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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS – UFSCar
Departamento de Engenharia Civil - DECiv
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA URBANA-PPGEU
O Estatuto da Cidade e osPlanejamentos de Transporte e de
Circulação
CATHERINE D’ANDREA
Orientador: Archimedes Azevedo Raia Jr.
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós Graduação em Engenharia Urbana
da Universidade Federal de São Carlos –
UFSCar, como parte dos requisitos para
obtenção do título de mestre em
Engenharia Urbana.
SÃO CARLOS
JUNHO DE 2004
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
PPGEU - UFSCarCATHERINE D’ANDREA
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Aos meus pais Flávio e Heliana, que sempre
me apoiaram, incentivaram e possibilitaram
a concretização de todos os meus objetivos.
Ao Eduardo, por sua compreensão e apoio
durante o desenvolvimento deste trabalho.
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ii
AGRADECIMENTOS
Ao Prof. Dr. Archimedes Azevedo Raia Jr., por sua dedicada orientação e
motivação no desenvolvimento deste trabalho.
À minha família pelo apoio e incentivo.
Às amigas Mariana, Daniela e Vivian pelo acolhimento e momentos alegres.
A todos que, direta ou indiretamente, colaboraram na execução deste trabalho.
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RESUMO
Um dos maiores problemas enfrentados pelas cidades brasileiras é a falta deplanejamento e a crescente urbanização que ocorre de forma descontrolada, queimpactam significativamente, dentre outros, os sistemas de transporte ecirculação. Além disso, os planejamentos dos diversos sistemas urbanos, via deregra, são realizados de forma sectária. Porém, desde julho de 2001, as cidadesbrasileiras passaram a conviver com uma nova legislação que estabeleceuimportantes diretrizes para a política urbana, visando a um desenvolvimentourbano sustentável. É o “Estatuto da Cidade-EC”, nome dado à Lei 10.257/01, queregulamentou os artigos 182 e 183 da Constituição Federal.
As diretrizes apresentadas no texto desta lei, no entanto, parecem não terdespertado quase nenhum interesse aos técnicos e pesquisadores das áreas deplanejamento de transportes e de circulação, visto que muito pouco foi publicado edebatido sobre o tema. Embasado no conceito de que o planejamento urbanodeve ser conduzido de maneira abrangente e harmônica, ou seja, considerando osdemais sistemas urbanos, tais como: transportes, circulação, saneamento, meioambiente, etc., admitiu-se como hipótese que, se o Estatuto é realmente umaferramenta importante para o planejamento das cidades, é igualmente significativopara os planejamentos de transportes e circulação.
Em vista disso, estabeleceu-se como objetivo deste trabalho realizar umapesquisa estritamente teórica, a partir de reflexões aprofundadas sobre o Estatutoda Cidade, sobre sua possível correlação com os sistemas de transportes ecirculação, para a comprovação da hipótese estabelecida. O método analíticoutilizado buscou interfaces entre as 16 diretrizes contidas no EC e osplanejamentos de transportes e circulação, por meio de experiências relatadas naliteratura, bem como reflexões pessoais do autor.
Os resultados obtidos puderam, de maneira geral, comprovar a hipóteseestabelecida. Algumas diretrizes, não só se mostraram fortemente correlacionadascom as áreas enfocadas como confirmaram a importância do transporte ecirculação na construção de cidades sustentáveis, objetivo geral do EC. Outrasdiretrizes se mostraram razoavelmente aderentes, enquanto poucas apresentaramuma tênue aderência.
Palavras Chave: - Estatuto da Cidade; Planejamento Urbano; Planejamento de
Transporte; Planejamento de Circulação.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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ABSTRACTOne of the greatest problems faced by Brazilian cities today is the lack of planningand the increasing uncontrolled urbanization, which has had a significant impactover the transportation and circulation systems. Moreover, the planning of thediverse urban systems are usually carried through in a sectarian way. However,since July 2001, Brazilian cities have started to live under a new legislation whichhas established important guide lines for urban policy, aiming at a sustainableurban development: "Estatuto da Cidade-EC" (Statute of Cities) was the namegiven to the Law 10.257/01, which regulated articles 182 and 183 of the BrazilianFederal Constitution.
The guide lines presented by the law, however, don't seem to have caused mucheffect on the technicians and researchers of the transportation and circulationplanning areas, since not many works on the subject have been published orbrought to debate. Based on the concept that urban planning must be led in anincluding and harmonic way, that is, taking into consideration the other urbansystems, such as, transportation, circulation, sanitation, environment, etc. - it wasadmitted, as a hypothesis that, if the "Estatuto" really is an important tool for theplanning of cities, it ought to be equally significant for transportation and circulationplannings.
The objective of this work was to carry out a research based on reflectionsdeepened about the "Estatuto da Cidade" and on its possibility of correlation withthe transportation and circulation systems, for the evidence of the establishedhypothesis. The analytical method used searched interfaces between the 16 guidelines contained in the EC and the transportation and circulation plannings, bymeans of experiences reported on the literature, as well as by personal reflectionsof the author. The results suggested the established hypothesis was true. Someguide lines not only revealed themselves strongly correlated with the focusedareas, but, also, confirmed the importance of transportation and circulation in theconstruction of sustainable cities, which was general objective of the “Estatuto daCidade”. Other guide lines showed themselves reasonably adherent, while a fewpresented a tenuous tack.
Key Words:- "Estatuto da Cidade"; Urban Planning; Transportation Planning;Circulation Planning.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 1
1.1 OBJETIVO ................................................................................................................................. 2
1.2 JUSTIFICATIVA E CONTRIBUIÇÃO......................................................................................... 3
1.3 ESTRUTURA DO TRABALHO .................................................................................................. 3
2 PROBLEMÁTICA DAS CIDADES BRASILEIRAS ............................................ 5
2.1 PROCESSO DE URBANIZAÇÃO.............................................................................................. 5
2.2 PLANEJAMENTO URBANO...................................................................................................... 8
2.3 GESTÃO URBANA .................................................................................................................. 14
3 PLANEJAMENTO E GESTÃO DO TRANSPORTE URBANO ........................ 19
3.1 A CRISE DO TRANSPORTE................................................................................................... 19
3.2 PROBLEMAS RELACIONADOS AO TRANSPORTE E TRÂNSITO ...................................... 21
3.3 POSSÍVEIS SOLUÇÕES PARA OS PROBLEMAS COM TRANSPORTE URBANO ............ 24
4 O ESTATUTO DA CIDADE .............................................................................. 33
4.1 O ESTATUTO E SUAS DIRETRIZES ..................................................................................... 38
4.2 INOVAÇÕES CONTIDAS NO ESTATUTO DA CIDADE......................................................... 42
5 LEITURAS DO ESTATUTO DA CIDADE ........................................................ 46
5.1 LEITURA DO EC COM ENFOQUE NO PLANEJAMENTO URBANO EM GERAL ................ 47
5.2 LEITURA DO EC COM ENFOQUE NO PLANEJAMENTO DE TRANSPORTE E DECIRCULAÇÃO................................................................................................................................... 53
6 METODOLOGIA ............................................................................................... 61
7 ESTUDO DAS DIRETRIZES ............................................................................ 64
7.1 DIRETRIZ I – GARANTIA DO DIREITO A CIDADES SUSTENTÁVEIS................................. 65
7.2 DIRETRIZ II – GESTÃO DEMOCRÁTICA POR MEIO DA PARTICIPAÇÃO DA POPULAÇÃOEM PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO URBANO; .................................................................... 70
7.2 DIRETRIZ XIII – AUDIÊNCIA DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL E DA POPULAÇÃOINTERESSADA NOS PROCESSOS DE IMPLANTAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS ................... 71
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7.3 DIRETRIZ III – COOPERAÇÃO ENTRE GOVERNOS, A INICIATIVA PRIVADA E OSDEMAIS SETORES DA SOCIEDADE NO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO................................. 76
7.4 DIRETRIZ IV – PLANEJAMENTO DO DESENVOLVIMENTO DAS CIDADES, DADISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA POPULAÇÃO E DAS ATIVIDADES ECONÔMICAS DOMUNICÍPIO DE MODO A EVITAR E CORRIGIR AS DISTORÇÕES DO CRESCIMENTO URBANO
81
7.5 DIRETRIZ V – OFERTA DE EQUIPAMENTOS URBANOS E COMUNITÁRIOS,TRANSPORTE E SERVIÇOS PÚBLICOS ADEQUADOS AOS INTERESSES E NECESSIDADESDA POPULAÇÃO .............................................................................................................................. 86
7.6 DIRETRIZ VI – ORDENAÇÃO E CONTROLE DO USO DO SOLO, DE FORMA A EVITAR: 88
7.7 DIRETRIZ VII – INTEGRAÇÃO ENTRE AS ATIVIDADES URBANAS E RURAIS................. 95
7.8 DIRETRIZ VIII – ADOÇÃO DE PADRÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO DE BENS ESERVIÇOS E DE EXPANSÃO URBANA COMPATÍVEIS COM OS LIMITES DASUSTENTABILIDADE AMBIENTAL, SOCIAL E ECONÔMICA DO MUNICÍPIO............................. 98
7.9 DIRETRIZ IX – JUSTA DISTRIBUIÇÃO DOS BENEFÍCIOS E ÔNUS DECORRENTES DOPROCESSO DE URBANIZAÇÃO................................................................................................... 100
7.10 DIRETRIZ X – ADEQUAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE POLÍTICA ECONÔMICA,TRIBUTÁRIA E FINANCEIRA E DOS GASTOS PÚBLICOS AOS OBJETIVOS DODESENVOLVIMENTO URBANO.................................................................................................... 103
7.11 DIRETRIZ XI – RECUPERAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DO PODER PÚBLICO DE QUETENHA RESULTADO A VALORIZAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS .............................................. 105
7.12 DIRETRIZ XII – PROTEÇÃO, PRESERVAÇÃO E RECUPERAÇÃO DO MEIO AMBIENTENATURAL E CONSTRUÍDO, DO PATRIMÔNIO CULTURAL, HISTÓRICO, PAISAGÍSTICO EARQUEOLÓGICO........................................................................................................................... 106
7.13 DIRETRIZ XIV – REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E URBANIZAÇÃO DE ÁREAS OCUPADASPOR POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA.......................................................................................... 110
7.14 DIRETRIZ XV – SIMPLIFICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DE PARCELAMENTO, USO EOCUPAÇÃO DO SOLO E DAS NORMAS EDILÍCIAS ................................................................... 112
7.15 DIRETRIZ XVI – ISONOMIA DE CONDIÇÕES PARA OS AGENTES PÚBLICOS EPRIVADOS NA PROMOCÃO DE EMPREENDIMENTOS E ATIVIDADES RELATIVOS AOPROCESSO DE URBANIZAÇÃO................................................................................................... 114
8 RECOMENDAÇÕES CONCLUSÕES ............................................................ 116
FONTES CONSULTADAS ................................................................................. 121
ANEXO................................................................................................................ 134
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O Planejamento Urbano, no Brasil, tem se apresentado, de maneira geral,
dissociado das diversas áreas correlatas: transportes, circulação, saneamento,
meio ambiente, etc. Assim a gestão dos sistemas urbanos se desenvolve como se
cada um dos seus subsistemas fossem independentes e, portanto, planejados e
operados de forma segmentada.
Esta maneira de tratar o planejamento urbano, nas suas mais diferentes
manifestações e óticas, tem trazido conseqüências bastante danosas, com
impactos financeiros, sociais e em termos de deseconomias urbanas, dentre
outros.
Um dos problemas mais sérios enfrentados pelas cidades brasileiras é a
evolução urbana desordenada, agravada pela falta de planejamento. Esta
evolução desordenada tem alterado os padrões de acessibilidade intra-urbana e
afetado os sistemas de transportes de nossas cidades. Assim, é necessário
considerar as inter-relações das variáveis internas do sistema de transporte com
as demais variáveis da estrutura urbana.
1 INTRODUÇÃO
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No entanto, parece ter surgido uma nova ferramenta capaz de trazer algum
alento. Os municípios brasileiros passaram a conviver, desde julho de 2001, com
uma nova legislação que poderá trazer como conseqüência mudanças nas
condições de vida de toda a população, além de impactar significativamente a
gestão municipal e os administradores, legisladores, etc. É o “Estatuto da Cidade”,
nome dado à Lei 10.257/01, que regulamentou os artigos 182 e 183 da
Constituição Federal, trazendo em seu bojo, novas e importantes diretrizes, de
maneira geral, para a política urbana nacional, no âmbito dos municípios.
O Estatuto da Cidade estabelece dezesseis diretrizes gerais para a política
de desenvolvimento urbano sustentável, disponibilizando para os municípios e
regiões metropolitanas um conjunto de instrumentos que podem ser utilizados
para direcionar o desenvolvimento das cidades.
Como o Planejamento do Transporte Urbano (PTU) e o Planejamento de
Circulação (PC) são partes integrantes do Planejamento Urbano (PU), e
considerando que o Estatuto da Cidade (EC) traz importante diretriz para o PU,
por hipótese, pode-se adotar que o EC traz também importantes implicações para
os Planejamentos de Transporte e de Circulação. Apesar dessa hipótese, leituras
preliminares, abrangendo artigos, livros e textos em geral, mostraram que os
autores destacaram a importância, o significado e as implicações da nova lei, e
muito pouco se referenciaram aos Planejamentos de Transporte e de Circulação.
Vale ressaltar que este trabalho estabeleceu o objetivo que se segue, no
sentido de confirmar a hipótese aqui adotada como verdadeira.
1.1 OBJETIVO
Estabeleceu-se como objetivo precípuo deste trabalho a realização de um
estudo conceitual das diretrizes do Estatuto da Cidade, procurando-se demonstrar
a existência de supostas relações entre este novo instrumento urbanístico e os
Planejamentos de Transportes e de Circulação Urbana.
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1.2 JUSTIFICATIVA E CONTRIBUIÇÃO
O desenvolvimento do ambiente urbano pode ser controlado e dirigido por
ações de planejamento no sentido amplo, seguido da adoção de medidas
concretas e específicas em vários setores. O mais abrangente deles é o que
define o uso e a ocupação do solo que, por sua vez, tem relação estreita com os
setores de transporte e de circulação.
O planejamento das atividades humanas é fundamental sob os mais
diversos enfoques. Planejar é tentar antever e diagnosticar problemas e mobilizar
recursos e esforços para corrigir e transformar positivamente as situações
indesejáveis e socialmente injustas.
No Brasil, o planejamento urbano, em geral, nem sempre atinge esses
objetivos, seja pela falta de coordenação de ações, pela falta de controles efetivos
sobre os agentes, por incapacidade de superar os conflitos políticos e econômicos
inerentes ao desenvolvimento urbano ou por excessiva rigidez na definição dos
padrões aceitáveis. Mudar esta situação é, portanto, um desafio para os
administradores municipais.
Diante disso, a contribuição esperada para este trabalho é a de auxiliar a
difusão, a reflexão, o aprofundamento desse instrumento, para que o Estatuto
possa ser adotado largamente pelas administrações municipais, ajudando, assim
na melhoria do processo de planejamento urbano brasileiro.
1.3 ESTRUTURA DO TRABALHO
O presente trabalho está estruturado em 9 capítulos, cada um subdivido em
itens. O Capítulo 1 trata da introdução, e descreve o objetivo, a hipótese a ser
comprovada, a justificativa e a contribuição esperada.
O Capítulo 2 aborda a problemática das cidades brasileiras desde o
processo de urbanização até a falta de planejamento urbano e dificuldades na
gestão dos municípios.
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O Capítulo 3 é voltado para o planejamento de transporte em si,
explicitando os problemas relacionados ao transporte e circulação, e as possíveis
soluções para tais problemas.
A apresentação do mais novo instrumento urbanístico em forma de lei,
denominado Estatuto da Cidade, suas diretrizes e inovações encontra-se no
Capítulo 4.
Já o Capítulo 5 mostra as abordagens sobre o Estatuto da Cidade feitas por
especialistas urbanos e por profissionais ligados diretamente a área de transporte.
O Capítulo 6 descreve a metodologia a ser utilizada para comprovar a
hipótese descrita no início deste trabalho.
O estudo das diretrizes do Estatuto da Cidade, disposto como resultado
deste trabalho, está apresentada no Capítulo 7.
Recomendações e conclusões consideradas importantes fazem parte do
Capítulo 8.
Finalmente está relacionada a bibliografia consultada (citada ou não no
texto) para elaboração deste trabalho.
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2.1 PROCESSO DE URBANIZAÇÃO
As cidades são criadas e desenvolvem-se para atender às necessidades
humanas. Estas somente podem ser atendidas por homens que vivam juntos,
numa organização comunitária. O comércio, a indústria, a administração
governamental, as vantagens culturais da região, a educação, a recreação e os
divertimentos, e ainda as oportunidades de contatos sociais e a fácil aquisição de
bens e serviços são forças responsáveis pela origem e desenvolvimento das
cidades (SEDU/PR, 1999).
As cidades se originaram a partir das vilas, ou de pequenas civilizações,
que tiveram influência de fatores, como a necessidade de fixar-se no espaço e
dividir-se em classe sociais. Segundo Mumford (1982, p.11),
“Antes da cidade, houve a pequena povoação, o santuário e a aldeia;
antes da aldeia, o acampamento, o esconderijo, a caverna, o montão
de pedras; e antes de tudo isso, houve certa predisposição para a
2 PROBLEMÁTICA DAS CIDADESBRASILEIRAS
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vida social que o homem compartilha, evidentemente, com diversas
outras espécies animais”.
Munford (1982) ainda assemelha a formação das cidades com a
organização de insetos como abelhas e formigas, principalmente pelas funções
sociais da colmeia e do formigueiro, da divisão do trabalho, da diferenciação das
castas, etc.
Todos esses fatores continuam a atrair gente para as comunidades
urbanas. A atração ou a combinação de atrações, causa determinante, a princípio,
do nascimento de uma cidade, nem sempre é responsável pelo seu subseqüente
desenvolvimento. Na verdade, as cidades crescem e definham na medida que as
forças, responsáveis por sua origem e desenvolvimento continuam em ação,
desaparecem ou são substituídas por outras.
As cidades podem crescer tanto de dentro para fora como de fora para
dentro. O primeiro caso resulta do excesso de nascimentos em relação aos óbitos,
não é, como regra, numericamente muito significativo. Já o segundo caso pode
derivar do desemprego de trabalhadores do campo em virtude do aperfeiçoamento
da maquinaria agrícola, de progressos industriais que atraem operários e
respectivas famílias das zonas rurais e de outras cidades, e de um complexo de
forças que têm provocado o constante movimento migratório para orlas marítimas,
fluviais ou lacustres do país, e para regiões metropolitanas.
A princípio, a topografia é de influência decisiva e determina,
freqüentemente, a direção do crescimento da cidade, desviando-se de colinas ou
barreiras aquáticas. Como regra geral, a terra plana é procurada para comércio,
as elevações moderadas para residências, o nível do mar para empresas de
transporte e respectivos armazéns e oficinas.
Para Serra (1987), o espaço a ser adaptado pode ser natural ou não, sendo
que o espaço natural é um dos determinantes da forma do espaço humano e pode
ser descrito por um conjunto de variáveis como relevo, hidrografia, clima, flora
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disponibilidade de materiais de construção entre outros. E completa, afirmando
que:
“... a forma da adaptação construída dependerá da declividade do
terreno, de sua origem e orientação, da importância do isolamento e
das condições de conforto térmico, assim como, dos tipos de técnicas
e materiais empregados” (SERRA, 1987, p.54).
Os embriões das modernas comunidades urbanas surgiram a partir das
feiras e centros de intercâmbio, resultantes da intensificação das trocas comerciais
da Idade Média. Aqueles centros urbanos tinham uma estrutura simplificada, com
fatores produtivos pouco especializados e funções econômicas e organizacionais
uniformes e desconcentradas. Não tendo sido consolidados ainda mecanismos de
mercado para a produção e comercialização, as especializações no uso do solo
eram reduzidas, não havendo diferenciações acentuadas de funções entre os
centros urbanos.
Sabe-se que o grande impulso no processo de urbanização correspondeu,
nos dois últimos séculos, em grande parte, ao processo de industrialização. Este
resultou de uma interação da abertura de mercados, do aumento da escala de
produção, da aglutinação de pequenas unidades artesanais em unidades
produtivas maiores, e novos esquemas de divisão de trabalho, que condicionaram,
cumulativamente, acréscimos na produtividade e aumentos nos níveis de renda.
À medida que o processo de produção se tornava mais complexo e
aumentavam as densidades urbanas, verificava-se a dissociação espacial entre
locais de residência. Os cidadãos passavam a habitar locais nem sempre
próximos ao seu trabalho, ao contrário do que acontecia nas áreas rurais ou semi-
urbanas de origem.
O ritmo de crescimento nas cidades brasileiras vem aumentando ao longo
do tempo, principalmente no núcleo das aglomerações urbanas. Segundo
SEDU/PR (1999), desde a transição demográfica dos anos 1960 aos anos 1970,
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quando a maioria da população brasileira transformou-se de rural para urbana,
são crescentes os graus de urbanização atingidos no Brasil. De 56% de população
urbana, em 1970, as cidades passaram a abrigar 68% dos habitantes, em 1980 e,
em 1996, chegaram a 78%. Neste período, a população brasileira cresceu a uma
taxa de 22%, da década de 70 para a de 80, passando a cerca de 90 milhões para
120 milhões de habitantes; e de 31%, de 1980 para 1996, alcançando
aproximadamente 127 milhões de habitantes (IBGE, 2003).
Segundo o Censo de 2000, a população urbana do Brasil chegou a
aproximadamente 138 milhões, alcançando 81% da população total (IBGE, 2003).
Trata-se, portanto, de um acelerado processo de crescimento populacional,
impulsionado, fundamentalmente, pela população das cidades.
Segundo ANTP (2001), o modelo de desenvolvimento urbano brasileiro é
marcado pelas seguintes características:
• Industrialização com baixos salários – gerando um mercado residencial
restrito;
• Gestões urbanas (prefeituras e governos estaduais) com tradição de
investimentos regressivos – provocando áreas de acumulação de
investimento em detrimento das demais;
• Legislação ambígua e aplicação arbitrária da lei – consagrada em Planos
Diretores;
• Legislação elitista, convivendo lado a lado com o crescimento da cidade
ilegal.
2.2 PLANEJAMENTO URBANO
Os planos urbanísticos na maioria das cidades do mundo, desde a
antigüidade, têm refletido as funções principais para cujo preenchimento a cidade
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foi criada. As cidades medievais, por exemplo, limitadas pelas muralhas, foram
planejadas para servir à necessidade primordial de defesa militar (AIAM, 1965).
Quer o plano urbanístico original de uma cidade tenha sido fruto de uma
visão curta ou não, apresenta ele uma determinada característica: logo estará
superado e necessitará de modificações para satisfazer a mudança de condições.
O planejamento não termina com a conclusão do plano. Muitas
municipalidades assim pensaram; na maioria de tais casos é possível identificar a
cidade planejada originalmente – se o plano for obedecido – e o desenvolvimento
posterior não planejado. Não basta nomear uma comissão provisória de
planejamento ou contratar um técnico de planejamento para preparar o plano, e,
pronto este, considerar a tarefa terminada. O planejamento é uma função
necessária e contínua do governo.
A meta básica do planejamento urbano é a elaboração de um plano geral
para o desenvolvimento futuro da comunidade e, em seguida, a adoção de
medidas indicadas para efetivação do plano na prática (SEDU/PR, 1999).
O objetivo amplo do planejamento é promover o bem-estar dos habitantes
da comunidade, concorrendo para criar na mesma um ambiente cada vez melhor,
mais saudável, conveniente, eficiente e atraente. O planejamento urbano consiste
em métodos e técnicas para coordenar e harmonizar ao máximo as numerosas e
variadas construções públicas e particulares, e o aproveitamento dos terrenos.
Uma das partes mais importantes do planejamento urbano é a que se refere
ao uso do solo e distribuição do mesmo por toda a comunidade. O plano de uso
do solo determinará, dentro dos limites, onde o povo vai morar na cidade, onde vai
trabalhar e onde vai fazer as compras. As escolhas das áreas industriais,
residenciais e de lazer muito influirão no tempo a ser despendido pelos residentes
da cidade em transporte e locomoção.
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O desenvolvimento não planejado das cidades, sob a influência das forças
econômicas, não tem evitado a mistura indevida de tipos incompatíveis de
utilização do solo, inclusive a intromissão de usos industriais e comerciais dentro
de áreas residenciais. Isso resulta num congestionamento prejudicial ao bem estar
da comunidade, e à tendência para mudanças na questão do uso do solo, levando
a necessidade de um zoneamento da cidade (AIAM, 1965).
Por outro lado, usos mistos, que sejam compatíveis, tanto no sentido
construído, como no sentido ambiental, podem, em muitos casos, contribuir para o
controle dos congestionamentos e melhoria da vida da comunidade. Pois com a
concentração de vários tipos de uso do solo, como comercial, residencial,
industrial etc., desde que sua implantação não seja prejudicial à vizinhança, pode-
se diminuir o número de viagens por modo motorizado contribuindo-se para a
maior fluidez do trânsito.
O planejamento da cidade tratará dos serviços e instalações postos à
disposição da população pelos órgãos públicos e semipúblicos: ruas, vias férreas,
bondes, ônibus, edifícios públicos, água, eletricidade, lazer e outros serviços de
utilidade pública.
É válido lembrar que o plano da cidade é, primordialmente, um plano para o
povo. Os tipos de parques e outros centros de lazer, que a municipalidade
proporciona, e o programa que se leva avante com tais empreendimentos
ajudarão a determinar como os habitantes despenderão suas horas de lazer. As
ruas e os meios de transporte serão importantes para determinar a distância que
terão de percorrer na cidade e o tempo despendido nesses deslocamentos.
A forma como uma cidade se desenvolve é determinada por um conjunto de
forças e interesses individuais, do Estado e das organizações privadas, que se
entrelaçam de forma complexa. Os futuros possíveis para a cidade dependerão
muito das escolhas sociais e da organização urbana que forem feitas, e nelas
estão implícitas as opções que forem tomadas em relação aos transportes e à
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mobilidade espacial das pessoas. Todos os agentes e processos que interagem
de forma complexa, “produzindo” o espaço urbano (Estado, setor privado,
população, valor da terra e dinâmica da economia), influenciam a forma como os
sistemas de transporte e trânsito são organizados e usados. (RAIA JR. &
D’ANDREA, 2002).
As cidades brasileiras apresentam, em geral, um alto grau de concentração
espacial dos serviços, equipamentos e infra-estrutura pública; uma alta
concentração de renda em bairros bem equipados e cada vez mais exclusivos; um
aumento da ocupação irregular do solo urbano; um deslocamento da população
de baixa renda para as áreas mais distantes do centro da cidade e desprovidas de
urbanização, constituindo, geralmente áreas insalubres, como encostas de morro
e de canais hídricos; um declínio das finanças municipais e da capacidade do
Estado intervir na cidade; uma deficiência do transporte coletivo público; um
crescimento da violência urbana, dentre outros fenômenos. (SEDU/PR, 1999).
Assim, está ocorrendo um aprofundamento das desigualdades sócio-
espaciais das cidades brasileiras, com a produção de um padrão de uso do solo
urbano crescentemente segregado e disperso.
A falta de planejamento e controle – que deveriam ordenar o uso e a
ocupação do solo – permite que o desenho urbano seja paulatinamente construído
sob pressões das forças do mercado (inclusive o processo especulativo), que
tendem a direcionar seus investimentos em regiões que apresentem maior
acessibilidade, com resultados que constatam severos impactos ao meio ambiente
e ao sistema de circulação.
A crescente urbanização e crescimento econômico tendem a agravar cada
vez mais as dificuldades dos deslocamentos de pessoas e mercadorias, assim
como a diferenciação nos padrões de uso do solo, nas cidades de médio e grande
porte, que reflete um complexo processo de diversificação das atividades
econômicas, sociais, de lazer, etc. O uso do solo é condicionado não só pelas
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especializações produtivas, bem como pelas relações internas - entre setores
produtivos, e externas, envolvendo um processo interativo das áreas urbanas com
as economias regional e nacional, e também pela divisão social do trabalho.
Mas, além das características de sua estrutura econômica, um outro fator
importante no condicionamento do uso do solo é a acessibilidade. Por
acessibilidade, entende-se a disponibilidade de infra-estrutura viária e sistemas
operacionais adequados à circulação de pessoas e bens, e expressa a distância
percorrida, o tempo despendido e o custo do transporte nos deslocamentos da
população.
A cidade ilimitada, sob o impulso do uso ampliado do automóvel e do
frenético movimento do mercado imobiliário, estimula, a médio prazo, a expansão
urbana e a dispersão das atividades, eleva o consumo de energia, e cria grandes
diferenças de acessibilidade às atividades, desafiando continuamente as
ineficientes redes de transporte (SEDU/PR, 1999).
Sendo assim, a garantia de mobilidade e facilidade de contatos que o
sistema de transporte pode proporcionar ao cidadão (habitante urbano em geral),
é de extrema importância, pois um dos mais relevantes propósitos das
concentrações urbanas é justamente o de facilitar contatos e aproximar atividades.
A falta de um planejamento é na maioria das vezes a principal causa do
crescimento descontrolado das cidades e dos processos de urbanização
inadequados e aleatórios que causam enormes problemas para à vida urbana.
Toda essa problemática passa, dentre outros motivos, pela pouca cultura
de planejamento existente no Brasil. Afirma Souza (2002), que em países que
possuem tradição e cultura de planejamento consolidada, o planejamento urbano
é um campo que congrega os mais diferentes tipos de profissionais. Nesses
países, o planejamento tem a participação não só de urbanistas, mas também de
cientistas sociais, profissionais das mais diversas formações e da população
organizada.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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13
Segundo Gondim (1994), as soluções para os problemas das cidades,
como habitação, saneamento básico, transporte, segurança, etc. não podem ser
encontradas separadamente das soluções para os problemas socioeconômicos
como desemprego ou subemprego, acesso a serviços de saúde e educação, e isto
remete à necessidade de se dotar um enfoque interdisciplinar para o
equacionamento dos problemas urbanos.
O planejamento não pode ser competência de um único técnico, ou de
vários deles de uma mesma categoria profissional, aponta Ferrari (1977), pois
deve haver um grupo de trabalho multidisciplinar, de tal forma que ele seja
abrangente e compreensivo.
A elaboração do planejamento urbano, no Brasil, comumente, se dissocia
da elaboração dos planejamentos de transporte e de circulação. No entanto, em
um rápido exercício de análise pode-se concluir que a integração desses
planejamentos é absolutamente imprescindível.
A dissociação entre o Planejamento Urbano e o Planejamento de
Transportes Urbanos no Brasil, assim como, em muitos casos, a ausência de
planejamento dos transportes vem desde muito tempo atrás.
No contexto político–institucional pós Constituição 1988, o Município tem se
destacado como Ente da Federação que mais avançou no campo do
desenvolvimento urbano, tendo implementado políticas urbanas, e tomado
iniciativas que resultaram na melhoria dos serviços públicos, atuando em áreas
onde a presença da união tradicionalmente ocorria (NETTO, 1994).
Mesmo limitado pela ausência de regulamentação dos dispositivos
constitucionais, o Município também tem evoluído no sentido de planejar e ordenar
o crescimento urbano, procurando atribuir função social à cidade e à propriedade.
Historicamente, no Brasil, os Municípios têm sido responsáveis pela
administração das cidades e, portanto, os mais solicitados a encontrar respostas
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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concretas para os problemas urbanos. A partir da reforma institucional da
Constituição de 1988, da aprovação das novas leis orgânicas Municipais e das
eleições municipais de 1988, fortaleceram-se as teses municipalistas da gestão
do processo de desenvolvimento intra-urbano (NETTO, 1994).
Segundo Pires et al. (1997), os municípios devem ter controle efetivo sobre
o seu desenvolvimento físico-territorial, o que implica ter instrumentos legais de
organização do uso e ocupação do solo. Isto pode ser conseguido pela formação
de recursos humanos adequados e pela promulgação de normas legais
pertinentes a estes controles, principalmente os planos diretores e as leis de
zoneamento.
O crescimento desordenado da cidade e a desconsideração dos seus
efeitos sobre os sistemas de transporte e de circulação têm causado enormes
prejuízos às cidades brasileiras. Grandes construções e ocupações que ocorrem
na cidade – escolas, centros de escritórios, shopping-centers - têm impacto
significativo nas condições de transporte e trânsito e precisam ter suas instalações
submetidas a regras e limites definidos pela municipalidade. O Código de Trânsito
Brasileiro, de 1998, torna essa análise obrigatória.
O patrimônio histórico e arquitetônico das cidades tem sido destruído pelo
crescimento desordenado e pela criação de sistemas agressivos de circulação de
veículos. A sua defesa pode ser organizada por instrumentos legais,
principalmente aqueles referentes ao plano diretor da cidade e com estímulos
através de políticas tributárias e fiscais.
2.3 GESTÃO URBANA
A maior parcela da população brasileira, no início do século XXI, está
concentrada nas cidades. Os problemas ambientais decorrentes dessas
aglomerações têm conseqüências diretas na vida das pessoas, entre as quais a
carência de saneamento básico, a poluição em diversas formas, os conflitos de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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uso do solo, a localização inadequada de atividades especializadas e os graves
contrastes sociais.
Todos esses fatores fazem da gestão urbana uma questão altamente
complexa que exige não apenas respostas técnicas, mas necessita também de
instrumentos para a implementação de estratégias e programas a partir de uma
perspectiva abrangente que incorpore a dimensão política, integrando os aspectos
ecológicos, econômicos e socioculturais no enfrentamento dos problemas de meio
ambiente e desenvolvimento urbano.
O termo gestão urbana vem sendo gradualmente utilizado a partir da
segunda metade dos anos 80. Segundo Souza (2002), o termo gestão tem se
apresentado com um “sucedâneo” do termo de planejamento, que vem sendo
amplamente desacreditado e ligado às práticas antidemocráticas e autoritárias na
esteira da crise do planejamento urbano e regional que, inicialmente, em um
patamar ideológico, chegou ao Brasil no início da década de 1980.
A gestão urbana, no Brasil, desde então, vem apresentando um quadro
pouco satisfatório, quando se considera, dentre outros aspectos, aqueles
relacionados com o controle e crescimento urbano, em que o planejamento (se
existente) tem se apresentado dissociado das diversas áreas (transportes,
saneamento, meio ambiente, etc.). A gestão do sistema urbano se configura como
se cada um dos seus subsistemas fossem independentes e, portanto, planejados
e operados de forma segmentada (RAIA JR., 2001).
Nos primeiros anos deste século, motivada pelos diversos instrumentos
(Constituição Federal, Código de Trânsito Brasileiro, Estatuto da Cidade, etc.) e
pelos conceitos da Gestão da Qualidade Total, gradativamente, e de forma ainda
insipiente, as administrações municipais vêm sofrendo pressões no sentido de
adotar novos modelos de gestão. A modernidade na ação de gerir uma
organização ou um instituto qualquer, basicamente adotada pela iniciativa privada,
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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passa a ser assumida, ainda que de maneira tímida, nas cidades médias e
grandes.
Os centros urbanos estão crescendo, e também com eles crescem os
grandes problemas sociais e os desequilíbrios ambientais, apontando para o
futuro com queda acentuada na qualidade de vida, de degradação ambiental
acelerada e de riscos de governabilidade. Segundo Costa, J. (2001), essa
realidade tem provocado muito sofrimento, doenças e mortes, exigindo uma
resposta adequada por parte do Estado e da sociedade, fazendo com que
diferentes organismos internacionais formulem propostas que visem adequar o
processo de desenvolvimento ao de preservação do meio e da vida da população.
É necessário que se abandone a idéia de cidades como espaços caóticos e
se passe a buscar formas de administrá-las e de administrar os processos sociais
que as produzem e modificam. Urge que se construam políticas urbanas alinhadas
com os princípios da sustentabilidade, mas que se concretizem em estratégias,
procedimentos e ações que compreendam a especificidade desses espaços, suas
relações com seus espaços de entorno e a dinâmica social que neles ocorrem
(FURTADO, 2002).
As regiões metropolitanas sofrem as crises mais profundas, mas também
as cidades de porte médio já as conhecem, embora nelas ainda seja possível
manter condições de sustentabilidade, com custos mais baixos do que nas
grandes cidades e metrópoles. Nos centros menores, as condições ambientais
são melhores, mas os problemas de sustentabilidade persistem, embora com
formas diferentes, como as questões de carência de infra-estrutura para o
desenvolvimento e problemas ambientais ligados à suas bases físicas.
Ainda, segundo Furtado (2002), tem-se, assim, cidades grandes que
apresentam grandes disparidades entre si e no seu interior. Disparidades
socioeconômicas que se cristalizam em disparidades nas condições ambientais.
Para enfrentar o desafio de levar as cidades a estágios progressivos de
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sustentabilidade, destacar-se-ão aqui apenas alguns aspectos da gestão urbana,
que, embora centrais, certamente não cobrem toda a gama de aspectos relativos
ao tema:
• É preciso promover a produtividade e fortalecer as vantagens
comparativas das cidades que são moldadas pelos fatores locais e pela
diversidade. Assim, deve-se assegurar o dinamismo econômico das
cidades, evitando a obsolescência de sua infra-estrutura e o abandono de
seus espaços públicos. Estar-se-á, assim, evitando as chamadas
deseconomias urbanas, que, na medida que diminuem a produtividade da
economia urbana, aumentam a pobreza e a queda da qualidade de vida da
população.
• A crescente dependência dos processos urbanos das condições
macroeconômicas gerais, do país e do mundo: mesmo que as primeiras
análises dos efeitos da globalização dos mercados nacionais sobre as
cidades brasileiras sejam desestimulantes, não se pode deixar de
reconhecer a irreversibilidade de alguns dos seus aspectos e a sua
importância para o desenvolvimento urbano. A gestão deverá garantir a
integração de cada cidade à rede urbana da qual faz parte, compreendendo
e explorando a sua articulação com as cadeias produtivas existentes, sejam
elas regionais, nacionais ou internacionais.
• A questão tecnológica também deve ser parte importante da gestão
urbana sustentável. A inovação tecnológica é fundamental porque as
condições de sustentabilidade estão definidas pela população, pela
tecnologia, pelos processos sociais e pelos padrões de consumo. Isso não
significa que ela seja suficiente. Algumas tecnologias utilizadas para
resolver problemas ambientais urbanos estão mostrando sinais de
esgotamento, deixando mais difícil e caro baixar os volumes adicionais de
contaminação e mitigar outros impactos ambientais. Para resolver esses
problemas, conjuntamente com a questão tecnológica, será necessário
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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atuar na organização espacial da cidade e cuidar da interação setorial das
políticas públicas.
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3.1 A CRISE DO TRANSPORTE
A crise do transporte urbano se deve, em grande parte, às características
específicas do processo de crescimento adotado. Depois dos anos 1950, o país
optou por uma política apoiada no modal rodoviário, com o abandono de outros
modos de transporte e o apoio crescente aos usuários do transporte individual,
cujo crescimento acompanhava o da indústria automobilística e do poder aquisitivo
da classe média, no Brasil, nas décadas de 1960 e 1970. Os efeitos da crise foram
agravados pela aplicação de abordagens teóricas e metodológicas que
desconsideravam, nos projetos de melhoria dos transportes urbanos, o controle da
demanda pelo disciplinamento do uso do solo.
A queda na inflação, a partir de 1995, levou a uma estabilização econômica
com impacto imediato na demanda de bens, principalmente entre as camadas de
renda mais baixa, que tinham sofrido muitas desvantagens no período
inflacionário. Para a classe média, as novas condições permitiriam o aumento da
compra de automóveis, dado que a indústria automobilística começou a oferecer
3 PLANEJAMENTO E GESTÃO DOTRANSPORTE URBANO
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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20
carros compactos por prestações mensais acessíveis, com uma política de juros
privilegiados. Como resultado destes fatores, o aumento da frota de automóveis,
verificado historicamente, acelerou-se.
A cultura do automóvel como sinônimo de desenvolvimento e status social
tem marcado o comportamento da sociedade brasileira, que vem se tornando
cada vez mais egoísta, sectária e excludente. O automóvel representa a grande
revolução do século XX, colocando a cidade aos seus pés. Mais de 40% dos
espaços das cidades lhe são reservados: ruas e avenidas, viadutos,
estacionamentos, oficinas, postos de abastecimento etc. O seu uso indiscriminado
tem implicado a segregação de praças, a destruição de edifícios históricos, a
elevada interferência em áreas residenciais, a ampliação exagerada das áreas
urbanas e os delitos de trânsito que, na sua maioria, são acobertados pela
legislação vigente (AFFONSO,1995).
As deseconomias urbanas provocadas por esse modelo de mobilidade se
fazem sentir duramente sobre o sistema de Transporte Coletivo, de maneira
especial, e sobre as cidades de maneira geral. As deseconomias são mais
acentuadas nas duas maiores cidades brasileiras - São Paulo e Rio de Janeiro -,
fenômeno que começa a se estender para outras cidades de médio e grande
portes, como Campinas, Recife e Belo Horizonte. O estudo do IPEA/ANTP (1998),
mostra que se gasta cerca de 240 mil horas/ano nos congestionamentos, observa-
se um desperdício de 200 milhões de litros/ano de gasolina e de 4 milhões de
litros/ano de diesel. Concluindo- se, o Brasil perde, anualmente, cerca de R$ 500
milhões.
Em paralelo, os investimentos no transporte público, como aqueles voltados
para ampliação das redes de metrô e ferrovias urbanas, por exemplo, são cada
vez mais insuficientes frente à demanda crescente e diferenciada, gerada pelo
crescimento e urbanização da população brasileira. Em contraposição, nos últimos
anos, a frota de automóveis foi duplicada.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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21
A crescente motorização dos deslocamentos das famílias brasileiras, cada
vez mais ávidas por possuir o seu próprio automóvel, somada à queda na
performance dos serviços públicos de transporte, estão na origem da crise atual,
que tem no aumento do transporte informal, por peruas e vans, sua maior
expressão. A depender de sua evolução, esse fenômeno ameaça a
regulamentação do setor, vindo a submeter os serviços de transporte público às
"regras de negócio". Esse processo em curso tem implicações gravíssimas para a
eficiência e a qualidade de vida nas cidades e constitui uma ameaça à
sobrevivência do transporte público regular e integrado.
3.2 PROBLEMAS RELACIONADOS AO TRANSPORTE E TRÂNSITO
As cidades brasileiras apresentam, neste início de século XXI, um quadro
sério de problemas relacionados com o transporte, trânsito, com a falta de controle
e ordenação do crescimento urbano, com o meio ambiente, etc. As cidades têm
também apresentado, principalmente aquelas de portes médio e grande, queda
acentuada na mobilidade e acessibilidade, degradação do meio ambiente,
congestionamento, número elevado de acidentes de trânsito, etc., com um
aumento significativo de problemas com os transportes urbanos.
Esses problemas são decorrentes de uma série de fatores sociais, políticos,
econômicos, além de políticas urbanas, de transporte e trânsito que vigoraram e,
em alguns casos, ainda prevalecem (RAIA JR., 2001). Cidades de portes médio e
grande, tal como ocorre em muitos outros países em desenvolvimento, foram
desenhadas e adaptadas nos últimos 40 ou 50 anos, para o uso do automóvel,
com ampliações no sistema de vias e o uso de técnicas que têm favorecido o uso
do transporte individual.
Com a colocação de um número cada vez maior de veículos nas vias,
menos confiável e lento se torna o transporte coletivo urbano, fazendo com que a
demanda e a receita sejam menores, necessitando a colocação de uma maior
quantidade de ônibus nas ruas para a prestação do mesmo serviço, provocando o
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22
aumento dos custos. Com isso, os usuários cativos do sistema se sentem
desestimulados no seu uso, procurando uma alternativa que lhes seja viável, ou
seja, o automóvel, fazendo crescer o congestionamento. Forma-se, por
conseguinte, um círculo vicioso.
Criou-se, desta forma, aquilo que se poderia chamar de cultura do
automóvel, que vem drenando uma quantidade muito grande de recursos para o
atendimento das necessidades advindas desta escolha, que muitos consideram
equivocada. Paralelamente, afirmam Pires et al. (1997) que o sistema de
transporte público, apesar da ocorrência de alguns investimentos de caráter
pontual e específico, permaneceram insuficientes para o atendimento da demanda
de viagens. Com isto, o setor vive crises cíclicas originadas, dentre outros motivos,
pela incompatibilidade entre custos, tarifas e receitas, gestões deficientes, além de
não receber prioridade de circulação.
O sistema de transporte público vivencia uma queda na sua importância
junto aos usuários e a comunidade, em geral, transparecendo uma imagem de um
serviço considerado como um “mal necessário”, para as pessoas que não
possuem outra alternativa, a não ser o transporte coletivo. Como conseqüência,
criou-se no Brasil uma linha divisória entre as parcelas de população que
efetivamente têm acesso ao transporte individual e aquelas que são dependentes
do transporte público, refletindo as grandes disparidades e iniqüidades sociais e
econômicas da sociedade brasileira. Enquanto uma parcela reduzida desfruta de
melhores condições de transporte, a maioria continua limitada nos seus direitos de
deslocamento e acessibilidade (PIRES et al., 1997).
Essa situação tende a se agravar: a falta de transporte público de qualidade
e capaz de corresponder às necessidades do usuário estimula o uso do transporte
individual que aumenta os níveis de congestionamentos e poluição. O uso do
automóvel estimula, no médio prazo, a expansão urbana e dispersão das
atividades, elevando o consumo de energia e criando problemas de acessibilidade
(LIMA, 1998).
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23
O crescimento que experimenta a maioria das cidades de portes médio e
grande, em grande parte dos casos
“vem seguido de um espalhamento da mancha urbana, fazendo com
que os grupos de baixa renda sejam compulsoriamente expulsos para
a franja periférica das cidades, tendo-se que realizar viagens cada
vez mais longas e demoradas” (RAIA JR. & SILVA, p.175, 1999).
As redes de equipamentos públicos, tais como água, esgoto, pavimentação,
drenagem, iluminação pública, telefonia, etc., tornam-se mais dispendiosas. Os
ônibus passam a fazer trajetos sempre maiores, reduzindo sua rentabilidade.
Algumas áreas tornam-se críticas, principalmente em locais periféricos, com o
transporte público altamente deficitário. A cidade caminha para a
insustentabilidade (PIRES et al., 1997).
A falta de planejamento e controle que deveriam ordenar o uso e a
ocupação do solo permitem que o desenho urbano seja paulatinamente construído
sofrendo pressões das forças de mercado (inclusive o processo especulativo), que
tendem a direcionar seus investimentos em regiões que apresentem maior
acessibilidade, com resultados que constatam severos impactos ao meio ambiente
e ao sistema de circulação.
Um agravante para esta situação é a ausência de mecanismos adequados,
tanto de ordem legal como gerencial, que orientem o uso e a ocupação do solo
conforme critérios de equidade e competitividade, levando a idéia de que a
configuração da cidade seja definida por forças especulativas do mercado,
causando graves impactos ambientais e gerando crescentes dificuldades de
circulação local (LIMA, 1998).
Neste processo, passeios de pedestres, praças, áreas verdes, áreas de
convivência são, de maneira progressiva, usados para a circulação e
estacionamento de veículos. Neste sentido, Pires et al. (1997) são enfáticos: “ruas
de trânsito local transformam-se em vias de articulação do sistema viário, praças
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se transformam em rotatórias, cruzamentos semaforizados ou terminais, e áreas
de fundo de vale passam a abrigar avenidas”.
Existe, na verdade, um círculo vicioso, em que o aumento do interesse pelo
automóvel traz como conseqüência o incentivo à expansão urbana, com aumento
de distâncias e custos para o sistema de transporte público, o aumento da sua
ineficiência, com um prejuízo para a comunidade, principalmente para os usuários
cativos, em geral, de baixa renda.
3.3 POSSÍVEIS SOLUÇÕES PARA OS PROBLEMAS COM TRANSPORTE
URBANO
A cidade pode ser considerada um complexo sistema de inter-relações que
está sofrendo constantes mudanças. A maneira como ocorre o uso do solo e as
condições socioeconômicas da população determinam a quantidade e o tipo de
viagens necessárias, e que precisam ser atendidas com a utilização da infra-
estrutura viária e dos veículos de transportes ofertados.
A Constituição Brasileira de 1988 consagrou o papel de diferentes esferas
de governo. De maneira particular, deu grande ênfase aos municípios, que
ganharam mais força, podendo, desde então, definir políticas de trânsito e
transportes. Assim, passaram a ter competência para tratar dos principais
problemas relacionados com trânsito e transportes, nas formas apresentadas a
seguir (BRASIL, 1988):
“Organizar e prestar, diretamente ou sob o regime de concessão ou
permissão, os serviços públicos de interesse local, incluindo o
transporte coletivo, que tem caráter essencial” (Art. 30, V);
“Promover, no que couber, adequado ordenamento territorial,
mediante planejamento e controle do uso do solo, do parcelamento e
da ocupação do solo urbano” (Art. 30,VIII);
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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25
“O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para
cidades com mais de 20 mil habitantes, é o instrumento básico da
política de desenvolvimento e expansão urbana” (Art. 182, § 4o);
O Estado promoverá programas de assistência obedecendo ao
seguinte preceito: “normas de construção dos logradouros e dos
edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte
coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de
deficiência” (Art. 227, § 2o).
Os municípios passaram a ter competências para iniciar um processo de
resolução dos principais problemas que afetam ou virão afetar a qualidade de
vida, de acordo com o seu porte, podendo cumprir as seguintes ações:
• Propor e monitorar políticas de uso do solo;
• Formular políticas de circulação e de transportes que venham ao encontro
das necessidades dos cidadãos;
• Assumir de forma efetiva a função de gestor da circulação de pessoas e
de carga;
• Estabelecer tarifas de transporte coletivo, táxi, de forma a restituir ao
operador os custos da operação de cada sistema;
• Propor parcerias com o setor privado ou outros órgãos públicos, visando a
resolução de problemas existentes ou novos investimentos;
• Propor ferramentas que possam restituir ao Poder Público ganhos obtidos
por pessoas físicas (contribuição de melhoria) ou jurídicas (taxa de
transporte , baseada no Versement Transport, francês).
A gestão deste complexo sistema de inter-relações exige uma organização
adequada da Administração Pública, seja ela em nível Municipal, Estadual ou
Federal. Uma das possibilidades de intervenção da Administração Municipal é
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avaliar as condições de transporte e trânsito segundo três áreas principais:
planejamento urbano, planejamento de transportes e de circulação, de acordo com
PIRES et al., (1997):
A. Planejamento urbano - é a atividade que define as condições de uso e
ocupação do solo, tais como: usos habitacionais, industriais, comerciais e de lazer.
Essa atividade define também a localização dos equipamentos públicos como
escolas, creches, praças, parques, hospitais, conjuntos habitacionais etc. Os
deslocamentos cotidianos de pessoas e de mercadorias, entre origens e destinos,
são diretamente influenciados pelas decisões dos técnicos da área de
planejamento urbano. Essa ação está, em geral, ligada a uma Secretaria ou
Departamento de Planejamento da Prefeitura, embora possa estar sob a
responsabilidade de outros órgãos municipais. Isto dependerá do tamanho da
cidade e estrutura da Prefeitura.
B. Planejamento de transporte - é a atividade que define a infra-estrutura
necessária para assegurar a circulação de pessoas e mercadorias, bem como os
sistemas de transporte que estarão sujeitos à regulamentação pública.
• No caso da infra-estrutura de transporte, são definidos dois componentes
básicos: i) ruas, calçadas, ferrovias, ciclovias e hidrovias; e ii) terminais de
passageiros ou de cargas.
• No caso dos sistemas de transportes, o planejamento define a tecnologia
a ser utilizada e o nível de serviço (NS) a ser ofertado, ou seja, veículos,
itinerários, freqüência de viagens, tarifas, formas de controle, etc.
Ao definir esses sistemas, o planejamento de transporte condiciona a
acessibilidade ao espaço por parte das pessoas, podendo melhorá-la ou piorá-la
conforme a decisão específica tomada. O planejamento de transporte está
normalmente ligado a uma Secretaria ou Departamento Municipal de Transportes.
Em muitas cidades, principalmente naquelas de menor porte, a definição do
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sistema viário está ligado a uma outra secretaria, por exemplo, Secretaria ou
Departamento de Obras e Vias Públicas.
C. Planejamento da circulação - é a atividade ligada ao trânsito, ou seja,
aquela que define como a infra-estrutura viária poderá ser utilizada por pessoas e
veículos. Essa definição envolve também as atividades de administração do
aparato de trânsito, de fiscalização sobre o comportamento dos usuários e de
promoção da educação para o trânsito. Ao definir como as vias podem ser usadas,
o planejamento da circulação influencia a escolha dos caminhos e dos meios de
transporte que têm melhores condições de serem utilizados. O planejamento da
circulação está ligado aos órgãos municipais de trânsito ou está incluído na
Secretaria ou Departamento Municipal de Transportes e Trânsito.
As três áreas de planejamento têm relações diretas entre si; eis alguns
exemplos mais rotineiros dessas relações, ainda segundo Pires et al. (1997):
• A definição de uma área como região destinada à habitação, pelo
planejamento urbano, cria uma necessidade de transporte de pessoas entre
o local de moradia e as atividades de trabalho, estudo, lazer, saúde, bem
como a necessidade de abastecimento da região por mercadorias. A
necessidade de infra-estrutura e de meios de transporte vão então afetar o
planejamento de transportes, e a necessidade de organizar o trânsito nas
vias vai afetar o planejamento da circulação.
• A implantação de uma nova infra-estrutura de transportes, definida pelo
planejamento de transportes, ou seja, vias, corredores de ônibus, metrô,
etc., aumenta a acessibilidade das regiões por ela servidas. Isso provoca,
em médio prazo, uma pressão pela alteração no uso e na ocupação do
solo, abalando o planejamento urbano. Provoca também, e freqüentemente
em curto prazo, um aumento ou modificação do tráfego local, afetando o
planejamento da circulação.
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• A mudança das mãos de direção de determinadas vias pelo planejamento
da circulação, associada ao aumento de tráfego, cria pressões de médio
prazo para mudanças no uso e na ocupação do solo, afetando o
planejamento urbano. Da mesma forma, pode aumentar o grau de
congestionamento, com impactos nas decisões do planejamento de
transporte, a respeito da necessidade de nova infra-estrutura ou meios de
transportes.
Em suma, as alterações no uso do solo geram novas demandas de
transporte e trânsito; a criação de novos sistemas de transporte gera por sua vez
alterações no uso do solo; a mudança nas condições do trânsito também pode
gerar mudanças no uso do solo e nas condições do transporte público. Apenas
uma ação coordenada nas três áreas pode reduzir os problemas e desenhar um
espaço de circulação com mais qualidade e eficiência.
Nas cidades brasileiras, na maioria dos casos, o enfoque mostrado acima
não é bem conhecido e/ou entendido pelas equipes de planejamento. Em geral, o
planejamento urbano está em uma secretaria de planejamento, o de transporte e
circulação está, muitas vezes, pendurado em uma secretaria de Serviços e Obras,
e em alguns casos, em uma secretaria ou empresa pública de transportes e
trânsito, e acabam trabalhando de maneira isolada uma das outras.
A criação e a estruturação de um Órgão Gestor para realizar o
planejamento e o controle do transporte e do trânsito são providências básicas
que uma Prefeitura deve tomar com o objetivo de assegurar as necessidades de
deslocamento da população, com confiança e confiabilidade. Tomando-se como
base a estrutura mais simples, tal como a do Conselho Municipal de Trânsito e
Transportes, pode-se evoluir paulatinamente para um organismo cuja atuação seja
abrangente e permanente.
Segundo ANTP (2001), de maneira geral e de forma sintética, frente às
necessidades de desenvolvimento urbano, do trânsito e do transporte público,
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levando-se em consideração a legislação em vigor, os municípios brasileiros têm
diversas obrigações, por exemplo, nos seguintes âmbitos:
• Legal: desenvolver o Plano Diretor Municipal; organizar as leis de
Zoneamento urbano; organizar os sistemas de transportes urbanos; garantir
condições seguras ao trânsito; responder às solicitações dos munícipes;
participar de programas nacionais;
• Institucional: organizar órgão gestor municipal de transporte e trânsito;
organizar o processo de fiscalização do trânsito local; organizar sistema de
compensação de multas de trânsito; organizar coordenadorias e escolas de
educação de trânsito;
• Financeiro: aplicar os recursos das multas de trânsito no próprio trânsito; 5
% do total de multas arrecadadas para programas nacionais; definir a tarifa
do transporte público;
• Técnico: planejar e controlar o transporte público; planejar, operar e
organizar o trânsito local; disponibilizar a sinalização viária; controlar obras
no sistema viário; controlar e organizar a circulação de veículos especiais;
controlar a instalação de pólos geradores de tráfego.
Os órgãos gestores de algumas das grandes cidades brasileiras, como São
Paulo, por exemplo, surgiram a partir de empresas multinacionais que operavam o
transporte coletivo por bondes.
Em 1887, quando foi autorizada a concessão para o lançamento de bondes
elétricos em São Paulo, os concessionários brasileiros resolveram buscar capital
no Canadá e fundaram a “The São Paulo Railway Light and Power Co”, que, em
1899, com a incorporação da Inglaterra, passou a ser chamada de “The São Paulo
Tramway Railway Co” (STIEL, 1984).
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O contrato com a municipalidade para os serviços de bonde, prestados por
essa companhia, terminaria em 1941 e, em 1937, a “Cia. Light” anunciou não mais
empregar suas atividades de prestação de serviços de Transporte Coletivo na
Capital com o término do contrato. Então, em 1939, pouco antes do término do
contrato, o governo federal emitiu um decreto-lei obrigando a Companhia a manter
seus serviços. Assim, a “Cia. Light” começou a manter seus serviços em estado
precário e com desinteresse total pelo sistema, o que acarretou uma falta de
integração com os demais setores municipais (STIEL, 1984).
Em síntese, pode-se afirmar que a própria “Light” tinha uma maior
preocupação com o aspecto operacional do que propriamente com o planejamento
e gestão do sistema. Isto poderia explicar o surgimento dos demais órgãos
gestores, de outras cidades, sem uma cultura de estruturação e planejamento.
Estimulado pela precária estruturação das administrações municipais e pelo
fato de os usuários pouco exigirem das empresas operadoras e órgãos gestores, o
quadro de pouca eficiência e qualidade do sistema de transporte urbano vinha, ao
longo do tempo, se perpetuando.
No entanto, essa realidade vem sendo transformada gradativamente e,
atualmente, existe uma pressão crescente da sociedade por desonerar os
brasileiros de custos com atividades que lhes consomem tempo e dinheiro e
pouco lhes agregam valor, principalmente no que se refere a serviços públicos
(PIRES et al., 1997).
O setor de transporte tem reagido, embora lentamente, de maneira positiva
diante dos novos paradigmas, principalmente as empresas privadas operadoras
urbanas; essa lentidão na resposta é devido aos condicionantes da qualidade
intrínseca ao transporte e aos serviços em geral (LIMA, 1996).
É necessária uma visão de planejamento urbano que possa se antecipar às
necessidades de locomoção, com uma ampla política voltada para a reforma do
uso do solo urbano. Reforma essa que contemple a distribuição dos equipamentos
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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e serviços pela cidade, de modo a reduzir as necessidades dos deslocamentos. É
preciso desenvolver uma política de descentralização organizada, capaz de
proporcionar à população residente em uma determinada região condições de
acessibilidade ao trabalho, à escola, aos hospitais, ao lazer, sem a necessidade
de percorrer grandes distâncias. Para isso, deve-se ter como princípio a busca da
maximização na utilização da infra-estrutura existente, com investimentos voltados
ao gerenciamento do sistema, não se limitando à execução de obras físicas de
grande porte (LIMA, 1998).
A região metropolitana de Curitiba, reconhecidamente competente no
processo de planejamento urbano, tem uma visão mais sistêmica e abrangente do
planejamento da cidade. Isto se exprime nas ações articuladas de seus
segmentos de planejamento, por exemplo, na definição do Plano de
Desenvolvimento Integrado, o PDI. Este Plano expressa claramente que a sua
Primeira Etapa tem como objetivo a definição de alguns temas críticos,
inicialmente no que tange ao uso do solo, recursos hídricos, desenvolvimento
econômico, transportes e sistema viário, habitação social e aspectos jurídicos e
institucionais.
O PDI da Região Metropolitana de Curitiba estabelece que a integração na
sociedade em rede é um dos principais fatores condicionantes da competitividade
das cidades, e é preciso definir os parâmetros propulsores que determinam essa
integração. Dentre eles cita a qualificação da infra-estrutura de logística - porque a
integração física e a velocidade de transporte são fundamentais para o processo
de diversificação espacial da produção e integração dos mercados (PARANÁ,
2001).
Uma frase bastante significativa é citada por Freitag (2001, p.D05):
“... o planejamento urbano no Brasil tem sido fundamentalmente
discurso, cumprindo missão ideológica de ocultar os problemas das
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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maiorias urbanas e os interesses dominantes na produção do espaço
urbano”.
Para Eduardo Hotz, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento de
SP, e citado por ANTP (2002), “nós não temos uma experiência de planejamento
integrado entre entes diferenciados”.
Como se pode verificar, à medida que as cidades crescem, aumentam os
congestionamentos nas vias urbanas e surgem os problemas com relação à
poluição ambiental, a segurança e mobilidade de pedestres e um considerável
descontrole no crescimento urbano. Durante esse período de crescimento
acelerado das cidades brasileiras, as administrações locais experimentaram a
aplicação de diversos instrumentos urbanísticos. Como o Planejamento do
Transporte Urbano e de Circulação são partes integrantes do Planejamento
Urbano, é de se presumir que novas diretrizes para este, como é o caso do
Estatuto da Cidade, tragam conseqüências também para aqueles.
Com a aprovação do Estatuto da Cidade foram abertas novas perspectivas
que potencializarão a administração pública com fundamento no direito às cidades
sustentáveis e à gestão democrática do desenvolvimento urbano.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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33
O Movimento pela Reforma Urbana surgiu a partir de iniciativas de setores
da Igreja Católica, como a CPT- Comissão Pastoral da Terra, com a intenção de
unificar as numerosas lutas urbanas pontuais que emergiram nas grandes cidades
em todo o país, a partir de meados dos anos 1970.
Apesar de haver uma diversidade de interpretações sobre seu conceito e
seus objetivos, pode-se dizer que o momento de maior repercussão e divulgação
da Reforma Urbana foi o da elaboração e coleta de assinaturas para a emenda
Constitucional da Reforma Urbana, promovidas pela iniciativa popular.
Segundo MARICATTO (1994), de acordo com a emenda popular os
objetivos da Reforma Urbana eram:
• Em relação à propriedade imobiliária urbana: instrumentos de
regularização de áreas ocupadas; captação da valorização imobiliária;
aplicação da função social da propriedade; proteção ambiental urbanística e
cultural;
4 O ESTATUTO DA CIDADE
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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• Em relação à política habitacional: programas públicos habitacionais com
finalidade social; aluguel ou prestação da casa própria proporcional a renda
familiar; agência nacional e descentralização na gestão da política;
• Em relação aos transportes e serviços públicos: natureza pública dos
serviços sem lucros, com subsídios; reajustes nas tarifas proporcionais aos
reajustes salariais; participação dos trabalhadores na gestão dos serviços;
• Em relação à gestão democrática: conselhos democráticos; audiências
públicas; plebiscitos; referendo popular; iniciativa legislativa e veto as
proposta do legislativo.
Segundo MVU (2001), as considerações prévias para uma Reforma Urbana
devem ser baseadas nas seguintes proposições:
1. O desenvolvimento urbano é essencialmente dinâmico, sujeito a
decisões da população, empresas e Estado. O êxito da política Urbana
depende mais dos instrumentos de coordenação destas decisões do que
das ações do Estado.
2. As atuações individuais geram externalidades e tornam indispensáveis
as regulações e medidas corretivas ao funcionamento do mercado, para
harmonizar as decisões individuais com a eficiência econômica, com a
eqüidade social e a proteção ao meio ambiente.
3. O desenvolvimento urbano tem significativas implicações sociais,
distributivas, culturais e econômicas, razão pela qual é necessário conciliá-
lo com os grandes objetivos nacionais de crescimento, igualdade e
qualidade de vida.
4. O desenvolvimento do país depende, de certo modo, da qualidade das
políticas urbanas, as quais afetam não só a qualidade de vida da
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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35
população, mas também o desenvolvimento econômico e a competitividade
do país.
5. Ao setor privado cabe uma alta responsabilidade sobre o
desenvolvimento urbano, na capacidade de inovação, melhoramento e
construção das cidades. O setor privado tem grande participação no total
edificado nas cidades.
6. Parte dos recursos públicos está direta ou indiretamente destinada ao
funcionamento e desenvolvimento das cidades. Isto não está
adequadamente explicitado quando se analisa o gasto público. Daí a
necessidade de melhorias na coordenação do estado.
7. O Estado carece de uma adequada estrutura institucional para enfrentar
a gestão do desenvolvimento urbano. Apesar dos avanços, ainda existe
uma alta dispersão administrativa de funções, uma falta de autonomia tanto
local quanto regional para dirigir o desenvolvimento urbano e um crescente
surgimento de conflitos de competência entre Ministérios, Serviços e
Governos locais, devido à superposição de leis e decretos.
O CNDU – Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, ligado ao
Ministério do Interior, em 1983, entregou ao Congresso Nacional a proposta de
“Lei de Desenvolvimento Urbano”, abarcando aspectos relacionados ao ambiente
das cidades. Segundo MARICATO (2001, p.2):
“Havia muita pressão nessa época, muita ocupação de terra urbana.
E também havia uma pressão da Igreja, que divulgou, em 1975, um
documento muito importante que se chamava Uso do Solo e Ação
Pastoral . Então, em 1983, já se propunha uma série de instrumentos
e medidas para se valer à função social da propriedade. O objetivo já
era diminuir os poderes absolutos do proprietário privado em função
do interesse público e coletivo“.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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36
Durante o processo de consolidação da Constituição de 1988, um
movimento multissetorial e de abrangência nacional lutou para incluir no texto
constitucional instrumentos que levassem à instauração da função social da
cidade e da propriedade no processo de construção das cidades. Retomando a
bandeira da Reforma Urbana, esse movimento reatualizava, para as condições de
um Brasil urbanizado, uma plataforma construída desde os anos 1960, no país. As
tentativas de construção de um marco regulatório em nível federal para a política
urbana remontam às propostas de lei de desenvolvimento urbano elaboradas pelo
então Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, nos anos 1970, que
resultaram no Projeto de Lei n° 775/83, aprovado pela Comissão de Justiça da
Câmara Federal em 1983.
Como resultado dessa luta, pela primeira vez na história, a Constituição
incluiu um capítulo específico para a política urbana, que previa uma série de
instrumentos para a garantia, no âmbito de cada município, do direito à cidade, da
defesa da função social da cidade e da propriedade, e da democratização da
gestão urbana (artigos 182 e 183).
No entanto, o texto constitucional requeria uma legislação específica de
abrangência nacional, para que os princípios e instrumentos enunciados na
Constituição pudessem ser implementados; era necessária, por um lado, uma
legislação complementar de regulamentação dos instrumentos; por outro, a
construção obrigatória de planos diretores que incorporassem os princípios
constitucionais em municípios com mais de 20.000 habitantes.
Iniciou-se, então, na esfera federal, um período de mais de uma década de
elaborações, negociações, idas e vindas em torno de um projeto de lei
complementar ao capítulo de política urbana da Constituição (BRASIL, 2001b).
Sofrendo diversas modificações, o Projeto de Lei 775/83 (que passou a ser
denominado como PL- Projeto de Lei - nº 5.788/90) que instituiu o chamado
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Estatuto da Cidade, depois de 11 anos de negociações e adiamentos, foi
finalmente sancionado em 10 de julho de 2001, pelo Presidente da República.
A Lei Federal nº10.257/2001 regulamenta os artigos 182 e 183 da
Constituição Federal de 1988, e estabelece diretrizes e normas para a aplicação
de importantes instrumentos de reforma urbana como: o parcelamento, edificação
ou utilização compulsórios; a desapropriação com pagamentos em Títulos da
Dívida Pública; direito de superfície; direito de preempção; a outorga onerosa do
direito de construir; a transferência do direito de construir; as operações
consorciadas; e o Estudo de Impacto de Vizinhança (BRAGA, 2001).
Esse conjunto de instrumentos – edificação compulsória, IPTU progressivo
e desapropriação com pagamentos em títulos da dívida pública - pode representar
uma possibilidade de intervir efetivamente no crescimento da cidade, promovendo
uma ocupação mais intensa nas áreas onde a infra-estrutura é mais presente e
dessa maneira reduzir a pressão pela urbanização das áreas periféricas, sem
infra-estrutura e ambientalmente frágeis. Esse combate ao espraiamento significa
menores necessidades de deslocamento, otimização do uso da malha viária e das
redes de transporte público (CYMBALISTA, 2001).
O Estatuto da Cidade pode se constituir num avanço social sem
precedentes, pois tem por finalidade e objetivo promover o planejamento urbano
de forma sustentável, elegendo como foco principal a qualidade de vida das
pessoas que moram em aglomerados urbanos, e em cidades com mais de 20.000
habitantes, bem como buscar a proteção ambiental como forma de melhorar essa
qualidade de vida.
Acredita-se estar diante de uma verdadeira Revolução Social na
Propriedade Urbana, conseqüência inevitável de profundas transformações no
processo que converteu o Brasil rural em um país urbano e industrial. À primeira
vista, para os proprietários de imóveis urbanos que serão atingidos pelos
instrumentos introduzidos pelo Estatuto da Cidade, o dano ao patrimônio, à livre
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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propriedade e iniciativa comercial será maior do que efetivamente o será para a
maioria da população a ser beneficiada com o implemento da política urbana.
Parece haver concordância da maioria que o EC não é somente mais uma
lei dentre as tantas que existem e apenas “dormem no papel”, apesar de algumas
opiniões contrárias, o que pode ser evidenciado pelas manifestações
apresentadas a seguir:
• “EC é uma lei longamente esperada e ansiosamente aguardada por
setores e profissionais interessados.” (CASTILHO, 2000, p.08);
• “Tudo indica estarmos diante de mais uma lei admiravelmente progressista,
arejada, com vocação democrática, autenticamente preocupada com o futuro de
nossas cidades e das novas gerações de moradores...” (FREITAG, 2001, p. D05);
• “O EC vem suprir uma carência normativa na área da política urbana...”
(CIDADES DO BRASIL, 2002, p.1);
• “Vejo o instrumento [Estatuto] como uma obra de arte, um sonho...” [a lei]
é necessária, ética e justa...” (MARICATO, 2001, p.1);
• “... pela primeira vez na história brasileira, temos uma regulação federal para a
política urbana (...). O Estatuto da Cidade dá respaldo constitucional a uma nova
maneira de realizar planejamento urbano.” (CYMBALISTA, 2001a, p.1);
• “O EC é fundamental para regular o desenvolvimento urbano com justiça
social” (BONDUKI, 2001, p. A3).
4.1 O ESTATUTO E SUAS DIRETRIZES
O Estatuto da Cidade estabelece 16 diretrizes gerais para a política de
desenvolvimento urbano sustentável e disponibiliza para os municípios e regiões
metropolitanas um conjunto de instrumentos que podem ser utilizados para
direcionar o desenvolvimento das cidades. Trata-se da garantia do direito à terra,
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos
serviços públicos, assim como ao trabalho e ao lazer.
As dezesseis diretrizes são apresentadas a seguir (BRASIL, 2001a):
I - Garantia do direito a cidades sustentáveis:
“Garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito
à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura
urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer,
para as presentes e futuras gerações.”
II - Gestão democrática:
“Gestão democrática por meio da participação da população e de
associações representativas dos vários segmentos da comunidade na
formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e
projetos de desenvolvimento urbano.”
III - Cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores
da sociedade:
“Cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais
setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento
ao interesse social.”
IV - Planejamento do desenvolvimento das cidades:
"Planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição
espacial da população e das atividades econômicas do Município e
do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as
distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o
meio ambiente”;
V - Oferta adequada de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e
serviços públicos:
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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“Oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e
serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da
população e às características locais.”
VI - Ordenação e controle do uso do solo:
“Ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou
inadequados em relação à infra-estrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam
funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-
estrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua
subutilização ou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental.”
VII - Complementaridade entre as atividades urbanas e rurais:
“Integração e complementaridade entre as atividades urbanas e
rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do
Município e do território sob sua área de influência.”
VIII - Produção de bens e serviços nos limites da sustentabilidade
ambiental:
“Adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de
expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua
área de influência.”
IX - Justa distribuição dos benefícios e ônus da urbanização:
“Justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de
urbanização.”
X - Privilégio para investimentos geradores de bem-estar geral:
“Adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e
financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento
urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-
estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes segmentos sociais.”
XI - Recuperação, de investimentos que valorizaram os imóveis urbanos:
“Recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha
resultado a valorização de imóveis urbanos.”
XII - Proteção do meio ambiente natural e do patrimônio cultural:
“Proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e
construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e
arqueológico.”
XIII - Audiência do Poder Público local e da população interessada para a
implantação de empreendimentos impactantes:
“Audiência do Poder Público municipal e da população interessada
nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades
com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural
ou construído, o conforto ou a segurança da população.”
XIV - Regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por
população de baixa renda:
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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42
“Regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por
população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas
especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação,
considerada a situação socioeconômica da população e as normas
ambientais.”
XV - Simplificação da legislação:
“Simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do
solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos
custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais.”
XVI - Isonomia de condições para os agentes públicos e privados:
“Isonomia de condições para os agentes públicos e privados na
promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de
urbanização, atendido o interesse social”.
4.2 INOVAÇÕES CONTIDAS NO ESTATUTO DA CIDADE
Segundo Rolnik (2001a), as inovações contidas no Estatuto situam-se em
três campos:
• Um conjunto de novos instrumentos de natureza urbanística voltados para
induzir – mais do que normatizar – as formas de uso e ocupação do solo;
• Ampliação das possibilidades de regularização das posses urbanas, até
hoje situadas na ambígua fronteira entre o legal e o ilegal.
• Uma nova estratégia de gestão que incorpora a idéia de participação
direta do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade;
No primeiro conjunto, a evidente interação entre regulação urbana e a
lógica de formação de preços no mercado imobiliário é enfrentada por meio de
dispositivos que procuram coibir a retenção especulativa de terrenos e de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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instrumentos que consagram a separação entre o direito de propriedade e o
potencial construtivo dos terrenos atribuído pela legislação urbana.
O segundo conjunto de instrumentos trata da regularização fundiária de
áreas ocupadas e não tituladas da cidade. Os números não são precisos, porém
pode-se afirmar que mais da metade das cidades é constituída por assentamentos
irregulares, ilegais ou clandestinos, que contrariam de alguma maneira as formas
legais de urbanização. Uma parte significativa destes assentamentos é composta
por posses de propriedades públicas ou privadas abandonadas ou não utilizadas.
Desde a década de 1970, os municípios vêm investindo nas favelas,
reconhecendo sua existência como parte da cidade. Entretanto, embora a
urbanização das favelas venha sendo defendida e praticada há décadas, a
titularidade definitiva destas áreas para seus verdadeiros moradores esbarra em
processos judiciais intermináveis e enormes dificuldades de registro junto aos
cartórios.
No terceiro conjunto de instrumentos, o Estatuto incorpora o que existe de
mais vivo e vibrante no desenvolvimento da democracia – a participação direta (e
universal) dos cidadãos nos processos decisórios. Audiências públicas,
plebiscitos, referendos, estudos de impacto de vizinhança, além da
obrigatoriedade de implementação de orçamentos participativos, são assim
mencionados como instrumentos que os municípios devem utilizar para ouvir,
diretamente, os cidadãos em momentos de tomada de decisão sobre sua
intervenção sobre o território (BRASIL, 2001b).
Os aglomerados urbanos irregulares têm, no Estatuto da Cidade, uma
forma legal de regularização. Ao administrador público é facultado, pelos
instrumentos que lhe foram outorgados pela lei, implementar em sua cidade um
planejamento urbano, visando dar às propriedades ociosas uma função social
compulsória, no caso de não aproveitamento do solo.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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A partir de agora, áreas vazias ou subutilizadas na mancha urbana, em
áreas dotadas de infra-estrutura estão sujeitas ao pagamento de IPTU progressivo
no tempo e a edificação e parcelamento compulsórios, de acordo com a
destinação prevista para região pelo Plano Diretor (ROLNIK, 2001b).
A implantação e o conhecimento do Estatuto da Cidade interessa
sobremaneira tanto ao administrador público como ao investidor, pois haverá um
conseqüente novo mercado imobiliário a partir de sua implantação.
Segundo Cymbalista (2001), o Estatuto incorpora a idéia de participação
direta e universal dos cidadãos nos processos decisórios da política urbana,
tornando obrigatória a participação popular na definição da política urbana nos
âmbitos nacional, estadual e municipal, audiências e consultas públicas, além da
obrigatoriedade de implementação do Orçamento Participativo.
Alem disso, dá aos municípios o poder de interferir sobre os processos de
urbanização e sobre o mercado imobiliário. Isso significa que a prefeitura pode
mexer com as práticas e privilégios muito arraigados, principalmente no que se
refere aos maiores proprietários urbanos.
O Estatuto consagra também a idéia do Solo Criado, através da
institucionalização do Direito de Superfície e Outorga Onerosa do Direito de
Construir. A idéia é muito simples: se as potencialidades dos diferentes terrenos
urbanos devem ser distintas em função da política urbana (áreas que em função
da infra-estrutura instalada devem ser adensadas, áreas que não podem ser
intensamente ocupadas por apresentarem alto potencial de risco – de
desabamento ou alagamento, por exemplo), não é justo que os proprietários
sejam, penalizados – ou beneficiados – individualmente por esta condição, que
independeu totalmente de sua ação sobre o terreno (ROLNIK, 2001c).
Enfim, o Estatuto da Cidade define dezesseis diretrizes gerais para política
urbana de cidades sustentáveis; algumas de caráter geral e outras de caráter mais
específico, abordando alguns assuntos mais técnicos. A política urbana tem por
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da
propriedade urbana, mediante essas diretrizes.
Apesar de tantos aspectos positivos encontrados no instrumento, ainda não
há garantia de que ele vá ser efetivamente implementado nas cidades. Mesmo se
a Lei estabelece, por exemplo, a obrigatoriedade do Plano Diretor, para cidades
com mais de 20 mil habitantes, que não tenha sido aprovado até a data da entrada
em vigor da Lei, deverão fazê-lo no prazo de até 5 anos (art. 50), poucos são os
municípios que estão trabalhando no sentido de providenciar a elaboração do
Plano.
Para Bonduki (2001), “não podemos, no entanto, nos iludir com o Estatuto
das Cidades”, pois “será absolutamente insuficiente se não houver, nos governos
locais, disposição e vontade política para intervir”.
O Estatuto confere aos municípios poder de interferir no mercado imobiliário
e processos urbanos, isto poderá mexer com grandes proprietários e práticas
clientelistas, que tentarão provavelmente insistir na permanência desses
privilégios, dificultando a implementação da Lei (CYMBALISTA, 2001a).
Maricato (2001, p.1) foi muito enfática e cética quanto às mudanças que
poderão advir do EC:
“Pode mudar muita coisa e pode não mudar nada. Digo isto porque
no Brasil, dependendo dos interesses dos poderosos, a lei se aplica
ou não. Eu acredito que se a elite brasileira tiver sensibilidade e
perceber que ela está sendo engolida pelos dramas decorrentes da
falta de moradia, principalmente nas metrópoles, e que ninguém vai
se salvar desta hecatombe, a lei vai ser aplicada. Nem tanto porque
ela é necessária, ética ou justa, mas principalmente porque a elite
deveria perceber que ela precisa salvar seu pescoço”.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Diante da diversidade dos artigos e textos publicados e analisados neste
trabalho sobre o Estatuto da Cidade foram feitas duas leituras diferentes sobre seu
conteúdo.
A primeira delas se concentra em uma análise do Estatuto feita por
especialistas urbanos, que abordam as características gerais da lei e enfatizam os
aspectos urbanos como um todo.
A segunda se volta para uma interpretação mais específica do Estatuto da
Cidade, com enfoque na área de transporte e circulação, relacionando temas que
estão explícitos e implícitos na lei sobre o planejamento desses itens.
Essa divisão se justifica pelo fato de que a discussão do Estatuto, desde a
concepção de suas primeiras idéias, vem sendo conduzida, em grande parte, por
pessoas que, embora ligadas ao planejamento das cidades, parecem só enxergar
aspectos relacionados ao urbanismo.
5 LEITURAS DO ESTATUTO DACIDADE
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Na primeira leitura encontra-se uma quantidade relativamente grande de
autores que procuram enfatizar aspectos relacionados com o crescimento urbano,
suas formas de controle, instrumentos urbanísticos, etc. Na segunda, são raros os
trabalhos que dão enfoque aos aspectos mais diretamente associados ao
planejamento de transporte e de circulação que, como foi abordado anteriormente,
possuem um estreita ligação com o planejamento urbano.
5.1 LEITURA DO EC COM ENFOQUE NO PLANEJAMENTO URBANO EM
GERAL
Desde o ano 2000, com a iminência da aprovação da Lei do Estatuto, vários
estudos, análises e leituras vêm sendo feitos por diversos especialistas de
distintas áreas ligadas ao ambiente urbano, revelando, dentre outros aspectos, a
sua importância, as virtudes, defeitos, dificuldades de implantação, etc. As
reflexões apresentadas têm se restringido quase que especificamente às áreas de
atuação dos autores, como se o planejamento urbano pudesse ser visto apenas
por um ângulo, sem levar em conta os demais, ainda que de forma superficial.
Chama a atenção o fato de o EC quase ter passado quase despercebido
aos técnicos urbanos ligados às áreas de transportes e circulação, como se ele
não atingisse diretamente o planejamento dessas áreas, o que não deixa de ser
preocupante, principalmente considerando a abordagem sistêmica do
planejamento, que vem sendo esperada e cobrada pela sociedade.
Com estudos apresentados ainda antes da sanção presidencial, diversos
autores abordaram o Estatuto, com distintos enfoques. Castilho (2000) apresenta
um histórico do EC, desde a idéia inicial do Projeto de Reforma Urbana, do
Governo João Goulart (1961-1964), até o ano de 1999, com a aprovação do
Estatuto da Cidade pela Comissão Permanente de Desenvolvimento Urbano e
Interior da Câmara dos Deputados, além de aspectos gerais do projeto. Aborda
também aspectos relacionados ao plano diretor e sua difusão. Francisco (2000)
faz um estudo sobre a produção dos vazios urbanos e estabelece uma correlação
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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dessa produção com a oferta de transporte coletivo urbano. Aponta o EC como um
mecanismo para conter o avanço e mesmo provocar a sua redução. As
implicações do EC, com visão voltada para a produção e acesso à moradia são
apresentadas por Castro (2000).
As dificuldades de implantação de instrumentos jurídicos para a gestão das
cidades, particularmente nos seus aspectos territoriais, tomando como temas o
zoneamento urbano e a contribuição oferecida pelo EC, é apresentada por
Carvalho (2000). Por outro lado, Falcoski (2000) defende a necessidade premente
da aprovação da Lei, tida como instrumento estratégico e sinalizador para uma
reforma urbana. Uma outra leitura, feita por Braga (2000), apresenta um quadro
comparativo entre o Projeto de Lei 5788/90, apresentado pelo Senador Pompeu
de Souza, em sua versão original, e o substitutivo aprovado pela Comissão de
Desenvolvimento Urbano e Interior, em 1999.
Alguns autores fazem apenas comentários gerais do Estatuto da Cidade,
como é o caso de Rodrigues (2001) e Bonduki (2001), que cobram mais vontade
política dos governos como condição sine qua non para viabilizar a implantação da
Lei. Cidades do Brasil (2002) e Bassul (2002) fazem comentários das principais
diretrizes e instrumentos dispostos no bojo da Lei. Freitag (2001), considerando a
própria formação em sociologia, acredita que a Lei seja “progressista, arejada,
com vocação democrática, autenticamente preocupada com o futuro de nossas
cidades e das novas gerações de moradores que as habitarão”. Embora Maricato
(2001) seja também uma defensora do instrumento, coloca uma série de dúvidas
demonstrando o seu ceticismo quanto ao sucesso da Lei, alegando que, contrárias
às inovações trazidas, há forças poderosas que apostam na sua inviabilização.
Cymbalista (2001a) comenta os principais instrumentos que fazem parte do
Estatuto e mostra a melhor maneira de aplicação do mesmo, apontando também
as prováveis dificuldades a serem vencidas. Uma radiografia sobre a necessidade
de apresentação de Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), previsto no art. 36, é
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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49
apresentado pelo autor, além de dispor de alguns exemplos de que essa idéia já
vem sendo aplicada em diversas cidades do Brasil.
Ceneviva (2001) apresenta uma série de 10 artigos que comentam o EC
sob o enfoque jurídico, destacando alguns itens considerados mais importantes e
aqueles que poderão trazer batalhas jurídicas, que dificultarão a implementação
do instrumento. Saule Jr (2001) relata, em seu artigo, a efetiva participação do
Instituto Pólis, do Fórum Nacional de Reforma Urbana, de ONGs e entidades de
classe no processo de elaboração e depuração do Estatuto ao longo dos anos.
Na tentativa de tornar a Lei mais acessível à sociedade, a Caixa Econômica
Federal encomendou um trabalho a Área de Desenvolvimento Urbano e Meio
Ambiente do Instituto Brasileiro de Administração Municipal-IBAM (Oliveira, 2001).
Trata-se de um esforço do Governo Federal em traduzir a linguagem jurídica da
Lei em um texto que possa ser entendido por pessoas comuns da comunidade, as
quais deverão ter um papel importante de participação na gestão urbana das
cidades, a partir do Estatuto.
Um estudo bastante abrangente foi desenvolvido pelo Instituto Pólis, a
pedido da Câmara Federal, procurando dissecar a nova Lei, com comentários
jurídicos e administrativos (BRASIL, 2001b).
Nessa publicação, os autores apresentam o Estatuto da Cidade, relatando
toda a trajetória de concepção até sua aprovação, relacionam as diretrizes gerais
e comentam os instrumentos contidos na lei para a indução do desenvolvimento
urbano.
Segundo Brasil (2001b), o Estatuto da Cidade oferece um conjunto de
instrumentos que, incorporando a avaliação dos efeitos da regulação sobre o
mercado de terras, oferece ao poder público uma maior capacidade de intervir – e
não apenas normatizar e fiscalizar – uso, ocupação e rentabilidade das terras
urbanas, realizando a função social da cidade e da propriedade.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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50
Dentre os instrumentos comentados nesse estudo, alguns estão
relacionados a seguir:
• Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios; IPTU Progressivo
no Tempo; Desapropriação com Pagamento em Títulos; Consórcio
Imobiliário são instrumentos que, se bem aplicados, podem promover uma
Reforma Urbana, estruturando uma política fundiária que garanta a função
social da cidade e da propriedade.
• Ao estabelecer o Direito de Superfície, o Estatuto da Cidade dá um passo
além, tornando este direito de construir na superfície, espaço aéreo ou
subsolo do terreno, independente do direito de propriedade. Isso quer dizer
que, além de representar uma limitação do direito de propriedade, aquilo
que se pode fazer sobre ou sob ela pode ser separado dela e desta forma
ser concedido para outro, sem que isto represente a venda, concessão ou
transferência da própria propriedade.
• A Transferência do Direito de Construir foi um instrumento concebido de
modo a permitir que os proprietários de imóveis a serem preservados
fossem compensados pelo fato de que em seus imóveis o coeficiente ou
densidade básicos estabelecidos para o território urbano não pode ser
atingido sob pena de comprometer o objetivo da preservação de imóveis de
interesse histórico, paisagístico ou ambiental. O objetivo da transferência do
direito de construir é viabilizar a preservação de imóveis ou áreas de
importante valor histórico ou ambiental.
• Operações urbanas consorciadas constituem um tipo especial de
intervenção urbanística voltada para a transformação estrutural de um setor
da cidade. As operações envolvem simultaneamente: o redesenho deste
setor (tanto de seu espaço público como privado); a combinação de
investimentos privados e públicos para sua execução e a alteração, manejo
e transação dos direitos de uso e edificabilidade do solo e obrigações de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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urbanização. Trata-se, portanto, de um instrumento de implementação de
um projeto urbano (e não apenas da atividade de controle urbano) para
uma determinada área da cidade, implantado por meio de parceria entre
proprietários, poder público, investidores privados, moradores e usuários
permanentes. O objetivo do instrumento das operações urbanas é viabilizar
intervenções de maior escala, em atuação conjunta entre o poder público e
os diversos atores da iniciativa privada.
O CEPAM-Centro de Estudos da Administração Municipal, ligado à
Fundação Prefeito Faria Lima, publicou uma coletânea de análises e estudos
sobre o Estatuto, dividida em três partes: diretrizes gerais, instrumentos
urbanísticos e, o Estatuto da Cidade e o CEPAM. Constam deste documento 29
artigos produzidos por diversos especialistas (CEPAM, 2001).
Em muitos desses artigos, os autores também fazem uma abordagem ao
Estatuto da Cidade mais voltada para o planejamento urbano de maneira geral,
dentre eles, pode-se citar Somekh (2001), que descreve o desenvolvimento das
cidades e do urbanismo, apontando os principais problemas a serem enfrentados
hoje por uma Administração Municipal. Mostra alguns princípios para a definição
da função social através do Plano Diretor e sinaliza o que a Lei de
Desenvolvimento Urbano estabelece de novo para o cumprimento da função
social da cidade e da propriedade.
Somekh (2001) defende ainda que o Plano Diretor é um instrumento já
previsto pela Constituição para a definição da função social da cidade e
propriedade e que a função social da cidade estará sendo atendida de forma plena
quando forem reduzidas as desigualdades sociais, e promovidas a justiça social e
a qualidade de vida urbana.
Ancona (2001) dirige o seu artigo para o desenvolvimento urbano
sustentável e comenta o Projeto de Lei 5.788/90 como instrumental para a
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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proteção e conservação dos recursos naturais, com vistas a um processo de
desenvolvimento urbano sustentável.
Ancona (2001, p.91) ainda faz uma crítica ao zoneamento, ao dizer que:
“O zoneamento funciona como instrumento de disciplinamento do
uso do solo apenas nos bairros ocupados pelas classes de maior
renda, onde ele de fato é demandado, estabelecendo referências e
garantias para a atuação do mercado imobiliário formal, preservando
o valor de uso dos imóveis e a qualidade de vida das elites. Nas
demais áreas, que constituem a maior parcela do espaço intra-
urbano, o zoneamento não é atendido, porque seus padrões são
estabelecidos em função das demandas das elites – muito acima das
necessidades básicas da maioria – e seu resultado é perverso para
as classes populares, pois define a irregularidade/clandestinidade dos
seus bairros e das suas moradias” .
Rolnik (2001) coloca o Estatuto da Cidade como um avanço no trato da
equação urbanística brasileira, e o distingue da legislação tradicional, pois ocupa-
se da garantia de espaços específicos para a política no marco legal do
planejamento urbano.
Moreira (2001) faz um histórico do Plano Diretor e o apresenta como uma
ferramenta para utilização da função social da propriedade urbana, função essa, já
apresentada no Estatuto da Cidade como instrumento voltado para promoção do
desenvolvimento urbano. E diz que:
“Os municípios que pretenderem utilizar esse instrumento precisam
ter um plano diretor, aprovado por lei municipal, que configure a
função social da propriedade urbana” (MOREIRA, 2001, p.145).
Macruz & Macruz (2001) discorrem sobre a competência constitucional do
município em matéria de urbanismo, lembrando que o conceito de urbanismo que
antes era tido como uma arte de embelezamento, e que se destacava por corrigir
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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as distorções urbanas visando a estética da cidade, evoluiu ao procurar organizar
e planejar a ocupação dos espaços urbanos, tendo como alvo o bem-estar da
coletividade. E colocam também que:
“Para realizar as ações destinadas ao desenvolvimento das funções
urbanas da cidade, deve o Poder Público exercer sua atividade
urbanística consistente no planejamento, na ordenação do solo,
socorrendo-se de instrumentos de intervenção urbanística, e na
ordenação das edificações” (MACRUZ & MACRUZ, 2001, p.49).
Em síntese, um número ainda maior de trabalhos e autores poderia ser
citado e com grande riqueza de abordagens e óticas. Mas, não sendo este o
objetivo precípuo deste trabalho, procurou-se apresentar apenas uma parcela,
relativamente pequena, quando comparada com o universo de escritos sobre o EC
e sua relação estreita com o planejamento urbano. Aqui, o planejamento urbano é
citado na forma com que é colocado em prática na grande maioria das cidades
brasileiras. Esse, porém, não representa o pensamento do autor, que defende
enfoque sistêmico, ou seja, o planejamento deve considerar além do enfoque
tradicional, os planejamentos de transporte, de circulação, de meio ambiente, de
saneamento, etc.
5.2 LEITURA DO EC COM ENFOQUE NO PLANEJAMENTO DE
TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
Da revisão bibliográfica geral realizada sobre o Estatuto da Cidade, alguns
autores sequer citam as palavras transportes, trânsito ou circulação, ou mesmo
palavras delas derivadas. Outros citam essas palavras, porém reproduzindo
textualmente trechos da Lei; alguns, porém, tecem pequenos comentários sobre a
área de transportes; e um grupo ainda menor faz uma análise um pouco mais
aprofundada da correlação entre o EC e o planejamento e gestão do transporte e
circulação.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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54
Freitag (2001) se refere a críticas feitas por alguns autores contra os
“instrumentos apontados pela Lei para ordenar e regularizar o caos urbano já
concretizado nos grandes centros brasileiros, a saber, o planejamento urbano, os
planos diretores, o saneamento urbano, a privatização de certos serviços, entre os
quais o transporte urbano”. Maricato (2001) coloca que o EC tem papel
importante ao enfatizar a gestão democrática da cidade. Cita como exemplo, a
recente gestão na Prefeitura de São Paulo, que contrariamente à orientação do
plano diretor, investiu maciçamente em “grandes obras viárias” que “quebraram a
cidade e não resolveram o problema do tráfego”.
O combate ao espraiamento, que se torna possível com o IPTU
progressivo, segundo Cymbalista (2001a), proporcionará “menores necessidades
de deslocamentos, otimizando o uso da malha viária e das redes de transporte
público”. Em outro trabalho, o mesmo autor aponta que a aplicação do Estudo de
Impacto de Vizinhança, previsto pelo EC, para grandes empreendimentos, pode
evitar grandes impactos às cidades, dentre eles a sobrecarga do sistema viário,
demanda por transporte coletivo e a poluição sonora (CYMBALISTA, 2001b).
Francisco (2000) aponta que o EC será um instrumento eficaz no combate
à “indústria” dos vazios urbanos, que por sua vez estaria diretamente relacionada
com o transporte público. Só há a ocupação de áreas após os vazios, se o
transporte público estiver presente. A adoção do EC pode significar “uma luz no
fim do túnel”, pois a cidade média ou grande “não tem uma ocupação
precocemente estendida, levando os governos a uma necessidade absurda de
investimentos em ampliação de redes de infra-estrutura – pavimentação,
saneamento, iluminação, transporte...”. E mais, “a cidade média ou grande ”não é
obrigada a transportar cotidianamente a maior parte da população para os locais
onde se concentram os empregos ...” (ROLNIK, 2001a).
Motta (2001) se mostra preocupada com a área de transportes, em geral,
em seu estudo histórico das propostas de legislação federal sobre política urbana
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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e o desafio da gestão das cidades. A autora se refere várias vezes à área de
transportes inclusive cobrando uma política mais clara para o setor.
Macruz & Macruz (2001) apontam não só a competência constitucional do
município sobre o transporte urbano, mas também cobram que a cidade deve
cumprir a sua função social, a todos que nela vivem, assegurando-lhes o direito “à
moradia, aos equipamentos e serviços urbanos, transporte público...”, colocando
em prática as três funções fundamentais do urbanismo que proporciona qualidade
de vida à população. Essas funções são: habitar, trabalhar e recrear. Os principais
objetos das funções do urbanismo são: a) ocupação do solo; b) a organização da
circulação; c) a legislação”.
Somekh (2001, p.85) afirma que :
“Enquanto essa população {de baixa renda} não tiver acesso à
moradia, transporte público, saneamento (...), não haverá como
postular a defesa de que a cidade esteja atendendo à sua função
sócial.”
Ancona (2001, p.90) critica os zoneamentos urbanos, afirmando que eles:
“São ineficazes para resolver grande parte dos problemas urbanos,
em especial os relacionados com as demandas dos setores
populares referentes a habitação, transporte, saúde”
Rolnik (2001c, p.114) faz uma contundente crítica ao planejamento urbano
disseminado nas administrações municipais, na década de 1970, afirmando que
ele é excludente, empurrando a população de menor renda para a periferia, e ao
concentrar as oportunidades de emprego em um fragmento da cidade. Isto faz
com que,
“esse urbanismo de risco crie a necessidade de transportar
multidões para os locais de trabalho e devolvê-los aos seus bairros
ao final do dia, gerando assim uma necessidade de circulação
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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imensa, o que, nas grandes cidades, tem gerado o caos nos
sistemas de circulação”
Aponta a autora que o planejamento urbano da época idealizava um projeto
da cidade do futuro, executado ano a ano, até chegar ao produto final. A
implementação do plano seria executada através de investimentos em
transportes, sistema viário, infra-estrutura (...) sobre a ação dos agentes
privados disciplinados via zoneamento; esse é também o pensamento de Di
Giuseppe (2001). As limitações do Legislativo e a desarticulação da sociedade
civil provocaram um isolamento no planejamento urbano, que aliado à “sua
separação da esfera de gestão provocou uma espécie de discurso esquizofrênico
nas Administrações”. Reconhece que o EC “representa um importante avanço no
trato da questão urbanística, diferentemente da legislação tradicional, pois ocupa-
se da garantia de espaços específicos para a política no marco legal do
planejamento urbano”.
Antenor (2001) reflete que os avanços tecnológicos, em especial nos meios
de transportes e de telecomunicações, promovem alterações significativas na
organização e distribuição espacial das atividades produtivas, econômicas e
sociais nas cidades. Aponta, também, a autora, a equivocada política pública de
permitir e incentivar a implantação de núcleos habitacionais de baixa renda –
devido ao baixo custo das terras – na região periférica, o que causa um aumento
significativo nos custos de redes de infra-estrutura urbana (pavimentação,
drenagem, etc.) e de transportes. Assim também pensa De Villa (2001, p.240),
apontando que:
“É dispendioso atender à população instalada num tecido urbano
esgarçado e franjado porque as redes de infra-estrutura e serviços –
como o fornecimento de água potável, os transportes coletivos e a
coleta de lixo, por exemplo – não podem passar apenas na frente dos
lotes ocupados; precisam seguir nos trechos de ruas próximos a lotes
vagos e atravessar glebas desocupadas para alcançar os
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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assentamentos isolados. Quem paga esses serviços acaba, assim,
tendo que arcar, de uma ou outra forma, com o custo extra de se
vencer essas distâncias. De maneira semelhante, a dispersão dos
moradores no território torna difícil e caro seu acesso a equipamentos
urbanos como creches, escolas e postos de saúde” .
Recomenda, ainda, Antenor (2001), que na elaboração do plano diretor e
da lei municipal específica, para estabelecer a área sujeita ao parcelamento, à
edificação ou à utilização compulsórios, de que trata o EC, a prefeitura deverá
definir, dentre outros, os fatores urbanísticos que traduzam a dinâmica urbana da
cidade. Um dos fatores que deverão ser considerados é a acessibilidade por
transporte coletivo.
Estudos apontam que o Estatuto da Cidade é “uma ferramenta importante e
perfeitamente alinhada com a Gestão da Qualidade em administrações
municipais”, particularmente se adotada em órgãos gestores de trânsito e
transportes.
Raia Jr. & D’Andrea (2002a e 2002c) estudaram especificamente nove
diretrizes e apontaram que o EC deixa evidenciados vários aspectos que fazem
parte dos fundamentos da Qualidade de um Programa de Gestão, inclusive da
gestão pública. Dentre outros aspectos citam que o foco no munícipe, a
responsabilidade social da Alta Direção, a visão de futuro de longo alcance, a
gestão baseada em fatos e processos, a qualidade do serviço centrada no cliente,
o comprometimento da Alta Direção, etc.
Em trabalho apresentado no I Congresso Nacional pelo Direito à Cidade,
em 2001, a Associação Nacional de Transportes Públicos indica que a
mobilidade, o transporte público e o Estatuto da Cidade são desafios para um
desenvolvimento urbano sustentável. Salienta o texto que:
“O transporte público não precisa forçar a própria natureza para
servir a uma vida urbana ecologicamente sustentável. Ele pode ser o
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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melhor instrumento para a requalificação urbana das cidades. (...) Ao
se estabelecer uma política de desenvolvimento ambiciosa, que
considere importante a valorização dos espaços públicos e sua
retomada para os pedestres, o transporte público aparece com
todas as suas vantagens. A recuperação das áreas verdes, hoje
comprometidas para estacionamentos, o aumento da
acessibilidade às áreas centrais adensadas e as áreas destinadas
exclusivamente a pedestres, tudo isto pode ser garantido pelo
transporte público, que organizado em rede, deve assegurar o
acesso a todos equipamentos de interesse coletivo, como
universidades, centros esportivos e culturais, museus e parques,
além dos locais de trabalho” (ANTP, 2001, p.5).
ANTP(2001, p.5), conclui a reflexão recomendando que:
“É preciso superar os objetivos que conduziram inicialmente a
implantação dos serviços públicos de transportes, centrados quase
que exclusivamente na oferta de viagens entre locais de trabalho e
de moradia. Mais que um serviço de transporte, os sistemas de
transporte cumprem uma missão essencial ao serviço social,
necessário à manutenção da solidariedade social e de coesão
geográfica de uma cidade e de uma região, assegurando o acesso a
cidade para todos”.
ANTP (2001) relata opiniões e análises que tiveram como enfoque “O
Estatuto da Cidade, o transporte e o trânsito”. O técnico Anive Soares, da
Urbanização de Curitiba-URBS, reporta que Curitiba vem se preparando para
adequar-se ao Estatuto, ao instituir o Grupo Técnico Multidisciplinar, que tem
como objetivo estudar e compreender o EC e o que a administração municipal
deve fazer para se adequar às suas determinações. Pretende-se “definir um
modelo para gestão urbana, através de critérios: uma matriz local de consenso,
adequada à nova política urbana nacional”, que compreende a formulação de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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planos setoriais, voltados para as áreas de mobilidade urbana, transporte
urbano e integração metropolitana.
Luis Carlos Bertotto, secretário de transportes de Porto Alegre, afirma que o
município possui um Plano Diretor, aprovado em 1998, e devidamente revisado
em 2000, e que está sendo rediscutido com a população, visando à sua
adequação ao EC. Baseado no Plano Diretor do município vem sendo debatido o
Plano Diretor de Transportes, previsto na Lei e essencial para incluir
socialmente as pessoas que moram em locais periféricos, levando-as a participar
da vida urbana (ANTP, 2001).
Em virtude da revisão apresentada, pode-se constatar que a vinculação do
EC com o planejamento de transporte e de circulação, encontrada nos estudos e
escritos, se resume, quase que na sua totalidade, a pequenas citações retóricas e
superficiais. Excetuando ANTP (2001) e Raia Jr. & D’Andrea (2002a, 2002b e
2002c), que procuram claramente aprofundar a correlação EC e os planejamentos
de transporte e de circulação, as demais referências aqui apresentadas não
mostraram essa preocupação.
Uma pesquisa adicional foi realizada junto aos Anais dos dois mais
importantes Congressos de Transportes no Brasil. O primeiro, Congresso Nacional
de Pesquisa e Ensino de Transportes – promovido pela ANPET, com
predominante caráter científico dos seus artigos e, o segundo, Congresso
Nacional de Transportes e Trânsito – promovido pela ANTP, cujos artigos trazem
as experiências técnicas mais relevantes no campo de aplicação das áreas de
transportes e circulação. A pesquisa procurou levantar o número de artigos
apresentados nestes congressos, a partir de 2002, e quantos deles trouxeram
alguma referência ao Estatuto da Cidade que entrou em vigor em 2001.
O resultado obtido foi que no Congresso Nacional de Pesquisa e Ensino de
Transportes – promovido pela ANPET em 2002, em um total de 138 artigos, não
houve nenhuma referência ao Estatuto da Cidade, em 2003 o total de artigos foi
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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de 123, e novamente nenhum deles sequer menciona o Estatuto. Já no Congresso
Nacional de Transportes e Trânsito – promovido pela ANTP, em 2003, em um total
de 224 artigos, apenas 4 fizeram referência ao Estatuto da Cidade
Esses dados tornaram evidente a falta de interesse de pesquisadores e
técnicos das áreas de transportes e circulação com o tema Estatuto da Cidade, ao
menos até o momento.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Segundo Silva & Menezes (2001), existem várias formas de classificar as
pesquisas. As formas clássicas de classificação são: do ponto de vista da sua
natureza; do ponto de vista da forma de abordagem do problema, e do ponto de
vista de seus objetivos.
Dentre essas várias formas de classificação de pesquisa, pode-se
enquadrar o presente trabalho como sendo uma Pesquisa Aplicada, do ponto de
vista da sua natureza, por gerar conhecimento para aplicação prática.
Quanto à sua abordagem, pode ser considerada uma Pesquisa Qualitativa
que não requer o uso de métodos e técnicas estatísticas e nem exige
interpretação dos fenômenos, além disso, neste caso, o pesquisador é
considerado um instrumento – chave para realização da pesquisa.
Já do ponto de vista de seus objetivos, pode-se afirmar que se está diante
de uma Pesquisa Exploratória, pois envolve um levantamento bibliográfico e uma
análise de exemplos que estimulam sua compreensão (Silva & Menezes, 2001).
6 METODOLOGIA
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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62
O método a ser empregado na realização desta pesquisa é baseado em
uma análise estritamente teórica. Propõe-se aqui destrinchar, com alguma
profundidade, o texto do Estatuto da Cidade. Tentar-se-á, também, fazer uma
leitura pormenorizada e reflexiva, subtraindo do texto da lei aspectos gerais do
ambiente urbano, para destacar interfaces implícitas ou explícitas desse ambiente
com a área de planejamento de transporte e de circulação.
O processo de entendimento, reflexão e, posterior extração de idéias e
objetivos que emergem do texto do Estatuto está baseado no conhecimento e
sensibilidade adquiridos pelo pesquisador, refinados pelo aprofundamento na
literatura, reflexões, e no debate de trabalhos sobre o assunto, apresentados pelo
pesquisador em congressos, como etapas que vêm sendo construídas ao longo
do mestrado.
O Estatuto trata de maneira genérica a questão dos transportes, levando o
leitor menos atento a entendê-lo somente como uma norma de política urbana
mais voltada para o controle do crescimento das cidades, na aplicação de
instrumentos urbanísticos, etc., porém sem grandes mensagens (ou cobranças, já
que se trata de uma lei) e diretrizes relacionadas ao planejamento de transporte
urbano e de circulação.
Espera-se, a partir de reflexões mais aprofundadas, fazer uma leitura
cuidadosa e, assim, dar um possível alinhamento entre as principais diretrizes
contidas no Estatuto e os Planejamentos de transporte e de Circulação.
Apesar de a análise desenvolvida por este trabalho ser de caráter
estritamente teórico, para melhor entendimento do método da pesquisa utilizado,
tentar-se-á relacionar suas etapas, a seguir. A etapas de revisão bibliográfica, que
nos trabalhos de pesquisa, em geral, não fazem parte propriamente do método de
pesquisa, neste, em particular, devido ao seu caráter teórico, não só é parte
integrante do método, como também é um passo fundamental para se atingir os
objetivos aqui definidos.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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63
As etapas do método de pesquisa assim se definem:
• Revisão do texto da lei que criou o Estatuto da Cidade, incluindo
publicações que descrevem as idéias que motivaram a apresentação do
projeto de lei, desde sua fase embrionária. Essa etapa abrange textos que
descrevem a evolução do processo de amadurecimento/refinamento das
propostas, as várias modificações pelas quais passou o anteprojeto, no
âmbito do Congresso Nacional. Faz parte dela um estudo aprofundado e
reflexivo, em que se procura conhecer as idéias apresentadas nas diretrizes
da lei e que, de forma explícita ou implícita, tenham relação com a área de
planejamento de transporte e circulação urbana;
• Revisão bibliográfica envolvendo as mais diversas publicações, artigos de
periódicos, artigos de congressos, livros, etc. que de uma forma ou de outra
fazem algum tipo de leitura, sob as mais variadas óticas, sobre as
mensagens contidas no todo do Estatuto. Aqui, procurar-se-á conhecer
como cada autor, pesquisador ou administrador fez a sua leitura,
interpretação e implicações da lei;
• Confrontação das duas primeiras etapas, tendo de um lado a leitura,
aprofundada e reflexiva, feita pelo pesquisador, sob a ótica do planejamento
de transporte e de circulação e, de outro, as leituras gerais apresentadas
pela literatura;
A partir da hipótese adotada de que o Estatuto da Cidade tem uma relação
muito mais íntima com a área de planejamento de transporte e de circulação do
que aquela até então apresentada na literatura, essa etapa se consumará com
uma apresentação, sistematizada e abrangente, das conclusões obtidas pelo
pesquisador sobre a relação Estatuto da Cidade - Planejamentos de Transporte e
de Circulação.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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64
O Estatuto da Cidade, estudado neste trabalho, é composto por capítulos,
seções e artigos específicos, que têm como objetivo colocar em prática
importantes instrumentos de política urbana, já previstos desde 1988. Apesar da
grande abrangência do EC e suas especificidades características de uma lei, o
estudo aqui apresentado concentrou-se em suas dezesseis diretrizes gerais que
visam o ordenamento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.
Dentre essas diretrizes, várias delas (doze diretrizes) puderam ser
fortemente ligadas com o planejamento de transporte e circulação, portanto, foram
analisadas individualmente. As demais diretrizes (apenas quatro), por terem uma
ligação mais superficial com a questão dos transportes, foram tratadas
conjuntamente e agrupadas conforme suas similaridades.
Os estudos de correlação entre as diretrizes e os planejamentos de
transporte e circulação são apresentadas a seguir.
7 ESTUDO DAS DIRETRIZES
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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7.1 DIRETRIZ I – GARANTIA DO DIREITO A CIDADES SUSTENTÁVEIS
A conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, aprovou um documento,
denominado Agenda 21, que estabelece um pacto pela mudança do padrão de
desenvolvimento global para o próximo século. A Agenda 21 Global traduz em
ações o conceito de Desenvolvimento Sustentável, "aquele que harmoniza o
imperativo do crescimento econômico com a promoção da eqüidade social e
preservação do patrimônio natural, garantindo assim que as necessidades das
atuais gerações sejam atendidas sem comprometer o atendimento das
necessidades das gerações futuras" (BEZERRA & FERNANDES, 2000).
Para entender do que se trata o termo “desenvolvimento sustentável”, pode-
se tomar o conceito apresentado por Bremer (2001) que o coloca como o
equilíbrio entre os níveis de desenvolvimento e os estoques de recursos naturais,
desenvolvimento este que deve dar-se de modo a não prejudicar o ambiente
natural ou as gerações futuras.
Bremer (2001) considera ainda as próprias cidades como recursos que
necessitam de proteção, e assim, coloca que as possibilidades para o seu
planejamento devem ser encaminhadas em busca da sustentabilidade. O autor
defende, que não deve ser permitido um decréscimo dos estoques de recursos
naturais ao longo do tempo, pois estes apresentam características de
irreversibilidade, e que, a igualdade entre as gerações deve ser entendida como
crucial ao tema desenvolvimento sustentável, por pressupor a garantia de que a
geração seguinte tem o direito de ter acesso mínimo à mesma base de recursos
da geração anterior.
A garantia do direito às cidades sustentáveis, dentre outros, presume o
direito ao transporte para a presente e as futuras gerações. Direito ao transporte,
no sentido de proporcionar a acessibilidade e mobilidade às pessoas, associando
os termos acessibilidade e mobilidade tanto aos aspectos espaciais de distribuição
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de atividades, como às características socioeconômicas da pessoa que realiza o
deslocamento.
Para os países em desenvolvimento, a preocupação pode ser direcionada
para os grupos que têm sérias restrições de mobilidade, particularmente (os
grupos de baixa renda) pela falta de oferta dos sistemas públicos de transportes e,
principalmente, pela ausência de recursos nos seus orçamentos para o
pagamento das tarifas. Estas, quase sempre, muito elevadas e incompatíveis com
os ganhos de grande parcela da população. A constatação é que a mobilidade e
acessibilidade estão decaindo rapidamente em grande parte do mundo em
desenvolvimento (RAIA JR., 2000).
Assim, conforme Raia Jr. & Silva (1999), não é suficiente oferecer à
população simplesmente uma determinada infra-estrutura urbana, mas é
necessário também assegurar a adequação efetiva dos recursos disponíveis às
possibilidades do usuário.
Como já explicitado anteriormente, a ausência de planejamento e controle
do uso e ocupação do solo acaba por deixar que o desenho da cidade seja
resultante de forças do mercado, que tendem a investir nas áreas de maior
acessibilidade, freqüentemente com graves impactos ambientais.
O crescimento urbano acelerado vem quase sempre acompanhado de um
espalhamento urbano, em que os grupos de renda mais baixa vão sendo expulsos
para periferia urbana. Como conseqüência, as viagens desses grupos ficam cada
vez mais longas e demoradas, comprometendo assim sua acessibilidade e
mobilidade, ou melhor, o direito ao transporte.
Para agravar ainda mais o problema, tem-se, de um lado, o crescimento
baseado no automóvel, com taxas de viagens cada vez maiores por modo
motorizado particular e, de outro, em muitas cidades, devido ao alto custo das
passagens do transporte urbano, grande parcela da população com sua
capacidade de deslocamento restringida.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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67
As facilidades do uso do automóvel incentivam a expansão urbana. As
distâncias aumentam e novas vias são necessárias. As redes de equipamentos
públicos - água, esgoto, iluminação, sistema viário, etc. – tornam-se caras. Os
ônibus precisam trafegar mais, reduzindo sua rentabilidade. Algumas áreas
tornam-se críticas, como o transporte público altamente deficitário. A área urbana
aproxima-se da insustentabilidade (PIRES et al., 1997).
ANTP (2000) enfatiza que a cada dia fica mais evidente a estreita
vinculação existente entre a qualidade de vida de nossas cidades e o tipo de
circulação que elas possuem.
Lima (2002) acrescenta que quem mais sofre com tudo isso são os pobres,
pois possuem dificuldades de ter acesso a tudo nas grandes cidades – não têm
acesso à terra urbana, à habitação, à infra-estrutura e aos serviços urbanos.
Também não têm acesso à segurança nos bairros pobres e favelas – locais onde
a criminalidade é grande. Não têm acesso aos transportes públicos de qualidade.
Essa situação contradiz o direito às cidades sustentáveis, apresentada na primeira
diretriz do Estatuto da Cidade.
Mas, com a aplicação deste novo instrumento urbanístico, que dispõe sobre
a garantia do direito às cidades sustentáveis, entendido como direito à moradia, ao
saneamento ambiental e aos transportes, entre outros, para a presente e as
futuras gerações, é possível que se reverta a situação de caos urbano, que fica
evidenciada pela expansão urbana descontrolada e dependente do uso do
automóvel, gerando uma ocupação dispersa e fragmentada.
Deve-se, segundo MC (2003), incentivar a articulação efetiva entre as
políticas públicas de transporte e trânsito e as políticas definidas para as áreas de
habitação, desenvolvimento urbano e meio ambiente, com o objetivo de promover
um desenvolvimento sustentável, que reduza as necessidades de deslocamentos
da população.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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68
Parâmetros como consumo de energia, aspirações por qualidade de vida,
melhores condições de mobilidade e acessibilidade e deslocamentos de pessoas
e de bens devem ser tidos como fundamentais ao se buscar o desenvolvimento
urbano sustentável.
A priorização do transporte multimodal deve visar a diminuição do tempo
gasto em deslocamentos, com o aumento de produtividade em todos os setores
da cidade, gerando tempo livre e conseqüentemente melhor qualidade de vida
para os cidadãos.
O incentivo e a adoção de transportes sustentáveis, tais como os modos a
pé, bicicleta, e os modos coletivos, tais como ônibus, bonde, VLT, trem, metrô, são
caminhos para a construção de cidades com mais qualidade de vida.
Uma das alternativas para se aproximar da sustentabilidade das cidades é
a adoção da Gestão da Demanda de Transportes (Transportation Demand
Management - TDM), um termo geral que descreve as estratégias que resultam
em um uso mais eficiente da infra-estrutura de transportes em uma cidade. Esse
procedimento tem sido uma resposta cada vez mais comum para os problemas
acarretados pelo uso intensivo dos automóveis no transporte urbano (VTPI, 2003).
As várias estratégias que integram as políticas de Gestão da Demanda de
Transporte têm como objetivo principal desestimular o uso do automóvel e podem
proporcionar diversos benefícios, incluindo redução dos índices de
congestionamentos, diminuição da poluição ambiental e sonora, acidentes de
trânsito, uso do solo mais eficiente, etc. Entre as estratégias citam-se as
seguintes:
• Planejamento do Transporte sem Automóveis (Car-Free Planning):
envolve estratégias para reduzir as viagens por automóvel, por meio de
medidas que proíbem a utilização do transporte motorizado individual, em
determinados períodos e locais;
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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• Moderação de tráfego (Traffic Calming): trata de projetos especiais de
vias, como a implantação de redutores de velocidade (lombadas, valetas),
estreitamento de vias, sinalização, vias sinuosas, etc., visando reduzir o
volume e a velocidade do tráfego em alguns trechos. Traffic Calming é uma
técnica que tem sido aceita, principalmente, em países europeus e,
recentemente, nos Estados Unidos e Austrália, como capaz de proteger as
áreas urbanas, em parte, dos efeitos nocivos do tráfego de veículos e ao
mesmo tempo criar um ambiente seguro, calmo, agradável e atraente;
• Melhorias para bicicletas: estratégias que incentivam o uso da bicicleta
não só como lazer, mas também como modo de transporte para viagens
utilitárias. Para essa finalidade pode-se citar: melhorias nas vias,
implantação de ciclovias e ciclofaixas, estacionamento próprio para as
bicicletas, etc., além de políticas para tornar o ciclismo mais conveniente,
seguro e agradável;
• Melhorias para pedestres: assim como as anteriores, são estratégias para
tornar mais convenientes, seguras e agradáveis as caminhadas,
proporcionando caminhos atrativos e confortáveis para os pedestres;
• Uso do solo orientado para o transporte coletivo (Transit Oriented Design):
Incentiva uma maior utilização do transporte coletivo, a partir de uma
configuração de uso do solo que propicia a melhoria deste modo de
transporte, contribuindo para a criação de cidades mais acessíveis e
agradáveis;
• Crescimento Inteligente (Smart Growth): Aborda a gestão mais eficiente
do uso do solo, otimizando a infra-estrutura existente, desestimulando a
criação dos vazios urbanos e conseqüentemente a especulação imobiliária;
etc.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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70
Alcançar a acessibilidade urbana sustentável é uma etapa essencial para a
melhoria global do ambiente urbano e para a manutenção da viabilidade
econômica das cidades. Para Martins (1999), o transporte deve ser percebido
como estratégia de produção urbana e assim tornar possível a identificarção de
perspectivas de políticas integradoras. Enfim, o direito às cidades sustentáveis, no
que diz respeito ao transporte, está diretamente ligado à garantia de
acessibilidade e mobilidade das pessoas.
A cidade de São Paulo já fez a tentativa de transformar toda a frota de
ônibus diesel em motores movidos a gás natural. No entanto, a idéia não passou
de uma lei não cumprida.
Fica aqui evidente que o alcance do objetivo de se construir cidades
sustentáveis passa, necessariamente, pelo setor de transportes. Porém, apesar de
todos os movimentos em prol da sustentabilidade urbana, por enquanto, ainda se
vê que cada vez mais a expansão urbana é incentivada pelas facilidades do uso
do automóvel, que a infraestrutura pública torna-se cada vez mais cara e o
transporte coletivo deficitário. Propicia-se, dessa forma, grandes restrições de
acessibilidade e mobilidade para a maior parte da população.
Como o uso do automóvel e a frota de veículos automotores, sejam eles
movidos a gasolina ou a diesel, é cada vez maior, conseqüentemente a poluição
do ar e da água, é crescente. Assim, pode-se afirmar que essa diretriz é uma das
mais importantes e o seu fiel cumprimento só será viabilizado como fruto de uma
transformação radical nas ações relativas à política urbana, por parte dos
administradores, políticos e técnicos municipais, estaduais e federais.
Enfim, cidades sustentáveis só serão possíveis com sistemas e modais de
transportes igualmente sustentáveis.
7.2 DIRETRIZ II – GESTÃO DEMOCRÁTICA POR MEIO DA PARTICIPAÇÃO
DA POPULAÇÃO EM PROJETOS DE DESENVOLVIMENTO URBANO;
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DIRETRIZ XIII – AUDIÊNCIA DO PODER PÚBLICO MUNICIPAL E DA
POPULAÇÃO INTERESSADA NOS PROCESSOS DE IMPLANTAÇÃO DE
EMPREENDIMENTOS
A preconização da gestão democrática possibilita a participação da
comunidade na discussão do nível de serviço, custo e atendimento de transportes.
Segundo Affonso (2002), a mobilidade é um atributo associado às pessoas
e aos bens, está diretamente ligada às necessidades de deslocamento do
indivíduo, e pode ser afetada por fatores como: renda, idade, sexo e capacidade
do indivíduo.
O meio urbano oferece condições desiguais de acessibilidade, abrigando
fatores tais como: o tratamento físico dado às vias; a existência de redes regulares
de transporte urbano; a qualidade dos seus serviços e o preço dos mesmos.
Esses fatores contribuem para tornar uma cidade mais ou menos acessível.
Hoje, aproximadamente 80% da população brasileira vive em áreas
urbanas, nas quais a maioria das pessoas depende do transporte público para
deslocar-se. As condições atuais de transporte, no entanto, são inadequadas para
a maior parte dessa população, pelo desconforto, congestionamento e acidentes.
Há uma grande probabilidade de as dificuldades nos deslocamentos de
pessoas e de mercadorias agravarem-se à medida que a urbanização prosseguir
da maneira descontrolada como vem acontecendo.
Em virtude dos impactos negativos relacionados ao crescimento
desordenado das cidades, requer-se, com urgência, um reexame do modelo atual
de transporte e circulação das cidades brasileiras. Com um sistema melhor
estruturado e de acordo com a situação atual das cidades é possível assegurar
uma melhor distribuição das oportunidades de deslocamento, ao lado de uma
maior eficiência geral.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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72
As ações destinadas à ampliação da oferta de serviços sociais e
comunitários precisam ser combinadas com uma melhor utilização da capacidade
de atendimento das estruturas já implantadas:
• Levar escolas para bairros carentes e organizar o transporte escolar;
• Criar condições de acesso à rede de transporte para pessoas com
redução de mobilidade;
• Levar a rede de saúde para perto das pessoas;
• Garantir a mobilidade e acessibilidade de todos para o trabalho, lazer,
escola.
Para tanto, é imprescindível que haja a participação da população no
processo de desenvolvimento urbano e na discussão de políticas de transporte e
trânsito, que devem ser revistas de forma a gerar um balanceamento mais
adequado entre os vários modos de transporte, otimizando a eficiência geral do
sistema e garantindo melhores condições para a maioria dos usuários.
Segundo Pires et al. (1997), a participação da comunidade nas decisões
relativas às políticas públicas tem o objetivo de garantir os seus direitos
constitucionais de informação sobre decisões governamentais e de aprimorar a
qualidade das decisões, aproximando–as da vontade da maioria.
A efetivação desta participação requer a abertura de órgãos de gestão e
dos operadores de sistemas públicos de transporte ao controle dos usuários e das
associações civis interessadas na questão. Requer, também, que ocorra uma
descentralização das decisões para os níveis mais próximos do usuário final, sem
prejuízo das necessidades de manutenção de capacidade mínima de coordenação
e de desenvolvimento nos níveis hierárquicos mais altos (PIRES et al. 1997).
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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73
A garantia da participação popular atende também aos novos requisitos de
defesa da cidadania e melhoria da qualidade de vida na prestação dos serviços
públicos.
Representantes da administração pública, de órgãos gestores e operadores
de transporte, assim como dos responsáveis pelo planejamento de transporte e
circulação devem organizar-se para atender as reivindicações dos usuários e
devem expor seus objetivos e projetos para a sociedade, garantindo uma política
clara de procedimentos que devem ser realizados em prol da comunidade.
A Constituição Federal, de 1988, as Constituições Estaduais e as Leis
Orgânicas Municipais incorporam uma série de direitos e de instrumentos que
podem ser utilizados para viabilizar a vontade popular:
• O direito ao plebiscito, referendo e iniciativa popular de lei;
• O mandado de segurança individual e coletivo;
• O acesso a informações de interesse coletivo e particular dos órgãos
públicos;
• A possibilidade de participação das associações civis organizadas no
planejamento municipal.
Esses direitos devem ser remetidos também ao planejamento de transporte
e de circulação. Segundo MC (2003), para democratizar e propiciar a cidadania à
gestão da Mobilidade Urbana devem ser incentivadas políticas que promovam
acima de tudo a participação cidadã, tanto no nível dos movimentos populares,
quanto da sociedade civil organizada e dos cidadãos não engajados, fomentando
um efetivo controle social das políticas públicas de transporte e trânsito.
Em termos de participação popular, existem algumas experiências antigas,
como por exemplo, a de Florianópolis, onde a participação popular, no setor de
transportes, começou a fazer parte do governo municipal, a partir do reajuste que
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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74
seria concedido à tarifa de ônibus, em fevereiro de 1987, com o término do
congelamento de preços definido pelo Governo Federal, de fevereiro/86 a
fevereiro/87. Para tanto, o Núcleo de Transporte Coletivo – NTC/PMF, órgão
gerenciador do sistema de transporte público de passageiros, veio discutindo com
as comunidades de bairro as questões que se referem a decisões e medidas
tomadas para o setor. A participação popular seria da maior relevância na
definição da nova tarifa, levando-se em conta toda a expectativa gerada em torno
de alterações em salários e despesas familiares (EBTU, s.d.).
O orçamento público, no Brasil, foi durante muito tempo elaborado a partir
de uma visão estritamente técnico-administrativa sem qualquer consulta ou
participação da população. O resultado de tal prática era quase sempre uma peça
de ficção que não contemplava os interesses da maioria da população.
Nos últimos anos, uma nova forma de conceber a gestão pública passou a
ser discutida por vários setores organizados da população no Brasil. Esses
setores reivindicavam uma maior democratização dos processos de decisão em
questões que afetavam as suas vidas. Dessa forma ganhou força a idéia de que o
processo de elaboração do orçamento público deveria contemplar uma efetiva
participação popular nas discussões e definições de políticas públicas.
A Constituição Federal, de 1988, já havia incorporado o princípio da
participação direta na administração pública, além de estabelecer vários
mecanismos de reforços a iniciativas populares, no sentido da ampliação da
cidadania política, como o referendo e o plebiscito.
Em Porto Alegre, em 1989, foi eleito o primeiro governo da Frente Popular,
numa coligação de partidos de esquerda cuja plataforma principal de seu
programa político era a democratização das relações entre o Estado e a
Sociedade.
Já no primeiro ano, o governo da Administração Popular de Porto Alegre
materializou essa idéia ao inserir em seu programa de ação a participação popular
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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75
para discutir os investimentos e gastos do poder público. Essa participação se deu
principalmente com a abertura de um canal de discussão e deliberação da
população juntamente com os movimentos populares urbanos. Tal procedimento
foi decisivo para a construção do Orçamento Participativo que apresenta entre
suas prioridades a melhoria do transporte e circulação (POZZOBON, 2000).
A gestão democrática por meio da participação da população na discussão
dos projetos de desenvolvimento urbano, que por sua vez englobam os projetos
de transporte e circulação assegurando a mobilidade das pessoas e dos bens, é
indispensável para que se consiga melhorar a qualidade de vida dos cidadãos
brasileiros.
A audiência do poder público e da população interessada nos processos de
implantação de empreendimentos apresentadas na diretriz XIII do Estatuto da
Cidade é uma das formas de realizar a gestão democrática por meio da
participação popular apresentada na diretriz II desta mesma lei.
No que diz respeito à área dos transportes, tem-se como exemplo as
Audiências Públicas realizadas, em 2003, para avaliar o impacto ambiental dos
trechos Sul, Leste e Norte do Rodoanel Mário Covas, que corta diversos trechos
urbanos na Região Metropolitana de São Paulo.
Nessas audiências foi enfatizada a importância da preservação da Serra da
Cantareira, garantindo que não haveria risco real para o abastecimento de água, e
também, que o Rodoanel é um dos elementos básicos para a qualidade de vida da
população e que isso já está sendo possível de ser avaliado no trecho Oeste,
entregue em outubro de 2002.
É importante ressaltar que essas audiências públicas têm como objetivo
trazer os diferentes setores da sociedade para integrar as discussões e, juntos
com o Governo do Estado, definir o melhor traçado para as próximas etapas do
Rodoanel Mário Covas – trechos Sul, Leste e Norte (SECTRAN, 2004).
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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De modo geral, a prática de audiências públicas vem ocorrendo em vários
municípios brasileiros. Este é o caso de Bauru, que vem realizando audiências
públicas para discussão do novo Plano Diretor. Dentre as propostas apresentadas
e debatidas concluiu-se pela necessidade de ampliação do atual sistema viário do
município para melhorar a interligação entre bairros e setores da cidade.
(SCHIAVONE, 2004).
Apesar de haver algumas experiências mais antigas, somente nos últimos
anos, têm-se percebido uma maior mobilização e conscientização da população,
para a importância da participação da comunidade nas discussões sobre
desenvolvimento urbano, sobretudo no que diz respeito aos transportes e
circulação. Felizmente, vê-se que as administrações públicas, de maneira geral,
estão se preocupando cada vez mais com a opinião e necessidades dos cidadãos
e que estes têm-se dedicado em participar do desenvolvimento dos projetos
urbanos para conseguir melhorar sua qualidade de vida.
7.3 DIRETRIZ III – COOPERAÇÃO ENTRE GOVERNOS, A INICIATIVA
PRIVADA E OS DEMAIS SETORES DA SOCIEDADE NO PROCESSO DE
URBANIZAÇÃO
Segundo SEDU (2001), o transporte é uma função urbana que interage
diretamente com o desenvolvimento e a organização das cidades.
A forma de ocupação espacial urbana define uma determinada rede de
transporte e essa rede, mediante investimento na infra-estrutura viária urbana,
pode induzir a ocupação da cidade.
A ocupação da cidade e a provisão do transporte de pessoas e bens, assim
como outros procedimentos para viabilizar a vida social e econômica das cidades,
podem ser feitas de forma planejada ou anárquica.
Para que essa ocupação e uso do espaço urbano se dêem de forma
planejada, assegurando um melhor funcionamento do sistema de circulação e
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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77
acessibilidade das pessoas, é necessária uma gestão compartilhada ou uma
articulação entre órgãos que definem as diretrizes para o desenvolvimento urbano
e os órgãos executores dessas diretrizes nas distintas áreas: habitação,
transporte, trânsito, saneamento e equilíbrio ambiental.
“O planejamento de transporte é a atividade que define a infra-
estrutura necessária para assegurar a circulação das pessoas e
mercadorias e que organiza os sistemas de transporte que estarão
sujeitos à regulamentação pública, inclusive a tecnologia e o nível de
serviço a ser ofertado” (PIRES et al., 1997, p.43).
Utiliza-se o planejamento de transportes para aumentar as chances de que
os objetivos sejam alcançados, com a qualidade, o custo e o prazo definidos
previamente como adequados. Formalmente, a organização adequada do
transporte público urbano é uma obrigação do município, explicitada na
Constituição Federal, de 1988.
Porém, o processo de planejamento de transporte pode e deve oferecer
possibilidade de parcerias entre os setores público e privado, ou seja, devem
dividir responsabilidades em troca de benefícios, em favor do desenvolvimento e
da infra-estrutura das cidades.
Dentre as situações em que tornam possíveis as parcerias na área de
transporte urbano podem ser citadas:
• A necessidade de complementar obra pública com investimentos de
entidades privadas;
• A aquisição de recursos adicionais para obras e serviços em troca de
benefícios para financiadores privados;
• A cobrança, de entidades privadas, dos custos causados por sua
intervenção no espaço da cidade.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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78
Segundo Pires et al. (1997), as parcerias podem ser divididas em três tipos:
• Espontânea – quando o setor privado toma a iniciativa de procurar o
Poder Público para obter autorização para implantar um projeto ou serviço
de seu interesse;
• Incentivada – quando a colaboração do setor privado se dá em troca de
algum tipo de benefício pela Prefeitura, como isenções fiscais, por exemplo;
• Compulsória – é aquela induzida por iniciativa do Poder Público como pré-
condição para aprovação de grandes empreendimentos nos espaços das
cidades – como a construção de equipamentos públicos para serem doados
ao Poder Público sem nenhuma indenização ao setor privado.
De acordo com Martins (1999), até hoje o investimento em infra-estrutura
urbana para que a propriedade pudesse ter valor de troca coube ao Estado. Mas a
história reclama a participação do capital privado na transformação urbanística
para o futuro. A inserção do capital privado pode ser uma solução para o problema
relacionado à necessidade de adensamento com a minimização de impactos
negativos. A possibilidade de oferecer atributos ao capital imobiliário (fundiário,
financeiro e construtor) por meio da exploração de espaços públicos estratégicos,
como ferrovias e vias arteriais, pode ser feita por instrumentos do tipo urbanização
consorciada ou operação interligada.
Ainda segundo Martins (1999), com a redefinição do papel do Estado e a
participação do capital privado na oferta dos serviços urbanos, já se pode
estabelecer propostas e negociações que permitam a viabilização da tese da
“arquitetura da circulação” de Buchanan, a qual tem como pressuposto a
redefinição de espaços públicos e privados da cidade, ao mesmo tempo em que
se pode investir em qualidade ambiental urbana, que clama por transporte público
de qualidade e redefinição do zoneamento urbano, no sentido de se evitar a
excessiva concentração e especialização de atividades urbanas.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Assim, em troca de poder explorar economicamente o que hoje é espaço
público, o empreendedor deveria arcar com os custos de construção de estações
de integração modal e financiar o transporte popular, que também ofereceriam ao
seu empreendimento vantagens de localização, por estar bem servido de
transporte público.
Explorar espaços públicos estratégicos significaria para o capital imobiliário
um atrativo irrecusável. Afinal, como a dinâmica urbana depende da articulação do
uso do solo com as facilidades de transporte, a proposta estaria vinculando essa
articulação prioritariamente à rede de centros de comércio e serviços
(empreendimento privado).
As Operações Urbanas, já previstas no Estatuto como instrumento de
desenvolvimento urbano, poderiam ser inseridas no setor de transporte, como
forma de parceria entre o poder público e o setor privado. As Operações Urbanas
consorciadas constituem um tipo especial de intervenção urbanística voltada para
a transformação estrutural de um setor da cidade. As operações envolvem
simultaneamente: o redesenho deste setor (tanto de seu espaço público como
privado); a combinação de investimentos privados e públicos para sua execução e
a alteração, manejo e transação dos direitos de uso e edificabilidade do solo e
obrigações de urbanização (BRASIL, 2001b).
Como exemplo, pode-se citar a construção de linhas de metrô, com o
loteamento e edificações situados nas proximidades das estações ou a construção
de uma via com a participação de financiadores privados, que paralelamente
desenvolvem projetos de edifícios comerciais, hotelaria, centros de lazer e
shopping centers.
Como exemplo de aplicação deste conceito pode ser destacado o projeto
Eixo Tamanduatehy, no município de Santo André-SP, que se propõe a
requalificar o principal eixo de transportes da cidade, correspondendo a uma faixa
situada entre a Avenida dos Estados, a estrada de ferro e a Avenida Industrial.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Porém, em uma primeira etapa, foram feitas propostas para o projeto de
requalificação da área, sem que, no entanto, se chegasse a um projeto que
sintetizasse e integrasse o conjunto das propostas. Assim, o Eixo Tamanduatehy
não configurou um projeto de lei de Operação Urbana. Mesmo na ausência do
projeto síntese, foram realizadas pequenas operações urbanas, referentes a
empreendimentos isolados e implementadas por meio de leis específicas, para
cada projeto (BRASIL, 2001b).
Como exemplo de parceria entre governos na área de transporte e
circulação, pode-se citar o Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de
Transporte Urbano e Trânsito, criado em junho de 1990, por solicitação da Frente
Nacional de Prefeitos. Esse Fórum tem como objetivo reunir responsáveis pela
gestão de transporte urbano e trânsito, na defesa de projetos de lei nessa área,
visando também, estabelecer um canal permanente de divulgação e troca de
experiências bem sucedidas.
Segundo ANTP (2004), o grande impulso que se teve a partir da idéia da
criação do Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes de Transporte Urbano e
Trânsito foi a percepção de que a força conjunta de mentes, inteligências e desejo
político têm conseguido derrubar barreiras, e facilitado o desenvolvimento de um
município por intermédio do desenvolvimento do transporte e do trânsito.
Dessa forma, idéias que já tiveram sucesso em uma cidade podem, e
devem, ser divulgadas e aplicadas em todo o território nacional, para se evitar
perda de tempo e dinheiro em novas pesquisas sobre o mesmo problema, em
outra localidade.
Em regiões metropolitanas e áreas conurbadas, os aspectos relacionados
ao transporte devem ser tratados em conjunto, com ênfase na parceria entre os
governos, pois, ao se traçar diretrizes comuns, a chance de amenizar os
problemas é maior. Ações desse tipo podem ser realizadas por um único órgão,
como é o caso das EMTUs - Empresas Metropolitanas de Transportes Urbanos.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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81
A idéia de criação desses órgãos foi uma iniciativa Federal, que ocorreu na
década de 1970. A proposta era que cada Região Metropolitana existente no país
tivesse uma empresa que cuidasse de todo o planejamento e gerenciamento dos
transportes públicos. Algumas EMTUs chegaram a ser criadas, mas hoje restam
apenas duas: em São Paulo e em Recife.
De maneira geral, pode-se dizer que a cooperação entre governos, agentes
públicos e privados e demais setores da sociedade, exigida na diretriz III do
Estatuto da Cidade, pode facilitar a obtenção de transporte com adequação.
Essa parceria já vem sendo realizada em algumas regiões brasileiras há
algum tempo, mostrando que existe um pensamento unânime entre secretários e
dirigentes da área de transporte de que é preciso transformar, radicalmente, a
fisionomia do transporte e do trânsito no país, e assim por meio de um sério
trabalho conjunto, alcançar resultados positivos e promissores.
7.4 DIRETRIZ IV – PLANEJAMENTO DO DESENVOLVIMENTO DAS
CIDADES, DA DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA POPULAÇÃO E DAS
ATIVIDADES ECONÔMICAS DO MUNICÍPIO DE MODO A EVITAR E
CORRIGIR AS DISTORÇÕES DO CRESCIMENTO URBANO
O espalhamento urbano nas cidades brasileiras se deve basicamente à
formação de grandes vazios urbanos. A especulação imobiliária, entendida como
ganho sem investimento, a não ser o inicial na compra da terra, é a principal causa
do espalhamento urbano.
O espalhamento urbano pode ocorrer como conseqüência de dois
processos: a falta de continuidade da malha urbana; ou vazios urbanos que
ocorrem porque novos loteamentos são implantados em áreas não contíguas aos
loteamentos existentes, dotados de alguma infra-estrutura. Assim, áreas de terras
desocupadas são mantidas entre os antigos bairros e os novos, as quais adquirem
uma valorização pelo efeito das externalidades positivas geradas no seu contorno;
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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e também pelas baixas densidades resultantes de lotes com áreas grandes (RAIA
JR., 1995).
Dentre os dois processos anteriormente identificados como causa do
espalhamento urbano, as cidades brasileiras sofrem principalmente pela falta de
continuidade da malha urbana, resultante de um grande número de vazios
urbanos dentro da área urbanizada. Geralmente são encontrados cerca de 30
lotes por hectare, o que representa, em média, 100 habitantes por hectare (se
todos estivessem ocupados), mesmo com apenas uma edificação por lote. No
entanto, devido aos vazios urbanos, a densidade média encontrada para as
cidades de porte médio é de apenas 40 pessoas por hectare (MASCARÓ &
MASCARÓ, 2003).
A especulação com a terra urbana é a principal causa dos vazios urbanos.
Ela expulsa os pobres para a periferia, e provoca um crescimento descontrolado,
principalmente pela retenção de terrenos vazios à espera da valorização
decorrente de obras de infra-estrutura e superestrutura implantadas pelo poder
público.
Pode-se dizer, também, que o advento do automóvel contribuiu com uma
mudança significativa na ocupação de áreas periféricas, ao diminuir os tempos de
viagem, a presença do automóvel assim como do transporte coletivo por ônibus
tornaram possível a ocupação de grandes áreas nas periferias das cidades.
No entanto, deve-se levar em consideração que as cidades serão mais
densas quanto maior for o uso do transporte coletivo e, menos densas, quando
prevalecer o uso do transporte individual motorizado.Isso ocorre por causa da
ociosidade de infra-estrutura urbana e seu alto custo, ocasionado quando o trajeto
do transporte coletivo passa por áreas desocupadas para se chegar à periferia,
como afirma Campos Filho (1989).
Por esses e outros motivos, as cidades brasileiras, assim como as cidades
dos demais países em desenvolvimento, apresentam graves problemas de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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transporte e qualidade de vida. Queda da mobilidade e da acessibilidade,
degradação das condições ambientais, congestionamentos crônicos e altos
índices de acidentes de trânsito já constituem graves problemas em muitas
cidades.
Com cinqüenta anos de crescimento baseado no automóvel, cidades como
Camberra, Phoenix, Denver, Houston, entre outras cidades americanas e
australianas, espalharam-se até o limite de conforto das viagens por carro. Muitos
dos residentes de áreas suburbanas não conhecem outro estilo de cidade. Novos
subúrbios, além de estarem situados a quarenta ou cinqüenta quilômetros do
centro, estão cada vez mais isolados das amenidades urbanas básicas, sendo que
o nível de problemas associados à dependência do automóvel em tais localidades
está crescendo rapidamente (COSTA, G., 2001).
No Brasil, a situação não é diferente, grandes cidades como São Paulo,
Porto Alegre e outras apresentam graves problemas urbanos, principalmente pela
adoção de uma política habitacional desarticulada da política urbana, estendendo
a área urbanizada para além do que seria necessário para abrigar a população,
gerando custos elevados na implantação de infra-estrutura e tornando necessária
a criação de linhas de transporte coletivo deficitárias.
A diminuição dos custos dos serviços públicos, tais como redes de água,
esgoto, energia elétrica e, sobretudo transporte coletivo e pavimentação, pode ser
bastante significativa quando se eleva a densidade urbana. A passagem do
transporte coletivo pode ser reduzida à metade, com a ocupação plena e contínua
das cidades, assim a classe mais pobre da população, que cada vez se utiliza
menos do ônibus, pela impossibilidade de pagar a tarifa, será beneficiada (RAIA
JR, 1995).
Como já citado anteriormente, a falta de planejamento urbano e o uso e
ocupação do solo desordenado geram demandas variadas e complexas de
transporte, ocasionando sérios problemas de ineficiência do sistema. A
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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desproporção no espalhamento urbano com acúmulo populacional em alguns
pontos e vazios em outros acarretam a ociosidade da infra-estrutura do transporte.
Conjuntamente com a promoção do planejamento do desenvolvimento das
cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do
município, evitando e corrigindo as distorções do crescimento urbano, pode-se
promover, segundo SEDU (2001), políticas de gestão territorial municipal e
controle do uso do solo que privilegiem a utilização do transporte coletivo urbano.
Em grandes cidades, um numero elevado de pessoas gasta muito tempo
nos seus deslocamentos por transporte coletivo, chegando a mais de duas horas
por dia para quase 50% delas. A necessidade de realizar transferências, devido às
grandes distâncias a serem percorridas, causa desconforto e aumento de custo e
tempo de viagem.
Com a ordenação e controle do uso do solo pode-se deter a retenção
especulativa do imóvel urbano, evitando-se a conseqüente formação de vazios
urbanos, que acarretam impactos significativos nos custos das redes de transporte
público.
O planejamento e a distribuição espacial da população, dispostos na
Diretriz IV, poderão auxiliar no controle do crescimento urbano, promovendo
cidades mais compactas e racionais com menores custos de transporte coletivo.
É preciso estimular o uso misto do solo, favorecendo a descentralização da
economia e também dos serviços públicos. Se mais pessoas morarem mais perto
do emprego, em bairros com escolas, hospitais, comércio e serviços, menos
necessidade de realizar deslocamentos e, portanto, menos motorizada, barulhenta
e poluída será a cidade. As pessoas poderão utilizar os modos não motorizados, a
pé ou bicicleta, todos se deslocarão mais rapidamente e haverá menos acidentes
de trânsito. Cidades compactas têm mais qualidade de vida (ANTP, 2002a).
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Com a construção de cidades mais compactas, diminuiem-se as viagens
excessivamente longas e tarifas cada vez mais altas, possibilitando uma maior
acessibilidade da população, em geral, aos serviços de transporte público, que
dessa forma se tornam mais eficientes e confortáveis.
A proposta de cidades compactas surgiu na Europa, com base na
justificativa de ser ambientalmente desejável já que reduz deslocamentos e
promove melhor qualidade de vida. Para tanto, propõe-se a volta de usos mistos
nas cidades, bem como o fim da expansão urbana extensiva, de tal forma que
novos empreendimentos aconteçam dentro dos limites urbanos existentes. A
ênfase do argumento recai sobre redução de custos e eficiência na utilização de
recursos energéticos e de transportes.
Porém, não se vê, no Brasil, um esforço, por parte das administrações
públicas, em se promover cidades mais compactas, pois, cada vez mais, são
implantados conjuntos habitacionais e equipamentos públicos em áreas distantes
dos centros urbanos, principalmente pelo valor da terra. Isso contribui justamente
para uma situação contrária à da proposta de cidades racionais, auxiliando no
espalhamento das cidades e conseqüente ociosidade da infra-estrutura de
transporte.
A grande influência promovida pelos grupos de empreendedores urbanos,
que se beneficiam justamente do quadro de cidades espalhadas, muitas vezes
financia campanhas políticas. Em contrapartida, estes grupos promovem a
manutenção do quadro atual de liberalidade no controle do crescimento urbano.
Afinal, a especulação neste país é uma realidade nas mais diversas áreas, e
também no processo de produção do espaço urbano. A transformação dessa
prática requer uma grande mudança de pensamento e atitudes do brasileiro, em
geral.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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7.5 DIRETRIZ V – OFERTA DE EQUIPAMENTOS URBANOS E
COMUNITÁRIOS, TRANSPORTE E SERVIÇOS PÚBLICOS ADEQUADOS
AOS INTERESSES E NECESSIDADES DA POPULAÇÃO
Com a tendência acentuada do uso do automóvel nas cidades modernas
torna-se cada vez mais difícil deslocar-se por meios não motorizados.
Recentemente as cidades experimentaram um crescimento muito intenso,
gerando distâncias médias, que em geral, não podem ser percorridas a pé ou de
bicicleta.
Assim, a dependência do transporte motorizado tornou-se inevitável em
cidades médias e grandes, exigindo que alguma forma de transporte motorizado
esteja disponível fisicamente (infra-estrutura e veículos) e seja acessível
economicamente.
Também a especulação da terra, a debilidade dos controles públicos sobre
o crescimento urbano e a segregação espacial de classes e grupos sociais foram
fatores que contribuíram para gerar agrupamentos sociais altamente diferenciados
por renda e características sociais, com as camadas mais pobres sendo
deslocadas para as áreas mais periféricas.
Tais formas de segregação social afetam diretamente a provisão de infra-
estrutura e de equipamentos públicos como escolas, hospitais, postos de saúde e
creches, afetando, portanto, as condições de acesso das pessoas e reforçando
ainda mais a dependência do transporte motorizado (VASCONCELOS, 2000).
Com as maiores distâncias a percorrer e com os serviços precários de
transporte, a maioria da população precisa aumentar os gastos de tempo para
realizar suas atividades essenciais. A conseqüência mais marcante é que os
setores de renda mais baixa têm sua acessibilidade bastante limitada, com quase
todas as viagens feitas apenas para os motivos de trabalho, estudo e compras.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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Um dos problemas mais freqüentes encontrados pelos planejadores da
administração municipal está relacionado à localização dos equipamentos
públicos. De maneira geral, a localização desses equipamentos, como hospitais,
creches, escolas, postos de saúde, etc. tem obedecido a critérios de
disponibilidade de áreas públicas, com a economia de aquisição do imóvel, sem
levar em consideração a localização adequada, a qual deve proporcionar
acessibilidade para a população de maneira eqüitativa (RAIA JR. & PEREIRA,
2001).
Dutra (1998) mostra a importância do planejamento e distribuição de
escolas em área urbana, de maneira a minimizar os custos com deslocamentos.
Dutra apresenta um aumento superior a 20% nos percursos de caminhada das
crianças após a reorganização escolar realizada no município de São Carlos,
interior de São Paulo, onde os alunos de 1a a 4a séries foram separados dos
demais níveis.
A rigor, os bens públicos devem estar distribuídos de forma equilibrada;
assim, próximo a cada aglomeração residencial deve haver equipamentos urbanos
que atendam às necessidades da população local, com a finalidade de se diminuir
o trânsito motorizado das pessoas.
Um exemplo interessante vem ocorrendo no Estado de São Paulo, onde
desenvolve-se um projeto que prevê a concentração de serviços. São unidades
chamadas de Poupatempo. O Poupatempo é uma instalação que reúne em um só
lugar diversos órgãos e empresas públicas, prestando diversos serviços à
comunidade. Seu objetivo principal é a agilidade e eficiência na solicitação de
documentos, pagamento de contas, recebimento de informações, etc. E, por outro
lado, acaba por contribuir com a redução de viagens, com a diminuição de
congestionamentos e com a melhoria na fluidez do trânsito.
Seguindo o pensamento de Joaquim (1999), existe um déficit na oferta de
serviços e infra-estrutura urbana, segregação social e iniqüidade nas condições de
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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acesso e custo, determinados por um sistema de transporte que dá prioridade ao
uso do automóvel em detrimento do transporte público e modos não motorizados.
Esses aspectos determinam prejuízos significativos à qualidade de vida da maior
parcela da população, que, no caso de países em desenvolvimento, é
representada pelas classes de baixa renda.
As políticas de transportes constituem instrumentos muito importantes para
gerenciar o crescimento das cidades de forma eficiente e sustentável e com uma
preocupação social mais clara. Essas políticas devem ser usadas para reduzir a
desigualdade, além de inibir as tendências de reprodução da pobreza.
Para Vasconcelos (2000), as metodologias de planejamento disponíveis
estão sendo aplicadas no sentido de manter as desigualdades e vêm produzindo
um crescimento ineficiente das cidades, quando se considera o aspecto ambiental,
além de serem excludentes nos aspectos sociais.
É evidente que muitas das soluções para os problemas das cidades não
dependem somente das políticas de transportes. É importante que se mudem os
paradigmas sobre as políticas e o planejamento urbano no Brasil e para isso
conta-se com a efetiva implementação do Estatuto da Cidade, que pode contribuir,
entre outros aspectos, para a melhoria da oferta dos equipamentos urbanos e
comunitários e conseqüentemente para a melhoria da acessibilidade e mobilidade
das pessoas a todos os serviços públicos e privados.
7.6 DIRETRIZ VI – ORDENAÇÃO E CONTROLE DO USO DO SOLO, DE
FORMA A EVITAR:
• Utilização inadequada dos imóveis urbanos;
• Proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
• O parcelamento do solo, a edificação ou uso excessivos ou
inadequados em relação à infra-estrutura;
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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• A instalação de empreendimentos ou atividades que possam
funcionar como pólos geradores de tráfego, sem previsão da infra-
estrutura correspondente;
• Retenção especulativa do imóvel urbano, que resulte na sua
subutilização ou não utilização;
• Deterioração de áreas urbanizadas;
• Poluição e degradação ambiental.
As cidades precisam cuidar dos projetos de expansão urbana, prevendo
redes integradas de transportes e trânsito para as novas regiões a serem criadas.
E precisam também controlar a implantação em área já ocupada, de novos
empreendimentos que atraiam muitas pessoas e automóveis, ou seja, os pólos
geradores de tráfego, realizando conjuntamente o Estudo de Impacto de
Vizinhança, que tem a função de avaliar a proximidade de usos incompatíveis ou
inconvenientes.
Os pólos geradores de tráfego são construções urbanas que atraem grande
quantidade de viagens de pessoas ou cargas, como por exemplo, escolas,
shopping centers, grandes áreas de lazer, etc.
A instalação de empreendimentos que funcionam como pólos geradores de
tráfego está diretamente ligada ao planejamento e gestão do transporte e
circulação. Os pólos geradores de tráfego podem ser controlados por instrumentos
legais e técnicos que definam a obrigatoriedade de que novas construções e
ocupações com certas características sejam submetidas à análise dos órgãos
competentes de transporte e trânsito.
A Secretaria Municipal de Transportes – SMT do município de São Paulo,
através da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET, (SMT/CET, 2000), já
tinha essa preocupação, bem antes da vigência do EC. Para tanto, desenvolveu
um trabalho de análise do impacto de Pólos Geradores com o objetivo de: garantir
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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a melhor inserção possível do empreendimento proposto na malha viária
existente; diminuir ao máximo a perturbação do tráfego de passagem em virtude
do tráfego gerado pelo empreendimento; viabilizar a absorção, internamente à
edificação, de toda a demanda por estacionamento gerada pelo empreendimento;
assegurar que as operações de carga e descarga ocorram nas áreas internas da
edificação; reservar espaços seguros para circulação e travessia de pedestres; e
assegurar a existência de vagas de estacionamento para deficientes físicos e
motocicletas.
É necessário que haja uma previsão da infra-estrutura correspondente
quando da instalação de empreendimentos que possam funcionar como pólos
geradores de tráfego, no sentido de minimizar ou eliminar os impactos
indesejáveis que possam ter sobre o transporte e o trânsito da área de influência,
e que são causas importantes das más condições de circulação nas cidades de
médio e grande porte (RAIA JR., 2001).
Seguindo-se essa diretriz que propõe a ordenação do uso do solo de forma
a controlar, entre outros problemas, a instalação de pólos geradores de tráfego
sem previsão de infra-estrutura correspondente, podem ser evitadas:
• A inserção inadequada de grandes empreendimentos na malha viária
existente;
• A perturbação indevida no tráfego de passagem em virtude do tráfego
gerado pelo empreendimento;
• A falta de vagas de estacionamento no pólo gerador de tráfego, levando à
redução da capacidade do sistema viário em suas proximidades com
estacionamento irregular de veículos;
• A falta de segurança na circulação de pedestres no entorno do
empreendimento.
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A retenção especulativa do imóvel urbano é a principal causa dos vazios
urbanos que expulsam os pobres para a periferia, tanto nas grandes como nas
pequenas cidades, mas o processo de especulação não teria sido tão intenso sem
a presença do automóvel e também sem a flexibilidade do ônibus, que tornou
possível a ocupação de enormes áreas na periferia das cidades (SILVA, 1993).
Algumas políticas públicas também são responsáveis pelo espalhamento
urbano e conseqüente especulação imobiliária, como programas governamentais
para a construção de habitações populares em terras localizadas longe da
mancha urbana em virtude do preço de aquisição do terreno ser bem mais baixo
do que aqueles mais próximos ao centro.
Embora o automóvel seja um dos mais importantes contribuintes para o
espalhamento urbano, nos países em desenvolvimento, eles servem apenas a
uma parcela relativamente pequena de pessoas, considerada como uma elite,
deixando a maior parte da população sem transporte adequado.
Desta forma, para atender à população, geralmente de baixa renda e
dependente do transporte coletivo, que fica nas franjas periféricas das cidades, é
necessário levar os serviços para essas localidades, o que torna a infra-estrutura
ociosa e assim aumenta seus custos.
Combatendo o espalhamento urbano e a especulação imobiliária, evitar-se-
á situação antiestética das cidades espalhadas, mas, sobretudo o aumento dos
custos com serviços urbanos (basicamente infra-estrutura como transporte, água,
energia elétrica).
Ao se pensar no desenvolvimento da cidade, o Plano Diretor, que com o
Estatuto da Cidade, torna-se obrigatório para cidades com mais de 20.000
habitantes, deverá considerar de forma integrada o transporte público, o trânsito e
o uso e ocupação do solo.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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O Plano Diretor deve propor políticas habitacionais para privilegiar a
consolidação de áreas urbanas já ocupadas, como prédios sem uso localizados
nos centros das cidades, ou revitalizar os bairros degradados, entre outras. Essas
medidas fazem com que as cidades se adensem em áreas que já contam com
infra-estrutura urbana.
Como exemplo da relação direta dos transportes com a deterioração das
áreas urbanizadas pode-se citar o caso da área portuária do Rio de Janeiro,
abordado por Silva & Lentino (2003). Eles apontam que a área portuária do Rio,
em sua maior parte, apresentava um aspecto de decadência com imóveis mal
conservados e até em ruínas, ruas esburacadas, muitas construções sem uso e
vários terrenos mal aproveitados. Recentemente, alguns armazéns originais da
construção do cais foram reformulados para abrigar novos usos como eventos e
armazéns de escolas de samba. A legislação em vigor ainda é bastante restritiva.
A classificação como zona portuária permite somente uma tipologia ligada a essa
atividade, como galpão, telheiro e edificação industrial. O uso residencial é apenas
tolerado e com restrições quanto à tipologia e ao gabarito de altura.
Dessa forma, a organização do transporte público se torna ineficiente para
integrar internamente a zona portuária e esta com o centro administrativo da
cidade do Rio de Janeiro. Essa falha do sistema se deve ao fato de a zona
portuária, que dispõe de instalações destinadas ao transporte marítimo,
apresentar ausência de atividades e conseqüentemente ausência de fluxos de
circulação. As linhas de ônibus usam a área como passagem e não funcionam
como transporte específico para servir o bairro.
Assim, como o Rio de Janeiro, a maioria das cidades brasileiras, precisa
redefinir a função das áreas subutilizadas e promover uma revisão das Leis de
Uso e Ocupação do Solo que permita a requalificação do espaço urbano e a
melhoria da acessibilidade para a comunidade.
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Um outro exemplo importante de áreas subutilizadas é o caso das
instalações ferroviárias, desativadas em um grande número de cidades brasileiras.
Com a ascensão do transporte sobre pneus, as ferrovias muito utilizadas até
meados do século XX, hoje estão desativadas, e suas estruturas subutilizadas. A
reativação dessas ferrovias pode significar a recuperação de áreas degradadas
além de uma maneira de desafogar o trânsito, uma vez que as ferrovias são uma
das formas mais baratas de se transportar cargas.
Quanto à degradação e poluição ambiental, uma das maiores desvantagens
em relação ao número excessivo de carros e motos é a poluição ambiental.
Grande parte da frota de veículos particulares é velha, com motores desregulados.
E, mesmo que um automóvel novo polua menos, ao se somar com milhões de
outros, acaba por contribuir para a contaminação do ar; nas grandes cidades, os
automóveis e as motos são responsáveis por até 70% das emissões de gases
poluentes.
IPEA/ANTP (1998) desenvolveram um estudo sobre as deseconomias
advindas do congestionamento em função do aumento do consumo de
combustível, da emissão de poluentes, do impacto no sistema de ônibus, do
tempo gasto e da ocupação do espaço urbano. No que diz respeito à emissão de
poluentes, o estudo mostra que os coeficientes desta emissão por veículos
automotores variam em função das condições dos combustíveis e dos veículos. A
pesquisa concentrou-se na emissão dos quatro principais poluentes nocivos à
saúde: monóxido de carbono (CO), hidrocarbonetos (HC), óxido de nitrogênio
(NOx) e materiais particulados (MP).
O estudo do IPEA/ANTP apresenta o aumento das emissões de CO e HC e
a diminuição de NOx à medida que a velocidade média diminui. Os resultados são
que as emissões de HC variam de 5,97g/km a uma velocidade de 10km/h a 0,50
g/km a 80km/h e as emissões de CO variam de 68,32 g/km a 10km/h a 13,15 g/km
a 80km/h; já as emissões de NOx aumentam de 1,04g/km a 10 km/h para
1,51g/km a 80km/h.
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O controle das emissões de poluentes pelos veículos mostra-se essencial
para reduzir os efeitos negativos do congestionamento; a melhor ordenação do
tráfego pode elevar a velocidade média e reduzir o consumo. Nesse sentido, são
muito importantes duas ações: a instalação de equipamentos de controle de
tráfego de melhor qualidade, associada à manutenção de equipes profissionais
especializadas, e na área operacional, referente à manutenção de serviços
eficientes de operação de trânsito (IPEA/ ANTP, 1998).
As pessoas que vêem os ônibus parados em congestionamentos, podem
até imaginar que sejam eles os vilões do tráfego e da poluição. Mas a realidade é
outra, em comparação com os ônibus, os modos de transporte individuais
motorizados, automóveis e motos, são caros e ineficientes, pois ocupam mais
espaço nas vias, gastam mais energia e poluem muito mais o meio ambiente.
Os automóveis são os maiores responsáveis pelos congestionamentos,
obrigando a maior parte da população, que utiliza o transporte público, a gastar
mais tempo de viagem e sofrer as conseqüências da poluição.
Pode ser verificado que nas localidades com maior concentração de
veículos, como é o caso da região metropolitana de São Paulo, o setor de
transporte é a maior fonte poluidora, ultrapassando até mesmo o nível de poluição
gerada com a produção de energia (CETESB, 1994 apud OLIVEIRA et al, 2003).
Para se reverter essas expectativas negativas, será preciso desestimular o
uso do automóvel nas cidades, e oferecer transporte público suficiente,
confortável, seguro e barato.
A comunidade pode utilizar o transporte individual de forma mais racional,
integrando-o ao transporte coletivo ou até mesmo trocando-o pelo transporte
público de boa qualidade, para realizar os deslocamentos diários, contribuindo
assim para diminuição da poluição ambiental.
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Uma outra questão relacionada à degradação ambiental é a utilização dos
recursos naturais que precisam ser preservados. Para isso, é necessário utilizar-
se de energia renovável, como o álcool, os óleos vegetais e as fontes alternativas.
É preciso, também por esse motivo, aumentar o uso do transporte público -
que consome menos energia - e reduzir o uso do transporte individual. É de igual
importância que haja uma melhor organização do trânsito, com prioridade para o
transporte público.
No entanto, apesar da difícil situação econômica brasileira, a grande
produção de automóveis e as facilidades na sua aquisição estão aumentando
cada vez mais o número de carros circulando nas ruas. Além disso, não há
incentivos para o uso do transporte coletivo que se torna cada vez mais caro e
com seu nível de serviço cada vez mais baixo. Dessa maneira, não se vêem
grandes chances, em curto prazo, de reduzir o uso do automóvel e aumentar o
uso do transporte coletivo para que se possa adquirir um meio ambiente mais
saudável.
7.7 DIRETRIZ VII – INTEGRAÇÃO ENTRE AS ATIVIDADES URBANAS E
RURAIS
Esta diretriz que visa a integração entre as atividades urbanas e rurais pode
ser diretamente relacionada à área de transporte e circulação com base, por
exemplo, na necessidade do transporte escolar adequado, nas áreas rurais.
As crianças e adolescentes da área rural não podem ficar à margem dos
esforços que os três níveis do governo vêm fazendo para que todas as crianças
do país alcancem a educação do ensino fundamental. O transporte é o único meio
de dar à população rural em idade escolar oportunidades de educação
equivalentes às que são oferecidas à população urbana. Pode-se então dizer que
a falta de transporte corresponde a uma discriminação de uma população em
relação à outra.
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A construção de escolas em locais adequados da área rural seria sem
dúvida a solução ideal, mas ela só é viável do ponto de vista pedagógico,
administrativo e financeiro se complementada por um sistema de transporte que
busque os alunos que não possam alcançar esses centros de ensino a pé. Ocorre
que, independentemente dos locais escolhidos da área rural para instalação
desses centros, os alunos dependentes de transporte serão sempre a grande
maioria, e escolas na área rural só serão viáveis se atraírem alunos residentes
tanto em locais próximos quanto em locais distantes (GEIPOT, 2004).
Nos municípios mais pobres do Brasil, as crianças residentes na área rural
vão a pé para a escola — quando há escola nas redondezas. Não raro são
obrigadas a caminhar 10, 12 e até 15 quilômetros por dia. Todo esse esforço para
chegar às tradicionais escolinhas rurais. A professora, muitas vezes, também
precisa fazer longas caminhadas para chegar à escola.
Nas demais localidades não urbanas, veículos de propriedade ou
contratados pela prefeitura — de todos os tipos, inclusive caminhões e pick-ups,
velhos e superlotados — recolhem as crianças nas fazendas ou nas encruzilhadas
das estradas vicinais, para levá-las a escolas localizadas nas cidades, vilas ou
povoados do município ou de municípios vizinhos. Mesmo assim, há crianças que
precisam caminhar 5, 6 ou 8 quilômetros por dia para pegar o veículo escolar.
Não há como exigir da maioria das prefeituras um transporte melhor. São
centenas ou milhares de crianças a transportar em todas as direções. Um
transporte seguro, pontual e confortável e com capacidade suficiente, consumiria
grande parte do orçamento municipal, em muitas cidades brasileiras. Poucos
estados ajudam os municípios a financiar o Transporte Rural Escolar. Se um
programa em que a participação dos três níveis de governo no custeio
permanente do Transporte Rural Escolar não for concebido e implementado, não
há perspectivas de reverter a situação.
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Há muito tempo já vêm sendo realizadas, no Brasil, pesquisas sobre o
transporte rural com atenção especial para o segmento escolar, como é o caso do
GEIPOT, hoje desativada e substituída pela ANTT – Agência de Transportes
Terrestres que, desde 1992, vinha realizando pesquisas nessa área. O Relatório
Final da primeira pesquisa chegou às seguintes conclusões (GEIPOT, 2004):
• A implantação e o desenvolvimento de um transporte que atenda as
necessidades mínimas da população, que reside e/ou trabalha na área
rural, serão factíveis e socialmente rentáveis se forem conjugados os
esforços e recursos dos governos federal, estadual e municipal.
• A implantação e o desenvolvimento desse transporte devem ser iniciados
pelo Segmento Escolar, em razão de sua reconhecida prioridade e das
oportunidades e condições favoráveis criadas para o desenvolvimento dos
demais segmentos.
Outro problema encontrado, em relação ao transporte e circulação, quando
se fala em integração de atividades urbanas e rurais, é o transporte dos
trabalhadores rurais. Devido à dinâmica demográfica brasileira das últimas cinco
décadas, caracterizada pelo processo de urbanização acelerado, tem-se, em
alguns casos, grande parte dos trabalhadores rurais morando nas cidades e sendo
transportados diariamente ao campo. Na maioria das vezes, esse transporte é
precário, tornando a viagem desconfortável e perigosa.
Sendo assim, torna-se necessária a conscientização de que, ao se pensar
em integração rural e urbana, é indispensável que se analise, enfaticamente, a
questão dos transportes e da circulação.
Há de se falar na política de melhoria das estradas vicinais que, além de
atender às necessidades de escolares e trabalhadores rurais, servem igualmente
e de forma não menos importante, ao escoamento da produção rural. Em grande
parte dos municípios, a rede vicinal é de competência do município. Para as
propriedades rurais, em geral, a abertura, manutenção e melhoria das vias vicinais
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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ajudam no escoamento da produção para grandes centros consumidores e
distribuidores; para as pequenas propriedades, possibilita a chegada da produção
às quitandas, mercearias e supermercados da cidade. Ações deste tipo poderão,
inclusive, baratear o transporte da produção, fazendo com que o custo final seja
reduzido, beneficiando diretamente o consumidor.
7.8 DIRETRIZ VIII – ADOÇÃO DE PADRÕES DE PRODUÇÃO E CONSUMO
DE BENS E SERVIÇOS E DE EXPANSÃO URBANA COMPATÍVEIS COM
OS LIMITES DA SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL, SOCIAL E
ECONÔMICA DO MUNICÍPIO
Segundo Brasil (2001b), coloca-se a idéia do direito às cidades
sustentáveis, como um dos princípios básicos da política urbana. A
sustentabilidade, apresentada nesta diretriz, é percebida no seu sentido mais
amplo, indo além do equilíbrio ambiental e incorporando as dimensões
econômicas e sociais.
A adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços
compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do
município pode ser voltada para a área dos transportes, ainda que de forma tênue.
As cidades podem e devem incentivar o uso de modais de transportes que
venham a ser ambiental, social e economicamente compatíveis com suas
características naturais e/ou construídas.
Assim, pode-se citar o caso de cidades planas como Santos, Araçatuba,
Rio Claro entre outras, cujo relevo é propício para utilização da bicicleta. Em
cidades como estas poderiam ser oferecidos subsídios e isenções públicas para
fabricação e/ou comercialização de bicicletas como forma de incentivo a esse
modo de transporte.
Paralelamente, a implantação de dispositivos que estimulem o uso desse
modal, tais como ciclofaixas, ciclovias, estacionamentos, segurança, sinalização
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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adequada, equipamentos em escolas, fábricas, para que os ciclistas possam
tomar banho, etc. é fundamental.
A bicicleta é acima de tudo um modo de transporte sustentável, pois não
coloca em risco a saúde pública ou ecossistemas e atende às necessidades de
mobilidade de forma consistente com o uso de recursos renováveis.
No entanto, parece que as cidades onde o modo bicicleta tinha uma
importância superlativa, pouco a pouco vão deixando que o automóvel, numa ação
predatória sem precedentes, vá tomando conta das estatísticas de uso de modais
urbanos de transportes. Esse problema parece não ser exclusivamente de cidades
brasileiras. Recentemente, assiste-se à gradativa substituição do uso do modal
bicicleta e seus derivados pelos automóveis, nas cidades chinesas.
Trata-se, no entanto, de uma questão basicamente de cultura, pois em
alguns países europeus, mais especificamente na Holanda, o uso da bicicleta é
plenamente incentivado para todas as classes, desde o trabalhador até o
executivo.
De maneira geral, o modo a pé deve ser estimulado para qualquer tipo de
cidade, com distâncias compatíveis com a capacidade humana. Isso é ainda mais
válido para cidades com topografias favoráveis. Para isso, deve haver uma
mudança de paradigmas, em que o administrador deixe de pensar exclusivamente
na infra-estrutura para o automóvel e passe a se preocupar também com aquela
voltada para o pedestre. O Código de Trânsito Brasileiro deixa bem claro que a
responsabilidade sobre o sistema viário para pedestres é do órgão gestor
municipal de trânsito.
Uma vez que esses meios de transporte não são poluentes, dever-se-ia,
cada vez mais, incentivar a adoção dessas alternativas em cidades brasileiras,
diante dos avisos globais sobre o efeito estufa, camada de ozônio, recursos
energéticos limitados e outros problemas ecológicos, que não são agravados com
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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100
uso da bicicleta nem pelo seu processo industrial (simples e barato) e pelo modo a
pé.
Estudos de engenharia de tráfego indicam que uma faixa de via rodoviária
pode transportar o dobro de pessoas em bicicletas do que em automóveis. Com
velocidades de tráfego de 16 km/h, velocidades médias das bicicletas, o
automóvel não apresentaria nenhuma vantagem.
Fica claro que o aproveitamento das características intrínsecas de algumas
cidades deve ser utilizado para se obter cidades mais sustentáveis, principalmente
com o incentivo e facilitação para do uso de modos de transportes também mais
sustentáveis. A mudança de paradigmas deve ser entendida como uma
necessidade a ser buscada nas próximas décadas. Em alguns países, o Estado
chega, em alguns casos, a não só incentivar o uso da bicicleta, por exemplo, como
também a financiar a sua compra e manutenção. No Brasil, o mesmo incentivo
fiscal que é dado à indústria automobilística não é oferecido à indústria de
bicicletas.
7.9 DIRETRIZ IX – JUSTA DISTRIBUIÇÃO DOS BENEFÍCIOS E ÔNUS
DECORRENTES DO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO
Para conter o espalhamento urbano, sugerem alguns autores que o
mercado de terras urbanas seja capaz de se auto–regulamentar sem a
interferência do poder público. Outros autores, no entanto, pensam o contrário e
não acreditam numa mudança de consciência dos especuladores brasileiros, pelo
menos a curto prazo. É necessário que se aplique um instrumento capaz de
corrigir essa distorção (SILVA, 1993).
Estratégias de taxação surgem como uma alternativa para o problema de
terras urbanas ociosas no Brasil. A Constituição Federal dispõe, no seu artigo 182,
que vem agora ser regulamentado pelo Estatuto da Cidade, que o proprietário da
terra urbana não utilizada ou sub-utilizada que não promover a ocupação desta
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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101
terra poderá sofrer taxação progressiva, culminando com a desapropriação do lote
(BRASIL, 1988).
Silva et al (2000) colocam que uma política de taxação, baseada nos custos
adicionais de transporte e infra-estrutura produzidos pela terra urbana ociosa,
pode ser uma forma de reduzir o problema dos altos custos dos transportes e
infra-estrutura enfrentados pelas cidades espalhadas.
Essa taxação é baseada na idéia de que a urbanização com densidades
adequadas pode reduzir os custos com transporte e infra-estrutura, seguindo
recomendações da Constituição Federal de 1988.
Silva (1993) e Raia Jr. (1995) propõem como alternativa para minimizar os
problemas do espalhamento urbano, causados pela presença de vazios urbanos,
a taxação dos terrenos ociosos, tomando como referência os custos adicionais de
transporte e infra-estrutura por eles causados.
As propostas de Silva (1993) e Raia Jr. (1995) consistem na utilização de
modelos matemáticos para cálculo dos custos de transporte e infraestrutura e
seus usos na tributação de terrenos ociosos. Com a aplicação dessa metodologia,
por Raia Jr. (1995), na cidade de Araraquara, interior do Estado de São Paulo, foi
possível simular diferentes cenários para a cidade, podendo-se avaliar o impacto
das alterações realizadas no adensamento urbano.
Como resultado teve-se que, na configuração real, na cidade com uma
densidade de 25 hab/ha, os custos com transporte e infraestrutura chegam a
aproximadamente U$1,80/hab e na configuração ideal, com uma densidade de 83
hab/ha, estes custos ficaram em torno de U$0,80/hab. Isso mostra que na cidade
mais compacta os custos com transporte e infraestrutura podem cair,
praticamente, pela metade, e que os terrenos ociosos mantidos para fins
especulativos devem ser ocupados, para se conter o espalhamento urbano.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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102
Raia Jr. (1995) estimou que os custos adicionais provocados pelo
espalhamento urbano para a cidade de Araraquara, se devidamente cobrados dos
donos de terrenos não edificados, segundo os critérios por ele adotados, trariam
ressarcimento substancial ao erário público.
Assim, a tributação de terrenos ociosos demonstra-se viável para minimizar
a distorção urbana ocasionada pelo espalhamento das cidades, conseguindo
recursos a serem aplicados nas áreas desprovidas de infra-estrutura.
O IPTU Progressivo, regulamentado pelo Estatuto da Cidade, pode gerar
recursos a serem utilizados, por exemplo, no financiamento da implementação e
melhoria da qualidade dos transportes e redes de infra-estrutura básica nas áreas
periféricas.
Segundo Silva (1993), em muitos países da Europa, as Prefeituras já
cobram uma taxa especial dos proprietários de terrenos cujo valor aumentou
devido alguma melhoria de transporte público. O dinheiro arrecadado é revertido
para o próprio setor de transporte público.
Porém, sabe-se que, no Brasil, esse tipo de procedimento não é fácil de ser
aplicado, principalmente pela forte reação contra qualquer tipo de estratégia que
possa reduzir os ganhos de grupos influentes. E, por esse motivo, pouco se vê em
termos de aplicação desse instrumento, principalmente devido às forças contrárias
exercidas pelos especuladores imobiliários urbanos.
Somente com a conscientização da população e principalmente com a
intervenção do Poder Público, por intermédio da utilização adequada dos
instrumentos apresentados no Estatuto, pode-se conseguir uma justa distribuição
dos benefícios e ônus provocados pelo espalhamento urbano.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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103
7.10 DIRETRIZ X – ADEQUAÇÃO DOS INSTRUMENTOS DE POLÍTICA
ECONÔMICA, TRIBUTÁRIA E FINANCEIRA E DOS GASTOS PÚBLICOS
AOS OBJETIVOS DO DESENVOLVIMENTO URBANO
A adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira
aos objetivos do desenvolvimento urbano, apresentada na diretriz X do Estatuto
da Cidade, pode ser remetida à área de transporte e circulação no que se refere
aos cortes de alguns impostos sobre o transporte urbano.
Alguns autores e técnicos da área de transporte defendem a idéia de
isenção fiscal para o transporte urbano como uma das soluções para o problema
sofrido pelas grandes cidades brasileiras, de correrem risco de viver um colapso
no sistema de transporte. Considerando o transporte urbano como um serviço
básico, assim como a saúde e a educação, ele deve ter políticas de isenção fiscal.
Dessa forma, a tarifa do transporte público poderá ficar até 50% mais
barata e com esse dinheiro poderão ser feitas melhorias nos veículos. Assim,
parte das pessoas que hoje andam de carro vai preferir o transporte coletivo
porque ficará mais barato, e será um serviço, provavelmente, de boa qualidade
(CARVALHO, 2002).
Porém, para conseguir cortar as tarifas pela metade, deve haver uma
mudança na tributação sobre os encargos sociais, não só na esfera municipal
como é o caso do corte do ISS - Imposto Sobre Serviço, mas também na esfera
federal como a isenção de alterações que aumentam a alíquota do COFINS –
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social.
Um outro tributo considerado uma inadequação da política econômica e
tributária em relação ao desenvolvimento urbano é a taxa de gerenciamento do
transporte coletivo, entendida como um percentual (que varia de município para
município de 1% a 5%) sobre o faturamento do transporte de passageiros urbanos
efetuado pelas empresas permissionárias que atendem a população.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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104
A taxa de gerenciamento sobre os serviços de transporte público coletivo
urbano ou metropolitano incide sobre a mesma base de cálculo do ISS,
constituindo uma bitributação, prática essa inconstitucional, em face do Artigo 145
da Constituição Federal, o qual define que a taxa não poderá ter a mesma base de
cálculo do imposto.
Assim, a taxa de gerenciamento não possui a sustentação legal necessária,
e dessa forma, deve-se buscar a desoneração desse custo sobre a tarifa,
tornando-a mais acessível à população de usuários deste serviço público
(PALMEIRA, 2004).
Um outro problema relacionado ao alto preço da tarifa do transporte coletivo
é o chamado subsídio cruzado, que é compulsório, obrigando o trabalhador a
transferir parcela do seu orçamento para grupos privilegiados de usuários, como,
por exemplo, idosos, policiais, estudantes, etc. (RAIA JR., 1995).
Cerca de 20% dos usuários de ônibus têm desconto total ou parcial nas
tarifas, mas quem paga por isso são todos os outros usuários. Em grande parte
dos casos, os que financiam têm menor renda do que aqueles que são
beneficiados, configurando uma redistribuição de renda negativa. Para corrigir
esse problema sugere-se que as gratuidades e os abatimentos somente serão
concedidos se o proponente dessas vantagens garantir a liberação dos recursos
financeiros compensatórios necessários (RAIA JR, 1995). Uma outra alternativa
seria o governo federal assumir o ônus da gratuidade e dos descontos do
transporte coletivo.
De maneira geral, há um interesse por parte de técnicos e pesquisadores
da área de transportes em encontrar formas de diminuir o valor das tarifas, para
que o transporte coletivo seja acessível a toda população. Porém, não se tem
percebido nenhuma atitude, por parte dos órgãos gestores de transporte ou das
administrações municipais, para adoção das práticas propostas por alguns
técnicos no sentido de possibilitar o uso eqüitativo do transporte urbano.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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105
Muito se fala das altas tarifas, que oneram significativamente o trabalhador
usuário do transporte coletivo. No entanto, pouco se vê em termos de ações
concretas no sentido de diminuir o impacto dos custos dos transportes no
orçamento familiar, principalmente das classes menos favorecidas.
7.11 DIRETRIZ XI – RECUPERAÇÃO DOS INVESTIMENTOS DO PODER
PÚBLICO DE QUE TENHA RESULTADO A VALORIZAÇÃO DE IMÓVEIS
URBANOS
Quanto à recuperação dos investimentos do poder público, as cidades
brasileiras podem melhorar de maneira significativa as condições de trânsito e
transportes urbanos utilizando investimentos adequados e compatíveis aos seus
recursos.
O artigo 47 do EC traz esperanças, pois prevê que “as tarifas relativas a
serviços públicos, serão diferenciadas em função do interesse social”, podendo
fazer retornar ao sistema de transporte público a parcela da população que dele
se afastou devido ao exagerado custo das tarifas constatado nos últimos anos.
Além do orçamento, existem diversas fontes externas de recursos que
podem ser usadas: órgãos financiadores, iniciativa privada e sociedade em geral.
Como exemplo, pode-se citar a taxa de transporte, que é uma taxa derivada da
Versement Transport, criada na França em 1971(RAIA JR., 2001).
A Taxa de Transporte seria paga por proprietários de estabelecimentos
industriais comerciais e de serviços, localizados ao longo de corredores de
transporte coletivo e que desfrutam de uma acessibilidade privilegiada,
proporcionada pelo transporte, garantindo acesso de clientes e funcionários.
A taxa é uma contraprestação de serviços, cobrada das pessoas jurídicas
do município e abrange o comércio, a indústria e setor de serviços, tendo por base
o número de empregados de cada empresa. Seu fundamento é que os transportes
coletivos municipais são um insumo de produção para as atividades econômicas,
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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106
assim como a água ou a eletricidade. Nada mais justo, portanto, que os
estabelecimentos sediados no município co-responsabilizem-se pelos
investimentos que o poder público municipal se vê obrigado a realizar para
promover a melhoria e ampliação desse serviço. Apesar de pouco usada no Brasil,
houve algumas iniciativas de implantação, como foi o caso de Campinas.
Uma outra forma de se obter a recuperação dos investimentos públicos, no
que diz respeito ao setor de transporte, é a Contribuição de Melhoria, já prevista
na Constituição Federal de 1988, que deve ser aplicada aos moradores residentes
em áreas servidas por melhorias realizadas e que promovem valorização dos
imóveis localizados próximos às facilidades de transportes recém implantadas.
Apesar de estar prevista na Constituição Federal de 1988, a Contribuição de
Melhoria praticamente não é utilizada no Brasil, por questões políticas.
7.12 DIRETRIZ XII – PROTEÇÃO, PRESERVAÇÃO E RECUPERAÇÃO DO
MEIO AMBIENTE NATURAL E CONSTRUÍDO, DO PATRIMÔNIO
CULTURAL, HISTÓRICO, PAISAGÍSTICO E ARQUEOLÓGICO.
O chamado meio ambiente natural, ou físico, engloba ar, água, solo,
subsolo, flora e fauna. Ao lado do meio ambiente natural, tem-se o meio ambiente
construído ou artificial, ou seja, aquele produzido pela ação do homem ao
transformar a natureza, compondo as cidades. A planejada ocupação do solo
urbano, determinando as limitações ao direito de construir, informa como e para
onde a cidade irá crescer, como fluirá o trânsito, onde estarão localizadas as áreas
verdes, etc. Um meio ambiente construído sadio contribui para o bem-estar da
população que ali vive; por outro lado, um meio ambiente artificial hostil gera o
abandono, o descaso e a agressão ao espaço público.
A crescente preocupação com as questões ambientais, objetivando a busca
do desenvolvimento sustentável, torna cada vez mais evidente a necessidade de
se buscar alternativas de proteção e preservação do meio onde se vive,
principalmente no que diz respeito aos impactos causados pelos transportes.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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107
As cidades são constituídas por espaços funcionais e áreas de circulação
que estão em contínua transformação e crescimento. A metamorfose urbana
implica, entre outros aspectos, na renovação e ocupação de novos espaços e na
conseqüente expansão de suas fronteiras (PORTO JR & MACHADO, 2003).
Assim, os investimentos em projetos de desenvolvimento da infra-estrutura e de
serviços urbanos envolvem uma ampliação da rede viária, sem garantia de um
correspondente aumento das áreas para circulação de pedestres, ciclistas e
transporte público.
Neste sentido, é de extrema importância que seja dado tratamento
urbanístico adequado às vias da rede estrutural e aos corredores de transportes,
de modo a garantir a segurança dos cidadãos e a preservação do patrimônio
histórico, ambiental, cultural, paisagístico, urbanístico e arquitetônico das cidades.
A técnica denominada Traffic Calming, citada no item I deste capítulo, pode ser
uma boa alternativa para contribuir com a preservação do patrimônio e com a
recuperação de áreas degradadas. Por meio da utilização de alguns mecanismos
da técnica Traffic calming como, por exemplo, estreitamento de vias e
conseqüente alargamento de calçadas, implantação de vias sinuosas, etc. que
têm como objetivo reduzir a velocidade dos veículos, podem, ao mesmo tempo,
contribuir com a estética e recuperação de áreas degradadas e auxiliar na
segurança de pedestres e motoristas.
A degradação de áreas urbanas centrais é um fenômeno bastante comum
em cidades que adquirem um porte grande ou mesmo médio. As áreas centrais
começam a ser substituídas por outras regiões da cidade na função de centro de
atração de investimentos e de consumo de setores mais abastados.
No entanto, nos últimos anos, pôde-se perceber uma maior preocupação
com a revitalização dos centros urbanos caracterizando-se não somente por
critérios funcionais, mas também políticos, sociais e ambientais. Esses critérios
conferem às intervenções uma nova vitalidade não só econômica, mas sobretudo
social.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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108
Entre as principais iniciativas de revitalização de áreas centrais estão: a
redefinição de usos da via pública, a melhoria do padrão de limpeza e
conservação dos logradouros e a priorização da acessibilidade por transporte
coletivo e transporte não motorizado.
No Brasil, projetos de intervenção em áreas centrais utilizando pelo menos
alguns conceitos de revitalização disseminaram-se a partir do final da década de
1970. Em São Luís-MA (cerca de 700 mil habitantes), o Projeto Reviver vem
promovendo ações de revitalização no centro e em outros setores históricos da
cidade. Dentre as atividades realizadas, destacam-se a reconstituição de calçadas
originais, praças, e iluminação pública; a restauração de edifícios públicos e
orientação de proprietários para restaurar e conservar prédios particulares; a
construção de habitações para a população encortiçada e a criação de centros
culturais em edifícios históricos. Outras experiências têm sido realizadas em
Recife-PE, Rio de Janeiro - RJ, São Paulo-SP, Belém-PA, Curitiba-PR,
Florianópolis-SC, São Sebastião-SP, Santos-SP e Poços de Caldas-MG (VAZ,
2003).
Como exemplo de empreendimentos ligados ao setor de transporte e
circulação, que interferem no meio ambiente natural e construído, pode-se citar a
implantação do Rodoanel Mário Covas que se configura como uma via perimetral
que circunda o núcleo central da Região Metropolitana de São Paulo. O Rodoanel
é um empreendimento que tem como principal objetivo a melhoria da qualidade de
vida da Grande São Paulo. Além de tornar o trânsito ágil, eliminando o tráfego de
passagem, deixará a cidade mais livre para o transporte coletivo.
A justificativa do empreendimento, segundo EIA/RIMA (2003), é que os
objetivos da obra visam melhorar a qualidade de vida da região metropolitana de
São Paulo envolvendo aspectos ambientais e socioeconômicos e ordenar o
tráfego de passagem na região, hierarquizar e estruturar o transporte de
passageiros e de cargas, proporcionando integração modal. O empreendimento
inclui adotar medidas específicas de proteção para as áreas ambientalmente
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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protegidas incluindo mananciais e parques florestais e promover o
desenvolvimento eco-sustentável na área de influência ordenando o uso e
ocupação do solo.
Além disso, há a preocupação em articular as rodovias estaduais e federais
que acessam a Região Metropolitana de São Paulo, evitando que o tráfego das
mesmas se sobreponha ao fluxo veicular urbano, aumentando os
congestionamentos e as emissões no meio urbano, proporcionando
desenvolvimento sustentado da região.
Um outro exemplo é a duplicação da Rodovia dos Imigrantes que liga a
cidade de São Paulo à Baixada Santista. A rodovia possui trechos urbanos, e no
que diz respeito ao meio ambiente natural, a sua preservação foi uma
preocupação constante durante todas as etapas da construção de sua segunda
pista. Uma das medidas de proteção ambiental foi a instalação de uma estação de
Tratamento de Água - ETA - em cada túnel, para evitar que a água que escorria
constantemente com escavação dos túneis contaminasse o meio ambiente. A
construção da pista não chegou a afetar 40 hectares da Mata Atlântica, e cada
árvore derrubada foi substituída por outras dez (VERLANGIERI, 2003).
No entanto, Oliveira (2003) coloca que não foram feitos estudos dos
impactos sobre as malhas viárias dos municípios da Baixada Santista e com o
aumento imprevisível de fluxo de veículo; questiona também a forma como será
controlado o trânsito. Além disso, com o aumento populacional, é bastante
provável que haja um conseqüente aumento de acidentes, e esses municípios têm
graves problemas de atendimento hospitalar, e não terão condições de atender a
população.
De qualquer maneira, para implantação de empreendimentos que
interferem no meio ambiente é necessária a realização de Estudos de Impacto
Ambiental e de Relatórios de Impacto ao Meio Ambiente – EIA/RIMA, para que se
garanta sua preservação.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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110
O uso indiscriminado das vias urbanas pelo fluxo não controlado de
veículos pode comprometer significativamente o patrimônio privado, além das
edificações de interesse histórico, cultural e arquitetônico. Nesse sentido, o
Estatuto da Cidade pode trazer significativa contribuição para a mitigação do
problema.
7.13 DIRETRIZ XIV – REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E URBANIZAÇÃO DE
ÁREAS OCUPADAS POR POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA
No transcorrer das ultimas décadas, as políticas governamentais de
remoção e substituição de favelas se revelaram ineficazes e onerosas sob vários
pontos de vista, sobretudo no que diz respeito ao atendimento das necessidades e
expectativas das comunidades envolvidas.
A partir do final dos anos 1970, a questão dos assentamentos informais
passa a ser tratada de modo distinto, com o surgimento de propostas de
permanência dessas populações nos seus locais de moradia, com a urbanização
das respectivas áreas. Com essa nova abordagem, o conceito de urbanização é
ampliado, uma vez que, além das melhorias promovidas nos espaços de uso
coletivo, através de implantação da infra-estrutura urbana, é prevista a construção
de postos de saúde, escolas comunitárias e creches, assim como a legalização da
posse da terra (PEREIRA JR., 2003).
Além das dificuldades cotidianas, a favela convive com problemas
relacionados aos inúmeros serviços de construção comprimidos em pequenos
espaços e pode ser considerada como um canteiro de obras permanente Um
projeto urbanístico para a favela deve procurar organizar esse canteiro, para
produzir melhor e minimizar transtornos.
Dessa forma, para a urbanização de uma favela, é necessário garantir a
existência de praças de acesso, com um conjunto múltiplo de funções que incluem
terminais de transporte tanto para passageiros quanto para mercadorias,
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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mudanças e disposição temporária de materiais de construção. O transporte
interno deve ser facilitado por um sistema viário hierarquizado, que encurte
distâncias e viabilize o acesso mecânico na maior extensão possível, como por
exemplo, o uso de vielas em rampa. As vias de penetração, as de circulação
interna e as residenciais devem prever espaço para combinar as funções de
conjunto com as funções pontuais de servir como espaços semiprivados. Assim, a
criação de alargamentos e recuos permite bases de apoio aos trabalhos de
construção, que podem também receber tratamento de paisagismo e se tornar
recantos de amenização ao longo das vias. Em um sistema viário e de transporte
interno racionalizado para a entrada de materiais e mudanças pode-se tirar o lixo e
o entulho comumente espalhados pelas favelas em depósitos históricos
(PEREIRA JR., 2003).
Deve-se prever o dimensionamento de rampas e escadas, faixa de
circulação de pedestres, veículos, etc. Pavimentar, quando possível, todas as vias
públicas e em trechos íngremes, aproveitar e criar alargamentos para implantar
pequenas praças e armazenamento provisório de materiais de construção.
O acúmulo de lixo também é um dos graves problemas da vida nas favelas.
Planejar um sistema eficiente de coleta e retirada do lixo é um fator importante
para se obter bons resultados ambientais com urbanização. A ação de planejar o
sistema de coleta e retirada do lixo das favelas está diretamente ligada ao sistema
de transporte e circulação, pois requer uma revisão dos acessos existentes para
permitir a circulação e o acesso dos veículos de coleta.
Essas ações têm como objetivo modificar o tecido urbano da favela, para
que se torne semelhante ao da cidade formal. No entanto, os espaços públicos
são quase inexistentes em uma favela, o que obriga a remoção de várias
habitações para que sejam introduzidos os tais valores da cidade formal.
Como na maioria das vezes os acessos existentes são poucos e estreitos,
torna-se bastante difícil a abertura de vias para o acesso carroçável, sem que haja
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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112
um número muito grande de relocações. Por tanto, não é possível viabilizar o
acesso carroçável a todos os domicílios, bem como a construção de verdadeiras
praças nas favelas, o que dificulta a transformação física do espaço e sua
pretendida leitura como bairro da cidade (MOREIRA, 2002).
Um outro fator correspondente às intervenções urbanas, diz respeito às
questões legais, como a regularização fundiária, a delimitação da área da favela
como Área de Especial Interesse Social, e a execução de uma legislação local,
além do reconhecimento dos logradouros existentes. Dentre essas ações, a
questão fundiária é uma das mais importantes, já que tem como objetivo transferir
o título de propriedade da terra para os seus moradores, que assim deixariam de
ocupar terreno de propriedade alheia, não se configurando como invasões e
ocupações ilegais de terra.
Diante dessa realidade, pode-se dizer que a regularização fundiária e a
urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda, como é o caso das
favelas, apresentada pela diretriz XIV do Estatuto da Cidade, estão diretamente
relacionadas ao sistema de transporte e circulação. E que juntamente com
saneamento básico, de igual importância, a infra-estrutura viária, que proporciona
acessibilidade das pessoas e circulação de bens e serviços, deve ser priorizada
para que se possa realizar a transformação das favelas em bairros urbanizados.
7.14 DIRETRIZ XV – SIMPLIFICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DE
PARCELAMENTO, USO E OCUPAÇÃO DO SOLO E DAS NORMAS
EDILÍCIAS
Se a simplificação da legislação do parcelamento, uso e ocupação do solo e
normas edilícias estiver realmente voltada para a desburocratização do sistema,
levando em consideração a proximidade de usos compatíveis, essa diretriz pode
ser encarada de forma positiva, e assim contribuir não só para o aumento da
oferta de lotes e unidades habitacionais, mas também para um planejamento do
transporte e da circulação coerentes.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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113
Incentivando-se o adensamento racional, pode-se minimizar o número de
viagens motorizadas e aumentar o uso dos modos não motorizados, considerados
sustentáveis.
A grande preocupação está no fato de que, se o adensamento se tornar
descontrolado, devido às facilidades da lei, esse instrumento poderá ter efeito
negativo, pois as altas densidades poderão sobrecarregar as redes urbanas,
dentre elas, a rede de transporte. Como exemplo, tem-se o caso das áreas
centrais, urbanizadas no início da criação das cidades. Pela falta de rigidez nas
legislações mais antigas, ou até mesmo pela ausência destas, houve uma grande
concentração de edifícios altos e, conseqüentemente, uma alta densidade
populacional nestas áreas; a infra-estrutura, sub-dimensionada, acabou, na
maioria dos casos, ficando sobrecarregada, num primeiro momento. O contrário
também se apresenta como verdadeiro ao se considerar, num segundo momento,
muitas das cidades brasileiras.
Em algumas delas, as regiões centrais, que no passado eram super
adensadas e valorizadas, passaram por processo de esvaziamento e transferência
de parte de suas atividades para bairros localizados em uma “região central
expandida”. Com isso, as regiões centrais ficaram com excesso de oferta de infra-
estrutura, subutilizada em grande parte do dia. Nesse sentido, uma ocupação
mista deve ser incentivada, por meio de uma simplificação nas leis de zoneamento
e uso e ocupação do solo para permitir uma ocupação mais adequada e racional.
Portanto, as leis, mesmo que simplificadas, devem estabelecer parâmetros
para uma ocupação racional considerando a previsão de infra-estrutura adequada.
Por outro lado, a preocupação com a simplificação da legislação em regiões
periféricas, em áreas de interesse social, deve levar em conta não só a
necessidade de oferta de mais lotes e moradias às populações mais pobres, mas
também garantir que o novo uso e ocupação do solo seja parcimônico com as
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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114
redes e equipamentos urbanos, particularmente aqueles destinados aos
transportes e circulação.
De acordo com Brasil (2001b), os parâmetros complexos e exigentes
dificultam e reduzem a possibilidade de oferta de lotes e moradia pelo mercado
formal. A simplificação da legislação deve ser buscada, de maneira a permitir –
dentro da lei – um uso intenso e racional dos recursos territoriais e dos
investimentos públicos, sem que isso ameace a salubridade e a qualidade
ambiental. Se a legislação for mais simples, certamente será mais conhecida e
praticada pelo conjunto dos cidadãos.
7.15 DIRETRIZ XVI – ISONOMIA DE CONDIÇÕES PARA OS AGENTES
PÚBLICOS E PRIVADOS NA PROMOCÃO DE EMPREENDIMENTOS E
ATIVIDADES RELATIVOS AO PROCESSO DE URBANIZAÇÃO
As regras de produção da cidade devem ser fruto de um pacto entre entes
públicos e privados, como já foi apresentado na diretriz III do Estatuto da Cidade,
a qual se refere à cooperação entre governos e iniciativa privada, e uma vez
estabelecidas estas regras devem ser respeitadas por todos.
Fazendo-se uma ligação com outra diretriz do Estatuto, a diretriz II, que
preconiza a gestão democrática, pode-se combater práticas, ultrapassadas de
intervenções estatais autoritárias, que urbanizam e implementam equipamentos
sem dialogar com a cidade e sua população. As regras de uso e ocupação do
solo, assim como os procedimentos para aprovação e licenciamento das obras,
devem ser obedecidos igualmente por todos (Brasil, 2001b).
Como já foi colocado em itens anteriores, o processo de urbanização e
implantação de equipamentos urbanos estão diretamente relacionados com a área
de transportes. Assim, quando se propõe isonomia de condições para os agentes
públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao
processo de urbanização, subentende-se que deva se levar em consideração a
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115
relação direta entre planejamento de transporte e circulação e planejamento
urbano principalmente no que diz respeito às regras de uso e ocupação do solo e
aprovação de empreendimentos em geral.
Assim fica claro, portanto, que as regras devem ser elaboradas
considerando todos os aspectos do planejamento urbano e devem ser respeitadas
tanto pelos agentes públicos como pelos agentes privados.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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116
A revisão bibliográfica realizada permitiu confirmar, que o Estatuto da
Cidade, de maneira geral, veio com o objetivo, dentre outros, de fornecer diretrizes
para subsidiar o planejamento urbano, este entendido em sua forma tradicional,
isolada. Os vários autores pesquisados quase sempre relacionaram o EC ao
controle do crescimento, à utilização de ferramentas de gestão urbana, ao Plano
Diretor, etc. A impressão clara que se teve, com raras exceções, é que as
interpretações do EC pouco explicitam a respeito dos planejamentos de
transportes e de circulação, como se não estivessem intimamente correlacionados
ao planejamento urbano, este entendido aqui, como próprio de uma visão geral,
incluindo todos os sistemas urbanos.
Os técnicos e planejadores de transporte e circulação parecem não se
sentir atingidos pela lei – EC. Ao menos foi a impressão extraída pelos poucos
trabalhos publicados nas áreas de transporte e de circulação, aos quais teve–se
acesso na realização deste trabalho.
Mais uma vez, ficam evidenciadas as visões estanques, sectárias e
individuais de planejadores urbanos, de transportes e circulação. Visão esta que
8 RECOMENDAÇÕES CONCLUSÕES
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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tem contribuído para que o país não avance com a velocidade necessária para a
resolução dos sérios problemas urbanos, tais como queda acentuada na
mobilidade e acessibilidade, altos custos de transportes e deseconomias urbanas
(congestionamentos, acidentes, poluição, etc.).
Acreditando-se na visão abrangente do planejamento urbano, ou seja, de
que as áreas de urbanismo, transportes e circulação são efetivamente
correlacionadas, pôde-se estabelecer a hipótese desse trabalho.
Recapitulando a hipótese adotada, têm-se: se o EC está sendo considerado
de grande importância para o planejamento urbano e este, sendo fortemente
correlacionado com os planejamentos de transportes e de circulação, então o EC
é igualmente importante para esses dois últimos planejamentos.
A conclusão principal a que se pôde chegar, a partir deste trabalho,
embasada nas reflexões apresentadas no capítulo 7, “Estudo das Diretrizes”, é de
que existe forte aderência entre o EC e os Planejamentos de Transportes e de
Circulação.
O Estudo das Diretrizes, longe de pretender esgotar as manifestações de
correlações entre o EC e os Planejamentos de Transporte e de Circulação,
puderam trazer uma idéia mais clara desse fato.
Todas as diretrizes do Estatuto da Cidade, algumas mais fortemente, outras
de maneira mais superficial, puderam ser diretamente relacionadas com as áreas
de transporte e de circulação, demonstrando que o planejamento urbano e o
planejamento de transporte e de circulação não podem ser pensados de maneira
dissociada.
Pôde-se avaliar que o direito a cidades sustentáveis, no que diz respeito ao
transporte, está diretamente ligado à garantia de acessibilidade e mobilidade das
pessoas e ao uso de modais de transportes mais sustentáveis.
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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118
A gestão democrática por meio da participação da população engloba a
discussão dos projetos de transporte e circulação assegurando a mobilidade das
pessoas e dos bens. E a prática de audiências públicas vem sendo adotada em
vários municípios brasileiros envolvendo discussões sobre transporte e sistema
viário.
A cooperação entre governos e iniciativa privada por meio de parcerias
pode auxiliar o sistema de transporte e circulação no sentido de facilitar a
obtenção de transporte com adequação. O apoio da iniciativa privada à área de
transportes assim como a criação de órgãos públicos ligados ao transporte, que
visam estabelecer um canal permanente de divulgação e troca de experiências
bem sucedidas, podem contribuir significativamente para a melhoria da qualidade
dos serviços de transporte e condições de acessibilidade e circulação.
Como foi apresentado anteriormente, a desproporção no espalhamento
urbano com acúmulo populacional em alguns pontos e vazios em outros, acarreta
a ociosidade da infra-estrutura de transporte. Porém, com o planejamento do
desenvolvimento das cidades e da distribuição espacial da população, proposto no
Estatuto da Cidade, poder-se-á promover o desenvolvimento de cidades mais
compactas e racionais com menores custos de transporte coletivo.
Entre outros aspectos abordados no Estatuto, a regularização fundiária e a
urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda, como é o caso das
favelas, estão diretamente relacionadas ao sistema de transporte e circulação, e
assim a infra-estrutura viária, que proporciona acessibilidade das pessoas e
circulação de bens e serviços, deve ser priorizada para que se possa realizar a
transformação das favelas em bairros urbanizados.
A efetiva implementação do Estatuto da Cidade pode contribuir para a
melhoria da oferta dos equipamentos urbanos e comunitários e conseqüentemente
com a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas a todos os serviços
públicos e privados. Porém, é importante ressaltar que muitas das soluções para
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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os problemas das cidades não dependem somente das políticas de transportes,
mas também de políticas de planejamento urbano, uma vez que o planejamento
de transporte e o planejamento urbano devem ser realizados em conjunto.
O estudo das 16 diretrizes contidas no Estatuto da Cidade e a possível
aderência das mesmas aos planejamentos de transportes e de circulação
deixaram claro que algumas dessas diretrizes (I, II, III, IV, V, IX, XII) possuem uma
correlação muito grande. Outras diretrizes (VI, VII, VIII, X, XI, XIII, XIV, XV, XVI)
mostraram ligações um pouco menos fortes com os planejamentos de transportes
e de circulação.
Há que se citar que as diretrizes I (Direito a cidades sustentáveis), IV
(Desenvolvimento das cidades de modo a evitar distorções no crescimento e
efeitos ao meio ambiente), V (Oferta de equipamentos urbanos e comunitários,
transportes) só podem ser atingidas pela gestão municipal se bem articuladas às
áreas de transporte e de circulação.
De maneira geral, pode-se concluir que o Estatuto da Cidade, assim como
todas as ações de planejamento urbano, de uma forma mais ou menos intensa,
têm implicações diretas ou indiretas com o planejamento de transporte e
circulação.
Mudanças de paradigmas deverão ocorrer para quebrar a práxis do
planejamento dos sistemas urbanos, e o Estatuto da Cidade, a partir do estudo
aqui apresentado, pode ser uma ferramenta que agregue de maneira adequada os
planejamentos dos sistemas urbanos.
Afinal, vale a pena citar uma frase de Raia Jr. (1997) que parece refletir
bem o significado da inter-relação planejamento urbano e de transportes:
“O transporte pode ser considerado como o sangue da cidade,
fazendo-se uma analogia ao corpo humano. Se falta sangue, o corpo
O ESTATUTO DA CIDADE E OS PLANEJAMENTOS DE TRANSPORTE E DE CIRCULAÇÃO
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morre; se este sangue está doente, todo o corpo está doente e,
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10 ANEXO
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LEI No 10.257, DE 10 DE JULHO DE 2001.
Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizesgerais da política urbana e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacionaldecreta e eu sanciono a seguinte Lei:
CAPÍTULO I
DIRETRIZES GERAIS
Art. 1o Na execução da política urbana, de que tratam os arts. 182 e 183 daConstituição Federal, será aplicado o previsto nesta Lei.
Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto daCidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o usoda propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar doscidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.
Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimentodas funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintesdiretrizes gerais:
I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terraurbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, aotransporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes efuturas gerações;
II – gestão democrática por meio da participação da população e deassociações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação,execução e acompanhamento de planos, programas e projetos dedesenvolvimento urbano;
III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setoresda sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;
IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacialda população e das atividades econômicas do Município e do território sob suaárea de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbanoe seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;
V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviçospúblicos adequados aos interesses e necessidades da população e àscaracterísticas locais;
VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequadosem relação à infra-estrutura urbana;
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d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionarcomo pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estruturacorrespondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilizaçãoou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais,tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sobsua área de influência;
VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e deexpansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, sociale econômica do Município e do território sob sua área de influência;
IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo deurbanização;
X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeirae dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo aprivilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos benspelos diferentes segmentos sociais;
XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultadoa valorização de imóveis urbanos;
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural econstruído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;
XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nosprocessos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitospotencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o confortoou a segurança da população;
XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas porpopulação de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais deurbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situaçãosocioeconômica da população e as normas ambientais;
XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo edas normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento daoferta dos lotes e unidades habitacionais;
XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados napromoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização,atendido o interesse social.
Art. 3o Compete à União, entre outras atribuições de interesse da políticaurbana:
I – legislar sobre normas gerais de direito urbanístico;
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II – legislar sobre normas para a cooperação entre a União, os Estados, oDistrito Federal e os Municípios em relação à política urbana, tendo em vista oequilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional;
III – promover, por iniciativa própria e em conjunto com os Estados, o DistritoFederal e os Municípios, programas de construção de moradias e a melhoria dascondições habitacionais e de saneamento básico;
IV – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,saneamento básico e transportes urbanos;
V – elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação doterritório e de desenvolvimento econômico e social.
CAPÍTULO II
DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA URBANA
Seção I
Dos instrumentos em geral
Art. 4o Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:
I – planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e dedesenvolvimento econômico e social;
II – planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas emicrorregiões;
III – planejamento municipal, em especial:
a) plano diretor;
b) disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo;
c) zoneamento ambiental;
d) plano plurianual;
e) diretrizes orçamentárias e orçamento anual;
f) gestão orçamentária participativa;
g) planos, programas e projetos setoriais;
h) planos de desenvolvimento econômico e social;
IV – institutos tributários e financeiros:
a) imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana - IPTU;
b) contribuição de melhoria;
c) incentivos e benefícios fiscais e financeiros;
V – institutos jurídicos e políticos:
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a) desapropriação;
b) servidão administrativa;
c) limitações administrativas;
d) tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano;
e) instituição de unidades de conservação;
f) instituição de zonas especiais de interesse social;
g) concessão de direito real de uso;
h) concessão de uso especial para fins de moradia;
i) parcelamento, edificação ou utilização compulsórios;
j) usucapião especial de imóvel urbano;
l) direito de superfície;
m) direito de preempção;
n) outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso;
o) transferência do direito de construir;
p) operações urbanas consorciadas;
q) regularização fundiária;
r) assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociaismenos favorecidos;
s) referendo popular e plebiscito;
VI – estudo prévio de impacto ambiental (EIA) e estudo prévio de impacto devizinhança (EIV).
§ 1o Os instrumentos mencionados neste artigo regem-se pela legislação quelhes é própria, observado o disposto nesta Lei.
§ 2o Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social,desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública com atuaçãoespecífica nessa área, a concessão de direito real de uso de imóveis públicospoderá ser contratada coletivamente.
§ 3o Os instrumentos previstos neste artigo que demandam dispêndio derecursos por parte do Poder Público municipal devem ser objeto de controle social,garantida a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedadecivil.
Seção II
Do parcelamento, edificação ou utilização compulsórios
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Art. 5o Lei municipal específica para área incluída no plano diretor poderádeterminar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solourbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as condições eos prazos para implementação da referida obrigação.
§ 1o Considera-se subutilizado o imóvel:
I – cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ouem legislação dele decorrente;
II – (VETADO)
§ 2o O proprietário será notificado pelo Poder Executivo municipal para ocumprimento da obrigação, devendo a notificação ser averbada no cartório deregistro de imóveis.
§ 3o A notificação far-se-á:
I – por funcionário do órgão competente do Poder Público municipal, aoproprietário do imóvel ou, no caso de este ser pessoa jurídica, a quem tenhapoderes de gerência geral ou administração;
II – por edital quando frustrada, por três vezes, a tentativa de notificação naforma prevista pelo inciso I.
§ 4o Os prazos a que se refere o caput não poderão ser inferiores a:
I - um ano, a partir da notificação, para que seja protocolado o projeto noórgão municipal competente;
II - dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras doempreendimento.
§ 5o Em empreendimentos de grande porte, em caráter excepcional, a leimunicipal específica a que se refere o caput poderá prever a conclusão em etapas,assegurando-se que o projeto aprovado compreenda o empreendimento como umtodo.
Art. 6o A transmissão do imóvel, por ato inter vivos ou causa mortis, posteriorà data da notificação, transfere as obrigações de parcelamento, edificação ouutilização previstas no art. 5o desta Lei, sem interrupção de quaisquer prazos.
Seção III
Do IPTU progressivo no tempo
Art. 7o Em caso de descumprimento das condições e dos prazos previstos naforma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas previstasno § 5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do imposto sobre apropriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no tempo, mediante amajoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.
§ 1o O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específicaa que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valorreferente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.
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§ 2o Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida emcinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que secumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8o.
§ 3o É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributaçãoprogressiva de que trata este artigo.
Seção IV
Da desapropriação com pagamento em títulos
Art. 8o Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que oproprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização,o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento emtítulos da dívida pública.
§ 1o Os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federale serão resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais esucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de seis porcento ao ano.
§ 2o O valor real da indenização:
I – refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montanteincorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público na área onde omesmo se localiza após a notificação de que trata o § 2o do art. 5o desta Lei;
II – não computará expectativas de ganhos, lucros cessantes e juroscompensatórios.
§ 3o Os títulos de que trata este artigo não terão poder liberatório parapagamento de tributos.
§ 4o O Município procederá ao adequado aproveitamento do imóvel no prazomáximo de cinco anos, contado a partir da sua incorporação ao patrimônio público.
§ 5o O aproveitamento do imóvel poderá ser efetivado diretamente pelo PoderPúblico ou por meio de alienação ou concessão a terceiros, observando-se,nesses casos, o devido procedimento licitatório.
§ 6o Ficam mantidas para o adquirente de imóvel nos termos do § 5o asmesmas obrigações de parcelamento, edificação ou utilização previstas no art. 5o
desta Lei.
Seção V
Da usucapião especial de imóvel urbano
Art. 9o Aquele que possuir como sua área ou edificação urbana de atéduzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e semoposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á odomínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1o O título de domínio será conferido ao homem ou à mulher, ou a ambos,independentemente do estado civil.
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§ 2o O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmopossuidor mais de uma vez.
§ 3o Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de plenodireito, a posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião daabertura da sucessão.
Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metrosquadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cincoanos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar osterrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidascoletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvelurbano ou rural.
§ 1o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo,acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
§ 2o A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz,mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro deimóveis.
§ 3o Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cadapossuidor, independentemente da dimensão do terreno que cada um ocupe, salvohipótese de acordo escrito entre os condôminos, estabelecendo frações ideaisdiferenciadas.
§ 4o O condomínio especial constituído é indivisível, não sendo passível deextinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo, dois terços doscondôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição docondomínio.
§ 5o As deliberações relativas à administração do condomínio especial serãotomadas por maioria de votos dos condôminos presentes, obrigando também osdemais, discordantes ou ausentes.
Art. 11. Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarãosobrestadas quaisquer outras ações, petitórias ou possessórias, que venham a serpropostas relativamente ao imóvel usucapiendo.
Art. 12. São partes legítimas para a propositura da ação de usucapiãoespecial urbana:
I – o possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente;
II – os possuidores, em estado de composse;
III – como substituto processual, a associação de moradores da comunidade,regularmente constituída, com personalidade jurídica, desde que explicitamenteautorizada pelos representados.
§ 1o Na ação de usucapião especial urbana é obrigatória a intervenção doMinistério Público.
§ 2o O autor terá os benefícios da justiça e da assistência judiciária gratuita,inclusive perante o cartório de registro de imóveis.
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Art. 13. A usucapião especial de imóvel urbano poderá ser invocada comomatéria de defesa, valendo a sentença que a reconhecer como título para registrono cartório de registro de imóveis.
Art. 14. Na ação judicial de usucapião especial de imóvel urbano, o ritoprocessual a ser observado é o sumário.
Seção VI
Da concessão de uso especial para fins de moradia
Art. 15. (VETADO)
Art. 16. (VETADO)
Art. 17. (VETADO)
Art. 18. (VETADO)
Art. 19. (VETADO)
Art. 20. (VETADO)
Seção VII
Do direito de superfície
Art. 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito desuperfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, medianteescritura pública registrada no cartório de registro de imóveis.
§ 1o O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou oespaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo,atendida a legislação urbanística.
§ 2o A concessão do direito de superfície poderá ser gratuita ou onerosa.
§ 3o O superficiário responderá integralmente pelos encargos e tributos queincidirem sobre a propriedade superficiária, arcando, ainda, proporcionalmente àsua parcela de ocupação efetiva, com os encargos e tributos sobre a área objetoda concessão do direito de superfície, salvo disposição em contrário do contratorespectivo.
§ 4o O direito de superfície pode ser transferido a terceiros, obedecidos ostermos do contrato respectivo.
§ 5o Por morte do superficiário, os seus direitos transmitem-se a seusherdeiros.
Art. 22. Em caso de alienação do terreno, ou do direito de superfície, osuperficiário e o proprietário, respectivamente, terão direito de preferência, emigualdade de condições à oferta de terceiros.
Art. 23. Extingue-se o direito de superfície:
I – pelo advento do termo;
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II – pelo descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelosuperficiário.
Art. 24. Extinto o direito de superfície, o proprietário recuperará o plenodomínio do terreno, bem como das acessões e benfeitorias introduzidas no imóvel,independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado ocontrário no respectivo contrato.
§ 1o Antes do termo final do contrato, extinguir-se-á o direito de superfície seo superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para a qual forconcedida.
§ 2o A extinção do direito de superfície será averbada no cartório de registrode imóveis.
Seção VIII
Do direito de preempção
Art. 25. O direito de preempção confere ao Poder Público municipalpreferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entreparticulares.
§ 1o Lei municipal, baseada no plano diretor, delimitará as áreas em queincidirá o direito de preempção e fixará prazo de vigência, não superior a cincoanos, renovável a partir de um ano após o decurso do prazo inicial de vigência.
§ 2o O direito de preempção fica assegurado durante o prazo de vigênciafixado na forma do § 1o, independentemente do número de alienações referentesao mesmo imóvel.
Art. 26. O direito de preempção será exercido sempre que o Poder Públiconecessitar de áreas para:
I – regularização fundiária;
II – execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;
III – constituição de reserva fundiária;
IV – ordenamento e direcionamento da expansão urbana;
V – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;
VI – criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;
VII – criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas deinteresse ambiental;
VIII – proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico;
IX – (VETADO)
Parágrafo único. A lei municipal prevista no § 1o do art. 25 desta Lei deveráenquadrar cada área em que incidirá o direito de preempção em uma ou mais dasfinalidades enumeradas por este artigo.
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Art. 27. O proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, paraque o Município, no prazo máximo de trinta dias, manifeste por escrito seuinteresse em comprá-lo.
§ 1o À notificação mencionada no caput será anexada proposta de compraassinada por terceiro interessado na aquisição do imóvel, da qual constarão preço,condições de pagamento e prazo de validade.
§ 2o O Município fará publicar, em órgão oficial e em pelo menos um jornallocal ou regional de grande circulação, edital de aviso da notificação recebida nostermos do caput e da intenção de aquisição do imóvel nas condições da propostaapresentada.
§ 3o Transcorrido o prazo mencionado no caput sem manifestação, fica oproprietário autorizado a realizar a alienação para terceiros, nas condições daproposta apresentada.
§ 4o Concretizada a venda a terceiro, o proprietário fica obrigado a apresentarao Município, no prazo de trinta dias, cópia do instrumento público de alienação doimóvel.
§ 5o A alienação processada em condições diversas da proposta apresentadaé nula de pleno direito.
§ 6o Ocorrida a hipótese prevista no § 5o o Município poderá adquirir o imóvelpelo valor da base de cálculo do IPTU ou pelo valor indicado na propostaapresentada, se este for inferior àquele.
Seção IX
Da outorga onerosa do direito de construir
Art. 28. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construirpoderá ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado,mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.
§ 1o Para os efeitos desta Lei, coeficiente de aproveitamento é a relação entrea área edificável e a área do terreno.
§ 2o O plano diretor poderá fixar coeficiente de aproveitamento básico únicopara toda a zona urbana ou diferenciado para áreas específicas dentro da zonaurbana.
§ 3o O plano diretor definirá os limites máximos a serem atingidos peloscoeficientes de aproveitamento, considerando a proporcionalidade entre a infra-estrutura existente e o aumento de densidade esperado em cada área.
Art. 29. O plano diretor poderá fixar áreas nas quais poderá ser permitidaalteração de uso do solo, mediante contrapartida a ser prestada pelo beneficiário.
Art. 30. Lei municipal específica estabelecerá as condições a seremobservadas para a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso,determinando:
I – a fórmula de cálculo para a cobrança;
II – os casos passíveis de isenção do pagamento da outorga;
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III – a contrapartida do beneficiário.
Art. 31. Os recursos auferidos com a adoção da outorga onerosa do direito deconstruir e de alteração de uso serão aplicados com as finalidades previstas nosincisos I a IX do art. 26 desta Lei.
Seção X
Das operações urbanas consorciadas
Art. 32. Lei municipal específica, baseada no plano diretor, poderá delimitarárea para aplicação de operações consorciadas.
§ 1o Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções emedidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dosproprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com oobjetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais,melhorias sociais e a valorização ambiental.
§ 2o Poderão ser previstas nas operações urbanas consorciadas, entre outrasmedidas:
I – a modificação de índices e características de parcelamento, uso eocupação do solo e subsolo, bem como alterações das normas edilícias,considerado o impacto ambiental delas decorrente;
II – a regularização de construções, reformas ou ampliações executadas emdesacordo com a legislação vigente.
Art. 33. Da lei específica que aprovar a operação urbana consorciadaconstará o plano de operação urbana consorciada, contendo, no mínimo:
I – definição da área a ser atingida;
II – programa básico de ocupação da área;
III – programa de atendimento econômico e social para a populaçãodiretamente afetada pela operação;
IV – finalidades da operação;
V – estudo prévio de impacto de vizinhança;
VI – contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes einvestidores privados em função da utilização dos benefícios previstos nos incisos Ie II do § 2o do art. 32 desta Lei;
VII – forma de controle da operação, obrigatoriamente compartilhado comrepresentação da sociedade civil.
§ 1o Os recursos obtidos pelo Poder Público municipal na forma do inciso VIdeste artigo serão aplicados exclusivamente na própria operação urbanaconsorciada.
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§ 2o A partir da aprovação da lei específica de que trata o caput, são nulas aslicenças e autorizações a cargo do Poder Público municipal expedidas emdesacordo com o plano de operação urbana consorciada.
Art. 34. A lei específica que aprovar a operação urbana consorciada poderáprever a emissão pelo Município de quantidade determinada de certificados depotencial adicional de construção, que serão alienados em leilão ou utilizadosdiretamente no pagamento das obras necessárias à própria operação.
§ 1o Os certificados de potencial adicional de construção serão livrementenegociados, mas conversíveis em direito de construir unicamente na área objetoda operação.
§ 2o Apresentado pedido de licença para construir, o certificado de potencialadicional será utilizado no pagamento da área de construção que supere ospadrões estabelecidos pela legislação de uso e ocupação do solo, até o limitefixado pela lei específica que aprovar a operação urbana consorciada.
Seção XI
Da transferência do direito de construir
Art. 35. Lei municipal, baseada no plano diretor, poderá autorizar oproprietário de imóvel urbano, privado ou público, a exercer em outro local, oualienar, mediante escritura pública, o direito de construir previsto no plano diretorou em legislação urbanística dele decorrente, quando o referido imóvel forconsiderado necessário para fins de:
I – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;
II – preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico,ambiental, paisagístico, social ou cultural;
III – servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreasocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.
§ 1o A mesma faculdade poderá ser concedida ao proprietário que doar aoPoder Público seu imóvel, ou parte dele, para os fins previstos nos incisos I a III docaput.
§ 2o A lei municipal referida no caput estabelecerá as condições relativas àaplicação da transferência do direito de construir.
Seção XII
Do estudo de impacto de vizinhança
Art. 36. Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados oupúblicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio deimpacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção,ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.
Art. 37. O EIV será executado de forma a contemplar os efeitos positivos enegativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida dapopulação residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo,das seguintes questões:
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I – adensamento populacional;
II – equipamentos urbanos e comunitários;
III – uso e ocupação do solo;
IV – valorização imobiliária;
V – geração de tráfego e demanda por transporte público;
VI – ventilação e iluminação;
VII – paisagem urbana e patrimônio natural e cultural.
Parágrafo único. Dar-se-á publicidade aos documentos integrantes do EIV,que ficarão disponíveis para consulta, no órgão competente do Poder Públicomunicipal, por qualquer interessado.
Art. 38. A elaboração do EIV não substitui a elaboração e a aprovação deestudo prévio de impacto ambiental (EIA), requeridas nos termos da legislaçãoambiental.
CAPÍTULO III
DO PLANO DIRETOR
Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende àsexigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor,assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidadede vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas,respeitadas as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei.
Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico dapolítica de desenvolvimento e expansão urbana.
§ 1o O plano diretor é parte integrante do processo de planejamentomunicipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamentoanual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.
§ 2o O plano diretor deverá englobar o território do Município como um todo.
§ 3o A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cadadez anos.
§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de suaimplementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação dapopulação e de associações representativas dos vários segmentos dacomunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informaçõesproduzidos.
§ 5o (VETADO)
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Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:
I – com mais de vinte mil habitantes;
II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;
III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentosprevistos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal;
IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;
V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades comsignificativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.
§ 1o No caso da realização de empreendimentos ou atividades enquadradosno inciso V do caput, os recursos técnicos e financeiros para a elaboração doplano diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas.
§ 2o No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá serelaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o planodiretor ou nele inserido.
Art. 42. O plano diretor deverá conter no mínimo:
I – a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado oparcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência deinfra-estrutura e de demanda para utilização, na forma do art. 5o desta Lei;
II – disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 e 35 desta Lei;
III – sistema de acompanhamento e controle.
CAPÍTULO IV
DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE
Art. 43. Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados,entre outros, os seguintes instrumentos:
I – órgãos colegiados de política urbana, nos níveis nacional, estadual emunicipal;
II – debates, audiências e consultas públicas;
III – conferências sobre assuntos de interesse urbano, nos níveis nacional,estadual e municipal;
IV – iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos dedesenvolvimento urbano;
V – (VETADO)
Art. 44. No âmbito municipal, a gestão orçamentária participativa de que trataa alínea f do inciso III do art. 4o desta Lei incluirá a realização de debates,audiências e consultas públicas sobre as propostas do plano plurianual, da lei dediretrizes orçamentárias e do orçamento anual, como condição obrigatória parasua aprovação pela Câmara Municipal.
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Art. 45. Os organismos gestores das regiões metropolitanas e aglomeraçõesurbanas incluirão obrigatória e significativa participação da população e deassociações representativas dos vários segmentos da comunidade, de modo agarantir o controle direto de suas atividades e o pleno exercício da cidadania.
CAPÍTULO V
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 46. O Poder Público municipal poderá facultar ao proprietário de áreaatingida pela obrigação de que trata o caput do art. 5o desta Lei, a requerimentodeste, o estabelecimento de consórcio imobiliário como forma de viabilizaçãofinanceira do aproveitamento do imóvel.
§ 1o Considera-se consórcio imobiliário a forma de viabilização de planos deurbanização ou edificação por meio da qual o proprietário transfere ao PoderPúblico municipal seu imóvel e, após a realização das obras, recebe, comopagamento, unidades imobiliárias devidamente urbanizadas ou edificadas.
§ 2o O valor das unidades imobiliárias a serem entregues ao proprietário serácorrespondente ao valor do imóvel antes da execução das obras, observado odisposto no § 2o do art. 8o desta Lei.
Art. 47. Os tributos sobre imóveis urbanos, assim como as tarifas relativas aserviços públicos urbanos, serão diferenciados em função do interesse social.
Art. 48. Nos casos de programas e projetos habitacionais de interesse social,desenvolvidos por órgãos ou entidades da Administração Pública com atuaçãoespecífica nessa área, os contratos de concessão de direito real de uso de imóveispúblicos:
I – terão, para todos os fins de direito, caráter de escritura pública, não seaplicando o disposto no inciso II do art. 134 do Código Civil;
II – constituirão título de aceitação obrigatória em garantia de contratos definanciamentos habitacionais.
Art. 49. Os Estados e Municípios terão o prazo de noventa dias, a partir daentrada em vigor desta Lei, para fixar prazos, por lei, para a expedição dediretrizes de empreendimentos urbanísticos, aprovação de projetos deparcelamento e de edificação, realização de vistorias e expedição de termo deverificação e conclusão de obras.
Parágrafo único. Não sendo cumprida a determinação do caput, ficaestabelecido o prazo de sessenta dias para a realização de cada um dos referidosatos administrativos, que valerá até que os Estados e Municípios disponham em leide forma diversa.
Art. 50. Os Municípios que estejam enquadrados na obrigação prevista nosincisos I e II do art. 41 desta Lei que não tenham plano diretor aprovado na data deentrada em vigor desta Lei, deverão aprová-lo no prazo de cinco anos.
Art. 51. Para os efeitos desta Lei, aplicam-se ao Distrito Federal e aoGovernador do Distrito Federal as disposições relativas, respectivamente, aMunicípio e a Prefeito.
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Art. 52. Sem prejuízo da punição de outros agentes públicos envolvidos e daaplicação de outras sanções cabíveis, o Prefeito incorre em improbidadeadministrativa, nos termos da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992, quando:
I – (VETADO)
II – deixar de proceder, no prazo de cinco anos, o adequado aproveitamentodo imóvel incorporado ao patrimônio público, conforme o disposto no § 4o do art. 8o
desta Lei;
III – utilizar áreas obtidas por meio do direito de preempção em desacordocom o disposto no art. 26 desta Lei;
IV – aplicar os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito deconstruir e de alteração de uso em desacordo com o previsto no art. 31 desta Lei;
V – aplicar os recursos auferidos com operações consorciadas em desacordocom o previsto no § 1o do art. 33 desta Lei;
VI – impedir ou deixar de garantir os requisitos contidos nos incisos I a III do §4o do art. 40 desta Lei;
VII – deixar de tomar as providências necessárias para garantir a observânciado disposto no § 3o do art. 40 e no art. 50 desta Lei;
VIII – adquirir imóvel objeto de direito de preempção, nos termos dos arts. 25a 27 desta Lei, pelo valor da proposta apresentada, se este for, comprovadamente,superior ao de mercado.
Art. 53. O art. 1o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, passa a vigoraracrescido de novo inciso III, renumerando o atual inciso III e os subseqüentes:.(Vide Medida Provisória nº 2.180-35, de 24.8.2001)
"Art. 1o .......................................................
.......................................................
III – à ordem urbanística;
......................................................." (NR)
Art. 54. O art. 4o da Lei no 7.347, de 1985, passa a vigorar com a seguinteredação:
"Art. 4o Poderá ser ajuizada ação cautelar para osfins desta Lei, objetivando, inclusive, evitar o danoao meio ambiente, ao consumidor, à ordemurbanística ou aos bens e direitos de valorartístico, estético, histórico, turístico e paisagístico(VETADO)." (NR)
Art. 55. O art. 167, inciso I, item 28, da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de1973, alterado pela Lei no 6.216, de 30 de junho de 1975, passa a vigorar com aseguinte redação:
"Art. 167. .......................................................
I - .......................................................
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.......................................................
28) das sentenças declaratórias de usucapião,independente da regularidade do parcelamento dosolo ou da edificação;
......................................................." (NR)
Art. 56. O art. 167, inciso I, da Lei no 6.015, de 1973, passa a vigoraracrescido dos seguintes itens 37, 38 e 39:
"Art. 167. .......................................................
I – .......................................................
37) dos termos administrativos ou das sentençasdeclaratórias da concessão de uso especial parafins de moradia, independente da regularidade doparcelamento do solo ou da edificação;
38) (VETADO)
39) da constituição do direito de superfície deimóvel urbano;" (NR)
Art. 57. O art. 167, inciso II, da Lei no 6.015, de 1973, passa a vigoraracrescido dos seguintes itens 18, 19 e 20:
"Art. 167. .......................................................
II – .......................................................
18) da notificação para parcelamento, edificaçãoou utilização compulsórios de imóvel urbano;
19) da extinção da concessão de uso especialpara fins de moradia;
20) da extinção do direito de superfície do imóvelurbano." (NR)
Art. 58. Esta Lei entra em vigor após decorridos noventa dias de suapublicação.
Brasília, 10 de julho de 2001; 180o da Independência e 113o da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSOPaulo de Tarso Ramos RibeiroGeraldo Magela da Cruz QuintãoPedro MalanBenjamin Benzaquen SicsúMartus TavaresJosé Sarney FilhoAlberto Mendes Cardoso