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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO DENIS FOSTER GONDIM DOJÔ: espaço de educação Recife 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

DENIS FOSTER GONDIM

DOJÔ: espaço de educação

Recife

2017

DENIS FOSTER GONDIM

DOJÔ: espaço de educação

Dissertação apresentada ao Núcleo de Teoria e História do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito para a obtenção do título de mestre em Educação.

Orientador: Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes

Coorientador: Prof. Dr. Henrique Gerson Kohl

Recife

2017

Catalogação na fonte

Bibliotecária Kátia Tavares, CRB-4/1431

G637d Gondim, Denis Foster.

Dojô: espaço de educação / Denis Foster Gondim. – Recife, 2017.

180 f. : il. ; 30 cm.

Orientador: Vilde Gomes de Menezes.

Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de

Pernambuco, CE. Programa de Pós-graduação em Educação, 2017.

Inclui Referências.

1. Educação não-formal. 2. Dojô. 3. Judô. 4. UFPE - Pós-graduação.

I. Menezes, Vilde Gomes de. II. Título.

370.11 CDD (23. ed.) UFPE (CE2017-65)

DENIS FOSTER GONDIM

DOJÔ: espaço de educação

Dissertação apresentada ao Núcleo de Teoria e História do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito para a obtenção do título de mestre em Educação.

Aprovada em: 26/05/2017.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes (Orientador)

Universidade Federal de Pernambuco

___________________________________________________________________

Prof. Dr. Edilson Fernandes de Souza (Examinador Interno) Universidade Federal de Pernambuco

___________________________________________________________________

Prof. Dr. Henrique Gerson Kohl (Examinador Externo) Universidade Federal de Pernambuco

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Marcos André Nunes Costa (Examinador Externo)

Universidade Federal Rural de Pernambuco

Dedico esta obra (in memorian) ao meu tio, George William Foster, que,

dentre vários lições, nos ensinou que a sabedoria vem através das experiências de

vida. E mesmo sem ser um judoca de fato (era na essência!), com ele aprendi o real

significado do princípio judoístico Jita Kyoei (Prosperidade e Benefícios Mútuos).

AGRADECIMENTOS

Todos sabem que uma pesquisa nunca é realizada por uma só mão. Sou

muito grato a todos que, direta ou indiretamente, passaram por minha vida

positivamente, de forma a contribuir para a realização desta importante etapa em

minha vida. Peço-lhes sinceras desculpas se por ventura não mencionar alguns dos

tantos nomes que gostaria de expor neste momento.

Primeiramente, agradeço a Deus, enquanto fonte de energia positiva que me

permite ter saúde física e mental para batalhar todos os dias rumo as minhas

escolhas de vida.

Agradeço imensamente à minha família (Foster’s e Gondim’s),

especialmente à minha esposa (Tathiana) por ter tido sabedoria e paciência em

momentos difíceis de isolamento produtivo. Aos meus pais (Dorimar e Doris) e

irmãos (Daniela e Danilo) que são alicerces fundamentais de minha personalidade.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes, pela confiança

depositada na parceria e pela autonomia produtiva delegada. Ao Dr. e coorientador,

Henrique Gerson Kohl, pelas pontuais orientações e as parcerias firmadas junto ao

estudo das lutas, artes marciais, esportes de combate e a capoeira.

A todos os meus amigos do universo judoístico (Não me arriscarei

mencioná-los, uma vez que são muitos) e também de outras práticas marciais e/ou

de combate.

Aos meus senseis, que compuseram meu DNA no judô (em ordem

cronológica: senseis Claudemir Bezerra, Diógenes Moraes, Carlson Moraes e Marco

Aurélio Lauriano). Agradeço-os imensamente pela minha inserção e imersão no

campo teórico e prático do caminho suave.

A todos os notórios mestres entrevistados nesta pesquisa (Byung Kuk Lee;

Diógenes Moraes; Hayashi Kawamura, Marco Aurélio Lauriano e Tadao Nagai).

Incluo minhas homenagens póstumas aos senseis William Arruda (também um dos

pioneiros do judô na cidade de Recife) e ao sensei Márcio Eustáquio (por todo seu

legado e luta por um judô mais acadêmico).

Especial agradecimento ao amigo e sensei Haroldo Bezerra, pelo apoio

técnico junto às transcrições das entrevistas.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

pelo apoio financeiro institucional enquanto bolsista.

Aos amigos de formação na ESEF-UPE, assim como, a todos os mestres e

doutores do DEF-UFPE e do PPGE-UFPE (em especial ao Prof. Pós-doutor Edilson

Souza e ao Prof. Dr. José Luís Simões) que sempre reconheceram meu incansável

engajamento frente à concretização desta pesquisa,

A todos os membros de minha banca (Dr. Vilde Gomes de Menezes, Dr.

Henrique Gerson Kohl, Dr. Marcos André Nunes, e os suplentes, Dr. Leandro Mazzei

e o Dr. José Luís Simões), que ofertaram ampliação dos horizontes da pesquisa a

partir de todas as considerações e críticas lançadas à melhoria da mesma (tanto na

qualificação quanto na defesa).

Ao amigo e Prof. Dr. Luciano Leonídio, pela contribuição à gênese deste

trabalho, em meados de 2005.

Aos amigos da ACCEL, por toda paciência e apoio ao longo desta jornada

acadêmica, como também, a todos os meus alunos que, igualmente, sempre tiveram

muita paciência e sabedoria para entender todo o sacrifício envolvido durante meu

período de estudos.

Ao Colégio Eminente e a todos (as) os meus judocas que me ensinaram a

ser uma pessoa melhor.

Aos meus amigos e revisores técnicos, Gilson Reis e Sandra Santiago, por

todo apoio e profissionalismo.

Aos amigos do Laboratório de Gestão do Esporte e Políticas Públicas

(LABGESPP-UFPE) e do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Lutas, Artes

Marciais, Esportes de Combate e Capoeira (NEPEX – L/AM/MEC/Cap. - UFPE).

A todos os professores/pesquisadores envolvidos em produzir ciência na

área das Lutas, Artes Marciais e Esportes de Combate e que me influenciaram na

paixão por esta nobre área de investigação científica. Um especial agradecimento ao

Emerson Franchini, Fabrício Del Vecchio, Bianca Miarka, Maurí de Carvalho, Saray

Giovana, Victor Coswig, Gustavo Oliveira, Leandro Paiva, Rafael Mocarzel, Felipe

Marta e tantos outros importantes pesquisadores.

Por fim, agradeço ao Shihan1 Jigoro Kano por ter idealizado tão nobre arte

encantadora e completo método educacional.

                                                            1 Shihan “é um termo em japonês que pode ser traduzido para o português como MESTRE”

(SOARES, 2007, p. 201).

Educação Não há nada maior no mundo. A educação moral de uma pessoa se estende a dez mil pessoas. A educação de uma geração se expande por uma centena de gerações. Educação Não há nada mais agradável no mundo. Cultivando o talento e melhorando o mundo, Essa fragrância perfuma para sempre após a morte (KANO, 2008a, p. 121).

RESUMO

O presente estudo foi desenvolvido no âmbito da história da educação com o

propósito de analisar os dojôs (espaços específicos ao ensino do Judô) do Recife-

PE, através de uma perspectiva sócio-histórica e educacional, situada no recorte

temporal entre 1952 e 1972, por meio do olhar de alguns antigos senseis

(professores de Judô), principais protagonistas da pesquisa. Trabalhamos com a

hipótese de que estes dojôs possibilitaram educação de seus praticantes, em

ambientes não formais de ensino, cumprindo importante função como ferramenta

educativa. Quanto ao problema de pesquisa, intencionamos compreender como, a

partir das experiências vividas por alguns de seus antigos senseis, uma teia de

interdependência foi estabelecida e articulada nos mais diversos contextos (social,

educacional, histórico e econômico), proporcionando uma configuração social

específica (judoística) que culminou com o desenvolvimento do Judô na cidade. O

objetivo foi investigar a história do Judô recifense, visando compreender as relações

e reconstruções entre o ensino do Judô no ambiente do dojô e sua dimensão

educacional. Os objetivos específicos foram: a) identificar a gênese do Judô em

Recife no marco temporal entre os anos de 1952-1972; b) desvelar o processo

educativo proporcionado pela prática do judô no dojô, como ambiente não formal de

ensino; c) registrar as características específicas relacionadas à cultura judoística,

facilitando a compreensão de pontos como a disciplina, a hierarquia, o

tradicionalismo e o processo de esportivização do Judô; d) investigar a relação entre

prática marcial (do Judô) e a violência, do ponto de vista do processo civilizatório; e)

registrar o legado de alguns antigos senseis e pontuar as heranças significativas de

suas memórias à comunidade judoística do Recife. Adotamos o viés metodológico

da história oral associada à técnica de análise de conteúdo com suporte do software

NVivo® (versão 11 Pro for Windows®). À guisa de conclusão, tem-se uma dissertação

com relevância educacional, evidenciando que a história do Judô do Recife ocorreu

de forma processual, à luz da teoria eliasiana do processo civilizatório, contudo,

ressalta-se que existiram pontos positivos e negativos em seu percurso, pelo qual o

Judô seguiu seu fluxo natural enquanto ferramenta educacional, reconhecendo-se,

em seus espaços efetivos de ensino (dojôs), o seu caráter genuíno, do ponto de

vista da sua legitimidade facilitadora da educação não formal.

Palavras-chave: Dojô. Judô. Educação Não Formal. Recife. Cultura. Processo

Civilizatório.

ABSTRACT

The present study was developed within the history of education with the

purpose of analyzing the dojôs (spaces specific to the teaching of Judo) of Recife-

PE, through a socio-historical and educational perspective, situated in the temporal

cut between 1952 and 1972, through the eyes of some old senseis (teachers of

Judo), main protagonists of the research. We work with the hypothesis that these

dojôs enabled the education of their practitioners in non-formal teaching

environments, fulfilling an important function as an educational tool. As for the

research problem, we intend to understand how, from the experiences lived by some

of its old senseis, a web of interdependence was established and articulated in the

most diverse contexts (social, educational, historical and economic), providing a

specific social configuration (about Judo) that culminated in the development of Judo

in the city. The objective was to investigate the history of Judo in Recife, aiming to

understand the relationships and reconstructions between the teaching of Judo in the

environment of the dojô and its educational dimension. The specific objectives were:

a) to identify the genesis of Judo in Recife in the time frame between the years 1952-

1972; b) to unveil the educational process provided by judo practice in dojo, as a

non-formal teaching environment; c) to register the specific characteristics related to

the judo culture, facilitating the understanding of points such as discipline, hierarchy,

traditionalism and the process of sportifying Judo; d) investigate the relationship

between martial practice (Judo) and violence, from the point of view of the civilizing

process; e) to register the legacy of some old senseis and to punctuate the significant

legacies of their memories to the Judo community of Recife. We adopted the

methodological bias of oral history associated with the content analysis technique

supported by NVivo® software (version 11 Pro for Windows®). As a conclusion,

there is a dissertation with educational relevance, evidencing that the history of Judo

Recife had occurred in a procedural way, in the light of the Eliasian theory of the

civilizing process, however, it is emphasized that there were positive and negative

points in its course, whereby Judo followed its natural flow as an educational tool,

recognizing, in its effective teaching spaces (dojôs), its genuine character, from the

point of view of its legitimacy as facilitator of non-formal education.

Keywords: Dojô. Judo. Non-formal Education. Recife. Culture. Civilization Process.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Teses e Dissertações encontradas ………………………… 38

Quadro 2 – Entrevistas realizadas ........................................................ 59

Figura 1 – Interligação entre categorias e fontes (Processo de

codificação via software NVivo®) .......................................

76

Figura 2 – Macro percurso metodológico da pesquisa ....................... 78

Figura 3 – Influências Orientais e Ocidentais da origem do Judô..... 86

Figura 4 – Princípios filosóficos/educativos do Judô e as influências

orientais e ocidentais .........................................................

88

Figura 5 – Modelo sistêmico de pensamento de Jigoro Kano ao

formular o método educativo denominado judô .................

91

Figura 6 – Categorias e subcategorias de Análise ............................. 101

Fotografia 1 – Sensei Byung Kuk Lee ...................................................... 102

Fotografia 2 – Sensei Lee de Judogui ...................................................... 104

Fotografia 3 – Sensei Diógenes Cavalcanti de Moraes ........................... 104

Fotografia 4 – Diógenes e família ............................................................. 107

Fotografia 5 – Sensei Hayashi Kawamura ................................................ 107

Fotografia 6 – Prof. Kawamura (ao centro) e seus alunos no Clube

Astrea em João Pessoa-PB em 1964 ................................

111

Fotografia 7 – Sensei Marco Aurélio Lauriano de Oliveira ........................ 111

Fotografia 8 – Sensei Tadao Nagai .......................................................... 114

Fotografia 9 – Família Nagai ..................................................................... 117

Figura 7 – Categoria 1: Gênese do Judô no Recife-PE ...................... 120

Figura 8 – Influências e principais referências dos senseis

entrevistados ......................................................................

121

Figura 9 – Cronologia do Judô recifense a partir dos protagonistas

entrevistados ......................................................................

122

Figura 10 – Professor William Arruda ................................................... 124

Figura 11 – Registro documental de trabalho do Prof. William Arruda

com o judô (1949-1964) .....................................................

124

Figura 12 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Lições educativas do

judô) ...................................................................................

125

Figura 13 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Princípios filosóficos e

suas aplicabilidades práticas) ............................................

127

Figura 14 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Complementação à

formação educacional) .......................................................

128

Figura 15 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Judô nas Escolas) ...... 129

Figura 16 – Categoria 3: Cultura Judoística (Disciplina e Hierarquia).. 131

Figura 17 – Categoria 3: Cultura Judoística (Esportivização do Judô).. 133

Figura 18 – Categoria 3: Cultura Judoística (Tradicionalismo no Judô) 135

Figura 19 – Categoria 4: Sociedade e Violência (aspectos

civilizatórios do Judô) .........................................................

137

Figura 20 – Categoria 5: Expectativas para futuro do Judô

(Mensagem dos mestres à comunidade judoística) ..........

142

Figura 21 – Categoria 5: Expectativas para futuro do Judô

(Expectativas dos senseis para o futuro) ...........................

143

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABHO Associação Brasileira de História Oral

ABNT Associação Brasileira de Normas e Técnicas

A.M. Artes Marciais

ACJR Associação Cultural Japonesa do Recife

ASCES Associação Caruaruense de Ensino Superior

Cap. Capoeira

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior

CAV Centro Acadêmico de Vitória

CBJ Confederação Brasileira de Judô

CBK Confederação Brasileira de Karatê

CD Compact Disc

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico

CONFEF Conselho Federal de Educação Física

DEF Departamento de Educação Física

EEFE Escola de Educação Física e Esporte

ENAMEC Encontro Nacional de Artes Marciais e Esportes de Combate

ESEF Escola Superior de Educação Física

ETC Escola Técnica de Contabilidade

EUA Estados Unidos da América

FASNE Faculdade Salesiana do Nordeste

FESP Fundação de Ensino Superior de Pernambuco

FPJU Federação Pernambucana de Judô

FPK Federação Pernambucana de Karatê

FPK Federação Pernambucana de Karatê e Goshin Jutsu

Kawamura

HD Hard Disc

IAS Instituto Ayrton Senna

IBC Instituto Brasileiro do Café

IES Instituição de Ensino Superior

IFPE Instituto Federal de Pernambuco

JKMISI Jigoro Kano Memorial International Sports Institute

L. Lutas

LABGESPP Laboratório de Gestão do Esporte e Políticas Públicas

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

LIPEJU Liga Pernambucana de Judô

LNJ Liga Nacional de Judô

MEC Ministério da Educação e Cultura

MEC Modalidade Esportiva de Combate

NEPEX Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão

PA Pará

PE Pernambuco

PB Paraíba

PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação

PSA Projeto Santo Amaro

PT Partido dos Trabalhadores

PUC Pontifícia Universidade Católica

QDAS Qualitative Data Analysis Software

SP São Paulo

TCC Trabalho de Conclusão de Curso

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UFG Universidade de Goiás

UFPE Universidade Federal de Pernambuco

UFPR Universidade Federal do Paraná

UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e

a Cultura.

UNESP Universidade Estadual Paulista

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

UNIVERSO Universidade Salgado de Oliveira

UPE Universidade de Pernambuco

USP Universidade de São Paulo

WAR William Arruda (Academia de Judô)

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................... 18

1.1 Motivações que Originaram a Pesquisa ..................................................... 18

1.2 Contextualizando o Judô ............................................................................ 22

1.3 Por que Pesquisar a Gênese do Judô no Recife-PE? ............................... 27

1.4 Justificando o Recorte Temporal ................................................................ 28

1.5 Problema, Objetivos e Hipótese ................................................................. 30

2 FUNDAMENTOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .................. 32

2.1 Tipo de Pesquisa, Abordagem e a Opção pela Metodologia de História

Oral .............................................................................................................

32

2.2 Metodologia de História Oral e sua Aplicação no Universo das Lutas: um

Estado da Arte ............................................................................................

37

2.3 Definindo os Mestres a serem Entrevistados, o Processo de Técnica e

Coleta de Dados .........................................................................................

46

2.4 Técnica de Análise de Conteúdo com Complementação por Pesquisa

Documental ................................................................................................

59

2.5 Sistemas Informatizados em Tratamento de Dados Qualitativos: opção

pela Utilização do NVIVO®..........................................................................

70

3 EDUCAÇÃO E JUDÔ: análise e Compreensões Acerca desta Relação ......................................................................................................

79

3.1 Educação: uma Visão Macro ………………………………………………… 80

3.2 Judô Contextualizado na Contemporaneidade .......................................... 81

3.3 Do Japão Feudal dos Samurais ao Japão da Era Meiji e do Judô de

Jigoro Kano ................................................................................................

82

3.4 A Visão Ampliada de Kano e suas Bases Educacionais e Filosóficas ..... 85

3.5 Pontos Relevantes quanto à Proposta Educacional de Kano .................... 91

3.6 Compreendendo o Processo Civilizatório nas Artes Marciais/Judô ........... 92

3.7 Judô enquanto Modelo de Ensino não Formal ........................................... 97

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ................................................... 101

4.1 Quem são os nossos Mestres Selecionados para a Pesquisa? Uma

Breve Apresentação ...................................................................................

102

4.1.1 Sensei Byung Kuk Lee ............................................................................. 102

4.1.2 Sensei Diógenes Cavalcanti de Moraes ................................................. 104

4.1.3 Sensei Hayashi Kawamura ...................................................................... 107

4.1.4 Sensei Marco Aurélio Lauriano de Oliveira ........................................... 111

4.1.5 Sensei Tadao Nagai .................................................................................. 114

4.2 Gênese do Judô no Recife ......................................................................... 117

4.3 Educação pelo Judô …………………………………………………………… 125

4.4 Cultura Judoística ....................................................................................... 131

4.5 Sociedade e Violência (Aspectos Civilizatórios do Judô) ........................... 136

4.6 Expectativas para o Futuro do Judô ........................................................... 142

5 RELAÇÕES E (RE)CONSTRUÇÕES DO JUDÔ RECIFENSE: o que Aprendemos com o Ontem e que poderemos Revolucionar no Cenário Judoístico do Amanhã? ............................................................

145

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ………………………………………………...... 148

REFERÊNCIAS .......................................................................................... 155

APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista ………………………….................... 165

APÊNDICE B – Termo de Consentimento e Livre Esclarecimento (TCLE)

.....................................................................................................................

167

APÊNDICE C – TCLE do professor Byung Kuk Lee .................................. 169

APÊNDICE D – TCLE do professor Diógenes Cavalcanti de Moraes ....... 170

APÊNDICE E – TCLE do professor Hayashi Kawamura ........................... 171

APÊNDICE F – TCLE do professor Marco Aurélio Lauriano de Oliveira ... 172

APÊNDICE G – TCLE do professor Tadao Nagai ..................................... 173

APÊNDICE H – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens ..... 174

APÊNDICE I – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do

professor Byung Kuk Lee ...........................................................................

175

APÊNDICE J – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do

professor Diógenes Cavalcanti de Moraes ................................................

176

APÊNDICE K – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do

professor Hayashi Kawamura ....................................................................

177

APÊNDICE L – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do

professor Marco Aurélio Lauriano de Oliveira ............................................

178

APÊNDICE M – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do

professor Tadao Nagai ...............................................................................

179

18

1 INTRODUÇÃO

Como forma de introduzir o leitor, buscaremos, a seguir, esclarecer nossas

motivações pessoais com a pesquisa, como também, contextualizar um pouco da

identidade da mesma diante do cenário em que se pretendeu investigar à luz da

ciência e de forma à facilitar a plena compreensão da obra, situando assim os

interessados, através de informações pertinentes e relevantes ao entendimento

central da pesquisa.

1.1 Motivações que Originaram a Pesquisa

A presente pesquisa parte de minha motivação no sentido da busca

incessante por histórias que explicassem os fatos que envolviam a gênese do judô

em Recife-PE. Praticante na modalidade desde muito cedo2e tendo uma formação

judoística3 oriunda de importantes senseis4, sempre tive alta criticidade relacionada

às questões históricas que me foram repassadas e que se ampliou ainda mais

quando, no ano de 2002, entrei na Escola Superior de Educação Física (ESEF) da

Universidade de Pernambuco (UPE) para cursar licenciatura plena, ampliando meus

conceitos sobre o judô, do ponto de vista da ciência e analisando-o à luz do viés

acadêmico. Dentro deste cenário, conheci o professor mestre Marco Aurélio

Lauriano5, a quem devo boa parte de minha inspiração para rumar em direção a esta

dissertação de mestrado.

                                                            2 Iniciei no judô através do professor (sensei) Claudemir Bezerra, aos quatro anos de idade (em 1986)

na Escola Peralta, localizada na Estrada do Arraial no bairro de Casa Amarela, pertencente à zona norte do Recife.

3 Termo comumente utilizado no Brasil para referir-se ao universo do judô, inclusive já existem produções científicas nacionais que utilizaram o verbete em seus títulos. Contudo, a palavra deriva de origem da língua italiana e que significa relacionado a algo “do Judô”. Pode ser verificado através do dicionário online italiano que consta link para o site: https://www.infopedia.pt/dicionarios/italiano-portugues/judoistico.

4 Sensei: palavra que em japonês é traduzida como mestre ou professor (SOARES, 2007, p. 197). Em minha trajetória no judô, tive três senseis: como primeiro Professor (sensei) tive o Prof. Claudemir Bezerra e, ao longo de minha vida no judô, ainda tive importantes professores, tais como o Prof. Diógenes Moraes e seu filho Carlson Moraes, posteriormente recebi orientações do sensei Marco Aurélio, enquanto estudava na ESEF-UPE. Aos 17 anos de idade, já lecionava no Colégio Eminente (localizado no bairro do Parnamirim, na zona norte do Recife) onde, atualmente, ainda me encontro trabalhando.

5 O professor Marco Aurélio também foi meu orientador na graduação, onde realizei um trabalho de conclusão de curso (TCC) reconhecidamente significativo para a área do Judô Infantil. Na ocasião, a temática da monografia foi: “Aspectos metodológicos aplicados ao ensino do judô para crianças”, defendido em 2006.

19

Para que possamos compreender esta pesquisa dentro do viés educacional,

é necessário frisarmos que o judô apresenta-se como importante veículo de

transformação social através de suas particularidades educativas, as quais

trataremos mais adiante. Devido esta possibilidade transformadora, enquanto

esporte educacional6, nos motivamos a pesquisar a importância que estes antigos

mestres possuem enquanto agentes ativos de educação frente à sociedade na

formação de seus cidadãos(ãs).

Quando tratamos de pesquisas que objetivam a identificação de marcos

históricos, a linha que divide o imaginário do real é sempre tênue e complexa.

Baseados nesta problemática, podemos perceber que o conhecimento acerca da

introdução do Judô no Brasil ainda sofre alterações constantes, oriundas de novas

descobertas. Por exemplo, em sua maioria, existem linhas que pontuam a chegada

do Judô no Brasil pela região norte, através do Mitsuyo Maeda7, aluno direto do

Jigoro Kano - criador do Judô (VIRGÍLIO, 2002a), contudo,também existem

correntes que fortalecem a ideia da chegada inicial através da imigração japonesa

na região Sudeste-São Paulo, conforme podemos conferir em Nunes (2011).

No âmbito da cidade do Recife-PE, este marco histórico dos protagonistas é

confuso e baseia-se nos relatos de antigos professores que foram passando aos

seus alunos uma “provável” história, porém bastante recortada, da origem do judô na

cidade. Logicamente, alguns destes relatos correm risco de serem tendenciosos

e/ou carregados de interesses pessoais, e que algumas vezes são apenas relatos

parciais de uma história macro.

Quando tratamos de memória, pensamos em algo que é ativado

voluntariamente a partir da intencionalidade de cada indivíduo. A memória, quando

intencionalmente resgatada através de técnica de entrevista, é passiva de falhas no

que concerne à realidade concreta e não manipulada daquilo que se quer extrair do

entrevistado. Sobre este teor de veracidade podemos entender que a memória é um

retorno transferido e transitório, pelo qual o pesquisador sanará as nuances de

                                                            6 Em nossa pesquisa, adotamos a concepção de esporte educacional enquanto aquele que têm um

propósito bem definido quanto ao direcionamento voltado ao fim educativo e a utilização do esporte como ferramenta para tal. Exclui-se então, por exemplo, esportes com objetivos principais voltados ao alto rendimento competitivo ou até mesmo com objetivos voltados ao fitness (finalidades estéticas). 

7 Mitsuyo Maeda ou Conde Koma, como também é conhecido, foi enviado por Jigoro Kano para divulgar o Judô na América do Sul. É citado por vários autores como por exemplo: Virgílio (2002a,b) e Gracie (2008) dentre vários outros como o pai do Jiu-Jitsu brasileiro devido ao seu encontro junto a lendária Família Gracie no Norte do Brasil (Belém-PA).

20

distanciamento entre as narrativas a partir de técnicas apropriadas durante a fase de

tratamento dos dados coletados. Frente a este cenário, faz-se necessário um

registro sistemático e criterioso destes relatos históricos por parte dos antigos

mestres para que possamos elucidar como se constituiu a história do Judô no Recife

e, mais importante ainda, entender a relação destes mestres em seus atos de

docência e a significativa relevância desta formação através do judô (prática não

formal de ensino), realizando interface interdependente com o processo educacional

formal (escolar), e buscando construir uma compreensão de como o judô poderia ser

reconhecido enquanto significativa ferramenta de finalidades educativas daqueles

que o praticam.

A presente pesquisa deu seus primeiros passos em meados de 2008,

quando eu e o então estudante Luciano Flávio Leonídio (atualmente, doutor em

Educação pela UFPE), devidamente orientados pelo professor mestre Marco Aurélio

Lauriano, iniciamos a coleta de dados por intermédio de algumas entrevistas com

protagonistas ícones do judô pernambucano - alguns já falecidos, como é o caso do

saudoso sensei Jurandir Moura8– e, ainda hoje mantemos estes documentos não

tratados em arquivo pessoal (todos salvos em mídia de Compact Disc-CD e Hard

Disc-HD externo), com intenção de, no presente momento, utilizá-los em uma

pesquisa científica de cunho histórico, que sempre foi nosso maior alvo de

inquietação.Contudo, ao longo desta pesquisa, percebemos que o material coletado

no passado não responderia ao objeto desta presente pesquisa9, sendo assim, ao

detectarmos esta incompatibilidade, partimos para a realização de uma coleta mais

condizente com o que pretendíamos investigar na atualidade. Detalharemos este

novo caminho da pesquisa na seção dois que versa sobre a metodologia da

pesquisa.

Outro agente motivador para esta pesquisa foi a conclusão recente da tese

de doutorado em Educação de autoria de Cavalcante (2014), porém ainda não

publicada). Nossa intenção é buscar a ampliação desta discussão fornecida por esta

                                                            8 Importante referência do Jiu-jitsu pernambucano e de expressão nacional (Faixa coral – 8º grau).

Também se consolidou na divulgação da antiga luta-livre na cidade do Recife-PE. Faleceu em 28/01/2010.

9 Apenas durante o processo de transcrições das antigas entrevistas que fora realizado durante o processo de realização desta dissertação é que pudemos perceber que as respostas proferidas pelos mestres naquele período de tempo e ocasião, não mais, responderiam satisfatoriamente ao objeto de pesquisa deste presente estudo. Muitas das perguntas e respostas remetiam aos fatos históricos relacionados aos componentes técnicos e competitivos do judô, o que não é alvo de nossa investigação.

21

tese, porém através de um novo viés de pesquisa. Percebemos claramente que,

recentemente, as lutas tem sido alvo de interesse de pesquisas dentro do programa

de Pós-Graduação do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco

(UFPE), tanto em níveis de mestrado quanto de doutorado. Dentre elas podemos

citar importantes obras como Kohl (2007, 2012). Em âmbito nacional, podemos

relacionar algumas outras pesquisas relevantes de cunho histórico com o judô, tais

como Nunes (2011); Nunes e Rubio (2012); Drigo (2014); Farias (2012); Figueiredo

(2012) e Marta (2010). Isso nos mostra que existe espaço para o tratamento e a

discussão acadêmica deste elemento da cultura corporal10 (Lutas – por onde inclui-

se o Judô). A relevância desta determinada área do conhecimento é reforçada por

órgãos internacionais importantes como a Organização das Nações Unidas para a

Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)11 onde a reconhece enquanto

Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. Dentro desta macro área (Lutas),

inclui-se o nosso objeto de pesquisa, que é o Judô e a sua respectiva historicidade12

na cidade do Recife-PE.

                                                            10 Concordamos com o conceito de Cultura Corporal, enaltecido por Souza Júnior et al. (2011) que

defendem que a cultura corporal se configura dimensão constituinte da produção cultural humana, condicionada histórica e socialmente. Ainda segundo os mesmos, “Nos jogos, lutas, ginástica, dança [...] o homem também se constitui homem e constrói sua realidade pessoal e social” (SOUZA JÚNIOR et al., 2011, p. 408).

11 Baseado na leitura do documento oficial da UNESCO (2012) compreendemos que esta entidade internacional não reconhece nenhum seguimento social/cultural isolado como patrimônio. Porém existem atividades que para dada cultura, conservam aspectos culturais e/ou sociais históricos para gerações futuras, estes, são reconhecidos como Patrimônio Cultural Imaterial (ou intangível) da Humanidade. A roda capoeira, por exemplo, é uma manifestação brasileira que foi reconhecida em 2014, mas não é a única luta, já que também são reconhecidas, a Luta Tradicional Turca – Kirkpinar (onde os combatentes são besuntados em azeite) aceita em 2010 e também a luta Koreana chamada Taekkyeonaceita em 2011). Diante do exposto podemos afirmar que as Lutas são patrimônio Cultural da Humanidade, mas nem todas (ainda) são reconhecidas como tal pela UNESCO.

12 Entende-se aqui por historicidade aquilo que queremos colocar em perspectiva temporal e/ou cronológica as ações humanas que podem ser compreendidas a partir da análise dos documentos. De acordo com Athayde (2014, p. 98), “o conceito de historicidade pretende ser útil para colocar em perspectiva a dinâmica temporal e espacial das ações e experiências dos humanos”. Ainda segundo o mesmo autor, “Pode-se dizer que no vocábulo historicidade o sufixo -idade deve ser percebido como a intervenção de um indício do que se encontra em análise, gerando um deslocamento com relação a história. Historicidade teria então como foco os efeitos de sentido” (ATHAYDE, 2014, p. 99). No caso do judô e de seus antigos mestres, é o que queremos trazer a tona enquanto nosso objeto de estudo.

22

De acordo com a ementa13 de nossa linha de pesquisa (Teoria e História da

Educação), publicada no site14 do Programa de Pós-Graduação em Educação da

Universidade Federal de Pernambuco (PPGE-UFPE), podemos defender a

justificativa de que o objeto de estudo em questão está devidamente contextualizado

a partir da leitura de que o Judô e a Educação sempre caminharam muito próximos,

seja no viés social, educacional, sociológico ou filosófico. É intuito deste estudo,

facilitar a análise e compreensão desta aproximação teórica entre as duas partes

(Judô e a Educação), assim como, fazendo interface com a nossa ementa

institucional, entendendo a fundamental importância da contextualização deste

cenário de debate e as contribuições advindas deste ponto de discussão que

poderão proporcionar avanços no debate educacional, não só ao âmbito direto da

prática (como em escolas de judô), como também dentro do ensino superior, por

exemplo, em cursos de Graduação em Educação Física, no que concerne ao âmbito

das disciplinas acadêmicas, como a de Judô, capoeira ou a de Lutas, que são

obrigatórias nestes cursos. Para tal, poderemos ver de forma mais aprofundada na

seção três de nossa obra.

O debate científico proporcionado a partir deste estudo ofertará legados

importantes à Educação Física, ao judô, aos projetos sociais esportivos e à

discussão da educação através do esporte.

1.2 Contextualizando o Judô

Para melhor definirmos o significado da expressão “JUDÔ”, vamos buscar

embasamento na sua literatura clássica e,para isso, utilizaremos a obra KODOKAN

JUDO escrita pelo próprio Jigoro Kano (criador do judô) e publicada pela primeira

vez em 1956, porém apenas traduzida para o português em 2008 pela editora

Cultrix. Kano (2008b) ressalta que a expressão JU= suave e DÔ15= caminho,

                                                            13 EMENTA: As pesquisas da linha têm como referência as teorias da Educação e da História da

Educação que visam a ampliar os limites da compreensão tradicional da Ciência, possibilitando maior aproximação entre a investigação e seu objeto. Abrange estudos teóricos e empíricos relacionados a temáticas e aspectos da História da Educação (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO, 2017).

14 Para conhecer mais ver Universidade Federal de Pernambuco (2017). 15 O Judô, assim como outras artes marciais japonesas, tais como Karatê-Dô, Kendô, Aikidô, dentre

outras, pertencem ao conceito do BUDÔ, que em tradução literal significa “Caminho marcial” ou “caminho do guerreiro”, estas artes marciais possuem como características principais, uma ligação forte com a cultura e sociedade japonesa, e principalmente aquela relacionada ao guerreiros do

23

poderia ser melhor compreendido como o “caminho suave ou da suavidade” e, para

isso, buscou nortear seu método através de dois eixos filosóficos primordiais:

Seiryoku-Zenyo (princípio da máxima eficiência/eficácia) e Jita Kyoei (prosperidade e

benefícios mútuos). Kano (2008b) acreditava que a prática desenvolvida através

destes dois princípios seria capaz de trabalhar a mente e o corpo integrados, e que

isso favoreceria a educação e a formação moral, social e psicológica de seus

praticantes. Sobre estes aspectos, e também realizando um debate em interface do

judô com a educação, pretendemos expandir esta discussão na seção três desta

pesquisa.

Buscando contextualizar os âmbitos por onde o Judô é reconhecido e, de

acordo com Gondim (2006), podemos afirmar que o Judô pode tomar diversas

vertentes, atuar em diversos âmbitos e apresentar várias finalidades. São exemplos:

perspectiva educacional (escolas); competitiva (clubes, academias e associações); saúde (para melhora da aptidão física); reabilitação (idosos e crianças); prática mental e filosófica; projetos sociais (massificação do Judô preconizado por Kano); Universidades (currículo acadêmico de Educação Física); e esporte adaptado à deficientes (especialmente aos cegos e pessoas com síndrome de down) (GONDIM,2006, p. 4).

Desta forma, compreende-se que o judô ocorre de forma diversificada,

contextualizado nas mais diversas possibilidades enquanto prática. Este lastro de

intervenções pelo qual o judô ocorre relaciona-se com a forma pela qual o mesmo é

compreendido terminologicamente. Assim, segundo o autor supracitado, tratando-se

de sua conceituação terminológica:

Há bastante controvérsia quanto ao que realmente é o Judô. Entre as diversas opiniões de autores, encontramos: arte marcial; desporto de combate ou contato; sistema de luta; filosofia; esporte. Frente a estas diversificadas opiniões, acreditamos que ele possa conter um pouco de cada conceito destes, pois isso irá depender da leitura, da forma de trabalho e da contextualização em que se dará sua prática (GONDIM, 2006, p. 4).

Ainda buscando-se discutir a conceituação acerca do judô, é sabido,

segundo Franchini e Del Vecchio (2012), que as artes marciais, lutas e esportes de

combate16 possuem suas próprias estratégias metodológicas de ensino. Através

                                                                                                                                                                                          passado, os chamados samurais. No Budô, entende-se que todo praticante deverá assimilar a prática a partir de princípios morais e filosóficos que irão reger a mente e o corpo dos praticantes.

16 Segundo os autores Franchini e Del Vecchio (2012), o que difere basicamente as três terminologias (Lutas/artes marciais/ Modalidade esportivas de combate) é praticamente a forma como os praticantes utilizam-se destes elementos corporais e culturais. Sendo que entende-se que LUTAS é

24

destas metodologias, são estabelecidos os princípios sociais, culturais e de

civilidade, objetivando uma cultura de ordem marcial com seus próprios códigos de

conduta. Em qualquer país, as normas do Judô são regidas por influência direta do

sistema educacional de origem, ou seja, o sistema japonês (oriental) de educação.

Frente a esse contexto, inquieta saber até que ponto a chegada destes mestres

japoneses em nosso estado (via processo imigratório) influenciou a nossa cultura

educacional vigente (no que tange ao nicho específico das artes marciais)e por esta

também foi influenciada e,por consequência, tenha delineado,por exemplo, o estilo

ou forma de ensinar judô no Recife?

Atualmente, é notório que o Judô chegou ao âmbito escolar

institucionalizado com certo respeito, tendo em vista que diversas áreas profissionais

(Educadores/as Físicos, pediatras, psicólogos/as e pedagogos/as) o indicam para

crianças, pois dependendo da forma como for trabalhado por ‘’senseis” capacitados

– (academicamente e também quanto à formação em graus superiores – ‘’dans’’)17,

do ponto de vista socioafetivo, motor e cognitivo, será uma importante ferramenta

educacional para as crianças (DELIBERADOR, 1990; VILLAMÓN, 1999 apud

GONDIM, 2006).

Um estudo realizado por Gomes e Avelar-Rosa (2012) comparou a presença

de práticas e incentivo institucional de modalidades de lutas em cursos superiores

de formação em Educação Física de quatro países (Brasil, França, Portugal e

Espanha) e detectou que a modalidade Judô é o esporte mais influente nestes

quatro países.

No Brasil, o Judô como disciplina/componente curricular sempre esteve

presente no currículo dos cursos superiores de Educação Física de todo país, tendo

ganhado maiores valorizações advindas de berços militaristas e principalmente no

auge da chamada Educação Física Militarista (1930-1945). Com a reformulação                                                                                                                                                                                           

um termo mais genérico, dado a situação de confrontos que remeta a oposição entre dois ou mais oponentes. Já o termo ARTE MARCIAL, está mais relacionado à praticas que possui um cunho mais espiritual, religioso e/ou filosófico em suas praticas e por fim, MODALIDADE ESPORTIVA DE COMBATE, está relacionada aquelas praticas que sofreram o processo de esportivização com o passar do tempo, e que hoje são plenamente institucionalizadas por órgãos que gerenciam seus rankings, regras, exames de faixas, competições etc. Neste sentido, o Judô atual se encaixa melhor enquanto MEC (modalidade esportiva de combate) do que como arte marcial como em outrora.

17 “Dans” – representam graduações superiores a partir da faixa preta (que vão do 1º ao 10º no judô) e que são promovidas a depender do tempo de judô, história do mestre e mediante aprovação por alguns testes e/ou provas teórico-práticas. Quanto mais dans se têm, mais maestria se espera por parte dos senseis. A partir do 6ºdan geralmente os mestres também são chamados pelo termo “Shihan” (mestre).

25

curricular de várias universidades públicas e privadas e, também, devido à

separação18 em licenciatura e bacharelado nos cursos de formação superior em

Educação Física, o judô (componente/disciplina curricular) atualmente ainda

encontra-se presente em vários cursos, inclusive como obrigatória (como por

exemplo, na Universidade de São Paulo)19 e como disciplina eletiva/optativa,

inclusive com abordagens de tópicos avançados como Judô II (como na

Universidade de São Paulo (USP), onde o docente titular é o Prof. Dr. Emerson

Franchini.20

Em Pernambuco, nas duas mais antigas universidades públicas21,

Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Universidade de Pernambuco (UPE)

(antiga Fundação de Ensino Superior de Pernambuco (FESP) a disciplina Judô

sempre foi ministrada (enquanto única representante dos esportes de combate), e

apenas recentemente (em média na última década), depois na revisão curricular de

ambas, os dois cursos nestas duas instituições passaram a possuir a disciplina

Lutas22 enquanto componente obrigatório (apesar de em suas ementas constar um

bom direcionamento também para o Judô). Vale ressaltar que na UFPE se tem o

acréscimo da disciplina Capoeira23 (obrigatória para o bacharelado e eletiva a

                                                            18 De acordo com o site do Conselho Federal de Educação Física (CONFEF), para a intervenção

profissional em Educação Física no país, a legislação atual (marcos legais) possibilita duas vertentes de formação: LICENCIATURA E BACHARELADO, instituídas pelo CNE através da Resolução 1, de 18 de fevereiro de 2002 e Resolução 7, de 31 de março de 2004. Para conhecer mais sobre, acesse o artigo do Steinhilber (2006) na página: http://www.confef.org.br/extra/revistaef/show.asp?id=3613.

19 Código da disciplina obrigatória: EFE0119-Judo 1 – 60h – 04 créditos (Curso de graduação em Bacharelado em Esporte na Universidade de São Paulo).

20 De acordo com Peset et al. (2013), o Prof. Dr. Emerson Franchini é atualmente considerado como um dos maiores pesquisadores científicos mundiais sobre a temática Judô.

21 Aqui, vale ressaltarmos, que posteriormente surgiram cursos de Educação Física nas seguintes e importantes Universidades Públicas de Pernambuco: Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE (ano de 2010), no Centro Acadêmico de Vitória-PE – UFPE/CAV (ano de 2010) e, também, na Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF) com campus na cidade de Petrolina-PE (no ano de 2009).

22 Na ESEF-UPE nos cursos de licenciatura e bacharelado, temos as disciplinas obrigatórias, Fundamentos teórico-metodológicos das Lutas (UM03212/ 54hs/ 03créditos) ministradas pelo prof. Ms. Marco Aurélio. Já no curso de bacharelado do Departamento de Educação Física da UFPE, a disciplina denomina-se como, Modalidade do esporte individual – lutas (EDF0017/60HS/03creditos), atualmente ministrada por professores substitutos. No entanto, no curso de licenciatura, a disciplina é denominada como Metodologia do ensino das Lutas (45hs/02creditos) e também é ministrada atualmente por professores substitutos.

23 No bacharelado: Disciplina (EDF0010/60hs/03creditos): Modalidade do esporte individual – capoeira e na licenciatura (EDFxxxx/60hs/03creditos), ambas ministradas pelo prof. Dr. Henrique Gerson Kohl.

26

licenciatura) e, na UPE, ainda temos a presença da disciplina judô enquanto optativa

para o curso do bacharelado.24 Quanto à presença do Judô nas universidades, podemos dizer que esta

determinada área de conhecimento aparece bem representada naquela que

chamamos de tríade acadêmica, pela qual espera-se que o conhecimento ocupe seu

espaço, representando-se nos três eixos: o do ensino, da pesquisa e da extensão.

Evidencias nos mostram que no campo da pesquisa, o judô tem crescido

vertiginosamente no que compete ao grande aumento de publicações científicas em

níveis de graduação (Trabalhos de Conclusão de Curso - TCCs) e de pós-graduação

(Dissertações e Teses). Dentro deste contexto, ainda temos estudos que mostram

que o judô possui expressivo grau de interesse científico enquanto objeto de

pesquisa no mundo inteiro (PESET et al., 2013).

Recentemente, tivemos um importante salto em âmbito estadual

(Pernambuco) no que concerne às possibilidades de avanços com pesquisas que

envolvam a área de conhecimento pertinente as Lutas (incluindo o Judô), pois, em

2015, foi criado, através de iniciativa do Prof. Dr. Henrique Gerson Kohl, o primeiro

grupo de pesquisa25 especifico nesta área do conhecimento, filiado ao Departamento

de Educação Física da UFPE.

Ainda debatendo a representatividade do judô nas universidades, no que diz

respeito à extensão, observamos que diversos projetos, de caráter social, estimulam

a prática da modalidade em diversas universidades. A exemplo disso podemos citar

o Projeto Santo Amaro (PSA) (presente na Universidade de Pernambuco em

parceria com a Escola Superior de Educação Física), um “case” de sucesso, pois

possui vários casos de participantes da modalidade Judô do PSA que tiveram suas

vidas modificadas positivamente a partir do contato e da experiência com este

projeto.26

                                                            24 Na ESEF-UPE, temos a presença das disciplinas optativas (no curso de Bacharelado): Judô

(DO05224/ 72hs/ 04creditos), ministrada pelo Prof. Ms. Marco Aurélio e também da disciplina Capoeira (DO05228/72hs/04créditos) ministrada pela Profa. Ms. Isabel Cordeiro.

25 Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão de Artes Marciais, Modalidades Esportivas de Combate, Lutas e Capoeira (NEPEX) (AM|MEC|L|CAP), que deste 2015 esta devidamente registrado nos Diretórios de Grupos de Pesquisa Nacional do CNPQ. Apesar do pouco tempo de existência, o referido grupo já captou importante evento nacional denominado de Encontro Nacional de Artes Marciais e Esportes de Combate (ENAMEC), que foi realizado em cinco de novembro de dois mil e dezesseis (05/11/2016) na cidade do Recife-PE.

26 Criado em 1986, o Projeto Santo Amaro (PSA) se consolidou por muitos anos como um dos maiores projetos sociais esportivos da cidade do Recife-PE, mantido por muito tempo por fortes parcerias institucionais como, por exemplo, o Instituto Ayrton Senna (IAS) – AUDI, teve como

27

Estas aproximações entre o judô e o meio acadêmico fortalecem ainda mais

a compreensão deste enquanto pertencente ao meio educacional, relacionando-o à

sua ação direta em busca de um comprometimento com a formação social,

educacional e moral do(a) cidadão(ã), seja através do estudo e/ou da prática do

mesmo.

1.3 Por que Pesquisar a Gênese do Judô no Recife-PE?

Visando nortear este mapeamento histórico judoístico, o presente estudo

possui também o intento de compreender as influências orientais na construção da

identidade educacional e cultural desta modalidade na cidade do Recife.

Devido a modalidade ser de origem japonesa, de acordo com o estudo de

Nagai, Silvana e Nagai, Sérgio (1998), acredita-seque estes protagonistas

imigrantes e/ou descendentes possam ter gerado uma espécie de “revolução

pedagógica” na forma de ensinar o Judô ao aportarem no estado de Pernambuco, e

que, consequentemente, tenham gerado ajustes significativos (ou não) ao cenário

local. Para tal, as entrevistas com os senseis Tadao Nagai e Hayashi Kawamura (o

primeiro, filho de japonês e, o segundo, veio do Japão para o Recife) serão

importantes para esta identificação cultural quanto à forma de atuação docente de

ambos e a sua contextualização em uma outra cultura (no caso a brasileira). Dentre

os senseis “estrangeiros”, também entendemos a importância da adição de

entrevistas com o sensei Byung Kuk Lee, que, apesar de ser coreano, e não

japonês, teve grande importância na cena judoística da cidade do Recife, além de

ter ministrado aulas na disciplina Judô (enquanto componente curricular) no

Departamento de Educação Física da Universidade Federal de Pernambuco

(UFPE)27, onde se aposentou e definitivamente afastou-se do ensino superior em

2010.

                                                                                                                                                                                          intenção inicial, estabelecer relação de integração entre a comunidade local e a escola Superior de Educação Física (ESEF-UPE) através do esporte e lazer como principal elo de ligação. Sobre o Judô do projeto Santo Amaro, vários atletas de nível nacional foram formados além de casos de pessoas (estudantes de Educação Física) que hoje são professores de clubes ou docentes universitários, inclusive alguns da disciplina Judô (Flávio Miguel Archanjo, Rodolfo Pio, Vânialucia Barros, Hamilton Sena, Luciano Flávio Leonídio dentre outros) e pelo qual foram iniciados na modalidade a partir do contato com este projeto transformador.

27 O sensei Byung Kuk Lee começou na UFPE em 1975, quando foi aprovado via concurso, e aposentou-se em 1996 (pelo IFPE), contudo seguiu atuando na docência do Ensino Superior ministrando a disciplina Judô oficialmente até 2000 e seguiu até 2010 sendo professor substituto a cada dois anos.

28

Através de seus achados, acreditamos que este estudo facilitará a aquisição

de novas informações que fortaleçam os materiais didático-pedagógicos

institucionais, tais como, apostilas, manuais e/ou cartilhas, podendo assim, por

exemplo, auxiliar como mais um componente informacional na formação dos(as)

professores(as) durante cursos de capacitação de faixas-preta e graus superiores

das entidades esportivas reguladoras e específicas, tais como, a Federação

Pernambucana de Judô (fundada em 1972) e a Liga Pernambucana de Judô

(fundada em 2003). Contribuições estas no âmbito teórico da história do judô da

cidade (Recife) e do estado de Pernambuco e, também, da ampliação da

compreensão histórica, cultural e educacional do ensino do Judô. Também se

estende a importância desta pesquisa para o âmbito das disciplinas acadêmicas de

Lutas (pertencentes ao currículo dos cursos de Educação Física, tanto da

licenciatura quanto do bacharelado), visto que poderão ser levantadas novas

abordagens históricas e pedagógicas, possibilitando uma análise mais crítica e

embasada a partir dos achados encontrados nesta pesquisa. Em interface com a educação, pretende-se favorecer análises e

compreensões acerca dos processos envolvidos quanto às diferenças culturais

educacionais entre Brasil e Japão (ocidente e oriente), assim como, compreender o

importante viés educacional próprio do Judô, pelo qual é mundialmente reconhecido

(principalmente em países desenvolvidos como França e Espanha) conforme visto

em Gomes e Avelar-Rosa (2012). Por fim, queremos propor uma reflexão onde

possamos compreender a gênese do judô na cidade do Recife-PE, a partir da

atuação de seus antigos mestres (senseis), compreendendo que os seus locais de

atuação prática (Dojôs)28 eram espaços educacionais significativos e interligados à

própria história de vida de cada mestre formador.

1.4 Justificando o Recorte Temporal

De acordo com Barros (2015, p. 41), “uma delimitação adequada do período

histórico que será examinado é, naturalmente, questão de primeira ordem para

qualquer historiador”. Aqui, vale ressaltarmos que apesar do autor citar o termo

                                                            28 Segundo Kano (2008b, p. 30), “a palavra Dojô deriva de um termo budista que faz referência ao

‘local de iluminação’. Como um monastério, o dojô é um local sagrado que as pessoas procuram para aperfeiçoar seu corpo e sua mente”.

29

“historiador”, mesmo que não sejamos historiadores de formação, compreendemos

que sua afirmação se estende naturalmente a qualquer pesquisador, ainda mais se

estiver investigando uma pesquisa de cunho histórico como esta. Contudo, sobre a

questão da delimitação temporal, o mesmo teórico afirma que a escolha de um

recorte qualquer de tempo historiográfico não deve, por outro lado, ser gratuita.

É o problema que define o recorte, e as problematizações da pesquisa é que

irão conduzir a um recorte ou outro que lhe seja mais adequado, frente a isso, “[...]

pensar os limites de um recorte em termos de viabilidade para a pesquisa e de

adequação ao problema é sempre a postura mais equilibrada” (BARROS, 2015, p.

44-46). Sobre este aspecto, podemos perceber que existe um alinhamento quanto

ao período selecionado e o problema central da pesquisa, que abordamos

detalhadamente no tópico 1.5.

Sobre o recorte temporal, e ainda de acordo com o autor supracitado, é

importante que analisemos critérios quanto à viabilidade, ou seja, propostas

exequíveis relacionadas ao tempo real disponível à execução da pesquisa em si.

Sobre este aspecto, todo esforço prévio à pesquisa (desejo antigo de realização por

parte do pesquisador), realizado para a ampliação substancial do acervo físico

documental, fora de relevante importância no que tange à relação tempo-execução

da mesma.

Em nossa pesquisa optamos pelo recorte temporal do período entre os anos

de 1952 e 1972. A escolha por este período está relacionada aos escassos achados

históricos que nos mostram que por volta dos anos 50, alguns japoneses envolvidos

com Judô passaram pelo Recife na intenção de divulgação, e por volta dos anos 70

chegaram alguns orientais que advogam ter influenciado a prática pedagógica do

ensino do judô no estado (NAGAI, Silvana; NAGAI, Sérgio, 1998). Sendo que, até

1975 acredita-se ter sido o auge de um “novo” judô, já estabelecido no estado e

proporcionado pela chegada, em 1971, e fixação de um japonês, especificadamente,

o prof. Tadao Nagai.

Ainda sobre o período escolhido para a investigação da pesquisa, sabe-se

que existe a necessidade de um levantamento de fontes documentais relacionadas

ao histórico do judô pernambucano, pois pesquisas prévias (CAVALCANTE, 2014;

NAGAI, Silvana; NAGAI, Sérgio, 1998; VIRGÍLIO, 2002b) identificaram que o que se

tem melhor documentado (do ponto de vista historiográfico), está mais atrelado à

30

fase posterior à fundação da Federação Pernambucana de Judô, em 1972. Tal

informação fortaleceu a necessidade de realização da presente pesquisa.

Importante ressaltar que os cinco (05) senseis entrevistados para este

trabalho “vivenciaram” mais fortemente o judô na época selecionada como marco

temporal para este estudo, e por isso, são importantes referências testemunhais ao

nosso registro histórico.

Complementarmente, fazem-se necessários questionamentos frente às

lacunas históricas ainda não documentadas e/ou registradas. Como procedeu-se a

vinda destes mestres orientais que atuaram (ou ainda atuam) com o judô no Recife?

Qual o impacto quanto à atuação destes senseis no processo de ensino do judô

neste determinado período histórico?

1.5 Problema, Objetivos e Hipótese

Em nossa pesquisa, procuramos manter-se fiel à investigação historiográfica

a partir da história oral dos mestres de judô da cidade do Recife-PE enquanto

principal fonte a ser analisada.

Investigou-se o processo histórico envolvido no surgimento, implantação e

consolidação do Judô, no período de 1952 a 1972, relacionando-o aos sistemas

educacionais vigentes da época e sua ligação com os modelos educacionais e

condições próprias do sistema tradicional/clássico de ensino do judô.

A presente pesquisa tem como problema central a inquietude relacionada à

busca pela identificação, análise e compreensão da dinâmica processual com que

uma teia de interdependência foi estabelecida diante do contexto social,

educacional, histórico e econômico em que os primeiros mestres se estabeleceram

na cidade e desenvolveram seus próprios métodos de ensino partindo para a

construção histórica do judô na cidade do Recife-PE (aqui, compreendida enquanto

uma configuração social específica a ser analisada pela pesquisa).

Respostas a estes questionamentos nos levaram à possibilidade de

identificação de como estes senseis puderam, ou não, contribuir com a formação

marcial e também educacional daqueles que vivenciaram seus ensinamentos

naquela época.

Enquanto objetivo geral da pesquisa, vislumbramos investigar a história do

Judô recifense, partindo de seus antigos senseis (pioneiros na introdução e

31

sistematização do judô em Recife-PE), visando compreender as relações e

(re)construções entre o ensino do judô no ambiente do Dojô e sua dimensão

educacional.

Os objetivos específicos estabelecidos são os seguintes:

a) identificar a gênese do judô em Recife no marco temporal entre os anos

de 1952-1972;

b) desvelar o processo educativo proporcionado pela prática do judô no dojô,

como ambiente não formal de ensino;

c) registrar as características específicas relacionadas à cultura judoística,

facilitando a compreensão de pontos como, a disciplina, a hierarquia, o

tradicionalismo e o processo de esportivização do Judô;

d) investigar a relação entre prática marcial e a violência do ponto de vista do

processo civilizatório29 e;

e) registrar o legado de alguns antigos senseis e pontuar as heranças

significativas de suas memórias à comunidade judoística do Recife.

Enquanto hipótese para nossa pesquisa, acreditamos na possibilidade de

que os referidos espaços (Dojôs) analisados, associados às praticas pedagógicas

dos antigos mestres participantes da pesquisa, possibilitaram educação de seus

praticantes em um ambiente não formal de ensino e associado à educação formal

(institucionalizada), e que o judô, é sim, uma importante ferramenta educativa

quando bem intencionada. É sabido que no intento de elucidar/evidenciar a história e

o desenvolvimento do judô da cidade e suas respectivas nuances, temos que partir

da busca por compreender todo o contexto macro de sua gênese.

                                                            29 De acordo com Dunning (2014), é dito como alerta pelo autor (através de relato pessoal a sua

orientanda e organizadora da obra no Brasil, a Profa. Dra. Heloisa Helena Baldy do Reis – (UNICAMP-SP) que existe um equívoco quanto a tradução brasileira da palavra civilising como civilizador e civilising process como processo civilizador, o mesmo ainda afirma que esta tradução errônea contribuía para a má compreensão da teoria de Elias, e que seu “velho mestre” sempre utilizava o termo civilizador entre aspas. Para Dunning (2014), a tradução correta de civilising process para o português é processe civilizatório. Desta forma a partir deste conhecimento, decidimos fazer a adoção recomendada pelo termo civizatório, exceto no caso de citação em referência a obra já publicada no Brasil com título Processo Civilizador ou em citações diretas que possuam o termo civilizador.

32

2 FUNDAMENTOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Visando facilitar a compreensão dos caminhos adotados para a nossa

pesquisa, detalharemos na presente seção, todo o nosso percurso metodológico,

assim como as nossas filiações teóricas ao que se refere aos métodos e técnicas

adotados por nossa pesquisa.

2.1 Tipo de Pesquisa, Abordagem e a Opção pela Metodologia de História Oral

Etimologicamente, metodologia significa o estudo dos caminhos, dos

instrumentos para fazer uma pesquisa ou estudo científico. Interessados no

detalhamento para a validação do caminho traçado por esta pesquisa, buscaremos,

no decorrer desta seção, explicitar nossas adesões metodológicas, bem como, as

técnicas e os instrumentos selecionados.

Caracterizando a pesquisa quanto ao tipo, optamos pela abordagem

qualitativa, preocupando-se, assim, com os aspectos da realidade, centrando-se na

compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais. De acordo com Minayo

(2001, p. 22), a pesquisa qualitativa “[...] trabalha com o universo de significados,

motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço

mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser

reduzidos à operacionalização de variáveis”. Compreendemos que este estudo

encontra-se norteado nesta abordagem de pesquisa, já que a mesma enfatiza

aspectos sociopsicológicos, tais como opiniões abertas, motivações e questões

subjetivas, próprias conceitualmente deste tipo de pesquisa.

Quanto à classificação da pesquisa, com base nos objetivos, reafirmamos

adesão conceitual à pesquisa do tipo exploratória. Sobre esta, Gil (2008, p. 27),

afirma que “tem como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar

conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas mais precisos ou

hipóteses pesquisáveis para estudos posteriores”. Ainda de acordo com o mesmo

autor, a maior parte destas pesquisas envolve um levantamento bibliográfico e

documental, além de entrevistas com pessoas que tiveram experimentações práticas

com o problema pesquisado. Em nossa pesquisa, utilizaremos tanto o levantamento

bibliográfico e documental, como também, as entrevistas semiestruturadas.

33

Como metodologia de nossa pesquisa, optamos pela história oral, onde a

mesma apresentou-se como de fundamental importância, pois conforme identificada

por pesquisa de temática semelhante e realizada no estado de Pernambuco por

Cavalcante (2014), são previstas algumas dificuldades no que diz respeito à

organização do acervo bibliográfico que contemple semelhante objeto deste tipo de

pesquisa no Estado de Pernambuco, o que fortalece a ideia de que são necessários

esforços para que se construam novos documentos a partir dos depoimentos dos

antigos mestres de judô de nossa cidade. A partir dos relatos obtidos (entrevistas

realizadas), foram empregadas as técnicas desenvolvidas por Alberti (2005), bem

como por Montenegro (2013) e Thompson (1992), a fim de filtrar as informações e

selecionar novas fontes de pesquisa advindas dos relatos dos entrevistados que

experimentaram, intensamente, acontecimentos, situações e suas consequências

para compor, juntamente com as outras fontes enunciadas, o arcabouço teórico do

trabalho de pesquisa.

Diversos autores conceituam a história oral das formas mais variadas

possíveis, contudo, para o nosso estudo, adotamos algumas fontes mais clássicas

como, por exemplo, a que se faz presente na Associação Brasileira de História Oral,

entidade devidamente reconhecida nesta área do conhecimento, fundada em 1994,

e que, de acordo com o seu estatuto traz a seguinte definição: “Por história oral se

entende o trabalho de pesquisa que utiliza fontes orais em diferentes modalidades,

independentemente da área de conhecimento na qual essa metodologia é utilizada”

(ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE HISTÓRIA ORAL, 1998, artigo 1, parágrafo 1º, p.

14).

Para fins de contextualização contemporânea acerca da história oral, Meihy

e Holanda (2014, p. 63) ressaltam que devido à globalização “a história oral chama a

atenção por ser um recurso crescente, prático, persuasivo e, para muitos,

respeitável”. Ainda de acordo com o mesmo, para ser compreendida enquanto

metodologia, a história oral deverá formular suas entrevistas como o epicentro da

pesquisa. Não diferente disso, temos as entrevistas em nosso trabalho como fonte

principal de produção de conhecimento, mesmo que ainda e, para isso, também

necessitem de fortalecimento teórico a partir da pesquisa documental.

Thompson (1992, p. 44), outro autor clássico no que concerne a metodologia

da história oral, afirma que a “a história oral é uma história construída em torno de

pessoas [...] leva a história para dentro da comunidade e extrai a história de dentro

34

da comunidade”. Desta forma, entendemos que exista uma nítida troca social na

construção deste conhecimento advindo da oralidade. Ainda segundo o mesmo

autor, “a história oral devolve a história às pessoas em suas próprias palavras. E ao

lhe dar um passado, ajuda-as também a caminhar para um futuro construído por

elas mesmas” (THOMPSON, 1992, p. 337), acreditamos que isso garante não

apenas importância social, enquanto metodologia, mas principalmente a garantia de

valorização daqueles sujeitos que se colocam à disposição da ciência através de

suas memórias.

Alberti (2004, p. 27) relata que “a metodologia da história oral é bastante

adequada para o estudo da história de memórias, isto é, de representações do

passado”. Diante da justificativa proposta por esta autora (somada à outras

importantes filiações teóricas optadas e nossa pesquisa), entendemos que a

metodologia de história oral mostrou-se viável e adequada à utilização por parte do

presente estudo.

Entendemos que as representações do passado constituem a base para o

estudo da história de memórias e que a criação de fontes históricas advém da

realização de pesquisas que envolvam a metodologia de história oral. Ante o

exposto, delimitamos que o nosso objeto de pesquisa é atendido por esta

metodologia científica, uma vez que visamos contemplar nossos protagonistas como

base para construção destas fontes históricas.

De certo, segundo Meihy e Holanda (2014, p.22), “[...] a história oral não se

faz sem a participação humana direta, sem o contato pessoal”. Nesse sentido,

tratando-se de metodologia da história oral, entendemos que através da oralidade de

mestres de judô podemos elucidar de forma documental uma história que muitas

vezes poderia ser perdida no tempo devido à falta de oportunidades que as fizessem

serem registradas e validadas no tempo presente. Bossi (2003, p.15) afirma que a

“memória dos velhos pode ser trabalhada como um mediador entre a nossa geração

e as testemunhas do passado”, por isso, entendemos que a sapiência de nossos

protagonistas deva ser socializada como conhecimento para explicar o nosso

presente. Ainda sobre a importância de trazermos à tona esta memória enquanto

transformação e ressignificação histórica, a mesma autora supracitada reafirma que

em se tratando da história recente, “feliz o pesquisador que se pode amparar em

testemunhos vivos e reconstituir comportamentos e sensibilidades de uma época!”

(BOSSI, 2003, p. 16-17). Fazemos plena adesão a estas reconstituições de

35

comportamentos e de sensibilidades ressaltadas pela pesquisadora, visto que, em

nossa pesquisa vivenciamos esta sensação de passado no presente através de

cada memória registrada. Nosso entendimento corrobora com uma importante

citação do filósofo polonês Bauman (2003, p. 7), ao afirmar que “as palavras têm

significado: alguma delas, porém, guardam sensações”.

Um fator importante de delimitação metodológica neste trabalho é o de

caracterização quanto ao tipo de história oral que decidimos trabalhar. De acordo

com Meihy e Holanda (2014) existem três tipos de história oral, são elas: História

oral de vida, História oral temática e tradição oral. No nosso caso, optamos pela

história oral temática, já que, de acordo com este autor, ela delimita um tema e se

propõe a organizar a entrevista em torno deste tema alvo relacionado ao problema e

objetos da pesquisa, neste sentido, delimitamos que queremos, através de nossas

fontes orais, construir documentos que debatam em torno da relação do judô e da

educação a partir do conhecimento vivido pelos antigos mestres.

Ainda de acordo com o autor supracitado, em relação à temática envolvida

no tipo de história oral, a escolha dos entrevistados nesse ramo de história oral é

fundamental. Quanto ao recorte do tema, o mesmo afirma que “deve ficar explícito

de tal maneira que conste nas perguntas a serem feitas ao colaborador” (MEIHY;

HOLANDA, 2014, p. 39). De acordo com a literatura vigente, pretendemos, ao longo

de nossa pesquisa, explicitar detalhadamente todo o procedimento quanto à escolha

dos colaboradores, como também, o processo de montagem de nossas perguntas

aos mesmos, sempre primando por contemplar o contexto temático no que se refere

ao tipo de história oral no qual aderimos. No tocante às entrevistas faz-se necessário

esclarecer que quando a história oral é aceita como metodologia da pesquisa

possibilita-se que as mesmas sejam consideradas o epicentro da pesquisa (MEIHY;

HOLANDA, 2014).

É importante ressaltar que nessa pesquisa também faremos adesão teórica

ao conceito de história oral hibrida, preconizada por Meihy e Holanda (2014). De

acordo com estes, trata-se do fato de as entrevistas dialogarem com outros tipos de

fontes e/ou documentos. Neste sentido, “preza-se o poder de ‘conversa’, contatos ou

diálogos com outros documentos, sejam iconográficos ou escritos, como:

historiográficos, filosóficos ou literários” (MEIHY; HOLANDA, 2014, p. 129). Ademais,

queremos dizer que transcenderemos as entrevistas como fonte de pesquisa, como

veremos ao longo desta seção sobre a metodologia.

36

No tocante à questão metodológica, foram selecionadas três (03) teses

norteadoras (KOHL, 2012; MARTA, 2009; NUNES, 2011) de relevante importância

por tratarem da questão do método de história oral com complementação e suporte

através da pesquisa investigativa documental e bibliográfica. Também utilizamos de

semelhante percurso metodológico nesta pesquisa, optando por visitações em

espaços específicos, tais como: Arquivos físicos e virtuais pertencentes a banco de

dados de Museus; Instituições Acadêmicas; Bibliotecas públicas e privadas;

Entidades Organizacionais do judô (Liga e Federação) e Academias de judô.

Ainda sobre o método da história oral, verifica-se sua significativa

importância, pois:

Aprender a ouvir é uma habilidade humana fundamental: para aqueles que importam, a história oral está aí para nos ajudar a compreender melhor nossos passados e para criar memórias nacionais muito mais ricas, mas também para nos ajudar a construir um futuro melhor, mais amável, mais democrático (THOMPSON, 2000, p. 28).

A presente pesquisa deu voz aos antigos mestres entendendo ser

importante no processo de valorização e ressignificação destes professores da

época, protagonistas diretos de uma importante história, onde, infelizmente, muitos

dos que entrevistamos,estavam pouco evidenciados e sem o devido reconhecimento

pela sociedade, principalmente pela nova geração do judô recifense, que, em

algumas conversas informais com alguns professores mais contemporâneos,

mencionavam que não “faziam ideia de quem eram estes que estávamos a procurar

para entrevistá-los” (informação verbal).30 O cenário é triste, porém real. E coube

aqui, no papel de investigador científico, buscar contribuir para este cenário e

devolver o real valor destes “senhores do passado” a quem devemos

reconhecimento pela construção histórica de nosso judô atual. Faz-se necessária e

relevante esta devolução de reconhecimento e saber à comunidade/sociedade

relacionada às práticas do Judô em nossa cidade. Quanto a estes aspectos

relacionados à valorização e desvalorização dos mestres, compreendemos que

fazem parte dos avanços e retrocessos civilizacionais que oscilam em uma evolução

não linear na forma de evidenciar positivamente ou negativamente determinados

aspectos sociais e/ou culturais, e neste sentido, necessita-se que o passado se faça                                                             30 Situação ocorrida durante treinamento prático de judô realizado na cidade de Recife, onde um

jovem faixa preta (20 anos de idade) mencionou o desconhecimento de alguns dos nomes selecionados a esta pesquisa.

37

valorizado no presente a partir de uma contextualização da consciência coletiva

através do reconhecimento de sua história e civilização.

Como veremos a seguir, a escolha, leitura e sistematização das dissertações

e teses, foram de extrema importância para criação de um roteiro metodológico, e

para refletir criticamente, possibilitando o pensar construtivo de nosso estudo. A

pesquisa foi de característica exploratória com abordagem qualitativa direcionada à

investigação por documentos de judô (registros, artigos, matérias de jornais e

revistas da época), dados coletados junto à comunidade japonesa e relativos à

imigração japonesa, políticas institucionais esportivas e de educação não formal a

respeito dos dados históricos que remetam a registros raros dos pioneiros mestres

de judô em nossa cidade.

Como veremos mais adiante, ao longo desta pesquisa, investigamos à luz

da interrelação entre a fonte documental e a história oral (realizada por coleta de

entrevistas), e para tal, utilizamo-nos da técnica de análise de conteúdo com auxílio

de software específico.

2.2 Metodologia de História Oral e sua Aplicação no Universo das Lutas: um Estado

da Arte

Estudos, como o de Franchini e Correia (2010), apontam que, embora com

notório crescimento, as pesquisas científicas com a temática “Lutas” ainda são

escassas no Brasil. Além disso, a maioria das pesquisas (monografias, artigos,

dissertações e teses) está concentrada na área da Saúde (no campo do

Treinamento Esportivo; Avaliação e testes de Aptidão física e na área da fisiologia

humana). Estudos compreendidos nas áreas das Ciências Humanas ainda são

minoria nesta referida temática e se concentram mais em setores como os da

Educação Física Escolar.

No intento de melhorar a organização e sistematização das ideias,

buscamos mapear quais as principais Teses e Dissertações existentes no Brasil, e

que tivessem como objeto de pesquisa as Lutas, analisadas no viés da educação e

que, preferencialmente, tivessem sido realizadas através do método de história oral.

Foram realizadas buscas no portal de Teses e Dissertações da

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), na

Biblioteca Digital da Universidade de São Paulo (USP), Biblioteca Digital da

38

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Biblioteca Digital de Teses e

Dissertações da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e ainda no Portal de

Teses e Dissertações do Domínio Público. Foram encontradas importantes obras

defendidas em vários estados do Brasil, conforme podemos verificar no quadro

abaixo (Quadro 1).

Quadro 1 – Teses e Dissertações encontradas Continua

Nº Titulo Tipo Autor Instituição Ano

1

Civilização e educação de artistas marciais: os saberes através da prática do Judô (1970 – 1980).

Tese Marcio Eustáquio Lopes Cavalcante.

UFPE 2014

2

Educação e Capoeira: figurações emocionais na cidade do Recife-Pernambuco-Brasil.

Tese Henrique Gerson Kohl

UFPE 2012

3

A influência da imigração japonesa no desenvolvimento do judô brasileiro: uma genealogia dos atletas brasileiros medalhistas em Jogos Olímpicos e campeonatos mundiais.

Tese Alexandre Velly Nunes

USP 2011

4

A memória das lutas ou o lugar do “DO”: as artes marciais e a construção de um caminho oriental para a cultura corporal na cidade de São Paulo

Tese Felipe Eduardo Ferreira Marta

PUC-SP 2009

5

O Judô; Do modelo artesanal ao modelo científico: um estudo sobre as lutas, formação profissional e a construção do Habitus

Tese Alexandre JanottaDrigo

UNICAMP 2007

6

O pulo do gato preto: estudo de três dimensões educacionais das artes-caminhos marciais em uma linhagem de capoeira angola

Tese Fábio José Cardias Gomes

USP 2012

7

Caminhando para uma nova (?) consciência: uma experiência de introdução da Arte Marcial na Educação.

Tese Luzia Mara Silva Lima

UNICAMP 1999

8

Do conceito do BUN BU RYU DO à atividade esportiva: a racionalidade moderna nas lutas marciais tradicionais

Dissertação. Marcel Farias de Sousa

UFG 2010

Fonte: o autor (2017)

39

Quadro 1 – Teses e Dissertações encontradas Conclusão

Nº Titulo Tipo Autor Instituição Ano 9

Uma história do Karate-dô no Rio Grande do Sul: de arte marcial à prática esportiva

Dissertação Tiago Oviedo Frosi.

UFRGS 2012

10

Capoeiras e valentões na história de São Paulo (1830 a 1930)

Dissertação Pedro Figueiredo Alves da Cunha

USP 2011

11

A inserção do Kung Fu no Brasil na perspectiva dos mestres pioneiros.

Dissertação Fernando Dandoro Castilho Ferreira

UFPR 2013

12

Princípios e valorização do judô na vida cotidiana de mestres da região de Mogi das Cruzes

Dissertação Gilmar Barbosa de Souza

USP 2010

13

Artes Marciais Chinesas: histórias de vida de mestres brasileiros e as tensões entre a tradição e o modelo esportivo

Dissertação Márcio Antônio Tralci Filho

USP 2014

14

No caminho das artes marciais: a relação Mestre e Discípulo como educação sensível.

Dissertação Luiz Arthur Nunes da Silva

UFRN 2014

15

O caminho dos pés e das mãos: Taekwondo, arte marcial, esportee a colônia Coreana em São Paulo (1970 a 2000)

Dissertação Felipe Eduardo Ferreira Marta

PUC-SP 2004

16

Artes Marciais e Jovens: violência ou valores educacionais? Um estudo de caso de um estilo de Kung Fu

Dissertação Rafael Carvalho da Silva Mocarzel

UNIVERSO-RJ

2011

17

Shaolin à brasileira: estudo sobre a presença e a transformação de elementos religiosos orientais no Kung-Fu praticado no Brasil

Dissertação Rodrigo Wolff Apolloni.

PUC- SP 2004

Fonte: o autor (2017)

Diante das 17 obras encontradas e listadas no Quadro 1, podemos inferir

que a produção científica acadêmica em nível de pós graduação (mestrado e

doutorado) no Brasil tende a aumentar, dada a relevância temática (lutas) já

defendida anteriormente na introdução desta pesquisa, como também, devido a

consolidação da história oral no meio científico. Entretanto, é sabido que quando

falamos de artes marciais e lutas existe um processo cultural vigente, tradicionalista

40

e específico no que concerne à transmissão de conhecimentos. A passagem muitas

vezes se dá de forma artesanal (de mestre a pupilo) e não sofre registros para

preservação, desta forma, a decisão por entrevistar mestres/senseis pioneiros

(através do método de história oral) torna-se importante do ponto de vista da

preservação, como também, pela construção de uma historicidade (FERREIRA;

MARCHI JÚNIOR; CAPRARO, 2014).

Dentre as sete teses e dez dissertações identificadas como estado da arte

nesta temática, tivemos a decisão de adotar três teses (3), selecionadas como base

para o presente estudo, justificando-se por esta decisão, baseados nas

aproximações que as mesmas possuem com nosso estudo. Logo abaixo realizamos

análise referente às três teses selecionadas por onde buscamos discutir a interface

que as mesmas apresentam com a nossa pesquisa.

Importante atentarmos para a relação direta presente nas três obras

escolhidas, visto que as mesmas se utilizam tecnicamente de métodos semelhantes

(história oral associada à investigação em arquivos e materiais históricos impressos

[fontes documentais], e a pesquisa bibliográfica). Além de que, os autores debatem

acerca de algumas modalidades de lutas em suas respectivas memórias e dentro de

determinados marcos temporais.

No estudo do Marta (2009) percebe-se uma obra de cunho mais histórico,

visto que o autor visa questionar como o Brasil (o estudo foi centrado na cidade de

São Paulo-SP), um país tão distante, geográfica e, talvez, mais ainda culturalmente,

dos países do chamado extremo oriente, acolheu as práticas corporais oriundas

daquela região? O autor busca entender como procedeu o processo migratório dos

orientais no pré e pós II Guerra Mundial, buscando identificar as nuances da relação

entre estabelecer-se no país e a busca por trabalho. Neste sentido, iremos utilizar a

referida obra no tocante à semelhança do contexto central investigado. Para este

estudo, foi de relevante importância o entendimento e a compreensão de como

instalaram-se os primeiros mestres de Judô na cidade do Recife-PE, e ainda

compreender como estes iniciaram seus trabalhos com a modalidade, vencendo as

possíveis adversidades de choques culturais.

Sabe-se que os primeiros mestres japoneses (criadores da modalidade

Judô) entraram pela cidade de São Paulo e de lá foram dispersando-se por todo o

Brasil. Frente a isso, buscamos investigar como se deu este processo de difusão até

a chegada à Recife. Neste cenário, foi objetivo de nossa investigação buscar

41

compreender o processo de instalação destes mestres e a respectiva receptividade

por parte da sociedade recifense. Estes e outros questionamentos são inevitáveis

quando se pretende investigar e reconstruir (e/ou reconstituir) esta história.

Outro ponto relevante encontra-se no fato de que o autor supracitado buscou

fundamentar seus argumentos a partir de importantes teóricos, nos quais, também

foram utilizados em nossa pesquisa, como por exemplo, o Norbert Elias (Teoria do

processo civilizatório). Para a metodologia, utilizaram-se do Paul Thompson (Método

de história oral) embasando através deste a sua opção metodológica. Refletindo

através do objeto de estudo do Marta (2009) nos perguntamos: Como e quanto

poderemos extrair das histórias de vidas dos mestres de Judô em Recife? Qual a

relação com o espaço, tempo e cultura no âmbito do processo de implantação desta

modalidade na cidade? E ainda, qual processo de ensino e disciplina era perpetuado

nestes ambientes (academias/ clubes) e em que ponto influenciou na

formação/educação dos cidadãos e cidadãs de nossa cidade? Aqui, vale

ressaltarmos que o ensino através das artes marciais caracteriza-se conceitualmente

como modelo de educação não formal, conceito este que, de acordo com a Gohn

(2010), defende-se enquanto processo de produção de sujeitos autônomos e

emancipados, cuja formação cidadã aparece como pressuposto fundamental.

Ainda sobre o método aplicado à tese de Marta (2009), percebe-se

claramente a intencionalidade do autor em valorizar a história a partir de critérios

estabelecidos para tornar a pesquisa mais original e, para isso, o autor determinou

entrevistar apenas mestres oriundos do Japão, China e Coréia do Sul, justamente

por perceber que eram destes países as artes marciais mais praticadas na cidade de

São Paulo (SP).

Outro ponto relevante da obra deve-se ao fato do pesquisador se questionar

quanto à gênese destas lutas na cidade de São Paulo. Quanto a este quesito, o

autor conclui que as artes marciais sofreram adaptações culturais próprias da

ocidentalização, onde, a partir disso, foi possível ganhar maior amplitude de

consumo por parte dos brasileiros. Neste quesito, fica claro que o autor busca

identificar um caráter de interdependência onde a modalidade influenciou, porém

também fora influenciada pela cultura vigente. Sabe-se que neste rito não existe

imparcialidade, ou seja, há de existir um processo natural de influencias recíprocas.

Este fato deve-se principalmente ao que o autor chama de esportivização das artes

marciais, processo pelo qual, muitas vezes, as mesmas sofrem “alterações” ou

42

“exclusões” de gestos técnicos (compreendidos como mais violentos) visando uma

maior aprovação e/ou aceitação em sociedades que compreendem as artes marciais

enquanto favorecedoras do aumento da violência social. Para isso, o autor da tese

buscou entender este fenômeno à luz da teoria do processo civilizatório preconizado

pelo sociólogo Elias (1994a,b), compreendendo, assim, que a esportivização teria

um papel como parte do processo civilizatório ocidental, em especial no que se

refere ao controle das emoções, por consequência da violência.

Esta passagem, particularmente, nos ofertou reflexão crítica e de relevante

interesse, por entender que os componentes das lutas e artes marciais têm sua

gênese (pré-história) relacionada à sobrevivência, e que, a partir do momento em

que ressignifica-se mediante cada cultura de seus países, as lutas partem, então,

para um processo contemporâneo de estabelecimento de regras próprias que estão

intimamente relacionadas às regras sociais de convivências estabelecidas entre os

indivíduos na sociedade. A partir disso, devemos entender que os conceitos de boa

convivência, valorizados no meio esportivo ocidental, tais como o “fair play” (ou jogo

limpo) estão intimamente relacionados ao processo civilizatório (ELIAS, 1994a,b) por

onde os indivíduos foram desenvolvendo suas próprias regras e normas de

convivência. Neste sentido, Marta (2009) impulsionou para que pudéssemos debater

mais amplamente sobre os conceitos de tradição e modernidade relacionados a esta

cronologia temporal, em que as lutas refletem a partir de sua relocação cultural,

como também, para situar estas intervenções educacionais tradicionalistas e não

formais de ensino em seu devido contexto histórico e educacional vigente, e no

período específico em que se pretendeu investigar.

Outro estudo significativo para a pesquisa é o do Nunes (2011). Nele, o

pesquisador buscou compreender como procedeu a possível genealogia do judô

brasileiro a partir de seus medalhistas olímpicos e mundiais. Apesar do caráter

competitivo por trás do objeto de estudo desta investigação, percebe-se que a obra

traça o debate a partir da importância do resgate e da valorização de todos os

antigos mestres (genearcas da modalidade) que residem ou residiram no país e que

foram responsáveis pela formação desta geração de grandes atletas nacionais do

judô (heróis olímpicos e mundiais). Aqui, vale ressaltarmos a ênfase com que o autor

solicita que esta rica memória do esporte nacional não seja perdida ou esquecida,

pois os protagonistas destas histórias devem ser catalogados e terem suas histórias

de vida reveladas.

43

O trabalho ressalta, ainda, que existiu marcos temporais relevantes quanto

ao desenvolvimento da modalidade no Brasil. Podemos citar, por exemplo, a

chegada do navio Kasato Maru no porto de Santos-SP, em 1908 (considerado o

marco zero da imigração japonesa no Brasil), destaca-se também o período antes

da segunda guerra mundial, onde o judô estava instalando-se como foco em um

judô de base, ou seja, um ensino de judô mais voltado à formação do cidadão (Judô

tido como de caráter mais educacional) e que, após o período de guerra, começou a

desenvolver-se rumo ao viés de esportivização e, consequentemente, de

competições (olimpíadas e mundiais), dando cara a um novo judô de caráter mais

competitivo e com propósitos mais comerciais, pensados para uma sociedade cada

vez mais capitalista. Quanto a estas modificações pós-guerra, e relacionadas à

esportivização, podemos perceber que os argumentos do Nunes (2011) relacionam-

se aos do Marta (2009) pelo qual destacamos anteriormente neste presente texto.

Quanto à tese do Prof. Nunes (2011), identificamos que não possuía um

princípio teórico norteador bem definido, apesar do mesmo utilizar-se de conceitos

do sociólogo jamaicano, Stuart Hall. No entanto, fica claro que o mesmo utiliza-se,

predominantemente, das obras de sua orientadora, a professora doutora Katia

Rúbio31 (Pesquisadora da Escola de Educação Física e Esportes - USP), pois é

notório que a mesma possui vasta experiência em pesquisa na linha da história dos

esportes Olímpicos no Brasil e por onde o mesmo, enquanto participante em seu

grupo de estudos, pôde desenvolver esta pesquisa específica com a modalidade

Judô.

É interessante perceber que a obra foi de grande abrangência, visto que o

pesquisador passou por estados de todas as regiões do Brasil (inclusive Recife,

onde o mesmo esteve com o sensei Tadao Nagai – pelo qual também o

entrevistamos aqui nesta pesquisa) dando continuidade a uma saga investigativa

que objetivava dar voz ao passado através de seus protagonistas de várias

gerações. Em relação à abordagem metodológica, percebe-se que o autor, ao

utilizar-se da análise das histórias de vida, baseou-se em autores como Poirier et. al.

(1999) para justificar o método e, na intenção de complementar, também buscou

documentos do judô nacional (impressos) em arquivos públicos e bibliotecas.

                                                            31 Link para o Currículo Lattes da Profª. Dra. Kátia Rúbio: http://lattes.cnpq.br/0941910739814664.

44

Em relação ao trabalho desenvolvido por Nunes (2011), encontramos

suporte relacionado não só ao método utilizado como também aos achados, pois, o

pesquisador supracitado, encontrou diferenciações entre mestres com

características de reconhecimento diferenciadas, uns mais pedagógicos e formativos

e outros com o viés mais competitivo e voltado à formação de atletas. Quanto a este

quesito, também encontramos evidências semelhantes, visto que existiam indícios

(matérias de jornais da época e entrevistas registradas – acervo pessoal) de que o

Judô tenha se estabelecido em Recife-PE a partir de confrontações e desafios (a

exemplo das competições de vale-tudo por onde estes mestres envolviam-se para

suas próprias promoções) e que, na época, eram publicamente divulgados por eles

mesmos em veículos de informação (como rádio e jornais da época), algo que

constatamos ao longo das entrevistas realizadas durante esta pesquisa,

identificando, assim, quais estilos e características docentes são mais presentes e

pertinentes dentre estes antigos mestres.

Sempre acreditamos que traçar os genearcas do judô recifense

representaria não apenas a importância desde dado para a memória do judô

estadual, municipal e até regional, mas principalmente, enquanto expressão de uma

filosofia de vida e de educação, que se apresentara de suma importância ao cenário

educacional esportivo de nossa cidade. Por já possuirmos alguns importantes

arquivos documentais e termos mapeado boa parte da estratégia metodológica

quanto aos critérios da seleção dos possíveis mestres a serem entrevistados,

percebemos que a pesquisa tornar-se-á não só possível e viável, mas que, após ler

a tese do Nunes (2011, grifo nosso) pudemos refletir criticamente e perceber o

quanto poderia ser importante escrever a história destes nossos genearcas32, que

possuem um valor inestimável perante a sociedade, enquanto importantes

agentes/educadores sociais de seus meios e métodos de educação não formal

(GOHN, 2010) e, ao que tudo indicava (mesmo que ainda fosse apenas uma

hipótese), confirmou-se como de relevante importância social na formação

complementar de cidadãos (ãs) recifenses de várias gerações.

Durante a leitura da obra do Kohl (2012), tese de doutoramento defendida no

Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPE (PPGE-UFPE), na linha de

                                                            32 Grifo nosso em intenção de ressaltar significativa emoção em relação a importância de tal pesquisa

e enquanto função de pesquisador engajado em um proposta de estudo que sonhava realizar desde 2006, ao terminar a graduação em Educação física.

45

pesquisa em Teoria e História da Educação, pudemos nos apropriar melhor de um

tratamento metodológico e científico que investigasse uma modalidade de lutas em

nossa própria cidade (Recife), neste caso, o autor em questão debateu acerca da

capoeira. Aproveitamos satisfatoriamente desta referida obra, visto que o autor

busca compreender e elucidar as figurações emocionais envolvidas na relação entre

a Educação e a Capoeira, próprias da implantação e evolução desta cultura corporal

(capoeira) no âmbito local do Recife-PE no período que compreendeu as décadas

de 80 e 90 do século XX.

Na obra do Kohl (2012), segundo o próprio autor, trabalhou-se com a

hipótese de que houve mudanças no processo de formação do capoeira, geradas

por processos educativos norteados por relações interdependentes e materializadas

entre figurações da capoeira da cidade de Recife e doutras figurações. Delimitou-se

o seguinte problema de pesquisa: enquanto fenômeno educativo não formal, como a

capoeira desenvolveu-se na cidade de Recife entre as décadas de 80 e 90 do século

XX? O objetivo foi identificar e analisar o processo civilizatório existente na capoeira

desenvolvida por algumas de suas referências na cidade do Recife entre as décadas

de 80 e 90 do século XX. Ao longo de toda tese, o autor deixa claro a opção por ter

desenvolvido sua pesquisa a partir do sociólogo Elias (1994a,b) e uma de suas

principais teorias, o processo civilizatório, principalmente quanto ao aspecto do

controle das emoções. Quanto ao teórico norteador para a metodologia, Kohl busca

amparar-se em Thompsom (1992) e Montenegro (2007) na intencionalidade de

justificar, embasadamente, o método de história oral em seu trabalho.

Em relação à obra do Kohl (2012), ressaltamos que a mesma traça um

desenho metodológico de pesquisa pelo qual tivemos semelhante intencionalidade

de realização em nosso estudo. O autor busca elucidar a memória da capoeira

recifense a partir dos relatos de história oral de seus principais protagonistas e, a

partir disso, relacionar com uma construção temporal/cronológica de como se

implantou e expandiu-se a capoeira na cidade. Ressalta-se aqui a opção pelo

processo civilizatório (ELIAS, 1994a,b) como base para justificar a implantação da

capoeira na cidade e por onde ocorriam as relações que envolviam emoções e

tensões próprias de uma sociedade em que se ajustava, dinamicamente, na

intenção de uma boa relação de convívio e harmonia entre os pares. No que

compete aos saberes educacionais da capoeira, o autor busca o conhecimento

acerca da educação não formal como centro teórico de discussão dos modelos e

46

sistemas educacionais específicos da capoeira. Fica claro que o percurso utilizado

por Kohl (2012) possui grandes aproximações metodológicas com a nossa pesquisa,

sendo que, no caso dele, o objeto de estudo foi a capoeira, e o nosso será

delimitado aos primórdios do Judô local (Recife).

Neste sentido, a obra apresentou-se de grande relevância para a nossa

pesquisa, pois também tínhamos o intento de analisar o início do judô a partir deste

mesmo teórico (ELIAS, 1994a,b) e de sua respectiva abordagem (processo

civilizatório) como sendo o principal teórico norteador da pesquisa. Também tivemos

a intencionalidade e perspectiva de abordar a educação através da interface com o

judô a partir do processo não formal de ensino a que foi estabelecido ao longo da

história da modalidade e protagonizado por seus antigos mestres.

Ressalta-se, nas três obras selecionadas, o rigor metodológico desenvolvido

pelos autores, além de que, por tratar-se de teses defendidas em programas de Pós-

Graduação com reconhecidos níveis de excelência e de importantes Instituições

Nacionais (PUC; UFPE e USP), acreditamos que as mesmas se constituíam como

importantes fontes de pesquisa para nortear-nos ao longo da dissertação.

No próximo tópico da dissertação descreveremos detalhadamente como

procedemos quanto aos critérios para definição dos mestres, como também, quanto

ao processo da técnica de entrevistas e coleta dos dados (fontes orais).

2.3 Definindo os Mestres a serem Entrevistados, o Processo de Técnica e Coleta de

Dados

Em nossas leituras e pesquisas, atentamos ao fato de que todo projeto de

história oral necessita de uma boa organização estrutural. No que tange aos

procedimentos, optamos pela técnica de entrevistas para contemplar a metodologia

da história oral. A seguir, decorreremos detalhadamente acerca de nossas adesões

quanto aos conceitos teóricos e procedimentais relacionados à nossa intervenção

metodológica, ressaltando, assim, os nossos passos, cuidados e observações neste

aspecto.

De acordo com Meihy e Holanda (2014, p. 14), “entrevista em história oral é

a manifestação do que se convencionou chamar de documentação oral, ou seja,

suporte material derivado de linguagem verbal expressa para esse fim”, contudo, o

mesmo afirma que estas documentações orais, quando por intermédio de um

47

propósito e devidamente registradas através de gravações eletrônicas, tornam-se

fontes orais.

Como já ressaltamos na introdução desta pesquisa, podemos dizer que

nossa jornada metodológica em busca da sistematização de fontes orais teve início

em 2008, enquanto graduando na Escola Superior de Educação Física da

Universidade de Pernambuco (ESEF-UPE), juntamente com o auxílio do então

estudante de Educação Física, Luciano Flávio Leonídio (hoje, doutor em educação)

e o docente titular da disciplina Judô naquela instituição, o prof. Marco Aurélio

Lauriano, tivemos a ideia de levantar material histórico que buscasse resgatar a

história do Judô no estado de Pernambuco e por onde relacionaríamos as histórias

de vida coletadas via metodologia da história oral e focadas em questionamentos

que pudessem esclarecer aspectos históricos, sociais e de episódios (contos)

técnicos ou competitivos vivenciados por aqueles personagens (senseis).

Este material nunca foi tratado (paramos na fase de registro das entrevistas),

ficando arquivado (salvo e protegido intocavelmente) com o presente pesquisador

deste estudo por todo este período (de 2008 a 2016) transformando-se em arquivo

pessoal. Contudo, ao partirmos para a “primeira”33 fase de transcrições do material

(ocorrida durante a fase de escrita desta dissertação), percebemos que aquela

versão semiestruturada de perguntas não mais atenderiam ao nosso novo objeto de

pesquisa, ou seja, detectamos uma incompatibilidade temporal e conceitual quanto

ao (re)aproveitamento daqueles dados, o que é compreensível, uma vez que em um

espaço temporal de oito anos avançamos quanto à maturidade científica enquanto

pesquisadores. Frente a este novo cenário constatado, fez-se necessário que

revisitássemos parte daqueles mestres anteriormente entrevistados, com a

finalidade de buscarmos novas informações, porém, agora direcionadas a responder

as especificidades desta pesquisa. É importante reafirmarmos a nossa decisão por

não utilizarmos nenhuma das antigas entrevistas realizadas em 2008, pois optamos

construir um novo percurso metodológico que proporcionasse a formação de um

novo acervo documental, e assim, partirmos de um marco zero para nossa presente

pesquisa.

                                                            33 “Primeira” porque nesta nossa pesquisa iniciamos tratando nosso acervo pessoal referente as

entrevistas executas em 2008, contudo e como explicamos, decidimos não mais utilizar este material citado, e assim, partimos para novas entrevistas em 2016 juntamente a uma “segunda” fase de transcrição como detalharemos em seguida.

48

Sobre o nosso antigo banco de dados, possuíamos entrevistas com sete (7)

mestres (sendo quatro do judô e três da luta livre/jiu-jitsu34), destes, revisitaríamos

apenas três (3)35e realizaríamos mais duas (2) novas entrevistas36, totalizando,

assim, 05 novas entrevistas. Com respeito às entrevistas, vale ressaltarmos

afirmação de Meihy e Holanda (2014, p. 167) de “que história oral não é só

entrevista, ainda que entrevistas façam parte de uma abordagem da história oral”.

Desta forma, queremos enfatizar que as etapas seguem após a mesma (fases de

pós-entrevistas), e também possuem sua importância enquanto história oral em sua

macro análise metodológica.

Sobre o quantitativo selecionado, entendemos que equalizar a definição

quanto ao número “ideal” de entrevistas que contemplasse a nossa investigação em

sua totalidade não seria tarefa fácil, sobre este quesito, Meihy e Holanda (2014, p.

29), corroboram ao afirmarem que “calibrar o número de entrevistados com o

alcance do projeto é quase uma arte”. Em relação à definição quanto ao número de

entrevistas, Alberti (2005, p. 36) afirma que “deve ser suficientemente significativo

para viabilizar certo grau de generalização de resultados do trabalho”. Concordando

com ela, percebemos que, conforme avançávamos no tratamento das entrevistas

(processos de transcrições e leituras), percebíamos que o número determinado por

nós (cinco no total) não exigia complementação com novos entrevistados, pois

aquilo que tínhamos em mãos contemplava a nossa pesquisa.

Para o novo percurso de entrevistas, determinamos que todas seguiriam um

roteiro de perguntas previamente estabelecido (entrevista semiestruturada), no

intuito de colher o registro de história oral dos mestres aposentados e/ou atuantes

dentro e/ou fora do âmbito escolar formal.Sobre este modelo de roteiro de entrevista

denominado como semiestruturada (também conhecido como semidiretiva ou

semidirigida), nos embasamos em Bardin (2011, p. 93) quando diz que “entrevistas

semidiretivas (também chamadas com plano, com guia, com esquema, focalizadas

semiestruturadas), são mais curtas e mais fáceis [...]”, sobre este aspecto,

entendemos que a autora relaciona estas características (curtas e fáceis) ao controle

do tempo e da centralização do tema (foco) por parte do entrevistador durante a                                                             34 Com a decisão por realizarmos novas entrevistas, não foi necessário refazermos as mesmas com

os mestres Jurandir Moura, Francisco Arruda e nem o José Gomes, pois agora contemplaríamos apenas o objeto Judô e não mais a luta livre e/ou o JiuJitsu.

35 Na ocasião, foram revisitados os mestres: Tadao Nagai, Diógenes Moraes e Hayashi Kawamura. 36 Dos novos entrevistados em comparativo ao antigo banco de dados de 2008, tivemos a

oportunidade de entrevistar os senseis Marco Aurélio e Byung Kuk Lee.

49

intervenção prática. Corroborando com nosso entendimento, Matos e Senna (2011,

p. 104) afirma que “a mais indicada é a semidirigida, é um meio termo entre a fala

única da testemunha e o interrogatório direto”. Segundo este autor, conceitualmente,

o que ele denomina como “dirigida”, seria a que engessa o entrevistado a um

questionário fechado, e a “não dirigida”, a que pode facilitar o afastamento temático

por parte do entrevistado (por ser muito aberta). Evitando conflitos terminológicos,

optaremos pelo termo conceitual denominado por semiestruturado.

Sobre o roteiro ou guia (Apêndice A) de perguntas selecionadas (aqui,

denominado por semiestruturado), focamos em questões que proporcionassem a

análise não apenas da importância social e histórica destes protagonistas, mas

principalmente, a importância educacional destes para aqueles que vivenciaram os

benefícios educacionais do judô. Assim, objetivamos contemplar um legítimo debate

acerca de aspectos históricos e pessoais dos mestres e do judô recifense e,

também, sobre a educação em si, já que nossa pesquisa está lotada em um

programa de pós-graduação nesta área do conhecimento e, por onde pretendemos

traçar uma interrelação que contemple o judô e os aspectos educacionais envolvidos

nas vivências do judô pela sociedade (praticantes). Sobre o caminho para a

construção do roteiro de perguntas, contemplamos o roteiro com base em

Montenegro (2013, p. 150) que traz à tona a importância de que “as perguntas

devem sempre ter um caráter descritivo e evitar qualquer indução ou juízo de valor

[...] As perguntas devem ser curtas [...]”.

Em relação à seleção dos entrevistados, de acordo com Meihy e Holanda

(2014), devemos pensar em responder ao questionamento “de quem?”, para

justificar a realização da história oral. Desse modo, o autor pede que justifiquemos

as razões pelas escolhas dos entrevistados. Já Alberti (2005) ressalta a importância

de que a escolha dos entrevistados seja guiada inicialmente pelos objetivos de

pesquisa e de seu domínio por parte do entrevistador. A mesma ainda ressalta a

importância de atentar ao aspecto qualitativo quanto ao posicionamento dos

selecionados frente ao seu contexto/grupo social e do significativo de suas

experiências relacionadas ao tema e objeto de pesquisa.

Quanto aos protagonistas selecionados para a nossa pesquisa, os mesmos

foram identificados previamente através de análise de pesquisa documental

realizada com o intuito de traçar aqueles que eram mais mencionados por

praticantes e também, significativamente, presentes em reportagens e recortes

50

históricos de jornais e revistas da época (análise documental), como também,

através de conversas informais com alguns outros mestres que fortaleciam a citação

destes mesmos nomes selecionados na pesquisa.

Dentre os critérios de inclusão para a escolha dos entrevistados,

determinamos que todos os entrevistados deveriam ter sua história, total ou

predominantemente, ligada especificamente à modalidade judô (e não à outras

lutas). Também ficou decidido que, no caso de mestres falecidos, excluiríamos a

possibilidade de entrevistas por terceiros (familiares e/ou amigos), visto que

acreditamos que não teríamos uma boa riqueza de detalhes informacionais. Vale

ressaltarmos que os sujeitos relacionados no quadro 2 (abaixo) foram encontrados

e/ou contatados predominantemente através da utilização de redes sociais

(principalmente Facebook®37 – através de acesso inicial por seus familiares) além de

contatos diretos, onde fomos gentilmente atendidos a partir de agenda pessoal de

contatos através de outros mestres que nos passaram gentilmente os telefones e/ou

endereços dos senseis selecionados para a pesquisa, para que pudéssemos

estabelecer os primeiros contatos.

Ainda sobre os senseis (mestres) selecionados, é importante registrar que

existiam laços sociais de boa convivência entre o pesquisador e os mesmos,

facilitando não só o acesso aos mesmos, como também, um maior conforto e

segurança quanto à amplitude de suas falas, ou seja, daquilo que gostariam de dizer

ao serem solicitados através da entrevista. Sobre este aspecto, Tourtier-Bonazzi

(2006 apud MATOS; SENNA, 2011, p. 104), afirma que “o sucesso da entrevista

depende da relação de amizade – conquistada através de encontros anteriores ao

dia marcado para entrevista – entre a testemunha e o pesquisador”. Já Bosi (2013,

p. 60) alerta que “a entrevista ideal é aquela que permite a formação de laços de

amizade [...] Da qualidade do vínculo vai depender a qualidade da entrevista”.

Compactuamos com esta ideia, haja vista que, mesmo após a coleta das

entrevistas, continuemos em laço afetivo-social junto aos nossos senseis

entrevistados. Esta nossa habilidade comunicacional estabelecida na relação

também é corroborada por Guerra (2014, p. 52):

                                                            37 Rede social digital criada em 04/02/2004, mundialmente conhecida e utilizada.

51

Claro que se pretende uma relação de neutralidade face ao conteúdo do que é dito, mas a ética da relação estabelecida nas entrevistas é comunicacional e não apenas racional, pelo que se revelam fundamentais as capacidades de empatia e de interação humana.

De acordo com referências teóricas importantes que atuam no estudo da

história oral e da análise de conteúdo, tais como, Bardin (2011), Bosi (2013), Guerra

(2014), Meihy; Holanda (2014) e Montenegro (2013), a técnica e/ou procedimento de

entrevista é parte crucial em uma investigação qualitativa voltada à coleta de

dados/depoimentos a partir de fontes orais. Contudo, sabíamos de toda

complexidade envolvida neste procedimento metodológico enquanto técnica de

coleta informacional de dados, pois Guerra (2014, p. 52) já nos alertava que “parece

uma questão simples, mas não é. Pedir a alguém que nos conte a sua vida é

complexo [...]”.

Antes de cairmos, de fato, em campo e na prática com as realizações das

entrevistas, tivemos alguns cuidados técnicos prévios, que nos proporcionaram

melhor qualidade em nossos futuros documentos de registros orais. Neste sentido,

criteriosamente, buscamos conhecer previamente o máximo acerca da história dos

nossos entrevistados e também sobre o assunto em pauta. Sobre este quesito existe

um consenso dos autores quanto à importância destes dois cuidados. Corroborando

conosco, podemos citar o que diz Montenegro (2013, p. 151), “o fato de o

pesquisador ter um perfil da história de vida do entrevistado aumenta, de forma

significativa, a compreensão da própria memória do depoente”. Já a Bosi (2013, p.

59) fortalece o nosso cuidado, dizendo que “convém recolher o máximo de

informações sobre o assunto em pauta para formular questões que o estimulem a

responder”.

Quanto ao local das entrevistas seguimos os direcionamentos preconizados

pelos autores. De acordo com Guerra (2014, p. 60), “as entrevistas devem ser

realizadas preferencialmente em local neutro, ou pelo menos de fácil controle pelo

entrevistado”, igualmente, Matos e Senna (2011, p. 104) afirmam que “o lugar

escolhido também é importante para o sucesso da entrevista: deve ser tranquilo,

onde o entrevistado sinta-se a vontade”. Ainda quanto ao aspecto do local a serem

realizadas as entrevistas, selecionamos um trecho da fala de Meihy e Holanda

(2014, p. 56) no qual o autor refere que devemos “[...] sempre que possível, deixar o

colaborador decidir onde gostaria de gravar a entrevista”. Por fim, concordamos com

52

Bosi (2013) no entendimento de que não existirá o lugar ideal, ou melhor, todos

apresentarão prós e contras, como exemplo, podemos citar o ambiente residencial

que, por um lado, poderá ser confortável e hospitaleiro, mas por outro, poderá sofrer

interrupções por parte de familiares. Em suma, caberá sempre uma análise mediada

pelo bom senso e ponderações. Por fim, esclarecemos que todos os locais por onde

realizamos as entrevistas foram, satisfatoriamente, relevantes quanto à qualidade do

ambiente para captação do áudio, assim como, quanto ao ambiente de conforto aos

entrevistados.

Todas as nossas entrevistas foram conduzidas tecnicamente pelo próprio

autor da pesquisa e o local de entrevistas variou entre os espaços de atuação dos

senseis (Dojôs), suas residências ou outros espaços de trabalho, a exemplo de uma

entrevista que fora realizada em uma sala localizada numa instituição de ensino

superior (IES) onde o sensei também trabalhava. Importante ressaltar que o local e

horário foram plenamente decididos de acordo com a disponibilidade e conforto

mencionado por parte do depoente durante primeiro contato para efetivação do

convite (via contato telefônico). Foram entrevistados em seus dojôs (Tadao Nagai,

Hayashi Kawamura); em suas residências (Diógenes de Moraes e Byung Kuk Lee) e

por fim, em seu outro ambiente de trabalho – uma sala da Escola Superior de

Educação Física (ESEF) – o sensei e professor universitário Marco Aurélio Lauriano.

Sobre a duração das entrevistas, de acordo com Guerra (2014, p. 60), “as

entrevistas têm um tempo muito variável, dependente do tipo de pesquisa [...] De

qualquer forma, o tempo desejável para não criar mal-estar no entrevistado é de

duas a três horas”. Neste sentido, atendemos a este requisito, conforme podemos

conferir no quadro 2 desta pesquisa, nossa menor duração foi de média de 22

minutos, e a nossa maior, ficou em torno de 1 hora e 24 minutos. Torna-se

importante ressaltarmos que não gerávamos nenhum tipo de informação quanto a

limites de tempo aos entrevistados e que todas elas fluíram naturalmente e de forma

confortável a todos (entrevistador-pesquisador e entrevistado).

Quanto à captação de áudio durante as entrevistas, existe atualmente um

pleno reconhecimento científico acerca da utilização de recursos tecnológicos. De

acordo com Meihy e Holanda (2014, p. 23):

Até pouco tempo resistia-se às mudanças do sistema analógico para o digital. A conquista de mercado digital, porém, se impôs de maneira definitiva. A reprodutividade técnica e a facilidade de armazenamento e

53

transporte fazem com que, atualmente, não haja dúvida da validade do uso de recursos digitais. Ademais, os expedientes digitais facilitam o arquivamento das entrevistas e seus manejos em programas de computadores.

Para as nossas coletas de entrevistas foram realizados os devidos registros

das mesmas, utilizando-se de equipamentos eletrônicos tais quais, um micro

gravador digital da marca GPx® (DVR540) e, por segurança, contamos também com

mais dois outros gravadores reservas (aplicativo Apple de gravação/captação de voz

presente no celular de marca Iphone®38 5s), como também, um mp3 player da

marca Philips®39. Todos estes equipamentos eletrônicos foram devidamente

colocados em locais importantes dentro do cenário/local da entrevista, visando uma

melhor e segura captação do áudio. O gravador central/principal da pesquisa, da

marca GPx (DVR540), ficou mais próximo do narrador (geralmente no bolso da

camisa dos mesmos), o Iphone® 5s ficou localizado de forma fixa entre o narrador e

o pesquisador, e, por fim, o mp3 player da Philips foi usado como microfone na mão

do pesquisador.

Estas decisões estratégicas quanto aos recursos tecnológicos foram de

extrema importância, uma vez que, nas transcrições (fase pós-entrevistas), foi

possível cruzarmos as informações e tirar dúvidas sobre o que foi dito através do

comparativo de mais de um aparelho. Outro fator importante deve-se ao fato de, em

caso de decisão por uso apenas de um equipamento, incorreríamos no risco de

termos que remarcar entrevistas caso os aparelhos apresentassem problemas

técnicos e/ou que, por motivos não controlados, houvesse falhas de captação da

voz. Entendemos que um eventual processo de remarcação de entrevistas

desgastaria a relação pesquisador-entrevistado, visto que interferiria no cotidiano

destes mestres e em toda sua logística diária.

Quanto à equipe de trabalho, não foi necessário mais que o entrevistador e

seu aparato tecnológico de gravações. Todas as entrevistas foram conduzidas única

e exclusivamente pelo próprio pesquisador, não apenas pela proximidade do mesmo

aos entrevistados, como também pelo domínio pleno da problemática e dos

objetivos de pesquisa, o que garantiu maior rigor metodológico quanto aos

procedimentos técnicos.

                                                            38 Fabricado pela empresa Apple Inc. (Estados Unidos da América – EUA). 39 Fabricado pela empresa holandesa de mesmo nome – PHILIPS Inc.

54

Após contato prévio, via ligação telefônica, visando a definição de local,

horários e melhores datas por parte dos entrevistados, passamos a fase de

realização de todas as entrevistas, realizadas através de apenas uma visita/encontro

com cada mestre. Todo procedimento padrão metodológico e sequencial fora

repetido com todos os entrevistados, e incluíam as seguintes etapas: a)

detalhamento da importância do entrevistado à pesquisa; b) leitura do roteiro de

perguntas (semiestruturadas) e do termo de consentimento livre esclarecido (TCLE);

c) esclarecimentos de eventuais dúvidas que surgissem; d) realização da

coleta/entrevista propriamente dita (início da gravação); e) fase final de assinatura

dos documentos; f) agradecimentos e considerações finais por parte do

entrevistador.

Para a nossa pesquisa, todos os sujeitos selecionados a serem

entrevistados assinaram o TCLE (Apêndice B) - onde constam todos os detalhes e

procedimentos da pesquisa e pelo qual os mesmos puderam optar livremente pelo

fornecimento ou negação de informações à pesquisa.

Como dito anteriormente, para esta pesquisa optamos pelo tipo de entrevista

denominada como semiestruturada (Apêndice A), através da qual pudemos traçar

um caminho conceitual e focar na temática a ser desenvolvida, e por onde a mesma

norteou-se através de um determinado roteiro. Em nosso prévio roteiro

(semiestruturado), idealizamos treze (13) perguntas base que seriam agregadas por

outras demandas intrínsecas ao próprio momento da entrevista, ou seja, formulam-

se perguntas sem fugir do assunto, abrindo possibilidades de flexibilidade para que o

entrevistado possa relatar outras ações (caso necessite) e que não se encontram no

roteiro previamente estipulado. Desta forma, justificou-se a variabilidade do tempo

total entre as entrevistas realizadas, conforme podemos conferir no (quadro 2).

Em relação à estipulação das treze perguntas que constam no roteiro

semiestruturado, buscamos contemplar os objetivos da pesquisa, como também o

seu problema em investigação. Em fortalecimento à nossa decisão sobre o roteiro,

evidenciamos a afirmação incisiva de Bosi (2013, p. 55) quando afirma que “no

tocante às técnicas de pesquisa, estas devem ser adequadas ao objeto: é a lei de

ouro. Não conheço outra”. Desta forma, dando conta do objeto de pesquisa em

questão, as perguntas foram estruturalmente divididas em cinco partes sequenciais:

Bloco 1. (Três perguntas relacionadas à gênese do Judô em Recife); Bloco 2.

(Quatro perguntas relacionadas ao processo de educação através do judô); Bloco 3.

55

(Três perguntas relacionadas a especificidade dos aspectos da cultura judoística);

Bloco 4. (Uma pergunta contextualizada no âmbito do debate da sociedade x

violência – aspectos da civilidade); e, por fim, o Bloco 5 (Duas perguntas

relacionadas a reflexões acerca de expectativas para o futuro no que tange ao judô,

pela visão dos mestres). Mais adiante, no tópico 2.4 desta seção, detalharemos

como nos utilizamos da técnica de análise de conteúdo em relação ao tratamento

destes dados informacionais (categorizações das perguntas contidas no roteiro)

colhidos pelas entrevistas.

Durante a fase de entrevistas, ressalta-se que, para o pesquisador, era um

momento de certa forma sublime, onde, mesmo tendo que manter toda exigência

ética e protocolar enquanto investigador científico, não poderia deixar de mencionar

que fora uma fase realizada com muita satisfação por parte do pesquisador e por

onde se faria presente uma exaltação emotiva e natural por parte deste. Conversar

com históricos e reconhecidos mestres de judô, tidos, inclusive, como referencias na

vida do próprio pesquisador, possibilitaram oportunidade ímpar de aproximação

através de cada encontro realizado. Contudo, reforçamos que, seguindo o rigor

metodológico, cumprimos todos os procedimentos necessários a este momento da

pesquisa, sem que fatores pessoais e/ou emocionais por parte do pesquisador,

pudessem influenciar na pesquisa.

Sobre as narrativas coletadas via entrevistas, existiu uma constante

preocupação em relação a possibilidade de que os mestres pudessem falar ao

máximo e naturalmente de acordo com suas memórias. Sobre estes momentos de

entrega de relatos e narrativas, Bosi (2013, p. 64-65) nos atenta ao fato de que “os

lapsos e incertezas das testemunhas são o selo da autenticidade. Narrativas

seguras e unilaterais correm sempre o perigo de deslizar para o estereótipo [...] a

fala emotiva e fragmentada é portadora de significações que nos aproximam da

verdade”. Desta forma, e tomando como base a fala da autora supracitada, sempre

nos mantivemos com a clareza de que os entrevistados nunca poderiam ser

colocados em situações de réus, mesmo que por parte do investigador/pesquisador,

pudesse haver reflexões críticas sobre o fato dos relatos serem integralmente

verdadeiros ou não. Cada um conta a sua verdade, e não é nossa função julgá-los

(BOSI, 2013).

Muitas vezes durante as entrevistas, e devido a capacidade individual de

cada mestre de judô, os mesmos não lembravam alguns detalhes informacionais, o

56

que era totalmente normal devido a fatores do tempo (quanto aos fatos ocorridos) e

da idade dos mesmos. Estávamos, na verdade, preocupados apenas em conhecer

suas histórias, respeitando a capacidade de memória de cada um. Bosi (2013, p. 66)

reforça que “ser inexato não invalida o testemunho, diferentemente da mentira,

muitas vezes exata e detalhista”, desta forma, seguimos sempre na certeza de que

estávamos procedendo corretamente quanto aos procedimentos metodológicos de

entrevistas.

Neste momento, é importante ressaltarmos o procedimento quanto ao

fechamento das entrevistas, no que concerne à formalização documental. Após cada

uma das entrevistas decidimos por colocar em opção, por parte dos entrevistados,

se os mesmos preferiam assinar os documentos finais após terem cedidos seus

depoimentos ou se queriam uma nova visita relacionada à leitura de suas falas e

respectivas autorizações de transcrições. Para tal encaminhamento opcional, nos

baseamos em Montenegro (2013, p. 149), onde o mesmo afirma que “o

entrevistador deverá solicitar, por escrito, autorização para divulgar a entrevista.

Caberá, entretanto, ao entrevistado decidir se assina ao final da entrevista ou

apenas após a transcrição da mesma”. Em nosso caso, todos os cinco optaram por

assinar antecipadamente os documentos relacionados à utilização de suas

entrevistas gravadas, como também de suas transcrições de forma antecipada como

prevê Montenegro (2013).

Vale ressaltar que, do ponto de vista ético, foram respeitadas todas as

ponderações ao longo das entrevistas, onde, na medida em que os mestres se

posicionavam acerca da exclusão de algum aspecto da fala (por algum motivo ou

desejo pessoal), nós anotávamos os minutos e cortávamos durante a transcrição.

Aqui, ressaltamos que foram raríssimas as ocasiões em que houve solicitações

deste tipo.

Também vale destacarmos que decidimos por não anexar as entrevistas

(transcrições) ao final da pesquisa por dois motivos: primeiramente, por julgarmos

desnecessário, por acreditarmos que isso apenas ocasionaria em aumento do

volume quantitativo de páginas; e por analisarmos os dados via software (Nvivo®),

prevendo, assim, que através desta opção metodológica não seriam necessários,

por exemplo, identificarmos a totalidade e/ou trechos de falas nominais aos mestres,

desta forma, preservamos os dados coletados sem perder a qualidade da análise.

Por fim, observamos que todos os mestres entrevistados assinaram devidamente as

57

versões contidas nos Apêndices B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, inseridas no final

desta obra, relativas à participação na pesquisa e demais deliberações burocráticas.

Findado o processo de entrevistas e, consequentemente, de registro das

mesmas, partimos para a fase denominada por transcrição das falas.

A importância das transcrições é endossada por diversos estudiosos de

história oral, de acordo com Meihy e Holanda (2014, p. 24) “não resta dúvida: os

produtos de entrevistas em história oral devem sempre resultar em documentos de

base material escrita, ainda que, em tantos casos, derivados de diálogos verbais”,

sendo assim, entendemos que o propósito maior das transcrições é exatamente o de

propor a documentos escritos que sejam arquivados, ou preferencialmente

analisados pelo pesquisador. Ainda de acordo com o autor, “a passagem do oral

para o escrito compreende, antes de tudo, bom entendimento do que foi falado”

(MEIHY; HOLANDA, 2014, p.135), desta forma, fica claro a interrelação e

sinergismos necessários entre as fases das gravações das entrevistas e o processo

de transcrição das mesmas.

As transcrições representam parte fundamental diante dos processos e

fases que compreendem a metodologia de história oral. Na verdade, é a

concretização de todo um processo onde se reconhece, de fato, o devido registro

documental a partir da passagem do oral ao escrito. De acordo com Meihy e

Holanda (2014, p. 16), “o processo de passagem do oral para o escrito é bastante

complexo e demanda tempo. É necessário esclarecer que o resultado demorará e

que há etapas até chegar a uma solução final”. Enquanto pesquisadores

comprometidos, entendemos que a transcrição representa parte fundamental de um

todo, visto que, somente quando se chega ao texto é que a história oral se

concretiza e que, daí, podemos buscar o caminho para a formação de um corpo

documental a ser trabalhado e analisado.

Sobre esta fase, Guerra (2014) afirma que as transcrições são sempre

aconselháveis, mas que, a depender do tempo disponível ao pesquisador, seja feita

apenas nas entrevistas em profundidade, ou seja, as que exigem que o material seja

analisado e tratado diretamente. Em nosso caso, foram necessárias a realização das

transcrições relacionadas as cinco entrevistas realizadas, visto que as mesmas

exigiam profundidade e criteriosa análise.

Sobre os detalhes no processo de transcrição, Meihy e Holanda (2014, p.

31) alerta que “os cuidados da transposição de um estado da palavra – oral – para

58

outro – escrito, são necessários”. Diante deste alerta, em nosso processo de

transcrição, optamos pelo trabalho minucioso de transpor a fala à escrita de forma

tecnicamente pausada, onde executávamos a passagem do oral ao escrito de forma

gradativa e intermitente40, e assim, até serem concretizadas em sua totalidade de

transcrições. Todas as entrevistas foram transcritas na íntegra, correspondendo à

todas as falas dos colaboradores (senseis), contudo, para maior clareza textual, nos

baseamos nas diretrizes preconizadas por Meihy e Holanda (2014) para facilitar a

compreensão dos leitores, que possibilitam que o pesquisador/transcritor realizasse

pequenos ajustes (cortes e/ou correções) textuais que, eventualmente, possam

dificultar a acessibilidade quanto à leitura do documento escrito construído, mas,

vale ressaltar, que estes eventuais ajustes jamais poderão modificar a essência e a

clareza das mensagens emitidas através do conteúdo falado pelos entrevistados.

O processo de transcrição das entrevistas foi realizado, em sua maioria, pelo

próprio pesquisador e, em alguns poucos momentos, com auxílio técnico (e mesmo

assim, supervisionado pelo pesquisador) de profissional capacitado e ambientado a

nomenclatura própria do meio judoístico41, evitando-se, assim, erros de transcrição

que comprometessem a qualidade da pesquisa. Acreditamos que quanto maior a

aproximação do pesquisador com a sua pesquisa, maior será a qualidade da

mesma, bem como, serão minimizadas as possibilidades de erros. Sendo assim,

mantivemos todo controle dos procedimentos metodológicos em nossas mãos,

desde a execução das entrevistas, passando pelo processo de transcrição e

realizando o tratamento técnico de análise de conteúdo por manuseio de sistema

informatizado.

Atenta-se ao fato de que “é relevante lembrar que só faz sentido discutir o

documento em história oral se for considerada a sua disponibilidade pública”

(MEIHY; HOLANDA, 2014, p. 30). Com respeito a este quesito, sabemos do

comprometimento que uma dissertação de mestrado possui de devolver seus

resultados à sociedade para que faça bom uso de seus achados, e isso faz parte da

responsabilidade social da pesquisa.

                                                            40 Como estratégia de transcrição, todas as entrevistas eram cuidadosamente escutadas e daí

pausadamente o transcritor ia digitando as partes em sequencia. Isso repetido em cada entrevista. 41 Este cuidado faz com que possamos obter maior qualidade no método de transcrição, visto que a

língua mãe do judô é a japonesa e por isso justifica-se a utilização de transcritores (técnicos) familiarizados ao meio.

59

No tópico adiante desta seção, será detalhadas etapas metodológicas

relacionadas à técnica de análise de conteúdo por utilização de recurso

informatizado, como também, o apoio através da pesquisa documental.

Segue abaixo (quadro 2), a relação de entrevistas realizadas.

Quadro 2 – Entrevistas realizadas

SENSEIS INÍCIO NO JUDÔ

DATA DE NASCIMENTO

DATA DAS ENTREVISTAS

TEMPO DE ENTREVISTA

1

DIÓGENES MORAES

Iniciou em

1947

02/03/1930 28/09/16 26min: 06seg

2

HAYASHI KAWAMURA

Iniciou em

1947

26/08/1936 23/09/16 23min: 30seg

3

TADAO NAGAI

Iniciou em

1946

06/06/1935 23/09/16 22min: 55seg

4

BYUNG KUK LEE

Iniciou em

1950

25/02/1936 29/09/16 01h:

24min:18seg

5

MARCO AURÉLIO DE OLIVEIRA

Iniciou em

1973

14/12/1956 27/09/16 41min: 09seg

Fonte: o autor (2017)

2.4 Técnica de Análise de Conteúdo com Complementação por Pesquisa

Documental

Em nossa pesquisa, entendemos que a história oral nos oferta a base

teórica necessária para alicerçar nossa pesquisa social que, antes de tudo, possui

um lado humanístico guiado através do processo do “escutar o outro”. Não temos

dúvidas que esta filiação teórica permitiu dar saltos qualitativos, onde, através das

entrevistas, foi possibilitado dar voz aos importantes protagonistas desta pesquisa,

os senseis.

Ainda sobre as entrevistas, percebemos que, findada a fase das transcrições

e das inúmeras leituras das mesmas, seria necessário iniciarmos as análises do

novo documento (agora escrito). Sobre a importância desta fase pós transcrição:

60

Para a história oral ser valorizada metodologicamente, os oralistas centram sua atenção, desde o estabelecimento do projeto, nos critérios de recolha das entrevistas, no seu processamento, na passagem do oral para o escrito e nos resultados analíticos. Com um corpus documental estabelecido em cima das entrevistas, pensa-se nas análises que demandam diálogos com outros documentos (MEIHY; HOLANDA, 2014, p. 72).

Um dos grandes desafios da história oral é justamente analisar os sentidos

das mensagens para além do que é registrado em palavras durante os processos de

entrevistas (MEIHY; HOLANDA, 2014).

Ainda de acordo com o referido autor, sabe-se que as entrevistas, quando

isoladas, não falam por si, ou seja, não se sustentam enquanto história oral. É

necessário alinhá-las objetivando compreender os pontos de intercessão entre as

mesmas, que possibilitem possíveis analises acerca de suas dimensões sociais.

A contextualização acima discutida é endossada pela pesquisadora Bosi

(2013, p. 49), quando afirma que “muito mais que qualquer outra fonte, o

depoimento oral ou escrito necessita esforço de sistematização e claras

coordenadas interpretativas”, assim, fortalecemos o nosso entendimento do cuidado

e rigor nesta fase (analise de conteúdo) e, principalmente, a importância da

necessidade que a mesma ocorra em colaboração à metodologia de história oral.

Ainda de acordo com a pesquisadora, é ideal que a colheita de dados (entrevistas)

seja procedida pelo mesmo intérprete (analista), neste sentido, tivemos o cuidado

para que o autor fosse o mesmo agente de ação durante todas as fases da

pesquisa.

O que pretendemos detalhar a partir deste momento são as filiações teórico-

metodológicas ao que concerne exatamente aos procedimentos para

processamentos destas análises e respectivos resultados analíticos anteriormente

citados por Meihy e Holanda (2014).

Dentro de um processo de rigor científico, tornar-se-ia mais interessante

ampliar a metodologia de estudo, integrando a história oral e a técnica de análise de

conteúdo, já bastante compreendida em pesquisas qualitativas, principalmente na

área das ciências humanas, como veremos adiante.

No intento de buscarmos embasamento sólido para o nosso aprofundamento

teórico quanto à técnica metodológica de Análise de Conteúdo, fizemos adesão a

autores referências nesta área do conhecimento, são eles: Bardin (2011); Campos

(2016); Franco (2012); Guerra (2014); Minayo (2007).

61

Enquanto que para os diversos autores, como os citados acima, a análise de

conteúdo já é bem consolidada no meio acadêmico-científico, sabe-se também que

existem cientistas que ainda se opõem à sua utilização. Sobre isso, Campos (2016,

p. 325) afirma que “há ainda nos meios acadêmicos autores e professores aos quais

falta conhecimento teórico-científico para criticar a análise de conteúdo, e que o

fazem sem ao menos possibilitar um diálogo”.

Franco (2012), justificando o quanto é antiga a análise do conteúdo, afirma

que, historicamente, símbolos, sinais e “mensagens de Deus” compreenderiam as

primeiras tentativas interpretativas no sentido de entender o significado das mesmas

através de textos bíblicos. Lembra ainda que estes são compostos por linguagem

pautada em metáforas e parábolas. Neste sentido, Campos (2016) afirma que,

enquanto prática milenar, a interpretação de textos bíblicos só pode ser entendida

através da interpretação, já que sua linguagem é metafórica. Observa-se que não é

recente na humanidade a busca interpretativa da linguagem. Vale enfatizar que os

avanços teóricos permitem entendermos que a análise de conteúdo vem sendo

reconhecida e consolidada na ciência enquanto procedimento metodológico.

Ainda de acordo com Campos (2016), sabe-se que o desenvolvimento da

análise de conteúdo ocorreu nos Estados Unidos, no início do século XX, por H.

Lasswell, agente responsável por “analisar” e medir o sensacionalismo contido em

manchetes de jornais, revistas e propagandas na segunda guerra.

Buscando conceituar a análise de conteúdo, Campos (2016, p. 322) afirma

que “analisar o conteúdo de uma entrevista, de uma fala, de uma observação

realizada exigirá que o pesquisador esteja aberto para a compressão de que as

palavras tem muito mais a dizer do que dizem”. Neste sentido, compreendemos que

aquilo que é dito/falado, permite compreensões e interpretações que exigem critérios

sistematizados enquanto pesquisa. Franco (2012, p. 21) afirma que “o ponto de

partida da análise de conteúdo é a mensagem, seja ela verbal (oral ou escrita),

gestual, silenciosa, figurativa, documental ou diretamente provocada.

Necessariamente, ela expressa um significado e um sentido”. Guerra (2014) reforça

que a análise de conteúdo é uma técnica e não um método e a conceitua mais

tecnicamente:

Tem uma dimensão descritiva que visa dar conta do que nos foi narrado e uma dimensão interpretativa que decorre das interrogações do analista face a um objeto de estudo, com recurso a um sistema de conceitos teórico-

62

analíticos cuja articulação permite formular as regras de inferência42 (GUERRA, 2014, p. 62)

Quando falamos em análise de conteúdo, temos que compreender que

estamos falando de técnicas para interpretar mensagens. Neste sentido, Campos

(2016, p. 322) explica que a análise de conteúdo visa “possibilitar que o pesquisador

se sinta atraído pelo que está escondido, pelo latente, pelo que está pronto a se

fazer presente, desde que haja habilidade por parte do ouvinte, do observador”.

Ainda, segundo o mesmo autor, esta capacidade e/ou habilidade interpretativa

deverá ser realizada dentro dos rigores científicos de quem se propõe a fazer

ciência.

Através de uma compreensão ampla do homem, permeada pelas ciências

humanas, a análise de conteúdo exigirá que “se compreenda que o homem, mais do

que fruto do meio, é agente que influencia, bem como, é influenciado pelo meio”

(CAMPOS, 2016, p. 326). Sendo assim, temos que enxergar um pertencimento a

uma teia relacional que permite aos depoentes da pesquisa que, através de trocas

comunicativas e interpretativas, influenciem e sejam influenciados na construção do

conhecimento.

De acordo com Bardin (2011, p. 44), “a análise de conteúdo aparece como

um conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos

sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens”. Ainda segundo

a autora, a intenção “é a inferência de conhecimentos relativos às condições de

produção (ou, eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a

indicadores (quantitativos ou não)”.

Ante ao exposto, vale ressaltar que as inferências dizem respeito à

comunicação, que, de acordo com Franco (2012, p. 26, grifo do autor), “é composta

por cinco elementos básicos: uma fonte ou emissão; um processo codificador que

resulta em uma mensagem e se utiliza de um canal de transmissão; um receptor, ou

detector da mensagem, e seu respectivo processo decodificador”.

Partindo do pressuposto de que interpretar está intimamente relacionado à

capacidade de produzir inferências sobre o que está sendo analisado, fazemos

adesão ao entendimento de Campos (2016, p. 322) quando menciona que a

inferência “é advinda da dedução, da compreensão do significado no qual o                                                             42 Entende-se por inferência, operação lógica, pela qual se admite uma proposição em virtude da sua

ligação com outras proposições já aceitas como verdadeiras (BARDIN, 2011).

63

pesquisador se debruça para, como que com uma lupa, desvendar a fala, as ações

ocorridas”, o que acaba corroborando com Bardin (2011, p. 45) quando afirma que o

analista “é como um arqueólogo. Trabalha com vestígios: ‘documentos’ que pode

descobrir ou suscitar”.

Justamente devido à importância do pesquisador, enquanto analista à frente

da pesquisa, pressupõe, por parte deste, o domínio das técnicas de entrevistas,

dirigidas, semidirigidas ou abertas (CAMPOS, 2016).

Diante destes pressupostos teóricos explanados e do intento de justificarmos

nossa adesão à técnica de análise de conteúdo, faz-se necessário afirmar que

realizamos, após as devidas transcrições, extenuantes leituras e releituras daquilo

que fora transformado em linguagem escrita. Esta fase das leituras documentais (e

consequentemente, desenvolvimento da capacidade interpretativa) das falas cedidas

por nossos mestres de judô foram importantes, pois segundo Campos (2016, p. 323)

“para que ocorra uma correta compreensão, a análise exige sempre leituras, e não

apenas uma leitura dos dados contados”. Com isso, pretende-se aguçar o olhar do

cientista que, quase que microscopicamente, permite enxergar nas entrelinhas do

processo (CAMPOS, 2016).

Enquanto técnica de pesquisa, a análise de conteúdo tem determinadas

características metodológicas, são elas: objetividade, sistematização e inferência.

Daqui em diante detalharemos o desenho procedimental trilhado pela pesquisa

quanto às etapas envolvidas na execução da técnica de análise de conteúdo.

De acordo com Bardin (2011) e Minayo (2007), quanto à organização da

análise, ela se divide em três fases (ou polos) cronológicas, são elas: a) pré-análise;

b) a exploração do material; c) o tratamento dos resultados, a inferência e a

interpretação.

Embasando-se nas duas autoras supracitadas, buscamos partir para a pré-

análise, realizando a organização propriamente dita dos documentos, dando conta

de realizar as seguintes missões: escolha dos documentos, retomada das hipóteses

e dos objetivos da pesquisa, e elaboração de indicadores que fundamentem a

interpretação final.

Iniciando a pré-analise, realizamos a denominada leitura “flutuante” (leitura

extenuante visando maior aproximação com os textos a serem analisados), em

seguida, quanto às escolhas dos documentos, delimitamos o material a ser

64

analisado objetivando a constituição do corpus43 documental, para tal, guiamo-nos

por Bardin (2011), seguindo algumas regras desta fase: Regra da exaustividade (ao

definirmos o campo do corpus, buscamos dar conta de todos os elementos deste,

esgotando a totalidade da comunicação, do acervo e da coleção); Regra da

representatividade (buscou-se uma amostra representativa do universo inicial);

Regra da homogeneidade (os documentos referiam-se ao mesmo tema e seguiram

critérios precisos de escolha); e por fim, a regra da pertinência (documentos

adequados enquanto fonte de informação, correspondendo ao conteúdo e objetivo

previstos). Após a “leitura flutuante” e a escolha dos documentos, buscamos retomar

as hipóteses e objetivos preconizados por nossa pesquisa. Neste momento, nossa

intenção foi a de preparar o material no sentido de alinhá-lo (manter-se no foco

investigativo) com a prática técnica da análise em si, que viria a ocorrer

posteriormente, e que detalharemos melhor ainda nesta seção. Fechando a pré-

análise, buscamos fazer referência aos índices e a elaboração de indicadores, como

veremos adiante. Isso significa que, para a pesquisa, foram levantados os temas e

mensagens mais relevantes (índices) onde, através da frequência (indicador),

buscamos analisar a importância e representatividade em que estes ocorriam nos

documentos.

Visando a cronologia de fases de nossa organização de análise e passado a

fase da pré-analise, ainda realizamos a exploração do material (BARDIN, 2011), que

consiste na definição das categorias e da codificação. Nesta fase, de acordo com

Minayo (2007), é o momento em que se codifica o material; realiza-se inicialmente

um recorte do texto; logo após, definem-se regras de contagem; e, por fim,

classificam-se e agregam-se os dados, objetivando organizá-los em categorias

teóricas ou empíricas. De acordo com Bardin (2011, p. 131):

Não é mais do que a aplicação sistemática das decisões tomadas. Quer se trate de procedimentos aplicados manualmente ou de operações efetuadas no computador44, o decorrer do programa completa-se mecanicamente. Esta fase, longa e fastidiosa, consiste essencialmente em operações de codificação, decomposição ou enumeração, em função de regras previamente formuladas.

                                                            43 De acordo com Bardin (2011, p. 126) “é o conjunto dos documentos tidos em conta para serem

submetidos aos procedimentos analíticos”. 44 Aqui vale ressaltarmos, que ainda durante esta seção referente a metodologia, justificaremos a

decisão em relação ao uso do computador previsto por diversos autores quando ao tratamento de dados qualitativos na análise do conteúdo.

65

Contextualizados na fase de exploração do material, partimos para a

codificação em nossa análise. De acordo com Bardin (2011, p. 133, grifo do autor),

“torna-se necessário saber a razão por que se analisa e explicitá-la de modo que se

possa saber como analisar [...] Tratar o material é codificá-lo”. Buscando responder

a autora, justificamos a decisão por analisarmos tendo em vista a relevância e

pertinência dos dados em nossa pesquisa, assim como, por pretendemos detalhar

os encaminhamentos acerca de como analisaremos a mesma. A codificação

corresponde a uma identificação que permite atingir uma representação de conteúdo

e de sua expressão (BARDIN, 2011).

Buscando codificar os nossos dados a serem analisados, surgiu o desafio de

definirmos as unidades de análise. Bardin (2011, p. 134) afirma que “a escolha das

unidades de registro e de contexto deve responder de maneira pertinente

(pertinência em relação às características do material e face aos objetivos da

análise)”, desta forma, ao nos debruçarmos e imergirmos na teoria da análise de

conteúdo fizemos adesão teórica as denominadas unidades de registro que,

segundo a autora supracitada, “é a unidade de significação codificada e corresponde

ao segmento de conteúdo considerado unidade de base, visando a categorização e

a contagem frequencial” (BARDIN, 2011, p.134). Dentro desta (contagem

frequencial), em nossa pesquisa, optamos por filiação à unidade de registro

referente, predominantemente, ao tema, pois não descartamos as eventuais

análises relacionadas a unidades de registros previstas, tais como a palavra, o

personagem, o acontecimento, o documento, dentre outros.

A adesão maior à análise temática deve-se à realidade contextual de nossos

principais documentos, utilizados pela análise de conteúdo (que neste caso, são as

transcrições das entrevistas com os mestres), e aos objetivos de pesquisa a serem

investigados. Para tal decisão, nos embasamos em autores, como Franco (2012, p.

45), que afirma que as unidades de registro relacionadas ao tema “envolve não

apenas componentes racionais, mas também ideológicos, afetivos e emocionais”,

fato este, bastante contextualizado nas entrevistas (fontes orais materializadas em

fontes escritas). O mesmo autor nos informa que “o tema é considerado como a

mais útil unidade de registro, análise de conteúdo” (FRANCO, 2012, p. 45).

Neste momento, vale resgatarmos algumas aproximações teóricas quanto

aos métodos e técnicas preconizados para a presente pesquisa. Desta forma,

resgatamos que fora citado e detalhado, no início desta seção, que a nossa

66

pesquisa quanto ao tipo de história oral foi desenvolvida através da história oral do

tipo temática, ou seja, a que delimita um tema (em nosso caso a relação Judô e a

interrelação com a Educação) e constrói sua entrevista ao redor deste. Faz-se,

portanto, necessário ressaltarmos que, quanto à técnica de análise de conteúdo

optamos pela vertente temática, pois, segundo Minayo (2007, p. 316), “a análise

temática consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma

comunicação cuja presença ou frequência signifique alguma coisa para o objetivo

analítico visado”. Bardin (2011, p. 135) corrobora, fortalecendo a ideia, pois “fazer

uma análise temática consiste em descobrir os ‘núcleos de sentido’ que compõem a

comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição, pode significar alguma

coisa para o objeto analítico escolhido”. Desta forma, reafirmamos adesão à análise

temática porque é considerada apropriada para as investigações qualitativas, além

de ser simples e eficaz ao nosso tipo de estudo.

Ainda no tocante à fase da técnica de análise de conteúdo no que refere-se

a exploração do material, enfatizamos, a seguir,acerca da sua categorização.

Segundo Franco (2012, p. 63), “a criação de categorias é o ponto crucial da análise

de conteúdo [...] Formular categorias, em análise de conteúdo é, via de regra, longo,

difícil e desafiante”. Conceitualmente, podemos compreender a categorização como

“uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por

diferenciação e, em seguida, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com

critérios previamente definidos” (BARDIN, 2011, p. 147). De forma mais objetiva,

podemos esclarecer que as unidades de registro (temas, palavras etc.) são

agrupadas em classes/categorias (em razão das características comuns destes

elementos), alocadas sob um título genérico, e ainda, de acordo com critérios de

categorização. No caso desta pesquisa, filiamo-nos ao critério semântico, que diz

respeito às categorias temáticas. Podemos citar, como exemplo, que todos os temas

que significam disciplina ficam agrupados na categoria “disciplina”, enquanto que os

que significam indisciplina ficam agrupados sob o título conceitual de “indisciplina”.

De acordo com Bardin (2011), a categorização é um processo de tipo estruturalista e

comporta duas etapas: o inventário (isolam-se os elementos comuns); e a

classificação (repartem-se os elementos e impõem-se certa organização às

mensagens). Guiando-nos através de Guerra (2014), também podemos dizer que,

quanto a técnica optada, a nossa pesquisa classifica-se também como uma análise

de conteúdo tradicional, que por onde, segundo a autora,

67

[...] são identificados os corpus centrais da entrevista a analisar em profundidade e, com recurso à identificação e à contagem de categorias e subcategorias, faz-se uma análise de conteúdo temática. Volta-se ao material original registrado na gravação e já transcrito, e recompõem-se os fragmentos do discurso dispersos ao longo do texto (GUERRA, 2014, p. 83).

Desta forma, através da análise descritiva, tem-se a intenção de contar ao

leitor o que nos disseram os entrevistados, mas, ao invés de divulgar todas as

opiniões, agregam-se as diferentes lógicas (interseções das falas) do que nos foi

contado pelos entrevistados (GUERRA, 2014).

Quanto à análise categorial, sabe-se que é a mais utilizada e funciona

através de operações de desmembramento do texto em unidades, em categorias,

segundo reagrupamentos analógicos (BARDIN, 2011). Ainda de acordo com a

pesquisadora, “entre as diferentes possibilidades de categorização, a investigação

dos temas ou análise temática, é rápida e eficaz na condição de se aplicar a

discursos diretos (significações manifestas) e simples” (BARDIN, 2011, p. 201).

Diante do exposto, fortalecemos nossa decisão metodológica para a presente

pesquisa.

Como última fase cronológica prevista e mencionada por Bardin (2011), nos

deparamos com a etapa de tratamento dos resultados, da inferência e da

interpretação. De acordo com a teórica Bardin (2011, p. 131), acerca desta etapa:

Os resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos (‘falantes’) e válidos. Operações estatísticas simples (percentagens), ou mais complexas (análise fatorial), permitem estabelecer quadros de resultados, diagramas, figuras e modelos, os quais condensam e põem em relevo as informações fornecidas pela análise.

No processo final das análises se encontram as inferências (já debatidas

nesta seção), e por fim, as interpretações analíticas. Vale lembrarmos que as

inferências levam às interpretações, e que as interpretações são sempre no sentido

de buscar o que se esconde sob os documentos selecionados. A interpretação

representa a leitura profunda das comunicações, indo além da leitura aparente

(BARDIN, 2011).

Sobre esta última fase do processo cronológico e gradativo da análise de

conteúdo, é importante ressaltarmos que toda codificação e categorização de nossa

pesquisa, assim como o tratamento dos resultados, serão melhor detalhados e/ou

especificados no item (2.5) da parte final da presente seção. Em relação às

68

inferências e interpretações de nossos achados, serão devidamente discutidos na

seção 4 que versa sobre análise e discussão dos dados.

Conforme mencionamos para esta seção, neste momento vamos tratar,

objetivamente, da forma como procedemos com o apoio metodológico da pesquisa

documental ao nosso estudo.

Conforme relatamos no início desta seção, fizemos filiação teórico-

metodológica à história oral híbrida (conceituada pelos pesquisadores Meihy e

Holanda (2014),) que representa a associação das fontes orais (entrevistas)

apoiadas pelo diálogo e interação junto a outros tipos de fontes ou documentos

(iconográficos, historiográficos, filosóficos, literários ou outros). Diante desta adesão,

buscamos apoio em Gil (2008, p. 51) onde o mesmo ressalta que “a pesquisa

documental vale-se de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico,

ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa”.

De acordo com o mesmo autor, “essas fontes documentais são capazes de

proporcionar ao pesquisador dados em quantidade e qualidade suficiente para evitar

a perda de tempo e o constrangimento que caracterizam muitas das pesquisas em

que os dados são obtidos diretamente das pessoas” (GIL, 2008, p. 147), neste

sentido, o apoio documental possibilitou um “reforço” qualitativo quanto ao conteúdo

do estudo.

Para realização deste trabalho foram utilizados como fontes documentais,

arquivos pessoais de vídeos, fotos e matérias, livros, periódicos, artigos científicos,

jornais, revistas, fotografias, atas, regimentos e documentação oriundos das

entidades reguladoras esportivas, para coleta e análise de dados sobre os fatores

que relacionam a histórias dos mestres (senseis) e que, possivelmente,

influenciaram o processo judoístico educacional presente na prática do Judô e suas

consequências na formação de crianças e jovens praticantes na cidade de Recife.

Segundo Chizzotti (1998, p. 18), “A pesquisa documental visa responder as

necessidades objetivas da investigação [...]” e “[...] é parte integrante de qualquer

pesquisa sistemática e precede ou acompanha os trabalhos de campo”. Enquanto

critérios elencados para decisão acerca dos locais das fontes a serem consultadas,

afirmamos adesão por aqueles que possuíssem, em seus acervos, informações

relacionadas ao tema da pesquisa. Esta análise/consulta fora realizada no início

desta pesquisa, ainda em fase de elaboração do projeto para qualificação da

mesma.

69

As pesquisas foram realizadas junto aos seguintes órgãos institucionais e

setores específicos: Arquivo Público do Estado de Pernambuco; Associação Cultural

Japonesa do Recife (ACJR); Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil;

Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e Assistência Social; Escola Superior de

Educação Física da Universidade de Pernambuco; Curso de Educação Física da

UFPE; Biblioteca do Centro de Educação da UFPE; Biblioteca Pública do Estado de

Pernambuco; Federação Pernambucana de Pugilismo; Federação Pernambucana

de Jiu-jitsu; Federação Pernambucana de Judô e Liga Pernambucana de Judô,

dentre outros órgãos de informação e pesquisa.

Quanto às fontes documentais, reafirmamos a utilização de arquivos

pessoais (dos entrevistados e do pesquisador)–matérias de sites, jornais e revistas

especializadas acumuladas pelo pesquisador, como também, acervo fotográfico

pessoal. Sobre isso, Belotto (2006, p. 266) ressalta:

Podem-se definir arquivos pessoais como o conjunto de papéis e material audiovisual ou iconográfico resultante da vida e da obra/atividade de pessoas cuja maneira de pensar, agir, atuar e viver possa ter algum interesse para as pesquisas nas respectivas áreas onde desenvolveram suas atividades; ou ainda, pessoas detentoras de informações inéditas que, se divulgadas na comunidade científica e na sociedade civil, trarão fatos novos para as ciências, a arte e a sociedade.

Entendemos que os arquivos/documentos coletados e acumulados

favorecerão aos setores mencionados pela autora supracitada e, em nosso caso,

cumprirão a missão de interesse de pesquisas na área do judô, assim como,

pretendemos, através da elucidação das histórias de cada sensei (atores sociais de

nossa pesquisa) e a partir de suas divulgações nos meios científicos e da sociedade

civil, acrescentar conhecimento ao âmbito da ciência, da arte e da sociedade.

Desta forma, o nosso pensamento acerca dos arquivos pessoais recebidos

enquanto pesquisador, e aqueles doados à própria pesquisa, convergem e são

defendidos pela pesquisadora anteriormente citada, já que a mesma reforça-nos o

conceito de que os arquivos pessoais estão embutidos na definição geral dos

arquivos privados, pois quando se afirma tratar-se de papéis produzidos/recebidos

por entidades ou pessoas físicas de direito privado, compreende-se desta forma

(BELOTTO, 2006).

70

2.5 Sistemas Informatizados em Tratamento de Dados Qualitativos: opção pela

Utilização do NVivo®45

Neste último sub tópico da seção acerca da metodologia de trabalho,

pretendemos explorar os detalhamentos oriundos de nossas escolhas sobre a

utilização de formas, que de certo modo, apresentaram-se inovadoras ao nosso

programa de pós-graduação. Debateremos nosso embasamento teórico envolvido

nesta escolha metodológica que se refere ao tratamento dos dados coletados via

metodologia da história oral (coletadas por técnicas de entrevistas) e técnica de

análise de conteúdo, porém, como foi dito, por utilização de recurso tecnológico

informatizado e voltado ao tratamento de dados qualitativos de pesquisa.

É importante ressaltarmos que nossa decisão sobre a utilização desta

ferramenta se deu mediante o intento de buscar a inovação a partir de recursos

contemporâneos, cientificamente embasados por pesquisas recentes, como

veremos a seguir.

Para iniciarmos o presente debate é importante refletirmos criticamente

sobre duas passagens da pesquisadora Laurence Bardin (principal referência em

análise de conteúdo), citadas em sua principal obra. A primeira, ela menciona que “a

análise qualitativa não rejeita toda e qualquer forma de quantificação” (BARDIN,

2011, p. 146), desta forma, compreendemos que ao nos posicionarmos com

sistemas informatizados que auxiliem nossa pesquisa e tratem os dados qualitativos

ofertando respostas também quantitativas não oferta nenhum descrédito a pesquisa,

pelo contrário, a fortalece do ponto de vista do rigor e do método. Na segunda

passagem da autora, enquanto a mesma debate tecnologia em sua obra, nos traz a

seguinte afirmação: “além disso, com certo nível de complexidade, nos próximos

anos espera-se muito da inteligência artificial e dos sistemas especializados”

(BARDIN, 2011, p. 196). Neste momento intentamos despertar ao leitor desta

dissertação para uma abertura de pensamento através de reflexão crítica, pautada

na contemporaneidade quanto aos avanços dos métodos tradicionais de pesquisas

nas ciências humanas, como também, ao reconhecimento de autores clássicos em

relação a estes avanços.

                                                            45 Marca registrada da empresa QSR International PtyLtd. Para maiores informações, acessar:

www.qsrinternational.com.

71

No tocante à utilização destes recursos em âmbito nacional, Vosgerau

(2012) ressalta que “a utilização de recursos informáticos para a análise de dados

quantitativos data de, ao menos, meio século, contudo, o uso de ferramentas

informáticas na análise de dados qualitativos ainda é um desafio, em grande parte,

para as instituições de pesquisa, principalmente as brasileiras”. Isso apenas reforça

nossa escolha quanto a uso dos recursos informáticos para análise qualitativa

denominados Qualitative Data Analyses Softwares (QDAS)46.

Ainda de acordo com a autora supracitada, no final da década de 80 uma

importante pesquisadora chamada Renata Tesch, pioneira no uso dos recursos

informáticos para análise qualitativa, defendera que, através de suas conclusões de

pesquisa nesta área, justificava seu uso “declarando que a análise assistida pelo

computador pode reduzir o tempo de análise, suprimir muitas das tarefas

enfadonhas da análise, tornar os procedimentos mais sistemáticos e explícitos,

assegurar um trabalho mais exaustivo e detalhado e ainda facilitar a revisão dos

procedimentos de análise” (TESCH apud VOSGERAU, 2012).

Ainda nos referindo ao embasamento teórico existente, e que investigam a

utilização de sistemas informatizados ou computadorizados (também comumente

chamados de software) em pesquisas qualitativas, é importante relatar uma surpresa

em nossa pesquisa. Durante as leituras dos estudos percebemos que existiam

clássicos da análise de conteúdo que já previam a utilização destes recursos em

suas projeções de futuro nestes tipos de pesquisa. Sobre isso, resgatamos um

trecho em que Bardin (2011, p. 31) discute, ainda no ano de 1977 (lançamento de

sua obra), sobre as tendências atuais para a análise de conteúdo, afirmando que a

mesma “[...] se multiplica às aplicações, marca um pouco o passo, ao concentrar-se

na transposição tecnológica, em matéria de inovação metodológica”. Desta forma,

fica nítida a postura da autora quanto a utilização da tecnologia em pesquisas

qualitativas de análise de conteúdo, ademais, a mesma autora complementa seu

posicionamento explicitando que o uso de computadores tem consequências

positivas sobre a prática da análise de conteúdo, são elas: a rapidez; acréscimo de

rigor na organização da investigação; reforço positivo ao objetivo geral da técnica de

análise de conteúdo; flexibilidade da técnica (permeabilidade dos dados); facilitação

no armazenamento, reprodução e troca de dados entre investigadores; possibilidade

                                                            46 Da tradução: “Sistemas de análise de dados qualitativos”.

72

de manipulação de dados complexos; e por fim, estimulação à criatividade, já que o

analista se ver livre de tarefas laboriosas, longas e estéreis (BARDIN, 2011).

Corroborando com a discussão, nos utilizamos de Franco (2012), para

ressaltarmos que recentes programas computadorizados podem ser utilizados como

auxílio para uma eficiente análise de conteúdo, pois, segundo o mesmo, estes

programas possuem lógica embutida que permitem dar conta da dimensão central

da análise de conteúdo. Outro ponto importante a ser ressaltado é que, como

trabalharemos com unidades de registro (temas e palavras), percebemos que,

mesmo tendo gerado muitos dados destas unidades, o advento do software, de

certa forma, atenuou nossas dificuldades quanto ao tratamento dos mesmos.

Por fim, ainda referindo-se ao campo teórico clássico envolvido em justificar

a análise de conteúdo através do uso de sistemas informatizados, apoiamo-nos na

pesquisadora portuguesa Isabel Carvalho Guerra, pois, neste debate, a mesma

menciona que limitações técnicas relacionadas à capacidade humana de tratar

grandes quantidades de dados qualitativos (por exemplo, entrevistas) são atenuadas

devido ao uso destas ferramentas, haja vista que, sendo cada vez amigáveis, estão

a mudar rapidamente estes panoramas de dificuldades quanto a estes tipos de

pesquisas (GUERRA, 2014).

Ante o exposto, a partir deste momento apresentaremos mais

especificamente sobre o software NVivo® (versão NVivo 11 Pro for Windows®47), no

qual escolhemos48 para a nossa pesquisa. Desta forma, buscaremos também

apresentar recentes estudos que comprovam a eficácia de sua utilização em

pesquisas semelhantes à nossa.

De acordo com o próprio “Guia de iniciação da edição Pro para

Windows®”49, quanto à utilização do mesmo em pesquisas qualitativas, afirma-se

que:

                                                            47 Marca registrada da Microsoft Corporation (Estados Unidos). 48 Ressaltamos que para utilização plena em nossa pesquisa, foi feito investimento na compra de

uma chave anual do referido software internacional (versão original e oficial) em moeda estrangeira (dólar), este procedimento se deu através do próprio pesquisador que utilizou-se de parcela financeira de sua bolsa de estudo CAPES para efetivar a compra do mesmo no próprio site da empresa criadora do site.

49 “Getting Started Guide Pro Edition” adquirido em 2016 (versão em português), no seguinte link: http://download.qsrinternational.com/Document/NVivo11/11.3.0/en-US/NVivo11-Getting-Started-Guide-Pro-edition.pdf.

73

Muitos pesquisadores qualitativos estão interessados em avaliar, interpretar e explicar fenômenos sociais. Eles analisam dados de entrevistas, pesquisas, anotações de campo, páginas na internet e artigos em revistas científicas e trabalham em vários setores; desde ciências sociais e educação até saúde e negócios [...] NVivo® não favorece uma metodologia em particular. Ele foi desenvolvido para facilitar técnicas qualitativas comuns para organizar, analisar e compartilhar dados, independentemente do método usado (QSR INTERNATIONAL, 2016, p. 5)

Ainda de acordo com o referido guia, a versão adquirida (PRO) se apresenta

como uma sofisticada50 ferramenta de pesquisa com tudo aquilo que é necessário

para análise de todas as formas de dados não estruturados. Contudo, é feito um

importante alerta pelo fabricante: “Lembre-se de que o NVivo® pode ajudar você a

gerenciar, explorar e encontrar padrões em seus dados, mas não substitui seu

conhecimento analítico”(QSR INTERNATIONAL, 2016, p.7). Esta observação é

importante, pois também é corroborada por outros pesquisadores da área de análise

de conteúdo, como Bardin (2011), Franco (2012) e Guerra (2014). De acordo com

todos estes, os recursos tecnológicos possuem diversos benefícios à pesquisa, mas

não excluem o importante e necessário trabalho humano enquanto pesquisador,

onde cabe a este transcrever as entrevistas e categorizá-las manualmente,

buscando alimentar o sistema visando uma boa codificação dos dados e,

consequentemente, maior eficiência no processamento dos dados e colheita de seus

resultados. Também, de acordo com Alves, Figueiredo Filho e Silva (2015, p. 124),

“os programas computadorizados facilitam o processo analítico dos dados, porém

não substituem a responsabilidade do pesquisador na interpretação substantiva dos

resultados”.

Ainda sobre o NVivo®, Alves, Figueiredo Filho e Silva (2015) busca

enaltecer e justificar o uso da ferramenta associada a técnica de análise de

conteúdo. Dada a aproximação teórico-conceitual com a nossa pesquisa,

entendemos e classificamos o contemporâneo estudo como importante dentro de

nosso referencial teórico destinado a justificar nossas opções metodológicas para a

pesquisa. De acordo com os autores:

O NVivo é um programa para análise de informação qualitativa que integra as principais ferramentas para o trabalho com documentos textuais, multimétodo e dados bibliográficos. Ele facilita a organização de entrevistas,

                                                            50 De acordo com a fabricante (QSR International), mais de um milhão de pessoas em 150 países

usam o programa, ou seja, é utilizado em praticamente todas as áreas, dentro e fora das universidades.

74

imagens, áudios, discussões em grupo, leis, categorização dos dados e análises. Na parte de dados qualitativos é possível realizar transcrição de vídeos e áudios, codificar texto, análises de redes sociais e/ou páginas da web, entre outros. Já na parte quantitativa tem-se estatística descritiva, inferencial e até mesmo meta-análise(ALVES; FIGUEIREDO FILHO; SILVA, 2015, p. 125).

Outro estudo interessante acerca da temática é o de Mozzato, Grzybovski e

Teixeira (2012), que se propôs a investigar as vantagens da Utilização do NVivo®

em pesquisas qualitativas. Neste, os autores observam:

[...] O corpus (dados brutos) de uma pesquisa só terá sentido ao ser trabalhado pelo pesquisador de acordo com uma técnica de análise apropriada. A aplicação dessa técnica com a utilização de um software auxilia muito o processo, a exemplo da utilização do NVivo® como apoio à ‘análise de conteúdo’ [...] (MOZZATO; GRZYBOVSKI; TEIXEIRA, 2012, p. 4, grifo do autor).

Do ponto de vista do reconhecimento do software no cenário acadêmico, de

acordo com Lage (2011 apud MOZZATO; GRZYBOVSKI; TEIXEIRA, 2012, p. 4):

O NVivo®é um dos softwares mais utilizados no ambiente acadêmico brasileiro, tendo sido adotado por centros de pesquisa da maioria das grandes universidades, como a Unicamp, a USP, a UFRGS, entre outras. No entanto, ainda é baixo o número de pesquisas qualitativas que usam algum tipo de software de apoio.

Concluindo a seção, a partir deste momento detalharemos como

procedemos com a fase de categorização e codificação51 dos dados dentro do

NVivo®. No entanto, as inferências e interpretações dos dados remetidos pelo

programa, assim como, a confrontação dos resultados com os nortes teóricos da

pesquisa, serão detalhados na seção quatro (4), que refere-se a discussão e análise

dos dados.

Contudo, antes de iniciarmos as explicações mais técnicas de nossa

pesquisa já no NVivo®, torna-se importante resgatarmos o entendimento da Bardin

(2011) sobre a análise temática, onde a autora reforça que este tipo consiste em

descobrir os “núcleos de sentido” nas comunicações, e que a presença ou

frequência de aparição poderão ter significados de acordo com os objetivos

analíticos selecionados. Desta forma, compreendemos que a utilização do programa

                                                            51 De acordo com o próprio Guia do NVivo®, codificação “é o processo de reunir materiais por tópico,

tema ou caso” (QSR INTERNATIONAL, 2015, p. 6).

75

NVivo® em nossa pesquisa poderá apresentar-nos gráficos esteticamente

interessantes, mas principalmente, relações analíticas que em trabalho manual não

conseguiríamos enxergar ou minimizar as chances de erros de análises. Ainda,

segundo a autora, “os textos dever ser preparados e codificados conforme as

possibilidades de “leitura” do computador e a instrução do programa” (BARDIN,

2011, p. 131).

Diante do exposto acima, iniciamos a fase de importação de dados ao

sistema, enviando todos os arquivos referentes às cinco transcrições na íntegra. A

partir daí, pudemos dar início à fase de codificação dos dados e agregação de

unidades.

A organização estrutural de nossa pesquisa, agora dentro e operando o

próprio NVivo®, se deu primeiramente através da alocação de trechos de cada

entrevista com os senseis (transcrições), estas “partes” foram selecionadas

criteriosamente pelo pesquisador e distribuídos nos “nós” (ou nodes)52 dentro do

programa. Estes “nós” foram categorizados em principais e secundários (sub-nós) de

acordo com o problema da pesquisa e seus objetivos investigativos.

Optamos pelo caminho da “criação” de categorias que, de acordo com

Franco (2012, p. 64), “são predeterminadas em função da busca a uma resposta

específica do investigador”. Desta forma, foram criadas as seguintes categorizações

temáticas para a nossa pesquisa:

a) Gênese do Judô Recifense- (Entrada no Judô; Origem e desenvolvimento

do Judô do Recife; Referências dos senseis).

b) Educação pelo Judô - (Lições educativas do Judô; Princípios Filosóficos

e sua aplicabilidade prática; Complementação à formação educacional;

Judô nas escolas).

c) Cultura Judoística – (Disciplina e Hierarquia; Esportivização do Judô;

Tradicionalismo no Judô).

d) Sociedade e Violência (aspectos civilizatórios do Judô)

                                                            52 De acordo com Alves, Figueiredo Filho e Silva (2015, p. 125), “os ‘nós’ funcionam como variáveis

que reúnem informações descritivas do texto, possibilitando a identificação de tendências”. O Guia do NVivo® nos informa que os “nós” são recipientes para sua codificação que representam temas, tópicos ou outros conceitos - eles permitem que você reúna materiais relacionados em um lugar para que possa procurar padrões e ideias emergentes” (QSR INTERNATIONAL 2016, p. 6).

76

e) Expectativas para o futuro do Judô – (Mensagem dos mestres à

comunidade Judoística; Expectativas dos senseis para o futuro).

A forma como os nossos dados coletados se relacionaram durante a nossa

pesquisa podem ser compreendidos através de uma espécie de “teia” gráfica que

representa a interrelação entre nossas fontes (entrevistas) e as respectivas

categorizações de análises criadas para serem posteriormente analisadas em nosso

trabalho. Desta forma, a figura 1, localizada logo abaixo, sintetiza graficamente esta

nossa organização enquanto metodologia (incluindo suas fontes, categorias [nós e

subnós] e suas respectivas ligações [codificações]).

Figura 1 – Interligação entre categorias e fontes (Processo de codificação via software

NVivo®)

Fonte: o autor (2017)

77

Diante das categorizações citadas acima, para a fase de análise dos dados,

optamos por utilizar a técnica de “nuvem de palavras”53 ofertada pelo Nvivo®, pois a

mesma cria pontos de intersecções entre as falas dos entrevistados, de forma que

facilita a visualização dos dados ao pesquisador. Para tal, enquanto análise do

conteúdo, utilizamos a unidade de registro temática (com ênfase nas palavras),

onde, através da frequência com que a mesma ocorria (análise frequencial) entre as

falas dos senseis entrevistados, pudemos inferir analisando a importância de tais

dados qualitativos, assim, propondo considerações sólidas, interpretações e

reflexões críticas pertinentes. Seguindo um padrão de análise, e baseado na análise

frequencial de ocorrência das palavras, decidimos por configurar a produção de

gráfico através do padrão fixo do total de cinquenta (50)54 palavras com maiores

ocorrências percentuais de repetições. Vale ressaltar, que a representação gráfica

contida na técnica de “nuvem” apenas facilita, mas não omite a necessidade e

obrigação de análise interpretativa por parte do pesquisador para emitir suas

inferências quanto ao conteúdo analisado.

Por fim, ressaltamos a importância do detalhamento metodológico minucioso

trilhado por nossa pesquisa e que, nesta seção, fora detalhado em todas as suas

fases. Desta forma, esperamos possibilitar o pleno entendimento por parte do leitor

quanto aos métodos, técnicas, procedimentos e ferramentas utilizadas em nosso

estudo. Quanto ao nosso percurso metodológico, pode-se conferir através da

representação gráfica contida na figura 2, que sintetiza todos os nossos passos no

que compete à metodologia.

                                                            53 Na técnica adotada de nuvem de palavras, percebemos que palavras tidas como artigos,

conjunções e/ou preposições gramaticais apareciam demasiadamente e, assim, foram excluídas (filtradas pelo sistema e que configuramos para permitir apenas a aparição de palavras que contivessem a partir de cinco letras), pois não se faziam importantes à pesquisa. Desta forma, conseguimos expor uma nuvem mais “limpa” e com conceitos pertinentes e diretamente relacionados ao objeto da pesquisa.

54 Dentre as configurações de opções de filtragens pelo software, decidimos por este número para facilitar a visualização gráfica, visto que, o nosso número/volume de entrevistas não era tão grande, como ocorre em pesquisas de cunho mais quantitativos (ex: dados de pesquisas epidemiológicas em saúde). 

78

Figura 2 – Macro percurso metodológico da pesquisa

Fonte: o autor (2017)

Na seção a seguir, aprofundaremos o debate sobre o judô e sua interrelação

com a educação a partir dos propósitos de Jigoro Kano, criador do judô.

79

3 EDUCAÇÃO E JUDÔ: análise e Compreensões Acerca desta Relação

No contexto atual, o Judô é uma modalidade olímpica praticada em vários

países do mundo, isso deve-se ao professor Jigoro Kano, um indivíduo

reconhecidamente à frente do seu tempo. Enquanto arte marcial, percebemos em

sua gênese que os meios educacionais e acadêmicos foram fundamentais para sua

difusão. É intuito desta seção, buscar esclarecer as aproximações filosóficas entre

os modelos educacionais orientais e ocidentais, como também, traçar a identificação

dentre os ideais sociais e educacionais que permearam as semelhanças de

pensamentos entre Pierre de Coubertin (pai dos jogos olímpicos modernos) e o

Jigoro Kano (criador do Judô). Percebe-se que Kano buscou, através da criação de

seu sistema, difundir possibilidades educativas através dos esportes, mas

principalmente, uma evolução social sólida e possível de ser conquistada através de

uma prática embasada por princípios filosóficos norteadores, e que possibilitem

otimizar a energia mental e física dos praticantes em prol de uma razão social,

humanística, pacífica e de plena convivência entre os indivíduos.

A sociedade é regida por suas regras, costumes e demais variáveis que dão

suporte a uma boa convivência social. Dentro deste contexto, entendemos que a

educação é base para o processo mediador da formação do status social entre os

indivíduos. Diante deste contexto, o judô, prática oriental e educativa de origem

japonesa com importantes preceitos educacionais idealizados pelo seu criador, o

prof. Jigoro Kano, surge como importante meio colaborativo para o que esperamos

em termos de Educação para uma sociedade.

O intento desta seção é proporcionar uma reflexão acerca das relações

existentes entre a educação e os preceitos do Judô, buscando entender suas

aproximações e compreensões, de modo que permita-se encontrar as interseções

entre os mesmos, a fim de esclarecer suas virtudes e relevâncias educacionais.

Percebemos claramente a necessidade de ampliação das discussões acerca

do Judô, extrapolando a discussão tecnicista, tão comum à maioria dos estudos que

o investiga, e assim, contribuir para a ampliação do debate científico pertinente à

área das ciências humanas, mais especificadamente com ênfase na sociologia das

lutas, artes marciais e esportes de combate.

80

3.1 Educação: uma Visão Macro Na literatura existem diversas conceituações sobre o que seria a educação,

contudo, utilizaremos o conceito clássico do Brandão (2013), que é todo

conhecimento adquirido com a vivência em sociedade, seja ela qual for. Sendo

assim, ocorre em diversos ambientes (institucionalizados, ou não) e constantemente.

O mesmo autor defende a ideia de que não existe apenas uma maneira de educar,

pois, através do momento em que se observa, entende, imita e se aprende temos

em curso um processo educativo.

De acordo com Saviani (2013, p. 3), “educação é o ato de produzir, em cada

indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo

conjunto dos homens”. Assim, entendemos que cada indivíduo, ao se relacionar em

um determinado convívio social, acaba por construir um modelo educativo próprio e

pertinente a este coletivo.

Para isso, Brandão (2013, p. 49) afirma que “a educação do homem existe

por toda parte e, muito mais do que na escola, é o resultado da ação de todo o meio

sociocultural sobre os seus participantes. É o exercício de viver e conviver que

educa”.

Tentando uma maior aproximação contemporânea com o que pretende-se

compreender pelo termo educação, fazemos adesão ao conceito mencionado por

Trilla (2008, p. 29), que afirma:

É um fenômeno complexo, multiforme, disperso, heterogêneo, permanente e quase onipresente. Há educação, é claro, na escola e na família, mas ela também se verifica nas bibliotecas e nos museus, num processo de educação à distância e numa brinquedoteca. Na rua, no cinema, vendo televisão e navegando na internet, nas reuniões, nos jogos e brinquedos (mesmo que eles não sejam dos chamados educativos e didáticos) etc. ocorrem, igualmente, processos de educação. Quem educa, evidentemente, são os pais e professores, mas as influências formadoras (ou eventualmente deformadoras) também são frequentementes exercidas por políticos e jornalistas, poetas, músicos, arquitetos e artistas em geral, colegas de trabalho, amigos e vizinhos, e assim por diante.

No âmbito da educação, sabe-se que a aproximação de Jigoro Kano (criador

do Judô) com a mesma era nitidamente transparecida a partir de seus próprios

discursos. Aqui podemos mencionar um deles, de 1916:

81

Quando eu era jovem, após me graduar na universidade, pensei em me tornar primeiro-ministro ou milionário, mas achei que nenhuma dessas opções seria satisfatória. Eu concluí que a educação é a única coisa à qual um homem poderia devotar à sua vida sem arrependimentos, e assim busquei uma carreira na área da educação (KANO, 2008a, p. 120).

Como já foi mencionado, a partir deste momento nos deteremos um pouco

mais ao debate sobre as nuances da gênese do judô e sua relação com o meio

educacional.

3.2 Judô Contextualizado na Contemporaneidade

O judô tem sofrido diversas influências culturais devido seu processo de

globalização. Na atualidade, se faz presente nos mais diversos espaços e contextos,

desta forma, compreendemos que os dojôs vão estabelecendo-se nos mais diversos

espaços e se apropriando culturalmente de acordo com os propósitos com os quais

se têm a intenção de desenvolvê-lo.

Independente do seu uso e finalidade, entende-se que o judô

contemporâneo possibilita uma vasta amplitude de propósitos, dentre eles, podemos

citar, por exemplo, a sua utilização voltada à benefícios da saúde do praticante e ao

desenvolvimento atlético. No entanto, sem dúvida, o seu maior valor se dá enquanto

ferramenta educacional de possibilidades quanto à formação moral e social

daqueles que o praticam. O propósito fim do judô efetiva-se mediante as pretensões

e necessidades daqueles que fazem do seu uso aquilo que cabe enquanto prática.

O fato é que, seja enquanto prática holística (por exemplo, por benefícios

mentais) ou por finalidades educacionais (inserido nas escolas e/ou universidades)

ou ainda, com utilizações contextualizadas enquanto ferramenta de lazer ou prática

social (judô inclusivo, por exemplo), o judô, atualmente, é uma espécie de vetor de

catalisação por onde possibilita-se à sociedade um melhor convívio social, pautado

por normas civilizadoras respaldadas por pilares e bases filosóficas consistentes, e

que são preconizadas pelo professor Jigoro Kano. Princípios como os de

prosperidade, benefícios mútuos e o da máxima eficácia são norteadores

educacionais para uma sociedade melhor na atualidade.

82

3.3 Do Japão Feudal dos Samurais ao Japão da Era Meiji e do Judô de Jigoro Kano

O Judô faz parte de diversos momentos da política japonesa, mas para que

possamos compreender melhor o surgimento do mesmo, é necessário localizarmos

a gênese do ju-jutsu55 japonês.

No Japão feudal (período Tokugawa 1603 a 1868) os samurais possuíam

forte influência na sociedade, tinham prestigio e reconhecimento. O sentimento

nacional de isolamento cultural, no intento de fazer prevalecer uma hegemonia

sólida da cultura japonesa, como também, o ideal bélico e militarizado da sociedade

neste período, fizeram com que a sociedade japonesa valorizasse sua própria

cultura e buscasse nas artes marciais um eixo norteador de defesa de seu país.

Porém, com a queda do Xogunato de Tokugawa veio a nova era, liderada

pelo empossamento do imperador Meiji. Neste período, denominado com o mesmo

nome do novo imperador, o Japão reabriu as portas para o mundo. Esta abertura foi

pressionada pela chegada dos americanos, pelo qual o Japão não resistiu e, ao

ceder espaço, uma nova sociedade estava sendo construída (SANTOS, 2012).

Na era Meiji ficaram claros os objetivos de trocas culturais e de

possibilidades de conquistas bélicas, como o aumento do poderio de armamentos,

agora com armas de fogo. Porém, sabe-se que houve implicações negativas ao

tradicionalismo cultural japonês, a exemplo do ju-jutsu (pratica marcial básica dos

samurais e extremamente valorizada no período Tokugawa). Posteriormente,

durante o período Meiji, o Ju-jutsu ficaria relegado a segundo plano frente ao

deslumbramento da sociedade japonesa diante das novas possibilidades culturais

ocidentais.

Para que possamos compreender os princípios educacionais do judô,

devemos ressaltar o nome de Jigoro Kano como principal elo de ligação entre o judô

e a educação. Para isso, é fundamental entendermos um pouco da cronologia de

Kano a fim de que possamos construir uma teia informacional que permita refletir

frente à dimensão educacional na qual o judô foi constituído.

Kano nasceu em 10 de dezembro de 1860, em Mikage (Japão), e aos dez

anos de idade já estava lendo obras da literatura clássica chinesa. Adolescente,                                                             55 O Ju-jutsu era uma prática de luta corporal dos samurais japonese e teve sua ascensão no período

Edo ou Tokugawa (1603-1868), logo após a abertura dos portos (a chegada da pólvora) na Era Meiji (1868-1912) os samurais e a cultura tradicional japonesa perderam espaço, e assim o Ju-Jutsu ficou relegado, sendo posteriormente resignificado por Jigoro Kano.

83

estudou inglês, alemão e matemática e, aos 14 anos, ingressou na Escola Nacional

de Línguas Estrangeiras onde, aos 15 anos, já havia se formado em letras e partia

para iniciar os estudos em uma das mais importantes universidades japonesas, a

Universidade Imperial de Tóquio (hoje, chamada apenas de Universidade de

Tóquio). Aos 21 anos, Kano se graduou no Departamento de Ciências Políticas e

Economia (Faculdade de Literatura da Universidade de Tóquio) e, um ano depois,

na mesma Instituição, em Filosofia Moral e Estética (SANTIAGO, 2002).

Kano sempre foi considerado um homem à frente de seu tempo, prova disso

encontra-se no fato de suas inúmeras viagens ao ocidente (principalmente o

continente europeu) em busca de conhecimento e ampliação de visão de mundo.

Dentre suas inúmeras viagens (contabilizam-se 12 ao total), passou por cidades

importantes como Paris, Berlim, Viena, Copenhagem, Estocolmo, Amsterdan, Los

Angeles, Cairo, Londres, Genebra, Praga, dentre outras, sendo, oito viagens com

fins exclusivos de busca por experiências educacionais europeias. Também

conquistou importantes cargos políticos e educacionais, dentre eles, destaca-se o

fato de ter sido reitor da escola nobre de Gakushuin* aos 28 anos de idade, diretor

do Ministério da Educação do Japão e, posteriormente, nomeado Presidente da

Federação Esportiva do Japão, além de ter sido o primeiro membro asiático do

Comitê Olímpico Internacional (COI).

De acordo com o Jigoro Kano Memorial International Sports Institute

(2016)56, ao longo de sua vida e principalmente após a criação da Kodokan (Escola

para aprendizagem do Caminho), Kano sempre esteve intimamente relacionado com

a educação. Existem registros que nos mostram que Kano beneficiou oito mil

estudantes chineses a estudarem no Japão com bolsas pagas pelo próprio governo

japonês, onde o seu principal foco era mostrar a eles que os esportes deveriam

fazer parte de suas vidas e formações educacionais.

Sendo um homem bastante influente na sociedade japonesa, o professor

Kano recebeu visitas importantes em sua Kodokan, destas, destacamos a visita de

personalidades de grande prestígio acadêmico e científico, oriundos de

Universidades renomadas como a de Yale (EUA), Oxford (Inglaterra), Cambridge

(Reino Unido) e Columbia (EUA). Também recebeu visitas do filósofo indiano e

                                                            56 Instituição que busca relacionar as benfeitorias de Kano ao universo esportivo.

84

também prêmio Nobel Rabindranath Tagore, que gostaria de convidar um professor

para ensinar judô na universidade de Bombay (Índia) (SANTIAGO, 2002).

De acordo com o autor supracitado, Kano teve conferências suas

publicizadas pela revista americana TIME. Ainda no âmbito internacional, destaca-se

a ida de seu aluno Yamashita Yoshitsugu57 à Casa Branca, dos Estados Unidos,

para ministrar aula ao então presidente Theodore Roosevelt e sua esposa, no ano

de 1902 (SANTIAGO, 2002).

Dentre as honrarias e reconhecimentos recebidos por Kano em sua trajetória

de envolvimento com a educação, destacam-se: a nomeação de professor emérito

do Colégio de preparação de Professores de Tokyo (Escola Normal superior); a

nomeação como membro da Câmara Superior do Japão; o reconhecimento

ocidental como “Pai da Educação Física no Japão”; o recebimento do 2º grau

imperial (homenagem póstuma).

O prof. Kano criou seu sistema baseando-se em suas experiências prévias,

mais fortemente, em duas escolas de Ju-jutsu.58 A partir desta vivência, ressignificou

estas práticas modificando não apenas a seleção de conteúdo técnico, mas

principalmente os seus propósitos para com a sociedade. Ele percebeu que dentro

daquele momento histórico (Restauração Meiji) em que se encontrava o declínio da

cultura samurai e, por consequência, do ju-jútsu, já não cabia mais aquele tipo de

prática. É ai que surge a genialidade de sistematizar o seu novo ideal,

acrescentando a este toda a sua bagagem de estudos sobre cultura esportiva

(ocidental), vindo a criar, em 1882, o seu próprio sistema, denominado Judô59 (ou

Caminho suave em tradução literal).

Kano entendia que o contexto histórico pré-guerra, assim como, a mudança

político-cultural em seu país exigiriam algo que passasse a ser aceito por todas as

camadas sociais e, principalmente, pelos militares, que tiveram muita força política

durante o período Meiji.

O seu Judô tinha como diferencial uma proposta baseada no conceito

oriental do “DO”, ou seja, um caminho que não apenas focasse no físico (corpo) e                                                             57 Yoshitsugu Yamashita foi um dos principais alunos de Jigoro Kano, encarregado de levar o Judô a

América do Norte, por onde chegou a ministrar aulas em plena Casa Branca em 1902 (SANTIAGO, 2002).

58 De acordo com Kano (2008a, p. 23), o mesmo estudou mais intensamente o ju-jutsu das escolas TenjinShinyo-Ryu e Kito-Ryu e, posteriormente outras escolas.

59 Judô ou Caminho Suave foi criado por Jigoro Kano em 1882, inicialmente considerada uma arte marcial japonesa e atualmente contextualiza-se enquanto como uma modalidade esportiva de combate após sua plena esportivização.

85

sim, que ofertasse um pensar e agir, culturalmente e socialmente, avançados por

parte de seus praticantes.

Assim, depois de eliminar todas as técnicas consideradas violentas e/ou

agressivas, o professor reorganizou os conteúdos e garantiu que o seu sistema

pudesse ser aceito nas escolas e, consequentemente, que fosse praticado por

crianças (algo até então impensável ao Japão daquela época).

Dada a sua influência no âmbito político educacional do japonês, percebe-se

que Kano adquiriu um reconhecimento gradativo e consistente por parte do governo

e da sociedade.

No âmbito militar, conseguiu oficializar a sua escola (Kodokan) enquanto

principal método de luta institucional militar em seu país. Sabe-se que a polícia

metropolitana realizou evento onde ocorreram combates entre as escolas de Kano e

de mestres de Ju-jutsu, e por onde a Kodokan sagrou-se campeã e foi, então,

oficializada enquanto arte marcial da polícia japonesa.

Outro ponto historicamente importante e de relevância quanto ao Judô

Kodokan, e que deve ser ressaltado, refere-se à autonomia de Kano frente ao

governo, pois é sabido que, em 1895, o governo japonês queria apoderar-se de suas

culturas de artes marciais (com objetivos claros de blindar sua sociedade que vivia

um clima de pré-guerra) e para isso foi criada a instituição governamental Botukakai,

onde Kano, mesmo sofrendo pressão, não deixou que o seu método tivesse sido

militarizado pelo governo, o salvando de uma possível sub-utilização do método,

blindando, assim, deste fato que seria algo trágico frente aos preceitos idealizados

pelo criador (CASADO; VILLAMÓN, 2009, p. 36-38).

3.4 A Visão Ampliada de Kano e suas Bases Educacionais e Filosóficas

Conforme relatamos acima, Jigoro Kano era um asiático com uma

cosmovisão diferenciada. Percebe-se que durante seus estudos na Universidade de

Tokyo, o mesmo sofreu fortes influencias de filósofos ocidentais, tais quais, Comte,

Mill, Montesquieu, Hegel, dentre outros (VILLAMÓN; BROUSSE, 1999, p. 115-116).

Somado a estas aproximações conceituais com filósofos e teóricos

ocidentais, Kano buscou relacionar os seus estudos e experiências com filosofias

próprias da cultura oriental: Budismo, Confucionismo e Taoismo, bem como, aquelas

86

de maiores aproximações específicas à sociedade japonesa, tais quais, o Zen, o

Bushidô e o Xintoísmo.

Segundo Villamón e Brousse (1999), Kano sofreu influencias ocidentais

próprias de culturas greco-romanas, da ética industrial européia e também do

racionalismo lógico de tradição Kantiana (todas estas relacionavam-se à gênese do

esporte moderno). Ainda, segundo o autor supracitado, identificam-se influencias da

Ginástica Sueca de P. H. Ling e da Educação Física Inglesa (1850-1860).De acordo

com a figura abaixo, fica mais fácil compreender a complexidade de áreas com as

quais Jigoro Kano construiu aproximações para desenvolver o Judô.

Figura 3 – Influências Orientais e Ocidentais da origem do Judô

Fonte: extraída de Mazzei (2006) e adaptado de Villamón e Brousse (1999)

A principal aproximação de Kano à educação se dá no momento em que o

mesmo idealiza o seu Judô com um caráter único e inovador, amparado por uma

ideologia pacifista e humanista e que abarca o princípio básico de proporcionar uma

educação integral (ou por completa), que proporcionasse a evolução de indivíduos

através de uma cultura de formação moral, intelectual e física.

Kano, ao criar o método Kodokan, buscou implementar um conceito

educacional de prática corporal (baseada no antigo Ju-jutsu), porém, expandiu as

87

possibilidades ao criar os seus dois importantes princípios filosóficos (pilares

fundamentais de seu método).

A criação dos dois princípios do judô, nos anos de 1915 (Seiryoku-Zenyo) e

em 1922 (JitaKioey), trata-se de um marco, pois Kano, a partir deste momento,

definia de forma clara que o seu método deveria se encarregar de ser útil à

sociedade e ir além da concepção física (corpo).

JitaKyoei (prosperidade e benefícios mútuos) e Seiryoku-Zenyo (máxima

eficiência ou melhor uso da energia) são a representatividade filosófica e prática

daquilo que deverá ser transmitido positivamente a uma sociedade e ser extrapolado

para além dos tatames. O princípio Seiryoku-Zenyo apareceu pela primeira vez no

ano de 1915 (Kano tinha 55 anos de idade), o seu principal propósito é o de

proporcionar ao praticante de judô, o conceito ampliado acerca do melhor uso da

energia, por exemplo: na situação técnica de uma luta, fica claro que devemos nos

desgastar o mínimo a fim de guardar energia para utilizarmos através de um golpe

na hora certa. Mas, o professor Kano sempre pensou além, ou seja, no ambiente

extra dojô, para ele, só seremos eficientes na sociedade a partir do momento que

aprendermos que não devemos desperdiçar energia e, pelo contrário, o não uso da

força (física) é fundamental para dar saltos maiores de convivência social.

O JitaKyoei surge depois do princípio da máxima eficácia (ou menor uso da

energia). Kano o criou objetivando disseminar o conceito de prosperidade e

benefícios mútuos. Neste princípio básico e fundamental, entende-se que só se

evolui (seja tecnicamente ou espiritualmente) a partir do momento em que também

proporciona-se o bem aos demais que estão ao redor. Uma sociedade é feita de

compartilhamentos de boas ações e, que em reciprocidade, permitem a evolução

social e pacífica. Percebe-se que Kano criava princípios filosóficos ao seu sistema

educacional (Judô) para que, a partir deles, pudesse extrapolar os muros da prática

esportiva para o uso nas ações do dia a dia na sociedade.

Em 1922 (Kano tinha 62 anos), foram anunciados os princípios combinados

de Seiryoku-Zenyo e Jita Kyoei. Em 1927, dissemina-se os dois princípios a fim de

serem utilizados por toda sociedade japonesa e não apenas aos que praticavam o

Judô.

É sabido que o sistema previsto por Jigoro Kano baseava-se em três pilares

de sustentação: Educação Física, Moral e Ética. O trabalho permeado pela prática

do Judô permitiria ao praticante um apoio educacional complementar e fundamental.

88

Somado a estes dois princípios (prosperidade e benefícios mútuos e o de

melhor uso da energia), evidencia-se que, de acordo com Watson (apud SANTOS,

2012), Kano, em seu método educativo, baseou-se no estudo do filósofo inglês

Herbert Spencer, para determinar três elementos fundamentais denominados shugi

(cuidado e fortalecimento do corpo pela educação física), Iku (desenvolvimento

moral e ético) e san (aquisição de conhecimento), ou seja, neste contexto, fica nítido

uma preocupação com uma formação de desenvolvimento físico, moral e ético.

As nuances encontradas nas propostas conceituais filosóficas e

educacionais do sistema criado por Kano pode ser facilmente compreendida a partir

da figura 4. Nela, percebe-se que Jigoro utilizou-se de bases de influencias orientais

e ocidentais para sistematizar os princípios norteadores educacionais e filosóficos

pautados pela racionalização de sua prática, enquanto alicerce para melhoria global

(seja físico, emocional, social, psicológico e/ou cultural) do indivíduo perante sua

atuação enquanto ser pertencente a um coletivo social.

Figura 4 – Princípios filosóficos/educativos do Judô e as influências orientais e ocidentais

Fonte: Santos (2015, p. 164)

De acordo com a Confederação Brasileira de Judô (2016), Jigoro Kano

também instituiu o código moral do judô, destinado a todos os praticantes da

89

modalidade, que visa o fortalecimento do caráter filosófico de sua prática e se baseia

em oito princípios básicos e norteadores, que são:

Cortesia, para ser educado no trato com os outros; Coragem, para enfrentar as dificuldades com bravura; Honestidade, para ser verdadeiro em seus pensamentos e ações; Honra, para fazer o que é certo e se manter de acordo com seus princípios; Modéstia, para não agir e pensar de maneira egoísta; Respeito, para conviver harmoniosamente com os outros; Autocontrole, para estar no comando das suas emoções; Amizade, para ser um bom companheiro e amigo (CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE JUDÔ, 2016).

Segundo o próprio Jigoro Kano, três áreas foram trabalhadas por ele no

contexto da relação entre o Judô e a educação: o aprimoramento do caráter; o

treinamento do intelecto; e a aplicação da teoria da luta nos aspectos da vida, com a

finalidade de dominar um método para lidar com as coisas à nossa maneira (KANO,

2008, p. 93).

Aqui, percebemos claramente que os propósitos desta arte marcial (em sua

gênese) possuíam ideais sólidos voltados ao sistema educacional japonês. Não

bastava pensar no corpo (físico), era fundamental extrapolar as barreiras e educar a

mente (intelecto), objetivos muito específicos do sistema de Kano (Judô) e que não

existiam, até então, em nenhum outro esporte e/ou arte marcial naquele momento.

As aproximações de Kano com a educação impressionam, tanto que, em

uma de suas mais importantes obras, o clássico livro “Energia Mental e Física”, são

mencionados poemas que denotam claramente sua visão emotiva com a educação:

Educação Não há nada maior no mundo. A educação moral de uma pessoa se estende a dez mil pessoas. A educação de uma geração se expande por uma centena de gerações. Educação Não há nada mais agradável no mundo. Cultivando o talento e melhorando o mundo, Essa fragrância perfuma para sempre após a morte (KANO, 2008a, p. 121).

Dentro do âmbito educacional, percebe-se que a pretensão de Kano era,

principalmente, a de proporcionar a educação através do esporte, entendendo que,

a partir deste, o sujeito desenvolveria uma melhora física, intelectual e moral.

Tratando-se de ética, não podemos deixar de analisar a relação entre Kano

e o Barão de Coubertin (Pierre de Freddy). Sabe-se que Kano viveu o mesmo

90

período que ele (porém em culturas distintas – oriente e ocidente), porém a

convergência de ideais se deu de forma impressionante, uma vez que os mesmos

eram humanistas e, assim, percebiam que através da pratica de atividade física e

esportes poderíamos chegar a uma sociedade pacificada.

Ainda sobre esta relação, diversos autores e instituições Del Vecchio e

Mataruna (2004), Franchini e Da Costa (2002), Jigoro Kano Memorial International

Sports Institute (2016), afirmam encontrar similaridades conceituais entre os

princípios preconizados pelos mesmos. Sabe-se que Coubertin, através do

olimpismo, defendia o “Fair Play” e o “amadorismo”, já Jigoro Kano, tinha como

máximas de seu caminho da suavidade, a prosperidade e os benefícios mútuos,

assim como também, a máxima eficácia (ou o melhor uso da energia).

Por sua vez, no que relaciona-se à ocidentalização das ideias do Professor

Kano, Duarte (2016) nos lembra acerca do relatório para a Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) da Comissão

Internacional sobre Educação para o século XXI, que ressalta a importância de

quatro pilares fundamentais da educação: Aprender a conhecer; Aprender a fazer;

Aprender a viver com os outros; Aprender a ser. Todos estes princípios de origem de

pensamento ocidental podem ser plenamente relacionados aos princípios judoísticos

preconizados por Kano, dada as devidas contextualizações culturais pertinentes a

cada nação.

Por fim, dentro da seara do debate que relaciona a educação e o judô, cabe

comentarmos sobre dois dos mais importantes textos já publicados. Primeiramente,

Kano (2008c) que trata de uma análise crítica comentando a conferência, na íntegra,

do criador do Judô, Kodokan, realizada na Universidade de Southern Califórnia (Los

Angeles – EUA) no ano de 1932. Neste, Garcia e Gutiérrez (2008, p. 39-53) nos

trazem importantes detalhes da personalidade de Kano, assim como o seu caráter

humanista que baseava-se na racionalidade e na colaboração entre as pessoas e

países. Casado e Villamón (2009), publicaram um dos textos mais críticos neste

cenário, intitulado “La utopia educativa de Jigoro Kano: el Judô Kodokan”.

Considerado quase como um manifesto, neste texto os autores buscam levantar

questionamentos acerca da esportivização do judô, que após a II Guerra Mundial

sofrera uma espécie de influência multicultural proporcionada por diversos países e

que têm se distanciado cada vez mais dos genuínos fins e objetivos educativos

91

idealizados pelo humanista e pedagogo Jigoro Kano, justificando o que denominam

como “utopia educativa de Jigoro Kano”.

Em conclusão ao presente subtópico de discussão (3.4), vale reflexão a

partirda figura 5, extraída de Santos (2015), e que sintetiza as interseções culturais

(e outras) relacionadas ao oriente e ocidente para formular seu pensamento de

construção do judô enquanto método educativo. É possível percebermos que o Judô

foi formulado e desenvolvido a partir de uma complexa interrelação cultural, mediada

por circunstâncias específicas de cunho social, histórico, político e econômico, que,

junto às experiências de vida de Kano, possibilitaram a criação e aprimoramento dos

princípios filosóficos, ideológicos e educativos do Judô.

Figura 5 – Modelo sistêmico de pensamento de Jigoro Kano ao formular o método educativo

denominado judô

Fonte: Santos (2015, p. 184)

3.5 Pontos Relevantes quanto à Proposta Educacional de Kano

A partir de sua influência na política japonesa, Jigoro Kano conseguiu inserir

o judô no sistema educacional Japonês (nas escolas primárias, secundárias e

superiores). A partir desta conquista, o judô buscou o seu reconhecimento mundial,

principalmente, através dos meios acadêmicos e esportivos.

92

Apesar de todos os avanços cronológicos no desenvolvimento do judô,

muitos autores têm ressaltado que, no contexto atual, muito se têm perdido quanto

ao uso real e prático da filosofia preconizada e idealizada por Jigoro Kano. É sabido

que seu criador intencionava criar um método que fosse difundido e divulgado

mundialmente, porém, não se imaginava que estes avanços, somados às influências

culturais diversas, pudessem enfraquecer os ideais e princípios filosóficos instituídos

por Kano para a sua prática. Temos, assim, um cenário no mínimo incoerentemente

negativo acerca da esportivização do judô.

De acordo com Carvalho (2007), o judô passa a ser reutilizado no mundo

contemporâneo de forma descontruída e com diminuição de solidez a partir do

momento em que sofre as influências da sociedade capitalista que utiliza-o como

manobra de massa e com intenções claramente mercantilistas (vide por exemplo, os

abusos de cobranças exorbitantes em exames de graduação, assim como taxas por

parte de entidades regularizadoras).

Apesar das ponderações ressaltadas anteriormente, entendemos que o

legado deixado por Jigoro Kano impactou, e ainda impacta, toda a sociedade, pois o

Judô é uma das modalidades esportivas de combate mais praticadas pelo mundo,

além de possuir a confiabilidade de classes profissionais importantes como a

médica, a de psicologia e a dos educadores. Prova disso é que, no Brasil, o Judô,

juntamente com a Capoeira, possui forte aderência nas escolas enquanto prática

extracurricular. Também se faz importante ressaltar a presença do ensino do Judô

enquanto componente “Lutas” na Educação Física Escolar e no ensino superior,

principalmente em Faculdades de Educação Física (enquanto componente

curricular).

3.6 Compreendendo o Processo Civilizatório nas Artes Marciais/Judô

Neste tópico de nossa pesquisa, discutiremos, brevemente, os produtos da

relação entre o Judô de Jigoro Kano com a teoria Elisiana do processo civilizatório,

proposta pelo sociólogo alemão Nobert Elias (1897 – 1990), constituindo-se uma

relevante base teórica para a presente pesquisa. Elias (1994b, p. 193) afirma que o

processo civilizatório é caracterizado por uma “mudança na conduta e sentimentos

humanos rumo a uma direção muito específica”. Queremos compreender, de acordo

93

com o processo civilizatório, que diferenças existem no que diz respeito à cultura

ocidental e oriental na formação e evolução dos indivíduos em uma sociedade?

Elias é visto como “um dos maiores sociólogos do século XX, se não o

maior” (DUNNING, 2014, p. 23), e há um reconhecimento geral de que a teoria dos

processos civilizatórios é a principal contribuição do teórico à sociologia. Considera-

se, inclusive, esta teoria como uma teoria central de todas as suas obras

(DUNNING, 2014).

Existem críticas ligadas à teoria do processo civilizatório oriundas do

entendimento de que a mesma é muito eurocêntrica, ou seja, que esteja muito ligada

a uma análise voltada ao ocidente, mais precisamente ao desenvolvimento da

sociedade europeia. Como estamos buscando compreender a importância desta

teoriana evolução das artes marciais e dos esportes de combate, e ainda,

especificadamente, ao judô, faz-se necessário que tenhamos criticidade em

compreender as possibilidades e limitações referentes à análise da mesma no

contexto específico oriental (asiático).

Contudo, contrapondo-se a crítica sobre as limitações quanto à utilização da

teoria do processo civilizatório, em relação à sua aplicabilidade para analogias

referentes aos esportes ou práticas marciais oriundas da cultura oriental, nos

fortalecemos, embasando-se através de dois importantes estudos internacionais,

que visaram investigar/analisar justamente o processo civilizatório do judô no âmbito

do continente europeu e de sua respectiva cultura. De acordo com os pesquisadores

Goodger, B.; Goodger, J. (1977) e Régner, (2010) o Judô é compreendido na

Europa enquanto uma arte marcial que através de um processo de “reculturação”

sofreu forte institucionalização cultural ocasionando em mudanças que permearam

novas ressignificações que transitaram da marcialidade (gênese do judô) para a

esportivização, ou seja, tradição e modernidade duelaram frente aos novos

horizontes desbravados pela internacionalização do judô de Jigoro Kano. Contudo,

ainda de acordo com os autores acima, o próprio Kano visava civilizar sua prática

visto que, da transformação do antigo jujútsu dos samurais, Jigoro codificou a sua

nova prática, visando excluir técnicas mortais e/ou demasiadamente violentas, e

assim, entendemos que o mesmo já visava facilitar sua prática enquanto

popularização já que agora, o novo sistema podia ser praticado da criança ao idoso,

94

pois não havia mais chances de muitas lesões ou até mortes. Régnier (2010, p. 93)60

analisa, que ao tomar a biografia de Jigoro Kano do ponto de vista do processo

civilizatório, “seria mais apropriado colocar o judô como uma prática puramente

heterodoxa para o Japão da época, mas perfeitamente ortodoxa quanto ao modo de

prática ocidental”, isso denota quanto a contextualização cultural é fator

determinante para a assimilação do judô de acordo com a sociedade em que o

mesmo se insere ou desenvolve-se.

Contextualizando, conceitualmente, o processo civilizatório, identificamos

que, segundo Souza (2014, p. 104) pode ser definido como a “manipulação

consciente de fontes culturais por atores sociais, derivando, igualmente, do

aperfeiçoamento da consciência que os indivíduos possuem em relação ao meio que

o cerca”. Assim, o que pretende-se enfatizar é a necessidade de entendimento

evolutivo e consciente por parte da sociedade, na qual se espera boa convivência e

respeito recíproco mediante normas condizentes de civilidade. Sabe-se que o

processo civilizatório transpassa gerações e, por isso, depende de uma análise

processual que leve em consideração um longo prazo, por onde os valores e

costumes sociais sofrem mutações evolutivas em seu percurso.

Tratando-se do judô e, por consequente, de uma prática oriental japonesa,

Cavalcante (2014) afirma que o judô segue este processo civilizatório, tendo em

vista que, desde a sua concepção, existe a preocupação em eliminar todas as ações

lesivas aos seus praticantes, garantindo a sua integridade física e possibilitando a

sua prática desde a idade escolar até a condição do alto rendimento. Contudo,

pretendemos ampliar esta análise, dada a importância da mesma para a

compreensão exitosa de como podemos inferir sobre esta influência teórica no

desenvolvimento do judô enquanto esporte de combate.

Tem-se pleno entendimento na literatura do esporte enquanto substituto

aceito para as emoções reprimidas, e por onde a civilização das condutas e das

emoções podem ser vistas em práticas esportivas (QUITANEIRO, 2010). Elias (1982

apud QUINTANEIRO, 2010, p. 93), afirma que o “esporte é sempre uma luta entre

os seres humanos”, concepção que fortalece o nosso discurso sobre a relação

pertinente às lutas civilizadas (em geral pertinentes a contemporaneidade), por onde                                                             60 Tradução do trecho em francês: “[...] il serait plus juste de placer le judo comme une pratique

purement hétérodoxe au Japon de l’époque, mais parfaitement orthodoxe quant au mode de pratique occidental” (RÈGNIER, 2010, p. 93). 

95

compreendemos que lutar é interagir com o outro, sabendo respeitar o próximo,

independente do resultado, e privilegiando sempre a integridade física do oponente

acima de qualquer coisa. Entretanto, sabemos que as artes marciais, dentre elas o

judô, originam-se da cultura oriental, bastante distinta da ocidental, dito isso, nos

perguntamos qual será a relevância desta abordagem teórica, especificadamente no

tocante a estas práticas orientais?

Sobre as artes marciais orientais, Marta (2010, p. 29) ressalta que, ao longo

do século XX, “delas foram gradualmente retirados ou sublimados os gestos

considerados violentos em demasia”, o que o autor batiza como “controle da

violência potencial”. Entretanto, o mesmo autor ressalta que estas práticas sofreram

estes ajustes em tempos diferentes e que, ainda, algumas delas se utilizam

atualmente de crítica a este controle da violência buscando construir uma ferramenta

de marketing para que se justifique a sua difusão. A exemplo disso cita que alguns

tipos de jiu-jitsu são voltados à concepção de retorno da violência a partir de práticas

como o vale-tudo, razão pela qual entendemos que, de certa forma, tal postura

caracteriza-se como um retrocesso civilizador de “des-esportivização”.

Ainda de acordo com o autor supracitado:

Existem artes marciais criadas no ocidente que foram sendo lentamente convertidas em jogos que, em alguns casos, posteriormente, foram convertidos em esportes como resultado de um processo de amenização ou suspensão daqueles elementos considerados violentos ou bárbaros para as novas sensibilidades ‘civilizadas’ que foram se desenvolvendo na Europa [...] (MARTA, 2010, p. 47).

Alguns exemplos de modalidades de lutas que podem ser relacionadas de

acordo com a citação acima seria o boxe e a luta greco-romana.

Sobre o judô, propriamente dito, sabe-se que foi propósito de seu criador,

Jigoro Kano, a busca pela esportivização da prática visando a massificação da

mesma e o reconhecimento olímpico, conforme pudemos ver na seção três de nosso

estudo. Entretanto, a teoria do processo civilizatório compreende que o caminho

desta pratica para a esportivização é conquistada mediante ajustes, como em suas

regras, por exemplo, visando torná-las práticas em níveis mais aceitáveis

socialmente. No entanto, os esportes de combate e artes marciais possuem a

particularidade do confronto direto e do “tocar no outro”. Pensando em um dos

pilares da teoria, referente ao controle das emoções, é sabido que práticas deste

96

cunho possuem maiores necessidades para que não se extrapolem suas emoções e

não incorram em desvios para a violência.

Por outro lado, a “regratização” de práticas das lutas através de sua

esportivização projeta-as para culturas civilizadas e bem aceitas como, por exemplo,

o entendimento do fair play (jogo limpo), ou respeito recíproco para além das regras

em si, e que é tão bem aceito na concepção de esporte moderno. Em contrapartida

aos pontos positivos entendidos na utilização da teoria civilizatória no universo

marcial, é pertinente considerar que a esportivização excessiva de algumas práticas

de artes marciais orientais levam a perdas e pontos negativos.

Sobre este quesito, de acordo com Marta (2010), a transformação em uma

arte marcial esportivizada poderá ressignificá-la a tal ponto, que as mesmas percam

suas importantes essências filosóficas orientais, pois na cultura ocidental as

mesmas poderão, inclusive, serem rotuladas e comercializadas como, por exemplo,

transvestidas em ambientes de academias de ginásticas61, porém, não mais com os

propósitos originais que a caracterizavam enquanto arte marcial oriental, tornando-

se apenas gestos soltos (chutes e socos) e desvirtuados de contexto.

No que corresponde ao Judô, recorremos a uma citação de Marta (2010, p.

54) que afirma ter sido a “primeira arte marcial oriental a expressar um sentido

pedagógico que, ao mesmo tempo em que buscava a difusão e manutenção de

valores morais tradicionais japoneses, buscava também fundir esses valores a

aspectos pedagógicos ocidentais”. Entendemos que esta base filosófica por parte do

judô permite-o que, mesmo sofrendo influencias pela ocidentalização, se for bem

guiada de acordo com os princípios que o constituem, a prática estará segura e

impermeável a possíveis desvios de condutas por parte de seus praticantes. Por ser

uma prática de forte cunho educacional, o judô visa formar cidadãos, inclusive no

que tange a civilidade e boa convivência social. Este autocontrole é essencial para a

preservação e desenvolvimento do processo civilizatório. De acordo com Souza

(2014, p. 116), o autocontrole “é visto por Elias como uma espécie de etapa final do

processo civilizador, e etapa que o legitima perante os indivíduos que dele fazem

parte.

                                                            61 Modalidades como o BodyCombat®, tipo de ginástica que utiliza-se de gestos estereotipados das

artes marciais orientais e que são propostas nestes ambiente com o intuito de perder peso e melhorar a estética corporal.

97

Como visto no tópico 3.4 desta seção, um dos pilares filosóficos do Judô é o

Jita Kyoei, que, em sua essência, significa prosperidade e benefícios mútuos, ou

seja, podemos compreender, por analogia, que o indivíduo só cresce e desenvolve-

se a partir do crescimento coletivo. O judô cultua esta máxima em todos os dojôs

pelo mundo afora. É possível percebermos aproximações conceituais entre o

pensamento de Kano com o de Elias. De acordo com Quintaneiro (2010, p. 55),

Elias entende a sociedade através de uma perspectiva sociológica figuracional, por

onde, segundo a autora, Elias assinala que, “[...] em nossa era, a tendência é de que

‘mais e mais grupos e, com eles, mais e mais indivíduos’ dependam ‘uns dos outros

para sua segurança e a satisfação de suas necessidades [...]” e que esta

interdependência social acaba favorecendo com que as pessoas apenas consigam

“sustentar sua vida e sua existência social em conjunto com muitas outras”

(QUINTANEIRO, 2010, p. 55). Destarte, fica claro que Kano, assim como Elias,

compreendiam e preconizavam que a convivência social era ditada pelo respeito ao

próximo, guiado por normas de civilidade e controle de emoções.

3.7 Judô enquanto Modelo de Ensino Não Formal

Ao discutir o judô quanto ao seu propósito educacional, torna-se importante

compreender a influência de determinada cultura (japonesa) nos modelos de

educação formal e não formal proposto por Gadotti (2005). Para tal, faz-se

necessária a compreensão do modelo vigente não formal de educação através do

ensino do Judô no período em questão, de 1952 a 1972. Segundo pesquisa

realizada por Cavalcante (2014), foi identificado que o Judô se apropria do modelo

não formal, uma vez que seu conteúdo é provido de fundamentação pedagógica,

visando não só o ensino da luta em si, mas a formação ética e o desenvolvimento

intelectual de seus praticantes, através de sua doutrina filosófica, facilitando o

convívio social de seus praticantes.

Contudo, faz-se necessária uma ampliação quanto à discussão do conceito

de não formalidade baseando-se a partir de importantes autores. Destarte, quando

falamos em Educação Não Formal, necessitamos compreender os equívocos

conceituais que se relacionam a este campo de atuação. Frente a este quesito, uma

das maiores pesquisadoras neste âmbito, Gohn (2013, p. 11) de forma clara e

objetiva, conceitua:

98

A educação formal é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a informal é aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de socialização – na família, bairro, clube, amigos, etc – carregada de valores e culturas próprias, de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação não formal é aquela que se aprende ‘no mundo da vida’, via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivas cotidianas.

Visando a expansão no que tange ao conceito de educação não formal,

apoiamo-nos no entendimento “oficial” por parte do Ministério da Cultura e Educação

do Brasil (2003, p. 28), que nos oferta a seguinte definição:

A educação não formal, enquanto modalidade de ensino/aprendizagem implementada durante a trajetória de vida das pessoas, pode ser compreendida em seis dimensões: a qualificação dos indivíduos para o trabalho; adoção e exercício de práticas voltadas para a comunidade; a aprendizagem política de direitos através da participação em grupos sociais; a educação realizada na e pela mídia; a aprendizagem de conteúdos da escolarização formal em modalidades e esferas diversificadas; e finalmente, a educação para a vida, no sentido de garantir a qualidade de vida.

Trazemos, ainda, para a discussão um terceiro conceito proposto por

Coombs e Ahmed (1974, p. 27), onde afirma que a educação não formal é “toda

atividade organizada, sistemática, educativa, realizada fora do marco do sistema

oficial, para facilitar determinados tipos de aprendizagem a subgrupos específicos da

população, tanto adultos como infantis”.

Desta forma, entendemos que o ensino do Judô, em seus respectivos e

específicos espaços, denominados como Dojô, ou seja, ambiente/espaço para o

ensino do Judô (e demais artes marciais japonesas) pode ser compreendido como

uma prática não formal de ensino, visto que não possui características padronizadas

e/ou formais do ambiente escolar quanto as suas diretrizes e regulamentações.

Além disso, podemos perceber que nos dojôs os compartilhamentos de experiências

através de ações coletivas com o outro é algo constante e rico, ou seja, não segue

os regimentos formais de espaços institucionalizados. Vale lembrar, que a educação

através de modalidades esportivas (por onde também encaixam-se as lutas e, por

consequência, o Judô) se desenvolve usualmente nos extramuros escolares no

sentido de que são livres de atuações guiadas pela “formalidade” escolar.

Guiando-nos pela definição acima é que compreendemos a importância do

Dojô (local por onde se aprende o caminho – Judô) enquanto espaço educacional

liderado pela docência do sensei (professor de judô). Independente se este dojô

99

(espaço) está localizado dentro dos muros da escola (como por exemplo, enquanto

prática extracurricular – escolinhas esportivas) ou fora da institucionalização deste

espaço (como por exemplo, as academias de judô). Neste sentido, os autores Rufino

(2016) e Rufino e Darido (2015), simplificam o entendimento no que tange ao

contexto local ou ambiental onde ocorre a prática de lutas e/ou artes marciais,

mencionando, objetivamente, o ensino formal (por meio do ambiente escolar) e o

ensino não formal (como clubes, academias, centros esportivos, projetos sociais

etc.). Aqui, vale ressaltarmos que os autores reduzem o olhar ao local, dando uma

visão pertinente, porém sintetizada, do conceito de educação não formal, como

pudemos ver anteriormente junto aos outros autores citados.

No esporte, e aqui entendendo o judô dentro deste conceito, percebe-se que

a educação não formal se contextualiza mais fortemente quando relacionada a fins

com objetivos sociais, tais como os que são pregados através dos diversos projetos

esportivos existentes pelo Brasil e no mundo (como por exemplo, o Instituto Reação

– RJ, chefiado pelo ex-atleta Flávio Canto), vale ressaltar, que o próprio Jigoro Kano

preconizava um judô inclusivo ou “para todos” enquanto ideal para sua prática.

Desta forma, se o judô já possui um caráter filosófico e educacional voltado à

formação dos indivíduos, quando realizado em tais projetos de cunho social tem

suas capacidades educativas potencializadas, já que têm-se o entendimento de que

o fenômeno esportivo funciona como elemento de coesão social e ferramenta

educativa (BENDRATH, 2010). Ampliando a discussão e, de acordo com o referido

autor, “o princípio da educação não-formal, portanto, é usado nos projetos

esportivos, partilhando experiências entre jovens, lições de cidadania e respeito

mútuo, competitividade coletiva e individual e superação de barreiras e dificuldades”

(BENDRATH, 2010, p. 131).

Compreendemos a importância do debate acerca da contextualização

espacial (local) onde se ocorre o tipo de educação. Sobre este aspecto, Gohn (2013,

p. 15) reforça a ideia quando afirma que “a educação não formal é um processo de

aprendizagem, não uma estrutura simbólica edificada e corporificada em um prédio

ou numa instituição; ela ocorre via o diálogo tematizado”. Fica claro, portanto, o

posicionamento da autora em criticar o entendimento pautado apenas no viés da

“estrutura” ou dos “muros” que delimitam um local para se aprender. Mediante esta

compreensão, podemos afirmar que o dojô, enquanto “espaço de educação”,

independente do local em que esteja instalado, é um ambiente sem muros e

100

fronteiras no que corresponde à sua fertilidade em propor educação daqueles que

neles praticam o judô com fins para a formação humana e cidadã.

Por fim, reafirma-se em nosso estudo a importância de práticas de lutas e/ou

artes marciais enquanto educação não formal dada à importância complementar

desta na formação do indivíduo junto a seu percurso de escolarização/educação

formalizada. Sobre esta importância, nos ancoramos em Gohn (2013, p. 14) onde a

mesma menciona:

A educação não formal contribui para a produção do saber na medida em que atua no campo no qual os indivíduos atuam como cidadãos. Ela aglutina ideias e saberes produzidos via o compartilhamento de experiências, produz conhecimento pela reflexão, faz o cruzamento entre saberes herdados e saberes novos adquiridos.

Este percurso transicional, onde realizam-se as trocas recíprocas de saberes

entre o mestre (sensei) e o seu alunado, é algo constante na práxis do ambiente

judoístico. Neste ambiente propício de trocas educativas, os conhecimentos

historicamente acumulados pelos senseis são muitas vezes transmitidos aos seus

discípulos em uma relação por onde permite-se a fusão entre o antigo e o novo, e

por onde alimenta-se a perpetuação temporal através da preservação do saber

enquanto conhecimento dinâmico. Esta forma de educação na relação mestre-aluno

ocorre com certa constância nos ambientes marciais e é reconhecida como uma

forma de transmissão de conhecimento tradicional por onde facilita-se a educação

dos indivíduos.

101

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS Nesta penúltima seção, nos detemos exclusivamente à análise das imagens

geradas através do software NVivo®, de forma a possibilitar inferirmos quanto ao

desfecho das análises, assim como das reflexões conclusivas. Também buscamos a

construção de gráficos facilitadores da compreensão dos mais diversos contextos,

como também, apoio em fontes documentais e iconográficas.

Logo abaixo, apresentamos o detalhamento acerca de cada categoria

temática analisada (conforme detalhadas nas páginas 75 e 76). Para tal, se faz

importante apresentar a forma organizacional em que conduzimos nossa

categorização dos dados (também denominados, em nossa pesquisa, de nós e

subnós) conforme podemos compreender a partir da representação gráfica contida

na figura 6 apresentada a seguir.

Figura 6 – Categorias e subcategorias de Análise

Fonte: o autor (2017)

102

4.1 Quem são os nossos Mestres Selecionados para a Pesquisa? Uma Breve

Apresentação

Antes da análise, propriamente dita, de cada categoria supramencionada, se

faz necessário uma breve apresentação formal de nossos personagens

entrevistados, peças fundamentais enquanto fontes principais de nossa pesquisa.

Todas as informações que virão a seguir nesta seção, referentes ao breve

histórico de vida de todos os senseis participantes de nossa pesquisa, tiveram dados

informacionais extraídos de fontes diversas (devidamente citadas), tais como sites

de internet, matérias jornalísticas impressas, acervos pessoais disponibilizados ao

pesquisador e, principalmente, informações cedidas na própria entrevista concedida

a esta pesquisa.

4.1.1 Sensei Byung Kuk Lee

Fotografia 1 – Sensei Byung Kuk Lee

Fonte: o autor (2017)

O sensei Byung Kuk Lee nasceu em 25 de fevereiro de 1936, em Seoul,

capital da Coréia do Sul, naturalizando-se brasileiro em 1972. Começou no judô aos

14 anos, quando, por causa da guerra, seu pai o colocou no Judô. O professor

afirma que considera ter, em média, 60 anos de judô (1950 a 2010) e, após sua

aposentadoria, já não tinha mais tanto envolvimento com o judô.

Em meados de 1957, quando entrou no ensino superior, já era técnico de

judô na Escola Técnica de Incheon (Coréia do Sul), em média, aos 21 anos de

103

idade. Considera que aprendeu judô com o mestre Kim-Sangtae (na época, então

chefe de polícia).

Chegou ao Recife no dia 26 de janeiro de 1967, período em que já existiam

alguns professores atuantes com judô na cidade. Tão logo, o professor Lee foi

recebido por William Arruda (dono da academia William Arruda - WAR), localizada

na Rua do Paissandu, nº 720, para que pudesse morar com ele e também dar aulas

naquele espaço. Na verdade, Arruda foi uma grande amigo e apoiador do professor

Lee, bem como, o professor José Alves, que também morava na academia do

Arruda.

Academicamente, o professor Lee (como costuma ser chamado) destacou-

se por sua disciplina em estudar e capacitar-se. Graduou-se em Licenciatura Plena

em Educação Física na Escola Superior de Educação Física-FESP (hoje

Universidade de Pernambuco), tendo iniciado seu curso em 1957, ainda na Coréia.

Foi aprovado no concurso público para professor da UFPE, em 1975. Em 1979,

retornou a Coréia para realizar seu mestrado em Ciências Físicas na Universidade

de Kiung-Hee (Seoul, Coréia do Sul), na época, foi um dos primeiros docentes a

buscarem formação acadêmica no exterior.

Dentre suas experiências com o judô na cidade do Recife-PE, podemos

destacar alguns locais de atuação enquanto professor de ensino primário, médio e

superior: Colégio Militar do Recife (1968 a 1973); Colégio Nóbrega (1969 a 1970);

implantou o judô no Colégio Santa Maria (1969 a 1990); Também lecionou no ensino

superior nos cursos de Educação Física da antiga FESP – hoje ESEF/UPE (1982) e

do DEF/UFPE (1975 a 2008) como membro efetivo do coletivo docente ou,

posteriormente, como substituto (já aposentado da instituição). Também foi

professor de judô e técnico nas seguintes instituições/academias: Academia Willians

Arruda - WAR (1967 a 1968); Clube dos Oficiais da Aeronáutica (1967 a 1968); IV

Exército – 7ª RM (1968 a 1970); Clube Internacional do Recife (1969 a 1976);

Fundador e professor do Clube Lee, localizado na Rua Barão de São Borja (1969 a

1979).

Atualmente o sensei Lee possui o 6º dan da faixa preta (faixa coral) no judô

(reconhecido pela Liga Nacional de Judô – LNJ) e o 7º dan (Grão mestre) no

Taekwondo (pela Liga Nacional de Taekwondo), esporte no qual também é um dos

pioneiros no Nordeste. Hoje, afastado voluntariamente do judô, reside com sua

104

esposa Sônia no bairro de Boa Viagem (zona sul do Recife) e possui duas filhas já

adultas.

Fotografia 2 – Sensei Lee de Judogui

Fonte:o autor (2017)

4.1.2 Sensei Diógenes Cavalcanti de Moraes

Fotografia 3 – Sensei Diógenes Cavalcanti de Moraes

Fonte: o autor (2017)

A história de vida do professor Diógenes Moraes cruza, naturalmente, com o

universo do pugilismo (no qual foi atleta amador e árbitro), do vale-tudo e/ou luta-

105

livre (no qual era árbitro em um programa de TV) e, principalmente, no Judô, esporte

pelo qual é reconhecido como um dos pioneiros de Pernambuco.

Nascido em 02 de março de 1930, o sensei tem atualmente 87 anos,

“turbinados”, como o próprio gosta de frisar. Alagoano, de União dos Palmares, já

está em Recife desde 1942. Em 1950, deu inicio no aprendizado sistemático do

judô, no espaço de seu principal professor, o sensei Takeo Yano (Japonês, 6º dan

na época), localizado na rua da Roda (Bairro do Recife).Contudo, o mestre ressalta

que seus primeiros passos no tatame foram dados a partir de aulas sob orientação

de uma dupla de amigos, doutor Geraldo Fernandes (na época, estudante de

medicina) e Valzenir (apelidado de “Cearense”). Em meados de 1947 (Diógenes

tinha 17 anos), estes dois possuíam um pequeno espaço com tatames em seu

apartamento, localizado na Praça Maciel Pinheiro (centro do Recife). Sensei

Diógenes afirma que, após uma média de um ano (ou mais) de prática, os dois

amigos reconheceram suas limitações em conhecimentos e sugeriram para que

Diógenes fosse ter aulas com um japonês chamado Takeo Yano, que o recebeu

muito bem e daí Diógenes iniciou a pratica de forma mais sistematizada, passando

média de 5-6 anos, até abrir seu próprio espaço. O tempo passou e já são 67 anos

de judô, sendo, atualmente, faixa coral (7º dan de judô). O professor destaca, ainda,

que no início de seus primeiros passos no tatame, além da academia do Takeo

Yano, só existia, no Recife, o George Gracie, que possuía uma academia na Rua do

Hospício, mas que não lecionava judô, mas o jiu-jitsu brasileiro de sua família.

A partir de 1954, já estava dando aulas de Judô em Recife, período no qual

também iniciara, paralelamente, na Rua Paissandu, o Professor Willians Arruda –

também considerado um pioneiro na cidade. Dentre os espaços em que o mestre

atuou, podemos destacar os seguintes: Escola de Aprendizes de Marinheiro de

Pernambuco (de 1956 a 1994); Colégio Nóbrega; Colégio São Luís; Academia de

Polícia de Pernambuco e Escola Carochinha. Também inaugurou seu espaço

próprio, inicialmente na Rua da Concórdia, nº 692 (1º andar), em seguida, na Rua

Corredor do Bispo, e outra unidade no bairro de Piedade (posteriormente este se

tornou o único espaço).

De 1960 a 1966, existiu a TV Ringue Torre, exibido pela TV Jornal do

Comercio, onde o professor Diógenes atuou como árbitro de desafios de lutas de

vale-tudo e de boxe (amadores e profissionais). Esta mídia (programa de TV) dada

aos esportes de combate abriu portas para o judô na cidade. Na década de 70, o

106

mestre ensinava judô em um programa na TV Universitária e também assinou, por

dois anos, uma coluna jornalística sobre artes marciais (era a NOCAUTE, no Diário

da Noite). Ajudou também a organizar a então Federação Pernambucana de

Pugilismo e, posteriormente, a fundar a Federação Pernambucana de Judô (FPJU).

O sensei Diógenes possui formação em contabilidade pela ETC (Escola

Técnica de Contabilidade) e Graduação em Educação Física pela Universidade de

Pernambuco (UPE). Também atuou em importantes cargos gestores em instituições

esportivas, tendo assumido cargo de Presidente da Comissão de Graus da

Federação Pernambucana de Judô (FPJU); Vice-presidente da FPJU; Presidente da

Federação de Pugilismo; Professor de Judô da Universidade Federal de

Pernambuco (UFPE); Fundador da Federação Pernambucana de Fisiculturismo e

Musculação; Coordenador de eventos e chefe de delegação em diversas

competições de nível, estadual, regional e nacional.

Sol (2002) destaca um pouco da história de vida do mestre, ressaltando uma

homenagem ao mesmo na Câmara Municipal do Recife, em reconhecimento aos

serviços prestados em nome das artes marciais. Homenagem que fazia parte do

projeto do vereador Henrique Leite (PT) e que entregou a medalha José Mariano (a

mais importante concedida pelos vereadores recifenses).

Também foi agraciado pela Marinha do Brasil com a medalha Amigo da

Marinha, a medalha Mérito Funcional, a medalha da ordem mérito Tamandaré e

também a medalha Mestre Antônio Silva. Também recebeu a medalha da comissão

do Exército Brasileiro, além de inúmeras homenagens em eventos judoísticos.

O sensei Diógenes ficou viúvo de Terezinha Moraes, com quem foi casado

ao longo de 51 anos e teve 4 filhos (Carlson, Erivaldo, Diógenes e Cláudia). Destes,

apenas a filha não seguiu os passos do judô rumo à faixa preta. Possui onze netos

(todos judocas, sendo 3 na faixa preta) e duas bisnetas. Recentemente (em 2016),

foi veiculada uma reportagem62 jornalística que abordou sobre esta tradicional

família de judocas do Recife e um pouco da história de seu patriarca. Atualmente, o

professor Diógenes está casado com Solange Gueiros e gosta de curtir a vida

próximo à família, lendo bastante, cuidando de sua saúde física através de

exercícios e viajando sempre que pode.                                                             62 Matéria exibida na data de 06/07/2016 na Rede Globo Nordeste no programa esportivo Globo

Esporte e intitulada: “Família atravessa quatro gerações dedicadas ao Judô”. Pode ser acessada através do link: http://globoesporte.globo.com/pe/videos/t/ultimos/v/familia-atravessa-quatro-geracoes-dedicadas-ao-judo/5145761/.

107

Fotografia 4 – Diógenes e família

Fonte: o autor (2017)

4.1.3 Sensei Hayashi Kawamura

Fotografia 5 – Sensei Hayashi Kawamura

Fonte: o autor (2017)

108

Filho de Sue Kawamura e terceiro filho mais velho de seis irmãos, sensei

Hayashi Kawamura nasceu no dia 26 de agosto de 1936, no Japão, província de

Toba-Shi, em Mie-Ken. Nesta época, pós-segunda guerra mundial, o Japão sofria de

muita violência e dificuldades econômicas e, neste contexto, o jovem Hayashi, até

então com 11anos de idade, foi direcionado à prática de artes marciais no intuito de

ter possibilidades de se defender da criminalidade. Desta forma, deu início no judô

através do mestre Izuda. Posteriormente, Kawamura ingressou na prestigiada

Universidade de Takushoku (também conhecida como Takudai), em Tokyo,

instituição reconhecida por formar jovens nas artes marciais. Na faculdade, cursou

administração e logo integrou a equipe de Judô da renomada universidade. Nesta

instituição também iniciou a prática do karatê, pois, de uma forma geral, era um

entusiasta dos esportes.

Após se formar na faculdade, já com 23 anos, sonhava com a possibilidade

de divulgar as práticas marciais no ocidente. Neste período também treinou com o

sensei Suganuma, ainda no Japão.

De acordo com informações extraídas do site institucional da Federação

Pernambucana de Karatê e GoshinJutsu Kawamura(FPKK)63, em 12 de abril de

1960 (até então com 24 anos de idade), com passagens pagas pelo governo

japonês como incentivo a imigração, chega ao Brasil desembarcando no Porto de

Santos-SP, residindo em São Paulo no período de 1960 a 1961. Inicialmente,

trabalhou em lavoura de pêssego e, migrando depois para o Rio de Janeiro, passou

a atuar como professor de artes marciais. O professor ressalta que passou muitas

dificuldades na época em que desembarcou em São Paulo, e que o judô,

literalmente, salvou sua vida, seja economicamente ou do ponto de vista da proteção

de vida, já que não tinha recursos financeiros, não tinha familiares, não tinha amigos

e não sabia falar outra língua que na oa japonesa. Ainda em São Paulo, teve a

felicidade de reencontrar um grande amigo da época de faculdade e que já estava

estabelecido por ser imigrante mais antigo. Seu nome era Yasutaka Tanaka (mestre

de Karatê) e que lhe deu um suporte básico para enfrentar as dificuldades.

Já no Rio de Janeiro, atuando no ensino das artes marciais e também

participando de desafios com lutadores de outras modalidades, a dupla japonesa de                                                             63 Para construção desta síntese sobre a vida do sensei Kayashi Kawamura, também extraímos

informações de fontes advindas do site institucional da Federação Pernambucana de Karatê e GoshinJutsu Kawamura (FPKK) – encontrado no link: http://fkawamura.com/prof-kawamura/biografia/.

109

amigos já estava ficando conhecida. Neste contexto, em 1963, foi convidado pelo

Governo do Estado da Paraíba (na cidade de João Pessoa) para ensinar judô em

escolas e clubes sociais. Foi em João Pessoa-PB que conheceu Maria Elisabeth

Códula, com quem casou e teve dois filhos (Raul e Sue Kawamura). Fez seu

trabalho naquele estado até 1967, como seu nome já estava bem conhecido pelos

paraibanos, começou a chamar atenção também dos recifenses e, desta forma,

começa ministrar aulas também em Recife, a convite do Governo do Estado de

Pernambuco, com foco na preparação dos militares pernambucanos, onde atua

diretamente junto ao batalhão de contingente efetivo, como também no curso de

formação de oficiais da Academia de Polícia Militar de Pernambuco. De 1963 a

1977, participou de diversos desafios de luta-livre com o objetivo de divulgar o judô.

Para tal, utilizava-se do judô tradicional Kodokan (instituído por Jigoro Kano). Sobre

estes desafios, segundo entrevista concedida ao estudante Verner Roberto, em

201564, o mestre afirma que para se estabelecer no cenário local eram muito

comuns “visitas” em que mestres de outras artes marciais o desafiavam

constantemente e que em nenhuma destes combates foi derrotado.

Ao chegar efetivamente ao Recife-PE para morar e trabalhar percebeu que

existiam poucos professores de Judô (menciona especificadamente os professores

Willians Arruda e o Diógenes Moraes), pois ainda não existiam academias que

ensinassem o Judô e também o karatê. Desta forma, inaugura a Academia

Kawamura, onde funciona até os dias atuais na Rua do Sossego, 107 (bairro da Boa

Vista).

De 1973 a 2005 (quando se aposentou), foi funcionário público na função de

professor de artes marciais da Polícia Militar de Pernambuco. Certo momento,

confirmando sua intensa atividade na modalidade esportiva, o mestre atuava com

judô em nove espaços diferentes no Recife.

Possui importância na fundação e organização da Federação

Pernambucana de Judô (FPJU), onde atua ainda hoje como membro da comissão

de graus. Em 1982, fundou a Federação Pernambucana de Karatê (FPK), pela qual

foi presidente e também ocupou diversos cargos. Nestas duas instituições, o

                                                            64 Entrevista publicada em 09/11/2015 no YouTube® (site de armazenamento e compartilhamento de

vídeos na internet), pelo estudante Verner Roberto (em seu próprio canal na página). O conteúdo pode ser livremente acessado através do link: https://www.youtube.com/watch?v=OVBreLP0qQ4.

110

professor Kawamura sempre teve bastante destaque em cargos e funções de gestão

e direção.

O sensei Kawamura desenvolveu um sistema próprio de defesa pessoal

voltado ao universo militar, chamado de GoshinJutsu Kawamura. Além de ter

formado inúmeros atletas e professores de Judô e Karatê, o professor Kawamura

recebeu honrarias por todo seu trabalho com as práticas marciais, dentre elas,

destacamos: reconhecimento por parte da Prefeitura do Recife (ano de 2006) que o

considerou o “pai” do Karatê pernambucano; em 2008, recebeu a homenagem da

Ordem do Mérito KASATO MARU, concedida pela Comissão Nacional do Centenário

da Imigração Japonesa do Brasil.

De acordo com Ferreira (2012, p. 1), é relatado segundo que a mãe do

sensei Hayashi (Sue Kawamura) haveria dito ao filho antes de sair em direção ao

Brasil: “Vá, mas nunca volte pra casa. A covardia seria uma vergonha para a

família”. Ainda segundo a reportagem, reafirma-se a força do sensei em cumprir sua

missão dada pela mãe e ressalta-se o lema que é estampado em sua academia

“Coragem, Justiça, Benevolência, Bom Senso, Gratidão, Sinceridade e Honra”

(FERREIRA, 2012, p. 1), valores que representam a superação dos obstáculos e as

conquistas adquiridas em sua trajetória de vida.

Atualmente, o sensei Hayashi Kawamura segue firme ministrando aulas em

seu mesmo DOJÔ de sempre. Possui o 6º dan de judô (pela Confederação

Brasileira de Judô - CBJ) e o 8º dan de Karatê (pela Confederação Brasileira de

Karatê (CBK). Dentre os seus dois filhos, Raul Kawamura também segue o caminho

marcial, é mestre em karatê,ajuda o pai na gestão da academia e também divulga o

Karatê no estado de Pernambuco.

111

Fotografia 6 – Prof. Kawamura (ao centro) e seus alunos no Clube Astrea em João Pessoa-PB em 1964

Fonte: Federação Pernambucana de Karatê e Goshin Jutsu Kawamura (2017b)

4.1.4 Sensei Marco Aurélio Lauriano de Oliveira

Fotografia 7 – Sensei Marco Aurélio Lauriano de Oliveira

Fonte: o autor (2017)

Marco Aurélio Lauriano de Oliveira nasceu no ano de 1956 e teve toda sua

infância vivenciada no bairro de Santo Amaro (zona norte do Recife). De origem

humilde, Marco sempre brincou bastante nas ruas de seu bairro e também tinha

112

muitos amigos, porém, também tinha fama de brigão da infância para a

adolescência.

Sua entrada no Judô se deu, de certa forma, tardiamente, já que apenas aos

17 anos de idade foi levado por seu irmão para sua primeira aula de judô. Contudo,

a partir de sua entrada neste novo universo, não sabia ele que sua vida seria

integralmente guiada por esta prática enquanto uma verdadeira filosofia de vida.

Teve como primeiro sensei, José Alves (que foi aluno de Willians Arruda).

Seus avanços no judô se deram de forma muito rápida, com, aproximadamente, um

ano e meio (já na faixa roxa) vivenciaria seu primeiro campeonato brasileiro de judô,

numa época em que, geralmente, participavam apenas faixas pretas de judô. Em

sua trajetória competitiva, Marco acumulou alguns importantes feitos, tais como:

treze vezes campeão pernambucano de judô, além de títulos norte-nordeste e

participações em nacionais. No decorrer do histórico competitivo, também foi aluno

do sensei Tadao Nagai (no Sport Club do Recife).

Profissionalmente, Marco Aurélio iniciou seus trabalhos enquanto professor

de Judô por volta do ano 1976 (aos 20 anos de idade). Ao longo de sua experiência

docente nos tatames, acumulou passagens por alguns importantes dojôs da cidade,

tais como: Escola Americana, Instituto Santa Isabel, Radier Junior, Sport Club do

Recife (onde recebeu o título de sócio benemérito por ter sido 10 vezes campeão

Pernambucano), Clube dos Oficiais da Polícia Militar, Colégio São Bento, Academia

Santa Gertrudes (onde também foi coordenador de esportes e Educação Física),

além de ter acumulado várias participações enquanto professor do curso de

formação de faixas pretas da Federação Pernambucana de Judô (FPJU).

Assim como o sensei Lee, Marco Aurélio também partiu para o investimento

nos estudos acadêmicos na área da Educação Física. Com sua formação em

Educação Física (pela Escola Superior de Educação Física – Universidade de

Pernambuco), no ano 1990, motivou-se a investir na área acadêmica, não só

especializando-se (fez especialização na ESEF-UPE entre os anos de 1997 a 1999,

e seu Mestrado em Educação no PPGE-UFPE de 2002 a 2005), como também,

investindo em ser professor universitário, fato este que se deu no ano 1994, quando

foi aprovado no concurso publico da ESEF-UPE.

O trabalho de conclusão do curso de especialização de Oliveira (1999),

tornou-se importante referência científica de contribuição à formação dos

professores de Educação Física de Pernambuco, que optassem em intervir com judô

113

nas escolas, dado que este trabalho possibilitava quebras de paradigmas para

aquela época e nesta área do conhecimento.

A vida de Marco Aurélio está entrelaçada ao da ESEF, não apenas por

situar-se no bairro em que cresceu, mas principalmente pela espécie de “revolução”

acadêmica que liderou nesta instituição, do ponto de vista da formação de novos

senseis envolvidos com o cenário de Lutas (e mais especificadamente com o Judô)

e que pudessem proporcionar novas práticas pedagógicas quanto ao tratamento

teórico-prático deste componente da cultura corporal (Lutas). Para que sua teoria

pudesse ser testada na prática, formou um grupo de estudantes acadêmicos

interessados em aprender judô e, desta ideia, surgiu a Associação ESEF de Judô

(uma das mais fortes do estado).

Podemos reforçar sua importância institucional, citando, por exemplo, o

aumento no número de publicações científicas no estado envolvendo a temática do

Judô e das Lutas a partir de sua entrada na docência universitária. Dentre estas

publicações, vale ressaltarmos duas obras acadêmicas (SALES, 2001; SILVA, 2008)

que trataram sobre sua história de vida e, especificamente, de sua contribuição

institucional. Por volta do ano 2006, deu-se início um grupo informal de estudos em

Lutas (com ênfase em Judô), contanto, a princípio, com apenas quatro integrantes

(Marco Aurélio, Luciano Leonídio, Cláudia Santos e Denis Foster). Houveram

algumas produções e participações em eventos científicos, porém, devido à falta de

tempo dos integrantes, o grupo foi pausado em suas ações.

Do ponto de vista de gestão de entidade reguladora esportiva, Marco

acumulou experiências enquanto dirigente em funções na FPJU e posteriormente,

por divergências ideológicas, encabeçou junto a outros senseis a criação da Liga

Pernambucana de Judô (LIPEJU), sendo o primeiro presidente da mesma. Também

ocupou varias funções na ESEF, dentre elas, a de coordenação de extensão

universitária, por onde também foi coordenador geral (de 1999 a 2003)do Projeto

Santo Amaro (PSA), importante projeto social atrelado a instituição de ensino

superior da ESEF.

Na docência no ensino superior, também atuou no curso de graduação em

Educação Física da instituição Universo Salgado de Oliveira (Universo).

Atualmente, porta o 6º dan (faixa vermelha e branca), é professor do curso

de formação de faixas pretas e membro da comissão de graus da LIPEJU, atua nos

cursos de Educação Física da Faculdade da Associação Caruaruense de Ensino

114

Superior (ASCES-UNITA) e ainda na ESEF-UPE. É casado com Suely de Fátima e

possui duas filhas.

4.1.5 Sensei Tadao Nagai

Fotografia 8 – Sensei Tadao Nagai

Fonte: o autor (2017)

Sensei Tadao Nagai nasceu em 06 de julho de 1935, na cidade de Avaré.

Filho de lavradores japoneses, iniciou no Judô em 1946, quando fora levado por um

amigo de seu pai para morar na residência do professor Ryuzo Ogawa (um dos mais

importantes disseminadores do judô no Brasil) em São Paulo, em sua academia

chamada Budokan. Neste período, Tadao precisou adaptar-se ao severo modelo de

educação tradicionalista imposta pelo seu novo mestre. De acordo com Virgílio

(2002b, p. 252), “o mestre Ogawa responsabilizava os seus alunos pelos afazeres

domésticos como varrer, limpar, cuidar da conservação das instalações, das roupas

[...]”. Todos estes choques foram atenuados pela boa índole e a origem rural do

sensei Tadao.

Aos poucos, o garoto Nagai fora despontando, física e tecnicamente, dentro

do judô. Aos 15 anos, no ano de 1950, tornou-se o mais jovem faixa preta na época.

Em 1955, já com 20 anos, concluiu o curso técnico em contabilidade e, em

1958, ingressou no curso superior de Ciências Econômicas, contudo, devido a sua

115

agenda agitada, dividida entre a vida de atleta e de funcionário do Instituto Brasileiro

de Café, não conseguiu concluir o curso superior.

Em uma situação inusitada, solicitando ajuda para o conserto de um kimono,

conheceu uma jovem de nome Shisako (carinhosamente chamada por todos do judô

como “Dona Edith”), com quem iniciou um namoro, noivado e, por fim, casaram-se,

em 05 de setembro de 1964. Deste casamento surgiram quatro filhos (Elcio, Sérgio,

Silvana e Silvio), sendo todos estes judocas reconhecidos e premiados

competidores. Destes, apenas o Elcio não chegou a faixa preta, preferindo

direcionar-se à área de profissional de Computação.

Enquanto competidor, Nagai soma diversos títulos importantes, dentre eles

podemos destacar: campeão Paulista (1955), campeão Paranaense (1956),

bicampeão Brasileiro de Judô; campeão do Torneio de Faixas Pretas da Budokan

(1957). Em torneio internacional, realizado no Ibirapuera, foi eleito por Sumiyuki

Kotani65 (aluno direto de Jigoro Kano – na época 8º dan) o judoca mais técnico da

competição, recebendo um troféu. Em 1964, Nagai representou o Brasil em torneio

realizado em Nova York – Estados Unidos e, por muito pouco, não representou o

Brasil nas Olimpíadas de Tóquio, onde estreou a modalidade judô.Na ocasião, o

sensei ficou classificado (juntamente com o sensei Shiozawa) para ir as Olímpiadas,

contudo, devido aos cortes de verbas nacionais aos esportes, foi enviado apenas o

melhor ranqueado, que na ocasião era o Shiozawa. Em 1987, chefiou a delegação

brasileira no México, onde sagraram-se campeões Pan-americanos.

Em 1970, foi transferido de são Paulo para Recife pelo Instituto Brasileiro de

Café. Nesta nova etapa da vida estava decidido a não mais atuar profissionalmente

com o judô. Contudo, não foi bem o que aconteceu. Assim que aportou no Recife,

muitos ficaram sabendo de sua vinda e, com isso, começaram os convites para

retornar ao universo judoístico, principalmente através do então presidente da

Federação Pernambucana de Pugilismo, o Prof. Williams Arruda. Cedendo a estes,

inicia-se uma nova fase no judô Pernambucano, onde o sensei Nagai, em 1971,

decide fundar sua própria academia, a Associação Nagai de Judô. Desta nova

                                                            65 Sobre os episódios da premiação relacionada ao professor japonês e aluno de Jigoro Kano Kotani

e também sobre a “quase” participação nas olimpíadas de 1964, conseguimos ricas informações através do canal de vídeos no YouTube® (site de armazenamento e compartilhamento de vídeos na internet) intitulado de “SOBRE NAGAI” que trata-se de um projeto gerenciado por Luana Nagai (neta de Tadao Nagai) e que visa explorar especificadamente de fatos importantes da vida de seu avô. As entrevistas podem ser acessadas através do Link: https://www.youtube.com/channel/UCIMb0o5U4U9UlW9niaXDhwg.

116

escola surgiu boa parte dos competidores e professores de judô do estado de

Pernambuco. Atualmente, três de seus ex-alunos, fazem parte da seleção brasileira

de judô: Mariana Barros, Katherine Campos e Guilherme Pinheiro.

Participou da fundação da Federação Pernambucana de Judô (FPJU), em

16 de novembro de 1972, tendo presidido no decorrer dos anos 1977, 1978, 1979,

1980, 1983, 1984, 1987 e 1988.

De acordo com Nagai, Silvana e Nagai, Sérgio (1998), podemos verificar

que, enquanto educador do judô, o professor lecionou em importantes escolas da

capital, tais quais: Colégio Boa Viagem, Colégio Santa Maria e o Colégio Salesiano.

Em matéria recente Ponsoni (2014, p. 4), menciona que o professor destaca

a seguinte frase de cunho educacional:

Para evoluir de uma graduação para outra nos exames de faixa, nunca cobrei apenas a execução perfeita dos golpes. Meus alunos precisam apresentar ainda uma declaração de bom comportamento assinada pela família e boas notas na escola. Quando me questionam sobre isso, respondo que, antes de mais nada, eu sou educador.

Atualmente, o sensei Nagai é nono dan de Judô (único em Pernambuco),

sua associação está filiada à Liga Pernambucana de Judô (LIPEJU), entidade pela

qual também ajudou a fundar, e também é diretor nacional da comissão de Graus da

Liga Nacional de Judô (LNJ). Leciona com Judô infantil em algumas escolas

particulares e também em sua academia. Sensei Nagai começa a observar os seus

netos progredindo no tatame e dando continuidade à tradição familiar. Casado com

“Dona Edite”, agora curtem o retorno de seu filho Silvio que possui um restaurante

Japonês vinculado ao espaço da academia do sensei.

117

Fotografia 9 – Família Nagai

Fonte: Associação Nagai (2017)

4.2 Gênese do Judô no Recife

Buscando a valorização daqueles que fizeram parte do início do judô na

cidade do Recife, detalharemos um pouco mais acerca desta gênese do ponto de

vista de sua cronologia e de seus principais personagens. Faz-se importante esta

discussão uma vez que nos situa em relação aos marcos temporais relacionados

aos problemas, avanços e conquistas vivenciados por tais mestres.

Mesmo que ainda esteja fora de nossa delimitação temporal prevista para

esta pesquisa (1952 a 1972), é necessário que possamos detalhar algumas

particularidades que antecederam nossa delimitação temporal, para que, assim,

possamos contextualizar mais claramente nossos principais achados. Desta forma,

algumas pesquisas, como a de Cavalcante (2014, p. 73), nos trazem o indicativo de

que o Judô “pode ter sido iniciado no Estado a partir da passagem de um mestre

japonês chamado Takeo Yano, por volta da década de 1950”. Contudo, em recente

e importante descoberta, foram encontrados registros de passagem pelo Recife de

uma trupe de lutadores (dentre eles, Mitsuyo Maeda, até então, principal nome

relacionado à introdução do judô no Brasil) com demonstrações e desafios de lutas

estreando na cidade no antigo Theatro Moderno (pertencente ao grupo Bandeira e

Cia.) localizado no bairro de Santo Antônio, em 26 de agosto de 1915, e ficando na

cidade até 06 de setembro. Este fato sugere uma grande investigação, pois tem

118

modificado toda a base histórica do judô nacional que, até então, previa que esta

trupe havia se instalado quase que diretamente para dar aulas em Belém-PA, tendo

como seus primeiros alunos a família Gracie (LAYDNER; TAKAO, 2013)66. Afora

esta nova informação que remete aos primórdios do judô/jiu-jitsu de passagem pelo

Recife, acredita-se que, no início, os professores de judô possam ter vivenciado

embates e divergências quanto à liberdade de atuação profissional e certa confusão

quanto à habilitação para se atuar com o Jiu-jitsu Brasileiro (oriundo da Família

Gracie) ou com o próprio Judô (preconizado pelo Jigoro Kano), tendo em vista que

um dos principais responsáveis por trazer o Judô ao Brasil (Mitsuyo Maeda ou

Conde Koma) foi também o responsável por introduzir o Jiu-jitsu Brasileiro.

Somando-se a isso, nesta época, ainda não existiam entidades reguladoras e/ou

organizacionais destas modalidades. Acreditamos que deva ter existido uma fusão,

com linha tênue, entre a atuação dos mestres pioneiros habilitados ao Jiu-jitsu

brasileiro e/ou Judô (acredita-se que a faixa preta nesta época garantia ampla

atuação frente às duas distintas modalidades). É provável que apenas

posteriormente isso tenha sido melhor organizado, ou seja, após as criações de

instituições reguladoras em nosso estado (ex: federações esportivas). Aqui, vale

lembrarmos que Recife também é considerado um dos berços da Luta Livre67, ou

Vale-Tudo, como era comumente chamado. Neste antigo cenário, não se tinha

grandes diferenciações dentre estas especialidades de lutas (jiu-jitsu, judô e luta

livre).

Tendo Mitsuyo Maeda e Takeo Yano (este segundo, veremos adiante mais

detalhadamente) como principais referências relacionadas aos primeiros sinais de

passagem do judô pela cidade do Recife, e sendo estes, japoneses, é inevitável e

relevantemente necessário que busquemos informações acerca da imigração

japonesa no estado de Pernambuco. De acordo com importante pesquisa realizada

por Fabreau (2009) resgatamos importantes informações para o entendimento deste

referido contexto histórico (imigração japonesa em Pernambuco). A partir deste

autor, temos a informação de que um maior volume de japoneses chegou ao Recife

                                                            66 Ainda sobre a passagem do Maeda pelo Recife-PE, de acordo com Laydner e Takao (2013): “O

fato é que entre 26 de Agosto e 6 de Setembro a trupe se apresentou no Theatro Moderno, no formato já conhecido: lutas entre os membros do grupo e desafio do Conde Koma valendo 5.000 francos a quem o vencesse ou 500 francos a quem lhe resistisse por 15 minutos”.

67 Atualmente, conhecido como Mix Martial Arts (MMA) ou Artes marciais Mistas, como o próprio nome indica, significa uma modalidade esportiva de combate com utilização dos saberes técnicos de várias modalidades integradas.

119

oficialmente por volta da década de 30 e se estabeleceram principalmente no

comércio recifense (área da horticultura), residindo em bairros como os da Torre,

Várzea e Bongi. Desta forma, temos a imigração japonesa na cidade do Recife,

sendo estabelecida mais fortemente a partir da década de 30. Contudo, ainda de

acordo com o autor supracitado, sabe-se que existiram passagens mais isoladas de

alguns japoneses entre as décadas de 10 e 20, com fins comerciais.

Devidamente contextualizada a época que antecede nosso foco de pesquisa,

pretendemos, como ponto de partida, conhecer um pouco das histórias de nossas

referências entrevistadas, antes de tudo, compreendendo como ocorreram suas

entradas no universo judoístico. Para tal, nesta presente categoria de análise

(Gênese do Judô no Recife) perguntamos-lhes centrados em três quesitos: 1. Como

procederam as suas entradas na prática do Judô? 2. Como se deu a origem e

desenvolvimento do judô na cidade do Recife-PE? 3. Quais foram suas principais

referências judoísticas (senseis)? Dentre as respostas proferidas pelos cinco

entrevistados e sintetizadas pela técnica de análise de conteúdo por predominância

frequencial de palavras (devidamente tratadas pelo software NVIVO®)68, pudemos

obter a seguinte representação gráfica (“nuvem de palavras”) contida devidamente

na figura 7 a seguir.

                                                            68 Nesta primeira imagem contida na figura 7 decidimos por permitir a busca por palavras a partir de

três (3) caracteres e não cinco (5) como as demais. Esta decisão deve-se ao fato de que por estarmos buscando nomes relacionados à gênese do Judô no Recife, sabíamos que existiam senseis (nomes próprios) que poderiam ser citados pelos entrevistados e que possuíam três caracteres em seu nome. Desta forma evitamos que dados importantes pudessem ser colocados fora da questão a que se referia à imagem.

120

Figura 7 – Categoria 1: Gênese do Judô no Recife-PE

Fonte: o autor (2017)

De acordo com a imagem produzida mediante interseção das falas, podemos

perceber que várias referências importantes do cenário nacional, regional e estadual

do judô são mencionadas com maior constância que outras. Em associação à

pesquisa documental, foi possível remontarmos graficamente a genealogia destes

mestres, possibilitando sintetizar quais foram as influencias e principais referencias

dos nossos professores participantes na pesquisa, como podemos verificar logo

abaixo na figura 8.

121

Figura 8 – Influências e principais referências dos senseis entrevistados

Fonte: o autor (2017)

Na análise da figura acima, percebe-se que dentre os nossos cinco mestres

entrevistados temos dois genuinamente estrangeiros (um japonês – Hayashi

Kawamura e um Coreano – Byung Kuk Lee), um brasileiro descendente (filho) de

Japonês (Tadao Nagai) e mais dois brasileiros e nordestinos (Diógenes Moraes e

Marco Aurélio). Desta forma, percebe-se que existiu certa heterogeneidade cultural

em nossa amostra no tocante às experiências de judoísticas experimentadas por

estes mestres entrevistados. Aqui, cabe relatarmos que ao longo das entrevistas,

percebíamos muitas vezes que os dojôs vivenciados através de culturas distintas,

sejam em países diferentes e/ou até mesmo regiões distintas do Brasil,

possibilitavam vivências e aprendizagens diferenciadas. Isso nos faz crer que

mesmo que o judô possua um sistema base de ensino, linguagem (japonesa) e

técnicas padrões, possivelmente o mesmo sofre influências diretas a depender da

cultura local de onde o dojô esteja instalado.

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pesquisa enquanto entrevista, visto que o mesmo já é falecido69, bem como, em

decorrência do critério de exclusão em nossa pesquisa (já que ficou definido que

apenas entrevistaríamos diretamente aos mestres e não por terceiros e/ou

familiares). Contudo, se faz importante mencionarmos que em todas as falas dos

senseis entrevistados, o nome do professor William Arruda foi mencionado com

grande constância (aferida via técnica análise frequencial de palavras e que pode

ser verificada conforme na figura 7) no que se refere ao início do judô na cidade do

Recife-PE. Desta forma, buscando reforçar a afirmativa constante nas falas dos

entrevistados (conforme pudemos verificar na imagem supracitada), encontramos

importante comprovação documental70 que ratifica a veracidade de que, no período

inicial da origem do judô no Recife (por volta de 1947-1948), o professor Arruda,

possivelmente, havia tido instruções com a passagem do Takeo Yano pelo Recife (o

que também foi fortalecido pela fala do mestre Diógenes Moraes). O referido

documento, contido na figura 11 logo abaixo, menciona o reconhecimento de

atividade profissional com judô por parte de William Arruda em instituição militar

(Guarda Civil da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Pernambuco) já nos

anos de 1949, e que podemos usar como importante fonte documental e

comprovatória de atuação profissional com o judô em proximidade e/ou

concomitância ao sensei Diógenes Moraes. Desta forma, podemos inferir que estes

dois mestres representam o marco inicial do ensino sistematizado do Judô na cidade

do Recife-PE.

                                                            69 Nasceu em 18 de dezembro de 1923 e faleceu em 03 de outubro de 2001, aos 77 anos. 70 Documento de importante relevância à pesquisa e que foi postado na página pessoal de William

Arruda Filho (filho do falecido professor William Arruda) no Facebook® e cedido posteriormente por ele mesmo à nossa pesquisa.

124

Figura 10 – Professor William Arruda

Fonte: Arruda Filho (2017a)

Figura 11 – Registro documental de trabalho do Prof. William Arruda com o judô (1949-1964)

Fonte: Arruda Filho (2017b)

125

4.3 Educação pelo Judô

Nesta segunda categoria temática de análise de nossa pesquisa, nos

preocupamos em compreender a interrelação existente entre a educação e o judô

através do entendimento dos antigos mestres da cidade do Recife. Desta forma, os

mesmos foram motivados a opinarem baseando-se em quatro eixos temáticos

norteadores (que também podem ser denominados como sub-nós ou

subcategorias): 1. Lições educativas do judô; 2. Princípios Filosóficos e sua

aplicabilidade prática; 3. Complementação à formação educacional; 4. Judô nas

escolas.

Sobre as lições educativas vivenciadas através da prática do judô, obtemos

os seguintes dados de acordo com a figura 12.

Figura 12 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Lições educativas do judô)

Fonte: o autor (2017)

Mediante os dados coletados, e de acordo com a imagem acima, constatou-

se que palavras tais como: CONTRIBUIR, REGRAS, ENFRENTAR, FORMAÇÃO,

SENTIMENTO, ESPORTE, JIGORO, IMPORTANTE, dentre outras, tiveram maior

predominância de aparecimento nas falas dos senseis. Desta forma, inferimos que

126

os mestres percebem que o judô é importante ferramenta educacional e que

possibilita a aprendizagem de algumas lições educativas.

Dentre estas lições, os mestres mencionaram que o praticante de judô

aprende a enfrentar obstáculos da vida através da formação constituída por regras

(sejam normas de etiqueta dentro do dojô, ou ainda, no ambiente extra dojô) e pela

ética e moral esperada de uma judoca frente à sociedade.

Também ressalta-se a percepção dos senseis de que Jigoro Kano destacou-

se ao formular um sistema de cunho educacional e que, através do mesmo, os seus

praticantes seriam capazes de buscar um emancipação que permitisse enfrentar a

vida com maior fluidez e sabedoria.

Em relação aos princípios filosóficos e a sua respectiva aplicabilidade prática,

de acordo com a figura 13, foi possível obtermos os seguintes termos como

prevalentes: PRINCÍPIO, FILOSOFIA, ALUNO, CRIANÇA, IMPORTANTE,

COMPREENSÃO, dentre outros que nos fizeram criticamente compreender que, de

acordo com atores desta pesquisa (senseis), é possível entendermos que os dois

princípios filosóficos do judô (melhor uso da energia e também o de prosperidade e

benefícios mútuos) são de suma importância como fio condutor para uma postura

íntegra e humana perante a sociedade. Contudo, com a modernidade e os costumes

contemporâneos, de certa forma mais liberais no que diz respeito a criação dos

filhos, os senseis convergem para um entendimento de que esta filosofia só

funcionaria na prática e no cotidiano a partir dos ideais defendidos pelo sensei que

conduz o seu dojô, ou seja, a depender daquele que fará bom uso deste

conhecimento. Quanto a esta questão, existem estudos como o de Santos (2006) e

Santos et al. (1990) que ratificam a ideia de que os princípios judoísticos parecem

estar enfraquecidos nos dias atuais, principalmente em decorrência de um

desvirtuamento dos propósitos preconizados por Kano, e que parecem ter

sucumbido ao universo do judô competição. Os autores em questão constataram,

inclusive, que faixas pretas muitas vezes desconhecem os princípios filosóficos

existentes.

Ainda de acordo com os mestres entrevistados, os mesmos reforçaram a

ideia de que o judô possa ser conduzido, preferencialmente, desde a infância, para

que possa ser empreendido um ensinamento consistente e progressivo do ponto de

vista do entendimento da filosofia. Um outro ponto interessante ressaltado é a

conexão entre os princípios filosóficos e o código moral do judô (descrito na página

127

89). Por fim, sugere-se que para que se tenha o máximo proveito dos princípios

filosóficos norteadores da prática judoística, são necessários esforços para que

sejam explorados os conceitos da forma mais didática possível e que, assim,

colaborem para a compreensão plena por parte do alunado e de acordo com a

capacidade de cada faixa etária.

Figura 13 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Princípios filosóficos e suas aplicabilidades práticas)

Fonte: o autor (2017)

Mediante o resultado obtido através da representação gráfica apresentada

acima, podemos compreender que os mestres entrevistados percebem que os

princípios filosóficos específicos da modalidade são pilares importantes a serem

apreendidos e compreendidos pelos praticantes, de modo a possibilitar que desde

muito cedo (crianças) possam dominar suas energias (também um princípio

Eliasiano do processo civilizador) e conduzir um estilo de vida alicerçado por estes

princípios.

O terceiro passo na categoria de análise refere-se à educação pelo judô,

nele buscamos entender como se dá a possível complementação à formação

128

educacional a partir da prática do judô. Quanto a este ponto, podemos verificar os

dados contidos na figura 14.

Figura 14 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Complementação à formação educacional)

Fonte: o autor (2017)

Através da imagem acima referenciada, é possível percebermos uma

evidência maior aos termos: ALUNO, FILOSOFIA, ESCOLA, CRIANÇA, COLÉGIO,

COMPREENSÃO, ESTUDO e PERSPECTIVA. Desta forma, percebe-se que os

senseis compreendem que o judô é importante ferramenta educativa a partir do

momento em que o mesmo possibilita a complementação educacional dos

praticantes (educação não formal ou não institucionalizada) associadamente ao

papel da escola (educação formal) e também à educação do lar (geralmente

conduzida pelos pais). Também ficou subentendido que o judô ocupa forte função na

educação comportamental e disciplinar, já que a prática têm sido fortemente

indicada por médicos, terapeutas etc. Todos os senseis entrevistados se

enxergavam reconhecidamente importantes nesta função auxiliar enquanto

educadores.

Ainda em análise a esta categoria, cabe uma reflexão crítica para que

possamos compreender que o judô sozinho não consegue e nunca conseguirá dar

conta da educação de qualquer indivíduo. Apesar de cumprir com uma função

129

importante (e auxiliar), é sabido que esta complexidade do ato de educar só se fará

qualitativamente presente a partir do entendimento da tríade educacional composta

pela relação Judô-Pais-Escola que, em sincronismo ideológico, gerarão perspectivas

mais exitosas de facilitar a educação. Aqui cabe uma ressalva, pois o judô tem sido

largamente “vendido” como o “esporte que educa porque tem filosofia”, ou o judô

“disciplina as crianças”, dentre outras expressões que escutamos com frequência.

Contudo, é pertinente reforçar a ideia de que o que faz do judô uma importante

ferramenta de potencial educativo é o equilíbrio em sua volta, e que permite que o

mesmo favoreça a este fim.

Por fim, enquanto última análise em questão nesta macro categoria,

(Educação pelo Judô) buscamos favorecer a reflexão dos mestres a partir do

questionamento quanto ao olhar dos mesmos no que se refere à importância, ou

não, da presença do judô dentro das escolas (instituições formais de ensino). A

figura 15 abaixo, representa os dados pertencentes a esta análise.

Figura 15 – Categoria 2: Educação pelo Judô (Judô nas Escolas)

Fonte: o autor (2017)

Dentre os termos/palavras mais constantes, pudemos constatar os seguintes:

ESCOLAS, COLÉGIO, CAPOEIRA, FORMA, TRATADA, IMPORTANTE,

NECESSÁRIO e CAMINHO. Enquanto análise, depreendemos que os mestres

130

imprimem importantes reflexões através de suas informações, declaradas ou

subliminares, contidas em suas falas. Uma delas refere-se ao reconhecimento de

que, dentre as modalidades de lutas existentes no ambiente escolar, o judô71 têm

sido uma das mais difundidas, e que, atualmente, estes mesmos mestres já

percebem e reconhecem a chegada e importância da capoeira neste contexto

escolar. Os senseis destacam que no cerne da importância de tais práticas dentro

da escola foca-se a formação dos indivíduos, e que o judô possui reconhecido valor

neste ambiente devido ao reconhecimento social enquanto ferramenta de cunho

educacional.

Todos os senseis entrevistados mostraram-se otimistas quando ao aumento

expressivo do judô dentro das escolas do Recife. Este olhar deve-se também ao

histórico destes senseis, pois conforme vimos (no breve histórico descrito nesta

pesquisa) muitos destes atuaram em escolas importantes de nossa cidade e tiveram

papel fundamental nesta massificação e maior permeabilidade da modalidade no

ambiente escolar. Um outro fator relevante quanto à presença do judô nas escolas

deve-se à sua histórica relação com IES (Instituições de Ensino Superior),

principalmente em cursos de graduação em Educação Física, segmento formativo

que ainda possui forte ligação com o judô, através de projetos de extensão,

disciplinas curriculares e/ou núcleos específicos de pesquisa, e que,

consequentemente, impulsiona um maior número de pesquisas científicas sobre a

modalidade, fortalecendo a aproximação e o reconhecimento por parte da instituição

escola.

Por fim, enquanto fechamento de análise desta categoria (educação pelo

Judô), concluímos que, reforçados por todo debate construído na seção 3 de nossa

pesquisa (que detalhou a relação entre o judô e a educação), juntamente com as

falas dos relevantes mestres por nós entrevistados, não é possível dissociar o judô

da educação, visto que seu próprio criador lutou desde a gênese para que o seu

sistema possuísse abrangência educativa. Logicamente, deduzimos que um sensei

humanista e bem formado pelos pilares filosóficos da modalidade fomentará a

otimização prática deste mencionado contexto.                                                             71 Lembramos que a palavra JUDÔ não consta no gráfico devido aos critérios estabelecidos (e já

esclarecidos) para a nossa análise. Contudo, ao liberarmos palavras a partir de quatro caracteres, constatamos que de fato foi a palavra mais repetida por todos e em quase todos os gráficos deste trabalho. Para que não ficasse cansativo à análise, deixamos claro que a palavra JUDÔ sempre estivera presente repetidamente nas falas de todos os senseis, o que enquanto analistas dos dados, naturalmente já esperávamos por isso.

131

4.4 Cultura Judoística

Para análise dos aspectos relacionados especificadamente à cultura

judoística, propriamente dita, intentamos compreender as nuances contidas nos

seguintes núcleos de análise: 1. Disciplina e Hierarquia; 2. Esportivização do Judô e

3. Tradicionalismo no Judô. Optamos pelos mesmos por compreendermos que a

análise destes pontos facilitará uma compreensão macro dos pontos mais relevantes

quanto à cultura específica do judô.

Quanto à disciplina e hierarquia, extraímos a seguinte informação, a partir de

nossos mestres entrevistados, conforme podemos verificar de acordo com a figura

16.

Figura 16 – Categoria3: Cultura Judoística (Disciplina e Hierarquia)

Fonte: o autor (2017)

Ao analisarmos os dados obtidos, constata-se que as palavras como

“DISCIPLINA”, “HIERARQUIA”, “RESPEITO”, “FAMÍLIA”, “RESPEITAR”,

“DETERMINADAS” e “SUPERIOR” foram as mais mencionadas pelos senseis

entrevistados. Desta forma, é possível compreendermos que, possivelmente, devido

à gênese do judô (no Japão) ter sido desenvolvida à luz dos conflitos e batalhas

oriundas do contexto cultural pertinente à cultura samurai, desta forma entendida

132

aqui, enquanto de cunho marcial (guerras e batalhas no lado oriental), levanta-se

assim, a compreensão de que disciplina e hierarquia naturalmente façam parte do

contexto atual e diário daqueles que praticam tal modalidade de combate (judocas).

Conforme discutimos anteriormente, durante as entrevistas percebemos que os

senseis enfatizavam que a procura pelo judô, por intermédio das famílias atuais, dá-

se, em grande parte, devido a esta “propaganda” declarada ou, ainda, subliminar, o

que nos conduz ao entendimento de que o judô é vendido para a sociedade como

um esporte de luta ideal, que irá favorecer a educação das crianças juntamente ao

apoio familiar e à educação formal proporcionada pela escola.

Na prática do judô, seja através da hierarquia das graduações (cores das

faixas) ou na relação sensei-discípulo, são claras as exemplificações por onde são

favorecidas a disseminação prática do cultivo de valores pertinentes ao respeito,

disciplina e hierarquia. A própria “etiqueta” da modalidade favorece-nos a este

entendimento. É padrão entrar no dojô e respeitosamente saudar aos mais

graduados, à imagem do mestre Jigoro Kano (geralmente exposta na maioria dos

dojôs) e até a forma de se dispor no dojô quanto à hierarquia dos demais. Acredita-

se que estes valores e costumes culturais possibilitem possíveis ajustes

educacionais e/ou comportamentais aos seus praticantes (positivos e/ou negativos).

Apesar da maioria dos senseis entrevistados (quatro, do total de cinco)

reforçarem um discurso de forte valorização ao modelo tradicional de rígida

disciplina vivenciada por eles em suas vidas dentro do judô, fazemos uma

ponderação crítica para apontar a necessidade de alguns ajustes comportamentais

por parte dos professores de judô. Sabemos que culturalmente o Japão é muito

distinto do Brasil e que, ainda mais atualmente, se transferirmos integralmente o seu

modelo de ensino judoístico à nossa cultura, possivelmente geraremos choques de

compatibilidade. Como exemplo desta discussão, podemos relembrar que

antigamente ainda era aceito no Brasil que um sensei pudesse corrigir seus

discípulos através de “leve” pancada com uma “shinai” (espécie de espada de

bambu), algo que nos dias atuais foi inteiramente extinto (ao menos na maioria dos

dojôs do país), inclusive, por exemplo, devido às possíveis interpretações das leis de

proteção à criança e ao adolescente que poderiam, eventualmente, entender como

abuso por parte do professor. Outro exemplo clássico e vivido por boa parte dos

senseis entrevistados era o ato de comumente lavar banheiros e varrer os dojôs de

seus mestres, algo que também fora extinto gradativamente com o passar do tempo.

133

O que aqui queremos discutir com estas exemplificações são os ajustes culturais

necessários para que o judô tradicional, como ele foi “importado” ao Brasil, seja

ressignificado a partir das demandas culturais de nosso próprio país, contudo, que

não perca os pilares essências da prática, preconizados por Jigoro Kano.

For fim, concluímos que são necessários esforços para que fatores, tais

como a disciplina e a hierarquia, possam ser desenvolvidos nos dojôs, pois é sabido

que, em escalas contextualizadas, são importantes de serem valorizados dentro do

convívio em sociedade. Todavia, devem ser desenvolvidos mediante uma

contextualização cultural não advinda de incidências de práticas autoritárias por

parte de senseis, infelizmente ainda comum em alguns dojôs.

Para que possamos ampliar os horizontes quanto à compreensão do judô,

faz-se necessário que analisemos o processo de esportivização sofrido pelo mesmo

ao longo do tempo, para tal, obtivemos os seguintes termos chaves mais frequentes

analisados via software e representado abaixo pela figura 17: “ESPORTE”,

“OLIMPÍADAS”, “EDUCAÇÃO”, “ESPORTIVIZAÇÃO”, “PROBLEMA”, “MUNDO” E

“MODALIDADE”.

Figura 17 – Categoria3: Cultura Judoística (Esportivização do Judô)

Fonte: o autor (2017)

A partir dos dados acima encontrados, podemos identificar que os mestres

entrevistados percebem que o processo de esportivização vivenciado pelo judô, ao

134

longo do tempo, perpassa pela reflexão crítica que compreende o Judô enquanto

arte marcial esportivizada. Contudo, nada é tão simples de ser analisado. Dentre os

senseis entrevistados para esta pesquisa, a grande maioria (quatro, dos cinco)

valorizou os ganhos do judô enquanto modalidade esportiva, no entanto, boa parte

(três, dos cinco entrevistados) reconhecem que o judô atual teve perdas, ou seja,

pagou o preço por sua transformação. Expliquemos melhor esta análise. A palavra

“problema”, ressaltada dentre as mais frequentes, representa esta preocupação por

parte dos senseis da pesquisa. Podemos dizer (de acordo com o que detalhamos na

seção três desta dissertação) que não restam dúvidas quanto à existência de

aproximação entre Jigoro Kano e o ocidente (vide suas 12 viagens, não apenas para

compreender mais sobre o modelo educacional ocidental, como também, através de

sua real aproximação com o Barão de Coubertin – pai das olimpíadas modernas).

Esta mesma aproximação denota, dentre outras intenções, que Jigoro Kano

planejou seu projeto de expansão e massificação do judô por todos os continentes

através do envio de seus principais alunos. Todavia, com a forte institucionalização

da modalidade foi criando-se uma rigidez que acabara por enfraquecer o lado

“marcial”, de cunho filosófico-educativo do judô, através da massiva

espetacularização da modalidade.

A percepção que transparece nas entrevistas é ade que os senseis ficam

preocupados com as perspectivas deste judô, ou seja, até onde ele poderá chegar.

Sabe-se, por exemplo, que atualmente, até mesmo na luta competitiva em si,

judocas não mais buscam o golpe perfeito, pois sabem que podem sair vitoriosos

apenas através de componentes táticos que levem o outro a ser punido por faltas

(penalidades), ou seja, até as lutas estão ficando, muitas vezes, monótonas e

preocupantes, já que não se vê mais aquele judô de técnicas “plásticas” e

“perfeitas”, como de outrora. Quanto ao aspecto educacional do judô, acreditamos

que a esportivização ajuda na popularização e aumento significativo e gradual de

adeptos pelo mundo inteiro (seja com acesso via projetos sociais ou via clubes e

escolas particulares – judô pago), contudo, temos pequenos judocas muito mais

preocupados em iniciar uma carreira de atleta que o leve a ser um “lutador” de judô

e não mais um “judoca”, o que se constitui um fator de preocupação e

questionamento acerca da cultura moderna do esporte – mais especificadamente no

judô.

135

Para fim de análise, ainda no que concerne à cultura do Judô, intentamos

saber como contextualiza-se o tradicionalismo (propriamente dito) dentro do judô no

olhar dos antigos mestres. Para tal, solicitamos ao leitor que atentem à figura 18.

Figura 18 – Categoria 3: Cultura Judoística (Tradicionalismo no Judô)

Fonte: o autor (2017)

Através da técnica de análise de conteúdo, via utilização de software (com

ênfase na incidência frequencial de palavras contidas nas falas dos entrevistados –

nossa principal fonte para a pesquisa), é possível percebermos que as palavras ou

termos predominantes para esta análise foram as seguintes: “CULTURA”, “BRASIL”,

“MANEIRA”, “DIFERENTE”, PRÓPRIO”, “JIGORO”, “CUMPRIMENTO”, “FORMA”,

“TRADICIONAL” e “BRASILEIRO”. Através destes dados podemos analisar e

deduzir uma compreensão que nos leva a reflexão crítica de que, no judô, são muito

claras as formalizações e normas de etiqueta próprias e mundialmente

disseminadas. O tradicionalismo no judô é tido como algo fortemente predominante

no cotidiano dos praticantes, contudo, para nossa surpresa, os atores (senseis)

desta pesquisa ressaltaram palavras como “cultura”, “Brasil”, “diferente” e “maneira”

que, devidamente contextualizadas nas falas dos mesmos, nos deixou

apontamentos interessantes do ponto de vista da percepção dos senseis quanto a

necessidade de que o povo brasileiro, ao treinar judô (no contexto contemporâneo),

deva tê-lo adaptado e um pouco mais flexibilizado quanto à rigidez japonesa

136

tradicional da modalidade. Endossando a nossa análise, em estudo realizado por

Drigo et al. (2005) percebeu-se que não era estratégia interessante simular

radicalmente o oriente no ocidente através de práticas de artes marciais,

estimulando espécie de um “mini Japão” nos dojôs, pois isso poderia gerar

problemas de especialização precoce e aculturamento dos praticantes. Esta

maleabilidade cultural a que nos referimos visa determinar que o judô se adapte à

cultura local do país onde está inserido o dojô (logicamente com permanência de

seus princípios e etiquetas) e não o inverso (a cultura do país ser modificada

naquele ambiente de educação – dojô). Contudo, o judô é tão massificado em nosso

país (em quantidades de praticantes e popularização) ejá está tão entrelaçado à

nossa cultura, que autores como Machado (2011, p. 22) chegam a afirmar que “o

Judô é uma japonesização da sociedade brasileira”.

De forma conclusiva, sintetizando as inferências gerais possibilitadas pela

análise da presente categoria, intitulada de “cultura judoística”, é pertinente

apontarmos para um entendimento coletivo e reflexivo de que os senseis da

atualidade sejam críticos quanto à apropriação cultural japonesa, de forma

exacerbada e refletida, nas práticas dentro de seus espaços de ensino (dojôs). Aqui,

provocamos o leitor a uma expansão compreensiva da necessidade de que, mesmo

que o foco (enquanto proposta de seu dojô) seja direcionado ao judô como prática

esportiva voltada ao alto rendimento, é necessário não contribuirmos para o declínio

ou a extinção de características culturais, etiquetas e/ou princípios educativo-

filosóficos do judô de Kano.

4.5 Sociedade e Violência (Aspectos Civilizatórios do Judô)

Aqui, nesta categoria de análise, buscamos “provocar” os mestres para que

pudessem se posicionar acerca do entendimento de como uma prática de luta, arte

marcial e/ou esporte de combate pode se relacionar negativa ou positivamente com

aspectos da violência social, do ponto de vista do praticante e do sensei. O que

intentamos é posicionar a prática do judô, ou até mesmo a “persona” do judoca em

si, enquanto pertinente à discussão acerca do controle das emoções e a excitação

preconizadas pela análise da teoria eliasiana (construída pelo sociólogo alemão

Norbert Elias). Para tal discussão, obtemos os seguintes dados coletados via

entrevistas e representados graficamente através da figura 19, abaixo apresentada.

137

Figura 19 – Categoria 4: Sociedade e Violência (aspectos civilizatórios do Judô)

Fonte: o autor (2017)

Desta forma, analisando a imagem acima, constatamos uma prevalência dos

seguintes termos e/ou palavras: “PROFESSOR”, “DEFENDER”, “REALIDADE”,

“MEDIADOR”, “COMPREENSÃO”, “RELAÇÃO”, “ALUNO”, “ENFRENTAR”,

“VIOLÊNCIA”, “FAMÍLIA” e “ENSINANDO”.

Ao analisarmos os dados informacionais presentes nas entrelinhas das

“falas” de cada mestre, é possível deduzirmos que os mesmos compreendem que as

artes marciais possuem capacidade para formar o cidadão em busca de uma

sociedade mais equilibrada emocionalmente.

De acordo com Almeida et al. (2009, p. 166), “um ponto importante na obra

de Elias é a compreensão da necessidade de domar os instintos violentos”. Nesta

lógica, pretendemos analisar o papel do Judô frente a esta possibilidade de

utilização.

É sabido que as artes marciais (de uma forma geral, mas principalmente as

orientais) possuem, paradoxalmente, uma compreensão antagônica dentro de sua

própria cronologia histórica, e que, com o passar do tempo, as levaram a serem

resignificadas em esportes. Podemos dizer que da mesma forma em que as

mesmas foram reconhecidamente importantes enquanto possibilidade de

manutenção da sobrevivência de guerreiros (por exemplo, os samurais no Japão)

138

quando em batalhas/guerras entre civilizações, percebe-se que, atualmente, o

mundo contemporâneo lhes desconstrói para fazer delas novas formas de utilização.

Se no passado tinha-se o propósito claro de confrontar o inimigo até a morte, hoje

têm-se um “oponente” transitório que, emocionalmente controlados, é possível, por

exemplo, disputar uma competição usando as “armas” (técnicas resignificadas não

mais para matar) e ao mesmo tempo possuir uma relação de amizade real com este

mesmo oponente (nesta analogia, este mesmo indivíduo seria o inimigo do

passado). Mas como isso é possível? Certamente devido ao processo civilizatório

pela qual passaram as artes marciais, até se transformarem, em sua grande maioria,

em esportes de combate.

Nesta transição civilizatória, pertinente ao mundo esportivo, percebemos que

o judô caminhou claramente em direção a uma esportivização, já em sua gênese,

como podemos perceber mais detalhadamente através das aproximações e filiações

teóricas conduzidas pelo próprio Jigoro Kano (ver mais detalhadamente na seção 3).

O próprio encaminhamento de uma arte marcial até transformar-se em uma

modalidade esportiva de combate, os leva, através de seus próprios sistemas

regrados e burocratizados, à uma representação clara e direta de um processo lento

de encaminhamento voltado a um processo civilizatório direcionado para um

controle da violência (ALMEIDA et al., 2009). Em outras palavras, pode-se dizer que

ao transformá-la em esportes, as próprias inclusões e desenvolvimento de regras faz

com que ocorra uma espécie de controle social destas praticas, no sentido de

reduzir a violência, seja na intenção de proteção e/ou um maior respeito à

integridade física do oponente, ou por um julgamento social que cerceia a

possibilidade de ter-se a violência exaltada através do esporte. Afinal, o que

pretende-se é “civilizar” a arte marcial “rude”, “violenta” e “agressiva” de outrora.Em

relação a esta nossa analogia referente à teoria do processo civilizatório quando

aplicada ao contexto da esportivização das artes marciais, nos fortalecemos de

outros autores, como por exemplo,o Marta (2009) em sua tese de doutoramento,

que corrobora com esta nossa compreensão e proposição reflexiva.

De acordo com os atores da pesquisa (senseis), o Judô possui base

filosófica capaz de favorecer o autocontrole do praticante e, consequentemente,

minimizar conflitos sociais. Basta compreendermos a essência do pilar filosófico do

JITA KIOEY (prosperidade e benefícios mútuos) e perceberemos que por trás deste

princípio se favorece ao judoca que, para uma convivência harmoniosa numa

139

sociedade, são necessários esforços relacionados à ajuda ao próximo e/ou

semelhante. Esta mesma teia relacional, por onde ocorrem episódios nos mais

diversos âmbitos sociais, é prevista pela teoria do processo civilizatório onde

compreende-se que a sociedade é moldada por costumes e hábitos que são

constantemente dinâmicos e mediados por uma interrelação na cadeia social em

questão. Em nossos estudos, observamos importantes aproximações conceituais

entre os fundamentos teóricos de Kano (2008) e os de Elias (1994a,b), pois é

perceptível que o criador do judô compreendia a importância emocional dos

indivíduos perante suas interrelações sociais, quanto a isso, encontramos trecho por

onde o mesmo ressalta que “a educação moral deve ser implementada com base no

aspecto das emoções” (KANO, 2008, p. 59), e com isso, ele pretendia comunicar

que um indivíduo treinado emocionalmente (capacidade de exercer o autocontrole)

torna-se mais hábil em lidar com relações sociais e discernir melhor sobre suas

ações e tomadas de decisões. Outro ponto relevante de proximidade conceitual

entre os dois personagens (Kano e Elias) deve-se ao fato de que Jigoro com a

criação e implementação de um dos princípios filosóficos (Seiryoku Zenyo), âncoras

de seu sistema, pregava com este, a ideia de “melhor utilização da força física

(energia)”, Oras... ao nosso ver, isso nada mais é que a conscientização por parte

do judoca (praticante de judô) de que ele deva racionalizar a sua energia através

das técnicas do judô e que filosoficamente possa entender que não deva

desperdiçar energia sem razão em suas ações no tatame e na vida. Se entendermos

que violência é desgaste energético gratuito (e muitas vezes irracional) ao indivíduo,

perceberemos que Kano possuía nas entrelinhas de seus pilares filosóficos, a idéia

de que devemos prezar pelo não uso da força, das “brigas”, das “guerras” etc.

Utilizando-se de analogia direta do processo civilizatório preconizado por

Elias (1994a,b), Pimenta (2009, p. 3) afirma, categoricamente, que se o processo

histórico fosse linear, movimentos violentos e agressivos pertinentes as práticas do

passado seriam facilmente banidos do contexto atual, pois, segundo o autor, “no

processo civilizador a contenção de atitudes evidenciadas pela constante

interdependência entre os indivíduos torna-se condição essencial para a convivência

coletiva”. Contudo, o número de praticantes de esportes de combate só faz

aumentar no mundo inteiro. É justamente este fenômeno que queremos analisar,

sob a ótica da ressignificação das artes marciais pelo mundo contemporâneo.

Algumas importantes ponderações são necessárias: Compreender que a cultura do

140

oriente difere plenamente do ocidente; utilizar-se adequadamente de Elias enquanto

modelo de análise, independente de que ele não tenha investigado culturas fora da

europeia em suas pesquisas.

Em se tratando de artes marciais e/ou esportes de combate, mais

especificadamente do judô, compreendemos que a sociedade contemporânea passa

por diversas tensões emocionais (guerras, crises econômicas, políticas, etc.) e que

levam ao aumento da violência de uma forma geral. A pergunta que se faz é a

seguinte: Qual o papel destas práticas marciais na sociedade contemporânea? Ao

nosso ver, ainda que complexa, esta pergunta direciona para uma resposta que

contempla a compreensão de que estas práticas são verdadeiras válvulas de escape

emocional, que permitem aos praticantes extravasarem suas aflições e

agressividades acumuladas (mas que obviamente não podem ser extravasadas em

demasia) e que são mediadas por controle de regras sociais entre os indivíduos de

uma sociedade (sejam as leis, bom senso social, etc.). Reforçando a nossa

compreensão acima explanada, de acordo com Elias e Dunning (1979 apud

PIMENTA, 2009), a prática desportiva é reconhecida como espaço (quase

institucionalizado), para a exaltação de emoções suprimidas pelo processo social.

Segundo Pimenta (2009, p. 5) “o processo civilizador está ligado ao ganho

progressivo de autocontrole por parte dos indivíduos, autocontrole necessário para a

convivência social e para o progresso industrial e comercial”. Também entendemos

que práticas de lutas, artes marciais e/ou esportes de combate que possuam algum

tipo de propósito filosófico por trás de sua idealização (como é o caso do Judô),

facilitem no sentido de os praticantes serem direcionados há um estado de maior

autoconhecimento, sabedoria e, consequentemente, um maior controle de suas

emoções (autocontrole). Logicamente não somos ingênuos em pensar que não

existiria significativo peso na forma com que os líderes (senseis) transmitem este

conhecimento técnico-filosófico pertinente à modalidade desenvolvida em seu dojô.

A exemplo disso, citamos o clássico problema sofrido pelo Jiu-Jitsu brasileiro, na

década de 90, na cidade do Rio de Janeiro, quando muitos destes praticantes da

época foram chamados de “pit-boys”, como forma de expressão de sua extrema

agressividade não controlada e que eram externalizadas constantemente em brigas

e conflitos na vida noturna daquela época. Sabe-se que este era um caso típico de

má utilização e apoderação equivocada destas práticas marciais que, por sinal, eram

141

facilitadas, inclusive, por boa parte dos próprios senseis de jiu-jitsu brasileiro daquela

geração, algo difícil de compreender.

Muitos dos mestres de judô entrevistados por esta pesquisa reforçaram a

necessidade do bom uso do judô, mediado por um bom professor e devidamente

contextualizado aos seus praticantes. Nossos entrevistados ainda mencionaram a

importância de um seio familiar devidamente equilibrado para que formemos

crianças mais inteligentes emocionalmente.

Percebe-se que, ao longo de um continuum histórico-cronológico, as artes

marciais foram sendo “civilizadas” ao ponto de terem seus golpes (técnicas) mais

contundentes excluídos (o próprio judô vem alterando regras constantemente e

banindo atitudes e técnicas perigosas), além disso, novas roupagens vão sendo

idealizadas nas artes marciais, gerando, inclusive, conflito entre as gerações de

senseis mais tradicionalistas e outros mais contemporâneos. Dentre estas novas

“roupagens” dadas a estas práticas milenares e/ou seculares, podemos citar o

exemplo da prática do Muay Thai (boxe tailandês) do tipo “executivo” que chegou

forte comercialmente (do ponto de vista mercadológico), no universo das academias

de ginástica do Brasil, e que acaba vulgarizada enquanto prática centenária, agora

reduzida a um mero “produto fitness”. Nesta modalidade não existe confrontação

alguma, para evitar ao máximo as lesões os praticantes executam suas técnicas ou

de frente à espelhos ou, no máximo, impactando os membros contra materiais

específicos acolchoados (também chamados de “paradores”). Nossa inquietação se

faz presente ao entendermos que a luta pede a oposição, e esta mesma oposição se

dá a partir da confrontação com um ou mais oponentes. Oras... Sem oposição não

existe combate! Não nos resta dúvida que assim, desvios de propósitos, como os

citados acima, são claramente recriações equivocadas de práticas de lutas, e que

não possuem grandes benefícios ao autocontrole, autoconhecimento e/ou

espiritualidade alguma. No máximo, apenas facilitarão a construção de corpos

fisicamente mais fortes, consistindo, portanto, em reducionismo dos potenciais que

uma prática marcial pode oferecer à sociedade.

Em síntese, para esta categoria de análise, inferimos (a partir das próprias

falas dos mestres entrevistados) que não será o judô que favorecerá a violência

enquanto prática de luta/marcial. Este tende a cumprir justamente uma função

inversa, ou seja, de favorecimento de um maior controle dos impulsos e emoções

142

inadequadas que possam ocorrer por parte dos praticantes. Assim entendem os

mestres requeridos por esta pesquisa.

4.6 Expectativas para o Futuro do Judô

Em nossa última categoria de análise vislumbramos refletir acerca da

perspectiva de futuro ao judô a partir do olhar de nossos mestres protagonistas. É

sabido que ao longo da trajetória de cada um deles muitas histórias e episódios

positivos e/ou negativos foram vivenciados. Desta forma, entendemos que ao

extraímos suas reais perspectivas de futuro, as quais julgamos serem importantes

para a geração do presente e do futuro no judô do Recife, fica subentendido que

isso só é possível a partir da história de vida de cada um, o que permitirá análise

inferida através de olhar único e exclusivo carregado de vieses próprios de cada

uma destas histórias. Desta forma, decidimos dividir essa presente categoria de

análise, permeando-as a partir de duas subcategorias, que são elas: 1. Mensagem

dos mestres à comunidade Judoística; e 2. Expectativas dos senseis para o futuro.

Em relação à mensagem final e pessoal, proferida pelos mestres à toda

comunidade judoística (e eventuais leitores desta dissertação), obtivemos as

seguintes palavras-chave (dados) de acordo com a figura 20: “APRENDE”,

“TEMPO”, “TÉCNICA”, “MENSAGEM” e “UNIVERSIDADES”.

Figura 20 – Categoria 5: Expectativas para futuro do Judô (Mensagem dos mestres à

comunidade judoística)

Fonte: o autor (2017)

143

Percebemos que estão incutidas nas entrelinhas dos discursos dos mestres

a ideia central de que são necessários esforços para que o judô seja cada vez mais

popularizado, mas que também o mesmo não perca seus valores e significados

preconizados pelo seu criador.

Nos chama atenção a ênfase dada as “universidades” enquanto espaço

reconhecidamente exitoso, do ponto de vista da propagação e qualificação do judô.

Logicamente, acreditamos que esta palavra tenha sido bastante mencionada devido

ao envolvimento da Educação Física no processo de valorização ao judô, seja

através de pesquisas, ensino (disciplinas) e/ou extensão universitária que envolvam

projetos com o Judô. O aumento numérico de IES que ofertam os cursos de

graduação em Educação Física tem possibilitado uma maior aproximação entre

treinadores de judô (portadores da faixa preta) e uma maior procura pela dupla

formação (formação do Judô e acadêmica), fator que tem resultado em saltos

qualitativos no que tange aos aspectos didáticos e metodológicos do ensino do Judô

na cidade do Recife.

Já em relação à perspectiva de futuro para o judô, foi possível coletar os

seguintes dados terminológicos predominantes (contidos na figura 21):

“UNIVERSIDADES”, “TEMPO”, “MUNDO”, “CAMPEONATO”, “LUTAS”,

“EVOLUÇÃO”, “SERVIR”, “ESPERANÇA”, “GRATIFICANTE” e, por fim, “HUMANO”.

Figura 21 – Categoria 5: Expectativas para futuro do Judô (Expectativas dos senseis para o

futuro)

Fonte: o autor (2017)

144

Ao analisarmos as falas dos mestres, podemos inferir que suas perspectivas

de futuro em relação ao judô giram em torno da compreensão de que, de modo

geral, as universidades refletem boas possibilidades e oportunidades ao judô. A

predominância de termos tais como: “mundo”, “humano”, “esperança”, “evolução”,

“servir”, refletem o otimismo por parte dos senseis entrevistados nesta pesquisa, de

forma que estes percebem a existência de espaço para o referido esporte avançar e

se desenvolver, não só no Recife como no mundo. Também nos chama atenção o

olhar humanista de busca por uma sociedade mais equilibrada, denotando que

muitos destes mestres carregam consigo o judô e os princípios de Kano como uma

filosofia de vida, que preza por uma relação social de valorização ao próximo e de

prosperidade a partir de boas atitudes para com o semelhante.

Todas as cinco categorias de análise criadas para a nossa pesquisa foram

permeadas pela necessidade e intento de que houvesse reflexões críticas por onde

se fizesse presente análises e inferências entre o judô e a educação, para tal,

buscamos interfaces pertinentes ao problema central de nossa pesquisa, como

também, aos seus objetivos de análise.

145

5 RELAÇÕES E (RE)CONSTRUÇÕES DO JUDÔ RECIFENSE: o que Aprendemos com o Ontem e que poderemos Revolucionar no Cenário Judoístico do amanhã?

Baseando-se pela teoria da interdependência, proposta por Elias (1994a), é

possível compreendermos que os acontecimentos do presente são proporcionados

por um conjunto de interrelações que montam uma teia relacional entre os indivíduos

de uma sociedade e que, assim, permite-se que ocorra um pleno desenvolver social

e civilizatório em direção a nichos denominados de configurações. Assim, pudemos

perceber que a gênese do judô na cidade do Recife-PE se deu através de

interrelações entre a sociedade recifense e seu respectivo acolhimento a alguns dos

mestres residentes e “estrangeiros” aqui entrevistados, como também (e

principalmente) da interação entre estes próprios mestres. A esta permissividade e

este intercâmbio cultural permitiu-se que houvesse uma simbiose entre as mais

diferentes realidades que cada um destes mestres carregava e ainda carregam

consigo. Assim, de forma harmoniosa, foram sendo constituídos processualmente e

se estabelecendo cada uma das escolas judoísticas pioneiras de nossa cidade.

Ao longo de nossa investigação junto aos mestres, ficaram claras as

evidências de que o tradicionalismo no âmbito do judô é algo bastante valorizado. O

que se discute é que os senseis da atualidade possam contextualizar devidamente a

representação destas mesmas tradições no presente momento. Falamos isso

porque é sabido que práticas culturalmente aceitas há décadas podem não ser mais

facilmente compreendidas, ou até mesmo nem sejam mais interessantes frente aos

conceitos globalizados atuais. Neste sentido, são necessários esforços para que o

judô possa ter sua identidade preservada do ponto de vista dos princípios filosóficos

e/ou educacionais, mas que possamos analisar a viabilidade, por exemplo, da

perpetuação de gestos rígidos e culturais próprios da etiqueta e costumes

civilizatórios específicos da sociedade japonesa, que em muito difere da brasileira.

Assim, o judô sempre deverá adaptar-se à cultura local de onde se insere (e não o

contrário), porém sem perder sua essência.

Entendendo que o presente só se concretiza mediante um passado de muita

luta, é importante lembramos as dificuldades e os obstáculos superados por parte

destes senseis que fizeram de seus dojôs importantes espaços de educação, e que

através destes formaram diversas gerações de judocas, mas antes de tudo,de

146

cidadãos. Quanto a este aspecto, não nos restam dúvidas, pois mediante nosso

contato com estas referências, durante as entrevistas, pudemos perceber através de

suas falas e também de seus gestuais o comprometimento destes mestres com o

propósito judoístico, como também, com suas próprias perspectivas educacionais,

enquanto agentes influenciadores de toda uma geração de praticantes que

passaram por suas mãos. Não nos restam dúvidas, entendermos não apenas a

função exercida por estes senseis, mas principalmente o engajamento dos mesmos

enquanto educadores na essência da palavra. Não foram poucos os relatos de

episódios relacionados às importantes intervenções educacionais realizadas pelos

mesmos.

Dentre outros legados, ressaltamos que, por mérito destes senseis,

atualmente temos um bom número de praticantes de judô em nossa cidade, e a

escola pernambucana (estadual) de judô é bastante valorizada no cenário nacional

de competições. No contexto vigente, quase todas as escolas (predominantemente

privadas) possuem o judô como atividade extracurricular, além da pluralidade

numérica de academias/dojôs específicas que não param de crescer, e das várias

instituições reguladoras da pratica em nossa cidade (entre Federações e Ligas).

Este legado mencionado acima só foi possível mediante a construção de uma

configuração que se deu de forma processual através de uma teia relacional muito

comum nas praticas marciais, que é aquela que se dá na direção do mestre para o

pupilo que fica incumbido de perpetuar aquele conhecimento a uma próxima

geração. Não temos nenhuma dúvida de que na arvore genealógica (ou teia) do judô

Recifense os atuais senseis (pelo menos em sua maioria) se interligam por algum

momento da história com as nossas referências entrevistadas para esta pesquisa. E

assim, o judô do agora nada mais é que a representação ressignificada do judô

relatado historicamente por nossa pesquisa.

Por fim, respondendo à pergunta provocativa desta presente seção,

podemos afirmar que um caminho promissor parece apontar para a necessidade de

preservar nossas raízes genealógicas, a fim de que não fiquem esquecidas. Há

muito que aprender com estes educadores e suas sabedorias de vida. Os senseis

de hoje deverão compreender os de ontem, de forma que possam contextualizar

sócio-historicamente as suas intervenções docentes em suas “salas de aula” (dojôs).

O judô do futuro é interdependente do judô do passado e não restam dúvidas que,

se bem direcionado, poderá fazer a diferença enquanto meio de educação não

147

formal. Resta-nos provocar a nova geração dos senseis do agora (os que

atualmente estão ativos no cenário): Qual legado vocês querem perpetuar para as

próximas gerações? Ainda estamos dando conta dos pressupostos filosóficos e

educacionais preconizados por Jigoro Kano? Esperamos que estas e outras

perguntas sejam respondidas brevemente através de novos estudos de cunho

histórico, filosófico e/ou educacionais que venham a ser produzidos nestas áreas do

conhecimento.

148

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Chegar neste ponto da pesquisa nos traz bastante satisfação na medida em

que reconhecemos a importância da organização processual de todo o trabalho.

Olhar para trás e perceber que a obra foi construída ao longo de dois anos

investidos em sólidas leituras, em congruência ao exercício constante da reflexão

crítica, nos orgulha, tendo em vista a assimilação de novas teorias, que inicialmente

não eram tão próximas ao cotidiano do pesquisador, mas que já são de extrema

relevância a este. Durante todo o processo, e por cada fase de construção desta

dissertação, tivemos a sensação de que dois anos foi um tempo muito curto diante

da “sede” do pesquisador em investigar e construir algo que faz parte do universo

das grandes motivações do mesmo. Neste sentido, tivemos que lidar com a

compreensão de que se tratava de uma dissertação, e não de uma tese e, assim,

acalmava-se um pouco mais o ímpeto de tentativa de “abraçar o mundo” dentro da

própria pesquisa.

Aliás, ressalta-se que dissertar sobre as ideias de Jigoro Kanofoi

demasiadamente prazeroso ao autor, em especial, a partir do reconhecimento ao

mérito que fazemos do mesmo, bem como, mediante sua biografia, mas

principalmente, a sua genialidade e importância para a Educação Física oriental. A

sapiência de Kano para transformar o complexo no simples e, a partir disso, criar

conceitos, muitas vezes nos impressiona. A exemplo, citamos o conceito do “ceder

para vencer”, que nada mais é do que a habilidade cognitiva e/ou física de utilizar-se

da força do oponente para vencê-lo (entendimento de que o mais fraco pode vencer

o mais forte). Curiosamente, este conceito (ceder para vencer) extrapolou os muros

dos dojôs, e atualmente são utilizados em diversas outras áreas do conhecimento,

como por exemplo, pelo mundo corporativo/empresarial e/ou na área da psicologia

comunicacional, como atestam as seguintes obras literárias – Yoffie; Kwak (2002) e

Lager; Kraft (1981). Em suma, reafirmamos que para tratar apenas de Jigoro Kano e

sua biografia, seria necessária uma exclusiva dissertação para tal missão. Contudo,

como não vem ao caso em nossa obra, seguimos com nossa missão de aqui, no

final da obra, apontar ao leitor os nossos principais achados nesta pesquisa.

Neste último ponto da pesquisa, a pretensão é de identificar cada etapa

vivenciada, mas principalmente, projetar inferências que permitam dar a nossa

identidade à pesquisa e possibilitar reflexões acerca do que conquistamos para a

149

atualidade com a nossa pesquisa. Também se pretende, e de forma especial,

discutir as possibilidades de utilização de nossos achados, no intento de projetarmos

acréscimos à comunidade científica interessada em nosso objeto de estudo.

Ao longo do trajeto da pesquisa, sabíamos que o desafio de analisar a

história do judô da cidade do Recife-PE, buscando compreende-la através de seus

próprios protagonistas (senseis), seria tarefa árdua a ser enfrentada. Durante toda a

pesquisa buscamos realizar interface compreensiva com a educação a partir dos

espaços próprios de ensino do judô, denominados dojôs, através dos quais

construímos (processualmente) um pleno entendimento de que são verdadeiras

salas de aulas onde estes mestres, literalmente, complementaram a educação de

seus praticantes a partir de complexas relações. Neste contexto, subentende-se que

a educação dos indivíduos deverá ser pautada através da tríade: ESCOLA

(educação formal) – PAIS (educação familiar) – AMBIENTE (pertinente ao mundo

externo - não institucionalizado/universo não formal de educação – facilitador de

apreensão de conhecimento, por exemplo, práticas esportivas, tais como o judô).

Buscando remeter o leitor a relembrar toda a linha de construção de nossa

pesquisa, iniciamos a partir do resgate da introdução (seção 1) por onde buscamos

localizar o autor da pesquisa no seio judoístico e, desta forma, estabelecer as

principais motivações para encabeçarmos o presente trabalho. Nesta fase também

foi possível resgatar importantes conexões entre o pesquisador e seu objeto de

pesquisa (reflexões educacionais acerca dos dojôs de judô a partir de seus

mestres). Ao longo desta primeira parte introdutória, buscamos contextualizar o judô

facilitando a compreensão das razões fundamentais para entender a gênese do judô

no Recife, em determinado recorte temporal (1952 a 1972). Este caminho foi de

suma importância para, ainda na mesma seção, apresentarmos também o problema,

os objetivos e a hipótese de nosso estudo. Quanto ao problema de pesquisa, ao

longo da dissertação, buscamos facilitar a compreensão de como as vidas e

experiências vividas pelos mestres entrevistados possibilitaram a constituição de

uma configuração específica (judoística) relacionada aos mais diversos contextos

(social, educacional, histórico e econômico) e, ao que constatamos, culminou com o

desenvolvimento do Judô na cidade do Recife-PE. Entendemos também que foi

possível, ao longo do trabalho, dar conta de cada objetivo proposto, assim

como,ratificamos que houve ao final da pesquisa uma concordância com a hipótese

sugerida à pesquisa, o que nos leva a constatar que os dojôs configuram-se

150

enquanto espaços de educação (não formal) e que o judô, quando bem direcionado,

possui potencial enquanto reconhecida ferramenta educativa. Esperamos que a

partir desta apresentação inicial da pesquisa, contida na primeira seção, tenha

despertado o interesse dos leitores em conhecer um pouco mais de nossa

investigação científica.

Na segunda seção de nossa pesquisa, centramos em ressaltar as nossas

filiações teóricas pertinentes à estruturação metodológica. Buscamos reforçar a

justificativa por adesões, fizemos um levantamento das teses e dissertações que

investigaram as lutas através da metodologia da história oral, constituindo, assim,

um estado da arte. Neste âmbito, vale ressaltar que dentre 17 teses e dissertações,

selecionamos três Kohl (2012), Marta (2009), Nunes (2011) para nortear importantes

aproximações com nossa respectiva filiação metodológica. Também pontuamos

nosso cuidado quanto aos critérios de inclusão e exclusão relacionados à seleção

dos mestres entrevistados. Quanto às opções metodológicas, buscamos elucidar

quais critérios, métodos e técnicas optamos como eixo central à nossa pesquisa,

neste sentido, defendemos o posicionamento em decisão à utilização da

metodologia de história oral e da técnica de análise de conteúdo. Para tal, buscamos

filiação teórica embasada em autores clássicos destas áreas, tais como Bardin

(2011), Thompson (1992), Meihy (2014) dentre outros relevantes autores

selecionados. Ainda no âmbito metodológico, vislumbramos o desafio de utilizar-se

de software (NVivo®) de análise qualitativa (até então ainda pouco utilizado em

nosso programa de pós-graduação), pois compreendemos que desta forma

possibilitaríamos a expressão de um olhar mais contemporâneo em associação às

possibilidades tecnológicas de ferramentas científicas disponíveis na atualidade.

Acreditamos que o resultado foi positivo, não só no aspecto visual e na exposição

dos achados da pesquisa, mas, principalmente, porque nos permitiu realizar

inferências que poderiam não ser enxergadas através de um trabalho

predominantemente manual, no que corresponde ao tratamento e análise dos dados

coletados. Vale pontuarmos que, do ponto de vista da aprendizagem, também foi

enriquecedora e satisfatória a experiência de atuar com métodos e técnicas

relacionadas à história oral e a análise de conteúdo, estes que já são considerados

recursos metodológicos clássicos em pesquisas de cunho sociológico dentro da

grande área das ciências humanas e sociais.

151

Na terceira seção, podemos dizer que tratou-se do coração de nossa

pesquisa, foi construído todo arcabouço teórico acerca das aproximações teóricas

existentes e referentes ao judô e à educação. Buscamos levantar questionamentos

quanto à base educacional de Jigoro Kano para a construção do judô, discutimos

também quanto à relação de diferenças pertinentes à cultura ocidental e oriental,

como também a relação entre tradicionalismo e modernidade no âmbito do judô.

Também possibilitamos discussão acerca da teoria do processo civilizatório

(preconizada pelo sociólogo Norbert Elias) aplicada às lutas, artes marciais e/ou

esportes de combate. E por fim, ainda levantamos a discussão do ambiente dojô

como espaços condizentes com o favorecimento da educação não formal. A ideia

central desta seção foi a de permitir reflexões críticas por parte do leitor, de forma

que o mesmo pudesse visualizar o propósito central de nossa pesquisa no que

tange a discussão do judô como pertencente ao macro contexto da educação e

reconhecido como importante ferramenta educativa. Acreditamos que tenhamos

dado conta de explicitar importantes ligações relacionadas à Jigoro kano e a

educação em suas devidas especificidades, selecionadas por nós para análise e

discussão.

Dando sequência à pesquisa, chegamos a seção 4 buscando analisar e

discutir os dados coletados e tratados por nossa metodologia e, a partir destes,

produzir inferências que favorecessem responder à nossa pesquisa. Nesta seção,

apresentamos um breve histórico de cada sensei (participantes ativos de nossa

pesquisa). Vale ressaltarmos que para montagem deste histórico buscamos a

interligação entre as entrevistas (fonte oral materializada) e as fontes documentais

selecionadas para tal intuito de análise. Também seguimos analisando,

individualmente, cada categorização (codificações) delineada por nossa pesquisa.

Através da criticidade reflexiva, realizamos nossa função ativa enquanto

pesquisadores e, assim, analisamos e construímos reflexões diretas e objetivas

referentes a todos os gráficos (resultantes enquanto produtos da análise efetuada

via software), como também, construímos alguns elementos gráficos e mapas

mentais que facilitarão, ao leitor, o entendimento de nossa análise.

Em nosso quinto (e penúltima seção), através de análise direta, compilamos

todas as nossas inferências e compreensões acerca da pesquisa e construímos uma

analogia que remetesse a uma crítica direta relacionada ao passado, presente e ao

futuro do judô na cidade alvo investigada (Recife). Para tal, ensaiamos uma reflexão

152

crítica que facilitasse a compreensão do presente a partir da valorização do passado

e, para tal, resgatamos a história de importantes referências do judô recifense

investigados em nossa pesquisa. Desta forma, provocativamente, denominamos a

seção de “relações e re(construções) do judô recifense: o que aprendemos com o

ontem e que poderemos revolucionar no cenário judoístico do amanhã?” Neste

ponto da pesquisa, pretendeu-se inferir diretamente e criticamente, buscando uma

análise do cenário local do judô e a formulação de propostas e/ou sugestões. Para

tal, baseamo-nos nos achados da própria pesquisa (produtos resultantes da análise

de fontes orais e documentais) em associação às opiniões emitidas a partir da

expertise de quinze anos atuando enquanto professor de judô em escola privada

(em exercício), por parte do pesquisador/autor deste trabalho.

Em termos de conclusões e impressões finais, para tal, baseando-se nos

achados desta pesquisa, constatamos que o judô se diferencia de demais

modalidades esportivas devido as suas características e especificidades filosóficas

preconizadas por seu criador (Jigoro Kano), sujeitas a notadamente à frente do seu

tempo, e que sempre buscou grandes aproximações com a cultura ocidental e

perspectivas europeias de educação para desenvolver um sistema de luta voltado à

educação, formação física e moral dos indivíduos, e que inicialmente teria cunho

marcial, mas ao longo de um lento e gradual processo civilizatório vivenciado

também por todos os atuais esportes (incluindo-se outras práticas de lutas e artes

marciais), foram se transformando em modalidade esportiva de combate.

Quanto às particularidades do ambiente da prática educacional, denominado

dojô, constata-se que estes podem ser consideradas verdadeiras “salas de aula” por

onde se facilita o “caminho” (DÔ) literal da educação. Logicamente que a qualidade

do sensei à frente deste processo será de fundamental importância, haja vista que

caberá a este líder docente, “educar” os seus alunos, embasado pelos preceitos

educacionais do judô preconizados por Jigoro Kano e em convergência com a

cultura social local da configuração judoística em questão. A não formalidade deste

“espaço” (no sentido da não institucionalização) facilitará com que sejam favorecidos

momentos de aprendizagem que extrapole os seus muros e favoreça uma educação

para a vida daqueles que ali estão a aprender para além do judô em si.

Quanto ao processo civilizatório vivenciado pelo judô ao longo de seu trajeto

histórico, pudemos constatar que, contraditoriamente, temos dois posicionamentos

opostos (um positivo e outro negativo). Um primeiro, positivo, relacionado ao fato de

153

que era notório que o próprio Jigoro Kano, em seu plano de difusão do Judô pelo

mundo, pretendia que através das bases educacionais ocidentais vivenciadas por

ele no continente Europeu, pudesse favorecer a própria esportivização do judô,

basta entendermos que na própria gênese do judô, Kano busca a exclusão de

gestos violentos do antigo ju-jutsu (pratica samurai) e com isso ele planeja o

desenvolvimento de uma prática de luta mais pedagógica, que ao ser permitido

vivenciá-la pelo mais diverso público (de crianças a idosos), facilita-se sua

expansão, só que agora, através de uma conotação esportiva. Contudo, e

contraditoriamente, ao se transformar em esporte olímpico e, consequentemente,

renderem-se ao capitalismo esportivo, os preceitos educacionais e filosóficos

(verdadeiros pilares de sustentação da prática), tão importantes ao Judô, acabam

sendo quase que esquecidos, em razão da busca por medalhas e a “luta pela luta”,

enquanto derivação de uma “ex-arte” marcial, agora espetacularizada e

especularizada comercialmente através de um universo que desconfigura suas

raízes fundamentais enquanto ferramenta educativa, pondo-o em risco de extinção,

em troca de um judô dito “moderno”. Esta configuração “contemporânea” do judô

nos permite realizar uma crítica contundente, quanto, por exemplo, à mercantilização

dos exames de faixas, que vem aumentando no Brasil e no mundo, através de

entidades administrativas esportivas e também de professores que não valorizam o

percurso natural (ético e honesto) da conquista da faixa preta (e seus graus

superiores - dans), acabando assim, banalizando a importância e o mérito deste

trajeto clássico do universo das lutas e artes marciais.

Desta forma, entendemos que a teoria civilizatória aplicada ao universo das

práticas marciais possibilita a ocorrência de resultados positivos (a exemplo da

massificação/popularização das práticas pelo mundo) e negativos (como por

exemplo, uma maior abertura para a “mercantilização” do universo das lutas, artes

marciais e esportes de combate),dependendo assim do ângulo em que se analisa e

o que se quer de cada prática.

Temos clareza das limitações existentes, e de que a pesquisa não encerra o

debate no que diz respeito às interrelações entre o judô e a educação, contudo,

ressaltamos a relevância de que a mesma tenha levantado importantes discussões

relacionadas à temática em questão. Entretanto, necessitamos apontar para uma

direção futura, que através de novas pesquisas científicas busquemos ampliar as

nossas compreensões relacionadas ao judô e a sua respectiva magnitude em

154

relação a outros pontos de discussão que parecem ainda pouco estudados dentro

da área educacional. Para tal, apontamos algumas sugestões de áreas carentes de

maiores produções científicas, são algumas delas: Análise dos aspectos didáticos,

pedagógicos e metodológicos relacionados ao ensino do judô; Aproximações

filosóficas e educacionais interdependentes entre o judô e demais modalidades

esportivas de combate de origem oriental e/ou ocidentais; compreensões de gênero

no universo das lutas, artes marciais e esportes de combate.

Sabendo que este estudo não esgota as possibilidades quanto ao objeto

investigado, também temos ciência de que, como toda obra, muitos outros temas

estão interligados e permitem a ampliação de novas discussões e análises. No

entanto, ficamos satisfeitos quanto à produção desta obra, que dentre suas

intenções, esperamos que seja consultada por professores de judô, historiadores

e/ou praticantes de lutas, artes marciais, capoeira e esportes de combate, como

também, acadêmicos da Educação Física, Educação e áreas afins, dentre outros

segmentos interessados em conhecer não só os aspectos históricos do judô da

cidade do Recife, mas principalmente, a relação destes com a educação não formal

viabilizada através das experiências no âmbito dos Dojôs.

155

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165

APÊNDICE A – Roteiro da Entrevista

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO

Pesquisa: DOJÔ: espaço de educação.

Pesquisador: Denis Foster Gondim

Orientador: Prof. Dr. Vilde Gomes de Menezes

ROTEIRO DE ENTREVISTA

FICHA DE IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO

Número da entrevista: ________ Data: ___/___/___ Hora: ___________________

Local:_____________________________________________________________

Nome do entrevistado:

__________________________________________________________________

Endereço Profissional

__________________________________________________________________

Telefones: _________________________________________________________

E-mail:_____________________________________________________________

Informações básicas:

1. Tempo de Judô: 2. Graduação no Judô (cor da faixa): 3. Idade: 4. Data que iniciou as atividades profissionalmente com o Judô em Recife-PE:

166

Perguntas (entrevista semiestruturada):

1. Como se deu a sua entrada no judô?

2. Para o senhor, como se deu a gênese (origem) e o desenvolvimento do judô

em Recife?

3. Quais foram suas referências e o que o senhor aprendeu com eles?

4. Quais as lições educativas que o judô pode oferecer

aos(as) seus(uas) praticantes?

5. Existem dois princípios fundamentais criados por Jigoro Kano, prosperidade e

benefícios mútuos e, também, o de melhor uso da energia. Como o senhor

compreende a utilização destes princípios no judô e fora dele (na vida)?

6. Como o judô poderá complementar a educação das pessoas junto a

outros espaços educacionais (Exemplos: escola, família, etc.)?

7. Atualmente o judô encontra-se presente na maioria das escolas brasileiras.

Como o senhor avalia esta conquista e a sua importância?

8. Disciplina e hierarquia podem ajudar as pessoas? Se sim, como?

9. A esportivização do judô tem pontos positivos e/ou negativos? Explique.

10. O judô tradicional japonês ainda é praticado em nossa cidade?

11. Por ser uma prática de combate (luta), como o judô se relaciona com o

possível controle da violência?

12. Que mensagem o senhor enviaria aos que praticam e os que pretendem

praticar o judô?

13. O que o senhor espera do judô para o futuro?

167

APÊNDICE B – Termo de Consentimento e Livre Esclarecimento (TCLE)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIMENTO

Pesquisa: DOJÔ: espaço de educação.

Pesquisador Orientador: Prof. Dr.Vilde Gomes de Menezes

Contatos: E-mail:[email protected] Fone: (81)99206 7498

Pesquisador Orientando:Denis Foster Gondim.

Contatos: E-mail: [email protected] Fones: (81) 99111 7376

Nome do voluntário:

___________________________________________________________________

Introdução

O (a) Sr.(a) está sendo convidado(a) a participar da pesquisa DOJÔ: espaço

de educação. Se decidir participar, é importante que leia estas informações sobre a

pesquisa e o seu papel enquanto participante. Em caso de, posteriormente, o(a)

Sr.(a) decidir retirar a participação, deverá notificar ao pesquisador(a).

Objetivo da pesquisa

O objetivo desta pesquisa, desenvolvida no Núcleo de Teoria e História da

Educação, do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPE, é partir das

narrativas de antigos mestres e investigar a história do Judô na cidade do Recife-PE,

considerando as relações e (re)construções entre o ensino do judô enquanto

formação complementar e a sua relação com a formação educacional padrão

(formal) de seus praticantes.

168

Procedimentos Utilizando a história oral como metodologia, recorreremos à História de Vida

para coleta de dados. Os colaboradores serão professores (senseis) que, através de

pesquisa prévia, tiveram seus nomes selecionados e recomendados para presente

pesquisa. Como fonte, teremos os relatos orais e os registros escritos (artigos, livros,

narrativas e fotografias).

Após a transcrição da entrevista o(a) Sr. (a) receberá uma cópia para

conferência do texto, correções, ajustes e autorização da publicação com identidade

revelada na dissertação.

Declaração de consentimento

Li as informações contidas neste documento antes de assinar este termo.

Confirmo que recebi uma cópia deste formulário de consentimento.

Compreendo que sou livre para retirar a minha participação da pesquisa em

qualquer momento, sem perda de benefícios ou qualquer outra penalidade.

Dou meu consentimento, de livre e espontânea vontade, para participar

deste estudo como voluntário.

Assinatura do (a) voluntário (a). Local e data.

________________________ _____________________________

169

APÊNDICE C – TCLE do professor Byung Kuk Lee

170

APÊNDICE D – TCLE do professor Diógenes Cavalcanti de Moraes

171

APÊNDICE E – TCLE do professor Hayashi Kawamura

172

APÊNDICE F – TCLE do professor Marco Aurélio Lauriano de Oliveira

173

APÊNDICE G – TCLE do professor Tadao Nagai

174

APÊNDICE H – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO

CESSÃO DE DIREITOS DE USO E DIVULGAÇÃO DE ENTREVISTA E IMAGENS

Pelo presente documento, eu ______________________________________,

CPF____________________________ residente na cidade de

__________________________ Estado _______________declaro ceder à Pesquisa

DOJÔ: espaço de educação, sob a responsabilidade do pesquisador: DENIS

FOSTER GONDIM, sem quaisquer restrições quanto aos seus efeitos patrimoniais e

financeiros, a plena propriedade e os direitos autorais do relato de caráter histórico e

documental (quando for o caso), fotografias e acervos doados (recortes de jornal e

documentos) que prestei à referida pesquisa, na cidade de Recife-PE, em

_____/_____/_____.

O pesquisador fica, consequentemente, autorizado a utilizar, publicar e

disponibilizar, para fins acadêmicos, as mencionadas fontes, no todo ou em parte,

com ressalva de, após a transcrição da entrevista, apresentar texto para possíveis

ajustes (que também deverá ser autorizado por escrito) e de sua integridade e

indicação de fonte e autor.

____________________, _______de ______________ de 2017

____________________________________________________

Assinatura

175

APÊNDICE I – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do professor

Byung Kuk Lee

176

APÊNDICE J – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do professor

Diógenes Cavalcanti de Moraes

177

APÊNDICE K – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do professor

Hayashi Kawamura

178

APÊNDICE L – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do professor

Marco Aurélio Lauriano de Oliveira

179

APÊNDICE M – Cessão de Direitos de Uso e Divulgação de Imagens do professor

Tadao Nagai