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Universidade Federal de São João Del-Rei
Programa de Pós-Graduação em Geografia
LETÍCIA MARIA DE PAIVA
HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO
EM SÃO JOÃO DEL-REI/MG ENTRE OS ANOS 2006-2016
SÃO JOÃO DEL-REI
MINAS GERAIS-BRASIL
SETEMBRO DE 2017
LETÍCIA MARIA DE PAIVA
HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL E A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO
EM SÃO JOÃO DEL-REI/MG ENTRE OS ANOS 2006-2016
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Geografia da Universidade Federal de São João Del-Rei, Área
de Concentração: Análise Ambiental e Territorial como
requisito final para a obtenção do grau de Mestra em
Geografia, sob orientação da Prof.ª Dra. Tatiane Marina Pinto
de Godoy
SÃO JOÃO DEL-REI
2017
Aos meus pais Antônio e Marisa pelo apoio
incondicional e motivação sem os quais não
poderia concluir essa jornada
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus que me abençoa e ampara dando força e
determinação para realização de mais um sonho.
Aos meus pais Antônio e Marisa, minha irmã Cláudia e meu cunhado Edvaldo pelo
apoio incondicional e motivação para que pudesse concluir essa jornada.
A Universidade Federal de São João Del-Rei e em especial ao Programa de Pós-
Graduação em Geografia pela oportunidade em cursar o mestrado e pela ampla experiência
acadêmica adquirida.
A todos os professores e funcionários do Programa de Pós-Graduação em Geografia
por todo conhecimento e vivências compartilhadas.
A minha orientadora Dra. Tatiane Marina Pinto de Godoy pela amizade, confiança,
paciência, apoio e incentivo durante a orientação dessa pesquisa.
As professoras Dra. Daniela Abritta Cota e Dra. Márcia Saeko Hirata que integraram a
Banca de Qualificação pelas importantes contribuições concedidas para o desenvolvimento
dessa pesquisa.
As professoras Dra. Heloisa Soares de Moura Costa e Dra. Daniela Abritta Cota,
membros da banca examinadora, pela prontidão diante do convite para a defesa, e pelas
considerações e sugestões oferecidas à pesquisa.
Aos amigos que conheci no mestrado especialmente Bruno, Filipe e Cassi pela
amizade, acolhida, apoio e bons momentos.
Aos amigos que fiz em diferentes fases da vida, Otávio, Elaine, Cecília, Patrícia,
Aline, Martin, Carol, Daniela e Luana, minha segunda família, que sempre estiveram juntos
comigo em todos os momentos, apoiando, torcendo pela realização desse sonho e me fazendo
sempre acreditar no meu potencial para alcançá-lo.
Aos moradores dos conjuntos habitacionais Dom Lucas Moreira Neves, Marechal
Cyro do Espírito Santo Cardoso, Risoleta Neves I e Risoleta Neves II por me receberem,
participarem da construção dessa pesquisa, e por compartilharem um pouco de seus viveres.
A questão da habitação não soluciona
simultaneamente a questão social, mas só através
da solução da questão social e da abolição do
modo capitalista de produção que se torna
simultaneamente possível a solução da questão
da habitação.
Friedrich Engels, 1887
RESUMO
Esta pesquisa pretende analisar as contradições existentes na produção capitalista do espaço
urbano e na política de habitação na cidade de São João Del- Rei, Minas Gerais. A pesquisa
partiu de duas hipóteses aqui investigadas. No modo de produção capitalista, o espaço é
produzido segundo as lógicas de reprodução do capital por meio de alianças entre mercado e
Estado. À primeira hipótese é que seja qual for o porte da cidade, a reprodução capitalista do
espaço opera a partir da mesma lógica: segregando socioespacialmente as classes sociais por
meio de uma atuação conjunta com o Estado. À segunda hipótese é que o direito à moradia,
reduzido ao habitat não garante aos moradores dos conjuntos habitacionais o direito à cidade.
O processo de urbanização brasileiro caracterizado pelo crescimento populacional acelerado
teve como consequência o déficit habitacional e a necessidade do desenvolvimento de
políticas públicas que buscassem suprir a demanda por moradias. Em decorrência das atuais
políticas e programas de habitação, vem ocorrendo um aumento na produção do espaço
edificado, por meio da ação do mercado imobiliário e do Estado. Esse modelo não se restringe
apenas aos grandes centros, mas avança para a realidade de cidades de pequeno porte, como é
o caso de São João Del-Rei. É importante compreender a produção do espaço urbano desse
município por meio das políticas habitacionais porque essa é uma das principais ações que
ocasionam as transformações urbanas nas cidades de pequeno porte em momento recente.
Além disso, permite o entendimento do que essas cidades expressam para o atual processo de
urbanização brasileiro. De acordo com o método proposto, a pesquisa possui 3 momentos: o
primeiro tratará sobre as origens do déficit habitacional e a atuação das políticas habitacionais
no Brasil e o segundo descreverá a problemática habitacional em São João Del-Rei. Por fim, o
terceiro momento discutirá a ideia de que a produção de habitação de interesse social ocasiona
parte das contradições identificadas no espaço urbano de São João Del-Rei.
Palavras-Chave: Habitação de Interesse Social; Política Habitacional; Espaço Urbano;
Capitalismo; São João Del-Rei
ABSTRACT
This research intends to analyze the contradictions existing in the capitalist production of the
urban space and the housing policy in the city of São João Del-Rei, Minas Gerais. The
research started from two hypotheses investigated here. In the capitalist mode of production,
the production of space happens according to the logics of reproduction of capital through
alliances between market and state. The first hypothesis is that whatever the size of the city,
the capitalist reproduction of space operates from the same logic: segregating socio-spatially
the different social classes through a joint action with the State. The second hypothesis is that
the right to housing, reduced to the habitat, and does not guarantee the inhabitants of the
housing estates the right to the city. The Brazilian urbanization process characterized by rapid
population growth, resulted in the housing deficit, and the need to develop public policies to
supply the demand for housing. Because of current policies and housing programs, there has
been an increase in the production of built space, through the action of the real estate market
and the State. This model is not restricted to large centers, but advances to the small towns, as
is the case of São João Del-Rei. It is important to understand the production of the urban
space of this municipality, because the housing policies are one of the main actions that cause
the urban transformations in the small cities in recent moment. In addition, it allows the
understanding of what these cities express for the current process of Brazilian urbanization.
According to the proposed method, the research has three moments: the first will deal with the
origins of the housing deficit and the performance of housing policies in Brazil and the second
will describe the housing problem in São João Del-Rei. Finally, the third moment will discuss
the idea that social housing causes part of the contradictions identified in the urban space of
São João Del-Rei.
Key words: Social Housing, Housing Policy, Urban Space, Capitalism, São João Del-Rei
LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Residencial Juscelino Kubitschek ...................................................................... 78
Figura 2- Conjunto Habitacional Inconfidentes ................................................................ 78
Figura 3- Conjunto Habitacional Tancredo de Almeida Neves ........................................ 79
Figura 4- Conjunto Habitacional Tancredo de Almeida Neves ........................................ 79
Figura 5- Conjunto Habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso .................. 79
Figura 6- Conjunto Habitacional Dom Lucas Moreira Neves ...........................................79
Figura 7- Conjunto Habitacional Risoleta Neves I ........................................................... 80
Figura 8- Conjunto Habitacional Risoleta Neves II .......................................................... 80
Figura 9- Conjunto Habitacional Parque da Cachoeira ..................................................... 80
Figura 10- Localização dos conjuntos habitacionais de São João Del-Rei
............................................................................................................................................ 82
Figura 11- Localização dos vazios urbanos estabelecidos no Plano Local de Habitação de
Interesse Social .................................................................................................................. 93
Figura 12- Localização dos conjuntos habitacionais estudados ........................................ 97
Figura 13- Conjunto Habitacional Parque da Cachoeira ................................................... 98
Figura 14-Conjunto Habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso ................. 99
Figura 15-Conjunto Habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso ................ 99
Figura 16 - Origens dos moradores do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso .............................................................................................................................. 101
Figura 17- Conjunto Habitacional Dom Lucas Moreira Neves ......................................... 107
Figura 18- Conjunto Habitacional Dom Lucas Moreira Neves ......................................... 107
Figura 19- Origens dos moradores do conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves .......
............................................................................................................................................. 109
Figura 20- Conjunto Habitacional Risoleta Neves I ........................................................... 115
Figura 21- Conjunto Habitacional Risoleta Neves II ......................................................... 115
Figura 22- Origens dos moradores dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II .............
............................................................................................................................................ 117
Figura 23- Uso de grades nas unidades habitacionais ........................................................ 120
Figura 24- Uso de grades nas unidades habitacionais ........................................................ 120
Figura 25 - Atividades comerciais no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso ............................................................................................................................... 145
Figura 26 - Atividades comerciais no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso ............................................................................................................................... 145
Figura 27 - Praça existente no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso ............................................................................................................................... 146
Figura 28 - Praça existente no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso ............................................................................................................................... 146
Figura 29 - Atividades comerciais desenvolvidas pelos moradores .................................. 146
Figura 30 - Atividades comerciais desenvolvidas pelos moradores .................................. 146
Figura 31 - Equipamentos coletivos existentes no conjunto habitacional Risoleta I ........ 147
Figura 32 - Equipamento coletivo existente no conjunto habitacional Risoleta I ............. 147
Figura 33 - Equipamentos coletivos existentes no conjunto habitacional Risoleta II ....... 147
Figura 34 - Equipamentos coletivos existentes no conjunto habitacional Risoleta II ....... 147
LISTA DE TABELAS E QUADROS
Tabela 1- Déficit habitacional brasileiro por número de domicílios no período entre 2007-
2014 ...................................................................................................................................... 38
Tabela 2- Composição do déficit habitacional por faixa de renda em salários mínimos no
período entre 2007 -2014 .................................................................................................... 40
Tabela 3- Comparativo entre o déficit habitacional e o número de domicílios vagos no período
entre 2007 -2014 ................................................................................................................. 41
Tabela 4- Municípios com Plano Diretor e Lei Específica de PEUC segundo classes de
tamanho da população ........................................................................................................ 90
Quadro 1 - Panorama comparativo da habitação familiar .................................................. 104
Quadro 2 - Motivos de evasão do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito
Cardoso .............................................................................................................................. 105
Quadro 3- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais ............................... 106
Quadro 4- Panorama comparativo da habitação familiar .................................................. 112
Quadro 5- Motivos de evasão do conjunto habitacional do Conjunto Habitacional Dom Lucas
Moreira Neves ................................................................................................................... 113
Quadro 6- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais ............................. 114
Quadro 7- Panorama comparativo da habitação familiar ................................................. 121
Quadro 8- Motivos de evasão dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II ........... 122
Quadro 9- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais ............................. 123
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1- Classificação da localização do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito
Cardoso quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos .......................... 102
Gráfico 2- Problemas identificados no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito
Cardoso ........................................................................................................................... 103
Gráfico 3- Classificação da localização do conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves
quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos ......................................... 110
Gráfico 4- Problemas identificados no conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves
........................................................................................................................................... 111
Gráfico 5- Classificação da localização dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II
quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos ......................................... 118
Gráfico 6- Problemas identificados nos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II .. 119
LISTA DE SIGLAS
Banco Nacional de Desenvolvimento Social - BNDS
Banco Nacional de Habitação – BNH
Cadastro Nacional dos Mutuários - CADMUT
Cadastro Único – CADÚNICO
Caixa Econômica Federal- CEF
Companhias de Habitação – COHAB
Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais - COHAB-MG
Conselho Monetário Nacional- CMN
Conselho Municipal de Habitação- CMH
Estudo prévio de impacto ambiental - EIA
Estudo prévio de impacto de vizinhança - EIV
Fundação da Casa Popular – FCP
Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social- FADS
Fundo de Arrendamento Residencial – FAR
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS
Fundo Estadual de Habitação - FEH
Fundo Monetário Internacional- FMI
Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social - FNHIS
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE
Institutos de Aposentadoria e Pensão - IAP
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada- IPEA
Ministério do Planejamento e Orçamento – MPO
Orçamento Geral da União – OGU
Parcelamento, edificação ou utilização compulsória - PEUC
Plano de Ação Imediata para Habitação – PAIH
Plano Local de Habitação de Interesse Social – PLHIS
Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado – PMDI
Plano Nacional de Habitação – PlanHab
Política Nacional de Desenvolvimento Urbano – PNDU
Política Nacional de Habitação - PNH
Programa de Arrendamento Residencial – PAR
Programa de Financiamentos Individuais Isolados - FINIS
Programa de Habitação Popular de Minas Gerais – PROHAB
Programa de Subsídio Habitacional - PSH
Programa Lares Habitação Popular - PLHP
Programa Lares Segurança Pública - PLSP
Programa Mineiro de Apoio e Orientação Técnica à Reforma e Melhoria de Moradias -
PROMORAR
Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV
Secretaria de Estado de Habitação e de Desenvolvimento Urbano - SEHADU
Secretaria de Política Urbana - SEPURB
Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo – SBPE
Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI
Sistema de Proteção ao Crédito - SPC
Sistema Financeiro de Habitação - SFH
Sistema Nacional de Habitação – SNH
Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS
Trabalho Técnico Social – TTS
Zona de Adequação Ambiental - ZAA
Zona de Controle Ambiental - ZCA
Zona de Controle Urbanístico – ZCU
Zonas de Especial Interesse Social - ZEIS
Zona de Proteção Ambiental - ZPA
Zona de Proteção Paisagística – ZPP
Zona de Proteção Cultural - ZPC
Zona de Reabilitação Ambiental - ZRA
Zona de Reabilitação Urbana - ZRU
Zona de Urbanização Futura – ZUF
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 19
PRIMEIRO MOMENTO .............................................................................................. 32
CAPÍTULO 1. A QUESTÃO DA HABITAÇÃO: O PAPEL DAS POLÍTICAS
HABITACIONAIS NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO .................................................. 32
1.1 Origens do Déficit Habitacional ................................................................................. 34
1.2 Panorama das Políticas Habitacionais no Brasil ....................................................... 43
1.2.1 Políticas Habitacionais Pré-Constituição de 1988 .............................................. 45
1.2.2 Políticas Habitacionais Pós-Constituição de 1988 .............................................. 55
SEGUNDO MOMENTO ............................................................................................. 75
CAPÍTULO 2. A PROBLEMÁTICA HABITACIONAL NO CONTEXTO DE SÃO
JOÃO DEL-REI-MG ................................................................................................... 75
2.1 Considerações sobre a produção habitacional .......................................................... 77
2.1.1 O habitar na cidade: Políticas Habitacionais ...................................................... 83
2.1.2 Instrumentos da política urbana e habitacional .................................................. 85
2.1.3 Territórios da habitação: conjuntos habitacionais .............................................. 96
TERCEIRO MOMENTO ........................................................................................... 127
CAPÍTULO 3. HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL COMO EXPRESSÃO DAS
CONTRADIÇÕES NO ESPAÇO URBANO DE CIDADES DE PEQUENO PORTE
........................................................................................................................................ 127
3.1 A produção da habitação por seus diferentes agentes ............................................. 128
3.2 Impactos da política habitacional no espaço urbano ............................................... 138
3.3 Materialização das políticas habitacionais no espaço urbano de São João Del- Rei
........................................................................................................................................ 150
3.4 Desafios à gestão urbano-habitacional em São João Del-Rei ................................. 158
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 168
RFERÊNCIAS ............................................................................................................ 172
APÊNDICE ................................................................................................................. 184
19
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa trata das contradições existentes na produção capitalista do espaço
urbano, a partir da análise da política habitacional no contexto de São João Del- Rei/MG, no
período entre 2006 e 2016.
São João Del-Rei, município de pequeno porte, localiza-se na Região do Campo das
Vertentes, no Estado de Minas Gerais. Possui cerca de 89.000 habitantes, e tem o setor de
comércio e serviços como a principal atividade da economia local, segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE (2015).
A categorização de São João Del-Rei como município de pequeno porte advém da
classificação estabelecida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) que
considera de pequeno porte, aqueles municípios com população inferior a 100 mil habitantes.
São objetos de estudo dessa pesquisa quatro conjuntos habitacionais destinados à
moradores de baixa renda existentes na cidade. Dois deles, os conjuntos Risoleta Neves I
(2011) e Risoleta Neves II (2015), estão vinculados ao Programa Minha Casa Minha Vida do
governo federal. Os conjuntos Dom Lucas Moreira Neves (2009) e Marechal Cyro do
Espírito Santo Cardoso (2006), foram edificados pelo Programa Lares Geraes Habitação
Popular do governo de Minas Gerais.
Levando em consideração a problemática habitacional em São João Del-Rei, constata-
se que o déficit habitacional, segundo o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS)
lançado em 2010, situa-se em torno de 5.000 moradias.
Essa dissertação traz um debate teórico que discute a questão da habitação por meio
das políticas públicas implementadas pelo Estado e o seu papel na produção do espaço urbano
utilizando-se de duas escalas de análise, tais sejam, nacional e local.
As cidades pequenas representam um espaço heterogêneo, tanto no que tange ao
espaço físico quanto nas relações sociais que nelas se estabelecem. Assim, cada lugar
combina, de maneira particular, variáveis que podem ser comuns a outros contextos.
Disto reside a importância de uma duplicidade de escalas, para que partindo das
particularidades de uma cidade de pequeno porte, possa-se colaborar para o entendimento da
estrutura e da dinâmica da política habitacional no contexto brasileiro.
Conforme Cota (2010), o processo de urbanização brasileiro se apresenta diretamente
vinculado ao desenvolvimento econômico do país, especialmente à industrialização a partir
dos anos de 1930. Até meados do século XX observa-se o predomínio da atividade
agroexportadora e de maior contingente populacional ainda residindo no campo. Somente a
20
partir de 1930 e, principalmente, da década de 1950, com a abertura do país para o capital
estrangeiro é que essa situação se altera: observa-se então, uma nova configuração espacial
caracterizada pelo crescimento populacional das cidades e seu posterior adensamento.
As cidades se formaram inseridas no modo capitalista de produção, que se caracteriza
por significativa desigualdade entre as classes sociais. Essas contradições se materializaram
no espaço urbano e se tornaram ainda mais evidentes com o aumento do déficit habitacional,
como consequência da concentração fundiária no espaço urbano.
De acordo com Rolnik (2015 b), combinado com uma estrutura de regulação fundiária
excludente, o modelo de urbanização estabeleceu as condições de espraiamento de
assentamentos autoconstruídos nas franjas urbanas. Diante disso, o direito à moradia e o
direito à cidade se tornaram uma das mais importantes demandas dos movimentos sociais.
Nesse contexto, o Estado assume importante papel na elaboração de políticas públicas
que buscassem suprimir a demanda por moradias. Por sua vez, as políticas habitacionais se
tornaram um dos elementos que condicionam a produção do espaço urbano.
Compreende-se que o Estado é marcado por disputas e que, no contexto do
capitalismo, ele privilegia o interesse das classes dominantes. Além disso, o Estado, em uma
sociedade marcada por contradições e desigualdades, tende a promover ações de
planejamento e gestão que ocasionam a manutenção dessas desigualdades.
Segundo Carlos (2013), o papel do Estado nesse processo é legitimar a propriedade
privada do solo como direito, direcionar o processo de valorização e desvalorização dos
lugares por meio das políticas públicas e intervir no urbano a partir de estratégias que
viabilizam a reprodução do capital
No caso da habitação de interesse social objeto desse estudo, ressalta-se que as atuais
políticas e programas de habitação vigentes, são um dos fatores que contribuem para a
produção do espaço nos mais diferentes contextos urbanos.
Cabe ressaltar que nessa pesquisa concorda-se com as ideias de Alvarez (2013) e
compreende-se o espaço geográfico como produto histórico e social, sendo entendido como
produto e condição de práticas e relações sociais que são também espaciais, o que envolve
uma dimensão de uso, e da possibilidade de apropriação. No caso do espaço inserido no
modo capitalista de produção, ele passa a constituir não apenas um produto, mas também
condição e meio para a reprodução do capital.
Como resultado dessa atuação o que se nota é a (re) produção do espaço de forma
contraditória, marcada por processos como dispersão urbana e segregação socioespacial. Esse
21
modelo não se restringe apenas aos grandes centros, mas avança para a realidade de cidades
de pequeno e médio porte. São João Del-Rei não constitui exceção nesse cenário.
Conforme Carlos (2013) a segregação é uma característica fundamental da produção
do espaço urbano contemporâneo, produção essa que se apresenta como condição, meio e
produto da reprodução social e da urbanização capitalista.
Para a autora se essa produção se submete à lógica de acumulação do capital, própria
do capitalismo, o espaço urbano passa a ser produzido sob a égide do valor de troca que se
impõe ao uso social da cidade. Esse processo se realiza apoiado na existência da propriedade
privada da riqueza, criando acessos diferenciados dos cidadãos à cidade, a partir da aquisição
da moradia.
De acordo com Sanfelici (2009) também cabe ressaltar a atuação do Estado enquanto
provedor de infraestrutura física e social para a reprodução social. As decisões de alocação de
recursos pelo Estado afetam diretamente a atividade imobiliária suscitando comportamentos
especulativos por parte de proprietários fundiários e incorporadores.
Carlos (2008) afirma que o uso da cidade remete à análise das relações sociais de
produção, e dentro do capitalismo os mecanismos do mercado é que determinarão a garantia
de acesso à propriedade privada, pela possibilidade de pagamento do preço da terra. O que
determina o preço da terra são as condições de reprodução do espaço urbano, o grau de
crescimento demográfico, utilização do solo e políticas de zoneamento ou de reserva
territorial.
Assim as classes de maior rendimento habitam as melhores áreas e melhor servidas
por infraestrutura. À parcela da população de menor poder aquisitivo cabem as ocupações
irregulares, as áreas periféricas, onde os terrenos são mais baratos, e o acesso à moradia pela
autoconstrução à margem do mercado formal de habitação.
Considerando-se as políticas habitacionais para baixa renda, é possível identificar o
que, segundo Corrêa (2013), denomina-se segregação imposta, uma vez que seus
beneficiários não possuem alternativas de escolha locacional e do tipo de habitação.
No caso dos conjuntos habitacionais de interesse social a inserção segregadora no
espaço urbano é reforçada, já que os mesmos se localizam em áreas afastadas do núcleo
urbano central, apresentando problemas quanto à oferta de infraestrutura urbana e de
qualidade espacial.
Além disso, como afirma Silva (2013) apesar de ser uma necessidade básica, dentro da
sociedade capitalista a moradia passa a ter um valor de troca e a produção da habitação busca
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aprofundar a acumulação do capital, sendo materializada pela financeirização, especulação
imobiliária e o próprio sistema de mercado.
No caso das políticas de habitação, o papel do Estado nesse processo, se dá em termos
de regulamentação, legislação, e da própria produção e financiamento habitacional. Assim,
considerando-se a questão da habitação e seu papel na produção do espaço, de acordo com
Carlos (2011) apontam-se também como agentes desse processo, as diferentes frações do
capital com suas estratégias objetivando sua reprodução continuada e os sujeitos sociais que
em suas necessidades tem o espaço como condição e meio para sua ação.
Shimbo (2012) ressalta que o histórico da política habitacional brasileira é marcado
por diversos mecanismos regulatórios que favorecem a atuação do mercado privado na
produção de moradias, num longo processo de canalização de recursos públicos e
semipúblicos para esse setor.
A autora aponta que a confluência entre o Estado, capital financeiro e mercado
imobiliário têm sua origem com a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH), e se
consolida a partir dos governos de Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002) quando se
assume definitivamente a lógica privada na provisão e na produção de habitação.
A partir de 2003, com a proposição da Política Nacional de Habitação (PNH), esse
processo se fortalece, uma vez que promove a criação de um Sistema Nacional de Habitação
que visava, conforme Shimbo (2012), a integração entre agentes públicos e privados
envolvidos com a questão da habitação, além de ampliar as formas de captação de recursos e
facilitar a promoção imobiliária.
De acordo com Arantes e Fix (2009) essa perspectiva também se estende ao Programa
Minha Casa Minha Vida lançado em 2009. Ele foi considerado uma das principais ações do
governo de Luís Inácio Lula da Silva em reação à crise econômica internacional (2008-2009),
estimulando a criação de empregos e de renda por meio de investimentos na construção civil.
O Programa Minha Casa Minha Vida foi tratado como um instrumento capaz de
minimizar os efeitos da crise, uma vez que foi aplicado em larga escala, demandando o
atendimento de uma meta puramente quantitativa e configurando mais uma vertente no
processo de reprodução do capital no espaço urbano, em parceria com a atuação do Estado.
A subordinação da política habitacional aos interesses da reprodução das relações
capitalistas de produção está acima das próprias necessidades de se superar o déficit
habitacional das camadas populares, gerado pelo processo de urbanização brasileiro.
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Outro aspecto a ser considerado em relação à produção de moradias é a ideia de que se
encontra materializada no espaço uma visão reducionista do conceito de habitar, que não deve
se restringir apenas ao âmbito da unidade habitacional. O que se encontra edificado no espaço
urbano é o habitat.
Para Lefebvre (1999) o habitat reprime as características elementares da vida urbana,
na medida em que desconsidera a diversidade cultural e de modos de viver, criando espaços
homogêneos. Essa concepção conceitual foi a utilizada ao longo dessa pesquisa.
A habitação não se reduz ao domicílio, mas também ao seu entorno, isto é, as relações
que o cercam, bem como a promoção de serviços e equipamentos públicos. No caso das
políticas públicas a problemática habitacional é analisada quantitativamente, sem atentar para
as necessidades do cotidiano e assegurar o direito à cidade.
Pensar a cidade como uma obra, segundo Lefebvre (2001b) é pensá-la como um local
privilegiado da transformação das relações sociais. Afirmar a cidade como obra, significa
reivindicar direitos fundamentais, como o direito à apropriação e participação. Também é
importante compreender o direito à cidade como condição para a realização dos demais
direitos. Esse direito implica reinventar as relações sociais do capitalismo e da estrutura
espacial da cidade.
Contudo, o processo de urbanização sob o modo de produção capitalista, transforma a
cidade em mais um produto a ser consumido, em detrimento dos espaços de encontro e
partilha. O direito à cidade desenvolve a necessidade de reestruturar as relações que servem
de base à produção do espaço urbano, sendo fundamental o deslocamento da lógica do capital
para os interesses coletivos, assegurando o direito à cidade, para além da propriedade e
dominação.
Em conformidade com as ideias de Lefebvre, Harvey (2014 a) traz importantes pontos
de reflexão frente ao direito à cidade. Para ele, o direito à cidade, é mais do que o direito de
acessar os recursos que a cidade incorpora, é um direito de mudar e reinventar a cidade
conforme nossos desejos, sendo um direito mais coletivo do que individual.
Entretanto, Harvey (2014 a) evidencia que o direito à cidade conforme é concebido,
inclusive no caso das políticas públicas de habitação, encontra-se confinado nas mãos de uma
elite política e econômica com condições de moldar a cidade segundo seus interesses.
Diante desse contexto e considerando-se a realidade socioespacial de São João Del-
Rei, nota-se na cidade que as políticas habitacionais para baixa renda também foram
materializadas de forma reducionista do ponto de vista do habitar, reforçando a segregação
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socioespacial. O habitat é reproduzido indiscriminadamente nas zonas periféricas da cidade,
desprovidas de serviços e equipamentos públicos.
Além disso, apesar de ser uma cidade de pequeno porte, também se constata que a
implementação dos programas habitacionais, tanto do governo federal quanto do governo
estadual, reforça a premissa de que se busca com os mesmos, assegurar a reprodução do
capital imobiliário no espaço urbano.
Outra importante questão a ser considerada e que corrobora esse processo é a não
articulação entre a política fundiária e a política habitacional e urbana, no âmbito do
município, uma vez que os instrumentos previstos no Plano Diretor do Município (2006) não
são regulamentados ou aplicados, o que contribui para a valorização imobiliária local. O alto
valor da terra urbanizada se constitui como barreira ao direito à cidade.
Ao mesmo tempo, na cidade um número considerável de loteamentos urbanos vem
sendo construídos nas áreas de expansão urbana, transformadas em lucrativos produtos
imobiliários direcionados especialmente aos segmentos de média renda. Estes loteamentos
ocupam terrenos melhor localizados e mais valorizados, em detrimento de onde se localizam
os conjuntos habitacionais de baixa renda.
Assim sendo, ressalta-se que cada localidade busca compatibilizar suas demandas com
a necessidade de articulação com o mercado, desenvolvendo formas de acumulação do
capital, via produção do espaço, fato que também pode ser notado em São João Del-Rei.
Cabe ressaltar ainda a contribuição que a Geografia Crítica, perspectiva abordada
nesse trabalho, trouxe frente às questões propostas nessa pesquisa e diante do contexto aqui
apresentado. Para Carlos (2004) ao se analisar a cidade geograficamente considera-se sua
realidade material, pois esta realidade se revela pelo conteúdo das relações sociais de
determinados períodos que lhe dão forma, sendo um produto histórico e social.
A Geografia, ao tratar da produção do espaço, considerando diferentes sujeitos sociais
e a contraditória lógica capitalista, possibilita a compreensão da materialização e
espacialização dos conflitos existentes no urbano, e que envolvem a questão da habitação.
O objetivo geral dessa pesquisa foi compreender o papel das políticas públicas de
habitação de interesse social na produção do espaço urbano. Dentre os objetivos específicos
ressalta-se:
Verificar a atuação dos atuais programas habitacionais no espaço urbano de São
João Del-Rei no período entre 2006 e 2016;
25
Compreender as transformações urbanas resultantes da ação dos diferentes agentes
relacionados à habitação de interesse social;
Discutir os desafios para o planejamento e a gestão urbano-habitacional no
contexto local;
Conhecer a realidade socioespacial dos conjuntos escolhidos como objeto de
estudo.
Considerando-se a atual produção formal de unidades habitacionais no contexto de
São João Del-Rei, a pesquisa partiu de duas premissas que levaram a construção das hipóteses
aqui investigadas. A primeira premissa é que no modo de produção capitalista, o espaço é
produzido segundo as lógicas de reprodução ampliada do capital por meio de alianças entre
mercado e Estado.
Assim sendo, trabalhou-se com a hipótese de que seja qual for o porte da cidade, as
lógicas de reprodução capitalista do espaço operam a partir da mesma forma: segregando
socioespacialmente as classes sociais em atuação conjunta com o Estado.
A segunda premissa é que o direito à moradia, reduzido ao habitat, não garante o
direito à cidade. Considerando-se essa premissa, a outra hipótese da pesquisa é que os
moradores dos conjuntos habitacionais de interesse social não têm garantidos o direito à
cidade.
Esta pesquisa aborda a habitação de interesse social frente às especificidades de uma
cidade de pequeno porte, que evidenciam as contribuições que esse estudo pode trazer para
análises socioespaciais de contextos urbanos de mesma escala.
A experiência da política habitacional recente tem ocasionado um impacto
contraditório sobre as cidades. A ausência de diretrizes específicas voltadas para a política
habitacional para moradores de baixa renda induz a uma atuação direta do capital privado de
forma inadequada segundo os preceitos da função social da cidade, que contribui para a (re)
produção de espaços urbanos dispersos e excludentes.
Segundo Monte-Mór (2003), cada vez menos é possível perceber com clareza os
limites entre cidade e campo. Pelo processo de dispersão urbana, a área urbana se prolonga,
modificando as relações entre os agentes e suas escalas de atuação, e ocorre também o
processo de fragmentação e segregação socioespacial.
Cota e Diório (2013) afirmam que este fenômeno tem sido observado em espaços
urbanos com características funcionais e dimensões demográficas heterogêneas, colocando
em xeque essa distinção entre campo e cidade.
26
A pesquisa busca analisar a produção do espaço urbano de São João Del-Rei, por meio
da implantação das políticas habitacionais porque parte-se do pressuposto que esta seja uma
das ações que resultam no processo de segregação urbana no contexto local.
Essa abordagem permite identificar não apenas as especificidades desses processos em
curso nesta cidade, mas também contribuir para uma reflexão das dinâmicas urbanas nas
cidades de pequeno porte.
Conforme ressalta Moreira (2010), muitos estudos são realizados para se compreender
as dinâmicas físico-territoriais e sociais nas metrópoles e nas cidades médias brasileiras, mas
pouco tem sido efetuado em cidades pequenas, que correspondem à grande maioria dos
municípios no país e representam uma ampla extensão do território nacional. Segundo a
estimativa populacional do IBGE para 2015, do total de 5.570 municípios brasileiros 5.225
apresentam população inferior a 100 mil habitantes, assim sendo considerados de pequeno
porte.
As pesquisas com abordagens no nível metropolitano continuam sendo necessárias,
mas enfatiza-se que compreender os processos urbanos em diferentes escalas, no caso em uma
cidade de pequeno porte, também é relevante, considerando-se que se observa um
crescimento populacional expressivo nas cidades de pequeno e médio porte.
Além disso, em função das características do momento atual, todas as cidades
brasileiras exibem problemáticas semelhantes. As desigualdades socioespaciais em marcha
não atingem apenas as cidades grandes e médias, ou seja, ocorrem independentemente do
porte da cidade.
Para Oliveira (2011) a articulação entre a atual política habitacional e os agentes que
atuam na produção do espaço de interesse social, constitui referência para a compreensão da
cidade e do significado que essa construção espacial assume frente aos imperativos da
globalização e da reestruturação produtiva na contemporaneidade, nas cidades intermédias e
de pequeno porte.
Assim, cada localidade busca compatibilizar suas demandas específicas, com a
necessidade de articulação com o mercado e com os interesses globais, desenvolvendo formas
de obtenção de lucro via produção do espaço.
Spósito (2011), refletindo sobre a diferenciação e a desigualdade socioespacial,
argumenta que na atualidade deve haver uma articulação entre as escalas de análise,
ponderando que o processo que ocorre é complexo e perpassa por todas as escalas, se
materializando na escala local.
27
A produção do espaço urbano materializa as desigualdades e as contradições sociais,
mas também as reafirma e reproduz. A questão da habitação se sobressai, ao passo que a
produção da moradia emerge como uma das facetas da segregação urbana também nas
cidades pequenas. O padrão de moradia implantado indica a espacialização das diferenças
sociais na cidade, e as barreiras que dificultam o acesso e o direito à cidade.
Considerando-se a principal política habitacional vigente que tem como enfoque o
Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), reafirma-se que o Estado corrobora a
dinâmica da produção capitalista do espaço e atende aos interesses do mercado imobiliário
especulativo, na medida em que confere a ele a possibilidade de integrar essa política e lhe
oferece um maior nicho de mercado consumidor expresso nos segmentos de baixa renda.
A ocupação do espaço urbano de São João Del-Rei, é condicionada pela ação de
agentes produtores do espaço, sendo eles o Estado, os proprietários fundiários, o mercado
imobiliário, além dos grupos sociais excluídos.
Os instrumentos legais de controle das formas de ocupação territorial em São João
Del-Rei não estão sendo aplicados efetivamente, uma vez que, o Plano Diretor Municipal,
vigente desde 2006, não apresenta uma lei, acompanhada de um mapa de zoneamento que
permita identificar as diretrizes de ocupação das diferentes áreas do espaço urbano. Assim, a
expansão urbana é dirigida por uma parte dos agentes produtores do espaço, que não atendem
aos interesses que deveriam estar expressos no planejamento municipal.
Os conjuntos habitacionais localizados distantes do centro denunciam o papel que
assume o poder público e a esfera privada no ordenamento territorial e na organização do uso
e ocupação do solo, e se revelam como possibilidades que asseguram o direito à moradia, mas
não o direito à cidade.
Diante do exposto, fica clara a relevância em se buscar a compreensão das
transformações urbanas decorrentes do atual quadro de produção habitacional partindo das
particularidades de uma cidade de pequeno porte, que, por conseguinte, colabora para o pleno
entendimento da estrutura e dinâmica da política habitacional na produção do espaço, no
contexto brasileiro.
A análise da dinâmica habitacional urbana requer uma abordagem teórico-
metodológica apoiada em discussões sobre a produção e reprodução do espaço na cidade.
Dessa forma, para atingir os objetivos propostos na pesquisa, foi realizada uma análise dentro
da perspectiva da Geografia Crítica. A metodologia proposta consistiu na observação do
fenômeno a ser estudado, sob uma perspectiva histórico- crítica e cartográfica.
28
O método da pesquisa é o Materialismo Histórico - Dialético. Busca-se com o mesmo
o entendimento da produção social do espaço. Na obra “A cidade do Capital”, Lefebvre
(2001a) aponta a importância desse método na busca investigativa acerca da complexidade,
das diferenças, conflitos e contradições, que têm como lócus o espaço urbano.
Paralelamente será empregado para o levantamento e análise de dados o método
Regressivo- Progressivo de Henri Lefebvre. Esse método foi formulado em sua obra “De lo
rural a lo urbano”, de 1978.
O método parte da práxis quotidiana por meio da descrição do momento presente, para
em seguida retomar-se as ações engendradas no passado, como um caminho para
compreender as especificidades vivenciadas no momento atual. A realização da pesquisa
dividiu-se em três momentos:
Descritivo- O primeiro momento se deu pela observação do objeto de estudo, com diversas
técnicas que possam ser utilizadas na descrição. Para a coleta de informações foram utilizados
procedimentos como pesquisa bibliográfica, coleta de dados através de observação direta e
aplicação de questionários, bem como informações obtidas de fontes secundárias.
Nessa etapa segundo Martins (1996), em conformidade com as ideias de Lefèbvre
cabe ao pesquisador reconstituir, a partir de um olhar teoricamente informado, a diversidade
das relações sociais, identificando e descrevendo o que vê.
Analítico-Regressivo- realizou-se nesse momento a análise da realidade descrita, a datação
dos fatos, a observação de como se materializam e sob que circunstâncias se apresentam.
Foram consideradas as contradições e possibilidades. Nessa etapa a construção teórico-
conceitual foi fundamentada por autores relacionados à vertente da Geografia Critica e do
planejamento urbano.
Buscou-se, portanto, no caso dessa pesquisa investigar as origens do déficit
habitacional e a trajetória histórica das políticas habitacionais como subsídio ao entendimento
da atual forma de produção de um espaço desigual e combinado nas cidades brasileiras, em
decorrência da produção de habitação de interesse social no espaço urbano, especialmente no
contexto de São João Del-Rei.
Além disso, objetivou-se compreender nesse momento o contexto histórico,
econômico e político da produção da habitação de interesse social e como a mesma contribui
na materialização de uma construção espacial de caráter capitalista e segregado.
29
Histórico-Genético- No último momento efetivou-se o exercício do movimento regressivo-
progressivo, uma vez que o presente foi explicado com base nos diferentes processos que
ocorreram no passado e que foram identificados na etapa anterior.
Na pesquisa o intuito foi retomar a atual configuração espacial de São João Del-Rei e
compreende-la à luz das relações sociais e das condicionantes históricas de reprodução do
sistema capitalista.
Lefebvre (1999) salienta a potencialidade do método. Segundo o mesmo, sem os
procedimentos progressivos e regressivos no tempo e no espaço da análise, e sem os múltiplos
recortes e fragmentações, é impossível conceber a ciência do fenômeno urbano, enquanto
processo inacabado e virtualidade.
Assim sendo, a duplicidade desse método ao abordar práxis e história, contribui para a
efetivação de uma análise crítica, que considera a complexidade inerente à produção
contraditória do espaço, que no caso da pesquisa, teve como objetivo compreender como a
produção formal de moradias, por meio de políticas habitacionais, corrobora esse processo.
Os resultados dessa pesquisa consistiram na contribuição para uma visão crítica acerca
da atuação das políticas habitacionais inseridas na ótica da produção capitalista do espaço,
bem como das transformações urbanas resultantes dos diferentes agentes relacionadas à
habitação de interesse social.
Além disso, considerando-se a gestão urbano-habitacional da cidade de São João Del-
Rei buscou-se contribuir para a realidade local com a proposição de diretrizes urbanísticas
frente a essa temática.
A dissertação segue os três momentos propostos no Método Regressivo -Progressivo
apresentado anteriormente, sendo assim dividida em três capítulos. O primeiro capítulo
utilizou-se de uma elaboração teórica que se volta para o passado, a fim de compreender as
contradições que se materializam no presente de forma mais aprofundada. Apresentou
enquanto processo investigativo, a ação estatal no intuito de intervir frente à problemática
habitacional e o que potencialmente acredita-se representar os limites e avanços trazidos pelas
políticas habitacionais.
Abordaram-se também os antecedentes que desencadearam a demanda por moradias
no contexto brasileiro, fundamentada no paralelo urbanismo e industrialização, momento em
que o espaço urbano se torna o lócus de reprodução do capital. Também foram mostrados
dados referentes ao déficit habitacional.
30
O segundo capítulo foi, na tentativa de construção de uma análise sobre as
contradições existentes entre a produção capitalista do espaço urbano e a política de habitação
de interesse social, no contexto de uma cidade de pequeno porte, organizado de forma a
entender a realidade local, por meio de um panorama da problemática habitacional em São
João Del-Rei.
Foram apresentados dados referentes ao déficit habitacional no município, as políticas
e programas habitacionais implantados no contexto local, os instrumentos da política urbana e
habitacional, além das condições socioespaciais identificadas nos conjuntos habitacionais, que
são objeto desse estudo.
O terceiro capítulo trouxe a retomada da problematização da dissertação, a partir da
configuração espacial de São João Del-Rei decorrente da implantação de políticas
habitacionais, compreendendo-a a luz das contradições e das condicionantes de reprodução do
sistema capitalista.
No mesmo discutiu-se a ideia de que a habitação de interesse social é um dos
condicionantes das contradições identificadas no espaço urbano de São João Del-Rei, e
abordou-se a produção da habitação por seus diferentes agentes, relacionando a confluência
entre a ação do Estado, do mercado imobiliário e do capital na cidade, e no contexto
brasileiro.
Além disso, foram debatidos os impactos da política habitacional no espaço urbano, e
identificados os processos de materialização das políticas habitacionais em São João Del-Rei,
trazendo como debate principal a luta pelo direito à cidade e à moradia, dentro do modo
capitalista de produção.
Por fim coube um debate sobre os desafios para a gestão urbano-habitacional em São
João Del-Rei, ressaltando-se que a implementação do arcabouço político-institucional tanto
em relação à gestão urbana quanto no âmbito habitacional, deve considerar as especificidades
das diferentes realidades na escala municipal, onde esses instrumentos se efetivam.
Um dos resultados da pesquisa foi a proposição de diretrizes urbanísticas frente à
temática do direito à moradia para a realidade local. Acredita-se que com o desenvolvimento
desse debate foi possível identificar criticamente como a gestão urbana e habitacional em São
João Del-Rei se concretiza, ao mesmo tempo em que se vislumbraram as possibilidades
futuras para o enfrentamento dessa questão no município.
O objetivo das diretrizes, muito mais do que se colocar como solução para a
problemática habitacional na cidade, foi convidar ao questionamento de que, a partir da
31
compreensão do processo de produção socioespacial de São João Del-Rei, como é possível
produzir habitação de interesse social em áreas urbanas consolidadas, e assegurar o direito à
cidade em um momento onde o que se prioriza é a acumulação do capital em detrimento dos
direitos sociais.
32
PRIMEIRO MOMENTO
CAPÍTULO 1. A QUESTÃO DA HABITAÇÃO: O PAPEL DAS POLÍTICAS
HABITACIONAIS NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO
Nesse primeiro momento do trabalho busca-se apresentar o papel do Estado enquanto
agente promotor de políticas públicas direcionadas ao provimento de moradias, vistas como
produto do contexto histórico, econômico e tecnológico.
Serão aqui discutidas as causas do déficit habitacional no contexto brasileiro e um
panorama das políticas públicas enquanto possibilidade de enfrentamento dessa problemática
ao longo do tempo.
A importância de uma análise aprofundada em torno das políticas habitacionais
possibilitará entender as contradições desse processo, partindo-se do pressuposto que as
mesmas não buscam apenas assegurar o direito à moradia, mas também representam a atuação
do capital imobiliário no Brasil.
Silva (2013) salienta que em todos os momentos históricos em que essas políticas se
fizeram presentes, de certa forma representaram não apenas medidas de cunho social, mas se
vislumbraram como formas de proteção do grande capital em busca da valorização e da
especulação imobiliária.
A moradia, segundo a lógica capitalista de produção, torna-se uma mercadoria.
Conforme Borges (2011) o fato de que uma parcela da população das cidades encontra-se
excluída do mercado formal de aquisição de habitação é consequência da desigual
distribuição territorial de rendas e da atribuição de um alto valor de troca agregado à moradia.
A subordinação da política habitacional aos interesses da reprodução das relações
capitalistas de produção está acima das próprias necessidades de se superar o déficit
habitacional das camadas populares, gerados pelo processo de urbanização brasileiro.
Harvey (2014 a), ao considerar o paralelo existente entre urbanização e capitalismo
afirma que a absorção do excedente do capital por meio de transformação urbana quase
sempre tem uma dimensão de classe, porque em geral são os pobres e desprivilegiados que
mais sofrem com esses processos.
Essa situação evidencia que as intervenções no espaço urbano, ampliam a cadeia que
aprisiona as populações marginalizadas às lógicas de circulação e acumulação do capital. Não
há direito à cidade e direito à moradia quando a lógica de acumulação prevalece.
33
O déficit habitacional se tornou um problema estrutural grave desde o início do
processo de urbanização brasileiro e, apesar de terem se realizado ao longo da história
diversas políticas públicas a fim de minimizar o problema, nenhuma delas conseguiu enfrentar
a acentuada desigualdade social vigente, inerente ao modo capitalista de produção.
As políticas habitacionais se inserem em um contexto urbano marcado pela
desigualdade socioespacial, e buscam responder as necessidades habitacionais pautando-se na
produção da casa própria, construída pelo mercado formal da construção civil, em parceria
com o Estado.
Bonduki (2008) ressalta que essa característica dos investimentos no setor da
habitação deve ser criticada por não buscar estruturar qualquer ação significativa para apoiar,
do ponto de vista técnico, financeiro, urbano e administrativo, a produção de moradia ou
urbanização por processos alternativos, que incorporem o esforço próprio e capacidade
organizativa das comunidades.
Diante disso, o que ocorre nas cidades é um processo de urbanização informal, onde a
população garante seu acesso à moradia por meio da autoconstrução na periferia, distantes das
áreas urbanizadas e muitas vezes mal servida de infraestrutura. Esta forma de uso da terra está
presente na grande maioria das cidades brasileiras, inclusive naquelas de pequeno porte.
Outra importante questão a ser considerada é a não articulação entre a política
fundiária e a política habitacional e urbana, no âmbito dos municípios. O alto valor da terra
urbanizada se constitui como barreira ao direito à cidade. A produção do espaço de forma
desigual persiste mesmo diante do incremento da política nacional de habitação em anos
recentes.
A política habitacional nas últimas décadas segundo Bonduki (2008) trouxe alterações
relevantes no que diz respeito ao financiamento habitacional, com elevação dos
investimentos, ampliação de subsídios, e foco mais dirigido para a população de baixa renda,
cabendo ao poder público municipal uma gestão urbano-habitacional dos recursos adequada à
realidade local.
Entretanto, considera-se que as mudanças na concepção e na intervenção do poder
público na habitação, apesar de representar conquistas significativas no âmbito normativo-
institucional no setor habitacional, ainda não foram acompanhadas de transformações efetivas
na função social das cidades, seja em grandes centros ou nas regiões interioranas nos quais as
desigualdades sociais e territoriais se agravam. Em seguida será discutida a demanda por
moradias no contexto brasileiro.
34
1.1 Origens do Déficit Habitacional
A produção do espaço urbano está intrinsecamente relacionada ao modo de produção
dominante em determinado tempo e lugar. Dessa forma considera-se que o processo de
urbanização, foi redefinido pelo desenvolvimento da industrialização, e é nesse momento que
a cidade se reproduz com a mesma lógica da fábrica.
Lefebvre (2001a) ressalta que nesse contexto também se desencadeia o processo de
divisão técnica e social do trabalho, que instaura uma sociedade marcada pela desigualdade
entre classes. A cidade se tornou o lócus da reprodução do capital, onde cada classe social tem
seu lugar determinado no espaço urbano.
As mudanças que culminaram na consolidação da cidade capitalista, geraram
transformações essenciais quanto às formas de relações sociais, pois, é neste contexto, que se
desenvolve no espaço urbano, o domínio da propriedade privada da terra e dos meios de
produção, isto é, o valor de uso se submeteu ao valor de troca.
Diante disso, o que se nota hoje é a perpetuação desse modelo de divisão
socioespacial. No caso específico da habitação, objeto da pesquisa, o padrão de moradia
implantado indica a espacialização das diferenças sociais na cidade. As áreas providas de
melhor infraestrutura destinam-se aos extratos sociais privilegiados, enquanto às camadas
mais pobres cabem às zonas periféricas.
Lefebvre (1999) discute a hipótese da urbanização completa da sociedade, que deve
ser entendido como um processo que existe apenas como virtualidade, através da qual, o
urbano não pode ser entendido como uma realidade acabada.
Para compreender a urbanização recente, torna-se necessário, portanto, se voltar
dialeticamente sobre o urbano enquanto processo em construção. Tendo como suporte as
ações engendradas no passado, é possível entender o momento presente e vislumbrar
possibilidades futuras
Essa trajetória tem início nas cidades da Antiguidade, com suas funções políticas,
estabelecendo uma vida social organizada, um domínio sobre o campo, e se materializando no
conceito de Cidade-Estado. Posteriormente, essa cidade se transforma em mercantil na
medida em que, as relações comerciais de troca se inserem na mesma, tornando-se uma
função urbana decorrente da existência de um mercado.
No terceiro momento surge a cidade industrial, que efetiva o processo de urbanização
de forma mais acentuada e que significou também, a condição para o desenvolvimento do
35
capital industrial. A indústria impõe à cidade sua lógica centrada na produção e o espaço da
cidade passa a ser privatizado e submetido ao valor de troca. Nessa fase ocorre a inflexão da
cidade sobre o campo, decorrente do êxodo rural em direção à cidade industrial, e da inserção
do modo de vida urbano no campo.
O autor aponta como parte integrante desse processo o fenômeno de implosão-
explosão das cidades, considerado como uma zona crítica. Como explosão entende-se a
expansão horizontal das cidades, com a criação de subúrbios, zonas periféricas. Ao mesmo
tempo ocorre a implosão, onde as concentrações urbanas se acentuam devido ao adensamento
do espaço.
Conforme Spósito (2000) contribuiu para este fenômeno, o fato de que houve um
abandono das formas de controle público sobre o espaço construído. O liberalismo, como
referencial ideológico, a livre concorrência, a iniciativa privada sem intervenção do poder
público como princípio de conduta, e a busca de reprodução do capital a todo custo,
transformaram as cidades em espaços caóticos. Ao se analisar o impacto da industrialização
sobre a urbanização destaca-se que essa produção social do espaço, é ao mesmo tempo
manifestação e condição do estágio de desenvolvimento das forças produtivas sob o
capitalismo.
Pensando-se o contexto brasileiro o que se nota é que o processo de urbanização no
país também é resultado do modelo de industrialização vigente nos países em
desenvolvimento, marcado pelo crescimento populacional acelerado. As cidades também se
configuraram inseridas no modo capitalista de produção, ocupando um papel central na
divisão social do trabalho e recriando a exclusão e segregação territorial para grande parcela
da população.
Zorraquino (2005) ressalta que o modelo produtivo açucareiro e cafeeiro nos grandes
latifúndios agrícolas, durante os séculos XVI a XIX, definiu no Brasil, um modelo territorial
fundamentalmente rural. A passagem do modelo rural ao urbano produz-se na segunda
metade do século XX, quando o processo de industrialização do país avança. É então que se
dá o intenso processo de migração do campo para a cidade.
De acordo com Cota (2010) no Brasil na década de 1970 cerca de 60% da população
já vivia em cidades. Observa-se, então, um crescimento da população na periferia dos grandes
centros urbanos, bem como dos assentamentos informais. Na década de 1980, entretanto,
observa-se uma mudança no padrão de urbanização brasileiro, com a queda no ritmo do
crescimento demográfico nas grandes cidades e aumento nas cidades de porte médio.
36
De acordo com o IBGE (2010), 84% da população residem no espaço urbano,
totalizando 160.879.708 habitantes. A população residente no meio rural corresponde a 16%,
somando 29.852.986 habitantes.
A opção por um rápido desenvolvimento industrial significou a concentração de
capitais em alguns setores como indústrias siderúrgicas, petroquímicas, hidrelétricas e
infraestrutura, em detrimento dos chamados setores sociais. (CAMPOS FILHO, 1992; p.46).
Assim sendo, a evolução urbana no país foi marcada por um desenvolvimento
desigual, conduzida pelos interesses do capital e acarretando sérios problemas urbanos, tais
como segregação socioespacial, crescimento periférico e o déficit habitacional.
O fenômeno do crescimento urbano não está isento de grandes contradições sociais e,
com diferenças de grau e intensidade, todas as cidades brasileiras exibem problemas
semelhantes. Essa pesquisa se propõe a discutir essa problemática decorrente da produção
capitalista do espaço, tendo como enfoque nesse momento, o déficit habitacional.
A Fundação João Pinheiro, órgão responsável pela quantificação do déficit
habitacional no país, considera um conceito amplo de necessidades habitacionais,
desenvolvendo uma metodologia de análise sobre duas vertentes: o déficit habitacional e a
inadequação de moradias.
Segundo a mesma, o conceito de déficit habitacional está ligado diretamente às
deficiências do estoque de moradias, seja por necessidade de reposição de moradias precárias,
seja pela existência de mais de uma família habitando a mesma unidade. Incluem-se ainda a
moradia em imóveis e locais com fins não residenciais, imóveis alugados com grande
densidade e o ônus excessivo com aluguel.
O déficit habitacional pode ser entendido, como déficit por reposição de estoque e
déficit por incremento de estoque de moradias. O primeiro refere-se aos domicílios
rústicos, e à depreciação de domicílios. O déficit por incremento de estoque
contempla os domicílios improvisados, parte da coabitação familiar e dois tipos de
domicílios alugados: os fortemente adensados e aqueles onde famílias pobres (renda
familiar até três salários mínimos) pagam 30% ou mais da sua renda para o locador.
(FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2015, p.18-19).
O conceito adotado para domicílios rústicos é do IBGE, sendo aqueles sem paredes de
alvenaria ou madeira aparelhada. Em decorrência das suas condições de insalubridade, esse
tipo de edificação provoca desconforto e traz risco de contaminação por doenças.
37
Os demais conceitos aqui apresentados estão em conformidade com os parâmetros
estabelecidos pela Fundação João Pinheiro (2015). A depreciação de domicílios consiste no
pressuposto de que há um limite para a vida útil de um imóvel e dependendo de sua
conservação, a substituição completa do mesmo é inevitável.
Por sua vez, os domicílios improvisados englobam todos os locais e imóveis sem fins
residenciais e lugares que servem como moradia alternativa, tais como imóveis comerciais,
barcos, embaixo de pontes e viadutos entre outros.
A coabitação familiar compreende a soma das famílias conviventes secundárias, que
vivem junto à outra família no mesmo domicílio e das que vivem em apenas um cômodo.
O ônus excessivo com aluguel corresponde ao número de famílias urbanas com
rendimento familiar de até três salários mínimos que moram em casa ou apartamento
(domicílios urbanos duráveis) e que despendem 30% ou mais de sua renda com aluguel.
Juntamente com a coabitação familiar corresponde a maior parcela de composição do déficit
habitacional no país.
O componente do déficit habitacional chamado adensamento de moradores em
domicílios alugados, considera excessivo um número médio de moradores superior a três
pessoas por dormitório. Como, nesses casos, o inquilino não pode ampliar o imóvel nem o
vender para comprar outro maior, caracteriza-se a necessidade potencial de um novo imóvel
para essas famílias.
As habitações inadequadas não proporcionam condições desejáveis de habitação. Isso
não implica, contudo, necessidade de construção de novas unidades. Como inadequados são
classificados os domicílios com carência de infraestrutura, adensamento excessivo de
moradores (em domicílios próprios), problemas de natureza fundiária, cobertura inadequada,
sem unidade sanitária domiciliar exclusiva ou em alto grau de depreciação.
São considerados domicílios carentes de infraestrutura todos os que não dispõem de
ao menos um dos seguintes serviços básicos: iluminação elétrica, rede de
abastecimento de água com canalização interna, de esgotamento sanitário ou fossa
séptica e coleta de lixo.
O adensamento excessivo considera apenas os domicílios (casas e apartamentos)
próprios. Caracteriza situação em que o número médio de moradores no domicílio é
superior a três por dormitório.
A inadequação fundiária refere-se aos casos em que pelo menos um dos moradores
do domicílio tem a propriedade da moradia, mas não, total ou parcialmente, a do
terreno ou da fração ideal de terreno (no caso de apartamento) onde ela se localiza.
Sob cobertura inadequada estão incluídos todos os domicílios que, embora possuam
paredes de alvenaria ou madeira aparelhada, têm telhado de madeira aproveitada,
zinco, lata ou palha.
A inexistência de unidade sanitária domiciliar exclusiva define o domicílio que não
dispõe de banheiro ou sanitário de uso exclusivo.
38
Domicílios com alto grau de depreciação são aqueles com mais de 50 anos de
construção e que não precisam ser repostos apenas necessitando de manutenção.
(FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2015, p.22-23).
O relatório brasileiro para o Habitat III (2016) referente à participação do país na
terceira Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano
Sustentável, Habitat III, realizada em 2016, aponta a importância de se considerar como
indicador os dados referentes à moradia adequada, no cálculo do déficit habitacional. Segundo
o mesmo 59,89% da população residia em moradias adequadas em 2013. Na região Sudeste
75,63% da população reside em condições adequadas.
O documento ainda ressalta algumas medidas que possibilitariam elevar o acesso à
habitação adequada: aplicação dos instrumentos previstos no Estatuto da cidade (2001) para
garantir a provisão de terras públicas para fins de interesse social, requalificação de edifícios
em desuso nas áreas centrais para o atendimento de famílias de baixa renda, programas e
linhas de financiamento voltado para o combate ao ônus excessivo com o pagamento de
aluguel e a continuidade e ampliação de programas de urbanização de favelas, assistência
técnica e provimento de unidades habitacionais associados às estratégias urbanísticas e
fundiárias.
Levando-se em conta todos os fatores aqui explicados, serão apresentados na tabela 1
dados referentes ao cálculo do déficit habitacional realizado pela Fundação João Pinheiro no
período entre 2007 e 2014, sendo este último o mais recente levantamento realizado pelo
instituto.
Tabela 1- Déficit habitacional brasileiro por número de domicílios no período entre
2007-2014
Ano Déficit Habitacional por número
de domicílios
2007 6.273.000
2008 5.546.000
2009 5.998.000
2010 6.490.000
2011 5.889.000
2012 5.430.000
2013 5.846.000
2014 6.068.000
Fonte: Fundação João Pinheiro
Elaboração: PAIVA, Letícia, 2017
39
A escolha desse intervalo de análise (2007 a 2014), diz respeito ao recorte temporal da
pesquisa, que estuda a produção de habitação de interesse social no município de São João
Del-Rei entre os anos 2006 e 2016.
Além disso, a partir de 2007 houve segundo a Fundação João Pinheiro um ajuste
metodológico no que se refere ao cálculo do déficit habitacional, o qual passou a considerar
como integrante do déficit, um percentual dos domicílios com adensamento excessivo: os
apartamentos e as casas alugadas.
Até 2007 esse componente era apenas considerado um fator de inadequação de
domicílios. Assim sendo, os dados atuais no que diz respeito ao déficit habitacional não
podem ser comparados com levantamentos anteriores ao ano de 2007.
De acordo com os dados apresentados, nota-se primeiramente, que no ano de 2007, o
déficit habitacional ainda é expressivo apesar de já se encontrar em vigência no país a Política
Nacional de Habitação instituída no ano de 2005, e que será apresentada adiante no próximo
tópico.
Em 2007, durante o governo Lula, foi proposto o Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) abrangendo as áreas de energia, rodovias, portos, saneamento e habitação.
Com a implantação do PAC surgiu em março de 2009 o Programa Minha Casa Minha Vida,
integrado ao Plano Nacional de Habitação e operacionalizado pela Caixa Econômica Federal.
Seu objetivo é facilitar a aquisição da casa própria pelas famílias com renda mensal entre zero
e dez salários mínimos. (OLIVEIRA, 2011).
O Programa Minha Casa Minha Vida foi considerado uma das principais ações do
governo Lula em reação à crise econômica internacional (2008-2009), estimulando a criação
de empregos e de renda por meio de investimentos na construção civil.
A partir do lançamento do pacote habitacional Minha Casa Minha Vida com um
expressivo montante de recursos, nota-se uma diminuição do déficit habitacional nos anos de
2011 e 2012 embora não tão significativa, levando-se em consideração as metas propostas
para o programa, de construir um milhão de casas em sua primeira fase e dois milhões na
segunda fase. Contudo, salienta-se que essa diminuição pode ter ocorrido em decorrência do
número de contratações e unidades habitacionais entregues no período.
De acordo com os dados nota-se que a partir de então se iniciou um processo de
crescimento do déficit habitacional, atingindo 6.068.000 de domicílios em 2014. Diante disso,
cabe ressaltar que o enfoque da política habitacional no Programa Minha Casa Minha Vida
não tem conseguido responder ao déficit habitacional de forma efetiva. Acredita-se que esse
40
aumento na demanda por moradias, tende a manter-se em decorrência do cenário de
instabilidade política vivenciado no país a partir de 2015 e das alterações propostas para o
Programa Minha Casa Minha Vida. Essas mudanças serão debatidas em profundidade no
próximo tópico em que se discutem as políticas habitacionais no Brasil.
Além disso, é importante considerar fatores como a taxa de desemprego no país que
segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios divulgada pelo IBGE em maio de
2017, o índice de desemprego chegou a 13%, o que representa 13, 771 milhões de
desempregados, o que acaba por influenciar as condições de vida da população no que diz
respeito a gastos com aluguel, e financiamentos imobiliários.
Outro ponto chave a ser debatido é o processo de valorização do solo urbano e de
imóveis promovido pela própria atuação do Programa Minha Casa Minha Vida no cenário
nacional, o que acaba por acentuar as desigualdades socioespaciais no que diz respeito ao
direito à moradia. Esse aspecto será mais bem discutido no terceiro momento dessa
dissertação.
Considerando o déficit habitacional urbano segundo as faixas de renda, nota-se que o
padrão de renda das famílias que demandavam novas moradias não se alterou nos últimos
anos, conforme os dados apresentados na tabela 2.
Tabela 2- Composição do déficit habitacional brasileiro por faixa de renda em salários
mínimos no período entre 2007- 2014
Faixa de renda 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Até 3 s.m 89,4% 89,6% 90,1% 62,7% 81,0% 82,5% 83,4% 83,9%
Mais de 3 a 5 s.m 6,5% 7% 7% 14,5% 11% 10,1% 5,2% 5%
De 5 a 10 s.m 3,1% 2,8% 2,4% 13,1% 5,9% 5,6% 1,5% 1,4%
Mais de 10 s.m 1% 0,6% 0,5% 5,8% 2,1% 1,8% 1,5% 1,4%
Fonte: Fundação João Pinheiro
Elaboração: PAIVA, Letícia, 2017
Torna-se importante ressaltar que mesmo a partir do lançamento do Programa Minha
Casa Minha Vida em 2009, cujo objetivo é priorizar a redução do déficit habitacional na faixa
de renda de 0 a 3 salários mínimos por meio da maior concessão de subsídios, ainda persiste a
maior concentração do déficit habitacional nessa faixa de renda.
41
Outro fator a ser destacado sobre o déficit habitacional é o grande montante de
domicílios vagos existentes no Brasil. Esses dados evidenciam a má distribuição das moradias
no país, em razão da atuação dos agentes do mercado privado de habitação. A tabela 3
estabelece um comparativo entre o déficit habitacional e o número de domicílios vagos no
período entre 2007 e 2014.
Tabela 3- Comparativo entre o déficit habitacional brasileiro e o número de domicílios
vagos no período entre 2007 -2014
Ano Déficit Habitacional por número de domicílios Número de domicílios vagos
2007 6.273.000 7.351.000
2008 5.546.000 7.542.000
2009 5.998.000 7.517.000
2010 6.490.000 6.052.000
2011 5.889.000 7.594.578
2012 5.430.000 7.198.023
2013 5.846.000 7.230.000
2014 6.068.000 7.241.000
Fonte: Fundação João Pinheiro
Elaboração: PAIVA, Letícia, 2017
Segundo a Fundação João Pinheiro (2015) o cálculo do número de domicílios vagos
leva em consideração três aspectos: os imóveis em construção, os em condições de serem
ocupados e os em ruínas.
Ressalta-se então que no período entre 2007 e 2014 com exceção do ano de 2010, o
número de domicílios vagos é superior ao déficit habitacional, levando ao questionamento de
que existe uma contradição entre a existência de demanda por moradias, bem como a
construção de novas unidades habitacionais, ao lado de um grande número de imóveis
desocupados.
Dessa forma, evidencia-se que a forma como a política habitacional é conduzida visa
privilegiar os interesses do mercado ao promover a reprodução do capital via produção do
espaço edificado, e também as dificuldades de se ter acesso ao estoque de domicílios vagos.
Além disso, esses domicílios se vislumbram como possibilidade para suprir parte das
carências habitacionais da população, desde que, conforme enfatiza a Fundação João
Pinheiro, se obtenha maiores detalhamentos sobre as condições, localização, situação da
propriedade e padrão de construção desse estoque de moradias.
42
O recorte espacial dessa pesquisa é o município de São João Del-Rei que se localiza
na Região do Campo das Vertentes, no estado de Minas Gerais. Possui cerca de 89.000
habitantes, sendo o setor de comércio e serviços a principal atividade da economia local.
(IBGE, 2015). De acordo com o censo demográfico realizado em 2010 pelo IBGE, desse
contingente populacional 95% reside no espaço urbano, o que corresponde a 79.790
habitantes.
Levando em consideração a problemática habitacional em São João Del-Rei, constata-
se que o déficit habitacional, segundo o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS)
lançado em 2010, situa-se em torno de 5.000 moradias. Na área rural do município o déficit é
de 205 moradias.
Cabe ressaltar que a análise da demanda habitacional no contexto local, foi realizada,
segundo o PLHIS (2010), por meio de quatro etapas. A primeira foi à visita in loco nas áreas
mais adensadas da cidade e que apresentam maiores problemas habitacionais. As áreas foram
mapeadas e classificadas de acordo com suas características. A zona rural foi avaliada em
função do tipo de construção existente.
A segunda etapa consistiu na aplicação de 91 questionários com as famílias moradoras
dos locais mapeados na primeira etapa. Os questionários abordavam temas como faixa de
renda, situação de moradia, serviços de abastecimento, saneamento, números de pessoas por
unidade, número de famílias por unidade, situação de infraestrutura, disponibilidade de
equipamentos urbanos, satisfação com o perfil da moradia e perfil habitacional.
A terceira etapa consistiu em avaliar os dados do Cadastro Único (CADÚNICO)
responsável pelas informações sociais dos beneficiários do Programa Bolsa Família.
Considerando que as famílias de maior vulnerabilidade social se encontram cadastradas neste
programa, as informações disponíveis neste cadastro auxiliaram traçar o quadro habitacional
do município. Por fim, a quarta etapa tratou de levantar o número de inscritos em programas
habitacionais já realizados pela Prefeitura Municipal.
O Cadastro Único foi regulamentado pelo Decreto n˚ 6.135 de 26 de junho de 2007. É
um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda. Nele são registradas
informações como: características da residência, identificação de cada membro da família,
escolaridade, situação de trabalho e renda, entre outros. Tornou-se o principal instrumento do
Estado brasileiro para a seleção e a inclusão de famílias de baixa renda em programas
federais.
43
As múltiplas formas com que se apresentam as necessidades habitacionais no país vêm
desafiando a intervenção do poder público no setor. Também se mantêm desafiadoras as
diferentes expressões que essa questão assume na escala municipal, em contextos com
distintas dimensões populacionais e configurações econômicas, políticas e sociais.
De acordo com Bonduki (2008) permanece um elevado déficit habitacional
concentrado nas famílias de baixa renda, evidenciando que depois de décadas de política
habitacional impulsionada pelo Estado, o problema persiste evidenciando a necessidade se de
se formular estratégias mais eficazes para atender as faixas de menor poder aquisitivo.
Morado e Braga (2009) afirmam que os mecanismos públicos privados estabelecidos
para o enfrentamento da demanda por moradias vêm se ancorando na predeterminação do
modo de morar dos beneficiários, na mercantilização da casa própria, na produtividade
lucrativa da indústria da construção civil e na negação as famílias de baixa renda do acesso à
terra, aos serviços urbanos e ao crédito.
O déficit habitacional no país, portanto, ainda é visto como um problema numérico a
ser superado pela provisão em massa de unidades habitacionais genéricas, desprovidas do
acesso a serviços e equipamentos públicos.
Contudo, pensando-se os dados referentes ao número de domicílios vagos existentes
no país e com potencial para a ocupação, cabe relativizar as políticas públicas ancoradas no
imperativo de construir habitações como forma de reduzir ou amenizar o déficit habitacional
brasileiro.
Muitas vezes os imóveis vagos situam-se em áreas consolidadas e bem servidas de
infraestrutura, enquanto o acesso à terra urbanizada para a população de baixa renda, persiste
como uma das questões mais importantes para se enfrentar a demanda habitacional no Brasil.
Enquanto a política habitacional que se vislumbra como possibilidade de ação frente
essa problemática, não for acompanhada de instrumentos capazes de alterar o ciclo de
especulação imobiliário e do acesso ao solo urbano, essa concepção contraditória da produção
espacial continuará constituindo o padrão geral de urbanização e o direito à moradia não será
assegurado de forma plena.
1.2 Panorama das Políticas Habitacionais no Brasil
Pensar em políticas públicas de habitação significa segundo Oliveira (2011),
compreender como as mesmas buscaram reduzir a demanda por moradias ao longo do tempo,
44
que no caso brasileiro, foi acentuada com o processo de industrialização iniciado a partir de
1950.
Contudo, torna-se importante ressaltar que o intuito de se realizar uma retrospectiva
histórica das políticas habitacionais, é também o de apresentar uma crítica à ineficiência das
políticas públicas de habitação no que se refere às desigualdades sociais, à concentração de
renda e à manutenção do crescimento desordenado das cidades nos mais diversos contextos
socioespaciais. O retorno dialético ao passado permitirá assim, vislumbrar como se
materializam essas políticas no momento presente.
A propriedade privada da terra por uma determinada parcela da sociedade é uma
característica da produção capitalista do urbano. Mesmo com os avanços no arcabouço
jurídico-institucional das políticas habitacionais a propriedade privada ainda se constitui em
um entrave para a garantia do direito à moradia.
Conforme salienta Oliveira (2011), o que acontece é que o poder estatal aliado aos
interesses da classe dominante constitui um elemento que irá condicionar, onde e de que
forma as diversas classes sociais poderão se localizar no âmbito de uma configuração espacial
que assume características segregadoras.
Diante disso, o panorama da política habitacional aqui proposto foi dividido em dois
momentos: políticas habitacionais pré-Constituição de 1988 e políticas habitacionais pós-
Constituição de 1988. No primeiro momento serão apresentados o início da intervenção
estatal no setor habitacional, por meio da criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensão,
bem como as ações engendradas no Governo Dutra a partir de 1946 com a Fundação da Casa
Popular, e o período de vigência do Banco Nacional de Habitação (BNH) durante o governo
militar.
No segundo momento será apresentado o quadro de esvaziamento da política
habitacional no país, as políticas realizadas durante os governos Itamar Franco (1992-1995) e
Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a implantação da Política Nacional de Habitação a
partir do governo Lula e sua atuação até os dias atuais.
A escolha da Constituição Federal de 1988 como marco para se debater a ação estatal
no enfrentamento do déficit habitacional, se deve, como aponta Aguiar (2008), pela mesma
representar uma inflexão, na qual a função social da cidade e da propriedade passam a se
constituir elementos centrais da política urbana.
45
A concepção de função social da propriedade e da cidade abre novas possibilidades
para a intervenção pública, ao subordinar a propriedade privada aos interesses
coletivos. Nesse sentido, a emergência de um novo arcabouço institucional-jurídico
representado pela nova Carta Magna e, sobretudo, com a posterior aprovação do
Estatuto da Cidade, prevê princípios e instrumentos, que podem conformar um novo
modelo de gestão urbana e, consequentemente influenciar no campo da política
nacional de habitação. (AGUIAR, 2008, p.56).
Além disso, é na Constituição Federal de 1988 que a moradia se torna um direito
social e onde, aponta Oliveira (2011), o processo de descentralização política- administrativa
do país, restabeleceu uma redefinição de competências, passando a ser atribuição dos Estados
e municípios a gestão dos programas sociais e de habitação, o que trouxe novos
desdobramentos na forma como os mesmos serão conduzidos. A seguir apresenta-se um breve
panorama das políticas habitacionais no Brasil.
1.2.1 Políticas Habitacionais Pré-Constituição de 1988
Segundo Bonduki (2008) pensar em políticas públicas de habitação, significa
compreender como as mesmas se deram enquanto medidas de enfrentamento do déficit
habitacional, que no caso brasileiro, foi acentuado com o processo de industrialização no final
do século XIX, e a consequente urbanização desordenada, levando a formação de diversos
tipos de ocupação informal do espaço urbano.
A situação habitacional se constitui como um grave problema social, que já não se
limita apenas aos grandes centros urbanos e seus contingentes elevados no que diz respeito à
demanda por moradias, mas também atinge as cidades de pequeno porte como é o caso de São
João Del-Rei analisada nesse estudo.
Diante disso, propõe-se nesse primeiro momento apresentar o histórico das políticas
habitacionais brasileiras e a evidenciar qual foi sua contribuição para o atual estágio de
desenvolvimento da mesma. Essa análise se inicia na República Velha (1889-1930) indo até a
atuação do Banco Nacional de Habitação (BNH), durante o regime militar (1964-1986). Além
da política estadual de habitação em vigência nesse período.
Cabe aqui ressaltar que a intervenção estatal na produção de moradias vai ocorrer
somente a partir da década de 1930. O período anterior caracteriza-se pela produção rentista
de habitação via setor privado, que não conseguiu responder as necessidades habitacionais,
46
sobretudo, para as famílias de baixa renda. Entretanto, apenas no período de 1964 a 1986 é
que o país teria uma política habitacional, política essa, em que o Estado passa a se tornar um
intermediador de recursos entre o poder público e a iniciativa privada.
A produção habitacional durante a República Velha (1889-1930)
Com a proclamação da República (1889), ocorreram algumas políticas de expulsão das
classes pobres das áreas centrais da cidade, que, conforme Rubin e Bolfe (2014) tinham como
justificativa o controle sanitário e uma política urbana de embelezamento. Assim, empresas de
iniciativa privada investiram na construção civil e no fornecimento de habitações, porém esses
investimentos não se destinavam à população de baixa renda. Para os mais pobres, a única
alternativa eram as moradias coletivas como os cortiços.
Entretanto, segundo Bonduki (2014), essa fase caracterizou-se pela concepção liberal
de que o Estado não deveria intervir diretamente na produção e nas regras de locação da
moradia, consideradas questões de mercado. Com o predomínio dessa visão, o poder público
acabou por ter uma presença insignificante no enfrentamento do problema habitacional.
Assim, conforme salienta Borges (2011), privilegiou-se o incentivo à produção
privada de moradias, como as várias modalidades de alojamentos coletivos e as vilas
operárias, empreendidas por investidores para locação ou por empresas para abrigar seus
empregados.
Vários fatores estimularam a produção rentista: forte demanda por moradias nas
principais cidades, alta rentabilidade do investimento e baixo risco, pois os aluguéis
não eram controlados e os empreendedores se beneficiavam, ainda, da valorização
imobiliária. Além disso, o Estado atuou para estimular essa produção, com
incentivos fiscais, segurança jurídica para os locadores e tolerância em relação às
normas jurídicas e sanitárias. Assim, as alternativas habitacionais produzidas em
série para os operários e a classe média representavam agenciamentos arquitetônicos
específicos da procura por rentabilidade pela locação. (BONDUKI, Nabil, 2014,
p.19).
Além disso, de acordo com Borges (2011), não havia uma legislação que
regulamentasse as relações entre locadores e inquilinos e vigoravam as disposições liberais
que garantiam o direito absoluto de propriedade, isto é, o domínio do proprietário sobre o
imóvel alugado. O aluguel era fixado pelas partes segundo as regras do mercado, sem
interferência do poder público.
A produção habitacional do período se caracterizou pela construção de vilas, sejam
elas particulares, ou vilas operárias financiadas por empresas para seus operários. Bonduki
47
(2014) aponta que as vilas particulares eram promovidas tanto por pequenos investidores
como por grandes empresas construtoras e sociedades mutuárias, alcançado até mesmo a
classe média, que não dispunha na época de qualquer sistema de financiamento para compra
da casa própria.
O autor ressalta que por sua vez, as vilas operárias atendiam a necessidades específicas
da fase inicial de implantação do capitalismo no país, como a harmonia entre o capital e o
trabalho, submetendo os trabalhadores à ordem burguesa e mantendo-os sob permanente
controle, necessidades da própria produção.
O mesmo ainda enfatiza que o fato de muitas vilas apresentarem equipamentos sociais
junto às moradias, introduziu a ideia de que o núcleo residencial não devia ser constituído
apenas por unidades habitacionais, mas requeria uma gama de serviços coletivos. Requisito
que até hoje não tem sido atendido de forma efetiva nos conjuntos habitacionais edificados
pela política recente.
O início da intervenção estatal no setor da habitação: os Institutos de Aposentadoria e Pensão
(1930-1964) e Lei do Inquilinato
Segundo Bonduki (2014) o período do Governo Getúlio Vargas marca o surgimento
da habitação social no Brasil. Com a Revolução de 1930, ocorre uma profunda transformação
no Estado brasileiro, que abandona o liberalismo e passa a interferir em todos os aspectos da
vida econômica do país e no setor habitacional. O governo passa a intervir tanto no processo
de produção como no mercado de locação de moradias.
Para Houri (2008) o problema da moradia ganhou destaque na medida em que
influenciava nas condições de vida dos trabalhadores, assim a intervenção estatal na produção
habitacional consolidou-se como forma de garantir condições de moradia e promover o acesso
dos trabalhadores assalariados à propriedade urbana. A atuação no setor habitacional se
caracterizou neste período, pela ideologia da aquisição à casa própria e da propriedade
privada, relacionando-a não somente ao progresso econômico, mas, sobretudo, como meio de
garantir a estabilidade da ordem política e legitimar o governo junto à massa de trabalhadores.
Nesse contexto, foram criados em 1930 para cada categoria profissional os Institutos
de Aposentadoria e Pensão (IAP). Conforme apontam Rubin e Bolfe (2014), em 1937, os IAP
passaram a atuar no campo habitacional, onde poderiam investir até 50% de suas reservas
para o financiamento habitacional. Os recursos para esses financiamentos provinham dos
48
cofres dos institutos originados do depósito compulsório de empresas e trabalhadores para o
pagamento futuro de aposentadoria e pensões.
De acordo com Ferreira (2009), as operações imobiliárias dos IAP eram baseadas em
quatro planos: o Plano A de locação ou venda de imóveis em conjuntos residenciais
adquiridos ou construídos pelos institutos para seus associados; o Plano B de financiamento
aos associados para aquisição de moradia ou construção em terreno próprio e o Plano C de
empréstimos hipotecários ou outras operações imobiliárias feitas a qualquer pessoa física ou
jurídica. Além disso, havia o Plano D que visava à formação de patrimônio imobiliário do
instituto. Todas as atividades de financiamento ou arrendamento dos IAP visavam o retorno
sobre o capital investido.
Bonduki (2014) ressalta que a atuação do IAP na área habitacional foi importante
tanto do ponto de vista quantitativo como qualitativo. Sua produção avançou na perspectiva
de formular estratégias para garantir uma produção habitacional em massa, e tendo a visão de
que a habitação não se reduz apenas a moradia, mas também a construção de equipamentos
coletivos e a necessidade de se prover infraestrutura urbana.
Entretanto, para o autor, o caráter fragmentário da intervenção dos IAP acabou por
restringir a ação pública e estimular a busca pela própria população, de soluções informais
para o problema habitacional, como a favela e a casa auto empreendida em loteamentos
periféricos.
Aguiar (2008) enfatiza que apesar da política instaurada ter como objetivo atender a
população de baixa renda nas intervenções realizadas dentro dos Planos A e B eram
considerados apenas beneficiários inseridos em relações formais de trabalho. Assim, parte da
população mantinha-se a margem do sistema criado pelos IAP.
A produção estatal de conjuntos habitacionais pelos institutos reforçou a preferência
pela locação em detrimento da venda dos imóveis, mostrando-se um instrumento de
capitalização de recursos através de aluguéis, com caráter excludente do ponto de
vista de beneficiamento dos setores populares não assalariados. (HOURI, 2008,
p.25).
Contudo, Andrade (2012) salienta que os IAP sofreram com a locação de imóveis
devido à alta inflação vigente no país e o congelamento do preço dos aluguéis. O mesmo
observou-se quanto ao financiamento para os contribuintes, uma vez que as prestações eram
fixas. A partir deste momento os IAP privilegiaram os empréstimos hipotecários para a
49
população de alta e média renda, onde a rentabilidade dos empréstimos era garantida, devido
a menores riscos de inadimplência. Com o passar do tempo, as reservas dos Institutos foi
declinando e deixando de ser fonte de recursos para a habitação. A atuação deste mecanismo
também não reduziu de forma contundente a necessidade de habitações no Brasil.
Outra medida de intervenção estatal na problemática habitacional foi a promulgação
da Lei do Inquilinato em 1942. Ferreira (2009) afirma que essa lei determinava o
congelamento dos valores dos aluguéis, regulamentava a relação entre proprietários e
inquilinos e proibia despejos. Afetou em larga escala a produção, distribuição e consumo de
moradias populares. Como justificativa para a mesma, apontava-se que a habitação era uma
mercadoria especial na qual o interesse social deveria ultrapassar os mecanismos de mercado.
A Lei do Inquilinato procurou ampliar as bases de apoio popular ao governo Vargas, no âmbito
do populismo, reduzir o custo de reprodução da força de trabalho e desestimular o investimento
em casas de aluguel de modo a concentrar a aplicação de capitais nos setores considerados
mais estratégicos para o projeto desenvolvimentista, em especial na indústria. No período
procurou-se impulsionar um processo de industrialização sem que se contasse com uma base
de acumulação prévia nem com disponibilidade de capitais externos. Seria necessário, portanto,
mobilizar capitais internos, canalizando recursos que normalmente se inclinariam para outros
setores da economia. (BONDUKI, 2014, p.43).
Como aponta Andrade (2012) o aumento da população urbana nas cidades, acrescido
do movimento de imigração, fez com que o mercado imobiliário em apreciação se tornasse
uma forma atrativa de investimento. Na inexistência de mercado de capitais e com a ausência
de formas de financiamento à casa própria e sendo o inquilinato prática que atingia quase a
totalidade da população, havia um poder de barganha muito concentrado nas mãos dos
proprietários de moradias, em um contexto que a oferta de novas unidades era quase nula,
devido à Primeira Guerra Mundial e a Revolução de 1924.
Diante desse quadro, e considerando-se a vigência da Lei do Inquilinato o
investimento no setor imobiliário para fins de aluguel deixa de ser lucrativo. Bonduki (2014)
evidencia que os despejos se tornaram práticas frequentes, uma vez que se tornou uma
alternativa para que em uma nova locação, os proprietários pudessem elevar o aluguel, o que
evidencia a ineficácia dessa medida, uma vez que, se empregavam recursos para burlar a lei.
Além disso, os investidores reduziram drasticamente a construção de casas de aluguel para a
população de baixos rendimentos, aumentando de forma drástica a carência de habitações nas
grandes cidades brasileiras.
50
A concepção de habitação da Fundação da Casa Popular (1946-1964)
Para Valladares (1983), o contexto em que foi criada a Fundação da Casa Popular
(FCP), evidenciava uma crise do setor imobiliário que se traduziu na crescente diminuição de
investimentos e no aumento do déficit habitacional. No centro da crise estava a inflação, que
desestimulava a produção de moradias e provocava maior especulação nos grandes centros e a
desarticulação do setor imobiliário.
Bonduki (2014) salienta ainda que o congelamento dos aluguéis, instituído pela Lei do
Inquilinato em 1942, agravou a situação, reduzindo a oferta de imóveis para locação no
mercado privado. Ressalta-se, que no período, também ocorreu uma intensificação da
urbanização e uma forte migração interna em direção às grandes cidades, estimulada pelo
projeto de desenvolvimento nacional, de caráter urbano e industrial, implementado pelo
governo Vargas, que ampliou então, a demanda por moradias.
Diante disso, em 1946 é instituído no Governo Dutra a Fundação da Casa Popular.
Segundo Andrade (2012), foi o primeiro órgão federal criado para promover o
desenvolvimento habitacional e urbano, sendo concebida no final do Estado Novo e extinta
em 1964 pelo regime militar, devido à criação do Banco Nacional de Habitação (BNH). Seu
propósito era centralizar e coordenar a política de habitação no âmbito nacional.
O ambicioso anteprojeto de criação da FCP previa centralizar as reservas das
carteiras prediais de todos os Institutos de Aposentadoria e Pensão em um grande
fundo capaz de alavancar a produção em massa de habitação social e atuar de
maneira ampla, incluindo desenvolvimento urbano, social e econômico. Previa-se,
além da construção de casas populares, o financiamento das indústrias de material
de construção, o apoio a pesquisas sobre processos construtivos e a estudos sobre as
tendências regionais das moradias, incluindo arquitetura, hábitos, clima, materiais e
mão de obra. (BONDUKI, 2014, p.245).
Conforme Aguiar (2008), posteriormente, através da Portaria nº 69 de maio de 1952,
as linhas de ação da Fundação seriam redefinidas, restringindo seu alcance no que se refere às
atividades complementares, admitindo-as apenas quando estritamente necessárias,
estendendo-se, sobretudo, aos municípios de menor capacidade orçamentária.
Ferreira (2009) aponta que os recursos da FCP eram oriundos do Orçamento Geral da
União e eram bem limitados. Originalmente o decreto que criou a FCP previu que os estados
repassassem 1% sobre as transações imobiliárias para o órgão, porém interesses regionais
impediram que este repasse se concretizasse. Além disso, foi proibido por parte dos Institutos
de Aposentadoria e Pensão que a FCP utilizasse seus recursos. Ao pretender financiar
51
habitações para população de baixa renda o Estado brasileiro, diante desses fatores, se viu em
uma situação financeira delicada, e o projeto não encontrou assim bases para sua sustentação.
Apesar de ter como objetivo garantir que a habitação fosse um direito de todos os
cidadãos e uma responsabilidade do Estado, Aguiar (2008) ressalta que, o órgão sofreu forte
oposição de vários setores da sociedade, como os Institutos de Aposentadoria e Pensão,
sindicatos, empresários do setor imobiliário, estados, entidades profissionais e esquerda
organizada no Partido Comunista. Com tanta oposição e sem contar com um apoio forte no
âmbito do próprio governo, o projeto da FCP não conseguiu implementar seus objetivos
originais.
A atuação da FCP ficou limitada, em grande parte, à construção de pequenos
núcleos residenciais, em parceria com prefeituras que deviam se responsabilizar pela
doação de terrenos e implantação da infraestrutura. A maioria dos núcleos
habitacionais da FCP foi implantada nas franjas periféricas urbanas, tendo sido
comum a entrega das unidades com a infraestrutura incompleta ou inexistente, o que
contrariava a intenção original de promover o desenvolvimento urbano.
(BONDUKI, 2014, p.245).
Além disso, conforme Andrade (2012) apesar do objetivo primordial da FCP ser atuar
no provimento de moradias para atender a população de baixa renda, a mesma obteve, no
entanto, limitados resultados no que se refere ao atendimento dessa demanda. Ao longo de
dezoito anos de atuação, a Fundação da Casa Popular financiou perto de 17 mil moradias,
montante pouco expressivo frente ao déficit habitacional da época.
Como nos diz Ferreira (2009) nota-se que o fato da FCP ter objetivos muitos amplos
em sua proposição, sua fragilidade, carência de recursos e desarticulação com outros órgãos e
principalmente a ausência de uma ação coordenada para enfrentar o déficit habitacional, fez
com que a atuação do Estado nesse período, estivesse muito distante de construir uma política
habitacional eficiente.
A política habitacional no regime militar (1964-1986)
Segundo Rubin e Bolfe (2014), o período após o golpe militar de 1964 inaugura um
modelo de política urbana e habitacional marcado pela forte intervenção do estado.
Considerando-se a questão habitacional no país, foram criados o Sistema Financeiro de
Habitação (SFH) e o Banco Nacional de Habitação (BNH). O BNH foi uma resposta do
governo militar, à forte crise habitacional presente no país que se urbanizava aceleradamente.
52
O governo buscava adquirir o apoio das massas populares urbanas e criar uma política
permanente de financiamento, que estruturasse o setor da construção civil habitacional.
Oliveira (2011) ressalta que, o SFH se constituiu como um instrumento oficial para dar
condições de capitalização das empresas ligadas à construção civil, e estruturação de uma
rede de agentes financeiros e privados para financiamento da produção habitacional. Além
disso, foi criado para captar recursos e destiná-los através da intermediação financeira para os
setores de habitação, urbanização saneamento, e facilitar a aquisição de moradia pela
população de baixa renda. O modelo de intervenção do SFH se tornou estratégico para a
estruturação e consolidação do mercado imobiliário capitalista no Brasil.
Conforme aponta Ferreira (2009), o SFH operava com recursos oriundos do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), somados aos provenientes da poupança voluntária,
formando o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). O FGTS foi criado em
1967 devido aos problemas das relações trabalhistas e obrigava o empregador a fazer um
depósito compulsório de 8% da remuneração mensal paga ao trabalhador, e 3% opcionais
pagos pelo empregado para a composição de uma conta poupança que serviria de renda
durante eventuais períodos de perda de emprego e posteriormente na aposentadoria.
Almeida (2011) explica que os recursos do SBPE eram utilizados para financiar
empreendedores ou construtoras. Estes produziam e vendiam as unidades habitacionais aos
consumidores finais que, mediante a tomada de empréstimo para a compra de unidades,
tornavam-se mutuários do sistema. Os recursos do FGTS deveriam ser canalizados
prioritariamente para a habitação de interesse social.
A criação do BNH inaugura um novo modelo de intervenção e de gestão do Estado,
que como enfatiza Aguiar (2008) se assentava na centralização de recursos numa agência
federal, onde também eram formuladas as políticas a serem efetivadas em todo o território
nacional. A implementação das políticas nos estados e municípios era transferida às agências
promotoras de âmbito estadual como as Companhias de Habitação (COHAB), designadas
pelo BNH. A atividade de construção propriamente dita ficava a cargo do setor privado
mediante processo de licitação.
De acordo com Cardoso (2003) o papel representado pelo BNH no modelo de política
habitacional estabeleceu um desenho institucional que influenciaria as políticas adotadas nos
anos seguintes. Entre essas características ressalta-se a criação de um sistema de captação de
recursos, cujas maiores fontes eram o FGTS e o SBPE; a formulação e a operacionalização de
programas federais que estabeleceram as diretrizes a serem adotadas nas localidades; a
53
definição de uma agenda de redistribuição de recursos, subordinada às decisões centrais e a
criação de agências responsáveis de âmbito local pela promoção direta das políticas.
O BNH, durante sua vigência, financiou 4,8 milhões de habitações, em torno de
25% das moradias construídas no país entre 1964 e 1986. Esse período foi o único
em que o país teve uma política nacional de habitação. As habitações financiadas se
destinaram a todas as faixas de renda, pela promoção privada das Companhias de
Habitação Popular e pela incorporação imobiliária. Porém, a população de baixa
renda é responsável por apenas 20% dos financiamentos. Além das habitações,
foram financiadas obras de infraestrutura urbana e equipamentos sociais, vinculados
aos empreendimentos habitacionais. (RUBIN; BOLFE, 2014, p.208).
Oliveira (2011) evidencia que apesar de sua atuação expressiva, uma das carências do
plano foi não destinar recursos para apoiar a produção de moradias ou urbanização por
processos alternativos, incorporando o esforço próprio e a capacidade organizativa das
comunidades. Em consequência, ocorreu um intenso processo de urbanização informal, onde
as comunidades carentes auto empreenderam a casa própria em assentamentos urbanos
precários, distantes das áreas urbanizadas e deficientes de infraestrutura.
Mesmo com os avanços institucionais gerados por essa política, são várias as críticas
ao BNH. Borges (2011) destaca que apesar de significativa, a produção de moradias esteve
longe de suprir o déficit habitacional resultante do acelerado processo de urbanização. Outro
ponto relevante foi a incapacidade do BNH em atender a população de baixa renda. O banco
utilizou-se de critérios bancários, centrados em recursos retornáveis sem subsídios, excluindo
essa faixa de renda do atendimento dos projetos.
Para Bonduki (2014), a política habitacional do regime militar reforçou uma
característica já presente embrionariamente, na produção realizada pelos IAP e pela FCP no
período anterior: ao colocar em primeiro plano a produção massiva realizada por empreiteiras,
os projetos não levavam em conta aspectos culturais, ambientais e do contexto urbano,
reproduzindo à exaustão modelos padronizados.
Ainda segundo o autor, os conjuntos habitacionais edificados pelo BNH, localizavam-
se onde os terrenos fossem mais baratos, na zona rural ou nas franjas da área urbanizada. Essa
lógica contribuiu para acelerar o processo especulativo que prevaleceu no período, baseado na
extensão desmesurada dos perímetros urbanos, deixando espaços vazios entre a área
urbanizada e os novos assentamentos. Com isso, a política habitacional colaborou para
ampliar o padrão periférico de expansão urbana, reproduzindo um modelo urbano excludente
e especulativo, e como resultado gerou a formação em grande escala de bairros, com uma
54
expressiva concentração de moradias populares, mas carentes de mobilidade, equipamentos
sociais e, em alguns casos, até mesmo de infraestrutura urbana básica.
Com a crise e a recessão dos anos 80, os aportes dos recursos do FGTS tinham um
comportamento pró-cíclico, uma vez que se expandiam ou contraíam-se conforme as
características do ciclo econômico, e com o aumento do desemprego, aumentava também, a
demanda dos desempregados sobre o FGTS, e em consequência, comprometendo os recursos
para habitação, já que, a gestão dos depósitos desse fundo era gerida pelo BNH e os recursos
lastreados pelo FGTS. (OLIVEIRA, 2011, p.16).
Diante desse quadro inicia-se o período de declínio do BNH. Outros fatores que
também contribuíram para esse processo, segundo Borges (2011), foram o fato do SFH não
resistir à grave crise inflacionária vivenciada pelo Brasil, que levou a uma forte queda do
poder de compra do salário, principalmente da classe média, público que havia se tornado
alvo das políticas habitacionais desse sistema, a inadimplência dos mutuários e os constantes
casos de corrupção verificados ao longo da sua existência.
Além disso, como demonstram Rubin e Bolfe (2014) quando o BNH entrou em
declínio, as Companhias Estaduais de Habitação tiveram seus financiamentos restringidos
pelo governo central, a fim de diminuir o endividamento dos estados e municípios com a
União. Desse modo, elas passaram de agentes promotores e executores de obras para órgãos
assessores, diminuindo a capacidade de atuação dos estados e municípios na questão
habitacional.
Como descreve Ferreira (2009), em 1985 com o fim da ditadura militar, verificou-se
uma reestruturação no SFH e no BNH. Durante o primeiro ano do governo de José Sarney
(1986) houve uma tentativa de assegurar a permanência do sistema. Discutia-se desde a
descentralização do BNH até mudanças no sistema de financiamento. Dada à complexidade
da questão e falta de consenso sobre a reforma, em 21 de novembro de 1986 foi extinto o
Banco Nacional de Habitação. Suas atribuições foram incorporadas pela Caixa Econômica
Federal.
Política estadual de habitação no período anterior à Constituição de 1988
O objetivo aqui é apresentar alguns aspectos políticos, sociais e institucionais que
resultaram na atual configuração da política habitacional do Estado de Minas Gerais.
Segundo Drumond (2014), a primeira grande política habitacional no Brasil, decorre
do Regime Militar, com a instituição do Sistema Financeiro da Habitação e do Banco
55
Nacional de Habitação. Entre as estruturas para operacionalização desta política destacam-se
as Companhias Habitacionais criadas por diversos estados, como meio de implementar a
política elaborada em nível nacional.
A Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (COHAB-MG) foi criada pela
Lei n° 3.403 de 1965 com o objetivo de implementar as políticas de habitação no estado
destinadas às famílias de baixo rendimento. Segundo a COHAB-MG (2017) essa empresa de
economia mista foi instituída condicionada às normas estabelecidas pela Lei Federal n° 4.380
de 1964, que criou o Sistema Financeiro de Habitação e o Banco Nacional de Habitação. A
sua criação como uma sociedade de economia mista a transforma em um ponto chave de
interligação entre o governo estadual, a iniciativa privada e a sociedade civil.
De acordo com Drumond (2014), apesar de no âmbito federal a política habitacional
ter percorrido outros caminhos e desmantelado a estrutura criada no período do BNH, em
Minas Gerais a COHAB continuou desenvolvendo alguns projetos habitacionais, mesmo que
a partir de ações autônomas do estado e municípios e em um volume inferior ao período do
Regime Militar.
A autora ainda salienta o fato do estado de Minas Gerais mostrar seu pioneirismo, se
antecipando as mudanças institucionais que ocorreriam em nível federal com o fim do BNH,
caracterizadas pelo processo de descentralização das políticas sociais, que transferiu para os
estados e municípios a gestão dessas políticas. Tratava-se da criação, em 1982, de um órgão
colegiado para elaborar, coordenar, fiscalizar e executar a política habitacional no estado, o
Conselho Estadual de Política Urbana, incentivando a participação social. No entanto, este
conselho era subordinado diretamente ao governador.
1.2.2 Políticas Habitacionais Pós-Constituição de 1988
Propõe-se nesse segundo momento apresentar um panorama do quadro de
esvaziamento da política habitacional no país com a extinção do Banco Nacional de
Habitação em 1986. Também serão debatidas as ações realizadas durante os governos Itamar
Franco (1992-1995), Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), e a retomada da centralização
da política habitacional, a partir do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva, bem como seus
desdobramentos até os dias atuais. Além da política estadual de habitação em vigor nesse
período.
Conforme Bonduki (2014) o período pós- extinção do BNH se caracterizou pela
ausência de uma política federal de habitação e pelo surgimento de programas alternativos,
56
promovidos em geral, por administrações estaduais e municipais democráticas que
procuraram construir novos paradigmas de política urbana e habitacional. A retomada das
ações habitacionais em caráter nacional só ocorreria em 1995, durante o governo Fernando
Henrique Cardoso.
Nesse contexto, destaca-se também a promulgação da Constituição Federal de 1988,
que pela primeira vez dispõe sobre a política urbana, expressa nos artigos 182 e 183. Segundo
Brito (2007) os artigos trazem importantes modificações, como a descentralização, cabendo
agora ao poder público municipal a efetivação da política de desenvolvimento urbano, o Plano
Diretor como principal instrumento da política urbana e os parâmetros de função social da
cidade e da propriedade.
As transformações previstas na Constituição passaram a vigorar com a aprovação do
Estatuto da Cidade (2001) e se mostraram relevantes para a retomada da política de habitação
de forma centralizada a partir de 2005, onde se evidenciaria a necessidade de articulação entre
a política urbana e habitacional.
Além disso, conforme ressalta Shimbo (2012), nesse período se introduziu princípios
de mercado e abriram-se as portas para a centralidade da dinâmica privada na provisão
habitacional brasileira. Esse processo inicia-se com as ações engendradas pelo governo de
Fernando Henrique Cardoso e se efetiva a partir do governo Lula, tendo como principal
mecanismo o Programa Minha Casa Minha Vida
O período pós- BNH
No período pós-BNH segundo Ferreira (2009), o setor habitacional brasileiro se via
em uma situação complicada: por um lado tinha-se o enxugamento dos financiamentos, com o
intuito de recompor o Sistema Financeiro de Habitação do rombo provocado pelas reduções
das prestações na ditadura militar, por outro lado, a precariedade da situação de moradia da
população intensificava-se devido ao aumento da pobreza nas décadas de 1980 e 1990.
Silva (2013) salienta que com o fim do BNH a Caixa Econômica Federal torna-se o
agente do governo no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação, no qual a regulação do
crédito habitacional ficaria a cargo do Conselho Monetário Nacional (CMN), tornando-se
assim a política urbana, pelo menos no que diz respeito ao financiamento habitacional, um
instrumento do governo de política monetária, o que de certa forma teria levado a um controle
mais rígido de crédito, dificultando e limitando a produção habitacional.
57
Neste processo emerge a Constituição Federal de 1988. Para Borges (2011) ela
redefine as competências entre os entes federados, atribuindo aos estados e municípios grande
parte das políticas sociais, dentre elas a habitação. Na política habitacional ocorreu uma
lacuna em relação ao enfrentamento da problemática, o que foi executado a partir do processo
de descentralização é decorrente da ação de alguns estados e municípios que propõem suas
próprias medidas de enfrentamento da demanda por moradias.
Conforme acrescentam Bonduki (2008) e Borges (2011) nesse período emergiram
programas de urbanização de favelas e loteamentos periféricos realizados juntamente com
movimentos sociais, além de projetos de construção por mutirão, que inauguram uma nova
postura de enfrentamento à problemática habitacional. Essa foi uma fase de atomização de
experiências com grande heterogeneidade, marcada pela diversidade de iniciativas, mas pouco
articulada em decorrência da ausência de uma política nacional.
Para Silva (2013) esse período também se caracteriza como sendo um momento de
atribulado processo institucional com diversas mudanças ministeriais de responsabilidades da
formulação e execução das políticas urbanas, além da própria implementação de medidas
liberalizantes de política econômica, o que reverbera de forma acentuada no papel do estado
enquanto promotor de políticas sociais, passando a prevalecer às soluções de mercado.
A questão da habitação nos governos Sarney, Collor e Itamar Franco (1985-1994)
Conforme Soares (2007), diante do quadro de crescimento desordenado das cidades e
aumento do déficit habitacional na década de 1980, durante o governo de José Sarney (1985-
1989) as ações voltadas para o setor habitacional, ligaram-se a Secretaria Especial de Ação
Comunitária, que influenciada por iniciativas internacionais, criou programas nacionais de
mutirões para construção de moradia, voltados para população com renda inferior a 3 salários
mínimos.
A autora ressalta que já no final da década de 1980 e primeiros anos da década de
1990, tornou-se crescente e notória a presença de diretrizes de organismos financiadores
internacionais nas intervenções urbanas e no financiamento de programas habitacionais, a
exemplo do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, dotados de um
grande poder de influência e decisão nas parcerias travadas com instituições nacionais.
Para Almeida (2011) os investimentos do Programa Nacional de Mutirões tiveram o
mérito de atender uma faixa da população que vinha sendo negligenciada pelas ações
58
engendradas no setor habitacional. Por outro lado, contribuíram para o enfraquecimento das
COHAB e INOCOOP, que tiveram seus financiamentos restringidos pelo governo federal sob
a justificativa de contribuir para a redução do endividamento dos estados e municípios com a
União.
De acordo com Silva (2013) no que diz respeito ao aparato estatal institucional, o
governo Sarney cria o Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, que
concentra as responsabilidades antes do Ministério do Interior, Banco Nacional de Habitação
e do Departamento Nacional de Obras de Saneamento. Por meio dessa nova estrutura
acreditava-se que seria possível dar um novo direcionamento para a política urbana no país,
com a reestruturação do Sistema Financeiro de Habitação.
Entretanto, como aponta Bonduki (2008), ocorreram sucessivas modificações no setor
do governo federal responsável pela gestão da política habitacional, que durante esse período
esteve subordinado a sete ministérios ou estruturas administrativas diferentes, caracterizando
descontinuidade e ausência de estratégia para enfrentar o problema.
Segundo Borges (2011) ao fim do processo Constitucional de 1988, ocorrem às
eleições para o governo federal, que passa a ser administrado pelo presidente Fernando Collor
de Mello, no período entre 1990 e 1994. Entretanto, as denúncias de corrupção levaram ao
impeachment do presidente em 1992, assumindo o vice-presidente Itamar Franco.
Ferreira (2009) evidencia que com o início do governo Collor, os principais programas
habitacionais passaram para o controle do Ministério da Ação Social. As mudanças no
Sistema Financeiro de Habitação não foram eficazes, tendo piorado a situação da população
de baixa e média renda. O principal programa habitacional realizado nesse período foi o Plano
de Ação Imediata para Habitação (PAIH), que era um plano de cunho social cujos
financiamentos estavam centralizados na Caixa Econômica Federal.
Conforme explicam Almeida (2011) e Ferreira (2009) o PAIH previa a construção
emergencial de 245 mil unidades habitacionais em um período de 180 dias, para famílias com
renda até 5 salários mínimos, através da contratação de empreiteiras privadas, mostrando uma
inclinação do governo à privatização do setor. O programa não cumpriu suas metas de prazo,
e a quantidade de unidades construídas foi inferior ao objetivo inicial. As unidades produzidas
apresentavam baixa qualidade, sendo edificadas em áreas desprovidas de infraestrutura urbana
e saneamento básico, os quais eram responsabilidade das prefeituras. Como resultado tem-se
inúmeros imóveis produzidos sem valor de comercialização, ou até mesmo abandonados.
59
Silva (2013) salienta que nesse período houve a desvinculação entre os programas
habitacionais e os de saneamento e desenvolvimento urbano, falta de controle sobre a
qualidade das moradias construídas e irresponsabilidades na gestão das fontes de recursos, em
especial do FGTS. A utilização predatória dos recursos do FGTS, onde se efetivaram
empréstimos superiores à disponibilidade efetiva do fundo, comprometeu o orçamento para
novas operações e financiamentos nos anos seguintes.
Após o impeachment de Fernando Collor assumiu a presidência da república em 1992,
Itamar Franco. Como mostra Ferreira (2009) nesse período foram criados dois programas
habitacionais, Habitar Brasil desenvolvido para cidades grandes e médias, e o Morar
Município, desenvolvido para cidades pequenas.
Estes programas utilizaram recursos oriundos do Orçamento Geral da União (OGU)
e do Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF). Os dois
programas juntos financiaram entre 1993 e 1994, 54 mil unidades habitacionais para
famílias que recebiam até 3 salários mínimos. Entretanto, os investimentos
realizados pelos programas ficaram abaixo das expectativas devido ao
contingenciamento dos recursos imposto pelo Plano Real. (FERREIRA, 2009, p.26).
Nesse momento como enfatiza Borges (2011) a gestão das políticas públicas na área
de habitação sofreu consideráveis alterações. Os programas na área de habitação popular,
agora sob o comando do Ministério do Bem-Estar Social, foram redesenhados e passaram a
exigir a participação de conselhos comunitários dos governos locais e uma contrapartida
financeira dos mesmos aos investimentos da União.
Ao estabelecer esse processo de descentralização, de acordo com Soares (2007), o
mesmo passou a ser utilizado como um instrumento de estímulo nas investidas
governamentais na busca pela manutenção de parcerias com bancos internacionais, tendo em
vista que essas medidas estão presentes na regulamentação do Fundo Monetário Internacional
(FMI), passando a se integrar à plataforma política do governo e a serem aplicadas de forma a
atender os princípios do mesmo.
Além disso, conforme mostra Silva (2013) ocorreu a utilização sem critérios de
recursos do FGTS, fazendo com que a própria existência do fundo fosse comprometida,
chegando ao limite de cessar os empréstimos no período entre 1992 e 1994, o que demonstra
evidente falta de lucidez sobre os rumos a serem dados em longo prazo por parte dos
governos sobre a política habitacional brasileira.
60
Política habitacional no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)
Segundo Rubin e Bolfe (2014), com a posse de Fernando Henrique Cardoso em 1995,
do ponto de vista da problemática habitacional no país, ocorre a retomada dos financiamentos
de habitação e saneamento com base nos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS). Novos referenciais como flexibilidade, descentralização e diversidade foram
adotados, rejeitando programas convencionais que tinham como base a construção de grandes
conjuntos habitacionais.
Para Silva (2013) esse governo pode ser entendido como a consolidação do modelo
neoliberal sobre o direcionamento da política econômica brasileira, ficando a política social a
mais dilapidada no sentido de uma adequação ao modelo, uma vez que, para atingir os
objetivos impostos pelo Banco Mundial e seus organismos multilaterais, o governo FHC
implanta diversos ajustes institucionais para obter empréstimos e assim atingir o receituário
liberal de austeridade fiscal.
Nesse período, conforme aponta Oliveira (2011) ocorreu a implementação de um
programa abrangente de descentralização das políticas sociais, que transferiu para os estados e
municípios grande parte das funções de gestão dessas políticas. A descentralização da
autoridade para alocação dos recursos se combinava um endurecimento das exigências para
obtenção de empréstimos federais, as empresas públicas estatais ou municipais deveriam
comprovar capacidade de endividamento, exigindo por parte delas contenção do seu déficit
público.
De acordo com Cardoso (2003), dentro do campo da política habitacional extingue-se
o Ministério do Bem-Estar Social e cria-se a Secretaria de Política Urbana (SEPURB), tendo
como vínculo institucional o Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), o que torna a
política social urbana atrelada à lógica de um ministério que busca essencialmente contenção
de gastos para gerar superávits fiscais.
Ainda do ponto de vista institucional, como mostra Ferreira (2009), foi criado em
1997, o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), criado para complementar o Sistema
Financeiro de Habitação. O SFI introduziu inovações no mercado imobiliário brasileiro, tendo
como objetivos; diminuir a intervenção estatal, aumentar a flexibilização dos financiamentos
imobiliários, estimular o crédito imobiliário e incentivar novos empreendimentos
habitacionais.
Conforme Bonduki (2008) a maior parte dos financiamentos ocorridos neste período
foram com a utilização dos recursos do FGTS. Dentre os programas criados por FHC pode-se
61
citar; a Carta de Crédito Individual, a Carta de Crédito Associativo, voltados à pessoa física,
Habitar Brasil e o Pró-Moradia que visavam à urbanização de áreas precárias. Para o setor
privado pode-se citar o Programa de Apoio à Produção. Em 1999 é criado o Programa de
Arrendamento Residencial (PAR).
Como explica Silva (2013), os programas de Carta de Crédito implicam concessão de
financiamento diretamente à pessoa física com renda mensal de até 12 salários mínimos. Os
programas eram operados pela Caixa Econômica Federal. A Carta de Crédito Associativa
previa a destinação de recursos para associações, cooperativas, companhias de habitação ou
entidades privadas, voltadas para a produção habitacional. No caso do programa Carta de
Crédito Individual para se candidatar o mutuário precisaria ser optante do FGTS, atender aos
critérios de enquadramento no público-alvo dos programas e comprovar não propriedade de
imóvel.
Os programas Pró-Moradia e Habitar Brasil são destinados a estados e municípios
que apresentam projetos às instâncias federais, que decidem a aprovação ou não do
financiamento conforme critérios de qualidade técnica do projeto, disponibilidade de
recursos e adequação aos objetivos do programa. Estes programas visam à melhoria
de assentamentos precários que necessitem de urbanização e regularização fundiária,
e são destinados a populações com renda inferior a três salários mínimos. O
Programa Pró-Moradia era financiado pelo FGTS e o Habitar Brasil com recursos do
Orçamento Geral da União. (BORGES, 2011, p.52).
Almeida (2011) salienta que os problemas econômicos enfrentados pelo país a partir
1998, fizeram reduzir drasticamente o volume de operações realizadas pelo programa Pró-
Moradia, principalmente pela dificuldade de municípios e estados fazerem face às
contrapartidas exigidas pelo mesmo, de modo que a execução do programa ficou muito
abaixo das metas estabelecidas pelo governo federal.
O programa Habitar Brasil de acordo com Carmo (2006) apresenta a maior quantidade
de intervenções da era FHC. Sofreu desaquecimento a partir de 1998, devido à situação fiscal
do governo, e por alterações no programa, que a partir de então, contava com uma nova fonte
de financiamento, por meio de um convênio firmado com o Banco Interamericano de
Desenvolvimento. Essa segunda fase do Habitar Brasil teve desempenho bastante modesto na
produção de unidades habitacionais. Por sua vez, o Programa de Apoio à Produção
Habitacional direcionado ao setor privado, teve um desempenho pouco expressivo.
62
Em 1999 foi criado o Programa de Arrendamento Residencial (PAR) que funciona
por meio de uma operação financeira chamada arrendamento mercantil, em que o
imóvel é de propriedade fiduciária da Caixa Econômica Federal, e o arrendatário
paga uma taxa de arrendamento mensal por um período de 15 anos até tornar-se
proprietário do imóvel. O programa estava voltado ao atendimento das capitais
estaduais e suas regiões metropolitanas, bem como os centros urbanos de grande
porte, e destinava-se para famílias com renda mensal entre 4 e 6 salários mínimos.
Sua fonte de financiamento era o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), o
qual por sua vez foi constituído por outros fundos e teve como principal fonte
primária o FGTS. (BORGES, 2011, p.51).
Maricato (2012) critica o fato da política habitacional no Brasil nesse período, ter por
suposto básico contribuir para a dinamização da economia, com programas habitacionais
descontextualizados e constituídos à revelia das reais necessidades da população de baixa
renda. Parece não ter sido objetivo da política habitacional, ampliar os espaços da cidadania e
garantir o pleno direito à habitabilidade, uma vez que aumentou o déficit habitacional para as
camadas de menor renda.
Para Valença (2001), os governos FHC podem ser avaliados como sendo de
priorização de soluções de mercado, limitando-se a alocar recursos do FGTS somente nos
requisitos legais, no entanto, sem que isso reverberasse nas reais necessidades dos
trabalhadores. Isso fez com que a população, sobretudo de baixa renda, tivesse como solução
imediata a autoconstrução de moradias. Desse modo o estado se ausentou de suas
responsabilidades quanto à promoção de políticas habitacionais para essa população.
É importante enfatizar que a conjuntura neste período é marcada por ações de
macroeconomia em continuidade às políticas neoliberais iniciadas no governo
anterior, centradas no ajuste fiscal. O ajuste fiscal consolidou-se como principal
obstáculo à realização de investimentos voltados para a urbanização e a produção de
moradias destinadas ao atendimento desse segmento. (BONDUKI, 2008, p.81).
No final do governo FHC foi aprovado o Estatuto da Cidade, que traz os princípios de
função social da cidade e da propriedade, constituindo um marco importante a ser considerado
no enfrentamento da problemática habitacional no país.
Política Habitacional no governo Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010)
Segundo Shimbo (2012) paralelamente à implementação da política habitacional de
FHC, foi elaborado o Projeto Moradia a partir de uma iniciativa do Instituto Cidadania,
coordenada por Luiz Inácio Lula da Silva, então candidato à Presidência da República pelo
Partido dos Trabalhadores (PT).
63
O Projeto Moradia tinha como um de seus pressupostos a ampliação do mercado
formal para os setores de renda média e média baixa, a serem atendidos com
recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) e do Sistema
Financeiro Imobiliário (SFI), na perspectiva de se liberarem os recursos do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para as classes de renda mais baixas.
(SHIMBO, 2012, p.38).
Conforme Drumond (2014), em 2002 o governo do então presidente eleito Luiz Inácio
Lula da Silva, buscou a partir do que foi possibilitado pelo Projeto Moradia, desenvolver uma
nova política urbana e habitacional no Brasil, sobretudo a partir da criação do Ministério das
Cidades em 2003. O Ministério das cidades passa a ser responsável pela Política de
Desenvolvimento Urbano, reunindo áreas de habitação, saneamento, mobilidade urbana e a
política de ordenamento territorial.
Moreira (2013) ressalta que a criação do Ministério das Cidades definiu a
responsabilidade de elaborar, de maneira participativa e federativa, a Política Nacional de
Desenvolvimento Urbano (PNDU), incluindo uma nova política para o setor da habitação, em
particular da Habitação de Interesse Social.
De acordo com Ferreira (2009) em 2004, o governo federal lançou a Política Nacional
de Habitação (PNH), que tem por finalidade orientar as ações dos órgãos e entidades, dos
diferentes níveis de governo, na área habitacional, em uma ação compartilhada com o setor
privado, de modo a garantir à população brasileira acesso à moradia adequada, com
urbanização e integrada à cidade, principalmente para a população de baixa renda.
Em conformidade com o que foi definido na Política Nacional de Habitação (2004)
ressalta-se que a mesma apresenta como objetivos: universalizar o acesso à moradia digna;
promover a urbanização, regularização e inserção dos assentamentos precários à cidade;
fortalecer o papel do Estado na gestão da política e na regulação dos agentes privados; tornar
a questão habitacional uma prioridade nacional, integrando, articulando e mobilizando os
diferentes níveis de governo e fontes objetivando potencializar a capacidade de investimentos
com vistas a viabilizar recursos para sustentabilidade da PNH; democratizar o acesso à terra
urbanizada e ao mercado secundário de imóveis; ampliar a produtividade e melhorar a
qualidade na produção habitacional e incentivar a geração de empregos e renda dinamizando a
economia.
Entre os princípios norteadores definidos para a Política Nacional de Habitação,
merecem destaque: moradia digna como direito e vetor de inclusão social; função
social da propriedade urbana, buscando implantar instrumentos de reforma urbana
64
para combater a especulação e garantir o acesso à terra urbanizada; questão
habitacional como uma política de estado, ou seja, o poder público como agente
indispensável na regulação urbana e do mercado imobiliário, na provisão de
moradias e na regularização de assentamentos precários; gestão democrática com a
participação de variados segmentos sociais e articulação das ações habitacionais à
política urbana.(AGUIAR, 2008,p.83).
Ferreira (2009) salienta que essa política previu a organização de um Sistema Nacional
de Habitação (SNH). Esse sistema é o principal instrumento da PNH, estabelecendo suas
bases institucionais e a articulação financeira, com o propósito de reduzir o déficit
habitacional, para isso conta com a integração entre a união, os estados, e municípios, agindo
de modo integrado evitando o desperdício de recursos e a fragmentação de programas e
projetos. Além disso, o SNH promove a integração entre a política habitacional e as políticas
de planejamento territorial, fundiária e de saneamento, coordenada pelo Ministério das
Cidades.
O SNH é dividido em dois subsistemas: o Subsistema de Habitação de Interesse Social
e o Subsistema de Mercado. Como explica Silva (2013) o Subsistema de Habitação de
Interesse Social busca direcionar os recursos públicos unicamente para subsidiar a população
de menor renda (1 a 3 salários mínimos). Enquanto o Subsistema de Mercado teria como
objetivo impulsionar o volume de recursos para o mercado privado de crédito habitacional
com vistas a elevar a captação de recursos via mercado, e com isso, promover o setor
imobiliário brasileiro.
Ainda conforme Silva (2013) com a implantação do SHIS é desenvolvido uma nova
estrutura institucional que estabelece a criação de um Fundo Nacional de Habitação de
Interesse Social (FNHIS), que centraliza e articula recursos de fontes distintas a fim de
viabilizar a melhor gestão do financiamento da habitação de interesse social.
Almeida (2011) acrescenta que o FNHIS conta com recursos do Fundo de Apoio ao
Desenvolvimento Social (FADS), dotações do Orçamento Geral da União (OGU),
contribuições e doações, receitas de alienação de imóveis da União, receitas de operações
realizadas com recursos do FNHIS, e outros recursos que lhe vierem a ser destinados.
A aplicação dos recursos é descentralizada em ações vinculadas aos programas de
habitação de interesse social realizados pelos estados, municípios e Distrito Federal.
Os programas financiados pelo FNHIS são:
Urbanização, Regularização e Integração de Assentamentos Precários: direcionado a
melhorar as condições de habitabilidade de assentamentos precários, por meio da
urbanização e regularização fundiária, bem como a integração dos mesmos à cidade.
65
Habitação de Interesse Social: objetiva viabilizar o acesso à moradia adequada para
a população com renda familiar mensal de até 3 salários mínimos em localidades
urbanas ou rurais.
Planos Habitacionais de Interesse Social: envolve ações de apoio aos municípios na
elaboração de seus Planos Locais de Habitação de Interesse Social.
Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social: busca oferecer consultorias
e serviços técnicos voltados à produção de habitações.
Produção Social da Moradia: visa realizar repasses do OGU às entidades sem fins
lucrativos vinculadas ao setor habitacional, a fim de promover ações integradas que
viabilize o acesso a moradia às famílias de baixa renda. (ALMEIDA, 2011, p.127).
A Política Nacional de Habitação (2004) estabelece atribuições para os agentes
operadores do Sistema Nacional de Habitação. Nesse sentido destaca-se a atuação da Caixa
Econômica Federal. A Caixa continua sendo o agente operador do FGTS, contudo passou a
assumir o papel de agente operador do Fundo Nacional de Habitação e a definir os
procedimentos operacionais necessários à aplicação dos recursos do Fundo, com base em
normas e diretrizes elaboradas pelo Ministério das Cidades.
Para terem acesso aos recursos do FNHIS destinados aos programas de habitação de
interesse social, estados, Distrito Federal e municípios devem atender a diversos requisitos
como aponta Aguiar (2008): constituir um Fundo Habitacional de Interesse Social, com
dotação orçamentária própria, destinado a implantar a política de habitação; formalizar adesão
ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social; criar um Conselho Gestor para o
FNHIS, elaborar o Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS) e elaborar relatórios
de gestão.
Como define Oliveira (2011), o Plano Local de Habitação de Interesse Social é um
conjunto articulado de diretrizes, objetivos, metas, ações e indicadores que caracterizam os
instrumentos de planejamento e a gestão habitacional. A partir de sua elaboração é que
municípios e estados consolidam, em nível local, a Política Nacional de Habitação, de forma
participativa e compatível com outros instrumentos de planejamento local, como os Planos
Diretores, quando existentes e os Planos Plurianuais Locais.
Em relação aos programas desenvolvidos no âmbito do governo Lula, Silva (2013)
afirma que nos anos de 2003 e 2004 foram mantidos ou reformulados programas criados na
gestão FHC, agora atrelados ao Ministério das Cidades: Programa de Arrendamento
Residencial (PAR), Carta de Crédito Associativo, Habitar Brasil, Pró-Moradia, além da
criação de um novo programa: Programa Crédito Solidário. Já entre os anos 2005 a 2008
foram criados: Programa de Ação Provisão Habitacional de Interesse Social; Programa
66
Urbanização, Regulamentação e Integração de Assentamentos Precários e Ação de Apoio à
Produção Social da Moradia.
Programa Crédito Solidário: tem como objetivo o financiamento habitacional para
famílias de baixa renda organizadas em associações, cooperativas, sindicatos ou
entidades da sociedade civil organizada. O programa é financiado com recursos do
Fundo de Desenvolvimento Social.
Programa de Ação Provisão Habitacional de Interesse Social: tem por objetivo
proporcionar habitação digna a população de baixa renda em área urbana ou rural. O
programa é financiado com recursos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse
Social.
Programa Urbanização, Regulamentação e Integração de Assentamentos Precários:
tem como objetivo apoiar as unidades da federação no que tange a regularização
fundiária, segurança, salubridade e habitabilidade para população que habita áreas
inadequadas ou em situações de risco. O programa é destinado para famílias de
baixa renda e financiado com recursos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse
Social.
Programa Ação de Apoio à Produção Social da Moradia: tem por objetivo apoiar
entidades privadas sem fins lucrativos, vinculadas ao setor habitacional, no
desenvolvimento de ações integradas e articuladas que resultem em acesso à
moradia digna, situada em localidades urbanas ou rurais, voltada para famílias de
baixa renda. O programa é financiado com recursos do Fundo Nacional de
Habitação de Interesse Social. (FERREIRA, 2009, p.43-58).
Segundo Rubin e Bolfe (2014), foi anunciada pelo Governo Federal a implantação do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em 2007, que traria investimentos em várias
áreas como infraestrutura, transporte, os setores de habitação, saneamento e a urbanização de
assentamentos precários. No seu desenho estavam previstas parcerias entre os setores públicos
e privado, além da articulação entre os poderes públicos estaduais e municipais.
Almeida (2011) evidencia que a crise financeira internacional, acirrada em 2008,
provocou redução de crédito, afetando os investimentos e a economia de diversos países. O
governo brasileiro lançou mão de algumas medidas no intuito de reduzir os impactos
negativos dessa crise no país e, como os setores da construção civil e infraestrutura
desempenham papel expressivo na geração de emprego e renda, com forte capacidade
anticíclica, foram alvo dessas medidas através do Programa Minha Casa Minha Vida.
Conforme Silva (2013) o Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) foi criado em
2009, pela Lei 11.997, tendo com finalidade em sua primeira fase, a concessão de
financiamento para construção de 1 milhão de unidades habitacionais, para famílias com
renda mensal de até 10 salários mínimos. O intuito era reduzir o déficit habitacional brasileiro
em 14%, além da geração de emprego e renda.
Moreira (2013) enumera como metas do PMCMV: redução significativa do déficit
habitacional brasileiro; favorecimento da regularização fundiária urbana; criação de fonte de
67
demanda de capital e trabalho como medida anticíclica civil, e aumento do investimento na
construção. A operacionalização do programa ficou a cargo da Caixa Econômica Federal,
tendo como fonte de recursos o Orçamento Geral da União, o Fundo de Garantia por Tempo
de Serviço e o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDS).
O caderno do Programa Minha Casa Minha Vida (2009) aponta que o mesmo abrange
as capitais estaduais e suas regiões metropolitanas, as regiões metropolitanas de Campinas e
da Baixada Santista em São Paulo, o Distrito Federal e municípios com população igual ou
superior a 50 mil habitantes. São priorizados estados e municípios que oferecem maior
retorno financeiro, que possuam maior infraestrutura, maior quantidade de terrenos
adequados, desoneração fiscal, menor valor na aquisição de unidades habitacionais e regiões
que receberam impacto de grandes investimentos de infraestrutura.
O Programa Minha Casa Minha Vida compreende dois grandes programas: o
Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU) e o Programa Nacional de
Habitação Rural (PNHR). O PNHU é destinado para população urbana, que busca
adquirir unidade residencial e possua renda de até dez salários mínimos. Utiliza
recursos do FGTS. Já o PNHR tem como objetivo subsidiar a população rural que
tenha como propósito a construção na área rural, por meio da aquisição de materiais
de construção. Nesse programa a renda familiar anual deve ser limitada a dez mil
reais. Este programa emprega recursos do OGU. O PNHU divide-se em dois
segmentos, o de baixa renda e o segmento econômico. O segmento de baixa renda
compreende a faixa de renda entre 0 e 3 salários mínimos. O financiamento dessas
moradias deriva do OGU e do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). O
segmento econômico abrange a população que recebe até 10 salários mínimos. É
gerido usando recursos de fundos não onerosos e do FGTS. (SILVA, 2003, p.95-96).
Outra modalidade do programa como cita Borges (2011) é o Programa Minha Casa
Minha Vida Entidades com o objetivo de tornar acessível à moradia para população cuja
renda familiar bruta não ultrapasse R$ 1.395,00, organizadas em cooperativas habitacionais
ou mistas, associações e demais entidades privadas sem fins lucrativos, visando à produção e
aquisição de novas habitações.
Andrade (2012) e Silva (2013) ressaltam que as famílias elegíveis ao PMCMV são
divididas em três faixas de renda: a Faixa 1 corresponde a beneficiários com renda entre zero
e três salários mínimos, a Faixa 2 famílias com renda de três a seis salários mínimos e a Faixa
3 de seis a dez salários mínimos. O maior montante de recursos foi direcionado para o
segmento de baixa renda, contemplados pela Faixa 1.
Borges (2011) ressalta que a operacionalização programa em relação às famílias
beneficiárias apresenta diretrizes específicas para cada faixa de renda. No Faixa 1 recebem
68
subsídio integral, as prestações podem comprometer 10% da renda familiar por 10 anos, tendo
prioridade famílias chefiadas por mulheres, com idosos ou pessoas portadoras de deficiência.
Na Faixa 2 ocorre o aumento do subsídio em financiamento do FGTS, podendo comprometer
20% da renda para pagamento das prestações e refinanciamento das parcelas em caso de
perda da renda familiar. Na Faixa 3 há um estímulo para aquisição da casa própria, com
redução de custos do seguro, dos custos de registro de imóveis e refinanciamento da parcela
em caso de perda de renda.
De acordo com Almeida (2012), no PMCMV, estados e municípios tem como
atribuição o cadastro e seleção das famílias beneficiadas. A produção de moradias é de
responsabilidade das construtoras ou incorporadoras contratadas pela Caixa Econômica
Federal, sendo de responsabilidade das mesmas entregar as residências concluídas e
legalizadas. Até a entrega do imóvel e posterior pagamento do mutuário, o imóvel integra o
patrimônio do Fundo de Arrendamento Residencial.
O Programa minha Casa Minha Vida é a representação da tendência crescente que a
política habitacional no Brasil vem imprimindo nas últimas décadas, uma tendência
de redução da intervenção direta dos agentes públicos no processo de provisão
habitacional, diferente da intervenção do BNH. Com a extinção do BNH, as
políticas habitacionais iniciaram um processo de estímulo aos agentes não públicos
como o setor privado, as comunidades, os movimentos sociais e as organizações não
governamentais. Essa tendência se relaciona diretamente com a inserção das
políticas de corte neoliberal iniciadas na década de 1990, aliado ao processo de
globalização e a necessidade de um mercado que requer um Estado cada vez com
menor intervenção e flexível. (BORGES, 2011, p.63).
Como acrescenta Ferreira (2009) com o PMCMV o governo ainda permitiu maior
abertura ao capital financeiro internacional, uma vez que as grandes empresas da construção
civil participaram do movimento especulativo ocorrido nos últimos anos na bolsa de valores e
se fortaleceram com grandes aportes de capital estrangeiro.
O PMCMV recebeu muitas críticas do ponto de vista de sua materialização nos
diversos contextos urbanos, por todo território nacional. Cardoso, Aragão e Araújo (2011)
apontam o fato do modelo utilizado no programa promover uma periferização das
intervenções habitacionais na cidade, uma vez que as construtoras visando maior
lucratividade buscam por terrenos mais baratos para a construção dos conjuntos habitacionais,
que tendem a se localizar nas franjas urbanas.
69
Além disso, para os autores, características como diferenças regionais na dinâmica
econômica, tamanho do grupo familiar, aspectos culturais e novas possibilidades de inovações
tecnológicas são ignorados nesse tipo de política, que tende a reproduzir indiscriminadamente
tipologias e processos construtivos de forma homogênea. No terceiro momento dessa pesquisa
será realizada uma análise mais aprofundada do Programa Minha Casa Minha Vida e da
produção do espaço urbano via política habitacional de interesse social.
Para Borges (2011) a política habitacional implementada no governo Lula parece
caminhar na ambivalência, do agente público que planeja, elabora, e também no crescimento
da atuação dos agentes não-públicos com intervenção direta na política habitacional. Os
avanços obtidos nesse período referem-se ao fortalecimento institucional e a aspectos como a
abordagem integrada entre a política habitacional e a política de desenvolvimento urbano; a
articulação entre os três níveis de poder, a adoção de um modelo descentralizado na aplicação
dos recursos e o forte investimento financeiro nos programas de habitação, principalmente, de
interesse social.
Política Habitacional no governo Dilma Rousseff (2011-2016) e conjectura atual
De acordo com Andrade (2012) em 2011, sob o governo da presidente Dilma
Rousseff, teve início à segunda fase do Programa Minha Casa Minha Vida. Ocorreram
mudanças no que diz respeito, ao montante de recursos dirigidos ao Programa que aumentou,
assim como o número de unidades residenciais a serem contratadas, no caso 2 milhões de
moradias. Os preços-teto dos imóveis abrangidos também foram modificados e as cidades
com população inferior a cem mil habitantes e superiores à cinquenta mil habitantes passaram
a ser atendidas. Esse governo dá continuidade, portanto, às ações engendradas no governo
Lula.
Segundo o autor a fase 2 do Programa Minha Casa Minha Vida continua sendo
dividida em faixas de renda, mas agora são balizadas por valores absolutos em reais. Na Faixa
1 estão famílias com renda até R$ 1.600,00; na Faixa 2 a renda varia entre R$ 1.600,00 e R$
3.100,00 e na Faixa 3 de R$ 3.100,00 a R$ 5.000,00. Também aconteceram alterações no
preço-teto dos imóveis abrangidos pelo programa. Nas regiões metropolitanas o valor
aumentou de R$ 52 mil para R$ 65 mil, nas cidades com mais de 100 mil habitantes, de R$ 37
mil para R$ 57 mil e nas cidades de 50 a 100 mil habitantes, de R$ 37 mil para R$ 51 mil.
Além disso, estabeleceram-se mudanças nas especificações técnicas dos apartamentos,
e a destinação de três por cento das unidades de cada empreendimento para deficientes físicos,
70
sendo que essas moradias devem ser adaptadas. Visando-se dar maior dinamismo aos
processos de contratação, assinaturas de financiamentos e repasses bancários, o Programa
Minha Casa Minha Vida 2 contou com a entrada do Banco do Brasil na qualidade de gestor
operacional ao lado da CEF.
Conforme Rolnik (2016), já no segundo mandato de Dilma Rousseff estava previsto o
lançamento da terceira fase do Programa que previa a contratação de 3 milhões de moradias.
Nessa etapa ocorreram modificações no Programa Minha Casa Minha Vida, no caso, a criação
da Faixa de renda intermediária 1,5, para famílias com renda de até R$ 2.350,00 por mês.
Essa Faixa funcionaria como hoje funciona a Faixa 2 do Programa, ou seja, os beneficiários
devem comprovar que podem suportar o pagamento de um crédito bancário, porém o subsídio
é maior para a faixa 1,5.
Segundo o Ministério das Cidades (2016) os juros dos beneficiários do programa nas
Faixas 2 e 3 também foram alterados, antes variavam de 5% a 7,16%, ao ano, dependendo da
renda familiar bruta, subiram para entre 6% e 8%. Já a nova faixa criada pelo governo terá
juros de 5% ao ano. Na Faixa 1 os beneficiários continuam isentos de juros. Outra mudança
diz respeito aos limites do valor da prestação na Faixa 1 do programa. Antes os beneficiários
poderiam comprometer somente 5% do seu salário no pagamento da parcela do
financiamento. Agora as famílias deverão destinar 10% do que recebem no pagamento da
prestação.
Dentro de um cenário de crise política que culmina com o processo de impeachment
da Presidente Dilma Rousseff, o que se vislumbra para o Programa Minha Casa Minha Vida
no governo Michel Temer, como aponta Rolnik (2016) é a proposta de consolidação da Faixa
de renda 1,5, um número inferior de contratações em relação à meta inicial para a fase 3 do
programa, somado a impossibilidade de se utilizar recursos do FGTS como aporte de recursos
para o mesmo.
Cabe ressaltar que embora haja uma nova oferta de mercado para faixa de renda 1,5, o
déficit habitacional persiste para os segmentos de baixa renda atendidos pela Faixa 1 do
programa, onde deveriam se concentrar o maior montante de recursos que agora encontra-se
comprometidos pelos cortes de gastos estabelecidos pelo governo com o ajuste fiscal e com o
fim dos subsídios a fundo perdido.
Diante desse contexto, cabe destacar que as mudanças ocorridas no Programa Minha
Casa Minha Vida no governo Temer, retomam a política do Banco Nacional de Habitação que
deixa de priorizar o atendimento das famílias de baixa renda e a restringir o acesso à moradia
71
para aqueles que tenham capacidade de crédito imobiliário. Esta opção política terá como
possíveis consequências o agravamento da crise urbana e dos conflitos sociais.
Política estadual de habitação no período Pós-Constituição de 1988
De acordo com Drumond (2014) nos anos 1980, a lacuna deixada pela união em
relação às políticas habitacionais força os estados e municípios a buscarem formas próprias
para atuação. Neste contexto, mais precisamente em 1992, em Minas Gerais é criada a
Secretaria de Estado de Habitação e de Desenvolvimento Urbano (SEHADU), cuja função era
planejar, coordenar e executar as atividades relativas à habitação e ao desenvolvimento
urbano.
Dentre os programas elaborados em Minas Gerais nesse período, destacam-se: o
Programa de Habitação Popular de Minas Gerais (PROHAB), o Programa Minas
Mais Humana ou Pró-lar, o Programa de Financiamentos Individuais Isolados
(FINIS) e o Programa Mineiro de Apoio e Orientação Técnica à Reforma e Melhoria
de Moradias (PROMORAR). (DRUMOND, 2014, p.37).
Segundo o Decreto nº 33.476 de 02 de abril de 1992, que institui o Programa de
Habitação Popular de Minas Gerais, o mesmo teve como objetivo principal o estímulo à
construção de casas para as famílias de renda igual ou inferior a cinco salários mínimos, por
meio de financiamentos. As modalidades do programa eram: aquisição de casa própria,
aquisição de lote e simultânea construção; término, ampliação e reforma de habitação; e
construção de conjuntos habitacionais.
O Minas Mais Humana ou Pró-lar era destinado à construção de moradias para
famílias com rendimento de até três salários mínimos, em parceria com os
municípios e a Caixa Econômica Federal (CEF). O Programa de Financiamentos
Individuais Isolados ou FINIS utiliza recursos próprios da COHAB/MG para
financiar famílias na aquisição ou construção de residência própria. O Programa
Mineiro de Apoio e Orientação Técnica à Reforma e Melhoria de Moradias
(PROMORAR) era coordenado pela SEHADU e tinha por objetivo fornecer
assistência técnica gratuita às famílias de baixa renda na construção, reforma ou
melhoria de suas moradias. (DRUMOND, 2014, p.37).
Do ponto de vista institucional conforme Lei nº 11.830 de 1995 foi criado o Fundo
Estadual de Habitação (FEH), que tinha por objetivo fornecer suporte financeiro a programas
habitacionais de interesse social, ou seja, aos programas voltados para famílias de baixa
renda, e se constituiu como a principal fonte de recursos para programas habitacionais do
Estado.
72
Silveira et al. (2011) afirma que o tratamento mais recente da questão habitacional em
Minas Gerais, está presente na estrutura de planejamento do governo do estado que elaborou,
em 2003, o Plano Mineiro de Desenvolvimento Integrado (PMDI), que consiste no plano
estratégico para as ações do estado, tendo como horizonte o ano de 2020.
Como apontam os autores este Plano estabelece 11 áreas de resultados para a
concretização das estratégias do estado. Uma dessas áreas é a redução da pobreza e inclusão
produtiva, a ser alcançada a partir de medidas regionalmente integradas nas áreas de
educação, saúde, assistência social, habitação e saneamento.
A carteira de propostas elaborada pelo governo do Estado é composta por trinta
Projetos Estruturadores intitulados “GERAES” – Gestão Estratégica dos Recursos e
Ações do Estado. Cada Área de Resultado é alvo da intervenção de pelo menos um
projeto estruturador. Neste contexto foi instituído o Projeto Estruturador “Lares
Geraes” composto por dois programas: Lares Habitação Popular (PLHP) e Lares
Segurança Pública (PLSP). O Programa Lares Segurança Pública objetiva propiciar
acesso a moradia a policiais civis, policiais militares e agentes de segurança
penitenciários. Enquanto o Programa Lares Habitação Popular destina-se à
construção de conjuntos habitacionais e ao acesso à casa própria para famílias que
possuem renda de um a três salários mínimos, mediante a concessão de
financiamentos. O Programa Lares Habitação popular se tornou o principal
programa da política habitacional estadual. (Silveira et al, 2011p.5).
Conforme o Decreto 44.168 de 3 de novembro de 2005, que institui o Programa Lares
Habitação Popular (PLHP),o programa possui cinco objetivos: reduzir o déficit habitacional,
de modo prioritário, em área urbana; priorizar regiões e municípios com maior concentração
de déficit habitacional; promover habitação de qualidade dentro da malha urbana e em
terrenos dotados de equipamentos e serviços públicos; apoiar a remoção de população em
áreas de risco, além da recuperação ambiental dessas áreas; e reduzir o custo de aquisição de
moradia para permitir o acesso a famílias mais carentes.
Drumond (2014) salienta que os recursos do PLHP são provenientes do Fundo
Estadual de Habitação (FEH), de demais fundos ou órgãos federais destinados a programas
habitacionais e dos municípios, por meio da doação de terrenos e do provimento de sua
infraestrutura. Visando ampliar os investimentos do programa e reduzir os custos do valor do
financiamento ao beneficiário final, a COHAB/MG firmou acordos junto ao Governo Federal.
Nos primeiros anos foram captados recursos do Programa de Subsídio Habitacional (PSH) e
posteriormente os recursos do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV).
A autora ainda explica que A COHAB-MG atua como agente financeiro do Fundo
Estadual de Habitação e é responsável pela implantação do PLHP, cabendo à mesma o
73
gerenciamento da licitação das obras, o repasse de recursos à empresa vencedora, o
monitoramento da execução, a avaliação dos empreendimentos, além de garantir o
provimento de infraestrutura e realizar o Trabalho Técnico Social (TTS). Neste caso, devem-
se acompanhar os municípios durante os primeiros seis meses após a entrega do
empreendimento.
A contratação de empresas para executar os empreendimentos habitacionais do
PLHP ocorre via processo licitatório organizado pela COHAB-MG podendo assumir
as modalidades de empreitada global, administração direta ou convênio. O
município que desejar executar um empreendimento do PLHP deve assumir alguns
compromissos diante da COHAB, como instituir, caso não tenha, o Conselho
Municipal de Habitação (CMH), o qual juntamente com a prefeitura tem a
responsabilidade de divulgar para as famílias a implantação do programa no
município, cadastrá-las e classificá-las de acordo com os critérios estabelecidos pelo
PLHP. Além disso, para pleitear recursos do programa devem estar conveniados à
COHAB-MG. (DRUMOND, 2014, p.41).
O PHLP possui alguns critérios para a participação de beneficiários. Segundo a
COHAB-MG (2017) é necessário que a família possua renda média mensal de até três salários
mínimos, resida no município há pelo menos um ano, não tenha restrição no Cadastro
Nacional dos Mutuários (CADMUT), no Sistema de Proteção ao Crédito (SPC) e no
SERASA (Centralização de Serviços de Bancos) e ter renda compatível com o valor do
imóvel financiado. A família não pode ser proprietária de imóvel no município para o qual se
inscreveu e nem pode ser promitente comprador de imóvel em qualquer município por meio
do Sistema Financeiro de Habitação (SFH).
O enfoque da política estadual de habitação representado pelo PLHP está voltado para
a construção de unidades padronizadas e em larga escala, e assim como acontece no âmbito
federal, também atende aos interesses da indústria da construção civil. Além disso, como
enfatiza Drumond (2014) ao buscar captar recursos dos demais entes federados para execução
da política estadual, o PLHP desconsidera a incapacidade administrativa e limitações dos
municípios em relação à questão habitacional.
Outro ponto levantado pela autora em relação ao programa é a não diversificação das
modalidades de atuação, como reforma de moradias, doação de lotes e material de construção
e a assistência técnica gratuita. Estes problemas ainda não integraram a agenda de decisão do
governo estadual, assim como a articulação da política habitacional com as demais políticas
urbanas, sendo necessário, portanto, que se passe a considerar essas especificidades para que
o enfrentamento do déficit habitacional em Minas Gerais se dê de forma efetiva.
74
Nesse momento por meio de uma perspectiva histórica apresentaram-se as causas do
déficit habitacional brasileiro, enquanto resultado do acelerado processo de urbanização
vivenciado pelo país com o desenvolvimento industrial e do crescimento caótico das cidades.
Além disso, construiu-se um panorama das políticas habitacionais ao longo de tempo, de
forma a compreender as lógicas de produção do espaço em momento presente, uma vez que
as mesmas não podem ser vistas apenas como um instrumento de garantia de direitos sociais,
mas evidenciam a atuação do capital imobiliário no país.
Em parceria com o Estado, e utilizando-se das políticas públicas de habitação o setor
imobiliário promove transformações urbanas de acordo com a lógica de acumulação
capitalista, podendo ser notadas nos mais diversos contextos socioespaciais. Esse processo
será discutido para a realidade de São João Del-Rei nos capítulos que se seguem.
75
SEGUNDO MOMENTO
CAPÍTULO 2. A PROBLEMÁTICA HABITACIONAL NO CONTEXTO DE SÃO
JOÃO DEL-REI
“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a moradia,
a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição. ” (BRASIL, 2000, p.12).
A problemática da habitação constitui-se em um dos elementos fundamentais para a
(re) produção do espaço socialmente construído.O espaço urbano é produzido e ocupado de
acordo com a renda de cada grupo da sociedade, revelando formas urbanas distintas e
contraditórias. O problema referente à moradia aparece acompanhado de várias
determinantes, entre elas a propriedade privada, que se apresenta como barreira à efetivação
do direito à cidade.
O fato de que parcela da população das cidades encontra-se excluída do mercado
formal de aquisição de moradia é consequência da desigual distribuição territorial de rendas e
devido ao alto valor agregado ao produto casa, resultado do sistema capitalista.
Diante desse quadro, o Estado tem implementado programas habitacionais que são
justificados pelo objetivo de minimizar o déficit habitacional e assegurar o direito à moradia.
Contudo, em geral, esse direito não é assegurado de forma plena, uma vez que tem como
componentes essencias não apenas o acesso a unidade habitacional,mas também a
disponibilidade de serviços e infraestrutura.
Considerando-se a intervenção estatal na produção de moradias por meio de políticas
públicas, o termo habitação de interesse social refere-se, de acordo com Bonduki (2004), à
habitação produzida e financiada por órgãos estatais destinados a população de baixa renda. O
termo interesse social também é utilizado para caracterizar assentamentos humanos onde os
moradores possuem condições socioeconômicas que exigem políticas públicas para o acesso
ao direito à moradia.
A política habitacional, comandada pelo Estado capitalista, está subordinada aos
interesses da reprodução das relações sociais capitalistas. A atuação do poder estatal aliado
aos interesses das classes dominantes condicionam onde e de que forma as diversas classes
sociais se localizam e se apropriam do espaço urbano, assumindo uma configuração espacial
de características segregadoras. Além disso, a produção da cidade por meio do elemento
76
habitação de interesse social foi direcionada para o interesse do capital imobiliário marcando
a cidade com um tipo de intervenção descontínua e fragmentada.
Conforme Maricato (1997), as autoridades governamentais ligadas às políticas de
habitação, e os representantes do capital imobiliário referem-se à questão da habitação em
termos numéricos de déficits ou de unidades isoladas a serem construídas. Esta forma
simplista de tratar o tema ignora que a habitação urbana vai além dos números e das unidades.
Ela deve estar conectada às redes de infraestrutura e ter apoio dos serviços urbanos. Há,
portanto, uma visão redutora do conceito de habitar. O conceito de habitação de interesse
social abordado nesse estudo considera a moradia e sua relação com a cidade, ou seja, o
acesso à infraestrutura, serviços e equipamentos urbanos e comunitários.
O recorte espacial dessa pesquisa é o município de São João Del-Rei que se localiza
na Região do Campo das Vertentes, no estado de Minas Gerais. Possui cerca de 89.000
habitantes, sendo o setor de comércio e serviços a principal fonte da economia local. (IBGE,
2015). De acordo com o censo demográfico realizado em 2010 pelo IBGE, desse contingente
populacional, 95% reside no espaço urbano, o que corresponde a 79.790 habitantes.
Pensando-se a problemática habitacional nesse contexto, nota-se na cidade que em
momento recente, a promoção de políticas habitacionais é uma das vertentes da produção
capitalista do espaço urbano. Em relação ao acesso ao solo urbano, as políticas públicas
habitacionais implantadas no município estão ocorrendo em consonância com os objetivos do
mercado imobiliário.
Na cidade um número considerável de loteamentos urbanos vem sendo construídos
nas áreas de expansão urbana, transformadas em produtos imobiliários valorizados
direcionados especialmente aos segmentos de média renda. Estes loteamentos ocupam
terrenos melhor localizados, em detrimento de onde se situam os conjuntos habitacionais de
baixa renda, sendo estas áreas predominantemente residenciais, afastadas do centro da cidade
e desprovidas de infraestrutura e equipamentos urbanos.
Os processos de valorização imobiliária e segregação socioespacial estão presentes em
São João Del-Rei, assim como de maneira generalizada nas cidades brasileiras, representando
uma barreira à apropriação do espaço urbano e ao direito à cidade. No município a forma
como foi conduzida a materialização das políticas públicas segue a mesma lógica
contraditória e reducionista do habitar disseminada pelo território nacional, com viés
puramente quantitativo e sem assegurar aos moradores dos conjuntos habitacionais o direito à
77
moradia de forma plena. A seguir serão apresentadas algumas considerações sobre questão
habitacional na cidade.
2.1 Considerações sobre a produção habitacional em São João Del-Rei
O processo de urbanização brasileiro se apresenta diretamente vinculado ao
desenvolvimento econômico do país. Segundo Santos (2008), inicialmente esse processo
direcionava-se à geração de cidades apoiadas economicamente na agricultura e na mineração.
Somente após os anos de 1940-1950, impulsionado por forças econômicas, e pelo
desenvolvimento industrial, é que esse fenômeno ocorre de forma acelerada.
Observa-se, então, uma nova configuração espacial caracterizada pelo crescimento
populacional das cidades e seu posterior adensamento. A urbanização brasileira foi conduzida
pelos interesses do capital, baseada na concentração de renda e acarretando, sobretudo, o
aumento do déficit habitacional, seja nos grandes centros ou nas cidades de pequeno porte.
Queiroz (2010) salienta em relação à demanda por moradias que no país existe um
déficit qualitativo, por reposição do estoque de moradias e um déficit quantitativo, por
incremento desse estoque, sendo que a maior demanda habitacional se encontra nas faixas de
renda entre 0 e 3 salários mínimos.
Levando em consideração a problemática habitacional na cidade de São João Del-Rei,
reafirma-se que o déficit habitacional segundo o Plano Local de Habitação de Interesse Social
(2010) se situa em torno de 5.000 moradias, sendo que as famílias de baixa renda representam
a maior parcela da demanda por moradias no município.
Na cidade nota-se a produção de moradias em três vertentes:
Produção privada- promovida pelo mercado imobiliário destinada aos seguimentos
de média renda, ou seja, a uma parcela da população que pode pagar pela moradia.
Produção estatal- realizada pela política de habitação por meio da construção de
conjuntos habitacionais de interesse social destinados à população de baixa renda. Em
momento recente destaca-se a atuação dos Programas Minha Casa Minha Vida e Lares
Habitação Popular, no Estado de Minas Gerais.
Autoconstrução- realizada por moradores à margem do mercado de produção formal
de moradia e que muitas vezes não conseguem acesso aos financiamentos habitacionais. Essas
moradias muitas vezes são edificadas em loteamentos populares voltados para o público de
baixa renda, construídos pelo mercado privado.
78
De acordo com o PLHIS (2010) a produção da habitação rural em São João Del-Rei é
pouco significativa, dada a pequena proporção dos seus habitantes em relação ao núcleo
urbano. Devido ao baixo adensamento populacional não há predominância de assentamentos
precários, sendo as habitações produzidas via autoconstrução.
Em São João Del-Rei nota-se ainda, a produção formal de moradias advindas de
diferentes momentos da política habitacional brasileira. Conforme dados do Plano Local de
Habitação de Interesse Social (2010) foi construído pelo Instituto de Aposentadoria e Pensão
(IAP), política iniciada a partir da década de 1930, o Residencial Juscelino Kubitschek,
totalizando duzentas unidades habitacionais destinadas a trabalhadores da indústria.
Durante o período de vigência do Banco Nacional de Habitação surgiram na cidade os
primeiros conjuntos habitacionais. Em 1969 criou-se o bairro da COHAB, com a construção
de 252 casas populares financiadas pelo BNH. Em 1982 é edificado o Conjunto Habitacional
Inconfidentes, localizado próximo ao centro da cidade e constituído por 48 apartamentos
divididos em 6 blocos.
Em 1983 foi construído, a partir de uma cooperativa e sob orientação do Instituto de
Orientação às Cooperativas Habitacionais (BNH), o conjunto Tancredo de Almeida Neves
com 375 unidades divididas em 25 blocos de 15 apartamentos.
Figura 1- Residencial Juscelino Kubitschek Figura 2- Conjunto Habitacional
Inconfidentes
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
79
Com o fim do Banco Nacional de Habitação (BNH), em 1986, desestruturou-se a
política habitacional no país. A partir de então o Estado se exime da responsabilidade de
financiar os programas habitacionais.
Considerando-se a política habitacional recente foram construídos na cidade dois
conjuntos habitacionais vinculados ao Programa Lares Habitação Popular, criado pelo
Governo de Minas Gerais. Esses conjuntos seriam: o conjunto habitacional Marechal Cyro do
Espírito Santo Cardoso construído em 2006, totalizando 243 unidades, e o conjunto
habitacional Dom Lucas Moreira Neves, inaugurado em 2009, e apresentando um total de 234
unidades habitacionais.
Figura 3- Conjunto Habitacional
Tancredo de Almeida Neves
Figura 4- Conjunto Habitacional
Tancredo de Almeida Neves
Figura 6- Conjunto Habitacional Dom
Lucas Moreira Neves
Figura 5- Conjunto Habitacional Marechal
Cyro do Espírito Santo Cardoso
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
80
Além disso, a cidade recebeu um expressivo investimento decorrente do Programa
Minha Casa Minha Vida do Governo Federal. Foram edificados três conjuntos habitacionais;
os conjuntos Risoleta Neves I e II e o Conjunto Habitacional Parque da Cachoeira.
Os conjuntos Risoleta Neves I e II juntos somam 660 unidades habitacionais,
distribuídas em prédios de 5 pavimentos. Os mesmos foram entregues em 2011 e 2015
respectivamente. O conjunto Parque da Cachoeira conta com 300 unidades habitacionais e
ainda não foi entregue aos beneficiários até o presente momento.
Figura 7- Conjunto Habitacional
Risoleta Neves I
Figura 8- Conjunto Habitacional
Risoleta Neves II
Figura 9- Conjunto Habitacional Parque
da Cachoeira
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016)
81
Analisando-se os diferentes períodos das políticas habitacionais materializadas em São
João Del-Rei, que se encontram identificados no mapa 1, destaca-se em relação ao
Residencial Juscelino Kubitschek, edificado por meio da ação do Instituto de Aposentadoria e
Pensão para trabalhadores da indústria, que o mesmo foi o primeiro conjunto urbano de
produção seriada de unidades habitacionais na cidade.
Além disso, apresenta características que podem ser identificadas nos conjuntos
edificados pelo IAP em outros contextos espaciais, como inserção urbana próxima as
indústrias, que no caso de São João Del-Rei é do setor têxtil, bem como uma tipologia
arquitetônica baseada em racionalidade, salubridade e com qualidade espacial.
Os conjuntos habitacionais Inconfidentes (1982) e Tancredo de Almeida Neves (1983)
construídos durante a vigência do Banco Nacional de Habitação evidenciam a forma como foi
conduzida a política habitacional nesse período. No que diz respeito à sua inserção,
localizavam-se nas zonas periféricas da cidade, em áreas que não dispunham de infraestrutura
urbana.
Apresentam um maior número de unidades e a mesma tipologia reproduzida
indiscriminadamente sem atentar para as especificidades culturais, sociais e econômicas do
contexto em que se encontram. Entretanto essas áreas hoje já se encontram, no momento de
realização dessa pesquisa, incorporadas ao tecido urbano e adensadas.
Considerando-se a política habitacional recente no município, tem-se os conjuntos
habitacionais Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso, Dom Lucas Moreira Neves e
Risoleta Neves I e II. Os mesmos apontam que os conjuntos habitacionais destinados aos
segmentos de menor renda têm sido construídos em locais afastados da malha urbana,
distantes dos setores de comércio e serviços, em áreas de expansão onde o valor da terra é
menor comparando-se a outras áreas e a infraestrutura precária.
82
Figura 10- Localização dos conjuntos habitacionais de São João Del-Rei
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
83
Nota-se, portanto, que a localização dos conjuntos habitacionais é determinada pela
renda de seus mutuários. Ao se evidenciar a localização periférica dos conjuntos destinados às
famílias de baixa renda destacam-se o processo de segregação que tem marcado a produção
do espaço urbano pelas políticas habitacionais. Uma análise mais aprofundada sobre a
temática será realizada no terceiro momento dessa pesquisa.
2.1.1 O habitar na cidade: Políticas Habitacionais em São João Del-Rei
Pode-se observar em São João Del-Rei, a produção formal de moradias materializadas
no espaço urbano em diferentes momentos da política habitacional brasileira. Entretanto,
ressalta-se que o recorte temporal da pesquisa dará maior enfoque a política habitacional
instaurada a partir de 2002, caracterizada por um aumento expressivo de investimentos no
setor.
É nesse contexto que foram edificados os 4 conjuntos habitacionais existentes na
cidade e que são objeto de análise desse estudo: o conjunto Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso, o conjunto Dom Lucas Moreira Neves, ambos produzidos pelo governo estadual por
meio da Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (COHAB-MG) e os conjuntos
Risoleta Neves I e II vinculados ao Programa Minha Casa Minha Vida.
O Programa Lares Habitação Popular do Governo de Minas Gerais, conforme a
COHAB-MG (2017), destina-se à construção de conjuntos habitacionais e acesso a casa
própria, mediante a concessão de financiamentos para famílias que possuem renda de 1 a 3
salários mínimos.
Em relação ao Programa Minha Casa Minha Vida em São João Del-Rei vem sendo
implantada a modalidade do programa com recursos do Fundo de Arrendamento Residencial
(FAR). O Fundo de Arrendamento Residencial recebeu recursos transferidos do Orçamento
Geral da União para viabilizar a construção de unidades habitacionais, com o intuito de
atender ao déficit habitacional urbano para famílias com renda até R$ 1.600,00 reais, o que
representa no valor vigente em 2017, pouco menos de 2 salários mínimos.
Esses programas habitacionais foram apresentados e discutidos em profundidade no
primeiro momento dessa pesquisa, no panorama sobre as políticas habitacionais no Brasil, pós
Constituição de 1988.
Segundo o Guia de Adesão ao SNHIS (2008), o Plano Local de Habitação de Interesse
Social é considerado o instrumento articulador entre a Política Nacional de Habitação e a
84
política urbana e fundiária local, devendo ser produzido em três etapas: Proposta
Metodológica, Diagnóstico Habitacional e Estratégia de Ação.
De acordo com as informações contidas no PLHIS (2010), a proposta metodológica
para sua elaboração na cidade de São João Del-Rei, estabeleceu as equipes responsáveis pela
elaboração do plano, o cronograma de atividades, as formas de participação da comunidade e
a divulgação dos trabalhos.
Na segunda etapa realizou-se o diagnóstico buscando avaliar e conhecer todos os
aspectos relacionados à habitação de interesse social no âmbito do município. Dessa forma
foram levantados dados como a caracterização geral do município, sua inserção regional,
evolução urbana, precariedade habitacional e marcos normativos.
Na etapa do diagnóstico, foram identificadas inúmeras ações necessárias para o
enfrentamento da problemática habitacional no município. As ações necessárias vão desde a
construção de unidades residenciais e acesso a lotes urbanizados, até urbanização,
remanejamentos, regularização fundiária, construção de vias de acesso e de equipamentos
públicos e promoção de saneamento.
A terceira etapa de definição de estratégias de ação tratou das formas através das quais
os problemas habitacionais detectados no diagnóstico seriam enfrentados, trazendo propostas
concretas e apontando as fontes de recursos previstas para financiar tais ações. Também
foram estipuladas as prioridades de ação e as metas a serem cumpridas.
No Plano Local de Habitação de Interesse Social (2010), ficou estabelecido que seu
horizonte de planejamento fosse um período de 15 anos, compreendido entre 2011 e 2026. A
revisão do PLHIS deve ocorrer conjuntamente com a elaboração do Plano Plurianual, dessa
forma as avaliações e revisões do PLHIS de São João Del-Rei deverá ocorrer nos anos de
2013, 2017, 2021 e 2025. Constatou-se que o plano não foi revisado ou avaliado em 2013.
Salienta-se que as etapas de elaboração do PLHIS em São João Del-Rei estão em
conformidade com os processos previstos no Guia de Adesão ao Sistema Nacional de
Habitação de Interesse Social (2008) e no manual Plano de Habitação de Interesse Social
como fazer: um guia para os municípios mineiros (2009) elaborado pela Secretaria de Estado
de Desenvolvimento Regional e Política Urbana.
Cabe aqui analisar que em relação à Política Nacional de Habitação a elaboração do
Plano Local de Habitação de Interesse Social é um dos desafios a ser ultrapassado pelas
cidades de pequeno porte, como é o caso de São João Del-Rei.
85
Denaldi, Leitão e Akaishi (2011), salientam que esses desafios se iniciam pela
limitação na caracterização e identificação dos assentamentos precários e da demanda
habitacional existentes nessas cidades, além das deficiências no âmbito do planejamento
urbano, de investimento público e baixa capacidade institucional.
Além disso, deve-se considerar também, as dificuldades do poder público municipal
em articular estratégias de planejamento contidas nos planos diretores e nos planos locais de
habitação, que deveriam orientar a formulação de políticas e ações para o fomento à moradia
social integrada ao tecido urbano.
2.1.2 Instrumentos da política urbana e habitacional no contexto local
O desenvolvimento urbano-habitacional e a prática de planejamento em municípios de
pequeno porte envolvem o conhecimento da realidade e especificidades destes territórios, no
que se refere à precariedade habitacional existente e dos instrumentos de política urbana
presentes nesses contextos.
No artigo 182 da Constituição Federal de 1988 foi estabelecido que a política de
desenvolvimento urbano executada pelo poder público municipal, tem por objetivo ordenar o
pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus
habitantes. O Plano Diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de
expansão urbana.
Esses preceitos foram regulamentados com a promulgação do Estatuto da Cidade
(2001). Nele determina-se que o Plano Diretor é parte integrante do planejamento municipal e
deve englobar todo o território do município. Além disso, a lei que instituir o plano deve ser
revista pelo menos a cada 10 anos. O Plano Diretor é obrigatório para aqueles municípios com
mais de 20 mil habitantes, integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas,
áreas de especial interesse turístico, situados em áreas de influência de empreendimentos ou
atividades com significativo impacto ambiental na região ou no país.
No processo de elaboração do Plano Diretor e na fiscalização de sua implementação, o
município deverá garantir a promoção de audiências públicas e debates com a participação da
população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade.
Diante disso, considerando-se o contexto de São João Del-Rei, cabe ressaltar sobre a
política urbana, que o município apresenta Plano Diretor Participativo, instituído pela Lei nº
4.068, 13 de novembro de 2006.
86
Segundo o Guia de elaboração do Plano Diretor Participativo do Ministério das
Cidades (2004) as etapas referentes ao desenvolvimento do Plano Diretor seriam: a
constituição de um Núcleo Gestor, divulgação das ações referentes ao plano, capacitação
técnica, leitura técnica e comunitária, realização de conferências, formulação de estratégias de
planejamento, aprovação do Projeto de Lei e implementação do plano.
No caso de São João Del-Rei todas as etapas foram realizadas e estão em
conformidade com o que é previsto pelo Ministério das Cidades, como parâmetros
fundamentais para que se tenha um plano em consonância com a realidade do município e
com a participação da sociedade.
De acordo com a Lei nº 4.068 que institui o Plano Diretor Participativo do Município
de São João Del-Rei (2006), o plano é o instrumento básico da política de desenvolvimento
urbano e rural, aplicável a todo o território municipal e referência obrigatória para os agentes
públicos e privados que atuam no município integrando o processo contínuo de planejamento
municipal.
Cabe destacar que, de acordo com o Artigo 8˚da referida lei, que são objetivos gerais
do Plano Diretor municipal e que estão relacionados a temática habitacional: assegurar que o
processo de organização territorial do município se faça de forma ambientalmente sustentável
e adotar instrumentos de política urbana existentes no Estatuto da Cidade (2001) para gestão
do meio urbano.
Além disso, busca estimular a democratização do acesso à terra urbana, à habitação, ao
saneamento básico, aos transportes, aos sistemas de infraestrutura e serviços urbanos,
priorizando o atendimento à população de baixa renda e coibir o uso especulativo da terra
como reserva de valor, de modo a assegurar o cumprimento da função social da propriedade.
Outra característica do Plano Diretor é o estabelecimento de um Macrozoneamento
que divide o município em quatro unidades territoriais estabelecendo um referencial espacial
de ocupação. Seriam elas:
Zona de Proteção Ambiental (ZPA): Área destinada à preservação dos recursos
naturais, caracterizada pela ausência de aglomerações urbanas. Sua utilização é
restrita a atividades que não gerem impactos ambientais.
Zona de Controle Ambiental (ZCA): Área destinada à preservação dos recursos
naturais e a manutenção da qualidade ambiental, caracterizada pelo predomínio de
atividades agropastoris e pequenas aglomerações urbanas.
Zona de Reabilitação Ambiental (ZRA): Área caracterizada pela presença de
atividades industriais. Seu ambiente encontra-se degradado por causa da
concentração de processos erosivos e da monocultura de eucalipto.
87
Zona de Adequação Ambiental (ZAA): Área urbana do município para fins de
parcelamento e ocupação do solo, que se caracteriza pela ocupação humana.
(Caderno do Plano Diretor Participativo, 2006, p.22-25).
No Plano Diretor (2006) ressalta-se que essas zonas foram definidas a partir de
critérios como: cobertura vegetal existente; condições gerais dos recursos hídricos; existência
de processos erosivos; tipologia das aglomerações urbanas; grau de intervenção antrópica e a
influência das atividades antrópicas sobre o meio ambiente.
Em relação à Zona de Adequação Ambiental, que corresponde à área urbana do
município, estabeleceu-se segundo a Lei nº 4.068 /2006 diretrizes gerais de ocupação do solo,
cabendo destacar aquelas vinculadas a gestão urbano-habitacional na cidade, como
identificação de áreas que possuem condições favoráveis de topografia, acessibilidade e
infraestrutura para urbanização futura; áreas para a implantação de programas habitacionais
de interesse social; e promoção da regularização fundiária de parcelamentos e construções, em
especial as de interesse social.
Segundo o artigo 63 da Lei nº 4.068/2006 o território da Zona de Adequação
Ambiental do distrito-sede de São João Del- Rei divide-se, para fins de delimitação do
perímetro urbano e de parcelamento, uso e ocupação do solo em: Zona de Proteção Cultural;
Zona de Proteção Paisagística; Zona de Controle Urbanístico; Zona de Reabilitação Urbana; e
Zona de Urbanização Futura. A serem caracterizadas a seguir:
Zona de Proteção Cultural (ZPC): Trata-se da área de tombamento e entorno do
conjunto arquitetônico e urbanístico de São João Del-Rei.
Zona de Proteção Paisagística (ZPP): área urbana de uso e ocupação restritos,
visando manter a paisagem urbana e proteger os recursos naturais existentes.
Zona de Controle Urbanístico (ZCU): área de ocupação e urbanização consolidadas
e densidade populacional variada. Procura manter ou melhorar as condições urbanas,
incentivando usos diversificados.
Zona de Reabilitação Urbana (ZRU): área pública ou privada caracterizada por
parcelamento ou ocupação clandestina ou irregular, onde são necessários
implementar programas de regularização fundiária e melhorar as condições de
infraestrutura, equipamentos e serviços.
Zona de Urbanização Futura (ZUF): áreas próximas à malha urbana com
características de acessibilidade que a tornem preferencial para a expansão da
ocupação. (Caderno do Plano Diretor Participativo, 2006, p.28-32).
Em relação aos instrumentos urbanísticos presentes no Estatuto da Cidade (2001) que
visam garantir a função social da propriedade urbana, são citados no artigo 81 da Lei nº
4.068/2006 que instituiu o Plano Diretor: desapropriação; limitações administrativas;
88
tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano; instituição de zonas especiais de interesse
social; concessão de direito real de uso; parcelamento, edificação ou utilização compulsórios;
imposto progressivo sobre a propriedade predial e territorial urbana; usucapião especial de
imóvel urbano; direito de superfície; direito de preempção; outorga onerosa do direito de
construir; transferência do direito de construir; operações urbanas consorciadas; regularização
fundiária; assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais menos
favorecidos; estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto de
vizinhança (EIV).
Diante da caracterização geral do Plano Diretor Participativo de São João Del-Rei,
cabe aqui uma análise crítica frente a alguns aspectos do mesmo. Primeiramente, salienta-se
que o Macrozoneamento contido no Plano é voltado para questões de interesses ambientais,
uma vez que procurou adequar os usos do solo de acordo com as características físico-
ambientais do município, sobretudo quando se consideram os critérios estabelecidos para a
determinação das diferentes zonas que o integram.
O Plano Diretor menciona todos os instrumentos do Estatuto da Cidade (2001)
necessários para que o município cumpra a função social da propriedade. No entanto, detalha
apenas uma parcela desses instrumentos, estabelecendo critérios para a sua aplicação, são
eles: parcelamento, edificação ou utilização compulsória; desapropriação; outorga onerosa do
direito de construir e de alteração de uso; direito de preempção; transferência do direito de
construir; operações urbanas consorciadas e estudo de impacto de vizinhança.
No plano é ressaltado que a aplicação dos instrumentos será feita a partir da criação de
legislação específica, mas não se estabelece a necessidade de articulação entre os mesmos,
tratando a política urbana de forma fragmentada. Nenhum dos instrumentos é aplicado no
município, segundo o Plano Diretor (2006) o prazo para que os mesmos fossem
regulamentados era de 12 meses após a promulgação da Lei nº 4.068/2006.
De modo geral, os municípios de pequeno porte apresentam limitações para promover
as práticas de planejamento e gestão urbanas previstas no
Estatuto da Cidade (2001), devido a fatores como falta de estrutura administrativa, corpo
técnico, e de um banco de dados atualizado que permita o conhecimento da realidade urbano-
habitacional dos mesmos.
Segundo Akaishi (2013) no contexto das cidades de pequeno porte o Plano Diretor
Participativo, quando existente, incorpora os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade
(2001), mas não dialoga com a realidade desta tipologia de município. Grande parte desses
89
instrumentos se aplica de forma mais eficaz em cidades com alta e média densidade,
apresentando índices elevados de especulação imobiliária. Nesses casos, os instrumentos
estão direcionados para reverter o padrão excludente dos mercados imobiliários formais e
inibir a retenção especulativa de imóveis.
Contudo, no caso de São João Del-Rei, apesar de ser considerada uma cidade de
pequeno porte, a aplicação dos instrumentos urbanísticos de gestão do solo urbano, se torna
viável, porque se acredita que em momento recente, a expansão da Universidade Federal de
São João Del-Rei, e o consequente aumento do número de investimentos no setor imobiliário
presentes na cidade, têm sido fatores geradores de especulação imobiliária local.
Apesar dos desafios frente à gestão urbana e habitacional nos municípios de pequeno
porte ser mais evidente, a não aplicação dos instrumentos urbanísticos do Estatuto da Cidade
(2001) não se restringe apenas a essa realidade.
Uma pesquisa desenvolvida em 2015 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA) se propôs a investigar a regulamentação e a aplicação de dois instrumentos previstos
no Estatuto da Cidade (2001): o parcelamento, edificação ou utilização compulsória (PEUC) e
o imposto predial territorial urbano progressivo no tempo.
O recorte espacial da pesquisa foi definido como os municípios com população acima
de 100 mil habitantes. Totalizando 288 municípios, incluindo todas as capitais e o Distrito
Federal. Adotou-se como referência a Pesquisa de Informações Básicas Municipais realizada
em 2012 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Desse total, 286 municípios (99%) declararam possuir Plano Diretor e 91 municípios
(32%) afirmaram possuir lei especifica para aplicação do parcelamento, edificação ou
utilização compulsória. (Ver tabela 4).
90
Tabela 4- Municípios com Plano Diretor e Lei Específica de PEUC segundo classes de
tamanho da população
Classes de tamanho
da população
Quantidade de
municípios
% em
relação ao
total
Municípios
com Plano
Diretor
% Municípios com
lei específica de
PEUC
%
Classe 1: até 5.000
habitantes
1298 23% 328 25% 61 19%
Classe 2: de 5.001 a
10.000 habitantes
1210 22% 352 29% 61 17%
Classe 3: de 10.001 a
20.000 habitantes
1388 25% 474 34% 107 23%
Classe 4: de 20.001 a
50.000 habitantes
1054 19% 900 85% 128 14%
Classe 5: de 50.001 a
100.000 habitantes
327 6% 318 97% 73 23%
Classe 6: de 100.001
a 500.000 habitantes
250 4% 248 99% 74 30%
Classe 7: mais de
100.000 habitantes
38 1% 38 100% 17 45%
Total 5565 100% 2658 48% 521 20%
Fonte e organização: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2015
No caso dos municípios do porte de São João Del-Rei com população entre 50.000 e
100.000 habitantes de um total de 327 municípios, 318 (97%) apresentam Plano Diretor, mas
apenas 73 (23%) apresentam a lei específica para o instrumento analisado. (Ver tabela 4).
Já em relação ao IPTU Progressivo no Tempo após verificação junto aos gestores de
desenvolvimento urbano dos municípios, do total de 91, apenas 25 apresentavam de fato lei
específica de regulamentação do e/ou o imposto predial territorial urbano progressivo no
tempo.
Desses, constatou-se que apenas oito municípios estavam aplicando ou aplicaram o
instrumento de parcelamento, edificação ou utilização compulsória em algum período. São
eles: Curitiba (PR), Palmas (TO), Goiânia (GO), São Paulo (SP), Maringá (PR), Santo André
(SP), São Bernardo do Campo (SP) e Diadema (SP). Em relação ao IPTU progressivo no
91
tempo, a aplicação foi identificada apenas em 2 municípios: Maringá (PR) e São Bernardo do
Campo (SP).
A análise realizada nessa pesquisa evidencia, portanto, as limitações da macropolítica
urbana, pós Estatuto da Cidade (2001), quando se trata do ordenamento territorial na esfera
municipal, e que independem do porte populacional dos municípios.
Segundo Queiroz (2010), um dos instrumentos que possibilitam regulamentar uma
propensa equidade na distribuição de serviços sobre o solo urbano, é a instituição de Zonas de
Especial Interesse Social (ZEIS), com a finalidade de reservar parcelas de terras compatíveis
com a proposta de integração da população de baixa renda nas áreas consolidadas das cidades
brasileiras.
Para o autor essas áreas ao se tornarem reservas territoriais para assentamento
populacional possibilitam a minimização dos custos de implantação de Habitações de
Interesse Social, descaracterizando o conteúdo especulativo da terra e possibilitando integrá-la
a paisagem urbana e morfológica da cidade.
Com relação a esse instrumento urbanístico deve-se destacar que na cidade de São
João Del-Rei o Plano Diretor Municipal (2006), não prevê áreas destinadas as Zonas
Especiais de Interesse Social (ZEIS), deixando a escolha da localização dos projetos
residenciais de interesse social a cargo de quem irá produzi-los.
No mesmo apenas estabelece-se que a Zona de Reabilitação Urbana deve ser ocupada
pela população de baixa renda e prever a implantação de programas de regularização fundiária
visando incentivar à promoção de loteamento e moradias de caráter social.Com relação às
áreas de expansão, o plano estabelece a criação da Zona de Urbanização Futura. No entanto,
nestas áreas, não estão previstos percentuais para áreas de habitação de interesse social.
O município não possui instrumento legal de controle das formas de ocupação em seu
território, como a Lei de Uso e Ocupação do Solo. De acordo com o Plano Diretor (2006) o
prazo para elaboração da mesma deveria ser de 6 meses a partir da promulgação da lei que o
instituiu. A princípio, a expansão urbana no município é resultado da ação dos agentes
produtores do espaço e não de medidas vinculadas ao planejamento e ordenamento territorial.
Na ausência de outra legislação municipal que oriente sobre o local adequado para a
implantação de empreendimentos de caráter social, o poder público utilizou-se do Plano Local
de Habitação de Interesse Social (2010), para a delimitação de áreas de reserva para a
produção de habitação de interesse social.
92
Conforme o PLHIS (2010), detectou-se vazios urbanos que podem ser destinados a
produção de Habitação de Interesse Social, apresentados no Mapa 2. Esse levantamento foi
efetivado considerando-se como critérios: a topografia dos terrenos, sua distância em relação
ao centro da cidade, disponibilidade de transporte público, e proximidade com algum
assentamento precário como forma de permitir o reassentamento de famílias nessas áreas.
De acordo com a Lei Orgânica do Município (1990) no capítulo da Política Urbana,
cabe a Administração Municipal promover e executar programas de construção de moradias
populares e garantir condições habitacionais, saneamento básico e acesso aos transportes.
Entretanto, as áreas selecionadas no PLHIS (2010) apresentam características opostas
àquelas consideradas essenciais para a garantia do direito a cidade, ou seja, a produção de
moradias em áreas mais centrais, integradas à malha urbana, equipadas e providas de
infraestrutura e serviços urbanos.
93
Figura 11- Localização dos vazios urbanos estabelecidos no Plano Local de
Habitação de Interesse Social
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
94
Foram identificados 9 vazios urbanos com potencial para serem ocupados por
conjuntos habitacionais de interesse social. Considerando-se os critérios estabelecidos para
escolha dos mesmos ressalta-se segundo o PLHIS (2010), que todos os vazios urbanos
apresentam topografia favorável ao adensamento e em relação a disponibilidade de transporte
público apenas nos vazios 1, 8 e 9 ela é satisfatória. Também foram identificados
assentamentos precários nas proximidades de todos os vazios detectados.
Quanto à localização dos terrenos o que se nota é que a escolha dessas áreas não leva
em consideração a função social da cidade, que em conformidade com o Plano Diretor (2006)
compreende não apenas o direito à moradia, mas à infraestrutura, serviços públicos, transporte
coletivo e acessibilidade. Além disso, se encontram nas zonas periféricas reforçando a
segregação socioespacial inerente à produção capitalista do espaço.
Cabe destacar o caso do vazio urbano 4, uma vez que no seu entorno já se encontra
edificado um conjunto habitacional voltado para baixa renda, o conjunto habitacional
Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso construído em 2006. Critica-se a escolha do
mesmo, uma vez que o agrupamento de empreendimentos de interesse social em áreas
periféricas da cidade cria espaços segregados e agrava a vulnerabilidade social nessas áreas.
Dos terrenos selecionados pelo PLHIS (2010), o vazio urbano 9 é o que mais se
aproxima de garantir o direito à cidade, uma vez que o mesmo se encontra bem inserido na
malha urbana, próximo à área central, com infraestrutura consolidada e acesso a serviços e
equipamentos públicos.
Três desses vazios urbanos não se encontram mais disponíveis para se tornarem zonas
de especial interesse social. O vazio 9 abriga atualmente, um empreendimento privado, onde
foi construído um estacionamento. O vazio urbano 8 se tornou de interesse do mercado
imobiliário, e hoje abriga o Loteamento Parque Bela Vista. No vazio urbano 6 se encontra o
loteamento Colinas dos Inconfidentes e parte do terreno pertence a iniciativa privada para
construção de um campus universitário.
Outro ponto a se analisar é a localização dos vazios urbanos dentro do
microzoneamento urbano estabelecido no Plano Diretor de São João Del-Rei (2006). Os
vazios urbanos 1, 4, 6, 7 e 9 encontram-se na Zona de Proteção Paisagística (ZPP). Na Zona
de Proteção Paisagística o uso e ocupação do solo devem ser restringidos devido à presença
de recursos naturais, não sendo favorável, portanto, o adensamento nesses vazios urbanos,
uma vez que não se estabelece assim, o atendimento do que está previsto pela política urbana
local.
95
Por sua vez os vazios urbanos 3 e 5 situam-se na Zona de Urbanização Futura (ZUF).
A Zona de Urbanização Futura, segundo o Plano Diretor (2006), é considerada preferencial
para a realização de novos parcelamentos do solo, entretanto, torna-se necessário suprir a área
com infraestrutura e equipamentos públicos por se tratarem de vetores de expansão urbana.
O vazio urbano 2 localiza-se na Zona de Reabilitação Urbana (ZRU). De acordo com
o Zoneamento do Plano Diretor (2006), na Zona de Reabilitação Urbana deve ser incentivada
a promoção de loteamentos e moradias de caráter social para população de baixa renda.
Entretanto nessa zona as condições de infraestrutura, equipamentos e serviços necessitam de
melhorias. Promover a ocupação desse vazio urbano requer, assim, uma intervenção no setor
habitacional que as assegurem, ou ocorrerá um agravamento desse quadro com o adensamento
local.
Já o vazio urbano 8 integra a Zona de Controle Urbanístico (ZCU). Em relação à Zona
de Controle Urbanístico, ressalta-se de acordo com o Plano Diretor (2006) que nessa área é
importante garantir a manutenção ou melhoria das condições urbanas e incentivar a
multiplicidade de usos.
Apesar desse vazio urbano se situar em uma área em que prevalece o uso residencial, o
estímulo à criação de novos usos, diminuiria a dependência que os conjuntos habitacionais ao
serem construídos nas zonas periféricas têm em relação às áreas centrais da cidade, onde se
concentram serviços e equipamentos públicos.
Diante do exposto, trona-se claro que a definição de áreas para o provimento
habitacional deve levar em consideração o planejamento do município como um todo. A
articulação da política habitacional com os instrumentos urbanísticos contidos no Plano
Diretor pode contribuir para combater a segregação socioespacial, criando condições para que
as cidades se reproduzam de forma mais igualitária, e democratizando o acesso ao solo urbano
e à própria cidade
É de extrema importância que os programas habitacionais estejam associados a uma
política fundiária que iniba o exacerbado processo de especulação e valorização do solo
urbano. No caso de São João Del-Rei isso poderia ser evitado caso o Plano Diretor Municipal
(2006) previsse a criação de ZEIS e se os instrumentos estabelecidos no Estatuto da Cidade
(2001) fossem aplicados.
Entretanto, os Planos Diretores muitas vezes estabelecem diretrizes e objetivos
relativos à implementação de políticas habitacionais, sem, contudo, incorporar os elementos
96
necessários para que os instrumentos adotados se efetivem. Essa realidade pode ser
encontrada em diferentes contextos urbanos, independentemente do porte dos municípios.
Daí reside à necessidade de se pensar em soluções de planejamento urbano-
habitacional próprios para os casos das cidades de pequeno porte, em que as limitações frente
ao enfrentamento da gestão urbano-habitacional se acentuam.
2.1.3 Territórios da habitação: conjuntos habitacionais
Esta pesquisa analisou a realidade de 4 empreendimentos imobiliários de baixa renda
em São João Del-Rei, o conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso,
localizado no Bairro Bonfim, o conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves, e os
conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II, todos situados no Bairro Tijuco.
98
Cabe ressaltar que por se encontrar em obras no período de coleta de dados da
pesquisa, o Conjunto Habitacional Parque da Cachoeira, situado no Bairro Tijuco, não foi
analisado como os demais conjuntos, no que diz respeito à observação direta e contato com os
moradores que aí residirão. As unidades habitacionais ainda não foram entregues aos
beneficiários.
Um ponto importante a se observar é que oficialmente São João Del-Rei divide-se em
8 bairros criados através da Lei nº 2.521 de 31 de agosto de 1989. São os bairros Bonfim,
Centro, Colônia do Marçal, Fábricas, Jardim Central, Matosinhos, Senhor dos Montes e
Tijuco. Contudo, o que acontece na cidade é a subdivisão desses grandes bairros em outros
menores. Daí reside o maior número de bairros que serão citados nessa análise pelos
entrevistados.
Serão aqui apresentados dados coletados junto aos moradores dos conjuntos
habitacionais e da observação direta da pesquisadora. A observação direta aconteceu mediante
visitas aos conjuntos habitacionais. Os dados obtidos com os moradores originam-se da
aplicação de 160 questionários, realizada no primeiro semestre de 2016. (Ver questionário em
apêndice).
Uma questão a ser relatada e que se apresentou como uma dificuldade na efetivação
dessa parte da pesquisa é que se buscou uma aproximação junto à Prefeitura Municipal de São
João Del-Rei, na figura da Secretaria Municipal de Cidadania, Desenvolvimento e Assistência
Figura 13- Conjunto Habitacional Parque
da Cachoeira
Fonte: Acervo pessoal (2016)
99
Social, que atua na implantação das políticas habitacionais no município para coleta de dados
secundários.
Entretanto, a instituição não se mostrou disponível em colaborar com o trabalho
exigindo um convênio para pesquisa, cuja prática não é vigente na Universidade Federal de
São João Del-Rei, segundo a Pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação. Dessa forma devido à
ausência de diálogo e considerando-se o cronograma a ser cumprido, optou-se por utilizar
apenas as informações levantadas em trabalho de campo. A seguir propõe-se descrever a
realidade social e habitacional encontrada nos conjuntos habitacionais estudados.
Conjunto Habitacional Marechal Cyro do Espírito Cardoso
O conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso foi inaugurado em
2006, apresentando um total de 243 unidades habitacionais. O mesmo está vinculado ao
Programa Lares Habitação Popular, do Governo de Minas Gerais, sendo o primeiro conjunto
habitacional de baixa renda edificado na cidade. No mesmo foi aplicado um total de 50
questionários.
Figura 14- Conjunto Habitacional
Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso
Figura 15- Conjunto Habitacional
Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso
Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016)
100
A caracterização dos moradores do conjunto habitacional que será apresentada está
vinculada aos critérios de seleção dos beneficiários do Programa Lares Habitação Popular.
Destaca-se que o programa prioriza as mulheres como responsáveis pela unidade,
especialmente aquelas que sustentam a família.
No caso de idosos são aceitos segundo a COHAB-MG, apenas aqueles cuja renda
comprovada, ou valor de entrada, permita a redução do prazo do financiamento que é de 20
anos, de forma que a soma do prazo de financiamento mais a idade do candidato não
ultrapasse 80 anos.
No município consideram-se também as famílias residentes em área de risco, aquelas
que apresentam pessoas com deficiência, e beneficiários de programas sociais cadastrados no
Cadastro Único do governo federal.
Do total de 50 famílias entrevistadas 9 residiam em área de risco antes de se mudarem
para o conjunto habitacional, vivendo em áreas de inundação. Aponta-se ainda, que 22
famílias têm as mulheres como responsáveis pela unidade familiar, 6 delas apresentam idosos
no núcleo familiar, e 12 são beneficiárias de programas sociais. Os moradores se originam de
diferentes bairros da cidade de São João Del-Rei.
101
Figura 16 - Origens dos moradores do conjunto habitacional Marechal Cyro do
Espírito Santo Cardoso
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
TIJUCO
GUARDA-
MOR
BONFIM
BOM PASTOR
CENTRO
MATOSINHOS
FÁBRICAS
COLÔNIA DO MARÇAL
SENHOR DOS
MONTES
102
Localização do conjunto habitacional
Foi proposto aos moradores que classificassem a localização do conjunto habitacional
quanto à facilidade de acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos. Os resultados
estão expressos no gráfico.
Gráfico 1- Classificação da localização do conjunto habitacional Marechal Cyro do
Espírito Cardoso quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Do total de entrevistados 22 famílias classificaram a localização do conjunto quanto o
acesso a comércio, serviços e equipamento públicos, facilitada pela presença de transporte
público coletivo no local ou por utilizarem veículo próprio.
Por sua vez, 14 famílias consideraram o acesso dificultado, devido a dependência ao
uso do transporte coletivo. Os moradores salientaram também que o alto preço da passagem
acaba por comprometer a renda familiar.
Um total de 14 famílias destacou a proximidade do conjunto habitacional com o centro
da cidade, onde se concentram comércio e serviços, sendo possível realizar deslocamentos a
pé com facilidade.
103
Problemas identificados no conjunto habitacional
Os problemas relatados pelos moradores do conjunto habitacional estão expressos no
gráfico abaixo.
Gráfico 2- Problemas identificados no conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito
Cardoso
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Do total de famílias entrevistadas 30 não identificam problemas no conjunto
habitacional. As mesmas afirmam que as dificuldades de convívio e os problemas de
infraestrutura enfrentados no período de ocupação, foram amenizados com o tempo de
consolidação da comunidade, no caso 10 anos.
Em relação ao transporte coletivo 7 famílias reforçam a demanda por mais linhas de
ônibus no local, além do valor da passagem ser considerado alto, tratando-se de famílias de
baixa renda utilizando o serviço.
Outro problema relatado por 5 famílias é o abandono de animais no local. De acordo
com uma das entrevistadas é frequente os casos de pessoas residentes em outros bairros que se
deslocam até o conjunto abandonando animais nas ruas.
104
Por fim, outras questões levantadas foram; a limpeza das vias para além da coleta de
lixo, onde 5 famílias ressaltaram que gostariam que a Prefeitura Municipal prestasse esse
serviço com mais frequência, além do atendimento no posto de saúde do bairro, onde 3
famílias apontam a ausência de médicos.
Análise comparativa da moradia
Foi solicitado aos moradores que desenvolvessem uma comparação do conjunto
habitacional com o local de moradia anterior, em relação a aspectos como localização, acesso
a serviços e equipamentos públicos, deslocamentos entre outros. O resultado é apresentado na
seguinte tabela. Do total de entrevistados 20 famílias preferiam o local de moradia anterior,
enquanto 30 optaram pelo conjunto habitacional.
Quadro 1 - Panorama comparativo da habitação familiar
Famílias que preferem o local anterior de moradia
Famílias que preferem o Conjunto Habitacional
MOTIVOS MOTIVOS
Considerava o bairro anterior melhor servido por
infraestrutura e comércio
Deixou de viver em área de risco, apesar da melhor
localização do bairro anterior
Residia no centro da cidade, onde se concentram
equipamentos públicos
Considera o acesso ao centro da cidade onde
predominam comércio e serviços, facilitado
Moravam em bairros considerados mais próximos
da área central como Tijuco e Fábricas
Acreditam que a infraestrutura do conjunto habitacional
melhorou desde sua implantação
Considerava o bairro anterior (Colônia do Marçal)
mais acessível
Dependência do uso de transporte público na moradia
anterior para acessar serviços e equipamentos
Total: 20 famílias Total: 30 famílias
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Diante dessa tabela, nota-se que o fato de São João Del-Rei ter como característica a
área central como um polo de comércio e serviços, é frequente os moradores mencionarem a
acessibilidade ao centro como motivo principal de comparação. Contudo vale destacar que
São João Del-Rei apresenta bairros onde existem parcelas expressivas de atividades
comerciais, como no caso dos bairros Matosinhos e Fábricas.
105
Evasão de moradores do conjunto habitacional
As informações referentes à evasão de moradores do conjunto habitacional foram
obtidas junto aos moradores, como uma tentativa de estabelecer parâmetros iniciais de
entendimento do motivo pelo qual essas famílias abrem mão do benefício conquistado.
Mesmo com as ressalvas frente à forma como a política habitacional vem sendo
materializada no espaço urbano, o direito à moradia ainda persiste como uma demanda,
sobretudo para famílias de baixa renda onde se concentra o déficit, compreender o que
desencadeia a evasão dentro dessa possibilidade de acesso a moradia, é um fator convidativo
para a investigação.
Foi questionado às famílias se elas conheciam dentro do conjunto pessoas que se
mudaram e quais seriam os motivos da mudança. Do total de 50 famílias que responderam ao
questionário 24 relataram casos de evasão.
Quadro 2 - Motivos de evasão do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito
Cardoso
Motivos apontados pelos moradores Número de famílias levantado
Venda da unidade habitacional 8
Famílias que moram de aluguel no conjunto
habitacional e mudaram-se
5
Mudança de cidade 3
Aluguel da unidade habitacional 3
Famílias que não se adaptaram ao conjunto
habitacional
3
Famílias que já possuíam casa própria 2
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Diante do que foi levantado e pensando-se a venda e aluguel de unidades
habitacionais, cabe apontar como possíveis causas de evasão a insatisfação das famílias em
106
residir no local, ou falhas no processo de seleção dos beneficiários no que diz respeito ao
acesso a moradia.
Locais para construção de novos conjuntos habitacionais na perspectiva dos moradores
Coube aos moradores apontar na cidade de São João Del-Rei, locais em que se
acredita ser adequada a construção de novas unidades habitacionais voltadas para baixa renda.
Os locais levantados bem como a justificativa da escolha apresentam-se na tabela.
Quadro 3- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais
LOCAIS ESCOLHIDOS JUSTIFICATIVAS NÚMERO DE
FAMÍLIAS
Matosinhos Bem servido por transporte público, boa
infraestrutura e acesso a comércio e
serviços
14
Colônia Bem servido por transporte público, boa
infraestrutura, comércio local
10
Bonfim Proximidade ao centro da cidade, boa
infraestrutura
7
Pio XII Fácil acesso, proximidade com o Bairro
Matosinhos onde se tem atividade
comercial expressiva
6
Fábricas Fácil acesso e proximidade com o centro
da cidade
5
Caieira Proximidade com o centro da cidade 4
Guarda-Mor Proximidade com o centro da cidade 2
Conjuntos menores
distribuídos em diferentes
bairros
Evitar problemas de convívio social
devido à diversidade dos moradores
2
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
De acordo com os dados aqui levantados, para os moradores entrevistados, o Bairro
Matosinhos se constitui na melhor opção para a construção de um conjunto habitacional,
107
devido à infraestrutura, e o fato de que o mesmo representa um dos núcleos comerciais da
cidade para além do eixo central.
Dos bairros citados, em 3 deles, Fábricas, Colônia e Bonfim foram identificados
vazios urbanos no Plano Local de Habitação de Interesse Social (2010), como potenciais áreas
para construção de conjuntos habitacionais.
Outro ponto a destacar é que o bairro Caieira citado pelos entrevistados tornou-se
atrativo ao mercado imobiliário, principalmente pela proximidade em relação ao centro da
cidade, daí reside à importância de se regulamentar os instrumentos previstos no Estatuto da
Cidade (2001), buscando coibir a especulação imobiliária e garantir a função social da cidade.
O mesmo pode ser dito em relação ao bairro Guarda-Mor, onde um dos vazios urbanos
existentes se tornou o Loteamento Jardim das Acácias voltado para o público de classe média.
Torna-se evidente, portanto, que na cidade os locais melhor situados em relação ao núcleo
urbano central, despertam interesses imobiliários, não sendo destinados à produção de
habitação de interesse social, até o presente momento.
Conjunto Habitacional Dom Lucas Moreira Neves
O conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves, situa-se no Bairro Tijuco, foi
inaugurado em 2009 e apresenta um total de 234 unidades habitacionais. Está vinculado ao
Programa Lares Habitação Popular do Governo de Minas Gerais. Nesse conjunto foi aplicado
um total de 50 questionários.
Figura 17- Conjunto Habitacional Dom
Lucas Moreira Neves
Figura 18- Conjunto Habitacional Dom
Lucas Moreira Neves
Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016)
108
A caracterização do perfil dos moradores, como no caso anterior, também está
vinculada aos critérios de seleção dos beneficiários estabelecidos pelo Programa Lares
Habitação Popular e pelo município de São João Del-Rei.
Do total de 50 famílias entrevistadas 15 residiam em área de risco, sendo 8 delas em
área de inundação, 5 em área de deslizamento de encostas, e 2 cuja habitação oferecia risco de
desabamento por problemas estruturais. Cabe também ressaltar o número de famílias onde
mulheres é quem são responsáveis pela unidade familiar, no caso 28.
Das famílias que responderam ao questionário, em 2 delas há a presença de um idoso
e de uma pessoa com deficiência na composição familiar respectivamente, e 16 são
beneficiárias de programas sociais. Os moradores também residiam em diferentes bairros da
cidade de São João Del-Rei antes de se mudarem para o conjunto habitacional.
109
Figura 19- Origens dos moradores do conjunto habitacional Dom Lucas Moreira
Neves
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
TIJUCO
GUARDA-
MOR
BONFIM
BOM PASTOR
CENTRO
MATOSINHOS
FÁBRICAS
SENHOR
DOS
MONTES
110
Localização do conjunto habitacional
Os moradores classificaram a localização do conjunto habitacional quanto à facilidade
de acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos. Os resultados constam no gráfico.
Gráfico 3- Classificação da localização do conjunto habitacional Dom Lucas Moreira
Neves quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Do total de entrevistados, 34 famílias consideraram o acesso a comércio, serviços e
equipamentos públicos dificultado pela dependência ao transporte público para deslocamento.
Cabe ressaltar que o transporte público oferecido na cidade não oferece um serviço de
qualidade. Os moradores salientaram que os gastos com o transporte público comprometem a
renda familiar, uma vez que o conjunto habitacional é voltado para baixa renda. Cerca de 7
famílias consideraram o acesso facilitado devido a oferta de transporte público no conjunto
habitacional e 9 delas por apresentarem veículo próprio.
111
Problemas identificados no conjunto habitacional
Os problemas relatados pelos moradores do conjunto habitacional estão expressos no
gráfico abaixo.
Gráfico 4- Problemas identificados no conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
No terreno onde se localiza o conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves foi
edificado no entorno, os dois conjuntos habitacionais vinculados ao Programa Minha Casa
Minha Vida, Risoleta Neves I e II. Um dos dados levantados de destaque é que para 15
famílias a concentração dos conjuntos habitacionais nesse vazio urbano acentuou a
vulnerabilidade social e trouxe problemas de convívio.
Além disso, um total de 11 famílias atribui os índices de criminalidade detectados no
local, aos moradores do Risoleta Neves. As mesmas apontam problemas como furtos e tráfico
de drogas, no que diz respeito à segurança.
Cerca de 9 famílias relataram problemas na infraestrutura do conjunto habitacional
relacionados ao abastecimento de água intermitente, iluminação pública, ausência de espaços
coletivos de lazer e o transporte público insuficiente.
112
Ressalta-se também que 4 famílias consideram a falta de manutenção do conjunto um
problema a ser solucionado. Os moradores apontam que solicitam a Prefeitura Municipal
serviços de limpeza e capina, e que estes não são realizados regularmente.
Entre os entrevistados 7 famílias não identificam problemas no conjunto habitacional e
4 delas apontam a localização periférica do conjunto como um problema, devido à distância
em relação ao centro da cidade e dependência com relação ao uso de transporte público.
Análise comparativa da moradia
Na análise comparativa desenvolvida pelas famílias das condições de moradia anterior
e atual, considerando aspectos como acesso a comércio, serviços, equipamentos públicos e
localização, constatou-se que 29 famílias preferiam o local de moradia anterior enquanto 21
delas preferem o conjunto habitacional. Os motivos são apresentados na seguinte tabela.
Quadro 4- Panorama comparativo da habitação familiar
Famílias que preferem o local anterior de moradia Famílias que preferem o Conjunto
Habitacional
MOTIVOS MOTIVOS
Considerava o local anterior melhor servido por infraestrutura,
comércio ou mais acessível devido ao serviço de transporte público
satisfatório
Considera facilitado o acesso ao centro da
cidade onde predominam comércio e
serviços
Residia em bairros próximos ao centro da cidade, que é onde se
concentram os equipamentos públicos.
Deixou de viver em área de risco, apesar da
melhor localização do bairro anterior
Total: 29 famílias Total: 21 famílias
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Do total de famílias que preferem o local de moradia anterior, 10 famílias apontaram
que o bairro em que moravam anteriormente era bem servido por infraestrutura, comércio e
transporte público. Esses moradores residiam em bairros como Matosinhos, Bonfim e Bom
Pastor. Por sua vez, 19 relataram que a moradia era localizada em bairros mais próximos ao
centro da cidade, como Fábricas, Guarda-Mor e Senhor dos Montes.
Considerando as famílias que preferem residir no conjunto habitacional, 10 delas
pontuaram a possibilidade de deixar de viver em área de risco a inundação, no caso, na Vila
113
Nossa Senhora de Fátima. Contudo pontuaram que por se localizar no bairro Matosinhos, essa
área era mais acessível e melhor servida por infraestrutura. As demais apontaram a facilidade
de acesso ao centro da cidade devido à presença de transporte público ou uso de veículo
próprio.
Evasão de moradores do conjunto habitacional
As informações referentes à evasão de moradores do Conjunto Habitacional foram
obtidas junto às famílias, buscando estabelecer parâmetros iniciais de entendimento da
desistência do benefício conquistado.
Quadro 5- Motivos de evasão do conjunto habitacional do conjunto habitacional Dom
Lucas Moreira Neves
Motivos apontados pelos moradores Número de famílias levantado
Famílias que não se adaptaram ao conjunto
habitacional
7
Venda da unidade habitacional 5
Localização do conjunto habitacional 4
Famílias que moram de aluguel no conjunto
habitacional e mudaram-se
3
Moradores que não se mudaram para o conjunto
habitacional
2
Falta de infraestrutura 2
Mudança de cidade 1
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
O número de famílias que não se adaptaram ao conjunto habitacional decorre das
dificuldades de convívio social enfrentados pelos mesmos. O aluguel e venda de imóveis tem
se mostrado uma informação frequente, levando entre outras inquietações, ao questionamento
se o processo de seleção dos beneficiários tem se dado de forma eficiente e se ele atende a
uma demanda real. Quanto à localização, mais uma vez enfatiza-se a promoção habitacional
de interesse social nas periferias da cidade.
114
Locais para construção de novos conjuntos habitacionais na perspectiva dos moradores
Os moradores apontaram na cidade de São João Del-Rei, locais em que acreditam ser
adequada a construção de novas unidades habitacionais listados na tabela abaixo.
Quadro 6- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais
LOCAIS ESCOLHIDOS JUSTIFICATIVAS NÚMERO DE
FAMÍLIAS
Tijuco Nas áreas do bairro que se encontram mais
próximas ao centro
17
Matosinhos Bem servido por infraestrutura e acesso a
comércio e serviços
14
Colônia Bem servido por transporte público, boa
infraestrutura, vazios urbanos
5
Fábricas Proximidade com o centro da cidade, boa
infraestrutura
4
Guarda-Mor Proximidade com o centro da cidade 4
Bonfim Proximidade ao centro da cidade, boa
infraestrutura
3
Conjuntos menores distribuídos em
diferentes bairros
Evitar problemas de convívio social
devido à diversidade dos moradores
3
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Para os moradores entrevistados, o bairro Tijuco é visto como a melhor opção para a
construção de conjuntos habitacionais, desde que os terrenos se localizem nas áreas mais
próximas ao centro, ou com transporte público satisfatório. No Plano Local de Habitação de
Interesse Social (2010), foram selecionados dois vazios urbanos situados no bairro.
Outro local de preferência é o bairro Matosinhos devido a infraestrutura, acesso a
transporte público satisfatório, além de contar com um núcleo de atividades comerciais.
Dos bairros citados pelos moradores, também foram identificados vazios urbanos no
PLHIS (2010), Colônia, Fábricas e Bonfim, sendo que o terreno inserido no bairro Fábricas é
o que melhor possui acesso a comércio, serviços, e equipamentos públicos.
115
Uma importante consideração feita por algumas famílias é que deveriam ser
construídos conjuntos habitacionais de menor escala distribuídos pelos diferentes bairros de
São João Del-Rei, de forma a minimizar os problemas de convívio social decorrentes da
diversidade cultural dos moradores beneficiados. Acredita-se que essa forma de produção de
moradias de interesse social é a mais condizente com o preceito de função social da cidade.
Conjuntos Habitacionais Risoleta Neves I e II
Os conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II foram inaugurados em 2011 e 2015
respectivamente, apresentando juntos 660 unidades habitacionais. Os mesmos foram
produzidos pelo Programa Minha Casa Minha Vida do governo federal e edificados pela
Construtora Dharma. Nesses conjuntos foram aplicados 60 questionários.
A caracterização dos moradores desses conjuntos também se deve aos critérios de
priorização na escolha de beneficiários do Programa Minha Casa Minha Vida e aqueles
determinados pelo poder público municipal.
Nota-se que do total de questionários aplicados, em 47 famílias a mulher é responsável
pela unidade. Além disso, 23 famílias residiam em área de risco, sendo que 13 delas
habitavam áreas inundáveis, 7 áreas sujeitas a desabamento de encostas e 3 devido a
precariedade da habitação onde viviam.
Ressalta-se ainda que o número de beneficiários de programas sociais é de 29 famílias.
O número de famílias que apresentam idosos e pessoas com deficiência na composição
Figura 20- Conjunto Habitacional
Risoleta Neves I
Figura 21- Conjunto Habitacional
Risoleta Neves II
Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016)
116
familiar, correspondem a 12 e 4 famílias respectivamente. A origem dos moradores também é
diversificada como no caso dos outros conjuntos habitacionais.
117
Figura 22- Origens dos moradores dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
TIJUCO
GUARDA-
MOR
BONFIM PIO XII
CENTRO
MATOSINHOS
COLÔNIA
DO MARÇAL
SENHOR
DOS
MONTES
FÁBRICAS
118
Localização dos conjuntos habitacionais
Os moradores entrevistados classificaram a localização do conjunto habitacional
quanto à facilidade de acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos. Os resultados
constam no gráfico.
Gráfico 5- Classificação da localização dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II
quanto acesso a comércio, serviços e equipamentos públicos
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Das famílias que participaram da pesquisa, 10 delas consideraram o acesso a
comércio, serviços e equipamentos públicos facilitado pela presença de transporte público no
local, e 7 pelo uso de veículo próprio. Do total de famílias, 43 classificaram como difícil o
acesso a esses serviços indispensáveis devido à dependência ao uso do transporte público. Os
mesmos apontaram que os gastos com o transporte público comprometem a renda familiar.
119
Problemas identificados nos conjuntos habitacionais
Alguns dos problemas relatados pelos moradores do conjunto habitacional estão
reapresentados pelo gráfico.
Gráfico 6- Problemas identificados nos conjuntos habitacionais Risoleta
Neves I e II
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
O principal problema relatado pelos moradores dos conjuntos é a falta de segurança.
Os mesmos apontam fatos como roubos, violência e tráfico de drogas acontecendo no
conjunto habitacional. As famílias se veem obrigadas a habitar uma área de vulnerabilidade
social e com índices de criminalidade. Durante as visitas aos conjuntos habitacionais notou-se
que os moradores têm colocado grades nas portas dos apartamentos como forma de se
sentirem resguardados.
120
Essas ocorrências têm acentuado a segregação do local, uma vez que segundo relato
dos moradores elas se tornaram motivos de discriminação e criaram uma visão negativa para
os conjuntos habitacionais na cidade.
Outro ponto levantado por 8 famílias é o convívio social nos mesmos, marcado por
conflitos e disputas. Esses entrevistados afirmaram que se tiverem oportunidade deixarão de
viver nos conjuntos, mesmo que isso traga novamente gastos com aluguel.
Os moradores também apontam a falta de manutenção nas áreas coletivas dos
conjuntos habitacionais. Diante disso, muitas famílias têm deixado de pagar a taxa de
condomínio por comprometer o orçamento familiar e pelo fato do serviço não ser oferecido.
Também se ressaltou as ações de vandalismo na estrutura dos conjuntos Risoleta I e II,
portões, gradis e equipamentos coletivos encontram-se deteriorados.
Outro problema apresentado por 14 famílias está relacionado à infraestrutura urbana
nos conjuntos, no que diz respeito à oferta de equipamentos coletivos, saneamento básico, e
ao transporte público considerado insatisfatório,
Por fim cabe ressaltar que 4 famílias consideraram a localização dos conjuntos como
um problema, devido a dependência ao uso do transporte público, que além de comprometer a
renda, ainda se torna um obstáculo aos deslocamentos cotidianos a trabalho. Do total de
entrevistados apenas 2 famílias não identificaram problemas no local por considerarem as
condições de moradia adequadas.
Figura 34-Uso de grades nas unidades
habitacionais. Fonte: Acervo pessoal
Figura 23- Uso de grades nas unidades
habitacionais
Figura 24- Uso de grades nas unidades
habitacionais
Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016)
121
Análise comparativa da moradia
Na análise comparativa das condições de moradia antes da mudança para os conjuntos
Risoleta Neves I e II e atualmente, constatou-se que 45 famílias preferiam o local de moradia
anterior enquanto 15 delas preferem os conjuntos habitacionais. Os motivos são apresentados
na seguinte tabela.
Quadro 7- Panorama comparativo da habitação familiar
Famílias que preferem o local anterior de moradia Famílias que preferem o Conjunto
Habitacional
MOTIVOS MOTIVOS
Considerava o local anterior melhor servido por
infraestrutura e comércio
Considera facilitado o acesso ao centro da
cidade onde predominam comércio e serviços
Residia em bairros próximos ao centro da cidade, que é onde
se concentram os equipamentos públicos.
Deixou de viver em área de risco, apesar da
melhor localização do bairro anterior
Total: 45 famílias Total: 15 famílias
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Do total de 45 famílias que preferem o local de moradia anterior, 29 relataram que a
moradia era localizada em bairros mais próximos ao centro da cidade, como Tijuco, Guarda-
Mor, Bonfim e Senhor dos Montes.
As demais famílias apontaram que o bairro em que moravam anteriormente, era bem
servido por infraestrutura e comércio. Esses moradores residiam em bairros como
Matosinhos, Pio XII e Cohab.
Considerando as famílias que preferem residir nos conjuntos habitacionais, 5 delas
apontaram a facilidade de acesso ao centro da cidade devido à presença de transporte público
no local ou uso de veículo próprio.
Além disso, 10 delas pontuaram a possibilidade de deixar de viver em área de risco a
inundação, no caso na Vila Nossa Senhora de Fátima. Contudo ressaltaram que por se
localizar no bairro Matosinhos, essa área era bem servida por infraestrutura.
122
Evasão de moradores dos conjuntos habitacionais
As informações referentes à evasão de moradores do conjunto habitacional foram
obtidas junto aos entrevistados, e estão expressas na tabela abaixo:
Quadro 8- Motivos de evasão dos conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II
MOTIVOS APONTADOS PELOS MORADORES NÚMERO DE FAMÍLIAS
LEVANTADO
Localização do conjunto habitacional 25
Convívio social no conjunto habitacional 14
Venda da unidade habitacional 9
Famílias que alugam a unidade habitacional 7
Beneficiários que não se mudaram para o conjunto 5
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
O principal motivo de evasão apontado pelos moradores é a localização periférica do
conjunto habitacional. Algumas famílias abriram mão do benefício devido às dificuldades de
deslocamento, ausência de infraestrutura e comércio. Além disso, também ressaltaram os
problemas de convívio social no conjunto habitacional.
O aluguel e venda de imóveis também foi relatado e tem se mostrado uma informação
frequente, cabendo ressaltar que a venda ou aluguel de unidades habitacionais é irregular se
realizada antes do período de quitação do financiamento. Outro fator detectado são as famílias
que foram contempladas com o benefício, mas não se mudaram para o conjunto habitacional.
Locais para construção de novos conjuntos habitacionais na perspectiva dos moradores
Os moradores apontaram locais na cidade de São João Del-Rei em que acreditam ser
adequada a construção de novas unidades habitacionais de interesse social.
123
Quadro 9- Locais para construção de novos conjuntos habitacionais
LOCAIS ESCOLHIDOS JUSTIFICATIVAS NÚMERO DE
FAMÍLIAS
Bonfim Proximidade ao centro da cidade, boa
infraestrutura
15
Matosinhos Bem servido por transporte público, boa
infraestrutura e acesso a comércio e
serviços
12
Colônia Bem servido por transporte público, boa
infraestrutura
9
Fábricas Proximidade com o centro da cidade, boa
infraestrutura
8
Centro Onde se concentram comércio, serviços e
equipamentos públicos.
7
Tijuco Nas áreas do bairro que se encontram mais
próximas ao centro
4
Guarda-Mor Proximidade com o centro da cidade 3
Senhor dos Montes Proximidade com o centro da cidade 2
Elaboração: PAIVA, Letícia (2016)
Para os moradores entrevistados, o bairro Bonfim é visto como a melhor opção para a
construção de conjuntos habitacionais, devido à proximidade ao centro da cidade, e por
apresentar boa infraestrutura. No PLHIS (2010) foram selecionados alguns vazios urbanos no
bairro situados no entorno do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo
Cardoso. Outros locais de preferência seriam os bairros de Matosinhos e Colônia, devido à
infraestrutura existente nos mesmos e o acesso ao transporte público que é considerado
satisfatório.
Os bairros Guarda-Mor, Senhor dos Montes e Fábricas, foram escolhidos pela
proximidade dos mesmos em relação ao centro da cidade. No PLHIS (2010) foi identificado
um vazio urbano no bairro Fábricas, sendo o melhor local estabelecido, uma vez que possui
acesso a comércio, serviços, e equipamentos públicos. Os moradores também ressaltaram a
possibilidade de garantir o direito à moradia nas áreas centrais da cidade.
O bairro Tijuco também foi considerado como uma escolha desde que os terrenos se
localizem nas áreas mais próximas ao centro, ou com transporte público satisfatório. No
124
PLHIS (2010) foram selecionados dois vazios urbanos situados no bairro. Contudo, um desses
vazios se encontra em uma área onde as condições de infraestrutura, equipamentos e serviços
necessitam de melhorias de acordo com o macrozoneamento previsto no Plano Diretor
municipal (2006).
Considerações gerais sobre os conjuntos habitacionais analisados
Diante dos dados aqui apresentados, cabe desenvolver uma análise crítica frente à
realidade habitacional e social dos conjuntos estudados. Um dos principais problemas
levantados são as dificuldades de convívio social nos conjuntos habitacionais.
Para as famílias beneficiadas, habitar nessa realidade se constitui como uma
experiência de recomeço, de uma nova construção social. Os moradores se originam de
diferentes bairros da cidade de São João Del-Rei, o que possibilita a ocorrência de conflitos
devido à grande diversidade das famílias.
O acesso a casa própria é mediado por mudanças no círculo social das famílias que se
distanciam da comunidade onde estavam acostumadas a viver, e consequentemente pela perda
das relações de pertencimento e de identidade com o local.
Quando questionados sobre o melhor local para a construção de novos conjuntos
habitacionais, muitas famílias citam como justificativas questões como localização e
infraestrutura urbana, mas é frequente a escolha do bairro em que as mesmas residiam
anteriormente por também se identificarem com o local.
Segundo Ferreira et al. (2014) as políticas habitacionais para a população de baixa
renda privilegiam o capital imobiliário, que constrói moradias nas periferias das cidades
gerando segregação socioespacial e promovendo o processo de desterritorialização desses
indivíduos.
“A desterritorialização pode ser entendida como uma quebra de vínculos já
estabelecidos causando uma perda de territórios, identidades, havendo assim,
uma perda do controle das territorialidades pessoais ou coletivas, do acesso a
territórios sociais, econômicos, infraestrutura e afins. ” (FERREIRA et al.,
2014, p.5).
No caso do conjunto habitacional Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso os
conflitos e disputas decorrentes da desterritorialização eram mais acentuados durante o
período inicial de ocupação do conjunto.
125
Já os conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II construídos em regime de
condomínio, apresentam um grande número de unidades habitacionais e abrigam uma ampla
diversidade social. Diante disso, neles estabeleceram-se territórios de disputa e
vulnerabilidade social de forma mais acentuada.
Se por um lado as famílias beneficiárias salientam a importância da conquista da casa
própria, por outro convivem com disputas de poder e índices de violência. Grande parte das
famílias entrevistadas e que residem nesses conjuntos apontaram as dificuldades em se
estabelecer uma boa convivência coletiva local.
Por sua vez, o caso do conjunto habitacional Dom Lucas Moreira Neves chama
atenção pelo fato dos moradores atribuírem os conflitos sociais ali existentes a construção dos
conjuntos Risoleta Neves I e II no entorno imediato. O que se nota é uma disputa de território,
marcada por uma perspectiva excludente diante da apropriação do espaço pelos moradores
dos demais conjuntos ali existentes.
Outro ponto de análise diz respeito à segregação socioespacial enquanto um dos
processos condicionados pela produção contraditória do espaço urbano inserida no modo de
produção capitalista.
No caso das políticas públicas de habitação os conjuntos habitacionais devido a não
regulamentação fundiária nas cidades localizam-se em áreas isoladas, muitas vezes
desprovidas de serviços básicos. Tais serviços quando não oferecidos pelo Estado tornam
mais próximas a periferia física da periferia social.
A fragmentação territorial delineia bolsões de pouca expressividade política e
econômica, onde serviços essenciais são oferecidos de forma deficiente. A produção
habitacional de interesse social em São João Del-Rei também é marcada por esse processo.
No diálogo com os moradores dos conjuntos habitacionais são notórios o
distanciamento e a dificuldade de se estabelecer uma relação de identidade no que diz respeito
à localização da moradia em relação à cidade de São João Del-Rei.
Grande parte das famílias entrevistadas não identifica o conjunto habitacional no
contexto urbano, há um distanciamento entre os conjuntos e os núcleos mais populosos dos
bairros em que se situam no caso, Tijuco e Bonfim.
Poucos moradores declaram residir nesses bairros. É frequente a utilização dos termos
“predinhos” e “casinhas” para designar o local de moradia, visto como um território
fragmentado e sem conexão direta com a cidade de São João Del-Rei.
126
Os depoimentos das famílias demonstram não apenas os problemas de convívio social
nesses contextos, mas também a relação que os conjuntos habitacionais enquanto territórios
estabelecem com a cidade.
Os conflitos existentes nesses espaços criaram uma visão negativa dos mesmos, e que
gera discriminação por parte dos demais moradores da cidade, o que foi inclusive relatado por
algumas famílias.
Os moradores também apontam o descaso do poder público no atendimento das
demandas locais, alegando viverem em um espaço marcado por esquecimento e por um
sentimento de impotência diante da dinâmica da esfera pública. Assim sendo, também se
conjectura que a falta de construção de uma identidade e de pertencimento é um fator
limitador para que os moradores se articulem na busca por mudanças e mediação de conflitos.
Compreende-se que as informações apresentadas contribuem para o entendimento da
realidade habitacional dos conjuntos estudados, e ampliam o debate frente a produção do
espaço urbano de São João Del-Rei por meio das políticas habitacionais de interesse social.
Nesse momento da pesquisa buscou-se identificar a forma como se materializam as
políticas habitacionais na cidade de São João Del-Rei em momento presente. Isso se deu pela
descrição da realidade urbano-habitacional no município e das relações sociais existentes nos
quatro conjuntos habitacionais estudados. Partindo de uma análise metodológica que se
debruça sobre a realidade visível, essa etapa subsidiará, juntamente com o arcabouço teórico,
a busca pela compreensão das especificidades vivenciadas no momento atual relacionadas à
produção do espaço na cidade de São João Del-Rei e que serão abordadas a seguir no terceiro
momento.
127
TERCEIRO MOMENTO
CAPÍTULO 3. HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL COMO EXPRESSÃO DAS
CONTRADIÇÕES NO ESPAÇO URBANO DE CIDADES DE PEQUENO PORTE
Almeida (2011) ressalta que as cidades brasileiras se formaram inseridas no modo
capitalista de produção, e que o espaço urbano materializa uma contradição fundamental, que
se expõe claramente no contexto espacial: o conflito de interesses entre a reprodução do
capital e as demandas sociais. Esse processo se dá por diferentes sujeitos sociais. No âmbito
habitacional, objeto desse estudo, destaca-se o papel do Estado, proprietários fundiários e dos
agentes imobiliários.
Carlos (2013) evidencia que a produção capitalista, ao incorporar o solo urbano como
mercadoria, transforma-o em valor de troca, redefinindo a produção da cidade, uma vez que
faz do espaço meio e condição de seu constante processo de valorização.
Para a autora o Estado tem importante papel nesse processo, na medida em que
legitima a propriedade privada do solo como direito, direciona o processo de valorização e
desvalorização dos lugares por meio de políticas públicas, e intervém no urbano a partir de
estratégias que viabilizam a reprodução do capital. Neste terceiro momento, será analisada a
sua atuação por meio das políticas públicas de habitação de interesse social.
Conforme Barbosa (2009) as relações sociais estabelecidas pelas diferentes classes
podem influenciar diretamente as ações estatais, mesmo que seus interesses possam ser
conflitantes. Ao se subordinar à lógica do sistema capitalista, o Estado se torna contraditório,
na medida em que, representa a classe dominante e evidencia a relação de forças aí existentes.
“Torna-se relevante compreender ainda a ação do Estado na produção de moradias,
uma vez que o atendimento ou não da demanda habitacional se transforma em um
instrumento político importante para assegurar o controle estatal sobre o espaço. ’’ (COSTA;
OLIVEIRA, 2007, p.37).
Silva (2013) salienta que a produção da habitação busca aprofundar a acumulação do
capital ao ser materializada pela financeirização, especulação imobiliária e pela lógica
inerente ao sistema de mercado. Esse processo pode ser identificado ao longo da trajetória das
políticas habitacionais no Brasil.
Os agentes imobiliários também influenciam na dinâmica espacial urbana vinculada a
provisão de moradias. Segundo Boni (2009) sua atuação baseia-se na constante transformação
da divisão socioespacial, produzindo a obsolescência de determinados espaços e abrindo
128
novas fronteiras de valorização. Assim sendo, reforça-se a segregação, visto que se produzem
áreas valorizadas, inacessíveis à maioria da população.
Segundo Corrêa (2002) o espaço urbano é assim produzido por agentes concretos que
atuam sobre o mesmo, movido pela reprodução do processo de acumulação do capital. Esse
fenômeno ocorre incessantemente pela reorganização espacial através de processos espaciais,
e por meio da criação de novas áreas periféricas.
Considerando-se a materialização das políticas habitacionais nas cidades, Moreira
(2010) afirma que o padrão de moradia adotado evidencia o processo de desigualdade no
espaço urbano. O que se nota é que a inserção urbana segregadora dos conjuntos habitacionais
é reforçada, já que os mesmos se localizam em áreas afastadas do núcleo urbano central,
apresentando problemas quanto à oferta de infraestrutura urbana e serviços.
Essa característica dos empreendimentos retrata a atual vertente das políticas
habitacionais, que se preocupam em atingir uma meta quantitativa sem garantir o acesso à
terra urbanizada. Outra importante questão a ser considerada é a não articulação entre a
política habitacional e a política urbana, que faz com que o alto valor da terra urbanizada se
constitua uma barreira para que se assegure o direito à cidade.
Estes foram alguns dos aspectos que condicionam a produção do espaço nas cidades
brasileiras e que já não se limitam apenas aos grandes centros urbanos, mas também avançam
para a realidade das cidades de pequeno porte. A seguir será discutida a produção da
habitação de interesse social por seus diferentes agentes.
3.1 A produção da habitação por seus diferentes agentes
Segundo Carlos (2008) a produção do espaço urbano recria constantemente as
condições gerais a partir dos quais se realiza a reprodução do capital. Assim o uso do solo
ligado ao processo de produção das relações capitalistas é o modo de ocupação de
determinado lugar da cidade, a partir da necessidade de realização de determinada ação, seja a
de produzir, consumir, habitar ou viver. Nesse momento propõe-se discutir a produção do
espaço do ponto de vista do habitar, considerando-se as políticas públicas de habitação de
interesse social.
Para o entendimento da produção do espaço urbano, Harvey (1980) evidencia que é
preciso então, considerar o monopólio de uma classe sobre o espaço, a alta burguesia no caso
do capitalismo, o que exclui principalmente os pobres da propriedade fundiária. Isso, porque a
129
classe que detém a maior parte dos recursos pode através do dinheiro, ocupar, modelar,
fragmentar o espaço da forma que melhor lhe convém. A maximização dos valores de troca
produz benefícios desproporcionais para alguns grupos e diminui a oportunidade para outros.
O espaço urbano passa então a ter cada vez mais importância para o capital, ao
mesmo tempo em que é influenciado pela dinâmica do modo de produção
capitalista. A predominância do financeiro nas estratégias de acumulação capitalista
tem a produção do espaço como uma das condições de sua realização. (CARLOS,
2004, p.52).
De acordo com Corrêa (2002) o espaço capitalista é um produto social, resultado de
ações acumuladas através do tempo, e engendradas por agentes concretos cuja atuação é
complexa, uma vez que, derivam da dinâmica de acumulação de capital, das necessidades
mutáveis de reprodução das relações de produção, e dos conflitos de classe que dela
emergem.
Leal (2013) identifica no que tange à questão da moradia que o Estado, os
proprietários fundiários, os promotores imobiliários e as empresas incorporadoras são os
principais agentes. Estes refazem os recortes urbanos, transformam glebas rurais em urbanas,
constroem e incitam o consumo de novas formas de morar.
Os proprietários de terras conforme Borges (2011) atuam no sentido de obterem a
maior renda fundiária de suas propriedades, isto é, estão fundamentalmente interessados no
valor de troca da terra urbana e não no seu valor de uso. Podem exercer pressões junto ao
Estado, especialmente na instância municipal, visando interferir no processo de definição das
leis de uso do solo e de zoneamento, buscando a conversão da terra rural em urbana e
ocasionando a expansão da cidade. Além disso, podem ter suas terras valorizadas através do
investimento público em infraestrutura.
Abramo (1989) explica que o incorporador imobiliário é o agente econômico capaz de
modificar e estruturar o espaço urbano e ao passo que age sobre o mesmo cria as rendas
fundiárias. O capital incorporador transforma os usos do solo urbano pelo processo de
valorização, assim sendo, se trata de produção e usos da cidade, onde a terra urbana é
atribuída às atividades que estão em condições de oferecer a renda mais elevada.
Para Corrêa (2002) a estratégia dos produtores imobiliários para produzir moradias
para as camadas populares, é obter ajuda do Estado por meio de créditos imobiliários, e a
criação de mecanismos jurídicos e financeiros de forma a viabilizar a acumulação capitalista.
Esta estratégia é viável em razão da importância da produção de habitações na sociedade
130
capitalista. Cumpre ela um papel fundamental que é de amortecer as crises cíclicas da
economia através do investimento de capital. Daí reside o apoio do Estado.
O Estado é um agente que atua de diferentes formas: como proprietário fundiário,
promotor imobiliário e agente regulador do uso do solo urbano. Além disso, pode
criar restrições institucionais quanto ao mercado de moradia, como zoneamento de
uso do solo, dotação de infraestrutura urbana e alocação de serviços que modificam
o ambiente construído e o valorizam. A ausência destes serviços assevera a
diferenciação socioespacial e paisagística, podendo agravar a segregação e a
fragmentação do espaço urbano. (LEAL, 2013, p.86).
Lefèbvre (1999) afirma que o próprio urbanismo efetivado pelo Estado também deve
ser considerado como uma estratégia de manutenção dos ganhos da classe capitalista no setor
imobiliário, encobrindo as operações realizadas pelo setor público como forma de auxílio à
reprodução do capital e sem colocar em questão a existência da propriedade privada do solo.
Almeida (2011) enfatiza que a intervenção estatal no setor habitacional é necessária,
devido ao alto custo da moradia e à falta de acesso a esse bem por parte da população de baixa
renda que se encontra à margem do mercado formal de habitação. Assim, esse setor sofre uma
intervenção justificada pelos objetivos de maior eficiência e justiça social. Entretanto, a ação
estatal apresenta limites por estar inserida no modo de produção capitalista e que contradizem
a ideia de um Estado mediador de conflitos de classe.
Carnoy (1988) baseando-se nas ideias de Marx afirma que o capitalismo é constituído
por uma sociedade de classes dominada pela burguesia, e que o Estado é a expressão política
dessa dominação. Ele não está acima dos conflitos de classe, mas profundamente envolvido
neles. Dessa forma, o Estado capitalista tem suas origens na necessidade de controlar os
conflitos sociais entre os diferentes interesses econômicos e que esse controle é realizado pela
classe economicamente mais poderosa na sociedade. Essa visão da atuação do Estado será
considerada no debate aqui apresentado.
“O Estado regulador impõe as relações de produção sob forma de dominação do
espaço, imbricando espaços dominados/dominantes para assegurar a reprodução da sociedade
enquanto reprodução continuada do capital e do seu poder. ” (CARLOS, 2004, p.145).
Barbosa (2009) e Farias (2000) evidenciam que diante da atuação do Estado que
prioriza os interesses das classes dominantes, pode-se considerar que apesar do país viver em
um regime democrático, isto não significa a existência do pleno domínio popular. A atual (ou
real) democracia consiste num sistema de disputa pelo poder, por parte de empresas, partidos,
burguesia, dentre outros e que se fundamenta nas relações capitalistas. Nesse sentido,
podemos falar numa democracia capitalista, ou seja, em um conjunto de procedimentos
131
políticos – sistema do voto, competição partidária, representação parlamentar, políticas–,
regido pelo princípio da soberania popular, mas que contribui para a manutenção do sistema
capitalista.
Contudo, para Barbosa (2009) a ação do Estado também é influenciada pelos
movimentos sociais, ainda que em primeiro plano se encontrem os interesses da elite
capitalista. Os movimentos sociais expressam o conflito e a diferenciação de classes na
desigualdade de acesso a bens e serviços urbanos e sociais. Todavia, o Estado possui a nítida
intenção de controlar esses movimentos por meio de políticas públicas, mantendo sua posição
de classe diante dos conflitos de interesses dos diferentes membros da sociedade de classes.
Neste tópico, ressaltam-se as políticas habitacionais.
Borges (2011) destaca que a cada momento da história social e política do país houve
uma fase de intervenção estatal no setor habitacional, ou seja, a transformação urbana das
cidades é oriunda da ação do Estado segundo a ordem estabelecida pelo modo de produção
capitalista.
Lucena (1985) salienta que o Estado tem duas funções importantes no contexto da
cidade e no mercado de habitação, atua como fornecedor de bens públicos e também como
legislador do uso e ocupação do solo. No caso específico do Brasil, atua ainda como
intermediário financeiro, determinando dessa forma as condições gerais dos financiamentos
imobiliários.
Conforme apontado por Royer (2009), as políticas habitacionais têm buscado
fundamentalmente dar respostas às questões da falta de moradia por meio de políticas de
crédito o que se choca com o conceito de universalização da habitação enquanto direito.
Assim, as demandas habitacionais à luz do desenvolvimento capitalista são compreendidas na
maioria das vezes, como um processo de financeirização.
Dessa forma, segundo Silva (2013) torna-se necessário observar o movimento do
capital, dos agentes do processo e encontrar na materialidade da contradição do modo de
produção capitalista, as causas que movem esse sistema em torno do problema da moradia no
Brasil.
O setor imobiliário no Brasil, segundo Botelho (2005), é constituído por atividades de
três áreas: as da indústria da construção civil, ligadas à construção de edifícios e obras de
engenharia civil; as atividades da indústria de materiais de construção e as atividades
imobiliárias como loteamento, compra, venda, aquisição de imóveis e manutenção predial.
132
O autor enumera as formas de atuação desse setor e que interferem diretamente na
problemática habitacional. Primeiramente, está o fato de que os empresários do mesmo
necessitam dispor de um volume considerável de recursos, para adquirirem terras destinadas à
produção imobiliária. A propriedade fundiária é vista como um empecilho uma vez que,
limita as opções de construção, e encarecem o produto final comprometendo a demanda.
Outro aspecto é o alto custo para a produção de habitação, que faz com que seja preciso a
existência de um capital de giro que financie a mesma, o que também contribui para o
encarecimento do produto final, e limita o acesso à moradia apenas para a população com
capacidade financeira de adquirir esse bem.
Diante disso, o Estado se torna um importante agente de influência no setor
imobiliário urbano. Conforme Rolnik (2015 b) o mesmo oferece ampla disponibilidade de
subsídios ao credito habitacional por meio das políticas públicas, e interfere ativamente no
que diz respeito ao preço da terra e à sua valorização, provocando um ciclo de crescimento do
setor nas cidades brasileiras.
Shimbo (2012) e Botelho (2005) consideram que o setor da produção imobiliária de
mercado, voltado para a moradia, passou por um longo processo de constituição de suas
relações com o capital financeiro e o Estado. Tornou-se um setor da economia conduzido por
uma trajetória de crescente financeirização e desregulamentação econômica. Esse processo
pode ser identificado no histórico da política habitacional brasileira por estabelecerem ao
longo do tempo mecanismos que favorecem majoritariamente a atuação do mercado privado,
o que nesse momento será discutido a partir da efetivação da política instaurada durante a
vigência do Banco Nacional de Habitação, até os dias atuais.
Com o início do regime militar no Brasil, ocorreu uma profunda mudança na política
habitacional, com a criação do Banco Nacional de Habitação, órgão central do
Sistema Financeiro de Habitação rearticulando as relações do setor público com o
setor privado. O Estado passou a atuar tanto na produção de moradias, como no
financiamento dos capitais do setor imobiliário e da construção. Interesses
econômicos como o desenvolvimento da acumulação no setor industrial da
construção ou no setor bancário foram os que guiaram as políticas estatais
relacionadas à habitação. (BOTELHO, 2005, p.99-100).
Botelho (2005) analisa que a linha de solução proposta e implementada para o
problema habitacional pelo governo militar era a empresarial, porque buscava um esquema de
autofinanciamento das instituições de promoção habitacional. Ou seja, não era intenção dos
formuladores do Sistema Financeiro de Habitação, criar mecanismos de subsídio à produção
133
habitacional para a população de baixa renda e sim uma forma de financiar a produção
capitalista da moradia com uma racionalidade de mercado.
Carlos (1999) explica que nos países capitalistas os sistemas de produção e circulação
da moradia têm sido financiados com recursos públicos administrados pelo Estado e pela
fração financeira do capital privado. Contudo, com frequência a renumeração do capital
financeiro no setor é considerada não competitiva frente a outras possibilidades de
investimentos e volatilidade dos capitais, o que amplia as dificuldades de fixação no
financiamento habitacional, principalmente para a população de baixa renda.
No governo de Fernando Henrique Cardoso, iniciado em 1995, é que, segundo Shimbo
(2012), se ampliou os princípios de mercado na provisão de habitação. No mesmo ocorreu a
introdução do financiamento direto ao mutuário final, considerada uma importante medida
para a dinamização tanto do setor imobiliário como da construção civil. Nesse período
também é criado em 1997, o Sistema Financeiro Imobiliário, cujos mecanismos permitiram
aproximar o mercado imobiliário do modo de funcionamento do mercado de capitais.
É importante destacar conforme Rolnik (2015 b) que nesse momento o país vê avançar
a hegemonia dos circuitos globalizados do capital e das finanças, assim como as pautas
neoliberais, focada no retraimento da intervenção estatal, no ajuste e na consolidação das
instituições de mercado. Os gastos públicos foram reorientados da promoção de direitos
sociais em direção à aceleração do desenvolvimento de um ambiente favorável ao mercado de
capitais.
Shimbo (2012) afirma que a aproximação entre o Estado, capital financeiro e setor
imobiliário no Brasil se tornou mais forte a partir do Governo Lula. No mesmo a proposta da
Política Nacional de Habitação (2004) destacava a necessidade de se estimular a produção
empresarial de moradias, sobretudo para setores da classe média.
A autora salienta que ainda estava previsto na PNH oferecer segurança jurídica aos
investidores como elemento indispensável para a ampliação do mercado imobiliário. Dessa
forma o governo Lula adota duas medidas: a primeira diz respeito à aprovação da Lei
n˚10.931, conhecida como Lei do Patrimônio de Afetação promulgada em 2004. A segunda
medida foi a liberação de recursos da Caderneta de Poupança que estavam retidos no Banco
Central, visando ampliar os recursos financeiros para o mercado privado.
Cabe explicar que em conformidade com a Lei n˚10.931 (2004) ficou estabelecido que
as construtoras tivessem contabilidade específica para cada empreendimento imobiliário,
inviabilizando a transferência de capital entre empreendimentos. Em caso de falência da
134
construtora os empreendimentos imobiliários não podem ser utilizados para quitação de
dívidas. A mesma também determina que o valor principal da prestação do mutuário seja pago
mesmo quando este entra na justiça questionando os valores do financiamento.
Diante das restrições impostas por essa lei, a saída encontrada pelos grandes grupos
imobiliários a partir de 2005, foi aumentar sua base financeira por meio da
distribuição primária de ações representativas de seu patrimônio a serem negociadas
pelo mercado secundário na Bovespa, ou seja, a abertura de capital na bolsa de
valores, que proporcionou uma rápida alavancagem financeira das empresas. Essa
medida consolidou a aproximação entre mercado financeiro e setor imobiliário no
Brasil. (SHIMBO, 2012, p.63-63).
Conforme Andrade (2012) o discurso dos incorporadores para justificar a captação de
recursos na bolsa de valores era conseguir adquirir novos terrenos que tornassem possíveis
não somente a expansão geográfica de seus negócios para além de suas cidades de origem,
como também a inserção em outros segmentos além da média e alta renda, para os quais essas
empresas sempre construíram seus produtos até então.
Royer (2009) aponta que a intensificação da atividade imobiliária nesse momento se
deveu, portanto, à atuação do governo federal em dois âmbitos, o primeiro se refere à
melhoria do ambiente regulatório, oferecendo maior segurança jurídica para os
incorporadores, como mostrado anteriormente. O segundo está circunscrito à melhoria do
crédito para pessoa física a partir da redução das taxas de juros, do aumento de prazos para
pagamento (até 30 anos) e da diminuição dos valores de entrada para financiamento de
imóveis.
Em 2009, ocorre o lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida, que de acordo
com Rolnik (2015 b) exerceu importante papel ao dinamizar a economia, através da geração
de empregos e fortalecimento do setor da construção civil, em reposta a crise financeira
mundial iniciada a partir de 2008.
Ainda de acordo com Rolnik (2015 b) no advento da crise hipotecária e financeira dos
Estados Unidos, visando evitar a queda do setor imobiliário o governo federal chega a propor
como resposta ao problema a Medida Provisória 443, de 2008, que autorizava a Caixa
Econômica Federal, a comprar ações de empresas da construção civil, no caso, construtoras e
incorporadoras, que por sua vez, se opuserem à medida. Diante disso, passa a ocorrer uma
pressão por parte do setor para que o governo lançasse esse pacote habitacional, prevendo a
intervenção estatal com a concessão de subsídios. O mesmo foi elaborado pelo governo em
135
diálogo direto com empresários e os investidores envolvidos nesse projeto, que viram os
valores de suas ações serem recuperados e impulsionados.
Um importante ponto a ser analisado para Silva (2013) é a postura do governo em
privilegiar o setor da construção civil. A mesma é facilmente compreendida quando se
considera as principais empresas que financiaram as campanhas eleitorais no país nos últimos
anos, sendo as empreiteiras os maiores doadores privados. O Estado busca canalizar a liquidez
dos recursos externos enquanto o setor da construção civil a fim de manter as relações de
poder político e econômico, busca retroalimentar o sistema com doações na expectativa de
retorno do capital investido. Essa forma de reprodução do capital reforça a valorização do
mercado imobiliário, mesmo que de modo artificial, sendo favorável para os detentores de
capital.
Diante desse quadro, notam-se os padrões específicos da articulação entre agentes
públicos e privados no capitalismo brasileiro, expresso, sobretudo nas políticas habitacionais.
Evidencia-se assim os limites da ação do Estado inserido nesse sistema, que notoriamente se
utiliza da demanda histórica da provisão habitacional como instrumento para privilegiar os
interesses do setor da construção civil.
Em relação à produção do espaço urbano vinculada a questão habitacional no país, não
se pode desconsiderar a ação dos grupos sociais excluídos, como evidencia Corrêa (2002).
Para esse autor, na sociedade de classes verificam-se diferenças sociais no que se refere ao
acesso aos bens e serviços produzidos socialmente. A habitação é um desses bens cujo acesso
é seletivo: parcela enorme da população não integra o mercado formal de moradias.
Rolnik (2015 b) afirma que essa estrutura de regulação fundiária excludente, resultou
em um modelo de urbanização que estabeleceu as condições de espraiamento de enormes
assentamentos autoconstruídos nas franjas urbanas, em que formas ambíguas de segurança da
posse e padrões não planejados de uso do solo prevalecem.
Em conformidade com as ideias de Botelho (2005) salienta-se que parcela expressiva
da produção de moradias não está vinculada ao financiamento de recursos oficiais, revelando
uma elevada carga de autofinanciamento na produção de imóveis no país. Os trabalhadores,
ao construírem suas próprias moradias em precárias condições, barateiam a força de trabalho
consumida pelo capital, ao assumirem os encargos de um aspecto fundamental de sua
reprodução: a moradia. E como sua reprodução também faz parte do processo de reprodução
das relações de produção capitalistas, a autoconstrução também se torna um componente
fundamental desse processo dentro das especificidades brasileiras.
136
Trazendo esse debate para a realidade de São João Del-Rei também se nota a atuação
do Estado, proprietários fundiários, promotores imobiliários e dos grupos sociais excluídos na
produção do espaço urbano. Conforme debatido nos momentos anteriores nota-se a vigência
de dois programas habitacionais no município em momento recente o Programa Minha Casa
Minha Vida e o Programa Lares Habitação Popular.
O Programa Minha Casa Minha Vida na cidade, opera da mesma forma que nas
regiões metropolitanas e cidades com mais de 100 mil habitantes. A execução das obras dos
empreendimentos é realizada por construtoras devidamente habilitadas e contratadas pela
Caixa Econômica Federal. No caso do Programa Lares Habitação Popular a articulação entre
o setor privado e a ação estatal também se mantém, uma vez que as unidades habitacionais
também são construídas por empresas cadastradas junto a Companhia de Habitação do Estado
de Minas Gerais.
Como mostra Melazzo (2012) como qualquer outro mercado, o imobiliário está sujeito
às condições mais gerais do ambiente econômico em que se desenvolve no caso o modo
capitalista de produção, seja na escala local, seja com mais intensidade na escala nacional.
Os conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II vinculados ao Programa Minha Casa
Minha Vida foram edificados pela construtora Dharma com sede na cidade de Lavras em
Minas Gerais coordenada pelo Grupo CAP (Carlos Alberto Pereira). O terreno onde foram
construídas as unidades habitacionais era de propriedade privada.
O grupo CAP segundo informações obtidas no site da empresa atua no mercado
imobiliário há mais de 40 anos, e figura entre as dez maiores loteadoras do país, atuando em
onze estados Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais,
Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
Além disso, o mesmo coordena e executa simultaneamente ações em quatro das cinco
regiões do país, trabalhando com diferentes segmentos do setor imobiliário, como no ramo da
construção civil, planejamento, urbanização e vendas de loteamentos residenciais e
comerciais, com atuação em mais de 62 municípios. Na cidade de São João Del-Rei existem
outros dois empreendimentos realizados pelo Grupo CAP os loteamentos Jardim das Acácias
e Colinas dos Inconfidentes.
O conjunto habitacional Parque da Cachoeira que também integra o Programa Minha
Casa Minha Vida foi construído pela Construtora Clip da cidade de Belo Horizonte. A
construtora tem foco na construção e lançamento de empreendimentos no mercado de
137
habitação popular, tendo como campo de atuação as cidades de Belo Horizonte, São João Del-
Rei, Barbacena e Juiz de Fora de acordo com o site da mesma.
A Construtora Clip edificou no município outro empreendimento imobiliário
composto por apartamentos vinculados a Faixa 2 do Programa Minha Casa Minha Vida que
atende famílias com renda entre 3 e 5 salários mínimos.
Durante o processo de construção do conjunto Parque da Cachoeira a empresa
enfrentou problemas financeiros decretando falência e deixando uma dívida ativa com a
União. Diante disso, foi substituída pela Construtora Ribeiro Alvim de Juiz de Fora. A
Ribeiro Alvim Engenharia atua na prestação de serviços de empreitada para instituições
públicas e empresas privadas, atuando no mercado há mais de 30 anos. O terreno onde foi
construído o conjunto habitacional também era de propriedade privada.
Já o Conjunto Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso pertencente ao Programa
Lares Habitação Popular, foi edificado em um terreno pertencente à COHAB-MG, segundo
informações da Prefeitura Municipal de São João Del-Rei. A construtora responsável pelo
empreendimento foi a Edenge Engenharia de Belo Horizonte, que atua na construção civil
desde 1987, realizando obras públicas, residenciais, de saneamento urbano, industriais e
comerciais.
Por fim o conjunto Dom Lucas Moreira Neves foi construído em um terreno de
propriedade privada, através do Programa Lares Habitação Popular pela Construtora Pantheon
de Belo Horizonte. Não foi localizado o site da empresa. Apenas constatou-se que a mesma
realiza obras públicas em geral, atua na área de incorporação imobiliária e na compra e venda
de imóveis.
Nota-se então que os conjuntos habitacionais não foram construídos por construtoras
do mercado local da construção civil, mas por grupos maiores com campo de atuação amplo,
interessados em expandir seus mercados e com capital financeiro para conduzir a produção de
um maior número de unidades habitacionais.
Outro ponto a ser evidenciado é as construtoras Dharma e Clip possuem outros
empreendimentos imobiliários em São João Del-Rei, voltados para a classe média. Os
mesmos localizam-se em áreas mais valorizadas da cidade, em bairros melhor servidos por
infraestrutura e próximos ao núcleo urbano central, diferentemente dos conjuntos
habitacionais de baixa renda por elas construídos, inseridos na periferia.
Assim, conforme Carlos (2013), sob as relações capitalistas, o espaço urbano se tornou
uma mercadoria fazendo com que seu acesso seja determinado pelo mercado imobiliário, uma
138
vez que os usos submetidos ao valor de troca se articulam a partir do lugar da moradia. Além
disso, se a existência da propriedade privada esfacela a cidade limitando seu acesso e
restringindo a prática socioespacial, para a autora o que une e dá sentido a estes fragmentos é
a existência do Estado, viabilizando a reprodução do capital.
No caso de São João Del-Rei a atuação do poder público municipal também legitima
esse processo, uma vez que não aplica a legislação urbana vigente, o que favorece a
ocorrência da especulação fundiária e a ação do mercado imobiliário, cabendo ao mesmo
estabelecer os eixos de valorização no espaço urbano, em detrimento da função social da
cidade.
Outros agentes que também determinam a produção do espaço na cidade são os grupos
sociais excluídos do mercado formal de moradias, que asseguram a provisão habitacional por
meio da autoconstrução em loteamentos precários na periferia e escassamente urbanizados.
Além disso, deve-se considerar o próprio mercado imobiliário provedor de habitação para
aqueles que têm condições de pagar pela moradia, que na sociedade capitalista de classes se
torna uma mercadoria. No próximo tópico propõe-se discutir as relações existentes entre a
política habitacional e a produção do espaço urbano.
3.2 Impactos da política habitacional no espaço urbano
De acordo com Albuquerque (2009) é preciso compreender o urbano como um
produto social. Assim, o mesmo se torna um pressuposto para a compreensão da produção do
espaço sob o sistema capitalista, visto que este passa a ter um valor político e econômico para
a repro1dução do capital.
Lefèbvre (2001a) salienta que a própria cidade é uma obra, e esta característica
contrasta com a orientação irreversível na direção do dinheiro, do comércio, das trocas, e dos
produtos. A obra é valor de uso e o produto é valor de troca. Para ele a cidade e a realidade
urbana dependem do valor de uso, contudo o valor de troca e a generalização da mercadoria
ocorridas a partir da industrialização tenderam a subordinar a cidade, tornando-a mercadoria.
É sob esse viés que se dá a produção do espaço.
Para Carlos (2004) o espaço como produto do trabalho do homem nos leva a refletir
sobre o processo de produção social . A questão é como se dá a configuração específica da
produção espacial através das relações capitalistas de produção . O capital aparece como uma
139
relação social fundamentada nas lutas e contradições de classe,o que nos obriga a entender
esse processo em seu dinamismo.
Lefèbvre (2001a) evidencia que o termo produção deve ser tomado em uma acepção
mais ampla do que a utilizada pelos economistas, se estendendo à produção de coisas
(produtos), obras, ideias, ideologias, conhecimento, e de verdades. Além disso, para o autor a
história resume a produção do ser humano por ele mesmo. Partindo do passado distante ao
presente, é preciso que se retome em sentido contrário esse caminho para compreender como
esse passado pode engendrar o presente, percurso metodológico utilizado nessa pesquisa, a
fim de se compreender a complexidade inerente à produção social do espaço.
Albuquerque (2009) ressalta que a produção do espaço pode ser assim entendida como
um processo de materialização do trabalho humano sob a égide do capital, produzindo
espaços diferenciados de acordo com a força dos diferentes agentes produtores do espaço.
Essa produção se estabelece na condição de espaço como mercadoria, fruto da propriedade
privada da terra, orientada pelas estratégias do capital que direcionam este processo.
Segundo Sanfelice (2009) o Estado se coloca como importante agente na produção do
espaço uma vez que é o provedor de infraestrutura física e social para a reprodução social
como um todo. Diante da impossibilidade de distribuição plena e equânime dos recursos
físicos e sociais as decisões do Estado afetam diretamente a atividade imobiliária,
principalmente suscitando comportamentos especulativos por parte de proprietários fundiários
e investidores.
Sempre que o poder público dota uma zona qualquer da cidade de um serviço
público, ele desvia para esta zona demandas de empresas e moradores que
anteriormente, devido à falta do serviço em questão, davam preferências a outras
localizações. Estas novas demandas estão preparadas a pagar pelo uso do solo, em
termo de compra ou aluguel, um preço maior do que as demandas que se dirigiam à
mesma zona quando esta ainda não dispunha do serviço. Daí a valorização do solo
nesta zona, em relação às demais. (MARICATO, 1979, p.34).
Como aponta Silva (2013), o Estado dado suas funções, também atua na oferta
habitacional, por meio de políticas públicas. Como provedor de serviços urbanos, desempenha
importante papel no condicionamento das demandas do uso do solo, direcionando por vezes,
para áreas específicas da cidade e, por conta disso, influenciando seu preço. Além disso, pode
criar restrições institucionais quanto ao mercado de moradia, como zoneamento do uso do
solo e alocação de serviços que modificam o ambiente construído e o valorizam.
140
Conforme Leal (2013) e Schmidt (1983), a intervenção do Estado na produção do
espaço permite que as relações capitalistas se reproduzam. A política urbana se define como
meio de resolver as manifestações acarretadas pelo desenvolvimento de uma economia de
mercado. Porém, a preocupação do Estado está voltada para atingir níveis mais altos de
acumulação e não de resolver questões sobre propriedade privada e socialização do capital.
Assim, o poder político dispõe de instrumentos ideológicos e científicos. De acordo
com Lefèbvre (2001a), ele tem capacidade de ação, podendo modificar a distribuição de
recursos, dos rendimentos, do valor criado pelo trabalho. Nos países capitalistas atualmente o
sistema utilizado é o neoliberalismo, que permite ao máximo de iniciativa à empresa privada,
e no que concerne ao urbanismo, aos promotores imobiliários e bancos.
Silva (2013) afirma que a estreita relação entre capital financeiro, setor imobiliário e
Estado, traz consequências diretas para a população de baixa renda, pois tal dinâmica força
uma valorização do mercado de terras urbanizadas e, de um modo geral, obriga que essa
população busque moradia nas zonas periféricas, em locais aonde o processo de valorização
do solo ainda não chegou de forma acentuada.
Rufino (2016) e Spósito (2004) mostram que é sobre essas periferias que na atualidade
se evidencia a expansão da produção imobiliária de mercado, tornando-se predominante no
processo de urbanização. Em parte, a periferização foi propiciada pelos financiamentos
públicos destinados à aquisição de imóveis construídos nessas áreas ou pela implantação dos
programas habitacionais estatais.
A política habitacional desempenhou historicamente um papel central na
consolidação de um modelo urbano que reproduz um padrão de segregação
socioespacial. A construção de grandes conjuntos habitacionais em áreas periféricas
onde a terra é mais barata contribuiu substancialmente para impulsionar o
espraiamento urbano, a proliferação de um padrão urbanístico monofuncional e o
estabelecimento de uma divisão territorial entre ricos e pobres. (ROLNIK, 2015 b,
p.313-314).
Botelho (2005) enumera que a segregação se dá de diferentes formas: está relacionada
à oposição entre o centro, onde o preço do solo é mais alto e a periferia; separação entre zonas
e moradias reservadas às camadas sociais mais privilegiadas e de moradia popular;
esfacelamento generalizado das funções urbanas, disseminadas em zonas geograficamente
distintas e cada vez mais especializadas e a segregação dos equipamentos coletivos. Nessa
análise será discutida a segregação residencial no espaço urbano.
141
Corrêa (2001) aponta que a segregação parece constituir-se como uma projeção
espacial do processo de estruturação de classes e da produção de residências na sociedade
capitalista. A segregação socioespacial revela o problema habitacional vivido pela parcela
pobre da população nas cidades brasileiras, visto ser a habitação a forma mais visível desse
processo.
Ao mesmo tempo, de acordo com Carlos (2013), a segregação se mostra como
desdobramento da contradição que produz o espaço urbano que é, ao mesmo tempo e
dialeticamente, valor de uso (condição necessária à realização da vida) e valor de troca
(mercadoria cujo uso está submetido ao mercado imobiliário visando à produção do valor). A
paisagem urbana revela as desigualdades que são socioespaciais, porque são fundamentadas
num processo contraditório de produção social do espaço, no qual a valorização/circulação de
capitais de diferentes níveis (locais, regionais e globais) pressupõe a produção da cidade como
condição e meio de sua própria realização, o que implica a adoção de estratégias e alianças
(no plano econômico e político) que buscam viabilizar seus objetivos, qual seja, a reprodução
ampliada.
Harvey (1982) analisa que os conflitos que se concentram sobre o ambiente construído
exibem certas características peculiares porque o poder monopolístico conferido pelos
arranjos da propriedade privada gera não apenas o poder de se apropriar da renda, mas
também confere aos proprietários o monopólio natural do espaço. O caráter fixo e imóvel do
ambiente construído acarreta a produção de uso de mercadorias sob condições de competição
espacial, com fortes efeitos de vizinhança e externalidades. Esse monopólio pode ser
identificado na inserção dos conjuntos habitacionais de baixa renda, edificados fora das áreas
mais valorizadas da cidade onde residem as classes privilegiadas.
Outro aspecto inerente à produção do espaço urbano por meio das políticas de
habitação de interesse social, diz respeito à fragmentação socioespacial. Spósito (2011)
explica que a fragmentação urbana repousa sobre uma imagem: a sociedade (e seus territórios,
em particular urbanos) seria um todo que se quebra em pedaços. Esta imagem é tanto mais
eficaz porque se pode associar a elas ‘provas’ sociais e espaciais: criação de fronteiras ou de
rupturas internas às aglomerações, isolamento dos grupos, uns em relação aos outros,
expresso pela segregação de áreas residenciais fechadas, fortes disparidades no acesso aos
serviços urbanos, falta de sentimento de pertencimento. Esse processo traduz as desigualdades
e rupturas entre grupos sociais e territórios, e também pode ser notado na materialização das
políticas de habitação no espaço urbano que serão agora analisadas.
142
Pensando-se a política habitacional em momento recente, nota-se que no âmbito
nacional ela tem se restringindo a ação do Programa Minha Casa Minha Vida. O primeiro
ponto a ser ressaltado sobre o programa é, de acordo com Rufino (2016), o fato de que o
mesmo se utiliza de três estratégias para assegurar a ampliação da lucratividade na produção
habitacional para baixa renda, seriam elas: padronização da construção, geração de economia
de escala e busca por terrenos mais baratos. O programa MCMV atribui o poder de decisão
sobre a localização e o desenho do projeto para os agentes privados.
Conforme a autora, a busca pela disponibilidade de grandes glebas e terrenos mais
baratos direciona os empreendimentos para as periferias das cidades, que anteriormente não
eram consideradas pela atuação do mercado formal. Assim, além de se abrirem novas frentes
de urbanização, contribuem para o adensamento dessas áreas. A apropriação de novas áreas e
dos tecidos existentes tem, entretanto, caráter seletivo, associando basicamente dois aspectos
principais: menor custo da terra e disponibilidade de alguma infraestrutura de mobilidade.
Cardoso e Aragão (2013) analisam que o fato das construtoras buscarem terrenos mais
baratos na periferia se reverte como ampliação das margens de lucro e não na redução do
preço final da moradia que favoreceria os adquirentes. Essa estratégia de valorização do
capital tem como consequência um aumento do “custo” social final do empreendimento, já
que os adquirentes terão que arcar com maiores despesas de transportes e com problemas de
infraestrutura no entorno, pagando então pelo lucro das construtoras e reafirmando o modelo
da espoliação urbana que caracteriza o processo de urbanização brasileiro historicamente.
Ferreira (2012) mostra que a produção de unidades em grande escala nos conjuntos
habitacionais vem sendo adotada no Programa MCMV como forma de diluição dos preços do
terreno e da construção, reforçando a tendência de espraiamento territorial, na medida em que
parte das grandes glebas disponíveis se encontra fora dos centros urbanos mais consolidados,
na qual já existem equipamentos, serviços e infraestrutura instalada. Além disso, ao assumir
como mote principal uma perspectiva quantitativa o mesmo promove o processo de
valorização fundiária que drena os subsídios públicos ao pagamento dessa valorização,
beneficiando os proprietários fundiários.
Segundo Arantes e Fix (2009) com o intuito de viabilizar o maior número de
empreendimentos, o poder municipal fica refém de uma forma predatória e fragmentada de
expansão da cidade. O modelo de provisão mercantil e desregulada da moradia irá sempre
buscar a maximização dos ganhos por meio de operações especulativas. Não há nenhum
instrumento no MCMV que estimule a ocupação de imóveis construídos vagos, de forma a
143
contribuir para o cumprimento da função social da propriedade prevista no Estatuto da Cidade
(2001).
Cardoso e Aragão (2013) enumeram outras críticas referentes ao Programa MCMV.
Seriam elas: falta de articulação do programa com a política urbana; a ausência de
instrumentos para enfrentar a questão fundiária; excessivo privilégio concedido ao setor
privado; a baixa qualidade arquitetônica e construtiva dos empreendimentos; a
descontinuidade do programa em relação ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse
Social e a perda do controle social sobre a sua implementação.
Bonduki (2009) ao estabelecer um comparativo entre o Programa MCMV e o Plano
Nacional de Habitação – PlanHab (2009) afirma que o MCMV não emprega o conjunto de
estratégias previstas no PlanHab. A localização dos empreendimentos visa apenas a
lucratividade, não se adota por exemplo, uma das estratégias contidas no PlanHab de oferecer
um valor adicional de subsídio para os empreendimentos habitacionais localizados em áreas
mais centrais e consolidadas.
O autor ainda evidencia que do ponto de vista da articulação entre a política urbana e
habitacional o PlanHab propôs incentivar, com prioridade no acesso aos recursos, os
municípios que adotassem políticas fundiárias e urbanas corretas. Entretanto a grande maioria
dos municípios que formularam planos diretores, não puseram em prática os instrumentos
para combater a especulação imobiliária, e não se estabeleceu essa priorização dos recursos
para execução do programa na escala municipal.
Rolnik (2015 b) analisa que dentre as diferentes faixas de renda atendidas pelo
programa, os conjuntos para o faixa 3 são os que mais se aproximam das áreas centrais mais
bem equipadas das cidades, enquanto os empreendimentos do faixa 1 estão claramente
dispersos pelas periferias mais afastadas, em lugares que não apenas são distantes dos
territórios privilegiados, mas também são homogêneos do ponto de vista social. Se o
programa passou a atingir uma camada da população que historicamente não era atendida
pelas iniciativas federais na área habitacional, não chegou a interferir no lugar
tradicionalmente ocupado por ela nas cidades, reproduzindo o padrão periférico. Além disso,
os conjuntos habitacionais são edificados com carências de equipamentos públicos e
permanecem sem acesso a comércio e serviços, os quais muitas vezes passam a ser oferecidos
por meio informais.
As análises aqui apresentadas também se estendem ao Programa Lares Habitação
Popular do governo de Minas Gerais. Os conjuntos habitacionais edificados pelo mesmo
144
também apresentam localização periférica em áreas desprovidas de infraestrutura,
contribuindo para a expansão do tecido urbano. Além disso, também se nota a produção de
unidades habitacionais padronizadas e em larga escala, criando espaços homogêneos e
caracterizados pela segregação socioespacial.
Cabe agora debater como se dá o impacto das políticas habitacionais no espaço urbano
de São João Del-Rei. Cota e Diório (2013) observam que na cidade nota-se uma tendência de
produção do espaço marcada pela extensão do tecido urbano e pela descontinuidade em
relação às áreas já implantadas, reforçando o caráter disperso e fragmentado da cidade, fruto
inclusive dos interesses dos agentes produtores do espaço.
Além disso, as autoras apontam que a cidade vem apresentando um processo de
crescimento marcado por forte especulação imobiliária, que se acredita estar vinculado ao
crescimento da Universidade Federal de São João Del-Rei, e vem interferindo nas relações de
produção do espaço. Os agentes locais, sejam eles proprietários fundiários, incorporadores e o
setor imobiliário despertaram para a possibilidade de agregar valor às áreas até então, não
ocupadas – seja loteando áreas de expansão urbana municipal, ou parcelando glebas rurais –
transformando-as em lucrativos produtos imobiliários que se destinam principalmente ao
segmento de média renda da população.
Por sua vez ressalta-se a também a atuação do Estado na produção do espaço por meio
da implantação de programas habitacionais de interesse social voltados para famílias de baixa
renda no município. Os quatro conjuntos habitacionais estudados nessa pesquisa, tais sejam
Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso, Dom Lucas Moreira Neves e Risoleta Neves I e II
foram implantados em terrenos afastados das áreas centrais, nas periferias urbanas habitadas
por segmentos de baixa renda, criando agrupamentos urbanos por extratos de renda,
diferentemente dos loteamentos de classe média que se situam em áreas de valorização
imobiliária e próximas ou com fácil acesso ao centro da cidade.
Para Rufino (2016) essa forma de ação estatal promove a expansão das periferias,
disseminando a valorização imobiliária em áreas que até então não haviam sido objeto de
investimentos imobiliários. O horizonte desse processo é a priorização de urbanização
segregada e privada, isso porque cada localidade busca compatibilizar suas demandas
específicas com a necessidade de articulação com o mercado e com os interesses globais via
produção do espaço.
Segundo Pereira (2005), nessa reestruturação espacial as estratégias de crescimento da
cidade passam a depender do setor financeiro e do imobiliário, conformando novos laços
145
entre a valorização e a propriedade da terra. Assim, a produção do espaço urbano subordinada
aos interesses imobiliários e financeiros acentua os processos de espoliação urbana.
Notadamente, esse modelo de expansão urbana, não se desenha sem traços
segregatórios. Pelo contrário, a divisão economicamente hierarquizada do espaço se
mostra cada vez mais nítida, permitindo-nos identificar claramente três padrões de
ocupação na cidade de São João Del-Rei: o da área central (centro histórico
protegido pelo patrimônio cultural), o das periferias de classe média e média-alta; e
o dos territórios periféricos habitados pela população de baixa renda. (COTA,
DIÓRIO, 2013, p.11).
Em relação aos conjuntos habitacionais existentes, aponta-se que os residenciais Dom
Lucas Moreira Neves e Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso edificados pelo Programa
Lares Habitação Popular do governo estadual localizam-se em áreas periféricas de São João
Del-Rei, e não asseguram o direito à moradia de forma ampla no que diz respeito ao acesso a
equipamentos, comércio e serviços. No entanto, cabe mencionar que no entorno do conjunto
Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso já começaram a se instalar alguns estabelecimentos
comerciais, considerando-se que o mesmo já se encontra consolidado por ter sido o primeiro
conjunto habitacional da cidade.
Os mesmos foram edificados na tipologia de unidade unifamiliar isolada no lote,
apresentando um grande número de unidades habitacionais e a ausência de equipamentos
coletivos, apenas no conjunto Marechal Cyro do Espírito Santo Cardoso nota-se a existência
de uma pequena praça.
Figura 25 - Atividades comerciais no
conjunto habitacional Marechal Cyro
do Espírito Santo Cardoso
Figura 26 - Atividades comerciais no
conjunto habitacional Marechal Cyro
do Espírito Santo Cardoso
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
146
Analisando-se os conjuntos habitacionais Risoleta Neves I e II vinculados ao
Programa MCMV nota-se que eles apresentam a mesma inserção urbana em áreas
desprovidas de infraestrutura, e da oferta de comércio, serviços e equipamentos públicos,
detectada em diversos empreendimentos por todo território nacional. No caso específico
desses conjuntos é possível notar algumas atividades comerciais oferecidas de modo informal
por moradores que ali residem.
Além disso, também se evidencia a homogeneizante produção de moradias em larga
escala, restrita a grandes condomínios inseridos no mesmo terreno e que oferecem como áreas
Figura 29 - Atividades comerciais
desenvolvidas pelos moradores
Figura 30 - Atividades comerciais
desenvolvidas pelos moradores
Figura 27 – Praça existente no conjunto
habitacional Marechal Cyro do Espírito
Santo Cardoso
Figura 28 – Praça existente no conjunto
habitacional Marechal Cyro do Espírito
Santo Cardoso
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
147
coletivas espaços pouco utilizados que se reduzem a um centro comunitário, uma pequena
quadra e alguns mobiliários urbanos.
Diante do exposto considerando as políticas habitacionais em São João Del-Rei,
acontece à mesma reprodução espacial contraditória que vem sendo disseminada pelo
território nacional, marcada por fenômenos como dispersão urbana e segregação
socioespacial. Essa análise se evidencia quando se estabelece um comparativo do Programa
MCMV entre São João Del-Rei e outros contextos espaciais no território nacional.
Figura 31– Equipamentos coletivos
existentes no conjunto habitacional
Risoleta I
Figura 32 – Equipamento coletivo
existente no conjunto habitacional
Risoleta I
Figura 33 – Equipamentos coletivos
existentes no conjunto habitacional
Risoleta II
Figura 34 – Equipamentos coletivos
existentes no conjunto habitacional
Risoleta II
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
Fonte: Acervo pessoal (2016) Fonte: Acervo pessoal (2016)
148
Para efeitos de comparação serão utilizados alguns dados provenientes da avaliação do
Programa Minha Casa Minha Vida em seis estados brasileiros Pará, Ceará, Rio Grande do
Norte, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. A mesma foi lançada em 2015 e
desenvolvida a partir de projetos de pesquisa e equipes articuladas na Rede Cidade e Moradia,
com a participação de universidades públicas, privadas e duas organizações não
governamentais. Foram escolhidos os diagnósticos desenvolvidos para a região metropolitana
de Belo Horizonte, Minas Gerais, contexto urbano próximo ao recorte espacial dessa pesquisa
e os dados obtidos na pesquisa do estado de São Paulo.
No caso da região metropolitana de Belo Horizonte, foram estudados conjuntos
habitacionais inseridos na faixa 1 do MCMV nas cidades de Belo Horizonte, Betim, Caeté,
Contagem, Ribeirão das Neves e Vespasiano. Nascimento et.al (2015) constataram que a
localização dos empreendimentos do PMCMV é predominantemente nas periferias da malha
urbana, em áreas com baixos índices de bem-estar urbano. A implantação dos
empreendimentos muitas vezes consiste na continuidade de processos prévios de expansão e
adensamento de periferias tradicionalmente populares. Também se ressalta o grande porte dos
empreendimentos e sua característica monofuncional como impulsionadores de novas
transformações do território em seu entorno.
Para os pesquisadores soma-se a esse cenário do PMCMV, a fragilidade
socioeconômica, já evidente entre os beneficiários, agora agigantada pela baixa qualidade
urbanística (péssimas localizações, grandes deslocamentos diários, ausência de equipamentos
sociais e culturais) e arquitetônica (tipologias mínimas padronizadas incompatíveis com a
diversidade das composições familiares, complexificação presente na forma-condomínio) dos
empreendimentos.
A avaliação empreendida no Estado de São Paulo foi resultado de uma pesquisa em
sete empreendimentos de Faixa 1 (que atende famílias com renda familiar mensal de até
R$1.600,00), nos municípios de Hortolândia, Campinas, Osasco, e São Paulo. Rolnik et al.
(2015 a) enfatizam que o direito à moradia adequada, diz respeito à infraestrutura urbana,
acesso a saneamento básico e disponibilidade de serviços e equipamentos públicos básicos.
Nas análises realizadas pelos pesquisadores os moradores estabeleceram uma comparação
entre os conjuntos habitacionais e os locais de moradia anterior. Nela constatou-se que se há
uma maior satisfação com a infraestrutura básica, há uma insatisfação com a questão do
acesso a serviços e equipamentos públicos. Dentre os entrevistados, a avaliação predominante
149
é de que, com a mudança da moradia anterior para a atual, houve piora no acesso ao
comércio, ao local de trabalho, a equipamentos etc.
A equipe de pesquisadores mostrou ainda que o padrão de localização dos
empreendimentos do PMCMV é caracterizado por parques habitacionais monofuncionais em
periferias longínquas e subequipadas, muitas vezes apartadas do tecido urbano, com
condições precárias de urbanidade e de acesso aos serviços e à vida da cidade. Grande parte
das famílias beneficiárias saiu de áreas com renda média mais elevada e foi alocada em uma
região ocupada predominantemente por população de baixa renda.
Diante dessas informações pode-se analisar que independente do porte das cidades a
forma como vem sendo conduzida as políticas habitacionais é a mesma, caracterizada pela
priorização da reprodução do capital em detrimento do direito à moradia de forma plena. Isso
se evidencia na localização dos empreendimentos em áreas onde o preço da terra é mais
barato, desprovido dos recursos básicos inerentes à vida urbana; na redução do habitar e na
precarização das condições de moradia quando se compara com os locais de origem dos
moradores desses conjuntos. Todos esses aspectos puderam ser identificados em São João
Del-Rei durante o processo de coleta de dados da pesquisa.
Dessa forma, para Silva (2013) o modo como os programas habitacionais são
executados mantém a desigualdade e a segregação nas cidades dominadas pelo capital
imobiliário rentista e pelo patrimonialismo visceral, gerando desse modo, não só condições
desiguais de acesso à moradia como do próprio acesso ao direito à cidade. O direito à cidade é
aqui entendido conforme a definição de Lefèbvre (2001b) como o direito à vida urbana,
priorizando o valor de uso do espaço urbano.
Diante disso, Carlos (2015) enfatiza a importância de se colocar no centro do debate o
direito à cidade como possibilidade de questionamento sobre as formas de atuação do poder
público, em que o espaço se revela instrumento político intencionalmente organizado e
manipulado por meio de um poder que se realiza enquanto estratégia de classe, bem como
diante das condições de vida precarizada. Questiona-se assim, o processo de valorização
aliado às estratégias dos empreendedores imobiliários que ao intervirem no urbano, interferem
na prática socioespacial e com isso, nos modos de apropriação do espaço da vida.
Harvey (2014 a) destaca que cada vez mais o direito à cidade vem caindo nas mãos de
interesses privados, como hoje existe, encontra-se muito mais estreitamente confinado, na
maior parte dos casos, na mão de uma pequena elite política e econômica com condições de
moldar a cidade cada vez mais segundo suas necessidades particulares. Assim, pensando-se a
150
questão habitacional nota-se que tem prevalecido o direito à acumulação do capital por parte
do setor imobiliário via produção do espaço urbano, em detrimento do direito à moradia e,
sobretudo à cidade. A seguir propõe-se analisar as contradições da produção do espaço urbano
via políticas habitacionais no contexto de São João Del- Rei.
3.3 Materialização das políticas habitacionais no espaço urbano de São João Del- Rei
Neste tópico propõe-se discutir as contradições existentes no espaço urbano de São
João Del-Rei produzido por meio da materialização das políticas habitacionais de interesse
social. Para Leal (2013) a cidade é produzida e organizada pelos agentes produtores do espaço
de modo a permitir a reprodução do capital. O espaço citadino é configurado segundo lógicas
econômicas provenientes dos interesses dos agentes que atuam na produção da cidade. Os
mesmos não atuam de forma idêntica: os mais poderosos econômica ou politicamente
conseguem atuar mais abrasivamente na configuração do espaço. Destaca-se a atuação do
Estado, proprietários fundiários e promotores imobiliários.
Barbosa (2009) salienta que as ações contraditórias do Estado capitalista, se
especializam de forma visível, na segregação espacial, na diferença de distribuição de
infraestrutura e serviços entre espaços habitados por ricos e pobres e na forma de condução
das políticas públicas. As políticas públicas são ações de Estado com finalidade de proteção
social e redistribuição dos benefícios sociais visando à diminuição das desigualdades
estruturais produzidas pelo desenvolvimento socioeconômico. As políticas habitacionais,
assim como outras modalidades, servem como instrumento de dominação do Estado sobre a
sociedade, fundamentalmente, sobre os segmentos mais pobres, que se tornam dependentes do
poder público.
No caso específico de São João Del-Rei nos locais aonde vem sendo implantada
programas habitacionais voltados para famílias de baixa renda isso se torna evidente, uma vez
que os agentes produtores do espaço criam na cidade diferentes eixos de valorização
imobiliária a partir da localização e agrupamento dos diferentes extratos sociais no espaço
urbano.
Além disso, no caso das famílias beneficiárias dos programas habitacionais aqui
vigentes, muitas vezes os mesmos se configuram como única alternativa para que essas
famílias acessem o mercado formal de moradias por meio da concessão de subsídios públicos.
Contudo, essas famílias tornam-se subjugadas à ação do Estado na medida em que não
151
possuem papel nas decisões da provisão habitacional. Passam a integrar um financiamento
imobiliário, mas sem o poder de decisão referente à localização ou as características da
moradia a ser adquirida. Assim sendo, sabe-se que como ocorre no contexto nacional o Estado
prioriza a atuação do setor privado na questão habitacional e que essa passará a ser regida pela
lógica da acumulação e lucratividade.
Segundo Carlos (2008) o uso da cidade remete-nos à análise das relações sociais de
produção. O mercado será o elo e os seus mecanismos determinarão a garantia de acesso à
propriedade privada, pela possibilidade de pagamento do preço de terra. Os fatores que
determinarão a formação do preço vinculam-se principalmente, à localização do terreno, a
acessibilidade, acesso à infraestrutura existente, à privacidade; e, secundariamente têm-se
fatores vinculados ao relevo, que se refletem nas possibilidades e custos de construção. Por
isso, no município identifica-se a manutenção do padrão de escolha locacional dos conjuntos
habitacionais de baixa renda nas franjas urbanas dos bairros onde se situam a parcela da
população de menor poder aquisitivo, já que os terrenos são menos valorizados.
Conforme Villaça (2001) a segregação socioespacial existe porque responde às
necessidades de dominação da classe dominante. A segregação permite o controle do espaço
pela classe dominante, que se apropria das centralidades que são a essência do urbano. Se
expressa, na morfologia profundamente desigual das habitações, e hoje, marcadamente pela
quase impossibilidade da presença na cidade, para grande parte dos seus habitantes.
A segregação socioespacial não pode ser compreendida apenas pela diferenciação e
isolamento espacial da função habitacional, mas pelas dificuldades de ter acesso ao
conjunto da cidade, tanto no sentido objetivo, para aqueles que enfrentam as
limitações orçamentárias para o acesso às formas mais eficientes de deslocamento e
comunicação, como no sentido subjetivo, tendo em vista as dificuldades de
construção de uma identidade urbana. (SPÓSITO, 1996, p.82-83).
De acordo com Botelho (2005) há uma intensa relação entre o crescimento da
segregação socioespacial e o modelo de crescimento econômico adotado há décadas pelo
Estado brasileiro em conformidade com o empresariado dito nacional, por meio da formação
de uma relação clientelista, constituindo-se em uma maneira de expandir e aumentar sua
lucratividade.
Assim como foi discutido nos momentos anteriores em São João Del-Rei a inserção
dos conjuntos habitacionais se dá de forma fragmentada e segregada no espaço. A segregação
se manifesta em diferentes âmbitos conforme foi identificado nas visitas realizadas nos quatro
152
com conjuntos habitacionais estudados. Manifesta-se na dificuldade de acesso à cidade,
sobretudo ao centro, em virtude da localização dos mesmos, que tornam as famílias que ali
residem dependentes do uso de meios de transporte, comprometendo a renda familiar. No
tratamento homogêneo conferido as unidades habitacionais, construídas sem se atentar para as
especificidades locais e culturais e no distanciamento e ausência de identidade dos moradores
para com os conjuntos e o contexto urbano em que se encontram.
Isso ocorre porque há a dominação do espaço urbano pelas classes dominantes,
sobretudo o mercado imobiliário que escolhe as melhores áreas da cidade para a construção
de empreendimentos voltados para as classes de rendimento médio e alto, que se sustenta no
fato de que em São João Del-Rei não são aplicados os instrumentos da política urbana, que
combateriam o uso especulativo da terra, o que acaba por atender os interesses desses grupos
na escala local. Mesmo sendo objetivos do Plano Diretor (2006) estimular a democratização
do acesso à terra urbana, à habitação, ao saneamento básico, aos transportes, aos sistemas de
infraestrutura e serviços urbanos, priorizando o atendimento à população de baixa renda, o
padrão dos programas habitacionais implantados favorece a atuação do setor privado na
produção do espaço e se distanciam dos preceitos de função social da cidade e da propriedade.
Botelho (2005) afirma que diante disso, a ação do Estado não é neutra, no sentido de
ser igual para todas as classes sociais. As áreas de população de classe alta e as atividades
ligadas ao capital monopolista são privilegiadas no que diz respeito aos investimentos estatais
em infraestrutura e equipamentos coletivos, bem como em relação à legislação urbanística. A
contradição social que se desenvolve no interior do espaço urbano se materializa na oposição
entre, de um lado, a fração monopolista do capital que tende a garantir para si o monopólio do
uso dos equipamentos coletivos oferecidos pelo poder estatal e de outro o conjunto das
camadas populares excluídas desse uso social.
Sanfelice (2009) evidencia que o surgimento de formas de gestão urbanas mais
comprometidas com o propósito de criar condições para a valorização do capital investido no
ambiente construído é nesse sentido um testemunho, que mostra o poder dos incorporadores
em definir os rumos da política local, de que a produção do espaço assume um lugar
proeminente no período atual.
O espaço produzido pelo modo de produção capitalista está repleto de contradições
que se materializam no urbano. Lefebvre (2001a) apresenta algumas contradições do espaço e
de sua produção. A primeira delas é que o modo de produção capitalista impõe uma unidade
repressiva a uma separação (segregação) generalizada dos grupos, funções, dos lugares, no
153
espaço urbano. Outra contradição seria o fato de que a cidade se estende desmesuradamente,
havendo absorção do campo pela cidade, ocorrendo simultaneamente a urbanização da
sociedade e a ruralização da cidade. As extensões urbanas são submetidas à propriedade da
terra e as suas consequências como renda fundiária e especulação.
Lefebvre (2001 a) também aponta que à dispersão nas periferias e à segregação que
ameaça as relações sociais, se opõe uma centralidade que acentua suas formas, enquanto
centralidade de decisões (de riqueza de informação, de poder, de violência). Por fim o
indivíduo se encontra ao mesmo tempo socializado, integrado, submetido a pressões e limites
pretensamente naturais que o dominam (principalmente no seu quadro espacial, da cidade e
suas extensões) e separado, isolado, desintegrado. Contradição que se traduz em angústia,
frustração e revolta.
Essas contradições são encontradas na realidade de uma cidade de pequeno porte
como São João Del-Rei e também podem ser relacionadas à produção do espaço via políticas
de habitação. No que diz respeito à segregação já se debateu que na cidade cada classe social
tem seu lugar determinado e evidenciado na materialização das desigualdades inerentes ao
sistema capitalista. Em relação à expansão do tecido urbano ela tem ocorrido não apenas pela
intervenção estatal na construção de conjuntos habitacionais, mas pelo mercado imobiliário
que vislumbra na produção de loteamentos, possibilidades de obtenção da renda fundiária,
além da valorização dessas novas frentes de urbanização.
Na cidade nota-se a oposição entre as áreas urbanas consolidadas e as novas
urbanidades decorrentes da ocupação das periferias de forma segregada. Esses locais são
marcados por disputas de poder e vulnerabilidade social. Encontram-se distantes física e
socialmente do direito à própria cidade. Quanto aos conjuntos habitacionais os moradores se
integram ao mercado formal de moradias por meio dos programas habitacionais, contudo esse
direito não é assegurado de forma efetiva. Conceder o acesso a uma propriedade privada tem
se mostrado muito distante de garantir o habitar de forma digna. Se por um lado esses
beneficiários alcançam o ideal da casa própria, por outro ainda assim se encontram
marginalizados, esquecidos pelo próprio poder público, e seu espaço de reprodução da vida
carregado de estigmas.
Harvey (2014 b) debate as contradições do capitalismo que são consideradas cruciais,
de forma que o capital não funcionaria sem se sustentar sobre elas. Assim sendo, cabe aqui
discutir duas dessas contradições e que também se estendem a produção do espaço pela
habitação, o valor de uso e o valor de troca, e a propriedade privada e o Estado capitalista.
154
O autor salienta que o caso da habitação é um exemplo perfeito de como a diferença
entre valor de uso e valor de troca pode se tornar uma oposição e antagonismo que intensifica
essa contradição. A moradia enquanto mercadoria deixa de se tornar um direito social, uma
vez que o alto valor agregado à mesma faz com que ela se torne um benefício apenas para os
extratos sociais com poder de compra.
No caso dos conjuntos habitacionais de baixa renda, apesar dos subsídios que
permitem a essas famílias acessarem o mercado formal o que se tem é a priorização de uma
política pública de valorização da propriedade privada em detrimento do entendimento que o
direito à moradia também deve possibilitar a apropriação de todos os recursos que a cidade
incorpora.
Harvey (2014 b) ainda aponta que o direito à propriedade privada detém a propriedade
individual de habitações e os estados capitalistas tem consistentemente apoiado a extensão
desse direito para diferentes setores da população. Essa medida é destinada a garantir o
crescimento contínuo do mercado imobiliário, mas também tem uma função ideológica
fundamental, consolidando o apoio popular para a estratégia de que os mecanismos baseados
em valor de troca é que assegurarão o direito à moradia enquanto valor de uso, em outras
palavras, garante-se o apoio para as estratégias capitalistas. Dessa forma, a paisagem
geográfica passa a ser moldada por interesses inseridos em um ambiente de processos
macroeconômicos e de desenvolvimento geográfico desigual.
Isso se evidencia no fato de programas como o Minha Casa Minha Vida e o Lares
Habitação Popular apresentarem de um lado um forte apelo social, mas em contrapartida
serem determinados por interesses privados, constituindo-se ainda como táticas eleitoreiras.
Assim, a forma como são conduzidos esses programas nos mais diversos contextos urbanos,
torna nítida a ideia de que ampliar a reprodução do capital por meio da produção de moradias
está muito longe de ser um instrumento de atendimento às demandas do déficit habitacional
(que aumentou conforme os dados apresentados no primeiro momento dessa pesquisa) e no
enfrentamento das desigualdades vigentes no país.
Cabe ainda analisar algumas especificidades da política habitacional, que passou a se
vincular exclusivamente à atuação do Programa Minha Casa Minha Vida. Rolnik (2015 b)
analisa que de pacote de salvamento de incorporadores financeirizados, o MCMV
transformou-se na política habitacional do país, baseada no modelo único de promoção da
casa própria, acessada via mercado e crédito hipotecário. Abortou-se assim, a incipiente
155
construção de uma política habitacional diversificada, aderente às especificidades locais e sob
controle social.
O Plano Nacional de Habitação (2009) prevê, por exemplo, como alternativa para
intervir na demanda habitacional em cidades de pequeno porte viabilizar a promoção pública
e privada de lotes urbanizados que pode estar associada à oferta de materiais de construção e
serviços de assistência técnica, se constituindo opção prioritária para as famílias de baixa
renda e que requerem subsídios.
Um ponto a ser ressaltado sobre o MCMV é que de acordo com Loureiro et al. (2013)
a proposta inicial do programa não englobava a população de baixa renda que não era atrativa
ao setor privado orientado pelo lucro. Outro aspecto a ser considerado é o fato de que
inicialmente o mesmo contemplava apenas as regiões metropolitanas e municípios acima de
100 mil habitantes. Contudo, durante a tramitação da Medida Provisória (MP) n˚459/2009,
que criou o programa, houve pressão para que se reservasse parte dos recursos para os
municípios de pequeno porte no Congresso Nacional. Essa pressão se deu por parte de
entidades municipalistas e por meio da mobilização de grupos financeiros que atuam através
do Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social, voltado à construção de unidades
habitacionais em cidades pequenas.
As modificações sofridas pelo programa antes de seu lançamento que criou não apenas
a Faixa 1 voltada para famílias de baixa renda com rendimento até R$ 1600,00, mas também a
inserção dos municípios de pequeno porte ampliou o mercado de atuação de construtoras e
incorporadoras. Assim sendo, as formas de reprodução e absorção do capital por meio de
investimentos no setor imobiliário trazidas pelo mesmo se estenderam aos mais diversos
contextos e escalas espaciais, como foi o caso de São João Del-Rei. No caso específico da
cidade a mesma se tornou atrativa para grandes grupos da construção civil que passaram a
atuar no mercado local e edificaram os conjuntos habitacionais aqui existentes além de outros
empreendimentos.
Akaishi (2013) aponta que com o Programa MCMV cresceu o interesse de
construtoras em atuar em cidades de pequeno porte, associadas a instituições financeiras e
agentes financeiros do Sistema Financeiro de Habitação, devido ao baixo risco envolvido na
produção dos empreendimentos, já que a demanda se torna solvável pelo subsídio
habitacional e, em caso de eventual inadimplência dos mutuários, é suportada por fundo
garantidor. Entretanto, o interesse das construtoras em cidades de pequeno porte, não ocorre
em todas as regiões de um mesmo Estado. As construtoras atuam em determinadas cidades
156
considerando a inserção destas na rede urbana regional. Dessa forma, cidades localizadas
próximas a polos regionais tendem a ofertar mais mão-de-obra e matéria-prima com preços e
oferta mais atraentes.
Rufino (2016) analisa que no MCMV ocorre uma ampla convergência de interesses
entre agentes públicos e privados que favorece a imposição de um padrão imobiliário. Esse
padrão se sobrepõe às condições extremamente desiguais de desenvolvimento urbano das
cidades brasileiras, que por influir no preço da terra, são determinantes na definição das
estratégias de produção do espaço. A disseminação dessa lógica de produção às periferias faz
com que a expansão da produção imobiliária capitalista aconteça em muitos casos dissociados
das condições gerais de urbanização. Nessa lógica, qualquer terreno adquire potencial para a
valorização do capital.
O forte investimento que acontece com o MCMV pressiona o mercado de terras e a
valorização fundiária. Isso se deve ao fato de que poucos municípios desenvolveram suas
políticas. Sanfelice (2009) discute que com isso o poder público municipal deixa de ter
controle sobre a implantação dos empreendimentos de interesse social, se rendendo à estrutura
de mercado, regida pela busca de máxima lucratividade. A pressão por resultados, a forte
legitimidade do programa, aliados ao despreparo das administrações locais para controlar
efetivamente os processos de organização e desenvolvimento do território, fizeram com que
as administrações locais se tornassem meros coadjuvantes desse processo e se acentuassem as
desigualdades socioespaciais.
Assim nota-se a contradição inerente ao fato de que a Constituição de (1988) e o
Estatuto da Cidade (2001) estabelecem maior autonomia dos municípios nas decisões e ações
engendradas em seus territórios, mas por outro lado estes se rendem aos interesses globais de
reprodução ampliada do capital, que direcionam o processo de produção do espaço.
No município o poder político local se torna conivente com as lógicas de produção
espacial engendradas por esses agentes. Não há empenho político em implantar os preceitos
da política urbana ou sua articulação com a política habitacional, já que isso muitas vezes
significaria enfrentar importantes interesses fundiários e imobiliários. A priorização de setores
privados também se estende à política estadual de habitação encontrada na cidade.
Ferreira (2012) ressalta que pensar uma política habitacional de interesse social
implica em pensar uma política fundiária que preveja terra urbanizada e infraestruturada para
atender à demanda habitacional, bem como uma política de regulação do uso do solo que
priorize a urbanização das áreas desprovidas dos serviços urbanos básicos.
157
Entretanto, como explica Alvarez (2013) os programas habitacionais vigentes não
conseguem realizar o urbano (enquanto encontro sociabilidade, diferença, centralidade) a
partir do habitar. As políticas do Estado não garantem acesso à mobilidade, aos espaços
públicos e coletivos de produção de sociabilidade e cultura e, especialmente, à moradia de
forma plena, de modo que, muitas vezes, sequer a possibilidade do habitat existe de fato,
reduzindo ainda mais as possibilidades de apropriação. As lutas se direcionam então pelo
direito de ficar na cidade.
O direito à cidade é um significante vazio. Tudo depende de quem lhe vai conferir
significado. Os financistas e empreiteiros podem reivindicá-lo, e tem todo direito de
fazê-lo. Mas os sem-teto também o podem. Inevitavelmente, temos de enfrentar a
questão de os direitos de quem está sendo identificado, e, ao mesmo tempo
reconhecer, que entre direitos iguais, o que decide é a força. (HARVEY, 2014 a,
p.20).
Em São João Del-Rei no que diz respeito à produção formal de moradias é o mercado
imobiliário quem tem alcançado o direito de se apropriar da cidade e transformá-la de acordo
com seus interesses mercantilistas. Também se torna evidente que o habitat representado
pelos conjuntos habitacionais de interesse social não assegura o direito à cidade, que para
Harvey (2014 a) é um direito mais coletivo do que individual, uma vez que reinventar a
cidade depende inevitavelmente do exercício de um poder coletivo sobre o processo de
urbanização.
O Plano Diretor de São João Del-Rei (2006) estabelece que o direito à cidade
compreenda o direito à terra urbanizada, à moradia, à infraestrutura, serviços públicos, ao
transporte coletivo, trabalho, cultura e lazer. Diante disso, considerando-se os dados obtidos
nas visitas de campo as políticas habitacionais estão distantes de garantir o acesso aos
recursos que a cidade incorpora, como previsto pela política urbana local.
Ribeiro e Júnior (2012) concluem que as cidades, passam por um ciclo de
mercantilização que combina as conhecidas práticas de acumulação urbana baseada na ação
do capital. Para enfrentar esse novo contexto é necessário, antes de tudo, atualizar o ideário do
direito à cidade como parte de uma nova utopia dialética em construção, emancipatória e pós-
capitalista materializada em um novo projeto de cidades e de organização da vida social,
expressa na promoção de práticas e políticas socioterritoriais de afirmação desse direito. No
tópico a seguir serão discutidos os desafios à gestão urbana e habitacional na cidade de São
João Del-Rei.
158
3.4 Desafios à gestão urbano-habitacional em São João Del-Rei
Nesse tópico pretende-se analisar as limitações que se colocam ao planejamento e à
gestão urbano-habitacional no âmbito dos pequenos municípios brasileiros a partir das
especificidades do contexto espacial de São João Del-Rei. Segundo Akaishi (2011) essa
análise se insere no contexto do novo quadro territorial do país, no qual os avanços do
arcabouço jurídico-institucional e os esforços federais para a ampliação de investimentos no
setor habitacional levantam novos questionamentos sobre a condução destes processos em
territórios específicos.
Conforme Maricato (2008) nesse cenário, as pequenas cidades, agora tratadas
eminentemente como territórios urbanos, deparam-se com o desafio de gerir seu território em
uma nova fase do capitalismo mundial. Variáveis globais nessa nova fase determinam
transformações de toda ordem, sobre espaços que no Brasil acumulam dívida social histórica
e guardam traços de nossa formação social patrimonialista e clientelista.
Carvalho et al (2010) evidenciam que os principais problemas encontrados nesses
municípios dizem respeito à falta de moradias na área urbana, a precariedade do padrão de
construção das habitações e da infraestrutura urbana, constituindo assim um déficit
quantitativo e qualitativo, além da falta de propriedade dos imóveis e ocupações irregulares
materializadas pela autoconstrução. Diante desse contexto é que tem sido implementada as
políticas habitacional e urbana.
Bonduki (2009) ressalta algumas contradições a serem enfrentadas pela Política
Nacional de Habitação. A Constituição Federal (1988) e o Estatuto da Cidade (2001)
delegaram aos municípios a competência de definir e aplicar os instrumentos da política
urbana, particularmente àqueles que fazem referência ao princípio da função social da
propriedade e ao controle do uso do solo urbano. Nesse sentido, considerando que a questão
da moradia passa pelo enfrentamento do problema de financiamento e do problema da terra, o
modelo institucional pós-Constituição deixa uma dessas dimensões (a terra) na esfera
municipal e outra (o financiamento) na esfera federal. Nesse sentido a descentralização gera
um problema de articulação administrativa, uma vez que a política habitacional dependeria de
iniciativas governamentais de esferas políticas e administrativas autônomas.
Para o autor esse problema se agrava com a enorme diferenciação existente entre os
municípios brasileiros, que vão desde grandes cidades com aparatos administrativos bem
consolidados e competentes a pequenas localidades, com histórico de administrações com
159
baixíssima capacidade institucional e administrativa, cujas gramáticas políticas concentram-se
no clientelismo.
Rolnik (2015 b) aponta que o modelo proposto pelo Programa MCMV teria sido
adotado justamente em função da avaliação por parte dos gestores federais, de que os
municípios não possuem capacidade para implementar uma política habitacional. Com o
MCMV os municípios não precisavam mais destinar recursos orçamentários para ações na
área de habitação nem se preocupar em viabilizar projetos, apenas indicar os beneficiários a
serem atendidos pela Faixa 1 a partir de um cadastro habitacional atualizado. O programa
também permite a utilização de informações contidas em outros cadastros direcionados a
políticas assistenciais já existentes. Ao delegar essa indicação da demanda ao município, o
MCMV permite a manutenção das velhas gramáticas políticas de interação entre poder
público e eleitores no plano local, segundo a qual a distribuição de benefícios constitui
importante ativo para atrair capital político.
Carvalho (2000) enumera algumas características da gestão municipal em cidades de
pequeno porte tais como, ausência de políticas locais de desenvolvimento; carência de
instrumentos de caráter institucional, financeiro e técnico-administrativo capazes de
acompanhar seu crescimento; problemas financeiros relacionados à geração de renda e na
gestão dos recursos financeiros. Além disso, devem-se considerar também as dificuldades na
prestação de serviços de interesse local; o predomínio dos interesses das lideranças políticas
locais e o inexpressivo poder de reivindicação da população.
Do ponto de vista da gestão urbano-habitacional em cidades de pequeno porte
constatam-se alguns desafios no enfrentamento dessa questão. A Política Nacional de
Habitação (2004) prevê a articulação entre a política habitacional e a política urbana expressa
nos Planos Diretores. De acordo com Cardoso e Silveira (2011) em geral os Planos Diretores
municipais constituem um conjunto de intenções, diretrizes e objetivos orientados pelos
princípios do Estatuto da Cidade. Contudo, fazem menção à função social da propriedade,
porém sem definir claramente as implicações da adoção desse preceito no ordenamento do
território, nas políticas urbanas locais ou sem indicar as medidas necessárias para garantir seu
real cumprimento. Esse fato também pode ser observado nos municípios de pequeno porte.
No caso de São João Del-Rei, o Plano Diretor (2006) estabelece como um dos
princípios estruturais do planejamento municipal garantir o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade. A propriedade cumpre sua função quando for
utilizada para o atendimento das necessidades dos cidadãos e houver compatibilidade de seu
160
uso com a infraestrutura urbana, equipamentos disponíveis e com a preservação da qualidade
do ambiente urbano e natural. Entretanto, na cidade não se realizam as medidas necessárias
para a efetivação desse princípio, uma vez que a política urbana local não é aplicada de forma
concreta.
Cardoso e Silveira (2011) ainda apontam que os Planos Diretores identificam as
diretrizes gerais da política urbana definidas pelo Estatuto da Cidade, sem, entretanto,
alcançar efetividade no tocante à possibilidade de garantir o acesso à terra e a moradia digna;
inibir a retenção de imóveis ociosos; evitar os processos especulativos e propiciar a justa
distribuição dos benefícios e ônus decorrentes da urbanização. Da mesma forma, incorporam
os instrumentos instituídos pelo Estatuto da Cidade de maneira superficial e genérica. Esses
instrumentos encontram-se basicamente listados, sem aprofundamento, seguindo os mesmos
parâmetros da lei federal e remetendo as regulamentações para leis especificas. Em geral, os
instrumentos não são autoaplicáveis e apenas uma minoria define as áreas passiveis de uso
dos mesmos.
Além disso, para os autores os principais desafios para a efetividade dos Planos
Diretores nos municípios de pequeno porte dizem respeito à dificuldade de acesso a
informação; à falta de equipe técnica nas prefeituras; precariedade do conhecimento das
questões urbanas locais; pouco ou nenhum envolvimento das Câmaras Municipais; falta de
integração entre as políticas e legislações urbanas; não cumprimento da elaboração de leis
especificas; e pouca efetividade dos Conselhos das Cidades e similares. A maioria desses
municípios também não consegue exercer a competência de controle urbano, ou seja,
atividades de licenciamento e fiscalização. Faltam parâmetros edilícios e de parcelamento do
solo, além de pessoal qualificado para tal função.
Esses aspectos também podem ser identificados em São João Del-Rei. O Plano Diretor
(2006) enumera os instrumentos jurídicos e políticos de intervenção do poder municipal na
garantia do cumprimento da função social da propriedade urbana, em consonância com o que
está regulamentado no Estatuto da Cidade. Entretanto, esses instrumentos foram transcritos do
Estatuto sem dialogar com as especificidades do contexto local. A aplicação dos mesmos se
daria pela criação de leis específicas que não foram elaboradas no município após a aprovação
do Plano Diretor.
Em relação aos desafios para a aplicação da política urbana na cidade, nota-se a
ausência de corpo técnico e de informações capazes de subsidiar o exercício dos princípios de
planejamento previstos no Plano Diretor. Foi criado pela Lei n˚3.990 de 09 de novembro de
161
2005 o Conselho da Cidade de São João Del Rei, de caráter consultivo e deliberativo que objetiva
atuar em prol do desenvolvimento urbano e rural, por meio de processo de participação autônoma
de todos os seus integrantes. Contudo, o mesmo tem limitações na sua atuação, sendo que poderia
se constituir como um importante agente para que se estabelecesse de forma concreta uma política
urbana municipal.
O Guia para a elaboração do Plano Diretor Participativo pelos municípios e cidadãos
(2004) traz algumas considerações em relação aos municípios de pequeno porte. Embora possam
não sofrer na mesma escala os problemas urbanos dos grandes centros, os pequenos
municípios seguramente sofrem com a falta de definição de diretrizes e instrumentos para
orientar seu desenvolvimento e, portanto, não devem abrir mão de construírem referencial que
oriente o seu desenvolvimento urbano.
O mesmo também enfatiza a importância da articulação da política habitacional com
os instrumentos de ordenação do território contidos no Plano Diretor, para combater a
segregação espacial, o desenvolvimento desordenado das periferias e destinar áreas bem
servidas por infraestrutura para provisão de habitação de interesse social, democratizando o
acesso ao solo urbano e à própria cidade.
Quanto à delimitação de áreas para o crescimento urbano e provisão habitacional, o
Guia (2004) orienta que ela deve levar em consideração o planejamento municipal como um
todo, as áreas que não podem ser ocupadas, a necessária existência de saneamento cuja
estrutura dê conta do adensamento populacional estimado, bem como a infraestrutura e
equipamentos urbanos que acompanham os núcleos habitacionais.
As diretrizes trazidas pelo Guia não são observadas em São João Del-Rei que apesar
de possuir Plano Diretor não estabelece a integração da política urbana com a política
habitacional na gestão de seu território, permanecendo o modelo de produção do espaço
periférico e segregador. Na cidade as áreas de expansão urbana, que no microzoneamento do
Plano Diretor correspondem à Zona de Urbanização Futura, devem ser parceladas
adequadamente com suprimento de infraestrutura, áreas verdes, equipamentos públicos e
apresentando usos diversificados.
Entretanto, esses princípios não foram considerados em relação aos conjuntos
habitacionais de interesse social existentes na cidade. Os conjuntos Risoleta Neves I e II e
Dom Lucas Moreira Neves situados no bairro Tijuco foram implantados em um terreno que
segundo o Plano Diretor integra a Zona de Urbanização Futura. Os mesmos foram edificados
apresentando problemas quanto à infraestrutura, oferta de serviços, equipamentos públicos e
162
conflitos sociais, negando assim o direito à cidade e evidenciando a ausência de integração
entre a questão habitacional e o ordenamento territorial no município.
Cabe ainda observar que apesar de trazer importantes diretrizes para os municípios de
pequeno porte, o Guia para a elaboração do Plano Diretor Participativo pelos municípios e
cidadãos (2004) ainda desconsidera as limitações enfrentadas nesses contextos espaciais para
estabelecer uma prática de planejamento, gestão urbana e habitacional que permitam que
esses preceitos sejam empregados de forma concreta, propiciando a democratização do solo
urbano.
Segundo Akaishi (2013) após a Constituição de 1988, o processo de descentralização
atribuiu um novo papel aos municípios e passou a representar um novo paradigma na
condução das políticas sociais. No entanto, esse arcabouço institucional considera todos os
municípios igualmente capacitados para gerir as responsabilidades que lhes foram atribuídas,
isso também se estende à Política Nacional de Habitação.
A autora enfatiza que no processo de descentralização e articulação federativa no qual
foi embasada a estruturação da política habitacional, o Sistema Nacional de Habitação de
Interesse Social tratou de forma igual os 5.570 municípios brasileiros. O conteúdo para
elaboração dos Planos Locais de Habitação de Interesse Social segundo o Guia de Adesão ao
SNHIS (2008), também não difere conteúdos mínimos ou diferenciados de acordo com a
diversidade de situações institucionais encontradas no país. Inclusive, a Caixa Econômica
Federal, responsável pela análise e aprovação dos planos, dispõe de normativa padronizada
nacionalmente para a avaliação dos mesmos.
Fonseca et al (2012) apontam que a adoção de um mesmo conteúdo na elaboração dos
PLHIS para todos os municípios brasileiros desconsidera que a capacidade administrativa, a
base fiscal, o estágio de desenvolvimento institucional, a inserção da cidade na rede regional e
mesmo as necessidades habitacionais das diversas comunidades são bastante distintas,
significando diferentes oportunidades, inclusive para contratação de assessoria, acesso a
informação e recursos para elaboração dos planos.
Akaishi (2013) explica que frente às dificuldades encontradas, o Ministério das
Cidades apresentou uma mudança de escopo na condução do processo de elaboração do
PLHIS e lançou seu modelo simplificado. No entanto, esse modelo pode ser considerado
simplificado apenas no formato que assume (questionário de preenchimento), pois o conteúdo
a ser inserido ainda se apresenta complexo e pressupõe que os municípios já possuam
informações sistematizadas e organizadas, realidade raramente encontrada, em especial nos
163
municípios com capacidade institucional limitada, nos quais as questões de habitação não têm
lugar definido na estrutura organizacional da administração.
São João Del-Rei integra o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social,
apresentando Plano Local de Habitação de Interesse Social cumprindo as exigências previstas
no Guia de Adesão ao SNHIS (2008). Contudo o município apresenta uma série de limitações
institucionais e técnicas que se tornaram barreiras a serem superadas durante a elaboração do
PLHIS. Assim, para Akaishi (2013) as exigências para adesão ao SNHIS foram as mesmas
para todos os municípios do país, independentemente do porte populacional, inserção na rede
urbana, capacidade financeira ou institucional instalada em cada um deles, demonstrando o
tratamento análogo conferido aos municípios que apresentam diferentes estágios de
desenvolvimento. Dessa forma o município de São Paulo cumpriu as mesmas exigências ao
aderir ao SNHIS que São João Del-Rei com sua limitada capacidade de gestão urbana e
habitacional.
Outra limitação enfrentada pelos municípios de pequeno porte na elaboração do
PLHIS conforme Fonseca et al (2012) reside na inexistência de informações sobre as
carências habitacionais, assentamentos precários e de infraestrutura urbana, ou a dificuldade
em obtê-las, muitas cidades não possuem um cadastro específico para esse setor. Também se
salienta a ausência de uma base cartográfica no município, ou a sua existência de forma
desatualizada, além da inexistência de um órgão específico competente para tratar das ações
da área habitacional e de planejamento do território. Os municípios costumam atribuir tal
responsabilidade às suas Secretarias Municipais de Ação Social.
Para Akaishi (2013) a ausência de técnicos capacitados no quadro permanente das
prefeituras também constitui limitação para elaboração e posterior aplicação do PLHIS. Muitas
cidades necessitaram contratar equipes de consultoria para esse processo. Se, por um lado, é
importante para os municípios pequenos contarem com a prestação de serviços de consultoria
especializada em matéria urbanístico-habitacional, por outro, é também preciso se pensar em
uma reestruturação do sistema habitacional e urbano que dote as pequenas cidades de
profissionais ou funcionários públicos capacitados para tal, de forma permanente.
Carvalho et al (2010) evidenciam que apesar da exigência no âmbito federal de criação
de conselhos locais de habitação e de um Fundo Local de Habitação de Interesse Social para
adesão ao SNHIS, estes instrumentos não estão em funcionamento em muitas cidades. Os
municípios não estão operando por meio do fundo de habitação, uma vez que parcela
164
significativa dos recursos do setor advém do PAC e do Programa MCMV que não passam
pelo FNHIS.
Conforme Cardoso e Silveira (2011) ainda se devem considerar o fato de que os
municípios não foram capazes de implantar concretamente um programa de ações voltado
para a superação da ordem urbanística excludente comum às cidades brasileiras. Em linhas
gerais o zoneamento foi pouco utilizado para garantir incremento no acesso à terra
urbanizada, bem localizada e à moradia; a definição de ZEIS em áreas vazias também foi
pouco adotada.
Essas limitações também são encontradas na cidade de São João Del-Rei. Na
prefeitura local não há um corpo técnico permanente responsável pela gestão da política
urbana e habitacional. Quanto ao levantamento de informações referentes à demanda
habitacional e aos assentamentos precários, não existia na cidade um banco de dados
sistematizado, sendo a coleta das mesmas, realizada durante a elaboração do PLHIS, que por
sua vez foi desenvolvido por uma equipe de consultoria. O município também não contava
com uma base cartográfica, sendo essa obtida durante o processo de construção de seu Plano
Diretor.
O Plano Diretor de São João Del-Rei não prevê a criação de ZEIS de vazios urbanos,
apenas no PLHIS é que foram selecionados alguns terrenos que poderiam ser destinados para
a construção de habitação de interesse social. Contudo, essas áreas não foram regulamentadas
ou delimitadas de forma a assegurar a função social da cidade.
Assim como em outros municípios, São João Del-Rei apresenta um Conselho
Municipal de Habitação, criado pela Lei n˚ 4.125 de 30 de maio de 2007, com objetivo básico
de estabelecer, acompanhar e avaliar a política municipal de habitação; um Fundo Municipal
e um Conselho Gestor de Habitação de Interesse Social criados pela Lei n˚ 4.257 de 18 de
dezembro de 2008. Entretanto, os mesmos não foram implementados. Na cidade o setor que
tem respondido pela área de habitação é a Secretaria Municipal de Cidadania,
Desenvolvimento e Assistência Social, sendo a mesma responsável pela seleção de possíveis
beneficiários dos programas habitacionais, na figura do Conselho Municipal de Assistência
Social, criado pela Lei n˚ 3.494 de 27 de janeiro de 2000.
Considerando-se o quadro aqui apresentado podem-se identificar criticamente as
limitações e como a gestão urbana e habitacional se concretiza nas cidades de pequeno porte,
partindo-se das especificidades de São João Del-Rei. Vislumbrando-se as possibilidades
165
futuras para o enfrentamento dessa questão no município, cabe ainda apresentar algumas
diretrizes frente à temática do direito à moradia para a realidade local.
A primeira diretriz proposta seria além da revisão do Plano Diretor de São João Del-
Rei, a regulamentação dos instrumentos urbanísticos previstos no mesmo, e a criação de uma
Lei de Uso e Ocupação do Solo, de forma a intervir na questão fundiária e coibir o processo
de valorização do solo. Outro ponto a ser ressaltado é a articulação entre política urbana e
habitacional no município, fundamental para a garantia da função social da cidade e da
propriedade. Torna-se importante ainda considerar os princípios existentes na política e no
Plano Nacional de Habitação, de forma a assegurar o direito à moradia e a consolidação da
política habitacional local.
No caso de São João Del-Rei a existência de um corpo técnico permanente para atuar
no planejamento e gestão da política urbana e habitacional também se faz necessário. Além
disso, é fundamental que depois de instaurado o corpo técnico, efetive-se o seu fortalecimento
institucional e capacitação constante. Quanto às informações sobre a questão habitacional no
município, obtidas durante a elaboração de seu Plano Local de Habitação de Interesse Social,
devem ser atualizadas assim como cadastros de beneficiários e a base cartográfica do
município.
Klink (2010) aponta que a limitada capacidade institucional dos municípios apresenta-
se como limite significativo para o planejamento e gestão dos problemas territoriais. Diante
disso, além da consolidação institucional, uma alternativa para cidades de pequeno porte
como São João Del-Rei seria a criação de consórcios ou sistemas de gestão colaborativa entre
municípios, além de maior incentivo para a atuação do estado junto aos entes locais.
Uma importante diretriz para o município seria a criação de um banco de terras
públicas voltadas prioritariamente para a produção de habitação de interesse social e a
delimitação de Zonas de Especial Interesse Social (ZEIS). Segundo o Guia para
regulamentação e delimitação de ZEIS do Ministério das Cidades (2009), legalmente as ZEIS
podem ser definidas como zonas urbanas destinadas ao uso habitacional e devem possuir
infraestrutura e serviços urbanos ou garantir a viabilidade da sua implantação.
O mesmo especifica alguns parâmetros que poderiam ser observados em São João
Del-Rei na delimitação de ZEIS. É importante que se realize a distinção entre tipos de ZEIS,
estabelecendo regras diferenciadas de uso do solo em função de situações urbanas distintas, a
serem contempladas. As ZEIS podem incidir em áreas centrais mais bem servidas de
infraestrutura e com maior potencial de adensamento, ou em áreas intermediárias, onde seja,
166
onde é mais adequado adotar um potencial de adensamento médio, em relação aos padrões
vigentes no município. A participação da sociedade civil, mediante representação dos diversos
grupos de interesse no processo de criação e regulamentação das ZEIS, é essencial para que
elas produzam resultados efetivos.
No município poderiam ser instituídos dois tipos de ZEIS: a do tipo 1 estabelecendo-
se normas especiais de parcelamento, uso do solo e edificação para viabilizar a regularização
e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda; e a do tipo 2 a partir da
seleção de vazios urbanos voltados para a construção de habitação de interesse social e
delimitadas partindo-se do diagnóstico das necessidades habitacionais locais. No caso das
ZEIS de vazios é importante que sejam selecionadas áreas cujo preço da terra seja compatível
com a produção de habitação de interesse social; localizadas em zona urbana ou indicadas
para expansão; servidas por infraestrutura e equipamentos públicos; ou de proximidade de
assentamentos precários que demandam remoção de parte ou totalidade das moradias.
Akaishi (2011) enumera ainda alguns instrumentos para regularização fundiária de
possível aplicabilidade no contexto de municípios de pequeno porte, a Concessão Especial
para Fins de Moradia (CUEM), criada pela Medida Provisória n° 2.220/2001, e a Demarcação
Urbanística e a Legitimação de Posse, instituídas pela Lei n° 11.977/2009. A Demarcação
Urbanística acarretou consistente simplificação aos processos de regularização fundiária. É
um procedimento realizado pelo poder público para demarcar o imóvel objeto de
regularização fundiária de interesse social, definindo limites, área, localização e
confrontantes, com o objetivo de qualificar os ocupantes e os respectivos tempos de posse. A
Demarcação Urbanística não altera o domínio do imóvel, mas é o primeiro passo importante
de caracterização da área como de interesse social para fins de regularização fundiária, e
permite que seja posteriormente concedido o título de legitimação de posse aos ocupantes que
atenderem aos critérios da lei.
Outras diretrizes a serem apontadas para São João Del-Rei, seriam o estabelecimento
por meio de legislação municipal de parâmetros urbanísticos e arquitetônicos para a
aprovação de empreendimentos habitacionais de interesse social; propor parcerias com as
instituições de ensino existentes na cidade para o desenvolvimento de políticas, práticas de
capacitação e treinamento dos gestores urbanos e habitacionais; promover a integração e
inclusão socioespacial dos moradores dos conjuntos habitacionais existentes, de forma a
assegurar o direito à cidade e o levantamento de terras aforadas para viabilizar um processo de
regularização fundiária. Salienta-se ainda a relevância da atuação do Conselho Municipal de
167
Habitação enquanto instrumento e canal de participação na condução da política habitacional
em nível local.
Diante do exposto ressalta-se, segundo França (2015), que no caso dos pequenos
municípios, reconhece-se que o impulso gerado pelo maior investimento no setor habitacional
no país induziu os gestores públicos a elaborarem planos e em alguns casos aperfeiçoarem
suas legislações, a despeito da deficiente capacidade institucional e técnica se constituírem
uma barreira a ser vencida. Ainda que o desenvolvimento de planos e legislações se coloque
como uma importante ferramenta para a gestão urbana, tratados de forma fragmentada, não
asseguram a promoção de cidades mais justas. A questão é complexa e envolve mudanças
estruturais nos rumos atuais que orientam as ações de desenvolvimento urbano gestadas de
forma setorizada e simétrica, para o atendimento das necessidades locais.
Por fim como enfatiza Akaishi (2013) pressupor o desenvolvimento urbano-
habitacional e a prática do planejamento nos pequenos municípios envolve, antes de tudo,
conhecer com mais profundidade a realidade e as especificidades presentes nestes territórios,
no que se refere à precariedade habitacional existente, à capacidade financeira de
investimento, e à articulação para gerir a política habitacional em nível local de forma que os
programas, propostas e projetos tenham, de fato, aderência nesses espaços.
168
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa buscou construir uma análise sobre as contradições existentes na
produção capitalista do espaço urbano e na política habitacional de interesse social, no
contexto de uma cidade de pequeno porte, considerando-se as especificidades encontradas na
cidade de São João Del-Rei.
O trabalho foi desenvolvido segundo o método Regressivo-Progressivo de Henri
Lefebvre (1978), sendo dividido em três momentos. No primeiro momento foi construída uma
análise das origens do déficit habitacional no país e um panorama das políticas públicas de
habitação, com o intuito de compreender o que se vislumbra no momento presente tanto no
contexto local, quanto nacional do processo de produção do espaço tendo como principal
mecanismo a construção de moradias.
O segundo momento foi organizado de forma a descrever a problemática habitacional
na cidade de São João Del-Rei. Por fim, no terceiro momento buscou-se retomar a
configuração espacial de São João Del-Rei decorrente da implantação de políticas
habitacionais e compreende-la à luz das contradições e condicionantes do sistema capitalista,
além de debater o quanto à atuação do Estado corrobora com a produção do espaço centrada
na reprodução ampliada do capital.
O papel do Estado enquanto agente promotor de políticas públicas direcionadas à
promoção de moradias descortina as contradições inerentes a esse processo, partindo-se do
pressuposto que as mesmas não representam apenas medidas de cunho social ou buscam
assegurar o direito à moradia, mas também representam a atuação do capital imobiliário no
Brasil.
A subordinação da política habitacional aos interesses das classes dominantes e ao
modo capitalista produção, se mostrou acima das próprias necessidades de se superar o déficit
habitacional dos setores de baixa renda, gerados pelo processo de urbanização brasileiro. A
manutenção da produção do espaço de forma desigual persiste mesmo diante do
fortalecimento da política habitacional em momento recente, uma vez que a mesma não foi
acompanhada de transformações efetivas que se desvinculem dos interesses do capital e que
possam garantir o direito à cidade, seja em grandes centros ou nas regiões interioranas.
A relação entre capital financeiro, setor imobiliário e Estado, traz consequências
diretas para a população de baixa renda, pois tal dinâmica força uma valorização do solo
urbano e, de um modo geral, obriga que essa população busque moradia nas zonas periféricas,
169
em locais aonde o processo de valorização do solo ainda não chegou de forma acentuada.
Assim, a produção do espaço urbano subordinada aos interesses imobiliários acentua a
exclusão socioespacial.
Esse processo também se estende aos quatro conjuntos habitacionais existentes em
São João Del-Rei e que foram estudados na pesquisa. As famílias beneficiárias tornam-se
subjugadas à ação do Estado, uma vez que não possuem papel nas decisões referentes à
provisão habitacional, como a localização dos empreendimentos ou características da
moradia. Durante as visitas a campo foi possível identificar que a segregação se manifesta em
diferentes âmbitos, seja nas barreiras que dificultam o acesso a infraestrutura, serviços e
equipamentos públicos, pensando-se que o direito à moradia não deve se restringir apenas a
unidade habitacional seja na ausência de um sentimento de identidade e pertencimento dos
moradores para com os conjuntos ou o contexto urbano em que se encontram.
Isso ocorre porque há a dominação do espaço urbano pelas classes dominantes,
sobretudo o mercado imobiliário que escolhe as melhores áreas da cidade para a construção
de empreendimentos voltados para as classes de rendimento médio e alto, que se sustenta no
fato de que em São João Del-Rei, não são aplicados os instrumentos da política urbana, que
combateriam o uso especulativo da terra. O padrão dos programas habitacionais implantados
favorece a atuação do setor privado na produção do espaço e se distancia dos preceitos de
função social da cidade e da propriedade.
Os princípios presentes na Política Nacional de Habitação (2004) foram deixados em
segundo plano com o lançamento do Programa Minha Casa Minha Vida que passou a
concentrar os investimentos públicos e a ação estatal na provisão de moradias. Entretanto, a
produção do espaço urbano engendrada pelo Programa se curva aos interesses do setor da
construção civil e atua como instrumento para reprodução ampliada do capital. Essa lógica é
aprofundada quando se considera o grande volume de financiamento eleitoral proveniente de
grandes empresas da construção civil interessadas em manter o processo de valorização
imobiliária no país.
Cabe ressaltar que o MCMV tem se distanciado de promover o desenvolvimento
social, já que persiste o déficit habitacional brasileiro, sobretudo, para famílias de baixa renda.
Além disso, a moradia reduzida ao habitat, com a criação de espaços homogêneos de inserção
periférica não assegura o direito à moradia e à cidade de forma plena, hipótese debatida na
pesquisa. Essa vertente é notória nos conjuntos habitacionais edificados pelo programa nos
mais diferentes contextos socioespaciais. A atuação do mercado no setor da habitação de
170
interesse social prioriza a lucratividade máxima sem se preocupar com os custos sociais de
uma urbanização excludente.
Essas características segregadoras dos conjuntos habitacionais de interesse social
também se estendem aos empreendimentos do programa estadual Lares Habitação Popular,
que contribuem para a construção de um modelo de cidade descontínua e fragmentada, onde
também há a predominância do valor de troca sobre o valor de uso no que tange à moradia.
Considerando-se os desafios à gestão urbano-habitacional em São João Del-Rei,
ressalta- se que a implementação do arcabouço político-institucional tanto em relação à gestão
urbana quanto no âmbito habitacional, não pode se resumir a proposições e estratégias que
padronizem as formas de atendimento das necessidades habitacionais e de ordenamento
território, sem considerar as especificidades das diferentes realidades na escala municipal,
onde esses instrumentos se efetivam.
Ainda que o desenvolvimento desses instrumentos se coloque como uma importante
ferramenta para a gestão urbana, tratados de forma setorizada, eles não asseguram de fato a
função social da cidade. Diante disso, torna-se evidente a importância da dimensão territorial
enquanto elemento-chave para que haja uma articulação concreta, sobretudo do ponto de vista
da gestão pública, entre a questão urbana e habitacional, como campo fundamental para o
enfrentamento do desafio urbano no país, sem desconsiderar os limites da ação estatal que os
promove, frente aos interesses do capital.
Retomando a segunda hipótese levantada na pesquisa de que considerando a produção
formal de unidades habitacionais pela atuação do Estado em São João Del-Rei, o que acontece
é a mesma (re) produção espacial contraditória que vem sendo realizada pelo território
nacional, os dados coletados apontaram que, as lógicas de interesse da produção capitalista do
espaço urbano são semelhantes em todas as cidades, indiferente do seu porte territorial ou
populacional, inclusive no que diz respeito a não utilização dos instrumentos urbanísticos
previstos nos Planos Diretores.
Quando se considera a descrição da realidade socioespacial dos conjuntos
habitacionais edificados no município, já se evidencia aspectos como segregação
socioespacial, desterritorialização, disputas, além de fenômenos como dispersão urbana, que
se encontram presentes nos mais diversos contextos em que as políticas habitacionais tais
como estão colocadas, são efetivadas.
Em relação ao déficit habitacional cabe ressaltar o papel do Estado enquanto
facilitador da ação do capital no espaço urbano, uma vez que as políticas públicas e
171
investimentos em infraestrutura são empregados como mais um instrumento de valorização do
solo urbano. O Estado, com seus instrumentos legais, produz grandes transformações nos usos
e funções dos lugares, ao mesmo tempo em que aprofunda as desigualdades. No caso das
políticas habitacionais e urbanas não é diferente, uma vez que as mesmas não se desvinculam
da priorização da propriedade privada.
Muito além de construir massivamente moradias, enfrentar o déficit habitacional para
além do viés quantitativo desenvolve a necessidade de reestruturar as relações que servem de
base à produção do espaço urbano, sendo fundamental o deslocamento da lógica do capital
para os interesses coletivos.
As questões colocadas nessa dissertação almejaram contribuir para uma visão crítica
acerca das contradições inerentes à produção do espaço por meio da habitação de interesse
social. O entendimento dessa temática no contexto de uma cidade de pequeno porte, ainda
pôde descortinar o que se evidencia da urbanização em momento recente e enquanto processo
em construção, no contexto nacional.
172
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185
QUESTIONÁRIO
Nome:
Local:
Data:
Número da entrevista:
Informações de cadastro:
Famílias residentes em área de risco:
Famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar:
Famílias de que façam parte pessoas com deficiência ou idosos:
Beneficiários de programas sociais:
1-A quanto tempo reside no conjunto habitacional?
2-Antes de se mudar para o conjunto qual era o local de sua residência?
3-Como você classifica a localização do bairro quanto à facilidade de acesso a comércio,
serviços e equipamentos públicos?
4-Como você classificaria a infraestrutura do conjunto habitacional?
5-Quais os principais problemas do conjunto habitacional?
6-Em sua opinião, quais aspectos de infraestrutura, comércio e serviços, são indispensáveis
próximos ao seu local de moradia?
7-Como você classifica sua residência comparativamente com a que vivia anteriormente,
quanto a localização, acesso a serviços?
8-Como você se sente em relação a sua moradia e ao conjunto habitacional? Por quê?
( ) Muito satisfeito
( ) Satisfeito