 1971, p. 202) Há ofícios tão nobres que ninguém pode fazê-los por dinheiro sem se mostrar digno de fazê-los; é o caso do soldado, e também o do preceptor. Quem, então, educará meu filho? Eu já disse: tu mesmo. Não posso. Não podeis?... Arruma um amigo. Não vejo outra saída. ( ROUSSEAU, 1999, p. 26) Coadjuvemos metodicamente a acção da escola infantil, organizando em casa a vida activa dos nossos filhos. Na medida do possível, deixemos-lhes um espaço reservado; demos-lhes utensílios e materiais para os seus jogos e trabalhos; arranjemos-lhes um horário ao qual nós próprios devemos nos submeter. (FREINET, 1974, p. 80)

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Compreendendo bastante justificada e referendada a relevância da temática,

por nós tão insistentemente estudada e retomada, vamos agora apresentar algumas

das principais idéias e concepções que nortearam o estudo da mesma:

II - Apresentando idéias e concepções.

Partindo do objeto e do objetivo proposto, bem como considerando todo o

contexto de implantação e sistematização do Centro Infantil no qual realizamos o

nosso trabalho, entendemos pertinente, ainda nessa introdução, apresentarmos

algumas concepções que, direta ou indiretamente, subsidiaram teoricamente a

realização da nossa proposta, dentre as quais vamos privilegiar as seguintes:

Figura 2 – Referenciais Norteadores

Além das concepções apresentadas acima, as concepções de criança e

infância, dentre algumas outras, também são muito importantes para o nosso

trabalho. Porém, até mesmo para poder aprofundá-las mais, optamos por discutir as

mesmas no capítulo 3. Dessa forma, iniciaremos o nosso diálogo agora refletindo

sobre a conjuntura social-econômica-histórica-cultural-política-ideológica que nos

rodeia, buscando situar e refletir sobre a mesma, a partir da seguinte afirmação:

Embora a incerteza faça parte intrínseca do mundo que vivemos, embora seja parte do presente, há sociedades e povos inteiros que não estão preparados para enfrentá-la. Não há nada seguro sob o

Currículo

Família

Conjuntura Atual

Instituição De Ed. Inf.

Desenvol-vimento Inf.

Educação

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sol: encontramo-nos diante de uma nova forma de ver o tempo, o poder, o trabalho, a comunicação, a relação entre as pessoas, a informação, as instituições, a velhice, a solidariedade (IMBERNÓN, 2000, P.19)

Na realidade, sabemos que, uma nova forma de ver o tempo, faz parte das

mudanças sociais, dos chamados novos tempos que vão surgindo, porém, a grande

maioria - tanto das instituições, quanto das pessoas na atualidade, não estão

preparadas para as mudanças e as transformações, e acabam não percebendo que,

até mesmo pelas conquistas da tecnologia, essas novas formas de visão vão

mudando rapidamente, embora dentro de um grande paradoxo, que é o fato dessas

novas tecnologias não serem acessíveis a todos, muito pelo contrário – é uma

minoria de privilegiados que se beneficiam das mesmas, enquanto a grande maioria

não tem acesso nem a chamada satisfação das suas necessidades básicas –

alimentação, moradia, saúde.

Ou seja, vivemos em um momento da nossa história em que a desigualdade

social, econômica, cultural, política; paralela a rapidez das mudanças – inclusive dos

valores e das tradições, e o incentivo ao consumismo, paradoxalmente, parece ser o

ponto de convergência, o lugar comum, a forma mais adequada de caracterizar a

sociedade contemporânea.

Embora seja importante frisar também que, no meio dessa situação eclodem

as contradições próprias dos momentos de transição, que já apontam, conforme nos

elucida BOFF (2003), para a necessidade de uma ética do cuidado, voltada para a

compaixão e a solidariedade, como forma de preservação da própria vida no

planeta.

Sintetizando, podemos dizer que vivemos um momento de transição, onde o

grande e rápido crescimento das tecnologias, precisa ser ancorado em bases éticas

e morais sólidas, para que a exclusão social, possa dar lugar a uma solidariedade

capaz de propiciar a continuidade da vida no planeta terra. São essas questões e

necessidades de mudança, muitas vezes imperceptíveis pela grande maioria das

pessoas, que precisam ser elucidadas.

E a educação, que lugar ocupa nessa sociedade contemporânea,

informacional, globalizada, desigual e consumista? E que contribuições pode

oferecer no sentido de modificar esta realidade?

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A educação, representada pelas instituições escolares, continua sendo

protagonista do seguinte embate: “um dos debates mais insistentes e repetidos em

torno da instituição escolar sempre foi a questão de evidenciar se o seu papel era

“reprodutor” ou “transformador”, isto é, se contribuía para conservar a sociedade, ou

para mudá-la” (ENGUITA, 2004, p.13)

Compreendendo a educação como uma práxis social multifacetada, e tendo

clareza de que, conforme nos aponta o autor acima citado, ela é reprodutora, na

medida em que nenhuma sociedade poderia subsistir sem formar seus membros em

certos valores, habilidades, etc., mas, ao mesmo tempo, é transformadora,

considerando que nenhuma sociedade atual seria, sem a escola, o mesmo que

chegou a ser com ela, é que nos propomos a investir nesse caráter transformador da

educação escolar, buscando aliá-lo também as possibilidades educativas da família,

como uma forma de não nos distanciarmos da seguinte assertiva: “Educar é a mais

avançada tarefa social emancipatória”. (ASSMANN, 2007, p. 26)

Porém, para que a educação promova realmente a emancipação da

sociedade, é preciso que se perceba a profundidade e complexidade da mesma, ou

seja, seu caráter multifacetado, fazendo um investimento planejado e mais amplo no

âmbito social, econômico, político, ético, moral, e também um investimento que

podemos denominar de pedagógico, não apenas no âmbito do conhecer, mas nos

vários aspectos que constituem a totalidade do ser humano, pois, na realidade: “A

sociedade informacional requer uma educação intercultural quanto aos

conhecimentos e aos valores, assim como a vontade de corrigir a desigualdade das

situações e das oportunidades. ” (FLEXA & TORTAJADA, 2000, p. 27), e é por essa

educação que precisamos trabalhar, tendo clareza de que:

A educação tem um papel por si mesma no desenvolvimento das pessoas, em seu enriquecimento cultural e no progresso de seus conhecimentos. A educação deve contribuir também para a igualdade de oportunidades de todos os alunos, procurando compensar as desigualdades de origem social. No desenvolvimento desses objetivos, a educação influi na orientação das mudanças sociais e econômicas (MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.13).

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Nesse sentido, uma contribuição que consideramos importante de ser

valorizada, é a proposta dos quatro pilares da educação (DELORS, 2003): aprender

a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver.

Compreendemos que a consideração e valorização dessa visão mais

abrangente de educação, onde o educando é visto na sua totalidade e unicidade,

sendo incentivado não apenas a conhecer, mas a agir concretamente sobre o meio

que o circunda, num processo de interação e cooperação com o outro, a partir de

uma construção de valores e crenças interiores, é fundamental, tanto para a

proposta que nos propomos a vivenciar, como para o redimensionamento da

educação de forma geral, trazendo mudanças positivas para o próprio contexto

social vigente.

É preciso, portanto, que a educação cumpra esse papel emancipatório,

contribuindo para que essa conjuntura de incertezas, mudanças e transição, possa

dar lugar a uma conjuntura mais ética, mais humana, menos excludente.

Nesse sentido, colaborando e complementando, as proposições dos autores

acima citados, nós compreendemos que a seguinte afirmativa:

Ganha força, hoje em dia, o pressuposto de que a educação não pode mais ficar limitada aos muros escolares, mas deve se estender ao bairro e à comunidade aos quais atende, incluindo as relações com as famílias dos estudantes e as demais pessoas que convivem no entorno. Sem abrir mão de suas especificidades como instituição responsável pela educação entende-se que a escola deva estar em contato direto com seu entorno e com aqueles que ali vivem, de forma que a comunidade participe, dentro de suas condições e responsabilidades, dos processos educativos. Isso ajudará na construção desse ambiente ético de que estamos falando. (ARAÚJO, 2007,p.56)

é uma das propostas viáveis de operacionalização de uma primeira mudança

positiva, em prol de uma educação emancipatória. Acreditamos que a experiência

descrita nesse trabalho, aponta as possibilidades de implantação dessa proposta.

Assim sendo, nos perguntamos: e a família, que posição ocupa nesse atual

contexto, e que possibilidades apresenta para contribuir com as mudanças acima

propostas?

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A família, principalmente após os estudos de Marx (1818 - 1883) e Engels

(1820 - 1895), quando passou a ser compreendida como uma construção sócio-

histórica, vivencia também todo esse contexto de incertezas e mudanças, embora

continue a ser reconhecida como “o grande fundamento da sociabilidade humana”

(MORAES, 2001, p.17), sendo também universalmente reconhecida:

Todas as sociedades reconhecem a existência de certas unidades cooperativas, intimamente entrelaçadas e internamente organizadas, que ocupam lugar intermediário entre o indivíduo e a sociedade total de que ele faz parte. ( LINTON, 1976, p.165)

Ou seja, mesmo que com estruturas diferentes e variadas, a família é uma

instituição que faz parte da vida do indivíduo desde tempos imemoriais, o que, por si

só, já aponta a relevância dessa instituição para os seus integrantes, e para a

sociedade de um modo geral.

Outro ponto fundamental a ser considerado quando nos reportamos a família,

é o fato da sua estrutura se modificar a partir do contexto social, econômico e

político, bem como dos valores de cada época e de cada sociedade, sem deixar de

considerar que, em uma mesma época, numa mesma sociedade, no seio das várias

classes sociais, podemos encontrar também estruturas familiares variadas, embora

sempre exista uma estrutura predominante em cada momento histórico.

Todas essas contingências e variáveis, nos levam a concordar que:

O termo família, do ponto de vista científico, é extremamente difícil de definir, particularmente nos tempos pós-modernos. A idéia de pós-modernidade, caracterizada pelo rompimento com visões universalistas e pela busca da descentralização de modelos predeterminados (Vaitsman, 1994), tem caracterizado a ciência de modo geral , e, consequentemente, a psicologia da família. Essa idéia teve implicações importantes para o conceito e a caracterização de família, em diferentes enfoques disciplinares. (DESSEN & COSTA JUNIOR , 2005, p.116)

Dessa forma, é importante registrar que o que estamos compreendendo como

família no trabalho que nos propomos a realizar, são aqueles agrupamentos de

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pessoas que, independente de estrutura ou de vínculos consangüíneos, vivem e

convivem num mesmo ambiente doméstico, interagem e se relacionam entre si –

enquanto adultos, e com as crianças pelas quais são responsáveis, direta ou

indiretamente; num processo constante e permanente de influência mútua, que faz

da família a primeira instituição responsável, tanto pela sobrevivência, como pela

formação da personalidade e dos valores que o indivíduo começa a construir nas

suas interações iniciais com o contexto no qual está inserido, e com as pessoas que

o rodeiam.

Outro ponto fundamental a ser considerado em relação à família é que, tenha

ela a estrutura que tiver, a mesma possui um papel fundamental na formação do

indivíduo, papel esse que é diferente do exercido pela instituição de Educação

Infantil, embora o trabalho de uma, deva complementar o trabalho da outra.

Porém, para que esse trabalho de complementaridade de ações aconteça,

além dessas mudanças propostas acima para á educação, é preciso que as famílias

se reinventem, pois essa reinvenção “[...] se trata de um processo necessário para

transformar quase toda família ‘tradicional’ em uma família capaz de lidar com as

condições da pós-modernidade e até de florescer nelas.” (MARSHALL & ZOHAR

2006, p. 358)

Segundo ainda esses mesmos autores, principalmente dois níveis da vida

familiar, que embora diferentes, estão relacionados, precisam ser reinventados:

inicialmente a questão do significado da família, que passa pela questão dos

fundamentos morais e espirituais, tanto do relacionamento íntimo do casal, quanto

das relações entre estes e os filhos. Depois o problema da estrutura da família, que

é a questão de como ela se organiza para enfrentar os desafios cotidianos da

cooperação, do compromisso, do poder e da autoridade entre os seus membros.

Ou seja, é preciso que se repense as relações dentro e entre as famílias,

buscando um ponto de convergência, um ponto de união, de encontro, que leve

cada um dos seus membros a deixar as posturas mais narcisistas em prol de

posturas mais coletivas, mais abrangentes, mais éticas e mais humanas,

entendendo as suas próprias famílias como parte integrante de uma rede maior de

relações, capaz de influenciar e transformar as relações do seu entorno e de toda

uma coletividade.

Considerando que Marshall e Zohar (2006) apontam ainda que muitas vezes

as famílias atuais, a partir das transformações pelas quais vem passando, se

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encontram vinculadas socialmente apenas pela escola dos filhos e por alguns

poucos amigos, compreendemos que a instituição escolar, mesmo sem perder de

vista a sua grande responsabilidade com a construção do conhecimento junto às

novas gerações, precisa colaborar também com as famílias, incentivando o

compartilhamento de ações educativas, a partir de uma proposta de diálogo e

interação com as mesmas.

No tocante as Instituições de Educação Infantil, sabemos que as mesmas

surgiram depois das escolas destinadas às crianças maiores de 7 anos –

aproximadamente no século XVIII, a partir da revolução industrial, como

conseqüência do ingresso da mulher no mercado de trabalho, do surgimento de uma

nova estrutura familiar: a conjugal ou nuclear, composta por pai, mãe e filhos; como

também das idéias de especialistas que passaram a estudar mais as crianças,

embora a grande maioria defendesse a idéia de que as crianças precisavam dessas

instituições – principalmente as das classes menos favorecidas, para vencer as más

inclinações que lhes eram atribuídas, mais notadamente a preguiça e a

vagabundagem, conforme nos afirma Bujes (2001).

Como podemos perceber, estas instituições já nascem entrelaçadas a

instituição família, considerando que as mudanças que ocorreram na estrutura

familiar nesse período, favoreceram o surgimento das instituições infantis, sendo

determinantes até para as funções assumidas pelas mesmas que, neste momento

inicial, era de guardar/cuidar das crianças cujas mães trabalhavam fora de casa,

sendo muito mais um direito dessas mães trabalhadoras, do que das próprias

crianças.

E hoje, no Brasil, como está a Educação Infantil, cujo atendimento surgiu no

contexto acima apresentado?

No Brasil, é impossível negar que a Educação Infantil obteve várias

conquistas, principalmente no âmbito da legislação. A constituição de 1988,

colocando a Educação Infantil como direito da criança e dever do Estado; o Estatuto

da Criança e do Adolescente - ECA, sistematizando e legislando sobre aspectos

específicos dos direitos das crianças e dos adolescentes; a LDB 9394/96, alçando a

Educação Infantil à condição de primeira etapa da Educação Básica, além do próprio

crescimento do número de vagas nesta modalidade de ensino nos últimos 30 anos,

conforme aponta Didonet (2002), são algumas dessas conquistas, que, mesmo não

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37

tendo sido ainda aplicadas na prática em sua totalidade, e apresentando até

algumas contradições, não podem deixar de ser comemoradas.

Por contradições estamos entendendo o fato de, por exemplo, apesar de,

desde 1988, a Educação Infantil ser dever do estado, o mesmo não ser intimado

legalmente a matricular toda a demanda existente. O fato também de, mesmo

considerada como primeira etapa da Educação Básica, a Educação Infantil não ter

sido incluída no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e

de Valorização do Magistério - FUNDEF – fundo proposto pelo governo federal que

beneficiou, como o próprio nome já aponta, apenas o Ensino Fundamental. Outro

fato contraditório é que, enquanto quase 90% das crianças das classes mais

favorecidas da sociedade, freqüentam uma instituição pré-escolar privada, menos de

50% das crianças das classes populares, tem acesso a uma instituição pública de

Educação Infantil, por ausência de vagas nas mesmas, conforme aponta Didonet

(2002).

No tocante a função proposta para a Educação Infantil na atualidade, também

percebemos que aconteceram muitos avanços, deixando-se aquela postura mais

guardiã e assistencialista, e propondo-se uma Educação Infantil que tenha a função

de cuidar e educar, compreendendo estes dois aspectos como indissociáveis e

complementares no dia-a-dia da instituição infantil.

A própria literatura na área da Educação Infantil avançou muito na discussão

sobre os aspectos pedagógicos dessa modalidade de ensino. Até aproximadamente

o final da década de 80, a maioria dos autores escrevia para externar a importância

da Educação para a primeira infância, numa tentativa de sensibilizar, principalmente

os gestores e legisladores públicos, para a preocupação e o atendimento a essa

demanda.

Já na década de 90, as preocupações se voltam para os aspectos

pedagógicos, as especificidades do trabalho com a criança nas instituições de

Educação Infantil. Este também é um grande avanço que precisamos registrar e

comemorar. Porém é inegável que muitas questões ainda precisam sair do papel,

para se consolidarem no cotidiano, principalmente das crianças das classes

populares e dos seus familiares.

Acreditamos que o atual Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da

Educação Básica - FUNDEB, que entrou em vigor a partir de março de 2007,

objetivando financiar e garantir toda a Educação Básica, e portanto, também, a

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Educação Infantil, trará grandes benefícios para esta modalidade de ensino, na

medida em que garantirá o financiamento da mesma, originando recursos para o

investimento dos municípios.

Porém, sabemos que além dos recursos a serem investidos em construção,

equipamentos e manutenção das instituições de Educação Infantil, é necessário e

imperioso, um investimento também na formação dos profissionais que irão trabalhar

com as crianças, tanto formação inicial com caráter específico, quanto formação

continuada e em serviço, para que as especificidades das crianças e das funções de

cuidar e educar as mesmas, sejam conhecidas, debatidas e trabalhadas no cotidiano

das instituições infantis, na busca de promover o desenvolvimento integral das

crianças, complementando a ação da família e da comunidade, conforme preconiza

a LDB 9394/96, ou seja, é preciso que se saiba que:

Falar em professor de educação infantil é diferente de falar em professor de séries iniciais e isso precisa ser explicitado para que as especificidades do trabalho dos professores junto às crianças de 0 a 6 anos em instituições educativas sejam respeitadas. (CERISARA, 2002,p.113)

Outro aspecto que também merece ser considerado, além desse maior

investimento na formação dos professores da Educação Infantil, é um investimento

na melhoria salarial e nas condições de trabalho desses profissionais, o que vai

contribuir, com certeza, para a valorização social da profissão, aumentando a auto-

estima dos professores e, consequentemente, melhorando também a qualidade do

trabalho realizado com as crianças.

Por fim, retomando a questão principal que norteia o nosso trabalho - e a

relação família e Instituição de Educação Infantil, como acontece na

contemporaneidade?

Com base tanto nos estudos, artigos e pesquisas divulgados, quanto na

nossa própria experiência de pesquisadora da temática e de formadora de

professoras dessa modalidade de ensino, podemos afirmar que, infelizmente, essa

relação não anda muito bem, com várias queixas de ambas as partes: a instituição

reclama que os pais não comparecem, não se interessam pela vida escolar dos

filhos e querem delegar a escola responsabilidades e funções que seriam

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específicas da família; a família por sua vez, reclama que a escola não cumpre seu

papel, não ensina, não educa, e só busca a família para fazer reclamações relativas

a procedimentos e desempenhos negativos dos seus filhos.

Embora esta seja basicamente a tônica da relação família e instituições

educativas na atualidade – fruto, obviamente, de todas as transformações pelas

quais estas instituições vem passando, é inegável que nas contradições próprias da

dialética dos momentos de transição, já existe também uma preocupação, por parte

de algumas pessoas que formam estas instituições – tanto a família, como a escola,

no sentido de procurar caminhos para mudar esta realidade, por já compreenderem,

como nós, que estas duas instituições formativas da nossa sociedade, precisam ter

funções complementares para darem conta da responsabilidade educativa que

possuem.

Responsabilidade educativa esta que, a nosso ver, precisa ser cada vez mais

compartilhada, considerando que, com a descrença em relação ás teses

exclusivistas e reducionistas, tanto do inatismo, quanto do behaviorismo, sabemos

hoje que o desenvolvimento humano se dá num contexto, numa perspectiva de

interação, influenciado por inúmeros determinantes e podendo se orientar em

múltiplas direções, mas principalmente, a partir das relações iniciais que acontecem

no seu contexto social mais intimo, pois:

Desde os primeiros dias de desenvolvimento da criança, suas atividades adquirem um significado próprio num sistema de comportamento social e, sendo dirigidas a objetivos definidos, são refratadas através do prisma do ambiente da criança. O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é produto de um processo profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. ( VIGOTSKI, 1999, p.40)

Partindo então desses pressupostos interacionistas sobre o desenvolvimento

infantil, percebe-se a necessidade de uma ampla conexão interativa entre os adultos

que compõem esse seu ambiente, constituintes da história social que rodeia a

criança, e, portanto, também da sua história individual, considerando as inter-

relações entre ambas, o que aponta também para a implementação de um currículo

que seja criado a partir do que é produzido na interação educacional, e não em

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conhecimentos preexistentes, conforme nos aponta Bujes (In: CRAIDY;

KAERCHER, 2001), currículo este, capaz de impulsionar as I.E.I a uma relação

cada vez mais próxima com a cultura dos seus integrantes e, portanto, buscando

compartilhar com a comunidade e as famílias, ações de cuidado e educação das

crianças.

Essas são algumas das principais concepções e questões que envolvem a

nossa compreensão sobre a temática, e que nortearam também a experiência aqui

descrita.

Com o objetivo de tornar a descrição dessa experiência mais clara e objetiva,

incentivando os que se dispuserem a conhecê-la através da leitura dessa tese, e

tendo clareza também de que o conhecimento não é linear, conforme aponta

Elias(2000), compreendemos que esse nosso trabalho se assemelha a uma longa

viagem, onde os caminhos não estão previamente traçados - Caminhante, são teus rastos o caminho, e nada mais; caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar - precisando ser abertos a partir da certeza do lugar onde se quer chegar

– considerando a decisão coletiva de todos os viajantes; e utilizando como

parâmetro, também, as experiências adquiridas em outras viagens. Dessa forma,

dividimos a mesma, a partir de agora, em cinco capítulos assim intitulados e

organizados:

No capítulo 1, intitulado Revisitando caminhos já percorridos em busca de novas paisagens, retomamos algumas considerações em torno de experiências

anteriores com a mesma temática – monografia e dissertação, buscando, através

dessas experiências construídas em viagens anteriores, estabelecer relações que

nos possibilitem elencar alguns pontos de partida para os caminhos que nos

propomos a construir nesse momento.

No capítulo 2, intitulado Construindo diretrizes para novos caminhos,

caracterizamos os outros viajantes que se aventuraram conosco em busca de novos

caminhos, bem como os instrumentos e possibilidades de que nos utilizamos –

procedimentos e instrumentos metodológicos, para a vivência dessa empreitada,

explicitando os detalhes da mesma.

No capítulo 3, intitulado Buscando caminhos do passado, para construir o futuro, enveredamos por caminhos já trilhados e percorridos por viajantes que nos

antecederam – história da criança, da infância, das I.E.I., e das famílias, buscando

no passado, elementos para compreender o presente e vislumbrar o futuro.

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No capítulo 4, cujo título é Apresentando caminhos trilhados, mostramos a

trajetória inicial da nossa viagem, bem como os caminhos que foram possíveis de

serem trilhados com cada um dos segmentos de viajantes que conosco interagiram

– professoras, funcionários, crianças e famílias.

No capítulo 5, intitulado Descrevendo e refletindo sobre os caminhos percorridos, descrevemos pormenores das construções de alguns caminhos,

analisando-os, a partir da ótica dos viajantes mais diretamente envolvidos – as

famílias.

Finalmente, a guisa de considerações finais, vamos buscar algumas sínteses,

mesmo tendo clareza de que serão provisórias, que possam retratar a situação

vivida, e os caminhos descobertos e trilhados, com seus desafios e possibilidades.

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CAPÍTULO 1

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1. REVISITANDO CAMINHOS JÁ PERCORRIDOS, EM BUSCA DE NOVAS PAISAGENS

A educação não é um destino, mas uma construção social.

Antônio Nóvoa.

Neste capítulo, vamos voltar ao início da nossa história com este tema –

monografia e dissertação, para que, através da retomada dos objetivos e de

algumas considerações acerca desses dois trabalhos, possamos refazer a nossa

trajetória com a temática em questão, buscando elementos que nos ajudem na

construção/sistematização da experiência que nos propomos a vivenciar agora,

cientes de que educar-se e educar, são construções sociais que existem e se

renovam constantemente.

1.1 – Refletindo sobre a monografia

Na nossa monografia, realizada como já explicitamos numa creche vinculada

a Secretaria Municipal do Trabalho e Ação Social - SEMTAS, o nosso objetivo foi

Identificar a possibilidade de existir uma relação entre família e Instituição de Educação Infantil, em prol do desenvolvimento da criança. Foi uma pesquisa de

natureza exploratória, onde através de observações assistemáticas e entrevistas

semi-estruturadas com coordenadora, professoras, funcionários e famílias, nós

procuramos atingir o objetivo proposto.

Foi um trabalho muito produtivo na medida em que nos possibilitou perceber o

enorme campo de investigação que se abria a nossa frente sobre a temática, bem

como a relevância da mesma para todos os envolvidos na desafiante tarefa de

formar as crianças da Educação Infantil. Esta relevância pode ser observada

através de alguns depoimentos de professores, funcionários e famílias da creche

campo do nosso estágio, apresentadas na introdução deste trabalho.

Nossas observações, e as análises das entrevistas com os sujeitos da

pesquisa nos indicaram que, embora todos os envolvidos pontuem e reconheçam a

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relevância de uma parceria entre a família e a I.E.I, como importantes para o

trabalho educativo que precisam realizar com a criança, cada um coloca essa

parceria e essa participação, a partir do seu próprio ponto de vista:

Participam. Alguns pais, quando chegam mais cedo, ajudam na cozinha, nas salas-de-aula, trazem material que a Creche necessita para doação, outros participam na manutenção hidráulica e elétrica, nos serviços gerais e outras coisas que precisa. ( coordenadora da creche)

Os meninos que dão mais trabalho são os que os pais vem menos, os que os pais participam mais, são menos trabalhosos. Era bom que todos os pais viessem, para saber o que a creche faz com os filhos. ( Professora da creche)

Eles (os pais, no sentido masculino do termo) não participam não, quem participa são as mães, elas participam, elas colaboram nas brincadeiras, nas festas.( funcionária da creche)

Acho muito boa ( a creche). Nestes três anos foi o que ajudou bastante a gente. Não tenho família perto e não tinha com quem deixar o menino. ( mãe de aluno da creche)

Eu sempre ajudo, coloco fechaduras nas portas, tudo que a coordenadora pede eu faço. ( pai de aluno da creche)

Na época em que fizemos a análise das respostas da coordenadora, dos

professores, funcionários e pais à entrevista realizada na creche, com o objetivo de,

como já dissemos, “Identificar a possibilidade de existir uma relação entre família e

Instituição de Educação Infantil, em prol do desenvolvimento da criança”, as

considerações a que conseguimos chegar foram as seguintes:

Um primeiro fato que nos animou muito nos dados coletados, foi a

comprovação de que todos os professores, funcionários e pais entrevistados

entendem que a participação dos pais é fundamental naquela instituição de

Educação Infantil. Outro fato relevante é que todos os entrevistados também

colocaram que realmente os pais das crianças dessa instituição participam do dia-a-

dia da mesma, embora cada um coloque essa participação como sendo mais efetiva

no âmbito específico no qual trabalha, ou pelo qual são responsáveis de forma mais

direta. Por exemplo; a coordenadora ressalta mais a participação dos pais no que

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diz respeito a manutenção física da creche e aos eventos realizados de forma mais

pontual; já as professoras valorizam mais o fato da participação dos pais melhorar o

comportamento das crianças e a relação professor-aluno; os pais já ressaltam a

participação deles da forma como percebem que atuam mais: uns contribuindo com

a manutenção da instituição, outros estando sempre presentes para trazer e levar os

filhos, outros na sala-de-aula, outros nas datas festivas e outros até se esquivando

pela falta de tempo, enfim, cada um destacando a participação de acordo com a

própria atuação e entendimento.

Entendemos que os dados colhidos na Creche foram fundamentais para a

nossa pesquisa, porque foi através deles que podemos perceber que uma parceria

com esse objetivo: o de contribuir para o desenvolvimento da criança pequena,

precisa ser muito bem discutida junto a pais e escola para que possa surtir os efeitos

esperados.

No nosso entendimento, a Creche estudada, ainda não conseguiu pontuar

muito bem esta questão e por isso fica complicado perceber nesta instituição que

contribuições efetivas a participação dos pais, que é inegável neste local, traz para o

desenvolvimento da criança, de maneira bem específica

Por outro lado, percebe-se que a instituição possui realmente um diferencial,

um ponto de partida que pode propiciar um trabalho desse jaez que é este fato da

maioria dos pais estarem sempre presentes na mesma, colaborando com a

manutenção da creche, mesmo que seja apenas quando a coordenadora solicita,

além do fato de realizar também programações sistemáticas tentando envolver os

pais. Entendemos que este é um primeiro passo porque em muitas instituições não

existe nem esta participação que nós vamos denominar de pontual. Outro ponto que

consideramos fundamental para iniciar o estabelecimento de uma parceria é o fato

de ambas as instituições, (família e creche), se mostrarem cientes da importância

dessa parceria. Nas entrevistas, tanto a coordenadora, como os pais, professores e

funcionários da creche, reconheceram a importância de um bom relacionamento

entre eles.

Entendemos que esta breve retomada deste nosso primeiro trabalho realizado

sobre a temática da relação da família com a escola, nos permite compreender que

esta é uma das formas pelas quais esta relação se estabelece – em prol da

manutenção do espaço físico, onde cada um contribui como pode, dentro das

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limitações e possibilidades que o entendimento que possuem acerca da mesma

possibilita.

Como já dissemos anteriormente, essa é uma das formas como a relação da

família com a instituição de Educação Infantil pode se apresentar em alguns

momentos e algumas realidades. Sabendo que este tipo de relação é fruto de um

contexto e de uma contigência, que tem as suas nuances individuais, sociais,

econômicas, políticas, ideológicas e histórico-culturais, não nos cabe julgar ou

classificar, apenas analisar, a partir de outros pontos de vista, de outros olhares,

buscando contribuir com a ampliação da mesma, na medida das nossas

possibilidades.

1.2 - Refletindo sobre a dissertação

No nosso segundo trabalho sobre a temática, que teve como objetivo refletir sobre ações e estratégias realizadas pela escola, que possam contribuir para o fortalecimento da relação desta Instituição com a família do aluno,

entrevistando também gestoras, professoras, pais e funcionários, conseguimos

perceber igualmente, a unanimidade de todos em relação á relevância da relação

família e instituição de Educação Infantil, embora haja algumas diferenças na forma

como compreendem a mesma. Vejamos o que dizem gestoras e professoras:

Entendemos que a participação dos pais tem muito a contribuir para que o aluno aprenda mais. Para que o professor e o aluno façam um trabalho melhor. A parceria maior é a aprendizagem, não apenas a limpeza da escola. No momento que o pai conhece a proposta, ele pode ajudar em casa.

EXEMPLO: Uma dificuldade que os pais tem é com relação a leitura e a escrita. Colocamos a alfabetização dos pais como uma proposta. Uma professora já se propôs a dar aula aos pais. Não descartamos o pai ajudar na limpeza da escola, porém quando o pai se propõe a ajudar ao aluno, o desempenho dele é melhor.( Gestora da pré-escola)

como estamos dando prioridade a aprendizagem, os pais estão mais interessados na aprendizagem da criança. Um exemplo disso são as atividades de casa: antes era o pai ou o irmão que fazia, agora os pais estão deixando a criança fazer e estão nos dizendo que deixam que a criança faça. Porque agora

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sabem que a criança faz do jeito dela, que é diferente do jeito dos pais. ( Gestora da pré-escola)

Uma boa relação família e escola é fundamental para ajudar nos processos de aprendizagem e desenvolvimento do aluno. ( professora da pré-escola)

No tocante aos pais, todos reconheceram que a escola foi importante e

ensinou algo aos filhos, bem como a importância de participar das reuniões:

Muito boa, porque elas ensinam muito, tanto ensina pras crianças, como pra gente também nas reuniões. ( mãe de aluno da pré-escola)

-Eu acho muito importante né? Porque é essa relação que tem que haver mesmo, porque eu não vou deixar meu filho aqui ao léu. Pronto, se eu for deixar ele na casa de um parente, eu vou perguntar se ele arengou, se brigou, o que fez de errado, o que fez certo. Do mesmo jeito tem que ser na escola.Assim, porque o pedaço que ele fica em casa eu sei: toma café, assiste televisão, depois toma banho, almoça para vir pró colégio, aí eu tenho que vir saber o que ele está fazendo aqui também. Na reunião é que a gente discute, acho muito interessante as reuniões, e acho importante todos os pais comparecer. (mãe de aluno da pré-escola)

Elas são bastante assim, conversam muito com as mães, elas, até os problema da escola passam tudo pra gente.( mãe de aluno da pré-escola)

Em relação a este segundo trabalho, nossas considerações finais foram as

seguintes:

O nosso objetivo, conforme já foi explicitado, foi refletir sobre ações e

estratégias realizadas pela escola que possam contribuir para o fortalecimento da

relação dessa instituição com a família do aluno e, para isso, foi preciso também

discutir a relevância de um trabalho educativo integrado entre escola e família,

principalmente na Educação Infantil, bem como refletir sobre a família e a escola no

atual contexto sócio-econômico-cultural, buscando caminhos que se tornem viáveis

para fortalecer a integração dessas duas instituições.

A experiência no Centro Municipal de Educação Pré-escolar, subsidiou toda a

nossa reflexão na medida em que apontou caminhos para viabilizar o fortalecimento

dessa relação, nos mostrando que a mesma é possível. Acreditamos que essa

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experiência, poderá servir de estímulo á outras instituições que queiram, também,

encarar esse desafio de fortalecer sua relação com a família dos alunos.

Antes de especificarmos melhor esses caminhos apontados pela experiência

do Centro de Educação Pré-Escolar, entendemos pertinente dizer que, para nós, a

importância maior desse trabalho está na própria temática que ele traz a tona,

suscitando a oportunidade de maiores estudos e reflexões sobre a relevância do

estabelecimento/fortalecimento da relação entre duas instituições tão vitais para a

sociedade, em todos os seus momentos históricos, tais quais a família e a escola,

como também possibilitar esse estímulo a outras instituições educativas, sem

contudo ser uma receita, ou um modelo a ser seguido.

Só para retomar, as questões que nortearam esse nosso trabalho, e para as

quais buscamos algumas respostas, mesmo que provisórias, foram:

1) Quais as funções da escola e da família na atualidade?

2) É importante que a escola e a família possuam uma boa relação? Por que? 3) É possível, construir uma boa relação entre escola e família? Como?

4) Quando escola e família caminham juntas, acontecem mudanças no processo de formação das crianças? Quais?

No tocante as funções dessas duas instituições na sociedade atual,

considerando algumas discussões já iniciadas, principalmente no que diz respeito às

novas demandas formativas que a sociedade impõe à escola na atualidade, bem

como á todas as transformações pelas quais a família vem passando no seio dessa

mesma sociedade, o que nós inferimos é que, realmente, as funções dessas duas

instituições não devem ser tão diferentes, nem mesmo tão separadas ou

dissociadas, mas complementares.

Embora, seja importante relembrar que, no tocante aos processos de ensino e

aprendizagem do saber sistematizado, a tarefa é, prioritariamente, da escola,

cabendo a família porém, no intuito de complementar esse trabalho da escola,

ajudar e incentivar os filhos em casa, criando horários e momentos de estudo, bem

como valorizando a escola e o conhecimento.

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Ambas precisam assumir e discutir, em conjunto, as reais condições de cada

uma delas para atender aos interesses e necessidades das novas gerações, visando

à integração das mesmas na sociedade, ou seja, cada escola, juntamente com as

famílias dos seus alunos, precisa refletir sobre a colaboração efetiva que pode estar

oferecendo para a socialização/integração do indivíduo no contexto social do qual

faz parte, pois:

Assumir um trabalho de acolhimento às diferentes expressões e manifestações das crianças e suas famílias significa valorizar e respeitar a diversidade. Cada família e suas crianças são portadoras de um vasto repertório que se constitui em material rico e farto para o exercício do diálogo, aprendizagem com a diferença, a não discriminação e as atitudes não preconceituosas. (BRASIL, 1998. Vol I, p. 77).

Que homem precisamos formar? Não para atender aos interesses da

sociedade, no sentido de reproduzir o modelo social vigente, que é muito

excludente, mas no sentido de modificar, de mudar o que está posto, objetivando a

formação de uma sociedade mais igualitária e justa. Entendemos que é dessa forma,

observando os interesses e necessidades dos sujeitos alunos, e envolvendo as

famílias nessa discussão, que a escola vai deixar de ser “transmissora de ideologias

dominantes”, para se tornar agente de mudanças sociais efetivas.

Em relação à segunda problematização que norteou nossos estudos,

entendemos que, durante todo o percurso, ficou muito claro que escola e família

precisam caminhar juntas. Diante da grande demanda que se apresenta para a

escola hoje, de todas as mudanças pelas quais a família vem passando, bem como

pelas próprias falas de gestoras, professoras e famílias por nós entrevistadas, não

se pode mais conceber que as duas instituições responsáveis pela formação das

novas gerações, não se unam em torno desse ideal.

Portanto, buscar em conjunto diretrizes educativas comuns, que possibilitem

ao indivíduo uma reflexão e atuação crítica e responsável, objetivando tornar o

mundo globalizado menos excludente e mais igualitário, deve ser o grande objetivo

da escola e da família hoje.

As possibilidades para o fortalecimento dessa relação, principalmente no

tocante ao que cabe a escola, segundo o que aponta a nossa pesquisa, são muito

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grandes, basta apenas que haja uma compreensão da relevância dessa relação, e

que se inicie um processo de conscientização de todos os que fazem a escola, para

que se discuta em conjunto estratégias que venham a fortalecer essa questão.

No que diz respeito ao que a escola deve fazer para fortalecer sua relação

com a família do aluno, o primeiro passo é entender e aceitar que a família pode

contribuir com o processo formativo dos filhos e que ela – escola, não consegue dar

conta sozinha das demandas que as transformações sociais estão lhe cobrando:

Cabe, portanto, às instituições estabelecerem um diálogo aberto com as famílias, considerando-as como parceiras e interlocutoras no processo educativo infantil. (BRASIL, 1998. Vol I, p. 76).

A família também, pelas bruscas mudanças que tem vivenciado na sua

estrutura, precisa reconhecer na escola a sua grande aliada no processo educativo

dos seus filhos, buscando se unir a ela para melhor desempenhar essa tarefa.

Depois de todo o percurso aqui analisado, compreendemos que essa relação

é possível: compreensão da relevância desse entendimento, união em torno desse

objetivo e boa-vontade para colocar as idéias em prática, foi o caminho trilhado pelo

Centro Pré-escolar pesquisado, com resultados positivos.

Quando falamos em resultados, não estamos entendendo que chegamos ao

final do percurso, mas que conseguimos iniciá-lo.

Aumento na frequência dos alunos, uma média de mais de 50% de presença

dos pais nas reuniões, maior interesse e participação dos pais nas atividades dos

filhos, reconhecimento, por parte dos pais, de que os filhos aprenderam muito na

escola, opinião favorável, da grande maioria dos pais entrevistados, em relação ao

trabalho desenvolvido pela escola, reconhecimento das gestoras e das professoras

de que houve uma melhoria no relacionamento da escola com a família, são, para

nós, indícios seguros de que o trabalho realizado foi positivo.

Olhando novamente para as entrevistas dos pais, percebemos que as

opiniões - em relação á forma como são recebidos e tratados na escola, a segurança

que a escola oferece as crianças, a fala clara e compreensível com que as pessoas

da escola (gestoras, professoras e funcionários), se dirigem aos pais, a preocupação

da escola em melhorar sempre o trabalho com a criança, solicitando a opinião dos

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pais; demonstram uma coerência, uma unidade que nos permite inferir que o

trabalho realizado está sendo realmente positivo.

Assim sendo, entendemos que o objetivo maior desse nosso estudo: “refletir

sobre ações e estratégias realizadas pela escola, que possam contribuir para o

fortalecimento da relação dessa instituição com família do aluno” foi alcançado,

considerando, obviamente, todas as questões já elencadas no início dessas

considerações.

Compreendemos que esses dois estudos apontam na direção de que:

[...] quando se estabelece uma relação construtiva baseada em objetivos compartilhados, no respeito mútuo e no conhecimento do que o outro proporciona no processo educativo, cria-se um contexto mais favorável à aprendizagem do aluno, tanto na escola como na família. (MARCHESI & MARTÍN, 2003, p.128)

Dessa forma, acreditando na relevância de uma relação participativa entre

famílias e instituições educativas, e a partir de alguns estudos já realizados sobre

esta temática, bem como das pesquisas efetuadas na especialização e no mestrado,

defendemos algumas teses que são importantes de serem lembradas, e que, com

certeza, serão consideradas no trabalho que nos propomos a empreender agora:

• É possível estabelecer uma boa relação entre a escola e a família, apesar das dificuldades a serem enfrentadas. • Cabe a escola dá o primeiro passo em busca de fortalecer a sua relação com a família do aluno. • Uma boa relação entre a família e a instituição de educação infantil é fundamental para a aprendizagem e o desenvolvimento da criança. • A escola e a família, embora possuindo funções específicas, possuem também funções que podem ser compartilhadas. • A família, tenha ela a estrutura que tiver, é fundamental no processo formativo das suas crianças. • Precisamos ter um olhar para a relação que se estabelece no interior das famílias e não para as estruturas que elas apresentam.

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• Escola e Família são instituições historicamente construídas. • Chegar a um consenso em torno do horário mais adequado para fazer uma reunião de pais, considerando a opinião dos próprios pais, é um passo muito importante para se conseguir a adesão e comparecimento dos mesmos a escola.

Entendemos pertinente ressaltar também que, ampliar os espaços de

interação entre escola e família, possibilitando que estas duas instituições

compartilhem ações de cuidado e educação, significa uma grande contribuição para

o processo formativo das crianças pequenas, principalmente neste momento de

busca de novos paradigmas para um mundo em permanente transformação.

Partindo destes postulados, e conscientes de que uma relação dessa natureza

é uma construção coletiva, com avanços e recuos, idas e vindas, acertos e

equívocos, vamos apresentar a experiência que conseguimos realizar buscando

construir num Centro Municipal de Educação Infantil, que dirigimos durante dois

anos, uma relação com a família que objetivasse compartilhar as ações de cuidado e

educação das crianças que estavam sob a nossa responsabilidade.

Compartilhamento esse que só entendemos possível, através da

sistematização de um trabalho educativo junto ás famílias, pautado, principalmente,

no diálogo e na interação entre as pessoas que compõem estas duas grandes

instâncias formativas da nossa sociedade.

Dessa forma, considerando a grande contribuição desses caminhos já

percorridos, para a ampliação/aprofundamento dos novos caminhos a serem

construídos, vamos prosseguir na descrição reflexiva da nossa experiência.

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CAPÍTULO 2

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2. CONSTRUINDO DIRETRIZES PARA NOVOS CAMINHOS

Espaço e tempo não são somente coordenadas entre as quais nossa vida transcorre, mas dimensões que nos constituem.

J. Gimeno Sacristán.

Dando continuidade ao nosso trabalho, vamos agora apresentar as diretrizes

que traçamos e vivenciamos para a concretização do mesmo. Dessa forma, nesse

capítulo, nos propomos a realizar uma reflexão em torno dos referenciais

metodológicos que nortearam o nosso trabalho, descrevendo os procedimentos

metodológicos utilizados, bem como fazendo uma caracterização do campo de

pesquisa e dos sujeitos envolvidos no processo.

2.1 - Refletindo sobre referenciais metodológicos

Ao iniciarmos uma reflexão em torno de como realizar uma pesquisa na área

das ciências sociais e, mais especificamente, na área da Educação, a primeira

questão que se coloca para nós é: qual o referencial teórico metodológico que vai nortear o nosso trabalho de pesquisa?

Entendemos de fundamental relevância essa questão, pelo fato de

compreendermos que os postulados metodológicos são á base de sustentação de

todo o processo de pesquisa, principalmente quando se trata dos fenômenos sociais

e educativos, já que “o caráter subjetivo e complexo destes requer uma metodologia

de investigação que respeite sua natureza.” (GÓMEZ, 2000, p. 99)

Segundo ainda este mesmo autor, durante muitos séculos as pesquisas foram

realizadas tendo como referencial teórico metodológico a perspectiva positivista, que

alcançou grandes progressos nas ciências sociais e nas aplicações tecnológicas.

Foi assim que, quando decidiu superar o estado de pura especulação

filosófica, ou especulativa, as ciências sociais, mesmo com todas as suas

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55

complexidades e subjetividades, aderiu a este mesmo modelo padrão de

cientificidade, como única garantia de rigor e eficiência.

Segundo os estudos de André (2002) e Bogdan & Biklen (1994), foi a partir do

final do século XIX, que os cientistas sociais começaram e indagar sobre a validade

desse tipo de metodologia para os estudos dos fenômenos humanos e sociais,

considerando toda a complexidade e dinamicidade desses fenômenos, que os

tornam impossibilitados de se submeterem a leis gerais como na física ou na

química.

Segundo Gómez (2000), os fenômenos sociais em geral, e os educativos em

particular, manifestam duas características que o diferenciam claramente dos

fenômenos naturais:

O caráter radicalmente inacabado dos mesmos, sua dimensão criativa, autoformadora, aberta à mudança intencional. A dimensão semiótica de tais fenômenos. A relação em parte indeterminada e, portanto, polissêmica entre o significante observável e o significado latente de todo fenômeno social ou educativo ( GÓMEZ, 2000, p. 100)

Assim sendo, foi a partir desses questionamentos e considerações acerca das

especificidades dos fenômenos sociais, que começou a surgir uma nova abordagem

ou um novo paradigma de pesquisa conhecida como naturalística ou qualitativa por

alguns estudiosos; não convencional no dizer de Fazenda & Soares (1992), ou ainda

abordagem interpretativa, como propõe Gómez (2000).

Entendemos esse novo paradigma de pesquisa, que vamos optar por chamar

de qualitativa, como um grande avanço para os estudos das ciências sociais,

principalmente pelas considerações que faz a não-neutralidade do pesquisador e a

sua possibilidade de participar efetivamente na construção do seu objeto de

pesquisa, embora estejamos de acordo com André (2002), quando ela diz que nem

todas as pesquisas que se dizem qualitativas o são, considerando que qualitativa

não é, apenas, antônimo de quantitativa, e também que uma pesquisa qualitativa,

não obrigatoriamente, tem que prescindir de aspectos quantitativos.

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Dessa forma, não podemos estar denominando as pesquisas apenas de

qualitativas, não convencionais ou interpretativas, para não cairmos em

generalizações que acabem designando muitas coisas, sem caracterizar nenhuma.

É importante detalhar melhor o tipo de investigação que queremos fazer,

especificando as características das mesmas, as técnicas utilizadas para a

construção dos dados, bem como as formas utilizadas para se compreender estes

dados dentro do contexto pesquisado, para podermos classificar este estudo ou

investigação com mais propriedade, ou até mesmo eleger aspectos mais

significativos de um ou outro tipo de pesquisa.

Estamos nos utilizando da terminologia compreender dados, ao invés de

explicar dados, porque concordamos que:

A compreensão é própria do comportamento humano, portanto está sempre implicada com o singular, com a consciência-aí com a subjetividade. A explicação, por seu lado, é peculiar as ciências da natureza, o que a torna sempre implicada com o “regular”, o contínuo, com a consciência-tipo (consciência em si, o conceito geral de uma série regular) – com a objetividade. (GALEFFI, 2000, p. 17)

É exatamente esse caráter singular e subjetivo, que nos leva a refletir

bastante sobre qual a abordagem de pesquisa que melhor vai responder as

questões que nos propomos a investigar, embora tenhamos a certeza de que

nenhuma delas terá condições de atender a todas as especificidades do nosso

processo de pesquisa. Dessa forma, vamos eleger uma abordagem de pesquisa de

natureza qualitativa, abraçando postulados da pesquisa-ação, por entendermos que,

no momento é a que melhor responderá a natureza do nosso campo empírico e dos

fenômenos que nos propomos a observar.

Uma das principais singularidades e subjetividades do trabalho que nos

propomos a realizar, já que o nosso objetivo é descrever e refletir sobre a construção

de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de

cuidado e educação das crianças, no contexto de criação de um Centro Municipal de

Educação Infantil, dizem respeito ao fato das ações que nos propomos a realizar

serem tanto nossas – enquanto pesquisadoras, quanto de todos os outros atores

envolvidos no processo. Nessa questão encontramos respaldo na pesquisa-ação:

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[...] a pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social, com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.(THIOLLENT, 2004, p.14)

Uma outra singularidade, embora intrinsecamente ligada a primeira, é o fato

de fazermos parte do cotidiano desta Instituição onde nos propomos a construir esta

ação. Assim sendo, nos colocamos como uma pesquisadora que vai influenciar,

participar diretamente de todo o processo de sistematização do trabalho,

participação esta que, no nosso entendimento, também se encontra bastante

respaldada nos postulados da pesquisa-ação:

Não se trata de simples levantamento de dados ou de relatórios a serem arquivados. Com a pesquisa-ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos observados. (THIOLLENT, 2004, p.16)

Dessa forma, após justificarmos a nossa opção por realizar uma pesquisa

qualitativa com características de uma pesquisa-ação, passaremos agora a explicitar

os instrumentos e procedimentos metodológicos utilizados, bem como a caracterizar

o campo de pesquisa e os sujeitos envolvidos na mesma.

2.2 - Detalhando instrumentos de construção dos dados

Os instrumentos metodológicos utilizados para a construção dos nossos

dados foram: caderno pessoal de registro, ficha de caracterização dos alunos,

(Anexo 1) entrevistas abertas ou semi-estruturadas com familiares das crianças

(Anexos 2 e 3) e observações participantes.

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O nosso caderno pessoal de registro começou a ser elaborado desde as

primeiras reuniões com as professoras, antes da Instituição começar a funcionar. Foi

com base nas anotações realizadas nesse caderno que pudemos resgatar todo o

percurso de formação inicial das professoras, inclusive os depoimentos registrados,

principalmente, no capítulo 4; bem como o processo de acolhimento dos funcionários

e as propostas discutidas e elaboradas para os trabalhos com as crianças e as suas

famílias.

A ficha de caracterização dos alunos, elaborada em conjunto por toda a

equipe técnico-pedagógica da Instituição logo nas primeiras reuniões, com o objetivo

de obter informações sobre os alunos e suas famílias, tanto ajudou no sentido de

fazer as caracterizações aqui apresentadas, quanto na organização do próprio

trabalho com as crianças e as famílias de forma mais específica.

Estas fichas foram preenchidas pelos pais e/ou responsáveis no ato da

matrícula. A pessoa da escola encarregada de fazer a matrícula, explicava o objetivo

da ficha aos pais e/ou responsáveis e ia fazendo as perguntas e anotando as

respostas. Depois a ficha foi analisada e tabulada pela secretária geral da

Instituição, o que nos possibilitou o acesso as porcentagens e números na

caracterização das crianças e suas famílias, que será apresentada em seguida.

Foi através da consultas ás fichas de caracterização, que também foi possível

saber o que os pais esperavam da Instituição, o motivo pelo qual estavam

matriculando nela o seu filho, o melhor horário para o comparecimento as reuniões,

bem como informações relativas aos cuidados especiais que se deveria ter com a

saúde das crianças, as suas singularidades e histórias de vida; o que muito

contribuiu com o trabalho realizado.

A opção pelas entrevistas semi-estruturadas, foi pelo fato desse tipo de

entrevistas, permitir que o entrevistado se coloque mais, fale e opine melhor sobre a

temática em questão, já que as perguntas são mais abertas e menos direcionadas.

As entrevistas abertas ou semi-estruturadas, conforme afirmam Bogdan e

Biklem (1994), deixam o entrevistado mais a vontade para se expressar. Essas

entrevistas foram realizadas com os familiares das crianças, e aconteceram em dois

momentos distintos: o primeiro momento, constando de aproximadamente 1 ou 2

perguntas apenas (Anexo 2) – se constituindo quase que numa conversa informal,

embora gravada, aconteceu, após os eventos realizados com as famílias, com o

objetivo de se perceber a opinião das mesmas sobre o evento em questão. O

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59

segundo momento foram as entrevistas realizadas no final do ano de 2005, cujo

roteiro está no anexo 3 , com o objetivo de se obter uma visão geral dessas famílias

sobre as atividades realizadas pela instituição, e a relação da mesma com as

famílias, de forma mais geral. A opção por esses dois tipos de entrevistas foi

respaldada pela seguinte afirmação:

[...] podem-se utilizar diferentes tipos de entrevistas, em diferentes fases do mesmo estudo. Por exemplo, no início do projecto pode parecer importante utilizar a entrevista mais livre e exploratória, pois nesse momento o objectivo é a compreensão geral das perspectivas sobre o tópico. Após o trabalho de investigação, pode surgir a necessidade de estruturar mais as entrevistas de modo a obter dados comparáveis num tipo de amostragem mais alargada. (BOGDAN & BIKLEM, 1994)

Todas as entrevistas foram gravadas, transcritas e alguns desses

depoimentos estarão sendo apresentados e discutidos no decorrer desse trabalho.

Optamos por fazer as entrevistas em dois momentos distintos, por

compreendermos que cada momento desse tinha um objetivo diferente: as

entrevistas realizadas logo após os eventos com os pais, objetivavam uma opinião

mais específica sobre a atividade em questão. Já as entrevistas realizadas ao final

do ano de 2005, com familiares das crianças, objetivavam uma opinião sobre o

trabalho da Instituição como um todo, procurando perceber também qual a

atividade/evento que os pais entrevistados consideraram mais significativo para eles.

Essa entrevista final foi realizada apenas com pessoas de 8 famílias, por

entendermos que as entrevistas realizadas após cada evento já apresentavam

dados bastante significativos sobre o objeto de estudo em questão.

As observações participantes aconteceram durante o decorrer dos anos

letivos de 2004 e 2005, e, até mesmo pelo fato de atuarmos profissionalmente na

Instituição, procurávamos aproveitar todos os momentos possíveis para observar

como acontecia essa relação família e escola no cotidiano da Instituição, junto a

familiares, professoras, funcionários e crianças.

É importante registrar que, embora consideremos a relevância das falas, da

participação e da opinião de toda a comunidade escolar, nesse processo de

construção da relação família e I.E.I, conforme já elucidado na introdução desse

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trabalho, não foi possível construir dados a partir das falas das crianças e dos

funcionários, considerando que, por razões de tempo e também do recorte

priorizado, registramos mais efetivamente as falas e opiniões das famílias e das

professoras.

Como já colocamos, pelo fato de fazermos parte diretamente do grupo que

realiza o trabalho em pauta, a observação participante foi uma das técnicas de

construção utilizadas, considerando que:

A observação participante, ou observação ativa, consiste na participação real do observador na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada. Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um membro do grupo. Daí por que se pode definir observação participante como a técnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior dele mesmo. (GIL, 1994, p.108)

É importante frisar que, no nosso caso, a observação participante é definida

por Gil (1994), como natural, pelo fato de fazermos realmente parte do grupo, e de

não termos nos integrado ao mesmo, apenas com essa função de observar.

É interessante perceber que essa situação promove vantagens e

desvantagens. Vantagem porque nos proporciona um olhar privilegiado, pelo fato de

fazermos parte do grupo, não sermos um elemento estranho ao mesmo, o que,

realmente, proporciona uma observação muito mais natural. Desvantagens no

sentido da subjetividade do pesquisador que fica muito mais presente, já que ele

está observando e pesquisando, num ambiente e numa situação em que o vínculo

emocional é muito maior e muito mais forte.

Dessa forma, entendemos que um dos nossos grandes desafios nesse

trabalho, foi a busca por ultrapassar esse vínculo emocional, procurando fazer, na

medida do possível, uma descrição reflexiva da experiência que possa realmente

retratar, não unicamente uma visão pessoal, mas, também, a visão de todos os

outros atores/protagonistas dessa história. O desafio está lançado...

2.3 - Caracterizando o campo e pesquisa

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61

O Centro Municipal de Educação Infantil Profª Carmem Maria Reis

(CEMEICAR), está localizado na Vila de Ponta Negra, possuindo 4 salas de aula,

sendo duas menores: uma com capacidade para apenas 15 alunos e outra, no

máximo, para vinte alunos. E duas maiores, com capacidade para 25 alunos. Possui

ainda uma sala destinada a direção, coordenação e secretaria, um almoxarifado,

uma cozinha, uma dispensa, uma área de serviço com lavanderia coberta, dois

banheiros destinados aos adultos, um masculino e outro feminino, além de 2

banheiros adaptados para as crianças pequenas: um para as meninas e outro para

os meninos.

Além dessa área interna, a Instituição possui uma área externa toda gramada

nas duas laterais, e na frente do prédio, uma área toda recoberta por areia de praia,

e um quadrado de 16m feito com cimento, e cheio de areia branca - que é a caixa de

areia, onde as crianças brincam também, além do parque infantil, situado atrás do

prédio. Neste local foi também colocada um

a tenda de 8mt por 6mt, objetivando que as crianças tivessem uma área coberta e

cimentada, como opção para a realização de outras atividades.

FOTO 1: Área gramada na frente do prédio.

Fonte: arquivo do CMEICAR. ANO: 2005

FOTO 2: Caixa de areia e área livre.

Fonte: arquivo do CMEICAR. ANO: 2005

FOTO 3: Parque infantil.

Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 4: Tenda em área cimentada.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

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Em relação ao mobiliário e utensílios, a Instituição também foi toda equipada

com materiais novos e adequados as necessidades e objetivos a que se

destinavam. Dessa forma, a cozinha recebeu freezer, geladeira, fogão industrial,

liquidificador industrial, armários, panelas, frigideiras, colheres, garfos, facas, pratos

e copos plásticos para serem usados na merenda das crianças, enfim, o material

básico necessário ao trabalho a ser realizado.

Cada uma das salas de aula foi equipada com um quadro negro, mesinhas de

madeira e fórmica, com quatro cadeirinhas cada, adaptadas ao tamanho das

crianças, além de um armário para guardar o material e de uma mesinha com um

filtro de barro, reabastecido diariamente com água, para que as crianças não

precisassem sair da sala para beber água.

A Instituição recebeu também um aparelho de som, um vídeo cassete e uma

televisão de 21”, além de um acervo de livros infantis com 80 títulos

aproximadamente e 3 unidades de cada um; brinquedos como carrinhos, bolas,

bonecas; jogos como damas, dominós, boliches; material didático pedagógico e de

expediente, como papel ofício, papel madeira, cartolina, tinta guache, tinta a dedo,

massa de modelar, lápis grafite, giz de cera, coleção de madeira, pincel atômico,

isopor, papel crepom e outros materiais necessários ao trabalho com as crianças.

Este Centro Infantil foi criado para atender a um pedido da comunidade da

Vila de Ponta Negra que, através da sua associação de moradores, enviou uma

comissão à SME solicitando que fosse criado um espaço educativo para atender a

uma demanda de crianças, na faixa etária de 4 a 6 anos, que tinha sido registrada

desde o início do ano e continuava sem este espaço definido.

Inicialmente, estas crianças iriam freqüentar uma instituição de Educação

Infantil vinculada ao projeto pré-escola para todos1 que já funcionava na Vila de

Ponta Negra, desde o ano de 2003. Só que em 2004 esta escola fechou o prédio

localizado na própria Vila e estava se propondo a atender os alunos na sua matriz,

localizada no Conjunto Ponta Negra, distante uns 3 a 4 KM da Vila, o que dificultava

o acesso das crianças e dos seus pais.

Ao tomar conhecimento dessa situação, a Secretária Municipal de Educação

compreendeu a necessidade de criar uma Instituição Municipal de Educação Infantil

1 Projeto mantido pela Prefeitura Municipal de Natal, com o objetivo de comprar vagas, em instituições de Educação infantil particulares e filantrópicas, para crianças na faixa etária de 4 a 6 anos que não conseguem vagas nas instituições públicas de ensino da cidade.

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na Vila de Ponta Negra, considerando que as crianças dessa faixa etária, precisam

de um atendimento de qualidade, e que esta qualidade passa também pela

facilidade de acesso as instituições educativas.

Podemos inferir então que, foi a solicitação da comunidade, e a compreensão

da necessidade e urgência da mesma, que fez com que no dia 10 de março de

2004, fosse criado o CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PROFESSORA CARMEM MARIA REIS, situado num prédio alugado na Rua João

de Deus de Lima, S/N CEP 59.090-318, Vila de Ponta Negra.

Apesar de não ser um espaço construído especificamente para ser uma

Instituição de Educação Infantil, e de possuir uma área - principalmente a área

coberta, de dimensões muito pequenas – inclusive as salas de aula, consideramos

que, depois da reforma a Instituição ficou bastante agradável, possibilitando,

obviamente que dentro das condições possíveis, a realização de um trabalho que

respeitasse a criança enquanto ser sócio-histórico-cultural, promovendo o acesso

das mesmas ás interações e aprendizagens próprias do seu grupo cultural, como a

brincadeira, as artes, o movimento, a linguagem oral e escrita, a matemática, as

ciências naturais e sociais, enfim, as várias linguagens que o ser humano precisa

utilizar no seu cotidiano:

FOTO 5: Aulas do grupo de capoeira.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 6:Grupo de pastoril do CMEICAR. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

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FOTO 7: Leitura na biblioteca

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 8: Momento do faz-de-conta.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004.

FOTO 9: brincadeiras no parque e caixa de areia. Fonte: Arquivo do CMEICAR.

Ano: 2004

FOTO 10: Escrevendo textos que se

sabe de cor.

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2.4 - Caracterizando o corpo técnico-docente

A contratação e o encaminhamento das professoras e coordenadoras

pedagógicas, foi realizado pelo próprio setor de carga horária da SME,

obedecendo aos critérios gerais estabelecidos por este órgão. É importante

registrar que, hoje, só se ingressa no magistério público municipal de Natal

mediante concurso. O último concurso para este cargo aconteceu no final do

ano de 2003, para nomear os professores logo no início de 2004.

Dessa forma, a equipe técnico-docente que iniciou os trabalhos no

Carmem Reis era composta por 8 professoras, 2 coordenadoras pedagógicas,

1 secretária geral, 1 vice-diretora e nós, como diretora. A caracterização

dessas profissionais será feita no quadro abaixo:

FUNÇÃO FORMAÇÃO EXPERIÊNCIA NA

EDUCAÇÃO EXPERIÊNCIA NA

ED. INFANTIL Diretora Pedagoga com

mestrado 15 anos 8 anos

Vice-diretora Pedagoga com especialização

16 anos 10 anos

Secretária geral Pedagoga 25 anos 10 anos

Coordenadora 1 Pedagoga com especialização

13 anos ----------

Coordenadora 2 Pedagoga com especialização

20 anos 16 anos

Professora 1 Pedagoga 04 anos 4 anos

Professora 2 Pedagoga Recém-concursada -----------

Professora 3 Pedagoga 12 anos -----------

Professora 4 Pedagoga 06 anos ------------

Professora 5 Pedagoga Recém-concursada ------------ Professora 6 Pedagoga com

especialização 05 anos 05 anos

Professora 7 Pedagoga com especialização

20 anos 16 anos

Professora 8 Pedagoga com especialização

04 anos 04 anos

Quadro 1 - Caracterização da equipe técnico-docente-administrativa

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Além dessa caracterização que vamos chamar de técnica-burocrática, é

importante registrar que todas essas profissionais estavam muito empolgadas

com o fato de irem trabalhar em uma instituição recém-criada, onde havia a

proposta de uma construção coletiva de todos os saberes e fazeres que iriam

nortear o cotidiano da mesma.

Tanto as que já tinham experiência na área da Educação Infantil, como

as que ainda não tinham atuado nessa modalidade de ensino, se apresentaram

bastante dispostas, motivadas e ansiosas em partilhar esta experiência, o que,

na nossa opinião, foi muito positivo para o trabalho que nos propúnhamos a

realizar, considerando que, acreditamos que é a motivação interior, a nossa

disposição enquanto seres humanos, que vai impulsionar verdadeiramente as

nossas ações.

Esse trabalho inicial de reflexão, estudo e interação do grupo de

professoras será melhor detalhado no capítulo 4 dessa tese.

2.5 - Apresentando os funcionários

A Instituição possui 9 funcionários, sendo 4 vigias – 2 noturnos e 2

diurnos; 2 merendeiras; 2 Auxiliares de Serviços gerais - ASGs e 1 auxiliar de

secretaria. Todos esses funcionários são contratados por uma firma que presta

serviços a SME, trabalhando num regime de 8 horas diárias, exceção dos

vigias que trabalham numa escala de 12 horas de serviço por 36 horas de

folga.

É importante dizer que, embora estes profissionais não possuam

nenhuma qualificação técnica na área da educação, tendo no máximo o ensino

médio, durante o ano de 2004, a SME, através do seu Setor de Educação

Infantil (SEI), realizou um curso de formação para todos esses funcionários que

atuavam em Centros de Educação Infantil da rede Municipal, e em escolas de

Ensino Fundamental que também trabalhavam com essa modalidade de

ensino. O objetivo desse curso era orientar e discutir com estes profissionais as

especificidades do trabalho com a criança, refletindo desde a função da

Educação Infantil – educar e cuidar, até noções de primeiros socorros e a

relação família e escola.

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Outro ponto importante que merece destaque em relação aos

funcionários que chegaram ao Carmem Reis, é o fato dos mesmos serem

terceirizados, ou seja, não fazerem parte do quadro técnico-funcional

permanente da Prefeitura de Natal, o que faculta que os mesmos trabalhem

num regime de 44 horas semanais, sendo 8 horas diárias e 4 horas aos

sábados, possibilitando uma vivência e um envolvimento maior dos mesmos

com a Instituição, além do fato – cujos condicionantes sócio-históricos-

econômicos não serão nosso objeto de discussão no momento, que é a

questão de poderem ser demitidos a qualquer momento em que não estiverem

correspondendo as expectativas, o que os leva a se empenharem mais nas

tarefas que realizam.

Acreditamos que estes fatores contribuíram de forma positiva também,

para a disponibilidade e o envolvimento desses profissionais no trabalho

proposto, bem como as disposições e motivações íntimas de cada um, como já

explicitamos anteriormente.

Outro fator que consideramos importante foi o fato da Instituição estar

sendo criada numa filosofia de envolvimento, participação e gestão

democrática, ou seja, os caminhos estavam sendo traçados ao se caminhar,

embora já existisse um desejo, uma vontade, uma diretriz, indicando aonde se

queria chegar: a realização, através de uma práxis participativa, de um

trabalho de qualidade com as crianças (DAHLBERG, MOSS e PENSE, 2003),

e a construção de uma relação entre a Instituição e as famílias que

promovesse o compartilhamento das ações de cuidado e educação, que são

as principais funções da Educação Infantil hoje, funções estas que serão

melhor discutidas no capítulo 3.

2.6 - Caracterizando as crianças e suas famílias

Esta caracterização foi realizada através da análise e sistematização dos

dados das crianças e das suas famílias, construídos através da ficha de

caracterização que consta nos anexos deste trabalho. (Anexo 1)

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Tanto no ano de 2004, como no de 2005, o CMEI Carmem Maria Reis,

matriculou 170 crianças, divididas em 2 turnos, de acordo com as turmas

abaixo especificadas:

ANO DE 2004 – TURNO MATUTINO NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV

15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio.

20 crianças na faixa etária de 4 anos

25 crianças na faixa etária de 5 anos

25 crianças na faixa etária de 6 anos

Quadro 2 - nº de crianças por nível: 2004 - matutino

ANO DE 2004 – TURNO VESPERTINO

NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio

20 crianças na faixa etária de 4 anos

25 crianças na faixa etária de 5 anos

25 crianças na faixa etária de 6 anos.

Quadro 3 - nº de crianças por nível: 2004 vespertino

ANO DE 2005 – TURNO MATUTINO NÍVEL II A NÍVEL II B NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 4 anos

20 crianças na faixa etária de 4 anos

25 crianças na faixa etária de 5 anos

25 crianças na faixa etária de 6 anos

Quadro 4 - nº de crianças por nível: 2005 matutino

ANO DE 2005 – TURNO VESPERTINO

NÍVEL I NÍVEL II NÍVEL III NÍVEL IV 15 crianças na faixa etária de 3 anos e meio

20 crianças na faixa etária de 4 anos

25 crianças na faixa etária de 5 anos

25 crianças na faixa etária de 6 anos.

Quadro 5 - nº de crianças por nível: 2005 vespertino

Considerando que no ano de 2005, a demanda de crianças com 3 anos

e meio foi menor que a de crianças com mais de 4 anos. A turma de nívelI, do

turno matutino foi substituída por uma turma de nívelII.

Ainda em relação à caracterização dessas crianças apresentada abaixo,

a mesma foi realizada a partir da análise das respostas de 164 pais as fichas

de caracterização. Não foram analisadas as 170 fichas, porque 6 fichas

continham muitas informações incompletas, por se tratar de crianças vindas do

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69

interior para morar com outros familiares, que não dispunham de todas as

informações necessárias.

Após a análise e tabulação dos dados dessas 164 fichas, foi possível

saber que 77 crianças são do sexo masculino, enquanto 87 são do sexo

feminino. Dessas crianças, 60% moram com os pais, 15% só com a mãe, 5%

com a mãe e o padrasto, 12% com a mãe e os avós, e os 8% restantes com

tias, avós e/ou outros adultos, sejam da mesma família consangüínea, ou não.

Esses dados nos levam a compreender que estas crianças fazem parte de

várias estruturas familiares diferentes, com a predominância da chamada

família nuclear, composta por pai, mãe e filhos.

Em relação ao número de irmãos, 15% dessas crianças não tem irmãos;

38% possui apenas 1 irmão, 32% entre 2 e 3 irmãos; e os outros 15% possuem

entre 4 e 7 irmãos. Estes dados nos surpreenderam, na medida em que

mostraram, diferentemente do que geralmente acontece nas chamadas

famílias das classes populares, um número pequeno de irmãos nessas

famílias, considerando que apenas 15% das mesmas possuem 4 ou mais

filhos; o que contribui para que 45% dessas crianças morem em casas com até

4 pessoas no máximo; 38% morem com 5 a 7 pessoas, e apenas 17% residam

com mais de 7 pessoas na mesma casa.

Ainda com o objetivo de conhecer melhor as crianças com as quais

iríamos trabalhar, a ficha de caracterização mostrou que 95% delas

brincam/convivem e interagem com outras crianças; 68% fazem isso dentro da

própria casa, enquanto 13% brincam na rua e 19% brincam e interagem com

crianças em outros ambientes, diferentes da casa e da rua. No tocante ao lazer

de final de semana, 58% dessas crianças freqüentam a praia, 29% ficam em

casa, 5% vão à igreja e os outros 10% passeia, visita parentes e viaja .

È importante frisar que o alto número de crianças que freqüentam a

praia no final de semana deve-se ao fato do bairro aonde residem está

localizado numa praia, que muitas vezes, é também o meio de subsistência da

própria família, já que a grande maioria trabalha e vive em função de

atividades, formais ou informais, realizadas nessa praia que possui um fluxo

turístico muito grande, sendo um dos principais cartões postais da cidade.

Vamos agora, a partir também da análise e tabulação da ficha de

caracterização, conhecer um pouco mais as mães e os pais dos nossos alunos.

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Vamos caracterizar mãe e pai separadamente porque foi assim que foi

perguntado na ficha, e não foi possível analisar em conjunto.

Das mães que responderam a ficha, 75% se apresentaram como

católicas; 17% como evangélicas e as 8% restantes como outras religiões ou

não professando nenhuma religião. Em relação ao grau de instrução, 12% se

disseram analfabetas, 28% como tendo cursado entre a 1ª e a 4ª série; 29%

como tendo cursado entre a 5ª e a 8ª série; 7% como tendo o ensino médio

incompleto; 6% como tendo concluído o fundamental; 8% como tendo

concluído o Ensino Médio e os outros 10% não souberam informar o grau de

escolaridade, embora não se declarassem analfabetas. Uma mãe declarou ter

o curso superior completo.

Dando continuidade a caracterização das mães, em relação a profissão;

44% se apresentaram como sendo do lar, trabalhando apenas em casa e

cuidando dos filhos; 23% se disseram empregadas domésticas, faxineiras e

diaristas; 8% trabalham em hotéis, bares ou restaurantes, como cozinheiras ou

auxiliares de cozinha. As 25% restantes se colocaram como artesãs,

ambulantes, garçonetes, camareiras, ASGs, manicures e outras profissões que

podem ser chamadas de liberais, pela ausência de vínculo empregatício, já que

são exercidas mais no chamado período de veraneio, pela presença maior de

turistas e visitantes na praia do bairro no qual residem, e nos estabelecimentos

comerciais ao redor da mesma.

Em relação à caracterização dos pais dos alunos, das 164 fichas

respondidas, apenas 145 possuem informações sobre os pais, as 18 restantes

foram respondidas por pessoas que não tinham essas informações, ou eram

fichas de crianças em cujo registro não constava o nome do pai. Nas fichas

respondidas, em relação à instrução, vamos encontrar que, 4% são

analfabetos; 10% se consideram alfabetizados – escrevem o nome; 36%

cursaram entre a 1ª e a 4ª série; 30% entre a 5ª e a 8ª série; 3% possuem o

Ensino Médio incompleto; 3% concluíram o Ensino Fundamental e 5% o Ensino

Médio; os outros 9% não informaram e um pai disse ter o curso superior.

Em relação à profissão, 15% dos pais trabalham na construção civil,

como pedreiros e/ou auxiliares de pedreiro; 10% são zeladores, eletricistas e

funcionários públicos; 18% se colocam como autônomos, exercendo as

profissões de ambulante e artesão, dentre outras; 13% são garçons,

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cozinheiros e/ou auxiliares de cozinha; os outros 44% restantes não possuem

profissão fixa, ficando desempregado e/ou subempregado. É importante frisar

que esses subempregos aparecem principalmente no período de veraneio,

quando a praia – vizinha ao bairro em que habitam, fica repleta de turistas,

oferecendo oportunidades de trabalho, mesmo que temporárias.

Finalizando este capítulo, é importante dizer que estes dados

construídos, principalmente a partir das fichas de caracterização, foram

fundamentais para nortear todo o trabalho que realizamos com as crianças e

suas famílias.

No início do ano letivo, cada professora ficava com as fichas dos seus

alunos por um período de aproximadamente 30 dias, consultando-as e fazendo

registros quando necessário. Após esse período, as fichas eram guardadas no

armário da sala da coordenação e secretaria, onde, tanto as professoras,

quanto a equipe técnico-administrativa-pedagógica tinha acesso as mesmas

sempre que se fazia necessário e, primordialmente, quando ia se discutir

especificidades de alguma criança e/ou família.

Vamos agora, retomar a concepção de criança, Instituição de Educação

infantil e família que norteia a nossa proposta de trabalho, procurando, no

próximo capítulo, fazer um resgate histórico das mesmas, até situá-las na

contemporaneidade, por acreditarmos que esse resgate vai contribuir com o

trabalho que nos propomos a realizar, considerando que, sendo concepções

historicamente construídas, é preciso que as conheçamos para que possamos

compreender melhor as nossas crenças, posturas e práticas, sabendo que,

conforme aponta Weisz (2001), cada uma delas é norteada por uma concepção

que a sustenta, ressaltando assim a grande relação entre teoria e prática.

Dessa forma, prosseguindo na construção dos caminhos a serem

trilhados, vamos retomar um pouco o passado, procurando no mesmo alguns

elementos para construir o futuro.

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CAPÍTULO 3

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3 - BUSCANDO CAMINHOS DO PASSADO, PARA CONSTRUIR O FUTURO

A história é o exercício da memória realizado para compreender o presente e para nele ler as possibilidades do futuro, mesmo que seja de um futuro a construir, a escolher a tornar possível.

Franco Cambi.

Neste capítulo, antes de descrevermos a nossa experiência propriamente

dita, vamos procurar situar melhor as principais concepções que embasaram a

mesma, realizando um passeio pela história da criança, da infância, da família

e das funções das instituições destinadas à atender as crianças, na certeza de

que toda prática, toda experiência, toda proposta é embasada por referenciais

teóricos que a sustentam, como também de que conhecer a história é

importante para que possamos compreender o presente, e vislumbrar

perspectivas para o futuro

3.1- Reflexões iniciais em torno da temática Para Freitas & Kuhlmann Jr. (2002, p. 7), “A constituição do campo das

ciências da infância é objeto de perplexidade àqueles que se ocupam com o

estudo sistemático da história da criança”. Perplexidade esta, que segundo

ainda estes mesmos autores, têm a sua intensidade, já no fato das próprias

formas distintas com que as palavras infância e criança são empregadas.

Desta forma, vamos optar por iniciar este capítulo refletindo sobre o significado

dos termos criança e infância, bem como sobre as suas histórias, para que os

mesmos possam nortear todo o nosso trabalho:

Podemos compreender a infância como a concepção ou a representação que os adultos fazem sobre o período inicial da vida, ou como o próprio período vivido pela criança, o sujeito real que vive esta fase da vida. A história da infância seria então a história da relação da sociedade, da cultura, dos adultos, com essa classe de idade e a história da criança seria

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a história da relação das crianças entre si e com os adultos, com a cultura e a sociedade. (FREITAS & KUHLMANN Jr, 2002, p. 7)

Embasados pelas idéias apresentadas pelos autores acima citados,

vamos buscar, neste capítulo, a partir de alguns historiadores e outros

estudiosos desta temática, fazer uma retomada da história da infância, e da

própria criança, bem como da família e das instituições de Educação Infantil.

Antes de iniciarmos este passeio pela história da infância e das crianças,

porém embasados pela mesma linha de raciocínio já exposta, entendemos

pertinente ainda, lembrarmos que “a imaturidade das crianças é um fato

biológico, mas a forma como ela é compreendida e se lhe atribuem significados

é um fato da cultura” ( PROUT & JAMES, apud, HEYWOOD, 2004, p. 12)

É com base neste novo paradigma da sociologia da infância, proposto

por Alan Prout, Allison James e Chris Jenks em 1998, que Heywood ( 2004)

destaca três proposições bastante frutíferas para quem quer estudar, com base

na história, a infância. São elas:

A primeira é de que a infância deve ser compreendida como uma construção social . Em outras palavras, os termos “criança” e “infância” serão compreendidos de formas distintas por sociedades diferentes. O segundo elemento do novo paradigma é de que a criança é uma variável da análise social, a ser analisada em conjunto com outras, como a famosa tríade classe, gênero e etnicidade. A terceira afirmação era de que as crianças devem ser consideradas como partes ativas na determinação de suas vidas e das vidas daqueles que estão a seu redor. ( HEYWOOD, 2004, p. 12)

Com base nestes postulados teóricos, vamos passar a fazer uma reflexão

sobre a história da infância, retomando algumas épocas históricas com suas

respectivas características e contextualizações, como também alguns teóricos,

estudiosos da educação e da própria criança, que deixaram contribuições

valiosas para a nossa compreensão acerca do assunto, procurando, na medida

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do possível, estabelecer relações entre esta história, a história das famílias e

das Instituições dedicadas ao trabalho com as crianças

É importante registrar que, apesar de estarmos nos utilizando das

classificações por idades, com que a historiografia tradicional marca a

passagem do tempo e as mudanças ocorridas no mundo, temos a clareza de

que as mudanças na forma das pessoas perceberem a infância, possuem toda

uma ligação com os contextos sociais, econômicos, políticos e culturais de

cada época – ultrapassando assim, a idéia de que fatos isolados são

responsáveis pelas mesmas.

3.1.1- Em busca da visão de infância da idade média

Para Ariès (1981), na sua conhecida obra História social da criança e da família, considerada por Heywood (2004), como sendo uma “descrição

abrangente e dramática sobre a ‘descoberta’ da infância e um trabalho

verdadeiramente seminal,” a infância não foi considerada no período medieval,

ou seja, não existia um sentimento de infância que caracterizasse este período

da história da humanidade, como podemos perceber nas citações abaixo:

A primeira refere-se inicialmente a nossa velha sociedade tradicional. Afirmei que essa sociedade via mal a criança, e pior ainda o adolescente. A duração da infância era reduzida a seu período mais frágil, enquanto o filhote do homem ainda não conseguia bastar-se; a criança então, mal adquiria algum desembaraço físico, era logo misturada aos adultos, e partilhava de seus trabalhos e jogos. ( ARIÈS, 1981, p. 10) Até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava representá-la. É difícil crer que essa ausência se devesse à incompetência ou à falta de habilidade. É mais provável que não houvesse lugar para a infância nesse mundo. ( ARIÈS, 1981, p. 50)

São essas afirmações de Ariès (1981), baseadas em sua grande maioria

no estudo e observação da iconografia da época, que fazem com que,

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principalmente historiadores, refutem algumas das suas colocações sobre o

sentimento de infância da idade média:

É muito fácil atacar Ariès, e suas afirmações arrebatadoras sobre a infância podem fascinar o intelecto, mas também são muito arriscadas. Em primeiro lugar, os críticos o acusam de ingenuidade no trato das fontes históricas, e são particularmente severos em relação a suas evidências iconográficas. Ariès fez a famosa afirmação de que, até o século XII, a arte medieval não tentou retratar a infância, indicando que “ não havia lugar” para ela em sua civilização. Tudo o que os artistas produziram foi a figura minúscula ocasional lembrando um homem em escala reduzida: um “ anãozinho horrendo” no caso do menino Jesus. Ninguém questiona a idéia de que as crianças costumam estar ausentes da arte da Alta Idade Média. No entanto, como observa Anthony Burton, a concentração nos temas religiosos fez com que muitas outras coisas também estivessem ausentes, notadamente “ quase toda a vida secular”, o que impossibilita que se isole a criança como ausência significativa. ( HEYWOOD, 2004, p. 24)

Analisando as afirmações de Ariès, bem como as críticas a alguns

aspectos do seu trabalho e, mais detidamente sobre a ausência do sentimento

de infância na idade média, e tomando como base o fato de cada sociedade,

em cada época distinta, ter a sua história da infância, ou seja, a sua visão

acerca desse período da vida, concordamos com estas críticas, até porque

entendemos que o que acontece na realidade é que a maioria das pessoas

partem do princípio de que as idéias e práticas sobre a infância são ‘fatos

naturais’, e acabam se chocando ao descobrirem que outras sociedades

divergem dessas idéias e práticas, ou seja, apresentam dificuldades para

compreender que a infância é um fato social, conforme nos elucida Miranda

(1987).

Assim sendo, o que fica patente é que Ariès (1981), acabou

apresentando algumas conclusões apressadas da história da infância na idade

média, contribuindo assim para que não se considerasse a idéia de infância

dessa sociedade: É incrível, mas há quase quarenta anos atrás o próprio Jacques Le Goff perguntou: “teria havido crianças no Ocidente Medieval?” seguindo a trilha deixada por Philippe Ariès, ele

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buscou a criança na arte e não a encontrou. É verdade. Apressadamente concluiu então que a criança foi um produto da cidade e da burguesia e, portanto, o mundo rural não a conheceu. Pior: a conheceu sim, mas a desprezou, marginalizando-a. Deixo claro que minha perspectiva será bastante diferente. ( COSTA, 2005, p.1-2)

Concordando com esta afirmação, não estamos querendo negar a

grande contribuição deste autor - Ariès, para os estudos acerca da história

social da criança e da família, até porque, temos clareza de que, na realidade,

“Há uma marginalidade conceptual no que respeita á idéia ou imagem de

infância no passado, que é correlata da marginalidade social em que foi tida”

(SARMENTO, In: VASCONCELOS E SARMENTO, 2007, p.26-27), e essas

questões só começam a se tornar mais perceptíveis na atualidade, a partir de

outros estudos, pesquisas e descobertas mais recentes.

Dessa forma, o nosso objetivo com o aprofundamento desse estudo,

com base em autores como Miranda (1987), Cambi (1999), Heywood (2004),

Costa (2005), Sarmento (2007), dentre outros, é buscar alguns elementos e

reflexões que vão, com certeza, corroborar com a seguinte opinião:

Nas palavras da historiadora Doris Desclais Berkvam, isso deixa aberta a questão da possibilidade de existência, na idade média, de “uma consciência da infância tão diferente da nossa, que não a reconhecemos. ( HEYWOOD, 2004, p. 26).

Um dos elementos apresentados por alguns historiadores que criticam a

tese de inexistência do sentimento de infância na idade média, defendida por

Ariès, é baseado na análise de códigos jurídicos da época, que demonstram

que já havia algum reconhecimento das especificidades da infância.

Além desses códigos jurídicos que continham algumas concessões ao

status de minoridade da infância, defendendo os direitos de herança dos

órfãos, livrando da morte os menores de 15 anos envolvidos em roubo e

exigindo, em alguns casos, até o consentimento de crianças com relação a um

casamento; o próprio discurso greco-romano sobre o sujeito, apresentando

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estudos detalhados sobre a infância, demonstram a fragilidade da tese de que

o sentimento de infância não existia na idade média.

Diante dessas evidências, concordamos com a seguinte afirmação: “Uma

abordagem mais frutífera é buscar essas diferentes concepções sobre a

infância em vários períodos e lugares, e tentar explicá-las à luz do material e

das condições culturais predominantes” (HEYWOOD 2004, p.27). É isso que

estamos nos propondo a fazer, considerando também as contradições, que

como veremos mais adiante, sempre estiveram presentes na história da

infância.

“Uma pesquisa francesa recente proclama que a criança nunca foi tão

celebrada como na idade média” (HEYWOOD, 2004, p.28), e um bom exemplo

disso é o próprio papa da época – Leão, o grande, que fazendo suas

pregações no século V dizia que “Cristo amou a infância, mestra da humildade,

lição de inocência, modelo de doçura”. O próprio culto ao menino Jesus, tão

presente durante o século XII, é outro exemplo de exaltação á infância.

Costa (2005), também se reporta a grande revolução que o Cristianismo

representou para a visão de criança, embora ressalte que o processo tenha

sido lento, demorado, levado à cabo pela igreja. Referendando esta idéia ele

cita que:

Os monges criaram verdadeiros “jardins de infância” nos mosteiros, recebendo indistintamente todas as crianças entregues, vestindo-as, alimentando-as e educando-as, num sistema integral de formação educacional. (COSTA, 2005, p. 4)

Ainda com base nos autores já citados, vimos que alguns estudos

recentes sugerem que a Idade Média compreendia a infância como um

processo, ao invés de um estado fixo, ou seja, neste período já existia uma

compreensão de toda esta dinâmica do crescimento, apresentando as

sucessivas etapas vivenciadas pelas crianças até atingir a idade adulta. Este

fato fica patente quando analisa-se a literatura médica, didática e moralizadora

deste período, deixando claro, também, que a Europa medieval reconhecia

algumas qualidades positivas na infância, principalmente nos mais jovens, já

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que os adolescentes eram vistos com algum desagrado pela própria

licenciosidade e lascívia que apresentavam nesta fase da vida.

Não se pode negar que os autores medievais preferiam escrever sobre a

idade adulta, não se dedicando muito à infância, o que fica retratado no fato de

um levantamento de histórias e crônicas da alta idade média ter concluído que

elas eram bastante vazias em relação à infância, como também no fato de que

há um silêncio de mil anos com relação ás crianças entre Santo Agostinho e a

reforma.

Uma reflexão em torno desses fatos nos leva realmente a perceber que,

na verdade, o que acontecia na Idade Média não era um desconhecimento da

idéia de infância, mas uma forma diferente de tratar a infância, talvez mais

vaga ou indefinida até:

De qualquer maneira, o fato é que, historicamente, o papel da criança sempre foi definido pelas expectativas dos adultos, e esse anseio mudou bastante ao longo da história, embora a família elementar e o amor tenham existido em todas as épocas. (COSTA, 2005,p. 2)

No tocante a existência, em todas as épocas, do sentimento de família

elementar e de amor, podemos exemplificar com o fato citado pelo próprio

Costa (2005), de que “Fredegunda, uma das mulheres mais cruéis da história,

apesar de filha do seu tempo bárbaro, chora a morte de seus filhos e afirma

que perdeu o que tinha de mais belo”.

Ou seja, a idade média, como todas as outras épocas da história da

humanidade, teve o seu sentimento, a sua visão de infância, embasados,

obviamente, pelos contextos e conjunturas que a sociedade vivia naquele

período. Vamos prosseguir, analisando outras formas de se considerar a

infância ao longo do tempo, cientes também de que em uma mesma época,

numa mesma sociedade, podem conviver formas diferentes de se pensar e

vivenciar a infância, embora haja a predominância de uma sobre as outras em

cada um desses momentos.

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3.1.2- O sentimento de infância na idade moderna

Apesar das críticas feitas a alguns aspectos do trabalho de Ariès, não se

pode negar que:

Ao se procurarem transformações de longo prazo nas concepções acerca da infância, mais uma vez foram Philippe Áries e sua História Social da Criança e da Família que, em princípio, estabeleceram a agenda para os historiadores. Sua principal preocupação, evidentemente, era documentar o surgimento, durante o período moderno, de um sentiment de l’enfance: uma expressão ambígua, que transmite tanto a idéia de uma consciência da infância quanto de um sentimento em relação a ela. (HEYWOOD, 2004, P. 33) Independente da crítica historiográfica a que a obra de Áries tem sido submetida, há, no entanto, um conjunto de aspectos pelos quais é considerada como uma referência incontornável, a ponto de, de alguma maneira, não apenas a História da infância, mas os estudos da infância em geral, terem sofrido, a partir dela, uma mudança de rumo significativa. (SARMENTO, In: VASCONCELOS E SARMENTO, 2007, P. 27)

Para Ariès ( 1981), foi o fato novo de mães e amas começarem a tratar

as crianças como fonte de prazer, valorizando seus gracejos, espontaneidades

e doçuras, como também a valorização que as famílias passaram a dispensar

a educação, que possibilitaram o surgimento, do que ele classifica como

sentimento de infância na idade moderna, e até mesmo de um novo sentimento

de família:

A família tornou-se o lugar de uma afeição necessária entre os cônjuges e entre pais e filhos, algo que ela não era antes. Essa afeição se exprimiu sobretudo através da importância que se passou a atribuir a educação. Não se tratava mais apenas de estabelecer os filhos em função dos bens e da honra. Tratava-se de um sentimento inteiramente novo: os pais se interessavam pelos estudos de seus filhos e os acompanhavam com uma solicitude habitual nos séculos XIX e XX, mas outrora desconhecida.( ARIÈS,1981, p.11-12)

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Além de Ariès, vários outros historiadores se reportam a fatos diferentes

para justificarem o nascimento de um novo sentimento de infância, ou a

descoberta deste sentimento, na idade moderna:

C. John Sommerville sustenta que “ um interesse permanente pelas crianças na Inglaterra começou com os puritanos que foram os primeiros a se questionar sobre sua natureza e seu lugar na sociedade” ( HEYWOOD, 2004, p. 36) Okenfuss afirma de forma inequívoca que “a infância foi descoberta na Rússia na década de 1690”, tomando como evidência a série de cartilhas eslavas produzidas por Karion Istomin (1640-1717) em Moscou. ( HEYWOOD, 2004, p. 36).

Enquanto alguns historiadores observam a esfera cultural para explicar o interesse renovado nas crianças durante este período, outros destacaram o impacto das transformações econômicas, argumentando que o período entre os séculos XV e XVIII testemunhou o surgimento do capitalismo na Europa Ocidental. ( HEYWOOD, 2004, p. 37)

Como podemos observar, cada autor citado acaba fazendo uma espécie

de reducionismo, colocando o surgimento, ou a mudança no sentimento de

infância na idade moderna, como tendo origem em um único fator, seja ele

emocional, cultural, econômico ou social.

As teses que temos defendido até agora, nos permitem perceber este

reducionismo e afirmar que na realidade, cada época, cada momento histórico,

partindo das transformações de ordem social, econômica, política, cultural,

psicológica, enfim, de todo um contexto mais amplo que cerca as relações em

sociedade, apresenta idéias diferentes sobre a criança e a infância, embora

com a predominância de umas sobre as outras. Com a chamada idade

moderna, não poderia ser diferente!

Com o fim do quatrocentos ( tomando 1453 como ano-chave e ano-símbolo, com a queda do império do oriente, ou 1492, com a descoberta da América, a morte de Lorenzo, o Magnífico, e a expulsão dos mouros de Granada, ou 1494, com o início das dominações estrangeiras na Itália), fecha-se um longo ciclo histórico e preparara-se outro, igualmente longo e talvez ainda inconcluso, que é geralmente designado como Modernidade. Trata-se de um ciclo histórico que tem características

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profundamente diferentes do anterior, em relação ao qual ele opera uma ruptura consciente, manifestando estruturas substancialmente homogêneas e orgânicas. (CAMBI, 1999, p. 195).

Segundo ainda este mesmo autor, como não poderia deixar de ser, as

mudanças no âmbito educacional também são muito grandes e profundas

neste período:

Mudam assim os fins da educação, destinando-se esta a um indivíduo ativo na sociedade, liberado de vínculos e de ordens, posto como artifex fortunae suae e do mundo em que vive; um indivíduo mundanizado, nutrido de fé laica e aberto para o cálculo racional da ação e suas conseqüências. Mas mudam também os meios educativos: toda a sociedade se anima de locais formativos, além da família e da igreja, como ainda da oficina; também o exército, também a escola, bem como novas instituições sociais ( hospitais, prisões e manicômios) agem em função do controle e da conformação social, operando no sentido educativo; entre essas instituições, a escola ocupa um lugar cada vez mais central [...] (CAMBI, 1999, p. 198-199)

Diante de tantas e tão profundas mudanças, fica para nós a seguinte

interrogação: Mesmo considerando todos os fatos, sem reduzir a este ou

aquele único fator as mudanças ocorridas, será que realmente todas as

crianças passaram a usufruir dessas transformações? E a história da infância?

Será que modificou-se por completo, a partir das transformações de ordem

social, econômica, emocional, legal e cultural que se realizaram com o

chamado advento da modernidade?

Na realidade, apesar das grandes contribuições para a história da

criança e da infância, deixadas por todo o contexto sócio-econômico-político-

cultural-filosófico da chamada idade moderna, na nossa opinião, muitas dessas

indagações, só começaram a fazer sentido, a partir de algumas reflexões da

contemporaneidade, principalmente as que dizem respeito as contradições

relativas as concepções de criança e infância que se fazem perceptíveis, não

apenas de uma época, ou de uma sociedade para outra, mas em uma mesma

época, no seio de uma mesma sociedade.

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3.1.3 - Reflexões sobre as contradições da história da infância na contemporaneidade Mesmo considerando as afirmações com que encerramos o item anterior

sobre a idade moderna, para termos uma idéia mais precisa do quanto a

criança, a infância e a história de ambas, ainda precisam ser mais conhecidas,

debatidas e discutidas, principalmente no campo da educação, precisamos

saber que, apesar de todos os avanços já evidenciados acima:

Entretanto, somente em 1990, os sociólogos da infância reuniram-se pela primeira vez no Congresso Mundial de Sociologia para debater sobre os vários aspectos que envolvem o processo de socialização da criança e a influência exercida sobre esta pelas instituições e agentes sociais com vistas à sua integração na sociedade contemporânea. (QUINTEIRO, 2006, p. 01))

Não estamos querendo dizer com isto que, durante os primeiros tempos

da idade contemporânea não aconteceram mudanças ou avanços na história

da criança e da infância, pelo contrário. Estamos querendo apontar o quanto

que ainda precisamos avançar, pois:

A natureza contraditória das idéias e emoções relacionadas à infância é como um fio que percorre a literatura histórica. É impressionante a freqüência com que as palavras ambivalência e ambigüidade aparecem em relação a períodos muito diferentes da história, o que pode não surpreender se partirmos do pressuposto de que as sociedades tendem a abrigar concepções conflitantes de infância. ( HEYWOOD, 2004, p. 49)

Neste momento, em que de forma mais específica, nos propomos a

estudar a criança e a infância na contemporaneidade, vamos nos deter um

pouco mais nesta ambivalência e ambiguidade, optando por aprofundar as

discussões, agora, nas seguintes contradições: impureza/inocência;

inato/adquirido e independência/dependência. É importante ressaltar que,

mesmo que algumas destas contradições tenham sido herdadas até mesmo de

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antes da idade média, vamos estudá-las agora, por compreendermos, como já

frisamos anteriormente, que foi sob a lente das idéias contemporâneas que

passamos a enxergá-las melhor.

Segundo Heywood (2004), tanto a idéia da criança como impura, quanto

como inocente são heranças do Cristianismo, pois foi Santo Agostinho, um dos

chamados pais da Igreja, quem concluiu que a mancha do pecado original fora

transmitida de geração a geração, não poupando nem os recém-nascidos; e foi

o próprio Cristo quem disse, segundo São Mateus, que aquele que não se

converter e se tornar como criança, não entrará no Reino dos Céus.

Como podemos observar tanto pela afirmação acima, como pelos outros

aspectos já apontados no item 1.1, existia uma oscilação, entre dois extremos,

sobre a natureza boa ou má das crianças, desde a mais tenra idade, gerando

opiniões e posições diferentes em relação ao tema, mesmo entre os que

professavam a mesma crença.

O que entendemos mais importante para nós neste momento, é a

reflexão a que a seguinte afirmação nos conduz:

Na verdade, a associação da infância à inocência tornou-se profundamente arraigada na cultura ocidental, especialmente após os românticos deixarem sua marca, no século XIX. Ainda assim, uma coisa era proclamar a natureza angelical da infância em um poema, e outra, bastante diferente, seria criar personagens bem definidas em um romance, ou lidar com moleques de rua, que estavam longe de ser inocentes.(HEYWOOD, 2004, p. 51)

É essa contradição entre uma visão romântica - atemporal e

descontextualizada, que define a criança como um ser angelical, puro,

inocente, espontâneo, naturalmente bom, independente de qualquer coisa; e

algumas realidades vivenciadas por várias crianças, hoje, e ao longo de toda a

história da humanidade, que nos move a continuar estudando e buscando uma

nova forma de compreender a infância e a criança.

Outra ambivalência e ambigüidade bastante presente nos relatos do

passado e do presente sobre a infância é a questão sobre de que natureza é a

personalidade, os chamados dons e/ou aprendizagens da criança. Seriam

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todos herdados biologicamente ou construídos/transmitidos a partir das

experiências do contexto do indivíduo?

Com base ainda nos autores já citados, podemos perceber que a idade

média, de uma maneira geral, tinha uma visão de inteligência e de

personalidade como algo herdado; em alguns momentos dos pais, em outros

da própria classe social a qual o indivíduo pertencia: “Para a mente medieval,

segundo Berkvem, a natureza com a qual se nasce é a influência mais

importante na vida, a matéria-prima sem a qual a criação mais refinada será

desperdiçada” (HEYWOOD, 2004, p. 52)

Embora a denominada Baixa Idade Média estivesse já familiarizada com

a idéia de criança como uma cera mole, possível de ser moldada de várias

formas: “Os educadores identificavam a infância como o período da vida em

que as pessoas eram mais receptivas ao ensinamento, e assim enfatizavam a

importância de se proporcionarem bons exemplos para que os jovens

seguissem.” (HEYWOOD, 2004, p. 52), a predominância ainda era a do

inatismo, ou seja, das características já definidas biologicamente, a partir de

heranças genéticas.

Essa contradição, com certeza, também influenciou muito o tratamento

dado à infância, facultando as discriminações e diferenças, a partir de questões

já pré-definidas e previamente estabelecidas.

Na realidade, foi só a partir do renascimento que o equilíbrio entre o

inato e o adquirido foi mudando, começando uma predominância de idéias em

torno do segundo. “A idéia de que a ‘mão que embala o berço define os

destinos da sociedade’ tornou-se sabedoria aceita.” (HEYWOOD, 2004, p. 52)

Porém, as contradições prosseguiram. De um lado, John Locke, com a

polêmica afirmação de que “de todos os homens que encontramos, nove entre

dez são o que são, bons ou maus, úteis ou não, por sua educação”.

(HEYWOOD, 2004, p. 52), dando origem à questão, que passou para a

posteridade como sendo a idéia de que a criança é uma folha em branco. De

outro, os avanços científicos já do final do século XIX, início do XX, negando

que a criança viesse ao mundo como uma folha em branco e questionando o

que havia em seus genes.

Foi ainda no contexto dessas contradições que surgiram os chamados

testes de QI – propostos inicialmente por Binet & Simon - para aprofundamento

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dessa questão, sugerimos a leitura de Fontana e Cruz, 1997, p. 11-23 - que

acabaram gerando mais motivos para contradições, na medida em que foram

usados também para processos de discriminação de crianças, a partir da

identificação de QIs superiores ou inferiores, oferecendo, inclusive, um

processo educativo diferenciado, com base no nível de inteligência

apresentado por cada criança.

Essa contradição encontra-se hoje já bastante dirimida, até porque a

tendência atual é enfatizar a relação, a interação, entre o inato e o adquirido,

ao invés de priorizar um em detrimento do outro. Neste sentido, foi fundamental

a contribuição dos chamados autores interacionistas, notadamente Piaget

(1896-1980), Vigotski (1896-1934) e Waloon (1879-1962), cujas principais

idéias consideramos relevante retomar nesse momento, mesmo que de forma

breve.

Segundo La Taille (1992), embora Piaget (1896-1980) costume ser

criticado pelo fato de não considerar o papel do social no desenvolvimento

humano, essa crítica é injusta, considerando que o mesmo, embora não tenha

se detido longamente sobre esta questão, deixou balizas muito importantes,

não apenas na sua teoria, mas para a temática de uma forma geral, deixando

sempre muito claro, nas vezes em que se reportou ao assunto que “a

inteligência humana somente se desenvolve no indivíduo em função de

interações sociais que são, em geral, demasiadamente negligenciadas.”

(PIAGET, apud LA TAILLE, In: LA TAILLE, OLIVEIRA E DANTAS,1992, p. 11.)

Ou seja, apesar de propor estágios seqüenciais pelos quais todas as

crianças devem passar, e colocar que o desenvolvimento antecede a

aprendizagem, Piaget (1896-1980) contribuiu muito com a perspectiva

interacionista, esclarecendo, a partir das suas experiências com os próprios

filhos, e de outros estudos e experimentos realizados, que a criança se

desenvolve num intricado processo de trocas e interações entre o biológico e o

meio.

Diferentemente de Piaget (1896-1980), Vigotski (1896-1934) enfatizou

muito o social, o historicamente construído, enfatizando também que não é

preciso esperar por determinadas etapas do desenvolvimento para possibilitar

o acesso à aprendizagem, já que esta última pode impulsionar o primeiro.

Quando afirma que:

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O caminho do objeto até a criança e desta até o objeto passa através de outra pessoa. Essa estrutura humana complexa é o produto de um processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas ligações entre história individual e história social. (VIGOTSKI, 1999, p. 40)

Vigotski (1896-1934) está demonstrando, de forma muito clara, o valor que

atribui ás interações sociais no processo de formação dos aspectos tipicamente

humanos do comportamento. Essa proposta de Vigotski (1896-1934) bem

como os estudos sobre a chamada zona de desenvolvimento proximal, dentre

outros, são fundamentais para todos os educadores que desejam realizar uma

intervenção positiva e produtiva no processo de aprendizagem dos educandos.

Como interacionista, considerando também a relevância do inato e do

adquirido, do biológico e do social, Wallon (1879-1962) deixou uma grande

contribuição para os estudos acerca do desenvolvimento humano, afirmando

inclusive que:

Não há, portanto, hiato inicial entre o social e o individual, ainda que exista naturalmente toda uma série de conflitos entre o que se costuma designar por falta de jeito ou inaptidão da criança e as necessidades de acção imposta pelo meio, estando estas faltas de jeito ou estas inaptidões muitas vezes ligadas a sistemas de actividade cuja estrutura psicológica ou instintiva deve ser modificada pelas estruturas da vida técnica ou social. (WALLON, 1975, p.11)

Outro aspecto fundamental de Wallon (1879-1962), é que na sua

psicogenética “ a dimensão afetiva ocupa lugar central, tanto do ponto de vista

da construção da pessoa quanto do conhecimento”. (DANTAS, In: LA TAILLE,

OLIVEIRA E DANTAS 1992, p.85)

Consideramos pertinente abrir esse parágrafo para nos referirmos

brevemente a algumas idéias básicas de Piaget (1896-1980), Vigotski (1896-

1934) e Wallon (1879-1962), por compreendermos que as mesmas deram um

novo impulso aos estudos e entendimentos acerca do desenvolvimento

humano e, embora encontremos, em alguns aspectos, pontos de vista

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divergentes entre os mesmos, temos clareza de que é possível um diálogo

entre os três, numa perspectiva de complementaridade, a partir de um

entendimento maior do objeto de estudo de cada um, bem como dos

condicionantes sociais, históricos, culturais, ideológicos e de formação

acadêmica dos mesmos.

Vamos prosseguir agora retomando as contradições da história da

infância que, infelizmente, apesar dos avanços teóricos, e até legais, ainda

persistem.

Uma outra contradição também muito presente na história da infância é

a questão da dependência ou independência da criança, principalmente em

relação a idade na qual este processo deve estar mais consolidado. A maioria

dos autores – Heywood, Freitas e Kulmann Jr, Cambi, Costa, dentre outros,

quando se reportam ao assunto são unânimes em afirmar que, embora a idade

de 7 anos fosse referência em algumas culturas e algumas épocas, não existia

uma definição precisa, sendo a classe social a qual a criança pertence um

outro forte indicador de como e quando ela se tornará independente, ou

permanecerá na dependência da família:

Os seres humanos nascem desamparados e, quando se tornam independentes, com o próprio lar, considera-se que tenham deixado para trás a infância e a juventude. Alguns jamais conquistam a independência completa, como no caso de escravos e servos, e assim sofrem da indignidade de serem considerados parcialmente como ‘crianças’ por toda a vida. [...] Ainda no século XIX, a maioria das crianças no ocidente era estimulada a se sustentar muito cedo. A idade de 7 anos era o momento informal da virada, quando geralmente se esperava que os filhos de camponeses e artesãos começassem a ajudar os pais com pequenas tarefas na casa, na fazenda ou no ateliê. (HEYWOOD, 2004, p. 54)

Hoje essa contradição dependência/independência ainda persiste, tendo

também, não somente a idade, mas principalmente as diferenças entre classes

sociais e entre concepção de infância de cada família, ou grupo social, como

fatores determinantes dessa questão: enquanto crianças das chamadas

classes populares, aos 5 ou 6 anos já tomam conta de casa e de irmãos

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menores para que as mães trabalhem fora; nesta mesma idade, e até maiores,

as crianças das classes mais favorecidas economicamente falando, ainda se

encontram pajeadas por babás, que as banham , alimentam e cuidam delas

integralmente.

Na nossa opinião, essas questões que Heywood trata como sendo as

ambigüidades e ambivalências da infância, possuem toda uma relação com as

tratadas por Leite Filho In: Leite Filho; Garcia (2001, p. 50) como sendo os

paradoxos da infância: “ Para Pinto & Sarmento (1997), a maneira como a

sociedade ‘dos adultos’ considera as crianças e suas circunstâncias e

condições de vida dá a infância um caráter paradoxal [...]”

A partir dessa afirmação, o autor supra citado vai colocando o que, para

ele, seriam os inúmeros paradoxos da infância na contemporaneidade.

Partindo do que é proposto pelo autor, porém com uma estrutura textual

diferente, vamos elencar os mesmos:

• Embora a formulação de Leis Nacionais e Internacionais - Constituição

de 88, a convenção dos Direitos da criança em 1989 – aprovada pelas Nações

Unidas, o ECA, a LDB 9394/96, dentre outras, que garantem um conjunto de

direitos fundamentais, próprios e inalienáveis às crianças; elas constituem o

grupo etário onde há mais pobreza, sendo a população mais sujeita a opressão

e afetação das condições de vida; são as principais vítimas dos conflitos

contemporâneos; pertencem a um dos grupos que possui um crescimento

significativo no aumento do número da Aids; São vítimas freqüentes da

prostituição infantil associada ao turismo sexual, do aumento no número de

crianças presas ao trabalho precocemente, bem como vítimas também de

perseguição e assassinato.

• Num mundo que proclama gostar tanto de crianças, o número delas

decresce a cada dia, e as mesmas vão dispondo de muito menos tempo e

espaço.

• Embora acreditando que as crianças precisam estar junto aos pais,

nunca foi tão grande o número de pais que vivem separados.

• Mesmo os adultos dizendo que valorizam a espontaneidade das

crianças, a vida delas é cada dia mais submetidas as regras.

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• As crianças são importantes e sem importância ao mesmo tempo:

embora pareça um consenso que se deve dar prioridade as crianças, as

mesmas continuam alijadas das decisões políticas e econômicas.

• As crianças permanecem longo tempo afastadas do convívio social,

embora os adultos acreditem e preguem que deve ser dada as crianças a

melhor iniciação à vida.

• Há uma crítica as infantilidades das crianças, embora se ache que elas

devam se comportar como crianças

• Ora se cobra da criança uma adultização, tratando-as como adulto em

miniatura; ora elas são infantilizadas, sendo consideradas como imaturas e

despreparadas.

• Mesmo defendendo que as crianças devem ser educadas para a

liberdade e a democracia, a organização das instituições e serviços dedicados

à infância, se utilizam muito do controle e da disciplina.

Na realidade, o que podemos inferir de todos estes paradoxos, é que:

Apesar do ordenamento legal ter avançado no Brasil, no sentido de conceitos e estabelecimento de direitos para as crianças, a situação da infância brasileira ainda não é boa, ou mesmo razoável. Muito ainda se tem por fazer. Educadores, pesquisadores, governantes e em especial professores precisam, vigilantemente, lutar para assegurar as conquistas já alcançadas ‘no papel’, mas que não se concretizaram na realidade. (LEITE FILHO, In: LEITE FILHO E GARCIA, 2001, p. 52)

Essa afirmação nos leva a inferir que, além de todas as ambigüidades,

ambivalências e paradoxos já mencionados, existe uma outra questão que

permeia também toda a história da criança e da infância: é a contradição entre

o legal e o real; entre o discurso e a prática.

Comênios (1592-1657), ainda no século XVII, pregava a necessidade de

“uma educação que ensinasse tudo a todos”; em pleno século XXI, a escola

continua segregando e discriminando crianças, jovens e adultos. Esse mesmo

autor se refere ainda a importância de uma educação voltada para as crianças

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menores de 6 anos de idade, designada por ele como ‘escola maternal’, aberta

também para todas as crianças indistintamente; ainda hoje – séc. XXI, as

estatísticas dizem o seguinte:

Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2003, apenas 37,7% do total de crianças com idade entre 0 e 6 anos freqüentam uma instituição de Educação Infantil ou de Ensino fundamental. (BRASIL, 2005, p.06)

Rousseau (1712-1772), ainda no século XVIII, igualmente a Comênios

(1592-1657), redimensiona a idéia de infância, propondo que a criança

deixasse de ser vista como um adulto em miniatura e passasse a ser

considerada e respeitada como um indivíduo que vive um período especial da

vida, a infância; Pestalozzi (1746-1827), também se referia à pedagogia do

afeto; porém, ainda hoje, vemos nos paradoxos já apresentados, as

dificuldades de se levar esse respeito, essa consideração, esse afeto, para a

convivência diária com as crianças. Os chamados educadores da infância –

Froebel (1782-1852), Decroly (1871-1932) e Montessori (1879-1952), dentre

outros, ainda no final do século XIX, início do século XX, afirmam a

necessidade de uma educação mais livre, que respeite a subjetividade, a

espontaneidade das crianças; um espaço arejado, amplo, específico para o

trabalho com a criança pequena, porém, ainda hoje – séc. XXI, encontramos as

crianças abafadas em cubículos, submetidas a rigidez de rotinas repetitivas:

Refiro-me a experiências que trazem para a pré-escola, especialmente, o modelo da escola fundamental, as atividades com lápis e papel, os jogos ou atividades realizadas na mesa, a alfabetização ou a numeralização precoce, o cerceamento do corpo, a rigidez dos horários e da distribuição das atividades, as rotinas repetitivas, pobres e empobrecedoras. (BUJES In: CRAIDY; KAERCHER, 2001, p. 17)

Tem razão Heywood (2004) quando afirma a existência de um fio de

ambivalências e ambigüidades percorrendo toda a história da criança e da

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infância. Esta constatação nos leva também a afirmar que, realmente a infância

é socialmente construída, cada sociedade tem a sua concepção, e várias

concepções subsistem num mesmo período e numa mesma época, embora

precisemos reconhecer que, apesar de tudo isso, existem características que

são próprias, inerentes ao período da infância, e que elas – as crianças, não

podem deixar de ser consideradas: “ [...] como sujeitos que vivem um

momento em que predominam o sonho, a fantasia, a afetividade, a brincadeira,

as manifestações de caráter subjetivo.” (BUJES, In: CRAIDY; KAERCHER,

2001, p. 17)

Entendemos que só essa percepção da infância como fato social,

construída historicamente, nos possibilita a compreensão e o respeito ás

especificidades da mesma, bem como a luta por uma Educação Infantil que

considere essas especificidades, promovendo a vivência das cem linguagens

da criança, conforme nos propõe Malaguzzi (In: Edwards, Gandim e Formam,

1999) no seu belo poema:

AO CONTRÁRIO, AS CEM EXISTEM (Loris Malaguzzi.)

A criança É feita de cem.

A criança tem cem mãos Cem pensamentos

Cem modos de pensar De jogar e de falar. Cem sempre cem Modos de escutar

De maravilhar e de amar. Cem alegrias

Para cantar e compreender. Cem mundos

Para descobrir Cem mundos Para inventar Cem mundos Para sonhar. A criança tem

Cem linguagens ( e depois cem cem cem)

mas roubaram-lhe noventa e nove. A escola e a cultura

Lhe separaram a cabeça do corpo. Dizem-lhe:

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De pensar sem as mãos De fazer sem a cabeça

De escutar e de não falar De compreender sem alegrias De amar e de maravilhar-se

Só na páscoa e no Natal. Dizem-lhe:

De descobrir um mundo que já existe E de cem roubaram-lhe noventa e nove.

Dizem-lhe: Que o jogo e o trabalho A realidade e a fantasia

A ciência e a imaginação O céu e a terra

A razão e o sonho São coisas

Que não estão juntas. Dizem-lhe enfim:

Que as cem não existem. A criança diz:

Ao contrário as cem existem.

3.2- As I.E.I. ao longo da história

Em falando de crianças e infância, não poderíamos deixar de nos

reportar as instituições que, historicamente, também foram criadas para

atender a estas crianças:

As creches e pré-escolas surgiram depois das escolas e o seu aparecimento tem sido muito associado com o trabalho materno fora do lar, a partir da revolução industrial. Devemos lembrar, no entanto, que isto também esteve relacionado a uma nova estrutura familiar, a conjugal, na qual pai/mãe/seus filhos passaram a constituir uma nova norma, diferente daquelas famílias que se organizavam de forma ampliada, com vários adultos convivendo num mesmo espaço, possibilitando um cuidado que nem sempre estava centrado na figura materna. (BUJES, In: CRAIDY E KAERCHER, 2001, p. 14)

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É interessante percebermos que, da mesma forma que Bujes (In:

CRAIDY e KAERCHER, 2001), mais recentemente, estabelece relações entre

as mudanças na estrutura familiar e o surgimento das instituições que atendem

a criança pequena, Ariès, (1981), antes dela, também relaciona um novo

sentimento de família com a educação.

Para nós fica patente, mais uma vez, a estreita relação entre família e

escola – referendando ainda mais a relevância da temática que trazemos

novamente à tona nesse trabalho. Vamos agora fazer uma breve retrospectiva

das funções exercidas pelas creches e pré-escolas ao longo da história, nos

detendo um pouco mais na função proposta na contemporaneidade.

O contexto histórico desse atendimento tem revelado, ao longo do tempo, uma divergência de ênfase no que se refere às funções da pré-escola. Inicialmente, o atendimento proposto às classes populares foi médico e sanitário; em seguida, passou a incorporar o aspecto nutricional e social, e só mais recentemente incluiu uma preocupação educacional. Essas funções, por um lado, acompanham as profundas transformações sociais que os países em desenvolvimento vêm enfrentando e, por outro, são influenciadas pelas descobertas da psicologia e da pedagogia modernas, no que se refere ao processo de desenvolvimento e aprendizagem da criança. (SOUZA, In: KRAMER; SOUZA, 1991 p.13)

Este texto de Souza, escrito em 1991, e por isso não contemplando

ainda a função proposta para a Educação Infantil na atualidade – educar e

cuidar, se reporta a uma questão importante que merece ser discutida e

refletida: o fato da função atribuída á Educação Infantil, na época do escrito da

autora ainda denominada de pré-escola, passar realmente por muitas

divergências, no tocante ao que é, ou não, enfatizado em cada época, cada

sociedade e, por que não dizer, cada classe social a qual o trabalho era

destinado.

Igualmente a concepção de infância, podemos afirmar que as funções

atribuídas a Educação Infantil, também são, muitas vezes, ambíguas,

ambivalentes e paradoxais, chegando a coexistir, numa mesma sociedade e

em um mesmo período histórico, funções tão diferentes, que se torna difícil

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perceber que estamos tratando da mesma modalidade de ensino. Saber que as

transformações sociais, bem como as novas descobertas das ciências,

contribuem para mudanças nas funções da Educação Infantil, nos ajuda a

compreender um pouco o porque de algumas dessas ambigüidades.

Vamos agora, com base em estudos de Abramovay e Kramer (In:

SOUZA e KRAMER, 1991), retomar algumas funções que a Educação Infantil

vem assumindo ao longo da história, para depois prosseguirmos nas nossas

reflexões:

» Guardar as crianças – função guardiã

Esta função aparece, a partir do próprio surgimento das instituições de

Educação Infantil, por volta do século XVIII, como reflexo das

transformações sociais, econômicas e políticas. Tem um caráter

assistencialista, objetivando guardar as crianças para as mães poderem

ingressar no mercado de trabalho.

É interessante perceber que, nessa proposta inicial de surgimento das

I.E.I., o objetivo das mesmas não era atender as necessidades das

crianças, mas das mães trabalhadoras. Essa percepção nos ajuda, não a

aceitar, mas a entender muitas das questões que até hoje permeiam o

trabalho realizado por algumas dessas I.E.I.

» Compensar as carências infantis - função preparatória

Essa função surge, por volta do Séc. XIX, a partir da influência de

Froebel (1782 - 1852) nas favelas da Alemanha; de Montessori (1870 -

1952) nas favelas da Itália e de Reabodif nas favelas americanas.

Compensar as deficiências das crianças, sua miséria, sua pobreza e a

negligência das suas famílias era o objetivo dessa função atribuída a

Educação Infantil.

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Após a 2ª Guerra Mundial, influenciadas, de um lado pela psicanálise e

pelas teorias do desenvolvimento infantil; de outro pelos estudos lingüísticos

e antropológicos, aliados as pesquisas que correlacionavam linguagem e

pensamento com rendimento escolar, dando origem a abordagem da

chamada “privação cultural”, essa abordagem foi fortalecida. No Brasil, o

auge foi a década de 70, onde a chamada pré-escola, foi considerada

como a solução para todos os males, capaz de suprir todas as carências e

deficiências, atribuídas, principalmente, as crianças das classes populares.

» Promover o desenvolvimento global e harmônico da criança - Objetivos em si mesma.

Com uma filosofia bastante ampla – promover o desenvolvimento global

e harmônico da criança, essa proposta acabou facultando um

esvaziamento da função da pré-escola. Sob o disfarce de que tem funções em si mesma, cabe tudo, sem uma discussão mais aprofundada sobre um

trabalho que traga contribuições reais para as crianças. “Já que a pré-

escola não é responsável pelo desempenho no 1º grau, ela até não

necessita de qualidade, podendo ser informal, não-convencional,

assistemática etc” (ABRAMOVAY & KRAMER, In: SOUZA; KRAMER, 1991,

p. 28)

» Instrumentalizar as crianças – função pedagógica

Considerar a realidade e os conhecimentos infantis como ponto de

partida, buscando ampliá-los através de atividades que possuam um

significado concreto para a vida das crianças, assegurando

simultaneamente a aquisição de novos conhecimentos, é a proposta dessa

nova função atribuída a Educação Infantil. A mesma preconiza também uma

confiança nas possibilidades de desenvolvimento das crianças e uma

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valorização das suas manifestações, organizando um trabalho sistemático

e intencional.

Mesmo considerando a brevidade com que foram apresentadas, estas

são, em linhas gerais, as principais funções atribuídas/assumidas pela

Educação Infantil ao longo do tempo. Porém, é preciso acrescentar que, a

predominância, e até mesmo a existência - ou não, de uma ou outra dessas

funções, está atrelada, não apenas ao tempo cronológico e/ou histórico,

mas também - e até mesmo principalmente, a classe social a qual a criança

pertence.

Dessa forma, tanto a função guardiã, quanto à preparatória,

estiveram/estão muito mais presentes nas instituições que trabalham com

as crianças das classes populares, enquanto aquelas funções mais voltadas

para a educação e o desenvolvimento de forma mais ampla, estão mais

presentes no trabalho voltado para as crianças das classes mais abastadas.

É importante que se diga também que, mesmo que de forma implícita,

disfarçada apenas sobre a capa da guarda, da assistência, ou até mesmo

do cuidado, todas essas funções possuem um caráter educativo/formativo

que precisa ser desvelado e discutido, para que não continue a ser

direcionado apenas para a submissão e a aceitação da ideologia neo-

liberal.

Após essas considerações, vamos discutir a função proposta para a

educação infantil na atualidade, buscando perceber também, seus desafios

e possibilidades.

» Educação Infantil na contemporaneidade - Educar e Cuidar

Segundo Tiriba (2006), foi após a primeira metade da década de 80, que

a expressão guarda – até então utilizada por textos acadêmicos e documentos

oficiais para se referir as atividades assistenciais desenvolvidas pelas creches,

passou a ser substituída pelas palavras cuidado e cuidar. E foi só na década de

90, com a possibilidade das creches e pré-escolas serem incorporadas aos

sistemas de ensino como primeira etapa da educação básica, que se começou

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a pensar sobre a possibilidade de integração entre as atividades de cuidado,

realizada pelas creches, e as de cunho pedagógico, desenvolvidas nas pré-

escolas.

Essas propostas de mudança estão respaldadas por todo um amparo

legal, que surgiu também nesse período, impulsionado pela Constituição de 88,

e sistematizado e detalhado pelo ECA de 1990, pela LDB 9394/96, e por

algumas outras leis e documentos referendados pelo próprio Ministério da

Educação, onde a Educação Infantil, que antes era considerada,

primordialmente, um direito das mães trabalhadoras, passa a ser um direito da

criança: “Hoje, pelo ordenamento legal, temos assegurada no Brasil uma

concepção de criança cidadã e de Educação Infantil como direito da criança.” (

LEITE FILHO, In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001, p. 46)

Retomando as nossas reflexões iniciais sobre a função da Educação

Infantil, e após tomar conhecimento de algumas dessas funções que

predominaram ao longo da história, bem como das mudanças propostas para a

nomenclatura, e dos aportes legais impulsionados pela Constituição de 88, nos

deparamos com a função proposta para essa modalidade de ensino na

contemporaneidade, cuja “solução conceitual encontrada foi o binômio educar

e cuidar.” (TIRIBA, 2006, p. 2)

Porém, essa solução conceitual não foi suficiente para dirimir um

impasse que continua presente na Educação Infantil, que é discutir e refletir

sobre duas ações indissociáveis – educar e cuidar que, equivocadamente, são

vivenciadas de forma totalmente dissociada na prática pedagógica da maioria

das instituições infantis. Dissociação esta que pode ser compreendida a partir

da seguinte afirmativa:

A visão negativa de creche, como uma instituição que cuida de crianças pobres, as quais não podem desfrutar do convívio de seus pais que estão sempre ausentes do lar, trabalhando, e a visão positiva de pré-escola ou jardim-de-infância, freqüentados por crianças ricas, cujas famílias optam por deixar as crianças por um determinado período de tempo, a fim de que convivam com outras crianças de seu meio social e recebam ensinamentos morais , manuais e intelectuais pode ter dado início à separação entre cuidar, educar e brincar que ainda hoje marca as práticas pedagógicas das instituições de Educação Infantil. (ASSIS, In: ANGOTTI, 2006, p.97)

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Essa marca citada pela autora, na nossa visão, pode ser compreendida,

primordialmente, a partir de duas situações bem presentes nas práticas dessa

modalidade de ensino: primeiro, a desvalorização da função/ação de cuidar,

que leva a uma relação direta com a maternagem, o que acaba desvalorizando

as profissionais que atuam nessa área, distanciando-as inclusive do processo

de formação profissional tão necessário e urgente, considerando as

especificidades do trabalho com as crianças da Educação Infantil:

A injusta estrutura social brasileira espelha-se sobremaneira nas instituições educacionais, onde as atividades de cuidado são empurradas para os de menor salário e status, dado que a elas é atribuído um menor valor que àquelas denominadas educativas. (ROSSETI-FERREIRA, 2003, p.10)

Em segundo lugar, essa aparente dicotomia entre educar e cuidar,

principalmente nas instituições públicas, destinadas as crianças das classes

populares, acaba prejudicando o trabalho realizado, na medida em que,

disfarçada em uma prática equivocada só de cuidados, essas instituições

trabalham, mesmo que implicitamente, uma educação voltada para a

subserviência, totalmente distanciada do seu caráter emancipatório, caráter

esse, já apontado como primordial na introdução desse trabalho, a partir da

proposta de Assmann (2007).

Para ilustrar essa situação, vamos lembrar um exemplo de uma rotina de

banho numa creche, que se assemelhava “as linhas de montagem das fábricas

ironizadas por Charles Chaplin no filme Tempos Modernos” (ROSSETI-

FERREIRA, 2003, p.10), tanto pelas ações mecânicas realizadas pelas

professoras, quanto pela situação de submissão, silêncio e passividade as

quais as crianças eram submetidas, sem o mínimo incentivo e possibilidade de

iniciativa e autonomia, numa atividade permanente da rotina diária, como é a

atividade do banho, onde as crianças poderiam estar sendo estimuladas a

desfrutar o prazer da água escorrendo no corpo, bem como a interagir e brincar

umas com as outras, dentre outras possibilidades.

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100

Essas duas questões explicitadas acima, como também a da

escolarização precoce – onde a Educação Infantil continua a ser vista apenas

como tendo a função de preparar para o nível posterior da escolaridade, dentre

outras vivenciadas no cotidiano das I.E.I., apontam para a urgência da

superação dessa dicotomia, superação essa que, conforme aponta Haddad

(2003), passa pela necessidade de se profissionalizar o cuidado e também de

se ampliar o conceito de educação. Aproveitamos para acrescentar a

pertinência também de se incluir o brincar como um outro elo importante nesse

processo, devendo ser percebido mesmo como um eixo norteador fundante do

trabalho realizado com a criança na Educação Infantil:

É importante que se processe uma nova forma de interpretar o educar na Educação Infantil, uma prática educativa a partir da brincadeira talvez seja um caminho. Na brincadeira, a professora pode intervir pedagogicamente nas ações de cuidado e educação, a fim de promover o desenvolvimento das crianças nas instituições de Educação Infantil. Assim, reconhecendo a intencionalidade do trabalho educativo que se configura pela mediação que a professora estabelece entre a criança e o conhecimento, há de se considerar que a Educação Infantil é um direito da criança, por meio do qual ela encontra condições para se apropriar ativamente do mundo, através da tríade cuidar-educar-brincar. ( ASSIS, In: ANGOTTI, 2006, p.99)

Considerando que a pertinência da inclusão do brincar já ficou

referendada pelas afirmações acima, e que a sua relevância para o

desenvolvimento infantil será melhor explicitada e discutida no próximo

capítulo, onde ele constará como uma das temáticas estudadas/trabalhadas,

tanto com as professoras, como com as crianças e suas famílias, vamos agora

prosseguir com as nossas reflexões em torno do cuidar e do educar, buscando,

nas propostas dos autores que serão citados a seguir, compreender, ampliar e

profissionalizar essas ações, para que elas possam ser incorporadas à prática

pedagógica das instituições de Educação Infantil, trazendo uma contribuição

efetiva para os processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças.

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101

Apesar de termos clareza de que essas ações são indissociáveis,

conforme já apontamos acima, compreendemos também que as mesmas

possuem especificidades que precisam ser apresentadas e discutidas, para

que possam ser trabalhadas de forma integrada. Porém, considerando que as

maiores polêmicas giram em torno do cuidar, pela desvalorização histórica que

essa prática carrega, vamos nos deter, inicialmente, um pouco mais na

discussão da mesma.

Ao refletirmos sobre o cuidar na Educação Infantil, não podemos deixar

de nos reportar a famosa fábula número 220 de Higino (43 a.C. -17 d.C),

resgatada por Boff (2003), e que nós pedimos permissão para reproduzir aqui:

Certo dia, cuidado, passeando nas margens do rio, tomou um pedaço de barro e moldou-o na forma do ser humano. Nisso apareceu Júpiter e, a pedido de Cuidado, insuflou-lhe espírito. Cuidado quis dar-lhe um nome, mas Júpiter lho proibiu, querendo ele impor o nome. Começou uma discussão entre ambos. Nisso apareceu a Terra, alegando que o barro é parte de seu corpo e que, por isso, tinha o direito de escolher um nome. Gerou-se uma discussão generalizada e sem solução. Então todos aceitaram chamar Saturno, o velho deus ancestral e senhor do tempo, para ser o árbitro. Este tomou a seguinte sentença, considerada justa: - você Júpiter, que lhe deu o espírito, receberá o espírito de volta quando essa criatura morrer. Você, Terra, que lhe forneceu o corpo, receberá o corpo de volta, quando essa criatura morrer. E você, Cuidado, que foi o primeiro a moldar a criatura, acompanhá-la-á por todo o tempo em que ela viver. E, como vocês não chegaram a nenhum acordo sobre o nome, decido eu: chamar-se-á homem, que vem de húmus, que significa “terra fértil”. (p.28-29)

Dessa forma, podemos dizer que: “O cuidado é o a priori ontológico,

aquilo que deve existir antes, para que possa surgir o ser humano. O cuidado,

portanto, está na raiz frontal da constituição do ser humano. Sem ele, o

humano não existiria” (BOFF, 2003, p. 29). O que nos leva a compreender a

relevância e a necessidade desse redimensionamento em torno da questão do

cuidado na Educação Infantil, retirando-o da perspectiva apenas dos chamados

cuidados primários – que apesar de necessários e relevantes também, estão

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sempre, meio que de forma pejorativa, condicionados a maternagem,

ampliando-o, conforme propõem os autores abaixo elencados:

Segundo Bujes (In: CRAIDY E KAERCHER, 2001), cuidar, envolve não

só os cuidados primários como higiene, sono e alimentação, mas também

prover ambientes acolhedores, seguros, alegres, instigadores, com adultos

bem preparados, organizados para oferecer experiências desafiadoras e

aprendizagens adequadas às crianças de cada idade, o que precisaria envolver

também a organização de horários e de espaços, bem como a atenção aos

materiais e brinquedos e o respeito ás manifestações individuais.

Para Costa (2005), os cuidados na Educação Infantil estão relacionados,

tanto à sobrevivência, como ao desenvolvimento da identidade das crianças, o

que propicia que se leve em conta as necessidades integrais das mesmas,

suas peculiaridades e sua condição de sujeito ativo do seu processo de

desenvolvimento.

Assis (In: ANGOTTI, 2006), em se referindo ao cuidar, diz que o mesmo

não é a parte menos nobre, ou o mal necessário do fazer na Educação Infantil,

mas sim, é parte integrante do fazer docente nessa modalidade de ensino,

sendo tão importante quanto à educação. Já Didonet (2003), aponta que:

Não há um conteúdo “educativo” na creche descolado dos gestos de cuidar. Não há um “ensino”, seja um conhecimento ou um hábito, que use via diferente da atenção afetuosa, alegre, disponível e promotora da progressiva autonomia da criança. (p. 6)

Compreendendo já bastante referendada, tanto a relevância e a

necessidade do cuidado na Educação Infantil, quanto a sua abrangência e

complexidade, vamos agora explicitar o que compreendemos como educar, de

forma mais específica, e retomar a indissociabilidade entre o cuidar e o educar,

para que possamos refletir sobre como está a vivência dessa nova função nas

instituições de Educação Infantil, atualmente.

Para Bujes (In: CRAIDY; KAERCHER, 2001), educar, considerando

educação como o processo através do qual a criança passa a participar de

uma experiência cultural que é própria do seu grupo social, tendo direito a

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acolhimento, segurança, lugar para a emoção, para o gosto, para a

sensibilidade, o desenvolvimento de habilidades sociais, o domínio do espaço e

do corpo, a curiosidade e a investigação; é considerado como a condição de

promover todos estes aspectos.

Essa abrangência do educar, retirando-o da esfera apenas do cognitivo,

do conceitual, clarifica mais ainda o caráter realmente complementar e

indissociável que existe entre o educar e o cuidar, nos levando a perceber

também que;

A compreensão de que uma ação não exclui a outra é muito importante para compreender que a criança deve ser tratada como um ser único e não dividida em cognitivo e físico. Consequentemente, a postura da professora não deve se diferenciar entre as atividades de higiene/saúde e as pedagógicas, até porque, em ambas ela está educando e cuidando, e essa ação indissociável é o objeto de trabalho da professora de Educação Infantil. (DUTOIT, consultora do RCNEI, texto mimeografado)

Após todas essas considerações sobre a função da Educação Infantil na

atualidade, bem como da necessidade de continuar refletindo sobre as

ambivalências, ambigüidades e paradoxos, que, além de permear a história

da infância, aparecem também na história desta modalidade de ensino,

podemos nos indagar: será que, pelo fato de estar amparada por todo um

aporte legal, bem como pela valorização que demonstra para com os

processos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, essa nova

função está promovendo mudanças na realidade das mesmas, e sendo

realmente contemplada nas instituições de Educação Infantil?

Infelizmente, com base em todo um estudo, é o autor Leite Filho (In:

LEITE FILHO; GARCIA, 2001), que nos responde, afirmando que, embora todo

este aparato em torno da nova função, e mesmo a legislação apresentando a

Educação Infantil como um direito de criança:

Isto não assegura, no entanto, que a realidade das crianças brasileiras tenha mudado, nem mesmo que as creches e pré-escolas tenham modificado suas propostas e seus trabalhos

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pedagógicos no sentido de, coerentemente com novas leis e diretrizes, desenvolverem um cuidar das/educar as crianças de acordo com uma pedagogia cidadã, que sem dúvida passou a ser demandada na última década do final do século passado (LEITE FILHO, In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001, p. 46)

Ou seja, mais uma vez, vamos nos deparar com um paradoxo,

considerando que, embora definida e assegurada em lei, a função da

Educação Infantil continua sem atender aos interesses das crianças, na medida

em que a grande maioria das instituições que trabalham com esta modalidade

de ensino, ainda não modificaram as suas propostas no sentido de contemplá-

la.

Essa é a realidade com a qual nos deparamos na nossa prática de

formadoras de professoras da Educação Infantil. Na verdade, a afirmação mais

coerente é a de que todas essas funções atribuídas a Educação Infantil ao

longo da história, ainda se encontram presentes nas instituições infantis do

nosso estado e, porque não dizer, do nosso País.

Muitas das nossas instituições – apesar dos avanços legais já

conquistados no papel, ainda se apresentam como verdadeiros depósitos de

crianças, apenas ‘guardando-as’, enquanto suas mães buscam o trabalho fora

do lar, sem nenhuma preocupação efetiva com os processos de aprendizagem

e desenvolvimento dessas crianças. Outras se estruturam como verdadeiras

‘escolas preparatórias’, objetivando, através de exercícios e treinamentos

monótonos e repetitivos, com base mnemônica - sem nenhum incentivo a

reflexão e a criatividade, deixar o aluno ‘pronto’ para o ingresso no Ensino

fundamental.

Essa realidade, ainda tão preocupante, nos leva a uma clareza maior da

relevância de estarmos, cada vez mais, estudando, discutindo e refletindo

sobre a formação das crianças, bem como buscando o fortalecimento da

relação entre família e Instituição de Educação Infantil, como uma forma de

possibilitar que os direitos dessas crianças ultrapassem a letra das leis, e

cheguem à realidade das nossas instituições, principalmente as instituições

públicas, onde estão ás crianças das classes populares que, na maioria das

vezes, dispõem apenas desse espaço como oportunidade de se tornarem

atores, sujeitos da sua própria história.

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3.3 - As famílias e suas histórias Em pesquisa anterior, Farache (2004), já citada na introdução e no

capítulo 1 desse mesmo trabalho, fizemos uma retrospectiva da história da

família, retomando desde a chamada família consangüínea, passando pelas chamadas famílias punaluana, sindiásmica e patriarcal, que se

caracterizavam, respectivamente, por se fundarem sobre matrimônios de várias

irmãs carnais e colaterais com os maridos de cada uma das outras no interior

de um grupo, ou de vários irmãos com as mulheres dos outros, passando pelos

matrimônios entre casais singulares, mas sem obrigação de coabitação

exclusiva, bem como sobre o matrimônio de um homem com diversas

mulheres, até chegarmos na chamada família nuclear, composta por pai, mãe e

filhos, entre outras estruturas atuais.

Dessa forma, considerando o estudo já realizado anteriormente,

optamos, neste capítulo, por discutir e refletir um pouco mais sobre os

impactos das transformações sociais, econômicas, tecnológicas, culturais e

políticas sobre as várias estruturas familiares da contemporaneidade, sempre

com a convicção de que: tenha a estrutura que tiver, a família é fundamental na

vida e na formação do indivíduo.

Outro ponto importante que vale a pena ressaltar é que:

Embora a cada momento histórico corresponda um modelo de família preponderante, ele não é único, ou seja, concomitante aos modelos dominantes de cada época, existem outros, com menor expressão social, como é o caso das famílias africanas escravizadas. Além disso, o surgimento de uma tendência não elimina imediatamente a outra, prova disso é que neste início de século podemos identificar a presença do homem patriarca, da mulher “rainha do lar” e da mulher trabalhadora. Assim, não podemos falar de família, mas de famílias, para que possamos tentar contemplar a diversidade de relações que convivem em nossa sociedade. (PEQUENO, 2004, p.3)

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Ou seja, apesar da família ser uma instituição social e historicamente

construída, tendo estruturas diferenciadas em cada momento histórico e

contexto sócio-econômico-cultural diversos, várias estruturas familiares

diferentes acabam convivendo e existindo num mesmo período e no interior de

uma mesma cultura. É importante termos clareza desse fato, para buscarmos

vencer o preconceito de que é preciso haver um único modelo de família e/ou

de que apenas esse único modelo possui uma estrutura capaz de contribuir, de

forma positiva, com a formação das novas gerações.

Podemos dizer que a nossa sociedade contemporânea é campeã na

coexistência de várias estruturas familiares: famílias nucleares – pai, mãe e

filhos; famílias alargadas – pai, mãe, filhos, avós, tios, primas; famílias sem

laços consanguíneos – crianças adotadas por casais ou por uma única pessoa;

as chamadas famílias monoparentais, que são chefiadas só por mulheres ou só

por homens – pai ou mãe e os filhos do casamento desfeito; famílias

compostas por casais homossexuais e filhos adotivos ou filhos de um dos

membros do casal; as chamadas famílias unidas ou reconstituídas - formadas

por um casal, os filhos de cada um - frutos de uniões anteriores, e os filhos de

ambos, dentre outras estruturas que por ventura nos escaparam.

Conforme já foi apresentado e discutido no decorrer desse trabalho,

existe uma relação direta entre as transformações sociais e as estruturas

familiares. Considerando que, como nos aponta Assmann (2007), nunca

houve, ao longo da evolução da espécie humana, mutações e transformações

tão profundas e rápidas em vários aspectos da vida cotidiana, como podemos

constatar no atual período histórico, fica mais fácil compreender essa

diversidade de estruturas familiares da contemporaneidade.

Vamos agora refletir um pouco mais sobre algumas dessas

transformações e mutações, e seus principais impactos sobre as famílias,

partindo da seguinte afirmação:

As mudanças decorreram de vários fatores: impacto da tecnologia e das novas idéias sobre a economia, com as modificações correspondentes da natureza, da organização e da divisão do trabalho; transformações demográficas e sociais ligadas ao crescimento populacional e que levam a uma rápida industrialização e urbanização; migrações étnicas e políticas, e,

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como conseqüências de todos esses fenômenos, ameaças implícitas aos sistemas de valores tradicionais. (HUGHES, In: DELORS, 2005, p. 39-40)

Como podemos perceber, as mudanças de ordem tecnológica e

econômica, que levaram, inicialmente, as famílias a deixarem o campo e se

mudarem para as cidades, desde o final do século XVIII - com a chamada

revolução industrial, modificaram enormemente a estrutura das famílias,

propiciando que as mesmas rompessem com as chamadas famílias alargadas

- onde pais, avós, tios e vizinhos, possuíam uma responsabilidade maior e mais

direta com as crianças com as quais conviviam; para as chamadas famílias

nucleares, que diminuíram muito de tamanho quando chegaram as cidades –

ficando reduzida a pai, mãe e filhos, perdendo assim, não apenas a

possibilidade de vários adultos para cuidar e educar a criança no próprio

ambiente doméstico, como também, alguns valores e tradições arraigados a

esses ambientes e transmitidos a essas novas gerações, em sua grande

maioria, a partir da tradição oral e da própria convivência no dia-a-dia.

Podemos afirmar que esse foi o primeiro grande impacto, seguido por

outros, decorrentes deste e, mais notadamente, os que dizem respeito a

independência e emancipação feminina que, infelizmente, mesmo sem nos

arvorarmos aqui a discutir o aspecto moral e ético da questão, contribuíram

também para as modificações nas estruturas familiares, a partir do momento

em que, saindo para o mercado de trabalho e buscando, através das lutas

feministas, não apenas sair do estado de subserviência em que vivia em

relação aos homens – o que consideramos válido; mas buscando ultrapassá-

los em questões que vão de encontro a sua própria natureza biológica e

emocional, acabou sendo protagonista e vítima, ao mesmo tempo, de uma

crise de valores que contribuiu, a nosso ver, com alguns problemas que

enfrentamos hoje - com nossas crianças, jovens e até mesmo adultos.

Principalmente os que dizem respeito a busca desenfreada do individualismo,

do consumo, do ter, em detrimento do ser; mesmo reconhecendo aí, também,

as questões de ordem econômica e política, principalmente hoje, com as novas

tecnologias da informação e do conhecimento (TIC), que transformam o mundo

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numa aldeia, onde as notícias e tendências se espalham e são absorvidas

numa velocidade alarmante.

A grave crise de valores que se alastra no mundo contemporâneo tem

chegado a um patamar que nos leva a perder os parâmetros do que seria ético,

moral e humano, devendo ser apresentado e discutido nos processos

formativos das novas gerações. Antes das bruscas e profundas mudanças as

quais já nos referimos, aonde fosse, a criança e o jovem se deparavam com os

mesmos valores e tradições, que, embasados por princípios comuns,

chegavam a ser inquestionáveis.

Longe de nós a intenção de difundirmos e alimentarmos um saudosismo,

ou retorno ao passado - incompatível, nós sabemos, com as conjunturas e

contingências do mundo atual. Nossa intenção é apenas a de refletir sobre a

busca de alguns parâmetros, de alguns valores - alguns estudiosos já se

reportam a essa questão, com os quais algumas sociedades já começam a se

preocupar: “Inúmeras culturas começam a se dar conta agora de que

inadequados não são simplesmente seus métodos, mas também seus

objetivos e seus valores fundamentais”. (HUGHES, In: DELORS, 2005, p. 41)

A solidariedade, o sentimento de pertencimento, o engajamento social

representam alguns desses parâmetros, desses valores, que não podem mais

ser desprezados e esquecidos pela nossa sociedade:

Em sua análise da sociedade ocidental, Eckersley fala de uma derrocada dos valores: “ os flagelos modernos da civilização ocidental, como o suicídio de jovens, o uso de drogas e a delinqüência, costumam ser explicados em termos pessoais, sociais e econômicos: desemprego, pobreza, maus-tratos infligidos às crianças, dissolução das famílias e outros fatores. Minhas pesquisas pessoais e outros trabalhos parecem indicar algo mais fundamental na natureza das sociedades ocidentais. Penso que esse ‘algo mais’ é um fracasso profundo e crescente da cultura ocidental, uma incapacidade de dar um sentido, um sentimento de fazer parte e um objetivo ás nossas vidas, assim como um sistema de valores. As pessoas precisam acreditar em alguma coisa e viver para alguma coisa, sentir que pertencem a uma comunidade e que são membros estimados da sociedade, além de terem um sentimento de realização espiritual, isto é, o sentimento de estarem ligadas e incorporadas ao mundo e ao universo em que vivem. (ECKERSLEY, 1994, apud HUGHES, 2005,p. 41)

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Apesar de longa, a citação acima referenda a nossa preocupação com

essas questões das buscas e das necessidades que reconhecemos na

atualidade, e que, apesar de forjadas e alimentadas pelo contexto sócio-

econômico-cultural, transcendem o mesmo, impulsionando-nos a refletir,

conforme já elucidado, sobre estratégias que nos levem a essa transcendência.

Dessa forma, finalizando este capítulo, onde nos propomos a retomar e

refletir sobre as concepções de criança e infância, bem como as histórias das

I.E.I. e das famílias, compreendemos que, com base em todas essas reflexões

sobre os impactos e transformações vivenciadas pelas estruturas familiares na

atualidade, bem como sobre as imperiosas necessidades da sociedade atual

como um todo, as instituições de Educação Infantil, não podem mais estar se

perguntando que estrutura familiar seria a mais adequada para educar as

crianças e qual, ou quais, seriam estruturadas e desestruturadas. O que

precisa ser perguntado e refletido é: quais as melhores estratégias para

trabalhar com as famílias dos alunos, contemplando a diversidade com a qual

elas se apresentam?

A partir dessa pergunta inicial, deve-se procurar refletir e discutir com essas

famílias as necessidades que se apresentam para a grande tarefa educativa

que elas possuem junto as novas gerações, buscando – enquanto instituição

escolar, compartilhar com as mesmas esta função.

Procurar conhecer cada uma dessas famílias, dialogando e

estabelecendo uma relação de confiança, de troca e buscando realmente o

compartilhamento das funções de cuidado e educação, é o urgente desafio que

se apresenta para as instituições infantis que querem realmente, cumprir a

função que está posta para ela na contemporaneidade – educar e cuidar,

considerando a criança como cidadã, como sujeito de direitos.

Mesmo reconhecendo que na atualidade a escola já possui muitas

demandas que até fogem a sua função precípua, de possibilitar as novas

gerações que se apropriem dos conhecimentos acumulados pelas gerações

antigas, sendo capazes também de criar/recriar novos conhecimentos,

finalizamos essa nossa reflexão propondo que a escola assuma também essa

nova demanda, que é convocar as famílias dos seus alunos para uma reflexão

constante em torno do processo educativo das novas gerações, propondo que

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o mesmo seja realmente compartilhado por estas duas instituições – escola e

família, que no decorrer da história da humanidade são responsáveis mais

diretas por esse trabalho formativo.

No próximo capítulo, considerando todas as questões aqui discutidas,

vamos descrever a experiência que vivenciamos, buscando este

compartilhamento de ações entre Instituição de Educação Infantil e família, a

partir de atividades realizadas pela instituição educativa.

Dessa forma, vamos apresentar os caminhos trilhados, sabendo que os

mesmos foram alicerçados pelas experiências e estudos aqui já elencados e

discutidos, o que aponta para o entrelaçamento, a relação dialética entre teoria

e prática, saberes e fazeres, ação e reflexão, embora a forma didática

escolhida para apresentá-los possa dar uma idéia equivocada de dicotomia

e/ou fracionamento.

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CAPÍTULO 4

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4 - APRESENTANDO CAMINHOS TRILHADOS

As instituições dedicadas à primeira infância são socialmente construídas. Elas não têm características inerentes, qualidades essenciais, nem propósitos necessários. Para que elas servem, a questão do seu papel e do seu propósito, não são auto-evidentes. Elas são o que nós, “como uma comunidade de agentes humanos”, fazemos delas”. DAHLBERG, MOSS & PENCE,

Conforme já explicitado na introdução desse trabalho, embora o nosso

recorte e o nosso foco maior, enquanto pesquisadora, seja a construção de

uma relação entre a família e a I.E.I, em prol do compartilhamento das ações

de cuidado e educação das crianças, tanto pelo fato dessa pesquisa ter sido

realizada no contexto de surgimento dessa Instituição, quanto pela função que

nós ocupávamos na mesma – a de gestora; participamos de todo o processo

de implantação da proposta do Centro Infantil, coordenando-o, registrando-o,

e buscando encaminhá-lo na perspectiva da práxis participativa, conforme

apresentado também na introdução desse trabalho.

Dessa forma, com base nas concepções de criança, infância, função da

Instituição de Educação Infantil e família, dentre outras discutidas, tanto no

capítulo anterior, quanto nos outros capítulos desse trabalho, bem como nas

questões elencadas no final do capítulo 1 - como sínteses possíveis, a partir

dos dois trabalhos de pesquisa realizados e dos estudos e experiências que

tivemos com a temática em pauta, vamos agora, descrever algumas das ações

que foram realizadas com professoras, funcionários, crianças e famílias, que

foram relevantes para a concretização da nossa proposta de um trabalho

pedagógico centrado em uma práxis participativa, tendo como foco maior a

construção da relação família e Instituição de Educação Infantil.

É importante registrar que todas essas ações iniciais foram pensadas e

planejadas em conjunto com a professora que assumiu conosco a gestão da

Instituição, na função de vice-diretora. Essa professora já tinha sido nossa

parceira de trabalho em outras experiências, como os parâmetros em ação de

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Educação infantil e o Programa de Formação de Professores Alfabetizadores -

PROFA, além de sermos, também, assessoras pedagógica do Setor de

Educação Infantil da SME, ou seja, já tínhamos toda uma história de

envolvimento e trabalho, tanto com a Educação Infantil em si, quanto com a

formação de professores dessa modalidade de Ensino, e das séries iniciais do

Ensino Fundamental.

Com certeza, foi essa nossa experiência anterior como formadoras de

professores, bem como o conhecimento de que “Pesquisas indicam que a

qualidade da Educação Infantil está relacionada diretamente com a formação

dos profissionais” (KISHIMOTO, In: CERIZARA, 2002, p.8), que nos motivou a

iniciar todo o processo de implantação desse novo Centro Municipal de

Educação Infantil, por um trabalho de diálogo, discussão e estudo com os

profissionais que lá iriam atuar, objetivando a construção de uma proposta de

trabalho interativa entre toda a comunidade escolar, em prol das ações de

cuidado e educação das crianças.

Assim sendo, este capítulo está subdividido em 4 tópicos: no primeiro,

apresentamos todo o trabalho inicial realizado com as professoras, antes

mesmo da inauguração da Instituição; no segundo, explicitamos o processo de

contratação e recepção dos funcionários; no terceiro descrevemos uma das

propostas de trabalho realizada com as crianças, com base na metodologia de

projetos; no quarto e último tópico, mostramos a proposta pensada e realizada

para o trabalho com as famílias.

4.1- Ações iniciais com as professoras

Os 30 anos do bem-sucedido projeto da Ponte assentaram na reelaboração da cultura pessoal e profissional dos seus professores. Toda a mudança passa por aí. Se a pessoa não muda, como poderá mudar a escola? Dito de outro modo: onde não houver uma pessoa, será possível encontrar um professor? (PACHECO, 2006, p.1)

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Concordando plenamente com a afirmação acima do Prof José Pacheco,

e tendo a convicção de que qualquer projeto de trabalho, e mais ainda um

projeto que busca o envolvimento da família, só daria resultados positivos se

fosse um projeto coletivo de toda a equipe da Instituição – perspectiva da

práxis participativa, nossa primeira providência, após assumir a direção da

escola, conforme já explicitado no início desse capítulo, foi pensar como

faríamos, tanto esse processo inicial de conhecimento, acolhimento e

sensibilização do corpo técnico-docente da Instituição, como também o

processo de formação continuada do mesmo.

Foi com esse pensamento, e com o objetivo de conhecer melhor as

professoras que iriam trabalhar conosco, como também de propiciar a

formação de um vínculo e de um gosto pelo estudo, pela leitura, pela reflexão

em torno do trabalho realizado com as crianças e suas famílias, que

planejamos os nossos primeiros encontros com as futuras professoras da

Instituição, e todos os outros que se seguiram a esses.

Dessa forma, no dia 10 de março de 2004, no 7º andar da SME, tivemos

o nosso primeiro encontro com o grupo, tendo como pauta a necessidade de

nos conhecermos melhor, facultando que cada uma se apresentasse, falasse

das suas experiências profissionais, bem como das expectativas que trazia

para o novo desafio que se apresentava, que era realizar um trabalho de

qualidade, a partir de uma interação e participação de todos os envolvidos, no

CMEI Carmem Reis.

Considerando que registramos por escrito todas essas reuniões, vamos

colocar abaixo alguns depoimentos das professoras nesse primeiro encontro:

Sou professora da rede municipal há treze anos, mas nunca

trabalhei com Educação Infantil. Considero que vai ser um grande desafio, mas gosto de desafios, entendo que são eles que nos movem, que nos incentivam novas e grandes realizações.

Já estou no município há dez anos, tenho experiência, tanto com Educação Infantil, quanto com EJA – Educação de Jovens e Adultos, e, apesar de está na sala de leitura de uma escola há três anos, resolvi retornar a sala de aula, aceitando o desafio de trabalhar num Centro Infantil que vai começar agora.

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Minha história com a educação vem do berço. Tenho um pouquinho de tudo, não sou especialista em nada, sou especialista no novo. Tem que ter preparação, mas tem que ter ousadia, por isso estou aqui.

Já tenho alguma experiência com Educação Infantil na escola particular, passei no concurso do município agora, e fiquei feliz de vir trabalhar num Centro de Educação Infantil que está sendo criado agora.

Uma das questões que mais nos chamam a atenção nos depoimentos

das professoras nesse primeiro encontro, é o fato delas se referirem muito ao

desafio do novo, ao fato da Instituição está sendo criada, deixando a

possibilidade da participação e do envolvimento de todos nesse processo.

Acreditamos que essa disposição para vivenciar o novo, para participar e

contribuir com o estabelecimento de uma nova estrutura educacional, foi

fundamental para o envolvimento de todos na Instituição.

Dessa forma, esse primeiro encontro foi muito produtivo e importante, na

medida em que possibilitou que nos conhecêssemos melhor, que cada uma

abrisse o seu coração, falando das suas experiências e das suas expectativas.

Neste primeiro encontro, estavam presentes 6, das 8 professoras do

Centro, além da secretária geral, das 2 coordenadoras e da direção e vice-

direção. Todas essas profissionais estão devidamente caracterizadas no

capítulo 1.

A partir desse conhecimento inicial do grupo, e da disposição do mesmo

para estudar e aceitar os desafios de realizar um bom trabalho numa Instituição

de Educação Infantil; fizemos, junto ao mesmo, um levantamento de temáticas

relevantes para a realização desse trabalho. As temáticas sugeridas pelo grupo

nesse primeiro momento foram:

• Adaptação da criança na Instituição

• O brincar da criança

• Os conteúdos da Educação Infantil

• A rotina

• A leitura e a escrita

• O desenvolvimento da criança

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• O papel do professor da Educação Infantil

• Como ensinar matemática na escola infantil

• A relação com a família da criança

• Metodologias na escola infantil

• Especificidades da criança

Levando em conta a relevância de todas as temáticas propostas pelas

professoras, foi muito difícil selecionar as que seriam contempladas nesse

primeiro momento. Porém, a exigüidade do tempo disponível, nos forçava a

fazer essa seleção; e a mesma foi realizada com o objetivo de priorizar as que

iriam subsidiar melhor o início do processo, ficando as outras para os estudos

posteriores. Dessa forma, as temáticas inicialmente contempladas nos nossos

estudos foram:

• Concepção de criança e infância

• Processo de adaptação da criança

• A rotina da Instituição de Educação Infantil

• O brincar na Educação Infantil

• Alfabetização na Educação Infantil

• A relação família e Instituição de Educação Infantil e suas funções.

A função da Educação infantil – educar e cuidar, embora não tenha sido

contemplada como um conteúdo específico desse primeiro momento de

estudos, permeou todas as discussões que aconteceram, em virtude de está

presente em todas as ações que envolvem o trabalho com a criança na

instituição infantil. Em especial, essa temática permeou os estudos relativos a

relação família e I.E.I.

Estes estudos foram realizados nos dois turnos, sendo que o grupo que

iria assumir o turno matutino na escola vinha pela manhã e o grupo que iria

trabalhar no vespertino vinha à tarde, enquanto eu e a vice-diretora,

participávamos dos encontros nos dois turnos, discutindo a mesma temática

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em ambos, e procurando estabelecer as pontes e as relações em termos de

idéias e procedimentos a serem adotados.

Vamos apresentar abaixo as principais concepções norteadoras dos temas

estudados, bem como um pouco da metodologia e das reflexões vivenciadas. É

importante registrar também que os estudos relativos a esses temas não se

esgotaram nesse momento inicial. Pela relevância e desdobramentos que

apresentam em relação a outros conteúdos do dia-a-dia da Instituição de

Educação Infantil, os mesmos continuaram a ser explorados em outros

momentos de estudos, que foram organizados levando em consideração a

situação abaixo especificada:

Nos anos de 2004 e 2005, período em que se deu a experiência aqui

descrita, os professores da rede Municipal de ensino da cidade do Natal,

possuíam uma carga horária de trabalho de 30 horas semanais, das quais,

segundo a SME, 24 horas deviam ser dedicadas a regência, e ás 6 horas

restantes as atividades extra-classe, dentre as quais estavam incluídas os

planejamentos e encontros de estudos dos professores.

Essa situação acima descrita sempre foi motivo de muita polêmica entre

os professores e a própria SME, considerando que o tempo de estudo e

planejamento não se encontrava regulamentado oficialmente no calendário da

Secretaria, ficando cada instituição com a responsabilidade de discutir e

combinar esse horário com os professores, o que levou uma grande maioria

dessas instituições a eleger um dia da semana, de quinze em quinze dias, em

que as aulas terminariam após o recreio, para que o tempo restante fosse

usado em reuniões e planejamentos com os professores.

Diante dessa realidade, e considerando a importância do estudo e do

planejamento para a realização de um bom trabalho pedagógico, combinamos

inicialmente com as professoras e, posteriormente com os pais, que, ao invés

de pararmos meio período de aula, de quinze em quinze dias, iríamos escolher

uma sexta-feira de cada mês – previamente agendada e comunicada, para que

as crianças não viessem à Instituição, e as professoras pudessem se reunir

para planejar. Essa sugestão foi aceita, tanto pelas professoras, quanto pelos

pais, que preferiram não trazer a criança à escola um dia no mês, do que

durante dois dias, vir deixá-la as sete, para pegar ás nove horas e quinze

minutos. Em relação ás professoras, também houve o consenso de que seria

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melhor utilizar quatro horas e meia direto para planejar, do que apenas duas

horas e quinze minutos a cada quinze dias.

No que diz respeito aos estudos, partindo da experiência inicial que será

melhor detalhada ainda nesse capítulo, as próprias professoras sentiram

necessidade de dar continuidade aos mesmos, por isso, combinamos que um

sábado por mês, para não prejudicar o tempo letivo dos alunos, iríamos nos

reunir na Instituição para estudar. Foi combinado também que, a cada três

meses, ao final do estudo, comemoraríamos os aniversariantes do trimestre,

com direito a bolo, salgados, refrigerantes e presentes, comprados com a

contribuição financeira de todos.

No início desse processo a proposta pedagógica da Instituição ainda não

existia, posto que a mesma foi sendo construída ao longo dos encontros e

interações, nesses momentos de estudo e reflexão. Esses estudos e reflexões,

realizados logo no início do processo de implantação da Instituição, serviram

de baliza, de parâmetro inicial para as nossas ações, e, a continuidade dos

mesmos contribuiu para a elaboração coletiva do projeto político pedagógico

da Instituição, cuja primeira versão só foi apresentada a SME em 2006.

Vamos fazer a descrição dos estudos iniciais, realizados, conforme já

explicitamos, com as temáticas selecionadas a partir da lista proposta pelas

professoras.

» Concepção de criança e infância

No tocante as concepções de criança e infância, percebemos que

algumas professoras ainda possuíam uma visão de infância como fato natural;

uma visão que podemos denominar de romântica, pois, quando solicitadas a

dizer o que lhes vinha à cabeça quando pensavam em criança, muitas ainda se

referiam a bondade, pureza, inocência, alegria, espontaneidade, sem

estabelecer relação com o contexto sócio-econômico-político-familiar e cultural

dessas crianças:

“Criança lembra alegria, pureza, inocência”

“Criança é brincadeira, liberdade, risos”

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“Criança lembra alegria, embora nem todas sejam felizes”

“É um momento mágico da vida”

Partindo dessas palavras iniciais, procuramos estabelecer com as

mesmas uma relação entre esses atributos colocados por elas e a situação de

algumas crianças que a mídia apresenta diariamente, bem como da grande

maioria que nós encontramos nas instituições públicas de ensino.

Após essas reflexões iniciais, com base em autores como Miranda

(1987); Ariès (1981); Oliveira (2002); Bazílio & Kramer (2003), dentre outros,

além de estudos do Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil e dos

Parâmetros em Ação de Educação Infantil, discutimos e refletimos com as

professoras sobre a relevância de se considerar a criança como um sujeito

sócio-histórico-cultural e a infância, também como socialmente construída.

Essa compreensão das concepções de infância e criança como

socialmente construídas, nos mostra que as mesmas não podem ser vistas

como fatos naturais, determinados apenas por características de ordem

biológicas e cronológicas, mas como possuindo também, determinantes

sociais, culturais e históricos, se apresentando, portanto, diferentes em cada

momento histórico, em cada sociedade, bem como em cada classe social, e

geralmente envolvidas por visões ambíguas, ambivalentes e paradoxais,

conforme vimos no capítulo 3, deste trabalho.

Porém, considerando também todas as especificidades dessa situação,

e desse sujeito, que dizem respeito mais diretamente, conforme nos aponta

Bujes (In: CRAIDY; KAERCHER, 2001), ao predomínio do sonho, da fantasia,

da afetividade, da brincadeira, enfim, das manifestações de caráter mais

subjetivo.

Estas discussões sobre as concepções de criança e infância, se fazem

indispensáveis para que os profissionais da Educação Infantil, possam refletir,

tanto sobre as especificidades da infância, quanto sobre uma criança concreta,

contextualizada, situada numa família, num bairro, numa classe social, numa

cultura, enfim, numa sociedade que lhe constitui enquanto sujeito, sem deixar,

também, de ser por ela influenciada; e não numa criança abstrata, atemporal e

universal.

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Compreendemos que essa discussão é fundamental para que possamos

abrir mão das nossas posturas adultocêntricas no trabalho com as crianças,

conforme propõe Leite Filho (In: LEITE FILHO; GARCIA, 2001), abraçando

assim a postura da pedagogia da participação, buscando dar voz e vez as

crianças (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e

PINAZZA, 2007) .

» Processo de adaptação da criança.

Nesse estudo sobre a adaptação da criança na instituição de educação

infantil, o que nos chamou mais a atenção foi o fato das professoras,

principalmente aquelas que nunca haviam trabalhado com essa modalidade de

ensino, estabelecerem uma relação direta entre adaptação, choro de criança,

cobrança de pais e uma sensação de desespero e impotência que isso devia

desencadear nas professoras:

“Meu Deus, é uma loucura esse momento de adaptação”

“A vontade é ir embora e só voltar depois que passar as primeiras semanas” “Precisa ter segurança e tranqüilidade para viver esse momento”

“Dá um pouco de desespero, pois é um choro só.”

Partindo dessas falas, procuramos, com a colaboração também das

professoras presentes que já tinham experiência com Educação Infantil, discutir

um pouco as mesmas, buscando compreender os motivos desse choro, bem

como da cobrança dos pais e do suposto desespero das professoras.

Após essas reflexões iniciais, a adaptação da criança na escola foi

estudada com base em autores como Balaban (1988); Freire, M. & Davini

(1999) e Rosseti-Ferreira et al (2002), dentre outros, bem como nos estudos do

Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, buscando ser

compreendida sempre como um processo, que envolve não apenas a criança,

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mas a família e também o professor. Todos e cada um, neste momento inicial

de cada ano letivo, estão passando por um processo adaptativo que não possui

um tempo determinado para acontecer, mas que vai se constituindo nas

relações estabelecidas e tendo como base também as experiências do

passado de cada um nesta área.

Dessa forma, outra questão importante a ser considerada, é que cada

criança passa pelo seu processo de adaptação, bem como cada família e cada

educador: nenhum processo de adaptação é igual ao outro, apresentando cada

um suas diferenças e especificidades, bem como imprevisibilidades também.

Essa compreensão da adaptação como um processo com

especificidades e particularidades, que envolve não apenas as crianças, como

também as famílias e os educadores, é fundamental para que os profissionais

da instituição vivenciem esse momento, na maioria das vezes tão complexo, de

forma mais tranqüila e equilibrada, buscando transformar o mesmo em uma

situação mais prazerosa e menos angustiante.

Particularmente, consideramos que esse estudo sobre adaptação foi um

dos mais relevantes e produtivos para as professoras, deixando-as mais

seguras e tranqüilas. Outro ponto que contribuiu muito para a construção dessa

segurança inicial foi o fato de termos combinado que as atividades dessas

primeiras semanas de aula seriam mais lúdicas, mais voltadas as artes, ao

movimento e seriam planejadas em conjunto com a coordenação pedagógica e

direção. Outro fator também relevante foi o de combinarmos que,

principalmente nas primeiras semanas - além das professoras, todas as

pessoas da Instituição – coordenadoras, gestoras e funcionários, estariam

atentos as necessidades das crianças, promovendo intervenções e

colaborando diretamente com as professoras, quando necessário.

Consideramos também que a decisão coletiva, após algumas

discussões e reflexões, de que os pais deveriam, desde o primeiro dia de aula,

entrar na Instituição, deixar os seus filhos na porta da sala e permanecer um

tempo na mesma, se necessário, foi muito importante.

Para que possamos também conhecer a opinião das professoras sobre

essa vivência, vamos apresentar abaixo alguns depoimentos registrados na

primeira reunião com as mesmas, após as duas primeiras semanas de aula:

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Foi muito bom esse planejamento inicial, essas atividades mais

soltas, essa intenção de deixar as crianças se colocarem mais, se soltarem. Pude perceber que essas crianças estavam aquém do que eu esperava. Vou ter que planejar uma intervenção que atenda aos interesses e as necessidades delas, pensando mais nos valores que elas precisam construir, na carência de afeto que elas trazem, na autonomia que elas não tem.

A forma como vivenciamos essas duas primeiras semanas foi muito legal. A discussão sobre adaptação, como sendo também dos pais e professoras, me ajudou a ficar mais tranqüila, menos ansiosa, a trabalhar melhor com as crianças.

Me surpreendi positivamente com a minha turma. Apesar da grande maioria nunca ter freqüentado a creche, ( eram crianças de 3 anos e meio a quatro), penso que o fato de deixar os pais entrarem na escola, na sala, bem como todo o material, os brinquedos que disponibilizamos, e o planejamento mais flexível, fez com que apenas uma criança chorasse, e só por pouco tempo. Estou muito feliz!

Confesso que no começo fiquei receosa com a questão dos pais terem livre acesso a entrar aqui no centro e até na sala de aula, mas depois, até mesmo porque senti a presença e o apoio da direção, da coordenação e dos funcionários, fiquei mais tranqüila e até achei legal a presença deles, embora alguns, realmente, tumultuem um pouco.

Compreendemos que esses depoimentos referendam a relevância do

estudo e do planejamento pensado para as primeiras semanas de aula, a partir

das reflexões sobre adaptação. Queremos registrar que esses estudos e

reflexões sobre adaptação, como também a própria vivência desse processo,

não se esgotaram nessas duas primeiras semanas. Prosseguiram além, pois,

considerando que é um processo com inúmeras variáveis e especificidades,

não possui tempo determinado para se consolidar.

» A rotina da I.E.I.

Os estudos sobre rotina na Educação Infantil também foram muito

interessantes e desencadearam discussões muito produtivas. A primeira delas

foi sobre a necessidade e a importância da rotina na nossa vida de maneira

geral. Iniciando o estudo, fizemos uma tempestade de idéias, pedindo que cada

uma definisse rotina em uma palavra. Eis algumas delas:

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“Monotonia”

“Mesmice”

“Organização”

“Repetição”

“Trajetória”

“Perfeccionismo”

Dessa forma, antes de trabalharmos a importância da rotina na

Educação Infantil, fomos discutir o que cada um entendia por rotina, e o real

sentido da palavra, muito mais numa perspectiva de planejamento, de

caminhos a serem percorridos, de jornada, conforme propõe Faria (In: FARIA;

PALHARES, 2000). Após estas reflexões iniciais, a rotina foi estudada como sendo

fundamental nas instituições de Educação Infantil, principalmente pelas

possibilidades que faculta a criança de construir suas concepções de tempo e

espaço, se for trabalhada de forma a representar, tanto para elas, quanto para

as professoras, uma orientação segura, capaz de possibilitar uma previsão do

que vai acontecer, sem transformar isto em mera repetição de atos mecânicos

e enfadonhos.

Para os estudos sobre essa temática, além do livro de Freire, M. (1992),

utilizamos um texto mimeografado de autoria das professoras Vânia e Elba do

Núcleo de Educação Infantil da Universidade Federal do Rio Grande do Norte -

NEI, intitulado A Rotina Escolar, bem como a proposta curricular de Educação

Infantil, elaborada pela equipe de Educação Infantil da SME de Natal, na

década de 90.

Para promover uma rotina com essas características, é necessário que

as atividades sejam planejadas levando em consideração os conhecimentos

prévios dos alunos, bem como suas potencialidades e possibilidades, com

situações e momentos diversificados, que promovam para as crianças o

exercício das suas várias linguagens: artística, musical, escrita, oral, corporal,

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teatral, enfim, as inúmeras possibilidades de manifestação e expressão das

quais os seres humanos são capazes.

Uma questão muito discutida no momento em que refletíamos sobre a

rotina, foi a questão do espaço, já que o mesmo tem uma grande contribuição e

importância para a elaboração e vivência dessa rotina. No caso específico da

Instituição na qual iríamos trabalhar, e espaço é um aspecto limitador desse

processo, na medida em que, como já afirmamos anteriormente, apesar das

modificações e adaptações que foram possíveis de serem realizadas, o espaço

da Instituição não foi construído especificamente para tal fim, o que gera

problemas e limitações na operacionalização do seu uso. Mesmo assim, foi

pensada e planejada a melhor rotina possível, diante das adversidades do

espaço, procurando incentivar e possibilitar a manifestação das várias

linguagens das crianças.

No tocante ao espaço, uma observação importante de registrar é que,

logo no início, quando as professoras foram conhecer o espaço físico da

Instituição que estava terminando de passar pela reforma antes da

inauguração, as mesmas se disseram positivamente surpreendidas.

Segundo elas, a partir das informações que tínhamos passado – nós e a vice-

diretora que já conhecíamos o prédio, elas tinham feito uma idéia bem pior.

Seguem abaixo alguns desses depoimentos:

Ah, não é tão pequeno assim! Pelo menos as salas são ventiladas, iluminadas, dá para fazer um trabalho. Não está nos padrões ideais, mas não é das piores.

Apesar de algumas salas, como a 1 e a 2, serem pequenas – não vai caber 25 crianças, né? Mas pelo menos, são arejadas e claras, estão pintadinhas... e tem o espaço externo, que depois que colocar areia limpa, vai ficar agradável.

Não é o ideal, mas não é dos piores, pelo menos vai ter parque, caixa de areia e lugar para brincar lá fora, e as salas, apesar de pequenas, são ventiladas.

Ah! Só é ruim mesmo aquela salinha menorzinha. Acho que não dá nem para fazer a rodinha. Quantos alunos vão ficar nela?

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Achamos estes depoimentos importantes, porque eles mostram que as

professoras, desde o início, souberam valorizar os pontos positivos do espaço,

bem como de todas as outras situações, para pensar a rotina da melhor forma

possível. Durante a realização de todo o trabalho, esta sempre foi a nossa

tônica: procurar as possibilidades de trabalhar, sem nos apegarmos as

dificuldades, como desculpa para que o trabalho não acontecesse, tendo

clareza de que:

Um contexto físico, por si só, não faz uma escola; para que um edifício escolar seja uma escola, são necessárias diversas condições. Uma escola é um contexto social constituído por atores que partilham metas e memórias, por indivíduos em interdependência com o contexto que constroem intencionalidade educativa. (FORMOSINHO, In: OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO e PINAZZA, 2007, p.23)

Dentro dessa proposta, a rotina inicial da Instituição com as crianças, foi

pensada, em linhas gerais, de forma a contemplar, em cada espaço físico e de

tempo, as atividades abaixo especificadas, e outras que possam surgir a partir

das demandas das crianças e da comunidade:

» Quinzenalmente ou mensalmente

• Atividade prática de higiene: Banho, corte de unha, salão de beleza, etc,

ou

• Passeio ou atividade mais prática relativa a algum projeto didático em

andamento: visitas, exposições na escola, peças teatrais, etc

» Semanalmente – 1 ou 2 vezes

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• Faz-de-conta

• Execução do hino Nacional

• Cinema com vídeo ou DVD

• Atividades de artes.

• Recreação com professora de Educação Física

• Música e/ou dança.

• Atividades relativas ao projeto didático em andamento.

• Atividades de relaxamento

• Visita à biblioteca.

» Diariamente

• Rodinha de conversa

• Leitura e/ou contação de histórias

• Parque

• Lanche

• Escovação de dentes

• Acolhimento: com livros, ou brinquedos, ou jogos de encaixe, ou massa

de modelar.

• Atividade relativa à temática estudada.

• Atividade livre.

» O brincar na Educação Infantil

Essa temática sobre o brincar, ou a brincadeira, na verdade permeou

muitos dos nossos estudos, até mesmo pela profundidade, importância e

complexidade da mesma no trabalho das instituições de Educação Infantil,

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considerando que brincar é um atividade primordial para o desenvolvimento da

criança.

Quando iniciamos esse estudo, nas primeiras reuniões, a grande

questão inicial, após o levantamento de conhecimentos prévios, foi: o que é

brincar, o que é brincadeira, e como devemos trabalhá-la com as crianças?

Embora as professoras compreendessem a relevância da garantia de

um espaço para as brincadeiras nas instituições de Educação Infantil:

Brincar é muito importante

Toda criança gosta, e precisa brincar

Toda instituição que trabalha com criança pequena tem que

promover a brincadeira

percebemos a necessidade de um aprofundamento maior sobre o papel da

brincadeira para o desenvolvimento da criança, bem como sobre as várias

formas de se trabalhar a brincadeira.

Segundo Borba (2001), existem várias formas de se conceber a

brincadeira na Educação Infantil, dentre elas, a concepção estruturalista

organicista – calcada numa visão de natureza infantil, biologicamente

determinada, onde a brincadeira é vista como atividade recreativa, permitindo

apenas que as crianças liberem energias e relaxem; a concepção tradicional –

onde a brincadeira é vista como um estorvo na situação de aprendizagem; a

brincadeira como instrumento didático, talvez a mais comum – onde a

brincadeira é vista como preparação para a escolaridade futura, servindo como

meio para o ensino de noções e habilidades como cores, formas, numerais,

entre outras.

Essa mesma autora chama a atenção também para o fato de que,

embora as crianças se beneficiem, tanto do aspecto lúdico, quanto da diversão,

do prazer e da aprendizagem nas atividades recreativas e nas brincadeiras

instrucionais, “é importante que o educador saiba que as maiores contribuições

do brincar ficam em segundo plano, sobretudo, naquelas brincadeiras que

evidenciam apenas os objetivos instrucionais”. ( BORBA, 2001, p.5)

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Assim sendo, buscamos estudar e refletir sobre o brincar a partir das

idéias de estudiosos como Vigotski (1999), Wajskop (2005), Borba (2001),

dentre outros, que apresentam o brincar como sendo fundamental para o

desenvolvimento da criança: “É enorme a influência do brinquedo no

desenvolvimento de uma criança” Vigotski, (1999, p.126), principalmente pelo

fato de possibilitar que a criança recrie a realidade, se mostrando maior do que

realmente é, ou seja, atuando na chamada zona de desenvolvimento proximal:

Assim, o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo é como se ela fosse maior do que é na realidade. ( VIGOTSKI, 1999, p. 134)

Os estudos realizados sobre a brincadeira nos levam a considerá-la

como uma construção social, espaço privilegiado de interação e de constituição

da criança como um sujeito humano, que é produto e produtor de história e de

cultura, ou seja, “A brincadeira pressupõe uma aprendizagem social. Aprende-

se a brincar” (WAJSKOP, 2005, p.29).

Na perspectiva histórico-cultural, a incorporação da brincadeira nas práticas pedagógicas significa desenvolver diferentes formas de jogos e brincadeiras que contribuam para inúmeras aprendizagens e para a ampliação da rede de significados construídos pelas crianças. Dentre essas diferentes modalidades de brincadeiras que podem ocorrer na creche a na pré-escola, citamos: as brincadeiras de faz-de-conta organizadas pelas próprias crianças; a transmissão e a recriação das brincadeiras tradicionais da nossa história e cultura; os jogos de construção; e os jogos educativos propiciadores de aprendizagens em diferentes áreas do conhecimento. (BORBA, 2001, p.5)

Essa concepção sobre a brincadeira, aponta para a percepção de que

as implicações práticas da mesma nos remete a repensar a rotina, os tempos

e os espaços das instituições infantis, bem como a compreender a grande

responsabilidade dessas instituições, considerando que: “...organizada em

torno da brincadeira infantil, a pré-escola poderia cumprir sua função

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pedagógica, ampliando o repertório vivencial e de conhecimentos das crianças,

rumo à autonomia e à cooperação.” (WAJSKOP, 2005, p.28).

O impacto desses estudos sobre a brincadeira numa perspectiva

histórico-cultural, foi tão grande, que, como poderemos verificar no decorrer

desse trabalho, o brincar foi, realmente, um dos eixos norteadores do trabalho

pedagógico realizado com as crianças, e foi estendido também até as famílias,

chegando a ser, conforme depoimentos que veremos ainda neste capítulo e no

seguinte, uma das atividades mais citadas e elogiadas pelos familiares, tanto

pela contribuição que deixou para a interação entre estes e as crianças, como

pela compreensão que propiciou acerca da relevância da brincadeira na vida e

no desenvolvimento das mesmas.

» Alfabetização na Educação Infantil

Sabemos que os estudos e reflexões sobre alfabetização são

geralmente polêmicos, até mesmo pelo fato de estarmos diante de um dos

maiores desafios do nosso país, que é alfabetizar uma boa parcela das suas

crianças, jovens e adultos, que ainda não são usuários efetivos da leitura e da

escrita.

No nosso grupo, os estudos também suscitaram muitas questões, fato

que pode ser constatado através da apreciação de depoimentos como os que

se seguem:

Eu já alfabetizei, mas não sei como. Será que eu realmente ensinei?

Não tem tempo certo para se alfabetizar. Acontece no decorrer de várias séries.

Para a alfabetização, o desejo de aprender é muito importante, mas o professor tem que ensinar também.

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Hoje fala-se muito em função da escrita. Quando fomos alfabetizadas não se falava disso não.

O fato é que, apesar de todas as pesquisas, as crianças das escolas públicas demoram a aprender a ler e escrever.

Em se tratando da Educação Infantil, sempre vem aquela pergunta: é, ou não é, para alfabetizar?

Dessa forma, uma das primeiras discussões no nosso grupo acerca

dessa temática, foi exatamente esse questionamento sobre se deve-se, ou

não, alfabetizar na Educação Infantil. Questionamento esse que encontrou

respaldo para ser compreendido principalmente na seguinte afirmação:

[...] escrevi um artigo com um título em forma de pergunta: “ Deve-se ou não se deve ensinar a ler e escrever na pré-escola?”. Esse artigo circulou bastante e foi traduzido para o português e o italiano. Ali não respondo nem sim, nem não. O que digo é que a pergunta está malfeita, porque pressupõe que a resposta NÃO equivale a deixar essa responsabilidade para o Ensino Fundamental, e a resposta SIM pressupõe introduzir na pré-escola as más práticas tradicionais do Ensino Fundamental. O que proponho é substituir a pergunta centrada no ensino por outra centrada na aprendizagem: deve-se permitir ou não que as crianças aprendam sobre a língua escrita na pré-escola? Nesse caso a resposta é redondamente afirmativa. (FERREIRO, 2001, p.146)

Partindo dessa premissa, e de outras grandes contribuições dessa

mesma autora, principalmente sobre a psicogênese da língua escrita – Ferreiro

(1985), foi que encaminhamos as nossas discussões sobre a alfabetização,

refletindo sobre a mesma como sendo um processo, que a criança não pede

permissão ao adulto para iniciar, embora o adulto tenha o papel fundamental

de mediar, de colaborar com a criança, possibilitando que ela interaja com

vários portadores de texto, com vários gêneros textuais, refletindo e se

apropriando dos vários usos sociais da linguagem oral e escrita na nossa

sociedade.

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É importante registrar que a grande maioria das professoras já

apresentava essa concepção de alfabetização como processo, embora

sentissem necessidade de aprofundar a discussão, principalmente, sobre as

etapas desse processo, possíveis e necessárias, de serem vivenciadas na

Educação Infantil.

Algumas conseqüências práticas mais imediatas desse primeiro estudo

sobre alfabetização na Educação Infantil, foi a implantação dos seguintes

aspectos:

• Além do acervo de livros da biblioteca – que seria visitada

semanalmente, obedecendo a uma escala, cada sala de aula teria um

pequeno acervo de 20 ou 25 livros, remanejados regularmente, que poderiam

ser manuseados pelos alunos diariamente.

• A leitura e/ou contação de história pela professora aos alunos, faria parte

da rotina diária.

• O trabalho com o nome próprio – a partir do uso de crachás, de

pesquisas sobre a origem dos nomes, bem como do cartaz com a listagem

dos nomes dos alunos da sala, dentre outras possibilidades, seria realizado

por todas as professoras.

Uma outra discussão presente nesse primeiro momento reflexivo sobre a

alfabetização, foi sobre o uso da letra cursiva ou de imprensa. As professoras

que ainda não tinham trabalhado com Educação Infantil, em sua grande

maioria, apresentaram essa questão como uma dúvida. Porém, as mais

experientes, se colocaram logo a favor do uso da letra de imprensa, ou bastão,

alegando que ela é mais fácil de ser escrita e de ser lida, no início do processo

de alfabetização.

Aprofundando um pouco mais esse aspecto, introduzimos a questão de,

em iniciando com a letra de imprensa, qual seria o momento mais adequado

para utilizar a letra cursiva. Após algumas reflexões, relembramos, mais uma

vez, as pesquisas sobre a psicogênese e discutimos o fato do momento mais

adequado para a criança passar a escrever com a letra cursiva, ser aquele

momento em que ela já percebe a escrita na perspectiva da hipótese

alfabética, conforme preconiza Emília Ferreiro.

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132

Essa primeira discussão foi muito interessante e produtiva, porém a

temática, pela própria complexidade que apresenta, voltou a tona em muitos

outros estudos e discussões, e, particularmente para nós, se concretizou

realmente, no momento em que, como paraninfas das turmas que concluíram a

Educação Infantil no Carmem Reis no ano de 2006, a grande maioria das

crianças – algumas com 6 anos e outras com 7, segundo podemos constatar,

tanto na fala das professoras e coordenadoras, quanto nas próprias

apresentações realizadas pelas crianças na solenidade, estavam saindo da

Instituição para o ensino fundamental já com um domínio da leitura e da

escrita bastante considerável, ou seja, fazendo a leitura de textos significativos

para o seu cotidiano e pensando a escrita já nas hipóteses alfabética, ou, pelo

menos, silábica com valor sonoro, conforme classificação apresentada nos

estudos realizados por Ferreiro (1985).

» Relação família e I.E.I. Foi durante estes estudos iniciais, que fizemos a proposta do trabalho que

nos propúnhamos a realizar com a família, e contamos com a adesão e

envolvimento de todas as professoras. É importante dizer que antes de

iniciarmos o estudo sobre a relação família e I.E.I, solicitamos que as

professoras opinassem sobre a relação da família com a escola. Dessas

opiniões, destacamos as seguintes:

A relação da família com a instituição de Educação Infantil é fundamental para que as ações realizadas sejam concretizadas de forma eficaz.

É de fundamental importância a relação da família com a escola, pois fortalece os laços de compromisso com a educação de qualidade, por ter apoio direto com os pais que irão ter um outro olhar sobre a aprendizagem dos filhos.

É muito importante que a escola busque compartilhar com as famílias todo o trabalho formativo das crianças..

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133

Dessa forma, a temática foi trabalhada partindo das opiniões e

experiências das professoras, bem como da nossa própria vivência com o

tema, e da discussão da experiência vivenciada em um outro Centro Infantil –

O Centro de Educação Pré-escolar Profª Stella Lopes da Silva, por ocasião da

nossa pesquisa para o mestrado.

Autores como Barbosa & Dornelles (1998), Bassedas, Huguet & Solé

(1999), Paro (2000), Kaloustian (2002), Carvalho (2002), dentre outros já

citados, também nortearam a nossa discussão, principalmente no tocante a

compreensão sobre o respeito e a consideração às várias estruturas familiares

da atualidade, bem como a relevância das famílias para o processo de

escolaridade das suas crianças, mesmo quando são analfabetas. Outro ponto

bastante discutido sobre essa temática foi a necessidade da instituição

educativa procurar dar o primeiro passo na busca de construir/sistematizar a

sua relação com a família do seu aluno.

No momento desse estudo, uma das questões que discutimos bastante

foi sobre o papel, a função da Instituição de Educação Infantil e da família. As

professoras ficavam se perguntando, e nos perguntando: onde começa um, e

termina o outro; até onde a Instituição deveria fazer, e até onde iria á

responsabilidade da família; os papéis seriam os mesmos, ou seriam

diferentes, considerando a abrangência e a complexidade do cuidar e educar?

Acreditamos, que já foi possível identificar, pelos estudos e propostas

aqui apresentadas, que, particularmente, temos a convicção de que famílias e

instituições educativas possuem papéis diferentes, que se devem

complementar. A grande questão é: refletir e discutir sobre essas diferenças e

possibilidades de complementaridade. Eis o desafio que surgiu nesse primeiro

estudo, e acabou permeando boa parte do nosso trabalho no Carmem Reis.

Quando nos reportamos ás questões relativas ás famílias e as

instituições educativas, não podemos nos esquecer de que são ambas

instituições construídas historicamente, que passam na atualidade por muitas

mudanças e transformações, o que acaba repercutindo também nas funções

que lhe são atribuídas socialmente.

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134

Dessa forma, as nossas discussões e reflexões sobre esta temática com

as professoras, nos levaram a inferir que, diante da crescente diversidade de

estruturas familiares da atualidade – muitas das quais já identificadas no

capítulo anterior desse trabalho, bem como da compreensão da infância como

um fato social, e da amplitude e complexidade da função proposta para a

Educação Infantil hoje – educar e cuidar, é complicado, á priori, tentar

determinar e dividir, de forma muito fechada, o que seria realmente função de

uma e de outra instituição, sem um conhecimento mais aprofundado da

realidade, do contexto, do universo que permeia o cotidiano dessas duas

instituições, considerando também que:

A família, em decorrência dos avanços sociais, econômicos e tecnológicos, tem mudado os seus papéis, suas obrigações e sua estrutura tradicionais. Mães e pais tem cada vez mais negociado entre si as tarefas domésticas e responsabilidades no geral. A escola tem também avançado para oferecer aos alunos uma educação pertinente à nossa época. A aproximação das duas instituições é também uma tentativa de rever esses papéis tradicionais e, acima de tudo, visando melhorar a condição de vida e educação das nossas crianças. (BHERING & BLATCHFORD, 1999, p. 192)

Foi a partir dessas reflexões, bem como do consenso coletivo de que o

principal papel de ambas as instituições (família e instituição educativa), – e aí

deve se encontrar, realmente, o grande campo de convergência de ambas; é

promover o bem estar e o desenvolvimento integral das crianças, considerando

as suas necessidades de cuidado e educação, que optamos por construir os

limites e possibilidades da nossa atuação, após um conhecimento mais

detalhado de cada realidade.

Dessa forma, a partir dessas discussões, e da concordância em aceitar

o desafio de buscar implantar um trabalho de construção e sistematização das

relações entre Instituição de Educação Infantil e famílias, objetivando o

compartilhamento das ações de cuidado e educação, a primeira providência foi

refletir sobre essa implantação, concluindo que deveríamos iniciar por uma

reunião de pais, antes mesmo do início das aulas, e elaborar uma ficha de

caracterização dos alunos e das suas famílias, para que elas pudessem ser

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135

um importante aliado nosso nesse trabalho, pelo conhecimento que nos

proporcionariam acerca das especificidades dessa nossa clientela.

Assim sendo, podemos dizer que, inicialmente, foi a consulta à ficha de

caracterização dos alunos, bem como o diálogo constante com as famílias, e a

preocupação com os processos de cuidado e educação das crianças, que

possibilitaram o processo de reflexão em torno das funções específicas e

complementares da família e da Instituição de Educação Infantil, servindo como

elementos balizadores da construção da nossa relação com as famílias no

C.M.EI. Carmem Reis.

Porém, é importante frisar também que um outro elemento balizador

desse processo, foi a reflexão de que as instituições educativas não podem

abrir mão da sua tarefa de contribuir efetivamente com a construção do

conhecimento pelas crianças, e, portanto, não devem nem se transformar

numa continuidade da família, num segundo lar, nem tentar substituir estas

famílias na ausência da mesma:

A escola imagina que pode se estruturar, para seus alunos, de forma que compense a falta da família. Como se isso fosse possível... Não é, e ponto final. A pior conseqüência desse rumo que a escola tomou é que, desse modo, os alunos ficam carentes de família e de escola também. Ou seja, querendo ser família, a escola deixa de ser escola. (AQUINO e SAYÃO 2004 p. 62-63)

A nossa proposta é que cada uma das instituições – família e escola,

dialoguem em busca da complementaridade de funções, porém, cada uma

respeitando as especificidades da função da outra. O referencial teórico

utilizado para embasar os estudos e discussões sobre a relação família e I.E.I.,

e as suas respectivas funções, foi o mesmo já apresentado no capítulo 3 desse

trabalho, por isso nos eximimos de repeti-lo neste item.

Enfim, o processo de adaptação, tanto das crianças, quanto dos pais; a

rotina como norteadora da construção dos conceitos de tempo e espaço; a

importância do brincar na Educação Infantil; a relação família e I.E.I e suas

funções, o processo de alfabetização; o trabalho com o nome próprio; a

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136

relevância de conhecermos a criança com a qual vamos trabalhar, bem como a

sua família; o respeito a diversidade religiosa presente na escola; os horários

de funcionamento da Instituição; os horários de planejamento e estudo;

resumindo: temas relativos ao cotidiano, ao dia-a-dia, tanto da Instituição como

um todo, quanto da sala de aula, foram estudados, debatidos, discutidos e

refletidos, tanto durante estes dias iniciais, quanto durante todos os nossos

outros encontros, e sempre que surgia alguma dúvida, ou questão que

precisava ser resolvida.

Entendemos essa disposição para o diálogo, como também a dialética

entre reflexão-ação-reflexão e ação-reflexão-ação, como fundamental para o

bom andamento da nossa proposta.

Nesses encontros iniciais, além da já citada ficha de caracterização dos

alunos (Anexo 1), elaboramos também um outro documento que aponta

caminhos discutidos e propostos coletivamente para a realização do trabalho

no cotidiano da Instituição, se constituindo num marco inicial para a elaboração

do projeto político pedagógico da mesma. Vamos apresentar abaixo esse

documento, conservando a forma original como o mesmo foi construído pelo

coletivo das pessoas envolvidas:

COMBINADOS ESTABELECIDOS NOS ENCONTROS INICIAIS DO GRUPO DE PROFESSORAS, COORDENADORAS E GESTORAS DO CARMEM

REIS: MARÇO/2004

• A necessidade de acolher também os pais, nesse período inicial de adaptação das crianças, já que os mesmos também estão se adaptando a uma nova situação, vivenciando receios, medos e conflitos. • Os pais deverão entrar na escola para deixar os seus filhos na porta da sala de aula, ocasião em que terão a oportunidade de conversar com as professoras, bem como as professoras com os pais, quando sentirem necessidade. • Ficou combinado que os horários de aula na escola seriam os seguintes: # turno matutino: 7:15 ás 11:15 # turno vespertino: 13:30 ás 17:30 • É importante que as professoras e coordenadoras cheguem sempre uns 10 a 15 minutos antes, para encaminharem algumas questões referente ao bom desenvolvimento das aulas.

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• Reconhecendo a nossa condição de profissionais da educação devidamente qualificadas para tal função, bem como todo o processo histórico de desvalorização que permeia a nossa profissão, como também o fato de que o afeto não passa pelo nome pelo qual a criança chama a professora, concordamos que não devemos incentivar o fato de sermos chamadas de tia, mas sim de professoras. • Compreendendo que medicar uma criança é tarefa para profissionais qualificados na área de saúde, chegamos ao consenso de que evitaremos, ao máximo, medicar autonomamente as crianças na escola, chamando sempre os pais e/ou encaminhando-as a um posto de saúde quando necessário. • No tocante a religião, também compreendemos que é uma opção e tarefa da família, Portanto, em sala de aula, quando a professora entender pertinente, será realizada uma prece, oração ou reza de agradecimento ou louvor a Deus, sem fórmulas, rituais ou gestos específicos de nenhuma religião em particular, como forma de respeito e consideração ás várias crenças religiosas professadas pelos nossos alunos e seus familiares. • A alfabetização é um processo e, como tal, não acontece em um único ano letivo ou momento específico, devendo ser uma construção prazerosa e significativa, onde a criança tenha contato com livros, gibis, músicas, textos variados e outros materiais gráficos do cotidiano, tendo a professora como propiciadora de momentos de aprendizagem, pensando desafios possíveis para cada aluno. • A brincadeira livre e a brincadeira dirigida precisam estar presentes no cotidiano das instituições de Educação infantil, propiciando lazer, divertimento, desenvolvimento e aprendizagens significativas para as crianças. • Considerando a necessidade de se estudar, discutir e planejar em conjunto, ficou decidido que teríamos reuniões quinzenais, sendo uma vez no mês em um dia da semana em que as aulas seriam suspensas, após a aprovação dos pais, e outra vez aos sábados a tarde.

No dia 25 de março, considerando que a reforma do prédio da Instituição

já estava quase concluída, passamos a nos reunir no mesmo, iniciando o

processo de confirmação das matrículas dos alunos já pré-matriculados no

início do ano.

Nesse processo contamos com o apoio direto das professoras, que

participaram efetivamente das matrículas, entrevistando os pais para o

preenchimento da ficha de caracterização aqui já apresentada. Essa

participação inicial foi muito importante, até porque foi propiciando um contato e

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138

um conhecimento maior entre a equipe da escola e os pais, familiares, enfim, a

comunidade de forma mais geral.

FOTO 11: Equipe da I.E.I efetuando

matrículas (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 12: Equipe da I.E.I efetuando

matrículas (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

Entre 25 de março e 02 de abril, a equipe se reuniu diariamente no

prédio da escola, efetivando as matrículas, arrumando as salas de aula e

finalizando o planejamento para as semanas iniciais.

FOTO 13: Professoras confeccionando

materiais (1) Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 14: Professoras confeccionando

materiais. (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

É importante registrar que esses momentos iniciais de estudos e

discussões do grupo de professoras, equipe técnica e gestoras, foi de

fundamental importância para todo o trabalho realizado na escola, tendo sido,

inclusive, a semente de um grupo de estudos, formado por professoras,

coordenadoras pedagógicas e gestoras, que se reúne mensalmente, sempre

aos sábados, desde a fundação da Instituição, até os dias atuais, numa

demonstração concreta da relevância do processo de formação em serviço

para esses profissionais.

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139

Outro ponto fundamental sobre o qual não poderíamos deixar de nos

reportar é que: antes do professor, existe o ser humano, essa convicção nos

levou a proporcionar também na escola momentos de acolhimento, de

confraternização, enfim, de uma convivência mais humana e fraterna, que nos

permitisse a criação e o fortalecimento de vínculos afetivos mais consistentes.

Dentre esses momentos vamos destacar os seguintes: reuniões

trimestrais para comemoração dos aniversários de professores e funcionários;

café da manhã para acolher professores e funcionários no início do 1º

planejamento do ano; reuniões de avaliações onde o trabalho da direção

também era avaliado e aberto para críticas, comentários e sugestões;

comemoração do dia do professor e do funcionário, dentre outros.

FOTO 15: Aniversariantes do trimestre FOTO 16: Café da manhã na I.E.I Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005 Fonte: Arquivo do CMEICAR. ANO: 2005

4.2 - Ações iniciais com os funcionários

Conforme iam chegando os funcionários encaminhados pela firma, cujos

serviços a SME terceirizava, nós íamos nos reunindo com eles para falar sobre

as especificidades do trabalho com a criança da Educação Infantil, colocando

que eles também eram educadores, na medida em que iriam atuar diretamente

com as crianças.

Em relação a essa questão, a primeira discussão que promovíamos era

no sentido de que os funcionários pudessem perceber a importância do

momento da infância que as crianças com as quais iríamos trabalhar estão

vivendo, bem como a importância das mesmas serem tratadas como cidadãos,

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140

sujeitos também dos seus processos de aprendizagem e desenvolvimento,

necessitando, portanto, de serem ouvidos, respeitados e considerados, nas

suas especificidades e singularidades.

Orientávamos também acerca da importância do tratamento que deveria

ser dado a família, enfatizando a importância de um bom relacionamento entre

a Instituição e a família dos seus alunos, lembrando, para isso, o respeito, a

gentileza e a simpatia com que as famílias dos alunos precisavam ser

recebidas na Instituição.

Neste momento colocávamos também as tarefas de cada um, tanto no

particular da função – vigia, merendeira, ASG, quanto na colaboração com o

educar e cuidar das crianças. É importante frisar que, desde o início os

funcionários se mostraram disponíveis para colaborar com a proposta da

Instituição.

Queremos registrar que hoje, retomando toda essa proposta de trabalho

e refletindo sobre a mesma, percebemos que deveríamos ter feito com os

funcionários uma proposta de trabalho mais efetiva, promovendo também a

participação deles nos momentos de planejamento e estudo. Infelizmente essa

questão, apesar de ter sido até pensada em alguns momentos, não foi posta

em prática.

É certo que alguns pontos da própria especificidade do trabalho deles –

como por exemplo, o fato da faxina geral mensal da Instituição ser realizada

por eles, exatamente no dia de planejamento, quando as crianças não se

encontravam presentes, dificultaram um pouco esse envolvimento maior, mas,

com certeza, se tivéssemos apostado mais nessa possibilidade, teríamos

encontrado uma saída.

Porém, mesmo considerando essa questão, é importante dizer que

fazíamos também reuniões periódicas com os funcionários, onde eles podiam

se colocar, e também que os mesmos participavam - juntamente com as

professoras e toda a equipe, das reuniões semestrais para avaliação geral do

trabalho, bem como das reuniões trimestrais para a confraternização em torno

dos aniversariantes do trimestre.

Feitos esses esclarecimentos, é importante registrar que, apesar dessa

lacuna que apresentamos acima, o envolvimento e a participação dos

funcionários foi muito importante em todas as atividades realizadas, tanto junto

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141

as crianças, como as famílias, considerando que os mesmos faziam parte da

escala diária da Instituição, tanto no horário do lanche, como do parque e da

higiene bucal das crianças, bem como de outras atividades realizadas com as

crianças, contribuindo efetivamente com as professoras nas tarefas de cuidado

e educação das mesmas nestas atividades; bem como se faziam presentes,

com tarefas definidas e relevantes em todos os encontros e reuniões

promovidas com as famílias.

Outro fato que queremos destacar, é que a grande maioria dos

funcionários, em sendo informados das tarefas que a escola pretendia e/ou

necessitava realizar, colocavam as suas habilidades pessoais a serviço das

mesmas: como cantores, como atores de peças infantis, como costureiras de

bonecas e das suas roupas, como recuperadores de livros e brinquedos, enfim,

naquilo que fosse possível e indispensável para o êxito das atividades em

questão.

FOTO 17: Funcionário tocando violão para

as crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.

FOTO 18: Funcionárias fazendo docinhos

para festa das crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.

É importante dizer também que nós, enquanto direção da escola,

procurávamos sempre incluir esses funcionários nas atividades já citadas de

incentivo e valorização ao ser humano, como cafés da manhã, jantares,

almoços, e outros momentos de confraternização promovidos ao longo do ano,

até mesmo pelo fato de compreendermos que todos os que atuam nas

Instituições educativas, independente da função específica que exercem, são

também educadores no sentido amplo e irrestrito da palavra.

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142

4.3 - Algumas ações realizadas com as crianças

O nosso objeto específico de estudo nessa tese, é a relação entre

família e I.E.I, com uma ênfase, portanto, para o trabalho realizado com as

famílias em prol desse objetivo; porém, como trabalhamos numa perspectiva

da práxis participativa - conforme já discutido na introdução deste trabalho,

estamos apresentando algumas ações gerais do contexto inicial de surgimento

e organização da Instituição, e compreendemos ser importante também

apresentar alguns aspectos do trabalho realizado com as crianças.

Um dos maiores desafios da Educação Infantil na contemporaneidade,

diante de todas as ambivalências e ambigüidades que permeiam a história da

infância – conforme apresentado e discutido no capítulo 3 desse trabalho, é

promover um trabalho pedagógico que considere a criança como sujeito de

direitos, ativo e reflexivo na construção das suas aprendizagens e do seu

desenvolvimento, para tanto, concordamos que:

O trabalho pedagógico precisa favorecer a experiência com o conhecimento científico e com a cultura, entendida tanto na sua dimensão de produção nas relações sócias cotidianas e como produção historicamente acumulada, presente na literatura, na música, na dança, no teatro, no cinema, na produção artística, histórica e cultural que se encontra nos museus. Essa visão do pedagógico ajuda a pensar sobre a creche e a escola em suas dimensões políticas, éticas e estéticas. A educação, uma prática social, inclui o conhecimento científico, a arte e a vida cotidiana. (KRAMER, 2006, p. 19)

Dessa forma, compreendemos que a organização do trabalho

pedagógico a partir da perspectiva de projetos didáticos, é uma alternativa que

contempla as dimensões propostas acima, principalmente porque “Essa forma

de estruturar o ensino leva em conta possibilidades, necessidades e

características das crianças, favorecendo um estudo multidisciplinar” (HORN,

2005, p.3), ou seja, possibilita que a criança seja respeitada nas suas

especificidades, tenha os seus conhecimentos prévios, a sua cultura e o seu

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143

contexto considerados, mas também a oportunidade de ampliação do seu

universo de conhecimentos, através de uma proposta que trabalhe com as

suas várias linguagens.

Foi o reconhecimento das várias possibilidades de aprendizagem e

desenvolvimento que o trabalho com projetos didáticos descortina para as

crianças, que levou os profissionais do Carmem Reis a adotar os mesmos

como uma das estratégias de trabalho realizada com os alunos da Instituição.

No biênio 2004/2005 vários projetos foram realizados pelas professoras.

Alguns mais restritos, e de menor duração, para trabalhar conteúdos

específicos como identidade pessoal, família, animais, vegetais, higiene

pessoal, dentre outros. Outros mais amplos, envolvendo conteúdos

procedimentais, atitudinais, conceituais; bem como abrangendo vários eixos

temáticos propostos pelo Referencial Curricular Nacional para Educação

Infantil - RCNEI para o trabalho pedagógico na Educação Infantil, como foi o

caso do projeto Brinquedos e brincadeiras: um resgate cultural; No mundo

encantado dos contos de fadas; Desvendando a vida e a cultura da Vila; além

de outros.

Para efeito da nossa descrição nesse momento, vamos nos deter no

projeto intitulado Rendeiras da Vila: a preservação de uma cultura, pelo fato

do mesmo ter despertado muito o interesse dos alunos, além de ter trabalhado

com uma temática que valorizou bastante a cultura do bairro no qual o Centro

Infantil está localizado, como também pelo fato da professora ter

disponibilizado esse projeto, para que o mesmo pudesse ser apresentado no

nosso trabalho.

É importante registrar que esse projeto fez parte de uma temática maior

– Desvendando a vida e a cultura da Vila, proposta pela Instituição como uma

forma de construir um currículo que, conforme nos aponta Bujes (In: CRAIDY;

KAERCHER, 2001), surja das interações que ocorrem no cotidiano da

instituição educativa, valorizando a cultura e o conhecimento da comunidade

local.

O mesmo foi realizado no segundo semestre do ano de 2005, na turma

do nível I vespertino, composta por 15 crianças na faixa etária de 4 anos, teve

uma duração de aproximadamente 3 meses, e foi organizado pela professora

titular da sala, com os seguintes objetivos:

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• OBJETIVO GERAL:

o Conhecer e valorizar o trabalho das rendeiras da Vila de Ponta Negra, reconhecendo a importância desse ofício para a preservação da cultura local.

• OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

o Compreender como se deu o aprendizado do ofício de rendar.

o Conhecer os principais instrumentos de trabalho das rendeiras. o Saber que tipos de peças são produzidas pelas rendeiras.

o Reconhecer a importância do trabalho das rendeiras para a

cultura da Vila de Ponta Negra.

A temática específica do projeto nasceu de uma atividade realizada com

as crianças, sobre as profissões exercidas pelos seus familiares. Considerando

que algumas crianças da sala eram parentes, sobrinhas e netas de rendeiras, e

que esse é um ofício que faz parte do universo cultural do bairro desde a

década de 1960, tendo perdurado até os dias atuais, sendo repassado de uma

geração a outra, praticamente dentro das mesmas famílias, além do fato das

crianças terem demonstrado interesse por conhecer melhor esse trabalho, foi

que a professora optou pela realização desse projeto. Segue abaixo um trecho

da escrita da professora na justificativa do projeto:

A escolha do tema deu-se primordialmente pelo fato de estarmos realizando uma roda de conversa sobre as profissões dos familiares dos alunos. Numa dessas conversas, uma das alunas afirmou: “minha avó é rendeira”. Fiquei realmente muito entusiasmada e curiosa com a afirmação, e as crianças também, pois queríamos saber um pouco mais sobre este ofício e sobre os instrumentos utilizados pela avó da aluna para realizá-lo. Por outro lado, como toda a escola estava interessada em elaborar um projeto sobre a comunidade e os aspectos sócio-econômicos e culturais da Vila de Ponta Negra, o estudo sobre as rendeiras da Vila seria uma excelente oportunidade para a realização de um projeto, o qual seria um dos subtemas relacionados.

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Outro aspecto que influenciou na escolha do tema foi o fato de tal ofício ser um dos principais da Vila, sendo repassado de mãe para filhas, ou seja, de uma geração para outra até os dias atuais. Muitas rendeiras da Vila, já idosas, aprenderam a rendar com as mães, sustentaram os filhos através desse trabalho e passam para as filhas e aprendizado dessa função nos dias atuais. Desse modo, desenvolveremos o projeto “Rendeiras da Vila: a preservação de uma cultura”, durante o segundo semestre do corrente ano.

Segundo o relato da professora, após a opção pelo tema do projeto, a

primeira atividade realizada foi uma roda de conversa para o levantamento dos

conhecimentos prévios das crianças, bem como para sentir o nível de

participação e interesse das mesmas pelo projeto, para que se pudesse

estruturá-lo da melhor forma possível. Foi assim que, a partir dos seguintes

questionamentos:

Você conhece alguém da sua família que sabe rendar?

Como é que a rendeira faz a renda?

O que será que as rendeiras usam para rendar?

apresentados inicialmente pela professora - dentre outros surgidos no diálogo e

na interação com as crianças no momento da roda, que o levantamento de

conhecimentos prévios foi realizado, obtendo respostas como as que se

seguem:

Minha avó sabe rendar

A minha também sabe

Ela usa almofada para rendar

Eu nunca vi uma mulher rendando. Quero ver!

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Tendo essas questões iniciais relativas ao levantamento de

conhecimentos prévios como parâmetro, a professora organizou o referido

projeto, através do qual foram vivenciadas as seguintes atividades:

• Rodas de conversa sobre o trabalho das rendeiras, objetivando sistematizar as atividades a serem realizadas. • Visita a casa das rendeiras da Vila, para observação do trabalho e realização de perguntas, considerando a curiosidade e o interesse dos alunos. • Roda de conversa sobre a visita a casa das rendeiras, registrando a fala das crianças para a elaboração de um texto coletivo. Desenhos livres das crianças sobre essa visita. • Elaboração coletiva de um convite escrito para que uma rendeira – avó de uma aluna da turma, viesse até a Instituição para ser entrevistada. • Elaboração e realização coletiva da entrevista com a rendeira na Instituição • Ensaio da conhecida canção popular “mulher rendeira”.

• Confecção, pelas crianças, com a mediação da professora, da almofada de bilro usada pelas rendeiras no seu ofício. • Exposição das almofadas de bilro confeccionadas pelas crianças, bem como de todas as atividades individuais e coletivas ( desenhos, textos, entrevista, etc) para a comunidade, sendo este o produto final do projeto.

No dia dessa exposição final do trabalho realizado por esta turma, e por

todas as outras turmas da Instituição, dentro do projeto maior intitulado

Desvendando a vida e a cultura da Vila, três rendeiras do núcleo sediado na

Vila de Ponta Negra, denominado Casa das Rendeiras, se fizeram presentes

na Instituição, com suas almofadas e bilros, apresentando esta arte para todos

os que compareceram ao evento.

Segundo a professora, após a realização de todo o projeto, na avaliação

final, quando solicitadas a opinar sobre o trabalho realizado, as crianças deram

os seguintes depoimentos:

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Eu gostei de ver a mulher rendando.

Eu gostei de fazer a almofada.

Eu também gostei de fazer a almofada.

Eu gostei de tudo.

Esse foi apenas um dos aspectos do trabalho realizado com as crianças

no cotidiano da Instituição, mas que, no nosso entendimento, retrata a

preocupação, a responsabilidade e o compromisso de todos os que fazem a

equipe administrativa-técnica-pedagógica-funcional do CMEI Carmem Maria

Reis, com um trabalho pedagógico de qualidade, que valorize os

conhecimentos prévios das crianças, respeite a sua cultura, e contribua com a

ampliação dos conhecimentos das mesmas.

4.4 – Ações realizadas com as famílias

Partindo dos princípios já elencados no início desse trabalho – a grande

maioria construídos após as duas experiências de pesquisa sistematizadas já

apresentadas, bem como dos estudos e discussões realizadas junto a toda a

equipe de profissionais do CMEI Carmem Reis, vamos expor as linhas gerais

que nortearam a nossa proposta de trabalho nesta área, explicando como a

mesma foi sendo construída ao longo do processo.

Compreendendo a relevância de um trabalho dessa natureza ser uma

construção coletiva, nossa primeira preocupação foi envolver as professoras e

toda a equipe técnica administrativa da Instituição nessa proposta desde os

primeiros dias de estudo, quando levamos este tema para ser refletido, e já

fomos construindo coletivamente algumas diretrizes para a vivência do

mesmo, começando pela elaboração de uma ficha de caracterização das

crianças e suas famílias, onde iríamos encontrar, também, alguns subsídios

para nortear o nosso trabalho.

Outro passo importante, logo nos primeiros dias de contato com a futura

equipe de educadores do Centro Infantil, foi o consenso de que os pais

deveriam ter livre acesso a Instituição, deixando e pegando os filhos na porta

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148

da sala de aula, ocasião em que poderiam, dentre outras coisas, conversar

com a professora, e conhecer/observar o cotidiano da Instituição, bem como a

recepção dada ao seu filho(a) na mesma.

FOTO 19: Livre acesso das famílias a I.E.I.

(1) Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 20: Livre acesso das famílias a I.E.I.

(2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

Combinar que teríamos momentos de reuniões, tanto de caráter

formativo, quanto informativo, bem como outros momentos de

interação/troca/vivência com os pais durante o ano letivo, foi outro

compromisso firmado com todos que faziam o corpo técnico-docente-

administrativo da Instituição desde o início, embora as ações específicas só

tenham sido definidas ao longo do ano letivo, considerando as demandas que

foram surgindo na interação do processo.

Dessa forma, vamos agora apenas citar, após termos agrupado em

blocos, as atividades desenvolvidas durante os anos de 2004 e 2005,

elegendo, a partir das nossas próprias observações, das observações das

professoras e das falas dos entrevistados, uma ou duas atividades mais

significativas de cada bloco, para serem analisadas no capítulo seguinte:

• Reuniões com os pais.

• Palestras sobre temas relevantes para os processos de aprendizagem e

desenvolvimento das crianças.

• Vivência com os pais de atividades realizadas com as crianças no

cotidiano da instituição

• Festas comemorativas

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149

• Incentivo a participação dos pais em projetos didáticos vivenciados pelas

crianças

• Intervenção individual, junto a algumas famílias.

a) Reuniões entre Famílias e Instituição de Educação Infantil.

É importante frisar que estamos sempre designando “reuniões entre

famílias e I.E.I.”, como aqueles encontros de caráter mais informativos, bem

como destinados a ouvir os pais, sobre questões que entendemos serem

necessárias e pertinentes ao dia-a-dia da Instituição. Outros encontros, com

um caráter mais de trocas de idéias e reflexões sobre as ações de cuidado e

educação das nossas crianças, terão outra denominação.

Inicialmente, estas reuniões foram previstas em número de 4 ao ano: 1

no início do 1º semestre, outra no final; uma no início do 2º semestre e outra

também no final. Porém, no transcorrer do ano letivo, essas reuniões

ultrapassaram a previsão inicial, e aconteceram sem uma periodicidade pré-

estabelecida, mas, sempre com o objetivo de informar as famílias sobre

acontecimentos da escola, solicitar a opinião e colaboração das mesmas

nesses acontecimentos, como também, principalmente no início do ano letivo,

apresentar a escola, sua proposta e seu corpo técnico-docente-administrativo,

aos familiares dos alunos.

Tanto no início do ano de 2004, quanto no início do ano de 2005,

realizamos, com a presença de todos os funcionários docentes e não docentes

da Instituição, uma primeira reunião com as famílias dos nossos alunos,

objetivando apresentar a Instituição, a nossa proposta de trabalho, algumas

regras necessárias ao funcionamento da mesma, bem como ouvir os familiares

– inclusive apresentado a professora responsável por cada turma, e abrindo já

um espaço para aqueles que quisessem tratar de alguma questão específica

sobre o filho; como também dizendo aos mesmos que nós – direção,

coordenação, professoras e funcionários, estaríamos disponíveis para atendê-

los em qualquer dúvida, sugestão ou outra necessidade que eles sentissem.

Para tanto, os portões da Instituição, tanto no início, quanto no final de cada

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150

turno de aulas, estariam abertos, para que eles pudessem entrar e conversar,

deixando e recebendo de volta as suas crianças na porta das respectivas salas

de aula.

Além dessas primeiras reuniões no início de cada ano letivo, e das

reuniões para entrega dos relatórios de desempenho dos alunos ao final de

cada semestre, outras reuniões aconteceram durante o ano, sempre com o

objetivo de discutir e ouvir a opinião dos pais sobre algum assunto relevante ao

funcionamento da Instituição, organização de passeios, festividades, horário de

início das aulas, merenda, bem como para tratar e retomar os nossos

combinados com as famílias sobre horário de entrada e saída das crianças,

uso da farda, higiene pessoal dos alunos, uso da carteirinha de identificação ao

vir pegar a criança na Instituição, dentre outras questões relevantes ao

trabalho.

b) Palestras e vivências sobre temas relevantes para as ações de cuidado e educação das crianças.

Durante os anos de 2004 e 2005, realizamos algumas palestras com as

famílias sobre temas relevantes para o cuidado e a educação das crianças,

entre eles destacamos os seguintes: a relevância da brincadeira para o

desenvolvimento da criança, a importância do limite na educação da criança; a

relação entre pais e filhos; a higiene bucal e tratamento e prevenção de

doenças de pele e pediculose.

Essas temáticas foram trabalhadas pela equipe da escola, a partir da

observação e vivência de algumas questões do cotidiano na Instituição:

• No caso da higiene bucal e do tratamento e prevenção de doenças de

pele e pediculose, a idéia nasceu a partir da constatação, realizada pela equipe

da Instituição, da necessidade de cuidado que as crianças necessitavam

nessa área. Dessa forma, através de uma parceria com o posto de saúde do

bairro, convidamos pais e crianças a participarem desse evento. Na ocasião,

além da palestra de esclarecimento, foi distribuída escova dental e as mães

presentes foram convidadas a escovar, sob a orientação do dentista, os dentes

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151

da sua criança, participando também da aplicação de flúor. Na palestra sobre

pediculose e outras doenças da pele, a enfermeira também atendeu alguns

casos específicos, encaminhando mães e crianças, quando necessário para

uma consulta médica, ou distribuindo e orientando sobre o uso da medicação

adequada.

• No caso da temática sobre a importância da brincadeira, a necessidade

de se trabalhar a mesma surgiu, também, a partir das observações da equipe

da Instituição, principalmente as professoras, sobre a questão de algumas

mães não ficarem satisfeitas com o fato das crianças se sujarem no parque,

brincarem com areia; além de outras que alegavam, em alguns momentos,

que, como a criança vinha “só para brincar”, elas não se preocupavam muito

com o cumprimento do horário, chegando atrasadas com os filhos, ou

querendo sempre levá-los mais cedo, a partir de uma conveniência delas.

• No tocante as palestras sobre limites e relação pais e filhos, a idéia

nasceu partindo de algumas observações realizadas pela equipe técnica-

docente no dia-a-dia da Instituição, tais como: era comum as crianças usarem

uma espécie de “chantagem emocional” com a mãe, tipo: traga confeito

quando vier me buscar, se não, não vou para casa ; ou então espernear,

chegar na escola correndo e a mãe correndo atrás; as mães reclamarem que

não sabiam mais o que fazer com as crianças. Partindo dessas observações,

resolvemos fazer as citadas palestras com o objetivo de compartilhar com as

famílias estas funções de cuidar e educar as crianças, discutindo, refletindo e

procurando dirimir algumas dúvidas.

c) Oficina com as Famílias de atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição

Partindo da necessidade, que entendemos imperiosa, das famílias

conhecerem o trabalho que é realizado no cotidiano da Instituição de Educação

Infantil com os seus filhos, e concordando que: “As relações entre a família e o

Centro Educativo devem proporcionar que os pais e as mães possam

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152

compreender, aceitar e valorizar a tarefa educativa da escola”.( BASSEDAS,

HUGUET & SOLÉ,1999, p.289), foi que nos propomos a realizar estas oficinas,

com o objetivo de proporcionar as famílias um conhecimento mais aprofundado

das atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição.

Essas oficinas foram planejadas por toda a equipe da escola e

realizadas pelas professoras, na própria sala de aula, cada uma com os pais

dos seus alunos. As temáticas trabalhadas foram organizadas, tanto com base

nas atividades da própria rotina da Instituição, quanto nas falas espontâneas de

alguns familiares, dentre as quais destacamos as seguintes:

mulher, eu nem trouxe ele ontem, também é só pra brincar, não faz mal não, né?

Diretora, esse menino não vai aprender a ler não? Quando é que vai ter dever escrito de casa todo dia?

Diretora, essa menina está chegando em casa muito suja de areia, suada, eu vou pedir a professora para ela não ir mais para o parque não.

Esses são pequenos exemplos de falas das famílias dos alunos que,

para nós, atestam, tanto o desconhecimento das funções da Educação Infantil,

como a necessidade de um conhecimento maior acerca das atividades

vivenciadas pelas crianças na Instituição.

Dessa forma, algumas das temáticas discutidas e vivenciadas foram: a

hora do parque, a atividade de desenho, a hora da história, o momento do

vídeo, o trabalho com o nome próprio, dentre outras.

FOTO 21: Oficina sobre a hora do parque. Fonte: arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

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FOTO 22: Oficina sobre desenho.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 23: Oficina sobre escrita com

alfabeto móvel. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

O objetivo maior de cada uma dessas oficinas, foi apresentar e fazer uma

reflexão com as famílias sobre a nossa proposta de trabalho, mostrando, por

exemplo, o quanto a hora da história é importante para que a criança se

aproxime da linguagem escrita, perceba a estrutura dos vários gêneros

textuais, amplie o seu conhecimento de mundo; a relevância das atividades

com desenho, com o vídeo, ou então no parque, explorando as muitas

linguagens e formas de expressão das crianças, etc.

d) Festas comemorativas

Algumas datas comemorativas foram lembradas pela Instituição como

uma forma de resgatar aspectos da cultura da comunidade, bem como com o

objetivo de reunir as famílias em torno de uma atividade de caráter mais lúdico,

mais divertido, propiciando assim convivência, troca de experiências e lazer no

ambiente em que os filhos estudam.

Dentre essas comemorações destacamos a páscoa, as festas juninas, o

dia do folclore, a comemoração alusiva ao Natal, bem como as datas

comemorativas do dia das mães e dos pais, que acabaram se transformando

nos Encontros da Família Carmem Reis, onde todos os familiares dos

alunos, independente de serem apenas mães ou pais, no sentido biológico do

termo, eram convidados a se fazerem presentes, participando de atividades

informativas, artísticos-culturais, ou de lazer.

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FOTO 24: Festa junina.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 25: Famílias visitando exposição de

trabalhos das crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

e) Incentivo a participação dos pais em projetos didáticos vivenciados pelas crianças Desde o início das nossas reuniões pedagógicas, o projeto didático foi

discutido como sendo uma metodologia possível e adequada de ser utilizada

para se trabalhar alguns conteúdos junto com as crianças. Dessa forma, dentro

da organização geral da rotina, nas nossas reuniões mensais de planejamento,

sempre se pensava um projeto, buscando contemplar algum tema relevante

para os processos de desenvolvimento e aprendizagem das crianças. Dentre

os temas trabalhados a partir dessa metodologia, destacamos: brinquedos e

brincadeiras; desvendando a vida e a cultura da Vila e o mundo encantado do

imaginário infantil.

Considerando as especificidades das nossas crianças, bem como todo o

seu contexto sócio-histórico-cultural, pensávamos um tema maior, como os já

citados anteriormente, e cada professora, tendo esse tema maior como eixo

condutor, e respeitando os interesses, necessidades e conhecimentos prévios

dos seus alunos, pensava o projeto específico da sua sala de aula, construindo

o título, a justificativa, os objetivos, as etapas e atividades a serem vivenciadas,

bem como o produto final de cada projeto, procurando também, durante o

mesmo, propiciar o envolvimento das famílias das crianças.

Esse envolvimento das famílias se dava de várias formas, dependendo

da temática, do objetivo de cada turma, e do produto final proposto. Em

algumas salas havia um envolvimento no tocante a coleta de dados e materiais

para subsidiar o projeto; em outras alguns familiares eram convidados para

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entrevistas, depoimentos e/ou vivências juntamente com os alunos na própria

sala de aula; em outras situações ainda, o envolvimento das famílias acontecia

por ocasião do momento das atividades dos produtos finais ou culminâncias

dos projetos.

f) Intervenção individual junto a algumas famílias Nas nossas reflexões coletivas, em busca de aperfeiçoar o trabalho

realizado com a família dos nossos alunos, sentimos necessidade de, além das

intervenções gerais, pensadas e realizadas com o coletivo das famílias,

fazermos também algumas intervenções de caráter mais individual, procurando

colaborar, de forma mais específica com o processo de formação de algumas

crianças que, a nosso ver, precisavam de um acompanhamento mais direto,

mais direcionado, acompanhamento esse que, sem dúvida nenhuma, tinha

início com um diálogo mais aberto e mais direto com a família dos mesmos.

Nessa perspectiva, sempre que as professoras, coordenadoras,

gestoras, ou os próprios funcionários, percebiam alguma mudança de

comportamento de alguma criança, que apontava para a necessidade de um

diálogo mais direto com as famílias, a questão era discutida no coletivo e,

dependendo da situação, pensávamos uma estratégia para que, a professora,

a coordenadora e/ou a direção, realizasse esse trabalho. No capítulo seguinte

vamos especificar e refletir sobre uma intervenção dessa natureza que

aconteceu no ano de 2005.

Estas foram, em linhas gerais, as ações realizadas junto a professoras,

funcionários e famílias, objetivando a sistematização de ações que

possibilitassem o fortalecimento das relações entre as famílias e a Instituição, e

o compartilhamento das ações de educação e cuidado que precisam ser

realizadas junto ás crianças da Educação Infantil.

No capítulo seguinte, buscando atender de forma mais específica ao

objetivo ao qual nos propomos nesta tese – descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças, no

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contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, vamos,

conforme já citado anteriormente, eleger, de cada um desses denominados

blocos de atividades, uma ou duas atividades consideradas mais significativas,

a partir das nossas próprias observações, como também da opinião de

professoras e famílias, e da repercussão que a atividade teve na Instituição,

para refletirmos melhor sobre as mesmas. Vamos também, no capítulo que se segue, apresentar uma análise

reflexiva da última entrevista realizada com familiares dos alunos em 2005.

Dessa forma, após apresentarmos, em linhas gerais, os contornos dos

caminhos percorridos, vamos agora procurar descrever e refletir sobre algumas

especificidades dos mesmos, a partir de um diálogo maior com os outros atores

que construíram/compartilharam conosco essa trajetória.

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CAPÍTULO 5

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5 - DESCREVENDO E REFLETINDO SOBRE OS CAMINHOS PERCORRIDOS.

Cabe, portanto, ás instituições estabelecerem um diálogo aberto com as famílias, considerando-as como parceiras e interlocutoras no processo educativo infantil. Brasil (1998)

Nesse capítulo, onde nos propomos a refletir sobre algumas

especificidades dos caminhos percorridos, vamos descrever e analisar as

ações e intervenções mais significativas de cada um dos blocos de atividades

desenvolvidas com as famílias, bem como apresentar uma análise mais

detalhada e sistemática das entrevistas finais realizadas com familiares dos

nossos alunos, buscando perceber a opinião dos mesmos sobre a experiência

aqui vivenciada.

É importante lembrar que, conforme já explicitado no capítulo 2, as

nossas entrevistas foram realizadas em dois momentos distintos: o primeiro,

com duas perguntas (Anexo 2), sempre após alguma atividade realizada com

as famílias, procurando perceber a opinião e percepção delas sobre a atividade

específica; o segundo momento, constando de uma entrevista semi-estruturada

com sete perguntas (Anexo 3), e realizada ao final do ano letivo de 2005, com

o objetivo de perceber a opinião mais geral das famílias, sobre todo o trabalho

realizado pela escola.

Alguns trechos e opiniões das entrevistas do primeiro momento, estão

aqui apresentados nos blocos específicos de análise de cada atividade. Já as

entrevistas finais, serão catalogadas por perguntas, e analisadas a partir das

respostas apresentadas pelas famílias entrevistadas.

Vamos citar novamente abaixo os blocos de atividades realizadas com

as famílias, lembrando que, de cada um desses blocos, vamos eleger uma ou

duas atividades para serem descritas e analisadas de forma mais específica

nesse capítulo.

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a) Reuniões com as famílias. b) Palestras e vivências sobre temas relevantes para as ações de cuidado e educação das crianças. c) Oficinas com as famílias sobre atividades realizadas com as crianças no cotidiano da instituição. d) Festas comemorativas. e) Incentivo a participação das famílias em projetos didático-educativos vivenciados pelas crianças. f) Intervenção individual, junto a algumas famílias.

5.1. Reuniões com as famílias Das reuniões realizadas com as famílias, vamos nos deter na análise da

1ª reunião do ano de 2004 e da última reunião do ano de 2005, por

compreendermos que as mesmas nos apontam vários elementos para reflexão

sobre o nosso trabalho.

Na primeira reunião do ano de 2004, realizada, conforme já colocado

anteriormente, com o objetivo de conhecer as famílias com as quais iríamos

trabalhar, bem como de apresentar a Instituição a estas famílias, um dos

aspectos que mais chamou a nossa atenção, foi o elogio das mesmas a

reforma que tinha sido realizada no espaço físico da Instituição. Os pais, que

conheciam o espaço que, como já dissemos, era ocupado por uma escola

particular, conveniada com a Prefeitura, deram os seguintes depoimentos

quando se depararam com a reforma que havia sido feita:

ah! Agora sim o espaço está mais seguro para as crianças: posso deixar meu filho sem medo!

Vocês se preocuparam com tudo: até a areinha do parque está limpinha, e tem um lugarzinho separado, onde ninguém pisa, só para as criança brincar com areia!!

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A escola ta toda pintadinha, as cadeirinha e mesa novinha, os banheiro do tamanho dos menino, isso sim que nossos filho precisa!

Que diferença, nem parece o mesmo lugar: tem parque, tem brinquedo, areia limpa, sem mato!

Esses depoimentos nos mostram o quanto as famílias percebem e

valorizam a organização dos espaços, a limpeza, a segurança, enfim a

preocupação com o bem estar dos filhos delas. Essa foi uma das nossas

primeiras preocupações: dentro dos limites possíveis, oferecidos por um

espaço que não foi projetado com o objetivo de atender uma Instituição infantil,

adequá-lo da melhor forma possível, objetivando atender as necessidades de

cuidado e educação dessas crianças.

FOTO 26: Reunião de pais.

Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

Outra questão também muito elogiada pelas famílias nessa primeira

reunião foi o fato de todo o corpo técnico-docente-administrativo e funcional da

escola, desde a direção até o vigia e a merendeira, estarem presentes à

reunião, se apresentando e se colocando a disposição delas.

As professoras também ficaram muito satisfeitas com essa primeira

reunião, principalmente pelo fato dos familiares dos alunos terem reconhecido

todo o esforço que foi realizado para melhorar o espaço físico da Instituição,

bem como o empenho das professoras em se fazerem presentes e

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161

participarem ativamente de todo o movimento das matrículas e arrumação do

espaço interno, tornando-o o mais agradável possível.

Bassedas, Huguet & Solé (1999), chamam bastante a atenção sobre a

importância dos contatos iniciais entre famílias e escolas, lembrando que os

mesmos são fundamentais para o estabelecimento de uma relação mais sólida

e produtiva entre essas duas instituições, principalmente no sentido de

conhecer quem é esta criança, seus gostos, preferências, sentimentos:

Quando a criança ingressa na escola, por pequena que seja – e quanto maior, ainda mais – já viveu, em sua família, um conjunto de experiências transcendentes a si. Os professores e as professoras necessitam saber como é esta criança, quais os seus ritmos, que pautas de relação está estabelecendo e com que pessoas, o que lhe agrada, o que não lhe agrada, etc. Frequentemente essas informações são obtidas mediante uma entrevista inicial que serve também para marcar os primeiros contatos entre a escola e a família. (BASSEDAS, HUGUET & SOLÉ, 1999, p. 285)

No nosso caso específico esse contato inicial se deu, a partir da

matrícula, com a ficha de caracterização, e dessa primeira reunião com as

famílias, onde toda a equipe da Instituição se fez presente, se colocando a

disposição para conhecer melhor, e dialogar com as famílias das crianças.

De nossa parte, a partir das observações e do registro das falas de

familiares e professoras – algumas dessas falas já apresentadas no corpo

desse trabalho; percebemos a importância desse primeiro contato com os

pais, como sendo fundamental para o fortalecimento de todo o trabalho

posterior. Outra questão muito relevante de ser lembrada nesse momento, é o

fato de que, no início do ano, até pelo interesse das famílias em conhecer o

lugar e garantir a vaga dos filhos, o comparecimento das mesmas é maior,

tornando, realmente, esse momento privilegiado para o início de um processo

exitoso de relação entre família e escola.

Acreditamos assim que todas essas questões já expostas apontam para

a relevância de um trabalho bem estruturado e direcionado desde o início do

ano letivo, desde as primeiras oportunidades de contato com as famílias, para

o fortalecimento da relação da família com as instituições de Educação Infantil,

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como acreditamos também que a nossa relação inicial foi muito produtiva, na

medida em que abriu os caminhos para todo o processo aqui descrito.

A última reunião de pais do ano de 2005 foi escolhida para ser analisada

nesse capítulo, pelo fato de ter sido um momento no qual, a grande maioria das

famílias já com 2 anos de convivência na Instituição, pôde fazer uma avaliação,

um balanço do trabalho realizado:

Eu gosto desta escola porque as crianças são bem tratadas, elas gostam de vir para cá, elas são felizes, e toda mãe quer ver seus filho feliz

Eu tenho pena porque a minha já vai embora, não pode mais ficar. Aqui eu fico tranqüila, porque sei que quando ela entra, só sai comigo, ou com gente de confiança, não vai ficar solta na rua – mesmo se não tiver aula, elas ficam com as criança, não mandam sozinha para casa.

A segurança daqui é muito boa, a limpeza também, e as pessoa, que trata a gente bem, atende a gente, dá informação, fala pra gente entender.

Eu gosto muito daqui, as vez até tenho pena porque não posso vir mais, elas chamam pra muita coisa, mas eu trabalho e as vezes não posso vir, minha mãe, ou minha irmã é que vem, mas eu gosto de vir, só não venho quando não posso.

Uma das questões que mais chamam a nossa atenção, desde as

primeiras entrevistas que começamos a fazer com os pais da Instituição, é o

fato da grande maioria deles se referir ao bom tratamento que recebem, e ao

fato de terem acesso fácil à direção e aos outros profissionais da Escola, como

se isso fosse uma dádiva, uma benção ou um favor. Na nossa visão isso é uma

obrigação de todos os que fazem ás instituições, principalmente as instituições

públicas, considerando que são pagos pelo povo, para prestar um serviço ao

povo, além, é óbvio, do grande compromisso social que possuem na formação

das novas gerações.

Em uma das nossas entrevistas, exatamente por estranharmos os

entrevistados elogiarem a forma como são tratados e o fato de terem acesso

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fácil a direção da Instituição, perguntamos a entrevistada o porque desse

elogio, e ela respondeu:

mulher, tem escola que trata muito mal a gente, parece que a gente vai lá só pra falar mal, pra atrapalhar. Falar com diretor, aí é que é difícil! Pra você ter uma idéia, faz mais de uma semana que quero falar com o diretor da escola onde meu outro filho estuda e não consigo.

Infelizmente, sabemos que a fala dessa mãe ainda é uma realidade

presente em muitas escolas. É como se os pais fossem inimigos, pessoas que

não pudessem contribuir com a escola ou, pior ainda, fossem atrapalhar, ou

apenas criticar o cotidiano da instituição. As experiências que já tivemos em

relação ao livre acesso dos pais à Instituição escolar, demonstram que esse

fato é muito importante, fazendo com que os pais se sintam mais responsáveis,

mais atuantes, mais presentes. É lógico que para a instituição é uma

responsabilidade, uma preocupação a mais, já que os pais estão observando

mais de perto o que acontece no interior da mesma, porém, quando se tem um

compromisso coletivo com um trabalho de qualidade, essa presença maior dos

pais passa a ser um incentivo, uma contribuição para a continuidade do

trabalho, pois, do mesmo jeito que os pais criticam e reclamam quando

percebem que o trabalho não está adequado às necessidades das crianças,

eles também elogiam e reconhecem o esforço que a escola faz para oferecer

um trabalho de qualidade.

Outro ponto importante que foi colocado pelas famílias nessa última

reunião, é em relação à segurança, como um ponto positivo assegurado pela

Instituição, segurança essa que se torna mais visível pela implementação da

chamada carteirinha de identificação - carteira com a foto e os dados da

criança, que é confeccionada e distribuída pela Instituição no início do ano

letivo, com a recomendação de que a criança só sairá da escola, após o

período de aula, acompanhada da pessoa que trouxer esta carteirinha.

Esta prática adotada pela Instituição em relação à carteira de

identificação, é discutida com as famílias desde a primeira reunião do ano, e

recebe sempre o apoio total de todos os presentes, embora a vivência diária da

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mesma cause, às vezes, alguns contratempos e dificuldades, principalmente

quando as famílias delegam a tarefa de pegar os filhos na escola a outras

pessoas e se esquecem de falar na carteira. Porém, sempre que o problema

aconteceu, foi contornado pela equipe da escola, principalmente porque as

famílias sempre pegam as crianças com as respectivas professoras, na porta

das salas de aula, o que facilita uma identificação, um conhecimento e uma

interação maior entre as mesmas.

Nos poucos casos em que foi necessário solicitar que o portador que

veio pegar a criança voltasse para buscar a carteira, ou tivemos que telefonar

aos pais, usando as informações da ficha de caracterização, para confirmar a

idoneidade do portador - embora os transtornos do momento às vezes

gerassem alguns mal entendidos, posteriormente as questões eram

esclarecidas, e as famílias reconheciam que as providências eram necessárias

e importantes para preservar a segurança das crianças.

Uma outra questão relevante que a fala dos familiares aponta é essa

questão de, muitas vezes, eles não comparecerem por causa do trabalho, ou

de outro compromisso igualmente importante.

Por ocasião do terceiro Encontro da Família Carmem Reis, tivemos o

cuidado e a curiosidade de procurar saber de todas as famílias ausentes –

através de uma entrevista informal, o motivo da ausência, e constatamos que

90% dos ausentes alegaram trabalho e doença como os motivos que os

levaram a não comparecer ao encontro. Apenas os 10% restantes é que

afirmaram não ter comparecido por esquecimento ou por terem outro

compromisso de lazer já programado e ao qual não podiam faltar.

Esse fato para nós foi motivo de muita alegria e estímulo para o trabalho,

considerando que a maioria dos ausentes lamentou profundamente não ter

comparecido, alegando que gostavam muito das atividades programadas pela

Instituição, além da convicção que nos proporcionou de que algumas famílias

não comparecem a instituição escolar, não apenas por descaso, ou falta de

interesse, mas porque possuem também toda uma necessidade de luta pela

sobrevivência que as impossibilitam de comparecer.

Essa constatação foi fundamental para que pudéssemos refletir sobre a

necessidade de conhecer mais as realidades, para criticá-las menos, e

compreendê-las melhor.

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165

5.2. Palestras e vivências com as famílias

O tema relativo ao limite na educação da criança, foi trabalhado pela

coordenadora pedagógica do turno matutino, partindo de uma dramatização de

um diálogo entre mãe e filha, onde ficava claro as dúvidas e contradições da

mãe no tocante a questão de colocar um limite, tanto em relação ao horário,

quanto em relação ao tipo de programação que a filha poderia assistir na TV.

FOTO 27: Dramatização sobre limites. (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

FOTO 28: Dramatização sobre limites. (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004.

Partindo dessa dramatização, encenada por uma das professoras e por

nós próprias, a coordenadora pedagógica do turno matutino, iniciou um diálogo

com as famílias presentes sobre esta questão do limite. A participação das

famílias foi bastante significativa neste momento, cada uma colocando a forma

como agia, as dúvidas que tinha, as incertezas. Na entrevista realizada ao final

dessa atividade, onde perguntamos a opinião dos presentes sobre a mesma,

as respostas foram as seguintes:

Gostei muito. É bom a gente conversar sobre estas coisas para poder saber como tratar melhor esse povo de hoje, que é muito diferente de quando eu era menina, e obedecia o que meu pai e minha mãe dizia.

Foi um encontro muito bom, ri muito com a filha teimosa, perecendo a que eu tenho lá em casa, e achei bom falar sobre essas coisas de ter respeito, de obedecer, de ter hora para fazer as coisa. Foi muito bom, é bom que tenha outros desse.

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166

Gostei. Gostei de rir, de conversar, de escutar Kátia falar, de saber

que em toda casa tem confusão por causa de teimosia e de saber que a gente precisa de botar rédea, de ter hora prá esses menino fazer as coisa.

Essa conversa foi muito boa, as vezes não sei o que fazer com essa menina, mas como trabalho muito, acabo fazendo o que ela quer, para não ter confusão. Vou pensar um pouco no que vocês disseram aqui.

Gostei mulher! É igualzinho o que acontece lá em casa, eu mando fazer as coisa, eles não me obedece e eu as vezes acabo batendo e não resove. É bom conversar sobre essas coisa pra gente ficar sabendo mais agir com essas crianças danada.

Essas falas dos familiares presentes foram muito importantes para a

nossa reflexão, por que mostram claramente, a relevância da Instituição

escolar está abraçando essa nova demanda que é discutir, refletir com as

famílias, sobre temáticas relevantes para o processo educativo dessas

crianças. Considerando a grave crise de valores da sociedade moderna, é

fundamental que as duas maiores instâncias formativas dessa sociedade –

família e instituição educativa, busquem trabalhar princípios educativos

comuns.

Outra temática trabalhada, que despertou muito o interesse das famílias

foi sobre a importância do brincar para o desenvolvimento da criança. Como já

dissemos a decisão de discutir esse tema com os pais nasceu das

observações, tanto nossa, quanto das professoras, sobre o fato de algumas

mães reclamarem muito porque os filhos ficavam meio sujos e brincavam de

areia, e suavam no parque; algumas chegando até a solicitar que os filhos não

fossem mais ao parque, não brincassem mais, para não se sujar, nem suar.

Partindo dessas observações e constatações, e tendo como parâmetro

os estudos realizados desde o início do ano de 2004, que nos mostravam o

quanto a brincadeira, o jogo simbólico, é importante para o desenvolvimento

infantil, discutimos bastante o assunto com as professoras e a coordenação

pedagógica, e juntas, elaboramos algumas ações a serem realizadas com as

famílias sobre essa temática.

A primeira delas foi uma conversa, numa reunião mesmo de pais, onde

nós informávamos sobre a importância desse brincar, retomávamos com as

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167

famílias os cuidados que tínhamos com o horário do parque – pela manhã,

sempre no início do turno; e a tarde sempre no final, quando o sol não estava

muito quente, como também o fato do cuidado que tínhamos de varrer, de

aguar e de trocar a areia regularmente, principalmente a da chamada caixa de

areia – local reservado, onde as crianças mais brincavam com esse material.

Mesmo depois dessa reunião, sentimos necessidade de uma ação mais

efetiva, mais específica com o tema, foi aí que, em reunião com as professoras,

surgiu a idéia de uma vivência com as famílias sobre o tema.

Dessa forma, as próprias professoras, com a ajuda da equipe

pedagógica e administrativa, realizaram uma vivência sobre o brincar com as

famílias, partindo de um resgate de memória sobre as brincadeiras que elas

faziam na infância, promovendo a vivência de algumas dessas brincadeiras, e

depois, após pedir que cada participante expressasse os sentimentos vividos

naquele momento, foi realizada uma discussão sobre a importância do brincar

para as crianças. Segue abaixo alguns depoimentos das famílias após o

evento:

Foi muito bom voltar a ser criança, eu até comentei que agora, a partir de hoje, acho que vou até mudar com Marília, vou deixar ela brincar mais, porque eu prendo muito: não suje aqui, não suje ali. Mas hoje eu extravasei e vou deixar ela um pouco mais livre para brincar.

A gente aprende as coisas por brincadeira, só que não brinquei porque não posso com as pernas. Sentada fiquei, o abacaxi chamava e eu não saia do canto. Mas foi ótimo.

Aprendi a brincar mais com a minha filha, a ficar mais com ela, pois o tempo também é pouco. Mas vou tirar mais um tempinho para brincar com ela, para conviver mais com ela.

Achei maravilhoso, porque o senhor está conosco, e ele nos guia, levantando pessoas para melhorar o nosso dia, a nossa convivência com as crianças, porque é muito importante ter esses momentos assim. Não temos tempo para parar, mas Deus levanta outras pessoas para nos ajudar.

Maravilhoso. Agora dá para entender porque meus filho não ver a hora de vim para o colégio: para se divertir. Foi maravilhoso.

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168

Particularmente para nós, esse encontro com as famílias sobre o brincar,

foi uma das melhores contribuições que a Instituição conseguiu dar aos pais

para a compreensão deles em torno da relevância da brincadeira como parte

integrante das ações de cuidado e educação dessas crianças. Essas atividades

sobre o brincar ainda tiveram outro desdobramento, que foi a realização de um

projeto didático sobre brinquedos de sucata, cuja culminância foi um grande

encontro com as famílias, para que, juntamente com as crianças, elas

construíssem brinquedos com os materiais disponíveis.

FOTO 29: Brincando de roda com famílias

e crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 30: Construindo brinquedos de

sucata com as famílias e crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.

Pelos depoimentos das famílias é possível identificar a percepção deles,

após este trabalho, sobre a relevância do brincar para as crianças.

Os depoimentos que mais nos chamaram a atenção, foi o das mães que

colocaram que iriam tirar mais um tempo para dedicar aos filhos, que iriam

permitir que eles brincassem mais, mesmo se sujando ou bagunçando.

Tivemos a preocupação de acompanhar um pouco mais de perto essas mães,

principalmente as mães do 1º e do 3º depoimento citado acima e tivemos a

grata satisfação de constatar que as mesmas, realmente, passaram a dedicar

um tempo maior as filhas, valorizando mais o brincar na vida delas. Esse

acompanhamento foi possível pelo fato das duas mães estarem sempre muito

presentes na Instituição, sendo que uma delas é funcionária da mesma. Dessa

forma, através de diálogos e interações constantes com essas mães e as suas

crianças, nos foi possível acompanhar, observar e registrar efetivamente esse

processo de mudança.

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169

Entendemos que são iniciativas como essa que promovem realmente o

compartilhamento, entre instituição de Educação Infantil e famílias, das ações

de cuidado e educação das crianças pequenas, e concordamos que “o trabalho

de formação de pais e mães na escola, como uma tarefa coletiva, aos poucos,

irá ocupar seu lugar em nosso contexto social” (BASSEDAS,HUGUET & SOLÉ,

1999, p. 289)

5.3. Oficinas com as famílias sobre atividades realizadas com as crianças no cotidiano da Instituição

Essas oficinas, como já registramos no capítulo anterior, foram

realizadas com o objetivo de proporcionar as famílias um conhecimento mais

aprofundado das atividades realizadas com as crianças no cotidiano da

Instituição, por termos clareza de que as famílias precisam conhecer o trabalho

educativo da escola, para poder aceitá-lo, respeitá-lo e valorizá-lo.

Vamos optar por analisar nesse momento a oficina relativa “A hora da

história”, tanto pelo fato dessa atividade fazer parte da rotina diária da

Instituição, como pelo fato da mesma envolver, também, a linguagem escrita,

que se constitui numa preocupação sempre presente na fala das famílias.

A referida oficina foi trabalhada pela professora do nível IV – crianças de

5 a 6 anos, e teve como objetivo discutir com as famílias a importância do

manuseio, do acesso aos livros, bem como da leitura de história, para a

aprendizagem e o desenvolvimento das crianças.

A professora trabalhou com as famílias inicialmente, a diferença entre ler

e contar histórias, procurando discutir a questão da diferença entre a linguagem

oral e escrita, bem como a necessidade das crianças terem acesso desde cedo

ao universo dos livros, como uma forma de ampliar os seus conhecimentos de

mundo e ir ingressando paulatinamente no universo da linguagem escrita.

Uma das propostas mais interessantes a partir dessa oficina, foi a da

criação de uma estratégia de empréstimos de livros por parte da Instituição

para que as crianças levassem para casa e compartilhassem a leitura com os

seus pais. A idéia foi muito bem aceita e funcionou de forma adequada, na

medida em que muitas crianças começaram a levar os livros para casa,

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170

proporcionando que algumas pessoas da família começassem também a se

interessar em ler os mesmos para as crianças, estimulando e colaborando com

a aprendizagem e o desenvolvimento das mesmas na área da linguagem.

5.4. Festas comemorativas Apesar de termos o cuidado de não transformarmos o currículo da

Educação Infantil num mero cumprimento de calendário de festas já pré-

estabelecidas, não podemos nos furtar a comemoração de algumas datas,

históricas-cultural e emocionalmente importantes para as crianças, até porque

também nos utilizamos dessas datas para promover uma integração maior com

as famílias, e com a comunidade de uma forma geral. Dessa forma, as datas

que elegemos para comemorar, além do caráter cultural e da valorização da

simbologia da mesma, tinham também como objetivo a integração família-

escola.

Assim sendo, nos utilizamos, principalmente das datas relativas ao dia

das mães e dos pais, para realizarmos o que convencionamos chamar de “

Encontro da Família Carmem Reis”. Vamos citar um desses encontros,

procurando refletir sobre a relevância do mesmo para o nosso trabalho junto às

famílias:

O encontro que vamos destacar é o I Encontro da Família Carmem Reis, que aconteceu em Agosto de 2004, tendo as manifestações culturais da

comunidade como o mote do mesmo, onde, tanto os alunos da Instituição

apresentaram suas danças, cantos e outras manifestações, como também o

Pastoril Estrela do Amanhã, formado por um grupo de idosos da Vila de Ponta

Negra, apresentou para todos os presentes, esta manifestação cultural tão

presente e viva no Bairro. Foi um momento muito importante, dando início a

uma tradição de se perceber o C.M.E.I Carmem Reis como um espaço,

também, de vivências e convivências da comunidade local.

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171

Foto: 31: 1º enc. da família na I.E.I Foto 32. Pastoril estrela do amanhã. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2004

Para referendar a relevância que as famílias e a própria comunidade

deram a esse evento, vamos apresentar alguns depoimentos, colhidos tanto na

entrevista informal realizada ao final do evento, quanto,nas falas espontâneas

dos presentes:

Fazia tempo que eu não passava uma tarde tão gostosa! Esqueci até meus probrema. Devia ter uma dessa toda semana.

Foi muito bom. Eu nasci aqui na Vila, dancei pastoril, mas não me canso de gostar de pastoril não!

As escola devia fazer sempre isso! A gente não tem dinheiro pra ir em festa, então faz a festa na escola.

Gostei muito dessa festa aqui na escola do meu filho. Pude me divertir junto com meu filho, não paguei nada, ainda lanchei (risos), e vi o povo do pastoril que fazia tempo que não via. Quando tiver outra dessa, eu venho de novo!

Animação minha gente! A festa ta muito boa, vamos dançar e aproveitar e pedir mais festa como essa.

É muito bom saber que a escola também pensa que a gente precisa de se divertir e não só de estuda. (Risos)

Pelo conteúdo das falas apresentadas, fica claro o sucesso do

evento. Uma questão importante de se destacar é que esse evento foi um dos

primeiros grandes eventos realizados pela escola, envolvendo as famílias e a

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172

comunidade em geral. Foi uma forma que nós encontramos de trazer as

famílias para a Instituição, apenas para uma tarde de lazer, uma aproximação

maior, mais interativa, tanto com o espaço, como quanto com o corpo técnico-

docente-administrativo da Instituição. É uma forma de mostrar que a escola

precisa convidar os pais para participarem de eventos os mais variados, e não

apenas para reclamar do mau comportamento e da ausência de estudo dos

seus filhos.

Compreendemos que esses foram momentos muito especiais

para estreitar os laços, as relações entre as famílias e o Centro infantil.

5.5. Incentivo a participação das famílias em projetos didáticos-educativos vivenciados pelas crianças.

No capítulo 4 deste trabalho, no tópico reservado a descrição reflexiva

do trabalho realizado com as crianças, já abordamos a relevância pedagógica

da metodologia do projeto didático, justificando assim, a opção pelo trabalho

com a mesma. Agora vamos apresentar como se deu a participação das

famílias em um desses projetos.

Dentre os projetos didáticos vivenciados com as crianças e que tiveram

também a participação das famílias, queremos destacar o projeto intitulado

Desvendando a vida e a cultura da Vila, onde cada turma elegeu um aspecto

da Vila de Ponta Negra para ser trabalhado e solicitou a participação dos pais e

da própria comunidade das mais variadas maneiras.

É importante lembrar que esse tipo de atividade, no nosso entendimento,

é muito rico, pois possibilita várias situações de aprendizagem, de interação, de

desenvolvimento, tanto para as crianças – conforme já explicitado

anteriormente, quanto para as professoras, as famílias e a comunidade de

uma maneira geral.

A idéia desse projeto nasceu a partir do entendimento do corpo técnico-

docente da Instituição de que é importante um resgate da cultura local, das

vivências de cada comunidade, para que o indivíduo se sinta integrado, se

sinta parte da mesma, conhecendo e valorizando as suas origens. Após o

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173

surgimento da idéia, em uma reunião de professoras, coordenação e direção,

convidamos um historiador da própria Vila – Profº Ângelo, para conversar com

a equipe técnica-docente sobre a história da Vila, e nos fornecer também

algumas fontes de consulta para que pudéssemos elaborar o projeto a ser

vivenciado com as crianças.

Após esse contato inicial com o historiador da Vila, e com as fontes de

pesquisa que conseguimos, começamos a estudar em equipe e preparar o

projeto maior da Instituição, com as possibilidades que eram vislumbradas para

o trabalho com as crianças.

Posteriormente, em novos encontros de planejamento e estudos com as

professoras e coordenação, fomos pensando algumas temáticas específicas

possíveis de serem exploradas, e as professoras foram planejando seus

objetivos, suas atividades, enfim, o projeto que iriam desenvolver com as

crianças, inclusive os produtos finais ou culminâncias e as possibilidades de

participação das famílias em cada uma das turmas e temáticas específicas,

realizando também um levantamento de conhecimentos prévios com as

crianças, e de opiniões das mesmas para a elaboração final do projeto.

Vamos elencar e ilustrar abaixo, alguns momentos de participação

efetiva das famílias e da própria comunidade durante a construção desse

projeto, mostrando também a interação, envolvimento e participação efetiva

das crianças nos mesmos:

FOTO 33: Pescador, e avô de 1 aluno, em

visita a I.E.I. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 34: Pescador apresentando peixe às

crianças. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

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FOTO 35: Crianças visitam a casa das

rendeiras na Vila. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

FOTO 36: Rendeira, e avó de uma aluna,

em visita a I.E.I. Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

Além dessas atividades mostradas nas fotos, aconteceram também

passeios a pontos turísticos do bairro – inclusive a lugares onde familiares das

crianças trabalhavam; entrevista com uma das moradoras mais antigas do

bairro – as crianças se deslocaram até a casa da mesma; Visitas a praia –

observando a paisagem atual e comparando com fotos antigas, dentre outras

atividades.

A culminância final dos projetos de todas as turmas foi uma grande

exposição realizada na Instituição com as produções, fotografias, atividades e

apresentações de cada turma, aberta para as famílias e todas as pessoas da

comunidade que quisessem comparecer. A referida exposição foi bem aceita

pelas famílias e pela comunidade, tendo contado com a participação e a visita

de, aproximadamente, 180 pessoas distribuídas nos dois turnos em que os

trabalhos estiveram expostos e foram apresentados. Segue abaixo algumas

fotos do evento:

FOTO 37: Exposição final dos trabalhos do

projeto. (1) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005.

FOTO 38: Exposição final dos trabalhos do

projeto (2) Fonte: Arquivo do CMEICAR. Ano: 2005

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175

Compreendemos este tipo de iniciativa, como uma das grandes

possibilidades de construção/sistematização das relações entre famílias e

instituições educativas, bem como de compartilhamento de funções entre

ambas, além de ser uma grande oportunidade de valorização da cultura e das

vivências da comunidade onde a Instituição está inserida, e, conforme já

discutido no capítulo 4, uma excelente metodologia para desenvolver o trabalho

pedagógico junto às crianças.

5.6. Intervenção individual junto a algumas famílias

Dentre as intervenções individuais realizadas com os pais, queremos

destacar uma feita com a mãe de uma aluna que, de forma fictícia, vamos

denominar de Alice. Alice era uma criança muito bem cuidada, muito limpa,

que se negava sistematicamente a brincar e a se sujar. A professora,

observando e estranhando esse comportamento pouco habitual em uma

criança de 5 anos de idade, trouxe a questão para ser discutida com a

coordenação pedagógica e a direção.

Após alguns dias de observação mais sistemática por parte de toda a

equipe – onde constatamos também a realidade da situação apresentada pela

professora, resolvemos, numa reunião conjunta entre professora, coordenadora

pedagógica e direção, convidar a mãe para uma conversa conosco.

O convite foi feito e ficou a cargo da coordenadora pedagógica e da

professora a conversa com a mãe. Segundo conversa informal com a

coordenadora, tomamos conhecimento de que a mãe alegou que não deixava

a criança brincar, nem conviver muito com outras crianças, porque a mesma

era muito doente. Tanto a coordenadora, quanto a professora, fizeram

intervenções perguntando a mãe se a criança estava deixando de ficar doente

por ser privada de brincar, se ela percebia como a criança se sentia, qual a

opinião dela sobre o fato da criança ser muito adulta; enfim, fornecendo

elementos para ela refletir sobre a conduta dela em relação à criança. A mãe

agradeceu e ficou de pensar sobre o assunto.

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Algum tempo depois dessa conversa, com a continuidade também das

intervenções da professora em relação à menina, começou-se a perceber

mudanças no comportamento da criança: a mesma passou a ir para o parque,

a conversar mais com as colegas, a participar das atividades de artes, enfim,

começou a apresentar um comportamento mais infantil e menos adulto.

No final do ano resolvemos chamar novamente a mãe para uma

conversa entre ela, a professora e a coordenadora. Só que, infelizmente, por

conta do novo horário do emprego da mãe – das 7:00h as 13:00h, não tinha

como a professora e a coordenadora esperá-la, o que fez com que nós –

enquanto gestoras, ficássemos com a responsabilidade dessa conversa,

procurando saber a opinião dela sobre a filha, bem como sobre a intervenção

realizada.

Para nós foi muito gratificante quando, nessa conversa com a mãe da

aluna, no final de novembro de 2005, ela nos deu o seguinte depoimento,

extremamente emocionada:

Eu não percebia o que estava fazendo com a minha filha não! eu estava proibindo-a de viver, de ser criança. Na verdade, não era ela que não gostava de se sujar, de brincar, era eu que não permitia, e não me dava conta disso. Agradeço muito a vocês, a esta escola, que se preocupa realmente com as crianças, que olha, que tem a coragem de chamar as mães para conversar, para dizer o que vocês estão vendo, estão sentindo. Tenho muito o que agradecer. Hoje minha filha é mais feliz, é mais viva, é mais criança.

Tanto a mudança no comportamento da criança – que passou a brincar,

a participar das aulas de pintura, a ir ao parque; quanto esse depoimento da

mãe, atestam o êxito do trabalho realizado. É óbvio que outras intervenções

foram realizadas também, com outras famílias, e não surtiram o efeito

esperado, até porque, nem todas as pessoas estão preparadas para esse tipo

de intervenção. Algumas famílias compreendem isso como intromissão, como

querer mandar nelas e nos filhos, mas mesmo correndo esse risco, a instituição

educativa precisa continuar investindo nessa abordagem, principalmente

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quando reconhece a relevância de um trabalho integrado entre escola e família,

envolvendo as ações de cuidado e educação das crianças.

5.7. Análise das entrevistas finais com as famílias Vamos apresentar agora as nossas reflexões em torno da entrevista

final, realizada com oito pessoas das famílias das crianças matriculadas na

Instituição. O critério de escolha dessas pessoas entrevistadas foi o da

disponibilidade de tempo para realizar a entrevista, bem como a vontade e pré-

disposição para o fazê-lo.

Essas pessoas foram por nós abordadas no momento em que iam

deixar, ou pegar as crianças, sobre a possibilidade de responder algumas

perguntas sobre a Instituição, sabendo de antemão que essa conversa seria

gravada. Apesar de se tratar de uma entrevista semi-estruturada, onde as

perguntas são mais amplas, podendo haver a inserção de outras perguntas ou

sub-perguntas para esclarecer melhor algumas respostas, optamos por fazer

apenas as perguntas já previamente formuladas, deixando o entrevistado falar

livremente, sem interferências outras da nossa parte.

Para efeito da análise dessas entrevistas, vamos proceder da seguinte

forma: Primeiramente apresentaremos as questões, buscando explicitar a

nossa intenção, o nosso objetivo, quando formulamos a mesma. Depois

apresentaremos uma breve síntese das respostas dos entrevistados, citando

alguns trechos das mesmas, e analisando-as a partir das nossas concepções,

com base nos referenciais teóricos aqui já discutidos, buscando também,

quando possível, estabelecer relações entre as nossas análises e as opiniões

de alguns autores que abordam a temática trabalhada.

≈ 1ª questão: Quando você matriculou seu (sua) filho(a) nessa Instituição, o que você esperava que ele(a) aprendesse aqui?

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Quando elaboramos esta primeira questão, partimos do princípio de que as

instituições de Educação Infantil tem algo a ensinar, tem um papel, tem uma

função extremamente relevante a cumprir, pois concordamos que:

[...] as creches e pré-escolas vão ainda, por muito tempo, constituir um importante espaço de “descoberta do mundo” para um sem número de crianças. Ora, cumprir essa responsabilidade social de compartilhar com as crianças esta descoberta tão instigante não é pouca coisa. Ela nos desafia, nos compromete e nos convoca. Cabe a nós a opção. (BUJES, In: CRAIDY; KAERCHER, 2001, p. 21)

Outra questão relevante a se considerar nesse aspecto é que as famílias,

embora muitas vezes não tenham a noção exata deste papel, dessa

responsabilidade, possuem também uma expectativa em relação à Instituição

onde matriculam os seus filhos, expectativa essa que gera uma preocupação,

e, “ De fato, a preocupação é pertinente. Ao matricular a criança, estamos

praticamente assinando uma procuração, passando para terceiros – mesmo

que seja a melhor escola do mundo – a formação dos nossos filhos.” (

ZAGURY, 2002, p. 21)

O nosso objetivo, portanto, com essa questão é perceber as expectativas

que as famílias traziam em relação a Instituição, até mesmo para,

posteriormente podermos identificar até que ponto essas expectativas foram,

ou não, atendidas. Analisando as respostas dadas nessa entrevista,

percebemos que algumas famílias apresentavam expectativas muito amplas,

tais como:

Aprendesse a ser gente, a se comportar, tivesse educação... aprendesse tudo que a escola tem que ensinar.”

que ele aprendesse a ser gente, a se comportar

Aprendesse as coisa de acordo com a idade dele

As coisa que ele precisa para se dá bem no mundo de hoje

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179

A amplitude e complexidade dessas expectativas apresentadas pelas

famílias em relação à Instituição de Educação Infantil, nos leva a perceber o

quanto o papel dessas instituições precisa ser refletido, repensado e discutido.

Principalmente entre nós, profissionais que atuamos nessas instituições, para

que percebamos que os conteúdos que essas famílias propõem, são, não

apenas de natureza conceitual, mas, principalmente atitudinais e

procedimentais, indo ao encontro da proposta aqui já discutida dos quatro

pilares da educação: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e

aprender a conviver, ou seja, a família matricula os seus filhos nas instituições

educativas, esperando uma formação:

[...] quer no que se refere ao conteúdo programático que será desenvolvido, que terá influência no seu futuro profissional, como no que concerne à formação de hábitos, atitudes e, acima de tudo, da formação mais ampla e importante, a mente dos nossos filhos, a forma de ver o mundo e a sociedade. (ZAGURY, 2002, p. 21)

Outro ponto fundamental, ao qual a análise dessas respostas nos

remete, é o da relevância de estarmos constantemente discutindo, também

com as famílias, o papel das Instituições de Educação Infantil, e da própria

família, nesse caráter de complementaridade que os mesmos apresentam,

pois, considerando um velho ditado africano que diz que “ é preciso uma aldeia

para educar uma criança”, bem como a amplitude das expectativas

depositadas nas instituições educacionais, é imprescindível esse fortalecimento

da relação das mesmas com as famílias, para darem conta da tarefa educativa

a que estão sendo convocadas.

É inegável também que ainda existe muito a expectativa, do aprender a

ler e escrever – das 8 pessoas entrevistadas, 5 se referiram a ler e escrever

como expectativas que traziam para a Instituição.

É importante relembrar que, desde a ficha de caracterização, já

havíamos feito esse questionamento aos pais, com o mesmo objetivo aqui

exposto, por compreendermos que é importante sabermos as expectativas das

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famílias, até mesmo por considerá-las como ponto fundamental para ser

refletido pela Instituição.

Na análise das respostas das famílias a ficha inicial de caracterização,

estas duas questões, ou seja, a amplitude das expectativas que as famílias

trazem para as instituições de Educação Infantil, bem como uma grande

expectativa em torno do aprender a ler e escrever já tinham sido percebidas e

embasaram também o nosso trabalho, na medida em que nos apontaram para

a necessidade de realizarmos ações onde estas questões fossem discutidas.

Foi a partir dessas expectativas das famílias que realizamos algumas

atividades com as mesmas, como as oficinas sobre atividades vivenciadas com

as crianças na Instituição; como as palestras discutindo aspectos relativos ao

cuidar e educar, enfocando a participação e responsabilidade das famílias em

relação a estas questões, e todos os outros blocos de atividades realizadas nos

anos de 2004 e 2005.

A partir das respostas as próximas questões vamos perceber como

estas expectativas foram, ou não, sendo atendidas e até que ponto as ações

atenderam aos objetivos propostos, segundo a opinião das próprias famílias.

≈ 2ª questão: Na sua opinião, essa Instituição atendeu ao que você esperava? Justifique a sua resposta.

Nessa segunda questão, o nosso maior objetivo era perceber até que

ponto as expectativas das famílias tinham, ou não, sido atendidas, até mesmo

porque temos convicção de que “ para que a união família-escola dê certo, é

preciso que os pais estejam convencidos de que fizeram, de fato, a melhor

opção” ( ZAGURY, 2002, p. 25), quando matricularam os seus filhos em uma

instituição educativa, e convicção no acerto dessa escolha, passa,

incondicionalmente, pelo atendimento, ou não, dessas expectativas que as

famílias depositaram na instituição escolhida. Pelo que podemos observar,

houve o atendimento, pelo menos, de algumas dessas expectativas:

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Atendeu né? Minha filha gosta daqui, gosta das amiguinhas, brinca muito, faz pecinha de teatro

Eu acho que atendeu

Eu gosto daqui e acho que ele aprendeu coisa sim dentro da capacidade de idade dele

essa Instituição superou até as minhas expectativas

ele aprendeu umas coisa sim

dentro da idade dele, acho que atendeu

“Ela ta aprendendo as coisa né?”

As falas transcritas acima, revelam que os entrevistados reconhecem

que as expectativas foram atendidas, na medida em que colocam que houve

algum tipo de aprendizagem por parte das crianças. Uma única entrevistada

coloca que a Instituição superou as suas expectativas. Vamos prosseguir

analisando uma outra percepção que as respostas dos entrevistados nos

possibilitou.

Na nossa percepção, a partir da visão da complexidade e da

abrangência das expectativas que as famílias traziam para a Instituição, que

ficou bastante perceptível nas respostas a questão 1, um fato que nos chamou

a atenção nas respostas a questão 2, foi o de que, no nosso entendimento,

começou a haver uma espécie de redimensionamento das expectativas

apresentadas inicialmente, e um reconhecimento das aprendizagens

construídas pelas crianças, mesmo quando essas aprendizagens não

corresponderam plenamente as expectativas iniciais, o que fica mais patente

nas seguintes respostas:

Ela ainda não sabe ler e escrever bem, bem mesmo não, mas escreve o nome, passa as folha dos livrinho, das revista e conta as história. Isso é legal, né?

ele brinca muito aqui, ele lê livrinho, as vezes leva prá lê em casa, não lê bem, bem não, mas lê com as figura. Ele já conta os número, ele fez

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um trabalho aqui sobre a vila, chegou em casa falando umas coisa, de como era o morro antes, a praia, essas coisa.

Olhe, ler, escrever e contar bem bem, ele não aprendeu não. Até já conversei com a professora e ela me explicou que ele ainda é muito pequeno, e me mostrou uns trabalhinho dele aqui na escola, dizendo que ele tinha aprendido coisa sim: sabia achar o nome dele, sabia o nome dos coleguinha, se interessava por contar a história dos livrinho, se dava bem com os coleguinha, brincava muito, era esperto pra responder as pergunta da professora, essas coisa. Essas outras coisa ele vai aprendendo depois, com o tempo, né?

Na nossa visão, conforme já dito acima, essas falas demonstram que as

famílias percebem e entendem que houve aprendizagem por parte das

crianças, mesmo que não tenham sido as aprendizagens que elas esperavam

inicialmente.

Até mesmo nas questões mais específicas sobre a leitura e a escrita, as

famílias reconhecem que, apesar das crianças não se apresentarem ainda

como leitores e escritores autônomos, elas estão num processo dessa

conquista. Outro ponto importante que nós identificamos é que há uma

confiança na professora, e consequentemente na Instituição, quando a mãe

coloca que conversou com a professora, ela enumerou as aprendizagens que a

criança estava construindo e a mãe entendeu que a criança estava

aprendendo, estava avançando e, no próprio dizer dela: com o tempo iria

aprendendo mais.

Consideramos essa confiança demonstrada pela mãe na sua fala, como

extremamente relevante para a consolidação de uma boa relação entre a

família e a Instituição de Educação Infantil. Dessa forma, a partir das respostas

das famílias a questão acima, compreendemos que o trabalho realizado pela

Instituição contribuiu muito, também, com esse maior entendimento das

mesmas em relação a compreensão das aprendizagens efetuadas.

≈ 3ª questão: E você, enquanto pai, mãe, responsável, enfim, familiar de aluno matriculado nessa instituição, como se sente aqui? O que tem a dizer das pessoas que trabalham aqui, das reuniões e eventos

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que são realizados com as crianças e as famílias, enfim, da instituição como um todo?

Nessa terceira questão, o nosso objetivo maior é perceber como as

famílias se sentem na Instituição, e qual a opinião delas sobre as pessoas, bem

como sobre as atividades que foram realizadas, sempre com a intenção de

acolhê-las, fortalecer a relação entre as famílias e a Instituição e compartilhar

com elas o processo de cuidado e educação das crianças.

Pelas respostas, podemos perceber que a grande maioria das famílias

se sente bem na Instituição, gosta de todas as pessoas e se considera bem

tratada e respeitada por todos:

Eu também gosto muito daqui né? Todos que trabalham aqui tratam a gente bem, falam com a gente.

Eu gosto daqui. A gente pode falar com todo mundo na hora que precisa. Pode deixar e buscar as crianças na sala, conversar com a professora, perguntar dos menino, elas até gostam quando a gente pergunta.

Olhe, eu gosto muito daqui. A gente se sente bem, é bem tratado.

Eu gosto muito dessa escola, das pessoas, do trabalho, de tudo.

Eu gosto. Sou bem tratada, todo mundo é simpático

Eu gosto de tudo aqui, é todo mundo muito bom, muito amigo

Eu gosto muito daqui. As pessoas são simpáticas, tratam a gente bem.

Eu gosto de tudo aqui, são todos muito bom.

Consideramos este reconhecimento das famílias de que são bem

tratadas, e a afirmação de que gostam da Instituição, como um reconhecimento

ao trabalho que é realizado pela Instituição, no sentido de envolvê-las, de

valorizá-las, de respeitá-las, e reconhecemos este aspecto como muito

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relevante, pois concordamos que: “A requerida coordenação entre escola-

família passa pelo respeito e pela estima mútuos.” ( LÓPEZ, 2002, p. 83)

No tocante as atividades realizadas para envolver as famílias e buscar o

compartilhamento das funções de educar e cuidar, também percebemos que as

mesmas foram reconhecidas e valorizadas pelas famílias:

Gosto também das festa, das reunião que fazem, perguntam a opinião da gente, o que a gente achou, faz umas atividade pra gente participar, brincar, essas coisa.

Gosto das reunião, das festa, das palestra. Só não venho, quando não posso mesmo, quando estou trabalhando.

sempre tem atividade pra gente participar, é divertido, a gente aprende as coisa, é legal.

Gosto das reuniões, das festas, dos encontros, enfim, gosto de tudo.

Os depoimentos acima apontam para o fato das famílias gostarem

também das atividades realizadas, afirmam que só não comparecem quando

não podem, por causa do trabalho. Outra questão importante é o fato de haver

o reconhecimento de que elas podem opinar nas reuniões, participar das

festas, dos eventos, pois “ a eficácia da educação escolar depende do grau de

implicação, enfim, do grau de participação dos pais.” (LÓPEZ, 2002, p. 82)

Por fim, conseguimos perceber que a Instituição conseguiu realizar um

trabalho de tal forma, que as famílias estão se sentindo envolvidas, acolhidas,

o que consideramos fundamental para a construção/sistematização dessa

relação, objetivando o compartilhamento das ações de cuidado e educação

entre essas duas instituições formativas.

≈ 4ª questão: O que você mudaria nessa instituição? Se dependesse de você, o quê seria diferente?

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185

Fizemos esta pergunta com o objetivo de perceber quais as propostas

de mudança que os pais poderiam sugerir para a melhoria do trabalho

realizado pela Instituição, pelo fato de partirmos do princípio de que todo

trabalho pode ser aperfeiçoado e de que as famílias tem condições de opinar,

de participar realmente do processo educativo dos seus filhos, sugerindo e

propondo mudanças no mesmo.

Algumas entrevistadas não sabiam como responder a esta pergunta, se

expressando apenas da seguinte forma:

Não sei nem o que diga. Até agora to gostando.

Nem sei o que dizer.

Eu gosto tanto daqui, que num sei nem o que diga.

Analisando estas respostas, podemos compreender que esta ausência

de um pensamento mais crítico, de uma proposta de mudança, de uma opinião

mesmo, pode ter como causa o fato das classes populares serem tão alijadas

do seu poder de decisão, de participação, de opinião, que quando se sentem

convidados, conclamados a participar, a opinar sobre a possibilidade de

mudanças não o conseguem fazer de imediato.

Um outro fator também, que pode estar por trás dessa questão é o fato

das pessoas acharem que, por que gostam da Instituição e das pessoas, não

devem propor mudanças; ou ainda que a Instituição pública é uma espécie de

“favor’ que elas recebem do governo, dos profissionais que lá estão, o que as

leva a ter receio de reclamar. Essas são algumas das interpretações que

entendemos possíveis de serem feitas a partir das respostas transcritas acima.

Já as outras pessoas entrevistadas, estas em número maior,

apresentaram as seguintes respostas:

Se fosse um prédio maior, com sala maior, com quadra, acho que seria milhó.

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Só não gosto é quando falta professora e não tem aula. Eu sei que elas adoece, tem as coisa dela pra fazer, mas era pra ter outra professora para ficar com as criança, pra elas não voltar pra trás. Até já conversei aqui, mas a senhora explicou que é a secretaria lá que não manda ninguém, essas coisa que a gente até entende, mas não gosta não. É muito ruim trazer o filho pra escola e ter que levar de volta pra trás de novo.

Eu só mudaria uma coisa: colocaria professoras substitutas para que quando as professoras titulares tirassem licença, as crianças não ficassem nenhum dia sem aula. Só isso. Ah!, melhoraria também o prédio, o espaço físico, principalmente o interno, algumas salas são muito pequenas.

eu fazia umas salas maior, mais banheiro

Olhe, eu construiria salas de aula maiores e colocaria mais professoras, mais gente pra ajudar também. Quando tem festa eu vejo que vocês trabalham muito, é uma loucura, e quando falta uma professora, muitas vezes a gente tem que levar a criança de volta porque, como vocês explicam pra gente, não tem quem fique com as crianças daquela sala e as salas são muito pequenas para caber crianças de 2 salas.

Se fôssemos nos utilizar da análise categorial para as reflexões em torno

dessas respostas, com certeza, poderíamos abrir duas únicas categorias:

espaço físico e ausências de professoras. Concordamos plenamente com

essas respostas das entrevistadas acima. Realmente, tanto o espaço físico,

principalmente o interno – o espaço das salas de aula; quanto o fato da

ausência de substituição imediata para as professoras que tiram licença

médica ou precisam se ausentar por algum outro motivo plenamente

justificado, são dois problemas que enfrentamos na Instituição e para os quais,

infelizmente, não conseguimos vislumbrar nenhuma solução à curto prazo.

O problema do espaço físico, ao qual já nos referimos no início desse

trabalho, é um problema real. O espaço não foi previamente planejado para

abrigar uma Instituição de Educação Infantil, sendo uma casa que foi adaptada

para tal fim. E, embora tenhamos conseguido fazer algumas adaptações, a

partir da reforma aqui já descrita, que melhoraram consideravelmente o espaço

– tendo o mesmo até sido elogiado pelas famílias que o conheciam antes da

reforma; no que diz respeito, principalmente ao tamanho das salas, não nos foi

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possível mexer, e as possibilidades de construção de um prédio próprio,

adequado as necessidades de uma Instituição de Educação Infantil, estão cada

dia mais distantes, até mesmo pela grande especulação imobiliária vivenciada

pelo bairro de Ponta Negra, que eleva muito o valor dos terrenos, o que,

segundo o setor de engenharia da SME, inviabiliza a compra dos mesmos por

parte dos órgãos públicos.

No tocante as ausências das professoras e ao fato de, em algumas

dessas ausências, a Instituição se achar impossibilitada de receber as

crianças, conversando com as famílias e encaminhando as mesmas de volta

para casa, esse também é um fato real, que nos preocupou muito e ainda nos

preocupa, mas para o qual, infelizmente, também, não conseguimos vislumbrar

solução à curto prazo.

As professoras da rede municipal de ensino da cidade do Natal,

trabalham todas no regime estatutário, e são também regidas por um estatuto

que permite que, durante o mês, possam ser apresentados até 3 atestados

médicos ou odontológicos, sem a necessidade de passar na chamada junta

médica do município. Após este número de 3 dias de atestado médico é

necessário passar na junta médica, que avalia a solicitação do médico

requisitante, e emite o seu parecer, o que ampara o professor em caso de

problemas de saúde.

Porém, o setor de carga horária da SME, encarregado de encaminhar os

professores às escolas, avisa aos diretores que, em caso de licença médica, só

enviará professor substituto quando a licença for superior a 15 dias. Nos casos

de licenças menores que 15 dias, a própria Instituição teria que dar um jeito de

não enviar as crianças para casa. No caso específico da Instituição aqui

estudada, esta situação se torna muito complicada, considerando que o

referido Centro é muito pequeno, contando apenas com as professoras de sala

de aula, a coordenadora pedagógica, a diretora e a vice, como professoras

devidamente habilitadas para o exercício do magistério, sendo que estas três

últimas profissionais citadas possuem as suas funções específicas, tanto de

caráter pedagógico, quanto administrativo, a partir do próprio cargo que

ocupam, o que dificulta a possibilidade de estarem sempre disponíveis para

substituir as professoras, em suas ausências, mesmo que plenamente

justificadas.

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188

O fato das salas de aula serem muito pequenas, também dificulta a

opção por colocar as crianças da professora ausente para participarem de

atividades nas salas das outras professoras. Deslocar um dos funcionários

para ficar com essas crianças, na nossa opinião, foge a proposta da Instituição

principalmente por dois motivos: primeiro porque compreendemos que o

trabalho com a criança precisa ser planejado e executado por um profissional

com formação e competência apropriada para o exercício dessa tarefa;

segundo porque iríamos desfalcar a função exercida por esse profissional,

criando outro problema mais adiante.

Dessa forma, sempre que era possível, e considerando a antecipação

com a qual a professora comunicava a sua ausência, a questão era discutida

pela coordenação e direção, e uma dessas profissionais – coordenadora,

diretora ou vice-diretora, assumia a sala de aula, encaminhando o trabalho com

as crianças, a partir da rotina e do planejamento da referida turma.

Infelizmente, quando isso não era possível, chamávamos os familiares que

tinham ido deixar as crianças na Instituição, explicávamos a questão e

pedíamos a compreensão de retornar com as crianças para casa.

Essa é uma questão que reconhecemos extremamente séria, mas,

infelizmente, cuja solução não estava na vontade individual de nenhum dos

componentes da Instituição. É importante dizer que esse fato não acontecia

com uma freqüência muito grande, até porque, como já colocamos, sempre

que possível, buscávamos uma forma para que as crianças não voltassem para

casa sem aula. Porém, compreendemos que a solução definitiva da questão

passa por uma decisão mais ampla, por uma vontade política de encaminhar

uma solução mais viável, seja a partir de um trabalho compartilhado em sala de

aula, de uma equipe permanentemente preparada para assumir estas

substituições, ou de outro encaminhamento qualquer que solucione a questão.

≈ 5ª questão: O que você mais gosta nesta Instituição? Com esta pergunta, o nosso objetivo era perceber os pontos mais

relevantes do trabalho da Instituição, a partir daquilo que as famílias

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189

apontassem como sendo o que elas mais gostavam na mesma. Vejamos

algumas dessas respostas:

O jeito de tratar a gente, sempre escutando e perguntando, e as

festas e comemoração que fazem aqui, é muito legal.

Gosto do cuidado que tem com as criança, da segurança, tem sempre o vigia na porta, na entrada e na saída, tem a carteirinha, pra não entregar as criança a gente estranha, essas coisa.

olhe, eu gosto da limpeza, das pessoa daqui que trata a gente bem, das reunião , das festa que faz pra gente e pras criança, das opinião da gente que sempre pedem, escutam a gente, essas coisa.

Gosto da limpeza, da organização, da segurança, do trabalho com as crianças, das pessoas.

Das pessoas, desde o porteiro até vocês da direção, e da forma como todos aqui trabalham com as crianças e atendem a gente.

De tudo, também num sei nem o que diga que gosto mais, mas acho que gosto mesmo é do povo daqui, povo simpático, que conversa, que ri, que conhece a gente, que fala com a gente, que explica as coisa.

Percebemos que nestas respostas as famílias apresentam uma série de

motivos que as fazem gostar do trabalho realizado pela Instituição. Vamos

procurar destacar primeiramente as que consideramos como sendo de caráter

mais físico, mais administrativo, mais passível de ser mensurado e analisado,

tais como a limpeza, higiene e organização do prédio, a segurança que a

Instituição oferece as crianças, bem como todo o trabalho que realiza com as

mesmas e os eventos e festas realizadas.

Na nossa percepção, essas questões só foram percebidas e

consideradas pelas famílias, porque elas tiveram acesso a Instituição, não

apenas em determinadas ocasiões preestabelecidas, mas ao cotidiano, ao dia-

a-dia da mesma, na medida em que podiam entrar para deixar e pegar as

crianças nas salas de aula, como também na hora em que necessitavam de

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procurar a secretaria da Instituição, a coordenação, a direção, ou outro

qualquer setor ou funcionário.

Os outros motivos apresentados pelas famílias nós consideramos que

são de caráter mais humano, mais subjetivo, tais como a simpatia, o diálogo, a

atenção e o respeito que elas dizem encontrar na Instituição. Particularmente,

consideramos que são esses aspectos, que denominamos mais subjetivos e

menos mensuráveis, que dão o diferencial do trabalho e impulsionam o

mesmo.

No nosso entendimento, precisamos compreender que, antes de sermos

profissionais, pais, tios, avós, etc, somos seres humanos, dotados de

características cognitivas, políticas, econômicas, ideológicas, mas também,

emocionais, psicológicas, sociais, culturais, enfim, características que nos

tornam altamente susceptíveis e vulneráveis aos sentimentos, aos valores, a

comportamentos e atitudes.

Esse foi um dos aspectos que nós mais enfatizamos na nossa proposta

de fortalecimento da relação com as famílias, daí a nossa preocupação em

acolhê-las, em recebê-las da melhor forma possível, abrindo sempre as

possibilidades de diálogo e negociação.

Outro ponto que consideramos muito importante nessa relação das

Instituições educativas com as famílias, é o fato de considerarmos que as

famílias, tenham elas a estrutura e os níveis sociais e educacionais que

tiverem, são também responsáveis e influenciam na educação das crianças,

por isso concordamos que: “Um passo importante para a construção de uma

parceria entre escola e pais é considerá-los também como educadores, que

tem o que transmitir e o que aprender.” (SZYMANSKI, 2001, p. 10)

≈ 6ª questão: Dos eventos realizados com as famílias, qual o que você mais gostou?

Nesta questão, o nosso objetivo maior foi perceber, dos eventos

realizados com o objetivo de construir/sistematizar as relações com as famílias

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e compartilhar as ações de cuidado e educação, quais os que despertaram

mais o interesse e a atenção das mesmas.

Gostei do que veio o pastoril da vila e o que pesquisou os costumes da vila.

Gostei muito do das brincadeiras

Olhe, eu gostei do das brincadeiras e daquele sobre a Vila.

Gostei daquele sobre a importância das brincadeiras para as crianças.

Gosto das festa, Gostei muito daquele das brincadeira.

Gostei do do pastoril, daquele das brincadeira que fizeram com a gente.

Olha eu gostei muito daquele que falou sobre o comportamento das crianças de hoje, aquele que teve a história da mãe e da filha sobre o horário da televisão.

Gostei de todos, num perdi nenhum.

Pelas respostas, fica evidenciado que o evento que mais chamou a

atenção das famílias foi o trabalho realizado sobre as brincadeiras.

Compreendemos que esse trabalho foi muito marcante, tanto pelo fato da

temática despertar o interesse de crianças e adultos, bem como pelo mesmo

ter sido trabalhado, tanto através do resgate de experiências, quanto das

vivências de brincadeiras da infância de cada um, como também pelas

situações práticas de construção de brinquedos, e interação entre crianças e

adultos que o mesmo proporcionou.

Outras reflexões que as respostas das famílias a esta questão nos

proporcionou, foi no sentido de podermos identificar também alguns indícios

que apontem até que ponto as famílias perceberam, ou não, esse objetivo que

a Instituição tinha, ao realizar determinadas atividades com as mesmas, de

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192

contribuir com as ações de cuidado e educação dessas crianças.

Compreendemos que as respostas abaixo, possibilitam essa identificação:

A gente brincou, lembrou o passado de quando era criança, viu que é bom brincar com os filho da gente, pena que a gente cresce, não tem tempo e esquece de brincar.

do que veio a enfermeira do posto e deu remédio pra coceira e ensinou a tratar os piolho

As crianças de hoje não brincam mais, não são mais crianças, acho legal a escola alertar para isso. Acho legal essa coisa de trazer a família para a escola, para participar de várias formas.

Eu achei muito legal discutir essas coisas de como educar, de como tratar os filhos. Outro que gostei muito foi o das brincadeiras, até passei a brincar mais com os meus dois filhos, o que estuda aqui e a menina menor.

Analisando os depoimentos apresentados acima, podemos identificar

que as ações realizadas trouxeram contribuições positivas no sentido de

proporcionarem as famílias condições de perceberem a necessidade de

algumas modificações na maneira como tratam as suas crianças, como

também no tempo que dedicam as mesmas.

Outro fator que nos chama a atenção nessas falas das famílias é que

elas apresentam sim uma abertura para a vivência de um trabalho

informativo/formativo realizado pela instituição educativa, ou seja, percebe-se

que as famílias estão atendendo ao chamado da Instituição no sentido de

discutir/dialogar sobre processos formativos necessários ao desenvolvimento e

aprendizagem das crianças.

≈ 7ª questão: Na sua opinião, as atividades realizadas aqui na instituição ajudaram você a entender, a cuidar e educar melhor a sua criança?

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Esse questionamento, feito de forma bem mais explicita e direta, foi

realizado com a intenção de observar se as famílias reconheciam, ou não,

mudanças no processo educativo delas em relação ás crianças, a partir das

ações e atividades propostas pela Instituição, ou seja, se o trabalho realizado

pela Instituição, atingiu, na opinião das famílias, o objetivo a que se propunha,

que era, compartilhar com as famílias as ações de cuidado e educação junto ás

crianças. Vamos apresentar algumas respostas para, a partir das mesmas,

fazermos algumas análises.

Ah sim! o dentista ensinou a gente a escovar direito os dente das criança. A enfermeira que falou e deu remédio pra doença de pele. Tudo é bom, tudo ajuda a gente a saber mais, né? Pena que nós não tem o tempo todinho pra viver aqui.

Ah mulher foi esse que eu já disse, o do brincar, ele ajudou muito a gente a deixar mais as criança brincar, bagunçar, essas coisa.

Com certeza. Como eu já disse é importante a escola e a família se entenderem bem, participarem. Foi muito bom pra mim ter matriculado minha filha aqui, me ajudou a participar mais da vida dela.

Ajudaram! Teve aquela do piolho, que ensinou o remédio. Aquelas conversa da gente dá mais atenção, ter mais calma, mais tempo pras criança. Eu gosto sim.

Ajudaro sim, a gente vê que tem que tê mais paciênça, conversá mais, entendê mio, esses minino de hoje são muito diferente dos meu.

Sim, ajudaram bastante. Podia até ter tido mais encontros pra conversar mais.

As respostas das famílias evidenciam que elas reconhecem que houve

uma contribuição das atividades realizadas pela Instituição, para que elas

pudessem interagir melhor com as crianças, embora seja perceptível que cada

pessoa entrevistada tenha apreendido mais um aspecto ou outro, enfatizando

apenas uma ou outra atividade, ao invés da totalidade do trabalho.

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Apesar dessa observação que fizemos acima, entendemos que houve

um reconhecimento por parte das famílias de que as atividades realizadas

contribuíram para que elas compreendessem melhor algumas especificidades

das crianças, para que elas respeitassem mais certos aspectos do

comportamento ou das necessidades de desenvolvimento das mesmas, enfim,

o objetivo proposto foi atendido, na medida em que as famílias apontam

algumas mudanças na forma como educam e cuidam das suas crianças,

considerando atividades, diálogos e propostas sistematizadas pela Instituição

educativa.

Ou seja, após a análise dessas entrevistas finais, a percepção que

temos é que o trabalho realizado surtiu um determinado efeito, atendendo, em

boa parte, aos objetivos propostos, na medida em que as famílias reconhecem

o trabalho da Instituição, se sentem bem na mesma e apresentam mudanças

na forma de cuidar e educar as suas crianças, a partir de ações realizadas pela

Instituição.

Outro ponto que podemos considerar como relevante na percepção de

que foi possível alcançar o objetivo proposto de construir e sistematizar uma

relação participativa entre família e a I.E.I., buscando compartilhar ações de

cuidado e educação, é o fato de haver uma coerência, uma relação direta, em

todas as respostas as entrevistas, bem como nos depoimentos das famílias,

em vários momentos e situações do processo vivenciado.

Dessa forma, embasadas por estes depoimentos acima, e incentivadas

pelas perspectivas de diálogo, pela abertura das famílias em atender aos

chamados da Instituição, na experiência aqui descrita e analisada, defendemos

a tese de que as instituições educativas precisam se preparar, se qualificar,

para assumir essa nova demanda de implantar/sistematizar e/ou fortalecer as

suas relações com as famílias, buscando construir com elas um trabalho de

compartilhamento das ações de cuidado e educação junto às crianças pelas

quais são responsáveis mutuamente.

Para uma tarefa como esta, sabemos que os desafios são inúmeros –

iremos refletir sobre alguns nas nossas considerações finais; mas as

possibilidades também existem, e podem ser multiplicadas, a partir da

compreensão da relevância do fortalecimento dessa relação, bem como da

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grande contribuição que o compartilhamento de funções entre I.E.I. e famílias

pode proporcionar as crianças.

Dessa forma, buscando elaborar algumas sínteses possíveis de serem

realizadas nesse momento, vamos apresentar as considerações finais, mesmo

tendo clareza de que esse final é provisório e inacabado.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado.

Paulo Freire.

É essa condição de, histórica e socialmente, nos sabermos inacabados,

porém com perspectivas de irmos sempre mais além, que nos permite afirmar

que, embora chegando as chamadas considerações finais desse trabalho -

onde descrevemos e refletimos sobre uma experiência vivenciada durante dois

anos, não nos sentimos concluindo ou finalizando nada em definitivo, apenas

encerrando um pequeno trecho de uma longa trajetória, como uma espécie de

pausa, de balanço, em busca da sistematização de elementos que nos

possibilitem novas vivências e experiências na área da relação família e I.E.I,

que continuamos a considerar como sendo um dos grandes desafios das

instituições educativas no século XXI.

Essa compreensão acerca do nosso inacabamento, mas também das

nossas possibilidades de superação de nós mesmos, é que nos impulsiona à

retomarmos o nosso objetivo nesse trabalho: descrever e refletir sobre a construção/sistematização de uma relação entre família e I.E.I, em prol do compartilhamento das ações de cuidado e educação, no contexto de criação de um Centro Municipal de Educação Infantil, e perceber que, ao

lado das grandes possibilidades e realizações já apontadas no decorrer desse

trabalho, com base na experiência vivenciada, também existem lacunas,

percalços e desafios sobre as quais não podemos deixar de nos referir, para

que possamos estar alimentado essa capacidade de superação, buscando que

ela se transforme em desejo para a busca de novas experiências, que, embora

igualmente inacabadas, avançarão sempre, umas a partir das outras.

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Partindo das percepções apresentadas acima, vamos agora, refletir

sobre essas lacunas, percalços e desafios, iniciando pela questão sobre a qual

mais refletimos ultimamente, que é a percepção de que deveríamos ter reunido

mais as famílias, para que elas próprias escolhessem e opinassem, por

exemplo, sobre os temas das palestras, das oficinas e, por que não, até

mesmo de alguns projetos didáticos a serem trabalhados com as crianças.

Na realidade o que conseguimos perceber hoje, é que, apesar das

reuniões, das discussões e das afirmações das famílias entrevistadas de que

gostaram das atividades realizadas; as temáticas trabalhadas não partiram de

uma necessidade expressa por elas, mas das necessidades que nós, enquanto

Instituição, entendíamos que as famílias apresentavam.

Essa é uma das grandes indagações que nos fazemos agora: será que a

sistematização desse compartilhamento com as famílias das tarefas de cuidado

e educação das crianças, não teria sido mais efetivo se nós tivéssemos ouvido

mais as mesmas, procurando sondar as demandas que elas traziam, ao invés

de apenas pensar as temáticas e as ações partindo das percepções da equipe

da escola?

Ou será que o caminho trilhado foi o caminho possível no início de um

processo como esse, considerando, principalmente, a falta de tempo dos pais,

bem como, em alguns aspectos, o desconhecimento de alguns pontos

específicos e relevantes para o cuidado e educação das crianças, a escassez

de tempo que os profissionais da educação, e o próprio calendário escolar,

apresentam para esse tipo de atividade?

Com certeza, essa é uma indagação que não será respondida nesse

momento, porém, o acompanhamento, mesmo que de longe, das ações

realizadas pela Instituição no ano de 2006, quando já nos achávamos

afastadas oficialmente da mesma para a escrita desse trabalho, aponta para o

fato de que a busca, o investimento por parte da instituição nessa

sistematização da relação família e I.E.I. continua a ser realizado, e que a

participação das famílias é uma realidade muito presente e crescente na

mesma, o que nos dá, pelo menos, a tranqüilidade de que as ações iniciais

realizadas frutificaram na Instituição, e foram abraçadas realmente pela

equipe, considerando que, mesmo com o meu afastamento, o trabalho teve

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continuidade e inovações que demonstram o crescimento e fortalecimento do

mesmo.

Conforme já tínhamos colocado desde a apresentação deste trabalho,

reservamos este espaço das chamadas considerações finais, para fazermos,

também, algumas reflexões sobre os percalços, as dificuldades, os desafios

que surgiram na construção desses novos caminhos . É isto que nos propomos

a fazer agora!

Agora chegou o momento de evidenciarmos um pouco os medos, as

angústias, as dificuldades e as dúvidas, que também fizeram parte da

experiência e foram, igualmente importantes, para as possibilidades de

crescimento apresentadas que se descortinaram.

Além das questões das dificuldades do espaço físico e das ausências de

professoras apresentadas pelas famílias na última entrevista, e descritas e

analisadas por nós no final do capítulo 5, vamos relembrar outras questões e

aspectos que também dificultaram o trabalho.

O primeiro que registramos, diz respeito a exigüidade do tempo que

temos para planejar e estudar, frutos, principalmente, das duras jornadas de

trabalho as quais a grande maioria das nossas professoras precisam se

submeter para poderem enfrentar a árdua luta pela sobrevivência. É uma

questão de ordem política, econômica, social e cultural, que acaba produzindo

uma conseqüência pedagógica meio desastrosa, na medida em que influencia

diretamente os processos de ensino e aprendizagem, comprometendo

amplamente os mesmos.

No caso específico da Instituição, campo da experiência aqui descrita e

analisada, apesar de termos o estudo mensal aos sábados e o planejamento

também mensal em uma sexta feira onde as crianças eram dispensadas,

conforme já explicitado no início do capítulo 5, percebemos que as duas

situações, além de não serem suficientes, são extremamente inadequadas, na

medida em que a primeira sacrifica mais diretamente as professoras, retirando-

as do convívio familiar e das obrigações domésticas em um dia – o sábado,

que poderia ser dedicado a estas situações, já que de segunda a sexta feira

elas estão nas Escolas.

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E a segunda acaba sendo até ilegal, na medida em que priva os alunos

de um dia de aula, diminuindo assim os 200 dias letivos que são um direito dos

alunos.

Em relação a estas duas questões, que foram, como já apontamos,

desafios enfrentados, acreditamos que a partir do ano de 2006, com a

implantação do plano de cargos, carreira e salários, que diminuiu a jornada

semanal para 20 horas, sendo 16 horas em sala de aula e 4 horas,

semanalmente, para planejamento, houve uma melhora dessa questão, pelo

menos no que se refere a não diminuir os dias letivos e oferecer um tempo

para planejamento das aulas; já que enquanto o professor titular da sala

planeja com a coordenação um dia por semana, as crianças ficam com os

professores de artes e educação física. É importante dizer que os professores

dessas duas áreas do conhecimento, também fazem o seu planejamento em

conjunto com a coordenação da Instituição em dias e horários também já

previamente organizados.

Porém, uma outra questão igualmente importante e determinante para o

sucesso dos processos de ensino e aprendizagem, continua sem período

definido oficialmente para acontecer, que são as reuniões de estudo em grupo,

bem como as reuniões com toda a equipe da Instituição para as decisões

coletivas, em torno de projetos, passeios, feiras de ciências, exposições e

operacionalização das propostas de interdisciplinaridade, que compreendemos

relevantes de acontecerem regularmente nas instituições educativas.

Acreditamos que esta questão continua a ser um desafio, embora o

grupo de estudos que se reúne mensalmente aos sábados, continue a se reunir

normalmente, realizando estudos e discussões, em busca do aperfeiçoamento

do trabalho da instituição.

Outra situação vivenciada na Instituição, e que se constituiu para nós em

um grande desafio, foram ás mudanças de professoras ocorridas durante o

biênio 2004/2005, o que, de certa forma, dificultou tanto o processo de

formação continuada das mesmas, quanto o próprio andamento das turmas.

Os motivos que ocasionaram essas mudanças foram os mais variados

possíveis, indo desde pedidos de demissão – por questões pessoais; passando

por doenças sérias, com afastamentos prolongados; até necessidades de

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mudanças no horário dos turnos, que acabaram por ocasionar a saída de

algumas professoras da Instituição.

Sabemos que esta mobilidade de professoras possui também influência

de aspectos sociais, políticos e econômicos, no sentido de que a

desvalorização social pela qual a profissão vem passando, além dos baixos

salários, e, muitas vezes, das difíceis condições de trabalho oferecidas, vão,

paulatinamente, minando as resistências, enfraquecendo os ânimos,

ocasionando comprometimentos orgânicos, psicológicos, emocionais, que

acabam contribuindo com os problemas e as dificuldades que explodem, ou

implodem..., nas alarmantes estatísticas que enfeitam o sistema educacional

público do nosso País. Acreditamos que esse foi um dos nossos maiores

desafios!

Uma outra questão que foi também um desafio na vivência da nossa

proposta de construção/sistematização das relações com as famílias e

compartilhamento das ações de cuidado e educação, foi a dificuldade que

algumas famílias apresentavam em comparecer a Instituição, tanto para

acompanhar as crianças no dia-a-dia, como para participar das atividades

propostas.

Inicialmente tivemos aquela tendência em achar que o não

comparecimento se devia ao descaso, a falta de interesse pela vida escolar

das crianças, porém, após uma breve pesquisa, onde procuramos saber o

motivo da ausência dessas pessoas, chegamos a conclusão, embasadas pelos

fatos apresentados, de que a grande maioria dos que não compareciam ,

possuíam motivos extremamente justos, como a acirrada luta pela

sobrevivência, problemas de saúde – as vezes originados por vícios, além de

violência doméstica e outros problemas dessa ordem.

Entendemos que essa nossa preocupação em procurar nos informar

acerca dos motivos das ausências, registrando e analisando os mesmos, foi

fundamental para modificarmos a nossa postura em relação a ausência dessas

famílias. O que inicialmente era visto como descaso, passou a ser

compreendido como dificuldades que justificavam plenamente a ausência das

pessoas, e não se constituía numa desvalorização, nem das responsabilidades

que tinham com as crianças, nem do trabalho realizado pela Instituição.

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Essas questões nos levam a refletir que, ao realizar um trabalho com as

famílias, por mais que nos esforcemos, ele não vai atingir a totalidade das

mesmas, considerando que existem questões alheias as vontades das

instituições – família e escola, que interferem, que dificultam o fortalecimento

das relações entre ambas, impossibilitando até, um contato mais direto.

Ou seja, não existe uma receita única, pronta, nem caminhos já

determinados a serem trilhados de forma regular pelas instituições que

objetivam suas relações com as famílias e compartilhar ações de cuidado e

educação. O que podemos apontar, após as três experiências vivenciadas com

a temática e os estudos efetuados, são desafios e possibilidades: desafios que

são variados, multifacetados; e possibilidades que são inúmeras, sempre

relacionadas com o contexto em que ambas as instituições – família e escolas

estão inseridas, bem como com a intensidade da relevância que as pessoas

envolvidas dão a estas relações, e a disponibilidade que demonstram para

vivenciá-las.

Dessa forma, além dos aspectos já apontados no capítulo 1, a partir das

duas primeiras experiências vivenciadas, vamos eleger algumas outras

questões, igualmente relevantes, que podem se constituir em novas

possibilidades para estas relações.

Inicialmente podemos dizer que é imprescindível que o fortalecimento

das relações entre as instituições educativas e as famílias, façam parte do

próprio currículo escolar, ou seja, que componha os pilares de sustentação das

propostas das mesmas. Depois, que as principais concepções que embasam a

proposta da instituição – criança, educação, função da instituição, valores,

normas, entre outras, sejam discutidas e estudadas por toda a sua equipe, e

levadas também para serem refletidas com as famílias.

Outro ponto importante é que a Instituição e todos os seus profissionais

se qualifiquem para a realização desse trabalho informativo e formativo junto as

famílias, incluam este aspecto como um dos pontos relevantes das

especificidades da sua formação enquanto profissionais, sempre lembrando

que, principalmente a formação de valores, procedimentos e atitudes, antes de

serem verbalizados para as crianças, precisam ser vivenciados entre as

pessoas que compõem, que fazem parte, das duas maiores instituições

responsáveis diretamente pela educação das mesmas, pois aquilo que se

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ensina pelo exemplo e pela vivência é melhor apreendido, do que o que é

ensinado apenas pelas palavras.

Nesse aspecto, consideramos fundamental que essa vivência se inicie

pela libertação de alguns preconceitos por parte das instituições educativas,

principalmente aqueles que dizem respeito á uma convicção equivocada de

que só uma família estruturada dessa, ou daquela forma padrão, pode

contribuir com a formação adequada das suas crianças, desvalorizando e

desqualificando as famílias reais presentes na grande maioria das nossas

instituições de ensino, e se negando a dialogar e buscar fortalecer as relações

com as mesmas, em prol do compartilhamento das ações educativas.

Finalizando essas considerações, vamos retomar o nosso problema de

pesquisa: é possível que juntos – direção, equipe técnica-pedagógica,

professoras e funcionários, construam, no contexto de surgimento de uma

I.E.I., uma relação com as famílias, objetivando o compartilhamento das ações

de cuidado e educação?, buscando refletir sobre o mesmo, procurando, no

nosso trabalho, elementos que apontem as respostas possíveis de serem

encaminhadas nesse momento.

De uma maneira geral, a partir das questões que foram descritas e

analisadas aqui, e apesar dos percalços e desafios que elencamos

anteriormente, compreendemos que o nosso problema de pesquisa pode ser

respondido de forma afirmativa, ou seja, é perfeitamente possível que a

direção, equipe técnica-pedagógica, professoras e funcionários, juntos,

construam uma relação com as famílias, objetivando as ações de cuidado e

educação das crianças. Aliás, podemos, inclusive, afirmar que é exatamente

essa ação conjunta, que viabiliza o atendimento do objetivo proposto, conforme

já explicitado um pouco mais acima.

Dessa forma, queremos registrar a importância de termos vivenciado

essa experiência, o quanto ela foi enriquecedora das nossas potencialidades

enquanto educadora. Queremos registrar também, que consideramos que a

mesma, ao ser divulgada, pode contribuir com outras instituições e/ou pessoas

que tenham interesse em realizar um trabalho desse jaez.

Além das contribuições específicas na área do fortalecimento das

relações entre instituições de Educação Infantil e famílias, vislumbramos

também contribuições para as áreas de formação de professores, de

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funcionários, além do incentivo as gestões participativas e ao envolvimento dos

gestores, funcionários, enfim, de toda a equipe da instituição educativa com o

processo pedagógico vivenciado nas mesmas.

Esperamos ter conseguido dar conta do enorme desafio que foi, e é,

está refletindo sobre uma experiência da qual somos parte integrante, tendo

compartilhado a mesma, com uma dedicação integral, por um período de dois

anos, e que esse envolvimento não nos tenha embotado totalmente a visão,

no sentido de nos impossibilitar uma posição mais crítica sobre a situação

vivida.

Porém, temos clareza de que, a partir do momento que esse trabalho sai

das nossas mãos, se torna público, abre-se a possibilidade de enriquecimento

do mesmo, motivadas, exatamente, por essa condição de incompletude, de

inacabamento, conforme discutido no início dessas considerações, que vão

impulsionar o descortinamento de outras possibilidades de se pensar/vivenciar

as relações entre famílias e Instituições de Educação Infantil, bem como outros

percalços e desafios também.

E são exatamente esses percalços, desafios e possibilidades que devem

alimentar a nossa alma de educadores, nos impulsionando sempre para a

busca de alternativas e estratégias possíveis de serem vivenciadas, em prol da

grandiosa tarefa de contribuir com o processo educativo das novas gerações!

Assim sendo, relembramos que, se educar é a mais avançada tarefa

social emancipatória – Assmann (2007), e se a participação dos pais diferencia

as escolas eficazes das ineficazes – Marchesi e Martín (2003), para colocar um

ponto e vírgula nesse trabalho, defendemos a tese de que, para que a

educação assuma essa tarefa emancipatória, é urgente e imprescindível que

as instituições educativas abracem e idéia de envolver as famílias, buscando o

compartilhamento das ações de cuidado e educação das crianças.

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LUCK, Heloísa, et al. A escola participativa: o trabalho do gestor escolar. 5. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. 166p. MACHADO, M. Lúcia de A. Encontros e desencontros em educação infantil. São Paulo: Cortez, 2002. MALAGUZZI, Lóris. Pelo contrário as cem existem. In: As Cem Linguagens da Criança. EDWARDS, Carolyn.; GANDINI, Lella.; FORMAN, George. Porto Alegre: Artmed, 1999. MARCHESI, Álvaro; MARTÌN, Elena. Qualidade do Ensino em Tempos de Mudança. Tradução por Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2003. MARQUES, Ramiro. A escola e os pais como colaborar? Lisboa: Texto Editora, 1999. 87 p. MARQUES, Ramiro. Professores, famílias e projeto educativo. Porto. Portugal: Asa Editores, 2001. 111p. MARSHALL, Ian; ZOHAR, Danah; Sociedade Quântica: a promessa revolucionária de uma liberdade verdadeira. Tradução de Luiz A. de Araújo. Rio de Janeiro: Bestseller, 2006. MELLO, Luiz Gonzaga. Antropologia cultural. Iniciação, teoria e temas. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1983. 526 p. MINAYO, Maria Cecília de Souza (Org.). Pesquisa Social teoria, método e criatividade. 19 ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001. 80p. MIRANDA, Marília Gouveia de. A condição social de ser criança. In: Psicologia social: o homem em movimento. LANE, Sílvia T. M.; CODO, Wanderley. 5 ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. NOGUEIRA, Maria Alice.; ROMANELLI, Geraldo.; ZAGO, Nadir (Orgs.). Família e Escola: trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis: Vozes. 2000. 183 p. NÓVOA, Antônio. Apresentação. In: História da Pedagogia. CAMBI, Franco. São Paulo: UNESP. 1999. 701 p. OLIVEIRA, Inês Barbosa.; ALVES, Nilda (Orgs.). Pesquisa no/do cotidiano das escolas sobre redes de saberes. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. 157p. OLIVEIRA, Zilma Ramos. Educação Infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2002. 255p. OLIVEIRA, Z.M.R. (org) A Criança e seu desenvolvimento: perspectivas para se discutir a educação infantil. São Paulo: Cortez, 1997. OLIVEIRA, Z.M.R. (org) Educação Infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2000.

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ANEXOS

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ANEXO 1

PREFEITURA MUNICIPAL DO NATAL SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO

CENTRO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL PROFª CARMEM Mª REIS

FICHA DE CARACTERIZAÇÃO DA CRIANÇA

- NÍVEL: ( ) I = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) II = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) III = ANO _______________ TURNO ______________________ ( ) IV = ANO _______________ TURNO ______________________

- DADOS DO ALUNO:

Nome da criança:_________________________________________________

Data de nasc. ____/_____/_____ sexo: ( ) masc. ( ) fem.

Nacionalidade: ( ) brasileira ( ) outra______________________

Etnia: ( ) parda ( ) branca ( ) negra

End:___________________________________________ Nº______________

Bairro: _______________________tel: ________________ ( ) res. ( ) orelhão

Ponto de referência: _______________________________________________

- DADOS DO PAI:

Nome do pai:_____________________________________________________

Data de nasc:________________________

Profissão_____________________

Religião: ( ) católica ( ) evangélica ( ) outras__________________________

Grau de instrução: ( ) analfabeto ( ) alfabetizado ( ) 1ª a 4ª série ( ) 5ª a 8ª

série ( ) Fund. Completo ( ) médio incompleto ( ) médio completo ( )

superior incompleto ( ) superior completo

Nome, end. E tel do local de trabalho do pai: ___________________________

- DADOS DA MÃE:

Nome da mãe:___________________________________________________

Data de nasc: ___/___/___. Profissão: ( ) do lar ( ) outra ________________

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Religião: ( ) católica ( ) evangélica ( ) outras__________________________

Grau de instrução: ( ) analfabeto ( ) alfabetizado ( ) 1ª a 4ª série ( ) 5ª a 8ª

série ( ) Fund. Completo ( ) médio incompleto ( ) médio completo ( )

superior incompleto ( ) superior completo

Nome, end. E tel do local de trabalho da mãe: __________________________

-SITUAÇÃO FAMILIAR:

Renda: ( ) Menos de 1 salário mínimo ( ) 1 salário mínimo ( ) não tem renda

fixa ( ) 1 a 3 salários mínimos ( ) 3 a 5 salários mínimos.* Residência: ( )

casa própria ( ) casa alugada ( ) outros ( ) alvenaria ( ) barraco ( ) 1 a 2

cômodos ( ) 2 a 5 cômodos.

Número de pessoas que residem em casa: ( ) 1 a 4 pessoas ( ) 5 a 7

pessoas ( ) mais de 7 pessoas

Número de irmãos: ( ) masc ( ) fem ( ) mais novos ( ) mais velhos

Com quem a criança mora: ( ) com os pais ( ) pais separados: ( ) mãe ou ( )

pai ( ) com os avós ( ) outra situação _________________________________

Quando a criança vem para a escola, fica alguém em casa: ( ) não ( ) sim

Quem? ___________________________________________

- CARACTERÍSTICAS DA CRIANÇA:

A criança costuma fazer 3 refeições ao dia: ( ) sim ( ) não

Que alimentos a criança gosta: ( ) sopa de legumes ( ) cuscuz com leite ( )

cuscuz com carne ( ) canjicão ( ) arroz doce 9 ) leite ( )

outros__________________________________________________________

Com quem a criança dorme: ( ) quarto sozinha ( ) quarto com irmãos ( ) com

os pais ( ) outros

Que doenças a criança já teve? ( ) convulsão ( ) hepatite ( ) problemas

cardíacos ( ) sarampo ( ) outras _____________________________________

A criança toma algum remédio diariamente: ( ) não ( ) sim ______________

Motivo: _________________________________

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A criança vivencia situações como: ( ) piolho ( ) bicho de pé ( ) coceira ( )

dor de dente ( ) outros_____________________________________________

A criança costuma usar o sanitário sozinha: ( ) sim ( ) não

De que a criança mais gosta de brincar? ______________________________

Costuma brincar com outras crianças ( ) não ( ) sim. Em que espaço: ( )

quintal ( ) dentro de casa ( ) na rua ( ) outros__________________________

0 que a criança faz no final de semana: ( ) passeia com os pais ( ) vai a praia (

) fica em casa ( ) visita parentes ( ) outros ______________________

Qual a sua opinião sobre o seu

filho:___________________________________________________________

Quando seu filho age de forma incorreta, o que você faz: ( ) conversa ( )

castiga ( ) bate ( ) outros:__________________________________________

Quando você promete alguma coisa ao seu filho, costuma cumprir ( ) sim ( )

não

Por que você está matriculando a criança nesta escola? _________________

A criança já estudou em outra escola? ________________________________

O que você espera que a criança aprenda aqui? ________________________

Como você pode colaborar para que a criança se saia bem na escola? ( )

comparecendo aos eventos promovidos sempre que solicitado ( ) se fazendo

presente no dia a dia, conversando com a professora ( ) Acompanhando as

atividades realizadas na escola e as tarefas de casa. ( ) não dispõe de tempo

Quem vem buscar a criança na escola?

Qual o melhor horário para você comparecer a reunião de pais? ( ) horário de

estudo do filho ( ) início do turno ( ) final do turno ( ) a noite

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Nome da pessoa que forneceu as informações sobre a criança e grau de

parentesco. _____________________________________________________

Assinatura: ______________________________________________________

Nome da pessoa da escola que preencheu a ficha: ______________________

Data do preenchimento da ficha:_____________________________________

Observações: ____________________________________________________

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ANEXO 2

ROTEIRO DAS ENTREVISTAS INICIAIS COM AS FAMÍLIAS NO CARMEM REIS

1- O que o(a) sr(ª) achou desse evento? 2- Que mais poderia dizer: que fazer alguma crítica, alguma reclamação,

alguma sugestão?

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ANEXO 3

ROTEIRO DAS ENTREVISTAS FINAIS COM AS FAMÍLIAS NO CARMEM REIS

1- Quando você matriculou seu (sua) filho(a) nessa instituição, o que você

esperava que ele(a) aprendesse aqui? O que você esperava dessa escola?

2- Na sua opinião, essa instituição atendeu ao que você esperava?

Justifique a sua resposta.

3- E você, enquanto pai, mãe, responsável, enfim, familiar de aluno

matriculado nessa instituição, como se sente aqui? O que tem a dizer das pessoas que trabalham aqui, das reuniões e eventos que são realizados com as crianças e as famílias, enfim, da instituição como um todo?

4- O que você mudaria nessa instituição? Se dependesse de você, o quê

seria diferente? 5- O que você mais gosta nesta instituição? 6- Dos eventos realizados com as famílias, qual o que você mais gostou? 7- Na sua opinião, as atividades realizadas aqui na instituição ajudaram

você a entender, a cuidar e educar melhor a sua criança?

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ANEXO 4

TERMO DE AUTORIZAÇÃO

Eu, NINODJA THAISE BARBALHO DA SILVA, Brasileira, casada,

Professora da rede municipal de ensino da cidade de Natal-RN, portadora da

identidade nº 1.513702, autorizo a pesquisadora CLÁUDIA DA SILVA

FARACHE – doutoranda do Programa de Pós-graduação da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte – UFRN – e sua orientadora, a Profª Drª

NEIDE VARELA SANTIAGO, a utilizar o projeto didático intitulado “Rendeiras

da Vila: a preservação de uma cultura”, por mim elaborado e vivenciado, na

turma de nível I, do turno vespertino – no Centro Municipal de Educação Infantil

Profª Carmem Maria Reis, no ano de 2005; na sua tese de doutorado, podendo

também disponibilizar o mesmo na rede mundial de computadores – Internet –

e permitir a reprodução por meio eletrônico da OBRA, a partir da data abaixo.

.

Natal, 21 de Junho de 2007

Ninodja Thaise Barbalho da Silva

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