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Universidade Estácio de Sá MARCIA REIS DA SILVA O geoprocessamento como ferramenta de apoio à Gestão da Estratégia de Saúde da Família Rio de Janeiro 2011

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Universidade Estcio de S

MARCIA REIS DA SILVA

O geoprocessamento como ferramenta de apoio Gesto da Estratgia de Sade da Famlia

Rio de Janeiro 2011

MARCIA REIS DA SILVA

O geoprocessamento como ferramenta de apoio Gesto da Estratgia de Sade da Famlia

Dissertao apresentada Universidade Estcio de S como requisito parcial para a obteno do grau de Mestre em Sade da Famlia. Orientador Prof. Dr. Paulo Henrique de Almeida Rodrigues

.

Rio de Janeiro 2011

S586 Silva, Marcia Reis da O geoprocessamento como ferramenta de apoio gesto da estratgia de sade da famlia/ Marcia Reis da Silva. Rio de Janeiro, 2011. 116 f. ; 30 cm. Dissertao (Mestrado em Sade da Famlia) Universidade Estcio de S, 2011. Bibliografia: f. 100-107 1. Programa Sade da Famlia. 2. Avaliao 3. Geoprocessamento. 4. Rio de Janeiro (RJ) I. Ttulo

CDD 613.8153

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM SADE DA FAMLIA

A dissertao

O GEOPROCESSAMENTO COMO FERRAMENTA DE APOIO

GESTO DA ESTRATGIA DE SADE DA FAMLIA

elaborada por

MARCIA REIS DA SILVA

e aprovada por todos os membros da Banca Examinadora foi aceita pelo Curso de Mestrado

Profissional em Sade da Famlia como requisito parcial obteno do ttulo de

MESTRE EM SADE DA FAMLIA

Rio de janeiro, 29 de maro de 2011.

BANCA EXAMINADORA

Universidade Estcio de S

Dedico a:

DEUS que alimenta minha vida. Renova minhas foras e me acompanha em todos os momentos.

Minha me, Jacyra, exemplo de amor, sabedoria, cuidado e dedicao

Zurlinde, meu amor companheiro, parceiro e sempre presente em minha vida. Traduz em seus gestos a dimenso de famlia como o porto seguro, o fundamento e os valores que nos mantm unidos, mesmo com tantas diferenas, facilitando o meu

cotidiano de Mulher e Me.

Gustavo e Bernardo Pela intensidade do amor que partilhamos. Meus filhos que enchem minha vida de

felicidade e orgulho.

Paulo, meu irmo, que dedica sua vida a cuidar de todos ns.

Se eu pudesse trincar a terra toda E sentir-lhe um paladar,

E se a terra fosse uma cousa para trincar Seria mais feliz um momento...

Mas eu nem sempre quero ser feliz. preciso ser de vez em quando infeliz

Para se poder ser natural... Nem tudo dias de sol,

E a chuva, quando falta muito, pede-se, Por isso tomo a infelicidade com a felicidade

Naturalmente, como quem no estranha Que haja montanhas e plancies

E que haja rochedos e erva...

O que preciso ser-se natural e calmo Na felicidade ou na infelicidade,

Sentir como quem olha, pensar como quem anda,

E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre, E que o poente belo e bela a noite que fica...

Assim e assim seja...

Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)- O Guardador de Rebanhos, XXI.

http://pensador.uol.com.br/autor/Alberto_Caeiro_(Fernando_Pessoa)/

Agradecimentos

- Aos meus leais e verdadeiros amigos e amigas, presentes que recebi ao longo de

minha vida, que me permitiram crescer nessa convivncia, muitas vezes distantes,

mas presentes nos momentos mais difceis.

- Aos meus companheiros de jornada no Municpio, que acreditam na possibilidade

de partilharmos da construo de uma Sade Pblica de qualidade.

- A Secretaria Municipal de Sade e Defesa Civil do Rio de Janeiro que sempre

investiu no meu crescimento profissional.

- A Daniel Soranz, Subsecretrio de Promoo, Ateno Primria e Vigilncia em

Sade, que com coragem e empenho, possibilitou que chegssemos concluso

dessa etapa de nossa qualificao profissional.

- A Hugo Marques Fagundes Junior, que me deu a oportunidade de partilhar de uma

nobre misso. Acreditou nesse projeto e permitiu a sua construo em conjunto com

toda a equipe da CAP 3.1. Toda a minha admirao, respeito e agradecimento. Mais

um presente que recebi da vida.

- Ao meu Orientador, Professor Paulo Henrique de Almeida Rodrigues, que desde

que nos conhecemos, nas relaes institucionais, foi o grande responsvel pelo

estmulo a essa experincia no Mestrado. Agradeo pela generosidade e por

acreditar que eu seria capaz de embarcar nesse vo.

- A Licia Magna, outro grande presente em minha vida. Lembro-me at hoje de

nosso primeiro encontro, na turma do Introdutrio do PSF, naquela etapa do

psicodrama, quando voc me escolheu para juntas realizarmos um primeiro desafio.

Quis Deus que pudssemos nos encontrar em novas jornadas. Tive sempre todo o

seu apoio. Um exemplo de competncia. Uma grande e querida amiga, sempre

disponvel para partilhar comigo de belos projetos e tambm, de momentos difceis

quando sempre me incentivou a no desistir dos nossos objetivos.

- Ao meu querido tutor, Luis Fernando Rukop Eckstein, que me possibilitou enfrentar

o desafio da utilizao das ferramentas de Geoprocessamento. Com todo respeito,

devo a voc tambm uma etapa importante desse trabalho.

- A Paulo Marques, o desbravador dos territrios da AP 3.1. Adoro voc!

- Ao Jos Ricardo, brilhante e criativo. Tenho muito a agradecer a voc. A

implicncia s pr descontrair nossos dias de intenso trabalho.

- A minha filhota Luana, que sempre me traz palavras de f e esperana. Sempre

me transmitindo fora.

- Ao Leandro e Letcia, por me acolherem, quando buscava um local escondidinho,

para a concluso do meu trabalho. Ao final do dia, ainda partilhavam comigo de

minhas angustias em relao pesquisa.

- Aos meus companheiros de jornada no PSF do Rio de Janeiro, por permitirem que

eu aprendesse muito com cada um, numa intensa troca de experincias e emoes.

- A Lenita, Karla e Walter, meus companheiros inseparveis nos momentos

sagrados das refeies. Muitas saudades.

- Aos queridos professores do Mestrado, cada um com sua caracterstica marcante.

Agradeo pelos ensinamentos. Especialmente aos professores Carlos Serra,

Haroldo Matos e Adriana Aguiar, sempre dispostos a contribuir para o meu

crescimento.

- A Luciana Borges, minha primeira Coordenadora de Sade da Famlia, que sempre

admirei. Que bom poder encontrar-me com voc nessa etapa de minha vida. Sua

contribuio na construo desse trabalho foi fundamental.

- A admirvel Tereza Costa por todo apoio e carinho dispensado a mim.

- A Coordenao do Mestrado, pelo empenho na manuteno desse diferencial, na

qualificao de profissionais para atuarem na consolidao do modelo de ateno

primria.

- A Aline por toda sua ateno nos momentos em que precisvamos de informaes,

todos juntos e ao mesmo tempo.

- A toda a querida equipe da CAP 3.1, que com muita pacincia e respeito

contribuem comigo em todos os momentos. Tenho por todos vocs muito carinho.

Vocs so fantsticos. Belas pessoas e profissionais dedicados. Agradeo por terem

me apoiado nessa jornada difcil e estarem prontos a me ouvir nos momentos em

que precisei desabafar.

- Aos profissionais das equipes do CMS Rodrigo Roig e da Clinica da Famlia Zilda

Arns, em especial aos ACS, que nos acolheram no cotidiano de seu trabalho e

permitiram que juntos trilhssemos esse caminho, que estiveram prontos para

reavaliar todo o processo de trabalho permitindo um novo olhar em suas prticas.

- A minha querida turma do Mestrado em Sade da Famlia. Foram dois anos muito

especiais. A convivncia semanal das sextas e sbados foi muito agradvel e feliz.

Conseguimos juntos, superar as provas mais difceis, os professores mais exigentes.

Fomos solidrios. Uma grande virtude. Vocs ficaro para sempre em meu corao

e nas belas recordaes. Desejo todo sucesso do mundo! Por favor, no

desapaream. A Lapa nos aguarda para nos encontrarmos e darmos muitas risadas.

Momentos felizes!

RESUMO

Esta dissertao apresenta elementos que podem contribuir para a melhoria do

monitoramento e a avaliao do Programa Sade da Famlia (PSF) na Cidade do

Rio de Janeiro. Apresenta o processo de trabalho das equipes para o mapeamento

de reas e microreas das comunidades. Utiliza a informao dos marcadores

encontrados no Sistema de Informao de Ateno Bsica SIAB, como ferramenta

de gesto para o PSF e apresenta a viabilidade de geoprocessamento de alguns

marcadores selecionados do Relatrio da Situao de Sade e Acompanhamento

das Famlias SSA2. O cenrio escolhido foi uma Clinica da Famlia composta por

onze equipes, localizada no Complexo do Alemo, regio do Subsistema Leopoldina

Sul da AP 3.1. Teve como objetivo geral desenvolver e testar o mtodo de

monitoramento e avaliao da Sade da Famlia, com base no georreferenciamento

de marcadores, em apoio gesto das Redes de Ateno Sade - RAS. Seus

objetivos especficos foram: analisar e selecionar marcadores fornecidos pelo SIAB

para o monitoramento e a avaliao da Sade da Famlia e analisar a viabilidade do

uso de georreferenciamento de marcadores do SIAB extrados do SSA2 do Agente

Comunitrio de Sade - ACS, visando a construo de um Sistema de Informao

Geogrfica (SIG). Para tal utilizamos o software Terraview que possibilitou a

construo de mapas temticos das reas e microreas com marcadores

selecionados a partir de um banco de dados. A pesquisa apontou a necessidade das

equipes se apropriarem das informaes de base local para o planejamento de suas

aes e constatou problemas ligados ao uso da informao. Evidencia que o uso do

SIG constitui-se em potente sistema para identificar problemas relacionados

qualidade da informao, o que possibilita avaliar os marcadores subsidiando a

gesto local na tomada de deciso para qualificao dos servios prestados nos

territrios cobertos pelo PSF.

Palavras Chave: avaliao em sade, indicadores de sade da ateno bsica,

geoprocessamento, mapas temticos.

ABSTRACT

This essay presents elements that may contribute to the improvement of the

monitoring and evaluating of the Family Healthcare Program (FHP), in Rio de Janeiro

City. It presents the working process of teams for the mapping of their areas and

microareas. It uses the information of the markers found on the Basic Attention

Information System BAIS, as a managing tool for FHP, and presents the feasibility

of geoprocessing of some selected markers. The chosen scenario was a Family

Clinic composed by eleven teams, located on the Alemo Complex, a region of the

South Leopoldina Subsystem of PA 3.1. It has as its general goal. developing and

testing a method of monitoring and evaluating Family Healthcare, based on geo-

referencing markers, supporting the management of Healthcare Attention Networks

(HAN). Its specific goals were: analyzing and selecting markers provided by the BAIS

for monitoring and evaluating of Family Healthcare; and analyzing the feasibility of

using geo-referencing markers extracted from the BAIS from HSFM 2 of

Communitarian Healthcare Agent (CHA), aiming on the construction of Geographic

Information System (GIS). For that purpose, we used the software Terraview, which

made possible the fashioning of thematic maps of areas and microareas with

selected markers from a database. The research highlighted the necessity of teams

to take hold of local base information for the planning of their actions and found

problems concerning the use of information. It indicates that the use of GIS is a

powerful system to identify problems concerning the quality of information, which

allows the evaluation of markers subsidizing local managing on the decision making

for the qualification of the provided services on the territories covered by FHP.

Keywords: healthcare evaluation, basic attention healthcare markers,

geoprocessing; theme maps.

Lista de quadros e tabelas

Quadro 01: A concepo biolgica e a concepo do Processo Sade-Doena ...... 28

Quadro 02: caractersticas essenciais dos sistemas de informao do DATASUS .. 48

Quadro 03: Instrumentos de coleta e consolidado de dados do SIAB ...................... 50

Quadro 04: Notificaes dos profissionais da ESF para acompanhamento das condies marcadoras contidas na Ficha D - SIAB. ................................................. 52

Tabela 1 : Unidades de sade do SUS na AP 3.1, por subsistema e tipo de unidade, 2011 ........................................................................................................................66

Quadro 05: Distribuio de equipes por Subsistemas na AP 3.1 .............................. 66

Quadro 06: Marcadores do SSA2 ............................................................................. 80

Quadro 07: Relao dos mapas temticos gerados por microareas ......................... 82

APNDICE A: Dicionrio de Equipes com cdigo de CNES e nmero de microreas ......................................................................................................................108

APNDICE B: Dicionrio de variveis com respectivas siglas ................................ 109

APNDICE C: Dicionrio de variveis/proporo com respectivas siglas .............. 110

Lista de figuras

Figura 01-Quadro de referncia contempornea da Geografia da Sade face construo multidimensional do espao .................................................................... 25

Figura 02: Diagrama de Dawson ............................................................................... 30

Figura 03: Linha do tempo com esquema dos Sistemas de Informao utilizados pela SMSDC no PSF ................................................................................................. 55

Figura 04: Formatos vetoriais bsicos reconhecidos por um SIG ............................. 58

Figura 05: Mapa da cidade do Rio de Janeiro com as reas de Planejamento em Sade 64

Figura 06: Populao ajustada para 2008 com base em estimativa IBGE do censo 2000, por Subsistemas .............................................................................................. 65

Figura 07: Bairros do subsistema Leopoldina Sul, da AP 3.1 ................................... 65

Figura 08: rea onde se iniciou o uso do geoprocessamento das microreas no Complexo do Alemo ................................................................................................ 69

Figura 09: Primeiras imagens elaboradas com os ACS das microreas de equipes do Conjunto de favelas do Alemo ............................................................................ 72

Figura 10: Barra de ferramentas do Google Earth .................................................. 74

Figura 11: Equipes da Clinica da Famlia Zilda Arns e CMS Rodrigo Roig, Subsistema Leopoldina Sul, AP 3.1, Rio de Janeiro ................................................. 75

Figura 12: Equipes com a diviso das microreas da Clinica da Famlia Zilda Arns, Subsistema Leopoldina Sul, AP 3.1, Rio de Janeiro ................................................. 76

Figura 13: Mapa das reas e microreas das ESF da Clnica de Famlia Zilda Arns do Complexo do Alemo ........................................................................................... 77

Figura 14: Mapa Temtico da Clinica da Famlia Zilda Arns com vista, tema e legenda das equipes ................................................................................................. 78

Figura 15: Mapa temtico das 11equipes com 69microreas da Clinica da Famlia Zilda Arns .................................................................................................................. 79

Figura 16: Imagem da tabela Excell com base de dados utilizada no SIG ................ 80

Figura 17: Imagem da tabela TXT com base de dados utilizada no SIG ................. 81

Figura 18: Proporo de recm-natos pesados ao nascer com peso inferior a 2500g em relao ao total de nascidos vivos no ms de novembro de 2010 por reas e microreas................................................................................................................. 89

Figuras 19 e 20: Proporo de gestantes menores de 20 anos cadastradas em relao s gestantes acompanhadas nos meses de agosto e setembro de 2010 por reas e microreas .................................................................................................... 92

Figuras 21e 22: Proporo de hospitalizaes por complicaes do Diabetes Mellitus em relao aos diabticos acompanhados nos meses de agosto e setembro de 2010 por reas e microreas ............................................................................................. 95

Lista de abreviaturas e siglas

ACS Agente Comunitrio de Sade

APS Ateno Primria de Sade

AP 3.1 rea de Planejamento 3.1 (SMS Rio de Janeiro)

AVS Agente de Vigilncia em Sade

CAP Coordenao de rea de Planejamento

CAP 3.1 Coordenadoria de Sade da rea de Planejamento 3.1 (SMSDC/RJ)

CAPS Centro de Ateno Psico-Social

CAPSIJ Centro de Ateno Psico-Social Infanto-Juvenil

CFZA Clinica da Famlia Zilda Arns

CMS Centro Municipal de Sade

CNES Cadastro |Nacional de Estabelecimentos de Sade

DATASUS Departamento de Informtica do SUS

EAD Ensino Distncia

ESF Equipes de Sade da Famlia

FAPERJ Fundao de Amparo Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro

FIOCRUZ Fundao Oswaldo Cruz

FUNASA Fundao Nacional de Sade

GIL Gerenciador de Informaes Locais

GPS Global Positioning System/Sistema de Posicionamento Global

GSF Sistema de Gesto do Sade da Famlia

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

ICICT Instituto de Comunicao e Informao Cientfica e Tecnolgica em Sade

(FIOCRUZ)

IplanRio Empresa Municipal de Informtica do Rio de Janeiro

.LARES - Laboratrio de Redes e Sistemas de Sade

NOB Norma Operacional Bsica

NOAS Norma Operacional de Ateno Sade.

OPAS Organizao Pan-americana de Sade

OSS - Organizaes Sociais de Sade

PDR Planos Diretores de Regionalizao

PROESF - Programa de Expanso da Estratgia de Sade da Famlia

PMA2 Relatrio de Produo e Marcadores para Avaliao.

PSF Programa Sade da Famlia

SGSB Sistema de Gesto de Ateno Bsica

RAS Redes de Ateno Sade

RIPSA Rede Interagencial de Informaes em Sade

SIAB Sistema de Informao de Ateno Bsica

SIG Sistema de Informaes Geogrficas

SILOS Sistemas Locais de Sade

SIH Sistema de Informaes Hospitalares

SIM Sistema de Informao de Mortalidade

SINAN Sistema de Informao de Agravos de Notificao

SINASC Sistema de Informao de Nascidos Vivos

SMS/RJ Secretaria Municipal de Sade/Rio de Janeiro

SMSDC Secretaria Municipal de Sade e Defesa Civil

SSA2 - Relatrio da Situao de Sade e Acompanhamento das Famlias

SUBPAV Subsecretaria de Ateno Primria, Vigilncia e Promoo Sade.

SSLS Subsistema Leopoldina Sul

SSLN Subsistema Leopoldina Norte

SSI Subsistema Ilha do Governador

SUS Sistema nico de Sade

TEIAS Territrios Integrados de Ateno Sade

TCMRJ Tribunal de Contas do Municpio do Rio de Janeiro

USF Unidade de Sade da Famlia

UFG Universidade Federal de Gois

UPS Unidades Prestadoras de Servios

15

Sumrio

1 Introduo .............................................................................................................. 17

2. Territrios e Regies na gesto da sade ............................................................. 24

2.1 Territrio e Sade ....................................................................................... 24

2.2 Regionalizao da Sade ........................................................................... 29

2.3 Os marcos legais da Regionalizao .......................................................... 33

2.4 O modelo de ateno baseado na Sade da Famlia ................................. 36

2.5 O PSF na Cidade do Rio de Janeiro: um breve histrico ............................ 39

3 Sistemas de informao e gesto da Sade da Famlia ........................................ 46

3.1 Sistemas de informao do SUS ................................................................ 47

3.2 Sistemas de Informao de Ateno Bsica (SIAB) ................................... 50

3.3 O SIAB na Cidade do Rio de Janeiro potencialidades e fragilidades ....... 53

3.4Geoprocessamento ...................................................................................... 56

4. Problema, Objetivos, Mtodos e Procedimentos ................................................... 61

4.1 Problema..................................................................................................... 61

4.2 Premissas ................................................................................................... 61

4.3 Pergunta norteadora: .................................................................................. 61

4.4 Objetivos ............................................................................................................. 62

4.4.1 Objetivo Geral .......................................................................................... 62

4.4.2 Objetivos especficos ............................................................................... 62

4.5 Mtodos e Procedimentos ................................................................................... 63

4.5.1 Natureza e tipo do estudo ........................................................................ 63

4.5.2 Populao ................................................................................................ 63

4.5.3 Cenrios de pesquisa: ............................................................................. 63

4.5.4 Aspectos ticos do Estudo ...................................................................... 67

4.5.5Procedimentos .......................................................................................... 67

4.5.6 Vetorizao dos limites das reas e microreas ...................................... 67

4.5.7 O passo a passo da construo das reas e microreas para definio da base de dados a ser utilizada para o SIG ......................................................... 74

4.5.8 Construo do banco de dados ............................................................... 79

4.5.9 Marcadores selecionados para geoprocessamento ................................. 82

5. Anlise dos resultados .......................................................................................... 83

16

5.1 Anlises do mapeamento das reas e microreas ..................................... 83

5.2 Anlise espacial dos marcadores selecionados .................................................. 88

5.2.1 Marcador: Recm-natos pesados ao nascer, com peso inferior a 2500 g .......................................................................................................................... 89

5.2.2 Marcador: Gestantes menores de 20 anos cadastradas ......................... 91

5.2.3 Marcador: Hospitalizaes por complicaes do Diabetes Mellitus ......... 93

6. Consideraes finais ............................................................................................. 96

Referncias ............................................................................................................. 100

Anexo 1: Distribuio de regies Administrativas com a relao dos Bairros ......... 111

Anexo 2: PMA2 ....................................................................................................... 112

Anexo 3: SSA2 ........................................................................................................ 113

17

1 INTRODUO

Ao tratarmos do Programa Sade da Famlia (PSF), consideramos trs

elementos que so fundamentais para a melhoria do monitoramento e a avaliao

como subsidio a gesto local1do mesmo na Cidade do Rio de Janeiro: a) A forma

com que as equipes organizam o mapeamento de suas reas e microreas. b) o

uso das informaes dos marcadores encontrados no Sistema de Informao de

Ateno Bsica SIAB, como ferramenta de gesto para o PSF; e c) a viabilidade

de geoprocessamento dos marcadores do SIAB nas reas cobertas pelas ESF.

A pesquisa contou com o apoio de profissionais da Coordenao de Sade da

rea de Planejamento 3.1 (CAP 3.1) e com a colaborao de pessoas externas

mesma, como professores do Mestrado e o Enfermeiro Tony da Silva Ferreira, ex-

aluno do Mestrado, alm do engenheiro Cludio de Almeida Magalhes diretor da

Kartor Consultoria e Informtica, que contriburam para que a equipe da CAP 3.1

fosse treinada inicialmente para a utilizao dos softwares Arcview e TerraView,

objetivando criar uma base de dados cartogrfica com base nos mapas do Instituto

Pereira Passos (IPP).

A motivao para realizao dessa pesquisa surgiu no meu trabalho como

atual Assessora da CAP 3.1 e com experincia anterior atuando no PSF da Cidade

do Rio de Janeiro entre 2003 e 2009, pois percebi a necessidade de aprofundar

conhecimentos e prticas onde os nveis locais e regionais desenvolvam aes

concretas para o monitoramento e avaliao de aes desenvolvidas nas ESF, alm

de contribuir com o acompanhamento da expanso da ateno primria na rea.

A utilizao de sistema de informao com base atualizada que permita

identificar e agir sobre os riscos diagnosticados e interferir para a reduo de

agravos e bitos registrados em fichas utilizadas nos Sistema de Informao de

Ateno Bsica. (SIAB), Sistema de Informao de Agravos de Notificao (SINAN),

Sistema de Informao de Nascidos Vivos (SINASC), Sistema de Informao de

Mortalidade (SIM), entre outros, associados a um Sistema de Informaes

A gesto local caracteriza-se por ser a rea de Planejamento em Sade, conforme Resoluo n 431, de 14 de abril de 1993 da Secretaria Municipal de Sade, considerando o que estabelece a Lei Orgnica do Municpio e o Plano Diretor Decenal

1 da Cidade do Rio de Janeiro, cria nessa cidade

reas de Planejamento Sanitrio, que se constituem como proposto na 8 Conferncia Nacional de Sade , como Distritos Sanitrios.

18

Geogrficas (SIG), podero se constituir numa inovao no cotidiano da gesto

local, permitindo aes mais geis para a tomada de deciso sobre as necessidades

do territrio.

Alm disso, o trabalho na CAP 3.1 pressupe tambm, o apoio s ESF,

capacitando-as para o desenvolvimento de suas aes. A pesquisa foi uma grande

oportunidade para identificar de que forma as equipes organizaram o trabalho nos

seus territrios, para garantir a cobertura das famlias.

O trabalho pode ser considerado relevante por pretender subsidiar a utilizao

pelos gestores locais de ferramenta de SIG para o monitoramento e avaliao das

aes desenvolvidas pelas ESF. A utilizao da ferramenta pode contribuir, tambm,

para melhorar a capacidade das equipes de trabalharem a informao e se

apropriarem melhor da realidade dos seus territrios de abrangncia.

Est ligado a outras pesquisas desenvolvidas pelo Laboratrio de Redes e

Sistemas de Sade (LARES), do Mestrado Profissional em Sade da Famlia.

Dentro da mesma linha de pesquisa foram desenvolvidos dois trabalhos das

mestrandas Licia Magna Silva de Lima e Karla Arajo Maciel que respectivamente,

trataram na mesma rea de Planejamento os seguintes temas: Avaliao da

qualidade da assistncia prestada pelo PSF aos portadores de hansenase

utilizando geoprocessamento e; Oferta de servios especializados em apoio Sade

da Famlia: pirmide ou eclipse?. Utilizam elementos comuns (cartografia e bases de

dados sobre as unidades), havendo colaborao entre os projetos.

A proposta desse trabalho estimulou a participao e o interesse da

Coordenao e da equipe tcnica da CAP 3.1 permitindo que se estabelecesse um

amplo trabalho de equipe, envolvendo tcnicos das diversas divises (estruturas

organizacionais da CAP).

At 2009, os mapas elaborados na CAP, no utilizavam ferramentas de

geoprocessamento e nessa ocasio a AP 3.1 possua o maior nmero de ESF j

implantadas na Cidade, com 54 Equipes de Sade da Famlia, das quais 49 eram

19

equipes completas2 sendo necessrio definir um recorte do territrio para o

desenvolvimento desse estudo.

A pesquisa em questo utiliza dados oriundos da ficha de Produo e

Marcadores para avaliao - PMA2 e do SSA2 - Relatrio da Situao de Sade e

Acompanhamento das Famlias do SIAB, esse ltimo, instrumento utilizado pelos

Agentes Comunitrios de Sade (ACS). Tais instrumentos permitem tanto que se

verifique a produo de procedimentos dos profissionais das ESF, quanto o

acompanhamento das condies de risco da populao adstrita no territrio coberto,

possibilitando em mdio prazo avaliar o impacto das aes e servios de sade na

rea, em nvel ecolgico. O ideal seria que essa populao adstrita j estivesse

inserida em um pronturio eletrnico.

A principal utilizao do geoprocessamento na rea da sade est

relacionada vigilncia em sade, por se tratar de potente ferramenta para o

diagnstico da situao de sade, permitindo o planejar das intervenes com base

nesse diagnstico. Assim, entendo que seja utilizado para avaliar as necessidades

da populao quanto s condies de sade, permitindo a adequao dos servios

a estas.

Inicialmente nosso interesse foi pesquisar a possibilidade de ajustar as reas

cobertas pelo Programa de Sade da Famlia aos Setores Censitrios, pois estes

so a clula bsica de informaes do censo demogrfico do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatstica - IBGE.

As informaes dos setores so agregadas nas diferentes divises territoriais

bairros, distritos, municpios, estados e mesmo divises locorregionais. Porm,

percebemos que muitos entraves relacionados s caractersticas do territrio, nos

impediam de utilizar essa metodologia.

Ao longo dos anos observamos que situaes relacionadas a condies

scio polticas locais, aliadas a fatores ligados violncia urbana, dificultavam o

direito ao cidado de ir e vir livremente de acordo com as leis formais, principalmente

em regies dominadas pelo trfico de drogas e que convivem com a disputa pelo

territrio. Alm desse contexto, barreiras geogrficas tambm impedem que a

2 Informaes sobre equipes de Sade da Famlia, extradas do estudo do TEIAS AP 3.1de 16 de

julho de 2009, verso4 ppt, fonte CAP 3.1

20

estratgia de associar a microarea ao setor censitrio seja adotada, salvo melhor

juzo.

Embora no caso da Cidade do Rio de Janeiro, os setores censitrios possam

configurar os limites dos bairros menor diviso poltico-administrativa da Cidade, e

a Secretaria Municipal de Sade e Defesa Civil do Rio de Janeiro (SMSDC/RJ)

utilize a mesma diviso para a territorializao da sade, os territrios das CAPs

correspondem a essa diviso, no nos foi possvel durante a pesquisa, avanar com

a proposta de compatibilizar reas e setores censitrios que permitiria contar com as

informaes do Censo Demogrfico aliadas aos cadastros das famlias

acompanhadas pela ESF, como j mencionado no pargrafo anterior.

Dessa forma, as reas e microreas que organizam o processo de trabalho

das equipes, muitas vezes no tm qualquer correspondncia com os setores

censitrios, o que impede o intercmbio de informaes entre o SIAB principal

fonte de dados da Sade da Famlia e os dados censitrios.

A atual gesto da Secretaria Municipal de Sade e Defesa Civil do Rio de

Janeiro iniciou, atravs da Subsecretaria de Ateno Primria, Vigilncia e

Promoo da Sade SUBPAV, a partir de 2009, um trabalho que visou a

coordenao da Rede de Sade atravs da organizao dos territrios, iniciando o

trabalho junto s CAPs e unidades de ateno primria, utilizando como ferramenta,

planilhas com os Cdigos de Endereamento Postal (CEP) de todas as reas da

cidade.

No decorrer do ano de 2011, a proposta da SMSDC RJ ser a de

compatibilizar as bases dos setores censitrios com as microreas do Sade da

Famlia.

Esse trabalho teve como finalidade a organizao dos Territrios Integrados

de Ateno Sade TEIAS, possibilitando a identificao dos logradouros sob

responsabilidade das unidades de Sade em todos os nveis de ateno sade.

Essa iniciativa contribui para minha reflexo acerca do uso de Sistemas de

Informaes Geogrficas (SIG) permitindo ao gestor incorporar atributos que

favorecem a tomada de deciso de forma eficiente e eficaz para a anlise da

situao de sade do territrio sob sua responsabilidade.

21

O geoprocessamento pode trazer vantagens para o monitoramento e

avaliao do Programa Sade da Famlia3, por permitir a integrao das informaes

scio-demogrficas do Censo Demogrfico a dados oriundos de outros sistemas de

informao da sade, como o Sistema de Informaes da Ateno Bsica (SIAB),

Sistema de Informaes de Mortalidade (SIM), Sistema de Informaes de Nascidos

Vivos (SINASC), Sistema de Informaes de Agravos de Notificao (SINAN),

Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Sade (CNES), Sistema de Informaes

Hospitalares (SIH), entre outros.

.Ao avaliar todos os aspectos inerentes necessidade de desenvolver essa

pesquisa, tornou-se necessrio aprofundar conceitos e temas que esto contidos em

captulos organizados da seguinte forma:

O captulo 2 traz o conceito de territrio e suas caractersticas dinmicas, que

no esto conceituadas somente nos conhecimentos de geografia, mas que

necessitam de anlise baseada nas cincias sociais e as diversas formas de abord-

lo. Introduz a proposta de Redes de Ateno Sade -RAS, com base na

organizao da rede de aes e servios de sade na garantia de acesso a todos os

nveis de ateno..

Apresenta-se uma reflexo sobre o conceito de Regionalizao, com nfase

na importncia da organizao da rede de aes e servios de sade, as

contradies decorrentes da dificuldade de articulao entre os entes federados no

sentido de garantirem os pressupostos do SUS.

Faz um breve resumo sobre as Normas Operacionais Bsicas NOB e sobre

a Norma Operacional de Assistncia Sade NOAS/SUS. Traz um pequeno

histrico sobre a expanso da ESF na Cidade do Rio de Janeiro e na rea de

Planejamento AP 3.1.

3 H uma ntida divergncia nos textos acadmicos e do prprio MS que ora utilizam o termo

Estratgia, ora Programa. O termo Programa vem da legislao de direito financeiro obrigatria para toda a administrao pblica brasileira, que estabelece programas e subprogramas (Lei n. 4.320/64) para a organizao das atividades do governo. A idia central que o planejamento seja integrado ao oramento permitindo a visualizao das diversas aes de governo por suas funes, programas, subprogramas projetos e atividades (BRASIL, Ministrio do Planejamento, 1998). De acordo com as normas de direito financeiro pblico a Sade da Famlia continua sendo um Programa, mesmo quando chamado pelo MS de Estratgia, como na rea da sade. Na portaria 648/2006 a sigla ESF se refere a Equipe de Sade da Famlia.

22

O captulo 3 apresenta os Sistemas de Informao desenvolvidos pelo

Departamento de Informtica em Sade, DATASUS, enfatizando a importncia do

Sistema de Informaes de Ateno Bsica (SIAB), por tratar-se de sistema de base

local com caractersticas que permitem s equipes de sade da famlia elaborar o

diagnstico da situao de sade da populao sobre sua responsabilidade e

planejar as aes de acordo com essas necessidades.

D nfase aos conceitos de geoprocessamento, abordando as caractersticas

de um Sistema de Informaes Geogrficas,( SIG), com todas as vantagens de sua

utilizao para o planejamento, monitoramento e avaliao das aes desenvolvidas

na Sade da Famlia.

O capitulo 4 descreve o cenrio da pesquisa, os objetivos, a metodologia e

os procedimentos utilizados no desenvolvimento desse trabalho, possibilitando uma

ampla integrao entre o pesquisador, profissional desse servio e membros da

equipe que participaram em conjunto de qualificao para utilizao do mtodo.

Apresenta as etapas que foram desenvolvidas, desde a construo dos

limites das reas e microreas, junto ao territrio selecionado, atravs da elaborao

de mapas e do banco de dados.

Esclarece os resultados encontrados com a construo dos mapas temticos

dos marcadores selecionados do SIAB e a proposio de intervenes que

possibilitaram a compreenso do territrio e sua importncia para as aes de

promoo, assistncia e vigilncia sade bem como o desenvolvimento de

metodologia que possibilite o monitoramento e avaliao dos servios prestados

pelas ESF.

O captulo 5 descreve a anlise de resultados atravs dos mapas temticos

gerados com a base de dados das informaes provenientes do SSA2. Os limites e

possibilidades com a elaborao dos mapas, alm das dificuldades encontradas

com o mapeamento do territrio e com a utilizao do banco de dados existente na

Clinica da Famlia Zilda Arns

As consideraes finais contidas no captulo 6 trazem a reflexo sobre a

necessidade de reviso dos processos de trabalho que envolve as etapas de

reconhecimento do territrio coberto pelas equipes de sade da famlia e a utilizao

da informao contida no SIAB e que sempre se constituiu em desafio, pela

23

ausncia de cultura dos profissionais de sade em se apropriarem dessa potencial

ferramenta, que traz dados de diagnstico local da situao de sade.

Prope a utilizao do SIG, pois considero que, o emprego de mapas

temticos no monitoramento e avaliao da qualidade da assistncia, constitui-se

em interface para anlise junto a outros bancos dos diferentes sistemas de

Informao, contribuindo para que a gesto tenha com facilidade, informaes que

permitam que as etapas do planejamento sejam baseadas em evidncias claras

para a tomada de deciso.

.

24

2. TERRITRIOS E REGIES NA GESTO DA SADE

2.1 Territrio e Sade

Para compreendermos a noo de territrio e sade, precisamos levar em

considerao a multiplicidade de fatores que interagem dentro do espao e que

levam em considerao as formas de organizao poltica e social, cultural e

econmica e todas as intervenes que se do atravs de diversas condies.

necessrio que esteja claro o papel do governo e sua responsabilidade na oferta de

polticas pblicas que possibilitem o desenvolvimento territorial e a garantia de

acesso rede de servios.

O SUS atravs da tica da gesto dos servios traz a necessidade de

organizao dos servios atravs da delimitao de bases territoriais, constitudas

por reas poltico-administrativas. Segundo Unglert (1999 apud Monken et

col,2009,p.16), a base territorial um dos princpios organizativo-assistenciais mais

importantes do sistema de sade. Alm da diviso poltico-administrativa, de

responsabilidade do governo que facilita o agrupamento e a integrao de reas

com caractersticas similares, encontramos formas de diviso do territrio com a

finalidade de estudar suas caractersticas para planejar intervenes nos diversos

segmentos das polticas pblicas.

Monken e Barcellos (2007, p. 188) os territrios so,

[...] espaos e lugares, construdos socialmente. So muito variveis e dinmicos, e a sua peculiaridade mais importante ser uma rea de atuao, de fazer, de responsabilidade. [...] o territrio sempre um campo de expresso do poder pblico, privado, governamental ou no governamental e, sobretudo, populacional. Cada territrio tem uma determinada rea, uma populao e uma instncia de poder.

O trabalho das equipes de sade da famlia se consolida atravs de um

territrio definido, numa relao estreita da equipe com as famlias e seu modo de

viver, suas crenas e culturas. Trata-se de responsabilidade fundamental dessas

equipes o conhecimento sobre as caractersticas e os riscos que envolvem a

populao acompanhada. Alm disso, a estratgia permite configurar arranjos

atravs das organizaes e associaes locais, buscando a co-responsabilizao

como instrumento de mobilizao da comunidade para assumirem o papel de

agentes de mudana.

25

Para Milton Santos (2007. p. 14),

O territrio no apenas o conjunto de sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas; o territrio tem que ser entendido como o territrio usado, no o territrio em si. O territrio usado o cho mais a identidade. A identidade o sentimento de pertencer quilo que nos pertence. O territrio o fundamento do trabalho, o lugar da residncia das trocas materiais e espirituais e do exerccio da vida. [...] Assim o territrio que ajuda a fabricar a nao, para que a nao depois o afeioe.

A figura a segui traduz as interfaces necessrias para a compreenso dos

aspectos que determinam o espao no contexto mais amplo.

Fonte: http://www.geosaude.cict.fiocruz.br/simposio/xris/Paulo Nossa.pdf pesquisado em 07 de janeiro de 2011

Figura 01-Quadro de referncia contempornea da Geografia da Sade face construo multidimensional do espao

Santos (1988; 28) conceitua o espao geogrfico como um conjunto

indissocivel de sistemas e objetos [fixos] e de aes [fluxos] que se apresentam

como testemunhas de uma histria escrita pelos processos do passado e do

presente. A adoo desta concepo requer a considerao de todos os elementos.

26

Para o PSF esse conceito refora mais uma vez a necessidade de atuar com

todas as instncias de polticas pblicas que se articulem em aes territrio com as

bases de todos os elementos, fixos e fluxos, que possibilitam identificar o contexto e

a dinmica social de uma populao e num planejamento conjunto, buscar as

solues para o desenvolvimento do territrio, gerando qualidade de vida.

Barcellos [org.] (2008, p.35-61) apresenta uma anlise sobre as diferenas de

conceitos de espao e territrio, a saber,

Podemos considerar, ainda, que a construo do espao geogrfico uma contingncia histrica do processo de reproduo social, geradora da necessidade de organizao econmica e social e de um determinado ordenamento espacial. No processo de construo do espao geogrfico, a vivncia e a percepo so dimenses essenciais e complementares, como fenmenos que consolidam os aspectos subjetivos associados a esse espao. [...]

Na verdade, entre as muitas diferenas dos conceitos de espao e territrio, a mais marcante talvez seja a de que a idia de espao no faz referncia a limites e ao acesso, enquanto a de territrio imediatamente nos recorda dos limites e das restries ao acesso dos que a ele no pertenam, [...]

Tais conceitos nos levam a reforar o que j foi apontado por Berkman e

Kawaki (2000 apud Nossa in Barcellos [org.] 2008, p.50). , quando evidenciam que

a Epidemiologia Social, tida como um ramo da Epidemiologia investiga as

determinantes sociais dos estados saudveis, sendo que os mesmos no existem

no vcuo, apartados das pessoas e do espao por elas edificado.

Dessa forma, entendemos que as relaes de sade-doena esto ligadas

pelo contexto do espao em que vivemos cercados pelos determinantes sociais e

por valores estabelecidos pelos indivduos e pelo coletivo. Isso nos ajuda a

compreender que para se valorizar o espao na conformao geogrfica, torna-se

necessrio uma relao de identidade e pertencimento a esse territrio.

Segundo Conceio (1999)

Inicialmente utilizado pela epidemiologia como uma tentativa de integrar o biolgico e o no biolgico, o espao geogrfico era considerado um lugar esttico, isolado sem dimenso histrica. Ao revestir-se de carter social, ele passa a atender tambm s necessidades os diferentes fatores que compem a estrutura epidemiolgica sejam analisados numa perspectiva dinmica e histrica, estando a sua compreenso diretamente articulada formao econmica e social. (CONCEIO et al., 1999;p.8)

27

Mendes (2007) destaca que os territrios sanitrios so espaos de oferta

tima de servios de rede e que esta rede precisa estar organizada segundo os

nveis de ateno, levando-se em considerao os fluxos de acesso aos servios de

sade. Assim a escala populacional precisa ser definida no desenho dos territrios

sanitrios, e que para a ateno primria, no h uma escala mnima necessria,

visto que esses servios devem estar localizados prximos s pessoas.

Segundo Donabedian (1973 apud Travassos C. Martins M. 2004, S.191), em

uma de suas primeiras publicaes o conceito de acesso diz respeito a aspectos da

oferta de servios relativos capacidade de produzi-los e de responder s

necessidades de sade de uma determinada populao. Ele apresenta duas

dimenses da acessibilidade: a scio-organizacional e a geogrfica e refora que

para garantia do acesso fundamental que essas dimenses se interrelacionem. A

acessibilidade scio-organizacional inclui todas as caractersticas da oferta de

servios, exceto os aspectos geogrficos, que obstruem ou aumentam a capacidade

das pessoas no uso de servios

Consolidando a compreenso sobre o tema, apresentamos a seguir o quadro

descrito por Giacomini (1992), em seu estudo sobre Regionalizao da Sade, que

demonstra a importncia do conceito de sade ser trabalhado a partir do processo

sade-doena.

28

Quadro 01: A concepo biolgica e a concepo do Processo Sade-Doena

Fonte: GIACOMINI, 1992, p.35.

29

2.2 Regionalizao da Sade

Minhas consideraes acerca do assunto fundamentam-se na preocupao

em apresentar alm de conceitos, algumas reflexes quanto a questes que se

apresentam por vezes contraditrias, se forem aprofundados os estudos, no que

tange a organizao da rede de servios em seus diversos nveis de ateno.

Ao nos depararmos com os estudos feitos na Inglaterra no incio do sculo XX

por Bertrand Dawson (1920), mdico e oficial do Imprio Britnico, que props a

reestruturao dos servios de sade nos meios civis, entendemos que o modelo

terico por ele apresentado se contrapunha s idias de Abraham Flexner (1910),

educador formado pela Universidade de Johns Hopkins, nos Estados Unidos, que

em sua reforma do ensino mdico colocava o foco na ateno curativa a ser

realizada nos hospitais e nos especialistas mdicos. Uma medicina orientada para o

indivduo e sua doena.

Dawson defendeu em seu relatrio a reorganizao do setor de sade

britnico, com base nas necessidades da comunidade, com aes e servios de

sade acessveis a toda a populao, alm de defender a organizao de uma rede

de servios de diversos nveis de ateno, de forma integrada com vnculos para os

encaminhamentos de pacientes (NOVAES, 1990, P.38).

A diferena no modelo de ateno se d quando Dawson formula que:

Os servios para as famlias de uma regio especfica devem possuir como base um centro primrio de sade, ou seja, um estabelecimento que oferea os servios da medicina curativa e preventiva e que esteja a cargo de mdicos generalistas, junto com um servio de enfermagem eficiente, e que tenha a colaborao de consultores e especialistas visitantes. (DAWSON, 1920 apud NOVAES, 1990, p. 38)

30

Centros de Ateno Primria

Hospitais de Ensino

Centros de Ateno Secundria

Servios Suplementares

Servios Domiciliares

Fonte: adaptado de http://www.med.virginia.edu/hs-library/historical/kerr-white/dawson.htm

Figura 02: Diagrama de Dawson

Passados tantos anos, percebemos o quanto as idias do Relatrio Dawson

so contemporneas e se aplicam perfeitamente ao modelo de sistemas e servios

de sade to presentes em nossa legislao de sade em vigor.

As idias do relatrio Dawson so fundamentais quando pensamos na organizao do setor como um sistema, ou seja, como um conjunto integrado de aes e servios de carter tanto preventivo quanto curativo, incluindo a a promoo e a educao para a sade (RODRIGUES, 2009, p.48).

Segundo Novaes (1990), o processo de coordenao entre os nveis de

governo precisa estar muito afinado para que cada segmento dessa rede oferea os

servios para o qual estejam mais bem preparados. Destaca que:

http://www.med.virginia.edu/hs-library/historical/kerr-white/dawson.htm

31

A regionalizao considerada como um esquema de implantao racional dos recursos de sade, organizados dentro de uma disposio hierrquica na qual seja possvel oferecer uma assistncia mxima nos centros primrios e os demais servios utilizados apropriadamente de acordo com as necessidades individuais. [...] A regionalizao envolve sempre um ordenamento ou reordenamento de recursos com alterao das funes e das relaes entre os provedores de servios de sade. (NOVAES, 1990; p.40)

Para a implementao do modelo regionalizado h necessidade de: a) providenciar informao demogrfica e epidemiolgica da populao objeto; b) dispor de inventrio atualizado dos servios existentes; c) receber informao sobre a utilizao dos recursos; d) obter consenso comunitrio sobre prioridades; e) possuir completo conhecimento dos diversos aspectos da acessibilidade dos servios para corrigir as principais deficincias do sistema e de sua prestao; f) relacionar a formao pelas entidades educadoras de graduados nas cincias da sade, com as oportunidades de emprego; g) estabelecer novos mecanismos de cooperao intersetorial com planejamento conjunto, controle de qualidade e avaliao dos servios. (NOVAES. 1990, p.41)

Para Sheps e Madson (1977 apud Organizao Panamericana de Sade,

2003, p.26), a regionalizao envolve a construo e aceitao de uma filosofia do

espao social, ou seja, a regio como base da organizao, de instalaes e

pessoal para servios de sade de alta qualidade, econmicos e acessveis

Para Guimares (2005, p.1020), a regionalizao da sade no Brasil uma

necessidade para o fortalecimento do SUS e uma mudana qualitativa da poltica

nacional de sade. Qualquer proposta de regionalizao de sade no Brasil dever

contribuir para o fortalecimento da identidade local e de um determinado territrio no

qual o poder poltico-institucional exercido por um amplo conjunto de atores sociais

envolvidos.

Destaco aqui uma anlise sobre as reformas do governo federal a partir da

Constituio de 1988 quando no processo, a Unio prevaleceu sobre estados e

municpios

Arretche (2002) avalia que o Ministrio teria concentrado muito poder no

processo de descentralizao, transformando-se na principal arena decisria da

formulao da poltica nacional e no ator mais poderoso no processo de

implementao da reforma. Segundo ela, o processo teria se iniciado no governo

Collor e concludo no governo de Fernando Henrique Cardoso, com a NOB 96, o

que permitiu ao Ministrio fortalecer o controle sobre estados e municpios, os quais

tm de aderir s suas regras para ter acesso a recursos financeiros. Ela define este

processo como descentralizao concentradora

32

Tal concentrao se evidencia pelo fato do Ministrio da Sade definir todas

as regras que devem ser seguidas pelos estados e municpios, sem que se leve em

considerao as caractersticas de cada regio em todo o pas. Portanto no h

autonomia para definio de critrios com base no perfil epidemiolgico e

caractersticas de cada regio.

Cabe destacar que a regionalizao no deve deter-se aos aspectos

burocrticos administrativos, mas sim ter em conta a necessidade de uma anlise

espacial acerca dos aspectos tcnicos que possibilitam o acesso aos servios nos

seus nveis de ateno sade. Nesse sentido, o estudo do territrio se fundamenta

como estratgia para determinao das necessidades de sade da populao.

Dessa forma, um dos problemas identificados baseia-se no fato de que a maioria

dos municpios do pas, no tem a estrutura e capacidade financeira que garantam a

oferta desses servios

Peres (2002) traz em sua anlise a forte tendncia centralizadora da Unio,

destacando:

[...] na histria do federalismo brasileiro os perodos de sstoles (concentrao de poder) foram mais numerosos e longos do que os movimentos de distole. Como outras federaes, a brasileira surge com um centro relativamente fraco, sem capacidade de impor sua vontade sobre todo o territrio e, por isso, obrigado a pactuar freqentemente certa partilha do poder com os interesses regionais e locais, mas que vai aos poucos se transformando num Estado crescentemente centralizado em torno da Unio (PERES, 2002, p. 43-44).

Entende-se que a opo pela poltica de municipalizao da sade, representa no uma opo tcnica, mas uma estratgia vitoriosa da Unio na sua disputa de poder com os governos estaduais na rea da sade. Ao optar por este caminho, a Unio pde assegurar o total domnio sobre o processo, que vai da definio detalhada de todas as regras, ao controle de sua execuo, o que pode incluir at mesmo a perda pelos demais entes federados de recursos financeiros transferidos pela Unio (PERES, 2002, p. 112).

Esse modelo baseado na concentrao dos repasses financeiros pelo

governo federal trouxe uma dependncia para o nvel local, comprometendo a

descentralizao para os estados e municpios, visto que o Ministrio da Sade

atravs de suas portarias e normas reforam a concentrao de autoridade na

formulao de regras para estes (ARRETCHE, 2003).

evidente que municpios com menos de 50 mil habitantes certamente tero

dificuldade de garantir acesso s aes e servios de sade em todos os nveis de

33

ateno, exigindo dessa forma uma ampla cooperao do estado no sentido de

garantir esse acesso.

Mecanismos para a qualificao do processo de regionalizao foram criados

no sentido de garantir os princpios do SUS. A criao do Colegiado de Gesto

Regional (CGR) prope um espao permanente e privilegiado para a pactuao

entre municpio(s) e estado(s). (BRASIL op.cit. p.21)

Exemplos como o da Espanha, com um modelo que descentralizou o poder

do governo central para as regies com autonomia de gesto, para gerir o sistema

de sade e autonomia oramentria, permitiu que a partir de 2001 todas as regies

do pas tenham fundos prprios para aplicao nas necessidades de ateno

sade de acordo com as caractersticas de cada territrio.

Porm a Espanha necessitou implantar sistemas integrados de sade que

resolvessem problemas originados nas caractersticas produzidas pelas diversas

Comunidades autnomas, permitindo a elaborao de um Sistema que se baseou

na racionalizao dos recursos existentes e se programou para organizar-se em trs

nveis: a ateno primria sade, a ateno especializada e a ateno scio

sanitria (MENDES, 2009, p.120).

Sistemas pblicos de sade como o do Canad, partiram de um modelo

fragmentado para sistemas integrados de sade, com a definio de uma populao

de responsabilidade do mdico de famlia, com pagamento por captao, que passa

ser o responsvel pela porta de entrada para a rede de servios nas provncias (ibid,

2009, p.117).

2.3 Os marcos legais da Regionalizao

A Constituio Federal de 1988 estabelece que: as aes e servios pblicos

de sade integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema

nico (art. 198). Nesse mesmo artigo menciona a descentralizao como uma das

trs diretrizes do SUS (art. 198, I), o atendimento integral, com prioridade para as

atividades preventivas, sem prejuzo dos servios assistenciais (artigo, 198, II), e a

participao da comunidade.

34

A Lei Orgnica da Sade (Lei n. 8.080/90), ao definir os princpios do SUS,

inclui os seguintes:

II integralidade de assistncia, entendida como conjunto articulado e contnuo das aes e servios preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os nveis de complexidade do sistema;

[...]

XI [...]

b) regionalizao e hierarquizao da rede de servios de sade; (art. 7).

Os dois princpios destacados acima mostram uma inteno da legislao no

sentido de assegurar a oferta dos diferentes nveis de ateno em cada regio de

sade. Para Teixeira e cols.

[...] o processo de construo do Sistema nico de Sade no Brasil tem contemplado a implementao de um conjunto de estratgias de mudana do financiamento, gesto e organizao da produo de servios. Nesse contexto ganha importncia o debate sobre a municipalizao da gesto do sistema e as alternativas da redefinio do(s) modelo(s) assistencial (ais) do SUS (IESUS,VII(2) Abril/junho,1998, p.7).

Ressalta-se que a organizao dos Sistemas Locais de Sade (Silos),

apresentada em 1989 pela Organizao Pan-americana de Sade (OPAS), se

desenhou como proposta de organizao dos sistemas nacionais de sade na

Amrica Latina.

A nfase dos SILOS a organizao do sistema a partir do nvel primrio, que deve constituir o primeiro contato da populao com o sistema de sade e o nvel que deve tambm estabelecer a relao mais estvel e permanente do sistema com seus usurios. O nvel primrio tambm deve desempenhar o papel de porta de entrada do sistema de sade de forma que o acesso ao atendimento especializado (secundrio) ou hospitalar (tercirio) deve normalmente depender de encaminhamento (referncia) por parte dos clnicos gerais e demais profissionais das unidades primrias de sade. ( RODRIGUES e SANTOS, 2009, p.50).

No processo de implantao do SUS, alm da Lei Orgnica, a partir dos anos

90 foram editadas diversas portarias do Ministrio da Sade as Normas

Operacionais Bsicas (NOB) e as Normas Operacionais de Assistncia Sade

(NOAS), que estabeleceram critrios para a descentralizao e a regionalizao

(grifos meus).

35

O impulso descentralizao da sade do governo federal para os municpios

iniciou-se atravs das NOB/91 e NOB/92 que regulamentaram a transferncia de

recursos para estados e municpios. A NOB/93 de forma mais clara definiu atravs

de trs modalidades de gesto a forma como os municpios poderiam fazer sua

habilitao, conforme a capacidade de gesto administrativa, permitindo que

recebessem recursos oriundos do governo federal na mesma proporo da

capacidade de assumir os compromissos definidos para a sade.

A partir da Norma Operacional Bsica de 1996 (NOB 01/96), o PSF ganhou

grande impulso com a transferncia de recursos financeiros (fundo a fundo) para os

municpios atravs de recursos federais para ateno bsica, propiciados pelo Piso

de Ateno Bsica PAB fixo (repasse per capita) e o PAB varivel (repasse

financeiro para implantao e manuteno de equipes de sade da famlia).

Com a publicao da NOB/96 as metas estabelecidas pelo Ministrio da

Sade, reforam a idia de planejar, organiza e monitorar aes e garantindo a

descentralizao.

A municipalizao da gesto dos servios de sade foi o elemento central da agenda de reformas do governo federal ao longo da dcada de 90, e pode-se afirmar que, deste ponto de vista, a reforma foi um sucesso. Em 2000, 99% dos municpios estavam habilitados junto ao SUS, aceitando, assim, as normas da poltica de descentralizao do governo federal (ARRETCHE, 2003.p. 446).

Visando o desenvolvimento dos princpios organizativos do SUS, ressalta-se:

a descentralizao da gesto do sistema, a regionalizao e hierarquizao dos

servios, a participao da comunidade e o carter complementar do setor privado.

A Norma Operacional de Ateno Sade (NOAS/SUS 01/01) prev a organizao

de uma rede articulada e efetiva a ser definida em cada Estado por meio de Planos

Diretores de Regionalizao (PDR).

No artigo Subsdios para uma proposta de gesto da Rede de Aes e

servios de Sade do SUS, com base em resultados, CORDEIRO et al.(2008),

descrevem:

Desde 2001, a Norma Operacional de Assistncia Sade (NOAS 01/01), publicada pela Portaria GM/MS n. 95, de 26 de janeiro de 2001 do Ministrio da Sade estabelece que os estados devam coordenar o esforo de definio de regies, microrregies e mdulos assistenciais, englobando um ou mais municpios para a regionalizao da rede de aes e servios do SUS. Tal regionalizao deve ser estabelecida pelos Planos Diretores de Regionalizao (PDR), pactuados entre os estados e os municpios. Mais

36

recentemente, o Pacto pela Sade (Portaria GM/MS n. 399, de 22 de fevereiro de 2006), define as Regies de sade como territrios contnuos, identificados a partir de identidades culturais, econmicas e sociais, de redes de comunicao e infra-estrutura de transportes compartilhados do territrio. Esta Portaria diz, ainda, que a organizao da Regio de Sade deve favorecer a ao cooperativa e solidria entre os gestores e o fortalecimento do controle social, o que deve ser atingido por meio da pactuao entre todos os gestores envolvidos e a criao de Colegiados de Gesto Regional (CORDEIRO et al., 2008 jul-dez. p.53-62).

O Pacto de Gesto (Brasil, 2006) estabelece diretrizes para a gesto do

sistema nos aspectos da Descentralizao, Regionalizao, Financiamento,

Planejamento, Programao Pactuada e Integrada PPI; Participao e Controle

Social; Gesto do Trabalho e Educao na Sade.

Porm deparamo-nos a com o desafio de organizao dessa rede que

pressupe a pactuao entre estado e municpio para a perfeita distribuio dos

servios de forma a garantir o acesso da populao a esses bens. Existem

dificuldades concretas e relacionadas integrao intermunicipal que garantam

esses princpios.

2.4 O modelo de ateno baseado na Sade da Famlia

A Sade da Famlia se consolida como um modelo que busca programar

novas formas de ateno sade que visam garantir populao acesso universal,

a integralidade e a equidade numa rede de servios hierarquizada e resolutiva.

Dessa forma buscou-se romper com o modelo de ateno sade centrado na

assistncia mdica, curativa e individual, com forte concentrao na especializao

clinica fortemente baseada em tecnologias duras, para um modelo centrado no

conceito de cidadania que vai alm dos aspectos relacionados a ausncia de

doena.

Nessa direo, o PSF foi criado na dcada de 1990, baseado em

experincias de xito em outros pases, como Canad e Inglaterra e se prope a ser

pautado na ateno multiprofissional baseado na premissa de mudana do modelo

de ateno sade com base no indivduo, sua famlia e a comunidade onde vive.

Fortalece tambm a necessidade de proporcionar a participao social no controle

da assistncia de sade prestada (BRASIL, 1990).

37

No artigo Informes Tcnicos Institucionais, publicado na Revista de Sade

Pblica (2000) destacamos:

A estratgia do PSF prope uma nova dinmica para a estruturao dos servios de sade, bem como para a sua relao com a comunidade e entre os diversos nveis e complexidade assistencial. Assume o compromisso de prestar assistncia universal, integral, equnime, contnua e, acima de tudo, resolutiva populao, na unidade de sade e no domiclio; sempre de acordo com suas reais necessidades alm disso, identifica os fatores de risco aos quais est exposta, neles intervindo de forma apropriada. (REV.. SADE PBLICA, vol. 14 n 3, 2000 p.2)

Apontamos a a necessidade de consolidar as prticas de vigilncia em

sade, garantindo a capacitao de profissionais de sade que possuam habilidades

para o desempenho de um trabalho em equipe, centrado no processo de trabalho

baseado na realidade de um determinado territrio com suas caractersticas e

especificidades.

Com o objetivo de dinamizar os preceitos estabelecidos no SUS, o PSF traz

para a ateno primria o foco nas aes desenvolvidas em um territrio definido

para cada equipe de SF responsvel pela coordenao do cuidado com um olhar

para a promoo da qualidade de vida das famlias e cidados desse territrio.Essa

equipe possa a ser responsvel por uma rea definida e dividida em microareas,

possibilitando que o acompanhamento das famlias acontea a partir de um

processo de trabalho compartilhado pelos membros dessa equipe.

O foco deixa de ser a doena e o olhar da equipe passa a ser a avaliao de

risco sob a tica da Vigilncia em Sade. As aes de sade so desenvolvidas de

forma mais abrangente respeitando-se os ciclos de vida que potencializam essa

interveno.

Nesse cenrio, o PSF prope uma nova dinmica para estruturao dos

servios e aes de sade, bem como sua relao com a comunidade e entre os

diversos nveis de complexidade assistencial. Essa estratgia assume o

compromisso de prestar assistncia universal, integral e equnime, de forma

contnua e resolutiva populao, tanto nas unidades de sade quanto nos

domiclios, identificando os fatores de risco aos quais ela est exposta e neles

intervindo de forma apropriada. (SOUSA, 2000, p.25 apud TIMTEO et. col. 2005).

A necessidade de reorientao da ateno primria define essa estratgia

como potente modelo de reorganizao de ateno a sade, visando maior

38

resolubilidade da ateno e compreendida como principal para mudana de

modelo que dever se integrar ao contexto de reorganizao do sistema de sade

(BRASIL. 2007). O Ministrio da Sade ento criou mecanismos indutores para

adeso dos municpios mudana. O Programa de Sade da Famlia (PSF) passa a

ser prioridade na poltica nacional de sade.

O Ministrio da Sade enfatiza, entretanto, que cada equipe de sade da

famlia responsvel por at 4000 pessoas, no territrio e que para a ateno

secundria, a escala mnima pode estar entre 100 a 150 mil pessoas e para a

ateno terciria a escala de acesso deve estar em torno de 500 mil pessoas.

Passamos a conviver com a necessidade de converso do modelo tradicional

de ateno para a estratgia de sade da famlia. Isso especialmente notado em

grandes centros urbanos que travam esforos com diferentes caractersticas nos

modelos de ateno. Dessa forma, o Ministrio da Sade atravs do PROESF

estimulou os municpios com mais de 100 mil habitantes a ampliarem a cobertura da

ateno primria atravs do novo modelo. Sendo assim, a expanso da rede

assistencial se faz atualmente, atravs dessa estratgia e da necessidade de

reorganizao das unidades tradicionais no sentido de ampliar o acesso e garantir

maior cobertura.

Mudar o modelo assistencial curativo, centrado na figura do mdico, requer

fundamentalmente interferir nos micro processos do trabalho em sade, nas

concepes deste mesmo trabalho e construir novas relaes entre usurios e

profissionais e destes entre si, na tentativa de transform-los em sujeitos, ambos

produtores do cuidado em sade (Franco & Merhy, 1999 apud Scherer 2005).

Devido s caractersticas da cidade, com desigualdades sociais marcantes e

crescimento dos aglomerados subnormais, a SMS/RJ definiu em 2003 como

prioridade, no incio de sua implantao, relacionada a primeira etapa do PROESF

(Programa de Expanso da Estratgia de Sade da Famlia), a expanso da

cobertura da ateno bsica, atravs da Estratgia de Sade da Famlia,em reas

consideradas prioritrias4.

4 4 SMS-Rio;IPP- Coleo Estudos da Cidade (2003). Expanso e consolidao da Sade da Famlia.

Apresenta o planejamento com base nas caractersticas da Cidade,( suas necessidades de cobertura da ateno bsica atravs da implantao de ESF, nas reas definidas como prioritrias, segundo critrios especficos.

39

2.5 O PSF na Cidade do Rio de Janeiro: um breve histrico

A Cidade do Rio de Janeiro possui 1.182,296 Km e densidade demogrfica

de 5.232 habitantes/km. (BRASIL,2010). O Municpio est organizado em cinco

reas de Planejamento (AP) com 33 Regies Administrativas (RA) e 160 Bairros.

Em 1993 a SMS/RJ criou e implantou suas reas de Planejamento (Resoluo SMS

n 431 de 14/04/1993). Nesse mesmo ano, haviam com 86 unidades prestadoras de

servios (UPS) municipais, num total de 15 hospitais e 71 unidades ambulatoriais.

(Ofcio S/STE/CIG n 67/96). (SOUZA, 2010)

As reas de Planejamento so subdivididas em dez (10), com caractersticas

diferenciadas no que diz respeito oferta de servios, estrutura de suas

populaes e aos indicadores scio-econmicos, cada uma destas AP possui

estrutura gerencial denominada Coordenao de rea de Planejamento (CAP).5

Se levarmos em considerao que a Cidade do Rio de Janeiro, atravs de

sua diviso administrativa em 10 reas de Planejamento (AP) de sade, tem como

funo a gesto de servios e aes de sade nos nveis de ateno primria e

secundria, observamos ainda que muitas dificuldades se originaram na forma como

se deu essa desconcentrao, que ainda possui mecanismos frgeis de controle e

avaliao dos servios.

Ressalte-se aqui que, a desconcentrao do oramento iniciada em 2006,

ocorreu sem levar em considerao o tamanho da populao, o tamanho da rede de

servios sob responsabilidade da AP e as caractersticas epidemiolgicas de cada

uma dessas reas

A partir do ano de 20036, a Secretaria Municipal de Sade do Rio de Janeiro

elaborou o Projeto Municipal de Expanso da Sade da Famlia como parte

integrante do Projeto de Expanso e Consolidao da Sade da Famlia PROESF,

5 As Coordenaes de rea de Planejamento (CAP) configuram uma unidade intermediria e

mediadora entre o nvel central e as unidades prestadoras de servios do SUS em seu territrio e, em algumas circunstncias, dessas com a populao usuria desses servios, ou com as lideranas e conselheiros de sade da rea.(Ministrio da Sade. 4 seminrio da Regio Metropolitana 1. Frum dos Conselhos Municipais de Sade. Srie D, Reunies e Conferncias. Braslia.2005.) 6 6 SMS-Rio; IPP- Coleo Estudos da Cidade. Expanso e consolidao da Sade da Famlia,2003..

Apresenta o planejamento com base nas caractersticas da Cidade, suas necessidades de cobertura da ateno bsica atravs da implantao de ESF, nas reas definidas como prioritrias, segundo critrios especficos.

40

do Ministrio da Sade com o apoio do Banco Mundial. O programa que seria

desenvolvido at 2009 props como objetivo a organizao e ao fortalecimento da

Ateno Bsica.

Na ocasio foram utilizados trs critrios para definir que reas por sua maior

vulnerabilidade, deveriam ser prioritrias para a implantao da Sade da Famlia.

Esses critrios foram assim definidos: no primeiro, o IDH dos bairros que foram

ordenados do mais baixo ao mais alto com as suas respectivas populaes.

Nesse critrio de bairros com o IDH abaixo de 0.7, estimou-se uma populao

de 1.800.000 habitantes distribudos em 33 bairros, correspondendo a 30% da

populao do municpio. No segundo critrio definiu-se a cobertura da populao

que habita nos setores subnormais ou favelas que correspondiam a 545.011

habitantes. (RIO DE JANEIRO 2003)

No terceiro critrio, levou-se em considerao reas com vazios

assistenciais, caracterizando-se dessa forma a dificuldade de acesso da populao,

aos servios e aes de sade.

Em 2003 a Ateno Bsica contava em todo municpio com 76 centros de

sade e 13 postos de sade, distribudos nas dez reas de planejamento (AP),

caracterizando assim uma baixa cobertura do nvel de Ateno Primria no

municpio, (RIO DE JANEIRO, 2003) No mesmo ano apresentava 80 equipes de

Sade da Famlia, conforme informaes contidas na pgina do Ministrio da Sade/

Departamento de Ateno Bsica, Secretaria de Ateno Sade, competncia

dezembro de 2003.

Utilizou-se naquele momento o mapeamento de domiclios baseados em

documentos da Fundao Nacional de Sade (FUNASA), objetivando a definio do

nmero de equipes da Sade da Famlia. Ressalta-se que, ao longo de todo o

processo, foi necessrio garantir e priorizar o canal de comunicao entre o

Conselho Municipal de Sade, os Conselhos Distritais de Sade com as discusses

locais com as Associaes de Moradores.

Nesse cenrio, foi comum o surgimento de conflitos quanto ao entendimento

da mudana de modelo de ateno na Cidade do Rio de Janeiro, em especial nas

reas onde se iniciou a converso de unidades de ateno tradicional para o modelo

sade da famlia.

41

Esse processo identificou a necessidade de reavaliao quanto a metodologia

aplicada, visto que face aos vazios sanitrios existentes, muitas unidades

transformadas possuam um vasto territrio sob sua responsabilidade, tornando a

operacionalizao do processo de trabalho por vezes, invivel face necessidade

da incluso de um nmero enorme de equipes de sade da famlia em espaos j

existentes com caractersticas distintas quelas preconizadas pelo Ministrio da

Sade. Some-se a essa dificuldade a necessidade de grandes deslocamentos da

populao e das equipes de PSF para a unidade de sade..

Neste perodo a Prefeitura definiu a poltica contratual de recursos humanos

para o Programa Sade da Famlia. O quadro tcnico para as equipes e para a

superviso deveria ser inicialmente, oriundo do quadro de servidores e os agentes

comunitrios de sade contratados atravs de convnios, mediante processo

seletivo pblico, e seguindo as orientaes do Ministrio da Sade.

Quanto rea fsica para implantao de novas unidades, observou-se que

um dos maiores desafios foi o de se identificar espaos para reforma ou adequao

que pudessem respeitar os limites pr-determinados de custo, por tratar-se de

contrapartida do municpio. Esse foi um dos motivos que contribuiu para inviabilizar

a expanso da forma como se programou de 2003 a 2008. Certamente a falta de

apoio entre os trs segmentos da Gesto Pblica impediu que alternativas fossem

encontradas na ocasio para superao deste problema.

Ressalte-se que naquele perodo, embora o governo municipal tenha

disponibilizado oramento para a expanso do PSF, a enorme dificuldade de

regularizao dos imveis para implantao das unidades de sade em

comunidades definidas como prioritrias, foi um dos grandes entraves para o

alcance das metas estabelecidas.

Entre os anos de 2005 e 2008, as dificuldades para expanso do PSF

permaneceram, mesmo com a interveno federal em hospitais da Cidade do Rio de

Janeiro, que levou a SMS a devolver os hospitais originados do Ministrio da Sade,

o nmero de equipes implantadas nesse perodo, ficou aqum do que foi planejado,

mesmo com previso oramentria para tal.

O Plano Municipal de Sade da Cidade do Rio de Janeiro, em seu quadrinio

2005-2008, apresentou o seguinte quadro:

42

Em fevereiro de 2005, o Conselho Municipal de Sade do Rio de Janeiro votou pela suspenso da condio de Gesto Plena do Sistema Municipal, encaminhando sua deciso Secretaria de Estado de Sade do Estado do Rio de Janeiro SES / RJ e Comisso Intergestores Bipartite - CIB. Estabelecido o impasse poltico, o Presidente da Repblica assinou o Decreto n 5.392 de 10 de maro de 2005, cujas conseqncias geraram a interveno federal em hospitais da cidade Janeiro.

[...] o nmero de equipes do Programa de Sade da Famlia aumentou,. (Rio de Janeiro, p.291; Plano Municipal de Sade 2005-2008) A SMS-RIO manteve integralmente as suas atividades assistenciais e gerenciais, garantindo o funcionamento de sua rede composta, poca, por 176 unidades, sendo 146 ambulatoriais, 22 hospitalares, 5 maternidades, 1 centro de parto normal e 2 unidades de atendimento veterinrio. Em 2005, foram realizadas 103.140 internaes e 25.554.611 procedimentos ambulatoriais e, ainda, a dispensao de 462.007 remessas de medicamentos para pacientes hipertensos e diabticos atravs do Programa Remdio em Casa. Continuou aprimorando suas formas de gesto, priorizou a ateno bsica. (PMS RJ 2005-2008)

A partir do ano de 2009 o Municpio do Rio de Janeiro adotou o Programa

Mais Sade (Ministrio da Sade, 2007), que prope qualificar e ampliar a rede de

servios de Ateno Primria, garantindo de forma compartilhada com a Unio, e o

Estado do Rio de Janeiro, a expanso e a sustentabilidade para o Sade da Famlia.

O Plano Estratgico da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro contemplou

maior oramento para a Sade, passando de 15% para 19%. A SMSDC em seu

Plano Plurianual (PPA) 2010 2013 estabelece entre as suas diretrizes o

fortalecimento da ateno primria, com a meta de ampliar a cobertura do

Programa de Sade da famlia para 55% da populao at 2013 (grifos meus).

(Site Sade-Rio Noticia, em 28/09/2009)

Esse plano de expanso do Sade da Famlia na cidade do Rio de janeiro,

trouxe como resultado no ano de 2010, o aumento de cobertura do Sade da

Famlia, permitindo que para cada 15 equipes implantadas, haja o aumento de

cobertura em mais 1% do Sade da Famlia

A nova conformao props a implantao dos Territrios Integrados de

Ateno Sade (TEIAS), visando a organizao da rede de servios de sade de

forma hierarquizada e regionalizada.

Dessa forma, abordamos o assunto a seguir, por tratar-se dessa estratgia

de organizao, a partir do diagnstico das necessidades da regio, com base nos

estudos dos fluxos de acesso aos servios de sade.

43

Os TEIAS reforam:

(...)o papel da ateno primria como modelo de organizao do sistema de sade para satisfao das necessidades da populao e se delineia atravs dos seguintes atributos: o primeiro contato, a longitudinalidade, a integralidade, a coordenao, a orientao comunitria, a focalizao na famlia e a orientao comunitria ( STARFIELD 1992, p. 32).

MENDES (2007) em a Modelagem das redes de Ateno a Sade apresenta

os momentos de modelagem das redes de ateno:

No momento 3: a construo dos territrios sanitrios e os nveis de ateno sade destaca-se que os territrios so tambm espaos de responsabilizao sanitria por uma populao definida onde necessrio que haja uma definio clara das aes e servios que a rede de ateno sade ofertar naquele territrio [...].Por conseqncia, os territrios sanitrios so recortados de forma a compatibilizarem ateno sade -se com os princpios da construo das redes de. ( MENDES, 2007, p.16)

Entendemos com base no conceito descrito nesse pargrafo que, os

Territrios Integrados de Ateno Sade devem proporcionar e garantir ateno

sade, tendo como critrio o acesso aos servios com qualidade, dentro dos

princpios do SUS. As redes de ateno sade buscam garantir a integralidade do

cuidado e os servios devem ser ofertados de forma articulada e integrada dando a

garantia da populao a esse direito constitucional.

Vale aqui destacar o documento datado de 1977 da OPAS/OMS:

O conceito de oferta de servios implcito na definio de cobertura significa que tais servios sejam acessveis aos membros da comunidade e, desse modo, satisfaam s suas necessidades no tocante sade. A possibilidade de acesso aos servios , por conseguinte, condio sine qua non para que a cobertura universal seja alcanada. A acessibilidade supe o seguinte:

a. A continuidade e organizao da prestao de servios mediante a combinao dos recursos geogrficos, financeiros, culturais e funcionalmente ao alcance da comunidade.

b. Servios adequados no que se refere ao volume e estrutura, ao tamanho e composio da populao e aos seus problemas de sade.

c. Aceitao e utilizao por parte da comunidade dos servios oferecidos. (OPAS/OMS, 1977, p 78.)

Para garantirmos aes e servios de sade dentro da modelagem dos

TEIAS, fundamental levarmos em considerao os determinantes e condicionantes

do processo sade-doena, de forma que se mude as caractersticas dos servios

44

baseados na ateno doena para uma abordagem ampliada, integrando as

necessidades de sade do indivduo, da famlia e da comunidade.

Nesse aspecto mais uma vez ressalta-se que a ateno primria a

coordenadora do cuidado sade, articulando-se com os demais pontos, ou

unidades de outros nveis de ateno, proporcionando servios de apoio diagnstico

para garantir que os cuidados sejam prestados com qualidade, de forma integrada e

articulada com outros segmentos das polticas pblicas, a exemplo da assistncia

social, da educao, entre outras.

necessrio que o desenho da rede se d, levando-se em considerao os

aspectos scio-demogrficos e culturais; a existncia de fluxos assistenciais que

identifiquem as caractersticas da regio, permitindo o acesso da populao aos

servios e aes de sade alm de garantir as aes de vigilncia em sade.

Como metodologia para organizao da rede de servios na Ateno Primaria

da Cidade do Rio de Janeiro, a SMSDCRJ/SUBPAV (2010), publicou a Carteira de

Servios, que alm de definir as caractersticas de cada unidade apresenta os

servios oferecidos de acordo com o perfil de cada uma.

Quanto aos modelos de ateno as unidades da APS podem ser classificadas em:

A Unidade onde todo o territrio coberto por equipes de Sade da Familia

B Unidades Mistas onde somente parte do territrio coberto pelo Sade da Famlia.

C Unidades onde ainda no temos equipes de sade da famlia, mas com territrio de referncia bem definido (, SMSDCRJ; SUBPAV; Ago 2010. p.04).

Segundo MENDES (2009), o modo de organizar as redes de ateno sade

define a singularidade de seus processos descentralizadores frente a outros setores

sociais. Os servios de sade estruturam-se numa rede de pontos de ateno

sade, composta por equipamentos de diferentes densidades tecnolgicas que

devem ser distribudos, espacialmente, de forma tima.

Em dezembro de 2010 o Grupo Tcnico da Comisso Intergestores Tripartite

(GTCIT), elaborou a verso final para anlise sobre Diretrizes para organizao

das Redes de Ateno Sade do SUS RAS, que estabelece os fundamentos

conceituais e operativos no sentido de operacionalizar as redes de assistncia.

45

Segundo essas Diretrizes (2010)

O objetivo das RAS promover a integrao sistmica, de aes e servios de sade, com proviso de ateno continua, integral, de qualidade, responsvel e humanizada, bem como incrementar o desempenho do Sistema em termos de acesso, equidade, eficcia clinica e sanitria, e eficincia econmica. (GTCIT, dezembro, 2010, p.7)

Para trabalharmos as RAS em SIG torna-se necessrio mapear todos os

servios de uma rede de ateno regional, de forma a possibilitar o desenvolvimento

de estratgias que facilitem a coordenao do cuidado e o acesso de forma

hierarquizada e regionalizada.

46

3 SISTEMAS DE INFORMAO E GESTO DA SADE DA FAMLIA

Os sistemas de informao so fundamentais para o processo de avaliao

nas aes e servios de sade. Constituem-se em fundamento para o tratamento,

disseminao e o uso das informaes em sade.

Mesmo que ao longo dos anos os Sistemas de Informao em Sade (SIS)

tenham sido programados de forma fragmentada desconsiderando a importncia de

utilizarem as mesmas bases de dados caracterizando-se por aparente

desorganizao entre as diferentes bases de dados existentes, que em uma anlise

simplista poderia apontar, reflete na prtica a lgica norteadora da dinmica de

funcionamento do Estado e de como se d o processo decisrio (MORAES, 1994,

p.40 apud MOTA, 2009 p.24).

MORAES (1993) j trazia em seus estudos a preocupao com o rumo da

sade pblica no Brasil e com as propostas para escolha dos Sistemas de

Informao em Sade.

O cotidiano intelectual do chamado setor sade vem se defrontando, cada vez mais, com a fragilidade e o esgotamento no s do atual modelo operante na rea, como tambm, dos atuais instrumentos de planejamento, de epidemiologia e de gerncia. Dentre eles, destacam-se os sistemas de informao e suas respectivas bases de dados, pela possibilidade de subsidiarem as respostas necessrias as questes colocadas pela sria crise sanitria e institucional vigente. Entretanto, as ltimas polticas de sade (AIS, SUDS, SUS) vm mostrando dificuldades em implementar propostas de estruturao de bancos de dados que estejam orientados pela lgica da descentralizao/integrao, superando a histria da fragmentao dos sistemas de informao em sade. Isto se reflete no atual panorama das informaes de sade que pode ser assim caracterizado: 1) um acmulo de dados, com baixo percentual de utilizao para apoio a deciso; 2) poucas informaes que dem conta da complexa situao de sade nas diferentes regies do pas; 3) esse triste quadro no um privilgio do Brasil [...] o resultado que na Amrica Latina fluem tremendas quantidades de dados que vo a lugar algum e que vm de fontes que no importa a ningum. (MORAES, 1993, p.05 apud MOTA, 2009, p.45)

Esse cenrio permanece atual na Sade Pblica no Brasil e exige dos

gestores que busquem formas de integrao das informaes mais eficientes.

evidente que a gesto em qualquer nvel de responsabilidade

necessita avaliar todos os processos que envolvem os servios de sade, que

permitam decidir os rumos para a qualificao de suas aes e apontem alternativas

47

inovadoras que garantam bons resultados tanto para quem utiliza esses servios,

quanto para os profissionais que nele atuam. Para Hartz:

Institucionalizar a avaliao tem o sentido de integr-la em um sistema organizacional no qual esta seja capaz de influenciar o seu comportamento, ou seja, um modelo orientado para a ao ligando necessariamente as atividades analticas s de gesto. Para tal, torna-se fundamental que as escolhas de sistemas de informao contribuam para a democratizao da informao, tendo seu uso incorporado pelos profissionais no servio e que subsidiem cada vez mais o controle social. (HARTZ, 2002: p.419 apud FELISBERTO, 2004 p.317)

3.1 Sistemas de informao do SUS

Segundo Branco (1996 apud MOTA, F. R. L., 2009, p.70) em seu artigo

Sistemas de Informao em Sade - SIS no nvel local chama a ateno para o

fato de que os SIS devem ser entendidos enquanto instrumentos para adquirir,

organizar e analisar dados necessrios definio de problemas e riscos para a

sade, avaliar a eficcia, eficincia e influncia que os servios prestados possam

ter no estado de sade da populao, alm de contribuir para a produo de

conhecimento acerca da sade e dos assuntos a ela ligados.

Sob esta tica, observa-se que os SIS no se restringem simples

repositrios de dados, mas, ao contrrio, tais sistemas deveriam ter o dinamismo

latente nos processos de troca, transferncia, comunicao e uso das infor