universidade federal da fronteira sul campus ...mda - modelo discipulado apostólico mst- movimentos...

111
UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL CAMPUS DE ERECHIM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO NELCI DAGA HORTA ESCOLAR NA ESCOLA DO CAMPO: DIAGNÓSTICO DA EXPERIÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM PEDRO I ERECHIM 2017

Upload: others

Post on 09-Sep-2020

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL

    CAMPUS DE ERECHIM

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EDUCAÇÃO

    CURSO DE MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO

    NELCI DAGA

    HORTA ESCOLAR NA ESCOLA DO CAMPO: DIAGNÓSTICO DA

    EXPERIÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I

    ERECHIM

    2017

  • NELCI DAGA

    HORTA ESCOLAR NA ESCOLA DO CAMPO: DIAGNÓSTICO DA

    EXPERIÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I

    Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

    Graduação em Stricto Sensu, Mestrado em

    Educação da Universidade Federal da

    Fronteira Sul – UFFS como requisito parcial

    para obtenção do título de Mestre em

    Educação.

    Orientador: Profº Drº. Emerson Neves da

    Silva.

    ERECHIM

    2017

  • PROGRAD/DBIB - Divisão de Bibliotecas

    Daga, Nelci

    HORTA ESCOLAR NA ESCOLA DO CAMPO: DIAGNÓSTICO DA

    EXPERIÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I/ Nelci Daga. -- 2017.

    111 f.:il.

    Orientador: Emerson Neves da Silva.

    Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal da

    Fronteira Sul, Programa de Pós-Graduação em Mestrado

    Profissional em Educação - PPGPE, Erechim, RS , 2017.

    1. As Concepções da Educação do Campo: Um Espaço Que

    Gera Movimento. 2. Educação do Campo: Apresentando a

    Comunidade Escolar. 3. Apresentando a Escola Estadual de

    Ensino Fundamental Dom Pedro I. 4. Diagnóstico da Horta

    Escolar:Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro

    I. 5. PropostaPedagógica: Utilizando-se da Horta Escolar

    Da Escola Estadual Dom Pedro l. I. Silva, Emerson Neves

    da, orient. II. Universidade Federal da Fronteira Sul.

    III. Título.

    Elaborada pelo sistema de Geração Automática de Ficha de Identificação da Obra pela UFFS com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

  • NELCI DAGA

    HORTA ESCOLAR NA ESCOLA DO CAMPO: DIAGNÓSTICO DA

    EXPERIÊNCIA NA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I

    Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Stricto Sensu da Universidade

    Federal da Fronteira Sul – UFFS. Para obtenção do título de Mestre em Educação, defendido

    em banca examinadora em 15/08/ 2017.

    BANCA EXAMINADORA

    __________________________________________________________________________

    Prof. Dr. Emerson Neves da Silva –UFFS -Orientador (a):

    ________________________________________________________________________

    Prof. Dr. Fernando Bomfim Mariana –UFRN - Membro

    _______________________________________________________________________

    Prof. Dr. Jerônimo Sartori– UFFS - Membro

    Erechim RS, Agosto de 2017.

  • Dedico a todos que lutam pela Educação

    Pública e Popular e para todos os que

    promovem uma sociedade mais justa,

    humana e tem preocupação com o homem do

    campo.

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeço a Deus e aos Orientadores Espirituais, pela iluminação e inspiração no

    momento de escrever a dissertação. Agradeço a Universidade Federal Fronteira Sul pela

    oportunidade de estar cursando o Mestrado Profissional. Agradeço em especial o orientador

    Emerson Neves da Silva pela dedicação, comprometimento e ajuda para chegar nesta

    construção. Agradeço a meus filhos Fabrício Daga Rubenich e Letícia Daga Rubenich, meus

    maiores tesouros, que sempre estiveram comigo nesta caminhada. Também agradeço a

    NatieleTodero pelas palavras de apoio nos momentos mais difíceis. Agradeço a meus pais

    Pedro Daga e Adelina Catharina Daga, por terem sido o canal que me trouxeram até a terra

    para poder cumprir a minha missão, e ainda, agradeço pelos princípios de vida que me

    ensinaram pelo exemplo, os quais me tornaram numa pessoa íntegra e grata.

    Agradeço a todos os meus antepassados, aos meus irmãos pela caminhada de

    aprendizagem, de amor, de amizade, de evolução, de perdão construído nesta vida e em

    outras vidas. Agradeço a todos os professores e em especial aos professores que compuseram

    Banca Examinadora que contribuíram com a minha pesquisa. Agradeço aos amigos e, em

    especial, a professora Solange Todero Von Onçay, o Professor Jerônimo Sartori e demais

    professores por estarem presentes quando precisei. Agradeço aos amigos e colegas do

    mestrando pela bela caminhada que construímos juntos. Também agradeço a Direção os

    professores, alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I pela acolhida e

    disponibilidade quando solicitados. Muita gratidão a todos.

  • “A leitura após certa idade distrai

    excessivamente o espírito humano das suas

    reflexões criadoras. Todo o homem que lê

    mais e usa o cérebro de menos adquire

    preguiça de pensar”.

    Albert Eistein

  • RESUMO

    A Educação do Campo está enraizada aos processos de lutas travados pela classe

    trabalhadora que é analisada por educadores que apresentam a concepção de educação do

    campo. Molina (2012) diz que a mesma nasce e se desenvolve no embaulamento do

    movimento com suas experiências de luta e de superação ao capitalismo. É uma educação

    que tem como foco o desenvolvimento humano que busca a autonomia dos camponeses

    através do movimento. Esta pesquisa conheceu a prática da horta escolar, na Escola Estadual

    Dom Pedro I, de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, Rio Grande Sul, partindo do

    pressuposto que a mesma não levava os estudantes a entenderem a sua condição de sujeitos

    do campo fazendo com que tal atividade se justificasse na prática pela prática. Assim, com o

    objetivo de analisar esse processo pedagógico, esta dissertação faz uma apresentação da

    comunidade e da Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, Coronel Teixeira,

    Marcelino Ramos, bem como o objeto de pesquisa a horta escolar. Também apresenta a

    análise dos instrumentos utilizados na elaboração do diagnóstico, para isso se utilizou de

    diversos mecanismos de análise, como os diários de classe dos alunos do oitavo ano a fim de

    verificar a compreensão epistemológica presente na prática pedagógica; o projeto político

    pedagógico para ver como se consolidavam os objetivos, princípios, metodologias da

    educação, desta escola; a roda de conversa, os professores responderam o questionário

    semiestruturado para consolidar o diagnóstico de como se efetivava a prática. Desta forma,

    optou-se pela pesquisa–ação para melhor diagnosticar a prática e compreender as questões

    voltadas para o campo. De acordo com Thiollent (1947 p.19), “pela pesquisa-ação é possível

    estudar dinamicamente os problemas, decisões, ações, negociações, conflitos e tomadas de

    consciência que ocorrem entre os agentes durante o processo de transformação da situação”.

    Esta metodologia proporcionou a análise do diagnóstico desta dissertação que,

    consequentemente, serviu de instrumento para elaborar a proposta pedagógica para ser

    aplicada na escola do campo. A proposta pedagógica tem como finalidade gerar autonomia,

    emancipação, e está voltada aos interesses dos camponeses em apresentar à auto-organização

    dos estudantes na organização da horta. Com isso, a horta escolar pode se tornar um

    laboratório de aprendizagens, quando interligar os conteúdos científicos com a prática de

    forma interdisciplinar na Escola do Campo.

    Palavras-chave: Educação do campo. Horta Escolar. Proposta Pedagógica.

  • ABSTRACT/RESUMÉN

    La Educación del Campo está enraizada a los procesos de luchas trabados por la clase obrera

    que es analizada por educadores que presentan la concepción de educación del campo.

    Molina (2012) dice que la misma nace y se desarrolla en el embaulamiento del movimiento

    con sus experiencias de lucha y de superación al capitalismo. Es una educación que tiene

    como foco el desarrollo humano que busca la autonomía de los campesinos a través del

    movimiento. Esta investigación conoció la práctica de la huerta escolar, en la Escuela

    Estadual Dom Pedro I, de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, Rio Grande Sul, partiendo

    del supuesto que la misma no llevaba a los estudiantes a entender su condición de sujetos del

    campo haciendo con que tal La actividad se justificara en la práctica por la práctica. Así, con

    el objetivo de analizar ese proceso pedagógico, esta disertación hace una presentación de la

    comunidad y de la Escuela Estatal de Enseñanza Fundamental Don Pedro I, Coronel

    Teixeira, Marcelino Ramos, así como el objeto de investigación la huerta escolar. También

    presenta el análisis de los instrumentos utilizados en la elaboración del diagnóstico, (para

    ello se utilizó de diversos mecanismos de análisis, como los diarios de clase de los alumnos

    del octavo año a fin de verificar la comprensión epistemológica presente en la práctica

    pedagógica, el proyecto político pedagógico para Como se consolidaban los objetivos,

    principios, metodologías de la educación, de esta escuela, la rueda de conversación, los

    profesores respondieron el cuestionario semiestructurado para consolidar el diagnóstico de

    cómo se efectúa la práctica). De esta forma, se optó por la investigación-acción para mejor

    diagnosticar la práctica y comprender las cuestiones dirigidas al campo. De acuerdo con

    Thiollent (1947 p.19), "por la investigación-acción es posible estudiar dinámicamente los

    problemas, decisiones, acciones, negociaciones, conflictos y tomas de conciencia que

    ocurren entre los agentes durante el proceso de transformación de la situación". Esta

    metodología proporcionó el análisis del diagnóstico de esta disertación que, en consecuencia,

    sirvió de instrumento para elaborar la propuesta pedagógica para ser aplicada en la escuela

    del campo. La propuesta pedagógica tiene como finalidad generar autonomía, emancipación,

    y está orientada a los intereses de los campesinos en presentar a la autoorganización de los

    estudiantes en la organización de la huerta. Con ello, la huerta escolar puede convertirse en

    un laboratorio de aprendizajes, cuando interconectar los contenidos científicos con la

    práctica de forma interdisciplinaria en la Escuela del Campo.

    Palabras clave: Educación del campo. Huerta Escolar. Propuesta Pedagógica.

  • Figura 1 – Ponte Férrea sobre o Rio Uruguai.......................................................................32

    Figura 2 – Vista aérea da cidade de Marcelino Ramos........................................................33

    Figura 3-Vista aérea do Distrito de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, RS.....................36

    Figura 4- Localização da Escola Estadual de Ensino Fund. Dom Pedro I.......................40

    Figura 5-Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I.........................................41

    Figura 6- Imagem da Horta Escolar.......................................................................................43

    Figura 7- Alunos plantando mudas na horta escolar............................................................109

    Figura 8- Alunos irrigando as mudas plantadas na horta escolar.........................................109

    Figura 9 – Canteiro de temperos verdes...............................................................................110

    Figura 10– Alfaces da Escola Estadual Dom Pedro I organizada pelos alunos do oitavo ano

    ..............................................................................................................................................110

    Figura 11 - Estufa de germinação da Escola Estadual Dom Pedro I ...................................110

    LISTA DE ILUSTRAÇÕES

  • LISTA DE SIGLAS

    CAPA – Centro de Apoio ao Pequeno Agricultor

    CPM- Círculo de Pais e Mestres

    FNDE- Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

    IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

    INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

    ISE- Informatização da Secretaria da Educação

    LDB - Lei de Diretrizes de Bases da Educação Brasileira

    MDA - Modelo Discipulado Apostólico

    MST- Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

    PNAE- Plano Nacional de Alimentação Escolar

    PPP - Projeto Político Pedagógico

    PT – Partido dos Trabalhadores

  • SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 13

    1.1 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................. 17

    2 AS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM ESPAÇO QUE GERA

    MOVIMENTO ...................................................................................................................... 20

    2.1 EDUCAÇÃO DO CAMPO: APRESENTANDO A COMUNIDADE ESCOLAR ......... 29

    2.2 APRESENTANDO A ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I ................................................................................................................................. 37

    3 DIAGNÓSTICO DA HORTA ESCOLAR: ESCOLA ESTADUAL DE ESNINO

    FUNDAMENTAL DOM PEDRO I. ................................................................................... 47

    3.1 ANÁLISE DOS DIÁRIOS DE CLASSE ......................................................................... 48

    3.2 ANÁLISE DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO .................................................. 58

    3.3 RODA DE CONVERSA .................................................................................................. 64

    3.4 ANÁLISE DO DIAGNÓSTICO ...................................................................................... 69

    4 PROPOSTA PEDAGÓGICA: UTILIZANDO-SE DA HORTA ESCOLAR DA

    ESCOLA ESTADUAL DOM PEDRO I ............................................................................ 75

    4.1 PROPOSTA PEDAGÓGICA: AUTO-ORGANIZAÇÃO NA PRÁTICA DA HORTA

    ESCOLAR .............................................................................................................................. 93

    5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 98

    REFERÊNCIAS ............................................................................................................. 102

    ANEXOS ......................................................................................................................... 109

    APÊNDICES....................................................................................................................111

  • 13

    1 INTRODUÇÃO

    Sou parte do campo e o campo habita em mim. Desta forma, a Educação do Campo

    impregna sentido à vida na infância. Frequentei a Escola Estadual de Primeiro Grau

    Incompleto São Caetano1, no interior de Marcelino Ramos. Foi lá que vivi parte de minha

    vida com minha família: meus pais, Pedro Daga e Adelina C. Daga; meus cinco irmãos,

    Dileta, Valdir, Marilene, Neuza e Jaimir Daga. Somos filhos de camponeses e estudamos na

    escola do campo na nossa comunidade de São Caetano, Marcelino Ramos, RS. Como filha

    de camponeses, percebi e senti as dificuldades que enfrentam os agricultores para viver e

    poder estudar na escola do campo. Relato um fato que veio em minha memória quando

    cursava o ensino médio na década de 80. Minha família, na época, tinha cinco vacas de leite,

    e todo o dinheiro que a família recebia, no mês, era para pagar o transporte dos três irmãos

    que estudavam no Instituto Estadual Marcelino Ramos da Silva, em Marcelino Ramos RS.

    Esse fato serve para exemplificar as dificuldades encontradas pelos camponeses para

    frequentar a escola.

    Estudei em escola pública e conclui o Ensino Médio no Instituto de Marcelino

    Ramos, cursei magistério no Bom Conselho de Passo Fundo, RS. Quando retornei a cidade

    origem, fui contratada como professora, assumindo uma escola no interior de Marcelino

    Ramos na comunidade de Suzana. Iniciei minha vida profissional, junto às escolas do

    campo com turmas multisseriadas. Fui educadora, cursei a faculdade em Letras Português,

    Inglês, na Universidade Integrada de Erechim, URI e Pós-graduada em Interdisciplinaridade.

    Sempre lutei para que a escola do campo elaborasse um projeto de educação que viesse a

    atender aos interesses dos camponeses, no entanto, encontrei muitas dificuldades para

    realizar um trabalho de coletividade. Esse era um pensamento a ser elaborado neste tempo,

    porque competitividade e individualismo estavam aflorados entre as pessoas. Além do mais,

    não havia, no grupo, interesse pelo campo e o mesmo não era visto como um local de

    possibilidades e desenvolvimento, mas sim, um lugar de atraso, ideologias impostas pelo

    capital para obter mão de obra na indústria. Destaco que passei sete anos exercendo várias

    funções nas escolas do Município de Marcelino Ramos como: diretora, alfabetizadora,

    professora, merendeira e dava aula para quatro turmas multisseriadas.

    1 A Escola Estadual de Primeiro Grau Incompleto de São Caetano foi uma das primeiras Escolas do Município

    de Marcelino Ramos, que foi desativada. Atualmente a escola não existe mais, foi demolida. Oferecia um

    ensino do primeiro ao quinto ano.

  • 14

    Passado esse tempo, comecei a atuar como educadora nomeada2, na rede Estadual de

    Educação e construí outra trajetória como professora, vice-diretora e diretora da Escola

    Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, RS.

    Tive a oportunidade de organizar momentos de formação com os professores e alunos, para

    melhorar o desempenho em sala de aula de ambos. Já com a comunidade escolar organizei

    cursos de plantas medicinais, horta e outros cursos, em parceria com EMATER nas escolas

    em que trabalhei. Com os professores realizei alguns projetos interdisciplinares, entretanto

    sem o envolvimento de todos os colegas no trabalho, porque não se sentiam sensibilizados e

    comprometidos com a causa.

    Nessa caminhada, sempre busquei me fortalecer no coletivo e como gestora trabalhei

    para que o grupo crescesse na coletividade e em conhecimento, buscando formação para

    construir uma escola de melhor qualidade educacional e que atendesse aos interesses dos

    camponeses. Mas não obtive sucesso totalmente, porque o fazer pedagógico está nas mãos

    do professor, e se o mesmo não quer ver o mundo de forma crítica,a educação acaba sendo

    uma repetição de atividades que acontecem em sala de aulas, que se resume em ler, copiar e

    responder questionários. O docente precisa querer interligar os conteúdos científicos com a

    vida dos camponeses, só assim a mudança acontece. Portanto, me desafiei a elaborar uma

    pesquisa que pudesse melhorar a prática da escola do campo e, consequentemente, atender

    aos interesses dos camponeses e mostrar a importância da escola do campo no espaço em

    que ela está inserida.

    Para o desenvolvimento deste estudo foi realizada uma pesquisa na Escola Estadual

    de Ensino Fundamental Dom Pedro I, a qual se localiza no distrito de Coronel Teixeira, no

    município de Marcelino Ramos, Rio Grande do Sul. A mesma possui uma horta escolar e

    produz hortaliças. Tal prática pedagógica representa uma atividade afim aos propósitos

    estabelecidos para uma Educação Rural de qualidade, no entanto, a horta não dialoga com o

    processo de emancipação dos sujeitos histórico. Baseada nesta inquietante constatação, nesta

    dissertação se examinou a experiência da horta escolar como meio para chegar à elaboração

    de uma proposta pedagógica, para ser aplicada na escola, com a finalidade de gerar

    autonomia aos sujeitos que vivem no campo.

    A referida pesquisa se utilizou da pesquisa-ação como instrumental metodológico

    para diagnosticar como se efetivava a prática da horta escolar no oitavo ano da escola

    Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I. Nessa perspectiva observei em que medida a

    2Nomeada no Estado do Rio Grande do Sul são professores que passam em concurso e são considerados

    efetivos.

  • 15

    horta pode se tornar objeto de estudo e aproximar os conteúdos científicos, como, por

    exemplo, a agroecologia com a prática da horta escolar.

    A motivação do presente trabalho está ligada à experiência profissional3 e pela

    necessidade de elaborar uma proposta pedagógica que esteja voltada para os interesses dos

    camponeses, em que se utilizem da horta escolar como instrumento de emancipação dos

    sujeitos envolvidos no processo. Freire diz (2005) que a emancipação busca construir um ser

    humano mais esclarecido numa sociedade com valores humanistas que emancipe para

    transformação social, e que parte do reconhecimento de sua real condição de ser humano,

    enquanto responsável pela sua construção histórica.

    Esta pesquisa tem a finalidade de melhorar a qualidade do ensino na Escola

    Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, e apresenta uma proposta que vem interligar

    a teoria com a prática da horta escolar de forma interdisciplinar. Também têm a pretensão de

    servir de apoio pedagógico as demais escolas do campo e de referência a quem tiver

    interesse no tema.

    O trabalho foi constituiu baseado em autores que retratam da Educação do Campo

    em que autonomia e emancipação são importantes neste processo. Destacam-se alguns

    autores: Monica Molina, Roseli Caldart, Gaudêncio Frigotto, Miguel Arroyo, Paulo Freire e

    outros autores. São pesquisadores que escrevem sobre a Educação do Campo, conceituam,

    relacionam historicamente e politicamente com a vida dos camponeses e os movimentos

    sociais. Possuem o conhecimento epistêmico que levam a compreensão da vida dos

    camponeses. Destacam que a educação nasce em meio aos movimentos de lutas dos

    trabalhadores. Já Freire (2014) fundamenta a dissertação e especialmente a proposta

    pedagógica porque ele se refere à emancipação e a autonomia tanto dos educandos como dos

    educadores e eles se constituem num ato de amorosidade. São referências que dialogam no

    decorrer desta dissertação.

    A experiência pedagógica da horta escolar da Escola Estadual de Ensino

    Fundamental Dom Pedro I, serviu de instrumento de análise para construir uma proposta

    pedagógica voltada para escola do campo. Ao longo do percurso, produziu um diagnóstico

    da experiência pedagógica realizada na horta escolar com finalidade de apresentar uma

    proposta pedagógica para a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I.

    3Nelci Daga Rubenich, mestranda, trabalhou 23 anos com alunos das escolas do campo no Município de

    Marcelino Ramos, sendo que desses anos 9 foi gestora pública. Filha de agricultores e conhece a luta dos

    pequenos agricultores. Estudou na Escola Estadual de São Caetano, Marcelino Ramos. Foi uma das primeiras

    escolas a serem fechadas no município e viu a sua comunidade esvaziar e perder o vínculo da escoa na

    comunidade

  • 16

    A pesquisa utilizou a pesquisa-ação, para analisar e verificar se a horta cumpria o

    seu papel como uma prática de emancipação, ou era realizada como uma atividade que fazia

    parte do currículo e não refletia a sua ação. Neste pensamento, Freire (2005) diz que a

    emancipação ganha o significado de humanização. Humanização essa que se opõe e luta

    contra a desumanização. A desumanização é fato histórico, a humanização é vocação

    humana. O homem é projetado para ser mais. Se a ordem existente, não possibilita isso, ela

    não está de acordo com a natureza humana, sendo, portanto, injusta. Neste caso a horta não

    cumpre o papel de humanizar e emancipar.

    No entanto, a horta escolar necessita promover a humanização entre alunos,

    professores e comunidade escolar. Para isso precisa se voltar para temáticas específicas que

    promovam o desenvolvimento do ser humano do campo, conduzindo-os para a compreensão

    da vida social e política dos camponeses além desenvolver princípios básicos de

    agroecologia4 para intervir na qualidade de vida dos sujeitos utilizando-se da horta escolar

    para realizar o aprofundamento teórico e prático.

    A horta escolar5 é uma atividade realizada nas escolas municipais e estaduais do

    município de Marcelino Ramos, RS. Este é um ponto que contribuiu para esta pesquisa se

    constituísse, e além do mais poderá servir de referência para as escolas do campo do

    município, com a finalidade de promover a emancipação dos sujeitos camponeses.

    Esta dissertação aborda no capitulo I a Concepção de Educação do campo: Um

    espaço que gera Movimento; no capitulo II, apresentando a comunidade escolar e a Escola

    Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I; no capitulo III relata o diagnóstico da horta

    escolar e finaliza com o capitulo quatro com a proposta de intervenção na escola do campo.

    4Os princípios básicos de agroecologia estão referendados no Livro Agroecologia: bases científicas para uma

    agricultura sustentável de Miguel Altieri (2012, p. 16). Incluem como princípio da agroecologia: reciclagem de

    nutrientes energias; a substituição de insumos externos; a melhoria da matéria orgânica e da atividade biológica

    do solo; a diversidade de espécies e plantas e dos recursos genéticos dos agroecossistema no tempo e no

    espaço; a integração das culturas com a pecuária; a otimização das interações e da produtividade do sistema

    agrícola, como um todo, ao invés de redimensionar isolados obtidos com um única espécie. 5 Destaco a horta escolar como uma prática da produção de alimentos, realizada nas escolas do campo de

    Marcelino Ramos- RS.

  • 17

    1.1 JUSTIFICATIVA

    Esta dissertação se justifica pela intenção de apresentar uma proposta pedagógica

    voltada para a escola do campo, baseada na experiência6 da horta da Escola Estadual de

    Ensino Fundamental Dom Pedro I, de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, RS. Está

    fundamentada na realidade da prática e, por isso, se optou em examinar a prática da horta

    escolar visando construir uma proposta pedagógica para a escola do campo em que se utiliza

    da horta escolar, para servir de laboratório de aprendizagens para as escolas com educação

    no campo, de referência para professores, auto-organização dos alunos e quem tiver interesse

    no assunto.

    Também tem a sua importância por ser um trabalho final do Mestrado Profissional

    em Educação da UFFS de Erechim, baseado em leituras e análises de referências, motivada

    pela experiência7 e pela necessidade de elaborar uma metodologia que emancipe os sujeitos

    do campo, para isso se utilizou da horta escolar8 por ser uma atividade que é realizada nas

    escolas Municipais e Estaduais do município de Marcelino Ramos.

    Esta dissertação tem a devida importância porque parte do “chão” da escola do

    campo, em que frequentam alunos provindos da agricultura familiar, que merecem receber

    uma educação de qualidade e que atenda aos interesses dos camponeses. Isso tem a intenção

    de motivar aos alunos a frequentarem a escola e consequentemente melhorara prática da

    horta escolar de uma forma que os emancipe. Outro ponto importante deste trabalho é

    organizar a proposta para interligar os conteúdos científicos com a prática escolar de forma

    interdisciplinar.

    O objeto da pesquisa horta escolar é uma prática real da escola, portanto servirá de

    instrumento de análise para se efetivar o diagnóstico, bem como, um espaço de organização,

    para a reflexão do trabalho prático e interdisciplinar no fazer pedagógico. Também terá

    importância na auto-organização dos estudantes em se utilizou do diálogo organizador para a

    produção de alimentos, na horta da escola do campo. Tudo isso se integra a esta dissertação.

    É de relevância esta dissertação porque surge como necessidade de (re) organizar a

    práxis na escola do campo,tornando a horta escolar como um laboratório de aprendizagem,

    6Experiência da mestranda Nelci Daga em trabalhar com escolas do campo em que envolve a prática da horta

    escolar. 7 Destaco, Nelci Daga, mestranda, trabalhou 23 anos com alunos das escolas do campo no Município de

    Marcelino Ramos. Sendo que desses anos 9 anos foi gestora pública. 8 Destaco a horta escolar como uma prática da produção de alimentos, realizada nas escolas do campo de

    Marcelino Ramos. RS

  • 18

    capaz de gerar autonomia nos estudantes na produção de alimentos.Essa análise partiu do

    pressuposto que a ação não tem a preocupação com a emancipação dos sujeitos e que a

    mesma se efetiva e nem faz uma reflexão da práxis na escola do campo, por isso da

    importância desta proposta.

    Nessa relação o mundo dos camponeses vem para dentro da escola através dos

    relatos, temas específicos dos agricultores familiares, produção de alimentos agroecológicos,

    discussão das relações entre alunos, professores e produtores, organizando o conhecimento, a

    produção de forma coletiva e dialógica. Também relacionar os saberes provindos do campo

    com o conhecimento científico tornando este espaço de reflexão e de compreensão das

    formas do capital. Perceber que o mesmo se utiliza das vendas de agrotóxicos e de insumos

    como um processo de manutenção do sistema. Refletir os modelos de produção utilizando a

    horta e apresentar a horta como forma de agregar valor a pequena propriedade. A horta,

    nesse processo, servirá de laboratório de aprendizagem e será visto como um espaço didático

    onde os conteúdos científicos são relacionados com terra e vida dos alunos.

    Destaca-se o referido trabalho pela intencionalidade pedagógica de produzir

    discussões, qualificar os sujeitos e levá-los a compreensão da vida no campo. Também

    perceber que a horta se apresenta como uma possibilidade de aprendizagem e de renda

    agregada a agricultura familiar, com isso compreender os modelos de produção e

    preservação do meio ambiente. A Escola Estadual Dom Pedro I é uma escola no campo que

    desenvolve atividades voltadas para o meio rural e realiza atividades desconectadas da

    realidade, sem ter a preocupação com a emancipação dos sujeitos do campo, por isso da

    necessidade de se propor uma proposta pedagógica que venha oferecer momentos de

    discussão entre os sujeitos envolvidos, para que haja entendimento de como ocorrem às

    relações políticas, sociais e filosóficas entre o mundo capitalista e os camponeses.

    Outro fator que destaca a importância deste trabalho se dá pela preocupação com os

    sujeitos que fazem parte da escola do campo e necessitam de um olhar diferenciado em que

    se possa perceber quais são as reais necessidades dos mesmos e apresentar um trabalho

    metodológico que possa atender aos anseios dos camponeses. Para isso, é preciso interligar a

    ciência com a prática. Nesta visão, destaca-se Freire (2014) quando menciona que o trabalho

    pedagógico precisa ser crítico e necessita apresentar resultados, mas para isso precisa da

    “reflexão – ação- reflexão” para que se possa constituir nos sujeitos habilidades de refletir as

    suas práticas, ações, capacidades de transformar o meio em que habitam.

  • 19

    Além do mais, esta dissertação se faz necessária, porque aos sujeitos do campo estão

    legitimados à educação de “direito” que tenha qualidade. Portanto, mudar a forma de

    trabalhar em sala de aula na escola do campo e observar as reais necessidades dos

    camponeses, são aspectos urgentes a serem avaliados, porque temos escolas do campo, mas

    com características de escolas rurais. Miguel Arroyo (2009) enfatiza que a educação do

    campo “nasce de um olhar sobre o campo” e que este olhar não pode ser preconceituoso,

    mas de valorização, amorosidade para com a vida dos camponeses, bem como as suas lutas

    sociais e os modelos de produção. Portanto, esta pesquisa tem a finalidade de servir de

    referência às escolas do campo e em especial a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom

    Pedro I.

  • 20

    2 AS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UM ESPAÇO QUE GERA

    MOVIMENTO

    Não existe outra forma de compreender os sujeitos do campo e a organização da escola,

    se não relatar e analisar alguns pontos da história da Educação do Campo em que se

    relaciona com a Educação Rural. É escrita por historiadores que a nominam de Educação

    Rural e do/no campo. Estas concepções da Educação do Campo se fazem presentes na vida

    dos camponeses em meio aos movimentos sociais, diz Caldart (2014).

    Esses fatos históricos nos levam a compreensão da história da educação, bem como

    movimento da educação do campo, que apontam alguns elementos sobre a história da

    educação, envolvendo a educação rural e do/ campo. Para elaborar esta análise, são trazidas

    as ideias e pensamentos dos seguintes autores: Mônica Castagna Molina, Roseli Salete

    Caldart, Miguel Gonzales Arroyo, Marlene Ribeiro, Gaudêncio Frigoto e Paulo Freire que

    dialogam e analisam a caminhada da educação do campo.

    O caminho da Educação do Campo se construiu em meio ao sistema capitalista.

    Nesse sistema estão os camponeses, a escola, a vida e os modelos de produção. Tudo isso

    está presente na escola do campo como um movimento globalizado. Por isso, se traz presente

    nesta discussão o sistema capitalista em que Marx (1982) se refere ao capitalismo como a

    cultura do capital e destaca a sua relação com materialidade hegemônica e contra

    hegemônica que apontam e definem os caminhos da educação. No entanto, quando ocorre a

    materialidade hegemônica, a educação não analisa e não reflete as ideologias do capital com

    a vida dos camponeses na escola. Ela reproduz a alienação dos educandos. Entretanto,

    quando a escola está comprometida com a emancipação dos sujeitos pensa num novo

    modelo de escola, que venha atender aos interesses dos sujeitos que moram no campo, nesse

    caso, se está fazendo a “contra hegemonia”. Portanto, para que ocorra uma educação que

    gere autonomia é preciso que ocorra de forma coletiva a elaboração de propostas contra

    hegemônica na escola do campo.

    Além disso, Marx (1982) também trata do capital como uma relação social de

    apropriação de todos os meios de produção convertidos em mercadorias, dinheiro e capital, a

    serviço da produção e da mais valia. O sistema capitalista se concretiza na educação do

    campo, principalmente quando o modelo de educação que se oferece na escola do campo,

    não atende aos interesses dos camponeses e, além do mais, desenvolve um projeto que

    beneficia o modelo capitalista e não emancipa para vida.

  • 21

    Não se pode falar em emancipação sem citar Marx (1982, p.37) ao citar a relação do

    mundo do trabalho com o universo em que os sujeitos estão envolvidos, já que o homem do

    campo faz parte deste universo.

    O Estado é emancipado, o homem é determinado. A emancipação política do

    homem não é direta, ela é mediada pelo Estado. A emancipação política é a

    redução do homem, por um lado, a membro da sociedade civil, indivíduo

    independente e egoísta e, por outro, a cidadão, a pessoa moral. Só será plena a

    emancipação humana quando o homem real e individual tiver em si o cidadão

    abstrato; quando como homem individual, na sua vida empírica, no trabalho e nas

    suas relações individuais, se tiver tornado um ser genérico; e quando tiver

    reconhecido e organizado as suas próprias forças (forces propes) como forças

    sociais, de maneira a nunca mais separar de si esta força social como força política.

    Já Frigoto (2010, p. 35), menciona em seus escritos a relação da educação com o

    sistema capitalista e chama a relação do capital na educação de “materialismo cultural”

    mostrando que o uso das preposições “para, no campo” diferenciam o tipo de ensino na

    escola do campo. Destaca que, aparentemente, é só uma expressão histórica da educação dos

    homens e mulheres do campo, mas que na verdade são processos educativos alienadores da

    ordem do capital que pautam o horizonte da emancipação humana e das formas sociais que

    incidem sobre o gênero humano e que consequentemente compõe a história da Educação do

    Campo.

    A história da educação do campo veio se consolidando em meio ao movimento que

    gerou a percepção crítica na formação histórica da educação do/no campo, em que aparecem

    os usos das preposições para e no campo, de acordo com Frigoto (2010, p.35)

    A expressão para o campo e no campo, expressão concepções políticas do estado e

    assim educação escolar para o campo consiste em estender modelos, conteúdos e

    modelos pedagógicos planejados de forma centralizada e autoritária, ignorando as

    especificidades e particularidades dos processos sociais produtivos simbólicos e

    culturais da vida do campo. Por outro lado, a educação do campo mantém o sentido

    extensionista do localismo e cresce-lhes a dimensão do localismo e particularismo.

    Trata-se da visão de a criança, jovens e adultos do campo estão destinados a

    permanecer sempre no campo. Desconhecer os processos produtivos do campo e

    cidade atende a industrialização.

    Estas denominações compõem os aspectos históricos, críticos e sociais da educação

    do campo, no entanto, a educação antes de ser vista como do/no campo era considerada

    educação rural. Foi justamente no movimento de luta em que consolidou o “confronto na

    perspectiva de colonização, extensionista”, de acordo com Frigoto (2010). O autor ainda

    relata que é “possível de ser entendida social e humanamente no processo de construção do

  • 22

    movimento social e de um sujeito social, político e educacional contra-hegemônico”. Estas

    discussões que contrapõe o modelo de produção capitalista são de suma importância na

    escola do campo, porque elas proporcionam um entendimento da situação do camponês. Foi

    com o movimento que a educação do campo foi legitimada pelo estado.

    A Educação do Campo vem sendo vista como um direito do cidadão e um dever do

    Estado desde a Constituição de 1988, transformando-a em direito público “subjetivo,

    independentemente dos cidadãos residirem em áreas rurais ou urbanas”. Desde então, passou

    a regimentação dos processos educativos nas escolas do campo, mas não quer dizer que com

    a legitimação do direito as escolas passaram a receber uma educação de qualidade a qual

    permitiu que os sujeitos do campo pudessem se desenvolver no campo, até então, porque a

    educação do campo acontece moldada à educação urbana determinada pelo capital e com

    características de Educação Rural.

    A Educação Rural, segundo o Dicionário do Campo em que Ribeiro (2014, p. 293),

    diz que é a que:

    [...] se destina aos sujeitos que são considerados agricultores e “tem o sustento

    provindo da agricultura. Destaca também que quando estes agricultores têm uma

    escola próxima de onde vivem, recebem um ensino nos moldes da cidade”. É uma

    escola, “destinada a oferecer conhecimentos elementares de leitura, escrita e

    operações matemáticas simples, mesmo a escola rural multisseriadas não tem

    cumprido esta função. O que explica as altas taxas de analfabetismo e os baixos

    índices de escolaridade, nas áreas rurais”.

    Mesmo tendo um índice elevado de baixa escolaridade no campo, as instituições

    responsáveis pela educação não apresentaram um novo modelo de educação que viesse

    desenvolver os sujeitos do campo, mas pelo contrário, propuseram uma educação para

    atender a industrialização que, consequentemente, atende aos interesses do capital. Com

    isso, foi proposta uma metodologia que disciplinava e ensinava os alunos a obedecer e a não

    questionar. Estes eram os quesitos exigidos para que os trabalhadores pudessem atuar na

    indústria.

    A Educação Rural foi constituída para atender aos interesses do capital, e em meio a

    isso, o Estado pensou numa proposta pedagógica, que viesse atender a industrialização:

    “corpos disciplinados e dóceis” e a educação rural desempenhou esta função, quando não

    valorizou o saber do camponês, aplicando na escola do campo um saber totalmente

    urbanizado. Com isso, foi se construindo um processo ideológico que perpassou gerações,

    em que, o campo foi visto como um local de atraso e os agricultores foram discriminados e

    desvalorizados na sociedade. Mas, atualmente, vem se construindo um movimento de

    valorização ao campo, mostrando a sua importância na produção de alimentos e na

  • 23

    preservação do meio ambiente. Para isso, é importante que se construa uma nova ideia do

    homem camponês e que se perceba que o “campo é um lugar de possibilidades”.

    Em virtude deste novo paradigma e da intencionalidade da Educação Rural, os

    filhos dos camponeses sentem a necessidade de aproximar o trabalho no campo com o

    estudo, porque eles ingressam muito cedo na lida do campo. Com isso, surgem os

    movimentos de luta para que escola rural esteja voltada aos interesses dos camponeses

    oportunizando o surgimento da escola do campo.

    Para que uma escola possa ser considerada do campo precisa desenvolver uma

    educação que atenda aos interesses dos camponeses, tendo, muitas vezes que transformar sua

    forma de ensinar, dando voz e vez aos menos favorecidos com o objetivo de gerar autonomia

    e atender as expectativas de aprendizagem dos camponeses. Caso não apresente essas

    características, será considerada uma escola com Educação Rural que, segundo Ribeiro

    (2013, p.171 – 172), “A educação rural [...] funcionou como uma educação formadora tanto

    de uma força de trabalho disciplinada, tanto consumidora de produtos agropecuário, agindo

    nesse sentido, para eliminar os saberes acumulados pela experiência do trabalho com a

    terra”. Essa escola, ainda segundo a autora, tem a finalidade de manter as demandas do

    capital e está muito distante de atender aos interesses dos camponeses, quando não valoriza o

    saber que envolve a vida do camponês.

    Em contra partida, foram surgindo os movimentos para manter viva a educação do

    campo, objetivando a luta pela terra, pela sobrevivência dos pequenos agricultores e da

    escola no campo, surgindo grupos que trabalhavam em favor da educação de qualidade nos

    Movimentos Sociais e na Escola do Campo, com a finalidade de gerar autonomia aos

    agricultores e atender aos interesses dos camponeses. Molina (2014, p. 324), diz que

    A concepção de escola do campo nasce e se desenvolve no bojo do movimento da

    EDUCAÇÃO DO CAMPO, a partir da experiência de formação humana

    desenvolvidas ao contexto de luta dos movimentos socais camponeses por terra e

    educação. Trata-se, portanto, de uma concepção que emerge das contradições da

    luta social e das práticas de educação dos trabalhadores do e no campo.

    O direito a uma educação de qualidade passou a ser a grande luta dos movimentos

    sociais. Os mesmos defendem uma escola que venha a atender aos interesses dos agricultores

    e das comunidades em que a escola está inserida. É uma “peleia” constante, devido à escola

    que temos não atender aos interesses dos pequenos agricultores, estar a serviço do capital e

    ter características de escola rural. Esta última é uma escola que está no campo, mas que

    realiza um ensino que não a tende aos interesses dos camponeses.

  • 24

    Outro ponto polêmico é conseguir manter a escola no campo funcionando e fazer

    com que a mesma tenha condições de atender aos direitos dos camponeses. Caldart (2009,

    p149) diz que “a grande luta por direito à educação e a uma educação que seja no e do

    campo” e que atendam aos interesses dos camponeses e esteja voltada para manter os

    sujeitos no campo. Esses processos de luta se configuram em meio às movimentações que

    atendam aos interesses da classe trabalhadora que visem o seu desenvolvimento, ainda de

    acordo com a autora, “o movimento por uma educação vincula a luta por educação com o

    conjunto das lutas pela transformação das condições sociais de vida no campo”. Tais ações

    se constituem em meio ao “movimento9”, que se refere à educação do campo. A mesma está

    em movimento desde a forma de olhar para o homem que vive no campo, e precisa ser vista

    com outros olhos e atender as prioridades dos sujeitos camponeses. Destaca que a Educação

    Básica do campo está sendo produzida numa dinâmica “sociocultural de humanização das

    pessoas que dela participam” e menciona que uma nova prática de educação no campo está

    sendo gestada no movimento com a finalidade de apresentar possibilidades no entorno do

    conhecimento dos sujeitos que vivem na terra.

    Já para Fernandes (2009, p 141) a “educação do campo é um conceito cunhado com

    a preocupação de delimitar território”. Entretanto LDB10

    no seu artigo 206 de 2006 da

    Constituição Federal faz um reconhecimento à diversidade sociocultural, ao direito plural

    possibilitando a elaboração de diferentes diretrizes operacionais, que conforme Fernandes

    (2009, p. 143), a “Constituição foi resultado das lutas” e que a “escola do campo são

    palavras que encerram em si uma história de uma luta e que começa a dar frutos com a

    provação das Diretrizes Operacionais para educação Básica da escola do Campo”.

    9 Movimento expressão utilizada por Roseli Caldart (2009), no Livro Por Uma Educação no Campo,

    representando os diferentes tipos de movimentos. 10

    Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o

    acesso e permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e

    o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e

    privadas de ensino; IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; V - valorização dos

    profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente

    por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº

    53, de 2006) VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei; VII - garantia de padrão de qualidade.

    VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei

    federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006) Parágrafo único. A lei disporá sobre as

    categorias de trabalhadores considerados profissionais da educação básica e sobre a fixação de prazo para a

    elaboração ou adequação de seus planos de carreira, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

    Municípios. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006). Conforme:

    http://pactoensinomedio.mec.gov.br/

  • 25

    Essas Diretrizes Operacionais para Educação Básica da Escola do Campo, no

    parágrafo único do seu artigo 2º, diz que a identidade da escola do campo é mencionada da

    seguinte forma:

    A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação, as questões

    inerentes a sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos

    estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciências e

    tecnologias disponível, na sociedade e nos movimentos sociais e tecnologia

    disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que

    associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida

    coletiva do País.

    Essa menção feita na LDB sobre a educação do campo foi resultado das lutas dos

    movimentos, mas que, mesmo com a legitimação, faz-se necessário uma escola que esteja

    vinculada aos interesses dos educandos no campo, já que na prática, existem escolas no

    campo com características rurais porque desenvolvem um ensino urbanizado que não

    atendem aos interesses dos camponeses. Essa transformação no ensino, segundo Caldart,

    (2010 p. 324), se refere a tendências de transformação que se efetivam a partir da

    “concepção da forma de educar no debate político e pedagógico voltado as práticas e ao

    Movimento Social”. No entanto, conta a história, que a educação do campo foi se

    construindo, em meio a lutas, organizadas pelos Movimentos Sociais, buscando

    desempenhar a função de fazer com que a “escola do campo fosse vista com outros olhos”.

    Esse movimento envolveu os trabalhadores, professores, alunos, pais, comunidades, que se

    engajarem na luta para reivindicar os seus direitos e principalmente na luta por um pedaço de

    terra.

    Essas lutas se configuraram e deram voz à educação do campo, a qual foi pensada

    por especialistas que elaboram um conceito em que definiram a educação do campo. Nesse

    movimento Arroyo, Caldart, Molina (2004, p. 176), dizem que:

    A educação do campo, tratada como educação rural na legislação brasileira, tem

    um significado que incorpora os espaços da floresta, da pecuária, das minas e da

    agricultura, mas os ultrapassa ao acolher em si os espaços pesqueiros, caiçaras,

    ribeirinhos e extrativistas. O campo, nesse sentido, mais do que um perímetro não

    urbano, é um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos

    com a própria produção das condições da existência social e com as realizações da

    sociedade humana.

    Em meio às lutas e o movimento, surge educação do campo, portanto é possível

    afirmar que na sua trajetória, o Movimento acabou fazendo uma verdadeira ocupação da

    escola nos três sentidos (CALDART, 2000). No primeiro sentido, houve o envolvimento das

  • 26

    famílias pelo direito à educação na década de oitenta; no segundo, o MST se configurou um

    grupo de articulação e de mobilização para se construir uma proposta pedagógica específica

    para as escolas do campo e tendo que formar educadores com capacidade de atuar nesta

    perspectiva, isto ocorreu em 1987; e o terceiro elemento foi a incorporação da escola pelo

    MST, o qual passa fazer parte do cotidiano do movimento.

    Com a mobilização, a educação do campo que surge nos anos de 1990, a qual se

    utiliza da legislação para fazer as Diretrizes da Educação do Campo, é considerada um

    avanço para uma educação. Já o movimento social surgiu como princípio educativo, com

    base na educação construída através da experiência e diz que a “intencionalidade não está no

    campo da educação, mas no caráter do MST”. A educação do campo começa ser vista com

    outros olhos e passa exigir o seu valor.

    A história da Educação do campo teve um avanço no Governo Luís Inácio da Silva,

    quando as Diretrizes, que normatizam a Educação do Campo, se tornaram lei pelo Decreto

    número7352 de 04/11/2010. Institucionalizou o PRONERA vinculado ao MDA, mas

    continuou a ser executado pelo INCRA. Ribeiro (2013) diz que essa foi uma das conquistas

    da Educação do Campo e que, garantindo os recursos materiais e financeiros para a sua

    realização, pode ser indicado como um avanço: a obtenção dos marcos legais para a

    efetivação dos programas educacionais direcionados a esta modalidade de educação. A

    inserção do tema na agenda de pesquisa das universidades públicas brasileiras, a articulação

    entre os movimentos sociais, populares e as instituições que lutam pela Educação do Campo

    geraram o movimento e obtenção de certos recursos destinados a escolas do campo.

    Esses movimentos vão construindo a história da educação, a qual aos poucos passam

    a fazer parte dos processos educacionais como interlocutores. Caldart (2000, p. 200)

    menciona que os “movimentos sociais não têm sido figura muito presente nas teorias

    pedagógicas, nem como sujeito educativo, nem como interlocutor da reflexão sobre

    educação”. Estes grupos que defendiam a escola do campo, no campo, perceberam que além

    de manter a escola do campo aberta era preciso construir um currículo com características

    específicas para ser ensinado nesta escola, que contemplasse os interesses da classe

    trabalhadora e dos movimentos sociais. Sentindo-se responsáveis por uma educação de

    qualidade no campo, Caldart (2000, p. 94) afirma que:

    [...] passaram a construir uma escola diferente, o que era (e continua sendo) um

    direito passou a ser também um dever [...], precisamos preocupar-nos em

    transformar instituições históricas como a escola em lugar que ajudem a formar

    sujeitos destas transformações.

  • 27

    Transformar a escola do campo num local que possa formar sujeitos com capacidade

    de se manter no campo é importante e necessário para o desenvolvimento desses sujeitos que

    ali vivem. Ribeiro (2002, p.100) diz que os trabalhos realizados nas escolas “[...] estão

    voltados para o trabalho urbanizado no sentido de esvaziar a identidade dos filhos dos

    agricultores, construído nas vivências que decorrem da relação com a terra, com o trabalho e

    acultura ligada a terra”. Nesse viés, a horta escolar, pode servir como um instrumento de

    diálogo e de construção de conhecimento e atender aos interesses dos camponeses.

    No entanto, no Brasil a história da educação do campo perpassou e ainda perpassa

    momentos difíceis. No ano de 2008, no Estado do Rio Grande do Sul, deparou-se com

    decisões arbitrárias. O Ministério Público gaúcho e a Secretaria Estadual de Educação

    assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta, em dezembro de 2008, determinando o

    fechamento das escolas itinerantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

    (MST), fazendo com que ocorresse o fechamento de muitas escolas no campo. No Município

    de Marcelino Ramos, algumas escolas foram fechadas.

    Sentindo o impacto político e social, as escolas da Rede Estadual do Rio Grande do

    Sul no município de Marcelino Ramos também foram sendo fechadas. Elenco Escolas

    Estaduais que encerraram suas funções sendo hoje extintas: Escola Estadual de Pinhalzinho,

    Escola Estadual de Santa Bárbara, Escola Estadual de São Caetano, Escola Estadual da

    Linha São Paulo, Escola Estadual do Rio Ligeiro11

    . Atualmente o Estado tem duas escolas na

    Rede Estadual que estão abertas no campo, em funcionamento. A Escola Estadual Nossa

    Senhora das Graças com um turno no Estado do 6º ao 9º ano e do 1º ao 5º ano faz parte da

    rede municipal do Município de Marcelino Ramos. Já a Escola Estadual de Ensino

    Fundamental Dom Pedro I, exerce suas funções, até hoje, em virtude de, na época, ter mais

    de cem alunos e por ser uma escola que se localiza distante 25 quilômetros da sede do

    Município.

    São exemplos que ilustram e vem confirmar a história da educação neste País. Com

    isso, é possível perceber que no Brasil, a educação sempre esteve a serviço dos interesses do

    capital. Estamos a 300 anos da colonização, período em que brancos e negros, índios e

    quilombolas, não lhes eram dados o direito de estudar. No entanto, se configurava a ideia

    que para trabalhar na terra não era necessário saber ler e escrever. Tal percepção quanto ao

    11 Informações obtidas junto à 15ª Coordenadoria Regional de Erechim.

  • 28

    papel da escola foi sendo configurado, sem ter uma preocupação com o desenvolvimento do

    homem do campo para que permanecesse na terra.

    Nessa luta, conta a história que, por uma educação do e no campo e não apenas para

    o campo, que nasce dos e nos movimentos sociais um novo contorno nacional, o qual gerou

    o que Munarim (2008, p. 58) nomeou de Movimento Nacional de Educação do

    Campo,salientando que:

    [...] a experiência acumulada pelo Movimento Sem Terra (MST) com as escolas de

    assentamentos e acampamentos, bem como a própria existência do MST como

    movimento pela terra e por direitos correlatos, pode ser entendida como um

    processo histórico mais amplo de onde deriva o nascente Movimento de Educação

    do Campo.

    É em meio a esses espaços de lutas que se constituem que vai se configurando a

    educação do campo. Para compreender a origem deste conceito Molina (2006, p. 30) afirma

    que:

    É necessário salientar que a Educação do Campo nasceu das demandas dos

    movimentos camponeses na construção de uma política educacional para os

    assentamentos de reforma agrária. Este é um fato extremamente relevante na

    compreensão da história da Educação do Campo. Dessa demanda também nasceu o

    Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e a Coordenação

    Geral de Educação do Campo. As expressões Educação na Reforma Agrária e

    Educação do Campo nasceram simultaneamente, são distintas e se complementam.

    A Educação na Reforma Agrária refere-se às políticas educacionais voltadas para o

    desenvolvimento dos assentamentos rurais. Neste sentido, a Educação na Reforma

    Agrária é parte da Educação do Campo, compreendida como um processo em

    construção que contempla em sua lógica a política.

    O que se percebe é que tanto na história da educação como no seu conceito

    elaborado está presente a lógica da política. No entanto, para que a educação no campo tenha

    características do campo é preciso o envolvimento dos educadores, em que Ribeiro (2002),

    diz que cabe a nós professores, enquanto trabalhadores da educação, nos engajar também

    nessa luta e ajudarmos a fazer realidade da escola básica do campo que todos queremos. É

    para isso é preciso perceber o valor da história da educação do campo e da vida dos

    camponeses, aproximando a vida do campo e o mundo da cidade como um saber cultural.

    Numa visão separatista entre cidade e campo se compreende e se justifica que a

    educação é uma reprodução do sistema capitalista, que almeja mão de obra barata e o

    esvaziamento do campo. O desafio é atender as demandas do capital, para tanto é necessário

    atender aos interesses dos sujeitos do campo na escola do campo, e com isso oferecer uma

    educação de direito aos povos menos favorecidos em que, Molina (2009, p. 12 -13) diz:

  • 29

    A Educação do Campo traz, então, uma grande lição e um grande desafio

    para o pensamento educacional: entender os processos educativos na

    diversidade de dimensões que os constituem como processos sociais,

    políticos, culturais; formadores de ser humano e da própria sociedade.

    O grande obstáculo na escola do campo é pensar numa educação que atenda os

    interesses do campesinato. Um exemplo disso é perceber que a horta escolar pode se tornar

    um elemento de aprofundamento histórico, social e político que levam a compreender a

    identidade do sujeito do campo, servindo de elemento de discussão e de organização dos

    povos menos favorecidos, apontando instrumentos de lutas voltados para os movimentos

    com a finalidade de manter a escola aberta no campo em meio a tantos desafios econômicos.

    Com isso, é preciso oportunizar aos camponeses o direito à educação de qualidade, em meio

    às lutas. Caldart (2009, p. 28) diz que “é preciso pensar a relação homem, campo e cidade,

    refletindo os modelos de produção do capitalismo e de desenvolvimento do país”. Portanto,

    na escola do campo é preciso que se pense num modelo que favoreça os seus sujeitos, que os

    levem a compreender o sistema e os seus impactos sociais, gerando no meio rural

    possibilidades de autonomia, de desenvolvimento; emancipando-os. Para isso é preciso

    compreender a história dos sujeitos do campo em meio aos movimentos sociais que lutam

    pela terra e pelo direito à educação de qualidade que venha manter o homem no campo.

    Contudo, não há como fazer educação no campo sem passar pelo movimento e a história da

    educação do campo.

    2.1 EDUCAÇÃO DO CAMPO: APRESENTANDO A COMUNIDADE ESCOLAR

    Educação do Campo ou Educação Rural? Para que se possa apresentar a

    comunidade escolar da Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, é preciso

    caracterizá-la primeiro, com a finalidade de perceber se esta Escola é do Campo ou é uma

    Escola Rural. Frente a essa indagação, apresenta-se o que relatam alguns pesquisadores

    sobre a Educação do Campo e a Educação Rural. Consta-se que a educação do campo nasce

    em meio aos movimentos sociais e está associada ao desenvolvimento dos sujeitos do

    campo, com a finalidade de proporcionar autonomia. De acordo com Molina (2012, p.325)

    A concepção de escola do campo se insere também na perspectiva gramsciana da

    ESCOLA UTILITÁRIA, no sentido de desenvolver estratégias epistemológicas e

  • 30

    pedagógicas que materializam o projeto marxiano da formação humanista

    omnilateral, com sua base unitária integradora entre trabalho, ciência e cultura,

    tendo em vista a formação dos intelectuais da classe trabalhadora.

    A formação da classe trabalhadora se faz necessário para o desenvolvimento dos

    trabalhadores do campo, diz Molina (2012, p. 325), e acrescenta que, para que se possa

    apresentar um projeto de transformação social voltado para os trabalhadores do campo. A

    mesma destaca que o processo ocorre “simultaneamente a transformação do mundo e a

    autotransformação humana” e para isso, é preciso que os educadores percebam a importância

    da escola do campo e realizem um trabalho pedagógico que atenda aos interesses dos

    camponeses. Por tanto, necessitam de formação e de uma mudança na forma de ensinar, isto

    quer dizer passar da Educação Rural para a Educação do Campo.

    Entretanto, a Educação do Campo antes de ser considerada como tal era chamada de

    Educação Rural. Segundo Ribeiro (2012, p. 293) do Dicionário do Campo diz que

    Para definir educação rural é preciso começar pela definição de sujeito a que ela se

    destina. “De modo geral, o destinatário da educação rural é a produção agrícola

    construída por todas aquelas pessoas para as quais a agricultura representa

    principal meio de sustento” (Petty, Tombim e Vera, 1981). Trata-se dos

    camponeses, ou seja, daqueles que residem e trabalham nas zonas rurais e recebem

    os menores rendimentos por seus trabalhos.

    No entanto, as escolas rurais foram construídas na zona rural e o ensino se

    constituiu baseado na Educação Rural. Ribeiro (2012, p. 293) diz que nas escolas rurais o

    ensino está “destinado a oferecer conhecimentos elementares de leitura, escrita e operações

    matemáticas, simples” e não tendo a preocupação com os filhos dos camponeses que

    precisam de um ensino mais específico para o campo e que possibilite autonomia.

    No Estado do Rio Grande do Sul, se constituiu o Ensino Rural, no final da década

    de 1950 e início de 1960, período, em que se intensificava a expansão do Ensino Primário.

    Conforme constatações de Gritti (2003, p.65),“Foi nesse período a implementação do Plano

    “Nenhuma Criança sem Escola no Rio Grande do Sul” que previa a construção de duas mil

    escolas em dois anos”. Historicamente serviam para responsabilizar e incorporar o homem e

    o meio rural aos planos do desenvolvimento da sociedade capitalista, urbano-industrial.

    Essas escolas rurais foram sendo construídas gradativamente no interior do Rio

    Grande do Sul e se estabeleceram em determinados locais que eram denominadas de

    comunidade. Foram nas comunidades que se estabeleceram os sujeitos que desempenharam

    e desempenham as funções no campo. Elas são compostas por famílias que têm seu terreno

    próprio e algumas são arrendatários. Na comunidade de Coronel Teixeira, Marcelino

  • 31

    Ramos, RS, todos possuem casa para morar, e além do mais, em algumas propriedades

    possuem galpão, chiqueirão, estrebarias para ordenha de vacas e aviários. Outras possuem

    somente alguns desses itens. Da terra, os camponeses retiram o sustento da família sendo

    que, segundo a EMATER, setenta por cento do alimento que está em nossa mesa é

    produzido na agricultura familiar.

    A Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, fica situada na

    comunidade de Santa Terezinha de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, Rio Grande do Sul.

    Os moradores da cidade de Marcelino Ramos, que residem em Coronel Teixeira, tem seus

    filho frequentando essa escola. Os mesmos construíram a sua história, sendo que parte dela

    foi editada pelo histórico do IBGE (2017), dizendo que Marcelino Ramos foi assim

    colonizado:

    “Entretanto, a colonização do território somente teve início, por ocasião da

    revolução Federalista de 1893, também denominada de castilhista, quando algumas

    famílias procuravam refúgio no “Vale do Uruguai”. As terras onde tais famílias

    procuravam asilo (refúgio) aqui localizadas, pertenciam naquela época ao 8º

    Distrito de Passo Fundo. Dentre os colonizadores, merecem destaque aqueles que,

    quando ali se instalaram, como o italiano João Antônio Speranza – e o descendente

    de açorianos – Francisco Vicente Duarte (da Silva – após suprimido) fixando-se

    este, no lugar hoje denominado de Coronel Teixeira, Tais famílias que aqui

    aportaram se locomoveram com canoas – a revés de estradas líquidas de cursos

    d’água e outros, por picadas, em lombos de burros ou cavalos, munidos de

    “Bruacas e mantimentos”, serpenteando densa e inóspita floresta, em moldes de

    uma função verdadeiramente civilizadora, nesta fértil e ubérrima região, hoje,

    MARCELINENSE.

    Nesse relato tem-se a percepção de como foi se formando o povo que reside em

    Coronel Teixeira, no município de Marcelino Ramos. As famílias foram se instalando num

    determinado local e derrubaram as matas para começar a construir as suas casas. Tiveram

    que fazer estradas, sem nenhum auxílio de máquinas. Exemplifico com um fato contado por

    minha avó, Angela Daga, que residiu no Município de Marcelino Ramos, no entorno de

    1825, em que relatou o seguinte: “Quando chegamos neste município de Marcelino Ramos,

    meu marido e eu, viemos de trem de Caxias do Sul, a minha roupa cabia num saco de sal. Os

    mantimentos que tínhamos vieram com carroça a cavalo. Instalamo-nos, derrubamos uma

    árvore, fizemos fogo e a primeira polenta que fizemos para comer, foi colocada no tronco da

    árvore que foi serrada”. Com o passar do tempo foram se organizando suas propriedades e as

    comunidades. Chegaram até a construir a igreja para rezarem todos os domingos.

  • 32

    Esse povo se instalou próximo da água das margens do Rio Uruguai para facilitar a

    vida deles. Marcelino Ramos é uma cidade que fica às margens Rio Uruguai12, atualmente ao

    lago do Rio Uruguai13. Esse município tem a sua economia essencialmente agrícola. Porém,

    é conhecido no Brasil pelo Turismo porque recebe muitos visitantes de todo o país por ter

    em seu município o Balneário das Águas Termais (águas sulfurosas e quentes); o Seminário

    Salete; Parque Teixeira Soares14; o Parque Quinto Rancho15 que tem atrativos voltados para o

    campo.

    Marcelino Ramos possui uma riqueza natural formada por águas cristalinas e matas.

    No Lago do rio Uruguai tem a Ponte Férrea16, assoalhada, que liga o Estado do Rio Grande

    do Sul a Santa Catarina. Tem o comércio local, mas a sua economia provem basicamente da

    agricultura familiar.

    Figura 1: Ponte Férrea sobre o Rio Uruguai

    Fonte: Disponível em:

  • 33

    definido “O Alto Uruguai, onde se instala a Colônia Erechim, situa-se ao Norte do Rio

    Grande do Sul, confrontando com Santa catarina através do Rio Uruguai”.

    Figura 2: Vista aérea da Cidade de Marcelino Ramos

    Fonte:.https://www.marcelinoramos.rs.gov.br Acessado em: 22-03- 2017

    Esse Município se constitui a partir da divisão territorial datada em 1955, em que foi

    formada de 4 distritos: Marcelino Ramos, Coronel Teixeira, Maximiliano de Almeida e

    Viadutos pela Lei Estadual nº 3728, de 18-02-1959, segundo dados do IBGE. Coronel

    Teixeira foi denominado distrito em 2001 por uma lei municipal, sendo que a divisão

    territorial ocorreu em 2003. Marcelino Ramos faz divisa com Severiano de Almeida,

    Viadutos e Estado de Santa Catarina, que tem como limite o Lago do Rio Uruguai.

    O Distrito de Coronel Teixeira tem aproximadamente dois mil e quinhentos

    habitantes, fica distante da sede do município de Marcelino Ramos em torno de 25

    quilômetros. Antigamente possuía um comércio bem estruturado. Contam os moradores

    que, nas décadas cinquenta e sessenta, nesse local tinha subprefeitura, delegacia de polícia,

    armazéns, farmácia, serraria, moinho, ferragem e outras atividades. Com o passar do tempo

    os moradores foram residir em outros locais, como no Paraná e outras regiões do Brasil.

    Essa comunidade também sofreu o impacto da Barragem de Itá, entre 1998 e 2001,

    na qual muitas famílias se deslocaram para outras regiões, devido as suas terras terem sido

    invadidas pelas águas do Lago do Rio Uruguai. Com isso houve uma diminuição do número

    de habitantes e consequentemente diminuiu o número de alunos nas escolas.

    O comércio local, hoje assim se constitui: uma loja com mercadorias diversas da

    família Roll, um Bazar da família Agliardi, uma Serraria da família Beal, Comércio

    Berlanda, Feragem Ferri, Moinho da família Gudoski, uma Unidade Básica de Saúde, dois

    centros comunitários, duas igrejas, sendo uma Evangélica Luterana e outra Católica.

    https://www.marcelinoramos.rs.gov.br/

  • 34

    Esse distrito atualmente é formado por comunidades instituídas pela igreja que assim

    são nominadas: Comunidade de Santa Terezinha de Coronel Teixeira; Comunidade São

    Miguel do Estreito do Rio Uruguai; Comunidade Evangélica Luterana da Água Verde,

    Comunidade de São Sebastião. Próximo à comunidade passa a BR 153. São comunidades

    formadas por famílias de agricultores que se instalaram e sobrevivem da agricultura familiar.

    Na comunidade de Coronel Teixeira existem “duas escolas”: uma de educação

    infantil e outra para o Ensino Fundamental, que foram construídas no terreno que “era” do

    Estado Do Rio Grande do Sul. Justifico: esse terreno foi doado pela família Rosset17 ao

    Estado para construir a Escola. A escola foi construída pelo Estado, mas com o passar do

    tempo, devido à necessidade de se construir uma escola para atender as crianças do jardim e

    pré-escola, o terreno foi doado para o município de Marcelino Ramos com a finalidade de se

    organizar uma Escola de Educação Infantil.

    A Escola Municipal de Educação Infantil Gabriel Ferri foi construída entre o ano de

    2002 e 2003, já a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I foi construída entre

    os anos cinquenta a sessenta. A primeira atende os alunos da pré-escola e a segunda escola

    atende os alunos do Ensino Fundamental. Na Escola municipal os professores são da rede

    municipal do Município de Marcelino Ramos e os da Estadual são da rede Estadual, do

    Estado do Rio Grande do Sul. Neste espaço, tem um refeitório que é compartilhado entre os

    funcionários, professores e alunos, que além de servir o lanche, em determinados dias serve

    como local de reunião com os pais.

    A quantidade de alunos nas escolas diminuiu em função do êxodo e da migração do

    jovem rural para as cidades maiores em busca de novos rumos. Foram em busca de novas

    perspectivas de trabalho junto às indústrias e outras atividades. Veja no quadro abaixo, a

    quantidade de alunos matriculados na Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro l,

    nos últimos cinco anos.

    17

    Tal informação a respeito da doação da Família Rosset, foi obtida junto a moradora da comunidade.

  • 35

    Tabela1: Tabela de Alunos Matriculados

    Últimos cinco anos Quantidade de alunos do 1º ao 9º ano

    2012 101

    2013 91

    2014 95

    2015 84

    2016 84

    2017 76

    Fonte: Senso Escolar, fornecido pela direção Esc. Est. De Ens. Fund. Dom Pedro I, em- 20-04-2017.

    Pode-se observar uma diminuição significativa na matrícula de alunos. Observa-se

    que do ano de 2012 até 2017, nos últimos cinco anos, houve uma diminuição de 25 alunos na

    matrícula escolar. Segundo registros da escola, na década de 90, o número de estudantes era

    de até 160 alunos. A diminuição é gradativa, gera preocupação porque algumas escolas

    acabaram sendo fechadas devido ao número de alunos e pelo próprio sistema. Esse processo

    vem se agravando anualmente, porque saem mais alunos do que são matriculados.

    Com a diminuição do número de alunos e o esvaziamento das comunidades, algumas

    escolas enceraram as suas funções e foram desativadas. Exemplifico: escola da comunidade

    Água Verde; São Miguel na BR 156; eram escolas municipais que atendiam alunos do

    primeiro ao quarto ano. No entanto, com o fechamento os alunos e professores foram

    transferidos para uma escola núcleo em São Sebastião. Esta última pertencia à rede do

    Estado do Rio Grande do Sul e foi municipalizada no final dos anos noventa. Tornando-se os

    alunos e o prédio de responsabilidade do município de Marcelino Ramos. Já o professor da

    Rede Estadual foi transferido para uma escola mais próxima. Nesta escola de São Sebastião

    foram levados alunos de três escolas que foram fechadas no município: Linha Daga, Água

    Verde, BR153.

    No Distrito de Coronel Teixeira há duas escolas que atendem do primeiro ao quinto

    ano: Escola Municipal São Sebastião que hoje tem 22 alunos, e a Escola Estadual de Ensino

    Fundamental Dom Pedro I, tem 76 alunos na matricula geral da escola. Sendo que do sexto

    ao nono ano, se concentram o maior número de alunos, porque a escola recebe alunos da

    rede municipal para concluir o Ensino Fundamental.

    Dos alunos que chegam até a Escola Estadual Ensino Fundamental Dom Pedro I,

    98% dependem do transporte escolar; que é realizado em parceria do Estado do Rio Grande

    do Sul com o município de Marcelino Ramos. Desses, 99% são filhos de pequenos

  • 36

    agricultores e somente 2% têm sua renda que provem do comércio e funcionários públicos.

    Os pais desses alunos são agricultores produtores de milho, soja, feijão, mandioca, pomares

    de laranja, hortaliças, arroz e outros produtos.

    Os alunos chegam à escola com a finalidade de concluir o Ensino Fundamantal.

    Quando encerram, alguns alunos, saem da comunidade e vão estudar no Instituto Estadual

    de Educação Marcelino Ramos, já outros estudam em outros municípios, como Severiano

    de Almeida, Concórdia, Viadutos e não retornando mais para a propriedade para

    desempenhar as funções no campo, apartir do momento que concluem o Ensino Médio.

    Pode-se observar na imagem aérea do Distrito de Coronel Teixeira, que é um local

    tranquilo e fica em meio natureza. O mesmo tem duas ruas com calçamento e no centro do

    Distrito está a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, a Escola Municipal

    de Educação Infantil Gabriel Ferri, a igreja Católica Santa Terezinha e o Ginásio de esportes

    da comunidade.É uma comunidade harmoniosa em que todos se conhecem e cuidam um dos

    outros.

    Figura 3: Vista aérea do Distrito de Coronel Teixeira, Marcelino Ramos, RS.

    Fonte:

    Coronel Teixeira é uma comunidade que está inserida no campo, formada por uma

    população descendente da cultura alemã, italiana, polonesa. Pode-se observar que neste

  • 37

    aglomerado temos aproximadamente em torno de 80 moradores e os demais residem em

    locais distantes formando as famílias camponesas.

    2.2 APRESENTANDO A ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL DOM

    PEDRO I

    Como apresentar a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I? Essa é a

    pergunta que levou a reflexão para iniciar este escrito. Inicio contando uma história que foi

    relatada por Gritti (2003), que se refere aos anos de 1930, ano em que as escolas rurais

    começaram a ter relevância por parte dos governos federal e estadual, antes disso, era de

    responsabilidade dos órgãos de administração local ou privada. Essas escolas foram sendo

    construídas no meio rural justamente no período em que no país se intensificava o processo

    de industrialização.

    Para Gritti (2003), mencionado por Ribeiro (2013, p. 176), afirma que

    Escola rural pública foi um potente instrumento para a proliferação do capitalismo

    no campo brasileiro, trazendo como consequência a desestruturação do modo de

    vida dos trabalhadores rurais principalmente seu trabalho, os saberes e sua cultura

    que lhe são próprios [...] contraditoriamente a educação rural objetivava ensinar o

    agricultor a trabalhar na terra, como se ele não soubesse fazê-lo.

    Em meio, esse processo de se ver o homem do campo como um sujeito que não

    sabia trabalhar, nasce a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I, no meio rural,

    e tem sua origem a partir dos anos de 1946, na qual foi decretada a “Lei Orgânica” no estado

    que se referia ao estudo primário. Destaca Gritti (2008, p.22) que:

    A escola primária rural tinha como objetivo identificar de que nível de ensino foi

    contemplado para as populações rural na referida lei do Ensino Primário, nº 8529.

    Tinha como finalidade este ensino primário evidenciar a realidade social e

    econômica que se configurava naquele período que passava a exigir uma

    escolaridade mínima não somente para o mercado de trabalho, mas também para as

    novas condições de sobrevivência e de relações decorrentes da urbanização.

    Essa escola se configurou numa época em que o ensino era divido em dois cursos: o

    primário e elementar, de quatro anos, e o complementar, isto quer dizer que, os alunos

    cursavam até o quarto ano e estudavam mais um ano como reforço. As disciplinas que eram

  • 38

    trabalhadas na escola, não tinham nenhuma preocupação com o homem rural, segundo Gritti

    (2003, p.23) “a lei específica às disciplinas e as atividades para cada um dos cursos, sem, no

    entanto, fazer qualquer menção às características peculiares do trabalho rural”. Assim se

    constituiu a educação no meio rural.

    A história da Escola Estadual Dom Pedro I, foi sendo escrita pelos moradores, já e as

    normas foram sendo executadas no Estado. Assim consta no decreto- lei número 8.529, o

    qual faz menção à obrigatoriedade da matrícula e frequência escolar, afirmando que “Os

    proprietários agrícolas e empresas, em cuja propriedade se localizar estabelecimentos de

    ensino primário, deverá facilitar e auxiliar as providências que visem à plena execução da

    obrigatoriedade escolar”. Essa obrigatoriedade foi concretizada e a escola passou a existir

    nas comunidades.

    Constatou-se que essa escola teve outros nomes antes de ser Escola Estadual de

    Ensino Fundamental Dom Pedro I. Quando iniciou as atividades era chamada de Escola

    Isolada Daltro Filho, porque de acordo com a lei, as escolas que possuíssem somente uma

    turma e um só professor, se chamariam isoladas. Por isso do nome Escola Isolada Daltro

    Filho. Mais tarde se nominou Grupo Escolar de Coronel Teixeira, pois possuía na época

    cinco ou mais turmas, iguais ou superiores ao número de professores. Anos mais tarde essa

    escola foi chamada de Escola Estadual de Primeiro Grau Dom Pedro I. Posterior a isso, a

    escola com o ensino fundamental completo passou a ser chamado de Escola Estadual de

    Ensino Fundamental Dom Pedro I.

    É uma escola regida pelas normas do Estado do Rio Grande do Sul e atua com o

    Ensino Fundamental Completo do primeiro ao nono ano. É considerado um núcleo no

    interior do Município de Marcelino Ramos, porque nela os alunos concluem o Ensino

    Fundamental. Pode-se considerar uma escola rural porque ela desenvolve um trabalho que

    não se identifica com do trabalho dos camponeses. Segundo Ribeiro (2013, p. 17), “a

    educação rural está profundamente distanciada da realidade do trabalho e da vida dos

    agricultores, uma vez que a educação tem sido utilizada pelas classes dominantes para

    manter a classe trabalhadora rural subordinada aos seus interesses”. Mesmo tendo este perfil

    e fazer parte de um modelo de educação que está atrelada ao estado tem desenvolvido a

    prática da horta escolar na escola. Nesta horta é produzido verduras, legumes que são

    consumidos no refeitório da escola com a merenda para os alunos.

    Nesta dissertação, a prática da horta escolar tem importância na escola do campo,

    mas pode servir de instrumento de emancipação e autonomia dos camponeses, afim de que

  • 39

    escola rural se torne realmente uma escola do campo. Entretanto, estudos mostram a

    importância da escola do campo que é apresentado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e

    Estatística - IBGE - a Escola do campo é aquela que está situada em área rural, ou aquela

    situada em área urbana, desde que atenda predominantemente a populações do campo. Já no

    Dicionário da Educação do Campo, Caldart (2012 p. 113),diz que:

    Ela nasce e se desenvolve no bojo do Movimento da Educação do Campo, a partir

    das experiências de formação humana desenvolvidas no contexto de luta dos

    movimentos sociais camponeses por terra e educação. Trata-se, portanto, de uma

    concepção que emerge das contradições de lutas sociais e das práticas educativas

    dos trabalhadores de e no campo.

    Esse campo se constitui de sujeitos que podem ser denominados camponeses que

    formam o campesinato que é definido por Caldart (2012, p. 113)

    Como um conjunto de famílias camponesas existente em um território [...] isto é

    num contexto de relações sociais que se expressão em regras de uso (institucionais)

    das disponibilidades naturais (biomas e ecossistemas) e culturas (capacidade difusa

    internalizadas nas pessoas e aparatos infraestruturais tangíveis) de um dado espaço

    geográfico politicamente delimitado.

    Já a família camponesa é definida como um conjunto de sujeitos que vivem num

    espaço de terra e dela têm seu sustento. São pequenos proprietários que têm sua renda

    econômica retirada da propriedade, isto quer dizer que plantam, colhem e vendem os

    produtos produzidos da terra, para dela viver no campo. Caldart (2012, p.113) define família

    camponesa como

    Aquelas famílias que, tendo acesso a terra e aos recursos naturais que ela suporta,

    resolve seus problemas reprodutivos, suas necessidades imediatas de consumo e o

    encaminhamento de projetos que permitem cumprir adequadamente um ciclo de

    vida da família mediante a produção rural.

    Mas porque conceituar campo e família camponesa? Para que se possa entender em

    que espaço se está inserido e quem são os alunos que são atendidos na escola do campo.

    Feita esta analogia, se pode dizer que os camponeses são as famílias dos alunos que

    frequentem a Escola Estadual de Ensino Fundamental Dom Pedro I. Já campesinato se

    denomina a quantidade de terreno em que moram as famílias dos alunos da escola. Po