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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO – NPGA MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO – MPA FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. SALVADOR 2006

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Page 1: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO

NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO – NPGAMESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO – MPA

FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL

MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR.

SALVADOR2006

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FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL

MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOSCONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR.

Dissertação apresentada ao Núcleo de Pós-graduação em Administração (NPGA), MestradoProfissional da Universidade Federal da Bahia,como requisito para obtenção do grau de Mestreem Administração.

ORIENTADORA: PROFa. Dra. ELAINE FIGUEIRA NORBERTO S ILVA

SALVADOR2006

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FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL

MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOSCONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR.

Dissertação apresentada ao Núcleo de Pós-graduação em Administração (NPGA),Mestrado Profissional da UniversidadeFederal da Bahia, como requisito paraobtenção do grau de Mestre emAdministração.

BANCA EXAMINADORA:

Profa. Dra. Elaine Figueira Norberto Silva – Orientadora

Prof. Dr. Paulo Henrique de Almeida

Profa. Dra. Beth Loiola

SALVADOR, 10 DE MARÇO DE 2006

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Escola de Administração – UFBA

S677 Sobral, Flávia Cavalcante Medicamentos genéricos: as representações sociais dos consumidores da cidade

do Salvador / Flávia Cavalcante Sobral. – 2006.104 f.

Orientadora: Prof.ªDr.ª Elaine Figueira Norberto Silva Dissertação (mestrado profissional) – Universidade Federal da Bahia. Escola de

Administração, 2006. 1. Medicamentos genéricos. 2. Confiança do consumidor. 3. Comportamento do

consumidor. 4. Representações sociais. 5. Mercado farmacêutico – Mercado. I.Universidade Federal da Bahia. Escola de Administração. II. Silva, Elaine FigueiraNorberto. III. Título.

615.19 CDD 20 ed.

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Dedico este trabalho a meus pais, que me ensinaram a vencer com esforço e honestidade.

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AGRADECIMENTOS

À Deus, por tudo, sempre.

À meus pais, Eliana e Clóvis, pelo entusiasmo, atenção e paciência.

À Prof. Elaine Norberto, pela incansável dedicação e compreensão ao longo desses anos. Sãoraros, mas inspiradores os exemplos que temos de “mestres” e você é um deles. Muito obrigadapor tudo.

Ao Prof. Célio, pela compreensão, espírito de cooperação e por ter sempre uma palavra de ânimoe força.

À minha equipe de pesquisadores: Emanuel, Wesley, Bárbara e Graciela, pelo incansável esforço.Em especial a Emanuel, pela paixão e disciplina neste trabalho.

À Prof. Gilca e Valdinea, pelo valioso auxílio.

Ao núcleo do NPGA, por todo acompanhamento e carinho.

À todos que direta ou indiretamente colaboraram para a realização deste.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.................................................................................121.1 OBJETO DE PESQUISA................................................................... 131.2 OBJETIVOS....................................................................................... 141.3 JUSTIFICATIVA................................................................................ 141.4 HIPÓTESE.......................................................................................... 141.5 UNIDADE DE ANÁLISE.................................................................. 151.5.1 Corte espacial...................................................................................151.5.2 Corte Temporal................................................................................151.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS....................................... 15

2 NOÇÕES SOBRE O MERCADO FARMACÊUTICO............... 212.1 HISTÓRICO DOS MEDICAMENTOS NO MUNDO..................... 212.2 HISTÓRICO DOS MEDICAMENTOS NO BRASIL...................... 252.3 OS MEDICAMENTOS GENÉRICOS NO BRASIL........................ 292.3.1 A motivação brasileira para os medicamentos genéricos ............ 302.3.2 A implantação dos medicamentos genéricos no Brasil................. 312.3.3 Os primeiros registros e o mercado nacional de medicamentosgenéricos......................................................................................................

37

2.4 MEDICAMENTOS DE REFERÊNCIA, GENÉRICOS ESIMILARES: SUA REALIDADE...............................................................

42

2.4.1 Medicamentos de Referência.......................................................... 432.4.2 Medicamentos Similares..................................................................442.4.3 Medicamentos Genéricos.................................................................45

3 REFERENCIAL TEÓRICO...........................................................493.1 MARCAS........................................................................................... 503.2 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS........................................................ 533.2.1 As funções das representações sociais............................................ 573.2.2 Transformando o não-familiar em familiar.................................. 593.3 CONFIANÇA ................................................................................... 613.3.1 Confiança, risco e perigo.................................................................623.3.2 Confiança e relacionamento............................................................643.3.3 Os sistemas peritos...........................................................................65

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS EMPÍRICOS.... 67

5 CONCLUSÃO..................................................................................88

REFERÊNCIAS..............................................................................94 APÊNDICES.................................................................................... 97 ANEXO............................................................................................ 103

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Medicamentos genéricos – comercialização 37

Figura 2: Medicamentos genéricos registrados por país de origem 38

Figura 3: Medicamentos genéricos –comercialização – nacionais eimportados

39

Figura 4: Medicamentos genéricos – registros por empresa detentora 40

Figura 5: Medicamentos genéricos – visão geral 41

Figura 6: Evolução de número de apresentações de medicamentosgenéricos registradas

42

Figura 7: Quando eu digo “medicamento genérico”, qual a primeira coisaque vem à sua mente? (Respostas Múltiplas)

67

Figura 8: Você já usou medicamentos genéricos? 71

Figura 9: Para os consumidores que responderam “não”, por que nuncausaram medicamentos genéricos? (Respostas Múltiplas)

72

Figura 10: Para os consumidores que responderam “sim”: relate a suaexperiência mais marcante com os medicamentos genéricos. (RespostasMúltiplas)

73

Figura 11: Você usaria novamente o medicamento genérico? 76

Figura 12: Você sabe se existe um medicamento genérico para substituiro que você veio comprar agora?

80

Figura 13: Nesta sua compra, você pediu o medicamento genérico? 82

Figura 14: Nesta sua compra, o balconista ofereceu o medicamentogenérico?

83

Figura 15: Algum médico já falou sobre medicamentos genéricos comvocê?

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Quando eu digo “medicamento genérico, qual a primeira idéiaque vem à sua mente?" – Por critério de localização (RespostasMúltiplas)

69

Tabela 2: Você já usou medicamentos genéricos? – Por localização 71

Tabela 3: Relate a sua experiência mais marcante com os medicamentosgenéricos – Por localização (Respostas Múltiplas)

74

Tabela 4: Você usaria novamente o medicamento genérico? – Porlocalização

77

Tabela 5 : Para os que responderam “depende”: Você usaria novamente omedicamento genérico? – Por localização.

78

Tabela 6: Para os que responderam “não”: Você usaria novamente omedicamento genérico? – Por localização.

79

Tabela 7: Você sabe se existe um medicamento genérico para substituir oque você veio comprar agora? – Por localização

81

Tabela 8: Nesta sua compra, você pediu o medicamento genérico? – Porlocalização

82

Tabela 9: Nesta sua compra, o balconista ofereceu o medicamentogenérico? – Por localização.

84

Tabela 10: Algum médico já falou sobre medicamentos genéricos comvocê? – Por localização.

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RESUMO

A preocupação em encontrar alternativas que reduzissem os custos de saúde pública e que, aomesmo tempo, favorecessem o acesso da população em geral à medicamentos levaram – dentreoutros fatores – o Governo Brasileiro a adotar uma política de medicamentos genéricos,institucionalizada oficialmente em 1999 através da Lei 9.787. O Governo, ao lançar os genéricos,apoiou esta categoria sob duas bases: medicamento de qualidade garantida e preço baixo. Mas, sepor um lado, o argumento de “preço baixo” funciona como um trunfo comercial para osmedicamentos genéricos, por outro, a ausência de uma marca de produto pode dificultar a relaçãode confiança do consumidor acerca do produto. Portando, a “qualidade” só seria observada peloconsumidor em um processo de composição de representações sociais positivas. O processo decomposição de representações sociais positivas para um produto é processo fundamental para asua aceitação social e sucesso, principalmente no caso de medicamentos cujo efeito é ligadodiretamente à saúde humana. Com base nisso, o objetivo deste trabalho é verificar quais asrepresentações sociais elaboradas pelos consumidores da cidade do Salvador sobre osmedicamentos genéricos, com a finalidade de ajudar a compreender como elas orientam ocomportamento do consumidor local no processo de aquisição deste novo produto.

Palavras-chave: medicamentos genéricos, representações sociais, mercado farmacêutico nacional,confiança, comportamento do consumidor.

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ABSTRACT

The raise in the public health assistance and the precarious access of the general population tomedicine pushed the Brazilian Government to search for alternatives that could minimize theseproblems. One of the alternatives found was the National Politics of Generic Drugsinstitucionalized in 1999 by the Law 9.787. The Brazilian Government launched the genericdrugs as a category of medicine in which quality was guaranteed at a low price to the consumer.But, if in one hand the low price is a strong commercial argument, on the other hand, the lack of aproduct brand can lead costumers not to trust its quality. Therefore, “quality” can only be trustedby customers if a process of positive social representations occurs. The process of buildingpositive social representations to a product is fundamental to a product to be accepted and reachsuccess, specially when it comes to medicine which have the power to affect directly humanhealth. Based on this, this work aims to check what are the social representations that theconsumers in the city of Salvador have build on generic drugs so that can help understand howthey can orient and affect their behaviour when buying this new category of medicine.

Palavras-chave: generic drugs, social representations, national pharmaceutical market, trust,consumer behavior.

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1 INTRODUÇÃO

A indispensabilidade de medicamentos para a saúde humana estimulou, no início do século XX, a

intensificação de pesquisas e a massificação da produção de novas drogas, originando um

mercado mundial multibilionário. Após a I Guerra Mundial, com os problemas de abastecimento

resolvidos e altos volumes de produtos acabados em estoque, os laboratórios passam a buscar

novos mercados para expandir seus negócios. Indústrias de atuação local ou regional,

principalmente advindas dos Estados Unidos e da Europa, tornaram-se multinacionais originando

megaempresas no setor farmacêutico mundial.

O acirramento da competição por um maior “market share” forçou a redução das margens de

lucro. Intensificaram-se, então, os esforços de pesquisa no desenvolvimento de novas drogas

devido à proteção patentária que permitia ao laboratório desenvolvedor a exclusividade na

fabricação e comercialização do produto por um período mínimo de dez anos (podendo variar de

acordo com as leis vigentes de cada país) e à valorização das ações destas empresas no mercado

mundial. Esse período de proteção patentária possibilitava a estes laboratórios a oportunidade de

recuperar os investimentos aplicados na pesquisa e divulgação da nova droga, permitindo ainda,

vultosos lucros com a exclusividade na comercialização da mesma.

Um dos resultados disso foi o crescente incremento nos custos de tratamentos de saúde. A

tendência mundial de envelhecimento da população somada ao aumento dos custos na saúde

pública passaram a preocupar principalmente os países economicamente desenvolvidos mais

acentuadamente a partir da década de 70, forçando-os a buscar novas alternativas. É nesse

contexto que os Estados Unidos resolvem adotar uma Política de Medicamentos Genéricos como

uma das soluções viáveis para reduzir os gastos com a saúde pública. Seguindo o exemplo norte-

americano, países como a Alemanha, Inglaterra, Canadá, Japão, etc. implantam também os

medicamentos genéricos.

Ao longo da História recente outros países resolvem adotar políticas de utilização do

medicamento genérico, dentre eles o Brasil, que somente procedeu à regulamentação dos

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medicamentos genéricos em 1999, embora o início da discussão da matéria tenha se dado nos

primeiros anos da década de 90.

A motivação brasileira em adotar os genéricos não diferiu das demais, ou seja, a preocupação em

reduzir os altos custos dos medicamentos para o sistema público de saúde. Havia também outros

interesses em jogo. Era interessante para o Estado abrir uma nova oportunidade de negócios na

economia brasileira, já que o mercado nacional de medicamentos era, à época, avaliado em

aproximadamente R$ 5 bilhões (GRUPO PRÓ-GENÉRICOS, 2003) e dominado por marcas de

laboratórios estrangeiros. Uma outra motivação, de cunho social, também influiu na definição de

uma política de medicamentos genéricos nacional: facilitar à população, sobretudo a mais

carente, o acesso a tratamento a partir de uma categoria de medicamento – com qualidade

idêntica à do medicamento de referência - com o diferencial de preços mais acessíveis.

Considerando que a realidade brasileira mostra uma sociedade marcada por graves distorções de

renda – que restringem o acesso a tratamentos de saúde – uma categoria de medicamentos com

essas características teria potencial de causar considerável impacto tanto social quanto

econômico.

É nessa conjuntura que o Governo Federal lança, sob o argumento de viabilização de uma

alternativa de medicamento com “preço baixo e qualidade garantida”, os medicamentos genéricos

à população.

1.1 OBJETO DE PESQUISA

O objeto deste estudo são as representações sociais sobre os genéricos em Salvador. O fato de

que o governo tenha tido a intenção de apresentar os medicamentos genéricos à população como

produtos de “qualidade garantida” e com o diferencial de “preço baixo” não assegura que sejam

estas as representações partilhadas pela população. Daí a importância em estudá-las.

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1.2 OBJETIVOS

A concepção de que as crenças sobre um determinado produto têm influência decisiva em

seu sucesso comercial é um lugar comum na literatura de marketing. Aprofundando essa idéia, o

estudo das representações sociais dos medicamentos genéricos no Brasil se faz necessário, pois as

representações que os consumidores formarem sobre os genéricos direcionarão seu

comportamento de consumo. Reconheço, todavia, que esta não é a única variável relevante na

determinação do comportamento do consumidor; inúmeras outras variáveis têm influência, com

destaque para a ação dos prescritores: os médicos (prescritores autorizados), mas também

balconistas de farmácias (que muitas vezes atuam como prescritores informais). O papel destes

atores é muito importante na dinâmica deste mercado.

Portanto, o objetivo geral desta dissertação é colaborar para o desenvolvimento do

mercado de medicamentos genéricos, elaborando um estudo que mostre as representações sociais

sobre este produto. O objetivo específico é identificar se as populações de poder aquisitivo

diferente partilham representações diferentes sobe estes medicamentos.

1.3 JUSTIFICATIVA

A motivação desse trabalho se deu ao perceber que os medicamentos genéricos surgiram como

novos concorrentes cujo potencial poderia alterar a arquitetura do multibilionário mercado

farmacêutico nacional.

Outra justificativa se dá pelo fato de que poucos trabalhos sobre o tema foram desenvolvidos em

âmbito local (cidade do Salvador).

1.4 HIPÓTESES

Algumas hipóteses foram desenvolvidas como pontos de partida deste estudo, como seguem:

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a) A falha na divulgação de informações sobre os medicamentos genéricos fez com que os

consumidores tivessem pouco conhecimento e acumulassem dúvidas sobre o assunto;

b) Em geral, a maior parte dos consumidores não confia nos medicamentos genéricos,

inibindo, assim, seu consumo;

c) Há uma maior resistência nas classes que concentram maior poder aquisitivo, pois têm

maior capacidade de compra do medicamento de referência;

d) A opinião dos balconistas é mais influente em áreas onde a renda é mais baixa (e o

acesso a médicos é menor).

1.5 UNIDADE DE ANÁLISE

1.5.1 Corte Espacial

Uma pesquisa de amplitude nacional requisitaria uma grande estrutura de profissionais e tempo

para execução, portanto, opto por restringir esta pesquisa à cidade do Salvador, no Estado da

Bahia, com a finalidade de desvelar quais as representações sociais locais formadas acerca dos

medicamentos genéricos com a finalidade de colaborar a compreensão com a dinâmica do

mercado local dos medicamentos genéricos.

1.5.2 Corte Temporal

A pesquisa empírica foi realizada na cidade de Salvador no segundo semestre de 2005.

1.6 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

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A elaboração do panorama nacional e internacional dos medicamentos genéricos teve como

instrumentos de coleta: web sites de empresas e organizações (públicas e privadas) ligadas ao

produto, manual médico sobre os medicamentos genéricos, matérias divulgadas em web sites, etc.

Para descobrir quais as representações sociais formadas por consumidores da cidade do Salvador

sobre os medicamentos genéricos, foi elaborada uma pesquisa in loco cujo instrumento de coleta

era a entrevista semi-diretiva com os consumidores.

O cálculo da amostragem respeitou a qualidade exigida na análise estatística. Isso possibilita que

sejam estabelecidas inferências sobre um universo em questão após a análise de uma amostra do

mesmo. O universo, ou a população, seria composto de todas as possíveis observações sobre o

fenômeno enquanto que a amostra é somente uma seleção desses valores coletados

aleatoriamente. No entanto, para que a inferência estatística seja feita de forma correta, as

características da população devem estar representadas nas características da amostra. Para que

isso seja alcançado, a amostra deve ser: escolhida aleatoriamente, homogênea e independente.

O tamanho da amostra que represente uma população está definido na equação (1) a seguir:

( )qpe

Nqp

..)1(

)(..22

2

σση

+−= (1)

em que: =η tamanho da amostra

=2σ nível de confiança escolhido;

p = proporção da característica pesquisada;

q = complemento de p;

=2e erro de estimação permitido;

N = tamanho da população

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Para a amostra dos estabelecimentos farmacêuticos da cidade de Salvador, o tamanho da

população, de acordo com a lista telefônica Telelista 2004, é de 532 estabelecimentos e o nível de

confiança considerado foi de 90%. A proporção da característica pesquisada, estabelecida após

pesquisa piloto, foi de 0,7 para a característica pesquisada (p), e 0,3 para seu complemento (q).

Permitiu-se um erro, inicialmente, de 7% e obteve-se, portanto, uma amostra de 129

estabelecimentos a serem pesquisados. No entanto, devido a alguns problemas na coleta das

informações, como o caso de estabelecimentos estarem fechados, houve uma perda que, no final,

contou com 93 estabelecimentos, ou seja, um erro de 8,5%. Esta redução não gera prejuízo à

investigação, haja vista que, um erro considerado de 10% é amplamente aceito.

Os 532 estabelecimentos foram divididos em dois grupos para se construir uma amostragem

estratificada, para assim, ponderar os dois grupos de acordo com a participação do número de

estabelecimentos em cada um dos grupos. Este tipo de amostragem dispõe os grupos em

subgrupos “homogêneos”, reduzindo a variabilidade da população global e ponderando a

participação dos elementos nos subgrupos (STEVENSON, 1981).

Para a classificação dos dois grupos considerou-se como aspecto diferenciador, a localização dos

estabelecimentos, pois a Prefeitura Municipal, a Superintendência de Estudos Econômicos e

Sociais da Bahia (SEI), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) não dispunham de

dados que revelassem a faixa de renda média de cada bairro da cidade. Os grupos, então, foram

segmentados de acordo com conhecimento comum já estabelecido sobre o seu poder aquisitivo.

Esse critério foi estabelecido para descobrir se, em diferentes localidades (segmentados em

função da renda) verificam-se representações sociais diferentes, já que o Governo Federal lançou

os medicamentos genéricos como solução mais acessível de tratamento com qualidade, com alvo

principal na parcela mais carente da população.

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Neste sentido, os grupos ficaram definidos como: “bairros nobres” e “outros bairros”1. Nos

primeiros, foram selecionadas aleatoriamente 22 farmácias e nos “outros bairros”, foram

selecionadas 71. Houve um cuidado especial em não categorizar os “outros bairros” como

“bairros populares” pois seria uma afirmação precipitada e inadequada visto que nestes há bairros

onde a classe média é significativa.

Conseguiu-se, a despeito da redução dos estabelecimentos pelos problemas descritos acima, a

manutenção da proporcionalidade exigida pelo diferencial do número de estabelecimentos entre

bairros nobres e outros que foi de 72% de estabelecimentos em outros bairros e 28% nos bairros

nobres.

O mesmo procedimento foi feito para a definição das entrevistas dos consumidores,

considerando-se a população como sendo de Salvador de 2.556.429,00 (SEI, 2000). Finalmente,

nos arredores dos 93 estabelecimentos definidos na amostragem, também referentes ao nível de

erro de 8,5%, foram coletadas informações com 89 consumidores nas farmácias de “outros

bairros” e 35 nos “bairros nobres” ao saírem da farmácia pois acabaram de experimentar uma

situação de compra. Neste caso, foi possível alcançar também, de forma bastante aproximada, a

proporcionalidade exigida.

O roteiro de entrevistas foi elaborado propositadamente para extrair do consumidor suas opiniões

sobre os genéricos - com especial atenção aos detalhes - para que o resultado destas permitisse a

elaboração das representações sociais.

1 Considerou-se como “bairros nobres”: Barra, Caminho das Arvores, Campo Grande, Canela, Chame-Chame, CostaAzul, Federação, Garcia, Graça, Imbui, Itaigara, Jardim Apipema, Ondina, Piatã, Pituba, Rio Vermelho, StellaMares, STIEP, Vitória. E quanto aos “outros bairros” considerou-se: Acupe de Brotas, Águas Claras, Alto daTerezinha, Alto das Pombas, Amaralina, Armação, Baixa dos Sapateiros, Barbalho, Barris, Brotas, Cabula, CabulaVI, Candeal, Centro, Barros Reis, Boa Viagem, Boca do Rio, Bonfim, Caixa D’Água, Cajazeiras, Calçada, Campinasde Pirajá, Capelinha, Castelo Branco, Cidade Nova, Comércio, Coutos, Curuzu, Dois de Julho, Engenho Velho daFederação, Engenho Velho de Brotas, Engomadeira, Fazenda Grande, IAPI, Itacaranha, Itapuã, Jardim Brasília,Liberdade, Lobato, Marechal Rondon, Mares, Massaranduba, Mata Escura, Matatu de Brotas, Mussurunga,Narandiba, Nazaré, Novo Horizonte, Paripe, Pau da Lima, Pau Miúdo, Periperi, Pernambués, Pero Vaz, Pirajá,Pituaçu, Plataforma, Politeama, Ribeira, Roma, San Martin, Santa Cruz, São Bento (Avenida Sete), São Caetano,São Cristóvão, São Marcos, São Pedro (Avenida Sete), Saúde, Sete de Abril, Sussuarana, Tancredo Neves, Uruguai,Valéria, Vasco da Gama e Vila Laura.

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As perguntas foram desenhadas com a finalidade de direcionar o consumidor a manifestar-se

sobre os conceitos-chave de imagem (representação), grau de informação sobre o genérico,

confiança, influência e comportamento de consumo.

Houve uma preocupação em elaborar perguntas com textos claros e diretos, visto que seriam

investigadas classes sociais diversas - para que não pairassem dúvidas quando no momento da

entrevista. Outra preocupação foi a de elaborar um roteiro que não fosse extenso o suficiente para

desencorajar o consumidor a responder visto que o ambiente não era o mais propício a uma

entrevista longa (os consumidores entrevistados foram abordados ao sair da farmácia) mas que,

ao mesmo tempo, fosse adequado ao seu objetivo. O roteiro da pesquisa foi testado três vezes

junto a consumidores antes que o modelo final fosse aprovado.

As variáveis contidas nas tabelas que expõem os dados obtidos são uma compilação dos

argumentos citados pelos consumidores quando no momento da entrevista. Por se tratar de uma

pesquisa qualitativa, a opção por questões abertas marca a maior parte do roteiro desta pesquisa.

Por fim, o presente trabalho se apresenta em cinco capítulos. O capítulo inaugural diz respeito à

apresentação do projeto de pesquisa, detalhando seu objeto de pesquisa, objetivos, justificativa,

hipóteses, unidade de análise e procedimentos metodológicos.

O segundo capítulo preocupa-se em montar um panorama dos medicamentos genéricos no

mercado brasileiro com o intuito de ambientar o leitor sobre mercado a ser tratado e facilitar sua

compreensão sobre esta matéria. Para tanto, é necessário que se remeta ao seu histórico mundial

onde se justifica o surgimento da categoria até desembocar na motivação que o trouxe para a

recente história do Brasil. Faz-se fundamental para que se permita entender as complexidades do

mercado farmacêutico em geral e qual a sua realidade no Brasil.

A infra-estrutura do setor será descrita através do papel de cada um dos seus participantes na

cadeia: os fornecedores (produtores), distribuidores/revendedores (intermediários), os varejistas

(revendedores finais) até chegar ao consumidor final, levando em consideração também a

importância da concorrência para o mercado e dos prescritores para o consumidor final.

Legislação, dados estatísticos do mercado, dentre outros, coletados através de artigos, manual

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médico e matérias de web sites de organizações interessadas ou envolvidas no assunto serão

abordados neste capítulo.

O capítulo que segue é responsável pelo marco teórico deste trabalho, desenvolvendo o conceito

de “marca”, a Teoria das Representações Sociais, o conceito de “confiança” e conceitos sobre o

comportamento do consumidor.

O quarto capítulo, por sua vez, traz a apresentação e análise dos dados empíricos coletados na

pesquisa com o intuito de verificar quais as representações sociais formadas e se elas diferem

entre consumidores de bairros onde há diferenças entre faixas de renda.

Por fim, o capítulo cinco corresponde à conclusão desta dissertação.

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2 NOÇÕES SOBRE O MERCADO FARMACÊUTICO

2.1 HISTÓRICO DOS MEDICAMENTOS NO MUNDO

Nas antigas civilizações, as doenças eram relacionadas como manifestações espirituais negativas.

Para tratá-las, então, surge a farmacoterapia, isto é, o “tratamento de doenças através do uso de

medicamentos” (MICHAELIS, 2005). Seu primeiro registro deu-se na Mesopotâmia, onde foi

produzido o primeiro Compêndio farmacêutico com trinta fórmulas elaboradas a partir de

vegetais, animais, minerais e acompanhou a evolução da humanidade tornando-se a alternativa

terapêutica mais utilizada e difundida no mundo (MENDA, 2002).

Há ainda outros registros importantes na História Antiga. Conforme Menda, (2002, p.7) o Papiro

de Ebers, elaborado no Egito Antigo (aproximadamente 1.500 a. C.), apresenta 811 prescrições e

700 medicamentos. Na China, o naturalista Li Shih-chen desenvolveu o Compêndio Pen-ts’ao

Kang-um com 1000 plantas, 450 substâncias derivadas de animais e 11.100 prescrições. A

civilização grega através de Hipócrates colaborou com sua busca de bases empíricas onde ate

então só existia a magia ou a religião. A partir disso, os medicamentos passaram a ser

desenvolvidos para curar doenças. Hoje, o conceito de prevenção soma-se ao objetivo de cura

quando no desenvolvimento de novas substâncias.

Na História Moderna, a Alemanha tem posição de destaque já que foi responsável pelo

desenvolvimento das primeiras drogas sintéticas ainda no final do século XIX. À época, as

farmacêuticas alemãs tinham tamanha relevância no mercado que se auto-intitulavam “a farmácia

do mundo” (MENDA, 2002). Porém, uma série de fatores ao longo do século XX mudaram essa

realidade.

Na Primeira Guerra Mundial, o governo americano classificou e leiloou as unidades das fábricas

alemãs Bayer e Merck que se situavam no território americano, o que originou uma nova e forte

indústria farmacêutica americana sob o nome de Merck & Co. Essa atitude americana causou

altos prejuízos às matrizes alemãs não só pela perda das unidades americanas como também pela

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perda da penetração que tinham como seus produtos no mercado americano, o maior do mundo

(MENDA, 2002).

No período compreendido entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, a indústria americana

experimentou grande êxito, triplicando o número de fabricantes. Até 1914 os Estados Unidos

dependiam da Alemanha; em 1937 já eram o segundo maior produtor mundial de medicamentos,

suprindo suas necessidades internas e passando a exportar para 78 países (QUINTANEIRO,

2002).

O “boom” de novas substâncias se deu entre 1925 e 1945 motivado essencialmente pelas

necessidades advindas da Segunda Guerra Mundial. É nesse período que as indústrias

farmacêuticas que existiam passaram a investir grandes somas no desenvolvimento de novos

fármacos. Receosos do nazismo, cientistas judeus fugiram da Alemanha e procuraram novos

mercados para se colocarem, o que ajudou a enfraquecer o processo local de recuperação do setor

na década de 50 (MENDA, 2002).

A preocupação ambiental se traduziu em regulamentos rígidos e o pensamento antiquado dos

químicos alemães acabaram por atrasar os investimentos em biotecnologia, a tendência para qual

caminhava o mercado farmacêutico mundial principalmente a partir da década de 80. As

empresas líderes alemãs não aderiram à biotecnologia e investiram em pesquisas na área de

química básica, que já havia rendido bons dividendos ao longo da História. Todo esse esforço

contra a biotecnologia desestimulou alguns cientistas alemães que encontraram fora da Alemanha

boas ofertas de trabalho voltadas à biotecnologia.

A partir da década de 80, o mercado farmacêutico mundial foi marcado pela intensificação de

fusões, aquisições e joint ventures em forma de negociações multibilionárias. A alta concentração

do mercado farmacêutico nas mãos de poucas indústrias permitiu às grandes corporações uma

condição muito confortável para delinear estratégias de acordo com seus interesses.

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Os altos preços de medicamentos eram justificados pelas corporações como necessário para

custear as pesquisas de novas moléculas e, assim, manter o ritmo de novas descobertas que

trariam benefícios à população como um todo.

Considerando que as estratégias dessas corporações são voltadas à propaganda do novo fármaco

junto à comunidade médica, não havia interesse em estimular políticas agressivas de redução de

preços, o que comprometeria seriamente a rentabilidade das mesmas. A comunidade médica é o

prescritor autorizado que define qual o tratamento adequado para o paciente e, portanto, é alvo

principal das indústrias farmacêuticas.

A prática dessa estratégia incorre em investimentos maciços em propagandistas especializados,

material informativo e publicitário e ações de marketing, o que ajuda a desanimar as

farmacêuticas a reduzirem o preço de medicamentos. Mesmo depois de expiradas as patentes, a

concorrência mantinha-se no mesmo seleto grupo de grandes farmacêuticas que tinham

estratégias comerciais semelhantes, o que não propiciava um ambiente competitivo propício para

redução de preços.

Com base nisso, o custo de aquisição de um medicamento tanto para o consumidor quanto para a

saúde pública tornou-se muito alto e pouco poderia ser feito para reduzi-lo, já que não havia

outras alternativas mais acessíveis. A partir desse contexto, buscou-se soluções para equacionar o

alto custo dos medicamentos; era o campo fértil para que se originassem novas alternativas e,

dentre elas, os medicamentos genéricos.

Os primeiros passos em direção aos medicamentos genéricos se deram na década de 60 quando o

governo dos Estados Unidos preocupou-se em comprovar a segurança e eficácia dos

medicamentos disponíveis. Coube ao National Research Council of the National Academy os

Sciences a responsabilidade desse estudo (GRUPO PRÓ-GENÉRICOS, 2005). Tais

medicamentos foram classificados em três categorias: os efetivos para todas as indicações

recomendadas, os provavelmente efetivos para as indicações recomendadas e os inefetivos para

as indicações recomendadas.

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A partir dessa classificação, os fabricantes locais conseguiram autorização para produzir os

medicamentos eficazes, isentando-se de estudos “in vivo”. Apesar disso, os processos para

registro de medicamentos genéricos ainda eram complexos. Foi que, em 1984, o Congresso

americano aprova o Drug Price Competition and Patent Term Restauration Act através da

Abbreviated New Drug Application que se tornaram medidas a facilitar a expansão dos genéricos

nos Estados Unidos. Foi adotado o teste de bioequivalência em substituição à obrigação de

repetição dos estudos para comprovação da segurança e eficácia. Esta lei revogou a proibição de

substituição de medicamentos prescritos e aumentou a duração efetiva das patentes. Essas

mudanças reduziram o tempo de disponibilização ao mercado de um medicamento cuja patente

expirou, de mais de 3 anos para menos de 3 meses, na média (COM CIÊNCIA, 2005).

O sucesso dessa experiência não tardou a chamar a atenção de outros países desenvolvidos –

principalmente no continente europeu – a seguir o exemplo. Outros fatores, como expõe a

ANVISA (2004), também colaboraram para a expansão dos genéricos no mundo. Calcula-se que

aproximadamente US$ 35 bilhões em patentes têm expiração próxima. O aumento da expectativa

de vida da população através da queda da mortalidade, naturalmente aumentou os gastos com a

saúde pública já que o envelhecimento da população traz consigo o aumento de doenças crônicas.

O consumidor, por sua vez, também tinha custos elevados devido ao alto valor dos medicamentos

disponíveis.

A ANVISA (2004) ainda aponta que atualmente cerca de 42% dos receituários médicos norte-

americanos são de medicamentos genéricos. Números expressivos também são encontrados em

outros países, principalmente na Europa. Os Estados Unidos, Japão e Alemanha juntos

representam 60% do mercado mundial de genéricos e o Grupo Pró-Genéricos (2004) indica que o

mercado mundial de genéricos se expande à taxa média de 11% ao ano.

Menda (2002) informa que o mercado farmacêutico mundial no ano de 1999 faturou US$ 338

bilhões. Destes, US$ 135 bilhões corresponderam aos Estados Unidos, US$ 47 bilhões ao Japão e

US$ 20 bilhões à Alemanha. Só nos Estados Unidos nesse ano foram gastos US$ 3,4 bilhões em

marketing voltado à comunidade médica (conforme a estratégia montada pelas grandes

corporações do ramo) e US$ 1 bilhão em marketing público.

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No mesmo ano, o mercado de genéricos norte-americano somava US$ 10 bilhões; na Alemanha,

US$ 2,2 bilhões; no Canadá, US$ 720 milhões e no Reúno Unido, US$ 650 milhões conforme

dados extraídos do SCRIP 99 – World Generic Drugs Market (GRUPO PRÓ-GENÉRICOS,

2004).

2.2 HISTÓRICO DE MEDICAMENTOS NO BRASIL

Até o descobrimento do Brasil, cabiam aos pajés a elaboração de fórmulas para tratamento de

doenças. À época, havia poucos médicos e farmacêuticos em Portugal e, de início, nenhum foi

mandado ao Brasil. A botica era uma prática pouco disseminada no Reinado e nas primeiras

expedições não foi trazido nenhum boticário. Portanto, na medida em que se acabavam as

fórmulas trazidas de Portugal, novas alternativas eram buscadas na natureza, tarefa que ficava a

cargo dos jesuítas já que eles eram os responsáveis pela saúde dos navegadores. Coube a eles

enfrentar as intempéries do novo território e a hostilidade dos indígenas; muitos obtiveram

sucesso e aprenderam com os pajés a manipular fórmulas para cura de seus males (MENDA,

2002).

Segundo o Menda (2002), a Europa esgotou seus recursos naturais para pesquisa e

desenvolvimento de novos fármacos, situação tal que a fez olhar para o Novo Continente, já que

as expedições haviam revelado o grande potencial. As novas expedições passaram a negociar

com os nativos os recursos naturais a serem levados à Europa.

Ao instituir o Governo Geral em 1549, Portugal escolhe Thomé de Souza para chefiá-lo. Sua

comitiva totalizava cerca de mil pessoas, dentre eles um boticário (Diogo de Castro) e seis

jesuítas, estes sob o comando de Manuel da Nóbrega. Nenhum médico compunha o quadro desta

comitiva (MENDA, 2002).

Outros jesuítas também foram enviados e se espalharam ao longo da costa brasileira onde

construíram igrejas e colégios. Dentro de seus colégios construíram enfermarias e boticas.

Dividiam as tarefas: uma parte deles cuidava dos doentes e a outra preparava as fórmulas. A sua

participação era de tamanha importância que, em São Paulo, José de Anchieta comandou os

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trabalhos e hoje é considerado o primeiro boticário de Piratininga e o patrono da Farmácia

brasileira.

A colonização se expandiu e as boticas as acompanhou, multiplicando-se de norte a sul. Na falta

de botica, as lojas dos mais variados ramos vendiam as fórmulas. A regulamentação somente se

deu no século XVI quando Dom Manuel I determinou que a distribuição de medicamentos fosse

exclusividade dos boticários. Em 1742, encomendado por Dom João V, foi elaborado um

regimento para determinar normas precisas e rígidas quanto ao licenciamento e ao exercício das

profissões de médico e boticário, o comércio e o preço das drogas e o exame periódico das

boticas. Em 1744, cria-se o Regimento para o Reino e o Império, que se tratava de um modelo de

legislação médico-farmacêutico (MENDA, 2002).

Segundo o Menda (2002), no início do século XIX havia falta de muitos medicamentos, quadro

que se inverteu na segunda metade do século já que drogas de todos os tipos, nacionais e

estrangeiras, eram colocadas à venda anunciadas como eficazes, mas que na verdade não tinham

qualquer valor terapêutico, e sim, motivação comercial. Até 1822, a fiscalização era feita pelo

físico-mor do Reino. Após a Independência, coube às Câmaras Municipais este encargo até que

os inspetores de saúde dos governos provinciais as substituíssem.

Também é notável a importância para o desenvolvimento da ciência no Brasil a formação

cientifica de José Bonifácio de Andrada e Silva, tutor de Dom Pedro II, formado em Direito e

Ciências Naturais pela Universidade de Coimbra. Sua influência despertou em seu pupilo o

interesse pelas ciências naturais.

Durante seu reinado, manteve estreitos laços com as ciências. Foi eleito sócio da Academia de

Ciências de Bruxelas e da Sociedade Real de Londres, assim como também enviava suas

observações astronômicas à Academia de Ciências de Paris. Comparecia com freqüência às

reuniões da Academia Imperial de Medicina. Inaugurou em 1880 o Primeiro Laboratório de

Fisiologia do Brasil. Acompanhou as experiências de dois pesquisadores brasileiros: João Batista

de Lacerda Filho e Luiz Couty (MENDA, 2002).

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Ao longo do século XIX instalaram-se no país várias faculdade de Farmácia. O curso foi criado

oficialmente a partir da fundação das Faculdades de Medicina do Império, em 1832 e, daí,

espalhou-se pelo país. Os alunos aprovado recebiam o título de farmacêuticos e estavam aptos a

exercer a profissão em todo território do Império (MENDA, 2002).

Até a data, o Império não havia preparado uma farmacopéia propriamente brasileira, então ficou

estabelecido em 1851 que o preparo dos medicamentos oficinais seguiria a farmacopéia francesa

até que se organizasse a nativa. Em 1917, é publicada a Farmacopéia Paulista que se tornou

obrigatória no estado de São Paulo e se disseminou, sendo aceita em vários outros estados. Mas

somente em 1926 é aprovado o Código Farmacêutico Brasileiro. O Brasil passa a ter a sua

farmacopéia, elaborada por Albino Dias da Silva. Esta teve sua primeira revisão dez anos depois

(MENDA, 2002).

A partir da segunda metade do século XIX, surgiram as farmácias. As boticas também se

transformariam em farmácias com estruturas bem montadas. Em 1918, contava-se 1.008

farmácias no estado de São Paulo (MENDA, 2002). A possibilidade de riqueza fez com que as

farmácias se proliferassem rapidamente.A partir deste fato, a falta de tabelas de preços permitia

que os preços variassem muito, o que causava prejuízos à população.

A indústria nacional de medicamentos foi lançada ao final do século XIX e se desenvolveu com

maior intensidade a partir do século XX. Conforme descrito no Manual Médico (2002), datam

desse período os pioneiros:

a) Farmácia, Drogaria e Laboratório Giffoni;

b) a Casa Granado;

c) o Laboratório Xavier;

d) o Laboratório e Drogaria Werneck;

e) o Instituto Medicamenta Fontoura, dentre outros.

Com isso, reduziu-se em muito a necessidade do país importar produtos químicos, drogas e

especialidades farmacêuticas, já que havia se iniciado a fabricação nacional. O mercado nacional

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se expandiu de tal forma que, no estudo de Cândido Fountoura realizado m 1938, ele contabilizou

6261 farmácias no Brasil, ou seja, uma farmácia para cada 7.027 habitantes. Destas, o estado do

Rio de Janeiro detinha 518 e o estado de São Paulo, 408. Constatou também que havia 20 escolas

de Farmácia no país (MENDA, 2002)

Na segunda metade do século XX, os médicos não mais formulavam e os farmacêuticos não mais

manipulavam as prescrições, e sim, comercializavam o que era preparado em laboratórios

industrializados que, por sua vez, fizeram desaparecer as farmácias oficinais.

2.2.1 O mercado farmacêutico brasileiro no século XX

Apesar da evolução dos laboratórios nacionais, o século XX é marcado pela entrada maciça dos

laboratórios multinacionais no Brasil. Com altos investimentos em P&D (pesquisa e

desenvolvimento) os países desenvolvidos conseguiram, principalmente após a II Guerra

Mundial, produção suficiente para atender as necessidades internas e devido à larga escala,

buscaram novos mercados que tivessem demanda potencial de absorvê-la. A essa fase Modell dá

o nome de “explosão das drogas” (MENDA, 2002). Várias substâncias, dotadas de eficiência

farmacêutica, foram desenvolvidos aumentando o desnivelamento científico e tecnológico entre

os laboratórios multinacionais e nacionais. O maior destaque do período é dos Estados Unidos

que dão um salto no desenvolvimento e produção de medicamentos.

O Brasil, por seu alto potencial para consumo de medicamentos, torna-se um mercado

interessante para a instalação e desenvolvimento de laboratórios estrangeiros, que tinham

privilégios, como incentivos fiscais e de importação (entre os anos de 1955 e 1958). Não tardou

até que eles assumissem a frente no “ranking” nacional e respondessem pelo maior “market

share” do setor, situação que perdura até os dias atuais. Fiuza e Lisboa (2004), no seu “Estudo

Econométrico da Indústria Farmacêutica Brasileira”, afirmam que as 20 maiores empresas do

setor – em sua maioria multinacionais – concentravam cerca de 63% do mercado total no ano de

1998.

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Acreditando que os medicamentos são artigos de primeira necessidade e que, portanto, devem

estar à disposição da população, o Brasil na década de 70 mesmo pressionado pelo “lobby” dos

países desenvolvidos, decidiu não reconhecer a Lei Internacional de Patentes para Medicamentos.

Essa decisão continha um segundo propósito, desta vez econômico: fomentar a indústria

nacional. Como os medicamentos não eram protegidos por patentes, abriu-se um mercado para

produção de cópias em laboratórios nacionais. Em 1976, a Lei 6.360 coloca sob o controle da

Vigilância Sanitária a matéria e as indústrias farmacêuticas tiveram autorização para realizar o

registro oficial dos medicamentos similares ao original (ANVISA, 2005). Está oficializado o

medicamento similar no país.

Até 2001 havia dois tipos de medicamentos similares: o similar com marca (isto é, com nome de

fantasia) e o similar sem marca (que utilizava a nomenclatura genérica, ou seja, do princípio ativo

da fórmula). Esta última categoria foi eliminada em outubro de 2001 – devido às leis que

regulamentaram o medicamento genérico – obrigando os medicamentos similares a ter marcas

comerciais (ou de fantasia) em destaque na impressão da caixa do medicamento (os princípios

ativos estariam impressos logo após o nome da marca, por força de lei em 1983, mas vinham em

menor destaque que a marca comercial, pela qual o produto deveria ser identificado).

2.3 OS MEDICAMENTOS GENÉRICOS NO BRASIL

No que tange a políticas sociais, é responsabilidade do Estado brasileiro, por força de lei, prover

assistência de saúde à população através de Políticas Públicas de Saúde elaboradas de acordo

com suas reivindicações e necessidades (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004). Historicamente,

sabe-se que o Estado não obteve sucesso em cumprir o seu papel, o que resultou em graves

distorções no sistema público de saúde no que diz respeito ao acesso digno e completo a

tratamento, criando um quadro social marcado pela aguda desigualdade, situação tal que ainda

perdura nos dias atuais.

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Na tentativa de reverter ou minimizar esta realidade, o governo, ao longo do tempo, busca

alternativas. É nessa conjuntura que se desenvolvem novas idéias, como a implantação dos

medicamentos genéricos no país.

2.3.1 Motivação brasileira para genéricos

Retoma-se com força a discussão sobre a implantação de medicamentos genéricos no país.

Alguns fatores a motivaram:

a) a economia proveniente da redução dos custos referentes à assistência de saúde,

principalmente na esfera pública, que os países que adotaram os genéricos experimentaram. Com

o crescimento da população, os custos referentes à saúde também se elevam e a situação se

agrava com o envelhecimento da população que aumenta os casos de doenças crônicas; estudos

da OMS apontam que pessoas com mais de 55 anos respondem por mais de 50% do consumo de

medicamentos no mundo (FERREIRA, 2003).

b) o decréscimo dos índices de mortalidade devido às descobertas de novo fármacos

aumentaram a expectativa de vida da população, baixando as taxas de mortalidade. Segundo a

OMS, a expectativa média de vida no início do século XX era de 40 anos, nos anos 60, de 55

anos e ao final do século, era de 65 anos. Projeções apontam que em 2020 a expectativa média

será de 75 anos; em 2050, de 90 anos e em 2080 o numero saltará para 110 anos (FERREIRA,

2003).

c) no mundo, cerca de um terço da população não têm acesso a medicamentos de acordo

com a OMS (FERREIRA, 2003). No Brasil, a assistência pública é muito dispendiosa e não

atende às necessidades da população, o que agrava o quadro interno de acesso a medicamentos. O

quadro que segue é parte de um estudo realizado em 1999 pelo The Economist (PRÓ-

GENÉRICOS, 2004) e explicita a grave desproporção no acesso ao consumo de medicamentos

no Brasil. Neste ano, o país angariou a 9ª colocação mundial de consumo de medicamentos per

capita mas a desigualdade social mostra que mais de 50% da população é privada de tratamento

condizente:

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Fonte: The Economist (1999)

d) no Brasil, cerca de 86% dos medicamentos disponíveis no mercado já têm suas

patentes expiradas, podendo ser transformados em genéricos a qualquer momento. No mundo,

estima-se que 35 bilhões de dólares em patentes expirem nos próximos anos (ANVISA, 2005);

e) até o surgimento dos genéricos, a única classe de medicamentos com garantia de

qualidade (atestada por órgãos internacionais) eram os medicamentos de referência, já que o

governo brasileiro não exigia aos similares os testes de bioequivalência e biodisponibilidade,

sendo assim uma opção duvidosa para consumo. Portanto, a única alternativa que garantia

segurança e eficácia eram os medicamentos de referência, que custavam mais à população e ao

sistema de assistência a saúde. A falta de concorrência à altura mantinha o governo e a iniciativa

privada dependentes – em muitos casos – dos “gigantes farmacêuticos” internacionais agravando

o cenário de acesso a tratamento. Economicamente, ao se aprovar a Lei de Genéricos, abriu-se

oficialmente no mercado farmacêutico nacional mais uma categoria de medicamentos capaz de

ser um forte concorrente pois se tratava de uma categoria com qualidade garantida e preço mais

baixo;

f) a taxa mundial de crescimento do mercado de genéricos é de 11% ao ano (GRUPO

PRÓ-GENÉRICOS, 2004), índice muito animador se levado em consideração o fator econômico.

2.3.2 A implantação dos genéricos no Brasil

O início do processo de discussão sobre a implantação dos medicamentos genéricos no Brasil se

deu ainda na década de 70, quando da publicação do Decreto no. 793 que obrigava o uso da

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denominação genérica do medicamento, isto é, o nome do princípio ativo do mesmo nas

embalagens em tamanho três vezes maior que o da marca do medicamento. Esse decreto esbarrou

na falta de motivação política e de problemas técnicos e não foi adiante (ANVISA, 2004).

Segundo a ANVISA (2004), um dos principais motivos que atravancaram a implantação dos

medicamentos genéricos foi o fato de o Brasil não reconhecer patentes. Em 1996, o Brasil volta a

ser pressionado a reconhecer medicamentos com patentes devidamente registradas no exterior e,

então, é sancionada a Lei de Patentes no país (Lei 9.279 de Proteção Industrial) que entrou em

vigor em maio de 1997. Esta regulamentava que os medicamentos com patentes reconhecidas no

exterior e que ainda não tenha vencido o período de proteção patentária não poderiam mais ser

copiados, a não ser quando em acordo com o detentor patentário do medicamento. Até então, as

“cópias” de medicamentos (medicamentos similares) eram permitidas.

Exemplos de sucesso em países como os Estados Unidos, Alemanha, Japão dentre outros

motivaram o Brasil a discutir uma política nacional para medicamentos genéricos, seguindo o

modelo desses países que se embasavam em diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS).

A OMS recomendava que os países deveriam implementar políticas nacionais de medicamentos.

Afirmava que para que obtivesse êxito em um política nacional de medicamentos genéricos se

fazia necessário envolver os responsáveis pela prescrição, produção, obtenção de garantias de

qualidade, dispensação e uso adequado destes medicamentos.

Dados da ANVISA (2004) informam que no Brasil, o Ministério da Saúde formulou sua Política

Nacional de Medicamentos com a Portaria 3.916/98 considerando as recomendações da

Assembléia Mundial de Saúde em 1993. Estava aberto o espaço para implantação de uma Política

Nacional de Genéricos, o que se daria através da Lei 9.787/99 que fica conhecida como Lei de

Genéricos e revoga o Decreto 793. Sua iniciativa se deu por motivação do deputado federal

Eduardo Jorge do Partido dos Trabalhadores de São Paulo e sua sanção data de 1999. Era

finalidade desta lei instituir a Política Nacional de Medicamentos Genéricos traçando diretrizes,

normas e critérios para sua implementação.

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A ANVISA (2004) monta um quadro-geral resumido para ilustrar o caminho do processo de

implantação dos genéricos no país:

Década de 70 Início do processo com o Decreto 793 - primeira tentativa de estabelecer osgenéricos – revogado pelo Decreto 3.181, de 23/9/99, que regulamentou aLei 9.787, de 10/2/99 .

Década de 90 Com a aprovação da Lei 9.787/99, de 10/2/99, foram criadas as condiçõespara a implantação da Política de Medicamentos Genéricos, em consonânciacom normas internas adotadas pela Organização Mundial de Saúde, Paísesda Europa, Estados Unidos e Canadá.

Fevereiro/2000 Concessão dos primeiros de registros de medicamentos genéricos(03/02/00) e início da produção dos medicamentos.

Fev. a dez/2000 Foram concedidos 189 registros de medicamentos genéricos e tomadasações para implementar a produção desses medicamentos, inclusive comincentivo à importação desses medicamentos.

Estimativa p/2001 Incrementar, em 70%, a concessão de registros de medicamentosgenéricos.

Redução dos prazos de análise dos processos para concessão de registro.

Disseminar informações sobre os medicamentos genéricos para a populaçãoe, em especial, para os profissionais da saúde.

Fonte: ANVISA, 2004.

Após a promulgação da Lei 8.787/99 a ANVISA (2004) elabora a resolução 391/99 que tinha o

objetivo de estabelecer critérios técnicos para o registro de genéricos. Esta resolução passou por

duas revisões ate ser republicada como RDC 84 de março de 2000, determinando o regulamento

técnico vigente.

Pronto o arcabouço legal, o governo apressou-se em realizar ações para consolidar os

medicamentos genéricos no país. Uma das principais ações em prol da implantação dos genéricos

se deu em 2000 com o Decreto 3.675 que definiu critérios para concessão de registro especial

com prazo de validade de um ano para medicamentos que fossem importados e que possuíssem

registro pelo “Food and Drug Administration” ( FDA) dos Estados Unidos, pela Direção de

Produtos Farmacêuticos do Canadá e pela Agência Européia de Avaliação de Produtos

Medicinais.

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Para evitar que o consumidor se confundisse ao escolher o medicamento genérico – já que alguns

similares também eram comercializados utilizando-se o nome do princípio ativo – a ANVISA

(2004), por meio das resoluções RDC 92 de outubro de 2000 e a RDC 36 de 2001, proibiu a

produção e comercialização dos similares que tinham em sua embalagem apenas o princípio

ativo. Também, com a finalidade de facilitar o reconhecimento do genérico pelo consumidor foi

criada uma embalagem diferenciada, constando uma tarja amarela com a letra “G” em azul e o

termo “medicamento genérico” conforme consta na resolução RDC 47 de 2001.

Abaixo, o modelo-padrão instituído por essa resolução:

Fonte: ANVISA, 2004.

Neste mesmo ano, como já havia uma quantidade expressiva de genéricos à disposição no

mercado, o Ministério da Saúde elaborou diversas campanhas publicitárias com o intuito de

disseminar informações e propagar os genéricos para a população. Era interesse do órgão

divulgar os medicamentos genéricos como uma alternativa segura, eficaz e a um custo menor, ou

seja, o Governo Federal apostou no apelo do binômio “qualidade e preço baixo” como

argumentos principais na divulgação desta categoria de medicamentos.

A classe médica teve ações específicas com o objetivo de informar sobre os genéricos para que

ela pudesse reproduzir informações corretas aos pacientes, assim como também para estimular a

prescrição de medicamentos utilizando-se o princípio ativo. Criou-se em agosto de 2000 o

Programa Nacional de Monitoramento dos Medicamentos Genéricos objetivando garantir a

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manutenção da qualidade dos genéricos disponíveis. Coube à Fiocruz, através do Instituto

Nacional de Controle da Qualidade em Saúde (INCQS) a sua coordenação. Amostras eram

extraídas de medicamentos no mercado para que se testasse quanto à qualidade.

Para as empresas interessadas em comercializar os genéricos foram abertas pelo Banco Nacional

de Desenvolvimento (BNDES) linhas de financiamento destinadas a projetos industriais de

produção de genéricos. Abrangia o financiamento para cultivo e melhoramento genético de

plantas, custeio de testes de bioequivalência e aquisição de matéria-prima.

Um quadro elaborado pela ANVISA,dá uma visão geral da implantação dos medicamentos

genéricos no Brasil:

ÁREAS BÁSICAS AÇÕES DESENVOLVIDAS

REGULAÇÃO ResoluçãoRDC 10

2/1/01 Assegura a qualidade medicamentos genéricos.Revoga a Resolução 391, de 9/8/99

ResoluçãoRDC 92

23/10/00 Dispõe sobre critérios para rotulagem demedicamentos. Substituiu a Resolução 510/99.

Resolução 349 20/1/00 Dispõe sobre a dispensação de medicamentosgenéricos – intercambialidade/substituição dogenérico.

ResoluçãoRDC 45

15/5/00 Estabelece a obrigatoriedade das farmácias,drogarias e estabelecimentos que comercializammedicamentos, fixarem a relação de genéricos.

Decreto 3.181 23/9/99 Regulamenta a Lei 9.787 e estabelece a utilizaçãodos nomes genéricos.

ResoluçãoRDC 78

17/8/00 Determina as empresas apresentaremmensalmente relatório de produção ecomercialização de genéricos.

Resolução 41 28/4/00 Cadastramento para habilitação de realização deensaios de biodisponibilidade e bioequivalência.

Lei 9.787 10/2/99 Regulamenta o medicamento genérico

GARANTIA

DA QUALIDADE

• Ampliação dos Centros e Sistemas de Referência para realizaçãode testes de bioequivalência .

• Programa de monitoramento dos genéricos, assegurando a garantia daqualidade dos medicamentos comercializados no mercado.

• Programa de inspeções nas Indústrias.

PRODUÇÃO • Estímulo para produção de genéricos.

• Seleção de medicamentos de referência e definição de prioridades paraprodução de genéricos.

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IMPORTAÇÃO • Fortalecimento das estruturas de oferta e regulação dos preços,possibilitando maior oferta competitiva no mercado.

REGISTRO • Trato preferencial aos genéricos, com redução dos prazos paraprocessos de registro.

REGULAÇÃO DOMERCADO

FARMACÊUTICO

• Criação da Câmara dos Medicamentos através da MP 2138-2, de28/12/00, para acompanhamento da comercialização dosmedicamentos no mercado.

• Monitoramento dos preços dos medicamentos praticados pela IndústriaFarmacêutica.

EFICIENTE SISTEMADE INFORMAÇÃO

• Publicação atualizada de informações sobre medicamentos genéricosregistrados e em análise.

• Atendimento à população e profissionais de saúde através do faleconosco .

• Produção de material técnico-científico e informativo aos profissionaisde saúde e usuários.

• Campanhas na TV.

• Disponibilização de informações técnicas e de cunho informativo emsite da ANVISA

FORTALECIMENTO DAPOLÍTICA DEASSISTÊNCIA

FARMACÊUTI-CA

• Farmacêutico faz a substituição genérica nas farmácias.

• Articulação e parcerias com todos os segmentos envolvidos na área demedicamentos, como: MS, OPAS, MERCOSUL, ENSP, FIOCRUZ, NAF,ALFOB e demais entidades representativas de classes.

Fonte: ANVISA (2004).

2.3.3 Os primeiros registros e o mercado nacional de medicamentos genéricos

Datam do ano 2000 a liberação dos primeiros registros assim como o início do processo de

produção dos medicamentos genéricos no país. Ao final do ano, 189 registros haviam sido

aprovados e, para acelerar a entrada de genéricos no mercado, o governo concedeu incentivos às

importações de genéricos. A partir de então se intensificaram os pedidos e, consequentemente, a

emissão de registros. Dados da ANVISA, atualizados até julho de 2005, informam que há 1617

genéricos registrados, dos quais 945 já são comercializados. São 299 fármacos de 64 classes

terapêuticas distribuídos em 7596 apresentações; destes, 203 fármacos de 49 classes terapêuticas

em 1689 apresentações estão disponíveis no mercado.

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Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 1 - Medicamentos genéricos - comercialização

Contabilizando por país de origem, o Brasil é o país que mais registros conseguiu junto a

ANVISA como se pode observar no gráfico:

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Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 2 – Medicamentos genéricos registrados por país de origem

Entre os laboratórios nacionais e importados, o Brasil também detém a maior participação de

medicamentos comercializados, consoante gráfico abaixo:

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Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 3 Medicamentos genéricos –comercialização – nacionais e importados

São 61 laboratórios autorizados pela ANVISA para produzir ou importar genéricos e que já

possuem registros aprovados, como segue:

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Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 4 – Medicamentos genéricos – registros por empresa detentora

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Segmentando os genéricos, temos que mais de 80% dos registros concedidos são de

medicamentos de administração por via oral e tópica, predominantemente encontrados em

farmácias e drogarias enquanto menos de 20% são administrados por via injetável, mais

utilizados em hospitais. Um quadro geral explicita essa realidade:

Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 5 – Medicamentos genéricos – visão geral

Para ilustrar a rápida evolução no registro de fármacos no Brasil desde sua aprovação, temos o

gráfico abaixo:

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Fonte: ANVISA, 2005.

Figura 6 - Evolução de número de apresentações de medicamentos genéricos registradas

Observa-se neste que a motivação comercial serve como fator impulsionador de registros.

Somando-se isso à limitação de fármacos que podem ser transformados em medicamentos

administrados por via injetável, temos curvas bem distintas.

2.4 MEDICAMENTOS DE REFERÊNCIA, GENÉRICOS E SIMILARES: SUA REALIDADE

A legislação brasileira reconhece oficialmente três categorias de medicamentos, segundo a

ANVISA: os medicamentos de referência, os genéricos e os similares. A Lei 9.787/99 dá suas

definições. A seguir, tratarei individualmente as peculiaridades de cada categoria, abordando

definição, características, estratégias aplicadas, etc.

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2.4.1 Medicamento de referência

A Lei 9.787/99 define o medicamento de referência como “o produto inovador registrado no

órgão federal responsável pela vigilância sanitária e comercializado no país, cuja eficácia,

segurança e qualidade foram comprovadas cientificamente junto ao órgão federal competente,

por ocasião do registro” (ANVISA, 2004).

Os medicamentos de referência no Brasil são, em sua maioria, provenientes de laboratórios

multinacionais. São predominantemente mais caros que as demais categorias devido aos altos

investimentos em pesquisa e desenvolvimento e aos elevados gastos e propaganda da nova

marca.

O médico é o alvo da estratégia de marketing das indústrias farmacêuticas que comercializam

medicamentos dessa categoria, também conhecidos informalmente por “medicamentos de

marca”. Usam geralmente nomes de fantasia de fácil memorização associado ao fármaco e

contratam inúmeros propagandistas para que visitem regularmente a categoria de médicos

correspondente à classe terapêutica do medicamento propagado. Algumas ferramentas são

utilizadas tais como amostras grátis, folhetos informativos, catálogos e listas de produtos e verbas

revertidas em forma de prêmios, brindes, viagens, passeios etc. Esse trabalho é tão intensivo que

a ABIFARMA – Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica – realizou um estudo sobre as

despesas com promoção de medicamentos no Brasil e atestou que elas se situam entre 14% e

32,5% de seu faturamento, distribuídas da seguinte forma (MENDA, 2002).

a) Representantes: 43%

b) Mala direta: 19%

c) Publicidade médica: 13%

d) Amostras grátis: 9%

e) Outras atividades: 16%.

O intuito dessa estratégia é de conduzir a comunidade médica a uma prescrição cativa desses

medicamentos propagados.

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Devido aos altos custos envolvidos nesse processo, os descontos oferecidos nestes medicamentos

são poucos ou até mesmo nulos, não trazendo benefícios para o consumidor no que diz respeito a

preços mais acessíveis.

2.4.2 Medicamentos similares

Segundo a ANVISA (2004), a Lei 9.787/99 em seu 3º. Artigo, inciso XX define o medicamento

similar como:

aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a mesma

concentração, forma farmacêutica, via de administração, posologia e indicação

terapêutica, preventiva ou diagnóstica do medicamento de referência registrado no

órgão federal responsável pela vigilância sanitária, podendo diferir somente em

características relativas ao tamanho e forma do produto, prazo de validade,

embalagem, rotulagem, excipientes e veículos, devendo sempre ser identificado por

nome comercial ou marca.

Surgiram como uma alternativa aos medicamentos de referência e são cópias destes, nem sempre

idênticas. Os laboratórios produtores não precisam desenvolver o fármaco inovador, o que os

poupou de altos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Até recentemente não havia

obrigação de testes de bioequivalência ou biodisponibilidade, o que deixava a impressão de não

haver qualidade. Esses dois aspectos permitiram que os medicamentos similares tivessem preços

mais acessíveis ao consumidor.

A estratégia principal das indústrias farmacêuticas produtoras destes é voltada aos profissionais

de balcão e aos donos de farmácias. As indústrias fabricantes de medicamentos similares não se

utilizam de propagandistas para atuar junto à comunidade médica. Seus recursos disponíveis são

repassados em forma de descontos para distribuidores ou atacadistas. Estes, por sua vez, têm

equipes de representantes comerciais que atuam junto aos compradores ou donos de farmácias

oferecendo altos descontos, o que torna o medicamento similar o mais rentável para as farmácias

se comparados às demais categorias de medicamentos existentes no país.

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Como não têm um trabalho direcionado à comunidade médica, para gerar demanda, parte dos

descontos recebidos pelos distribuidores e atacadistas é revertido em prêmios, brindes ou verbas

para profissionais de balcão; trata-se de uma categoria de profissional cuja remuneração é

historicamente baixa, sendo assim, mais suscetíveis à sedução dos benefícios financeiros

oferecidos por distribuidores e atacadistas.

Em suma, é um medicamento que oferece benefícios financeiros a profissionais de balcão, a

maior rentabilidade ao farmacistas e o preço mais acessível à população.

2.4.3 Medicamentos genéricos

Conforme consta no banco de dados da ANVISA (2004), o artigo 3º., inciso XXIII, da Lei

9.787/99 traz a definição dos medicamentos genéricos como

o medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende

ser com este intercambiável, geralmente produzido após a expiração ou renúncia

da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada a sua

eficácia, segurança e qualidade, e designado pela DCB (denominação comum

brasileira) ou, na sua ausência, pelo DCI (denominação comum internacional).

A mesma lei explica o conceito de “intercambialidade” como “o equivalente terapêutico e um

medicamento de referência, comprovados essencialmente, os mesmos efeitos de eficácia e

segurança”. A intercambialidade é garantida pela obrigatoriedade dos testes de bioequivalência e

biodisponibilidade, ou seja, o registro de um medicamento genérico somente poderá ser

concedido a partir dos resultados positivos destes dois testes que garantem eficácia e segurança

idênticas a do medicamento de referência. Entende-se por bioequivalência a

demonstração de equivalência farmacêutica entre produto apresentados sob a

mesma forma farmacêutica, contendo idêntica composição qualitativa e

quantitativa de princípio(s) ativo(s), e que tenham comparável

biodisponibilidade, quando estudados sob um mesmo desenho experimental”

(Lei 9.787/99).

Já o teste de biodisponibilidade “indica a velocidade e a extensão de absorção de um princípio

ativo em forma de dosagem, a partir de sua curva concentração/tempo na circulação sistêmica ou

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sua excreção na urina” (Lei 9.787/99). Foi sob estes argumentos de “qualidade x preço baixo”

que o Governo Federal defendeu e divulgou os medicamentos genéricos.

A Lei 9.787/99 também regula a prescrição dos genéricos, obrigando todas as prescrições

médicas e odontológicas advindas do Sistema Único de Saúde (SUS) a adoção da DCB, ou na sua

falta, da DCI. Já para os serviços privados de saúde, a prescrição de genéricos é facultada pelo

responsável da mesma, podendo conter o nome do princípio ativo ou a marca comercial. Caso

haja restrições à intercambialidade, o prescritor deve registrar de próprio punho a não permissão

à troca do medicamento prescrito pelo equivalente genérico.

Fica sob responsabilidade da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), autarquia sob

regime especial criada pela Lei 9.782/99 e vinculada ao Ministério da Saúde, a proteção da saúde

da população por meio de controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e

serviços submetidos à vigilância sanitária. Portanto, cabe a ANVISA a liberação de registros, o

monitoramento, a fiscalização e controle dos medicamentos genéricos, dentre outras várias

atribuições.

O registro de um medicamento genérico dar-se-á apenas após a expiração da patente do

medicamento de referência ou havendo permissão do detentor patentário. Havendo a intenção de

comercializá-lo, a empresa interessada deve definir a fórmula e o processo de produção. Uma

série de requisitos exigidos pela ANVISA (2004) devem ser atendidos: a pré-submissão, o

registro e o pós-registro.

A pré-submissão é a fase em que a empresa apresenta o projeto de análise e aprovação da

ANVISA constando de: fórmula padrão, processo de fabricação, equipamentos utilizados,

protocolo com estudos de estabilidade e validação do processo, a metodologia analítica utilizada,

o protocolo de estudos de bioequivalência e atender às normas estabelecidas na Resolução

84/2002. O projeto é analisado e, se aprovado, a empresa recebe a autorização para produção de

lotes preliminares a serem utilizados nos estudos acima citados.

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A fase seguinte é o registro. Nesta, a empresa terá que apresentar toda a documentação exigida

pela legislação vigente, como: alvará de funcionamento, certificado de Boas Práticas de

Fabricação, certificado de responsabilidade técnica, relatório técnico do fármaco contendo

aspectos farmacodinâmicos, farmacocinéticos, toxicológicos, resultados de estudos clínicos

realizados. Se o parecer técnico for favorável, o medicamento será considerado genérico e será

publicado no Diário Oficial da União (DOU), podendo ser comercializado a partir da data de

publicação.

No pós-registro, após a publicação do registro, a empresa deve comunicar à ANVISA, entre

outros procedimentos, a distribuição de lotes para que se possa fazer a apreensão de algumas

unidades para análise e controle de qualidade dos lotes produzidos e distribuídos mensalmente.

Periodicamente, devem ser emitidos relatórios informando a ocorrência de reações adversas, para

garantia do monitoramento da segurança e eficácia do medicamento genérico.

Segundo o Grupo Pró-Genéricos (2005), os números atingidos pelos genéricos no Brasil têm uma

trajetória ascendente desde seu surgimento, alcançando este ano um crescimento de 20,2% em

unidades vendidas no período de janeiro a maio se comparado com o mesmo período de 2004.

Foram 57,2 milhões de unidades comercializadas contra 47,6 milhões do mesmo período do ano

anterior. Quanto ao faturamento, o período registrou US$ 239 milhões contra US$ 166,8 milhões.

Vale ressaltar que o mercado farmacêutico nacional regrediu 0,6% em unidades vendidas no

período. O “market share” dos genéricos no mercado farmacêutico nacional registrou em maio de

2005, 11,31% com faturamento de US$ 58,9 milhões e 13,2 milhões de unidades

comercializadas.

O Grupo Pró-Genéricos (2005) afirma ainda que o mercado de genéricos no mundo cresce a uma

taxa média anual de 11% e que este mercado no Brasil também tem acompanhado a tendência de

crescimento com grande potencial futuro. Para 2005, a meta do Grupo Pró-Genéricos era atingir

12% de “market share”.

A estratégia adotada pelas indústrias fabricantes de genéricos não tem se mostrado tão clara como

nas outras categorias. Observa-se que, logo no início da comercialização, as indústrias ainda não

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tinham uma estratégia comercial sólida. Suas políticas foram se delineando ao longo dos últimos

anos. Algumas optaram por propagar seus produtos junto à comunidade médica ao mesmo tempo

em que ofereciam descontos aos distribuidores e atacadistas para que estes os repassassem às

farmácias.

A maioria das indústrias, todavia, optou por trabalhar com uma estratégia próxima à dos

similares, com descontos agressivos embora ainda não na mesma monta destes já que destinavam

parte de sua verba a ações no ponto de venda. Alguns ainda somaram à essas ações a utilização

de mídia direcionada à população com o objetivo de disseminação de informação e de

fortalecimento do marketing institucional para agregar valor e atribuir confiança ao produto, já

que os genéricos têm a peculiaridade de não serem reconhecidos por uma marca; a única marca

que consta no genérico é a do laboratório fabricante do produto. Outros, ainda, fazem um híbrido

dessas estratégias e atuam em várias frontes.

Qualquer que seja a estratégia utilizada, os descontos praticados são muito maiores que nos

medicamentos inovadores, mas ainda inferiores aos dos similares. Portanto, estão no segundo

lugar quando se leva em consideração a rentabilidade que propõem aos farmacistas. Apesar disso,

são interessantes aos farmacistas pela características de intercambialidade que legalmente permite

a indicação e troca do medicamento prescrito por um genérico o que não ocorre com os

medicamento similares, pois caso seja comprovada a troca de um medicamento prescrito por um

similar, a Vigilância Sanitária pode efetuar multas.

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3. REFERENCIAL TEÓRICO

O objetivo de todo produto novo é atingir o sucesso comercial. Para tal, é imprescindível que o

consumidor consiga identificá-lo e diferencia-lo dos demais concorrentes; uma das funções das

marcas é colaborar com esse objetivo (KOTLER, 1998, p. 393).

O produto sob estudo neste trabalho são os medicamentos genéricos, categoria que tem como

trunfos qualidade e preço baixo, mas que, por outro lado, apresenta como problema a ausência de

marca de produto. A característica de ausência de marca de produto é altamente relevante pois

tem o potencial de causar impacto no desempenho comercial do produto, principalmente se

analisarmos que a categoria de medicamentos genéricos está inserida em um mercado complexo e

dinâmico, dominado por “medicamentos de marca”.

A única marca que se evidencia nos medicamentos genéricos é a do laboratório fabricante, que

pode funcionar como uma “marca-caução” (NORBERTO, 2006) para transferir ao produto as

significações positivas atreladas à imagem institucional do seu fabricante. A ausência de marca

de produto e o papel da marca-caução para os medicamentos genéricos serão discutidos neste

capítulo.

A ausência de marca própria do produto, todavia, não implica em ausência de significado para o

consumidor. Um produto novo, como o medicamento genérico, apesar de não contar com o

recurso da marca de produto, não é desprovido de significações para a sociedade; qualquer

produto que esteja inserido no meio social tem significações e seu sucesso dependerá diretamente

da aceitação e confiança da sociedade na qual está inserido.

O medicamento genérico tem breve histórico nacional e, como qualquer novo produto, necessita

naturalmente de um período de tempo para que as trocas de informações se dêem através dos

processos de interação social e, consequentemente, atribuam significações ao produto. Cabe aos

interessados em seu sucesso – Governo Federal e laboratórios fabricantes – a responsabilidade de

divulgar informações que colaborem positivamente com a formação das representações sociais

sobre os genéricos. O senso comum de uma coletividade sobre o produto, formado nesse

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processo, compõe as representações sociais partilhadas e estas, por sua vez, ajudam a direcionar o

comportamento de compra do consumidor em relação a um determinado produto, daí a

importância de desenvolver a Teoria das Representações Sociais relacionando-a com os

medicamentos genéricos.

O conceito de “confiança” está intimamente relacionado com os conceitos de marca/imagem de

marca e representações sociais. Os laboratórios fabricantes de medicamentos genéricos somente

conseguirão caucionar seus produtos se transmitirem credibilidade à população; credibilidade

está intimamente ligada à confiança. O medicamento genérico, como produto novo, precisa ser

associado a significações positivas que lhe atribua segurança, já que todo medicamento ao ser

prescrito envolve risco. O consumidor somente terá confiança quando avaliar que o medicamento

é seguro e eficaz à sua necessidade pois o que está em questão é o bem mais valioso do ser

humano, a vida. A segurança, o perigo e o risco são elementos que se relacionam diretamente

com a confiança e, portanto, serão abordados no desenvolver deste conceito.

Este capítulo é composto de três seções. Na primeira será debatida o conceito de “marcas” de

acordo com Philip Kotler, David Aaker e Elaine Norberto. A segunda seção se preocupa em

desenvolver a Teoria das Representações Sociais com base em Serge Moscovici, Gerard Duveen,

Jean Claude Abric e Celso Pereira de Sá. A terceira seção diz respeito ao desenvolvimento do

conceito de “confiança” com base nos estudos de Anthony Giddens.

3.1 MARCAS

Embora haja registros na História Antiga de mercadorias que utilizavam nomes para identificar

seus fabricantes, as marcas surgiram como um forte conceito no século XX. À medida que

avançávamos neste século, o mercado se tornava mais competitivo com a ampliação de ofertas de

produtos. O acirramento da disputa concorrencial forçou uma redução de preços e impulsionou os

fabricantes a buscarem formas de diferenciação com o objetivo de destacar seu produto frente aos

demais e, assim, proteger suas margens. Uma das formas encontradas para defender as margens

em mercados competitivos foi desenvolver marcas sólidas.

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David Aaker (1998, p.07) e Philip Kotler (1998, p. 393) têm definições muito semelhantes no que

tange à marca. Para ambos, a marca é um nome ou símbolo que tem o propósito de identificar

bens ou serviços de um vendedor e diferencia-los dos demais concorrentes.

Elaine Norberto (2006) complementa, enfatizando que as marcas não têm somente a função de

diferenciar produtos, mas têm também a função social de identificação, diferenciação e

segmentação de indivíduos e grupos sociais. Conforme a autora, as marcas são “a construção de

um patrimônio simbólico” e sua imagem é o resultado do campo simbólico partilhado sobre ela,

ou seja, as representações sociais partilhadas.

A marca é um ativo intangível e, quanto mais consolidada no mercado, maior é seu valor

patrimonial para a instituição. Assim, ao convencer o consumidor que o seu produto é composto

por um conjunto de significações positivas, seu fabricante consegue diferencia-lo dos demais,

atraindo os consumidores à sua marca, o que coloca a empresa em vantagem competitiva diante

da concorrência.

Sabendo-se da importância que uma marca consolidada tem para o desempenho de um produto

no mercado, como analisar, então, um produto ausente de marca de produto?

Uma marca bem estabelecida ambienta automaticamente o consumidor em relação às suas

qualidades e atributos pois traz consigo conceitos esperados pelos consumidores, tais como

modernidade, durabilidade, credibilidade, segurança, etc. Ao optar por uma marca, o consumidor

se apóia nas representações que a compõe; ele cria a expectativa de que as características

específicas, os benefícios e serviços prometidos por ela estejam em conformidade com o que ele

espera.

Os medicamentos genéricos, por definição em lei, são medicamentos “designados pela DCB

(denominação comum brasileira) ou, na sua ausência, pela DCI (denominação comum

internacional)” - Lei 9.787, de 1999, artigo 3º. Inciso XXI -, isto é, na sua embalagem consta(m)

o(s) princípio(s) ativo(s) da fórmula que o compõe, sendo proibida, então, uma marca de produto

que o identifique. A única marca que se evidencia nos medicamentos genéricos é a marca do

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fabricante, isto é, uma “marca-caução”. Ao caucionar um medicamento ausente de marca de

produto, o fabricante procura relacionar os valores contidos em sua imagem institucional ao seu

produto como forma de lhe atribuir segurança e confiança.

O que a realidade brasileira mostra é que os laboratórios fabricantes de medicamentos genéricos

pouco fizeram quanto à divulgação e consolidação de sua marca institucional junto à sociedade,

focando seus esforços em ações comerciais. Partindo do pressuposto que os consumidores em

geral pouco conhecem sobre medicamentos (pois se exigem conhecimentos técnicos para tal) as

marcas dos laboratórios produtores não têm expressividade para os consumidores e, portanto, têm

pouca capacidade de influir no seu comportamento de consumo.

No Brasil, os medicamentos genéricos surgem numa conjuntura onde as marcas de produtos já

estabelecidas dominam o mercado farmacêutico. Os laboratórios produtores de medicamentos

inovadores dispõem de proteção patentária sobre a nova droga, que dura um período mínimo de

dez anos (ANVISA, 2004). Durante o período de patente nenhum outro concorrente pode lançar

no mercado droga idêntica com a sua marca própria, ou seja, o direito de fabricação e

comercialização da nova droga é protegido por patente ao descobridor do princípio ativo até que

expire o período de patente.

Como são investidos bilhões de dólares e anos de pesquisa até que se chegue a uma droga final

para ser colocada no mercado (ANVISA, 2004), os laboratórios fazem uso principalmente do

período de patente para conseguir o retorno desse seu investimento e obter lucros para reinvestir

em novas drogas no futuro. Durante esse período, a nova droga ganha o nome de uma marca e é

divulgada maciçamente por propagandistas junto à comunidade médica com a finalidade de

penetrar e consolidar esta marca no mercado, para que ela possa se manter em posição

privilegiada diante dos concorrentes mesmo depois de extinto o período de patente. Sendo assim,

os medicamentos genéricos surgem como um concorrente substituto a um medicamento de marca

já consagrada e têm como desafio conquistar mercado destes.

A conjuntura do mercado farmacêutico nacional, a ausência de marca de produto e a falha dos

laboratórios em funcionar como uma marca-caução se traduzem em percalços à intenção de

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sucesso comercial dos medicamentos genéricos. O que se observa é que não há nesta categoria de

medicamentos uma marca representativa que leve o consumidor a um processo de reenvio e

associação com os medicamentos genéricos.

A ausência de marca dos genéricos não implica na ausência de significação do produto.

Independente da existência ou não de uma marca própria que o caracterize, qualquer produto

deve ser composto de significações positivas no âmbito social para que atinja sucesso. Reforço

esse raciocínio com base nos escritos de Norberto (2006, p.16) onde diz que “o sucesso comercial

da organização e, consequentemente, sua própria sobrevivência dependem não apenas de seu

desempenho tecnológico, produtivo, mas igualmente dos resultados obtidos na esfera simbólica”.

Marshall Sahlins apud NORBERTO (2006) defende que a utilidade dos objetos está intimamente

ligada à sua significação. Portanto, cabe aos interessados no sucesso dos medicamentos genéricos

a tarefa de disseminar informações que lhes atribuam eficácia e qualidade, permitindo que o

consumidor desenvolva a confiança no produto. O conjunto de significações agregado a um

produto quando comum a uma coletividade forma as representações sociais partilhadas.

O conceito de marca é insuficiente para tratar o campo simbólico dos medicamentos genéricos

pois não há a presença de uma marca de produto que lhes atribua significação e a “marca-caução”

contida no produto aparenta não agregar valor a ele. Como todo produto está inserido em um

campo simbólico, busco na Teoria das Representações Sociais embasamento teórico para tratar

da formação das representações sociais partilhadas sobre os medicamentos genéricos.

3.2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Na década de 60 emergiu um forte interesse acerca dos fenômenos que diziam respeito ao campo

do simbólico. Na tentativa de explicá-los, conceitos como consciência e imaginário ganharam

importância. É neste contexto que o romeno naturalizado francês Serge Moscovici, desenvolve a

Teoria das Representações Sociais que se torna um marco histórico para a Psicologia Social

(ARRUDA, 2002).

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A idéia de representação, todavia, não era inédita. O sociólogo Émile Durkheim já havia

anteriormente desenvolvido o conceito de “representações coletivas”. Moscovici se contrapõe à

idéia de representação defendida por Durkheim e desenvolve uma nova abordagem: a Teoria das

Representações Sociais. Esta abordagem se difundiu amplamente na década de 80. Até então, seu

desenvolvimento havia ficado restrito ao Laboratório de Psicologia da École de Haute Études em

Sciences Sociales (Paris), a alguns laboratórios de colegas como Jean Claude Abric e Claude

Flament (também na França) e a outros interessados por ela, dispersos pela Europa. Alguns

outros também alcançaram reconhecimento estudando o tema como Denise Jodelet, Gerard

Duveen, etc. No Brasil, alguns nomes se destacaram ao estudar as representações sociais, como

Celso Pereira de Sá e Sandra Jovchelovitch, dentre outros.

O que seriam, então, as “representações sociais”?

Embora afirme o quanto é fácil vivenciar as representações sociais na vida cotidiana por se tratar

de um fenômeno presente nas relações interpessoais, Moscovici revela a dificuldade em traduzir

esse fenômeno a um único e fixo conceito. De toda forma, no livro “Representações Sociais”,

Moscovici trabalha o tema auferindo algumas definições do que são as representações sociais.

Para o autor, por representações sociais

entendemos um conjunto de conceitos, proposições e explicações originado na vida

cotidiana no curso de comunicações interpessoais. Elas são o equivalente, em nossa

sociedade, dos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; podem

também ser vistas como a versão contemporânea do senso comum”. (SÁ, 1996)

Herdamos da Psicologia Social a noção de que os seres humanos sentem-se perturbados e

ameaçados com algo que não lhes seja familiar. A ausência de sentido é intolerável ao ser

humano, forçando-o a buscar informações que transformem este “algo não-familiar” em

“familiar” e assim restabeleça a sua estabilidade.

No processo de transformação do não-familiar em familiar, as pessoas partilham conhecimentos

umas com as outras e constroem, a partir disso, representações sociais que montam uma realidade

comum. Gerard Duveen apud Moscovici (2003, p. 09) traduz bem essa idéia ao afirmar que o

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propósito da Psicologia Social é compreender “os processos através dos quais o conhecimento é

gerado, transformado e projetado no mundo social”, ou seja, é conhecer como as idéias migram

do campo do abstrato para tornarem-se realidade para uma coletividade.

A vida cotidiana é cenário das representações sociais a partir do momento em que a linguagem é

utilizada como principal ferramenta para a comunicação com outras pessoas, promovendo a

interação social; a formação de representações sociais somente se dá quando interagimos

socialmente. Ao nos relacionarmos, estamos estabelecendo associações que dão sentido às coisas

e que nos ligam uns aos outros pelo senso comum, permitindo a estabilidade no convívio social.

Trazendo essas idéias para o estudo sobre medicamentos, os genéricos surgem como novo

concorrente em um mercado hipercompetitivo dominado por medicamentos com marcas. Ter

uma marca com significações positivas resulta em vantagem comercial pois identifica e destaca

os valores do produto frente aos demais concorrentes, facilitando sua penetração no mercado.

Ocorre que os medicamentos genéricos são produtos caracterizados pela ausência de marca de

produto e, portanto, não contam com o auxílio do recurso da marca própria para se diferenciar no

mercado. A única marca presente é a marca do laboratório fabricante que, na grande maioria dos

casos, é desconhecida pela sociedade. Essa realidade monta um quadro inicial desfavorável aos

medicamentos genéricos e a única forma de promovê-lo ao sucesso comercial é elaborar um

campo simbólico composto por significações positivas sobre eles que, ao ser partilhado pela

sociedade através de seu senso comum, forma representações sociais positivas sobre o produto.

Por se tratar de uma classe nova de medicamentos, a sociedade inicia um processo natural

reconhecimento, com a finalidade de transformar esse produto não-familiar em familiar.

Informações são buscadas no meio social para que se possam atribuir significações ao produto e,

posteriormente, compor suas representações sociais. Quando as informações de um produto estão

disponíveis em quantidade e qualidade suficiente para atingir todas as camadas da população, as

representações sobre ele tendem a se aproximar do que foi propagado. Portanto, para que o

medicamento genérico atinja o sucesso comercial, cabe aos interessados – Governo Federal e as

indústrias do segmento – divulgar informações que esclareçam as características do medicamento

genérico, possibilitando a associação de significações positivas.

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Caso contrário, a sociedade preenche as lacunas originadas pela falta de informação produzindo,

por si mesma, significações aleatórias que tornem o medicamento genérico familiar. Nesse

contexto, muitas vezes crenças e mitos, que nem sempre, correspondem à realidade do produto

são criados e absorvidos pela sociedade. Para ilustrar, alguns dos entrevistados na pesquisa

informaram que necessitavam dobrar a posologia do medicamento genérico para que ele tivesse o

mesmo efeito de um medicamento original.

No processo de interação social, os membros da sociedade trocam informações e estão sujeitos à

influência de determinados atores, principalmente nos casos onde seu conhecimento sobre o

assunto é precário ou inexistente. A sociedade em geral pouco conhece sobre a área de saúde pois

esta requer conhecimentos técnicos específicos já que lida com o bem-estar e a vida humana. É

natural, então, que na composição das representações sobre os medicamentos genéricos os

indivíduos busquem informações não só em membros de grupos que convivem mas também em

“sistemas de peritos” (estes defendidos por Anthony Giddens em seus estudos sobre a confiança

que tratarei a seguir).

O que vai determinar o nível de influência do prescritor é a credibilidade que o consumidor o

atribui. Legalmente, os únicos peritos autorizados a dar consultoria sobre os medicamentos são a

comunidade médica (prescritores oficiais) e os farmacêuticos (autorizados a substituir o

medicamento procurado por um medicamento genérico). A tarefa da comunidade médica, nesse

sentido, é de esclarecer os questionamentos dos pacientes pois são os profissionais preparados

para tal finalidade. Todavia, o que se observa na prática, é que além da influência de membros

dos seus grupos de referência (família, amigos, colegas, etc.), os consumidores também podem -

em determinadas situações - atribuir credibilidade a terceiros quando, por exemplo, consultam a

opinião de um balconista no ato de aquisição de um medicamento.

De toda forma, qualquer que seja o influenciador - respeitados os níveis de credibilidade junto ao

consumidor – ele tem a capacidade de ajudar a fixar significações sobre os medicamentos

genéricos já existentes, ou mesmo, de alterar significações retidas previamente pelo consumidor

nos casos em que são divergentes das opiniões do influenciador.

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Em resumo, qualquer que seja a conjuntura, é intolerável para a sociedade a condição de ausência

de significado de um produto, portanto, a inquietude social sobre os medicamentos genéricos

somente se estabilizará a partir da formação de representações sociais sobre eles. O medicamento

genérico somente atingirá sucesso comercial se, dentre outros fatores, conseguir compor

representações sociais positivas, já que através delas estão “legitimadas” socialmente as

qualidades do produto. Atingindo esse objetivo, os genéricos atrairão a confiança do consumidor.

Justifico, então, a importância da Teoria das Representações Sociais para o estudo sobre

medicamentos genéricos, pois, independente de uma marca de produto, nenhum objeto é isento

de representações e elas, por sua vez, terão papel fundamental na influência do comportamento

do consumidor na decisão de compra de um medicamento.

3.2.1 As funções das representações sociais

Moscovici (2003) consoante seus escritos, atribui às representações sociais duas funções básicas,

a saber:

a) Orientação: visa estabelecer uma lógica que permitiria as pessoas se orientarem em

relação ao mundo material e social em que vivem e, a partir disso, possam ter controle sobre ele;

b) Comunicação: visa permitir que a sociedade se comunique, utilizando para tal um

código que nomeie e classifique os aspectos do mundo em que está inserida, da sua história

individual e social.

Em complemento a Moscovici, Abric apud Sá (2002, p.44) prefere tratar mais especificamente as

funções das representações sociais atribuindo quatro funções às mesmas, como segue:

a) As funções do saber são as que permitem as pessoas elaborarem um quadro onde se

agregam conhecimentos acerca de uma determinada matéria, respeitando-se para tal seu quadro

cognitivo e seus valores. Daí sua importância para o estabelecimento da comunicação social, pois

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desenham o quadro de referência comum que torna possível a troca social, a transmissão e a

difusão do saber;

b) As funções identitárias, têm a responsabilidade de definir a identidade e garantir as

particularidades do grupo;

c) As funções de orientação, por sua vez, orientam os comportamentos e as práticas de

acordo com o que é considerado aceitável socialmente;

d) Por fim, a partir das funções justificatórias, os atores envolvidos no processo social

podem explicar os seus atos realizados.

No que diz respeito a medicamentos genéricos, a função do saber permite que os atores sociais

construam uma teia de conhecimentos associados ao genérico a partir da comunicação e interação

dos membros da sociedade. No processo de interação social, o consumidor recebe e troca

informações sobre um novo produto e o associa a partir do que já conhece com a finalidade de

classificá-lo. Para se familiarizar com o produto “medicamento genérico”, o consumidor se

utiliza do conhecimento prévio acumulado ao longo de sua existência para classificar o produto

em questão como um medicamento. Ao enquadrar o medicamento genérico em uma categoria, o

consumidor cria uma referência inicial do produto baseada no conhecimento que ele adquiriu

sobre medicamentos (seu quadro cognitivo sobre medicamentos). Após classificar o produto de

acordo com as informações obtidas no convívio social, a sociedade ainda em seu processo de

interação, acrescentará significações à classe de medicamentos genéricos, compondo suas

representações sociais.

As funções identitárias mostram que, a partir de um determinado “quadro de conhecimento”

elaborado sobre os genéricos e comum a um grupo de atores sociais, criam-se laços entre atores

sociais que unem os grupos sociais por afinidade. A pesquisa realizada neste trabalho, por

exemplo, pretende investigar se há representações diferentes entre classes segmentadas por

localização em função do poder aquisitivo da área. Ao participar de um determinado grupo

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social, seu comportamento em relação aos medicamentos genéricos serão orientados por esse

grupo, o que caracteriza a função de orientação.

Por fim, a função justificatória das representações sociais partilhadas por esse determinado grupo

social justificar os comportamento e ações que seus membros têm diante de uma determinada

matéria.

3.2.2 Transformando o não-familiar em familiar

Reconhecidas as funções das representações sociais, faz-se fundamental entender qual a estrutura

que as forma. A Teoria das Representações Sociais coloca que toda representação tem sua

estrutura construída por um processo figurativo e por outro simbólico, isto é, a objetivação e a

ancoragem, respectivamente (MOSCOVICI, 2003).

O processo de objetivação dá materialidade a um objeto abstrato, classificando-o de acordo com

o conhecimento prévio do indivíduo. Dá-se uma forma ao objeto, tornando-o concreto, ou seja,

transforma um conceito em uma imagem na mente humana. Para ilustrar, o processo de

objetivação do medicamento genérico se dá ao reconhecer e classificar este produto na categoria

de medicamentos.

Segue ao processo de objetivação a ancoragem. Sabe-se que as coisas não familiares causam

ameaça ao equilíbrio humano. É intrínseco ao ser humano não aceitar que um objeto não tenha

significado, ou seja, a lógica humana exige que um objeto tenha um significado, seja ele positivo

ou negativo. As coisas precisam ter identidade reconhecida para que se devolva o equilíbrio ao

ser humano.

A importância da ancoragem é de agir sobre o não-familiar transformando-o em familiar. Nesse

processo, o ser humano busca associações a partir do que já conhece para familiarizar o que não

lhe é conhecido. Para o genérico compor representações sociais positivas ele precisa ser

associado com valores tais quais eficácia, segurança e qualidade, o que estimulará a confiança do

consumidor em relação ao produto e, consequentemente, facilitará sua decisão no ato da compra.

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Para ratificar esse raciocínio, retomo as palavras de Moscovici (in SÁ, 2002 ) onde coloca que

“no todo, a dinâmica dos relacionamentos é uma dinâmica de familiarização, onde objetos,

indivíduos e eventos são percebidos e compreendidos em relação a encontros ou paradigmas

prévios”.

A dinâmica constante de comunicação e interação social forma e transforma as representações

sociais. A emergência de novas representações parte da mudança dos interesses da sociedade, ou

seja, a representações mantêm sua constância enquanto interessante para sociedade. Quando

passam a perder sua importância, a estabilidade da representação anterior é modificada gerando

uma nova ou substituída, contato que venha a se encaixar melhor com o novo interesse social.

Evidencia-se, aqui, o contraponto de Moscovici a Durkheim. Moscovici contesta o trabalho do

sociólogo afirmando que as representações sociais não são um conceito estático mas um

fenômeno psicossocial dinâmico. O dinamismo do fenômeno das representações sociais parte da

observação que as coisas mudam na sociedade e que a vida social é composta tanto de novidades

e mudanças quanto de conservação e preservação.

Quando tratamos de representações sociais como o “senso comum”, não estamos com isso

“obrigando” a sociedade como um todo a partilhar de uma mesma representação, isto é, não se

pretende atingir uma unanimidade social pois se sabe, de largo, que a sociedade moderna é palco

de diferenças devido à sua grande diversidade de idéias. Essas diferenças sociais proporcionam

tensões e fraturas que provocam conflitos, a partir dos quais se originam novas representações

com a finalidade de proporcionar novamente a estabilidade.

Grupos sociais se formam com base na identificação entre os envolvidos e o que dá sentido à essa

formação social são as representações partilhadas de seus membros; estas têm a utilidade de dar

sentido a nossa realidade cotidiana e de estabelecer associações que ligam uns aos outros dentro

do grupo.

Ao tratar de medicamentos genéricos, é admissível que a sociedade partilhe de um senso comum

sobre ele, o que não implica dizer que essa representação é partilhada por todos; sem dúvida,

alguns atores sociais terão conceitos diferentes da maioria. A intenção de promover neste

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trabalho uma pesquisa cujas entrevistas são segmentadas entre consumidores de área nobre e

consumidores das demais áreas tem a finalidade de investigar se, em relação ao assunto, essas

classes de consumidores têm representações diferentes sobre os medicamentos genéricos.

3.3 CONFIANÇA

Anthony Giddens é considerado por muitos o mais importante pensador inglês desde John

Maynard Keynes e suas idéias o levaram ao posto atual de assessor do Primeiro Ministro inglês,

Tony Blair. Está entre os grandes expoentes da Sociologia contemporânea, área na qual

direcionou boa parte de seus trabalhos à compreensão da Modernidade e dos conceitos

relacionados a ela.

Em sua obra As Conseqüências da Modernidade, Giddens (1991) trabalha o conceito de

confiança sob a sua perspectiva de Modernidade. Ao desenvolver este conceito, o autor aborda a

relação “segurança versus perigo” e “confiança versus risco” na sociedade moderna, assim como

a questão do estabelecimento da confiança a partir do relacionamento entre pessoas - o que nos

permite relacionar o conceito de confiança ao de influência.

O conceito de confiança está presente na sociedade moderna em suas representações sociais sobre

medicamentos. As principais expectativas da sociedade em relação aos medicamentos dizem

respeito à eficácia e segurança. Consumir um produto pode trazer efeitos indesejáveis à saúde ou

colocar em risco a vida, portanto sempre provoca uma sensação de insegurança.

Os consumidores, em geral, pouco conhecem sobre medicamentos, portanto, a única forma de

reduzir sua sensação de insegurança e retomar sua condição de bem-estar é confiar no produto ou

confiar no conhecimento perito de quem o prescreveu. Na primeira situação, cabe aos

interessados no sucesso comercial dos medicamentos genéricos a responsabilidade de colocar à

disposição da sociedade informações suficientes que circulem nos diferentes grupos sociais e

atribuam significações positivas ao longo do processo de composição das suas representações

sociais. A confiança será atribuída às representações dos genéricos quando for claro ao

consumidor valores como eficácia e segurança. No segundo, é fato que o consumidor não tem

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domínio sobre o assunto pois não tem conhecimento técnico suficiente que o atribua expertise na

matéria. Portanto, ainda que não confie nos medicamentos genéricos, pode ter suas

representações alteradas pela influência de peritos nos quais ele deposita confiança, como

médicos, farmacêuticos, etc.

Por se relacionar com o risco, o perigo, a segurança, e por ser relevante nos processos de

influência, a confiança é conceito fundamental para a composição das representações sociais

sobre os medicamentos genéricos, daí a necessidade de desenvolvê-la nesse referencial teórico.

3.3.1 Confiança, risco e perigo

Inevitavelmente os seres humanos estão fadados a passar por inúmeras situações de perigo ao

longo da vida, o que relativiza a sensação de segurança e traz à tona o risco, desequilibrando

assim seu estado de bem-estar, forçando-o a buscar formas de recuperá-lo.

Regra geral, sabe-se que a ingestão de um medicamento oferece riscos e os consumidores não

têm amplo conhecimento sobre medicamentos. Ao buscar o médico para a prescrição de um

medicamento, o consumidor apóia-se no seu conhecimento perito para diminuir o efeito do risco

e lhe garantir segurança, retomando seu estado de bem-estar.

Risco está atrelado à possibilidade de resultados inesperados que podem ser frutos de nossas

decisões a partir de um determinado comportamento. A intensidade do risco está diretamente

vinculada ao aspecto ameaçador que alguma coisa possa possuir. O risco não é apenas resultado

de uma ação cujo resultado não ocorreu conforme o esperado, mas também, como a incerteza

envolvida em uma situação de decisão futura. Há risco quando não se domina plenamente uma

situação e vivencia-lo é experimentar sensações de falta ou dúvida de segurança numa conjuntura

de incerteza.

Não se pode falar em risco sem se levar em consideração o fator “segurança” como o próprio

Giddens define “segurança é a situação na qual um conjunto específico de perigos está

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neutralizado ou minimizado. A experiência de segurança baseia-se geralmente num equilíbrio de

confiança e risco aceitável”. (GIDDENS, 1991, p.43).

Segundo Giddens (1991) há uma ligação íntima entre confiança, perigo e risco. O risco pressupõe

o perigo; este, por sua vez, é a ameaça que algo ocorra que possa mudar o curso dos resultados

esperados. A percepção de risco influi no comportamento humano, isto é, se o risco não for

minimizado ou eliminado através da confiança, ele tem o potencial de alterar o comportamento

do ser humano. A confiança funciona, então, como mecanismo de minimização do perigo que

contém uma certa atividade.

Não há como se negar a estreita relação entre confiança e segurança; elas caminham juntas ao

longo da vida humana e fazem parte das representações sociais partilhadas sobre medicamentos.

A ignorância ou o precário conhecimento sobre um determinado assunto resulta na perda da

sensação de segurança, levando o ser humano a ter respeito por quem o domina, isto é, confiamos

em peritos quando não dispomos de conhecimento técnico suficiente em um determinado

assunto. Essa realidade está intrinsecamente incorporada à vida cotidiana moderna. A confiança

surge, então, para minimizar ou bloquear as ansiedades que podem se tornar fonte de angústia

contínua emocional podendo influenciar poderosamente o comportamento do ser humano ao

longo da vida.

Consumir um medicamento expõe o consumidor a uma situação de risco, que tem graus

variáveis. Se o consumidor atribuir segurança e eficácia no medicamento – por já tê-lo

experimentado anteriormente e registrá-lo em sua mente com significações positivas ou em casos

onde registra positivamente as experiências de sucesso de outras pessoas com o produto – ele

pode relevar seu desconhecimento técnico sobre a matéria, ignorar a necessidade da busca por

conhecimento perito e optar pela auto-medicação, como se observa rotineiramente.

Mas quando o consumidor enxerga o risco no consumo de um determinado medicamento de

forma elevada, sua tendência é buscar conhecimento técnico através de peritos nos quais ele

confia, como forma de minimizar o desconforto da situação de perigo que está exposto. Nesses

casos, o consumidor está mais sensível à influencia de perito em seu comportamento de consumo.

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Giddens (1991, p. 41) define confiança como a “crença na credibilidade de uma pessoa ou

sistema , tendo em vista um dado conjunto de resultados ou eventos, em que essa crença expressa

uma fé na probidade ou amor de um outro, ou na correlação de princípios abstratos

(conhecimento técnico)”.

A confiança é geralmente um estado contínuo, desligado de tempo e espaço; só é alterada caso

ocorra algum acontecimento suficientemente relevante que seja capaz de colocá-la em dúvida,

caso contrário, permanece.

Trazendo essa realidade para o mercado farmacêutico nacional, em geral, a população brasileira

pouco conhece sobre medicamentos, portanto busca sempre que possível a “consultoria” de um

perito – seja um médico ou um terceiro que julgue dominar a matéria na qual ele pouco domina

como, por exemplo, um balconista – com a finalidade de diminuir a sensação de risco diante de

uma matéria a qual desconhece pois atribui confiança ao perito, afastando-se assim do perigo que

pode envolver o consumo de um medicamento.

3.3.2 Confiança e relacionamento

Giddens (1991) afirma que confiar nos outros, acima de qualquer coisa, é uma necessidade

psicológica humana de caráter persistente e recorrente.

Erikson apud Giddens (1991, p. 117) coloca que

a confiança nas pessoas é erigida sobre a mutualidade de resposta e envolvimento:

a fé na integridade de um outro é uma fonte primordial de um sentimento de

integridade e autenticidade do eu. A confiança em sistemas abstratos contribui para

a confiabilidade da segurança cotidiana, mas por sua própria natureza ela não pode

fornecer nem a mutualidade nem a intimidade que as relações de confiança pessoal

oferecem.

Relacionamentos são, então, construções sociais onde a confiança é construída ao longo do

tempo; ela não é automática, mas sim, sofre um processo de composição onde os envolvidos se

abrem aos outros. Os médicos, ao iniciarem o contato com um paciente, dão início a um processo

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de elaboração da confiança. À medida que têm suas necessidades satisfeitas pelo auxílio do

perito, o relacionamento agrega mais subsídios que reforçam a confiança do paciente no

prescritor. Se não ocorrer algum percalço ao longo deste processo, a confiança se mantém. Como

prescritor perito, os médicos têm um importante papel porque, ao prescrever ou explicar sobre

medicamentos, podem atribuir ou não a característica de confiança aos medicamentos genéricos,

o que infere diretamente na formação da representação social dos medicamentos genéricos e no

seu posterior desempenho comercial.

3.3.3 Os sistemas de peritos

Para desenvolver o conceito de confiança, Giddens (1991) afirma que na Modernidade ocorrem

os processos de encaixe e desencaixe que funciona a partir de dois mecanismos: “as fichas

simbólicas” e “os sistemas de peritos”. Ambos estão estreitamente ligados ao desenvolvimento

das instituições sociais modernas e dependem da confiança para existir, o que reforça a

importância da mesma no contexto da sociedade moderna.

Por “fichas simbólicas” entendem-se os meios de troca que têm valor aos mais diversos grupos

em qualquer situação. O “sistema de peritos”, por sua vez, tratam de sistemas onde se encontram

experts aos quais recorremos em situações que não dominamos a matéria e nos quais atribuímos

confiança pela credibilidade em sua expertise.

Interessa-nos aqui a relação entre sistemas de peritos e confiança. Os consumidores, na condição

de leigos ou de pouco conhecedores de inúmeras matérias procuram sistemas de peritos, ou seja,

ao desconhecer ou não dominar uma determinada matéria, buscamos referência em terceiros –

pessoas ou profissionais – que tenham conhecimento perito acerca dela e depositamos neles nossa

confiança. Para ratificar esse raciocínio, trago a definição de Giddens sobre os sistemas de

peritos: ”são sistemas de excelência técnica ou competência profissional que organizam grandes

áreas dos ambientes material e social em que vivemos hoje” (GIDDENS, 191, p.35).

Partindo do pressuposto que a sociedade em geral pouco conhece a respeito das particularidades

do mercado farmacêutico, é natural que seus membros procurem informações sobre uma classe

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nova de medicamentos – neste caso, os medicamentos genéricos – com o objetivo de elaborar um

campo simbólico sobre ele formando suas representações sociais. Ao buscar em um terceiro a

expertise sobre o assunto, o consumidor procura sistemas de peritos, sob os quais apóia sua

confiança.

Em medicamentos, o conhecimento perito está ligado à comunidade médica e aos farmacêuticos,

já que dizem respeito a peritos oficialmente autorizados a lidar com o assunto. No contexto

brasileiro, o que se observa é a aceitação (por parte de alguns consumidores) de outros atores

mesmo não reconhecidos oficialmente como “peritos” como os balconistas, dentre outros.

Ao investigar se há comportamentos diferenciados de compra dos medicamentos genéricos por

parte dos consumidores pertencentes a áreas com poder aquisitivo diferentes, essa dissertação

parte do pressuposto que em camadas da população com renda mais baixa, o acesso à

comunidade médica é mais restrito. Portanto, um perito substituto à ela pode se mostrar relevante

para essa classe de consumidores quando no processo de aquisição de um medicamento genérico:

entram em cena os balconistas.

Ao buscarmos sistemas de peritos, depositamos confiança na excelência técnica das pessoas ou

profissionais envolvidos neles, o que nos dá sensação de diminuição dos riscos que poderíamos

nos sujeitar ao nos depararmos com uma determinada situação na qual nosso conhecimento é

nulo ou precário.

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4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS EMPÍRICOS

Os dados aqui apresentados foram obtidos através de entrevistas semi-diretivas com 124

consumidores, segmentados por “bairros nobres” e “outros bairros”, onde se verificam diferenças

no que tange à poder aquisitivo (ver capítulo I, item “procedimentos metodológicos” para

maiores detalhes sobre a metodologia aplicada nesta pesquisa).

Ao ser realizada a pergunta de abertura “quando eu digo genérico, qual a primeira coisa quem

vem a sua mente?” a finalidade é obter do entrevistado seu conceito imediato, sua primeira idéia

sobre os medicamentos genéricos, livre de qualquer influência externa ou mesmo de uma

elaboração própria mais meticulosa. Desta forma, conseguimos identificar as representações dos

consumidores em relação aos medicamentos genéricos.

0,8%

0,8%

0,8%

3,2%

19,4%

26,6%

35,5%

61,3%

46,8%

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Mais barato

Faz o mesmoefeito/substância/fórmula/composição/Substituto

Nada

Pouco/ nenhuma informação sobre o produto

Genérico é inferior/Não gosta/Substância fraca

Preferência pelo Genérico

Restrição médica

Não entendeu

Nunca pensou nisso

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 7: Quando eu digo “medicamento genérico”, qual a primeira coisa que vem à sua

mente? O que mais? (Respostas Múltiplas)

67

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A representação que mais se destaca sobre os medicamentos genéricos diz respeito ao preço mais

baixo do produto em relação ao medicamento de referência, com 61,3% dos casos, o que

demonstra que a estratégia de divulgação do preço como diferencial competitivo foi absorvida

pela maioria dos consumidores.

O percentual de consumidores que evocou a equivalência dos genéricos (faz mesmo efeito/mesma

substância) aproxima-se de 50% da totalidade de entrevistas, o que nos mostra que metade dos

entrevistados confiam na eficácia do produto, facilitando o comportamento de consumo em favor

dos genéricos.

É interessante observar que, ao serem questionados, 1/3 dos entrevistados não evocam nenhuma

representação imediata sobre os genéricos (responderam nada), o que nos revela uma

representativa lacuna de significação que pode interferir no consumo do produto. Esta situação

não implica dizer que os consumidores que não tem representações formadas sobre os genéricos

os rejeitam, e sim, que o fato de não ter informações pode não levar à compra. Aproximadamente

1/4 dos entrevistados admitem não possuir informações suficientes sobre o produto

(pouca/nenhuma informação sobre o produto), resultado que pode advir, pelo menos

parcialmente, da lacuna de representação evocada por cerca de 1/3 dos consumidores.

Quase 20% dos entrevistados, alegaram que consideram o medicamento genérico inferior ao de

referência, o que pode influir negativamente em seu comportamento de consumo do produto.

Vejamos o detalhamento das respostas por localização:

68

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Col % *casos

51,6 64,5 61,3

51,6 45,2 46,8

48,4 31,2 35,5

25,8 26,9 26,6

19,4 19,4 19,4

4,3 3,2

3,2 ,8

1,1 ,8

1,1 ,8

100,0 100,0 100,0

Mais barato

Faz o mesmoefeito/substância/fórmula/composição/Substituto

Nada

Pouco/ nenhumainformação sobre oproduto

Genérico é inferior/Nãogosta/Substância fraca

Preferência peloGenérico

Restrição médica

Não entendeu

Nunca pensou nisso

Quandoeu digoGenérico,qual aprimeiracoisa quevem a suamente?

Totala

BairrosNobres

OutrosBairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

TABELA 1: Quando eu digo “medicamento genérico”, qual a primeira idéia que vem à sua

mente? O que mais? – Por critério de localização (Respostas Múltiplas)

Analisando por localização, a representação preço mais barato é a mais evocada por

consumidores de ambas as áreas, destacando-se mais nos “outros bairros” com 64,5% de citações

contra 51,6% dos demais. Estes dados nos indicam que a condição financeira mais restrita de

consumidores de “outros bairros” os estimula a reconhecer o diferencial de preço mais baixo do

medicamento genérico, pois há um interesse maior dessa classe em buscar alternativas de menor

custo para tratamento que os demais.

No que tange à confiança do consumidor no efeito/substância do produto, não se mostrou grande

diferença, pois cerca de metade dos consumidores de ambas as localizações alegaram confiar no

efeito dos genéricos (caracterizando empate técnico).

O resultado da lacuna de representação sobre os genéricos apresenta diferenças quando analisado

por localização, pois quase metade dos consumidores de “bairros nobres” alegaram que os

69

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genéricos nada representam para eles enquanto que cerca de 30% dos consumidores dos “outros

bairros” fizeram a mesma afirmação. As lacunas de representação ainda podem influenciar os

índices de consumidores que alegam ter pouco/nenhuma informação sobre o produto, com cerca

de 25% dos casos em ambas as localizações.

Não se mostram diferenças nos consumidores que afirmaram que o medicamento genérico é

inferior, pois em ambas as localizações o índice não superou 20% de ocorrências.

A segunda pergunta “você já usou medicamentos genéricos?” preocupa-se em descobrir qual o

comportamento de compra já exercido pelo consumidor. Esta abre duas possibilidades de

resposta: sim ou não. Quando a resposta dada foi “sim”, a entrevista é direcionada para levar o

entrevistado a relatar com detalhes sua experiência mais marcante com os genéricos. Neste caso,

ao relatar sua experiência foram identificados elementos que colaborassem com a formação da

representação do genérico para cada entrevistado. Ao responder “não”, o interesse era descobrir

qual ou quais motivos os levaram a não experimentar os genéricos.

70

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Não12,1%

Sim87,9%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 8: Você já usou medicamentos genéricos?

O gráfico acima nos revela que um índice alto de consumidores que já experimentaram os

medicamentos genéricos. É interessante observar que apesar do alto índice de experiência com os

genéricos, muitos dos que já experimentaram continuam não tendo uma representação clara sobre

o mesmo conforme observamos no quadro anterior.

83,9% 89,2% 87,9%

16,1% 10,8% 12,1%

25,0% 75,0% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Sim

Não

Já usou medicamentoGenérico?

Total LinhaTotal Coluna

a

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 124b.

TABELA 2: Você já usou medicamentos genéricos? – Por localização

71

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Aqui, a diferença de poder aquisitivo de indivíduos habitantes de localizações diferentes não

evidencia diferenças significativas no comportamento de experimentação do medicamento

genérico, pois o índice de experimentação mostra-se alto em ambas as localizações.

6,7%

6,7%

6,7%

6,7%

6,7%

46,7%

33,3%

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Nunca teve necessidade

Não faz efeito/ Não confia/Acha que é falso

Só compra de marca

Restrição médica

Dúvidas sobre acomposição/ fórmula

Não encontrou

Não gosta do Genérico

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 9: Para os consumidores que responderam “não”, por que nunca usaram

medicamentos genéricos? (Respostas Múltiplas)

Em números gerais, entre os consumidores que alegaram dúvida na repetição do consumo de

medicamentos genéricos em uma próxima oportunidade, a desconfiança no efeito do produto não

é a principal causa para a dúvida no seu comportamento de compra, pois apenas 1/3 dos

entrevistados alegaram não confiar produto; o motivo principal da não utilização do genérico

deu-se pela falta de necessidade, citado por cerca de metade dos entrevistados. Entenda-se por

falta de necessidade a situação na qual, ao adoecer, o indivíduo não cogitou a compra de um

substituto genérico ao medicamento de referência por motivos financeiros, o que pode

demonstrar uma desconfiança implícita.

72

Page 73: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

4,6%

9,2%

9,2%

12,8%

13,8%

15,6%

29,4%

62,4%

54,1%

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Fez mesmo efeito/ mesmasubstância

Era mais barato/ Preço

Resultado pos itivo/ próprioou de terceiros

Dúvida pers is tente sobre aeficácia do Genérico

Menos eficácia

Indicado pelo médico

Não sabe/ Não lembra

Influenciado pelo balconista

Influenciado pela mídia

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 10: Para os consumidores que responderam “sim”: relate a sua experiência mais

marcante com os medicamentos genéricos. (Respostas Múltiplas)

Dos entrevistados que experimentaram os medicamentos genéricos, a maioria afirma estar

satisfeita com a eficácia do produto (62,4%), contra apenas 13,8% que expressaram frustração

com a experiência.

A representação “preço baixo” aparece aqui como um dos principais motivadores da experiência

em 54,1% dos casos.

O resultado de uma experiência anterior – própria ou de terceiros – indica que o resultado da

experiência anterior própria ou de terceiros é retida na memória do consumidor para futuras

referências quando se renovar a necessidade de adquirir um medicamento, o que facilita o

comportamento de compra do genérico.

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Observa-se que, ao pensar sobre medicamentos genéricos, apenas 12,8% dos entrevistados

recordou que foi indicado por um médico (prescritor autorizado) e 9,2%, por um balconista

(prescritor informal).

A seguir os dados segmentados por bairros:

Col % *casos

53,8 65,1 62,4

46,2 56,6 54,1

38,5 26,5 29,4

15,4 15,7 15,6

18,1 13,8

15,4 12,0 12,8

15,4 7,2 9,2

7,7 9,6 9,2

3,8 4,8 4,6

100,0 100,0 100,0

Fez mesmo efeito/mesma substância

Era mais barato/ Preço

Resultado positivo/próprio ou de terceiros

Dúvida persistente sobrea eficácia do Genérico

Menos eficácia

Indicado pelo médico

Não sabe/ Não lembra

Influenciado pelobalconista

Influenciado pela mídia

Experiênciacom omedicamentogenérico

Totala

BairrosNobres

OutrosBairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

TABELA 3: Relate a sua experiência mais marcante com os medicamentos genéricos – Por

localização (Respostas Múltiplas)

Mais da metade dos consumidores de ambas as localizações afirmam estar satisfeitos com a

eficácia do medicamento, com destaque para os de “outros bairros” com índice de 65,1%. Vale

observar que parte destes também o maior índice de insatisfação com a eficácia dos genéricos

conforme 18,1% dos consumidores da área citaram, enquanto que nenhum consumidor de

“bairros nobres” afirmou estar insatisfeito com a sua eficácia.

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O preço é uma preocupação de ambas as classes, independente de faixa de renda, já que cerca de

metade dos consumidores de ambas as localizações citam o preço como fator estimulante ao

consumo dos medicamentos genéricos.

Uma experiência própria ou de terceiros em que se tenha obtido êxito fica armazenada na

memória do consumidor para futuras referências. Os dados da tabela confirmam a importância

desse fato pois um percentual muito elevado recordou uma experiência de sucesso própria ou de

terceiros com os genéricos – 38,5% dos consumidores de “bairros nobres” e 26,5% dos “outros

bairros” – que serviu de estímulo para repetição do comportamento de consumo do mesmo.

Apenas 15,4% de consumidores de “bairros nobres” e 12% de “outros bairros” recordaram que

utilizaram os medicamentos genéricos por indicação médica. Um percentual ainda menor – 7,7%

de indivíduos de “bairros nobres” e 9,6% de “outros bairros” – relembraram terem sido

influenciados por balconistas no momento da compra.

A mídia, que é ser um veículo importante na divulgação de informações, pouco foi evocada pelos

consumidores de ambas as áreas, o que pode apontar uma das razões da significativa lacuna de

representação e dos índices de dúvida sobre os genéricos.

A terceira questão “Você usaria novamente o medicamento genérico?” tem o objetivo de avaliar

a confiança do consumidor em relação aos medicamentos genéricos após tê-lo experimentado.

Três respostas eram possíveis – sim, não e depende – e, em cada uma delas, foi pedida uma

justificativa.

A experimentação é fundamental para a formação de um conceito próprio e influi diretamente no

processo decisório de compra. O resultado de uma experiência é armazenado na memória do

consumidor e será possivelmente utilizado como referência em uma próxima situação na qual se

renove a necessidade de aquisição deste tipo de produto. Em contrapartida, uma experiência

frustrante forma representações negativas sobre o produto e tende a inibir a repetição da

experiência, reduzindo consideravelmente as chances do mesmo produto ser consumido em uma

situação futura.

75

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Consumidores que afirmem repetir a experiência com os medicamentos genéricos em uma

situação futura nos dão indício de que a experiência acumulada colaborou para formar

representações positivas, daí a importância desta questão.

Depende/Talvez12,8%

Sim82,6%

Não4,6%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 11: Você usaria novamente o medicamento genérico?

Dos consumidores entrevistados que experimentaram o genérico, um percentual muito

representativo (82,6%) repetiria o uso, demonstrando que a maioria dos consumidores ficou

satisfeita com a experiência inicial, favorecendo a confiança no produto.

Por localização, temos em detalhe:

76

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88,5% 80,7% 82,6%

11,5% 13,3% 12,8%

6,0% 4,6%

23,9% 76,1% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Sim

Depende/T alvez

Não

Usaria novamenteo medicamentoGenérico?

Total LinhaTotal Coluna

a

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 109b.

TABELA 4: Você usaria novamente o medicamento genérico? – Por localização

Nesta tabela observa-se que não há divergências representativas entre os consumidores das duas

classes após a experimentação do genérico. Os índices de consumidores dispostos a repetir a

experiência com os medicamentos genéricos são maciçamente mais altos que os de rejeição ou

dúvida, em qualquer uma das classes entrevistadas.

Dentre os consumidores que responderam “depende”, a condição financeira no momento da

compra é o fator mais relevante na decisão de compra do genérico, em 71,4% dos casos,

conforme observamos na tabela abaixo. Evidencia-se aqui uma grande diferença de perfil de

consumo entre consumidores habitantes de localizações onde o poder aquisitivo é diferente.

Como esperado, nos “bairros nobres” a preocupação com a condição financeira foi citada em

apenas 1/3 dos casos enquanto que nos “outros bairros” a importância da condição financeira

sobe para 81,8% dos casos.

77

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Col % *casos

33,3 81,8 71,4

33,3 18,2 21,4

18,2 14,3

33,3 7,1

100,0 100,0 100,0

P reço/ Condição financeirano momento da compra

Opinião médica

P referência pelo original

Gravidade da doença

P ara aqueles queresponderam quedepende usarGenériconovamente

T otala

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

T otal

FONTE: PESQUISA (2005)a.

TABELA 5: Para os que responderam “depende”: Você usaria novamente o medicamento

genérico? – Por localização.

Por fim, na tabela abaixo vemos que o motivo mais citado pelos consumidores que afirmaram

não repetir a experiência com o medicamento genérico foi a falta de necessidade em substituir o

medicamento prescrito por um substituto genérico por força de renda, citado por 40% dos

consumidores de “bairros nobres” e por 50% dos demais.

Ao contrário do que se imaginava, a falta de confiança explícita na eficácia do produto não foi

citada como o motivo principal pela recusa dos consumidores de ambas as regiões em repetir seu

consumo e, sim, a falta de necessidade financeira em adquirir um substituto genérico, que pode

nos indicar uma desconfiança implícita no produto. É interessante observar que, destes, o índice

foi mais acentuado na área onde o poder aquisitivo é mais restrito.

Ainda, os consumidores de “outros bairros” também demonstraram maior desconfiança no efeito

do medicamento (40% dos casos) se comparados aos demais (20% das citações).

78

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TABELA 6: Para os que responderam “não”: Você usaria novamente o medicamento

genérico? – Por localização.

O nível de informação do consumidor é o ponto central da quarta questão. Para saber qual o grau

de informação dos consumidores entrevistados em relação aos medicamentos genéricos, lhes foi

perguntado se conheciam um substituto genérico ao medicamento que foram buscar nesta visita à

farmácia. Havia três possíveis respostas: sei que existe, sei que não existe ou não sei se existe. Ao

optar pela primeira ou pela segunda opção, o consumidor demonstra conhecimento sobre a

matéria; optando pela última alternativa, revela desconhecimento.

79

Page 80: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

Não comprou remédio34,7%

Não sabe35,5%

Sei que existe/não

existe29,8%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 12: Você sabe se existe um medicamento genérico para substituir o que você veio

comprar agora?

Da totalidade, extraindo-se os consumidores que não visitaram a farmácia à busca de um

medicamento, cerca de metade dos consumidores não conhecem se há ou não um substituto

genérico ao medicamento que procurou, o que evidencia que uma parcela muito alta não tem

conhecimento suficiente sobre o produto.

Por localização, temos:

80

Page 81: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

35,5% 35,5% 35,5%

38,7% 33,3% 34,7%

25,8% 31,2% 29,8%

25,0% 75,0% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Não sabe

Não comprou remédio

Sei que existe/não existe

Tem Genérico parasubstituir o que foicomprar?

Total LinhaTotal Coluna

a

BairrosNobres

OutrosBairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 124b.

TABELA 7: Você sabe se existe um medicamento genérico para substituir o que você veiocomprar agora? – Por localização

No geral, não há grandes diferenças entre os níveis de conhecimento dos consumidores de ambas

as regiões sobre os medicamentos genéricos. O que se observa é que, excluindo-se os que não

compraram um medicamento nesta visita à farmácia, cerca de metade dos que tinham intenção

em consumir um medicamento não sabiam se existia ou não um substituto genérico ao

medicamento procurado.

A quinta questão observa se o consumidor tem um comportamento de consumo do medicamento

genérico, solicitando espontaneamente o produto. Qualquer que seja a resposta pergunta-se se o

balconista indicou o genérico pois ele tem capacidade de influenciar o consumidor no seu

processo decisório, visto que ele interage com o cliente no momento da compra.

Em algumas situações, os balconistas podem ser vistos como “peritos” por prestar assessoria

sobre medicamentos no ato da compra, principalmente em casos onde há acesso restrito a

médicos (considerados pelos consumidores como maior autoridade de saúde). A postura do

balconista ao oferecer outras opções, pode alterar a opinião do consumidor no ato da compra e

influenciar seu comportamento de compra final.

81

Page 82: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

Não pediu69,6%

Pediu30,4%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 13: Nesta sua compra, você pediu o medicamento genérico?

Da totalidade da amostra entrevistada apenas 3 em cada 10 consumidores solicitaram o

medicamento genérico ao balconista, o que caracteriza a falta de hábito na solicitação de um

substituto genérico.

66,7% 70,4% 69,6%

33,3% 29,6% 30,4%

21,7% 78,3% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Não pediu

P ediu

Na compra pediuGenérico?

Total LinhaTotal Coluna

a

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 69b.

TABELA 8: Nesta sua compra, você pediu o medicamento genérico? – Por localização

82

Page 83: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

A falta do hábito de solicitar o medicamento genérico independe de poder aquisitivo, pois não se

apresenta uma diferença representativa entre os consumidores de “bairros nobres” e de “outros

bairros” na solicitação dos medicamentos genéricos no ato de sua compra (empate técnico).

Balconista NÃO ofereceu79,2%

Balconista ofereceu20,8%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 14: Nesta sua compra, o balconista ofereceu o medicamento genérico?

Nos processos de decisão de compra que os entrevistados acabavam de experimentar, quase 80%

dos balconistas, ao serem consultados por um medicamento de referência, não oferecem

espontaneamente o genérico como alternativa de um substituto. A falta de interesse na indicação

dos genéricos pode ser atribuída a fatores diversos como o interesse financeiro que leva o

balconista a preferir a indicação de um medicamento similar ou até mesmo a falta de interesse do

profissional em realizar o intercâmbio entre o medicamento prescrito e um genérico, dentre

outros fatores.

Tratando os dados de acordo com a localização de sua ocorrência, segue:

83

Page 84: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

90,0% 76,3% 79,2%

10,0% 23,7% 20,8%

20,8% 79,2% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Balconista NÃO ofereceu

Balconista ofereceu

NÃO P EDIU Genéricona compra

Total LinhaTotal Coluna

a

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 48b.

TABELA 9: Nesta sua compra, o balconista ofereceu o medicamento genérico? – Por

localização

A falta de interesse dos balconistas indicar os medicamentos genéricos mostra-se na maioria dos

casos (em ambas as localizações), embora o índice se mostre mais acentuado nos “bairros

nobres”. Desta situação, deduz-se que nos “outros bairros” há uma maior necessidade de oferta

do substituto genérico mais barato que o medicamento de referência, já que se trata de uma

localidade onde há menor poder aquisitivo.

Por fim, a sexta questão pergunta se “algum médico já falou sobre medicamentos genéricos com

você?”. O objetivo desta questão é retomar o conceito de informação sobre os genéricos

relacionando-o desta vez com a influência do médico (“perito” de saúde) quando em contato com

o consumidor.

O acesso à comunidade médica também é diferenciado de acordo com os perfis de renda dos

bairros. Portanto, o intuito da sexta questão é descobrir qual o resultado da interação médico-

paciente – quando existente - experimentada pelo consumidor e como ela influenciou o

consumidor no seu comportamento final de compra (influência).

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Page 85: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

Não61,3%

Sim38,7%

FONTE: PESQUISA (2005)

FIGURA 15: Algum médico já falou sobre medicamentos genéricos com você?

O objetivo dessa questão é descobrir, através dos consumidores, se os médicos têm interagido

com seus pacientes para esclarecer e orientar sobre medicamentos genéricos, visto que ele é

considerado o “perito” oficial no que diz respeito ao restabelecimento da saúde humana e essa

“autoridade” – atribuída pela confiança do consumidor ao perito que pode orientá-lo sobre um

determinado assunto que ele não domina - tem papel importante no comportamento de compra do

consumidor.

Essa estatística é curiosa de se observar pois os consumidores alegam que o médico – que seria o

“perito” mais adequado para disseminar informações e esclarecer dúvidas – na maioria dos casos,

61,3%, não tratou desse assunto com seus pacientes.

Descriminando esses números por localização, temos:

85

Page 86: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

45,2% 66,7% 61,3%

54,8% 33,3% 38,7%

25,0% 75,0% 100,0%

100,0% 100,0% 100,0%b

Não

Sim

Algum médico já falou sobreGenérico com você?

Total LinhaTotal Coluna

a

Bairros Nobres Out ros Bairros

Localização

Total

FONTE: PESQUISA (2005)a.

N = 124b.

TABELA 10: Algum médico já falou sobre medicamentos genéricos com você? – Porlocalização

Os números se mostram diferentes de acordo com a localização. Nos “bairros nobres” o índice de

consumidores orientados por médicos a respeito dos genéricos é muito superior ao dos “outros

bairros”, com 54,8% contra 33,3%. Algumas hipóteses podem ser levantadas: a) os mais ricos

vão mais a médicos; b) os médicos dos mais pobres (em grande parte do SUS) têm menos tempo

para cada consulta, etc.

Essas informações abrem um questionamento quanto ao comportamento dos médicos ao orientar

os pacientes, pois eles são “peritos” no assunto e lhes cabe a tarefa de informar e esclarecer as

dúvidas dos pacientes.

Se analisarmos por localização, vemos que a falta de orientação se agrava ainda mais quando se

trata de pacientes localizados em regiões onde a renda é mais escassa, o que pode evidenciar um

problema social.

Em resumo, este capítulo nos mostra que as representações sociais de populações com faixas de

renda diferentes apresentam poucas diferenças e, não, diferenças significativas como se

imaginava.

Ambas as classes evidenciaram preocupação na aquisição de um medicamento mais barato; a

maioria dos consumidores evoca o preço mais baixo como a representação mais marcante

reconhecendo, secundariamente, sua qualidade.

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Page 87: UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE … · FLÁVIA CAVALCANTE SOBRAL MEDICAMENTOS GENÉRICOS: AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS CONSUMIDORES DA CIDADE DO SALVADOR. Dissertação

Uma parcela muito representativa (1/3) da totalidade dos consumidores, quando questionada, não

evoca nenhuma representação sobre os genéricos, evidenciando um grave problema para esta

classe de medicamentos: a lacuna de representação. Estes, ao serem questionados sobre os

medicamentos genéricos, não foram capazes de lhes atribuir significações imediatamente e isso

pode dificultar a penetração e aceitação dos genéricos. Essa lacuna de representação implica na

falta de informação dos consumidores e pode ser uma das causas pela qual metade dos

consumidores entrevistados que visitaram farmácias na busca por um medicamento não sabiam

se existia um substituto genérico ao que ele procurava.

Apenas 1/5 dos entrevistados informaram taxativamente não confiar no efeito dos medicamentos

genéricos, o que certamente, influi negativamente no seu comportamento de compra.

É interessante observar que, o índice de experimentação e de repetição após a experimentação são

altamente significativos em ambas as localizações. Apesar disso, os consumidores demonstraram

um comportamento no qual não há o hábito de solicitar o medicamento genérico como substituto

a um medicamento de referência em suas visitas à farmácia.

Um índice muito baixo de consumidores recordaram ter sido influenciados no seu

comportamento de compra de um medicamento genérico por médicos, balconistas ou mesmo pela

mídia. Alguns dos motivos aparentes são: o alto índice de médicos que não conversaram com

seus pacientes sobre o produto, 45,2% nos “bairros nobres” acentuando-se para 66,7% nos

“outros bairros” e o comportamento de desinteresse na indicação do medicamento genérico

demonstrado pela maioria dos balconistas.

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5. CONCLUSÃO

O mercado farmacêutico nacional agitou-se em 1999 com a aprovação da Lei 9.787, conhecida

informalmente como Lei dos Genéricos, que permitia a implantação dos medicamentos genéricos

no Brasil. Seguindo os respeitados padrões da Organização Mundial de Saúde (OMS), os

medicamentos genéricos são lançados como medicamentos substitutos aos de referência no que

diz respeito à qualidade (avalisada pelo Governo Federal através de órgãos do Ministério da

Saúde), oferecendo como diferencial preço mais baixo. Portanto, a entrada de um produto com

tais características teria o potencial de alterar a estrutura do mercado farmacêutico nacional.

Mas, se por um lado, o preço baixo e a qualidade são aspectos positivos ao sucesso dos

medicamentos genéricos, por outro, a característica da ausência de marca de produto caracteriza-

se um problema, principalmente em um mercado dominado por marcas já estabelecidas. Os

medicamentos genéricos, então, precisam alcançar visibilidade e ganhar a confiança da

população, ou seja, para os medicamentos genéricos consigam atingir o sucesso, cabem aos seus

interessados divulgar informações suficientes para que a sociedade possa formar representações

positivas sobre eles – principalmente quando o medicamento em questão é ausente de uma marca

que lhe atribua significações positivas imediatas – daí a escolha das representações sociais como

objeto de estudo desta dissertação.

Ao desenvolver este objeto de pesquisa descobrimos quais as representações formadas pela

sociedade soteropolitana, analisando-as em classes sociais segmentadas pela localização em

função do poder aquisitivo (“bairros nobres” e “outros bairros”), com o objetivo de colaborar

com o entendimento do comportamento do consumidor (de cada uma destas localizações

investigadas) no processo decisório de aquisição de um medicamento. A pesquisa mostra que, ao

contrário do que se imaginava, as representações sociais da sociedade da cidade do Salvador,

seguindo esse critério, apresentam diferenças pontuais.

O grande diferencial competitivo dos medicamentos genéricos – preço mais baixo – conseguiu

fixar-se como a representação social mais imediata entre os entrevistados enquanto que a

confiança no efeito e qualidade do produto aparece como a segunda representação mais evocada,

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evidenciando um problema: a maioria reconhece o produto pelo seu preço enquanto que menos

da metade dos consumidores de ambas as regiões evocou espontaneamente a sua qualidade.

O dado mais interessante no que tange à formação das representações sociais diz respeito à

lacuna de representação sobre os genéricos que atinge 1 em cada 3 consumidores, ou seja,

quando indagados sobre o que lhes vem à mente quando se diz “medicamento genérico”,

responderam nada. Ao contrário do que se podia esperar, o maior índice de consumidores que

não têm nada a dizer sobre os genéricos está nos “bairros nobres” onde, teoricamente, o acesso à

informação é melhor. Uma possível conclusão pode se extrair disso: os medicamentos genéricos

não despertaram tanto interesse em consumidores com maior faixa de renda, porque talvez estes o

considerem uma opção para “pobres”.

Mais ainda, o índice de consumidores que disseram “nada” é superior aos que alegaram ter pouca

ou nenhuma informação sobre o produto (cerca de 1/4 destes). A mídia, canal principal de

divulgação dos medicamentos genéricos para a sociedade, pouco foi evocada por consumidores,

o que mostra que um número significativo de consumidores das duas regiões não foi alcançado

pelas ações de divulgação do Governo Federal e dos laboratórios fabricantes. Este fato pode

evidenciar uma das razões pelas quais as representações sociais sobre os genéricos não têm

índices mais representativos.

Ainda no que diz respeito ao nível de informação sobre os medicamentos genéricos, testamos o

conhecimento dos entrevistados ao questioná-los sobre sua última tentativa de compra de um

medicamento. O resultado revela que cerca de metade dos consumidores (de ambas regiões) que

visitaram uma farmácia na busca de um medicamento, não sabiam informar se conheciam – ou

não – a existência de um substituto genérico ao medicamento procurado.

O somatório desses resultados ratifica a primeira hipótese levantada nesse estudo de que houve

falhas na divulgação de informações sobre os genéricos, gerando dúvidas aos consumidores e,

certamente, influindo negativamente na sua aceitação e consumo.

Os dados estatísticos coletados na pesquisa apontam que a segunda hipótese “em geral, a maior

parte dos consumidores não confia nos medicamentos genéricos, inibindo, assim, seu consumo”

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não retrata a realidade pois, como posto anteriormente, cerca de metade dos entrevistados

afirmaram confiar nos genéricos, uma parcela muito significativa ainda não tem informações

suficientes ou tem dúvidas sobre eles e apenas um em cada cinco entrevistados – de ambas as

localizações investigadas – consideram que o medicamento genérico é inferior, o que

evidenciaria uma tendência de comportamento contrária ao consumo do genérico.

Também, a cada interação que o consumidor tem com um produto, mais informações vão se

acumulando em sua memória, ajudando a compor suas representações sobre ele. Os resultados de

uma má experiência ficariam retidos na memória do consumidor e ajudariam a inibir o

comportamento de compra deste mesmo produto em uma próxima situação de necessidade. O

que se observou é que o índice de consumidores que experimentaram os medicamentos genéricos

é maciço e, da totalidade dos entrevistados que os experimentou, a grande maioria afirma estar

disposta a repetir a experiência. Esses dados servem para ratificar a confiança do consumidor

visto que ele não colocaria em risco a sua saúde ao experimentar um medicamento de qualidade

duvidosa e, menos ainda, repetiria esta experiência se o resultado não fosse satisfatório.

Da pequena parcela de consumidores que não experimentaram os genéricos, o principal motivo

que os levou a isso foi a falta de necessidade por questões financeiras em adquirir um substituto,

e não, a falta de confiança no produto que aparece como segundo motivo, demonstrando baixos

índices que tendem à rejeição do seu consumo.

A terceira hipótese levantada “há uma maior resistência na classe que concentra maior poder

aquisitivo, pois esta tem maior capacidade de compra do medicamento de referência” não reflete

a realidade, pois consumidores de ambas as localizações demonstraram que valorizam o

diferencial de preço do genérico e o consideram na hora da compra de um medicamento.

No geral, ambas as áreas não demonstraram um rejeição significativa ao genérico de forma

taxativa; o que se verificou foi uma tendência de não consumo dos medicamentos genéricos por

uma minoria a partir da falta de confiança, pois acreditam que ele é inferior ao de referência.

Mais ainda, em nenhum momento, foi observado na pesquisa que os consumidores de área nobre

também demonstraram fidelidade ao medicamento de referência.

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Apesar de valorizar o preço mais baixo, a grande maioria dos consumidores de ambas as

localizações informou não ter o hábito de solicitar espontaneamente o medicamento genérico.

Acreditava-se que os balconistas teriam um papel fundamental no resultado da compra do

consumidor devido a influência sobre seu comportamento de compra, mas uma parcela mínima

de consumidores relembraram que os balconistas fizeram a indicação espontânea do substituto

genérico ao medicamento de referência. Algumas das possíveis razões desse comportamento

devem-se ao fato de que os balconistas recebem comissão como forma de estímulo para a

indicação de medicamentos similares (mais rentáveis às farmácias) ou mesmo a falta de interesse

em trocar o medicamento prescrito, oferecendo o que o cliente pediu.

Embora a falta de hábito em indicar o medicamento genérico caracterize maioria nas duas

regiões, nos “outros bairros” esse comportamento é menos acentuado provavelmente pelo fato de

que os consumidores dessa localidade, na falta de acesso a um médico, atribuem ao balconista o

papel de “perito” (em substituição ao médico) e solicitam a ele prescrições com maior freqüência

que os demais.

É interessante observar que os consumidores, no processo de compra dos genéricos, recordaram-

se mais de experiências anteriores próprias ou de terceiros de sucesso do que da indicação médica

ou de balconistas. Esse fato nos mostra a importância de um resultado positivo de uma

experiência anterior em uma nova situação de necessidade de compra de um medicamento e,

também, da relevância dos grupos primários (amigos, familiares, etc.) no comportamento de

compra.

Ao contrário do que se imaginava, o índice de consumidores que evocaram a influência médica

no seu comportamento de compra foi relativamente baixo. Ao longo da pesquisa, os

consumidores pouco relacionaram a postura médica com seu comportamento de consumo de

medicamentos genéricos. Uma das prováveis razões disso está na resposta da última questão da

pesquisa na qual os consumidores recordaram que os médicos, em geral, pouco orientam no

consumo ou esclarecem dúvidas de seus pacientes em relação aos medicamentos genéricos. Esta

situação dificulta a sua aceitação já que os consumidores, ao desconhecer o assunto, confiam no

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conhecimento “perito” do médico e, a opinião destes, ajuda a formar as representações sociais

sobre o produto.

Percebeu-se que a credibilidade dos laboratórios têm pouca ou nenhuma importância para a

formação das representações sociais sobre os medicamentos genéricos pois os consumidores, em

nenhum momento da entrevista, apontaram esse aspecto. Portanto, a marca dos laboratórios

fabricantes de medicamentos genéricos não agregam valor ao produto, ou seja, a credibilidade

dos laboratórios pouco colabora com a formação de representações sociais positivas dos

medicamentos genéricos.

Em resumo, o que a pesquisa nos revelou é que, respeitadas algumas particularidades das duas

localizações investigadas, as representações sociais elaboradas pela sociedade soteropolitana

sobre os medicamentos genéricos pouco se diferenciam. Destaca-se em primeiro lugar o preço do

produto, evocado pela maioria dos consumidores entrevistados, seguido da confiança na sua

qualidade, citada por metade deles.

Um dado significativo que a pesquisa mostrou foi o alto índice de consumidores que não tem

representações formadas sobre os medicamentos genéricos, causado por falhas na estratégia de

divulgação dos interessados sucesso dos medicamentos genéricos (Governo Federal e

laboratórios produtores).

Ao contrário do que se esperava, observou-se que não há um comportamento generalizado de

rejeição ao medicamento genérico, pois somente 1 e cada 5 entrevistados receia confiar no

medicamento genérico e a maioria já o experimentou, reafirmando que faria uso dos genéricos

novamente. Considerando o restante da amostra entrevistada, temos que metade dos

consumidores afirmou confiar no produto e o que se destaca é o alto índice dos que não têm

representações sociais (lacuna) formadas sobre o assunto.

Essas lacunas de representação ratificam o precário conhecimento dos consumidores acerca do

assunto e podem inibir o consumo do medicamento genérico de várias formas, pois criam um

ambiente de dúvida ou de receio que afeta o comportamento do consumidor quando no processo

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de compra de um genérico. Essa situação se agrava ao analisarmos que uma grande parte dos

consumidores não sabe se existe substituto genérico ao medicamento que foi comprar e, mais

ainda, ao perceber que não há o hábito do consumidor em solicitar ao balconista um

medicamento genérico. Os balconistas, por sua vez, também não demonstraram interesse na

indicação dos genéricos.

Mas, se por um lado, as lacunas de representação são um problema real para os genéricos, por

outro, elas mostram aos interessados no sucesso dos medicamentos genéricos um mercado

potencial a ser trabalhado.

De acordo com as respostas dos consumidores, os médicos – “peritos” – pouco esclarecem o

assunto a seus pacientes e elucidam suas dúvidas, fato que se verifica tanto para consumidores de

“bairros nobres” quanto para de “outros bairros”, agravando-se nesta última localidade. Essa

situação de distinção do comportamento dos médicos diante de consumidores de diferentes faixas

de renda pode evidenciar um problema social no que diz respeito à qualidade no atendimento de

seus pacientes e levantar a questão para uma pesquisa posterior: será que não caberia aos médicos

um papel mais ativo de orientação e esclarecimento junto a seus paciente?

Por fim, o grande desafio dos medicamentos genéricos é estabelecer representações sociais

positivas, já que são ausentes de uma marca de produto, para que os consumidores lhes atribuam

valor e confiança. Não se deve, todavia, responsabilizar apenas as representações sociais pelo

desempenho dos genéricos, pois outras variáveis como estratégias de concorrentes, custos e

tempo de espera para registro e fabricação de um fármaco, benefícios concedidos a médicos e

balconistas, questões ligadas à distribuição dentre outras também afetam diretamente o

desenvolvimento dos medicamentos genéricos no mercado. De toda forma, o objetivo deste

trabalho foi demonstrar a importância das representações sociais para o desempenho dos

medicamentos genéricos, pois um produto só é aceito socialmente quando reúne atributos e

significações que são desejados e reconhecidos pela sociedade. É a forma com que o indivíduo

concebe um produto que orienta o seu comportamento de compra.

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APÊNDICE A

ROTEIRO DE ENTREVISTAS PARA CONSUMIDORES

(Entrevista nº_____________)

1. Quando eu digo genérico, qual a primeira idéia que vem à sua mente? O que mais?

R:____________________________________________________________________________________

2. Você já usou medicamentos genéricos?

( ) SIM ( )NÃO

2.1 {Se NÃO}:

Porquê?____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________(ir para questão 4)

2.2. {Se SIM}: Relate a sua experiência mais marcante com os medicamentos genéricos...

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

3. Você usaria novamente o genérico?

( ) SIM ( )NÃO ( ) DEPENDE/ TALVEZ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

3.1 { Se SIM}: Mesmo no caso de uma doença grave, você compraria o genérico?

( )SIM ( ) NÃO ( ) Depende/Talvez

3.2 { Se NÃO}:

Porquê?___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________3.3 {Se DEPENDE/ TALVEZ}:

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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4. Este remédio que você veio comprar agora...você sabe se existe um medicamento genérico para substituí-lo?

( ) SEI que EXISTE (ir para Q 5) ( ) SEI que NÃO existe (ir para Q6) ( ) NÃO SEI (ir para Q 6)

5. {Se SEI que EXISTE}: Nesta compra que você foi fazer...você pediu o medicamento genérico? O balconista teofereceu o medicamento genérico?

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

6. Algum médico já falou sobre os medicamentos genéricos com você?________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Sexo: F( ) M ( )

Faixa Etária: 18 a 25 ( ) 26 a 40 ( ) 41 a 60 ( ) Acima de 60 ( )

Escolaridade:___________________________________________________________________________

Estado Civil: ___________________________________________________________________________

Filhos: Sim ( ) Não ( )

Equipe:________________________________________________________________________________

Bairro:____________________________________

Farmácia Nº________________________________

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APÊNDICE B – Caracteristicas dos entrevistados da pesquisa

Sexo

Masculino41,1%

Feminino58,9%

Sexo

73 58,9

51 41,1

124 100,0

Femin ino

Masculino

T otal

Valid

FrequênciaAbsolut a

FrequênciaRelat iva

Faixa Etária

26-40 anos40,3%

18-25 anos26,6%

41-60 anos24,2%

60 anos ou +8,9%

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Faixa Etária

33 26,6

50 40,3

30 24,2

11 8,9

124 100,0

18-25

26-40

41-60

60 ou +

T otal

Valid

FrequênciaAbsoluta

FrequênciaRelat iva

Escolaridade

Superior22,6%

Foi ao 1º Grau21,0%

Foi ao 2º Grau56,4%

Escolaridade

18 14,5

8 6,5

13 10,5

57 46,0

13 10,5

15 12,1

124 100,0

1º grau incompleto

1º grau completo

2º grau incompleto

2º grau completo

3º grau incompleto

3º grau completo

T otal

Valid

FrequênciaAbsoluta

FrequênciaRelat iva

100

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Tem filhos?

Não31,5%

Sim68,5%

Tem filhos?

85 68,5

39 31,5

124 100,0

Sim

Não

T otal

Valid

FrequênciaAbsoluta

FrequênciaRelat iva

Localização

Outros Bairros75,0%

Bairros Nobres25,0%

101

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Localização

31 25,0

93 75,0

124 100,0

Bairros Nobres

Out ros Bairros

T otal

Valid

FrequênciaAbsoluta

FrequênciaRelat iva

102

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ANEXO A – Lei 9.787/99

LEI Nº 9.787, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1999

Altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o

medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras

providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 3o ............................................................................

........................................................................................"

"XVIII - Denominação Comum Brasileira (DCB) - denominação do fármaco ou princípio farmacologicamente ativo aprovada pelo órgão federal responsável pela

vigilância sanitária;

XIX - Denominação Comum Internacional (DCI) - denominação do fármaco ou princípio farmacologicamente ativo recomendada pela Organização Mundial de

Saúde;

XX - Medicamento Similar - aquele que contém o mesmo ou os mesmos princípios ativos, apresenta a mesma concentração, forma farmacêutica, via de

administração, posologia e indicação terapêutica, preventiva ou diagnóstica, do medicamento de referência registrado no órgão federal responsável pela vigilância

sanitária, podendo diferir somente em características relativas ao tamanho e forma do produto, prazo de validade, embalagem, rotulagem, excipientes e veículos,

devendo sempre ser identificado por nome comercial ou marca;

XXI - Medicamento Genérico - medicamento similar a um produto de referência ou inovador, que se pretende ser com este intercambiável, geralmente produzido

após a expiração ou renúncia da proteção patentária ou de outros direitos de exclusividade, comprovada a sua eficácia, segurança e qualidade, e designado pela

DCB ou, na sua ausência, pela DCI;

XXII - Medicamento de Referência - produto inovador registrado no órgão federal responsável pela vigilância sanitária e comercializado no País, cuja eficácia,

segurança e qualidade foram comprovadas cientificamente junto ao órgão federal competente, por ocasião do registro;

XXIII - Produto Farmacêutico Intercambiável - equivalente terapêutico de um medicamento de referência, comprovados, essencialmente, os mesmos efeitos de

eficácia e segurança;

XXIV - Bioequivalência - consiste na demonstração de equivalência farmacêutica entre produtos apresentados sob a mesma forma farmacêutica, contendo idêntica

composição qualitativa e quantitativa de princípio(s) ativo(s), e que tenham comparável biodisponibilidade, quando estudados sob um mesmo desenho

experimental;

XXV - Biodisponibilidade - indica a velocidade e a extensão de absorção de um princípio ativo em uma forma de dosagem, a partir de sua curva

concentração/tempo na circulação sistêmica ou sua excreção na urina."

"Art. 57 .............................................................................."

"Parágrafo único. Os medicamentos que ostentam nome comercial ou marca ostentarão também, obrigatoriamente com o mesmo destaque e de forma legível, nas

peças referidas no caput deste artigo, nas embalagens e materiais promocionais, a Denominação Comum Brasileira ou, na sua falta, a Denominação Comum

Internacional em letras e caracteres cujo tamanho não será inferior a um meio do tamanho das letras e caracteres do nome comercial ou marca."

Art. 2o O órgão federal responsável pela vigilância sanitária regulamentará, em até noventa dias:

I - os critérios e condições para o registro e o controle de qualidade dos medicamentos genéricos;

II - os critérios para as provas de biodisponibilidade de produtos farmacêuticos em geral;

III - os critérios para a aferição da equivalência terapêutica, mediante as provas de bioequivalência de medicamentos genéricos, para a caracterização de sua

intercambialidade;

IV - os critérios para a dispensação de medicamentos genéricos nos serviços farmacêuticos governamentais e privados, respeitada a decisão expressa de não

intercambialidade do profissional prescritor.

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Art. 3o As aquisições de medicamentos, sob qualquer modalidade de compra, e as prescrições médicas e odontológicas de medicamentos, no âmbito do Sistema

Único de Saúde - SUS, adotarão obrigatoriamente a Denominação Comum Brasileira (DCB) ou, na sua falta, a Denominação Comum Internacional (DCI).

§ 1o O órgão federal responsável pela vigilância sanitária editará, periodicamente, a relação de medicamentos registrados no País, de acordo com a classificação

farmacológica da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais - Rename vigente e segundo a Denominação Comum Brasileira ou, na sua falta, a Denominação

Comum Internacional, seguindo-se os nomes comerciais e as correspondentes empresas fabricantes.

§ 2o Nas aquisições de medicamentos a que se refere o caput deste artigo, o medicamento genérico, quando houver, terá preferência sobre os demais em

condições de igualdade de preço.

§ 3o Nos editais, propostas licitatórias e contratos de aquisição de medicamentos, no âmbito do SUS, serão exigidas, no que couber, as especificações técnicas dos

produtos, os respectivos métodos de controle de qualidade e a sistemática de certificação de conformidade.

§ 4o A entrega dos medicamentos adquiridos será acompanhada dos respectivos laudos de qualidade.

Art. 4o É o Poder Executivo Federal autorizado a promover medidas especiais relacionadas com o registro, a fabricação, o regime econômico-fiscal, a distribuição e

a dispensação de medicamentos genéricos, de que trata esta Lei, com vistas a estimular sua adoção e uso no País.

Parágrafo único. O Ministério da Saúde promoverá mecanismos que assegurem ampla comunicação, informação e educação sobre os medicamentos genéricos.

Art. 5o O Ministério da Saúde promoverá programas de apoio ao desenvolvimento técnico-científico aplicado à melhoria da qualidade dos medicamentos.

Parágrafo único. Será buscada a cooperação de instituições nacionais e internacionais relacionadas com a aferição da qualidade de medicamentos.

Art. 6o Os laboratórios que produzem e comercializam medicamentos com ou sem marca ou nome comercial terão o prazo de seis meses para as alterações e

adaptações necessárias ao cumprimento do que dispõe esta Lei.

Art. 7o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 10 de fevereiro de 1999; 178o da Independência e 111o da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

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