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TESE DE MESTRADO "Análise do Potencial de Calibração da Força Óptica através de Dispositivos de Microscopia de Força Atômica" GUSTAVO PIRES MARQUES CAMPINAS 2005

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TESE DE MESTRADO

"Análise do Potencial de Calibração da Força Óptica através de Dispositivos de Microscopia de Força Atômica"

GUSTAVO PIRES MARQUES

CAMPINAS 2005

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

INSTITUTO DE FÍSICA "GLEB WATAGHIN"

Departamento de Eletrônica Quântica

GUSTAVO PIRES MARQUES

"Análise do Potencial de Calibração da Força Óptica através de Dispositivos de Microscopia de Força Atômica"

Tese de mestrado apresentada ao Instituto de Física “Gleb Wataghin” da Unicamp para obtenção do título de Mestre em Física.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Lenz Cesar

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA POR GUSTAVO PIRES MARQUES E ORIENTADA PELO PROF. DR. CARLOS LENZ CESAR.

_______________________________________

CAMPINAS 2005

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA POR VALKÍRIA SUCCI VICENTE – CRB8/5398 - BIBLIOTECA DO IFGW

UNICAMP Marques, Gustavo Pires, 1978- M348a Análise do potencial de calibração da força óptica através de dispositivos de microscopia de força atômica / Gustavo Pires Marques. -- Campinas, SP : [s.n.], 2005. Orientador: Carlos Lenz Cesar. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Física “Gleb Wataghin”.

1. Calibração. 2. Sensores. 3. Lasers. 4. Fotodetectores. 5. Microscopia de força atômica. 6. Pinças óticas. 7 . Força ótica. 8. Cantilever de silício. 9. Cantilever piezoresistivo. 10. Piezoresistividade. 11. Condicionamento de sinais. 12. Baixa relação sinal ruído. I. Cesar, Carlos Lenz,1955- II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Física “Gleb Wataghin”. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em inglês: Analysis of the calibration potential of optical force through atomic force microscopy devices Palavras-chave em inglês: Calibration Sensors Lasers Photon detectors Atomic force microscopy Optical tweezer Optical force Silicon cantilever Piezoresistive cantilever Piezoresistivity Signal conditioning Low signal to noise ratio Titulação: Mestre em Física Banca Examinadora: Carlos Lenz Cesar [Orientador] Luiz Carlos Barbosa Oswaldo Luiz Alves Data da Defesa: 19-12-2005 Programa de Pós-Graduação em: Física

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Resumo

O microscópio de força atômica é uma ferramenta que possibilita a medida de forças

precisamente localizadas com resoluções no tempo, espaço e força jamais vistas. No coração

deste instrumento está um sensor a base de uma viga (cantilever) que é responsável pelas

características fundamentais do AFM. O objetivo desta pesquisa foi usar a deflexão deste

cantilever para obter uma calibração rápida e precisa da força da armadilha da pinça óptica, assim

como testar e comparar com os método tradicionalmete utilizados para este propósito. Para isso,

foi necessário analisar e entender o condicionamento de sinais utilizados no AFM. Foram

estudados cantilevers tradicionais, cujo sistema de detecção é basedo na deflexão de um feixe

laser em conjunto com fotodetectores, bem como cantilevers piezoresistivos. Cantilevers

piezoresistivos fornecem uma alternativa simples e conveniente aos cantilevers ópticos. A

integração de um elemento sensorial dentro do cantilever elimina a necessidade de um laser

externo e de um detector utilizados na maioria dos AFMs. Isto elimina a etapa delicada de

alinhamento da laser ao cantilever e fotodetector que normalmente precede uma medida com

AFM, uma simplificação que expande o potencial do AFM para o uso em meios adversos, como

câmaras de ultra alto vácuo ou, como no caso específico das Pinças Ópticas, onde existem esferas

em solução líquida e também restrições de dimensão.

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Abstract

The atomic force microscope (AFM) is a tool that enables the measurement of precisely

localized forces with unprecedented resolution in time, space and force. At the heart of this

instrument is a cantilever probe that sets the fundamental features of the AFM. The objective of

this research has been using the deflection of this cantilever to get a fast and accurate calibration

of optical tweezers trap force, as well as testing and comparing to the traditionally used methods

of calibration for this purpose. For that it was necessary to resolve and understand the sensors

signals conditioning used in the AFM. Traditional cantilevers, whose detection system is based

on the deflection of a laser beam in addition with a photodetector, as well as piezoresistive

cantilevers has been studied. Piezoresistive cantilevers provide a simple and convenient

alternative to optically detected cantilevers. Integration of a sensing element into the cantilever

eliminates the need for the external laser and detector used in most AFMs. This removes the

delicate step of aligning the laser to the cantilever and photodetector which usually precedes an

AFM measurement, a simplification which expands the potential of the AFM for use in difficult

environments such as ultrahigh vacuum chambers or, as in Optical Tweezers specific case, where

there are spheres into a liquid solution as well as dimensional constraints.

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Sumário

RESUMO III

ABSTRACT IV

SUMÁRIO V

CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO 1

1.1 FORÇAS NA NATUREZA 2

1.2 PINÇA ÓPTICA + AFM: MOTIVAÇÃO 2

1.3 OBJETIVO ESPECÍFICO 5

1.4 DESAFIOS 5

1.4.1 Alcance de forças: Pinça Óptica x AFM 6

1.4.2 Focalização do laser dentro da câmara 6

CAPÍTULO 2. PINÇA ÓPTICA 8

2.1 TEORIA DAS PINÇAS ÓPTICAS 9

2.1.1 Regime Rayleigh (d << ) 12

2.1.2 O Regime Lorenz-Mie (d ~ ) 13

2.1.3 Regime de Óptica Geométrica (d>> ) 15

2.2 INSTRUMENTAÇÃO 23

2.2.1 O Microscópio 23

2.2.2 O Laser 24

2.2.3 Construção e Alinhamento 25

2.2.4 O Sistema de Imagem 28

2.3 CALIBRAÇÃO 29

2.3.1 Força de Arraste 29

2.3.2 Eqüipartição da Energia 30

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CAPÍTULO 3. MICROSCÓPIO DE FORÇA ATÔMICA (AFM) 31

3.1 INSTRUMENTAÇÃO 32

3.2 MODOS DE IMAGEM DO AFM 34

3.2.1 Contato 34

3.2.2 Não-contato 34

3.2.3 Tapping 35

3.3 MEDINDO FORÇAS 35

3.4 CALIBRAÇÃO 37

3.5 PARÂMETROS FUNDAMENTAIS DOS CANTILEVERS 38

3.5.1 Sensibilidade 39

3.5.2 Largura de Banda 40

3.5.3 Ruído 41

3.5.4 Resolução 43

3.5.5 Constante de mola 43

CAPÍTULO 4. CALIBRAÇÃO DA PINÇA COM AFM 44

4.1 FOCALIZAÇÃO DO FEIXE LASER NO CANTILEVER 44

4.1.1 O Feixe Gaussiano 46

4.2 DEFLEXÃO DO CANTILEVER ─ PICOMOTOR 55

4.2.1 Calibração do picomotor 56

4.2.2 Calibração do cantilever com o picomotor 57

4.3 FOTODETECTOR “BI-CELL” 58

4.3.1 Princípio de funcionamento 58

4.3.2 Resistência Shunt, RSH 60

4.3.3 Resistência Série, RS 60

4.3.4 Capacitância de Junção, CJ 60

4.3.5 Responsividade, Rλ 61

4.3.6 Curva Característica I-V 62

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4.3.7 Ruídos 63

4.3.8 Potência Equivalente de Ruído (NEP) 64

4.3.9 Polarização 64

4.4 CONDICIONAMENTO DE SINAIS PARA O FOTODETECTOR 65

4.4.1 Amplificador deTransimpedância 66

4.4.2 Amplificador de Subtração 67

4.5 RESULTADOS OBTIDOS 70

CAPÍTULO 5. PIEZORESISTORES 73

5.1.1 Tensor Piezoresistivo 75

5.1.2 Coeficientes Piezoresistivos 76

5.2 RUÍDOS NOS PIEZORESISTORES 77

5.2.1 Ruído Johnson 78

5.2.2 Ruído 1/f 79

5.3 CONDICIONAMENTO DE SINAIS PARA CANTILEVERS PIEZORESISTIVOS 79

5.3.1 Ponte de Wheatstone 80

5.3.2 Montagem Experimental 82

5.4 RESULTADOS OBTIDOS 84

CAPÍTULO 6. CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS 86

APENDICE A. AMPLIFICADOR LOCK-IN 89

APENDICE B. FOLHAS DE ESPECIFICAÇÕES DOS COMPONENTES UTILIZADOS 93

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Capítulo 1. Introdução

Recentes avanços em instrumentação científica possibilitaram a determinação direta de

forças tão pequenas quanto forças intermoleculares que controlam interações biomoleculares.

Utilizando ferramentas como Surface Force Apparatus – SFA1, Atomic Force Microscopy- AFM

2, Optical Tweezers – OT 3 e a Biomembrane Force Probe 4 foi possível o entendimento da

natureza destas forças e do papel fundamental que elas têm na manutenção da vida. Juntas estas

técnicas fornecem uma janela de forças acessíveis de 10-6– 10-14 N, embora individualmente suas

respectivas janelas de força tenham sobreposição apenas em algumas regiões. A tabela 1.1 ilustra

as janelas de força para as técnicas de medida de força disponíveis, ou técnicas de

espectroscopias de força.

Técnica de Força Alcance de Força

Surface Force Apparatus 10.000 – 1.000.000 pN

Atomic Force Microscopy 10 – 100.000 pN

Optical Tweezers 0.01 – 200 pN

Biomembrane Force Probe 0.01 – 1.000 pN

Tabela 1.1 Valores típicos da janela de forças das técnicas de espectroscopias de força disponíveis 5

1 Israelachvili et al.,1990 "Adhesion and short-range forces between surfaces. Part I: New apparatus for surface force measurements". Journal of Materials Research (1990), 5 : pp 2223-2231 2 Binnig et al.,1986. "Atomic Force Microscope". Phys. Rev. Lett. 56, 930–933 (1986) 3 Ashkin, 1986. "Experimental Observation of Optically Trapped Atoms". Phys. Rev. Lett. 57, 314–317 (1986) 4 Evans et al., 1995. "Sensitive force technique to probe molecular adhesion and structural linkages at biological interfaces". Biophys J 68: 2580–2587. 5 Leckband, D. 2000.”Measuring The Forces That Control Protein Interactions”. Annu. Rev. Biophys. Biomol. Struct.29:1–26

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1.1 Forças na Natureza

Forças intermoleculares são fundamentais para a existência da vida. Essencialmente, elas

determinam as propriedades físicas dos sólidos, líquidos e gases e ainda são responsáveis pela

organização de estruturas biológicas6. Coesão estrutural e interações biomoleculares são ditadas

por uma complexa teia de fracas forças intermoleculares e não covalentes 7. Essas forças são

classificadas de acordo com o papel que elas apresentam no reconhecimento molecular. As forças

envolvidas no mecanismo de chave-e-fechadura das ligações entre receptor-ligante são

comumente chamadas interações específicas e incluem pontes de hidrogênio, interações

hidrofóbicas e forças de van der Waals. Já as forças envolvidas no direcionamento das trajetórias

dos ligantes para os receptores são tipicamente eletrostáticas e de van der Waals.8 É a

sobreposição destas duas categorias que intermedia o processo de reconhecimento biomolecular.

1.2 Pinça Óptica + AFM: Motivação

A técnica de aprisionamento de partículas, baseada na transferência de momentum dos

fótons, ficou conhecida como pinça óptica e surgiu em 1986 com o trabalho pioneiro de A.

Ashkin9. Embora essa técnica não tenha sido desenvolvida para aplicações biológicas logo ficou

claro que essa seria sua área principal de aplicação. Em um trabalho posterior, Ashkin et al.

utilizaram a técnica para capturar e manipular partículas biológicas com tamanhos variando de

décimos a centenas de micra demonstrando, desta forma, que este sistema funcionava como uma

6 Israelachvili, J. N. (1991). "Intermolecular and Surface Forces; With Applications to Colloidal and Biological Systems", Academic Press Inc. (London) LTD. 7 Leckband, D. & Israelachvili, J. (1993). "Molecular-basis of protein function as determined by direct force measurements". Enzyme Microb. Technol., 15, 450-459. 8 Leckband, D. & Israelachvili, J. (2001). "Intermolecular forces in biology". Quarterly Rev. Biophys., 34, 105-267. 9A. Ashkin, J.M. Dziedzic, J.E. Bjorkholm, S. Chu, "Observation of a single-beam gradient force optical trap for dieletric particles"; Optic Lett. 11:288-290 (1986).

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“pinça óptica” para realizar manipulações intra e extracelulares, sem causar morte ou outros

danos aos microorganismos estudados10. Desde então essa técnica tem tido uma grande variedade

de aplicações na biologia molecular e áreas afins. Basicamente, a pinça óptica tem sido utilizada

em duas vertentes: manipulação direta de microorganismos e medidas de propriedades

mecânicas de estruturas. Para as aplicações da pinça como instrumento de medida de

propriedades mecânicas é fundamental a calibração da força óptica. O procedimento padrão da

calibração desta força tem sido através da medida do deslocamento de uma microesfera de sua

posição de equilíbrio contra a força hidrodinâmica existente quando esta é arrastada por um

fluido com determinada velocidade (Lei de Stokes). Para se obter resultados quantitativos deve-se

conhecer com precisão o raio da esfera, a viscosidade do fluido, a velocidade de translação da

microesfera no fluido e considerar também as distâncias da microesfera às paredes devido às

interações hidrodinâmicas. Modelos teóricos para a força hidrodinâmica na presença de duas

paredes em baixos números de Reynolds são conhecidos apenas para geometrias esféricas ou

elipsóides de revolução. Por outro lado, a força óptica depende do índice de refração do fluido e

da microesfera, do raio da microesfera, da potência do laser e da distribuição de intensidade do

cone de luz incidente. Modelos teóricos para a força óptica foram desenvolvidos para

microesferas e, usualmente, na aproximação de um cone formado por ondas planas. São modelos

que ainda precisam de uma boa confirmação experimental. Alguns desses parâmetros são de

difícil acesso, como o índice de refração da microesfera. Algo tão simples quanto a medida da

potência do laser é complicada no caso da pinça óptica devido as grandes aberturas numéricas

(>1) utilizadas. Os medidores de potência são construídos para medidas com incidência normal e

o erro sistemático para cones de luz com grandes aberturas numéricas pode chegar a mais de

10A. Ashkin, J.M. Dziedzic, "Optical trapping and manipulation of viruses and bacteria"; Science, 235: 1517 - 1520 (1987).

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20%. O fato de que a força óptica depende de parâmetros que mudam de acordo com o

experimento, como o índice de refração do líquido (solução) e da microesfera, a potência e

qualidade do modo do laser etc. mostra o quanto seria importante desenvolver uma forma rápida

e precisa de calibração das forças ópticas para cada experimento e que independa de parâmetros

variáveis. Com tal calibração poderíamos utilizar qualquer microesfera ou mesmo geometrias não

esféricas, em qualquer solução, e extrair das mesmas medidas de força. Além disso, nem sempre

é possível, ou conveniente, aprisionar partículas esféricas, ou mesmo selecionar determinada

solução, como no caso de medidas intracelulares. Se a calibração for rápida e independente destes

parâmetros poderemos escolher qualquer organela intracelular como probe da pinça óptica.

Também poderemos acompanhar diferencialmente a evolução da força de microorganismos em

soluções na qual a concentração de determinadas drogas ou outras substâncias variam ao longo

do tempo, desde que o procedimento de calibração seja rápido o suficiente.

Paralelamente ao desenvolvimento da pinça óptica, a microscopia de força atômica (AFM),

introduzida por Binnig11 et al também em 1986, emergiu como uma importante técnica para

aquisição de imagens e medida de forças, possibilitando aos pesquisadores não apenas obter

imagens de micro e nano estruturas mas também examinar suas propriedades mecânicas. Em

particular, o uso do microscópio de força atômica (AFM) veio preencher a lacuna na aquisição de

imagens deixada pelo seu predecessor, o microscópio de varredura por tunelamento (STM), já

que este, devido a seu princípio de funcionamento (corrente de tunelamento), funcionava apenas

com materiais metálicos, o que impedia sua utilização em materiais biológicos. Outra

característica importante da AFM é que esta técnica mede forças em uma escala que se superpõe

11 Binnig, G., Quate, C. F., and Gerber, Ch. Phys. Rev. Lett. 56, 930(1986).

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à da pinça óptica. Tal fato permite que uma técnica seja utilizada para calibrar a outra de forma

rápida e precisa.

1.3 Objetivo específico

O objetivo desta pesquisa foi o desenvolvimento de um sistema experimental incorporando

as duas técnicas, pinça óptica e AFM, em um mesmo microscópio, principalmente para a

calibração da força óptica de uma maneira rápida e precisa. Além disso este novo método servirá

para testar e comparar os modelos atualmente utilizados nas calibrações da pinça óptica.

1.4 Desafios

A instrumentação do sistema de detecção do AFM utilizada tinha que ser desenvolvida a

partir de cantilevers de AFM usados e um fotodetector “bi-cell” de silício. A pinça óptica tinha de

ser montada num microscópio invertido para satisfazer as necessidades de espaço requeridas pelo

projeto. Assim, parte significante desta pesquisa foi a montagem da instrumentação da pinça

óptica e a construção da instrumentação necessária para a detecção da deflexão do cantilever de

AFM. A seguir detalhamos alguns dos principais desafios a serem vencidos para a realização do

objetivo inicial.

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1.4.1 Alcance de forças: Pinça Óptica x AFM

Um dos desafios para esta calibrção vinha do fato de que, tipicamente, o alcance de forças

do AFM começa onde termina o da pinça óptica. A Figura 1.1 ilustra o fato.

Figura 1.1 Alcance de forças da pinça óptica e do AFM. Em condições típicas uma começa onde termina a outra.

Para resolver este problema havia duas possibilidades: Estender o alcance de forças da

pinça óptica ou aumentar a resolução obtida com o AFM. Ou ainda um pouco de cada, para que

houvesse uma região de sobreposição entre as duas técnicas. Havia a necessidade de explorar os

limites das duas técnicas.

1.4.2 Focalização do laser dentro da câmara

Um outro desafio que havia era com relação à focalização do feixe laser no cantilever em

contato com a esfera presa pela pinça óptica. Devido a grande abertura numérica necessária para

uma boa armadilha e a distância de trabalho (WD) típicas das objetivas com tais aberturas

numéricas de no máximo 200μm sobrava pouco espaço para acomodar o feixe laser dentro da

câmara da solução, principalmente levando em conta que o feixe deveria ser focado atingindo

dimensões da ordem de 20 μm quando estivesse em contato com o cantilever que possui

dimensões da ordem de (200μm x50μm).

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Figura 1.2 Esquema proposto inicialmente para a calibração da pinça óptica com um cantilever de AFM

Figura 1.3 Componentes típicos de um AFM. Um feixe laser é focado nas superfície de um cantilever de silício

microfabricado e refletido de volta para um fotodetector, possibilitanto monitorar as deflexões do mesmo.

7

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Capítulo 2. Pinça Óptica

O princípio fundamental da pinça óptica está na pressão de radiação exercida por um feixe

de luz em partículas dielétricas. A pressão de radiação foi pela primeira vez observada no século

XVII pelo astrônomo Johannes Kepler, que propôs que a radiação do sol forçava a calda do

cometa apontar sempre na direção oposta ao seu deslocamento12. Em 1873 James Clerk Maxwell

mostrou em sua teoria do eletromagnetismo que a luz podia exercer força12. Entretanto,

experimentalmente isto não foi demonstrado até 1970 com o advento do laser13. A manipulação

óptica de partículas dielétricas micrométricas, e até de átomos individuais tem sido possível

desde então, mas só por volta de 1986 a pinça óptica foi aplicada a partículas biológicas. A partir

daí, ela foi usada para manipular vírus e bactérias, células vivas, organelas, para inserir DNA

dentro de diferentes tipos de células, para conectar DNA ao silício na tentativa de construção de

uma interface biomecânica e para fertilizações in vitro14. Como ferramenta de medida a pinça

óptica foi utilizada para estudar propriedades mecânicas de hemácias15, para medir e comparar

deslocamentos celulares e forças de miosinas cardíacas16, para caracterização de motores

biológicos moleculares17 e rigidez flexural de microtubos18, para medir o comprimento de uma

12 Hecht, E. (1987) Optics. 2nd Ed. Addison-Wesley Publishing Company, Inc. 13 Ashkin, A. (1970) "Acceleration and trapping of particles by radiation pressure". Phys. Rev.Lett., 24, 156-159. 14[Anon], "Optical tweezer attaches single DNA molecular to silicon", Laser Focus World 34, 9-9 (1998); C.S. Buer, K.T. Gahagan, A. Grover A et al., "Insertion of Agrobacterium rhizogenes into Ginkgo biloba using lasers as optical tweezers and scalpel", Plant Physiol 114, 1613 (1997); A. Obruca, H. Strohmer, A. Blaschitz et al., "Ultrastructural observations in human oocytes and preimplantation embryos after zona opening using an erbium-yttrium-aluminium-garnet (Er : YAG) laser", Hum Reprod 12, 2242 (1997) 15R.R. Huruta, M.L. BarjasCastro, S.T.O. Saad, F.F. Costa and C.L. Cesar, "A new method to study mechanical properties of red blood cells using optical tweezer", Blood 90, 9-9 (1997) 16S. Sugiura, N. Kobayakawa, H. Fujita et al., "Comparison of unitary displacements and forces between 2 cardiac myosin isoforms by the optical trap technique - Molecular basis for cardiac adaptation", Circ Res 82, 1029 (1998) 17N. Thomas, R.A. Thornhill, "The physics of biological molecular motors", J Phys D Appl Phys 31, 253 (1998) 18H. Felgner, R. Frank, M. Schliwa,"Flexural rigidity of microtubules measured with the use of optical tweezers", J Cell Sci 109, 509 (1996)

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molécula de DNA19 e estudar a motilidade de espermatozóides humanos20. Foi utilizada também

para detectar concentrações ao nível de femtomolar de antígenos21 e permitiu a observação da

ausência de travamento do movimento de rotação reversa de flagelos motores de bactérias22. As

intensidades das forças envolvidas nas interações ao nível celular são da ordem de pico a

femtoNewtons, devido ao tamanho microscópico das partículas que interagem. Um cubo de 1 μm

de lado com densidade igual à da água (103 kg/m3) tem massa de m = (10-6)3 x 103 = 10-15 kg.

Forças de picoNewtons nesse caso implicam em acelerações de 1000 m/s2. A força necessária

para ruptura de uma ligação antígeno-anticorpo é aproximadamente de 240 pN23. Já as forças de

motores moleculares tais como kinesina e miosina variam entre 7 a 9 pN24.

2.1 Teoria das Pinças Ópticas

O efeito da pinça óptica é possível graças ao momento transportado pelo fóton. Quando um

fóton atinge um objeto de índice de refração diferente daquele do meio do qual esta viajando,

podem ocorrer em princípio três fenômenos: Reflexão, refração ou absorção. No caso da pinça

óptica, o efeito do aprisionamento na região de maior intensidade do feixe deve-se

19K. Sakata-Sogawa, M. Kurachi, K. Sogawa K et al.,"Direct measurement of DNA molecular length in solution using optical tweezers: detection of looping due to binding protein interactions", Eur Biophys J Biophy 27, 55 (1998) 20K. Konig, L. Svaasand, Y.G. Liu et al.,"Determination of motility forces of human spermatozoa using an 800 nm optical trap", Cell Mol Biol 42, 501 (1996) 21K. Helmerson, R. Kishore, W.D. Phillips et al.,"Optical tweezers-based immunosensor detects femtomolar concentrations of antigens", Clin Chem 43, 379 (1997) 22H.C. Berg, R.M. Berry, "Absence of a barrier to backwards rotation of the bacterial flagellar motor demonstrated with optical tweezers", P Natl Acad Sci USA 94, 14433 (1997) 23 Hinterdorfer, P.,Baumgartner, W., Gruber, H. J., Schilcher, K., and Schindler, H.(1996).”Detection and localization of individual antibody-antigen recognition events by atomic force microscope”.Proc.Natl. Acad. Sci. USA 93, 3477-3481. 24Finer, J.T., Simmons, R. M., and Spudiche, J.A. (1994).”Single myosin molecula mechanics: Piconewton forces and nanometre steps”.Nature 368, 113-119

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principalmente a refração dos fótons através da partícula, enquanto a reflexão e a absorção

causam um efeito de expulsão da partícula daquela região. A estabilidade da armadilha se dá

devido a uma dominância da força de gradiente (devido ao efeito da refração) sobre a força de

espalhamento (devido aos efeitos de reflexão e absorção). Para conseguir tal estabilidade é

necessário um feixe fortemente focado.25

Figura 2.1 Esquema de forças em uma esfera dielétrica aprisionada por um feixe laser fortemente focado

A força óptica (F) exercida em uma partícula dielétrica por um feixe laser é dependente de 4

fatores fundamentais: A potência (P) da luz incidente, do índice de refração do meio n, da

velocidade da luz (c) e de um fator adimensional de eficiência (Q), da seguinte forma:

c

nPQF 2.1

O fator de eficiência Q, é uma representação da fração de potência utilizada para exercer força e é

dependente da abertura numérica da objetiva empregada para focar o laser, do comprimento de

25Ashkin A., “Forces of a single-beam gradient laser trap on a dielectric sphere in the ray optics regime” - Biophysical Journal 61 (2): 569-582 FEB 1992

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onda λ e do estado de polarização da luz, do modo do laser, do índice de refração relativo entre

meio e partícula, e da geometria da partícula aprisionada26.

Partindo do momento transportado pelo fóton, podemos facilmente derivar a equação 2.1

para a força exercida em uma partícula devido à reflexão. Utilizando as expressões de momento e

energia do fóton temos:

h

p f e como n

cfv segue que

c

Enp

c

hfnp f

ff

onde pf é o momento do fóton, v é a velocidade da luz no meio de índice de refração n, Ef é a

energia de um fóton com freqüência f e c é a velocidade da luz no vácuo. Considerando reflexão

total temos então:

t

Np

t

pF ff

2

c

nP

t

EN

c

n ff 22

Para uma reflexão total do feixe laser que se propaga no ar (n=1) com uma potência de 1W temos

F da ordem de 10 nN, que é uma força bastante significativa para partículas da ordem de

micrômetros de dimensão. Na pinça óptica, entretanto, as forças típicas da armadilha são da

ordem de 0.01-100 pN, com fator de eficiência de transferência de momento Q da ordem de 0,2,

ou seja dez vezes menor que no caso da reflexão total.

Os modelos teóricos existentes são dependentes do tamanho da partícula. No regime de

Raleigh, a partícula é muito menor que o comprimento de onda utilizado para aprisioná-la. No

regime de Mie a partícula é muito maior que o comprimento de onda. No regime Lorenz-Mie a

partícula é da mesma ordem de grandeza que o comprimento de onda.

26 Svoboda, K. & Block, S. M. (1994) “Biological application of optical forces”- Ann. Rev. Biophys. Biomol. Struct., 23, 247-285.

11

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2.1.1 Regime Rayleigh (d << )

Neste regime, os campos eletromagnéticos são uniformes através da partícula dielétrica,

de forma que estas podem ser tratadas como dipolos induzidos. As forças da armadilha se

decompõem naturalmente em duas componentes. Força de espalhamento, Fscatt e força de

gradiente, Fgrad. A força de espalhamento é dada por:

c

SnF mscatt

onde 2

2

224

2

1)(

3

8

m

mrkr é a sessão de choque de espalhamento de uma esfera de raio

r27. S é media temporal do vetor de point, n é o índice de refração da partícula, nm é o índice de

refração do meio onde a partícula está imersa, m=n/nm é o índice de refração relativo, e k=2nm/

é o número de onda da luz. A força de espalhamento é proporcional ao fluxo de energia e aponta

na direção de propagação feixe laser incidente.

A força de gradiente é a força de Lorentz agindo nos dipolos induzidos pelo campo

elétrico da luz e é dada por28:

BpFgrad

t

pE)( 2.2

onde p

é o momento de dipolo da partícula. Considerando Ep obtem-se

BEFgrad

t

EE)( 2.3

27 K. Svoboda and S. M. Block, Annu. Rev. Biophys. Biomol. Struct. 23, 247–285 (1994). 28 Gordon J. P. “Radiation forces and momenta in dielectric media”- Phys.Rev.A 8:14-21

12

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Utilizando a identidade vetorial EEE

EE

)2

()(2

e a equação de Maxwell

0

t

BE

podemos escrever a equação 2.3 como

B

EFgrad

E

t2

2

e tomando a média temporal

2

2EFgrad

,

onde

2

12

232

m

mrnm é a polarizabilidade da partícula29. A força de gradiente é proporcional e

paralela ao gradiente da densidade de energia (para m>1). Portanto, uma armadilha estável requer

que a força de gradiente, que tem direção oposta a de propagação do feixe laser, seja maior que

força de espalhamento. Então, ao mover o foco do feixe a partícula pode ser manipulada.

Aumentando a abertura numérica diminui-se o spot-size e aumenta-se a intensidade do gradiente,

aumentando as forças da armadilha óptica em todas as direções.

2.1.2 O Regime Lorenz-Mie (d ~ )

Neste regime nem a teoria eletromagnética nem a teoria de óptica geométrica são

adequadas para explicar os resultados experimentais. Em 2001, Tlusty et al30. introduziram uma

teoria que simplifica os cálculos da força óptica neste regime ao explorar as propriedades de um

feixe altamente localizado. Eles argumentam que para tais feixes, a diferença de fase através do

spot-size 2 é desprezível e portanto a energia da partícula pode ser calculada da seguinte forma.

29 K. Svoboda and S. M. Block, Annu. Rev. Biophys. Biomol. Struct. 23, 247–285 (1994). 30 12T. Tlusty, A. Meller, and R. Bar-Ziv, ‘‘Optical gradient forces of strongly localized fields,’’ Phys. Rev. Lett. 81, 1738–1741 ~1998!.

13

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dVUWV

onde α 10

p polarizabilidade e a integração é sobre o volume V da partícula.

A força de gradiente surge devido à variação de W em resposta a uma variação de

coordenada da partícula. Os campos eletromagnéticos localizados próximos ao ponto focal

podem ser aproximados por um feixe gaussiano 3D. A densidade de energia deste feixe pode ser

expressa por:

2

2

2

2

0 22exp),(

zUzU

onde 200 2

1EU é a máxima densidade de energia do feixe no foco, ρ é a distância radial do

eixo do feixe, z é a distância ao longo do eixo, ω e ωε são as dimensões da cintura do feixe laser

nas direções transversal e axial respectivamente. As interações das polarizações induzidas com os

campos formam um poço de potencial. A força de restauração proveniente deste poço calculada

para o caso onde o feixe tem simetria radial (ε=1) é dada por

)]sinh()cosh([4)()( 2/)(20

22

auauaueUrWrF ur

onde a = R/ω e u = r/ω são o raio e a coordenada normalizada pelo raio da cintura do feixe ω

respectivamente. Para pequenas perturbações em torno da origem chegaram a seguinte expressão

para o constante de mola da armadilha:

2/30

2

3

4 aeaUk

Tlusty et al. mostraram que estas expressões, bem como as expressões completas para a força de

restauração não linear para grandes perturbações estão em excelente concordância com os

experimentos, para todos os tamanhos de partículas.

14

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Uma outra opção, para este regime, muito mais precisa e complexa, é a Teoria de Lorenz-

Mie generalizada (GLMT), uma extensão da teoria de Mie do espalhamento. Ela permite calcular

os campos espalhados e forças de radiação exercidas sobre uma partícula de tamanho qualquer

colocada em um feixe gaussiano31 ou em um perfil de feixe mais geral32.

2.1.3 Regime de Óptica Geométrica (d>> )

Quando o diâmetro da partícula sendo aprisionada é muito maior que o comprimento de

onda do laser utilizado podemos explicar o fenômeno do aprisionamento através de óptica

geométrica. Daremos mais atenção a este regime pois corresponde a situação de maior interesse

na nossa pesquisa. Analisaremos inicialmente o efeito da incidência de um único raio sobre uma

esfera dielétrica de índice de refração n2 maior que o do meio a sua volta n1. Ao incidir em um

meio com índice de refração diferente, o raio sofre reflexão com probabilidade R e transmissão

com probabilidade T. R e T são os coeficientes de Fresnel dependentes da polarização e dados por

(utilizando a lei de Snell):

2

)sin(

)sin(

sR ss RT 1 ; 2

)tan(

)tan(

pR pp RT 1 2.4

onde o subscrito s indica uma polarização perpendicular ao plano de incidência e o p uma

polarização paralela. R em geral é da ordem de 1% e, portanto, T é da ordem de 99%. Assim,

podemos exemplificar o fenômeno do aprisionamento considerando apenas o efeito

predominante, ou seja, a refração dos raios de luz. Considere então dois raios simétricos que são

refratados na esfera dielétrica:

31 G. Gouesbet, B. Maheu, G. Gréhan, J. Opt. Soc. Am. A 5 (1988) 1427. 32 James A. Lock, APPLIED OPTICS _ Vol. 43, No. 12 _ 20 April 2004

15

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Figura 2.2 Dois raios simétrico a e b incidindo sobre a esfera com índice de refração n2>n1 sendo refratados pela

mesma. No processo ocorre transferência de momento dos fótons para a esfera ocasionando uma força F

sempre direcionada para a região de maior intensidade do laser (foco).

A variação no momento do fóton devido à refração da origem a forças Fa e Fb, mostradas

na direção da variação do momento. A força resultante dos dois raios age na direção de maior

intensidade da luz, deste modo levando a o centro da esfera para o foco do laser.

Para levar em conta os efeitos secundários devido à reflexão na superfície da esfera e às

múltiplas reflexões dentro da esfera, é necessária uma análise cuidadosa do trajeto de um único

raio que incide sobre a esfera. A figura abaixo ilustra o fenômeno:

Figura 2.3 Trajeto de um único raio incidindo sobre a esfera dielétrica com ângulo e refratando com ângulo .

O esquema ilustra as inúmeras reflexões e refrações que um raio sofre nestas condições. O eixo Z’ tem a direção do

raio incidente e o eixo Y’ é ortogonal ao eixo Z’ tal que 'ˆ'ˆ'ˆ xzy e a direção de é dada por 'x az ˆ'ˆ . Da

geometria obtemos os ângulos )(2 e 2 .

16

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Podemos calcular a força que atua na esfera nas direções y’ e z’ através do cálculo da

variação de momento por unidade de tempo nestas direções 1. A força óptica total agindo sobre a

esfera é a soma das contribuições devido ao raio refletido PR, e do número infinito de raios

refratados emergentes de potências sucessivamente decrescentes PT2, PT2R,... PT2Rn,... :

0

2111' )cos()2cos(

n

nz nRT

c

Pn

c

PRn

c

PnF 2.5

0

211' )sin()2sin(0

n

ny nRT

c

Pn

c

PRnF 2.6

Para realizar os somatórios, escrevemos as forças no plano complexo : yzc iFFF

])(exp[)2exp(10

21

n

nc niRTiR

c

PnF 2.7

Notamos então que o terceiro termo é a somatória de uma progressão geométrica de razão

)exp( iR .Então:

)exp(1

1)exp()2exp(1 21

iRiTiR

c

PnFc 2.8

Tomando agora parte real e parte imaginária obtemos da equação acima:

Q

zS RR

RTR

c

PnFF

)2cos(21

)]2cos()22[cos()2cos(1

2

21

' 2.9

Q

yG RR

RTR

c

PnFF

)2cos(21

)]2sin()22[sin()2sin(

2

21

' 2.10

Assim, cada raio dá origem a um termo de força de espalhamento e a um termo de

força de gradiente . Precisamos agora calcular o efeito de todos os raios componentes do feixe

SF

GF

17

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laser incidindo sobre a esfera dielétrica. Para isso devemos levar em conta que as objetiva

comerciais de que dispomos obedecem à condição do seno de Abbe.33 Ou seja, um raio que

incide perpendicularmente na abertura de uma objetiva de distância focal f, a uma distância r do

seu centro é refratado com um angulo tal que f

rsin . A figura abaixo ilustra o fenômeno:

a

b

Figura 2.4 a) Feixe focado pela objetiva com ângulo max correspondente ao raio mais distante do eixo . A

abertura numérica é definida em função deste ângulo:

)( maxr

)( maxsennNA onde n é o índice de refração do meio

entre a objetiva e a amostra. b) Esquema das variáveis envolvidas na condição de seno de Abbe. L é o comprimento do tubo (160mm).

Como a força exercida por cada raio na esfera depende do ângulo de incidência ,é

preciso calcular este ângulo em função do ângulo de convergência e do ângulo azimutal que

define a direção no espaço de cada raio. Para isso utilizamos o sistema de coordenadas abaixo,

onde o foco da objetiva está na origem dos eixos e o vetor S

,que liga a origem ao centro da

esfera, faz um ângulo com o eixo X:

33 Min Gu, P. C. Ke, X. S. Gan; “Trapping force by a high numerical-aperture microscope objective obeying the sine condition” - Rev. Sci. Instrum., Vol. 68, No. 10, October 1997

18

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Figura 2.5 Sistema de coordenadas utilizado no modelo teórico. C é o centro da esfera e é o angulo entre OC e o

eixo X. Sem perda de generalidade, o segmento OC está contido no plano XZ.

Escrevemos em coordenadas esféricas o vetor

que liga a origem ao ponto de incidência de um

raio com ângulo de refração e ângulo azimutal como:

cos,sinsin,cossin

2.11

O vetor neste sistema é escrito como: S

cos,0,sin SSS

2.12

A figura abaixo ilustra a configuração destes vetores:

Figura 2.6 Esquema dos vetores utilizados para o cálculo do ângulo de incidência . O vetor a

dá a direção

normal no ponto de incidência e tem módulo igual ao raio da esfera. Em geral, ae

não estão no plano XZ.

19

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Da Lei dos Cosenos:

a

Sa

2cos

2221 2.13

E como

Sa

SSa

2222 Portanto:

222 )sinsincoscos(cos1)sinsincoscos(cos SSS 2.14

já que 0 .Assim obtemos:

a

SSa 2221 )sinsincoscos(cos

cos

2.15

Levando em conta agora a condição de seno de Abbe ( sinfr ):

a

rrff

SSa

Sr

2222

22

1

)sincoscos(

cos),,,(

2.16

Utilizando a lei de Snell obtemos o ângulo de refração :

a

rrff

SS

nSr

2222

2

1

)sincoscos(1

sin),,,(

2.17

Assim determinamos as forças e devido a cada raio com direção definida pelo par 'zF 'yF ),( r .

Para encontrarmos as forças nas direções precisamos decompor os versores

naquelas direções. Claramente o versor

zeyx ˆˆ,ˆ 'ˆ'ˆ yez

'z é dado por:

),sin,cos(1

)cos,sinsin,cos(sin'ˆ 22 rfrrf

z 2.18

20

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Já o versor é dado por: 'y

)'ˆˆ('ˆ)ˆ'ˆ('ˆ'ˆ'ˆ'ˆ zSzazzxzy 2.19

,)sincoscoscos(sin

('ˆ2

22222

f

rrfrfy

)sincoscos(

,)sincoscos(sin

2

22

2

22

f

rfrr

f

rrfr 2.20

Agora basta realizarmos uma integração na abertura de entrada da objetiva para o cálculo da

força resultante:

rdrdrIyQzQc

nF

r

yztotal ),('ˆ'ˆ2

0 0

''1

max

2.21

onde ),( rI é a intensidade na entrada da objetiva. Fizemos a integração numericamente no

software Mathematica para o caso de uma intensidade uniforme na entrada da objetiva, para

0 e 2

:

Figura 2.7 Gráfico das forças de espalhamento (Qs), de gradiente (Qg)e total(Qt) na direção z.

21

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Figura 2.8 Gráfico da forças de espalhamento(Qsz) na direção z, de gradiente (Qgx) na direção x e total

( 22gxszt QQQ )

Podemos observar das simulações acima a assimetria existente entre as a forças da

armadilha na direção de propagação do feixe, Figura 2.7 e na direção perpendicular a propagação,

Figura 2.8, que é cerca de duas vezes maior. É a constante de mola da armadilha associada à

direção perpendicular ao feixe que objetivamos calibrar com o cantilever de AFM.

22

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2.2 Instrumentação

A figura abaixo mostra a montagem experimental construída para a pinça óptica:

Figura 2.9 Montagem experimental da pinça óptica.

2.2.1 O Microscópio

Qualquer microscópio com uma porta de epi-iluminação pode ser utilizado para a

construção da pinça óptica (comprometendo, entretanto, a microscopia de fluorescência).

Existem três requisitos indispensáveis para o microscópio. O primeiro é a necessidade de um

espelho dicróico para a reflexão do laser da pinça enquanto transmite a luz visível. O segundo é

23

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uma objetiva com grande abertura numérica (NA>1) para a obtenção de uma armadilha real. E o

terceiro é a estabilidade do estágio e do acoplamento da câmera de vídeo ao microscópio.

2.2.2 O Laser

A seleção do laser deve levar em conta os requisitos específicos necessários de:

Comprimento de onda, potência, estabilidade e qualidade do modo do feixe.Para não causar

danos a materiais biológicos, que em geral são mais transparentes para grandes comprimentos de

onda e, ao mesmo tempo, para que o laser não seja muito absorvido pela água ao redor do

material que se vai manipular, que em geral é mais transparente para curtos comprimentos de

onda, deve-se utilizar lasers com comprimentos de onda na janela de 800nm a 1100 nm.

Figura 2.10 Espectro de absorção de alguns materiais biológicos e da água

Para a obtenção de uma armadilha estável, o laser deve operar em modo continuo (CW) e

apresentar um feixe com baixo ruído que possa ser focalizado com menor diâmetro possível. O

diâmetro do menor ponto focal será da ordem do comprimento de onda do laser utilizado e é

24

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descrito como um spot limitado pela difração. Em geral utiliza-se o modo TEM00, mas pode-se

utilizar também o modo TEM01 (do-nut) com leve aumento no desempenho da armadilha34.

Em nosso caso utilizamos um laser de Nd:YAG, CW de comprimento de onda 1064nm,

operando no modo TEM00 com capacidade de fornecer até 10W de potência. No entanto, a

potência utilizada é sempre de no máximo um 1W, pois com potências maiores existe o risco de

danos permanentes na objetiva devido à absorção do laser pela mesma e conseqüente

superaquecimento.

2.2.3 Construção e Alinhamento

Para que haja estabilidade durante o aprisionamento, todo o aparato deve ser montado em

uma mesa óptica específica que isole o sistema de vibrações indesejáveis. O diagrama da figura

14 ilustra os componentes principais da montagem.

Figura 2.11 Diagrama da montagem da pinça óptica.

34 Ashkin A., "Forces of a single-beam gradient laser trap on a dielectric sphere in the ray optics regime" Biophysical Journal 61 (2): 569-582 FEB 1992

25

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O primeiro espelho E1 é utilizado para levar o feixe laser para a direção do microscópio, já

proporcionando um ajuste da altura do feixe com relação à entrada do microscópio. Os espelhos

E2 e E3 tem papel fundamental durante o alinhamento do sistema, permitindo não só com que o

feixe saia na horizontal, mas também um ajuste da inclinação deste no plano, fator este que

possibilita o feixe entrar perpendicularmente ao plano de abertura de entrada da objetiva

proporcionando um ponto focal limitado pela difração. Já o telescópio formado pelas lentes L1 e

L2 tem dupla função. A de ampliar o diâmetro do feixe para que este preencha completamente a

abertura da objetiva como ilustra a Figura 2.12 e a de possibilitar enxergar a partícula aprisionada

pela objetiva. Isto porque o plano objeto não coincide com o plano focal da objetiva. Para isto,

ajusta-se a distância entre L1 e L2 até que se possa ver com nitidez a partícula aprisionada. A

Figura 2.13 ilustra o procedimento.

Figura 2.12 Preencher a entrada da objetiva possibilita maior abertura numérica

26

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Figura 2.13 Utilização do telescópio para levar o foco do laser da pinça para o plano objeto permitindo a visualização da partícula aprisionada. Em (a) a distância d entre L1 e L2 é igual a soma das distâncias focais

das mesmas e o feixe é focalizado no plano focal da objetiva. Em (b) d é maior que 21 ff 21 ff e o

feixe é focado antes do plano focal da objetiva. Em (c) d é menor que 21 ff e o feixe é focalizado no

plano objeto permitindo a visualização do mesmo na tela da TV.

Para a realização do alinhamento, inicialmente sem as lentes L1 e L2 com a ajuda de um

cartão para visualização do infravermelho e dos espelhos E1 E2 e E3 ajusta-se o feixe

horizontalmente e de modo a entrar pela abertura da objetiva. Coloca-se uma lamínula após a

objetiva sob o estágio do microscópio e ajusta-se a altura deste até que se tenha uma imagem do

padrão de difração do spot laser na tela da TV. Isto ocorre porque parte do feixe é refletida pela

lamínula. Além disso, é necessário que o filtro de IR seja removido da câmera para a visualização

do laser. Logo em seguida, utiliza-se os espelhos E2 e E3 para fazer com que o feixe entre

perpendicular ao plano da abertura da objetiva, gerando um spot limitado pela difração

completamente simétrico, conforme ilustra a Figura 2.14.

27

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Figura 2.14 Ilustração da imagem vista na TV durante o processo de alinhamento.

Em seguida colocam-se as lentes L1 e L2 de modo a não alterar o centro do padrão de difração na

tela da TV e então, ajusta-se a distância entre L1 e L2 até que se obtenha um spot limitado pela

difração simétrico novamente. Alterando-se a relação entre os focos de L1 e L2 regula-se o

diâmetro do feixe na entrada da objetiva, preenchendo-a completamente. Por fim adiciona-se uma

solução de esferas da ordem de alguns micrômetros e com uma esfera aprisionada, faz-se o ajuste

fino em L1 e L2 para conseguir uma focalização ideal a mesma.

2.2.4 O Sistema de Imagem

Adaptamos uma câmera VHS analógica ao tubo de observação binocular do microscópio.

Esta é então ligada diretamente a uma televisão comum e a uma placa de captura em computador

para digitalização e análise via software.

28

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2.3 Calibração

A dificuldade que circunda a computação teórica da rigidez da armadilha óptica implica

que esta deve ser determinada experimentalmente. Tais armadilhas, apresentam forças

restauradoras diretamente proporcionais ao deslocamento, similarmente a molas de Hook, para

pequenos deslocamentos da posição de equilíbrio. Assim são caracterizadas por constantes de

rigidez k fixas para uma dada condição experimental. Uma vez conhecida a constante de rigidez

da armadilha, a força pode então ser determinada utilizando-se a lei de Hook F=kx. A calibração

da rigidez pode ser feita de várias maneiras35, das quais destacamos duas:

2.3.1 Força de Arraste

Esta técnica determina a rigidez ou constante de mola da armadilha através da aplicação

de uma força de viscosidade conhecida a uma partícula aprisionada e mede seu deslocamento da

posição de equilíbrio. A rigidez é dada então por:

x

fk

onde f é a força de arraste conhecida e x é o deslocamento da partícula da posição de equilíbrio.

Utiliza-se em geral a lei de Stokes:

rvF 6

Onde η é a viscosidade do meio, r é o raio da partícula e v é a velocidade relativa da partícula em

relação à solução. Tal expressão é válida apenas se a esfera é mantida longe das paredes da

câmara da solução. Caso contrário, é preciso acrescentar um fator de correção35:

rvkF 6

35 K. Svoboda and S. M. Block, Annu. Rev. Biophys. Biomol. Struct. 23, 247–285 (1994).

29

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543 )/(16

1)/(

256

45)/(

8

1)/(

16

91

1

hrhrhrhrk

onde h é a distância das paredes ao centro da esfera.

2.3.2 Eqüipartição da Energia

Alternativamente, a rigidez da armadilha pode ser determinada a partir do movimento

Browniano da partícula aprisionada. Quanto maior o deslocamento médio quadrático da partícula,

menor a rigidez da armadilha. Utilizando o teorema da eqüipartição da energia para um poço de

potencial harmônico, temos

Tkxk B2

1

2

1 2

2x

Tkk B

onde kB é a constante de Boltzmann e T é a temperatura.

30

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Capítulo 3. Microscópio de Força Atômica (AFM)

O AFM, um descendente da família das microscopias de varredura (SPM-scanning probe

microscopy), foi inventado por Binnig et al. em 1986 seguindo o advento do microscópio de

tunelamento STM (scanning tunnelling microscope) também por Binnig et al. em 1982. Desde

então, o AFM se tornou uma técnica de análise de superfícies bem estabelecida, capaz de realizar

imagens de alta resolução de superfícies de materiais isolantes e condutores em uma grande

variedade de condições, bem como imagens submoleculares de materiais biológicos36. Também

provou ser uma ferramenta indispensável na determinação de forças intermoleculares.

O AFM tem uma resolução de força teórica de 10-15 N37 e emprega sensores com o raio da

ponta da ordem de 10 – 15 nm38 fornecendo regiões de contato tão pequenas quanto 10 nm239. A

alta resolução de força e a pequena área de contato superam as limitações do aparato de força

superficial (SFA), e é ideal para as medidas de interações de moléculas individuais. O

estabelecimento do AFM como uma ferramenta de medida de força também levou a elucidação

de propriedades nanomecânicas adicionais, tais como a elasticidade e a plasticidade de

moléculas.

36 Hansma, H. G., Kim, K. J., Laney, D. E., Garcia, R. A., Argaman, M., Allen, M. J. & Parsons, S. M. (1997) “Properties of biomolecules measured from atomic force microscope images: A review”. J. Struct. Biol., 119, 99-108. 37 Smith, S. B., Cui, Y. & Bustamante, C. (1996) “Overstretching B-DNA: The elastic response of individual double-stranded and single-stranded DNA molecules.” - Science, 271, 795-799. 38 Thundat, T., Zheng, X. –Y., Shrap, D., Allison, D. P., Warmack, R. J., Joy, D. C. & Ferrell, T. L. (1992) “Calibration of atomic force microscope tips using biomolecules.” - Scanning Microscopy, 6, 903-910. 39 Lee, G. U., Chrisey, L. A. & Colton, R. J. (1994a) “Direct measurement of the forces between complementary strands of DNA.” - Science, 266, 771-773.

31

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3.1 Instrumentação

O AFM investiga a superfície de uma amostra com uma fina ponta de silício, integrada a

extremidade de um cantilever microfabricado com uma constante de mola k (N/m) conhecida.

Um feixe laser é focado na superfície metálica do cantilever em forma de v e, após, refletido do

cantilever para um fotodiodo de quadrante sensível a posição. Um mapa da topografia da

superfície da amostra é gerado ao monitorar-se as deflexões do cantilever (um resultado de forças

que agem entre a ponta e a superfície) à medida que a ponta varre a superfície da amostra. Ao

monitorar a posição do feixe laser através dos sinais de saída de cada um dos segmentos do

fotodiodo deflexões tão pequenas quanto 0.1 Å podem ser detectadas 40. Os principais

componentes do AFM são mostrados esquematicamente na Figura 3.1:

A vantagem principal do AFM como uma ferramenta de imagem é que ele não sofre das

limitações de difração dos microscópios óticos ou eletrônicos. Tais microscópios baseados em

ondas são geralmente limitados à resolução da mesma ordem que o comprimento de onda

utilizado pra fazer a imagem. Esta capacidade impressionante foi convincentemente demonstrada

através de imagens de resolução atômica de cristais não condutores como mostra a Figura 3.2:

40 Rugar, D. & Hansma, P .K. (1990) “Atomic force microscopy.” - Physics today, 43, 23-30.

32

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Figura 3.1 Diagrama esquemático de um AFM. Tipicamente a ponta fica levemente em contato com a amostra (via mecanismo de feedback) e parada em uma mesma coordenada x,y enquanto a amostra é deslocada pelo piezoscanner para a varredura linha por linha e a obtenção da imagem 3D desejada. À medida que a ponta passa por regiões elevadas da superfície da amostra, forças repulsivas aumentam entre a ponta e a amostra, resultando em uma variação na deflexão do cantilever. Um circuito de feedback é empregado para manter a altura da ponta com relação à amostra fixa através do controle da coordenada z da amostra, mantendo também uma força de interação entre ponta-amostra constante. Imagens 3D que são representativas da topografia da superfície da amostra são portanto obtidas monitorando-se o sinal de feedback e a posição (x,y) da amostra.(Adaptado de Allen, 1997)

Figura 3.2 a) imagem de mica com resolução atômica no modo de contato de 5nm. Imagem obtida com NanoScope-SPM, cortesia Digital Instrument, Veeco Metrology Group, Santa Barbara, CA. b) Imagem de DNA no modo tapping de 252nm. Imagem obtida com o NanoScope-SPM, cortesia do Laboratório Bustamante, Instituto de Biologia Molecular, Universidade de Oregon, Eugene.

33

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3.2 Modos de Imagem do AFM

Existem 3 modos de imagem principais que são usados para investigar a superfície de

amostras, dependendo da sensibilidade de cada uma. Os modos utilizados são:

3.2.1 Contato

Neste modo a ponta é trazida em contato físico com a superfície do substrato. A

desvantagem deste modo de imagem é que ele pode causar deformações em superfícies muito

sensíveis devido as grandes forças repulsivas entre ponta e amostra que são da ordem de

nanonewtons41. Os modos de não-contato e tapping foram desenvolvidos para contornar este

problema. (Lindsay, 1993).

3.2.2 Não-contato

Neste modo o cantilever é feito oscilar em sua freqüência de ressonância com a ponta

muito próxima, mas sem tocar, a superfície da amostra. Infelizmente, esta técnica perde em

sensibilidade a pequenas variações na separação entre ponta e amostra e como resultado

demonstra menor resolução do que os demais modos de imagem 42.

41 Lindsay, S. M., Lyubchenko, Y. L., Tao, N. J., Li, Y. Q., Oden, P. I., Derose, J. A. & Pan, J.(1993) “Scanning-tunneling-microscopy and atomic-force microscopy studies of biomaterials at a liquid-solid interface.” - J. Vac. Sci. Technol. A-Vac. Surf. Films, 11, 808-815. 42 Magonov, S. N. & Whangbo, M. H. (1996) "In Surface Analysis with STM and AFM." VCH Publisher, New York. Chapter 3, Scanning probe microscopes. pp 21-49.

34

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3.2.3 Tapping

O modo de tapping combina alta resolução e rápida aquisição de imagens do modo de

contato com a característica não destrutiva do modo de não-contato. Neste modo o cantilever é

feito oscilar na sua freqüência de ressonância e a ponta levemente toca superfície da amostra. A

medida em que ponta e a amostra entram em contato intermitente, a amplitude vibracional do

cantilever diminui. É esta variação na amplitude que é monitorada para produzir imagens da

topografia da amostra. A determinação da diferença de fase entre as oscilações excitando o

cantilever e as produzidas pela ponta durante o contato intermitente com a superfície fornecem

informações sobre propriedades da superfície tais como adesão e viscoelasticidade, que em geral

não são detectadas pelos outros modos de imagem.

O AFM tem sido empregado na obtenção de imagens de alta resolução de biomoléculas

tais como proteínas, DNA, membranas de lipídios e células.

3.3 Medindo Forças

Os primórdios da espectroscopia de força foram dominados pelo AFM. A habilidade desta

técnica em medir forças de adesão discretas da ordem de 10 pN foi primeiro identificada por Hoh

et al. em 199243, que atribuiu tal força àquela necessária para romper uma simples ligação de

hidrogênio. Desde aquele tempo, o AFM tem sido empregado na investigação de interações do

tipo receptor-ligante, mecanismos de desenovelamento de proteínas (unfolding) e forças

intramoleculares dentro de polímeros. Na aplicação do AFM como uma técnica de medida de

forças, a deflexão do cantilever é monitorada à medida que a ponta (tip) é posta em contato com a

43 Hoh, J. C., Cleveland, J. P., Prater, C.B., Revel, J. –P. & Hansma, P. K. (1992) “Quantized adhesion detected with the atomic force microscope.” - J. Am. Chem. Soc., 114, 4917-4919.

35

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superfície da amostra e então separada. Se a constante de mola do cantilever é conhecida, esta

deflexão pode ser traduzida em uma força. Os dados obtidos a partir da deflexão do cantilever são

então utilizados para construir a curva Força vs. Distância 44( Figura 3.3).

Figura 3.3 Curva Força vs. Distância.

No início da medida de uma força (A) o cantilever está na sua posição de equilíbrio. À

medida que a ponta e amostra são aproximadas (curva de aproximação) a ponta alcança uma

distância (B) onde a ponta salta para o contato com a amostra. Este “salto para o contato” é

resultado das forças atrativas da superfície da amostra que excedem a força exercida pela

constante de mola do cantilever. As forças responsáveis por esta forte atração são

predominantemente devido a forças de van der Waals. O cantilever continua aproximando-se da

superfície da amostra até um ponto de máxima carga (C). A ponta é então afastada da superfície

da amostra (curva de afastamento). Durante o afastamento, a ponta pode aderir à superfície da

amostra devido a interações não específicas (forças de capilaridade, forças eletrostáticas) ou

44 Cappella, B. & Dietler, G. (1999) “Force-distance curves by atomic force microscopy.” - Surf. Sci. Reports, 34, 1-104.

36

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devido a interações específicas entre moléculas complementares na ponta e na superfície da

amostra, como por exemplo em um par receptor-ligante (D). Ponta e amostra são separadas

quando quebram-se tais ligações e o cantilever volta ao seu estado inicial. Durante o ciclo de

medida de força, a deflexão do cantilever é monitorada por um laser sendo refletido do cantilever

para um fotodetector de quadrante.

Medidas de força são tipicamente obtidas a partir de gráficos do sinal de deflexão do

cantilever (A ou V) versus distância do movimento do cantilever (m). O sinal de deflexão do

cantilever pode ser convertido na força sentida pela ponta da seguinte forma: inicialmente este é

convertido para a distância de deflexão (m) utilizando o coeficiente angular da região de contato

da curva de força (A/m ou V/m. A lei de Hook (F = -kd) é então utilizada para converter a

distância de deflexão para força (N), onde d é a distância pela qual o cantilever é defletido a partir

da sua posição de repouso, e k é a constante de mola do cantilever determinada empiricamente.

3.4 Calibração

Foi estabelecido que para medidas exatas na escala de piconewtons é essencial

experimentalmente calibrar a constante de mola do cantilever. As constantes de mola dos

cantilevers disponíveis comercialmente variam de 0.01 – 1.0 N/m. Entretanto, as constantes de

mola dadas pelo fabricante podem variar significativamente das obtidas experimentalmente45,

acentuando a necessidade de uma calibração precisa. Os métodos experimentais disponíveis

incluem a medida da variação na freqüência de ressonância devido a adição de massas

45 Cleveland, J. P., Manne, S., Bocek, D. & Hansma, P. K. (1993) “A non-destructive method for determining the spring constant of cantilevers for surface force microscopy.” - Rev. Sci. Instrum., 64, 403-405.

37

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conhecidas(tipicamente esferas de tungstênio, 10-12 Kg) à extremidade do cantilever46, a medida

da deflexão do cantilever quando pressionado contra um outro cantilever com constante de mola

conhecida47, ou alternativamente a medida do espectro de excitação térmico do cantilever48.

Florin et al., (1995)49 experimentalmente revisaram os métodos acima expostos e concluíram que

o método de excitação térmico era o método mais preciso para cantilever com k pequenas, que

são comumente utilizados em experimentos biológicos. Nesta técnica de excitação térmica, a

ponto é mantida longe da amostra de modo que o movimento experimentado por ela é devido

puramente a flutuações térmicas. Através da utilização do teorema da eqüipartição da energia é

possível determinar a constante de mola, k, a partir da medida do deslocamento quadrático médio

do cantilever:

2/12x

Tkk B

onde kB é a constante de Boltzmann, T é a temperatura (K) e <x2> é o deslocamento quadrático

médio do oscilador48.

3.5 Parâmetros Fundamentais dos Cantilevers

O objetivo de qualquer sensor é medir sinais de interesse na presença de ruído, e fazer isso

em uma escala de tempo compatível com o sinal. Além disso, o sensor não pode ser intrusivo

demais afetando o sinal ou mudando as condições ambientes. Uma grande resposta a um pequeno

46 Cappella, B. & Dietler, G. (1999) “Force-distance curves by atomic force microscopy.” - Surf. Sci. Reports, 34, 1-104. 47 Butt, H.-J., Siedle, K., Siefert, K., Fendler, K., Seeger, T., Bamberg, E., Wiesenhorn, A. L., Goldie, K. & Engel, A. (1993) “Scan speed limit in atomic force microscopy” - J. Microscopy, 69, 75-84. 48 Hutter, J. L. & Bechhoefer, J. (1993) “Calibration of atomic-force microscope tips.” - Rev. Sci. Instrum., 64, 1868-1873. 49 Florin, E. L., Rief, M., Lehmann, H., Ludwig, M., Dornmair, C., Moy, V. T. & Gaub, H. E. (1995) “Sensing specific molecular-interactions with the atomic-force microscope.” - Biosens. Bioelectron., 10, 895-901.

38

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sinal é claramente desejada e é medida como sensibilidade. Uma saída sem um sinal de entrada é

o ruído. Resolução é definida como o ruído dividido pela sensibilidade, e é uma medida do

menor sinal que se pode resolver. Deve portanto ser tão pequeno quanto possível. A janela de

freqüência que pode ser medida é a largura de banda, e está relacionada à velocidade do sensor,

bem como à taxa de amostragem e duração total da medida. Finalmente para um cantilever de

AFM, a constante de mola do cantilever determinará como ele interage com o ambiente. Estes

termos importantes serão explicados em mais detalhes a seguir:

3.5.1 Sensibilidade

Para transdutores que convertem um sinal de entrada em um sinal elétrico, a sensibilidade

determina quão grande o sinal de voltagem de saída é dada uma entrada particular. Para um

sensor de força, é portanto usualmente expressa em unidades de Volts por Newton [V/N], e para

sensores de deslocamento em Volts por metro [V/m]. Em um piezoresistor, uma mudança na

resistência é geralmente convertida em uma voltagem utilizando-se uma Ponte de Wheatstone

seguida por um amplificador de instrumentação, como mostrado na figura abaixo:

Figura 3.4 Cantilever piezoresistivo em um circuito de uma ponte de Wheatstone. O piezoresistor é metade de um divisor de tensão, de modo que quando há uma variação de resistência, a voltagem de saída varia. A outra metade da ponte é outro divisor de tensão, balanceado com um resistor variável para anular o sinal de saída quando não há deflexão do cantilever. Um amplificador de instrumentação fornece ganho.

39

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É evidente da figura que a sensibilidade pode ser feita arbitrariamente grande variando-se

o ganho do amplificador de instrumentação. Por esta razão, a sensibilidade por si só contém

pouca informação. A sensibilidade é portanto algumas vezes expressa como uma variação

fracional por sinal, tal como R/R por Newton [N-1] para a variação de resistência de um sensor

de força piezoresistivo. Este tipo de sensibilidade é freqüentemente dado em partes por milhão,

onde 10-6 N-1

é equivalente a 1 ppm/N. Enquanto sensibilidade pode ser uma métrica útil, o

parâmetro real de interesse na maioria das aplicações é a resolução. Para determinar a resolução o

ruído deve ser conhecido.

3.5.2 Largura de Banda

A janela de freqüências que é medida é conhecida como largura de banda da medida. O

limite superior pode ser selecionado através de filtros eletrônicos, ou pode ser especificado pela

taxa de amostragem da medida, pela largura de banda do amplificador, pela freqüência de

ressonância do cantilever, ou perdas capacitivas nos fios utilizados no experimento, entre outras

possibilidades. O limite inferior de freqüência da largura de banda é geralmente selecionado em

função da duração da medida, ou novamente por filtros eletrônicos. Para uma medida que dura

apenas um segundo, um sinal de 1mHz parece imutável. A resposta mecânica do cantilever é

atenuada acima da ressonância, de modo que a máxima largura de banda da medida para um

cantilever é geralmente dada pela sua freqüência de ressonância. A escolha da largura de banda

determina a fonte de ruído dominante. Se sinais de freqüência baixa são de interesse primário,

ruídos de alta freqüência podem ser eliminados através do condicionamento de sinais adequado,

para a filtragem de ruído de altas freqüências.

40

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3.5.3 Ruído

Para o circuito na Figura 3.4, ruído é qualquer tensão Vsaída que esteja presente quando

não exista força aplicada ao cantilever. Uma simples medida do ruído é tomar o quadrado do

valor Vsaída, fazer uma média no tempo, e tomar a raiz quadrada. Se este valor rms fosse por

exemplo de 1mV, então este valor seria considerado o limite inferior de sinal que pode ser

medido com aquele circuito. É geralmente interessante, entretanto, considerar a distribuição de

freqüências do ruído, obtida via transformada de Fourier do sinal de saída quando a entrada é

zero. Se existe ruído em freqüências que não são de interesse para a medida, estes podem ser

filtrados eletronicamente, efetivamente aumentando a relação sinal-ruído. Exemplos de formas de

onda simuladas em computador são mostradas a seguir:

Figura 3.5 Sinais simulados no Matlab na presença de ruído branco. a) mostra um sinal senoidal na freqüência de 10Hz, 100mV rms e largura de banda de medida de 10Khz. b) mostra a mesma forma de onda depois de aplicado um filtro passa baixa com freqüência de corte em 100Hz. c) e d) mostram a densidade espectral de potência das formas de onda (PSD).

41

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Porque o ruído total depende da largura de banda da medida, a densidade espectral de

potência (PSD) [V2/Hz] é geralmente avaliada. A PSD é uma medida da potência do sinal em

uma banda de freqüência de 1 Hz. Embora V2 não seja unidade de potência [W], é assumido ser a

potência dissipada em um resistor de 1 . Para conseguir a potência total de duas ondas senoidais

não coerentes, as amplitudes quadradas devem ser somadas. Ao somar a PSD sobre todas

freqüências na largura de banda, o ruído total pode ser computado. Como um exemplo, o ruído

branco na Figura 3.5 tem PSD de 6 10-7 V2/Hz, de modo que o ruído em largura de banda de 100

kHz tem um potência total de ruído de (6 10-7 V2/Hz )( 105 Hz)=0.06 V2 ou 240mV. Já o ruído

em uma largura de banda de 100 Hz é de (6 10-7 V2/Hz )( 102 Hz)=0.00006 V2 ou 8 mV. Além de

simplesmente filtrar uma forma de onda para remover ruídos, é muitas vezes necessário a

utilização de um amplificador lock-in. Um amplificador lock-in multiplica o sinal de entrada por

uma onda senoidal de referência. Considere uma componente senoidal do sinal (após uma

decomposição de Fourier) com amplitude A1 em uma freqüência 1 . Se o sinal de referência do

lock-in tivesse amplitude unitária e freqüência 0 , então o sinal de saída seria dado

])sin[(2

])sin[(2

)sin()sin( 101

101

011 tA

tA

ttA 3.1

Metade da potência das componentes de freqüência do sinal próximas a 0 serão

deslocadas para DC, e a outra metade para 2 0 . Os componentes DC podem então ser filtradas

com um filtro passa baixa de largura de banda B. Isto é equivalente a ter um filtro passa banda de

largura de banda ±B centrado na freqüência 0 .

Esta técnica também é utilizada nos amp-ops modulados ou “chopped” para contornar o

problema dos ruídos de baixa freqüência (1/f). No entanto, modular um sinal para remover ruído

é possível apenas se a freqüência do sinal puder ser alterada antes da introdução do ruído. Como

42

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um exemplo, o ruído devido à deriva térmica da resistência de um piezoresistor não pode ser

removido por modulação, pois o ruído da deriva é introduzido no mesmo ponto e ao mesmo

tempo em que o sinal, e os dois não podem ser separados.

3.5.4 Resolução

A resolução do sensor determina a mínima força ou deslocamento que pode ser medido.

Resolução é definida como o ruído dividido pela sensibilidade. A quantidade total de ruído é

dependente da largura de banda da medida. Assim, resolução deve ser dada como a mínima força

ou deslocamento detectável em uma dada largura de banda. Ela é freqüentemente dada em

unidades de N/ Hz ou m/ Hz para medidas em uma largura de banda de 1Hz. Se o ruído é

constante em função da freqüência, tal medida é suficiente para computar a resolução em

qualquer largura de banda. Se o nível de ruído varia irregularmente com a freqüência, então a

resolução deve ser dada para a largura de banda relevante, como 10pN em uma largura de banda

de 10 Hz a 1 kHz.

3.5.5 Constante de mola

A constante de mola, k [N/m], de um cantilever também é critica para desempenho do

sensor. Quanto maior a constante de mola de um cantilever melhor sua sensibilidade para

deslocamento, e quanto menor melhor sua sensibilidade para força.

43

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Capítulo 4. Calibração da pinça com AFM

Este capítulo trata dos ítens fundamentais para detecção e calibração da deflexão do feixe

laser refletido do cantilever. A Figura 4.1 ilustra a configuração proposta para a calibração da

força óptica utilizando um cantilever de AFM.

Figura 4.1 Calibração da força óptica com cantilever de AFM. O feixe laser é focado no cantilever em contato com a esfera aprisionada pela força óptica e refletido para o fotodetector bi-célula. À medida que o cantilever é deslocado em direção a esfera aprisionada pela luz, desloca a mesma da sua posição de equilíbrio.

Para tanto, precisáva-se inicialmente de uma curva de calibração para o cantilever, ou

seja, do sinal obtido pelo fotodetector, V(x) em função do deslocamento horizontal sofrido pela

extremidade do cantilever, x. Convertendo então esta curva para V(F) através da relação F=kx, a

força óptica seria calibrada utilizando um sistema de imagem. A primeira tarefa foi focar o feixe

laser na região maciça do cantilever que tem da ordem de 20μm2.

4.1 Focalização do Feixe Laser no Cantilever

A figura abaixo mostra a montagem experimental utilizada para o estudo das diversas

partes do sistema de detecção óptica da deflexão do cantilever:

44

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Figura 4.2 Montagem experimental utilizada para o estudo do sistema de detecção óptico da deflexão do cantilever. Da direita para a esquerda: Laser, chopper, beam expander, pinhole, filtros de atenuação, suporte da objetiva e microscópio convencional.

As figuras abaixo mostram a geometria, as dimensões e as propriedades mecânicas dos

cantilevers utilizados:

Figura 4.3 Cantilever de AFM Figura 4.4 Dimensões do chip, dos cantilevers e do tip

45

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Figura 4.5 Propriedades mecânicas e dimensões típicas de cantilevers de AFM comerciais para o modo de contato.

Como utilizamos um laser de HeNe, cujo modo TEM00 é um feixe gaussiano, foi necessário

um estudo sobre a óptica dos feixes gaussianos para que pudéssemos focá-lo na região do

cantilever específica para este fim.

4.1.1 O Feixe Gaussiano

Ondas cujas normais às suas frentes de onda são raios paraxiais são chamadas ondas

paraxiais. Uma maneira de construir uma onda paraxial é começar com uma onda plana

, considerá-la como uma onda portadora e modificar seu envelope constante A,

fazendo-o variar lentamente com a posição na direção z, de modo que a amplitude da onda seja

dada por:

)exp(ikzA

)exp()()( ikzrArU

4.1

e com a restrição de que AA dentro da distância de um comprimento de onda k

2 .

Assim :

z

rAk

z

rAkA

z

rAA

z

rA

)()()()(2

2

Para que esta onda satisfaça a equação de Helmholtz, A deve satisfazer a seguinte

equação:

46

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0202

2222

z

A

z

AkiAUkU T , onde

2

2

2

22

yxT

é o operador Laplaciano

transversal. Levando em conta a restrição de onda paraxial, o último termo desta equação pode

ser desprezado se comparado ao segundo termo, restando então:

022

z

AkiAT 4.2

Esta é a equação de Helmholtz paraxial. A solução mais simples desta equação resulta em uma

onda paraboloidal para U(r), que é a aproximação paraxial da onda esférica:

)(

22

11

]2

exp[]exp[

]exp[

rA

zz

yxikA

ikzr

ikrA

, se 222 zyx

Uma outra solução da equação paraxial de Helmholtz fornece o feixe Gaussiano. É obtida a partir

do envelope da onda paraboloidal por uma simples transformação, ( z0 é conhecido

como parâmetro Rayleigh):

0izzz

0

0

22

1 ])(2

exp[

)(izz

izz

yxikA

rA

4.3

Para separar a amplitude e a fase deste envelope complexo, escrevemos a função 0

1

izz

em termos de sua parte real e parte imaginária e definimos duas novas funções reais, R(z) e W(z)

tais que:

)()(

1122

02

020

20 zW

izRzz

zi

zz

z

izz

2

01)(z

zzzR e

212

1

00

2

00 ,1)(

z

Wz

zWzW 4.4

47

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A amplitude complexa do feixe gaussiano é dada em termos destas novas variáveis por:

)exp()()( ikzrArU

)exp()()(

1

2exp

0

2

2

1

ikzizz

zWi

zRikA

)exp()()(

1

2exp

0

2

2

1

ikzizz

zWi

zRikA

que ainda pode ser manipulada para:

)(2))((exp

)(exp

)()(

2

2

20

0 zRikzkzi

zWzW

WArU

4.5

onde 0

10 iz

AA e

0

1tan)(z

zz

A seguir algumas propriedades importantes do feixe gaussiano:

4.1.1.1 Intensidade

A intensidade de um feixe gaussiano é dada por:

)(

2exp

)(),()()(

2

22

00

2

zWzW

WIzIrUrI

4.6

Figura 4.6 Perfil de intensidade de um feixe gaussiano para um dado z.

48

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4.1.1.2 Raio do Feixe

Em qualquer plano transverso, a intensidade assume seu valor de pico no eixo do feixe, e

cai por um fator de 1/e2 na distância radial )(zW . Como 86% da potência do feixe está

concentrada dentro de um círculo de raio W(z), este é considerado o raio do feixe. A dependência

em z do raio do feixe é dada por:

212

1

00

2

00 ,1)(

z

Wz

zWzW 4.7

Este assume seu valor mínimo W0 no plano z=0, chamado beam waist. O diâmetro do waist, 2W0

é chamado spot size. Para z>>z0 :

zz

zWzW 0

00)(

4.8

onde 0

0 W

Figura 4.7 O raio do feixe tem o seu valor mínimo em )(zW 0W 0z , alcança 02W em 0zz e

aumente linearmente a medida em que aumenta. z

4.1.1.3 Profundidade de Foco

A distância axial dentro da qual o raio do feixe é menor ou igual a 02W é conhecido como

profundidade de foco ou parâmetro confocal. Pode ser visto da equação para o raio do feixe que o

parâmetro confocal é duas vezes o alcance Rayleigh, 2z0, e da equação para W0 obtemos:

49

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2

00

22

Wz

Figura 4.8 A profundidade do foco de um feixe gaussiano

4.1.1.4 Transmissão através de uma lente

A fase introduzida em um feixe que passa por uma lente de distância focal f é dada por:

)2

exp(2

f

ki

4.9

Assim a fase do feixe gaussiano que chega a uma lente com largura W e raio de curvatura R, após

passar pela lente é alterada para:

'222

222

Rkkz

fk

Rkkz , onde

fRR

11

'

1 4.10

Figura 4.9 Transmissão de um feixe gaussiano através de uma lente fina

Concluímos que a onda transmitida é ainda um feixe gaussiano com largura W’=W a raio

de curvatura R’, onde R’ satisfaz a equação fRR

1

'

11 . Além disso, como os parâmetros de um

50

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feixe gaussiano podem ser determinados a partir de sua largura e de sua curvatura em um

determinado ponto, obtemos o novo raio mínimo W0’ e a nova posição do waist :

21

220)'/(1

'RW

WW

e

22 )/'(1

''

WR

Rz

4.11

Substituindo agora

2

01)(z

zzzR e

21

2

00 1)(

z

zWzW nas três equações acima, as

seguintes expressões que relacionam os parâmetros dos dois feixes são obtidas:

Raio do waist 00 ' MWW

Localização do waist )()'( 2 fzMfz

Profundidade de Foco )2('2 02

0 zMz

Magnificação 2

121 r

MM r

,

fz

fM r

, fz

zr

0

Se uma lente é colocada no waist de um feixe gaussiano, como mostra a figura abaixo, os

parâmetros do novo feixe gaussiano são obtidos substituindo-se z=0 nas equações acima:

Figura 4.10 Focando um feixe com waist na lente

51

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21

20

0)/(1

'fz

W

0W e

2

0

1

'

z

f

fz

Quando o parâmetro de Rayleigh z0 é muito maior que a distancia focal da lente, como mostra a

Figura 4.11, podemos aproximar as expressões acima por:

21

20

0)/(1

'fz

W

0W e

2

0

1

'

z

f

fz 4.12

Figura 4.11 Focando um feixe colimado.

Estas foram as expressões que utilizamos para o cálculo do spot size, já que o parâmetro

confocal do laser utilizado é da ordem de 1 metro, enquanto a distância focal da lente utilizada é

da ordem de 10 cm.

Devido às correções para as aberrações esféricas preferimos utilizar uma objetiva de

microscópio, com aumento de 4x, para focalizar o feixe laser. Para estimarmos a distância focal.

utilizamos o fato de que eram objetivas projetadas para um tubo de microscópio com

comprimento de 160mm. Com a ajuda das figuras abaixo obtemos:

52

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Figura 4.12 Esquema de uma objetiva de microscópio.

Figura 4.13 Planos conjugados em um microscópio óptico

Da Figura 4.12 por semelhança de triângulos temos:

h

hmonde

m

xf

h

f

h

x ',

'

'

'

E da Figura 4.13 temos que o comprimento do tubo é igual a x’. Então, como neste caso

e , . Utilizando a equação mmx 160' 4m mmf 40 4.12 obtemos o tamanho do spot size. O

diâmetro inicial do feixe utilizado é de mmw 8.02 . Assim encontramos para o raio do waist do

novo feixe:

mmm

mmnm

w

fw

204.0

408,6320 mw 402 0

53

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Este valor de spot size ainda era grande comparado as dimensões do cantilever utilizado, com

largura dos braços de m18 . Assim foi necessário expandir o feixe. Utilizamos um beam

expander com aumento de 10x para tanto:

11

22 W

f

fW

Figura 4.14. Esquema ilustrando um beam expander Figura 4.15 Beam Expander de 10x utilizado

Com a expansão do feixe obtivemos um spot size 10 vezes menor, aproximadamente de

m4 de diâmetro, compatível com as dimensões do cantilever utilizado.

A seguir imagens feitas por um microscópio convencional durante a focalização do feixe

laser no cantilever.

Figura 4.16 Cantilever visto lateralmente na tela da TV após aumento de 100x do microscópio

Figura 4.17 Visualização do feixe laser sendo focado no cantilever

54

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Figura 4.18 Detalhe da focalização do feixe laser pela objetiva(da horizontal) no cantilever

4.2 Deflexão do Cantilever ─ Picomotor

Precisávamos defletir o cantilever com precisão de nanômetros. Utilizamos um picomotor

(Newfocus) controlado por computador e com resolução melhor que 30 nm. Foi construído um

software em LabView para o controle e para a calibração deste pico motor.

55

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Figura 4.19 Picomotor, controlado por computador, utilizado para defletir o cantilever

Figura 4.20 Peça construída para isolar o movimento translacional do movimento rotacional do picomotor.

Abaixo a imagem vista no monitor do computador do painel de controle do VI(Virtual

Instrument) construído em LabView para o controle e a calibração do picomotor:

4.2.1 Calibração do picomotor

A Calibração do picomotor foi feita da seguinte maneira: Com a ajuda de uma câmara de

Neubauer, de um microscópio e uma câmara de vídeo acoplada ao microscópio, calibramos na

tela de uma TV a distância de m50 . Após, colocamos um corante na superfície interna de uma

cubeta de acrílico e focalizamos uma das partículas deste corante para que servisse de referência

56

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na tela da TV quando a cubeta fosse empurrada pelo picomotor. Este foi controlado via software,

que manda uma determinada quantia de pulsos a uma determinada freqüência para o picomotor.

Então, após um determinado número de pulsos que permitia uma destas partículas cruzar

completamente a distância calibrada na tela da TV, obtivemos uma calibração do deslocamento

do picomotor para cada pulso de tensão recebido de pulsonm /220 .

4.2.2 Calibração do cantilever com o picomotor

A Figura 4.21 mostra o a configuração utilizada na calibração do sinal da fotodetector com

a utilização do picomotor.

Figura 4.21 Esquema da calibração da deflexão do cantilever com o picomotor

O cantilever foi colocado em um suporte com ajustes x, y e z sobre o microscópio e em

contato com o picomotor. Este então empurrava o cantilever com pulsos controlados enquanto o

fotodetector registrava o sinal V(x). A partir desta curva obtêm-se a sensibilidade S do sensor

que, juntamente com o ruído do sistema possibilitava a determinação da mínima deflexão

57

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detectável, xmin (MDD). Com este parâmetro determina-se a mínima força detectável ou a

resolução de força do sistema, Fmin.

4.3 Fotodetector “Bi-Cell”

A seguir as principais características do fotodetector utilizado nos experimentos ornecido

pelo fabricante50.

4.3.1 Princípio de funcionamento

O Silício é um semicondutor com um gap de energia de 1.12 eV a temperatura ambiente.

Este é o gap entre a banda de valência e a banda de condução. Os elétrons podem saltar para a

banda de condução por colisões com partículas ou fótons com energias maiores que 1.12eV, que

correspondem a comprimentos de onda menores que 1100 nm. Os elétrons resultantes na banda

de condução são livres para conduzir corrente elétrica.

Devido ao gradiente de concentração, a difusão dos elétrons da região tipo N para a região

tipo P e a difusão de buracos da região tipo P para a região tipo N, geram um voltagem interna

através da junção. A inter-difusão de elétrons e buracos entre as regiões N e P através da junção

resulta em uma região ausente de portadores que é chamada região de depleção. Qualquer

polarização reversa aplicada se soma a voltagem inerna e alarga esta região. Os pares electron-

buraco gerados pela luz são varridos para fora da região de depleção por deriva e são coletados

por difusão da região não depletada. A corrente gerada é proporcional potência da radiação

incidente. A luz é absorvida exponencialmente com a distância e é proporcional ao coeficiente de

absorção. O coeficinete de absorção é muito alto para comprimrntos de onda curtos na região do

50 “Photodiode Characteristics and Applications”- UDT Sensor, Inc. – www.udt.com

58

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UV e é pequeno para grandes coprimentos de onda. Daí, fotons na região do UV são absorvidos

em uma fina camada da superfície mais externa, enquanto o silício se torna transparente para

comprimentos de onda maiores que 1200nm. Além disso, fótons com energia menores que o

band gap do silício não são absorvido de maneira alguma.

As figuras abaixo ilustram detalhes do fotodetector utilizado:

Figura 4.22 Construção de um fotodiodo de Si por difusão planar

Figura 4.23 Circuito equivalente de um fotodiodo. RSH é a resistência de shunt, RL é a carga vista pelo fotodiodo, CJ é a capacitância de junção e IP é a fotocorrente e ID é a corrente de escuro

Figura 4.24 Vista esquemática e dimensões do fotodiodo utilizado (em polegadas)

59

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4.3.2 Resistência Shunt, RSH

A Resistência Shunt é a inclinação da curva corrente-voltagem do fotodiodo na origem,

i.e. V=0. Embora um fotodiodo ideal deva ter resistência shunt infinita, os valores reais variam de

dezenas a milhares de Mega ohms. É usada na determinação da corrente de ruído do fotodiodo no

modo fotovoltaico (não polarizado). Para uma melhor performance do fotodiodo uma maior

resistência shunt é desejada.

4.3.3 Resistência Série, RS

A Resistência Série de um fotodiodo vem da resistência dos contatos e da resistência do

silício que não está em depleção. É dado por:

CdS

s RA

WWR

)( 4.13

onde WS é a espessura do substrato, Wd é a largura da região de depleção, A é a área difundida da

junção, é a resistividade do substrato e RC é a resistência do contato. É usada para determinar

a linearidade do fotodiodo no modo fotovoltaico (V=0). Embora fotodiodos ideais devam ter

resistência série nula, valores típicos variam de 10 a 1000 ohms.

4.3.4 Capacitância de Junção, CJ

As fronteiras da região de depleção agem como placas de um capacitor de placas

paralelas. A capacitância de junção é diretamente proporcional à área difundida e inversamente

proporcional a largura da região de depleção. Além disso, substratos com maior resistividade têm

menores CJ. É dependente da polarização reversa de acordo com:

60

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)(20

iA

Sij

VV

AC

4.14

onde ε0 é a permissividade do vácuo, εSi é a constante dielétrica do silício, µ é a mobilidade dos

elétrons, ρ é a resistividade do silício, Vi é a voltagem intrínseca do silício e VA é a voltagem

aplicada. CJ é utilizada na determinação da velocidade de resposta do fotodiodo.

4.3.5 Responsividade, Rλ

A responsividade de um fotodiodo de Si é uma medida de sua sensibilidade à luz, e é

definida como a razão da fotocorrente IP com a potência da luz incidente P em um dado

comprimento de onda (λ):

Figura 4.25 Responsividade do fotodetector utilizado (dado pelo fabricante)

P

IR P

61

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4.3.6 Curva Característica I-V

A curva corrente-voltagem característica de um fotodiodo sem nenhuma luz incidente é

similar a de um diodo retificador. Quando o fotodiodo é diretamente polarizado, existe um

aumento exponencial na corrente. Quando uma polarização reversa é aplicada, uma pequena

corrente de saturação ISAT aparece. Ela está relacionada com a corrente de escuro ID por:

)1( Tk

qV

SATDB

A

eII

onde q é a carga do elétron, VA é a voltagem aplicada de polarização, kB é a constante de

Boltzmann e T é a temperatura absoluta.

Figura 4.26 Curvas I-V características para três potências de luz incidente

Iluminando o fotodiodo com radiação óptica, desloca-se a curva I-V de uma quantidade igual a

fotocorrente IP:

PTk

qV

SATTOTAL IeII B

A

)1(

62

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4.3.7 Ruídos

Em um fotodiodo, duas fontes de ruído podem ser identificadas: Shot noise e Johnson

noise:

4.3.7.1 Ruído Shot

O ruído shot está relacionado a flutuações estatísticas em ambas – fotocorrente e corrente de

escuro. A magnitude do ruído shot é expressa como o valor rms da corrente shot noise Isn :

fIIqI Dpsn )(2

onde q é a carga do elétron, IP é a fotocorrente gerada, ID é a corrente de escuro e Δf é a largura

de banda de medida do ruído. Shot noise é a fonte de ruído dominante quando o modo de

operação é fotocondutivo (polarizado).

4.3.7.2 Ruído Johnson ou Térmico

A resistência shunt em um fotodetector tem um ruído Johnson associado a ela. Isto se

deve a geração térmica de portadores. A magnitude desta corrente de ruído gerada é dada por:

SH

Bjn R

fTkI

4

onde KB é a constante de Boltzmann, T é a temperatura absoluta, RSH é a resistência shunt do

fotodiodo e Δf é a largura de banda de medida do ruído. Este tipo de ruído é o dominante no

modo de operação fotovoltaico (não polarizado).

63

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4.3.7.3 Ruído Total

A corrente total de ruído gerada em um fotodetector é dada por:

22jnsntn III

4.3.8 Potência Equivalente de Ruído (NEP)

Potência equivalente de ruído é a quantidade de potência de luz incidente em um fotodetector,

que gera uma fotocorrente igual à corrente total de ruído Itn. NEP é definida como:

R

INEP tn

4.3.9 Polarização

Um sinal de fotodiodo pode ser medido como voltagem ou corrente. Medidas de corrente

demonstram de longe melhor linearidade, offset, e performance de largura de banda. A

fotocorrente gerada é proporcional à potência da luz incidente e deve ser convertida para

voltagem usando uma configuração de transimpedância. O fotodiodo pode ser operado com ou

sem uma polarização reversa aplicada, dependendo das necessidades específicas de cada

aplicação. Eles são conhecidos como modo “fotocondutivo” (polarizado) e modo “fotovoltaico”

(não polarizado).

4.3.9.1 Modo Fotocondutivo

A aplicação de uma polarização reversa (i.e. catodo positivo, anodo negativo) pode aumentar

enormemente a velocidade de resposta e a linearidade destes instrumentos. Isto se deve ao

aumento na largura da região de depleção e conseqüentemente ao decréscimo na capacitância de

junção. Aplicar uma polarização reversa, entretanto, aumentará as correntes de escuro e de ruído.

64

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4.3.9.2 Modo Fotovoltaico

O modo fotovoltaico de operação é preferido quando o fotodiodo é usado em aplicações

de baixa freqüência (até 350 kHz), e por isso foi o modo em que o utilizamos. Também é

indicado para aplicações com níveis de luz ultrabaixos. Além de oferecer uma simples

configuração operacional, as fotocorrentes neste modo apresentam menos variações na

responsividade em função da temperatura.

4.4 Condicionamento de sinais para o fotodetector

Abaixo a figura 23 ilustra o circuito construído para o condicionamento de sinais do fotodiodo:

Figura 4.27 Circuito construído para a utilização do fotodiodo Figura 4.28 Amplificador OPA37 ultralow noise utilizado no circuito ao lado

O primeiro estágio é um amplificador de transimpedância que tem por objetivo tornar a

impedância vista pelo fotodetector a menor possível, já que este funciona de modo análogo a uma

fonte de corrente, convertendo a corrente gerada no fotodetector em tensão. O segundo estágio é

65

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um amplificador de diferenças que é responsável pela subtração dos sinais fornecidos por cada

elemento do fotodiodo anteriormente convertidos em tensão pelo primeiro estágio.

4.4.1 Amplificador deTransimpedância

Uma das característica principais dos amplificadores operacionais é o elevado ganho.

Assim, mantendo a entrada positiva aterrada, qualquer diferença de potencial positiva na entrada

inversora de um amplificador causa um grande sinal de saída negativo. Colocando um resistor de

feedback, RF, da saída para a entrada negativa, ou seja, fazendo uma realimentação negativa,

drenamos o potencial da entrada inversora através de RF para a saída, Vo. No caso ideal de ganho

infinito(amplificador ideal), toda corrente chegando a entrada inversora será forçada pelo

amplificador a passar através de RF, para manter o potencial da entrada inversora próximo de

zero, igual ao da entrada não inversora mantendo assim Vo com um valor finito. Vo é portanto

dada por:

PF IRV 0

Figura 4.29 Amplificador de transimpedância

Vale notar que a impedância de entrada deste amplificador é idealmente zero,

característica muito desejável para maximizar a velocidade de resposta de componentes que

66

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apresentam capacitâncias internas como os fotodiodos. Além disso o ganho pode ser feito

arbitrariamente grande através da escolha de RF apropriado sem prejuizos na velocidade de

resposta.

4.4.2 Amplificador de Subtração

A Figura 4.30 mostra a configuração utilizada para subtrair dois sinais V1 e V2:

Figura 4.30 Amplicador subtrador

Utilizando o modelo do ampop ideal podemos chegar a função de transferência deste

circuito facilmente:

VVAVo e como

22V

V e 22

111

oo VVR

R

VVVV

segue

22

122

1212 VVA

AV

VVVAV o

oo e no limite de A

12 VVVo

67

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Inicialmente o circuito eletrônico construído para o condicionamento do sinal do

fotodetector foi montado em um protoboard, com amplificadores de uso geral (LM741) e com

resistores comuns com precisão de 5%. Tais amplificadores aumentavam os ruídos do nosso

sistema de medidas. Como desejávamos obter a melhor a resolução com o fotodetector e

conseqüentemente diminuir os ruídos da eletrônica, adquirimos amplificadores ultralow noise

(OPA37) para a substituição dos comuns, cuja principal diferença está nas tensões e correntes de

ruído intrínsecas e na corrente de polarização de entrada que em amplificadores operacionais

construídos a base de transistores de efeito de campo (Fet) é da ordem de 1000 vezes menor que a

corrente de polarização de amplificadores operacionais a base de transistor bipolar de junção

(Bjt) como os LM741.

Figura 4.31 Fotodetector e eletrônica para o condicionamento do sinal configurados para fácil utilização

68

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Substituímos os resistores comuns por resistores de precisão (1%) para uma maior

linearidade e rejeição de modo comum do nosso sinal, e também alimentamos os amplificadores

com baterias para minimizar ruídos. Foram acrescentados ainda capacitores para a estabilidade

dos OpAmps OPA 37, pois estes não são compensados internamente para estabilidade em

freqüência como o LM741.

Figura 4.32 Fotodetector e suporte com regulagem.

Figura 4.33 Saída BNC do sinal proporcional a diferença das fotocorrentes e conector para o fotodetector.

Figura 4.34 Eletrônica para o condicionamento do sinal (internamente). Baterias alimentam o circuito para minimizar ruídos.

O sinal era então levado diretamente da saída BNC do módulo na Figura 4.33 a um lock-in para aquisição e filtragem de ruídos.

69

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4.5 Resultados Obtidos

A figura abaixo é a imagem vista no monitor do computador do VI construído para o

controle e a aquisição de dados do experimento de detecção óptica da deflexão do cantilever,

utilizando um fotodetector e um picomotor. Isto foi possível graças à facilidade que o Lock-in

utilizado (SR833) oferecia de comunicação via GPIB.

Figura 4.35 VI construído em LabView para controle e aquisição de dados durante o experimento. O gráfico da esquerda representa a variação da intensidade do sinal detectado pelo lock-in (R) à medida que o picomotor empurra o cantilever. O gráfico da direita representa a variação da fase do sinal de entrada com relação ao sinal de referência

O lock-in dava apenas o módulo do sinal fornecido pela eletrônica, gerando uma figura

simétrica em forma de V no gráfico a esquerda da Figura 4.35. A medida em que a haste

empurrada pelo picomotor se aproximava do cantilever de AFM, este sentia uma atração pela

70

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mesma devido a forças de van der Waals e sofria um deslocamento da sua posição de equilíbrio

defletindo o feixe laser. Após mais alguns passos do picomotor o cantilever passava pela sua

posição de equilíbrio e logo após invertia o sentido da deflexão inicial. Então o sinal fornecido

pelo circuito ao lock-in, que é proporcional à subtração das intensidades que chegam em cada

elemento do fotodiodo, começa a diminuir, passando por um mínimo e voltando novamente a

aumentar com a mesma inclinação. Selecionamos a região à direita do mínimo do melhor

conjunto de dados obtido para realizarmos uma regressão linear com o objetivo de obter a

sensibilidade do fotodetector para este sistema:

0,00E+00

5,00E-05

1,00E-04

1,50E-04

2,00E-04

2,50E-04

3,00E-04

3,50E-04

2400 2600 2800 3000 3200

Distancia (nm)

Sig

nal

(V

)

Figura 4.36 Pontos selecionados para a realização da regressão linear.

A partir destes dados, após um tratamento estatístico, obtivemos a sensibilidade para o nosso

sistema de detecção óptica da deflexão do cantilever de 2,7 10-7 V/nm. Obtivemos também o

mínimo deslocamento e a mínima força detectável com este sistema: 1nm e 10pN

respectivamente, este último considerando uma constante de mola de 0,01N/m. Assim, com este

71

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sistema seria possível calibrar as forças ópticas na faixa de 10-100pN, não fosse o fato de que era

necessário ainda resolver o problema de detecção da deflexão do feixe laser refletido do

cantilever dentro da câmara com a solução de esferas dielétricas. As dificuldades relacionadas a

este fato motivaram a busca de uma outra solução.

72

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Capítulo 5. Piezoresistores

A variação de resistência de um condutor metálico quando sujeito a uma deformação

mecânica foi pela primeira vez observada por Lord Kelvin em 185651. O valor da resistência R de

um bloco de material pode ser definida em termos de sua resistividade ρ e suas dimensões pela

seguinte equação:

WH

LR

onde L é o comprimento, W é a largura e H é a altura de um material isotrópico.

Um fio esticado fica mais longo e fino, o que aumenta sua resistência devido à alteração

em sua geometria apenas. Qualquer material pode sofrer uma alteração na resistência devido a

alterações geométricas apenas, mas o termo piezoresistivo refere-se especificamente a alterações

na resistividade do material devido a tensões em semicondutores. As propriedades elétricas de

alguns semicondutores dopados respondem a tensões com variações de resistência cem vezes

maior do que aquela atribuída apenas à geometria.

Piezoresistores em silício são criados pela introdução de átomos dopantes para a criação

de portadores de carga. Quando o silício experimenta pressão / tensão e, portanto se comprime /

expande, o espaçamento entre os átomos da rede varia, afetando o gap de energia da banda. Esta

variação também aumenta ou diminui o número de portadores disponíveis na região dopada, que

é medida como uma variação na resistência52, pois a resistividade depende da concentração de

elétrons excitados n e buracos p nas bandas e também de suas mobilidades:

51W. Thomson (Lord Kelvin), "On the electrodynamic qualities of metals", Proc. Royal Society, pp 546-550, 1857 52 F. J. Giessibl and B. M. Trafas, "Piezoresistive cantilevers utilized for scanning tunneling and scanning force microscope in ultrahigh vacuum." Rev. Sci. Inst., vol. 65, no. 6, pp. 1923-1929, 1994.

73

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)(

1

pn pnq

5.1

onde q é a carga unitária, n e p são as concentrações dos elétrons e buracos, e μn e μp são as

mobilidades do elétron e do buraco respectivamente.

O primeiro cantilever de AFM foi criado na Universidade de Stanford por Marco

Tortonese em 199153. Ao implantar boro, um caminho condutor foi criado na superfície de um

cantilever de silício. Com uma voltagem aplicada a corrente flui por um braço e retorna pelo

outro como ilustrado pela Figura 5.1:

Figura 5.1. Esquema de um cantilever piezoresistivo. A camada superior conduz devido a estar dopada com boro. Aplicar uma tensão nos contatos gera um fluxo de corrente saindo de um terminal em direção ao outro, contornando a separação física existente entre cada braço do cantilever.

Com uma deflexão vertical e para baixo do cantilever, a tensão criada na camada superior resulta

em um aumento da resistência e, ao contrário, se o cantilever sofre uma deflexão vertical para

cima, a pressão criada na camada superior resulta em uma diminuição da resistência. Assim a

deflexão pode ser medida como uma variação de resistência do cantilever e para isto comumente

utiliza-se uma ponte de Wheatstone com alimentação DC:

53 M. Tortonese, H. Yamada, R. C. Barrett, and C. F. Quate, "Atomic force microscopy using a piezoresistive cantilever." Transducers 97. 1997 International Conference on Solid-State Sensors and Actuators, pp. 448-451, 1991.

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Figura 5.2 Esquema de detecção da deflexão de um cantilever de AFM piezoresistivo.

É fácil notar que este tipo de detector de força é ideal para a solução do nosso problema,

já que poderia facilmente ser posicionado dentro do câmara com a solução das partículas a serem

pinçadas para uma calibração da força óptica em um microscópio invertido.

O efeito piezoresistivo no silício tem uma natureza anisotrópica e pode ser descrito

utilizando um tratamento tensorial.

5.1.1 Tensor Piezoresistivo

O tensor de piezoresistividade caracteriza a variação na resistividade do material sujeito a

uma tensão. Este tensor é encontrado na teoria da condução da carga elétrica em um condutor

ôhmico anisotrópico. A relação linear mais geral relacionando campo elétrico E e densidade de

corrente J é:

jiji JE

Onde ρij são os componentes da tensor de resistividade e a convenção de Einstein é utilizada. Os

subscritos j e i estão relacionados à direção da densidade de corrente e campo elétrico,

respectivamente. Em geral, os subscritos 1,2 e 3são usados para representar as componentes x, y,

e z dos vetores num sistema de coordenadas cartesiano. A resistividade de um cristal

semicondutor não tencionado é um escalar, ou seja, ρ11=ρ22=ρ33=ρ e as outras componentes são

zero. Quando este semicondutor é mecanicamente tencionado, sua simetria cúbica é quebrada e a

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resistividade não é mais isotrópica54. Assim, J não é paralela a E e ρij para i≠j pode não ser mais

zero.

A piezoresistência de um material é freqüentemente representada por um conjunto de

constantes empíricas: os coeficientes piezoresistivos. A variação relativa em ρij até a segunda

ordem na tensão é dada por:

)( 30

Omnklijklmnklijklij

onde ρ0 é a resistividade para o material não tencionado, σkl e σmn são tensores de tensão de

segunda ordem, πijkl e πijklmn são os coeficientes piezoresistivos de primeira e segunda ordem

respectivamente e O(σ3) é o termo dependente da tensão de ordem superior que geralmente pode

ser desprezado.

5.1.2 Coeficientes Piezoresistivos

A simetria da estrutura do diamante reduz o número de coeficientes piezoresistivos de

primeira ordem a 3 e o número dos de segunda ordem a 9. Geralmente, uma convenção de

contração é usada para reduzir a complexidade da legenda dos índices através de um esquema de

renumeração usando uma notação de 6 componentes. (sufixos mudam de 11, 22, 33, 23, 13 e 12

para 1, 2, 3, 4, 5 e 6 respectivamente). Tabela 3.1 mostra os três coeficientes de

piezoresistividade de primeira ordem (FOPR) e os nove coeficientes de segunda ordem (SOPR)

e seus correspondentes55:

54 C.S. Smith, "Macroscopic symmetry and properties of crystals", in F. Seitz and D. Turnbull (ed.), Solid State Physics, Vol. 6, Academic Press, New York, pp.175-249, 1958. 55 K. Matsuda, K. Suzuki, K. Yamamura, and Y. Kanda, "Nonlinear piezoresistive coeficients in silicon", J. Appl. Phys., 73, 1838-1847, 1993.

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Tabela 5.1 Coeficientes independentes de primeira e segunda ordem de um cristal cúbico

A dependência dos coeficientes piezoresistivos com relação à concentração de impurezas

para diferentes temperaturas foi estudada por Kanda56. Em concentrações de dopagem abaixo de

1018 cm-3 os coeficientes piezoresistivos dependem fortemente da temperatura. Entre -50 °C e

+150 °C para ambos materiais tipo p ou n, os coeficientes de primeira ordem diminuem com o

aumento da temperatura por aproximadamente:

CTijkl

ijkl

/1031 3

5.2 Ruídos nos Piezoresistores

Sensores piezoresistivos têm duas principais fontes de ruído, ambos distinguíveis facilmente em

um espectro de ruído vs Freqüência, como mostrado na Figura 5.3. Em baixas freqüências, todos

resistores sofrem de flutuações na condutância, geralmente chamadas ruído 1/f porque a

densidade de potência deste ruído (PSD) [V2/Hz] tem esta dependência com a freqüência. Além

deste, existe o ruído Johnson que é independente da freqüência e aparece no espectro de

56 Y. Kanda, "Piezoresistance effect of silicon." Sensors and Actuators A, vol. 28, pp. 83-91, 1991.

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freqüência como uma linha horizontal. A origem do ruído Johnson é bem entendida e se dá

devido à geração térmica de portadores no resistor57 A origem do ruído 1/f, por outro lado, é

ainda uma área de pesquisa ativa.

.

Figura 5.3 Típico espectro de ruído de um cantilever piezoresistivo mostrando ruídos Johnson e 1/f.58

5.2.1 Ruído Johnson

O ruído Johnson de um piezoresistor é um limite fundamental, dado pela energia térmica

dos portadores em um resistor, e depende apenas da resistência, R e temperatura, T. É um

ruído branco, independente da freqüência. A densidade espectral de potência deste ruído,

SJ (unidades de [V2/Hz]) em uma dada largura de banda, de fmin a fmax é dada por:

)(4 minmax ffTRkS BJ 5.2

57 H. Nyquist, "Thermal Agitation of Electric Charge in Conductors." Phys. Rev., vol. 32, pp. 110-113, 1928. 58 Harley, J. A. and Kenny, T. W., “High-sensitivity piezoresistive cantilevers under 1000 Å thick” - Applied Physics Letters Volume 75, Number 2 - 12 July 1999

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5.2.2 Ruído 1/f

Em 1969, F. N. Hooge publicou a observação empírica de que a densidade espectral do

ruído 1/f (unidades de [V2/Hz]) de um resistor homogêneo é dependente do número total de

portadores no resistor de acordo com a equação:

Nf

VS B

H

2 5.3

Onde VB é a tensão de polarização através do resistor com um número total de carregadores N, f é

a freqüência e é um parâmetro adimensional. Se a equação acima é integrada de fmin a fmax,

então tensão de ruído nesta largura de banda é dada por:

min

max2

2 lnf

f

N

VV B

H

5.4

Note que para qualquer década de freqüência, o ruído integrado é constante. O ruído total entre 1

Hz e 10 Hz é o mesmo que entre 1 kHz e 10 kHz. Embora a largura de banda seja muito maior no

último caso, o nível de ruído é o mesmo.

5.3 Condicionamento de Sinais para Cantilevers Piezoresistivos

A equação geral para um sensor baseado em uma variação fracional de resistência x, em

resposta a uma variável a ser medida, é )(0 xfRR , assumindo 1)0( f .59 Para o caso onde a

relação é linear tem-se:

)1(0 xRRS

59 Palás-Areny R., Webster J. G., Sensors and Signal Conditioning, John Wiley

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No caso do cantilever piezoresistivo que adquirimos, o valor de x dado pelo fabricante é da

ordem de nm610 . Como precisamos detectar deslocamentos sub-angstron para alcançarmos a

resolução desejada de força, precisamos ser capazes de medir variações de resistência da ordem

de 10-2 ppm (0,2 m para uma resistência de 2 k como a do cantilever utilizado).

5.3.1 Ponte de Wheatstone

O método usual para medida de pequenas variações de resistência é o arranjo conhecido

por ponte de Wheatstone. A figura abaixo ilustra esta configuração:

a) b)

Figura 5.4 Ponte de Wheatstone. a) Forma usual. b) Forma análoga (Dois divisores de tensão em paralelo)

A tensão no braço esquerdo da ponte é dada por:

inVRR

RV

21

2

Similarmente no braço esquerdo é dada por:

inVRR

RV

43

4

Assim a voltagem na saída é dada por:

80

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inout VRR

R

RR

RVVV

21

2

43

4 5.5

Consideramos então que . Para que a ponte esteja equilibrada (com x=0 ) SRR 4 kR

R

R

R

0

3

2

1 .

Substituindo este parâmetro na equação 5.5 obtemos:

inout Vxkk

kxV

)1)(1( 5.6

Vemos a partir da equação 5.6 que a linearidade de Vout com relação a x só está garantida

se a condição for satisfeita. Nesta situação a sensibilidade da ponte é dada por: 1 kx

inS

out Vxkk

k

RdR

dVS

)1)(1(

1

0 5.7

O valor máximo da sensibilidade em função de k é obtido quando 0dk

dS que resulta em:

xk 12

Como no nosso caso x é da ordem de 10-7, a condição de máxima sensibilidade que deve

ser satisfeita pêlos resistores é dada por 1k , que resulta em:

inS

out VRdR

dVS

04

1

que para uma resistência da ordem de 2000 e para um voltagem de alimentação da ponte de

10V é da ordem de . Para detectarmos variações da ordem de 0,2 , levando em

conta esta sensibilidade, precisamos detectar sinais de voltagem da ordem de

/1mVS m

V2,0 . Portanto

precisamos manter os ruídos eletrônicos em uma escala pelo menos dez vezes menor.

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5.3.2 Montagem Experimental

Foi utilizado um lock-in para excitar a ponte e simultaneamente adquirir o sinal de saída

da mesma, objetivando minimizar o principal tipo de ruído deste tipo de sensor que é o flicker,

cujo espectro é da forma f

1.Utilizamos inicialmente freqüências baixas, de no máximo 100Hz,

devido ao descasamento de impedâncias nos braços da ponte para sinais AC. Para isolar ao

máximo o experimento do ambiente externo foram utilizados cabos coaxiais para transportar o

sinal de cada braço da ponte às entradas diferencias A e B do Lock-in conforme ilustra o esquema

abaixo:

Figura 5.5. Esquema da ligação utilizada no experimento.

Figura 5.6 Esquema de detecção da deflexão do cantilever de AFM piezoresistivo.

Inicialmente balanceávamos a ponte com uma alimentação DC. Em seguida alternávamos

para alimentação AC para a aquisição da medida pelo lock-in, à medida que empurrávamos o

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cantilever com uma alavanca acionada por um picomotor e controlado pelo computador. As

figuras abaixo mostram o dispositivo final construído:

a

b

Figura 5.7 Dispositivo construído para a primeira parte do condicionamento do sinal do cantilever piezoresistivo (Ponte de Wheatstone) a) Vista frontal: Saídas dos sinais de cada braço da ponte e potenciômetro para o ajuste do zero da tensão. b) Vista traseira: conector para o piezoresistor e chave comutadora entre alimentação AC e DC da ponte.

a

b

Figura 5.8 a) Dispositivo internamente b) Plug do cabo utilizado para ligar o piezoresistor ao dispositivo (2 vias + malha)

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ChipChip

a

b

Figura 5.9 a) Suporte utilizado para fixação e movimentação do cantilever piezoresistivo. b) Imagem do cantilever na TV (180 μm de comprimento)

5.4 Resultados Obtidos

Abaixo está um gráfico dos dados obtidos com o cantilever piezoresistivo a medida que era empurrado pelo picomotor:

0,00E+00

1,00E-04

2,00E-04

3,00E-04

4,00E-04

5,00E-04

6,00E-04

150 2150 4150 6150 8150 10150 12150 14150 16150

Deslocamento (nm)

Sin

al (

V)

Figura 5.10 Pontos obtidos com o cantilever piezoresistivo e regressão linear.

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A partir destes dados, após um tratamento estatístico, obtivemos uma calibração para o nosso

sistema de detecção da deflexão do cantilever piezoresistivo de 2,9 10-8 V/nm. Obtivemos

também o mínimo deslocamento e a mínima força detectável com este sistema: 397nm e 397nN

respectivamente, este último considerando uma constante de mola de 1N/m que é fornecida pelo

fabricante. Estes resultados são bem piores que os obtidos anteriormente com o sistema de

deflexão óptico (1nm e 10pN). Isto mostra que o nível de ruído existente no sinal deste sensor

para as freqüências utilizadas é demasiadamente grande para permitir resoluções sub-angstron

que seriam necessárias com este tipo de detector, devido a sua maior rigidez. Além disso

apresenta menor sensibilidade que no caso óptico. Estes resultados indicam que é preciso

aumentar a sensibilidade do sensor através de uma outra topologia de circuito ou baixar muito os

níveis de ruído deste detector para utilizá-lo na calibração da força óptica. Uma possibilidade é

aumentar a freqüência para a faixa de kHz e balancear a ponte nestas condições. Entretanto surge

o problema de balanceamento da ponte de Wheatstone em altas freqüências, onde capacitâncias e

indutâncias parasistas começam a ser relevantes.

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Capítulo 6. Conclusões e Perspectivas

As principais constatações foram:

O sistema de detecção óptico da deflexão do cantilever de AFM apresenta a resolução

necessária para a calibração da força óptica como era esperado da literatura, no entanto tal

sistema apresenta características desfavoráveis para a utilização na calibração da força

óptica, principalmente dadas as condições específicas deste problema como a necessidade

de alinhamento, focalização e detecção do feixe laser que passa por uma solução.

O sistema de detecção piezoresistivo da deflexão do cantilever de AFM apresenta

características ideais para a utilização na calibração da força óptica, principalmente por

dispensar a utilização de laser e detector externo. Entretanto não conseguimos

inicialmente a resolução necessária para a calibração da força óptica com tal sistema,

principalmente devido ao fato de que os cantilevers que existiam comercialmente a época

da realização desta pesquisa apresentavam constantes de mola muito altas (1N/m)

exigindo resoluções de deflexão muito altas.

Acreditamos que novos esforços para atingir os objetivos iniciais devem seguir na direção

do sistema de detecção piezoresistivo. Recentemente Harley60 construiu cantilevers

piezoresistivos ultrafinos com resoluções de força de até 8.6 fN/(Hz)1/2 e com constantes de mola

tão baixas quanto às da pinça óptica (10-5 N/m). Vale notar que com tais cantilevers a calibração

60 Harley, J. A. and Kenny, T. W., “High-sensitivity piezoresistive cantilevers under 1000 Å thick” - Applied Physics Letters Volume 75, Number 2 - 12 July 1999

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da força óptica seria imediata, pois as deflexões do cantilever seriam da mesma ordem que o

deslocamento da partícula aprisionada(μm), facilitando imensamente o condicionamento de

sinais.

Uma segunda alternativa, para tentar melhorar a resolução dos cantilever duros (1 N/m) é

uma nova topologia de circuito conhecida como Loop de Anderson61. Ela supera

significativamente a performance da clássica ponte de Wheatstone em muitas aplicações de

instrumentação. Usando subtração ativa como tecnologia chave, o loop de Anderson fornece

maior precisão com menor excitação se comparado à ponte de Wheatstone e realiza funções

adicionais de medidas. As principais desvantagens da ponte de Wheatstone em nosso caso é a

baixa sensibilidade fornecida e a dificuldade de separar ruídos autogerados quando utilizando

alimentação.

O Loop de Anderson utiliza um subtrador diferencial ativo para medir a diferença de

potencial através de duas ou mais impedâncias que são atravessadas pela mesma corrente. O

subtrador entrega em sua porta de saída a diferença entre duas diferenças de potencial

selecionadas e possivelmente amplificadas observadas por suas portas de entrada. Diferentes

fatores de amplificação podem ser usados ao observar as varias diferenças de potencial do loop e

este pode conter qualquer úmero prático de impedâncias monitoradas.

As principais vantagens desta topologia em nosso caso são a maior sensibilidade

fornecida, a possibilidade imediata de excitação AC para separar o sinal dos ruídos 1/f, bem

como a possibilidade direta de compensação através da utilização de um segundo sensor

piezoresistivo na diferença de potencial de referência, cancelando completamente as variações da

piezoresistividade com a temperatura.

61 Karl F. Anderson, “The new current loop: NASA's successor to the Wheatstone bridge”, ISA Transactions. Vol. 36. No. 4. pp. 351-356. 1998

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Figura 6.1 Subtrador de Anderson

Figura 6.2 Loop de Anderson

Se Zref = Z então

ZiVOUT

Esta sensibilidade é 4 vezes maior que a fornecida pela ponte de Wheatstone nas mesmas

condições de dissipação de potência.

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Apendice A. Amplificador Lock-in

Amplificadores lock-in são usados para detectar e medir sinais AC muito pequenos (até

alguns nanovolts). Medidas exatas podem ser feitas mesmo quando pequenos sinais são

obscurecidos por ruídos dezenas de milhares de vezes maior. Estes amplificadores utilizam uma

técnica conhecida como “phase sentive detection” (PSD), ou seja detecção sensível à fase. Sinais

de ruído em freqüências diferentes da freqüência de referência em que é realizado o

experimento são rejeitados e não afetam a medida. No dia grama abaixo o sinal de referência é

uma onda quadrada na freqüência r . Este poderia ser o sinal de referência fornecido por um

chopper que modula um feixe laser incidindo em um fotodetector. Como resposta do fotodetector

teríamos um sinal dado por V )sin(( sigrsigsig tV)t . O lock-in gera sua própria onda de

referência dada por )sin( ref)( LL VtV Lt .

Representação dos sinais de referência e do sinal de entrada no lock-in.

O lock-in amplifica o sinal e então o multiplica pelo seu sinal de referência usando um

PSD ou multiplicador digital. A saída do PSD é simplesmente o produto de duas ondas senoidais:

)sin()sin()( refLsigrLsigPSD ttVVtV

])cos[(2

1])cos[(

2

1)( refsigLrLsigrefsigLrLsigPSD tVVtVVtV

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Notamos que se L for igual a r o sinal do PSD será separado em um componente DC e em um

componente AC que poderiam ser facilmente separados por um filtro passa-baixa (FPB):

)2cos(2

1)cos(

2

1)( refsigrefLsigrefsigLsigPSD tVVVVtV

Esta é a estratégia do lock-in. Ele utiliza um “phase-locked-loop” (PLL) para gerar seu sinal de

referência na mesma freqüência de referência r . O PLL trava (locks) o seu oscilador interno a

freqüência do sinal de referência, rastreando-a continuamente, o que possibilita uma onda

senoidal de referência com freqüência r e com uma fase fixa ref . A saída do PSD passa então

por um FPB. Este remove os sinais AC com freqüências maiores que a sua largura de banda.

Assim, se o sinal de interesse esta misturado com ruídos indesejados, cujas freqüências são

suficientemente distantes da freqüência de referência, estes serão filtrados pelo FPB e somente o

sinal de interesse na freqüência r não será afetado.

Resposta em freqüência de um filtro passa baixa. A inclinação na região linear é de –6dB/oitava

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A constante de tempo do Lock-in nada mais é que do que dBf32

1

, onde é a freqüência de –

3dB do filtro passa-baixa. Assim a constante de tempo define a largura de banda do filtro passa-

baixa, ou seja, quanto maior a constante de tempo menor a fazendo a atenuação do filtro

começar a freqüências menores, diminuindo sua largura de banda.

dBf3

dBf3

O sinal DC filtrado por este FPB é proporcional a cossigPSD VV , onde refsig é a

diferença de fase entre o sinal de referência e o sinal do oscilador interno do lock-in. Ajustando

ref podemos fazer 0 e assim sigPSD VV . Se no entanto 90 0 PSDV . Esta

dependência da fase pode ser eliminada se adicionamos um segundo PSD, que multiplica o sinal

de entrada pelo sinal do oscilador interno do lock-in com uma diferença de fase de +90o :

)cos()sin()90sin()sin()( refLsigrLsigo

refLsigrLsigPSD ttVVttVVtV

Assim o sinal DC filtrado será proporcional a sinsigPSD VV . Teremos agora dois sinais:

)cos(sigVX e )sin(sigVY

Estes duas quantidades representam o sinal como um vetor de módulo que faz um ângulo sigV

com relação ao sinal de referência do oscilador do lock-in. Ou seja podemos medir o sinal

independentemente da fase calculando deu módulo:

sigVYXR 22

A fase também pode ser calculada da seguinte maneira:

X

Y1tan

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Abaixo o diagrama em bloco do lock-in utilizado resume as principais etapas. Os filtros Notch

filtram os ruídos da rede elétrica em frede e 2frede :

Diagrama em bloco do Lock-in utilizado em nosso experimento (SR830 da Stanford Research Systems)

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Apendice B. Folhas de Especificações dos componentes utilizados

OPA37

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Fotodetector