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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS ALINE BARROS SANTANA AVALIAÇÃO DAS EXPRESSÕES PROTEICAS TECIDUAIS E CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE AMILÓIDE SÉRICA A E ADIPONECTINA EM MULHERES COM CÂNCER DE MAMA E RELAÇÃO COM OBESIDADE CAMPINAS 2016

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

    ALINE BARROS SANTANA

    AVALIAÇÃO DAS EXPRESSÕES PROTEICAS TECIDUAIS E CONCENTRAÇÕES

    SÉRICAS DE AMILÓIDE SÉRICA – A E ADIPONECTINA EM MULHERES COM

    CÂNCER DE MAMA E RELAÇÃO COM OBESIDADE

    CAMPINAS

    2016

  • ALINE BARROS SANTANA

    AVALIAÇÃO DAS EXPRESSÕES PROTEICAS TECIDUAIS E CONCENTRAÇÕES

    SÉRICAS DE AMILÓIDE SÉRICA – A E ADIPONECTINA EM MULHERES COM

    CÂNCER DE MAMA E RELAÇÃO COM OBESIDADE

    Tese apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da

    Universidade Estadual de Campinas como parte dos

    requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora

    em Ciências Médicas, na área de concentração em

    Ciências Biomédicas.

    Orientadora: Profª. Drª. Sílvia de Barros Mazon

    ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO

    FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA

    ALINE BARROS SANTANA, E ORIENTADA PELA PROFª. DRª. SÍLVIA DE BARROS

    MAZON.

    CAMPINAS

    2016

  • BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

    ALINE BARROS SANTANA

    ORIENTADOR: Sílvia de Barros Mazon

    MEMBROS:

    1. PROFª. DRª Sílvia de Barros Mazon

    2. PROFª. DRª. Helenice Gobbi

    3. PROFª. DRª. Márcia Carvalho Garcia

    4. PROFª. DRª. Liliana Aparecida Lucci De Angelo Andrade

    5. PROFª. DRª. Elaine Conceição de Oliveira

    Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas da Faculdade de

    Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

    A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca

    examinadora encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

    Data: 24/02/2016

  • Dedico este trabalho a

    Nivaldir Antonio Santana e Theo Barros Santana

  • AGRADECIMENTOS

    Profa. Dra. Sílvia de Barros Mazon - Departamento de Patologia Clínica/FCM,

    pela orientação.

    Profa. Dra. Maria Salete da Costa Gurgel - Departamento de Tocoginecologia/FCM.

    Profa. Dra. Eliana Cotta de Faria - Departamento de Patologia Clínica/FCM.

    Prof. Dr. José Vassalo – Departamento de Anatomia Patológica/FCM

    Profa. Dra. Glauce Aparecida Pinto - Laboratório de Patologia Especializada (LAPE)

    do Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM.

    Dra. Luciana Regina Moreira – Laboratório de Citopatologia do Hospital da Mulher

    Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM

    Marisa de Almeida Matsura - Laboratório de Patologia Especializada (LAPE) do

    Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM

    Carlos Ferreira Nascimento - Departamento de Patologia Investigativa do AC

    Camargo Cancer Center

    Cleide Aparecida Moreira Silva - Câmara de Pesquisa/FCM.

    Aos funcionários da secretaria do Departamento de patologia Clínica: Paulo

    Henrique de Oliveira e Bruna de Almeida Bianchine

    Aos funcionários da Seção de Imunologia da Divisão de Patologia Clínica do

    Hospital das Clínicas – UNICAMP.

    Aos funcionários da Seção de Bioquímica da Divisão de Patologia Clínica do

    Hospital das Clínicas – UNICAMP.

    Aos funcionários do serviço de Enfermagem da Unidade de Internação - Seção

    Oncologia do Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM.

    Rogéria Elias Malaquias (in memoriam) - Serviço de Arquivo Médico (SAME) do

    Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM.

  • Aos funcionários da Divisão de Oncologia: Neuza Aparecida de Melo Balduci,

    Débora Fernanda Glicério Andrade Fernandes e Sônia Aparecida Pianca.

    Aos funcionários da Seção de Coleta de Exames da Divisão de Patologia Clínica do

    HC/UNICAMP

    Aos funcionários da Central de Recepção e Separação de Amostras da Divisão de

    Patologia Clínica do HC/UNICAMP.

    Higor Campos do Nascimento – Laboratório de Imunorregulação FCM/UNICAMP

    A todas as pacientes da Unidade de Internação - Seção Oncologia do Hospital da

    Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti CAISM, participantes desta pesquisa.

    Aos meus pais, Renato e Alice.

    Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), à

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), e ao

    Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e Extensão (FAEPEX).

    Aos queridos amigos,

    Muito Obrigada!

  • “Se temos de esperar, que seja para colher a semente boa que lançamos

    hoje no solo da vida”.

    (Cora Coralina)

  • RESUMO

    Mulheres obesas apresentam risco aumentado para o câncer de mama, e este tem

    sido associado a uma alteração de mediadores inflamatórios e adipocinas. A obesidade

    cursa com um estado inflamatório subclínico e está intimamente relacionada a diversas

    comorbidades, incluindo a síndrome metabólica (SM). Na vigência da inflamação

    subclínica, as adipocinas amilóide sérica SAA e adiponectina APN, que possuem

    funções antagônicas, têm suas concentrações séricas alteradas. Além disso, ambas

    têm sido associadas com a instalação e a progressão do câncer de mama. O objetivo

    deste trabalho foi investigar em pacientes com câncer de mama, as relações das

    adipocinas SAA e APN com a obesidade, com a SM e com as características clínico-

    patológicas da doença. Desta forma, 196 pacientes na pré- ou pós-menopausa foram

    classificadas em três grupos: não obesas (NO), n= 42; sobrepeso/obesidade (SP/O),

    n= 103; e sobrepeso/obesidade com síndrome metabólica (SP/O-SM), n= 51 e todas

    foram submetidas à análise das concentrações séricas e da expressão proteica de SAA

    e APN em espécimes cirúrgicos provenientes de mastectomia ou quadrantectomia. As

    concentrações séricas de SAA foram determinadas por nefelometria e as de APN por

    imunoensaio enzimático (ELISA). A expressão tecidual das adipocinas foi analisada

    pelas técnicas de Tissue Microarray (TMA) e imunoistoquímica, em quatro diferentes

    áreas teciduais: epitélio tumoral (T), epitélio não tumoral (NT), tecido adiposo

    peritumoral (GP) e distante do tumor (GD). Os grupos SP/O (p=0,0028) e SP/O-SM

    (p=0,0013), demonstraram concentrações séricas mais elevadas de SAA do que o

    grupo NO e inversamente, concentrações mais reduzidas de APN (SP/O, p=0,0073 e

    SP/O-SM, p=0,0002). Concentrações séricas mais elevadas de SAA foram observadas

    em pacientes com tumores que não expressavam RE (RE-), tanto no grupo total

    (p=0,009), quanto no subgrupo NO (p=0,043). Também foram detectadas

    concentrações séricas mais elevadas de APN no grupo total de pacientes com tumores

    RE- (p=0,011). Estes resultados foram independentes de obesidade (IMC e CA) e

    estado menopausal. Em relação às análises de expressão proteica, no grupo total de

    pacientes foram detectadas diferenças de expressão de SAA entre todos os tecidos (≤

    0,0439), com expressão mais frequente nos tecidos adiposos GP (76,6%) e GD

    (87,9%), seguidos dos epitélios NT (61,7%) e T (40%). Também foi verificada

    expressão mais frequente de APN nos tecidos adiposos GP (94,4%) e GD (98,4%) em

    relação aos epitélios T (82,9%, p≤ 0,0115) e NT (9%, p< 0,0001), sendo que a

    diferença também foi significativa entre os epitélios T e NT (p< 0,0001). Quando os

  • tecidos foram analisados quanto à diferença de expressão entre as proteínas,

    observou-se que a expressão de SAA no epitélio T foi 2,1 vezes menos frequente do

    que a de APN (p< 0,0001) e no epitélio NT 6,9 vezes mais frequente do que APN (p<

    0,0001). A análise de frequência entre as proteínas nos diferentes tecidos dentro de

    cada subgrupo revelou expressão de SAA no epitélio NT aproximadamente 15 vezes

    mais frequente do que a de APN no grupo SP/O-SM (p< 0,0001). Em relação à

    associação da expressão das adipocinas com as características clínico-patológicas do

    câncer de mama, verificou-se elevada frequência de pacientes com ECP III que não

    expressavam SAA no tecido adiposo GP. Não foram detectadas associações entre as

    concentrações séricas e as expressões teciduais das proteínas investigadas. A

    demonstração de concentrações séricas mais elevadas de SAA e APN em pacientes

    com tumores RE- sugere um estímulo de respostas sistêmicas antagônicas na vigência

    de tumores mais agressivos. Já, a detecção de expressão diferencial de SAA e APN no

    epitélio T poderia ser associada aos efeitos antiproliferativos e pró-apoptóticos de APN

    no microambiente tumoral. Em contrapartida, SAA mais frequente no epitélio NT,

    poderia sugerir a presença de maior atividade inflamatória no ambiente peritumoral,

    que seria ainda mais exacerbada no grupo SP/O-SM.

    Palavras-chave: SAA – APN – obesidade - síndrome metabólica – inflamação - câncer

    de mama.

  • Abstract

    Obese women are at increased risk for breast cancer, and this condition has been

    associated with a change of inflammatory mediators and adipokines. Obesity is

    associated with a low grade chronic inflammation and it is closely related to several

    comorbidities including the metabolic syndrome (MetS). As part of low grade

    inflammation, the antagonistic adipokines serum amyloid A (SAA) and adiponectin

    (APN) have changes in their serum concentrations. In addition, both have also been

    associated with the development and prognosis of breast cancer. This study aimed to

    investigate the relationship of SAA and APN with obesity, MetS and with the clinical and

    pathological features of breast cancer. Thus, 196 patients were classified into three

    groups: non-obese (NO), n= 42; overweigh/obesity (OW/O), n= 103; and

    overweight/obesity with MetS (OW/O-MetS), n= 51 and all of them have had SAA and

    APN serum concentrations and protein expression in surgical specimens from

    mastectomy and quadrantectomy analyzed. The serum concentrations of SAA and APN

    were respectively determined by nephelometry and by enzymatic immunoassay (ELISA)

    and the protein expression by immunohistochemistry tissue microarray (TMA), was

    done for four different tissue tumor epithelium (T), non-tumor (NT), adipose tissue close

    to tumor (GP) and adipose tissue distant from tumor (GD). The OW/O (p= 0.0028)

    and OW/O-MetS (p= 0.0013) groups showed higher serum concentrations of SAA than

    NO group, and conversely, lower concentrations of APN (OW/O, p= 0.0073 and OW/O-

    MetS, p= 0.0002). Higher concentrations of SAA were observed in patients bearing RE-

    tumors from total p= 0.009, and NO group p= 0.043. Higher APN serum concentrations

    were also detected in patients with RE- tumors from the total group of patients (p=

    0.011). Those results were independent of obesity (BMI and WC) and menopausal

    status. Regarding protein expression in the total group of patients, adipose tissue close

    to tumor (GP) and distant from tumor (GD) had the higher frequencies of SAA

    expression, 76.6% and 87.0 respectively, followed by non-tumor (T), 61.7%, and tumor

    epithelium (T), 40%. Higher frequencies of APN expression were observed in GD

    (98.4%), GP (94.4%) and T (82.9%) samples, in contrast to 9.0% frequency in NT tissue

    (p

  • group NT epithelium the expression frequencies of SAA was around 15 fold higher than

    APN. Regarding the association of frequency expression of adipokines with the breast

    cancer clinical and pathological features, we observed enhanced frequency of patients

    with ECP III, with no expression of SAA in adipose tissue GP. The results demonstrate

    direct and inverse association respectively of serum SAA and APN with obesity and

    MetS, but no correlation between adipokines serum concentrations. The fact that the

    concentrations of both, SAA as APN were related to RE- tumors, would suggest

    antagonist systemic responses in those patients. Opposite frequency expression

    between SAA and APN in T and NT epithelium could be associated with anti-

    proliferative and pro-apoptotic functions of APN.

    Keywords: SAA. APN. Obesity. Metabolic syndrome. Inflammation. Breast cancer.

  • LISTA DE ESQUEMAS E FIGURAS

    Esquema 1: Mecanismo proposto para explicar a associação da obesidade com

    tumores mamários RE positivos a partir da produção estrogênica extra

    glandular.....................................................................................................................24

    Esquema 2: Mecanismo proposto para explicar a associação da obesidade com

    tumores mamários RE positivos a partir da hiperinsulinemia que pode acompanhar a

    obesidade...................................................................................................................26

    Esquema 3: Esquematização da ação sinérgica dos mecanismos propostos para

    explicar a relação da obesidade com a

    carcinogênese............................................................................................................29

    Esquema 4: Constituição inicial dos grupos de estudo: NO (não obesas) e SP/O

    (sobrepeso-

    obesidade).................................................................................................................40

    Esquema 5: Reagrupamento das pacientes em estudo: grupos NO, SP/O e SP/O-

    SM.............................................................................................................................51

    Figura 1: Blocos e lâminas pareadas e demarcadas com as áreas de interesse para confecção do TMA...........................................................................................................................45

    Figura 2: Etapas geral do processo de construção dos blocos e obtenção dos cortes

    de tissue microarray (TMA)........................................................................................45

    Figura 3: Comparação das concentrações séricas de SAA e APN entre os três

    grupos de estudo de pacientes com câncer de

    mama.........................................................................................................................54

    Figura 4: Imagem representativa da reação imunoistoquimica de SAA nas quatro

    regiões

    estudadas..................................................................................................................61

    Figura 5: Imagem representativa da reação imunoistoquimica de APN nas quatro

    regiões estudadas ....................................................................................................62

  • LISTA DE TABELAS E QUADROS

    Tabela 1: Escores finais obtidos pela análise simultânea dos parâmetros:

    intensidade de reação e porcentagem de células reativas.......................................47

    Tabela 2: Classificação das variáveis dicotômicas...................................................48

    Tabela 3: Dados demográficos, antropométricos, bioquímicos e clinico-patológicos

    entre os grupos NO e SP/O.......................................................................................50

    Tabela 4: Dados demográficos, antropométricos, bioquímicos e clinico-patológicos

    entre os grupos NO, SP/O e SP/O-SM......................................................................53

    Tabela 5: Análise de correlação entre SAA e APN no grupo total e nos subgrupos de

    pacientes com câncer de mama.................................................................................55

    Tabela 6: Associação das concentrações séricas de SAA com as variáveis clínico-

    patológicas da doença no grupo total e nos subgrupos NO, SP/O e SP/O-

    SM............................................................................................................................57

    Tabela 7: Associação das concentrações séricas de APN com as variáveis clínico-

    patológicas da doença no grupo total e nos subgrupos NO, SP/O e SP/O-

    SM.............................................................................................................................59

    Tabela 8: Comparação entre as frequências de expressão proteica de SAA e APN

    nos microarranjos T, NT GD e GP dos espécimes cirúrgicos de carcinoma ductal

    invasivo da mama do grupo total de pacientes..........................................................64

    Tabela 9: Comparação das frequências de expressão de SAA e APN entre os

    microarranjos T, NT GD e GP dos espécimes de carcinoma ductal invasivo da mama

    no grupo total de pacientes........................................................................................65

    Tabela 10. Comparação da frequência da expressão entre SAA e APN nos

    microarranjos T, NT GD e GP dos espécimes de carcinoma ductal invasivo da mama

    nos subgrupos NO, SP/O e SP/O-SM de pacientes..................................................67

  • Tabela 11. Comparação da frequência de expressão de SAA e APN entre os

    microarranjos T, NT GD e GP dos espécimes de carcinoma ductal invasivo da mama

    nos subgrupos NO, SP/O e SP/O-SM........................................................................69

    Quadro 1: Critérios para identificação de síndrome metabólica nas pacientes em

    estudo........................................................................................................................41

    Quadro 2: Especificações dos anticorpos.................................................................47

  • LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    Português Inglês

    AdipoR1 receptor para adiponectina-1 adiponectin receptor-1

    AdipoR2 receptor para adiponectina-2 adiponectin receptor-2

    AKT ---------- Kinase B protein

    AMPK ---------- AMP activated protein kinase

    APN

    Col-T

    adiponectina

    colesterol total

    adiponectin

    ----------

    CA circunferência abdominal ----------

    ERK ---------- extracelular signal regulated kinase

    Gli glicose ----------

    HDL-Col lipoproteína de alta densidade high-density- lipoproteins

    HER2 receptor para fatores de crescimento human epidermal growth factor receptor 2

    IGF ---------- insulin-like growth factor

    IMC índice de massa corpórea ----------

    IL-1 ínterleucina-1 ----------

    IL-6 interleucina-6 ----------

    LDL-Col lipoproteína de baixa densidade low - density lipoprotein

    MAPK ---------- mitogen activated protein

    kinase

    mTOR ---------- mammalian target of

    rapamycin

    PI3K ---------- phosphatidylinositol 3 kinase

  • RE receptor de estrógeno ----------

    RP receptor de progesterona ----------

    SAA amiloide sérica A serum amyloid A

    SHBG globulina ligante de hormônio sexual sex hormone-binding globulin

    SM síndrome metabólica ----------

    TG triglicérides ----------

    TLR4 ---------- toll like receptor 4

    TMA microarranjo tecidual tissue microarray

    TAM macrófagos associados ao tumor tumor associated macrophages

    TNM T: extensão do tumor primário - N: ausência ou presença e a extensão de metástase em linfonodos regionais - M: ausência ou presença de metástase à distância

    ----------

    TNF-α fator de necrose tumoral alfa tumor necrosis factor alpha

    TNBC tumores mamários triplo negativos triple negative breast cancer

    VR valor de referência

  • LISTA DE SÍMBOLOS

    cm - centímetro

    dL - decilitro

    g - grama

    h - hora

    kg - quilograma

    L - litro

    M - molar

    mg - miligrama

    min - minuto

    mL - mililitro

    mmHg - milímetro de mercúrio

    m2 - metro quadrado

    n - tamanho da amostra

    ng - nanograma

    nm - nanômetro

    p - p valor, nível de significância estatística

    pg - picograma

    rpm - rotação por minuto

    ºC - graus Celsius

    µg - micrograma

    µL - microlitro

    µm - micrômetro

  • SUMÁRIO

    1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 21

    2. OBJETIVOS ............................................................................................................. 36

    2.1. OBJETIVO GERAL .............................................................................................36

    2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS..................................................................................36

    3. SUJEITOS E MÉTODOS .......................................................................................... 37

    3.1. TIPO DE ESTUDO ................................................................................................ 37

    3.2. TAMANHO AMOSTRAL.........................................................................................37

    3.3. SELEÇÃO DOS SUJEITOS..................................................................................38

    3.3.1 CRITÉRIOS DE SELEÇÃO ..............................................................................................39

    A. CRITÉRIOS DE INCLUSÃO .....................................................................................39

    B.CRITÉRIOS DE XCLUSÃO......................................................................................39

    3.3.2 CONSTITUIÇÃO INICIAL DOS GRUPOS......................................................................39

    3.4. COLETA DE SANGUE ....................................................................................... 40

    3.5.QUANTIFICAÇÃO DAS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE COLESTEROL TOTAL E FRAÇÕES, TRIGLICERÍDEOS E GLICOSE ............................................................. 40

    3.6. CARATERIZAÇÃO DA SÍNDROME METABÓLICA ENTRE AS PACIENTES ... 41

    3.7. QUANTIFICAÇÃO DAS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE SAA ..................... 41

    3.8. QUANTIFICAÇÃO DAS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE APN ..................... 42

    3.9. COLETA DAS INFORMAÇÕES CLÍNICO PATOLÓGICAS ............................... 43

    3.10. AVALIAÇÃO DA EXPRESSÃO PROTEICA TECIDUAL DE SAA E APN NAS

    QUATRO REGIÕES ESTUDADAS DA MAMA DAS PACIENTES COM CÂNCER DE

    MAMA............................................................................................................................44

    A- CONSTRUÇÃO DO MICROARRANJO DE TECIDOS - TISSUE MICROARRAY

    (TMA).....................................................................................................................................44

    B- ANÁLISE IMUNOISTOQUÍMICA PARA INVESTIGAÇÃO DA EXPRESSÃO DAS

    PROTEÍNAS SAA E APN .................................................................................................... 46

    C- INTERPRETAÇÃO DO ESTUDO IMUNOISTOQUÍMICO................................................47

    3.11. ANÁLISES DE DADOS............................................................................................48

    4. RESULTADOS...........................................................................................................49

    4.1 DADOS DEMOGRÁFICOS, ANTROPOMÉTRICOS, BIOQUÍMICOS E CLÍNICO-PATOLÓGICOS ENTRE OS GRUPOS NO E SP/O.......................................................49

    4.2. DADOS DEMOGRÁFICOS, ANTROPOMÉTRICOS, BIOQUÍMICOS E CLÍNICO-PATOLÓGICOS ENTRE OS GRUPOS NO, SP/O E SP/O-SM ..................................... 51

  • 4.3. COMPARAÇÃO DAS CONCENTRAÇÕES DE SAA E APN ENTRE OS TRÊS GRUPOS DE ESTUDO ................................................................................................ 54

    4.4 ANÁLISES DA CORRELAÇÃO ENTRE AS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE SAA E APN NO GRUPO TOTAL E NOS SUBGRUPOS NO, SP/O E SP/O-SM..................................................................................................................................55

    4.5. ASSOCIAÇÃO DAS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS DE SAA E DE APN COM AS VARIÁVEIS CLÍNICO-PATOLÓGICAS DA DOENÇA NO GRUPO TOTAL E NOS SUBGRUPOS DE PACIENTES......................................................................................56 4.6. AVALIAÇÃO DA EXPRESSÃO PROTEICA TECIDUAL DE SAA E APN DAS PACIENTES COM CÂNCER DE MAMA ................................................................ .......60

    4.6.1. COMPARAÇÃO DAS FREQUÊNCIAS DE EXPRESSÃO PROTEICA DE SAA E DE

    APN NOS MICROARRANJOS T,NT,GD E GP DOS ESPÉCIMES CIRÚRGICOS NO

    GRUPO TOTAL DE PACIENTES.......................................................................................63

    4.6.2. COMPARAÇÃO DAS FREQUÊNCIAS DE EXPRESSÃO PROTEICA TECIDUAL DE

    SAA E DE APN ENTRE OS MICROARRANJOS T, NT,GD E GP DOS ESPÉCIMES

    CIRÚRGICOS NO GRUPO TOTAL DE PACIENTES............................................................64

    4.6.3 COMPARAÇÃO ENTRE AS FREQUÊNCIAS DE EXPRESSÃO PROTEICA DE SAA E

    APN NOS MICROARRANJOS T, NT, GD, E GP DOS ESPÉCIMES CIRÚRGICOS NOS

    SUBGRUPOS DE PACIENTES...........................................................................................66

    4.6.4 COMPARAÇÕES DAS FREQUÊNCIAS DE EXPRESSÃO PROTEICA DE SAA E APN

    ENTRE OS MICROARRANJOS TECIDUAIS NOS SUBGRUPOS DE PACIENTES NO,

    SP/O E SP/O-SM...................................................................................................................67

    4.6.5 ASSOCIAÇÃO DA EXPRESSÃO PROTEICA TECIDUAL DE SAA E APN COM AS

    CARACTERÍSTICAS CLÍNICO PATOLÓGICAS DOS TUMORES.......................................70

    4.6.6 AVALIAÇÃO DAS CORRELAÇÕES ENTRE AS CONCENTRAÇÕES SÉRICAS E AS

    FREQUÊNCIAS DE EXPRESSÃO TECIDUAL DE SAA E APN NO GRUPO TOTAL DE

    PACIENTES...........................................................................................................................70

    5. DISCUSSÃO ............................................................................................................ 70

    6. CONCLUSÕES......................................................................................................... 77

    7. REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 78

    8. APÊNDICES...............................................................................................................112

    9. ANEXOS.....................................................................................................................116

  • 21

    1. INTRODUÇÃO

    A obesidade tem aumentado consideravelmente no mundo todo e sua

    prevalência mais que dobrou no período entre 1980 e 2014 (WHO, 2015). Em

    2014 a Organização Mundial de Saúde anunciou que 1,9 bilhões de adultos

    apresentavam sobrepeso, e entre eles, mais de 600 milhões eram obesos

    (WHO, 2015). No Brasil, pesquisas realizadas pelo Ministério da Saúde

    mostraram que 52,5% dos adultos apresentavam sobrepeso. A incidência de

    obesidade nos adultos era de 17,9%, com igualdade entre os gêneros e com

    frequência mais elevada nas faixas entre 45-64 anos (Ministério da Saúde,

    2015).

    A obesidade impacta negativamente a saúde da mulher de muitas

    formas: acarreta maior risco para o desenvolvimento de diabetes (Gallagher et

    al., 2008) e doença arterial coronariana (Weiss et al., 2009), prejudica a

    contracepção e a fertilidade (Lash e Armstrong, 2009), diminui a intenção, o

    início e a duração da amamentação (Hilson et al., 2004) e contribui para o

    aumento do risco de mortalidade neonatal e de malformações (Kristensen et

    al., 2005 e Stothard, 2009). Também tem sido associada à depressão (Yu et

    al., 2015; Arterburn et al., 2012), bem como ao alto risco para o

    desenvolvimento de vários cânceres. Casos novos de câncer em adultos têm

    sido atribuídos ao excesso de peso corporal (Arnold et al., 2015). Evidências

    clínicas mostram que o aumento das medidas de obesidade, tais como, índice

    de massa corpórea (IMC) e circunferência abdominal (CA), estão associadas

    com o aumento da prevalência de certos cânceres, como próstata, pâncreas

    (Pischon et al., 2008; Gonzalez et al., 2006; Calle et al., 2003; Renehan et al.,

    2008; Wolin et al., 2010), endometrial (Kaaks et al., 2002; Jenabi et al., 2015)

    cervical (Maruthur et al., 2009), ovariano (Leitzmann et al., 2009) e de mama

    (Kuhl, 2005; Goodwin et al., 2015) e também pode prejudicar a resposta aos

    tratamentos de quimioterapia e radioterapia, levando a um prognóstico inferior

    ao esperado em indivíduos obesos (Vucenik et al., 2012; Griggs et al., 2005;

    Wong et al., 2009).

    A agência internacional de pesquisa em câncer (IARC/WHO) anunciou

    uma estimativa de 14,1 milhões de novos casos de câncer em 2012. Entre

  • 22

    eles, o câncer de mama é o câncer mais frequentemente diagnosticado e

    responsável pela causa de morte entre as mulheres no mundo todo, com uma

    estimativa de 1,7 milhões de novos casos e 521,900 mortes em 2012,

    contabilizando 25% dos casos e 15% das mortes causadas pelo câncer entre

    as mulheres (WHO 2012; Torre et al., 2015).

    No câncer de mama, em particular, a obesidade tem se mostrado

    responsável pelo aumento de 30 a 50% na taxa de acometimento de mulheres

    na pós-menopausa (Tehard, 2006). Todavia, em mulheres mais jovens o papel

    da obesidade é controverso. Nessas mulheres, a obesidade poderia ser um

    fator protetor para câncer de mama e não um fator de risco (Rose e Vona-

    Davis 2010). Entretanto, outros autores demonstraram que mulheres obesas na

    pré-menopausa apresentam risco aumentado para o câncer de mama, e este

    tem sido associado a uma alteração de mediadores inflamatórios e adipocinas

    (Alokail et al., 2009). Além do estado hormonal, alguns estudos indicam que o

    aumento do IMC está associado ao câncer de mama mais agressivo e a um

    período de sobrevida mais reduzido (Porter et al., 2006, Carmichael 2006;

    Haakinson et al., 2012; Copson et al., 2015; Kamineni et al., 2013; Chan et al.,

    2014). Diante do exposto, algumas teorias propõem mecanismos que poderiam

    levar à compreensão parcial desta associação.

    Entre as hipóteses propostas para explicar a associação entre câncer de

    mama e obesidade na pós-menopausa, a primeira delas considera a

    concentração mais elevada de estrógeno circulante proveniente da

    aromatização de andrógenos no tecido adiposo de mulheres obesas em

    comparação ao de mulheres magras na pós-menopausa (Lorincz e Sukumar,

    2006). Nesta fase o estrógeno é produzido quase exclusivamente nos pré-

    adipócitos do tecido adiposo pela aromatização do esteróide androestenediona

    C19 em estrona (Judd et al., 1982; Key et al., 2003). O aumento do peso

    corporal faz com que esta produção extraglandular de estrógeno também

    aumente, elevando a concentração plasmática de estrógeno em mulheres

    obesas na pós-menopausa. (Baglietto et al., 2009).

    Além da aromatase, a enzima 17- β-hidroxiesteróide desidrogenase,

    responsável pela conversão da estrona em estradiol biologicamente ativo, está

    presente no tecido adiposo (Rose e Vona Davis 2014). A obesidade não só

  • 23

    aumenta a produção de estrógeno na pós-menopausa, como aumenta também

    a sua biodisponibilidade. Cerca de 1 a 2 % do estradiol circula no plasma em

    sua forma não ligada (livre); 30 a 50 % circula em sua forma não funcional, ou

    seja, se liga com alta afinidade à globulina ligante de hormônio sexual (SHBG)

    que controla a sua biodisponibilidade e acesso a células alvo; mas o restante

    circula ligado fracamente à albumina se tornando uma potencial fonte de

    estradiol livre (Vona-Davis e Rose 2013).

    O estrógeno é um importante fator biológico na promoção de câncer de

    mama e tem sido associado à progressão para fenótipo invasivo e metastático

    em significativa parcela dos tumores mamários humanos (Vona-Davis e Rose,

    2007). Todavia, a capacidade de responder à ação deste hormônio é

    dependente da presença e concentração de receptores de estrógeno (RE) nas

    células tumorais (Hemsell et al., 1974; Lorincz e Sukumar, 2006). Desta forma,

    a associação do estrógeno com o desenvolvimento do câncer mamário poderia

    ser decorrente de sua ação na proliferação das células epiteliais mamárias,

    ativando vias de sinalização intracelular mediadas pelos RE (Yager 2000;

    Strong et al., 2013) (esquema 1).

    Este mecanismo poderia explicar a associação da obesidade com

    tumores mamários RE positivos, mas não a relação da obesidade com tumores

    RE negativos (Godden et al., 1992; Hou et al., 2007)

  • 24

    Esquema 1: Mecanismo proposto para explicar a associação da obesidade com tumores

    mamários RE positivos a partir da produção estrogênica extraglandular. Adaptado de Wang X

    et al., 2015.

    Alguns estudos demonstram que altas concentrações séricas de glicose

    têm sido associadas ao aumento do risco de câncer de mama tanto em

    mulheres na pré- quanto na pós-menopausa (Alokail et al., 2009; Gunter et al.,

    2009; Kabat 2009; Sieri et al., 2012).

    A obesidade pode desencadear a resistência à insulina, com

    consequente aumento da glicose circulante, que pode fazer com que o

    pâncreas produza o hormônio insulina em excesso, na tentativa de equilibrar a

    glicemia. Este estado hiperinsulinêmico, também está presente em indivíduos

    que apresentam Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2) (De Bruijin et al., 2013). A

    literatura demonstra como segunda hipótese para explicar a associação do

    câncer de mama com a obesidade que a resistência à insulina, hiperglicemia,

    hiperinsulinemia e uma grande biodisponibilidade do fator de crescimento 1

    semelhante à insulina (IGF-1) são anormalidades metabólicas diretamente

    relacionadas com o risco de câncer de mama (Krebs et al., 2006; Larson et al.,

  • 25

    2007; Gunter et al., 2009; Kabat et al., 2009; Sundaram et al., 2013). A insulina

    possui ações mitogênicas, e durante a formação tumoral, por meio de seu

    receptor, pode ativar vias que conduzem a eventos proliferativos. (Garg et al.,

    2014). A expressão dos receptores 1 de insulina (IRS1) é aumentada no tecido

    mamário com câncer, particularmente naqueles com alto grau de diferenciação

    (Sisci et al., 2007). Deste modo, a insulina pode ativar tanto a via ERK

    (extracelular signal-regulated kinase) quanto a via PI3K (phosphatidylinositol 3-

    kinase), levando ao desenvolvimento tumoral, pela perda de integridade

    epitelial e aumento na migração e invasão celular (Chan et al., 2007; Frasca et

    al., 2008). A insulina, tanto como seu receptor, possui alta homologia com o

    IGF-1 e seu receptor, o IGF-1R, e desta forma, ambos os ligantes podem agir

    por meio de ambos os receptores (Gunter et al., 2008).

    Ao lado de suas ações mitogênicas, a insulina e o IGF-1 podem ativar a

    transcrição do RE em linhagens celulares de câncer de mama (Moscho e

    Mantozoros, 2002), como demonstrado pela ação sinérgica entre IGF-1 e

    estradiol na ativação transcricional dos RE (Yee e Lee, 2000). De fato, a

    produção estrogênica pode ser modulada pela insulina, levando à gênese

    tumoral (Jalving et al., 2010) (esquema 2).

    Adicionalmente, a hiperinsulinemia crônica inibe a síntese hepática da

    SHBG. Esta globulina, que é uma glicoproteína plasmática se liga com alta

    afinidade aos esteróides sexuais e controla a sua biodisponibilidade e acesso a

    células alvo. Deste modo, a inibição da síntese de SHBG contribui para o

    aumento da biodisponibilidade de andrógenos e estrógenos circulantes

    (Madigan et al., 1998).

  • 26

    Esquema 2: Mecanismo proposto para explicar a associação da obesidade com tumores

    mamários RE positivos a partir da hiperinsulinemia que pode acompanhar a obesidade.

    Adaptado de Wang X et al., 2015.

    Além das hipóteses acima, outros autores, ao relacionarem a obesidade

    com câncer de mama, referem a importância de outros fatores secretados pelo

    tecido adiposo coletivamente chamado de adipocinas ou adipocitocinas como:

    adiponectina, leptina, resistina, TNF, IL-6, IL-8, IL1β, (Frayn et al., 2003;

    Lorincz e Sukumar, 2006; Vona-Davis e Rose, 2007). Sugerindo assim, a

    terceira hipótese.

    O tecido adiposo é composto por adipócitos, pré-adipócitos, fibroblastos,

    macrófagos e vasos sanguíneos. Integrados, estes componentes funcionais

    revelam que o tecido adiposo não é apenas um depósito de energia, mas

    também age como órgão endócrino que controla uma grande diversidade de

    funções biológicas de forma, autocrina, parácrina e endócrina (Hotamisligil et

    al., 1995; Skurk et al., 2007; Wang et al., 2015). Fatores secretados pelo tecido

    adiposo estão envolvidos no controle de vários processos biológicos.

  • 27

    Na obesidade, a hipertrofia e hiperplasia do tecido adiposo conferem

    uma característica disfuncional ao tecido. Este estado inicia uma ação crucial

    em muitas doenças relacionadas à obesidade como inflamação, resistência à

    insulina e câncer (P. Br 2015). O aumento do tecido adiposo, especialmente o

    tecido adiposo branco, produz um grande número de citocinas ou adipocinas

    (TNF, IL-6, IL-8, IL1β) que apresentam um aumento local e sistêmico em

    mulheres obesas (Harvey et al., 2011 e Subbaramaiah et al., 2011).

    A localização do tecido adiposo apresenta um papel fundamental nas

    complicações metabólicas da obesidade. Por isso, o tecido adiposo intra-

    abdominal, localizado próximo ao fígado, é especialmente associado a um

    perfil metabólico anormal (Jensen et al., 2008). Em comparação à gordura

    subcutânea, a gordura visceral apresenta maior infiltração macrofágica e o

    aumento da concentração de citocinas inflamatórias na circulação do sistema

    porta hepático, o que leva à inflamação crônica subclínica sistêmica (Fontana

    et al., 2007; Harman-Boehm et al., 2007).

    A inflamação crônica subclínica é causada pela secreção alterada de

    adipocinas no tecido adiposo disfuncional e este estado pode alterar o

    metabolismo lipídico e de glicose, além de contribuir para o risco de doenças

    coronarianas em indivíduos com obesidade abdominal (Trayhum, 2005;

    Ferrante et al., 2007).

    A transformação maligna tem sido estreitamente associada à inflamação

    crônica e as secreções de citocinas pró-inflamatórias e proteínas de fase aguda

    podem representar a principal causa para esta estreita conexão. A inflamação

    crônica aumenta o risco de vários cânceres e está associada com o

    desenvolvimento e progressão tumoral (Sica et al., 2008; Hursting et al., 2010).

    Em indivíduos obesos, os adipócitos, além de secretarem citocinas

    inflamatórias e outras adipocinas, também secretam a proteína de fase aguda

    amilóide sérica A (SAA), que possui ação pró-inflamatória (Poitou et al., 2006)

    e os fatores de crescimento endotelial (VGF) e IGF-1 (Miyazawa-Hoshimoto et

    al., 2003). VGF e IGF-1 estimulam a via de sinalização PI3K/Akt

    (phosphatidylinositol 3-kinase / Kinase B protein), que controla a proliferação,

  • 28

    sobrevivência, migração e invasão celular promovendo hiperplasia,

    crescimento tumoral e formação metastática (Ungefroren, 2015).

    No câncer de mama, estudos revelam que a inflamação crônica

    relacionada à obesidade estabelece um microambiente que favorece a

    mutagênese, proliferação de células neoplásicas e formação tumoral com alto

    potencial metastático (Lithgow e Covington, 2005; Rose e Vona Davis, 2014).

    Sua associação com a promoção de carcinogênese tem sido demonstrada por

    processos complexos, como a polarização de macrófagos associados ao tumor

    (TAM), via ação de citocinas inflamatórias TNF, IL-6, IL-8, IL1β e subsequente

    produção de fatores de crescimento tumoral (Ulrich et al., 2006; Schwertfeger

    et al., 2006; De Nardo e Coussens, 2007).

    A inflamação crônica pode induzir a angiogênese e grande número de

    fatores angiogênicos incluindo VEGF, que é induzido por TNF- através da

    ativação da via NF-kappa B (Yoshida et al., 1997). O processo de angiogênese

    e adipogênese é coordenado por uma interação parácrina mediada

    amplamente por VEGF secretado de pré-adipócitos e macrófagos. Esta íntima

    relação é demonstrada em humanos pela associação direta entre IMC, gordura

    corporal total e concentração plasmática de VEGF (Brakenhielm et al., 2004)

    Nos últimos anos, as adipocinas SAA e APN, que possuem funções

    antagônicas, têm recebido notável destaque na literatura por suas associações

    com aspectos metabólicos e inflamatórios ligados à obesidade (Matsubara et

    al., 2002; Hoffstedt et al., 2004; Kim et al., 2005; Yang Rog Ze et al., 2006;

    Poitou et al., 2006; Lappalainen et al., 2008; Zhao et al., 2010; Esfahani et al.,

    2015). Além disso, ambas têm sido relacionadas com o câncer de mama.

    Estudos relatam que concentrações aumentadas de SAA (O’Hanlon et al.,

    2002; Pierce et al., 2009) e, inversamente, concentrações diminuídas de APN

    (Myoshi et al., 2003; Jarde et al., 2011) correlacionam-se com risco aumentado

    para o desenvolvimento e o pior prognóstico do câncer mamário (esquema 3).

  • 29

    Esquema 3: Esquematização da ação sinérgica dos mecanismos propostos para explicar a

    relação da obesidade com a carcinogênese. Adaptado de Mauro et al., 2015.

    Amilóide Sérica-A (SAA)

    Atualmente sabe-se que a inflamação crônica tem um papel no

    desenvolvimento e progressão do câncer, e este processo pode ser associado

    à secreção de citocinas pró-inflamatórias, entre outros mecanismos

    fisiopatológicos (Schottenfeld, 2006).

    A proteína amilóide sérica A (SAA) é uma biomolécula de fase aguda,

    que atua tanto em processos homeostáticos quanto patológicos (Eklund et al.,

    2012). Ela é sintetizada pelo fígado (Ramadori et al., 1985, Betts et al., 1991;

    Raynes et al., 1991), e a sua secreção aumenta na presença de citocinas

    inflamatórias (i.e. IL-1β, IL-6 and TNF-). No período entre 5 ou 6 horas após o

    início da reação aguda, as concentrações de SAA no sangue podem aumentar

    em até 1.000 vezes (Steel e Whitehead, 1994). Ela é uma proteína de 12 kDa,

    que pertence a família de apolipoproteinas, (Levin et al., 1973, Anders et al.,

    1975; Rosenthal et al., 1976; Bendit e Erikssen 1977; Skogen et al., 1979) e

    atraiu interesse devido a deposição fibrosa de proteína amiloide A (AA) que é

    produto da clivagem de SAA, em doenças inflamatórias crônicas associadas à

    amiloidose (Bendit e Eriksen,1971). Embora a SAA tenha quatro isoformas, em

    humanos, a SAA-1 é a isoforma mais abundante (Steel e Whitehead, 1994).

    A SAA é secretada também pelo adipócito e está envolvida no transporte

    de colesterol, na degradação da matriz extracelular e no recrutamento de

    células inflamatórias para o sítio da inflamação (Schultz 1990; Ulhar 1999;

  • 30

    Manley et al., 2006, Poitou et al., 2009). A partir da detecção de sua síntese

    pelo tecido adiposo (Sjöholm et al., 2005; Yang et al., 2006) esta proteína vem

    sendo aventada como um sensível marcador biológico de obesidade, com

    potencial uso clínico na avaliação de ganho e redução de adiposidade (Poitou

    et al., 2006; Lappalainen et al., 2008).

    Em relação às doenças malignas, há mais de três décadas a SAA já era

    associada ao seu desenvolvimento, especialmente ao processo metastático

    (Rosenthal et al., 1979) com o seu valor destacado no monitoramento de

    câncer de próstata (Kaneti et al., 1984), e associação com inflamação e com o

    estágio do câncer de mama (Weinstein et al., 1984; Biran et al. ,1986).

    Posteriormente, em um estudo prospectivo, a SAA e a proteína C reativa (PCR)

    foram consideradas fatores prognósticos para o câncer de mama, pela

    detecção de concentrações mais elevadas de ambas, em portadoras de

    tumores mais avançados. Desta forma, postulou-se que estas proteínas

    poderiam ser utilizadas tanto na avaliação de risco, quanto na indicação da

    progressão do câncer mamário (O’Hanlon et al., 2002; Dowling et al., 2012;

    Zhang et al., 2012). E ainda, Pierce e colaboradores (2009) também

    demonstraram que concentrações mais elevadas de SAA foram associadas à

    sobrevida global reduzida destas pacientes.

    Resultados de ensaios in vitro demonstram que a SAA é capaz de

    estimular a síntese e secreção de citocinas pró-inflamatórias em neutrófilos e

    monócitos humanos (Ribeiro et al., 2003). Por outro lado, citocinas pró-

    inflamatórias, como IL-1, IL-6 e TNF-α agindo sobre os hepatócitos e monócitos

    podem aumentar a síntese e liberação da SAA no organismo (Raynes e

    McAdam 1991, Husby et al., 1994). Levando em conta a ação recíproca entre

    SAA e citocinas inflamatórias presentes na obesidade, esta conexão garantiria

    a manutenção do estado inflamatório crônico (Poitou et al., 2006; Lappalainen

    et al., 2008). Além disso, a SAA, pela sua propriedade de se ligar a proteínas

    da matriz extracelular, como laminina e heparina, somada à sua ação

    quimiotática para monócitos e leucócitos (Urieli-Shoval et al., 2002; Preciado-

    Patt et al., 1998), pode contribuir para a manutenção de um microambiente

    inflamatório crônico. Ainda neste contexto, a modificação das proteínas da

    matriz extracelular, poderia levar ao aumento da ativação de plasminogênio e

  • 31

    produção de metaloproteinases (MMPs), contribuindo para a redução de

    interação entre células epiteliais e matriz extracelular, e subsequente para a

    carcinogênese e invasão das células tumorais (Ancsin e Kisilevsky 1999).

    Estudos in vitro demonstraram que a SAA é capaz de agir sobre os

    receptores TLR4 de macrófagos e deflagrar uma resposta via ERK ½ / p-38 e

    MAPK (mitogen-activated protein kinase), resultando na produção de óxido

    nítrico (NO) (Sandri et al., 2008). O NO é considerado uma espécie reativa de

    oxigênio (ROS), que ao entrar em contato com o oxigênio torna-se um radical

    livre (NO•), o qual rapidamente se transforma em peroxinitrito (ONOO-). Esta

    última molécula é responsável por lesar moléculas como DNA e RNA

    (Vasconcelos et al., 2007). Desta forma, a SAA poderia estar indiretamente

    envolvida neste mecanismo carcinogênico.

    Embora a literatura ainda não tenha demonstrado a expressão proteica

    de SAA no epitélio tumoral de pacientes com câncer de mama, a expressão de

    SAA-3 foi relatada em células das linhagens tumorais mamárias MCF-7 e T47-

    D (Larson et al., 2003). Sua alta expressão foi também detectada em células

    tumorais de cabeça e pescoço, mas não em células não tumorais. (Shinriki,

    2010). Além disso, a sua expressão também foi demonstrada em células

    epiteliais de carcinoma de ovário, e revelou correlação direta com a

    agressividade do tumor (Urieli-Shoval, 2010).

    É conhecido que, no início do desenvolvimento tumoral, macrófagos

    associados ao tumor (TAM) liberam citocinas pró-inflamatórias, tais como TNFα

    e IL-6 (Zamarrom et al., 2011), que por sua vez possuem a capacidade de

    induzir SAA (Raynes e McAdam 1991, Husby et al., 1994). Desta forma, a

    presença de SAA favoreceria a amplificação da inflamação no ambiente

    peritumoral.

    Adiponectina (APN)

    Com função antagônica à SAA, a APN é uma adipocina envolvida em

    vários processos biológicos do corpo humano e foi descrita como o primeiro

    peptídeo do tecido adiposo a apresentar concentrações diminuídas na

    obesidade (Ouchi et al., 1999). A APN é uma proteína de 244 aminoácidos, 30

  • 32

    kD de peso molecular codificada no cromossomo humano 3q27. Ela é

    secretada pelo tecido adiposo em quantidade inversamente proporcional ao

    IMC (Takahashi et al., 2000; Rajala e Scherer, 2003; Ryan et al., 2003; Yuan et

    al., 2006). Sua estrutura se origina de um domínio amino-terminal não-globular,

    um domínio colágeno-símile e um domínio carboxi-terminal globular (Scherer et

    al., 1995) e pode ser secretada nas formas de trímero (3 × 1) baixo peso

    molecular (LMW), hexâmero (3 × 2) médio peso molecular e 18 monômeros (3

    × 6) multímero, este último constituindo a forma de alto peso molecular (HMW)

    (Rajala e Scherer, 2003; Pajvani et al., 2003; Wang et al., 2008). Em humanos,

    as concentrações presentes na circulação sanguínea são relativamente altas,

    variando de 0,5 a 30 µg/mL (Whitehead et al., 2006), entretanto é reduzida em

    indivíduos com resistência à insulina e obesidade visceral (Lang e Ratke,

    2009). Uma vez sintetizada pelos adipócitos, ela exerce seus efeitos biológicos,

    principalmente por meio de seus receptores, AdipoR1 e AdipoR2 (Yamauchi et

    al., 2003).

    Baixas concentrações de APN também têm sido relacionadas com um

    aumento no risco de cânceres associados à obesidade (Mauro et al., 2015).

    Em relação ao câncer de mama, alguns estudos mostram a associação da

    hipoadiponectinemia com risco aumentado para o seu desenvolvimento e pior

    prognóstico (Myoshi et al., 2003; Jardé et al., 2011; Duggan et al., 2011; Dubois

    et al., 2013).

    Grande parte da ação da APN no câncer ocorre via AMPK (AMP-

    activated protein kinase), que por sua vez, interfere na sinalização do

    crescimento celular, por meio da via mTOR (mammalian target of rapamycin), e

    inibe a promoção da carcinogênese (Shackelford et al., 2009; Taliaferro et al.,

    2009).

    O tratamento de linhagens celulares de carcinoma mamário com APN

    recombinante humana demonstrou sua ação sobre a via PI3K/AKT, por

    diminuir a fosforilação desta, com consequente redução do crescimento e

    proliferação celulares (Fresno et al., 2004). E também, outros estudos in vitro,

    com linhagens celulares de câncer de mama e endométrio mostraram que a

    APN inibiu a sinalização da via ERK1/2, afetando sua função mitogênica e

  • 33

    exercendo efeitos anti-proliferativos e apoptóticos (Dieudonne et al., 2006;

    Cong et al., 2007).

    Ensaios realizados com as linhagens celulares de câncer mamário

    humano, MDA-MB-231 e T47D, estimuladas com APN, demonstraram que

    estas foram induzidas à apoptose e apresentaram significativa diminuição da

    síntese de DNA e da proliferação celular (Kang et al., 2005; Wang et al., 2006).

    Além disso, a APN inibiu o crescimento de outras duas linhagens celulares

    Hs578T e SK-BR-3, mas não o crescimento das linhagens, MCF-7 e HCC-38

    (Kang et al., 2005). Entretanto, outros pesquisadores demonstraram que o

    crescimento das linhagens, MCF-7 foi negativamente regulado pela APN

    (Dieudonne et al.,2006; Arditi et al., 2007). Em concordância com resultados

    experimentais, baixas concentrações de APN sérica têm sido associadas com

    um pior prognóstico em mulheres com câncer de mama na pós-menopausa

    (Miyoshi et al., 2003; Mantzoros et al., 2004; Tworoger et al., 2007) e na pré-

    menopausa (Korner et al., 2007), ao passo que, altas concentrações séricas

    foram correlacionadas com aumento de sobrevida global (Duggan et al., 2011).

    Todavia, um estudo caso-controle demonstrou que baixas concentrações

    séricas de APN não se correlacionaram com o risco aumentado para o câncer

    de mama (Gaudet et al., 2010). Por outro lado, Grossmann e colaboradores

    (2010), reportam que hipoadiponectinemia tem sido associada ao aumento do

    risco para câncer de mama e com a expressão de um fenótipo agressivo e

    metastático.

    Quanto à expressão tecidual, os estudos são ainda controversos.

    Karaduman e seu grupo (2007) demonstraram que a expressão tecidual de

    APN em pacientes com câncer de mama foi significativamente maior do que

    em controles e sugeriram que a alta expressão de APN detectada no câncer de

    mama estava associada ao aumento do risco para a neoplasia. A APN e seus

    receptores foram associados à invasividade do câncer de mama (Jeong et al.,

    2011) e a expressão de APN foi mais elevada no carcinoma ductal invasivo

    (CDI) do que no in situ, forma menos grave da doença (Jardé et al., 2008).

    Todavia, estes últimos autores demonstraram expressão maior de APN no

    epitélio adjacente ao tumor do que no epitélio tumoral. Além disso, um estudo

    recente mostrou a ausência de associação entre a expressão tecidual de APN

  • 34

    e tumores mamários triplo negativos (TNBC), considerados de pior prognóstico

    (Cubukc et al., 2014). Sonmez e colaboradores (2011), por sua vez, sugerem

    que os mecanismos regulatórios da APN parecem ser diferentes na circulação

    e no tecido de pacientes com câncer de mama, pois as concentrações séricas

    de APN foram inversamente correlacionadas com a sua expressão tecidual

    tumoral.

    Tanto a hipoadiponectinemia, como altas concentrações de SAA, além

    de se correlacionarem com obesidade e câncer de mama, se associam com a

    síndrome metabólica (SM) (Bremer et al., 2011).

    A obesidade leva a várias disfunções, incluindo alterações no

    metabolismo lipídico, da glicose e da função arterial, e estas alterações

    encontram-se associadas com o estado inflamatório subclínico (Alberti et al.,

    2009). A síndrome metabólica pode ser caracterizada por cinco critérios:

    obesidade central, redução de HDL- colesterol, elevação de triglicérides,

    hipertensão arterial e hiperglicemia, sendo que a presença de três destes

    fatores é suficiente para o diagnóstico de SM (NCEP-ATP III, 2005). O depósito

    do tecido adiposo que se relaciona fortemente com a SM é o tecido adiposo

    visceral, que por ser o mais metabolicamente ativo é responsável pela

    inflamação subclínica sistêmica, devido à secreção de citocinas pró-

    inflamatórias. (Gilbert et al., 2013).

    Nos últimos anos a síndrome metabólica (SM) tem sido associada ao

    risco, tanto para o desenvolvimento, como para o pior prognóstico do câncer de

    mama (Rosato et al., 2011; Bao et al., 2013). Um estudo de coorte, com

    aproximadamente 20.000 mulheres, demonstrou associação entre SM e o risco

    para o câncer de mama em mulheres na pós-menopausa, mas não em

    mulheres na pré-menopausa (Agnoli et al., 2015). Alguns estudos demonstram

    a sua associação com fenótipos mais agressivos em pacientes na pós-

    menopausa. Healy e colaboradores (2010) relataram que 51% das pacientes

    que possuiam tumores mamários entre os estágios II e IV apresentavam SM.

    Além disso, Maiti e seu grupo (2010) observaram que a SM foi mais prevalente

    em pacientes com tumores triplo negativos do que aquelas que não

    apresentavam esta característica clínico-patológica, sugerindo possíveis

    interações entre as alterações metabólicas e a gravidade dos tumores. Em

  • 35

    relação à sobrevida livre de progressão, em um estudo com 110 pacientes com

    câncer mamário, acompanhadas por cinco anos, os autores demonstraram que

    95% daquelas que apresentaram SM ao diagnóstico desenvolveram metástase

    (Pasanisi et al., 2006).

    Além disso, alguns estudos sugerem o desenvolvimento da SM na

    vigência do tratamento quimioterápico (Levine et al.,1991; Campbell et al, 2007;

    Arpino et al., 2015; Vagenas et al., 2016). Nestes estudos, pacientes que

    faziam uso de quimioterapia adjuvante apresentaram um aumento significativo

    na adiposidade corporal, seja no aumento da massa de gordura ou na

    alteração da localização desta adiposidade e também apresentaram alteração

    do perfil lipídico, com consequente desenvolvimento da SM. Todavia, ainda não

    estão bem estabelecidos quais fatores poderiam levar ao desenvolvimento do

    ganho de peso e subsequentes alterações metabólicas durante o tratamento do

    câncer mamário.

    Vários estudos demonstram o aumento de biomarcadores inflamatórios

    na circulação sanguínea, na vigência da SM, sugerindo um estado pró-

    inflamatório associado a ela (Eckel et al., 2005, Cornier et al., 2008). Bremer e

    colaboradores (2011) compararam as concentrações de vários biomarcadores

    inflamatórios circulantes e observaram concentrações de SAA mais elevadas e

    de APN mais reduzidas em portadores de SM do que em indivíduos saudáveis.

    Deste modo, a detecção da SM ao diagnóstico do carcinoma mamário através

    de biomarcadores como a SAA e a APN, poderia auxiliar no manejo de tais

    pacientes, tanto em relação ao tipo de terapia adjuvante, como no controle da

    adiposidade e na mudança de estilo de vida.

    Existem muitas pesquisas que buscam respostas para a influência da

    obesidade e de suas alterações metabólicas sobre o câncer de mama,

    incluindo sua relação com as adipocinas inflamatórias. Entretanto, devido à alta

    complexidade das funções e interações dessas adipocinas na obesidade, os

    mecanismos precisos ainda não foram elucidados. Além disso, como os

    tumores mamários estão expostos tanto às adipocinas circulantes quanto às

    produzidas localmente nos adipócitos adjacentes, a íntima asociação entre as

    celúlas tumorais mamárias e os adipócitos poderia favorecer uma ação mais

    direta das adipocinas sobre o microambiente tumoral. Neste cenário, a

  • 36

    exploração das relações das adipocinas SAA e APN com o câncer de mama,

    obesidade e SM, constitui-se assunto ainda inesgotado. Desta forma, a

    proposta do presente trabalho considera a possibilidade de que pacientes com

    concentrações mais elevadas de SAA e mais reduzidas de APN apresentarão

    características clínico-patológicas de maior gravidade e esta condição será

    dependente de obesidade e SM. Já, nos espécimes cirúrgicos mamários

    destas pacientes, espera-se encontrar expressão diferencial das adipocinas

    pesquisadas, fato este ainda não demonstrado na literatura.

    2. OBJETIVOS

    2.1. Objetivo Geral

    Investigar, em pacientes com câncer de mama, as relações das

    adipocinas SAA e APN com a obesidade e com as características clínico-

    patológicas da doença.

    2.2. Objetivos Específicos

    1- Comparar as concentrações séricas de SAA e APN entre os grupos de

    pacientes não obesas (NO) e com sobrepeso/obesidade SP/O.

    2- Investigar a presença de síndrome metabólica (SM) entre as pacientes em

    estudo.

    3- Comparar as características clínico-patológicas do câncer de mama:

    estadiamento clínico-patológico (ECP), status dos receptores de estrógeno

    (RE), de progesterona (RP) e do fator de crescimento epidérmico tipo 2

    humano (HER2), entre os grupos de pacientes.

    4- Investigar as correlações entre as concentrações séricas de SAA e APN no

    grupo total e nos subgrupos de pacientes.

  • 37

    5- Investigar a associação das concentrações séricas de SAA e de APN com

    as características clínico-patológicas do câncer de mama no grupo total e nos

    subgrupos de pacientes.

    6- Comparar a frequência de expressão entre as proteínas SAA e APN em

    cada regiaõ tecidual do espécime cirúgico mamário das pacientes: epitélio

    tumoral (T), epitélio não tumoral (NT), gordura peritumoral (GP) e gordura

    distante do tumor (GD), no grupo total e nos subgrupos de pacientes.

    7- Comparar as frequências de expressão de cada proteína entre as diferentes

    regiões teciduais, no grupo total e nos subgrupos de pacientes.

    8- Investigar a associação das frequências de expressão de SAA e de APN

    com as características clínico-patológicas do câncer de mama no grupo total e

    nos subgrupos de pacientes.

    9- Investigar as correlações entre as concentrações séricas e as frequências de

    expressão tecidual no grupo total e nos subgrupos de pacientes.

    3.0 SUJEITOS E MÉTODOS

    3.1. Tipo de Estudo

    Trata-se de estudo transversal com portadoras de câncer de mama. As

    pacientes foram atendidas nos ambulatórios de Patologia Mamária e Oncologia

    Clínica do Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti - Centro de

    Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM) pertencente à Universidade

    Estadual de Campinas (UNICAMP).

    3.2. Tamanho Amostral

    Para definição do tamanho amostral foi levada em consideração a

    frequência de portadoras de câncer de mama não obesas, atendidas nos

    ambulatórios de Patologia Mamária e Oncologia Clínica do CAISM-UNICAMP,

    que corresponde a 37% do total de atendimentos (cerca de 350 casos/ano)

  • 38

    para essa doença (Zorlini et al., 2008). Desta forma, o tamanho da amostra

    total (n= 258) foi determinado a partir de estimativa aproximada entre a

    frequência de portadoras de câncer de mama não obesas (n= 129) pareada

    com o número de portadoras com sobrepeso/obesidade.

    Todavia, na prática, a soma de critérios (IMC e CA) para a composição do

    grupo de não obesas (NO) impediu o alcance do tamanho amostral teórico. Isto

    se justificou pelo fato da frequência de não obesas de 37% (Zorlini et al., 2008)

    só ter levado em conta o IMC. Na realidade, a frequência de não obesas

    verdadeiras (duplo critério) é bem mais baixa, devido à alta frequência de

    adiposidade central entre as pacientes. Além disso, os critérios de seleção no

    presente estudo limitaram ainda mais o alcance do tamanho amostral teórico.

    Desta forma, a amostra final foi composta por 196 pacientes: 42 no grupo NO e

    154 no grupo SP/O.

    3.3. Seleção dos sujeitos

    Entre 2009 a 2014 foram selecionadas, consecutivamente, pacientes

    com diagnóstico de câncer de mama ductal invasivo que foram internadas na

    unidade de Oncologia Cirúrgica do CAISM-UNICAMP para o tratamento

    cirúrgico.

    A agenda das pacientes que seriam submetidas à cirurgia mamária era

    obtida na Divisão de Oncologia, com antecedência de 15 dias. No dia da

    internação, com o objetivo de constatar a possibilidade de participação da

    paciente na pesquisa, os dados eram verificados nos prontuários médicos e

    segundo os critérios de inclusão e exclusão (Check List – Apêndice I) a

    paciente era convidada ou não a participar do estudo.

    Após leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e

    Esclarecido – (TCLE – Apêndice II) a paciente era entrevistada quanto aos

    seus dados demográficos, hábitos alimentares e de atividade física

    (Questionário – Apêndice III), e também eram obtidos os seus dados

    antropométricos: peso, altura, circunferência abdominal (prega umbilical). O

    índice de massa corpórea (IMC), foi calculado utilizando-se a fórmula peso (kg)

  • 39

    / estatura (m)2, que foi categorizado segundo a classificação da OMS (2009),

    IMC normal de 18,5-24,99 kg/m2, sobrepeso de 25,0-29,9kg/m2 e obesidade ≥

    30 kg/m2. A aferição da circunferência abdominal (CA) foi realizada na altura da

    prega umbilical e o ponto de corte para CA normal (≤ 88 cm) foi estabelecido

    de acordo com Jansen et al., 2004.

    3.3.1 Critérios de seleção

    A- Inclusão

    Para o grupo de pacientes com sobrepeso/obesidade: presença de

    câncer de mama, IMC ≥ 25 kg/m2 (sobrepeso) ou ≥ 30 kg/m2 (obesidade) e /ou

    presença de gordura abdominal (CA > 88 cm) e aceite em participar do estudo

    proposto.

    Para o grupo de pacientes não-obesas: presença de câncer de mama,

    ausência de gordura abdominal, IMC ≤ 24.9 kg/m2 (CA ≤ 88 cm), ausência de

    perda de peso acentuado e aceite em participar do estudo proposto.

    B- Exclusão

    Não foram incluídas no estudo pacientes com IMC abaixo do normal,

    tratamento quimioterápico e/ou radioterápico prévio, presença de outro tipo de

    câncer associado, sinais clínicos e/ou relato de infecções ou inflamações

    agudas ou crônicas, relato de doença auto-imune, relato de doenças

    pulmonares crônicas, recusa em participar do estudo proposto e reposição

    hormonal.

    3.3.2 Constituição inicial dos grupos

    O grupo de pacientes com sobrepeso/obesidade (SP/O) foi composto

    por pacientes com IMC ≥ 25 kg/m2 e CA > 88 cm e alguns casos de pacientes

    com somente uma das duas medidas elevadas. Já o grupo de pacientes não

  • 40

    obesas (NO) foi composto exclusivamente por pacientes com IMC ≤ 24,9 kg/m2

    e CA ≤ 88 cm (esquema 4).

    Esquema 4: Constituição inicial dos grupos de estudo: NO (não obesas) e SP/O (sobrepeso-

    obesidade).

    3.4 Coleta de sangue

    No dia da cirurgia, as pacientes em jejum prévio de 12 horas, foram

    submetidas à coleta de duas amostras de 8 mL de sangue (em tubos

    Vacuette® com gel separador e ativador de coágulo). Após 30 minutos à

    temperatura ambiente, para retração do coágulo, o sangue foi centrifugado por

    10 minutos, a 2.500 r.p.m. (centrífuga Beckman-GPR, Indianápolis, IN, EUA) a

    25°C. O soro foi distribuído em alíquotas de 500 µL em microtubos tipo

    eppendorf. Uma das alíquotas era encaminhada imediatamente para análise

    bioquímica e as demais armazenadas a -80ºC até o momento das demais

    análises.

    3.5 Quantificação das concentrações séricas de colesterol total e frações,

    triglicerídeos e glicose.

    As concentrações séricas de colesterol total (Col-T) e frações (LDL-Col,

    HDL-Col), triglicerídeos (TG) e glicose, foram determinadas por métodos

    enzimático-colorimétricos no mesmo dia em que as amostras foram coletadas,

    imediatamente após sua centrifugação, em sistema de automação (Boehringer

    Mannhein Hitachi 917-Roche-Basileia, Suíça) utilizando reagentes comerciais

    da Roche (Mannhein, Alemanha) e expressos em mg/dL. Estas análises são

    rotineiramente realizadas na Seção de Bioquímica da DPC do HC/UNICAMP.

    Para o perfil lipídico foram adotados os valores de referência que seguem as

    recomendações da V Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da

  • 41

    Aterosclerose (2013) e para a glicose, as Diretrizes da Sociedade Brasileira de

    Diabetes (2009). Valores de referência adotados: Col-T< 200 mg/dL, LDL-Col<

    160 mg/dL, HDL-Col ≥ 50 mg/dL (para mulheres), TG< 150 mg/dL, Gli< 100

    mg/dL.

    3.6 Caracterização da síndrome metabólica (SM) entre as pacientes em

    estudo.

    Os resultados das análises bioquímicas foram utilizados para estimar a

    frequência de pacientes com Síndrome Metabólica (SM), que, no presente

    trabalho, foi definida a partir da presença de três ou quatro dos seguintes

    critérios:

    Quadro 1: Critérios para identificação de Síndrome Metabólica nas pacientes

    Critérios Definição

    Circunferência abdominal 88 cm

    Glicemia de jejum# ≥ 100 mg/dL

    Triglicérides ≥ 150 mg/dL

    HDL-colesterol < 50 mg/dL

    Adaptado de: National Cholesterol Education Program Adult Treatment

    Panel III e #International Diabetes Federation. Worldwide definition of the

    metabolic syndrome . Circulation. 2005; 112: 2735–52.

    O parâmetro hipertensão arterial não foi considerado no presente

    trabalho, pela impossibilidade de diagnóstico clínico fidedigno, visto que as

    pacientes incluidas no estudo tiveram apenas um contato com o pesquisador, na

    véspera do procedimento cirúrgico. Além disso, a maioria das pacientes era

    encaminhada de outros serviços e a totalidade não apresentava registro de

    diagnóstico de hipertensão arterial em seus prontuários.

    3.7 Quantificações das concentrações séricas de SAA

    As concentrações de SAA foram determinadas nas amostras de soro,

    por meio do kit comercial SAA Látex N (SIEMENS, Marburg, Alemanha), de

    alta sensibilidade (0,82 mg/L). As reações de micro-aglutinação em látex foram

  • 42

    realizadas de acordo com as recomendações do fabricante e detectadas por

    nefelometria (BN Prospec, SIEMENS, Munique, Alemanha).

    O método é inteiramente automatizado; partículas de poliestireno

    revestidas com um anticorpo monoclonal específico para SAA humana, ao

    serem misturadas com as amostras de soro, agregam-se com estas proteínas

    formando micro-aglutinados. Esses agregados dispersam luz quando

    irradiados. A intensidade desta dispersão é dependente das concentrações das

    respectivas proteínas na amostra e a quantificação das concentrações séricas

    é automaticamente realizada a partir de uma curva padrão, determinada a cada

    ensaio. A curva padrão é realizada a partir de 7 diluições seriadas do padrão

    SY SAA N, calibrado pelo padrão internacional da proteína SAA sérica - lote nº

    92/680. Além disso, um controle interno (SY SAA), com concentração

    conhecida, é aferido em cada corrida. Os coeficientes de variação intra e

    interensaio foram menores do que 2% e 5%, respectivamente. Os ensaios

    foram realizados exclusivamente para esta pesquisa, na Seção de Imunologia

    da Divisão de Patologia Clínica (DPC) do HC/UNICAMP.

    3.8 Quantificações das concentrações séricas de APN

    As concentrações de adiponectina foram determinadas nas amostras de

    soro, por meio do kit comercial de Imunoensaio Multiplex da marca Millipore

    (Billerica, MA, EUA) Catálogo # HADK1MAG-61K (adiponectina) - Lote:

    103203. A sensibilidade do kit para cada analito foi de 21pg/mL.

    A tecnologia xMAP (MAP=MultipleAnalyteProfiling, x= sua variável ex:

    citocinas, endócrino, oligo), envolve um processo exclusivo que cora

    microesferas magnéticas com dois fluoróforos. Utilizando proporções precisas

    de dois fluoróforos, podem ser criados 100 conjuntos diferentes de

    microesferas – cada uma delas com uma assinatura baseada em “código de

    cores” e que podem ser identificadas pelo instrumento MagPix™.

    Anticorpos de captura específicos para o analito (adiponectina) estão

    imobilizados nas microesferas através de ligações covalentes não reversíveis.

    Após a incubação dos padrões e das amostras de soro diluídas com as

    microesferas, o analito se liga aos anticorpos de captura localizados na

    superfície das respectivas microesferas. Após ser feito o procedimento de

  • 43

    lavagem automatizada, para a retirada do excedente que não se ligou aos

    anticorpos específicos, é feita a incubação com anticorpos de detecção

    biotinilados. Outra lavagem é realizada, para eliminação do que não se ligou e

    é feita uma incubação com o conjugado estreptavidina-ficoeritrina, que se liga

    ao anticorpo biotinilado e emite sinal fluorescente. O resultado final é um

    ensaio “sanduíche” realizado com microesferas, que é lido pelo equipamento

    MagPix (Softwarex Ponent/Analyst versão 4.2.), onde as micoresferas são

    capturadas por uma placa magnética e a classificação é feita por 2 lasers, o

    primeiro detecta (classifica) a microesfera (o código de cor para o ensaio) e o

    segundo quantifica o sinal de fluorescência em cada microesfera.

    O ensaio foi considerado válido quando os controles de qualidade

    estavam dentro da faixa esperada (Controle baixo: 21,9-45,6 pg/mL; Controle

    alto: 126,8-263,5 pg/mL). Os coeficientes de variação intra e interensaio foram

    menores do que 1%.

    3.9 Coletas das informações clínico-patológicas

    As informações clínico-patológicas das pacientes foram coletadas dos

    prontuários médicos, com o auxílio da Profa Dra Maria Salete da Costa Gurgel,

    do Departamento de Tocoginecologia – CAISM-FCM-UNICAMP,

    aproximadamente 60 dias após a cirurgia mamária. Estas incluíram o

    estadiamento clínico-patológico (ECP) da doença, bem como os resultados do

    exame anátomo-patológico e o status dos receptores RE, RP e HER2. O ECP

    foi determinado de acordo com o sistema TNM: T- extensão do tumor primário,

    N- ausência ou presença e a extensão de metástases em linfonodos regionais,

    M- ausência ou presença de metástase à distância (INCA, 2004).

    As características anatomopatológicas dos tumores foram determinadas

    a partir de amostras do tecido tumoral provenientes de peças cirúrgicas obtidas

    por mastectomia ou quadrantectomia. Após análise macroscópica, os

    fragmentos tumorais foram fixados em formalina, incluídos em parafina e

    seccionados. Os cortes histológicos foram corados por hematoxilina e eosina,

    para determinação do tipo histológico do tumor, bem como de seus graus de

    diferenciação histológica e nuclear. Estes últimos são classificados de acordo

  • 44

    com os critérios de Scarff-Bloom-Richardson, modificado (Bloom et al., 1957;

    Scarff et al., 1968; Frierson et al., 1995). Este exame é rotineiramente

    realizado pelo Laboratório de Anatomia Patológica do Hospital das Clínicas

    (HC) / UNICAMP. Os receptores hormonais RE, RP e a expressão do

    oncogene HER2 foram avaliados pelo método imunohistoquímico. Estas

    análises são realizadas rotineiramente no Laboratório de Patologia

    Experimental do CAISM/UNICAMP utilizando-se a técnica da Estreptavidina-

    Biotina-Peroxidase, de acordo com HSU, HAINE & FANGER, 1981.

    3.10 Avaliação da expressão proteica tecidual de SAA e APN nas quatro

    regiões estudadas dos espécimes cirúrgicos das pacientes com câncer

    de mama.

    A- Construção do microarranjo de tecidos - Tissue Microarray (TMA)

    Primeiramente foi feito um levantamento do material de estudo

    proveniente de peças cirúrgicas obtidas por mastectomia ou quadrantectomia,

    fixadas em formalina e incluídas em blocos de parafina arquivados no

    Departamento de Anatomia Patológica/FCM/UNICAMP (figura 1). Foram

    selecionadas as lâminas histológicas originais de cada paciente, coradas

    rotineiramente com hematoxilina e eosina (H&E) e os respectivos blocos de

    parafina contendo as áreas de interesse: gordura distante do tumor (GD),

    gordura peritumoral (GP), epitélio tumoral (T) e epitélio não tumoral (NT) da

    margem da peça cirúrgica, evitando áreas de hemorragia e necrose. Após a

    marcação das áreas selecionadas em duplicatas (Teleki et al., 2013) nas

    lâminas histológicas pelo médico patologista, as mesmas áreas

    correspondentes foram marcadas nos blocos (figura 1). O conjunto de lâminas

    de HE e os respectivos blocos foram enviados para o Departamento de

    Patologia Investigativa do AC Camargo Cancer Center onde foram realizadas

    perfurações em duplicatas nos blocos de parafina com agulhas do aparelho de

    TMA (Beecher Instruments Microarray Technology, Silver Spring, CA, USA), na

    espessura de 1,0 mm. Os cilindros de tecidos foram retirados e ordenados

    sobre o bloco receptor, com distância de 0,2 mm entre si. A confecção do TMA

    foi realizada com o Manual Tissue Arrayer 1 (Beecher Instruments Microarray

    Technology, Silver Spring, CA, USA). Foram realizados cortes histológicos em

  • 45

    lâminas silanizadas, submetidas à fixação por UV (Instrumedics Inc®,

    Hackensack, NJ, EUA) e recobertas com adesivo, para impedir que o tecido se

    movesse durante a técnica. Posteriormente, as lâminas sofreram um banho de

    parafina e foram armazenadas em freezer a -20 °C, até o momento do uso para

    reação imunoistoquímica. A figura 2 esquematiza todas as etapas do processo.

    Figura 1. Blocos e lâminas pareadas e demarcadas com as áreas de interesse para confecção do TMA.

    Figura 2: Etapas geral do processo de construção dos blocos e obtenção dos cortes de

    tissue microarray (TMA).

  • 46

    B- Análise imunoistoquímica para investigação da expressão das

    proteínas SAA e APN

    A técnica de imunoistoquímica foi realizada no Laboratório de Patologia

    Especializada (LAPE) do Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti-

    CAISM. Após obtenção das lâminas de TMA, estas foram hidratadas em álcool

    etílico nas concentrações decrescentes (100, 80, 50%) e lavadas com água

    destilada corrente. A atividade da peroxidase endógena foi bloqueada com três

    banhos em água oxigenada a 10 volumes, cada um com duração de 3 minutos,

    seguida de lavagem em água corrente e destilada. Para recuperação

    antigênica foi utilizada a panela a vapor Pascal Dako, com o objetivo de expor

    os antígenos. As lâminas foram imersas em tampão citrato de sódio 10 mM, pH

    6,0, a 95ºC, durante 30 minutos. Em seguida, foram resfriadas em temperatura

    ambiente durante 20 minutos e lavadas em água corrente e destilada. Após

    esta etapa, os cortes histológicos foram incubados em câmara úmida com

    anticorpo primário específico, nas diluições específicas padronizadas, a 4ºC,

    overnight. Os anticorpos utilizados estão mencionados no quadro 2. Após a

    incubação, as lâminas foram lavadas três vezes com PBS, sob agitação

    (solução salina tamponada com fosfato, pH 7,4 a 7,6) e secas. Posteriormente

    foram incubadas com ADVANCE™ HRP Detection System (Dako, Carpinteria,

    California, Estados Unidos), a 37ºC, durante 1 hora e, a seguir, submetidas a

    três lavagens com PBS, sob agitação. Após a incubação, a revelação foi feita

    com substrato cromogênico DAB (3´- diaminobenzidine) (código D5637,

    SIGMA, Saint Louis, Missouri, Estados Unidos) na proporção: 0,06g

    DAB:100ml PBS: 500μl água oxigenada a 3%:1 ml dimetilsulfóxido (DMSO), a

    37ºC, durante 5 minutos. Finalmente, as lâminas foram lavadas em água

    corrente e contra-coradas com hematoxilina de Harris, durante 30 a 60

    segundos. Os cortes foram desidratados em banhos de álcool etílico em

    concentrações crescentes e diafanizadas em três banhos de xilol para, a

    seguir, serem montadas com lamínula e resina. Controles internos e externos,

    positivos e negativos, foram utilizados para validar as reações

    imunoistoquímicas.

  • 47

    Quadro 2: Especificações dos anticorpos utilizados nas análises imunoistoquímicas

    Anticorpos

    Código

    Diluição

    Fabricante

    Controle

    Padrão de expressão

    Soro Amilóide A

    (SAA)

    115 /ab687

    1:500

    Abcam,Inc

    fígado

    citoplasmático

    Adiponectina

    (APN)

    ab22554

    1:100

    Abcam,Inc

    pele

    citoplasmático

    C- Interpretação das reações imunoistoquímicas

    Os critérios para a leitura das lâminas foram estabelecidos com base

    nos trabalhos de Korner et al., 2007 e Pfeiler et al., 2010. As leituras foram

    realizadas pela patologista Dra. Luciana Regina Moreira, do Laboratório de

    Citopatologia do CAISM e acompanhadas pela pesquisadora. A patologista não

    teve acesso às informações clínico-patológicas das pacientes (estudo cego).

    O microscópio utilizado foi da marca Nikon-Eclipse E 200, com aumento de

    400x. A interpretação do estudo imunoistoquímico foi realizada a partir de dois

    parâmetros: intensidade da reação e porcentagem de células reativas, como se

    observa na tabela 1. Como as lâminas de TMA foram confeccionadas em

    duplicata, entre os dois resultados obtidos, utilizou-se o maior valor de

    somatória dos escores (% + intensidade), com base nos trabalhos de

    Makretsov et al., 2003 e Fadare et al., 2014.

    Tabela 1 - Escores finais obtidos pela análise simultânea dos parâmetros: intensidade de

    reação e porcentagem de células reativas

    Intensidade da reação

    % de células reativas 0 (negativo) 1 (leve) 2 (moderado) 3 (intenso)

    0 0

    1 (60) 4 5 6

    Para a análise estatística da expressão proteica tecidual, os escores

    foram transformados em variáveis dicotômicas. Positivo: presença de

  • 48

    expressão variando do escore 4 a 6. Negativo: ausência de expressão ou

    expressão muito fraca, variando do escore 0 a 3 (tabela 2), com base no

    trabalho de Bachmann et al, 2006.

    Tabela 2 - Classificação das variáveis dicotômicas

    Variável Significado da variável Escore

    1 Positivo 4 a 6

    2 Negativo a muito fraco 0 a 3

    3.11. Análise dos dados

    Devido à ausência de distribuição normal, as variáveis numéricas foram

    transformadas em postos (ranks) e suas comparações entre os grupos foram

    realizadas pelos testes não paramétricos de Mann-Whitney (2 grupos) ou

    Kruskal-Wallis (3 grupos), acompanhado do teste post hoc de Dunn. A

    comparação das variáveis categóricas entre os grupos foi realizada pelo teste

    Qui-quadrado (X2) ou exato de Fisher e as análises de correlação entre as

    variáveis numéricas foram feitas pelo teste de Spearman. Para comparar os

    valores de SAA e APN entre as variáveis categóricas, foi utilizada a análise de

    covariância (ANCOVA), com ajuste para IMC, CA, idade ou estado

    menopausal.

    As análises foram realizadas pelo programa GraphPad Prisma 5 e SPSS

    (Statistical Package for the Social Sciences) versão 13.0 para Windows. O nível

    de significância adotado foi de 5% (p< 0,05).

  • 49

    4. RESULTADOS

    4.1. Dados demográficos, antropométricos, bioquímicos e clinico-

    patológicos entre os grupos NO e SP/O.

    A tabela 3 demonstra os dados demográficos, antropométricos,

    bioquímicos e clínico-patológicos das pacientes com câncer de mama. Quanto

    aos parâmetros antropométricos, observamos IMC (p

  • 50

    Tabela 3 - Dados demográficos, antropométricos, bioquímicos e clinico-patológicos entre

    os grupos NO e SP/O. NO

    n= 42

    SP/O

    n= 154 p

    Idade (anos) a 50 (44–58) 54 (48–63) ns

    IMC (kg/m2)

    a 22,0 (21.4–23.6) 29.0 (26,3–3,.1) 88 cm; Grupo NO: IMC ≥18.5 e ≤ 24.99 kg/m2 e CA ≤ 88cm. Valores de referência: Col-T: ˂ 200 mg/dL; LDL-C: ≤ 160 mg/dL; HDL-C: ≥ 50 mg/dL; TG: ≤ 150 mg/dL; Gli: ˂ 100 mg/dL. ECP: estadiamento clínico-patológico, com base no sistema TNM (T-extensão do tumor primário; N-ausência ou presença de metástase em linfonodos regionais; M-ausência ou presença de metástase à distância); RE: receptor de estrógeno; RP: receptor de progesterona; HER2: Receptor do fator de crescimento epidérmico humano tipo 2; Triplo negativo: tumor mamário sem expressão de RE,RP

    e HER2. Estado pós-menopausa: 12 meses consecutivos de ausência de menstruação. ªDados expressos como mediana e IQR (variação interquartil), comparações realizadas pelo teste de Mann-Whitney. bDados expressos como frequências absoluta (n) e relativa (%), analisados pelo teste Qui-quadrado ou exato de Fisher. *O nível de significância adotado foi de 5% (p < 0.05).

  • 51

    4.2. Dados demográficos, antropométricos, bioquímicos e clinico-

    patológicos entre os grupos NO, SP/O e SP/O-SM.

    A alta freqüência de parâmetros bioquímicos alterados no grupo SP/O

    nos levou a identificar pacientes com a presença de Síndrome Metabólica (SM).

    Verificamos que 51 (33,1%) pacientes do grupo SP/O apresentaram o número de

    critérios suficientes para serem caracterizadas como portadoras de SM, e, diante

    desta constatação, o grupo SP/O-SM (n=51) foi formado (esquema 5) e todas as

    análises subsequentes foram realizadas para os três grupos de pacientes:

    Esquema 5: Reagrupamento das pacientes em estudo: grupos NO, SP/O e SP/O-SM

  • 52

    Ao analisarmos as características demográficas e antropométricas entre

    os 3 grupos (tabela 4), observamos que o grupo SP/O-SM apresentou idade mais

    elevada tanto em relação ao grupo NO (p=0,0076), quanto ao grupo SP/O

    (p=0,010). Estas diferenças se refletiram sobre as comparações relativas ao

    estado menopausal, com frequência mais elevada de pacientes na pós-

    menopausa no grupo SP/O-SM tanto em relação ao grupo NO (p=0,0386), quanto

    ao grupo SP/O (p=0,0070). Ao analisarmos o estadiamento clínico-patológico

    (ECP) não verificamos diferença entre os 3 grupos pelo teste de Kruskal-Wallis

    (p=0,0802).