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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS UFAL CAMPUS DE ARAPIRACA SIRLEIDE VIEIRA DA SILVA OS ASPECTOS LINGUÍSTICO-PERSUASIVOS NO DISCURSO DOS FEIRANTES DE ARAPIRACA/AL ARAPIRACA 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL

CAMPUS DE ARAPIRACA

SIRLEIDE VIEIRA DA SILVA

OS ASPECTOS LINGUÍSTICO-PERSUASIVOS NO DISCURSO DOS FEIRANTES

DE ARAPIRACA/AL

ARAPIRACA

2018

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SIRLEIDE VIEIRA DA SILVA

OS ASPECTOS LINGUÍSTICO-PERSUASIVOS NO DISCURSO DOS FEIRANTES

DE ARAPIRACA/AL

Monografia apresentada como requisito parcial para

obtenção do título de graduação em Letras – Língua

Portuguesa, pela Universidade Federal de Alagoas –

UFAL (Campus de Arapiraca).

Orientador: Prof. Dr. Deywid Wagner de Melo

ARAPIRACA

2018

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Dedico este trabalho a mim e a todas as pessoas

que contribuíram direta ou indiretamente para a

minha formação acadêmica.

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AGRADECIMENTO

Agradeço a Deus por me proporcionar viver tantos momentos de aprendizado junto a pessoas

especiais.

Agradeço a toda minha família, em especial aos meus pais Maria Suely e José Maria Vieira, e

ao meu irmão Pedro por, mesmo diante das dificuldades, sempre me incentivarem e ajudarem

nos momentos que precisei.

Agradeço ao meu esposo Jamerson por toda paciência, incentivo e ajuda durante todo o meu

período de formação acadêmica.

Agradeço a todos os professores do curso de Letras da UFAL Campus de Arapiraca, em

especial ao Prof. Dr. Elias André, ao Prof. Dr. Marcelo Marques e ao meu orientador Prof. Dr.

Deywid Wagner de Melo por todos os conhecimentos compartilhados.

Agradeço ao meu amigo/irmão Wilames Nunes por ter feito minha inscrição neste curso.

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RESUMO

Essa pesquisa tem como objetivo analisar, primordialmente, os aspectos linguístico-

persuasivos presentes no discurso dos sujeitos (feirantes) em suas atividades laborais na

tradicional feira livre da cidade de Arapiraca/AL. Esta pesquisa fundamenta-se em Reboul

(2004) Citelli (2007), Abreu (2004), dentre outros estudiosos da área. É uma pesquisa de

cunho qualitativo. Nesta pesquisa, entende-se texto/discurso como um evento comunicativo

constituído numa atividade de interação nas diversas práticas sociais do ser humano. Nesse

sentido, é por meio do texto/discurso que o sujeito chegará ao outro no intuito de convencer

e/ou persuadir. Além disso, entende-se retórica como “a arte de persuadir pelo discurso”

(REBOUL, 2004). Realizar um estudo sobre esses aspectos faz-se necessário por apresentar

um cenário sócio-histórico e cultural bem representativo da cidade em tela. Uma das

características marcantes dos profissionais é saber lidar com o freguês, uma vez que necessita

manter uma boa relação com sua clientela na intenção de vender seus produtos, assim, Citelli

(2007, p. 6) afirma “que o elemento persuasivo está colado ao discurso como a pele ao corpo.

É difícil rastrearmos organizações discursivas que escapem a persuasão”, pois a fala é o

principal instrumento de seu trabalho e é, a partir dela, que o feirante chega ao seu auditório.

O corpus foi coletado com o auxílio de gravador portátil e da observação de momentos

interativos entre feirante e seu cliente. As análises demonstraram a constante presença de

elementos linguístico-persuasivos na fala dos feirantes e o quanto o uso desses elementos

contribui para sua atividade laboral. Realizar um estudo da fala destes profissionais é muito

importante, pois eles desempenham uma atividade que contribui para a formação da

identidade social e cultural dos espaços sociais ocupados por eles. Essa importância pode ser

justificada, principalmente, pelo fato de seu principal instrumento de trabalho ser a fala.

Sendo assim, o corpus deste trabalho se conceitua de grande importância no campo

linguístico da modalidade oral da língua.

Palavras-chave: Aspectos linguístico-persuasivos. Texto/discurso. Feirante de Arapiraca.

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ABSTRACT

This research aims to analyze, primarily, the linguistic-persuasive aspects present in the

discourse of the subjects (fair) in their work activities in the traditional fair of the city of

Arapiraca / AL. This research is based on Reboul (2004) Citelli (2007), Abreu (2004), among

other scholars in the area. It is a qualitative research. In this research, text / speech is

understood as a communicative event constituted in an activity of interaction in the diverse

social practices of the human being. In this sense, it is through the text / discourse that the

subject will reach the other in order to convince and / or persuade. In addition, rhetoric is

understood as "the art of persuading by discourse" (REBOUL, 2004). Carrying out a study of

these aspects makes it necessary to present a socio-historical and cultural scenario that is very

representative of the city in question. One of the hallmarks of professionals is knowing how to

deal with customers, since they need to maintain a good relationship with their customers in

order to sell their products, so Citelli (2007, p.6) states that "the persuasive element is speech

as skin to body. It is difficult to trace discursive organizations that escape persuasion,

"because speech is the main instrument of their work and it is from there that the marketer

arrives in his auditorium. The corpus was collected with the aid of a portable recorder and the

observation of interactive moments between the marketer and his client. The analyzes

demonstrated the constant presence of linguistic-persuasive elements in the speakers' speech

and how much the use of these elements contributes to their work activity. Conducting a study

of the speech of these professionals is very important because they perform an activity that

contributes to the formation of the social and cultural identity of the social spaces occupied by

them. This importance can be justified, mainly, by the fact that its main instrument of work is

speech. Therefore, the corpus of this work is conceptualized of great importance in the

linguistic field of the oral modality of the language.

KEY-WORDS: Linguistic-Persuasive Aspects. Text / speech. Arapiraca Fair.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 8

2 ESTUDOS DOS ASPECTOS PERSUASIVOS DO TEXTO/DISCURSO. ................... 10

2.1 A argumentação: conceitos e definições ............................................................................ 10

2.2 A constituição dos argumentos: os topoi da argumentação ................................................ 13

2.3 O acordo e o auditório ........................................................................................................ 15

2.4 A tríade/ ethos, pathos e logos (Aristóteles) ....................................................................... 17

3ESTUDO DOS ASPECTOS ORAIS NO TEXTO/DISCURSO ....................................... 19

3.1 As características da Oralidade........................................................................................... 19

3.2 A constituição do texto oral. ............................................................................................... 21

3.3 Os elementos coesivos na Oralidade .................................................................................. 22

3.4 A modalização Persuasiva..................................................................................................24

4 OS ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA .................................................. 28

4.1 Caracterização da pesquisa qualitativa ............................................................................... 28

4.2 A constituição do corpus .................................................................................................... 28

4.3 Análises .............................................................................................................................. 29

4.3.1 Momento interativo 1 ...................................................................................................... 30

4.3.2 Momento interativo 2 ...................................................................................................... 31

4.3.3 Momento interativo 3 ...................................................................................................... 33

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................36

REFERÊNCIAS......................................................................................................................38

ANEXO A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (T.C.L.E.).............................39

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1 INTRODUÇÃO

A feira livre é uma atividade que acontece em todo o mundo. No Brasil, as feiras

livres são muito comuns, tanto que na maioria das cidades é possível encontrá-las. Na

literatura podemos destacar estudos e algumas pesquisas sobre a história dos feirantes, sua

forte ligação com a cultura agrícola de cada região, entre outras características inerentes a

esses profissionais. Porém, não encontramos pesquisas que ressalvem a importância do uso da

fala no dia a dia desses profissionais. Trata-se de um campo de estudo ainda não explorado

exaustivamente.

O dia a dia desses trabalhadores caracteriza uma organização discursiva, pois sua

atividade laboral se materializa a partir de sua interação com o outro, a qual se dá através da

fala. A melhor maneira de se dar bem com o outro é mantendo uma boa interação com ele.

Desse modo, podemos inferir que o discurso do feirante precisa ser convincente, mas não um

convencimento pertinente ou abusivo. É necessário que se estabeleça uma conversa agradável,

na qual o foco seja a satisfação do freguês e a compra do produto. O discurso que tem por

intuito persuadir possui processos constitutivos no âmbito linguístico e social.

Com base em estudos de Ferreira (2010), pode-se salientar que o discurso que

possui muitos aspectos persuasivos é aquele que se destina a convencer e/ou persuadir um

auditório. Fazer uso de elementos persuasivos durante a construção de seu discurso é algo

muito importante para que o feirante alcance seu objetivo maior, que é a venda de sua

mercadoria. Citelli (2007) em seu livro Linguagem e persuasão ressalva que “[...] é possível

afirmar que o elemento persuasivo está colocado ao discurso como a pele ao corpo. É difícil

rastrearmos organizações discursivas que escapem à persuasão;[..]”(CITELLI, 2007, p. 6).

Como já exposto, a fala é o principal instrumento de trabalho do feirante. Sobre

questões inerentes à fala, Ferreira (2010) salienta uma das principais características da

linguagem; segundo ele, “[...] quando vista como ação, é ser dotada de uma orientação

argumentativa [...].” (FERREIRA, 2010, p. 27). Através do discurso o sujeito materializa

estratégias discursivas de convencimento e na argumentação isso ocorre com o consentimento

do outro. Citelli (2007) expõe que a partir das escolhas de signos linguísticos, os quais são

formadores de frases, textos, períodos, é que se consegue matéria-prima para a elaboração de

estratégias discursivas de convencimento, isto é, fazer a escolha certa de quais palavras

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usarem durante a venda de seu produto, pode fazer com que o feirante consiga ter maior ou

menor sucesso em seu trabalho.

A pesquisa “Os aspectos linguístico-persuasivos no discurso do feirante de

Arapiraca – AL” tem por intuito fazer a análise de dados que demonstrem a presença de

aspectos persuasivos no discurso desses profissionais bem como mostrar qual sua função

social no seu dia a dia. Buscou-se realizar um trabalho que, de fato, apresentasse um registro

sobre as práticas comunicativas e a presença ou não de elementos linguístico-persuasivos no

discurso desses indivíduos.

As seções deste trabalho apresentam discussões sobre os aspectos persuasivos no

texto/discurso, os aspectos orais do texto/discurso e os aspectos metodológicos da pesquisa. A

primeira seção expõe discussões acerca dos conceitos sobre Argumentação e Retórica: a

constituição dos argumentos, o que configura acordo e auditório e apresenta a tríade

aristotélica: ethos, phatos e logos. A segunda seção traz as características do texto oral, com a

sua constituição, os elementos coesivos na oralidade e os tipos de modalização persuasiva

(afetiva, deôntica e epistêmica). Por último foram expostas as características da pesquisa

qualitativa, como se deu a constituição do corpus, e as análises dos momentos interativos

coletados. Essas discussões foram levantadas com base em textos de Abreu (2004), Ferreira

(2010), Fávero, Andrade e Aquino (2009), Koch e Elias (2011), entre outros autores.

O interesse em estudar mais detalhadamente a presença da argumentação na fala

de feirantes levou ao desenvolvimento desse trabalho. O objetivo do feirante é vender sua

mercadoria, para tanto ele precisa persuadir as pessoas a comprarem seu produto. Estes

profissionais se valem do uso dos aspectos linguístico-persuasivos presentes em seu discurso

para obter êxito em suas vendas. Os estudos retóricos buscam contribuir para uma

sistematização de como o uso desses elementos contribuem satisfatoriamente para a atividade

laboral dos feirantes.

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2 ESTUDOS DOS ASPECTOS PERSUASIVOS DO TEXTO/DISCURSO

Nesta seção serão discutidos os conceitos e definições sobre a Argumentação e

sua intrínseca presença na linguagem, a concepção e constituição dos argumentos, qual a

relação entre acordo e auditório no discurso persuasivo e a tríade aristotélica: ethos, pathos e

logos. Através das discussões levantadas, objetiva-se explanar qual a importância desses

estudos para a análise dos aspectos persuasivos no texto/discurso. Nessa perspectiva para

melhor desenvolver um estudo sobre os aspectos persuasivos presentes no texto/discurso, as

análises precisam estar fundamentadas em observações de que o grau de persuasão presente

varia de acordo com o tipo de discurso construído/elaborado na situação comunicativa a ser

estudada.

2.1 A argumentação: conceitos e definições

Diante de tantos estudos sobre as diversas maneiras de interação que existem entre

as pessoas, pode-se destacar a linguagem verbal como principal meio pelo qual isso acontece.

Através da linguagem as informações são gerenciadas, ou seja, o homem consegue se

comunicar com o outro, de modo que novas e diferentes tipos de relações vão sendo

estabelecidas. Sobre esse meio de interação entre as pessoas, Koch (2011) instiga que a

linguagem deve “ser encarada como forma de ação, ação sobre o mundo dotada de

intencionalidade[...]” (KOCH, 2011, p.15). Consoante essa assertiva, é correto afirmar que o

discurso de um indivíduo se constituirá, na maioria das vezes, com uma forte presença da

argumentatividade, ou seja, sempre que alguém diz algo, o diz com algum tipo de intenção.

Nos parágrafos desta seção, o trabalho apresenta um leve pincelar sobre a arte de argumentar

e sua presença constante na linguagem.

A argumentação possui muitas definições e conceitos. Abreu (2004) em seu livro

“A arte de argumentar: gerenciando Razão e Emoção” define a Argumentação como sendo a

arte de conseguir convencer e persuadir o outro: “Argumentar é, pois, em última análise, a

arte de, gerenciando informação, convencer o outro de alguma coisa no plano das ideias e de,

gerenciando relação, persuadi-lo, no plano das emoções, a fazer alguma coisa que nós

desejamos que ele faça.” (ABREU, 2004. p.10). Essa definição da argumentação é a mesma

definição dada à Retórica Antiga, pois segundo este e outros autores, exemplo, Reboul (2004),

a Retórica desde seus primórdios é conhecida como a “arte de persuadir e convencer”.

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Estudos sobre a história da Retórica demonstram o quanto ela era mal vista por

muitos povos contemporâneos ao seu surgimento. Sobre esse evento, vale ressaltar que

estudiosos, como Reboul (2004), advertem que não é sugestivo afirmar data específica para o

nascimento da retórica, o mesmo é feito apenas, por convenções de estudos. Pois, segundo o

autor, “a retórica é anterior à sua história [...], pois é inconcebível que os homens não tenham

usado a linguagem para persuadir.” (REBOUL, 2004, p. 1). Ainda segundo o autor, o ano 465

pode ser usado como referência para o nascimento da Retórica, o qual aconteceu na Grécia

em Sicília, e pertencia ao campo jurídico de estudos. Não é de interesse deste trabalho se

estender a cerca da história da Retórica e da Argumentação.

Segundo Breton (1999), a partir do século XVI com o advento do Cartesianismo,

do Protestantismo e do Empirismo, a linguagem utilizada pela arte retórica foi rejeitada.

Nesse ínterim pensava-se que as evidências tomadas por essas três dimensões bastavam para

estabelecer os valores de verdade das coisas. Esse momento de „queda‟ da Retórica foi

superado durante os anos 60 do século XX, quando a Filosofia da Linguagem passou a ser

vista com mais prestígio, e igualmente a Retórica volta a se tornar um importante campo de

estudos para os linguistas.

Do mesmo modo que a Retórica, a Argumentação também passou por uma

renovação, e segundo Breton (1999) e Ferreira (2010), isso se deve também aos estudos de

Perelman (1988). De acordo com Bretton (1999) os estudos de Perelman define que a

Argumentação passa a realizar os estudos sobre técnicas do discurso, as quais permitem o

inicio e aumento da aceitação por parte das pessoas a teses que são apresentadas no intuito de

serem aceitas. Ferreira (2010) conceitua argumentação como

o meio civilizado, educado e potente de construir um discurso que se insurja contra a

força, a violência, o autoritarismo e se prove eficaz (persuasivo e convincente) numa

situação de antagonismos declarados. Argumentar implica demonstrar ideias para

clarear no espírito do outro nossa opinião de um assunto polêmico. (FERREIRA,

2010, p. 14).

A arte de Argumentar pode ser entendida e analisada como uma parte intrínseca a

uma determinada situação comunicativa, na qual é possível identificar uma tese sendo

apresentada por um interlocutor, no intuito de convencer e persuadir um determinado

auditório. Trata-se de uma área de estudo que vem se consolidando ao passar dos anos, e

adquirindo a importância que lhe é devida e necessária para a melhor análise dos aspectos

persuasivos presentes nos diferentes discursos, sendo este possuidor de diferentes finalidades

em diversas situações sociocomunicativas.

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Outra questão muito importante e oriunda das concepções e definições do que

venha a ser Argumentação está ligada aos conceitos de convencer e persuadir. Segundo

Abreu (2004), a arte de argumentar consiste em “convencer e persuadir” um determinado

auditório, ou seja, a partir do discurso apresentado este deve aderir à opinião do orador e

passar a agir de acordo com o que lhe foi apresentado por meio da argumentação. Por motivos

didáticos, alguns estudiosos, como Ferreira (2010) e Abreu (2004), apresentam uma distinção

entre as ações de convencer e persuadir, pois “persuadir contém em si o convencer

(cum+vincere), que equivale a vencer o opositor com sua participação, persuadir o outro por

meio de provas lógicas, indutivas ou dedutivas” (Ferreira. 2010, p.15). Sendo assim, ambas as

ações são por vezes estudadas como equivalentes, mas ao se levar em consideração sua

origem etimológica, será possível constatar facilmente a essência de suas distinções.

Convencer explora o lado racional das pessoas, ou seja, é necessário falar junto à

razão do outro. O discurso precisa estar coordenado pela exposição de provas lógicas, assim o

orador conseguirá convencer seu auditório, sem ser agressivo, pois todo o gerenciamento de

informações estará sendo feito com o consentimento do receptor/auditório. Convencer

etimologicamente significa “vencer junto ao outro” (ABREU, 2004, p. 7), ou seja, o receptor

do discurso passa a aceitar a opinião apresentada, e ela passa a ser sua própria opinião sobre o

que lhe foi apresentado.

Por outo lado, persuadir volta-se para o campo emocional do auditório. Quando se

deseja persuadir alguém, é necessário ir além da razão, os argumentos apresentados pelo

orador precisam atingir a emoção, as paixões de seu auditório. Percebe-se assim a importância

de saber escolher, por exemplo, as palavras „certas‟ e aceitas pelo determinado auditório na

atividade comunicativa. O orador precisa falar junto às paixões de seu auditório, no intuito de

que o auditório mude de atitude, ou seja, passa agir segundo a tese que foi apresentada e

acerta por ele.

A partir dos conceitos e definições apresentadas sobre a Argumentação, pode-se

constatar que essa ação acontece de várias maneiras, em lugares diferentes, de modos

diferentes e com finalidades diversas, sendo a comunicação seu principal palco de atuação.

Ela é considerada uma parte indissociável da linguagem e consequentemente é através dela

que se torna possível persuadir e convencer o outro através do discurso.

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2.2 A constituição dos argumentos: os topoi da argumentação

O discurso, que tem por intuito persuadir, possui processos constitutivos no

âmbito linguístico e social. Ao elaborar/construir um discurso, é necessário atentar-se à

escolha do léxico, à estrutura sintático-semântica que deve usar, ao contexto social a que

pertence o auditório, ao cenário ideológico no qual o discurso será manifestado. Todos esses

aspectos precisam ser considerados se o orador deseja construir um bom discurso, ao mesmo

tempo em que todos esses aspectos devem ser observados ao se estudar um texto/discurso.

Logo, a definição de argumento precisa se valer de toda essa complexidade e dinamicidade da

atividade comunicativa na qual os argumentos se manifestam.

Bretton (1999) acredita que é necessário levar em consideração toda a dinâmica

argumentativa da comunicação para que se possa chegar a uma definição e conceituação dos

argumentos. Segundo ele, para que haja um melhor entendimento sobre a constituição dos

argumentos, faz-se necessário um esclarecimento sobre a diferença entre dois níveis de

definição, os quais se confundem com frequência. Esses níveis são: o nível do conteúdo do

argumento das opiniões em si mesmo; e o nível do “molde argumentativo” que vai dar sua

forma à tese proposta. Os estudos tendem a utilizar este último nível para definir os

argumentos. A literatura designa o que é argumento a partir do estudo das definições dos

“moldes argumentativos”, ou “técnicas argumentativa”, classificada assim por Abreu (2004),

ou ainda, dos “lugares retóricos”/ os topoi como são designados por Ferreira (2010). Esses

conceitos definem a forma como o argumento pode ser apresentado ao seu auditório.

Neste trabalho, o argumento está sendo estudado como uma atividade

comunicativa complexa, composta de um conteúdo particular (tese defendida pelo orador) e

suas maneiras (formas/técnicas) de apresentar sua tese para seu auditório, com o intuito de

convencê-lo e/ou persuadi-lo. Dessa maneira, o ato de argumentar poderá ser analisado

englobando toda sua dinâmica de comunicação. É relevante advir que os argumentos se

constituem da relação estabelecida entre o orador e seu auditório, e a partir desse contexto

comunicativo lhes são atribuídos valores, formas e definições.

Essa relação estabelecida entre orador e auditório precisa acontecer

harmoniosamente; ou seja, precisa existir um vínculo entre os dois, uma base comunicativa. O

discurso apresentado não pode aparecer como algo impossível de acontecer; pelo contrário, o

discurso necessita de uma referência existencial, que Bretton (1999) chama de

“Enquadramento do Real”. É esse enquadramento que atribuirá o grau de aceitabilidade do

argumento apresentado. Os argumentos serão aceitos se o enquadramento do real acontecer de

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maneira satisfatória, pois assim será construído e mantido um campo referencial do discurso

entre o orador e auditório.

A escolha de argumentos é de fundamental importância para que o objetivo de

persuadir o auditório seja alcançado. Essa escolha acontece no início de um discurso retórico.

Os lugares retóricos funcionam como grandes armazéns, que podem encontrar os argumentos

certos para serem utilizados em determinados contextos, dependendo do perfil, dos valores,

das crenças, das opiniões e de tudo que se conhece do auditório que se deseja

convencer/persuadir.

A classificação dos lugares retóricos já foi definida por Aristóteles em seus

estudos, esses lugares persistem até os dias atuais quando se fala em análise de discursos

retóricos. Segundo Ferreira (2010), esses lugares retóricos foram estudados também por

Olbrechts-Tyteca e Perelman em seu livro Tratado de Argumentação (1996). Aqui nos

deteremos em alguns lugares retóricos definidos por Ferreira (2010).

Sendo assim, faz-se o uso do lugar de quantidade quando se utilizam razões

quantitativas para dar valor a uma determinada coisa. Existe também o lugar da qualidade,

que valoriza os aspectos únicos das coisas, opondo-se ao lugar de quantidade. O lugar de

ordem baseia-se nos princípios de finalidade, o posterior é mais importante do que o anterior.

Outro lugar retórico é o lugar de essência, utilizado quando se quer destacar um único

produto, indivíduo, entre outros como representante de algo, por exemplo, a marca de sabão

em pó OMO que é muito representativa quando se quer referir ao produto oferecido pela

marca. O lugar de pessoa notado quando o orador nesse momento fará uso da superioridade

da pessoa do discurso sobre o tópico discursivo. Existe também o lugar do existente utilizado

para dar preferência ao que já existe em contra ponto ao novo que estar sendo apresentado.

Existem outros lugares considerados mais contemporâneos e voltados para a

publicidade, como o lugar da beleza, o lugar da juventude e o lugar da sedução, mas não

convém ao trabalho adentrarmos aos conceitos desses lugares.

A noção de acordo também possui um papel muito importante na manutenção de

um discurso persuasivo, esse conceito será explanado mais adiante. Por enquanto,

relacionemos acordo com a lógica do verossímil, ou seja, os argumentos apresentados não

precisam necessariamente ser verdadeiros, mas precisam construir uma verdade

argumentativa, isto é, a credibilidade do enunciado depende do ethos construído pelo orador,

termo que também será exposto no desenrolar do trabalho.

Essa nova forma de olhar a escolha dos argumentos, a partir da lógica do

verossímil, surgiu com a Nova Retórica. Esse acordo poderá ter um grau maior ou menor de

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aceitabilidade, podendo ser observado a partir do uso das técnicas discursivas/argumentativas.

Sobre essas técnicas, Ferreira (2010) remetendo-se aos estudos de Perelman, que as técnicas

argumentativas “ajudam provocar ou aumentar a adesão das pessoas às teses que são

apresentadas à sua aceitação.” (FERREIRA, 2012, p. 145).

2.3 O acordo e o auditório

Através dos textos/discursos, os falantes são capazes de transmitir suas

particularidades, ou seja, suas crenças, experiências de vida, opiniões, entre outras. Mesmo

fazendo parte de uma sociedade e sendo identificados por suas características em comum, os

seres humanos são únicos, cada um com especificidades e experiências únicas, próprias de

cada ser. A partir dessa premissa e, conforme a afirmação de Ferreira (2010, p.13): “Agimos

retoricamente quando nos valemos do discurso para descrever, explicar e justificar nossa

opinião com o objetivo de levar o outro a aceitar nossa opinião”. Pode-se concluir que o ser

humano, em vários momentos, age fazendo uso de discursos retóricos, tendo em vista suas

particularidades e o fato de usarem a linguagem para transmiti-las tentando influenciar as

pessoas, buscando acordos, na intenção de persuadi-las.

Para que o discurso retórico seja eficaz, é necessário que exista um acordo entre o

orador e seu auditório. Ferreira (2010) expõe que o acordo pode ser definido como sendo a

eficácia da interação que deve existir entre os sujeitos do discurso. Essa eficácia se constitui a

partir da autoridade atribuída ao orador, por parte de seu auditório, sendo necessário que a

contra parte aconteça, ou seja, o orador também precisa adjudicar valores ao seu auditório.

Outro ponto importante para manter o acordo é a sustentação da função hermenêutica do

discurso, isto é, o orador precisa interpretar de que maneira seu discurso está sendo

compreendido.

Segundo Bretton (1999), toda essa dinâmica de interação entre orador e auditório

se inicia com a apresentação do ponto de vista do orador. A partir dessa apresentação, é

possível que ocorra o enquadramento do real, que “[...] permite constituir o fundo no qual a

opinião proposta encontrará harmoniosamente seu lugar [...]” (BRETTON, 1999, p. 75). Após

o enquadramento ocorrer, tem-se a escolha dos argumentos a serem apresentados, estes, por

sua vez, são os responsáveis por manter um vínculo entre orador e auditório. Assim, acordos

começam a ser constituídos no desenrolar do momento de interação.

Diante de tantos indivíduos com tantas diferenças, podemos nos perguntar, como

o orador pode conseguir ir de encontro a tantas opiniões? Através da argumentação, ela

permite ir ao encontro da vontade do outro de maneira civilizada, ou seja, abre-se mão de uma

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imposição no intuito de se conseguir um acordo com o outro, por meio de um texto/discurso

constituído de elementos persuasivos. Como já exposto nos tópicos, “a argumentação implica

em uma relação de comunicação” (BRETTON, 1999, p. 26). Deseja-se convencer e/ou

persuadir o outro utilizando argumentos que se adequem ao contexto e objetivo do orador.

Desse modo é possível construir “acordos” entre os integrantes/pessoas do discurso, ou seja,

opiniões passam a ser compartilhadas entre orador e auditório.

Conforme Abreu (2004) pode-se chamar de auditório o conjunto de pessoas que o

orador deseja convencer e persuadir. O auditório pode ser uma pessoa, um grupo de mulheres,

um país, entre outros, variando de tamanho e de características. Um bom orador precisa

adequar seu texto/discurso ao „perfil‟ de seu auditório, pois só assim ele conseguirá atingir

seus objetivos através da argumentação.

O autor supracitado chama à atenção para a necessidade de não confundir

auditório com interlocutor, muitas das vezes as pessoas que se dirigem ao orador são

representadas por um interlocutor, como por exemplo, um repórter de um programa de TV,

nessa situação, caracteriza-se como auditório os telespectadores do programa, são eles que o

discurso do orador deseja convencer e/ou persuadir.

O auditório varia muito de tamanho como já mencionado, diante dessa

característica Abreu (2004) distingue dois tipos de auditório. Segundo ele, tem-se o Auditório

Universal e o Auditório Particular: “Auditório universal é um conjunto de pessoas sobre as

quais não temos controle de variáveis. [...] e Auditório particular é um conjunto de pessoas

cujas variáveis controlamos” (ABREU, 2004, p. 14). Não importa para qual tipo de auditório

o orador discurse, ele precisa estar atento as suas particularidades, assim poderá apresentar e

manter um discurso mais persuasivo diante dos objetivos que deseja alcançar.

Bretton (1999, p. 29) afirma que um bom orador “[...] é aquele que, dispondo de

uma opinião, se coloca na postura de transportá-la até um auditório e submetê-la a este

auditório, para que ele partilhe dela.” Sendo assim, o orador precisa levar em consideração as

particularidades de seu auditório. É necessário agir com ética, pois ele precisa obter confiança

por parte dos que o ouvem/leem. Outro ponto relevante é o fato de considerar a possibilidade

de que um discurso apresentado ao auditório particular pode chegar ao campo discursivo de

um auditório universal. Torna-se de suma importância elaborar um discurso observando as

possibilidades dos argumentos utilizados serem definidos em ambos os auditórios.

Diante das observações sobre acordo e auditório, é possível afirmar a necessidade

de se atentar ao „perfil‟ dos indivíduos que possivelmente constituirá o auditório para quem o

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discurso está sendo proferido/escrito, pois a chance de alcançar o objetivo de persuadi-lo,

provavelmente, será bem maior.

2.4 A tríade/ ethos, pathos e logos (Aristóteles)

A presença de um orador, de seu auditório e a elaboração de um discurso

persuasivo é a constituição basilar em uma situação de atividade comunicativa, na intenção de

se convencer e/ou persuadir. Estes são elementos constituintes do discurso retórico. Ferreira

(2010) apresenta a tríade já estudada por Aristóteles – ethos; pathos e logos. Melo (2009) em

seu livro “Análise retórica do gênero discursivo defesa pública” fez alusão referente à tríade

aristotélica“ [...] o ethos é algo comedido, o pathos é irreprimível. Sendo assim, o ethos pode

estar para o orador e o pathos para o auditório já o logos, para a argumentação propriamente

dita” (MELO 2009, p. 33). Tais estudos concluem que o ethos e o pathos estão mais ligados

ao campo emocional do ser humano, enquanto que, do outro lado, encontra-se a razão humana

representado pelo logos.

O discurso retórico se encontra dentro de um contexto retórico e se realiza durante

um ato retórico. Conforme Ferreira (2010), o primeiro refere-se a todos os acontecimentos

históricos, sociais, culturais, entre outros precedentes que estão relacionados e inferem sobre o

auditório que se quer convencer e/ou persuadir. O segundo é o momento em que o discurso

retórico se realiza. É de suma importância para o orador conhecer e fazer uma análise do

contexto retórico de seu auditório. Desse modo, ele obterá conhecimentos que irão lhe auxiliar

em sua atividade discursiva.

O ethos concentra-se na pessoa do orador e construirá seu próprio ethos. Ao ter

contato com o auditório, o orador precisa passar uma credibilidade em relação ao seu

texto/discurso. Para que se aceite a opinião apresentada, primeiramente se aceitam os aspectos

extralinguísticos, ou seja, os traços éticos, culturais e morais do orador. Diante disso, Ferreira

(2010, p. 21) salienta: “Não importa, pois, se o orador é ou não sincero: a eficácia do ethos é

distinta dos atributos reais de que assume o discurso.” Não se pode acreditar em algo que

está sendo dito, se a pessoa que o diz não transmitir confiança e autoridade sobre os

argumentos apresentados. Um bom orador atenta às exigências observáveis de seu auditório e,

a partir dessas observações, se posiciona e constrói seu próprio ethos, com a finalidade de se

adequar às necessidades exigidas por determinado contexto discursivo. Desse modo, o orador

atendendo às perspectivas de seu auditório, possibilitará uma maior chance de convencê-lo.

Diante dos estudos sobre análise do discurso, é possível afirmar que toda

atividade desenvolvida pelo orador concentra-se no auditório, este podendo ser representado

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por uma única pessoa, ou por várias, e variando muito ou pouco, dependendo do contexto

discursivo. O auditório também pode ser representado pelos leitores, pois quando se escreve

quer atingir o leitor de alguma maneira e muitas vezes pretende-se convencê-lo de alguma

coisa como, por exemplo, quando se escreve uma notícia, um cartaz de propaganda, entre

outros.

O auditório não é estável, ele faz parte de uma situação comunicativa e se

caracteriza por sua dinamicidade, o auditório pode concordar ou discordar do discurso

apresentado pelo orador podendo levantar novas questões envolvendo a problemática do

discurso já apresentado. O orador não pode deixar de observar que o seu auditório já possui

sua moral, seus valores sociais, suas paixões. O pathos configura-se na necessidade de

despertar no auditório os sentimentos, as paixões e emoções que possuem, no intuito de

persuadi-lo, pois já afirmara Abreu (2004, p. 7): “Persuadir é saber gerenciar relação, é falar a

emoção do outro”. A escolha das palavras é fundamental para a elaboração de um bom

discurso persuasivo, pois a sequência lexical influencia o modo como o texto pode ser

interpretado/entendido e como ele será aceito, recebido pelo pathos.

Para tentar persuadi-lo é importante atingir todos esses níveis extralinguísticos

que envolvem a dinâmica da comunicação social. Desse modo, pode-se observar a

importância do uso da função hermenêutica no estudo do discurso persuasivo. Esta função

está presente no discurso retórico, ela ressalta a questão de que, não basta apenas dizer algo, é

necessário fazer um estudo interpretativo do seu próprio discurso, para que seus objetivos

seus alcançados. Fazer o uso de um termo genérico, ao invés de um particular e/ou

determinante, pode tratar-se de uma estratégia discursiva. A partir dessa observação, fica claro

que o orador precisa estar atento ao discurso, seu logos, que deseja construir, pois é o

instrumento principal na sua atividade comunicativa, trata-se do meio pelo qual ele vai

persuadir e/ou convencer seu auditório.

Através da análise da presença desses elementos constitutivos do discurso retórico

é possível estudá-lo na sua materialização. A modalidade oral da língua já possui seus

elementos constitutivos e suas características distintos da escrita. Os estudos desses elementos

e da tríade aristotélica apresentada nesta seção se caracteriza de suma importância para a

realização das análises do corpus deste trabalho.

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3 ESTUDO DOS ASPECTOS ORAIS NO TEXTO/DISCURSO

O discurso neste trabalho está sendo estudado como a manifestação oral do texto,

equivalente à fala do feirante. Segundo Cittele (2007), é possível constatar, através dos

estudos linguísticos, que dificilmente se rastreiam organizações discursivas que fujam à

persuasão. Tendo o texto/discurso como meio de comunicação, pode-se introduzir que através

dele o sujeito consegue chegar ao outro, caso sua intenção seja convencer e/ou persuadir, o

sujeito fará uso do texto para alcançar seu objetivo. Nos próximos tópicos desta seção, serão

apresentadas observações e análises sobre a importância de se fazer um estudo a partir das

particularidades da modalidade oral da língua, no intuito de se obter uma análise mais eficaz

dos aspectos persuasivos presente no discurso retórico.

3.1 As características da Oralidade

Dá-se o nome de texto ao evento comunicativo resultado de uma coprodução entre

interlocutores. Este evento pode se realizar na modalidade escrita e/ou oral da língua, o que as

diferencia é o modo como a referida coprodução se manifesta. Essas duas modalidades do

texto possuem suas próprias características de produção e realização, sendo que por muito

tempo as características do texto oral foram vistas como a banalização da modalidade escrita.

Outra afirmação era a existência de uma dicotomia, as características de uma anula a presença

das características da outra.

Ao passar do tempo, essa visão simplista das características foi perdendo

credibilidade. Novas pesquisas começaram a ser feitas e, segundo Fávero, Andrade e Aquino

(2009), “[...]discute-se que ambas apresentam distinções porque diferem nos seus modos de

aquisição; nas suas condições de produção, de transmissão e recepção; nos seus meios através

dos quais os elementos de estruturas são organizados.” (FÁVERO, ANDRADE e AQUINO,

2009, p. 69).

As diferentes características começaram a ser analisadas mais a fundo, novos

estudos linguísticos foram sendo realizados e ganharam novos conceitos. Koch e Elias (2011,

p. 14) ressaltam que “Fala e escrita são, portanto, duas modalidades da língua. Assim, embora

se utilizem do mesmo sistema linguístico, cada uma possui características próprias”. Ainda

segundo os autores Koch e Elias (2011), o texto escrito pode ser mais planejado, reescrito,

revisado, em sua elaboração o escritor idealiza como será o leitor de seu texto, pois o seu

contexto de produção normalmente não condiz com seu contexto de recepção. Enquanto que

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no texto oral não existe a oportunidade de uma revisão, uma reescrita. O discurso, a

manifestação oral de textos, emerge no próprio momento da interação.

Os novos conceitos sobre as diferentes características entre as duas modalidades

da língua, admitem que a dicotomia de que as características de uma anulam a presença das

características de outra não se sustenta. De acordo com os estudos apresentados por Koch e

Elias (2011), o fato de se tratar de duas modalidades diferentes da língua, não significa que as

características predominantes em uma modalidade anule a presença das características mais

comuns de outra. As autoras constatam que as duas modalidades se configuram em um

continum, ou seja, as características da modalidade escrita podem ser encontradas em textos

orais e vice-versa.

É válido frisar que, na maioria das vezes, o texto oral se realiza face a face e

mesmo que o meio de produção seja outro, como por exemplo, a internet, o telefone, o locutor

que detém a palavra no dado momento (o turno) não se caracteriza como único responsável

por seu discurso, pois, em situações discursivas interacionais, os interlocutores presentes se

ocupam com a produção do texto, agindo como conegociantes, coargumentadores se

manifestando efetivamente como coprodutores do texto.

Os autores em tela apresentam também em seus textos que a aquisição do texto

oral também se difere do escrito. Quando uma pessoa recebe um e-mail, por exemplo, ela tem

a opção de não abrir, e assim não ter acesso ao assunto do texto. No entanto se, por exemplo,

a pessoa estiver andando na rua, e for abordada por um vendedor de praça, será difícil ela

conseguir impedir que não fale sobre o que deseja. Desse modo, é possível observar que

existem muitas distinções em relação à aquisição dessas duas modalidades da língua. O texto

escrito favorece uma maior liberdade ao receptor de decidir se quer ou não ter acesso ao

assunto do texto. Por outro lado, o texto oral não proporciona tanta liberdade, já que será

quase impossível, mesmo que use um protetor de ouvido, que um indivíduo andando na rua

não escute uma determinada propagando anunciada por um carro de som.

O objeto de estudo deste trabalho se constitui a partir da modalidade oral da

língua, o discurso do feirante se manifesta sem nenhum planejamento prévio, trata-se de algo

natural. A fala desse profissional se constitui na interação com uma única pessoa, quando o

cliente se aproxima, ou na interação com todos que passam por seu espaço de trabalho, isto é,

muitas vezes eles gritam para que todos que por ali passam possam ouvi-lo.

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3.2 A constituição do texto oral.

O texto é um dos meios pelos quais as pessoas se comunicam, seja ele na

modalidade escrita ou oral, trata-se do veículo de comunicação social mais usado, pois é

através dele que se diz algo, faz-se um pedido, declara-se para alguém, envia-se um mandato

de busca e apreensão, vende-se um produto, entre tantas outras atividades conversacionais.

Koch e Elias (2011) definem o texto “como o próprio lugar da interação”. A partir da linha de

análise dos conceitos de texto que as autoras seguem para chegar a essa definição, será

possível enxergar que o texto está sempre inserido em um contexto, possui uma estrutura

sintático-semântica e o mais relevante, tem por intuito fins sociais, pois é a partir dele que os

sujeitos são construídos/constituídos socialmente. Sendo assim, por meio do texto eles

participam como produtores do cenário social, a medida que atuam ativamente nas definições

das situações sociais em que se encontram engajados.

Koch (2011) discute a constituição da modalidade oral do texto. A autora destaca

que ela possui uma estrutura própria. O texto oral e a escrita possuem o mesmo sistema da

língua, porém seus constituintes são de ordens sintáticas, estrutural e semântica diferentes. O

texto oral se efetiva dentro de uma atividade conversacional, em que dois ou mais

interlocutores interagem. Para se analisar a constituição dessa modalidade da língua é

fundamental realizar um estudo sobre como se instaura a Conversação. Esta é definida por

Fávero, Andrade e Aquino (2009, p. 15) “como atividade na qual dois ou mais interlocutores

que se alternam constantemente, discorrem sobre temas próprios do cotidiano”. Uma

atividade comunicativa ocorre em um determinado tempo e situação social, pode ser via

telefone, pela internet ou face a face. Esse tipo de atividade, como já mencionado, possui um

caráter interativo, pois seus participantes se envolvem durante toda a situação.

A fala dentro de uma atividade conversacional é organizada a partir de turnos. O

turno “define-se como a produção de um falante enquanto está com a palavra” (FÁVERO,

ANDRADE E AQUINO, 2009, p. 35), não só enquanto este está com a palavra, mas até

mesmo um momento de silêncio pode constituir um turno. A organização dos turnos em uma

atividade conversacional é responsável pela coesão e coerência daquela determinada

atividade. Sobre esse assunto iremos decorrer nos próximos tópicos.

O discurso se constitui em uma organização conversacional. Dependendo do grau

de envolvimento entre os interlocutores, o grau de interação pode ser maior ou menor. Os

autores em tela distingue esse encontro. No primeiro, os interlocutores possuem os mesmos

direitos em tomar a palavra e fazer a escolha do tópico, direcionar o encontro, determinar o

tempo de duração, isso é possível nos encontros simétricos. Enquanto que no encontro

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assimétrico, acontece um privilégio em relação ao uso da palavra, ao início do diálogo, a sua

condução e a escolha dos tópicos.

Fávero, Andrade e Aquino (2009) apresentam algumas variáveis presentes nesta

modalidade da língua. Dentre elas destacam-se as seguintes: tópico ou assunto, tipo de

situação, papéis dos participantes, modo e meio do discurso.

O assunto ou tópico é o que mantém o canal de comunicação, por ele acontece a

manutenção das relações sociais, promovendo o contato entre os participantes/interlocutores.

Em se tratando dos tipos de situação, a qual acontece face a face, é possível constatar que os

participantes precisarão estar atentos às atividades não verbais que compõem uma atividade

comunicativa, pois elas ajudam no entendimento do que está sendo dito. A partir desta

ressalva, fica clara a importância de que quando se deseja analisar uma atividade

conversacional não se pode levar em conta apenas os elementos linguísticos do texto oral.

Desse modo, observa-se ser necessário também analisar os elementos não-verbais presentes

nessa atividade, que interferem nos sentidos construídos pelo texto naquele dado momento de

interação.

Em relação aos papéis dos participantes, observa-se que as situações sociais de

comunicação são diversas, tendo o participante que se adequar a suas particularidades,

comportando-se de diferentes modos. Outro constituinte é o modo discursivo, este se refere ao

grau de formalidade que o texto oral precisa ter para que a interação aconteça da melhor

forma. E o meio discursivo indica o canal pelo qual o texto é transmitido: face a face, via

internet, telefone, entre outros.

A identificação dos componentes do texto oral possibilita um estudo mais bem

detalhado da sua estrutura e da relação que se estabelece entre seus participantes. Outro fato

relevante é que através das características apresentadas torna-se possível ressaltar que o texto

conversacional possui natureza coletiva, acontecendo de forma interacional e organizada.

3.3 Os elementos coesivos na Oralidade

De acordo com estudos apresentados pela Linguística Textual, os sentidos do

texto são construídos a partir da interação entre texto, sujeito (escritor, leitor, interlocutor) e

contexto. Para que se possa obter êxito na compreensão e interpretação dos sentidos, é

necessário que o texto possua uma unidade temática, ou seja, as partes que constitui o texto

precisam estar ligadas, isto é, se faz necessário que exista uma conexão nas estruturas

sintática e semânticas do texto. Esse fenômeno precisa ser efetivado tanto na modalidade

escrita quanto na modalidade oral. Irandé Antunes em seu livro Lutar com as palavras:

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coesão e coerência afirma que diante desta perspectiva “sobressai a questão da coesão,

exatamente como sendo essa propriedade pela qual se cria e se sinaliza toda espécie de

ligação, de laço, que dá ao texto unidade de sentido ou unidade temática.” (ANTUNES,

2005, p. 47).

A coesão garante ao texto uma unidade de sentido. Um texto coerente apresenta

suas unidades constitutivas (palavras, orações, parágrafos, entre outras) interligadas,

formando uma teia de ligação estrutural, sintática e semântica que as une. Fazer a escolha das

palavras, tendo em vista seus significados e a relação entre elas vai estabelecendo no

desenrolar da elaboração do texto a continuidade do tema, a partir da sequência de suas partes

que estão sendo interligadas permitindo a sua unidade e a realização das intenções pretendidas

através de determinada interação verbal.

Assim como o texto escrito, o texto oral também precisa de elementos coesivos

para uma efetivação das intenções almejadas ao realizar-se uma atividade comunicativa.

Levando em consideração a diferença da natureza do texto conversacional, os elementos

coesivos que os constituem devem ser estudados de um modo específico.

Para poder adentrar aos estudos dos recursos coesivos na oralidade, é necessário

entendermos como se dá a organização do texto oral. Desse modo será possível observar e

analisar a presença dos recursos coesivos na atividade conversacional. No texto oral sua

organização se dá a partir da constatação de quatro elementos básicos: o turno; o tópico

discursivo; os marcadores conversacionais e os pares adjacentes.

A atividade conversacional é caracterizada a partir de turnos. No ato de interação

entre os interlocutores cada um tem o seu momento de interagir. Essa interação pode ser uma

fala, um momento de silêncio, um gesto, entre outros aspectos verbais e não-verbais que

compõem uma conversação. O turno é caracterizado por um desses atos de interação. Logo a

conversação se configura em vista de um processo de continuidade de turnos entre os

participantes de determinada atividade comunicativa.

Os turnos que caracterizam a conversação giram em torno de um assunto, pode ser

definido com antecedência ou no momento inicial da interação. O assunto da conversação é

definido como o tópico discurso, ou seja, as falas discorrem sobre um determinado tema,

porém um tópico principal se destaca entre as intervenções dos interlocutores, caracterizando

o tópico discurso daquele momento de interação.

Outro elemento que compõe a fala são os marcadores conversacionais. Estes se

configuram como elementos principais para a organização da fala. Segundo Marcuschi (1998,

p. 61), “[...] estes sinais servem de elo de ligação entre as unidades comunicativas, de

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orientadores dos falantes entre si”, melhor relatando, são eles que sinalizam a troca de

falantes, a mudança de tópico e marcam as falhas de construção (pausas, hesitações, entre

outras). Sendo assim, os marcadores desempenham uma função sintática, o que ressalva sua

grande importância como elemento coesivo na oralidade.

A interação entre os falantes dificilmente ocorre de maneira aleatória, ou seja, os

interlocutores seguem uma sequência de turnos. Para que essa sequência ocorra de maneira

satisfatória, é necessário que durante a interação os interlocutores se compreendam. O turno

apresentado precisa ser entendido por parte do outro interlocutor, pois, dessa forma, poderá

dar continuidade à conversação. Essa continuidade se constitui de pares adjacentes (perguntas

–resposta, convite- aceitação ou recusa, entre outros), estes têm a função de organizar a fala,

de dar inicio a um tópico discursivo, direcionar o tópico, dar continuidade a ele. Logo fica

claro que os pares adjacentes servem “[...] tanto de organizadores como de mecanismos de

seleção de falantes e proponentes de tema [...]” (MARCUSCHI, 1998, p. 36) da atividade

comunicativa.

Do mesmo modo que a coesão do texto falado se constitui de modo diferente da

modalidade escrita da língua, a coerência vai além da construção de uma unidade de sentido

para o texto. A coerência na fala se estabelece como “um processo global e implica

interpretação mútua, local e coordenada” (MARCUSCHI, 1998, p. 76). Sendo assim, sua

análise precisa levar em consideração um número maior de fatores, não apenas marcas

linguísticas e discursivas. A organização dos tópicos é muito importante, ela emerge do

sentido e da compreensão que ocorre no âmbito interacional das relações entre os

interlocutores. Essa organização se dá primordialmente na fala, através do uso dos

marcadores conversacionais, como já mencionado. Esse constituinte tão importante do texto

oral segundo Fávero, Andrade e Aquino (2009, p. 47), “[...] serve para designar não só

elementos verbais, mas também prosódicos e não linguísticos que desempenham uma função

interacional qualquer na fala”. Desse modo, fica evidente que esses elementos são

indispensáveis para que o texto oral possua coerência.

3.4 A modalização Persuasiva (modalização e modalidade: epistêmica, deôntica e afetiva)

O discurso, como já mencionado, é conceituado como uma atividade entre

interlocutores, podendo, às vezes, ser caracterizado como uma atividade conversacional,

quando dois ou mais interlocutores discorrerem sobre um determinado assunto do cotidiano.

Koch (2012) em seu livro A inter-ação pela Linguagem discorre sobre o fato de que o estudo

sobre linguística do discurso vem ganhando muito espaço nos últimos tempos, o olhar dos

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linguistas, em especial europeus, voltarem-se para as relações existentes entre a língua e seus

usuários. Suas novas análises se apoiam na refuta de que, tanto a linguística estrutural

(Saussure) quanto a linguística gerativa (Chomsky) estudam a língua como algo abstrato,

desprezando seu contexto de uso.

O ser humano faz uso da linguagem para interagir socialmente. Sendo assim, para

fazer um melhor estudo de como se dá essa interação é necessário ir além dos estudos

gerativos e estruturais sobre a linguagem , e buscar um estudo que tenha por intuito descrever

e explicar de que modo essa interação se materializa.

Para este trabalho é importante ressaltar o uso da linguagem verbal como principal

meio de persuadir o outro, pois é através da interação que os sujeitos conseguem reproduzir

seus mecanismos argumentativos, com o intuito de conseguir seus objetivos. Ao falar com seu

cliente, o feirante tem um objetivo em mente, vender seu produto, para isso ele precisa

estabelecer uma relação que pode suscitar reações (verbais e não verbais) que demonstrem a

eficácia do seu discurso. O modo como às relações se estabelecem vai se efetivar a partir das

estratégias discursivas utilizadas pelos interlocutores.

Quando uma pessoa quer dizer algo a alguém, molda o enunciado de acordo com

suas intenções, ou seja, existem diferentes tipos de modos para se dizer a mesma coisa. A

gramática tradicional apresenta o estudo dos modos verbais, como sendo “as diferentes

formas que o verbo apresenta para indicar a atitude que o falante assume em relação ao

processo verbal” (TERRA, 2011, p. 20 apud SILVA, 2015). Desse modo, podemos tomar

modo como sinônimo de modalidade, isto é, a modalidade vai caracterizar a maneira que o

tópico discursivo será apresentado pelos interlocutores.

Como já discutido em tópicos anteriores, os sujeitos se constroem a partir da

interação com outros sujeitos, isso ocorre, na maioria das vezes, através da fala, numa

determinada atividade comunicativa. Também foi ressaltada a importância dos valores e dos

papéis sociais atribuídos ao orador/interlocutor no momento da interação. Sendo assim, ao

apresentar suas opiniões, valores, conceitos, entre outras particularidades de cada sujeito, o

interlocutor toma posicionamento diante dos assuntos apresentados, podendo concordar ou

discordar. Logo, se o intuito do orador é persuadir seu auditório, ele precisa ter atenção em

relação ao modo como ele vai se dirigir ao seu auditório, e ir além, preocupar-se com o

posicionamento que vai tomar.

Ao posicionamento que o orador vai assumir, Silva (2015) conceitua como sendo

a modalização verbal, ou seja, é importante a posição que o orador vai tomar diante do que foi

apresentado. Sendo assim, tomemos Modalização como sendo o “processo através do qual os

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interlocutores ora enfatizam ora atenuam o que vai sendo dito” (Castilho, 2011, apud Silva,

2015, p. 21). A modalização se materializa no discurso através do uso de modalizadores.

Estes são responsáveis pela construção de sentido do discurso a partir do posicionamento

assumido pelo interlocutor. Os modalizadores sinalizam o modo e o posicionamento do

orador diante de seu discurso. Logo, o uso desse mecanismo linguístico é muito importante

quando a intenção é persuadir o auditório.

Para o estudo do discurso retórico destacaremos três tipos de modalizadores, os

quais referenciam três tipos de modalização: 1) modalização epistêmica; 2) modalização

deôntica e 3) modalização afetiva. Ainda de acordo com Santos (2015), “esses modalizadores

são percebidos em enunciados que, em geral, são utilizados por indivíduos que têm a

pretensão de exercer certo domínio sobre seu interlocutor [...]”. Portanto, é de suma

importância adentrar sobre seus conceitos no intuito de uma análise mais bem detalhada do

discurso do feirante, já que, tem por intuito convencer o cliente a comprar seu produto.

Os modalizadores epistêmicos são utilizados quando o orador quer atribuir um

valor de verdade para seu enunciado, podendo eles ser a) assertivo: nesse contexto de uso o

orador vai atribuir valor afirmativo ou negativo; b) quase-assertivo: nesse momento o orador

não assume totalmente a responsabilidade sobre o que diz e c) delimitadores: o orador

delimitar até que ponto pode-se ser discutido o assunto. Os deônticos sinalizam um valor de

obrigatoriedade do conteúdo apresentado, ou seja, o orador se posiciona na intenção de

construir um sentido de que é obrigatório e necessário aceitar o que foi dito.

E por último temos os modalizadores afetivos, esses estão fortemente

relacionados ao discurso persuasivo, pois como já estudado, a persuasão vai além da razão,

ela busca atingir o campo emocional do auditório. Assim, este passará a agir segundo a

aceitação do que foi proposto pelo orador. Esses modalizadores, conforme Castilho e Castilho

(1993, apud SILVA 2015), dividem-se em dois grupos: 1) subjetivos e 2) intersubjetivos. No

primeiro o orador expressa claramente suas proposições a seu favor e a favor do interlocutor,

e, no uso do segundo, ele tenta demonstrar certa imparcialidade nas sugestões propostas.

Verifica-se a partir do conceito de modalização apresentado, o quanto o uso dos

modalizadores é importante no discurso retórico. O uso destes favorece a construção do ethos,

pathos e do logos discursivo, tendo em vista, que a modalização verbal demonstra o modo e

as intenções do interlocutor ao proferir seus enunciados, neste sentindo, sinaliza o modo e as

intenções do orador ao apresentar seu discurso a um determinado auditório. Tratando-se do

discurso retórico, pode-se entender o conceito de modalização verbal como o conceito de

modalização persuasiva.

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Diante do que foi apresentado sobre modalização neste tópico, é de grande

ressalva para este trabalho verificar a existência ou não desses mecanismos argumentativos no

discurso do feirante da cidade de Arapiraca. Desse modo, será possível observar o quanto o

uso de modalizadores pode contribuir na construção.

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4 OS ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

Essa seção apresenta como se deu o desenvolvimento e elaboração do trabalho.

Discorre sobre a caracterização do trabalho de pesquisa, como se constituiu o corpus da

pesquisa, quais os referenciais bibliográficos para o aparato teórico conceitual e posterior

análises dos dados coletados.

4.1 Caracterização da pesquisa qualitativa

Estudos demonstram que a pesquisa qualitativa está voltada para a realização de

analises interpretativas de dados que constituem o objeto de estudo em um determinado

trabalho. Trata-se de uma abordagem interacionista entre os envolvidos na pesquisa em

campo. Esse tópico tem por referência realizar um aparato sobre esse tipo de pesquisa,

segundo algumas reflexões abordadas por Moreira (2002), Ludk e André (1986) e Trivinos

(1987) apud Oliveira (2008), tratando das características, de algumas técnicas e dos dois tipos

de pesquisa qualitativa.

Para o desenvolvimento e estudo do objeto de pesquisa deste trabalho, nos

restringimos ao processo metodológico da pesquisa qualitativa, pois trabalhamos com dados

sociais, em um ambiente onde o homem possui lugar privilegiado de interação através de seu

discurso. Dentre os dois tipos de pesquisas qualitativas, selecionamos a etnográfica. As

técnicas desse tipo de pesquisa foram utilizadas para a obtenção e auxilio na análise dos dados

coletados.

4.2 A constituição do corpus

A atividade comercial de feira livre existe há muitos anos na cidade de Arapiraca

e em quase todas as cidades alagoanas. Antes eram bem mais populares e geravam muito mais

lucros. Segundo alguns populares relataram durante o período de coleta de dados, atualmente,

ocorreu uma grande diminuição do fluxo de pessoas que frequentam as feiras, principalmente

na feira do domingo. Existem vários pontos de feira espalhados pela cidade, as quais ocorrem

em dias diferentes, entretanto as principais, ou seja, aquelas que aglomeram uma quantidade

maior de pessoas são as do dia de segunda-feira, essa ocorre em algumas ruas no centro da

cidade, e a do domingo, que ocorre no bairro Primavera. Essa última recebe o nome de

Fumageira, devido à tradição agrícola do cultivo do fumo, que antes era muito forte no

munícipio.

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A coleta de dados para este trabalho ocorreu na feira livre do domingo que há

muitos anos existe na cidade, sendo seu dia de realização mudado somente por motivos

extremos como, por exemplo, quando a data de eleições se coincide, ou as comemorações

pascoais. As pessoas que frequentam a feira aos domingos, também conhecida como

Fumageira são, na maioria das vezes, da cidade de Arapiraca. Foi necessária a realização de

várias visitas à feira para conseguir realizar as gravações. Nas feiras livres da cidade de

Arapiraca, é possível encontrar uma grande diversidade de mercadoria como, por exemplo,

roupas, móveis, diferentes tipos de carne, e o mais comum em todas as feiras livres do país,

frutas, verduras, legumes, ervas medicinais entre outros produtos agrícolas.

Os dados para a constituição do corpus da pesquisa foram coletados com o auxílio

de um gravador. Os informantes portaram o aparelho por alguns minutos, em momentos

diferentes, e durante sua atividade laboral. Encontrei muitas dificuldades para a obtenção de

dados pelo fato de se tratar de um ambiente com muito barulho. As bancas ficam muito

próxima umas das outras, por exemplo, uma banca de frutas e/ou verduras fica ao lado de

outra que vende CDs, DVDs, e as quais possuem aparelhos sonoros para o teste da

mercadoria. Também, além dessas bancas, existem carros de mão com caixas de som

acopladas que ficam circulando pela feira, vendendo os produtos já mencionados.

Foram realizadas algumas gravações, das quais os informantes são vendedores de

frutas, verduras e legumes. Durante as visitas foram realizadas as gravações e também

entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecimento (TCLE). Dessa maneira, durante

todo o trabalho os informantes se mantiveram ciente da importância do trabalho, e o modo

como se daria sua participação.

Os momentos de interação que foram gravados se deram de maneira espontânea,

ou seja, aconteceram no ambiente de trabalho desses feirantes. Devido ao fato de a linha de

pesquisa desde trabalho estar voltada para a análise do discurso do feirante, apenas a fala

desses sujeitos foi transcrita para composição do corpus da pesquisa. O intuito é observar a

presença de elementos linguístico-persuasivos, os quais constituem o discurso retórico; os

elementos coesivos, marcas constantes na oralidade e a existência e importância da

modalização na fala dos feirantes, a qual é utilizada no intuito de persuadir o cliente.

4.3 Análises

A seguir, foram analisados trechos das gravações realizadas na feira livre dos dias

de domingo. Esses fragmentos foram escolhidos a partir das maiores recorrências, nas

transcrições realizadas, do objeto de estudo, tendo assim como foco os aspectos persuasivos

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30

na fala dos feirantes, que podem indicar a ocorrência de um discurso retórico, imbuídas dos

tipos de modalização persuasiva.

4.3.1 Momento interativo 1

O trecho abaixo foi gravado logo no início da feira do dia de domingo, por volta

de 7h30min da manhã. Os vendedores falam em voz alta para que as pessoas, que por ali

passem, possam ouvir. Trata-se de dois irmãos que trabalham juntos com sua mãe na banca.

O fato de falarem em voz alta é uma característica que varia muito do perfil do feirante, pois

se observa que muitos deles não agem assim, só se dirige ao cliente no momento que ele se

aproxima de sua banca, objeto de madeira utilizado para por as mercadorias em cima.

L1. Fruta boa e barata hoje aqui, viu... Tomate 3 reais, batatinha 5, só hoje, viu. Bora chegar, meu

povo.

C. (meneios) – o cliente olha para o feirante e com um gesto da cabeça sinaliza que aceitou o

convite.

L1. Vai levar o que hoje, Dona Maria? Vamos levar acerola? Tá 2 reais, pode ser 3 por 5!

C. Tá de quanto o pimentão?

L1. Um é 50 centavos, mas faço 3 por 1 real. Vai querer? Foram colhidos hoje, são bem grandes.

Esse trecho proferido pelo orador L1 foi destinado a um auditório universal. Em

alguns momentos da feira, o discurso dos feirantes tem como alvo este tipo de auditório, pois

em algumas das vezes eles gritam em voz alta, para que todos que por ali passam possam

ouvir. O fato de eles não conhecerem o que as pessoas desejam comprar naquele momento,

caracteriza um discurso voltado para as diversas e possíveis necessidades da pessoa que visita

à feira.

Outro aspecto persuasivo que podemos destacar logo no início do enunciado com

o trecho “Fruta boa e barata” caracteriza o uso do lugar retórico da qualidade. A fruta

vendida por ele não é qualquer fruta, ele destaca duas qualidades, com o uso dos adjetivos boa

e barata, demonstrando duas particularidades, em vista das possíveis ofertas de frutas que o

cliente possa encontrar em outras bancas da feira. Neste mesmo trecho, pode-se destacar a

presença da modalização epistêmica, o orador atribui um valor assertivo de verdade referente

ao que foi pronunciado anteriormente.

O lugar de quantidade também é utilizado no momento que o orador L1 profere o

valor dos produtos: “Tomate 3 reais, batatinha 5”. Logo após, ele usa o modalizador

argumentativo “hoje”, na intenção de enfatizar seu argumento, deixando claro que em outro

dia o valor será diferente, e possivelmente mais caro. Temos também marcas visíveis

predominantes na modalidade oral da língua, a repetição de palavras, e a presença de

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31

elementos coesivos desta modalidade da língua. Pode-se destacar o modalizador hoje e o

marcador conversacional viu. O modalizador hoje aparece em dois momentos da fala de L1,

marcando e reforçando o tópico discursivo de L1. O marcador conversacional viu neste

momento de interação está organizando internamente o turno de L1.

Após a fala de L1, o cliente volta o olhar para a banca dos respectivos feirantes,

com isso podemos destacar que o phatos construído pelo orador foi satisfatório, na medida em

que, o orador conseguiu atingir o ethos construído em seu auditório. Ou seja, o feirante passou

credibilidade/confiança ao cliente, por conseguinte desperta o interesse em ir verificar as

frutas vendidas por ele. Com isso é possível afirmar que o logos apresentado foi suficiente

para convencer, de inicio, que o cliente fosse visitar sua banca. Assim, pode-se destacar a

presença da construção de um acordo entre orador (feirante) e seu auditório (cliente), aspecto

fundamental para dar inicio a argumentação e manter uma boa interação em um discurso

retórico. Também é possível observar nesse instante a constituição de um par adjacente

(convite-aceitação), o feirante fez o convite e o cliente aceitou, dirigindo-se até a sua banca.

Depois da aproximação do cliente até a banca, L1 direciona sua fala a um

auditório particular, ou seja, o orador neste instante sabe que essa pessoa que se aproximou,

provavelmente tem interesse em comprar algo de sua banca. Desse modo ele busca reforçar a

sugestão de que o cliente leve a acerola com o uso do lugar de quantidade, visível com o

trecho “Tá 2 reais, pode ser 3 por 5.”

No momento que o cliente começa sua interação mais um par adjacente pode ser

constatado, (pergunta – resposta), ele questiona sobre o valor do pimentão, e o feirante

responde. Logo após o feirante, mais uma vez, faz uso do lugar da quantidade, pois ele

profere “mas faço 3 por 1 real.” Outro lugar retórico utilizado é o da qualidade “Foram

colhidos hoje, são bem grandes”.

A todo o momento na fala do feirante pode-se destacar a presença dos aspectos

linguístico-persuasivos. Neste momento interativo, é possível observar o uso dos lugares de

quantidade e de qualidade, a modalização epistêmica, a construção do ethos, do phatos e do

logos, o vínculo e o acordo estabelecido entre orador e auditório, marcas constitutivas

importantes desta modalidade da língua, como por exemplo, os pares adjacentes, os turnos e

os modalizadores.

4.3.2 Momento interativo 2

Neste segundo momento, os informantes conseguem fazer com que o cliente se

aproxime de sua banca. Primeiro L1 fala em voz alta, tentando chamar a atenção, e toca em

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32

uma pessoa que passa em frente sua banca. A partir desse primeiro contato, dá-se inicio ao

momento interativo entre orador e auditório. Esse trecho foi gravado em um horário

considerado mediano para a atividade do feirante, por volta de 9h30min. A feira inicia às 6h

da manhã.

L1. E aí meu patrão, vai levar o que hoje? Venha dar uma olhadinha, sem compromisso!

C. (o cliente se aproxima da banca e pega um maço de coentro)

L1 Tá de 1 real o pezinho, pode ser 3 por 2!

C. E esse mamão, tá de quanto? (ele pega o mamão e mostra para o feirante)

L1. Tá de 2 reais o quilo. Pode levar, viu! É mamão papaia, bem docinho, melhor da feira.

C. Vou querer! Pese esse pra mim.

No inicio da fala de L1 já se pode destacar a presença da construção do phatos

discursivo, no momento que ele profere “E aí meu patrão” usado como um vocativo, o orador

fala a emoção do outro. Neste caso, ele eleva o seu auditório, o cliente a quem ele se dirigiu

naquele momento, ao patamar de seu patrão. Sendo assim, ele se coloca no cargo de seu

subordinado, induzindo que está ali para atender as necessidades deste. Isso demonstra a

presença da modalização afetiva, tendo em vista que o feirante deixa claro sua intenção de

conquistar o cliente. O cliente sabe que o termo “meu patrão” foi utilizado na intenção de

agradá-lo, e persuadi-lo a comprar algo de sua banca. No final de seu turno, pode-se observar

a intenção do orador de que é necessário que o cliente visite sua banca, pois assim ele poderá

comprar alguma coisa.

Nesse primeiro momento de analise já é possível observar a presença da

modalização persuasiva. No trecho “vai levar o que hoje” fica claro o uso da modalização

deôntica, tendo em vista que o orador atribui ao seu enunciado a intenção de obrigatoriedade.

Outro tipo de modalização que se pode destacar nesse trecho é a epistêmica. Segundo Castilho

e Castilho (1993, apud SILVA, 2015), os modalizadores epistêmicos podem atribuir um valor

de verdade, porém este valor pode ser assertivo ou quase-assertivo. Pode-se destacar esse uso

no instante em que L1 profere “pode ser 3 por 2”, ele atribui ao seu enunciado um valor

afirmativo, porém demonstra que a afirmativa é quase assertiva. O orador assume a atitude de

que existe uma possibilidade que seja assim, isto é, de que ao invés do cliente pagar 3 reais

em 3 maços de coentro, ele leve a mesma quantidade da mercadoria por um valor inferior, no

caso da oferta feita por ele, os 3 maços por 2 reais.

O cliente não fala nada, mas demonstra ter sido convencido pelo orador, ao se

aproximar de sua banca e pegar uma de suas mercadorias, ele demonstra o interesse pelo

produto. É muito comum na feira livre as pessoas pegarem as mercadorias na mão, para

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33

observarem com cuidado se está em boa qualidade. Diante da aproximação do cliente ficou

claro que um acordo foi estabelecido, a partir daí o orador começou a apresentar seus

argumentos. Estes, por sua vez, são os responsáveis por manter o vínculo construído a partir

do acordo entre as pessoas do discurso, neste caso, o feirante e o cliente.

No instante que o cliente se aproxima da banca e pega o maço de coentro na mão,

o orador pode observar a necessidade do seu auditório, o que proporcionou que ocorresse o

enquadramento do real. O feirante apresentou ao auditório sua opinião, ele queria que

visitasse sua banca, sua opinião foi aceita configurando o enquadramento do real, e

sinalizando que o acordo entre as partes, isto é, o algum tipo de vínculo entre os integrantes

fosse estabelecido. Para que esse acordo se sustente e proporcione o objetivo final ao orador

que é a venda de seu produto, o orador precisa apresentar seus argumentos/seu logos, e é o

que acontece posteriormente.

O lugar de quantidade é explorado nesse momento de interação. No segundo

turno de L1 ao ser questionado sobre os valores do maço de coentro, ele usa o argumento “ Tá

de 1 real o pezinho, pode ser 3 por 2!”, ou seja, ele destaca a quantidade referente ao valor da

unidade, sobrepondo um em relação ao outro. O lugar da essência é utilizado posteriormente

na sua fala. No instante que o feirante responde sobre o mamão “É mamão papaia”, é de

conhecimento trivial que esse tipo de mamão é considerado um dos melhores dentre os

diversos tipos de mamões existentes. Outro lugar de argumentação utilizado é o da qualidade,

depois de apresentar o mamão usando o lugar da essência, o feirante reforça seu logos

apresentando as qualidades do produto, destinado e ele entre os demais mamões papaias que

ele possa encontrar em outra banca da feira.

A presença de elementos coesivos da oralidade também podem ser constatados

nesse trecho de análise. É o caso de pares adjacentes no primeiro turno de L1, o feirante faz o

convite e o cliente aceita, pois visita sua banca. Dando continuidade ao momento de interação,

o cliente que está com o turno faz uma pergunta e o feirante responde. Assim temos dois tipos

de pares adjacente, no primeiro um convite - aceitação e no segundo uma pergunta –

resposta. Outro elemento que faz parte da organização conversacional é o tópico discursivo,

neste trecho temos dois, o valor do maço de coentro e do mamão papaia.

4.3.3 Momento interativo 3

Esse momento de interação ocorreu já no final da feira, umas 11h, normalmente as

bancas ficam armadas até as 13h. O horário é um fator muito importante para os feirantes,

pois quanto mais tarde for mais difícil fica de vender a mercadoria, porque o fluxo de cliente

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na feira diminui. É uma característica dos feirantes diminuírem os valores da mercadoria, para

que eles consigam vender, tendo em vista que são alimentos perecíveis.

C. (se aproxima da banca)

L2. Venha escolher! Promoção aqui hoje, o cliente é quem manda. Acerola na promoção, 2 reais.

C. Tá de quanto a batatinha?

L2. 3 reais, vai levar? Pode misturar, viu. Faço tudo por 3, batinha, cenoura, cebola, tomate.

C. Moça, tá caro! Na outra banca tá de R$2,50. Pode ser? Se for eu levo!

L2. Certo! Pode ser!

C. E essas acerolas são boas mesmo?

L2. São sim, foram colhidas hoje, estão fresquinhas!

C. Coloque um litro de acerola, e pese 2kg de batatinha.

Sobre os constituintes da conversação, nesse momento interativo temos como

tópico discursivo o interesse pelas mercadorias: acerola e batatinha. O meio discursivo se dá

face a face, possibilitando o uso de elementos extra linguísticos na interação e contribuindo

para a sinalização dos possíveis acordos construídos entre auditório e orador. Temos durante

todo o momento a presença de pares adjacentes do tipo pergunta-resposta. Os marcadores

também estão muito presentes, mantendo a organização e possibilitando a continuidade da

interação e a troca de turno entre os participantes. Neste instante de conversação, podem-se

destacar os marcadores conversacionais: “viu”, “pode ser”, “mesmo”. Outro ponto que pode

ser destacado do começo da interação é que o orador construiu seu discurso para um auditório

particular, pois a todo o momento ele interage com uma única pessoa.

O inicio da interação se deu no momento que o cliente se aproxima da banca, ele

ficou apenas observando as mercadorias. Os feirantes nesse momento estavam na outra

extremidade da banca, ao verem o cliente, L2 se aproximou e o convidou a escolher algo. No

primeiro turno do feirante, pode-se destacar a presença da modalização afetiva, pois deixa

claro a sua intenção. Ele deseja que o cliente compre algo de sua banca, e no instante que ele

profere “Venha escolher!” deixa isso bem claro para o cliente, sinalizando sua intenção

através do uso deste enunciado.

Ainda no primeiro turno já é possível destacar a presença do pathos. L2 expressa

que o cliente é quem tem o poder de escolha. No trecho “o cliente é quem manda” ele tenta

construir um vínculo com seu auditório, o cliente, segundo o feirante, detém o poder de

escolha. Desse modo, o orador já consegue construir seu ethos, passando para o auditório que

está ali a serviço dele, sendo assim, o auditório pode vê-lo como seu subordinado. Seu logos

foi bem aceito e ele obteve o acordo que precisava para dar continuidade ao seu discurso.

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Pois, logo após, o cliente começa a interagir e fazer perguntas sobre os valores das

mercadorias.

O lugar de quantidade é muito explorado durante todo o momento de interação.

Nos trechos: L2: “Acerola na promoção, 2 reais”, “Faço tudo por 3 reais”; C “Na outra

banca tá de 2,50.” Este tipo de lugar retórico é muito utilizado em todos os momentos

interativos observados neste trabalho. Por ser uma atividade comercial que explora valores

versos quantidade, e também, relaciona esses valores à qualidade dos produtos, o lugar de

qualidade também é muito utilizado para argumentar. No final da interação o feirante enfatiza

a qualidade da acerola, “foram colhidas hoje, estão fresquinhas”, fazendo uso do lugar de

qualidade.

Nesse trecho de interação, como em todos os outros analisados, é possível

observar muitas características marcantes da modalidade oral, a presença constante do

discurso retorico, marcas visíveis da atividade argumentativa, a qual já foi estudada como

sendo intrínseca a linguagem.

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36

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a realização deste trabalho, foi possível observar o quanto a fala é importante

no ambiente de trabalho para muitas pessoas, não apenas no cenário comercial da feira livre,

como também já mostrado em outras pesquisas, no comércio de um modo geral. O objetivo

principal de um vendedor é vender seu produto, e ir além, conquistar as pessoas de um modo

que eles possam virar seus clientes. A partir desta ressalva, de que é preciso „conquistar‟ as

pessoas, um leque de questionamentos pode surgir, dando abertura a estudos sobre a

materialidade do principal instrumento de trabalho dos feirantes, a fala. O texto apresentou

uma revisão literária sobre a Retórica, a Argumentação, as características e a constituição do

discurso oral da língua, pois o corpus de pesquisas se constitui nessa modalidade. Também

foi exposta uma visão sobre a importância da feira livra para a cidade em tela, e qual a

natureza metodológica da pesquisa. Tratando-se de um estudo etnográfico, teve como base a

pesquisa de cunho qualitativo.

Como o feirante pode convencer uma pessoa a comprar ou pelo menos visitar sua

banca? Este trabalho mostrou que é através da argumentação, conforme estudos linguísticos

sobre Retórica e Argumentação, esse é o meio civilizado de se chegar à vontade do outro. O

trabalho mostrou que se pode ir além, pois apresenta que mais do que convencer é necessário

que o cliente/auditório seja persuadido pelo orador/feirante, desse modo, ele levará sua

mercadoria, e possivelmente poderá tornar-se um cliente assíduo.

A partir das análises, é possível observar a forte presença dos elementos

linguístico-persuasivo na fala destes profissionais. A tríade aristotélica foi destacada em

ambos os momentos interativos, como também, os acordos entre orador e auditório. Os

lugares argumentativos mais explorados foram os de quantidade, qualidade e essência. Os

constituintes organizacionais responsáveis pela coesão e coerência nos diversos tipos de

discursos, inclusive no discurso retórico, também puderam ser constatados. Os pares

adjacentes, o tópico discursivo de cada momento e principalmente a presença de marcadores

conversacionais estão explicitamente presentes nos turnos das pessoas envolvidas nos trechos

analisados.

As análises também constataram a presença dos três tipos de modalização

persuasiva exploradas como base teórica para a pesquisa em campo: a modalização

epistêmica, a deôntica e a afetiva.

As questões norteadoras deste trabalho foram sendo constatadas ao longo de sua

realização. Trata-se de fundamental importância se questionar quais aspectos linguístico-

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37

persuasivos estão presentes na fala dos feirantes de Arapiraca-AL? Qual a importância da sua

utilização no trabalho destes profissionais? E de que maneira o uso desses elementos se

materializa? Diante das questões apresentadas e após analise do corpus foi possível constatar

que a presença de elementos linguístico-persuasivos é constante na fala destes profissionais, e

o uso deles é indispensável para que se consiga vender sua mercadoria. Mesmo sem os

conhecimentos teóricos sobre a construção/elaboração de seu logos, o feirante faz uso do

discurso retórico de maneira satisfatória.

O objetivo do trabalho foi alcançado plenamente. A análise do corpus apresentou

resultados compatíveis com as hipóteses levantadas durante a elaboração deste trabalho. Foi

possível constatar a presença dos elementos linguístico-persuasivos no discurso dos feirantes

de Arapiraca e o quanto o uso destes são importantes para que os profissionais possam obter

êxito na venda de suas mercadorias. A realização deste trabalho possibilitou mostrar o quanto

esses profissionais possuem um discurso repleto dos elementos linguísticos em tela, e os

utilizam com muita perspicácia, deixando claro que o uso da argumentação é intrínseco ao uso

da linguagem e que está constantemente presente na vida do ser humano.

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REFERÊNCIAS

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Editorial, 2005.

CITELLI, Adilson. Linguagem e persuasão. 6. ed. São Paulo: Ática, 2007.

FÁVERO, L. L; ANDRADE, M. L. C. V. O; AQUINO, Z. G. O. Oralidade e escrita:

perspectiva para o ensino de língua materna. 7. ed – São Paulo: Cortez, 2009.

FERREIRA, Luiz Antônio. Leitura e persuasão: princípios de análise retórica. São Paulo:

Contexto, 2010.

KOCH, Ingedore G. V.; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção textual.

São Paulo: Contexto, 2011.

KOCH, Ingedore G. V. Argumentação e linguagem. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

KOCH, Ingedore G. V. A inter-ação pela linguagem. 11.ed. São Paulo: Contexto, 2012.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Análise da Conversação. 4. ed. São Paulo: Ática, 1998.

MELO, Deywid Wagner. Análise Retórica do Gênero Discursivo Oral Defesa Pública.

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OLIVEIRA, Cristiano Lessa. Um apanhado teórico-conceitual sobre a pesquisa qualitativa:

tipos, técnicas e características. Revista Travessias v.2, n. 3, 2008. Disponível em: e-

revista.unioeste.br/index.php/travessias/article/view/3122/2459. Acesso em 14 jun 2018.

REBOUL, Olivier. Introdução à retórica. Trad. Ivone Castilho Benedetti. São Paulo:

Martins Fontes, 2004.

SILVA, Bruna Marques. Estudo dos Aspectos Modais no Discurso do Professor em

Interação de Sala de Aula. Universidade Federal de Alagoas, Arapiraca, 2015. Disponível

em: ud.arapiraca.ufal.br. Acesso em 27 dez 2017.

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ANEXO A - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (T.C.L.E.)

Eu,.........................................................................................................................., tendo sido

convidado (a), a participar como voluntário (a) do projeto de pesquisa Os aspectos

linguístico-persuasivos no discurso do feirante de Arapiraca-AL, recebi da Sra. Sirleide

Vieira Lino da Silva, do curo de Letras da Universidade Federal de Alagoas (UFAL),

responsável por sua execução, as seguintes informações que me fizeram entender sem

dificuldades e sem dúvidas os aspectos:

Que o trabalho se destina ao estudo dos Aspectos linguístico-persuasivos no discurso

do feirante da cidade de Arapiraca-AL.

Que a importância deste trabalho para o reconhecimento do uso dos elementos

linguístico-persuasivos na fala do feirante é de fundamental relevância, pois estes

profissionais têm por intuito vender sua mercadoria, e através do uso do discurso

retórico seu objetivo encontrará meios mais eficazes para se materializa.

Os desejos que se pretendem alcançar são os seguintes: observar a presença desses

elementos na fala desses profissionais, fazer as análises do corpus e apresentar dados

que comprovem a presença de elementos linguístico-persuasivos na fala do feirante da

cidade de Arapiraca-AL.

A coleta de dados começará em 2017 e terminará em 2018.

O estudo será feito da seguinte maneira: visitas serão realizadas em algumas feiras

livres de Arapiraca, posteriormente serão escolhidos alguns informantes. Essa escolha

se dará após conversas com alguns feirantes, pois se pretende explicar como será a

participação do voluntário na construção do trabalho. Por último, os dados serão

gravados, com o auxilio de um gravador portátil, e assim, serão transcritos para a

análise.

Que deverei contar com a seguinte assistência: terei todas as minhas dúvidas quanto à

minha participação no estudo resolvidas, sendo responsável por isso: Sirleide Vieira

da Silva.

Os benefícios esperados com a minha participação no projeto de pesquisa, mesmo que

não diretamente são: refletir sobre a importância do estudo dos elementos linguísticos

presente na fala, meu principal instrumento de trabalho e o quanto a presença de

elementos linguístico-persuasivos podem contribuir para que meu objetivo maior,

vender minha mercadoria, seja alcançado.

Que, sempre que eu desejar, ser-me-ão fornecidos esclarecimentos sobre cada uma das

etapas do estudo.

Que serei informado(a) do resultado final do projeto e sempre que desejar, serão

fornecidos esclarecimentos sobre cada uma das etapas do estudo.

Que, a qualquer momento, eu poderei me recusar a continuar participando do estudo e,

também, que poderá retirar seu consentimento, sem que isso lhe traga qualquer

penalidade ou prejuízo.

Que as informações conseguidas através da minha participação não permitiram a

identificação de minha pessoa, exceto para equipe de pesquisa, e que a divulgação das

mencionadas informações só serão feitas entre os profissionais estudiosos do assunto

após a autorização.

Que o estudo não me acarretará nenhuma despesa.

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Que eu serei indenizado por qualquer dano que venha a sofrer com a participação na

pesquisa, podendo ser encaminhado para o curso de Letras da Universidade Federal de

Alagoas, Campus de Arapiraca.

Que receberei uma via do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado por

todos.

Eu ................................................................................................................................, tendo

compreendido perfeitamente tudo o que me foi informado sobre a minha participação no

mencionado estudo e estando consciente dos meus direitos, das minhas responsabilidades, dos

riscos e dos benefícios que a minha participação implicam, concordo em dele participar e para

isso eu DOU O MEU CONSENTIMENTO SEM QUE PARA ISSO EU TENHA SIDO

FORÇADO OU OBRIGADO.

Endereço d(o,a) participante-voluntári(o,a)

Domicílio:____________________________________________________

Bloco:____________________ Nº:_______ Complemento:_______________________________

Bairro:_____________________CEP______-_____Cidade:_______________________________

Telefone:_____________________. Ponto de referência:_________________________________

Endereço d(os,as) responsáve(l,is) pela pesquisa (OBRIGATÓRIO):

Instituição: Universidade Federal de Alagoas, Campus Arapiraca.

Endereço: Rua José Elvio Higino da Silva. N/ 270

Bairro: Cacimbas

Cidade/CEP:57.304-630

Telefone: (82) 99973-4287

ATENÇÃO: Para informar ocorrências irregulares ou danosas durante a sua

participação no estudo, dirija-se ao:

Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Alagoas:

Prédio da Reitoria, sala do C.O.C. , Campus A. C. Simões, Cidade Universitária

Telefone: 3214-1041

Arapiraca, de de .

Assinatura ou impressão

datiloscópica d(o,a) voluntári(o,a)

ou responsável legal e rubricar as

demais folhas

Nome e Assinatura do Pesquisador pelo estudo (Rubricar as

demais páginas)