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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE ANDRÉA MARIA SARMENTO MENEZES MEMÓRIA GERACIONAL E RISCOS AMBIENTAIS NO SÉCULO XXI São Cristóvão Sergipe 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

ANDRÉA MARIA SARMENTO MENEZES

MEMÓRIA GERACIONAL E RISCOS AMBIENTAIS NO SÉCULO XXI

São Cristóvão – Sergipe

2013

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ANDRÉA MARIA SARMENTO MENEZES

MEMÓRIA GERACIONAL E RISCOS AMBIENTAIS NO SÉCULO XXI

Dissertação apresentada como requisito parcial

para obtenção do Título de Mestre pelo Núcleo de

Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio

Ambiente da Universidade Federal de Sergipe.

Área de Concentração: Desenvolvimento

Regional.

ORIENTADOR: Prof. Dr. Antônio Vital

Menezes de Souza.

São Cristóvão – Sergipe

2013

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

Menezes, Andréa Maria Sarmento

M543m Memória geracional e riscos ambientais no século XXI / Andréa Maria Sarmento Menezes ; orientador Antônio Vital Menezes de Souza. – São Cristóvão,

2013. 131 f. : il.

Dissertação (mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) – Universidade Federal de Sergipe,

2013.

O 1. Riscos ambientais. 2. Memórias geracionais. 3.

Futuro. I. Souza, Antônio Vital Menezes de, orient. II.

Título.

CDU: 504.4”20”

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ii

ANDRÉA MARIA SARMENTO MENEZES

MEMÓRIA GERACIONAL E RISCOS AMBIENTAIS NO SÉCULO XXI

Dissertação apresentada como exigência parcial para a obtenção do Título

de Mestre ao Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente da

Universidade Federal de Sergipe, vinculado ao Programa Regional de Pós-

Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente- PRODEMA, Área de

Concentração: Desenvolvimento Regional.

Aprovado (a) com média: _________________

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________

Antônio Vital Menezes de Souza, Doutor em Educação.

Universidade Federal de Sergipe - UFS/ PRODEMA

Orientador

_____________________________________________________________

Maria José Nascimento Soares, Doutora em Educação.

Universidade Federal de Sergipe - UFS/PRODEMA

1º Examinador

_____________________________________________________________

José Mário Aleluia Oliveira, Doutor em Educação.

Universidade Federal de Sergipe – UFS/DED

2º Examinador

São Cristóvão (SE), 20 de Dezembro de 2013.

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iii

Este exemplar corresponde à versão final de Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento e

Meio Ambiente.

______________________________________

Prof. Dr. Antônio Vital Menezes de Souza

Orientador – Universidade Federal de Sergipe

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iv

É concedida ao Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da

Universidade Federal de Sergipe permissão para disponibilizar, reproduzir cópias, emprestar

ou vender tais cópias desta dissertação.

______________________________________

Andréa Maria Sarmento Menezes

Universidade Federal de Sergipe

______________________________________

Prof. Dr. Antônio Vital Menezes de Souza

Orientador – Universidade Federal de Sergipe

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v

Dedico este trabalho ao meu filho

Rodrigo com muito amor.

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vi

AGRADECIMENTOS

Para a realização desta dissertação, pude contar com o apoio e ajuda de algumas

pessoas. A essas pessoas presto os meus agradecimentos:

À família pela compreensão nos momentos de ausência. A Ricardo e ao meu filho

Rodrigo, pelo carinho e ternura, fontes de inspiração em minha vida.

Ao professor Doutor Antônio Vital, orientador, pelo apoio, compreensão e,

principalmente, por dividir comigo seus conhecimentos.

A todos os professores do PRODEMA pelo conhecimento transmitido e pelas

discussões enriquecedoras;

Aos colegas do Grupo de Pesquisa em Tecnologias Intelectuais, Mídias e Educação

Contemporânea - SEMINALIS, pelas discussões fecundas.

Aos colegas da turma 2012, em especial, às amigas Roseanne, Ana Maria e Danielle

pela amizade e dedicação nos trabalhos desenvolvidos em equipe;

Ao corpo administrativo, Najó, Val, Luzia pela presteza no atendimento às minhas

solicitações;

Aos colegas do Departamento Financeiro (DEFIN/UFS) - Carminha, Jussara, Adriana

- em especial, aos da Divisão de Contabilidade (DICON/UFS) Magno, Bruno, Clara, Rosana,

Maurício, Albérico, Marcel, Cristiane, que nunca se opuseram em ajudar-me nos momentos

difíceis.

A todos, meus sinceros agradecimentos.

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vii

Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo claro e brevemente? [...]

e que modo existem aqueles dois tempos – o passado e o futuro – se o

passado já não existe e o futuro ainda não veio? Quanto ao presente, se

fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, como

poderíamos afirmar que ele existe, se a causa da sua existência é a

mesma pela qual deixará de existir?

Santo Agostinho.

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viii

RESUMO

Esta pesquisa tem como objeto de estudo a caracterização das projeções futuras de diferentes

gerações quanto aos riscos ambientais. Trata-se da análise dos tipos de influência de

memórias geracionais exercidos na caracterização da ideia de futuro ambiental, considerando

a sensação de insegurança socioambiental, advinda das experiências sociais diretas e/ou

indiretas em torno de flagelos e/ou catástrofes ocorridas no século XXI. A abordagem teórica

sobre o tema é demarcada pela natureza interdisciplinar de pesquisa, descrita pelo diálogo

entre autores distintos, particularmente (Barbrook (2009); Bauman (2006; 2007; 2008a;

2008b e 2009); Beck (2010); Becker (2011), Dubet (1996); Espinheira (2008); Fischer

(2011); Grings (2002); Lemos (2012); Mannhein (1982); Morin (1997 e 2001); Navarro

(2005); Rushkoff (1999); Thompson (1998); Toynbee (1973); Bergson (2006);

Halbwachs(1990); Bosi (1994,2003) dentre outros. A pesquisa foi realizada no Campus José

Aloísio de Campos da Universidade Federal de Sergipe, situado no município de São

Cristovão. Participaram desta pesquisa 294 indivíduos distribuídos em quatro grupos

(menores de 15 anos, jovens com idade entre 15 e 24 anos, adultos de 25 a 59 anos e idosos

com idade igual ou superior a 60 anos). A metodologia se insere no paradigma

interpretativo/qualitativo e no método descritivo-fenomenológico de pesquisa. Os principais

instrumentos utilizados na coleta de informações foram entrevistas semidirigidas, questionário

fechado e diário de campo. Os resultados alcançados explicitam a identificação da crença na

intervenção humana como contributiva no agravamento das catástrofes e/ou flagelos naturais.

Os entrevistados quando se referem ao futuro ambiental não alteram de imediato seu

comportamento ante audiência de flagelos ou catástrofes ambientais produzidos pelos

veículos de cultura de massa. O que eles alimentam é a insegurança que apela por novo

consumo da mesma porção de medo a fim de mantê-los com a sensação de viventes em

direção provável à extinção. Por isso mesmo, vivem entre atônitos e sobressaltados riscos na

relação cotidiana de perceber, esquecer e voltar à consciência a finitude imprevista de

qualquer instante em qualquer direção. Há tendência de transferirmos nossas

responsabilidades em relação ao meio ambiente para os "outros" da nossa geração e os das

próximas. Por fim, o futuro ambiental como projeto do presente traduz a dinâmica social

contemporânea em seus movimentos de idas e vindas, de seguir com outro tipo de

consciência, seja focada em longos e médios prazos, seja em pequenas porções de momentos.

PALAVRAS-CHAVE: Memórias Geracionais. Futuro. Riscos Ambientais.

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ix

ABSTRACT

This research has as its object of study the characterization of future projections of different

generations about environmental risks. It is the analysis of the types of influences from

generational memories exercised in the characterization of the idea of future environmental,

considering the feeling of insecurity, socioenvironmental consequential social experiences

direct and/or indirect around scourges and/or disasters in the 21st century. The theoretical

approach on the topic is demarcated by interdisciplinary nature of research, built by dialog

between distinct authors, particularly (Barbrook (2009); Bauman (2006; 2007; 2008a; 2008b e

2009); Beck (2010); Becker (2011), Dubet (1996); Espinheira (2008); Fischer (2011); Grings

(2002); Lemos (2012); Mannhein (1982); Morin (1997 e 2001); Navarro (2005); Rushkoff

(1999); Thompson (1998); Toynbee (1973); Bergson (2006); Halbwachs (1990); Bosi

(1994,2003), among others. The research was conducted on Campus Jose Aloisio de Campos,

at the Federal University of Sergipe (UFS), situated in São Cristóvão city. Two hundred e

ninety-four individuals participated in this survey, distributed in four groups (younger than 15

years, young people aged between 15 and 24 years old, adults from 25 to 59 years and elderly

with age above than or equal to 60 years). The methodology fits into interpretative

paradigm/qualitative and descriptive method of phenomenological research. The main

instruments used to collect information were semi-structured interviews, closed questionnaire

and field diary. The results explain the identification of belief in human intervention as

contributory to worsening disasters and/or natural calamities. The interviewees when referring

to future environmental does not alter their behavior immediately ante audience of scourges or

environmental disasters produced by vehicles of mass culture. What they nourish is the

insecurity which calls for new consumption of the same portion of fear in order to keep them

with the feeling of living in direction likely to extinction. For this reason, live between

amazed and startled everyday risks in relation to perceive, forget and return to consciousness

the finiteness of any unexpected moment in any direction.For this reason, living between

amazed and startled everyday risks in relation to perceive, forget and return to consciousness

the finiteness of any unexpected moment in any direction.There is a tendency to transfer our

responsibilities in relation to the environment to the "other" of our generation and the next.

Finally, the future as environmental project of the presente days could be translated to

contemporary social dynamics in its movements of comings and goings, to follow with

another type of conscience, be it focused on long and medium term, be it in small portions of

moments.

KEY WORDS: Generational Memories. Future. Environmental Risks.

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x

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 1

2 (IN) SEGURANÇA E FUTURO NO LIMIAR DO SÉCULO XXI .................................. 8

2.1 DO MEDO E DA INSEGURANÇA ................................................................................ 8

2.2 CULTURA DE MASSA, A INDIVIDUALIZAÇÃO E A CRISE DA SOCIEDADE .. 12

2.3 O FUTURO COMO ALTERNATIVA AO APOCALIPSE (?) ..................................... 24

3 RISCOS AMBIENTAIS NA CONTEMPORANEIDADE .............................................. 33

3.1 RISCOS E PERIGOS: CONCEITOS E CLASSIFICAÇÕES ....................................... 33

3.2 SOCIEDADE DE RISCO ............................................................................................... 47

4 MEMÓRIA DA (NA) SOCIEDADE ................................................................................. 52

5 METODOLOGIA DA PESQUISA .................................................................................... 67

5.1 DO LOCAL DA PESQUISA ......................................................................................... 72

5.2 DA AMOSTRA .............................................................................................................. 72

5.3 DOS INSTRUMENTOS ................................................................................................. 75

5.4 ETAPAS DA PESQUISA .............................................................................................. 76

6 RESULTADOS E DISCUSSÕES ...................................................................................... 79

6.1 PERCEPÇÃO DE RISCOS AMBIENTAIS SOB AS FORMAS DOS FLAGELOS,

CATÁSTROFES OU DESTRUIÇÃO NATURAL DE MÉDIA OU DE GRANDES

PROPORÇÕES. .................................................................................................................... 83

6.2 VISÃO PESSOAL A RESPEITO DO “FUTURO” (DEFINIÇÃO E

CARACTERIZAÇÃO). ........................................................................................................ 91

CONCLUSÕES ....................................................................................................................... 99

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 102

APÊNDICES ......................................................................................................................... 111

APÊNDICE A – ENTREVISTA SEMIDIRIGIDA ........................................................... 112

APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO FECHADO ............................................................... 113

APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO PARA REALIZAÇÃO DA

PESQUISA NAS DEPENDÊNCIAS DA UFS .................................................................. 115

APÊNDICE D – CARTA DE APRESENTAÇÃO DO PRODEMA ................................. 116

APÊNDICE E – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ............. 117

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xi

LISTA DE TABELAS

Número

Título Página

Tabela 1

Distribuição das quatro amostras geracionais em função do

gênero, nível de escolaridade.

82

Tabela 2

Meios de comunicação mais utilizados para se manter

informado.

82

Tabela 3

Associação de riscos ambientais à ação antropogênica e/ou

natural

84

Tabela 4

Sensações e Comportamentos diante da audiência ou

percepção a respeito de notícias veiculadas pelos meios de

comunicação.

85

Tabela 5

Ideia a respeito do futuro. 92

Tabela 6

Crença de ser afetado ou não pelos riscos ambientais no

presente.

95

Tabela 7

Crença de ser afetado ou não pelos riscos ambientais no

futuro.

96

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1Introdução 1

1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa teve origem nas experiências vividas por mim nos últimos vinte e cinco

anos. Entre 1986 e 2011 mantive contato com uma diversidade de experiências, circunstâncias

de interação com pessoas de gerações diferentes, seja no campo do trabalho, na formação

inicial em fisioterapia, seja nas interações cotidianas com familiares ou amigos próximos. As

primeiras reflexões sobre as questões ambientais surgiram desde o desafio de compreensão

mais ampla a respeito do conceito de saúde. O complexo conceito de meio ambiente,

apareceu, desse modo, em torno das minhas angústias pessoais de formação e de

profissionalização. De modo específico, em igual intensidade, deparei-me com a problemática

do futuro e com os modos distintos com que cada subjetividade, em sua origem cultural,

expressa sensações de (in) segurança ante os desastres, flagelos e/ou catástrofes naturais de

médias ou grandes proporções. Tais sensações de insegurança ou relativa despreocupação

foram percebidas e partilhadas, principalmente pelas influências geracionais de diferentes

atores sociais no cotidiano das relações que fui estabelecendo no decorrer de minha própria

história de vida.

Em tais contextos, percebia-me envolvida e afetada diretamente pelos tipos de

conversação, emissões de opinião e de crenças partilhadas por diferentes atores sociais a

respeito do futuro ante a apreensão perceptiva de algum flagelo natural. Porém, pouco a

pouco, fui observando que existiam diferentes modos de percepção e de apreensão destas

mesmas mensagens por distintas gerações. Crianças, jovens, e adultos exprimiam-se e

observavam de maneira ora divergente, ora partilhada ora apaticamente ante a noção de futuro

da biosfera e das condições de vida humana no planeta Terra. Então prossegui nos últimos

cinco anos exercitando a observação indireta de tais fenômenos a tal ponto que decidi torná-la

objeto de pesquisa científica dentro do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e

Meio Ambiente da Universidade Federal de Sergipe.

Em 1995, durante formação acadêmica inicial em fisioterapia, já se delineava o

percurso de inquietações intelectual em torno do tema. A experiência de vivenciar e/ou

acompanhar diretamente a angústia de pacientes em torno da possibilidade da finitude da

vida, em casos específicos do trabalho com a saúde humana, depreendia de minhas atitudes

profissionais em formação um constante encontro com a noção de futuro. A possibilidade (ou

sua negação) da existência de um futuro breve ou em longo prazo desafiava e alterava o modo

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1Introdução 2

como cada um dos atores sociais desenvolvia-se no contexto social das cenas de interação

cultural. Particularmente, a participação simultânea nas disciplinas acadêmicas relativas aos

estudos de Fisioterapia Aplicada à Pediatria, Fisioterapia Aplicada à Neurologia e Fisioterapia

Aplicada à Geriatria foi determinante neste sentido. Nestes termos, o contato com as

diferentes gerações durante a graduação e a especialização (2000) contribuiu para a apreensão

de que a sensação de (in) segurança ou uma visão negativa quanto ao futuro da humanidade

era diferentemente expressada por muitas pessoas, principalmente, após o acontecimento de

catástrofes ambientais divulgados pelos veículos de comunicação de massa. As divulgações

midiáticas eram construídas em termos apocalípticos e transpareciam que o problema das

mudanças climáticas era inevitável e por culpa antropogênica.

Estas experiências culminaram na aproximação com o campo da pesquisa em ciências

ambientais, sobretudo, em torno das questões relacionadas à ideia de riscos, meio ambiente,

memória e meios de comunicação de massa. Com base nestas trajetórias, as projeções futuras

de diferentes gerações quanto aos riscos ambientais ((in) segurança socioambiental frente aos

flagelos e/ou catástrofes naturais) foram se consolidando como objeto de pesquisa em minha

trajetória intelectual.

Toynbee (1973) destaca que as rápidas transformações da vida moderna refletem-se

sobre todos e, em especial, sobre os jovens. Embora presente em todas as idades, é na

juventude que o sentido da vida é mais questionado, principalmente por esta tentar

compreender as circunstâncias em que se encontra. Consequentemente, a ideia de futuro se

consolida como problema difuso nos estudos sobre juventude. Um dos argumentos centrais

debatidos pelo autor é a ideia segundo a qual a juventude deve ser estudada como uma

circunstância sociohistórica de compreensão da natureza humana e descoberta dos

enfrentamentos intensivos e crísicos no que se refere ao sentido da vida.

E isto decorre da busca autonegada do amor transcendental o que significa que o

homem deveria empreender toda sua “habilidade e força” no sentido de alcançar os objetivos

da vida: viver para amar, compreender e criar. De outra forma, que o “homem se dê a outrem,

ao mundo ou a um espírito maior” (TOYNBEE,1973,p.14-15). O autor descreve a

necessidade de existir uma atividade extrapessoal em benefício dos outros no que se refere à

sociedade do futuro. Por isso, é possível afirmar que é para os jovens que a humanidade se

volta ao tentar assegurar o futuro e que, portanto, as gerações mais velhas devem buscar

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1Introdução 3

conciliar-se com as novas, mesmo que isto seja difícil dada a atual crise das relações

humanas.

Bauman (2008a, 2008b) discorre sobre o abandono do indivíduo a uma luta solitária

para impor sentido e objetivo em suas vidas sem que, necessariamente, existam recursos

suficientes para enfrentá-la. A individualização, enquanto característica das sociedades

modernas, traz uma sensação crescente de liberdade para experimentar, mas, ao mesmo

tempo, vem revestida da tarefa de lidar com suas consequências.Nessa perspectiva, a ideia

segundo a qual a liberdade do indivíduo moderno veio acompanhada da incerteza, falta de

proteção e a insegurança pode ser associada ao conceito de medo desenvolvido por Espinheira

(2008). Entre ambos, a referência à ideia de medo e insegurança se sustenta dentro das

seguintes proposições: (a) o medo orienta comportamentos; (b) o medo é ubíquo; (c) O medo

fabricado desemboca num futuro que está fora de nosso controle.

A primeira proposição fundamenta-se na ideia de que o medo é visto como um

enfrentamento a uma ameaça direta ocorrido no passado. Isto se perpetua mesmo que não haja

um novo fator desencadeador. A segunda proposição refere-se ao fato de temermos ameaças

de todos os lugares, pois o mundo está cheios de perigos que podem abater-se sobre nós. Esta

inclui, ainda, a vulnerabilidade a que estamos dispostos, o que depende muito mais de uma

falta de confiança nas defesas disponíveis que da possibilidade de ameaças reais. Tememos

ameaças da natureza, tememos as atrocidades de outros indivíduos, enfim, tememos tudo que

venha a atingir nossas vidas, lares, empregos. Porém, a terceira proposição se desenvolve em

torno da ideia que a economia de consumo depende de consumidores produzidos para

consumirem seus produtos que, logicamente, causam alívio ou expurgam os medos

cotidianamente fabricados.

Nesse sentido, o “futuro” pode ser definido como uma promessa do presente. O

determinismo tecnológico preconiza o presente como um instante-já (futuro) glorioso. No

entanto, cabe-nos a reflexão sobre o que determina o futuro em relação às práticas históricas

com as quais a humanidade em si se desenvolveu, usando as tecnologias e ferramentas,

construindo-o de acordo com seus interesses. Nesse contexto, a exploração de recursos

naturais e a poluição, sob a égide de um futuro onde todos terão acesso aos bens tecnológicos,

devem ser repensadas, haja vista que a utopia dos benefícios à sociedade não se concretizou,

ou seja, a revolução tecnológica não implicou uma revolução social. (PASQUALI, 2004;

BARBROOK, 2002; GRINGS, 2002). A partir daí, esta pesquisa pretende analisar as

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1Introdução 4

projeções futuras de diferentes gerações como constructo social de primeira ordem frente aos

riscos ambientais.

Beck (2010) define que os riscos ambientais são invisíveis e em muitos casos

imprevisíveis. Este fato exigiria medidas preventivas e responsabilidades por danos futuros,

mesmo que estes ainda não tenham ocorrido. Dessa forma, a estruturação do conceito de

riscos ambientais não pode ser amplamente debatida sem considerarmos suas dimensões

sociais, ecológicas, políticas e administrativas. Afirmamos isto ao concordamos com o Fisher

(2011) que entende que as transformações culturais estão diretamente relacionadas à ideia de

manutenção, conservação alterações ou mudanças em torno da ideia de futuro.

A percepção dos riscos ambientais, enquanto construída em determinados contextos

históricos, depende de cruzamento entre o perigo fornecido pelos elementos naturais (risco

ambiental objetivo) e as experiências vividas. Nesse sentido, a evocação da memória é

fundamental e, para cada geração, terá um enfoque diferente. De acordo com Queirós (2006),

a memória histórica geracional pode ser vista como a reunião complexa das memórias

comuns - adquiridas ou apropriadas dos participantes de uma situação de geração e das

memórias coletivas que grupos concretos desses participantes tenham construído, não sendo

incomum que as representações que compõem uma ou algumas destas memórias coletivas

adquiram predominância sobre as demais e se difundam mais amplamente no seio de uma

dada geração.

Assim sendo, o problema dessa pesquisa é a caracterização de influências das

projeções futuras de diferentes gerações quanto aos riscos ambientais. Trata-se da análise

dos tipos de influência de memórias geracionais exercidos na caracterização da ideia de futuro

ambiental, considerando a sensação de insegurança socioambiental advinda das experiências

sociais diretas e/ou indiretas de imagens e notícias propagadas pelos veículos de comunicação

de massa em torno de flagelos e/ou catástrofes ocorridas no século XXI. Para desenvolver

esse estudo, foi elaborada a seguinte pergunta:

Que tipos de influências as memórias geracionais exercem na

caracterização do “futuro ambiental” em decorrência da ideia de riscos

ambientais?

O objetivo dessa pesquisa é caracterizar as projeções futuras de diferentes gerações

frente aos riscos ambientais. Ademais, pretende-se analisar os tipos de influências exercidas

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1Introdução 5

pelas memórias geracionais na caracterização do “futuro ambiental”, considerando a

percepção dos riscos ambientais nas condutas sociais verbais de atores sociais de diferentes

gerações quanto às experiências sociais diretas ou indiretas advindas estabelecidas entre os

atores sociais de diferentes gerações.

A relevância social e científica desta pesquisa é justificada por dois elementos. O

primeiro está no reconhecimento das experiências sociais como elementos de efetiva

influência na estruturação, funcionalidade e expressões da vida sociocultural partilhada pelos

atores sociais, dentro da caracterização e desenvolvimento do objeto de pesquisa; o segundo

explicita a importância das pesquisas em ciências ambientais demarcarem-se pela inclusão e

complementaridade entre as diferentes dimensões peculiares aos atores sociais (dinâmica

socioantropológica e biopsicossocial).

Metodologicamente, a pesquisa está situada no paradigma interpretativo, pois visa

compreender e interpretar a dinamicidade relativa ao objeto de pesquisa. Baseia-se na

pesquisa do tipo qualitativa e no método fenomenológico. Participaram dessa pesquisa 294

indivíduos distribuídos entre as faixas etárias estabelecidas pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE, 2011). Para os jovens, consideramos os indivíduos com idade

entre quinze e vinte e quatro anos. Os adultos, aqueles com idade variável entre vinte e cinco

e cinquenta e nove anos. Por fim, os idosos, aqueles com idade superior a sessenta anos.

Sendo o local de estudo o Campus José Aloísio de Campos da Universidade Federal de

Sergipe, incluímos também como sujeitos de pesquisa alunos do Colégio de Aplicação

(CODAP) com idade inferior a 15 anos. Utilizamos como instrumentos de coletas de dados a

entrevista semiestruturada, desenvolvida frente-a-frente com auxílio do gravador de áudio,

após prévia autorização do entrevistado, e questionário fechado. Foram ainda recorrentes

anotações pontuais sistematizadas em diário de campo.

Por fim, a pesquisa teve três etapas. Na primeira, o estudo consistiu de pesquisa

bibliográfica sobre as categorias de análise. Para tanto, buscamos fundamentos teóricos em

Zigmund Bauman (Medo Líquido e a Sociedade Individualizada) e Gey Espinheira(Sociedade

do medo) para a construção acerca da (in)segurança e do medo da sociedade atual. No

contexto da abordagem da problematização histórica da cultura de massas, foram

desenvolvidos estudos sobre as obras de Edgar Morin (Cultura de massas no século XX:

neurose e Cultura de massas no século XX: necrose). Para a compreensão dos riscos

ambientais na contemporaneidade, ancoramo-nos em Ulrich Beck (A sociedade do risco).

Quanto ao futuro, debruçamo-nos em Arnolde Joseph Toynbee (A sociedade do futuro),

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1Introdução 6

Douglas Rushkoff (Um jogo chamado futuro: como a cultura dos garotos pode nos ensinar a

sobreviver na era do caos) entre outros teóricos.

Na segunda etapa, selecionamos e entrevistamos os sujeitos, conforme faixas etárias já

definidas. Em seguida, tratamos de analisar os discursos refletindo sobre a relevância dos

dados baseada na questão norteadora da pesquisa. Nesta etapa, também validamos a

interpretação dos relatos dos sujeitos que vivenciaram o fenômeno por meio da recorrência e

diálogo das interpretações conclusivas com as opiniões dos autores-pesquisadores envolvidos

na construção teórica dessa pesquisa.

Esta dissertação está dividida em cinco capítulos, antecedidos pela introdução e

seguidos pela conclusão da pesquisa, e pelas referências utilizadas na construção de todo o

trabalho. Na Introdução foram situadas as motivações que levaram à construção do objeto de

pesquisa. Também, foi apresentada uma contextualização sintética do tema e apresentação do

objetivo da pesquisa. Destacamos ainda a relevância social e científica em que se

fundamentou esta pesquisa.

No Capítulo I, intitulado (in) segurança e futuro no limiar do Século XXI,

desenvolvemos teoricamente a ideia de futuro na sociedade individualizada, na qual o medo e

a insegurança, advindos de ameaças externas, são vistos como fatores que imobilizam o

indivíduo e o tornam cada vez mais individualizado. Portanto, nessa perspectiva, deve-se

evitar os espaços públicos, as ruas. Sendo o público esvaziado, o privado, o familiar, torna-se

lugar seguro contra tais perigos.

No Capítulo II, intitulado Riscos Ambientais na Contemporaneidade, foram abordadas

desde a definição de risco, até as formas e as dificuldade de gestão e/ou enfrentamento

técnico-político ante as demandas instaladas. Mesmo considerando que os riscos tornaram-se

uma constante ameaça às pessoas e ao meio ambiente, sendo cada vez mais difíceis de serem

controlados, a dimensão do perigo não corresponde com a sua percepção pelos indivíduos

ameaçados. Nessa direção, é que a caracterização das projeções futuras de diferentes gerações

quanto aos riscos ambientais fez-se importante elemento de análise científica, aqui, elaborado

como objeto de pesquisa no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio e

Ambiente da Universidade Federal de Sergipe.

No Capítulo III, os conceitos relativos às “memórias” foram discutidos levando-se em

consideração a visão anatômica, filosófica e psicossociológica. Em seguida, debatemos a ideia

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1Introdução 7

do problema sociológico das gerações proposto por Karl Mannheim, a experiência social

definida por François Dubet e por último as representações sociais de Serge Moscovici.

No Capítulo IV está delineada a “Metodologia da Pesquisa”. Destacamos o método

fenomenológico, o paradigma interpretativo e todos os demais elementos formais que

correspondem aos procedimentos de análise escolhidos para o desenvolvimento desse estudo.

São apresentados e definidos os instrumentos de coleta de informações, suas finalidades e

critérios específicos.

O Capítulo V, intitulado “Análise e interpretação dos dados”, corresponde às análises

dos discursos produzidos nas entrevistas tendo em vista as categorias de análise: futuro e

percepção de riscos ambientais diante dos flagelos e catástrofes naturais.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 8

2 (IN) SEGURANÇA E FUTURO NO LIMIAR DO SÉCULO

XXI

2.1 DO MEDO E DA INSEGURANÇA

A adesão dos indivíduos ao sistema fabril e urbano inclinou a associação do tempo às

horas de trabalho e ao relógio. Em benefício de um futuro melhor, sacrificou-se o tempo

presente. No entanto, o salto para a tão esperada modernidade caracterizada pela certeza no

progresso tecnológico e científico que nos guiaria a um futuro distante dos medos e

inseguranças não foi expurgador destes sentimentos. A erosão das certezas do positivismo e

das promessas deterministas de progresso, na passagem do século XIX para o século XX,

atinge seu auge nas duas grandes guerras, cedendo lugar a uma modernidade líquida

assinalada por uma velocidade acelerada da vida e individualismo diante da não credulidade

na ciência, na tecnologia, nas instituições clássicas etc.

As expectativas não atendidas no passado e no presente contribuíram para a ruína da

ideia de um futuro glorioso entre nós. Nossa existência é muito mais angustiante e

permanecemos à espera de fatos e acontecimentos que possam nos atingir, mesmo que estes

realmente não aconteçam. Vivemos a contemporaneidade como uma era de medos e tendemos

a nos proteger de tudo e todos que nos cercam. No século XIX, a oposição entre sociedade e

natureza serviu ao propósito do conhecimento e controle desta com intuito de contrapor a

irracionalidade da sociedade agrária estamental, instituindo uma sociedade industrial.

Naquele século, os privilégios do Estado soberano e das imagens religiosas foram

corroídos e cederam lugar ao entendimento de que uma sociedade industrial, desenvolvida em

suas estruturas esquemáticas de vida e de trabalho, seus setores produtivos, papéis de gêneros

definidos, sua compreensão científica e tecnológica são constituintes de uma sociedade

moderna. Este pensamento se estendeu ao século XX e na oposição entre sociedade e natureza

esta última foi subjugada e explorada. Ao longo deste processo de exploração e transformação

tecnológico-industrial, a natureza foi absorvida, passando de um fenômeno externo e pré-

determinado, para interno e fabricado. O consumo da natureza revela uma sociedade que, sem

seu contrário, encontra a si mesma, pondo em desencanto seus fundamentos balizadores da

sociedade industrial: progresso, ciência, classes, família nuclear, democracia.. Em outros

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 9

termos, ao se concretizar, a sociedade industrial se desestabiliza. (BECK, 2010).

No cenário da modernidade sólida, as formas tradicionais de controle do medo e da

segurança mantidas pelo Estado, pela família, instituições religiosas, papéis definidos de

gêneros são destituídas do caráter de solidariedade no quadro da modernidade líquida,

passando-se para o indivíduo este controle: o indivíduo é remetido a si mesmo e ao seu

próprio destino individual no mercado de trabalho, com todos os riscos, contradições e

oportunidades. E isto não reflete uma emancipação bem-sucedida do indivíduo, mas sim a

uma dependência do mercado de trabalho, das instituições e do consumo pala padronização

dos estilos de vida. (BECK, 2010).

Neste contexto, Bauman (2008a, 2008b) discorre sobre o abandono do indivíduo a

uma luta solitária para impor sentido e objetivo em suas vidas sem que, necessariamente,

existam recursos suficientes para enfrentá-la. A individualização, enquanto característica da

modernidade líquida, trouxe uma sensação crescente de liberdade para experimentar, mas, ao

mesmo tempo, veio revestida da tarefa de lidar com suas consequências.

Nessa perspectiva, a ideia segundo a qual a liberdade do indivíduo moderno veio

acompanhada da incerteza, falta de proteção e a insegurança pode ser associada ao conceito

de medo desenvolvido por Espinheira (2008). Para estes autores, a referência à ideia de medo

e insegurança se sustenta dentro das seguintes proposições: (a) o medo orienta

comportamentos, quer haja ou não uma ameaça presente; (b) o medo é ubíquo; (c) O medo

fabricado desemboca em um futuro que está fora de nosso controle.

A primeira proposição fundamenta-se na ideia de que o medo é visto como um

enfrentamento a uma ameaça direta ocorrido no passado. Isto se perpetua mesmo que não haja

um novo fator desencadeador de reações que oscilem desde a fuga à agressão. E, sendo

produto de uma experiência anterior, o medo pode ser reciclado, servindo como modelo para

o comportamento humano, mesmo que não exista um perigo iminente. É um “sentimento de

ser susceptível ao perigo” (BAUMAN, 2008a, p.09).

Diferentemente dos animais, o homem experimenta um medo não instintivo, social e

reciclado que orienta seu comportamento. Assim, o medo disseminado que acompanha o

indivíduo é muito mais desconfortante e assustador quando é

difuso, disperso, indistinto, desvinculado, desancorado, flutuante, sem endereço nem

motivos claros; quando nos assombra sem que haja uma explicação visível, quando

ameaça que devemos temer pode ser vislumbrada em toda parte, mas em lugar

algum se pode vê-la. (BAUMAN,2008b,p.08)

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 10

Uma sensação de insegurança, já que estamos sujeitos a perigos que podem abater-se

sobre nós a qualquer momento, e vulnerabilidade, uma vez que poderemos não ter sucesso na

defesa ou fuga a uma ameaça. A vulnerabilidade é muito mais decorrente da não credulidade

nos mecanismos de defesa que propriamente na intensidade e força de uma ameaça real. Para

este autor,

uma pessoa que tenha interiorizado uma visão de mundo que inclua a insegurança e

a vulnerabilidade recorrerá rotineiramente, mesmo na ausência de ameaça genuína,

às reações adequadas a um encontro imediato com o perigo; o ‘medo derivado’

adquire a capacidade de autopropulsão. (Bauman, 2008a, p.09).

No entanto, o medo reciclado pode ser desvencilhado dos perigos que o produz,

independente das contribuições e responsabilidades de cada um deles. Assim, as reações de

defesa ou de enfrentamento podem ser direcionadas para longe dos perigos responsáveis pela

insegurança.

A segunda proposição refere-se ao fato de temermos ameaças de todos os lugares, pois

o mundo está cheios de perigos que podem abater-se sobre nós. Tememos ameaças da

natureza (furacões, terremotos, inundações, deslizamentos etc.), tememos as atrocidades de

outros indivíduos (assassinatos, agressões sexuais, contaminação de alimentos, ar e água

poluídos etc.), enfim, tememos tudo que venha devastar nossas vidas, lares, empregos. Além

de poderem surgir de qualquer lugar, pessoa (conhecidas ou impercebíveis) e da natureza,

estas ameaças ainda vêm de uma zona de produção diária de perigos que, prontos a nos

atacarem sem aviso, está longe de terminar. Como afirma o autor, de uma

[...] terceira zona entorpecente de sentidos e irritante, até agora sem nome, por onde

se infiltram medos cada vez mais densos e temíveis, ameaçando destruir nossos

lares, empregos e corpos com desastres: naturais, mas nem tanto; humanos, mas não

de todo; ao mesmo tempo naturais e humanos, embora diferentes de ambos

(BAUMAN, 2008a, p.11).

Porém, a terceira proposição se desenvolve em torno da ideia que a economia de

consumo depende de consumidores produzidos para consumirem seus produtos que,

logicamente, causam alívio ou expurgam os medos fabricados. Para este autor, numa

sociedade de consumo, os consumidores produzidos são amedrontados e buscam nos produtos

oferecidos no mercado o alívio e conforto para seus mais temerosos sentimentos frente aos

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 11

perigos iminentes. Enfim, o enfrentamento dos medos é uma luta diária e sem fim e os perigos

provocadores destes sentimentos são indissociáveis da vida humana.

Os perigos desencadeadores de medos podem ser de três tipos: os que ameaçam o

corpo e a propriedade; os que ameaçam a ordem social e a confiabilidade nela da qual

depende a segurança o sustento; e “os perigos que a ameaçam o lugar da pessoa no mundo- a

posição na hierarquia social, a identidade (de classe, gênero, étnica, religiosa) e, de modo

mais geral, a imunidade à degradação e à exclusão sociais”. (BAUMAN, 2008b, p.10). Na

modernidade carente de certezas e segurança, ter medo tornou-se comum. Assim:

Os medos são muitos e variados. Pessoas de diferentes categorias sociais, etárias e

de gênero são atormentadas por seus próprios medos; há também aqueles que todos

nós compartilhamos-seja qual for a parte do planeta em que possamos ter nascido ou

que tenhamos escolhido (ou sido forçados a escolher) para viver. (BAUMAN,

2008b, p. 31).

Viver no mundo “líquido-moderno”, no qual o “amanhã não pode ser, não deve ser,

não será como hoje”, implica em um ensaio diário de desaparecimento, extinção e morte. E

assim, indiretamente, um ensaio da não finalidade da morte, de ressurreições recorrentes e

reencarnações perpétuas. Reprime-se o horror ao perigo, silenciando-se os medos derivados

de perigos que, pela preservação da ordem social, não devem ou não podem ser efetivamente

evitados. (BAUMAN, 2008b, p 12-13). A morte, neste caso, seria passageira e duraria até o

surgimento de um novo fato ou acontecimento.

No entanto, para o autor, ainda que possamos adiar despreocupadamente os perigos

iminentes, nem todos estes podem ser descartados. Para ultrapassarmos estas barreiras que

ficaram próximas demais de nossa tranquilidade e que não podem ser negligenciadas,

pensamos os perigos como “riscos”. Numa tentativa de prever suas conseqüências

indesejadas, calculamos os riscos e vivemos o mais próximo da certeza, ainda que esta não

seja de um todo possível, uma vez que perigos calculados ensejam uma probabilidade e não

previsibilidade.

E esta fuga do problema, nada mais é que um subterfúgio ou um caminho para não

minarmos nossa autoconfiança e mantermos nossa saúde mental, já que, desviando nossa

atenção para os riscos previsíveis, não nos preocupamos com aqueles que somos impotentes

para impedir. Isto até que outra catástrofe se apresente e nos mostre que eles são reais. Sobre

os riscos discutiremos com mais ênfase no Capítulo 3. Por ora, pontuaremos na sequência a

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 12

segunda industrialização e a formação da cultura de massa como fomentadores do processo de

individualização do homem.

2.2 CULTURA DE MASSA, A INDIVIDUALIZAÇÃO E A CRISE DA

SOCIEDADE

A segunda industrialização não é aquela que ocorre com o avanço tecnológico de

máquinas no ambiente fabril. De acordo com Morin (1997), trata-se daquela que se processa

nas imagens e nos sonhos, colonizando a alma e industrializando o espírito, dominando o

interior humano e derramando mercadorias culturais. Oriunda do cinema, imprensa, rádio,

televisão nos Estados Unidos na segunda metade do século XX, pós Segunda Guerra, a

segunda industrialização visava atender aos problemas emergentes da civilização que já não

se contentava com respostas prontas.

A vida privada e a cultura passam a ser fabricadas industrialmente e vendidas de forma

comercial. Os problemas periféricos do homem (amor, medo, fatos variados do coração e da

alma) retomam a centralidade das interrogações contemporâneas, contribuindo para a

formação da ‘Terceira Cultura’ ou cultura de massa. Ainda que produzida segundo as normas

de produção industrial,

ela constitui um corpo de símbolos, mitos e imagens concernentes à vida prática e à

vida imaginária, um sistema de projeções e de identificações específicas. Ela se

acrescenta à cultura nacional, à cultura humanista, à cultura religiosa, e entra em

concorrência com estas culturas. [...] A cultura de massa integra e se integra ao

mesmo tempo numa realidade policultural; faz-se conter, controlar, censurar (pelo

Estado, pela Igreja) e, simultaneamente, tende a corroer, a desagregar as outras

culturas. A esse título, ela não é absolutamente e autônoma: ela pode embeber-se de

cultura nacional, religiosa ou humanista e, por sua vez, ela embebe as culturas

nacional, religiosa ou humanista. (MORIN, 1997, p. 15-16).

Se no começo do século XX as fronteiras das classes sociais, etárias, do nível de

educação demarcavam as respectivas zonas de cultura, é justamente com a instituição de

cultura de massa que estas são suprimidas. A sua produção visa atingir o maior número de

indivíduos, de variadas estruturas sociais, e este objetivo implicava na procura de um

denominador comum: misturam-se conteúdos, buscando atender a uma variedade de

interesses e gostos, obtendo-se, assim, o máximo de consumo. Destaca-nos o autor que a

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 13

cultura de massa é média em sua inspiração e seu objetivo, porque ela é cultura do

denominador comum entre as idades, os sexos, as classes, os povos, porque ela está

ligada a seu meio natural de formação, a sociedade na qual se desenvolve uma

humanidade média, de níveis de vida médios, de tipo de vida médio. (MORIN,

1997, p. 51).

Na homogeneização, não apenas das fronteiras anteriores, a cultura de massa traz

fundamentalmente a identificação de valores entre os distintos indivíduos, padronizando

gostos e interesses, democratizando o consumo e tornando-se lugar-comum entre as diferentes

classes e estratos. E este caráter se projeta transnacionalmente, enfraquecendo as

diferenciações culturais nacionais, principalmente por universalizar1 temas como amores e

medos romanceados, fatos distintos da alma e do coração comum a todos os humanos,

separando-os de folclores e tradições. Desta forma, as tradições não são destruídas, mas ficam

cada vez mais envolvidas com as formas de interação mediadas pelos veículos de

comunicação de massa, liberando-as das formas simbólicas das localidades da vida cotidiana.

(MORIN, 1997. THOMPSON, 2012).

A modificação das condições de vida pela técnica, a ampliação dos horizontes do bem-

estar, a possibilidade de mais consumo e a promoção de uma nova vida privada são fatores

que correspondem a um novo grau de individualização da existência humana. Neste aspecto, a

cultura de massa se apropria principalmente da área do lazer. Ela vai fornecer os modelos e

imagens que a vida privada do homem moderno aspira. Enquanto produto da organização do

trabalho industrial, o lazer refere-se não apenas a um tempo de descanso e repouso, mas um

tempo concedido para o consumo, em detrimento do fortalecimento da vida familiar

tradicional e das relações sociais. (MORIN, 1997).

É neste tempo que o indivíduo tenta reencontrar sua personalidade negada no trabalho

que, embora menos penoso fisicamente, se esvazia de qualquer substância pessoal dada sua

especialização. E, desta forma, por intermédio do espetáculo, do estético a “pobreza da vida

1 Ao destacar a universalização, Morin (1997) questiona se seria esse homem universal aquele comum a todos

os homens (homem médio). Deixa claro que sim, ao apontar os seguintes sentidos antropológicos: a) O homem

imaginário- aquele que se projeta, que responde às imagens pela identificação; b) O homem –criança - aquele

que se encontra em todo o homem, que gosta “do jogo, do divertimento, do mito, do conto”;c) o homem dotado

de “um tronco comum de razão perceptiva, de possibilidades de decifração, de inteligência”(p.45). Para este

homem, a linguagem adaptada é a audiovisual (imagem, som musical, palavra, escrita), “que se desenvolve

tanto mais sobre o tecido do imaginário e do jogo que sobre o tecido da vida prática”. Por outro lado, e ao

mesmo tempo, a cultura de massa “cria uma nova universalidade a partir de elementos culturais particulares à

civilização moderna e, singularmente, à civilização americana”. Neste sentido, o homem universal não apenas

é aquele comum a todos e sim aquele “homem novo que desenvolve uma civilização nova que tende à

universalidade”. (p.44-45).

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 14

real” é enriquecida de “liberdade antropológica” 2 quando o homem se direciona e se projeta

no mundo das imagens,

onde reinam a aventura, o movimento, a ação sem freio, a liberdade, não a liberdade

no sentido político do termo, mas a liberdade no sentido individual, afetivo, íntimo,

da realização das necessidades ou instintos inibidos ou proibidos. [...] E é porque a

cultura de massa se torna o grande fornecedor dos mitos condutores do lazer, da

felicidade, do amor, que nós podemos compreender o movimento que a impulsiona,

não só do real para o imaginário, mas também do imaginário para o real. Ela não é

só evasão, ela é ao mesmo tempo, e contraditoriamente, integração. (MORIN,

1997, p.90).

Seja na violência projetiva, no erotismo difundido, na felicidade e no amor

identificativo em detrimento “dos valores tradicionais e das grandes transcendências”, o

indivíduo privado realiza-se individualmente. Neste aspecto, o tema da felicidade pessoal

liga-se ao tema do presente, dissolvendo-se o passado e o futuro. A felicidade projetiva

corresponde ao hedonismo do presente da civilização contemporânea. “Esse hedonismo é de

bem-estar, de conforto, de consumo: desenvolve-se em detrimento de uma concepção da

existência humana na qual o homem consagra seu presente a conservar os valores do passado

e a investir no futuro” (MORIN, 1997, p.126).

O dinheiro perde parte de seu valor cumulativo que visava à segurança e manutenção

do patrimônio familiar e volve-se para as despesas hedonistas. A procura por mais

mercadorias atende mais à satisfação, ao conforto e ao prestígio que propriamente às

necessidades. A felicidade moderna volta-se para o encontro entre “as prioridades de valores

afetivos e a prioridade dos valores materiais, a prioridade do ser e a prioridade do ter, e ao

mesmo tempo faz força para superá-la, para conciliar o ser e o ter”. (MORIN, 1997, p. 126-

127).

E, sob esta ótica, o homem moderno quer sempre estar jovem para amar e desfrutar

seu presente, desvalorizando a velhice e os “valores gerontocráticos” e afirmando a

2 Neste aspecto, a liberdade antropológica é para Morin aquela em que o homem não está mais a mercê da norma

social, das leis. Uma liberdade verdadeira que desemboca no maldito “a zona de sombra dos instintos e dos

interditos” (p.113). Na apreciação das imagens e impressos, o homem faz com toda a segurança a experiência

da insegurança. Vive-se toda a liberdade, haja vista ser o homem livre um homem sem segurança. Segundo o

autor, há um fundo de violência no humano que precede qualquer civilização e que não pode ser reduzida

indefinidamente. Sob a “crosta da civilização”, existem latentes energias adormecidas da espécie, prontas a

qualquer instante a irromperem ”não mais sobre as telas e os jornais, mas em cada um de nós. Todas as

experiências nos provam que ninguém está definitivamente civilizado [...] A cultura de massa nos entorpece,

nos embebeda com barulhos e fúrias. Mas ela não nos curou de nossas fúrias fundamentais. Ela as distrai, ela

as projeta em filmes e notícias sensacionalistas”. (MORIN, 1997, p. 117)

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 15

dominância dos valores juvenis3. Deprecia-se a experiência acumulada, haja vista que no

aceleramento de nossa evolução civilizacional muito mais importante é a “adesão ao

movimento”. O abrandamento ao acesso a idade adulta leva, por exemplo, ao apagamento da

família. A nucleação familiar (casal e filhos) declinou o valor da família baseada no pai chefe.

Nesta dimensão, o pai autoritário, ordenador, cede lugar para um pai mais humano, liberador.

Da mesma forma, a mãe envolvente e sempre presente, é substituída por uma mãe que

trabalha, que quer viver mais intensamente sua vida. A ausência destes pais arcaicos implica

numa contracorrente ao movimento de desenvolvimento: a experimentação pelos adolescentes

de um “vazio, angústia, aborrecimento” para a figura paterna, e a necessidade “de uma

comunhão, de uma fé, de uma religião ou de um clã” (MORIN, 1997p.149-150), para a figura

materna4.

Sendo a adolescência uma fase de busca de si mesmo, do sentido da existência

humana, de confrontação às normas e valores sociais vigentes, é ainda aquela que

contraditoriamente revela um indivíduo que pretende integrar-se à sociedade. Nessa sombra, a

cultura de massa apropria-se da função familiar e de ancestrais oferecendo modelos

imaginários de condutas5 que, ao mesmo tempo em que integram os temas da adolescência,

também atrofiam sua virulência e enfraquecem suas revoltas. Assim, para o autor:

a cultura de massa desagrega os valores gerontocráticos, acentua a desvalorização da

velhice, dá forma à promoção dos valores juvenis, assimila uma parte das

experiências adolescentes. Sua máxima é ‘sejam belos, sejam amorosos, sejam

jovens’. Historicamente, ela acelera o vir-a-ser, ele mesmo acelerado, de uma

civilização. Sociologicamente, ela contribui para o rejuvenescimento da sociedade.

3 Morin(1997) destaca existir uma nova Trindade que delineia o novo modelo de existência: o amor, beleza e

juventude. Neste modelo, centra-se “o adulto juvenil de trinta, quarenta, cinquenta, sessenta anos, logo além

sem dúvida, até às portas da morte, com a angústia da morte que confere uma certa febre ao presente”.Na

desvalorização da velhice, a supremacia da juventude se estabelece não como a juventude em si, porém como

a adolescência. E, desta forma, “A adolescência surge enquanto classe de idade na civilização do século XX.”

(p. 153, grifos do autor). O autor prefere manter a ambivalência do termo classe de idade ao considerar que a

noção de idade conduz ao transitório e a de classe, ao estável. E justifica o uso do termo pelo aparecimento em

grande escala de “traços distintos comuns”, principalmente a violência imaginária, da cultura adolescente que

contribui para fazê-la existir como uma realidade socio-histórica. (MORIN, 2001, p.141-142).

4

A decadência das figuras materna e paterna impulsiona, segundo Morin, a uma identificação com outras

entidades como a Igreja, o Estado-pai, a pátria-mãe e dos modelos disseminados pela cultura de massa.

5

Para Morin(1997), os olimpianos são os modelos mortais promovidos à divindade que ‘por meio de sua dupla

natureza, divina e humana, efetuam a circulação permanente entre o mundo da projeção e o mundo da

identificação(p. 107).Os astros de cinema, os campeões, os jogadores, os playboys, os artistas tornam-se

modelos de cultura, modelos de vida, substituindo os antigos modelos (pais, educadores, heróis nacionais). A

cultura de massa incentiva a divindade dos olimpianos, ao mesmo tempo em que mergulha em suas vidas

extraindo delas as particularidades que permitem a identificação.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 16

Antropologicamente, ela verifica a lei do retardamento contínuo do Bolk,

prolongando a infância e a juventude junto ao adulto. Metafisicamente, ela é um

protesto ilimitado contra o mal irremediável da velhice. (MORIN, 1997, p.157).

Nas polaridades globais6, a cultura de massa incita as necessidades de bem-estar, da

felicidade da vida individual ao mesmo tempo em que, em determinadas sociedades, torna-se

estimuladora de revolta e insatisfação. Para as classes mais favorecidas de todo o planeta, o

lançar-se sobre o consumo real pode ser alcançado, no entanto às classes mais populares é

dificultado este acesso. Nestas últimas, a realidade pode conduzir a um estado de revolta, dada

a análise crítica de suas condições de vida, ou de imobilização numa espécie de “catalepsia de

espectador”. (MORIN, 1997, p. 164).

O indivíduo privado, que busca suas realizações e felicidades privadas no presente,

está cada vez mais desenraizado de passado e tampouco se dispõe a encarar o futuro, visto que

não investe nada além de sua própria existência. Um indivíduo que “[...] poderia reconhecer

nos heróis de filmes a imagem exaltada de sua própria condição: heróis sem passado, sem

futuro além do happy end, e que respondem ao apelo do ‘realizem-se’”. (MORIN, 1997, p.

176). Para este autor, os valores por ela difundidos e exaltados, em detrimento das

transcendências, tendem a ser transitórios e precários, assim como o indivíduo que dela

emerge. A cultura de massa que privilegia o presente, a atualidade, que estimula e é

estimulada pelo consumismo, na qual tudo é passageiro ou em que “tudo se usa muito

depressa”, voltada à mitologia da felicidade, das futilidades e superficialidades, faz emergir,

por outro lado, uma contracorrente ao seu movimento.

Para Morin (2001), nas décadas de 60-70, a cultura de massa começa a perder seu

caráter homogeneizante, integrador e euforizante. A crise se estabelece justamente em seus

aspectos mais integradores como a “[...] promoção dos valores juvenis, a promoção dos

valores femininos, a promoção da libertinagem, e do princípio do prazer, enfim a promoção

da mitologia concreta dos lazeres/ férias, viagens.” (MORIN, 2001, p.10). A progressão desses

valores desenvolve-se de forma ambígua: ao mesmo tempo em que integra, apresenta um

desdobramento “reivindicativo e corrosivo”, provocando uma crise da cultura e,

consequentemente, uma crise da sociedade.

Ao passo que o indivíduo torna-se cada vez mais desejoso de objetos, estimula-se sua

subjetividade. Valores subjetivos, afetivos são impregnados nos objetos. O lazer, as férias, por

6 Tratamos este termo como referência aos Hemisférios Norte e Sul, Oriente e Ocidente.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 17

exemplo, tornam-se motivos de fuga para o indivíduo que, em sua atomização social, busca

um reencontro com a vida comunitária, com a natureza. É a liberação de “[...] virtualidades

abafadas na vida cotidiana urbana dedicada ao trabalho e às obrigações, e de outra parte, à

problemática da vida privada em que a cultura de massas apresenta os problemas do casal, da

sexualidade, da solidão etc.”. (MORIN, 2001, p. 109). Este retorno ao “neo-arcaísmo ou neo

naturismo” de final de semana torna-se, portanto, mais virulento e presente em oposição à fria

e artificial vida urbana. O que para o autor,

Mais que uma noção estável, a contratendência ‘neo-arcaica’ é uma espécie de

síndrome cuja definição bastante ampla permite pouco a pouco associar e explicar

múltiplos fenômenos: o surgimento de uma crise de identidade cultural regional, a

abertura ecológica, os diversos aspectos de uma contracultura juvenil (‘neo-

rousseauismo, neo-ruralismo’) estão, assim, ligados no seio de uma mesma

síndrome e definidos em suas relações com um modo de vida urbano e consumidor

fundado sobre o princípio da alternância trabalho-férias-lazeres. (MORIN, 2001, p.

175).

O neo-arcaísmo, apontado inicialmente na intelligentsia, seguida pela alta sociedade e

espalhando-se nas demais camadas burguesas e urbanas, surgiu como uma necessidade de

retorno à natureza (physis) e às origens (arché), porém não se recusa o bem estar e o conforto

da técnica (techné). Por sua vez, o neo-arcaísmo propiciou o despertar da consciência

ecológica, tornando-se forma de contestação e que põe em choque o ecossistema urbano-

industrial “[...] que tende a poluir as fontes primeiras da vida e a desagradar a própria vida. As

soluções, nestas condições, não podem ser tecnológicas: implicam uma reestruturação geral

do sistema, não apenas urbano, mas também civilizacional.” (MORIN, 2001, p.184).

Diante de tanto progresso na ciência e da tecnologia, o indivíduo, paradoxalmente,

sente uma necessidade de volta à baixa racionalidade. Comparativamente aos modelos neo-

arcáicos surgidos na década de 70, como o aparecimento da astrologia, o movimento contra-

cultural dos filhos do caos neste início de século, pode ser entendido como uma tentativa de

espiritualidade e amor genuínos em face da fria pós-modernidade urbana e cibernética. Estes

fenômenos são indicativos não apenas do desenvolvimento da subjetividade moderna, mas

também da atomização do indivíduo nas grandes aglomerações. (RUSHKOFF, 1999,

MORIN, 2001).

Os meios de comunicação de massa são notoriamente transformadores sociais,

políticos e pessoais. Ao passo que novos meios são desenvolvidos, as relações indivíduo a

indivíduo e as relações consigo mesmo tendem a ser modificadas. A produção e transmissão

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 18

de formas simbólicas num sentido único podem ser usadas por indivíduos, instituições

públicas ou privadas etc. com objetivo de intervir nos acontecimentos e produzir

consequências as mais diversas. Nestes termos, os meios de comunicação de massa são muito

mais de transmissão que de comunicação. Por outro lado, é importante destacar que o receptor

dos produtos midiáticos não é inteiramente passivo. O sentido que cada indivíduo dá ao

produto recebido depende de sua cultura, condição social e formação, de tal sorte que uma

mesma mensagem possa ser entendida de maneiras distintas e em diferentes contextos.

(THOMPSON, 2012).

Por meios de comunicação- ou os media - são entendidos os dispositivos tecnológicos

que suportam mensagens e permitem a sua difusão. Quando esta difusão é enviada a um

número grande de receptores, podem ser nomeados por mass media, ou meios de

comunicação de massa. Existem muitos meios de comunicação social por meio dos quais as

sociedades contemporâneas recorrem: rádio, a televisão, a imprensa, o cinema, a fotografia,

os discos, a internet. (SOUSA, 2006).

O campo do mass media é para Sousa (2006) diversificado. É nele que os diferentes

grupos sociais se articulam, se representam e se legitimam. Quanto à importância dos meios

de comunicação, o autor nos descreve:

A importância dos meios de comunicação para a sociedade assenta, efectivamente,

nessas enormes capacidades de representação das pessoas, da sociedade e da cultura;

de produção e reprodução, de construção e reconstrução dos processos sociais e

culturais. Os meios concorrem com outros agentes mediadores, como a família ou a

escola, mas têm um papel central na prescrição dos comportamentos e atitudes

aceitáveis e convenientes no meio social, no estabelecimento dos parâmetros da

normalidade, na disponibilização de informação, na promoção do conhecimento e na

oferta social de referentes sobre a realidade. A influência dos meios de comunicação

social nas pessoas e na sociedade é mais positiva do que negativa. Os meios tiveram

um papel importante, talvez mesmo decisivo, na emancipação das pessoas face à

ignorância e na construção do ambiente de "conhecimento geral" que caracteriza os

nossos tempos. (SOUSA, 2006, p. 539, grifo do autor).

A recepção dos produtos da mídia é uma atividade rotineira e prática na sociedade

moderna. Ela é uma atividade, posto que não seja passiva, dado que o material recebido pode

ser trabalhado e adaptado para suas próprias finalidades. Trata-se ainda de uma atividade

situada, haja vista que os produtos são recebidos por indivíduos situados em seus contextos

sócio-históricos (recursos disponíveis e poder), embora também permita o distanciamento dos

contextos de suas vidas diárias. É também uma atividade de rotina ao participar como

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 19

integrante da vida do indivíduo. E, ao mesmo tempo, é uma realização especializada, pois

depende de habilidades e competências adquiridas por meio de “[...] processos de

aprendizagem ou de acumulação socialmente diferenciados e diversamente acessíveis a

indivíduos de formação diferente”. (THOMPSON, 2012, p. 68).

Por fim, a recepção dos produtos é um processo hermenêutico devido à necessidade de

interpretações distintas para produtos distintos. Um processo ativo e criativo no qual o

indivíduo inclui uma “[...] série de conjecturas e expectativas para apoiar a mensagem que ele

procura entender.” (THOMPSON, 2012, p. 69). Dessa forma, a compreensão do produto varia

de um indivíduo para o outro e de um contexto sócio-histórico para o outro. Esta interpretação

também é incorporada e modifica a compreensão que o indivíduo faz de si e do outro. Torna-

se uma apropriação das formas simbólicas readaptadas a sua vida e contexto. Destaca-nos o

autor:

Na recepção e apropriação das mensagens da mídia, os indivíduos são envolvidos

num processo de formação pessoal e autocompreensão [...] uma consciência daquilo

que ele é e de onde ele está situado no tempo e no espaço. Nós estamos

constantemente modelando e remodelando nossas habilidades e nosso cabedal de

conhecimento, testando nossos sentimentos e gostos e expandindo os horizontes de

nossa experiência. [...] É um processo no qual algumas mensagens são retidas e

outras são esquecidas, no qual algumas mensagens se tornam fundamento de ação e

de reflexão, tópico de conversação entre amigos, enquanto outras deslizam pelo

dreno da memória e se perdem no fluxo e refluxo de imagens e ideias.

(THOMPSON, 2012, p. 71).

Em algumas situações, a recepção e apropriação das mensagens podem dar origem ao

que Thompson denomina formas conjuntas de ação responsiva. São aquelas em que distintos

indivíduos, em contextos diversos, respondem de maneira semelhante e até coordenadas. A

ação responsiva dos receptores pode ser guiada pela mensagem, mas não controlada ou

determinada por ela, principalmente porque corresponde a um conjunto de ações em que há

várias possibilidades de resposta. As reações sociais podem ser intensificadas ou estimuladas

e fugir do controle7.

Na maior parte da história da humanidade, as interações sociais sempre ocorriam face

a face. O desenvolvimento dos meios de comunicação proporcionou novas formas de

interações e relacionamentos sociais, que romperam com a barreira do tempo e do espaço,

7 O autor faz alusão a uma série de eventos sociais, como a Guerra do Vietnam, do Golfo Pérsico, as convulsões

do Leste Europeu, cuja participação da sociedade foi muito influenciada pela mídia. Para mais detalhes, ver

páginas 153 a 157.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 20

assim como de ações à distância, onde os indivíduos podem dirigir suas ações a outros

distantes, bem como responderem a ações ocorridas em ambientes distantes, com

consequências que ultrapassam seus limites de localização e contexto. (THOMPSON, 2012).

Neste tocante, Barbrook (2009) destaca que, desde a década de 90 do século passado,

as possibilidades culturais e políticas abertas pela internet se tornaram simbolizadas por

pessoas comuns. Para este autor, na maioria da população, a posição social é usada para

quebrar as regras e descobrir novas maneiras de fazer as coisas. “Através da extensão

cibernética da internet, indivíduos isolados tornaram-se uma nova e poderosa força política: a

‘inteligência crítica de massa’.” (BARBROOK, 2009, p. 380). Durante as últimas quatro

décadas, suas atitudes do “façam-vocês-mesmos” transformaram os veículos de comunicação

e informação em poderosas máquinas de sociabilidade e expressão pessoal. Os usuários da

internet, neste século XXI, são agora tanto consumidores quanto produtores de mídia.

Três principais tipos de interações8 são destacados por Thompson: a) interação face a

face que acontece no contexto da copresença, partilha comum de espaço e tempo, tem um

caráter dialógico ou de fluxo de informações. Nesta interação, os indivíduos empregam “[...]

uma multiplicidade de deixas simbólicas para transmitir mensagens e interpretar as que cada

um recebe do outro”. (THOMPSON, 2012, p. 120); b) interação mediada, aquela que implica

no uso do meio técnico, orientada para outro específico, que se estende no espaço e no tempo

e que, diante disto, pode incorrer no erro de interpretação da mensagem, haja vista que as

deixas simbólicas (gestos, entonação de voz etc.) não podem ser utilizadas ou ficam restritas;

c) a quase-interação-mediada, aquela estabelecida pelos meios de comunicação como a

televisão, o rádio, os livros etc. Neste caso, as formas simbólicas são direcionadas para um

número indefinido de receptores e o fluxo de informação ocorre num único sentido

(monológica).

A quase-interação-mediada pela televisão cria uma experiência denominada espaço

temporal descontínua. Aqueles que assistem à televisão suspendem temporariamente suas

coordenadas temporais e espaciais da vida cotidiana e se transportam para outras coordenadas

espaçotemporais. Viajando no espaço e no tempo, envolvem-se “[...] numa transação com

diferentes estruturas espaçotemporais e num intercâmbio de experiências mediadas de outros

tempos e lugares com suas próprias experiências cotidianas”. (THOMPSON, 2012, p.130).

8 No prefácio desta edição, o autor menciona as novas interações sociais mediadas pelo computador e celular

nesta década. Destaca que as formas descritas no livro não captam de maneira adequada essas formas de

interação, já que sua elaboração ocorreu na década 1990, no entanto, acredita que a abordagem possa

desvendar as consequências sociais, políticas e pessoais destes tipos de mídia.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 21

Por intermédio da quase-interação-mediada, os indivíduos experimentam outros mundos que

lhe são apresentados.

A separação dos lugares comuns e a dialogicidade permitida pelos meios de

comunicação de massa, notadamente a televisão, priorizam os sentidos da visão e da audição.

A nova forma de publicidade criada por este meio é semelhante à publicidade de copresença

tradicional (imprensa escrita). Neste aspecto, Thompson (2012) aborda algumas diferenças

importantes. A primeira diz respeito às ações e eventos visíveis a um número maior de

pessoas e em contextos diversos, por isso a necessidade da espetacularização.

A segunda tem a ver com o campo de visão do espectador, diferente do campo de

visão de seu contexto diário, cuja mensagem recebida, em muitos casos, é adaptada e

controlada pelos envolvidos na produção, não ficando o espectador livre para escolher o seu

campo de visão, tendo pouco controle sobre o que é visto. A terceira diferença corresponde à

“direcionalidade da visão”, ou seja, em sentido único. Há um contraste entre produtores e

receptores, na qual os indivíduos que aparecem na tela são visíveis e os que recebem a

mensagem não podem ser vistos. O principal disto tudo é que nos novos meios de

comunicação a publicidade separa-se da função dialógica em espaços compartilhados e ligou-

se de forma cada vez mais crescente ao tipo de visibilidade produzida e alcançada pela mídia.

A comunicação do mundo atual acontece numa escala cada vez mais global. Como já

mencionados, a distância e o tempo foram ofuscados e os indivíduos podem obter

informações de distintas partes do mundo. A reorganização espaço-temporal proporcionada

pela mídia está diretamente ligada ao fenômeno da globalização9. Embora este fenômeno

tenha iniciado com a expansão do mercantilismo dos séculos XV e XVI, sua intensificação na

últimas décadas contribuiu sobremaneira na globalização da comunicação, dada a organização

e concentração de poder econômico.

Thompson (2012) destaca três importantes aspectos que proporcionaram este

desenvolvimento: a) o advento do telégrafo como primeiro meio de comunicação a explorar o

potencial comunicativo da eletricidade e cujo aprimoramento, como telégrafos submarinos,

permitiu a rápida expansão da comunicação em escala global. As rotas refletiam a

organização do poder político e econômico. b) o estabelecimento das agências internacionais

de notícias que desde a Segunda Guerra mantêm-se em liderança10

. c) O uso de ondas

9 Aqui o termo é empregado em um modo mais geral e refere-se às formas de interconexão das diferentes partes

do planeta, proporcionando um processo complexo de interação e interdependência.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 22

eletromagnéticas para a transmissão de informação e a necessidade da regulação da

distribuição do espaço radioespectro dentro dos países e entre eles que culminou na criação de

organizações nacionais e internacionais de administração. Na primeira metade do século XX,

as comunicações transmitidas por estas ondas se estendiam apenas sobre áreas geográficas

específicas, Estados-nação e rotas de navegação marítima. Somente com o lançamento dos

satélites de comunicação na década de 60, a comunicação se tornou realmente global.

Esta globalização da comunicação no século XX foi um processo conduzido por

conglomerados de comunicação em grande escala, cujas origens remontam a transformação

da imprensa no século XIX. A mudança na base econômica dos jornais, diante dos novos

métodos de produção, promoveu um processo de acumulação e concentração nas indústrias da

mídia, que assumiu, mais tarde, um caráter transnacional. Parte dos interesses financeiros e

industriais foi direcionada para os setores de informação e comunicação, promovendo fusões,

compras ou outras formas de crescimento corporativo que dominaram a “[...] arma global do

comércio de informação e comunicação” (THOMPSON, 2012, p.209). A maior parte do

poder econômico e simbólico ficou, assim, controlada de forma privada e desigualmente

distribuída.

Localmente, a construção do self torna-se um processo ativo à medida que o indivíduo

apropria-se de materiais simbólicos na trajetória de suas vidas e vão construindo suas próprias

narrativas em interações face a face. No entanto, é importante lembrar que o self também é

condicionado socialmente, haja vista que os materiais simbólicos nem sempre são distribuídos

de maneira igual e o acesso a eles, neste caso, pode exigir habilidades que nem todos os

indivíduos possuem. Na recepção, interpretação e apropriação dos materiais simbólicos

crescentemente divulgados pela mídia, o processo de formação do self torna-se mais

reflexivo, posto que o conhecimento não local enriquece, alarga os horizontes dos recursos

simbólicos para esta construção. Desta forma, a formação reflexiva pode ter consequências

conflituosas tanto para as os indivíduos quanto para suas comunidades, visto permitir uma

reflexão crítica sobre si mesmo e sobre as reais circunstâncias de suas vidas. (THOMPSON,

2012).

Por outro lado, os aspectos negativos da nova forma de interação devem ser

destacados. Um destes refere-se à forma como a mídia, em alguns contextos, pode reforçar as

10

O autor destaca quatro principais conglomerados a Reuters, a AP ( Associated Press) a UPI (United Press

International) e a AFP (Agence France-Presse).

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 23

relações de poder muito mais que as enfraquecer, disseminando mensagens ideológicas11

nos

contextos práticos de vida diária. Outro aspecto diz respeito à dependência que a construção

do self tem dos produtos da mídia, os quais os receptores têm pouco controle. Distanciando os

indivíduos de seus contextos espaço temporais de vida, ao mesmo tempo em que contribuem

para a formação reflexiva, mais os indivíduos se tornam dependentes de materiais simbólicos

para sua formação. Aqui, destaca o autor que:

os indivíduos se tornam cada vez mais dependentes de um leque de instituições e

sistemas sociais que lhes proporcionam os meios- tanto materiais quanto simbólicos-

de construção de seus projetos de vida. A entrada no sistema educacional, no

mercado de trabalho, no sistema de assistência social, etc. são possíveis movimentos

no projeto de vida a que um indivíduo pode aspirar, mas as possibilidades de fazer

estes movimentos são diversamente distribuídas e dependentes de decisões alheias.

O acesso a estes e a outros sistemas é governado por agências e processos que

muitos indivíduos dificilmente podem de alguma maneira influenciar; [...] Este é o

paradoxo com o qual as pessoas se confrontam cada vez mais no século XX: a

acentuação da organização reflexiva do self acontece sob condições que tornam o

indivíduo ainda dependente de sistemas sociais sobre os quais tem relativamente

pouco controle. (THOMPSON, 2012, p. 273-274).

Outro aspecto negativo da extensa disponibilidade de materiais simbólicos mediados é

o seu efeito desorientador. A variedade e multiplicidade das mensagens acarretam numa

“sobrecarga simbólica”. O enfrentamento a este excesso pode ser realizado, em parte, pela

seleção dos materiais simbólicos, bem como por meio da construção individual de “sistemas

práticos de conhecimento para enfrentar o sempre crescente fluxo de formas simbólicas”

(THOMPSON, 2012, p.276). Este último pode ser creditado às opiniões de outros indivíduos

com os quais interagem ou a críticos e profissionais da própria mídia.

Por último, destacamos ainda própria absorção do self na quase interação mediada.

Nestes casos, os indivíduos podem confiar e apegar-se emocionalmente a materiais

simbólicos mediados. Eles deixam de ser recursos de reflexão para a construção do self e

tornam-se objetos de identificação. Não é uma suspensão da reflexividade, mas um tipo de

extensão do caráter reflexivo do eu. O autor, neste ponto, afirma que:

É precisamente porque o indivíduo é capaz de incorporar reflexivamente materiais

simbólicos mediados num processo de autoformação, que estes materiais podem se

11

Thompson (2012) dá enfoque a uma “[...] concepção de ideologia que focaliza a atenção nas maneiras em que

as formas simbólicas servem, em circunstâncias particulares, para estabelecer e sustentar relações de

domínio”(p. 271). Desta forma, as formas simbólicas, seriam ideológicas somente até onde servem.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 24

tornar fins em si mesmos, ideais simbólicos ao redor dos quais o indivíduo começa a

organizar sua vida e seu sentido. Por isso a absorção do self na quase-interação

mediada não é um fenômeno qualitativamente diferente da organização reflexiva do

self: é uma versão dele, de tal modo que os materiais simbólicos mediados não são

simplesmente um recurso para o self, mas sua preocupação central. (THOMPSON,

2012, p. 277)

Além das experiências vividas que ainda permanecem fundamentais, o indivíduo

experimenta uma crescente suplementação, por meio das interações mediadas ou quase

interação mediada, de eventos que dificilmente seriam presenciados no curso normal de suas

vidas. Um dos aspectos diferentes das experiências vividas é que improvavelmente os eventos

mediados, dada sua distância espacial, seriam afetados pelas ações dos indivíduos. Por isso

destacamos a necessidade do entendimento da cultura de massa e da mídia na sociedade

contemporânea, haja vista a importância destas experiências sociais indiretas na construção e

formação do indivíduo.

Outro ponto seria o fato de que a experiência mediada é sempre uma experiência

recontextualizada, já que ela acontece num contexto diferente daquele do evento. Neste caso,

a recontextualização pode assumir um lado positivo ao permitir que o indivíduo se desloque

de seu contexto espaçotemporal e experimente novos e diferentes espaços sem que haja

alteração de seu contexto prático diário. Contrariamente, também pode permitir que o

indivíduo sinta-se chocado com realidades que destoam dramaticamente da sua. A

recontextualização, neste ponto, nos levaria a tomar decisões ou assumir responsabilidades

por partes distantes do mundo. Mais um ponto importante é a inclinação que fazemos para

experiências que fazem parte das prioridades de construção do self que queremos. Se o

indivíduo coloca esta experiência mediada como centro deste projeto de construção, muito

provavelmente ela se tornará um aspecto integral e particular de sua vida. Se, por outro lado, o

indivíduo tem a construção do self com experiências vividas, este terá pouco contato com

formas mediadas.

2.3 O FUTURO COMO ALTERNATIVA AO APOCALIPSE (?)

Irrompendo a barreira do tempo e do espaço, as experiências adquiridas pela mídia

causam-nos medo tanto quanto as experiências vividas. Os variados infortúnios, mesmo que

não venham a ocorrer, proporcionam ao indivíduo a sensação de que ele pode ser ignorado de

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seus efeitos. (Bauman, 2008). Ou seja, podemos ser atingidos ou não até que uma nova

advertência global seja propalada.

A experiência da insegurança decorrente de situações catastróficas noticiadas por

veículos de comunicação de massa, por exemplo, pode ser vivenciada com toda a segurança

do lar, uma vez que não somos diretamente afetados por ela. E, neste aspecto, os mortos

destas tragédias, ainda que bem reais, são ofertados em “sacrifício à infelicidade e à morte [...]

A catarse é como que dirigida no cotidiano, isto quer dizer que o grande tema de sacrifício,

‘eles morrem em meu lugar’, se atenua num ‘são os outros que morrem, e não eu’”. (MORIN,

2000, p.115). Nessa perspectiva:

A vida líquida flui ou se arrasta de um desafio para outro e de um episódio para

outro, e o hábito comum dos desafios e episódios é sua tendência a terem vida curta.

Pode-se presumir o mesmo em relação à expectativa de vida dos medos que afligem

as nossas esperanças. Além disso, muitos medos entram em nossa vida juntamente

com os remédios sobre os quais muitas vezes você ouviu falar antes de ser

atemorizados pelos males que esses prometem remediar. (BAUMAN, 2008b, p.14).

É nesse sentido que o “futuro” pode ser definido como uma promessa do presente. O

determinismo tecnológico difundido pelos meios de comunicação garante que um futuro

glorioso pode ser consolidado no instante-já, graças aos avanços da ciência e da tecnologia.

Retardamos a frustração, mas não a satisfação. Vive-se o agora, pois se o futuro está fora de

nosso controle este pode ser consumido por antecipação. Amparados na certeza desta

descontinuidade do presente, pressentimos um futuro incerto, embora não saibamos de que

forma ou grau este venha a acontecer, e vivemo-lo no instante imediato. Nesta linha:

E se o futuro se destina a ser tão detestável quanto se supõe, pode-se consumi-lo

agora, ainda fresco e intacto, antes que chegue o desastre e que o futuro tenha a

chance de mostrar como esse desastre pode ser detestável. (É isso, pensando bem,

que faziam os canibais de outrora, encontrando no hábito de comer seus inimigos a

maneira mais segura de pôr fim às ameaças de que estes eram portadores: um

inimigo consumido, digerido e excretado não era mais assustador. Embora,

infelizmente, não seja possível comer todos os inimigos. À medida que mais deles

são devorados, suas fileiras parecem engrossar em vez de encolher). (BAUMAN,

2008b, p.16-17).

Neste ponto, cabe-nos pontuar as reflexões de Michio Kaku . Para este autor, estamos

vivendo uma “nova e dinâmica era da ciência e da tecnologia”, no ápice de uma transição,

passando de observadores passivos da natureza a coreógrafos ativos. (KAKU, 2001, p.18-19).

Desconsiderando qualquer outra visão que não a dos profissionais cientistas (aqueles que

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 26

ajudaram a moldar ou a criar a tecnologia), o autor considera em três os pilares da ciência: a

matéria, a vida e a mente. O conhecimento dos componentes básicos destes pilares culminou

na (1) revolução quântica, cujo auge é o modelo padrão que pode prever todas as coisas, na

(2) revolução informática, na qual a descoberta dos movimentos das correntes de elétrons e

das vacâncias de elétrons, que corresponderiam aos elétrons positivos, permitiu a

amplificação dos sinais elétricos, formando a base da eletrônica atual e, por último, na (3)

revolução biomolecular, cuja explicação da vida poderia ser dada pelo código genético.

Sucintamente, Kaku (2001) enfatiza que a sinergia e o cruzamento entre estas

revoluções nos permitiriam no século XXI manipular e definir novas formas de matéria,

manipular o fenômeno da inteligência, com a decodificação do genoma humano, manipular a

vida, segundo nossa vontade. E, logicamente, a prosperidade, a riqueza e o poder no futuro

seriam das nações que privilegiem investimentos e dominem estas revoluções. Para este autor,

uma civilização dita avançada no espaço, diante de um possível esgotamento de suprimentos

energéticos, deveria encontrar outras fontes de energia a sua disposição: além de seu planeta,

buscar-se-ia, sua estrela e sua galáxia.

Contudo, cabe-nos a reflexão sobre o que determina o futuro em relação às práticas

históricas com as quais a humanidade em si se desenvolveu, usando as tecnologias e

ferramentas, construindo-o de acordo com seus interesses. Nesse contexto, a exploração de

recursos naturais e a poluição, sob a égide de um futuro onde todos terão acesso aos bens

tecnológicos, devem ser repensadas (PASQUALI, 2004; BARBROOK, 2002; GRINGS,

2002).

E, neste aspecto, reflexões sobre a tecnologia permitem-nos vislumbrar os caminhos e

as mudanças que a sociedade escolheu. A tecnologia não pode ser vista unicamente como

objeto de consumo. “[...] Ela é matéria-prima pronta para ser moldada em aplicações que

fogem do óbvio”. (LEMOS, 2012, p.146). Por trás dela existe um plano em que se embutem

questões políticas, econômicas, culturais e sociais no contexto presente. Atendendo aos

interesses econômicos, percebemos que a tecnologia tornou os humanos seus servos, sendo,

atualmente, um grande desafio o contrário: torná-la serva da humanidade. (LEMOS, 2012)

Por certo, tanto delírio sobre as incertezas que provocam os possíveis futuros é sempre

decorrente de situações estratégica e mercadologicamente criadas. A centralidade existencial

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 27

do homem12

na economia separou-o dos princípios básicos da convivência (justiça, amor e

solidariedade) e dos princípios sociais à dignidade e ao bem comum (GRINGS, 2002). De,

como afirma Jonas (2006), uma responsabilidade substantiva que objetiva o tratamento com

respeito, dignidade e que pretende o bem estar de outros.

Num mundo planejado onde tudo finda em termos da economia de mercado, o que

vislumbramos é o esforço sequioso do homem em predizer o futuro, de transpassar a barreira

da opacidade, de determiná-lo e definir tudo de forma antecipada. Assim, tudo se torna “[...]

pré-construível, sem espontaneidades, surpresas ou imprevistos” (PASQUALI,2002, p.14),

evitando-se o fator azar e mantendo-se a tão desejada segurança. Neste esforço constante de

reduzir o fosso entre o futuro previsível e o futuro imprevisível, Pasquali enfatiza ser

enclausurada a liberdade a um futuro. O autor ainda afirma que:

Tempo futuro como única dimensão considerável e valiosa de nossa inserção na

temporalidade, justamente por seu caráter meôntico, de não ser ainda, de única

abertura livre ao ainda-não-necessário e, todavia, possível. Futuro, contudo, semi-

incompreensível e semi-ingovernável por antonomásia, por ser a única dimensão da

temporalidade em que, apesar de tudo, o fator túje ou azar ainda campeia de pleno

direito. Porvir repleto então de inabordáveis e anabrangíveis, amorfo e refratário a

nossos avanços, se formos compará-lo com o crescente império que exercemos sobre a dimensão do espaço. (PASQUALI, 2002, p10-11)

E não poderia ser diferente, posto que esteja no futuro a abertura para o projetável. A

compreensão de si mesmo depende desta projeção como se fosse um processo de renovação

do indivíduo. E que seria de nós se não existisse esta possibilidade? Onde assentaríamos

nossa esperança? É nessa perspectiva que concordamos com Grings (2002) quando afirma

que o apagamento do futuro é o desengano da continuidade da vida e que a esperança é a

memória do futuro.

Para este autor, “[...] Esperar supõe um futuro no qual possamos colocar o objeto de

nossa esperança” (GRINGS, 2002, p.38). Mas, o sentido dessa esperança não deve ser

confundido com um futuro com expectativas concretas e objetos determinados, ainda que

estes possam momentaneamente trazer felicidade individual. Enquanto memória do futuro, a

esperança dá sentido à vida, pois está intimamente ligada ao exercício da comunhão e torna

12 GRINGS (2002) afirma que a humanidade centraliza sua existência em alguma referência. Seria um centro

espiritual, posto não ser físico, no qual os interesses e empenho das pessoas tende a gravitar. Para este autor, o

centro deslocou-se nos últimos quatro séculos. A) Na Idade Média, prevalecia o Teocentrismo e a teologia

organizava o pensamento humano; B) Na Idade Moderna, o centro deslocou-se para a metafísica, para o ser; C)

Da metafísica, mudou-se para a “moral humanitária”, centralizando a ação humana na ética e na moral; D) Por

fim, em nossos dias, o centro espiritual da existência humana passa a ser o da economia.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 28

capaz de esperar mesmo que existam motivos contrários. O futuro, nessa perspectiva, “[...]

seria um tempo que nos é dado para viver, para esperar, para crer, para amar e ser felizes”

(GRINGS, 2002, p.40).

Para Toynbee (1973), as rápidas transformações da vida moderna refletem sobre

todos, contudo há uma influência especial sobre os jovens, haja vista ser a juventude a fase de

idade em que mais o sentido da vida é questionado, principalmente por esta tentar

compreender a situação em que se encontra. A ideia de futuro se consolida como problema

difuso nos estudos sobre juventude. Um dos argumentos centrais debatidos pelo autor é a

ideia segundo a qual a juventude deve ser estudada como uma circunstância sociohistórica de

compreensão da natureza humana e descoberta dos enfrentamentos intensivos e crísicos no

que se refere ao sentido da vida.

E isto decorre da busca autonegada do amor transcendental o que significa que o

homem deveria empreender toda sua habilidade e força no sentido de alcançar os objetivos da

vida: viver para amar, compreender e criar. De outra forma, que o “[...] homem se dê a

outrem, ao mundo ou a um espírito maior” (TOYNBEE, 1973, p.14-15). O autor descreve a

necessidade de existir uma atividade extrapessoal em benefício dos outros no que se refere à

sociedade do futuro. Por isso, é possível afirmar que é para os jovens que a humanidade se

volta ao tentar assegurar o futuro e que, portanto, as gerações mais velhas devem buscar

conciliar-se com as novas, mesmo que isto seja difícil, dada a atual crise das relações

humanas.

Diante do apagamento do futuro à medida que a vida acelera, destacamos, então, as

ideias de Rushkoff (1999). Embora muitos indicadores de saúde da sociedade indiquem uma

crise e que pareça estarmos vivendo o fim, o autor questiona se seria ingenuidade admitir que

os sinais não apontariam o apocalipse, mas sim, apenas parecer sê-lo e se, na verdade, essa

confusão não seria muito mais um problema de percepção do que um problema real.

Destacando ser a mente aberta da juventude o aporte necessário para criar uma visão

de mundo que não culmine com a “decadência, a decomposição e a morte”. O autor frisa que

a cultura dos garotos surge como um prazeroso campo comum para todos esses tipos de

desenvolvimento digitais, mágicos e biológicos. Para adaptar-nos ao próximo milênio, temos

de procurar nossos filhos na busca de respostas diante das “[...] incertezas associadas ao

colapso da cultura que aprendemos a conhecer e amar” (RUSHKOFF, 1999, p. 07-08), pois

olhar o mundo das crianças é olhar para frente, visto serem estas o futuro evolutivo.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 29

Para o autor, “[...] o grau de mudança a que as três últimas gerações se submeteram se

compara com o de espécies em mutação. O ‘screenager’ moderno - a criança nascida numa

cultura mediada pela televisão e pelo computador” (RUSHKOFF, 1999, p. 09). - interage

com seu mundo de maneira muito diferente da de seu avô. O que se considera nesse cenário

é a presença de evolução complexa e a elaboração de níveis mais altos de consciência

geracional. Esta evolução também reflete que estamos cada vez mais conectados,

interligados, revelando-se uma nova forma de vida colonial. O que, para uma sociedade que

preserva a individualidade, é amedrontador.

Rushkoff (1999) dá centralidade aos estilos de vida empregados pelas novas gerações

frente às transformações, alterações e mudanças ocorridas em nosso século. Para

sobrevivência na era do caos, as pessoas devem desenvolver em si habilidades essenciais, o

que leva à possibilidade de co-evolução com a tecnologia como uma alternativa ao

apocalipse. Tais estilos de vida ou "modos de vida" decorrem da experiência sociocultural

direta com os artefatos sociotécnicos produzidos nos últimos trina anos.

Entretanto, a experiência sociocultural não se reduz ao uso de tais artefatos, mas, à

produção e à incessante apropriação e alteração desses mesmos artefatos, incrementando-os

no cotidiano das relações sociais como processos-produtos da formação cultural e social. A

redução da fronteira entre o real e o virtual permite-nos vivenciar experiências como, por

exemplo, relações afetivo-sexuais, a integração a uma banda de música, tornar-se um

fazendeiro etc. Dentre estas e outras tantas possibilidades de interação social, as discussões

culturais e sociais minadas expandem-se e transformam a própria sociedade. (LEMOS,

2012; RUSHKOFF,1999).

A ideia da espera do fim do mundo13

é mantida usando-se histórias lineares14

em

detrimento das evolutivas e de “metáforas estáticas para representar nossa realidade”.

(RUSHKOFF,1999, p.270). Utilizando-se do modelo da religião, assegura que, quando

13

E a virada do século, neste aspecto, parece ter sido um ponto importante nesta visão. Pasquali (2002) destaca

que a reaparição do milenarismo e do quiliasmo acrescentada dos prováveis futuros divergentes (permanecer

na terra por um curto espaço, porém acalentado e aproveitando os benefícios da ciência e da tecnologia, ou a

possibilidade iminente de perecer no arsenal atômico) contribuiu para esta sensação do apocalipse.

14 Outra forma linear pode ser a que torna possível a salvação por meio da ciência e da tecnologia. Para Toynbee

(1973), na era da automação serão os indivíduos altamente especializados que desenvolverão e conservarão as

máquinas, tornando-se, portanto monopolizadores do poder. E, embora toda a sociedade tenha se transformado

num extenso laboratório de computação, esta condição é garantida mantendo-se o mistério da tecnologia de

forma secreta e isolada. Desenvolve-se um campo místico e mágico em torno do avanço tecnológico, onde os

detentores superiores de seu controle, assim como os sacerdotes religiosos, criam um público supersticioso que

acredita fielmente que o conhecimento e a salvação são estados recebidos e não deslocados à pessoa média.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 30

comparadas com as experiências caóticas modernas, as histórias bíblicas tornam-se

problemáticas. É na concepção da obediência às cláusulas da religião que os indivíduos

podem ser salvos quando o apocalipse chegar e a ideia de que podemos fazer algo para

melhorar o mundo, como donos de nosso próprio destino, contraria os princípios básicos do

fim. Segundo o autor, usar os sentidos para julgar a metáfora não quer dizer rejeição ou um

ataque aos dogmas religiosos. Trata-se apenas do crescimento da civilização e , à medida que

crescemos, tornamo-nos menos lineares e hierárquicos não nos enquadrando em parábolas

simplificadoras. Dessa forma, o fim a ocorrer não é o do mundo, mas sim das histórias

lineares que utilizamos para explicar o mundo. Então, assim afirma:

Mas, a evolução dá a humanidade uma saída simples: mudar. Desenvolver.

Aprender a tolerar as diferenças. Incluir. Se nosso destino é a evolução no sentido de

uma organização inteiramente interligada, como poderemos excluir quem quer que

seja? Quem podemos marcar como pecadores? Como poderíamos nos considerar

salvos se ninguém for condenado? O apocalipse com que contamos nem mesmo

aconteceria. (RUSHKOFF,1999, p. 271).

E por mais assustador que possa parecer, um mundo em evolução, em caos, é um

mundo sem Deus, pelo menos o conhecido pelas doutrinas religiosas mais fundamentalistas.

Se adotarmos a escolha de sermos donos de nossos próprios destinos, isso também significa

que estamos sós, pois não temos orientadores a nos dizer o caminho certo a seguir. Porém,

isso não indica que deixamos nossos impulsos religiosos. Somos autoconscientes da

necessidade do amor espiritual, por isso o autor destaca não precisarmos perder nossa religião,

mas sim vivê-la de forma que não atrapalhe nossa evolução.

A predeterminação ou a manipulação do futuro torna-nos moralmente responsáveis

por nossos atos no aqui e agora. Dessa forma, concordamos que o planejamento do futuro

como tentativa de inversão da degradação ambiental galopante seja louvável. Nesta

perspectiva, o Relatório Brundland, também conhecido como “Nosso Futuro Comum”,

elaborado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento no ano de

1987 constitui um bom exemplo de planejamento do futuro. Este relatório representou um dos

primeiros esforços globais em constituir uma agenda mundial que modificasse o paradigma

do desenvolvimento humano vigente.

Em seu primeiro capítulo, Um Futuro Ameaçado, apresenta-se uma série de sintomas e

causas que teve grande impacto sobre o meio ambiente e que deveria ser combatida para a

promoção de um futuro mais próspero e igual. Dentre estes, destacamos: a pobreza de muitas

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 31

nações devido à desigualdade de distribuição de bens e de terra; o crescimento populacional

que contribui para o aumento da degradação ambiental15

; a sobrevivência, que trata do

aumento do uso de recursos naturais e da emissão de dióxido de carbono para atender as

crescentes necessidades humanas contribuindo para o aquecimento global; e da crise

econômica que ocorre devido à degradação dos recursos ambientais.

Diante destes sintomas e causas, novas abordagens para o meio ambiente e o

desenvolvimento passam a ser pensadas como desafios interligados que deveriam ser

conjuntamente tratados. Além dos problemas ambientais diretamente causados pela

industrialização e da previsão e antecipação de outros danos, deveria também ser promovido o

desenvolvimento social por meio de modificações nos fatores culturais e políticos como a

melhoria da posição social feminina, a proteção de grupos vulneráveis e a participação local

na tomada de decisão. Visando o atendimento das necessidades do presente sem comprometer

a capacidade de atendimento das gerações futuras, o relatório traz o conceito de

desenvolvimento sustentável (DS) como uma estrutura para a integração das políticas

ambientais e o desenvolvimento em todo o mundo.

O DS exige a satisfação das necessidades básicas de todos, bem como do atendimento

das aspirações por uma melhor qualidade de vida. No entanto, para atendimento destas

aspirações seria necessária a promoção de valores que estimulasse padrões de consumo dentro

dos limites do possível ecológico. Embora destacasse ser importante a conservação de

espécies e plantas, tendo em vista que estes não são renováveis, o termo permitiria que os

recursos naturais fossem degradados desde que considerados três aspectos: (1) o caráter

crítico de esgotamento do recurso fóssil mineral; (2) que as tecnologias fossem responsáveis

pela redução do uso destes recursos; e (3) que fosse equilibrado este uso até que existissem

substitutos disponíveis para ele.

No Relatório, há o reconhecimento de que os problemas ambientais ocorrem pela

disparidade existente entre o poder econômico e o poder político, contudo existe também o

destaque de que as pessoas poderiam ser persuadidas a agirem no interesse comum, em parte

por intermédio da educação, pelo desenvolvimento institucional ou pela aplicação direta da

lei. Em sentido específico, o termo DS necessitaria da confluência de diversos sistemas: o

15

No ponto sobre o crescimento populacional, o Relatório traz a conotação, à época, que induzia ao pensamento

de que a pressão sobre a biosfera dar-se-ia pelo atendimento das necessidades materiais crescente dos países

em desenvolvimento. Esta pressão não seria tão evidenciada pelos países industrializados, visto que estes, com

alguns “possíveis futuros ajustes” na emissão de poluentes, já detinham a tecnologia avançada para a

manutenção do consumo de energias e matérias-primas.

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2(In) Segurança e Futuro no Limiar do Século XXI 32

político, que visasse uma maior participação do cidadão nas tomadas de decisões; o

econômico, que fosse capaz de gerar excedentes e conhecimentos técnicos em uma base

suficiente; o social, que fornecesse soluções para as tensões decorrentes dos

desenvolvimentos desarmônicos; o de produção, que respeitasse a base ecológica; o

tecnológico, que desenvolvesse sempre novas soluções; o internacional, que promovesse

padrões sustentáveis de comércio e finanças; por fim, o de administração flexível com

capacidade de se autocorrigir.

Entretanto, as defesas ambientalistas para “salvar o planeta” parecem-nos não ser

necessárias. Afirmamos isto diante de duas considerações: A primeira está no reconhecimento

de que o agir imediato no aqui e agora serve muito mais para mantermos um planeta viável à

nossa hospedagem e a continuidade da vida de nossa espécie que propriamente da “salvação

do planeta”. Este sobreviverá muito bem sem nós. Se criarmos a desorganização, a natureza

não evitará em impor sua organização, mesmo que para isso sejamos neutralizados por um

dos muitos outros sistemas reguladores. O planeta que nos gerou não é nossa mãe e

continuará indiferente à nossa luta pela sobrevivência.

Segundo, quaisquer que sejam as propostas ou projetos para o futuro, a ação

consciente só pode ser realizada no presente. Como ter uma ética da responsabilidade com as

gerações futuras, como propões Jonas (2006), se o mundo do sensível, a consciência do

Dasein (ser-aí, ser-no-mundo) que nos afirma Heidegger (1989) está no presente? E a

propósito, teríamos mesmo um futuro comum ou um futuro individual? Parece-nos que,

diluindo-nos no todo, a nossa responsabilidade também é diluída e, assim, esperamos sempre

as ações dos “outros” em detrimento das nossas próprias ações e responsabilidades com o

meio ambiente no presente e no futuro.

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 33

3 RISCOS AMBIENTAIS NA CONTEMPORANEIDADE

De acordo com Toynbee (1973), enquanto primitivo, o homem encontrava-se à mercê

da natureza da realidade do universo. Era necessário lutar para alimentar-se, contra seu

extermínio por outros animais selvagens e contra as condições inóspitas do ambiente. Foi no

despertar da consciência e por meio do desenvolvimento de suas tecnologias que o homem

passou a dominá-la. A divulgação das tecnologias eram “virtualmente estáticas”, dada a

dificuldade de locomoção e comunicação existente naquele período. Inicialmente, estas

tecnologias visavam apenas a transformação de objetos encontrados na natureza objetivando

adequá-los à necessidade humana. O autor destaca que é a partir da Revolução Industrial que

se inicia o domínio da natureza. Assim:

aquela que consideramos cientificamente como Revolução Industrial (cujos

fundamentos científicos encontram-se no século XVIII) não foi a primeira revolução

industrial da humanidade.[...] A característica distinta dessa revolução industrial[..]

foi a utilização da energia como força motriz, substituindo a energia muscular do

homem e do animal.[...] A partir da Revolução Industrial o homem tornou-se capaz

de dominar a natureza e isso parece ser definitivo e irreversível, a menos que o

homem se autodestrua.(TOYNBEE, 1973, p.41-42).

.

Na oposição sociedade/natureza, o desenvolvimento científico industrial expôs os

indivíduos a riscos nunca antes observados, modificando sua natureza, o contexto que estes

aparecem e a capacidade que a sociedade tem em compreender e geri-los. Nesta perspectiva, e

diante da complexidade do risco na sociedade contemporânea, traremos neste capítulo as

diferentes abordagens relacionadas ao termo.

3.1 RISCOS E PERIGOS: CONCEITOS E CLASSIFICAÇÕES

O risco constitui-se num importante conceito e tem sido utilizado em diversos campos da

sociedade como a economia (análise do risco-país, risco das bolsas de valores), a saúde

(riscos ocupacionais, riscos de contaminações), a engenharia (riscos de acidentes na

construção), os seguros etc. Dada a polissemia do termo, o seu estudo tornou-se

particularizado e fragmentado sendo comum a problemática em torno das conceituações e

entendimentos dos termos risco, perigo, acidente, azar, desastre, entre outros. Nessas

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 34

situações, frequentemente, o termo é substituído ou está associado a potencial,

susceptibilidade, vulnerabilidade, sensibilidade ou danos potenciais. A ausência de um acordo

na terminologia chegou a inaugurar uma nova ciência na década de oitenta cujo objetivo foi o

de estudar e limitar os riscos aos quais estavam expostas as populações: a Cindinologia ou

Cindínica. No entanto, ainda assim, continua a não existir um conceito universalmente aceito

do risco. (ALMEIDA, 2012; DAGNINO; CARPI Jr., 2007; MARANDOLA JR. e HOGAN,

2004a; QUEIRÓS, 2006).

Para Almeida (2012), a confusão do termo advém da complexidade como característica

inerente à sociedade contemporânea permeada pelo medo, insegurança e incertezas. Assim,

destaca que a origem do termo risco é considerada como incerta por alguns autores16

, embora

esteja presente em todas as línguas europeias: risk em inglês, rischio em italiano, riesgo em

espanhol, risque em francês. O termo também é referido por outros autores ao castelhano

antigo “resegue”, que significa ressecar, cortar, e ao latim rixare (brigar) e resecare (extirpar,

suprimir). Há, ainda, em grego rhizikon e o árabe risk. De forma geral, para esta autora, o

termo “[...] risco pode ser tomado como categoria de análise associada às noções de incerteza,

exposição ao perigo, perda e prejuízos materiais e humanos, atrelados não só a processos

naturais, mas também a processos oriundos das atividades humanas.” (ALMEIDA, 2012,

p.19).

De forma semelhante, Souza e Zanella (2009) destacam que a imprecisão da terminologia

da palavra risco ocorre justamente por não existir um corresponde em português, ou em outra

língua de origem latina como o Espanhol ou Francês, da palavra inglesa hazard, muito

comum na literatura norte-americana. Assim, em levantamento sobre a terminologia, os

autores destacam:

Em língua portuguesa, autores da Geografia têm interpretado o termo hazard ora

como risco, ora como acidente. Xavier (1996) procurou adotá-lo como sinônimo de

risco, já Monteiro (1991) optou pela tradução como acidente. Na versão em

português da obra de Gregory (1992), o termo foi traduzido como acaso. Em língua

espanhola, Castro (2000) propôs a tradução de hazard como perigo, traduzindo mais

fielmente o sentido da expressão em inglês e fornecendo um significado similar à

ideia de ameaça, considerada enquanto possibilidade. (SOUZA; ZANELA, 2009,

p.15). 17

16

Almeida (2012) cita Veyret (2007) e Aneas de Castro (2000).

17 Os correspondentes autores e obras citados são: XAVIER, H. Percepção geográfica dos deslizamentos de

encostas em áreas de risco no município de Belo Horizonte, MG.1996. 222 f. Tese (Doutorado em

Geografia) – Instituto de geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 1996.

MONTEIRO, C. A. F. Clima e excepcionalismo: conjecturas sobre o desempenho da atmosfera como

fenômeno geográfico. Florianópolis: Ed. UFSC, 1991. GREGORY, K. J. A natureza da geografia física. Rio

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 35

Por fim, os autores defendem que o melhor significado para a palavra inglesa hazard

seria entendê-la como sinônimo de ameaça ou perigo, uma vez que existe também o termo

risk que, em outra análise18

, refere-se à existência conjunta de ameaça (ou perigo) e

vulnerabilidade. Nestes termos, os autores completam que:

Logo, os riscos devem ser tratados como resultado da intricada relação entre ameaça

e vulnerabilidade, que apresentam uma profunda dependência entre si. A noção de

risco se estabelece com base na relação conflituosa entre o homem e o seu ambiente,

em um processo de mútua influência. Portanto, deve se procurar também rejeitar a

ideia maniqueísta da existência de um evento natural agressor atuando sobre uma

sociedade que, por sua vez, é tida como vítima. (SOUZA; ZANELA, 2009,

p.16).

Risco é um constructo social, ou seja, é uma percepção humana ou de um grupo de

indivíduos da probabilidade de ocorrência de um evento perigoso e causador de danos, diante

da vulnerabilidade deste indivíduo ou grupo. Conflituosamente, a noção de risco é confundida

com a noção do próprio evento causador de perigo e ameaça. Assim, o perigo corresponde à

possibilidade ou a ocorrência de um evento causador de prejuízo. É uma ameaça potencial às

pessoas e seus bens. Risco, contudo, é uma probabilidade de ocorrência de perigo e de

geração de perdas. (ALMEIDA, 2012).

A palavra risco vem sempre acompanhada de um adjetivo que o qualifica e o associa ao

cotidiano da sociedade. As classificações mais correntemente citadas na literatura são: risco

tecnológico, risco natural, risco social e risco ambiental.

Os riscos tecnológicos, de acordo com Veyret (2007), podem ser classificados como

tipos de poluições. Estas podem ser as crônicas, quando os fenômenos ocorrem de maneira

perigosa e recorrente e, por vezes, lenta e de forma difusa, ou as acidentais, aquelas que

ocorrem quando há vazamentos de produtos tóxicos, explosões, incêndios. Para Dagnino e

Carpi Jr. (2007), três fatores são indissociáveis deste tipo de risco, sendo que, onde quer que

exista um desses fatores, haverá a probabilidade do risco: o processo de produção (recursos,

técnicas, maquinários e equipamentos), o processo de trabalho (relações entre direções

de Janeiro: Bertrand Brasil, 1993. CASTRO, S. D. A. Riesgos y peligros: uma visión desde la Geografía.

Scripta Nova. Revista Eletrónica de Geografía y Ciências Sociales, Barcelona, n. 60, 2000. Disponível em:

<htt p://www.ub.es/geocrit/sn-60.htm>. Acesso em: 20 ago. 2005.

18

Está versão é defendida segundo Souza e Zanella (2009) por : SMITH, K. Environmental hazards: assessing

risk and reducing disaster.3nd. ed. London: Routledge, 2001.

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 36

empresarias e estatais e empregados) e a condição humana (existência individual e coletiva,

ambiente).

Os riscos naturais são assim denominados quando os riscos não podem ser relacionados

ou atribuídos à ação humana, podendo, contudo, serem agravados pelo homem. Para Veyret

(2007), os riscos naturais são aqueles pressentidos, percebidos e suportados por um indivíduo

ou grupo diante de uma possível ação de um evento natural. Apresentam causas físicas, sendo

difícil a intervenção ou previsão humana. Dentre estes, a autora cita os de origem litosférica,

como os terremotos, vulcões, desmoronamento de solo, e os de origem hidroclimática, como

os ciclones, as tempestades, nevascas, inundações, secas etc. Quando agravados pela ação

humana, os riscos naturais tendem a impactar mais gravemente. Assim, a autora cita como

exemplos a erosão, a desertificação, os incêndios, a poluição, inundações etc.

Os riscos sociais implicam uma diversidade de atores e variáveis a serem consideradas.

Deste modo, diante da polissemia da palavra social, pode-se identificar como risco social a

maior parte dos riscos. Riscos relacionados a elementos naturais como furacões, terremotos,

epidemias, secas etc., bem como os riscos decorrentes das sociedades e das formas políticas e

de administração adotadas (crescimento urbano, industrialização, grande densidade em alguns

bairros) podem afetar ou ser afetados pelos riscos sociais. (DAGNINO; CARPI Jr., 2007).

Os riscos ambientais para Veyret (2007) seriam a síntese dos riscos naturais e os riscos

decorrentes de processos naturais agravados pela intervenção e ocupação humana. Souza e

Zanella (2009), por outro lado, inferem que, conhecendo a diferença entre hazard e risk, a

expressão risco ambiental refere-se a uma situação de ameaça ambiental (de ordem física,

tecnológica e até mesmo social) atuando sobre uma população reconhecidamente vulnerável.

Cerri e Amaral (1998) afirmam que nas diferentes formas de classificação dos riscos, os

riscos ambientais assumem a classe maior quando são consideradas as situações potenciais de

perdas e danos ao homem (vide figura 1). Os autores propõem na figura que os riscos

naturais, sociais e tecnológicos seriam subclasses dos riscos ambientais. Como exemplos de

riscos tecnológicos, destacam os vazamentos de produtos tóxicos, inflamáveis, radioativos,

colisão de veículos, queda de aviões etc. Dentre os riscos sociais, enfatizam os assaltos

guerras, conflitos, sequestros, atentados.

Para estes autores, os riscos naturais, enquanto componente do risco ambiental, ainda são

subdivididos em riscos físicos e riscos biológicos (associados à fauna e à flora). Os riscos

físicos são tripartidos em riscos atmosféricos (furacões, secas, tempestades, granizo etc.),

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 37

riscos hidrológicos (enchentes e inundações) e riscos geológicos. Estes últimos, podem ser

ainda classificados quanto ao seu caráter endógeno, associado aos processos da geodinâmica

interna, (terremotos, atividades vulcânicas e tsunamis) e exógeno, associado à geodinâmica

externa, (escorregamentos e processos correlatos, erosão/assoreamento, subsistências e

colapsos de solo, solos expansivos).

Os riscos biológicos associados à fauna correspondem às doenças que seriam provocadas

por vírus e bactérias, pragas, como gafanhotos e roedores, picadas de animais venenosos etc.

Por fim, os riscos biológicos associados à flora seriam aqueles determinadores de doenças

provocadas por fungos, pragas como as ervas daninhas, ervas tóxicas e venenosas etc.

Figura 1. Riscos Ambientais. Adaptado de Cerri e Amaral, 1998, p. 302.

Para Marandola Jr. e Hogan (2004a, b), o fato da natureza dos riscos não estar restrita a

uma única dimensão da realidade, exprimindo toda a complexidade da sociedade

contemporânea em seus diferentes embates e naturezas, enseja uma postura de análise

multidimensional e transescala para um melhor conhecimento da sua dinâmica. Estes autores

destacam que as abordagens correntes sobre o tema envolvem desde leituras altamente

objetivistas, encarando-o como eventos probabilísticos, a outras que entendem o risco

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subjetivamente somente como fonte de interações sociais. Entre ambas, contudo, existem

outras tendências com diferentes graus de objetivismo e subjetivismo.

Muitas destas abordagens estão, para os autores, voltadas para estudos com escalas de

análise coletivas, relegando-se a individual e não levando em consideração como as

populações experienciam ou como percebem o risco em suas vidas. Este fato deve-se

principalmente por estas análises direcionarem-se a espaços-tempos distintos (localizados),

sem que se haja uma ligação com as macroestruturas sociais ou culturais. Os teóricos da

Sociedade de Risco é que passam a estudar esta amplitude, colocando o risco no próprio

mecanismo de produção social. Marandola Jr. e Hogan (2004b) dividem as abordagens e

tendências sobre o risco em quatro grupos: (1) Avaliação e Gestão do Risco; (2) Percepção do

Risco; (3) Eventos e Sistemas Ambientais; (4) Sociedade de Risco, conforme veremos a

seguir.

Avaliação e Gestão do Risco trata-se de uma forma de abordagem fortemente objetivista.

É propriamente a análise do risco. Suas características fundam-se na importância de que

estudos de identificação, avaliação e gestão do risco poderiam diminuir as incertezas com as

quais convivemos diariamente, assim como, fornecer bases seguras para a ação política por

meio do conhecimento científico. Estes foram estudos defendidos pelos primeiros geógrafos

envolvidos com os natural hazard (perigos naturais), bem como em trabalhos preocupados

com a saúde pública.

William Rowe (1987) no artigo Alternative risk evaluation paradigms, define o que vem

a ser a gestão e avaliação risco:

[...] avaliação do risco [...] significa estimar o risco e a gestão do risco significa a

redução ou controle do risco para um nível ‘aceitável’, se é que este nível pode ser

explicitamente determinado. Na verdade estes dois processos são inseparáveis desde

que a incerteza em um afete os nossos julgamentos sobre o outro e vice versa

(ROWE, 1987, p.1-2 apud MARANDOLA JR., HOGAN, 2004b).

Ainda para Rowe (1987), a análise do risco seria uma ferramenta de análise política

que combinaria conhecimentos científicos associados à ciência da informação política para

auxiliar na tomada de decisões. Seria um subsídio para a decisão e sua importância e utilidade

derivariam de suas aplicações e sucesso na resolução das decisões envolvidas. Este autor

salienta que a análise não seria um modelo, mas, sim, um arcabouço de princípios norteadores

para a formulação de metodologias aplicadas em distintos contextos. Esta concepção do

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 39

importante papel da ciência na política ambiental era fortemente defendida por organismos

supranacionais, bem como por associações acadêmicas internacionais,como a Scientific

Committe on Problems of the Environment (SCOPE). Marandola e Hogan (2004b) trazem

duas considerações a respeito da avaliação objetivista do risco:

em primeiro lugar, a linha de investigação surge a partir de problemas empíricos,

principalmente ligados à gestão. Em segundo lugar, apesar de reconhecer a

incerteza, assenta-se sobre uma concepção de ciência onde ela é encarada como

possuidora de meios para disciplinar a incerteza, promovendo uma base segura para

a tomada de decisões. Temos uma certa reserva com respeito a esta crença, embora

não neguemos o papel do conhecimento científico em auxiliar a elaboração de

políticas públicas. No entanto, este auxílio deve ser realizado a partir da participação

dos cientistas na construção dos conhecimentos, juntamente com as populações

afetadas e o poder público, e não estabelecendo um processo de cima para baixo.

Seria talvez este o papel da percepção neste quadro. (MARANDOLA JR.; HOGAN,

2004b, p.32).

Na Percepção do Risco, a ênfase é dada à cultura e aos processos socioconstrucionistas.

Dentre os trabalhos precursores nesta área e que tiveram resultados reveladores, Souza e

Zanella (2007) mencionam o de Kates (1962 e 1967) que tinha por objetivo traçar um

comparativo entre a visão dos técnicos e pesquisadores com a dos cidadãos comuns diante das

inundações em diferentes áreas dos Estados Unidos e das tempestades tropicais no Leste

daquele país, respectivamente. Estes estudos mostraram que as imagens dos cidadãos frente

aos riscos e as medidas de combates podiam ser muito diferentes daquelas observadas pelos

técnicos.Contudo, os autores também enfatizam que até mesmo os mais informados ou

instruídos podem sofrer influências dos fatores subjetivos, logo, é necessário considerar o

papel da percepção tanto na avaliação leiga quanto na avaliação técnica e científica dos riscos.

Na abordagem sobre a percepção, enriquecida com trabalhos oriundos da Sociologia,

Antropologia e Psicologia, o risco recebe um tratamento mais subjetivista, embora não fique

totalmente descolado dos processos sociais. Navarro (2005) destaca a importância dos

estudos sobre os riscos envolverem a percepção dos envolvidos, tendo em vista que, diante da

segunda modernidade, novos padrões cognitivos estão se desenvolvendo no que tange a

tomada de decisões tanto no âmbito governamental quanto no cotidiano da vida dos

indivíduos.

A objetividade dada em alguns estudos compromete a importância do processo cognitivo

elaborador da percepção do risco. Sendo este um fenômeno que se processa em concorrência

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 40

com a autopercepção no contexto coletivo, o enfrentamento ou não de situações de risco,

segundo a autora:

dependerá do contexto que posiciona o indivíduo em um determinado lugar, ou seja,

sua inserção em um dado evento (cotidiano ou esporádico), da função que ocupa o

indivíduo em determinado espaço social, dos aspectos culturais, da personalidade,

da história de vida, das características pessoais e das pressões e/ou demandas do

ambiente. Influenciados por um sistema de valores, os indivíduos tendem a construir

uma auto-imagem e a consolidar o que pensam ser um determinado potencial

humano, baseando-se neste sentimento para promoverem auto-avaliações para se

exporem ou não a riscos. (NAVARRO, 2005, p. 68).

Outro aspecto enfatizado é a dificuldade no reconhecimento e tratamento dos perigos,

uma vez que muitos indivíduos não se declaram cognitivamente proprietários ou vítimas

destes perigos potenciais. Tal fato deve-se ao descuido nas observações precisas das situações

de perigos o que leva a “[...] elas não se inscrevam num campo de competências bem

definidas, causando a dispersão de interesses e prerrogativas para análises bem pontuadas

capazes de transformar as situações difusas de perigo em riscos definidos.” (NAVARRO,

2005, p.68).

A autora assegura que a complexidade em que se situa a problemática do risco, e sua

distribuição na sociedade contemporânea, demanda atitudes e escolhas individuais que

relegam questões voluntárias como a afetividade ou o desejo. Estas escolhas são elaboradas

por processos cognitivos balizadores que envolvem objetividades e subjetividades. Como

exemplos, a autora cita situações de dúvidas cotidianas: os riscos do consumo dos alimentos

geneticamente modificados, a confiança e fidelidade no parceiro em relação às doenças

sexualmente transmissíveis. Entretanto, estas mesmas situações que transformam o perigo

difuso em risco definido desenvolvem, em paralelo, condições de mobilização, sejam na

esfera individual, sejam pelo intermédio de associações, sindicatos etc., que se revertem em

conquistas legais e sociais.

Para Souza e Zanella (2007), levando-se em consideração os prejuízos das

comunidades afetadas por desastres ambientais, percepções distintas, assim como percepções

semelhantes, podem ser identificadas em grupos socioeconômicos e culturais diferenciados.

Algumas características ou qualidades das situações de risco são capazes de influenciar a

percepção de forma a atenuar ou a agravar a avaliação que se faz da realidade. No Quadro 1,

elencamos os principais fatores que podem influenciar a percepção:

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FORTE INFLUÊNCIA FRACA INFLUÊNCIA

Alta probabilidade de ocorrência Baixa probabilidade de ocorrência

Curto intervalo de recorrência Impactos nunca experimentados

Expectativa de que ocorra em breve Expectativa de que ocorra no futuro

Evento extremo Baixa variação em torno do habitual

Evento imaginável, de fácil definição. Início e fim difíceis de identificar

Fortes consequências Fracas consequências

Impacto direto sobre o bem-estar Efeitos indiretos sobre o bem-estar

Perdas de vidas humanas Sem perdas de vidas humanas

Vítimas identificáveis Vítimas tratadas estatisticamente

Impactos concentrados Impactos aleatórios

Razoável certeza de que irá ocorrer Incerteza de que irá ocorrer

Mecanismos e efeitos inteligíveis Mecanismos e efeitos não entendidos

Impactos dramáticos Impactos pouco perceptíveis

Quadro 1. Principais características climáticas que influenciam a percepção. Adaptado

de Souza e Zanella (2007, p. 38) apud Whyte (1985, p.101).

Os autores destacam que, mesmo diante da importância de todas as características, o

impacto do evento apresenta-se como a principal influência no processo de avaliação

subjetiva dos riscos. Assim, os desastres experimentados quando, por exemplo,

acompanhados de perdas humanas e financeiras tendem a ser os mais concretos e evidentes.

Contudo, é necessária a consideração dos valores inerentes a cada indivíduo (cultura, religião

etc.).

Outra variante na percepção do risco a avaliar é a de indivíduos que observam o

fenômeno de um ponto de vista externo, como os gestores públicos. Souza e Zanella (2007)

apontam que a tomada de decisão, nestes casos, envolvem análises de custo-benefício

assentadas na racionalidade econômica. Este modelo, na maioria dos casos, tende ao fracasso

ao materializar-se.

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Os estudos relacionados aos eventos e sistemas ambientais são riquíssimos em

empiria, no entanto, sua abordagem conceitual necessita de avanço. De forma geral, a base

conceitual aplicada à empiria é sempre relacionada a uma anterior. Os riscos avaliados,

tratando-se de eventos naturais, são principalmente os ligados à Geomorfologia, à

Climatologia, à Hidrologia e à Geologia. (MARANDOLA Jr.; HOGAN, 2004b).

Nos estudos ligados à Geomorfologia19

, destacam existir uma ligação muito estreita

com as características intrínsecas dos sistemas ambientais. Os estudos voltavam-se à dinâmica

dos sistemas em relação aos eventos externos, assim, os riscos seriam expressos pela

vulnerabilidade, suscetibilidade ou fragilidade dos próprios sistemas a estes eventos que, em

geral, eram de origem antrópica. Os perigos pouco aparecem e, geralmente, de uma forma não

muito bem conceituada relacionada mais aos riscos ou às consequências dos eventos.

Nos riscos avaliados e ligados à Climatologia, abordagens foram feitas considerando o

fenômeno das cheias20

, de origem natural, mas com forte influência da geomorfologia e da

ação humana. Outra vertente estuda este fenômeno considerando também a vulnerabilidade

das áreas21

. Nos estudos dedicados aos recursos hídricos e aquíferos, os autores ressaltam as

contribuições de Foster & Hirata (2003)22

. Para a determinação dos riscos e vulnerabilidades

nesta natureza de investigação, foram utilizados “[...] medições bioquímicas, análise

geológica e geomorfológica, estudos de drenagem e de recarga, pluviosidade, análises

químicas da qualidade da água, perfurações etc.” (MARANDOLA Jr.; HOGAN, 2004b, p.

38). O homem é marginalizado no processo e teria um caráter meramente contaminante,

relegando-se, assim, discussões acerca das causas e estruturas que contribuiriam para a

contaminação.

19

MARANDOLA Jr. & HOGAN (2004b) atribuem a Jurandyr Ross a proposta metodológica de análise da

fragilidade do relevo, contudo ressaltam uma série de outros estudiosos que trataram os riscos desvinculando-

os das fragilidades e dos perigos naturais. Foram abordagens enfocadas nas áreas de risco, nas vulnerabilidades

e nas susceptibilidades. Assim, como contribuinte desta linha, os autores destacam o artigo escrito por Nelson

F. Fernandes e Cláudio P. do Amaral: “Movimentos de massa: uma abordagem geológico-geomorfológica”

(FERNANDES & AMARAL, 2000).

20 Cf. MONTEIRO, Carlos A. de F. Clima e excepcionalismo:conjecturas sobre o desempenho da atmosfera

como fenômeno geográfico. Florianópolis: Ed. da UFSC, 1991. 241p.

21 Cf. SOUZA, Cristiane M. Avaliação ambiental estratégica como subsídio para o planejamento urbano.

2003. Tese (Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas,

Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.

22 Cf. FOSTER, Stephen & HIRATA, Ricardo. Determinação do risco de contaminação das águas

subterrâneas. Um método baseado em dados existentes. (trad. Ricardo Hirata et al) São Paulo: Instituto

Geológico, 1993. 92p. [Boletim n.10]

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Outros trabalhos dão ênfase à relação entre as dinâmicas físicas e a ação antrópica.

Neste caso, em primeiro lugar é determinada a vulnerabilidade para, em seguida, cruzar os

dados físicos e humanos em forma de mapas, produzindo, consequentemente, o que se

denomina de Unidades de Risco, que “[...] podem ser caracterizadas conforme a capacidade

que apresentam para armazenar ou mobilizar os contaminantes mediante alguma ação, seja ela

antrópica ou natural” (HADLICH, 1997, p.68 apud MARANDOLA Jr.; HOGAN, 2004b, p.

39).

Por último, os autores debatem abordagens em diversos contextos efetuadas por

demógrafos. Os conceitos, nesta discussão, referem-se às populações em situação de risco,

capacidade de suporte e vulnerabilidade. O foco dos estudos localiza-se no reconhecimento

dos fenômenos (enchentes, deslizamentos, inundações, enquanto dinâmicas físicas) e o

entendimento das dinâmicas sociais que expõem determinadas populações de determinados

segmentos sociais a estes riscos (populações em situações de risco). Neste aspecto, as

dinâmicas demográficas e sociais são evidenciadas e a vulnerabilidade para os autores é

entendida :

mais como vulnerabilidade das populações diante de tais eventos (capacidade de

diminuir ou dar resposta ao risco), enquanto o estudo das dinâmicas físicas fica

restrito ao limite suficiente para avaliá-las enquanto causadoras de danos às

populações e passíveis de ser controladas por políticas de gestão. No entanto, em

geral, entende-se que os riscos advêm do mau uso do solo, e que a razão dos riscos é

a sobreposição de ocupação humana em áreas onde já existiam dinâmicas anteriores

ou, ainda, que não possuiu capacidade de suporte para aquele uso. (MARANDOLA

Jr. ;HOGAN, 2004b, p. 40).

Quem não se recorda do Furacão Sandy23

que provocou mais de 250 mortes no Caribe e

nos Estados Unidos em 2012? Ou das chuvas24

que causaram deslizamento e enchentes na

região Serrana do Rio de Janeiro em 2011? Estes e muitos outros exemplos de catástrofes

refletem a vulnerabilidade da civilização contemporânea. Hogan e Marandola Jr. (2006)

ressaltam que as dinâmicas e fenômenos ambientais, além de fazerem parte do dia a dia de

23

Para mais informações sobre o Furacão Sandy, consultar: Sandy, a devastadora tempestade: como furacão,

"sandy" nunca chegou a superar a categoria 2 de um máximo de 5 da escala de saffir-simpson disponível em

:< http://exame.abril.com.br/meio-ambiente-e-energia/noticias/sandy-a-devastadora-tempestade>. Acesso em:

27 mai.2013.

24 Mais informações, consultar : CASTILHO, L.V; OLIVEIRA, P.M.C; FABRIANI, C.V. Análise de uma

tragédia ambiental e a participação da população no equacionamento dos problemas de moradia: um estudo de

caso da tragédia na região serrana do rio de janeiro. In: VI Encontro Nacional da ANPPAS, 2012, Anais...

Belém, 1996. Disponível em: < VI Encontro Nacional da ANPPAS18 a 21 de setembro de 2012Belém – Pará –

Brasil>. Acesso em : 27 mai. 2013.

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 44

cada indivíduo, passaram a ocupar destaque na agenda política e econômica mundial. De uma

questão do domínio de ativistas e ecologistas, as consequências da inadequada relação

sociedade-natureza atingem dimensões globais.

Assim, outra vertente que surge com bastante força para o conceito de risco é a

vulnerabilidade. E, por estar correntemente associado ao risco, o termo traz conflituosa

discussão. Citando Rebelo (2003), Dagnino e Carpi Jr.(2007) destacam que a confusão entre

os termos utilizados para tratar de riscos e vulnerabilidades está associada às diferentes ideias

que são empregadas. Para os franceses, o termo está ligado a ideia de “aleatório” (aléa). Os

anglo-saxónicos adotaram a de “acaso” ou “casualidade” (hazard); Alguns espanhóis,

italianos e portugueses, ao manifestarem a ideia de ameaça optaram pelas palavras

peligrosidad, pericolosità e “perigosidade”, respectivamente.

Contudo, os autores afirmam existir um ponto de confluência que independe das palavras

empregadas. O risco, neste aspecto, corresponderia ao somatório de algo que nada tem a ver

com a vontade do homem (aleatório, acaso, casualidade ou perigosidade), com algo que

resulta da presença direta ou indireta do homem, ou seja, a vulnerabilidade.

Com objetivo de levantar elementos das diferentes abordagens do termo vulnerabilidade,

Hogan e Marandola Jr. (2006) enfocaram seus estudos em dois grandes temas: pobreza,

exclusão e marginalização e, o segundo, a problemática ambiental. Neste último, informam

as conseqüências nefastas da inadequada relação sociedade natureza eram tratadas nas

primeiras décadas após a Segunda Guerra como fenômenos naturais (desastres ou catástrofes

naturais). Ao longo das décadas, os estudos passaram a incorporar perspectivas mais

complexas e holísticas, “[...] visando compreender a intricada rede de relações humano-físico-

socias que estão na base da trama genética dos desastres”. (HOGAN; MARANDOLA Jr.,

2006, p. 33).

Dessa forma, outros fenômenos tecnológicos, como as contaminações e intoxicações

industriais, desastres químicos, acidentes nucleares, além dos fenômenos sociais como a

fome, a pobreza e a violência, também foram incorporados aos estudos, mostrando a

indissociação entre as problemáticas ambientais e sociais. Assim, ao incluírem a crítica de

Cutter, (1996) aos estudos dos perigos naturais que não incorporavam a discussão sobre o

desenvolvimento e a pobreza em suas análises, não mencionando as causas da vulnerabilidade

social aos desastres, os autores destacam que:

Se, por um lado, os estudos sobre os perigos naturais traziam uma ampla gama de

questões sobre as respostas, ajustamentos e percepção do risco e do perigo,

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 45

buscando alternativas para a gestão, previsão e planejamento do perigo e de seus

danos, por outro, não se discutia detidamente as capacidades ou possibilidades de

proteção. A análise dos eventos era externa, passando de imediato à percepção, sem

uma discussão sobre os processos sociais diretamente envolvidos não apenas na

gênese, mas, sobretudo, nas formas de proteção contra o desastre. É aqui que a

vulnerabilidade aparece como conceito que irá proporcionar esta análise mais

complexa. Assim, os estudos sobre os perigos e desastres, no campo da geografia,

passam a abarcar desde os processos biofísicos e sociais do evento até suas

conseqüências no campo ambiental, social e individual, passando pelas decisões,

escolhas e ajustamentos individuais, coletivos e estatais. (HOGAN; MARANDOLA

Jr., 2006, p. 33-34).

A partir da década de 80, a adoção do termo vulnerabilidade aos estudos produz uma

série de conceitos e aplicações que estão mais ou menos relacionados. As variações vão desde

aplicações ligadas diretamente às dinâmicas naturais a outras estritamente sociais, existindo

também aquelas que procuram equilibrar estas dimensões. (HOGAN; MARANDOLA JR.,

2006). No Quadro 1, é possível visualizar estas nuances de conceitos adotados por distintos

autores, conforme Cutter (1996):

Quadro 1 – Variações conceituais a respeito da vulnerabilidade

VARIAÇÕES CONCEITUAIS A RESPEITO DA VULNERABILIDADE

Gabor e Griffith (1980): Vulnerabilidade é a ameaça (perigos materiais), à qual as pessoas estão expostas

(incluindo agentes químicos e evento ecológico das comunidades e seu nível de preparação para

emergências). Vulnerabilidade é o contexto de risco.

Timmerman (1981): A vulnerabilidade é o grau em que um sistema atua negativamente para a ocorrência de

um evento perigoso. O grau e a qualidade da reação adversa são condicionados pela resiliência do sistema

(uma medida da capacidade do sistema de absorver e se recuperar do evento).

UNDRO (1982): A vulnerabilidade é o grau de perda para um determinado elemento ou conjunto de

elementos em risco resultante da ocorrência de um fenômeno natural de uma determinada magnitude.

Susman et al. (1984):A vulnerabilidade é o grau em que diferentes classes da sociedade estão

diferencialmente em risco.

Kates (1985): Vulnerabilidade é a "capacidade de sofrer danos e reagir negativamente".

Pijawka e Radwan (1985): Vulnerabilidade é a ameaça ou a interação entre risco e preparação. É o grau em

que os materiais perigosos ameaçam a uma determinada população (risco) e a capacidade da comunidade para

reduzir os riscos ou consequências adversas de lançamentos de materiais perigosos.

Bogard (1989): A vulnerabilidade é operacionalmente definida como a incapacidade de tomar medidas

eficazes para assegurar-se contra perdas. Quando aplicada a indivíduos, a vulnerabilidade é uma

consequência da impossibilidade ou improbabilidade de mitigação eficaz é uma função de nossa capacidade

de selecionar os perigos.

Mitchell (1989): A vulnerabilidade é o potencial de perda.

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Liverman (1990): Faz distinção entre a vulnerabilidade como condição biofísica e vulnerabilidade como

definida pelas condições políticas, sociais e econômicas da sociedade. Ela defende vulnerabilidade no espaço

geográfico (onde as pessoas e os lugares mais vulneráveis estão localizados) e vulnerabilidade no espaço

social (quem em qual lugar é vulnerável).

Downing (1991): Vulnerabilidade tem três conotações: refere-se a um efeito (por exemplo, a fome) em vez de

uma causa (por exemplo, está vulnerável à fome), e é um termo relativo que diferencia entre grupos ou

regiões socioeconômicas, ao invés de uma medida absoluta de privação.

Dow (1992): A vulnerabilidade é a capacidade diferencial de grupos e indivíduos lidarem com os riscos, com

base em suas posições nos mundos físico e social.

Smith (1992): Risco de um perigo específico varia ao longo do tempo e de acordo com as mudanças em

qualquer exposição física (ou ambos) ou vulnerabilidade humana (a amplitude da tolerância social e

econômica disponível no mesmo local).

Alexander (1993): A vulnerabilidade humana é uma função dos custos e benefícios de habitar em áreas de

risco para desastres naturais.

Cutter (1993): A vulnerabilidade é a probabilidade de que um indivíduo ou um grupo será exposto e

prejudicado por um perigo. É a interação dos perigos do lugar (risco e mitigação) com o perfil social das

comunidades.

Watts e Bohle (1993): A vulnerabilidade é definida em termos de exposição, capacidade e potencialidade.

Assim, a resposta prescritiva e normativa para a vulnerabilidade é reduzir a exposição, aumentar a capacidade

de enfrentamento, reforçar o potencial de recuperação e reforçar o controle de danos (ou seja, minimizar as

consequências destrutivas) através de meios públicos e privados.

Blaikie et al. (1994): Por vulnerabilidade entende as características de uma pessoa ou grupo em termos de sua

capacidade de antecipar, lidar, resistir e se recuperar do impacto de um perigo natural. Trata-se de uma

combinação de fatores que determinam o grau em que a vida de alguém e sua subsistência são postas em risco

por um evento capaz e discreto que pode ser identificado na natureza ou na sociedade.

Bohle et al. (1994): Vulnerabilidade é melhor definida como uma medida agregada do bem-estar humano que

integra a exposição ambiental, social, econômica e política de uma gama de potenciais perturbações

prejudiciais. Vulnerabilidade é um espaço social de múltiplas camadas e dimensões definida por determinadas

capacidades políticas, econômicas e institucionais de pessoas em locais e tempos específicos.

Dow e Downing (1995): Vulnerabilidade é a suscetibilidade diferencial de circunstâncias que contribuem

para ela. Fatores biofísicos, demográficos, econômicos, sociais e tecnológicos, como as idades das

populações, a dependência econômica, o racismo e a idade da infraestrutura são alguns dos fatores que foram

examinados em associação com os riscos naturais.

Fonte: Adaptado na tradução da língua inglesa para a portuguesa de Cutter, 1996.Cutter, 1996, p.531-532.

White, Kates e Burton (2001) retomando o conceito de vulnerabilidade de Blaike et

al,(1994), citam que alguns grupos da sociedade são mais propensos do que outros ao dano, à

perda e ao sofrimento no contexto de diferentes perigos. As principais características nas

variações de impacto incluiriam a classe social, a etnia, o gênero, incapacidade, idade ou a

senilidade. Por fim, os autores destacam que junto ao crescimento do interesse no conceito de

vulnerabilidade veio o reconhecimento do papel das forças sociais mais amplas, mais

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 47

profundas e mais poderosas que restringem a escolha e que não podem ser combatidas com

correções técnicas ou sociais.

Em termos gerais, entendemos ser a vulnerabilidade uma condição de fragilidade, seja

de ordem física, social, econômica e/ou política, em que um indivíduo, ou grupo de

indivíduos, estaria mais susceptível à exposição de eventos nas mais distintas situações.

3.2 SOCIEDADE DE RISCO

Se as ciências sociais já haviam entrado no debate dos riscos, a grande mudança ocorre

no deslocamento da discussão acerca dos riscos: de tema marginal, ela passa para o centro da

teoria social, tomando dimensões de um paradigma. Assim, por meio dos teóricos como

Ulrich Beck e Anthony Giddens, ocorreu uma ampliação que colocou o risco no próprio

mecanismo de reprodução social da sociedade contemporânea. Tanto Beck quanto Giddens

identificam uma mudança da organização social na transição da sociedade industrial para a

Sociedade de Risco sem que existisse uma alteração na razão predominante (MARANDOLA

Jr.; HOGAN, 2004b). Esta transição pode ser resumidamente visualizada no Quadro 2:

Quadro 2 - Características das sociedades tradicionais, 1ª modernidade e 2ª modernidade,

segundo Beck

Sociedades tradicionais 1ª Modernidade 2ª Modernidade

Estruturas comuns

Influência da família na

construção da

individualidade;

Tradição;

Religião/crenças;

Dogmas.

Peso do Estado-nação;

Estrutura de classes sociais;

Pleno emprego;

Rápida industrialização;

Exploração de natureza não

visível.

Reflexividade;

Destradicionalização;

Indivivdualização;

Globalização;

Desemprego;

Liberdade de escolha;

Revolução do gênero;

Progresso tecnológico;

Poder tecnocrata.

Segurança

Previsibilidade

Confiança

Norma

Dúvida quotidiana;

Incerteza;

Fragmentação cultural;

Insegurança

Comportamentos predefinidos Pensar antes de agir

Fonte: QUEIRÓS, 2001, p.06.

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Beck (2010) afirma que o mundo hoje se encontra em uma disposição de perigo que

atinge a todos. Para ele, o risco é global e da civilização e que a correspondente produção

social da riqueza veio acompanhada da produção social do risco. No que denomina

modernidade tardia, a lógica da produção e distribuição igualitária do risco, ainda que não

acompanhada da distribuição igualitária da riqueza, está historicamente ligada a duas

condições: primeira, consuma-se quando se é objetivamente reduzida e socialmente isolada a

autêntica carência material, por meio do nível alcançado pelas forças produtivas humanas e

tecnológicas bem como das garantias e regras jurídicas do Estado Social; segunda, na

produção exponencial do processo de modernização são desencadeados riscos até então

desconhecidos.

De acordo com o autor, a redução de riscos e ameaças não se trata mais da utilização

econômica da natureza para libertar as pessoas de sujeições tradicionais, mas, e sobretudo, de

liberá-las dos problemas decorrentes do próprio desenvolvimento técnico-econômico. Assim,

o processo de modernização “[...] torna-se reflexivo, convertendo-se a si mesmo em tema e

problema” (BECK, 2010, p.24). Destaca ainda que enquanto algumas sociedades (países em

desenvolvimento) o pensamento e a ação das pessoas girarem sobre a escassez material, o

processo de modernização encontrará terreno fértil sobre a pretensão de ter o

desenvolvimento científico-tecnológico que leve ao “acesso” às fontes de riqueza.

No entanto, nos Estados de Bem-Estar do Ocidente, a luta pelo pão de cada dia, o

combate à miséria, cede lugar ao problema da nova pobreza, o excesso de peso, fazendo cair o

fundamento da legitimidade do processo de modernização sob esta ótica. Segundo o autor,

paralelamente a este ponto “dissemina-se a consciência de que as fontes de riqueza estão

contaminadas por ameaças colaterais.” (BECK, 2010, p. 25).

O autor afirma que os riscos do desenvolvimento industrial são tão antigos quanto ele

mesmo, sendo sistematicamente agravados com seu desenvolvimento posterior. Ameaçando a

vida no planeta, a produção destes riscos desloca-se do lócus da fábrica e da percepção

sensorial e assume uma característica coletiva justamente por conta da globalidade de seu

alcance (homem, fauna e flora). No entanto, essa dimensão do perigo não corresponde com a

sua percepção pelos indivíduos ameaçados.

Em sua obra Sociedade de Risco, os temores individuais são interpretados como uma

disposição social, relegando-se a disposição individual. Para Beck, há uma dependência

cognitiva do indivíduo para o reconhecimento destes riscos da modernização. Isto se deve ao

fato de que riscos e ameaças que prejudicam a saúde ou destroem a natureza são geralmente

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 49

imperceptíveis a olhos nus e, mesmo que evidentes, eles sempre necessitam da argumentação

e o juízo comprovado de algum especialista para sua afirmação objetiva.

Nas definições de risco, há sempre interesses, pretensões e pontos de vista

concorrentes e conflitivos que se desdobram em definições no sentido de causa e efeito. Esta

conflituosa pluralização da definição visa rechaçar os efeitos ameaçadores ao mercado.

Assim,

Ameaças ao solo, à flora, ao ar, à água e à fauna ocupam uma posição especial nesta

luta de todos contra todos em torno das definições de risco mais lucrativas, na

medida em que dão espaço ao bem comum e às vozes daqueles que não têm voz

própria (talvez só mesmo direitos eleitorais ativos e passivos estendidos às

gramíneas e minhocas serão capazes de trazer as pessoas à razão). No que diz

respeito aos referenciais dos riscos em termos de valores e interesses, tal

pluralização é evidente: alcance, urgência e existência de riscos oscilam com a

diversidade de valores e interesses. (BECK, 2010, p. 37-36).

Nesta esfera argumentativa de causa-efeito, para onde quer que seja apontado um

produtor potencial de risco, sempre existirá um especialista de plantão para contra argumentar

e indicar outras possíveis causas e culpados, na medida do possível, com uma “contra-

ciência” institucionalizada em termos empresariais. Desta forma, o autor afirma que:

A imagem diversifica-se. O acesso à mídia torna-se crucial. A incerteza no interior

da indústria aprofunda-se: ninguém sabe quem será o próximo sob o holofote da

moral ecológica. Bons argumentos, ou pelo menos argumentos capazes de se impor

publicamente, convertem-se em condição prévia do sucesso profissional. Os artesãos

da esfera pública, os “carpinteiros argumentativos”, têm sua grande chance

profissional. (BECK, 2010, p.38).

Não respeitando fronteiras sociais e nacionais, os riscos apresentam, ainda, um caráter

ambivalente: além de ameaças, estes se configuram como oportunidades de mercado

originando, daí, as disputas por definição em torno da extensão, do grau e da urgência dos

riscos. De outra forma, manipulando-se os riscos e definindo-os conforme alguns interesses

poderiam ser geradas novas necessidades e, consequentemente, novos mercados, o que, para

Beck, significaria um risco autofabricável. Para o autor,

É precisamente com o avanço da sociedade de risco que se desenvolvem como

decorrência as oposições entre aqueles que são afetados pelos riscos e aqueles que

lucram com eles. Da mesma forma, aumenta a importância social e política do

conhecimento, e consequentemente do acesso aos meios de forjar o conhecimento

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 50

(ciência e pesquisa) e disseminá-lo (meios de comunicação de massa). A sociedade

do risco é, nesse sentido, também a sociedade da ciência, da mídia e da informação.

Nela, escancaram-se assim novas oposições entre aqueles que produzem definições

de risco e aqueles que as consomem.(BECK, 2010, p. 56, grifo do Autor).

O autor destaca que aqueles que apontam os riscos são difamados como “estraga

prazeres” e reais produtores de risco. Os efeitos para o meio ambiente e o homem são vistos

como exagerados, sendo necessárias novas pesquisas para a definição dos riscos e das

medidas a serem tomadas. Desta forma, a confiança na racionalidade da ciência e na

tecnologia em encontrar soluções para todos os problemas é professada. A crítica à ciência e

as inquietações quanto ao futuro são estigmatizadas como irracionalidades. Contudo, o

predomínio dessa interpretação não deveria enganar quanto à realidade. Ao negá-la, há uma

produção maior daquilo que se nega: “as situações de perigo da sociedade de risco” (BECK,

2010, p. 55).

Neste aspecto, destaca que, quando o excedente de risco supera o excedente de riqueza, a

aparente inofensiva diferenciação entre a estipulação científica do risco (racional) e a

percepção (irracional) dos riscos ganha importância, perdendo até sua razão de ser. A posição

de dogma da concepção científica dos riscos é contraposta pela percepção social diante de

riscos e ameaças civilizacionais crescentes que nos conduzem a um presente de mudanças

urgentes e um futuro ameaçador.

O autor aponta que os efeitos sociais dos riscos independem da pluralidade de

interpretações causais e de interesses. Em termos de mercado globalizado e da visão

sistêmica, somos todos causa e efeito, ou seja, há a ausência de causas específicas e

responsabilidades isoladas. Nesse sentido, a sociedade de risco dispõe de novas formas de

conflitos e de consenso. Diante do potencial de autoameaça civilizacional, do efeito

equalizador, um novo tipo de solidariedade global surge: a superação do risco, ou seja, “[...]

aprender a sentar à mesa e a encontrar e a implementar soluções para as ameaças

autoinfligidas capazes de atravessar todas as fronteiras.”(BECK, 2010, p. 58). Por fim, se na

sociedade de classes a solidariedade girava sob a ótica da carência, na sociedade do risco, esta

gira sob o medo, tornando-se força política.

A consciência do risco proposto por Beck centra-se no futuro, esperando-se dele algo

desastroso que impossibilita qualquer ação corretiva. Os riscos são sempre indicativos de um

futuro que precisa ser evitado. Neste aspecto, escreve o autor:

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3 Riscos Ambientais na Contemporaneidade 51

De um lado, muitas ameaças e destruições já são reais: rios poluídos, ou mortos,

destruição florestal, novas doenças etc. De outro lado, a verdadeira força social do

argumento do risco reside nas ameaças projetadas no futuro. São, nesse caso, riscos

que, quando quer que surjam, representam destruições de tal proporção que qualquer

ação em resposta a elas se torna impossível e que, já como suposição, como ameaça

futura, como prognóstico sincreticamente preventivo, possuem e desenvolvem

relevância ativa. O núcleo da consciência do risco não está no presente, e sim no

futuro. Na sociedade de risco, o passado deixa de ter força determinante em relação

ao presente. Em seu lugar, entra o futuro, algo todavia inexistente,construído e

fictício como “causa” da vivência e da atuação presente. Tornamo-nos ativos hoje

para evitar e mitigar problemas ou crises do amanhã ou do depois de amanhã, para

tomar precauções em relação a eles - ou então justamente não. [...] Na discussão

com o futuro, temos portanto de lidar com uma “variável projetada”, com uma

“causa projetada” da atuação (pessoal e política) presente, cuja relevância e

significado crescem em proporção direta à sua incalculabilidade e ao seu teor de

ameaça, e que concebemos (temos de conceber) para definir e organizar nossa

atuação presente. (BECK, 2010, p. 40, grifo do autor).

Embora nossa consciência esteja no presente, os riscos são cálculos que fazemos

projetando-os sempre para o futuro. Esta relação das dimensões entre presente, passado e

futuro é realizada por meio da memória. Por isso, continuamos com breves considerações

desta relação entre as dimensões temporais e a memória no capítulo seguinte.

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4.Memória da (na) Sociedade 52

4 MEMÓRIA DA (NA) SOCIEDADE

Antes de discorremos sobre a memória, é preciso uma breve consideração a respeito

do tempo. Em Temporalidades na Formação, Gaston Pineau (2003, p. 24) afirma ser o tempo

“[...] uma daquelas noções básicas no limite da compreensão”. O indivíduo sabe o que é,

porém se questionado não sabe responder ao seu interlocutor. Isto se reflete porque o tempo

“[...] está ligado às matérias-primas, ao telúrico, ao cósmico, ao físico, ao biológico, ao

psíquico, ao social.” Ao citar Gabel (1962), o autor destaca ser o tempo a dimensão dialética

por excelência, pois sua progressão realiza uma síntese dialética constantemente renascente

do passado, presente e futuro.

Existem atrativos temporais (palavras do vocabulário temporal) que presentificam a

ausência do substantivo tempo. Muitas dessas palavras podem se classificar conforme a

referência: no sentido de movimento, os verbos porvir, devir e sobrevir exprimem mudança

em relação ao futuro ou passado; no sentido da estagnação ou cisão ao movimento, existe uma

série de palavras que expressam uma imobilidade, “uma certa duração: é o presente, o

momento.” (PINEAU, 2003,p.35).

O autor representa o tempo como um iceberg no qual se tenta chegar à ponta por dois

declives submersos muito escorregadios: do sobrevir e do porvir, do passado e do futuro . A

duração consciente do presente, que neste caso seria o topo do iceberg, não duraria em termos

quantificáveis mais que 1/16º de segundo. Contudo, para o autor:

a transformação ocorrida não desaparece como se nada tivesse acontecido, ela passa

para a memória e pode se conectar com as seguintes. A linguagem constitui, então,

uma ferramenta importante de construção do tempo humano [...]. Ela utiliza o

cérebro constantemente, com movimentos tão rápidos que anda mais rápido que

qualquer outro tempo, podendo até voltá-los para trás. Ela permite operações de

reversibilidade: pode-se - intelectualmente – voltar para trás, lembrar-se, refletir,

assim como em operações de antecipação: prevenir, prever, projetar. Sobre os vários

declives escorregadios do iceberg, a humanidade dispõe, nessa situação, para

construir seu tempo, de vantagens capitais, o cérebro e a linguagem. (PINEAU,

2003, p.36, grifo do autor.).

A existência histórica exige a conjugação acrobática das partes emersas e imersas

deste iceberg e não o simples manejo dos verbos ou dos advérbios de tempo (agora, neste

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4.Memória da (na) Sociedade 53

momento, ontem, hoje, depois, durante etc.). Assim, toda conduta verbal seria uma conduta

temporal ao passo que torna presente aquilo está ausente (passado e futuro) no espaço ou atual

momento (o presente).

Em referência a Borges (1960), Izquierdo (1989) afirma existir, duas maneiras de

conceber o fluxo do tempo: desde o passado em direção ao futuro, ou desde o futuro em

direção ao passado. O autor destaca que

Em qualquer um dos casos, o fluxo nos atravessa num ponto, que denominamos

presente. Um ponto não tem superfície nem volume; é intangível e fugaz. É curioso

que, em ambas concepções do tempo, o futuro (ou o passado) sejam conseqüências

de algo quase imaterial como é o presente; de um simples ponto. Esse ponto

evanescente, porém, é nossa única posse real: o futuro não existe ainda (e a

palavra ainda é uma petição de princípio) e o passado não mais existe, salvo sob a

forma de memórias. Não há tempo sem um conceito de memória; não há presente

sem um conceito do tempo; não há realidade sem memória e sem uma noção de

presente, passado e futuro. (IZQUIERDO, 1989, p.89, grifo do autor.).

Neste contexto, o que evocamos ao dizer a palavra memória? Que nos sobressai à

mente? Passado, lembranças, histórias? Para Izquierdo (1989), a memória é nosso senso

histórico e nosso senso de identidade pessoal. Na memória, há a conservação do passado por

meio de imagens ou representações que podem ser evocadas. A memória, na visão deste

neurocientista, é a evocação da informação armazenada no cérebro que foi adquirida por meio

das experiências individuais dos homens e dos animais, aquela que de alguma maneira se

registra no cérebro.

De acordo com o autor, ela é fruto de algo que percebemos ou sentimos e, dessa

forma, a memória adquirida em estado de alerta e com certa carga emocional ou afetiva é

mais bem lembrada que aquela de fatos inexpressivos ou adquiridas em estado de sonolência.

Esta aquisição de memórias denomina-se aprendizado e as experiências seriam aqueles pontos

intangíveis que chamamos presente. Assim, não há memória sem aprendizado, nem há

aprendizado sem experiências. E, como existem muitas e variadas experiências, seria mais

correto expressar a palavra memórias e não memória.

Izquierdo (1989) ressalta que a variedade de memórias possíveis é tão grande que é

evidente que a capacidade de adquirir, armazenar e evocar informações é inerente a muitas

áreas ou subsistemas cerebrais, não sendo função exclusiva de nenhuma delas. Contudo, para

o autor, existem:

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4.Memória da (na) Sociedade 54

certas estruturas e vias (o hipocampo, a amígdala, e suas conexões com o

hipotálamo e o tálamo) que regulam a gravação e evocação de todas, de muitas, ou

pelo menos da maioria das memórias. Este conjunto de estruturas constitui

um sistema modulador que influi na decisão, pelo sistema nervoso, ante cada

experiência, de que deve ser gravado e de que deve ou pode ser evocado. O

hipocampo e a amígdala estão interligados entre si e recebem informação de todo.

[...] Estas estruturas e suas conexões estão, portanto, estrategicamente localizadas

para modular o processamento de informações baseadas na experiência.

(IZQUIERDO, 1989, p.92).

Para o autor, por existir esta variedade de memórias, seu estudo não deve reduzir-se a

modelos experimentais. Um dos fatores que colaborou para esta afirmação é o refinamento

crescente das técnicas e dos conceitos neuropsicológicos. Estes ratificaram não ser admissível

adequar a enorme variedade de memórias possíveis dentro de um número restrito de esquemas

ou modelos, nem reduzir seu alto grau de complexidade a mecanismos bioquímicos ou

processos psicológicos únicos ou simples.

Para Jedlowski (2001), a palavra "memória" na linguagem cotidiana e científica

refere-se a um vasto conjunto de fenômenos não sendo, assim, homogênea. Em seu sentido

mais amplo, a memória pode ser considerada como a capacidade de um sistema (vivo ou

artificial) para responder ao evento, armazenar a informação resultante e modificar a sua

estrutura de tal maneira que a resposta a eventos subsequentes seja afetada por aquisições

anteriores. Num sentido mais restrito, seria a memória entendida como a faculdade humana de

preservação de certos traços de experiências passadas e de poder acessá-los, ao menos em

parte, por meio da recordação.

Em termos filosóficos, Jedlowski (2000, 2001) entende a memória como campo de

uma dialética temporal complexa: de um lado, o fluxo da vida ao longo do tempo produz

efeitos que condicionam o futuro; por outro, embora o passado estruture o presente por meio

do seu legado, é o presente que molda o passado, ordenando, reconstruindo e interpretando

seu legado, juntamente com as expectativas e esperanças também ajudando a selecionar o que

melhor serve para o futuro. Sociologicamente, a memória passa a ser estudada quando há o

reconhecimento da importância dimensão temporal nos assuntos da humanidade. Tanto a

continuidade quanto a descontinuidade da vida social implicam mecanismos de lembrar e

esquecer, selecionar e processar o que o passado deixou para trás.

Nos princípios proposto por Bergson (2006) em Memória e Vida, a duração tem o

sentido de memória, pois o que sentimos, pensamos e quisemos desde o nascimento é

preservado sob a forma de lembranças e de características adquiridas. Nesse contexto, a

duração não seria “[...] um instante que substitui outro instante: nesse caso haveria sempre

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4.Memória da (na) Sociedade 55

apenas presente, não haveria prolongamento do passado no atual, não haveria evolução, não

haveria duração concreta”. (BERGSON, 2006, p.47). A duração seria o progresso contínuo, o

incessante crescimento do passado “que rói o porvir” e sua conservação indefinida. Dessa

forma, a memória é que nos permite estabelecer relação entre as existências presentes e as

anteriores, religar dois instantes um ao outro.

Em Bergson, a memória é uma atividade do espírito, a conservação do espírito pelo

espírito, sendo o mecanismo cerebral “feito precisamente para recalcar a quase totalidade do

passado no inconsciente e só introduzir na consciência o que for de natureza que esclareça a

situação presente, que ajude a ação e em preparação, que forneça, enfim um trabalho útil”.

(BERGSON, 2006, p.48). O autor enfatiza que, mesmo que não tivéssemos uma ideia clara

disso e que só utilizemos uma parte desse passado como representação, é com ele inteiro,

“inclusive com nossa curvatura de alma original, que desejamos, queremos e agimos”

(BERGSON, 2006, p.48).

Afastando-nos do presente para retomarmos o passado, nossa lembrança evocada

assume uma virtualidade inicial. Aos poucos, ela surge “[...] como uma névoa que se

condensasse; de virtual, passa ao estado atual; e, à medida que seus contornos vão se

desenhando e sua superfície vai ganhando cor, tende a imitar a percepção” (BERGSON, 2006,

p.49). Contudo, mantém-se enraizada no passado, à sua virtualidade original e contrasta com

o presente, sendo daí reconhecida como lembrança. O passado é apreendido por nós quando

ele se manifesta como imagem presente. E nisso consiste o erro do associacionismo entre

imagem e lembrança que o autor adverte:

instalado no atual, esgota-se em vãos esforços para descobrir, num estado realizado

e presente, a marca de sua origem passada, para distinguir a lembrança da percepção

e para erigir em diferença de natureza o que ela condenou de antemão a ser apenas

uma diferença de grandeza.

Imaginar não é lembrar. Uma lembrança, à medida que se atualiza, sem

dúvida tende a viver numa imagem; mas a recíproca não é verdadeira, e a imagem

pura e simples não me remeterá ao passado a menos que tenha sido de fato no

passado que eu a tenha ido buscar, seguindo assim o progresso contínuo que a levou

da obscuridade para a luz. (BERGSON, 2006, p.49, grifo do autor).

O autor traz a diferença de natureza entre lembrança e percepção ao considerar o

presente como um jorro que se desdobra em dois jatos: um que cai para o passado (a

lembrança) e o outro que cai para o porvir (a percepção). A ilusão de que a lembrança sucede

a percepção se dá em decorrência da consciência descartar a lembrança, considerando-a

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4.Memória da (na) Sociedade 56

inexistente, haja vista que “[...] Não temos o que fazer com a lembrança das coisas enquanto

temos as próprias coisas” (BERGSON, 2006, p.50).

Há também, segundo o autor, outra fonte que leva a esta ilusão: a impressão que a

lembrança reavivada, consciente causa em nós de ser a própria percepção ressuscitando numa

forma modesta. A diferença existente entre a percepção e a lembrança ocorreria na

intensidade e no grau e não na natureza. E por ser a diferença de natureza, “[...] a lembrança

aparece duplicando a cada instante a percepção, nascendo com ela, desenvolvendo-se ao

mesmo tempo que ela e sobrevivendo a ela[..]”.(BERGSON, 2006, p.52).

Entretanto, o autor questiona como o passado que cessou de ser poderia conservar-se

por si mesmo. Na verdade, a questão consistiria em definir se o passado deixou de existir ou

se ele apenas deixou de ser útil. Para Bergson (2006), nada existe menos que o presente, o

momento ínfimo que separa o passado do porvir. Assim, ao referir que concebemos o presente

como o que existe, ele afirma que simplesmente o presente é o que se faz. Nestes termos, o

autor, destaca:

Quando pensamos este presente como devendo existir, ele ainda não existe; e,

quando o pensamos como existente, ele já passou. Se, ao contrário, você considerar

o presente concreto e realmente vivido pela consciência, pode-se dizer que esse

presente consiste em grande parte no passado imediato. Na fração de segundo que

dura a mais curta percepção possível da luz, ocorreram trilhões de vibrações, a

primeira das quais está separada da última por um intervalo enormemente dividido.

Sua percepção, por mais instantânea que seja, consiste portanto numa incalculável

quantidade de elementos rememorados e, na verdade, toda percepção já é memória.

Na prática, percebemos apenas o passado, sendo o presente puro o inapreensível

avanço do passado roendo o porvir. (BERGSON, 2006, p.90, grifo do autor).

Destaca existirem duas memórias profundamente distintas, mas, ao mesmo tempo

ligadas: uma fixada no organismo e a outra a memória verdadeira. A memória fixada no

organismo corresponde ao conjunto dos mecanismos montados que “[...] garantem uma

réplica adequada às diversas interpelações possíveis” (BERGSON, 2006, p. 91). Ela promove

adaptação à situação presente e reflete uma reação apropriada às ações sofridas por nós. Seria

muito mais o hábito que propriamente memória. Ela atua por meio da experiência passada,

mas não evoca sua imagem. A memória verdadeira é a coextensiva à consciência. Ela alinha e

retém “[...] todos os nossos estados à medida que se produzem, reservando para cada fato seu

lugar e, por conseguinte, marcando-lhe sua data, movendo-se realmente no passado

definitivo”. (BERGSON, 2006, p.91).

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4.Memória da (na) Sociedade 57

No caráter psicológico da memória, a ideia de “lembrar” de algo está revestida da

existência de um evento e de um indivíduo. Esta corresponderia à noção individual de

memória, ao passo que entendemos ser necessária a existência de um indivíduo que tenha

participado de um fato, na forma ativa ou passiva, e que, lembrando-se daquele evento, seja

capaz de relatá-lo e armazená-lo. A memória individual, neste aspecto, seria uma capacidade

de armazenamento de informações. Halbwachs (1990), afirma a existência desta memória

individual, no entanto esta se inscreveria em quadros sociais. A memória para este autor não

se consistiria em reviver o passado, mas a reconstrução deste passado a partir das experiências

coletivas.

A existência da memória individual não é cessada, porém ela está enraizada em

diferentes contextos e com diferentes participantes. A memória individual passa a ser coletiva

quando há a uma transposição da memória pessoal para se converter num conjunto de eventos

compartilhados por um grupo. Há uma relação inerente entre a memória individual e a

memória coletiva, visto não ser possível ao indivíduo recordar de lembranças de um grupo

com o qual suas lembranças não se identificam. (HALBWACHS, 1990).

As lembranças permaneceriam coletivas e nos seriam lembradas pelos outros, “[...]

mesmo que se trate de acontecimentos nos quais só nós estivemos envolvidos, e com objetos

que só nós vimos. É porque, em realidade, nunca estamos sós” (HALBWACHS,1990, p.26).

Destaca ser necessária a existência de testemunhos para fortalecer ou debilitar, mas também

completar um fato ou evento que já conhecemos. A primeira testemunha a apelarmos seria a

nós mesmos. Contudo, para o autor, não seria necessária a existência material de outros

homens no evento, posto que exista “[...] sempre conosco e em nós uma quantidade de

pessoas que não se confundem”. (HALBWACHS,1990, p.26).

Segundo o autor, há uma condição para que o relato das testemunhas tenha valor no

processo de complementação das lembranças: que estas reapareçam primeiro, que se

mantenham conservadas no espírito. Assim, descreve-nos:

Quando dizemos que um depoimento não nos lembrará nada se não permanecer em

nosso espírito algum traço do acontecimento passado que se trata de evocar, não

queremos dizer todavia que a lembrança ou que uma de suas partes devesse

substituir tal e qual em nós, mas somente que, desde o momento em que nós e as

testemunhas fazíamos parte de um mesmo grupo e pensávamos em comum sob

alguns aspectos, permanecemos em contato com esse grupo, e continuamos capazes

de nos identificar com ele e de confundir nosso passado com o seu.

(HALBWACHS, 1990, p. 28).

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4.Memória da (na) Sociedade 58

Na análise sobre a memória individual e a memória coletiva, Epelboim (2004) traz a

contraposição da ideia de memória intacta, individual e revivida de Bergson com a ideia de

memória trabalhada e não sonhada de Halbwachs. A autora destaca que para Halbwachs

(1990) a memória do sujeito dependeria de sua relação com a família, com a classe social,

escola e com todos os grupos aos quais pertencesse. A lembrança conservada do passado seria

impossível, na medida em que o indivíduo “[...] não poderia manter intacto seu sistema de

representações, hábitos e relações sociais da sua infância” ( EPELBOIM, 2004, p.26).

Qualquer mudança do ambiente atingiria a qualidade da memória, vinculando a memória da

pessoa à memória grupo em que está inserido “[...] e, esta última, à esfera maior da tradição,

que representaria a memória coletiva de cada sociedade.” (EPELBOIM, 2004, p. 26).

Em Memória e sociedade: lembrança de velhos, Ecléa Bosi (1994) destaca que a força

da evocação da memória pode depender do grau de interação envolvida. Assim, na

memorização, eventos restritos diferem daqueles que foram revividos por anos a fio. Todavia,

estes eventos “sofrem o processo de desfiguração, pois a memória grupal é feita de memórias

individuais.” (BOSI, 1994, p. 419). A autora, neste aspecto, relata:

Será a memória individual mais fiel que a social? Sim, enquanto a percepção

original obrigar o sujeito a conter as distorções em certos limites porque ele viu o

fenômeno. Mas o quando, o como, entram na órbita de outras motivações. Se a

memória grupal pode sofrer os preconceitos e tendências do grupo, sempre é

possível um confronto e uma correção dos relatos individuais e a história salva-se de

espelhar apenas os interesses e distorções de cada um. A memória pode percorrer

um longo caminho de volta, remando contra a corrente do tempo. Ela corre o perigo

de se desviar quando encontra obstáculos, correntes que se cruzam no percurso. São

as mudanças, os deslocamentos dos grupos, a perda de um meio estável em que as

lembranças pudessem ser retomadas sempre pelos que as viveram. (BOSI, 1994,

p.420, grifo da autora).

Nos relatos de velhos destacados, a autora consegue identificar que a apreensão do

tempo é dependente da ação passada e da presente e é diferente em cada indivíduo. Esse

tempo que é relativo, social e que envolve lembranças é constituidor da natureza humana.

Para a autora, esse é “[...] tempo represado e cheio de conteúdo, que forma a substância da

memória” (BOSI, 1994, p.422). No que denomina substância social da memória (memória

política, memória familiar, memória do trabalho), captada nas oralidades, Bosi (2003) afirma

ser a memória oral um instrumento precioso na constituição da crônica cotidiana ao revelar

paixões individuais que se escondem atrás de eventos e que não são repassadas pelas histórias

apoiadas em documentos oficiais.

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4.Memória da (na) Sociedade 59

Neste contexto entre memória e história, é importante destacar que para Nora tudo que

se denomina memória não é memória, mas história. A memória verdadeira, imediata,

espontânea, social e coletiva é, na sociedade contemporânea, substituída pela memória

indireta “[...] transformada por sua passagem em história” (NORA, 1993, p.14). Assim, a

memória passa a ser voluntária, deliberada, vivida como um dever, individual, psicológica e

subjetiva.

O autor destaca ser o fenômeno da mundialização, da democratização, da massificação

e da mediatização contributo para o desmoronamento central da nossa memória. Em

substituição aos meios da memória (igreja, escola, família, grupo, etnias) instituem-se os

lugares onde a memória se cristaliza e se refugia (museus, arquivos, mídias). Os lugares de

memória são construções históricas com tríplice significado: lugares materiais, como um

depósito de arquivos, onde a memória social se ancora e pode ser apreendida pelos sentidos;

lugares funcionais porque têm ou adquiriram a função de cristalizar a lembrança e garantir sua

transmissão; e lugares simbólicos visto que caracterizam um acontecimento ou uma

experiência vivenciados por poucos e que são concentrados na lembrança de uma maioria que

deles não participou.

Nesta perspectiva, Bosi (2003, p.18) ressalta que a memória oral também tem “[...]

seus desvios, seus preconceitos, sua inautenticidade”. As testemunhas orais muitas vezes são

dominadas e se rendem à memória institucional. A autora percebeu a força da memória

coletiva, trabalhada ideologicamente, sobre a memória individual do recordador, mesmo que

este tenha participado e testemunhado os fatos. A autora afirma parecer existir “[...] sempre

uma NARRATIVA COLETIVA privilegiada no interior de um mito ou de uma ideologia. E

essa narrativa explicadora e legitimadora serve ao poder que a transmite e a difunde.” (BOSI,

2003, p.17-18, grifo da autora).

Haveria uma memória coletiva no interior de uma classe, que se difunde e se alimenta

de imagens, ideias, sentimentos e valores que dão identidade àquela classe. Assim, quando um

evento político agita um grupo social, a memória de seus membros “[...] é afetada pela

interpretação que a ideologia dominante dá desse acontecimento. Portanto, uma das faces da

memória pública tende a permear as consciências individuais.” (BOSI, 2003, p. 22).

A autora destaca a face geradora de futuro da memória. O passado reconstruído não

seria refúgio, mas uma fonte de motivos para continuar lutando. E retoma Merleau-Ponty ao

citar que o tempo da lembrança não é o passado, mas o futuro do passado. A nostalgia, neste

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4.Memória da (na) Sociedade 60

aspecto, seria uma crítica da sociedade atual e o desejo de que o presente e o futuro devolvam

alguma coisa perdida. (BOSI, 2003).

No artigo Memória histórica uma perspectiva psicossocial, Celso Sá (2012) discute a

retomada do estudo da memória por parte da psicologia social e o consequente processo de

constituição de uma perspectiva psicossocial da memória. Caracteriza sucintamente a

psicologia social da memória em termos do reconhecimento de cinco princípios unificadores

do seu campo de estudo, do mapeamento deste campo em sete diferentes instâncias de

fenômenos da memória e da utilização do termo memória social. O autor ressalta que, em seus

esforços para se manter não-psicologista e não-sociologista, a perspectiva psicossocial

contribui para que as extremas riqueza e complexidade dos fenômenos da memória em

sociedade possam emergir, notadamente no que se refere à memória histórica.

Na sistematização da perspectiva psicossocial da memória, o autor destaca o resultado

de uma seleção, exploração e articulação de contribuições teórico-conceituais de diferentes

origens disciplinares, com ênfase sobre as perspectivas pioneiras de Halbwachs e de Bartlett,

servindo o uso da memória social como um “termo guarda-chuva”, para designar o inteiro

conjunto dos fenômenos psicossociais da memória. Entretanto, ressalta que a psicossociologia

procura não confundir o seu nível de análise com os de tais disciplinas. Assim, mesmo se

apropriando das contribuições sociais, “[...] a perspectiva psicossocial não adere à proposição

da existência de uma ‘memória da sociedade’, nos termos de Halbwachs, mas prefere estudar

os mesmos fenômenos como uma ‘memória na sociedade’, segundo a fórmula devida a

Bartlett”. (SÁ, 2012, p.95, grifo do autor).

O autor assegura que ao se falar em memória social está se referindo na psicologia

social de coisas diversas e não muitos diferentes entre si, porém até certo ponto distinguíveis.

Dessa forma, destaca cinco princípios extraídos de fontes diversas que unificam o campo do

estudo psicossocial da memória:

(1) a memória tem um caráter socialmente construtivo, e não meramente reprodutivo

das experiências individuais passadas; (2) são as pessoas que se lembram e se

esquecem, embora o que ou como se lembram e se esquecem seja determinado pela

sociedade, pela cultura e, em especial, pela linguagem; (3) a construção da memória

não se produz senão através da interação e da comunicação sociais; (4) lembranças e

pensamentos estão sempre e intrinsecamente associados nos fenômenos de memória

social; (5) motivação, afeto e sentimento desempenham um papel importante na

construção da memória social.[...] os primeiros dois princípios se complementam

numa rejeição simultânea de posições psicologistas e sociologistas; o terceiro

confere à interação social – variável naturalmente privilegiada na psicologia social –

um status explicativo máximo da construção da memória; o quarto e o quinto

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4.Memória da (na) Sociedade 61

sustentam que, à diferença das separações artificiais freqüentemente estabelecidas

pela psicologia, os processos cognitivos – pensamento e memória, por exemplo – e

afetivos são produzidos e mobilizados de forma necessariamente interdependente na

vida cotidiana.( SÁ, 2012,p.95-96).

Sá (2007, 2012) descreve sete instâncias da memória social ao levar em consideração

denominações clássicas e outras emergentes: memórias pessoais, memórias comuns,

memórias coletivas, memórias históricas documentais, memórias históricas orais, memórias

práticas e memórias públicas. Mas, ressalta não se tratar de uma classificação da memória,

haja vista que “[...] as categorias não são mutuamente excludentes e algumas delas podem se

transformar em outras, além do que o sistema não é exaustivo, podendo incorporar ainda

‘outras memórias’” (2012, p.96).

Jedlowski (2000) destaca as memórias comuns como recordações comuns a um

grupo de pessoas sem que necessariamente exista interação social entre elas. Este tipo de

memória, que se refere a objetos ou eventos de transmissão no panorama social que muitas

pessoas têm sido expostas ao mesmo tempo, é extremamente importante e também constitui

uma das bases para a formação de grupos geracionais.

O termo geração quase sempre está associado ao "sentimento de pertencer" a um

grupo que compartilha de um dado patrimônio cultural, situado em um determinado período

histórico. Feixa e Leccardi (2010), ao proporem uma revisão no artigo O conceito de geração

nas teorias sobre juventude, repensam o conceito de geração a partir de uma perspectiva

histórica. Para estes autores:

O conceito de geração pode ser delimitado em termos sociológicos pelas referências

a Comte e Dilthey, dois autores do século XIX que, apesar das diferenças entre suas

abordagens teóricas, lançam as bases para reflexões subsequentes no século XX. Em

seguida, pode ser considerado à luz do pensamento de Mannheim, visto como o

fundador da abordagem moderna do tema gerações; posteriormente, de forma

sumária, a partir de Ortega y Gasset e Gramsci e, finalmente, pela teoria apresentada

por Abrams (1982).6 As duas primeiras teorias - uma positivista (Comte), outra

histórico-romântica (Dilthey) - são as que Mannheim (1928) usou como base para as

suas reflexões sobre gerações. Mannheim, além da importância dos demais

pensadores, será referência obrigatória para a análise das relações entre sociologia e

história.( FEIXA; LECCARDI, 2010, p.187)

Na visão positivista proposta por Augusto Comte, de acordo com os autores, o esforço

concentrava-se em identificar um tempo quantitativo e objetivamente mensurável como

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4.Memória da (na) Sociedade 62

critério para o progresso linear. Comte sugeria calcular o tempo médio em que uma geração

seria substituída na vida pública (algo em torno de 30 anos). O progresso, neste aspecto, seria

conduzido pelo equilíbrio entre as mudanças propostas pela nova geração e a estabilidade

oferecida pelas velhas gerações. O organismo social, assemelhando-se ao organismo humano,

fica sujeito ao desgaste, contudo, suas partes poderiam ser substituídas: as novas gerações

tomariam o lugar das velhas. O desequilíbrio aconteceria somente se as velhas gerações se

estendessem por muito tempo, impedindo o poder inovador das novas gerações e se, por outro

lado, existisse a brevidade da vida e ocorresse a permanência do instinto inovador.

Feixa e Leccardi (2010) trazem a visão historicista de Dilthey como oposição às de

Comte. Assim, entre os ritmos da história e os ritmos das gerações configura-se uma conexão

mais qualitativa baseada nos vínculos que os indivíduos das gerações mantêm em conjunto. A

formação das gerações se dá numa temporalidade concreta, formada de eventos,

acontecimentos e experiências compartilhadas.

Em termos mais gerais, para Dilthey as experiências históricas delimitam o

pertencimento a uma geração, porque se fundam na existência humana. Esta visão

só é compreensível se tivermos em mente a interpretação ampla que Dilthey

atribuiu à temporalidade. Ele opôs o tempo humano – concreto e contínuo – ao

tempo abstrato e descontínuo da natureza. A continuidade do padrão provém da

capacidade da mente humana – ao contrário da qualidade do tempo que a natureza

possui – de transcender o tempo percorrido e construir acontecimentos individuais

dentro de um todo homogêneo e coerente. Para Dilthey, ademais, a vida humana é

uma temporalidade (noção posteriormente retomada por Heidegger). A conexão

entre o tempo humano e o tempo histórico provém principalmente da capacidade

de moldar, uniformizar o tempo pessoal e interpretá-lo num todo significativo.

Mas ela também está intimamente associada à historicidade decorrente de um

ponto de vista adicional. É a história que possibilita de fato à mente humana

emancipar-se da tradição da natureza. De acordo com Dilthey, o tempo desta

última, ao contrário do tempo humano, é formado por uma série de eventos

descontínuos de valor igual, destituída de uma estrutura de passado, presente e

futuro. A natureza não tem história e é, consequentemente, teoricamente

irrelevante. (FEIXA; LECCARDI, 2010, p.188-189).

A formulação sociológica de Mannheim afastava-se das duas visões anteriores. Sua

teoria foi desenvolvida em paralelo aos movimentos sociais do século XX. Para Mannheim, o

que caracterizava a geração não é uma data de nascimento comum, mas é a parte do processo

histórico que jovens da mesma idade-classe de fato compartilham (a geração atual). Nesta

partilha, existem dois componentes centrais: a presença de acontecimentos que marcam e

dividem a vida em “antes e depois” no coletivo; e o fato de que esta cisura ou descontinuidade

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4.Memória da (na) Sociedade 63

é experienciada pelos membros de um grupo etário tornando-se estas experiências “primeiras

impressões” ou “experiências juvenis”.( FEIXA; LECCARDI, 2010.)

Sá (2012) destaca que a base conceitual de Mannheim extrai a hipótese quanto a um

período crítico de idade em que há maior retenção de experiências. Assim, este período se

situaria na adolescência e nos primeiros anos de vida adulta. De outra forma,

enquanto tais estratos etários estivessem se constituindo como uma geração dotada

de identidade e características próprias e únicas. [...] aqueles conjuntos de pessoas

que mais intensamente se recordassem de certos fatos, processos ou períodos

históricos como “coisas do seu tempo” seriam os mais prováveis produtores de

novos “documentos”, que terminariam por alimentar a memória histórica das

gerações subseqüentes (SÁ, 2012.p. 99-100).

De acordo com o autor, como a composição etária de uma população em qualquer

época é heterogênea, sempre estarão coexistindo distintas memórias geracionais acerca de

qualquer determinado fato, processo ou período histórico. As “memórias adquiridas” pelos

que, numa idade ou noutra, foram testemunhas dos fatos e processos do período histórico em

questão podem apresentar diferenças em relação às “memórias apropriadas” – ou seja, apenas

pela educação e pela mídia – daqueles que nasceram após o término do período. Neste ponto,

Bosi (1994, 2003) afirma que cada geração traz em si a memória de acontecimentos que

permanecem como pontos de demarcação em sua história de sua cidade e que a memória de

velhos, funcionando como um mediador informal da cultura entre nossa geração e as

testemunhas do passado, faz intervir pontos de vistas contraditórios e até distintos da

unilateralidade das memórias formais constituídas pelas instituições.

Retomando Feixa e Leccardi (2010), estes apontam o aprofundamento e expansão da

noção histórico-social de geração ao relacioná-la à identidade, na análise das contribuições

teóricas do sociólogo inglês Philip Abrams. Para ele, a individualidade e a sociedade são

construções históricas, sendo daí necessária a análise de suas interconexões e suas mudanças

ao longo do tempo. A identidade, neste aspecto, seria construída por meio dos recursos e

significados social e historicamente disponíveis, dependendo, assim, do entrelaçamento da

história individual e social e não meramente da execução de papéis sociais. Novas gerações,

portanto, criam novas identidades e novas possibilidades de ação. Dessa forma, gerações,

sociologicamente, não surgem da cadência temporal estabelecida por uma sucessão de

gerações biológicas:

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4.Memória da (na) Sociedade 64

Elas cessam quando novos e grandes eventos históricos – ou, mais frequentemente,

quando lentos e não catastróficos processos econômicos, políticos e de natureza

cultural – tornam o sistema anterior e as experiências sociais a ela relacionadas sem

significado. Consequentemente, para Abrams ou para Mannheim, o início de uma

geração é marcado por descontinuidades importantes até então dominantes em

determinada época histórica e institucional. Novamente, o tempo histórico-social e

seus ritmos é visto como central para a definição das novas gerações e identidades

sociais. Mais precisamente: é o processo de mudança que produz o anterior e o

posterior. Nesta perspectiva, gerações é o lugar em que dois tempos diferentes – o

do curso da vida, e o da experiência histórica – são sincronizados. O tempo

biográfico e o tempo histórico fundem-se e transformam-se criando desse modo uma

geração social (FEIXA; LECCARDI, 2010, p. 191).

A compreensão do conceito de experiência social proposto por François Dubet deve

ser aqui contextualizada. Em sua obra Sociologia da Experiência, Dubet (1996) afirma que o

indivíduo da sociedade pós-moderna, caracterizada pela diversidade cultural e multiplicidade

de ação social, destaca-se pela capacidade de distanciamento do sistema e pela capacidade de

iniciativa de escolha. Para ele, é na ação que se constrói o conhecimento da sociedade.

Segundo o autor, a experiência social é resultado da articulação autônoma entre a lógica da

integração – em que na identidade o que prevalece é a interiorização de valores e modelos

culturais institucionalizados através de papéis-vínculos com a comunidade; a lógica da

estratégia - na qual o que fundamenta ação é o poder e a identidade é vinculada a um status

social que influencia os outros a partir de sua posição e interesses particulares; e a lógica da

subjetivação – quando o ator é um sujeito crítico não reduzido a papéis ou a interesses, mas

que se percebe como sujeito/autor e não expectador de sua própria vida e que luta contra uma

sistemática dominante e de alienação.

Para Dubet, há diversidade de lógicas de ação numa mesma realidade social. A

experiência social é atividade crítica pela qual o indivíduo pode construir uma identidade

social ao articular estas lógicas, procurando dar sentido a suas condutas. É importante destacar

que a experiência social não é apenas da ação e da linguagem, mas também das

representações. Sendo daí necessário a discussão em termos da teoria da representação social

de Serge Moscovici (2010) que explica os fenômenos do homem numa perspectiva macro

sem renunciar o individual. Estando relacionada com trocas simbólicas em nossas relações

sociais e interpessoais, tem a finalidade tornar o incomum em algo familiar. Assim, a

representação social é todo conceito, ideia, conteúdo de natureza psicossocial partilhada por

diversas pessoas. Para sua existência é preciso, então, que as pessoas partilhem dos mesmos

conceitos e ideias que tenha um repertório comum.

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4.Memória da (na) Sociedade 65

Para Moscovici (2010), origens distintas, tanto dos indivíduos quanto dos grupos,

acrescidas da importância da comunicação, conduzem estes indivíduos a uma rede de

interações na qual qualquer fenômeno pode se tornar social ou vice-versa. No processo da

comunicação, as representações sociais se elaboram na contradição interativa na qual são ao

mesmo tempo geradas e adquiridas. O importante papel das comunicações em massa na

modernidade permite que as representações expliquem o modo pelo qual o novo é constituído

nos processos de interações sociais e como estes as produzem.

Becker pontua que os diferentes tipos de riscos enfrentados pelos indivíduos são

percebidos e valorizados de acordo com o contexto social no qual as percepções humanas são

formadas. Destaca ainda que as influências primárias (amigos, família) e as secundárias

(figuras públicas e mídia) atuam fortemente na percepção individual e/ou coletivas. Para a

autora, ao citar Hannigan, estas influências:

funcionam como filtros na difusão de informação na comunidade e reafirmam o

risco enquanto uma construção sociocultural determinada pelas forças estruturais na

sociedade, a exemplo da organização das estruturas políticas e administrativas, além

das crenças históricas, tradicionais e culturais” (BECKER, 2011, p.96).

A autora frisa a preocupação em verificar como os argumentadores da mídia têm

produzido seus argumentos, principalmente pelo fato do espaço da mídia ser ocupado pelos

produtores de notícia. Desta forma, é importante destacar o que Watier (2003), ao citar Dubet,

afirma que a televisão, é um aglomerado múltiplo e heterogêneo que abre espaço para vários

tipos de interpretação social. Objeto de propaganda e de alienação, ela é também "espelho",

isto é “espaço de projeção da sociedade e dos indivíduos”, espaço de socialização, por revelar

os problemas sociais e ensinar estratégias de comportamento. Para ela,

a experiência do telespectador se constrói, assim, na tensão entre diferentes lógicas

que se confundem. A televisão é um objeto de consumo, mas também é uma forma

de vínculo social (e assim produz sentido); ela também permite um distanciamento

na formação e expressão da opinião (sobre o conteúdo dos programas ou sobre a

própria TV). Desta forma, a televisão é um palco de representação social, e a mídia

em geral não só dá uma definição do mundo, mas o registra e o constrói (WATIER,

2003, p.200-201).

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4.Memória da (na) Sociedade 66

Assim, como apontado por Sousa (2007), a mídia televisiva é constituidora de sua

própria narrativa e a oferta aos telespectadores, como se esses relatos fossem a própria

realidade refletida na tela.

Os fatos, metamorfoseados em notícias, passam a representar eventos únicos,

autônomos e plenos em si, o que para muitos é interpretado como a própria

realidade. Essa naturalização das notícias esconde o cerne da questão de que fatos” e

“notícias” não existem por si só, como entidades “naturais”. Ao contrário, são assim

designados por alguém (por exemplo, por um editor), por motivos (culturais, sociais,

econômicos, políticos) que nem sempre são óbvios. Mas essa operação fica oculta

sob o manto mistificador da suposta objetividade jornalística (SOUSA, 2007,p.03).

A experiência social de fazer programas midiáticos para determinada audiência, para

determinado grupo é sempre demarcada pela escolha ou pela opção recortada da, pela e na

experiência social. Ou seja, os planejadores de mídia não trazem à tona seus produtos sem

inteligentemente estabelecer intencionalidades em relação às vivências dos atores sociais.

Jedlowski (2005) ressalta a crescente homogeneização das memórias pelos meios de

comunicação de massa, reduzindo os espaços da elaboração coletiva. Na medida em que as

memoriais comuns, constituídas pelas experiências sociais indiretas, assumem uma amplitude

grande na sociedade contemporânea, a importância de seus estudos cresce neste mesmo

sentido.

Nesta perspectiva, o que viria a ser o futuro? Uma elaboração sócio-cultural, por que

nasce das expectativas de sujeitos de atores sociais e de grupos sociais? Essas expectativas

decorrem da própria experiência. Observar essa experiência social significa dizer que o modo

como cada um de nós, dentro do grupo social, vai se apropriar dessa ideia de futuro depende

da expressão de elementos de natureza sociocultural, o que para cada geração apresentar-se-ia

distintamente.

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5 Metodologia da Pesquisa 67

5 METODOLOGIA DA PESQUISA

Esta pesquisa tem como base epistemológica o paradigma interpretativo de pesquisa.

Savoie-Zajc e Karsenti (2000) destacam a importância desse tipo de paradigma nas pesquisas

de natureza qualitativa. Portanto, pode-se afirmar que esta pesquisa tem o pressuposto

fenomenológico-hermenêutico, caracterizando-se como pesquisa do tipo descritiva e

exploratória quanto aos objetivos procedimentais. Define-se como fenomenológica por

assumir a intencionalidade durante o desenvolvimento e análise contextual e interpretativa

ante a realidade estudada.

Existem três tradições fenomenológicas predominantes: 1) a escola transcendental ou

descritiva criada por Husserl; 2) a abordagem interpretativa ou hermenêutica desenvolvida por

Heidegger; 3) a tendência contemporânea que consiste na integração das duas tradições

anteriores. Na concepção de Husserl (1989, 22p.), “a fenomenologia é a ciência das essências,

em que se integra a ciência da essência do conhecimento” e não dos fatos. No entanto, ao

longo de sua vida, o conceito de fenômeno evoluiu. Em sua obra Investigações Lógicas

referia-se primeiramente apenas às realidades possíveis de serem alcançadas pelos sentidos.

Entendia-se a fenomenologia como psicologia descritiva. Assim, inferiu que:

As ‘Investigações Lógicas’ fazem passar a fenomenologia por psicologia descritiva

(embora fosse nelas determinante o interesse teórico-cognoscitivo) [...] concerne à

simples esfera das vivências, segundo o seu conteúdo incluso. As vivências são

vivências do eu que vive, e nessa medida referem-se empiricamente às objetividades

da natureza. Mas, para uma fenomenologia que pretende ser gnosiológica, para uma

doutrinada essência do conhecimento (a priori), fica desligada a referência empírica.

(HUSSERL, 1989, 13-14p.)

Posteriormente, passou a incluir no conceito de fenomenologia todas as formas de

estar consciente de algo, qualquer espécie de sentimento, pensamento, desejo e vontade. Nesta

fase evidenciada em sua obra A Ideia de Fenomenologia, apresenta e define a fenomenologia

transcendental, ou método fenomenológico, como uma “[...] atitude intelectual

especificamente filosófica, o método filosófico” (HUSSERL, 1989, p.46.). Uma

fenomenologia que pretende, como já mencionado, ser uma ciência das essências. Neste

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5 Metodologia da Pesquisa 68

ponto, a fenomenologia husserliana diferencia-se da kantiana25

justamente por considerar a

ideia básica de constituição. Segundo o autor,

A fenomenologia transcendental é fenomenologia da consciência constituinte e,

portanto, não lhe pertence sequer um único axioma objetivo (referente a objetos que

não são consciência). O interesse gnosiológico, transcendental, não se dirige ao ser

objetivo e ao estabelecimento de verdades para o ser objetivo, nem, por conseguinte,

para a ciência objetiva. O elemento objetivo pertence justamente às ciências

objetivas, e é afazer delas e exclusivamente delas apenas alcançar o que aqui falta

em perfeição à ciência objetiva. O interesse transcendental, o interesse da

fenomenologia transcendental dirige-se para a consciência, enquanto consciência,

vai somente para os fenômenos, fenômenos em duplo sentido: 1) no sentido da

aparência (Erscheinung) em que a objetividade aparece; 2) por outro lado, no sentido

da objetividade (Objektität) tão só considerada, enquanto justamente aparece nas

aparências e, claro está,«transcendentalmente», na desconexão de todas as posições

empíricas (HUSSERL, 1989, p.14).

Para Husserl, os fenômenos seriam aqueles manifestados pelas vivências na

consciência- aquilo que se manifesta de imediato na consciência, isto é mostradas como são

em si mesmas- e sua capacidade imanente de conceder sentido às coisas enquanto puro

pensado- antes de toda reflexão e juízo. Nesse sentido, o fenômeno em Husserl se confunde

com a aparência sensível, podendo ser, ele próprio, aquilo que aparece à manifestação da

realidade. O ser que aparece em Husserl é o ser da intuição. (ARAÚJO, 2007).

Para a fenomenologia ser a ciência das essências, é necessária a redução eidética ou a

epoché. Segundo Husserl, toda vivência psíquica corresponde a um fenômeno puro que exibe

sua essência imanente por via desta redução. A redução eidética consiste em depurar o

fenômeno de tudo que não lhe seja essencial e invariável. O método fenomenológico é a

exploração do fenômeno tal como é dado à consciência, livre de qualquer crença e de

qualquer juízo, para alcançar a essência este não deve ser influenciado por conhecimentos

prévios e nem da forma como o fenômeno se apresente. Assim, a redução eidética é etapa

fundamental para a análise fenomenológica da apreensão da realidade e trata-se de uma “[...]

análise de essências e exploração dos estados de coisas genéricos que se podem constituir na

intuição imediata” (HUSSERL, 1989, p. 87).

Araújo (2007) descreve este caráter aprisionador da redução eidética em Hurssel.

Segundo a autora, o estudo dos fenômenos puros da consciência transcendental não estimula a

25

Não nos compete neste trabalho aprofundar a crítica que Husserl faz às ciências naturais. No entanto,

acreditamos ser necessário distinguir sucintamente a fenomenologia kantiana da husserliana com a citação de

Dartigues: “enquanto a fenomenologia do tipo kantiano concebe o ser como o que limita a pretensão do

fenômeno ao mesmo tempo em que ele próprio permanece fora do alcance, [...] a fenomenologia husserliana se

propõe como fazendo ela própria, as vezes, de ontologia pois, segundo Husserl, o sentido do ser e o do

fenômeno não podem ser dissociados. (DARTIGUES, 1992, p.03).

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5 Metodologia da Pesquisa 69

crítica pela compreensão-interpretação dos sentidos e significados daqueles que percebem o

que é percebido. A autora assim descreve:

o pensamento husserliano assume uma dimensão monológica do indivíduo-sujeito

da noese, espectador desinteressado do saber do outro, que somente reproduz pela

descrição a percepção da objetividade do objeto –apenas alguma coisa do mundo,

visada pela consciência. Na descrição da análise fenomenológica husserliana reduz-

se, dessa maneira, a amplificação das vozes na busca de sentido ou unidade dada nas

consciências cognoscentes. A essência ou unidade de sentido, dessa maneira, torna-

se apenas uma simples descrição daquilo que se dá à consciência pela redução

fenomenológica. A fenomenologia que surge como tentativa de capturar a

pluralidade de sentidos da vida, aprisiona-se pelo princípio redutor da epoché.

(ARAÚJO, 2007, p.77, grifo nosso).

A abordagem interpretativa ou hermenêutica desenvolvida por Heidegger, surge

quando este autor afasta-se da concepção originária da intencionalidade da consciência

husserliana. Para Nunes (2010), Ser e Tempo é composto do estudo do homem, numa

ontologia fundamental, do ponto de vista de seu ser, o Dasein26

. Há a reinterpretação da

fenomenologia de Hurssel em “íntima relação com a hermenêutica”. (NUNES, 2010.p.11).

Esta reinterpretação permite ver o fenômeno, mostrando-se por si mesmo e liberado de seus

encobrimentos.

E aquilo que assim se mostra é o ser do ente focalizado, uma vez que na

fenomenologia reinterpretada, a intencionalidade não é mais, como foi para Hurssel,

a propriedade fundamental da consciência, mas a direção para o ser compreendido,

isto é, para o ser pré-descoberto, de que a consciência é o ponto de abertura.

(NUNES, 2010.p.11).

Deste ponto, a fenomenologia se torna ontológica e, como tal, é hermenêutica, pois a

descrição do fenômeno é a interpretação “aplicada ao Dasein- não de fora para dentro, mas de

dentro para fora, uma vez que parte do Dasein e é pelo Dasein mesmo conduzida.”( NUNES,

2010, p. 12). Para Heidegger (2005 a, p.58), deve-se manter o significado de fenômeno “o que

se revela, o que se mostra em si mesmo”, o que os gregos identificavam simplesmente como

entes. Contudo, os entes podem mostrar-se de várias maneiras, até mesmo da maneira que não

é. Nesta maneira de mostrar-se, Heidegger chama de aparecer, parecer e aparência. Assim, o

fenômeno também em grego assume “[...] o significado do que ‘se faz ver assim como’, da

‘aparência’, do que ‘parece e aparece’” (HEIDEGGER, 2005, p.58, grifo do autor). Para ele,

26

O Dasein pode ser entendido como o ser-aí, o homem, o ser-no-mundo, a existência.

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5 Metodologia da Pesquisa 70

A compreensão posterior de fenômeno depende de uma visão de como ambos os

significados de fenômeno (fenômeno como o que se mostra, e fenômeno como

aparecer, parecer e aparência) se inter-relacionam reciprocamente em sua estrutura.

Somente na medida em que algo pretende mostrar-se em seu sentido, isto é, algo

pretende ser fenômeno, é que pode mostrar-se como algo que ele mesmo não é, pode

“apenas se fazer ver assim como”...[...] O que ambos exprimem, porém, nada tem a

ver, em princípio, com o que se chama de “manifestação” (Erscheinung) e muito

menos com “mera manifestação”(blosse Erscheinung). (HEIDEGGER, 2005, p. 58-

59, grifo do autor).

Ao discorrer sobre a manifestação de uma doença, o filósofo conclui que “[...]

manifestação enquanto manifestação de alguma coisa não diz um mostrar-se a si mesmo, mas

um anunciar-se de algo que não se mostra”. (HEIDEGGER, 2005, p. 59). Dessa forma, a

manifestação em Heidegger é um não mostrar-se que depende do ser do Dasein para ser

anunciada e pré-compreendida. (Araújo, 2007).

Assim, tratar em termos fenomenológicos o significado de Ser “[...] é partir de nossa

própria experiência de Ser: mas isso não significa examinar em nossas mentes as nossas

experiências interiores, nem separar (como foi a tendência do primeiro Hurssel) a nossa

consciência de seus objetos”. (MATTHEWS,2001, p. 22). Nosso Ser é Ser-no-mundo e não

existimos separados do mundo de nossa experiência. Somos seres que existem em lugares e

espaços definidos e que, dessa forma, interagem com o mundo circundante.

Rezende (1990) afirma ser o método fenomenológico “discursivo e não apenas

definitivo das essências”. A intuição da essência diz respeito à significação de uma essência

existencial que como tal deve ser descrita. Essa descrição deve explicitar “[...] em que sentido

há sentido, e mesmo em que sentidos há sentidos. Mais ainda nos fazer perceber que há

sempre mais sentido além de tudo aquilo que podemos dizer”. (REZENDE, 1990, p. 17, grifo

do autor). O fenômeno aparece como uma realidade do mundo humano, e o símbolo

concentra, articula e reúne as diversas manifestações do sentido na constituição do discurso

existencial. O autor justifica que ao se falar em discurso existencial, há uma tomada de

posição fenomenológica. Assim descreve que:

toda significação é inseparável da existência. Por esta razão, é toda história humana

que aparece como discurso: o discurso cultural, vivido por indivíduos e grupos

humanos, através de gerações sucessivas. Se podemos falar de uma tipologia do

discurso, é na medida em que também a existência se diversifica em função dos

lugares ou tópicos em que o sentido toma corpo. O discurso fenomenológico

pretende corresponder à encarnação do sentido em seus diversos lugares de

manifestação através da história. Uma palavra, uma frase, uma definição, nunca

poderão dizer o que há a dizer. Temos necessariamente de recorrer ao discurso para

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5 Metodologia da Pesquisa 71

nos aproximarmos o mais possível da densidade semântica do fenômeno humano.

(REZENDE, 1990, p.18, grifo do autor).

Por isso mesmo, destacamos ser esta pesquisa descritiva por apresentar e voltar-se aos

detalhes dos elementos de determinado contexto sociohistórico, fruto de uma consciência

perceptiva que se dedica a descrever as características e relações entre variáveis, ideias e/ou

processos. É também exploratória por ter a finalidade de desenvolver e modificar conceitos e

ideias, com vistas à formulação de fenômenos mais fiáveis, objetivando a caracterização de

projeções futuras de diferentes gerações sobre os riscos ambientais propagados pelas mídias

de massa, tanto quanto a sensação de insegurança e ações dos atores sociais decorrentes das

informações recebidas sobre o meio ambiente.

Quanto à forma de abordagem do problema, a presente pesquisa pode ser classificada

como qualitativa com aporte na quantitativa. Para tanto, utilizamos para esta pesquisa a

Triangulação27

não apenas como forma de validação cumulativa, mas também como maneira

de integrar diferentes perspectivas no fenômeno em estudo (complementaridade), produzindo

um retrato mais completo do que o alcançado por um único método. De acordo com Duarte

(2009), na Triangulação Intermétodos, os métodos qualitativos e os quantitativos podem

combinar-se de diferentes formas numa mesma investigação. Apesar de existir, comumente,

uma preponderância do quantitativo sobre o qualitativo, tanto uma quanto a outra podem ser

facilitadoras no processo de investigação e até mesmo ambas podem assumir a mesma

importância.

A autora destaca que na combinação dos métodos podem existir várias cambiantes,

ressaltando que diferentes métodos podem ser utilizados ao longo da investigação de forma

simultânea ou consecutiva. A combinação pode realizar-se no plano de estudo/investigação ou

até mesmo na análise de dados e na articulação de resultados. Para o desenvolvimento desta

pesquisa, utilizamos metodologia quantitativa sequenciada pela qualitativa.

27

Duarte (2009) faz menção aos estudos de Denzin (1989) que descreve quatro tipos de possíveis triangulações:

a) a triangulação de dados que se refere à recolha de dados recorrendo a diferentes fontes (tempo, espaço e

indivíduos diferentes); b) Triangulação do investigador , na qual os investigadores recolhem dados uns dos

outros sobre o mesmo fenômeno em estudo e procedem à comparação de resultados. É a comparação da

influência dos vários investigadores sobre os problemas e os resultados da pesquisa; c) Triangulação teórica,

em que diferentes teorias são utilizadas para interpretar um conjunto de dados de um estudo, verificando-se a

sua utilidade e capacidade; d) triangulação metodológica, na qual múltiplos métodos são utilizados para estudar

um determinado problema de investigação, existindo daí dois subtipos: a triangulação intramétodo – que

envolve a utilização do mesmo método em diferentes ocasiões – e a triangulação intermétodos – que significa

usar diferentes métodos em relação ao mesmo objeto de estudo.

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5 Metodologia da Pesquisa 72

5.1 DO LOCAL DA PESQUISA

A Fundação Universidade Federal de Sergipe (FUFS) foi instituída através do

Decreto-Lei n. 269 de 1967, contudo, sua instalação efetivou-se em 15 de maio de 1968. A

sede central está situada na Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos, localizada no

Jardim Rosa Elze, município de São Cristóvão. Atualmente, a UFS conta com os campi:

Alberto de Carvalho em Itabaiana, de Laranjeiras e de Ciências da Saúde em Lagarto. Além

destes, a UFS dispõe do Campus da Saúde (Hospital Universitário - HU), no município de

Aracaju e o Campus Rural, utilizado pelos cursos da área de Ciências Agrárias no município

de São Cristóvão. Para o desenvolvimento da pesquisa, elegemos como local para coleta de

dados o Campus José Aloísio de Carvalho (UFS,2013).

5.2 DA AMOSTRA

Os dados mais recentes da UFS obtidos por meio do Relatório de Gestão 2012

apontam um universo de 30053 indivíduos, sendo 25.115 matriculados em 2011/2 na

graduação, 1.589 matriculados em 2011/2 na pós-graduação stricto sensu, 54 residentes. No

tocante ao seu quadro funcional, a instituição conta, atualmente, com 1.069 docentes efetivos,

241 temporários, 1.154 servidores técnico-administrativos em atividade e efetivos e 831

terceirizados que dão suporte aos serviços técnicos e às atividades de apoio da instituição.

(UFS,2013). Acrescentem-se a estes o total de 454 aluno do Colégio de Aplicação (CODAP),

totalizando um universo final de 30507 indivíduos para o ano de 2012.

No aspecto quantitativo da pesquisa com a aplicação de questionários, foi definido o

cálculo de uma amostra probabilística aleatória simples, considerando-se que cada grupo da

população com o mesmo número de elementos teria a mesma chance de ser incluída na

amostra. A princípio, distribuímos em três diferentes grupos: (a) Grupo de Jovens; (b) Grupo

de Adultos e (c) Grupo de Idosos. Como critérios de escolhas para os grupos estabelecidos,

foram considerados os elementos etários, os quais adotamos os estabelecidos pelo Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2011). De outro modo: para os jovens, foram

considerados os indivíduos com idade entre 15 e 24 anos; para os adultos, aqueles com idade

entre 25 e 59 anos. Por fim, os idosos, aqueles com idade superior a 60 anos. No entanto,

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5 Metodologia da Pesquisa 73

durante a pesquisa de campo, encontramos um grupo que também fazia parte da UFS e da

qual não possuíamos conhecimento: os adolescentes com idade entre 11 e 14 anos do ensino

fundamental do Colégio de Aplicação (CODAP). Estes, então, passaram a constituir um novo

grupo de pesquisa que denominamos menores de 15 anos.

Portanto, utilizou-se a amostragem por conglomerados que deve ser utilizada quando

a população pode ser subdividida em conglomerados heterogêneos representativos da

população global. A amostragem é feita sobre os conglomerados, e não mais sobre os

indivíduos da população. (BARBETTA, 2002). De acordo com o autor, para que uma amostra

represente com segurança as características do universo, alguns pontos devem ser levados em

consideração: a extensão do universo, os recursos existentes, o nível de confiança

estabelecido, o erro máximo permitido e a percentagem com a qual o fenômeno se verifica.

Sendo o universo finito, ou seja, com população inferior a 100.000 (cem mil)

indivíduos, e a pretensão do nível de confiança28

ser estimada em 95%, determinou-se o

desvio-padrão 2. Para erro amostral não superior a 5% (cinco pontos percentuais) e a

percentagem com a qual o fenômeno se verifica29

de 25% (haja vista existirem quatro grupos

e que, a priori, desejou-se uma representatividade equitativa entre eles), consideramos a

seguinte fórmula:

Onde:

n = Tamanho da Amostra;

σ = Nível de confiança escolhido, expresso em números de desvio padrão;

p = Percentagem com a qual o fenômeno se verifica;

28

O nível de confiança é aquele que indicará os desvios-padrão em relação à sua média. Usualmente, estabelece-

se 1(um) desvio-padrão quando se deseja 68% de nível de confiança; 2(dois) desvios-padrão para 95.5% de

nível de confiança; e 3(três) desvios-padrão para 99.7% de nível de confiança. (BARBETTA,2002).

29 E a estimação previa da percentagem com que se verifica um fenômeno. Quanto maior percentual, maior o

tamanho da amostra.

n= σ² . p . q . N

e² (N-1) + σ² . p . q

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5 Metodologia da Pesquisa 74

q = Percentagem complementar (100-p)

e = Erro máximo permitido;

N = Tamanho da população;

Como resultado dos cálculos, obteve-se o valor aproximado de 286 indivíduos como

amostra. A amostra da pesquisa foi constituída de trezentos 303 indivíduos (valor superior em

5,94% ao calculado) do corpo de servidores ativos (técnicos e docentes), terceirizados e

estudantes que compõem a UFS Campus José Alberto de Carvalho. Contudo, após a

tabulação dos dados, a amostra final foi constituída de 294 indivíduos, sendo superior ao

calculado em 3,06%.

O aporte para definição da amostra em termos qualitativos foi desenvolvido nas

acepções teóricas de Moreira (2002). Para este autor, o caso da pesquisa qualitativa, em

particular no método fenomenológico, a amostra não tem o viés estatístico, mas sim

intencional. A escolha dos sujeitos ocorre por determinadas características que o habilitam a

compor a amostra. Assim, fica fora de questão tratar de generalização estatística na pesquisa

qualitativa e, tratando-se de amostra intencional, o trato é feito em termos da generalização

lógica ou de generalização estatística. O autor neste ponto descreve:

Com as amostras intencionais, é possível falar apenas de generalização lógica ou de

generalização naturalística. Este tipo de generalização é sempre mais limitado em

relação à generalização estatística: os resultados obtidos com a amostra intencional

podem ser (supondo-se validade interna satisfatória) transpostos para uma parcela

mais ou menos definida da população de trabalho que tenha fortes semelhanças com

os sujeitos da amostra. Esse julgamento de adaptação poderá ser explicitamente feito

pelo pesquisador nos seus comentários, mas será frequentemente feito também pelo

leitor ou pelo usuário da pesquisa. (MOREIRA, 2002, p.147, grifo do autor).

Na etapa consecutiva de entrevistas, foram selecionados 19 indivíduos que

responderam ao questionário. Os critérios para seleção foram os mesmos para a aplicação dos

questionários: ter vínculo com a UFS (servidores, terceirizados e alunos) e, para equilíbrio dos

dados, pertencerem equitativamente às quatro faixas etárias já definidas.

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5 Metodologia da Pesquisa 75

5.3 DOS INSTRUMENTOS

Os instrumentos utilizados para a coleta de informações foram a entrevista

semiestruturada (vide Apêndice A), questionário fechado (vide Apêndice B) e o diário de

campo. A entrevista foi desenvolvida frente-a-frente com auxílio, após prévia autorização do

entrevistado, do gravador de áudio e de anotações. Embora a análise dos dados tenha ocorrido

em todo o processo da coleta, a densificação ocorreu a partir dos registros, transcrição e

análise categorial e relacional dos discursos (depoimentos). A reflexão sobre a relevância dos

dados foi baseada nas questões norteadoras da pesquisa. Em seguida, fizemos a redução

eidética, na qual se lê:

se determina e se seleciona as partes da descrição que são consideradas “essenciais”,

e aquelas que, no momento, não sejam avaliadas como significativas. [...] A técnica

usual e comum para realizar a redução fenomenológica é denominada variação

imaginativa. Consiste em refletir sobre as partes da experiência que nos parece

possuir significados cognitivos, afetivos e conotativos, e, sistematicamente, imaginar

cada parte como estando presente ou não na experiência. (MACEDO, 2000, 203p.).

Nesse sentido, a entrevista é um dos principais instrumentos na pesquisa social para

coletar as informações sobre elementos próprios ao objeto de pesquisa e/ou ao fenômeno

pesquisado. Para Alves-Mazzotti (1998), a entrevista consolida a presença do investigador no

processo da construção da pesquisa de modo a oferecer perspectivas possíveis de diálogo e

desenvolvimento do estudo em ter clima de liberdade e a espontaneidade necessárias às

devidas finalidades pretendidas.

Por isso mesmo, a entrevista do tipo semidirigida se organizou em torno de perguntas

relevantes e centrais para a resolução de um problema de pesquisa, disposto sob forma de

pergunta. Foi as denominadas questão de pesquisa, mantida entre diálogos e reelaboração

concêntrica aos propósitos ou objetivos da pesquisa que favorecem amplo campo de

interrogações, fruto de novas perguntas que foram surgindo à medida que se recebiam as

respostas do informante. As entrevistas semidirigidas foram organizadas (ver Apêndice A) a

partir de dois eixos básicos:

I. Percepção de riscos ambientais sob as formas dos flagelos, catástrofes ou

destruição naturais de média ou de grandes proporções;

II. Visão Pessoal a respeito do “futuro” (definição e caracterização, magens e

sensações,mensagens para a geração futura).

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5 Metodologia da Pesquisa 76

O instrumento diário de campo serve para registrar as informações, após a coleta e

análise destas informações (Bogdan e Biklen, 1994). De outro modo, no diário de campo o

pesquisador sistematiza as descrições de fenômenos sociais e/ou físicos, procurando

acompanhar seu desenvolvimento, dando-lhes interpretações, estabelecendo explicações,

relações e especificando a natureza dos elementos que constituem o fenômeno central a ser

pesquisado. Nesse contexto, o diário de campo foi utilizado como potencialidade heurística

durante a categorização do objeto de estudo.

A leitura interpretativa dos dados foi realizada considerando as categorias analíticas

relativas às projeções futuras, aos riscos ambientais e à memória geracional produzidos pelas

interações constantes dos atores sociais com notícias propagadas pelos veículos de

comunicação de massa, particularmente aqueles relacionados aos flagelos, catástrofes ou

destruições naturais de médias ou grandes proporções. Objetivando-se maior validação da

interpretação da pesquisadora, ante relatos dos sujeitos que participarão da pesquisa, fez-se

confrontação das interpretações conclusivas com as opiniões dos autores envolvidos.

5.4 ETAPAS DA PESQUISA

Foram desenvolvidas três etapas distintas e complementares no decorrer dessa

pesquisa. A primeira foi destinada à Produção Teórico-conceitual da Pesquisa. Nesse

momento, a dedicação foi exclusivamente direcionada às leituras de variadas fontes teóricas e

trabalhos científicos já publicados sobre o tema. Tratou-se de momento importante porque

permitiu a sistematização das informações e o desenvolvimento de análises sistemáticas a

respeito do problema de pesquisa em busca de respostas aos questionamentos levantados.

Contudo, foi um procedimento complementar e não serviu como guia padrão para o

desenvolvimento das análises elaboradas no decorrer da categorização dos primeiros

resultados. A segunda etapa esteve ligada à interação com os sujeitos da pesquisa. Foi

dividida em dois momentos:

a) Pré-teste (momento de contato direto com o campo de pesquisa, interagindo para a

sistematização e delimitação mais precisa os enunciados do problema de pesquisa. Nesse

momento, foram efetuadas entrevistas iniciais e a busca de resposta aos questionários de

pesquisa com a finalidade de exercitar o método científico de coleta e sistematização de

dados, assim como, concretizar a possibilidade de reescrever qualitativamente o processo de

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5 Metodologia da Pesquisa 77

interação com os sujeitos participantes do estudo. Este momento foi executado com 06 (seis)

componentes do Grupo de Pesquisa em Tecnologias Intelectuais, Mídias e Educação

Contemporânea (SEMINALIS) e, após análise das entrevistas e questionários, verificou-se

que as perguntas e o roteiro atendiam aos objetivos iniciais da pesquisa.

b) Descrição da experiência: neste momento, relata-se como foi executado todo o

trabalho de pesquisa em torno da necessidade de responder às questões de pesquisa propostas

para o desenvolvimento do estudo. Para tanto, inicialmente foi solicitada autorização ao

dirigente máximo da UFS, Reitor Prof. Dr. Ângelo Roberto Antoniolli, para realização da

coleta de dados nas dependências da instituição (vide Apêndice C), assim como também foi

requerido uma carta de apresentação junto ao PRODEMA (Apêndice D) para formalização de

todo o processo nos diversos setores da UFS. Como a pesquisa incluiu gerações distintas, esta

foi cadastrada em setores estratégicos que atendiam diretamente a três faixas etárias: No

Núcleo de Pesquisas e Ações da Terceira Idade (NUPATI), para coleta de dados com

indivíduos com idade superior a 60 anos; no CODAP, para os menores de 15 anos e aqueles

entre 15 e 24 anos, no entanto também foram entrevistados servidores com idade superior a

esta faixa. Por tratar-se de questionários e entrevistas aplicados a menores de 18 anos, foi

elaborado termo de consentimento livre e esclarecido que foi encaminhado aos pais e

responsáveis pelos alunos (vide Apêndice E).

Os questionários foram aplicados em dois momentos: a) o primeiro, presencial,

consistiu na aplicação direta dos questionários impressos aos pesquisados no CODAP e em

diversos setores da UFS. Esta aplicação resultou numa amostra de 292 indivíduos, sendo que

05 questionários foram descartados por não conter as respostas de forma total. b) Como a

agregação de idosos foi baixa, apenas 22 do total, e iniciou-se em 30/09/2013 o período de

férias dos alunos, incluiu-se um segundo momento de aplicação por meio eletrônico. Para

tanto, foi disponibilizado o questionário, como formulário, pela internet (Google docs, cujo

link de acesso foi https://docs.google.com/forms/d/1urioqW5sJK-QygE308CXQSy

ED70aEc0urUi49B4sKP0/viewform). Este questionário foi encaminhado ao NUPATI e

direcionado aos servidores com mais de 60 anos por e-mail. Para encaminhamento aos

servidores, foi solicitado junto ao Departamento de Pessoal (DP) da UFS um relatório

contendo todos os servidores ativos, cujo critério de seleção fosse ter idade igual ou superior a

60 anos. Obteve-se uma quantidade de 213 servidores técnicos e docentes. Com e-mail

informado, a amostra reduziu para 118. Ainda assim, diante de duas tentativas, só foram

obtidas respostas de apenas 06 indivíduos. Enfim, a amostra total valida de toda a pesquisa

correspondeu a 294 indivíduos.

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5 Metodologia da Pesquisa 78

Sequencialmente à aplicação dos questionários, foram realizadas entrevistas gravadas

em aúdio, (com prévia autorização dos indivíduos) e as transcrições destas entrevistas

semidirigidas (instrumento de coleta padrão, conforme roteiro disponibilizado no Apêndice A,

contendo eixos temáticos e com relativa liberdade para emprego e consecução dos objetivos

da pesquisa em termos de coleta de informações necessárias à resolução do problema de

pesquisa). Foram entrevistados 19 indivíduos. Destes, 04 corresponderam aos menores de 15

anos, 04, aos que tinham entre 15 e 24 anos, 07, entre 25 e 59 anos, e 04 com idade igual ou

superior a 60 anos.

A terceira e última etapa foi destinada à sistematização de dados e análise dos

resultados Naquele momento, a dedicação ao trabalho deu-se por meio da organização de

informações coletadas durante o trabalho de campo e sua formalização através de categorias

de análise que erigiram durante o processo de interação qualitativa com os sujeitos que

integraram a pesquisa. Por fim, tratou-se da escrita do relatório final da pesquisa, cumprindo-

se as normas científicas aplicadas ao trabalho de dissertação acadêmica.

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6 Resultados e Discussões 79

6 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Embora existam dados quantitativos, informamos que nossa pesquisa além de levantar

estes fatos não tem objetivo de medir a frequência de alguns padrões. Visamos

substancialmente a apreciação das diferentes construções e significados que os indivíduos

possam atribuir como sua experiência diante de seus contextos histórico, cultural e social. Por

isso mesmo, Duarte (2009), ao citar Flick (2005), enfatiza que os dados dos questionários

quase não permitem a revelação do contexto de cada resposta. Isto só poderia ser conseguido

pela utilização explícita de métodos adicionais, como entrevistas complementares a uma parte

da amostra.

Espera-se que os resultados da pesquisa contribuam com o alargamento do debate

sobre o tema das projeções futuras de diferentes gerações quanto aos riscos ambientais, tanto

quanto possibilite compreender as influências de memórias geracionais e suas relações com as

questões da insegurança socioambiental advinda das experiências sociais indiretas de imagens

e notícias propagadas pelos veículos de comunicação de massa em torno de flagelos e/ou

catástrofes ocorridas no século XXI.

Quantitativamente, do total de 294 indivíduos que responderam aos questionários, 74

(25,17%) faziam parte do grupo de menores de 15 anos; 111 (37,75%) pertenciam ao grupo

de indivíduos com idade entre 15 e 24 anos; 81 (27,55%), ao grupo daqueles com idade entre

25 e 59 anos; e apenas 28 (9,52%) apresentavam idade superior a 60 anos no período da

aplicação dos questionários. O equilíbrio entre as amostras não se apresentou por razões já

explicitadas anteriormente. Contudo, tratando-se nosso objetivo da evidenciação dos

fenômenos e não a determinação de padrões, este fato não implica maiores consequências à

pesquisa.

Devido à facilidade de acesso aos alunos do CODAP, justifica-se a incidência alta de

indivíduos na amostra com nível de escolaridade situado no ensino médio incompleto (144

indivíduos ou 48,98% do total). Uma melhor distribuição por faixa etária, gênero e

alfabetização pode ser visualizada nos Gráficos 1, 2 e 3 abaixo:

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6 Resultados e Discussões 80

Gráfico 1- Distribuição de indivíduos por faixas etárias

Gráfico 2- - Distribuição de indivíduos por gênero em cada faixa etária pesquisada e

total.

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6 Resultados e Discussões 81

Gráfico 3- Distribuição de indivíduos por faixas etárias e nível de escolaridade. NA- não

alfabetizado, EFI- Ensino fundamental incompleto, EFC- Ensino fundamental completo,

EMI- Ensino médio incompleto, EMC- Ensino médio completo, ES- Ensino superior,ELS-

Especialização Latu Sensu, M-Mestrado, D- Doutorado.

Na análise quantitativa da pesquisa, foi também objetivo deste trabalho a comparação

intragrupal. Apresentam-se na Tabela 1 as composições das quatro amostras em termos de

gênero (masculino e feminino) e grau de instrução (não alfabetizado, ensino fundamental

incompleto, ensino fundamental completo, ensino médio incompleto, ensino médio completo,

ensino superior, especialização lato sensu, mestrado e doutorado).

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6 Resultados e Discussões 82

Tabela 1- Distribuição das quatro amostras geracionais em função do gênero, nível de

escolaridade. Legenda: Masc.(masculino), Fem.(feminino), não alfabetizado (NA), ensino

fundamental incompleto (EFI), ensino fundamental completo (EFC), ensino médio

incompleto (EMI), Ensino médio completo (EMC), Ensino superior (ES), Especialização

Latu Sensu,(ELS), Mestrado (M), Doutorado (D).

Gênero Grau de Instrução

Amostra

(anos)

Sujeito M F NA EFI EFC EMI EMC ES ELS M D

<15 74 33 41 0 0 0 74 0 0 0 0 0

Entre 15

e 24

111 49 62 0 9 1 69 12 20 0 0 0

Entre 25

e 59

81 32 49 1 1 1 0 20 26 20 9 3

>60 28 21 7 0 0 0 1 12 6 5 1 3

Total 294 135 159 1 10 2 144 44 52 25 10 6

Na tabela 2, pode-se observar que os meios de comunicação mais utilizados são a

televisão(56,12%) e a internet(40,13%). À medida que as experiências sociais indiretas

proporcionadas por estes meios assumem uma amplitude grande na formação das memórias

comuns na sociedade, estes dados explicitam a importância de estudos destas formas de

experiências, como já mencionado por Jedlowski (2005).

Podemos considerar os meios de comunicação de massa como lugares da memória,

conforme nos indica Nora (1993), principalmente por se constituírem em espaços

privilegiados no arquivamento e produção da memória contemporânea. Lugares que servem a

interesses particulares na construção de identidades e projetos na sociedade.

Tabela 2- Meios de comunicação mais utilizados para se manter informado

Tipo de veículo de comunicação que mais utiliza para se

manter informado sobre notícias gerais

Amostra

(anos)

Sujeitos Televisão Rádio Jornais e

revistas

impressos

Internet Outros

<15 74 56 0 0 18 0

Entre 15

e 24

111 45 1 1 62 1

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6 Resultados e Discussões 83

Entre 25

e 59

81 45 2 4 30 1

>60 28 17 1 2 8 0

Total 294 163 4 7 118 2

As análises dos questionários e entrevistas semidirigidas serão descritas conforme os

dois eixos básicos já delineados no Capítulo 5 – Metodologia- e que são retomados, por

conseguinte:

I. Percepção de riscos ambientais sob as formas dos flagelos, catástrofes ou

destruição natural de média ou de grandes proporções;

II. Visão Pessoal a respeito do futuro ambiental (definição e caracterização,

imagens e sensações, mensagens para a geração futura).

O método fenomenológico, de acordo com Rezende (2009), não impõe ao fenômeno

um caminho traçado que a reflexão deva trilhar. Em termos didáticos, utilizamos nesta

pesquisa a fenomenologia dialética que trabalha o discurso descritivo, sem fazer análise deste

discurso. Rezende destaca que o discurso descritivo deve empreender três principais noções:

1- ser significante, aspecto indispensável à descrição; 2- ser pertinente, pois se o fenômeno for

estruturado, ele apresentaria uma multiplicidade de sentido e de sentidos, assim o fenômeno

não se revela numa palavra, numa frase, mas no discurso; 3- ser relevante, pois o que se

apresenta menos pertinente e relevante é menos significante.

O lugar que a fenomenologia descritiva ocupa nesta pesquisa, o topos, assenta-se na

consciência da pesquisadora que reflete o discurso produzido por outras consciências. Acerca

dos eixos, foram desenvolvidas questões que, ao nosso ver, mantinham íntima relação com as

noções. Antes de tudo, ressalto que, em algumas partes do texto, há mudança da primeira

pessoa do plural para o singular no processo descritivo, justamente por tratar-se de uma

consciência que explicita suas sensações diante das sensações dos entrevistados.

6.1 PERCEPÇÃO DE RISCOS AMBIENTAIS SOB AS FORMAS DOS

FLAGELOS, CATÁSTROFES OU DESTRUIÇÃO NATURAL DE MÉDIA

OU DE GRANDES PROPORÇÕES.

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6 Resultados e Discussões 84

Para a associação de riscos ambientais a eventos naturais e/ou à ação do homem na

natureza, a Tabela 3 mostra a crença na intervenção humana como contributiva no

agravamento das catástrofes e/ou flagelos naturais. Assim, 97,28% (286) dos entrevistados ou

creem na ação antropogênica exclusiva (37,42%), ou nesta ação associada aos eventos

naturais (59,86%).

Tabela 3- Associação de riscos ambientais à ação antropogênica e/ou natural.

Você associa riscos ambientais a:

Amostra

(anos)

Sujeitos

Ação do homem

na natureza

Eventos naturais a que

todos podem estar

submetidos

Eventos tanto naturais

quanto por ação humana na

natureza e que podem

afetar a todos

<15 74 29(39,19%) 8 (10,81%) 37(50%)

Entre 15

e 24

111 40(36,04%) 0 71(63,96%)

Entre 25

e 59

81 31(38,27%) 0 50(61,72%)

>60 28 10(35,71%) 0 18(64,29%)

Total 294 110(37,42%) 8 (2,72%) 176(59,86%)

Muitas dessas catástrofes em parte são naturais e em outras partes são causadas

pelos próprios humanos. O próprio aquecimento, pelo..., destruição, ou a construção

em lugares onde a natureza predominava. Muitas catástrofes que dizem que a

natureza atacou a cidade, na verdade foi a cidade que invadiu o lugar da natureza. A

natureza só está fazendo sua parte, normalmente, E tá passando muitas catástrofes,

porque realmente tá uma situação muito frágil “pra”... Hoje em dia ta piorando

muito. Tendo muito acidentes, muitos problemas mesmo, talvez pela concentração, e

pela falta de educação também entre o meio ambiente, o que respeitar, muito lixo

também jogado por aí... (C, 17 anos.)

Eu acho que as catástrofes ambientais não têm nada haver com o planeta em si,

porque o planeta só está fazendo aquilo que é o trabalho dele, ele só está tentando se

defender da gente, nós somos os invasores, entendeu? (P,14 anos).

Ao falar em concentração, C refere-se à questão da concentração humana que, de

acordo com Souza e Zanela (2009), vêm expondo de forma desigual os indivíduos. Não

apenas a concentração humana em determinadas localidades é promotora do agravamento dos

efeitos dos riscos. Eventos e manifestações da natureza considerados normais podem trazer

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6 Resultados e Discussões 85

consequências graves, sobretudo, para aqueles que estão mais vulneráveis. Contudo, C

destaca a questão da educação também como um agravante para a ocorrência de catástrofes.

Da mesma forma, P entende que as catástrofes ambientais são uma forma da natureza

responder às agressões humanas.

Diante da audiência ou percepção a respeito de notícias veiculadas por jornais,

revistas, televisão etc. o comportamento e as sensações poderiam ser expressos em três

alternativas: 1) Medo, insegurança referente às catástrofes/ flagelos ambientais, mas não

alterando o comportamento: 2) Medo, insegurança referente às catástrofes/ flagelos

ambientais e alteração de comportamento; 3) Não me sinto afetado ou altero meu

comportamento.

Na tabela 4, os dados mostram que 53,74% (158 dos 294) dos entrevistados referem

não alterar seu comportamento diante da percepção ou audiência de flagelos ou catástrofes

ambientais, contudo, destes, 62,66% admitem sentir medo e insegurança. Dos 294 indivíduos,

79,93% referem medo e insegurança diante das catástrofes. Entretanto, dentre as gerações,

aqueles com idade superior a 60 anos são os que mais revelam, proporcionalmente, não se

sentirem afetados pelas notícias sobre as catástrofes ambientais ou alterarem seu

comportamento em função disso.

Tabela 4- Sensações e Comportamentos diante da audiência ou percepção a respeito de

notícias veiculadas pelos meios de comunicação.

Diante da audiência ou percepção a respeito de notícias veiculadas por meios de

comunicação seu comportamento expresso corresponde a:

Amostra

(anos)

Sujeitos

Medo, insegurança

referente às catástrofes/

flagelos ambientais,

MAS NÃO altero meu

comportamento.

Medo, insegurança

referente às catástrofes/

flagelos ambientais,

altero meu

comportamento.

Não me sinto

afetado ou altero

meu

comportamento.

<15 74 40(54,06%) 17(22,97%) 17(22,97%)

Entre 15

e 24

111 30(27,03%) 59(53,15%) 22(19,82%)

Entre 25

e 59

81 22(27,16%) 51(62,96%) 8(9,88%)

>60 28 7(25%) 9(32,14%) 12(42,86%)

Total 294 99(33,67%) 136(46,26%) 59(20,06%)

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6 Resultados e Discussões 86

Da mesma forma, foram os idosos, e aqueles com idade próxima a 60 anos, a

exteriorizarem a crença e fé numa entidade sobrenatural que as protegem e as livram das

catástrofes. Como podemos ver abaixo nos relatos dos indivíduos H, 64 anos, A, 59 anos, R,

63 anos:

Quando a senhora vê essas catástrofes pela televisão, a senhora sente medo ou

não sente, a senhora muda seu comportamento ou não muda?30

Eu tenho assim

muito respeito pelas coisas das naturezas e quando vejo não sinto medo, né? Até

porque eu creio em um Deus que tem controle sobre todas as coisas. Pela minha fé,

eu creio que há um controle e uma proteção sobrenatural naquele que crê em um

Deus todo poderoso, né? Aquele que criou o céu e a terra. Então, quando nós temos

certa consciência do que nós fazemos,né?, O que é que a gente produz e o que é que

a gente se prepara pra um futuro, né? Dentro da nossa fé, quando a gente milita

numa fé sobrenatural, a gente não tem medo do avançar e do que vai acontecer então

a gente tem consciência quando vê a destruição. Mas, quando você faz a sua parte,

você nunca espera que aquilo te atinja... Aquilo pode te atingir!, Eu mesmo não

tenho medo porque eu creio numa proteção sobrenatural de um Deus que pode todas

as coisas e que pode nos guardar de todos acontecimentos. (H, 64 anos.)

Olha isso são catástrofes naturais, das quais homem nenhum, a não ser o poder de

Deus, pode evitar. Homem nenhum pode evitar terremoto, homem nenhum pode

evitar maremoto, homem nenhum pode evitar nenhuma catástrofe como acontece.

ISSO É ATO DA NATUREZA! Então, não adianta homem nenhum querer se

envolver. Olha, uma coisa eu não acredito nunca na vida, é... Os homens falam na

televisão muitas mentiras: Ah, porque o planeta vai acabar a água! Aonde?! Nunca o

planeta vai acabar a água, porque, em questão de minutos, Deus bota água em todo

planeta, para todo mundo morrer afogado [...]. Então, o senhor acha que tudo

depende da intervenção de Deus? Deus é o poder supremo e que cria muitas

coisas. Veja bem, nós temos o continente asiático que fica do outro lado do mundo,

onde nunca se imaginaria que exista terra, mas foi toda a terra onde Deus andou,

onde Deus criou, onde Deus fez e aconteceu. Mas, nós temos pessoas... Os países

ali, naquele continente, que não respeitam nem acreditam nunca que exista Deus,

entendeu? Os japoneses não acreditam que “existe” Deus, que o deus dele é

qualquer animal que eles queiram fazer, né? O senhor acredita que essas

catástrofes na Ásia são em decorrência da intervenção divina? É um tanto de

castigo, porque aquele povo não acredita em Deus [...] Veja uma coisa! Analise o

que acontece, o mundo a fora, e analise o que acontece em nosso país, a não ser o

ato de muita violência, se nós vivemos tendo esse tipo de coisa. Não, porque, como

o povo diz que Deus é brasileiro, entendeu? O povo tem muita gente católica que

acredita em Deus. Então, Deus também anda e vê que aquele povo não merece tanto

absurdo, tal de miséria como muitos vivem enfrentado por aí.[...] Isso é ato de

pecados que as pessoas têm.( A, 59 anos).

Acredito que eles são naturais, eles não são provocados, acredito que tudo isso que

vem acontecendo é tudo natural, não pelo contrario, a não ser que em alguns casos

podem ser provocados, né?..., pelo homem, sei lá, o destino, mas ainda vejo na

minha visão que seja natural. Certo, é a minha visão. [...] Eu acredito, eu tenho

muita fé assim, sabe, eu sou muito católica, mas hoje o catolicismo, não é só, o

espiritismo, eu acho que tudo hoje é um Deus só pra todos, eu vejo, respeito a

religião de qualquer pessoa, entendeu, apesar de ser católica eu respeito a religião de

qualquer pessoa. Então eu vejo assim que a gente tem que ter mais fé, pensar mais,

REZAR MAIS, nem sei se é falta disso, sabe, fé, orações e tudo, por isso muita

30

Nas transcrições, as frases em negrito correspondem às intervenções da pesquisadora no momento da

entrevista.

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6 Resultados e Discussões 87

coisa vem acontecendo talvez por conta também de um pouco disso, por que a gente

num... A fé pra mim é muito importante. EXATAMENTE, entendeu?(R, 63 anos).

Os relatos de H, 64 anos e A, 59anos, referendam o risco ambiental como um constructo

social defendido por Almeida (2012). A probabilidade de ocorrência de um evento perigoso,

causador de danos, não se afirma na percepção humana porque o sentir-se vulnerável é

apagado diante da fé em Deus. O Deus protetor que vê as ações do devoto e o protege de

todos os acontecimentos. A, 59 anos, ainda destaca a penalidade imposta àqueles que não

acreditam em Deus, referindo que as catástrofes nada mais seriam que frutos da incredulidade

e dos pecados.

A religiosidade cristã que permeia nossa sociedade parece oferecer aos indivíduos a

certeza da possibilidade de intervenção divina nos momentos de perigo, já que há crença na

impotência humana de resolver as catástrofes, pois elas são naturais. R destacou a

necessidade de mais fé, mais orações. Em outro momento da entrevista, H ressalta não poder

fazer nada diante do sofrimento alheio, a não ser pedir “[...] a Deus que tenha misericórdia...”.

Vejamos:

E essas pessoas que são atingidas, o que a senhora sente quando as vê? Quando

eu vejo, eu fico assim, é..., um sentimento de todos “os ser humano”, de pena que

poderia não ter acontecido, sentindo assim compaixão das pessoas que estão

sofrendo aquelas consequências. E fico muitas vezes pedindo a Deus que tenha

misericórdia... E isso somente, porque não podemos fazer grande coisa. Cada um

tem que fazer sua parte, eu sou consciente de que eu faço a minha parte, né? Mas,

quando eu vejo as pessoas sofrendo, as consequências dessas coisas que estão aí

pelo mundo, fico lamentando, como todo ser humano, né? Mas a gente não pode

fazer nada porque é uma coisa da própria natureza. (H, 64anos).

O relato de B, 60anos, aponta a dificuldade em definir risco ambiental quando este é

experienciado pela mídia. Contudo, crê na impotência de fazer algo para contornar este

problema e que a ambição humana traz cada vez mais consequências desastrosas que se

refletem no presente. O risco como projeção para o futuro, conforme propõe Beck (2010),

deixa de ser risco e torna-se um perigo real quando se observa eventos cada vez mais

desastrosos, face à destruição do ambiente natural.

Olha, em relação a situação que você acabou de frisar, é um pouco, assim, difícil pra

aquelas pessoas que não viveram, apenas viram, o que, através da mídia, os

acontecimentos em alguma parte do país, do mundo. Então, mas mesmo assim eu,

como creio qualquer ser humano, lamento muito por situações como essa. De

antemão, é... , não podemos, é..., fazer nada assim que possa mudar esse curso

porque, é... , quando a gente pensa em tecnologia quando a gente pensa em avanços,

é..., todo mundo querendo ser melhor, tornar seu país melhor do que o outro, é...,

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6 Resultados e Discussões 88

atrair turista, é.., só que, no meu ponto de vista, está fazendo algo contra a essa

atração, este convite ao mundo quando, é... Digamos, assim: derrubam matas, tiram

os animais e constroem prédios. Eu, na minha concepção, não vejo isso como

vantagem para contribuir no sentido de futuro, de um progresso, é..., para qualquer

parte do mundo em qualquer ser humano.

[...] considerando essa sua ideia de futuro, E essa possibilidade ocorrerem mais

catástrofes, como o senhor definiria os riscos ambientais? Bom, fica aí uma

subjetividade e na qual eu diria que: nada mais é do que acontece cada dia que passa.

Cada, é...., problemas que surgem, é..., comprometer a natureza em geral, trazendo

riscos de destruição, né? Que já acontece, que já nem é mais nem risco. Tem

acontecido realmente, é..., verdadeiramente é..., regiões destruídas, vidas perdidas.

Isso, na proporção que avança o mundo, agente pode mais ou menos imaginar que...

Como dizer? A cada dez anos aumenta dez por cento de destruição. E isso posso

codificar como dez por cento de risco a cada dez anos. E, aí, é difícil para eu dizer

que exatamente um porcentual ou final ou um risco real exatamente que possa

acontecer daqui para frente. Nada de bom podemos esperar! Isso, é..., eu acho que é

inevitável ser dito por qualquer ser humano e só vai o risco piorar cada vez mais e

mais e mais...(B, 60 anos).

Para os jovens, a possibilidade de não ser atingido recai muito mais pelas favoráveis

aparentes condições geográficas em que estão situados. Há o reconhecimento da existência de

catástrofes e/ou flagelos de grandes proporções em outras partes do planeta, entretanto ser

afetado estaria num futuro remoto, os atingidos seriam sempre as vítimas expostas na

televisão. Para Bauman (2008), os infortúnios, mesmo que não venham a ocorrer,

proporcionam ao indivíduo a sensação de que ele pode ser ignorado de seus efeitos.

A percepção ou sensação da insegurança e do medo frente aos eventos, catástrofes ou

flagelos naturais é construída pelas experiências sociais indiretas formadas pela audiência a

jornais televisivos. Vivenciando-se estes fatos no conforto e segurança do lar, as vítimas das

tragédias são oferecidas em sacrifício à infelicidade e à morte. A catarse a que se refere Morin

(2000) pode ser observada quando M, 14 anos, destaca sentir medo, mas não acredita ser

afetado pelos infortúnios:

Em termos de futuro, esse medo, essa insegurança que você sente, que imagens

vêm à sua cabeça?Gente correndo (risos). Gente correndo? É, água!((risos)).

Sempre penso em águas. Em águas? Demolição, prédios caindo... E eu sempre

penso que aqui vai ser o último lugar, a gente vai ver isso no jornal e vai ficar com

medo (risos). [...] Aqui vai ser o último lugar? Com certeza, eu penso assim. Eu

sempre penso assim. Sei lá! Porque aqui, por exemplo, aqui não é de ter terremoto...

Aqui é muito afastado. Aí, eu sempre penso que aqui possa ser o último lugar. Você

vai ver isso no jornal, você vai ficar com medo... A gente tem que se preparar, mas,

de qualquer forma, alguém será atingido. [...] mas você acha que aqui, a gente não

será atingido? Tal- vez futuramente. O tempo é dono de tudo, então, com o tempo,

não daqui a cinquenta anos, mais tempo, é..., provavelmente. (M, 14 anos.)

Contudo, explicitamos o relato de D, 14 anos, que, ao sentir medo, expressa a

necessidade de precaução. Embora não sejam comuns eventos de grande proporção no Estado

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6 Resultados e Discussões 89

de Sergipe, as imagens associadas aos riscos são sempre referentes a grandes eventos como

tsunamis, furacões, terremotos. Os riscos, neste aspecto, refletem uma face natural, implicado

pelo processo civilizatório:

O que são riscos ambientais para você? Eu acho que é uma coisa natural, que uma

hora com todos esses (efeitos), tudo isso que o humano está fazendo, uma hora teria

uma consequência, exemplo: prédios destruídos, uma hora teria consequências, e... é

isso. Que imagens surgem em sua cabeça em relação a estes riscos, catástrofes?

terremotos, é... tsunamis, furacões, não sei, talvez uhn...(...) e o que você sente

quando vem essas imagens à sua cabeça, o que você sente? Um tanto de medo e

um tanto de... precaução. Eu tenho vontade de me precaver, porque, se tem alguma

coisa vindo, eu acho que a melhor coisa a fazer é ficar com ela. (B, 14 anos.)

Risco ambiental é o que pode ocorrer, é..., que pode afetar nossas vidas, né?, Como

aconteceu no Haiti, aqueles terremotos. Eu sofri o terremoto, eu viajei pra Itália e lá

teve um terremoto. Eu vi muitas pessoas, muita casa no chão, as pessoas

desesperadas sem casa correndo pelo meio da rua, com crianças sangrando, né?, Ali,

a gente vê como é difícil quando as pessoas passam por um negócio desses, né? A

gente até tentou ajudar, lá, mas a gente não entendia a língua, essas coisas. Mas a

gente vê as dificuldades que as pessoas têm. (F, 31 anos).

O entrevistado F nos revela um lado significante da construção do que vem a ser risco

ambiental. Para ser esta categoria, há que necessariamente existir perdas humanas e materiais.

Mesmo presenciando o último terremoto ocorrido na Itália em Maio de 201231

, o fato de F

não ter sido diretamente afetado ainda o distancia da possibilidade de que algo ocorra com

ele. Há sempre acontecimentos com os “outros”.

Se voltarmos à Tabela 3, percebemos que somente 08 indivíduos, todos menores de

15 anos, acreditam ser os riscos ambientais apenas eventos naturais. Este fato põe-nos a

refletir sobre a forma que a narrativa jornalística ou até a educação formal tem sido imposta.

Se para uma parcela dos mais jovens, a ideia de riscos está associada unicamente a eventos

naturais, como pensar um futuro para as próximas gerações, se não temos como agir sobre

coisas da própria natureza? Que memória ou memórias estão sendo divulgadas? A quem

interessa? Ou, quais projetos estariam por trás destas narrativas e imagens propagadas?

Por outro lado, aos que atribuem os riscos ambientais como resultado da relação entre

eventos naturais e ação antropogênica, há o reconhecimento de que os riscos sempre

existiram. Eles estão mais em evidência por conta da mídia e da contribuição humana neste

processo. O entrevistado G nos traz isto quando afirma que tudo está naturalmente posto no

ambiente, contudo o homem é quem potencializa os fenômenos e eventos ao manipular os

recursos naturais.

31

O entrevistado F refere-se ao terremoto de magnitude 5,8 ocorrido em Modena e que deixou 16 mortos em

Maio de 2012.

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6 Resultados e Discussões 90

“Pra” alguns fenômenos eu fico muito preocupado, tem alguns que é... assim, eu me

preocupo bastante. No entanto, eu percebo o seguinte: que esses fenômenos eles já

foram futuros no passado. Então, é como se eu tivesse querendo dizer aqui que esses

fenômeno já aconteceram no passado, né?, Não sei se pelo fato da mídia agora

divulgar mais e saber mais, então esses fenômenos ficam mais, como posso dizer?

Mais acentuado, é..., eles ficam mais em evidencia. Mas eu vejo que eles já foram

futuros. Eu me preocupo, na verdade, porque assim: eles já existiram, é um fato. No

entanto, eles tão mais evidentes, tão mais de forma efetiva por conta da nossa

interferência. Não venha me dizer que é um fenômeno que acontece naturalmente!

Lógico que a gente ta influenciando em alguns pontos pra que esta catástrofe venha

acontecer, né?! Tais como enchentes, esse tal derretimento de geleiras, aconteceu

sempre naturalmente, mas a evidencia vem sempre, é..., mais efetiva devida a nossa

interferência. [...] Pois é, esses riscos ambientais, é..., estes fenômenos sempre

aconteceram. Por exemplo: a geleira tem que derreter, é um fluxo natural, ele faz

parte do fluxo natural, no entanto, elas estão derretendo mais rápido, porque agente

ta interferindo nesse meio, que é com a questão de emissão de gases, então esses

riscos ambientais, é..., na verdade, se não todo, mas que, na maioria deles, é tudo

influência nossa. A questão de produção de gases... Pronto! Posso falar aqui o que

acontecia em Cubatão. Não existia vida em Cubatão. Qual era o risco ambiental lá

em Cubatão? Os gases tóxicos de enxofre. Hoje, não! Hoje, Cubatão é uma cidade

que você pode chegar lá e parece... Se você chegar lá hoje, nunca vai acreditar que

aquela cidade era há um tempo, porque os riscos ambientais foram excluídos de lá,

daquele meio. Então, esses riscos ambientais, posso colocá-los, é..., numa

definição... Não sei! São... O que? São materiais produzidos por nós mesmo. Assim,

tudo que agente produz é um risco ambiental. Porque, assim, tudo tá na natureza,

mas quando você tira e processa, você joga pra natureza de forma que ela vai ter

uma efetividade. Então, esses riscos, eles... É tudo que o homem produz, eu vejo

nesse sentido (G, 46 anos).

A tendência de transferirmos nossas responsabilidades em relação ao meio ambiente

para os "outros" da nossa geração e os das próximas pode ser observado no relato de J, 24

anos:

Se continuar do jeito que vai, a tendência é piorar. Eu acredito que tinha que ter uma

reeducação com relação ao meio ambiente, porque é algo necessário, é a vida

humana, é o ser humano. E que, infelizmente, muitos não dão, não tomam cuidados,

não dão valor, não pensam. Eu acredito que não pensem nem como pode ser daqui a

alguns anos, de como estará o que esta acontecendo aqui. Com certeza que só piora

as coisas só aumente com relação a isso [...] você tem esse cuidado no presente?

“pra” ser sincera não, tanto não. [...] Epor que você acha, você transfere para os

outros essa responsabilidade? Realmente, eu não tenho sido mais para o futuro do

que penso no agora. Do que pode ser feito no agora e não só pensar como estará

daqui alguns anos. E quando relaciono aos outros... porque no meu modo de pensar

AGORA, eu não estou agindo de forma que eu acharia que fosse errada, com relação

ao meio ambiente, o que possa ser melhorado, caso feito melhorado por mim. (J, 24

anos).

Embora volte sua consciência para o presente, a entrevistada J nos revela uma ser-no

mundo impessoal, diluído na cotidianidade, no ambiente familiar. Para Heidegger (2005),

mais originário é o Dasein no estranhamento, no afastamento ao familiar. Entretanto, é muito

mais comum a fuga de si, o encobrimento de seu ser-no-mundo.

Outro aspecto relevante é a sensação de ação mínima verificada no relato de L, 21

anos. A entrevistada nos transmite que os atos quando pensados e efetuados individualmente,

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6 Resultados e Discussões 91

criam a falsa sensação de que há um efeito mínimo sobre o meio ambiente, quando, na

verdade, torna-se ampliado no coletivo. Vejamos:

[...] e sua geração, você acredita que ela é responsável? Eu acho que hoje em dia

como tá sendo muito discutido, tá...Cada um tá tendo mais consciência, mas muitos,

ainda, é..., fazem mal, mesmo sabendo ainda prejudica o meio ambiente. [...] E a

que você credita isso? Ah, pelo o que vejo mesmo! Muita gente, às vezes, não tem

noção do que faz, às vezes, tem noção, mas diz assim: “Ah, só eu, então vou fazer!”

E, então, é uma coisa assim, de consciência mesmo. [...] Certo, a pessoa acha que

se só ela vai fazer não tem problema? É. E, aí, cada um, todo mundo pensa e todo

mundo faz [...] do mesmo jeito? É. Um coletivo, termina ficando um coletivo? É.

(L, 21 anos)

6.2 VISÃO PESSOAL A RESPEITO DO “FUTURO” (DEFINIÇÃO E

CARACTERIZAÇÃO).

Riscos ambientais e futuro são fenômenos inter-relacionados. Não há como separá-los,

pois os riscos são sempre probabilidades de que algum evento possa ocorrer no futuro. Por

isso, alguns trechos anteriormente descritos faziam também referência ao futuro. Esta parte da

descrição está dividida em três momentos: a) como os indivíduos definem o futuro; b) Se há

crença de serem afetados pelos riscos no presente e no futuro; c) Mensagem para a sua e para

as próximas gerações.

a) Definição de futuro:

Quanto à ideia a respeito do futuro, pretendíamos inicialmente observar sob quais

perspectivas os indivíduos faziam suas projeções. Existiria uma preocupação com o futuro? E

se existisse, como este seria imaginado? Sob uma perspectiva apocalíptica, ou esperançosa?

Para estas perguntas, elaboramos três respostas que poderiam ser escolhidas pelos indivíduos:

1) Melhor que hoje para a vida humana; 2) Ameaçador à vida humana 3)Não tenho ideia, não

me preocupo com o futuro.

Na tabela 5, fica evidente a superioridade das projeções voltadas para um futuro

ameaçador em todas as gerações (63,27%), se compararmos estes dados com aqueles

referentes a um futuro melhor para a vida humana (30,95%).

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6 Resultados e Discussões 92

Tabela 5- Ideia a respeito do futuro

Sua ideia a respeito do futuro planetário é:

Amostra

(anos)

Sujeitos Melhor que hoje

para a vida

Humana

Ameaçador à

vida humana

Não tenho ideia, não me

preocupo com o futuro

<15 74 39(52,7%) 30(40,54%) 5 (6,76%)

Entre 15 e

24

111 25(22,52%) 78(70,27%) 8 (7,21%)

Entre 25 e

59

81 22(27,16%) 56(69,14%) 3 (3,70%)

>60 28 5 (17,86%) 22(78,57%) 1 (3,57%)

Total 294 91(30,95%) 186(63,27%) 17(5,78%)

Ao definir futuro, P, 14 anos, traz duas visões: a de um futuro melhor, quando este é

vivido e traçado individualmente, e um futuro ameaçador quando analisado sob uma

perspectiva do coletivo:

Assim, sinceramente eu não me preocupo muito com o futuro. Eu acho que não vou

viver pra sempre, nem quero ter filho, nem netos, então eu não me importo muito

com o futuro. E como foi dito anteriormente, é..., a gente planta o que a gente colhe,

então, provavelmente nosso futuro não será nem um pouco agradável [...]. E por

que você tem essa certeza? Pelo o que a gente vê hoje, pelo o que a gente, é..., no

presente não está sendo fácil pra viver. O futuro provavelmente não será tão melhor

que isso, né? [...] Eu acho que futuro é o produto do presente. O futuro, ele vem

daquilo que você faz hoje. Se você faz coisas boas, virão coisas boas por mais que

tudo ao seu redor esteja ruim. Então, o futuro é aquilo que você faz [...] e por que

você não se preocupa com o futuro? Porque eu traçarei o meu futuro, então, o meu

futuro será da melhor maneira pra mim. E eu acho que todos não devemos nos

importar... SIM, se importar com o próximo, mas olhar pra dentro da gente e

procurar o melhor pra nós, entendeu? E isso será consequência. Nós...cuidando de

nós, cuidando do planeta, o planeta será um lugar bom pra todos no futuro.Eu

acredito nisso. (P, 14 anos).

Assim, desde um tempo eu já penso que talvez no futuro não tenha uma vida

muito... Ou vai acontecer mais catástrofe, vai piorar a situação, talvez a população

não consiga viver mais no futuro. Ou, se piorar muito a situação, vai ficar mais

difícil a vida mesmo. Poucas pessoas vão sobreviver se piorar a situação. Depende

de como é que vai seguir, é..., eu não posso dizer como é que vai seguir, mas a

situação ta muito ruim mesmo. Não tão seguindo com sua parte. [...] uma pequena

decepção, né? [...] Então você acredita que a vida humana possa se extinguir

aqui na Terradiante dessas catástrofes ou não? Eu acho que de certa forma pode.

E vai chegar um extremo que a população não vai conseguir viver. Hoje em dia, já ta

difícil... Inclusive muitas partes já estão deixando de ser “habitada”, porque a

situação já piorou. Já vi documentários que os antigos em partes e dá.... Até do

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6 Resultados e Discussões 93

Nordeste, aqui mesmo, uns que “era” habitáveis antes e que hoje já não são. Eu,

minha família é de interior, eu já vejo muitos comentários que antes a vida era

melhor, que tinha mais gados. Hoje, tem muitas terras desérticas, o mundo está

virando um verdadeiro deserto no Nordeste. Uma vez lá, no Rio, no Sudeste, tá

piorando a situação. E já dá pra perceber que não só no Brasil como em várias partes

do mundo tão evacuando e a criminalidade também ajudando nisso. As partes em

que eles estão evacuando, e..., em parte estão evacuando por causa da escassez de

alimentos, por causa do sol forte ou por causa de chuva, tempestades e naquela parte

onde as pessoas estão chegando, tão se concentrando tantas gentes que a

criminalidade está acabando com as pessoas ali. Então, está realmente uma situação

deplorável. (C, 17 anos).

O entrevistado C, 17 anos, percebe um futuro ameaçador tendo em vista a situação

presente. Destacando as áreas em que já há evacuação humana, C entende que isto não se

deve apenas pelos fatores ambientais, mas também pela violência.

Pensar ou projetar um futuro transmite em alguns entrevistados a sensação de medo e

insegurança. O futuro como projeto do presente, em alguns casos, é pensado para atingir

metas pessoais relacionadas à família, ao trabalho, aos estudos.

Dá um pouco de medo (risos), por que eu acredito que nos próximos anos só tende a

piorar a situação, acredito que depende muito do ser humano de como ele deve agir

e pensar. Como você caracteriza o futuro?Quando paro “pra” pensar no futuro, eu

penso mais em relação à família, como eu devo estar, como o mundo em si está,

como o mundo continuaria.... No caso, e espero que melhore, não tenda a piorar

como está acontecendo. É nisso como eu imagino no futuro, quando paro “pra”

pensar basicamente relacionada a isso. [...] e no presente você relaciona a quê?

Quando você pensa na sua família, nos seus projetos. No presente, estar com

minha família, é..., com relação a estudo, trabalho, por enquanto só. Só isso, só!

Limitado mesmo. NÃO, no momento não penso tanto no que está acontecendo no

que pode acontecer, mas me preocupo sim com o futuro... Agora, nem tanto (J, 24

anos).

A tendência de transferirmos nossas responsabilidades em relação ao meio ambiente

para os "outros" da nossa geração e os das próximas também é observado no relato de J. Ela

nos desvela um ser absorvido no público, no impessoal e na familiaridade. Para

Heidegger,(2005) mais originário é o Dasein no estranhamento, no não se sentir em casa.

Contudo, o comum é a fuga da situação de estar jogado no mundo e entregue a si mesmo.

Se continuar do jeito que vai, a tendência é piorar. Eu acredito que tinha que ter uma

reeducação com relação ao meio ambiente, porque é algo necessário, é a vida

humana, é o ser humano. E que, infelizmente, muitos não dão, não tomam cuidados,

não dão valor, não pensam. Eu acredito que não pensem nem como pode ser daqui a

alguns anos, de como estará o que esta acontecendo aqui. Com certeza que só piora

as coisas só aumente com relação a isso [...] você tem esse cuidado no presente?

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6 Resultados e Discussões 94

“Pra” ser sincera não, tanto não. [...] e por que você acha, você transfere para os

outros essa responsabilidade? Realmente, eu não tenho sido mais para o futuro do

que penso no agora. Do que pode ser feito no agora e não só pensar como estará

daqui alguns anos. E quando relaciono aos outros, porque no meu modo de pensar,

AGORA, eu não estou agindo de forma que eu acharia que fosse errada, com relação

ao meio ambiente o que possa ser melhorado, caso feito melhorado por mim.(J, 24

anos).

Na nossa discussão e reavaliação das escutas, os idosos e aqueles com idade próxima a

60 anos, revelaram não se sentir à vontade para falar de futuro. Isto se deve ao fato de

sentirem, por um lado, que as conquistas materiais já foram alcançadas. O futuro, neste

aspecto, seria um passado que já foi projetado e se realizou. Por outro lado, na escala da

evolução, o avançar da idade não os permite projetar algo mais, assim, o futuro está em

função da expectativa de vida. O entrevistado A nos revela que a vida finda quando a

dimensão profissional é extinta e as conquistas financeiras são concretizadas.

Pessoas indicadas a você “pra” dizer, falar a respeito do futuro, não vai ser eu, nem

uma pessoa assim da minha idade, não. Acredito que pessoas que tem...O meu

futuro está avançado já! O que eu quis conseguir, eu já consegui. O que eu poderia

ter, eu já tenho. Então, eu já tenho o meu futuro em mãos. Agora, o futuro de muita

gente, de meus netos, de meu filho que tem 36 anos, o futuro do nosso amigo ali que

tem apenas 25 anos (em referência a um colega de trabalho que assistia a entrevista),

é uma coisa a pensar, né? Ou imaginar o que possa ser o futuro de cada um. Não

uma pessoa com 59 anos a pensar no futuro. Até quando? Até quando nós vamos

imaginar que nós podemos viver? É um tanto difícil, entendeu? pensar no futuro já

com 59 anos. Então, o senhor acha que o futuro seriam essas conquistas que o

senhor já tem? Exatamente! Eu já tive minhas conquistas, graças a Deus acima de

tudo, entendeu? E, hoje, estou bem satisfeito com o que Deus já me deu, ou possa

vir a me dar amanhã ou depois, entendeu? Mas, que pensar: “Ah, vou pensar no meu

futuro...” A quem? Há cem anos? Fica difícil....O senhor pensa o presente? Na

verdade, é. O presente é o ideal, entendeu? Questão de futuro vai ficar “pra” quem

tá crescendo, prá quem tá começando a vida... Eu, hoje em dia, já passei de me

aposentar, vou pensar em futuro? (A, 59 anos).

[...] Como a senhora caracteriza o futuro? É porque dentro dos meus conceitos

religiosos eu vejo assim: o homem nasce, cresce e morre, né? Mas há o estágio.

Cada estágio da vida, ele tem a infância, a adolescência, adulto e a senilidade. Então,

quando a gente chega nesse estágio que olha pra trás, a gente vê que poderia ter feito

muito mais,né? Que poderia ter feito mais alguma coisa. Então, quando a gente é

educado “pra” construir, né? Fazer construção, o que é construir pra mim? Construir

é proporcionar um bem-estar tanto pra mim como “pra” todos que nos cercam,

aonde a gente vive. Então, eu acho que, eu vejo e olho “pro” futuro, assim... Eu vejo

que há muito descaso, né? Até do próprio poder público, dos agentes que

administram, que estão à frente do poder, que deveria ter mais consciência de que se

nós não cuidarmos desse planeta, ele vai entrar num estagio que não vai ter mais

sobrevivência. Essa é a minha visão e na minha expectativa de vida, como eu já

tenho sessenta e quatro anos, eu espero que haja um maior processo de

conscientização pra que as pessoas vivam bem e que respeitem a natureza. (H, 64

anos).

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6 Resultados e Discussões 95

O que você pensa do futuro? Que ideia você tem do futuro? O futuro é o

resultado do que, resultado do que eu estou fazendo agora no presente. (D, 14 anos)

Futuro pra mim... O futuro é tão (risos) tão indefinido,né? A gente, eu, na verdade

imagino muitas coisas boas. Claro,né? A gente sempre pensa. Agora... “pra” eu lhe

dizer em que sentido com relação aos riscos, eu acho que muito ainda tem que ser

feito “pra” que, a futura geração elas possam ter uma vida mais saudável. (K, 28

anos)

O que é futuro? É quando a gente realmente quer idealizar uma coisa melhor para

cada um de nós ou para sociedade, então pra mim o futuro se planta agora e não

esperar que aconteça, depender de governo ou de outras coisas que venham

acontecer, a partir da nossa posição que é tomada agora (M, 55anos)

Após o término da entrevista, K confessa estar nervosa e tensa e referiu um

desconforto físico, pois nunca havia refletido sobre os riscos ambientais ou sobre possíveis

eventos no futuro.

b) Crença de ser afetado pelos riscos no presente e no futuro;

Para esta parte relacionada ao futuro, trazemos as tabelas 6 e 7. Embora na tabela 6

exista o equilíbrio entre as gerações referente à sensação de ser afetado pelos riscos

ambientais no presente (76,53%), na tabela 7, podemos verificar que este sentimento é ainda

maior (97,62%) quando projetado para um futuro mais distante.

Tabela 6 - Crença de ser afetado ou não pelos riscos ambientais no presente.

Você sente que os problemas ambientais podem afetá-lo diretamente agora?

Amostra (anos) Sujeitos SIM NÃO

<15 74 50(67,56%) 24(32,43%)

Entre 15 e 24 111 85(76,58%) 26(23,42%)

Entre 25 e 59 81 70(86,42%) 11(13,58%)

>60 28 20(71,43%) 8(28,57%)

Total 294 225(76,53%) 69(23,47%)

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6 Resultados e Discussões 96

Você sente que pode ser atingido neste momento? É..., sempre a gente anda

assim, com medo, qualquer coisa pode acontecer, qualquer hora. Você ver um caso

assim passando no jornal, você pensa: E se fosse comigo? E você se previne de

qualquer forma. Mesmo quem diz que não tem medo, tem medo. Ela só esconde isso

dos outros, mas ela tem? Ela se precaver de certa forma, de uma outra forma, mais a

gente sabe que, por enquanto, dá pra viver. Mas no futuro, com meus filhos, meus

netos, vai ficar mais difícil ainda e... eu sei que talvez nem chegue lá,né? (C, 17

anos.).

Você acredita que esses riscos podem atingi-los agora? Não, de imediato não.

Pelo menos onde eu moro (...) E no futuro? No futuro que vai ser presente

provavelmente, onde moro eu acredito que não, a gente não tem essa possibilidade

de algumas catástrofes. As catástrofes que vemos agora “é “catástrofe de chuvas, de

enchentes, pode até ser. (G, 46 anos).

Tabela 7- Crença de ser afetado ou não pelos riscos ambientais no futuro

c) Mensagem para a atual e para as próximas gerações.

É... Consciência! Que teremos que tomar consciência, que cada um deverá fazer a

sua parte dentro da natureza para termos um mundo melhor futuramente. Para outras

gerações que vêm aí [...] E essa geração, você acha que o mundo pode ser

melhor? Essa, a depender de conscientização de cada um, pode. A depender de cada

um fazer sua parte, (isso acontece) na natureza, na sociedade (M, 55anos).

Viva para o próximo e não pra você mesmo. Você viver pensando no próximo, é

essa mensagem que eu tenho, que você viver no próximo que vai estar aqui e não

pensando só em você no seu eu ( G, 46 anos).

É...,que vocês estão colhendo o que a gente plantou (M, 14 anos).

Você sente que os problemas ambientais podem afetá-lo diretamente no futuro?

Amostra (anos) Sujeitos SIM NÃO

<15 74 72(97,30%) 2(2,70%)

Entre 15 e 24 111 108(97,30%) 3(2,70%)

Entre 25 e 59 81 79(97,53%) 2(2,47%)

>60 28 28(100%) 0

Total 294 287(97,62%) 7(2,38%)

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6 Resultados e Discussões 97

Assim, que as pessoas têm que se conscientizar que não é só o presente, Tem que

olhar muito o futuro dos nossos filhos, eu tenho uma filha e eu ensino muito isso a

ela, que ela tem que ajudar as pessoas, que ela tem que ver o lado das pessoas,Em

caso de acidente, de catástrofe a mesma coisa, ela tem que sentir e ajudar e ajudar as

pessoas (F, 31anos).

Eu acho que já esta na hora de parar, de fazer gerar... Gerar concepções do que é

melhor, porque o bom o mundo já nasceu com tudo que era. Então, o homem não

precisa dar essa de querer ser o tal, porque não vai contribuir nada para o mundo. O

homem tem apenas que amar a natureza, amar seu semelhante e agradecer todos os

momentos. Assim... como eu agradeço esse exato momento de tá passando essa

informação pra você (B, 60 anos).

Eu gostaria de dizer que todos nós temos a responsabilidade sobre o nosso futuro,

cada um tem que cumprir sua parte, né? Qualquer agressividade ao meio ambiente

qualquer coisa que venha desvirtuar a natureza, que vier transformar pelo próprio

poder humano, poder do homem, então isso pode causar dano. Então, tem que ter

uma consciência de que precisamos ter de garantir o nosso futuro e a continuidade

da espécie humana (H, 64 anos).

Diante do relato de G, percebemos que o lar é um refúgio seguro. Mais uma vez, “os

outros” podem ser afetados. Nós sentimos que somos ignorados dos fenômenos, justamente,

por não existir um contato direto com estes eventos. Em grande parte, as mensagens sinalizam

a tomada de consciência como processo e como fenômeno de consequências e de realização

palpáveis. A garantia da espécie humana, ainda, foi identificada como elemento de maior

predominância. Como pesquisadora, entendo que esses elementos são significativos. Destaco

quatro motivos relevantes na análise dessa parte da pesquisa.

Em relação às mensagens intergeracionais dos sujeitos pesquisados, o primeiro motivo

relevante é a identificação de foco antropocêntrico. Isso significa que a relação homem-

natureza é valorizada pela predominância do homem como sujeito e senhor, racional e digno

de vida, sobrepujando-se além da natureza e se diferenciando dela.

O segundo motivo corresponde à insistente referência ao parentesco e à filiação

genética. São os filhos, os humanos mais citados nas discussões sobre futuro e catástrofes

ambientais. A predominância desse aspecto faz brotar um altruísmo restrito no qual a

solidariedade é muitas vezes sustentada pela manutenção de heranças genéticas próprias ou

pertencentes a um determinado grupo de indivíduos. Os filhos, netos e descendentes formam a

parcela mais intimamente direcionada à preocupação dos entrevistados.

O terceiro motivo está relacionado ao romantismo idealista em relação à natureza. Os

participantes da pesquisa fazem referências ao “amor à natureza”, distorcendo e alimentando

uma relação supervalorizada e inacessível, como se não fizessem parte da própria natureza e,

ao mesmo tempo, se envolvessem na troca ou usufruto da mesma de modo conflitante e não

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6 Resultados e Discussões 98

harmônico. Assim como na relação “amorosa” entre humanos, os conflitos existem em picos

de altos e baixos, amando e rejeitando, recompondo aos caprichos de um egoísmo tolo, a

relação constituída.

O quarto motivo é de natureza política em relação à vida. Identifica-se esse elemento

no recorrente apelo “às garantias” de um futuro digno para todos. Considerando o conjunto de

todos os elementos identificados nessa pesquisa, este último, condensa importante papel de

articulação entre todos os outros. “Garantia” significa não apenas possibilidade de manter a

vida no planeta, sobretudo, a manutenção da espécie humana. Quando se aborda tais

“garantias” é possível encontrar um substrato de ideologia capitalista sustentando toda lógica

do discurso. Garantia significa direito privado, antes do público; direito individual, em

primeira ordem ao coletivo.

Além disso, é possível inferir, com base nas entrevistas e nas interações com os

participantes da pesquisa que a “garantia” não é realizável pelo anseio de todos para todos,

mas se concentra nas mãos de um grupo de pessoas mais aptas a tornar possível cada etapa a

ser cumprida (aqui encontramos romantismo, alienação e subordinação à autoridade). O lema

“cada um faz sua parte” aparece insistentemente. Nisso, entende-se que os participantes

colidem entre seus interesses, sua liberdade individual e os ranços de subordinação a que

estão gravemente dispostos desde épocas distantes. É preciso, pois, perceber tais elementos na

disposição de cada um de seus limites, pertinência e relevância para a pesquisa em ciências

ambientais e interdisciplinaridade. Não são verdades, apenas pontos de vista, nascidos de toda

relação de entrega, aprendizagem e interesse em compreender em profundidade as faces de

todo o problema de pesquisa desenvolvido.

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Conclusões 99

7 CONCLUSÕES

A conclusão de um trabalho de pesquisa requer um esforço não apenas pessoal, mas

representativo de todas as pessoas, circunstâncias e momentos vivenciados ao longo de sua

realização. É um momento de autoencontro, alteridade e de reflexão mútua. Esta pesquisa

teve como característica peculiar esse movimento. Desde seu início, habitando e construindo

uma relação não muito honesta e lúcida em relação ao tempo e suas temporalidades, vivi,

como pessoa, as sensações de seguir transitando sem a devida percepção centrada no que me

ocorria à frente, aqui e agora ou, ainda, naquilo que foi, como passado. Deparei-me com a

sensação do futuro: o que será? Nisso, a pesquisa me fez cessar esse modo de habitar o

tempo! Passado, presente e futuro se mesclam e fazem brotar a consciência, mesmo cheia de

incessa ‘nte e inconsistente relação com o vivido, o percebido, o partilhado, o visto junto.

É complexo e muito agradável falar dessa pesquisa. Com ela pude perceber processos

e mecanismos em valiosa interação dentro do tempo. As sensações humanas de insegurança,

medo, transtornos e dificuldades nascem dentro de um tempo e suas facetas de temporalidade.

É ao mesmo tempo cronologia e modo de vivência que vem de dentro para fora e que constrói

os contextos nos quais circulamos com nossos corpos, nossas ideias, nossas atitudes, escolhas,

ações etc. Como parte da conclusão desse trabalho, é possível elencar uma diversidade de

temas e de especificidades variadas que nos servem como resultados. Na fenomenologia,

resultados são enunciados significantes, relevantes e pertinentes ao problema de pesquisa

desenvolvido. Optei, como pesquisadora, elencar os mais insistentes encontrados na

construção fenomenológica pela qual essa pesquisa foi desenhada.

O primeiro enunciado corresponde, entre os pesquisados, à identificação da crença na

intervenção humana como contributiva no agravamento das catástrofes e/ou flagelos naturais.

Nesse sentido, o homem pode amenizar ou evitar maiores tragédias quando o assunto são os

flagelos naturais. Não é possível evita-los, todos. Mas é fundamental evitar que se acelerem

em frequência e proporção. Logo, a intervenção humana surge como revisão de posturas,

decisões e realização de comportamentos ou ações individuais, nacionais, setoriais, industriais

ou de consumo sobre os recursos naturais.

O segundo enunciado tangencia a questão da educação. A educação é apontada como

um agravante para a ocorrência de catástrofes. Mais a ausência de projetos consistentes e

menos superficiais em relação ao meio ambiente do que a inexistência de tentativas sobre a

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Conclusões 100

problemática do futuro ambiental e da vida planetária. Assim, a educação é apontada como

não tendo eficácia concreta na consolidação de outro modo de se relacionar com as questões

planetárias e frente às questões do futuro ambiental e das catástrofes. A educação, tanto

formal quanto a informal, tem servido mais como elemento ilustrativo e informativo do que

como possuindo poderosa consolidação formativa do caráter humano. Conscientização não é

saber sobre algo ou discursar. Este foi um dos “vazios” encontrados na pesquisa.

O terceiro enunciado é representativo pelos próprios entrevistados quando se referem

não alterar seu comportamento diante da percepção ou audiência de flagelos ou catástrofes

ambientais produzidos pelos veículos de cultura de massa. O percentual de 53,74% admitem

sentir medo e insegurança, mas, não se mantêm na atenção focada sobre a problemática

anunciada pelos veículos de cultura de massa e nem é possível identificar a repetição, o

enquadramento e a estruturação das notícias, propagandas etc quando feitos com a mesma

intencionalidade de comunicação. Nisso, os participantes sentem medo e insegurança, mas

sentem-se atônitos brevemente e desligados momentos seguintes. O que eles alimentam é a

insegurança que apela por novo consumo da mesma porção de medo a fim de mantê-los com

a sensação de viventes em direção provável à extinção.

Há peculiaridades nesse terceiro enunciado de pesquisa. Dentre as gerações, aqueles

com idade superior a 60 anos são os que mais revelam, proporcionalmente, não se sentirem

afetados pelas notícias sobre as catástrofes ambientais ou alterarem seu comportamento em

função disso. Todavia, para os jovens, a possibilidade de não ser atingido recai muito mais

pelas favoráveis aparentes condições geográficas em que estão situados. Há o reconhecimento

da existência de catástrofes e/ ou flagelos de grandes proporções em outras partes do planeta,

entretanto ser afetado estaria num futuro remoto, os atingidos seriam sempre as vítimas

expostas na televisão. Os participantes da pesquisa menores de 15 anos acreditam ser os riscos

ambientais apenas eventos naturais. Logo, vivem entre atônitos e sobressaltados riscos na

relação cotidiana de perceber, esquecer e voltar à consciência a finitude imprevista de

qualquer instante em qualquer direção.

O quarto enunciado explicita a tendência de transferirmos nossas responsabilidades em

relação ao meio ambiente para os "outros" da nossa geração e os das próximas. Foi recorrente

essa dinâmica de construção social, expressa pelos participantes da pesquisa. Há conflitante

relação entre duas lógicas: individual e coletiva. Quanto ao plano individual, viver aqui-agora,

não assume como incompatível o consumo exagerado, fundado por uma necessidade de

participar do “bolo social”. Em nenhuma época tivemos tantas oportunidades de usufruto e de

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Conclusões 101

estocagem à venda. Então, poder monetário associado à ideologia de consumo e ao

individualismo fundamenta a primeira lógica: individual. Quanto ao plano coletivo, o futuro

ambiental torna-se ameaçador. Quando analisado sob uma perspectiva do coletivo, o futuro

ambiental se associa às ações dos outros. São os outros ou as pessoas que deveriam, que

precisam etc. Individualmente pensar ou projetar um futuro ambiental transmite sensação de

medo e insegurança. Escapa às mãos de cada um e ao mesmo tempo depende disso. Futuro

ambiental é algo distante e não existente no aqui-agora.

O quinto e último enunciado elucida o futuro ambiental como projeto do presente.

Reflete todos os processos do quarto enunciado da pesquisa. Mas com uma característica: o

futuro é privado, mesmo coletivamente construído. A ideia de lar foi apresentada como um

refúgio seguro e como elemento que tem mantido a solidariedade entre os atores sociais

contemporâneos. Entretanto, o lar, mais intimista que a ideia de “casa”, advinda da ecologia,

corresponde ao cotidiano e suas atualizações e novidades contemporâneas. Lar significa

proteção e individualismo, direito a suprir necessidades individuais e garantias de

acolhimento e minimilização do medo. Lar é qualquer agrupamento que possa aquiescer o

frio da incerteza e nos dispor da momentânea sensação de “estamos juntos”. Mas, como

elemento contemporâneo, não se retém no tempo e nem permanece por muito tempo. Então,

futuro ambiental como projeto do presente traduz a dinâmica social contemporânea em seus

movimentos de idas e vindas, de seguir com outro tipo de consciência, seja focada em longos

e médios prazos, seja em pequenas porções de momentos. Futuro ambiental, riscos e medos

habitam em lares e nessa diversidade não estamos certos que estaremos assim tão seguros.

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Referências 102

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Apêndices 111

APÊNDICES

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Apêndices 112

APÊNDICE A – ENTREVISTA SEMIDIRIGIDA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE - UFS

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO – PROSGRAP

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

jk

INTRODUÇÃO. Fulano (a). Quero agradecer pela oportunidade de conversarmos um pouco sobre o tema dessa nossa pesquisa que gira em torno da ideia de futuro, riscos ambientais e catástrofes ou flagelos naturais. Procure falar com o máximo de liberdade de opinião, baseando-se em suas crenças e em momentos de sua história de vida, dentro do recorte de suas memórias sobre riscos ambientais e a noção de futuro planetário. Fique tranquilo (a) e diga apenas o que for importante para você. Se em algum momento eu tiver dúvidas, permita-me fazer-lhe outras perguntas para que a gente possa entender melhor seu pensamento e suas opiniões e experiências de vida. Peço-lhe permissão para gravar seu depoimento e uso posterior na análise e escrita da dissertação porque será muito importante para o desenvolvimento e resultados da pesquisa.

1. Para iniciar, gostaria de concentrar nossa conversa pensando um pouco

sobre a sua percepção a respeito dos flagelos, catástrofes ou destruição naturais de média ou de grandes proporções. Fale-me um pouco sobre como você percebe tais fenômenos e o que você sente quando relaciona tais fenômenos à ideia de futuro.

2. Fale-me um pouco mais sobre sua visão a respeito do “futuro”. O que é futuro para você (definição), como você o caracteriza?

3. E os riscos ambientais? Como você os define, considerando a sua ideia de futuro e da possibilidade de ocorrerem mais catástrofes naturais de média e de grandes proporções.

4. Que imagens surgem na sua cabeça quando associamos os termos futuro, insegurança, riscos ambientais, catástrofes ou flagelos naturais? Diante dessas imagens, o que você sente?

5. Que mensagem você gostaria de deixar para a sua geração e para as gerações futuras a respeito do tema de nossa conversa (futuro, riscos ambientais e catástrofes ou flagelos naturais).

Agradeço e peço autorização para dividir com a Universidade, através da

escrita da dissertação, a riqueza de suas experiências.

ENTR

EVIS

TA S

EMID

IRIG

IDA

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Apêndices 113

APÊNDICE B – QUESTIONÁRIO FECHADO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE - UFS

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO – PROSGRAP PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO

AMBIENTE MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

INTRODUÇÃO. Caríssimo (a), inicialmente agradece sua colaboração no desenvolvimento dessa pesquisa. A caracterização da ideia de futuro, riscos ambientais e catástrofes ou flagelos naturais é o ponto central do nosso trabalho. Procure assinalar as alternativas com o máximo de liberdade de opinião que você possa exercitar, baseando-se em suas crenças e em momentos de sua história de vida, dentro do recorte de suas memórias sobre riscos ambientais e a noção de futuro planetário. Fique tranquilo (a)! Será rápido. Peço-lhe permissão para utilizar esse questionário durante a análise e escrita da dissertação porque será muito importante para o desenvolvimento e resultados da pesquisa.

1. Iden 1. Identificação Nome: ______________________________________ Faixa Etária: entre 15 e 24 anos entre 25 e 59 anos. acima de 60 anos Sexo masculino Feminino Grau de Instrução não alfabetizado ensino fundamental incompleto ensino fundamental completo ensino médio incompleto ensino médio completo ensino superior (graduação) ensino superior (especialização Lato Sensu) ensino superior (mestrado) ensino superior (doutorado) 2. Sua ideia a respeito do futuro planetário é:

Melhor que hoje para a vida humana Ameaçador à vida humana

Não tenho ideia

QU

ESTI

ON

ÁR

IO F

ECH

AD

O

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Apêndices 114

3. Tipo de veículo de comunicação que mais utiliza para se manter informado sobre notícias gerais Televisão Rádio Jornais e revistas impressos Internet

Outros:__________________________ 4. Você associa riscos ambientais a

Ação do homem na natureza Eventos naturais a que todos podem estar submetidos Eventos tanto naturais quanto por ação humana na natureza e que podem afetar a todos

5. Diante da audiência ou percepção a respeito de notícias veiculadas

por jornais, revistas, televisão etc. seu comportamento expresso corresponde a: Medo, insegurança referente às catástrofes/flagelos ambientais, mas

não altero meu comportamento. Medo, insegurança referente às catástrofes/flagelos ambientais, altero meu comportamento.

Não me sinto afetado ou altero meu comportamento.

6. Você sente que os problemas ambientais podem afetá-lo diretamente agora? Sim Não

7. Você sente que os problemas ambientais podem afetá-lo diretamente no futuro? Sim

Não

QU

ESTI

ON

ÁR

IO F

ECH

AD

O

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Apêndices 115

APÊNDICE C – TERMO DE CONSENTIMENTO PARA REALIZAÇÃO

DA PESQUISA NAS DEPENDÊNCIAS DA UFS

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Apêndices 116

APÊNDICE D – CARTA DE APRESENTAÇÃO DO PRODEMA

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Apêndices 117

APÊNDICE E – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E

ESCLARECIDO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

PRO-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E

MEIO AMBIENTE

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

O menor __________________________________________, sob sua responsabilidade, está

sendo convidado (a) como voluntário (a) a participar da pesquisa “MEMÓRIA

GERACIONAL E RISCOS AMBIENTAIS NO SÉCULO XXI”. Nesta pesquisa,

pretendemos “CARACTERIZAR AS PROJEÇÕES FUTURAS DE DIFERENTES

GERAÇÕES FRENTE AOS RISCOS AMBIENTAIS”.

Pretende-se analisar os tipos de influências exercidas pelas memórias de diferentes

gerações na caracterização do “futuro ambiental”, considerando a percepção dos riscos

ambientais nas condutas de atores sociais de diferentes gerações quanto às experiências

sociais diretas ou indiretas. Para esta pesquisa adotaremos os seguintes procedimentos:

“aplicação de questionário fechado com 05 questões e entrevistas semi-dirigidas

gravadas em áudio com duração de aproximadamente 10 minutos.” Para participar desta

pesquisa, o menor sob sua responsabilidade não terá nenhum custo, nem receberá qualquer

vantagem financeira. Ele será esclarecido (a) em qualquer aspecto que desejar e estará livre

para participar ou recusar-se a participar. Você, como responsável pelo menor, poderá retirar

seu consentimento ou interromper a participação dele a qualquer momento. A participação

dele é voluntária e a recusa em participar não acarretará qualquer penalidade. O menor não

será identificado em nenhuma publicação. Esta pesquisa não apresenta risco ao menor.

Os resultados estarão à sua disposição quando finalizados. O nome ou o material que

indique a participação do menor não será liberado sem a sua permissão. Os dados e

instrumentos utilizados na pesquisa ficarão arquivados com o pesquisador responsável por um

período de 5 (cinco) anos, e após esse tempo serão destruídos. Este termo de consentimento

encontra-se impresso em duas vias, sendo que uma cópia será arquivada pelo pesquisador

Page 131: UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE PRÓ-REITORIA DE … · 2017-12-13 · ... Beck (2010); Becker (2011), Dubet ... em torno das minhas angústias pessoais de formação e de profissionalização

Apêndices 118

responsável, e a outra será fornecida a você. Anexo, está o termo de consentimento

conseguido junto à autoridade máxima da UFS para a realização desta pesquisa nas

dependências da Instituição.

Eu, _________________________________________, portador (a) do documento de

Identidade ____________________, responsável pelo menor

____________________________________, fui informado (a) dos objetivos do presente

estudo de maneira clara e detalhada e esclareci minhas dúvidas. Sei que a qualquer momento

poderei solicitar novas informações e modificar a decisão do menor sob minha

responsabilidade de participar, se assim o desejar. Recebi uma cópia deste termo de

consentimento livre e esclarecido e me foi dada a oportunidade de ler e esclarecer as minhas

dúvidas.

São Cristóvão-SE ____ de ______________ de 20___.

_____________________________________

Assinatura do (a) Responsável

_____________________________________

Assinatura da Pesquisadora

Em caso de dúvidas com respeito aos aspectos éticos desta pesquisa, você poderá consultar:

PESQUISADOR RESPONSÁVEL: ANDRÉA MARIA SARMENTO MENEZES

ENDEREÇO: AV. MARECHAL RONDON, S/N. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

CEP: .49.100-00 –SÃO CRISTÓVÃO-SE FONE: (79)2105-6487. E-MAIL:

[email protected]