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Universidade Federal do Rio de Janeiro Museu Nacional Simone Maria Bielesch EM BUSCA DE AUXÍLIO PARA O RENASCIMENTO: ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS Volume I - Texto Rio de Janeiro 2010

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Page 1: Universidade Federal do Rio de Janeiro - Museu Nacional · Ramessés XI Khaemuaset II Menmaatre Setepenptah 1100-1070 a.C. III PERÍODO INTERMEDIÁRIO 1070-712 a.C. Sumos Sacerdotes

Universidade Federal do Rio de Janeiro Museu Nacional

Simone Maria Bielesch

EM BUSCA DE AUXÍLIO PARA O RENASCIMENTO:

ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Volume I - Texto

Rio de Janeiro

2010

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EM BUSCA DE AUXÍLIO PARA O RENASCIMENTO: ESTÁTUAS

FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Volume I - Texto

Simone Maria Bielesch

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Mestrado em Arqueologia, Museu Nacional,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do

título de Mestre em Arqueologia.

Orientador: Prof. Dr. Antonio Brancaglion Jr.

Rio de Janeiro

Agosto/2010

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Bielesch, Simone Maria

Em Busca de Auxílio para o Renascimento: Estátuas Funerárias de Osíris

e Ptah-Sokar-Osíris – Simone Maria Bielesch. Rio de Janeiro: UFRJ/MN, 2010.

xxix, 549f.; 3v.: ils.; 31 cm

Orientador: Prof. Dr. Antonio Brancaglion Jr.

Dissertação (mestrado) – UFRJ/Museu Nacional/Mestrado em Arqueologia, 2010.

Referências Bibliográficas: f. 291-298.

1. Ptah-Sokar-Osíris. 2. Osíris. I. Brancaglion Junior, Antonio II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Museu Nacional, Mestrado em

Arqueologia. III. Em Busca de Auxílio para o Renascimento: Estátuas

Funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris.

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EM BUSCA DE AUXÍLIO PARA O RENASCIMENTO: ESTÁTUAS

FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Volume I - Texto

Simone Maria Bielesch

Orientador: Prof. Dr. Antonio Brancaglion Jr.

Dissertação de Mestrado submetida ao Mestrado em Arqueologia, Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em

Arqueologia.

Aprovado por:

______________________________________

Prof. Dr. Antonio Brancaglion Junior

______________________________________

Profª. Dr.ª Marcia Severina Vasques

______________________________________

Prof. Dr. André Leonardo Chevitarese

Rio de Janeiro

Agosto/2010

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Para minha família

Ma, Oma, Opa e Tee

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Agradecimentos:

Agradeço a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior) pela bolsa concedida como suporte financeiro para a

realização do presente trabalho. A mesma foi essencial para o meu sustento

no Rio de Janeiro.

Em especial agradeço ao meu orientador Prof. Dr. Antonio Brancaglion

Junior pela dedicação e paciência ao longo de todos esses anos. Seus

ensinamentos e a sua ajuda transmitidos nos cursos, reuniões e conversas,

desde que o conheci no curso de extensão por ele dado no Departamento de

Letras Orientais da FFLCH, USP, em 2002, foram fundamentais para a

minha formação e aprofundamento dos conhecimentos sobre o Egito.

Agradeço também à Marly Shibata, por sempre estar pronta a prestar ajuda

e em especial pela paciência de escanear voluntariamente textos cuja leitura

ajudaram na elaboração da presente dissertação. A ambos também agradeço

pela amizade que surgiu durante todos os momentos alegres e difíceis que

vivenciamos.

Agradeço a todos os professores do mestrado, Tânia Andrade Lima,

Claudia Rodrigues-Carvalho, Gláucia Malerba Sene, Renato Rodriguez

Cabral Ramos, e todos os outros cujos ensinamentos, se não ajudaram

diretamente na elaboração da presente dissertação, certamente poderão um

dia ser de grande ajuda na minha vida profissional como futura egiptóloga.

Sou grata aos funcionários do Museu Nacional, os quais me

auxiliaram nesses dois anos de mestrado. A secretaria do mestrado, Claudia

Borges, agradeço por sempre estar pronta a me ajudar a resolver as questões

e dúvidas referentes ao mestrado. A todos da equipe de museologia agradeço

pelo auxílio com o manuseio das peças da coleção por mim estudadas.

A todas as colegas e amigas do grupo de Egito, tanto do Rio de

Janeiro, como de São Paulo, Regina, Marilda, Juliana, Cintia (Lost), Thais,

Michele, e em especial agradeço à Cintia Gama pelos textos trazidos de suas

viagens para a França e o Egito, e pela estadia em seu apartamento nas

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primeiras vezes em que fui para o Rio de Janeiro, e à Marina Buffa César por

ter me abrigado nos primeiros seis meses de mestrado no Rio de Janeiro, e

pelas conversas tidas sobre diversos assuntos relacionados ao Egito durante

muitos cafés deliciosos e madrugadas à dentro.

Também a todos os outros colegas e amigos do mestrado, em especial

àqueles da minha turma, Beatriz Bandeira, Letícia, Caroline, Leandro e

Silvia Puccioni por todos os momentos que passamos juntos, principalmente

as muitas madrugadas passadas em claro na elaboração dos trabalhos para

as aulas.

Igualmente a todos os outros amigos, com uma menção especial para

Veronica Aparecida Silveira Aguiar, cuja amizade iniciada durante a

graduação em História na USP dura até hoje. Mesmo seguindo seus estudos

em História Medieval, sempre procura me informar sobre eventos ou

publicações que possam ser de meu interesse em relação ao Egito.

A todos os funcionários da Biblioteca do MAE, os quais sempre estão

dispostos a ajudar no que for possível e que na falta da bibliografia

necessária em seu acervo, muitas vezes procuram encontrar a

disponibilidade da mesma em outra localidade. A Robarts Library da

Universidade de Toronto e a Biblioteca do Instituto de Egiptologia da

Universidade de Viena, por gentilmente terem-me deixado consultar os seus

acervos durante as minhas viagens para o Canadá e para a Áustria.

Por fim, o agradecimento mais importante é para toda minha família,

que sempre procurou me ajudar e apoiar de todas as formas possíveis na

realização deste sonho, que é o estudo do Egito. Tanto aos que ainda me

acompanham diariamente, minha mãe, Katja Maria Deutsch Bielesch, meus

avós Judith Deutsch e Franz Deutsch e minha tia, Ruth Margot Deutsch

(Tee), quanto aos que já partiram em sua jornada rumo ao Ocidente, meu

pai, Peter Bielesch e meu avô August Bielesch (Linzer Opa).

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RESUMO

EM BUSCA DE AUXÍLIO PARA O RENASCIMENTO: ESTÁTUAS

FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Volume I - Texto

Simone Maria Bielesch

Orientador: Prof. Dr. Antonio Brancaglion Jr.

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Mestrado em Arqueologia, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro -

UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre

em Arqueologia.

As estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris eram um

importante artefato do equipamento funerário egípcio, servindo para auxiliar

o morto em seu renascimento no Mundo dos Mortos. O presente trabalho

tem por objetivo estudar a importância do simbolismo dessas estátuas

dentro do contexto funerário-religioso em seu período de existência, do Final

do Novo Império até o Período Ptolomaico. Para tanto, o presente trabalho

está dividido em duas partes complementares, uma textual (volume I) e

outra de catálogos (volumes II e III). Uma maior ênfase foi dada para as

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris da coleção egípcia do

Museu Nacional/UFRJ. Estas compõem um primeiro catálogo, sendo o

segundo um catálogo de referência composto por peças provenientes das

coleções de diferentes museus. A parte textual está divida em três partes

principais. A primeira parte trata do contexto histórico no qual as estátuas

estão inseridas, a segunda trata dos diferentes aspectos dos deuses

representados pelas estátuas, e a terceira parte trata das estátuas funerárias

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de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris propriamente ditas. Baseando-se na tipologia

elaborada por Raven (1978-1979) e suas posteriores correções e acréscimos

feitos por outros estudiosos, uma nova tipologia foi elaborada. O conjunto

dessas informações permitiu observar uma evolução no simbolismo das

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, na qual as estátuas

deixam de ser uma simples representação do deus Osíris, para serem cada

vez mais uma representação do morto como um ser vitorioso ao final de sua

jornada para o Outro Mundo, unido a Osíris e posteriormente também ao

deus-sol. Também foi possível fazer uma reconstituição parcial dos

exemplares da coleção do Museu Nacional/UFRJ.

Palavras-chave: Ptah-Sokar-Osíris, Osíris, Coleção Egípcia Museu

Nacional/UFRJ.

Rio de Janeiro

Agosto/2010

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ABSTRACT

IN SEARCH OF AID FOR DE REBIRTH:

FUNERARY STATUES OF OSIRIS AND PTAH-SOKAR-OSIRIS

Volume I - Text

Simone Maria Bielesch

Orientador: Prof. Dr. Antonio Brancaglion Jr.

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Mestrado em Arqueologia, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro -

UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre

em Arqueologia.

The funerary statues of Osiris and Ptah-Sokar-Osiris were an

important artifact of Egyptian funerary equipment, assisting the dead in his

rebirth in the Underworld. The current work has as it objective to study the

importance of the symbolism of these statues within de funerary-religious

context of the period of their existence, from the end of the New Kingdom to

the Ptolemaic Period. So, the present work is shared in two complementary

parts, one textual (volume I), and another of catalogs (volumes II and III). A

greater emphasis was given to the funerary statues of Osiris and Ptah-

Sokar-Osiris from the Egyptian collection of Museu Nacional/UFRJ. These

form a first catalog, being the second one a catalog of reference consisting of

pieces deriving from the collections of different museums. The textual part is

separated in three principal parts. The first part deals with the historic

context in which the statues are inserted, the second treats with the

different aspect of the gods which the statues represent and the third part

deals with the funerary statues of Osiris and Ptah-Sokar-Osiris themselves.

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Basing ourselves in the typology elaborated by Raven (1978-1979) and their

later corrections and additions by other studious, a new typology was

elaborated. The whole of this information allowed us to observing an

evolution in symbolism of the funerary statues of Osiris and Ptah-Sokar-

Osiris, in which the statues change from a simple representation of the god

Osiris, to ever more being a representation of the dead as a victorious being

at the end of his journey to the Other World united with Osiris and

afterwards also with the sun god. It also was possible to make a partial

reconstruction of the specimes of the collection of Museu Nacional/UFRJ.

Key-words: Ptah-Sokar-Osiris, Osiris, Egyptian Collection Museu

Nacional/UFRJ.

Rio de Janeiro

August/2010

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Mapa 1 – Egito (adaptado de mapa elaborado por Antonio BRANCAGLION JUNIOR)

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Mapa 2 – Região Tebana

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CRONOLOGIA1

PALEOLÍTICO 500.000-5500 a.C.

PRÉ-DINÁSTICO 5500-3050 a.C.

PROTODINÁSTICO 3150-3050 a.C.

PERÍODO THINITA (DINÁSTICO INICIAL-ARCAÍCO) 2920-2575 a.C.

ANTIGO IMPÉRIO 2575-2134 a.C.

I PERÍODO INTERMEDIÁRIO 2134-2040 a.C.

MÉDIO IMPÉRIO 2040-1640 a.C.

II PERÍODO INTERMEDIÁRIO 1640-1532 a.C.

NOVO IMPÉRIO 1550-1070 a.C.

XVIII Dinastia 1550-1307 a.C.

Ahmose [Ahmés] Nebpehtyre 1550-1525 a.C.

Amenhotep I Djeserkare 1525-1504 a.C.

Thutmés I Akheperkare 1504-1492 a.C.

Thutmés II Akheperenre 1492-1479 a.C.

Hatshepsut Maatkare 1473-1458 a.C.

Thutmés III Menkheperre 1479-1425 a.C.

Amenhotep II Akheperure 1427-1401 a.C.

Thutmés IV Menkeperure 1401-1391 a.C.

Amenhotep III Nubmaatre 1391-1353 a.C.

Amenhotep IV – Akhenaton Neferkheperure Waenre 1353-1332 a.C.

Neferneferuaten Ankhkheperure-Meruaenre 1332-1335 a.C.

Smenkhare Ankhkheperure 1335-1333 a.C.

Tutankhaton – Tutankhamun Nebkheperure 1333-1323 a.C.

Ay Kheperkheperure 1323-1319 a.C.

Horemheb Djeserkheperure Setepenre 1319-1307 a.C.

XIX Dinastia 1307-1196 a.C.

Ramessés I Menpehtyre 1307-1306 a.C.

Séthi I Menmaatre 1306-1290 a.C.

Ramessés II Usermaatre 1290-1224 a.C.

Merneptah [Merenptah] Baenre-merynetjeru 1224-1214 a.C.

Séthi II Userkheperure-setepenre 1214-1204 a.C.

Amenmesses Menmire-setepenre – usurpador 1213-1205 a.C.

Siptah [Merenptah] Ankhenre-setepenre 1204-1198 a.C.

Twosret Sitre-meryamun 1198-1196 a.C.

1 A cronologia egípcia baseia-se em datas relativas. A presente cronologia baseia-se na cronologia elaborada por Antonio BRANCAGLION JUNIOR

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XX Dinastia 1196-1070 a.C.

Setnakhte Userkhaure Setepenre 1196-1194 a.C.

Ramessés III Usermaatre Meryamun 1194-1163 a.C.

Ramessés IV Heqamaatre 1163-1156 a.C.

Ramessés V Amonherkepshef I Usermaatre Sekheperenre

1156-1151 a.C

Ramessés VI Amonherkepshef II Nebmaatre Meryamun

1151-1136 a.C.

Ramessés VII Itamon Usermaatre Meryamun Setepenre

1143-1136 a.C.

Ramessés VIII Setherkepshef Usermaatre Akhenamun 1136-1131 a.C.

Ramessés IX Khaemuaset I Neferkhare Setepenre 1131-1112 a.C.

Ramessés X Amonherkepshef III Khepermaatre 1112-1100 a.C.

Ramessés XI Khaemuaset II Menmaatre Setepenptah 1100-1070 a.C.

III PERÍODO INTERMEDIÁRIO 1070-712 a.C.

Sumos Sacerdotes de Amun (Tebas) 1080-945 a.C.

Herihor Siamun Hemnetjertepyenamun 1080-1074 a.C.

Piankh 1074-1070 a.C.

Pinedjem I Khakheperre Setepenamun 1070-1055 a.C.

Masaherta 1055-1046 a.C.

Menkheperre Hemnetjertepyenamun 1045-992 a.C.

Smendes II 992-990 a.C.

Pinedjem II Khakheperre Setepenamun 990-969 a.C.

Psusennes III 969-945 a.C.

XXI Dinastia (Tânis) 1070-1044 a.C.

Smendes I Nesbanebdjed Hedjkheperre Setepenre 1070-1044 a.C.

Amenemnisut [Amenemnisu] Neferkare Heqawaset 1044-1040 a.C.

Psusennes I [Pasebakhaenniut I] Akheperre Setepenamun

1040-992 a.C.

Amenemopet Usermaatre Meryamun 993-984 a.C.

Osorkon “O Velho” Aakheperre Setepenre 984-978 a.C.

Siamun Netjerkheperre Setepenamun 978-959 a.C.

Psusennes II [Pasebakhaenniut II] Titkheperure Setepenre

959-945 a.C.

XXII Dinastia (Tânis – Líbia ou Bubástis) 945-712 a.C.

Sheshonq I Meryamon Hedjkheperre Setepenre 945-924 a.C.

Osorkon I Meryamon Sekhemkheperre Setepenre 924-889 a.C.

Sheshonq II Meryamon Heqakheperre Setepenre 883 a.C.

Takelot I Meryamon Usermaatre Setepenre 909-883 a.C.

Osorkon II Meryamon Usermaatre Setepenamun 883-855 a.C.

Takelot II Meryamon Hedjkheperre Setepenre 860-835 a.C.

Sheshonq III Meryamon Usermaatre Setepenre 835-783 a.C.

Pami [Pimay] Usermaatre Setepenamun 783-773 a.C.

Sheshonq V Aakheperre 773-735 a.C.

Osorkon IV Aakheperre Setepenamun 735-712 a.C.

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Sumos Sacerdotes de Amun (Tebas) 945-825 a.C.

Iuput 945-924 a.C.

Sheshonq 924-889 a.C.

Smendes 889 a.C.

Iuwelot 889-874 a.C.

Harsiese Meryamon Hedjkheperre Setepenamun 870-860 a.C.

Nimlot 860-850 a.C.

Osorkon 850-825 a.C.

XXIII Dinastia (Leontópolis – Anarquia Líbia) 818-712 a.C.

Pedibastet I (Petubastis) Meryamon Usermaatre Setepenamun

818-803 a.C.

Sheshonq IV Usermaatre Meryamun 793-787 a.C.

Osorkon III Usermaatre Setepenamun 787-759 a.C.

Takelot III Usermaatre 764-757 a.C.

Rudamon Usermaatre Setepenamun 757-754 a.C.

Iuput Meryamon-Sibaster Usermaatre 754-715 a.C.

Shepenupet I - Divina Adoradora de Amun 754-715 a.C.

Heracleópolis 739-724 a.C.

Iny 739-734 a.C.

Peftjauabastet Neferkare 734-724 a.C.

Hermópolis

Nimlot

XXIV Dinastia (Sais) 724-712 a.C.

Tefnakht Shepsesre 724-717 a.C.

Bakenrenef Bocchoris Wahkare 717-712 a.C.

XXV Dinastia (Núbia/Kush) 747-656 a.C.

Alara 780-760 a.C.

Kashta Nimaatre 770-750 a.C.

Piankhi [Piyi] Menkheperre Seneferre 750-712 a.C.

Shabaka Neferkare 712-698 a.C.

Shabataka [Shebitku] Djedkare 698-690 a.C.

Taharqa Nefertemkhure 690-664 a.C.

Tanutamun [Tataman] Bakare 664-657 a.C.

Amenirdes I - Divina Adoradora de Amun

Shepenupet II - Divina Adoradora de Amun

Amenirdes II - Divina Adoradora de Amun

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PERÍODO SAÍTA 664-525 a.C.

XXVI Dinastia 664-525 a.C.

Nekau I [Necho] Menkheperre 672-664 a.C.

Psametik I [Psamético] Wahibre 664-610 a.C.

Nekau [II] [Necho] Wahemibre 610-595 a.C.

Psametik II [Psammetichus] Neferibre 595-589 a.C.

Wahibre Apries Haaibre 589-570 a.C.

Ahmose II [Amasis] Sineit Khnemibre 570-526 a.C.

Psametik III [Psammetichus] Ankha(em)re 526-525 a.C.

BAIXA ÉPOCA (PERÍODO TARDIO) 525-332 a.C.

XXVII Dinastia (I Período Persa) 525-405 a.C.

Cambises II Mesutire 525-522 a.C.

Dario I Setutre 521-486 a.C.

Xerxes I 486-465 a.C.

Artaxerxes I 465-424 a.C.

Xerxes II 424 a.C.

Dario II 423-405 a.C.

Artaxerxes II ? 405-359 a.C.

XXVIII Dinastia 405-399 a.C.

Amyrtee [Amyrtaeus] Príncipe 465-449 a.C.

Amyrtee [Amyrtaeus] Rei 404-399 a.C.

XXIX Dinastia 339-380 a.C.

Nepherites I [Nefaarud] Baenre Merynetjeru 399-393 a.C.

Pasherenmut [Psammuthis] Userre-setepenptah 393 a.C.

Hakor [Achoris] Maatibre [Khnemmaatre] 393-380 a.C.

Nepherites II [Nefaarud] 380 a.C.

XXX Dinastia 380-343 a.C.

Nakhtnebef I [Nectanebo] Kheperkare 380-362 a.C.

Djedhor Teos Irmaatenre 362-360 a.C.

Nakhthoreb II [Nectanebo] Snedjemibre Setepeninhur 360-343 a.C.

XXXI Dinastia (II Período Persa) 343-332 a.C.

Artaxerxes III Okhos [Ochos] 343-338 a.C.

Arses [Artaxerxes IV] 338-336 a.C.

Dario III 335-332 a.C.

Khababash Senentanen-setepenptah

REIS MACEDÔNIOS 332-304 a.C.

Alexandre “O Grande” Alexandre III Meryamun

Setepenre

332-323 a.C.

Filipe Arrhidaeus Meryamun Setepenre 323-317 a.C.

Alexandre IV Haaibre Setepenamun 316-304 a.C.

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PERÍODO PTOLOMAICO 304-30 a.C.

Ptolomeu I Soter I Meryamun Setepenre/Berenice I 304-282 a.C.

Ptolomeu II Philadelphus Userkaenre

Meryamun/Arsínoe II

282-246 a.C.

Ptolomeu III Euergetes I Iwaennetjerwy-senwy Sekhemankhre Setepamun/Berenice II

246-221 a.C.

Ptolomeu IV Philopator Iwaennetjerwymenkhwy Setepptah Userkare Sekhemankhamun/Arsínoe III

221-204 a.C.

Harwennofre [Haronnophris, Hurgonafhor, Sharonnophris] - usurpador autóctone

205-199 a.C.

Ptolomeu V Epiphanes Iwaennetjerwy-merwyitu Setepptah Userkare Sekhem-ankhamun/Cleópatra I

204-180 a.C.

Ankhwennofre - usurpador autóctone 199-186 a.C.

Ptolomeu VI Philometor Iwaennetjerwyper Setepenptahkhepri Irmaatenemunre/Cleópatra I

180-177 a.C.

Ptolomeu VI/Cleópatra II 177-170 a.C.

Ptolomeu VI/Ptolomeu VIII/Cleópatra II 170-164 a.C.

Ptolomeu VIII Euergetes II Physcon 164-163 a.C.

Ptolomeu VI/Cleópatra II 163-145 a.C.

Ptolomeu VIII 145-116 a.C.

Ptolomeu VII Eupathor Neos Philopator 145 a.C.

Harsiese - usurpador autóctone 131 a.C.

Ptolomeu IX Soter II Lathyros/Cleópatra III 116-107 a.C.

Ptolomeu X Alexandre I/Cleópatra III 107-101 a.C.

Ptolomeu X/ Cleópatra Berenice III 101-88 a.C.

Ptolomeu IX Soter II 88-80 a.C.

Ptolomeu XII Neos Dionysos Auletes 80-58 a.C.

Berenice IV 58-55 a.C.

Ptolomeu XII 55-51 a.C.

Cleópatra VII Thea Philopator Netjeret-merites/ Ptolomeu XIII

51-47 a.C.

Cleópatra VII /Ptolomeu XIV 47-48 a.C.

Cleópatra VII/Ptolomeu XV Caesarion

Iwapanetjerentynehem Setepenptah Irmaatenre Sekhemankhamun

44-30 a.C.

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Lista de Mapas

Pág.

1. Egito ............................................................................................ 11

2. Região Tebana .............................................................................. 12

3. Egito na XXI Dinastia ................................................................... 47

4. Divisão do Egito sob a XXII Dinastia ............................................. 48

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Lista de Figuras

Pág.

1. Modelo de tumba particular do Período Ramessida cuja

superestrutura é concebida na forma de um templo ................. 40

2. Representação típica de líbios .................................................. 51

3. Faraó kushita Taharqa ............................................................. 54

4. Estátua Dário I com traços egípcios .......................................... 60

5. Deus Ptah ................................................................................ 70

6. Deus Khonsu ............................................................................ 70

7. Pataikos ................................................................................... 71

8. Bes ........................................................................................... 71

9. Tríade Menfita .......................................................................... 72

10. Estela votiva de Ptah ................................................................ 78

11. Barca Henu .............................................................................. 85

12. Thutmés III fazendo oferendas para Sokar ................................ 85

13. Sokar na forma de falcão mumificado ....................................... 86

14. Barca Henu .............................................................................. 87

15. Quarta Hora Amduat ................................................................ 93

16. Quinta Hora Amduat ................................................................ 93

17. Deus Osíris .............................................................................. 101

18. Osíris na forma do Pilar Djed .................................................... 102

19. Genealogia da Teologia Heliopolitana ........................................ 107

20. Osíris fecundando Ísis na forma de um pássaro ........................ 110

21. Osireion .................................................................................... 111

22. A ba unificada de Rê e Osíris .................................................... 112

23. Base do caixão exterior da Senhora da Casa Seshepenmehyt

mostrando o deus Ptah-Sokar-Osíris ........................................ 133

24. Ptah-Sokar-Osíris em forma de Falcão ...................................... 134

25. Ptah-Sokar-Osíris na forma híbrida .......................................... 135

26. Porta Tumba Sennedjem ........................................................... 135

27. Ptah-Sokar-Osíris “Livro dos Mortos” ........................................ 135

28. Ptah-Sokar-Osíris “Livro dos Mortos” Anhai .............................. 137

29. Ramessés III oferecendo incenso e fazendo libações diante de

Ptah-Sokar-Osíris, protegido pela deusa Ísis alada .................... 137

30. Parte superior da estela de Metternich ...................................... 138

31. Ptah-Sokar-Osíris no interior de uma capela em frente ao deus Amun ....................................................................................... 139

32. Os raios do sol acordando Osíris para uma nova vida ............... 142

33. Representação do nTr Aa na forma de escaravelho com cabeça de

carneiro .................................................................................... 143

34. Estátua de Osíris Policromada do tipo II A de Raven ................. 147

35. Estátua de Osíris Policromada do tipo II C de Raven ................. 148

36. Estátua de Ptah-Sokar-Osíris com lótus no topo da base .......... 151

37. Verso estátua de Ptah-Sokar-Osíris JE 94473 ........................... 154

38. Shabti com base ....................................................................... 165

39. Shabti votivo de Qenamun ........................................................ 165

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40. Tijolos mágicos ......................................................................... 166

41. Figura mumiforme de verniz preto pertencente à Thutmés III .... 168

42. Figura mumiforme folhada a ouro pertencente à

Tutankhamun .......................................................................... 168

43. Figura mumiforme de verniz preto com coroa hedjet pertencente à Thutmés III ......................................................... 168

44. Figura mumiforme folhada a ouro com coroa hedjet pertencente

à Tutankhamun ....................................................................... 168

45. Figura de Amenhotep II com uma cavidade nas costas .............. 169

46. Detalhe estátua funerária de Osíris mostrando furo para

encaixe da barba divina ............................................................ 178

47. Detalhe estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris mostrando barba divina sobre plinto .......................................................... 178

48. Osíris do tipo 1. segurando dois açoites .................................... 179

49. Múmia com amarras semelhantes às que podem ser

encontradas representadas nas estátuas funerárias de Osíris ... 180

50. Colar wsx com terminais semicirculares .................................... 183

51. Colar wsx n bik com trabalho vazado ........................................... 183

52. Colar wsx com terminais em forma de flor de lótus .................... 183

53. Nut arqueada sobre Geb e sendo sustentada por Shu ............... 187

54. Livro da Vaca Celeste ................................................................ 188

55. Khepri sobre a sua barca, a qual é elevada pelo deus Nun ........ 189

56. Ísis e Néftis protegendo o corpo mumificado de Osíris ............... 192

57. Pino na parte inferior de estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris

para encaixe na base ................................................................ 193

58. Tampa da cavidade no topo da base em forma de falcão ............ 195

59. Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris de Horresnet com

tampa da cavidade no topo da base em forma de sarcófago ....... 196

60. Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris com base com listras ao redor .................................................................................... 198

61. Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris com base com

quadrados ao redor ................................................................... 198

62. Osíris de Verniz Preto com a abertura da cavidade tubular no meio da figura .......................................................................... 201

63. Parte de trás Ptah- Sokar-Osíris de Djehoutimes em forma de

caixão ....................................................................................... 203

64. Ptah-Sokar-Osíris com cavidade tipo caixão .............................. 203

65. Cavidade retangular no verso do toucado divino ....................... 203

66. Início do “Livro dos Mortos” ...................................................... 207

67. “Confissão Negativa” ................................................................ 210

68. Capítulo 125 do “Livro dos Mortos” ........................................... 210

69. O morto trabalhando no Campo de Oferendas .......................... 212

70. Pseudo “múmia-de-grãos” alongada .......................................... 213

71. Pseudo “múmia-de-grãos” em forma de pacote tubular ............. 214

72. “Cama de Osíris” de Maihirpre .................................................. 216

73. “Cama de Osíris” de Horemheb ................................................. 216

74. “Cama de Osíris de Tutankhamun” ........................................... 216

75. “Cama de Osíris de Tutankhamun” sem o envoltório ................. 216

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76. “Múmia-de-Grãos” .................................................................... 218

77. “Múmia-de-Grãos” .................................................................... 218

78. “Múmia-de-Grãos” .................................................................... 218

79. Caixão “Múmia-de-Grãos” ......................................................... 218

80. “Múmia-de-Grãos” .................................................................... 218

81. Tijolo de Osíris .......................................................................... 219

82. Tijolo de Osíris .......................................................................... 219

83. Tijolo de Osíris .......................................................................... 219

84. Tijolo de Osíris .......................................................................... 219

85. Osíris germinando .................................................................... 223

86. Colares de Cebola ..................................................................... 228

87. Festival de Sokar Cena I (Medinet Habu) ................................... 230

88. Festival de Sokar Cena II (Medinet Habu) .................................. 230

89. Festival de Sokar Cena III (Medinet Habu) ................................. 231

90. Festival de Sokar Cena IV (Medinet Habu) ................................. 231

91. Festival de Sokar Cena V e VI (Medinet Habu) ........................... 231

92. Festival de Sokar Cena VII (Medinet Habu) ............................... 232

93. Preparação da figura de Khenty-Amentet .................................. 235

94. Tumba figura de Sokar ............................................................. 235

95. Verso da estátua de Ptah-Sokar-Osíris W2051 .......................... 239

96. Figura feminina com vestido azul .............................................. 239

97. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 16 (frente) ...................................................................................... 250

98. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 16

(lado) ........................................................................................ 251

99. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 17 (frente) ...................................................................................... 252

100. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 17

(lado) ........................................................................................ 253

101. Falcão tampa estátua funerária Ptah-Sokar-Osíris .................... 254

102. Falcão tampa estátua funerária Ptah-Sokar-Osíris .................... 254

103. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 140

(frente) ...................................................................................... 255

104. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 140 (lado) ........................................................................................ 256

105. Comparação da inscrição observa por Kitchen (a) e Bielesch (b)

da estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181 ................... 257

106. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181 (frente) ...................................................................................... 259

107. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181

(lado) ........................................................................................ 260

108. Reconstituição estátua funerária de Osíris inv. 200 (frente) ....... 261

109. Reconstituição estátua funerária de Osíris inv. 200 (lado) ......... 262

110. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 203

(frente) ...................................................................................... 263

111. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 203

(lado) ........................................................................................ 264

112. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 204

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(frente) ...................................................................................... 266

113. Reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 204

(lado) ........................................................................................ 267

114. Osíris votivo inv. 199 (frente) .................................................... 268

115. Osíris votivo inv. 199 (verso) ..................................................... 268

116. Osíris votivo inv. 199 (lado) ....................................................... 269

117. Detalhe rosto Osíris votivo inv. 199 ........................................... 269

118. Detalhe mãos Osíris votivo inv. 199 .......................................... 269

119. Osíris votivo de bronze com base .............................................. 271

120. Osíris votivo de bronze .............................................................. 272

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Lista de Tabelas

Pág.

1. Diferenças regionais na iconografia de Osíris segundo Roeder ..... 102

2. Correspondência Tipologia .......................................................... 164

3. Comparação figuras de grãos ...................................................... 237

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Lista de Abreviaturas e Siglas

CT “Textos dos Caixões”

fig. figura

inv. Número de inventário

KV Tumbas reais do Vale dos Reis

LM “Livro dos Mortos”

N. nome do indivíduo a ser pronunciado junto com as fórmulas

p. página

pp. páginas

Pr. Prancha

PT “Textos das Pirâmides”

QV Tumbas do Vale das Rainhas

TT Tumbas da elite tebana

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SUMÁRIO

VOLUME I - TEXTO

INTRODUÇÃO ...................................................................................... 30

PARTE I – CONTEXTO HISTÓRICO ................................................. 37

CAPÍTULO 1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA .................................. 38

1.1 PERÍODO PÓS-AMARNIANO .............................................................. 38

1.2 III PERÍODO INTERMEDIÁRIO .......................................................... 45

1.3 PERÍODO SAÍTA ................................................................................ 53

1.4 BAIXA ÉPOCA ................................................................................... 60

1.5 PERÍODO PTOLOMAICO ................................................................... 63

PARTE II – DEUSES ....................................................................... 68

CAPÍTULO 2. PTAH .............................................................................. 69

CAPÍTULO 3. SOKAR ........................................................................... 82

CAPÍTULO 4. OSÍRIS ............................................................................ 99

CAPÍTULO 5. SINCRETISMO ................................................................ 116

5.1 SINCRETISMO: UM BREVE HISTÓRICO ............................................ 116

5.2 TIPOS DE SINCRETISMO .................................................................. 121

5.3 SINCRETISMO NA EGIPTOLOGIA ...................................................... 124

CAPÍTULO 6. PTAH-SOKAR-OSÍRIS ..................................................... 132

PARTE III – AS ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-

SOKAR-OSÍRIS .............................................................................. 144

CAPÍTULO 7. CLASSIFICAÇÃO ............................................................. 145

7.1 CLASSIFICAÇÕES INICIAIS DO SÉCULO XIX ............................... 145

7.2 A TIPOLOGIA RAVEN ........................................................................ 145

7.2.1 Tipo I – Estátuas de Verniz Preto ............................................. 146

7.2.2 Tipo II – Estátuas de Osíris Policromadas ................................ 147

7.2.3 Tipo III – Estátuas de Ptah-Sokar-Osíris com Face Verde ........ 148

7.2.4 Tipo IV – Estátuas de Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada .... 149

7.2.5 Classes Mistas ........................................................................ 150

7.3 ACRÉSCIMOS E CORREÇÕES DA TIPOLOGIA DE RAVEN ................ 151

7.3.1 Aston ...................................................................................... 151

7.3.2 Varga ...................................................................................... 153

7.3.3 Schoske .................................................................................. 153

7.3.4 Budka .................................................................................... 154

7.3.5 Ziegler .................................................................................... 155

7.3.6 Lipinska ................................................................................. 155

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7.4 NOVA CLASSIFICAÇÃO ..................................................................... 156

7.4.1 Tipo 1. Osíris Policromado ...................................................... 156

7.4.2 Tipo 2. Osíris de Verniz Preto .................................................. 157

7.4.3 Tipo 3. Osíris com Face Verde ................................................. 158

7.4.4 Tipo 4. Ptah-Sokar-Osíris com Face Verde .............................. 158

7.4.5 Tipo 5. Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada e Tronco

Vermelho ......................................................................................... 159

7.4.6 Tipo 6. Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada e Tronco Preto ... 161

7.4.7 Tipo 7. Ptah-Sokar-Osíris com Tronco Branco ......................... 162

7.4.8 Tipo 8. Ptah-Sokar-Osíris Folhados a ouro ............................. 163

7.4.9 Tipo 9. Ptah-Sokar-Osíris Sem Pintura ou Monocromáticos ..... 163

7.4.10 Tipo 10. Shabti transformado em Ptah-Sokar-Osíris ............. 163

7.4.11 Tipos Mistos ......................................................................... 164

CAPÍTULO 8. PREDECESSORES .......................................................... 165

CAPÍTULO 9. CORES ........................................................................... 171

9.1 VERDE .............................................................................................. 171

9.2 PRETO .............................................................................................. 171

9.3 VERMELHO ...................................................................................... 172

9.4 DOURADO ........................................................................................ 173

9.5 AMARELO ......................................................................................... 173

9.6 BRANCO ........................................................................................... 173

9.7 AZUL ................................................................................................. 173

CAPÍTULO 10. ICONOGRAFIA DA ESTÁTUA ............................................ 175

10.1 COROAS E ADORNOS DE CABEÇA ................................................. 175

10.1.1 Coroa HDt (Coroa Branca) ....................................................... 175

10.1.2 Coroa Atf ................................................................................ 175

10.1.3 pA-sHmty (Coroa Dupla) ............................................................ 176

10.1.4 Coroa Swty ............................................................................. 176

10.1.5 Coroa hmhm ........................................................................... 177

10.1.6 Toucado Divino ou Tripartite ................................................. 177

10.1.7 Nemés .................................................................................. 177

10.2 BARBA DIVINA ................................................................................ 177

10.3 CETROS .......................................................................................... 178

10.4 VESTIMENTA .................................................................................. 180

10.5 REDE DE CONTAS .......................................................................... 181

10.6 COLARES ........................................................................................ 183

10.6.1 Colar wsx .............................................................................. 183

10.6.2 Peitoral ................................................................................. 185

10.7 DIVINDADES ................................................................................... 186

10.7.1 Nut ....................................................................................... 186

10.7.2 Khepri .................................................................................. 189

10.7.3 Filhos de Hórus .................................................................... 190

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10.7.4 Ísis ....................................................................................... 191

10.7.5 Néftis .................................................................................... 192

CAPÍTULO 11. A BASE ......................................................................... 193

11.1 TOPO DA BASE ............................................................................... 194

11.1.1 Lago ..................................................................................... 194

11.1.2 Falcão ................................................................................... 194

11.1.3 Sarcófago .............................................................................. 195

11.1.4 Flor de Lótus ........................................................................ 197

11.2 REDOR DA BASE ............................................................................ 197

11.2.1 Listras .................................................................................. 198

11.2.2 Quadrados ............................................................................ 199

11.2.3 Símbolos Hieroglíficos Decorativos ........................................ 199

11.2.4 Serekh .................................................................................. 200

CAPÍTULO 12. CAVIDADES ................................................................. 201

12.1 CAVIDADE TUBULAR NO TRONCO ................................................. 201

12.2 CAVIDADE RETANGULAR NO VERSO DO TRONCO ........................ 202

12.3 CAVIDADE NA LATERAL DA BASE .................................................. 202

12.4 ESTÁTUA TIPO CAIXÃO .................................................................. 202

12.5 CAVIDADE RETANGULAR NO VERSO DO TOUCADO DIVINO ......... 203

12.6 CAVIDADE NO PILAR DORSAL ........................................................ 204

12.7 CAVIDADE NO TOPO DA BASE ....................................................... 204

CAPÍTULO 13. CONTEÚDO .................................................................. 205

13.1 LIVRO DOS MORTOS ...................................................................... 205

13.2 PSEUDO “MÚMIAS DE GRÃOS” ...................................................... 213

13.2.1 Outros Tipos de Figuras de Grãos encontradas no Contexto

Funerário ........................................................................................ 214

13.2.2 O Festival de Khoiak ............................................................. 220

13.2.2.1 Os Dias e Acontecimentos do Festival de Khoiak ..... 224

13.2.2.2 As Figuras de Grãos do Festival ............................... 234

13.3 EXCEÇÕES ..................................................................................... 237

CAPÍTULO 14. INSCRIÇÕES ................................................................ 240

14.1 LOCAL DAS INSCRIÇÕES ................................................................ 240

14.2 TIPOS DE INSCRIÇÕES ................................................................... 241

14.2.1 Proscinema ........................................................................... 242

14.2.2 Recitação .............................................................................. 242

14.2.3 Invocação do Morto ............................................................... 242

14.2.4 Hino a Ptah-Sokar-Osíris ...................................................... 243

CAPÍTULO 15. PROVENIÊNCIA ............................................................ 245

CAPÍTULO 16. AS ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRÍS E PTAH-

SOKAR-OSÍRIS DA COLEÇÃO DO MUSEU NACIONAL/UFRJ – RIO DE

JANEIRO ............................................................................................. 247

16.1 MN-1 (inv. 16) …………………………………………………………………… 248

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16.2 MN-2 (inv. 17) …………………………………………………………………… 249

16.3 MN-3 (inv. 140) …………………………………………………………………. 249

16.4 MN-4 (inv. 181) ............................................................................... 257

16.5 MN-5 (inv. 200) ............................................................................... 258

16.6 MN-6 (inv. 203) ............................................................................... 258

16.7 MN-7 (inv. 204) ............................................................................... 265

16.8 Osíris Votivo (inv. 199) .................................................................... 265

CONCLUSÃO ....................................................................................... 273

REFÊRENCIAS ..................................................................................... 277

FONTE FIGURAS ................................................................................. 292

APÊNDICES ......................................................................................... 299

APÊNDICE A – DIFERENTES FORMAS DE ESCRITA DO NOME PTAH-

SOKAR-OSÍRIS .............................................................................................. 300

APÊNDICE B – CORRESPONDÊNCIA NÚMERO CATÁLOGO E NÚMERO DE

INVENTÁRIO .................................................................................................. 302

APÊNDICE C – TABELA TIPOLOGIA ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E

DE PTAH-SOKAR-OSÍRIS RAVEN................................................................... 303

APÊNDICE D – TABELA NOVA TIPOLOGIA ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE

OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS ..................................................................... 306

APÊNDICE E - ESTÁTUAS COM COLAR wsx n bik ............................................ 309

APÊNDICE F – ESTÁTUAS SEM BASE ........................................................... 310

APÊNDICE G – FRISOS DECORATIVOS BASE ............................................... 311

APÊNDICE H – TOPO DA BASE ..................................................................... 313

APÊNDICE I – TIPOS DE CAVIDADES ............................................................ 314

APÊNDICE J - TABELA EVENTOS FESTIVAL DE KHOIAK .............................. 316

APÊNDICE K - PEÇAS DO CATÁLOGO DE REFÊRENCIA COM

PROVENIÊNCIA CONHECIDA OU PROVÁVEL ................................................ 324

ANEXOS .............................................................................................. 325

ANEXO A – PROVENIÊNCIA CONHECIDA DE ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE

OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS ANALISADAS POR RAVEN (1978-1979, pp.

291-292) ........................................................................................................ 326

VOLUME II – CATÁLOGOS

INTRODUÇÃO CATÁLOGOS ................................................................. 343

I. CATÁLOGO MUSEU NACIONAL/UFRJ .............................................. 344

II. CATÁLOGO DE REFERÊNCIA .......................................................... 353

VOLUME III – PRANCHAS

I. PRANCHAS CATÁLOGO MUSEU NACIONAL/UFRJ ........................... 480

II. PRANCHAS CATÁLOGO DE REFERÊNCIA ....................................... 498

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INTRODUÇÃO

Para os antigos egípcios, a morte não representava o fim. Ela era

apenas o início de uma jornada, que, se bem sucedida lhe permitir-lhe-ia

unir-se a Osíris, Senhor do Mundo dos Mortos, e acompanhar o deus-sol em

sua barca, em sua viagem diária pelos céus. Esta jornada apresentava

muitos perigos pelo caminho, os quais deveriam ser vencidos pelo morto. O

maior desafio enfrentado era o julgamento de sua alma pelo Tribunal de

Osíris. Caso houvesse cometido mais pecados do que ações boas em vida, ele

viria a sofrer a segunda morte, ou seja, a morte definitiva.

Para ajudar o morto a vencer os desafios impostos por essa jornada, os

antigos egípcios criaram um rico aparato de acompanhamentos funerários

ao longo de sua existência. O tema central da presente dissertação de

mestrado consiste justamente no estudo de um grupo desses artefatos para

favorecer o renascimento, as estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-

Osíris, em especial os exemplares presentes na coleção egípcia pertencente

ao Museu Nacional/UFRJ.

As estátuas funerárias de Osíris irão surgir dentro do contexto

religioso do Período Pós-Amarniano, quando temos a retomada da antiga

religião, após o “monoteísmo” imposto por Akhenaton. O Atonísmo não deixa

de influenciar o pensamento egípcio, passando o mesmo por alterações. Os

deuses passam a interagir diretamente com as pessoas, não tendo mais o

faraó o papel de intermediário entre o mundo humano e o divino. No

contexto funerário, essa mudança também pode ser vista nas tumbas de

particulares, na medida em que as cenas da vida cotidiana são substituídas

por outras do morto interagindo com os deuses, cenas essas antes restritas

às tumbas faraônicas. Um deus ganha destaque especial no contexto

funerário: Osíris.

Segundo os mitos envolvendo Osíris, este deus é o primeiro a renascer

após ter sido assassinado por seu irmão Seth. Sua ressurreição é efetivada

pelo processo de mumificação realizado pelo deus Anúbis e os rituais

mágicos de sua irmã e esposa Ísis. Ele irá tornar-se o Primeiro dos

Ocidentais, ou seja, o Senhor do Mundo dos Mortos. O desejo do morto é

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justamente o de obter o mesmo destino alcançado por Osíris. As estátuas

funerárias de Osíris são assim uma representação do deus, cujo destino

serve como modelo a ser seguido pelos mortos. Em seu interior, muitas

dessas estátuas contém um exemplar do “Livro dos Mortos”, o qual servia

como um guia para uma jornada bem sucedida ao Outro Mundo, assim

podendo o morto unir-se a Osíris.

No III Período Intermediário quando a atenção é voltada para o caixão,

e o equipamento funerário que acompanha o morto reduz-se drasticamente a

apenas alguns itens essenciais, as estátuas funerárias de Osíris

permanecem. Na XXI Dinastia elas atingem o seu ápice, sendo encontradas

em uma grande quantidade de tumbas. Estas em geral pertenciam a pessoas

que exerciam cargos sacerdotais ou estavam ligadas ao Templo de Amun. Na

XXII Dinastia, com o desaparecimento do “Livro dos Mortos”, as estátuas

funerárias de Osíris como receptáculo para a guarda deste também

desaparecem.

Por volta da XXV Dinastia, com a volta de um equipamento funerário

mais numeroso e da construção de grandes complexos funerários, o conceito

das estátuas funerárias de Osíris reaparece na figura de suas sucessoras, as

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris. Em seu interior essa estátua da

forma sincrética de Osíris agora geralmente contém uma pseudo “múmia-de-

grãos”. Dessa forma, o morto passa a estar conectado com rituais do Festival

de Khoaik, que encenavam o renascimento de (Ptah-Sokar-)Osíris e nos

quais era fabricada uma figura de grão semelhante à encontrada no interior

das estátuas.

No final da Baixa Época e no Período Ptolomaico, o simbolismo da

estátua de Ptah-Sokar-Osíris como um agente do renascimento é reforçado

com novos elementos adicionados a sua decoração e a inscrição com o hino

à Ptah-Sokar-Osíris. Estes não remetem mais apenas ao contexto osíriaco do

pós-vida, mas também ao solar. Assim, a estátua funerária de Ptah-Sokar-

Osíris passa a ser um retrato do morto que foi bem sucedido em todas as

etapas de sua jornada para a outra vida; ele se tornou um Justo de Voz

perante Osíris e um Glorificado perante Rê. Justamente após atingir o ápice

do seu simbolismo como um agente do renascimento, a estátua funerária de

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Ptah-Sokar-Osíris irá desaparecer no final do Período Ptolomaico com o

aumento da helenização dos costumes funerários.

A arqueologia cognitiva, definida por Kent Flannery e Marcus Joyce

como:

O estudo de todos os aspectos da cultura antiga que são o produto da mente humana: a percepção, descrição, e classificação do universo (cosmologia); a natureza do sobrenatural (religião); os princípios, filosofias, éticas, e valores em que sociedades humanas são governadas (ideologia); as maneiras em que aspectos do mundo, o sobrenatural, ou valores humanos são transportados na arte (iconografia); e todas as outras formas do comportamento simbólico e intelectual que sobrevive no registro arqueológico.

(1998, pp. 36-37)

É o ponto de vista sob o qual objetivamos elucidar o significado das estátuas

funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, compreendendo a importância de

sua introdução no cenário funerário-religioso a partir do final do Novo

Império até o Período Ptolomaico (c. 1293 a.C.-30 a.C.). As mesmas devem

ser vistas como a materialização simbólica do pensamento egípcio em sua

relação com o sobrenatural.

Segundo Weeks (1979, p. 61) muitos estudiosos ao tratarem dos

aspectos funerários tratam apenas de seu aspecto material, ignorando a sua

natureza não-material. Nossa intenção aqui é estudar tanto a natureza

material das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, quanto a sua

natureza não-material, dando maior atenção a este último aspecto, através

da análise da composição de seu simbolismo como um agente para o

renascimento.

Aqui devemos levar em conta que os egípcios não possuíam a

concepção de arte moderna, sua noção de arte era a de que ela deveria ser

útil. Para os egípcios, as representações pictóricas e a escrita interagem

uma com a outra na formulação de um significado. Na medida em que a arte

é útil, devemos supor que existia uma categorização, havendo uma seleção

do que deveria ser representado, e que existiam atributos específicos para a

representação selecionada. Assim, as estátuas funerárias de Osíris e Ptah-

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Sokar-Osíris são a construção de atributos cuidadosamente selecionados

para a representação do renascimento do morto.

Para a realização deste objetivo, a presente dissertação foi dividida em

três volumes: o volume I consiste da parte textual com a interpretação das

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, as quais estão baseadas

principalmente nos exemplares pertencentes ao Museu Nacional/UFRJ e em

um catálogo de referência por nós elaborado, cujas fichas de ambos

compõem o volume II, e o volume III é composto pelas pranchas com as

imagens dos exemplares do catálogo do Museu Nacional/UFRJ e do catálogo

de referência do volume anterior.

O volume I foi dividido em três partes para melhor compreensão dos

temas tratados.

A parte I compreende o contexto histórico no qual as estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris estão inseridas. Entende-se a necessidade

desse primeiro capítulo pelo pouco conhecimento à respeito do aspecto

religioso dessa fase da história do Egito antigo, em especial no Brasil.

Quando olhamos a história do Egito antigo, observamos que em muitos

livros ela termina onde começa o nosso recorte temporal, o fim do Novo

Império. O III Período Intermediário e a Baixa Época, muitas vezes vistos

como uma “Idade das Trevas”, são descartados como um período de pouca

importância. Estes estudos em geral levam em conta apenas o aspecto

político desse período, quando o Egito encontra-se fragmentado sob o

governo de vários monarcas paralelos ou governantes estrangeiros. Mas,

como vem mostrando uma série de descobertas feitas ao longo das últimas

décadas, na esfera cultural o Egito permanecia unido em suas crenças e

todo um novo repertório religioso é criado. O Período Ptolomaico, onde

termina o nosso recorte temporal, geralmente é apenas lembrado pelo

governo da famosa rainha Cleópatra VII, retratada em tantos romances e

filmes.

A parte II – Deuses, procura primeiramente nos capítulos 2 a 4 fazer

um breve estudo dos deuses os quais compõem o deus sincrético Ptah-

Sokar-Osíris, representado em nossas estátuas. Assim, temos uma melhor

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compreensão de seus aspectos em comum os quais permitem que um deus

“habite” os outros. Logo após, no capítulo 5, fazemos uma breve síntese

sobre os estudos acerca do sincretismo, na intenção de verificar se o mesmo

se aplica à união que origina o deus Ptah-Sokar-Osíris. Aqui são levados em

conta tanto os estudos feitos nas Ciências Humanas como um todo e aqueles

feitos pela Egiptologia. O último capítulo dessa parte irá tratar do deus Ptah-

Sokar-Osíris. Neste se aplicam os conceitos vistos no capítulo anterior e,

como no caso dos deuses Ptah, Sokar e Osíris tratados nos três primeiros

capítulos dessa parte, procuramos fazer um breve histórico seu

compreendendo, entre outros, as suas representações, funções e lugares de

culto.

A parte III irá tratar especificamente das estátuas funerárias de Osíris

e Ptah-Sokar-Osíris. O capítulo 7 trata do histórico feito a respeito. Através

deste podemos observar que o estudo destas estátuas já despertava o

interesse dos estudiosos desde o início da egiptologia. Assim, temos no

século XIX as primeiras interpretações a respeito, as quais tiveram por

mérito principal a divisão entre estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-

Osíris. Esta divisão terminológica continua a ser usada até hoje e por tanto,

também foi aplicada na presente dissertação. O conteúdo das estátuas

muitas vezes não era propriamente analisado, sendo as pseudo “múmias-de-

grãos” interpretadas como partes mumificadas do morto ou pequenos

animais mumificados.

O principal trabalho de referência sobre o tema será a tipologia

publicada por Raven em 1978-1979. Ele irá dividir as estátuas em cinco

tipos: Tipo I – Osíris de Verniz Preto, Tipo II – Osíris Policromado, Tipo III –

Ptah-Sokar-Osíris com Face Verde, Tipo IV – Ptah-Sokar-Osíris com Face

Dourada e um Tipo Misto, no qual Raven coloca os exemplares que não se

encaixam nas demais classes. Detendo-se em características específicas

dentro de cada tipo, ele faz subdivisões, as quais variam de quantidade de

um tipo para outro. Em outro artigo de 1982, ele irá fazer um estudo mais

profundo das pseudo “múmias-de-grãos” encontradas no interior das

estátuas de Ptah-Sokar-Osíris e demais figuras de grãos existentes. Através

de exames ele confirma as observações de Leemans (1840) de serem grãos de

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cereais o conteúdo dessas pseudo-múmias, demonstrando serem errôneas

as outras propostas para o seu conteúdo.

A Tipologia proposta por Raven serve como referência até os dias

atuais, mas publicações posteriores a sua demonstram a necessidade de se

fazer certas correções. Aqui se destacam os trabalhos de Aston (1992), Varga

(1995) e Budka (2003). Outros artigos, como os de Schoske (2001), Ziegler

(2003) e Lipinska (2007), apresentam peças de tipos inéditos à tipologia de

Raven.

Levando em conta estas correções e novos exemplares, propomos no

final desse capítulo uma nova classificação, ilustrada pelo catálogo de

referência no volume II. A tipologia de Raven foi usada como base, sendo por

nós feita uma nova divisão dos tipos, para que os exemplares e correções na

datação pudessem compreender uma ordem cronológica.

O capítulo 8 trata dos possíveis predecessores das estátuas funerárias

de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Estes compreendem um grupo especifico de

shabti, que possui uma base, e estátuas de formato semelhante às de Osíris

e Ptah-Sokar-Osíris, encontradas nas tumbas reais da XVIII Dinastia.

O capítulo 9 trata da simbologia das cores utilizadas nas estátuas.

Estas, em sua maioria, remetem ao universo osíriaco e funerário.

O capítulo 10 compreende o estudo dos diferentes elementos que

compõem as estátuas, e o capítulo 11 aqueles que compõem a base. Estes

em sua maioria são símbolos de proteção e renascimento, reforçando o

simbolismo da estátua.

O capítulo 12 trata dos diferentes tipos de cavidades encontradas

tanto no tronco como na base das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-

Sokar-Osíris.

O conteúdo dessas cavidades é abordado no capítulo 13. No interior

das estátuas funerárias de Osíris comumente encontramos um exemplar do

“Livro dos Mortos”, e no interior das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-

Osíris uma pseudo “múmia-de-grãos”. Aqui fazemos uma breve análise dos

outros tipos de “múmias-de-grãos” encontradas no contexto funerário e a

sua ligação com as figuras de grãos fabricadas durante o Festival de Khoiak.

Encerrando estes capítulos, tratamos de exceções encontradas no interior de

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estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, entre as quais estão

papiros diferentes daquele do “Livro dos Mortos” e uma figura feminina com

um vestido azul.

O capítulo 14 trata das inscrições encontradas sobre as estátuas.

Estas podem ser compostas de inscrições comuns em objetos funerários,

como a fórmula de oferendas ou a invocação à Osíris ou ao morto. Nos

exemplares tardios encontramos a inscrição do hino à Ptah-Sokar-Osíris, o

qual é o único hino conhecido em homenagem a este deus.

A proveniência das estátuas é abordada no capítulo 15.

O último capítulo dessa parte trata especificamente das estátuas de

Osíris e Ptah-Sokar-Osíris da coleção egípcia do Museu Nacional/UFRJ.

Aqui se encontram as informações que puderam ser obtidas com a sua

análise e as reconstituições, quando possíveis.

Para facilitar a leitura, as citações em língua estrangeira foram todas

traduzidas para o português.

Os números entre colchetes [ ] fazem menção às peças do catálogo de

referência. Os números entre colchetes que possuem a sigla MN à sua frente

pertencem ao catálogo com os exemplares do Museu Nacional/UFRJ.

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PARTE I

CONTEXTO HISTÓRICO

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CAPÍTULO 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA

As estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris são encontradas

no final da história do Egito antigo por um período de cerca de 1300 anos. O

cenário que encontramos a nossa frente é o do final de uma época gloriosa,

sob o reinado dos faraós ramessidas, sucedendo-se um período de

instabilidade marcado pela descentralização política, com o surgimento de

governadores locais e a sucessiva dominação do Egito por povos

estrangeiros: Líbios, Núbios (Kushitas), Assírios, Persas e, por fim, a

dominação grega por Alexandre, o Grande, dando início ao Período

Ptolomaico.

1.1 PERÍODO RAMESSIDA

O Período Ramessida compreende as XIX e XX Dinastias, sendo seu

nome originário dos onze faraós de nome Ramessés, os quais reinaram

durante este período. A primeira dinastia é marcada por um período de

prosperidade, com relativamente poucos conflitos, enquanto a segunda é

marcada por constantes conflitos e pela crescente perda de poder da

administração central, criando o cenário de um Egito dividido, o qual dará

origem às varias dinastias paralelas do III Período Intermediário.

O início desse período é marcado pelo retorno à religião tradicional,

abolida por Akhenaton em substituição ao deus único Aton no período

anterior. A restauração é iniciada no final da XVIII Dinastia por

Tutankhamun, logo após um curto período depois da morte de Akhenaton.

Os altos comandantes da administração egípcia2, os quais sucedem

Tutankhamun e também são os primeiros reis da XIX Dinastia, irão dar

continuidade a esse programa. Séthi I será aquele que fará os maiores

esforços para a restauração dos templos egípcios e a destruição dos vestígios

do atonísmo. Akhenaton e seus sucessores serão abolidos das listas reais,

constando nestas Horemheb como o sucessor direto de Amenhotep III.

2 Horemheb, um destes altos funcionários, pode ser considerado o último faraó da XVIII Dinastia ou o primeiro faraó da XIX Dinastia, dependendo da visão de autor para autor.

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Apesar dos vestígios materiais desse curto tempo de monoteísmo terem

sido apagados, a religião e a cultura egípcia do Período Pós-Amarniano foi

marcada por inovações, as quais tiveram a suas origens na religião de

Amarna. A questão da existência de um único deus foi unida à

multiplicidade de deuses, a qual havia sido abolida por Akhenaton. Assim,

“Amun-Rê se tornou o deus universal, transcendental, o qual existia em um

lugar distante, independente de sua criação; os outros deuses e deusas eram

aspectos seus, eles eram suas manifestações imanentes.” (VAN DIJK, 2003,

p. 305) O faraó deixa de ser o representante divino do deus na terra,

tornando-se seu subordinado, como os outros seres humanos, pois agora o

deus revela o seu desejo diretamente a todos os seres humanos e intervêm

diretamente nos eventos e no curso da história. Com isso, o rei adquire um

caráter mais humano, perdendo parte de seu poder. Está nova posição pode

ser observada na forma de agir dos primeiros governantes da XIX Dinastia. A

legitimação de sua subida ao trono não é confirmada como o rei sendo um

descendente da família divina do deus Amun, como ocorria

tradicionalmente. O futuro faraó é escolhido pelo deus local de sua cidade

natal e apresentado para Amun como candidato ao trono, este último aprova

a escolha do candidato em uma manifestação pública durante o seu festival.

(VAN DIJK, 2003, p. 285)

A perda do poder divino do faraó irá culminar em um movimento

religioso conhecido como “devoção pessoal”. Este movimento que já aparece

como um fenômeno local restrito a Tebas no Período Pré-Amarniano espalha-

se em todo o Egito no Período Ramessida. Como o deus agora pode se

manifestar em todos os locais e entrar em contato direto com seus devotos,

as preces dirigidas aos deuses antes por intermediário do faraó agora são

dirigidas diretamente aos deuses. Muitos pedidos aos deuses podem ser

encontrados inscritos em estelas votivas e ostracos. Os oráculos, antes

consultados exclusivamente pelo faraó, passam a ser consultados pela

população em geral para a resolução dos mais variados assuntos durante a

procissão do deus. (ASSMANN, 2001, pp. 4-5; VAN DIJK, 2003, pp. 305-307)

A “devoção pessoal” também teve a sua influência no contexto

funerário. A tumba passou a ser concebida na forma de um pequeno templo,

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no qual o morto expressava sua devoção pessoal aos deuses. Dois deuses se

destacam em especial aqui: Rê e Osíris. É o desejo do morto unir-se aos

devotos seguidores de Osíris no Mundo Inferior e participar da jornada diária

do deus-sol em sua barca.

A superestrutura da tumba tinha uma associação solar. No topo da

capela encontrava-se uma pequena pirâmide de tijolos com um nicho para

conter uma estela inscrita com hinos ao deus-sol e coroada com um

piramidion com cenas do morto adorando Rê e Osíris. A capela, as suas salas

internas e o pátio murado eram o local de culto aos deuses e dos ritos

funerários ao morto. A parte subterrânea da tumba, constituída por uma

passagem em declive e a câmara funerária, estava associada a Osíris e seus

domínios no Mundo Inferior. (Fig. 1) (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, pp. 92-

94)

Figura 1 – Modelo de tumba particular do Período Ramessida cuja superestrutura é concebida na forma de um templo.

(SILIOTTI, 1997, p. 133)

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As paredes das tumbas, antes decoradas com cenas da vida cotidiana

e da profisão do morto, passam a representar cenas de adoração dos deuses.

Cenas do “Livro dos Mortos” e outros textos funerários passam a aparecer

nas paredes de tumbas privadas. Este fenômeno, visto inicialmente nas

tumbas dos trabalhadores de Deir el-Medina, logo passa ser representado

nas demais tumbas.

Nos caixões e nas cartonagens colocadas sobre a múmia podem ser

encontradas cenas semelhantes às das paredes das tumbas. Dessa forma

temos entre os registros de hieróglifos cenas do morto adorando os deuses e

rituais funerários. Estas cenas eram pintadas em cores vivas, predominando

o vermelho e o azul sobre um fundo amarelo. O fundo das imagens nas

cartonagens muitas vezes era vazado, deixando aparecer as bandagens. Ao

mesmo tempo surgem caixões, cartonagens e shabtis que representam o

morto com os penteados e as roupas usadas no cotidiano. (TAYLOR, 1989,

pp. 35-39)

A tumba era preenchida com um rico aparato funerário, consistindo

tanto de objetos usados em vida como roupas, móveis, utensílios de higiene

e beleza, como por objetos de uso exclusivamente funerário, entre os quais

se encontravam vasos canopos, shabtis e ferramentas para a realização do

ritual de Abertura da Boca. Neste período também começam a aparecer as

primeiras estátuas funerárias de Osíris com um papiro do “Livro dos Mortos”

em seu interior. Assim como os demais objetos funerários da época, estes

possuíam uma rica policromia.

As tumbas reais do Período Ramessida no Vale dos Reis adquirirem

um eixo reto constituído de uma série de corredores, passagens e câmaras,

com a intenção de reproduzir o caminho percorrido pelo deus-sol no Mundo

Inferior e por conseqüência pelo faraó morto. Em suas paredes, novos textos

funerários como o “Livro dos Portões”, o “Livro dos Céus”, o “Livro da Vaca

Celeste”, o “Livro das Cavernas” e o “Livro da Terra” irão ilustrar essa

jornada. O ponto alto dessa viagem consiste na união do deus-sol com

Osíris, Senhor do Mundo dos Mortos. Com essa união, Osíris torna-se o sol

noturno que acorda os mortos de seu sono, e Rê regenera as suas forças

para poder derrotar os seus inimigos e poder renascer revigorado ao

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amanhecer na forma do deus Khepri. (HORNUNG, 1993, pp. 85-87, 1991,

pp. 94-101) Estes livros podem ser vistos como um contraponto à abolição

do Mundo dos Mortos por Akhenaton, sendo visto como um guia do que

pode ser encontrado nesse Mundo Inferior reintegrado ao imaginário

religioso egípcio (ASSMANN, 2003, p. 18).

As ameaças vindas do estrangeiro, apesar da perda de alguns

territórios na Sírio-Palestina, conseguiram ser controladas nos anos iniciais

desses reis. No reinado de Séthi I temos as primeiras tentativas de incursões

líbias pela borda ocidental do Egito. O grande oponente da época era

formado pelo Império Hitita. Entre os conflitos enfrentados por Ramessés II

contra este está a famosa batalha de Qadesh, conhecida pela detalhada

descrição tanto em fontes egípcias como hititas. Posteriormente, em seu

décimo-sexto ano de reinado, Ramsés II irá assinar o primeiro acordo de paz

conhecido na história com Hattusili III, rei dos Hititas, frente ao surgimento

de um novo poderoso inimigo na Ásia, os Assírios.

Ramssés II transfere a capital de Mênfis para Pi-Ramessés, cidade

recém-fundada no Delta por seu pai Séthy I. A cidade tinha uma localização

estratégica, situada perto da estrada que levava para o forte fronteiriço de

Sile e para as províncias na Palestina e na Síria, permitindo combater com

rapidez qualquer insurreição surgida nesta parte. E também estava

localizada às margens do braço Pelusiástico do Nilo, dando fácil acesso

marítimo; dessa forma logo se tornando um importante centro de comércio

internacional. Pi-Ramessés se manterá como a capital do Egito até o final do

Novo Império. (SHAW; NICHOLSON, 1995, pp. 202 e 237)

A prosperidade e paz alcançadas por Ramessés II em seu longo reinado

de aproximadamente sessenta e sete anos foram abaladas por sua morte.

Devido a sua idade avançada, Ramessés II chegou a enterrar muitos de seus

filhos candidatos à sucessão do trono. Merenptah, o filho que sucedeu

Ramessés II, devido a sua idade também já avançada reinou por apenas

alguns anos. O fim da XIX Dinastia foi então marcado pelo governo de reis

incapazes de sustentar as proezas alcançadas por Ramssés II, e conflitos

sucessórios surgiram.

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Na XX Dinastia, Ramessés III foi o último grande faraó a reinar

durante o Novo Império. Ele foi bem sucedido em suas campanhas contra os

líbios, cujas imigrações para o Egito se tornavam cada vez mais constantes,

e contra os Povos do Mar. Estes últimos transformaram toda a paisagem do

Oriente Médio, derrotando grandes impérios, como os Hititas. Os egípcios

foram os únicos que conseguiram derrotar os Povos do Mar. Uma tentativa

anterior de invasão por parte destes já havia falhado no reinado de

Merenptah.

Ramessés III tinha uma clara intenção de imitar o seu bem sucedido

antecessor de mesmo nome: Ramessés II. Além de seu nome ser igual ao

deste, os nomes de seus filhos eram os mesmos dos de Ramessés II. Na

arquitetura e nos relevos dos templos procurou igualmente imitar seu

antecessor. Aqui destaca-se a construção de seu Templo Memorial em

Medinet Habu, que era uma imitação do Ramesseum. Em seu interior temos

uma das representações mais completas das cenas do festival de Sokar,

realizado durante o mês de Khoiak. Apesar dos esforços nem ele, nem

nenhum outro faraó conseguiu superar a quantidade de obras realizadas por

Ramessés II espalhadas por todas as cidades do Egito e também na Núbia.

O Grande Papiro Harris menciona que uma grande porção de terras

foi doada aos templos, em especial ao templo de Amun em Karnak, por

Ramessés III. Ao final de seu reinado, um terço da terra cultivável pertencia

aos templos, e destas, três quartos pertenciam a Amun em Tebas. Este fator

levou à perda do controle das finanças do Estado e a uma crise econômica

gerada pelo aumento do preço dos grãos. Agora, Templo e Estado interagiam

para administrar a terra, mas o templo de Amun virtualmente tomou conta

do poder no Alto Egito. (BAINES; MALEK, 2000, p. 47; VAN DIJK, 2003, p.

298)

O reinado dos últimos faraós da XX Dinastia, todos de nome

Ramessés, foi marcado por uma crise crescente. Os territórios da Sírio-

Palestina foram todos perdidos, e a importância da Núbia declina. Exceto

pelo templo de Khonsu em Karnak, nenhum outro templo de grande

importância foi construído. Principalmente a região de Tebas vinha sofrendo

com constantes saques de tribos líbias vindas do Deserto Ocidental. Relatos

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de saques a tumbas passam a ser freqüentes. Os roubos muitas vezes eram

realizados pelos artesãos, cujos antepassados construíram estas tumbas.

(SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 202)

O ápice da crise pode ser visto no reinado de Ramessés XI, o último rei

do Novo Império, quando o vice-rei da Núbia, Panehsy, incursionou com

tropas núbias na região tebana sob o pretexto de instaurar a lei e a ordem

abaladas pelos constantes assaltos líbios. Por sua crescente tomada do

poder local, Panehsy entrou em conflito com o sumo sacerdote de Amun

Amenhotep, principal possuidor das terras locais, gerando uma guerra civil.

Tendo posteriormente avançado até Hardai no Médio Egito, foi derrotado

pelo exército do faraó comandado pelo general Piankh, retirando-se para a

sua residência em Aniba na Baixa Núbia. Em Tebas, Piankh assume os

títulos de Pahensy, de Vizier, e, após a morte de Amenhotep, o título de

Sumo Sacerdote de Amun. Dessa forma ele une em uma só pessoa os três

maiores cargos do Egito. Após a sua morte, seu filho adotivo Herihor assume

todos os seus cargos. Herihor aumentou seu status acima de qualquer um

de seus antecessores, retratando-se como rei no complexo de templos de

Karnak, e resepultando Séthi I e Ramessés II, na intenção de mostrar que

era um legítimo faraó. (BAINES; MALEK, p. 47; BRANCAGLION JUNIOR,

2009, informação verbal3; VAN DIJK, 2003, p. 302)

O wHm mswt, a Repetição dos Renascimentos, um sistema alternativo de

datação, o qual indicava que uma nova maat fora estabelecida após um

período de caos, foi adotada na região tebana. Este marcava uma cronologia

alternativa aos anos de reinado do faraó. Assim o Egito passou virtualmente

a ser governado por dois faraós, montando o padrão para o próximo período

da história do Egito. (BAINES; MALEK, p. 47; BRANCAGLION JUNIOR, 2009,

informação verbal4; VAN DIJK, 2003, p. 302)

3 Arqueologia e História do Egito Antigo II. Curso do mestrado em Arqueologia. Museu Nacional/UFRJ. Aula ministrada em: 08 jul. 2009. 4 Ibidem.

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45

1.2 III PERÍODO INTERMEDIÁRIO

Este período é marcado por uma crescente descentralização política. O

poder agora está nas mãos de governantes locais, não se encontrando mais

centrado na figura do Faraó como nos períodos anteriores da história do

Egito. Muitos desses governantes têm uma origem estrangeira.

As fontes sobre o período também são escassas. Até o presente

momento não foram encontradas listas com os nomes dos reis das XXI-XXV

Dinastias, sendo nossa melhor fonte Manetho. Mas este baseou seus escritos

apenas em fontes do Delta. A dificuldade também consiste no fato de que

muitos dos governantes da época possuíam nomes ou títulos iguais, sendo

difícil saber se diferentes fontes referem-se à mesma pessoa ou a pessoas

diferentes. Da cultura material, a maioria provém de Tebas, sendo formada

principalmente por estatuária privada e material funerário. (TAYLOR, 2003,

p. 324-5) No Delta existe pouco material preservado, devido principalmente

às condições desfavoráveis do solo local para a preservação e as poucas

escavações feitas na região. Outro fator pode ser os constantes conflitos na

região, os quais teriam levado à destruição de muitas construções locais.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. XIV)

A fragmentação política resultante do enfraquecimento do poder do rei

ocorreu devido a um encadeamento de fatores, entre os quais podemos

destacar: a atribuição, por parte do rei, de poderes importantes a familiares

e governantes locais, criando ímpeto para a formação de poderes locais e o

controle de recursos econômicos por estes. Assim, cargos importantes como

o de Vizier e Supervisor dos Tesouros e dos Armazéns passam a ter somente

poder local. Ao mesmo tempo, cargos burocráticos, clericais e militares

tornaram-se benefícios hereditários de famílias locais, permitindo a formação

de longas genealogias locais que passaram a exercer o poder. Casamentos

entre os clãs desses membros poderosos criavam poderosas elites locais, as

quais controlavam os centros locais. (TAYLOR, 2003, pp. 335-7, TRIGGER;

O‟CONNOR; LLOYD, 1983, p. 239)

O processo de descentralização foi mais marcado no Delta. Ao

contrário dos outros Períodos Intermediários, quando ocorreram às

fragmentações do Egito, no III Período Intermediário, ela era vista como

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aceitável e foi institucionalizada como uma forma de governo. (TAYLOR,

2003, p. 337) Apesar de o período ter sido marcado por tensões contínuas,

elas raramente chegavam a conflitos abertos, em grande parte devido aos

casamentos inter-dinásticos. (TRIGGER; O‟CONNOR; LLOYD, 1983, pp. 232

e 235; MYŚLIWIEC, 2000, p. 33)

O poder estava baseado em uma Teocracia, na qual o deus Amun

detinha o poder político supremo, sendo os faraós os governantes temporais

apontados pelo deus através do oráculo. (TAYLOR, 2003, p. 326) Essa

Teocracia permitiu que no Alto Egito o poder de Tebas fosse predominante,

pois era o principal centro de culto de Amun. (TAYLOR, 2003, p. 337)

No plano terrestre poderíamos classificar o governo como uma

Federação de governadores semi-autônomos, nominalmente sujeitos (e

muitas vezes relacionados) a um rei supremo. Este sistema era semelhante

ao dos povos seminômades, como os líbios. (TAYLOR, 2003, p. 338)

O poder militar passa a ser uma das maiores bases do poder no Egito.

No Sul, praticamente todos os governadores da XXI Dinastia eram generais e

governadores províncias, os da XXII Dinastia eram em sua maioria eram

comandantes do exército. (TAYLOR, 2003, p. 342; TRIGGER; O‟CONNOR;

LLOYD, 1983, p. 239)

Da XXI à XXIII Dinastia podemos dividir o Egito em duas unidades

principais de poder, cuja fronteira se localizava em Teudjoi (atual el-Hiba).

Ao norte temos na maior parte os líbios governando a partir de Tânis, e ao

sul temos os sumo-sacerdotes de Amun e comandantes reinando de Tebas

(Mapa 3 e 4). Essa divisão também se reflete na cultura material, como

podemos observar, por exemplo, na existência de duas formas divergentes de

hierático: o demótico no norte e o hierático “anormal” em Tebas. (TAYLOR,

2003, p. 339)

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Mapa 3 – Egito na XXI Dinastia (MANLEY, 1996, p. 101)

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Mapa 4 – Divisão do Egito sob a XXII Dinastia (MANLEY, 1996, p. 105)

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Em Tebas o cargo de Sumo-Sacerdote adquire praticamente o mesmo

peso do que o do Faraó. Segundo John Taylor:

Esse reinado esporádico pode ter sido assumido principalmente para fins de culto: já que era o rei que era o ponto de contato entre o mundo dos homens e o dos deuses, um estado praticamente independente assim como o Alto Egito requeria alguém para preencher o papel.

(2003, p. 340)

Ao mesmo tempo os sumo-sacerdotes assumiam funções militares. Todos

eram generais e tinham o título de “Grande Comandante do Exército” e

“Grande Comandante do Exército de Todo o País”. Também foram

responsáveis pela construção de várias fortalezas na área controlada por

Tebas, concentradas em sua maioria na margem leste: el-Hiba, Sheikh

Mubarek e Tehna (Akoris). (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 34-5)

No Delta, a mudança da capital de Pi-Ramessés para Tânis deve-se

segundo descobertas da Missão Austríaca, sob o comando de Manfred Bietak

a mudanças hidrológicas da época.

Havia muitas indicações de que, ao final do Novo Império, o braço Pelusiástico do Nilo areou e que como resultado, suas águas combinaram-se com aquelas do braço Tanita, o qual fluía um pouco mais para o oeste. A Capital Ramessida, que fica ao norte do local onde agora os dois braços se uniam, assim perdendo o seu acesso ao mar, impedindo o funcionamento normal, pois agora foi cortado de uma importante rota de comércio.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. 33)

Provavelmente Tânis foi escolhida devido a sua localização privilegiada

num planalto perto de uma baía do Mediterrâneo, e a sua conexão com o

interior do país. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 33) Para facilitar a construção da

nova capital, grande parte do material provém da re-utilização de edificações

de outras cidades do Delta, em especial Pi-Ramessés. Seus templos

procuravam imitar as construções monumentais de Tebas. (MYŚLIWIEC,

2000, pp. 27-8; TAYLOR, 2003, pp. 325-6)

O ponto alto do início do III Período Intermediário é o reinado de

Sheshonq I, primeiro rei da XXII Dinastia, o qual procurou retomar modelos

faraônicos do Novo Império, promovendo a integridade do país, uma política

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estrangeira expansionista e um programa ambicioso de construção real.

(TAYLOR, 2003, p. 329)

Para tentar diminuir o poder independente exercido por Tebas,

Sheshonq I apontou o seu terceiro filho, Iuput, como sumo-sacerdote de

Amun. Ele acabou com a hereditariedade do cargo de sumo-sacerdote, o que

de um lado “possibilitava a manipulação do cargo por um Faraó forte, mas

também criava uma oportunidade para os inimigos quando o faraó era

fraco”. (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 50-1) Iuput e seus sucessores governavam a

região tebana e o Médio Egito a partir da fortaleza de Teudjoi, comparecendo

em Tebas apenas para as festividades.

Com os sucessores de Sheshonq I, o poder no Egito volta a se

fragmentar, surgindo vários comandantes líbios com forte poder local.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. 42; TAYLOR, 2003, p. 330)

Os líbios que governaram o Egito no III Período Intermediário eram

originários principalmente dos grupos Meshwesh (ou Ma) e Libu, os quais

ameaçavam o Egito no Novo Império. Provavelmente eram originários da

Cirenaica, onde viviam baseados principalmente em uma economia pastoral

nômade. Eles começaram a migrar para o Egito em grande número,

principalmente nos reinados de Merenptah e Ramessés III, quando

supostamente ocorreram a falta de comida local e as incursões dos Povos do

Mar em sua terra natal. Com isso, passaram a ter uma maior cooperação

política e organização militar. (TAYLOR, 2003, pp. 332-3)

Ao final do Novo Império seus chefes passam a ter influência local no

Egito. Estabeleceram-se principalmente entre Mênfis e Heracleópolis, nos

Oásis do Deserto Ocidental e no Delta Ocidental, locais próximos à sua terra

natal e de pouco interesse faraônico. (TAYLOR, 2003, p. 333)

Ao mesmo tempo em que adotaram costumes faraônicos tradicionais

(alguns cuidadosamente selecionados, como a assimilação do rei como

Hórus criança, filho de Osíris e Ísis), também mantiveram determinados

traços étnicos como os nomes, os títulos de chefes e as duas penas na

cabeça como sinal distintivo. (TAYLOR, 2003, p.334) (Fig. 2)

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Nas práticas funerárias ocorrerá uma simplificação em todo

equipamento adotado para o sepultamento no início do III Período

Intermediário. Em geral encontram-se apenas uma pequena estela (na

maioria das vezes em madeira), caixões, vasos canopos (vazios), amuletos,

shabtis e papiros funerários, estando um dentro da figura de Osíris. A

prática de reutilizar material antigo se tornou comum no período. (TAYLOR,

2003, p. 358)

As tumbas reais e da elite, de grandes dimensões e ricamente

decoradas, serão substituídas por uma simples câmara funerária

subterrânea com uma modesta capela diretamente acima. Observam-se

também o surgimento de enterros no entorno dos templos, garantindo uma

maior segurança contra roubos e maior proximidade com as divindades. Na

região tebana, por exemplo, muitos deles são encontrados nos templos

memoriais de Medinet Habu e do Ramesseum. (TAYLOR, 2003, pp. 356-57)

Em Tânis, um complexo funerário subterrâneo com nove tumbas (entre elas

encontravam-se algumas das dos reis das XXI e XXII Dinastias) foi

construído no interior do templo de Amun. Parte do equipamento funerário e

do calcário utilizado na construção das tumbas veio de material reutilizado

de outras épocas. (BARD, 2008, p. 275)

Figura 2 – Representação típica de líbios – XIX Dinastia, KV17.

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Também temos o surgimento de grande número de enterros

comunitários, utilizando-se de tumbas mais antigas e estruturas religiosas

desativadas. Os assim chamados cachettes coincidem com a raridade de

capelas individuais encontradas no período. Eles foram preparados do

reinado de Herihor até Pinedjem II. Entre os mais conhecidos estão o

Cachette Real, na tumba de Amenhotep II no Vale dos Reis e o Cache Sul de

Deir el-Bahari, contendo as múmias de vários faraós das XVIII e XIX

Dinastias ali relocados pelos sacerdotes para protegê-los dos ladrões de

tumbas; e o Cachette de Sacerdotes de Amun em Deir el-Bahari, contendo

153 caixões dos sacerdotes da XXI Dinastia. Este último é o provável local de

origem de algumas das estátuas funerárias de Osíris estudadas na presente

dissertação. Os cachettes foram construídos em sítios ao longo do Egito,

entre os quais podemos mencionar Saqqara, Heracleópolis, Akhmin, além de

Tebas. Segundo os indícios em geral eles eram formados por membros da

mesma família. (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 35-38; TAYLOR, 2003, p. 357)

A atenção maior passou a ser dada para o corpo, em conseqüência ao

esquife, passando esse a desempenhar o papel dado antes à tumba. Este

tornou-se um mini universo, com o morto no centro, identificado como o

deus-criador e, portanto fonte de sua própria ressurreição. (MYŚLIWIEC,

2000, pp. 39; TAYLOR, 2003, pp. 358-9)

Os sacerdotes de Tebas criaram um rico novo repertório de iconografia funerária, promovendo o conceito de renascimento através das mitologias combinadas de Osíris e do deus-sol, e as imagens foram projetadas com uma visão para concentrar múltiplos níveis de significado em uma única cena complexa.

(TAYLOR, 2003, p. 359)

Junto com esses novos elementos apareciam composições pertencentes ao

repertório clássico. No fundo dos caixões podemos encontrar os faraós da

XVIII Dinastia, principalmente Amenhotep I e Thutmés III, deificados, sendo

identificados com Osíris. (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 39; TAYLOR, 2003, p. 359)

Na XXII Dinastia ocorre uma inovação no estilo dos caixões de Tebas.

Estes irão consistir de invólucros de cartonagem policromada encerrados em

caixões de madeira com design mais simples. No repertório iconográfico

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haverá uma concentração no arranjo simétrico dos deuses e maior uso das

cores. (TAYLOR, 2003, pp. 359-60)

No final do III Período Intermediário, com os reis Kushitas, há um

retorno às antigas tradições, acopladas com inovações. Temos a construção

de complexos gigantes para os oficiais, as “Divinas Adoradoras de Amun” e

os sacerdotes no final da XXV Dinastia, na região tebana, retornando a

tradição das tumbas ramessidas. Essas “tumbas palácios” consistiam

geralmente de um templo de pequenos tijolos de barro, com passagens

cortadas na rocha, as quais davam acesso ao sepultamento subterrâneo. Os

vasos canopos funcionais e a literatura funerária reaparecem. (BARD, 2008,

p. 285; BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 94; TAYLOR, 2003, p. 360)

As estátuas de Ptah-Sokar-Osíris surgem como um substituto para as

estátuas funerárias de Osíris, que desaparecem junto com os papiros

funerários na XXII Dinastia. Dentro do mesmo conceito de ajudantes para o

renascimento, elas foram readaptadas. No seu interior encontramos uma

pseudo “múmia-de-grãos” no lugar do “Livro dos Mortos”.

Novos estilos de caixões são desenvolvidos, diminuindo o número de

invólucros de cartonagem. Caixões exteriores retangulares com uma tampa

abobadada e um poste alto em cada canto representam a capela Per-nu ou a

tumba de Osíris. Estes apresentavam semelhanças com caixões “casa” do

Antigo Império e dos “catafalsos” da XVIII e XIX Dinastias. Os caixões

internos projetam uma nova imagem do morto transfigurado, lembrando

uma estátua, com pilar dorsal e pedestal. Os shabtis e as estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris seguiam a mesma linha. Essas inovações parecem ter origem

em Tebas e se expandem para o norte. (TAYLOR, 2003, p. 360; TAYLOR,

1989, p.53)

Ao mesmo tempo em que a arte deste período é marcada por

inovações, também encontramos um “arcaísmo” deliberado. Técnicas,

modelos e motivos do Antigo Império, Médio Império e Novo Império são

deliberadamente revividas e misturadas aos novos padrões.

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Os reis Kushitas, os que reinaram no Egito paralelamente à XXIV

Dinastia de Sais também recuperaram modelos antigos na arte e na religião.

Mas não deixaram de introduzir inovações as quais remetiam a sua terra

natal.

O corpo humano era representado com maior realismo, destacando-se

a musculatura dos governantes. Traços africanos são preservados, sendo os

reis Kushitas retratados como pessoas de ombros largos com pescoços

curtos e grossos, pele escura, lábios carnosos e largos, e nariz chato. As

representações femininas podiam apresentar o cabelo curto, típico da Núbia.

Mas, ao mesmo tempo, havia uma imitação dos arquétipos do Antigo Império

e Médio Império. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 85; SCHOLZ, 2006, p.100; TAYLOR,

2003, p. 350)

Em sua fronte portavam um uraeus

duplo (Fig. 3), em substituição ao uraeus

(deusa Wadjit) junto com a deusa abutre

Nekhbet, que representavam o Egito

unido. Este novo símbolo poderia

representar que eram governantes das

Duas Terras, não mais o Alto e Baixo

Egito, mas sim Kush e o Egito.

(MYŚLIWIEC, 2000, pp. 87-8; SCHOLZ,

2006, p.100) Segundo Myśliwiec (2000, p.

88), essa hipótese poderia se confirmar

pelo fato de na XXVI Dinastia apenas um

dos uraeus ser apagado das imagens da

XXV Dinastia.

Em especial Shabaka e Taharqa

promoveram uma série de reformas e

ampliações nos templos egípcios. O

segundo também conduziu uma série

delas na Núbia, em especial na sua capital Napata. Nessa, os governadores e

a elite eram representados com vestimentas egípcias e adotavam práticas

Figura 3 - Detalhe imagem Taharqa portando símbolos típicos dos faraós kushitas, como o uraeus duplo e o ―Gorro Kusshita‖. No pescoço usa um pendente do deus Amun, na sua forma de carneiro, a forma do deus adorada na Núbia – XXV Dinastia, Tumba de Tanwetamani, sobrinho de Taharqa.

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funerárias egípcias. Nas necrópoles de El-Kurru, Nuri e Meröe construíram

uma série de pirâmides, chegando a superar em número do Egito. Os deuses

egípcios eram igualmente adorados, em especial o deus Amun-Rê. Ali ele

recebia o nome de “Amun, residente da Montanha Pura (Gebel Barkal)”, em

referência à localização de seu templo ao lado dessa montanha. A forma

teoriomórfica do deus tinha uma cabeça de carneiro, que seria a origem para

o Amun tebano em forma de carneiro. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 71; TAYLOR,

2003, p. 346)

Tendo, os reis Kushitas, instalado sua residência real no Egito na

cidade de Mênfis (capital do Antigo Império), apresentaram uma devoção

especial à Ptah, deus patrono da cidade. A Teologia Menfita, que conta a

criação do mundo a partir do deus Ptah, foi inscrita na famosa estela de

granito preto do faraó Shabaka, a qual se encontra atualmente no British

Museum (EA 498). (MYŚLIWIEC, 2000, p. 89; TAYLOR, 2003, pp. 349 e 351)

O adorno de cabeça típico destes governantes, o “Gorro Kushita” (Fig. 3), é

igual ao usado pelo deus Ptah. A única diferença está na cor do gorro: o de

Ptah é azul e o dos faraós é amarelo. O mesmo já era usado pelos faraós

Ramessidas, especialmente quando conduziam rituais para Ptah. Ao que

tudo indica, os governantes kushitas adotaram o “Gorro Kushita” em

substituição à coroa khepresh (coroa azul), já que a mesma não era utilizada

por eles. (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 91-2 e 120; TAYLOR, 2003, p. 348)

Na medida em que o cargo de Sumo-Sacerdote de Amun declina, outro

cargo ganha proeminência, o das “Divinas Adoradoras de Amun” (ou

“Divinas Esposas de Amun”). Esta função sacerdotal fora criada na XVIII

Dinastia e exercida pela Grande Esposa Real. No início do III Período

Intermediário o cargo passa a ser hereditário, através da adoção por parte da

“Divina Adoradora de Amun” atual, de sua sucessora ao cargo. Este sistema

manteve-se até a XXVI Dinastia. Com o Sumo-Sacerdote Pinedjem, o cargo

passa a ser celibatário, como forma de coibir a criação de uma subdinastia.

Sua principal função religiosa era estimular o ímpeto procriativo do deus e

com isso assegurar a fertilidade da terra e a repetição cíclica da criação.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. 33; TAYLOR, 2003, p. 355)

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A partir da XXIII Dinastia, o seu status se aproxima ao do rei,

aparecendo com maior proeminência nos templos da XXV Dinastia, quando

sua posição é reforçada por Shabaka. Nas capelas de Osíris em Karnak e nas

de Medinet Habu elas são vistas em papéis antes reservados ao Faraó.

Pessoas a serviço das “Divinas Esposas” tornaram-se pessoas poderosas e

influentes no final da XXV Dinastia e tiveram um papel fundamental na

reintegração do sul, em um Egito totalmente unificado na XXVI Dinastia.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. 94; TAYLOR, 2003, p. 355)

O Final do III Período Intermediário é marcado pelos constantes

conflitos entre os núbios e os assírios pelo controle do poder na região da

Sírio-Palestina e no Egito. Em sua última e pior invasão do Egito, os assírios

chegam até Tebas saqueando e pilhando a cidade. Entre os confrontos das

duas potências Necho I, o governante de Sais, nomeado pelos assírios,

aproveita-se de um momento de fraqueza destes para assumir o trono do

Egito. Segundo David O‟Connor:

A ênfase Kushita sobre a unidade ideológica e ritual do Estado preparou o Egito psicologicamente para um retorno do governo centralizado; enquanto que a ativa oposição Kushita contra a Assíria requeria um grau sem precedentes de co-ordenação militar e política entre os dinastas egípcios.

(TRIGGER; O‟CONNOR; LLOYD, 1983, p. 245)

O filho de Necho I, Psametik I expulsou os Assírios definitivamente do Egito,

deste modo ascendendo ao trono de um Egito reunificado novamente e

encerrando o III Período Intermediário.

1.3 PERÍODO SAÍTA

Por aproximadamente 100 anos o Egito volta a ser um país governado

por apenas um rei, destacando-se como uma potência mundial. Este quadro

foi alcançado por Psametik I, que reorganiza o exército com a introdução de

mercenários estrangeiros (carius e jônicos principalmente) e reforça a

economia através de contatos com os gregos e fenícios.

A unificação do Egito é concretizada de fato com a nomeação de

Nitocris, filha de Psametik I, para o cargo de “Divina Adoradora de Amun”,

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fato retratado na Estela da Adoção. (MYŚLIWIEC, 2000, p.112) Neste período

estas sacerdotisas ficam ainda mais poderosas, sendo que a partir da

“Divina Adoradora de Amun” Ankhnesneferibre, filha de Psametik II, elas

também passam a assumir o cargo de Sumo-Sacerdote. Ambas as funções

são executadas até Nitocris II, quando o cargo de “Divina Adoradora de

Amun” é extinto pelos governantes persas. (MYŚLIWIEC, 2000, p.131)

O novo exército de mercenários tinha como função proteger o reinado

dos ataques estrangeiros, no início vindos dos assírios, depois dos caldeus e

dos persas. Mas, ao mesmo tempo, também serviam como um contrapeso

para os soldados nativos, os machimoi, formados principalmente por líbios,

os quais ainda possuíam um grande poder interno. (MYŚLIWIEC, 2000, p.

116; LLOYD, 2003, p. 366)

Tanto para as campanhas expansionistas na Ásia quanto para o

comércio no Mediterrâneo, foi construída uma grande frota marítima. Como

forma de facilitar a navegação, uma série de canais foi construída, tendo

Nekau II inclusive iniciado a construção de um canal que deveria ligar o Nilo

ao Mar Vermelho. Para regulamentar o comércio exterior e interior, a cidade

de Naucratis tornou-se o principal porto comercial da época. (MYŚLIWIEC,

2000, pp. 116 e 121; LLOYD, 2003, pp. 368-9)

Os Faraós dessa dinastia também se empenharam num amplo

programa de construções, dos quais a maioria estava localizada no Delta.

Pouca coisa se preservou, mas sabemos a respeito através das inscrições, de

fragmentos restantes e dos escritos de Heródoto. Este último vem a ser uma

fonte importante sobre o período, embora bastante fantasiosa em alguns

aspectos. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 122; LLOYD, 2003, p. 370)

Grande parte dessas construções deveria estar localizada na sua

capital Sais, da qual se origina o nome do período. O ponto central em Sais

era o centro de culto principal dedicado à deusa patrona da cidade, Neith5,

conhecido como Hwt Byt (“Mansão da Abelha”). (MONTET, 1957, p. 83;

LLOYD, 2003, p. 370) No Pátio do templo estavam localizadas as tumbas

5 Neith era uma deusa de caráter bélico, através do que acabou por ser identificada como uma deusa protetora, tornando-se assim uma deusa mãe universal. Às vezes ela também é confundida com a deusa Nut pelo seu epíteto de a “Grande Vaca”, e é igualmente conhecida como sendo a mãe de Rê. (HART, 1986, pp. 131-4; WILKINSON, 2003, pp. 160-3) Os gregos a identificaram com a deusa Atena/Minerva por seu caráter guerreiro. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 128)

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onde foram enterrados os reis da XXVI Dinastia. (LLOYD, 2003, p. 271) E

ainda segundo Heródoto, havia um local de sepultamento de Osíris e um

lago sagrado onde eram celebrados os rituais do Festival de Khoiak.

Em Sais também, no precinto sagrado de Minerva6, atrás da capela e rente à parede está à tumba de um7, cujo nome eu considero ímpio de divulgar nesta ocasião. E no seu interior encontra-se um grande obelisco de pedra e há um lago perto, ornamentado com uma margem de pedra, formando um circulo, e em tamanho, como me pareceu, o mesmo do de Delos, o qual é chamado de o Circular. Neste lago eles realizam à noite as representações das aventuras dessa pessoa, as quais eles chamam de mistérios. Nestas questões, contudo, apesar de corretamente informado com os particulares dele, eu devo guardar um discreto silêncio.

(apud MYŚLIWIEC, 2000, pp. 124-5)

Esse excerto de Heródoto também nos demonstra que a popularidade

de Osíris cresce ainda mais com o tempo. Seu festival, realizado no mês de

Khoiak, agora é celebrado em várias cidades ao longo do Egito. Os rituais de

renascimento, cujo ponto central é o preparo de uma figura mumiforme de

grãos, rituais esses executados para o deus, são adaptados para morto. Este

deseja renascer após a morte como Osíris; para tanto concentra-se parte

desse simbolismo nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris.

Mênfis torna-se uma cidade cosmopolita na época, onde vivem pessoas

de diversas nacionalidades introduzidas com as conquistas dos novos

territórios do período. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 128) Dessa cidade, junto com

Sais, provêm as melhores esculturas. A escultura, assim como os relevos da

XXVI Dinastia, apresentava um traço mais naturalista, capturando as

expressões das pessoas. O Arcaísmo, já presente no III Período

Intermediário, intensifica-se nesse momento em que são copiados

principalmente modelos do Antigo Império. Na pirâmide de degraus de

Saqqara chegaram inclusive a desenhar linhas guias sobre os relevos, para

que a cópia fosse feita nos mínimos detalhes. Os artistas procuram alcançar

tamanha perfeição que às vezes é difícil para os especialistas da atualidade

6 Neith 7 O deus Osíris, cuja forma local era conhecida como Osíris Hemag (MONTET, 1957, p. 84)

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atribuir a verdadeira época de uma peça. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 118; SHAW;

NICHOLSON, 1995, p. 250)

A forma humana, assim como os hieróglifos, são mais altos e delgados,

comparados às fortes proporções e formas musculares da XXV Dinastia.

Apesar de que nas obras de Psametik I ainda podemos ver a preservação de

alguns traços kushitas, as lembranças dos faraós Kushitas e a presença

destes nos antecessores de Psametik II são apagadas por ele. (MYŚLIWIEC,

2000, pp.117-120)

O culto aos animais sagrados, em especial ao touro Ápis ganha

atenção especial na XXVI Dinastia. Psametik I constrói uma nova galeria

subterrânea no Serapeum em Saqqara para o sepultamento dos touros. As

estelas dedicadas ao touro do período contêm preciosas informações

cronolgicas. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 130)

Em especial nas necrópoles de Saqqara e Giza, grandes esforços foram

gastos por altos oficiais no desenvolvimento de tumbas invioláveis por

ladrões. Nas chamadas “Tumbas Poços” ou “Tumbas Persas”, um sarcófago

antropomórfico de grandes dimensões era levado até o fundo por um sistema

de poços. Após o sepultamento elas eram preenchidas com areia. Os bens

funerários não eram mais tão ricos como no Novo Império. (BARD, 2008, p.

285; BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 94; LLOYD, 2003, p. 385) As tumbas

familiares e as “tumbas palácios” da região tebana continuam sendo

construídas. (LLOYD, 2003, p. 383)

Infelizmente as campanhas vitoriosas do início da XXVI Dinastia não

conseguiram ser sustentadas pelos últimos faraós desta dinastia. A principal

causa para a sua derrota é o surgimento no cenário internacional de uma

nova potência, o Império Persa. Em 525 a.C, Cambises II conquista o Egito

na Batalha de Pelusia, tornando-se o Egito uma satrapia desse império.

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60

1.4 BAIXA ÉPOCA

As informações sobre as ações dos governantes persas no Egito são

contraditórias. As fontes clássicas e hebráicas acusam Cambises de ser um

homem cruel, que entre outros fatos teria mandado matar o touro Ápis e ter

destruído os templos egípcios. Já as fontes arqueológicas vêm nos

demonstrando um quadro completamente oposto. Sabemos que dois touros

Ápis, os quais morreram durante o reinado de Cambises, foram sepultados

com todas as honras, estando o nome deste governante inclusive em seus

sarcófagos. Já através de uma inscrição na estátua de Udjahorresnet, um

egípcio que era conselheiro de Cambises, sabemos que o mesmo mandou

restaurar parte dos templos egípcios. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 135; LLOYD,

2003, p. 374) A mesma política é mantida por seu sucessor, Dario I. O

templo de Hibis, construído por ele no Oásis de Kharga, é o único grande

templo da Baixa Época se manteve praticamente intacto até os nossos dias.

(MYŚLIWIEC, 2000, p. 137)

E como nos demonstra Myśliwiec ao descrever uma estátua de Dario I

com fortes traços egípcios encontrada em Susa, atualmente

no Iran-Bastam Museum, Teerã (Fig. 4) havia muitas

semelhanças entre ambas as culturas.

Enquanto a Egiptomania de Dario pode ter sido causada pela sua reverência por antigas tradições faraônicas, ambas as culturas – a Persa e a Egípcia – continham elementos ideológicos similares os quais podiam ser facilmente comparados. A relação entre o governante e o divino era a mesma em ambas as religiões: assim como o faraó era o escolhido e era a imagem de Atum, o rei Persa era a encarnação de Ahuramazda. O amor egípcio pela ordem e verdade, conceitos personificados pela deusa Maat, tinham sua contraparte na oposição persa de verdade (arte) e falsidade (drauga). O arco, o atributo da deusa egípcia Neith, era a arma preferida dos persas. Não é de admirar, então, que não havia grandes obstáculos para a assimilação mutua das duas culturas, que também podiam encontrar expressão na arte.

(2000, p. 154)

O sistema de administração egípcio foi basicamente

mantido. No topo foi introduzido um sátrapa, o qual atuava

como um vice-rei. Este conduzia a administração central

através de uma chancelaria, a qual era controlada por um

Figura 4 – Estátua Dario I com traços egípcios - Iran-Bastam Museum, Teerã

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61

chanceler assistido por um escriba. A língua oficial usada era o aramaico,

exigindo a presença de tradutores egípcios. Abaixo desse nível o sistema

continuava egípcio. (LLOYD, 2003, p. 375)

Com as derrotas sofridas pelos persas na Grécia, os egípcios

aproveitaram-se da situação criando rebeliões na busca de sua

independência. Entre 414 à 405 a.C. Amyrtee, de Sais, com o apoio de

Esparta, finalmente obteve sucesso em expulsar os persas do Egito. Para a

sua vitória também contribuiu uma rebelião interna no Império Persa

liderada pelo irmão do rei Artaxerxes II, impossibilitando o envio de tropas

para o Egito. (MYŚLIWIEC, 2000, pp. 158-9; SHAW; NICHOLSON, 1995, p.

158)

A conquista de Amyrtee, o qual veio a ser o único faraó da XXVIII

Dinastia, conseguiu ser mantida apenas por cerca de 60 anos, quando

teremos uma nova dominação persa no Egito. Este curto período de

independência foi marcado por reinados curtos de reis que às vezes ficavam

apenas alguns meses no trono.

Para a XXIX Dinastia nossa evidência está longe de ser completa, mas ela demonstra inequivocamente que quase todo governador teve um reinado curto e sugere que todos eles, com a exceção de Hakor (393-380 A.C.), poderiam ter sido depostos, às vezes provavelmente pior.

(LLOYD, 2003, p. 377)

Nectanebo I, fundador da XXX Dinastia, certamente chegou ao

poder através de um golpe militar. Os faraós dessa dinastia, seguindo a

linha nacionalista das XXV e XXVI Dinastia, construíram muitas obras em

todo o Egito. Seu papel procura reafirmar a ordem cósmica entre o

governante e os deuses, com a devoção aos cultos tradicionais. (LLOYD,

2003, pp. 378-9; SHAW; NICHOLSON, 1995, p. 159) É nessa época que o

culto de Ísis, deusa adorada em Sebennytos, a capital na época, começa a se

desenvolver mais amplamente, até alcançar o seu status internacional nas

próximas épocas. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 168)

Os cultos aos animais sagrados eram particularmente importantes nessa época e é possível que as várias indústrias e sacerdócios

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associados com as necrópoles de animais sagrados tornaram-se uma parte importante da economia.

(NICHOLSON, 1995, p. 159)

Nossas fontes para esse período são principalmente de autores gregos.

Segundo consta, esse período (XXVIII-XXX Dinastias) estava voltado para

uma política de cooperação com a Grécia, frente à continua existência do

Império Persa, inimigo comum de ambos. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 163; SHAW,

2003, p. 377)

O segundo domínio persa foi completado não mais tardiamente do que

341 a.C.. Os templos foram saqueados e a defesa das cidades posta abaixo,

colocando mais uma vez a administração provincial persa no controle.

(SHAW, 2003, p. 382) Neste segundo reinado não houve uma integração com

os costumes egípcios; pelo contrário, os persas trataram sua recém

reconquistada satrapia com severidade. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 168)

Insatisfeitos nesses cerca de dez anos de reinado, os egípcios viram com

bons olhos a conquista de Alexandre, o Grande.

1.5 PERÍODO PTOLOMAICO

Com a derrota dos persas por Alexandre o Grande em 332 a.C., o Egito

é incorporado às províncias gregas. Apesar da introdução de novos costumes

gregos, muitos dos tradicionais costumes egípcios permanecem. Alexandre o

Grande é coroado como um legítimo faraó no templo de Ptah em Mênfis.

Com a morte de Alexandre e seus sucessores, seu Império é divido entre

seus generais. Das disputas entre estes três reinos são formados: o

Macedônio, o Selêucida e o Ptolomaico. O Egito, pertencente ao último junto

com a Cirenaica, passa a ser governado por Ptolomeu, filho de Lagos. Após a

sua coroação ele passa a se chamar Ptolomeu I Sóter, sendo o primeiro

governante de uma dinastia de governantes com o mesmo nome.

Entre estes três reinos Greco-Macedônios havia um espírito

competitivo por auto-afirmação, através da aquisição de status e prestígio.

Este era posto em prática pelos Ptolomeus através do poder militar e pela

sua capital, Alexandria, a qual era símbolo de opulência e esplendor dessa

dinastia. (LLOYD, 2003, pp. 391 e 399)

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Alexandria era uma cidade cosmopolita habitada por pessoas vindas

de diversas partes do Mediterrâneo e da Ásia Menor em especial, sendo os

egípcios nativos minoria. Com a construção do Mouseion, de cujo complexo

fazia parte a famosa biblioteca, Alexandria também passou a ser o grande

centro cultural e formador do conhecimento da época no Mundo Grego. Esta

configuração de Alexandria, localizada no Delta do Nilo, mostra um

realinhamento do Egito dando prioridade à região do Mediterrâneo. (LLOYD,

2003, p. 400; SHAW; NICHOLSON, 1995, p. 231; VASQUES, 2005, p. 12)

Aliás, Alexandria não era considerada como fazendo parte do Egito e

sim ad Aegyptum, isto é perto do Egito. O resto do Egito, tirando-se as

outras polis gregas fundadas, era chamado de chora, a área rural

pertencente às cidades gregas. Alexandria e as outras poléis gregas,

Naucrátis e Ptolomais também se diferenciavam, na medida em que

possuíam as suas próprias leis. (VASQUES, 2005, pp.12-13)

Para reforçar o seu poder, a partir de Ptolomeu II, os reis afirmavam

que ele e sua esposa eram deuses. Esta afirmação se desenvolveu no

conceito de que o rei pertencia a uma “família sagrada” consistindo de um

rei vivo e todos os governantes falecidos da dinastia, incluindo Alexandre o

Grande, de quem os Ptolomeus poderiam ter sua ancestralidade derivada

diretamente de Zeus, Héracles e Dionísio. (LLOYD, 2003, p. 403) Dentro

dessa linhagem divina tornou-se comum o casamento entre irmãos. Apesar

dessa prática ser chamada de casamento egípcio, ela não encontra

antecedentes no Egito faraônico e também não há referências suas na

Grécia, sendo portanto esta prática uma característica própria do Período

Ptolomaico e do posterior Período Romano. Por um lado, sendo os

governantes deuses, esta era uma representação da união mitológica entre

os irmãos Zeus e Hera, e talvez também dos deuses egípcios de crescente

prestígio no período de Ísis e Osíris. Por outro lado, ele assegurava que o

poder ficasse na linhagem dos Ptolomeus. (JOHNSON, 1999, p. 74; LLOYD,

2003, pp. 403-404)

Inicialmente havia uma diferenciação maior entre egípcios e gregos. Os

gregos constituíam a elite do país, ocupando altos cargos administrativos no

governo e adquirindo propriedades particulares. Fora da classe sacerdotal,

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eram poucos os egípcios que alcançavam cargos de prestígio. Nas poléis o

casamento entre gregos e egípcios era proibido, mas o mesmo provavelmente

não acontecia nas aldeias da chora, como comprovam as misturas de nomes

gregos e egípcios nessas aldeias. Esta situação ganhou novos contornos com

a Batalha de Raphia, em 217 a. C., quando Ptolomeu IV empregou os

machimoi, ou seja, soldados egípcios em seu exército para poder derrotar

Antíoco III. No final do Período Ptolomaico, nos séculos I e II a.C., não era

mais possível discernir entre gregos e egípcios. Muitos possuíam nomes

duplos, gregos e egípcios. (JOHNSON, 1999, p. 74; LLOYD, 2003, p. 409;

VASQUES, 2003, p. 13)

Como a propagação do culto aos deuses, entre os quais o recém-criado

Serapis da mistura de deuses gregos e egípcios, fazia parte do programa de

governo dos Ptolomeus, os sacerdotes egípcios mantiveram seu prestígio.

Além disso, a sua colaboração era vista como um importante caminho para a

aquiescência da população egípcia. Neste ponto, por serem os supremos

pontifícios do Egito na época, os Sumo Sacerdotes de Mênfis foram bastante

favorecidos. Eles eram responsáveis pelo culto dinástico e pelas cerimônias

que envolviam a pessoa do faraó (LLOYD, 2003, p. 407; VASQUES, 2005, p.

13)

Como faraós, os Ptolomeus, assim como seus antecessores nativos,

mantiveram a política de restauração e ampliação de templos egípcios. Entre

estes destacam-se os templos de Philae, Edfu e Dendera. Apesar das grandes

renovações destes, pequenas partes de suas edificações faraônicas foram

mantidas na intenção de demonstrar um vínculo de continuidade de

passado e presente. Uma renovação de destaque nos templos do período é o

mammisi, um pequeno templo anexo em ângulos retos ao templo principal.

Os mammisis ptolomaicos eram usualmente cercados por colunatas com

paredes decoradas intercolunares e eram usados para celebrar rituais de

casamento de deusas, como Ísis e Háthor, e o nascimento do deus criança.

(LLOYD, 2003, p. 406, SHAW; NICHOLSON, 1995, p. 169)

Com a morte de Ptolomeu VI, o poder central foi abalado pelas

constantes disputas dinásticas, muitas resultando em uma série de

assassinatos. Estas surgiram justamente da política de casamentos entre

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irmãos e da poligamia dos governantes, a qual acabou por incitar a briga

entre irmãos pelo direito ao trono. Como resultado de uma política fraca

surgiram muitas revoltas locais de egípcios insatisfeitos com a política local,

muitas vezes corrupta pela falta de controle central. A mais drástica dessas

revoltas foi a Tebaida, a qual resultou no governo da região de Tebas por

faraós locais, entre 204 a.C. e 186 a.C. Dois faraós reinaram neste curto

período: Harwennofre e Ankhwennofre. (LLOYD, 2003, p. 411, VASQUES,

2005, pp. 13-14)

Com uma política fraca também é cada vez mais constante a influência

de Roma no governo ptolomaico. Inicialmente ambas as nações mantinham

relações diplomáticas, mas com o enfraquecimento dos Ptolomeus, Roma

passou a intermediar a permanência da dinastia ptolomaica no poder. Aqui

se destaca o episódio final das “Guerras Sírias” (168 a.C.), quando o rei

selêucida Antíoco IV se autoproclama rei do Egito em Mênfis. Este desocupa

o país, após ser convencido diplomaticamente por uma embaixada romana a

deixar o Egito. Assim, Roma garantia seu poder sobre a porção oriental do

Mediterrâneo. Por fim essa política resultou no domínio total do Egito por

Roma, com a derrota de Cleópatra VII por parte Otávio, futuro Imperador

Augusto. (JOHNSON, 1999, p. 76; LLOYD, 2003, pp. 412-13, VASQUES,

2005, p. 14)

Na esfera mortuária temos o surgimento de novos textos funerários,

entre os quais estão o “Livro das Respirações”, o “Livro da Travessia da

Eternidade” e o “Livro da Ba”. “A função de todos esses livros é semelhante,

contudo: eles comemoram o morto no interior de seu grupo social e

asseguram um bom sepultamento, transfiguração efetiva e renascimento

bem sucedido na outra vida.” (RIGGS, 2010, p.1) Outra inovação do Período

Ptolomaico é que o texto transcorre longamente como o akh do morto e vai

participar em festivais por todo o Egito, listando grandes locais de culto

como Tebas e Bubastis. Assim, certo número de papiros, como o Papiro

Rhind e o “Livro de Atravessar a Eternidade”, adicionalmente atestam a

relação mútua entre rituais funerários e atuações nos templos ao afirmar

que o morto irá tomar parte em rituais nos templos ao longo do ano,

especialmente o festival de Sokar durante o mês de Khoiak. Textos rituais

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antes restritos aos templos passam igualmente a ser aplicados ao morto.

Grande preferência é dada as lamentações e glorificações (sAxw) realizadas

depois do embalsamamento e mumificação do morto. (RIGGS, 2010)

Podemos observar que boa parte destes rituais são aqueles realizados

durante o Festival de Khoiak; assim são recitados para o morto textos como

“As Lamentações de Ísis e Néftis” e as “Stundenwachen”. Dessa forma o

morto passa pelos mesmos rituais que Osíris e como este pode renascer no

Mundo dos Mortos.

Os caixões da XXX Dinastia e do início do Período Ptolomaico são

caracterizados por cabeças e corpos com proporções desproporcionalmente

grandes. O colar wsx, o qual cobre a parte de cima do torso, começa abaixo

das abas do toucado, possui terminais na forma de grandes cabeças de

falcões, e um peitoral é muitas vezes retratado no centro. (TAYLOR, 1989, p.

61)

Estas mesmas características podem ser observadas nas estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris desse período. Como inovação, estas ainda

trazem inscritas um hino em homenagem ao presente deus (ver 14).

As cartonagens e estojos de múmias, que se haviam tornado escassos

no período anterior voltam a aparecer, tornando-se predominantes. Estas

eram ricamente decoradas e colocadas sobre as bandagens e mantidas no

lugar por elaboradas amarrações. Estas consistiam de uma máscara e um

peitoral, podendo algumas múmias ainda conter um estojo para os pés.

(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 115; TAYLOR, 1989, p. 61)

Mesmo nas múmias mais simples do período, folhas de ouro podiam

ser aplicadas sobre o rostos, mãos e pés, o que corresponde ao tratamento

especial da cabeça, mãos e pés aduzido no Ritual de Embalsamamento.

Estas áreas também podiam receber amarras e tecidos especiais. (RIGGS,

2010, p. 2)

Esta forma de se apresentar a múmia era decorrente do próprio pensamento religioso da época, em que a aparência externa do morto era tão importante quanto a sua conservação para a perpetuação de uma vida além-túmulo. Esta “visão fictícia” criada pelo pensamento religioso egípcio tardio está muito presente na cultura material, o importante não é que as coisas existiam verdadeiramente, mas que tenhamos a idéia de que existiam.

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(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 116)

No decorrer do Período Ptolomaico surgem novos tipos de caixões os

quais misturam motivos tradicionais egípcios com elementos helenísticos. Ao

mesmo tempo desaparecem as estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris.

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PARTE II

DEUSES

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CAPÍTULO 2. PTAH

O deus Ptah aparenta ser um dos deuses mais antigos do Egito, sendo

seus cultos atestados desde o período Dinástico Inicial. Originalmente era o

deus patrono da capital do Antigo Império, Mênfis. Cultuado inicialmente

pelos artesãos locais, cujas oficinas estavam ligadas ao seu templo, e depois

em todo o Egito, Ptah era visto como o escultor ou ferreiro da humanidade.

Posteriormente foi elevado à condição de um deus criador, tendo gerado o

universo, existente através do seu pensamento e palavras.

O verdadeiro significado do nome (PtH) Ptah nos é desconhecido.

Devido ao fato de o seu nome não ser escrito com o hieróglifo determinativo

de deus ou um símbolo distintivo até o Novo Império, foram levantadas

hipóteses de uma origem estrangeira do oeste (HART, 1986, p. 173). Outra

possibilidade é apontada por Stolk (1911, p. 4): a de ele estar ligado com a

palavra ptH – “abrir”. Para Ermann e Grapow (1971, p. 565), esta forma da

palavra utilizada na Baixa Época e Período Ptolomaico remete ao sentido de

abrir os olhos, a boca ou o Mundo Inferior. Assim, poderíamos pensar numa

ligação do nome de Ptah com a Cerimônia de Abertura da Boca.

A etimologia mais aceita atualmente é a encontrada nos “Textos dos

Caixões” – Fórmula 647, a qual o conecta com o verbo ptH – “esculpir”.

Esta estaria diretamente ligada com uma das principais funções do deus.

Mas também temos de levar em conta que talvez o verbo seja uma derivação

do nome do deus. (VAN DIJK, 2001, p. 75; HART, 1986, p. 173; STOLK,

1911, pp. 4-5) Em Ermann e Grapow (1971, Vol. I, p. 565), encontramos

como tradução para o verbo ptH a palavra alemã “bilden”. Seu significado

pode ser entendido como esculpir, mas ao mesmo tempo ela também

significa criar, formar. Como pode ser visto mais abaixo, a Fórmula 647 dos

“Textos dos Caixões” é o primeiro indício de Ptah como um deus criador.

Assim, ptH remeteria a ambas as atribuições de Ptah, um deus escultor e um

deus criador.

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A primeira representação conhecida de

Ptah está numa vasilha da I Dinastia encontrada

em Tarkhan (VAN DIJK, 2001, p. 74;

WILKINSON, 2003, p. 125). Nesta, ele aparece

dentro de uma capela em sua típica forma

mumiforme, segurando um cetro. Em suas

imagens típicas posteriores ele é retratado

antropomorficamente como uma figura

mumiforme em pé, com as mãos saindo das

bandagens, segurando um cetro composto pelo

cetro was, o pilar djed e o símbolo ankh. Sobre a

sua cabeça raspada ele usa um gorro justo

(geralmente azul) com as orelhas de fora. O

mesmo gorro pode ser visto sendo usado pelos

artesãos, de quem Ptah é o deus patrono. Do

Médio Império em diante ele pode ser distinguido

de outros deuses através de uma barba reta. (VAN DIJK, 2001, p. 74;

WILKINSON, 2003, p. 125) (Fig. 5)

Ptah também pode usar uma grande borla

na parte de trás de suas vestes e um largo colar,

que é balanceado por um contrapeso pendurado

atrás de suas costas.

O contrapeso é arredondado no topo e às vezes largo embaixo como um sino estreito, tubular, e é distinto o bastante para permitir que imagens parciais de Ptah sejam diferenciadas de representações similares do deus Khonsu, que veste um contrapeso esculpido em forma de fechadura de chave. (Figs. 5 e 6)

(WILKINSON, 2003, p. 126)

Usualmente Ptah é representado sobre um

plinto na forma do hieróglifo (maAt), o qual

lembra a vara de medição usada por trabalhadores

egípcios, ou o monte primordial. (WILKINSON, 2003, p. 126)

Figura 5 - Ptah em sua forma típica, XX Dinastia (KV9)

Figura 6 – Khonsu usando um colar com o contrapeso manxt, XX Dinastia (Templo de Khonsu em Karnak)

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O deus Ptah também pode aparecer na forma de um anão,

denominado de Pataikos por Heródoto.

Pois a imagem de Vulcão [Ptah] é muito parecida com o Pataeci dos fenícios, com a qual eles ornamentam as proas de seus navios de guerra. Se uma pessoa não a viu, eu irei explicar de uma maneira diferente – é uma figura semelhante à de um pigmeu.

(Heródoto, Histórias III)

O epíteto de “Ptah, o anão” provavelmente está associado à sua forma

como Pataikos. (WILKINSON, 2003, p.123)

Essa forma tem aparência similar ao deus Bes, mas possui algumas

diferenças distintivas. Assim como Bes, ela representa um homem pequeno,

baixo (e usualmente com pernas curvadas), com as mãos apoiadas sobre

seus quadris. Ele também pode brandir facas e segurar ou morder cobras,

mas diferentemente de Bes, a sua cabeça excessivamente grande não tem

cabelos faciais e ele não tem os olhos grandes e a língua proeminente. A

cabeça é calva ou o cabelo é curtamente aparado ou às vezes possui uma

cabeça de falcão ou carneiro sobre a qual ele pode usar um cacho lateral,

um escaravelho ou uma coroa Atef. (WILKINSON, 2003, p. 123) (Figs. 7 e 8)

A sua forma de Pataikos certamente está associada aos artesãos, seus

devotos. Como mostram imagens do Antigo Império, muitos anões

trabalhavam como joalheiros ou artistas nas oficinas. Conhecido na forma

de amuletos rudes desde o final do Antigo Império, imagens suas também

são encontradas nos cippi mágicos da Baixa Época. (WILKINSON, 2003, pp.

123-4 e 126)

Figura 7 - Pataikos (Museu do Louvre)

Figura 8 - Bes (Museu do Louvre)

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Nos tempos Helênicos, Ptah foi identificado com o deus Hefesto/

Vulcano, sendo ambos os deuses conhecidos por suas habilidades como

artesãos. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 230)

A partir do Novo Império, Ptah é associado numa relação familiar com a

deusa leoa Sekhmet (esposa) e o deus do lótus primordial, Nefertum (filho),

formando a Tríade Menfita (Fig. 9). (VAN DIJK, 2001, p. 74; SHAW,

NICHOLSON, 1995, p. 230; STOLK, 1911, p. 9) As tríades foram um

desenvolvimento teológico do Novo Império, vinculando muitas vezes deuses,

antes independentes de uma mesma área, numa relação familiar

mitologicamente contextualizada. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 295) Este é

o caso da Tríade Menfita, sendo a relação de Nefertum com os deuses Ptah e

Sekhmet estabelecida posteriormente.

Também passam a ser vistos como seus filhos a forma menfita da

deusa Háthor, a “Senhora do Sicômoro do Sul”, a qual tinha um templo na

parte sul da cidade. (VAN DIJK, 2001, p. 74; STOLK, 1911, p. 11) E na Baixa

Época Imhotep, ele é conhecido como o construtor da primeira pirâmide, a

Figura 9 – Ramessés III diante da Tríade Menfita, composta pelo deus Ptah (dir.), a deusa leoa Sekhmet (meio) e o deus do lótus primordial Nefertum (esq.) – Grande Papiro Harris, XX Dinastia (BM EA 999,43)

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pirâmide de degraus do Faraó Djoser em Saqqara, e por suas habilidades

como médico. Essas habilidades e sua devoção à Ptah levaram à sua

divinização. Acreditava-se que era o filho de Ptah e de uma humana

chamada Khreduankh. (VAN DIJK, 2001, p. 75; SHAW, NICHOLSON, 1995,

p. 230; WILKINSON, 2003, p. 111)

O culto original de Ptah parece estar associado aos artesãos. Segundo

alguns autores ele poderia ter sido inicialmente o deus protetor dos

pedreiros e artesãos, os quais trabalhavam nas pedreiras de calcário de

Tura, pertencentes ao templo de Ptah em Mênfis. O desenvolvimento

artístico e cultural do Antigo Império e o grande aumento no número de

artesãos necessários para servir a capital Mênfis e para produzir os bens

funerários para as suas necrópoles poderia muito bem ter influenciado na

ascensão do deus. Com isso, seu culto logo se ampliou para todos os

artesãos. (HART, 1986, pp. 176-7; STOLK, 1911, p. 13; WILKINSON, 2003,

p. 124)

A partir da VI Dinastia o sumo sacerdote de Ptah recebe o título de

(wr xpr Hmwt)~ “grande líder dos artesãos”. Talvez de origem profana

este título mostra a sua ligação com os artesãos. (VAN DIJK, 2001, p. 74;

VELDE, 1982-1986, p. 1178; WILKINSON, 2003, p. 124)

Este papel de Ptah como o escultor ou ferreiro da humanidade e

criador das artes e dos ofícios certamente contribuiu para a sua elevação a

deus criador. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 230) As primeiras menções

nesta direção estão na Fórmula 647 dos “Textos dos Caixões”.

[...] Eu sou aquele que se encontra ao sul de seu muro, o protetor

dos deuses. Os homens, os deuses, os bem-aventurados, os mortos não têm poder sobre (meu) estabelecimento (?), sobre a minha construção (?). Eu sou aquele deus belo de face, o bem-amado, o mestre da vida, o soberano dos deuses. Eu distribuí a vida, eu conduzi os alimentos aos deuses mestres de oferendas. Sou eu o mestre da vida, aquele que é príncipe no céu; veja: Seth está a bordo da minha barca, pois ele é a natureza daquilo que eu criei. Eu sou o mestre da vida.

(BARGUET, 1986, p. 481)

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A versão mais conhecida de sua forma como um deus criador está na

Teologia Menfita inscrita na Pedra de Shabaka. Segundo a inscrição, esta é

uma cópia feita por ordem do Faraó Shabaka (XXV Dinastia) de um papiro

que estava sendo comido por traças. Atualmente a composição do texto é

atribuída ao Período Ramessida, sendo ela muito mais nova do que se

acreditava (atribuída ao Antigo Império). (VAN DIJK, 2001, p. 75; HART,

1986, pp. 174-5; LICHTHEIM, 1975, Vol. I, pp. 51-2; VELDE, 1982-1986, p.

1178)

Segundo a Teologia Menfita, Ptah dá vida a Atum e a sua Enéade

através de seu coração (pensamento) e sua língua (palavra). Estes são

concebidos como os dentes e lábios de Ptah. Aqui existe uma alusão à

Teologia Heliopolitana, cujo deus criador é Atum. Mas esta encontra-se

subordinada genealogicamente, ao passo que Ptah cria Atum e a sua

Enéade. Ele cria as coisas ao redor do cosmos, pronunciando-as em

existência. Como deus primordial, ele encerra toda a existência. Desta forma

a Teologia Menfita também é importante na medida em que é um dos

primeiros exemplos conhecidos da assim chamada doutrina “logos”, na qual

o mundo é formado através do discurso criativo de um deus. (VAN DIJK,

2001, p. 75; HART, 1986, pp. 174-5; LICHTHEIM, 1975, pp. 54-5; SHAW,

NICHOLSON, 1995, pp. 18 e 230; WILKINSON, 2003, p. 124)

[...] Pois Ptah é o maior de todos, o qual deu [a vida] para todos os

deuses e os seus kas através de seu coração e através de sua língua, na qual Horus tomou a forma de Ptah, na qual Thot tomou a forma de Ptah.

[...] Sua Enéade (de Ptah) está diante dele como dentes e lábios.

Eles são o sêmen e as mãos de Atum. Pois a Enéade de Atum veio à existência através de seu sêmen e seus dedos. Mas a Enéade são os dentes e lábios na sua boca, os quais pronunciaram o nome de todas as coisas, dos quais Shu e Tefnut vieram à existência, e os quais deram a vida a Enéade.

[...] Portanto é dito de Ptah: “Ele que fez tudo e criou os deuses.”

E ele é Ta-tenen, o qual deu nascimento aos deuses e de quem tudo veio à existência, alimentos, provisões, oferendas divinas, todas as

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coisas boas. Portanto é reconhecido e entendido que ele é o mais poderoso dos deuses. Portanto Ptah estava satisfeito depois que ele fez todas as coisas e todas as palavras divinas.

[...]

(LICHTHEIM, 1975, pp. 54-5)

Assim como Atum, Ptah também é visto como uma combinação de

elementos femininos e masculinos dentro dele. Ficou conhecido como “o

antigo”, o qual unia em seu ser ambos, a divindade masculina primordial

Nun e sua contraparte feminina, Naunet, sendo assim visto como a

divindade primordial cuja força criadora era manifestada em todos os

aspectos do cosmo. Ele era às vezes adorado como Ptah-Nun ou mesmo

Ptah-Naunet neste papel, embora o processo criativo também fosse atribuído

ao deus ao lado do antigo deus menfita da terra Tatenen, sob o nome Ptah-

Tatenen. Esta combinação entre feminino e masculino também pode ser

vista em textos nos quais o nome do deus era escrito de forma acrofônica

como pt-tA-HH ou p(et)+t(a)+h(eh), que o sugere sustentando o céu (pt) sobre a

terra (tA) na forma das divindades Heh (¡H)8, combinando desta forma o

elemento feminino do céu e o elemento masculino da terra. (WILKINSON,

2003, pp. 18 e 124)

A sua forma sincrética de deus criador Ptah-Tatenen surge no Antigo

Império. Segundo Montet (1957, Vol. I, p. 34), ele pode ser visto nesta forma

no jubileu do faraó. O deus Tatenen representava originalmente o

aparecimento do sedimento fértil do Nilo das águas vazantes da inundação.

(HART, 1986, p. 210)

No contexto funerário, era creditado a Ptah a invenção da “Cerimônia

de Abertura da Boca”, tendo consagrado o ritual ao desempenhá-lo sobre as

bocas e estátuas dos deuses quando ele os criou, conforme consta no

capítulo 23 do “Livro dos Mortos”:

FÓRMULA PARA ABRIR A BOCA DE N. NOS DOMÍNIOS DO DEUS Ele fala:

8 Personificação do infinito.

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Minha boca foi aberta por Ptah; as amarras que amordaçavam minha boca foram soltas pelo (deus) da minha cidade. Thot vem inteiramente equipado com magia; ele solta as amarras de Seth que amordaçavam a minha boca. Atum me dá as suas mãos, as quais <ele> erigiu em proteção. Minha boca me é dada; minha boca foi partida por Ptah com o seu cinzel de metal com o qual ele partiu as bocas dos deuses. Eu sou Sekhmet-Uto, a qual está sentada à estibordo do céu; Eu sou Sahit (a grande), alojada entre as Almas de Heliópolis. Por toda a mágica e todas as <afirmações> proclamadas contra mim, contudo, possam os deuses posicionar-se contra eles, toda a minha Enéade e toda Enéade deles.

(ALLEN, 1974, p. 36)

A “Cerimônia de Abertura da Boca” era executada sobre a múmia e as

estátuas do morto com o objetivo de torná-las um receptáculo para o ka. O

ritual poderia ser executado igualmente sobre as barcas sagradas, estátuas

dos deuses, escaravelhos coração, no Touro Ápis e alguns animais sagrados

mumificados. O ritual é executado pelo filho mais velho do morto no papel

do sacerdote-sem ou por um sacerdote-sem profissional, dessa forma,

representando o papel de Hórus, o qual aplica o ritual sobre o corpo de seu

pai Osíris. Após o morto passar por rituais de purificação, libação e

fumigação, o sacerdote irá tocar sua boca, seus olhos, suas orelhas e seu

nariz com diferentes instrumentos, para que o morto possa recuperar os

seus sentidos. Muitos desses instrumentos eram semelhantes aos usados

pelos artesãos. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, informação verbal9; HART,

1986, pp. 173-4; SHAW, NICHOLSON, 1995, pp. 211 e 230; WILKINSON,

2003, p. 126)

O sacerdote-sem pertencia ao clero de Ptah em Mênfis, tendo a função

principal de vestir a estátua divina. Mas ele também servia ao clero de

Sokar, deus da necrópole menfita, sendo por isso o principal executor da

“Cerimônia de Abertura da Boca”. (GOYON, 1972, pp. 96-7)

Segundo alguns autores, como Hart e Shaw:

Foi sugerido que a sua [Ptah] virtual, a omissão do culto funerário real poderia ter resultado da relutância do sacerdócio de Rê de Heliópolis do Antigo Império de permitir um deus menfita de rivalizar com o deus-sol. A Ptah, contudo, era creditado como tendo inventado a Cerimônia de Abertura da Boca e talvez num espírito

9 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 3 – Da casa do túmulo: a jornada rumo ao Ocidente. Ministrada em: 15 out. 2004.

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parecido de rivalidade teológica os sacerdotes de Ptah imaginaram um mito de criação (a Teologia Menfita), na qual Ptah dava o nascimento à Rê e sua Enéade.

(SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 230)

Na literatura funerária mais antiga composta pelos “Textos das

Pirâmides”, o deus só é mencionado em três fórmulas (PT 345, PT 349 e PT

573). Nestas ele aparece em conexão com Werkaf, o mordomo de Hórus, o

qual também era um “primogênito do palácio de Ptah”, sempre em conexão

com a provisão de comida para o rei falecido. (VAN DIJK, 2001, p. 74; HART,

1986, p. 173; SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 230)

Ó Werkaf, mordomo de Hórus, mestre do salão de Rê, primogênito do palácio de Ptah, dê-me o suficiente para que eu possa comer em conformidade com o que você dá, (até) o suficiente para me alimentar.

PT 349

(FAULKNER, 1910, p. 112)

No “Livro dos Mortos” também encontramos o deus Ptah ligado à

provisão de comida, como pode ser observado no Capítulo 82:

FÓRMULA PARA ASSUMIR A FORMA DE PTAH, COMER PÃO, TOMAR CERVEJA, EXCRETAR DO ÂNUS E EXISTIR VIVO EM HELIÓPOLIS

[...]

c “Do que você viverá daqui em diante?” falam eles, os deuses e os bem-aventurados, para mim. Eu vivo e medro com cerveja (quente). “Você de fato come-o?” eles falam, os deuses e os bem-aventurados, para mim. Eu medro a medida que eu o como em baixo das (folhagens e ) ramos da árvore-imA de Háthor, minha Senhora, a qual providenciou oferendas de comida, a qual providenciou pão e cerveja (em Busiris) e recompensas em Heliópolis. Eu visto um traje de linho da mão de Tayet. Eu fico em pé ou sentando onde eu desejar.

[...]

(ALLEN, 1974, p. 71)

E no capítulo 106:

FÓRMULA PARA DAR OFERENDAS PARA N. EM MÊNFIS E NOS DOMÍNIOS DO DEUS PARA SER DITO POR N.:

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Ó Primogênito, senhor das provisões, Ó Primogênito presidindo sobre as casas superiores e (vós) o qual dá pão a Ptah, dá-me meu pão, dá-me minha cerveja. Meu café da manhã (consiste) de uma perna e um doce. Ó barqueiro do Campo dos Juncos, traga-me esses pães (para) os seus domínios aquosos assim como (para) teu Pai, o mais velho, o qual partiu na barca do deus.

(ALLEN, 1974, p. 85)

Além disso, há, no Antigo Império, em contexto funerário,

primeiramente uma relação sincrética com o deus falcão menfita Sokar,

sendo conhecido como Ptah-Sokar; mais tarde, no Médio Império, junta-se a

esta forma sincrética o deus Osíris, formando o deus Ptah-Sokar-Osíris.

O povo comum recorria frequentemente a Ptah sob o seu epíteto, “o

qual ouve preces”. Muitas estelas votivas foram

achadas na área do templo de Ptah em

Memphis e em outras partes do Egito

entalhadas com representações de orelhas

humanas e dedicadas ao deus como

(msDr-sDm) meserdjer-sedjem, “o

ouvido o qual tudo escuta”, o qual iria escutar

as petições dos devotos (Fig. 10). Contudo são

raros os amuletos encontrados dedicados a este

deus. Dos que existem, os amuletos

plaqueformes representando o deus flanqueado

por Sekhmet e Nefertum são principalmente

atribuídos à XXVI Dinastia e podem ter sido

usados primordialmente em vida do que no contexto funerário. (WILKINSON,

2003, p. 125)

Em canções (de amor) e preces, ele era invocado sob os títulos

“Belo de Face (nfr-Hr)” e “Senhor da Verdade (nb-mAat)”, onde o deus é

requisitado a trazer a companhia da dama desejada para o seu admirador à

noite:

Eu quero ir para Mênfis; eu quero ir ao encontro de Ptah, o Senhor da Verdade, falar: dê-me a irmã hoje à noite!

(STOLK, 1911, pp. 44-5)

Figura 10 - Estela votiva de Ptah, encontrado no Templo de Ptah em Mênfis, XVIII Dinastia (Nacional Museum of Ireland NMI 1908:518)

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Ou como deus do destino, em relação ao qual as pessoas

experimentavam um senso de devoção pessoal (HART, 1986, p. 176; STOLK,

1911, pp. 44-5; VELDE, 1982-1986, p. 1179):

Ptah, meu coração é pleno de ti, meu coração é embelezado de teu amor como um pântano o é de flores de lótus. Eu fiz a minha casa ao lado do seu templo.

(VELDE, 1982-1986, p. 1180, nota 23)

Seu epíteto de (nfr-Hr) “Belo ou Piedoso de Face” ainda não tem um

significado conclusivo, sendo que para Hart:

Este epíteto explica a idéia de esplendor da divindade de Ptah na única área de sua anatomia, outra que seus antebraços, a ser reconhecível fora de sua vestimenta. Sua carne era vista imaginada como que consistindo de ouro.

(1986, p. 176)

Te Velde sugere que o epíteto deve ser tomado como “de aspecto

misericordioso”,

desde que não há razão para assumir que os egípcios pensavam um deus com cabeça de animal mais feio do que um deus com cabeça humana. Uma figura em relevo de Ptah, o qual escuta preces no templo de Medinet Habu tinha um impressivo olho incrustado, acentuado o seu aspecto benevolente.

(1982-1986, p.1179)

O principal templo do deus Ptah situava-se na cidade de Mênfis, da

qual ele era o deus patrono. Conforme Stolk (1911, p. 6) nos conta, Menés, o

primeiro Faraó do Egito, construiu uma fortaleza, chamada inb HD (“a

muralha branca”) no nomo menfita, que mais tarde se tornou a cidadela de

Mênfis, e construiu um Templo para Ptah. Este templo talvez possa ser

identificado com o templo mencionado na Pedra de Shabaka, “Templo de

Ptah, Balança das Duas Terras, na qual o Alto e o Baixo Egito se mantêm em

equilíbrio” (STOLK, 1911, p. 32). Talvez o templo chamado de “Casa do deus

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Ptah, o qual reside ao sul de sua muralha” refira-se ao mesmo templo.

Infelizmente pouco restou de seu templo na atualidade.

Vários epítetos de Ptah estão associados ao seu templo em Mênfis. No

epíteto de (rsi inb.f) “aquele que está ao sul de sua muralha” temos

uma referencia à posição de seu santuário atrás dos muros (brancos) ao sul

de Mênfis. (VAN DIJK, 2001, p. 74; HART, 1986, p. 175; VELDE, 1982-1986,

p. 1179; WILKINSON, 2003, p. 124) Já o epíteto de (Hr st wrt)

“(ele que está) sobre o seu Grande Trono” é tomado por te Velde (1982-1986,

p. 1179) como o lugar no templo de Ptah em Mênfis, onde os reis eram

coroados, enquanto para van Dijk (2001, p. 74), ele se refere ao próprio

templo. O epíteto (nb anx-tAwy) “Senhor de Ankh-tawy”, adquirido

no Médio Império, referia-se à cidade de Mênfis, para Wilkinson (2003, p.

124), e, para van Dijk (2001, p. 74), à área na margem ocidental do Nilo

entre a cidade e necrópole no deserto. E, por último, podemos mencionar

(xry-bAq=f), “o qual está sob a sua árvore de moringa”, o

qual torna-se comum no Médio Império, referindo-se ao antigo deus-árvore

de Mênfis, o qual foi absorvido por Ptah em tempos antigos. (HART, 1986, p.

176; WILKINSON, 2003, p. 124)

O Touro sagrado Ápis, residindo ao sul do Templo de Ptah em

Mênfis, estabelece desde cedo uma relação com este deus. No início, era

visto como arauto ou filho de Ptah, e, da XVIII Dinastia em diante, o Touro

Ápis passa a ser visto como a manifestação viva de Ptah. (VAN DIJK, 2001,

pp.74-5, WILKINSON, 2003, p. 170) Havendo apenas um touro sagrado por

vez, o novo Ápis era cuidadosamente escolhido após a morte de seu

antecessor, devendo conter as seguintes marcas conforme Heródoto

(Histórias III): “Ele é preto e tem uma mancha quadrada branca na fronte; e

nas costas a figura de um falcão; e o rabo em pelos duplos; e na língua um

escaravelho.” Era dito que o Touro Ápis nascia de uma vaca virgem,

chamada vaca Ísis, a qual havia sido fertilizada pelo deus Ptah. Depois de

reconhecidos, ambos eram levados para Mênfis. No templo, o Touro Ápis

tinha os seus sacerdotes e um harém de vacas. Ele participava de rituais e

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procissões religiosas, sendo considerado um dos mais importantes

mensageiros oraculares. (MYŚLIWIEC, 2000, p. 60; WILKINSON, 2003,

pp.170-2) Em associação com Ptah, ele exprimia o seu “poder procriador

como uma expressão concreta do poder criativo de Ptah” (WILKINSON, 2003,

p. 170).

Segundo alguns autores gregos, quando completava 25 anos o

touro era cerimonialmente morto e era sepultado com regalias semelhantes a

um Faraó no Serapeum, em Saqqara. Após a morte, ele se fundia com Osíris,

tornando-se o deus Ápis-Osíris ou Osirapis. Enquanto ainda estava vivo,

também poderia ser considerado a ba do deus Osíris. (MYŚLIWIEC, 2000, p.

61; WILKINSON, 2003, p. 171).

Fora de Mênfis, a presença de Ptah é atestada no grande templo de

Amun em Karnak em Tebas desde, pelo menos, o Médio Império. Ali ele

tinha o seu próprio santuário, que foi expandido ao longo do tempo. Ptah

também possuía uma capela construída por Séthi I no templo de Osíris em

Abidos. Ramessés II homenageou o deus na Núbia no templo de Abu Simbel,

El-Derr e Gerf Hussein. Como deus patrono dos artesãos, Ptah era

particularmente venerado em Deir el-Medina. (STOLK, 1911, p. 34-5;

WILKINSON, 2003, p. 126)

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CAPÍTULO 3. SOKAR

O culto ao deus Sokar e à sua barca Henu pode ser encontrado desde

os primórdios da história do Egito antigo. Inicialmente ele habita a região

dos cemitérios mênfitas, conhecido como Rosetau. Ele tem uma relação

antiga com os deuses Ptah e Osíris, não se sabendo ao certo se seus

atributos como um deus artesão e funerário vieram desses deuses ou, pelo

contrário, Sokar passou tais atributos para esses deuses. Como um deus

artesão, era conhecido principalmente pelo trabalho com o metal. Na esfera

funerária, atuava no renascimento de Osíris e na transferência do poder real

para Hórus. Posteriormente, no Novo Império, ele também atua no

renascimento do deus-sol, quando este passa pelos reinos do Amduat em

sua viagem noturna. Apesar de não ter nenhum templo exclusivo para si,

Sokar e sua Barca Henu foram adorados em todas as partes do Egito, até o

Período Romano.

O nome (¤kr) Sokar aparece inicialmente na III Dinastia ligado ao

festival em homenagem a este deus. Já nos “Textos das Pirâmides”,

encontramos o nome de Sokar acompanhado do determinativo de deus

ou do determinativo da barca Henu . Está última forma de

escrever o nome de Sokar torna-se comum a partir da V Dinastia, podendo-

se às vezes encontrar apenas o ideograma da barca Henu para designar o

nome do deus Sokar. (ERMANN, GRAPOW, 1971, Vol. III, p. 487;

GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, p. 2)

A partir do Médio Império encontramos uma nova forma do nome do

deus (¤kry) Sokary, igualmente encontrada com o determinativo .

Essas grafias, esporádicas no começo, tornam-se comuns no II Período

Intermediário, quando é possível encontrar mais uma forma do nome do

deus (¤krty) Sokarety. (GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 2-3)

No Novo Império encontramos as diferentes grafias do nome

acompanhadas de diferentes epítetos de Sokar, alguns emprestados de

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outros deuses, como Osíris. Entre os mais comuns estão: (nb Styt)

“Senhor da Shetayet”, (Hry-ib Styt) “O qual está em Shetayet”,

(nTr aA) “Grande Deus”, (nb pt) “Senhor do Céu” e (xnty Imntt)

“Primeiro dos Ocidentais”. (GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 3-4)

O verdadeiro significado do nome Sokar nos é desconhecido, existindo

diversas suposições. Os “Textos das Pirâmides” nos falam do surgimento do

nome de Sokar das palavras ditas por Osíris quando ele foi abatido por seu

irmão Seth em Nedit e faz um apelo as suas irmãs Ísis e Néftis.

Ísis vem e Néftis vem, uma delas do oeste e uma delas do leste, uma delas como um “falcão gritante”, uma delas como um milhafre; elas acharam Osíris, seu irmão Seth tendo-o deitado em Nedit; quando Osíris falou “Saia de perto de mim”, quando o seu nome se tornou Sokar.

PT § 1256

(FAULKNER, 1910, pp. 199-200)

M. Atzler (1971) levará em conta o nome do deus (¤kr) em conjunto

com o determinativo da barca Henu . ¤kr será interpretado por ele como

“transportar”, e o determinativo será interpretado como o rei morto (falcão)

na barca, sendo transportado por uma área desértica (presença do trenó sob

a barca), certamente a região da necrópole menfita. Essa suposição é feita

baseada principalmente nas passagens dos “Textos das Pirâmides”, nas

quais nos é dito que o rei morto é transportado por seu filho para o céu na

barca Henu. A partir da suposição de que skr significa “transportar”, Atzler

irá reinterpretar a fala de Osíris no PT § 1256, apresentada acima como uma

das possibilidades do significado do nome Sokar, da presente forma:

“Quando Osíris falou (para aqueles que o acharam): “(me) transportem,

quando seu nome (do rei falecido) surgiu como ¤kr.” (1971, p. 11)

Já para S. Aufrere skr assemelha-se ao verbo sqr, “bater o

metal”. Este significado estaria, portanto, associado à função de Sokar como

patrono dos artesãos, em especial dos trabalhadores de metal. (ERMANN,

GRAPOW, 1971, Vol. IV, p. 306; GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp.5-

6) Seguindo a mesma linha de que Sokar seria originalmente um deus dos

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metalúrgicos, Wolfgang Helck acredita que a palavra skr descende do

vocábulo sumério zubar, zabar, o qual por sua vez seria uma derivação do

vocábulo acádio siparru, vindo este a significar bronze e cobre (HELCK,

1991, p.162).

A. Gardiner conclui a partir de um Hino para Sobek, inscrito em um

papiro da XXII Dinastia encontrado no Ramesseum, que skr refere-se ao ato

de limpar a sujeira na face do morto, evocando o contexto de um afogado.

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 6-7)

Este limpa (sk) a boca (r) de seu pai em seu nome de Sokar!

(British Museum, online)

No entanto, Graindorge-Héreil pressupõem que o ato de limpar a boca não

está ligado à purificação, e sim ao Ritual de Abertura da Boca. Além do

trecho acima, ela usa como suporte para sua afirmação a fórmula 816 dos

“Textos dos Caixões”:

Abra, arame, diz Anúbis, para o céu! Desça, arame, e fure o

Ocidente! “Este é o arame que está sobre minha boca, (ele) que Sokar glorificou em Heliópolis e que purifica (?) a minha boca. Ó (vós que es) puro, arame, (faça) com que ele seja hábil e forte!

(BARGUET, 1986, p. 43)

Outra explicação para o nome de Sokar, originalmente proposta por

Hermann Kees (Apud GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, p. 5), associa o

mesmo com um ritual de fertilidade realizado por ocasião da inauguração do

templo de Séti I em Abidos. Ali, em uma inscrição, a deusa Seshat chama

Sokar de “cortador”, por ele estar segurando uma enxada para romper a

primeira terra fértil trazida com a cheia do Nilo, desta forma também

reforçando o caráter agrícola de Sokar. (HART, 1986, p. 149; GRAINDORGE-

HÉREIL, 1994, Vol. I, p. 5)

Você está diante de mim em sua forma de Henu, suas mãos

tem a enxada. Ele colocou no lugar seus quatro muros que são fixos com perfeição como os quatro suportes do céu ...

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, p. 5)

Alguns estudiosos associam o nome de Sokar ao vocábulo Saqqara

(BROVARSKI, 1984, p. 1056; GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 7-8).

Para Graindorge-Héreil, tal interpretação seria errônea, pois Saqqara teria a

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sua origem provável no nome de uma tribo Berbere, Beni Saqqar

(GRAINDORGE-HÉREIL. 2001, p. 305).

Segundo acreditam alguns estudiosos, a forma inicial de Sokar era a

forma de um monte, tendo acima uma cabeça de falcão, às vezes com asas

pendendo (Fig. 11). Este é em geral interpretado como sendo um monte

funerário, de minério, ou a capela shetayet. Em geral, o monte é encontrado

no interior da barca Henu. (BROVARSKI, 1984, p. 1056; HOLMBERG, 1946,

p. 123; WILKINSON, 2003, p. 210) Hermann Kees (Apud BROVARSKI, 1984,

p. 1056) acredita ser o monte o objeto de culto original de Sokar, pois o

falcão, conforme a sua visão, é um elemento secundário em seu culto, sendo

este uma influência de Hórus. Para Richard Wilkinson (2003, p. 210), o

epíteto de Sokar, “aquele que está sobre a sua areia”, encontrado no “Livro

do Amduat”, é uma referência a essa forma do deus.

Na sua forma mais comum, encontrada a partir do Novo Império,

Sokar aparece como um deus antropomorfo, com cabeça de falcão, sentado

ou em pé (Fig. 12). Muitos de seus atributos são tomados de outros deuses.

Em comum com Osíris encontramos o uso da coroa HDt ou Atf, e nas mãos

ambos portam o cajado e o açoite. O disco-solar e o uraeus são elementos

Figura 11 - Barca Henu no templo Ptolomaico de Háthor de Deir el-Medina, Período Ptolomaico.

Figura 12 - Thutmés III fazendo oferendas para o deus Sokar, XVIII Dinastia, Deir el-Bahari.

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solares presentes em sua iconografia. E às vezes podemos encontrar uma

identificação com o deus Hórus, quando Sokar é encontrado usando as

coroas do Alto e Baixo Egito. Sokar também pode

ser encontrado representado na forma de um falcão

mumificado, em geral coberto por um manto

funerário vermelho, com contas no padrão de favo,

usado por deuses funerários a partir do período

Ramessida na tenda de mumificação de Anúbis, e

que às vezes porta o disco solar na cabeça (Fig.

13). Na forma humana, portando a coroa Atf, o deus é encontrando em raras

ocasiões. (BROVARKSI, 1984, pp. 1062-1063; GRAINDORGE-HERÉIL, 1994,

Vol. I, pp.8-9; WILKINSON, 2003, p. 210)

As menções a relações familiares de Sokar são poucas. Nos “Textos dos

Caixões” é dito que Res-udja é seu filho, e no Período Ptolomaico, Sokar e

Néftis às vezes formam um casal. (BROVARSKI, 1984, p. 1061-1062) Ele

também apresenta uma contraparte feminina, Sokaret, a qual aparece em

rituais no Novo Império. No Período Ptolomaico ela é assimilada a Háthor.

(BROVARSKI, 1984, p. 1062)

Tanto na iconografia como no contexto textual podemos encontrar o

deus Sokar desde tempos primordiais freqüentemente associado a sua barca

chamada de (Hnw) Henu. Às vezes é até mesmo possível

encontrar o nome de Sokar substituído pelo da barca Henu. (ERMANN,

GRAPOW, 1971, Vol. III, p. 109) Sua forma característica já é encontrada no

Antigo Império, sendo posteriormente, no Novo Império, apenas acrescida de

mais ornamentação. A barca Henu está repousada sobre uma armação que é

reforçada por quatro suportes e colocada sobre um trenó, o qual recebe o

nome de trenó-mfx, sendo este último também um objeto de culto. Na proa

elevada encontra-se a cabeça de um antílope (Oryx beisa) olhando para o

interior da barca. Segundo Graindorge-Héreil (1994, Vol. I, p. 18), o casco da

barca seria feito com a pele desse mesmo animal. O antílope é considerado

Figura 13 - Sokar na forma de um falcão mumificado (Museu do Louvre)

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um animal do deserto por excelência, que está associado ao mundo da noite,

pois ele teria escondido ou engolido o olho wedjat. A partir do reinado de

Amenhotep III ele é sacrificado e sua cabeça é dada como uma oferenda para

Sokar. Abaixo segue um grande número de estais ou remos, conforme a

interpretação. A popa é adornada por dois remos de pilotagem.

Posteriormente podemos ver como acréscimo: atrás da cabeça de antílope

uma cabeça de touro olhando para frente, de cuja boca oscila uma corrente

ou corda, um peixe-inet (Tilapia nilotica) e seis falcões ou andorinhas

alinhadas em frente à cabine em cima dos remos. O peixe-inet e as

andorinhas também estão presentes na barca solar em sua viagem noturna,

e tem a função de guiá-la e protegê-la dos inimigos do deus-sol, em especial

da serpente Apepi. Da mesma forma as andorinhas podem ser identificadas

com as bas dos mortos, as quais se juntam ao deus-sol em sua viagem

diária, após terem-se tornado espíritos glorificados. Assim podemos dizer

que esses pássaros são os marinheiros que conduzem a barca Henu em sua

viagem. O número de remos de pilotagem é aumentado para três, depois

quatro. Na parte central da barca está um falcão, e, no Novo Império temos a

capela shetayet de Sokar, no topo da qual está um falcão em pé ou agachado

e na qual a imagem sagrada pode ser vislumbrada, ambas veladas por um

véu. Posteriormente ela evolui para um objeto cônico sobrepujado pela

cabeça de um falcão. No Período Ptolomaico a capela pode ser configurada

na forma de um sarcófago, com Sokar como uma múmia, deitado sobre uma

Figura 14 - Barca Henu, XIX Dinastia (Abidos)

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armação no interior. (Fig. 14) (BROVARSKI, 1984, pp. 1066-1067;

BRUYÈRE, 1952, pp. 106-108; GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 17-

33; OSBORN, OSBORNOVÁ, 1998, p. 166)

Nos “Textos das Pirâmides” (§1823) encontramos a afirmação de que

são os Filhos de Hórus que elevam a barca para o céu, e nos “Textos dos

Caixões” é dito que o deus Anti supervisiona a viagem da barca Henu.

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, p. 28; HART, 1986, p. 23)

A barca Henu não é uma embarcação feita para navegar, mas sim para

ser puxada. Como nos mostra o “Amduat”, as terras de Sokar são arenosas,

e um dos principais acontecimentos do Festival de Sokar é quando a barca

Henu é puxada pelo faraó em volta dos muros do templo. A sua iconografia

também já aponta para essa direção, pois a barca sempre é representada

sobre o trenó-mfx e posteriormente temos a corda que sai da boca do touro.

O culto a Sokar já se encontra estabelecido desde o Antigo Império,

como podemos observar nos fatos relacionados à celebração de seu festival e

através de títulos sacerdotais. Mas não sabemos qual a sua função original,

sendo a questão ainda debatida na Egiptologia até hoje. Outro fator que

dificulta saber se Sokar era originalmente um deus dos artesãos, funerário

ou agrícola, é a sua associação e sincretismo prematuros com outros deuses,

em especial Ptah e Osíris, dessa forma não se tendo certeza a qual deus a

função pertencia originalmente.

O domínio de Sokar era conhecido como Rosetau (R-stAw), “a boca (ou

abertura) das passagens” ou “entrada das galerias subterrâneas”, a área do

deserto onde se localizava a necrópole mênfita ou, mais especificamente, a

necrópole de Giza, segundo algumas interpretações baseadas na estela da

esfinge de Thutmés IV. (COCHE-ZIVIE, 1984, pp. 304-305) Brovarski

acredita que

Sokar pode ter se tornado um patrono das artes porque, como um deus adorado na necrópole mênfita, os artesãos ali trabalhando para providenciar equipamento para as pessoas enterradas em seus cemitérios o adotaram como a sua deidade especial.

(1984, p. 1057)

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Para ele o aspecto funerário de Sokar ainda não estava

particularmente marcado no Antigo Império, ganhando uma maior ênfase

apenas no Médio Império, da mesma forma que Hart (1986, p. 149) atribui à

conexão com Osíris o surgimento de tal aspecto.

Wolfgang Helck (1991) desenvolve ainda mais a afirmação de Sokar ser

originalmente um deus dos artesãos, em especial dos trabalhadores de

metal, ao ver toda a simbologia ligada ao deus como tendo uma origem

ligada ao trabalho do metal. O Festival de Sokar representaria a chegada (ou

partida) ritualizada de metalúrgicos ambulantes. Na procissão vemos

sacerdotes (trabalhadores de metal) seguindo a barca Henu carregando

bastões (tbA) e zarabatanas (wx), aludindo àqueles utilizados no trabalho do

metal. O monte encontrado na parte central da Barca Henu seria o minério

utilizado pelos trabalhadores. A capela shetayet, por ser um recinto abodado

construído artificialmente, segundo as suas conclusões, e não uma caverna

natural, seria o forno de fundição.

Como um deus artesão, Sokar era adorado especialmente pelos

trabalhadores de metais. Em tal aspecto é dito nos “Textos das Pirâmides”

que o presente deus teria produzido os ossos reais, e no “Livro dos Mortos”

ele fabrica as tigelas de prata para o morto usar como vasilhas de alimentos

e para lavar os seus pés. (BROVARSKI, 1984, p. 1057; HART, 1986, p. 149;

WILKINSON, 2003, p. 209) Como se encontra, por exemplo, no capítulo 172

do “Livro dos Mortos”: “Tu lavastes teus pés em tigelas de prata forjadas

pelos artesãos de Sokar” (ALLEN, 1974, p. 180) As jóias representadas numa

cena de oferenda na tumba da mãe de Antefoker, vizir de Amenemhat I e

Senusret I são ditas de serem: “os ornamentos habituais da necrópole, os

quais Sokar moldou com os seus próprios dedos, compostos de prata,

electrum, lápis-lazúli, turquesa e coralina.” (DAVIES-GARDINER Apud

BROVARSKI, 1984, p. 1057) Como um moldador de objetos, Sokar é

posteriormente associado à mistura de substâncias aromáticas para os

unguentos (HART, 1986, p. 149). Sokar continua a ser mencionado como um

deus artesão até o Período Greco-Romano, como pode ser visto nas palavras

do rei que oferece um espelho para a deusa Háthor: “Tome o espelho, que

Sokar modelou.” (MARIETTE Apud BROVARSKI, 1984, p. 1057)

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Na sua função como um deus artesão, Sokar está fortemente ligado à

Ptah, o deus patrono da cidade de Mênfis, e também ele um deus dos

artesãos. Em Mênfis a residência de Sokar era o templo de Ptah e os

sacerdotes desses dois deuses atuavam no culto de ambos. Essa

proximidade fez com que desde ao menos à V Dinastia surgisse o deus

sincrético Ptah-Sokar, como pode ser observado, por exemplo, nas estelas da

tumba de Shepsesptah em Saqqara, na mastaba da VI Dinastia em

Elefantina, pertencente à Herkhuef, e na estela numa mastaba em Edfu, da

VI Dinastia, pertencente ao oficial mênfita Kar Merirē-nefer (HOLMBERG,

1946, pp. 125-126). No Médio Império, Ptah-Sokar passa a adotar os

epítetos, os quais pertenciam originalmente aos deuses em separado, e

representações suas surgem apenas no Novo Império. No material pictórico

ele é sempre representado sob o aspecto de um dos dois deuses, nunca uma

mistura de elementos de ambos, dominando a forma de Sokar. (BROVARSKI,

1984, p. 1059-1560; HOLMBERG, 1946, pp. 124-137) Holmberg chega a

sugerir que “é possível que Ptah-Sokaris era o nome usualmente dado as

imagens de Sokar” (1946, p. 137).

Por Sokar residir na região do cemitério mênfita, alguns autores,

como Mikhail e Roeder, consideram Sokar um deus predominantemente

funerário. Neste contexto, como podemos observar nos “Textos das

Pirâmides” do Antigo Império, o deus está particularmente vinculado ao rei e

a Osíris. Ali Sokar é descrito como um deus ativo no renascimento do rei/de

Osíris e nas cerimônias de confirmação e transferência do poder real para o

herdeiro do trono/Hórus. É a barca Henu que carrega o rei morto/Osíris

para o céu depois que ele se tornou Sokar. (BROVARSKI, 1984, pp. 1057-

1058; GRAINDORGE-HÉREIL, 2001, p. 305)

O rei é colocado na barca de Sokar

Ó Osíris o Rei, Hórus te ergueu para dentro da barca Henu, ele te eleva na Barca de Sokar, pois ele é o filho que eleva o seu pai, Ó Osíris o Rei, no seu nome de Sokar. Que você possa ser no Alto Egito assim como esse Hórus através de quem você é poderoso; que você possa ser poderoso no Baixo Egito assim como esse Hórus através de quem você é poderoso, que você possa ser poderoso e proteger a si de seus adversários.

PT 645

(FAULKNER, 1910, p. 266)

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Aqueles autores, como visto acima, que tem Sokar como inicialmente

um deus dos artesãos, acreditam que ele somente ganha destaque como um

deus funerário no Médio Império, não considerando a conexão de Sokar com

o Rei nos “Textos das Pirâmides”, de caráter especificamente funerário. Mas,

ao mesmo tempo, podemos observar que em seu caráter como deus

modelador, Sokar está ligado ao universo funerário, pois os objetos que

produz estão relacionados com o morto e os primeiros artesãos a terem

Sokar como seu patrono são aqueles que trabalham na necrópole.

No Médio Império observamos que Sokar adquire um caráter mais

popular, não servindo mais apenas ao rei. Nos “Textos dos Caixões”, sua

principal função é a transfiguração do morto e ele também está associado

com o Ritual de Abertura da Boca. Fórmulas e oferendas funerárias que

mencionam Sokar também aparecem no Médio Império, como as nas

modestas estelas de madeira reusadas da XI Dinastia encontradas em

tumbas em Asasif e Deir el-Bahari, as quais mostram cenas do morto diante

de mesas de oferendas, com Sokar aparecendo sobre as oferendas na barca

Henu. Junto aos mortos encontramos títulos como “honrado por Sokar” ou

“honrado no séqüito (Sms) de Sokar, Senhor do Sepultamento (orst), mais que

os ancestrais”. (BROVARSKI, 1984, pp. 1058 e 1063; GRAINDORGE-

HÉREIL, 2001, p. 305)

Em seu aspecto funerário, Sokar está fortemente ligado a Osíris. Para

Mikhail (1984, p. 26), Sokar se distingue de outros deuses dos mortos,

devido a sua relação a Osíris, sendo ele responsável pela ressurreição de

Osíris e a transferência de seus poderes para Hórus. Ambos os deuses já

estão fortemente associados entre si nos “Textos das Pirâmides”, onde Sokar

aparece como um nome ou aspecto de Osíris. Da mesma forma, é dito que

Hórus faz um espírito de seu pai na forma de Sokar, levado pelo mesmo na

barca de Sokar e mantido na Mansão de Sokar. Em várias outras fontes,

além dos “Textos das Pirâmides”, como a Pedra de Shabaka e o Papiro

Bremner-Rhind, é dito que o corpo de Osíris é enterrado na capela shetayet

de Sokar. (BROVARSKI, 1984, p. 1060; MIKHAIL, 1984, pp. 25-27)

A partir do Médio Império podemos encontrar ambos os deuses na

forma sincrética de Sokar-Osíris e no Novo Império de Osíris-Sokar. A

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segunda forma torna-se mais popular apenas no Período Greco-Romano,

quando Osíris-Sokar é visto como o Juiz dos Mortos. Como exemplo, temos o

romance de Setne (segundo), onde os justo são postos ao lado dos

abençoados, os quais servem Sokar-Osíris. Do Novo Império em diante Sokar

também adquire cada vez mais um aspecto osirificado, no final tornando-se

apenas uma forma de Osíris. (BROVARSKI, 1984, p. 1060) No Médio Império

também surge o deus sincrético Ptah-Sokar-Osíris.

Kess, ao contrário dos demais autores, apresenta Sokar como sendo

inicialmente um deus ctônico associado com a agricultura. Ele baseia-se nos

dados do Festival de Sokar realizado nos mês de Khoiak e no fato de que o

ritual no seu culto incluía atividades agrícolas, como conduzir rebanhos,

sovar a terra e usar colares de cebolas. Brovarski opõem-se a Kees

argumentando que suas associações foram feitas a partir de dados do Novo

Império. (BROVARSKI, 1984, p. 1058; MIKHAIL, 1984, p. 26)

Do Novo Império em diante Sokar irá estabelecer uma relação com o

deus-sol. Neste período a barca Henu de Sokar pode ser vista como uma

barca solar que percorre o céu noturno, representando o triunfo solar sobre

a morte, sendo uma contraparte para a barca diurna do sol. Essa relação

pode ser observada na iconografia, onde observamos que os acréscimos

feitos no Novo Império (veja acima) são claramente elementos solares.

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, p. 33; 2001, p. 305)

A quarta e quinta hora noturna do Amduat são dedicadas à passagem

do deus-sol pelo Rosetau, a terra de Sokar “o qual está sobre a sua areia”

(Hry As.f). Aqui o domínio de Sokar é retratado como uma vasta caverna no

deserto, onde predomina a escuridão e a barca solar tem de ser puxada por

terra, em contraste com as outras horas quando a barca solar navega numa

espécie de Nilo subterrâneo. No registro do meio da quarta hora, Thot

entrega o olho do deus sol (a sua luz) para que Sokar tome conta dele e

ilumine esta região sombria. (Fig. 15) Na quinta hora não temos uma divisão

tão clara dos registros como nas outras horas. O registro do meio, onde os

demais se encontram está em destaque, e nele encontramos a “misteriosa

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Figura 15 - Quarta Hora Amduat (HORNUNG, 1991, p. 60)

Figura 16 – Quinta Hora Amduat (HORNUNG, 1991, p. 68)

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caverna de Sokar”. No registro inferior, elevando-se até o registro do meio,

está aqui representado em uma espécie de corte transversal a “Terra de

Sokar”, em cuja parte central se encontra a “caverna” ou “cripta” de Sokar,

sobre a qual a Barca Solar é puxada. Este oval pode ser entendido como todo

o Mundo Inferior, no qual o deus reside e os raios do Sol não podem

penetrar, mas o qual é ativado pela passagem diária do sol. (Fig. 16)

(BROVARSKI, 1984, pp. 1051 e1059; HORNUNG, 1991, pp. 62, 67 e 74-75;

2002, pp. 93, 109-110 e 112) Acima deste podemos encontrar a seguinte

descrição da cena:

Assim essa Imagem é constituída na escuridão primordial. O oval, pertencente a esse deus (Sokar) é iluminado, através

de ambos os olhos das cabeças do Maior dos Deuses (o deus-sol na forma de serpente).

Ambas as pernas (de Sokar) estão iluminadas ao redor do Maior dos Deuses, enquanto ele vigia a sua Imagem.

Um ruído é ouvido desse Oval, após o grande Deus ter sido puxado por ele, como a voz do trovão do céu numa tempestade.

(HORNUNG, 2002, pp. 113-114)

Para Graindorge-Héreil (2001, p. 306), o terrestre Ptah-Sokar torna-se

Sokar-Osíris, a encarnação noturna do Sol nesta passagem do Amduat,

desta forma possibilitando que o Sol complete seu curso durante a noite e

que renasça ao amanhecer. Na décima hora encontramos a ba de Sokar, a

qual acompanha o deus-sol até o céu. (HORNUNG, 1991, p. 166; 2002, p.

167)

No Período Greco-Romano, Sokar passa a ser conhecido como o

“pequeno sol”, e também temos conhecimento de um deus Sokar-Rê. Devido

a esse sincretismo, a capela shetayet era dita estar localizada em Heliópolis.

(BROVARSKI, 1984, p. 1051)

Assim Sokar, que atuava inicialmente no renascimento de Osíris no

Antigo Império, passa a atuar no renascimento diário do deus-sol em sua

passagem pelo Duat. Dessa forma ele se torna uma peça vital na

continuidade dos dois ciclos principais para os egípcios, o osiríaco e o solar.

Através da sua ação, Osíris e o deus-sol vencem a morte, renascendo Osíris

como o “Primeiro dos Ocidentais”, e o sol pode surgir rejuvenescido no

horizonte a cada manhã. No Novo Império, o Festival de Sokar passa a

celebrar esse duplo renascimento.

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Outros deuses ligados ao deus-sol também passam a ter uma ligação

com Sokar, em especial em seu Festival realizado no mês de Khoiak. Em

especial podemos mencionar o deus Nefertum. O estandarte deste deus é

mostrado sendo carregado na representação do Festival de Sokar em

Medinet Habu (Fig. 91), e no templo de Hathor em Deir el-Medina temos

uma cena na qual o deus Anúbis, segurando o disco solar, é seguido pelo

estandarte de Nefertum e pela barca Henu. Ambos os deuses são originários

de Mênfis, mas, segundo William Murnane, eles também tem uma ligação

mais profunda:

Nefertum, como a flor de lótus, simboliza renovação na

teologia do deus sol Rê e dessa forma ele pode aparecer como a realização da vida, a qual é latente apenas em Sokar ele mesmo. Essa relação é formada mais provável por uma exortação proferida por um sacerdote mostrado ao leste da parede, o qual carrega um emblema menor de Nefertum e clama, “Ao redor, ao redor, como Rê!”, assim associando o progresso de Sokar com o curso diário do sol cruzando o céu e através do Mundo Inferior.

(1980, p. 31)

Assim ambos os deuses estão incluídos no ciclo de transformações solares.

Eles também podem ser encontrados na forma do deus sincrético Sokar-

Henu-Nefertum (HOUSER-WEGNER, 2001, p. 516).

Na mitologia, Sokar possui uma capela chamada (STy.t)

shetayet, a qual estaria localizada em Mênfis. Esta é tida como uma cripta

ou caverna subterrânea, a qual evocava o céu da noite, sendo uma

passagem para o mundo subterrâneo. Posteriormente toda capela dedicada a

Sokar passa a receber o nome de shetayet, da mesma forma como pode

designar o Mundo Inferior ou a tumba de uma pessoa. Em seu interior

estaria o caixão contendo Osíris, ou seja, o corpo morto do deus-sol. Talvez

esse fato contribuiu para ela ser posteriormente atribuída ao deus Osíris.

(BROVARSKI, 1984, p. 1058; ERMANN, GRAPOW, 1971, Vol. IV, p. 559;

GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 25 e 37) Para I. E. S. Edwards a

shetayet de Rosetau/Busíris seria a contraparte no Baixo Egito da tumba de

Osíris em Abidos. (Apud JNES, on-line10, p. 49)

10 JSTOR. Disponível em: <http://www.jstor.org/pss/545416>. Acesso em 18 jun. 2008.

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Outro local associado a Sokar é o (Pdw-S) Pedju-she. Ainda não existe

uma definição certa do que exatamente ele seria, da mesma forma como a

sua localização exata, existindo várias hipóteses a respeito. Alguns acham

ser outra capela de Sokar na necrópole menfita. Como um ponto em comum

na maioria das interpretações, Catherine Graindorge-Héreil observa o fato de

ser um local onde existe um curso ou plano d‟água. Em sua opinião o Pedju-

she seria um lago em Abusir; para Roeder ele seria um lago situado na borda

do deserto, e para Bleeker um santuário num Oásis. Sethe, Mercer e

Piankoff acreditam que ele estivesse localizado no Delta. (GRAINDORGE-

HÉREIL, 1994, Vol. I, pp. 35-36)

Até o momento não foi descoberto nenhum templo dedicado

exclusivamente a Sokar, mas seu culto é atestado em vários templos ao

longo da história do Egito antigo. Seu culto é realizado inicialmente na

cidade de Mênfis. Ali era cultuado no templo de Ptah, cujos sacerdotes

serviam a ambos os deuses. Neste templo também eram realizados os rituais

de seu Festival no dia 26 de Khoiak. O principal ato do festival era quando o

faraó deveria puxar a barca Henu duas vezes em volta dos muros do templo.

Já no Antigo Império encontramos o culto de Sokar em outras localidades

além de Mênfis, como em Sheik Said, Meir, Dendera e Assuã. (BROVARSKI,

1984, p. 1063)

Na região tebana o culto à Sokar é atestado desde o Médio Império,

como demonstram as estelas encontradas em Asasif e Deir el-Bahari, já

mencionadas acima. Mas é no Novo Império que ele adquire maiores

dimensões, quando é encontrado em ambas as margens. Na margem oeste

encontramos representações de Sokar na capela de Anúbis, no segundo

terraço do templo de Hatshepsut, e na capela de Thutmés I, no terceiro

terraço em Deir el-Bahari. No Templo Memorial de Amenófis III encontramos

a menção no pilar dorsal do colosso de Memnom do sul que o presente rei

era um “amado de Sokar”, e ali provavelmente existia uma capela em

homenagem à sua forma sincrética de Ptah-Sokar-Osíris. Séthi I oferece

vinho à Ptah-Sokar e incenso para Sokar em uma representação no lintel

sobre a entrada da sala IX de seu templo em Qurna. Em Medinet Habu

temos a representação do Festival de Sokar realizado no mês de Khoiak.

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97

Estas imagens eram uma cópia daquelas que existiriam no Ramesseum,

localizado no registro superior na parede leste ao norte da sala hipostila

principal e no santuário de Sokar na Sala 4. Nesta sala provavelmente ficava

a barca Henu e eram realizados os rituais velados do Festival de Sokar.

(BROVARSKI, 1984, pp. 1063-1064; GRAINDORGE-HÉREIL, 2001, p. 306)

Nas Tumbas particulares do Novo Império, o proprietário podia ser

representado adorando Sokar e a barca-Henu, e às vezes temos a presença

de sua procissão e da “Litania de Oferendas para Sokar em todos os seus

nomes”, a qual enumera 45 formas e cultos do deus. (BROVARSKI, 1984, p.

1064-5)

Bruyère acredita na possibilidade de ter existido um templo em

homenagem a Sokar na margem oeste de Tebas. Suas suposições são feitas

a partir das tumbas raméssidas descobertas por H. Gauthier na região de

Gurnet Murai, as quais mencionam que seus proprietários eram

funcionários religiosos ou laicos do templo de Sokar. A presente região

poderia ser um dos locais onde este templo poderia ter existido. Outra

possibilidade é a de ele estar localizado onde hoje em dia encontramos o

templo Ptolomaico dedicado à Háthor em Deir el-Medina. Para esta última

localidade corroboram o fato de o culto de Sokar ter sido intimamente

associado ao de Háthor em Tebas. (BRUYÈRE, 1952, pp. 109-111)

Na margem leste observamos que vários faraós deixaram homenagens

a Sokar no Templo de Karnak. Entre eles, por exemplo, Thutmés III lhe

dedicou as salas ao sul do santuário axial, no templo de Akhmenu. No lintel

do portão de Amenhotep I, o presente faraó é levado por Sokar e Hórus para

Nekhbet. Na sala interior do templo de Amun-Rê-Horakhte Ramésses II

recebe o heb-sed de Sokar. (BROVARSKI, 1984, pp. 1063-1066)

Do mesmo período também temos uma capela em sua homenagem no

templo de Séthi I em Abidos.

Na iconografia sokariana tardia, a barca Henu torna-se um elemento

dominante, como pode ser visto em uma série de estátuas blocos das XXII e

XXIII Dinastias recuperadas no “cachette de Karnak”. Os faraós também

continuam a adorar o deus em Karnak. Em estátuas e na capela de Osíris

Heqadjet encontramos Osorkon III fazendo oferendas para a barca do deus.

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O rei persa Dário I reboca a barca de Sokar em uma representação no

templo de Hibis no Oásis de Kharga. Os reis Ptolomaicos aparecem

oferecendo incenso e outras oferendas para Sokar em diversos templos,

entre os quais podemos mencionar: o propileu de Khonsu em Karnak, no

templo de Montu na parte norte de Karnak, no templo de Háthor em Deir El-

Medina, no templo de Hatshepsut em Deir el-Bahari e em Medinet Habu. Em

Edfu ele tinha uma capela e em Dendera um santuário nesse período. Seu

culto continua até o Período Romano. O Imperador Claudio oferece um touro

e oferendas no templo de Triphis em Atripe, e no vestíbulo de Caracalla em

Philae observamos Osíris-Sokar despejar libações diante de Osíris entre as

deusas Ísis e Néftis aladas. (BROVARSKI, 1984, pp. 1065-1066;

GRAINDORGE-HÉREIL, 2001, p. 306)

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CAPÍTULO 4. OSÍRIS

Apesar de Osíris ter sido um deus de grande popularidade no Egito

antigo, os fatos que sabemos a seu respeito de fontes egípcias são

fragmentados. Os relatos dos autores do Período Greco-Romano são as

nossas fontes mais completas. Ele era cultuado em diversas cidades do

Egito, muitas vezes incorporando os deuses locais entre seus epítetos. Ao

que tudo indica Osíris tem sua origem na cidade de Abidos, sendo tido como

o Senhor do Mundo dos Mortos. No começo apenas o Rei unia-se ao deus

após a morte, mas, com o aumento de sua popularidade, este destino foi

estendido posteriormente à população como um todo. Com o tempo passou a

adquirir outras funções associadas às de deus dos mortos e da ressurreição.

Como um deus da fertilidade, era responsável por trazer as cheias do Nilo e

os campos fartos para a população. Da mesma forma, ligado aos ciclos da

natureza, Osíris teve uma associação cósmica ao ser identificado com a

constelação de Orion, a estrela Sirius e a lua.

A verdadeira fonética do nome Osíris nos é desconhecida. As formas

mais aceitas atualmente são Asir ou wsir, sendo a primeira considerada mais

correta atualmente. Estas correspondem ao copta ousire ou ouciri e ao grego

(GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, p. 623). Em sua forma inicial, como consta

nos “Textos das Pirâmides”, o nome de Osíris era escrito sem o determinativo

de deus, apenas com o trono e o olho, . Em formas posteriores

encontramos a ordem invertida, o olho antes do trono, e o nome de

Osíris escrito com o determinativo de deus: . Em períodos posteriores

também encontramos variações do nome, como por exemplo, e no

Médio Império, na XIX Dinastia e , , e

no Período Ptolomaico (ERMANN, GRAPOW, 1971, Vol. I, p.

359).

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Da mesma forma não existe um consenso do significado de seu nome,

existindo variadas suposições sobre seu significado11. Um significado aceito

por vários autores (HART, 1986, p. 152; WILKINSON, 2003, p.118) como

sendo o correto é de seu nome derivar da palavra wsr, “poderoso”, vindo a

significar “O Poderoso” como foi proposto por Gwyn Griffiths, a partir da

interpretação de Plutarco. Haveria um desvio fonético no segundo símbolo, e

o nome também possuiria o significado secundário de “Aquele que faz o seu

trono” (GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, p. 624). Este significado secundário faz

parte de outro grupo de suposições baseadas nos símbolos hieroglíficos que

compõem o seu nome. Kurt Sethe, por exemplo, sugere “O assento do Olho”,

um hipocorístico com o sentido de “alegria dos olhos, querida” (GRIFFITHS,

1982, Vol. IV, p. 624).

Ainda um outro grupo abrangente de possíveis definições é aquele que

procura atribuir uma origem estrangeira ao seu nome, como a identificação

com Ashur da Assíria, segundo Théodule Devéria e Asar, uma forma de

Marduk na Babilônia, segundo Sidney Smith. (GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, pp.

624-625)

Aparentemente, no início, no Período Pré-Dinástico e Dinástico Inicial,

e conforme mencionado na pirâmide de Neferkare (V Dinastia) Osíris possuía

a forma de um chacal, como os demais deuses funerários do Baixo Egito

(GRIFFITHS, 1966, pp.92-94).

Ó Soberano, você está vestido como um deus, a sua face é a

de um chacal como Osíris, esta alma que está em Nedit, esse poder que está na Grande Cidade.

PT § 2108

(FAULKNER, 1910, p. 299)

A primeira representação conhecida de Osíris encontra-se em um

bloco de pedra parcialmente danificado do Faraó Djedkare Isesi da V

Dinastia. Apenas a parte superior da figura e uma inscrição com o nome de

Osíris foi preservada. Nessa vemos uma figura antropomórfica usando o

toucado divino e com o braço esquerdo solto. Não sabemos se poderia estar

11 Uma lista abrangente pode ser encontrada em GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, pp. 624-625.

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segurando algo no braço direito, que está faltando. (GRIFFITHS, 2001, Vol.

II, p. 615; WILKINSON, 2003, p.121)

Sua forma mais conhecida é de um deus

antropomórfico mumiforme, cuja pele podia

ser representada branca, remetendo às

bandagens da múmia, ou preta, a cor das

deidades ctonicas ou da aluvião do Nilo, ou

verde, representando a vegetação e a cheia

(WILKINSON, 2003, pp. 121). As mãos

projetam-se para fora das bandagens para

segurar o cajado e o açoite. Do Médio Império

em diante Osíris geralmente é representado

usando a coroa Branca do Alto Egito (coroa

HDt). Outra coroa, comumente usada e

originalmente pertencente ao deus Andjety era

a coroa Atf, composta pela coroa Branca

acrescida de um par de plumas nas laterais; e,

a partir do Novo Império (em especial na região

tebana), são acrescentados um par de cornos

horizontais, o disco solar e o uraeus (Fig. 17)

(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, informação

verbal12). Essa podia ser usada sozinha ou

em conjunto com o toucado divino. A partir

do Novo Império, Osíris pode ser visto usando largos colares e braceletes e

com um grande número de detalhes na sua vestimenta. (WILKINSON, 2003,

pp. 120-121) A posição de seus braços, a forma de segurar a regalia real e a

sua vestimenta podem apresentar variações locais, reconhecidas

principalmente nas estátuas de bronze (Tabela I) (ROEDER, 1955). Segundo

Gwyn Griffiths (1966, p. 54), o uso de elementos reais na iconografia de

Osíris como o cajado, o açoite e a coroa HDt, apontam para uma associação

antiga com o rei.

12 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 7 – Os dois grandes mistérios: da “Justificação” à “Glorificação” do morto. Ministrada em: 03 dez. 2004.

Figura 17 – Osíris com coroa Atf sobre plinto em forma do hieróglifo maat e na frente do Pilar Djed – KV 57

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Tabela 1 – Diferenças regionais na iconografia de Osíris segundo Roeder (1955).

Osíris também podia ser representado na forma de um pilar Djed

usando seus atributos (Fig. 18). Nesta

forma ele é comumente representado na

parte interna dos caixões no Novo

Império, sendo um sinal simbólico de

estabilidade. O pilar Djed foi incorporado

como um elemento osíriaco, através do

sincretismo de Osíris com os deuses Ptah

e Sokar, a quem o pilar estava

originalmente associado. Seu simbolismo

original, quando ainda não estava

associado a Osíris nos é desconhecido.

No Livro dos Mortos ele é identificado

com as vértebras ou a coluna vertebral de Osíris. (HART, 1986, p. 160-161;

SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 86; WILKINSON, 1992, p. 165).

No Período Ptolomaico, Osíris foi identificado com o deus grego

Dionísio, devido ao caráter de ambos como deuses ligados à agricultura, e

por terem trazido a civilização aos homens, e ao deus Hades (Plutão), por

ambos serem considerados deuses do Mundo Inferior.

Baixo Egito Médio Egito Alto Egito

Posição do Braço Um braço sobre o

outro

Braço no mesmo nível encontrando-se

no peito Braços cruzados

Mão Esquerda Cajado Cajado Açoite

Mão Direita Açoite Açoite Cajado

Braços Não são visíveis

através da vestimenta

Cotovelos bastante proeminentes

Cotovelos bastante proeminentes

Vestimenta

Levantada como uma gola na altura do pescoço e dos

ombros

Rente ao corpo Rente ao corpo

Abertura Vestimenta

Presente para fazer espaço para as

mãos

Marcada por uma linha fina

Quase não está presente

Pernas Contorno pouco

marcado Contorno bem

marcado Contorno bem

marcado

Figura 18 – Osíris na forma do Pilar Djed (centro) - Tumba de Neferrenpet, XIX Dinastia (Tebas)

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Ptolomeu I cria o deus Serapis, da união de Osíris, do touro Ápis e dos

deuses gregos Zeus, Hélios, Hades, Asclépio, e Dionísio. De Osíris

principalmente incorporou seu aspecto funerário e de fertilidade, o qual foi

enfatizado principalmente no seu aspecto de deus protetor dos grãos. Da

mesma forma, Ísis também era considerada a sua esposa. (SHAW,

NICHOLSON, 1995, p. 261)

Osíris aparece inicialmente como um deus funerário, como pode ser

observado nas fontes mais antigas, como os “Textos das Pirâmides”, a

Teologia Menfita e o Papiro Dramático do Ramesseum. Como um deus

funerário, Osíris deve ser entendido como um deus da continuidade da vida

após a morte, e não como um deus da morte. A morte pode ser vista como

um estado de dormência, sendo que os rituais, como o de Abertura da Boca,

por exemplo, feitos em Osíris e posteriormente nos mortos, eram uma ajuda

para que os mesmos acordem. Sendo Osíris o primeiro a renascer após a

morte, ele torna-se o Senhor do Mundo dos Mortos. Em tal forma incorpora

o epíteto de (xnty Imntt), o “Primeiro dos Ocidentais13”, o qual era

originalmente um deus funerário na forma de chacal de Abidos.

(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, informação verbal14; GRIFFITHS, 1966, pp.

42-43)

Inicialmente, no Antigo Império, apenas o rei se unia com Osíris após

a morte. Mas, anteriormente a esse período, existe outro lado mais obscuro

do deus, no qual ele é temido pelo Faraó. Nestas passagens dos “Textos das

Pirâmides”, Rê não deixa que Osíris tome o rei nos domínios escuros e

proibidos do Duat, sendo o destino do Rei as estrelas. (GRIFFITHS, 1966, pp.

24-26; HART, 1986, pp. 154-155)

Rê-Atum não te dará para Osíris e ele não deve reivindicar o

seu coração, nem ter poder sobre o seu coração. PT § 144

(FAULKNER, 1910, p. 42)

13 Ocidentais refere-se ao nome dado pelos egípcios aos mortos. 14 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 7 – Os dois grandes mistérios: da “Justificação” à “Glorificação” do morto. Ministrada 03/12/2004.

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Abra o seu lugar no céu entre as estrelas no céu, pois você é a Estrela Solitária, o companheiro de Hu; olhe para baixo sobre Osíris quando ele governa os espíritos, pois você está longe dele, você não está entre eles e você não deve estar entre eles.

PT § 251

(FAULKNER, 1910, p. 58)

Podemos dessa forma observar nos “Textos das Pirâmides” uma

transformação do deus Osíris de um deus temido, representado pela sua

forma inicial de chacal, em um deus benevolente, que possui a forma

antropomórfica do rei morto que se une a ele (GRIFFITHS, 1966, p. 125). Nos

“Textos dos Caixões”, Osíris ainda pode ser visto como um demônio

ameaçador, controlando uma “máfia” de executores chamados “Açougueiros

de Osíris de dedos dolorosos” ou “pescadores de Osíris” (HART, 1986,

pp.154-155). Em uma forma completamente benevolente Osíris só irá

aparecer no “Livro dos Mortos”.

No contexto funerário particular, Osíris só irá aparecer com certa

predominância como deus funerário em inscrições, principalmente fórmulas

de oferendas, a partir da VI Dinastia. Anteriormente, Anúbis e Khentamentiu

apareciam com maior freqüência como deuses funerários. Mas nelas não há

nenhuma relação especial com o deus, como ocorre com o faraó. Uma

“democratização” de Osíris no contexto funerário só se estabelece

definitivamente após o Período Pós-Amarniano, quando a população em

geral podia se unir a Osíris após a morte, renascendo como o deus, como

pode ser observado, por exemplo, na incorporação das cenas de Osíris nas

tumbas tebanas não reais. A falta desse princípio em tempos mais antigos

poderia ser interpretada de maneira a que o rei morto seria o representante

de uma ba coletiva, sendo a sua ascensão no Mundo dos Mortos a ascensão

de todos os egípcios (GRIFFITHS, 1966, p. 161). Assim,

ele se tornou um deus salvador no sentido de que o seu destino, o qual conduzia ao triunfo final após sofrimento e morte, é visto como um modelo, o qual crentes humanos podem alcançar. Seu papel é passivo. Não é ele quem efetua o salvamento. Ele mesmo é salvado por Hórus. No hino de Amen-mose, e em outras partes, é Ísis quem salva Osíris; [...] Neste conceito de salvação, libertação da morte é o tema.

(GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, p. 629)

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Como o “Primeiro dos Ocidentais”, Osíris acaba por consequência se

tornando o Juiz dos Mortos. Esse aspecto já pode ser reconhecido no Antigo

Império, mas é no Novo Império, no capítulo 125 do “Livro dos Mortos”, que

encontramos a sua forma mais elaborada (Fig. 68). Neste capítulo a alma do

morto era julgada na Sala das Duas Maats, sendo seu coração pesado

refletindo sua conduta em vida. Se sua conduta fosse considerada de acordo,

o morto se tornaria um mAa-xrw (Justificado ou Justo de Voz), unindo-se com

Osíris. Sob este aspecto Osíris recebia o epíteto de “Senhor da Maat15”.

Também podemos encontrar Osíris representado sobre um plinto na forma

do hieróglifo (mAat) quando ligado ao conceito de justiça, como a estátua

de Osíris de Anhai [02] presente na coleção do British Museu. (GRIFFITHS,

1982, Vol. IV, p. 630; 2001, Vol. II, p. 618; HART, 1986, p. 163)

O título tardio de Osíris (wnn-nfr) Unnefer, que viria a significar

“aquele que está em boas condições” ou “aquele cujo corpo não se

corrompeu” remete aos rituais de embalsamento realizados no deus por

Anúbis, vindo Osíris a ser a primeira múmia. A mumificação, ao impedir a

putrefação do corpo de Osíris, torna possível, junto com os outros rituais

funerários, que ele reviva. Serão esses mesmos rituais seguidos pelos

egípcios na intenção de alcançar o mesmo destino de Osíris. (BRANCAGLION

JUNIOR, 2004, informação verbal16; GRIFFITHS, 2001, Vol. II, p. 618)

Devido ao seu aspecto ligado ao renascimento, Osíris foi

posteriormente associado à fertilidade, em especial da água e da vegetação.

Em um aspecto agrícola, ele está associado à cheia do Nilo, a qual traz a

fertilidade para o Egito. Adolf Erman resume bem essa ligação:

Quando a inundação chega, Osíris é a água nova, que deixa

os campos verdejarem. Quando então as plantas murcham e morrem, acredita-se desta forma que Osíris também morreu. Mas ele não está totalmente morto, pois no ano novo as ervas nascem

novamente de seu corpo e mostram que ele está vivo.

(ERMAN, 2001, p. 40)

15 Conceito de Verdade e Justiça, também uma deusa regente desses mesmos princípios. 16 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 7 – Os dois grandes mistérios: da “Justificação” à “Glorificação” do morto. Ministrada em 03/12/2004.

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Sendo o deus que traz as cheias do Nilo, Osíris foi posteriormente

conectado ao ciclo estelar. A deusa Sopdet (ou Sothis para os gregos) era a

personificação de Sirius, estrela que aparecia anualmente no horizonte,

próximo à chegada da cheia do Nilo. Desta forma foi associada com Osíris na

forma da constelação próxima de Orion (ou Sah para os egípcios), o qual

representava o ressurgimento anual do Nilo. Assim, a tríade familiar formada

por Osíris, Ísis e Hórus foi transferida para as estrelas na tríade formada por

Sah (Osíris), Sopdet (Ísis) e Soped ou Sopdu (Hórus). Também encontramos

a menção de que as estrelas estão sob o comando de Osíris. (HART, 1986,

pp. 150-151; WILKINSON, 2003, p. 167)

A ligação de Osíris com a vegetação e o universo cósmico descrita

acima pode ser observada de forma concreta na seguinte passagem do

“Grande Hino a Osíris” inscrito na estela de Amenmose, atualmente

localizado no Louvre:

Mais velho nas Duas Terras reunidas, Nutridor perante os Nove Deuses, Espírito potente entre os espíritos. Nun lhe deu a sua água, O Vento do Norte viaja para o sul para ele, O Céu faz vento diante de seu nariz, Que o seu coração esteja satisfeito. Plantas germinam ao seu desejo, A Terra cresce seus alimentos para ele, O Céu e suas estrelas lhe obedecem, Os grandes portais abrem-se para ele. Senhor da Aclamação no céu do sul, Santificado no céu do norte, As Estrelas Imperecíveis estão sob o seu controle, As Estrelas Infatigáveis estão na sua residência. Alguém lhe faz oferendas sob o comando de Geb, Os Nove Deuses o adoram, Aqueles do dat beijam o chão, Aqueles no alto se curvam, Os ancestrais alegram-se ao vê-lo, Aqueles que estão longe dele o respeitam profundamente.

(LICHTHEIM, 1976, p. 82)

Osíris também aparece ligado aos grãos. Neste aspecto, a primeira

referência concreta ocorre no Papiro Dramático do Ramesseum, no qual é

dito que Osíris, na forma de cevada, é batido (sovada) por Seth na forma de

um burro. Em outros textos do Médio Império, Osíris é comparado com o

deus do grão Neper. A cerimônia Ptolomaica de “conduzir os bezerros”, para

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o qual antecedentes podem ser encontrados na V Dinastia e no Novo

Império, aparenta ter tido como essência encorajar a intervenção divina

numa colheita farta pelos coices dos bezerros sovando os grãos num solo

consagrado ao deus. Mas, ele também pode ser interpretado como um ritual

apotropaico onde os bezerros, ao pisotear o local de sova, simbolizando a

tumba de Osíris, estariam escondendo o local dos inimigos do deus. (HART,

1986, pp. 158-159) Também temos a comemoração do Festival de Khoiak,

onde são produzidas figuras de grãos na forma do deus. Podemos observar a

origem deste festival no Festival de Osíris, que era realizado em Abidos desde

ao menos o Médio Império. Neste, como nos relata a estela de Ikernofret, era

celebrada a derrota dos inimigos de Osíris e o seu posterior renascimento.

Este aspecto foi incorporado ao Festival de Khoiak, que além de ressaltar o

renascimento de Osíris, também celebrava sua ligação com as cheias do

Nilo, as quais traziam a fertilidade para os campos (ver 13.2).

No Antigo Império, Osíris é incorporado pelos sacerdotes de Heliópolis

à sua teologia, estando ele subordinado aos deuses locais. Na Teologia

Heliopolitana, Osíris é tido como o primogênito dos deuses Nut e Geb, tendo

nascido em Rosetau. Eram considerados seus irmãos o deus Seth e as

Geb Nut

Néftis Seth

Hórus

Ísis Osíris

Shu Tefnut

Atum

Figura 19 – Genealogia da Teologia Heliopolitana

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deusas Ísis e Néftis, a primeira também sendo a esposa de Osíris e a

segunda sendo a esposa de Seth. (Fig. 19) Posteriormente, o deus Hórus é

incorporado como seu filho com Ísis, e, em algumas versões, o deus Anúbis

seria seu filho com a deusa Néftis.

A fonte mais completa conhecida sobre o mito de Osíris é a obra de

Plutarco “Sobre Ísis e Osíris”, sendo as fontes egípcias a seu respeito apenas

fragmentárias. A comparação das diferentes fontes nos mostra a existência

de diferenças entre elas. Não sabemos se as diferenças se devem a detalhes

tardios do mito de Osíris, desconhecidos por nossa parte, ou se foram

acréscimos de Plutarco.

Na versão de Plutarco, Osíris governava o Egito tendo trazido para o

seu povo o conhecimento da agricultura. Seth, invejoso de seu irmão Osíris,

consegue aprisioná-lo com a ajuda de seus aliados em um caixão e joga-o no

Nilo. Ísis, irmã e esposa de Osíris após longa procura consegue recuperar o

corpo preso no interior de um tronco de cedro, que servia como coluna do

palácio do rei de Biblos. Mas Seth consegue pegar o corpo e o esquarteja em

14 ou 16 pedaços, espalhando-os pelo Egito. Ísis recupera os pedaços

fazendo a primeira múmia, e concebe seu filho Hórus de forma mágica, pois

ela recupera todos os pedaços do corpo menos o falo de Osíris, o qual foi

comido por um peixe. Desta forma Osíris torna-se o primeiro dos Ocidentais,

Senhor do Mundo dos Mortos. Ísis cria seu filho Hórus escondido de Seth no

Delta. Quando adulto, Hórus vinga a morte de seu pai e torna-se o

governante do Egito.

Já nos “Textos das Pirâmides”, uma das fontes egípcias mais antigas a

apresentarem partes do mito de Osíris, consta que Seth teria matado Osíris

de forma violenta nas terras de Gehestey e o derrubou no chão nas margens

de Nedit. Ísis e Néftis foram à procura de seu irmão e velaram o seu corpo.

Após Seth ser julgado pelo assassinato de seu irmão, é atribuído a Osíris um

vasto reinado, incluindo o céu e a terra e os Campos de Iaru, as vilas Horitas

e Sethitas, as cidades e os nomos. Também é possível observar que Hórus

aparece apenas posteriormente como filho de Osíris. As Contendas de Hórus

e Seth são incorporadas posteriormente ao mito osiríaco, pois inicialmente

Hórus é tido como irmão de Seth, e ele não aparece na Teologia

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Heliopolitana. A partir daí podemos assumir que sua integração é posterior à

Teologia Heliopolitana. (GRIFFITHS, 1966, pp. 1-20) Griffiths chega à

seguinte conclusão quanto ao papel de Osíris e a sua incorporação ao mito

de Hórus e Seth:

A mais distintiva afirmação a respeito da história de Osíris é

que ele é representado como o deus que morreu. É dito que ele morreu através da ação de um inimigo, Seth, mas o seu inimigo emerge, em um mito mais antigo, como o inimigo de Hórus. A razão da inimizade de Seth para com Osíris é claramente o fato de que Hórus era identificado com o rei vivo e Osíris como o seu pai morto, assim a inimizade é transferida, na morte e para outro deus. Isso se torna de fato a causa da morte do rei e por analogia também é a causa da morte de Osíris. O mito de Hórus não relata que ele foi assassinado por Seth. Por outro lado, o rei vivo o qual é Hórus tem que morrer mais cedo ou mais tarde, e a resposta mítica para essa

situação é tornar Seth responsável. (1966, p. 13)

Outra versão encontrada na Teologia Menfita nos diz que Osíris teria

sido afogado. “------ Ísis e Néftis sem demora, pois Osíris se afogou nestas

águas.” (LICHTHEIM, 1975, p.53) Após o julgamento de Seth, Geb dá a

Hórus o governo do Egito. Segundo Griffiths (1966, p. 13), essa versão

parece estar ligada ao ritual funerário de carregar o corpo para o Nilo, tarefa

dada a Seth como punição, sendo ele a personificação da barca que carrega

a capela e o sarcófago. A morte por afogamento foi considerada abençoada

posteriormente por ter sido a morte sofrida por Osíris (GRIFFITHS, 1982,

Vol. IV, 626).

O desmembramento de Osíris por Seth surge apenas em versões do

Novo Império. Ao contrário da versão de Plutarco, na versão egípcia Hórus já

havia nascido quando Ísis junta os membros de Osíris e o falo é preservado

intacto e enterrado em Mênfis. (HART, 1986, pp. 166-167)

O relato do caixão com o corpo de Osíris ter sido aprisionado num

tronco de cedro e a sua posterior recuperação por Ísis no palácio do rei de

Biblos não aparece nos relatos egípcios. Mas, no Templo de Hathor em

Dendera, temos uma representação de Osíris em um caixão preso entre os

ramos de uma árvore. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 214)

O centro de culto original de Osíris mais provável é a cidade de Abidos.

A inexatidão dessa afirmação deve-se ao fato de já desde as V e VI Dinastias,

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Abidos aparecer mencionada paralelamente a outro importante centro de

culto do deus, a cidade de Busíris. Já nessa época o deus carrega junto os

epítetos “Aquele que está à frente de Busíris, Senhor do nomo Thinita17”.

Podemos ver uma divisão nos textos dessa época. Nos textos de origem não

real observamos uma menção mais freqüente de Busíris ligada à Osíris,

enquanto que nos “Textos das Pirâmides”, intencionado para o rei, vemos a

preponderância de Abidos ligada à Osíris. (GRIFFITHS, 1982, Vol. IV, p. 626)

Apesar de o culto de Osíris ser executado desde pelo menos o Antigo

Império em Abidos, a maior evidência do culto de Osíris provem do templo de

Sethi I, da XIX Dinastia. Em seu interior, na capela dedicada a Osíris, o

Faraó é mostrado executando todas as etapas do ritual osiríaco, e na capela

de Sokar podemos observar a representação da fecundação de Ísis por

Osíris, quando ela concebe o deus Hórus (Fig. 20). No templo de Sethi I

também está localizado o Osireion, uma tumba simbólica de Osíris (Fig. 21).

Ele foi construído nos moldes das tumbas da XVIII Dinastia do Vale dos

Reis, ao centro encontrando-se uma sala de granito vermelho com duas

plataformas suspensas cercadas por um fosso de água. Esta era uma

representação da tumba de Osíris sobre o Monte Primordial emergindo do

Oceano Primordial. Como nas tumbas do Vale dos Reis, podem ser

encontradas em seu interior representações do “Livro dos Portões”, “Livro

17 Nomo onde se localiza a cidade de Abidos.

Figura 20 – Osíris fecundando Ísis na forma de um milhafre, XIX Dinastia (Abidos)

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dos Mortos”, textos cosmológicos e dramáticos. (HART, 1986, p. 164; SHAW,

NICHOLSON, 1995, p. 13; SHUBERT, 1999, p. 114)

A região de Umm el-Qa‟ab ou “Mãe dos Potes” é outra importante

região de culto a Osíris em Abidos. Ali se localiza a tumba do rei Djer da I

Dinastia, que passou a ser vista como um cenotáfio de Osíris no final do

Médio Império. A tumba passou a ser um local tradicional de peregrinações

para os egípcios durante a vida, onde deixaram estelas, mesas de oferendas

e potes com inscrições em homenagem ao deus18. Dessas oferendas, a mais

famosa é a estela de Ikhernofret, diretor do Tesouro e Edifícios de Senusret

III e Chefe dos Segredos das Palavras Divinas, a qual relata a sua

participação no festival de Osíris. (DREYER, 1999, p. 125; MONTET, 1961,

p. 102; SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 14; WILKINSON, 2003, p. 122)

A cidade de Busíris funcionava como uma contraparte de Abidos no

Baixo Egito. Busíris é um termo grego cunhado por Heródoto, o qual deriva

do egípcio “A Casa de Osíris”, referindo-se justamente ao culto de Osíris

nesta cidade, sendo o nome egípcio da cidade Djedu. Osíris, além de

substituir Adjeti, o deus original da cidade, irá incorporar a sua forma

antropomórfica e seus atributos. Djedu era considerada o local de

sepultamento da coluna vertebral de Osíris. (HART, 1986, p.164; MONTET,

1957, p. 99; WILKINSON, 2003, p. 122)

A partir da XVIII Dinastia o culto de Osíris começa a ganhar um maior

destaque na região Tebana, alcançando um papel central no templo de

18 A enorme quantidade dessas oferendas deixadas pelos egípcios encontradas atribuíram o nome de “Mãe dos Potes” a essa região.

Figura 21 – Osireion (Abidos)

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Karnak, os domínios do deus Amun, no Período Tardio. Com exceção do

templo de Ptah, toda a área norte do templo de Amun até o muro de limite

do recinto era consagrada a Osíris. Ele está em evidência principalmente nas

capelas construídas pelas “Divinas Adoradoras de Amun” na XXV Dinastia, e

na cripta onde eram realizados os rituais em torno das figuras de grãos

produzidas durante o Festival de Khoiak. Estas últimas se mantém ativas

desde pelo menos o Novo Império/III Período Intermediário até o Período

Ptolomaico. Na parte construída por Nekau II foram encontradas figuras de

grãos em nichos, e na construída por Ptolomeu IV podemos observamos

relevos os quais remetem aos rituais funerários praticados para Osíris,

semelhantes aos encontrados em outros templos do Período Greco-Romano.

(GRIMAL, LARCHÉ, 2007, pp. 25-31; HART, 1986, p. 165)

Na margem oeste de Tebas observamos a partir do Período Raméssida,

a presença de Osíris não mais somente nas tumbas reais, demonstrando a

popularização do deus. O grande número de estátuas porta-papiro de Osíris

encontradas no “cachette” de sacerdotes de Amun, em Deir el-Bahari,

mostra a penetração de Osíris alcançada na Teologia Local.

Uma maior preocupação por

parte do clero de Amun em unir Osíris

ao culto solar, devido à sua crescente

popularização, pode ser observada a

partir da XVIII Dinastia. Um corpo de

textos é criado o qual mostra a viagem

noturna do deus Sol pelos domínios

de Osíris, como pode ser notado nas

tumbas reais do Vale dos Reis. O

ápice dessa viagem ocorre quando Rê

se une a Osíris, tornando-se ambos os

deuses em um só deus. Já temos uma

elucidação dessa união no Médio

Império, mas ela apenas passa a ser

representada no Período Raméssida.

O exemplar mais conhecido dessa Figura 22 - A ba unificada de Rê e Osíris – QV 66

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representação está na tumba da rainha Nefertari no Vale dos Reis, onde

temos a representação de um corpo mumiforme (de Osíris), com cabeça de

carneiro, portando o disco solar (do deus Sol), sendo protegido pelas deusas

Ísis e Néftis e acompanhado do seguinte verso da Litania de Rê: “Rê está em

Osíris e Osíris está em Rê” (Fig. 22). No Amduat nos é dito que a ba de Osíris

está em Rê e o corpo de Rê em Osíris. Assim, ambos estão em apenas um

corpo e falam com uma só boca. Osíris torna-se o sol noturno que acorda os

mortos de seu sono e Rê regenera as suas forças para poder renascer

revigorado na forma do deus Khepri ao amanhecer. O deus Sol, ao sair à luz

do dia, separa-se novamente de Osíris, mas a união se repetirá diariamente

todas as noites. (ASSMANN, 2003, pp. 18 e 251-253; HORNUNG, 1993, pp.

85-87, 1991, pp. 94-101; WILKINSON, 2003, p. 120) Segundo Jan Assmann

essa união ainda apresenta outro aspecto:

Mas o deus Sol não se une apenas com o seu segredo à Noite,

isto é Osíris como o seu cadáver, ele também entra, como nós vimos no corpo da Grande Mãe – e deusa do Céu, que lhe dá a luz todas às manhãs. Também nesse aspecto ele se une de outra forma a Osíris, pois ele se torna como este um filho de Nut, aquele que na morte, ao colo da mãe da deusa do céu retorna.

(2003, p. 253)

Posteriormente, essa união vai se tornando cada vez mais sólida. No

“Livro dos Portões”, Osíris ajuda Rê a reaparecer no horizonte, e no “Livro

das Cavernas”, ambos os deuses deixam o Mundo Inferior em sua forma

unida. Em uma forma mais ampla temos na iconografia da XXI Dinastia um

englobamento maior de deuses nessa união, sob as formas sincréticas de

Osíris e do deus Sol, chegando-se à união de Ptah-Sokar-Osíris com Rê-

Horakhty-Atum-Khepri. Nas formas em que Rê aparece unido a Sokar-Osíris

ou Ptah-Sokar-Osíris19, o deus é geralmente representado na forma

tradicional dessa forma sincrética de Osíris, uma figura mumiforme com

cabeça de falcão. Na mesma época também encontramos o morto unido a

esse deus, agora também conhecido como o Grande Deus (nTr-aA). (NIWIŃSKI,

1987-1988, pp. 90-91) Segundo Niwiński, essa composição tardia pode ser

resumida da seguinte forma:

19 Ver Capítulo Ptah-Sokar-Osíris sobre Sokar-Osíris e Ptah-Sokar-Osíris.

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Cada composição figural complexa de símbolos encontrada

nos caixões e papiros da XXI Dinastia deveria ser interpretada como tendo um significado duplo, apesar de que, em alguns casos, maior ênfase é dada ao lado osiríaco, e em alguns ao lado solar da mesma moeda. Cada cena expressava a idéia do curso eterno do Sol, o qual já foi nomeado de forma acurada pelo Prof. Dechain “perpetuum mobile”. Pelo outro lado, cada cena representa ao mesmo tempo a ideia do triunfo de Osíris sobre a morte, ou seja, o “final feliz”, entendido como uma promessa do mesmo destino para o morto. Não obstante, quando um artista do Egito antigo escolhe expressar as idéias cosmogônicas-cosmológicas e escatológicas, cada figura divina representa uma forma diferente do Grande Deus em ambos seus aspectos unidos; ele também representa o morto ele mesmo identificado com o Grande Deus criador, com Rê e com Osíris.

(1987-1988, p. 102)

A cidade de Mendes (Djedet) está tradicionalmente associada a Osíris

como sendo o local onde a sua ba habita. Como deus símbolo do 16º nomo

do Baixo Egito, ao qual pertence à cidade de Djedet, temos o deus carneiro

Banebdjedet (“A ba do Senhor de Djedet”). Este na verdade substitui na II

Dinastia a sua esposa, a deusa Hat-mehyt (“Ela que está diante dos peixes”),

que dá o nome para este nomo. Acreditava-se que este deus seria a ba de

Osíris. Já na Baixa Época Banebdjedet vai ser identificado como sendo a ba

de quatro deuses: Rê, Osíris, Shu e Geb. (HART, 1986, pp. 52-53 e 82-83;

WILKINSON, 2003, pp. 192-193 e 228-229)

Além desses centros principais de culto mencionados acima, devido à

sua grande popularidade, Osíris é cultuado em diversas outras cidades do

Egito. Algumas delas alegam ser o local de sepultamento dos membros

sagrados de Osíris. Segundo a lenda, Ísis teria construído uma tumba para

Osíris em cada cidade onde encontrou um de seus membros esquartejados

por Seth, estando o respectivo membro associado à cidade. No Novo Império

também temos um aumento de títulos de Osíris, de caracterização e

localização geográfica, como pode ser visto no “Grande Hino a Osíris” na

estela de Amenmose

Saudações a ti, Osíris, Senhor da Eternidade, rei dos deuses, De muitos nomes, formas sagradas, De ritos sagrados nos templos! Nobre de ka ele preside em Djedu, Ele é rico em sustento em Sekhem, Senhor de aclamação em Andjty,

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Primeiro em oferendas em On. Senhor de saudações na Sala da Justiça, Ba secreta do senhor da caverna, Sagrado na Muralha-Branca, Ba de Rê, seu corpo verdadeiro. Que repousa em Hnes, O qual é adorado na árvore-naret, A qual cresceu para carregar a sua ba. Senhor do Palácio em Khmun, Muito reverenciado em Shashotep, Senhor eterno o qual preside em Abidos, O qual mora distante no túmulo, Cujo nome se preserva na boca das pessoas.

(LICHTHEIM, 1976, pp. 81-82)

e no capítulo 142 do “Livro dos Mortos”, como demonstrado no excerto do

mesmo abaixo:

[...], Osíris que preside sobre Rosetau, Osíris governante das margens, residindo em Mendes, Osíris residindo nas terras incultas, Osíris a alma venerável a qual está em Mendes, Osíris em Busíris, Osíris no cemitério de Hermópolis, Osíris Senhor da Terra da Vida, Osíris em Sais, Osíris em Naref, Osíris no sul, Osíris em Pe, Osíris em Dep, Osíris em Bahbit, Osíris em Asyut, Osíris em Sais Inferior, Osíris em Sais Superior, Osíris como os Dois Falcões, Osíris em Assuan, Osíris em RA-antywy, Osíris em Apret, Osíris como o deus macaco, para Osíris em Zekret, para Osíris na Cheia, Osíris em sua casa em Rosetau, Osíris no Nomo de Abidos, Osíris em Nedit, [...]

(ALLEN, 1960, p. 227)

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CAPÍTULO 5. SINCRETISMO

Nos capítulos anteriores, observamos os deuses que compõem o deus

Ptah-Sokar-Osíris em suas características individuais. Como pudemos

observar, em alguns aspectos eles possuem atributos em comum desde

tempos muito antigos, já havendo certa aproximação entre eles. Por este

motivo, em alguns casos não sabemos a qual deus essas características

pertenciam originalmente. Certamente este fator também ajudou na

posterior união desses três deuses para formar um único deus. A forma

como estes se unem recebe comumente o nome de sincretismo. Tanto na

Egiptologia, como nas Ciências Humanas em geral, ainda não se chegou a

um consenso sobre o significado e uso do termo sincretismo. O conceito

varia praticamente de autor para autor, e o que é considerado sincretismo

por um, não o é pelo outro. Uma linha de pensamento chega inclusive a

sugerir que o termo deixe de ser usado. Mas, em linhas gerais, podemos

dizer que sincretismo é uma conexão que ocorre em especial entre línguas,

culturas ou religiões, ou elementos no interior destas, que a princípio não

tinham nenhuma ligação entre si. Esta conexão também pode ser desfeita a

qualquer momento e não anula a existência das línguas, culturas ou

religiões originais, as quais continuam existindo ao mesmo tempo. Portanto,

antes de observarmos o deus Ptah-Sokar-Osíris em si, faremos um breve

estudo sobre o sincretismo em geral, e, posteriormente, em especial na

Egiptologia, para podermos confirmar se é exata a denominação da união

entre Ptah, Sokar e Osíris como sendo uma formação sincrética.

5.1 Sincretismo: Um Breve Histórico

O termo sincretismo foi usado pela primeira vez por Plutarco no

capítulo “sobre o amor fraternal” (De fratero amoré) da coleção das Morais

(Moralia) para se referir à habilidade de facções guerreiras cretenses de se

unirem contra um inimigo comum (COLPE, 1987, p. 218; HUGHES, 1988, p.

670; LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 14; RUDOLPH, 2005, pp. 68-69):

Então isso deve ficar claro na mente e guardado novamente quando diferenças surgem entre irmãos: nós devemos ser cuidadosos em tais

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tempos para associar familiaridade com os amigos de nossos irmãos, mas evitar e afastar todas as intimidades com os seus inimigos, imitando nesse ponto, ao menos, a pratica dos cretenses, os quais, apesar de freqüentemente disputar com e lutar uns contra os outros, fizeram as suas diferenças e se uniram quando inimigos de fora atacaram; e isto era o que eles chamavam de “sincretismo”.

(Plutarco, 1939, p. 313)

O termo continuou a ser usado com o mesmo sentido de Plutarco por

Erasmo de Roterdan e George Calixto. Eles aplicaram o termo “synkretizein”

para se referir à combinação ou reconciliação das diferenças confessionais

de setores reformados competidores (LEOPOLD, JENSEN, 2005, pp. 14-15;

RUDOLPH, 2005, p. 69).

No século XVI e XVII, porém, os Protestantes, ao contrário de Plutarco,

usam o termo sincretismo como um aspecto negativo, o qual continuou a ser

usado por muito tempo. Assim, para denotar as traições ecumênicas contra

a ortodoxia reformadora de teólogos Protestantes dos séculos XVI e XVII, e

na visão destes contra Deus e Cristo, “synkerannumi” foi usado no sentido

de “misturar” coisas que são incompatíveis. (HUGHES, 1988, p. 670;

LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 14; RUDOLPH, 2005, p. 69) Temos, por

exemplo, uma monografia sobre a história do sincretismo do luterano

alsaciano Johannes Konrad Dannhauser, escrita em 1648, na qual o

sincretismo é visto como a mistura de coisas as quais não pertencem juntas.

(RUDOLPH, 2005, pp. 70-71).

No catolicismo, o termo sincretismo foi usado pelos franciscanos,

dominicanos e jesuítas, que pretendiam converter os povos locais durante a

Expansão Cristã do século XVII. Essa política foi aceita no começo por

Roma, mas, no século XVIII, tal política foi abandonada, sendo vista como

uma “falsa paz”. Certa aceitação do fenômeno só foi permitida novamente em

1965, com o segundo Concílio do Vaticano. (LEOPOLD, JENSEN, 2005, pp.

16-19; RUDOLPH, 2005, p. 69) Esse duplo movimento do cristianismo em

relação ao sincretismo se explica pelo próprio caráter dessa religião:

[...] por um lado suas intenções de ser uma religião universal é delimitada para compreender todas as pessoas do mundo, mas por outro lado sua existência futura como uma religião dogmática pelo livro demanda uma total lealdade de seus membros de congregações para permanecerem fieis ao cânon da Bíblia.

(LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 19)

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O primeiro uso de sincretismo no sentido de juntar diferentes religiões

e, não como anteriormente, para a aliança daqueles de ensinamentos

divididos, contra um inimigo em comum ocorreu em 1645 na obra Eirenikon

Catholicum do jesuíta Veit Erbermann, o qual concluiu que a tese de Calixto

de se conseguir a união dos povos apelando para o Credo dos Apóstolos

significava apenas que diferenças seriam unidas na aparência. Isso não

apenas sancionaria a união de povos de diferentes crenças religiosas, mas

também de diferentes religiões. (RUDOLPH, 2005, p. 69)

O uso acadêmico do termo ocorreu apenas no final do século XIX e

inicio do século XX. A principal influência pode ser atribuída ao historiador

Johann Gustav Droysen, com a sua obra Geschichte des Hellenismus (1836),

na qual cunhou a noção de Helenismo, que permanece um modelo clássico

para qualquer discussão sobre o sincretismo. O Helenismo representava a

fusão (Verschmelzung) entre Oriente e Ocidente que ocorreu em

consequência das conquistas em sua visão de Alexandre, o Grande, no

século IV a.C, sendo uma fase transitória que dá origem a um fim maior, o

cristianismo,. (LEOPOLD, JENSEN, 2005, pp. 20-21; MARTIN, 2005, p. 286;

RUDOLPH, 2005, p. 70) Assim:

Sincretismo ou “sincrético” tornou-se a marca de um estágio tardio de um desenvolvimento secundário, combinando elementos de uma ou outra prática ideológica ou cultural, a qual originalmente não tinha nada a ver uma com a outra e deste modo perdeu a “pureza” ou a “integridade” intrínseca na “combinação”. [...] Sincretismo se tornou um atributo de formações religiosas se desenvolvendo entre e ao lado das grandes religiões.

(RUDOLPH, 2005, p. 70)

A Escola da História das Religiões (Religionsgeschichtliche Schule)

alemã foi a grande responsável por tornar o sincretismo uma categoria

central no estudo das religiões e o retorno a um uso mais positivo do termo.

(LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 21; MARTIN, 2005, p. 287)

Para G. van der Leeuw, o sincretismo é inerente a todas as religiões, se

estas forem observadas desde a sua formação, sendo um estágio de

desenvolvimento necessariamente ligado ao “progresso da cultura”. “É a

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„mudança no significado de uma manifestação na dinâmica das religiões,

onde a forma permanece a mesma‟” (RUDOLPH, 2005, p. 71).

Hendrik Kraemer (1937, 1938 e 1959) observa o sincretismo como um

fenômeno das religiões não-cristãs, em especial daquelas do Extremo

Oriente, em contraste com as religiões proféticas da tradição judaico-cristã,

aí incluindo o Islã. Apesar de admitir a presença do sincretismo nas religiões

por ele consideradas anti-sincréticas, em sua visão, as religiões não-cristãs

possuem uma “apreensão inata” do fenômeno, sendo estas últimas uma

mistura de religiões ilegítimas. (LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 23; RUDOLPH,

2005, pp. 71-72) Podemos observar na definição de Kraemer um tom

teológico no qual as religiões judaico-cristãs são vistas com superioridade,

ao ser considerada a verdadeira religião, em detrimento das demais religiões.

Robert D. Baird (1971) pode ser considerado o nome mais conhecido de

uma corrente que é contra o uso da categoria sincretismo, pois em sua visão

ela carrega conotações pejorativas que estão historicamente ligadas a

disputas teológicas no Cristianismo, tendo absorvido as presunções

teológicas negativas sobre religiões de origens mistas, como ocorre no caso

de Kraemer, autor citado acima (LEOPOLD, JENSEN, 2005, pp. 8 e 24).

Baird, tratando o sincretismo como um fenômeno histórico, afirma que,

quando visto historicamente, a inter-relação de idéias e movimentos são universais e inevitáveis e elas incluem até mesmo o cristianismo. Baird afirma que esse entendimento [de Kraemer] está apenas enraizado na idéia de que nenhum crente iria descrever sua própria religião como sincrética; ela apenas é percebida dessa forma pelo lado de fora.

(RUDOLPH, 2005, p. 72)

Rudolph considera o pensamento de Baird a respeito do sincretismo

falho, ao observar a categoria a partir de um ponto de vista científico através

dos olhos do crente. Dessa forma, o estudioso deixa de ter uma visão neutra,

tomando o partido do crente. Outra falha sua é s de sempre pensar que o

crente não reconhece a sua religião como sincrética. (RUDOLPH, 2005, p.

72)

Em um entendimento teológico do sincretismo, J. Kamstra (1967,

1970) baseando-se no “pensamento selvagem” de Lévi-Strauss, chega à

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conclusão de que o sincretismo não pode ser repreendido, pois ele pertence à

natureza humana (RUDOLPH, 2005, p. 73). Ele também propõe outro

entendimento fenomenológico do sincretismo seguindo a linha de van der

Leeuw. Neste, o sincretismo é

o resultado da alienação dentro de uma religião existente. Seu processo ocorre desta forma de duas maneiras: uma levando para uma nova forma através da assimilação do exterior; a outra interna, resultando na liberação e ligação mecânica de elementos os quais eram originalmente inteiramente estranhos.

(RUDOLPH, 2005, p. 73)

Kamstra também irá distinguir um sincretismo “consciente” de um

“inconsciente” em The Cobweb (1977) (RUDOLPH, 2005, p. 74). O primeiro

consiste na “religiosidade refletida do fundador de uma religião que pode

levar a uma nova formação religiosa” (LEOPOLD, JENSEN, 2005, p. 26). O

segundo, que se refere principalmente à base do desenvolvimento

religioso/cultural, resulta de “formações sincréticas despercebidas, as quais

aparecem como resultados naturais de interações” (LEOPOLD, JENSEN,

2005, pp. 4 e 26).

Michael Pye, em contraste à ênfase de Kamstra em “alienação”, cujas

idéias considera apenas uma alternativa para Kraemer, percebe a natureza

do sincretismo como “ambigüidade”. O sincretismo é, portanto “a

coexistência temporária ambígua de elementos de diversas religiões e outros

contextos dentro de um padrão religioso coerente”, o qual pode, em algum

ponto, ser dissolvido (MARTIN, 2005, p. 288). Pye também entende o

sincretismo como uma manifestação das dinâmicas da religião, sendo

possíveis três soluções para o processo: 1. assimilação, 2. uma nova religião

ou 3. dissolução. A teoria de Pye está tanto localizada no nível da cultura,

como no da psicologia. (LEOPOLD, JENSEN, 2005, pp. 24-25; MARTIN,

2005, p. 288; RUDOLPH, 2005, p. 75)

Numa tentativa de alcançar uma resposta definitiva para as questões

que cercam o sincretismo foram realizados dois simpósios com o objetivo de

tentar resolver tais problemas. O primeiro foi realizado no Donner-Institute

em Åbo, em 1966, e o segundo em Reinhausen, Göttingen, em 1971. Do

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segundo resultaram, nos anos seguintes, uma série de pesquisas a respeito

do sincretismo, algumas inclusive dedicadas ao Egito antigo, publicadas na

serie Göttinger Orientforschungen. (BAINES, 1999, p. 199 n. 5; RUDOLPH,

2005, p. 79) Apesar dos esforços, não se conseguiu chegar a um resultado

definitivo.

O livro Syncretism in Religion: a Reader (2004), editado por Anita

Leopold e Jeppe S. Jensen, apresenta uma coletânea com uma série de

ensaios que discutem a situação do sincretismo na atualidade. A partir das

diferentes opiniões a respeito analisadas, os autores observam três níveis de

análise para o estudo da natureza do sincretismo:

O primeiro nível é o social, ao qual nós podemos atribuir questões de poder para o sincretismo. Isso também inclui as diferentes políticas e modos de religião em relação ao encontro de religiões e inovações religiosas, não obstante o antônimo “anti-sincretismo”. O segundo nível é o semiótico, onde nós devemos ter em mente o impacto hermenêutico e transformador que formações sincréticas têm na religião. Isto tem a ver com os mecanismos de mudança e inovação no significado religioso a que muitos estudiosos se referem como a dinâmica do sincretismo. O terceiro nível é o cognitivo, visto aqui como o nível básico subjacente aos outros dois níveis porque ele explica a natureza da mistura conceitual e a categorização religiosa da estrutura da cognição humana, a qual também pode ajudar a explicar a maneira transformativa da “semiótica sincretista”, assim como as várias repressões contra o sincretismo em sistemas religiosos.

(2005, pp. 378-9)

5.2 Tipos de Sincretismo

Carsten Colpe procura organizar os diferentes tipos de sincretismo no

tópico sobre o mesmo na Encyclopedia of Religions20 e em The Compatibility

of Historical and Structural Determinations of Syncretism, este último

apresentado no simpósio de Reinhausen, Göttingen, em 1971. Na sua visão,

o sincretismo pode tanto ser entendido como um estado ou como um

processo, resultando da relação entre entidades complexas (ex. diferentes

religiões) ou de relações entre componentes particulares (ex. deuses)

(COLPE, 1987, p. 219). As associações podem ocorrer em diferentes graus de

intensidade, sendo estes: 1. Simbiose, a coexistência de grupos, que na

20 ELIADE, Mircea (ed.). The Encyclopedia of Religion Vol. 14. Nova York: Macmillan, 1987, pp. 218-227.

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maioria das vezes é impessoal e etnicamente limitada (COLPE, 1987, p. 220;

RUDOLPH, 2005, p. 76); 2. Aculturação, uma integração, na maioria das

vezes consciente. Uma vez que movimentos de conquista tornaram-se de

alcance imperial (por exemplo, os impérios de Alexandre o Grande, dos

Romanos, dos Espanhóis), eles colocaram em contato diversas culturas; a

fusão de tradições que resultou para um dos dois lados pode repetidamente

levar ao sincretismo (COLPE, 1987, p. 221; RUDOLPH, 2005, p. 76) e 3.

Sobreposição, cujo exemplo mais expressivo provavelmente foi a migração

dos arianos para o subcontinente asiático, o qual já estava habitado por

povos não Indo-europeus. (COLPE, 1987, p. 221)

Para a relação entre componentes particulares outra tipologia em

particular é apresentada. Nesta, alguns dos tipos podem ocorrer juntos ou

apresentar subtipos: 1. Adição, ocorre quando uma barreira entre diversos

elementos é removida (e com ela a competição entre eles); mas um elemento

não absorve o outro, o resultado é uma combinação cujos componentes não

apenas estão evidentes para o estudante moderno, mas também deveria ser

reconhecível para os devotos do seu tempo. Subtipos de adição são: a)

Teocrasia, que é a combinação de deuses. Ela ocorre quando, por propósitos

práticos, um deus é fundido com outro aos olhos de seus adoradores,

mesmo que não haja identificação no nível conceitual. E b) Formas de

Adoração, que ocorre quando um rito adota componentes de outro rito e

formas de adoração são combinadas. Mas porque a origem básica de

possíveis ações rituais é relativamente pequena, influências externas nessa

área são geralmente indistinguíveis das ações de fatores já presentes na

tradição. (COLPE, 1987, p. 223) 2. Paralelismo é mais facilmente praticado

quando se é persuadido da unidade da verdade. Se a verdade é uma,

diversos nomes não apontam para diferenças reais, mas podem mostrar de

serem simplesmente diferentes nomes para a mesma coisa. (COLPE, 1987,

p. 224) Subtipos de paralelismo são: a) Interpretação, sendo as duas

principais a interpretatio graeca e a interpretatio romana. Nessas, na maioria

das vezes não havia uma teocrasia real, mas apenas uma tendência em sua

direção. Essa tendência era mais difundida na literatura, dessa forma nós

podemos falar primeiramente de um sincretismo literário. b) Equivalência é

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uma pressuposição em todas as formas de paralelização, na identificação, na

teocrasia e no sincretismo de unidades complexas. Mas ela adquire um

significado especial quando a unidades ou a elementos dela são atribuídos

diferentes valores, que são concebidos como caminhos para o mesmo

objetivo, com a estipulação de que um deles leva mais eficazmente ao

objetivo que os outros. c) Amalgamação, descreve uma fusão que é mais

irreversível que uma simples mistura. A amalgamação descreve um caso

limítrofe de sincretismo, e por sua extensão ela é uma grande equivalente à

síntese. d) Troca de Qualidades; nesta, as figuras envolvidas devem lembrar

uma a outra; por outro lado, elas não têm essência pessoal, mas antes suas

características são entrelaçadas como em um quebra-cabeça. e)

Identificação, ocorre onde não há teocrasia. A princípio, supõe o mesmo grau

de igualdade de ambos os lados existentes. (COLPE, 1987, pp. 224-225)

Junto ao sincretismo podem ocorrer outros fenômenos, os quais para

Colpe são erroneamente chamados de sincretismo. Estes são: 1. Síntese,

nesta categoria se encaixaria o Helenismo de Droysen, pois em sua visão

culturas misturadas não devem ser entendidas como sincretismo. 2.

Evolução designando esse termo um processo, interno a um sistema, que

produz novos elementos e que é irreversível. Os novos elementos podem

então se tornar o centro de uma nova unidade e assim de um novo sistema.

O resultado do processo é uma nova religião. No sincretismo, o resultado é

reversível. (p. 221) E 3. Harmonização, a qual parte da idéia de que todas as

religiões procuram alcançar o mesmo objetivo (ex. crença num deus único),

mas através de caminhos diferentes. Aqui, ao contrário do sincretismo as

linhas de demarcação entre as religiões não são rompidas. (COLPE, 1987, p.

221)

Sendo o sincretismo um processo e não o resultado deste, o mesmo

pode ter como resultado final: uma transformação, uma desintegração ou

uma absorção. (COLPE, 1987, pp. 221-222)

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5.3 Sincretismo na Egiptologia

Em linhas gerais, baseado na tipologia de Colpe apresentada acima,

podemos dizer que no Egito antigo, temos um sincretismo entre

componentes particulares, ou seja entre os deuses. Portanto, teríamos uma

Adição, mais especificamente uma Teocrasia. Por outro lado, o sincretismo

de deuses no Egito antigo apresenta um caráter único, sendo especifico

dessa antiga civilização. Esse fato recebeu atenção em especial na

egiptologia alemã. Mas justamente por sua singularidade, alguns são da

opinião, dentro e fora da egiptologia, que tal fenômeno não pode ser

chamado de sincretismo.

O primeiro a estudar o sincretismo no Egito antigo de forma mais

extensiva foi Hans Bonnet em 1939. Ele já percebe a importância de se

estudar o fenômeno de forma isolada, para não cair em generalizações que

não compreendem o sincretismo egípcio em sua totalidade. Para Bonnet ele

forma parte da base do pensamento egípcio, não tendo emergido

gradualmente ou sendo o resultado tardio de um processo. (BONNET, 1999,

p. 183) Ele designa o sincretismo egípcio sob o nome de “habitação”

(Einwohung), nisso se baseando no princípio de que, assim como um deus

egípcio pode habitar temporariamente uma estátua, ele também pode

habitar da mesma forma um outro deus. O mais comum era um deus de

caráter universal habitar um deus local.

O deus da cidade não era, ao final, inalterável, mas podia crescer e tornar-se maior. Deste modo, as percepções reluziam com um encontro com uma divindade maior e eram aplicadas ao deus da cidade, estendendo a sua natureza de modo a encerrar a realidade nova e maior. Mas essa realidade não era extinta ou absorvida inteiramente no deus da cidade. Ele permanecia existindo, e o deus da cidade retinha as características transmitidas para ele do deus maior algo como um empréstimo. Para colocar a questão de outra forma: os egípcios aceitavam ambas as divindades de tal modo que a sua natureza interpenetrava-se e se fundia em um, entretanto, preservando a sua própria identidade.

(BONNET, 1999, pp. 185-186)

Essa habitação poderia ser desfeita a qualquer momento, manifestando-se

ambos os deuses de forma independente novamente, assim como a união

poderia ocorrer com divindades diferentes. “Habitação não é identificação e

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não requer igualdade de forma”. (BONNET, 1999, p. 189) A única limitação

para Bonnet era a união entre deuses de sexos diferentes. (BONNET, 1999,

p. 192)

Segundo o autor os deuses egípcios possuíam duas naturezas: uma

material e outra imaterial. Era através da primeira que eles interagiam com

as pessoas. Para tanto era preciso que a divindade se tornasse visível aos

olhos do crente, dessa forma em geral assumindo uma forma antropomorfa.

(BONNET, 1999, p. 191)

Isto era onde o sincretismo era vital. Ele mantinha viva a experiência inicial da divindade como poder, através de todas as ofuscações produzidas pela aparência da noção antropomórfica de deus. Em conseqüência, os egípcios nunca sucumbiram inteiramente ao erro de adorar imagens.

(BONNET, 1999, p. 192)

Além disso, o sincretismo também levava a um monoteísmo “ideal”. O

Deus Único, Primordial, do qual tudo surgiu, era identificado nesses deuses

sincréticos pelo crente local. Assim, o Deus Primordial era um, mas se

manifestava em todas essas formas locais. Para Bonnet “o sincretismo

preparou o caminho para esse monoteísmo ideal porque as suas equações

repetidamente desviaram a atenção das formas visíveis para a sua base

espiritual comum”. (BONNET, 1999, pp. 194) Mas o politeísmo não fora

completamente abandonado, porque o sincretismo apresentava um caráter

duplo. “Enquanto de um lado ele tendia a dissolver as antigas formas de

crenças através da espiritualização progressiva, por outro lado ele não

rejeitava essas formas, e assim não as superava.” (BONNET, 1999, p. 198)

Siegfried Morenz (1962) irá aprofundar as idéias propostas por Bonnet.

Ele prefere o uso da palavra “habitação” (Einwohnung), visto como uma

dinâmica que não limita a independência e a liberdade de ambos os deuses

envolvidos, ao contrário do sincretismo. Ele descarta esta última, pois toma

como seu significado apenas aquele que lhe fora atribuído originalmente por

Plutarco.

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Nós devemos abandonar o termo infeliz “sincretismo”, que ao

contrário da opinião comum, não deriva de, “mistura” (o

qual é na verdade ou ), mas de , “cretense”, e denota a união dos cretenses contra um inimigo em comum.

(MORENZ, 1962, pp. 188-9)

Além da habitação de um deus local por um deus nacional como forma

de aumentar e intensificar o seu poder, nos moldes de Bonnet, Morenz

menciona outras possibilidades de habitação entre deuses. Assim também

temos relações entre deuses nacionais e entidades cósmicas ou entre deuses

com relações próximas. Ou ainda temos o caso de um “Hino a Ptah”, onde

não temos menções a este deus ou aos seus títulos característicos, mas

somente a Rê e a Amun. (MORENZ, 1962, pp. 188-190) Esse fator se deve,

na opinião do autor, ao fato de:

Os deuses egípcios possuíam personalidade, mas não individualidade. Isso é evidente pelas ligações instáveis que eles formavam e a transposição de qualidades de um deus para outro. Ao contrário dos deuses gregos, onde cada um possuía a sua própria individualidade. A indeterminação dos deuses egípcios corresponde, mutatis mutandis, à relativa falta de individualidade na arte e literatura egípcia; portanto pode ser chamado de tipicamente egípcio.

(MORENZ, 1962, p. 190)

Talvez uma das obras mais conhecidas sobre o assunto seja Der Eine

und die Vielen. Ägyptische Gottesvorstellungen de Erik Hornung (1971). Dos

vários sinônimos para sincretismo como “Fusão”, “Igualação” ou

“Identificação”, em sua opinião é mais apropriado o uso do conceito

“habitação” (Einwohnung) proposto por Bonnet. (HORNUNG, 1993, pp. 82-

83) Para ele o sincretismo não necessita a identidade ou fusão de deuses,

possibilitando a união de deuses de formas ou sexo diferentes. Neste ponto,

afirmando o contrário de Bonnet, o qual, como vimos, nega a possibilidade

de união de deuses de gêneros diferentes. O sincretismo também pode unir

mais de dois deuses, como é o caso do deus Ptah-Sokar-Osíris. “Como uma

corrente de elementos químicos, eles podem se separar novamente a cada

momento e se unir a membros diferentes, sem perder as suas características

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individuais.” (HORNUNG, 1993, p. 88) Não é uma síntese, mas uma nova

forma que aparece ao lado dos dois deuses antigos. (HORNUNG, 1993, p. 89)

Junto ao sincretismo existem outras formas de ligação entre os deuses

egípcios. Entre estas, temos: 1. Relações familiares (filho, companheiro,

irmão, ...); 2. O deus (ou rei) é uma imagem, forma de aparição ou ba de um

outro deus e 3. Associações do tipo das praticadas entre Rê e Osíris (ver 4),

que pode-se desfazer após algum tempo. Essa última geralmente acaba

sendo confundida como uma forma de sincretismo, mas para Hornung ela se

diferencia deste, pois, ao contrário do sincretismo, ela não gera um novo

deus que coexiste ao lado dos dois originais. Ela é apenas uma ligação

temporária entre ambos os deuses. (HORNUNG, 1993, pp. 84-85)

Ao contrário de Bonnet, Hornung não acredita que o sincretismo

caminha em direção a um monoteísmo; pelo contrário, ele evita que ele se

forme. Nos deuses sincréticos, o nome de todos os deuses envolvidos nessa

união aparece, o que demonstra que um não é mais importante que o outro.

E leva à consciência de que “o parceiro divino do homem não é apenas um,

mas múltiplo.” (HORNUNG, 1993, p. 89)

Jean Leclant em sua apresentação sobre o sincretismo egípcio chama

a atenção para o fato de ele ser um “procedimento” fundamental da religião

egípcia. (LECLANT, 1975, pp.1-18) Para uma definição geral de seu

significado, ele considera apropriada aquela atribuída por Vandier:

O sincretismo, que é, de uma forma geral, a fusão de diversos sistemas filosóficos ou religiosos, exprime, no caso em particular do Egito, a tendência, tão claramente atestada nesse país, para identificar um deus com outro deus de maneira a fazer dessa dualidade divina um ser único no qual se encontram caracteres, primitivamente independentes, destes dois elementos formadores. O sincretismo, que apareceu desde os mais antigos tempos da história egípcia, se desenvolveu rapidamente, e não faltarão ocasiões na seqüência desta discussão para citar as inúmeras conquistas feitas ao longo dos séculos, desse processo essencialmente dinâmico.

(Apud LECLANT, 1975, p. 2)

O sincretismo é muito mais um manifesto da “vontade piedosa de

eficiência sentida pelos crentes, do que o resultado de manobras políticas

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religiosas” (LECLANT, 1975, p. 6) Ele se expressa principalmente nos hinos.

(LECLANT, 1975, p. 6)

Leclant observa a existência de diversos tipos de sincretismo no Egito.

Temos a ligação entre dois ou mais deuses, equivalendo aqui ao conceito de

habitação de Bonnet. Essa união pode-se exprimir de diversas formas, onde

um deus pode aparecer na forma de outro ou um deus pode ser a ba ou

imagem de outro deus. A união pode ocorrer entre um deus local e um deus

superior (ex. Sobek-Rê, Amun-Min), ou entre deuses de diferentes sexos (ex.

Neith-Osíris, Hórus-Sothis). Também temos a Assimilação pela forma (ex.

diversos tipos de Hórus) ou pelas funções (ex. deuses da morte: Osíris,

Sokar, Khentamentiou). (LECLANT, 1975, pp. 7-9)

Schenkel, no tópico “Götterverschmelzung” (fusão de deuses), o qual ele

toma como sendo um sinônimo de sincretismo, no Lexikon der Ägyptologie,

observa a existência no Egito antigo de três tipos de fusão de deuses: A

primeira seria a Fusão Prática de deuses (Praktische Götterverschmelzung),

foi praticada por toda a história do Egito; contudo os objetivos mudam. Um

exemplo seria a tendência característica em tempos antigos de concentrar

diversos deuses animais com destaque para os componentes combativos em

Falcões e Leões. (SCHENKEL, 1977, pp. 721-722)

O segundo tipo é a Fusão Culto-Política de deuses (Kultisch-politische

Götterverschmelzung), que é a ligação de nomes de deuses. Assim temos

numa ligação no primeiro deus à cidade de culto do deus somada a um

segundo deus representado por um aspecto especial, pelo qual ele deve ser

adorado. (SCHENKEL, 1977, pp. 721-722) Se observarmos bem, na verdade

esse tipo é a habitação proposta por Bonnet. Esse tipo de sincretismo surge

o mais tardar na segunda metade do Antigo Império (IV Dinastia), quando Rê

se funde a Atum, surgindo o deus Atum-Rê (SCHENKEL, 1977, p. 722).

O terceiro e último tipo é a Fusão Teológico-Especulativa de deuses

(Theologisch-Spekulative Götterverschmelzung), a qual seria a fusão pela ba,

que ocorre entre Rê e Osíris (ver 4). Dessa forma, podemos ter um ser com

duas bas, um deus como a ba de outro deus, o qual é entendido como corpo,

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ou um deus é designado com o nome da forma de outro deus. (SCHENKEL,

1977, p. 723)

Na religião egípcia temos a tendência de um aumento da fusão de

deuses, em especial no Novo Império. No mesmo período temos uma

transferência de peso da fusão de deuses de “culto-política” para a

“teológico-especulativa”. O deus X tem o mesmo significado (pAj; dD) com o

deus Y, ou o deus X se manifesta (m) como deus Y, entre outros.

(SCHENKEL, 1977, pp. 721-723)

Para Schenkel a contraditória fusão entre deuses femininos e

masculinos pode ser encontrada a partir da Baixa Época. (SCHENKEL,

1977, p. 724)

Jan Assmann (2004) irá definir o conceito de habitação (Einwohnung),

entendido pela Egiptologia como sendo “uma ligação temporária entre dois

seres, dos quais pela regra um está relativamente distante, oculto ou

comumente inacessível e o outro, por outro lado, está relativamente perto,

presente e acessível”. (ASSMAN, 2004, p. 123) Ele também menciona que

fora da egiptologia o termo “habitação” se refere ao termo hebreu

“Schechinah”, a “habitação divina”, como hipóstase da presença de Deus,

comparável à representação cristã do Espírito Santo. (ASSMANN, 2004, p.

123, n. 1)

Através da leitura dos autores mencionados acima podemos observar

que o conceito de “Habitação” (Einwohnug) proposto por Bonnet em 1939 se

mantém central no estudo da Egiptologia até os tempos atuais. A sua

importância também pode ser vista pela tradução feita por John Baines para

o inglês 60 anos depois, este último ressaltando a importância e a atualidade

em certos aspectos que este artigo possui, e que muitas vezes foi ignorado

devido à falta de conhecimento da língua alemã por parte de muitos

estudiosos. (BAINES, 1999) Podemos ver que outros estudiosos, como

Hornung e Schenkel propõem outros tipos possíveis de união de deuses

realizados entre os deuses egípcios. Mas, dentre estes, a “habitação” se

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mantém como aspecto principal, e define, de um modo geral, o sincretismo

no Egito antigo.

Fora da Egiptologia, observamos que o conceito de sincretismo como

visto em sua peculiaridade no Egito antigo pela Egiptologia, é criticado como

sendo superficial, ou não aceito como sendo uma forma de sincretismo.

Assim, Berner crítica Hornung por definir o conceito de sincretismo muito

restritamente. “O „Sincretismo‟ é entendido exclusivamente como uma forma

muito específica de associação entre duas divindades” (BERNER, 2005, pp.

296-297), e considera imprópria a idéia de Morenz de abandonar o termo

sincretismo. (BERNER, 2005, p. 296) Aqui devemos mencionar que há uma

falha por parte de Berner em não mencionar as circunstâncias pelas quais

Morenz propõem o abandono do termo, como vimos acima. Assim, algo que

Morenz propõe no caso específico dos deuses egípcios, e entendendo o

sincretismo a partir do ponto de vista de Plutarco apenas, parece, na visão

de Berner, estar sendo proposto para o conceito de sincretismo como um

todo. Rudolph (2005), quando menciona os tipos de sincretismo mais

importantes para ele, faz o seguinte comentário a respeito de Bonnet numa

nota referente à Teocrasia:

Bonnet, 1939, percebe a “fusão de deuses” egípcia interna21 como sendo uma característica do pensamento egípcio, que ele considera de ser sincretismo, tentando explicá-lo com uma Teoria do Dinamismo. Ele designa aos egípcios uma tendência básica para o sincretismo como fluindo em suas veias. É parte da superação do politeísmo, e abre o caminho para o monoteísmo, preparando o divino para o ético. Eu assumo que o uso de sincretismo nessa instância é inapropriado, mesmo se Bonnet identificou características sincréticas. É uma questão de formas egípcias de pensamento e de interpretação do ser, a qual é única em “relação” com o divino.

(2005, pp. 83-84, n. 15)

No que se refere às críticas, talvez caiba aqui concordar com Bonnet,

quando ele diz que o fenômeno do sincretismo egípcio precisa ser estudado

em sua peculiaridade, e não inserido em uma categoria geral. Pelas críticas

podemos ver que é justamente isso o que acontece. Ao ser visto dentro das

21 Rudolph refere-se aqui á fusão apenas entre os deuses egípcios, não levando em conta o sincretismo entre deuses egípcios e deuses estrangeiros.

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linhas gerais, as características individuais do sincretismo egípcio são

perdidas e ele se torna algo simplório; no final, acaba não encontrando um

lugar em categorias gerais predefinidas, sendo descartado como sendo algo

que não é sincretismo.

Devemos aqui levar em conta a singularidade do sincretismo egípcio.

E, para tanto, o mais apropriado talvez seja adotar o termo “habitação”

proposto por Bonnet quando nos referimos a ele. Dessa forma fica clara a

sua distinção perante as outras formas de sincretismo identificadas em

outras circunstâncias.

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CAPÍTULO 6. PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Nos capítulos sobre os deuses Ptah, Sokar e Osíris, observamos existir

uma relação muito próxima entre esses deuses desde tempos muito antigos.

Os deuses Ptah e Sokar no Antigo Império foram unidos na forma de um

deus sincrético (ver 3). A natureza exata desse sincretismo não nos é

conhecida devido à falta de evidências. Mas, certamente ela não se configura

como uma “habitação” típica, conforme vimos no capítulo anterior, na qual

um deus de caráter mais universal habita um deus local, reforçando seu

poder. No presente caso temos dois deuses da região mênfita, o que nos

poderia levar a pensar em uma união política realizada pelo clero de ambos

os deuses na intenção de aumentar a sua influência. Pois, como sabemos, a

residência oficial do deus Sokar é o templo de Ptah em Mênfis, e seus

sacerdotes atuam no culto de ambos os deuses.

A partir do Médio Império essa união é reforçada pela “habitação” de

Osíris em Ptah-Sokar. Osíris, como o principal deus dos mortos na época

em que essa “habitação” foi concretizada vem justamente reforçar a natureza

funerária de Ptah-Sokar, senhor da necrópole mênfita. A natureza unida

dessas três divindades em um único deus irá resultar num potente agente

do ciclo regenerativo, no qual Ptah representa a criação, Sokar a

metamorfose e Osíris o renascimento (BRANCAGLION JR, 2009, informação

verbal22). Dessa forma Ptah-Sokar-Osíris atua em todas as etapas da

passagem do morto para a outra vida.

Como um deus único, Ptah-Sokar-Osíris pode ser encontrado em

inscrições a partir do reino de Amenemhat III (c. 1844 a.C. – 1797 a.C.),

sendo particularmente comum em estelas funerárias de Abidos. Nestas, ele

recebe usualmente epítetos de Osíris. (HOLMBERG, 1946, p. 138;

SCHENKEL, 1977, p. 723) Como, por exemplo, na seguinte estela

atualmente no Museu do Cairo: “Possa o rei ser benevolente e dar, e possa

Ptah-Sokar-Osíris, Senhor de Busíris, Grande Deus, Senhor de Abidos, ser

benevolente e dar ...” (LANGE-SCHÄFER apud HOLMBERG, 1946, p. 138)

22 BRANCAGLION JR, Antonio. Arqueologia da Morte: Crenças e Práticas Funerárias do Egito Antigo. Curso ministrado no mestrado em Arqueologia do Museu Nacional/UFRJ. Segundo semestre de 2009.

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Na falta de imagens, em alguns casos deste período fica a dúvida se a

inscrição se refere a Ptah-Sokar-Osíris como uma entidade única, ou se aos

três deuses em separado. Tal fato ocorre porque desde o início encontramos

o nome do deus escrito de diferentes formas. O nome de Ptah-Sokar-Osíris é

formado pela junção de uma das formas de escrita dos nomes de cada um

destes três deuses (ver 2, 3 e 4). (Apêndice A) Em algumas dessas formas,

cada parte do nome é seguida por um determinativo de deus próprio, como

por exemplo, na Fórmula de Oferendas encontrada na estela do Príncipe

Djad, atualmente localizada no Museu do Louvre (C41): .

Outro fator que gera dúvida é o fato de às vezes as referências ao deus se

encontrarem no singular e às vezes no plural. (HOLMEBERG, 1946, p. 138;

MORENZ, 1962, pp. 191-192)

No Novo Império o conceito plural do número

três das Tríades se fortalece na forma condensada das

Trindades, ou seja, três divindades contidas em uma

única forma (HORNUNG, 1993, p. 215). Talvez esse

mesmo movimento impulsionou a maior popularidade

e a criação de imagens do deus Ptah-Sokar-Osíris a

partir desse mesmo período (HOLMBERG, 1946, p.

139). Nas imagens, ele aparece de formas variadas,

podendo às vezes ser caracterizado como uma mistura

de todos os deuses, ou com uma maior ênfase nas

características originalmente pertencentes a um dos

três deuses. Às vezes ele pode aparecer no mesmo

local de diferentes formas, como é o caso do templo de

Séthi I em Abidos.

Como uma entidade que apresenta as

características dos três deuses, Ptah-Sokar-Osíris é

encontrado na forma de um corpo mumiforme com

cabeça de falcão usando a coroa Atf e segurando o

cetro was. Às vezes ele também pode usar junto o

disco solar e segurar o cajado e o açoite. Assim, o

Figura 23 - base do caixão exterior da Senhora da Casa Seshepenmehyt mostrando o deus Ptah-Sokar-Osíris sobre um estandarte e cercado pelo uraeus – Baixa Época, Tebas (BM EA 22814)

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deus tem a cabeça do deus Sokar, tem o corpo dos deuses Ptah e Osíris, e

segura em suas mãos as insígnias de ambos esses deuses. Nesta forma ele é

encontrado comumente no lado de dentro, no fundo dos caixões da Baixa

Época (Fig. 23). Geralmente nestas imagens o deus Ptah-Sokar-Osíris

aparece envolvido por uma serpente. Esta separa a ordem, o interior do

caixão onde está o deus e o corpo do morto, do caos, aqui representado pelo

que está fora do caixão.

Em um aspecto que se assemelha

mais ao deus Sokar, ele pode ser

encontrado na forma de falcão, como na

tumba de Pashedu (TT3) em Deir el-

Medina. Ali, sobre a passagem para o

recinto principal, temos a imagem de um

filho de Pashedu ajoelhado fazendo

oferendas para o deus Ptah-Sokar-Osíris,

na forma de um falcão com as asas estendidas sobre uma barca. (Fig. 24)

Em outras representações, ele pode aparecer de forma semelhante, usando a

coroa Atf, ou, ainda, sobre a barca Henu do deus Sokar. (LEITZ, 2002, p. 176)

Ptah-Sokar-Osíris também pode ser encontrado na forma híbrida de

Sokar, com corpo humano e cabeça de falcão, geralmente usando a coroa Atf,

tanto em pé como sentado no trono. Talvez essa seja a forma mais comum

em que encontramos este deus na iconografia. Assim, podemos encontra-lo

num pilar da câmara funerária da tumba de Ramessés V e Ramessés VI (KV

9), representado em pé, usando a coroa Atf e o disco solar, segurando na mão

esquerda o açoite e na mão direita o cetro was (Fig. 25). Em Medinet Habu,

no fuste da coluna 37 da colunata sul, podemos ver o faraó Ramessés III na

segunda Corte oferecendo ungüentos para Ptah-Sokar-Osíris nessa mesma

forma, na presença de Sekhmet e Thot. Na Porta da tumba de Sennedjem

(TT 1), este aparece junto de seus parentes venerando Ptah-Sokar-Osíris

sentado em seu trono, usando a coroa Atf e segurando o cetro was (Fig. 26).

Ou ainda no “Livro dos Mortos” de Sérimen, onde ele aparece sentado em

seu trono usando uma coroa Atf mais elaborada, segurando na mão esquerda

Figura 24 – Ptah-Sokar-Osíris na forma de falcão sobre uma barca – Período Ramessida, TT3.

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Figura 26 - Porta de madeira da tumba de Sennedjem, a qual mostra como Sennedjem e seus parentes veneram Osíris e Maat (em cima) e Ptah-Sokar-Osíris e Ísis (embaixo). XIX Dinastia, TT 1 (Museu do Cairo JE 27303)

Figura 27 - Ptah-Sokar-Osíris sentado em seu trono seguido da deusa Ísis na sala do Julgamento dos Mortos - XXI Dinastia, ―Livro dos Mortos‖ de Sérimen (Museu do Louvre)

Figura 25 - Ptah-Sokar-Osíris em sua forma hibrida com corpo humano e cabeça de falcão – XX Dinastia, KV 9. (Theban Mapping Project)

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o açoite e um ankh, e na mão direita, o cetro was (Fig. 27).

Como um deus antropomorfo, o deus Ptah-Sokar-Osíris é encontrado

geralmente em cenas de contexto funerário pertecentes ao imaginário

osiríaco. Nessa forma ele pode ser encontrado como uma múmia no interior

de seu caixão, deitado sobre uma esteira. As deusas Ísis e Néftis podem estar

paradas nas laterais da esteira, protegendo o corpo mumificado deste deus.

Alternativamente ele pode aparecer como um deus itifálico no interior de um

caixão, o qual é carregado pelos quatro filhos de Hórus. Sobre o caixão está

a barca Henu. (LEITZ, 2002, p. 176) Em uma cena do “Livro dos Mortos” de

Anhai (BM EA 10472,5), ele aparece como o juiz do Mundo dos Mortos,

sentado sobre o seu trono no interior de uma capela. Ele usa o toucado

divino junto com a coroa Swty, e nas mãos, as quais se projetam para fora

das bandagens, ele segura o cajado e o açoite. Atrás dele seguem as deusas

Ísis e Néftis fazendo o gesto de proteção sobre o seu corpo. (Fig. 28) No texto

que acompanha a imagem podemos ler seus epítetos de “Habitante do Lugar

Secreto, Grande Deus, Senhor do Ta-tchesertet, Rei da Eternidade,

Governador por toda a Eternidade” (BUDGE, 1969, Vol. I, p. 503). Na tumba

de Ramessés III (KV11) temos uma imagem deste faraó oferecendo incenso e

fazendo libações diante de Ptah-Sokar-Osíris, protegido pela deusa Ísis

alada. Aqui o deus apresenta um tom de pele verde, comumente associado a

Osíris como deus da fertilidade. Ele usa a coroa Atf junto com o toucado

divino com um uraeus, na mão direita segura o centro was e na esquerda

um ankh. (Fig. 29) Em suas estátuas funerárias, tema principal desta

dissertação, Ptah-Sokar-Osíris também é representado em sua forma

antropomorfa. Em linhas gerais estas representam Ptah-Sokar-Osíris como

um deus mumiforme sem mãos e braços, usando o toucado divino e a coroa

Swty (ver Parte III).

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Figura 28 - Ptah-Sokar-Osíris em forma antropomorfa como juiz do Mundo dos Mortos sentado em seu trono no interior de uma capela seguido das deusas Ísis e Néftis – ―Livro dos Mortos‖ de Anhai (BM EA 10472,5)

Figura 29 - Ramessés III oferecendo incenso e fazendo libações diante de Ptah-Sokar-Osíris, protegido pela deusa Ísis alada, XX Dinastia, KV 11 (Theban Mapping Project)

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A forma de anão do deus Ptah, conhecida como Pataikos, também

pode ser atribuída ao deus Ptah-Sokar-Osíris. Segundo Helen Coleman

(apud ARTWORLD, on-line23) Pataikos seria inclusive a versão grega do nome

23 ARTWORLD. Statuette of Pataikos. Disponível em: <http://artworld.uea.ac.uk/cms/index.php?q=node/816>. Acesso em: 12 mar. 2008.

Figura 30 – Parte superior da estela de Metternich na qual temos Ptah-Sokar-Osíris na forma do anão Pataikos (vermelho). (BUDGE, 1969, Vol. II, p. 271)

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Ptah-Sokar-Osíris. Na parte da frente da estela de Metternich (MMA 50.85),

temos duas representações de Ptah-Sokar-Osíris na forma de um anão calvo

com uma cabeça grande. Uma representação está localizada do início do

segundo registro à direita, e a outra quase no meio, entre um falcão

representando Hórus de Ouro e uma capela com dois olhos wedjats, e um

crocodilo com o disco solar em seu interior no sexto registro. Na primeira

representação, ele está parado sobre dois crocodilos, segurando uma cobra

em cada mão. (Fig. 30) Como Pataikos, Ptah-Sokar-Osíris também é

frequentemente encontrado na forma de amuletos, em especial de faiança.

Ptah-Sokar-Osíris é raramente encontrado na forma típica do deus

Ptah como uma figura mumiforme em pé, com as mãos saindo das

bandagens, segurando um cetro composto pelo cetro was, o pilar djed e o

símbolo ankh, e usando um gorro

justo com as orelhas de fora. Um

exemplo desta forma pode ser

observado em um fragmento de um

relevo pertencente ao Iseion de

Behbeit el-Hagar do tempo de

Ptolomeu II, atualmente no

Museum of Fine Arts de Boston

(inv. 51.739). Neste, Ptah-Sokar-

Osíris aparece na forma de Ptah no

interior de uma capela, à frente do

deus Amun (Fig. 31). Igualmente a

menção a epítetos de Ptah são raros. Isso leva Holmberg (1946, p. 144) a

afirmar que Ptah teria apenas um papel secundário na formação do

sincretismo de Ptah-Sokar-Osíris.

A afirmação de Holberg pode ter levado outros autores de chamarem

representações a formas sincréticas entre dois desses deuses, em especial de

Sokar-Osíris, genericamente de Ptah-Sokar-Osíris. Tal fato ocorre, pois tanto

Ptah-Sokar, Sokar-Osíris, Osíris-Sokar e Ptah-Sokar-Osíris podem ter as

mesmas representações. Assim, por exemplo, podemos tanto ter Sokar-

Figura 31 - Ptah-Sokar-Osíris no interior de uma capela em frente ao deus Amun. Período Ptolomaico (Museum of Fine Arts Boston inv. 51.739)

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Osíris como Ptah-Sokar-Osíris presidindo o Julgamento do Morto. Às vezes,

no decorrer de um evento, ambos os nomes também podem aparecer

alternadamente, ou no caso das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris,

onde na verdade podemos ter a menção de uma das diferentes formas

sincréticas desses deuses em suas inscrições.

Este fato nos leva a pensar que entre os próprios egípcios não havia

uma distinção muita clara entre as formas sincréticas desses deuses, ou que

Ptah-Sokar e Sokar-Osíris aparecem como uma forma abreviada de Ptah-

Sokar-Osíris, na qual certos as aspectos específicos desse deus são

ressaltados. Assim, por exemplo, Sokar-Osíris ressalta as principais etapas

da passagem para o Mundo dos Mortos: a metamorfose e o renascimento.

O deus Ptah-Sokar-Osíris não possuía nenhum templo próprio, mas

menções a ele podem ser encontradas em diversos templos. Em muitas

destas ele é aludido em relação a celebração de seu festival no mês de

Khoiak. Este festival, surgido da união dos festivais de Sokar realizado em

Mênfis e de Osíris realizado em Abidos, vem a ser uma celebração do

renascimento. É a vitória de Ptah-Sokar-Osíris sobre a morte que permite as

sementes nos campos de germinarem com a chegada da cheia do Nilo. Neste

festival são igualmente feitas figuras de grãos as quais se assemelham as

pseudo “múmias-de-grãos” encontradas no interior das estátuas funerárias

de Ptah-Sokar-Osíris. (ver 13.2.2)

Como um deus da ressurreição sua principal área de atuação está no

contexto funerário. Assim podemos encontrar menções a ou representações

de Ptah-Sokar-Osíris em estelas funerárias desde o Médio Império. Em

tampas de caixões a partir do III Período Intermediário ele aparece

freqüentemente mencionado em Fórmulas de Oferenda. Assim como Osíris,

originalmente ele preside o Julgamento dos Mortos na Sala das Duas Maats,

em especial no Período Ptolomaico (BRANCAGLION JUNIOR, 2009,

informação verbal24).

24 BRANCAGLION JR, Antonio. Arqueologia da Morte: Crenças e Práticas Funerárias do Egito Antigo. Curso ministrado no mestrado em Arqueologia do Museu Nacional/UFRJ. Segundo semestre de 2009.

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As estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris encontradas nas

proximidades do morto, nas tumbas a partir da XXV Dinastia, também se

encaixam nesse contexto funerário do deus. Aqui temos a representação do

morto na forma de Ptah-Sokar-Osíris com a intenção de ajudar em uma

jornada bem sucedida para o Outro Mundo, cujo ápice seria justamente a

união do morto com esse deus, o Senhor do Mundo dos Mortos.

Nas estátuas funerárias mais tardias de Ptah-Sokar-Osíris

encontramos outro aspecto desse deus, no qual ele está ligado ao ciclo solar.

Nestas estátuas podemos encontrar uma série de símbolos ligados ao mito

solar. Temos, por exemplo, o disco solar presente na coroa Swty; algumas

estátuas têm escaravelhos alados sobre o peito, e no hino a Ptah-Sokar-

Osíris, temos alusões ao momento da criação. Assim, além de representar o

morto como um mAa-xrw, a estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris também

passa a aludir ao êxito na segunda etapa da sua jornada no Mundo Inferior,

quando ele se torna um espírito glorificado e pode se unir ao deus-sol em

sua viagem diária (ver 13.1).

Ao mesmo tempo os raios do sol eram responsáveis por acordar (Ptah-

Sokar-)Osíris para uma nova vida, e faziam as plantas crescerem da matéria

morta, como podemos ver numa representação de um caixão da XXI

Dinastia (Fig. 32). A mesma idéia é transmitida pelas “múmias-de-grãos”,

como as encontradas no interior das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris, e as

fabricadas durante o festival de Khoiak. (HORNUNG, 1991, p. 134) Assim, o

deus-sol era o responsável pela realização do renascimento do qual Ptah-

Sokar-Osíris era o representante.

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Portanto, aqui a estátua passa a ser uma representação do morto

unido ao Grande Deus (nTr aA). A idéia do Grande Deus pode ser vista como o

ápice dessa criação teológica que une os dois principais ciclos religiosos dos

egípcios: o solar e o osiríaco (ver 4).

O nTr aA era transcendental e imanente ao mesmo tempo, acreditava-se que ele existia em qualquer forma visível e imaginável, e corresponde portanto a todas as formas de culto egípcias tradicionais de deuses. Todo morto após ter passado felizmente o Julgamento do Morto, era entendido como uma encarnação do Deus ele mesmo em ambos os seus aspectos unificados: o solar e o osiriaco.

(Niwiński, 1987-1988, pp. 105-106)

A partir do III Período Intermediário, Ptah-Sokar-Osíris como uma

forma sincrética do deus Osíris passa cada vez mais a ocupar o lugar de

Osíris na união com Rê e suas formas sincréticas, as quais, no ápice,

chegam à formação Rê-Horakhty-Atum-Khepri, como ocorre neste exemplo

dado por Niwiński:

Figura 32 - Os raios do sol acordando Osíris para uma nova vida, representada pelas plantas crescendo do corpo mumificado do deus. (HORNUNG, 1991, p. 134)

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Na forma mais compacta, a idéia do Ser Supremo era iconograficamente expressa na figura de um escaravelho com cabeça de carneiro (Fig. 33), às vezes complementada por elementos adicionais como asas, falo, disco solar e coroa. Tal imagem pode facilmente ser vista como uma forma criptográfica do nome Rê-Horakhty-Atum-Khepry, e a coroa, a qual muitas vezes é associada ao pilar Djed, indica que Ptah-Sokar-Osíris também era significado sob esta forma composta. Além disso, a presença da cabeça de um carneiro permite associações com a iconografia de Amun.

(1987-1988, p. 104)

Figura 33 – Representação do nTr Aa na forma de escaravelho com cabeça de carneiro, a qual incorpora os deuses Rê-Horakhty-Atum-Khepry e Ptah-Sokar-Osíris – III Período Intermediário, caixão Cairo J 29736 (Niwiński, 1987-1988, p. 105)

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PARTE III

AS ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS

E

PTAH-SOKAR-OSÍRIS

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145

CAPÍTULO 7. CLASSIFICAÇÃO

7.1 CLASSIFICAÇÕES INICIAIS DO SÉCULO XIX

As primeiras tentativas de um entendimento das estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris surgem de forma pontuada em trabalhos do século XIX,

juntamente com o início da egiptologia. Em 1824, Minutoli irá publicar um

desenho contrastando uma estátua de um Osíris de Verniz Preto, contendo

um papiro, com uma estátua policromada, com coroa de plumas e cavidade,

contendo “incenso e outras oferendas” (RAVEN, 1978-1979, p. 253). Em

1826, Passalacqua (1826, pp. 170-171) irá dividir as estátuas em Osiris

mitré (com coroa atef e contendo papiro funerário no tronco) e Osiris non

mitré (com disco solar e duas plumas e, às vezes, contendo papiro na base).

Em 1827, Minutoli, de acordo com a divisão de Passalacqua, irá discordar do

conteúdo da base, afirmando conterem essas em seu interior pequenos

animais ou fetos humanos (RAVEN, 1978-1979, p. 253). No mesmo ano

Champollion (1827, pp. 156-157) foi o primeiro a dar uma fundamentação

científica a essas teorias, fazendo a seguinte divisão: “Osiris Pet-hem-

Pamenthès”, preto ou policromado, contém manuscritos funerários, e

estátuas de “Phtha-Socar-Osiris”, contendo recipiente com objeto

mumificado. Em 1836, Rosellini (p. 349 n.2) irá afirmar que as estátuas

representando “Osiride-Sokari” contêm no interior de seu corpo um papiro

funerário, ou na base, o pênis mumificado do morto. Leemans (1840), a

partir de observações feitas nos exemplares de Leiden, é o primeiro a relatar

o verdadeiro conteúdo das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris. Ele demonstra

serem grãos de cereais o conteúdo dos objetos mumificados encontrados no

interior das cavidades, mas continua a relatar, baseado em Rosselini, a

existência de estatuetas com partes do corpo do morto mumificado no

interior da cavidade na base. (LEEMANS, 1840, p. 259; RAVEN, 1978-1979,

p. 253)

7.2 A TIPOLOGIA DE RAVEN

Até 1978, as publicações que surgem a respeito do tema não trazem

nenhuma inovação em relação às conclusões obtidas no século XIX. Neste

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ano, Maarten Raven publica o artigo Papyrus-sheats and Ptah-Sokar-Osiris

statues, propondo uma tipologia mais elaborada, que continua sendo a

principal referência para a classificação de estátuas de Osíris e Ptah-Sokar-

Osíris. A partir do estudo principalmente dos exemplares contidos no

Rijksmuseum van Oudheden em Leiden, complementado por relatórios de

escavações e catálogos de outros museus, ele irá dividir as estátuas em cinco

tipos, os quais, por sua vez, contêm outras subdivisões, levando em conta

características específicas no interior de cada tipo. Os tipos I e II abrangem

as estátuas de Osíris porta-papiros, e os demais tipos englobam as estátuas

de Ptah-Sokar-Osíris.

7.2.1 Tipo I – Estátuas de Verniz Preto

Esses exemplares têm como característica comum serem todos

cobertos por uma camada de verniz preto, podendo ser sólidas ou conter

uma cavidade no tronco ou na base. Algumas contêm detalhes em amarelo

ou folhados a ouro. Todos os subtipos podem ser encontrados durante a XXI

Dinastia e início da XXII Dinastia. O subtipo IA pode ter sobrevivido até a

XXV Dinastia. Elas lembram algumas estátuas igualmente cobertas por um

verniz preto, encontradas em tumbas reais da XVIII Dinastia (ver

ANTECESSORES). (RAVEN, 1978-1979, pp. 258-259)

Este grupo contém as três seguintes subdivisões:

I A. Figuras delgadas, sem mãos ou braços, usando o toucado divino, a

coroa de plumas de avestruz, com ou sem disco solar, e, às vezes, a barba

divina. A maioria é sólida, mas pode ter uma cavidade retangular na lateral

da base, fechada por um sarrafo deslizante. (RAVEN, 1978-1979, p. 258 e pl.

39, 1.) [09; 10]

I B. Figuras delgadas com braços cruzados sobre o peito e punhos

vazios. De resto, assemelham-se ao tipo I A, usando o toucado divino, a

coroa com duas plumas de avestruz, com ou sem disco solar, e, às vezes

usando a barba divina, e podendo conter a cavidade na lateral da base.

(RAVEN, 1978-1979, p. 258 e pl. 39, 2.) [11]

I C. Figuras corpulentas com braços cruzados sobre o peito, podendo

segurar o cajado e o açoite nas mãos. Usam a coroa Atf ou HDt, e às vezes a

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barba divina. No tronco possuem uma cavidade cilíndrica que se estende

através da cavilha até a parte de baixo da base, que é fechada por uma

tampa circular ou oval. A construção da cavidade foi facilitada pela

manufatura do corpo da estátua em duas partes, de forma que o verso pode

ser removido como um painel solto. (RAVEN, 1978-1979, pp. 258-259 e pl.

39, 3.) Como ocorre com o exemplar [MN-5]. [06]

7.2.2 Tipo II - Estátuas de Osíris Policromadas

As figuras desse grupo têm em comum uma pintura policromada,

possuindo uma face verde, barba divina e, geralmente, elas usam a coroa Atf,

seguram cetros nas mãos, e a base é amarela ou vermelha. Todos os tipos

(exceto I C) têm uma cavidade tubular com painel traseiro solto, o qual

continha em seu interior um papiro, geralmente um exemplar do “Livro dos

Mortos”. As figuras datam de um período que se inicia na XIX Dinastia,

talvez final da XVIII Dinastia, e vai até a XXI Dinastia, possivelmente até a

XXII Dinastia. (RAVEN, 1978-1979, p. 260-263)

II A. Um único espécime de Leiden desse tipo foi

registrado por Raven. Este parece ser um intermediário

entre os tipos I e II. O corpo da estátua com braços

cruzados e mãos segurando o cajado e o açoite é preto,

mas a face é verde; a coroa Atf, branca com detalhes em

verde, vermelho e preto, e a base é vermelha. A cavidade

na base é igual ao tipo I C. (RAVEN, 1978-1979, p. 261)

(Fig. 34)

II B. Há um único exemplar, no Museu do Cairo (JE

55146). De caráter tosco, esta estátua apresenta uma

face verde, usa a coroa HDt, e os braços estão ausentes. O

tronco é branco, com faixas vermelhas transversas, e usa

um simples colar. O tronco é oco, a base é muito baixa e

se projeta para frente e para trás. (RAVEN, 1978-1979, p.

261)

II C. Uma estátua simples com o mesmo tipo de

base do tipo II B, cuja cavidade se localiza num receptáculo tubular

Figura 34 – Estátua de Osíris Policromada do tipo II A de Raven. (Robert V. Fullerton Art Museum)

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separado, fixado ao verso da figura. A face é verde, o corpo

contém um padrão de escamas em vermelho e preto. A

parte de cima dos braços foram manufaturados de pedaços

de madeira separados, enquanto a parte inferior dos

braços, com as mãos segurando os cetros, foram apenas

pintados. A coroa, trabalhada de forma rude, lembra a

pschent. (RAVEN, 1978-1979, p. 261) (Fig. 35)

II D. Este é o subgrupo com o maior número de

exemplares. As figuras possuem cavidades e seguram

cetros, com braços cruzados ou mãos opostas. A parte

superior do tronco pode estar despida (vermelha),

enquanto a parte inferior é enfaixada (branca) ou pode

usar um rico vestuário consistindo de um colar

concêntrico, uma borla (manxt) ou contrapeso (mnat) na parte de trás do

pescoço, uma cinta apertada, uma capa curta com rosetas, ou um traje justo

com motivo de escamas ou penas. A coroa é sempre a Atf. Usualmente essas

estátuas contêm uma coluna vertical com inscrições na frente do tronco e no

topo da base. (RAVEN, 1978-1979, pp. 261-262 e Pl. 39, 4.) [02; 03; 04]

II E. É um exemplar de Leiden com toucado divino azul, com uma faixa

e uraeus e a coroa Atf. Segura dois açoites, e a inscrição na frente do tronco

branco é o início da fórmula dos shabtis (LM VI). (RAVEN, 1978-1979, p. 262

e pl. 39, 5.)

7.2.3 Tipo III – Estátuas de Ptah-Sokar-Osíris com Face Verde

O presente tipo não contém subdivisões, sendo seus os exemplares

caracterizados por uma forma humana mumiforme, com coroa Swty, e sem

mãos e braços. O toucado divino é azul, a barba divina sobre um plinto é

preta, a face é verde, com detalhes em preto e branco. Usa um colar

concêntrico simples ao redor dos ombros, interrompido pelas três abas do

toucado; este colar é liso (amarelo) ou possui faixas concêntricas (cores

escuras sobre fundo branco ou amarelo), podendo a borda inferior ter uma

fileira de elementos em forma de gota. O corpo da figura é vermelho, e pode

ter um padrão reticulado azul imitando uma rede de contas. A maioria dos

Figura 35 - Estátua de Osíris Policromada do tipo II C de Raven. (Rijksmuseum van Oudheden Leiden)

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exemplares possui um pilar dorsal, o qual forma uma continuação das abas

do toucado nos ombros. Pode haver um plinto entre a estátua e a base, mas

isso é raro. Na base amarela ou branca, uma cavidade pode ter sido

escavada, cuja tampa ostenta uma estatueta de madeira de um falcão

mumificado vermelho com detalhes em preto, branco e azul. Na parte da

frente do tronco e no pilar dorsal geralmente possuem uma coluna vertical

com inscrições em hieróglifos. A presença do pilar dorsal na maioria dos

exemplares aponta para uma data na XXVI Dinastia para o tipo III. (RAVEN,

1978-1979, pp. 264-266 e PL. 39, 6.) [14; 15; 16; 17]

7.2.4 Tipo IV – Estátuas de Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada

Estas figuras têm em comum corpos pretos ou vermelhos, faces

folhadas a ouro ou pintadas de branco ou amarelo para imitar a folhação, e

usam a coroa Swty, um toucado divino azul e, às vezes, a barba divina. O

colar, quando presente, é o wsx n bik, terminando com cabeças de falcões nos

ombros. Geralmente não possuem mãos e braços. Têm um pilar dorsal e um

plinto sob os pés. A cavidade mais comum é um receptáculo na parte da

frente da base, fechado por uma tampa na forma de um falcão mumificado

ou de um sarcófago. Outros tipo de cavidade encontram-se no tronco, sendo

uma aberta por um painel solto na parte superior do pilar dorsal; a outra é

manufaturada ao modo dos caixões, juntando-se a figura em duas partes.

No interior dessas cavidades são encontradas comumente pseudo múmias-

de-grãos. (RAVEN, 1978-1979, pp. 266-267 e 270-271)

O tipo IV aparenta ter sido criado na XXV Dinastia e perdurado até o

Período Ptolomaico. O subtipo IV A teria sobrevivido por todo esse período,

enquanto o subtipo IV B aparece apenas no início, na XXV Dinastia, o

subtipo IV E ocorre na XXX Dinastia e os demais subtipos, IV C, D e F são

encontrados no Período Ptolomaico. (RAVEN, 1978-1979, pp. 268-270)

Este grupo contém seis subdivisões:

IV A. Estátuas simples com corpo vermelho e face folhada a ouro, colar

simples, ou sem colar, e uma coluna vertical, com inscrição em hieróglifos

na frente. (RAVEN, 1978-1979, p. 267 e pl. 40, 1.) [19]

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IV B. Estátuas simples com corpo vermelho e face amarela, o colar wSx

com ou sem falcão, coluna frontal de hieróglifos; as inscrições na base estão

sobre um fundo amarelo. Todas as cores foram aplicadas diretamente sobre

a madeira. A inscrição contém o início do hino à Ptah-Sokar-Osíris. (RAVEN,

1978-1979, p. 267 e pl. 40, 2.) [20; 21]

IV C. Estátuas com corpo vermelho, face folhada a ouro e colar wSx n

bik, com várias fileiras de diferentes motivos. A decoração intricada pode

conter itens como uma barba franzida, um peitoral listrado entre as abas do

toucado, outro peitoral na forma de um relicário pendurado numa corrente,

escaravelhos alados, abutres, ou pássaros ba, redes de contas, frisos de

símbolos protetores, ou padrões srx ao redor da base, entre outros.

Geralmente têm três colunas de inscrições na frente do tronco, sobrepujadas

por uma deusa Nut com asas estendidas. Essas colunas, junto com a que

existe no pilar dorsal, geralmente contém o hino completo à Ptah-Sokar-

Osíris. Exemplares com apenas uma coluna de inscrição e sem o hino

também são conhecidas. (RAVEN, 1978-1979, p. 267 e pl. 40, 3.) [23; 24; 26;

27; 28; 29; 30]

IV D. Um exemplar de Leiden de uma estátua simples com corpo preto

e face folhada, sem colar e com uma coluna de inscrição na frente. (RAVEN,

1978-1979, p. 268 e pl. 40, 4.) [33; 34]

IV E. Estátuas com corpo preto e face folhada a ouro, branca ou

amarela. Os detalhes do colar wSx n bik e as inscrições, geralmente três

colunas na frente e uma no pilar dorsal, contendo o hino completo à Ptah-

Sokar-Osíris, estão pintados em finas linhas amarelas. Detalhes como

joelhos, canelas e ombros estão bem delineados, e às vezes a estátua

apresenta as mãos sobre o peito. A base contém inscrições e faixa

axadrezadas sobre fundo amarelo. (RAVEN, 1978-1979, p. 267 e pl. 40, 5.)

[35; 36; 37]

IV F. Estátuas com corpo preto e face folhada a ouro ou amarela. A

decoração é intrincada como no tipo IV C, mas redes de contas não ocorrem

aqui. (RAVEN, 1978-1979, p. 267 e pl. 40, 6.) [38; 39]

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7.2.5 Classes Mistas

Nesta categoria Raven incluiu todos os tipos que não se encaixam nas

categorias anteriores e não formam um grupo abrangente. Estes tipos

provêm de oficinas provinciais, sendo trabalhadas de acordo com as

tradições locais. Todas as estátuas são de Ptah-Sokar-Osíris com coroa Swty.

(RAVEN, 1978-1979, p. 271) Assim, temos um tipo de estátuas que se

assemelham ao tipo III, mas suas faces são vermelhas, e há outras nas quais

a face é verde, no entanto a cor do tronco é branca. Alguns desses

exemplares ainda lembram o tipo II e podem ser sólidos ou conter múmias-

de-grãos. (RAVEN, 1978-1979, p. 271-272)

Outras estátuas com face vermelha ou rosa e corpo

branco parecem formar um grupo pertencente ao Período Saíta

e ao Período Ptolomaico. Também podem ser encontradas

estátuas todas brancas. Parte das estátuas desse tipo, que

contêm uma flor de lótus na tampa da base (Fig. 36), parecem

ser típicas do Médio Egito. (RAVEN, 1978-1979,

pp. 272-273)

Em menor quantidade temos estátuas

completamente folhadas a ouro [48],

pertencentes ao Período Saíta, e outras na qual

prevalece a cor azul, decoradas em amarelo ou

ouro, pertencentes ao Período Ptolomaico.

(RAVEN, 1978-1979, p. 273)

7.3 ACRÉSCIMOS E CORREÇÕES DA TIPOLOGIA DE RAVEN

A tipologia feita por Raven no final da década de 1970 continua sendo

até os dias atuais a principal referência para a classificação das estátuas

funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Neste período, não surgiu nenhum

novo tipo de classificação. No entanto, ao longo desse período, algumas das

publicações que surgiram sobre o assunto apontam correções a serem feitas

a respeito, além do surgimento de outros tipos de exemplares de Ptah-Sokar-

Osíris que não são mencionados por Raven.

Figura 36 – Estátua de Ptah-Sokar-Osíris com lótus no topo da base. (RAVEN, 1978-1979, pl. 41, 2.)

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7.3.1 Aston

No artigo “Two Osíris Figures of the Third Intermediate Period”, Aston

(1992) irá descrever um shabti de Ramessés II transformado em um Osíris

de Verniz Preto [55], e outro Osíris [12], de tipo inédito, ambos pertencendo à

coleção do British Museum. Sendo o segundo (BM EA 22913) parecido com

duas figuras pertencentes ao Metropolitan Museum of Arts de Nova York

(MMA 28.3.61 e MMA 25.3.204), e com uma figura do Museu do Cairo (T.

25.11.25.17), ele propõe um novo tipo de Osíris, denominado de tipo V,

dando continuidade à tipologia de Raven.

As peças do tipo V têm em comum serem figuras de Osíris de face

verde, usarem o toucado divino amarrado por uma fita sSd, a coroa de

plumas de avestruz, um colar concêntrico e um sash cruzado sobre o torso.

Este tipo pode ser datado de um período entre 750 a.C.-675 a.C.,

compreendendo a segunda metade do III Período Intermediário. (ASTON,

1992, pp. 99 e 106)

Ao mesmo tempo, Aston propõem uma nova cronologia para a tipologia

proposta por Raven. Nesta, ele trata especificamente das figuras de Osíris e a

sua evolução para os primeiros tipos de Ptah-Sokar-Osíris, deixando de fora

os exemplares de Ptah-Sokar-Osíris mais tardios (tipos IV A, C, D, E e F).

Nesta tipologia, temos as seguintes novas datas propostas para os tipos:

Tipo Data a.C.

II c. 1300-1000

I C c. 1025-925

I A c. 975-900

I B c. 975-900

V c. 750-675

IV B c. 720-650

III c. 700-600

Assim, para Aston, as figuras de Osíris Policromadas do tipo II foram as

primeiras a surgir no Novo Império, continuando a existir até o III Período

Intermediário. Nesta época elas começam a ser substituídas pelas figuras

similares de Osíris de Verniz Preto do tipo IC, que, por sua vez, evoluem para

os tipos IA e IB, por volta do final do século X a.C.. Grande parte desses

últimos tipos é sólida, enquanto os anteriores, tipos IC e II, contêm uma

cavidade para conter papiro. Esta mudança poderia ser vista como uma

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consequência do fato de o papiro com a inscrição do “Livro dos Mortos” não

passar mais a ser usado neste período, tornando a cavidade desnecessária.

O tipo V representaria uma transição das estátuas de Osíris para as de Ptah-

Sokar-Osíris, por volta da metade do século VIII a.C, continuando esse tipo a

existir na primeira metade do século VII a.C., ao lado dos tipos III e IV B.

(ASTON, 1992, pp. 101-107)

7.3.2 Varga

Varga apresenta algumas estátuas de Ptah-Sokar-Osíris da coleção do

Museu de Fine Arts de Budapeste não mencionadas por Raven, as quais se

encaixam na tipologia deste. A figura 58.I-E é apresentada como

pertencendo ao tipo IA; mas características como plinto e pilar dorsal, não

são encontrados nas estátuas do tipo I, tendo surgido apenas em um período

posterior. Portanto seria mais correto atribuir esta estátua ao tipo IV de

Raven. (VARGA, 1995, pp. 3-6) Uma estátua de Ptah-Sokar-Osíris do tipo III

(inv. 51.2090) [13], por suas formas, aparenta ser anterior às apresentadas

por Raven, podendo ser atribuída à XXV Dinastia. Assim, sua forma é vista

como uma transição das estátuas Policromadas de Osíris do tipo II para as

estátuas típicas de Ptah-Sokar-Osíris do tipo III. Além dessas ainda são

apresentadas mais três estátuas: um Osíris do tipo I C (inv. 51.2099) [07],

um Ptah-Sokar-Osíris do tipo IV B (inv. 51.1930), e a parte de trás de um

Ptah-Sokar-Osíris do tipo IV F (inv. 51.244) (Varga, 1995, pp. 6-18).

7.3.3 Schoske

No artigo “Problems with Ptah-Sokar-Osiris Figures”, Schoske (2001) irá

apresentar uma parte de trás de uma estátua de Ptah-Sokar-Osíris em cujo

interior foi encontrada uma figura feminina de linho e gesso (Figs. 87 e 88)

presente na coleção do Wellcome Museum of Antiquities at University

College, Swansea. Este é o único exemplar conhecido com tal figura em seu

interior, a qual Schoske associa a uma deusa do céu, que, assim como as

“múmias-de-grãos”, teria a função de ajudar no renascimento do morto.

(SCHOSKE, 2001, pp. 1984-1987)

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7.3.4 Budka

Em sua tipologia, Raven atribui às figuras do Tipo IV B

uma inscrição a qual teria apenas o início do hino a Ptah-

Sokar-Osíris. Esta seria uma versão inicial mais curta do

hino que teria sua origem na XXV Dinastia, enquanto que a

versão completa teria surgido apenas na XXX Dinastia.

(RAVEN, 1978-1979, pp. 269-270 e 276) Raven chegou a

esta conclusão analisando uma foto da estátua de Ptah-

Sokar-Osíris do Museu do Cairo JE 94473. Conforme Budka

(2003) indica, Raven teve acesso apenas a uma foto de frente

da figura e concluiu não haver nenhuma inscrição na parte

de trás da mesma. Tendo acesso ao verso da figura (Fig. 37)

e a partir das informações do contexto em que a estátua de

Ptah-Sokar-Osíris foi encontrada na Tumba VII de Asasif,

Budka irá demonstrar que não há uma versão inicial do hino

da XXV Dinastia. Conforme mostra o verso da estátua,

temos a continuação do hino na coluna de inscrição ali

existente sobre o pilar dorsal. A continuação também não

está completa; o hino é interrompido quando acaba o espaço,

algo observado constantemente em objetos egípcios.

Características da figura, como um largo colar concêntrico

apontam para uma data da XXX Dinastia até o Período Ptolomaico inicial

para a figura. Isso demonstra que a mesma teria origem no material

depositado posteriormente na tumba, o qual vai até o Período Ptolomaico.

Dessa forma, poderíamos concluir que não há uma versão inicial do hino e,

que as figuras do tipo IV B ocorrem a partir da XXX Dinastia, e não da XXV

Dinastia. (BUDKA, 2003, pp. 33-35)

A estátua de Ptah-Sokar-Osíris do Museu do Cairo JE 94511 [18],

encontrada na mesma tumba em Asasif, demonstra ser uma variante do tipo

III. Ela apresenta as mesmas características das estátuas desse tipo, tendo

como diferença apenas uma face vermelha ao invés de uma face verde e a

ausência de um pilar dorsal, que é comum nas estátuas desse tipo. Com a

ausência do pilar dorsal, Budka conclui ser ela uma antecessora do final da

Figura 37 – Verso estátua de Ptah-Sokar-Osíris JE 94473 (BUDKA, 2003, Tafel 5 Abb. 1)

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XXV Dinastia do Tipo III tradicional, comum na XXVI Dinastia. (BUDKA,

2003, pp. 35-36)

Outro fator que chama atenção nesta estátua é o fato de ela possuir

colunas para inscrição na frente e no verso, mas as mesmas não contêm

nenhuma inscrição. Isso demonstra que as estátuas já poderiam ser pré-

fabricadas e o texto ser acrescentando posteriormente, conforme o desejo de

seu proprietário. (BUDKA, 2003, p. 36)

Uma terceira estátua de Ptah-Sokar-Osíris da mesma tumba,

atualmente no Kunsthistorisches Museum de Viena (KhM A1947),

pertencente às classes mistas de Raven apresenta uma variante do Hino à

Ptah-Sokar-Osíris. No hino desta estátua de fundo amarelo com decoração

predominando em preto, encontramos o uso de algumas palavras e sinais

diferentes da versão tradicional. (BUDKA, 2003, pp. 37-38)

7.3.5 Ziegler

Em um artigo, Ziegler (2003) apresenta a estátua até então inédita de

Ptah-Sokar-Osíris N 4131 A [46], pertencente ao Louvre, a qual possui

características singulares e, portanto, se encaixaria nas Classes Mistas de

Raven. Esta estátua, pertencente a Ankhpakhered, filho de Nesmin, pode ser

descrita em linhas gerais como uma estátua de Ptah-Sokar-Osíris

policromada de fundo branco, com face e mãos folhadas á ouro, contendo a

versão completa do Hino de Ptah-Sokar-Osíris. Pelo seu estilo, ela

pertenceria à XXX Dinastia.

7.3.6 Lipinska

Em um artigo publicado em 2007, Lipinska chama a atenção para a

coroa de uma estátua de Ptah-Sokar-Osíris do Museu do Louvre que se

encontra sob empréstimo de longa duração no National Museum of Warsaw.

Esta é até agora a única estátua conhecida que possui uma coroa hemhem,

sendo esta constituída por três khekherus, cada qual com um disco solar no

topo, duas plumas de avestruz e cornos. Quanto aos demais detalhes, a

estátua se assemelha àquelas classificadas por Raven como sendo do tipo IV

B tendo uma face amarela, um colar wsx n bik simples, e tronco vermelho. [22]

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156

7.4 NOVA CLASSIFICAÇÃO

No breve histórico feito acima sobre o estudo das estátuas funerárias

de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, pudemos observar que a divisão, a qual

diferencia as mesmas, feita por Champollion, em 1827, foi mantida até os

dias atuais (ver p. 145). Esta divisão, também foi levada em conta na

presente dissertação, sendo consideradas como estátuas funerárias de

Osíris, aquelas que contêm em seu interior um papiro com a inscrição do

“Livro dos Mortos” e estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, aquelas que

contêm em seu interior pseudo “múmias-de-grãos”. Exemplares sólidos

também podem ocorrer em ambos os casos, sendo as mesmas classificadas

de acordo com a semelhança de sua aparência com os exemplares com

cavidade.

A tipologia elaborada por Raven no final da década de 1970 ainda é a

principal referência sobre o estudo das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-

Sokar-Osíris. Nos trabalhos posteriores, temos a publicação de peças

inéditas, mas também de algumas correções necessárias referentes à

tipologia de Raven. A partir desses novos dados, propomos elaborar aqui

uma classificação alternativa à de Raven que incorpore essas informações.

Abaixo segue a descrição dos tipos por nós propostas, e no volume II

encontra-se um catálogo de refêrencia com as fichas dos exemplares modelo

de cada tipo da nossa classificação. As imagens dos exemplares das fichas

encontram-se no volume III. No final do presente capítulo encontra-se uma

tabela (Tabela 2) com a correspondência das diferentes classificações.

7.4.1 Tipo 1. Osíris Policromado

As figuras desse tipo têm em comum uma pintura policromada. A face

e as mãos são verdes. Os braços estão cruzados, ou as mãos opostas, e as

mãos seguram o cajado e o açoite. A parte superior do tronco pode estar

despida (vermelha), enquanto a parte inferior é enfaixada (branca) ou pode

usar um rico vestuário consistindo de um colar wsx, uma borla (manxt) ou

contrapeso (mnat) na parte de trás do pescoço, uma cinta apertada, uma capa

curta com rosetas, ou um traje justo com motivo de escamas ou penas. A

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coroa é a Atf ou a HDt. Na maioria das vezes a base é amarela. Usualmente

essas estátuas contêm uma coluna vertical com inscrições na frente do

tronco e no topo da base. A maioria tem uma cavidade tubular com painel

traseiro solto, o qual continha em seu interior um papiro, geralmente um

exemplar do “Livro dos Mortos”. [02; 03; 04]

As figuras datam de um período que se inicia na XIX Dinastia, talvez já

no final da XVIII Dinastia, e vai até a XXI Dinastia, possivelmente até a XXII

Dinastia. Elas correspondem às figuras do subtipo II D de Raven.

Os demais subtipos de Raven, II A, II B, II C e II E, por possuírem

apenas um exemplar cada, foram aqui considerados como exceções no

interior do presente tipo, como já fora sugerido por Aston (1992).

Como exceções dentro do grupo temos também a estátua de Osíris de

Hunefer (BM EA 9861). Trata-se do exemplar mais antigo pertencente ao

final da XVIII ou XIX Dinastia, e tem como variante a face e as mãos

amarelas. [01] A outra exceção é a estátua de Osíris de Khonsoumés (N

2872), pertencente à coleção do Museu do Louvre. O tom de sua face e mãos

é preto. [05]

7.4.2 Tipo 2. Osíris de Verniz Preto

Esses exemplares têm como característica comum serem todos

cobertos por uma camada de verniz preto, podendo ser sólidos ou conter

uma cavidade no tronco ou na base. Algumas contêm detalhes em amarelo

ou folhados a ouro. As figuras desse grupo datam da XXI e XXII Dinastias.

As do subtipo 2.a provavelmente são mais antigas, lembrando na forma as

figura do tipo anterior (1.). Com o tempo as figuras desse tipo vão adquirindo

uma forma mais delgada, devido à ausência da cavidade tubular no tronco,

já lembrando mais as suas sucessoras, as figuras de Ptah-Sokar-Osíris.

Os seguintes subtipos podem ser encontrados:

2.a Figuras volumosas com braços cruzados sobre o peito, nas mãos

podendo segurar o cajado e o açoite. Usam a coroa Atf ou HDt, e às vezes a

barba divina. No tronco possuem uma cavidade tubular com um painel

dorsal solto, o qual provavelmente tinha em seu interior um papiro do “Livro

dos Mortos”. Corresponde ao tipo I C de Raven. [MN-5; 06]

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2.b Estátuas usando a coroa Atf ou HDt, com ou sem barba divina com

os braços cruzados sobre o peito e os punhos vazios. No verso possuem uma

cavidade retangular que se estende da altura onde os braços se cruzam até

os pés. [07; 08]

2.c Figuras delgadas sem mãos ou braços, usando o toucado divino, a

coroa de plumas de avestruz, com ou sem disco solar, e, às vezes, a barba

divina. A maioria dessas figuras é solida, mas podem ter uma cavidade

retangular na lateral da base fechada por um sarrafo deslizante.

Correspondem às figuras do subtipo I A de Raven. [09; 10]

2.d Figuras delgadas com braços cruzados sobre o peito e punhos

vazios, ou segurando o cajado e o açoite. No demais se assemelham ao

subtipo 2.c, podendo igualmente usar o toucado divino, a coroa com duas

plumas de avestruz, com ou sem disco solar, a barba divina. Podem ser

sólidas ou conter uma cavidade na lateral da base. [11] Correspondem ao

subtipo I B de Raven.

7.4.3 Tipo 3. Osíris com Face Verde

Os exemplares desse tipo correspondem ao tipo V criado por Aston

(1992). Elas têm em comum serem figuras de Osíris de face verde, usarem o

toucado divino amarrado por um fita sSd, a coroa de plumas de avestruz, um

colar concêntrico e uma faixa cruzada sobre o torso. Este tipo pode ser

datado do período entre 750 a.C.-675 a.C., compreendendo a segunda

metade do III Período Intermediário. [12]

7.4.4 Tipo 4. Ptah-Sokar-Osíris com Face Verde

Este tipo, que corresponde ao tipo III de Raven, é caracterizado por

exemplares com uma forma humana mumiforme, com coroa Swty, e sem

mãos e braços. O toucado divino é azul, a barba divina sobre um plinto é

preta, a face é verde com detalhes em preto e branco. Usa um colar

concêntrico simples ao redor dos ombros, interrompido pelas três abas do

toucado; este colar é liso (amarelo), ou possui faixas concêntricas, podendo a

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borda inferior ter uma fileira de elementos em forma de gota. O corpo da

figura é vermelho e pode ter um padrão reticulado imitando uma rede de

contas. A maioria dos exemplares possui um pilar dorsal que forma uma

continuação das abas do toucado nos ombros. Um plinto pode existir entre a

estátua e a base. Na base amarela ou branca, uma cavidade pode ter sido

escavada, cuja tampa ostenta uma estatueta de madeira de um falcão

mumificado, em geral com o corpo vermelho. Na parte da frente do tronco e

no pilar dorsal em geral possuem uma coluna vertical com inscrições em

hieróglifos. As figuras desse tipo datam da XXVI Dinastia. A figura do Pai do

Deus Kha-aa, filho de Khomsu-mês [13] lembrando por sua forma mais

volumosa, a forma dos caixões da XXV Dinastia, parece pertencer ao final

deste período. Deste modo a sua forma caracterizaria uma peça de transição

das estátuas anteriores de Osíris para as estátuas de Ptah-Sokar-Osíris. [13;

14; 15; 16; 17]

A figura JE 94511 [18] pode ser caracterizada como uma variante

desse tipo, datando do final da XXV Dinastia. Ela é igual aos demais

exemplares do tipo 4, exceto por possuir uma face vermelha.

7.4.5 Tipo 5. Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada e Tronco Vermelho

Estas figuras têm em comum corpos vermelhos, faces folhadas a ouro,

ou pintadas de branco ou amarelo para imitar à folhação. Elas usam a coroa

Swty, um toucado divino azul e às vezes a barba divina. O colar, quando

presente, é o wsx n bik, terminando com cabeças de falcões nos ombros.

Geralmente não possuem mãos e braços. Têm um pilar dorsal e um plinto

sob os pés. A cavidade mais comum é um receptáculo na parte da base,

fechado por uma tampa na forma de um falcão mumificado ou um

sarcófago. Outros tipo de cavidade encontram-se no tronco, sendo uma

aberta por um painel solto na parte superior do pilar dorsal. A outra é

manufaturada ao modo dos caixões, juntando-se à figura em duas partes.

No interior dessas cavidades são encontradas comumente pseudo “múmias-

de-grãos”.

Os presentes subtipos podem ser encontrados:

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5.a Estátuas simples com corpo vermelho e face folhada a ouro, colar

simples ou sem colar e uma coluna vertical com inscrição em hieróglifos na

frente. Correspondem ao tipo VI A de Raven. [19; 20]

5.b Estátuas simples com corpo vermelho e face amarela. O colar wsx

com ou sem falcão, a coluna frontal de hieróglifos e as inscrições na base

estão sobre um fundo amarelo. A inscrição pode conter o hino à Ptah-Sokar-

Osíris. Todas as cores foram aplicadas diretamente sobre a madeira.

Levando-se em conta a correção feita por Budka (2003), atribuímos este tipo

como pertencente à XXX Dinastia, e não à XXV Dinastia, como proposto

inicialmente por Raven. Corresponde ao subtipo VI B de Raven. [21]

A estátua da Cantora de Amun-Rê, Isetemkheb [22] assemelha-se aos

exemplares deste subgrupo, exceto por ter mãos com punhos fechados

vazios e pelo uso da coroa hemhem. Até o momento esta é única peça

conhecida usando a coroa hemhem.

5.c Estátuas com corpo vermelho, face folhada a ouro e colar wSx n bik

com várias fileiras de diferentes motivos. Apresenta uma rica decoração

intricada que pode conter itens como uma barba com pregas, um peitoral

listrado entre as abas do toucado, outro peitoral na forma de um relicário

pendurado numa corrente, escaravelhos alados, abutres, ou pássaros ba, e

redes de contas. Geralmente têm três colunas de inscrições na frente do

tronco, sobrepujadas por uma deusa Nut com asas estendidas. Essas

colunas, junto com a que existe no pilar dorsal, geralmente contêm o hino

completo a Ptah-Sokar-Osíris. Exemplares com apenas uma coluna de

inscrição e sem o hino também são conhecidas. Pode haver frisos de

símbolos protetores, ou padrões srx ao redor da base, entre outros. O topo da

base pode conter inscrições e uma cavidade fechada com uma tampa em

forma de falcão ou sarcófago. Estas figuras, correspondentes ao subtipo VI C

de Raven, pertencem ao final da Baixa Época e ao Período Ptolomaico. [23;

24; 25; 26; 27; 28; 29; 30]

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As estátuas de Ptah-Sokar-Osíris de Djedhathourimu, filho de

Djedmut [31] e BM EA 9753 [32], podem ser vistas como figuras de transição

entre os subtipos 5.b e 5.c, pois já apresentam uma decoração um pouco

mais elaborada que as estátuas do subtipo 5.b (rede de contas na primeira, e

colar wSx n bik policromado com contas de vários formatos na segunda), mas

ainda não tão intrincada como nas figuras do subtipo 5.c.

7.4.6 Tipo 6. Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada e Tronco Preto

As estátuas deste tipo são semelhantes as do tipo anterior (5.), sendo a

maior diferença a de terem um tronco com fundo preto ao invés de vermelho.

De resto possuem igualmente faces folhadas a ouro, ou pintadas de branco

ou amarelo para imitar a folhação. Elas usam a coroa Swty, um toucado

divino azul e, às vezes, a barba divina. O colar, quando presente, é o wsx n

bik, terminando com cabeças de falcões nos ombros. Geralmente não

possuem mãos e braços. Têm um pilar dorsal e um plinto sob os pés. A

cavidade mais comum é um receptáculo na parte da base, fechado por uma

tampa na forma de um falcão mumificado ou um sarcófago. Outros tipos de

cavidade encontram-se no tronco, sendo uma aberta por um painel solto na

parte superior do pilar dorsal, e a outra é manufaturada ao modo dos

caixões, juntando-se à figura em duas partes. No interior dessas cavidades

são encontradas comumente pseudo “múmias-de-grãos”.

Os seguintes subgrupos podem ser encontrados:

6.a Estátuas simples com o corpo preto e a face folhada a ouro ou

pintada de amarelo. Usa o toucado divino, a coroa de plumas de avestruz

dupla e a barba divina. Podem ter uma coluna com inscrição na frente. Estes

Ptah-Sokar-Osíris são datáveis do Período Ptolomaico. O único exemplar do

subtipo IV D de Raven se encaixa aqui. [33; 34]

6.b Estátuas com tronco preto e face folhada a ouro, branca ou

amarela. Os detalhes do colar wsx n bik e as inscrições, geralmente três

colunas na frente e uma no pilar dorsal, contendo o hino completo à Ptah-

Sokar-Osíris, estão pintados em finas linhas amarelas. Detalhes como

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joelhos, canelas e ombros estão bem delineados, e às vezes essas estátuas

apresentam as mãos sobre o peito. A base contém inscrições e uma cavidade

com uma tampa de sarcófago, com um falcão sentado em cima ou somente

um falcão. Podem ser atribuídas à XXX Dinastia. Correspondem ao subtipo

VI E de Raven. [35; 36; 37]

6.c Estátuas com corpo preto e face folhada a ouro ou amarela. A

decoração é intrincada como no tipo 5.c, podendo ter vários atributos, mas

as redes de contas não ocorrem aqui. São comuns os colares wsx n bik com

várias fileiras de contas de diversos formatos, peitorais em forma de relicário

e deusas e escaravelhos alados. Estas estátuas pertencem ao Período

Ptolomaico e correspondem às estátuas de Ptah-Sokar-Osíris do tipo IV F de

Raven. [38; 39]

A estátua de Ptah-Sokar-Osíris de Hornedjitef [40] aparenta ser uma

figura de transição entre os subtipos 6.b e 6.c, pois exceto por seu colar wsx n

bik policromado, com contas de vários formatos; o resto dos detalhes e as

inscrições são pintadas com finas linhas amarelas como as estátuas do

subtipo 6.b.

7.4.7 Tipo 7. Ptah-Sokar-Osíris com Tronco Branco

Este tipo de estátuas apresenta em comum um tronco com fundo

branco, usam o toucado divino, a coroa Swty e o colar wsx.

Dois subtipos podem ser encontrados:

7.a Estátuas mumifomes sem mãos e braços, semelhantes às dos tipos

5.c e 6.c, sendo a face branca, vermelha ou amarela. O tronco é branco, com

um padrão de rede. Usam o toucado divino, a coroa Swty, um colar wsx com

ou sem fecho, em forma de falcão. Podem ter inscrições em hieróglifo cursivo

na frente e no verso do tronco. Na base, possuem uma cavidade fechada por

uma tampa em formato de falcão ou sarcófago. Datam do final da Baixa

Época e do Período Ptolomaico. [41; 42; 43; 44]

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7.b Estátuas com a face e mãos folhadas a ouro. O tronco tem fundo

branco coberto por padrão de plumagem ou asas protetoras. O corpo é

completamente coberto por padrões e atributos com rica policromia. Usam o

toucado divino, a coroa Swty, e um colar-wSx com ou sem fecho em forma de

falcão. Pode ter inscrições em hieróglifo cursivo na frente e no verso do

tronco e na base. Elas pertencem ao Período Ptolomaico. [45; 46; 47]

7.4.8 Tipo 8. Ptah-Sokar-Osíris Folhados a Ouro

Os seguintes subtipos podem ser encontrados:

8.a Estátuas completamente folhadas a ouro, exceto por alguns

detalhes pintados em preto. Usam a coroa Swty, o toucado divino e o colar wsx

n bik. Pode conter inscrições no tronco. Pertencem ao Período Ptolomaico. [48]

8.b Estátuas completamente folhadas a ouro, com detalhes em pintura

policromada. Usa a coroa Swty, o toucado divino e o colar wSx n bik. Podem

conter inscrições no tronco. [49]

7.4.9 Tipo 9. Ptah-Sokar-Osíris Sem Pintura ou Monocromáticas

Temos algumas estátuas de Ptah-Sokar-Osíris, sem pintura ou

monocromáticas, com formas bem delineadas, das quais não há a

informação se elas foram encontradas de tal modo ou se a pintura foi

removida. Em comum elas usam o toucado divino e podem ter a barba

divina, um pilar dorsal e um plinto. Geralmente possuem uma cavidade no

topo da base com uma tampa simples, em cujo interior deveria se encontrar

uma pseudo “múmia-de-grãos”. [50; 51; 52; 53; 54]

7.4.10 Tipo 10. Shabti transformado em Ptah-Sokar-Osíris

Podemos encontrar um grupo de estátuas que eram originalmente

shabtis e, por algum motivo por nós desconhecido, foram transformadas em

estátuas funerárias de Osíris ou Ptah-Sokar-Osíris. Em geral elas foram

cobertas por um verniz preto como as estátuas do tipo 2., para ocultar a

inscrição original, e fixadas a uma base. [55]

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7.4.11 Tipos Mistos

Nesta categoria se encaixam estátuas de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris

que são tipos únicos ou com poucos exemplares conhecidos. Raven

denomina esta categoria de Classes Mistas e nela também encaixa os tipos

aqui classificados como 7. e 8. Para Raven estes tipos proveriam de oficinas

provinciais, sendo trabalhadas de acordo com as tradições locais (RAVEN,

1978-1979, p. 271).

Estas estátuas podem apresentar faces vermelhas ou rosas ao invés de

verdes, em combinação com um tronco vermelho ou branco. Parte das

estátuas desse tipo, a qual contém uma flor de lótus no topo da base (Fig.

36), parece ser típica do Médio Egito. Em outros exemplares domina a cor

azul.

Correspondência Tipologias

Bielesch Raven Aston

TIPO 1. TIPO II -

Exceção Tipo 1. Tipo II A -

Exceção Tipo 1. Tipo II B -

Exceção Tipo 1. Tipo C -

Tipo 1. Tipo D -

Exceção Tipo 1. Tipo E -

TIPO 2. TIPO I -

Tipo 2.a Tipo I C -

Tipo 2.b - -

Tipo 2.c Tipo I A -

Tipo 2.d Tipo I B -

TIPO 3. - TIPO V

TIPO 4. TIPO III -

TIPO 5. TIPO IV -

Tipo 5.a Tipo IV A -

Tipo 5.b Tipo IV B -

Tipo 5.c Tipo IV C -

TIPO 6. TIPO IV -

Tipo 6.a Tipo IV D -

Tipo 6.b Tipo IV E -

Tipo 6.c Tipo IV F -

TIPO 7. CLASSES MISTAS -

Tipo 7.a Classes Mistas -

Tipo 7.b Classes Mistas -

TIPO 8. CLASSES MISTAS -

Tipo 8.a Classes Mistas -

Tipo 8.b Classes Mistas -

TIPO 9. - -

TIPO 10. - -

Tabela 2 - Correspondência Tipologias

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CAPÍTULO 8. PREDECESSORES

As estátuas funerárias de Osíris, e, posteriormente as estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris surgem em um período relativamente tardio

da história do Egito antigo. Os primeiros exemplares conhecidos datam do

final do Novo Império, na XIX Dinastia. Esse fato nos leva a pensar que as

mesmas têm sua origem em outro artefato, com funções ou formas

semelhantes às delas. Raven (1978-1979), em seu estudo sobre as estátuas

de Ptah-Sokar-Osíris, sugere cinco possíveis predecessores para elas. Estes

são:

1. Um tipo raro de shabti de madeira fixado em uma

base, o qual ocorre apenas na XII (Fig. 38)

e XVIII Dinastias (Fig. 39). Esses shabtis

são pintados, com ou sem mãos, usam o

toucado tripartite e comumente a barba

divina. (RAVEN, 1978-1979, p. 255)

Provavelmente este tipo de shabti

mencionado por Raven refere-se a uma

categoria de shabtis conhecidos como

shabtis votivos. Strudwick (apud BRITISH

MUSEUM, on-line25), afirma que tais

artefatos são erroneamente chamados de

shabtis, por terem uma forma parecida a

estes. Ao contrário destes, não carregam

implementos agrícolas, sua inscrição

contém um proscinema ao invés do capítulo 6

do “Livro dos Mortos”, e não são colocados

junto ao morto na tumba. Tais figuras foram

achadas em locais perto da região de Umm el-Qaab em

Abidos, na área mênfita de Rosetau, a entrada para o Mundo Inferior, e no

25 Disponível em: <http://www.britishmuseum.org/research/search_the_collection_database/search_object_details.aspx?objectid=125546&partid=1&searchText=shabti+base&fromADBC=ad&toADBC=ad&numpages=10&images=on&orig=%2fresearch%2fsearch_the_collection_database.aspx&currentPage=1>. Acesso em: 28.06.2010.

Figura 38 – shabti com base encontrado em Mir, XII Dinastia – Metropolitan Museum of Art

Figura 39 – shabti votivo de Qenamun, XVIII Dinastia – British Museum (EA 56929)

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Wadi Qubbanet el-Qirud, na margem Ocidental de Tebas. Nesta última

localidade foram encontradas uma série de figuras pertencentes a faraós, em

especial Ramessés II e Merenptah. Estas imagens serviam para comemorar a

presença da pessoa diante do deus.

2. Figura de um shabti mumiforme colocada em um nicho na parede

norte da câmara funerária (RAVEN, 1978-1979, p. 255). Esta pertence a um

grupo de quatro amuletos protetores, conhecidos como tijolos mágicos, os

quais eram colocados nos quatro pontos cardeais da câmara funerária. O

amuleto à oeste era um pilar djed de faiança, à leste uma figura de barro de

um chacal deitado e ao sul um junco para conter uma tocha (Fig. 40). A base

dessas quatro figuras era um tijolo de barro, o qual muitas vezes continha

inscrito partes do capítulo 151 do “Livro dos Mortos”. Este capítulo descreve

o papel dos tijolos mágicos na proteção do morto contra os inimigos de

Osíris. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 168)

3. Este grupo de estátuas do início da XVIII Dinastia assemelha-se ao

tipo anterior de figura, exceto pelo fato de a sua base ser de madeira ao invés

de barro. Três estátuas para parentes femininas de Senmut foram

encontradas em um contexto perturbado perto de sua tumba. Elas estão

pintadas apenas no toucado tripartite, nos olhos e na inscrição, e não têm

Figura 40 - Amuletos protetores conhecidos como tijolos mágicos colocados nos quatro pontos cardeais da câmara funerária. Da esquerda para a direita: shabti, pilar djed, junco e chacal. Os presentes exemplares foram encontrados na tumba de Henutmehyt, XIX Dinastia – British Museum (EA 41544).

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barba divina e mãos. Uma delas contém a inscrição imAxt xr Wsir, “Venerado

diante de Osíris”, e as outras duas apenas o nome do morto. (RAVEN, 1978-

1979, pp. 255-256) Hayes comenta que essas figuras lembravam “as figuras

[estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris] associadas com os

sepultamentos de períodos posteriores” (apud RAVEN, 1978-1979, p. 256).

Um grupo parecido de estátuas é encontrado nas tumbas reais da

XVIII Dinastia. Estátuas de verniz preto mumiformes, um pouco maiores do

que as mencionadas acima pertenciam ao equipamento funerário de

Thutmés III (Fig. 41), Amenhotep II e Thutmés IV. Essas figuras usam o

toucado tripartite, muitas vezes também a barba divina, e não há menção a

mãos. Através de uma grande cavilha elas foram fixas em uma base

retangular de madeira. Algumas dessas figuras possuem uma coroa

consistindo de duas plumas de avestruz ou falcão, ou então elas apresentam

um furo para fixar esse adereço no topo do toucado. O equipamento

funerário de Tutankhamun contém várias estátuas desse tipo sem coroas,

com acabamento em folha de ouro ao invés do verniz preto (Fig. 42). Estas

estátuas contêm o nome de uma variedade de deuses criadores ou

protetores, enquanto que os exemplares de Thutmés III foram inscritos para

esse rei como “amado do deus N.N.” (RAVEN, 1978-1979, p. 256)

Portanto parece que primeiro este tipo de estátuas eram consideradas representações do morto, enquanto que posteriormente na XVIII Dinastia elas eram vistas como deuses protetores. Contudo especialmente o tipo com plumas mostra uma semelhança marcada com as figuras posteriores. Nesse período inicial, há várias estátuas por indivíduo sepultado.

(RAVEN, 1978-1979, p. 256)

4. Este grupo consiste de figuras de verniz preto fixadas sobre uma

base de madeira retangular, com coroa HDt, ocasionalmente com mãos

cruzadas e segurando o cajado e o açoite, encontradas em tumbas reais da

XVIII Dinastia. São conhecidos exemplares das tumbas de Thutmés III (Fig.

43) e Amenhotep II, e exemplares folhados a ouro da tumba de

Tutankhamun (Fig. 44) de uma coleção privada alemã, este último exemplar

provavelmente da tumba de Séthi I. (RAVEN, 1978-1979, pp. 256-257)

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Figura 41 – figura mumiforme de verniz preto pertencente à Thutmés III, XVIII Dinastia – KV 34

Figura 42 – figura mumiforme folhada a ouro pertencente a Tutankhamun, XVIII Dinastia – Museu do Cairo

Figura 44 - figura mumiforme folhada a ouro

com coroa HDt pertencente a Tutankhamun, XVIII

Dinastia – Museu do Cairo

Figura 43 - figura mumiforme de verniz preto com coroa HDt pertencente a Thutmés III, XVIII Dinastia –

KV 34

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5. Por último temos um único exemplar de uma figura com cavidade

anterior à XIX Dinastia encontrada na tumba de Amenhotep II (Fig. 45). Esta

estátua mostra o rei mumificado usando as coroas reais e segurando dois

rolos de papiro nas mãos. Um painel no verso dá acesso a uma cavidade que

continha o exemplar conhecido mais antigo do “Livro das Cavernas”.

(RAVEN, 1978-1979, p. 257)

Predecessores dos tipos 1, 2 e 3 por sua forma saH lembram os Osíris

do tipo 2.c e todos os tipos de Ptah-Sokar-Osíris (tipos 4. à 10. e alguns

exemplares do tipo Misto). Aqui poderíamos pensar em uma possível conexão

em especial entre os predecessores em forma de shabtis e os shabtis

transformados posteriormente em estátuas funerárias de Osíris de verniz

preto (tipo 10.). Se observarmos bem, os shabtis votivos eram depositados

em locais sagrados aos deuses Osíris e Sokar. Umm el-Qaab, local do

sepultamento dos reis das primeiras dinastias, é posteriormente visto como

o local de sepultamento de Osíris (ver 4). Rosetau, os domínios do deus

Sokar, fazem a conexão deste mundo com o Mundo Inferior (ver 3). Assim,

estes podem ter servido como inspiração para essas mudanças e para a

confecção das demais estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, só que

agora as peças que representam o morto como Osíris ou Ptah-Sokar-Osíris

eram colocados próximas da múmia para ajudar em seu renascimento.

Figura 45 – figura de Amenhotep II com uma cavidade nas costas com um papiro em seu interior, XVIII Dinastia – KV 35

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As estátuas cobertas por um verniz preto, pertencentes aos tipos 3, 4 e

5 de predecessores, é uma possível origem para as estátuas funerárias de

Osíris de verniz preto do tipo 2. Assim, teríamos as seguintes

correspondências: O tipo 3 assemelha-se ao subtipo 2.c e d e os tipos 4 e 5

lembram os subtipos 2.a e b. A diferença entre as predecessoras e as

posteriores estátuas funerárias de Osíris é o local onde forma encontradas e

a quantidade. As primeiras foram encontradas em tumbas reais com vários

exemplares por tumba, já as segundas foram encontradas em tumbas

particulares, sendo um exemplar por pessoa.

O quinto tipo de predecessor, por sua função como porta-papiro,

também são uma possível origem das estátuas funerárias de Osíris dos tipos

1. e 2.a e b.. Estas, assim como a estátua de Amenhotep II continham uma

cavidade em seu tronco para guardar um papiro. Mas, neste caso outro texto

funerário era guardado em seu interior: um exemplar do “Livro dos Mortos”.

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CAPÍTULO 9. CORES

Para os egípcios o significado das cores tinha uma grande importância.

Objetos, animais e deuses poderiam ser definidos por uma cor específica.

Assim o sacerdote afirma em seu ritual diário: “Eu não igualei a sua cor (de

um deus) com a de outro deus.” (BRUNNER-TRAUT, 1977, p. 118) Com este

propósito analisaremos neste capítulo o significado das cores presentes nas

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris e a sua associação com

esses deuses e o morto.

9.1 VERDE

A cor da pele verde encontrada nas estátuas dos tipos 1., 3. e 4., e

algumas do tipo Misto representa o papel de Osíris como o deus da

vegetação e fertilidade. O verde é a cor símbolo do crescimento e da vida ela

mesma, dessa forma sendo igualmente um símbolo potente de ressurreição.

Materiais com a cor verde também podem ser símbolos de paz e alegria

(BRUNNER-TRAUT, 1977, p. 125). Assim, o deus Osíris representado nessa

tonalidade não apenas propicia a fertilidade e o crescimento dos campos,

mas também assegura a prosperidade do morto na outra vida. Da mesma

forma como os caixões da XVI Dinastia, o rosto das estátuas funerárias de

Ptah-Sokar-Osíris (tipo 4.) dessa época eram pintados de verde para associar

o morto a Osíris. (WILKINSON, 1999, p. 108)

9.2 PRETO

Como o verde, o preto era um símbolo de fertilidade e

a cor da noite e da morte (um buraco negro era às vezes usado para significar “morte” e “destruição dos inimigos”), preto simbolizava o Mundo Inferior como poderia ser esperado, mas também – como uma inferência natural – pode significar o conceito de ressurreição da morte e até mesmo fertilidade e assim paradoxalmente a vida ela mesma.

(WILKINSON, 1999, p. 109)

Osíris como o Senhor do Mundo dos Mortos era dessa forma muitas vezes

representando com a pele negra, sob este aspecto podendo ser chamado “o

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Negro” (RAVEN, 1978-1979, p. 282). Como o Nilo, ele era aquele que trazia a

terra fértil durante as cheias para os solos do Egito. As estátuas funerárias

do tipo 2., as quais têm o seu corpo completamente coberto por um verniz

preto, e as estátuas do tipo 6., que possuem um tronco preto estão imbuídas

desse simbolismo. Da mesma forma, objetos totalmente negros encontrados

no contexto funerário a partir do Médio Império mostram a sua associação

com os deuses da morte e do pós-vida. (RAVEN, 1978-1979, p. 282;

WILKINSON, 1999, p. 109)

9.3 VERMELHO

A cor vermelha geralmente é associada a aspectos negativos ligados ao

deserto e ao deus Seth, por serem portadores de elementos hostis, da

infertilidade e da morte. Mas o vermelho também tem aspectos positivos, os

quais são elucidados na mortalha vermelha das estátuas funerárias de Ptah-

Sokar-Osíris dos tipos 4. e 5. O vermelho é a cor do triunfo solar. O deus-sol

tinge ao amanhecer e ao anoitecer o céu com o sangue vermelho dos

demônios da escuridão, os quais combate em sua jornada diária no Mundo

Inferior. (BRUNNER-TRAUT, 1977, p.124) Dessa forma também vem a

simbolizar vida e regeneração em associação com o sol que nasce triunfante

todas as manhãs na forma de um escaravelho. Devido a este caráter a partir

do Período Ramessida passa a ser usado para designar múmias e deuses

mumiformes. Da mesma forma, em algumas estátuas funerárias de Ptah-

Sokar-Osíris a mortalha vermelha pode ser usada em conjunto com uma

rede de contas, estando desta forma associada à tenda de mumificação de

Anúbis. (BRANCAGLION JUNIOR, 2009, informação verbal; RAVEN, 1978-

1979, p. 282; WILKINSON, 1999, p. 106) O vermelho também é uma cor

festiva, sendo usada na roupa dos principais participantes do festival de

Sokar (RAVEN, 1978-1979, p. 282). Este fato pode ser uma reminiscência

dos primórdios da história do Egito antigo, quando os trajes festivos eram

vermelhos e não brancos (BRUNNER-TRAUT, 1997, p. 124).

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9.4 DOURADO

A face e as mãos das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos

tipos 5., 6. e 7., quando presentes, e a estátua por inteiro do tipo 8., são

folhadas a ouro ou amarelas, ou brancas, em imitação ao ouro. Assim como

nesses exemplares, no Período Ptolomaico é comum encontrar múmias com

seu rosto e membros cobertos com folhas de ouro. Esta cor representa o

aspecto divino do morto, a sua condição como um ser glorificado, que se

juntou ao deus-sol em sua jornada. A cor do sol era vista como simbólica do

que era eterno e imperecível. Os ossos e a carne dos deuses eram ditos de

serem de ouro puro. (BRUNNER-TRAUT, 1997, p. 125; RIGGS, 2010, p. 2,;

WILKINSON, 1999, p. 108)

9.5 AMARELO

Além de ser uma imitação do ouro, o amarelo também pode

representar a areia nas bases das estátuas funerárias de Osíris pintadas

neste tom. Assim temos uma referência ao monte primordial sobre o qual o

deus estaria parado. (RAVEN, 1978-1979, pp. 182-283)

9.6 BRANCO

Além de representar a divindade do morto, como o ouro, o branco

também pode representar a mortalha e as bandagens da múmia e de deuses

mumificados. Assim estátuas funerárias de Osíris do tipo 1., com o corpo

todo branco ou parcialmente branco, e estátuas funerárias de Ptah-Sokar-

Osíris do tipo 7., e ainda algumas Mistas representam o deus Osíris ou o

morto divinizado envolto nas bandagens da mumificação. (RAVEN, 1978-

1979, p. 282) O branco como a cor da limpeza também vem a simbolizar a

pureza ritual e o sagrado (WILKINSON, 1999, p. 109).

9.7 AZUL

O azul escuro do toucado divino usado pelas estátuas funerárias de

Ptah-Sokar-Osíris e o corpo na mesma cor de algumas estátuas do tipo

Misto, são representações do lápis-lazúli. Dizia-se desta pedra preciosa ser a

pele e o cabelo dos deuses. Da mesma forma o azul simboliza o céu e as

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águas primordiais, sendo ambos símbolos de vida e renascimento. O rio Nilo

e suas colheitas, oferendas e fecundidade a ele associadas também podiam

ser representados pela cor azul. (WILKINSON, 1999, p. 107)

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CAPÍTULO 10. ICONOGRAFIA DA ESTÁTUA

10.1 COROAS E ADORNOS DE CABEÇA

As divindades egípcias costumam usar coroas e adornos de cabeça

distintivos, através dos quais normalmente é possível identificar um deus em

particular. Quando uma divindade adota atributos de outra, como sua

coroa, por exemplo, a mesma assume parte das características desse outro

deus. O deus Osíris e suas formas sincréticas possuem igualmente coroas

que os definem. Estas também podem ser observadas nas estátuas

funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris.

10.1.1 Coroa HDt (Coroa Branca) - esta coroa branca em forma cônica

representava o Alto Egito. No capítulo 80 do “Livro dos Mortos” ela é

comparada ao brilho da lua. Como um símbolo de soberania, era usada

tanto pelo faraó quanto por Osíris. Nas estátuas funerárias de Osíris ela

pode ser encontrada em alguns exemplares do tipo 1. [03) e dos subtipos 2.a

e b [08]. Nas peças do primeiro tipo ela pode ser encontrada em sua

tradicional cor branca, ou em amarelo. Já naquelas dos subtipos 2. ela é

coberta pelo mesmo verniz preto do resto da estátua.

10.1.2 Coroa Atf - esta coroa é formada pela coroa HDt acrescida de um par

de plumas de avestruz. A coroa HDt pode ter a variação de uma forma de feixe

vegetal. A partir do Novo Império ela pode ser acrescida de cornos, disco

solar e uraeus, sendo esta versão mais popular no Período Ramessida na

região de Tebas. Nos “Textos das Pirâmides”, ela é chamada de “seu poder”

ou “seu terror”. Provavelmente um atributo originalmente pertencente ao

deus Andjety, foi posteriormente adotada por Osíris, junto com outros

atributos desse deus. A coroa Atf pode tanto ser usada sozinha como junto ao

toucado divino. Nas estátuas funerárias de Osíris do tipo 1. e subtipos 2.a e

b. ela aparece de ambas as formas. Nas primeiras, a coroa HDt é branca ou

amarela, e nas plumas geralmente dominam tons de azul. Estátuas como a

de Hunefer [01] e de Sérimen [04] são acrescidas de um disco solar

vermelho. Nas estátuas dos subtipos 2., a coroa é coberta pelo mesmo verniz

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preto do resto da estátua. Como as plumas são encaixadas separadamente

por pino, estas muitas vezes se perderam ou estão quebradas, como é o caso

da estátua funerária de Osíris do tipo 2.a da coleção do Museu

Nacional/UFRJ [MN-05].

10.1.3 Coroa pA-sHmty (Coroa Dupla) – composta pela união da coroa do Alto

e Baixo Egito, representa a união do Egito sob o domínio do faraó. Era

conhecida como “As Duas Poderosas”. Aparece em um exemplar de uma

estátua funerária de Osíris [54].

10.1.4 Coroa Swty – esta coroa formada por um par de plumas de avestruz

provavelmente pertencia originalmente ao deus Andjety. A partir do Novo

Império ela pode ser complementada com cornos, uraeus e disco solar. Tinha

um papel especial na ascensão do Faraó ao Trono, complementando o papel

da coroa dupla na coroação. (GOEBS, 2001, p. 323) O deus Osíris usa-a

comumente em suas formas sincréticas. Era igualmente utilizada na forma

de um amuleto que ficava sobre a cabeça do morto, assim como em estátuas

mumiformes do morto utilizadas durante o ritual de embalsamamento e de

Abertura da Boca. Dessa forma representava a transmissão do poder divino

e a assimilação do morto a Ptah-Sokar-Osíris. (RAVEN, 1978-1979, p. 284)

Nas estátuas funerárias de Osíris dos subtipos 2.c e d ela aparece com

um disco solar, e, nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, ela aparece

complementada por cornos e disco solar, usada sempre em conjunto com o

toucado divino. As plumas apresentam uma variada policromia, podendo ser

lisas, com faixas transversais ou listradas. Em muitos casos duas opções

são combinadas, sendo uma usada na frente e outra atrás. Os cornos em

geral são pretos, existindo algumas exceções em que eles são verdes [27; 41;

43]. Em um exemplar [43], os cornos são pintados junto às demais partes da

coroa, ao contrário dos outros exemplares nos quais eles são esculpidos

abaixo das plumas. Devido ao fato de a coroa Swty ser fabricada como uma

peça aparte da estátua que era encaixada por um pino em um furo na

cabeça, esta foi perdida em um grande número de exemplares. Isto ocorreu

com todos os exemplares pertencentes ao Museu Nacional/UFRJ.

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10.1.5 Coroa hmhm – também denominada de Atf triplo, esta coroa

denominada de “A Rugidora” ocorre inicialmente no Período Amarniano. Ela

é comum nas representações da criança solar emergindo da flor de lótus ao

amanhecer, dessa forma podendo identificar o rei com o deus-sol ao

amanhecer. (GOEBS, 2001, p. 324). Aparece sendo usada por uma única

estátua funerária conhecida de Ptah-Sokar-Osíris, a qual é uma variante do

subtipo 5.b [22].

10.1.6 Toucado Divino ou Tripartite – é um pano usado sobre a cabeça

pelos deuses, e às vezes pelo morto, como forma de ressaltar o seu aspecto

divino. A denominação toucado tripartite vem do caimento de suas abas,

sendo uma maior nas costas e outras duas na frente sobre os ombros. Ele

aparece sendo usado em algumas estátuas funerárias de Osíris junto com a

coroa Atf [01] e, nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, sempre

aparece em conjunto com a coroa Swty. A cor do toucado divino nas estátuas

é azul escuro ou preto, podendo terminar com algumas faixas na parte

inferior de ambas ou em alguns casos ele é listrado [17; 45; 41; 46; 47; 49].

Em alguns exemplares, sobre o toucado divino pode estar amarrado um

filete vermelho [12; 15; 23; 38; 39], branco [30] ou dourado [46], conhecido

como sSd.

10.1.7 Nemés – semelhante ao toucado divino, este pano, geralmente

listrado, era usado sobre a cabeça com as abas caindo sobre os ombros e

amarrado na parte de trás. Era usado pelo faraó diante dos deuses ou no

Mundo dos Mortos. Ele aparece nos shabtis reais transformados em estátuas

funerárias de Osíris de Verniz Preto [11; 55].

10.2 BARBA DIVINA

Uma barba de formato cilíndrico com a ponta levemente curvada para

cima era um atributo de Osíris como Senhor do Mundo dos Mortos. Também

era usado pelo faraó quando morto, contrastando com a barba reta usada

em vida. Também pode ser encontrada sendo usada pelo morto comum em

suas representações, principalmente nos caixões.

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A barba divina pode ser encontrada sendo usada por todos os tipos de

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Esta podia ser

confeccionada como uma peça à parte e ser presa por um pino no queixo da

estátua (Fig. 46). Este fato fez com que em algumas estátuas ela foi perdida,

como nas estátuas do Museu Nacional/UFRJ de números [MN-01] e [MN-05]

do nosso catálogo. A barba divina também podia ser esculpida junto com a

peça, muitas vezes estando sobre um plinto (Fig. 47), como ocorre com as

estátuas do Museu Nacional/UFRJ de números [MN-02] e [MN-03] do nosso

catálogo.

10.3 CETROS

As estátuas funerárias de Osíris (tipo 1. e subtipos 2.a, 2.b e 2.c) e

algumas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do Período Ptolomaico que

possuem mãos, muitas vezes seguram em seus punhos cerrados o cajado

(HqAt) e o açoite (nxAxA). Estes objetos, originalmente instrumentos agrícolas,

foram adotados como símbolos do poder real.

O cajado tem origem em um bastão de pastor em forma de gancho

longo conhecido como awt, usado para defender e guiar o rebanho. Com o seu

uso ritual ele foi encurtado, atingindo a sua forma clássica, mas o bastão

longo ainda continuou em uso em certas cerimônias. (MARTIN, 1980, p. 821)

Como um bastão de comando, ele é um símbolo de soberania do rei.

Figura 46 – detalhe da estátua funerária de Osíris mostrando furo para encaixe da barba divina – Museu Nacional/UFRJ (inv. 200)

Figura 47 – detalhe da estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris mostrando barba divina sobre plinto – Museu Nacional/UFRJ (inv. 17)

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O flagelo, constituído de um bastão no qual estavam penduradas três

fileiras de contas redondas ou cilíndricas, terminando em pendentes

alongados em forma de gotas, tem uma origem mais controversa. Entre estas

ele poderia ter sido originalmente um instrumento para a colheita do ládano

ou um espanta-moscas. Simbolicamente é um sinal de renascimento.

Geralmente usado em conjunto com o cajado, representava igualmente a

autoridade do soberano. (FISCHER, 1977, p. 516; SHAW; NICHOLSON,

1995, p. 75)

Provavelmente estes eram originalmente emblemas

usados por Andjety, deus do nono nomo do Baixo Egito,

posteriormente adotados pelo deus Osíris e pelo soberano.

Osíris usa tal regalia real como primeiro governante

terrestre e de quem os demais reis são sucessores. Ao

mesmo tempo eles também simbolizam a posição de Osíris

como governante do Mundo dos Mortos.

Pelo seu contexto funerário, nas estátuas de Osíris e

Ptah-Sokar-Osíris, o deus é representado segurando em

suas mãos o cajado e o açoite como o Senhor do Mundo

dos Mortos. Geralmente o cajado é segurado na mão

esquerda e o açoite na mão direita. As mãos podem estar

cruzadas [MN-05; 03; 04; 05; 06; 11; 55] ou paralelas sobre

o peito [91; 02]. Na estátua de Ankhpakhéred [46] a mão

esquerda está acima da direita. Uma estátua do Museu do

Cairo ao invés de segurar o cajado e o açoite, segura dois

açoites em suas mãos paralelas (Fig. 48). Como vimos no

capítulo sobre Osíris, em especial nas estátuas de bronze,

podemos determinar a origem das estátuas de Osíris

conforme a posição das mãos. Como as peças segurando o

cajado e o açoite presentes no catálogo são de proveniência desconhecida ou

incerta, não pudemos comprovar se tal regra também se aplica para as

estátuas funerárias de Osíris.

Figura 48 – Osíris do tipo 1. segurando dois açoites, ao invés do cajado e do açoite - Museu do Cairo (JE 12-11-25-3).

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10.4 VESTIMENTA

Como nas imagens tradicionais do deus Osíris, as estátuas funerárias

de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris vestem uma justa

mortalha que envolve todo o seu corpo, deixando

apenas a cabeça e às vezes as mãos aparecendo.

Estas últimas estão aparentes nas estátuas dos tipos

e subtipos 1., 2.a, 2.b, 2.d, 3., 7.b e algumas estátuas

tardias do tipo 6. A estátua da cantora de Amun-Rê,

Isetemkheb [22], uma variante do subtipo 5.b,

também tem as mãos aparecendo.

A mortalha pode ser de uma única cor ou ser

coberta por padrões de plumas, escamas ou uma rede

de contas, e ter elementos decorativos como deuses e

amuletos, os quais auxiliam na sua proteção. Em

algumas estátuas do tipo 1., a parte de cima do corpo

pode ter uma cor diferente da parte inferior. Nestes

casos, como ocorre nas estátuas de Anhai [02], [03] e

de Khonsoumés [05], a parte de cima do corpo é

vermelha e geralmente coberta por pintas pretas,

dessa forma provavelmente representando a pele de

um animal usado como um manto. A parte inferior

das duas últimas, assim como o corpo todo (exceto

face e mãos) das estátuas de Hunefer [01] e Sérimen

[04] é branca, sendo uma representação das

bandagens da múmia. A estátua de Sérimen deixa

ainda mais clara essa associação, pois contém faixas

vermelhas horizontais sobre o seu corpo,

representando as amarras feitas em múmias (Fig. 49). As estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris do tipo 7. também apresentam um fundo branco. Este pode

estar igualmente associado às bandagens, bem como representar um estado

de pureza do morto.

Figura 49 - múmia com amarras semelhantes às que podem ser encontradas representadas nas estátuas funerárias de Osíris – XXI Dinastia, Tebas (BM EA 48791-2)

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A parte inferior da estátua de Anhai é coberta por um padrão de

plumagem, da mesma forma como o corpo das estátuas do subtipo 7.b [46;

47] tem longas asas envolvendo o seu corpo. Estas representam as asas das

deusas Nut, Ísis ou Néftis, as quais elas estendem sobre o corpo de Osíris

para protegê-lo.

A mortalha também pode ser vermelha como nas estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris dos tipos 4. e 5. Esta cor está associada a deuses funerários

mumificados como Sokar e Osíris. As estátuas funerárias de Osíris do tipo 2.

e de Ptah-Sokar-Osíris do tipo 6. apresentam uma mortalha preta ligada à

deuses do Mundo Inferior e a conceitos de fertilidade e renascimento. Nas

estátuas do tipo 8., ela é folhada a ouro, sendo esta a cor da pele dos mortos

glorificados que seguem o deus sol em sua jornada diária. Em alguns raros

casos de estátuas pertencentes aos tipos mistos, esta pode ser azul, cor

associada à pele dos deuses, ao céu e às águas primordiais.

Estátuas de Osíris dos tipos 1. [01; 02; 03; 04; 05], 3. [12], e uma

estátua de Ptah-Sokar-Osíris da coleção do Museu Nacional-UFRJ [MN-1]

apresentam uma faixa amarrada na cintura ou se projetando abaixo do colar

wsx. Esta faixa é símbolo do cargo sacerdotal exercido pelo morto em vida e

às vezes também aparece sendo usada por Osíris e outros deuses. Ela surge

no Período Ramessida. Geralmente de cor vermelha, esta faixa poderia

remontar às auriflamas das entradas dos templos, as quais marcam a

presença da divindade no local. (BRANCAGLION JUNIOR, 2009, informação

verbal26)

10.5 REDE DE CONTAS

Sobre a mortalha algumas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do

tipo 4. e subtipos 5.c e 7.a usam uma rede de contas. As contas das redes

eram arranjadas em forma de losangos. Elas podem ser feitas de diversos

materiais, sendo o mais comum a faiança. Este padrão de rede pode ser

encontrado trajado sobre vestidos justos no Antigo Império, como os que as

deusas Ísis e Néftis aparecem usando de vez em quando. Nos sepultamentos,

26 Arqueologia da Morte: Crenças e Práticas Funerárias do Egito Antigo. Curso do Mestrado em Arqueologia do Museu Nacional/UFRJ. Aula ministrada em: 22 set. 2009.

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as redes de contas encontram grande popularidade a partir da XXI Dinastia,

quando são colocadas sobre as bandagens de múmias, tanto de homens

como de mulheres. (BIANCHI, 1998, p. 249 nº. 163) Como parte do vestuário

funerário, também aparecem comumente vestidas por deuses mumiformes

como Osíris e Sokar.

Nos “Textos dos Caixões” e no “Livro dos Mortos”, as redes

destinavam-se a prender os espíritos do mal e os inimigos do morto. Estes

poderiam ser representados como peixes e pássaros. Assim, nas cenas de

caça nos pântanos encontradas em tumbas de particulares, temos o morto

simbolicamente eliminando as forças do caos.

Além disso, o morto era identificado, através dessa rede de

contas, com Ruty, que é simbolizado por uma rede cujos flutuadores estão no céu e os lastros sobre a terra. Nos textos funerários, é Ruty quem abre as portas do céu para o morto e quem guarda os caminhos que levam ao céu.

(BRANCAGLION JUNIOR, 1993, p. 63)

O deus Ruty representava um par de leões associado aos deuses

heliopolitanos Shu e Tefnut, ao Horizonte Leste e Oeste. No capítulo 17 do

“Livro dos Mortos”, é o leão duplo sobre cujas costas o Sol nasce todos os

dias, e ele também é associado a Rê, Atum e Osíris (WILKINSON, 2003, p.

180).

Nas estátuas de Ptah-Sokar-Osíris, a rede de contas pode aparecer

representada como simples traços cruzados em preto [13; 15; 17; 31], ou em

preto e vermelho [41], ou ainda com as contas desenhadas individualmente

[14; 25; 27; 42; 43; 44]. O primeiro jeito ocorre em exemplares mais antigos

da Baixa Época, enquanto o segundo modo de representação aparece em

exemplares do final da Baixa Época e do Período Ptolomaico. Geralmente,

quando presente, o falcão mumificado no topo da rede usa o mesmo padrão

de rede de contas que a estátua [14; 42; 44].

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183

10.6 COLARES

10.6.1 Colar wsx

Em quase todos os tipos de estátuas

funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris,

exceto os tipos 2. e 9., podemos observar o

uso de um colar concêntrico de várias

fileiras conhecido como xAt no Antigo

Império e como wsx ou wsxt a partir do

Médio Império. Este colar usado pelos

egípcios desde o Antigo Império era feito

de cilindros, os quais estão graduados em

tamanho e pendurados verticalmente

entre terminais semicirculares (Fig. 50).

Os terminais são furados ao longo de seu

lado plano pela mesma quantidade de

furos que há de fios, os quais surgem

unidos numa única saída no centro do

lado curvo, para serem amarrados e

prender o colar. Normalmente também

existe uma fileira exterior de pendentes

em forma de folha, às vezes enfileirados

entre duas fileiras horizontais de contas.

A partir da XII Dinastia encontramos

colares mais elaborados, nos quais os

terminais podem ter a forma de cabeça de

falcão (Fig. 51), e, na XVIII Dinastia de

flores de lótus (Fig. 52). Da mesma forma

eles podem apresentar contas de

diferentes formatos, em geral de amuletos

ou flores, dessa forma dando um efeito de

trabalho vazado. Para contrabalancear o

peso do colar e segurá-lo no lugar no

Figura 50 – Colar wsx com terminais semicirculares – XII Dinastia, Tumba 954 Lisht (MMA 22.1.247)

Figura 51 - Colar wsx n bik com trabalho vazado – XVIII Dinastia, Tebas (MMA 26.8.70/58.153)

Figura 52 - Colar wsx com terminais em forma de flor de lótus – XVIII Dinastia, Tell el-Amarna (JE 53023)

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peito, um contrapeso era juntado aos terminais por cordas de contas e

colocado entre as omoplatas. (ANDREWS, 1991, p. 119-120; FEUCHT, 1977,

p. 933)

Em sua forma ideal o colar wsx deveria ser composto por nove fileiras,

uma para cada membro da Eneida. Como podemos observar no capítulo 158

do “Livro dos Mortos”, o colar estava relacionado à Teologia Heliopolitana,

sendo denominado de “guirlanda de Atum”. (VASQUES, 2005, p. 60)

Fórmula para o colar largo de ouro colocado no pescoço do abençoado. Para ser dito por Osíris N.: Meu Pai é um Heliopolitano, minha Mãe é uma Heliopolitana. (Ó) Oculto, olhe por mim. Eu sou um deles o qual é libertado quando Geb olha por eles. Para ser dito sobre um colar largo de ouro, sobre o qual essa fórmula está inscrita, colocado no pescoço desse abençoado no dia de se unir com a terra.

LM 158

(ALLEN, 1974, p. 156)

A partir da XXVI Dinastia ele também passou a ser usado como um amuleto

que se destinava ao morto para ele poder livrar-se das bandagens que

impediam a sua mobilidade (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 115).

Nas estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, o colar wsx

apresenta variações de estilo conforme o tipo e a época. Nas estátuas de

Osíris Policromado do tipo 1., observamos um colar wsx pintado com várias

fileiras simples em duas ou mais cores, terminando na borda inferior com

uma fileira em forma de gotas e acabando na altura dos ombros. Este colar é

complementado por um contrapeso nas costas. O tipo de contrapeso

representado pode variar conforme o exemplar. Assim temos, por exemplo,

no Osíris pertencente à Anhai [02], um contrapeso simples; já o Osíris de

Hunefer [01] apresenta um contrapeso manxt. Este último estava associado à

deusa Háthor, a qual possuía o epíteto de “Grande Menat”, e a seu filho Ihy.

Em cenas na qual a deusa oferece o manxt para o rei, ele representa idéias de

vida, potência, fertilidade, nascimento e renovação. Já no contexto funerário

ele está conectado ao papel de Háthor como a deusa da Necrópole Ocidental

e com sua parte no renascimento do morto. (WILKINSON, 1992, p. 173)

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“Nele estaria embutido a fecundidade da deusa, capaz de restituir ao morto a

sua atividade sexual, a durabilidade e a juventude. Nele confundem-se as

noções de nascimento, renascimento e de passagem do morto a uma nova

forma de vida” (BRANCAGLION JUNIOR, 1993, p. 58) Da mesma forma, o

manxt também está associado a divindades mumiformes como Ptah, Sokar,

Osíris e Khonsu. Aqui temos, por exemplo, o falcão mumificado (Sokar) na

base de uma estátua de Ptah-Sokar-Osíris do Fitzwilliam Museum, o qual

usa um colar wsx com um contrapeso manxt [43].

Nas figuras do tipo 3., o colar wsx continua a ter o mesmo estilo

daquele encontrado nas estátuas do tipo 1., mas o contrapeso desaparece. O

colar irá terminar entre as abas do toucado divino. Já nas estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris com Face Verde do tipo 4., ele apresenta o mesmo estilo, mas o

seu comprimento aumenta até a altura do peito, seguindo o estilo adotado

nos caixões desse período.

As estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris da XXX Dinastia e do

Período Ptolomaico, tipos 5., 6., 7., 8., e alguns exemplares do tipo Misto

usam o colar wsx n bik, ou seja o colar wsx com terminais em forma de falcão.

Assim como os colares das figuras do tipo 4., estes são compridos, alguns

chegando até a metade do tronco [23]. Suas várias fileiras podem ser

pintadas como simples faixas de diferentes cores ou com contas em diversos

formatos (Apêndice E). O terminal em forma de falcão está localizado sobre

os ombros das estátuas. Normalmente o falcão porta sobre a cabeça o disco

solar, dessa forma provavelmente sendo uma representação do deus Rê-

Horakhty. Mas também encontramos exceções, onde ele aparece sem um

atributo na cabeça [31] ou usando a coroa Atf [36], neste caso podendo ser

uma referência ao deus Sokar.

10.6.2 Peitoral

Algumas das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris usam junto ao colar wsx n

bik um peitoral em forma de pilono pendurado numa longa corrente. O pilono

era a representação das duas montanhas do horizonte (akhet), entre as

quais o sol nascia. Era igualmente a ligação visível entre o céu e a terra da

qual o deus sol surge na forma de um falcão ou uma fênix. Uma montanha

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representava a deusa Ísis enquanto a outra representava a sua Irmã Néftis.

(ASSMANN, 2004, p. 125; SHAW; NICHOLSON, 1995, p. 275)

O peitoral pode estar sobre o colar wsx n bik [46; 40; 39] ou abaixo dele

[29; 30]. No interior do pilono podemos encontrar uma barca sagrada [25],

provavelmente alguma barca sagrada (barca Henu?) ligada ao deus Ptah-

Sokar-Osíris, ou um grupo de três [39] ou quatro deuses sentados [29].

Alguns desses deuses levam plumas de avestruzes na sua mão, estes

poderiam ser representações dos juízes do Mundo dos Mortos, sendo as

plumas símbolo da verdade e justiça. Aqui o seu número de três representa

o plural egípcio, assim representando três desses deuses a totalidade desses

julgadores do morto.

10.7 DIVINDADES

Entre os atributos das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos

subtipos 5.c, 6.c e 7.a podemos observar a presença de deuses protetores,

ligados tanto ao ciclo osiríaco, quanto ao ciclo solar. Como as estátuas

desses subtipos pertencem à XXX Dinastia e ao Período Ptolomaico podemos

supor que a inclusão desses deuses dentre os elementos decorativos dos

Ptah-Sokar-Osíris é uma inovação tardia, ocorrendo em seu período final de

existência. Essas divindades estão dispostas sobre as estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris em posição semelhante àquela em que as mesmas muitas vezes

estão localizadas no lado exterior das tampas dos caixões e sarcófagos da

Baixa Época e do Período Ptolomaico.

10.7.1 Nut

Nut é conhecida principalmente como sendo a deusa do céu e a

personificação da abóbada celeste. Como tal ela é representada como uma

mulher arqueada de perfil sobre o deus da terra Geb e sendo sustentada

pelo deus do ar Shu. Os seus membros tocam os quatro pontos cardeais e às

vezes seu corpo está coberto por estrelas representando o céu noturno (Fig.

53). Na cabeça pode usar um pote circular de água ou o símbolo para o

céu , estes faziam parte da escrita de seu nome . Em uma estátua de

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Ptah-Sokar-Osíris do Liverpool Museum [34] o sinal inclusive substitui a

imagem da deusa sobre o peito da figura.

Nas estátuas [23; 26; 28; 44], nas quais temos a representação de Nut,

ela aparece como uma mulher agachada com asas estendidas segurando

uma pluma de avestruz em cada mão e com um disco solar sobre a cabeça.

As asas estendidas, usadas na iconografia de diversas deusas a partir do

Novo Império são um sinal de proteção (WILKINSON, 2003, p. 161). Aqui Nut

protege o morto, ou seja, o seu filho Osíris, na sua transição para a outra

vida. Já nos “Textos das Pirâmides” ela aparece como uma deusa que ajuda

na ressurreição do morto. “[Ela] os fez levantar para você, você tendo sido

dado a tua mãe Nut em seu nome de „Sarcófago‟, ela o abraçou no seu nome

de „Caixão‟ e você foi trazido para ela em seu nome de „Tumba‟.” PT §616

(FAULKNER, 1910, p. 119) Esta passagem pode ser encontrada representada

pictoricamente posteriormente no III Período Intermediário, quando

encontramos imagens da deusa Nut pintadas na face externa das tampas,

ou no fundo dos sarcófagos e caixões. Assim quando estes são fechados, o

corpo da deusa se estende sobre o corpo do morto, como se ela o estivesse

abraçando em sinal de proteção. Da mesma forma o caixão poderia ser visto

como o útero de Nut, que desta vez não traz o nascimento de seu filho, mas

“guarda eternamente o corpo que lhe foi confiado, assegurando-lhe uma vida

sem limite de tempo” (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 113).

Figura 53 - A deusa Nut representando a abóbada celeste arqueada sobre o deus da terra Geb e sendo sustentada pelo deus do ar Shu. (HORNUNG, p. 1717)

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O disco solar na cabeça de Nut nas estátuas de Ptah-Sokar-Osíris

também remete a outro aspecto funerário da deusa, o de mãe do deus sol

Rê. Este, em seu ciclo diário, navegava sobre o corpo estendido de Nut, para

no final do dia, quando o disco solar se aproxima da boca da deusa, ser

engolido por ela. Assim, acompanhado das estrelas, o sol viajava

seguramente durante as horas da noite no interior do corpo da deusa. Ao

amanhecer o deus sol emergia do ventre da deusa para novamente realizar

sua jornada diurna. Alternativamente a deusa Nut também era retratada

como uma vaca e o deus sol navegando na parte inferior de seu corpo, como

está representado no “Livro da Vaca Celeste” (Fig. 54). Assim, “o corpo de

Nut, por onde o deus-sol navegava todas as noites, é o meio regenerador do

sol e do morto” (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 114).

As plumas que Nut segura na mão podem ao mesmo tempo ser um

símbolo de ar, o sopro da vida fornecido ao morto, como também podem ser

uma alusão ao julgamento do morto na Sala das Duas Maats, representando

a pluma da verdade e justiça. Pois Nut é uma deusa que protege e cuida do

morto.

Ela junta os seus membros, purifica-o, prepara a sua

oferenda, abre-lhe as portas do céu, torna-o um imAxw, lhe concede a justificação no Tribunal dos Mortos, ela lhe fornece água e ar como deusa árvore e previne que ele morra uma segunda vez. Desde o Novo Império é chamada de “Senhora do Ocidente” ou “Soberana do Mundo Inferior”.

(KURTH, 1982, p. 537)

Figura 54 – Livro da Vaca Celeste (HORNUNG, 1997, p. 180)

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10.7.2 Khepri

O escaravelho alado [MN-1; 24; 29; 40], segurando o disco solar

representado sobre o peito de algumas estátuas de Ptah-Sokar-Osíris abaixo

do colar wsx n bik, representa o deus-sol Khepri. Este é a manifestação do

deus sol Rê como o sol nascente, quando ele emerge do ventre da deusa Nut

empurrando o disco solar (ver acima). Em um trecho de um hino ao deus sol

na estela dos irmãos Suti e Hor (BM EA 826) temos uma alusão a tal

fenômeno:

Khepri de nascimento distinto, Que eleva sua beleza no corpo de Nut, Que ilumina as Duas Terras com seu disco.

(LICHTHEIM, 1976, Vol. II, p. 88)

A escolha deste animal para representar o sol nascente ocorreu devido

à observação dos egípcios de que o escaravelho (Scarabaeus sacer) fazia uma

bola de excrementos e a arrastava pelo deserto, com o intuito de enterrá-la e,

após 28 dias, um novo escaravelho nascia. Este fato levou os egípcios a crer

que os escaravelhos se auto-regeneravam e renasciam. O seu nome deriva do

verbo (xpr), “se desenvolver” ou “tornar-se”.

Assim, (¢pri) Khepri vem a significar “aquele

que se auto-criou”, aludindo a tal ato.

Em algumas vinhetas de papiros de funerários,

como por exemplo, no “Livro dos Mortos” de Anhai

(BM EA 10472,7) (Fig. 55), podemos observar “o deus

Khepri sobre a sua barca, a qual é elevada pelo deus

Nun como a personificação do caos primordial

aquoso em direção aos céus como representação do

evento da criação” (WILKINSON, 2003, p. 230). No

hino à Ptah-Sokar-Osíris presentes nas estátuas da

XXX Dinastia e Período Ptolomaico temos a menção

ao deus que emerge das águas primordiais.

Figura 55 - Khepri sobre a sua barca, a qual é elevada pelo deus Nun – ―Livro dos Mortos‖ de Anhai (BM EA 10472,7)

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No contexto funerário o deus ainda poderia ajudar na transformação

do morto em um akh, espírito glorificado. E no capítulo 83 do “Livro dos

Mortos” ele era invocado para superar o medo da putrefação. (CÉSAR, 2009, p.

18)

Assumindo a forma de uma fênix. Para ser dito por N.: Eu me elevei como primordial (se eleva); Eu me tornei Khepri.

Eu cresci como as plantas (crescem); (Eu) me cobri como uma tartaruga. Eu sou o fruto de todo Deus; Eu essa (sétima) dessas (sete) cobras que vieram à existência no Ocidente, Hórus o qual (controla) o seu corpo, este Deus (contra) Seth. (Ó) Osíris, Eu sou Thot neste processo entre o superintendente de Letopolis e as almas de Heliópolis, este (deus) entre os deuses. Eu vim durante o dia, aparecendo nos passos dos deuses. Eu sou Khonsu, o qual corta a garganta dos Senhores.

LM 83

(ALLEN, 1974, pp. 71-72)

10.7.3 Filhos de Hórus

Assim como em alguns caixões do final da Baixa Época e do Período

Ptolomaico, nós temos algumas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris,

subtipos 5.c [26], e 6.c [37], nas quais os Filhos de Hórus aparecem em

registros horizontais nas laterais da coluna de inscrição no centro do tronco.

Este grupo de quatro deuses formado por Imsety, Duamutef, Hapy e

Qebesenuef está associado ao contexto funerário desde o Antigo Império. Ali,

nos “Textos das Pirâmides”, consta que são os filhos e também as almas de

Hórus, e como “amigos do rei”, ajudam este a ascender ao céu. (WILKINSON,

2001, p. 88) Já no Médio Império, mas de forma mais clara, eles passam a

ser associados à proteção dos órgãos internos da múmia, ao mesmo tempo

em que cada um possuí uma divindade protetora. A partir da XVIII Dinastia,

as tampas dos vasos canopos, os quais guardavam estes órgãos, passam a

ter a forma da cabeça desses deuses. Quando os vasos canopos caem em

desuso e os órgãos são novamente colocados no interior da cavidade

torácica, após terem sido mumificados, um amuleto na forma desses deuses

é colocado junto a eles. (HART, 1986, p. 149-150; WILKINSON, 2001, p. 88)

Também no Novo Império eles passam a fazer parte de um grupo de

sete deuses chamados “Os Sete Abençoados”, os quais têm a função de velar

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pelo caixão de Osíris no céu do norte (SHAW; NICHOLSON, 1995, p. 275).

Em tal função eles também podem ser observados durante os rituais do

Festival de Khoiak, em especial na “Vigília das Horas” (Stundenwachen),

quando o corpo de Osíris era protegido durante as vinte e quatro horas do

dia e da noite, para que nenhum mal lhe acontecesse enquanto passava

pelos rituais de mumificação (ver Festival de Khoiak). Nas estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris e nos caixões e sarcófagos, eles também exercem a função de

proteção do morto, simbolicamente Osíris. Assim, comumente temos, do lado

esquerdo, Hapy e Qebesenuef e, do lado direito, Imsety e Duamutef

(WILKINSON, 2001, p. 88).

10.7.4 Ísis

Irmã e esposa de Osíris, Ísis aparece em uma estátua de Ptah-Sokar-

Osíris do Museo Gregoriano Egizio [38] na forma de uma deusa alada,

segurando uma pluma de avestruz em cada mão, portando o disco solar e

com o hieróglifo do trono sobre a cabeça. Exceto pelo hieróglifo do trono,

que é o símbolo e forma o nome de Ísis ( ) essa figura é semelhante

àquelas da deusa Nut encontradas sobre outras estátuas de Ptah-Sokar-

Osíris (ver Nut). Talvez, por algum motivo de devoção pessoal, o proprietário

da estátua optou pela representação dessa deusa, pois na inscrição da

estátua o nome da deusa aparece igualmente junto ao epíteto “Grande Mãe”,

aludindo a seu papel como mãe do deus-falcão Hórus. Da mesma forma que

a deusa Nut, Ísis também tem um papel de proteção de Osíris e dos mortos.

Ela é conhecida como aquela que criou a primeira múmia do corpo

desmembrado de Osíris, e com suas asas sopra vida nova em seu corpo.

Neste ato, e na concepção mágica de Hórus, ela aparece na forma de um

milhafre. Na forma desse falconídeo, ou em sua forma antropomórfica, ela

aparece muitas vezes junto com a sua irmã Néftis, ambas como carpideiras

lamentando a morte de seu irmão e marido. Elas igualmente aparecem

constantemente ao lado de Osíris para protegê-lo. Assim, podemos observar

ambas posicionadas atrás de Osíris na cena do Julgamento da Alma (LM

125) ou Ísis posicionada aos pés (como deusa do sul) e Néftis na cabeça

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(como deusa do norte) no leito funerário desse deus (Fig. 56). Em caixões do

Médio Império em diante elas podem aparecer pintadas nas extremidades

inferior e superior dos mesmos, ou então como estátuas posicionadas ali

para proteger o morto identificado com Osíris (TAYLOR, 1989, p. 9). Assim,

na estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris mencionada no início desse item,

ao mesmo tempo em que Ísis protege o morto, suas asas estendidas também

sopram a vida para o morto poder renascer.

10.7.5 Néftis

Como já pode ser observado no tópico acima, Néftis é irmã de Ísis e

Osíris, e é casada com seu outro irmão Seth. Em um período tardio da

história do Egito também existe o relato de que ela teria tido um caso

amoroso com Osíris do qual nasceu o deus chacal Anúbis. Essa deusa

geralmente aparece ao lado de sua irmã Ísis. Ambas atuam no auxílio,

proteção e amparo de Osíris. Nessas funções, ambas aparecem retratadas

sobre o tronco de uma estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris do Museu

Nacional de Arqueologia de Lisboa [24]. Ambas as deusas estão ajoelhadas

com os braços estendidos em sinal de proteção à Osíris, o qual está

posicionado em pé entre as duas. Dessa forma atuam igualmente na

proteção e no renascimento do morto.

Figura 11 – Ísis (direita) e Néftis (esquerda) na forma de um milhafre protegendo o corpo

mumificado de Osíris – Tumba Rainha Nefertari (QV66), XIX Dinastia. (WILKINSON, 2001, p. 159)

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CAPÍTULO 11. A BASE

Todas as estátuas funerárias de Osíris e Ptah-

Sokar-Osíris estavam originalmente fixadas sobre

uma base retangular. As estátuas eram encaixadas

na extremidade posterior da base através de um

pino (Fig. 57). Como elas eram removíveis, em

alguns exemplares para se ter acesso ao seu

conteúdo, as bases de alguns exemplares foram

perdidas. No caso específico das estátuas funerárias

de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris presentes na coleção

do Museu Nacional/UFRJ, todas as bases foram

perdidas.

Sendo provavelmente de início apenas uma peça funcional, com o

tempo a base foi adquirindo uma decoração mais intrincada, passando a

incorporar o simbolismo funerário da estátua (Apêndices G e H). Assim, nas

estátuas funerárias de Osíris (tipos 1., 2., 3. e 10.) apresentando a base lisa,

sendo pintada em apenas uma tonalidade, ou um simples contorno de outra

cor ao redor de cada uma de suas faces. As bases das primeiras estátuas de

Ptah-Sokar-Osíris (tipo 4.) continuam a manter os mesmos padrões, mas

depois um novo padrão de listras aparece ao seu redor. Também aparecem

os primeiros exemplares com uma cavidade fechada por uma tampa em

forma de falcão. Nos exemplares mais tardios de Ptah-Sokar-Osíris (tipos 5.,

6., 7. e 8.) ainda podemos encontrar alguns exemplares com uma base lisa

com contorno, mas em geral agora temos uma decoração mais complexa,

com diferentes frisos decorativos. A tampa da cavidade, além da forma de

falcão, pode ter a forma de um sarcófago, ou um sarcófago com um falcão

mumificado em cima. Alguns exemplares dos tipos Mistos, provavelmente

originários do Médio Egito, têm no topo da base uma flor de lótus.

Abaixo destacamos os principais elementos encontrados na base e o

seu possível simbolismo, quando presente:

Figura 5 – pino na parte inferior de estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris para encaixe na base. Medidas pino: 1,60 cm alt. x 2,10 cm larg. x 2,10 cm prof. - Museu Nacional-UFRJ (inv. 181)

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11.1 TOPO DA BASE

11.1.1 Lago

No topo da base [19 e 29] e ao redor do plinto [23 e 24] de algumas

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris encontramos o motivo de

retângulos encaixados um no outro (em geral um conjunto de três). Este

motivo provavelmente representa um lago. Ele pode ser uma alusão as águas

primordiais das quais o deus criador surgiu, dando em seguida origem a

todo o universo. Portanto, pela localização do lago no conjunto da estátua

teríamos uma representação do deus criador (aqui Ptah-Sokar-Osíris)

emergindo das águas primordiais. No hino à Ptah-Sokar-Osíris encontrado

em estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris da XXX Dinastia e Período

Ptolomaico, temos a menção de que “O grande deus retornou, saindo das

águas primordiais”.

Outra alusão possível seria aos cursos de água do Mundo Inferior, dos

quais muitos, além de servirem para matar a sede do morto, também eram

meios de purificação e regeneração. Como a maioria dos núcleos dos

retângulos nas estátuas está pintado de vermelho, estes poderiam ser uma

alusão ao Lago de Fogo. Mencionado na literatura funerária desde os “Textos

dos Caixões”, as águas de fogo eram tidas como um refresco para Osíris e os

mortos glorificados, mas uma tortura para os pecadores (HORNUNG, 1991,

pp. 56 e 128), como pode ser observado no texto no final da sexta hora no

“Livro dos Portões”:

Eles se encontram nos arredores desse Buraco de Fogo27, uma serpente-uraeus viva está dentro desse Buraco de Fogo.

A água do Buraco de Fogo é fogo, Os deuses da terra e os bau da terra não podem se aproximar desse Buraco de Fogo,

devido à chama dessa serpente-uraeus. (Mas) esse Grande Deus, o qual governa o Dat (Osíris), respira

através da água inacessível desse Buraco de Fogo. Rê fala para eles: Ei, vocês Deuses, que guardam o Buraco de Fogo inacessível, os quais proporcionam a água para aquele que governa o Mundo dos Mortos (Osíris)- A água do Buraco de fogo pertence à Osíris,

27 Nessa passagem, o Lago de Fogo é chamado de Buraco de Fogo.

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o vosso refresco para aquele, que governa o Dat. O fogo de vosso bafo de brasa, vossa flama consumidora rebate os bau, quando eles se aproximam para tocar Osíris. O poder do Buraco de Fogo não sofre de insuficiência, não existe outro igual, sobre cujas águas os Deuses, que o vigiam, não tem poder!

(HORNUNG, 2002, pp. 249-250)

11.1.2 Falcão

A partir das estátuas funerárias de Ptah-

Sokar-Osíris do tipo 4., podemos encontrar um

falcão mumificado na tampa da cavidade, no topo da

base. Este pode ser representado de forma simples

[21 e 31], ou apresentando uma iconografia de

acordo com a estátua [14; 42; 43 e 44]. Assim, ele

tem as cores predominantes iguais às da estátua, e

usa um colar wsx, com ou sem contrapeso, e uma

rede de contas. Às vezes ele ainda pode usar a coroa

Swty, como ocorre em um exemplar do subtipo 7.a do

Manchester Museum [44], ou o disco solar, como

num exemplar do Museo Arqueológico Nacional de

Madri (inv. 15241) do tipo 6.b (Fig. 58).

Este falcão certamente representa o deus Sokar. Na forma de um

falcão mumificado, Sokar aparece igualmente em outros objetos funerários,

como, por exemplo, sobre a caixa para shabtis, ou nos quatro cantos de

caixões. Aqui ele estaria presente na sua função como o deus responsável

pela transfiguração e renascimento de Osíris e do morto.

11.1.3 Sarcófago

Como fecho para a cavidade no topo da base, em algumas estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos tipos 6. [35; 37 e 39] e 7. [41 e 46]

temos a miniatura de uma sarcófago ou caixão na forma da capela Per-nu.

Esta capela, reconhecida por sua abóbada arqueada e postes altos nas

laterais, era originalmente a capela Pré-Dinástica da deusa cobra Wadjet

localizada em Buto. Após a unificação do Egito, ela foi adotada como símbolo

do Baixo Egito, em contraposição à capela Per-wer, a qual representava o

Figura 6 – tampa da cavidade no topo da base em forma de falcão usando o disco solar e um colar wsx com contrapeso – Museo Arqueológico Nacional de Madri (inv. 15241)

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Alto Egito. Sua forma foi utilizada em uma série de construções desde o

Antigo Império.

Tradicionalmente o caixão de Osíris possuía a forma da capela Per-nu.

Sua forma pode ser encontrada em caixões e sarcófagos, sendo popular

principalmente nos caixões exteriores da Baixa Época, onde era adotado na

intenção do morto de se associar com Osíris no pós-vida. (ARNOLD, 1982, p.

932; WILKINSON, 1992, p. 143) Neste contexto sua tampa arredondada vem

a representar o céu, a deusa Nut estendida sobre a caixa simbolizando a

terra, o deus Geb e os quatro postes altos como os quatro cantos do mundo,

nos quais os membros de Nut estão encostados. Ao mesmo

tempo ele transmite um caráter divino ao morto, na medida

em que transmite a idéia do morto como um deus no

interior da capela Per-nu. (BRANCAGLION JUNIOR, 2009,

informação verbal28)

Assim, nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-

Osíris, o sarcófago poderia tanto representar aquele

pertencente à Osíris ou ao morto divinizado. A pseudo

“múmia de grãos” no interior da cavidade abaixo seria o

corpo deste. Os deuses e sinais pintados nas laterais de

alguns desses sarcófagos podem ser vistos como símbolos

protetores (Fig. 59).

Em algumas estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris dos tipos 5. [25] e 6. [36 e

40], encontramos um falcão mumificado

sobre o sarcófago. Este, como nas tampas

das cavidades em que aparece sozinho,

provavelmente representa igualmente o

deus Sokar. Neste contexto, em que

aparece em conjunto com o sarcófago,

poderíamos pensar neste deus como

repousando sobre a sua capela shetayet. Como vimos no capítulo sobre

28 Arqueologia da Morte: Crenças e Práticas Funerárias do Egito Antigo. Curso do Mestrado em Arqueologia do Museu Nacional/UFRJ. Aula ministrada em: 22 set. 2009.

Figura 7 – Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris de Horresnet com tampa da cavidade no topo da base em forma de sarcófago com o sinal djed (estabilidade) ao redor – Musée de Picardie

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Sokar, tardiamente esta pode representar o Mundo Inferior ou, uma tumba

em cujo interior está localizado o corpo de Osíris, o qual é ao mesmo tempo a

ba do deus-sol. Ao mesmo tempo, Sokar é o deus responsável pela

ressurreição de Osíris. Portanto temos aqui, no conjunto, Sokar protegendo

Osíris ou o morto no interior de sua capela/sarcófago, e ao mesmo tempo,

ajudando no processo de ressurreição deste, o qual é o propósito principal

do conjunto da estátua.

11.1.4 Flor de Lótus

Um grupo de estátuas pertencente aos tipos Mistos, de origem

provável no Médio Egito tem uma flor de lótus sobre base (Fig. 36). Esta

provavelmente está associada à representação da criação do mundo,

conforme é aludido no hino á Ptah-Sokar-Osíris presente em estátuas

tardias. De acordo com o mito Heliopolitano, o jovem deus-sol teria surgido

de um lótus flutuando nas águas do Nun, o oceano primordial. O conceito do

jovem deus-sol aparecendo como uma criança sobre um lótus é descrito no

capítulo 15 do “Livro dos Mortos”, e era frequentemente representado na arte

egípcia como o deus Nefertum, “o Senhor dos Perfumes”, que representava o

lótus fragrante, sendo assimilado a este imaginário. A flor de lótus também

é um símbolo de renascimento devido ao fato de a ninféia fechar à noite e

submergir na água, e ao amanhecer emergir e se abrir novamente. Neste

contexto de renascimento, a flor de lótus também está proximamente

associada com o imaginário do culto funerário. Os quatro filhos de Hórus

podem ser mostrados sobre um lótus que se eleva de um lago perante o

trono de Osíris, e o capítulo 81 do “Livro dos Mortos” contêm os encantos

para “se transformar em um lótus”. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 164;

WILKINSON, 1992, p. 121)

11.2 REDOR DA BASE

O redor da base pode tanto ser simples, com um simples contorno,

conter inscrições em hieróglifos cursivos (ver 14) ou ter um friso decorativo,

como pode ser encontrado em outras categorias de objetos ou em paredes de

templos e tumbas.

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11.2.1. Listras

A partir das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do tipo 4.,

pertencentes à XXV e XXVI Dinastia, encontramos um padrão de listras ao

redor da base. Este pode ser uma variação de duas cores, como é caso do

exemplar [17] do catálogo pertencente ao Museum of Fine Arts de Boston, no

qual temos duas listras amarelas, com uma preta no meio. Ou ele pode

apresentar três cores, como no exemplar com o número de inventário KhM

988, pertencente ao Kunsthistorisches Museum de Viena, no qual temos

uma faixa vermelha em cada extremidade, seguida por outras brancas e, ao

meio, uma faixa azul (Fig. 60).

Figura 60 – Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris com base com listras ao redor. (KhM

988)

Figura 61 – Estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris com base com quadrados ao redor. (NMI 1920:301)

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11.2.2 Quadrados

Outro padrão simples que pode ser encontrado em estátuas de Ptah-

Sokar-Osíris são quadrados lembrando um tabuleiro de xadrez. Este aparece

nas estátuas do tipo 5.c, datáveis do final da Baixa Época e do Período

Ptolomaico. Numa estátua do National Museum of Ireland (inv. 1920:301),

podemos observar tal friso de quadrados em preto, verde, vermelho e branco.

Os quadrados nas diferentes cores formam linhas diagonais (Fig. 61).

11.2.3 Símbolos Hieroglíficos Decorativos

O friso com símbolos hieroglíficos decorativos é composto pelo arranjo

do sinal hieroglífico (anx) ankh entre dois sinais do cetro (wAs) was

posicionados sobre o sinal da cesta (nb) neb. A combinação desses sinais

vem a significar “toda vida e poder”. Geralmente esses sinais ainda são

emoldurados por uma métopa egípcia na parte superior e inferior [19; 28;

30; 40 e 46]. Esta consiste de uma borda formada por pequenos retângulos

coloridos.

O ankh e o cetro was podem ser encontrados frequentemente sendo

segurados por divindades. O ankh, como um símbolo doador de vida, de ar e

água pode ser visto em imagens nas quais um deus oferece-o para o faraó,

vindo a simbolizar o sopro da vida. Em outras cenas podemos observar

correntes de ankhs sendo vertidas sobre o monarca, sendo lhe assim

oferecido o poder regenerativo da água. Posteriormente este simbolismo

também passa a ser adotado por pessoas comuns, onde podemos ver esses

rituais sendo executados sobre o morto. (WILKINSON, 1992, p. 177)

O cetro was como um sinal de “domínio” e “poder” é justamente

carregado pelas divindades como um símbolo de seu poder. Assim ele

também poderia ser visto nas mãos do faraó e, em períodos posteriores,

sendo carregado pelo morto. No contexto funerário servia para assegurar a

prosperidade contínua do morto. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 304;

WILKINSON, 1992, p. 181)

Em uma estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris do tipo 7.a

pertencente ao Fitzwilliam Museum [43], temos nas laterais a composição de

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sinais hieroglíficos descrita acima, mas na parte da frente temos a

composição do sinal (nfr) nefer no meio de dois olhos (wDAt) wedjat, cada

um sobre um sinal (nb) neb. O nefer simboliza conceitos como bondade,

beleza, felicidade, boa sorte e juventude. O olho wedjat é um símbolo de

proteção usado com bastante frequência pelos egípcios em diferentes

contextos. O olho esquerdo, o “Olho de Hórus” é visto como o símbolo da lua,

e o olho direito, o “Olho de Rê” é o símbolo do sol. Seu nome vem a significar

“o todo ou o restaurado”, em referência ao mito no qual o olho de Hórus é

ferido por Seth e depois curado por Thot, sendo este uma metáfora para as

diferentes fases da lua. O seu olho curado foi oferecido por Hórus a seu pai

Osíris, tornando-se o mesmo também um símbolo de oferendas.

(WILKINSON, 1992, p. 43)

11.2.4 Serekh

O segundo tipo de friso decorativo encontrado é aquele composto pelo

padrão serekh ou “Fachada de Palácio”. Este aparece ao redor da base de

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos subtipos 5.c [29], 6.c [38] e 7.a

[44]. A “Fachada de Palácio”, consistindo de armações retangulares, é a

representação da fachada e dos muros que cercavam os primeiros palácios

egípcios no Período Pré-Dinástico. Ele é usado como um elemento decorativo

desde o Período Dinástico Inicial em diferentes localidades como mastabas,

sarcófagos, caixões, estelas, portas falsas, jóias e em muitos outros

contextos funerários e cerimoniais. No Novo Império, o serekh pode ser

encontrado na forma de um estandarte associado ao ka real. Ele também

aparece na composição do “Nome de Hórus” do rei, onde é colocado sob um

falcão. (SHAW, NICHOLSON, 1995, p. 261; WILKINSON, 1992, p. 149)

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201

CAPÍTULO 12. CAVIDADES

As estátuas funerárias de Osíris e de Ptah-Sokar-Osíris têm como

característica serem sólidas ou possuirem uma cavidade. As do segundo tipo

são mais numerosas, mas o local e a forma da cavidade varia conforme o

tipo da estátua. Da mesma forma que o seu conteúdo varia, em geral temos

no interior das estátuas de Osíris (tipos 1, 2 e 3) um papiro do “Livro dos

Mortos” e no interior das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris (demais tipos) uma

pseudo “múmia-de-grãos”. (ver 13)

12.1 CAVIDADE TUBULAR NO TRONCO

No tronco das figuras dos tipos 1. e 2.a encontramos uma cavidade

cilíndrica que se estende através da cavilha até

a parte de baixo da base, onde ela é fechada

por uma tampa circular ou oval (Apêndice I.A),

conforme podemos observar na estátua de

Osíris de Khonsoumès pertencente ao Louvre

[05]. O corpo da estátua, por sua vez, divide-se

em duas partes, de forma que o verso pode ser

removido como um painel solto. Na estátua de

Osíris presente na coleção do Museu Nacional

[MN-5], mesmo tendo apenas sobrado uma

parte do painel traseiro (Pr. XII), podemos

observar a junção do mesmo com a parte da

frente, a qual é feita por pinos (Pr. XIII C).

Segundo Raven (1978-1979, p. 267), esta

disposição facilitaria a manufatura da

cavidade. Em outra estátua funerária de Osíris

pertencente a coleção do Museo Gregoriano

Egizio (Fig. 62), observamos que a abertura da figura transpassa

verticalmente o meio do tronco da figura, a cabeça sendo fixa na parte da

direita.

Figura 62 - Osíris de Verniz Preto da coleção do Museo Gregoriano Egizio, tendo a abertura da cavidade tubular no meio da figura

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As figuras desses tipos possuem uma forma mais corpulenta devido ao

tipo dessa cavidade. Esse formato se deve ao conteúdo que estes Osíris

deveriam carregar: um rolo de papiro que, em sua maioria, continha

inscrições do “Livro dos Mortos”. Como um possível antecedente desse tipo

de estátua poderíamos mencionar uma estátua oca encontrada na tumba de

Amenhotep II, a qual continha o exemplar mais antigo conhecido do “Livro

das Cavernas” (RAVEN, 1978-1979, p. 257).

12.2 CAVIDADE RETANGULAR NO VERSO DO TRONCO

No verso do tronco das figuras de Osíris do tipo 2.b encontramos uma

cavidade vertical retangular que se estende desde a altura onde os braços se

cruzam até os pés da figura (Apêndice I.B). Em uma figura do Museum of

Fine Arts of Budapest [07], a cavidade acaba junto à base da figura,

enquanto na figura do National Museum of Ireland [08], a cavidade termina

um pouco acima da base. Assim como na cavidade anterior, este tipo

também deveria conter um papiro em seu interior.

12.3 CAVIDADE NA LATERAL DA BASE

As figuras dos tipos 2.c e 2.d podem possuir uma cavidade retangular

na lateral da base fechada por um sarrafo deslizante (Apêndice I.C). No

presente catálogo podemos observar tal cavidade em um Osíris de Verniz

Preto do British Museum [11] (Pr. XXXV).

12.4 ESTÁTUA TIPO CAIXÃO

Algumas estátuas dos tipos 5, 6 e 7 são manufaturadas no estilo dos

caixões, dividindo-se a figura ao meio em duas partes (Apêndice I.D).

Podemos observar este tipo de cavidade na parte de trás do Ptah- Sokar-

Osíris de Djehoutimes, do Museum of Fine Arts de Budapest (inv. 51.244)

(Fig. 63), e num Ptah-Sokar-Osíris encontrado em Saqqara pela missão

arqueológica polonesa em um sepultamento do Período Ptolomaico (nº 483).

Neste último, podemos ver os pinos e furos, os quais servem para juntar as

duas partes da estátua, e também um pedaço de bandagem, provavelmente

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um vestígio que restou da pseudo “múmia-de-

grão”, conteúdo típico desse tipo de cavidade

(Fig. 64).

12.5 CAVIDADE RETANGULAR NO VERSO

DO TOUCADO DIVINO

Outras figuras dos tipos 5, 6 e 7 podem

apresentar uma cavidade retangular aberta por

uma tampa no verso do toucado divino

(Apêndice I.E). Tal tipo de cavidade pode ser

observado no exemplar W2052 do Egypt Centre

de Swansea, onde ainda temos a tampa (Fig.

65), ou no Ptah-Sokar-Osíris do tipo 6.c do

Museo Gregoriano Egizio do Vaticano [38] onde

Figura 63 - parte de trás Ptah- Sokar-Osíris de Djehoutimes em forma de caixão - Museum of Fine Arts de Budapest (inv. 51.244)

Figura 64 - Ptah-Sokar-Osíris com cavidade tipo caixão com vestígios de uma pseudo ―múmia-de-grãos‖ em seu interior – Período Ptolomaico, Saqqara.

Figura 65 – cavidade retangular no verso do toucado divino. Ptah-Sokar-Osíris W2052 – Egypt Centre, Swansea

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a tampa se perdeu (Pr. LXXII B).

12.6 CAVIDADE NO PILAR DORSAL

Parecida com a cavidade mencionada anteriormente, localizada no

verso do toucado divino, temos uma cavidade que se estende por todo o pilar

dorsal (Apêndice I.F). Essa cavidade pode ser encontrada no exemplar de

tipo 5.c pertencente à coleção do Allard Pierson Museum [29] (Pr. LVIII A), e

em uma estátua do mesmo tipo da coleção do Museu Nacional/UFRJ [MN-

01]. Nesta última, a cavidade estende-se por um pedaço do toucado divino

(Pr. I B).

12.7 CAVIDADE NO TOPO DA BASE

Dentre as estátuas de Ptah-Sokar-Osíris, o tipo mais comum de

cavidade é um receptáculo retangular ou quadrado no topo da base, fechada

por uma tampa deslizante simples, em forma de falcão ou sarcófago

(Apêndice I.G). Como exemplo de um Ptah-Sokar-Osíris com tampa simples

temos uma estátua do Museum of Fine Arts Boston do tipo 4.[17]. Com uma

tampa em forma de falcão, temos uma estátua do Kunsthistorisches

Museum de Viena do tipo 4. [14], na qual o falcão aparece com uma rica

decoração semelhante à da estátua; já numa estátua do British Museum

[21], o falcão aparece pintado simplesmente de preto. Com tampa em forma

de sarcófago temos os exemplares do Kunsthistorisches Museum de Viena

do tipo 6.b [37] e outro do tipo 7.a [41]. Outros exemplares têm um falcão

sentado acima do sarcófago, como pode ser visto no Ptah-Sokar-Osíris

Iâhmês de tipo 5.c [25] e no de Nesuy do tipo 6.b [36]

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205

CAPÍTULO 13. CONTEÚDO

As estátuas de Osíris e de Ptah-Sokar-Osíris podem ser sólidas, ou

conter uma cavidade no torso ou na base como pudemos observar acima. As

estátuas com uma cavidade são mais numerosas. Nas cavidades, no tronco e

na lateral da base das estátuas de Osíris podemos encontrar comumente um

papiro com inscrições do “Livro dos Mortos”. E nas cavidades, no tronco e na

base, das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris podemos encontrar uma pseudo

“múmia-de-grãos”. Em alguns casos, a cavidade também poder ser

encontrada vazia ou, no que se refere às estátuas de Osíris, temos em seu

interior um papiro com inscrições de outros textos funerários.

13.1 LIVRO DOS MORTOS

O “Livro dos Mortos” faz parte da categoria de textos pertencente à

Literatura Funerária. Estes textos, cujo uso é conhecido apenas entre os

egípcios antigos, eram de uso exclusivo do morto e serviam para auxiliá-lo

na sua passagem para o outro mundo, com o que o mesmo podia tornar-se

um espírito glorificado ao final de sua jornada. As fórmulas e encantamentos

necessários para ultrapassar as dificuldades dessa viagem encontravam-se

inscritos nas paredes das câmaras funerárias, nos caixões, nas bandagens e

nos papiros colocados junto à múmia. Assim o morto teria fácil acesso a

estes e poderia utilizá-los no momento adequado. (BRANCAGLION JUNIOR,

2004, pp.48-49)

Os “Textos das Pirâmides”, encontrados nas câmaras subterrâneas das

pirâmides dos soberanos da V e VI Dinastias, foram o primeiro corpo de

textos de Literatura Funerária cujo uso era exclusivo do rei. Suas fórmulas

provavelmente provinham de uma época mais antiga, quando as mesmas

deveriam ser recitadas oralmente por um sacerdote leitor, como indicam

certas referências. Nestas, o rei deveria ascender ao céu para se unir aos

deuses. Não tendo o resto da população o mesmo destino reservado ao faraó,

alguns estudiosos acreditam que o faraó era o representante de uma ba

coletiva do povo egípcio e que a sua ascensão ao céu representaria a

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ascensão de todos. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, pp. 49-52; 2007,

informação verbal29)

O uso por particulares dessa literatura funerária irá ocorrer pela

primeira vez nos “Textos dos Caixões” inscritos nos caixões de madeira do I

Período Intermediário e do Médio Império. Nestes, um novo destino é

oferecido ao morto: o Mundo Inferior, o domínio do deus Osíris. Assim, as

fórmulas antes de uso exclusivo do rei para ascender ao céu são adaptadas,

para que o morto transponha os perigos e dificuldades deste mundo e possa

se transformar num espírito glorificado. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, pp.

53-55; 2007, informação verbal30)

Com o “Livro dos Mortos”, sucessor dos “Textos dos Caixões”, temos

uma democratização dessa literatura funerária, passando ela a ser acessível

a todos os mortos. Ele irá surgir no II Período Intermediário, na região de

Tebas, aparecendo nessa época em sudários da realeza. Seu uso por pessoas

que não pertencem à realeza começa a ocorrer com mais frequência na XVIII

Dinastia, nos reinos de Hatshepsut (1473 a.C-1458 a.C.) e Thutmés III (1479

a.C.-1425 a.C.). (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 56; HORNUNG, 1997, p.

22)

No Período Ramessida e na XXI Dinastia, encontramos o papiro do

“Livro dos Mortos” encerrado no interior das estátuas de Osíris (tipos 1. e 2.).

Nesse período ele costuma aparecer em conjunto contendo um papiro com

uma cópia do “Livro do Amduat” e encerrado nas bandagens da múmia. Às

vezes, podemos encontrar, alternativamente, um papiro com uma mistura de

ambos os textos. Nessa mesma época também aparecem exemplares escritos

em hierático, ao lado daqueles escritos em hieróglifo cursivo. As vinhetas,

que anteriormente apareciam apenas como ilustrações simbólicas para

alguns poucos capítulos, agora ilustram quase todos os capítulos. Algumas

vinhetas chegam a ocupar toda a altura do papiro, representando ela um

resumo do capítulo. (HORNUNG, 1997, p. 22)

29 Cultura e Literatura no Egito Pré-Islâmico. Curso da Pós-Graduação do Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 6 – Literatura Funerária. Ministrada em 21 set. 2007. 30 Cultura e Literatura no Egito Pré-Islâmico. Curso da Pós-Graduação do Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 6 – Literatura Funerária. Ministrada em 21 set. 2007.

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207

Entre a XXII Dinastia e a XXVI Dinastia, o “Livro dos Mortos” cai em

desuso. Neste mesmo período, desapareceram as estátuas funerárias de

Osíris porta-papiro, sendo as mesmas substituídas na XXV Dinastia pelas

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, em sua maioria contendo uma

pseudo “múmia-de-grãos” no interior de sua cavidade. No Período Saíta,

quando o “Livro dos Mortos” ressurge, ele atinge a sua versão canônica

organizada em 165 capítulos em uma ordem regular, a qual é conhecida pela

denominação de Recensão Saíta. A sua versão completa, com 192 capítulos,

será encontrada apenas no Período Ptolomaico e irá sobreviver até o Período

Romano. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 56; HORNUNG, 1997, p. 23)

No Egito antigo, o “Livro dos Mortos” era conhecido sob o nome de

“Livro para sair à Luz do Dia”, uma referência ao título do primeiro capítulo:

“Início dos capítulos para sair à luz do dia, dos louvores e das invocações

(ligados ao) entrar (do) e sair do domínio sagrado do deus no Belo Ocidente.

A serem recitados no dia do sepultamento, de entrar depois de haver saído.”

(ALLEN, 1974, p. 5) (Fig. 66) A Denominação moderna foi dada em 1842,

pelo egiptólogo alemão Karl Richard Lepsius, na sua publicação do exemplar

do “Livro dos Mortos” pertencente à Iufankh, atualmente no Museu de

Turim. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 55; HORNUNG, 1997, p. 24)

Figura 66 - Início do ―Livro dos Mortos‖ com a inscrição ―sair à luz do dia‖ à direita (originalmente localizado no verso) e o morto fazendo oferendas para Rê-Horakhty, Osíris, Ísis e Néftis. ―Livro dos Mortos‖ de Khonsoumès (N 3070) – Museu do Louvre

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208

O tamanho do papiro contendo o “Livro dos Mortos” varia conforme o

número de capítulos utilizados. Assim, temos exemplares de 1m até 25m de

comprimento nas versões mais completas, e de 30 cm a 40 cm de altura

(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 56). Os exemplares do Novo Império até a

Baixa Época costumam ter as vinhetas coloridas, enquanto nos Período

Ptolomaico e Romano elas são apenas pretas (HORNUNG, 1997, p. 23).

Via de regra, cada capítulo é constituído por um título, seguido da

fórmula, e uma vinheta ilustrando o conteúdo do mesmo pode acompanhá-

lo. O título e as partes importantes eram escritos em vermelho, e a fórmula

em preto. Alguns capítulos ainda contêm uma rubrica com instruções de uso

e efeitos esperados que a fórmula deveria ter (exemplo ver LM 100 abaixo). A

ordem e a escrita dos capítulos varia de papiro para papiro. Mas, conforme a

época, existem certos capítulos preferenciais para o início e para fim do livro.

Sessenta por cento dessas fórmulas têm sua origem nos “Textos das

Pirâmides” e nos “Textos dos Caixões”. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p.

56; 2007, informação verbal31; HORNUNG, 1997, pp. 25-26)

As fórmulas do “Livro dos Mortos” contêm os conhecimentos

necessários para que o morto possa sobreviver no Mundo dos Mortos e não

seja condenado a não existência, ou seja, à morte definitiva. Entre os

principais conhecimentos estão: as preces dedicadas às grandes divindades,

a identificação do morto com os deuses e as forças divinas e o domínio

dessas forças por meio do conhecimento de seus nomes secretos.

(BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 57)

Com o domínio desses elementos, o morto poderia entrar e sair à

vontade no “Belo Ocidente”, transfigurar-se, glorificar-se, recuperar as

funções vitais, conduzir a ba de volta ao corpo, conhecer as almas de

Hieracômpolis, viajar até Abidos e seguir Osíris, derrotar os seus inimigos,

respirar a brisa e beber água à vontade, não comer excremento e não beber

urina, evitar os trabalhos no Mundo dos Mortos e obter o godê e a paleta de

escriba. (BRANCAGLION JUNIOR, 2007, informação verbal32)

31 Cultura e Literatura no Egito Pré-Islâmico. Curso da Pós-Graduação do Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aulas 6 e 7 – Literatura Funerária. Ministradas em 21 set. 2007 e 28 set. 2007. 32 Cultura e Literatura no Egito Pré-Islâmico. Curso da Pós-Graduação do Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 6 – Literatura Funerária. Ministrada em 21 set. 2007.

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209

Para realizar tais objetivos, duas eram as principais etapas que o

morto teria que ultrapassar: a justificação e a glorificação. Na primeira,

retratada principalmente no capítulo 125, a alma do morto era julgada na

Sala das Duas Maats, sendo seu coração pesado, refletindo sua conduta em

vida. O morto era conduzido a este recinto pelo deus Anúbis perante Osíris,

o juiz do julgamento, e de um grupo de 42 deuses assessores33. Diante de

cada um desses deuses assessores, ele teria que negar um pecado não

cometido em vida, sendo esta ação conhecida pelo nome de “Confissão

Negativa” (Fig. 67). Após ter realizado suas confissões, o morto era conduzido

perante a balança pela deusa Maat, pela deusa Amentet ou pelo deus Hórus.

Na balança, seu coração era pesado contra uma imagem da deusa Maat ou

uma pluma de avestruz, representando a mesma. O coração, registro das

ações do morto em vida, deveria ter o mesmo peso da pluma, a qual

representa a verdade e a justiça. Para evitar que o coração falasse algo que

pudesse prejudicar o seu dono, o mesmo era substituído em muitas múmias

por um amuleto chamado “escaravelho coração”, no qual estava inscrita a

fórmula 30B do “Livro dos Mortos”. A pesagem do coração era feita pelo deus

Anúbis ou Hórus, enquanto o deus Thot, o escriba dos deuses, registrava o

veredicto do julgamento. Caso o resultado fosse negativo, a deusa Ammut, “a

Devoradora”, uma criatura híbrida representada com cabeça de crocodilo,

patas dianteiras de leopardo ou leão e patas traseiras de hipopótamo,

sentada ao lado da balança, estaria pronta para engolir o coração do morto.

Dessa forma ele era condenado a não existência, ou seja, à segunda morte, a

morte definitiva. Mas, ao contrário, sendo o resultado positivo, o morto era

conduzido perante Osíris, sentando em seu trono, quase sempre

acompanhado de Ísis e Néftis e dos quatro Filhos de Hórus, e ele recebia o

título de maA-xrw (Justificado ou Justo de Voz). (BRANCAGLION JUNIOR,

2004, pp. 59-67) (Fig. 68) Este título era adicionado após o nome do morto

nas inscrições, como pode ser observado naquelas que se encontram em

algumas das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris aqui

estudadas. No Período Tardio, uma coroa, a coroa da justificação, era

33 O número de desses deuses pode variar conforme a versão. O número de 42 deuses, considerado o ideal, estaria associado com o número total de nomos do Egito.

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210

colocada na cabeça da múmia, para demonstrar que o morto foi aprovado no

tribunal de Osíris (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, informação verbal34).

34 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 8 – Deuses e Demônios: uma visão do Outro Mundo. Ministrada em: 10 dez. 2004.

Figura 68 - Capítulo 125 do ―Livro dos Mortos‖ mostrando a pesagem do coração do morto perante Osíris – Papiro Hunefer (BM EA 9901,3), XIX Dinastia – British Museum

Figura 67 – Anhai diante dos deuses da ―Confissão Negativa‖. ―Livro dos Mortos‖ de Anhai (BM EA 10472), XXI Dinastia – British Museum

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211

Após se tornar um Justo de Voz, o morto tem de passar por mais uma

importante aprovação. Nos capítulos 100 a 102 e 129 a 136 ele torna-se um

sAxu, ou seja, um ser glorificado diante do deus Rê. Assim, ele poderá se

tornar um membro da barca solar, e, junto com os demais deuses, viajar

pelo céu na barca do deus Sol e desfrutar dos Campos de Oferendas.

ROLO PARA INICIAR O GLORIFICADO E POSSIBILITAR QUE ELE EMBARQUE NA BARCA DE RÊ E SUA TRIPULAÇÃO.

PARA SER DITO POR N.: Eu transportei a Fênix para o leste, Osíris para Busíris. Eu

abri os poços da Inundação, eu aplainei os caminhos para o Disco. Eu puxei Sokar no seu treino e tornei poderosa a grande naja (real) na sua estação. Eu cantei, eu adorei o Disco. Eu me juntei aos (babuínos) adoradores (do sol); Eu sou um deles. Eu tenho sido o companheiro de Ísis; eu fiz poderosos os (seus) encantamentos mágicos. Eu amarrei o cabo de reboque. Eu repeli APOPHIS, eu retornei os seus passos. Rê estendeu as suas mãos para mim; sua tripulação não deve me repelir. Se eu sou poderoso, o Olho Perfeito é poderoso e vice-versa.

Para qualquer um que queira afastar N. (da barca de Rê), ele é afastado do ovo e do peixe-AbDw.

PARA SER DITO SOBRE ESTA IMAGEM QUE É DESENHADA, DESENHADA SOBRE UM PEDAÇO DE PAPIRO LIMPO, SEM USO, COM O PÓ (DE) ESMALTE VERDE COM ÁGUA DE MIRRA, COLOCADA NO PEITO DO GLORIFICADO SEM DEIXAR QUE SE APROXIME (MUITO) DO CORPO.

PARA TODO GLORIFICADO PARA QUEM ISTO É FEITO, ELE EMBARCA NA BARCA DE RÊ DIARIAMENTE E THOT OLHA POR ELE ENQUANTO ELE DESEMBARCA E EMBARCA (DIARIAMENTE).

UMA FÓRMULA VERDADEIRAMENTE EXCELENTE (EXPERIMENTADA) UM MILHÃO DE VEZES.

Tu deves desenhar ela com um traço cuidadoso e a barca de Rê igualmente. Referente (ao pó) de esmalte verde, ele é mencionado na intenção de enfatizar o verde, este com o qual (o documento) deve ser escrito.

Eu sou um iniciado, livre de pecados. Não há nada que (eu) não saiba sobre a verdade. Ela é apresentada nas minhas mãos para o seu senhor, e ele se alegra comigo sobre ela todos os dias. Eu vi segredos em Busíris, pois eu sou o companheiro do embalsamador. (Eu) elevei o Pilar e estabeleci o amuleto-tie. (Eu) naveguei na ascensão de Rê onde quer que ele fosse.

Graciosa foi a observação de Thot feita para Rê, com a aprovação do santuário-innt. Foi satisfeito com seu senhor Rê quando Thot falou: “Olha por sua (alma) quando ela desembarca ou embarca na barca de Rê, enquanto o cadáver permanece no seu lugar.”

LM 100

(ALLEN, 1974, p. 82)

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212

A glorificação aparece mais camuflada que a justificação, o que em

outro aspecto pode ser visto na maior importância dada pelos egípcios no

aspecto osiríaco da pós-morte. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, pp. 57-58;

2004, informação verbal35; 2007, informação verbal36)

No Campo de Oferendas ou Campos de Iaru, uma espécie de Campos

Elíseos egípcios, o morto teria o alimento necessário para a sua

sobrevivência no Mundo Inferior. Mas, para que o morto não precisasse

trabalhar na colheita de trigo e da cevada (Fig. 69), a qual atingia proporções

gigantes no Outro Mundo, segundo o capítulo 109 eram colocadas junto ao

morto em sua tumba figuras chamadas shabtis ou ushabtis. (SHAW;

NICHOLSON, 1995, p. 99) Inicialmente, no Médio Império, quando estas

figuras eram vistas como uma representação do morto, cada pessoa tinha

apenas uma shabti. Mas, no Novo Império, quando estas figuras passam a

serem vistas apenas como servos que trabalham para o morto, seu número

torna-se cada vez maior, chegando o faraó Séthi I ter por volta de 700

35 O Egito Antigo. Curso de Extensão Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 7- Os dois grandes mistérios: da “Justificação” à “Glorificação” do morto. Ministrada em: 03 dez. 2004 e Aula 8 – Deuses e Demônios: uma visão do Outro Mundo. Ministrada em: 10 dez. 2004. 36 Cultura e Literatura no Egito Pré-Islâmico. Curso da Pós-Graduação do Departamento de Letras Orientais, FFLCH, USP. Aula 6 – Literatura Funerária. Ministrada em 21 set. 2007.

Figura 69 – O morto trabalhando no Campo de Oferendas. ―Livro dos Mortos‖ de Ani (BM EA 10470,35), XIX Dinastia – British Museum

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213

servidores funerários. Nas mãos, as shabtis carregavam ferramentas para

trabalhar nos campos e para que obedecessem as ordens do senhor, o

capítulo 6 vinha inscrito sobre elas. (GAMA, 2008, pp. 65-67)

FÓRMULA PARA FAZER UM USHABTI TRABALHAR (PARA UM HOMEM) NO DOMÍNIO DO DEUS. PARA SER DITO POR N.:

Ó tu ushabti, se Osíris N. for chamado para fazer qualquer trabalho que se costuma fazer lá nos domínios do deus – veja, obstáculos foram colocados para ele lá – [como] um homem para com os deveres, tu estás encarregado com todas [essas (tarefas) as quais se costuma fazer lá], cultivar os campos, irrigar os canais, transportar areia do oeste ou do leste. “Eu (os) farei; aqui estou,” tu deves dizer.

LM 6

(ALLEN, 1974, p. 8)

Por algum motivo por nós desconhecido, algumas dessas shabtis

foram transformadas posteriormente em figuras funerárias de Osíris, como

ocorreu, por exemplo, com o exemplar de Ramessés II mostrado em nosso

catálogo [55].

13.2 PSEUDO ―MÚMIAS DE GRÃOS‖

Por volta da XXV Dinastia, as estátuas de Ptah-Sokar-Osíris aparecem

em substituição às estátuas funerárias de Osíris. Tendo o “Livro dos Mortos”

caído em desuso por volta da XXII Dinastia, as estátuas de Ptah-Sokar-

Osíris apresentarão um novo conteúdo em sua cavidade: uma pseudo

“múmia-de-grãos”. Estas se encontravam no interior de uma cavidade no

torso da estátua ou na base (ver 12). Quando no interior da cavidade no

tronco, elas possuíam uma forma fina e alongada (Fig. 70), e, na cavidade da

base, a forma de um pequeno pacote tubular (Fig. 71). As análises feitas nas

figuras dos exemplares do Museo Cívico de Bologna, do Fitzwilliam Museum

Figura 70 - Pseudo ―múmia-de-grãos‖ alongada encontrada no interior da cavidade no tronco das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris. (RAVEN, 1978-1979, pl. 41, 5)

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214

em Cambridge, do Rijksmuseum van Oudheden

de Leiden e do Museo Egizio de Turim mostram

serem estas figuras feitas de uma mistura de

barro e grãos de trigo ou cevada, que não

germinaram, envoltos em linho. Estas análises

também provam serem falsas as afirmações de

serem estas pseudo-múmias membros do morto

ou pequenos animais mumificados, como ainda

é comumente afirmado por estudiosos. (RAVEN,

1982, pp. 16-18)

Segundo Raven, o simbolismo do conjunto da estátua deixa clara a

sua ligação com os Mistérios de Osíris praticados no mês de Khoiak. Esta

ligação já pode ser vista na inscrição de uma estátua de Osíris de verniz

preto encontrada no “cachette” dos sacerdotes em Deir el-Bahari. A inscrição

“pA xnty-Imntt n Wsir N mAa xrw” (O primeiro dos Ocidentais (figura) de Osíris N

justificado) é a mesma aplicada às múmias-de-grãos preparadas durante os

Mistérios de Osíris, segundo consta no texto de Dendera. (RAVEN, 1982, p.

16)

13.2.1 Outros Tipos de Figuras de Grãos encontradas no Contexto

Funerário

No Papiro Dramático Ramesseum do Médio Império encontramos a

primeira relação conhecida entre Osíris e os grãos. Neste, é descrito um

ritual no qual um burro, representando Seth, pisoteia a cevada, a qual seria

Osíris, numa alusão a quando Seth esquarteja o corpo de seu irmão em

pedaços (GRIFFITHS, 1966, pp. 106-107). No mesmo período histórico

também já é possível observar a existência de uma ligação do morto com os

grãos e Osíris, nos “Textos dos Caixões”, fórmula 269

Palavras a serem ditas para “Tornar-se cevada do Baixo Egito” N. que você é esse feixe de vida que sai de Osíris, que se

desenvolve sobre os lábios de Osíris, que faz viver os homens, que diviniza os deuses, que espiritualiza os bem-aventurados, que alimenta os mestres dos kas, mestre dos produtos, que faz os pães pakou para os bem-aventurados, que faz prosperar os vivos, que

Figura 71 – Pseudo ―múmia-de-grãos‖ em forma de pacote tubular encontrada no interior da cavidade no topo da base das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris. (RAVEN, 1978-1979, pl. 41, 3)

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215

fortifica o corpo dos vivos. N. que você viva em Nepri hety. N. você é Nepri hety dos vivos, N. que você se enriqueça sobre os lábios de Geb. O amor de N. que você está no céu, sobre a terra, nos campos. Ísis é vantajosa sobre seu Hórus, para o seu amigo que ele é, para o seu Hórus. N. que você reviva em Osíris.

(BARGUET, 1986, p.544)

e fórmula 330

“Tornar-se Neper” [...] Eu vivo e eu morro, (pois) eu sou Osíris. Eu saí de você, eu

entrei em você, eu cresci em você, eu me desenvolvi em você, eu vim de você, eu caí sobre meu lado, (de modo que) os deuses vivem de mim. Eu vivo e eu me desenvolvo em Nepri que os Imakhous carregam. Eu recupero Geb. Eu vivo, eu morro, eu sou o trigo, eu não sou destruído.

(BARGUET, 1986, p.544)

Em períodos anteriores quando encontramos uma relação entre o

morto e os grãos, os grãos estão presentes puramente como alimento para o

morto e não em um sentido simbólico ligado ao renascimento (RAVEN, 1982,

pp. 7-12).

As “Camas de Osíris” pertencentes ao Novo Império são as primeiras

provas arqueológicas encontradas de figuras feitas de grãos. Ao total foram

encontrados sete espécimes em diferentes graus de conservação em tumbas

reais de Biban el-Muluk (Vale dos Reis). Estes exemplares possuem em

comum o fato de serem representações do deus Osíris de perfil, olhando

para a direita, usando a coroa Atf e segurando nas mãos o cajado e o açoite.

Eles estão deitados em um suporte de grade de madeira, coberto por tecido

ou esteiras (FIGURA 72), ou em uma caixa de madeira, e os exemplares do

Período Pós-Amarniano estão numa caixa com perfurações (Figs. 73, 74 e

75). Nos espécimes que sobreviveram, os grãos de cevada germinaram e

cresceram a uma altura considerável. (RAVEN, 1982, pp. 12-15)

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Figura 72 – ―Cama de Osíris‖ de Maihirpre

Figura 73 – ―Cama de Osíris‖ de Horemheb – XVIII Dinastia.

Figura 74 - Cama de Osíris de Tutankhamun – XVIII Dinastia.

Figura 75 - Cama de Osíris de Tutankhamun sem o envoltório – XVIII Dinastia.

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217

A partir da Baixa Época em diante temos as chamadas “Múmias-de-

Grãos” encontradas em sua maioria em fossas simples. Estas coexistem com

as estátuas de Ptah-Sokar-Osíris, ao contrário das “Camas de Osíris” que

desaparecem no final do Novo Império. As “Múmias-de-Grãos” têm em

comum serem objetos mumiformes antropomorfos, geralmente enroladas ou

cobertas em bandagens de linho e providas com máscaras de cera (Fig. 76).

Ocasionalmente são encontrados atributos como cetros reais, um falo em

ereção e uma coroa Atf ou HDt. Seus corpos consistem de terra (barro, areia ou

uma mistura de ambos) contendo numerosos grãos de trigo que não

germinaram (Fig. 77). Algumas são encontradas dentro de caixões de

madeira ou barro com cabeça de falcão, podendo conter inscrições (Figs. 76,

78, 79 e 80). Também é possível encontrar junto com as figuras quatro

pacotes mumiformes tubulares, por vezes com máscaras de cera dos filhos

de Hórus (Fig. 80). Estes possuem igualmente uma mistura de areia e

cevada. Estas múmias de grãos foram encontradas em quatro localidades:

em Tebas, no Wadi Qubbanet el-Quirud (também conhecido como Vale das

Tumbas de Macacos), Tihna el-Gabal, es-Sheik Fadl, e num sítio

desconhecido no Médio Egito37. (RAVEN, 1982, pp. 18-27)

Um último grupo de figuras são os chamados “Tijolos de Osíris”.

Características comuns dessas figuras são de serem de barro cozido

vermelho, de forma retangular, e de possuírem ao centro um rebaixo com a

imagem de Osíris, de perfil, usando a coroa Atf e a barba divina e portando o

cajado e o açoite (Figs 81, 82, 83 e 84). A imagem de Osíris era originalmente

preenchida com uma mistura de terra com grãos, a qual não foi preservada

na maioria das figuras (Figs. 81 e 83). Os tijolos têm em média 24 cm de

comprimento, 12 cm de largura e 6 cm de profundidade. Alguns exemplares

contêm um rebaixo raso na parte superior (Fig. 82). Os exemplares

conhecidos foram encontrados no Wadi Qubbanet el-Quirud, Gebel el-Tarif e

possíveis outras localidades na margem Ocidental de Tebas, tendo uma

datação entre o III Período Intermediário e o Período Romano. (TOOLEY,

1996, pp. 167-179)

37 características comuns levam a crer pertencerem este grupo de figuras ao mesmo sítio.

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218

Figura 76 – ―Múmia-de-Grãos‖ enrolada em linho e com máscara de cera em caixão com cabeça de Sokar - Museum of Fine Arts Boston

Figura 77 – ―Múmia-de-Grãos‖ de com falo ereto e máscara de cera - British Museum

Figura 78 – ―Múmia-de-Grãos‖ com máscara de ouro em caixão com cabeça de Sokar

Figura 79 - Caixão ―Múmia-de-Grãos‖ com cabeça de Sokar contendo inscrições e representação dos quatro Filhos de Hórus (primeira fileira) e de Ísis (segunda fileira à esquerda) e Néftis (segunda fileira à direita) - Museu do Louvre Inv. E 12181

Figura 80 – ―Múmia-de-Grãos‖ com quatro pacotes tubulares (Filhos de Hórus) em caixão com cabeça de Sokar - British Museum

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219

Figura 81 - Tijolo de Osíris com embrulho de Grãos - Medelhavsmuseet, Stockholm Inv. MME 10988

Figura 82 - Tijolo de Osíris - Museu do Louvre Inv. E 11375

Figura 83 - Tijolo de Osíris preenchido com grãos—Sammlung des Ägyptologischen Instituts der Universität, Heidelberg

Figura 84 - Tijolo de Osíris—Pelizaeus-Museum, Hildesheim Inv. Nr. 4550

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220

Alguns autores acreditam serem os “Tijolos de Osíris” na verdade os

moldes das figuras de grãos produzidas durante o Festival de Khoiak, já que

os moldes de ouro descritos nos textos do festival não foram encontrados

(RAVEN, 1982, p. 29). Angela Tooley contesta essa hipótese, assumindo que:

[...] Tijolos de Osíris eram preenchidos com terra e areia e cultivados com grãos, da mesma maneira que as Camas de Osíris do Novo Império, e de acordo com as posteriores instruções dos textos de Dendera, considerando a criação das múmias-de-grãos de Khenty-Imentiu. O fato de exemplares de tijolos de cerâmica terem sido encontrados com o seu conteúdo original indica que eles não podem ser vistos como moldes de figuras tridimensionais. Parece muito mais provável que estes sejam receptáculos com tampas, talvez uma variação das Camas de Osíris do Novo Império. Os dados do texto de Dendera e os materiais exatos ali citados podem não ter uma aplicação mais ampla, uma vez que está claro, conforme evidências existentes, que fatores locais determinavam esses fatos.

(TOOLEY, 1996, p.179)

13.2.2 O Festival de Khoiak

As figuras de grãos descritas acima se assemelham a figuras de grãos

produzidas durante o Festival de Khoiak. Este era um festival realizado no

quarto mês de Khoiak (Inundação) ou Akhet38, em homenagem ao deus

Osíris. Sua popularidade pode ser vista pelo aumento de sua duração, sendo

em seu período mais extenso comemorado do dia 12 ao 30 de Khoiak. Já no

final do Antigo Império, outro importante festival se junta ao Festival de

Osíris, o Festival de Sokar, realizado no princípio em Mênfis. Em pouco

tempo temos a fusão total dos dois festivais, sendo praticamente impossível

distinguir um do outro.

A menção ao festival nos chegou de várias fontes de diferentes

períodos. Mas as informações fornecidas muitas vezes se referem a

acontecimentos específicos, ou são lacunares. Portanto, ainda não sabemos

ao certo de todos os acontecimentos do festival, da mesma forma como nos

falta saber o seu verdadeiro significado. As hipóteses sobre o seu significado

concentram-se na idéia de este ser um festival agrícola em comemoração às

cheias do Nilo, ou um festival celebrando o renascimento de Osíris.

38 Khoiak é denominação copta para o mês egípcio de Akhet.

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Das informações que possuímos podemos perceber que um dos

objetivos do festival era representar o mito de Osíris, desde seu assassinato

por seu irmão Seth até a sua ressurreição como o Senhor do Mundo dos

Mortos. Os assim chamados mistérios de Osíris contavam com

representações dramáticas, com a participação de músicos e dançarinas. Em

geral era um monólogo no qual um ator se dirigia a Osíris, o qual sempre era

representado por uma estátua. A intenção era a de que o mito de Osíris fosse

melhor visualizado (MIKHAIL, 1984a, p. 36). Além disso, outra importante

ação realizada era a fabricação de figuras feitas em geral de uma mistura de

areia e grãos.

Do material referente ao Festival de Khoiak que chegou aos nossos

dias, a maioria pertence aos Períodos Ptolomaico e Romano. As fontes de

Períodos anteriores são escassas, pertencendo as primeiras ao Médio

Império. No caso de levarmos em conta o Festival de Sokar, o qual se integra

ao Festival de Osíris, nossas fontes remontam ao Período Arcaico. As

evidências contidas principalmente na Pedra de Palermo mostram eventos

associando Sokar ao rei, os quais seriam a origem para o seu Festival. A

procissão de circundar os muros (pXr HA inbw) e o ato de capinar a terra já

estão presentes, ocorrendo no começo inicialmente em períodos irregulares,

na I Dinastia associando-se à Festa da Barca Maaty39, passando na II

Dinastia a ser comemorado a cada seis anos. (GABALLA, KITCHEN, 1969,

pp. 13-19)

No início do Antigo Império o Festival de Sokar passa a ser celebrado

anualmente. Também passamos a encontrar menções fora de Mênfis em

fórmulas funerárias em Assuan, Dendera, Meir e Sheik Said (GABALLA,

KITCHEN, 1969, p. 21; MIKHAIL, 1984b, p. 28). Fora do Festival de Khoiak

já encontramos evidências da associação de Sokar a Osíris em especial nos

Textos das Pirâmides (§ 1256 e 1824), levando em conta principalmente o

caráter funerário de ambos os deuses. Segundo Gaballa e Kitchen (1969, p.

23 e 34-36), a “osirificação” e a junção ao Festival de Khoiak com o Festival

de Sokar teria ocorrido no final do Antigo Império.

39 Barca pertencente ao grupo das barcas solares associadas à Sokar

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No Médio Império nossas principais fontes são estelas encontradas em

Abidos, relatando a participação de seus donos no Festival de Khoiak.

Destas, a mais completa é aquela com o relato do príncipe Ikhernofret,

diretor do Tesouro e Edifícios de Senusret III e Chefe dos Segredos das

Palavras Divinas. Ao contrário da maioria dos autores, Frankfort (1948,

p.203-204) acha que os rituais descritos nessa estela não pertencem aos

Mistérios de Osíris celebrados no mês de Khoiak. Segundo ele, os fatos

ocorridos lembram os rituais praticados por ocasião da morte dos primeiros

reis, os quais estão ali enterrados, além da ausência de Hórus, que

desempenha importante papel no drama como filho que vinga a morte do

pai. Gwyn Griffiths (1966, p. 93), porém chama atenção para o fato de que

no Festival de Osíris, conforme representado na estela de Ikhernofret, temos

o resquício de um período anterior, no qual Osíris é representado como um

chacal, e o deus chacal Wepwawet é tido como seu filho. E, conforme a

inscrição da estela, Wepwawet vai salvar o seu pai Osíris, dessa forma

estando ele no lugar que posteriormente será ocupado por Hórus.

Outras evidências do Médio Império são relevos e inscrições em

Abusir, Assiut, Assuan, Beni Hassan, El Bersheh, Dendera, Meir e Licht

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, pp. 58-59; MIKHAIL, 1984b, p. 28). O Papiro

Kahun menciona a celebração de dois Festivais de Sokar, sendo um no

quarto mês de Akhet, e a celebração do Festival no templo funerário do

Faraó, além de Mênfis. Nos “Textos dos Caixões” (fórmulas 419, 439, e 557)

temos à menção de que o Festival de Sokar está associado a Osíris:

Saudações para ti, Ó Osíris, pai dos deuses, no teu agradável dia do festival de Sokar! A população (rmT) observa-te, todo povo comum (rxyt) segue-te, todas as pessoas (pat) adoram-te.

(CT Fórmula 419)

No Novo Império as fontes que temos concentram-se nos templos da

região tebana, sendo a principal o relevo no templo funerário de Ramessés III

em Medinet Habu. O relevo está localizado no registro superior na parede

leste (correndo de oeste para leste) e no santuário de Sokar, na Sala 4, ao

norte da sala hipostila principal. O relevo está localizado no registro superior

da parede sul do Segundo Pátio e continua até a metade da parede leste

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(correndo de oeste para leste). Nele estão retratados os principais

acontecimentos do dia 26 de Khoiak, dia do Festival de Sokar40. Estes

relevos estariam baseados nos que deveriam existir no Ramsseum.

(GABALLA, KITCHEN, 1969, pp. 2 e 30) No santuário de Sokar da Sala 4, ao

norte da sala hipostila principal ainda temos a representação da barca

Henu. Provavelmente a barca de Sokar usada em sua procissão ficava neste

recinto e no mesmo eram realizadas as partes reservadas do festival.

(MURNANE, 1980, p. 28)

Em Karnak, no templo de Akhmenu, temos a representação da

renovação do rei divino e do rei identificado à Sokar passando por rituais

funerários (Tenda da Purificação e Abertura da Boca), e, na parede sul do

templo principal de Amun, temos o relevo mostrando Ramessés II

conduzindo a barca de Sokar diante de Ptah-Sokar-Osíris. No templo de

Sethi I em Abidos também encontramos cenas do puxar da barca Henu.

(GABALLA, KITCHEN, 1969, p. 30)

Além dos templos também temos representações da barca de Sokar e

sua procissão ou a Litania de Sokar em algumas Tumbas Tebanas (exemplos

são: TT 45, TT 50, TT 158). (GABALLA, KITCHEN, 1969, p. 33; MIKHAIL,

1984b, p. 28)

Uma vasilha de granito para terra

semeada, inscrita sob um rei da XXII

Dinastia em Koptos; um sarcófago de

Hawara com uma representação de um

Osíris germinando (Fig. 85); e o Papiro

Louvre 3176[s] são as fontes que temos do

Período Tardio. O papiro nos conta dos

acontecimentos ocorridos em Karnak dos

dias 16 ao 26 de Khoiak.

No Período Greco-Romano temos a assimilação total do Festival de

Sokar ao Festival de Osíris, tornando-se Sokar apenas uma forma de Osíris.

Neste período a principal representação encontra-se em Dendera, na capela

de Osíris no terraço do templo de Háthor. Ali temos uma lista com 16

40 Neste caso Sokar-Osíris

Figura 85 - Osíris germinando - Baixa Época, sarcófago Hawara

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224

cidades onde os mistérios eram realizados, estando Dendera fora dessa lista.

Este fato nos leva a pensar que a lista é de fato mais simbólica do que real,

fazendo uma associação com as 16 ou 14 cidades onde Ísis encontrou os

membros mutilados de Osíris (RAVEN, 1982, pp. 27-28). O ponto central do

texto está na fabricação das figuras de Sokar e Khenty-Amentet feitas de

uma mistura de grãos. Os relevos dos recintos interiores das duas capelas se

concentram principalmente nas cenas de ressurreição, enquanto que os

outros recintos representam a proteção de Osíris durante o embalsamento

(BRUGSCH, 1881; LORET, 1882, 1883, 1884; MIKHAIL, 1984a, p. 36).

Também possuímos os textos dramáticos representados durante o

festival. Estes se concentram no aspecto funerário do mito de Osíris e no

papel de Ísis e Néftis. “O Livro de Proteger a Barca do Deus” nos conta sobre

as lutas contra Seth na barca neshemet. Já “Os Guardiões das Horas” é a

descrição das 24 horas guarda da múmia de Osíris. E por fim temos as “As

Canções de Ísis e Néftis”, as quais representam o aspecto lírico das

performances. (MIKHAIL, 1984a, pp. 42-47)

13.2.2.1 Os Dias e Acontecimentos do Festival de Khoiak

O Festival de Osíris durante o mês de Khoiak foi celebrado por quase

toda a história egípcia, sendo a sua duração ampliada ao longo do tempo

devido a sua popularidade. Gaballa e Kitchen, levando em conta este

aumento de dias, propõem três fases históricas para o Festival de Khoiak:

Os assim chamados „Mistérios‟ atestados para Abidos no Médio Império, por exemplo, a estela de Ikhernofret (Khoiak „A‟), as celebrações do 18 ao 30 do 4ºAkhet atestados no Novo Império e no papiro de 300 a.C.41 (Khoiak „B‟) e finalmente, as celebrações mais estendidas de Dendera do 12 ao 30 sob os Romanos (Khoiak „C‟).

(GABALLA e KITCHEN, 1969:35)

Levando em conta o Festival de Sokar, poderíamos incluir uma fase anterior,

a qual levaria em conta o Festival de Sokar celebrado durante o Antigo

Império.

41 Papiro Louvre N.3176(s)

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Como já mencionado, o Festival de Sokar em seus primórdios está

associado ao Festival da Barca Maaty. Neste, era realizado um ritual de

capinar a terra com uma enxada, ou a abertura de um canal, ao final

ocorrendo a navegação numa barca. No dia 26 de Khoiak era realizada a

procissão de circundar os muros de um templo real (GABALLA, KITCHEN,

1969, p.13-19; GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, p. 55-56). O primeiro circuito

é feito por Sokar e sua barca, representando o rei morto que vai ao encontro

do céu, e, o segundo, pelo rei, assumindo o papel de Hórus como governante

na terra. Para Wilkinson (Apud GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, p. 56), esta

procissão estaria ligada a um antigo ritual de coroamento, destinado a

ilustrar a unificação do Alto e Baixo Egito.

Nas estelas do Médio Império (Khoiak „A‟), na ausência de datas

específicas, podemos dividir os mistérios de Osíris realizados em Abidos em

cinco atos principais, tendo como base a estela de Ikhernofret

(GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, p. 60-61; FRANKFORT, 1948, p. 203-204;

LICHTHEIM, 1973, pp. 123-125; MORET, 1927, p. 249-251):

1. Preparativos para o festival, em especial da barca neshemet, da

capela e da estátua de Osíris.

Eu dirigi o trabalho relacionado com a barca neshemet; Eu entalhei a cabine, Eu adornei o corpo do Senhor de Abidos com lápis-lazúli, malaquita, electrum e todos os tipos de pedras preciosas, dignas para adornar a carne de um deus. (Depois) Eu adornei o deus com a sua indumentária, no meu ofício de Chefe do Mistério. Meu ofício foi aquele de Sem (mestre das cerimônias rituais), para isto eu tenho mãos puras para adornar o Deus, Eu sou um Sem com dedos purificados.

(MORET, 1927, p. 250)

2. Procissão triunfal de Osíris acompanhado por Upwaut, repelência

dos rebeldes da barca neshemet.

Eu arranjei a Procissão de Upwaut quando ele foi defender (vingar, apoiar) seu pai. Eu repeli aqueles os quais se rebelaram contra a barca

neshemet e subjuguei os inimigos de Osíris.

(FRANKFORT, 1948, p. 203)

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3. “Grande Procissão”, momento no qual Osíris morre; sua tumba é

então preparada e ele é enterrado em Peker, onde ele recebe a coroa de

justificação.

Eu dirigi a Grande Procissão e acompanhei o deus em seu caminho. Eu fiz a barca divina navegar e Thot guiou a jornada. Eu adornei a barca, chamada “Ela que reluz para frente em verdade”, e o Senhor de Abidos com uma capela, e coloquei nele (Osíris) belas jóias quando ele foi para a localidade de Peker. Eu conduzi o caminho do deus para a sua tumba em Peker.

(FRANKFORT, 1948, p. 203)

4. Grande Batalha de Nedit, na qual Osíris é vingado.

Eu vinguei Unnefer, naquele dia da Grande Batalha, Eu subjuguei todos os adversários nas margens de Nedit e Eu o fiz conduzir a grande barca, a qual carrega sua beleza.

(MORET, 1927, p. 251)

5. Retorno triunfante de Osíris à bordo da barca neshemet para o seu

templo.

Eles viram a beleza da barca neshemet, assim que ela chegava em Abidos. Ela trazia [Osíris, Primeiro dos Ocidentais, Senhor] de Abidos para o seu palácio. Eu segui o deus para a sua casa. A sua purificação foi feita; seu trono foi feito espaçoso. Eu soltei o nó no ---; [ele veio descansar entre] seus [companheiros], seu séquito.

(LICHTHEIM, 1973, p. 125)

Nas fases denominadas por Gaballa e Kitchen como Khoiak „B‟ e „C‟, já

temos uma datação mais específica dos acontecimentos. O maior número de

dias em períodos mais recentes acaba em geral por implicar apenas no

prolongamento por mais dias de certos rituais. Devemos levar em conta que

às vezes certos registros nos parecem meio confusos, por não estarem de

com os demais ou por não sabermos o seu significado. Destacamos abaixo

os principais acontecimentos mencionados nos templos de Abidos, Dendera,

Edfu, Karnak, Koptos, Medinet Habu e nos Papiros Jumilhac e Louvre

N.3176(s)42.

42 Ver ANEXO I para os eventos praticados em cada localidade nos dias do Festival de Khoiak.

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No dia 12 de Khoiak, temos a “Grande Festa de Tena”, com a

cerimônia de lavrar e a semeadura. O material das figuras de Khenty-

Amentet e dos membros sagrados era preparado e colocado em moldes e, no

dia 14, dia da “Grande Festa Per-t”, eram preparadas as figuras de Sokar.

Ambas eram então irrigadas diariamente até o dia 24 ou 25, dependendo da

fonte (BRUGSCH, 1881, pp. 94-95; FRAZER, 1922, p. 376; LORET, 1884,

pp. 99-100; MIKHAIL, 1984, p. 32). Ao longo desses dias, diferentes

recitações rituais eram feitas para a proteção das figuras. No texto de

Dendera temos a menção de que no dia 19 a figura de Sokar era tirada do

molde, colocada num pedestal de ouro, coberta com um véu e então levada

para secar ao sol até o dia 23 de Khoiak (LORET, 1884, p. 101).

No dia 22 de Khoiak, temos a menção de dois importantes eventos: o

primeiro é a cerimônia de navegação de 34 barcas de deuses, feitas de

papiro, no lago sagrado iluminado por 365 luzes, na oitava hora da noite

(BRUGSCH, 1881, pp. 92-93 e 97; FRAZER, 1922, p. 376; GABALLA,

KITCHEN, 1969, p.38; LORET, 1884, p. 101). O segundo é a capinação da

terra, quando Osíris é vindicado ou justificado contra seus oponentes

perante o Grande Concílio (quatro deuses), na “Grande Capinação da Terra”,

quando a terra era capinada e fertilizada com o sangue de seus oponentes –

interpretados como os confederados de Seth, os quais assumiram a forma de

gansos (GABALLA, KITCHEN, 1969, p.39; MURNANE, 1980, p. 29).

No dia seguinte começava a preparação para o enterro. O corpo (inteiro

ou desmembrado) de (Sokar)Osíris deveria ser achado e/ou coletado,

trazendo-o de volta para o santuário Shetayet, e então seu embalsamento

por Anúbis era encenado ritualmente na Mansão de Ouro ou wabt. A

proteção do corpo de Osíris durante as horas vitais de embalsamento era

crucial e para estas eram devotadas as 24 horas do dia e da noite na “Vigília

das Horas”43 dos templos Ptolomaicos, que certamente tinha precursores

mais antigos. A figura deveria ser deitada no caixão, o qual deveria ser

mantido numa tumba temporária, e ritos de amortalhamento deveriam ser

praticados nas figuras do ano anterior. (GABALLA, KITCHEN, 1969, p. 40;

MIKHAIL, 1984, p. 32)

43 Ritual conhecido de forma geral na egiptologia pelo nome alemão de Stundenwachen.

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No dia 25 de Khoiak era celebrada a festa Netjeryt, cujo significado não

sabemos. Talvez reflita a restauração dos poderes divinos ou do status do

(Sokar) Osíris mumificado e enterrado. Neste dia ocorria a navegação de

Osíris a bordo da barca neshemet para Abidos. Nesta ocasião, os inimigos do

deus eram virtualmente exterminados. (GRAINDORGE, 1992, pp. 95-98)

Oferendas eram feitas para Ptah-Sokar-Osíris, e os participantes das

cerimônias matinais amarravam colares de cebolas em seus pescoços para

acompanhar Sokar em sua procissão dentro dos precintos do templo (Fig.

86). Textos como “seja triunfante, seja triunfante, Ó soberano” e o

“Processionário de Sokar” eram recitados enquanto a imagem de Sokar era

carregada. À noite, colares de cebola eram novamente utilizados, desta vez

nas capelas de tumbas em Tebas. (GABALLA, KITCHEN, 1969 pp. 43-44) Os

colares de cebola tinham o papel de limpar e purificar a boca do morto, ou

seja, iluminar a face do deus morto, quando ao alvorecer do dia seguinte o

Sokar-Osíris desmembrado se tornasse um Osíris solar (GRAINDORGE,

1992, p. 98).

Figura 86 - participantes do Festival de Sokar diante de colares de cebolas, os quais eram utilizados por estes no dia 25 de Khoiak -

Tumba de Rai (TT225)

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O dia 26 de Khoiak era o principal dia do Festival de Sokar. O único

dia que era considerado feriado, estando os demais dias ligados apenas a

rituais praticados nos templos (GABALLA, KITCHEN, 1969, p. 47). Nos

relevos do templo de Medinet Habu temos a representação mais completa

desse dia do festival. Todas as divindades do templo recebem o culto do

ritual matinal, e as oferendas são presenteadas aos ancestrais do faraó.

Ptah-Sokar-Osíris recebe uma oferenda maior que os demais. (Fig. 87) Em

seguida o rei oferece incenso para Khum presidindo sobre seus muros, e

Herremenwy-f(y) na Grande Mansão e Shesmu presidindo sobre a Per-Wer.

(Fig. 88) Estes deuses mênfitas tinham papéis de fertilidade e de guardiões

na renovação e proteção de Sokar-Osíris. Na Per-Henu, o sumo-sacerdote de

Ptah de Mênfis coloca a barca Henu sobre o seu trenó-mefekh. Em seguida

ocorria a performance da Litania de Sokar, invocando o deus em todas as

suas manifestações. (Fig. 89) Talvez ocorresse uma procissão até o terraço

do templo. Ao final acontecia a parte pública do festival, quando o rei, com a

ajuda de oficiais, dos filhos reais e de sacerdotes, puxa a barca Henu de

Sokar para circundar os muros do templo, seguindo-se talvez uma visita à

necrópole. (Fig. 90 e 91) Atrás da barca Henu seguiam sacerdotes

carregando o estandarte de Nefertum e outro estandarte menor de “Hórus

sobre a sua Haste de Papiro”. (Fig. 91) Em seguida, encontramos sacerdotes

incensando e fazendo libações pelo caminho, acompanhados por músicos e

seguidos pelas cinco barcas das deusas Háthor, “Wadjet”, Shesmetet, Bastet

e Sekhmet, cada uma acompanhada por um pequeno estandarte de

Nefertum e um sacerdote carregando um cesto com cinco gansos. Estas

eram seguidas por duas filas de sacerdotes com incenso, estandartes,

oferendas, bastões e símbolos. Após, vinham os quatro estandartes de

Wepwawet (um para o sul e outro para o norte), Khons, Hórus e Thot. Então,

por último, o primeiro dos sacerdotes-wab carrega um bastão, diante do

qual outros sacerdotes se ajoelham em adoração, enquanto o último

sacerdote da fila oferece incenso para o faraó (Ramessés III), seguido por

criados pessoais. (Fig. 92) (GABALLA, KITCHEN, 1969, pp. 48-52;

GRAINDORGE-HÉREIL, 1994, pp. 62-3, MURNANE, 1980, pp. 28-32)

Segundo Catherine Graindorge-Héreil (1994, p.63): “A aparição do deus

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Figura 87 - Ramessés III fazendo uma oferenda de alimentos para Sokar-Osíris. Atrás do deus estão sentadas: ―a Grande Enéade, a qual está na Shetayet‖ (em cima) e a ―Enéade residindo na Grande Mansão‖ (em baixo). (EPIGRAPHIC SURVEY, 1940, Plate 218 A)

Figura 88 - Ramessés III oferece incenso para Khnum presidindo sobre seus muros, Herremenwy-f(y) na Grande Mansão e Shesmu presidindo sobre a Per-Wer. (EPIGRAPHIC SURVEY, 1940, Plate 218 B)

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Figura 89 - Ramessés III recitando a Litania de Sokar diante da Barca Henu. (EPIGRAPHIC SURVEY, 1940, Plate 221)

Figura 90 - Ramessés III seguindo a barca Henu carregada por sacerdotes em procissão. (EPIGRAPHIC SURVEY, 1940, Plate 223)

Figura 91 - Ramessés III segurando a ponta de uma corda a qual é puxada por oficiais, príncipes e sacerdotes (direita) e grupo de sacerdotes carregando o estandarte de Nefertum seguidos por um sacerdote carregando o estandarte de ―Hórus sobre a sua Haste de Papiro‖ (esquerda). (EPIGRAPHIC SURVEY, 1940, Plate 224)

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sobre sua barca é semelhante àquela de Rê. Ele sai do Nun, ultrapassa a

porta do horizonte, torna-se Akty, aquele do horizonte.”

Nos próximos dias eram feitas oferendas para Ptah-Sokar-Osíris e

outros deuses, e no dia 30 de Khoiak eram conduzidos os ritos finais. O Pilar

Djed era erigido. O enterro final de Osíris, para se tornar rei do Mundo dos

Mortos, era realizado, deixando o governo terrestre para Hórus. Dirigiam-se

ao sepulcro sagrado, um recinto subterrâneo sobre o qual aparentemente

crescia um arvoredo de Pérsea. Entrando na câmara mortuária pela porta

ocidental, eles deitavam a figura do deus morto, que se encontrava dentro de

um caixão, reverencialmente na câmara sobre um leito de areia. Assim eles o

deixavam para o seu descanso e partiam do sepulcro pela porta oriental.

Parte da cerimônia consistia em conduzir bois e burros ao redor dos muros

quatro vezes. Não se sabe ao certo o significado deste ritual, talvez seja

algum antigo ritual agrícola, o qual foi osírificado. (FRAZER, 1922, p. 377;

GABALLA, KITCHEN, 1969, p. 72-73, LORET, 1884, p. 101; MIKHAIL,

1984a, p. 32; MIKHAIL, 1984b, p. 33 e MURNANE, 1980, p. 32)

O Papiro Jumilhac menciona que a cada dia entre 19 à 30 de Khoiak

uma parte do corpo de Osíris deve ser encontrada. Provavelmente este

papiro se refere a um ritual, o qual tem a intenção de recriar a busca de Ísis

pelo corpo esquartejado de seu marido por seu irmão Seth.

Como podemos observar nos fatos discutidos acima, as informações

que possuímos a respeito do festival concentram-se na fabricação das

figuras de Khenty-Amentet e Sokar e os rituais feitos para estas. O seu

significado não é apresentado pelas fontes, restando-nos apenas conclusões

hipotéticas. Mas, podemos observar que o festival representa os

acontecimentos do mito de Osíris: seu assassinato por Seth e seus

seguidores, a procura dos membros de seu corpo por Ísis, a restauração do

seu corpo por Anúbis, a vingança de Hórus contra os inimigos de seu pai e

por fim a volta triunfal de Osíris, o qual renasce como o senhor do Mundo

dos Mortos.

Alguns rituais, como capinar a terra e a procissão de circundar os

muros no dia 26 de Khoiak permanecem ao longo da história. Outros rituais

se modificam, mas é possível perceber semelhanças. Um exemplo é o dia da

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Grande Procissão em Abidos no Médio Império, e os fatos ocorridos no dia 23

de Khoiak no Novo Império, quando Osíris morre, os membros de seu corpo

são coletados e os rituais funerários são realizados. E o dia 24 de Khoiak,

que apresenta semelhanças com o dia do seu enterro em Peker. Desta forma

podemos ver nos rituais praticados em tempos mais recentes a influência

por um lado dos rituais praticados antigamente no Festival de Sokar em

Mênfis, e, por outro, a influência do Festival de Osíris praticado em Abidos.

Outro fator interessante é o aparecimento a partir do Novo Império de

símbolos ligados ao mito solar. Temos a presença do Benben, as sete barcas

das deusas na Procissão de Sokar no dia 26, as quais estão ligadas a Rê,

além de semelhanças simbólicas, como a aparição de Sokar sobre a sua

barca. A ligação de Sokar com o Sol se confirma no Período Greco-Romano,

quando Sokar (-Osíris) passa a ser conhecido como o “pequeno Sol”.

Autores do Período Greco-Romano, como Heródoto e Plutarco nos

relatam acontecimentos parecidos aos que observamos acima (navegação no

lago sagrado, acendimento de lâmpadas, fabricação de figuras), mas que se

realizavam em épocas diferentes do ano. Isto mostra a provável

popularização dos ritos de Osíris realizados durante o mês da Inundação,

sendo eles adotados em outros dias de festas que foram surgindo para

Osíris, ou mesmo independentes de Osíris.

13.2.2.2 As Figuras de Grãos do Festival

Como observado acima, durante o Festival temos a fabricação de dois

tipos de figuras segundo o Texto de Dendera: uma de Khenty-Amentet44 (Fig.

93) e outra de Sokar (Fig. 94). As primeiras deveriam ser feitas de areia e

cevada e as segundas deveriam ser feitas de uma mistura de pasta de

tâmaras, incenso, resina, terebinto, material aromático, e pó de pedras raras

combinadas com terra (BRUGSCH, 1881, p. 89-90). Mas o próprio texto

44 Mikhail considera que tais deuses devam ser considerados como formas de Osíris; certamente Gaballa e Kitchen têm a mesma opinião ao afirmarem que no Período Greco-Romano Sokar torna-se apenas uma forma de Osíris. Frazer é mais específico ao afirmar que o Texto de Dendera transmitia a natureza de Osíris em seu aspecto triplo como morto, sendo chamado de Chent-Ament (Khenti-Amenti) [Khenty-Amentet], como desmembrado, possuindo o nome de Osíris-Sep e, como reconstruído pela união de seus membros separados, sendo conhecido por Sokari (Seker) [Sokar].

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menciona existirem variações das figuras em outras localidades, algumas

inclusive tendo apenas um tipo (BRUGSCH, 1881, pp. 80-82).

Na cripta de Osíris no templo de Karnak, Henri Chevrier encontrou

figuras de Osíris semelhantes às descritas no Texto de Dendera no interior

de nichos sobrepostos em vários níveis. Os nichos continham em seu

interior selos do Faraó Nekau II, da XXVI Dinastia, indicando que as figuras

foram ali depositadas nos Festivais de Khoiak realizados durante o seu

reinado. As figuras consistem de um corpo de areia, coberto por duas

camadas de estuque, tendo a forma de um Osíris mumiforme usando a

coroa branca. Ao seu lado encontram-se quatro pequenas figuras

representando os filhos de Hórus, e um objeto ovóide, o qual lembra um

escaravelho. Ao que parece, todas as figuras estavam envolvidas em linho,

conforme indica a impressão na resina negra de cobertura e elas eram

revestidas por uma rede de contas de faianças pretas, vermelhas e verdes

entrelaçadas. (GRIMAL, LARCHÉ, 2007, pp. 25-31)

Das figuras de grãos encontradas nas necrópoles, as “Múmias-de-

Grãos” são as que mais se assemelham às figuras produzidas durante o

festival. Pelo seu conteúdo, elas são similares às de Khenty-Amentet. Mas

alguns exemplares encontrados contêm inscrições para Sokar-Osíris, além

dos caixões com cabeça de falcão. No Texto de Dendera, as figuras de

Khenty-Amentet deveriam ser colocadas num caixão mumiforme, com

cabeça humana usando o toucado tripartite, barba divina e mãos segurando

cetros. Detalhes comuns às figuras encontradas nas necrópoles, como

máscaras de cera, falo, cetros e os Filhos de Hórus não são mencionados no

Figura 94 - tumba figura de Sokar, sendo velada por Ísis (esquerda) e Néftis (direita) — Templo de Dendera

Figura 93 - preparação figura de Khenty-Amentet – Templo de Philae.

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texto. Além disso, o Texto de Dendera diz que as figuras deveriam germinar

após os nove dias em que foram irrigadas. Nas figuras encontradas, não há

nenhum sinal de que os grãos tenham brotado. (MIKHAIL, 1984a, p. 33;

RAVEN, 1982, pp. 28-30)

A partir da comparação das figuras de grãos encontradas nas

necrópoles e aquelas produzidas durante o festival (Tabela 3), podemos

chegar a três hipóteses possíveis a respeito. A primeira seria a de concordar

com a opinião de Frazer (1922, pp. 377-178) de que as figuras de grãos

encontradas nas necrópoles serem imitações daquelas produzidas durante o

Festival de Osíris para garantir ao morto a sua ressurreição. Isto incluiria

todos os tipos encontrados: “Camas de Osíris”, Ptah-Sokar-Osíris, “Múmias-

de-Grãos” e “tijolos de Osíris”. A segunda hipótese seria a de considerar as

figuras encontradas (em especial as “Múmias-de-Grãos”) como variações

locais, o que explicaria as diferenças encontradas. Como observado, o

próprio Texto de Dendera já nos aponta a existência de pequenas diferenças

na comemoração do Festival de Khoiak de uma cidade para a outra. A

terceira hipótese seria a proposta por Quack, feita a partir de uma

reinterpretação dos Textos de Dendera do Festival de Khoiak. Segundo ele,

para o ritual das cidades de Koptos e Sais, temos, no final, a instrução que

as figuras sejam jogadas na água: “No que se refere ao que é feito em Koptos,

assim é feito no dia 12 de Khoiak, da mesma forma em todas as coisas como

é feito em Abidos. Que seja jogado no lago sagrado desse nomo.” (QUACK,

2000/2001, p. 6) Essa representação ritual do afogamento de Osíris por

Seth seria uma explicação para o fato de não terem sido encontradas figuras

de grãos nas localidades próximas aos templos, onde o Festival de Khoiak

era realizado. Assim também ocorreria uma inutilização dos objetos rituais,

para que eles não pudessem ser utilizados por terceiros. (QUACK,

2000/2001, p. 5-18) As Camas de Osíris e as pseudo “múmias-de-grãos”

encontradas no interior das estátuas de Ptah-Sokar-Osíris certamente se

encaixam na primeira hipótese, pois essas foram encontradas no interior das

tumbas relacionadas com o morto.

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Camas de

Osíris

Ptah-Sokar-Osíris

Múmias-de-Grãos

Tijolos de Osíris

Festival de Khoiak

Khenty-Amentet

Sokar

Proveniência

Vale dos Reis

(Biban el-Muluk)

Necrópoles em todo

Egito

Wadi Qubbanet el-Quirud, Tihna el-

Gabal, Es-Sheik Fadl

e sítio desconhecido Médio

Egito

Wadi Qubbanet el-Quirud, Gebel el-Tarif e

possíveis outras

localidades Tebas

Ocidental

Dendera

Período Novo

Império

XXV Dinastia –

Período Ptolomaico

Período Tardio – Período Greco-

Romano

III Período Intermediá

rio – Período Romano

Greco-Romano

Materiais

Mistura de cevada

com argila ou areia

com terra

mistura de barro e grãos de trigo ou cevada.

terra (barro,

areia ou uma

mistura de ambos)

contendo numerosos

grãos de trigo.

mistura de terra e grãos

mistura de areia e

cevada

mistura de pasta

de tâmaras, incenso, resina,

terebinto, material

aromático, pó de pedras raras

combinadas com terra

Formas

Tabela 3 – Comparação das figuras de grãos

13.3 EXCEÇÕES

Acima pudemos observar que, pela regra, as estátuas funerárias de

Osíris têm em seu interior um papiro com a inscrição do “Livro dos Mortos”,

e as estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris têm em seu interior uma

pseudo “múmia-de-grãos”. Mas temos relatos de algumas estátuas que

contêm em seu interior um papiro com uma inscrição diferente daquela do

“Livro dos Mortos”, ou outro conteúdo, além das pseudo “múmias de grãos”.

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238

Na maioria desses casos, fica a dúvida se elas foram achadas em seu

contexto original com esse conteúdo ou se o mesmo foi ali colocado

posteriormente, por exemplo, por algum vendedor, na intenção de conseguir

um preço mais alto com a venda da estátua, ou ainda se a peça foi

examinada corretamente pela pessoa que publicou a informação.

Raven (1978-1979, p. 260) menciona a possibilidade de no interior das

figuras de Osíris do tipo 2.a ter existido um exemplar do “livro do Amduat”, o

qual fala da viagem do deus Sol pelas 12 horas da noite no Mundo Inferior.

Mas, em nota (n. 82), observa que este único exemplar descrito por

Wijngaarden (1932, nº 17), encontrado no interior de uma cavidade de um

Osíris da coleção do museu de Leiden, não pode ser identificado entre os

manuscritos pertencentes à coleção egípcia do presente museu. Talvez este

na verdade fosse um papiro mitológico, o qual misturava diferentes textos

funerários e estes muitas vezes acabam sendo denominados de Amduat. Um

desses papiros mitológicos é aludido por Piankoff e Rambova como tendo

sido encontrado no interior da estátua do sacerdote Ba(em)mut, uma figura

do tipo 2.a. (RAVEN, 1978-1979, p. 260)

Os Ensinamentos de Amenemope (BM EA 10474), um texto de

natureza não funerária é mencionado por Budge (apud RAVEN, 1978-1979,

p. 262) como tendo sido encontrado no interior de uma figura pintada de

Osíris, o qual pertenceria a Nakht. Ao mesmo morto pertencem dois “Livros

dos Mortos” (BM EA 10471 e BM EA 10473) encontrados no interior de uma

caixa de madeira. Pela natureza peculiar desse achado, talvez em algum

momento o presente papiro tenha sido trocado por um dos exemplares do

“Livro dos Mortos”, que demonstra ser o conteúdo mais condizente com a

estátua funerária de Osíris.

Na coleção do Egypt Centre em Swansea, temos um pedaço de uma

parte traseira de uma estatueta de madeira preta de um Ptah-Sokar-Osíris

com o toucado divino azul, que possui duas colunas com uma inscrição em

hieróglifos cursivos pretos sobre fundo branco e borda preta (W2051) (Fig.

95). Em seu interior foi encontrada uma figura feminina com braços

esticados ao longo do seu corpo, feita de linho e gesso, usando um vestido

azul claro e um toucado de um azul mais escuro (W2051a). Suas pernas

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estão quebradas e na cabeça possui

um furo de cerca de 4 cm,

provavelmente para o encaixe de uma

coroa (Fig. 96). Segundo Schoske

(2001, pp. 184-186), o vestido azul

remeteria a deusas ligadas ao céu, em

especial a Nut. Podemos aqui remeter

à deusa Nut representada na tampa

dos caixões para proteger a múmia do

morto, representando seu filho Osíris,

deitado logo abaixo. Assim, aqui essa

figura substituiria aquela das

“múmias-de-grãos”, mas da mesma

forma, esta ajudaria no renascimento

do morto.

Neste capítulo observamos ter ocorrido uma mudança no conteúdo das

cavidades das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Em um

primeiro momento temos um papiro do “Livro dos Mortos” no interior das

figuras de Osíris. Por volta da XXII Dinastia, quando este texto funerário cai

em desuso, as figuras de Osíris também irão ser substituídas por suas

similares, as estátuas de Ptah-Sokar-Osíris. Em seu interior não mais é

encontrado um papiro, mas sim uma pseudo “múmia-de-grãos”, a qual

lembra aquelas produzidas durante o Festival de Khoiak. Apesar dessa

mudança, percebemos que o seu propósito permanece o mesmo: o de ajudar

no renascimento do morto.

Figuras 95 e 96 – Verso da estátua de Ptah-Sokar-Osíris W2051 (esquerda), a qual continha em seu interior a figura feminina com vestido azul (W2051a) (direita) – Egypt Centre, Swansea

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CAPÍTULO 14. INSCRIÇÕES

Uma grande parte de estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris

contêm inscrições. Podemos observar que com o passar do tempo elas

tendem a ser maiores. Nas estátuas funerárias de Osíris temos em geral

apenas um coluna de texto na frente, com o nome de Osíris acompanhado

de seus títulos, ou o nome de morto, podendo ambas serem presididas pela

fórmula de oferendas. Nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, temos

os mesmos tipos de inscrições ou recitações, e invocações de maior

tamanho, e, no final da Baixa Época, temos o surgimento do hino a Ptah-

Sokar-Osíris.

14.1 LOCAL DAS INSCRIÇÕES

Nas estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, podemos

encontrar inscrições em diferentes regiões de sua anatomia. O mais comum

é a presença de uma coluna vertical na frente da figura, entre o colar e os

pés, e outra coluna no verso entre o final da aba do toucado divino e os pés.

Conforme o tipo e o período, o número de colunas pode aumentar e se

estender por outras localidades, como a base. Abaixo descrevemos os

possíveis locais de inscrições.

Frente – na frente da figura, entre o colar ou a iconografia abaixo

deste, e os pés, podemos encontrar de uma a nove colunas verticais com

inscrições. Nas estátuas funerárias de Osíris (tipos 1., 2. e 3.) e nas estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do tipo 4. e subtipos 5.a, 5. b e 6.a, este

número se restringe a uma coluna. Em algumas estátuas funerárias de

Osíris do tipo 1., a coluna com a inscrição pode-se estender acima do topo

da base. Nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos tipos 5.c, 6.b, 6.c,

7. e 8., o número pode variar, chegando até nove colunas, mas sendo o mais

comum uma coluna ou três colunas.

Verso – na parte de trás da figura, muitas vezes sobre um pilar dorsal,

entre o final da aba do toucado divino e o calcanhar podemos encontrar de

uma a três colunas verticais com uma inscrição. Geralmente estas são uma

continuação do texto da frente. Nas estátuas funerárias de Osíris, ela

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raramente é encontrada; quando presente, há apenas uma coluna. Nas

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do tipo 4., ela também se restringe

a apenas uma coluna vertical e, nos demais tipos de Ptah-Sokar-Osíris, este

também é o número mais comum de colunas quando presentes.

Laterais do Plinto – no plinto, uma inscrição pode estar presente em

todos os seus lados, todos os lados menos a frente, apenas na frente ou só

no verso. Esta pode ser uma continuação da inscrição do verso, e pode ser

encontrada nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris dos subtipos 5.c,

6.b., 6.c. e tipos 7. e 8..

Topo da Base – em geral nestas podem ser encontradas linhas

transversais na frente da figura, voltadas tanto para a figura, quanto para o

espectador, ou até sete colunas verticais, também na frente da figura.

Algumas vezes a inscrição se alterna entre colunas e linhas, ocupando os

espaços vazios ao redor da figura e da tampa da cavidade no topo da base,

quando presente. As inscrições no topo da base são encontradas com maior

freqüência nos exemplares pertencentes ao final da Baixa Época e início do

Período Ptolomaico.

Laterais da Base – essa inscrição consiste em um texto que se inicia

na frente e corre em sentido horário ao redor das demais laterais da base.

Assim como as inscrições no topo da base é a inscrição é encontrada

especialmente nos exemplares de estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris

pertencentes ao final da Baixa Época e início do Período Ptolomaico.

14.2 TIPOS DE INSCRIÇÕES

Por excelência as estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris

com inscrições estão dotadas do nome do morto, acompanhado de suas

funções em vida e do título Justo de Voz, que demonstrava que o mesmo

havia sido aprovado no julgamento do tribunal de Osíris. O nome é

acompanhado por uma série de outras inscrições, muitas das quais típicas

de objetos funerários. As mais comuns são mencionadas abaixo por nós.

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14.2.1 Proscinema

O proscinema ou a fórmula de oferendas é a inscrição encontrada com

maior freqüência nas estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Ela

aparece em sua forma tradicional: Htp di nsw, “Uma oferenda que o rei faz” no

início da inscrição da coluna da frente, do verso ou ao redor da base. A

mesma é ofertada para Osíris ou suas formas sincréticas tardiamente,

acompanhado de seus epítetos de “Primeiro dos Ocidentais, Grande Deus,

Senhor de Abidos”. Após o nome de Osíris podem seguir aqueles de outros

deuses ligados ao ciclo de mitos osíriacos: Ísis, Néftis, Hórus, Anúbis e os

Filhos de Hórus. No pilar dorsal ela também pode estar endereçada ao deus

Rê-Horakhty (RAVEN, 1978-1979, p. 275). Após o nome dos deuses pode ou

não seguir a formula di.f prt-xrw, “que ele possa dar uma prece de oferendas

de ...” com uma listagem de alimentos e objetos ofertados.

Como nas outras localidades e em objetos de templos e de contexto

funerário, a fórmula tem a função de que as oferendas feitas pelo faraó para

os deuses fossem revertidas em favor do morto, garantindo o seu sustento

na outra vida. Devemos lembrar aqui que a mesma muitas vezes sendo

recitada para o morto por um familiar seu, era feita em nome do rei, pois

este era o verdadeiro dono de todas as riquezas do Egito e, desta forma,

somente ele estava habilitado a fazer as oferendas necessárias para os

deuses. (BRANCAGLION JUNIOR, 2004, p. 119)

14.2.2 Recitação

Nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris, outra fórmula bastante

comum encontrada no início das inscrições é a recitação Dd mdw n, “Palavras

ditas por” faladas por Osíris, às quais se seguem seus epítetos, ou pelo

morto. Ela também pode preceder o Hino à Ptah-Sokar-Osíris ou o

proscinema.

14.2.3 Invocação do Morto

Com menos frequência que as duas anteriores, mas também bastante

comum, em especial nos exemplares mais tardios, são as invocações do

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morto: hA Wsir N, “Ó Osíris N” ou inD Hr.k Wsir N, “Saudações a ti, Osíris N”. A

última costuma anteceder o Hino à Ptah-Sokar-Osíris.

14.2.4 Hino a Ptah-Sokar-Osíris

No final da Baixa Época uma nova categoria de texto irá surgir nas

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris: o Hino à Ptah-Sokar-Osíris. Por

sua criação tardia, ele se restringe aos tipos encontrados neste período: 5.b,

5.c, 6.b, 6.c, 7. e 8.. Na versão completa, o hino costuma aparecer em três

colunas verticais na frente e uma coluna no verso ou vice-versa podendo

continuar no plinto (RAVEN, 1978-1979, p. 276). Segundo Raven (1978-

1979, p. 276), ele teria surgido em Assasif. O Hino a Ptah-Sokar-Osíris

inscrito em suas estátuas funerárias é o único hino conhecido em

homenagem ao presente deus.

Dd mdw in Wsir N: “inD Hr.k, iw’w pr m nTr pn, nxx pr m &m, Dt nTr ii.ti m wHm, nTr aA, HqA &A-wrt, xa m iAbt, HqA Igrt m ixxw. ii.n nTr aA pr m Hbbt. HqA.n.f pr im.f psD.f m Nwt m ¤AH, Smsw.f (m) nA ¢mw-wrD. rmn.f pt Haa.ti Xr nb.s imyw m hy sA-tA n kA n Wsir N. sA nb sA.f.”

Palavras ditas por Osíris N: “Saudações a ti, herdeiro que procedeu desse deus, saliva que procedeu de Atum, corpo divino o qual retornou, grande deus, governador do nomo Tinita, o qual surgiu das lágrimas do olho esquerdo, soberano do reino dos mortos no crepúsculo. O grande deus retornou, saindo das águas primordiais. Ele (já) vinha reinando quando ele surgiu delas. Ele brilha no céu como Orion, seus seguidores são as estrelas infatigáveis. Ele sustenta o céu o qual está alegre sob o seu senhor. Os habitantes estão em júbilo para o ka de Osíris N. Toda proteção é a sua proteção.

(RAVEN, 1978-1979, p. 277)

Como pode ser observado, o Hino à Ptah-Sokar-Osíris faz uma série de

referências ligadas aos mitos de criação. Temos a menção ao deus Atum, o

qual se autocriou saindo das águas do oceano primordial e posteriormente

criou os deuses a partir de sua saliva. Outra alusão à criação dos deuses é

através das lágrimas de deus. Raven chama a atenção para essas menções

nas estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris e observa a presença constante

da água nesses mitos de criação.

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“É evidente que esse longo texto cheio de associações mitológicas é da maior importância para entender porque estas estátuas eram parte do equipamento funerário padrão. Um ser divino é invocado, o qual é caracterizado como um deus primordial. Sua origem é referida de várias formas. Ele é o „herdeiro‟ de um deus ainda mais antigo; isso claramente indica o deus como da prole de Atum, entre cujos descendentes esse titulo foi a origem de tantas contendas. Depois ele é chamado de saliva de Atum, em outras palavras descendente de Shu, o qual foi criado dessa forma. Terceiro, ele se origina das lágrimas derramadas pelo olho esquerdo do céu, ou seja, da lua; este também é um modo comum de descrever a criação dos deuses e dos homens igualmente. Finalmente, do deus invocado é dito que tenha surgido das águas primordiais. Devemos observar que três desses quatro mitos de criação diferentes tem o elemento água em comum.”

(1978-1979, p. 280-281)

Ao final do Hino temos uma alusão ao destino estrelar do morto, aqui

temos a forma de Osíris como Orion, cujas bas dos mortos seguem na forma

das estrelas infatigáveis.

Assim, o Hino a Ptah-Sokar-Osíris representa o morto não apenas

ligado à (Ptah-Sokar-)Osíris, mas também ao deus-sol, ao qual aludem os

mitos de criação. Como pudemos ver nos capítulos anteriores, a menção a

ambos destinos do morto, osiríaco e solar, também está presente na

iconografia das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris nesse seu período

final de existência. Dessa forma, o conjunto da estátua representa o morto

como tendo sido bem sucedido no tribunal dos mortos, tornando-se um

Justo de Voz e posteriormente um Glorificado perante Rê, podendo

acompanhar o deus-sol em sua jornada diária pelos céus.

Após o hino ainda podemos ter a seguinte invocação: inD Hr.k PtH-¤kr nTr

aA nb ^Tt Wsir N anx.k Dt, “Saudações a ti, Ptah-Sokar, Grande Deus, Senhor da

Shetayet, Osíris N, possa tu viver eternamente”. Esta sentença, como o resto

do Hino, também alude ao morto como um ser bem-sucedido na sua jornada

para a outra vida, podendo assim viver eternamente.

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CAPÍTULO 15 - PROVENIÊNCIA

Ao observarmos o campo proveniência nas fichas do nosso catálogo de

referência, podemos ver que na maioria encontramos esse campo preenchido

com a palavra desconhecido. Quando preenchido ele geralmente remete à

origem provável, sendo mínimas as peças com uma proveniência exata.

Tal fator está ligado ao contexto da descoberta das estátuas funerárias

de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris. Primeiramente deve-se levar em conta que

muitas dessas peças foram descobertas no século XIX quando os registro

arqueológicos ainda não eram precisos. E, como objetos bastante apreciados

por colecionadores, muitas peças eram de propriedade particular antes de

serem doadas ou compradas por museus, perdendo-se a informação sobre a

sua proveniência.

Quando a origem está presente, em geral em relatórios de escavações

ou publicações mais recentes, muitas vezes temos a menção que uma

estátua funerária de Osíris ou Ptah-Sokar-Osíris foi encontrada, mas não há

maiores detalhes que permitam sua classificação. A partir de uma lista

elaborada por Raven com peças de proveniência conhecida (Anexo I), mas

sem uma tipologia, é possível observar que as estátuas funerárias de Osíris e

Ptah-Sokar-Osíris são encontradas em sepultamentos ao longo do território

egípcio. Em quantidades mais significativas, elas foram encontradas em

Tebas, El-Hiba, Abidos e Akhmin.

Das poucas peças do nosso catálogo com alguma referência quanto à

proveniência (Apêndice H), também temos um maior número de peças as

quais podem ser atribuída a Tebas (5 peças) e Akhmim (6 peças). Os outros

exemplares são originários de Dendera, Hissayeh, em Assuã, e Rifeh.

Pelas informações obtidas do nosso catálogo e da lista elaborada por

Raven, podemos observar a existência de uma maior concentração de peças

ao redor da região tebana e em Akhmim.

Observando as peças com tipos conhecidos, podemos ver que as

estátuas funerárias de Osíris aparecem quase que exclusivamente em Tebas

e em algumas outras cidades do Alto Egito. Este fato nos leva a acreditar em

uma origem tebana para as mesmas. As peças pertencentes à XXI Dinastia

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são a maioria. Destas um total de 77 figuras foram encontradas no Segundo

Cachette de Deir el-Bahari. Estas eram em sua maioria estátuas de Osíris de

verniz preto com um papiro em seu interior. Seus proprietários eram na

maioria membros do Templo de Amun, com títulos administrativos e

religiosos. (GRAJETZKI, 2003, pp. 94-95) Fora de Tebas, temos um exemplar

de estátua funerária de Osíris com um papiro em seu interior, com

proveniência atribuída à tumba G50 em Abidos (GRAJETZKI, 2003, p. 122),

e o exemplar do tipo 1., pertencente à Anhai [02], tem a sua origem atribuída

a Akhmim.

Quanto às estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris podemos observar

que elas encontram-se espalhadas por todo Egito. Isto demonstra que,

quando estas surgiram em substituição às estátuas funerárias de Osíris,

houve uma popularização das mesmas. O grande número de peças

atribuídas a Akhmim deve-se à menção dessa cidade na inscrição desses

exemplares, e à semelhança que muitas delas apresentam com os estilos de

caixões típicos dessa cidade na Baixa Época e início do Período Ptolomaico.

Referente à sua localização no interior da tumba, a mesma é

igualmente imprecisa. Sua localização original muitas vezes não é conhecida

devido ao costume dessa época de reutilizar tumbas antigas. Assim, o

contexto em que foram originalmente depositadas encontra-se perturbado.

Dos poucos relatos a respeito, temos indicações de que se encontravam nas

proximidades dos caixões ou em seu interior junto à múmia.

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CAPÍTULO 16. AS ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRÍS E

PTAH-SOKAR-OSÍRIS DA COLEÇÃO DO MUSEU

NACIONAL/UFRJ – RIO DE JANEIRO

A coleção egípcia do Museu Nacional/UFRJ no Rio de Janeiro possui

atualmente um exemplar de uma estátua funerária de Osíris e seis

exemplares de estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris. Elas foram

adquiridas em 1826, por D. Pedro I e José Bonifácio em um leilão do

comerciante italiano Nicolau Fiengo junto com outros artefatos egípcios para

integrar o acervo do então Museu Real (atual Museu Nacional). Essa coleção

foi trazida por Fiengo de Marselha, alegando ele serem as peças fruto do

trabalho do famoso negociante de antiguidades egípcias, Giovanni Battista

Belzoni. Belzoni, por sua vez, afirma serem as peças originárias de suas

“escavações” em Karnak, no “Domínio de Amun”, e na necrópole tebana. A

origem de parte desses objetos se confirma, pois eles pertenceram a

sacerdotes e funcionários tebanos. (BRANCAGLION JUNIOR, 2002, p. 155) O

estudo da coleção nos últimos anos vem demonstrando, porém que existem

peças provenientes de outras localidades, como estelas de Abidos

(BRANCAGLION JUNIOR, 2002, 157) e shabtis de Saqqara (GAMA, 2008, p.

216).

A primeira referência feita às estátuas funerárias de Osíris e Ptah-

Sokar-Osíris encontra-se nos catálogos45 elaborado sobre as coleções de

Arqueologia Clássica do Museu Nacional/UFRJ por Alberto Childe em 1920,

quando ele era curador da mesma. Neste, as estátuas são erroneamente

chamadas de “duplo (ka) osiriano” e atribuídas em sua maioria ao Novo

Império. A outra referência que temos a respeito delas encontra-se no

catálogo da coleção egípcia46 elaborada por Kenneth A. Kitchen em 1990.

Neste, elas estão agrupadas sob a denominação de estatuetas de Ptah-

Sokar-Osíris na categoria de bens funerários, sem maiores acréscimos.

45 Catálogo das Collecções de Archeologia Clássica do Muzeu Nacional. Rio de Janeiro: 1920 e Catálogo

das peças de Archeologia Clássica da IVª Secção Museu Nacional. Rio de Janeiro: 1920. 46 Catálogo da Coleção do Egito Antigo existente no Museu Nacional, Rio de Janeiro: Preparado com a

colaboração da Professora Maria da Conceição Beltrão. Warminster: Aris & Philips Ltd, 1990.

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Nestes catálogos estão incluídas dentre as estátuas funerárias de

Osíris e Ptah-Sokar-Osíris as peças de número de inventário 182 e 199. A

primeira foi excluída do catálogo por nós elaborado das presentes estátuas,

por termos chegado à conclusão de se tratar de uma estátua votiva de Osíris,

e não de uma estátua funerária de Osíris (ver abaixo). A segunda peça não

foi incluída no nosso catálogo do Museu Nacional/UFRJ por encontrar-se

desaparecida desde 1960 e pela falta de maiores detalhes a respeito. No

catálogo de Kitchen, a única informação que consta a respeito é a de que se

trata de “uma figura de madeira, pintada e gravada” (1990, p. 224)

Devido às informações quase nulas até agora publicadas a respeito das

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris pertencentes à coleção

egípcia do Museu Nacional/UFRJ e levando em conta a sua importância no

contexto funerário do final do Novo Império até o Período Ptolomaico,

decidimos fazer um estudo mais aprofundado das mesmas, o qual resultou

na presente dissertação de mestrado.

Todas as estátuas encontram-se em um estado precário de

conservação. O estuque com a pintura caiu quase por inteiro em todas as

estátuas, restando apenas alguns traços. A base de todas as estátuas e a

coroa Swty das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris estão faltando.

Mesmo com essas limitações, uma série de conclusões pode ser tirada das

mesmas com auxílio das informações registradas nos capítulos anteriores da

presente dissertação. As informações individuais a respeito de cada estátua

encontra-se no catálogo das mesmas no volume II e nas conclusões feitas

abaixo.

16.1 MN-1 (inv. 16)

Das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do Museu

Nacional/UFRJ, a de inv. 16 [MN-1] é a que preservou o maior número de

detalhes, permitindo uma reconstituição mais exata do que as demais peças.

Os restos de pigmentação apontam para uma estátua do tipo 5.c com a face

folhada a ouro e o tronco de fundo vermelho com uma rica iconografia. O

colar wsx n bik, com contas de diversos formatos, iniciando-se abaixo do fim

das abas do toucado divino e com terminais em formas de grandes cabeças

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de falcões é típico em objetos funerários do final da Baixa Época e início do

Período Ptolomaico. O escaravelho alado sustentando o disco solar,

encontrado abaixo deste também é típico da iconografia das estátuas

funerárias de Ptah-Sokar-Osíris desse período. A ponta das fitas que se

projetam abaixo do colar são uma indicação do cargo sacerdotal exercido

pelo dono da estátua. (figs. 97 e 98)

Como possui uma cavidade no pilar dorsal, dentro da qual se deveria

encontrar originalmente uma pseudo “múmia-de-grãos” alongada, a base

certamente era sólida. A mesma poderia possuir ao seu redor um friso com

hieróglifos decorativos, como nas estátuas de número [28] e [30] do catálogo

de referência, ou o padrão serekh, como na estátua de número [29]. No topo

da base poderíamos ter uma continuação da inscrição que originalmente

existia no tronco, como no Ptah-Sokar-Osíris de número [30], ou um lago

acompanhando o padrão serekh como na estátua de número [29].

16.2 MN-2 (inv. 17)

Exceto pelo toucado divino de uma coloração preta, não há vestígios de

pintura na estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris de inv. 17. Os traços de

seu rosto são bem definidos, possuindo um rosto com um leve sorriso e

grandes orelhas projetadas para frente. Os pés terminam quase rentes ao

plinto. Este conjunto de características demonstra o seu pertencimento ao

estilo do Período Saíta ou inicial, por volta do final da XXV Dinastia e início

da XXVI Dinastia, ou final da XXX Dinastia. (figs. 99 e 100)

Como a estátua é sólida, uma cavidade com uma pseudo “múmia-de-

grãos” em seu interior poderia estar localizada na base desaparecida.

16.3 MN-3 (inv. 140)

A presente peça tem como característica principal o fato de sua

pintura ter sido aplicada diretamente sobre a madeira. O toucado divino

apresenta restos de pigmentação azul, o rosto verde e o tronco vermelho. As

fileiras do colar wsx e o contorno da coluna para inscrição em um tom

vermelho escuro ainda são visíveis. A inscrição desapareceu por completo.

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Figura 97 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 16

(frente)

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Figura 98 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 16 (lado)

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Figura 99 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 17

(frente)

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Figura 100 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 17 (lado)

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Sua forma robusta e a face com as orelhas projetadas para frente são típicas

do Período Saíta. A combinação de todos esses traços visíveis aponta para

uma figura do tipo 4. pertencente à XXVI Dinastia. (figs. 103 e 104)

Como a estatua é sólida, uma cavidade com uma pseudo “múmia-de-

grãos” em seu interior poderia estar localizada na base desaparecida. Como

na maioria das estátuas do tipo 4. a base provavelmente era amarela, talvez

com uma borda preta nas laterais, como nos exemplares de [14] e [15] do

catálogo de referência. A tampa da cavidade poderia ser simples, como na

estátua funerária de Osíris [17], ou ter um falcão, como na peça [14]. A

coleção egípcia do Museu Nacional/UFRJ possui um desses falcões (inv.

106), o qual provavelmente representa o deus Sokar, e que servia como

tampa para a cavidade no topo da base das estátuas funerárias de Ptah-

Sokar-Osíris (figs. 101 e 102). Em geral os falcões costumam seguir a mesma

paleta de cores usada na estátua. O presente falcão também é vermelho

como o tronco da nossa estátua e proporcionalmente também poderia servir

de tampa. O único detalhe que talvez indique que o mesmo não pertencesse

à presente estátua, é que a pintura do falcão foi aplicada sobre uma fina

camada de gesso, enquanto a pintura da estátua foi aplicada diretamente

sobre a madeira.

Figura 101 – falcão provavelmente usado como tampa da cavidade na base das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris - Museu Nacional/UFRJ (inv. 106)

Figura 102 - falcão provavelmente usado como tampa da cavidade na base das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris - Museu Nacional/UFRJ (inv. 106)

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Figura 103 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 140 (frente)

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Figura 104 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 140 (lado)

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16.4 MN-4 (inv. 181)

A estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris de inv. 181

é a única na qual restou parte de uma inscrição (Pr. VIII A).

A mesma, em hieróglifos cursivos pretos, está localizada em

uma coluna na frente do tronco da estátua. A marca de

uma coluna no verso da estátua aponta para a existência

de uma possível continuação da inscrição nesta localidade.

Os hieróglifos restantes identificados por nós apresentam

pequenas diferenças em relação às observações dos

mesmos feitos por Kitchen (1990, p.203), como pode ser

visto na figura 105, a qual mostra ambas as interpretações

das mesmas. A seguinte tradução para a inscrição foi

proposta por Kitchen (1990, p. 224): “[Ptah-Sokar-]Osíris, o

chefe da província de Thinis, grande deus, Senhor de

[Abidos].”

Comparando a tradução proposta por Kitchen com as

inscrições de estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris de

outras localidades, a mesma mostra-se incorreta, até

mesmo inexistente. Pelo tipo de decoração da estátua, um

colar wsx simples, com uma coluna de inscrição na frente e no verso e um

tronco vermelho, a presente estátua se encaixaria nos tipos 4. e 5.b. Na falta

da cor da face, poderíamos supor pela forma arredondada de sua face com

orelhas grandes, típica das representações do Período Saíta, tratar-se de

uma estátua do tipo 4., de face verde, da XXVI Dinastia. Em todo caso

temos em primeiro lugar o fato de não haver nenhuma estátua funerária de

Ptah-Sokar-Osíris por nós conhecida na qual a inscrição inicia diretamente

com o nome de Ptah-Sokar-Osíris. O mesmo costuma aparecer mais a diante

nas inscrições. Aqui, supondo pertencer a presente estátua ao tipo 4., nas

mesmas as inscrições mais comuns encontradas são o proscinema, ou para

a recitação para Osíris ou para o morto, ou para ambos. No nosso caso, a

mesma dirige-se para Osíris, como pode ser observado pela presença de seu

nome, . Pelo tamanho do espaço acima do nome de Osíris, o proscinema

a b

Figura 105 - comparação da inscrição observada por Kitchen (a) e Bielesch (b) da estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181.

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parece mais viável. Abaixo do nome de Osíris temos o provável início de seu

epíteto de xnty Imntt (“Primeiro dos Ocidentais”), seguido daquele de nTr aA

(“Grande Deus”) e por fim resta apenas a palavra nb (Senhor). Estes apontam

para a sequência de epítetos de Osíris encontrados junto a seu nome nas

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris: “Osíris, Primeiro dos Ocidentais,

Grande Deus, Senhor de Abidos”. Assim, olhando o conjunto teríamos a

seguinte inscrição: Htp di nsw Wsir xnty Imntt nTr aA nb AbDw (Oferendas que o rei faz

para Osíris, Primeiro dos Ocidentais, Grande Deus, Senhor de Abidos). (figs.

106 e 107)

16.5 MN-5 (inv. 200)

A única estátua funerária de Osíris da coleção egípcia do Museu

Nacional [MN-5] é uma estátua do tipo 2.a de verniz preto. Originalmente

usava uma coroa Atf e uma barba divina. No interior da cavidade de seu

tronco volumoso possuia um papiro, provavelmente com a inscrição do

“Livro dos Mortos”. Este Osíris assemelha-se àqueles encontrados no

segundo cachette de sacerdotes de Deir el-Bahari. A partir da comparação

com estes, poderíamos datar a nossa estátua funerária de Osíris como

pertencente à XXI Dinastia e considerar que ele seja proveniente de algum

sepultamento de um sacerdote ou funcionário do templo de Amun, na região

de Deir el-Bahari. Outro fator que reforça o provável cargo de seu

proprietário é a grande quantidade de objetos pertencentes aos servidores do

deus Amun originários dos sítios arqueológicos da margem Ocidental de

Tebas. (figs. 108 e 109)

16.6 MN-6 (inv. 203)

A estátua de Ptah-Sokar-Osíris de inv. 203 apresenta uma forma

robusta, com um rosto arredondado, e com orelhas projetadas para a frente,

semelhante aos sarcófagos saítas. Da pintura restam apenas alguns traços

de tinta preta de duas fileiras do colar wsx e da borda da coluna para uma

inscrição na frente do tronco. Talvez ela fosse originalmente uma estátua do

tipo 4., devido a seus traços saítas, mas, na falta de maiores detalhes,

classificamos ela como sendo uma estátua do tipo 9. (figs. 110 e 111)

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Figura 106 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181 (frente)

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Figura 107 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 181 (lado)

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Figura 108 – reconstituição estátua funerária de Osíris inv. 200 (frente)

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Figura 109 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 200 (lado)

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Figura 110 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 203 (frente e verso)

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Figura 111 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 203 (lado)

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Como a estatua é sólida, uma cavidade com uma pseudo “múmia-de-grãos”

em seu interior poderia estar localizada na base, que desapareceu.

16.7 MN-7 (inv. 204)

A presente estátua de Ptah-Sokar-Osíris tem apenas vestígios de uma

pintura preta no toucado divino e na borda da coluna para inscrição na

frente e no verso do tronco. Uma peculiaridade que chama atenção é furo

quadrado para encaixe da coroa Swty (Pr. XVI B). Este tipo de furo não

redondo como nas outras estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris do

Museu Nacional/UFRJ é encontrado normalmente apenas em estátuas de

maior porte. Sua forma delgada lembra as estátuas do final da Baixa Época

e início do Período Ptolomaico, mas por falta de maiores detalhes

classificamos a mesma como pertencendo ao tipo 9. Na nossa reconstituição

representamos o presente Ptah-Sokar-Osíris usando um colar wsx n bik, o

qual normalmente é usado por estátuas desse período. Como a pintura

desapareceu por completo no local da disposição do colar, apenas podemos

supor o uso deste em comparação com outras estátuas do mesmo período

(tipos 5.c, 6.b, 6.c., 7 e 8).

Como a estátua é sólida, uma cavidade com uma pseudo “múmia-de-

grãos” em seu interior poderia estar localizada na base desaparecida. A

tampa da cavidade poderia ser simples, na forma de um falcão, de um falcão

sobre um sarcófago ou como um sarcófago na forma da capela Per-nu, como

optamos por ilustrar na nossa reconstituição. (figs. 112 e 113)

16.7 Osíris Votivo (inv. 199)

Esta estátua, a qual figura na lista de estátuas funerárias de Ptah-

Sokar-Osíris no catálogo de Kitchen (1990, p. 222), demonstrou, na análise

feita por nós ser na verdade uma estátua votiva de Osíris.

É uma estátua de um Osíris mumiforme, coberta por uma fina camada

de gesso. A coroa, originalmente uma Atf (orifícios para encaixe das plumas),

é preta e deveria ter um uraeus (orifício). A face era verde com olhos

originalmente incrustados. O tronco é branco e possui uma gola na parte de

trás. A mão esquerda está sobre a direita. Saindo de seus punhos serrados,

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Figura 112 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv.

204 (frente)

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Figura 113 – reconstituição estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris inv. 204 (lado)

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Figura 114 – Osíris votivo inv. 199 (frente)

Figura 115 – Osíris votivo inv. 199 (verso)

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Figura 116 – Osíris votivo inv. 199 (lado)

Figura 117 – detalhe rosto Osíris votivo inv. 199

Figura 118 – Detalhe mãos segurando cetros Osíris votivo inv. 199

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é possível ver o resto da pintura do cabo de dois cetros, provavelmente o

cajado e o açoite. Os pés estão faltando. (figs. 114, 115, 116, 117 e 118)

A coroa Atf é usada por estátuas funerárias de Osíris dos tipos 1. e 2.a

e b.. Como o presente Osíris votivo apresenta policromia, ele poderia ser

pensado primariamente como um Osírís do tipo 1. Mas essa possibilidade é

logo descartada quando observamos a forma de ambos. As estátuas

funerárias de Osíris do tipo 1. apresentam todas uma forma mais volumosa,

devido à cavidade tubular em seu tronco para conter o exemplar de um

papiro, como pode ser observado na Pr. XXV. O presente Osíris é sólido e

apresenta uma forma delgada em “v”, sendo mais largo em cima devido à

posição dos braços e mais fino em baixo. Essa forma também não aparece

em nenhuma outra estátua funerária de Osíris. Apenas a estátua funerária

de Ptah-Sokar-Osíris de Ankhpakhéred [46] apresenta tal forma, mas

estátuas de Ptah-Sokar-Osíris não usam a coroa atf, apenas a coroa Swty.

Outro detalhe inexistente nas estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-

Osíris é gola projetada nas costas.

A presente estátua provavelmente pertence ao final do Novo Império ou

início do III Período Intermediário. A partir deste período estátuas votivas

ofertadas aos deuses nos templos tornam-se bastante populares. Com o

aperfeiçoamento da técnica do bronze, a qual permitiu uma produção em

larga escala, estas se tornaram bastante populares. Entre estas encontramos

estátuas de Osíris semelhantes à estátua votiva de madeira de Osíris do

Museu Nacional/UFRJ. Para comparação apresentamos aqui como exemplo

dois Osíris de bronze pertencentes ao British Museum. O primeiro (BM EA

67159) foi encontrado em Saqqara e pertence à Baixa Época. O segundo (BM

EA 11054) pertence igualmente à Baixa Época. Podemos observar que eles

apresentam as mesmas formas da nossa estátua, com a mão esquerda

posicionada sobre a direita, em cujos punhos cerrados segura o cajado e o

açoite, sua mortalha possui uma gola e usa a coroa Atf (Fig. 119 e 120). Está

estátua ainda possui uma base de madeira semelhante àquela que

encontramos nas estátuas funerárias de Osíris. Esta comparação com as

estátuas votivas de bronze de Osíris reforça a hipótese de o presente Osíris

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da coleção do Museu Nacional ter sido ofertado em algum templo egípcio

como sinal de devoção ao presente deus.

Figura 119 – Osíris votivo de Bronze com base – Baixa Época, Saqqara –

British Museum (EA 67159)

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Figura 120– Osíris votivo de – Baixa Época, – British Museum (EA 11054)

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273

CONCLUSÃO

A presente dissertação centrada no estudo das estátuas funerárias de

Osíris e Ptah-Sokar-Osíris procurou elucidar a importância das mesmas no

contexto funerário egípcio, onde atuavam como um agente para o

renascimento do morto.

Apesar da sua importância para o equipamento funerário do final da

história do Egito antigo, não há quase publicações a respeito. No século XIX

juntamente com o início da egiptologia, são feitos os primeiros estudos a

respeito das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris, sendo um

dos principais resultados alcançados a separação entre estátuas de Osíris e

de Ptah-Sokar-Osíris. Na primeira metade do século XX elas praticamente

caem em esquecimento entre os egiptólogos, como podemos ver pelo fato de

que muitas obras a respeito dos aspectos funerários no Egito antigo sequer

as mencionarem. O trabalho mais completo a respeito e a principal

referência até os dias atuais é um artigo publicado por Raven em 1978-1979,

no qual este estabelece uma tipologia das estátuas. Posteriormente surgiram

alguns artigos apresentando estátuas inéditas e propondo correções na

cronologia de Raven. Na presente dissertação procuramos organizar as novas

informações divulgadas após a publicação do artigo de Raven e suprir em

parte a carência de publicações a respeito das estátuas funerárias de Osíris

e Ptah-Sokar-Osíris.

Como base para o trabalho foram usadas as estátuas funerárias de

Osíris e Ptah-Sokar-Osíris presentes na coleção do Museu Nacional/UFRJ

no Rio de Janeiro, e foi elaborado um catálogo de referência com exemplares

presentes nas coleções de diferentes museus ao redor do mundo. Uma nova

tipologia foi elaborada para incorporar as atualizações de forma organizada

naquela anteriormente elaborada por Raven.

As estátuas funerárias de Osíris surgiram dentro do contexto do

Período Pós-Amarniano, no qual há uma popularização dos ritos funerários

antes reservados ao faraó. Cenas de deuses, antes restritas às tumbas reais

começam a aparecer em tumbas particulares. Neste contexto, um deus em

particular ganha grande popularidade, Osíris. O desejo das pessoas passa a

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ser de ter o mesmo destino alcançado por Osíris e, como este, renascer no

Mundo dos Mortos, juntando-se a seus seguidores. Da mesma forma, a

literatura funerária, antes exclusiva dos monarcas, passa a ser usada por

pessoas comuns. Para passar a guardar o “Livro dos Mortos”, o principal

guia dessa jornada para o Outro Mundo, são criadas as estátuas funerárias

de Osíris. Assim, o “Livro dos Mortos” passa a ser guardado pelo Senhor do

Mundo dos Mortos, garantindo a sua eficácia na ressurreição de seu

proprietário.

Na XXI Dinastia, apesar da diminuição do equipamento funerário a

apenas alguns itens essenciais, as estátuas funerárias de Osíris continuam

a existir. Ao lado dos exemplares porta-papiro, os quais continuam sendo a

maioria, surgem outros exemplares sólidos com formas mais delgadas,

devido à ausência da cavidade. Uma grande quantidade de estátuas de

Osíris de Verniz Preto pertencentes a este período foi encontrada no cachette

de sacerdotes de Amun em Deir el-Bahari. No final da XXII Dinastia, com o

desaparecimento do “Livro dos Mortos”, as estátuas funerárias de Osíris

também desaparecem.

Por volta da XXV Dinastia as estátuas funerárias de Osíris reaparecem

reformuladas, intensificando seu simbolismo ligado ao renascimento. Agora

recebendo o nome genérico de estátua funerária de Ptah-Sokar-Osíris, o

papiro no interior de sua cavidade é substituído por uma pseudo “múmia-

de-grãos” semelhante àquela fabricada durante o festival de Khoiak. A forma

osiríaca é substituída pela saH e a coroa Swty usada junto com o toucado

divino torna-se o padrão, passando portanto a estátua a aludir a uma forma

divinizada do morto unificada com Osíris.

Entre o final da Baixa Época e início do Período Ptolomaico, a

iconografia das estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris torna-se mais

elaborada, incluindo uma série de novos símbolos e deuses, os quais atuam

na proteção e renascimento do morto. Nas inscrições, antes praticamente

restritas a fórmulas funerárias e recitações, temos a introdução do hino à

Ptah-Sokar-Osíris. Essa nova iconografia e inscrição não conectam o morto

apenas com um destino osiríaco, mas também solar. Assim, a estátua

funerária de Ptah-Sokar-Osíris passa a representar o morto como um

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vitorioso em todas etapas de sua jornada no pós-vida; ele se tornou um

Justo de Voz perante Osíris e um Glorificado perante Rê. Com a maior

helenização do contexto funerário ao longo do Período Ptolomaico, as

estátuas funerárias de Ptah-Sokar-Osíris começam a desaparecer, dessa vez

por definitivo.

Sendo o segundo tipo de estátuas a representação de uma forma

sincrética do deus Osíris, Ptah-Sokar-Osíris, foi feito um breve estudo sobre

o uso do termo sincretismo, tanto nas Ciências Humanas como um todo,

quanto na Egiptologia para ver se o presente conceito realmente se aplica a

este deus.

Em linhas gerais podemos resumir o sincretismo como uma conexão

que ocorre em especial entre línguas, culturas ou religiões, ou elementos no

interior destas, que a princípio não tinham nenhuma ligação entre si. Esta

conexão também pode ser desfeita a qualquer momento e não anula a

existência das línguas, culturas ou religiões originais, as quais continuam

existindo ao mesmo tempo.

Na Egiptologia em especial podemos dizer que o princípio geral sobre o

sincretismo no Egito antigo foi cunhado em 1939 pelo egiptólogo alemão

Hans Bonnet. Ele criou o conceito de “habitação” (Einwohnung), segundo o

qual um deus de caráter nacional habita outro de caráter local, assim

reforçando o poder do mesmo. Essa “habitação” poderia ser desfeita a

qualquer momento e não implicava na perda da independência dos deuses

envolvidos. Ao longo do tempo outros tipos de ligações entre os deuses

egípcios foram ressaltadas, mas o princípio da “habitação” se manteve

central em todas elas.

No caso específico do deus Ptah-Sokar-Osíris, o mesmo resulta de dois

processos sincréticos. Primeiramente temos uma ligação sincrética de

caráter local entre os deuses Ptah e Sokar, a qual ocorre no Antigo Império.

Esta reforça a influência desses dois deuses mênfitas. No Médio Império, na

intenção de reforçar o caráter funerário do deus Ptah-Sokar, Senhor das

necrópoles mênfitas, Osíris, o principal deus do Mundo dos Mortos na época,

“habita” este deus. Dessa forma Ptah-Sokar-Osíris é um deus que atua em

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todas as etapas da passagem do morto para a outra vida. Neste ciclo

regenerativo Ptah representa a criação, Sokar a metamorfose e Osíris o

renascimento.

Um ponto no qual não conseguimos fazer maiores avanços em relação

a Raven é sobre a proveniência exata das estátuas. Na publicação de novas

estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-Osíris encontradas nas últimas

décadas, em especial relatórios de escavação, muitas vezes a única

informação presente é a de que uma dessas estátuas foi encontrada, e não

uma descrição mais detalhada, como ocorre com outros objetos, o que

permite uma classificação da mesma. O local exato dentro da tumba

também não fica claro, devido ao contexto perturbado em muitos desses

casos, e devido a sua reutilização contínua ao longo de vários séculos, como

é típico nesse período final da história do Egito antigo.

Grande parte das peças usadas em nosso catálogo provém de coleções

muito antigas de museus, como é o caso dos exemplares do Museu

Nacional/UFRJ adquiridos no início do século XIX. Como é sabido,

antigamente informações como a origem exata da peça não tinham grande

importância, sendo ignoradas. As poucas peças por nós obtidas com uma

proveniência exata não permitiram a elaboração de uma tipologia por

origem, que pudesse ser aplicada a peças de proveniência desconhecida.

Esperamos que futuros trabalhos possam clarear essa questão, ampliando o

nosso conhecimento acerca das estátuas funerárias de Osíris e Ptah-Sokar-

Osíris.

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83. TOOLEY, Angela M. Osíris Bricks. Londres: JEA 82, 1996; plate XIII. 84. TOOLEY, Angela M. Osíris Bricks. Londres: JEA 82, 1996; plate XIII.

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Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 218 A)

88. EPIGRAPHIC SURVEY. Medinet Habu, Volume 4. Festival Scenes of Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 218 B)

89. EPIGRAPHIC SURVEY. Medinet Habu, Volume 4. Festival Scenes of

Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 221) 90. EPIGRAPHIC SURVEY. Medinet Habu, Volume 4. Festival Scenes of

Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 223)

91. EPIGRAPHIC SURVEY. Medinet Habu, Volume 4. Festival Scenes of

Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 224) 92. EPIGRAPHIC SURVEY. Medinet Habu, Volume 4. Festival Scenes of

Ramses III. Chicago: The University of Chicago Press, 1940, Plate 226)

93. MORET, Alexandre. Rois et Dieux d’Égypte. Paris: Librarie Armand Colin, 1925 (5ª edição); p.101.

94. MORET, Alexandre. Rois et Dieux d’Égypte. Paris: Librarie Armand

Colin, 1925 (5ª edição); p.101.

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Acesso em 06 jul. 2008.

97. Desenho da autora 98. Desenho da autora

99. Desenho da autora

100. Desenho da autora 101. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010.

102. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010

103. Desenho da autora 104. Desenho da autora

105. Desenho da autora

106. Desenho da autora 107. Desenho da autora

108. Desenho da autora

109. Desenho da autora

110. Desenho da autora 111. Desenho da autora

112. Desenho da autora

113. Desenho da autora 114. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010.

115. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010.

116. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010. 117. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010.

118. Autor: BRANCAGLION JUNIOR, Antonio. Data: jul. 2010.

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299

APÊNDICES

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300

APÊNDICE A – DIFERENTES FORMAS DE ESCRITA DO NOME

PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Escrita Nome Exemplo Local Aparição

1

Caixão de Denytenamun (XXI Dinastia – Tebas) – BM

EA 6660;

Caixão de uma mulher (XXII Dinastia) BM EA 6686;

Caixão Nesperennub (XXII Dinastia – Tebas) BM EA

30720 A;

Corredor B, parede direita KV 1 (XX Dinastia –

Tebas);

Parede sul, segunda Corte Medinet Habu

2

Livro dos Mortos Sérimen (XXI Dinastia – Tebas),

Louvre E 17400;

Primeiro Pilono, passagem entrada principal Medinet

Habu (XX Dinastia)

3

Medinet Habu (MH VI (1963), pl. 450)

4

Fuste coluna 37, colunata sul, segunda Corte

Medinet Habu

5

Estela Tjentwawanu (XXVI Dinastia – Tebas?) – BM

EA 35897

6

Caixão interno Taywheret (XXI Dinastia – Tebas) -

Cairo CG 61032

7

Abitz, König und Gott, S. 246, Nr. 141

8

Aposento D1, parede esquerda KV 11 (XX Dinastia –

Tebas)

9

Pilar 4 Camara Funerária J KV 9 (XX Dinastia –

Tebas)

10

Tábua Caixão de Pa-Miu (III Período Intermediário) –

Pelizaeus Museum inv. 3099

Estela Horakhbit (III Período Intermediário) BM EA

66424

11

Estátua Cubo Amenhotep Hoey (XVIII-XIX Dinastia)

- Rijsmuseum van Oudheden AST 13

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301

Fragmento torso estátua (Napata ou Meroítico –

Gebel Barkal) – Museum of Fine Arts Boston inv. 16-

3-204

12

Estela Príncipe Djad (II Período Intermediário – Gebel

Zeit) – Louvre C41

13

Estela Munique

14

Estela Príncipe Ahmose (XVII Dinastia) - BM EA

69673

15

Piankoff, Litany, 87 und 148

16

Stela de Tuthmosis (XVIII Dinastia) - KhM128

17

Estátua Familiar de Amenemheb (Período Pós-

Amarniano - Dira Abu el-Naga) - State Hermitage

Museum inv. 740

18

Livro dos Mortos de Anhay (XX Dinastia) – BM EA

10472,5

19

Medinet Habu (MH VIII (1964), pl. 521)

20

Estela Nespasekher (Período Ptolomaico - Tebas?) -

BM EA 3650

21

Estela Djasetyenhemet (Período Romano – Tebas?) –

BM EA 8486

22

Estela Pakapefhamentu (XXVI Dinastia – Tebas?) BM

EA 8476

Estátua Funerária Ptah-Sokar-Osíris Ankhpakhéred

(XXX Dinastia) – N 4131 A

23

Estela Nehemesratawy (Período Ptolomaico – Tebas?)

BM EA 8470

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302

APÊNDICE B – CORRESPONDÊNCIA NÚMERO CATÁLOGO E

NÚMERO DE INVENTÁRIO

MUSEU NACIONAL/UFRJ

Nº Catálogo Nº Inventário Nº Catálogo Nº Inventário

MN-1 16 MN-5 200

MN-2 17 (16) MN-6 203

MN-3 140 (135) MN-7 204

MN-4 181 (176)

CATÁLOGO DE REFÊRENCIA

Nº Catálogo Nº Inventário Nº Catálogo Nº Inventário

01 BM EA 9861 29 APM 00020

02 BM EA 20868 30 03.1625a-c

03 AH 11 31 15242

04 N 2873 32 BM EA 9753

05 N2872 33 BM EA 9773

06 19666 34 NMGM M11043

07 51.2099 35 E 18936

08 L1030:101 36 BM EA 9737

09 BM EA 9870 37 KhM 974

10 72.4076 38 19656

11 BM EA 9769 39 NMGM 13.12.05.34a

12 BM EA 22913 40 BM EA 9736

13 51.2090 41 KhM 976

14 KhM 977 42 15244/a

15 KhM 987 43 E.23.1887

16 KhM 3945 44 11268

17 72.4074a-c 45 KhM 984

18 JE 94511 46 N 4131 A

19 KhM 980 47 N 1997

20 MAL E 143 48 D96.a-c-1982

21 BM EA 47577 49 KhM 975

22 14334/

D 670; 22; 207

50 E 126

23 BM EA 16784 51 E.3.1907

24 MAL E 142 52 2514

25 N 3510 D, N 4021 53 RPM 1677

26 SAT 102 54 E 120

27 SAT 3707 55 BM EA 69672

28 D 2056

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303

APÊNDICE C - TABELA TIPOLOGIA

ESTÁTUAS FUNERÁRIAS OSÍRIS E DE PTAH-SOKAR-OSÍRIS RAVEN

Osíris Verniz Preto Osíris Policromado

PSO Face

Verde Ptah-Sokar-Osíris com Face Dourada

I A I B I C II A II B II C II D II E III IV A IVB IV C IV D IV E IV F

Ca

vid

ad

e Base

Tronco

Sólido

Co

nt.

Papiro

Múmia de Grão

Coroa

Toucado Divino Azul Azul Azul Azul Azul Azul Azul

Disco Solar

Pluma

Atf

hDt Br

Swty

pA-sxmty

Fa

ce

Barba Divina

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304

Cor Preto Preto Preto Verde Verde Verde Verde Verde Verde Ouro Am Ouro Ouro Ouro, Br ou Am

Ouro ou Am

Tro

nco

Braços cruzados

Mãos

Cajado e Açoite 2

Rede de Contas

Decoração

Colar

Plinto

Pilar Dorsal

Cor Preto Preto Preto Preto Br varia varia Br Vermelho Vermelho Preto

Fo

rma

Volumosa

Delgada

Base

Falcão

Caixão

Lo

cal

Insc

riçã

o

Frente 1 Col. 1 Col. 3 Col. 1 Col. 3 Col.

Verso

Pilar Dorsal 1 Col. 1 Col. 1 Col.

Plinto

Topo Base

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305

Laterais Base

Insc

riç

ão

Nome do Morto

Texto Religioso

Início LM 6

Hino PSO Início

Altura 43 cm (15 exempl. entre 26 e 59.5 cm)

56,5 cm (9 exemplares entre 38,5 e 76 cm)

58 cm (10 exempl.

entre 36 + x e 72.5

cm)

74 cm (12 exemplares entre 60 e 83 cm)

Datação

IA-C XXI Dinastia até início XXII Dinastia; I

A sobrevivendo até XXII Dinastia ou até

XXV Dinastia

Final XVIII Dinastia – XXII Dinastia

XXVI Dinastia, talvez um

pouco mais cedo

Criado por volta da XXV Dinastia e chegou até o Período Ptolomaico. IV A. ocorre em todos os períodos; IV B. no início, IV E possivelmente

apenas na XXX Dinastia, IV C., (IV D.) e IV F. são Ptolomaicos.

Observação Detalhes em pintura amarelo ou folhação Base Vermelha ou Amarela

Base Branca ou Amarela

Legenda:

possui pode possuir possui um dos itens indicados Br – branco Am - amarelo

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306

APÊNDICE D - TABELA NOVA TIPOLOGIA

ESTÁTUAS FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS

Osíris Ptah-Sokar-Osíris

Shabti Policr

omad

o

Verniz Preto Face

Verde

Face

Verde

Face Dourada Tronco

Branco

Folhado a

ouro Tronco Vermelho Tronco Preto

1. 2.a 2.b 2.c 2.d 3. 4. 5.a 5.b 5.c 6.a 6.b 6.c 7.a 7.b 8.a 8.b 10.

Ca

vid

ad

e Base

Tronco

Sólido

Co

nt.

Papiro

Múmia de Grão

Coroa

Toucado Divino Azul

Atf

hDt

Swty

Face

Cor Verde Preto Verde Verde Ouro Am Ouro Ouro

ou Am

Ouro, Br ou Am

Ouro ou Am

Br, Am ou Verm Ouro Preto

Barba Divina

Tro

nco Braços

cruzados

Mãos

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307

Cajado e Açoite 2

Rede de Contas

Iconografia

Colar

Plinto

Pilar Dorsal

Cor varia Preto verm varia Vermelho Preto Branco Ouro Preto

Fo

rma

Volumosa

Delgada

Base

Tam

pa Simples

Falcão

Caixão

Fris

o D

ecor

ativ

o

Liso

Contorno

Listras

Serekh

Símbolos

Insc

riç

ão Frente

Verso

Pilar Dorsal

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308

Plinto

Topo Base

Laterais Base

Insc

riç

ão

Nome do Morto

Proscinema

Recitação

Invocação

LM 6

Hino PSO

Datação

XIX– XXII

Dinastia

XXI-XXII Dinastia

2ª metade III

Período

Intermediário

XXV-XXVI Dinast

ia

XXV Dinast

ia-Períod

o Ptolomaico

XXX Dinastia-Período

Ptolomaico

XXX Dinastia-Período Ptolomaico

XXX Dinastia-Período

Ptolomaico

XXX Dinastia-Período

Ptolomaico

XXI-XXII

Dinastia

Observação

Base Verm

ou Am

Detalhes em pintura amarelo ou folhação a ouro

Base Br ou Am

pode

usar o Nemés

Observação: os tipos 9. e Misto não foram incluídos na tabela, pois podem apresentar diferentes características.

Legenda:

possui pode possuir possui um dos itens indicados Br – branco Am – amarelo Verm - vermelho

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309

APÊNDICE E – ESTÁTUAS COM COLAR wsx n bik

Fileiras Simples

Nº catálogo Tipo

22 Variante 5.b

26 5.c

31 5.b-c

41 7.a

47 7.b

Fileiras com contas de diversos formatos

Nº catálogo Tipo

19 5.a

23 5.c

24 5.c

25 5.c

27 5.c

28 5.c

45 5.c

29 5.c

30 5.c

32 5.b-c

36 6.b

37 6.b

40 6.b-c

38 6.c

39 6.c

42 7.a

43 7.a

44 7.a

46 7.b

48 8.a

49 8.b

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310

APÊNDICE F – ESTÁTUAS SEM BASE

Nº Catálogo Tipo

06 2.a

13 4.

16 4.

20 5.a

22 var. 5.b

23 5.c

27 5.c

32 5.b-c

33 6.a

47 7.b

52 9.

53 9.

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311

APÊNDICE G – FRISOS DECORATIVOS BASE

Liso

Nº Catálogo Cor Tipo

03 Amarela 1.

04 Amarela 1.

05 Branca 1.

07 Preta? 2.b

08 Preta 2.b

09 Preta 2.c

10 Preta 2.c

11 Preta 2.d

12 Branca 3.

18 Branca 4.

50 Sem pintura 9.

51 Branca 9.

55 Preta 10.

Liso com contorno

Nº Catálogo Cor Tipo

01 Amarela com contorno preto 1.

02 Preta com contorno amarelo 1.

14 Amarela com contorno preto 4.

15 Amarela com contorno preto 4.

21 Amarela com contorno preto 5.b

31 Branca com contorno vermelho 5.b-c

37 Branca com contorno vermelho 6.b

41 Branca com contorno vermelho 7.a

42 Branca com contorno preto e amarelo 7.a

45 Branca com contorno vermelho 7.b

Listras

Nº Catálogo Cor Tipo

17 Amarela e preta 4.

Serekh

Nº Catálogo Tipo

29 5.c

38 6.c

44 7.a

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312

Símbolos

Nº Catálogo Motivo Tipo

19 neb, ankh, was, métopa egípcia 5.a

25 métopa egípcia 5.c

28 neb, ankh, was, métopa egípcia 5.c

30 neb, ankh, was, métopa egípcia 5.c

36 métopa egípcia 6.b

39 neb, ankh, was 6.c

40 neb, ankh, was, métopa egípcia 6.b-c

43

frente: neb, wadjet, nefer, laterais: neb, ankh, was, verso: branco e contorno

vermelho todos os lados

7.a

46 neb, ankh, was, métopa egípcia 7.b

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313

APÊNDICE H – TOPO DA BASE

Falcão

Nº Catálogo Tipo

14 4.

21 5.b

31 5.b-c

42 7.a

43 7.a

44 7.a

Sarcófago com Falcão

Nº Catálogo Tipo

25 5.c

36 6.b

40 6.b-c

Simples sem Tampa

Nº Catálogo Tipo

18 4.

19 5.a

26 5.c

28 5.c

29 5.c

30 5.c

34 6.a

38 6.c

48 8.a

54 9.

Sarcófago

Nº Catálogo Tipo

35 6.a

37 6.b

39 6.c

41 7.a

46 7.b

Tampa Simples

Nº Catálogo Tipo

17 4.

49 8.b

50 9.

51 9.

Tampa faltando

Nº Catálogo Tipo

15 4.

45 7.b

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314

APÊNDICE I – TIPOS DE CAVIDADES

A. Cavidade tubular

no tronco

C. Cavidade na lateral da base

D. Estátua tipo

caixão

B. Cavidade

retangular no verso do

tronco

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315

G. Cavidade no

topo da base

F. Cavidade no

Pilar Dorsal

E. Cavidade

retangular no verso

do toucado divino

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316

APÊNDICE J – TABELA EVENTOS FESTIVAL DE KHOIAK

Localidade

Data Tumbas Tebanas

TT 50 Akhemenu Medinet Habu Dendera Edfu Koptos Pap.

Jumilhac Pap. Louvre N.3176(s)

12 de Khoiak

“Grande Festa de Tena”

Preparação material

figuras de Khenty-

Amentet e membros

sagrados e colocados em

moldes

Cerimônia de lavrar e

semeadura

Preparação material figuras

de Khenty-Amentet e membros

sagrados e colocados em

moldes

13 de Khoiak

Aguar os moldes

Aguar os moldes

14 de Khoiak

“Grande Festa Per-t”

Aguar os moldes

Preparação material figura

de Sokar

Aguar os moldes

15 de Khoiak

decoração do

caixão

aguar os moldes

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317

Preparação óleo para untar

figuras

aguar os moldes

16 de Khoiak

“Festa de Osíris Khenty-Amentet”

aguar os moldes

aguar os moldes

enfaixar e ungir a figura de

Sokar, dando ela a sua mãe

chegada de Hórus para ver

seu pai.

Hórus na forma de crocodilo

carrega o corpo divino de Osíris a ser deitado no

templo

procissão de Sokar

acompanhado de Anúbis, das imagens dos

deuses nos seus estandartes e os quatro obeliscos

Benben circundando o

templo e a necrópole

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318

17 de Khoiak

aguar os moldes aguar os moldes

18 de Khoiak

umedecer o grão

colocado em moldes para

Camas (“jardins”) de

Osíris

aguar os moldes aguar os moldes

recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama” Abertura do “repositório de Osíris”

19 de Khoiak

aguar e umedecer os

grãos dos moldes

aguar os moldes

aguar os moldes

Procurar a cabeça de

Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama” Secar e incensar

as figuras de Sokar

20 de Khoiak

Aguar e umedecer os

grãos dos moldes

aguar os moldes

aguar os moldes

procurar os olhos de Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama” Confeccionar uma peça de

tecido

21 de Khoiak

Aguar e umedecer os

grãos dos moldes

início Festival de Ptah-

Sokar-Osíris com o “Dia de

abrir a abertura no Santuário Shetayet”

tirar figuras de Khenty-

Amentet, Sokar e membros

sagrados dos moldes e

transportar para o seu local

de enterro

aguar os moldes

procurar a boca de Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama”

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319

tecer um pedaço de tecido

22 de Khoiak

Aguar e umedecer grãos dos moldes

Capinar a terra

Capinar a terra

cerimônia de navegação de 34

barcas de deuses no lago

sagrado iluminado por 365 luzes na

oitava hora da noite

Aguar os moldes

Procurar o pescoço/ os

braço de Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama”

“Grande Capinação da

Terra"

23 de Khoiak

Aguar e umedecer grãos dos moldes

Dia de libação

Preparar (fazer) o

caminho para o santuário

Shetayet

preparação para o enterro, devendo a

figura de Sokar ser deitada no caixão, o qual

deveria ser mantido numa

tumba temporária

aguar os moldes

Procurar as vísceras de

Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama”

dia de procurar e/ou coletar o corpo

(inteiro ou desmembrado)

de Osíris, trazendo-o de volta para o

santuário para ser

embalsamado por Anúbis, encenado

ritualmente na Mansão de

Ouro

ritos de amortalhamento das figuras do ano anterior

rituais realizados sobre

os vasos canopos

24 de Khoiak

aguar e umedecer grãos dos moldes

procissão de Sokar-Osíris parando na entrada do vestíbulo do Akhmenu

dia de colocar Sokar em seus

centros

Ao anoitecer colocar a figura de Osíris em um

caixão de madeira de amoreira no

Festa de Hórus, o que resgatou as mortalhas de seu pai

procissão das figuras

Procurar os intestinos de

Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama”

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320 para: a litania de oferendas, incensamento,

libação, “massacre dos

inimigos”, e recitação dos

rituais: “Entrada de

Osíris”, “Proteção da

Cama”, “Adoração de

Osíris” e “Grande

Abertura da Boca na Casa

de Ouro”

túmulo procissão de Sokar-Osíris parando na entrada do vestíbulo do Akhmenu

para: a litania de oferendas, incensamento,

libação, “massacre dos

inimigos”, e recitação dos

rituais: “Entrada de

Osíris”, “Proteção da

Cama”, “Adoração de

Osíris” e “Grande

Abertura da Boca na Casa

de Ouro”

Na 9ª hora da noite remover a

figura depositada no ano anterior e coloca-la sobre

ramos de sicômoro.

Procissão de Sokar

acompanhado de Anúbis, das imagens dos

deuses nos seus estandartes e os quatro obeliscos

Benben circundando o

templo e a necrópole

Retorno ao santuário de

(Sokar-) Osíris com um ritual

das “Duas Irmãs” lido duas vezes

Retorno ao santuário de

(Sokar-) Osíris com um ritual

das “Duas Irmãs” lido duas vezes

rituais realizados sobre os vasos

canopos

À noite procissão para o topo do lago sagrado, onde eram entoados

os ritos da “Navegação de

Osíris” e

A noite procissão para o topo do lago sagrado, onde eram entoados

os ritos da

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321 “Navegação de

Osíris” e “Abertura das

Portas da barca

Neshemet”

“Abertura das Portas da

barca Neshemet”

sacerdotes acompanham o retorno de

Sokar-Osíris à Mansão de

Sokar através da grande sala

hipostila de Karnak

Sacerdotes acompanham o retorno de

Sokar-Osíris à Mansão de

Sokar através da grande sala

hipostila de Karnak

25 de Khoiak

festa NTryt

aguar e umedecer grãos dos moldes

festa NTryt

Rituais realizados sobre

os vasos canopos

procissão de Sokar ao

santuário de Hórus

ritos finais no terraço

Procurar os pulmões/o

falo de Osíris

Recitação de hora em hora

do ritual “Proteção da

Cama” À noite uso de colares de cebolas nas capelas das tumbas

tebanas

festa NTryt

26 de Khoiak

todas divindades do

templo recebem o

culto do ritual matinal e as

oferendas são presenteadas aos ancestrais

do faraó

rituais realizados sobre

os vasos canopos

Dia de oferendas à

Osíris, trazer um

burro selvagem, matá-lo, matar

Apophis e oferecer aos

mortos

ritos finais no terraço

procurar as coxas/ as pernas de

Osíris

―União com o disco solar”

(Xnm-itn),

procissão para a tumba

rei oferece incenso para

Khum presidindo sobre seus

muros, Herremenwy-f(y) na Grande

procissão de Sokar

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322 Mansão e Shesmu

presidindo sobre a Per-

Wer

Na Per-Henu, o sumo-

sacerdote de Ptah de Mênfis coloca a barca

Henu sobre seu trenó-mfx

performance da Litania de

Sokar

procissão pública da

barca Henu de Sokar para

circundar os muros do

templo seguida pelo Faraó, por

sacerdotes e pelos deuses.

27 de Khoiak

Festival de “untar a Enéada”,

oferendas para “Ptah-Sokar-Osíris e sua

Enéada”

rituais realizados sobre

os vasos canopos

Procurar as pernas/ os dedos de

Osíris

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323

28 de Khoiak

oferendas para Ptah-Sokar-Osíris e sua Enéada no

“dia de puxar enfrente o Benben

rituais realizados sobre

os vasos canopos

Procurar o falo/ os

braços de Osíris

29 de Khoiak

evento

danificado

rituais realizados sobre

os vasos canopos

Procurar o coração de

Osíris

30 de Khoiak

ereção do Pilar Djed

ereção do Pilar

Djed

“Festa da Lavragem da

Terra”

Procurar os braços de Osíris/ os filhos de Hórus

dia do enterro das figuras

feitas no ano anterior

dia do enterro das figuras

feitas no ano anterior

ereção do Pilar Djed

ereção do Pilar Djed

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324

APÊNDICE K – PEÇAS DO CATÁLOGO DE REFÊRENCIA COM

PROVENIÊNCIA CONHECIDA OU PROVÁVEL

Proveniência Nº Catálogo Tipo

Akhmim 48 8.b

Akhmim (?) 02 1.

23 5.c

38 6.c

42 7.a

43 7.a

Dendera (?) 30 5.c

Tebas

Asasif

55 10.

40 6.b-c

Tebas (?) 07 2.b

08 2.b

09 2.c

Hissayeh, Assuã 39 6.c

Rifeh 51 9.

Legenda: (?) – proveniência suposta

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325

ANEXOS

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326

ANEXO A – PROVENIÊNCIA CONHECIDA DE ESTÁTUAS

FUNERÁRIAS DE OSÍRIS E PTAH-SOKAR-OSÍRIS ANALISADAS POR RAVEN (1978-1979, pp. 291-292)

Lista de proveniência organizadas do Norte para o Sul

Sítio Publicações Número de Exemplares

Saqqara perto do Serapeum Basta 18, pls. VIII-IX 1 Saqqara perto da Pirâmide de . Userkaf

Khouly no. 71 1

Kafr Ammar tumba KA 34 Petrie/Mackay 35, pl. XXIX.4-6 6

Abusir el-Malaq Rubensohn/Knatz 6, 7, 15, figs. 5, 12 Möller/Scharff 104, pl. 78c

3+x 2

Sidmant el-Gabal Edinburgh reg. no. 1910.111.2&A 1

El-Hiba Ranke 1926, 50 Botti 1958, 173-184, pls. LI, LIII Bosse-Griffiths 101

1 35 (1)

Beni Hasan Garstang figs. 216, 218-219 2

El-Barsha Edinburgh reg. no. 1911.259 1

Dairut Kamal 1914, 60-61 2

Assiut Deir Dronka Kamal 1916, nos. 87, 95-97 4+x

Akhmin atribuído Budge 1893, nos. 15, 308 Price nos. 2063-2065 Budge 1925, 383-384 Daressy 1928, 11

2 3 x 2

Akhmin atribuído pelas inscrições Budge 1896, no. 30 Leiden inv. no. F 1961/12.2

1 1

Abidos tumbas G 50, 57, 61 Petrie 1902, 35-36, 38-39, pl. LXX 7 Abidos tumbas G S620, X7, R4 Peet 94-95, pl. XXXIX.1-2 5 Abidos atribuído Budge 1896, nos. 29, 31-32, pl. V 3

Tebas Qurna Petrie 1909, 15, pls. VIII, LIII 2 Tebas Cachette Real Edwards, A.B., 87

Maspéro 1889b, 592-594 (1) 7

Tebas Cachtte de Sacerdotes Daressy 1900, 144 Daressy 1902, 160 Daressy 1907, 3

77 (1)

Tebas outras tumbas Deir el-Bahri Winlock 1924, 28, fig. 26 Winlock 1928, 24, fig. 27 Winlock 1929, 19, fig. 21 Winlock 1930, 20-21, fig. 26 Winlock 1932, 82, pls. VII-VIII

6 1 1 (1) (1)

Tebas perto do Ramesseum Edinburgh reg. no. 1956.287&A 1 Tebas El-Asasif Bietak 32-33, pl. XVIIIb 2 Tebas Gabal Sheikh Abd el-Qurna Mond 99

Collins 35, 38 1 3

Tebas atribuído Budge 1899, 1, 19-20 Budge 1923, 9

2 1

Tebas atribuído pelas inscrições Champollion no. U 19 Rossi/Lanzone nos. 2470, 2479, 2483 Maspéro 1889a, no. 71 Budge 1898, 86 (BM 9736) Wijngaarden 1932 nos. 1, 4, 5, 9, 16, 24, 29, 34, 36

1 3 1 1 9

Nag el-Hissaya Gray/Slow 38, fig. 67 1

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327

Assuan Qubbet el-Hawa Cecil 1903, nos. 6, 19, 21 Cecil 1905, no. 31 Edel 93

3+x x

1+x

Referências utilizadas por Raven:

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at Saqqara. ASAE 59, 1966, pp. 15-22.

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