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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ - UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE - CCS
CURSO DE PSICOLOGIA
Sentido e saúde: uma perspectiva logoterapêutica
ÂNGELA CRISTINA BENINCÁ
Itajaí 2007
ÂNGELA CRISTINA BENINCÁ
Sentido e saúde: uma perspectiva logoterapêutica
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí Orientador: Prof. Aurino Ramos Filho
Itajaí 2007
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Ofereço esta pesquisa à minha família que tanto
se dedica e confia em mim, acreditando fielmente
em minha capacidade, me dando forças para nunca
desanimar. Aos meus amigos, que estiveram
sempre ao meu lado nos momentos mais difíceis
durante a construção desta pesquisa. Os meus
mais sinceros agradecimentos.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu Professor Orientador Aurino Ramos Filho, que me
orientou com dedicação, me apresentou a Logoterapia de uma maneira tão
maravilhosa a ponto de me deixar apaixonada por ela. Nos momentos de
dificuldade não apenas na construção da Pesquisa, mas também da própria vida,
eu pude contar com a sua ajuda, com as suas palavras. Tamanho foi o meu
crescimento pessoal ao longo do desenvolvimento desta pesquisa, que eu não
encontro palavras certas para definir o quanto eu agradeço e o quanto eu pude
aprender com os conhecimentos deste Professor. Espero ter sido uma ótima
orientanda aos seus olhos. Muito Obrigada.
SUMÁRIO
Resumo ................................................................................................................... 5
1 Introdução ............................................................................................................ 6
2 O processo saúde-doença ................................................................................... 9
2.1 Evolução do conceito de saúde ...................................................................... 11
3 Sentido de vida segundo a Logoterapia ............................................................ 15
3.1 Apontamentos históricos ................................................................................. 15
3.2 Sobre o sentido ............................................................................................... 19
4 Descoberta do sentido e promoção da saúde ................................................... 25
5 Considerações Finais .........................................................................................31
6 Referências Bibliográficas ..................................................................................34
Sentido e saúde: uma perspectiva logoterapêutica
Orientador: Aurino Ramos Filho Defesa: junho de 2007
Resumo
A psicoterapia logoterápica tem como princípio ajudar o homem a descobrir um sentido para a sua vida, seja na realidade, no amor ou no sofrimento. Incentiva o homem a encontrar o “para quê” viver, uma vez que esse sentido não precisa ser inventado, mas sim descoberto no simples ato de viver. Assim, a presente Monografia, tem por objetivo investigar, por meio da Pesquisa Bibliográfica, como, para a Logoterapia, a descoberta de um sentido promove a saúde, bem como relacionar essa teoria com os conceitos de saúde. Para isso foram realizadas leituras sobre o significado da descoberta de um sentido, segundo a Logoterapia, criada por Viktor Emil Frankl (1905-1997) e, também sobre os conceitos de saúde, segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS. Identificando, assim, que o ser humano quando encontra o sentido de sua vida é impulsionado a enfrentar os desafios que a vida impõe, sempre com a finalidade de encontrar o equilíbrio entre a saúde e a doença. Ao mesmo tempo que ele encontra um sentido para viver, algo para o qual ele se direcione para fora de si mesmo, ele previne e promove a sua própria saúde. Distanciando-se de suas neuroses, de seus problemas; tornando-se responsável por aquilo que tanto deseja: o seu sentido.
Palavras-chave: sentido de vida – Logoterapia - saúde.
1 Introdução
A presente Monografia consiste em investigar como, para a Logoterapia, a
descoberta de um sentido para a vida promove a saúde. Sendo assim, a
Logoterapia, por não ser, ainda, uma temática muito abordada no Curso de
Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí, Campus de Itajaí, despertou-me um
interesse muito grande em entender e descobrir qual o significado da descoberta
de um sentido para a vida e como ele pode promover a saúde da pessoa e da
coletividade.
Neste aspecto, a perspectiva da saúde é fundamental na práxis psicológica da
prevenção e da promoção da saúde do ser humano em geral, abordando o
conceito de saúde segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS, como sendo
o perfeito bem-estar biopsicossocial e na sua atual transformação, para bem-estar
biopsicossocio-noético.
A Logoterapia é a Terceira Escola Vienense de Psicoterapia, criada por Viktor
Emil Frankl (1905-1997). Foi precedida pela Psicanálise de Sigmund Freud (1856-
1939) e pela Psicologia Individual de Alfred Adler (1870-1937).
Logoterapia não é a procura de um sentido, mas “do” sentido. Não se trata de
inventar um sentido qualquer. Ele já existe e temos a tarefa de descobri-lo.
Esse sentido vital, para a Logoterapia, nasce da liberdade individual. É uma
direção que o homem se impõe pela responsabilidade para com a vida.
A Logoterapia busca tentar humanizar as Psicologias. Ela acredita que quando
o homem se humaniza ele se enxerga livre e, por ser livre, ele é consciente e
incondicionado.
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O sentido da vida é individual e intransferível. Encontra-se na intimidade de
cada um de nós. É um chamado para a liberdade e para a responsabilidade desta
liberdade.
Buscar um sentido na vida significa descobrir um “para quê” viver, ir além de si
mesmo, esquecer-se de si, seja direcionando-se para algo a ser realizado, um
objetivo, ou uma pessoa a qual amamos intensamente.
Muitas vezes nos percebemos fazendo perguntas a nós mesmos sobre o
porque vivemos e, quase sempre, sem respostas. Mas não somos nós quem
devemos perguntar. Na verdade, é a própria vida que a todo instante nos
questiona e o que devemos fazer é buscar interpretar e dar significado a essas
perguntas, pois são elas que nos abrem o caminho para que possamos dar sentido
a nossa vida. Esse sentido a que me refiro, muda constantemente, mas nunca
deixa de existir.
Para que o homem consiga suportar a dor do sofrimeno, das dificuldades, os
obstáculos que a vida coloca em seu caminho, não há nada melhor que ele saber
que a sua vida tem um sentido, um significado, uma missão para cumprir. É o que
vai dar forças a ele e, faz com que ele se despreocupe com o tempo, mesmo tendo
a consciência de sua finitude.
Foi empregada enquanto método, a Pesquisa Bibliográfica, de cunho
exploratório e, tem por princípio o aprimoramento de idéias, proporcionando um
melhor conhecimento e respondendo a um problema proposto, tornando-o mais
compreensivo. Consiste em dados encontrados em materiais publicados, sendo
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eles, livros, revistas e artigos científicos. A Pesquisa Bibliográfica é o primeiro
passo para qualquer pesquisa.
O decorrer do desenvolvimento de uma pesquisa envolve inúmeras fases,
desde a escolha do tema e a formulação de um problema, até a apresentação dos
resultados.
O tema referido nesta pesquisa, a Logoterapia, foi sugerido pelo orientador
Prof. Aurino Ramos Filho, que apresentou uma breve introdução sobre o assunto,
o qual foi do meu grande interesse.
O objetivo desta pesquisa consistiu em investigar como, para a Logoterapia, a
descoberta de um sentido promove a saúde. Definindo o conceito de saúde
segundo a Organização Mundial da Saúde – OMS, analisando e interpretando o
que significa a descoberta de um sentido para a Logoterapia e, enfim, relacionado
a descoberta de um sentido com a saúde.
2 O processo saúde-doença
Para Frankl (informação verbal)1, perceber o homem como biológico, é fácil,
palpável, mas ser humano é muito mais do que isso é espiritual, um ser que é
capaz de transcender, dirigir-se para alguma coisa que está fora dele, como
exemplo o amor. Sendo assim, ele tem a capacidade de enfrentar situações
lastimáveis e, ainda assim, tentar manter a saúde, ou seja, ter um sentido na vida
possibilita a saúde independentemente das circunstancias vividas.
O ser humano poderá ser saudável psicofisicamente. Porém, poderá ser uma
pessoa frustrada existencialmente ou, por outro lado, poderá ter problemas
psicofísicos, mas existencialmente ser saudável. Dessa forma, ter qualidade de
vida e saúde é mais do que estar biopsicossocialmente com bem–estar. A
dimensão espiritual-existencial deve formar parte do entendimento do ser humano
por inteiro e da avaliação dos processos de saúde e qualidade de vida. Quanto
maior o bem-estar espiritual e existencial da pessoa, maior o nível de saúde dela.
(TEIXEIRA, MULLER, SILVA, 2004 apud SARRIERA).
Há doenças que afetam o indivíduo e, ainda assim, ele dispõe de inteira saúde,
podendo viver muito tempo e é só depois de sua morte que se percebe a presença
de uma anomalia que ele próprio havia ignorado. Sendo assim, a ciência só pode
conhecer a anomalia, quando a mesma for sentida primeiramente na consciência
do indivíduo sob a forma de obstáculo ao exercício das funções, perturbação ou
nocividade. (CANGUILHEM, 1995).
1 Informação fornecida por Heloísa Marino, no Curso de Introdução a Logoterapia, SOBRAL, em São Paulo, dia 17 de março de 2007.
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Existe maneira de considerar a doença como normal, definindo o normal e o
anormal por uma estatística relativa, ou seja, uma saúde perfeita contínua é um
fato anormal, mas é que existem dois sentidos da palavra saúde, o biológico e o
espiritual.
Como já foi citado anteriormente, o ser humano é capaz de enfrentar situações
lastimáveis, como as perdas, a morte e é através da espiritualidade que ele
consegue retomar a vida, ser feliz e ter saúde.
Para Almeida Filho (2000), não há qualquer base lógica para uma definição
negativa de saúde, tanto no âmbito individual quanto no coletivo.
Nem todos os sujeitos sadios acham-se isentos de doenças e nem todos os
isentos de doenças acham-se sadios. A saúde não é o oposto lógico da doença,
por isso, não poderá de maneira alguma ser definida como ausência de doença.
A doença funciona como uma válvula de escape de conflitos intrapsíquicos e
emocionais, ou seja, o ser humano quando adoece necessita da doença para
sobreviver. É a maneira que ele encontra por manter a vida dentro dos limites
possíveis. (SILVA, 1994).
Em um conceito geral, ser doente é não ter valor, o que compreende a todos
valores negativos possíveis. Significa ser nocivo, socialmente desvalorizado. Mas
a doença não é somente um desequilíbrio, uma desarmonia. Ela é também o
esforço que a natureza exerce sobre o indivíduo para obter um novo equilíbrio.
Canguilhem (1995), percebe a doença como uma reação generalizada com
intenção de cura; o próprio organismo fabrica uma doença para se curar.
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Já na saúde, os valores desejados são uma vida longa, capacidade de
reprodução, de trabalho físico, força, resistência ao cansaço, ausência de dor, um
estado mental no qual sente-se o corpo o menos possível, e a sensação de existir.
Sampaio (1998), compreende a relação saúde/doença como opostos,
realidades diferentes, pontos extremos em uma escala quantitativa, onde muito de
um atributo de saúde, o faria um atributo de doença, qualidades diferentes de uma
mesma realidade, formas de expressão do dinamismo vital.
Canguilhem (1990) cita que a saúde perfeita não existe, a não ser como
conceito ideal. O conceito de saúde não é o de uma existência, mas sua função e
seu valor estão relacionados a ele juntamente com a existência.
Defino saúde como vida com saúde, ou seja, anos vividos com funcionalidade
produtiva e social, não esquecendo também o equilíbrio espiritual.
2.1 Evolução do conceito de saúde
Saúde, segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS, é definida como
perfeito bem-estar físico, mental e social e não apenas como ausência de doenças
(GIMENES, 1994 apud CAMON, 2002). Essa definição, até avançada para a
época em que foi realizada, é no momento irreal e ultrapassada.
Uma definição irreal, por que quando se fala de perfeito bem–estar, existe uma
utopia. Perfeição e bem-estar são palavras que implicam um certo subjetivismo, e
por esse fato, não são definíveis. Estão descritas dentro de um contexto que lhes
dá sentido, a partir da experiência íntima e pessoal do sujeito. A realidade é de
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cada um. Sendo assim, fica difícil rotular "boa" ou "má" qualidade de vida
(SEGRE; FERRAZ,1997).
Estamos vivendo em um período em que um grupo, nada pequeno de
profissionais da saúde buscam uma nova visão do paciente e da doença. Fundada
no preceito da Organização Mundial de Saúde - OMS que saúde deve ser definida
como bem-estar biopsicossocial, os segmentos mais avançados desse movimento
exigem que esse bem-estar seja também espiritual. Essa flexibilidade
paradigmática traduz a transformação pela qual o conceito biopsicossocial está
passando. Foi a partir da segunda metade do século XX, que lentamente ele está
transformando-se num conceito biopsicossocio-noético (GIMENES, 1994 apud
CAMON, 2002).
Um doente é um ser humano diferente, que talvez tenha sua vida encurtada. E
o sofrimento é também dor subjetiva, qualquer que seja sua a origem. O
tratamento de uma doença, qualquer que seja ela, somente será legítimo e ético
se o "doente" manifestar vontade de ser ajudado. Logo, volta-se a enfatizar a
prioridade da decisão pessoal em toda reflexão sobre qualidade de vida. Fica claro
que a realidade é também uma convergência de subjetivismos (SEGRE; FERRAZ,
1997).
Estudos têm demonstrado a influência do espiritual na saúde física, mental e
social. No ano de 1988 a Organização Mundial da Saúde – OMS despertou o
interesse de aprofundar as investigações na área, com a inclusão de um aspecto
espiritual no conceito multidimensional da saúde. Pode-se entender por
espiritualidade o conjunto de todas as emoções e convicções da natureza não-
material, supondo de que há mais no viver do que pode ser percebido ou
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compreendido. Como as questões sobre o significado do sentido da vida sem
nenhuma limitação de crenças específicas ou práticas religiosas (VOLCAN et al,
2003).
Segundo os mesmos autores, o bem–estar espiritual representa um fator de
proteção, relacionado a atitudes positivas de combate a enfermidade, diminuição
da ansiedade, das demandas impostas pela doença, diminuição do risco de
depressão e suicídio. O fortalecimento desse bem estar implica,
significativamente, na redução da angústia relacionada a doenças, bem como na
promoção da saúde mental.
Não existe a possibilidade de determinar com exatidão os mecanismos de
interação da espiritualidade na saúde. Sugere-se, então, que o exercício das
atividades espirituais, rituais e orações, por exemplo, podem influenciar
psicodinamicamente, através de emoções positivas como a esperança, o perdão,
a auto-estima e o amor. Estas emoções podem ser importantes para a saúde
mental. A vivência de ter sentido satisfação na vida possibilita ao indivíduo um
recurso interno para lidar e entender as situações existenciais críticas ao longo da
vida, como a dor, o sofrimento e, até mesmo a morte.
Sendo assim, a espiritualidade é considerada um recurso psicossocial
individual e, possivelmente comunitário de promoção de saúde (VOLCAN et al,
2003).
Para Samaja (2000), o conceito de que a saúde é um estado de perfeito bem–
estar físico, mental e social, criticado pelo seu idealismo (saúde é bem–estar) e
intenção normatizadora (implicando a medicalização de comportamentos sociais)
foi substituído, na Conferência Regional de Bogotá (1992), pela afirmação de que
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saúde é um projeto definido pelos países ou grupos sociais, de acordo com as
suas possibilidades econômicas, técnicas, políticas e culturais. Hoje, quando o
mundo vive sob o capitalismo globalizado, a saúde é vista também como um
projeto individual, capaz de conviver com certo grau de mal–estar, incapacidade e
mesmo de doença, a depender dos recursos materiais de que cada um disponha.
Para ele, não se separa saúde das condições de vida, com o que só pode ser
definida com o controle dos processos de reprodução social. Apesar de ser uma
posição difícil de ser sustentada.
O comportamento não–saudável é a principal causa de quase a metade de
todas as mortes na América do Norte. Há cem anos, as pessoas morriam
principalmente de doenças contagiosas ou acidentes. Hoje, geralmente, morrem
de "doenças de estilo de vida", ou hábitos pessoais prejudiciais à saúde. Alguns
estilos de vida promovem a saúde, enquanto outros causam doenças e levam a
morte. O inimigo somos nós mesmos.
Algumas causas de doenças estão fora do nosso controle. No entanto, muitos
riscos comportamentais podem ser reduzidos. Fatores comportamentais de risco
são ações que aumentam as chances de ocorrência de doenças, lesões ou morte
prematura. Sendo eles, altos níveis de estresse, hipertensão não tratada, fumo,
consumo excessivo de álcool e outras drogas, má alimentação, exposição
excessiva ao sol, direção em alta velocidade, entre outros (Coon, 2006).
Ainda para o mesmo autor, existe a possibilidade de se precaver com relação a
doenças e promover a saúde, se os comportamentos de risco forem diminuídos ou
eliminados, mas eles não são a única preocupação. Algumas pessoas têm uma
personalidade propensa a doenças que as deixa deprimidas, ansiosa, agressiva e,
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freqüentemente doentes. Porém, as pessoas intelectualmente habilidosas,
sensíveis, otimistas, e não hostis tendem a gozar de boa saúde.
Saúde não significa apenas ausência de doença. As pessoas realmente
saudáveis desfrutam de um estado positivo de boa saúde física e mental ou de
bem–estar. Manter a boa saúde é uma meta para a vida toda e um trabalho de
amor (Coon, 2006).
3 Sentido de vida segundo a Logoterapia
3.1 Apontamentos históricos
Nascido em 1905, em Viena, na Áustria, com a experiência de ter vivido 92
anos, quase um século inteiro, Viktor Emil Frankl, carrega no currículo da vida,
inúmeras experiências lamentavelmente vividas, mas que puderam vir a ser o
sentido de sua vida, deixando a nós seu legado mais importante: a Logoterapia.
A abordagem logoterapêutica, como uma modalidade de tratamento, busca
resgatar, na intimidade da alma, o sentido da vida. Nasceu na Segunda Guerra
Mundial, onde seu criador Viktor Emil Frankl esteve retido por três anos (GOMES,
1992).
Frankl como prisioneiro nos campos de concentração, sofreu as piores
degradações que um homem poderia suportar, perdeu tudo que era seu, sua
família, sofreu de fome, frio, teve seus valores destruídos. Mas mesmo em todo o
sofrimento, jamais lhe ocorreu se jogar contra as cercas elétricas, em busca da
morte (FRANKL, 2006).
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Atuou como psicólogo voluntário nos campos de concentração e, por meio de
suas observações, desenvolveu a Logoterapia, uma prática psicoterapêutica que
tem como característica principal o incentivo para o ser humano encontrar um
sentido para a vida (GOMES, 1992).
Sem qualquer intenção de substituir as grandes propostas anteriores, sendo
elas, a Psicanálise de Sigmund Freud (1856-1939) e a Psicologia Individual de
Alfred Adler (1870-1937), a Logoterapia surge como uma nova alternativa de
psicoterapia, tornando-se assim a Terceira Escola de Psicoterapia de Viena.
Sigmund Freud, descobriu no homem, a vontade de prazer, considerando-o um
ser ab-reagente, para o psicanalista a repressão é o momento onde surgem os
sintomas neuróticos, tornando inconscientes certos conteúdos da consciência.
Seu princípio terapêutico consiste, fundamentalmente, num fazer vir à consciência.
Já Alfred Adler enxerga no homem, a vontade de poder e, o sintoma neurótico é
interpretado como uma tentativa do indivíduo para se desvencilhar da
responsabilidade, ocorrendo uma diminuição do ser responsável (FRANKL, 1995).
Na Logoterapia de Viktor Frankl o homem é um ser agente (livre agir) e, tem
em si à vontade de sentido (LUKAS, 1989). Ser eu significa ser consciente e ser
responsável, e cabe ao paciente decidir perante quem se sente responsável, seja
perante Deus, seja perante sua própria consciência e decidir também pelo que se
sente responsável, sendo assim, que sentido encontra em sua vida (Frankl, 1995).
O conceito de homem segundo a Logoterapia está apoiado em três colunas:
1. Liberdade da vontade;
2. Vontade de sentido;
3. Sentido da vida.
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Liberdade da vontade significa liberdade da vontade humana, e a vontade
humana é a vontade de um ser finito. Visto isso, a Logoterapia, é vista como uma
psicologia não determinista (LUKAS, 1989).
O ser humano como ser autodeterminante, não é completamente condicionado
e determinado. Ele mesmo determina se cede ou não aos condicionantes. Não se
trata de um simples existir, mas de decidir qual e como será a sua existência. Da
mesma forma, todo ser humano tem a liberdade de mudar a qualquer instante
(Frankl, 2006).
Pelo fato de o ser humano estar sempre a procura de um significado para a
sua vida, devemos considerar o que Viktor Frankl chama de "vontade de sentido"
como um interesse primário do homem. Não apenas como uma questão de fé mas
também uma realidade. O ser humano busca constantemente algo que valorize a
sua sobrevivência (Frankl, 2003).
A Logoterapia tem como base a corrente filosófica existencial. O seu
pensamento privilegia o concreto, o singular, o vivido em relação aos conceitos e
generalidades. O Existencialismo é também uma forma de humanismo, onde o
cuidado de si, não tem sentido senão na perspectiva do cuidado dos outros
(HUISMAN, 2001).
Para Huisman (2001), a existência humana é contingência, ou seja, liberdade e
indeterminação. Sendo assim, enxerga-se a existência como uma escolha (viver é
escolher). Ela ultrapassa o saber objetivo, não se reduz nem ao ser, nem a uma
totalidade redutível a um sistema.
Existir é um ato de inventar quanto a maneira de viver, ser autêntico, em outras
palavras, é o reconhecimento de um ser-para-a morte, que se manifesta diante da
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certeza da morte, a significação da vida do homem não se deve a nada senão aos
seus próprios atos. O homem deve escolher o seu modo de ser, e dividido entre a
necessidade de escolher e a incerteza do fundamento dessa escolha, ele
experimenta a difícil experiência de uma liberdade que é como imposta para seu
próprio bem, para que seja livre (HUISMAN, 2001).
A Logoterapia, como análise existencial, reconhece no homem uma dimensão
noológica ou espiritual, em um aspecto mais amplo, situada além do psico-físico,
entendida não apenas como dimensão religiosa, mas valorativa, intelectual e
criativa. Frankl excluiu do estudo da Logoterapia qualquer comprometimento com
confissão religiosa (FRANKL, 1992).
É na dimensão noética que o indivíduo transcende a si mesmo, e faz dos
significados e valores uma parte fundamental da sua existência. Frankl fala da
auto-transcendência sendo que cada pessoa é única, vivendo no meio de
momentos únicos insubstituíveis que só pode ser realizado por aquela pessoa
como uma missão a por cumprir.
Frankl se deparou com o fato de que essa dimensão especificamente humana
é inconsciente e se manifesta através da intuição. O homem é constituído de uma
intencionalidade que o dirige para algo ou alguém fora da si mesmo, capaz de
orientá-lo. Frankl fala da relação com a transcendência atingida pelo sujeito, que
algo maior do que o homem o guia em direção a realização do sentido de vida.
De acordo com as teorias de Viktor E. Frankl, a imagem do homem segundo a
Logoterapia caracteriza-se em quatro dimensões, sendo elas, a biológica, a
psíquica, a social e a espiritual ou noética.
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A dimensão biológica compreende no homem, todos os fenômenos corporais,
abrange o fundamento celular orgânico, a estrutura vital fisiológica e tudo o que
faz parte dela, ou seja, uma dimensão somática. A dimensão psíquica abrange a
esfera da existência do homem com suas disposições, sensações, impulsos,
instintos, esperanças, desejos, vontades e também talentos intelectuais e
comportamentos. A dimensão social compreende os costumes e relações sociais.
Já na dimensão espiritual encontra-se a liberdade de tomada de posições
independente das condições corporais e da existência psíquica. Como exemplos,
as decisões pessoais da vontade, intencionalidade, interesses práticos e artísticos,
pensamentos criativos, religiosidade, consciência moral e compreensão de valores
(LUKAS, 1989).
Para Frankl, essa dimensão espiritual, chamada na Logoterapia de dimensão
noética, é especificamente humana e, é o que diferencia a visão de ser humano
das outras psicoterapias.
3.2 Sobre o sentido
O ser humano é capaz de superar qualquer sofrimento quando ele tem um
“para quê” viver, por mais difícil que seja a fase por qual ele passa, tudo se torna
suportável, por ter um “como” viver.
A Logoterapia tem como princípio a busca de um sentido, ou seja, ajudar o
homem a descobrir um sentido para sua vida, seja na realidade, no amor, ou no
sofrimento e incentivar cada pessoa a encontrar o “para quê” viver, uma vez que
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esse sentido não precisa ser inventado, tão pouco criado, mas sim descoberto no
simples ato de viver (GOMES, 1992).
Este sentido a qual me refiro, é uma meta, uma direção constante do homem
para alcançar um objetivo que nos impulsiona não apenas na busca da auto-
realização, mas também a transcender as limitações sociais (FRANKL, 2006).
O que importa, por conseguinte, não é o sentido da vida de um modo geral,
mas antes o sentido específico da vida de uma pessoa em um dado momento.
Uma vez que cada situação na vida constitui um desafio para a pessoa e lhe
apresenta um problema para resolver. Contudo, podemos perceber que não é o
ser humano que está sempre perguntando pelo sentido da vida. Na verdade, é ele
quem está sendo indagado pela própria vida. (FRANKL, 2006).
A realidade se apresenta na forma de uma particular situação concreta e, como
cada situação da vida é irrepetível, entende-se que o sentido de uma dada
situação é único. Esse significado, no momento em que ele é único, é objeto de
descoberta pessoal.
A descoberta do sentido se trata em particular de uma liberdade de agir com
responsabilidade em relação a situação a qual nos encontramos. Sendo que a
situação é sempre única, com um sentido que também é único, e a possibilidade
de fazer qualquer coisa com relação a situação é também única. É possível
também o não aproveitamento dessa oportunidade de dinamizar o sentido próprio
da situação, permitindo que ele passe e vá embora para sempre (FRANKL, 1989).
Ele é exclusivo, específico, e intransferível, pode ser cumprido apenas por
aquela determinada pessoa. Somente então, ele assume uma importância que
satisfará sua própria vontade de sentido (CAVALCANTE, 2006).
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Do mesmo modo, como os sentidos são únicos, eles são também mutáveis.
Mas não deixam de existir nunca. A vida não deixa, jamais, de ter sentido.
Segundo Cavalcante (2006), a Logoterapia tem como principal meta a
compreensão e aceitação das realidades da vida. Mesmo adversas, essas
realidades representam um destino existencial ao qual o homem é encarregado e
do qual não pode fugir.
O verdadeiro sentido da vida deve ser descoberto no mundo, e não dentro da
pessoa humana ou da psique. Essa característica denomina-se de
autotranscêndencia da existência humana. Ser humano é estar sempre dirigido
para algo ou alguém que está fora de si mesmo. Quanto mais ele esquece de si
mesmo, seja dedicando-se a alguma causa ou a amar outra pessoa, mais humano
será e mais se realizará. (FRANKL, 2006).
Segundo Frankl (2006), existem três diferentes formas de se descobrir o
sentido da vida. Sendo elas: criar um trabalho ou praticar um ato, encontrar
alguém ou experimentar algo e, a última pela atitude que tomamos em relação ao
sofrimento inevitável.
Ou seja, existe um sentido potencial a ser descoberto para além do agir e do
amor, mas ele também pode ser descoberto, mesmo em situações sem
esperanças, onde enfrentamos um destino que não pode ser mudado. Existe um
potencial unicamente humano que possibilita a transformação de uma tragédia em
um triunfo pessoal, a mudança da situação difícil em que o indivíduo se encontra
em um sucesso humano. (FRANKL, 1989).
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O sentido do sofrimento, só tem sentido quando quem sofre muda para melhor,
e esse é o segredo da riqueza absoluta do sentido da vida, riqueza essa que vê no
sofrimento e até mesmo na morte a possibilidade de um sentido.
Para Lukas (2002), existem momentos no decorrer da vida que fazem emergir
a questão do sentido. As fases fáceis da vida, em que o indivíduo dispõe de quase
tudo o que deseja, mas não tem nenhum objetivo para viver, nenhuma meta para
esforçar-se a cumprir. As fases difíceis da vida, onde acontecem perdas de
pessoas queridas, oportunidades de realização, e sem elas a vida parece ficar
totalmente sem sentido. E também os tempos de conflitos, onde as percepções do
indivíduo quanto ao sentido e quanto ao que é prazeroso se opõe, ele se sente
dividido entre o dever, a culpa, e os prazeres da vida.
Estes momentos são fundamentais para a busca do sentido da vida e para a
sobrevivência, onde o indivíduo busca por motivos autênticos de sua existência.
Contudo, ele pode encontrar esse sentido e, apesar de todo o sofrimento, dizer
"sim" à vida, e conscientemente responder à sua própria questão sobre o sentido.
Caso contrário, se o sentido não for encontrado, existe um grande perigo de
suicídio, pela justa causa de faltar um para quê viver.
A falta de sentido para a vida, segundo Frankl, é a causa das psicopatologias
modernas, justamente pelo fato da humanidade nunca ter vivido tão sem
esperanças e perspectivas (GOMES, 1992).
O vazio pode ser caracterizado como uma espécie de angústia, que atinge as
pessoas as quais não têm definido um bom motivo para viver. Sem fé e esperança
de viver, o homem perde o sentido que lhe dá capacidade de transcender e de
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superar-se através de uma nova orientação de sua vida no mundo (GOMES,
1992).
Nos dias de hoje, esse sentimento, o vazio existencial, tem se difundido tanto a
ponto de poder ser chamado de neurose de massa, não apenas ele mas também
a depressão, a agressão e a toxicodependência. Motivos pelos quais, as tentativas
de suicídio são inúmeras atualmente. É um grito não escutado por um sentido
para a vida (FRANKL, 2003).
Fato que ocorre com mais freqüência nas sociedades de nível de vida mais
elevado onde existem condições de maior bem-estar, mas dispor de recursos para
viver não significa ter um sentido pelo qual viver.
Sendo assim, a Logoterapia atua no sentido de promover a saúde do homem,
na busca do sentido de sua vida, facilitando o enfrentamento de qualquer situação,
seja ela de sofrimento ou não.
Na sociedade em que vivemos, cada vez as pessoas estão com mais tempo
livre. Não há nada que possua um sentido pelo qual vale a pena gastá-lo. Na
medida que se economiza tensões e empenho, perde-se a capacidade de suportá-
los.
Para a psicoterapia logoterapêutica, o homem tem em si a vontade de sentido
e precisa de um determinado grau de tensão que o faça lutar pela descoberta do
significado que cada tarefa representa em sua vida. O que possibilita a ele não ser
afetado pela chamada neurose noogênica ou doenças do espírito. Essas neuroses
surgem de problemas existenciais, entre eles a frustração da vontade de sentido,
que corresponde a um problema espiritual, um conflito moral ou uma crise
existencial (FANKL, 2006).
24
Uma técnica da logoterapia é a intenção paradoxal. Ela foi criada para
contrapor-se a hiperintenção, termo que denomina o empenho neurótico de fazer
alguma coisa, objetivo da intenção e da atenção. Frankl usou a intenção paradoxal
desde 1929, sua descrição formal só foi publicada dez anos mais tarde. Esta
técnica é eficaz em casos de condições obsessivas compulsivas, fóbicas e casos
de distúrbios do sono (FRANKL, 2003).
Sendo assim, a intenção paradoxal funciona a partir de uma ansiedade
antecipatória, onde um sintoma provoca uma expectativa grande de temor que
aquilo que ele teme possa acontecer. No entanto, o temor acaba sempre fazendo
com que aconteça, exatamente, aquilo que se teme. Ou seja, a ansiedade
antecipatória acaba causando, justamente, o que o paciente não gostaria que
acontecesse.
Nas palavras de Viktor Frankl, "um sintoma evoca uma fobia, a fobia provoca o
sintoma, e a recorrência do sintoma reforça a fobia" (FRANKL, 2003, p.106).
O paciente então começa a fugir das situações que o faziam sentir sua
ansiedade, fugindo do seu próprio medo, caracterizando assim a neurose de
ansiedade.
O procedimento da intenção paradoxal funciona numa inversão da atitude do
paciente. Ele deverá intencionar sua atenção para seu medo, procurar confrontá-lo
e senti-lo, mas não fugir. Ao mesmo tempo, o paciente faz uso da capacidade
humana de autodistanciamento que o possibilita distanciar-se de sua própria
neurose, de si mesmo (FRANKL, 2006).
Outra técnica da logoterapia é a derreflexão. Sua eficácia corresponde a
contenção da hiper-reflexão do paciente, nos casos de comportamento sexual
25
neurótico. Esse caracteriza-se por ser uma luta do paciente pela obtenção do
prazer sexual, e quanto mais o paciente foca a atenção no prazer, mais distante
dele ele fica.
Ou seja, com o objetivo de obter o prazer sexual, o paciente presta atenção em
si mesmo, observando e vigiando, preocupado com o seu desempenho, quando
na verdade ele deveria ter o parceiro como foco da sua atenção, esquecendo
assim da sua vontade de prazer e de si. Ele deve procurar ser ele mesmo,
entregar-se ao outro e, conseqüentemente, obter o prazer que ele tanto desejava
(FRANKL, 2003).
“Cada pessoa tem uma instância que nenhuma doença jamais conseguiria
atingir. Esta é a dimensão noética, a espiritualidade imaculada, o Deus vivo na
intimidade da pessoa humana” (GOMES, 1992, p 31).
Em nenhum momento o homem deixa as demais dimensões, mas a essência
da sua existência está na dimensão espiritual. (JUNIOR e MAHFOUD, 2001).
A dimensão espiritual se manifesta, basicamente, como uma dimensão da
vivência da liberdade e da responsabilidade. Responsabilidade se caracteriza pela
capacidade de responder, pela liberdade atuante no momento em que o homem
responde ou se posiciona diante das circunstâncias presentes. Na dimensão
espiritual, falar da existência é falar do “ser-responsável” e do “ser humano
consciente de sua responsabilidade”. A liberdade refere-se à maneira criativa e
própria de cada indivíduo para tomada de posição diante de todas as
circunstâncias, expressa no momento em que responde a elas. (JUNIOR e
MAHFOUD, 2001).
4 Descoberta do sentido e promoção da saúde
Com os conceitos sobre saúde segundo a Organização Mundial da Saúde -
OMS e, sobre o sentido da vida, segundo a Logoterapia de Viktor Emil Frankl já
esclarecidos, venho agora fazer uma relação sobre como a descoberta do sentido
da vida pode ser positiva para a saúde do ser humano.
Como já foi citado no primeiro capítulo, houve uma mudança no conceito de
saúde. A definição de perfeito bem-estar biopsicossocial foi transformada em bem-
estar biopsicossocio-noético enfatizando, assim, a importância da dimensão
espiritual como fator determinante dentro do conceito de saúde.
Ser saudável não significa apenas ser ausente de doenças. O indivíduo pode
ser saudável psicofisicamente, porém pode ser frustrado existencialmente, ou
seja, a sua dimensão espiritual está doente.
É nesse ponto que a Logoterapia, como ciência, vem a intervir no ser humano,
pois ela reconhece nele essa dimensão noológica ou espiritual, que pode ser
entendida como a dimensão dos valores pessoais, das emoções, da criatividade,
da inteligência e também da religião. Sendo assim, fica impossível negar a
existência dessa dimensão e todos nós como seres humanos a percebemos,
embora com uma certa dificuldade de compreendê-la.
Somente o ser humano tem a capacidade de transcender a si mesmo,
justamente pelo fato de ter em si essa dimensão noética, ou seja, ele tem a
capacidade de distanciar-se de si mesmo e ir além podendo, assim, encontrar um
sentido para viver que não seja ele próprio.
27
As doenças do espírito ou a frustração existencial se dão pelo fato do indivíduo
não ter encontrado um para quê viver, ou seja, ele perde a capacidade de
transcender e não enxerga nada além de si mesmo, acaba sendo escravo de sua
própria angústia, aumentando a cada dia o tédio de viver.
Essa falta de sentido, pode levar o indivíduo a fazer uso de drogas na tentativa
de substituir um vazio existencial pela sensação de prazer, esquecer pelo menos
por um momento os sentimentos, as sensações com as quais ele não sabe lidar e
nem ao menos quer entrar em contato. E também pode ser a causa de uma
depressão e, inclusive, levar ao suicídio.
Contudo, a psicoterapia logoterapêutica, busca ajudar o indivíduo a encontrar
um sentido para sua vida, tornando-o saudável tanto espiritualmente como
biológicamente, afastando-o dos perigos do vazio existencial e aceitando os
desafios que a vida coloca em seu caminho como sendo essenciais para sua
sobrevivência.
Este sentido é intransferível. Apenas pode ser conhecido e realizado por
aquele determinado indivíduo. Cada ser humano é único e insubstituível, ou seja,
cada ser humano tem como tarefa a realização desse sentido. E como ser único,
cada segundo de sua vida também é único, cada situação vivida é somente vivida
por ele, e o sentido de cada uma dessas situações é somente dele.
Independentemente de ser saudável ou não, como seres humanos, temos
consciência de nossa finitude. Um dia todos morreremos e esse é o maior mistério
com o qual nos deparamos. Então, qual é o sentido da vida? Não é o ser humano
quem deve perguntar sobre o sentido da vida. A própria vida é que vai nos
questionar a todo instante. Por isso, devemos estar atentos aos diversos caminhos
28
e oportunidades que vão aparecendo, e por meio da nossa intuição, somos
obrigados a fazer escolhas, com a liberdade de qualquer decisão. Mas essa
liberdade não desconsidera a responsabilidade posterior com a qual nos
deparamos.
Nossas próprias escolhas, comportamentos e ações, são fatores de risco para
a saúde, aumentando as possibilidades de ocorrer doenças, como consumo de
álcool e drogas, fumo, má alimentação, sedentarismo, estresse, entre outros.
Somos o que vivemos. Temos conhecimento de tudo o que experênciamos até
então. O passado é como arquivos e por meio de lembranças e pensamentos
podemos ter acesso a ele. Já o dia de amanhã, esse não se tem conhecimento, a
única certeza, é que sou eu quem cria esse dia, faço uso da minha liberdade e
com responsabilidade e criatividade posso dar sentido e significado para cada
momento da minha existência, ou seja, é no presente que devo estar, é no
presente que devo agir.
Se tivermos essa consciência, podemos perceber que não existem empecilhos
para que se sinta prazer em estar vivo e que o sentido da vida está ao alcance de
todos, independentemente das diferenças.
Algumas causas de doenças estão fora do nosso controle, nem todos os
fatores das doenças são subjetivos, como por exemplo, o câncer. Ele é bem
objetivo, mas pode ter surgido por uma grande frustração existencial. O indivíduo
com tanta dor espiritual e sofrimento subjetivo desenvolve no seu próprio corpo
uma anomalia. O subjetivo passa a ser objetivo.
Nesse caso, existe a possibilidade de cura por meio de tratamentos
quimioterápicos e cirurgias, embora nem sempre com resultado. Existem, no
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entanto, outras doenças, outros casos, onde o indivíduo tem que aprender a
conviver com a sua doença e ainda assim tentar ser feliz. Ter um sentido para
viver é a resposta.
Por mais difícil que seja a situação que um ser humano pode estar vivendo, se
ele tiver um sentido para viver, seja um trabalho para realizar, uma pessoa para
amar, suporta qualquer sofrimento, seja qual for, uma doença, a perda de pessoas
queridas, ou até mesmo como Frankl descreveu em sua biografia, suportar o
sofrimento de estar em um campo de concentração, convivendo com a
possibilidade da morte bem aos seus olhos, passando fome, frio e ainda assim,
não ter vontade de cometer suicídio pelo único motivo de ter um sentido para
continuar vivendo.
Sendo assim, a Logoterapia pode atuar no sentido de promover a saúde do ser
humano. Com o conhecimento de um significado da nossa existência, a
possibilidade de uma frustração existencial é muito reduzida. O ser humano vive
para algo que está além de si mesmo, o foco de sua atenção não são suas
próprias neuroses, seus próprios conflitos. Ele esquece de si mesmo e assim
consegue fazer uso de sua capacidade de autotranscêndencia, distanciando-se de
si mesmo, de suas dificuldades, possibilitando assim, uma nova concepção, um
novo olhar sobre estas questões.
O indivíduo age autenticamente com a sua liberdade e sendo responsável por
essa liberdade, fecha as portas para as chamadas "doenças" e tudo que pode
afetar o seu equilíbrio biopsicossócio-noético.
Ter um sentido na vida possibilita a saúde independentemente das
circunstancias vividas, mesmo nos momentos mais difíceis de suportar, momentos
30
de dor espiritual intensa. Se o indivíduo conhecer o sentido da sua vida, motivo
pelo qual ele deve estar vivo, ele alcança os valores desejados na saúde, como,
uma vida longa, capacidade de reprodução, de trabalho físico, força, resistência
ao cansaço, ausência de dor, um estado mental no qual sente-se o corpo o menos
possível, e a sensação de existir.
O que eu faço hoje, implica no que serei amanhã, por isso, manter a boa saúde
é uma meta para a vida toda e depende, em grande parte, de mim.
5 Considerações finais
Com as leituras e estudos realizados, esta Monografia foi desempenhada a
partir de alguns objetivos. Sendo eles: Definir o conceito de saúde segundo a
Organização Mundial da Saúde – OMS. Quanto a esse objetivo, ficou claro que o
conceito de saúde está passando por uma transformação devido ao fato de que
nos dias de hoje, definir saúde como perfeito bem-estar biopsicossocial é irreal e
ultrapassado. Ser humano é muito mais do que biológico, psicológico e social.
Para ele ser inteiro, deve ser considerada também a dimensão noética ou
espiritual. Sendo assim, saúde, nos dias de hoje, transformou-se em bem-estar
biopsicosócio-noético.
A dimensão noética pode ser entendida como o conjunto de todas as
emoções e convicções da natureza não–material, ou seja, o indivíduo não percebe
e nem compreende tudo o que ele sente e vive. Quanto maior o bem-estar
espiritual e existencial dele, maior será o nível de sua saúde, mais equilibrado ele
estará.
O segundo objetivo desta Monografia consistiu em analisar, segundo a
Logoterapia, o significado da descoberta de um sentido para vida. Sendo assim, a
partir dos estudos realizados sobre a Logoterapia de Viktor Emil Frankl, fica claro
que o ser humano, para esta psicoterapia, tem em si a vontade de sentido, ou
seja, é a vontade de saber o significado do para quê viver que o impulsiona para a
vida e que o faz continuar vivo.
A psicoterapia logoterapêutica tem como princípio a busca de um sentido. Ela
ajuda o ser humano a descobrir um sentido para sua vida, no amor, na realidade
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ou até mesmo no sofrimento. Sentido esse que é único, individual e intransferível.
Apenas pode ser conhecido e cumprido por aquela determinada pessoa.
Por maiores que sejam os sofrimentos, as dificuldades vividas,
independentemente de qualquer uma dessas situações, quando o indivíduo tem
um sentido na sua vida, um para quê viver, ele suporta qualquer dor e se mantém
vivo.
Descobrir um sentido se trata de uma liberdade de agir com responsabilidade
em relação a situação vivenciada. Sendo esta situação sempre única e com
sentido também único.
É através da dimensão noética que o ser humano tem a capacidade de
transcender as limitações sociais e, conscientemente, fazer dos significados e
valores parte fundamental da sua existência.
E, como terceiro objetivo desta Monografia, a relação do conceito de um
sentido para a vida com a promoção de saúde.
Relacionando os conceitos de saúde e a teoria da Logoterapia de Viktor Emil
Frankl, constata-se que a descoberta de um sentido para a vida pode promover a
saúde do ser humano sob vários aspectos.
Ter um sentido para viver significa viver o presente intensamente, procurando
enxergar os valores e os significados de cada momento, despreocupando-se com
o tempo e com a finitude. É agir autenticamente consigo e com os outros. É ser
livre diante das tomadas de decisões e responsável por elas, ou seja, ter um
sentido na vida é ter um equilíbrio físico, psíquico, social e espiritual.
Voltando ao atual conceito de saúde como bem estar biopsicosocio-noético,
fica claro que a descoberta de um sentido para a vida promove a saúde, pois se
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eu vivo para alguma coisa, eu vivo para algo que está fora de mim, distanciando-
me dos meus próprios problemas, das minhas próprias "doenças", superando
qualquer obstáculo em virtude do meu sentido. Vivo para ele, e não por mim
mesmo. Facilitando, assim, o equilíbrio do corpo, da mente e do espírito.
Aceitar as condições que a vida impõe como sendo necessárias para a
existência, absorvendo os melhores significados para tais situações, novos
olhares diante delas, possibilitando assim, ser saudável em qualquer
circunstância, justamente pelo fato de que a saúde não é, de forma alguma,
apenas a ausência de doença.
Ter saúde, ser saudável é um trabalho de amor e cuidado para consigo e para
com os outros. É respeitar os próprios limites, sejam eles físicos ou espirituais e é
um trabalho diário e permanente.
A realização deste trabalho foi de extrema satisfação para mim. Tamanho foi
meu crescimento pessoal em virtude do envolvimento com o assunto, que
diariamente, nas circunstâncias da minha própria vida, a questão do sentido da
vida se torna cada vez mais clara, a ponto de hoje poder afirmar que, como ser
humano, sou uma pessoa muito mais feliz e realizada, as mudanças foram muitas
e com certeza para muito melhor.
Há ainda a possibilidade de dar continuidade a esta pesquisa, investigando
em campo, casos reais de grandes sofrimentos e falta de sentido para viver,
aprofundando ainda mais a teoria e colocando-a em prática.
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