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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO JOSELITA MARIA SILVA E SILVA A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I CICLO: UM ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS RONDONÓPOLIS-MT 2014

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO

JOSELITA MARIA SILVA E SILVA

A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I

CICLO: UM ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS

RONDONÓPOLIS-MT

2014

1

JOSELITA MARIA SILVA E SILVA

A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I CICLO:

UM ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário de Rondonópolis, linha de pesquisa Linguagens, Cultura e Construção do Conhecimento, como exigência para obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientadora: Profª Drª Cancionila Janzkovski Cardoso

Rondonópolis-MT 2014

2

3

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Rod. Rondonópolis.-Guiratinga, km 06 MT-270 - Campus Universitário de Rondonópolis - Cep:

78735-901 -RONDONÓPOLIS/MT Tel : (66) 3410-4035 - Email : [email protected]

FOLHA DE APROVAÇÃO

TÍTULO : "A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I CICLO: UM

ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS"

AUTOR : Mestranda Joselita Maria Silva e Silva

Dissertação defendida e aprovada em 23/04/2014.

Composição da Banca Examinadora:

_____________________________________________________________________________

____________

Presidente Banca / Orientador Doutor(a) Cancionila Janzkovski Cardoso

Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinador Interno Doutor(a) Silvia de Fátima Pilegi Rodrigues

Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinador Externo Doutor(a) Telma Ferraz Leal

Instituição : Universidade Federal de Pernambuco

Examinador Suplente Doutor(a) Raquel Gonçalves Salgado

Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

RONDONÓPOLIS, 23/04/2014.

4

Para Beto, esposo, amigo e

companheiro de todas as horas e da

vida toda.

Para minha mãe Engrácia e meu pai,

José Rodrigues (in memoriam),

pessoas simples, de grande

sapiência, de quem herdei sonhos e

lutas.

5

AGRADECIMENTOS

Ao Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGEdu, por

oportunizar o conhecimento a tantos professores que, como eu, se preocupam

com o futuro de nossos aprendizes.

À professora Drª Cancionila Janzkovski Cardoso, orientadora no sentido

lato da palavra, que, com seu vasto conhecimento, conduziu-me pelos

caminhos iluminados do saber, tornando possível meu olhar para além das

ideias pré-concebidas sobre a escrita das crianças.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –

CAPES, pelo financiamento da pesquisa, possibilitando minha ida a

congressos e adquirindo, assim, maior conhecimento sobre a Educação em

nosso país.

Às professoras da banca examinadora, Drª Telma Ferraz Leal e Drª

Sílvia Maria Pilegi Rodrigues, pelas valiosas contribuições que trouxeram luz

ao meu objeto de pesquisa.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação, por

partilharem conosco os seus saberes, ensinando-nos a crer ainda mais na

força da educação e nas possibilidades de nossas crianças.

Aos professores, sujeitos da pesquisa, por terem me recebido com

entusiasmo e disposição de trabalho.

Aos alunos, também sujeitos da pesquisa, pelos momentos de alegria e

descoberta junto deles.

À equipe gestora e aos funcionários da Escola Arão Gomes Bezerra, por

permitirem a realização de meu estudo na instituição e disponibilizarem o que

era preciso para sua concretização.

À Anabel Beatriz de Col, secretária do PPGEdu, pela diligência, bom

humor e carinho com que sempre nos tratou.

6

Ao meu esposo Beto, pelo amor, companheirismo, compreensão e

incentivo incondicionais em todos os momentos, não medindo esforços para

que eu alcançasse meus objetivos.

Ao meu filho Kaká, por entender que, por vezes, o afastamento era

necessário para que ficássemos mais unidos.

À Engrácia, minha mãe, por compreender minhas ausências e, como um

anjo, estar sempre orando, fortalecendo, assim, meu ânimo.

Aos meus irmãos Maria José, José Rodrigues, Gilmar e Josimar, aos

sobrinhos, cunhado e cunhadas, pelas vezes que estive ausente, mas

compreenderem que meu coração estava com eles.

À minha sogra Ruth e meus cunhados, Celso, Fátima, Adriana e Joel e

meus sobrinhos, por acreditarem no meu potencial e me incentivarem nesse

estudo.

Aos amigos Aguimar, Célia, Cláudia e Neura, pelo interesse nessa

pesquisa e por estarem sempre atentos aos rumos da educação.

À eterna professora e amiga Maria Margarida Correia Leite, que me

ensinou a sonhar com uma educação melhor e lutar por essa conquista.

Aos meus colegas de mestrado, pelas experiências e sapiências

partilhadas, em especial ao Ezer, Molise, Patrícia e Evandro, que me

ensinaram muito sobre amizade e companheirismo. Com eles dividi momentos

de alegrias e angústias.

A Deus e à Nossa Senhora, por terem sido força nos meus momentos

de fraqueza e luz sobre as trevas da angústia e do desânimo.

A todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para a

concretização deste estudo.

7

EPÍGRAFE

A Sabedoria é resplandecente, não murcha, mostra-se facilmente para aqueles

que a amam. Ela se deixa encontrar por aqueles que a buscam. Ela se

antecipa, revelando-se espontaneamente aos que a desejam. Quem por ela

madruga, não terá grande trabalho, pois a encontrará à porta da sua casa.

Refletir sobre ela é a perfeição da inteligência (SABEDORIA 6, 12-15a).

“A Linguagem em seu ventre me modela”. (JOSÉ GERALDO NOGUEIRA

MOUTINHO)

8

RESUMO

Esta investigação foi desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em educação da Universidade Federal de Mato Grosso, campus de Rondonópolis e no interior do Grupo de Pesquisa ALFALE. Apresenta uma abordagem no ensino do gênero textual fábula por meio de sequências didáticas. Deparar com crianças com problemas de produção textual, durante a docência, motivou a investigação do fenômeno. Da mesma forma, questões como um baixo desempenho em escrita e o motivo de a escola nem sempre dar conta de produzir escritores competentes, futuros cidadãos conscientes e críticos inseridos na sociedade. A dúvida de que se intensificássemos o trabalho com produção textual resultaria num melhor aprendizado surgiu, bem como a de qual procedimento efetivaria essa apropriação. O objetivo geral do estudo é analisar a contribuição das sequências didáticas para a aprendizagem dos gêneros textuais por alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e os específicos são compreender como as sequências didáticas, enquanto instrumento pedagógico, interferem na apropriação dos gêneros textuais pelos alunos; investigar as relações entre as estratégias didáticas por meio das sequências didáticas e os resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos; avaliar os avanços obtidos durante o processo de ensino por meio das sequências didáticas nas produções textuais dos alunos. Bakhtin e outros teóricos que abordam gêneros textuais fundamentam o estudo. As sequências didáticas, nas perspectivas de Dolz, Noverraz e Schneuwly, contribuíram para a apropriação da escrita de textos dos alunos. A metodologia de investigação teve cunho de intervenção, valendo-se de entrevistas com os professores, observação de aulas e planejamento conjunto de sequências didáticas, tendo como foco duas turmas da 3ª fase do I ciclo de uma escola pública totalizando 47 alunos. Destes, foram selecionados 12, conforme critério de avaliação do Sistema de Avaliação do Ensino Municipal (SAEM), dos quais foram analisados os textos. A análise dos dados foi realizada partindo da categoria geral “Adequação ao gênero”, como meio de verificar se os textos se organizavam de forma não adequada, parcial ou completamente adequada à proposta de escrita. Secundariamente, foram estabelecidas as subcategorias: a)intertextualidade na escrita; b)apropriação/consolidação da escrita; c)sinais de pontuação e d)marcas da oralidade na escrita. Os resultados evidenciaram que nas produções iniciais, 2 alunos adequaram suas escritas ao gênero de forma parcial, 7 de forma não adequada e 3 completamente. Foram trabalhadas atividades, em sequências didáticas, que auxiliaram os alunos a melhor compreender os gêneros abordados e, assim, nas produções finais, 2 alunos adequaram seus textos de forma parcial, 4 de forma não adequada e 6 completamente ao gênero fábula. Tais resultados permitem concluir que, se esse ensino for ministrado por intermédio das sequências didáticas, as possibilidades de êxito na apropriação da escrita pelos alunos serão maiores.

Palavras-chave: Gênero textual. Sequência didática. Produção textual.

9

ABSTRACT

This research was developed in the graduate program in education at the

Universidade Federal de Mato Grosso, Rondonópolis campus and inside the

ALFALE research group. Presents an approach in the teaching of textual genre

fable through didactic sequences. Come across children with problems of

textual production, during the teaching, motivated the investigation of the

phenomenon. Similarly, issues like a low performance in writing and the

grounds of the school doesn't always handle produce competent writers, future

citizens aware and critics inserted in society. The doubt that if to intensify work

with textual production would result in a better learning emerged, as well as

which procedure permanent this appropriation. The overall objective of the

study is to assess the contribution of the didactic sequences for learning of

textual genres for students of the early years of elementary school and the

specifics are to understand how the didactic sequences, while pedagogical

instrument, interfere in the appropriation of the text genres by students;

investigate the relationships between the didactic strategies by means of

didactic sequences and results about the textual production capacities of

students; evaluate the progress achieved during the teaching process by means

of didactic sequences in the productions of textual students. Bakhtin and other

textual genres which address theoretical underlying the study. The didactic

sequences, in perspectives of Dolz, Noverraz and Schneuwly, contributed to the

writing of texts ownership of students. The research methodology had

intervention slant, using interviews with teachers, classroom observation and

planning set of didactic sequences, focusing on two classes of phase 3 of the

first cycle of a total of 47 public school students. Of these, 12 were selected as

evaluation criterion of Municipal Education Assessment System (LEAVE), of

which the texts were analyzed. Data analysis was performed taking into account

the General category "Fitness to the genre", as a means of checking whether

the texts if not appropriate, organised partly or completely suited to the written

proposal. Secondarily, were established subcategories: the Intertextuality in

writing); b) ownership/consolidation of writing; c) punctuation marks and d)

brands of orality in written. The results showed that the initial productions, 2

students have addressed his writings to the genre of partial form, 7 non-suited

and 3 completely. Were worked in didactic sequences activities, which helped

students better understand the genres covered and thus the final productions, 2

students have adapted their texts partially, 4 non-suitable and 6 completely to

the fable genre. These results allow to conclude that if that teaching is taught

through didactic sequences, the possibilities of success in the appropriation of

writing by students will be bigger.

Keywords: Textual Genre. Instructional sequence. Textual production.

10

LISTA DE QUADROS

Quadro 1– Funções desempenhadas na escola e quantidade de agentes por cargo (2013) 32

Quadro 2 – Distribuição das turmas por modalidades e turnos (2013) 32

Quadro 3 – Caracterização dos professores sujeitos da pesquisa 33

Quadro 4 – Perfil dos alunos conforme avaliação SAEM inicial (2013) 35

Quadro 5 – Classificação dos alunos conforme avaliação SAEM (2013) 36

Quadro 6 – Encontros de estudos sobre gêneros textuais com os professores 37

Quadro 7 – Demonstrativo das aulas observadas 38

Quadro 8 – Demonstrativo das aulas observadas após a apresentação do gênero Fábula 40 Quadro 9- Volume de produções encontradas em teses e dissertações da

CAPES 55 Quadro 10 – Produções de teses e dissertações com os descritores “gêneros

textuais” e “sequência didática” 55 Quadro 11 – Produções de dissertações com o descritor “gêneros textuais” 56 Quadro 12 – Produções de dissertações com os descritores “gêneros textuais”

e “sequência didática” 56 Quadro 13 – Volume de teses com o descritor “gêneros textuais” 57 Quadro 14 – Volume de teses com os descritores “gêneros textuais” e

“sequência didática” 58 Quadro 15 – Artigos encontrados e seus respectivos periódicos 58 Quadro 16 – Volume de teses e dissertações publicadas pela CAPES e artigos

em periódicos 60 Quadro 17 – Síntese das atividades da sequência didática 113 Quadro 18 – Comparativo da apropriação do gênero textual fábula – produção

inicial 168 Quadro 19 – Comparativo da apropriação do gênero textual fábula – produção

final 169 Quadro 20 – Síntese da apropriação do gênero fábula 170

11

LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Esquema da sequência didática 63 Figura 2 – Fábula com atividade de consolidação e interpretação 115 Figura 3 – Produção inicial da fábula de William – turma A 131

Figura 4 – Produção final da fábula de William 132

Figura 5 – Produção inicial da fábula de Tiago – turma B 134

Figura 6 – Produção final da fábula de Tiago 136

Figura 7 – Produção inicial da fábula de Myla – turma A 138

Figura 8 – Produção final da fábula de Myla 139

Figura 9 – Produção inicial da fábula de Caterina – turma B 141

Figura 10 – Produção final da fábula de Caterina 142

Figura 11 – Produção inicial da fábula de Jonathan – turma A 143

Figura 12 – Produção final da fábula de Jonathan 144

Figura 13 – Produção inicial da fábula de Marcos – turma B 145

Figura 14 – Produção final da fábula de Marcos 145

Figura 15 – Produção inicial da fábula de Juliana – turma A 147

Figura 16 – Produção final da fábula de Juliana 148

Figura 17 – Produção inicial da fábula de Manuelle – turma A 150

Figura 18 – Produção final da fábula de Manuelle 152

Figura 19 – Produção inicial da fábula de Juliano – turma B 154

Figura 20 – Produção final da fábula de Juliano 155

Figura 21 – Produção inicial da fábula de Ricardo – turma A 158

Figura 22 – Produção final da fábula de Ricardo 160

Figura 23 – Produção inicial da fábula de Alícia– turma B 161

Figura 24 – Produção final da fábula de Alícia 164

Figura 25 – Produção inicial da fábula de Tânia – turma B 165

Figura 26 – Produção final da fábula de Tânia 167

12

LISTA DE SIGLAS

A Acompanha

AB Acompanha Bem

AEE Atendimento Educacional Especializado

C Crítico

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CODER Companhia de Desenvolvimento de Rondonópolis

EJA Educação de Jovens e Adultos

GESTAR Programa Gestão da Aprendizagem Escolar

HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira

IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

MC Muito Crítico

MEC Ministério da Educação

MSN Microsoft Service Network (Rede de Serviços da Microsoft)

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PNAIC Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa

PNLD Programa Nacional do Livro Didático

PPP Projeto Político Pedagógico

PSF Posto de Saúde da Família

RBEP Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos

SAEM Sistema de Avaliação do Ensino Municipal

SciELO Scientific Electronic Library Online

SEA Sistema de Escrita Alfabética

SEMED Secretaria Municipal de Educação

13

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................... 14 2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ............................................ 22

2.1 Objetivos ........................................................................................................ 22

2.2 Pesquisa Qualitativa ...................................................................................... 27

2.3 Locus da pesquisa ......................................................................................... 30

2.4 Quem são os sujeitos da pesquisa ............................................................... 33

2.5 Procedimentos e instrumentos da coleta de dados .................................... 36

2.6 A escolha dos gêneros textuais estudados .................................................. 40

3 MAPEAMENTO DAS PRODUÇÕES NACIONAIS EM GÊNEROS TEXTUAIS E SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS....................................................................................45

3.1 O ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas: pesquisa feita no decênio 2002-2011.........................................................................................46

3.2 A elaboração do estado do conhecimento ................................................... 53

3.3 A abordagem dos temas gêneros textuais e sequências didáticas nos periódicos e banco de teses e dissertações da CAPES .................................... 54

4 PONDERAÇÕES SOBRE OS GÊNEROS DISCURSIVOS E AS

SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS .............................................................................. ....62

4.1 Os gêneros do discurso nas perspectivas de Bakhtin e outros autores................................................. ...................................................................64

4.2 A sequência didática na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly ........ 74

4.3 Como o professor utiliza os gêneros textuais nas aulas............................. 87

5 A PRODUÇÃO DE TEXTOS RELACIONADA AOS GÊNEROS DO

DISCURSO ....................................................................................................93

5.1 A transposição da fala para a escrita ........................................................... 94

5.2 A relevância dos gêneros discursivos nas produções textuais ................... 99

6 AS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS................................................................... .....107

6.1 OS módulos da sequência didática ............................................................. 107

6.2 AS produções iniciais dos alunos ................................................................ 108

6.3 AS produções finais dos alunos ................................................................... 121

7 AS PRODUÇÕES DOS ALUNOS NO GÊNERO FÁBULA..............................126

7.1 Intertextualidade na escrita ......................................................................... 129

7.2 Apropriação/consolidação da escrita ....................................................... 1377

7.3 Sinais de pontuação................................................................................ 14949

7.4 Marcas da oralidade na escrita ................................................................ 1611

CONSIDERAÇÕES..............................................................................................173

3

14

REFERÊNCIAS....................................................................................................178

8

ANEXOS....................................................................... ........................................185

5

1 INTRODUÇÃO

O estudo da gênese e do uso dos signos pela criança mostra claramente como a fala predomina e modela a vida interior, influenciando toda a dimensão simbólica do ser humano. Portanto, a aprendizagem da escrita se faz relacionando-se com a fala.

Cancionila Janzkovski Cardoso

Como educadora, notei que alguns alunos, embora já alfabetizados,

sentem certa resistência em realizar uma atividade de produção escrita. Essa

resistência pode ser oriunda de vários fatores como, por exemplo, o receio de

errar, ocasionado por cobranças; o não entendimento de um comando dado

pelo professor, ou mesmo a solicitação de uma produção que esteja distante

da realidade do aluno. Conforme Cagliari (2009, p. 29),

O ensino de língua portuguesa na alfabetização difere dos de outros anos não pelo objetivo em si, que deve ser o mesmo para todos os anos, mas pela especificidade desse primeiro momento, devido ao grau de desconhecimento que o aluno tem da escrita e da leitura. [...] Há tantas coisas a respeito de escrita e leitura, e de dificuldades tão variadas, que se torna conveniente o seu ensino ao longo de todos os anos de estudo.

Essas dificuldades são demonstradas à medida que alguns alunos

escrevem textos sem uma sequência lógica dos fatos narrados, com ausência

de coesão, coerência ou mesmo unidade temática, embora estudos

comprovem que os alunos vêm escrevendo com maior propriedade, graças à

mediação de professores que, segundo Leal e Melo (2007, p. 20),

compreendem que “[...] é indiscutível que os produtores de texto não se

formam apenas através do contato com materiais escritos [...], mas também

com a leitura de diferentes textos [...]” e, sugerem, ainda, as autoras, que “[...]

para ensinar a escrever textos, devemos proporcionar aos alunos situações de

15

escrita semelhantes àquelas de que participamos fora da escola [...]”. Atitudes

didáticas como essas evitariam ou amenizariam tais dificuldades.

Minha experiência com criança fez-me notar que, na modalidade oral, os

pequenos geralmente mostram aptidão para narrativas. Na sala de aula, não é

difícil criarem ou darem continuidade às histórias começadas pelo professor,

numa atividade oral, ou contar algo sobre seus cotidianos, sobre livros que

leram, situações vividas por eles ou por amigos, estando junto aos colegas, na

escola ou com familiares. Todavia, no momento da escrita, algo parece impedi-

los de avançar.

Surgiram, então, inquietações que me motivaram a investigar o

fenômeno da produção de textos, dentre elas o fracasso escolar presentificado

no baixo desempenho da produção escrita por parte de alguns de nossos

alunos; a escola nem sempre tem dado conta de formar escritores críticos e

competentes, capazes de atuarem numa sociedade letrada como a nossa; se o

trabalho com a escrita de textos fosse intensificado efetivaria a aprendizagem e

como isso poderia ser realizado?

Assim, questões como essas, correlacionadas à escrita, levaram-me a

realizar esta investigação, com a qual tenciono avançar nos conhecimentos

relativos ao ensinar/aprender a língua materna nos anos iniciais do Ensino

Fundamental de Nove Anos.

O trabalho objetiva expor uma pesquisa de produção textual realizada

com crianças da 3ª fase do I Ciclo de uma escola pública, com base nos

gêneros discursivos e enunciados, numa perspectiva bakhtiniana. A proposta

de Dolz, Noverraz e Schneuwly de sequências didáticas, também embasam o

estudo, pois a experiência de trabalhar com alunos desta fase escolar trouxe a

constatação de que muitos deles sentem dificuldades em realizar atividades de

produção de textos.

No Brasil, a partir dos PCNs (1997), os gêneros textuais têm sido, em

grande parte, fundamentadores do ensino-aprendizagem da produção textual

que figuram nas instituições de ensino, bem como têm merecido rodas de

discussões em encontros de educação. Assim, minha inquietação como

professora que se depara com crianças com dificuldade em produzir textos

coesos e coerentes, fez surgir o desejo de conhecer de perto essas formas de

resistência à produção escrita.

16

O capítulo 2 da dissertação vai tratar de aspectos metodológicos da

pesquisa, explicitando como o ensino de produção textual, fundamentado em

sequências didáticas, pode influenciar na apropriação dos gêneros textuais

pelos alunos desta escola pública como problema de pesquisa.

Diante do exposto, a pesquisa tenciona, de uma forma mais ampla,

analisar a contribuição das sequências didáticas para o aprendizado dos

gêneros pelos alunos da 3ª fase do 1º Ciclo e, como objetivos específicos,

Analisar aulas organizadas em sequência didática com foco em fábulas, para

identificar quais conhecimentos foram mobilizados e os modos como os

professores medeiam as atividades. Também investigar as relações entre as

estratégias didáticas aplicadas com intervenção das sequências didáticas e os

resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos e, por fim,

avaliar os avanços em produção de fábulas por alunos participantes da

sequência didática.

Essa pesquisa é qualitativa, pois, segundo Lüdke e André (1986), nela o

pesquisador preocupa-se tanto com o produto da pesquisa quanto com o

processo observado, interessando-lhe a interpretação dos fenômenos e os

fatos observados. O principal método de investigação foi a observação

participativa, que me possibilitou um contato mais estreito com o fenômeno

investigado.

Os registros da observação foram feitos por meio de protocolos que,

ainda de acordo com Lüdke e André (1986), é a forma mais utilizada nos

estudos de observação.

O locus da pesquisa foi a Escola Municipal de Ensino Fundamental Arão

Gomes Bezerra, situada num bairro periférico de Rondonópolis-MT.

Os sujeitos da pesquisa foram os dois professores das duas turmas da

3ª fase do 1º Ciclo, além dos alunos dessas duas turmas, dois quais foram

selecionados doze, seis de cada sala, para serem acompanhados mais de

perto seus processos de aprendizagem do gênero fábula. Esses alunos foram

classificados pelos professores, mediante critérios de avaliação do Sistema de

Avaliação do Ensino Municipal (SAEM), como A (Acompanha), AB (Acompanha

Bem) e C (Crítico). Portanto, foram analisadas as produções iniciais e finais de

dois alunos A, dois AB e dois C de cada turma. Os estudantes têm idade entre

8 e 9 anos. Em ambas as salas foram 220 horas de observação.

17

Depois das entrevistas com os professores sujeitos da pesquisa, eles

expuseram o desejo de trabalhar com a fábula.

Para compor o capítulo 3, pesquisei em sites como o Banco de Teses e

Dissertações da CAPES, no período de 2002 a 2011, Cadernos Cedes,

Cadernos de Pesquisas da Fundação Carlos Chagas e nas revistas: Revista

Brasileira de Educação, INEP e Educação e Sociedade, no decênio de 2003 a

2012, trabalhos publicados na área de Educação, Letras e Linguística, usando

os descritores “gênero textual” e “gênero textual e sequência didática”,

buscando teses, dissertações, artigos e periódicos que me indicassem o norte

para minha própria pesquisa.

Foram coletados trinta e um trabalhos entre teses, dissertações e artigos

de periódicos, dentre os quais destaco alguns, como a tese de Alessandra

Marques da Cunha, de 2010, “Produção textual: o que dizem e escrevem

educandos do 3ª ano sobre o gênero fábula”, cujo objetivo foi verificar e

analisar o que escreviam e diziam as crianças do 3º ano sobre a fábula e os

conhecimentos adquiridos na oralidade e na escrita depois das mediações e

diálogos entre eles, a professora e a pesquisadora.

Stella de Lourdes Garcia escreveu a tese “Os gêneros do discurso e a

prática da produção textual: dialogando sobre os conhecimentos necessários

aos educadores dos anos iniciais do Ensino Fundamental”. A pesquisa

realizada em 2010 foi durante um curso de formação continuada para

professores e estudantes de uma escola de São Carlos-SP e a autora acredita

que as reflexões proporcionadas na formação colaboraram para que houvesse

uma alteração no fazer pedagógico das educadoras envolvidas. O trabalho

com sequência didática foi importante tanto para os professores quanto para os

alunos.

Os trabalhos coletados restringiram-se à 3ª fase do 1º ciclo, fase na qual

minha pesquisa foi desenvolvida. O estado do conhecimento trouxe maior

clareza sobre meu objeto de pesquisa. As teses, dissertações e artigos me

mostraram um caminho a percorrer e, com esse estudo, pude constatar a

relevância dos gêneros textuais para a aprendizagem.

Pude notar, também, que o tema gêneros textuais vem sendo bastante

difundido no meio educacional, entretanto, segundo Marcuschi (2008, p. 147),

18

O estudo de gêneros textuais não é novo e, no Ocidente, já tem pelo menos vinte e cinco séculos, se considerarmos que sua observação sistemática iniciou-se com Platão. O que hoje se tem é uma nova visão do mesmo tema. Seria gritante ingenuidade histórica imaginar que foi nos últimos decênios do século XX que se descobriu e iniciou o estudo dos gêneros textuais. Portanto, uma dificuldade natural no tratamento desse tema acha-se na abundância e diversidade das fontes e perspectivas de análise.

Então, o tema justifica a realização de minha investigação, embora já

tenha sido tratado em várias outras pesquisas e continuará sendo abordado em

muitas mais. Estudos e pesquisas envolvendo gêneros textuais, sempre serão

bem vindos e o tema continuará sendo amplamente explorado, dado ao que

postula Bakhtin (2010, p. 262) sobre a riqueza e a diversidade dos gêneros

discursivos serem infinitas pelo fato de serem inesgotáveis as possibilidades da

multiforme atividade humana,

O capítulo 4 discute os gêneros textuais discursivos na visão de Bakhtin

e as sequências didáticas na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly e

demais autores que abordam esses temas.

Para Bakhtin (2011), o uso da língua acontece por meio de enunciados

orais e escritos e que as ações sócio-comunicativas determinam esses

enunciados, o que equivale a dizer que a linguagem é constituída na interação

verbal de sujeitos com o fenômeno social.

Os gêneros do discurso são primários e secundários, ou simples e

complexos (BAKHTIN, 2011, p. 263), sendo os primários tipos de diálogos

orais, que estão presentes nas conversas se salão, em círculos de amigos ou

entre familiares. Já os secundários ou complexos são os literários, os

científicos e os publicísticos. São predominantemente escritos. Contudo, um

gênero primário pode compor um secundário, como uma receita de bolo

fazendo parte de um romance.

Para Marcuschi (2010), os gêneros textuais são eventos maleáveis,

dinâmicos e plásticos, pois surgem à medida que as necessidades e atividades

socioculturais do homem exigem. Também são fenômenos históricos, por

estarem vinculados à vida cultural e social das pessoas, o que pode ser

observado, se compararmos a quantidade de gêneros que temos hoje às

sociedades de antes do surgimento da comunicação escrita.

19

Se os gêneros textuais se fundamentam na teoria bakhtiniana, seu

ensino, nesse estudo, se dá por meio das sequências didáticas, numa

perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), que apontam que uma

sequência didática é um conjunto de atividades escolares organizadas

sistematicamente em torno de um gênero textual, seja ele oral ou escrito, com

a intenção de ajudar ao aluno a dominá-lo, possibilitando, assim, que ele fale

ou escreva de maneira mais adequada.

De acordo com os autores, o esquema da sequência didática é formado

pela apresentação da situação, a produção inicial e os módulos, finalizando

com a produção final. A sequência didática tem movimento do complexo para

o simples, pois começa com a apresentação da situação, quando o professor

apresenta aos alunos o gênero que será trabalhado, passando pelos módulos e

voltando ao complexo com a produção final, na qual serão avaliados os

avanços obtidos pelos alunos.

Para produzir um texto precisamos ter em mente um interlocutor.

Cardoso (2008) ressalta que é preciso simular uma situação, prever um

destinatário e os efeitos que o texto terá sobre ele. Para tanto, é necessário

fazer uso dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e que já foram

apropriados pelo aluno.

No capítulo 5 é evidenciada a transposição da fala para a escrita,

processo no qual as crianças associam o som das palavras e tiram suas

próprias conclusões a respeito da escrita. Quanto a isso, Cardoso (2000)

afirma que o momento da transição da fala para a escrita é quando a criança

tem uma visão difusa sobre o objeto escrito e, por isso, características da

oralidade são comuns em seus textos.

Tal ensino tem importante função sociocognitiva, se entendida como um

facilitador da ação comunicativa, segundo Marcuschi (2008). Todavia,

diferentes tipos de textos requerem diferentes tipos de conhecimentos e

diferentes habilidades, como também deve ser diferente o ensino de produção

textual e de leitura para todos os gêneros estudados (SANTOS, 2007).

Para Beth Marcuschi (2007), é papel da escola a transposição do gênero

textual, transformando os saberes elaborados pela sociedade em ferramentas

de ensino. E o ensino da produção textual por meio dos gêneros do discurso

20

tem influência sobre esse aprendizado. Desta forma, os gêneros textuais são

de grande importância para a apropriação da escrita.

O capítulo 6 traz que, depois de definido o gênero a ser trabalhado nas

duas salas, foram lidas algumas fábulas para as crianças. Após a leitura, os

professores explicaram o que era o gênero que, segundo Coelho (2000), trata-

se de uma narrativa com a presença de animais em situações humanas e que

transmitem um ensinamento.

Assim, depois dessa apresentação da situação, os professores deram o

comando para que seus alunos fizessem a produção inicial da fábula.

As primeiras produções no gênero fábula foram avaliações diagnósticas

que serviram para nós, professores e pesquisadora, observarmos os

conhecimentos do gênero adquiridos pelas crianças. O resultado dessa

avaliação deu o norte para o planejamento e aplicação das atividades que

vieram a sanar os problemas surgidos. As aulas eram planejadas por mim e

pelos professores, sendo, posteriormente, aplicadas por eles.

Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), a produção inicial regula a

sequência didática tanto para os alunos quanto para os professores, pois ela

definirá o que é preciso trabalhar para desenvolver as capacidades de

linguagem dos alunos.

De acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), “nos módulos, trata-

se de trabalhar os problemas que apareceram na 1ª produção e de dar aos

alunos os instrumentos necessários pra superá-los”.

Assim, nessas primeiras produções surgiram problemas como animais

de estimação, em lugar de personificados, falta de moral da história ou moral

não condizente com o texto, falta de pontuação e marcas da oralidade nas

escritas.

Após os módulos de atividades, que tiveram a duração de 14 aulas de

Língua Portuguesa e incluíram leituras e interpretações de fábulas; pesquisas

em dicionários das palavras da fábula, cujo significado os alunos

desconheciam; reestruturações textuais e produções coletivas de textos no

gênero, houve a produção final.

É na produção final que os alunos apresentam os elementos trabalhados

em aula e que servem de critérios de avaliação. Assim, foi proposto aos

21

pequenos que criassem uma fábula ou fizessem um reconto. A maioria preferiu

a primeira opção.

Vários autores defendem a importância de um trabalho pedagógico por

meio de sequências didáticas. Alguns deles, como Barros-Mendes, Cunha e

Teles (2012) afirmam que uma das vantagens é o de minimizar o déficit de

aprendizagem no ensino da língua; e Marcuschi (2008) que ressalta que o

caráter modular da sequência didática contribui para a compreensão dos

gêneros, podendo ser aplicado a todas as séries do Ensino Fundamental.

No capítulo 7 são analisadas as produções iniciais e finais dos alunos no

gênero fábula. Utilizo como categoria de análise o texto em seu conjunto,

quanto sua adequação ao gênero, considerando o conteúdo temático, o estilo e

a construção composicional, as três dimensões do gênero discursivo, a fim de

verificar os textos que se caracterizaram como fábulas. Além do olhar global,

os textos também são observados em subcategorias como intertextualidade;

apropriação/consolidação da escrita; sinais de pontuação e marcas da

oralidade na escrita.

22

2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

Serão evidenciados aqui os caminhos percorridos para a realização da

pesquisa, que é qualitativa e para a qual utilizei como técnica a observação

participativa na coleta dos dados. As atividades observadas foram planejadas

em conjunto por mim e pelos professores e aplicadas por eles.

O estudo, que iniciou com a observação das práticas de ensino dos

professores sujeitos da pesquisa, trouxe a preocupação de me fazer aceita por

eles. Assim, antes mesmo da observação participativa, os objetivos do estudo

foram revelados a eles, a fim de obter as informações que fossem necessárias

para a pesquisa.

Apresentarei, também, os objetivos (geral e específicos) que busquei

alcançar com a investigação, assim como o locus da pesquisa, a escola Arão

Gomes Bezerra, localizada na periferia de Rondonópolis, que atendia às

crianças desde a Educação Infantil até aos alunos do 9º ano e da Educação de

Jovens e Adultos (EJA) e os sujeitos envolvidos na referida pesquisa.

Os textos produzidos pelos alunos no gênero fábula foram instrumentos

de coleta de dados. As entrevistas semiestruturadas com os professores

demonstraram o desejo de que o gênero trabalhado fosse a fábula e,

antecedendo a observação participativa, ocorreram seções de estudo sobre

gêneros textuais sob as perspectivas de alguns autores que discorrem sobre o

assunto, como Leal e Melo (2007); Koch e Elias (2010); Marcuschi (2010).

2.1 Objetivos

Iniciei minha docência no ano de 2007, na mesma escola em que efetuei

a pesquisa e no mesmo ano em que conclui a formação em Letras. Atuei,

primeiramente, com alunos do 1º e 2º segmentos da Educação de Jovens e

Adultos (EJA), para em seguida, trabalhar com alunos da 1ª fase do 1ºciclo,

23

pois a Secretaria Municipal de Educação (SEMED) permitia que professores

graduados em Letras lecionassem para crianças até a 3ª fase do I ciclo. Algum

tempo depois, a SEMED decidiu que apenas professores pedagogos poderiam

trabalhar com os anos iniciais do Ensino Fundamental. Assim, no ano de 2011

fiz uma complementação em Pedagogia por intermédio de uma faculdade de

Brasília- DF, que me habilitou para lecionar para crianças, desde a Educação

Infantil, uma vez que já possuo especialização nessa área, certificada pela

Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Ao longo de minha docência, percebi a resistência, por parte de alguns

alunos, em produzir textos. E, quando o faziam, eram produções desprovidas

de coesão, coerência ou unidade temática. Assim, como estudos vêm

discutindo a sequência didática para que a criança se aproprie da escrita, optei

por pesquisar como se dá esse aprendizado.

Foi notado, também, que essas crianças, na modalidade oral, são

bastante capazes. Então, o que lhes falta para serem bons escritores?

Intensificar o trabalho de produção de textos? Seria uma possibilidade, afinal,

as crianças necessitam de contato constante com a escrita. Porém, se isso for

feito sem um planejamento que efetive a apropriação de tal instrumento, a

mediação do professor e atividades adequadas às necessidades do grupo,

dificilmente ela ocorrerá e, como numa via de mão dupla, incorrer-se-á na

possibilidade de fazer com que alguns alunos abominem a escrita de textos,

pois a correção gramatical faz com que a criança tenha seu fluxo de

pensamento interrompido para pensar em como se escreve determinada

palavra. E, como nos assegura Cardoso (2008, p. 128),

O texto escolar se configura assim, mais do que nunca, como cumprimento de tarefa. Enquanto tal, quanto mais rápido o aluno puder resolvê-la, melhor será. Para tanto, valem: a definição dos temas, as sugestões de começo, as perguntas, o roteiro. Mesmo que reste a sensação de que a escrita já estava lá, “já vem pronta”, um real problema é colocado, pois esta escrita não possui, a rigor, um objetivo de comunicação. (grifos meus)

Embora o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) subsidie o

trabalho pedagógico dos professores distribuindo livros didáticos aos alunos da

educação básica, permitindo que os professores escolham as coleções,

previamente analisadas e aprovadas pelo Ministério da Educação (MEC),

24

alguns professores se apegam ao livro didático como sendo prescritivo, não

percebendo que alguns, dentre esses, podem trazer sugestões de produção

textual com um roteiro completo a ser seguido, inclusive com a proposta de

título, para que a criança “desenvolva” o texto a partir destes itens, como se

isso facilitasse a atividade de escrita. Evidentemente, a criança desenvolverá

um raciocínio, porém não usará de todo a sua capacidade intelectual de criar

histórias.

Um complicador é a exigência de uma letra primorosa e atenção aos

“erros” relacionados à sintaxe, gramática e outros que não colaboram para um

texto coerente e de fácil entendimento pelo interlocutor. Portanto, a professora

é o destinatário do texto. O aluno escreve para ela corrigir um texto que já vem

com encaminhamentos, fazendo com que ele tenha sua criatividade

prejudicada. Sem contar que, se a escrita não tem outro interlocutor (abordarei

o assunto mais adiante), senão a professora, essa produção falhará na sua

intenção comunicacional.

Produzir textos na escola é algo deveras laborioso, tanto por parte da

professora, que se esforça por ensinar, quanto do aluno que, por vezes, não

consegue encontrar sentido nessa atividade. O exemplo do aluno Guilherme,

do livro de literatura de Christiane Gribel (1999), “Minhas férias, pula uma linha,

parágrafo”, que deveria escrever uma redação sobre as férias, porém não via

sentido em colocar tantas diversões em poucas linhas e diminuto espaço de

tempo, mostra-nos que muitas crianças sentem-se dessa maneira quando

precisam cumprir a tarefa de produzir texto para a escola. O fato de ter a

professora como destinatário da produção deixa o estudante receoso de

“errar”, pois quem ensina, por seu turno, olhará a escrita com olhos de

correção, o que dificulta ainda mais o processo produtivo, uma vez que o aluno

precisa estar atento à gramática e à ortografia perdendo, assim, o fio condutor

dos pensamentos criativos. Assim, “A via de mão única para a produção infantil

em termos de destinatário, pode gerar inseguranças [...]”, como nos aponta

Cardoso (2008, p. 50).

Acerca dessas dificuldades, Albuquerque e Leal (2007, p. 100) salientam

que

25

Se, fora da escola, nós éramos e somos “produtores de textos”, na escola, éramos produtores de “redação”. Escrevíamos um texto específico, para um locutor também específico: o professor; com o objetivo preciso: aprender a escrever. E essa aprendizagem, para muitos de nós, deixou “traumas”, uma vez que nossa escrita estava sempre sendo avaliada como “boa” ou “ruim”, “certa” ou “errada”.

Marcuschi (2001, p. 38) reitera sobre os textos que se constituem como

domínios mistos, como uma aula expositiva, composta por partes em que a

professora lê o que preparou para os alunos e tece comentários a respeito do

assunto e, em outra parte, ela expõe algo sem um texto escrito previamente

como base, porém, pensamos numa aula como um evento oral.

Portanto, oralidade e escrita são parte de um mesmo sistema da língua.

E, assim, para Cardoso (2000, p.135), a linguagem escrita envolve um

movimento determinado pelas experiências da criança em registrar sua fala,

sendo importantes neste processo, os interlocutores e as condições de

produção, de maneira que tal processo de produção textual não termina

quando o produto parece acabado.

Neste contexto, Cardoso (2002, p. 177) aponta que a apropriação de

mecanismos de controle global da produção textual tem ligação com a

apropriação de técnicas e meios de linguagem diferenciados, que marcam as

ideias como encadeamento, continuidade, dependência e ruptura, como,

igualmente, marcam a posição do locutor do enunciado no texto.

Cagliari (2009, p. 86) relata a imposição de moldes que impossibilitam os

pequenos de experimentarem, tentarem e descobrirem, limitados a tarefas de

copiar vários traçados, num exercício de treinamento manual que não faz

sentido para eles. Segundo o teórico (2009, p. 86), “A escola é talvez o único

lugar onde se escreve muitas vezes sem motivo... Certas atividades da escola

representam um puro exercício de escrever”.

Então, Soares (2011, p. 108) diz que: “[...] os ‘textos’ não são mais que

uma lista de orações justapostas, sem elementos de coesão que

estabelecessem a continuidade do discurso”. Vejamos o texto exemplificado no

livro de Soares (2011, p. 108):

Hércules é um homem forte. O herói levanta a barra de ferro. Hoje Hércules vai levar Helena ao circo.

26

Helena é uma noiva habilidosa.

Assim, é natural que as crianças escrevam baseadas nestes modelos,

sem um encadeamento de ideias, sem coerência. Então, por ver este tipo de

escrita, comum nas produções de muitos alunos, é que me veio o desejo de

buscar entender o que acontece em grande parte dos textos de nossos

estudantes.

O PNLD, recriado a partir de 19961, vem distribuindo materiais que vão

para as escolas colaborar para a apropriação da escrita. De acordo com

Bunzem (2007, p. 43) o PNLD contribui para que textos autênticos em gêneros

textuais diversos estejam presentes nos livros de Língua Portuguesa, pois um

dos itens avaliados é a qualidade do material textual considerando quatro

principais aspectos:

a) diversidade de gêneros, de contextos sociais de uso (imprensa, literatura, ciência), de suportes, de registros e dialetos, etc; b) as temáticas e sua abordagem; c) os autores e sua diversidade e representatividade e d) aspectos da textualidade (fidelidade ao suporte, extensão, indicação de cortes nos textos fragmentados, etc.). (grifos do autor)

Desta forma, os livros didáticos têm chegado às mãos dos alunos com

material textual selecionado.

Para que o gênero textual abordado no livro didático, ou fora dele, seja

compreendido pelo aluno, a mediação do professor é fundamental, pois,

segundo Mendonça (2008, p.16),

[...] é preciso pensar em orientações claras sobre as condições de produção e circulação dos gêneros: qual a razão para elaborar o texto, qual o gênero, quem é o interlocutor, em que suporte será vinculado, etc. A partir daí, promover oportunidades para as etapas de planejamento, produção, revisão e reescrita/refacção.

A autora (2008, p.16) reitera que “quanto maior for nossa familiaridade

com um determinado gênero textual, melhor será nossa produção, seja ela oral

1 O Programa Nacional de Livro Didático existe desde 1929, com outra abrangência e outras

nomenclaturas (Instituto Nacional do Livro -INL; Programa Nacional do Livro para o Ensino Fundamental- PLIDEF). Em 1996 é reformulado, recebendo rigorosa avaliação por parte do

Ministério da Educação.

27

ou escrita”. E um coadjuvante no ensino do gênero abordado pelo professor é a

sequência didática.

Quanto às sequências didáticas, essas, segundo Dolz, Noverraz e

Schneuwly (2004, p. 97-98), têm a finalidade de auxiliar o estudante a melhor

dominar determinados gêneros textuais, o que poderá vir a melhorar sua

expressão tanto oral quanto escrita, de acordo com a situação de comunicação

que ele se veja envolvido. Portanto, elas servem para dar acesso às práticas

de linguagens novas ou de difícil domínio por parte dos alunos. Acreditando no

potencial das sequências didáticas e visualizando os problemas enfrentados

pelos discentes no processo de aquisição da escrita, o problema da pesquisa

pode ser assim enunciado: como o ensino de produção textual, baseado em

sequências didáticas, influencia na apropriação dos gêneros textuais por

alunos de 3ª fase do 1º ciclo de uma escola pública?

Desta forma, o objetivo geral desta pesquisa consiste em analisar a

contribuição das sequências didáticas para a aprendizagem de gêneros

textuais por alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e os específicos

são analisar aulas com foco em fábulas e organizadas em sequência didática,

identificando quais conhecimentos foram mobilizadas e os modos como os

professores medeiam as atividades; investigar as relações entre as estratégias

didáticas aplicadas por meio das sequências didáticas e os resultados sobre as

capacidades de produção textual dos alunos; avaliar os avanços em produção

de fábulas pelos alunos participantes da sequência didática.

2.2 Pesquisa Qualitativa

A pesquisa caracteriza-se como qualitativa, na qual, segundo a

perspectiva de Lüdke e André (1986), o pesquisador preocupa-se tanto com o

produto da pesquisa como com o processo observado. Interessa-lhe a

interpretação dos fenômenos e os fatos observados.

De acordo com Flick (2004, p. 272), os métodos quantitativos são

“apenas ‘atalhos’ econômicos de pesquisa do processo de geração de dados”.

Salienta ainda o autor (2004, p.273) que

[...] os métodos qualitativos podem viver muito bem sem o posterior emprego de métodos quantitativos; já os

28

métodos quantitativos precisam dos métodos qualitativos para explicar as relações encontradas.

O fenômeno pesquisado foi a apropriação da escrita pelas crianças, que

ocorreu por meio dos textos produzidos por elas abordando o gênero fábula. O

método de pesquisa utilizado foi a observação participativa, que proporcionou

maior clareza sobre o objeto investigado e possibilitou um contato mais estreito

da pesquisadora com o fenômeno investigado. Com relação a este tipo de

observação, Lüdke e André (1986, p. 29) asseveram que “o ‘observador como

participante’ é um papel em que a identidade do pesquisador e os objetivos do

estudo são revelados ao grupo pesquisado desde o início”. Assim, o

pesquisador pode ter acesso a informações, com a cooperação do grupo,

tendo a consciência de que esse grupo controlará o que deve ou não se tornar

público pela pesquisa.

Meu papel na escola foi o da observação participante, pois, além de

observar as práticas de ensino dos professores sujeitos da pesquisa,

planejamos juntos as atividades por eles aplicadas. Assim, em conformidade

com Lüdke e André (1986, p. 17 e 28), desde os primeiros contatos com os

participantes da pesquisa, o pesquisador deve se preocupar em ser aceito pelo

grupo, a fim de que ele consiga obter as informações que julgar necessárias. A

estratégia da observação participante, além de envolver a observação direta do

conjunto de técnicas metodológicas, subentende envolvimento do pesquisador

com a situação estudada.

De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 47-51), são necessários cinco

passos para se desenvolver uma pesquisa qualitativa;

1- a fonte direta de dados é o ambiente natural,

constituindo o investigador o instrumento principal; 2- é de natureza descritiva [...], os dados recolhidos são em forma de palavras e imagens e não de números; 3- o interesse está mais no processo do que simplesmente nos resultados ou produtos; 4- os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva; não se recolhem dados ou provas com objetivo de confirmar hipóteses construídas à medida que os dados particulares, que foram recolhidos, vão se agrupando; 5- o significado é de importância vital na obra qualitativa.

Esta modalidade de pesquisa permite o envolvimento com o objeto

estudado, a fim de obter dados.

29

Fundamentada nestes estudos, investiguei o universo escolar, as

práticas dos professores e a produção textual dos alunos, pois, de acordo com

Lüdke e André (1986, p. 5), ao pesquisador cabe o papel de “servir como

veículo inteligente e ativo entre o conhecimento acumulado na área e as novas

evidências que serão estabelecidas a partir da pesquisa”. As autoras salientam,

ainda, que não há uma neutralidade do pesquisador sobre o objeto pesquisado,

uma vez que esse está implicado nos fenômenos que conhece e na

importância desse conhecimento que ajudou a estabelecer.

Os registros das observações foram feitos em protocolos, ou seja,

registros que, ainda de acordo com as autoras acima citadas (1986, p. 32), são

as formas mais comumente utilizadas nos estudos de observação. Nos

referidos protocolos de observação registrei os dias, o horário e a turma da sala

observada, bem como as práticas de ensino dos professores, as atividades

planejadas, apenas entre eles e, depois, as programadas em conjunto comigo

para, posteriormente, serem aplicadas por eles. Registrei, igualmente, as

situações do cotidiano vividas pelos alunos na sala de aula, suas perguntas,

dúvidas e comentários sobre o conteúdo exposto.

Foram observadas, entre os meses de março e julho, ou seja, por um

período de cinco meses, as aulas ministradas pelos dois professores. Utilizei,

também, como estratégias entrevistas semiestruturadas, que foram feitas

individualmente, gravadas e, posteriormente, transcritas, pois havia a

necessidade de, previamente, compreender o trabalho desses profissionais e o

universo escolar, do qual professores e alunos são partícipes; coleta das

atividades de Língua Portuguesa, uma vez que a pesquisa teve foco na

aprendizagem da escrita de seis alunos de cada sala, embora todas as turmas

tenham sido partícipes da pesquisa, salvo algumas exceções, cujos pais não

autorizaram a participação no estudo; coleta das produções de textos iniciais e

finais dos alunos, que foram digitalizadas usando o programa HP Smart Install,

em formato PDF (Portable Document Format).

Foram selecionados apenas seis alunos por turma para que os avanços

ou não de cada um pudessem ser acompanhados mais de perto. Esse total de

alunos corresponde a um percentual de vinte e cinco por centro (25%),

considerando a quantidade de alunos existente nas duas salas.

30

Com exceção de 05 alunos da turma A, cujos pais não autorizaram suas

participações, todos os alunos das duas turmas eram sujeitos da pesquisa. Os

doze alunos foram selecionados com base nos critérios do Sistema de

Avaliação do Ensino Municipal (SAEM). Essa avaliação diagnóstica da

educação é exigida pela Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis –

MT (SEMED) e constituída por três provas, SAEM Inicial, Medial e Final, que

são aplicadas logo que o aluno adentra o ano escolar, em meados do ano e ao

final do ano letivo.

A coleta dos textos ocorreu depois da apresentação da situação, isto é,

a apresentação da fábula, de acordo com os estudos fundamentados nas

sequências didáticas de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004). Esse gênero foi

sugerido pela professora Luísa durante a entrevista semiestruturada, inicial e

individual:

Em quais gêneros textuais seus alunos apresentam maior dificuldade de aprendizado? Luísa: [...] no primeiro momento eles vão apresentar mais dificuldade vai ser em fábulas, porque ainda não têm conhecimento sobre fábulas, então eles vão apresentar dificuldades nestes gêneros que eles ainda não conhecem [...] Pesquisadora: Então, que gênero textual você gostaria de trabalhar com eles? Luísa: Eu acredito que um gênero que despertará mais a atenção deles será a fábula. Eu gostaria de trabalhar a fábula, porque é rica em ensinamento e como aparecem os animais, eles vão gostar e aprender muito.

Também o professor Antônio manifestou o desejo de trabalhar o gênero

fábula com seus alunos, conforme trecho de sua entrevista inicial.

Pesquisadora: Se fosse para ensinar um gênero textual específico para seus alunos, qual você escolheria? Qual você imagina que iria despertar a atenção deles? Antônio: Eu não trabalhei ainda neste ano, só nas leituras deleite, mas eu pretendo trabalhar fábulas, porque eu percebo que eles gostam de histórias. Eles conseguem guardar na memória as histórias lidas pra eles, então eu acredito que a fábula pode ensinar bastante pra eles.

Assim, a escolha da fábula se deu por iniciativa dos professores que já

tinham a ideia de trabalhar o gênero no decorrer do ano letivo de 2013.

31

2.3 Locus da pesquisa

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Arão Gomes Bezerra foi

fundada em 1987. Atualmente, possui quinhentos e quarenta e nove alunos

matriculados, desses, cento e trinta e cinco no I ciclo, com o número de trinta e

um professores atuando na escola em 2013.

Os estudantes atendidos naquela escola vão até o 9º ano do 3º ciclo.

Terminado o referido ano letivo, os alunos procuram uma escola estadual num

bairro mais centralizado do distrito de Vila Operária, ou em outras regiões para

continuarem os estudos.

A instituição possui oito salas de aula climatizadas, contando, ainda,

com um laboratório de informática, uma biblioteca e uma quadra coberta,

tendo, no mesmo quarteirão, divididos por muros, um PSF (Posto de Saúde da

Família) e a sede da associação de moradores do bairro. No período noturno,

na escola estão matriculados alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA),

dos 1º e 2º segmentos.

É uma das maiores escolas da Rede Municipal. As salas são amplas e

construídas num terreno de grandes dimensões, com possibilidades de

aumento de salas futuramente. Possui, ainda, quatro turmas de pré-escola que

funcionam nos períodos matutino e vespertino, mas em classes anexas, numa

pequena escola do bairro vizinho, Vila Iraci, distante três quarteirões da escola

principal.

A escola atende, também, a Educação de Jovens e Adultos, em salas

anexas funcionando na Companhia de Desenvolvimento de Rondonópolis

(CODER) e na Escola Municipal de Ensino Fundamental José Antônio da Silva,

atendendo aos alunos dos 1º e 2º anos dos 1º e 2º segmentos. Incluindo-se,

ainda, nos períodos da manhã e da tarde o 1º e 2º agrupamentos do 2º ciclo,

que funcionam também em salas anexas da antiga creche da Vila Iraci.

Os professores são qualificados e, em sua maioria, possuem pós-

graduação. O trabalho é coletivo e há trocas de experiências entre eles, o que

garante que a escola fique entre os primeiros lugares no Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de Rondonópolis, anualmente.

O diretor exerce o cargo há mais de dez anos, contando com a

colaboração das coordenadoras pedagógicas dos períodos matutino,

32

vespertino e noturno. É uma escola bastante procurada pelos moradores dos

bairros Jardim Itapuã, Vila Iraci, Vila Olga Maria, Jardins Ipiranga, D. Bosco,

Taiti e Primavera. As funções desempenhadas naquela escola, no ano

vigente de 2013, ficam assim demonstradas:

Quadro 1 – Funções desempenhadas na escola e quantidade de agentes por

cargo (2013)

FUNÇÃO AGENTES POR FUNÇÃO

Diretor 1

Coordenadoras pedagógicas 3

Agentes administrativos 2

Secretária 1

Auxiliar de serviços diversos 16

Professores

Educação Infantil

4

31 I Ciclo 9

II Ciclo 11

III Ciclo 7

Vigilantes 4

TOTAL 58 FONTE: Elaborado pela autora de acordo com o PPP (2013).

Vejamos como estão distribuídas as turmas por modalidades e turnos.

Quadro 2 – Distribuição das turmas por modalidades e turnos (2013)

MODALIDADES TURNOS TURMAS

Educação Infantil Matutino e vespertino 4

I Ciclo Vespertino 6

II Ciclo Matutino 6

III Ciclo Matutino 4

EJA Noturno 8

TOTAL 28 FONTE: Elaborado pela autora de acordo com o PPP (2013).

Na modalidade Educação Infantil, no período matutino, há uma sala

multifaseal, do 1º e 2º agrupamentos, ou seja, com crianças de 4 e 5 anos e

outra do 2º agrupamento, com alunos de 5 anos. No período vespertino existe

33

uma turma do 1º agrupamento com crianças de 4 anos e outra do 2º

agrupamento, com alunos de 5 anos. Essas salas estão no prédio da antiga

creche Vila Iraci e todas são do 2º Ciclo.

No período vespertino, na modalidade I Ciclo, estão as turmas A e B da

1ª fase, A e B da 2ª fase, A e B da 3ª fase e ainda as turmas A e B da 1ª fase

do II Ciclo. Pela manhã, no 2º Ciclo, estão lotadas as turmas A e B da 2ª fase,

A e B da 3ª fase, A e B da 1ª fase do III Ciclo, Única da 2ª fase e Única da 3ª

fase.

À noite, no prédio da escola Arão Gomes Bezerra, estão as turmas do 1º

e 2º anos A, do 1º segmento, 1º ano A, do 2º segmento e 2º ano A e C do 2º

segmento. No prédio da CODER estão em salas anexas e multifaseadas o 1º e

2º anos B do 1º e 2º segmentos, respectivamente e, anexos à Escola Municipal

José Antônio, os 1º e 2º anos C do 1º segmento.

2.4 Quem são os sujeitos da pesquisa

Em contato com o diretor, ainda no mês de dezembro de 2012, obtive a

autorização para fazer a pesquisa nessa escola. Iniciei com as observações em

março de 2013, totalizando duzentas e vinte horas de observação, antes de

começarmos a trabalhar com o gênero textual escolhido pelos professores.

A pesquisa, inicialmente, se daria com apenas uma turma da 3ª fase do I

ciclo, porém, a professora daquela sala estava na iminência de pedir um

afastamento, do que desistiu em seguida. Ficou decidido, então, que eu

acompanharia as duas turmas da 3ª fase do I ciclo da escola. A turma A, do

professor Antônio, conta com vinte e quatro (24) alunos, enquanto que a turma

B, da professora Luísa, com vinte e três (23)2. Vejamos a seguir o quadro que

caracteriza esses profissionais, sujeitos da pesquisa:

Quadro 3 - Caracterização dos professores sujeitos da pesquisa

PROFESSOR ANTÔNIO LUÍSA

2 Os nomes dados aos sujeitos da pesquisa são fictícios, tanto dos professores quanto dos

alunos.

34

FORMAÇÃO História e Pedagogia. Especialização em Educação

Pedagogia. Especialização em Planejamento Educacional

IDADE 50 anos 40 anos

TEMPO DE DOCÊNCIA 16 anos 20 anos

TEMPO NAQUELA ESCOLA

9 anos 4 anos

SITUAÇÃO FUNCIONAL Contratado Efetiva FONTE: Dados da pesquisa.

Como podemos notar, os professores em questão possuem larga

experiência no magistério e atuam naquela escola há bastante tempo, embora

o professor Antônio tenha vínculo provisório, visto ser contratado.

Os dois professores passaram por cursos oferecidos pela Secretaria

Municipal de Educação (SEMED), como o Programa de Gestão da

Aprendizagem Escolar (Gestar) e Pró-Letramento, tanto de Matemática quanto

de Língua Portuguesa. Atualmente estão participando do Pacto Nacional pela

Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Quanto ao Programa Gestar, apenas a

professora Luísa teve a oportunidade de cursar, pois o programa atendeu

apenas aos professores efetivos.

Luísa já desempenhou a atividade de professora do Atendimento

Educacional Especializado (AEE), como informado por ela no questionário de

caracterização dos professores, atuando na Sala de Recursos, o que, segundo

ela, foi uma experiência boa, que contribuiu para sua prática e fez perceber que

é possível aprender, desenvolver-se mesmo diante das deficiências.

Ela desempenhou a referida função naquela mesma escola da pesquisa.

Também já trabalhou com todas as fases do I ciclo e com a 1ª fase do II ciclo.

Na ocasião da pesquisa, estava dando continuidade com a turma que assumiu

no ano de 2012.

O professor Antônio, também de acordo com o questionário de

caracterização dos professores, trabalhava naquela escola há nove anos,

inicialmente com os 4º e 5º anos, isto é, 1ª e 2ª fase do II ciclo, lecionando

História. Desde então, não prestou concursos que o efetivasse em sua área.

Embora não saiba precisar o ano, passou num concurso da rede Estadual para

trabalhar História no município de Alta floresta, região Norte de Mato Grosso,

não podendo assumir pelo fato de sua mãe encontrar-se enferma na ocasião e

ser ele o único filho que poderia cuidar dela. No ano de 2009, começou a

35

ministrar aulas para as séries iniciais, mais precisamente para as terceiras

fases, em regime de unidocência, ou seja, trabalhava todas as disciplinas

dessa fase. No período da pesquisa era professor substituto, contratado pela

rede municipal para suprir a reserva técnica da coordenadora pedagógica, que

é lotada na 3ª fase do I ciclo.

Todos os alunos, no começo de cada ano letivo, são submetidos a uma

avaliação diagnóstica, o SAEM, seguindo os critérios e exigência da SEMED,

que os classifica como A (Acompanha), AB (Acompanha Bem), C (Crítico) e

MC (Muito Crítico). Essa avaliação, denominada SAEM Inicial, é composta por

todas as disciplinas da grade curricular referentes à fase e ao ciclo do aluno

avaliado. O aluno A é aquele que acompanha todo o processo ensino-

aprendizagem, sem, no entanto, se destacar muito, na avaliação ele obtém

nota entre 5,5 (cinco e meio) e 7,0 (sete). O AB é o que acompanha e se

destaca em todas as atividades propostas pelo professor, obtendo nota entre

8,5 (oito e meio) e 10,0 (dez). O C é o crítico, que domina o sistema de escrita

alfabética, porém não é um leitor ou escritor convencional, ou o faz com certo

grau de dificuldade, sua nota, na avaliação, fica entre 3,5 (três e meio) e 5

(cinco). O MC é o muito crítico, cujo aprendizado é lento e ainda não se

apropriou do sistema de escrita, necessitando de maior atenção do professor

para deixar essa condição de MC e avançar para C, A e chegar a AB, na

avaliação esse aluno obtém notas entre 1 (um) e 3,0 (três).

De acordo com o SAEM Inicial, os alunos das duas turmas ficaram

assim classificados:

Quadro 4 - Perfil dos alunos conforme avaliação SAEM Inicial (2013)

CLASSIFICAÇÃO DOS ALUNOS

ALUNOS TURMA A PROFESSOR ANTONIO

ALUNOS TURMA B PROFESSORA LUÍSA

A 5 10

AB 7 6

C 12 7

MC 0 0

TOTAL 24 23 FONTE: Dados da pesquisa.

36

Desta forma, da turma A, foram selecionados para a pesquisa os alunos

Juliana e Ricardo, considerados AB, William e Manuelle, alunos A e Jonathan e

Myla classificados como C.

Na turma B, os selecionados foram Tiago e Tânia, como AB; Juliano e

Alícia como A e Marcos e Caterina como C. Em ambas as salas, os

professores não consideram ter alunos muito críticos (MC). Os alunos C das

duas turmas estão se apropriando, aos poucos, da escrita e da leitura.

Jonathan e Myla, da turma A, fazem leitura deleite no início da aula, sempre

que o professor pede. Leem com auxílio do professor, mas não se sentem

inibidos, ao passo que Caterina e Marcos, da turma B, durante a pesquisa,

jamais foram à frente ler alguma coisa, embora a professora insistisse e

oferecesse ajuda. Eles alegavam vergonha, apesar de todos serem respeitados

pelos colegas no ato da leitura. Vejamos o quadro em que aparecem as

classificações desses alunos:

Quadro 5 – Classificação dos alunos conforme avaliação SAEM inicial

ALUNO TURMA CLASSIFICAÇÃO

JULIANA A AB

RICARDO A AB

MANUELLE A A

WILLIAM A A

JONATHAN A C

MYLA A C

TÂNIA B AB

TIAGO B AB

ALÍCIA B A

JULIANO B A

CATERINA B C

MARCOS B C FONTE: Dados da pesquisa.

As crianças das duas turmas têm idade entre 8 e 9 anos e, como

mencionado anteriormente, são moradoras de bairros que circundam a escola.

O alunato dessa escola é formado, em sua maioria, por famílias de médio a

baixo nível socioeconômico.

Mais adiante, no capítulo de análise, mostrarei as produções dos alunos

no gênero textual fábula.

37

2.5 Procedimentos e instrumentos da coleta de dados

Houve, também, durante a pesquisa, reuniões de estudos sobre textos

de autores que abordam gêneros textuais e ambos os professores passaram

por esses encontros, sendo que o primeiro foi somente entre nós três,

professores e pesquisadora. A partir daí, a escola não queria abrir mão de sua

hora de trabalho pedagógico coletivo (HTPC). Então, sugeri que esses estudos

se estendessem aos demais professores e a coordenadora pedagógica

aceitou, já que, segundo ela, a escola trabalhava gêneros textuais diversos

durante o ano letivo. Assim, desses estudos participaram, além dos

professores sujeitos da pesquisa também os colegas dos anos iniciais. Esses

encontros ficaram assim distribuídos:

Quadro 6 – Encontros de estudos de gêneros textuais com os professores

DATA TEXTO AUTOR

30/04/2013 Produção de textos: introdução ao tema

LEAL E MELO – In Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino Fundamental. Leal e Brandão (orgs.) 2007, p.11 a 26.

07/05/2013 Gêneros textuais: o que são? Para que servem?

KOCH e ELIAS – Ler e escrever: estratégias de produção textual, 2010, p. 53 a 62.

14/05/2013 Gêneros textuais: definição e funcionalidade

MARCUSCHI - In gêneros textuais e ensino. In Gêneros textuais e ensino. Dionísio; Machado; Bezerra (orgs.) 2010, p.19 a 38.

21/05/2013 Slides sobre Sequência Didática

Dolz, Noverraz e Schneuwly.

FONTE: Dados da pesquisa.

Em entrevista semiestruturada com os professores, ficou explícito que

eles desejavam que fosse trabalhado esse gênero.

Pesquisadora: Então, que gênero textual você gostaria de trabalhar com eles? Luísa: Eu acredito que um gênero que despertará mais a atenção deles será a fábula. Eu gostaria de trabalhar a fábula, porque é rica em ensinamento e como aparecem os animais, eles vão gostar e aprender muito. Pesquisadora: Se fosse pra ensinar um gênero textual específico para seus alunos, qual você escolheria? Qual você imagina que iria despertar a atenção deles?

38

Antônio: Eu não trabalhei ainda neste ano, só nas leituras deleite, mas eu pretendo trabalhar fábulas, porque eu percebo que eles gostam de histórias. Eles conseguem guardar na memória as histórias lidas pra eles, então eu acredito que a fábula pode ensinar bastante pra eles.

As observações iniciaram em março de 2013, primeiramente se deram

sobre as práticas dos professores Antônio e Luísa e, posteriormente, em maio

de 2013, as observações foram das aulas que planejávamos juntos e eram por

eles aplicadas.

Essas observações se deram nas aulas de Língua Portuguesa, de

segundas a quartas-feiras, iniciando com uma sala até a hora do recreio e indo

para a outra depois deste. Para que nenhuma sala ficasse em desvantagem,

quando eu encerrava a observação do dia na turma A, por exemplo, no outro

dia eu começava por ela. Assim, os comportamentos das turmas eram

observados antes e depois do recreio, visto que após este, as crianças ficam

um pouco cansadas e, consequentemente, menos disciplinadas e, às vezes,

pouco produtivas.

No próximo quadro explicito a distribuição das horas observadas, antes

da apresentação da situação, isto é, antes de eu dar início aos trabalhos com o

gênero textual previsto.

Quadro 7 – Demonstrativo das aulas observadas

PROFESSOR ANTÔNIO PROFESSORA LUÍSA

PROTOCOLO AULA/DIA HORAS PROTOCOLO AULA/DIA HORAS

1e 1A 18 mar 4 2 e 2A 18 mar 4

4 21 mar 4 3 e 3A 21 mar 4

5 25 mar 4 6 25 mar 4

8 26 mar 4 7 26 mar 4

10 27 mar 4 9 27 mar 4

12 01 abr 4 11 01 abr 4

13 02 abr 4 14 02 abr 4

16 03 abr 4 15 03 abr 4

18 08 abr 4 17 08 abr 4

19 09 abr 4 20 09 abr 4

22 10 abr 4 21 10 abr 4

23 15 abr 4 24 15 abr 4

26 16 abr 4 25 16 abr 4

27 17 abr 4 28 17 abr 4

30 22 abr 4 29 22 abr 4

31 23 abr 4 32 23 abr 4

34 24 abr 4 33 24 abr 4

35 29 abr 4 36 29 abr 4

38 30 abr 4 37 30 abr 4

39 06 mai 4 40 06 mai 4

39

42 07 mai 4 41 07 mai 4

43 08 mai 4 44 08 mai 4

46 13 mai 4 45 13 mai 4

47 14 mai 4

49 15 mai 4 48 15 mai 4

50 20 mai 4 51 20 mai 4

53 21 mai 4 52 21 mai 4

54 22 mai 4 55 22 mai 4

TOTAIS 28 aulas 112 horas 27 aulas 108 horas FONTE: Dados da pesquisa.

O dia de observação inexistente no quadro referente à professora Luísa

foi por ocasião da assembleia geral dos funcionários municipais, portanto,

naquela data, as aulas ocorreram até às quinze horas.

Os alunos das duas turmas logo se afeiçoaram a mim e,

frequentemente, pediam ajuda para completar suas atividades, quando não

entendiam perfeitamente. No começo eu fiquei desconcertada, porém, com o

passar dos dias, ajudava-os não lhes dando as respostas, mas fazendo com

que refletissem sobre elas. Todavia, isso ocorreu com a anuência dos

professores.

Durante a hora de trabalho pedagógico coletivo (HTPC), eu e os

professores planejamos as aulas sobre o gênero fábula, sugerido por eles na

ocasião da entrevista semiestruturada, que foram por eles ministradas. Assim,

a partir do dia 27 de maio de 2013, desenvolveu-se a pesquisa com a

apresentação da situação, por meio da leitura de várias fábulas e a explicação

dos professores, cada um em sua respectiva sala, sobre as características

desse gênero.

Na sala do professor Antônio, naquela mesma data, também houve a

apresentação da situação. O gênero fábula teve sua produção final no dia 03

de julho de 2013. O assunto será abordado mais adiante.

A coleta de dados deu-se na seguinte ordem: a observação de duzentas

e vinte horas teve início em 18/03/2013 e as entrevistas iniciais com os

professores ocorreram no dia 09/04/2013. Depois das entrevistas e,

concomitante a observação das práticas dos professores, houve os encontros

semanais para estudos sobre gêneros textuais nos dias 30/04, 07/05, 13/05 e

21/05/2013.

No dia 27/05 houve a apresentação da situação, ou seja, os professores

apresentaram as fábulas aos alunos e, a partir desse dia, a observação das

40

aulas que planejávamos juntos e eles, os professores, aplicavam. Foram

observadas, nesta etapa, cinquenta e duas horas, como demonstra o quadro

seguinte:

Quadro 8 – Demonstrativo das aulas observadas após a apresentação do

gênero fábula

PROFESSOR ANTÔNIO PROFESSORA LUÍSA

PROTOCOLO AULA/DIA HORAS PROTOCOLO AULA/DIA HORAS

57 27 mai 4 56 27 mai 4

58 28 mai 4 59 28 mai 4

60 29 mai 4

61 06 jun 4 62 03 jun 4

64 04 jun 4 63 04 jun 4

65 05 jn 4 66 05 jun 4

68 10 jun 4 67 10 jun 4

69 11 jun 4 70 11 jun 4

72 12 jun 4 71 12 jun 4

73 17 jun 4 74 17 jun 4

76 18 jun 4 75 18 jun 4

77 01 jul 4 78 02 jul 4

79 02 jul 4 81 03 jul 4

80 03 jul 4

TOTAL 13 aulas 52 horas 13 aulas 52 horas FONTE: Dados da pesquisa.

Na aula de 28/05 houve a coleta da produção inicial dos alunos. Os dias

que se seguiram e que estão demonstrados no quadro acima foram

trabalhados os módulos até a data de 03/07, quando houve a coleta dos textos

finais, no gênero fábula, produzidos pelos estudantes.

2.6 O gênero textual escolhido e suas características tomadas como

objeto de reflexão

Perguntei aos professores, durante o primeiro dia de estudos sobre

gêneros textuais, usando o texto de Telma Ferraz Leal e Kátia Leal Reis de

41

Melo, “Produção de textos: introdução ao tema”, o que eles entendiam como

gênero textual e assim me responderam:

Luísa: Pra mim são os diferentes tipos de textos que a gente vê, porque existe diferença de um texto pra outro, né? É os diferentes são fábulas, aí vêm os textos narrativos, contos... Antônio: Até música, né? Luísa: Música, receita, tudo é diferente um do outro. Antônio: Poesia... Luísa: Mesmo quando a gente fala assim: Ah! É um gênero textual. Você lendo um texto você já sabe do que se trata. Antônio: Sabe diferenciar, né, que texto que é. Luísa: E antes quando nós estudamos, não era falado em gêneros textuais. Antônio: Só se falava que era texto e pronto. Vamos trabalhar um texto. Luísa: É, vamos trabalhar um texto. E até quando eu comecei a ouvir falar em gêneros textuais eu encontrei dificuldades até entender o que que era... Antônio: O que que era, como se trabalhava esses textos, né? Pesquisadora: É. E então, nesse texto elas falam “eu costumo escrever e-mail, MSN, ofício e cartas e notas”. Então tudo isso... Luísa: É um gênero. Antônio: Se eu escrever um bilhete, é um gênero também.

Assim, vemos que os professores têm noções sobre gêneros textuais,

pois, de acordo com entrevista, ambos trabalhavam diversos portadores de

textos com suas turmas, nos quais figuravam poesia, convite, bilhete. Inclusive,

no início das observações, estavam trabalhando a poesia “Quintal”, de Elias

José (PROTOCOLO 1). A professora Luísa disse que trabalhava sempre os

gêneros textuais, principalmente a poesia e, junto com elas, a gramática e a

ortografia.

Pesquisadora: Com que frequência você trabalha os gêneros textuais, já que costuma trabalhar como já disse, com que frequência você trabalha? Luísa: Sempre. Todos os dias nós estamos passando, principalmente a poesia. Eu gosto muito de trabalhar a poesia com eles e aí, agora mesmo, nós estamos trabalhando Elias José e aí eu pretendo mudar, passar outros tipos de poesia com Cecília Meireles e trabalhando poesia e, dentro da poesia, já trabalha gramática junto, a ortografia.

42

Depois da entrevista com os professores sujeitos da pesquisa que me

informaram sobre o que gostariam de trabalhar com seus alunos em termos de

gêneros textuais (vide p. 36), ficou decidido que seria apresentado a eles o

gênero textual fábula que, de acordo com o quadro de aspectos tipológicos de

Dolz; Noverraz; Schneuwly (2004, p. 121), pertence à ordem do narrar, pois,

conforme os autores (2004, p. 120), “os gêneros podem ser agrupados em

função de um certo número de regularidades linguísticas e de transferências

possíveis”. Os teóricos informam ainda, que estes aspectos tipológicos

respondem a três critérios: domínios sociais de comunicação, que

correspondem às finalidades sociais atribuídas ao ensino; capacidades de

linguagem implicadas no domínio dos gêneros agrupados, que são narrar,

relatar, argumentar, expor e descrever ações; e os exemplos de gêneros orais

e escritos. Para os autores (2004, p.121) o conto maravilhoso, a lenda, a

narrativa de aventura, de ficção científica, de enigma, a novela fantástica e o

conto parodiado, pertencem, assim como as fábulas, à ordem do narrar.

Segundo Coelho (2000, p.164),

Há ainda uma multiplicidade de formas narrativas que vêm, desde a origem dos tempos, e que [...] consideramos também como pertencentes à grande área do gênero ficção, e às quais definimos como formas simples.

Escreve a autora (2000, p. 164) que se consideram formas simples

certas narrativas que surgiram há milênios e de forma anônima, que circularam

entre os povos da Antiguidade e, com o passar do tempo, transformaram-se no

que hoje conhecemos como tradição popular. Afirma ainda, a autora (2000, p.

165), que

São formas simples porque resultaram de “criação espontânea”, não-elaborada - diferentes, por exemplo, dos romances medievais ou das novelas de cavalaria, que apresentam uma forma ainda rudimentar, mas artisticamente elaborada. Pela simplicidade e autenticidade de vivências que singularizam essas narrativas, quase todas elas acabaram assimiladas pela literatura infantil, via tradição popular.

E as fábulas são exemplos dessas formas simples. De acordo com

Coelho (2000, p. 165),

Fábula (lat. fari = falar e gr. phaó = dizer, contar algo) é a narrativa (de natureza simbólica) de uma situação vivida

43

por animais que alude a uma situação humana e tem por objetivo transmitir certa moralidade. A julgar pelo que a história registra, foi a primeira espécie de narrativa a aparecer.

Informa a autora (2000, p. 165), que a fábula nasceu no Oriente, mas foi

reinventada no Ocidente pelo grego Esopo (séc. VI a.C.), sendo aperfeiçoada

mais tarde pelo escravo romano Fedro (séc. I a.C), que a enriqueceu

estilisticamente e, no séc. XVII, La Fontaine reinventou e introduziu

definitivamente esse gênero na literatura ocidental.

Em conformidade com Coelho (2000, p. 167), o que distingue a fábula

das demais formas metafóricas ou simbólicas é a presença do animal, que

assume característica humana e exemplar. Também os personagens são

símbolos, pois representam “algo no contexto universal (por exemplo: o leão,

símbolo de força, majestade, poder; a raposa, símbolo da astúcia; o lobo,

símbolo do poder despótico; etc.)”.

Segundo a Britannica Escola Online3,

Fábula é um tipo de história que traz uma moral, ou seja, ensina uma lição. É geralmente uma narrativa curta, em que animais falam, pensam e agem como gente. E, por destacarem qualidades e defeitos humanos, os animais mostram quão bobas ou sábias as pessoas podem ser. As fábulas são muito usadas nas sessões de contação de histórias.

Alguns autores caracterizam a fábula como uma narrativa na qual estão

presentes seres inanimados. De acordo com Coelho (2000, p. 168), tal

narrativa trata-se de um apólogo, isto é,

A narrativa breve de uma situação vivida por seres inanimados, ou melhor, sem vida animal ou humana [...], que, ali, adquirem vida e que aludem a uma situação exemplar para os homens [...]. Normalmente, o apólogo tem como personagens seres que ali adquirem valor metafórico. Isto é, não são símbolos como acontece com as personagens da fábula.

Portanto, nesse trabalho, utilizarei o conceito de fábula de Coelho

(2000).

3 Britannica Escola Online. Enciclopédia Escolar Britannica, 2014. Web, 2014. Disponível em

<http://escola.britannica.com.br/article/483330/Jean de La Fontaine. Acesso em 09 de fev. de 2014.

44

As atividades com as fábulas ajudam na apropriação da escrita e

reflexão do uso da língua, pois a partir delas a criança pode compreender o

processo de funcionamento da língua escrita. É por meio da escrita que os

pequenos percebem as estruturas dos textos que os auxiliam nas situações de

comunicação.

Citelli e Bonatelli (2011, p. 124) citam que

O ato de redigir deve ser mais do que um exercício de busca de um padrão modelar, de repetição de esquemas formais e estilísticos, de treino mecânico. A questão reside em fazer com que os alunos desenvolvam uma competência discursiva marcada por um bom domínio da modalidade escrita e por uma visão de que a produção de um texto é um trabalho que exige a superação de jogos de palavras ou frases soltas.

Houve uma etapa, na pesquisa, que foi feita a refacção do texto de um

aluno de cada turma para que todos compreendessem melhor os elementos

composicionais do gênero e alguns aspectos formais do texto como correção

gramatical. Quanto a isso, Citelli e Bonatelli (2011, p. 124) informam que

[...] no movimento de feitura e de refeitura do texto é que o aluno vai dominando a sua escrita, percebendo os recursos expressivos da linguagem, operando as variações intertextuais com a consciência de quem dialoga com uma tradição que o antecede e que o transcende.

Isso é feito, certamente, respeitando-se o ritmo e as peculiaridades de

cada aluno de cada turma.

Bakhtin (2011, p. 289) assevera que “A relação valorativa do falante com

o objeto do seu discurso [...] também determina a escolha dos recursos

lexicais, gramaticais e composicionais do enunciado”.

Escolhendo as palavras do seu discurso o escrevente assume uma

posição ativa no campo do objeto e do sentido, de acordo com Bakhtin (2011).

E, ainda conforme o autor (2011, p. 289), é por isso que

[...] cada enunciado se caracteriza, antes de tudo, por um determinado conteúdo semântico-objetal. A escolha dos meios linguísticos e dos gêneros de discurso é determinada, antes de tudo, pelas tarefas (pela ideia) do sujeito do discurso (ou autor) centradas no objeto e no sentido.

45

Mais adiante, no capítulo 7, as produções dos alunos serão analisadas

numa categoria geral, contemplando as três dimensões do gênero, na visão

bakhtiniana: construção composicional, conteúdo temático e estilo.

Posteriormente, os textos serão examinados por subcategorias transversais,

como intertextualidade na escrita, apropriação/consolidação da escrita, sinais

de pontuação e marcas de oralidade na escrita.

A análise em subcategorias justifica-se pelo fato de poder perceber a

criatividade do aluno ao escrever, quantos estudantes estão em processo mais

inicial e mais consolidado da escrita; o quanto se apropriaram das regras de

pontuação e o quanto a fala desses alunos aparece em suas escritas.

3 MAPEAMENTO DAS PRODUÇÕES NACIONAIS EM GÊNEROS TEXTUAIS

E SEQUÊNCIA DIDÁTICA

Ensinar é criar espaços para fazer valerem estes saberes silenciados para confrontá-los com os “conhecimentos” sistemáticos, mas nem sempre capazes de explicar os fatos.

João Wanderley Geraldi

Os gêneros textuais têm sido, em grande parte, fundamentadores do

ensino-aprendizagem da produção textual que figura nas instituições de ensino,

bem como têm merecido rodas de discussões em encontros de educação, o

que me leva a refletir: se a apropriação da escrita tem se firmado nos gêneros

de texto, muitas crianças deveriam estar menos resistentes às produções

escritas. Desta maneira, minha inquietação como professora que se depara

com alguns alunos com dificuldade em produzir textos coesos e coerentes

suscitou um desejo de conhecer de perto essas formas de resistência à

produção escrita e, assim, poder constatar ou não a eficácia dos gêneros

textuais na construção do arcabouço da escrita dos estudantes sujeitos da

pesquisa.

Pretendendo investigar o que há de produções referentes aos temas

gêneros textuais e sequências didáticas em âmbito nacional, é que me propus

46

a este tipo de investigação que denominamos Estado do Conhecimento, por

meio do qual poderei obter respostas para meus questionamentos.

A referida pesquisa é assim denominada, pois, segundo Therrien e

Therrien (2004, p. 8), ela tem por objetivo “[...] mapear e discutir uma certa

produção acadêmica em determinado campo do conhecimento”, o que

observamos como um valioso recurso que permitiu coletar dados fundamentais

para o presente trabalho, buscando o que se tem produzido no Brasil nos já

mencionados temas.

Apesar de essa pesquisa ter sido realizada tendo o gênero fábula como

alicerce, esse descritor não foi incluído nas buscas pelo fato de que este

levantamento foi feito antes de os professores sujeitos da pesquisa terem se

decidido por ele. Antes de entrevistá-los, a certeza que havia era a de trabalhar

com gêneros textuais organizados em sequências didáticas.

As pesquisas apontadas no estado do conhecimento contribuíram para

essa dissertação na medida em que mostraram a importância dos gêneros

textuais para o ensino da escrita com o respaldo das sequências didáticas.

3.1 O ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas: pesquisa feita

no decênio 2002-2011

Nesta investigação, utilizei o Banco de Teses e Dissertações da

CAPES 4 , no período de 2002 a 2011, Cadernos Cedes, Cadernos de

Pesquisas da Fundação Carlos Chagas e artigos de periódicos publicados nas:

Revista Brasileira de Educação, Educação e Sociedade5 e INEP6, no decênio

de 2003 a 2012.

Em conformidade com Therrien e Therrien (2004, p.8), a pesquisa

estado do conhecimento se faz “utilizando predominantemente fontes de

consulta disponíveis em forma de resumos ou catálogos de fontes”, portanto,

ainda de acordo com os autores, o estado do conhecimento é associado a uma

“metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e

científica sobre o tema que busca investigar”.

4 Disponível em <http://capesdw.capes.gov.br/capesdw >. Acesso em 12 fev. 2013.

5 Disponível em <http://www.scielo.org/php/index/php >. Acesso em 22 fev. 2013.

6 Disponível em <http://portal.inep.gov.br >. Acesso em 20 fev. 2013.

47

Ferreira (2013, p.1) cientifica que as pesquisas estado da arte são

definidas como de caráter bibliográfico.

Elas parecem trazer em comum o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários.

Desta forma, o que diferencia estado do conhecimento do estado da arte

é a quantidade de fontes consultadas na elaboração da pesquisa.

Comumente, vemos professores utilizando variados textos em sala de

aula, mas sem que haja um objetivo que o norteie, como o de efetivamente

auxiliar seu aluno a apropriar-se da escrita. Por vezes escolarizam poesias,

não percebendo a riqueza que têm em mãos, passando uma lista interminável

de questões relativas à interpretação do texto, quando poderiam explorar sua

musicalidade e seu lado lúdico para ensinar a escrever.

Sem dúvidas, há muitos textos circulando nas salas de aula, todavia,

pouco explorados. De acordo com Santos (2007, p. 30), é preciso trabalhar

com a diversidade de textos em sala, mas, sobretudo, abordar os gêneros

textuais no que eles têm de específico e em suas características, o que os

distingue uns dos outros.

Dentre as pesquisas publicadas no site da CAPES, na área de

Linguística, que abordam o ensino de gêneros textuais por meio de sequências

didáticas, destaco a pesquisa de Maria Angélica Cardoso “Leitura de diferentes

linguagens em suporte de texto não-escolar: o gênero embalagem de produtos

alimentícios na atividade pedagógica”(2005), cujo objetivo era descrever e

analisar uma intervenção pedagógica na instituição escolar, partindo de textos

não-escolares, mas que estão presentes no contexto sócio-histórico-cultural de

alunos do ensino fundamental. A pesquisa de Cardoso (2005) deu-se com

crianças da 3ª série do Ensino Fundamental de uma escola pública do

município de Tubarão, em Santa Catarina. A metodologia utilizada foi o estudo

de caso e, quanto ao referencial teórico, embasou-se nos princípios

relacionados ao gênero textual, ao letramento, nos pressupostos da Proposta

48

Curricular de Santa Catarina (1998), em Bronckart (1999/2004), em Dolz e

Schneuwly (1999/2004), em Maingueneau (2002), dentre outros autores que

abordam o trabalho com gêneros textuais.

Os resultados apontaram que as embalagens podem ser utilizadas como

suportes ou portadores de textos, todavia, precisam ser estudadas pelos

professores antes de serem trabalhadas com os alunos, pois esses fazem

diferentes leituras delas, conforme o uso que é feito delas.

A autora (2005, p.45) assinala que o trabalho com produção escrita, na

escola formal adota, ainda hoje, na grande maioria, o conceito de escrita como

representação gráfica da língua, enfatizando o trabalho com alfabetização,

desprezando os aspectos sociais do letramento. Este ensino centrado no

código “tem conduzido o ensino da produção textual a explorar

predominantemente atividades soltas, descontextualizadas do uso, enfatizando

os usos corretos da regência, ortografia, concordância”. Ela reitera (2005, p.

46) que

[...] a ação pedagógica com vistas ao ensino da produção textual deveria centrar-se em um projeto prévio, no qual o ensino é programado de forma a “fazer sentido” para o aluno, ou seja, uma proposta que o permita a apropriação de uma prática linguística ainda não dominada por ele.

Esse ensino pode ser mediado pelas sequências didáticas, pois, como

afirmam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 96),

Criar contextos de produção precisos, efetuar atividades ou exercícios múltiplos e variados: é isso que permitirá aos alunos apropriarem-se das noções, das técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento de suas capacidades de expressão oral e escrita, em situações de comunicação diversas.

A dissertação de Mestrado na área de Educação de Severina Érika

Morais Silva Guerra tem por título “Produção coletiva de carta de reclamações:

interação professoras/alunos” e a pesquisa analisou a interação entre

estudantes e entre estudantes e professoras em situação de produção coletiva

de textos. Participaram do estudo duas professoras e seus respectivos alunos

da 3ª série do Ensino Fundamental da Rede Municipal da cidade de Recife,

que desenvolveram uma sequência didática com o gênero discursivo carta de

reclamação. A metodologia foi um estudo de caso coletivo. O estudo

49

fundamentou-se na teoria dos gêneros discursivos de Bakhtin e na perspectiva

sociointeracionista de Schneuwly.

A pesquisadora percebeu que os conhecimentos sobre o gênero carta

de reclamação foram ativados durante a elaboração do texto e concluiu, assim,

que a produção coletiva de textos è excelente ferramenta didática, já que

possibilitou que os modos de funcionamento próprios de escritores experientes,

os professores, fossem compartilhados com os menos experientes, os alunos.

Quanto ao trabalho com os gêneros textuais, Guerra (2009, p. 50)

ressalta que

A partir desse trabalho sistemático com os gêneros em sala de aula, os alunos são levados a refletir sobre as diferentes dimensões da nossa língua, ao longo da escolaridade, trabalhando com gêneros que tenham semelhança entre si e com gêneros divergentes, deparando-se, assim, com os diferentes graus de complexidade desses gêneros.

Guerra (2009, p. 53) aponta que, mesmo nas produções individuais, há a

interação entre professores e alunos, pois quando o professor auxilia na

reelaboração de um pensamento ou na revisão de um texto são momentos

determinantes da escrita dos alunos e que fazem com que eles desenvolvam

novas habilidades e conhecimentos.

A tese de doutorado na área de Educação de Alessandra Marques da

Cunha, cujo título é “Produção textual: o que dizem e escrevem educandos do

3º ano sobre o gênero fábula”, tem como objetivo verificar e analisar o que

escreviam e diziam os alunos dessa fase escolar sobre a produção escrita e o

gênero fábula, que conhecimentos adquiriram na escrita e na oralidade a partir

de mediações e diálogos entre professora, alunos e pesquisadora. A pesquisa

utilizou a metodologia colaborativo-dialógica e fundamentou-se nos estudos e

trabalhos de Bakhtin, Vygotsky, Dolz e Schneuwly, Pasquier e Bronckart.

Segundo Cunha (2010), o que orientou o estudo foram a linguagem, a

oralidade, a leitura, a escrita, o gênero e a sequência didática. Sobre os

gêneros textuais e o ensino por meio de sequências didáticas, Cunha (2010, p.

42) tem a dizer que

As intervenções sociais, a ação recíproca dos membros do grupo e, em particular, as intervenções formalizadas nas instituições escolares são fundamentais para a organização das aprendizagens em geral e para o

50

processo de apropriação de gêneros em particular. Nesse sentido, as sequências didáticas são instrumentos que podem guiar as intervenções do educador.

Os resultados demonstraram que os estudantes, ao final do processo, se

apropriaram das características do gênero fábula tanto na oralidade quanto na

escrita. A pesquisadora deduziu, assim, que o trabalho desenvolvido com a

produção textual, com foco nos gêneros textuais e organizado em sequência

didática, respaldou a aprendizagem dos alunos.

A tese de doutorado em Educação de Stella de Lourdes Garcia,

intitulada “Os gêneros do discurso e a prática da produção textual: dialogando

sobre os conhecimentos necessários aos educadores dos anos iniciais do

ensino fundamental”, mostra uma pesquisa realizada durante um curso de

formação continuada realizado junto a professoras e estudantes de uma escola

da rede municipal de ensino da cidade de São Carlos-SP que integra o Projeto

“Comunidades de Aprendizagem: aposta na qualidade da aprendizagem, na

igualdade de diferenças e na democratização da gestão da escola”. Teóricos

como Freire, Bakhtin, Dolz, Noverraz e Schneuwly embasaram o estudo. Com

relação aos conhecimentos construídos durante a realização do curso de

formação, a autora acredita que as reflexões proporcionadas pela dinâmica

colaborativa dialógica possam ter contribuído para uma alteração nas práticas

das educadoras envolvidas.

Pode-se afirmar, então, que o trabalho com a sequência didática para o

ensino de um gênero escrito configurou-se como instrumental tanto para as

educadoras, quanto para os educandos, conforme pontua Garcia (2010, p. 6),

Para as educadoras [...] proporcionou orientações metodológicas para o ensino sistematizado de um gênero do Discurso escrito, contribuindo para a construção de uma base de conhecimento para o ensino; e para os educandos, pois permitiu a segurança na escrita uma vez que puderam apreender e vivenciar os conhecimentos e os procedimentos que envolvem a prática da produção textual, se considerando as características do gênero e a situação interlocutiva.

Assim, a autora (2010, p. 53) conclui que o uso das sequências didáticas

possibilita a avaliação formativa e regula o processo de ensino-aprendizagem e

nota-se, também, que o aluno fica mais motivado em suas produções escritas

ou oralizadas uma vez que, desde o início, parte-se do pressuposto de que as

51

atividades realizam-se em um contexto de interação entre quem escreve e

quem lê e também a diversificação de atividades contribui para a maximização

das aprendizagens, respondendo às exigências atuais da diferenciação do

ensino.

A pesquisa de Fabiana Vieira Nunes teve como motivação principal

buscar meios mais eficazes de se trabalhar com a produção de textos em sala

de aula. Bakhtin (1996), Van Dijk (2008), Marcuschi (2007), dentre outros

autores que abordam o ensino de gêneros textuais embasaram a pesquisa.

Nunes (2010) considera o estudo de gêneros textuais uma forma, por

excelência, de permitir aos alunos a conscientização de todos os processos

interacionais que envolvem a produção, distribuição e consumo de textos.

Trata-se de uma dissertação de Mestrado na área de Linguística, realizada em

2010 e cujo título é “Gêneros textuais no ensino: uma experiência por projeto”.

A pesquisadora procurou mostrar os resultados do trabalho realizado a

partir da aplicação do projeto desenvolvido numa escola da rede pública do

Distrito Federal, que previa atividades de análise e produção de gêneros

textuais.

Nunes (2010) expôs aos estudantes os gêneros textuais bilhete, piada,

instruções, receitas culinárias, classificados poéticos e propaganda. O projeto

foi trabalhado por meio de sequências didáticas fundamentadas em Dolz,

Noverraz e Schneuwly (2004) o que, segundo a autora (p. 72), proporciona ao

aluno “procedimentos em que ele possa produzir textos de acordo com o

gênero estudado a partir de tarefas feitas em etapas, de modo que as

dificuldades na produção sejam trabalhadas progressivamente”.

E ainda salienta Nunes (2010, p. 72), que

A proposta parte do pressuposto de que é possível e desejável o ensino de gêneros textuais, tanto orais como escritos, e que isso pode acontecer de forma ordenada. A ideia central da proposta é que situações reais de produção, distribuição e consumo de textos sejam criadas para permitir aos alunos perceberem, em situação concreta de uso, o processo de relação entre produtores e receptores.

O trabalho com gêneros textuais contribui para a construção do saber e

é preciso, sempre, refletir sobre esse procedimento, avaliando os resultados,

buscando o que é melhor e mais eficaz para o aprendizado dos alunos.

52

Cláudia Starling Bosco desenvolveu, no ano de 2010, a dissertação de

Mestrado em Educação intitulada “Práticas de escrita de crianças do primeiro

ciclo de alfabetização em situações reguladas pela professora e pelo grupo”. O

estudo teve como foco as práticas de escrita de gêneros textuais de crianças

de duas turmas do 1º ciclo de alfabetização de uma escola municipal de Belo

Horizonte - MG, em situações reguladas pelas professoras e pelo próprio grupo

de crianças.

A metodologia utilizada na pesquisa foi a perspectiva etnográfica e

observação participante, com registro no diário de campo. Quanto ao

referencial teórico, esse se embasou no conceito de discurso de Bakhtin

(2003); de gêneros textuais em Rojo (2001), Bazerman (2005), Dolz e

Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007), além de Ferreiro (1986), Soares (1998),

Costa Val (1991) e Geraldi (2002), sobre a construção da escrita, alfabetização,

letramento e ensino da escrita.

Teve como objetivos investigar como os gêneros textuais se organizam,

se constituem e circulam no contexto escolar, bem como reconhecer o que as

crianças já sabiam sobre os gêneros textuais e refletir sobre o que as crianças

pensavam sobre a escrita dentro e fora da escola.

Bosco (2010, p. 142) pontua que, nessa pesquisa, a concepção de

escrita estava vinculada a uma compreensão dialógica de linguagem e o texto

era entendido como um produto cultural. Portanto, em conformidade com a

pesquisadora (2010, p. 142),

A linguagem não é [...] apenas uma ferramenta que deve ser ensinada pelas professoras para o domínio da escrita. Parto da premissa de que a linguagem está a serviço dos interlocutores que a utilizam em diferentes situações comunicacionais e pode se concretizar em diferentes gêneros textuais.

A autora (2010, p. 148) explicou que as crianças identificaram, em

entrevistas, quais eram os gêneros textuais com os quais elas tinham mais

contato em casa, já que a escola dava maior enfoque às poesias, rimas e

histórias. Foram citados diversos gêneros textuais que, segundo elas, tinham

contato e reconheciam em seu cotidiano, tais como cartas, cartão de

aniversário, textos relacionados à catequese, desenhos e produções textuais

quando brincavam de escola.

53

Para Bosco (2010, p. 148) “as crianças demonstraram [...] que utilizavam

a escrita de diversos gêneros textuais no ambiente familiar, ao contrário do que

foi observado nas atividades reguladas pelas professoras”. Segundo a autora,

os resultados da pesquisa possuem implicações diretas com relação à

necessidade de se repensar o ensino da escrita, vinculando-o a uma

perspectiva dos gêneros textuais e possibilitam melhor compreensão do uso da

escrita pelas crianças em processo de alfabetização.

O critério para a escolha desses trabalhos apresentados foi o fato de os

pesquisadores abordarem o ensino da escrita, utilizando para isso os gêneros

textuais e as sequências didáticas, além de terem sido desenvolvidos com

alunos de 3º ano.

3.2 A elaboração do estado do conhecimento

Objetivando mapear os documentos já publicados no Brasil,

relacionados ao ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas, valho-me

da pesquisa do tipo qualitativa/quantitativa que, de acordo com Flick (2004, p.

272), são métodos unidos de diversas maneiras no plano de um estudo, sendo

que os “[...] quantitativos são, em qualquer caso, apenas ‘atalhos econômicos

de pesquisa do processo de geração de dados’”, ao passo que somente os

qualitativos fornecem explicações científicas efetivas dos fatos estudados.

Assim, o teórico (p. 273) afirma que os métodos qualitativos podem

muito bem viver sem o posterior emprego dos quantitativos, porém estes

necessitam dos qualitativos para explicar as relações encontradas.

Na perspectiva de Bogdan e Biklen (1994, p. 47-51), a pesquisa

qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos, que foram obtidos de

forma direta do investigador com a situação que investiga. Desta forma, ele dá

maior ênfase ao processo que ao resultado dessa pesquisa, preocupando-se

em descrever a representatividade dos participantes.

No decorrer do capítulo tentarei responder a questões como: qual a

ocorrência de trabalhos que abordam o ensino de gêneros textuais por meio de

sequências didáticas? Qual o volume de produções neste tema no decênio

2002-2011? Que áreas do conhecimento exploram o referido tema?

Interrogações estas que me levaram a desenvolver o presente capítulo.

54

Os dados foram coletados depois de lidos os resumos de teses e

dissertações da CAPES, no decênio de 2002 a 2011 e trabalhos publicados

nas revistas eletrônicas: Revista Brasileira de Educação, Revista Educação e

Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos INEP, nos Cadernos de

Pesquisa da Fundação Carlos Chagas e nos Cadernos CEDES, entre 2003 e

2012, usando os descritores “gêneros textuais; gêneros textuais e sequência

didática”, selecionando apenas os estudos que abrangem até o 3º ano do

Ensino Fundamental de nove anos.

A pesquisa Estado do Conhecimento identifica os trabalhos acadêmicos

realizados sobre determinado tema que venham a contribuir com outras

pesquisas. Assim sendo, os dados foram coletados nos sites anteriormente

mencionados, num estudo quantitativo7.

Iniciei a compilação pelas teses e dissertações da CAPES, selecionando

por áreas como Educação, Linguística e Linguística Aplicada e Letras, fazendo

um recorte posterior dos trabalhos produzidos de interesse de meu foco de

estudo. Depois disso, continuei a busca nos demais sites relatados. Para as

buscas foram adotados descritores, quais sejam: gêneros textuais e gêneros

textuais e sequências didáticas. Assim, ao se colocar o descritor gêneros

textuais, encontrei vinte e dois trabalhos. Posteriormente, adicionando o

descritor gêneros textuais e sequência didática, obtive um resultado de nove

produções.

3.3 A abordagem dos temas gêneros textuais e sequências didáticas nos

periódicos e banco de teses e dissertações da CAPES

No Banco de Teses e Dissertações da CAPES, usando os descritores

gêneros textuais e gêneros textuais e sequência didática, nos níveis de

mestrado e doutorado no período de 2002 a 2011, analisei os dados coletados

selecionando as produções por áreas que abordavam a temática dos gêneros.

As produções encontradas nestes níveis, com o descritor gêneros

textuais, perfazem um total de 20, sendo 12 trabalhos na área da Educação

7 Os dados sobre teses e dissertações da CAPES, com o descritor gêneros textuais, entre 2005

e 2009, foram obtidos por intermédio da pesquisadora Márcia Ormonde Portela Santos (2011).

55

(alfabetização e letramento), 6 na área de Linguística e Linguística Aplicada e 2

na área de Letras, como demonstrado no quadro seguinte.

Quadro 9 - Volume de produções encontradas em teses e dissertações da

CAPES – Descritor: Gêneros textuais

Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada

Letras Total

2002 1 1 1 3

2003 - - - -

2004 1 - - 1

2005 2 2 - 4

2006 1 - - 1

2007 1 - - 1

2008 - 1 - 1

2009 - 1 - 1

2010 4 1 - 5

2011 2 - 1 3

Total 12 6 2 20 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados por Santos e Silva.

Os trabalhos coletados no banco de teses e dissertações da CAPES

usando o descritor “gênero textual” e “sequência didática”, entre os anos de

2002 e 2011, foram apenas 5 na área de Educação, 1 na área de Linguística e

Linguística Aplicada e 3 na área de Letras, portanto, um total de 9 produções.

Quadro 10- Produções de teses e dissertações com os descritores “gênero

textual” e “sequência didática”

Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada

Letras Total

2002 - - - -

2003 - - - -

2004 - - 1 1

56

2005 - - 1 1

2006 1 - - 1

2007 - 1 - 1

2008 - - - -

2009 1 - - 1

2010 3 - - 3

2011 - - 1 1

Total 5 1 3 9 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

As produções coletadas no site da CAPES somente no nível de

mestrado, com o descritor “gêneros textuais” foram, dentro do decênio já

mencionado, onze na área de Educação, seis em Linguística e Linguística

Aplicada e apenas um na área de Letras, perfazendo um total de dezoito

produções.

Quadro 11 - Produções de dissertações com o descritor “gêneros textuais”

Ano Educação Linguística e Linguística

Aplicada

Letras Total

2002 1 1 1 3

2003 - - - -

2004 1 - - 1

2005 2 2 - 4

2006 1 - - 1

2007 1 - - 1

2008 - 1 - 1

2009 - 1 - 1

2010 3 1 - 4

2011 2 - - 2

Total 11 6 1 18 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

Foram referenciadas, ainda no site da CAPES, em nível de mestrado,

com os descritores gêneros textuais e sequência didática, três produções na

área de Educação, um em Linguística e Linguística Aplicada e um em Letras,

totalizando cinco dissertações.

Quadro 12 – Produções de dissertações com os descritores “gêneros textuais”

e “sequência didática”

Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada

Letras Total

2002 - - - -

57

2003 - - - -

2004 - - 1 1

2005 - - - -

2006 1 - - 1

2007 - - - -

2008 - - - -

2009 1 - - 1

2010 1 - - 1

2011 - 1 - 1

TOTAL 3 1 1 5

FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

Entre as teses de doutorado coletadas no referido site, com o descritor

“gêneros textuais”, foram coletadas duas produções, sendo uma na área de

Educação e uma na área de Linguística e Linguística Aplicada.

Quadro 13 - Volume de teses com o descritor “gêneros textuais”

Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada

Letras Total

2002 - - - -

2003 - - - -

2004 - - - -

2005 - - - -

2006 - - - -

2007 - - - -

2008 - - - -

2009 - - - -

2010 1 1 - 2

2011 - - - -

TOTAL 1 1 - 2

FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

Esse descritor aparece a partir de 2010, comprovando a importância que

estudos acadêmicos, em nível de doutorado, têm devotado aos gêneros

textuais para o ensino da leitura e da escrita.

Os gêneros textuais, embora já estejam contemplados nos PCNs, só de

modo recente é que têm sido mais veementemente tematizados em

publicações e nos cursos de formação de professores.

Utilizando os descritores gêneros textuais e sequência didática, foram

pesquisadas, em nível de doutorado, quatro produções: duas na área de

Educação, uma na de Linguística e Linguística Aplicada e uma na de Letras.

58

Quadro 14 - Volume de teses com os descritores “gêneros textuais” e

“sequência didática”

Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada

Letras Total

2002 - - - -

2003 - - - -

2004 - - - -

2005 - - 1 1

2006 - - - -

2007 - 1 - 1

2008 - - - -

2009 - - - -

2010 2 - - 2

2011 - - - -

TOTAL 2 1 1 4 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

Com fundamentação nos descritores “gêneros textuais” e “gêneros

textuais e sequência didática”, foi efetivada uma busca no site Scielo, que

agrega revistas eletrônicas com seus respectivos artigos, sendo possível notar

que há poucas produções relacionadas às temáticas citadas.

Os dados coletados foram os textos publicados no decênio de 2003 a

2012, em várias revistas eletrônicas como Revista Educação e Sociedade,

Revista INEP (RBEP e Em Aberto), Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos

Chagas, Cadernos Cedes e Revista Brasileira de Educação.

Quadro 15 - Artigos encontrados e seus respectivos periódicos

Ano Quantidade de artigos encontrados

Fonte

2003 - -

2004 - -

2005 1 INEP/ RBEP

2006 - -

2007 - -

59

2008 - -

2009 - -

2010 - -

2011 1 Rev. Bras. Educação

2012 - -

TOTAL 2 - FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

Embora a coleta tenha sido feita com base nos descritores gêneros

textuais e gêneros textuais e sequência didática, os dois artigos apresentados

foram coletados sob o tema gênero textual e, apenas um em 2005 e outro em

2011.

O fato é que, segundo Marcushi (2010, p. 38), “o trabalho com gêneros

textuais é uma extraordinária oportunidade de lidar com a língua em seus mais

diversos usos autênticos no dia a dia”. E ensiná-los, ainda conforme Marcushi

(2010, p. 38), “é levar os alunos a produzirem ou analisarem eventos

linguísticos os mais diversos”, pois, além de instruir, eles permitem a prática da

produção de textos.

Com relação ao ensino dos gêneros textuais, também Dolz e Schneuwly

(2004, p. 53) afirmam que as estratégias de ensino supõem a busca de

intervenções na escola que facilitem o entendimento, por parte dos alunos, dos

gêneros textuais. Asseveram, ainda (2004, p.53), que essas intervenções são

primordiais para a aprendizagem e apropriação dos gêneros. E é nesse sentido

que as sequências didáticas podem auxiliar o professor na sua prática de

ensino.

A pesquisa do tipo estado do conhecimento permite-nos conhecer

melhor o objeto investigado. Assim, foi possível verificar o que se tem

produzido no país com os temas gênero textual e gênero textual e sequência

didática, nas áreas de mestrado, doutorado e dentre os periódicos publicados

em sites de revistas eletrônicas. Não se trata de um trabalho estanque, embora

os dados levantados e analisados sejam parciais e nem todas as fontes de

publicações brasileiras tenham sido observadas. Todavia, é um estudo que me

serviu de norte para compreender meu objeto de pesquisa.

Desta forma, ao todo foram obtidos trinta e um trabalhos, entre teses,

dissertações e artigos de periódicos. Destes, vinte e dois com os descritores

gêneros textuais e nove com gêneros textuais e sequência didática. Entre as

teses foram apurados dois trabalhos em gêneros textuais e quatro em gêneros

60

textuais e sequência didática. Entre as dissertações, foram observadas dezoito

produções em gêneros textuais e cinco em gêneros textuais e sequência

didática e mais duas produções em periódicos, lembrando que nestes, as

quantidades de artigos publicados são ínfimas, se comparadas às teses e

dissertações encontradas na área do ensino de gêneros textuais.

Quadro 16 – Volume de teses e dissertações publicadas pela CAPES e artigos

em periódicos

Descritor Dissertações Teses Periódicos Total

Gêneros textuais

18 2 2 22

Gêneros textuais e sequência didática

5 4 9

TOTAL 23 6 2 31 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.

As produções aqui relacionadas limitaram-se ao foco de minha pesquisa,

isto é, trabalhos realizados com crianças das séries iniciais, até o 3º ano do

Ensino Fundamental de nove anos.

Em geral, a metodologia utilizada nas referidas pesquisas é a qualitativa,

cuja coleta de dados se dá a partir de entrevistas, observações, análises de

documentos e questionários, dentre outros.

Muitos trabalhos, embora nem todos aqui relacionados, expressam a

importância que se tem atribuído ao ensino fundamentado na realidade da

criança, para que essa venha de fato a compreender como agir numa

sociedade letrada como a nossa, em seu meio e com seus pares.

Em vista disso, o estado do conhecimento amplia nossos olhares para o

que se tem pesquisado em diversas áreas do conhecimento: o que se tem

discutido nas academias e mesas redondas que debatem sobre educação, o

que se tem ensinado nas escolas, como nossos estudantes têm respondido

aos métodos de ensino e, sobretudo, se estão realmente aprendendo. Enfim, o

estudo estado do conhecimento traz luz ao nosso próprio objeto de pesquisa.

Por meio desse levantamento pude compreender melhor meu objeto de

pesquisa. Foi lendo os trabalhos publicados que entendi a importância dos

61

gêneros textuais para o ensino da escrita e, assim, pude decidir por que

caminhos seguiria minha pesquisa.

O ensino de gêneros textuais fundamentado nas sequências didáticas,

na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), apontados nos trabalhos

pesquisados, mostrou ser esse um meio eficaz para o domínio de

determinados gêneros de textos, podendo o professor atingir seu objetivo de

ensino da linguagem aos seus alunos, pois, de acordo com os autores (2004,

p.100),

[...] as sequências didáticas devem ser realizadas no âmbito de um projeto de classe, elaborado durante a apresentação da situação, pois este torna as atividades de aprendizagem significativas e pertinentes.

Portanto, trabalhar com sequências didáticas na sala de aula não se

trata de encontrar uma solução para todos os problemas de aprendizagem de

nossos alunos, mas será um bom auxiliador desse aprendizado.

62

4 PONDERAÇÕES SOBRE OS GÊNEROS DISCURSIVOS E AS

SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS

Os diferentes gêneros discursivos pressupõem diferentes diretrizes de objetivos, projetos de discurso dos falantes ou escreventes. O empenho em tornar inteligível a sua fala é apenas o momento abstrato do projeto concreto e pleno de discurso do falante

Mikhail Mikhailovitch Bakhtin

Neste capítulo discuto os gêneros discursivos e as sequências didáticas

na visão dos principais autores que abordam esses assuntos, dentre eles

destaco Bakhtin (2011), para quem os gêneros discursivos são tipos de

enunciados elaborados pela língua, que o faz de acordo com suas

necessidades comunicacionais, o que explica a diversidade de gêneros, pois a

atividade humana também é multiforme, na concepção desse teórico. Assim, a

situação de comunicação mediante a qual um falante se vê envolvido é

determinante na escolha do gênero a ser utilizado.

Zayas (2012) relata que o texto, como gênero discursivo, é

fundamentado sobre dois pontos de vista. Um deles é como uma prática

discursiva própria advinda de certa esfera da atividade social. O outro é como

uma construção verbal que reflete o tipo de troca discursiva que se quer

efetivar.

Marcuschi (2010) caracteriza os gêneros textuais como eventos

maleáveis, dinâmicos e plásticos, uma vez que surgem à medida que

necessitamos interagir em situações socioculturais. Também são considerados

fenômenos históricos, pois, se compararmos o número de gêneros de textos

existentes hoje às sociedades de antes do surgimento da comunicação escrita,

notaremos que houve um aumento na quantidade desses.

O autor (2010) fala sobre a transformação do gênero em novos gêneros,

embora esses novos não sejam inovações absolutas, mas assimilações de um

63

por outro gênero, gerando um novo, como no caso do e-mail, que tem como

precedentes as cartas e bilhetes.

Dubeux e Silva (Brasil, 2012) citam, também, a carta e os diários como

precursores do e-mail e do blog, respectivamente, explicando que as

mudanças sociais é que transformam certos gêneros em outros novos.

As sequências didáticas (DOLZ, NOVERRAZ E SCHNEUWLY, 2004)

auxiliam o estudante no domínio dos gêneros textuais abordados em sala de

aula, pois se trata de um conjunto de atividades escolares elaboradas e

aplicadas de forma sistemática pelo professor que fará com que o aluno se

aproprie do conhecimento em torno desse gênero.

A sequência didática, segundo os autores (2004), tem movimento do

complexo para o simples. Ela parte da apresentação da situação, que é a

exposição do gênero que o professor deseja ensinar aos alunos numa

explanação que seja bastante clara para os mesmos. A seguir, vem a primeira

produção, na qual o estudante mostrará o que compreendeu e o que já sabia

com relação ao gênero abordado. Depois dessa produção, ocorrem os

módulos, que são constituídos de atividades que tentarão sanar os problemas

detectados pelo professor na produção inicial. Após passar pelos módulos, o

aluno fará a avaliação ou a produção final, na qual demonstrará o que

apreendeu nos módulos.

Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 98), a estrutura de base

de uma sequência didática é assim representada.

Figura 1 – Esquema da sequência didática

Fonte: Dolz, Noverraz e Schneuwly, 2004, p. 98

64

Produzir textos implica um destinatário, isto é, o aluno precisa de um

motivo para escrever e essa escrita deverá ser endereçada a alguém. Quanto a

isso, Cardoso (2008) informa que para escrever, o estudante necessita prever

um destinatário e o efeito que sua escrita terá sobre ele. Para isso, o educando

deve lançar mão dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e já

apropriados por ele.

4.1 Os gêneros do discurso nas perspectivas de Bakhtin e outros autores

Em consonância com Bakhtin (2011, p.261), o uso da língua se dá por

meio de enunciados orais e escritos e esses expõem as condições e objetivos

de cada campo por intermédio da seleção dos recursos lexicais, fraseológicos

e gramaticais da língua e, principalmente, por sua construção composicional, o

que equivale dizer que as ações sócio-comunicativas determinam o enunciado,

o que significa que, numa perspectiva bakhtiniana, a linguagem é constituída

na interação verbal de sujeitos com o fenômeno social.

Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso (BAKHTIN, 2011, p.262).

De acordo com Bakhtin (2011, p. 262), os gêneros do discurso são tipos

de enunciados elaborados por cada campo de utilização da língua. Ainda

segundo o autor, a diversidade de gêneros é grande, pois a atividade humana

é multímoda, isto é, se apresenta de muitas formas. Os gêneros discursivos

são “correias de transmissão entre a história da sociedade e a história da

linguagem” (2011, p.268).

Os gêneros do discurso, na visão bakhtiniana, são primários e

secundários (simples e complexos). Os primeiros, tipos de diálogos orais, se

presentificam nas conversas de salão, em círculos de amigos, no cotidiano

familiar, sociopolítico e outros, enquanto que os segundos são os literários,

científicos ou publicísticos, enfim, são predominantemente escritos. Todavia,

65

um gênero poderá integrar outro, como uma carta, que pertencente ao gênero

primário, pode fazer parte de um romance, que é secundário.

Ao falarmos, escolhemos um gênero de discurso, escolha essa que é

feita de acordo com a situação comunicacional na qual estamos inseridos, ou

seja, a seleção se dá por considerações temáticas, pela situação da

comunicação discursiva, ou pela composição pessoal de cada participante.

Bakhtin (2011, p.283) assevera, ainda, que se nós não dominássemos os

gêneros discursivos, se eles não existissem, ou se precisássemos criá-los, pela

primeira vez, a cada condição de comunicação, esta seria quase impossível.

Desta forma, falar é construir enunciados, visto que falamos por

enunciados e não de maneira descontextualizada ou por frases, orações ou

palavras desconexas e isoladas. Então, são os gêneros do discurso os

responsáveis por estabelecerem comunicação, organizando nosso discurso,

bem como as formas sintáticas, em enunciados inteligíveis.

Entender o enunciado como “unidade real da comunicação discursiva”

(BAKHTIN, 2011, p. 269), possibilita-nos compreender de maneira mais

acertada a natureza das unidades da língua, as orações e as palavras,

enquanto sistema. A língua integra a vida pelos enunciados e é através dos

enunciados que a vida entra na língua, isso equivale a dizer que é no

enunciado que a língua nacional se materializa individualmente. E, ainda

conforme Bakhtin (2006, p.93), “[...] o locutor serve-se da língua para suas

necessidades enunciativas concretas (para o locutor, a construção da língua

está orientada no sentido da enunciação da fala)”.

Cada situação de comunicação determina o gênero discursivo a ser

utilizado. Todo enunciado é individual e, por isso reflete a individualidade do

falante ou do escritor, daí a dizer-se que o enunciado tem estilo individual.

O homem necessita da língua para expressar-se e a língua necessita de

um falante e do objeto da fala para a comunicação. A autoria do enunciado

não começa ou termina no locutor. O autor não tem domínio sobre o que seu

interlocutor vai entender do seu discurso, assim, todo enunciado é uma

resposta àquilo que o locutor presume. Bakhtin (2011, p. 271) nos assegura

que seu interlocutor tem uma posição responsiva ativa, no momento que

compreende o significado do discurso, ou seja, ele pode concordar ou

discordar dele; pode completá-lo, aplicá-lo ou prepará-lo para utilizar em seu

66

favor. Assevera-nos o teórico (2006, p. 95), que “Todo ato de compreensão é

uma resposta, na medida em que ele introduz o objeto da compreensão num

novo contexto – o contexto potencial da resposta”. O importante é que essa

posição responsiva do ouvinte vai se constituindo durante o processo de

audição e compreensão do enunciado e, algumas vezes, a partir da primeira

palavra proferida pelo falante.

Portanto, o enunciado é prenhe de expressividade e todo discurso tem

um valor emocional, visto que as palavras não são vazias, elas estão

compostas de expressões, ao que Bakhtin (2011, p. 298) chama de entonação

expressiva, isto é, “A expressão do enunciado, em maior ou menor grau,

responde, ou seja, exprime a relação do falante com os enunciados do outro, e

não só a relação com os objetos do seu enunciado”.

A entonação expressiva está presente no enunciado pedagógico, pois a

linguagem de ensino do professor inexiste fora do enunciado. Portanto, as

expressões de emoção, de juízo de valores ou outras, nascem da utilização no

enunciado concreto. Brait e Melo (2006, p. 67) compreendem a enunciação

como estando na fronteira entre a vida e o aspecto verbal do enunciado. É

como se ela, a enunciação, bombeasse energia de uma situação da vida para

o discurso verbal. Para Brait e Melo (2006, p.68), “O enunciado concreto [...]

nasce, vive e morre no processo da interação social entre os participantes da

enunciação”. É, portanto, a interação que define sua forma e significado.

Desta forma, ensinar, aprender e empregar a linguagem, neste caso, o

ensino da produção de textos, obrigatoriamente passam pelo aluno, sujeito da

interação verbal e que compõe os estilos do discurso. Para produzir seu texto

escrito, é necessário que ele conheça enunciados anteriores, pois, “Cada

enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de outros

enunciados” (BAKHTIN, 2011, p. 272).

A perspectiva bakhtiniana sobre língua leva-nos a interessantes

reflexões sobre o modo como a compreendemos, como a conhecemos e que

concepção temos dela.

Os fatores que compõem o enunciado, que possibilitam a atitude

responsiva, a compreensão e acabamento são: 1 – o objeto do

sentido/discurso, o que dizer, qual tema escolher; 2 – o intuito, as intenções

67

discursivas do locutor, o querer dizer; 3 – as formas típicas de estruturação do

gênero do acabamento, a entonação expressiva, como dizer; 4 – a resposta

presumida do interlocutor. Para quem dizer? Como meu enunciado será

compreendido pelo outro? Como ele o receberá? Para quem eu escrevo?; 5 –

o contexto transverbal, que atravessa as interações verbais, extrapola a

relação específica da pesquisa, sendo necessário conhecer os atores da

pesquisa intimamente; 6 – a relação com os enunciados alheios. Dialogismo

interno: que outros textos compõem o meu, que outros discursos atravessam o

meu?

Pode-se notar, então, que conhecer estes fatores constituintes do

enunciado é importante para o ensino dos gêneros discursivos e,

consequentemente, da produção de textos na escola, uma vez que todo

enunciado é atravessado por um gênero do discurso. Neste processo de

aprendizagem da apropriação da escrita de textos, a língua que se internaliza

não é neutra, menos estática. Ela é a língua das relações sociais. Podemos

citar como neutralidade a palavra da língua, a dicionarizada, ela não tem autor,

não provém de ninguém. Opostamente, temos a palavra como enunciado, que

é viva e tem entonação expressiva; é a palavra da comunicação social.

Os gêneros discursivos, prenhes de palavras vivas, pois expressam uma

ideologia comunicativa, isto é, exprimem a intenção do locutor de emocionar,

informar, convencer, fazer rir, dentre outras, são categorizados de acordo com

essas funções. Porém, não é só isso que constitui um gênero discursivo. Suas

intenções dependem, também, do momento da produção e circulação, enfim,

das situações comunicativas.

De opinião semelhante, Zayas (2012, p. 66) afirma que

[...] cada texto, en cuanto género discursivo, ha de ser considerado según estos dos puntos de vista que no pueden separarse: como una práctica discursiva propia de una determinada esfera de actividad social y como una construcción verbal con unas características que reflejan el tipo de intercambio que se lleva a cabo.

Assim, ensinar a escrever é ensinar a apropriação das diversas formas

mediante as quais se efetua a comunicação escrita. Ainda segundo Zayas

(2012, p. 66), é preciso analisar as características de cada gênero ensinado,

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pois isso ajudará a alcançar os objetivos do ensino-aprendizagem e a planejar

as atividades.

Para trabalhar a produção textual com crianças, faz-se necessário

ensiná-las sobre cada gênero textual abordado, sistematicamente, para que, ao

final, sejam elas hábeis produtoras de textos orais e escritos. Afinal, quando

falamos, escrevemos, lemos ou ouvimos algo, ativamos nossos conhecimentos

prévios sobre os gêneros, pois tivemos acesso a eles em nossas relações com

a linguagem. Todavia, convém lembrar-se de que o gênero discursivo “não é

uma forma da língua mas uma forma típica do enunciado; como tal forma, o

gênero inclui certa expressão típica a ele inerente. No gênero a palavra ganha

certa expressão típica” (BAKHTIN, 2011, p. 293).

Como dito anteriormente, as palavras da língua não são de ninguém,

mas nós as ouvimos transformadas em enunciados individuais, bem como

lemos essas palavras em textos individuais, possuindo uma expressividade

também individual, de acordo com o gênero ao qual pertencem. Por isso, a

utilização dessas palavras na comunicação verbal ativa é marcada pelo

individualismo e contexto. Para os que as dizem, as palavras possuem três

aspectos: o primeiro é a palavra neutra, a palavra da língua, que não pertence

a ninguém; o segundo, a palavra do outro, palavras que vêm de outros

enunciados; e o terceiro, a palavra minha, é a expressividade, o tom conferido

à palavra da língua e à palavra do outro. Para Bakhtin, na linguagem não existe

fronteiras, todo diálogo se constitui e passa a ter algum sentido a partir de um

outro, assim, o dialogismo e o enunciado estão sempre em interação. A língua

não pode ser compreendida a partir da consciência de um só condutor.

Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada enunciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados precedentes de um determinado campo (aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles, subentende-os como conhecidos, de certo modo os leva em conta. (BAKHTIN, 2011, p.297)

Neste sentido, ensinar os gêneros textuais para crianças, é levar em

conta, acima de tudo, que a linguagem se dá na interação delas com os outros.

É compreender que é por meio desta ação mútua que se dá o conhecimento e

69

atribui-se sentido ao discurso. Trata-se, então, de um processo de “assimilação

– mais ou menos criador – das palavras do outro (e não das palavras da

língua)” (BAKHTIN, 2011, p. 294).

Como ressalta Sercundes (2011, p. 83), ao produzir textos, o estudante

deve se apropriar dessa heterogeneidade de vozes. Porém, ficam algumas

dúvidas: quanto tempo levará para que as “palavras alheias” tornem-se

“palavras próprias” na autoria do aluno? Segundo a autora (2011, p. 83), o

tempo transcorrido entre interiorizar informações, modos de composição de um

texto e a escrita é o tempo de “virar uma página”. Então, “este tempo escolar

acaba por produzir, para o aluno, uma imagem de produção de textos: ela

resulta mecanicamente da leitura e da aquisição de informações”. Portanto, ao

interiorizar as informações e os modos de produzir textos, o aluno será capaz

de produzir seus próprios textos escritos.

Ao produzirmos textos escritos, temos em mente um interlocutor. Assim,

Cardoso (2008) afirma que o fato de se dirigir a alguém, também é um índice

constitutivo do enunciado. Não escrevemos de maneira aleatória, sempre o

fazemos para um destinatário. Em certos casos, aparecem palavras do adulto

em textos de crianças, comumente as do professor, num processo de

assimilação, como citado anteriormente.

Neste sentido, presentifica-se, também, a alteridade na língua. Ao

falarmos ou escrevermos algo, nossos enunciados estão sempre repletos das

palavras do outro. Quando o aluno produz um texto escrito, a fala de outras

pessoas perpassa seu enunciado, os discursos não são inéditos. Quanto a

isso, Bakhtin (2011, p. 294-295) nos afiança que nossos enunciados são

plenos de palavras alheias, com certo grau de alteridade ou de assimilabilidade

do discurso do outro e com certo grau de aperceptibilidade e de relevância.

Assim, a palavra do outro nos chegam trazendo sua expressão e o tom

valorativo que assimilamos, reelaboramos e reacentuamos.

É por isso, então, que não há ineditismo em nossos escritos ou em

nossos discursos. Tudo que dizemos ou escrevemos é atravessado pelo

discurso alheio. Portanto, “O falante não é um Adão bíblico, só relacionado com

objetos virgens ainda não nomeados, aos quais dá nome pela primeira vez”

(BAKHTIN, 2011, p. 300).

70

Como citado anteriormente, dirigir-se a alguém, a um interlocutor, é algo

que compõe essencialmente o enunciado e sem ele não haveria enunciado. As

várias formas de endereçar-se a um destinatário são, da mesma forma,

particularidades que compõem e determinam a variedade dos gêneros

discursivos.

Na elaboração do enunciado, o locutor deve levar em conta o fundo

aperceptível do destinatário, com relação à percepção do seu discurso, o que

significa dizer que este destinatário deve estar a par da situação

comunicacional, bem como dispor de conhecimentos no dado campo da

comunicação. O enunciador deve ter em mente as crenças e concepções de

seu destinatário, os preconceitos que ele venha a ter, isso no ponto de vista do

locutor, o que ele gosta ou desgosta. Esses itens determinam a compreensão

responsiva do enunciado por parte do interlocutor. Desta forma, o locutor fará a

escolha do gênero, dos elementos composicionais e do estilo.

Salienta ainda Bakhtin (2006, p.96), que nosso discurso é constituído do

discurso do outro, pois os locutores necessitam de um contexto ideológico

preciso que os dote de compreensão, pois,

Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis [...]. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.

Assim, o produtor de texto, considerando tais elementos do enunciado,

produzirá um texto endereçado a um interlocutor ou leitor em especial, que

estará dotado de “um determinado fundo aperceptível de compreensão

responsiva” (BAKHTIN, 2011, p. 302).

Na escola, geralmente, a produção textual do aluno tem como

destinatário o professor que, por seu turno, lê a produção com olhos

profissionais, do ponto de vista gramatical. Destarte, por vezes, a criança se

perde em seus enunciados, pois não encontra no seu interlocutor os elementos

necessários para se fazer entender por ele. Assim, fica evidente o caráter

coercivo das normas linguísticas que, de acordo com Bakhtin (2006, p. 96), só

71

se deixa perceber em momentos de conflito, quase que exclusivamente

associados à expressão escrita.

Os gêneros do discurso ensinados na escola têm como finalidade o

ensino da língua materna, por meio de textos específicos e, segundo Costa

(2000, p. 72),

Apropriar-se, portanto, dos gêneros, sistematicamente, mediados por estratégias de ensino intervencionistas formalizadas, é reconstruir a linguagem em novas situações concretas de comunicação, mais complexas, que certamente levarão os alunos a uma autonomia

progressiva nessas atividades comunicativas complexas.

De acordo com Dolz e Schneuwly (2004, p. 71), “o gênero é que é

utilizado como meio de articulação entre práticas sociais e os objetos

escolares, mais particularmente no domínio do ensino da produção de textos

orais e escritos”.

Como podemos ver, o estudo dos gêneros é imprescindível para a

produção escrita, pois, segundo Dolz e Schneuwly (2004, p. 77), por meio dos

gêneros as práticas de linguagem se materializam nas atividades dos

aprendizes e que o lugar da aprendizagem da linguagem se dá entre as

práticas e as atividades de linguagem e que “nesse lugar, produzem-se as

transformações sucessivas da atividade do aprendiz, que conduzem à

construção das práticas de linguagem”.

Preconizam os PCNs (BRASIL, 2001, p. 65) que se um escritor

competente deseja convencer seu leitor, ele deve selecionar o gênero e

produzirá um texto predominantemente argumentativo, lembrando que um

escritor competente, segundo os PCNs,

É alguém que, ao produzir um discurso, conhecendo possibilidades que estão postas culturalmente, sabe selecionar o gênero no qual seu discurso se realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e à circunstância enunciativa em questão.

Articulando a reflexão sobre a língua e a prática da escrita está a revisão

de texto, assim denominada pelos PCNs (BRASIL, 2001, p. 80) por tratar-se de

um conjunto de procedimentos pelos quais o texto escrito passa até que se

entenda que ele está bem escrito.

72

Consoante a Marcuschi (2010, p.19), os gêneros textuais são

caracterizados como eventos maleáveis, dinâmicos e plásticos, eles “não são

instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa”, portanto, surgem à

medida que as necessidades e as atividades socioculturais do ser humano

exigem.

Assim, por estarem vinculados à vida cultural e social dos indivíduos,

são considerados fenômenos históricos, haja vista a quantidade de gêneros

existentes hoje, se compararmos às sociedades de antes do surgimento da

comunicação escrita.

O autor ainda nos afiança (Ibidem, p. 23) que seria irrealizável a

comunicação verbal que não fosse intermediada por um gênero, posição essa

defendida também por Bakhtin (2011, p. 283).

Ressalta ainda Marcuschi (2008, p. 79), que “quando um falante ou um

escritor se põe a usar a língua (produzir textos), ele pode fazer escolhas

diversas a partir do sistema virtual da língua, mas tem que se decidir por uma

escolha”. E essa escolha se dá de forma automática, sem que o falante ou

escritor se ponham a construir em suas mentes gêneros para convencer ou se

fazer entender pelos seus interlocutores.

De maneira semelhante, Marcushi (2010, p. 21) fala-nos sobre a

transmutação dos gêneros em novos gêneros. Porém, esses novos gêneros

não são inovações absolutas, pois se trata da assimilação de um por outro

gênero gerando novos, assim, “A tecnologia favorece o surgimento de formas

inovadoras, mas não absolutamente novas” (MARCUSCHI, 2010, p. 21). Nesse

caso, o autor cita o e-mail como um gerador de mensagens eletrônicas, cujas

cartas e bilhetes são seus antecessores, todavia esse correio eletrônico é um

gênero novo com características próprias.

Dubeux e Silva (PNAIC, 2012, p. 7) 8 , relatam que para que haja

interação entre falantes, cada sociedade traz consigo um legado de gêneros e,

por meio deles são partilhados conhecimentos comuns, portanto,

Em consequência das mudanças sociais, os gêneros se alteram, desaparecem, se transformam em outros gêneros. Desse modo, novos gêneros textuais vão se

8 Dubeux, Maria Helena Santos; SILVA, Leila Nascimento da. Por que ensinar gêneros textuais

na escola? in: Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Ano 02. Unidade 05. Disponível em: <http://www.criciuma.sc.gov.br/site/upload/ckfinder>. Acesso em 14 jan. 2014.

73

constituindo, em um processo permanente, em função de novas atividades sociais.

Assim, como já afirmou Bakhtin (2011, p. 283) sobre o domínio dos

gêneros discursivos pelo falante, também Dubeux e Silva (PNAIC, 2012, p. 7)

compartilham da ideia, afirmando que, caso isso não acontecesse, a

comunicação seria quase impossível, pois cada demanda comunicativa exigiria

a construção de um texto completamente novo que, por seu turno, precisaria

ser entendido pelos envolvidos na atividade, a fim de que se efetivasse essa

comunicação.

As autoras (PNAIC, 2012, p.8) citam, ainda, que nessa dinâmica de

ampliação dos gêneros são apresentados “como exemplos o e-mail e o blog,

que, como recursos recentes decorrentes do progresso tecnológico, são

respectivamente transmutações das cartas e dos diários”.

Marcuschi (2010, p. 36) afirma que alguns gêneros são recebidos de

forma oral, mas são originalmente produzidos na forma escrita como as

notícias de televisão e rádio e as orações que conhecemos. Todas são escritas

e, posteriormente, lidas por um locutor ou proferidas por um fiel religioso,

assim, o teórico assegura que “Ninguém reza por escrito e sim oralmente. Por

isso dizemos que oramos e não que escrevemos a Deus”. Portanto, há que se

ter cautela ao ensinar os gêneros aos alunos, pois é preciso fazer essa

distinção para que eles entendam que, apesar de escritos, esses gêneros são

oralizados.

Existe ainda, segundo o autor (2010, p.37), a produção e uso adequado

dos gêneros textuais, isto é, “contar piadas fora de lugar é um caso de

inadequação ou violação de normas sociais relativas aos gêneros textuais”.

Isso é um caso de adequação tipológica e não somente de uma regra de

etiqueta social, então, contar piada numa reunião formal não fica bem.

Compartilhando dessa mesma posição estão koch e Elias (2010, p.56),

asseverando que nós, falantes e ouvintes, escritores e leitores, construímos

durante nossa vida a “competência metagenérica que diz respeito ao

conhecimento de gêneros textuais, sua caracterização e função”. Como

possuidores de tal competência, sabemos escolher e produzir adequadamente

os textos usados nas situações comunicacionais que nos envolvem. É assim

74

que compreendemos que não devemos contar piadas em velório ou fazer

discursos numa mesa de bar com amigos.

Essa mesma competência (KOCH; ELIAS, 2010, p. 55) possibilita-nos,

numa interação, diferenciar os diversos gêneros, ou seja, podemos perceber

quando estamos diante de uma carta, de um bilhete ou de uma piada, bem

como identificar as práticas sociais que as exigem. É graças a essa

competência, também, que podemos reconhecer num texto a predominância

da narração, dissertação, exposição ou argumentação. Da mesma forma, é ela

que nos dá o norte para a leitura e o entendimento de textos, bem como para

as produções orais e escritas (KOCH; ELIAS, 2010, p. 56).

4.2 A sequência didática na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly

É na perspectiva bakhtiniana que os gêneros devem ser tratados em

sala de aula e o seu ensino pode ser ministrado sob o ponto de vista de Dolz,

Noverraz & Schneuwly (2004, p. 97), ou seja, por sequências didáticas.

Uma “sequência didática” é um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito. [...] tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação (grifos dos autores).

A sequência didática tem movimento do complexo para o simples, com a

produção inicial, passando por módulos, que trabalham uma ou outra

capacidade necessária ao domínio de cada gênero textual, até chegar à

produção final, na qual o aluno põe em prática o que aprendeu nos módulos.

Ao final de cada gênero apresentado, haverá avaliação diagnóstica, a fim de

verificar-se os avanços. Por fim, o movimento volta ao complexo, que é a

produção final.

A sequência didática, em conformidade com Dolz, Noverraz e

Schneuwly (2004, p. 98-99), apresenta um esquema formado pela

apresentação da situação, ou seja, o gênero de texto a ser trabalhado, ou

ainda, o projeto de comunicação que deve ser bastante detalhado para que o

aluno compreenda o gênero abordado. Nessa etapa duas dimensões principais

são distinguidas: a) apresentar um problema de comunicação bem definido,

75

quando é proposta aos estudantes, de forma explícita, a situação de

comunicação na qual eles deverão agir. Desta maneira, nessa fase, algumas

questões devem ser respondidas, como: 1 - que gênero será abordado? O

professor poderá apresentar uma receita culinária, um conto ou outro. Os

autores (2004, p. 99) sugerem que, “para esclarecer as representações dos

alunos, podemos, inicialmente, pedir-lhes que leiam ou escutem um exemplo

do gênero visado”. A questão 2 – a quem se dirige a produção? Os

destinatários podem ser vários como os pais, colegas de outras turmas ou de

outra escola. 3 – que forma assumirá a produção? Que instrumentos serão

utilizados? Podendo ser gravadores de áudio e vídeo, folheto, carta,

representação em palco ou na sala de aula. 4 – quem participará da produção?

Podem-se escolher todos os alunos da turma, apena alguns, todos da escola,

individualmente ou em grupos.

A segunda dimensão, de acordo com os autores (2004, p.100), trata de

preparar os conteúdos dos textos que serão produzidos. “Na apresentação da

situação, é preciso que os alunos percebam, imediatamente, a importância

desses conteúdos e saibam com quais vão trabalhar”, por exemplo, para

escrever um conto, eles deverão saber que elementos constituem esse gênero

como “personagens, ações e lugares típicos, objetos mágicos etc.”. Dolz,

Noverraz e Schneuwly (2004, p.101) explicam que

Criar uma coletânea de enigmas policiais, participar de um debate organizado por uma revista, ou, mais modestamente, redigir um texto explicativo para uma outra turma num projeto interclasses: são projetos realizáveis, que permitem ao aluno compreender melhor a tarefa que lhe é proposta e que facilitam a apresentação da situação.

A seguir, vem a produção inicial, que almeja entender o que a criança

compreende sobre aquele assunto abordado. Para Dolz, Noverraz e Schneuwly

(2004, p. 101), nessa produção, os aprendizes tentam elaborar um primeiro

texto, revelando para si e para o professor o que compreenderam dessa

atividade. O procedimento mostra que esse encaminhamento não leva os

alunos ao insucesso, pois se a situação de comunicação for bem definida na

apresentação da situação, todos os alunos serão capazes de produzir um texto

que demonstre o entendimento da situação dada, mesmo que não respeitem

76

todas as características do gênero abordado. Os autores (2004, p. 101)

reiteram que

Esse sucesso parcial é, de fato, uma condição sine qua non para o ensino, pois permite circunscrever as capacidades de que os alunos já dispõem e, consequentemente, suas potencialidades. É assim que se definem o ponto preciso em que o professor pode intervir melhor e o caminho que o aluno tem ainda a percorrer [...].

Assim, a produção inicial age como reguladora da sequência didática,

que começa pela definição do que é preciso trabalhar para desenvolver as

capacidades de linguagem dos estudantes. Para os autores (2004, p. 102),

essas primeiras produções não receberão uma nota do professor, mas é esse

momento que permite refinar a sequência, modulá-la e adaptá-la de maneira

mais acertada às necessidades e capacidades da turma. É por meio dessas

produções que o professor obtém as informações necessárias para diferenciar

e até mesmo individualizar o ensino. Relatam, ainda, os autores (2004, p. 101),

que a primeira produção, “guiada por critérios bem definidos, permite avaliar de

maneira bastante precisa em que ponto está a classe e quais são as

dificuldades encontradas pelos alunos”.

Após a realização da produção inicial, temos os módulos, nos quais

serão detectadas e posteriormente sanadas as dificuldades apresentadas pelos

estudantes, dando a eles os instrumentos necessários para superá-las. Dolz,

Noverraz e Schneuwly (2004, p. 103) informam que “a atividade de produzir um

texto escrito ou oral é, de uma certa maneira, decomposta, para abordar, uma

a um e separadamente, seus diversos elementos [...]”.

Organizando o trabalho pedagógico, os autores (2004, p. 103) sugerem

como trabalhar os problemas que se apresentaram na produção inicial: o

primeiro nível é trabalhar problemas de níveis diferentes: o aluno pode se

deparar com problemas específicos de cada gênero e deve ser capaz de

resolvê-los. Segundo os autores (2004, p. 104), para que os alunos sejam

preparados, em cada sequência devem ser trabalhados os problemas relativos

a vários níveis de funcionamento.

Para tanto, pode-se distinguir quatro níveis principais na produção

textual:

77

Representação da situação de comunicação: nesse nível, o aluno deve fazer

uma imagem, o mais real possível, do destinatário de seu texto; do que deseja

comunicar; de sua posição como autor desse texto; e do gênero abordado.

Elaboração dos conteúdos: o estudante precisa entender as técnicas que o

possibilitarão buscar, elaborar ou criar conteúdos. Para cada gênero, uma

técnica diferente.

Planejamento do texto: o texto deve ser estruturado de acordo com o objetivo

de comunicação ou destinatário.

Realização do texto: o vocabulário utilizado na produção do texto deve se

adequar a cada situação, variar os tempos verbais de acordo com o plano de

texto e usar organizadores textuais para estruturar o texto ou introduzir

argumentos.

O segundo principal nível na produção de textos é variar as atividades e

exercícios. É importante, nos módulos, variar os modos de trabalho e, para

isso, existem à disposição inúmeras atividades relacionadas com a leitura e

escrita que facilitarão o trabalho do professor. Em cada módulo, o professor

deve propor atividades diversas, dando ao aluno a possibilidade de acesso às

noções e aos instrumentos, pois, dessa forma, as chances de sucesso desse

aluno aumentam. Essas atividades, conforme os autores (2004, p. 105), podem

ser distribuídas em três grandes categorias:

As atividades de observação e de análises de textos: que podem ser efetivadas

a partir de um texto ou partes desse; podem comparar vários textos de um

mesmo gênero ou de gêneros diferentes.

As tarefas simplificadas de produção de textos: são atividades que impõem

limites ao estudante, permitindo-lhe descartar problemas de linguagem que ele

deve gerenciar, de acordo com os diferentes níveis de produção, podendo,

então, focar melhor um aspecto preciso da elaboração do texto.

A elaboração de uma linguagem comum: que possibilitará falar dos próprios

textos ou dos de outro aluno, comentá-los, criticá-los ou melhorá-los, o que

deve ser feito durante todo o trabalho com sequência didática.

O terceiro nível é capitalizar as aquisições. Para os autores (2004, p.

106), “realizando os módulos, os alunos aprendem também a falar sobre o

gênero abordado. [...] eles constroem progressivamente conhecimentos sobre

o gênero”.

78

Finalizando a sequência didática, há a produção final, que proporciona

ao estudante pôr em prática o que aprendeu nos módulos. Essa etapa indica

ao aluno os objetivos a serem atingidos, bem como lhe dá controle sobre o

processo de aprendizagem, levando-o a refletir: o que aprendi? O que resta a

fazer? Também serve de instrumento para regular e controlar suas produções

na refacção do texto e possibilita que ele avalie seus progressos no domínio

trabalhado.

Após a produção final há a avaliação de tipo somativo que, segundo os

autores (2004, p. 107), é exclusiva sobre a produção final. Nessa etapa, seja

qual for a grade de avaliação escolhida pelo professor, o discente explicita os

elementos trabalhados em aula e que também servem como critérios de

avaliação. Para os autores (2004, p. 107), a grade serve

[...] não só para avaliar num sentido mais estrito, mas também para observar as aprendizagens efetuadas e planejar a continuação do trabalho, permitindo eventuais retornos a pontos mal assimilados [...]. A avaliação é uma questão de comunicação e de trocas. Assim, ela orienta os professores para uma atitude responsável, humanista e profissional.

As escolhas pedagógicas, psicológicas e linguísticas guiaram a

elaboração e as principais finalidades da sequência didática. Entre as escolhas

pedagógicas, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 108) citam que o

procedimento com as sequências didáticas a) possibilita uma avaliação

formativa, ou seja, de regulação dos processos de ensino e aprendizagem; b)

esse procedimento inclui-se num projeto que incentiva os aprendizes a

escrever ou tomar a palavra; c) pela diversificação das atividades, ele

potencializa as chances do aluno se apropriar dos instrumentos e noções

propostos.

Entre as escolhas psicológicas (2004, p. 109) estão: a) a atividade de

produção textual oral ou escrita é trabalhada também na representação da

situação de comunicação, o trabalho sobre os conteúdos e a estruturação dos

textos; b) a sequência didática tem por objetivo transformar o modo de falar e

de escrever dos alunos; c) a transformação acontece pelo fato de se propor

aos estudantes diferentes instrumentos de linguagem.

Nas escolhas linguísticas, a) a atividade de linguagem produz textos e

discursos. A sequência didática serve-se de instrumentos linguísticos que

79

possibilitam compreender essas unidades de linguagem; b) a língua não é

estudada como um objeto único, que funciona sempre do mesmo modo, ela se

adapta às situações de comunicação; c) os gêneros correspondem a situações

de comunicação típicas, pois são formas históricas relativamente estáveis de

comunicação. São eles que definem o que se pode dizer, por meio de que

textos e com que meios linguísticos, isso porque são o objeto do procedimento

da sequência didática.

Em suma, para os teóricos (2004, p. 110) o procedimento da sequência

didática descrito por eles para o ensino da expressão escrita ou falada, tem as

seguintes finalidades:

Preparar os alunos para dominar sua língua nas situações mais diversas da vida cotidiana, oferecendo-lhes instrumentos precisos, imediatamente eficazes, para melhorar suas capacidades de escrever e falar; desenvolver no aluno uma relação consciente e voluntária com seu comportamento de linguagem, favorecendo procedimentos de avaliação formativa e de auto-regulação; construir nos alunos uma representação da atividade de escrita e fala em situações complexas, como produto de um trabalho, de uma lenta elaboração.

Esse procedimento pode ser aplicado tanto para o trabalho com a escrita

quanto com o oral, pois seu objeto de trabalho é o gênero textual. Todavia, de

acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 111), para adequar as

sequências didáticas às necessidades dos estudantes o professor precisa:

analisar as produções dos alunos conforme os objetivos da sequência e das

características do gênero; selecionar os exercícios e atividades necessários

para a realização da continuidade da sequência; prever e elaborar, em caso de

alcançar os objetivos esperados, um trabalho mais eficaz, com intervenções

diferenciadas.

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) sugerem, ainda, que os textos orais

e escritos que produzimos são diferentes, pois são produzidos em situações

diferentes, porém há algumas regularidades, já que escrevemos textos

semelhantes em situações semelhantes. Estes textos são compostos pelos

“gêneros de textos, conhecidos de e reconhecidos por todos, e que, por isso

mesmo, facilitam a comunicação: a conversa em família, a negociação no

mercado ou o discurso amoroso” (Idem, p. 97). A importância da sequência

didática para a escola é a de ajudar o aluno a dominar melhor determinados

80

gêneros textuais e, desta forma, facilitar a escrita e a oralidade da maneira

mais adequada à situação comunicacional.

O trabalho com sequências didáticas permite que o estudante

compreenda melhor as atividades que envolvem determinado gênero, lançando

mão deles, de forma consciente, em suas produções orais ou escritas, sendo

este trabalho feito sobre gêneros que o aluno ainda não domine ou o faça de

maneira insuficiente. De acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 98),

“As sequências didáticas servem, portanto, para dar acesso aos alunos a

práticas de linguagem novas ou dificilmente domináveis”.

Nos trabalhos com os gêneros textuais durante a pesquisa houve este

aprofundamento, seguindo os passos de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004),

com o esquema da sequência didática (figura 1, p. 63), iniciando pela

apresentação da situação que eram as fábulas.

A apresentação da situação é o primeiro componente da sequência

didática. Ela expõe aos alunos um projeto de comunicação que culminará com

a produção final. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 99) afirmam que “ao

mesmo tempo, ela os prepara para a produção inicial, que pode ser

considerada uma primeira tentativa de realização do gênero que será, em

seguida, trabalhado nos módulos”.

Ainda segundo os autores (2004, p. 99), é durante a apresentação da

situação que o aprendiz constrói uma representação da situação de

comunicação e dos exercícios de linguagem a serem realizados. Para que isso

se efetive, de acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 99), é preciso

que essa apresentação, que tem duas dimensões, seja bem definida.

A primeira dimensão, conforme os autores (2004, p. 99), “é a do projeto

coletivo de produção de um gênero oral ou escrito”, que deve ser proposto aos

alunos de uma forma bastante clara a fim de que eles entendam muito bem a

situação de comunicação na qual deverão agir. A segunda é a dos conteúdos,

que deverão ser imediatamente percebidos pelos estudantes, a importância

deles e com quais vão trabalhar, o que equivale dizer que os aprendizes devem

entender o que compõe o gênero exposto, a fim de reproduzi-lo

posteriormente.

A escola, ao ensinar a produção de textos, objetiva formar escritores

competentes, produtores de textos coerentes, coesos e eficazes, diz-nos os

81

Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 2001, p.

65). Desta maneira, um escritor competente é aquele que, produzindo seu

discurso, é conhecedor das possibilidades culturalmente postas, vindo a saber

escolher o gênero, no qual seu discurso se realizará, bem como selecionar o

que melhor se adapta aos seus objetivos e à situação enunciativa em questão.

Mas, afinal, o que é um texto? Geraldi (2011, p. 22) nos explica que o

texto, seja ele oral ou escrito, é exatamente o lugar onde se dão as

correlações: “construído materialmente com palavras (que portam significados),

organiza estas palavras em unidades maiores” e, assim, constrói informações,

cujos sentidos são compreendidos apenas na unidade global do texto. Este

texto, por sua vez, interage com outros textos, sem os quais não existiria.

Para Bakhtin (2011, p. 307), o texto, seja ele oral ou escrito, é um dado

primário de todas as disciplinas e do pensamento filológico-humanista.

Segundo o autor (2011, p. 307) “o texto é a realidade imediata (realidade do

pensamento e das vivências), a única da qual podem provir essas disciplinas e

esse pensamento. Onde não há texto não há objeto de pesquisa e

pensamento”.

Então, o texto conduz nossas experiências pelo fato de estar articulado

ao sistema de linguagem, pois tudo que falamos, pensamos ou escrevemos é

por meio de textos. E Bakhtin (2011, p. 308) reitera que “independentemente

de quais sejam os objetivos de uma pesquisa, só o texto pode ser o ponto de

partida”.

Em Marcushi (2008, p. 79), o texto “se dá como um ato de comunicação

unificado num complexo universo de ações humanas interativas e

colaborativas”, o que equivale a dizer que o texto é um sistema de escolhas

que fazemos no ato da comunicação oral ou escrita.

Santos, Mendonça e Cavalcante (2007, p. 28) afirmam que a língua

funciona não por unidades isoladas como os fonemas, os morfemas ou por

meio de palavras soltas, mas por intermédio de textos. E esses, para serem

compreendidos, contam com o conhecimento do leitor/ouvinte sobre o assunto

abordado, o meio no qual se encontram inseridos e a língua na qual foram

escritos ou falados.

82

Por ser um processo interlocutivo, como descrevem as autoras (2007, p.

28), o texto exige de seus falantes e escritores que articulem seus textos aos

seus interlocutores ou que os tenham em suas mentes. Assim,

[...] a criação e recepção de texto é uma atividade de co-construção de sentidos: tanto quem produz quanto quem recebe os textos está ativamente engajado no propósito de ser compreendido e de compreender; em suma, há o desejo de interagir verbalmente.

Pontuam, ainda, as autoras (2007, p. 28), que os textos não são algo

sem marcas de identidade. Eles se diferenciam não só pelo conteúdo, “mas

porque se configuram como gêneros textuais diversos”.

Conforme as autoras (2007, p. 29), “nas práticas de uso da língua, todos

os textos se organizam como gêneros textuais típicos”, os quais utilizamos em

situações interativas no meio social e histórico em que estamos inseridos. E, é

a partir desses gêneros que somos integrados como falantes à sociedade.

Portanto, “os gêneros [...] são entidades empíricas em situações comunicativas

em que predominam os aspectos relativos a funções, propósitos, ações e

conteúdos”.

Entretanto, as autoras (2007, p. 30) alertam para a insuficiência da

diversidade textual na sala de aula. Não basta que ela esteja presente, mas é

preciso que o professor trabalhe com essa diversidade, abordando os gêneros

textuais no que eles têm de mais específico, levando os alunos a distinguirem

uns dos outros, conforme suas características.

Portanto, gênero e texto são dimensões indissociáveis e, para as

autoras (2007, p.41), “não podemos separar um do outro, pois a textualidade

se manifesta num gênero textual específico e, obviamente, os gêneros se

materializam em textos”.

A intertextualidade entre estes textos que se harmonizam por possuírem

os mesmos temas, dividirem as mesmas opiniões ou mesmo por divergirem e

por coexistirem na mesma sociedade constituem nossa herança cultural

(GERALDI, 2011, p. 22).

À medida que o professor entende o ensino de textos como uma

oportunidade de diálogo com outros textos, outros autores e outros leitores,

oportunizará ao aluno produzir novos textos. Além disso, o texto não deve se

restringir às ações de escritas. Guimarães, Campani-Castilhos e Drey (2008, p.

83

8) asseguram-nos que o texto está também ligado às atividades que

possibilitam o desenvolvimento da oralidade dos alunos.

Com papel relevante no ensino, o texto, de acordo com Santos (2007,

p.18) “[...] passa a ser o centro do ensino de língua prescrito, tendo a gramática

um papel secundário e posterior ao domínio a ao uso da linguagem”.

O texto, depois de escrito, não está definitivamente acabado. O autor

pode sempre voltar-se sobre ele com intenção de revisar a escrita. Essa

revisão é importante, pois “permite separar não só o escritor do destinatário da

mensagem [...], como também permite romper a situação de produção do texto,

separando produtor e produto”. Isso cria um efeito de distanciamento, que

possibilita ao escritor trabalhar sobre o texto depois da primeira escrita

(BRASIL, 2001, p.73). A revisão de texto funciona como um controle de

qualidade da produção. Este procedimento é necessário durante todo o

processo de criação e não só após a finalização do texto.

O princípio da exotopia de Bakhtin, em Cardoso (2008, p. 27), “Esta é

definida pelo fato de uma consciência estar fora de outra e, deste lugar, poder

vê-la como um todo acabado, o que ela não pode fazer consigo mesma”, é um

deslocamento necessário, que permite dar um acabamento ao texto, como se

visto de fora.

Em algumas escolas, a prática de revisão de texto ainda é pouco

corriqueira. Esse espaço em que as práticas de leitura, escrita e reflexão sobre

a língua se articulam é o da atividade de revisão textual.

Chama-se revisão de texto o conjunto de procedimentos por meio dos quais um texto é trabalhado até o ponto em que se decide que está, para o momento, suficientemente bem escrito. Pressupõe a existência de rascunhos sobre os quais se trabalha, produzindo alterações que afetam tanto o conteúdo como a forma do texto (BRASIL, 2001, p. 80).

Nessa atividade de revisar o escrito a fim de melhorá-lo, é importante

que se aprenda a perceber os trechos com problemas de gramática, ortografia,

onde está dito o que não se pretendia dizer, acrescentar ou excluir palavras. A

intenção é de que a produção fique compreensível para o destinatário. Esse

exercício permite, também, “o desenvolvimento da atitude crítica em relação à

própria produção e a aprendizagem de procedimentos eficientes para imprimir

qualidade aos textos” (BRASIL, 2001, p. 82).

84

Todavia, segundo Jesus (2011, p. 105), alguns aspectos são ignorados

pelo professor durante a revisão textual, tais como: o que o aluno vivenciou

sobre o escreveu, que fatos ele selecionou para a construção de seu texto e os

critérios e as implicações dessa seleção. Então, o aluno se vê diante de sua

produção tendo que limpá-la ortograficamente “numa atitude esvaziada de

reflexão sobre a escrita e sobre sua condição de autor, uma vez que essas

duas instâncias são colocadas à margem do processo de reescrita” (JESUS,

2011, p.105).

Desta forma, a reescrita torna-se uma “operação limpeza”, de acordo

com a autora (2011, p. 104), cujo objetivo central é eliminar as “impurezas” do

texto do ponto de vista gramatical. Então, a escrita é vista como se fosse uma

transgressão das normas de ortografia, pontuação e concordância, o que pode

prejudicar essa produção na sua potencialidade de realização, embora esteja

linguisticamente correta.

É importante haver uma discussão, como cita Jesus (2011, p. 111), para

que não haja um sentido único para o texto e “ampliar as categorias

mediadoras da reescrita tendo em vista sobretudo a valorização do dizer do

autor, numa atitude de reflexão sobre a linguagem”. Assim, o aluno verá sua

escrita sendo valorizada pelo professor.

Para Brandão (2007, p. 119),

[...] os termos revisão e refacção buscam passar a ideia de um trabalho de parceria entre professores e alunos, com base no pressuposto de que o texto escrito não é, necessariamente, gerado numa primeira e única tentativa. Ao contrário, o texto passa a ser visto como algo que pode ser reescrito e melhorado, sendo o processo de revisão entendido como um dos elementos constitutivos da atividade de escrita.

Desta forma, conforme a autora (2007, p. 120), o texto passa por várias

etapas de planejamento do que se deseja comunicar tais como preparação e

escrita do que foi planejado, avaliação, replanejamento e reelaboração/edição

final.

A autora (2007, p. 120) salienta que “revisar um texto é torná-lo objeto

de nossa reflexão, é pensar sobre o que foi ou está sendo escrito e encontrar

meios para melhor dizer o que se quer dizer, reelaborando e reescrevendo o já

escrito”.

85

Ressalta, ainda, Brandão (2007, p. 120), que muitos professores

acreditam que a revisão textual é deveras elaborada para um escritor iniciante,

deixando essa etapa de refinamento do texto escrito para mais adiante, no

momento em que esse aluno dominar melhor a escrita de textos. Entretanto, a

tarefa exige mesmo reflexões sobre a escrita, que podem começar desde cedo.

Schneuwly (2004, p. 23) diz que o gênero é um instrumento. Este

instrumento, fator de desenvolvimento das capacidades individuais, possui

considerações psicológicas, pois a psicologia “tende [...] a conceber a atividade

do indivíduo como acontecendo entre dois polos: o sujeito, de um lado, e o

objeto sobre o qual ele age ou a situação na qual ele age, de outro”. Tais

instrumentos é que determinam nossos comportamentos, nos guiam e sua

intervenção modela a atividade. Portanto, a transformação do instrumento

transforma nossos comportamentos. De acordo com Schneuwly (2004, p.24),

ele se torna o lugar distinto de transformação dos comportamentos e “[...]

explorar sua possibilidades, enriquecê-las, transformá-las são também

maneiras de transformar a atividade que está ligada à sua utilização”.

Ainda segundo o teórico, os instrumentos são mediadores, pois há uma

relação entre o produto material existente fora do sujeito, isto é, a situação, e

os esquemas de utilização dos objetos que articulam suas possibilidades às

situações de ação desse sujeito. De forma que, para ser mediador e

transformador da atividade, o instrumento precisa ser apropriado pelo sujeito e,

para sua eficácia, é necessário construir-se os esquemas de utilização (2004,

p. 24). A apropriação do instrumento pela criança instrumentaliza-a, fornecendo

novos conhecimentos e saberes, que sustentarão e orientarão seus atos.

Para Bernard Schneuwly (2004, p. 26) há três elementos centrais na

definição de gêneros discursivos de Bakhtin. O primeiro é a escolha de um

gênero, definida por alguns parâmetros, a saber: a finalidade, os destinatários e

o conteúdo da situação de comunicação. O segundo é a seleção desse gênero

dentro desta base de orientação da ação discursiva acima referida, no interior

de uma esfera de troca dada. O terceiro é que, tendo os gêneros uma unidade

temática, um estilo e uma composição, “eles têm uma certa estrutura definida

por sua função; eles são caracterizados por aquilo que chamamos [...] um

plano comunicacional” (2004, p. 26).

86

A escolha do gênero, então, se dá pela situação que guia a ação,

havendo uma relação entre o meio e o fim, que se trata da estrutura de base da

atividade mediada (SCHNEUWLY, 2004, p.27).

Há esquemas para utilização dos gêneros (SCHNEUWLY, 2004, p. 27):

Um deles é que o gênero é articulado à base de orientação da ação discursiva;

ele pode ser adaptado a um interlocutor, um conteúdo e uma finalidade; o

conhecimento e a concepção da realidade estão inseridos nos modos de agir

sobre essa realidade.

Outros esquemas, segundo o autor (2004, p.28), podem ser concebidos,

como a utilização de diferentes níveis de operações necessárias para a

produção textual e o gênero como megainstrumento que contribui para a

sobrevivência de uma sociedade. Afinal, a comunicação e a interação social,

mantêm viva a cultura de um povo.

Os gêneros são responsáveis pelo desenvolvimento da linguagem. Ao

ingressar na escola, a criança passa por processos de desenvolvimento do

sistema de produção da linguagem. Isso se efetua por meio de estágios

durante sua vida escolar, podendo ser proposto com atividades que

contemplem os conceitos de gêneros primários e secundários.

A construção de gêneros secundários pressupõe a disposição de

instrumentos já complexos, que, de acordo com Schneuwly (2004, p. 34), pelo

seu novo uso, se revestem de novos significados, construindo simultaneamente

outros instrumentos para essa nova função, isto é, outros meios linguísticos

que distinguem ainda mais essa função de mudança de perspectiva textual.

Assim, o ser humano é capaz de construir instrumentos partindo de

outros ainda mais complexos. Numa analogia ao trabalho de um ferreiro,

Spinoza explica o uso que o intelecto faz para a construção de novos

instrumentos de criação dos gêneros.

“[...] para forjar o ferro, precisa-se de um martelo e, para se ter martelo, é preciso fazê-lo, para o que se necessita de outro e de outros instrumentos, os quais também supõem outros instrumentos, e assim ao infinito [...]. Mas como os homens no começo, com instrumentos inatos, puderam fabricar algumas coisas muito fáceis, ainda que laboriosa e imperfeitamente, feito o que fabricaram outras coisas mais difíceis, com menos trabalho e mais perfeição [...] também o intelecto, por sua força nativa, faz para si instrumentos intelectuais e por meio deles adquire

87

outras forças para outras obras intelectuais, graças às quais fabrica outros instrumentos [...].”9

Podemos inferir, então, que o mesmo sucede com nossas mentes, no

que tange às capacidades de construirmos instrumentos necessários, a fim de

lançar mão deles sempre que nos confrontarmos com variadas situações de

comunicação ou de entendimento de um texto lido.

Na perspectiva de Schneuwly (2004), a aparição dos gêneros

secundários na criança não é o ponto de chegada, mas de partida para um

alongado processo de reestruturação, que será capaz de promover uma

revolução nas operações de linguagem, ou seja, a criança passará a ser mais

autônoma em suas produções, pois terá maior controle consciente e voluntário

de operação de linguagem; será capaz de fazer escolhas de unidades

linguísticas, em diversos níveis, principalmente na perspectiva enunciativa; e

poderá, também, fazer combinações livres de gêneros e de tipos textuais.

4.3 Como o professor utiliza os gêneros textuais nas aulas

Uma reflexão se faz necessária: como os gêneros textuais têm pautado

nossas aulas?

E além do mais, eu tenho certeza que a professora nem quer saber de verdade como foram as nossas férias. Ela quer só saber como é a nossa letra e se a gente tem jeito para escrever redação. Aqueles dois meses inteirinhos de despreocupações estavam prestes a virar 30 linhas de preocupações com acentos, vírgulas, parágrafos e ainda por cima com a letra legível depois de tanto tempo sem treino.

O trecho do livro de Gribel (2000, p.9) acima citado e que traz a fala do

personagem Guilherme leva-nos a uma reflexão sobre como temos tratado

nossos alunos. Será que a imposição de produções textuais, exigindo certo

número de linhas, vai ajudar o aprendiz a se apropriar da escrita? Será que já

não evoluímos o bastante, em termos de educação, para deixarmos de exigir

de nossos alunos textos de forma convencional e mecânica?

9 Trecho da versão eletrônica do livro “Tratado da correção do intelecto”, de Spinoza.

Disponível em <http://br.egroups.com/group/acropolis>. Acesso em 25 jul. 2013.

88

Para Geraldi (2013, p. 117), há algum tempo, a escola ensinava seus

alunos com livros didáticos de dois gêneros:

[...] verdadeiros livros de textos para os alunos, e livros-roteiros para os professores, para que aprendessem a servir-se bem daqueles. Automatiza-se, a um tempo, o mestre e o aluno, reduzidos a máquinas de repetição material.

Isso ocorria pelo fato de o professor, conforme Geraldi (2013, p.116),

passar por “formação de professores em cursos rápidos, sem maior

embasamento teórico”, não o preparando como deveria para a profissão e

fazendo-o necessitar do auxílio do livro didático e mecanizando sua prática

pedagógica.

Evidencia, ainda, Geraldi (2013, p. 119) que, quando a criança adentra a

escola, ela já traz consigo, mesmo sem estar ciente disso, o conhecimento

prático dos princípios da linguagem, como o uso de gêneros textuais, de

números e conjugações. É a gramática internalizada, “o sistema de regras que

formam a estrutura da língua, e que os falantes interiorizam ouvindo e falando”.

Quanto às atividades impositivas da escola aos estudantes, Geraldi

(2013, p.121) escreve que “[...] os maus hábitos contraídos ficaram. O primeiro

é o enjôo pelo estudo, o desamor das letras, a repugnância ao trabalho

mental”.

Magda Soares (2011, p. 72) aponta que a escola ensina e a criança

deve responder com determinado discurso e sabe que quando a professora

pede um texto,

Seu interlocutor escolar não quer propriamente que demonstre o que pensa ou sente (não quer o uso da linguagem com função pessoal nem interacional), quer que demonstre o que sabe ou o que é capaz de criar (quer uso da linguagem com função representativa ou imaginativa) (grifos da autora).

Então, segundo a autora (2011, p. 73), os alunos desaprendem a escrita

como condição de interlocução real. Eles escrevem o que a escola quer que

eles escrevam e não o que eles gostariam de escrever, usando uma

interlocução artificial.

Todos nós já passamos pelo suplício das escritas contando como foram

as férias, sobre o final de semana ou o animalzinho de estimação. Porém, essa

89

velha prática continua. Às vezes vem disfarçada com o nome de produção de

texto, todavia, o assunto é posto pelo professor, que pede determinado número

de linhas para o aluno escrever.

Soares (2011, p.81) salienta que, na escola,

[...] o processo de aquisição da língua escrita [...] é desde o primeiro momento, um processo de desaprendizagem da escrita com as funções de interação autor/leitor, de intersubjetividade, e de aprendizagem de uma escrita que, em vez de interação, é reprodução de um modelo escolar de texto, é “prestação de contas” do autor a um leitor que nada mais espera senão reconhecer, no texto produzido, esse modelo; [...].

Como o menino Guilherme da história de Gribel, as crianças se

esforçam para escrever, contam as linhas do caderno, marcam um “x” para

saber até onde escreverão e se lançam na aventura. Então, o educador precisa

valorizar as produções e criar as oportunidades de o aluno mergulhar no

universo da escrita por meio de atividades que, ao longo de sua carreira

escolar, vão dotando-o de habilidades, pois, de acordo com Soares (2011, p

111), “[...] em situações de produção espontânea, alunos, mesmo ainda na fase

de alfabetização, escrevem verdadeiros textos [...] com alto grau de

informatividade e unidade temática”.

Os PCNs (BRASIL, 2011, p. 66) ressaltam que, para que a criança

aprenda a língua escrita, é necessário que ela tenha acesso à diversidade de

textos escritos, testemunhe o uso que se faz da escrita em variadas

circunstâncias e se depare com as reais questões que a escrita impõe aos que

se dispõem a produzi-la, procuram fazer como conseguem e recebem auxílio

de quem já escreve.

Marcuschi (2008, p. 77) compara a produção de textos com jogar um

jogo: é preciso se orientar por regras e ter uma série de jogadores, que devem

assumir seus papeis e funções e, para que o jogo aconteça, todos devem

colaborar e jogar o mesmo jogo ou não haverá jogo algum. Com os textos

também é assim:

Produtores e receptores de texto [...] todos devem colaborar para um mesmo fim e dentro de um conjunto de normas iguais. Os falantes/escritores da língua, ao produzirem textos, estão enunciando conteúdos e sugerindo sentidos que devem ser construídos, inferidos, determinados mutuamente. A produção textual, assim

90

como um jogo coletivo, não é uma atividade unilateral. Envolve decisões conjuntas. (MARCUSCHI, 2008, p. 77)

Assim, segundo o autor (2008, p. 77), a produção textual se caracteriza

como uma atividade sociointerativa. E a interação pode ocorrer entre professor

- aluno, aluno - aluno e aluno-texto-atividades. Então, “o texto se dá como um

ato de comunicação unificado num complexo universo de ações humanas

interativas e colaborativas” (MARCUSCHI, 2008, p. 79).

Exigir do aluno uma atividade de produção textual sem antes muni-lo de

possibilidades para essa tarefa é, no mínimo, perigoso, pois esse aprendiz

poderá vir a abominar a escrita. Momentos de oralidade discutindo o assunto

abordado, orientações para o desenvolvimento do trabalho devem anteceder a

produção.

O texto oral é de grande relevância para o ensino do texto escrito.

Marcuschi (2008, p. 53) pontua que, ao se enfatizar o ensino da escrita, não se

deve ignorar a fala, “pois a escrita reproduz a seu modo e com regras próprias,

o processo interacional da conversação, da narrativa oral e do monólogo”,

dentre outros.

O conhecimento de mundo do estudante conta muito nessas horas, mas

o educador deve levar em conta que nem todos os temas que circulam pela

sociedade são de conhecimento das crianças.

Sercundes (2011, p. 79) denomina os exercícios de escrita sem um

planejamento que os anteceda de “produção sem atividade prévia”,

[...] que apareceram desvinculados do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor, sem nenhuma ligação com o trabalho anterior ou posterior, não representando etapa de um processo mais amplo de construção do conhecimento.

Escrever, portanto, é um exercício que vem de constantes atividades

que encaminhem o aluno para esse fim e da definição de um projeto. A

sociedade exige, cada vez mais, sujeitos capazes de administrar bem suas

vidas, seus negócios e suas profissões. A escola tem que dar conta de

instrumentalizar esses sujeitos, pois as sociedades, não só em nosso país,

assim determinam e, ler e escrever torna-se uma condição de sobrevivência.

Com relação à apropriação da escrita, Koch e Elias (2010, p. 31)

afirmam que,

91

Se houve um tempo em que era comum a existência de comunidades ágrafas, se houve um tempo em que a escrita era de difícil acesso ou uma atividade destinada a alguns poucos privilegiados, na atualidade, a escrita faz parte da nossa vida, seja porque somos constantemente solicitados a produzir textos escritos (bilhete, e-mail, listas de compras, etc., etc.), seja porque somos solicitados a ler textos escritos em diversas situações do dia-a-dia (placas, letreiros, anúncios, embalagens, e-mail, etc., etc.).

Voltando à escola, já foi mencionado anteriormente, que o produtor de

texto precisa de um motivo para escrever. Além desse motivo, necessita

também de um interlocutor e que este tenha uma posição responsiva, que o

faça entender o discurso do outro. Cardoso (2008, p. 32) ressalta que

Escrever um texto pressupõe a simulação de uma situação: prever um destinatário e os efeitos de forma e de conteúdo do texto sobre ele. Significa, portanto, fazer uso dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e já apropriados.

Então, para que o aluno seja um “escritor”, a escola deve lhe

proporcionar eventos de apropriação dos gêneros de textos, fazer com que ele

entenda que existem outros interlocutores que não ele, o professor, enfim, deve

motivá-lo com atividades que o seduzam.

Afirmam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 124) que a expressão

oral ou escrita do aluno se desenvolve por intermédio do ensino-aprendizagem

de diversos gêneros,

[...] iniciado precocemente, graduado no tempo de acordo

com os objetivos limitados e realizado em momentos propícios, isto é, quando a intervenção do professor e as interações com outros alunos podem gerar progressos.

Durante a pesquisa, observei que os professores da escola trabalhavam

gêneros textuais como poesias, bilhetes, músicas, convites, dentre outros.

Todavia, o ensino não era aprofundado, o que impossibilitava alguns alunos

com desenvolvimento mais lento se apropriarem do conteúdo.

De fato, é de suma importância o contato dos estudantes com variados

textos do cotidiano que, se bem apropriados exercitarão o que Koch e Elias

(2010, p. 55) denominam de “capacidade metatextual, que vai nos orientar

quando da construção e intelecção de textos”.

92

Ultimamente, os alfabetizadores, inclusive os da escola pesquisada, têm

participado de cursos de formação oferecidos pelas secretarias de educação.

Programas de alfabetização como Gestar, Pró-Letramento e, hoje, o Pacto

Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), ofertados pelo governo

federal, têm colaborado para melhor instrumentalizar o professor na tarefa de

alfabetizar e letrar as crianças. Todavia, todo esse conhecimento deve estar

aliado ao compromisso do professor tornar efetivo o seu fazer pedagógico,

somado a condições objetivas para tal.

Na perspectiva atual, de acordo com Koch e Elias (2010, p.56), “[...] os

estudos sobre os gêneros textuais vêm contribuindo significativamente para

ampliar a compreensão do processamento cognitivo do texto (recepção e

produção)”. E, em sites que publicam pesquisas nessa área, como CAPES e

SciELO, dentre outros, podemos ver trabalhos profícuos que vêm estudando

formas de tornar nossos alunos escritores competentes.

Dentre estes se destacam os trabalhos encontrados na pesquisa estado

do conhecimento. O trabalho de Maria Angélica Cardoso (2005), por exemplo,

ressalta que a mesma utilizou o gênero embalagens de produtos alimentícios

como suportes ou portadores de textos para a atividade com produção escrita;

Severina Érika Morais Silva (2009) que desenvolveu uma pesquisa com o

gênero textual carta de reclamação e notou que a produção deste gênero de

texto leva os alunos a refletir sobre diferentes dimensões de nossa língua;

Alessandra Marques da Cunha (2010), em seu estudo, analisou o que

escreviam e diziam os alunos de 3º ano sobre a produção escrita e o gênero

fábula e que conhecimentos eles adquiriram na escrita e na oralidade e

Fabiana Vieira Nunes (2010), que em sua investigação considerou o estudo de

gêneros textuais uma maneira de possibilitar aos alunos a conscientização dos

processos interacionais que envolvem a produção textual.

93

5 A PRODUÇÃO DE TEXTOS RELACIONADA AOS GÊNEROS DO

DISCURSO

Se escrever, ser lido e ler é partilhar sentimentos, receber rosas e risos, mostrar nossas margens e oásis; se escrever, ser lido e ler não cabe em “fôrmas” de pura correção gramatical, em camisas de força do mero preciosismo vocabular, escrever, ser lido e ler não faz parte da concepção de ensino descrita. Ao aluno – à margem do seu texto irrequieto, mas sem vazão – resta o silêncio da cópia e da despersonalização.

Beatriz Citelli

Explicito neste capítulo como se dá a transposição da fala para a escrita,

a importância que os gêneros textuais adquiriram nas produções textuais das

crianças em geral e como se deram as produções iniciais e finais dos alunos.

O texto como pretexto para o ensino da gramática, como relata

Mendonça (2007), ainda reflete o método tradicional desse ensino, não

incentivando nos alunos a prática da escrita. Assim, atividades mais

preocupadas com a ortografia são impostas aos estudantes.

94

Para Geraldi (2013), para se produzir um texto é necessário que se

tenha algo a dizer, a quem dizer e uma razão para dizer o que se vai dizer. É o

estímulo que o aluno precisa para escrever. E cabe à escola o papel de

motivadora dessa produção escrita.

Ultimamente, o ensino de Língua Portuguesa tem se pautado na

diversidade textual. Todavia, em alguns casos, esse ensino tem sido

superficial, isto é, não tem havido um aprofundamento no ensino dos gêneros

textuais, dificultando, em certas ocasiões, que o aluno reconheça o gênero

quando se depara com ele.

Mendonça (2007) diz que a grande quantidade de gêneros textuais

existentes demonstra que também é diversa a necessidade de interação social

mediada pela linguagem. Então, o professor precisa familiarizar-se com os

gêneros antes de ensiná-los, a fim de entender como eles funcionam e

circulam nos meios sociais.

As produções iniciais dos alunos, no gênero fábula, foi uma sondagem.

Serviu para compreender o que as crianças haviam entendido sobre o gênero

e, lembrando Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), essa produção inicial tem o

papel de reguladora da sequência didática. Ela deu o norte para as atividades

que os professores aplicaram, a fim de desenvolver as capacidades de

linguagem dos estudantes.

A produção final é o quarto componente da sequência didática. Foi por

meio dela que os alunos puderam pôr em prática o que aprenderam nos

módulos da sequência didática.

De acordo com Dubeux e Silva (2012, p. 9),

No trabalho em sala de aula com os gêneros duas dimensões se articulam. A primeira se refere aos aspectos socioculturais relacionados a sua condição de funcionamento na sociedade e a segunda se relaciona aos aspectos linguísticos que se voltam para a compreensão do que o texto informa ou comunica.

Assim, estando os alunos em contato com variados suportes e gêneros

textuais, como sugerem as autoras (2012, p. 9), “o ensino da leitura e da

escrita na escola pode ser sistematizado de forma que o aluno possa refletir,

apropriar-se e usar diversos gêneros textuais”. E afirmam, ainda, que o

trabalho com os textos “ocorre de modo articulado ao ensino de gêneros, de

95

forma que refletir sobre o gênero seja uma estratégia que favoreça a

aprendizagem da leitura e da produção de textos”. (2012, p. 9)

5.1 A transposição da fala para a escrita

Para escrevermos precisamos de um motivo. Infelizmente, na escola, o

que vemos na maior parte do tempo é a imposição de tarefas de escrita que

vêm disfarçadas de prática renovada de ensino de português, o que muitos

professores têm chamado de “gramática contextualizada” (MENDONÇA, 2007,

p. 74). Tal prática usa o texto como pretexto para as tradicionais análises

gramaticais e aplicam exercícios que, segundo a autora (2007, p. 74), retratam

o velho método, como: “Retire os adjetivos do texto; Analise sintaticamente o

último período do texto; Leia o texto e sublinhe os verbos transitivos, etc.”.

Assim, aos alunos são impostas cotidianamente atividades mais

preocupadas com a ortografia do que com a escrita motivada.

Em conformidade com Geraldi (2013, p. 137), para produzirmos um texto

é preciso que:

a) Se tenha o que dizer; b) Se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer; c) Se tenha para quem dizer o que se tem a dizer; d) O locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que

diz o que diz para quem diz [...]; e) Se escolham as estratégias para realizar (a), (b), (c) e

(d).

Desta forma, a escola tem o papel de incentivadora da produção escrita.

Embora as aulas de Língua Portuguesa sejam, em sua maioria, pautadas no

trabalho com textos, esses servem, muitas vezes, apenas como modelos para

a elaboração de questões gramaticais. Para Geraldi (2013, p. 100), “um texto é

uma sequência verbal escrita coerente formando um todo acabado, definitivo e

publicado: [...] simplesmente dado a público, isto é, cumprindo sua finalidade

de ser lido”. Então, o texto produzido deve ser visto pelo professor não

somente com olhos de correção, mas sim de entendimento do que o estudante

quer dizer. Afinal, quando se pede um texto sobre as férias é para dar nota ou

para saber como foram as férias mesmo? É preciso incentivar o aluno a

produzir textos para os quais haverá destinatários, interlocutores. A produção

textual não endereçada a um interlocutor perde seu efeito “[...] já que um autor

96

isolado, para quem o outro inexista, não produz textos” (GERALDI, 2013, p.

100). E, sem um destinatário, o texto fica sem publicação.

Alguns alunos das duas turmas de 3ª fase pesquisadas estavam ainda

se apropriando da escrita. Nos primeiros dias de observação notei que as

crianças da 3ª fase B se sentiam orgulhosas quando conseguiam identificar

uma palavra escrita na lousa. Foi o caso da aluna Caterina, que leu a palavra

barata.

“[...] a aluna foi até o quadro ler a palavra “barata”, que estava numa frase com as sílabas separadas e leu a palavra, confirmando se era mesmo barata que estava escrito” (PROTOCOLO n. 3, linhas 36-39, de 12/03/2013).

A oralidade tem sua vez nas aulas da professora Luísa, pois, como um

texto suscita outro, as crianças sempre se lembram de algo relacionado ao

texto que está sendo trabalhado e começam a contar histórias e, como no caso

da leitura de “barata”, também foi assim.

Então Caterina contou uma história sobre uma mulher que tinha muito medo de barata e chamava o marido para matar baratas que ela nem via. Outros alunos contaram algumas histórias que envolviam baratas sobre os pais, irmãos e amigos. Esse instante de oralidade foi respeitado pela professora. (PROTOCOLO n. 3, linhas 33-38, de 21/03/2013)

Em muitas outras ocasiões as crianças contavam casos que a

professora ouvia com paciência e, para não ficar uma desorganização geral,

ela pedia que levantassem a mão e cada um, por vez, contava sua história.

As crianças dessa sala conversam muito e vão às mesas uns dos outros. A professora não briga muito com eles com relação a esses comportamentos [...]. Ela chama a atenção deles quando a atividade está na lousa e eles se levantam sem copiar. (PROTOCOLO n. 15, linhas 8-15, de 03/04/2013)

Não considero a atitude da professora como falta de domínio sobre a

turma, mas como respeito a uma forma de interação entre as crianças, afinal,

segundo Bakhtin (2011), é da interação verbal entre indivíduos que surgem os

gêneros textuais.

Além disso, para Azevedo e Tardelli (2011, p.28),

Decorrente das situações de interação social – dentro ou fora do ambiente escolar – a oralidade emerge em sala de aula de maneira informal, numa pluralidade de falas

97

(aqui consideradas como manifestações orais dos alunos) que constitui uma instância discursiva marcada pela heterogeneidade. É o momento em que o conteúdo circundante permeia o tema central estudado, configurando um cruzamento de vozes que caracteriza o processo interação/interlocução entre professor/aluno, aluno/aluno.

Para as autoras (2011, p. 29), a escola é um espaço de socialização e,

mesmo cerceados pela disciplina da sala, os alunos burlam as regras e

mantêm seus discursos paralelos ao do professor ao trocarem informações

entre eles, contarem piadas ou comentarem assuntos particulares. Eles estão

se utilizando da língua para necessidades reais de comunicação.

Os alunos daquela sala tinham a oportunidade de ler livros na leitura

compartilhada, momento em que um deles lia para os demais colegas no início

da aula. Não havia um cantinho da leitura na sala, mas a professora tinha uma

cesta com muitos livros e gibis que, quando algumas crianças terminavam a

atividade antes dos demais, elas podiam escolher um exemplar e ler em suas

mesas.

Durante a leitura compartilhada, a professora Luísa deixava-os à

vontade para ler como conseguiam, sendo respeitados pelos colegas ouvintes

que reclamavam apenas quando a leitura era feita em voz muito baixa. Se a

leitura não ficasse bem audível, ao final, a professora a refazia, sempre

explorando os personagens e as ações contidas na história. Os alunos iam

constantemente à biblioteca da escola em busca de livros. Eles próprios

escolhiam o que levar para a leitura deleite. Desta forma, iam se apropriando

da escrita.

Na sala do professor Antonio a situação era semelhante. Também lá

alguns alunos ainda estavam se apropriando do sistema de escrita. Faziam a

leitura deleite nas aulas de Português, e duas vezes por semana, retiravam

livros da biblioteca escolar. Atividades de pesquisa em dicionário eram comuns

em suas aulas. Alguns verbetes no texto de Cecília Meireles “A chácara do

Chico Bolacha” chamaram a atenção das crianças. “O professor explicou o

significado de algumas palavras. [...] pediu que pesquisassem no dicionário as

palavras ‘charco, coxo e caxambu’” (PROTOCOLO n. 22, linhas 32-35, de

10/04/2013).

98

Durante a pesquisa foi possível notar que algumas crianças que ainda

escreviam pouco, por estarem desenvolvendo a habilidade da escrita,

começarem a escrever mais, sem medo de “errar”. Em muitos momentos,

vinham até mim para perguntar como se escrevia determinada palavra.

Helena veio até mim perguntar como se escreve “olho” e Hellen se adiantou e escreveu na mesa para que a colega visse como é. Heitor disse que também poderiam escrever “ólho”, o de gasolina, segundo ele (PROTOCOLO n. 9, linhas 32-36, de 27/03/2013).

Vemos, então, que esses pequenos, estavam em pleno processo de

apropriação da escrita, associavam o som das palavras e começavam a tirar

suas próprias conclusões a respeito da grafia. Assim, para Cardoso (2000, p.

258),

[...] a transição da oralidade para a escrita se revela como um momento em que a criança possui uma visão difusa sobre o objeto escrito, muito própria de uma etapa de construção. Dessa forma, “envolvimento” e “fragmentação”, embora sejam características da oralidade, são comuns nos textos escritos [...].

Todavia, isso não significa que crianças como Heitor tenham problemas

com a escrita, pois nem todos os conflitos estão ligados aos hábitos de

pronúncia. De acordo com o Pró-Letramento Fascículo 7(BRASIL, 2008, p. 23),

“muitos são simplesmente consequência do caráter arbitrário das convenções

da língua, isto é, um mesmo fonema pode ser representado de duas formas ou

mais”.

Portanto, cabe à escola criar as circunstâncias necessárias e as

atividades para que Heitor e os demais alunos compreendam a transposição da

fala para a escrita.

Lima e Beserra (2012, p. 57) afirmam que, geralmente, os educadores

acreditam que se o aluno já sabe falar, ele pode executar qualquer tarefa que

envolva a modalidade falada da língua e, assim, para eles, trazer para a sala

atividades que desenvolvam a expressão oral é perda de tempo. “Assim, por

muito tempo e por motivos diversos, a supervalorização conferida à escrita

acabou por menosprezar a fala, como objeto de ensino”.

Nos cursos de formação raramente há espaço para o estudo da

oralidade, o que, segundo Lima e Beserra (2012, p. 58), faz com que muitos

99

desses profissionais não se sintam seguros em aplicar atividades que

envolvam tal modalidade.

Conforme as autoras (2012, p. 58), diversos pesquisadores, no século

XX, estudaram sobre a língua falada, objetivando identificar suas

características e diferenciá-la da modalidade escrita. Todavia, tais estudos

centravam-se apenas na análise do código e apresentavam as duas

modalidades como dicotômicas.

Ao aprofundarem os estudos, os pesquisadores puderam notar a

impropriedade dessa abordagem, e nos trabalhos mais atuais que

abandonaram essa dicotomia, perceberam que estudar fala e língua

focalizando as diferenças entre as duas modalidades “não contribui para a

compreensão e percepção dessas atividades como práticas sociais” (LIMA;

BESERRA, 2012, p. 59).

Afirmam ainda, as autoras (2012, p.59), que os estudos modernos

concluem que características sugeridas pelos primeiros estudiosos não devem

mais ser conferidas às modalidades da língua.

Por exemplo, hoje, considera-se que não tem cabimento a oposição “contextualizada x não contextualizada”, uma vez que se defende a ideia de que qualquer texto, seja da fala, seja da escrita, é sempre um texto produzido dentro de um contexto, ou, em outras palavras, é sempre um “texto situado”. (grifos das autoras)

Para Koch e Elias (2010, p. 16) o que realmente ocorre é que nem todas

as características são exclusivas de uma ou outra modalidade. Essas

características sempre foram medidas pelo parâmetro da escrita, levando a

uma visão preconceituosa da fala, que chegou a ser comparada com a

linguagem rústica das sociedades primitivas ou às crianças em fase de

aquisição da linguagem.

Em muitos casos, a sintaxe é sacrificada pelo locutor em favor das

necessidades da interação, o que provoca, no texto falado, “falsos começos,

truncamentos, correções, hesitações, repetições, inserções e paráfrases”, que

não chegam a serem defeitos, pois têm funções cognitivo-interacionais

importantes como:

Ganhar tempo para o planejamento ou para a compreensão por parte do interlocutor (pausas, hesitações, repetições); apresentar esclarecimentos, exemplificações, atenuações do que foi dito, reforçá-lo,

100

etc. (inserções, repetições, parafraseamentos), entre outras. (KOCH; ELIAS, 2010, p. 18)

Em conformidade com Koch e Elias (2010, p.18), a fala não pode ser

considerada absolutamente caótica, desestruturada e rudimentar. O texto

falado tem uma estrutura própria “ditada pelas circunstâncias sociocognitivas

de sua produção e é à luz desta que deve ser descrito e avaliado”.

Portanto, os professores devem ser preparados, em cursos de formação,

para trabalhar atividades que proponham o uso da modalidade oral da língua

nas situações de interação.

5.2 A relevância dos gêneros discursivos nas produções textuais

Ultimamente, parece haver um consenso de que o ensino de Língua

Portuguesa deve se embasar na diversidade textual. Porém, o que temos visto

é um ensino polvilhado de gêneros textuais, mostrando basicamente o que é

cada um, sem aprofundar muito o assunto.

Destacam Albuquerque e Leal (2007, p. 104), que tem ocorrido, por

diversas vezes nas escolas, um trabalho com diversidade textual que se

transforma em conteúdos tradicionais de ensino e, assim,

Nessa perspectiva, mais do que possibilitar aos alunos leituras e escritas diversas, de diferentes gêneros, escritos em contextos diferenciados e para diferentes fins, a ênfase no trabalho com textos têm recaído no ensino de suas características, na importância dos alunos identificarem e os classificarem. Não se nega, aqui, a importância desse conhecimento, mas o que se observa é uma escolarização desses textos, distanciada de seus contextos sociais de produção.

Com relação ao ensino da gramática, Marcuschi (2008, p. 56) diz que é

impossível trabalhar a língua sem atentar para o sistema, o que garante o

trabalho com a gramática no ensino da língua materna. Além disso, segundo o

autor, a gramática tem importante função sociocognitiva, se entendida como

ferramenta que possibilita uma melhor atuação comunicativa.

Santos (2007, p. 22) salienta, uma vez que diferentes gêneros de texto

requerem diferentes tipos de conhecimentos e diferentes conjuntos de

habilidades, também deve ser diferente o ensino da produção de texto e de

leitura para todos os gêneros estudados. Segundo a autora (2007, p. 22)

101

[...] a aprendizagem da escrita não é algo que se dá de modo espontâneo, mas se constrói através de uma intervenção didática sistemática e planejada. Em razão disso, vários pesquisadores têm defendido um ensino sistemático da produção escrita de diferentes gêneros, já a partir das séries iniciais. Não se trata apenas de permitir o acesso, o manuseio, a leitura ou a produção de diferentes tipos de textos, mas efetivar um ensino sistemático [...].

Esse ensino sistemático deve acontecer de maneira que o aluno adquira

o conhecimento implícito do gênero, isto é, entenda as características contidas

nele e aprenda a utilizá-lo nas diversas situações de interação. O ensino

sistemático significa que ele seja ordenado para determinado gênero, isto é,

que passe por etapas que viabilizem o aprendizado do aluno. Entretanto,

mediante a dificuldade de entendimento apresentada pelo discente, somente a

sistematização do ensino pode não ser suficiente para sua aprendizagem,

cabendo ao professor providenciar outras atividades que venham a contemplar

essa aprendizagem, ampliando a sistematização.

O ensino de certo gênero de texto ministrado pelos professores sujeitos

da pesquisa é comum ao que acontece com outros colegas de profissão: o

gênero é ensinado, porém, não de forma sistemática, que dê tempo suficiente

para os estudantes apreenderem, ficando, por vezes, apenas como uma

abordagem superficial sobre o tema.

Assim, ainda de acordo com Santos (2007, p. 23), em situação escolar

o gênero apresenta uma espécie de desdobramento, pois serve como

ferramenta de interação social e objeto de ensino-aprendizagem.

Conforme relata Santos (2007, p. 23), “[...] ao mesmo tempo em que a

escola reflete o mundo extra-escolar, ela difere discursivamente deste mundo”,

o que, segundo a autora (2007, p.23), significa que o conhecimento escolar é

formado por generalizações.

Na prática dos professores o desdobramento ocorre como comumente

acontece nas escolas: o ensino dos gêneros de texto, embora tente se

aproximar ao máximo da realidade extraclasse, não a alcança. Os gêneros

abordados espelham a vida além dos muros escolares, todavia, não

representam as experiências vividas pelos alunos em seus cotidianos. Assim,

os professores ensinam o gênero, mas precisam da metalinguagem, o que

102

quer dizer, como afirma Santos (2007, p. 23), que “[...] faz-se necessário trazer

para a escola explicitamente os “comos” e “porquês” da linguagem”.

A fala de um professor, numa reunião pedagógica, que me fez refletir

muito sobre o que pensam certos profissionais ao ensinarem aos seus alunos,

quando disse que o ensino do gênero textual carta estava ultrapassado, pois

atualmente não se escrevem mais cartas para ninguém, sendo, portanto um

aprendizado inútil.

A posição daquele professor forçou-me a pensar no que temos ensinado

aos nossos estudantes, caso nosso pensamento seja retrógrado assim. De

fato, escrevemos poucas cartas, atualmente, porém, há que se pensar que

esse gênero nada mais é que o precursor dos e-mails.

Diz-nos Marcuschi (2010, p. 21) que “O e-mail (correio eletrônico) gera

mensagens eletrônicas que têm nas cartas (pessoais, comerciais etc.) e nos

bilhetes seus antecessores”. Portanto, as cartas eletrônicas são novas formas

de gêneros textuais que têm identidades próprias, assim como as cartas

escritas de próprio punho.

Além disso, num país imenso como o nosso, existem localidades cujas

tecnologias do correio eletrônico ainda são realidades distantes e seus

habitantes, até hoje, contam com o correio tradicional e a entrega de cartas e

mensagens escritas, provando que este gênero textual não está fora do

contexto social.

Assim sendo, os gêneros discursivos são de grande relevância para a

produção dos estudantes. Não somente para eles, mas, também, para todos

nós, falantes da língua materna, pois organizamos nossos discursos por meio

dos gêneros textuais. Afirma-nos Bakhtin (2011, p. 266) que “uma determinada

função [...] e determinadas condições de comunicação discursiva, específicas

de cada campo, geram determinados gêneros [...]”.

Ao ensinar gêneros textuais aos pequenos, o professor capacita-os para

as mais diversas situações de comunicação oral ou escrita. Desta forma, de

acordo com os PCNs (BRASIL, 2001, p. 25), para organizar seu discurso, o

falante precisa ter conhecimento do que seu interlocutor sabe sobre o assunto

a ser abordado. Necessita supor suas opiniões, convicções, com o que ele

simpatiza e antipatiza, o grau de afinidade e familiaridade que se tem com

103

relação a ele, bem como a posição social e hierárquica que ocupa. Ainda

conforme os PCNs (Idem, p. 25),

Isso tudo pode determinar as escolhas que serão feitas com relação ao gênero no qual o discurso se realizará, à seleção de procedimentos de estruturação e, também, à seleção de recursos linguísticos.

Então, ao aprender os gêneros do discurso, o aluno comunicar-se-á com

maior eficácia, tanto na escrita quanto na oralidade, o que reforça a

necessidade de a escola propor uma diversidade de textos para a apropriação

da escrita. Além disso, como afirma Mendonça (2007, p. 76), “A imensa

variedade de gêneros textuais existentes manifesta, verbalmente, as nossas

diversas necessidades de interação social mediadas pela linguagem, oral ou

escrita”.

Portanto, o professor deve se familiarizar com os gêneros, antes de

ensiná-los, entendendo como eles circulam e funcionam na sociedade. Desta

forma, é inevitável que ele faça estudos e comparações, conhecendo mais

profundamente o material a ser explorado, a fim de obter um melhor

aproveitamento. Mendonça (2007, p. 76) expõe que,

Nesse sentido, o docente deve articular sempre o conhecimento macro sobre o gênero – função social, formas de circulação, interlocutores privilegiados, temas frequentes, organização geral da informação – e o conhecimento micro a respeito – estruturação dos períodos, escolha de palavras, expressões, etc.

Desta maneira, o ensino dos gêneros não ficará muito polvilhado,

possibilitando ao estudante uma maior compreensão sobre cada abordagem.

Com relação a isso, Bezerra (2010, p.234) descreve que

O trabalho com gêneros textuais na sala de aula favorece a aprendizagem da escuta, leitura e escrita de textos diversos, com funções específicas, visto que a orientação do professor não será mais a de considerar apenas o aspecto formal do texto escrito, mas a de proporcionar o uso efetivo do texto por parte de seus alunos, abrindo-lhes oportunidade de se desenvolverem como cidadãos de uma sociedade letrada. Assim, a leitura e a escrita não serão apenas práticas escolarizadas.

Essas práticas, certamente, transporão os muros da escola e teremos

cidadãos mais conscientes e críticos.

104

Beth Marcuschi (2007, p. 62) nos fala que há um “deslizamento de

sentido” quando o gênero textual vai do espaço extraescolar para o escolar. O

que equivale a dizer que, quando trabalhamos com os alunos atividades de

leitura e produção, os gêneros textuais serão uma variação dos gêneros de

referência, “sobretudo no que diz respeito aos aspectos funcionais, mas, em

parte, também quanto às características linguísticas formais e à seleção dos

conteúdos e conhecimentos”. Então, é inevitável e benéfica a escolarização do

gênero, se desejarmos que nossos discentes sejam compreendidos em seus

enunciados e compreendam o enunciado do outro. Porém, a abordagem dada

aos gêneros textuais muitas vezes tem sido apenas como pretexto para o

ensino da gramática e da ortografia, em vez de, também, o ensino da produção

textual.

Ainda segundo a autora (2007, p. 62), cabe à escola a transposição do

gênero textual, transformando os saberes elaborados pela sociedade em

objetos de ensino. Todavia, esses devem ser explorados, não aplicados

superficialmente apenas para que o aluno saiba que existem determinados

gêneros de texto.

Os gêneros textuais, quando mais profundamente explicados, ajudam os

alunos a dominá-los melhor e, de certa forma, vão letrando-os. Um exemplo

disso ocorreu na sala do professor Antônio:

A leitura deleite foi retirada do livro de Língua Portuguesa e Daniel Luís leu “História para boi casar”, de Alessandra

Roscoe. [...] o professor [...] perguntou sobre o texto e qual era o outro texto que ele lembrava. Responderam que era “Boi da cara preta”. (PROTOCOLO n. 22, linhas 3-8, de 10/04/2013)

Como o professor explorava os textos lidos em sala, seus alunos

souberam fazer a intertextualidade entre a “História para boi casar” e a cantiga

“Boi da cara preta”. O professor Antônio, após as leituras deleite, sempre

questionava seus alunos sobre o que ouviram. Perguntava sobre personagens

e suas atitudes, palavras desconhecidas das crianças e o ensinamento que o

texto trouxe.

Certo dia, na leitura feita pela aluna Leyla do livro “O traço e a traça”, de

Roseana Murray, a palavra cotovia foi citada. Logo após a leitura, o professor

Perguntou o que era cotovia citada no texto. Ryan disse que era uma criança e Leyla, que era um animal. O

105

professor explicou o que era. Em seguida, perguntou sobre as personagens do livro. Responderam que eram João e Maria. Mostrou as fotografias [...] da autora e da ilustradora, perguntando se eles imaginavam como elas eram. (PROTOCOLO n. 23, linhas 10 – 16, de 15/04/2013)

Também a professora Luísa procurava letrar suas crianças, ora

explorando os textos lidos, ora explicando as palavras estranhas para eles,

surgidas durante a leitura.

Quando a leitura é feita respeitando as pontuações e dando vida às

vozes dos personagens, também é uma forma de letrar, pois chama a atenção

da criança, que ouve determinadas palavras e, desconhecendo seus

significados, pergunta ao professor. Uma vez conhecida a acepção da palavra,

ela vai procurar empregá-la em suas produções.

[...] a professora leu “A verdadeira história dos três porquinhos”. [...] durante a leitura Brenda perguntou o que era “inflar” e a professora explicou que era encher os pulmões de ar. Daniel perguntou o que era “rechonchuda” e a professora ensinou que era “gordinha” e de novo perguntou o que era “empanturrado” e a resposta foi que o lobo comeu demais, ficou muito cheio. Victor perguntou o que era “ir às favas” e a professora disse que era não dar nenhuma importância a algo. (PROTOCOLO n. 24, linhas 4 – 11, de 15/04/2013)

Ao final da leitura, a professora perguntou se eles emprestariam uma

xícara de açúcar ao lobo e eles, em uníssono, responderam que não

(PROTOCOLO n.24, linhas 11-13, de 15/04/2013). Então, para que haja um

entendimento do texto, são necessárias interrupções como essas, pois, se a

criança não entende o sentido de alguma palavra, também o sentido do texto

fica comprometido.

O ensino da produção textual por meio dos gêneros discursivos interfere

positivamente nesse trabalho. Alguns alunos da turma A escreveram seus

textos com dificuldade, mas por que acharam complicado, no início, escrever

uma história com as características da fábula, conforme vemos no protocolo n.

58, linhas 17-21, de 28/05/2013:

Alguns alunos acharam complicado escrever tendo que obedecer às características do gênero fábula, mas depois de trocarem ideias com os colegas, mais sobre a história que deveriam escrever do que como iriam escrever, desenvolveram seus textos.

106

Assim, depois de tornar a explicar os passos do gênero textual

abordado, as crianças se sentiram mais seguras para produzirem seus textos.

O domínio do gênero, mesmo que superficialmente, ainda, deu aos alunos a

ferramenta para suas produções, mesmo que aqueles estudantes não tivessem

se apropriado por completo dos itens constituintes da fábula.

Marcuschi (2008, p. 84) explica que, entre o discurso e o texto está o

gênero, visto como prática textual-discursiva e social que funciona como ponte

entre o discurso como uma atividade mais universal e o texto, isto é, “gêneros

são modelos correspondentes a formas sociais reconhecíveis nas situações de

comunicação em que ocorrem”.

Para Marcushi (2008, p. 154), os gêneros têm identidade e são

entidades poderosas que regulam a produção textual sob o ponto de vista do

léxico, grau de formalidade ou natureza dos temas e, ao mesmo tempo em que

impõem restrições e padronizações, são um convite a escolhas, estilos,

criatividade e variação.

Na turma B, da professora Luísa a produção textual da fábula também

teve algumas dificuldades. Algumas crianças não entenderam as explicações

sobre a constituição do gênero e a professora precisou retomar o assunto.

Depois de novas explicações, os alunos escreveram, conforme o Protocolo n.

59, linhas 17-22, de 28/05/2013.

Como os alunos ainda apresentavam dificuldade para compreender o gênero, a professora retomou as explicações. Para produzirem suas fábulas, as crianças perguntavam sobre os animais, se podiam fazer um texto com tal animal e algumas criaram estranhas amizades entre animais que realmente só cabem na imaginação fértil dos pequenos [...].

Assim, os alunos produziram seus textos fundamentados nas

explicações da professora sobre o gênero fábula, pois, de acordo com Leal e

Brandão (2007, p. 46),

[...] para produzir um texto, buscamos, na memória, os conhecimentos relativos ao tema, à organização e configuração dos textos, adotando gêneros textuais que, usualmente, estão presentes em situações comunicativas similares à determinada situação com a qual nos deparamos no momento. Precisamos, pois, gerar conteúdos. Organizar tais conteúdos em sequências

107

linguísticas, textualizando o que se quer dizer, e notar (registrar) o texto no papel.

Conforme Schneuwly e Dolz (2004, p. 77), os gêneros textuais

intermediam a aprendizagem e são considerados megainstrumentos pelo fato

de darem suporte para as atividades, nas situações de interação, e serem

referência para os estudantes. E é por ensinar a ler, a escrever e a falar que,

segundo os autores (2004, p. 78), a escola trabalha com os gêneros textuais,

pois “há um desdobramento que se opera em que o gênero não é mais

instrumento de comunicação somente, mas é, ao mesmo tempo, objeto de

ensino-aprendizagem”.

Desta forma, como enfatizam Leal e Brandão (2007, p. 55),

[...] promover a inserção de nossos alunos em diferentes esferas de interlocução, assim como possibilitar o acesso a diferentes gêneros textuais, é imprescindível para que eles construam modelos textuais que sirvam de referência para a escrita de novos textos.

Então, os gêneros discursivos têm grande relevância para a apropriação

da escrita de textos.

6 AS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS

Neste capítulo serão evidenciados os módulos que constituíram a

sequência didática e algumas atividades utilizadas como ferramentas para a

apropriação da fábula e qual o planejamento feito para dirimir as dúvidas

daqueles estudantes no que se referia ao gênero.

Ressalto, também, o principal objetivo do trabalho com sequência

didática, que é o de levar os alunos a se apropriarem da escrita utilizando para

isso o gênero textual fábula, mostrando suas características.

Como auxiliar na tentativa de sanar os problemas surgidos na primeira

produção, os professores aplicaram exercícios, que planejamos em conjunto.

Dicionários foram utilizados para que as crianças compreendessem o

significado de algumas palavras por elas desconhecidas. Textos construídos de

forma coletiva pelos estudantes também foi uma estratégia para o

entendimento do gênero, sendo que alguns alunos se destacaram na criação

do texto pelo fluxo de ideias.

108

Depois da produção inicial houve uma reestruturação de texto, que deu

ênfase à história criada, aos sinais de pontuação, à ortografia e aos parágrafos.

Os alunos participaram dessa atividade com entusiasmo e sempre sabiam

responder às perguntas que os professores faziam sobre a refacção do texto.

6.1 OS módulos da sequência didática

De acordo com Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 26), a

sequência didática “traz em sua proposta um diferencial que é favorecer ao

aluno a ‘ciência do que irá estudar, para que irá servir esse estudo e como irá

desenvolver esse estudo’”.

O ensino por sequência didática, ora apresentado, tinha como objetivo

principal levar os alunos a se apropriarem da escrita por meio do gênero textual

fábula, conhecendo suas características e utilizando-se delas para produzir

seus textos, já que os gêneros são instrumentos de aprendizagem, pois como

relata Marcuschi (2008, p. 212),

[...] quando alguém tem de agir discursivamente, deve instrumentalizar-se com um conjunto de utensílios, por exemplo, usando o garfo para comer, o machado para cortar uma árvore ou então um gênero como instrumento para agir discursivamente.

Desta forma, o gênero textual está presente no processo de ensino-

aprendizagem da escrita. Compartilhando dessa opinião estão Barros-Mendes,

Cunha e Teles (2012, p. 20) que dizem que

O trabalho com sequência didática torna-se importante por contribuir para que os conhecimentos em fase de construção sejam consolidados e outras aquisições sejam possíveis progressivamente, pois a organização dessas atividades prevê uma progressão modular, a partir do levantamento dos conhecimentos que os alunos já possuem sobre determinado gênero textual a ser estudado em todas as suas dimensões.

As autoras ainda ressaltam (2012, p. 21) que uma aprendizagem

significativa precisa de um ensino sistemático, que faça com que a criança

explore, experimente, reorganize informações e conceitos, buscando novas

aquisições.

109

Para Marcuschi (2008, p. 215), a produção inicial pode ser feita apenas

como um treinamento para o gênero, como um primeiro contato com o gênero,

o que é de suma importância, pois representa a primeira atividade de produção

na qual o texto será avaliado e revisto tantas vezes quanto for preciso,

passando por módulos até chegar ao estágio final de elaboração.

Assim, conforme os protocolos n. 58 e 59, de 28/05/2013 (vide p. 105-

106 dessa dissertação), turma A e turma B, respectivamente, fizeram a

primeira produção do gênero fábula. Essa foi a aula n. 2.

6.2 AS produções iniciais dos alunos

Definido o projeto de escrita para trabalharmos com as duas turmas

(vide p. 36 da dissertação) o gênero literário fábula foi exposto às crianças com

a leitura de algumas. Na sala da professora Luísa ocorreu a apresentação da

situação, conforme o Protocolo de Observação n. 56, linhas 4-9; 16-21 e 45-48,

de 27/05/2013. Essa foi a aula n. 1 da sequência didática.

[...] Então a professora disse que leria uma fábula, que eles passariam a estudar. [...] perguntou se eles sabiam o que era fábula. As respostas foram variadas. [...] leu para eles a fábula “A Cegonha e a Raposa”. Depois da leitura, que as crianças acharam muito curta, a professora [...] explicou que toda fábula tem uma moral e disse que nessa a lição era de que não devemos fazer para os outros o que não queremos para nós. [...] contou outra fábula “O Lobo e o Cão”, perguntando se eles perceberam que as fábulas trazem a presença de animais e que eles falam. [...] Explicou, também, que os animais da fábula agem como pessoas e têm sentimentos e que moral é um ensinamento que a história passa para a gente.

Houve uma explicação sobre o que as crianças fariam nos próximos dias

nas aulas de Língua Portuguesa, como uma negociação para as atividades que

estariam por vir, para que elas compreendessem melhor o gênero fábula que

estariam estudando a partir daquele dia.

[...] a professora explicou novamente que, por cerca de dois meses, nas aulas de Língua Portuguesa, eles trabalhariam com a leitura e a produção destas histórias. Os alunos gostaram e Hellen disse que seria “legal” ler muitas histórias na aula e a professora falou para eles prestarem atenção às leituras, pois no dia seguinte eles

110

escreveriam uma. (PROTOCOLO n. 56, linhas 9-15, de 27/05/2013)

Na sala do professor Antônio houve a apresentação da situação no

mesmo dia, porém depois do recreio e, da mesma forma, ele explicou a fábula

para seus alunos, conforme Protocolo de Observação n. 57, linhas 7-8 e 11-16,

de 27/05/2013:

[...] passou na lousa a fábula “O Filhote de Cervo e sua mãe”. [...] perguntou que gênero era aquele. Como não disseram que gênero era, o professor, junto com os alunos, fez a leitura. [...] explicou que nas fábulas os animais conversam como seres humanos e também trazem moral da história. Explicou que, no caso em questão, a moral da história era sobre enfrentar o medo.

O professor conversou com seus alunos sobre o que fariam nas aulas de

Língua Portuguesa nos próximos dias, explicando que eles começariam a

trabalhar o gênero fábula e deu os comandos para a produção textual do dia

seguinte.

Quando o professor leu as fábulas, explicou para as crianças que elas passariam a estudar o gênero nas aulas de Português, nos próximos dias, pois precisavam conhecer o gênero. Explicou, também, que elas produziriam textos e fariam atividades do gênero. Ao ouvir as palavras “produzir textos”, alguns alunos reclamaram, mas outros gostaram e já começaram a falar sobre que animais participariam de suas histórias. Novamente o professor disse para pensarem numa história como as que tinham ouvido para amanhã escreverem suas fábulas (PROTOCOLO n. 57, linhas 25-35, de 27/05/2013).

Assim, os professores das turmas A e B deram os comandos para que

os seus alunos fizessem a produção inicial da fábula.

A produção inicial trata-se de uma sondagem para vermos o que as

crianças abstraíram da apresentação da situação ou o que elas já conheciam

sobre os gêneros abordados. Analisando as primeiras produções é que veio a

constatação dos problemas que surgiram e que era preciso sanar, por meio de

atividades.

Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.102) afirmam que “a produção

inicial tem um papel central como reguladora da sequência didática, tanto para

os alunos quanto para o professor”, pois é essa sequência que definirá o que é

111

preciso trabalhar para desenvolver as capacidades de linguagem dos

estudantes.

É durante a primeira produção que os alunos elaboram seu texto e

mostram o que entenderam sobre a apresentação da situação. Dolz, Noverraz

e Schneuwly (2004) afirmam que se a apresentação da situação for bastante

clara, todos os alunos serão capazes de produzir um texto, oral ou escrito, que

responda a situação dada, embora nem todos consigam respeitar as

características do gênero estudado. Os autores (2004, p. 101) informam, ainda,

que “cada aluno consegue seguir, pelo menos parcialmente, a instrução dada.

Esse sucesso parcial é, de fato, uma condição sine qua non para o ensino, pois

permite circunscrever a capacidades de que os alunos já dispõem [...]”.

A produção inicial da turma A (professor Antônio) ocorreu dessa forma,

conforme Protocolo n. 58, linhas 6-12, de 28/05/2013:

O professor explicou o significado de algumas palavras. Em seguida, as crianças partiram para a produção. Ficaram em silêncio por um tempo, pensando em seus textos, depois foram às mesas dos colegas trocarem ideias. [...] Alguns alunos não compreenderam e tiveram dificuldades para escrever.

A professora Luísa afixou um cartaz na lousa com a fábula “O filhote de

cervo e sua mãe” e explicou que, quando escrevemos um texto, não devemos

nos esquecer dos parágrafos e relembrou as características da fábula, de

acordo com o Protocolo n. 59, linhas 7-11, de 28/05/2013.

Depois, a professora distribuiu folhas para as crianças fazerem a primeira produção. Também nesta sala as dúvidas foram muitas. Faltando dez minutos para encerrar a aula, a professora recolheu os textos de quem já havia terminado [...].

Os problemas detectados com a produção inicial da turma A foram a

falta de diálogo entre os animais, sendo que esses apareciam, porém como

animais de estimação e a falta de moral da história, como nos comprova o

Protocolo n. 61, linhas 15-25, de 05/06/2013.

O professor lhes disse que, para ser fábula, eles precisavam dar voz aos animais e não apenas citar os animais. Depois disso, fizeram as atividades pertinentes à tarefa. Quanto a essas tarefas de interpretação do texto, algumas questões o professor perguntou oralmente [...]. Poucos erraram algumas perguntas, mas o mais importante é que entenderam a questão que perguntava

112

o que significava a frase “uma boa ação se paga com outra”, pois responderam que era a moral da história.

Com a turma B, os problemas detectados foram semelhantes, se não os

mesmos: contaram histórias sobre animais de estimação, sem que fossem os

protagonistas do texto e não havia, também, moral da história. O Protocolo n.

63, linhas 17-26, de 04/06/2013 mostra-nos como foi a primeira produção

daqueles alunos.

A professora devolveu as primeiras produções de fábula para os alunos verificarem onde eles se enganaram [...]. Esses alunos entenderam que a fábula tem como uma de suas características o diálogo entre animais, porém, também, nenhum deles escreveu uma moral para a história.

Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 102), essas primeiras

produções constituem ricos momentos de observação, pois elas “[...] permitem

refinar a sequência, modulá-la e adaptá-la de maneira mais precisa às

capacidades reais dos alunos de uma dada turma”. Os autores afirmam, ainda,

que elas também mostram, de maneira precisa em que ponto os alunos estão e

quais dificuldades encontradas por eles. Assim, o professor obtém informações

até para, se for o caso, individualizar o ensino e, a partir daí, aplicar as

atividades que venham de encontro com as dificuldades apresentadas pelos

alunos.

Estes exercícios fazem parte dos módulos, terceiro componente da

sequência didática, assim preconizados por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004,

p. 103): “Nos módulos, trata-se de trabalhar os problemas que apareceram na

primeira produção e de dar aos alunos os instrumentos necessários para

superá-los”.

Concordando com as ideias de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) está

Costa (2000, p. 72), que assegura que

Apropriar-se, [...] dos gêneros, sistematicamente, mediados por estratégias de ensino intervencionistas formalizadas, é reconstruir a linguagem em novas situações concretas de comunicação, mais complexas, que certamente levarão os alunos a uma autonomia progressiva nessas atividades comunicativas complexas.

A sequência didática é um modo de os estudantes apropriarem-se dos

instrumentos de linguagem próprios ao gênero. É, portanto, um modo de

113

preparar os alunos para a produção final e, consequentemente, para produções

de textos orais e escritos que eles venham a produzir no decorrer de suas

vidas.

Detectados os problemas surgidos na primeira produção, tentamos,

professores e pesquisadora, resolvê-los por meio dos módulos das sequências

didáticas, o que explanarei mais adiante.

Analisando a produção inicial, professores e pesquisadora puderam

intervir nos pontos onde surgiram os problemas a serem sanados e, de acordo

com essa avaliação, foram detectados:

Falta de animais personificados, isto é, com características humanas;

Presença de animais de estimação;

Falta de moral da história;

Moral da história não condizente com o texto;

Falta de pontuação;

Marcas da oralidade nos textos.

Tais itens justificaram as escolhas das atividades elaboradas e aplicadas

na sequência didática. Outros problemas surgidos são relacionados ao nível de

alfabetização dos educandos, como ortografia, por exemplo, que tendem a

desaparecer com o decorrer do ano letivo.

6.3 A sequência didática do gênero fábula

Antes de expor como foi o trabalho com a sequência didática e os

módulos, mostrarei um quadro que sintetiza o que ocorreu em cada dia da

pesquisa com o gênero fábula.

Quadro 17 - Síntese das atividades da sequência didática

DIA/MÊS ATIVIDADES

27/05 Apresentação da situação com leituras de fábulas e explicação sobre as características do gênero fábula.

28/05 Leitura e interpretação oral de fábulas; distribuição de textos para leitura e familiarização com o gênero; produção inicial da fábula.

29/05 Leitura e interpretação oral de fábulas; leitura das fábulas distribuídas aos alunos na aula anterior; leituras de fábulas na biblioteca escolar pelos alunos e bibliotecária com discussão sobre o texto.

03/06 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; entrega das produções iniciais para os alunos analisarem; ilustração de fábula.

114

04/06 Início dos módulos: leitura de fábula por meio de cartaz; atividade de consolidação da fábula “A pomba e a formiga”.

05/06 Leitura de fábulas na biblioteca; leitura e interpretação oral e escrita da fábula “O lobo e o burro”; pesquisa em dicionários de palavras da fábula, desconhecidas pelos alunos.

10/06 Leitura e interpretação oral de fábula; reestruturação de fábulas criadas pelos alunos.

11/06 Leitura e interpretação oral de fábula; texto explicativo sobre o gênero.

12/06 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula.

17/06 Leitura e interpretação oral de fábula; reestruturação de fábulas criadas pelos alunos, com ênfase nos sinais de pontuação e parágrafo.

18/06 Leitura e interpretação oral de fábula; produção coletiva de fábula.

01/07 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; pesquisa em dicionários de palavras da fábula, desconhecidas pelos alunos.

02/07 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; agrupamento dos alunos em duplas por nível de conhecimento (alunos A ou AB com alunos C) para trabalharem a interpretação do texto.

03/07 Leitura de fábula; produção final do gênero fábula. Fonte: Dados da pesquisa.

Portanto, atividades de consolidação, interpretação das fábulas,

reestruturação de texto e pesquisa em dicionários das palavras desconhecidas

foram aplicadas, além das leituras diárias de fábulas, até mesmo nas leituras

deleite.

A aula n. 3, conforme protocolo n. 60, linhas 20-30, de 29/05/2013, da

turma B, iniciou com os alunos lendo as fábulas que a professora havia

distribuído para eles na aula anterior e que levaram para casa para lerem. Os

que desejaram, foram à frente para ler seus textos para os demais colegas.

Após a leitura, fomos à biblioteca da escola.

Lá, a bibliotecária leu a fábula “A raposa que sabia tudo”. Depois da leitura e da discussão sobre o texto lido, a bibliotecária distribuiu algumas fábulas para os alunos lerem.

Na sala do professor Antonio, o protocolo n. 61, linhas 25-30, de

03/06/2013, a aula n. 4 começou com a leitura da fábula “A mulher e sua

galinha”, de Esopo. Depois, com base nas produções iniciais, o professor falou

para os alunos que para ser fábula

[...] eles precisavam dar voz aos personagens e não apenas citar os animais. [...] o professor entregou as primeiras produções das fábulas feitas pelos alunos para que eles vissem onde estavam os erros cometidos. Alguns alunos vieram me perguntar onde estava errado e eu expliquei a eles o que estava faltando para ser uma fábula.

115

O primeiro módulo, ou aula n. 5, na sala da professora Luísa, deu-se

como registrado no Protocolo de Observação n. 63, linhas 20-26, de

04/06/2013.

Depois de verificarem os erros, os alunos devolveram seus textos à professora, que seguiu passando atividades de interpretação e consolidação da fábula. Assim, detectado o problema de entendimento com as fábulas, inicia-se o módulo 1, que trata de atividades que venham auxiliar os alunos a dominarem esse gênero.

Na sala do professor Antonio, de acordo com o protocolo n. 64, linhas

13-16, de 04/06/2013.

Os exercícios passados no quadro eram sobre a fábula “A formiga e a pomba”, que está fazendo parte do primeiro módulo, a fim de que as crianças compreendam melhor e venham a dominar esse gênero.

A aula n. 6, na turma A começou com o professor levando os alunos

para a biblioteca escolar, porém a bibliotecária leu para eles um livro sobre

cuidados na escola. Depois da leitura e discussão do texto, como registrado no

protocolo n. 65, linhas 6-9 e 15-19, de 05/06/2013,

[...] a bibliotecária distribuiu alguns livros de fábulas para os alunos lerem. Relutaram, inicialmente, pois os livros não traziam figuras, mas depois começaram a ler e gostaram. Terminado o horário, os alunos retornaram à sala. [...] o professor distribuiu o texto da fábula “O lobo e o burro”, de Esopo. Depois, leu o texto e explorou-o oralmente.

E seguida, o professor trabalhou o vocabulário do texto e escreveu na

lousa as palavras desconhecidas pelos alunos, que eles mesmos ditaram e

depois pesquisaram em dicionários.

A figura 2 demonstra uma das atividades focadas no ensino-

aprendizagem do gênero.

Figura 2 - Fábula com atividade de consolidação e interpretação

A formiga e a pomba

116

Uma formiga sedenta veio à margem do rio para beber água.

Para alcançá-la, devia descer por uma folha de grama. Quando

assim fazia, escorregou e caiu dentro da correnteza.

Uma pomba, pousada numa árvore próxima, viu a formiga em

perigo.

Rapidamente, arrancou uma folha da árvore e deixou-a cair no rio,

perto da formiga, que pode subir nela e flutuar até a margem.

Logo que alcançou a terra, a formiga viu um caçador de pássaros,

que se escondia atrás duma árvore, com uma rede nas mãos.

Vendo que a pomba corria perigo, correu até o caçador e mordeu-

lhe o calcanhar. A dor fez o caçador largar a rede e a pomba fugiu para

um ramo mais alto.

De lá, ela arrulhou para a formiga:

__ Obrigada, querida amiga.

“Uma boa ação se paga com outra”.

(Esopo)

Assinale com um x as respostas corretas

1) Este texto é uma fábula porque apresenta características como

(A) humor e seres encantados

(B) instruções e imagens

(C) tabelas e informações científicas

(D) animais como personagens e moral da história

2) O texto começa dizendo: “Uma formiga sedenta veio à margem do rio para

117

beber água. Para alcançá-la devia descer por uma folha de grama”. A palavra

sublinhada refere-se a

(A) grama (B) água

(C) folha (D) formiga

3) A formiga se salvou da correnteza porque

(A) o rio parou de correr

(B) o caçador a tirou de dentro do rio

(C) caiu um galho de árvore em que ela se apoiou

(D) ela subiu numa folha de árvore jogada ao rio pela pomba

4) A formiga viu o caçador preparado para caçar a pomba no momento em que

(A) se debatia na correnteza (C) se escondia atrás de uma árvore

(B) foi presa pela rede do caçador (D) alcançou a terra

5) No início do texto, diz-se que a formiga estava sedenta. Isto significa que a

formiga estava com

(A) fome (B) frio

(C) sede (D) calor

6) "Uma boa ação se paga com outra". A frase, escrita entre aspas e em letras

maiores que as do texto, indica

(A) a moral da história

(B) que a história acabou

(C) a amizade que se formou entre a pomba e a formiga

(D) que foi o caçador de pássaros quem falou

Fonte: Dados da pesquisa.

A aula n. 7, na turma B, foi aberta com a leitura da fábula “A raposa e a

galinha”, cuja moral não era explícita, mas os alunos compreenderam-na no

decorrer da leitura, como está posto no protocolo n. 67, linhas 4-6 e 9-17, de

10/06/2013.

[...] a professora falou para os alunos que hoje eles fariam a reestruturação de uma fábula escrita por uma das alunas. [...] a fábula em questão foi “O lagarto, o sapo e a mamãe”. A aluna havia escrito “O lagato e o sapo e a mamae”. A professora, com a ajuda dos alunos, linha por linha do texto foi reestruturando-o. [...] os alunos Hellen e Carlos deram sugestões de moral da história. A de Hellen foi “nunca brigue com seu amigo, pois um dia pode precisar dele”. A moral de Carlos foi “uma boa amizade gera outra amizade”. O texto reestruturado foi afixado num cartaz na parede da sala.

118

Na sala do professor Antonio, a turma A, conforme o protocolo n. 68, de

10/06/2013, a fábula reestruturada foi a de Ricardo, “Dico, o lagartinho”, porém,

infelizmente, o professor fez quase que sozinho a reestruturação, sem envolver

a turma como deveria pouco lhes perguntando o que, na opinião deles, estava

incorreto.

Na aula n. 8, o professor voltou a explicar sobre as fábulas e passou na

lousa um texto explicativo sobre o gênero e, em seguida, a fábula “A raposa e

o corvo”, de acordo com o protocolo n. 69, linhas 8-12 e 17-20, de 11/06/2013.

Ao terminar de passar o texto, o professor foi olhar os cadernos e viu que quase todos os alunos copiaram sem respeitar os parágrafos. Então, o professor pediu que eles refizessem o texto da maneira correta. [...] falou que vai exigir uma produção de texto com parágrafos e pontuações corretas, mesmo porque as pessoas que leem seus textos precisam entender o que está escrito.

A aula da professora Luísa começou com ela perguntando às crianças o

que elas aprenderam sobre a fábula. Em conformidade com o protocolo n. 70,

linhas 2-13, de 11/06/2013, as respostas foram variadas.

Alex disse que era uma história pequenininha. Brenda disse que ensina muito. Carlos disse que era “um conto de fadas que faz as crianças lê e aprender a moral”. Tiago diz que “é feita pra ler, gostar e escrever”. Heitor, que são lendas que os animais fizeram. Helena, que “é bom pra ler e aprender ler”. Gabriela, que “é divertido pra ler”. Daniela, que “são história bem legal”. Daniel, que “é bom pra ler e pra brincar”. Eduardo disse que “é história que tem nos livro pra aprender a ler, escrever e responder as pergunta que a senhora faz”. Depois que as crianças falaram, a professora passou um texto resumido, explicando o que é fábula.

A aula 9, na sala de Luísa foi lida a fábula “O pescador e o peixe” e, na

sala do professor Antônio, a leitura deleite também foi uma fábula. Depois das

leituras os professores, cada um em sua respectiva sala, passaram atividades

de interpretação e consolidação do gênero. As aulas foram registradas nos

protocolos 71 e 72, do dia 12/06/2013.

A aula n. 10, na turma A, a leitura deleite da fábula “Assembleia dos

ratos” foi feita pela aluna Juliana. Nessa aula foi feita a reestruturação do texto

de Ryan “O lobo e a raposa”, que foi exposto num cartaz e afixado na parede

da sala. Na turma B, foi feita a reestruturação da história de Tiago, “A tartaruga

119

marinha”. Na reestruturação de textos foram trabalhados os sinais de

pontuação, como os dois pontos e travessões que marcam o diálogo, os

pontos finais, de interrogação e as vírgulas. O assunto vinha sendo abordado

oralmente em todas as aulas.

Todavia, para Marcuschi (2008, p. 218), sobre a revisão ortográfica dos

textos dos alunos,

[...] não são questões de gênero textual, mas podem ser tratados na produção linguística escrita sem dificuldade, dentro dos módulos [...]. O trabalho da ortografia não deve sobrepor-se ao trabalho efetivo com a produção textual, pois a ortografia é um detalhe específico que deve ser cuidado, mas com outro tipo de atenção e exposição do aluno. Transformar a revisão ortográfica em centro dos problemas é desvirtuar todo o trabalho com a sequência didática. (grifos meus)

A aula n. 11 foi composta por leituras e interpretação oral de fábulas e

produção coletiva de textos do gênero. A turma A produziu o texto “O urso e o

peixinho dourado”. A turma B fez o texto “O sapo e a coruja”.

A proposta de produzirem uma fábula, na turma B, logo foi aceita e

construíram coletivamente um texto, tendo a professora como escriba, que ia

perguntando sobre as pontuações, a grafia correta das palavras e ajudando-os

no encadeamento da produção. A história ficou curta e a moral da história não

foi condizente com o texto, porém foi escrita como eles elaboraram e ditaram,

conforme protocolo n. 74, linhas 3-10, de 17/06/2013 (aula n.11).

O sapo e a coruja O Sapo e a Coruja brincavam alegremente, quando um bruxo malvado chegou. Ele falou: -Abram a porta ou eu vou transformar vocês em estátuas. Eles ficaram com medo. E o Sapo falou: - Não vamos abrir a porta! A Coruja teve uma ideia: - Vamos sair pela janela do fundo. Os dois saíram correndo. Quando o bruxo entrou não encontrou ninguém e ele ficou bravo. Moral da história: uma boa pessoa ajuda a outra.

Embora a narrativa acima tenha sido uma produção coletiva dos alunos

da turma B e contenha personagens animais com falas e ações que se

assemelham às humanas, não se trata de fábula.

120

Com a turma A (aula n. 11), a construção do texto assim ocorreu:

[...] o professor passou o cabeçalho no quadro e informou aos alunos que eles fariam uma produção coletiva de uma fábula. Perguntou, então, se eles se lembravam das características das fábulas e eles responderam que eram os animais que falavam como gente. Durante a produção os alunos foram bastante participativos, produzindo a fábula “O Urso e o Peixinho Dourado”. Souberam também dar uma moral condizente com o texto. (PROTOCOLO n. 77, linhas 4-13, de 01/07/2013)

Nessa sala os alunos conseguiram trabalhar bem a produção coletiva,

iam tendo as ideias e o professor registrando, foram bastante participativos,

tanto que o texto ficou um pouco longo. Vejamos:

O Urso e o Peixinho Dourado Era uma vez, um urso que foi pescar. Ele pegou um belo peixe dourado e levou-o para casa, colocou-o num aquário para dar-lhe mais vida. Então o Peixinho falou:

- Ó, meu pai, onde estou? O Peixinho tentou escapar e pulou no chão. Ele estava sufocando fora da água, quando o Urso o encontrou e colocou-o de volta e tampou o aquário para ele não fugir mais. O peixinho teve uma ideia: -Vou me fingir de morto para o urso me tirar daqui, me levar para o lago e eu conseguir fugir e viver longe do Urso. E assim aconteceu! Ao chegar no lago, Peixinho Dourado viu que lá morava um crocodilo que correu atrás dele, mas não conseguiu pegá-lo, pois estava muito cansado. Um pescador pegou o crocodilo, levou-o para o rio, salvando Peixinho Dourado e o Urso que estava por perto, arrependeu-se de aprisionar o peixinho, chamou-o e disse: - Peixinho Dourado, o que eu fiz é muito feio. Você aceita ser meu amigo? Peixinho Dourado aceitou a amizade do urso e sempre estavam juntos e sem brigas. Moral da história: Não devemos maltratar as pessoas, mas ser amigos de todos.

O texto ficou longo, pois os alunos iam dando opiniões, sendo que

William era o maior entusiasta.

121

A aula n. 12, além das leituras deleite que foram fábulas, houve a

interpretação oral e escrita de fábulas e retiradas as palavras de significados

desconhecidos pelos alunos para que pesquisassem em dicionários.

Na aula n. 13, as turmas leram a fábula “O julgamento da ovelha” e,

depois, fizeram atividades de interpretação oral e escrita do texto. Os

professores separaram os alunos em duplas, de maneira que um dos

componentes da dupla pudesse ajudar o parceiro a fazer a tarefa. Isso já foi

feito em outras ocasiões, o que deu um bom resultado, pois os que conversam

muito e se dispersam, são chamados pelos colegas de dupla e voltam às

atividades e, assim, auxiliam uns aos outros. Os agrupamentos foram por

níveis de aprendizado, isto é, um aluno diagnosticado A ou AB, auxilia os

colegas diagnosticados como C, como registrado no protocolo n. 78, linhas 13-

18, de 02/07/2013.

A aula n. 14 foi dedicada à produção final do gênero fábula. Na turma A,

conforme o protocolo n. 80, linhas 4-16, de 03/07/2013, o comando do

professor para a produção foi de que fizessem um texto, criado por eles, ou

recontassem algum que já conhecessem. De toda a turma apenas três alunos

fizeram o reconto e os demais optaram por inventar uma história.

6.4 AS produções finais dos alunos

A produção final é o quarto componente da sequência didática.

Consoante a Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.106), “A sequência é

finalizada com uma produção final que dá ao aluno a possibilidade de pôr em

prática as noções e os instrumentos elaborados separadamente nos módulos”.

Com essa produção, o professor realiza a avaliação somativa.

Nessa avaliação do tipo somativo, conforme os autores (2004, p.107), “o

importante é que o aluno encontre, de maneira explícita, os elementos

trabalhados em aula e que devem servir como critérios de avaliação”. Os

critérios servem para também observar as aprendizagens e planejar a

continuação do trabalho, possibilitando a volta a pontos que não foram bem

apreendidos pelos alunos.

Nas produções finais dos alunos da turma A, do gênero fábula, o

professor propôs às crianças que escrevessem uma fábula de autoria deles

122

próprios ou que fizessem um reconto. As maiores dúvidas foram sobre o que

iriam escrever e, conforme o Protocolo n. 80, linhas 9-16, de 03/07/2013, os

alunos

Iniciaram a produção às 13h30min. [...] A maioria optou por inventar, pois alguns alegaram não se lembrar de nenhuma. Cerca de 30 minutos depois, Ryan entregou sua produção. A última aluna a entregar o fez às 14h30min. Nessa sala, a produção foi feita por 22 alunos. Desses, apenas 3 fizeram o reconto de uma fábula.

Depois da produção, que demorou cerca de uma hora, o professor deu

continuidade a uma atividade de pesquisa em dicionários que eles estavam

fazendo na aula anterior.

Com a turma B, como registrado no protocolo n. 81, linhas 1-15,

de 03/07/2013, o comando da professora para a produção final, foi de que as

crianças fizessem um texto criado por elas ou recontado de algum que já

ouviram anteriormente, dizendo que a pesquisadora sairia de férias e desejava

levar um texto delas como lembrança. Assim, a produção, para a maioria dos

alunos, terminou cerca de quarenta minutos depois de iniciada, pois haveria

um ensaio para a dança da quadrilha da festa junina da escola e algumas

crianças estavam inscritas. Heitor foi o último a entregar, aproximadamente

uma hora e vinte minutos depois de começar e Caterina não quis fazer logo

que a professora pediu, alegando que não se lembrava do gênero e nem de ter

ouvido nenhuma história. Pressionada pela professora, ela resolveu escrever,

porém ficou muito semelhante à primeira produção, que falava de uma amiga e

do cachorro de estimação. Durante a sequência didática, todas as leituras

nessa sala foram fábulas, inclusive as deleite.

Nessa turma a professora Luísa fez a mesma proposta, isto é, que os

alunos produzissem uma fábula já conhecida deles, um reconto, ou que

criassem uma. Assim, ocorreu a produção final de acordo com o Protocolo n.

81, linhas 3- 10, de 03/07/2013.

A produção teve início às 15h35min. A primeira produção foi entregue às 16h05min. Nessa sala, todos os alunos foram autorizados pelos pais a participar da pesquisa. O último aluno a entregar o texto foi Heitor, que o fez às 16h55min.

123

Todos entregaram suas fábulas, exceto Caterina, que não conseguiu

produzir e nem se lembrar de nada que foi lido nas aulas, embora a docente

tenha trabalhado a leitura de fábulas, inclusive nas leituras deleite, porém,

diante da insistência da professora, a aluna resolveu escrever seu texto.

Na sala do professor Antônio, trabalhos envolvendo o uso do dicionário

eram constantes. Na turma da professora Luísa a atividade foi novidade para

as crianças que se envolveram e se encantaram com a tarefa, como se cada

palavra encontrada fosse uma nova descoberta. Vejamos o Protocolo n. 75,

linhas 16-24, de 18/06/2013.

Nos exercícios de consolidação da fábula havia algumas palavras para serem pesquisadas no dicionário. Alguns dicionários não traziam todos os verbetes pedidos, então a professora pediu para formarem duplas e usarem os dicionários mais completos. Quando conseguiam encontrar a palavra que buscavam, ficavam muito felizes e corriam para mostrar à professora. A professora chamou os alunos para pegarem o lanche, mas alguns não quiseram sair, pois estavam gostando da atividade.

O texto referente a essa atividade foi “A Fábula do Porco-espinho” e as

palavras a serem pesquisadas eram “glacial”, “mutuamente”, “conviver”,

“relacionamento” e “admirar”, que foram escolhidas pelos professores e

pesquisadora. As palavras foram explicadas com o verbo no modo indicativo

para que as crianças encontrassem-nas com maior facilidade.

Atividades como essas e as dos módulos da sequência didática,

segundo Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 26), visam

Não somente a desenvolver conhecimento acerca do gênero em estudo (condições de produção, forma de composição, etc), mas [...] também de domínio do SEA [Sistema de Escrita Alfabética] (grafar corretamente palavras com correspondências regulares diretas entre letra e fonemas como em P, B, T, D, F, V; usar letra maiúscula e minúscula nos textos produzidos, segundo as convenções).

Isso foi possível notar, durante a sequência didática, pois os alunos se

esforçaram para grafar as palavras corretamente e até mesmo tentaram utilizar

outras mais formais, incomuns às suas falas cotidianas, mas presentes nos

textos lidos e ouvidos por eles.

Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 103), os módulos são

aplicados para trabalhar os problemas que apareceram na primeira produção

124

do gênero, dando aos alunos os instrumentos necessários para que venham a

superar esses entraves. Os autores (2004, p.103) sugerem, ainda, que

A atividade de produzir um texto escrito ou oral é, de uma certa maneira, decomposta, para abordar, um a um e separadamente, seus diversos elementos, [...]. O movimento geral da sequência didática vai, portanto, do complexo para o simples: da produção inicial aos módulos, cada um trabalhando uma ou outra capacidade necessária ao domínio de um gênero. No fim, o movimento leva novamente ao complexo: a produção final.

Marcuschi (2008, p. 216) explica que nos módulos, depois que o aluno

aprendeu a falar sobre o gênero e “adquirido meios de observá-lo sob vários

pontos de vista, ele deve adquirir uma linguagem técnica para se expressar

sobre o que está fazendo”.

Os módulos foram trabalhados de acordo com o que foi detectado nas

primeiras produções dos alunos, culminando com a produção final. A produção

final apresentou, ainda, alguns problemas. Alguns alunos não se apropriaram

completamente do gênero, mas gostaram muito das atividades.

Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 23) afirmam que o trabalho

pedagógico por meio de sequência didática tem sido apontado como positivo

pelo fato de apresentar muitas vantagens

Que poderão auxiliar a minimizar o déficit de aprendizagem no ensino de língua materna, desde as séries iniciais ao final da educação básica, pois, apesar de hoje se ter clareza de que os gêneros textuais precisam estar em sala de aula como ferramenta de ensino, ainda há dúvidas de como explorá-lo de modo efetivo.

Nesse trabalho com sequência didática, como será explicitado mais

adiante, alguns alunos que se encontravam em processo mais inicial de

apropriação da escrita, passaram a escrever de maneira mais inteligível, depois

da intervenção. Isso é uma somatória do ensino de gêneros por meio de

sequência didática, que ocupou todas as aulas de Língua Portuguesa no

período de 27/05 a 03/07 e de outros trabalhos com a linguagem feita pelos

professores.

Segundo Marcuschi (2008, p. 213), o caráter modular da sequência

didática contribui para a compreensão dos gêneros e, a exemplo do que

125

disseram as autoras acima citadas, pode ser aplicado a todas as séries do

ensino fundamental. E a ideia central é a de que se

[...] devem criar situações reais com contextos que permitam reproduzir em grandes linhas e no detalhe a situação concreta de produção textual incluindo sua circulação, ou seja, com atenção para o processo de relação entre produtores e receptores. (2008, p. 213)

Para Marcuschi (2008, p. 217), o trabalho com os módulos permite que

os casos em que não houve sucesso na aprendizagem sejam retrabalhados,

podendo haver um trabalho diferenciado sem a necessidade de divisão de

turmas.

A sequência didática foi adotada com a intenção de auxiliar os alunos a

melhor compreenderem esse gênero e produzirem textos melhores. Desta

forma, como apontam Nascimento, Silva e Lima (2012, p. 169),

Diante de uma tarefa de produção textual, oral ou escrita, precisamos lançar mão de todos os conhecimentos que temos em relação ao tema, ao gênero e às práticas de linguagem em que tal gênero circula.

Então, é a sequência didática que vai dar o contributo ao aluno, a fim de

fazê-lo conhecer o gênero e torná-lo um escritor mais competente. Para

Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 23), com as atividades elaboradas em

cada módulo da sequência didática, “a criança mobiliza as capacidades já

construídas integrando-as em um todo maior”.

126

7 AS PRODUÇÕES DOS ALUNOS NO GÊNERO FÁBULA

Acreditar nas sementes Mantê-las bem quentes nas mãos Saber ler do livro dos ventos Saber bem do cheiro do chão.

Gonzaguinha

O ensino de gêneros textuais tenciona lançar uma semente que

produza, sempre e cada vez mais, bons frutos, que as atividades levem os

alunos a refletir sobre a escrita de modo consciente e produtivo.

O gênero fábula estava presente nas duas salas apenas por meio das

leituras deleite, ou seja, os professores liam para as crianças, sem, no entanto,

trabalhar o tema com elas.

A abordagem do gênero fábula para os aprendizes foi interessante, pois

eles estavam acostumados com histórias mais longas e acharam a fábula um

texto bastante curto. O professor Antônio, de acordo com o Protocolo n. 58,

linhas 12 - 17, explicou o gênero em questão para seus alunos:

[...] explicou novamente, lendo num livro, que fábulas são pequenas histórias escritas com a intenção de ensinar

127

algo e que essas histórias mostram situações das vidas dos seres humanos, mas vividas por animais. Ele falou, também, dos maiores fabulistas do mundo.

Na sala da professora Luísa, também houve a explicação, conforme

Protocolo n. 60, linhas 25 - 31:

Retornando à sala, a professora explicou, lendo num livro de fábulas, que elas são histórias curtas que alguns fabulistas escreveram para ensinar algo para as pessoas. Falou sobre os mais famosos escritores de fábulas e que elas mostram situações do dia-a-dia das pessoas, mas vividas por animais.

O texto mencionado nas citações é um livro de fábulas, contos e lendas,

que trazia uma explicação simples sobre esses gêneros e, quanto às fábulas, o

esclarecimento era esse:

As fábulas são pequenas histórias escritas com a intenção de transmitir algum ensinamento sobre a vida, ou o que se chama “lição de moral”; no final de muitas delas o autor coloca uma frase que resume a lição. [...] a maior parte das fábulas mostra situações típicas do dia-a-dia dos seres humanos, mas vividas por animais. Os mais famosos fabulistas (autores de fábulas) foram: Esopo [...] e La Fontaine [...]. No Brasil, Monteiro Lobato [...], reescreveu muitas delas; nos dias de hoje, o mesmo foi feito por Millor Fernandes (BRASIL, FUNDESCOLA/SEF-MEC, 2000, p. 5).

As fábulas apresentadas para as turmas foram, na maioria, as de Esopo.

Algumas fábulas lidas não apresentavam a moral da história, porém as

crianças entendiam o ensinamento implícito no texto.

Em termos bakhtinianos, o emprego da língua consolida-se por meio de

enunciados que refletem as condições específicas e as finalidades de cada

campo da atividade humana. Desta forma, como explicita o teórico (2010, p.

261), os gêneros discursivos são o produto da união de três elementos que os

caracterizam como o conteúdo temático, o estilo e a construção composicional,

que “estão indissoluvelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente

determinados pela especificidade de um determinado campo de comunicação”.

Schneuwly (2004, p. 26), com referência à construção composicional do

gênero, diz que essa é um “tipo de estruturação e acabamento e tipo de

relação com os outros participantes da troca verbal”.

Para Cardoso (2002, p. 96), as três dimensões do gênero são:

128

1. Os conteúdos que são (que se tornam) dizíveis através dele;

2. A estrutura (comunicativa) particular dos textos pertinentes ao gênero;

3. As configurações específicas de linguagem, que são sobretudo traços da posição enunciativa do enunciador, e os conjuntos particulares de sequências textuais e de tipos discursivos que formam sua estrutura.

Assim sendo, a construção composicional da fábula são os elementos

que a constituem, como título; animais personificados, ou seja, com atitudes

humanas; moral da história; e o narrador em 3ª pessoa.

De acordo com Coelho (2000, p. 164), “há uma multiplicidade de formas

narrativas que vêm, desde a origem dos tempos [...]. São elas: fábula, apólogo,

parábola, [...] conto maravilhoso, [...] conto de fada, [...] etc.” Em tais narrativas,

prosa ou verso, o narrador relata a história de forma simples e direta.

Geralmente, têm poucos episódios, um desfecho claro e uma frase que indica a

moral da história.

O conteúdo temático da fábula é, pois, o que é possível ser dito em

textos desse gênero. Define o assunto abordado que, no caso da fábula,

geralmente é uma crítica ou ironia a determinados comportamentos humanos.

Nos Cadernos de Apoio e Aprendizagem da Fundação Padre Anchieta (2010,

p. 23), lemos que “a fábula apresenta um conteúdo didático-moralista que

veicula valores éticos, políticos, religiosos ou sociais”.

O estilo nas fábulas obedece às regras de uma linguagem formal, se

escritas e informal, quando oralizadas.Para Schneuwly (2004, p.26) o estilo

“deve ser considerado não como um efeito da individualidade do locutor, mas

como elemento de um gênero”.

Nas palavras de Bakhtin (2010, p. 266), o estilo é

Indissociável de determinadas unidades temáticas e – o que é de especial importância – de determinadas unidades composicionais: de determinados tipos de construção do conjunto, de tipos do seu acabamento, de tipos da relação do falante com outros participantes da comunicação discursiva – com os ouvintes, os leitores, os parceiros, o discurso do outro, etc. o estilo integra a unidade de gênero do enunciado como seu elemento.

Koch e Elias (2010, p. 60) dizem que é a construção composicional, o

conteúdo temático e o estilo que vão definir o contrato como contrato e não

129

como uma declaração ou qualquer outro gênero. Da mesma forma, esses três

elementos vão caracterizar o gênero fábula como sendo uma fábula e não um

conto. Todavia, não irei analisar o estilo nas produções dos alunos.

Então, definidas as dimensões do gênero fábula, Os textos dos alunos

serão analisados de acordo com suas adequações ao gênero, o conteúdo

temático, o estilo e a construção composicional, os três elementos que o

caracterizam.

Desse modo, os textos serão estudados, primeiramente, em seu

conjunto a partir da categoria geral “Adequação ao gênero”. Para tanto, procuro

responder às seguintes questões:

1. Possui título?

2. O título relaciona-se coerentemente ao gênero?

3. O conteúdo temático envolve animais?

4. Os animais são personificados?

5. Há a presença de moral da história?

6. A moral da história é condizente/coerente com o texto?

Dentro dessa categoria maior, as escritas das produções inicial e final

dos alunos serão, também, analisadas em subcategorias, a saber:

1 intertextualidade na escrita;

1.2 apropriação/consolidação da escrita;

1.3 sinais de pontuação;

1.4 marcas da oralidade na escrita.

Assim, será possível perceber se os textos estão de forma parcial,

completamente ou não adequados ao gênero.

É necessário dizer que esses aspectos serão abordados não como algo

que deveria ser aprendido durante a sequência didática, mas como traços

presentes nas produções das crianças e que chamaram minha atenção. Os

textos de alguns alunos apresentam intertextualidade com outros textos lidos

por eles lidos ou mesmo em filmes assistidos.

Os alunos se apropriam ou consolidam a escrita e, em seus textos,

faltam as pontuações, pois têm pressa de escrever, a fim de não perder o fluxo

das ideias e os que ainda estão em processo mais inicial dessa apropriação,

deixam marcas da oralidade em suas produções textuais.

130

1 Intertextualidade na escrita

Um dado importante e interessante nessas primeiras escritas foi a

criatividade que os alunos apresentaram. As fábulas criadas por eles foram

espontâneas e nós não percebemos ligação alguma com outros textos já lidos

para eles anteriormente. Mesmo os que, provavelmente, tenham se baseado

em algum outro trabalho na elaboração do deles, não deixaram pistas claras

disso.

Jolibert e colaboradores(1994, p. 198) explicitam que

[...] a imaginação constrói apenas com materiais tomados na realidade, [...] é que, para alimentar sua imaginação aplicando-a a tarefas suscetíveis de reforçar suas estruturas e ampliar seus horizontes, a criança deve poder crescer num meio rico de impulsos e estímulos.

Então, para que os textos sejam mais criativos é preciso que as crianças

tenham contato constante com materiais que venham a contribuir com o

imaginário delas, como livros, dicionários, jornais, revistas e gibis, dentre

outros. Tal recomendação também é feita pelos PCNs (BRASIL, 2001, p. 76).

Quando se pretende formar escritores competentes, é preciso também oferecer condições de os alunos criarem seus próprios textos e de avaliarem o percurso criador. Evidentemente, isso só se torna possível se tiverem constituído um amplo repertório de modelos, que lhes permita recriar, criar, recriar as próprias criações. É importante que nunca se perca de vista que não há como criar do nada: é preciso ter boas referências. Por isso, formar bons escritores depende não só de uma prática continuada de produção de textos, mas de uma prática constante de leitura.

É evidente que não há ineditismo nos textos, afinal esse fenômeno não

está presente nem mesmo em nossos discursos. Como afirma Bakhtin (2011,

p. 299), “O objeto do discurso do falante [...] não se torna pela primeira vez

objeto do discurso em um dado enunciado, e um dado falante não é o primeiro

a falar sobre ele”, isto é, ninguém é um Adão mítico, o que equivale dizer que

as escritas dos alunos, em algum momento, tiveram uma influência qualquer de

um enunciado alheio.

Refiro-me às escritas que não são cópias de outros textos, mas nos

quais há uma intertextualidade, uma “conversa” com outros textos, o que

advém do entendimento que as crianças adquirem ouvindo e lendo outras

131

histórias. Com relação a isso, Koch e Elias (2010, p. 125) salientam que “No

ensino da produção escrita, importante papel assume o conhecimento textual

do escritor advindo de suas práticas de leitura”. É por meio desse

conhecimento que os alunos elaboram suas produções intertextuais.

Assim, sempre haverá nas produções dos pequenos, um lobo que

persegue meninas ou animaizinhos inocentes, mas não serão os clássicos

Chapeuzinho Vermelho ou Os Três Porquinhos. Vejamos uma dessas criativas

produções.

Figura 3 – Produção inicial de William - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

Para um melhor entendimento, transcrevi o texto do aluno:

Tom e Jerry e a ilha dos dinossauro (dinossauros)

Era uma vez um gato chamado Tom e um ratinho chamdo (chamado) Jerry Um dia us (os) dois correram e foram parar nu

132

(num) navio eo (e o) navio afudou (afundou) padeu (bateu) nua (numa) [pedra] os dois foram para um (uma) ilha Tom achou um coco viro (viram) patas e viu um dinossauro ele coreu (correu) para um coceiro (coqueiro) e Jerry caiu de rir os dois siperdeu (se perderam) na ilha o ratinho encontrou um filhote de ticeratopixs e Tom entrou (encontrou) um mini veloci Rapitor e fez carinho e ele comeu sua mão. Marau (moral) da história: nuca (nunca) devemos agretitar (acreditar) nas diferenças (aparências)

No texto inicial de William, considerando o conteúdo temático, o estilo e

a construção composicional, pode-se caracterizá-lo como uma fábula?

Respondendo às questões postas anteriormente, o aluno atribuiu um título ao

seu texto, que está coerente com a história contada. O conteúdo temático

envolve animais personificados e traz o ensinamento de não se acreditar

somente no que os olhos veem. Quanto à construção composicional, vemos

que o texto possui título, que é condizente com o texto. A moral da história

também está coerente com a escrita. Ao escrever os nomes científicos dos

dinossauros, William demonstra o desejo de utilizar as regras da linguagem

formal.

Portanto, respondendo à pergunta acima, se podemos caracterizar o

texto do aluno como uma fábula, a resposta é sim, pois houve uma adequação

completa do gênero ao texto pedido.

O texto faz uma intertextualidade com o desenho animado da televisão,

embora o aluno tenha usado de criatividade para reproduzir um texto seu,

citando dinossauros que, certamente ele já leu com os nomes parecidos, pois é

aficionado por livros de dinossauros, porém acrescentando uma pitada de sua

imaginação nas cenas reproduzidas. Mesmo que ele tenha feito uma

intertextualidade na sua criação, notemos que a moral da história condiz com o

texto, salvo o engano que ele cometeu em grafar diferenças, quando desejava

escrever aparências. O aluno William é considerado um aluno A, de acordo

com a tabela de classificação do SAEM, e possui muito conhecimento de

mundo pelo fato de gostar de ler.

Exporei agora a produção final deste aluno.

Figura 4 – Produção final de William – turma A

133

Fonte: Dados da pesquisa.

A ideia de trazer a produção final neste momento é a de fazer uma

comparação com a inicial, a fim de vermos quais progressos o aluno fez e no

que ele avançou ou não. Assim, transcrevo o texto.

Mel, a Borboleta Num belo dia nua (numa) floreta (floresta) os animais se encatavam-se (encantavam-se) com Mel sua beleza era linda mais (mas) muito egoísta Rifi seu amigo (?) e responde com um não Rifi ficou muito triste um dia mel (Mel) [disse para?] sua amiga: - Amiga o Rifi e o beto (Beto) são muito egoista (egoísta) sua amia (amiga) beli (Beli) falou! - Egoista é você - Como você ouza (ousa) falar isso vai embora da minha casa mel (Mel) perdeu todos os amigos rifi (Rifi) viu uma placa mel (Mel) passou e nem percebel (percebeu) rifi (Rifi) correu e avisol (avisou) do lago do jacaré ele sauvou (salvou) e bidiu (pediu) descupas (desculpas) para todos. Moral da história: não devemos se (nos) levar pelo egoísmo (egoísmo).

A fábula de William obteve avanços. Seu conhecimento de mundo

permitiu a criação de personagens diferentes. Apesar de ter omitido um trecho

da narrativa (3ª linha), o aluno já empregou os dois pontos e os travessões nos

diálogos criados, o que não ocorreu na produção inicial.

A leitura de outros textos fez com que William trouxesse para o seu,

porém não de forma adequada, pois na fase do ciclo em que se encontra ainda

não foi sistematicamente ensinada, a partícula “se” ao escrever “[...] os animais

134

se encantavam-se [...]”, numa outra tentativa de obedecer às regras da

linguagem formal.

A produção final de William possui título que se relaciona coerentemente

com o conteúdo temático, trazendo uma crítica ao comportamento egoísta do

ser humano, aqui representado pela Borboleta Mel. A construção

composicional da fábula está contemplada no texto, uma vez que há a

presença, além do título, de animais personificados, embora o autor não faça

referência a que tipo de animais seja, o narrador em 3ª pessoa e uma moral da

história que está condizente com o texto. Então, o texto final de William,

também está completamente adequado ao gênero fábula.

William produziu textos narrativos, nos quais inseriu um título, tanto na

produção inicial quanto na final. Suas histórias possuem enredo simples, com a

situação inicial, o desenvolvimento e o desfecho claros. A moral da história está

explícita nas duas produções.

Outro caso de criatividade e intertextualidade esteve presente na

próxima produção, como veremos a seguir.

Figura 5 – Produção inicial de Tiago - turma B

135

Fonte: Dados da pesquisa.

O macaco, banana, leão Era uma vez um homem plantou um pé de banana e deu 1 (uma) banana duas, três, quatro, cinco, seis, sete e 8 (oito) banana (bananas) e um dia o guloso do macaco chegou perto do pé de bananeira E ai (aí) o macaco fui (foi) comendo uma por uma e ai (aí) ele não percebeu que um leão estava atrás (atrás) do pé de bananeira e ai (aí) o leão avançou no macaco e o leão falou assim pro leão [macaco] - Senhor macaco porque que o senhor esta (está) comendo as minhas bananas e o macaco falou por favor deixa eu comer pelomenos (pelo menos) uma banana senhor leão E o leão falou só se você me deixar eu fazer uma coisa com você e o macaco falou pode fazer Senhor leão

136

E o leão com dó do macaquinho falou não Senhor macaco eu não vou fazer nada com você macaco pode ficar tranquilo e (eu) não vou fazer nada com você tabom (está bom)...

Veremos, agora, se a produção inicial de Tiago está suficiente, parcial

ou completamente adequada ao gênero fábula.

No conteúdo temático há uma crítica, não muito explícita ao

comportamento de um ser humano que tira proveito do trabalho de outro,

apesar de isso não estar explícito. Dentre os elementos que compõem o

gênero fábula, nesse texto, há o título, os animais com atitudes humanas e

narração em terceira pessoa, porém não há a moral da história. Embora a

história possua um título, esse não se relaciona coerentemente com o

conteúdo temático, pois cita as bananas que apenas fazem parte da história

sem, no entanto, serem primordiais para o entendimento do texto.

Assim, essa primeira produção de Tiago ficou parcialmente adequada ao

gênero.

A história escrita pelo aluno é bastante criativa, embora a

intertextualidade não esteja no enredo, mas na maneira como escreveu seu

texto, em forma de quadrinhas, como se fosse um poema, apesar de não haver

rimas. Provavelmente, isso tenha ocorrido pelo fato de o aluno já ter visto ou

lido uma fábula escrita com essa estrutura, pois, de acordo com a Britannica

Escola Online, “As Fábulas foram escritas em versos e compõem doze livros.

Os seis primeiros foram publicados em 1668, e os restantes, entre 1678 e

1694”. As Fábulas foram escritas por Jean de La Fontaine.

Os Cadernos de Apoio e Aprendizagem, da Fundação Padre Anchieta

(2010, p.21), informam que

Um olhar mais estético sobre o gênero começou com a inovação introduzida por Fedro e aprimorada por La Fontaine que recuperaram as fábulas de Esopo recriando-as em versos. Essa modificação exigiu a incorporação de elementos da poesia, como as rimas, por exemplo, aproximando a fábula da arte literária. Daí em diante, na história da produção das fábulas passaram a coexistir as duas tendências: a que se manteve no sermão e na didática nua e a que enveredou pela poesia.

137

Não poderia dizer que o aprendiz usou seu conhecimento metagenérico

na produção, embora, inconscientemente o tenha feito, mas, de acordo com

Koch e Elias (2010, p.120), esse é um tipo de produção que ressalta o

conhecimento metagenérico do autor que emprestou ao seu texto (fábula) a

“roupagem” de outro gênero (poesia), sem transferir as funções que lhes são

reservadas.

Tiago começa sua fábula dizendo que um homem plantou um pé de

bananas, mas esse personagem ficou solto na narrativa, participando somente

neste episódio da plantação e dando lugar a um leão, que também surgiu de

repente e se dizendo dono das frutas. O aluno não explicou o que o leão queria

fazer com o macaco, deixando para seus leitores inferirem o que desejarem

sobre o triste fim (ou não) do inocente personagem.

Analisemos agora outro texto de Tiago.

Figura 6 – Produção final de Tiago – turma B

A tartaruga marinha Era uma vez uma tartaruga que gostava de viajar de barco e um dia apareceu um tal de jacaré que gostava de comer tartaruga e a tartaruga com medo tremia coitada.

138

E o jacaré com os demtes (dentes) afiados E a tartaruga falou senhor jacaré Porque o senhor qué (quer) me matar e o jacaré com pena caiu desmaiado no rio a a tartaruga com seu barco coreu (correu) pra (para) socore (socorrer) o jacaré e pegou o jacaré e o jacaré agradeceu a tartaruga e um dia a tartaruga caiu lá do céu (céu) caiu e o jacaré la do rio olhou e viu sua amiga e coreu (correu) pra (para) sucore (socorrer) e peguu (pegou) ela e levou pra (para) um abrigo. Moral: Uma boa ação ganha outra

O conteúdo temático do texto final de Tiago exalta a qualidade humana

da solidariedade. Na construção composicional estão presentes os elementos

que compõem a fábula, como título, a personificação dos animais, a moral da

história e a narração em 3ª pessoa.

A produção recebeu um título. O conteúdo temático envolve animais que

agem como pessoas e, nessa produção, já há a presença da moral da história,

que é condizente com o texto e com o conteúdo temático. Portanto, a produção

final do aluno ficou completamente adequada ao gênero fábula.

O texto de Tiago foi reestruturado como atividade na sala de aula,

quando foi retirado o organizador textual “e” que, de acordo com Cardoso

(2002, p. 193), o que sustenta a história é a “adição contínua de uma ação em

seguida da outra, sempre ligadas pelo E. Há quase uma enumeração das

ações [...]”.

Tanto na produção inicial quanto na final, Tiago produziu narrativas, para

as quais deu um título. Construiu enredos simples, com poucos episódios,

inserindo moral da história, criada por ele, apenas no texto final. Na produção

de William a falta de um diálogo na produção inicial, provavelmente, deveu-se

ao fato de a atração da televisão, Tom e Jerry, ser um desenho “mudo”.

Assim, nas produções dos doze alunos houve muita criatividade, até

mesmo nas dos que ainda não se apropriaram convencionalmente da escrita.

1.2 Apropriação/consolidação da escrita

Como já citado, alguns alunos ainda estavam se apropriando da escrita.

Nessas duas turmas esses alunos estavam classificados, conforme a tabela do

SAEM, como C (críticos). Eles liam e escreviam, porém não de maneira

convencional, contudo, produziram suas fábulas. Vejamos alguns textos.

139

Figura 7 – Produção inicial de Myla - turma A

.

Fonte: Dados da pesquisa.

Faz-se necessária a transcrição do texto da aluna para que fique mais

compreensível.

Era uma vez a princesa Branca de Neve Ela não viu que estava passeando numa floresta E um esquilo falou você esta (está) chorando não eu estava passeando e daí me perdi a rainha apareceu Branca de Neve o que está fazendo não rainha eu tava passando e a rainha foi embora e a Branca de Neve ficou assustada e até que enfim chegou na casa da vovó e ficou feliz para sempre. Moral da história: a rainha apareceu.

Myla estava num nível mais inicial de apropriação da escrita, portanto,

seu texto não apresenta, no plano do conteúdo, crítica, ironia, ensinamento ou

outro elemento referente ao comportamento humano.

No plano composicional não há um título. O animal que aparece é

personificado, pois o esquilo fala com Branca de Neve e a aluna teve o cuidado

de dar uma moral para sua história, embora não seja condizente com o texto.

Sendo assim, o texto, em seu conjunto, não corresponde ao gênero fábula.

A produção de Myla se apresenta com palavras ora segmentadas, ora

emendadas e ora com as letras trocadas de lugar dentro das palavras, como

está grafado na primeira linha de seu texto “E ranu avei” (Era uma vez). A

asserção de Cardoso (2000, p. 133) a esse respeito nos informa que

Falar é uma habilidade adquirida antes de escrever. Consequentemente, as regras gramaticais e textuais (e, é

140

claro, fonológicas) da fala são adquiridas primeiro e formam a base do conhecimento da criança e do uso da linguagem.

Assim, Myla tem tentado transpor para o papel o que já tem apropriado

do Sistema de Escrita Alfabética (SEA). Outra dificuldade enfrentada pela

aluna (e não somente ela) é se fazer entender por meio da escrita, da letra

registrada. As crianças, quando estão em processo de aprendizagem da

escrita, ao passar da letra bastão para a cursiva esbarram em outro entrave: o

de escrever com legibilidade. Pode ocorrer que nesse registro, o leitor, no caso

o professor, não as compreenda e venha a dizer que elas não sabem escrever.

Assim, Cagliari (2009, p. 125) nos relata sobre a “forma estranha de traçar as

letras”.

A escrita cursiva apresenta grandes dificuldades, não só para quem escreve como para quem lê. Às vezes consideramos que existe uma troca de letras numa palavra, mas na verdade estamos fazendo uma má interpretação do que foi escrito.

É o caso da palavra vovó, na última linha do texto de Myla, que ela

escreve semelhante a “varra”, pois a maioria das crianças em aprendizagem

escreve tanto o “v” quanto o “b” separados, sem juntá-los à letra seguinte.

O texto da aluna poderia se enquadrar na categoria anterior, pois conta

uma história com Branca de Neve e a Rainha, além da criatividade de ter

elaborado uma história diferente da original, porém tenciono analisar a

apropriação da escrita. Observemos, agora, a produção final da aluna.

Figura 8 – Produção final de Myla – turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

A transcrição será feita respeitando o texto da aluna, mas com as

devidas correções gráficas para maior compreensão.

141

A onsa (onça)e o buro (burro)

Erauna (era uma) ve (vez) um buro(burro) qfoi (que foi) norio (no rio) bebe (beber) a aga (água) e derepete (de repente) xeqeum (chegou) uma onsa (onça) e a onsa (onça) pergutol (perguntou) o buro (burro) o buro (burro) o qeitafazeto (o que está fazendo?) eusotobebdo aum (eu só estou bebendo água) você nãodeviabebe a qipoqueseriu (você não devia beber água aqui porque esse rio é meu) e o buro (burro) foi bora (foi embora)um dia o buro (burro) aio (achou) uma comida e a onsa (onça) gegia (queria) um poqio (pouquinho) e o buro (burro) não qeria (queria) dar po que (porque) eraso (era só) [ir] na repesa (represa) e a onsa (onça) ficou com votade (vontade) e a onça nuca (nunca) maiceuigoita (mais foi egoísta) [moral da história]: a onsa não dexo o buro bebea a aun (a onça não deixou o burro beber água). O buro não deum conida para a onsa (o burro não deu comida para a onça)

O texto final da aluna obteve progressos, mostrando que ela se

apropriou um pouco mais do gênero. Todavia, o conteúdo temático apresenta

um ensinamento quando a aluna escreve que a onça nunca mais foi egoísta.

No plano da composição, já há um título, que combina com o texto, mas não

com o conteúdo temático. Os animais conversam e a moral da história também

aparece na produção final, contudo, não está coerentemente adequada ao

conteúdo temático. A aluna se esforçou para obedecer às normas da

linguagem formal, entretanto, ainda está numa fase inicial da apropriação da

escrita.

O texto da aluna não está adequado ao gênero fábula.

A produção final de Myla apresenta progressos: a caligrafia melhorou e,

na dúvida, ela escreveu uma dupla moral para a história, embora ainda não

proporcional ao texto, mas na narrativa há o ensinamento de a onça nunca

mais ser egoísta. Isso mostra que a aluna está começando a se apropriar do

gênero textual e da escrita.

No texto de Myla aparece um pequeno diálogo entre a onça e o burro,

apesar de não trazer marcas como os dois pontos e o travessão.

142

A aluna produziu narrativas, porém, atribuiu um título apenas à produção

final. Seus enredos têm poucos episódios, todavia, por estar ainda se

apropriando da escrita, ficaram confusos.

Outra aluna apresentou texto semelhante, com pouca distinção entre

fala e escrita.

Figura 9 – Produção inicial de Caterina - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

Caterina também está se apropriando da escrita, porém, se encontra

num nível mais avançado que Myla. Eis o texto transcrito:

A Raqueile foi na ninha (minha) casa A Raqueile fui (foi) lana (lá na) minha casa i e la (ela) foi vire (ver) o meu cachoro (cachorro) que é la (ela) trrico (brincou) com o meu cachoro (cachorro) então a raqueile foi embora até que ela resolveu voltar la (lá) para ninha (minha) casa e brincar com meu cachorro de novo.

O texto inicial de Caterina mostra que ela ainda não se apropriou do

gênero, pois se trata de uma narrativa sem conteúdo temático. A construção

composicional não traz os elementos necessários ao gênero fábula, somente

um título, que é condizente apenas com o texto. Não há moral da história,

assim, o texto da aluna não está adequado ao gênero fábula.

O fato de estar aprendendo a ler e escrever agora, provavelmente faça

Caterina oscilar entre a escrita correta e a inadequada da mesma palavra ou o

emprego da letra “m”, ora como se fosse “n”, ora com mais “pernas” do que

deveria, como nos casos dos termos “cachorro” e “meu”, respectivamente.

Na segunda linha do texto original, Caterina escreve “trrico”, pois num

lapso, cortou a letra “b”, mas como escreve “b” separado do “r”, ficou

143

parecendo que grafou com dois “r”, evidenciando a dificuldade em passar da

letra bastão para a cursiva, já citada anteriormente, além de ter omitido os

grafemas “n” e “u” da palavra “brincou”, grafando-a adequadamente na

penúltima linha de sua produção.

As junturas intervocabulares apresentadas em “lana” (lá na) e “é la”

(ela), de acordo com Cagliari (2009, p. 125), refletem os critérios usados pela

criança para analisar a fala, uma vez que nessa existe a separação de palavras

somente quando marcada pela entonação do falante. Então, devido à

acentuação tônica, pode ocorrer uma segmentação na escrita.

Outras evidências de apropriação estão nas grafias de “resolveu”,

“voltar”, e “de novo” mostrando que a aluna está em meio ao processo de

aprendizagem.

Os textos espontâneos iniciais das duas alunas mostram que ambas não

se apropriaram, ainda, das características da fábula, embora no texto de Myla,

tenha havido um pequeno diálogo, porém sem marcações, enquanto que

Caterina produziu um texto no qual apenas figuram uma amiga e seu cãozinho

de estimação. A moral da história na escrita inicial de Myla não condiz com o

gênero fábula e Caterina sequer mencionou uma, além de ter alegado não se

lembrar como era a fábula, mas acabou por escrever.

Figura 10 – Produção final de Caterina – turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

A Raqueile e o cão É Ra (era) um dia tao bonido (tão bonito) que uma menina tao (tão) bonita que o mome (nome) é Ra Raqueile a chou (achou) o Pobre ção (cão) e o que faze (fez) a Raqueile le vou (levou) o Pobre cão Pra (para) dreto (dentro) da casa Moral: a Raqueile é muito cu da doza (cuidadosa) do Pobre cão

144

Na produção final da aluna houve uma repetição do que ocorreu na

primeira. Ainda não há um conteúdo temático ou os principais elementos que

compõem o gênero estudado, pois a moral da história não traz um

ensinamento. O texto parece uma continuação da produção inicial.

A orientação dos professores para a produção textual foi a mesma nas

duas salas, embora esses não tenham relembrado aos alunos os passos do

gênero fábula, afinal, tratava-se de uma avaliação dos conhecimentos

adquiridos pelos alunos durante a aplicação da sequência didática.

Todavia, Caterina, alegou não se lembrar de como era uma fábula.

Diante da insistência da professora para que ela produzisse e relembrando as

leituras deleite de fábulas feitas na aula, ela não se lembrou de nenhuma e

decidiu escrever algo parecido com a primeira escrita, na qual figurava sua

amiga. Em seus textos narrativos, apresentou situação inicial, trama e

desfechos claros, como uma história, que não configura fábula. Com isso, o

texto da aluna não está adequado ao gênero.

O progresso obtido por Caterina foi a moral da história que combina

com o texto, porém não com uma fábula. A aluna ainda não se apropriou das

características do gênero e continuou escrevendo sobre um animal de

estimação e a, provavelmente, melhor amiga, visto que Raqueile aparece nas

duas produções dela. A grafia dos “p” maiúsculos no meio da produção,

certamente, deve-se ao fato de as crianças em processo de alfabetização

gostarem de escrever letras como o “P”, o “B” e o “R” assim, pois acham mais

bonito e mais fácil que escrevê-las em minúsculo.

Outro aluno em processo inicial de apropriação da escrita é Jonathan.

Figura 11 – Produção inicial de Jonathan - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

145

É possível compreender algumas palavras do texto como “o gato e a

gata”, o começo da história como “Era uma vez o gato e a gata A gata ficou

apaixonada e o gato ficou apaixonado”. Os termos “Produção textual” escritos

no topo da folha de papel foram copiados da lousa.

Jonathan atribuiu uma moral da história para seu texto: “o gato e a gata

ficou apaixonado em 2013”. Todavia, o texto dele não está adequado ao

gênero. Embora os animais da história apresentem atitudes humanas como o

fato de estarem apaixonados, não há um conteúdo temático. Na construção

composicional o texto mostra um título, animais personificados, moral da

história e narrador em 3ª pessoa. O título relaciona-se com o texto, porém não

com o conteúdo temático, bem como a moral da história. Desse modo, o texto

não está adequado ao gênero. Vejamos agora a produção final do aluno.

Figura 12 – Produção final de Jonathan - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

Ainda nessa produção a leitura ficou impossibilitada. O aluno não

conseguiu ler sua própria escrita. Novamente deu um título ao texto e, pelo que

se pode notar, trata-se agora de um rato e uma rata apaixonados e a moral da

história é possível compreender “seja sempre amiga”.

Como na produção inicial, o título e a moral da história não estão

coerentes com conteúdo temático, embora os elementos que compõem o

gênero estejam presentes como o título, animais personificados, moral da

história e narrativa em 3ª pessoa. Desta forma, a produção de Jonathan não

está adequada ao gênero. Jonathan, de acordo com a tabela do SAEM, está

classificado como C.

146

Ainda nessa categoria, há o texto de Marcos.

Figura 13 - Produção inicial de Marcos - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

Marcos está se apropriando da escrita. Poucas palavras de sua

produção são inteligíveis como “batata”, “o rato pediu ao galo” e “sapo”, embora

não há a certeza de que são mesmo essas as palavras, pois o aluno não

conseguiu ler sua própria produção.

Devido o aluno estar em nível inicial da apropriação da escrita, o texto

não está adequado ao gênero fábula.

Figura 14- Produção final de Marcos - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

Transcrevi-a para uma melhor leitura.

A pomba e o ganvião (gavião) [e a] fomiga (formiga) Um dia [,] a pomba elafoinorio (ela foi no rio) [.] umdiaogavião (um dia, o gavião) estavaecondido (estava escondido) nomato (no mato) [,] ele e a pomba [e a] fomiga (formiga)[.] e pomba elapassou (ela passou) pecoafomiga e o ganvião (pegou a

147

formiga e o gavião) saiuatasidapomba (saiu atrás da pomba)[.] elaecoteu (ela escondeu) [?] e o ganvião (gavião). Moral: nunca brigue com seu amimigo (amigo), pois um dia pode precisar dele.

A produção final de Marcos surpreendeu pelo fato de estar mais

inteligível, exceto pela palavra escrita na antepenúltima linha, num claro sinal

de que o aluno vinha avançando no processo de apropriação da escrita. É

possível notar que a moral da história está bem legível, inclusive com vírgula e

ponto final, porém, essa provavelmente foi retirada de um cartaz afixado na

sala, depois da reestruturação do texto de uma de suas colegas.

O texto do aluno possui um conteúdo temático, uma vez que ele

introduziu uma moral para sua história, embora essa não seja condizente com

o texto. Em sua escrita há título, animais personificados, moral da história e

narrador em 3ª pessoa, elementos que compõem o gênero fábula. Entretanto,

o título não se relaciona coerentemente com o conteúdo temático, que envolve

animais personificados e moral da história, mas essa, também, não está

concordando com o conteúdo temático. Assim, a produção final de Marcos

também está parcialmente adequada ao gênero fábula.

É possível afirmar que a produção final de Marcos seja um texto

narrativo, no qual ele inseriu um título. Por ainda estar se apropriando da

escrita, o aluno construiu um enredo simples com uma situação inicial, o

desenrolar da história não é claro e teve um desfecho interrompido. A moral da

história está explícita.

A escrita consolidada não significa que a criança não cometa enganos

numa produção textual. A apropriação engloba o uso correto das palavras, das

ideias e sinais de pontuação, bem como dominar as relações fonema-grafema.

O fascículo 1 do Pró-Letramento informa que “[...] as marcas que usamos na

escrita para distinguir palavras, frases e sequências de frases não são ‘óbvias’

nem ‘naturais’”(BRASIL, 2008, p.27). Elas são, na verdade, convenções sociais

de nossa língua que a escola precisa ensinar.

A seguir, um exemplo de fábula criado por uma aluna que vinha

avançando no processo de apropriação da escrita, ou seja, ela estava num

nível mais consolidado da escrita.

148

Figura 15 – Produção inicial de Juliana - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

O Gatinho fofoca Era uma vez, um gatinho tão bonito e fofinho. O gatinho chama-se fofoca, fofoca era um gato de pelos lisos e brancos. Na sacada de seu dono tinha uma almofada colorida, bem fofinha. Onde fofoca gostava de ficar. Um dia, fofoca observou dois gatinhos conversando sobre um acidente de outro gato e assim ele foi espalhando e espalhando, até cansar. Moral da história: Quando estiver comverssando (conversando) cuidado, alguém pode estar ouvindo.

O texto de Juliana está adequado ao gênero fábula, pois o conteúdo

temático apresenta uma didática moralista que alerta sobre assuntos que se

propagam de forma indesejada. Em sua construção composicional o texto traz

título, o qual se relaciona coerentemente com o gênero; animais com atitudes

humanas como conversar e disseminar essas conversas; moral da história, que

está coerente com o conteúdo temático; e a narrativa está em 3ª pessoa e a

aluna procura escrever as palavras de maneira correta. Portanto, o texto de

Juliana está completamente adequado ao gênero fábula.

É possível notar, até mesmo pela caligrafia da aluna, que ela se

apropriou com sucesso da escrita, pois utiliza vírgulas e pontos no seu texto.

Usa, de forma inteligente, palavras de sílabas complexas como “almofada”,

“observou”, além de empregar corretamente a partícula “se” em “chama-se”,

embora não tenha grafado o nome do gatinho em letra maiúscula.

149

Ao aprender a escrever, os alunos têm dimensionadas as possibilidades

de enunciação de seu discurso. Quanto a isso, Cardoso (2002, p. 177) afirma

que

A apropriação de mecanismos de controle global do texto escrito está relacionada com a apropriação de técnicas e meios de linguagem diferenciados, utilizados para marcar, na superfície textual, não apenas as relações entre as ideias (encadeamento, dependência, ruptura, etc.), como também a posição do enunciador do texto.

Se Juliana tivesse colocado um ponto de exclamação no final da

primeira oração, teria criado um efeito melhor em seu texto. A produção da

aluna tem um encadeamento, isto é, começo, meio e fim bem organizados,

embora a história seja curta. Analisemos, agora, a produção final da aluna.

Figura 16 – Produção final de Juliana – turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

Assembleia dos ratos

Era uma vez, uma casinha no meio do campo onde moravam ums (uns) ratinhos. Um dia ospedou-se (hospedou-se) um novo morador que era um gato. Quando os ratinhos dormiam o gato malvado ficava vigiando qualquer gemido deles. Sendo assim eles ficaram com raiva, todos formaram um grupo para discutir, o chefe disse: - Alguém tem alguma ideia. E o ratinho Jerri disse: - Vamos aproveitar que o gato está dormindo e colocar uma coleira com sinos pequenos e assim quando ele se aproximar vamos saber que ele esta (está) aqui. Ele teve a maior ideia, mas quando pediu para alguém fazer ninguém levantou a mão. Moral da história: É mil vezes melhor fazer do que apenas falar.

150

A produção final da aluna está completamente adequada ao gênero

fábula. O conteúdo temático faz uma crítica ao comportamento de certas

pessoas que apresentam solução para algum problema, porém não encontram

apoio nas outras para seguir adiante com o plano.

A construção composicional traz todos os elementos que compõem o

gênero fábula, tais como o título, que se relaciona de forma condizente ao

conteúdo temático; esse conteúdo temático envolve animais, que são

personificados e uma moral da história coerente com o gênero.

A fábula de Juliana é um reconto da original de Esopo, com esse mesmo

nome, que a própria aluna havia lido numa leitura deleite na sala, antes mesmo

do início da sequência didática.

A aluna demonstrou ter se apropriado do gênero fábula utilizando os

personagens com características humanas e dando uma moral para o texto,

um pouco diferente do original pela inversão das palavras, pois o original diz

que falar é mais fácil que fazer. Todavia, segundo Juliana, fazer é bem melhor

que falar, o que não subverte a originalidade do texto de Esopo.

A escrita da estudante é aprimorada e ela procura usar palavras mais

rebuscadas para construí-la. Os erros gráficos são raros, em se tratando de

uma criança de oito anos.

Juliana, tanto na produção inicial quanto na final, construiu narrativas, às

quais atribuiu título. Os enredos são simples, com situação inicial,

desenvolvimento e desfechos claros. Ela também atribuiu moral aos textos:

criada por ela, na produção inicial e recontada, na final.

Continuarei vendo, nos próximos textos, a categoria geral de adequação

ao gênero, todavia, o olhar será mais voltado para as subcategorias.

1.3 Sinais de pontuação

Sabemos que os sinais de pontuação são marcações gráficas que

auxiliam na composição da coesão e da coerência textual e ainda ressaltam os

aspectos semânticos dos textos, além de nos dar a perceber as pausas e

entonações feitas pelos falantes no momento da escrita. Todavia, as produções

dos alunos sujeitos da pesquisa apresentaram problemas quanto à utilização

151

desses recursos, ou seja, os sinais como vírgula, ponto de interrogação, ponto

final e marcas de diálogo foram praticamente inexistentes em seus trabalhos.

Analisemos algumas dessas produções.

Figura 17 – Produção inicial de Manuelle - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

As melhores amigas As melhores amigas do muldo (mundo) inteiro uma se chamava lili e a oltra (oltra) se chamava mili e ela tem um gato e a oltra (outra) não gostava de gato mas mesmo asim (assim) elas eram melhores amigas. e a primeira adorava cachorro e gato mas preferia cachorro. ela gostava de bricar (brincar) de boneca e desenhar e a segulta (segunda) de pega pega e a tersera (terceira) se chamava bruna gostava de comer usava lasinho (lacinho) cor de rosa e se achava a mais linda da sala e gostava de rocho (roxo) as tres (três) nunca faltaram a aula se compotaram (comportaram) muito na sala a comida das três era salata (salada) esportes e conversar de mãotão (montão).

152

Moral da história: mesmo não gostando de gato ela são melhores amigas. mas se ela tivesse um cachorro elas não seriam melhores amigas.

O texto da aluna não possui um conteúdo temático, pois não há um

componente didático moralista. Na construção composicional do gênero, a

história possui um título, animais, moral da história e narração em 3ª pessoa.

Entretanto, o título não se relaciona coerentemente ao conteúdo temático.

Esse envolve animais, porém não personificados, apenas animais de

estimação. A moral da história não condiz com o texto.

Assim, considerando o conteúdo temático, o estilo e a construção

composicional, o texto não se caracteriza como fábula, apesar de possuir

elementos estruturais dela. Portanto, não está adequado ao gênero.

No texto de Manuelle já podemos notar a presença do ponto final nas

linhas 4 e 5, na última linha e no final da moral da história, bem como os dois

pontos. Embora não tenha utilizado letras maiúsculas após o ponto final, o fez

no único parágrafo do texto, o inicial. A única vírgula que aparece na escrita (na

linha 9) é um sinal da correção do professor, assim como o acento circunflexo

da palavra “três”, na penúltima linha. A aluna esforçou-se por não deixar seu

leitor confuso com as meninas, pois se referiu a elas como a primeira, e

segunda e a terceira. A produção é criativa, todavia é possível notar traços dos

modernos livros consumíveis para o público infantil com histórias sobre as

bonecas Barbie e Polly e suas amigas.

A aluna perdeu-se um pouco no enredo, pois começa como se as

amigas fossem crianças, que brincam com as bonecas personagens,

terminando como se fossem jovens que gostam de saladas, de esportes e de

conversar muito, características das bonecas e dos desenhos televisivos a elas

vinculados. A moral da história também ficou um adereço quase que avulso do

conteúdo, uma vez que foram citados os animais de estimação apenas no

começo do texto e eles não desenvolveram nenhum diálogo.

De acordo com Cardoso (2002, p.113), a principal dificuldade do

locutor/escritor é a de compartilhar a estrutura linear das informações que

contém o seu discurso com a estrutura não linear e as várias dimensões de seu

universo mental. No caso dessa aluna, é difícil organizar e registrar num papel

as informações que ela tem na mente.

153

Ainda segundo a autora (2002, p. 115), os sinais de pontuação são

utilizados “para delimitar ou segmentar as unidades textuais do tamanho da

expressão, da proposição, da frase e do parágrafo”. Com esse recurso, os

textos ficam mais inteligíveis.

Os PCNs (BRASIL, 2001, p. 87) orientam para duas questões que

sempre a escola se apoia para o ensino da pontuação: uma delas é que a

pontuação serve para indicar pausas na leitura em voz alta e a outra é que as

frases é que são pontuadas, visto que o texto não é um amontoado de frases,

mas um fluxo contínuo que precisa ser dividido em partes que contenham

marcas que possibilitem a legibilidade dele. Assim, de acordo com os PCNs

(BRASIL, 2001, p.88), “Aprender a pontuar é aprender a partir e a regrupar o

fluxo do texto de forma a indicar ao leitor os sentidos propostos [...], obtendo

assim efeitos estilísticos”.

Nos textos dos alunos em questão, a falta de pontuação prejudicou o

sentido. Todavia, todos os trabalhos apresentados até agora têm ponto final na

última linha do texto, marcando que este chegou ao final. Analisemos o texto

final de Manuelle.

Figura 18 - Produção final de Manuelle – turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

154

O burro enteligente (inteligente) Um belo dia um burro enteligente (inteligente)andava pela rua doto (todo) esibido (exibido) só porque era enteligente (inteligente) só tirava nota dez. Mas se distraiu com o porco espinho na rua parado até que um desconhesido (desconhecido) lhe avisou cuidado burro com o porco espinho na rua ele parou e se disviou (desviou) do porco e dise (disse). - Oprigata (obrigado) como poso (posso) agradese-lo (agradecê-lo) por iso (isso)- Não precisa só lhe avisei agora vou em pora (embora) um dia você faz o mesmo com outra pesoua (pessoa). Moral da história. não se distraia se isibido (exibindo) se não (senão) você se machuca.

A produção final da aluna traz visíveis progressos. O conteúdo temático

apresenta uma crítica a determinados comportamentos humanos como a

presunção exagerada. Estão presentes os elementos que compõem o gênero

fábula como título, que se relaciona coerentemente ao conteúdo temático,

animais personificados, como o Burro inteligente, moral da história também

condizente com o conteúdo temático.

Analisando o conteúdo temático e a construção composicional, o texto

caracteriza-se como fábula, ou seja, está completamente adequado ao gênero.

A segunda produção de Manuelle traz um travessão, marcando a fala do

personagem Burro Inteligente e a moral da história está de acordo com o texto.

No trecho do diálogo, o pronome oblíquo (agradecê-lo) que a aluna usou para

enriquecer sua escrita foi um indício da apropriação da norma culta.

Na sexta linha da história, Manuelle escreve “Oprigata” (obrigada),

trocando, por instantes, o papel de narradora pelo personagem, o Burro, que é

masculino.

Seu texto melhorou, pois está se apropriando do gênero textual.

Diferente da primeira produção, seu novo escrito está mais maduro e

demonstrando um esforço por parte da aluna de escrever uma fábula

respeitando as características que apreendeu. Há ainda alguns problemas com

a ortografia, cuja tendência é desaparecer com o tempo, pois a aluna estava

avançando no processo de ensino-aprendizagem.

Manuelle produziu textos narrativos. Inseriu título em ambas as

produções e construiu enredos simples, com situações iniciais, tramas e

155

desfechos claros. Inseriu, também, moral da história, criados por ela para os

textos.

Observemos outro exemplo de falta de pontuação.

Figura 19 – Produção inicial de Juliano - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

O cão e o ratinho Céto (certo) dia o cão falou para o ratinho - vanos (vamos) bricar (brincar) de pégapéga (pega pega) e com meço (começaram) a Bricar (brincar) de pois (depois) i vento (inventaram) outra Bricadeira (brincadeira) e começou a Bricar (brincar) de escondecomde (esconde-esconde) de pois (depois) inventaram outra Brincadeira de cola cola de pois (depois) começo (começou) a Bricar (bricar) de pois (depois) parou de Bricar (brincar) d pois (depois) foi comer.

A escrita inicial de Juliano não apresenta um conteúdo didático

moralista. Possui um título, animais personificados e narração em 3ª pessoa,

mas não uma moral da história.

Apesar de possuir um título, esse não é condizente com o conteúdo

temático. Os animais são personificados, pelo menos é o que mostra a primeira

linha do texto, mas não há uma moral para a história. Dessa forma, o texto não

se caracteriza como fábula.

Temos uma produção cuja falta de pontuação prejudicou o sentido.

Quanto a esse entrave, Jesus (2011, p. 110) explica que “o aluno ao se fazer

enunciador do seu texto pressupôs a pontuação como algo já implícito no seu

156

dizer”. No entendimento do aluno, seu interlocutor/leitor vai compreender

perfeitamente a mensagem que ele quis transmitir. Para ele, sua produção está

enquadrada nos padrões da legibilidade, cabendo à escola, fazê-lo entender as

regras e convenções da língua, porém não com atividades

descontextualizadas, fragmentadas. Jesus (2011, p. 111) expõe que

Devido à forma como as convenções foram apresentadas

ao aluno, estas passam a ser vistas por ele como

elementos de fora, estranhos à historicidade de seu dizer.

Logo, um trabalho fragmentado, no qual pontuação e

enunciação são tratadas de maneira desarticulada, como

se fossem instâncias excludentes, desencadeia uma

reescrita formal e mecânica, destituída de significado e

reflexão, que não facultam ao aluno a apropriação dos

recursos linguísticos necessários a uma melhor

contextualização da pluralidade imanente ao seu

enunciado.

Assim, quando as atividades são do tipo de pontuar frases

descontextualizadas, dificultam a apropriação por parte da criança, portanto, no

entendimento dela, os sinais de pontuação não cabem nos seus textos.

No texto de Juliano houve a ocorrência de um travessão marcando o

diálogo na segunda linha; porém, ainda não apareceu a moral da história.

Houve, também, uma gradação temporal, na qual o aluno escreve “depois

começou a brincar, depois inventou outra brincadeira, depois brincaram, depois

parou de brincar e depois foi comer”. Vamos analisar a produção final desse

aluno.

Figura 20 – Produção final de Juliano – turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

157

O gato e a forniga (formiga) certo dia o gato que gosta de forniga (formiga) ai (aí) o gato a chou (achou) una (uma) formiga e o gato falou para forniga (formiga):’ - como e (é) ceu (seu) nome meu nome e (é) gabriélem (Gabriele): - como e (é) o ceu (seu) Dada bonito o teu tenben (também) e (é) bonito eipóra (embora) bricar (brincar) de cocécoisa (qualquer coisa) ceto (certo) de pega-pega é mes mo (mesmo) é em tem (então) [em] borá (embora) bricar (brincar) a gora (agora) vanos (vamos) bricar (brincar) Moral: não Póde (pode) mau (mal) a gradeser (agradecer) o amigo

A produção final do aluno apresenta progressos, pois já existem alguns

sinais de pontuação, mas a falta de outros deixa o texto um pouco confuso.

Bentes (2007, p. 257) diz que os sentidos de um texto não estão no texto em si,

mas em fatores diversos como linguísticos, cognitivos, socioculturais e

interacionais. Ressalta ainda, (2007, p. 257) que

Texto incoerente é aquele em que o receptor (leitor ou ouvinte) não consegue descobrir qualquer continuidade de sentido, seja pela discrepância entre os conhecimentos ativados, seja pela inadequação entre conhecimentos e o seu universo cognitivo.

Então, em outras palavras, a coerência de uma produção textual está

nos recursos linguísticos, no conhecimento de mundo do leitor, bem como o

papel social desempenhado por ele ou por seu destinatário (BENTES, 2007, p.

261).

Para Marcuschi (2008, p. 119) “há uma distinção bastante clara entre a

coesão como a continuidade baseada na forma e a coerência como a

continuidade baseada no sentido”.

Desta forma, o texto de Juliano está confuso, mas não incoerente, se

aplicarmos a ele nossos conhecimentos linguísticos e de mundo. Quanto a

isso, Marcuschi (2008, p. 121) afirma que

[...] a coerência é em boa parte uma atividade realizada pelo receptor de um texto que atua sobre a proposta do autor. E, nesse afã, o receptor segue as pistas (deixadas pelo autor nas operações de coesão textual) como primeiros indicadores interpretativos. De todo modo, a coerência é uma atividade interpretativa e não uma propriedade imanente ao texto. Liga-se, pois a atividades cognitivas e não ao código apenas.

158

O autor (2008, p. 99) escreve, ainda, que fatores que regem a conexão

referencial e a sequencial dentro do texto são conhecidos como coesão e são

parte dos critérios que constituem a textualidade. Para Marcuschi (2008, p.99),

Os processos de coesão dão conta da estruturação da sequência [superficial] do texto (seja por recursos conectivos ou referenciais); não são simplesmente princípios sintáticos. Constituem os padrões formais para transmitir conhecimentos e sentidos.

Voltando ao texto de Juliano, uma outra pessoa que não estivesse ligada

à educação poderia não entender a escrita, ou melhor, poderia não conseguir

ler o texto. Mas, professores são “treinados” para isso ao longo de suas

docências, o que os capacita para essa compreensão, tanto da letra quanto do

sentido do texto.

A produção final do aluno não está enquadrada ao gênero fábula. No

plano do conteúdo a moral da história não condiz com o gênero. No plano da

composição há um título, a personificação de animais, moral da história e

narração em 3ª pessoa. Todavia, essa moral não é coerente com o conteúdo

temático.

No texto final de Juliano (p. 156) temos a presença da moral da história,

apesar de não combinar com o texto. Provavelmente, o aluno tencionava dizer

que devemos deixar nossos amigos contentes, participando de brinquedos e

brincadeiras com eles, portanto, não os mal-agradecer.

Presente, também, o diálogo entre o gato e a formiga com algumas

marcas dessa conversa, como os dois pontos e travessão, os únicos sinais de

pontuação que constam na história.

Na segunda linha, o aluno colocou os dois pontos e continuou a escrever

o diálogo na mesma linha, porém refletiu, apagou e transferiu para a linha

seguinte, o que é percebido pela sombra da escrita apagada, portanto, indícios

de refacção. Em sua primeira produção, Juliano escreveu “pégapéga” e na

produção final a grafia já está adequada e sem o acento.

Embora ainda haja um caminho a percorrer para o aluno se apropriar do

gênero fábula e da escrita, houve avanços na escrita. Ele produziu textos

narrativos, inseriu título nas produções, construiu enredos com situação inicial,

159

trama e desfechos claros e atribuiu moral da história criadas por ele, ainda que

não tenha adequado seus textos ao gênero fábula.

Vejamos outros trabalhos apresentando problemas de falta de sinais de

pontuação.

Figura 21– Produção inicial de Ricardo - turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

Dico o lagartinho num belo dia dico acordou. e ele estava andando. e apareceu um gato malvado ele disse porque você não vem comer comigo eu tenho um pote cheio de insetos. Não posso tenho um compromiso (compromisso). você pode comer tudo de graça. eu vou comer na minha casa. se você entrar você vai ser o primeiro a chegar e seus amigos vai (vão) ficar com inveja. tabom ( tá bom)eu entro vou ser o primeiro e assim (assim) depois o dico saiu tudo (todo) machucado.

Moral da historia (história): não obedeça as pessuas (pessoas) que você não conheça

Na produção inicial do aluno, no conteúdo temático há uma crítica ao

comportamento humano de planejar ardis para prejudicar o semelhante,

portanto, apresenta um conteúdo didático moralista. Na construção

composicional estão presentes todos os elementos que compõem o gênero

160

fábula, como o título, que se relaciona coerentemente ao conteúdo temático; a

personificação do gato e do lagartinho e a moral da história, cujo ensinamento

é condizente com o conteúdo temático. Portanto, o texto do aluno está

completamente adequado ao gênero fábula.

Na fábula de Ricardo o diálogo entre os animais está presente e até

mesmo os pontos finais, todavia, não há vírgulas. A história foi bem construída

com destaque para a artimanha do gato para convencer sua vítima e torná-la

sua presa e os argumentos do lagartinho Dico para não aceitar o convite.

Ricardo usou pontos finais, porém, ao continuar o texto, não utilizou

letras maiúsculas. Dico e o gato malvado conversaram, mas o diálogo não foi

marcado pelos característicos dois pontos ou travessões. A moral da história

condiz com o texto, num sinal de que o aluno já começou a se apropriar do

gênero fábula e suas características.

Durante o trabalho de campo, pude observar que o aluno tinha

conhecimento de mundo, gostava muito de ler e era atento a tudo o que

acontecia ao seu redor, por isso a construção do texto com um ensinamento

que, certamente, veio de outras leituras ou até mesmo de conversas com

adultos. Bakhtin (2011, p. 295), com relação a isso, relata que “Essas palavras

dos outros trazem consigo a sua expressão, o seu tom valorativo que

assimilamos, reelaboramos, e reacentuamos”.

Assim, Ricardo elaborou seu texto assimilando a palavra de um

enunciado alheio, o que acontece com nossos discursos, inclusive as obras

criadas são plenas de palavras dos outros (BAKHTIN, 2011, p. 294). O aluno

tomou para si e reelaborou as informações que recebeu dos adultos, de outros

discursos e do meio no qual convive.

Observemos a produção final do aluno.

161

Figura 22 - Produção final de Ricardo – turma A

Fonte: Dados da pesquisa.

A cigarra e as formigas

Era uma vez, uma cigarra que só sabia cantar e uma formiginha (formiguinha) pasou (passou) e disse: - Por que você não vai catar comida para você ele respondeu: - Eu gosto de cantar e depois eu cato e foi pasando (passando) o tempo e ficou inverno e a cigarra ficou com frio e ela procurou a formiga no formigueiro e ela falou pra (para) formiga: - Por favor me deixe entrar e a formiga respondeu: - Você não quis pegar comida pra (para) você e depois você corre para meu pé mas eu deixo você entrar e eles foram amigos para senpre (sempre). Moral da história: nós temos que trabalhar para ganhar nosas (nossas) nesessidades (necessidades)

162

O texto final do aluno está completamente adequado ao gênero fábula.

No conteúdo temático, há a presença do ensinamento moralista. No

plano da construção composicional estão presentes o título, que está

coerentemente relacionado com o conteúdo temático, a cigarra e a formiga

personificadas, moral da história condizente com o conteúdo temático e

narração em 3ª pessoa.

O texto de Ricardo é um reconto do original de Esopo, que ele já havia

ouvido em outras ocasiões, porém não nas aulas durante a pesquisa. Como

existem várias versões dessa fábula, Ricardo modificou o final, criando sua

própria versão, transformando, também, a moral da história.

A produção final do aluno traz os dois pontos e travessões que marcam

os diálogos. A vírgula aparece apenas no início do texto e ainda faltam alguns

pontos finais e de interrogação na 3ª linha.

Apesar da falta de pontuações no texto, Ricardo demonstrou que se

apropriou do gênero fábula. Ele produziu textos narrativos, inseriu títulos em

suas produções, construiu enredos simples nos quais figuram a situação inicial,

tramas e desfechos bem claros. Criou uma moral da história para cada um de

seus escritos.

1.4 Marcas da oralidade na escrita

A marca da oralidade, característica principal nas produções de quem

está se apropriando da escrita, aparece em alguns textos dos alunos da

pesquisa.

Figura 23 – Produção inicial de Alícia - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

163

O gato e o rato Era uma vez um gato e o rato eles senpre (sempre) ficava (ficavam) correndo prala (para lá) e praca (para cá) o gato corria corria e não conseguia pegar o ratinho e ele coria (corria) e ele não Dava conta de pegalo (pegá-lo) e ele vivia correndo atras (atrás) dele e até que sin (até que enfim) ele conseguiu pegalo (pegá-lo) e depois ele escapou e aí começou a correr dinovo (de novo).

A aluna, em sua primeira produção, demonstrou não ter se apropriado

completamente do gênero fábula. Os animais figuram em seu texto, têm

atitudes humanas, mas, também agem como os animais que são, inimigos

como sempre. O conteúdo temático não apresenta ensinamento moral.

A construção composicional traz alguns elementos do gênero, como

título, porém esse não se relaciona coerentemente com o conteúdo temático.

Ficou a dúvida se esses animais são personificados e não há uma moral da

história. O termo “pegalo” demonstra que a aluna tentou usar uma linguagem

mais elaborada em seu texto.

Assim, a escrita da aluna não está adequada ao gênero fábula.

O texto de Alícia traz algumas marcas da oralidade na grafia de “prala”

(pra lá), “praca” (pra cá) e “dinovo” (de novo), além dos pronomes oblíquos em

“pegalo” (pegá-lo), que vem da norma culta, mas a aluna a escreve como fala.

Quanto a isso, Koch e Elias (2010, p. 28) salientam que o aprendiz,

[...] ao tentar efetuar a segmentação gráfica adequada, acaba, por vezes, caindo no extremo oposto, isto é, “picando” demais a palavra ou, pelo contrário, emendando vocábulos, conforme a maneira como são pronunciados.

Assim, a aluna foi testando hipóteses em seus escritos. Tentando uma

maneira de escrever adequadamente as palavras, provavelmente Alícia ia

pensando nelas, soletrando-as mentalmente e, por fim, decidiu escrevê-las

como as pronunciava. Alícia não segmentou palavras, mas emendou-as, fato

bastante comum na escrita de principiantes que escrevem como falam.

Segundo Cardoso (2008, p. 31),

[...] a criança inicia seu processo de aprendizagem da escrita apoiada firmemente na sua oralidade e, portanto, essa oralidade vai deixar marcas na sua escrita que, nesse momento, está ainda longe de ser convencional, ortograficamente correta.

164

A escrita é controlada internamente pelo falante que, a cada discurso,

repensa e planeja as palavras, enquanto que na linguagem oral esse controle é

exterior e é construído na interação face a face. Ou seja, a escrita não é

controlada pela situação imediata, mas “pela ‘representação abstrata’ de uma

determinada situação, com um objetivo geral e um destinatário fictício ou, pelo

menos, parcialmente simulado” (CARDOSO, 2008, p. 31).

O texto de Alícia também não tem pontuações, vírgulas ou moral da

história, mas já traz a presença de animais, embora eles não mantenham

conversação. Há, também, algumas palavras grafadas com letras maiúsculas

no meio das frases, provavelmente pela dificuldade que as crianças encontram

em escrever o “p” e o “d” minúsculos ou até mesmo por acharem que as letras

maiúsculas trazem um efeito estilístico melhor ao texto.

A aluna criou seu texto e, como muitas outras, o pensamento é mais

rápido que as mãos e, então, muitos trechos ficam implícitos para o leitor,

porém, na cabeça dela, a história está completa. É o caso do trecho “e até que

sin ele conseguiu pegalo e depois ele escapou e aí começou a correr de novo”.

Houve um lapso temporal no enredo: o gato conseguiu pegar o rato, ele

escapou e começaram a correr de novo. Mas como o rato fugiu? Essa parte da

produção ficou “escondida”, internalizada na mente de Alícia. Provavelmente,

se sua produção fosse oral, esse trecho teria aparecido. Assim, Cardoso (2008,

p. 31) diz que

[...] para se produzir um texto escrito, é necessária uma visão global e antecipada do texto no seu conjunto. Isso nos leva ao caráter voluntário da produção linguística escrita, ou seja, o motivo de agir linguisticamente não decorre da dinâmica da situação imediata, como na oralidade, mas sim de um esforço constante do enunciador (grifos da autora).

Outra marca da oralidade na produção de Alícia é o modo como ela

termina o texto: “e assim termina a história”, como nas rodas de contação de

histórias. Vejamos como ficou a produção final da aluna.

165

Figura 24 – Produção final de Alícia – turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

O sapo e a rã Era uma vez uma rã no rio discansando (descansando) e apareceu [um sapo] e disse asim (assim) oi Rã vamos brincar de pega pega vamos sim quem pega e (é) você sapo eu não quero brincar só que eu não vou brincar mais eu não tonem (to nem) aí e também rã você nunca mais vai ser a minha [amiga] e eu também não voçe (você) aceitar (aceita) as minhas desculpa eu aceito a sua disculpa (desculpa) então vamos brincar de esconde esconde vamos agora sem brigar se nós dois brigarmos nos vamos se (nos) disculpar (desculpar) vamos brincar rã peguei voçe (você) sapo e assim termina a história moral: Uma boa amizade gera outra amizade

A aluna deu indícios de ter se apropriado do gênero fábula, pois o

conteúdo temático apresenta um ensinamento. No plano da construção

composicional há um título, que se relaciona coerentemente com o conteúdo

temático. Os animais, o sapo e a rã, brincam como crianças e a moral da

história é condizente com o conteúdo temático. Desta forma, o texto de Alícia

está completamente adequado ao gênero fábula.

Houve avanços na fábula de Alícia. O diálogo entre o sapo e a rã foi

bastante intenso. A moral da história aparece e está condizente com o texto. A

166

escrita já não tem tantas marcas da oralidade, a não ser no final que se repete

como na primeira produção (“e assim termina a história”).

O fluxo de ideias vem e a aluna vai escrevendo sem parar para refletir

sobre a pontuação, como que por receio de perder o fio condutor do texto. Com

relação a isso, Cardoso (2008, p. 43) denomina “jerky”, um “pensamento que

não se dá de forma linear e contínua, e sim, aos borbotões”. Destaque para a

apropriação da escrita na conjugação correta do verbo brigar, quando a aluna

escreve “brigarmos”.

Embora um dos textos de Alícia não esteja adequado ao gênero fábula,

ela produziu textos narrativos, nos quais inseriu títulos. Construiu enredos

simples, com poucos episódios e deu uma moral da história para a produção

final, criada por ela.

Vejamos outros trabalhos que trazem esses exemplos de marcas da

oralidade.

Figura 25 – Produção inicial de Tânia - turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

a raposa e o corvo Era uma vez uma raposa e o corvo estava (estavam) tomando chá na beira do rio comversando (conversando) No dia seguinte a raposa e o corvo foi (foram) Para a Praia Para entrar tinha que Pagar a raposa

167

pagou o corvo não pagou porque ele não tinha dinhero (dinheiro) para pagar como ela entrou viu que estava sem o corvo ela pagou Para o corvo eles foram banhar e eles comeram de tudo que quiser (quiseram). No outro dia a raposa e o corvo levaram Para fazer Piquinique (piquenique) – melancia – bolo de chocolate cachorro quente Só esse poquinho (pouquinho) Historia

Na produção inicial da aluna não aparece o ensinamento no conteúdo

temático. Na construção composicional identificam-se alguns elementos

constituintes da fábula, como o título, que está relacionado de forma coerente

com o conteúdo temático, que envolve animais e esses são personificados; a

narração é em 3ª pessoa, porém não há a presença de uma moral da história.

Portanto, a produção inicial de Tânia está parcialmente adequada ao

gênero fábula.

No texto de Tânia já se presentificam alguns parágrafos e apenas um

ponto final no meio da escritura. Apesar de não usar os pontos finais, a aluna

inicia algumas frases, onde supomos que deveria haver esse ponto

encerrando-as, com letras maiúsculas. Ao citar os alimentos levados para o

piquenique da raposa e do corvo, esses são separados por traços e não por

vírgulas, como sempre acontece. Cagliari (2009, p. 126) explica que

Estes sinais também não são ensinados logo no início e raramente ocorrem nos textos espontâneos. Às vezes alguns alunos usam sinais como ponto ou travessão para isolar palavras [...], fruto de ensinamentos obtidos em outras atividades que o aluno estende para os textos.

Assim, Tânia, que já deve ter visto os sinais em outros textos, adotou-os

para si.

Os animais, que já não são os de estimação, aparecem na sua

produção, porém não trocam palavras. Mas, há as características humanas

como tomar chá, ir à praia e fazer piqueniques. A história se encerra com uma

frase retirada das rodas de contação de histórias, isto é, marca da oralidade:

“só esse pouquinho de história”.

168

Figura 26 - Produção final de Tânia – turma B

Fonte: Dados da pesquisa.

O rato e a rã Era uma vez, o rato e a rã eles não se gostavam e um dia eles saíram para pescar quando eles chegaram começaram a brigar e a rã estava atrás. acabou pegando a corda e a amarrou e o rato nen (nem) sentiu e os [dois] abou (acabou/acabaram) caindo no rio, e a rã fez de propózito (propósito), e o rato sabia mas a rã não. até que um bombeiro de animais os acudiram (acudiu) e a rã falou ai que raiva e o rato escutou e desse dia em diante a rã nunca mais fez maldade e desse dia [em diante] ele (ela) conversava com o rato. Moral: uma briga se resolve.

O texto da aluna apresenta progressos. No conteúdo temático aparece

um ensinamento, uma moral da história. No plano da composição, também se

presentificam elementos constituintes do gênero fábula: o título, condizente

com o conteúdo temático; os animais personificados, a moral da história,

coerente com o conteúdo temático e o narrador em 3ª pessoa. O texto de Tânia

está completamente adequado ao gênero fábula.

Nessa produção final, Tânia utilizou um pouco mais de vírgulas e pontos

finais. Escreveu uma moral para a história, embora pouco convincente. Usou

alguns pontos finais encerrando as frases, mas não as iniciou com letras

maiúsculas.

169

O texto, inicialmente, dá a impressão de ser um reconto da fábula de

Esopo, “A Rã e o Rato”, todavia, no meio da narrativa, a história de modifica,

tendo um desfecho completamente diferente. Na verdade, a intertextualidade

se dá apenas com os personagens, o rio e a maldade da rã.

Para que não pairassem dúvidas sobre a originalidade de sua fábula,

Tânia inseriu um terceiro personagem, o bombeiro de animais. Faltou a aluna

explicar o porquê de o rato saber da maldade da rã e se deixar levar para a

armadilha. Tânia utilizou os pronomes oblíquos adequadamente ao grafar “e a

amarrou” e “os acudiu”. O texto foi escrito com apenas um parágrafo como

outros de outros alunos, demonstrando que a escola precisa fazer um trabalho

sistemático de como organizar a escrita em partes.

A moral da história condiz com o texto, mas ficaria mais harmônica se

houvesse uma conversação entre o rato e a rã entrando em entendimento e

reatando a amizade, se é que ela houve um dia, pois a aluna inicia o texto

dizendo que os personagens não se gostavam, porém não mencionou o motivo

da desunião entre os dois. A aluna produziu textos narrativos, atribuindo títulos

a eles. Construiu enredos com situações iniciais, tramas e desfechos claros,

inserindo uma moral da história, criada por ela, na produção final.

Vejamos o quadro a seguir, observando as características principais do

gênero fábula contempladas pelos alunos na produção inicial.

Quadro 18 – Quadro comparativo da apropriação do gênero fábula – produção inicial Aluno/turma Classificação

SAEM Título Animais

personificados Moral da história

Moral da história coerente com texto

Adequação ao gênero

Ricardo A AB x X x x Completamente

Juliana A AB x X x x Completamente

William A A x X x x Completamente

Manuelle A A x - x - Não adequado

Myla A C - - x - Não adequado

Jonathan A C - X x - Não adequado

Tiago B AB x X - - Parcialmente

Tânia B AB x X - - Parcialmente

Juliano B A x X - - Não adequado

Alícia B A - X - - Não adequado

Marcos B C - X - - Não adequado

Caterina B C x - - - Não adequado

FONTE: Dados da pesquisa.

170

O quadro mostra que, na produção inicial, dentre os doze (12) alunos,

três (3) se apropriaram do gênero fábula, enquanto que dois (2) o fizeram de

maneira parcial e sete (7) não adequaram seus textos ao gênero.

Os alunos classificados como C pela tabela do SAEM, além de Juliano,

Alícia e Manuelle considerados como A, mediante a mesma avaliação, não

adequaram seus textos ao gênero, provavelmente por não terem entendido os

comandos ou por estarem ainda em processo de domínio do SEA, no caso de

Myla, Jonathan, Marcos e Caterina.

Ricardo, Juliana e William, da turma A, produziram seus textos e estes

estavam completamente adequados ao gênero, pois atribuíram um título, havia

a presença de animais personificados em suas produções e deram uma moral

da história coerente com o texto. Manuelle deu um título e uma moral da

história, todavia, não trouxe os animais personificados para seu texto e a moral

da história não estava em consonância com o mesmo.

Assim, nas produções iniciais, ora faltou título, ora moral da história, ora

animais personificados. Na segunda produção, o quadro se diferencia um

pouco. Vejamos:

Quadro 19 – Quadro comparativo da apropriação do gênero fábula - produção final Aluno/turma Classificação

SAEM Título Animais

personificados Moral

da história

Moral da história

coerente com texto

Adequação ao gênero

Ricardo A AB x x x x Completamente

Juliana A AB x x x x Completamente

William A A x x x x Completamente

Manuelle A A x x x x Completamente

Myla A C x x x - Não adequado Jonathan A C x x x - Não adequado

Tiago B AB x x x x Completamente

Tânia B AB x x x x Completamente

Juliano B A x x x - Não adequado

Alícia B A x x x x Completamente

Marcos B A x - x - Parcialmente

Caterina B A x - x - Não adequado

FONTE: Dados da pesquisa.

Assim, na produção final, Além de Ricardo, Juliana e William (que

escreveram textos completamente adaptados ao gênero na produção inicial),

171

Manuelle, Tânia e Alícia também adequaram completamente seus textos ao

gênero abordado. Marcos, da turma B teve seu segundo texto parcialmente

adequado, enquanto que os demais não avançaram, em se tratando da

apropriação do gênero, o que não significa que não avançaram em outros

aspectos da apropriação do sistema de escrita alfabético.

Um quadro-síntese trará melhor entendimento sobre a apropriação da

fábula por parte dos alunos, antes e depois da sequência didática.

Quadro 20 - Quadro –síntese da apropriação do gênero fábula

ALUNO/TURMA CLASSIFICAÇÃO SAEM

ADEQUAÇÃO AO GÊNERO

PRODUÇÃO INICIAL

ADEQUAÇÃO AO GÊNERO

PRODUÇÃO FINAL

RICARDO A AB COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE

JULIANA A AB COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE

WILLIAM A A COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE

MANUELLE A A NÃO ADEQUADO COMPLETAMENTE

MYLA A C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO

JONATHAN A C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO

TIAGO B AB PARCIALMENTE COMPLETAMENTE

TÂNIA B AB PARCIALMENTE COMPLETAMENTE

JULIANO B A NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO

ALÍCIA B A NÃO ADEQUADO COMPLETAMENTE

CATERINA B C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO

MARCOS B C NÃO ADEQUADO PARCIALMENTE

Fonte: Dados da pesquisa.

O quadro demonstra que alguns alunos não haviam se apropriado do

gênero na primeira produção. De doze alunos (100%), dois (16,6%) o fizeram

de forma parcial e sete (58,3%) não adequaram seus textos ao gênero fábula

na produção inicial, enquanto que três (25%), desde essa produção já

adequaram suas escritas ao gênero.

A produção final evidencia que dos doze alunos (100%), quatro (33,2%)

não se adequaram ao gênero, um (8,3%) de forma parcial e sete (58,3%)

tiveram seus textos completamente adequados ao gênero fábula.

Com exceção do aluno Juliano, que não teve seu texto adequado ao

gênero, os demais, como Myla, Caterina, Jonathan e Marcos, pelo fato de

estarem em processo inicial de apropriação da escrita, que são classificados

como C, pela tabela do SAEM, também não tiveram seus textos adequados à

fábula.

172

Contudo, esses alunos classificados como C tiveram um desempenho

melhor em seus textos finais, escreveram de forma mais inteligível e se

aproximaram mais do gênero. Isso mostra que a sequência didática pode

ajudar, e muito, o aluno a se apropriar da escrita, juntamente com outras

atividades que o professor venha a desenvolver com seus aprendizes.

Os alunos Tiago e Tânia tiveram suas produções parcialmente

adequadas ao gênero, na produção inicial. Na produção final, seus textos já

estavam completamente adequados. William, Juliana e Ricardo, desde a

escrita inicial, já estavam com seus textos completamente adequados ao

gênero.

Portanto, dos doze (12) alunos sujeitos da pesquisa, sete (7) se

apropriaram do gênero e todos se apropriaram melhor da escrita, também.

De acordo com as entrevistas finais com os professores, ao serem

indagados se a intervenção da pesquisa contribuiu de alguma forma para o

aprendizado de seus alunos, a professora Luísa respondeu: “Sem dúvidas

houve grande contribuição, pois notamos que a cada passo as crianças foram

criando novos textos e desenvolvendo ainda mais a leitura e a participação”. A

resposta do professor Antônio foi: “Com certeza, contribuiu com a leitura, a

escrita e até com a oralidade”.

Segundo os professores, conforme a classificação da avaliação do

SAEM final, seus alunos não deixaram as condições apresentadas no quadro 5

(p. 35), isto é, continuam com as classificações de A, AB e C. Todavia,

relataram que os alunos Myla, Jonathan (turma A) e Marcos (turma B)

avançaram de forma significativa na leitura de palavras e frases simples.

Os resultados das pesquisas levantadas para a elaboração do estado do

conhecimento, assim como minha própria pesquisa, mostraram que o ensino

da produção de texto fundamentado nos gêneros textuais e organizado em

sequência didática auxilia na aprendizagem. Inclusive, um desses trabalhos, o

de Alessandra Marques da Cunha (vide p. 49 dessa dissertação), que também

utilizou o gênero fábula para o aprendizado dos alunos demonstra isso em

suas conclusões.

Os textos dos alunos não estiveram simbolizando os valores ou

comportamentos humanos citados por Coelho (2000, p.166) como “o leão,

símbolo da força, majestade, poder; a raposa, símbolo da astúcia; o lobo, do

173

poder despótico”, mas as ações desses personagens criados por eles, que se

comportavam mal, porém, depois de agirem de forma inadequada, se

arrependiam e ficavam em paz com os amigos a quem magoavam.

174

CONSIDERAÇÕES

O Morcego e a Doninha

Um Morcego desajeitado caiu acidentalmente no ninho de uma Doninha, que, com um bote certeiro o capturou. -Você é um rato, ela disse, e eu sou por natureza inimiga dos ratos. Cada rato que pego, evidentemente, me serve de jantar, essa é a lei. -Mas, a senhora veja bem, eu definitivamente, não sou um rato! Veja minhas asas. Você já viu um rato que é capaz de voar? Claro que sou apenas um tipo de pássaro, de uma variedade um tanto exótica. Por favor, me deixe ir embora! A Doninha, olhando melhor para sua vítima, concordou que ele não era um rato e o deixou ir embora. Mas, alguns dias depois, o mesmo atrapalhado Morcego caiu outra vez no ninho de outra Doninha. Ocorre que esta Doninha era inimiga declarada de todos os pássaros, e logo se preparou para abocanhá-lo. -Você é um pássaro, por isso mesmo o comerei! -O que? Eu, um pássaro! Isso é quase um insulto. Todos os pássaros possuem penas! Cadê minhas penas, você é capaz de vê-las? Claro que não sou nada além de um simples rato. Tenho até um lema que é: “Abaixo todos os gatos!”. E o Morcego teve sua vida poupada pela segunda vez. Moral da história: o sábio aprende a tirar do problema uma solução incapaz de criar outros problemas.

Esopo

Trabalhar com crianças é como plantar sementes e vê-las crescer e

produzir frutos. Com a pesquisa não foi diferente, pois tive a oportunidade de

ver essa sementeira frutificando. Pude ver os avanços dos alunos desde o

período da observação até o momento da produção final do gênero textual

trabalhado.

Alunos que não escreviam, aos poucos foram se apropriando da escrita

e foi possível notar a evolução de suas produções ao compararmos com as

primeiras.

Com relação à fábula, a criatividade dos estudantes foi bastante

exercitada, pois mesmo produzindo textos sustentados em outros, souberam

criar e dar seu traço pessoal à escrita. Ao escreverem a moral da história, nas

produções iniciais, alguns alunos não souberam fazê-la concordar com o texto,

175

ou mesmo deixar um ensinamento ao final. Já nas produções finais a moral da

história estava presente, porém, nos textos de alunos que ainda estavam se

apropriando da escrita, ela continuou sem ligação com estes.

O esforço da pesquisa foi gratificante, pois estar ao lado de crianças nos

ensina muito sobre seus comportamentos, sonhos e necessidades

pedagógicas. Ensina que é preciso enxergar para além do papel escrito, que

erros gráficos ficam em segundo plano quando o que se deseja é o

envolvimento do aprendiz com a escrita e com seu lugar de cidadão consciente

de seus direitos e obrigações, que atua criticamente na sociedade que o

circunda.

Sabemos que o sistema de ensino ainda nos faz caminhar numa estrada

já traçada há algum tempo, da qual não ousamos nos desviar, mas as

formações contínuas para professores estão aí para nos ajudar a ressignificar

nossas práticas pedagógicas. O que aprendemos nas formações oferecidas

pelas redes municipal e estadual transforma nossos olhares.

A pesquisa me proporcionou este olhar diferenciado. Certo dia, numa

reunião de trabalho coletivo na escola, conversando com os professores com

quem trabalhei na pesquisa, estes observavam os “erros” que seus alunos

cometiam em suas produções. Então, me surpreendi olhando os textos de

maneira diferente e dizendo para eles que os alunos haviam escrito algo e isso

era muito importante, que precisávamos ler mais do que as letras impressas no

papel.

Assim, pude verificar que o ensino por meio das sequências didáticas

aprofunda o conhecimento que os alunos já têm sobre os gêneros e ajuda-os a

dominar melhor um gênero no qual sentem alguma dificuldade. E o que se

aprende, verdadeiramente, jamais se esquece.

Meu objetivo era analisar a contribuição das sequências didáticas para a

aprendizagem dos gêneros discursivos pelos alunos e foi constatado que

houve progressos na escrita desses estudantes. De acordo com os

professores, na entrevista final, a intervenção da pesquisa contribuiu para que

os alunos lessem e escrevessem melhor, bem como tiveram sua participação

em eventos de oralidade melhorados.

Alguns alunos obtiveram avanços significativos na apropriação da

escrita, como é o caso de Myla, da turma A, e Marcos, da B. A produção inicial

176

de Myla foi lida com a ajuda da própria aluna, enquanto que na produção final

já foi possível ler e entender o que estava escrito. Depois do período da

pesquisa, tive a oportunidade de ler um texto da referida estudante e notar o

desenvolvimento de sua aprendizagem. Quanto à produção inicial de Marcos,

não foi possível fazer uma leitura. Nem mesmo o aluno leu sua própria escrita.

Porém, sua produção final pôde ser lida sem problemas.

Embora as produções dos alunos Myla e Marcos não tenham atingido a

adequação necessária à apropriação do gênero fábula, suas escritas

melhoraram sensivelmente, o que era desejado e previsto na intervenção.

Assim sendo, o problema da pesquisa consistiu em saber como o ensino

de produção textual baseado em sequências didáticas poderia influenciar na

apropriação dos gêneros textuais pelos alunos. Influenciou na medida em que

as atividades da sequência didática auxiliaram alguns dos alunos a se

apropriarem do gênero fábula e, consequentemente, da escrita. Isso ocorreu

devido ao caráter modular, às possibilidades de diferenciação decorrentes

desse ensino e à relação com outras dimensões de ensino da língua que são

pontos essenciais da sequência didática, segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly

(2004, p.96). Isso inclui o objetivo que tentei alcançar com o estudo.

As sequências didáticas, como instrumento pedagógico, interferiram de

maneira positiva na aprendizagem dos gêneros discursivos, permitindo que os

estudantes desenvolvessem suas habilidades de escrita, melhorando

sensivelmente a comunicação e, no decorrer da pesquisa, pude acompanhar o

desenvolvimento desses alunos que foram se envolvendo com os textos, lendo

e produzindo o gênero fábula.

A quase ludicidade dos textos no gênero encantou as crianças e,

provavelmente por esse fato, envolveu-os de uma forma que quase todos

foram apropriando-se do gênero sem se darem conta de que estavam

aprendendo.

A relação entre as estratégias de ensino por intermédio das sequências

didáticas e os resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos

foram perceptíveis quando seus textos finais receberam uma dose maior de

criatividade. Essa criatividade se presentificou mesmo nas produções dos

alunos que ainda não haviam se apropriado completamente do gênero. Uma

das possibilidades de isso ter ocorrido foi o fato de que os estudantes ouviram

177

muitas fábulas, enriquecendo, assim, o repertório de palavras e a imaginação

deles.

Quanto às categorias transversais, essas não estão relacionadas ao

gênero, mas às produções textuais dos alunos sujeitos da pesquisa. Alguns

textos apresentaram problemas com as pontuações e marcas da oralidade.

Outros faziam intertextualidade com diferentes produções. Algumas crianças,

ainda, escreveram demonstrando estarem em processo mais consolidado da

escrita, enquanto que outras, mais inicial de apropriação. Enfim, foram itens

que se sobressaíram nos textos dos estudantes.

Também os professores sujeitos da pesquisa, conforme entrevista final,

reconheceram ser importante o ensino por meio de sequências didáticas, pois

o ensino por etapas produz um efeito melhor na aprendizagem dos alunos. E,

indagados sobre a importância dos gêneros textuais para a interação dos

alunos e suas aprendizagens, responderam que há a necessidade de um

trabalho progressivo e aprofundado; que o professor precisa conhecer as

habilidades que seus alunos já possuem e estabelecer as que almeja alcançar,

explorando bem o gênero textual ensinado.

Ao questionar os professores se já haviam trabalhado anteriormente

atividades ensinadas por meio de sequências didáticas, disseram que sim,

todavia, não obtiveram os resultados esperados, provavelmente, segundo eles,

pela inexperiência no modo como foi abordado esse ensino.

Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.111), para adaptar a

sequência didática às necessidades dos alunos é preciso, da parte do

professor, analisar as produções dos alunos de acordo com os objetivos da

sequência e as características do gênero estudado; selecionar as atividades

que serão indispensáveis para a continuidade da sequência; e prever e

planejar, caso não obtenha sucesso, um trabalho mais aprofundado e

intervenções diferenciadas para os problemas que surgirem.

Segundo Bakhtin (2011, p. 261), o gênero discursivo apresenta três

dimensões: o conteúdo temático, a construção composicional e o estilo. No

caso da fábula, a primeira dimensão se refere ao conteúdo didático moralista

dessa. A segunda dimensão são os elementos que constituem o gênero fábula,

como o título, a presença de animais personificados, a moral da história e o

178

narrador em 3ª pessoa. Quanto ao estilo, esse se dá pela seleção dos recursos

lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua.

Ao comparar a produção inicial com a final de cada aluno, foi possível

notar o avanço que eles obtiveram. Com exceção de uma aluna que, ao

escrever seu texto final, praticamente repetiu a primeira produção, os demais

estudantes conseguiram melhorar seus textos, embora nem todos tenham feito

produções adequadas ao gênero fábula, considerando as dimensões do

próprio gênero.

Para Marcuschi (2008, p. 213), na ótica escolar, os gêneros, vistos por

meio dessas três dimensões, tornam-se um ponto de referência concreto para

os estudantes, que permitem que eles entendam os gêneros como unidades

reais, nas quais o ensino se dá.

Cardoso (2002, p. 96) observa que a aprendizagem da linguagem situa-

se entre as práticas e as atividades de linguagem e o desenvolvimento das

capacidades de linguagem apoia-se nos gêneros textuais. Portanto, o gênero

textual é um termo de referência para o ensino-aprendizagem da escrita.

O percurso desta pesquisa me autoriza a acreditar que, se esse ensino

for ministrado por intermédio das sequências didáticas, as possibilidades de

êxito na apropriação da escrita pelos alunos serão maiores. Assim, como

ressaltam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.114), as sequências didáticas

visam ao aperfeiçoamento das produções orais e escritas, focando a aquisição

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179

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186

ANEXOS

ANEXO 1 – Roteiro da entrevista inicial com os professores..........................186

ANEXO 2 – Roteiro da entrevista final com os professores............................187

ANEXO 3 – Questionário de caracterização dos professores.........................188

ANEXO 4 – Questionário de caracterização da escola...................................189

187

ANEXO 1 - Roteiro da entrevista inicial com os professores

1 - Como você tem desenvolvido seu trabalho com a Língua Portuguesa?

2 – Que meios você mais utiliza para o ensino da gramática?

3 – A escola escolheu uma coleção de livros didáticos para o ensino da língua

materna. Que livro é este?

4- Em sua opinião, ele dá conta de efetivar o ensino da escrita aos alunos?

5 – Que portadores de textos você mais utiliza para o ensino da escrita?

6 – O que significa para você alfabetizar com textos?

7 – Você utiliza o conhecimento prévio de seus alunos para o ensino da

escrita? De que forma?

8 – De que modo você trabalha a oralidade?

9 – Costuma trabalhar os gêneros textuais com seus alunos?

10 - Quais e com que frequência?

11 – Quais as principais dificuldades que você enfrenta ao ensinar Língua

Portuguesa?

12– Até que ponto você considera a interação social entre seus alunos como

uma ferramenta para a tarefa da produção escrita?

13 – Em quem/que você se embasa ao planejar suas aulas de produção

textual?

14 - Como você explica o fato de um aluno escrever bem ou escrever mal?

15 - Como você costuma trabalhar as produções de textos?

16 – Você considera isso importante ou não?Por quê?

17 – Como é para você a questão da tipologia narrativa, descritiva, dissertativa

e argumentativa e qual é a função dela na escola?

18 – Em quais gêneros textuais seus alunos apresentam maior dificuldade de

aprendizagem?

19 – Você tem feito cursos de atualização? Quais?

20 – Fez o Pró-Letramento?

21 – Tem feito leituras sobre o ensino da Língua Portuguesa? Quais?

22 – De acordo com o plano anual de ensino da escola, quais gêneros serão

abordados neste ano letivo?

188

ANEXO 2 – Roteiro da entrevista final com os professores

1 – Você considera ter compreendido melhor os gêneros textuais com o

decorrer da pesquisa? De que forma isso ocorreu?

2 – A intervenção da pesquisa contribuiu de alguma forma para o aprendizado

dos seus alunos? Como?

3 – Você já trabalhou anteriormente atividades ensinadas por meio de

sequências didáticas? Como foi?

4 – Você considerou a intervenção com alguns dos gêneros mais difícil? Por

quê?

5 – A minha presença em sala de aula prejudicou ou auxiliou de alguma

maneira o aprendizado de seus alunos? Você notou se houve alguma mudança

nos comportamentos e aprendizado deles?

6 – Até que ponto você considera as sequências didáticas importantes para a

aprendizagem dos alunos?

7 – Minha presença na sala de aula fez com que, de alguma forma, você

mudasse sua prática docente na disciplina Língua Portuguesa, intensificando

ou reduzindo-a?

8 – Ensinar a língua materna para os alunos, depois da intervenção da

pesquisa, pode ter uma ressignificação para você? Você mudaria algo na sua

prática docente? Se sim, o que mudaria?

9 – Em sua opinião, qual a importância dos gêneros textuais para a interação

dos alunos e suas aprendizagens?

10 – Observei que nas duas salas há um caderno específico para a produção

de textos. Por que isso ocorre?

11 – Que tipos de atividades você seleciona para auxiliar o aluno em processo

de apropriação da escrita?

12 – Tem obtido bons resultados nessa tarefa? Explique.

13 – Já pensou em ensinar a apropriação da escrita por meio de textos? Como

seria?

189

ANEXO 3 - Questionário de caracterização dos professores

1 – Qual é a sua formação?

2 – Há quanto tempo está na docência?

_______________________________________________________________

3 – Por qual razão se interessou pela docência?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

4 – Há quanto tempo leciona nesta escola?

_______________________________________________________________

5 – Durante este tempo, sempre trabalhou com as séries iniciais?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

6 – Desempenhou outra função nesta escola relacionada ou não à docência?

______________________________________________________________

7 – Que função era esta, quanto tempo durou e como foi a experiência?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

8 – Você é um profissional efetivo da rede?

_______________________________________________________________

9 – Já trabalhou com outras fases do ciclo? Quais?

_______________________________________________________________

10 – Por qual motivo está trabalhando com esta fase do ciclo neste ano letivo?

_______________________________________________________________

_______________________________________________________________

190

ANEXO 4 - Questionário de caracterização da escola

1 – Nome da instituição:

2 – Endereço da instituição:

3 – Fundada em:

4 – Nome do diretor:

5 – Coordenadora pedagógica das séries iniciais:

6 – Total de alunos matriculados:

7 – Alunos matriculados no I ciclo:

8 – Número de professores atuando neste ano letivo na escola:

9 – De acordo com o PPP, que gêneros textuais a escola pretende abordar

neste ano letivo?