caderno de formação mst

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    MTODODETRABALHODEBASE1

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    EXPEDIENTE

    O Caderno de Formao n 38: Mtodo de trabalho de base eMtodo de trabalho de base eMtodo de trabalho de base eMtodo de trabalho de base eMtodo de trabalho de base eorganizao popularorganizao popularorganizao popularorganizao popularorganizao popular, uma publicao do Setor de Formao -Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

    Diagramao: Secretaria Nacional MST

    Pedidos:Pedidos:Pedidos:Pedidos:Pedidos:Secretaria Nacional - Setor de [email protected]

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    SUMRIO

    Introduo ------------------------------------------------------------------------------7

    I. Sobre a Metodologia Popular: Princpios do trabalho popular ------- 11

    - Ranulfo Peloso

    II. A Retomada do Trabalho de Base -------------------------------------------- 23

    - Ranulfo Peloso

    III.Como fazer o Trabalho de Base ---------------------------------------------- 47 - Ranulfo Peloso

    IV.A Luta e a Organizao Popular---------------------------------------------- 53

    - Ranulfo Peloso

    V.A Luta Popular --------------------------------------------------------------------- 61

    - Ranulfo Peloso

    VI.O Poder Popular ------------------------------------------------------------------ 67

    - Ranulfo Peloso

    VII.Resgatar o Esprito de Militncia ---------------------------------------------------- 77

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    X. Como Fazer uma Reunio---------------------------------------------------------------113

    - Ademar Bogo

    XI. O papel da formao no trabalho de base ---------------------------------------121

    - Ademar Bogo

    XII. Os vcios e desvios poltico-organizativos:

    origens, implicaes e mecanismos para combat-los ---------------------131

    - Adelar Joo Pizetta

    XIII. A Mstica: parte da vida e da luta-------------------------------------------------148

    - Ademar Bogo

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    MTODODETRABALHODEBASE

    EORGANIZAOPOPULAR

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    MST- CADERNODEFORMAO6

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    IIIIINTRODUONTRODUONTRODUONTRODUONTRODUO

    Vivemos em uma sociedade que praticamente separou doisaspectos que devem do nosso ponto de vista ser uma unidadedialtica: teoria e prtica. Referimo-nos separao entre os quepensam, dirigem, e os que fazem, executam. A separao entre otrabalho intelectual e o trabalho braal. No podemos repetir essaprtica nas organizaes que buscam a transformao dessa

    sociedade.Buscando cada vez mais a superao dessa dicotomia, que

    o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST, sempretem se preocupado em articular as duas esferas. Por isso o estudo fundamental. A apropriao do conhecimento cientfico, dasexperincias histricas, das estratgias de lutas, dos mtodos detrabalho e direo, de organizao e tambm de formao polticaso condies essenciais, para o avano da organizao em queos seus partcipes se transformam em sujeitos polticos comcapacidade de pensar, elaborar e fazer.

    Foi com essa preocupao que vrios companheiros foramelaborando subsdios metodolgicos em diferentes momentos, e queagora organizamos nesse Caderno de Formao, a fim de que osmilitantes possam levar adiante as tarefas organizativas e sigam seformando no processo. Da a importncia do mtodo, do jeito, da

    maneira como se faz, como se aprende fazer fazendo. importante ressaltar que vrios dos subsdios que constamnessa publicao, foram redigidos h algum tempo para dar contade desafios especficos, numa realidade determinada. Por isso,nunca podem ser interpretados como receita, como algo que seaplica mecanicamente em toda a realidade. No entanto, servem

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    que j se construiu. A realidade est em permanente movimento enos coloca novas questes que precisamos interpretar e enfrentar,para avanar no processo de luta pela emancipao da classetrabalhadora. Um dos grandes desafios o como fazer?como fazer?como fazer?como fazer?como fazer?

    Por isso, o mtodomtodomtodomtodomtododeve ser um instrumento (no uma receita)

    que nos auxilie a dirigir melhor; a fazer planejamentos coerentescom a realidade e os objetivos; a delegar responsabilidades e tarefasque possam forjar novos militantes; a coordenar reunies produtivas,participativas; a desenvolver a mstica com motivaorevolucionria; a superar vcios e desvios organizativos que afetama coletividade; a compreender com mais profundidade a importnciae a necessidade do trabalho de base para o fortalecimento daorganizao; a discutir questes relacionadas ao exerccio do podere a necessidade de construir o poder popular, por intermdio daluta permanente de todos os trabalhadores envolvidos nos processosde organizao da classe.

    Oxal os subsdios que agora chegam at voc, possamcontribuir no Trabalho de Base, despertar a criatividade e fortalecernossa prtica para que ela seja mais eficiente nesses momentoscomplexos e difceis da luta pela Reforma Agrria, isto , da luta de

    classes em nosso pas. mais um instrumento para auxiliar os nossosprocessos de reflexo sobre a prtica, do balano crtico que estem curso em nossa organizao, buscando superar deficincias elimites, contribuindo com o salto de qualidade orgnico que o MSTprecisa dar nesse atual contexto da luta de classes, acumulando eaumentando nossa fora social.

    Sabemos que a fora de qualquer organizao construdade forma coletiva e tem a ver com muitos fatores a partir de uma

    realidade determinada, concreta. Dentre esses fatores podemosdestacar a questo da formao da conscincia, da organicidadede seus membros e da capacidade de mobilizao e lutas asverdadeiras parteiras das transformaes.

    A fora do povo est na sua organizao e na sua luta. Mas,a fora tambm reside na clareza dos seus objetivos, tanto imediatos

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    solidariedade com outros setores e movimentos sociais, nacapacidade de alianas com outras foras populares em luta. Mas,todo esse acmulo de foras deve ir sendo construdo tanto doponto de vista da elaborao terica como do ponto de vista prtico,sempre vinculando os dois aspectos do mesmo processo.

    preciso ter a convico de que a classe trabalhadora podeser arquiteta de seu destino. Para tanto, ter que decidir e tomar orumo da histria em suas mos. Se as circunstncias nesse momentoso adversas e vivemos um refluxo no movimento das massas,devemos dar a nossa contribuio para que as condies histricasmelhorem e nos preparemos para o ascenso do movimento demassas, com possibilidades efetivas de levar adiante as mudanas etransformaes necessrias para a libertao dos trabalhadores.Como j disse um dos grandes mestres do operariado mundial: Aemancipao da classe operria ser obra da prpria classe, ou,no haver emancipao.

    Bom estudo e bom Trabalho de Base a todos e todas.

    So Paulo, setembro de 2009.

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    MST- CADERNODEFORMAO10

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    I.

    SOBREAMETODOLOGIAPOPULAR- Ranulfo Peloso -

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    PRINCPIOSRINCPIOSRINCPIOSRINCPIOSRINCPIOS DODODODODO TTTTTRABALHORABALHORABALHORABALHORABALHO PPPPPOPULAROPULAROPULAROPULAROPULAR*****

    ApresentaoApresentaoApresentaoApresentaoApresentao

    Gostaria de iniciar dizendo que nem sempre cabe umapalestra sobre mtodo. O que ensina a gente fazer coisas e ler. Ofundamental fazer, lanar-se numa prtica e ir aprendendo-reaprendendo, criando-recriando, com o povo. Isso que ensina agente. Mas, ajuda muito bater um papocom quem tem prtica, comquem j teve prtica e com quem tem uma fundamentao terica, propsito da experincia. Nesse olhar uma assessoria tem sentido.Mas, o indispensvel fazero indispensvel fazero indispensvel fazero indispensvel fazero indispensvel fazer. Assim a gente vai tendo a sensaoagradvel de estar descobrindo as coisas com o povo.

    Tenho evitado escrever algo que no tenha feito. Nem cartasei fazer se no tiver algo importante para conversar. Meus livrosso sempre relatrios, embora relatrios tericos, feitos a partir daprtica. Quem pretende trabalhar com esses relatrios deve estardisposto a recriar o que fiz, a refazer e no s copiar, a reinventar ascoisas. Os elementos que vamos refletir so princpios vlidosprincpios vlidosprincpios vlidosprincpios vlidosprincpios vlidos

    para quem trabalha com o povotrabalha com o povotrabalha com o povotrabalha com o povotrabalha com o povo, quem est metido comalfabetizao de adultos ou participa de algum tipo de pastoral outrabalho popular.

    1. Ningum est no s no mundo1. Ningum est no s no mundo1. Ningum est no s no mundo1. Ningum est no s no mundo1. Ningum est no s no mundoO primeiro princpio ningum est s no mundoningum est s no mundoningum est s no mundoningum est s no mundoningum est s no mundo.

    Enquanto educadore(a)s devemos estar muito convencido(a)s deuma coisa que bvia: ningum est s no mundo..... Parece uma

    constatao besta - constatao aquilo que ningum precisapesquisar. Mas, preciso ver que implicaes se tira da constatao.O importante no fazer uma constatao. Fazer constatao fcil, basta estar vivo. O importante encarnar encarnar encarnar encarnar encarnar essa constataocomum bando deconseqncias,conseqncias,conseqncias,conseqncias,conseqncias, de implicaes.

    A primeira conseqnciaA primeira conseqnciaA primeira conseqnciaA primeira conseqnciaA primeira conseqncia, sobretudo no campo da

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    necessariamente respeitar nos outros o direito de dizer arespeitar nos outros o direito de dizer arespeitar nos outros o direito de dizer arespeitar nos outros o direito de dizer arespeitar nos outros o direito de dizer apalavra.palavra.palavra.palavra.palavra. A, comea o embananamento para quem tem umaposio nada humilde, quem pensa que conhece a verdade toda.Para elas s tem um jeito fazer a cabeafazer a cabeafazer a cabeafazer a cabeafazer a cabeade quem no tem ade quem no tem ade quem no tem ade quem no tem ade quem no tem averdade.verdade.verdade.verdade.verdade.

    2. Saber ouvir2. Saber ouvir2. Saber ouvir2. Saber ouvir2. Saber ouvirA implicao profunda e rigorosaque surge quando encarno

    que no estou s exatamenteo direito e o dever de respeitaro direito e o dever de respeitaro direito e o dever de respeitaro direito e o dever de respeitaro direito e o dever de respeitarem voc o direito de voc dizer a palavraem voc o direito de voc dizer a palavraem voc o direito de voc dizer a palavraem voc o direito de voc dizer a palavraem voc o direito de voc dizer a palavra.Isso significa ento,que preciso tambmpreciso tambmpreciso tambmpreciso tambmpreciso tambm saber ouvirsaber ouvirsaber ouvirsaber ouvirsaber ouvir. Na medida, em que eu partodo reconhecimento do teu direito de dizer a palavra, quando eufalo porque te ouvi,,,,, eu fao mais do que falar a ti, eu falo contigo.

    Mas, falar a ti s, falar a ti s, falar a ti s, falar a ti s, falar a ti s se convertese convertese convertese convertese converte no falar contigo, se eu teno falar contigo, se eu teno falar contigo, se eu teno falar contigo, se eu teno falar contigo, se eu teescutoescutoescutoescutoescuto.No Brasil t cheio de gente falando pr gente, mas nocom a gente.Faz 500 anos que o povo brasileiro leva porrete. Tudoisso tem a ver com o trabalho do educador(a): Numaposioautoritria, evidente que oeducador(a) fala ao povo, fala aoeducador(a) fala ao povo, fala aoeducador(a) fala ao povo, fala aoeducador(a) fala ao povo, fala aoeducador(a) fala ao povo, fala aoestudante.estudante.estudante.estudante.estudante.

    O terrvel ver um monto de gente se proclamando deesquerda e continuar falando ao povo e no com o povo

    numa contradio extraordinria com a prpria posio deesquerda. Porque o correto da direita falar ao povo,

    enquanto o correto da esquerda falar com o povo. Essetrequinho a primeira concluso que a gente tira quando

    percebe que no est s no mundo.

    Quando a gente encarna e vive este no estar s no mundoest falando da metodologia popularmetodologia popularmetodologia popularmetodologia popularmetodologia popular. Esse modo de ver e detratar muito mais que um mtodo uma concepo de uma concepo de uma concepo de uma concepo de uma concepo demundo. uma pedagogiamundo. uma pedagogiamundo. uma pedagogiamundo. uma pedagogiamundo. uma pedagogia. Pedagogia e no um mtodo cheiode tcnicas. A gente sabe muito mais as coisas quando aprendemoso significado dessa pedagogia do que quando se aplica uma tcnica.

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    Uma segunda conseqncia do falar a e do falar com queeu s falo com na medida em que escuto tambm. E eu s escutona medida em que eu respeito, inclusive o que fala mecontradizendo. Se a gente s escuta o que concorda com a gente... exatamente o que est a no poder. Quer dizer, desde que vocs

    aceitem as regras do jogo, a abertura prossegue.Se o povo brasileiroconcordar que a abertura, a democraciadeve ser assim, ela existe,seno... Gosto muito de anedotas, inclusive as anedotas chamadafeiasque so to bonitas.

    Quando era moo, me contaram uma estria que se deucom Henry Ford. Henry Ford reuniu seus tcnicos e assessores edisse: vamos aqui discutir o modelo novo dos carros Ford.Ento,os tcnicos comearam: Sr. Henry, vamos dar um jeito de acabarcom esses carros s pretos e feios; vamos tacar o carro marrom,verde, azul, mudar o estilo, fazer um negcio mais dinmico.Quando deu 17 h o Henry Ford falou: agora em tenho um negcio.Vamos fazer o seguinte: amanh, a gente se rene aqui s cincohoras, para decidir esse negcio. No outro dia, s 16h45 osassessores estavam todos na sala. s 16,50 h, a secretria de Fordentrou na sala e falou: senhores, o Sr. Ford no pode vir a essa

    reunio, mas pede que os senhores se renam; diz tambm queconcorda com os senhores, desde que seja preta a cor dos carros.

    Eu falo contigo quando sou capaz de te escutar. E se soucapaz, eu falo a ti. No falar a e no falar sobre (que significa

    falar em torno), falo a ti sobre a situao tal. Se me convencidesse falar com, desse escutar, meu trabalho vai partir

    sempre das condies concretas em que o povo est. Meu

    trabalho vai partir dos nveis, das maneiras e formas como opovo se compreende na realidade e nunca da maneiracomo eu entendo a realidade.

    3. Desmontar a viso mgica3. Desmontar a viso mgica3. Desmontar a viso mgica3. Desmontar a viso mgica3. Desmontar a viso mgica

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    Deus o responsvel. Sendo Deus o responsvelo problema passaa ter causa superior. melhor acreditar que Deus do que acreditarque no , porque a no se tem a obrigao de brigar, arriscando-se a morrer...

    Esta uma realidade que existe. No se sabe como que os

    jovens de esquerda no percebem esse trecojovens de esquerda no percebem esse trecojovens de esquerda no percebem esse trecojovens de esquerda no percebem esse trecojovens de esquerda no percebem esse treco! Ento, no possvel chegar a uma rea como essa e fazer um discurso sobre aluta de classe.luta de classe.luta de classe.luta de classe.luta de classe. No d mesmo! uma absoluta inconsistnciaterico-cientfica. Fazer um troo desse, ignorncia da cincia.Um dia, vai chegar o negcio da classe. Mas, ser impossvelenquanto no desmontar a viso mgica, a compreenso mgica.Se houvesse a possibilidade da participao ativa, da prtica polticaimediata, essa viso se acabaria. Porm, sempre umaviolnciaviolnciaviolnciaviolnciaviolnciavoc querer esquecer que a comunidade ainda no tem apossibilidadede um engajamento imediato.

    O que tem acontecido a gente falar comunidade e nocom a comunidade. Voc faz um discurso brabo, danado. E oresultado desse discurso? Cria mais medo; mete mais medo nacabea da populao. Quer dizer, o que a gente tem a fazer partirexatamente do nvel que a massanvel que a massanvel que a massanvel que a massanvel que a massa est. Diante desse fato, h

    duas possibilidades de errar: a) acomodaracomodaracomodaracomodaracomodar-se ao nvel da-se ao nvel da-se ao nvel da-se ao nvel da-se ao nvel dacompreenso da comunidadecompreenso da comunidadecompreenso da comunidadecompreenso da comunidadecompreenso da comunidade e passar a dizer que, na verdade, Deus mesmo que quer isso; b) ou arrebentar com Deus e dizerque o culpado o imperialismo.

    Seria uma falta de senso dessa pessoa porque, isso falta decompreenso do fenmeno humano, da espoliao e das razes. engraado, se fala tanto em dialtica e no se dialtico. (Dialtica o processo de conhecimento pelo qual se acerta o caminho, atravs

    de um processo de reflexo sobre a realidade ou a prtica). O queser que pode acontecer na cabea das pessoas: se Deus umcaboclo danado de forte, que criou todo esse trecoo que quepode gerar na cabea dessas pessoas se a gente chega e diz queno Deus?Vamos ter que brigar com uma situao feita por umser to poderoso como este e, ao mesmo tempo, to justo. Essa

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    - O senhor me desculpe, mas o senhor que deve falar e no ns.

    - Por que? Perguntei eu.

    - Porque o senhor o que sabe e nis no sabemos.

    - Aceito. Eu sei e vocs no sabem! Mas por que que eu sei evocs no sabem?

    (Aceitei a posio deles em vez de me sobrepor posio deles.Aceitei a posio deles, mas, ao mesmo tempo, indaguei sobre eles)

    - Um deles respondeu:

    - O senhor sabe porque foi escola e ns no.

    - Aceito. Fui escola e vocs no foram. Mas, por que que eu fui escola e vocs no foram?

    - Ah, foi porque seus pais puderam e os nossos no.

    - Concordo. Mas por que meus pais puderam e os de vocs nopuderam?

    - Ah, o senhor pde porque seus pais tinham condio, bomtrabalho, bom emprego e os nossos no.

    - T certo. Mas, por que os meus tinham e os de vocs no?- Porque os nossos eram camponeses. Meu av era campons,

    meu pai era campons, eu sou campons, meu filho campons,meu neto vai ser campons. (A, a concepo fatalista da histria!).

    - O que ser campons?

    - Ah, no ter nada, ser explorado.

    - Mas, o que que explica isso tudo?- Ah, Deus! Deus quis que o senhor tivesse e ns no.

    - T certo, concordo. Deus um cara bacana, um sujeitopoderoso! Agora, eu queria fazer uma pergunta: quem aqui pai? (Todo mundo era) Olhei para um e disse: Voc tem quantos

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    - Ento, voc que acha que Deus poderoso, que pai, ia tirar essaoportunidade de vocs? Ser que pode? Houve um silncio epor fim um falou:

    - no, no Deus nada! o patro!

    Seria idiotice minha se eu dissesse que era o patroimperialista yankee. O cabra ia dizer o qu, onde mora esse hme?A transformao social se faz com cincia, com conscincia, bomsenso, humildade, criatividade e coragem. trabalhoso, no se fazna marra. O voluntarismo nunca fez revoluo,O voluntarismo nunca fez revoluo,O voluntarismo nunca fez revoluo,O voluntarismo nunca fez revoluo,O voluntarismo nunca fez revoluo, em cantonenhum, nem o espontanesmo. TTTTTransformao social implicaransformao social implicaransformao social implicaransformao social implicaransformao social implicaem convivncia com as massasem convivncia com as massasem convivncia com as massasem convivncia com as massasem convivncia com as massas populares e no a distncia

    delas.5. Ningum sabe tudo5. Ningum sabe tudo5. Ningum sabe tudo5. Ningum sabe tudo5. Ningum sabe tudo ningum ignora tudoningum ignora tudoningum ignora tudoningum ignora tudoningum ignora tudo

    Um princpio que est ligado ao falar a e falar com queningum sabe de tudo, nem ningum ignora tudoningum sabe de tudo, nem ningum ignora tudoningum sabe de tudo, nem ningum ignora tudoningum sabe de tudo, nem ningum ignora tudoningum sabe de tudo, nem ningum ignora tudo. Istoequivale dizer que, em termos humanos, no h nem sabedoriano h nem sabedoriano h nem sabedoriano h nem sabedoriano h nem sabedoriaabsoluta, nem ignorncia absoluta.absoluta, nem ignorncia absoluta.absoluta, nem ignorncia absoluta.absoluta, nem ignorncia absoluta.absoluta, nem ignorncia absoluta.

    Um dia, no Chile, fui discutir com camponeses. Eles estavam

    inibidos para discutir comigo por que eu era doutor. Falei que noera. Peguei um giz, fui ao quadro e propus o seguinte jogo. Faouma pergunta a vocs e se vocs no souberem, eu marco um gol.Em seguida, vocs fazem uma pergunta e se eu no souber, vocsmarcam um gol. Vou dar o primeiro chute. De propsito, pergunteium treco difcil, coisa de intelectual: eu gostaria de saber o quehermenutica socrtica? Ficaram rindo, no sabiam o que era isso.Marquei um ponto para mim. Na vez deles, algum fez uma

    pergunta sobre semeadura. Eu no entendia pipocas! Perdi umponto. Fiz a segunda: o que alienao em Hegel?Dois a um. Mefizeram uma pergunta sobre praga. Foi uma senhora experincia,com empate de 10 a 10. Convenceram-se, no final do jogo, que defato, ningum sabe tudo e ningum sabe nada.

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    elitistamente, para salvar a massa inculta, incompetente, incapaz!Essa uma postura absurda, at porque no cientfica. H umasabedoria que se constitui na massa popular, pela prtica.

    Mas, existe tambm outro equvoco que chamamosbasismobasismobasismobasismobasismo: ou voc est na base, o dia todo, a noite toda, mora l,

    morre l ou no d palpite nunca! Isso conversa fiada, no dcerto! Esse negcio de superestimar a massa popular um elitismos avessas. No h porque fazer isso. Tenho claro que sou intelectualde mo fina. A sociedade burguesa em que me constitui comointelectual no me poderia ter feito diferentemente. Ou a gente humilde para aceitar uma verdade histrica que o nosso limitehistrico ou, nos suicidamos. E eu no vou me suicidar porque dentro dessa contradio que me forjo como um novo tipo deum novo tipo deum novo tipo deum novo tipo deum novo tipo deintelectualintelectualintelectualintelectualintelectual. E tenho uma contribuio a dar a massa popular.

    O fundamental que minha contribuio s vlida, namedida em que sou capaz de partir do nvel em que a massa est e,portanto, aprender com ela. Se no for assim, a contribuio denada vale ou muito pouca. Independente das tcnicas, o que vale o princpio: estar com o povo e no simplesmente para eleestar com o povo e no simplesmente para eleestar com o povo e no simplesmente para eleestar com o povo e no simplesmente para eleestar com o povo e no simplesmente para elee jamais sobre ele. Isso o que caracteriza a posturae jamais sobre ele. Isso o que caracteriza a posturae jamais sobre ele. Isso o que caracteriza a posturae jamais sobre ele. Isso o que caracteriza a posturae jamais sobre ele. Isso o que caracteriza a postura

    libertadora.libertadora.libertadora.libertadora.libertadora.7. Assumir a ingenuidade do educando7. Assumir a ingenuidade do educando7. Assumir a ingenuidade do educando7. Assumir a ingenuidade do educando7. Assumir a ingenuidade do educando

    Outro princpio fundamental acapacidadecapacidadecapacidadecapacidadecapacidade de assumir aingenuidade do educando, seja universitrio ou popular. comuma gente defrontar-se com ingenuidades, com perguntas que a genteno entende. E no entende porque quem faz a pergunta noconsegue fazer. Imaginem que pedagogo seria eu, se ao ouvir uma

    pergunta mal formulada, desorganizada ou sem sentido, eurespondesse com ironia. Que direito teramos ns de dizer quesomos educadores que pensam em liberdade e respeito? s vezes, complicado. Tenho feito assim quando no consigo realmenteentender a pergunta: vou repetir a pergunta; presta ateno pra verse eu no estou distorcendo o esprito da tua pergunta; se eu

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    Se fundamental assumir a ingenuidade do educandoassumir a ingenuidade do educandoassumir a ingenuidade do educandoassumir a ingenuidade do educandoassumir a ingenuidade do educando absolutamente indispensvel assumir a criticidade doindispensvel assumir a criticidade doindispensvel assumir a criticidade doindispensvel assumir a criticidade doindispensvel assumir a criticidade doeducando diante da nossa ingenuidade de educadoreducando diante da nossa ingenuidade de educadoreducando diante da nossa ingenuidade de educadoreducando diante da nossa ingenuidade de educadoreducando diante da nossa ingenuidade de educador. Esse o outro lado da medalha para o educador auto-suficiente. Para eles o educando ingnuo, o educador nunca .No fundo, ingnuo

    o educador porque aingenuidadese caracteriza pelaalienaoalienaoalienaoalienaoalienaode si mesmo ao outro.de si mesmo ao outro.de si mesmo ao outro.de si mesmo ao outro.de si mesmo ao outro. A alienao se faz pela transferncia de siem algum para o outro: eu no sou ingnuo, o outro que ingnuo.Transfiro para ele a minha ingenuidade. S posso criticar,se eu tambm acredito que tambm sou ingnuo; porque no hnenhuma absolutizao da ingenuidade, nem absolutizao dacriticidade. O educador que no faz esse jogo dialtico,contraditrio e dinmico, no trabalha pela libertao.

    8. Educao como ato poltico8. Educao como ato poltico8. Educao como ato poltico8. Educao como ato poltico8. Educao como ato polticoDiscutir esses princpios e posturas pedaggicas, tudo isso

    poltica. A educao tanto um ato poltico, quanto um atoA educao tanto um ato poltico, quanto um atoA educao tanto um ato poltico, quanto um atoA educao tanto um ato poltico, quanto um atoA educao tanto um ato poltico, quanto um atopoltico educativopoltico educativopoltico educativopoltico educativopoltico educativo. No possvel negar, de um lado, apoliticidade da educao e, do outro, a educabilidade do atopoltico. Nesse sentido, todo partido sempre educador. Tudodepende que educao essa que esse partido faz, depende comquem ele est, a favor de que est o educador ou a educadora. Seeducao sempre um ato poltico e a(o) educadore(a)s so serespolticos, importa saber a favor de quem fazemos poltica, quala favor de quem fazemos poltica, quala favor de quem fazemos poltica, quala favor de quem fazemos poltica, quala favor de quem fazemos poltica, qualnossa opo.nossa opo.nossa opo.nossa opo.nossa opo.

    Clareada nossa opo, a gente tem que ser coerente. Porqueno adianta o discurso revolucionrio com uma prticadiscurso revolucionrio com uma prticadiscurso revolucionrio com uma prticadiscurso revolucionrio com uma prticadiscurso revolucionrio com uma prticareacionriareacionriareacionriareacionriareacionria. No adianta participar, uma semana, de um curso

    sobre metodologia popular e, em seguida, ir favela salvar osfavelados com a nossa cincia, em lugar de aprender com osfavelados a cincia deles. No o discurso que diz se a prtica. No o discurso que diz se a prtica. No o discurso que diz se a prtica. No o discurso que diz se a prtica. No o discurso que diz se a prtica vlida; a pratica que diz se o discurso vlido ou no. vlida; a pratica que diz se o discurso vlido ou no. vlida; a pratica que diz se o discurso vlido ou no. vlida; a pratica que diz se o discurso vlido ou no. vlida; a pratica que diz se o discurso vlido ou no.Quem julga sempre a prtica, no o discurso. De nada adiantaum lindo sermo seguido de uma prtica reacionria. De nada

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    9. A marca do autoritarismo9. A marca do autoritarismo9. A marca do autoritarismo9. A marca do autoritarismo9. A marca do autoritarismoNs brasileiros temos que combater, em ns, a marca trgica

    do autoritarismo que vem dos primrdios do nosso nascimento. OOOOOBrasil foi inventado autoritariamente e autoritariamenteBrasil foi inventado autoritariamente e autoritariamenteBrasil foi inventado autoritariamente e autoritariamenteBrasil foi inventado autoritariamente e autoritariamenteBrasil foi inventado autoritariamente e autoritariamentecontinuacontinuacontinuacontinuacontinua. No de espantar que a abertura e a democracia se

    faam de forma autoritria.Pe. Antnio Vieira, num belo sermo, durante a guerra contra

    os holandeses, dizia: em nenhum milagre Cristo gastou mais tempo,nem mais trabalho teve do que em curar o endemoniado mudo. Eesta tem sido a grande enfermidade do nosso Pas: o silncio aosilncio aosilncio aosilncio aosilncio aoqual o povo sempre foi submetido.qual o povo sempre foi submetido.qual o povo sempre foi submetido.qual o povo sempre foi submetido.qual o povo sempre foi submetido. O que Vieira no disse que, neste Pas, quem tem sido mudo a classe popular, as classestrabalhadoras. No so mudas porque no fizeram nada. Elas tmtmtmtmtmfeito sua rebelio constantefeito sua rebelio constantefeito sua rebelio constantefeito sua rebelio constantefeito sua rebelio constante. As lutas populares, neste Pas, tmsido grandiosas! S que a historiografia oficial, primeiro esconde aslutas, quando conta distorce e, por fim, o poder autoritrio faz tudopr gente esquecer.

    Os intelectuais so autoritrios, inclusive quando somos deesquerda. Nosso autoritarismo se transformou na nossa arrogncia,na sabedoria que a gente fala, nas exigncias de leitura que fazemos,

    no nosso comportamento durante os cursos e seminrios. Cita uns40 livros e manda o aluno ler uns 200 captulos a mais do que os40 livros.

    10. Reaprender de novo10. Reaprender de novo10. Reaprender de novo10. Reaprender de novo10. Reaprender de novoSe voc pretende comear um trabalho com grupos

    populares, esquea-se de quase tudo o que lhe ensinaram. Dispa-se, fique nu e comece a se vestir de povo. Esquea-se da falsa

    sabedoria e comece a reaprender de novo. A que a gente descobrea validade do que j se sabe ao testar o que a gente sabe com oque o povo est sabendo.

    Um grupo de jovens fazia uma experincia de alfabetizaonuma comunidade de favelados, durante a construo de umbarraco. Depois sumiram. Quando reapareceram me disseram:

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    de jovens era um pessoal bacana. Tinha lido tudo meu, tinhadiscutido comigo um semestre. Eu tambm fui enrolado pela equipe.O povo queria outra coisa, mas a equipe tinha transferido ao povoa necessidade da alfabetizao. Num Pas de 500 anos dedominao fcil aceitar a insinuao de um intelectual sobre uma

    necessidade.111111. Pacientemente impaciente1. Pacientemente impaciente1. Pacientemente impaciente1. Pacientemente impaciente1. Pacientemente impaciente

    O educador com a opo libertadora tem que viverpacientemente impaciente. Significa viver a relao entre aimpacincia e a pacincia. No possvel viver s impaciente comomuita gente, querer a revoluo para amanh. A impacincia semanifesta, por exemplo, na afirmao as massas j tm o poder, no

    Brasil: s falta o Governo. A impacincia mete na cabea daA impacincia mete na cabea daA impacincia mete na cabea daA impacincia mete na cabea daA impacincia mete na cabea dagente um desenho da realidade que no existegente um desenho da realidade que no existegente um desenho da realidade que no existegente um desenho da realidade que no existegente um desenho da realidade que no existe. S podeexistir na cabea de algum fantasioso, no na realidade econmica,poltica e social do Brasil..... A impacincia significa a rupturaA impacincia significa a rupturaA impacincia significa a rupturaA impacincia significa a rupturaA impacincia significa a rupturacom a pacinciacom a pacinciacom a pacinciacom a pacinciacom a pacincia. Romper com um desses plos, romper emfavor de um deles.

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    MST- CADERNODEFORMAO22

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    II.

    A RETOMADADO

    TRABALHODEBASE- Ranulfo Peloso -

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    AAAAABERTURABERTURABERTURABERTURABERTURA

    Achavam-se agrupados e presos terra por uma raiz comum,como uma moita de bambu. E como esse vegetal, inclinavam-se e dobravam-se. Mas, sobreviviam s maiorestempestades

    Uma marca da organizao popular seu enraizamento navida da populao, animando e organizando os trabalhadores nabusca de soluo para seus problemas. O antigo e permanentesonho da humanidade de repartir o po e o poderrepartir o po e o poderrepartir o po e o poderrepartir o po e o poderrepartir o po e o poder, passa peladerrubada da velha pirmidederrubada da velha pirmidederrubada da velha pirmidederrubada da velha pirmidederrubada da velha pirmidee a construo de uma sociedade

    sem dominao.A luta e a organizao popular, para romper aprticaprticaprticaprticaprtica da classedominante,dominante,dominante,dominante,dominante, articula-se, desde a base, para estarpresente,presente,presente,presente,presente, todos os dias, l onde acontece aluta pela Vluta pela Vluta pela Vluta pela Vluta pela Vidaidaidaidaida. Essetrabalho exige vontade poltica, dedicao, tempo, pessoas erecursos. Se a elite manda porque o povo aprendeu a ficar caladoe a obedecer ao chefe de planto. O trabalho de base , ento, essaconvico profunda que se dispe a superar a cultura autoritriacultura autoritriacultura autoritriacultura autoritriacultura autoritriae oe oe oe oe o personalismopersonalismopersonalismopersonalismopersonalismoe contribuir para que o povo seja protagonistaprotagonistaprotagonistaprotagonistaprotagonista

    e tome a direo da barcadireo da barcadireo da barcadireo da barcadireo da barca.

    1. Um pouco de histria1. Um pouco de histria1. Um pouco de histria1. Um pouco de histria1. Um pouco de histria

    Cada um de ns constri a prpria histria e cada ser em sicarrega o dom de ser capaz e de ser feliz

    O Brasil nasceu como colnia dos pases ricos. Reis e rainhastornaram-se dono(a)s das terras, das riquezas e da vida das pessoas.Quem resistiu foi perseguido(a) e, muitas vezes, destrudo(a). Essadominao gerou uma cultura autoritria e, no povo, a mentalidadede escravo onde as pessoas se tornam passivas, sempre esperando

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    com os prprios ps. A resistncia popular significou luta eorganizao para reivindicar direitos. Nos anos 60, mais gentedescobriu que podia ser dona do seu nariz e participar. Noaceitaram ser coisa, nem ser usada como massa de manobra.Quiseram ter voz ativa e no seu destino mandar. A cultura popular,

    a participao popular levando conscincia de ser sujeito fez ostrabalhadores pensar tambm no poder popular A, veio a ditaduramilitar de 64, prendendo, torturando e matando. Mas, o sonhode ser livre e feliz coletivamente continuou nos bastidores. Durantemuitos anos, num paciente trabalho de base, a luta se multiplicou ecriou razes em muitos espaos. No final dos anos 70, o fogo quequeimava por baixo, explodiu em movimentos nos quatro cantosdo Pas. Nesses anos de chumbo, muita gente, no campo e na

    cidade, foi atingida pelo trabalho dedicado de milhares de militantes.Esse esforo teceu uma imensa rede de resistncia e de esperanacontra a dominao e pelo direito de ter vez e voz e contribuiupara o fim da ditadura militar.

    Nos anos 80, o campo popular reconstruiu suasreconstruiu suasreconstruiu suasreconstruiu suasreconstruiu suasferramentasferramentasferramentasferramentasferramentas de luta (sindicatos, partidos, associaes) e atinventou novas formasinventou novas formasinventou novas formasinventou novas formasinventou novas formas de juntar e canalizar a indignao e

    anseios da classe trabalhadoraclasse trabalhadoraclasse trabalhadoraclasse trabalhadoraclasse trabalhadora (movimentos, fruns, entidades).Esse processo de luta e organizao conseguiu recuperarEsse processo de luta e organizao conseguiu recuperarEsse processo de luta e organizao conseguiu recuperarEsse processo de luta e organizao conseguiu recuperarEsse processo de luta e organizao conseguiu recuperare conquistar muitos direitos. No campo eleitoral, as forase conquistar muitos direitos. No campo eleitoral, as forase conquistar muitos direitos. No campo eleitoral, as forase conquistar muitos direitos. No campo eleitoral, as forase conquistar muitos direitos. No campo eleitoral, as foraspopulares disputaram espaos no legislativo epopulares disputaram espaos no legislativo epopulares disputaram espaos no legislativo epopulares disputaram espaos no legislativo epopulares disputaram espaos no legislativo eadministrao pblica e, quase elegeu seu candidato administrao pblica e, quase elegeu seu candidato administrao pblica e, quase elegeu seu candidato administrao pblica e, quase elegeu seu candidato administrao pblica e, quase elegeu seu candidato presidncia do Brasil.presidncia do Brasil.presidncia do Brasil.presidncia do Brasil.presidncia do Brasil.

    Os anos 90Os anos 90Os anos 90Os anos 90Os anos 90 trouxeram grandes mudanas na economia,mudanas na economia,mudanas na economia,mudanas na economia,mudanas na economia,na poltica e na disputa das idias, em todo o mundo. A queda doqueda doqueda doqueda doqueda do

    muromuromuromuromuro representou a nova ofensiva do capitalismonova ofensiva do capitalismonova ofensiva do capitalismonova ofensiva do capitalismonova ofensiva do capitalismo e reveloumuitas fragilidades na prtica socialistafragilidades na prtica socialistafragilidades na prtica socialistafragilidades na prtica socialistafragilidades na prtica socialista. O ideal dacompetio individualcompetio individualcompetio individualcompetio individualcompetio individual, a qualquer preo, desafiou o projeto einiciativas da solidariedadesolidariedadesolidariedadesolidariedadesolidariedade. Para o campo popular foi um tempotempotempotempotempode derrotas, de sofrimento e de baixasde derrotas, de sofrimento e de baixasde derrotas, de sofrimento e de baixasde derrotas, de sofrimento e de baixasde derrotas, de sofrimento e de baixas: teve militante qued i t l d d

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    internacional do capital e falncia. O Estado abandonou suafuno social (educao, sade, segurana) para servir aos interessesdas grandes empresas. O resultado foi uma maior concentrao dasriquezas, desemprego em massa, violncia e misria da populao a excluso econmica, poltica e social.

    Em 2002, num acordo silencioso, a populao esgotada pelaspolticas neo-liberais, a esquerda propondo um grande arco dealianas eleitoral e a direita feliz porque mantinha o controle dasituao, elegeram Lula para presidente, depois da quarta tentativa.No incio, houve euforia porque a esperana teria vencido o medoe um operrio na presidncia brilhava como um sinal de que opovo deve e pode desejar o poder.

    A escolha do ministrio j assustou muita gente que, sem

    querer ler aCarta aos Brasileiros, preferia considerar um governoum governoum governoum governoum governoem disputaem disputaem disputaem disputaem disputa. Com seis meses veio a perplexidade ningumacreditava no que estava vendo: continuar o projeto da elitedominante de integrarintegrarintegrarintegrarintegrar-se-se-se-se-se de forma subordinada globalizaodo mercado capitalista,seguindo a mesma poltica econmica erespeitando todos os contratoscontratoscontratoscontratoscontratos lesivos aos interesses populares(barragens, agronegcio, entrega do patrimnio pblico. Para opovo polticas compensatrias em vez de polticas sociais (emprego,reforma agrria, sade, educao). Veio o desnimo para uns e acrena de que tudo isso no passava de um perodo de transioperodo de transioperodo de transioperodo de transioperodo de transiopara outros.

    Com um ano acabou a desiluso. Era um governo igual aosoutros defendia a estabilidade do capitalestabilidade do capitalestabilidade do capitalestabilidade do capitalestabilidade do capital, a mudana dentrodainstitucionalidadeinstitucionalidadeinstitucionalidadeinstitucionalidadeinstitucionalidade e alianas a qualquer preo, desde quegarantissem a governabilidadegovernabilidadegovernabilidadegovernabilidadegovernabilidade. Embora toda essa crise tenha sido

    um remdio amargo, despertou a militncia agora que ficava rfde um messiasque no salva, redescobria que o poder no est nogoverno, nem no estado, mas no prprio povo. Era urgente adotaruma estratgia de recuo organizadorecuo organizadorecuo organizadorecuo organizadorecuo organizado para recompor e acumularsuas foras contra a explorao com, sem, ou se for o caso,contrao governo. Para isso, a militncia, com redobrado vigor, deveriam

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    2. R2. R2. R2. R2. RETOMARETOMARETOMARETOMARETOMAR OOOOO TRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHO DEDEDEDEDE BASEBASEBASEBASEBASE

    Gente no boi de carro, pro carro de boi puxar;Gente temmente que gira, mente que pode girar;Gira a mente do carreiro e a canga

    pode quebrar.

    Retomar o trabalho de baseRetomar o trabalho de baseRetomar o trabalho de baseRetomar o trabalho de baseRetomar o trabalho de base no a repetio saudosade prticas e atividades do passado. Tambm no o basismobasismobasismobasismobasismoquetrata o povo como menorincompetenteou elogiando suas aesespontneas. (Basismo uma forma disfarada deautoritarismoporque mantm a base dependente). Retomar o trabalho de base o resgatem de uma estratgiao resgatem de uma estratgiao resgatem de uma estratgiao resgatem de uma estratgiao resgatem de uma estratgia de um caminho de luta e

    organizao que envolve os prprios interessadosenvolve os prprios interessadosenvolve os prprios interessadosenvolve os prprios interessadosenvolve os prprios interessados noconhecimento e soluo dos desafios individuais e coletivos.

    O Trabalho de Base reafirma objetivos como:

    1. Participao massiva dos trabalhadoresParticipao massiva dos trabalhadoresParticipao massiva dos trabalhadoresParticipao massiva dos trabalhadoresParticipao massiva dos trabalhadores - As elites notm medo de lideranas que se destacam. Para elas fcil isolar,destruir, comprar algumas cabeas que sobressaem.

    MultiplicarMultiplicarMultiplicarMultiplicarMultiplicar militantes e aes o que mete medo em todosaqueles que se acostumaram com a prtica da dominao. Porisso,multiplicarmultiplicarmultiplicarmultiplicarmultiplicar combatentes deve invadir todos os espaosda vida (trabalho, poltica, cultura, religio, lazer) e se tornaruma rede de animao, de resistncia e de vitrias. O trabalhode base condio e sustento do trabalho de massatrabalho de massatrabalho de massatrabalho de massatrabalho de massa; otrabalho de massa a expresso e a conseqncia dotrabalhotrabalhotrabalhotrabalhotrabalhode base.de base.de base.de base.de base.

    2 .2.2 .2.2 . Democratizao do poderDemocratizao do poderDemocratizao do poderDemocratizao do poderDemocratizao do poder - Participar do poder ser capazde fazer propostas, de tomar decises e de repartirresponsabilidades para concretizar o sonho da classe oprimida.O trabalho de base, enquanto experincia de novanovanovanovanovaconvivnciaconvivnciaconvivnciaconvivnciaconvivncia entre pessoas, pode ser escola de participao

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    3.3 .3 .3 .3. Construo socialistaConstruo socialistaConstruo socialistaConstruo socialistaConstruo socialista - A finalidade da luta a realizar o sonhodo mundo novo, livre de todas formas de opresso e com apossibilidade realpossibilidade realpossibilidade realpossibilidade realpossibilidade real de satisfazer os anseios materiais eanseios materiais eanseios materiais eanseios materiais eanseios materiais eespirituaisespirituaisespirituaisespirituaisespirituais das pessoas. Isto ser possvel quando a produo,distribuio e consumo forem feitos de forma solidria. Este

    projeto implica, desde agora, em uma nova relao entre osuma nova relao entre osuma nova relao entre osuma nova relao entre osuma nova relao entre oshumanos e com a naturezahumanos e com a naturezahumanos e com a naturezahumanos e com a naturezahumanos e com a natureza, sem dominao, semcompetio, sem preconceitos e sem destruio.

    A finalidade do trabalho de baseA finalidade do trabalho de baseA finalidade do trabalho de baseA finalidade do trabalho de baseA finalidade do trabalho de base

    A prtica multiplicadora do trabalho de baseprtica multiplicadora do trabalho de baseprtica multiplicadora do trabalho de baseprtica multiplicadora do trabalho de baseprtica multiplicadora do trabalho de base que podese dar nas favelas e nas ocupaes de terra, nas fbricas e nas igrejas,nos espaos estatais e fruns internacionais. Ela se sustentasustentasustentasustentasustenta quandomantm os ps no cho e a cabea nos sonhos.Consegue vitriasquando articula as lutas econmicas com a luta poltica, social,cultural, ... Perdura, em qualquer conjuntura, quando combinaaes de rebeldia com as disputas na legalidade. Sua finalidadepermanente :* anunciar a convivncia solidriaanunciar a convivncia solidriaanunciar a convivncia solidriaanunciar a convivncia solidriaanunciar a convivncia solidria como alternativa

    ganncia, competio e dominao. Quanto maior a

    opresso e a crise, maior a razo para propagar o sonho dasociedade sem classes.

    * Despertar a dignidadeDespertar a dignidadeDespertar a dignidadeDespertar a dignidadeDespertar a dignidade das pessoas e a confiana nos seusvalores e no seu potencial.A pessoa se torna feliz e perigosaquando comea a ser protagonista e andar com os prpriosandar com os prpriosandar com os prpriosandar com os prpriosandar com os prpriospspspspsps.

    * Canalizar a rebeldia popularCanalizar a rebeldia popularCanalizar a rebeldia popularCanalizar a rebeldia popularCanalizar a rebeldia popular contra a injustia e construir,

    desde j, a sociedadede homens novos e mulheres novasondea produo, distribuio e consumo sejam orientados pela lgicada solidariedade.

    * TTTTTransformar a realidaderansformar a realidaderansformar a realidaderansformar a realidaderansformar a realidade e conseguir vitrias em todos oscampos e as dimenses para satisfazer os justos anseios da

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    3. O3. O3. O3. O3. O QUEQUEQUEQUEQUE TRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHO DEDEDEDEDE BASEBASEBASEBASEBASE?????

    F na vida, f na gente, f no que virNs podemos tudo, ns podemos mais.

    Vamos l fazer o que ser.

    A garantia de um projeto depende do trabalho que lhe dtrabalho que lhe dtrabalho que lhe dtrabalho que lhe dtrabalho que lhe dsustentaosustentaosustentaosustentaosustentao. Isso vale para futebol, campanha eleitoral, trabalhopastoral e para a organizao popular. Mas, ser que o pensamentoou o objetivo o mesmo na cabea do tcnico de futebol, docandidato, do agente religioso e da liderana popular?

    O que baseO que baseO que baseO que baseO que base?Base quer dizer fundamento, alicerce, sustentao,Base quer dizer fundamento, alicerce, sustentao,Base quer dizer fundamento, alicerce, sustentao,Base quer dizer fundamento, alicerce, sustentao,Base quer dizer fundamento, alicerce, sustentao,

    incio, parte indispensvelincio, parte indispensvelincio, parte indispensvelincio, parte indispensvelincio, parte indispensvel. Na origem da palavra base osignificado andar sobre os prprios ps. Na histria do MovimentoPopular, a palavra base foi juntando vrios significados, umcompletando o outro. base da pirmidebase da pirmidebase da pirmidebase da pirmidebase da pirmide nasce de uma anlise da sociedade

    capitalista, dividida em classes, onde a classe trabalhadoraproduz as riquezas e a classe proprietria (das terras, fbricas,bancos...) se apodera dos frutos do trabalho. Nesse modo dever quem trabalha abase do mundo. Ao descobrir a fora quetm, pode derrubar a velha pirmide e organizar uma sociedadesem opresso.

    comunidade de basecomunidade de basecomunidade de basecomunidade de basecomunidade de base Nasceu com a experincia da

    populao se mexendo para resolver um problema concretode um bairro ou localidade (luz, gua, asfalto, sade, festa).Tomou fora com as CEBs que levou os cristos ao compromissosocial, a partir da sua f evanglica.

    categoria profissionalcategoria profissionalcategoria profissionalcategoria profissionalcategoria profissional Na reconstruo das organizaespopulares sobretudo os sindicatos a palavra base passou a

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    processo de construo de uma sociedade solidria. Qualquerpessoa, no importa a origem, pode ser base desse projetopoltico alternativo ao capitalismo.

    Base Base Base Base Base o povo o povo o povo o povo o povo que produz as riquezas e explorado emanipulado pelas elites dominantes, em todos os espaos.Significa comeocomeocomeocomeocomeo, sustentaosustentaosustentaosustentaosustentao, algo indispensvelindispensvelindispensvelindispensvelindispensvel que nopode faltar. Mas, , sobretudo, aquela parte da classeparte da classeparte da classeparte da classeparte da classeoprimidaoprimidaoprimidaoprimidaoprimida que se dispe e dar sustentaosustentaosustentaosustentaosustentao a um processoprocessoprocessoprocessoprocessode mudanade mudanade mudanade mudanade mudana, sempre.

    A fora do trabalho de base est:A fora do trabalho de base est:A fora do trabalho de base est:A fora do trabalho de base est:A fora do trabalho de base est:

    Na sustentao de basesustentao de basesustentao de basesustentao de basesustentao de base - tem razesrazesrazesrazesrazes plantadas na alma daalma daalma daalma daalma dapopulaopopulaopopulaopopulaopopulao que a base da sociedade. Por causa desse alicercesempre renasce e se reproduz. No um movimentopara aclasse oprimida. Ao contrrio ela precisa ser parteser parteser parteser parteser parte ecompanheira dessa construo superando o vcio dadependncia e contribuindo com sua disposio, idias erecursos financeiros.

    Na crena no povoNa crena no povoNa crena no povoNa crena no povoNa crena no povo A razo do trabalho de base ajudar opovo a entender e se comprometer com a vida feliz e solidria.Parte da certeza que o povo j luta porque precisao povo j luta porque precisao povo j luta porque precisao povo j luta porque precisao povo j luta porque precisasobreviversobreviversobreviversobreviversobreviver e reage contra a explorao, mesmo quando nofala a linguagem da militncia ou entra em becos que soarmadilhas. A histria mostra que, apesar de toda misria e todacontradio, o povo foi a sementeira permanentesementeira permanentesementeira permanentesementeira permanentesementeira permanente de novas

    formas de lutae demilitantes. Na clarezaclarezaclarezaclarezaclareza que a organizao popular, sendo uma parte, devedevedevedevedeve

    ser umaser umaser umaser umaser uma parte para incluir o todoparte para incluir o todoparte para incluir o todoparte para incluir o todoparte para incluir o todo. As direes ajudam opovo a entender a realidade e organizar os esforos, no rumoda transformao. No processo, o povo deve assumir-se como

    j i d hi i

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    Na metodologia multiplicadorametodologia multiplicadorametodologia multiplicadorametodologia multiplicadorametodologia multiplicadora. Cada pessoa convencidacompromete-se em mobilizar um novo time de militantes que,por sua vez, vai repartir os esclarecimentos e experincias comoutras pessoas, em muitos espaos de luta, de vida e de trabalho.

    No planejamento das aesplanejamento das aesplanejamento das aesplanejamento das aesplanejamento das aes - Na luta popular, como no

    futebol, o objetivo no s chutar a bola. preciso avanar e sedefender organizadamente, na hora certa e com a pessoa certa.Por isso, marca-se pontos e prazos de chegada; faz-se umacaprichada preparao dos militantes; escolhe-se responsveispelas atividades; realiza-se um balano dos resultados, em cadaetapa da luta.

    No amor pelo povo e pela vida.amor pelo povo e pela vida.amor pelo povo e pela vida.amor pelo povo e pela vida.amor pelo povo e pela vida.O trabalho de base um

    trabalho profissional, mas tem um segredo que anima aesperanada militncia e que a alimenta at doao da prpriavida. A vida,vida,vida,vida,vida, a dignidade, a liberdade das pessoasdignidade, a liberdade das pessoasdignidade, a liberdade das pessoasdignidade, a liberdade das pessoasdignidade, a liberdade das pessoas e afraternidade universalfraternidade universalfraternidade universalfraternidade universalfraternidade universal formam a base dessa paixo que invadesua alma e d sentido sua e dedicao. Tal convico se traduzno respeito ao povo, no carinho aos iniciantes, no cumprimentodos acertos coletivos, na capacidade de tomar iniciativas, nacoragem de encarar os desafios e nos gestos de indignao,

    entusiasmo e celebrao. Mas, se expressa, de maneira plena,nas manifestaes individuais e coletivas de companheirismo.companheirismo.companheirismo.companheirismo.companheirismo.

    Eficincia e eficcia do Trabalho de BaseEficincia e eficcia do Trabalho de BaseEficincia e eficcia do Trabalho de BaseEficincia e eficcia do Trabalho de BaseEficincia e eficcia do Trabalho de Base

    Uma atividade eficiente bem realizada pode at gerara euforia do participativo. Mas, seria uma prtica to autoritriaquanto imposio. Mas, pode tornar-se eficaz til quer

    dizer, ajuda a pessoas e grupos a serem protagonistas natransformao da realidade. Uma experincia popular eficaz: Quando animae apaixona as pessoas, resgatando sua identidade

    e dignidade (autoestima) e a postura de protagonista, gentecapaz de andar com os prprios ps.

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    Quando qualifica militantes e educadore(a)s umareproduo criativa, que se assume como parte e se tornammultiplicadore(a)s.

    Quando canaliza as lutas de emancipao para um projeto,alternativo incluso capitalista,onde no h lugar para a

    classe oprimida e onde o caminho a competio entresuperiores e inferiores.

    4. COMOFAZEROTRABALHODEBASE

    F na vida, f na gente, f no que vir; ns podemostudo, ns podemos mais.

    O trabalho de base no tem receitatrabalho de base no tem receitatrabalho de base no tem receitatrabalho de base no tem receitatrabalho de base no tem receita pronta e infalvel.Mas, olhando vrias experincias, possvel descobrir vrios pontosem comum:1.1 .1 .1 .1. Quem comeaQuem comeaQuem comeaQuem comeaQuem comea - Qualquer pessoa que desperta comea a ficar

    insatisfeita com a explorao. Essa revolta logo descobre queno basta se queixar das injustias e que no possvel sozinhoacabar com a opresso. A luta pela comea com as pessoas quese dispem a entrar num processo coletivo de luta pelatransformao. Para isso, elas precisam ter a convico quetodatodatodatodatodapessoapessoapessoapessoapessoa tm o dom de ser capaz, que desenvolvem talentosdiferentes, podem trocar saberes,,,,, mas s aclasse oprimida classe oprimida classe oprimida classe oprimida classe oprimida capaz de libertarcapaz de libertarcapaz de libertarcapaz de libertarcapaz de libertar-se-se-se-se-se e adotaa postura de respeito -a postura de respeito -a postura de respeito -a postura de respeito -a postura de respeito - semprecomcomcomcomcom, nunca paraparaparaparaparaou sobresobresobresobresobreas pessoas.

    2 .2 .2 .2 .2. Onde comearOnde comearOnde comearOnde comearOnde comear - A luta acontece l onde est a classe oprimida:na fbrica, bairro, escola, municpio, nos movimentos. Pode serum grupo de mulheres, adolescentes, de cultura... Qualquerlugar, na cidade ou no campo; at a priso j foi lugar onde amilitncia fez seu posto de luta. O melhor escolher ogrupo

    l di d lh i fl i

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    3.3.3 .3.3 . O ncleo de militantesO ncleo de militantesO ncleo de militantesO ncleo de militantesO ncleo de militantes uma primeira tarefa do Trabalho deBase que no pode faltar formao de um timetimetimetimetime de pessoascom um mnimo de compreensocompreensocompreensocompreensocompreenso eeeee disposiodisposiodisposiodisposiodisposiopara entrarnum processo. bom ter gente nova de idade e degente nova de idade e degente nova de idade e degente nova de idade e degente nova de idade e dementalidade.mentalidade.mentalidade.mentalidade.mentalidade. Pessoas novas esto mais abertas e livres para

    encarar uma caminhada.A escolha cautelosa baseada nabaseada nabaseada nabaseada nabaseada naconfianaconfianaconfianaconfianaconfiana precisa ter algumas qualidadesqualidadesqualidadesqualidadesqualidades fundamentais:pessoas que no aceitam ser manobradas, que vo alm do seuinteresse individual, que so discretas (no falam dos assuntospara quem no est interessado ou contra). esse grupo quedeve fazer uma preparao caprichada pensar o plano detrabalho, os primeiros contatos, os recursos necessrios, aescolha do lugar, o tempo de comear, o jeito de aproximao

    ... tambm o coletivo que vai avaliar permanentemente acoerncia entre o que foi dito e o que est sendo feito, pararetificar o dito ou o feito a partir do objetivo central.

    4 .4.4 .4.4 . O conhecimento da realidadeO conhecimento da realidadeO conhecimento da realidadeO conhecimento da realidadeO conhecimento da realidade - As informaes nascem daobservao, conversas, visitas, pesquisas. Conhecer e serconhecido exige o aprendizado da lngua do grupo parafavorecer aaaaa integrao eintegrao eintegrao eintegrao eintegrao e aaaaatroca.troca.troca.troca.troca. A condio ter a confiana

    se dar com a populao, no ser um estranho. Entre asInformaes que no podem faltar esto:

    as que tratam da quantidadeas que tratam da quantidadeas que tratam da quantidadeas que tratam da quantidadeas que tratam da quantidadede pessoas, volume da produo,renda, grupos que oprimem a populao ou que esto a seu favor;

    as carncias e o potencial da populao -as carncias e o potencial da populao -as carncias e o potencial da populao -as carncias e o potencial da populao -as carncias e o potencial da populao - as riquezas evalores econmicos, artsticos e culturais, bem como suasnecessidades.

    as que revelam os desejos, fantasiass que revelam os desejos, fantasiass que revelam os desejos, fantasiass que revelam os desejos, fantasiass que revelam os desejos, fantasias e projetose projetose projetose projetose projetosdas pessoasdas pessoasdas pessoasdas pessoasdas pessoas- Em geral, os sentimentos movem as pessoas: sentindo-sereconhecidas, tambm se dispem a participar;

    as histrias de resistnciaas histrias de resistnciaas histrias de resistnciaas histrias de resistnciaas histrias de resistncia - o ser humano protesta de formaindividual ou grupal, escondida ou aberta, espontnea ou

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    comuns e dicasdicasdicasdicasdicas para o tipo de ao e de organizao. essencial envolver as pessoas interessadas na coleta dos dadose apreciao dos resultados; elas devem ser as primeirasinteressadas em tomar conscincia do que est acontecendo.

    5. Fazer aes concretaFazer aes concretaFazer aes concretaFazer aes concretaFazer aes concretasssss Os dados da realidade podem

    sugerir propostas concretas de ao. A militncia tem quesacarsacarsacarsacarsacar:a) o que o povo est a fim de fazer para realizar seus desejos; b)a ao onde o grupo vai participar e no ficar assistindo na platiac) a ao que estdentro da compreenso, momento e ritmoque o grupo suporta. Pode ser um jogo, festa, celebrao, mas,tambm um protesto, um mutiro, uma disputa poltica. Amilitncia tem obrigao de sugerir propostas. No pode imporNo pode imporNo pode imporNo pode imporNo pode imporporque aes no assumidas geram acomodao e frustrao.

    decisivo que as primeiras aes dem certo. So asvitriasvitriasvitriasvitriasvitriasque animam a vontade de continuaranimam a vontade de continuaranimam a vontade de continuaranimam a vontade de continuaranimam a vontade de continuar. As derrotas, em geral,aumentam o sentimento de fraqueza e de impotncia. Uma aopuxa outra quando preparada e quando, depois de executada, avaliada para ver os avanos e recuos. Fazer aes e refletirFazer aes e refletirFazer aes e refletirFazer aes e refletirFazer aes e refletirsobre elassobre elassobre elassobre elassobre elastem sido a grande escola onde a militncia e o povose capacita e se forma.

    6 .6 .6 .6 .6. A militnciaA militnciaA militnciaA militnciaA militncia O povo foi acostumado a votar em gente quepromete, fala bonito, estudada e quietinha..... Mas, a mili-mili-mili-mili-mili-tncia deve ser escolhida por mritotncia deve ser escolhida por mritotncia deve ser escolhida por mritotncia deve ser escolhida por mritotncia deve ser escolhida por mrito como reconhecimentode algumas qualidades: a) sua ligaosua ligaosua ligaosua ligaosua ligao profunda eprofunda eprofunda eprofunda eprofunda epermanentepermanentepermanentepermanentepermanentecom o povocom o povocom o povocom o povocom o povo,,,,, sua vida, seus anseios e suas lutas;;;;;b) seu compromisso com a transformaoseu compromisso com a transformaoseu compromisso com a transformaoseu compromisso com a transformaoseu compromisso com a transformao das pessoas eda sociedade;;;;; c) sua capacidade de fazer propostas justas,sua capacidade de fazer propostas justas,sua capacidade de fazer propostas justas,sua capacidade de fazer propostas justas,sua capacidade de fazer propostas justas,

    principalmente nos momentos difceis;;;;; d) seu jeito paraseu jeito paraseu jeito paraseu jeito paraseu jeito paraorororororganizar o povo,ganizar o povo,ganizar o povo,ganizar o povo,ganizar o povo,de democratizar o poder, de compartilhare de comcomcomcomcomandar. tarefa da militnciamilitnciamilitnciamilitnciamilitncia preparar outros militantes.A militncia que interessaA militncia que interessaA militncia que interessaA militncia que interessaA militncia que interessa ao trabalho de base aquela queune seu interesseune seu interesseune seu interesseune seu interesseune seu interesse individual com os interesses do grupointeresses do grupointeresses do grupointeresses do grupointeresses do grupo.

    l

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    8.8.8 .8.8 . DirigentesDirigentesDirigentesDirigentesDirigentes - Em todo grupo, mesmo quando a pessoasparticipantes so conscientes, h pessoas que se destacam e setornam refernciasrefernciasrefernciasrefernciasreferncias. No se deve confundir direodireodireodireodireo comdiretoria.diretoria.diretoria.diretoria.diretoria. Diretoria um mandato que se ganha no votovotovotovotovoto,mesmo se as pessoas no tm preparo nem compromisso com

    o povo. A referncia, mais que privilgio, uma tarefa da luta,tarefa da luta,tarefa da luta,tarefa da luta,tarefa da luta,uma tarefa coletivauma tarefa coletivauma tarefa coletivauma tarefa coletivauma tarefa coletiva de coordenao das aes para ofuncionamento do trabalho. Dentro de um grupo, outras pessoasvo ter outras funes, conforme o momento e a suacompetncia.

    J houve gente que se aproveitou docargocargocargocargocargo de dirigente paraseu interesse individual. Uma direo popular nunca poderiaexercer sua misso de forma autoritria e personalista (comofazem os coronisda elite). Muito menos para dominar a maioriadesinformada.

    9 .9.9 .9.9 . AutonomiaAutonomiaAutonomiaAutonomiaAutonomia - No trabalho de base os trabalhadores e suasorganizaes no podem ficar dependentes de uma assessoriaou de um chefe.Sem independncia econmica e poltica, ostrabalhadores se tornam massa de manobra.Sem formaopoltica, sem recursos financeiros para as atividades, sem o

    conhecimento das tcnicas - como fazer uma reunio, falar empblico, operar uma mquina, fazer um plantio, organizar umamobilizao, administrar recursos, elaborar material pedaggico a classe oprimida vai continuar de rabo preso. (Uma assessoriaassessoriaassessoriaassessoriaassessoriamilitantemilitantemilitantemilitantemilitante e competente contribui na capacitao do(a)strabalhadore(a)s para que se tornem sujeitos e protagonistas daluta popular). Para ter independncia preciso coragem econdies de andar com os prprios psandar com os prprios psandar com os prprios psandar com os prprios psandar com os prprios ps. Desde o incio, ostrabalhadores devem ser envolvidos na sustentao de suasatividades e competentes numa tarefa da luta e da organizao.

    10.10.10.10.10. Criao de um movimentoCriao de um movimentoCriao de um movimentoCriao de um movimentoCriao de um movimento No trabalho de base todaao deve virar processo. E um processo que realiza muitasaes apresenta idias novas e rene muitas pessoas acaba

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    Com a participao da militncia o trabalho de base deveorganizar os princpios e valores para a orientao de quem jparticipa ou venha a participar do grupo. Infelizmente, muitagente ou organizao, quando se tornou importante, agarrou-se nos cargos ou a fama, esquecendo-se que no povo que

    est a fora. Para evitar esses desvios, os movimentos se previnemrenovando, de tempos em tempos, o pessoal que recebe cargos.Outra vacina contra o perigo de corrupoperigo de corrupoperigo de corrupoperigo de corrupoperigo de corrupo exigir que cadamilitante assuma uma tarefa concreta junto a uma luta direta.

    Uma organizao popular nasce para juntar pessoas, tornar-seuma ferramenta de luta permanente e ser uma escola depreparao de novo(a)s companheiro(a)s. Umaorororororganizao,ganizao,ganizao,ganizao,ganizao,em si mesma,em si mesma,em si mesma,em si mesma,em si mesma, nunca pode tornarnunca pode tornarnunca pode tornarnunca pode tornarnunca pode tornar-se o-se o-se o-se o-se o centro da lutacentro da lutacentro da lutacentro da lutacentro da luta. Ocentro da luta movimento real da classe oprimida na luta paraderrotar a opresso e construir uma nova humanidade, criandonovos homens e novas mulherescom dignidade

    111111.1.1.1.1. Formao polticaFormao polticaFormao polticaFormao polticaFormao poltica - A formao uma necessidade de quemluta pela vida. S o entusiasmo e a fora so insuficientes paravencer o poder da opresso. A classe oprimida precisa juntarsua fora, pensamentosua fora, pensamentosua fora, pensamentosua fora, pensamentosua fora, pensamento e espertezaespertezaespertezaespertezaesperteza para vencer a

    dominao. Mais do que ningum, deve saber como desmontaro sistema capitalista e apontar solues para os problemas dopovo. fcil derrotar quem no estuda, quem no pra parapensar. triste saber que muitosestudados no entram na luta,mas imperdovel que uma pessoa lutadora no estude, nosejaintelectual.

    EstudarEstudarEstudarEstudarEstudar significa entender o que est acontecendo consigo e

    com os outros e buscar soluo. Isso exige reflexo sobre aprpria experincia e sobre a experincia histrica da classetrabalhadora, apropriando-se dos conhecimentos acumulados.Formar-se no fazer cursos, nem encher a cabea deinformaes. estar capacitado para descobrir respostas paraos problemas que afligem o povo hoje Assim formao no

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    acompanhar um plano de formao. So muitas as atividadesde formao: a preparao, execuo e balano de uma ao,por exemplo. Mas, tambm os seminrios, cursos, debates,viagens, leituras, reunies, treinamentos, o esforo para contara prpria histria e a formulao de propostas. A formaoformaoformaoformaoformao

    polticapolticapolticapolticapoltica deve vir junto com a capacitao tcnicacapacitao tcnicacapacitao tcnicacapacitao tcnicacapacitao tcnica: comofazer uma reunio, escrever um relatrio, falar em pblico,administrar uma cooperativa, operar uma mquina, fazer umjornal...

    12.12.12.12.12. Evitar o isolamento, articulaoEvitar o isolamento, articulaoEvitar o isolamento, articulaoEvitar o isolamento, articulaoEvitar o isolamento, articulao Os donos do mundonos dividem para continuar reinando. verdade que no temosa mesma cor, o mesmo lugar de nascimento, a mesma religio,o mesmo sexo, o mesmo time de futebol, nem o mesmo gosto.Mas, ao mesmo tempo que se deve reconhecer e respeitar asdiferenas, no pode esquecer os interesses e dificuldades queso comuns eque nos uneque nos uneque nos uneque nos uneque nos une.

    Em toda parte, tem gente (organizada ou no) lutando contra ainjustia. O trabalho de base se fortalece quando se liga apessoas e grupos que vo no mesmo rumo. A articulaoarticulaoarticulaoarticulaoarticulaofacilita a troca de experincias e a realizao de aes conjuntas.

    Quando um movimento se achadono da verdadedono da verdadedono da verdadedono da verdadedono da verdade, torna-searrogante e vira uma seita fcil de ser destruda. Mas, a busca deparceria no pode ser a prtica de usar as pessoas s na hora doaperto, interessados no que elas podem dar em termos materiais.

    Parceria a descoberta que ningum pode fazer tudo, no obrigado a saber tudo e nem pode ser especialista em tudo; acrena no valor da troca de competncias, no poder de fogo da

    ao conjunta e na soma dos recursos disponveis. Ento,parceriaparceriaparceriaparceriaparceria no significa abrir mo da prpria convico, nemser o brao tarefeirode um projeto que no se ajudou a pensarou que se ajuntou s por interesse de alguns trocados. A parceria aunio de esforos para atingir objetivos que esto na mesmadireo

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    pblico pode ser um espao de disputa contra a opresso,quando se tem clareza do projeto popular e se garante aindependncia dos movimentos populares. Nos momentos deenfraquecimento da resistncia popular necessrio ocuparespaos na institucionalidade,,,,, desde que no se perca o

    horizonte da ruptura. A disputa de postos na organizao do Estado visa abrir espaosde participao popular e garantir direitos devidos a toda apopulao. A representao popular no espao pblico estatal,pode facilitar o acesso e o conhecimento da mquina. Podepossibilitar formas de presso na formulao de polticas sociaisou na destinao dos fundos pblicos para o conjunto dapopulao. Ajuda tambm a entender que o Estado, do jeitoque est organizado, no serve aos interesses populares:enquanto os oprimidos no derrotarem a opresso, no haverum governo realmente popular. Portanto, participar nos espaosinstitucionais no pode justificar a lgica das campanhaseleitoreiras, nem a perda da autonomia dos movimentos.

    14.14.14.14.14. Fazer a propagandaFazer a propagandaFazer a propagandaFazer a propagandaFazer a propaganda- Quem acredita no que faz, quer queessa idia se espalhe. Fazer propaganda anunciar e repartir

    com outros as lies que o povo aprendeu na sua experinciade luta. falar de seus sonhos e convidar muitos para a mesmaesperanaesperanaesperanaesperanaesperana. No se pode esconder um tesouro que vem delonge, necessrio repass-lo para as geraes futuras. Fazerpropaganda no a inveno de histrias para impressionar ouiludir algum. No incio do trabalho a propaganda se faz depessoa a pessoa. Quando a experincia cria razes e j podeencarar o sol, a propaganda pode ser feita de forma aberta: faixas,cartazes, boletins, filmes... Muita gente foi atrada para a lutapopular, atingidos pela propaganda.

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    5. Q5. Q5. Q5. Q5. QUALIFICARUALIFICARUALIFICARUALIFICARUALIFICAR OOOOO TRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHO DEDEDEDEDE BASEBASEBASEBASEBASE

    Se muito vale o j feito ... muito mais temos a fazer

    Quem j faz trabalho de base, no precisa comear do zero.A tarefa, agora, amolar a ferramentaparacontinuar servindo ssuas finalidades. O mundo mudou, a elite se reciclou. Ela agora,usa a ttica da seduo e o discurso da competncia, esvazia osentido de parceria, colaborao, repartio de lucros e at dasolidariedade para quebrar a unio da classe trabalhadora. Oresultado conhecido: mais desemprego, luta pela sobrevivncia,excluso social. Por isso, e sem largar o rumosem largar o rumosem largar o rumosem largar o rumosem largar o rumo, o campo popular

    precisa descobrir novas formas de fazer a luta e organizar-se, certoque nenhum sistema por mais poderoso e cruel, jamais conseguiudurar para sempre, na histria. preciso fazer uma grandeavaliao.Um tempo de avaliao

    O primeiro passo da cura reconhecer que existeexisteexisteexisteexisteproblemaproblemaproblemaproblemaproblema. A crisecrisecrisecrisecrisepode ser a oportunidade de testar as convicese redirecionar o modo de atuar. No verdade que muitas lideranase organizaes, hoje, esto dessintonizadas com suas bases, ondeos dirigentes esto em FM e o povo em AMdirigentes esto em FM e o povo em AMdirigentes esto em FM e o povo em AMdirigentes esto em FM e o povo em AMdirigentes esto em FM e o povo em AM????? A resposta aosdesafios no surge de uma cabea iluminada. Nasce de um balanodo movimento, da leitura rigorosa da conjuntura e da grandeza edisposio da militncia.

    Que partes devem ser avaliadas?Que partes devem ser avaliadas?Que partes devem ser avaliadas?Que partes devem ser avaliadas?Que partes devem ser avaliadas?

    Vrios aspectos do trabalho devem ser examinados. Para

    facilitar pode-se fazer as seguintes indagaes:a)cad os resultadoscad os resultadoscad os resultadoscad os resultadoscad os resultados? A primeira pergunta que se faz quando seentra numa luta : o que que eu ganho com isso?Sem sinais oupossibilidades concretas, difcil mobilizar. O povo quer comida,terra, lazer, renda, reconhecimento. As vantagens que queremos,no futuro devem estar ligadas com vantagens econmicas

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    c) cad a juventudecad a juventudecad a juventudecad a juventudecad a juventude? O novo, de idade e de mentalidade, emgeral, visto como algo de aborrecenteaborrecenteaborrecenteaborrecenteaborrecente. Quem quer inovar,quem no aceita ser manobrado por um dono (mesmo vestidode povo), incomoda e ameaa. Quando umaorganizao noorganizao noorganizao noorganizao noorganizao nose renovase renovase renovase renovase renova, nem se amplia porque j comeou a caducarj comeou a caducarj comeou a caducarj comeou a caducarj comeou a caducar.

    Existem organizaes que em vez de luta pela vida de muitos, setornou meio de vidameio de vidameio de vidameio de vidameio de vida para alguns. Os novos atoresnovos atoresnovos atoresnovos atoresnovos atores tm umalinguagem e um rostolinguagem e um rostolinguagem e um rostolinguagem e um rostolinguagem e um rosto que os movimentos tradicionais nemsempre reconhecem. Usam palavras da onda, tratam de dimensescomo sexualidade, raa, subjetividade, ecologia, cultura, religio,diverso... So temas antigos transformados em formas de luta emobilizao. claro que sempre ser preciso distinguir a rebeldiada simples insatisfao ou modismo.

    d) cccccad a competnciaad a competnciaad a competnciaad a competnciaad a competncia? AgirAgirAgirAgirAgir sobre a realidade a forma deprovar que se pode mudar a realidademudar a realidademudar a realidademudar a realidademudar a realidade..... Quer dizer, junto como sonho e a garra precisosaber fazersaber fazersaber fazersaber fazersaber fazer. deficincia ser tcnicoe no ser poltico; mas desmoralizao ser militante poltico eno saber fazer as coisas. A competncia necessria no trabalhode base a capacidade de desmontar a explorao, onde querque ela aparea e a capacidade de apresentar propostas, com

    fundamento, para ajudar na construo da nova sociedade.e)Cad o rumoCad o rumoCad o rumoCad o rumoCad o rumo? Em vez de remendar o velho sistema, a luta propeatransformaotransformaotransformaotransformaotransformaodomundo e daspessoas.....Por isso, no se podevender a almaem troca de concesses nos princpios. O sonhode mundo de homens e mulheres orgulhosos de sua dignidade ecomprometidos com a convivncia universal guia os esforos daluta popular.

    f)Cad a disciplinaCad a disciplinaCad a disciplinaCad a disciplinaCad a disciplina?A postura liberal de dirigentes tem cansadoa militncia. chato chegar na hora e esperar por algum que,sem motivo, vai chegar atrasado. Mas, disciplina no obedinciaa uma ordem ou horrio: o cumprimento dos acertos coletivos. convico que nasce no interior da pessoa, como profundorespeito por si e s pessoas um zelo que se treina todo dia

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    6. A 6. A 6. A 6. A 6. A ALMAALMAALMAALMAALMA DODODODODO TRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHO DEDEDEDEDE BASEBASEBASEBASEBASE

    Temos nossas mentes e nossas mos cheias de semente doamanhecer e estamos dispostos a seme-la e a defend-la

    para que d frutos Che)

    O trabalho de base no uma ttica para atrair o povo. Nemum conjunto de tcnicas que, se bem aplicadas, podem dar bonsresultados. uma metodologia que vai alm de qualquer modelo.O trabalho de base uma paixopaixopaixopaixopaixo assumida por gente que seentregaentregaentregaentregaentrega por seu tesouro. uma paixoindignada contra qualquer

    injustia e uma ternura por todos que se dispem construo dasolidariedadesolidariedadesolidariedadesolidariedadesolidariedade. Esse modo apaixonado de crer no povo e demultiplicar invade o corao dos lutadores da causa popular. Esseenvolvimento na construo desse modo de viver sem a marcamodo de viver sem a marcamodo de viver sem a marcamodo de viver sem a marcamodo de viver sem a marcada dominaoda dominaoda dominaoda dominaoda dominao alimentaessa convicocontagiante. Esse jeitode fazer polticad certo porque tem seu alicerce em convices.convices.convices.convices.convices.E isso torna a poltica uma atividade sensvel, comprometida ecriativa. Este o segredosegredosegredosegredosegredo que plantado na alma, motiva o militantepara dedicar-se realizao do projeto popular, mesmo que custe.A f na vidavidavidavidavida, o amor pelo povoamor pelo povoamor pelo povoamor pelo povoamor pelo povo, o sonho da liberdadeliberdadeliberdadeliberdadeliberdade e afraternidade universalfraternidade universalfraternidade universalfraternidade universalfraternidade universal formam a fora interior que impulsiona omilitante, principalmente nos momentos da dor, da dvida e dasderrotas. Mas, est presente na alegria de viver, na disposio paraa luta, na esperana sem iluses, no canto, nos smbolos, na belezado ambiente, nas celebraes e, sobretudo, no companheirismocompanheirismocompanheirismocompanheirismocompanheirismo.

    So expresses e atitudes, individuais e coletivas, que revelam, desdej , o sabor da convivncia solidria que sonhamos para todos.

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    7. R7. R7. R7. R7. RETOMARETOMARETOMARETOMARETOMAR OOOOO TRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHOTRABALHO DEDEDEDEDE BASEBASEBASEBASEBASE

    Gente no boi de carro, pro carro deboi puxar, gente tem mente que gira, mente que pode

    girar a mente do carreiro e a canga pode quebrar1. Uma pessoa se torna perigosaquando comea a andar com os

    prprios ps. Em geral, quem est no poder, prefere genteobediente e acomodada porque fcil manobrar uma populaodomesticada. A finalidade do trabalho de base despertar adignidade das pessoas e a confiana nos seus valores e potenciais. tambm organizar a rebeldia popular contra a injustia e para

    construir a nova convivncia entre os humanos, sem explorao,sem discriminaes e sem preconceitos.

    O grande s grande, porque ns estamos de joelhos

    2. Toda pessoa luta para livrar-se da opresso - ningum se acostumacom a escravido. A luta comea l onde acontece a exploraoe a dominao. s vezes, se diz que o povo no quer nada. Mas,o povo no deixa de lutar; procura sempre um jeito de sair do

    aperto, at quando corre atrs da iluso: presentes, promessas,salvadores. Mesmo sem ter conscincia, o povo guarda no peitouma indignao reprimida. Ningum luta porque gosta; lutaporque se v obrigado pela necessidade. A classe oprimida lutapela terra, pela comida, moradia, escola, dignidade, diverso,direitos. Luta para livrar-se da opresso, para continuar viva epara ser reconhecida como gente.

    Quando a fome di, qualquer pessoa entra na briga

    3. Quem domina tenta calar qualquer sinal de resistncia. Paraesvaziar a reao popular bate, amedronta, ilude e, sem piedade,calunia, tortura e mata. s vezes, a pessoa oprimida resiste sb l s d h mbo mas vencida pelas b l s d r A classe

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    Sentindo na vida que pode, o pobre entende que vale;

    Depois que a canga sacode, no h patro que o cale

    4. A elite dominante no tem medo delideranas brilhantes oudiretorias combativas. A elite teme o povo consciente e em

    movimento. Ento, a misso da militncia repartir osesclarecimentos com quem permanece escravo, no seu trabalhoe na sua mentalidade. Sua tarefa incentivar a luta popularespalhando a notciaque possvel mudar a realidade porque otrabalho a mola do mundo. Esclarecendo que a transformaoda sociedade no vem de cima, nem de fora.Vem da unio dequem descobre a opresso e cria diferentes formas de luta parabuscar a VIDA livre e feliz.

    Se o boi soubesse a fora que tem, ningum dominava ele

    5. Muitas organizaes populares conquistam grandes vitrias edepois fraquejam. Ou porque no se atualizam, repetindo o jeitoantigo de lutar e se organizar ou porque, em vez de organizaode trabalhadore(a)s, se tornam um grupinho deeleitose porquese acham donosfazem a luta parao povo. Mas, parece que aprincipal razo das derrotas que certas diretoriasno acreditamno povo. Como a elite, essas ditas direes concentram o poderem suas mos ou fazem do cargo o seu meio de vida. Mas, quem militante participa, estimula e sugere iniciativas populares. Porisso, est presente nas aes e contribui para que consigambenefcios concretos e permanentes. Uma ao indispensvel damilitncia a multiplicao de gente nova, de idade ementalidade, que entre no movimento tornando-se parte

    protagonista na luta de repartir o po e o poder.A libertao ser obra da prpria classe oprimida

    ou no haver libertao

    6. Reunio, em si, no luta.Luta so as aes organizadas dal i id i i d i d i i

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    devem ser momentos de formao, debate, de confraternizao,de recordao e celebrao dos valores que unem as pessoaslutadoras.

    Fazer a nica forma de mostrar que possveltransformar o mundo

    7. S faz trabalho popular quem acredita que a classe oprimida capaz de pensar a produo, a distribuio e o consumo dosbens, de forma solidria. Para construir esse projeto de sociedade preciso mobilizao e participao consciente da populao. isso que d sustentao a proposta de transformao social.Para ter vitrias, o trabalho de base precisa crescer e virar ummovimento - um p na roa e um p na estrada. nesse trabalho,

    local e geral, que vai aparecendo quem militante (pelo seu graude compromisso com a causa popular), quem base (porque jaderiu ao Movimento) e quem a massa (o conjunto dapopulao a ser atingida). A direo uma tarefa da luta e noprivilgio de alguns militantes.

    preciso ter os ps no cho e a cabea nas estrelas

    8. O trabalho popular comea no comtato com pessoas insatisfeitas

    que esto dispostas a entrar num processo de luta pelo fim docapitalismo e construo de uma sociedade fraterna. Ele crescequando responde ao interesse das pessoas, partindo da porta queo povo oferece. Fica forte quando realiza experincias simples eenvolve as pessoas na soluo dos problemas nem sobre, nempara, mas comas pessoas participantes - inclusive na sustentaofinanceira das aes. Firma-se quando tem uma organizaodemocrtica, com vez e voz para todas as pessoas, conforme anecessidade da luta e conforme sua capacidade e seu gostopessoal. Torna-se vitorioso quando as pessoas se apropriamdoprocesso, quando multiplicam essa prtica e quando se articulamcom grupos parceiros que seguem no mesmo rumo.

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    material e espiritual da sociedade. Tomando conscincia dainjustia, a classe oprimida pode se organizar e lutar por ummundo onde o ter, o saber e o poder sejam exercidos de formacompartilhada. Sempre consciente que o fim da explorao e atransformao da sociedade no nascem de um acordo com aclasse dominante. A histria mostra que a elite s entrega asriquezas roubadas e o seu poder de dominao quando derrotada.

    Os ricos s se entregam quando perdeme os pobres s ganham quando lutam

    10. A sociedade solidria comea, desde j - em casa, no trabalho,na comunidade, no movimento. na vida concreta que a

    militncia se exercita a nunca se rebaixar, nem tratar as pessoascomo coisa. na luta diria que ela aprende a superar acompetio entre superiores e inferiorese a criar as condiesda igualdade. Por isso, o grande sinal da nova sociedade ocompanheirismocompanheirismocompanheirismocompanheirismocompanheirismo. O companheirismo a forma mais perfeitade relacionamento entre as pessoas - mais forte que os laos desangue. o gesto humano e poltico que se revela na ateno spessoas excludas e desanimadas, no carinho juventude e scrianas e no respeito a(o) parceira(o) de vida e de caminhada.

    Companheiro ou companheira oirmo ou a irm que a gente escolhe

    11. O trabalho de base, composto de quadros (qualidade) e de massa(quantidade), um caminho longo e difcil. Porque junto com adisposio, da criatividade e da coragem, est presente no povo

    a mentalidade de escravo que torna o povo acomodado, inseguroe dependente. Muitas pessoas oprimidas fazem de sua cabeaum hotel de patro (lambari com cabea de tubaro). No trabalho,na famlia e no movimento repetem as idias e as prticas daelite; pensam em concentrar a riqueza e o poder em suas mos et t t it i d h i ( ) S

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    MST- CADERNODEFORMAO4

    6

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    III.

    COMO

    FAZER

    TRABALHO

    DE

    BASE

    - Ranulfo Peloso -

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    BaseBaseBaseBaseBase quem produz riquezas e explorado e manipuladopelas elites dominantes, em todos os espaos. comeo, alicerce,algo indispensvel. , sobretudo, a parte da classe oprimida que sedispe a dar sustentao a um processo de mudana. Quemtrabalha a base do mundo e, ao descobrir a fora que tem, derrubaa velha pirmide e organiza uma sociedade sem opresso.

    Trabalho de Base a ao poltica transformadora, realizadapor militantes de uma organizao popular que, conhecendo arealidade de um territrio, desperta, organiza e acompanha suapopulao na soluo dos problemas do cotidiano e liga essa lutaa luta geral contra a opresso.

    Qualquer militante que se disponha a entrar num processode luta pela transformao social pode e deve fazer Trabalho de

    Base. Para isso, no existem receitas. Mas, olhando vriasexperincias, possvel descobrir vrios pontos em comum. Algumastarefas, por exemplo, aparecem como indispensveis e permanentes:

    3.1. Conhecer os quatro cantos do territrio3.1. Conhecer os quatro cantos do territrio3.1. Conhecer os quatro cantos do territrio3.1. Conhecer os quatro cantos do territrio3.1. Conhecer os quatro cantos do territrio

    Conhecer mais do que ter informaes, ainda quenecessrias. Conhecimento aproximao, pelo contato direto ecotidiano. Nesse conhecimento da realidade, as informaes vm

    da observao, conversas, visitas, pesquisas e convivncia.Conhecer e ser conhecido no ser estranhoestranhoestranhoestranhoestranho um exerccioque exige cumplicidade e aprendizado da linguagem, para favorecera integrao, a troca e a confiana. Entre as informaes algumasso indispensveis: As que tratam doterritrio:territrio:territrio:territrio:territrio: a geografia, o jeito, a cultura, os

    costumes, os saberes, a populao...

    As que tratam daeconomia:economia:economia:economia:economia: o nmero de trabalhadores, o tipode trabalho, o volume da produo, a renda...

    As que mostram o social e o poltico:o social e o poltico:o social e o poltico:o social e o poltico:o social e o poltico: suas lideranas,personalidades, entidades e organizaes a favor e contra opovo...

  • 7/23/2019 Caderno de Formao MST

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    3.2. Descobrir sementes de militantes3.2. Descobrir sementes de militantes3.2. Descobrir sementes de militantes3.2. Descobrir sementes de militantes3.2. Descobrir sementes de militantes

    Mais importante que fazer grandes reunies a misso damilitncia descobrir pessoas insatisfeitas, com disposio paramudanas, que pensam alm de sua famlia, que sejam coerentesentre o que prometem e o que fazem, e sejam discretas. Pessoas

    que se destacam nesses critrios podem tornar-se refernciasrefernciasrefernciasrefernciasreferncias, maisadiante.

    3.3. Fazer aes concreta3.3. Fazer aes concreta3.3. Fazer aes concreta3.3. Fazer aes concreta3.3. Fazer aes concretasssss

    Os dados da realidade podem sugerir propostas concretasde ao. A militncia tem que sacar o que o povo est a fim defazer para realizar seus desejos. A ao a ser feita aquela onde ogrupo participa, que est dentro da compreenso, do momento e

    ritmo que o grupo suporta jogo, festa, celebrao, protesto,mutiro, disputa poltica... O povo se mobiliza quando sente quevai perder ou quando pensa que pode ganhar.

    A militncia tem a obrigao de apresentar propostas. Nopode impor, porque aes no assumidas geram acomodao efrustrao. decisivo que as primeiras aes dem certo; para isso necessria uma boa anlise das possibilidades de vitria. Na luta,se ganha ou se perde. Mas a vitria que anima a von